Modulo 1 - FILOSOFIA PDF
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era antes que tudo existisse tal como existe no presente; a filosofia,
ao contrário, se preocupa em explicar como e por que, no
O SURGIMENTO DA FILOSOFIA passado, no presente e no futuro, as coisas são como são.
O pano de fundo que o pensamento mítico representa para todas as 2. O mito narrava a origem por meio de genealogias e rivalidades ou
culturas deu lugar, com o passar do tempo, a outra forma de alianças entre forças divinas sobrenaturais e personalizadas; a
interpretação da realidade, marcada pela lógica e pela racionalidade, a filosofia, ao contrário, explica a produção natural das coisas por
qual passou a buscar explicações naturais (não sobrenaturais, como o elementos naturais primordiais (água ou úmido, fogo ou quente, ar
mito) para os fenômenos e o conjunto do meio que cercava os homens. ou frio, terra ou seco)
A palavra Filosofia provém da língua grega clássica e sua etimologia 3. O mito não se importava com contradições. Com o fabuloso e o
mostra que ela é uma composição, uma junção, de duas palavras: incompreensível, não só porque esses eram traços próprios da
philia e sophia, em português, podemos traduzir por amor e narrativa mítica, como também por que a confiança e a crença no mito
sabedoria. Segundo os relatos mais antigos, foi Pitágoras de Samos, vinham da autoridade religiosa do narrador. A filosofia, ao contrário,
um dos homens mais sábios da Grécia Antiga, no séc. VI a.C. que não admite contradições, fabulação e coisas incompreensíveis,
primeiro utilizou a palavra filosofia com esse significado. Para ele, o mas exige que a explicação seja coerente, lógica e racional; além
amante da sabedoria, o filósofo, é movido pelo desejo de observar, disso, a autoridade da explicação não vem da pessoa do filósofo, mas
contemplar, julgar e avaliar as coisas, as ações, as pessoas, os dá razão, que é a mesma em todos os seres humanos.
acontecimentos, a vida; enfim, pelo desejo de saber e não por FILOSOFIA ANTIGA
interesses comerciais ou financeiros.
A filosofia antiga grega e greco-romana tem uma história mais do que
A raiz da Filosofia
milenar. Partindo do século VI a.C., chega até o ano de 529 d.C., ano
Mas, após definir algumas características da filosofia alguém, com
em que o imperador Justiniano mandou fechar as escolas pagãs e
certeza, perguntará: Por que o homem sentiu a necessidade de
dispersar os seus seguidores. Nesse arco de tempo, podemos
filosofar? Os antigos respondiam que tal necessidade está
distinguir os seguintes períodos:
estruturalmente radicada na própria natureza do homem. Como
1) O período Naturalista, que caracterizou-se pelo problema da Physis
escrevia Aristóteles, “Por natureza, todos os homens aspiram ao e do Cosmos e que entre os séculos VI e V a.C., viu sucederem-se os
saber”. E ainda: “Exercer a sabedoria e conhecer são desejáveis pelos jônicos, os pitagóricos, os eleatas e os pluralistas.
homens em si mesmos: com efeito, não é possível viver o homem sem 2) O período chamado Humanista, que, em parte, coincide com a
essas coisas. ” E os homens tendem ao saber porque sentem-se última fase da filosofia naturalista e com sua dissolução, tendo como
plenos de “admiração” ou “maravilham-se”, dizem Platão e protagonistas os sofistas e, sobretudo, Sócrates, que pela primeira vez
Aristóteles: “Os homens começaram a filosofar, tanto agora como tenta determinar a essência do homem,
nas origens, por causa da admiração: no princípio, eles ficavam 3) O momento das grandes sínteses de Platão e Aristóteles, que
maravilhados diante das dificuldades mais simples; em seguida, coincide com o século IV a.C., caracterizando-se sobretudo pela
progredindo pouco a pouco, chegaram a se colocar problemas descoberta do supra-sensível e pela explicitação e formulação orgânica
sempre maiores, como os problemas relativos à origem de todo o de vários problemas da filosofia.
4) Segue-se o período caracterizado pelas escolas helenísticas, que
universo”.
vai da grande conquista de Alexandre Magno até o fim da era pagã e
MITO E FILOSOFIA
que, além do florescimento do cinismo, vê surgirem também os
Os historiadores da filosofia indagam se ela nasceu realizando uma
grandes movimentos epicurismo, do ceticismo e a posterior difusão do
transformação gradual sobre os mitos gregos ou produzindo uma
ecletismo.
ruptura radical com os mitos. O mito, pela sua relação com o divino,
é, pois, incontestável e inquestionável. Os problemas fundamentais da Filosofia Antiga
O mito narra a origem das coisas por meio de lutas, alianças e Inicialmente, a totalidade do real era vista como physis (Natureza) e
relações sexuais entre forças sobrenaturais que governam o como cosmo. Assim, o problema filosófico por excelência era a
mundo e o destino dos homens. Como os mitos sobre a origem do questão cosmológica. Os primeiros filósofos, chamados precisamente
mundo são genealogias, diz-se que são Cosmogonias e Teogonias. de “físicos”, “naturalistas”, ou “cosmológicos”, propunham-se os
A pergunta dos estudiosos é a seguinte: ao surgir, a filosofia não é seguintes problemas: como surgiu o cosmo? Quais são as fases e os
uma cosmogonia, e sim uma cosmologia, uma explicação racional momentos de sua geração? Quais são as forças originárias que agem
repetições das coisas; mas a cosmologia nasce de uma Com os sofistas e Sócrates, porém, o quadro mudou. A problemática
transformação gradual dos mitos ou de uma ruptura radical com os do cosmo entrou em crise e a atenção passou a se concentrar no
mitos? A filosofia continua ou rompe com a cosmogonia e a teogonia? homem e em suas virtudes específicas. Nascia assim a problemática
limitações dos mitos para explicar a realidade natural e humana Com as grandes construções sistemáticas do séc. IV. a.C., a
levaram a filosofia a retomá-los, porém reformulando e racionalizando temática filosófica iria enriquecer ainda mais, distinguindo alguns
as narrativas míticas, transformando-as numa explicação inteiramente âmbitos de problemas (relacionados com a problemática do todo) que,
nova e diferente. ao longo de toda história da filosofia, iriam permanecer com pontos de
Quais são as diferenças entre filosofia e mito? Podemos apontar três referência paradigmáticos.
1. O mito pretendia narrar como as coisas eram ou tinham sido no De acordo com a tradição histórica, a fase inaugural da filosofia grega é
passado imemorial, longínquo e fabuloso, voltando-se para o que conhecida como período pré-socrático. É difícil conhecer o pensamento
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desse período em toda sua dimensão, pois são poucos os escritos Por isso, denominou-o de ápeiron, termo grego que significa “o
encontrados dos seus pensadores, e até mesmo as datas de indeterminado”, o “infinito” no tempo.
nascimento e morte são incertas. O ápeiron seria a “massa geradora” dos seres e do cosmo, contendo
Cabe ressaltar, também, que alguns filósofos chamados de “pré- em si todos os elementos opostos.
socráticos” foram contemporâneos de Sócrates, mas são assim Anaxímenes
designados porque mantiveram o tipo de investigação de seus Um terceiro milésio, Anaxímenes (c. 588-524 a. C.), discípulo de
predecessores, centrado na physis (Natureza). Sócrates, por sua vez, Anaximandro, concordava que a origem das coisas era indeterminada.
defendia um tipo de reflexão centrada no ser humano, dando início a Entretanto, recusou-se atribuir a essa indeterminação o caráter de
outra tradição filosófica (como veremos mais adiante). arché.
Pensadores de Mileto Para ele, esta não poderia ser um elemento situado fora dos
Quando afirmamos que a filosofia nasceu na Grécia, devemos tornar limites da observação e da experiência sensível, como o ápeiron de
essa informação mais precisa. Afinal, é importante lembrar, que nunca Anaximandro.
houve, na Antiguidade um Estado grego unificado. O que chamamos Em discordância com aspectos do pensamento dos dois mestres
de Grécia nada mais era que o conjunto de muitas cidade-Estado anteriores, mas buscando uma síntese entre eles, Anaxímenes
(pólis), independentes umas das outras e muitas vezes rivais. incorporou argumentos de ambos e propôs que o Ar como princípio de
No vasto mundo grego, a filosofia teve berço na cidade de Mileto, todas as coisas, Diz Anaxímenes, “Como nosso, que é ar,
situada na Jônia, litoral ocidental da Ásia Menor (atual Turquia). soberanamente nos mantém unidos, assim também todo o cosmo
Caracterizada por múltiplas influências culturais e por um rico sopro e ar o mantém”.
comércio, Mileto abrigou três primeiros pensadores da história Infinito e ilimitado, penetrando todos os espaços vazios do
ocidental a quem atribuímos a denominação de filósofos. São eles universo, o ar constituiria uma arché mais determinada que o
Tales, Anaximandro e Anaxímenes. ápeiron.
Destaca-se, entre os objetivos desses primeiros filósofos, a construção Pitágoras: Os Números
de uma cosmologia, explicação racional e sistemática das Resposta bastante distinta na busca da arché veio de Pitágoras de
características do universo. Por isso, eles tentaram descobrir, com Samos (c. 570-490 a.C.). Profundo estudioso de matemática, Pitágoras
base na razão e não na mitologia, o princípio substancial ou defendeu a tese de que todas as coisas são números.
substância primordial (a Arché, em grego) existente a todos os seres Conta-se que, para chegar a essa tese, primeiro teria percebido que as
materiais. O princípio é “aquilo do qual derivam originariamente e no harmonias dos acordes musicais correspondiam certas proporções
qual se ultimam todos os seres”, é “uma realidade que permanece aritméticas. Supôs, então, que as mesmas relações se encontrariam na
idêntica o transmutar-se de suas alterações. Assim, o “princípio” é: natureza.
1) A fonte e origem de todas as coisas; Se para Pitágoras “tudo é número”, isso quer dizer que o princípio
2) A foz ou termo último de todas as coisas; fundamental (a arché) seria a estrutura numérica, matemática, da
3) O sustentáculo permanente que mantém todas as coisas. realidade.
Em resumo, o “princípio” pode ser definido como aquilo do qual As doutrinas pitagóricas tiveram grande influência sobre Platão e
provém uma coisa, aquilo no qual se concluem e aquilo pelo qual Platonismo. Recordemos, por último, que foi Pitágoras quem fez o uso
existem e subsistem todas as coisas. da palavra filosofia pela primeira vez.
Qual era a Arché para cada pensador pré-socrático? É o que Heráclito: Fogo e devir
detalharemos em seguida. Em outra cidade jônica, Efésio, também se desenvolveu um
pensamento distinto e original. Isso se deveu a Heráclito (c. 535-475
Tales: A água
a.C.), estudioso da natureza e preocupado com a arché.
Tales de Mileto (c. 623-546 a.C.) é tido como o pensador que deu início
Assim como os pensadores de Mileto, Heráclito observara que a
a indagação racional sobre o universo. Inspirando-se provavelmente
realidade é dinâmica e que a vida está em constante transformação.
em concepções egípcias, acrescidas de suas próprias observações de
Mas, diferentemente dos milésios, que buscavam na mudança aquilo
corpos hídricos, como rios e mares, bem como a vida animal e vegetal,
que permanece, decidiu concentrar sua reflexão sobre o que muda.
ele dizia: “Tudo é água”
Assim, o filósofo dirá que tudo flui, nada persiste nem permanece o
Para ele, a água, por permanecer basicamente a mesma, em todas as
mesmo. O ser não é mais do que vir a ser. “Tu não podes descer
transformações dos corpos, apesar de assumir diferentes estados
duas vezes no mesmo rio, porque novas águas correm sobre ti” diz ele.
(sólido, líquido e gasoso) seria a arché, a substância primordial, a
Para ele, o fluxo constante da vida seria impulsionado justamente pela
origem única de todas as coisas, presente em tudo o que existe.
luta de forças contrárias: a ordem e a desordem, o bem e o mal, o
Era também a primeira concepção monista da filosofia, isto é, que
belo e o feio, a construção e a destruição, a justiça e a injustiça, o
considera que tudo o que existe pode ser reduzido a um princípio único
racional e o irracional, a alegria e a tristeza etc. Assim, afirmava que “a
ou realidade fundamental. Muitas outras surgiram depois.
luta (guerra) é a mãe, rainha e princípio de todas as coisas”. É pela luta
Anaximandro: O indeterminado das forças opostas que o mundo se modifica e evolui.
Outro milésio, Anaximandro (c. 610-547 a.C.), discípulo de Tales, Por isso, Heráclito imaginou que, se devia haver um elemento
procurou aprofundar as concepções do mestre sobre a origem única de primordial na natureza, esse teria que ser o fogo, com chamas vivas e
todas as coisas e resolver os problemas que ele lançara. eternas, governando o constante movimento dos seres.
