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UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE

FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA

LICENCIATURA EM PSICOLOGIA

PERSPECTIVAS AFRICANAS E FENÓMENOS PSICOLÓGICOS

A possessão na cultura Moçambicana, no


Cristianismo e em Psicologia Ocidental

Discente:
Aída Mandhate
Crishula Celestina
Cristina Vilanculos
Eulália Marrina
Ercília Cumba
Nilza Machava
Jaime Mavie
Nilza Macia
Docente:
Dra. Isalia Mate

Maputo, Abril de 2020

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Índice

1. Introdução..................................................................................................................1

1.1. Objectivo Geral...................................................................................................1

1.1.1. Objectivos Específicos................................................................................1

1.2. Metodologia........................................................................................................1

2. Definição dos conceitos.............................................................................................2

3. Possessão pelos Espíritos...........................................................................................2

4. Possessão nas culturas Moçambicanas.......................................................................3

4.1. Período pré-colonial............................................................................................3

4.2. Período colonial..................................................................................................5

4.3. Período pós-colonial...........................................................................................7

5. Possessão no Cristianismo.........................................................................................7

6. Possessão na Psicologia ocidental..............................................................................9

7.Conclusão.....................................................................................................................10

8. Referências bibliográficas...........................................................................................11

9. Anexo 1: Caso empréstimo desperdiçado…………………………………………...12

10.Anexo2: Confrontação do caso com a obra na mão de Deus e o tema…….…13

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1. Introdução

O presente trabalho enquadra-se na cadeira de Perspectivas africanas e fenómenos


psicológicos, subordinado ao tema: A possessão na cultura Moçambicana, no
Cristianismo e em Psicologia Ocidental.

A possessão pelos espíritos é um factor estabilizador das relações humanas e tem


capacidades de possibilitar mudanças individuais e colectivas de identidade que se
explica grande parte da sua força e persistência e é através da possessão pelos espíritos,
os indivíduos acedem ao conhecimento esotérico que, por seu turno, lhes conferência
poder (Honwana, 2002).

Pretende-se neste trabalho analisar o fenómeno de possessão na cultura Moçambicana,


no cristianismo e em Psicologia Ocidental, que será possível mediante uma revisão da
literatura baseada na pesquisa documental que se caracteriza pela colecta de dados
restritos a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denominam de fontes
primárias.

1.1. Objectivo Geral


 Compreender o fenómeno de possessão na cultura Moçambicana, no
Cristianismo e em Psicologia Ocidental.

1.1.1 Objectivos Específicos


 Descrever o fenómeno possessão na perspectiva Moçambicana;
 Identificar as concepções sobre a possessão nos períodos pré-colonial colonial e
pós-colonial;
 Apresentar a ideologia cristã sobre a possessão pelos espíritos e a visão da
Psicologia Ocidental em relação a possessão pelos espíritos.

1.2. Metodologia
Para a realização do trabalho o grupo recorreu a pesquisa bibliográfica, onde Gil (2008)
advoga que esta pesquisa é desenvolvida a partir de material já elaborado constituído
por manuais e artigos científico e discussão intragrupal. O trabalho encontra se
estruturado da seguinte maneira: Introdução, revisão de literatura, desenvolvimento,
conclusão e referências bibliográficas.

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2. Definição dos conceitos
Tradição - É um conjunto de padrões de crenças, valores, significados, formas de
comportamento, conhecimento e saber, passados de geração em geração pelo nosso
processo de socialização. E que não se pode afirmar como uma réplica exacta de uma
prática anterior, porque as tradições são criadas e recriadas através de um processo
histórico (Honwana, 2002).

Cultura - É um padrão de significados que dá forma às experiências humanas e fornece


um quadro de entendimentos e de crenças que sustentam as acções que as pessoas
desenvolvem ao longo das suas vidas. Esta, desempenha um papel importante no bem-
estar social e emocional, visto que, em larga medida, as pessoas gerem suas doenças
com base em percepções sociais e culturais Geertz (1973) citado por Honwana (2002).

Possessão - Segundo Honwana (2002), é um estado particular em que o indivíduo


experimenta a separação temporária da sua própria essência e identidade.

