Bruxas Da Serra
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RESUHO
BRUXAS DA SERRA
Seminário de Investigação
Licenciatura de Antropologia
F.C . S.H. - U. N. L.
O r efer en te "b r uxa'· é uti li zado em Ant r opologi a pa ra designa r ser es , r e a is ou 1ma
ginã r ios, com o poder ou o s abe r de control a rem forças imate r i a is que lhe permitem
in t e r vir e / ou a t acar pessoas pr óximas . Aplic ado ao contexto europeu, e st e t e rmo
tem uma na tureza pol i s sémica, pois desi gna três f i gura s di st i ntas: a "bruxa" p rod~
tora de mau-olh ado , a "b r uxa " sabáti c a, geralmen t e a s s oc iada a o demónio e com os
poderes de se t ornar invisíve l e de voar de no ite, e a "bruxa''- curande i ra.
Na comuni dade estudada, pequena aldei a de 81 habitantes situada nas faldas da serra
do Caramu lo , traba l ham cinco pessoas como "bruxas"-curandeiras. O objectivo deste
trabalh o e o estud o do discurso e métodos utilizados por essas "bruxas " e das ra-
zoes qu e os tornam pausíveis e pertinentes para os restantes membros da comunidade .
Quatro delas assumem o poder de comunicar com os espíritos: são as chamadas "espí-
r i tas " ou "med ias ". Uma outra mulher trabalha como car t omante e exorcista, pois l ê
em cartas o futur o e a causa dos problemas e conhece os encantamentos para expulsar
os es pÍritos que assombram pessoas, animais ou casas. Pela análise do processo per-
corrido por essas pessoas até se tornarem "bruxas ", do seu discurso, dos ritos efec
tuados nas sessÕes que realizam, dos casos que lhes são apresentados e das soluções
apontadas para esses problemas, cheguei às seguintes conclusÕes, que apresento con-
cisamente :
zinhos ou ass ombramento dos esp í ritos é também coincidente com o di scu r so da Ne
dic in a "Popular" .
d) Es ta expli cação causal i nse r e -s e num sistema con cep tua l que considera poderem
os vizinhos atacar-se entre s i apenas por o dese j arem, l ançand o-se pragas, mau-
- olhado e "mal de inveja" . Este ataque efectua-se sob a forma de um roubo da
ener gia vital dos membros de uma casa ( à qual corresponde habitualmente um gr~
po d oméstico cujos membros estão ligados por laços d e parentesco em 19 grau ) ou
dos seus animais. Neste s i stema conceptual insere-se igualmente uma visão esca
t o lÕgica segundo a qua l todos os que sofreram uma "mã-morte" - morreram longe
da f amília, sem terem pago as dÍvidas ou resolvido os seus contenciosos, ou sem
que os ritos funerários tenham sid o devidamente cumpridos ou ainda aque l es que
mataram, roubaram ou rea l izaram partilhas desiguais pelos seus herdeiros - vo l
tam ã Terra e assombram os vivos, especialmente os que lhes eram mais chegados:
os parentes próximos.
e ) Como na maioria dos assombramentos por espíritos sao acusados os parentes (mor-
tos ) que realizaram mãs partilhas, podemos inferir que nesta sociedade se consi
dera que o infortúnio individual pode ter a sua origem em relaçÕes sociais defel
tuosas. Nesta comunidade, o círculo de sociabilidade onde as relaçÕes são mais
i ntensas é o grupo domé s ti c o , caracterizada por relaçÕes de reciprocidade genera
lizada (definição de Sahlins ) . Os outros círculos de sociabi l idade mais densa sao
de l imitados pelas relaçÕes entre parentes até ao 39 grau e entre vizinhos. Em
qualquer destes grupos as re l ações são caracterizadas pela reciprocidade equili
brada. As causas do infortúnio apontadas anteriormente relacionam-se com os po~
tos de ruptura destes círculos de sociabilidade: o momento da divisão da casa ori
ginal pelos herdeiros ou a possibilidade dos grupos domésticos vizinhos se ataca-
rem entre si, recusando-s e a manter as relaçÕes de cooperação e solidariedade que
mantêm esta comunidade. As "bruxas"-curandeiras relacionam o infortúnio individual
com os pontos estruturais de tensão social.
1 . INTRODUÇÃO
2.
(1) O mesmo método foi seguido ~or J . Favret- Saada ~a sua estadia
de 30 meses no Bocage frances , onde estudou fenomenos de bru-
xaria e feitiçaria . (Favret- Saada, 1977)
5.
(1) Composta por diversos mordomas e presidida por um juiz , cabe- lhe
organizar as festividades e tomar conta da capela durante o ano .
Em Santo Amaro existe também uma pequena capela dedicada a Nossa Senhora
do Rosário , que é festejada no primeiro domingo de Outubro , embora com
menos pompa que o santo patrono a 15 de Janeiro . Esta Última festa reúne
caracterÍsticas das festas comunais e das romarias que se fazem a capelas
isoladas . Tal como no caso das Últimas , dura dois dias , ambos com missa ,
baile e arraial , e a ela acorrem numerosas pessoas exteriores ao concelho,
a pagar promessas . Mas , tal como qualquer festa patronal , é organizada por
uma comissão onde estão incluÍdos jovens das cinco povoações referidas .
~ ocasião para em cada casa destas aldeias se realizar uma refeição ceri-
moniosa (cujo custo orça, actualmente , entre 15 a 20 mil escudos) para a
qual se convidam todos os parentes em segundo grau e alguns amigos . Esta
é a Única festa em que se convidam pessoas externas à aldeia. Todos os
restantes momentos do calendário festivo (Natal , Reis , Carnaval , Páscoa ,
dia de Nossa Senhora do Rosário e dia de Todos os Santos) são festejados
na intimidade da famÍlia. SÓ os jovens de cada aldeia se costumam reunir
ou para realizarem uma refeição comum (dia de Reis) ou para as partidas
carnavalescas ou ainda para os "tradicionais" jogos de futebol. Para
além do momento da festa patronal ou, eventualmente , da cerimÓnia do
" rito de passagem" de um dos seus membros , Calhandra vive entre si .
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1:-•be-~ra e zonôl
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D ·ca!laS é}b:mdo~/palhelr!>!>
, · L~Jq ( espíntsl)
2 • 'Prãz.ere.s (esrín~)
3 ·C..dene (~n~)
4 • NatAl~ (e.Jcorc.ts~;~...tomaV\te.)
por intenç5o das almas dos fami I iares mortos ou ainda em dias
de baptizados , casamentos ou funerais, estas populações rara-
mente vão~ missa. Nos ~ltimos anos a assistência r ei igiosa
tornou-se mais diffcil pelo facto de P in hais já não ter páro-
co residente e os serviços rei igiosos terem de ser prestados
por um padre de outra freguesia. Mas apesar destas dificulda-
des persiste a imagem do padre como um conse l heiro e um con-
fessor , como um dos poss fv eis apoios em caso de contrari edade .
Recorrer ao padre insere-se na busca duma soluç3o para o in-
fortónio que passa por pedir a intervenç3o divina . Mais ainda
do que os padres são os santos encarados como intermédios pa -
ra se obter uma protecç3o . Ao longo de toda a vida e l es são
recorrentemente invocados em Calhandra , e são-lhes feitas nu -
merosas promessas, algumas das quais implicam uma importante
despesa monet6ria . Muitas vezes os indivfduos escrevem as su -
as promessas , que podem ser irrisórias mas deverão todas ser
cumpridas . "Antes deixar a ladr3o que dever a santo" diz o
ditado , referindo-se ao facto de se crer que os santos nunca
esquecem o não cumprimento de uma promessa. As orações, a par
1 '-t.
2 . CUIDAR- SE ENTRE SI
11-.
tico. ~ a zona do chamado "self- care", ou seja, dos cuidados de salide efec-
tuados em casa e segundo os conhecimentos do pr~prio ou de pessoas pr~ximas
...; ...
1~.