Assim, para esse filósofo o princípio primordial deveria ser algo Pensadores de Eleia
que transcendesse os limites do observável, ou seja, não se As diversas cosmologias que acabamos de estudar despertaram, na
situaria em uma realidade ao alcance dos sentidos, como a água. época, uma nova questão. Por que tanta divergência? Por que tantas
opiniões contrárias? Foi assim que surgiu na cidade de Eleia outra
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forma de reflexão sobre a realidade, a qual se oporia tanta à método de ensino. Levando em consideração os interesses dos
preponderância fisicista dos pensadores de Mileto como ao mobilismo alunos, davam aulas de eloquência e de sagacidade mental.
de Heráclito. Trata-se da chamada escola eleática, do qual Ensinavam conhecimentos úteis para o sucesso nos negócios
Parmênides foi o principal expoente. públicos e privados. Alguns deles diziam-se mestres em qualquer
assunto desde a arte de fazer sapatos até a ciência política e como
Parmênides: O ser
viver bem na pólis grega. Por isso eram chamados de Sofistas,
Parmênides (c. 510-470 a.C.) entendia que o equívoco das pessoas e
palavra de origem grega que quer dizer “grande mestre ou sábio”, algo
dos demais pensadores era conceder demasiada importância aos
assim como “supersábios”.
dados fornecidos pelos sentidos. Embora também percebesse pela via
Segundo Alguns estudiosos, as lições dos sofistas tinham como
sensorial a mudança e o movimento no mundo, achava contraditório
principal objetivo o desenvolvimento do poder de argumentação, a
buscar o princípio (a arché) naquilo que não permanece (a
habilidade da retórica, bem como o conhecimento em doutrinas
mudança, o movimento), ou supor que aquilo que é permanente
divergentes, De acordo com essa interpretação, eles transmitiriam
pudesse converter-se em algo impermanente.
todo um jogo de palavras, raciocínios e concepções úteis para
Assim, Parmênides optou por escutar o que lhe diria a razão, e não os
driblar as teses dos adversários e convencer as pessoas.
sentidos que faziam sentir a mudança, e proclamou que existe o ser e
O momento histórico vivido pela civilização grega favoreceu o
não é concebível a sua existência. Desse modo: “O ser é e o não-ser
desenvolvimento desse tipo de atividade em Atenas. Era uma época de
não é”.
lutas políticas e intenso conflito de opiniões nas assembleias
Em vista dessa formulação, Parmênides é considerado o primeiro
democráticas. Por isso, muitos cidadãos sentiam a necessidade de
filósofo a expor o princípio de identidade (A = A) e de não
aprender a retórica ou oratória, arte de falar e argumentar em público,
contradição (se A = A, é impossível, ao mesmo tempo e na mesma
para conseguir persuadir as pessoas em assembleia e, muitas vezes,
relação, A = não A), cuja argumentação seria depois mais bem
fazer prevalecer seus interesses individuais e de seu grupo social.
desenvolvida por Aristóteles.
Essas características dos ensinamentos dos sofistas favoreciam o
Empédocles: Quatro elementos
surgimento de concepções filosóficas relativistas sobre as coisas.
Empédocles (c. 490-430 a.C. aproximadamente) esforçou-se por
Para o relativismo não existe verdade absoluta. Tudo seria relativo ao
conciliar as concepções de Parmênides e Heráclito. Aceitava de
indivíduo, ao momento histórico, a um conjunto de fatores e
Parmênides a racionalidade que afirma a existência e permanência do
circunstâncias de uma sociedade.
ser (“o ser é”), mas procurava encontrar uma maneira de tornar
O termo sofista teve originariamente um significado positivo.
racional os dados captados por nossos sentidos.
Porém, com o decorrer do tempo ganhou o sentido de
Defendeu, assim, a existência de quatro elementos primordiais, que
“enganador” ou “impostor”, devido, sobretudo, às críticas de
constituem as raízes de todas as coisas percebidas: o fogo, a terra, a
Platão (cujo pensamento estudaremos mais adiante).
água e o ar. Esses elementos seriam movidos e misturados de
Desde então, considerou-se a sofística, apenas uma atitude viciosa do
diferentes maneiras em função de dois princípios universais opostos:
espírito, uma arte de manipular e raciocínios, produzir o falso, iludir os
Amor (philia, grego): Responsável pela força de atração e união e pelo
ouvintes, sem qualquer amor pela verdade. Verdade se diz aletheia,
movimento de crescente harmonização das coisas;
em grego, e significa “manifestação daquilo que é”. Aletheia opõem-se
Ódio (neikos, em grego): Responsável pela força de repulsão e
a pseudos, que significa “o falso”, “aquilo que se esconde, que se
desagregação e pelo movimento de decadência, dissolução e
ilude”. Os sofistas pareciam não buscar a aletheia; contentavam-se
separação das coisas.
com pseudos.
Para Empédocles, todas as coisas existentes na realidade estão
Por isso hoje se utiliza a palavra sofisma, derivada de sofista, para
submetidas às forças cíclicas desses dois princípios.
designar um raciocínio aparentemente correto, mas que na realidade é
Demócrito: O átomo
falso ou inconclusivo, geralmente formulado com o objetivo de enganar
Demócrito foi o filósofo responsável, junto com seu mestre Leucipo,
alguém.
pelo desenvolvimento de uma doutrina conhecida pelo nome de
Entretanto, abordagens mais recentes sobre a atuação dos
atomismo. Concordava com a necessidade de plenitude e unidade do
sofistas procuram mostrar que o relativismo de suas teses
ser (como havia afirmado Parmênides), mas não aceitava que o não-
fundamenta-se em uma concepção flexível sobre os homens, a
ser (o movimento e a multiplicidade) fosse uma ilusão. Para ele, a
sociedade e a compreensão do real. Para os sofistas, as opiniões
experiência do movimento era justamente a prova da existência de um
humanas são infindáveis e não podem ser reduzidas a uma única
não-ser, que em sua concepção era o vazio. Sem espaço vazio,
verdade. Assim, não existiriam valores ou verdades absolutas.
nenhuma coisa poderia se mover, argumentava o filósofo.
É importante destacar, por último, que não existe uma doutrina sofística
Segundo sua doutrina, todas as coisas que formam a realidade são
única. O que há são alguns aspectos comuns entre as concepções de
constituídas por partículas invisíveis (porque são muito minúsculas) e
alguns sofistas, como Protágoras, Górgias e outros, o que permitiu que
indivisíveis. Denominou-as, por isso, átomos, palavra de origem grega
fossem considerados como um conjunto ou corrente.
que significa “não divisível” (parte, divisão). O átomo de Demócrito
seria equivalente ao ser de Parmênides: uno, pleno e eterno.
Protágoras de Abdera
Nascido em Abdera (mesma cidade do pré-socrático Demócrito),
PENSAMENTO CLÁSSICO OU HUMANISTA
Protágoras (c. 480-410 a.C) é considerado o primeiro e um dos mais
OS SOFISTAS: A ARTE DE ARGUMENTAR
importantes sofistas. Ensinou durante muito tempo em Atenas, tendo
Os sofistas pertenciam, em geral, a periferia do mundo grego. Eram
como princípio básico de sua doutrina a ideia de que o homem é a
professores viajantes que, por determinado preço, vendiam
medida de todas as coisas.
ensinamentos práticos. Empregavam a exposição ou monólogo como
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Górgias de Leontini reconstruir suas próprias ideias. Por isso, essa fase é chamada de
Górgias de Leontini (c. 487-380 a.C), considerado um dos grandes maiêutica, termo que em grego significa “arte de trazer à luz”.
oradores da Grécia, aprofundou o relativismo de Protágoras a ponto de
defender o ceticismo absoluto.
interlocutores sobre aquilo que pensavam saber, formulando lhes O texto faz uma apresentação crítica acerca do pensamento de
perguntas e procurando evidenciar suas condições. Seu objetivo era Demócrito, segundo o qual o “princípio constitutivo das coisas” estava
fazê-los tomar consciência profunda de suas próprias respostas, das representado pelo (a)
consequências que poderiam ser tiradas de suas reflexões, muitas
A) número, que fundamenta a criação dos deuses.
vezes repletas de conceitos vagos e imprecisos.
B) devir, que simboliza o constante movimento dos objetos.
2) Maiêutica – etapa em que Sócrates propunha aos discípulos uma
C) água, que expressa a causa material da origem do universo.
nova série de questões, com o objetivo de ajudá-los a conceber ou
D) imobilidade, que sustenta a existência do ser atemporal.
E) átomo, que explica o surgimento dos entes.
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03. (ENEM – 2016) C) A necessidade de buscar, de forma racional, a causa primeira das
TEXTO I coisas existentes.
Fragmento B91: Não se pode banhar duas vezes no mesmo rio, nem D) A ambição de expor, de maneira metódica, as diferenças entre as
substância mortal alcançar duas vezes a mesma condição; mas pela coisas.
intensidade e rapidez da mudança, dispersa e de novo reúne. E) A tentativa de justificar, a partir de elementos empíricos, o que existe
HERÁCLITO. Fragmentos (Sobre a natureza). São Paulo: Abril Cultural, 1996 (adaptado). no real.
TEXTO II
Fragmento B8: São muitos os sinais de que o ser é ingênito e
indestrutível, pois é compacto, inabalável homogêneo, uno, contínuo.
PLATÃO: ALICERCES DA FILOSFIA OCIDENTAL
Como poderia o que é perecer? Como poderia gerar-se? Nascido em Atenas, Platão (427-347 a.C) pertencia a uma das mais
PARMÊNIDES. Da natureza. São Paulo: Loyola, 2002 (adaptado).
nobres famílias atenienses. Seu nome verdadeiro era Arístocles, mas,
Os fragmentos do pensamento pré-socrático expõem uma oposição devido a sua constituição física, recebeu o apelido de Platão, termo
que se insere no campo das grego que significa “de ombros largos”. Platão foi discípulos de
Sócrates, a quem considerava o mais sábio e o mais justo dos homens.
A) investigações do pensamento sistemático. Por volta de 387 a.C. retornou a Atenas, onde fundou sua própria
B) preocupações do período mitológico. escola filosófica, a Academia. Essa escola foi uma das primeiras
C) discussões de base ontológica. instituições permanentes de ensino superior do mundo ocidental. Uma
D) habilidades da retórica sofística. espécie de universidade pioneira dedicada a pesquisa científica e
E) verdades do mundo sensível filosófica, além de um centro de formação política.
Dualismo platônico
04. (ENEM – 2015) Trasímaco estava impaciente porque Sócrates e os Como grande parte dos pensadores da sua época, Platão também
seus amigos presumiam que a justiça era algo real e importante. enfrentou o impasse criado pelos pensamentos de Parmênides e
Trasímaco negava isso. Em seu entender, as pessoas acreditavam no Heráclito, isto é, sobre o problema da permanência e da mudança, da
unidade e da multiplicidade. E chegou a uma conclusão dualista, isto
certo e no errado apenas por terem sido ensinadas a obedecer às
é, de que existiam duas realidades diametralmente opostas, baseadas
regras da sua sociedade. No entanto, essas regras não passavam de
em dois aspectos antropomórficos:
invenções humanas.
Realidade Sensível (kósmos horatós, em grego): Corresponde à
RACHELS, J. Problemas da filosofia. Lisboa: Gradva, 2009.
matéria e compõe-se das coisas como as percebemos na vida
O sofista Trasímaco, personagem imortalizado no diálogo A República,
cotidiana (isto é, pelas sensações), as quais surgem e desaparecem
de Platão, sustentava que a correlação entre justiça e ética é resultado
continuamente. Assim, as coisas e fatos do mundo sensível são
de
temporárias, mutáveis e corruptíveis (o mundo de Heráclito);
A) determinações biológicas impregnadas na natureza humana. Realidade Inteligível (kósmos noetós, em grego): Corresponde às
B) verdades objetivas com fundamento anterior aos interesses sociais. ideias, que são sempre as mesmas para o intelecto, de tal maneira
que nos permitem experimentar a dimensão do eterno, do imutável,
C) mandamentos divinos inquestionáveis legados das tradições
do perfeito (o mundo de Parmênides). Todas as ideias derivam da
antigas.
ideia do bem.
D) convenções sociais resultantes de interesses humanos
contingentes.
Teoria das Ideias
E) sentimentos experimentados diante de determinadas atitudes
Observe que a concepção dualista de Platão, também conhecida como
humanas.
teoria das ideias, opera uma mudança radical em relação aos
pensadores anteriores ao situar o verdadeiro fora ou separado do
05. (ENEM 2015) A filosofia grega parece começar com uma ideia mundo sensível. Dessa forma a verdade para Platão é transcendente.
absurda, com a proposição: a água é a origem e a matriz de todas as
coisas. Será mesmo necessário deter-nos nela e levá-la a sério? Sim, e Processo de Conhecimento
por três razões: em primeiro lugar, porque essa proposição enuncia A teoria das ideias também costuma ser estudada em seus aspectos
algo sobre a origem das coisas; em segundo lugar, porque o faz sem epistemológicos, isto é, como uma teoria sobre o conhecimento
imagem e fabulação; e enfim, em terceiro lugar, porque nela embora verdadeiro (Epistemologia). É que, para Platão, o processo de
apenas em estado de crisálida, está contido o pensamento: Tudo é um. conhecimento desenvolve-se por meio da passagem progressiva do
NIETZSCHE. F. Crítica moderna. In: Os pré-socráticos. São Paulo: Nova Cultural. 1999 mundo sensível, das sombras e aparências, para o mundo das ideias,
das essências (da verdade).