Firth (1959) citado por Honwana (2002), define posse pelos espíritos como uma forma
de transe em que as acções comportamentais de uma pessoa são interpretadas como
prova de controlo do seu comportamento por um espírito normalmente exterior a si
próprio. Beattie e Middleton (1969) citado por Honwana (2002) acrescentam a esta
definição a ideia de que a possessão pelos espíritos pode incluir um transe tanto real
como presumido.

Para Cranpazano (1977), citado por Bairrão, Dias e Miguel (2013), possessão é um
idioma cultural colectivamente compartilhados, capaz de fornecer aos indivíduos e
grupos que dele se utilizam a capacidade de articular, comunicar e elaborar as mais
variadas experiencias e situações de vida quotidiana.

3. Possessão pelos Espíritos


A possessão pelos espíritos é um factor estabilizador das relações humanas e tem
capacidades de possibilitar mudanças individuais e colectivas de identidade que explica
grande parte da sua força e persistência (Honwana, 2002).

Através da possessão pelos espíritos, os indivíduos possuídos podem assumir múltiplas


identidades pelo facto de serem hospedeiros de vários agentes espirituais (tanto
humanos como não humanos). Podem assumir a identidade de familiares e membros da

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comunidade falecidos, assim como de estrangeiros, como é o caso dos Nguni ou Ndau
com quem tiveram uma interacção próxima (Honwana, 2002).

Jackson (1978), defende que numa multiplicidade de palcos, indivíduos e grupos não
possuídos tem também a possibilidade de negociar, predefinir e recriar múltiplas
identidades (tanto pessoais como colectivas) tendo como referência o fenómeno da
possessão pelos espíritos. Tal acontece por meio de processos como adivinhação e a
cura, em que o diagnóstico do adivinho identifica uma transgressão de normas sociais
ou um comportamento incorrecto, exigindo-se uma reparação através de rituais.

Além disso, no diálogo adivinho/paciente, durante a consulta, gera-se um processo de


transferência e contra-transferência de informações no qual as identidades pessoais e
colectivas são objecto de negociação (Jackson, 1978).

4. Possessão nas culturas Moçambicanas

4.1. Período pré-colonial


No sul de Moçambique, os espíritos locais Tinguluve ou Mahlongaeram responsáveis
pelo sistema de moralidade da sociedade, e interligaram-se com os espíritos estrangeiros
dos grupos Ngunie Ndaucom os quais os grupos Tsonga tinham uma estreita ligação
(Honwana, 2002).

Além de mais, a síntese de espíritos Tinguluves locais com espíritos estrangeiros


Vanguni e Vandau deu origem a um novo tipo de praticantes de medicina tradicional o
Nyamsoro (Honwana, 2002).

A importância desse desenvolvimento reside na aceitação implícita do carácter


transcultural da posse pelos espíritos que se tornou central para as sociedades
(Honwana, 2002).

No sul de Moçambique, o conhecimento era tido como um recurso escasso, guardado


3331por indivíduos escolhidos (anciãos, antepassados e os que por eles são eleitos), que
deve ser passado de geração em geração. Através da possessão pelos espíritos, os
indivíduos acedem ao conhecimento esotérico que, por seu turno, lhes conferência
poder (Honwana, 2002).

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O conhecimento esotérico que certos indivíduos adquirem através da posse pelos
espíritos dá-lhes a base do poder para o controlo e influenciar os outros membros da
comunidade (Honwana, 2002).

Quando alguém morre e o seu corpo é enterrado, crê-se que o seu espírito permanece
como manifestação do seu poder, personalidade e conhecimento na sociedade, ou seja,
espíritos dos mortos exercem uma poderosa influência sobre os vivos e por isso, para
que haja harmonia os indivíduos têm que os acomodar e seguir a sua vontade. Deste
modo, o mundo espiritual é uma continuidade do mundo dos vivos no sentido em que,
mesmo após a morte, os mais velhos continuam a orientar e controlar os seus
descendentes (Honwana, 2002).