Embora a maioria das doenças de crianças sejam idênticas às dos adultos, são
consideradas específicas deste grupo et~io un conjunto de "maleitas" normal-
mente atribuídas ao comportamento de um tipo de lombrigas que s6 se desenvolvem
em corpos infantis . Estes seres encontram- se normalmente nos intestinos, tal
como as lombrigas vulgares, mas ao contrlrio de stas ültimas são pequenas e ne-
gras e podem- se passear por todo o organismo causando diversos dist6rbios.
. . .I . . .
Um outro m~todo para curar a febre provocada pelas lombrigas consistia em reci-
tar uma oração que as faria aparecer nas costas do doente sob a forma de mlfiti-
plos pontos negros, seguidamente cortados com uma faca (1). Este mê·todo era do
conhecimento exclusivo de uma habitante das redondezas;j~ falecida.
...I .. .
A urticária é ainda hoje em dia tratada passando- se azeite pela zona inflama-
da, vestindo o paciente uma camisa de homem e descansando.
Um outro tipo de infecção cutânea são erupções designadas por "cobrêlo" pois
são atribuídas à peçonha deixada por uma cobra, sapo ou aranha nas roupas da
pessoa afectada. No seu tratamento é utilizado azeite aquecido no qual se
misturam cinzas de palhas de alho queimadas. Com una pena de galinha negra
vai- se passando este preparado em círculo sobre as zonas afectadas enquanto
se diz:
. .. I . . .
2i.
11
- Donde vens S . Julião?
- Venho de Roma
- Que novidades por 1~ h~?
No fim cobre- se a ferid a com o resto do azeite, reza- se um Pai Nosso, uma
Avé l-1aria e una Salvé- Raínha em louvor de Nossa Senhora da Ehcarnação.
Tal como acontecia para o 11 cobrelo", esta operação repete- se un n6mero de
dias ímpar até a ferida sarar.
A "tr! zia", doença definida localmente como sendo uma hepatite mas que o
dicionúio traduz por icterícia, manifesta- se com os sintomas de perca de
apetite e um tom amarelado nos olhos . Cura- se com três pontas de alecrim que
se vão passando, una a uma, sobre a cara de paciente, em cruz, enquanto se
repete :
.../ ...
21.
No final reza-se um Pai Nosso, uma Avé Maria e uma Salvé Ra!nha e diz-se:
Uma outra doença, designada por "espinhela caída", aproxima-se pelos seus sin-
tomas das doenças psicossom~ticas. Detecta-se quando o paciente fica sem
forças para trabalhar e é atribuída ao facto de os ossos terem saído do seu
sítio. Para a curar repete-se um dos dois encantamentos seguintes - ou ambos.
En qualquer dos casos reza-se no fim um Pai Nosso, una Avé Haria e uma Salvé
Ra!nha em louvor de Nossa Senhora da Encarnação.
13.
Designa- se por "ter o quebranto" às dore s de cabeça repentinas que podem asso-
lar qualquer pessoa (embora se considere serem as raparigas jovens mais susce~
t.!veis de o apanhar). O "quebranto" é sempre "lançado" por um terceiro que pode
ser ou um animal "peçonhento " com o qual o paciente se tenha cruzado, ou una
pessoa que "lance" o ''mau-olhado 11 •
sifica ção são caracterizadas por terem "a vista forte demais" e podem por
vezes ser reconhecidas por uma mancha ocular com a fonna da pata de um gato .
Estas pessoas podem, com o olhar, causar os seguintes dist6rbios:
adoecer os animais
impedir as crianças de crescerem
"lançar quebranto", especialmente às crianças e
raparigas jovens.
2~.
Considera-se no entanto que quem tem "a vista forte demai s" consegue controlar
o efeito nefasto do seu olhar se não trouxer "inveja no coração". Mas como
ninguém pode estar absolutamente seguro de não atingir involuntariamente \.111
ser mais frágil, deve-se sempre repetir a frase "Benza-te Deus 11 quando se vai
visitar o filho pequeno ou o novo animal de un vizinho, como fónnula profilá.Q
tica.
11 Deus te fez,
Deus te criou,
Deus te tire todo o mal que para ti entrou".
Simultaneamente vão-se fazendo cruzes com a mão nas costas do ser atacado ou
no lombo do animal. Esta operação repete-se três vezes durante três dias cons~
cutivos . .Eln cada dia, no final, reza-se um Pai-Nosso, uma Avé Maria e \.llla
Salvé- Ra!nha e termina-se dizendo: "Eu peço à Nossa Senhora da Encarnação,
por toda a morte de paixão, que isto sej a o rem~dio para o teu corpo ficar são" .
2 5.
Entretanto faz-se três vezes o sinal da cruz nas costas da criança ou no lombo
do animal .
·.
Podemos perceber que, segundo esta classificação, a inveja entre vizinhos i
vista como un ataque do.::J 11
invejoS)I.S 11 e 11
fortes 11 aos "bondosos", 11 honestos 11
e "fracos 11 • (1)
Este ataque i encarado como um rou1o, geralmente um roubo de energia vital.
As duas f6nnulas utilizadas na cura do "aguado 11 fazem referência a un contra-
-ataque simb61ico a esse roubo. Na primeira reenvia-se o mal a quem o provo-
cou com a ajuda divina, a qual vem sancionar um acto anterionnente consider~
do nefasto. Na segunda responde-se a um roubo {de força vital) com t1111 outro
roubo (de folhas de couve). Os elementos roubados são muito pouco valóriza-
dos nesta comunidade, pelo que o acto não pode ser conotado negativamente.
Trata-se de um contra-ataque simbólico que, tal como no primeiro caso, i
feito com as mesmas 11
annas 11 •
Ou ainda:
Ap6s isto rezam-se três Pai-Nossos, três Avé-Marias e uma Salvé- Raínha.
As cinzas do defumadoiro devem ser lançadas em água corrente.
Os defumadoiros são também, e sobretudo, utilizados quando a causa do infortmuo
é atribuída à acção nefasta do espírito dos mortos. Nesse caso faz-se o mesmo
defumadoiro (ou uma variante can menos elementos: o que importa é que sejam
em mÊlero !mpar) utilizando-se a segu.i.l•1.e recitação:
rem de processos sancionados pela tradição. O paciente ter~ tanto mais ten-
dência a acreditar no processo quanto, para além de saber que j~ se revelou
eficaz com um seu familiar ou vizinho, ao longo do ritual ~ pedida a protec-
ção divina.
preensí vel composta de nomes latinos de formados (1) que aqui aparecem em dois
casos . Note- se que segundo esta divisão das grandes categorias formais que
se encontram no texto dos encantamentos, estas são tanto mais elaboradas
quanto as causas apontadas para o mal não são naturais ou orgânicas mas do
domínio das relações sociais: o mau-olhado, a inveja.
(1) A utilização, por parte dos m~gicos, de uma linguagem diferente, incom-
preensível, de uma não- linguagem, foi assinalada por Hauss:
11 Os encantamentos são feitos numa linguagem especi al, que 6 a lingua-
gem dos deuses, dos espí ritos, da magia. ( • • • ).
A magia falou em sânscrito na lndia dos pr~critos, em egípcio e
hebreu no mundo grego, em grego no mundo latino e em latim entre n<Ss .
Eln toda a parte ele procura o arcaísmo, os termos estranhos, incom-
preensí veis . " (Mauss, 1974: 87)
34.
Este tipo de pr~ticas podem ser consideradas uma extensão das suas responsabi-
lidades domésticas. Al~ de fazer a comida, cuidar da roupa da família, cuidar
da casa, tratar dos filhos, ir buscar erva ou palha para os animais, "fazer a
panela aos porcos", sã:o ainda elas quem cuida dos doentes e que vão, amorta-
lhadas ou de vela na mão, cumprir promessas pela sartde dos seus â capela dos
santos . São pois as mulheres as respons~veis pelos cuidados quotidianos para
com a família, na saúde ou na doença, e que como tal deverão conhecer as re-
ceitas e f~nnulas a utilizar para solucionar os pequenos infortrtnios.
deste saber • .T~ l-tauss apontava as mulheres como un dos grupos de pessoas que
mais facilmente podiam encarnar a figura do m~gico devido aos "sentúnentos
sociais de que são objecto":
filha de um homicida.