O que, de acordo com Nietzsche, caracteriza o surgimento da filosofia A primeira etapa desse processo é dominada pelas impressões ou
entre os gregos? sensações advindas dos sentidos. A opinião que temos da realidade.
A opinião representa o saber que se adquire sem uma busca metódica.
A) O impulso para transformar, mediante justificativas, os elementos O conhecimento, porém, para ser autêntico, deve ultrapassar a esfera
sensíveis em verdades racionais. das impressões sensoriais, o plano da opinião, e penetrar na esfera
B) O desejo de explicar, usando metáforas, a origem dos seres e das racional da sabedoria, o mundo das ideias. Para atingir esse mundo, o
coisas. ser humano não pode ter apenas “amor às opiniões” (filodoxia);
precisa possuir um “amor ao saber” (filosofia).
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estabelecimento de definições essenciais, que possam ser utilizadas 3. Causa eficiente: Consiste na fonte primária da mudança, o agente
de modo generalizado. transformador da coisa. Responde a questão: por que x é x?
Desse modo, a indução (operação mental que vai do particular para o 4. Causa final: Trata-se do objetivo, propósito, finalidade da coisa.
geral) representa, para Aristóteles, o processo intelectual básico de Responde à questão: para que x?
aquisição de conhecimento. É por meio do método indutivo que o ser A visão aristotélica é fortemente teleológica (do grego telos, finalidade)
humano pode atingir conclusões científicas, conceituais, de âmbito
universal. Notas sobre o pensamento político de Aristóteles
Vejamos um exemplo com o conceito de escola. Esse conceito seria o Aristóteles critica o autoritarismo de Platão, considerando sua utopia
resultado da observação sistemática das diferentes instituições às impraticável e inumana. Recusa a sofocracia platónica que atribui
quais se atribui o nome de escola. Somente dessa maneira, para poder ilimitado a apenas uma parte do corpo social, os mais sábios, o
Aristóteles, o conceito de escola pode ter sentido universal, já que que torna a sociedade muito hierarquizada. Não aceita a proposta de
reúne em si a estrutura essencial aplicável ao conjunto das múltiplas dissolução da família nem considera que a justiça, virtude por
escolas concretas existentes no mundo. excelência do cidadão, possa vir separada da amizade.
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03. (ENEM – 2017) Se, pois, para as coisas que fazemos existe um fim
que desejamos por ele mesmo e tudo o mais é desejado no interesse
01. (PREUNI-SEDUC/SE – 2019)
desse fim; evidentemente tal fim será o bem, ou antes, o sumo bem.
Texto 1
Mas não terá o conhecimento grande influência sobre essa vida? Se
Levantamento aponta que acidentes de trânsito matam mais que
assim é esforcemo-nos por determinar, ainda que em linhas gerais
assassinatos no Tocantins
apenas, o que seja ele e de qual das ciências ou faculdades constitui o
Um levantamento feito pela Segura Líder, responsável pelo seguro
objeto. Ninguém duvidará de que o seu estudo pertença à arte mais
DPVAT, mostra que os acidentes no Tocantins matam mais que
prestigiosa e que mais verdadeiramente se pode chamar a arte mestra.
homicídio e latrocínio. Ao todo foram 593 mortes no trânsito no estado,
Ora, a política mostra ser dessa natureza, pois é ela que determina
em 2018. Por outro lado 412 pessoas morreram vítimas de crime
quais as ciências que devem ser estudadas num Estado, quais são as
violentos.
Disponível em> https://g1.globo.com/to/tocantins/noticia/2019/05/10/levantamento-aponta-que-
que cada cidadão deve aprender, e até que ponto; e vemos que até as
acidentes-de-transito-matam-mais-que-assassinatos-no-tocantins.ghtml> Acesso: 08 jun. 2019 faculdades tidas em maior apreço, como a estratégia, a economia e a
retórica, estão sujeitas a ela. Ora, como a política utiliza as demais
Texto 2 ciências e, por outro lado, legisla sobre o que devemos e o que não
Ora, há uma virtude moral que diz respeito diretamente à lei: a justiça. devemos fazer, a finalidade dessa ciência deve abranger as duas
“O justo é o que é conforme a lei e respeita a equidade; o injusto é o outras, de modo que essa finalidade será o bem humano.
que viola a lei e a falta à equidade”, lemos no livro V da Ética a ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. In: Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1991 (adaptado).
Nicômaco. As leis se referem ao bem da comunidade política e são Para Aristóteles, a relação entre o sumo bem e a organização da pólis
justas as ações que tendem a produzir e a conservar a felicidade dessa pressupõe que
comunidade. Assim, entendida, a justiça é a virtude completa ou inteira,
A) o bem dos indivíduos consiste em cada um perseguir seus
pois quem a possui é capaz de usá-la para consigo mesmo e para com
interesses.
os outros.
B) o sumo em é dado pela fé de que os deuses são os portadores da
Chauí, Marilena de Souza. Introdução à história da filosofia: dos pré-socráticos à Aristóteles,
vol.1. 1.ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. verdade.
Analisando os excertos acima, podemos inferir que a teoria moral C) a política é a ciência que precede todas as demais na organização
elaborada por Aristóteles compreende que o(a) da cidade.
D) a educação visa formar a consciência de cada pessoa para agir
A) dever deve guiar as ações humanas a partir de imperativos corretamente.
categóricos. E) a democracia protege as atividades políticas necessárias para o
B) agir com justiça é agir com prudência, visando a felicidade do bem em comum.
comum.
C) vida ética ou virtuosa dependerá exclusivamente da alma racional e 04. (ENEM – 2016) Ninguém delibera sobre coisas que não podem ser
da ideia perfeita de bem. de outro modo, nem sobre as que lhe é impossível fazer. Por
D) agir comunicativo nos encaminha ao viver bem, a felicidade e a conseguinte, como o conhecimento científico envolve demonstração,
solidariedade entre os indivíduos. mas não há demonstração de coisas cujos primeiros princípios são
E) impulso da liberdade é sempre para o mal, necessitando assim do variáveis (pois todas elas poderiam ser diferentemente), e como é
justo equilíbrio divino para ordenar a sociedade. impossível deliberar sobre coisas que são por necessidade, a
sabedoria prática não pode ser ciência, nem arte: nem ciência, porque
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aquilo que se pode fazer é capaz de ser diferentemente, nem arte, O segundo inclui os prazeres mais imediatos, muitos dos quais
porque o agir e o produzir são duas espécies diferentes de coisa. movidos pela explosão das paixões e que, ao final, podem resultar
Resta, pois, a alternativa de ser ela uma capacidade verdadeira e em dor e sofrimento.
raciocinada de agir com respeito às coisas que são boas ou más para o É importante observar, contudo, que ao falar em prazer Epicuro não se
homem. refere ao prazer sensorial, mas ao prazer racional. Trata-se do prazer
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Abril Cultural, 1980. do sábio, o exercício da quietude da mente e da paz de espírito, o
Aristóteles considera a ética como pertencente ao campo do saber controle sobre as emoções e o domínio de si mesmo. Esse é o
prático. Nesse sentido, ela difere-se dos outros saberes porque é verdadeiro prazer, fonte da saúde e da felicidade. De acordo com o
caracterizada como filósofo, para que possamos desfrutar os grandes prazeres do intelecto,
A) conduta definida pela capacidade racional de escolha. precisamos aprender a dominar os prazeres exagerados da paixão,
B) capacidade de escolher de acordo com padrões científicos. como os medos, os apegos, a cobiça, a inveja. Por isso, os epicuristas
C) conhecimento das coisas importantes para a vida do homem. buscavam a ataraxia, isto é, o estado de ausência de dor, quietude,
D) técnica que tem como resultado a produção de boas ações. serenidade da alma.
E) política estabelecida de acordo com padrões democráticos de Epicuro classifica os desejos em:
deliberação. 1. Desejos naturais e necessários: Estes seriam os únicos
verdadeiramente válidos, porque subtraem a dor do corpo, como, por
exemplo, comer quando se tem fome, beber quando se tem sede,
repousar quando se está cansado, e assim por diante
FILOSOFIAS HELENÍSTICAS: A BUSCA DA FELICIDADE INTERIOR
2. Desejos naturais e não necessários: Estes são os que possuem
Com a conquista da Grécia pelos macedônicos (332 a.C.), teve início o
uma ligação com os prazeres naturais e necessários, mas que são
chamado período helenístico. Devido à expansão militar do império
supérfluos. Assim, se beber é necessário para sobrevivência, e
macedônico, efetuada por Alexandre Magno, o período helenístico
portanto, torna-se um ato pertencente à primeira categoria, ingerir
caracterizou-se por um processo de interação entre a cultura grega
bebidas refinadas, é desnecessário, pois está além do que é básico e
clássica e a cultura dos povos orientais conquistados.
essencial para conservação da vida.
O mesmo processo se deu no campo filosófico. As escolas platônicas
3. Desejos não naturais e não necessários: São aqueles que
(Academia) e aristotélica (Liceu) dirigidas, respectivamente, pelos
possuem relações com poder, honra e riqueza, portanto, são os
discípulos dos dois grandes mestres, Platão e Aristóteles, continuaram
desejos dos excessos e daquilo que é desnecessário e dispensável.
abertas e em plena atividade, mas os valores gregos começariam a
Esta última categoria de prazer, não é nunca saciável e pode
mesclar-se com as mais diversas tradições culturais.
facilmente se tornar nociva, devendo ser sempre evitada.
Do público ao privado Epicuro foi adepto do atomismo de Leucipo e Demócrito e o
No plano político, a antiga liberdade do cidadão grego, exercida no desenvolveu ainda mais. Ele afirmava que tanto nosso corpo quanto
contexto de autonomia das cidades, foi desfigurada pelo domínio nossa alma são compostos de átomos. Mas tanto corpo quanto alma
macedônico, ocorrendo um declínio da participação do cidadão nos são materiais, formados por átomos indestrutíveis. A morte nada mais
destinos da pólis. Com isso, a reflexão política também se é que a desagregação dos átomos que nos compõem, os do corpo e os
enfraqueceu. da alma, de modo que também a alma é mortal.
Substitui-se, assim, a vida pública pela vida privada como centro Epicuro escreveu os quatro princípios para a humanidade, também
das reflexões filosóficas. Em outras palavras, as preocupações conhecido como tetraphármakon, isto é, o “quádruplo remédio”:
coletivas cedem lugar às preocupações pessoais. Não há o que temer quanto aos deuses.
As principais correntes filosóficas desse período vão tratar da Não há nada a temer quanto à morte.
intimidade, da vida interior do ser humano. Formulam-se, então, Pode-se alcançar a felicidade.
diversos modelos de conduta, “artes de viver”, “filosofias de vida”. Pode-se suportar a dor.
Parece que a principal preocupação dos filósofos era proporcionar às Em suma, o epicurismo constituiu uma ética hedonista, colocando o
pessoas desorientadas e inseguras com a vida social alguma forma de “verdadeiro prazer”, o prazer do repouso do espírito, como o bem a ser
paz de espírito, de felicidade interior em meio às atribulações da época. almejado.
Entre as novas tendências desse período, destacaremos o epicurismo,
o estoicismo, o pirronismo e o cinismo. Estoicismo: o dever
Epicurismo: o prazer O estoicismo, foi fundado a partir das ideias de Zenão de Cítio (336-
O epicurismo é uma corrente filosófica fundada por Epicuro (341-271 263 a.C.), é a corrente filosófica de maior influência no período
a.C.), que defendia que o prazer é o princípio e o fim de uma vida feliz. helenístico, os representantes dessa escola, conhecido como
No entanto, Epicuro distinguia dois grandes grupos de prazeres. estoicos, defendiam a noção de que toda realidade existente é uma
O primeiro reúne os prazeres mais duradouros, que encantam o realidade racional, o que quer dizer que todos os seres, os indivíduos
espírito, como a boa conversação, a contemplação das artes, a e a natureza fazem parte dessa realidade racional.
audição da música etc.; O que chamamos de Deus, segundo esses pensadores, nada mais é
do que a fonte dos princípios racionais que regem a realidade.
Integrado à natureza, não existe para o ser humano nenhum outro
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lugar para ir ou fugir, além do próprio mundo em que vivemos. Somos “o Sócrates demente”, ou o “Sócrates louco”, pois questionava os
deste mundo e, ao morrer, nos dissolvemos nesse mundo. valores e as convenções sociais e procurava viver estritamente
Não dispomos, portanto, de poderes para alterar, substancialmente, a conforme os princípios que considerava moralmente corretos.
ordem universal do mundo e, pela filosofia, podemos compreender Vivendo em uma época em que as conquistas de Alexandre
essa ordem e viver segundo ela. Assim, em vez do prazer dos promoveram o helenismo, mesclando culturas e populações, Diógenes
epicuristas, Zenão propõe o dever, vinculado à compreensão da ordem também não tinha apreço pela diferença entre o grego e o estrangeiro.
cósmica, como o melhor caminho para a felicidade. É feliz aquele que Conta-se que, quando lhe perguntaram qual era a sua cidadania, teria
vive segundo sua própria natureza, a qual, por sua vez, integra a respondido: “Sou Cosmopolita” (palavra grega que significa “cidadão
natureza do universo. do mundo”).