Quando a pessoa fica possuída pelos espíritos o fenómeno é referido pelas seguintes
expressões locais. «Fulano/a tal a niSwikwembu», que significa ele/a tem espíritos; ou
«fulano/a tal a humelivihi Swikwembu». Estas expressões poderão sugerir que os
espíritos se encontram sempre no corpo da pessoa ou, pelo menos, que alguma força
espiritual pode iniciar, estes encontram-se dormentes em cada pessoa até ser escolhida
para desenvolver suas potencialidades (Honwana, 2002).

Svikwembué a palavra tsonga para designar os espíritos ou deuses. Segundo Junod


(1927), citado por Honwana (2002), sugere que o termo Svikwembu deriva da palavra
vukwembu que quer dizer «a coisa que cria a vida e provoca a morte, riqueza ou
pobreza». Assim sendo, torna-se necessário frisar que os swikwembu precisam de
mediadores para se manifestar ou manter contacto com o mundo dos vivos, Neste caso
os nyanga (curandeiro), os nyangarume, e o nyamusoro.

Tinyanga(ou nyanga- singular) é o termo tsonga para designar todos os indivíduos,


possuídos ou não por espíritos, que tratam das doenças e das desgraças nas
comunidades. Antes da interpenetração dos grupos Nguni e Ndau, no século XIX
existiam apenas dois tipos de tinyanga: os nyanga- praticantes da medicina tradicional
não possuídos pelos espíritos, que aprenderam os segredos da profissão com outros
indivíduos; e os nyangarume, possuídos pelos espíritos tinguluvee especialistas em
medicina à base de plantas para adivinharem, curarem e combaterem a magia e feitiçaria
mas sem entrarem em transe (Honwana, 2002).

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A possessão pelos espíritos implicando os estados de consciência alterados ou transe
«real» surge no último quarto do século XIX quando os povos Tsonga ficaram expostos
ao transe real através dos grupos externos à região, com os quais interagiram (Honwana,
2002).

A interacção entre estes vários grupos deu lugar a um novo tipo de praticante de
medicina tradicional: o nyamusoro. Esta nova figura incorpora os três tipos de seres
espirituais (Nguni, Ndau e Tsonga) combinando os seus poderes e funções (Honwana,
2002).

4.2. Período colonial


Durante o colonialismo houve tentativas de supressão da posse pelos espíritos;
argumentava-se a necessidade de «civilizar» a população africana (Honwana, 2002).

A introdução do cristianismo e da educação missionária básica para nativos foi


estruturada de modo a substituir, combater as suas crenças e práticas supersticiosas e a
fornecer-lhes conhecimento para servirem o domínio colonial. O colonialismo
português criou o sistema de regulados que encarregava-se, ao nível local da
implementação da justiça com base no direito consuetudinário da recolha de impostos,
do recrutamento do trabalho forçado bem como a análise dos fenómenos de cultos de
possessão (Honwana, 2002).

Desta forma, a rejeição de práticas sociais e culturais rotuladas de obscurantistas e de


supersticiosas, como a possessão, a feitiçaria bem como a conversão a religião cristã
eram elementos fundamentais no processo de aculturação (Honwana, 2002).

Nas primeiras décadas da dominação colonial, houve um esforço no sentido de reprimir


o funcionamento de instituições religiosas tradicionais. Os valores sociais e culturais da
população nativa, considerados retrógrados e incivilizados, foram reprimidos na
tentativa de introduzir novos valores ligados ao cristianismo. Alvos especiais a serem
combatidos foram particularmente as práticas ligadas aos cultos de possessão dos
espíritos e a feitiçaria (Honwana, 2002).

Vários informantes fizeram referência a casos e histórias de indivíduos envolvidos em


práticas como adivinhação, exorcismo e os rituais de cura espiritual que foram punidos
com pena de prisão, enviados para os trabalhos forçados ou mesmo deportados para
outras províncias ultra-marinas. Por volta dos anos 1916 - 1920, a detenção de nativos

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aumentou consideravelmente por causa de um movimento conhecido por murrimi, era o
nome de uma porção mágica distribuída para a população para ser bebida em rituais
especiais. Este era reconhecido poderes especiais como os de protecção de indivíduos e
grupos contra o feitiço e outros males, azares da vida e a capacidade de trazer paz e
harmonia às comunidades (Honwana, 2002).