São estas as mulheres deposit~ias do conhecimento sobre encantamentos (1)
e sobretudo aquelas a quem se recorre preferencialmente para 0s realizarem
mesmo que o pr6prio os conheça. Considera-se que elas são mais eficazes
pois "t&i mais f~". As suas caracter!stic<J.s de mulheres mais velhas e que
não se casaram ou que manifestam comportamentos hist~ricos, bem como o
facto de consultarem frequentemente as "ad.ivinhoas" (mesmo anterionnente â
existência destas na aldeia), conferem- lhes una aura de mistirio, de margi-
nalidade . Esta imagem contribui para que sejam elas as de posit~ias e exe-
cutantes pre ferenciais dos encantamentos em que abundam referências não s6
religiosa~ como â vontade e poder de quem as executa (são ditas na primeira
pessoa do singular). Quando as f6nnulas de stes processos implicam a invocação
de sere s divinos, de forças imateriais, como principais agentes na resolu-
ção do infort~o procura- se uma pessoa com maior aptidão para as realizar.
(I) Note-se que algumas das pessoas apontadas são do sexo mas-
cu! ino sendo nesse caso designados por "bruxos" ou por'~m
homem que trabalha nessas coisas". Co~o não hã nenhuma de-
signação no plural para d esig~ar estas pessoas e a maioria
são mulheres, mantenho o termo "adivinhoas" para designar
o conjunto.
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tenda por resolver. Estas almas podem ser afastadas da casa ou dos
currais com um defumadoiro,mas se o infort6nio que a sua presença
causa persistir deve-se procurar saber, através duma espfrita, o
(I) Não se trata efectivamente de u~a santa pois não foi canoniza
da pela Igreja mas~ alvo da devo~ão popular e realizam-se
nu·nerosas peregrinações ao seu t<.i .nu I o.
... / ...
Actualmente a igreja s6 autoriza exorcismos em casos de pos-
sessão devidamente comprovadas por um prelado que reside na
c~ria episcopal da cada diocese, e para os quais~ necess~ria
a autorizaçgo do bispo . Qualquer outro exorcis~o é veemente-
mente condenado . No entanto estas disposições eclesiásticas
datam deste século e os padres, não s6 por tradiç~o como pe-
lo carácter sagrado das funções que exercem continuam a ser
considerados co~o exorcistas preferenciais. Isto coloca os
padres interpelados perante a escolha/ dei icada e~-
tre recusarem a ajuda pedida pelas pessoas verdadeiramente
angustiadas que a eles recorrem ou serem colaborantes num tl.
pode discurso que é condenado pela Igreja. ~:uitos recusam-
-se imediatamente, outros aceitam rezar com as pessoas e como
as orações e acções realizadas por um padre são sempre con-
sideradas sagradas, mesmo que eles se recusem a fazer um e-
xorcismo qualquer acto que realizarem ser~ eficaz . Outros
ainda aceitam participar no discurso das espfritas, arrisca~
do-se a serem desobrigados das suas funções sacerdotais pelo
bispo. O n6mero de padres que recebe~ pessoas que se declara~
possessas ou atormentadas por espfritos ~ bastante 1 imitado,
mas esses s5o geralmente muito procurados e famosos , como p~
de observar junto de três sacerdotes com Fama de exorcistas
- fama essa que recusaram -da diocese de Aveiro.
5i.
tos t~m por guias Santa Maria Adelaide, a Rainha Santa Isabel,
Santa Terezinha e o Padre Cruz.
(I) "Em geral todo o indivfduo com poder de soltar a sua alma é
um mágico; não se conhece excepção a esta regra"(Mauss, 1974:
6s).
Todo o poder das médias lhes vem de servtrem de meio de comu-
nicação co~ o guia - diz-se habitualmente que um determinado
facto foi revelado por um santo "que falou na F ••• " e n~o que
a média o revelou - e da protecção desse espfrito santo. Esta
protecção justifica que os encantamentos proferidos pelas mé-
dias sejam con~iderados mais eficazes do que quando efectuados
por outra pessoa.
ticas estas apontadas por Mary Douglas co~o recorrentes nas si-
tuações marginais dos estaJos de transição entre dois estatutos
sociais: "( ••• ) mais KGennep, qui, avec une pénétration plus so-
ciologique, comparait la société à une maison avec des chambres
et des corridors- et aPfirmait que le passage de I 'un à I 'autre
était dangereux. C'est clone pendant les états de transition que
réside le danger, pour la si~ple raison que toute transition est
entre un ~tat et un autre et est ind~finissable. Tout individu
f l'ha)'\t>
qui passe de I 'un b I 'autre est en danger , et le danger de sa
personne. Le r"te exorcise le danger, en ce sens qu'il sépare
I ' individu de son ancient statut et I 'isole pendant un temps
pour le faire entrer ensuite publ iquement dans le cadre de sa
nouvel le condition . Non seulement la transition ele-m~me est
dangereuse , ma1s aussi les rites de s~grégation . constituent
la phase la plus dangereuse du rite . " (Douglas, 1981 :I 13)
das médias diversos esp fri tos , alguns dos quais de familiares
dos presentes o que veio originar contenciosos . As sessões
transformaram-se no palco de lutas individuais e inter-famia-
res, pelo que deixaram de se realizar. Mes~o actualmente a
sua referência e recordaç3o é evitada . Mas durante a sua curta
duraçgo estas sessões provaram perante todos o poder que õs no
vos espfritas agora possufam e espalhou a farna da aldeia. A sua
aceitação pela comunidade como médias tornou-se completa , e o
seu poder confirmadoJquando os vizinhos passaram a consultá-
-l as sistematicamente sempre que alguma situaç3o de infort6nio
se lhes deparava.
As orações uti I izadas por esta mulher s~o iguais qualquer que
seJa a explicação causal do infor t6nio (ver apêndice IV). Tal
como o m ~ t odo de ler nas cartas tamb~m todo o processo de e -
xercisar o mal vem in dicado no I ivro de S . C i pr i ano • Por sua
iniciativa a exor c i sta escolheu algumas de entre as orações do
I ivro e apenas repete o ss~~ T~mbém por sua iniciativa abenço~
(I) A exorci st a util izn est e conceito de u~a Forma d i ferente das
esp fri ta s , pois "fecha a morada" aos seus pacientes par a os
proteger \.de· c sp fri t o s que "andem~ sua beira" e dos ataques
... I . ..
61 .
. . . I . ..
de bruxaria feitos por vivos. Por def inição em nenhum destes
casos se tem a " morada aberta" pois não se está possufdo pe-
los esp fri tos .
Na sessão colaborou o homem con quem v1ve maritalmente e que
trabalha como espfrita. A sessão começou em torno da mesa da
cozinha onde foram colocados um crucifixo, uma vela e o I i-
vro de S. Cipriano. O guia do espfrita desceu e indicou que
aquela casa andava assombrada por d iversos espfritos pois tl
nha sido construfda sobre um terreno roubado e passado nmui-
ta trafulhicen fora realizada no seu interior (1). Depois
do guta se ter retirado a mulher começou o exorcismo pelos
quartos mais afastados, repetindo em cada um as mesmas ora-
ções. Ao chegar ~ cozinha, onde se encontravam os restantes
presentes, o espfrita começou repentinamente a contorcer-se e
a gemer: estava possufJo por um espfrito mau. Foi imediatamen
te seguro pelo casal de pacientes enquanto a mulher o interp~
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r(', ·cl, r c.. 'ta, d SN:Hico V'IO S€1J ed. . do ~ ..'nre ~
(1)
"' ... r .,· t;eq ..o r- ._li.l ~ < Íó ~ti~ O'rd. o f~~"O(t:''-t cr
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JY' ~o.A•Ja\r~t-e õ (I de' "• o~~va cle"e
( ~'>-Jr• ' í c; 1F
a sociedade .