Os estoicos também defendiam uma atitude de ausência física e moral,
baseada em virtudes como a resistência ante o sofrimento, a coragem
ante o perigo, a indiferença entre as riquezas materiais. O ideal Dentre as correntes filosóficas do helenismo, o Epicurismo é o
perseguido era um estado de plena serenidade (ataraxia) para lidar mais recorrente nas provas do ENEM. É importante ficar atento
que as diversas correntes desse período preocupavam-se em
com os sobressaltos da existência, fundado na aceitação e proporcionar aos indivíduos desorientados alguma forma de paz
de espírito, de felicidade interior.
compreensão dos “princípios universais” que regem toda a vida.
Filosofia helenista
Na física estoica, é fundamental o conceito de acontecimento. Para os https://www.youtube.com/watch?v=cV4uIR-Spd0
Epicuro e a Felicidade
estoicos, quando dois corpos físicos se encontram produz-se um https://www.youtube.com/watch?v=FFM45K1Dd9w
acontecimento, que não é algo corpóreo. Leandro Karnal | Minha Felicidade depende de mim
https://www.youtube.com/watch?v=STLKQPcZ40s
Essa noção de acontecimento é fundamental para a ética dos Série Merlí: Temp. 01, episódio 09 (Epicuro) e 10 (céticos).
Temp. 02, episódio 03 (os estoicos).
estoicos, pois seu princípio básico afirma que não devemos nos http://www.acervofilosofico.com/o-prazer-na-filosofia-de-
preocupar com aquilo que não está sob nosso controle. O epicuro
https://www.bbc.com/portuguese/geral-46458304
acontecimento, aquilo que nos acontece, é justamente o que não https://www.anarquista.net/relacao-entre-diogenes-de-
sinope-e-chaves/
podemos controlar.
A ética estoica consistia, portanto, em aprender a querer o Felicidade, de Marcelo Jeneci, 2010.
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Burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha Remanescente do período helenístico, a máxima apresentada valoriza
Tem o que quer a seguinte virtude:
Burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha A) Esperança, tida como confiança no porvir.
No croissant B) Justiça, interpretada como retidão de caráter.
Burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha C) Temperança, marcada pelo domínio da vontade.
Suquinho de maçã D) Coragem, definida como fortitude na dificuldade.
Burguesinha, burguesinha, burguesinha, burguesinha E) Prudência, caracterizada pelo correto uso da razão.
Disponível em <https://www.vagalume.com.br/seu-jorge/burguesinha.html> Acesso: 04 Dez.
2018
4. (ENEM – 2016) Pirro afirmava que nada é nobre nem vergonhoso,
justo ou injusto; e que, da mesma maneira, nada existe do ponto de
Texto II
vista da verdade; que os homens agem apenas segundo a lei e o
“Passemos ao domínio das riquezas, principal fonte de misérias dos
costume, nada sendo mais isto do que aquilo. Ele levou uma vida de
homens: pois, comparando-se todos os nossos outros perigos,
acordo com esta doutrina, nada procurando evitar e não se desviando
prazeres, doenças, temores desgostos, sofrimentos e preocupações de
do que quer que fosse, suportando tudo, carroças, por exemplo,
toda espécie, com os males que nascem do dinheiro, será deste lado
precipícios, cães, nada deixando ao arbítrio dos sentidos.
que muito claramente penderá a balança.
LAÉRCIO, D. Vidas e sentenças dos filósofos ilustres. Brasília: Editora UnB, 1988.
Figuremo-nos como se suporta mais facilmente não possuir do que
perder; e perceberemos que a pobreza tem muito menos tormentos a O ceticismo, conforme sugerido no texto, caracteriza-se por:
temer e muito menos riscos a correr.” A) desprezar quaisquer convenções e obrigações da sociedade.
Sêneca. Coleção “Os Pensadores” – 2.ed. – São Paulo: Abril Cultural, 1980.
B) atingir o verdadeiro prazer como o princípio e o fim da vida feliz.
C) defender a indiferença e a impossibilidade de obter alguma certeza.
De acordo com as filosofias do período helenístico, havia a
D) aceitar o determinismo e ocupar-se com a esperança transcendente.
preocupação com o alcance da felicidade. Dentre as correntes, aquela
E) agir de forma virtuosa e sábia a fim de enaltecer o homem bom e
que se associa aos textos acima é
belo
E) o platonismo, que propõe o controle racional das nossas vontades e No fragmento da obra filosófica de Epicuro, o homem tem como fim
paixões, geradoras de desequilíbrio em nossa alma como descrito no
A) alcançar o prazer moderado e a felicidade.
texto II.
B) valorizar os deveres e as obrigações sociais.
C) aceitar o sofrimento e o rigorismo da vida com resignação.
2. (PREUNI-SEED/SE – 2017) Para os estóicos, o mundo é como um
D) refletir sobre os valores e as normas dadas pela divindade.
corpo, animado pelo sopro vital (pneuma). O movimento do pneuma é
E) defender a indiferença e a impossibilidade de se atingir o saber.
tenso e disso resultariam a coesão e a unidade do mundo e de suas
partes [...]. Tudo é racional, e, se a realidade apresenta aos homens
fatos irracionais – como a doença, a injustiça, o sofrimento –, isso só
ocorre quando se tomam aspectos isolados dessa realidade, sem A FILOSOFIA MEDIEVAL.
considerar sua relação com o todo. Como o mundo é composto de PATRÍSTICA: A MATRIZ PLATÔNICA DE APOIO À FÉ
corpo vivo e de logos, conhecê-lo supõe a No processo de desenvolvimento do cristianismo, tornou-se necessário
ABRÃO, B. S. História da filosofia. São Paulo. Editora Nova Cultural, 1999.
explicar seus preceitos às autoridades romanas e ao povo em geral. A
A) necessidade de reconhecimento de que o real é racional. Igreja Católica sabia que esses preceitos não podiam simplesmente ser
B) inexistência dos sentimentos como artigo de espírito. impostos pela força. Tinham de ser apresentados de maneira
C) forçosidade de uma entidade de caráter absoluto, como Jeová. convincente, mediante um trabalho de pregação e conquista espiritual.
D) ideia de sofrimento que faz parte da condição humana.
Foi assim que os primeiros padres da igreja se empenharam na
E) relação entre a natureza corpórea das coisas e a razão.
elaboração de diversos textos sobre a fé e a revelação cristãs. O
Conjunto desses textos ficou conhecido como patrística, por terem
sido escritos principalmente por esses grandes padres da igreja.
3. (ENEM-2018)
Uma das principais correntes da filosofia patrística, inspirada na
“A quem não basta pouco, nada basta.”
EPICURO. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1985
filosofia greco-romana, tentou munir a fé de argumentos racionais, ou
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seja, buscou a conciliação entre o cristianismo e o pensamento pagão. ideia de submissão total do ser humano ao Deus cristão,
Seu principal expoente foi Agostinho, posteriormente consagrado defendida pela Igreja.
santo e doutor da Igreja Católica. Uma consequência disso é a forma como se passa a enfatizar a
Santo Agostinho (Aureliano Agostinho) (354-430) nasceu em interioridade Enquanto na filosofia grega o indivíduo se identificava
Tagaste, província romana situada na África, e faleceu em Hipona. Em com o cidadão (isto é, o ser humano social, político), a filosofia cristã
sua formação intelectual, Agostinho, professor de retórica em escolas agostiniana enfatiza no indivíduo sua vinculação pessoal com Deus, a
romanas, despertou para a filosofia com a leitura de Cícero. responsabilidade de cada indivíduo pelos próprios atos e exalta a
Posteriormente, deixou-se influenciar pelo Maniqueísmo, doutrina salvação individual.
persa que afirmava ser o universo dominado por dois grandes Liberdade e pecado
princípios opostos, o bem e o mal, em uma incessante luta entre si. Outro aspecto fundamental da filosofia agostiniana é o entendimento
Mas tarde, já insatisfeito com o maniqueísmo, passou a lecionar em de que a vontade é uma força que determina a vida e não uma função
Roma e posteriormente em Milão. Nesse período entrou em contato específica ligada ao intelecto, tal como diziam os gregos. Agostinho
com o ceticismo e, depois, com o neoplatonismo, movimento contrapõe-se, dessa forma, ao intelectualismo moral, que teve sua
filosófico do período greco-romano, desenvolvido por pensadores expressão máxima em Sócrates.
inspirados em Platão, que se espalhou por diversas cidades do Império Isso significa que, de acordo com Agostinho, a liberdade humana é
Romano, sendo marcado por sentimentos religiosos e crenças própria da vontade e não dá razão, e é nisso que reside a fonte do
místicas. pecado. A pessoa peca porque usa de seu livre-arbítrio para satisfazer
Cresceu em Agostinho uma grande crise existencial, uma inquietação uma vontade má, mesmo sabendo que tal atitude é pecaminosa. Por
quase desesperada em busca de sentido para a vida. Foi nesse isso, Agostinho afirma que o ser humano não pode ser autônomo em
período crítico que ele se sentiu extremamente atraído pelas pregações sua vida moral, isto é, deliberar livremente sobre a sua conduta. No
de Santo Ambrósio, bispo de Milão. Pouco tempo depois, converteu-se entanto, como o que conduz seus atos é a vontade e não a razão, o ser
ao cristianismo. humano pode querer o mal e praticar o pecado, motivo pelo qual
Superioridade da alma necessita da graça divina para se salvar.
Em sua obra, Agostinho argumentava a favor da supremacia do Precedência da fé
espírito sobre o corpo, a matéria. Para ele, a alma teria sido criada Agostinho, também discutiu a diferença entre a fé cristã e a razão,
por Deus para reinar sobre o corpo, dirigindo-o para a prática do bem. afirmando que a fé nos faz crer em coisas que nem sempre
O pecador, entretanto, utilizando-se do livre-arbítrio, costumaria entendemos pela razão: creio tudo que entendo, mas nem tudo que
inverter essa relação fazendo o corpo assumir o governo da alma. creio também entendo. “Tudo o que compreendo conheço, mas nem
Provocaria, com isso, à submissão do espírito à matéria, o que seria, tudo que creio conheço”, disse Agostinho.
para Agostinho, equivalente à subordinação do eterno ao transitório, da Baseando-se no profeta bíblico Isaías, dizia ser necessário
essência à aparência. A verdadeira liberdade estaria na harmonia das compreender para crer, pois a fé ilumina os caminhos da razão, e a
ações humanas com a vontade de Deus. Ser livre é servir a Deus, diz compreensão nos confirma a crença. Isso significa que, para
Agostinho, pois o prazer de pecar é a escravidão. Agostinho, a fé revela verdades ao ser humano de forma direta e
Boas obras ou graça divina? intuitiva. Vem depois a razão, esclarecendo aquilo que a fé já
Segundo o filósofo, o ser humano que trilha a via do pecado só antecipou. Há, portanto, para ele, uma precedência da fé sobre a
consegue retornar aos caminhos de Deus e da salvação mediante a razão.
combinação de seu esforço pessoal de vontade e a concessão, Influência helenística
imprescindível, da graça divina. Sem a graça de Deus, o ser humano O pensamento agostiniano reflete, em grande medida, os principais
nada pode conseguir. Essa graça, no entanto, seria concedida apenas passos de sua trajetória intelectual anterior à conversão ao catolicismo,
aos predestinados à salvação. quando sofreu a influência do helenismo. Vejamos alguns elementos:
Na mesma época de Agostinho, outro teólogo, Pelágio, afirmava que a 1. Do Maniqueísmo o filósofo herdou uma concepção dualista no
boa vontade e a boas obras humanas seriam suficientes para a âmbito moral, simbolizada pela luta entre o bem e o mal, a luz e as
salvação individual. Seus ensinamentos constituíam a doutrina do trevas, a alma e o corpo.
pelagianismo, contra a qual se colocou Agostinho. No Concílio de 2. Do Ceticismo ficou a permanente desconfiança nos dados dos
Cartago no ano de 417, o Papa Zózimo condenou a pelagianismo sentidos, isto é, no conhecimento sensorial, que nos apresenta uma
como heresia e adotou a concepção agostiniana de necessidade da multidão de seres mutáveis flutuantes e transitórios.