Embora o encarceramento e a deportação dos moçambicanos por praticarem actividades


envolvendo a posse pelos espíritos fosse já uma prática, os dirigentes coloniais
procuravam castigos mais severos, pois os existentes não bastavam para dissuadir a
população de continuar a praticar os seus costumes tradicionais (Honwana, 2002).

Alguns régulos, cientes da necessidade de a população continuar com as suas práticas


culturais, acabaram por autorizar a realização de rituais para venerar os espíritos dos
antepassados assim como a prática de adivinhação e da cura pelos espíritos. Algumas
destas actividades eram toleradas, especialmente às que não envolviam o que
comummente se apelidava por curanderismo e feitiçaria (Honwana, 2002).

Apesar dos severos castigos a que estava sujeita, a população nativa continuava a
praticar os seus cultos e não abandonava as suas raízes e tradições. Os antepassados
orientavam os régulos na governação do território e nas suas relações com os
governantes portugueses. Os principais rituais que eram tolerados são: mhamba, que se
destinava a kuphahla; os rituais da chuva (mbelele), destinados a promover a fertilidade
da terra e a boa produção agrícola; os rituais (vukanyi) que se realizavam
principalmente para evitar maus comportamentos e conflitos durante o período do
vukanyi (Honwana, 2002).

Numa determinada altura, era difícil realizar tais rituais por causa dos portugueses mas
posteriormente, eles acabaram por aceita-los, embora continuassem a proibir os
tinyangas (curandeiros, adivinhos e médiuns) e os valoyi (ceifeiros ou mágicos).
Quando os seus projectos estavam em risco, as autoridades coloniais por vezes
aceitavam a realização de rituais visando apaziguar os espíritos ancestrais (Honwana,
2002).

O Cristianismo constituía um instrumento poderoso de opressão. A Igreja era


fundamental na luta contra as crenças e práticas tradicionais dos africanos,

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particularmente as que se relacionavam com a possessão pelos espíritos, o culto dos
antepassados e a feitiçaria (Honwana, 2002).

4.3. Período pós-colonial


Em Junho de 1975 foi proclamada a independência de Moçambique, que se constituiu
num Estado de partido único. Um governo que rejeitou as autoridades tradicionais, as
crenças e práticas tradicionais ligadas à adoração dos antepassados e à posse pelos
espíritos, rotulando-as de obscurantistas e supersticiosas. Práticas como os ritos de
iniciação, o lobolo e a poligamia também foram desencorajadas e mesmo reprimidas por
não estarem de acordo com as novas políticas que proclamavam a emancipação da
mulher (Honwana, 2002).

A orientação marxista da Frelimo favorecia uma visão materialista da realidade social,


por oposição às crenças e práticas «supersticiosas» e «obscurantistas» da sociedade
tradicional onde, foram proibidos os rituais da chuva e da fertilidade, Kuphahlae os
rituais timhamba. Na mesma linhagem, foram igualmente reprimidos os praticantes de
medicina tradicional, como o nyanga, desencorajavam o recurso aos tinyanga, em
especial ao nyamusor79o (Honwana, 2002).

O Estado não reconhecia a sua profissão como adivinhos, praticantes de medicina


tradicional e médiuns de contacto com espíritos. Apesar de tudo, as instituições
tradicionais não desapareceram e continuaram a operar clandestinamente, tanto nas
zonas rurais como nas urbanas (Honwana, 2002).

Em finais de 1980 e início dos anos 90, os praticantes de medicina tradicional,


adivinhos e médiuns no contacto com os espíritos foram encorajados pelo governo a
criar uma associação nacional. O governo, com o intuito de conquistar o apoio popular,
ganhar a guerra e reconstruir o país, teve que recuperar a tradição promovendo a criação
da Associação Moçambicana de Medicina Tradicional (AMETRAMO), reconsiderando
a sua posição para com os chefes tradicionais e tomando outras medidas destinadas a
restaurar a dignidade da cultura tradicional na sociedade Moçambicana (Honwana,
2002).