Justificam por outro lado a eficácia das suas actuaç5es pots pos-
suem um dom que lhes foi dado pela "vontade divina" .
As "adivinhoas" definem-se co11o pessoas co11 dotes divina.tór ·ios
e poder de comunicar com os espfritos, cuja actuação é benéfica
para a comunidade .
O doloroso "rito de passage~" que atravessaram justifica a obtenção
de um poder nág i co . As numerosas refer8nc i as reI ig i asas presentes
tanto no seu discurso como nos rituais que realizam integram-se
na vis~o da Rei igião desta comunidade . Apesar da ambiguidade
inerente b figura dos que manipulam Forças mágicas e sagradas ,
tanto as "adivinhoas" como os seus pacientes consideram que
estas actuam de acordo com a "vontade divina" .
60.
(Id. ibid.:lC3)
~WAN-
CASOS rrtlftff CARACiTER t·ST I'CA '
IF===I=============t===t====ll
a) Terreno que por tr~s vezes fora a hasta
p6bl ica sem nunca ser vendido
7
2 a) Problemas de anlmais: vacas ou bezerros
que recusam os ai imentos; porcos que de- Inveja e
pois de capados recusam os ai imentos;ca- mau - olhado
bras ou ovelhas que morrem sucessivaMen-
te 9
QUAN
CASOS TIDADE CARACTERISTICA
27
o
4-'
c) AcL itas com medos repentinos: é o ca-
so de um homem com sobressaltos noc- t.
turnos e dores de cabeça constantes
e de um rapaz, motorista profissional o.
com receio de conduzir 3 C/)
~------------------------------------------------~------~'' ~
d) Adultos com problemas org~nicos: o
caso de uma mulher com dores de os-
sos e no pescoço par a os qua1s os
médicos não encontravam solução; um
homem que ficava subitamente com as
pernas parai izadas e que os médicos
não conseguiam curar 2
13
"Bruxarias" de
4 a) Esposas de homens com amantes 4 mulheres
4
QUAN-
CASOS CARACTERISTICA
illDAD E
12
TOTAL . • • 53
Os infort~os referidos no ponto 2. referem casos com os mesmos sintomas
dos males causados pela inveja e pelo mau-olhado: doenças de animais, crianças
que não crescem, estão enfraquecidas ou recusam os alimentos, pessoas com
dores de cabeça ou de ventre, problemas de gravidez. Fhcontra-se um outro grupo
de infortdnios expressos nos casos de doentes hospitalizados, de problemas
orgânicos sem resoluç~o m~dica, de medos inexplic~veis, de casos de histeria,
de alteraçô'e s de comportamento, de desmaios. Todos estes problemas podem
dever-se ao assombramento por espíritos como foi referido anteriormente.
Ambas estas explicaç8'es (inveja dos vivos ou assombramento dos espíritos)
se inserem na concepção de que o infort~o pode originar-se num ataque
pessoalizado.
A 11adivinhoa 11 tem a capacidade de confirmar esta hip6tese, j~ posta "a-priori"
pelos seus consultantes, e ainda de realizar junto dele s os encantamentos e
oraç8'es protectoras. O caso das mulheres que desejam afastar os maridos das
suas eventuais amantes merece uma atenç~o especial pois necessita de ser
explicado à luz da concep~o local sobre as relaç8'es extra-111aritais mascu-
linas. Nunca se considera que um homem mantenha relaçô'es com outra mulher
al~ da sua legítima esposa por raz8'es afectivas. Estas relações s~o sempre
encaradas ccmo fruto de uma bruxaria feita directamente pela amante ou
encomendada junto de uma "adivinhoa" que "trabalhe para o mal". t encarado
como um ataque à sobrevivência do casal, cabendo à mulher legítima procurar
as 11 adivinhoas" para que estas desfaçam a "bruxaria".
QUADRO .R
CALHANDRA
CASA 11
c_)___H_á__9
lr-------C-a_s_o___ ----~
___a_n_o_s__r_e_c__o_r _r_e_r_a_m___à _s __e_s_p_f_r__i _t _a _s__d_e__B_o__i _a_l__
CASA III
r--
CASA I V
- .;,-
CASA V
1:--------- -- ------ --=-=- ---=---================ ======l
Caso a) Por causa ' de uma criançá que sofria com
bronquite, recorreram há 25 anos a u~a
mulher que via a causa do infort6nio num
copo de água, a qual declarou que se tra
' tava da "doença de médicos "
CASA V I
-- _c~
CASA V I I
õz.
- ·-
CASA VIII
CASA I X
~ --
Caso a) Um homem com u m pequeno atraso mental , foi
levado pela famfl ia há 30 anos, a uma mulher
no lorvão que via a causa do mal por um copo
de água. A água vinha turva , sinal que algum
'11al afligia o paciente . A fa-nfl ia interpretou
o facto por ele ter engravidado uma rapa-
rt g a solteira, _ com a qual s6 casou obrig~
do pela lei , pots tratava-se de uma menor .
----'==========================================================~~===1
, CASA X
Bruxaria de mulher 2
Doença de médico 2
2~
O modo como os espíritos podem assombrar e causar problemas aos vivos j~ foi
descrito anteriormente . Os vizinhos podem causar o mal entre si lançando
pragas "do coração" ou através do mau-olhado, como foi referido. No entanto
podem tamb&l realizar (ou mandar realizar) detenninadas acçô'es de efeitos
nocivos: as chamadas "bruxarias". Considera- se habitualmente que qualquer
pessoa poder~ aprender no livro de S. Cipriano a fazer ela pr6pria os en-
cantamentos nocivos, dos quais o mais referido i cozer-se a boca a um sapo
que se coloca à porta da pessoa que se deseja atacar . A vítima sofrer~ os
mesmos sofrimentos do animal, incluindo a morte simultânea .
( l)
sa:o acusados alguns indivíduos, dos quais ninguém conhece exactamente o nome
e a morada, de realizarem actos de 11 bruxarla11 quando para tal sa:o remunorados.
Un tipo especial destes actos sa:o as designadas "bruxarias de mulher" .
l do consenso geral que qualquer mulher poder~ obrigar um homem a ficar- lhe
"ligado" se lhe der a beber um líquido (qualquer) que contenha "drogas":
sangue menstrual ou dejectos de unhas .
Os ~cos casos em que houve acusaça:o deste tipo de bruxaria foi contra mulheres
que tinham estabelecido uma relaça:o com um homem casado ou raparigas com fama
de estarem "desgraçadas", ou seja, de terem tido relaçô'es sexuais com outros
homens para além do noivo ou namorado .
l sempre uma relação entre prox:imos que est~ em causa quando se recorre
él adivinhoa.
A compreensão deste facto passa pela an~ise das principais relaç~es sociais
que os membros desta comunidade estabelecem entre si. Ser~ pois do tipo de
relaç~es que caracteriza os diferentes círculos de sociabilidade que tratarei
em seguida.
O n1vel a que as relaçô'es sociais são mais densas i entre os membros de uma
mesma casa. A cada casa (habitação) corresponde, idealmente, um grupo domés-
tico com os seus bens: animais, alfaias agrícolas e terras (de regadio, de
sequeiro e "sortes" de pinhais) que asseguram a sua subsistência . Segundo este
modelo ideal cada grupo domlstico é constituído por uma família nuclear que
partilha a mesma habitação e funciona como uma unidade de produção e consuno .
O grupo domlstico não é est~tico, vai-se modificando ao longo dum ciclo que l,
idealmente, o seguinte :
Uma outra alteraç~o ao modelo ideal situa- se ao nivel da partilha dos bens
herdados entre os inn~s . A herança l divisa e qualquer situa~o em que se
considere que um dos herdeiros foi privilegiado l contestada, levando
usualmente a um corte de relaç8'es entre os herdeiros ou entre os filhos e os
pais . Quando estes morrem ou quando entregam as terras em vida efectua- se o
seguinte processo de partilhas: S chamado um "louvado') que l um habitante da
zona com experiência de avaliar os bens . Este homem deve dividir cada tipo
de bens (habitaç~es, alfaias, terras, gado ) num n6nero de porç5es idênticas
que seja igual ao ndmero de herdeiros . Cada um destes escolhe um papel
fechado do qual n~o conhece o contet1do e que designa quais os bens que lhe
foram atribuidos. Todo este processo visa a que a partilha seja o mais rigo-
rosa e aleat6ria possivel, e n~o se costumam fazer contestaç~es posteriores .