graça divina, doada livremente por Deus aos seus eleitos. 3. Do Platonismo Agostinho assimilou a concepção de que a verdade,
A condenação do pelagianismo explica-se pelo fato de que conservava como conhecimento eterno deveria ser buscada intelectualmente no
a noção grega de autonomia da vida moral humana, isto é, de que o “mundo das ideias”. Por isso, defendeu a via do conhecimento, o
indivíduo pode salvar-se por si só, sendo bom e fazendo boas obras, caminho da interioridade, como instrumento legítimo para a busca da
sem a necessidade da ajuda divina. Essa noção chocava-se com a verdade. Assim, somente o íntimo de nossa alma, iluminada por Deus,
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poderia atingir a verdade das coisas. Da mesma forma que os olhos do 3. Ser Necessário e Ser Contingente: Esse argumento, uma variante
corpo necessitam da luz do sol para enxergar os objetos do mundo do segundo, afirma que todo ser contingente, do mesmo modo que
sensível, os “olhos da alma” necessitam da luz divina para visualizar existe, pode deixar de existir. Ora, se todas as coisas que existem
as verdades eternas da sabedoria. podem deixar de ser, então, alguma vez, nada existiu. Mas, se assim
É importante ressaltar também a influência do estoicismo na filosofia fosse, também agora nada existiria, pois aquilo que não existe somente
agostiniana Um aspeto fundamental do estoicismo é a crença de que é começa a existir em função de algo que já existia. É preciso admitir,
impossível para o homem encontrar regras de conduta ou alcançar a então, que há um ser que sempre existiu, um ser absolutamente
felicidade sem se apoiar em uma concepção do universo determinada necessário, que não tenha fora de si a causa de sua existência, mas,
pela razão ou logos. Inversamente, Agostinho enfatiza a função do livre ao contrário, que seja a causa da necessidade de todos os seres
arbítrio e da graça de Deus como elementos preponderantes na contingentes. Esse ser necessário é Deus;
capacidade humana de sobrepor-se às paixões e ordená-las para a 4. Os Graus de Perfeição: Em relação à qualidade de todas as coisas
razão. (SILVA) existentes, pode-se afirmar que há graus diversos de perfeição. Assim,
estabelecemos que tal coisa é melhor que outra, ou mais bela, ou mais
A ESCOLÁSTICA poderosa, ou mais verdadeira etc. Ora, se uma coisa possui “mais” ou
A filosofia conhecida como Escolástica foi responsável por intensificar “menos” determinada qualidade positiva, isso supõe que deva existir
as especulações acerca das Sagradas Escrituras e a filosofia grega. Se um ser com o máximo dessa qualidade, no nível da perfeição.
aos patrísticos coube estabelecer um sistema de dogmas cristãos, aos Devemos admitir, então, que existe um ser com o máximo de bondade,
filósofos escolásticos cumpriu tornar esses dogmas compreensíveis a de beleza, de poder, de verdade, sendo, portanto, um ser máximo e
um número maior de pessoas, contribuindo para a formação de pleno. Esse ser é Deus;
religiosos e para divulgar o cristianismo. 5. A Finalidade do Ser: Todas as coisas brutas, que não possuem
Fundamentalmente, Escolástica é o nome dado à filosofia ensinada inteligência própria, existem na natureza cumprindo uma função, um
nas escolas cristãs. Seu auge ocorreu na Baixa Idade Média. objetivo, uma finalidade, tal como a flecha orientada pelo arqueiro.
Devemos admitir, então, que existe algum ser inteligente que dirige
Santo Tomás de Aquino todas as coisas da natureza para que cumpram seu objetivo. Esse ser
A filosofia de Tomás de Aquino (1226-1274), o tomismo, parece ter é Deus.
nascido com objetivos claros de não contrariar a fé. De fato, sua
finalidade era organizar um conjunto de argumentos para demonstrar e Mérito de Tomás de Aquino
defender as revelações do cristianismo. Proclamado pela Igreja Católica como Doutor Angélico e Doutor por
Assim, Tomás de Aquino reviveu em grande parte o pensamento Excelência, Tomás de Aquino é reverenciado nos meios católicos por
aristotélico em busca de argumentos que explicassem os principais filósofos e professores de filosofia. É o caso, por exemplo, do filósofo
aspectos da fé cristã. Enfim, fez da filosofia de Aristóteles um católico Jacques Maritain (1882-1973). Filósofos não-cristãos, como o
instrumento a serviço da religião católica, ao mesmo tempo em que britânico Bertrand Russell (1872-1970), questionam os méritos de
transformou essa filosofia numa síntese original. Tomás de Aquino, considerando-os insuficientes para justificar sua
imensa reputação.
Provas da existência de Deus Em que pese essa discordância de opiniões sobre os méritos de
Outro aspecto importante da filosofia tomista são as provas da Tomás de Aquino, é praticamente unânime o reconhecimento de que
existência de Deus. Em um dos seus livros mais famosos, a Suma sua obra filosófica representa o apogeu do pensamento medieval
teológica, Tomás de Aquino propõem cinco provas: católico. Posteriormente a esse período, o tomismo seria
1. O primeiro Motor: Tudo aquilo que se move é movido por outro ser. progressivamente questionado pelos movimentos filosóficos que se
Por sua vez, esse outro ser para que se mova, necessita também que desenvolveram na Renascença e na Idade Moderna.
seja movido por outro ser, e assim sucessivamente. Se não houvesse
um primeiro ser movente, cairíamos em um processo indefinido. Logo,
conclui Tomás de Aquino, é necessário chegar a um primeiro ser Nas últimas edições das provas do Enem, a temática da filosofia
medieval vem sendo abordada com mais frequência, a exemplo
movente que não seja movido por nenhum outro. Esse ser é Deus; do Enem do 2018. Quando fala-se em pensamento medieval,
2. A Causa Eficiente: Todas as coisas existentes no mundo não levem em consideração a relação existente entre fé e razão.
Melhor dizendo, a razão sendo usada como ferramenta para
possuem em si a causa eficiente de suas existências. Devem ser justificar a fé cristã.
consideradas efeitos de alguma causa. Tomás de Aquino afirma ser Série Merlí: Temporada 03, episódios 08 (Plotino) e 12 (Santo
Agostinho).
impossível remontar indefinidamente à procura das causas eficientes. Em nome de Deus, de Clive Donner; 1988
O nome da rosa, de Jean-Jacques Annaud; 1986
Logo, é necessário admitir a existência de uma primeira causa Santo Agostinho, de Roberto Rossellini, 1972
eficiente, responsável pela sucessão de efeitos. Essa causa primeira é
Deus;
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01. (SAS 2019) Não há mentira, apesar do que se diz, sem intenção,
04. (ENEM - 2018) Não é verdade que estão ainda cheios de velhice
desejo ou vontade de enganar. Não se mente ao enunciar uma
espiritual aqueles que nos dizem: “Que fazia Deus antes de criar o céu
asserção falsa que cremos verdadeira, antes mente-se ao enunciar
e a terra? Se estava ocioso e na realizava”, dizem eles, “por que não
uma asserção verdadeira que cremos falsa. Pois é pela intenção que
ficou sempre assim no decurso dos séculos, abstendo-se, como antes,
se deve julgar a modalidade dos atos.
SANTO AGOSTINHO. Sobre a mentira. Tradução de Tiago Tondinelli. Ecclesiae: Campinas, de toda ação? Se existiu em Deus um novo movimento, uma vontade
2016. (adaptado) nova para dar o ser a criaturas que nunca antes criar, como pode haver
verdadeira eternidade, se n’Ele aparece uma vontade que antes não
Em relação estrita ao conteúdo, a mentira é algo existia?”
A) baseado em verdades incontestáveis. AGOSTINHO. Confissões. São Paulo: Abril Cultural, 19984
esse fim, considerando-se que se um homem a usa para pecar, O renascimento instaura uma revolução espiritual que representaram,
recairão sobre ele as punições divinas. Ora, isso seria injusto se a portanto, as novas concepções da ciência nascente. As conquistas e
vontade livre tivesse sido dada ao homem não apenas para agir realizações renascentistas deixaram a maioria das pessoas
corretamente, mas também para pecar. Na verdade, por que deveria desorientadas e desconfiadas. O mundo racionalmente ordenado da
ser punido aquele que usasse sua vontade para o fim para o qual ela antiguidade e do período medieval foi questionado e, aos poucos,
lhe foi dada? dissolvido. O que representariam a cidade, o Império ou a Igreja diante
AGOSTINHO. O livre-arbítrio. In: MARCONDES, D. Textos básicos de ética. Rio de Janeiro:
de um universo infinito?
Jorge Zahar, 2008.
Busca de um Novo Centro
Nesse texto, o filósofo cristão Agostinho de Hipona sustenta que a Uma das concepções fundamentais até então – a noção aristotélica de
punição divina tem como fundamento o(a) espaço hierarquizado, isto é, em que cada lugar apresenta uma
qualidade diferente da de outro lugar – foi substituída pelo conceito de
espaço homogêneo, ou seja, em que os lugares são equivalentes,
A) desvio da postura celibatária.
sem um ponto fixo referencial, sem uma hierarquia.
B) insuficiência da autonomia moral.
O Sol não se converteria no novo ponto fixo, pois o heliocentrismo de
C) afastamento das ações de desapego.
Copérnico representava apenas o primeiro passo de um processo de
D) distanciamento das práticas de sacrifício.
descentralização exterior do mundo.
E) violação dos preceitos do Velho Testamento.
Como ficará mais claro adiante, o ser humano só encontraria um novo
centro em si mesmo, isto é, na razão, entendida como a capacidade
03. (ENEM – 2018) Desde que tenhamos compreendido o significado humana de avaliar a realidade e distinguir o verdadeiro do falso.
da palavra “Deus”, sabemos, de imediato, que Deus existe. Com efeito,
Mundo representado
essa palavra designa uma coisa de tal ordem que não podemos
Uma das principais características do pensamento moderno foi tentar
conceber nada que lhe seja maior. Ora, o que existe na realidade e no
explicar a realidade a partir de novas formulações racionais. Galileu,
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por exemplo, explicaria o mundo concreto, sensível, por meio de Aplicando a dúvida metódica, Descartes chegou à conclusão de que no
relações matemáticas, geométricas, o que não havia sido feito até mundo haveria apenas duas substâncias, essencialmente distintas e
então, embora hoje esse seja um procedimento bastante comum. separadas:
Procura-se um Método 1. a substância pensante (res cogitans), correspondente à esfera do
Outra pergunta que surgiu foi: Qual é a garantia de que um eu ou da consciência; e
pensamento é verdadeiro? A ruptura com toda a autoridade 2. a substância extensa (res extensa), correspondente ao mundo
preestabelecida de conhecimento fez com que os pensadores corpóreo, material.
modernos buscassem uma base segura, algo que garantisse a O ser humano seria composto dessas duas substâncias, enquanto a
verdade de um raciocínio. Procurava-se, portanto, um método. natureza seria apenas substância extensa. Essa era uma concepção
A razão estava em alta. O método escolhido foi o matemático, pois a que se chocava com a noção tomista-aristotélica predominante,
matemática é o exemplo de conhecimento integralmente racional. Ela segundo a qual haveria tantas substâncias quantos seres existirem.
se tornaria, por isso, o modelo seguido pelo racionalismo do século A metafísica cartesiana também incluía uma substância infinita (res
XVII. infinita), relativa a Deus, o ser que teria criado todas as coisas. Mas
Durante o século XVII, a confiança no papel da razão no processo de essa substância não seria parte deste mundo, pois o Deus cartesiano é
conhecimento chega a seu auge no contexto da filosofia (que se transcendente, está separado de sua criação como também não
mantinha ainda aliada à ciência). Por isso a produção filosófica dessa possui nenhuma relação com o Deus pregado pela religião judaico-
época é chamada de grande racionalismo. cristã.
No campo das teorias do conhecimento, racionalismo designa a Idealismo
doutrina que privilegia a razão no processo de conhecer a verdade. Descartes concluiu, porém, que o pensamento (ou consciência) é algo
Abordaremos em seguida os principais filósofos racionalistas desse mais certo que qualquer corpo, pois ele considerava a matéria algo
período. Na próxima aula, iremos revisar os principais pensadores apenas conhecível, se é o que o é, por dedução do que se sabe da
empiristas do mesmo período. mente. Nesse sentido, o pensador francês descobre que a mente é
composta por ideias e serão elas que poderão validar ou não o
RENÉ DESCARTES conhecimento que se tem sobre a realidade assim como de si mesmo.
René Descartes (1596-1650) nasceu em La Haye, França, em uma Adotará, então, o critério da evidência do cogito na validação de
família de prósperos burgueses. Decepcionado com a formação jesuíta alguma ideia clara e distinta, ou seja, indubitável, que não suscite
(tomista-aristotélica) que recebera, decidiu buscar a ciência por conta nenhuma dúvida. Identifica, então, três tipos de ideias: (1) ideias inatas,
própria, esforçando-se por decifrar o “grande livro do mundo”. Temendo que não são derivadas da experiência, mas se encontram no
perseguições religiosas e tendo em mente a condenação de Galileu, indivíduo desde seu nascimento; (2) adventícias, também chamadas de
tomou uma série de cautelas na exposição de suas ideias. empíricas, formadas a partir da experiência sensível e estando
Autocensurou vários trechos de suas obras para evitar tanto a sujeitas à dúvida; e as da (3) imaginação, formadas em nossa mente
repressão da Igreja Católica como a reação fanática dos protestantes. a partir dos elementos de nossa experiência podendo ser mescladas.