5. Possessão no Cristianismo
As Igrejas Zione, levam a cabo rituais associados sobretudo a desordens espirituais
através de acções de purificação e protecção com água salgada e cinzas (Kiernan 1978),
9
mas também com o uso de vaselina (vimbhela), de objectos e elementos variados que os
seus profetas identificam através de sonhos e visões. Nos processos de cura, incluindo a
fase de diagnóstico, são marcados por fortes ambiguidades e elipses (Cavallo, 2013).

As relações entre as Igrejas Zionistas e os Tinyanga foram marcadas por alguns


conflitos e tensões pelo facto de ambas as instituições lidarem com a cura espiritual e a
promoção do bem-estar das comunidades. Estas correspondências são evidentes no que
se refere à posse pelos espíritos e à cura (Honwana, 2002).

A posse pelos espíritos constitui o centro do qual gravitam as actividades dos Tinyanga,
e ela também é uma das principais características dos rituais de cura Zionistas. A
revelação Zionista articula-se através da posse pelos espíritos, isto é, os profetas são
possuidos pelos agentes espirituais que os inspiram e ajudam na sua tarefa de curar
(Honwana, 2002).

Apesar de usarem algumas forças espirituais para a cura, os Zionistas não aceitam os
espíritos dos Vanguni e Vandau integrados na região através do processo Mpfhukwa,
porém, aceitam os espíritos dos antepassados da família, os tinguluvi e
mahlonga(Honwana, 2002).

Para o Cristianismo, a possessão consiste em um domínio que o demónio exerce


directamente sobre o corpo e indirectamente sobre a alma de uma pessoa. Esta se
converte em um instrumento cego, dócil, fatalmente obediente ao poder perverso e
despótico do demónio (Solimeo, 1994 citado por Vaz, 2015).

Aquino (2019) afirma que a Igreja católica admite a possibilidade da possessão, tanto
que recentemente actualizou o ritual do exorcismo. Desta forma, o exorcismo é quando
a igreja exige publicamente e com autoridade em nome de Jesus Cristo, que uma pessoa
ou objecto seja protegidos contra a influência do mal e subtraídos a seu domínio. E as
razões pelas quais uma pessoa possa ser dominada pelo demónio, não são muito claras,
mas certamente pode ser causada por uma vida de pecado, vivências esotéricas, falta
dos sacramentos especialmente do baptismo e outras razões.

O exorcismo solene chamado grande exorcismo só pode ser praticado por um sacerdote
preparado para realizá-lo com a permissão do bispo, nele é necessário proceder com
prudência, observando estritamente as regras estabelecidas pela Igreja. Este tem como

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finalidade expulsar os demónios ou livrar da influência demoníaca, e isto advém pela
autoridade espiritual que Jesus confiou a sua Igreja (Aquino, 2019).

É importante, assegurar-se antes de praticar o exorcismo se trata-se da uma presença do


mali ou de uma doença, isto porque, o progresso da medicina e da psicologia ensinam
que muitos dos sintomas outrora atribuídos ao demónio podem ter a sua causa em
efeitos patológicos, nervosos ou mesmo para psicológicos. Por isso a igreja exige que
haja um discernimento muito sério antes de se praticar o ritual (Aquino, 2019).

6. Possessão na Psicologia ocidental


A psicologia ocidental, com pressupostos baseados na teoria de descartes, encara o
corpo e a mente como entidades distinguíveis e separadas. Esta concepção indica que as
causas da doença se localizam no corpo ou na mente, mas não simultaneamente em
ambas (Honwana, 2002).

Os modelos psicoterapêuticos ocidentais também situam as causas da perturbação


psicossocial no indivíduo e procuram respostas que se baseiam fundamentalmente na
terapia individual, e deste modo, consegue-se a recuperação ajudando o indivíduo a
enfrentar a experiência traumática processando-se a cura em sessões individuais
privadas destinadas a desabafar e a exteriorizar sentimentos e males, ou por meio de
medicamentos (Gibbs&Boyden 1996, citados por Honwana 2002).