No entanto, caso algun(s) dos herdeiros n~ habite na zona, este costuna
arrendar aos irmãos as terras que lhe couberam nas partilhas. Neste caso
fica o arrendat~io cem o encargo de cumprir a parte das obrigaç8'es para com
os pais (cuidar deles ou dar- lhes a 11 pensão 11 ) que cabia ao irm~o ausente.
A renda dos terrenos arrendados aos irmãos nunca l cobrada .
~1 .
Este processo pennite que as casas com grande n6nero de filhos (1) não dividam
as suas terras ao ponto de inviabilizarem a subsistência dos herdeiros .
As outras alteraç~es ao modelo são os casos em que o jovem casal fica tempo-
t.;a ..... bétm
rariamente a residir com os pais até conseguir constituir casa; élo caso das
mães solteiras, que habitualmente residem sempr~om os pais ou com os
seus filhos, quando estes atingem a idade adulta.
O grupo doméstico implica também uma determinada atitude ética e moral. No seu
interior o ideal é a inter- ajuda, a cooperação e a harmonia . Os bens da casa
são de todos, os seus membros devem colaborar todos em comum, para a manuten-
ção e a prosperidade da casa, devem-se ajudar em qualquer ocasião sem exigir
nenhuma contrapartida. Os laços de solidariedade de qualquer indivíduo são,
em primeiro lugar, para com os outros membros do seu grupo doméstico. Por outro
lado qualquer pessoa é ~ralmente identificada com o grupo doméstico e pode
represent~-lo em certas ocasiões, como seja, funerais e reuni~es ocasionais de
toda a comunidade para discutir um problema comum. Desde que uma pessoa seja
solteira e não possua uma residência pr6pria e uma vida economicamente inde-
pendente e es~vel é considerada membro da sua casa de origem, mesmo que esteja
ausente da comunidade.
No caso destes parentes residirem noutra localidade, s~o sempre conv.:..•lados para
o almoço da festa patronal, sendo habitualmente os ~cos convidados. Costumam
ser as primeiras pessoas exteriores à aldeia chamadas em caso de morte de um
membro do grupo doméstico . Al~ disso , vêm por vezes ajudar às tarefas agrícolas.
Este é o grupo mais alargado de parentes que s~o convidados para a festa de casa-
mento ou que têm a obrigaç~o de colocar luto por um dos seus membros. Por outro
lado é entre estes parentes que s~ habitualmente escollridos os padrinhos de
baptismo das c!'ianças. Note- se que apesar da proximidade geneal6gica as trocas
entre o grupo dcm~stico e o seu grupo de familiares costumam ser dominadas
pela preocupaç~o do equil!brio, sobretudo se entre eles se interpffe a distância
espacial. Os convidados para a festa patronal devem depois retribuir convidando
os anfitriô'es para a sua festa. Se por alguna raz~ estes faltarem à festa, ou
por estarem de luto ou doentes, os membros da casa anfitri~ ~o v~ durante
um ano à festa dos seus convidados. Se s6 um membro da casa convidada faltou,
o membro equivalente da casa anfitri~ (por exemplo, a dona da casa) ~o ir1
por sua vez à festa. A este acto de troca de refeiç5es cerimoniais chama-se
o "convite", termo utilizado noutras ocasiô'es de inter-relaç~o.
'] 3.
Os parentes mais afastados são geralmente apenas nomeados como tal. Atravé's de
diagramas de parentesco relativas a esta aldeia percebemos que quase todas as
casas estão ligadas entre si por uma relação deste tipo~ Esta relação não é'
nomeada nas conversas correntes, apesar de ser conhecida . Entre estes parentes
mais afastados não existe uma relação de "convite 11 nem de interajuda no traba-
lho, a lillica obrigação que mantim entre si é' a assistência aos funerais res-
pectivos.
às acusaç8es de 11
ganância 11 e de 11
pactos ma~nicos 11 • Considera- se que um homem
que enriqueça flagrantemente durante a sua vida pode ter feito um pacto com o
Dem<Snio e ser "maÇ<Snico" . Esta teoria é comprovada se a pessoa em causa morrer
de acidente . Quanto às acusaç8es de ganância, são feitas a todas as pessoas que
nunca procuram ajudar os outros, sobretudo em bens. Nesta zona de miniftmdio
cada casa luta pelos mesmos ideais de prosperidade, não possuindo, em princípio,
muitos meios de aunentar os seus bens de raíz. Cada casa pode fechar-se sobre
si mesma e entrar em concorrência com as outras, recusando- se a agir como um
dos grupos domésticos da comunidade. E" este tipo de comportamento que é cri-
ticado na acusação de 11 ganância 11 (1), pois o ganancioso é aquele que se recusa
a participar com os vizinhos nos actos de interajuda. H~, por outro ladc, o
perigo de esta disjunçlto se maximalizar e os vizinhos se roubarem entre si.
Através destes dados pode - se compreender que se delimita uma z;~ cuj~s popu-
laçô'es mantêm entre si relaç~es preferenciais.
Os laços de solidariedade no interior desta zona ultrapassam os existentes no
interior da freguesia, o que se explica nã:o s6 pela proximidade espacial e pela
semelhança socio-econ6mica entre as aldeias serranas (1) como pela inexistencia
de laços que unam as povoaçffes da freguesia. A sede de freguesia ~ relativamente
distante das aldeias da serra (são aproximadamente 6 Km aU Calhandra) e as
populaçô'es da zona mais longínqua não costunam assistir regulannente ao serviço
lit'tirgico. Por outro lado nã:o participam em nenhuna festa comunal. Não existe
qualquer acontecimento comunal que pennita avivar os laços de solidariedade
da fre gue sia.
Este conceito, como já foi referido, liga- se à ideia de que a vida ~ una
preparação para a morte c de que todos os pecados cometidos serão resgatados
depois do falecimento.
105..
Mesmo não sofrendo uma. "má morte" todos os defuntos terão de passar pelo
Purgat6rio para se purificarem. Durante este tempo necessitam das devo-
ç~es dos vivos,• que os parentes pr6ximos costumam ser os principais accio-
nadores, mantendo activa a relação com os seus defuntos.
Esta ideia integra-se na visão da vida depois da morte já descrita. A ela
correspoL..I.e wna definição do mundo dos espíritos ou almas no qual se integram
também as figuras do s dem6nios e dos santos. Estas duas áltimas categorias
de seres encarnam as figuras do Mal e do Bem. A sua capacidade de intervenção
junto dos vivos é referida por Patricia Goldey: 11 Although the forces of good
are conunonly believed to appear in physical fonn with some regularity in the
Portuguese tradition - miraculous statues, springs, and the apparitions at
Fatima, all with finn credentials from orthodox Catholicism - there is nothing
inconsistent in an equally strong belief in the physical manifestations of
the forces of evil". (ib . ibidem: 7)
5. CONCLUSÕES
Desde o estudo clássico de Evans - Pritchard sobre os Azande, os antropÓ-
logos têm recorrentemente definido e interpretado a bruxaria como sendo,
fundamentalmente , um sistema explicativo do infortÚnio:
Esta inter pretação da bruxaria como uma forma de contr olo social através
do contributo que este discurso traz à manutenção do sistema de valores
da sociedade está igualmente expresso na interpr etaçã o da feitiçar ia na
sociedade trobriandesa realizada por Malinowski:
li\.
"La seule question d ' actualité qui se pose à eux est celle- ci:
comment organiser les gene et soi-même par rapport à autrui?