Apesar disso, o que publicou é suficientemente vasto e valioso para
situá-lo como um dos fundadores da filosofia moderna. Racionalismo
Descartes era um racionalista convicto. Recomendava que
Dúvida Metódica desconfiássemos das percepções sensoriais, responsabilizando-as
Descartes afirmava que, para conhecer a verdade, é preciso, de início, pelos frequentes erros do conhecimento humano. Dizia que o
colocar todos os nossos conhecimentos em dúvida. É necessário verdadeiro conhecimento das coisas externas devia ser conseguido
questionar tudo e analisar criteriosamente se existe algo na realidade através do trabalho lógico da mente.
que possamos ter plena certeza. Descarte atribuía, portanto, grande valor à matemática como
Fazendo uma aplicação metódica da dúvida, o filósofo percebeu que a instrumento de compreensão da realidade. Ele próprio foi um grande
única verdade totalmente livre de dúvida era que ele pensava. Deduziu matemático, sendo considerado um dos criadores da geometria
então que, se pensava, existia (“Penso, logo existo”). Para Descartes, analítica, sistema que tornou possível a determinação de um ponto em
essa seria uma verdade absolutamente firme, certa e segura, que, por um plano mediante duas linhas perpendiculares fixadas graficamente
isso mesmo, deveria ser adotada como princípio básico de toda a sua (as coordenadas cartesianas).
filosofia. Era sua base, seu novo centro, seu ponto fixo.
Sintetizando as características da dúvida cartesiana, temos: Método Cartesiano
1. Metódica: porque a dúvida vai se ampliando passo a passo, de Da sua obra Discurso do Método, podemos destacar quatro regras
modo ordenado e lógico. básicas, consideradas por Descartes capazes de conduzir o espírito na
2. Radical: porque a dúvida vai atingindo tudo e chega a um ponto busca de verdade:
extremo em que não é possível ter certeza de nada, nem mesmo de 1. Regra da Evidência: só aceitar algo como verdadeiro desde que
que o mundo existe. seja absolutamente evidente por sua clareza e distinção. As ideias
3. Hiperbólica: maior do que o normal ou o esperado, exagerada. claras e distintas seriam encontradas em sua própria atividade mental,
independentemente das percepções sensoriais externas.
Dualismo
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2. Regra da Análise: Dividir cada uma das dificuldades surgidas em tempo, confessa: “O silêncio eterno dos espaços infinitos apavora”. E
tantas partes quantas forem necessárias para resolvê-las melhor; completa: “O homem não é mais do que um caniço, o mais fraco da
3. Regra da Síntese: Reordenar o raciocínio indo dos problemas mais natureza, mas é um caniço pensante. Não é necessário que o universo
simples para os mais complexos; inteiro se arme para esmagá-lo; um vapor, uma gota d’água são
4. Regra da Enumeração: Realizar verificações completas e gerais suficientes para exterminá-lo. Mas ainda que o universo o esmague, o
para ter absoluta segurança de que nenhum aspecto do problema foi homem será mesmo assim mais nobre do que aquilo que o extermina,
omitido. porque sabe que morre (...) e o universo nada sabe. Toda nossa
Herança Cartesiana dignidade consiste portanto no pensar”.
Podemos dizer que Descartes é de grande importância não
propriamente pelas questões que resolveu, mas, sobretudo, pelos
GOTTFRIED WILHELM LEIBNIZ
problemas que formulou, problemas esses que foram herdados pelos Filósofo e matemático alemão, Leibniz (1646-1716) é considerado um
filósofos posteriores. dos mais importantes filósofos racionalista da modernidade.
Desenvolveu o projeto de criação de uma lógica simbólica que
BARUCH DE ESPINOSA antecipou algumas ideias-chave da lógica moderna. Leibniz também
Espinosa (1632-1677) nasceu na Holanda, filho de imigrantes judeus criou um dos sistemas metafísicos mais originais da história da
de origem hispano-portuguesa. Em sua filosofia, desenvolveu um filosofia.
racionalismo radical, que se caracterizou pela crítica às superstições As verdades da razão e as verdades de fato.
religiosas, políticas e filosóficas. Para Leibniz “nossos raciocínios fundamentam-se em dois grandes
De acordo com o filósofo, a fonte de toda superstição é a imaginação. princípios: o da contradição, em virtude do qual consideramos falso o
Incapaz de compreender a verdadeira ordem do universo, a que envolve contradição, e verdadeiro aquilo que é oposto ou
imaginação credita à realidade um Deus transcendente e voluntarioso, contraditório ao falso.
nas mãos de quem os seres humanos não passam de joguetes. A E o da razão suficiente, em virtude do qual consideramos que nenhum
partir da superstição religiosa, desenvolvem-se as superstições fato pode ser tomado como verdadeiro ou existente, tampouco nenhum
políticas e filosóficas. enunciado (possa ser considerado) verdadeiro, sem que haja uma
Deus Imanente razão suficiente para que assim seja e não de outro modo, ainda que,
Para combater essas superstições em sua origem, Espinosa escreveu na maioria das vezes, essas razões não possam ser conhecidas por
a Ética, texto no qual busca provar, como em uma demonstração nós.
geométrica, a natureza racional de Deus, que se manifesta em todas Também há dois tipos de verdades: as da razão e as de fato. As
as coisas (Deus imanente). Desse modo, Deus não está fora nem verdades da razão são necessárias e seu oposto é impossível; e as de
dentro do universo: ele é o próprio universo. fato são contingentes, e seu oposto, possível” (LEIBNIZ)
No interior desse entendimento racionalista, não há lugar para tragédia As verdades de fato não se apoiam no princípio lógico da contradição.
nem mistérios: tudo se torna compreensível à luz da razão. A filosofia Elas tem como base o princípio da razão suficiente, segundo esse
seria o conhecimento racional de Deus, e a liberdade humana princípio, nada pode ser o que é sem que haja uma razão para isso. Ou
consistiria na consciência da necessidade. Ou seja, não haveria livre- seja, por algum motivo as coisas que existem são de determinada
arbítrio, uma vez que Deus se identifica com a natureza universal e, maneira, ainda que pudessem ser de outra.
portanto, tudo o que existe é necessário, não pode ser transgredido, Já as verdades da razão partem do princípio da não-contradição, pois
pois faz parte da natureza divina. Por isso, Espinosa propunha a são verdades necessárias, isto é, não podem ser diferentes. Pois
equação Deus = Natureza, que significa: tudo existe em Deus e sabemos pelo raciocínio, que afirmações como “Um triângulo tem três
mantém-se em seu Ser. lados” são verdadeira e que negá-las é falso, pois se um triângulo
deixar de ter três lados, deixará de ser trângulo. Esse tipo de verdade
BLAISE PASCAL são necessárias e podem ser demonstradas somente pela razão.
Pascal foi um filósofo francês (1623-1662) que viveu na época do
grande racionalismo, mas que foi um pensador contra a corrente, isto As mônadas
é, um crítico de seus contemporâneos e da confiança excessiva na As mônadas são unidade simples que, embora não possam ser vistas,
razão. constituem tudo o que existe. Cada mônada é individual, diferente e
Apesar de ter sido um grande matemático e físico e de ter inventado dinâmica, uma espécie de centro autônomo de força responsável pela
uma máquina de calcular, não aceitava o reducionismo matemático nas vitalidade das coisas. Leibniz compreende o mundo real como algo
questões humanas. Exemplo disso é sua frase lapidar: “O coração tem complexo e, sobretudo, plural.
razões que a própria razão desconhece”. Pascal preferiu refletir sobre a Há, conforme o pensamento de Leibniz, infinitas mônadas
condição trágica do ser humano, ao mesmo tempo magnífico e independentes, que assumem maneiras e formas diferentes,
miserável, capaz de alcançar grandes verdades e gerar grandes erros. possibilitando a existência do mundo. Por exemplo, a alma é uma
Em sua obra Pensamentos, escrita sob a forma de aforismos, mônada. O corpo humano é composto de diversas mônadas, assim
questiona a situação paradoxal do ser humano em meio a toda a como uma árvore, um cachorro e uma pedra também resultam de
realidade existente: “No fundo, o que é o homem na natureza? É nada diversas combinações de mônadas.
em relação ao infinito, é tudo em relação ao nada, algo de intermediário
entre o nada e o tudo”. Diante das novas teorias astronômicas de seu
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https://www.netmundi.org/filosofia/category/filosofia-
moderna-2/ 03. (UNESP – 2017) Todas as vezes que mantenho minha vontade
Surgimento do Método Científico - InfoEscola
dentro dos limites do meu conhecimento, de tal maneira que ela não
https://www.infoescola.com/ciencias/surgimento-do-metodo-
cientifico/ formule juízo algum a não ser a respeito das coisas que lhe são claras
Espinosa
https://razaoinadequada.com/filosofos/espinosa/ e distintamente representadas pelo entendimento, não pode acontecer
Pascal
http://www.filosofia.com.br/historia_show.php?id=82 que eu me equivoque; pois toda concepção clara e distinta é, com
Leibniz certeza, alguma coisa de real e de positivo, e, assim, não pode se
http://www.filosofia.com.br/historia_show.php?id=76
originar do nada, mas deve ter obrigatoriamente Deus como seu autor;
LINK COM OUTRA DISCIPLINA:
Deus que, sendo perfeito, não pode ser causa de equívoco algum; e,
Leia em História – Renascimento Cultural
por conseguinte, é necessário concluir que uma tal concepção ou um
Leia em Sociologia - Precedentes teóricos da sociologia.
tal juízo é verdadeiro.
René Descartes. Vida e Obra. Os pensadores, 2000.
C) imposição de valores ortodoxos. norma da verdade. Em geral, essa corrente caracteriza-se pelo
D) autonomia do sujeito pensante. seguinte: 1º negação do caráter absoluto da verdade ou, ao menos, da
E) liberdade do agente moral. verdade acessível ao homem; 2º reconhecimento de que toda verdade
pode e deve ser posta à prova, logo eventualmente modificada,
corrigida ou abandonada. Portanto, o empirismo não se opõe à razão
ou não a nega, a não ser quando a razão pretende estabelecer
EMPIRISMO: O CONHECIMENTO PARTE DA EXPERIÊNCIA
verdades necessárias, que valham em absoluto. (ABBAGNANO)
Vimos que o desenvolvimento da ciência moderna se inseriu em um
GALILEU GALILEI
contexto de questionamento sobre os critérios e métodos para a
Nascido na cidade italiana de Pisa, Galileu Galilei (1564-1642) é
elaboração de um conhecimento verdadeiro.
considerado um dos fundadores da física moderna. Foi um entusiasta
Por essa razão, o processo de conhecer em si mesmo passou a ser
defensor da cosmologia que se desenvolveu a partir da teoria
investigado e discutido intensamente por boa parte dos principais
heliocêntrica de Copérnico. Rejeitava, portanto, a astronomia de
filósofos. Essa discussão concentrou-se entre os séculos XVII e XVIII.
Ptolomeu e a física de Aristóteles, que, incorporadas pelo cristianismo
Em consequência, a Idade Moderna tornou-se o período em que se
católico, reinaram durante o período medieval.
formularam algumas das principais gnosiologias, epistemologias ou
Por contrariar a visão tradicional do mundo, foi advertido pelas
teorias a respeito do conhecimento, da história da filosofia.
autoridades católicas, que o julgaram herege. Suas ideias eram
Ideias Inatas
consideradas contrárias às Sagradas Escrituras. Galileu teria
O início do debate esteve vinculado ao pensamento de René
comentado então que a Bíblia, em se tratando de temas científicos, não
Descartes, o primeiro e principal expoente do racionalismo moderno.
era um manual a ser obedecido cegamente.
Anteriormente, vimos que o filósofo francês dizia que o verdadeiro
Esse pioneirismo rebelde de Galileu atraiu a fúria da Inquisição. Em
conhecimento das coisas externas devia ser conseguido através do
1633, foi condenado por seus inquisidores, que lhe impuseram a
trabalho lógico da mente. Um de seus principais argumentos para
dramática alternativa: ser queimado vivo em uma fogueira ou retratar-
justificar essa posição era a suposição da existência de ideias
se publicamente, renegando suas concepções científicas. Galileu optou
fundadoras do conhecimento, as ideias inatas.
por viver e retratou-se perante o tribunal. Permaneceu, entretanto, fiel
Trata-se de ideias que teriam nascido com o sujeito pensante e que,
às suas ideias e, em 1638, quatro anos antes de morrer, publicou
por isso, dispensariam a percepção de um objeto exterior para que se
clandestinamente mais uma obra que contrariava os dogmas oficiais da
formassem no pensamento. Os conceitos matemáticos e a noção de
Igreja.
Deus seriam exemplos de ideias inatas, para Descartes.