Gibbs e Boyden (1996), citados por Honwana (2002), mostram que a terapia individual
levada a cabo por um psicólogo ocidental podia ser ineficaz na interpretação da
possessão por duas razões:

A primeira: não tomava em consideração o papel dos espíritos ancestrais, dos espíritos
malévolos e de outras forças sobrenaturais nos processos etiológicos que dão origem às
doenças;

Segundo: Ao individualizarem o processo terapêutico exclusivamente no paciente,


excluem o papel que a família e os antepassados podem desempenhar no tratamento e
na cura.

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7. Conclusão
A possessão consiste em um domínio que o demónio exerce directamente sobre o corpo
e indirectamente sobre a alma de uma pessoa. Esta se converte em um instrumento cego,
dócil, fatalmente obediente ao poder perverso e despótico do demónio. A possessão
permite aos indivíduos e grupos comunicarem e manterem relações saudáveis tendo em
conta o contexto cultural e considerando os seus antepassados como parte das suas
vivências e experiências quotidianas.

A psicologia concebe a possessão como uma perturbação mental que precisa ser tratada
com base em terapias individuais e medicamentos para aliviar a dor dos pacientes.

A religião cristã representada pelas igrejas zione e católica apresenta visões diferentes
em relação ao fenómeno de possessão. Os ziones interpretam a possessão como um dom
divino que nos permite manter relações com os nossos antepassados, estes que fazem
parte das nossas decisões, sendo a participação deles importantes na nossa vida. Em
contra partida, a igreja católica interpreta a possessão como um fenómeno diabólico no
qual um espírito maligno exerce um poder sobre pessoa, e esta torna-se inevitavelmente
obediente ao diabo.

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8. Referências bibliográficas
Aquino, F. (2019). O que é possessão diabólica? Universo católico. Consultado em
19.03.2020. disponível em: www.universocatolico.com.br/index.php? /O-que-e-
possessao-diabolica.html

Bento, C.L. (1969). A possessão em Moçambique. Achegas para o seu estudo; O


Curandeiro N ́kanga entre os Wamwuani do Ibo 1.

Cavallo, G. (2013). Curar o passado: mulheres, espíritos e “caminhos fechados” nas


igrejas Zione em Maputo, Moçambique. Universidade de Lisboa
Chiziane, P. e Da Silva, M. C. (2013). Na Mão de Deus.Maputo: Carmo Editora

Dias, R.N. & Bairrão, J.F.M.H. (2013). Trajectórias Investigativas da Possessão: Uma
Abordagem Etnopsicológica. Universidade de São Paulo (Ribeirão Preto), Brasil.
Consultado em 19/03/2020.Disponível em http://dx.doi.org/10.5327/Z1982-
1247201300020010

Gil, A.C. (2008). Métodos e técnicas de pesquisa social.6ªEdição.São Paulo

Honwana, A.M. (2002). Espíritos Vivos, Tradições Modernas: possessão de Espíritos e


Reintegração Social Pós-guerra no Sul de Moçambique. PROMEDIA

Zangari. (s/d). O que é a possessão na visão da psicologia? Consultado em 19/03/2020.


Disponível em https://www.altoastral.com.br/possessao-visao-da-psicologia/

Vaz, R. A. (2015). Possessão demoníaca e subjectivarão religiosa no processo de


romanização na será catarinense (primeira república). Consultado em: 19.03.2020.
Disponível em:
www.snh2015.anpuh.org/resources/anais/39/1443215499_ARQIVO_antigo_Anpu_201
5.pdf

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9. Anexo 1: Caso empréstimo desperdiçado

Dadinha, de 29 anos de idade mãe de dois filhos, secretária residente no bairro

Hulene "A"; vive momentos marcado por empréstimos bancários. No ano passado
Dadinha fez empréstimo em dois bancos da cidade de Maputo, seu esposo com quem
vive com ela perguntou lhe o porquê de tantos empréstimos bancários, em resposta
Dadinha afirmou que queria realizar seus sonhos de ampliar sua casa e comprar um
carro de marca BMW, mais isso não chegou de acontecer pois o valor desapareceu das
suas mãos e nem sabe explicar o que fez concretamente com o valor. Um dos bancos ao
se aperceber de que Dadinha não estava a cumprir com o combinado queria confiscar os
seus bens que era a casa com que construiu com o seu esposo dai seus padrinhos
prontificaram se em pagar sua divida, feito isso não tardou Dadinha recebeu novamente
uma notificação de um dos bancos fazendo lhe a cobrança da divida pois não estava a
cumprir com as cláusulas por ela assinadas.