( ••• ) Lorsque , dane une telle communauté la··vie sociale
s'est organisée en une forme quelconque mais constante , des
problêmes d'ordre social surgissent dana les domaines mêmes
ou rêgne la tension , ou existent des conflits. Les croyances
relativas au châtiment automatique , au destin, à la vengeance
des fantômes , à la sorcellerie même , font partie des mécanismes
destinés à résoudre ces problemas, et c'est pourquoi elles se
trouvent cristallisées dans les institutions "
(1) Uma vez que a ligação correcta com o mundo dos mortos deve
ser mediada pelo ritual religioso , o a~sombramento , ligação
não mediatizada e que origina o infortÚnio , pode ser encarado
como uma desordem cósmica .
I 1 ~.
APENDICE I
(I) Com uma taxa de arborização, obtida pela relação entre a ca-
pacidade e a utilização florestal do solo, de 70,6% a mais
elevada do distrito só sendo ultrapassada ' no continente pela
da Marinha Grande. Calcula-se que nesta região dois terço s
da floresta sejam de pinheiro bravo e o restante de eucalip-
ta I.
--
Agrfcola lnd~stria
Junto a Mortágua realiza-se duas vezes por m~s uma feira na qual
a maioria dos habitantes das povoações se abastecem e vendem os
seus produtos .
Os quadros apresentados ilustram algumas das afirmações
aldeia.
3 2 1 5 6 7 8 9
I . I so I ados I . a . vi6vas I
l.b. solteiras 2
3
2 . Agregados 2 . a . irmãos
não 2 . b. outros parentes
fam i I i ares 2 . c . sem parentesco
o
3. Agregados 3 . a . casal 3
fam i I i ares 3 . b . casal com fi I hos 8
simples 3.c. vi6vo "
, ," -
3.d. vi~va I
12
Calhand~a - lf
~e.s da~~ - 2'1
l>ovo ll<Pe<.> d<:J cc~celho - 6
Co"'ce\\...o ele A~d;a - s
Lefna. - 2..
\orAL - 4!
Cãlkandv-a _ 2
~VOà}Õ~ Ja ~~ _ 18"
Yolfvac.ô'c:s do co...,cellu,- 4
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Cc:>'-"Celh.o A~-~adia - 13
7) '!/ 1 ele À.g ue.da. _ 2
1"01"11 r'' 1-\0S"d - 1
Cara.W~ulo _ 1
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133 .
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APENDICE II
11
ORAÇÕES E ' RISPONSOS
ORAÇÃO A S. JUSTO JUIZ DE NAZARt
Eu entrego F •. .
1 a S.J .J .N.,
filho da Virgem l-faria,
que em Bel~m
foste nascido,
entre indo lá três 2
Eu vos peço Senhor, pelo vosso sexto dia,
que o nosso corpo não seja preso nas mãos da justiça nem dos Inimigos
Envolta past~com, past~com, past~com .
...I ...
1 ou "eu me entrego"
2 ou "entre os idolatras"
1J:t.
ORAÇÃO A S. DARTOL<J.fEU
- Diz-me lá a primeira.
- A primeira é a casa Santa de Jerusalém onde morreu Cristo por n6s Amén
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu não.
- Disseste-me a primeira, diz-me as duas.
- As duas são as duas tabuinhas de Hoisés onde Jesus Cristo botou os seus
sagrados pés e a primeira é a casa Santa de Jerusalém onde morreu Cristo
por n6s Amén.
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo tet:. não •
-Disseste-me as duas, diz-me as três.
- As três são as três exéquias, as duas são as duas tabuinhas de Hoisés
onde Jesus Cristo botou os seus sagrados pés e a primeira é a casa Santa
de Jerusalém onde morreu Cristo por n6s Amén.
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu não.
Disseste-me as três, diz-me as quatro •
- As quatro são os quatro "englistas" (evangelistas), as três são as três
exéquias, as duas s~o as duas tabuinhas de Moisés onde Jesus Cristo botou
os seus sagrados pés e a primeira é a casa Santa de Jerusalém onde morreu
Cristo por n6s Amén.
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu não .
Disseste-me as quatro, diz-me as cinco .
- As cinco são os cinco mandamentos, as quatro são os quatro 11 englistas 11 , as
três são as três exéquias, as duas são as duas tabuinhas de Moisés onde
Jesus Cristo botou os seus sagrados pés e a primeira é a casa Santa de Je-
rusalém onde morreu Cristo por n6s Amén.
. .. I ...
1~2.
. ..; ...
Cust6dlo amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu não.
- Disseste~e as nove, diz-me as dez.
As dez são os dez mandamentos, as nove são os nove templos, as oito são os
oito 11 cordângelos 11 , as sete são os sete sacramentos, as seis são os seis
servientes, as cinco são os cinco mandamentos, as quatro são os quatro
11 englistas 11 , as três são as três ext$quias;; as duas são as duas tabuinhas
de Moisés onde Jesus Cristo botou os seus sagrados pts e a primeira t$ a
casa Santa de Terusalt$m .onde morreu Cristo por n6s Amén.
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu não ·
Disseste-me as dez, diz-me as onze.
As onze são os onze 11empires 11 , as dez são os dez mandamentos, as nove são
os nove templos, as oito são os oito 11 cordângelos 11 , as sete são os sete
sacramentos, as seis são os seis servientes, as cinco são os cinco manda-
mentos, as quatro são os quatro 11englistas 11 , as três são as três exéquias,
as duas são as duas tabuinhas de Moist$s onde Jesus Cristo botou os seus
sagrados ~s e a primeira é a casa Santa de Jerusalt$m onde morreu Cristo
por n6s Amén.
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu não .
Disseste-me as onze, diz-me as doze •
As doze são os doze ap6stolos, as onze são os onze 11empires 11 , as dez são
os dez mandamentos, as nove são os nove templos, as oito são os oito 11 cor-
dângelos11, as sete são os sete sacramentos, as seis são os seis servientes,
as cinco são os cinco mandamentos, as quatro são os quatro 11
englistas 11 , as
três são as três exéquias,; as duas são as duas tabuinhas de Moist$s onde
Jesus Cristo botou os seus sagrados pés e a primeira t$ a casa Santa de
Jerusalém onde morreu Cristo por n6s Amén •
. ..; ...
Cust6dio amigo meu.
Cust6dio sim, amigo teu n~o
NOTA: Esta oração é utilizada contra o medo pois S. Crist6vão venceu o Diabo.
14S.
APENDICE III
11 Eu, como criatura de Deus feita à Sua semelhanqa e remida com o Seu Santíssimo
Sangue, vos ponhqopreceito, Dem6nio ou dem6nios, para que cessem os vossos deli-
rios, para qu~ esta criatura não seja jamais por v6s atonnentada com as vossas
f~ias infernais.
Pois o nome do Senhor ~ forte e poderoso, por quem eu vos cito e notifico que
vos ausenteis deste lugar para fora. Eu vos ligo eternamente no lugar que Deus
Nosso Senhor vos destinar: porque com o nome de jesus vos piso e rebato e vos
aborreço mesmo do meu pensamento para fora. O Senhor seja comigo e com todos
n6s, ausentes e presentes, para que tu, Dem6nio, não possas jamais atonnentar as
criaturas do Senhor. Fugi, fugi, partes contr~ias, que venceu o leão de Tudá e
a raqa de David.
Amarro-vos com as cadeias de S. Paulo e com a toalha que limpou o santo rosto de
jesus Cristo para que jamais não possais atonnentar os viventes."
2ª ORAÇÃO '
11 Eu, Cipriano, servo de Deus, a quem amo de todo o meu coraç[o, corpo e alma,
pesa~e por Vos não amar desde o dia em que me destes o ser. Porém, V6s, meu
Deus e meu Senhor, sempre Vos lembrastes um dia deste Vosso servo Cipriano.
Agradeço-Vos, meu Deus e meu Senhor, de todo o meu coração, os benefícios que
de V6s estou recebendo, pois, a gora, ó Deus das Alturas, dai~e for ça e f~ para
que eu possa de sligar tudo quanto teLho ligado, para o que invocarei sempre o
Vosso Santíssimo Nome. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém •
. . .I ...