Método Matemático-Experimental
Entre os principais defensores do inatismo no processo de
Na tradição grega aristotélica, para entender uma coisa não era preciso
conhecimento encontram-se Platão, na Antiguidade, e Santo
estudá-la experimentalmente. Bastava esforçar-se por compreender
Agostinho, na Idade Média, além do próprio Descartes, na filosofia
como essa coisa existe e funciona e, depois, elaborar uma teoria sobre
moderna.
isso. Assim, para grande parte dos pensadores antigos e medievais,
Reação Empirista
observar as coisas, agir sobre a natureza e pensar como matemático
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eram práticas incompatíveis. Já Galileu – professor de matemática da 1. Ídolos da tribo: referem-se às imperfeições do intelecto, que levam
Universidade de Pisa – decidiu, de forma inovadora, aplicar a os seres humanos a acreditar ingenuamente nos dados dos sentidos
matemática ao estudo experimental da natureza. ou em aspectos da realidade que lhes são convenientes;
Para Galileu, não interessava em explicar por que os corpos caem, 2. Ídolos da caverna: estão relacionados à predisposição do intelecto
mas como eles caem. A fim de apurar a observação e facilitar a de cada pessoa que, como os prisioneiros da alegoria platônica, toma
experiência, recorreu a técnicas e instrumentos que pudessem auxiliá- seu mundo particular pela verdadeira realidade;
lo. Assim, por meio do método experimental, Galileu elaborou a 3. Ídolos do mercado ou do foro: demonstram o problema de
descrição quantitativa dos fenômenos. Desprezando aspectos de cor, comunicação entre os indivíduos em sociedade visto que as palavras
odor e sabor, que são qualidades subjetivas, investigou o espaço físico seriam tidas como idênticas às coisas que designam e, além disso,
nos seu aspectos objetivos, ou seja, naqueles que se pode aplicar um raramente existe um acordo sobre o que de fato significam;
tratamento matemático. 4. Ídolos do teatro: apontam as doutrinas filosóficas que, assim como
Desse modo, alcançou grandes realizações, entre as quais podemos no teatro, não passariam de dramatizações especulativas meramente
destacar: inventadas.
1. a elaboração da lei da queda livre dos corpos, segundo a qual a Método Indutivo
aceleração de um corpo em queda é constante, independentemente de Para combater os erros provocados pelos ídolos, Francis Bacon propôs
o corpo ser leve ou pesado, grande ou pequeno. A demonstração o método indutivo de investigação, baseado na observação rigorosa
dessa lei exige condições ideais (vácuo); dos fenômenos naturais, que cumpriria as seguintes etapas:
2. a construção e o aperfeiçoamento de um telescópio, com o qual 1. Observação da natureza para a coleta de informações;
efetuou observações astronômicas que levaram a descobrir o relevo 2. Organização racional dos dados recolhidos empiricamente;
montanhoso da Lua, quatro satélites de Júpiter, as formas diferentes de 3. Formulação de explicações gerais (hipóteses) destinadas à
Saturno, as fases de Vênus e a existência das manchas solares. compreensão do fenômeno estudado;
Mas não é apenas por suas descobertas que Galileu merece especial 4. Comprovação da hipótese formulada mediante experimentações
destaque na história das ciências. Uma de suas mais extraordinárias repetidas, em novas circunstâncias.
contribuições foi ter assumido uma nova postura de investigação Bacon dizia que aquele que inicia uma investigação com muitas
científica, cuja metodologia tinha como base: certezas acaba cheio de dúvidas, mas aquele que começa com
1. a observação paciente e minuciosa dos fenômenos naturais; dúvidas pode terminar com algumas certezas.
2. a realização de experimentações para comprovar uma tese; e Assim, a grande contribuição de Francis Bacon para a história da
3. a valorização da matemática como instrumento capaz de enunciar ciência moderna foi apresentar o conhecimento científico como
as regularidades observadas nos fenômenos. resultado de um método de investigação capaz de conciliar a
observação dos fenômenos, a elaboração racional das hipóteses e a
FRANCIS BACON experimentação controlada para comprovar as conclusões.
Nascido em Londres, Francis Bacon (1561-1626) pertencia a uma
família de nobres. Depois de concluir seus estudos em Cambridge, JOHN LOCKE
iniciou, em 1577, sua carreira política, através da qual conquistaria os O filósofo John Locke (1632-1704) nasceu em Wrington, Inglaterra.
mais importantes postos do reino britânico. Durante os tempos de universidade, decepcionou-se com o
Bacon realizou uma obra científica de inegável valor. É considerado um aristotelismo e com a escolástica medieval, enquanto tomava contato
dos fundadores do método indutivo de investigação científica. com o pensamento de Francis Bacon e René Descartes. Problemas
Atribui-se a ele, também, a criação do lema “saber é poder”, que políticos obrigaram-no a sair de seu país, em 1675, exilar-se na França
revela sua disposição de fazer dos conhecimentos científicos um e, posteriormente, na Holanda. Regressou à Inglaterra somente em
instrumento prático de controle da realidade. 1688, durante a Revolução Gloriosa, que levou Guilherme de Orange
Preocupado com a utilização dos conhecimentos científicos na vida ao trono da Inglaterra, e a partir de então pôde dedicar-se livremente
prática, Bacon manifestava grande entusiasmo pelas conquistas às atividades intelectuais.
técnicas que se difundiam em seu tempo: a bússola, a pólvora e a
imprensa. Revelava igualmente sua aversão ao pensamento Tábula Rasa
meramente abstrato, característico da escolástica medieval. Em sua obra Ensaio acerca do entendimento humano, Locke combateu
duramente a doutrina cartesiana segundo a qual o ser humano possui
Teoria dos Ídolos ideias inatas. Ao contrário de Descartes, defendeu que nossa mente,
Para Bacon, a ciência deveria valorizar a pesquisa experimental, no instante do nascimento, é como uma tábula rasa.
tendo em vista proporcionar resultados objetivos para o ser A expressão tábula rasa usada por Locke tem o significado de “tábula
humano. Mas, para isso, era necessário que os cientistas se lisa”, isto é, tábua na qual nada foi escrito nem gravado. Ao nascer,
libertassem daquilo que denominava ídolos, isto é, falsas noções, nossa mente seria como um papel em branco, sem nenhuma ideia
preconceitos e maus hábitos mentais. previamente escrita.
Em sua obra Novum Organum, o filósofo destaca quatro gêneros de Locke retomava, assim, a tese empirista segundo a qual nada existe
ídolos que bloqueiam a mente humana e prejudicam a ciência: em nossa mente que não tenha sua origem nos sentidos. O filósofo
defendeu que as ideias que possuímos são adquiridas ao longo da vida
mediante a experiência sensível imediata e seu processamento interno.
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Desse modo, o conhecimento seria constituído basicamente por dois de um fato nos levam a confiar em que aquilo que se repetiu até hoje
tipos de ideias: irá se repetir amanhã. Assim, por exemplo, cremos que o Sol nascerá
1. Ideias da Sensação: são nossas primeiras ideias, aquelas que amanhã porque até hoje ele sempre nasceu. Mas, em termos lógicos,
chegam à mente através dos sentidos, isto é, quando temos uma nada pode garantir essa certeza.
experiência sensorial constituindo as sensações. Essas ideias seriam Para Hume, somente o raciocínio dedutivo utilizado na matemática
moldadas pelas qualidades próprias dos objetos externos. Por fundamenta-se em uma lógica racional.
sensação Locke entende, por exemplo, as ideias de amarelo, branco
quente, frio, mole, duro, amargo, doce, etc. Crítica a causalidade
2. Ideias da Reflexão: São aquelas que resultam da combinação e A noção de causalidade, ou seja, a crença na existência de um
associação das sensações por um processo de reflexão, de tal maneira princípio causal que relaciona os fenômenos naturais, constituindo-se
que a mente vai desenvolvendo outra série de ideias que não poderiam em uma lei universal, explicando a própria racionalidade do real em
ser obtidas das coisas externas. Seriam ideias como a percepção, o termos da relação causa-efeito, e estabelecendo assim um nexo, um
pensamento, o duvidar, o crer, o raciocinar. elo causal entre tudo o que acontece, é um pressuposto filosófico que
Assim, a reflexão seria nosso “sentido interno” que se desenvolve remonta aos filósofos pré-socráticos. Entretanto, Hume questiona a
quando a mente se debruça sobre si mesma, analisando suas próprias realidade objetiva desse princípio causal. De fato, se observarmos, no
operações. Das ideias simples, a mente avança em direção a ideias famoso exemplo do movimento das bolas de bilhar em uma mesa, tudo
cada vez mais complexas. Porém, para Locke, de qualquer maneira a o que vemos é o impacto do taco sobre a primeira bola e, por sua vez,
mente sempre tem as coisas materiais externas, como objeto de o impacto da primeira sobre a segunda, mas a causalidade
sensação, e as operações de nossas próprias mentes, como objeto da propriamente dita não pode ser observada. Tudo o que a experiência
reflexão. nos revela é uma conjunção constante entre fenômenos, e não uma
O filósofo admitia, no entanto, que nem todo conhecimento limita-se, conexão necessária que chamamos de causalidade.
exclusivamente, à experiência sensível. Considerava, por exemplo o Para Hume, portanto, a causalidade resulta apenas de uma
conhecimento matemático válido em termos lógicos, embora não regularidade ou repetição em nossa experiência de uma conjunção
tivesse como base a experiência sensível. Nesse sentido, Locke não constante entre fenômenos que, por força do hábito, acabamos por
era um empirista radical. projetar na realidade, tratando-a como se fosse algo existente. É nesse
sentido que pode ser dito que a causalidade é uma forma nossa de
DAVID HUME perceber o real, uma ideia derivada da reflexão sobre as operações de
David Hume (1711-1776) nasceu em Edimburgo, Escócia. Estudou nossa própria mente, e não uma conexão necessária entre causa e
filosofia, direito e comércio, ocupando importante posição na efeito, uma característica do mundo natural.
diplomacia inglesa. Realizou diversas viagens a países europeus, Crítica a ideia de Identidade Pessoal.
como França e Áustria, estabelecendo contato com grandes Hume questiona o modelo cartesiano de mente como substância
pensadores da época, entre eles Adam Smith e Jean-Jacques pensante, a res cogitans de Descartes, sustentando que não podemos
Rousseau. ter nenhuma representação de nossa mente independente de nossa
Na obra Investigação Acerca do Entendimento Humano, Hume experiência, ou seja, de nossas impressões sensíveis e da maneira
formulou sua teoria empirista. Dividiu, primeiramente, tudo aquilo que como as elaboramos. Não há como nos representarmos o pensamento
percebemos em: puro, independente de qualquer conteúdo. Para Hume, jamais posso
1. Impressões: referem-se aos dados fornecidos pelos sentidos, como apreender a mim mesmo sem algum tipo de percepção.
as impressões visuais, auditivas, táteis;
2. Ideias: referem-se às representações mentais (memória, Legado Epistemológico
imaginação, etc.) derivadas das impressões. Ao questionar a validade lógica do raciocínio indutivo, a obra de Hume
Assim, toda ideia é uma re(a)presentação de alguma impressão. Essa legou um importante problema para os teóricos do conhecimento
representação pode possuir diferentes graus de fidelidade. E alguém (epistemologistas). Afinal, é ou não possível partir de experiências
que nunca teve uma impressão visual – um cego de nascença, por particulares para chegar a conclusões gerais, representadas pelas
exemplo – jamais poderá ter uma ideia de cor, nem mesmo uma ideia leis científicas?
pouco fiel. Enquanto o senso comum acredita que por meio de observações
repetidas, realizadas no passado, podemos justificar nossas
Crítica à Indução expectativas futuras, Hume sustentou que a repetição de um fato não
A indução, ou raciocínio indutivo, vai do particular para o geral. nos permite concluir, em termos lógicos, que ele continuará a se repetir
Conclusões indutivas são produzidas, assim, pelo seguinte processo da mesma forma, indefinidamente.
mental: partindo de percepções repetidas que nos chegam da Desse modo, o filósofo revelou um ceticismo teórico, pois, para ele, o
experiência sensorial, saltamos para uma conclusão geral, da qual não conhecimento científico – que ostenta a bandeira da mais pura
temos experiência sensorial. racionalidade – também está ancorado em bases não racionais, como
Hume argumentou que a conclusão indutiva, por maior que seja o a crença e o hábito intelectual.
número de percepções repetidas do mesmo fato, não possui Isso significa que, desconfiado das posições arraigadas pela força do
fundamento lógico. Será sempre um salto do raciocínio hábito, o cientista deveria apresentar suas teses como
impulsionado pela crença ou hábito, isto é, as reiteradas percepções probabilidades, e não como certezas irrefutáveis. Tal atitude
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epistemológica, estendida ao convívio social, tornaria os indivíduos isso, concluirei também que um cego tem ideias das cores, e um surdo,
mais tolerantes, democráticos e abertos. noções reais dos diversos sons.
(John Locke. Ensaio acerca do entendimento humano, 1991. Adaptado.)
O aspecto central pontuado anteriormente se insere no contexto da ideia de natureza. São Paulo: Loyola, 2006.