Dai que as dividas atormentavam lhe, que começou a ter maus sonhos constantemente, e
quando seu esposo a questionava, ela alegava sonhar com a charà, que morreu a quinze
(15) anos mandando contrair dividas que ia ajudar a pagar. Preocupados com a Dadinha,
o esposo e seus pais levaram-na à uma igreja profética onde ela manifestou um espírito
que dizia: sou chara dela, vocês sabem que eu não tenho filhos, vocês nunca se
lembram de mim e nunca fizeram missa para mim, por isso eu tenho rancor de vocês e
para me vingar eu guio a vossa filha a fazer empréstimos em banco sem motivos
concretos para que ela seja mal vista na família e criar conflitos com o seu esposo. O
Pastor orou pela Dadinha e ela voltou ao seu estado normal. Porém alguns dias depois,
Dadinha começou a entrar em transe em casa e os pais decidiram desta vez levá-la a um
curandeiro.

Chegados ao curandeiro, após o relato de todos acontecimentos, este procedeu com o


"ku lhalhuva" onde avançou que eles deviam comprar: um cabrito, duas capulanas,
dois lenços da cabeça e três latas de milho, rapé, um garrafão de vinho branco e uma
garrafa de refresco de marca fanta, e um valor de mil meticais trocados em notas de cem
meticais somente as notas vermelhas e uma moeda de dez meticais para fazerem um
ritual visando uma reconciliação com a tia

14
10. Anexo 2: Confrontação do caso com a obra na mão de Deus e o tema
A luz da obra na mão de Deus (p. 63), na mente do povo, a doença é provocada, e as
pessoas com doença mental são vistas como quem está a pagar por algum mal que fez.
No caso acima percebe-se que o espírito que possui a Dadinha, vem para fazer pagar a
família da Dadinha pelo facto de terem se esquecido da chara dela.

É preciso que se começe a tomar em consideração o flagelo da obsessão que é o


domínio que alguns espíritos exercem sobre algumas pessoas (p. 81), no caso da
Dadinha trata-se do domínio que o espírito da sua charà exerce sobre ela, ordenando
com que ela contraia dívidas de modo a ser mal vista na família e entrar em conflitos
com o esposo.

Os espíritos de baixa moral impõem constrangimentos á vontade do indivíduo (p. 81),


no caso da Dadinha, traz constrangimentos no seu lar e na sua família por ter contraído
dívidas em dois bancos.

A família pode ajudar a vencer a influência desses maus espíritos, pois é considerada
um escudo, uma defesa contra essas tentações (p.82), neste caso os pais e o esposo
preocupados com a filha, procuraram ajuda na Igreja, e como não resultou recorreram
ao curandeiro.

Percebe-se que aqueles que se julgam mortos estão sempre connosco, como entidades
invisíveis (p. 91), uma vez que o espírito da chara de Dadinha, alega ou reclama que
ninguém visita a sua campa, pior porque nem teve filhos.

Os bons espíritos não forçam, perguntam e sugerem caridosamente dando liberdade ao


médium de pensar e de agir. Os espíritos são poderosos sim, mas entram em
concordância com os vivos.

Em relação ao tema possessão na cultura moçambicana, de acordo com a obra na mão


de Deus: os espíritos estão ainda muito ligados a terra, vivem uma preocupação perante
aqueles que deixaram, estão preocupados com a solidão e a exclusão daqueles membros
da família que não tiveram a sorte de singrar na vida. Estão preocupados com a quebra
da coesão na condução da família (p. 109).

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