V6s que viveis e reinais por todos os séculos dos séculos. Amém. ~ certo, Nosso
Deus, que agora sou Vosso servo Cipriano, agora dizendo-Vos: Deus Forte e Pode-
roso que morais no grande cume que é o Céu onde existe o Deus Forte e Santo,
louvado sejais para sempre !
V6s que vistes as malícias deste Vosso servo Cipriano! E tais malícias pelas
quais eu fui metido debaixo do poder do Diabo! Mas eu não conhecia o Vosso Santo
Nome : ligava as mulheres, ligava as nuvens do céu, ligava as águas do mar para
que os pescadores não pudessem navegar para não pescarem o peixe para sustento
dos homens! Pois eu, pelas minhas malícias, minhas grandes maldades, ligava as
mulheres prenhes para que não pudessem parir, e todas estas coisas eu fazia em
nome do Dem6nio. Agora, meu Deus e meu Senhor, conheço o Vosso Nome e o invoco
e torno a invocar para que sejam desfeitas e desligadas as bruxarias e feitiça-
rias da máquina ou do corpo desta criatura (fulano). Pois Vos chamo, ó Deus Pod~
roso, para que rompais todos os ligamentos dos homens e mulheres . Caia a chuva
sobre a face da terra para que dê seu fruto; as mulheres tenham seus filhos;
livre de qualquer ligamento que lhe tenha feito, desligue o mar para que os pes-
cadores possam pescar. Livre de qualquer perigo desligue tudo quanto está ligado
nesta criatura do Senhor; seja desatada, desligada de qualquer forma que o este-
ja: eu a desligo, desalfineto, rasgo, calço e desfaço tudo, boneco ou boneca ~ue
esteja nalgum poço ou levada, para secar esta criatura (fulano), pois todo o
maldito diabo e tudo seja livre do mal e de todos os males ou maus feitos, fei-
tiços, encantamentos ou superstiçffes, artes diabólicas. O Senhor tudo destruiu
e aniquilou; o Deus dos Altos Céus seja glorificado no Céu e na Terra, assim
cerno por Emanuel, que é o nome de Deus Poderoso. Assim como a pedra seca se
abriu e lançou água de que beberam os filhos de Israel, assim o Senhor muito Po-
deroso, com a mão-cheia de graça, livre este servo {fulano) de todos os malefí-
cios, feitiços, ligamentos e encantos em parte e tudo que seja feito pelo Diabo
ou seus servos, e assim que tiver esta oração sobre si e a trouxer consigo ou
tiver em casa, seja com ela diante do paraíso terreal do qual saíram quatro rios,
cinquenta e seis tigres eufrates, pelos quais mandastes deitar água a todo o
mundo, por cujos Vos suplico, Senhor meu Jesus Cristo, Filho de l-faria Santíssima,
a quem entristecer ou maltratar pelo mnldito maligno espírito, nenhun encanha-
mento nem maus feitos não façam nem movam coisa alguma má contra este Vosso servo
... / ...
(fulano), mas todas as coisas aqui mencionadas sejam obtidas e anuladas, para o
qual eu invoco as setenta e duas línguas que estão repartidas por todo o mundo e
qualquer dos seus contrários, sejam aniquiladas as suas pesquisas, pelos Anjos
seja absolvido este Vosso servo (fulano), com toda a sua casa e coisas que nela
estão, sejam todos livres de todos os malefícios e feitiços pelo nome de Deus
Padre que nasceu sobre Terusalém, por todos os mais Anjos e Santos e por todos
os que servem diante do Paraíso ou na presença do alto Deus Padre Todo-Poderoso,
para que o maldito Diabo não tenha poder de empecer a pessoa alguna. Oualquer
pessoa que esta oraç~o trouxer consigo ou lhe for lida ou onde estiver algum si-
nal do Diabo de dia ou de noite por Deus, Tiago e Jacob, o inimigo maldito seja
expulso para fora; invoco a comunhão dos Santos Ap6stolos, de N. S. J. C.,
S. Paulo; pelas oraçô'es das religiosas, pela limpeza e fonnosura de Eva, pelo
sacrifício de Abel, por Deus unido a Jesus, seu eterno Pai, pela castidade dos
fiéis; pela bondade deles, pela fé em Abraão, pela obediência de Nossa Senhora
quando Ela livrou a Deus, pela oração de Madalena, pela paciência de Hoisés,
sirva a oração de S. José para desfazer os encantamentos, Santos e Anjos valei-
-me; pelo sac~ifício de Jonas, pelas l~grimas de Jeremias, pela oraç~o de Zaca-
rias, pela profecia e por aqueles que não dormem de noite e estão sonhando com
Deus Nosso Senhor J. C., pelo profeta Daniel, pelas palavras dos Evangelistas,
pela coroa que deu a Moisés em línguas de fogo, pelos sennô'es que fizeram os
Ap6stolos, pelo nascimento de N. S . J. C., pelo Seu santo baptismo, pela voz
que foi ouvida do Padre Eterno, dizendo: 11 Este é meu Filho escolhido, meu amado;
deve-me muito apreço porque toda a gente o teme e porque faz abandonar o mar e
faz dar frutos à terra!', pelos milagres dos Anjos que juntos a Ele est~o, pelas
virtudes dos Ap6stolos, pela vinda do Espírito Santo que baixou sobre eles,
pelas virtudes e nomes que nesta oraç~o estão, pelo louvor de Deus que fez todas
as coisas pelo Pai , pelo Filho , pelo Espírito Santo (fulano), se te est~
feita alguma feiti~aria nos cabelos da cabeça, roupa do corpo, ou da cama, ou
no· calçado, ou em algod~o, seda, linho, ou lã, ou em cabelo de crist~o, ou de
mouros ou de hereges, ou em ossos de criatura hunana, de aves ou de qualquer
outro animal; ou em madeira, ou em livros, ou em sepulturas de crist~os ou em
sepulturas de mouros, ou em fonte ou ponte, ou altar, ou rio, ou em casa, ou em
paredes de cal, ou em campo, ou em lugares solitários, ou dentro das igrejas, ou
repartimentos de rios, em casa feita de cera ou m~ore, ou em figuras feitas de
fazenda ou em sapo ou dentro das igrejas, ou repartimentos de rio ou de lameiro,
... I ...
ou em comidas ou bebldas, ou em terra do pé esquerdo ou direito, ou em qualquer
coisa que se possa fazer feitiços •..
Todas estas coisas sejam desfeitas e desligadas deste servo (fulano) do Senhor,
tanto as que eu Cipriano tenho feito, como as que têm feito essas bruxas servas
do Dem6nio; isto tudo seja tornado ao seu pr6prio ser que dantes tinha, ou em
sua pr6pria figura, ou em que Deus a criou.
Santo Agostinho e todos os Santos e Santas, por santos nomes, que façam que
todas as criaturas sejam livres do Dem6nio. Amém. 11
3ª ORAÇÃO
''oRAÇOES PARA PEDIR A DEUS PELOS :OONS ESP!RITOS QUE \1&1 A ESTE HUNOO BUSCAR ORA-
ÇÕES PARA SEREM PURIFICADOS DO HAL QUE FIZERAM NESTE MUNOO, E RESTITUIR ALGUMA
D!VIDA OU ROUBO.\.'
11 Sai, alma cristã, deste mundo, em nome do Deus Padre Todo-Poderoso, que te
criou; em nome de jesus, Espírito Filho do Deus Vivo, que por ti padeceu; em nome
do Espírito Santo, que copiosamente se te comunicou. Aparta-te deste corpo ou
lugar em que estás, porque o Senhor te recebe no Seu reino; jesus, ouve a mi"ha
oração e sê amparo como és amparo dos Santos, Anjos e Arcanjos; dos Tronos e
Dominaçffes: dos Querubins e Serafins; dos Profetas, dos Santos Ap6stolos e dos
Evangelistas: dos Santos I-lru-tires, Confessores, l-tanges, Religiosos e Eremitas;
das Santas Virgens e esposas de jesus Cristo e de todos os Santos e Santas de
Deus, o qual se digne dar-te lugar de descanso, e gozo da paz eterna na cidade
santa da celestial Sião, onde O louves por todos os séculos. Amém.~
I(
No final reza-se um acto de contricção. 11
4ª ORAÇÃO E l1LTIMA PARTE DA SESSÃO
11 0 Senhor lance sobre ti a Sua santí ssima bênção e o Seu santíssimo poder para
que te dê a virtude eficaz, para que toda a morada ou porta por onde entra Sat.s:
nás por ti seja fechada, jamais o Dem6nio ou seus aliados por ela possam entrar,
pois, abençoada seja em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo. Amém.