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05. (ENEM – 2015) Todo o poder criativo da mente se reduz a nada indagação radical e de uma nova articulação sobre o pensar e fazer
mais do que a faculdade de compor, transpor, aumentar ou diminuir os política, que põe fim à ideia de uma ordem natural e eterna. A ordem,
materiais que nos fornecem os sentidos e a experiência. Quando produto necessário da política, não é natural, nem a materialização de
pensamos em uma montanha de ouro, não fazemos mais do que juntar uma vontade extraterrena, e tampouco resulta do jogo de dados do
duas ideias consistentes, ouro e a montanha, que já conhecíamos. acaso. Ao contrário, a ordem tem um imperativo: deve ser
Podemos conceber um cavalo virtuoso, porque somos capazes de construída pelos homens para se evitar o caos e a barbárie, e, uma
conceber a virtude a partir de nossos próprios sentimentos, e podemos vez alcançada, ela não será definitiva, pois há sempre, em germe, o
unir a isso a figura e a forma de um cavalo, animal que nos é familiar. seu trabalho em negativo, isto é, a ameaça de que seja desfeita.
HUME. D. Investigação sobre o entendimento humano. São Paulo: Abril Cultural, 1995. Dessa forma, o filósofo afastou-se da concepção idealizada de
política. Centrou sua reflexão na constatação de que o poder político
Hume estabelece um vínculo entre pensamento e impressão ao tem como função regular as lutas e tensões entre os grupos sociais, os
considerar que quais, em seu entendimento, eram basicamente dois: o grupo dos
poderosos e o povo. Essas lutas e tensões existiriam sempre, de tal
A) os conteúdos das ideias no intelecto têm origem na sensação. forma que seria ilusão buscar um bem comum para todos.
B) o espírito é capaz de classificar os dados da percepção sensível. Mas se a política não tem como objetivo o bem comum, qual seria
C) as ideias fracas resultam de experiências sensoriais determinadas então seu objetivo?
pelo acaso. Maquiavel respondeu: a política tem como objetivo a manutenção
D) os sentimentos ordenam como os pensamentos devem ser do poder do Estado. E, para manter o poder, o governante deve lutar
processados na memória. com todas as armas possíveis, sempre atento às correlações de forças
E) as ideias têm como fonte específica o sentimento cujos dados são que se mostram a cada instante. Isso significa que a ação política não
colhidos na empiria. cabe nos limites do juízo moral. O governante deve fazer aquilo que,
a cada momento, se mostra interessante para conservar seu poder.
Não se trata, portanto, de uma decisão moral, mas sim de uma decisão
repercussão, O Príncipe, marca a história do pensamento político Na construção de sua teoria política, Maquiavel realiza uma análise da
Ocidental. Desenvolveu sua filosofia política em um quadro teórico história e da condição humana. Segundo o pensador, os fatos
completamente diferente do que se tinha até então. Revolucionando a históricos se repetem em suas linhas gerais, conhecer os fatos
história das teorias políticas, constituindo um marco que a dividiu em históricos é ter como referência um conhecimento essencial para
duas fases distintas, a teoria política clássica e a teoria política entender o presente.
moderna (ou a ciência política). Tal concepção do acontecer histórico, complementa-se com a
Até então, a teoria do Estado e da sociedade não ultrapassavam os compreensão da natureza (ou psicologia) humana.
limites da especulação. Em Platão, Aristóteles ou Tomás de Aquino, o Esse "diálogo" com os homens da antiguidade clássica e sua prática
estudo desses assuntos vinculava-se à moral e constituía-se como leva Maquiavel a concluir que por toda parte, e em todos os tempos,
teoria de ideais de organização política e social. À mesma regra não pode-se observar a presença de traços humanos imutáveis. Daí
fogem seus contemporâneos, como Erasmo de Rotterdan (no Manual afirmar, os homens "são ingratos, volúveis, simuladores, covardes ante
do Príncipe Cristão), ou Thomas More (na Utopia), que, na base de um os perigos, ávidos de lucro" (O príncipe, cap. XVII). Estes atributos
humanismo abstrato e distante do mundo concreto, constroem modelos negativos compõem a natureza humana e mostram que o conflito e a
ideais do bom governante de uma sociedade justa. anarquia são desdobramentos necessários dessas paixões e instintos
A preocupação do filósofo florentino é o Estado. Não o melhor Estado, malévolos. Por outro lado, sua reiterada permanência em todas as
aquele tantas vezes imaginado, mas que nunca existiu. Mas o Estado épocas e sociedades transformam a história numa privilegiada fonte
real, capaz de impor a ordem. Maquiavel rejeita a tradição idealista de ensinamentos. Por isso, o estudo do passado não é um exercício
(política clássica) e segue a trilha inaugurada pelos historiadores de mera erudição, nem a história um suceder de eventos em
antigos, como Tácito, Políbio, Tucídides e Tito Lívio. Seu ponto de conformidade com os desígnios divinos até que chegue o dia do juízo
partida e de chegada é a realidade concreta. Daí a ênfase na a final, mas sim um desfile de fatos dos quais se deve extrair as causas e
verdade efetiva das coisas. Esta é sua regra metodológica: ver e os meios utilizados para enfrentar o caos resultante da expressão da
examinar a realidade tal como ela é e não como se gostaria que ela natureza humana. Desta forma, sustenta o pensador florentino: “aquele
fosse. A substituição do reino do dever ser, que marcara a filosofia que estudar cuidadosamente o passado pode prever os
anterior, pelo reino do ser, da realidade, leva Maquiavel a se acontecimentos que se produzirão em cada Estado e utilizar os
perguntar: como fazer reinar a ordem, como instaurar um Estado mesmos meios que os empregados pelos antigos. Ou então, se não há
estável? O problema central de sua análise política é descobrir como mais os remédios que já foram empregados, imaginar outros novos,
pode ser resolvido o inevitável ciclo de estabilidade e caos. segundo a semelhança dos acontecimentos”. (Discursos, livro I, cap.
ruptura com o saber repetido pelos séculos. Trata-se de uma Maquiavel conclui, através do estudo dos antigos e do conhecimento
dos poderosos de sua época, que os homens são todos egoístas e
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ambiciosos, só recuando da prática do mal quando coagidos pela força raposa (para conhecer os lobos), o que conta é "o triunfo das
da lei. Os desejos e as paixões seriam os mesmos em todas as dificuldades e a manutenção do Estado. Os meios para isso nunca
cidades e em todos os povos. deixarão de ser julgados honrosos, e todos os aplaudirão" (O príncipe,
cap. XVIII).
Os conceitos de VIRTÚ e FORTUNA
É de grande importância que o aluno compreenda os conceitos de virtú Qual a melhor forma de governo para evitar a anarquia e o caos?
e fortuna em Maquiavel, pois são conceitos chaves para entender o Maquiavel sugere que há basicamente duas respostas à anarquia
papel do governante na manutenção do poder. decorrente da natureza humana e do confronto entre os grupos sociais:
Para pensar a virtù e a fortuna mais uma vez Maquiavel recorre aos o Principado e a República. A escolha de uma ou de outra forma
ensinamentos dos historiadores clássicos. Para os antigos, a Fortuna institucional não depende de um mero ato de vontade ou de
não era uma força maligna implacável. Ao contrário, sua imagem era a considerações abstratas e idealistas sobre o regime, mas da situação
de uma deusa boa, uma aliada potencial, cuja simpatia era importante concreta. Assim, quando a nação encontra-se ameaçada de
atrair. Esta deusa possuía os bens que todos os homens desejavam: a deterioração, quando a corrupção alastrou-se, é necessário um
honra, a riqueza, a glória, o poder. Mas como fazer para que a deusa governo forte, que crie e coloque seus instrumentos de poder para
Fortuna nos favorecesse e não a outros? Perguntavam-se os homens inibir a vitalidade das forças desagregadoras. O príncipe não é um
da antiguidade clássica. Era preciso seduzi-la, respondiam. Como se ditador; é, mais propriamente, um fundador do Estado, um agente da
tratava de uma deusa que era também mulher, para atrair suas graças transição numa fase em que a nação se acha ameaçada de
era necessário mostrar-se vir, um homem de verdadeira virilidade, de decomposição. Quando, ao contrário, a sociedade já encontrou formas
inquestionável coragem. Assim, o homem que possuísse virtù no mais de equilíbrio, o poder político cumpriu sua função regeneradora e
alto grau seria beneficiado com os presentes da cornucópia (antigo "educadora", ela está preparada para a República. Neste regime, que
símbolo da fertilidade, riqueza e abundância) da Fortuna. por vezes o pensador florentino chama de liberdade, o povo é virtuoso,
Dessa forma, o poder que nasce da própria natureza humana e as instituições são estáveis e contemplam a dinâmica das relações
encontra seu fundamento na força é redefinido. Não se trata mais sociais. Os conflitos são fonte de vigor, sinal de uma cidadania ativa, e
apenas da força bruta, da violência, mas da sabedoria no uso da força, portanto são desejáveis.
da utilização virtuosa da força. O governante não é, pois,
simplesmente o mais forte — já que este tem condições de conquistar Fiquem ligados...
mas não de se manter no poder —, mas sobretudo o que demonstra O livro O Príncipe tornou-se um clássico sobre a arte de governar,
possuir virtù, sendo assim capaz de manter o domínio adquirido e se constituindo até hoje uma referência para aqueles que se dedicam à
não o amor, pelo menos o respeito dos governados. política. Essa obra de Maquiavel recebeu interpretações polêmicas. De
Um governante virtuoso procurará criar instituições que "facilitem" o um lado, há aqueles que veem ali a defesa de um governo forte e
domínio. Consequentemente, sem virtù, sem boas leis, geradoras de centralizador, um conjunto de conselhos para um governante sobre
boas instituições, e sem boas armas, um poder rival poderá impor-se. como proceder para conquistar o poder e mantê-lo; enfim, um
A força explica o fundamento do poder, porém é a posse de virtù a verdadeiro “manual de política”. De outro lado, alguns afirmam que, ao
chave por excelência do sucesso do príncipe. Sucesso este que tem mostrar como funcionam os mecanismos do poder político, mais que
uma medida política: a manutenção da conquista. O homem de virtù dar conselhos a um governante o autor estava chamando a atenção do
deve atrair os favores da cornucópia, conseguindo, assim, a fama, a povo para os perigos da tirania. Seja qual for a interpretação, não se
honra e a glória para si e a segurança para seus governados. pode negar que esse livro mudou completamente a forma de ver a
É desta perspectiva que ganha um novo sentido a discussão sobre as política.
qualidades do príncipe. Este deveria ser bom, honesto, liberal,
cumpridor de suas promessas, conforme rezam os mandamentos da
virtude cristã? Maquiavel é incisivo: há vícios que são virtudes. Não
O tema da filosofia política é um dos mais abordados no ENEM,
tema pois o príncipe que deseje se manter no poder "incorrer no dentre os pensadores mais cobrados dessa temática, destaca-
se Maquiavel. Tenha em mente a importância de Maquiavel
opróbrio (vergonha) dos defeitos mencionados, se tal for indispensável como fundador da ciência política no Ocidente, pois é a partir da
sua obra que a política é observada de forma realista, em que
para salvar o Estado" (O príncipe, cap. XV). Os ditames da as relações de poder tornam-se o foco da análise. Separando a
moralidade convencional podem significar sua ruína. Um príncipe moral (ética), sobretudo a cristã, da análise política.
Série Merlí: Temporada 01, episódio 03 (Maquiavel).
sábio deve guiar-se pela necessidade — "aprender os meios de não
Documentário: O Príncipe
ser bom e a fazer uso ou não deles, conforme as necessidades". https://www.youtube.com/watch?v=LUDOnaqziLo
Assim, a qualidade exigida do príncipe que deseja se manter no poder
Maquiavel - Prof. Leandro Vieira
é sobretudo a sabedoria de agir conforme as circunstâncias. https://www.youtube.com/watch?v=yz-b1gUR960
Maquiavel: Os fins justificam os meios
Devendo, contudo, aparentar possuir as qualidades valorizadas pelos https://super.abril.com.br/cultura/os-fins-justificam-os-meios/
Maquiavel
governados. O jogo entre a aparência e a essência sobrepõe-se à
http://www.filosofia.com.br/historia_show.php?id=62
distinção tradicional entre virtudes e vícios. A virtù política exige Maquiavel: A política e o príncipe
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/filosofia/maquiavel-a-
também os vícios, assim como exige o reenquadramento da força. O politica-e-o-principe.htm
agir virtuoso é um agir como homem e como animal. Resulta de
uma astuciosa combinação da virilidade e da natureza animal. Quer
como homem, quer como leão (para amedrontar os lobos), quer como
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Leia em História – O Antigo Regime. E) É necessário ao governante agir em conformidade com a situação
Leia em Sociologia – Teoria Geral do Estado. para garantir o bem comum.
e a regeneração da Itália.
(Adaptado de: SADEK, M. T. “Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de virtú”. O texto aponta uma inovação na teoria política na época moderna
In: WEFORT, F. C. (Org.). Clássicos da política. v.2. São Paulo: Ática, 2003. p.11-24.)
expressa na distinção entre
1979 (adaptado).
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