Jesus seja contigo.''''
IJ PALAVRAS SANT!SSIHAS QUE O RELIGIOSO DEVE DIZER QUANDO ESTIVER A FECHAR A HORADA''
ti ~ Deus <Enipotente, que do seio do Eterno Pai viestes ao mundo para salvação
dos homens, dignai-vo s, pois, Senhor, pôr preceito ao Dem6nio ou dem6nios,
para que eles não tenham mais o poder e atrevimento de entrar nesta morada.
Seja fechada a sua porta, assim como Pedro fecha as po1 ·tas do C~u às almas que
l~·quercm entrar sem que primeiro expiem as suas faltas. ~'
... I . ..
ôl.
Dignai-vos~ Senhor, permitir que Pedro venha do Céu à Terra fechar a morada
onde os malditos dem6nios querem entrar quando muito bem lhes parece.
No fim da oração que fica dita, escrevam num papel o nome de Satanás e queimem-
-no, dizendo :
11 Esta esconjuração deve ser feita pelo religioso com todo o respeito e fé~ e
quando veja que o enfermo está aflito e o Dem6nio ou mau espirito não quer
sair~ deve-lhe tornar a ler o preceito que está no capítulo IV~ no fim da
ladainha~ ou o que est~ em latim.
Eu~ Cipriano~ digo eu (fulano)~ da parte de Deus Nosso Senhor Jesus Cristo~
absolvo o corpo de (fulano) de todos os meus feiti~os~ encantos~ encanhos~ em-
pates que fazem e requerem homens e mulheres em nume de Jesus N. S. J. C .~ Deus
de Abraão~ Deus muito grande e poderoso! Glorificado seja~ para sempre sejam
em seu Santíssimo Nome destruídos~ desfeitos~ desligados~ reduzidos ao nada~
todos os males de que padece este Vosso servo (fulano); venha Deus com seus
bons auxílios por amor de miserirordia que tais homens ou mulheres que são cau-
sadores destes males que sejam j~ tocados no coração para que não continuem com
esta maldita vida!
. .. / ...
Ainda mais pela virtude daquelas santíss:im.as palavras por que Jesus Cristo
chamou : Adão, Adão, Adão, onde estás? Por estas santíssimas palavras absolva-
mos, por esta virtude de quando Jesus Cristo disse a un enfermo: "levanta-te
e vai para tua casa e não queiras mais pecar", de cuja enfermidade havia de
estar três anos, pois absolva- te Deus que criou o Céu e a Terra e Ele tenha
compaixão de ti criatura (fulano), pelo profeta Daniel, pela santidade de
Israel, e por todos os Santos e Santas de Deus, absolvei este vosso servo ou
serva (fulano) e abençoai toda a sua casa e todas as mais coisas sejam livres
do poder dos dem6nio s por Elnanuel, pois Deus seja com todos n6s . Amém.
11
EXORCISt-fO PARA EXPULSAR O DIABO DO CORPO
Este exorcismo foi encontrado num livro muito antigo, escrito por Frei Bento
do Rosário, religioso descalço da Ordem de Santo Agostinho.
Cristo, pelo poder das Suas divinas chagas, eu te esconjuro, maldito, para
que não possas tentar a minha alma sossegada. Amlm.
(Deve ser dita três vezes, e outras tantas fazer-se o sinal da Cruz sobre
o peito)"
APENDICE IV
I I de Dezembro de 1983
A- Sim? Que eu não queria perder aquilo por nada. Mas ent3o
quem mo tirou daqui?
2ª Sessão
S.M.A. - Pois é irmã, ele por ele próprio não é de muitas comi-
das. Ele há-de ser sempre assim, miudinho. Deixa-o andar,
não te preocupes •
lJo ·
3ª Sessâ'o
A -Podemos doutriná-lo?
S.M.A. - Já af vem
E - (Suspiro)
E - (Suspiro)
A ~ água não é? Ah! Não é prec1so, não é prec1so que isto
passa tudo . Sabes , eu tiro-te já essa aflição. Pronto eu
tiro-te isso (passa-lhe as mãos pela barriga). Pronto já
passou !
E - (Suspiro)
E - Sou mulher.
/
E - Sim.
E - Andava atentada.
A -Andavas atentada! Quer dizer: foste tu que te ati r aste .
Não foi?
A - N!o andavas boa! Isso sei eu. Mas fizeste ~ai por que
sabes , a vida que é nossa , não é nossa! A vida que é
nossa é de Deus.
A - Então pede perdão à tua mãe, que uma m~e perdoa sempre
E - ... é que n~o tenha medo, que era eu que ia v is i tar .•.
E- Era eu, que tinha uma tão grande mágoa ••• ela ~s vezes
16/.
E - ~
~o meu mar1'd o .I
A Pois, ele está em bom lugar! Vês? Vai, vai c~m ele e
que Deus te acompanhe .
28/3/84- Iª Sessão
A -Pronto, eu desgravo ·
E - i ele !
A - Af é? Tu gostas dele?
E - Eu mo r r f no v a •
A - E gostavas de v~-lo?
E- Gostava .
dara? Es de I onge .
I
E - Não .
E - Sabes, eu era casada. Mas era nova, andava com este e com
aquele, e depois meu amigo antes que descobrissem, cat~a
puz !
A Ah, então por isso é que ele n3o anda bem, n3o é?
A
A - Ele não te sente, ele não te ve, como ê que o podias
assustar? Ele n3o te vA!
A - Ai era? Então é por 1sso que ele anda sempre com dores
de cabeça, anda •••
A -Mas tu, não há muito tempo, não estavas lá. Como é 1sso
A -Minha boa amiga. Amiga, Anda cá. Eu não estou aqui para
brincar, sabes. Eu estou para te ajudar
E - Ah, mas é que eu sempre fui brincalhona !
A Está bem, está certo, eu não estou contra 1sso mas esta-
mos a perder o nosso tempo e tu tens o tempo marcado, e
poJes ser muito feliz hoje. V3 lá tu, repara s6 nisto: tu
não v3s o que eu te puz aqui na tua frente .
E- Eu quero um rapaz !
E - Tá bem '·
A - Estás contente?
E - Estou!
A- ... Pois está bem . Hoje ~ noite vou-lhe dizer . Ele vai -
- te perdoar e ela também , está bem?
/~ 1.
ração , dizes?
28/3/84 - 2ª sessão
S.i•... A;- Pois, mas agora é gr1pe irmã'. f gr1pe que está a atacar
um bocadito.
S • M• A • - Nã o, é g r i pe ·
A - A ideia dele!
S . M. A. - Aquela coisa , quer dizer, ele gosta dela . E o pr azer
.ISSO .I r -
dele era ir para o pé dela e e l a aceitá -l o . f
mã.
A - Mas asso dela ter dito mal da mãe de l e , olha que não é
verdade . E o esp f rito dela já tu aqu i disseste que está
em bom I ugar.
S .M. A. - Pois é irmã , mas ele pensa nela . Mas tu concor das irmã,
não andes a ••• a chateá - lo .
110.
S.~ . A . - Não penses nada nisso . Não irmã , a pessoa tem de de i tar
isso par a trás das costas.
A - Ci~mes?
A - Não .
16/4/84 - Iª sessão
E - (Suspi l"o)
A - Ent3o porquê?
E - Por desastl"e ·
A - Desastl"e? De quê?
E - [)e tr acto!" .
E - Chamo- me Am t lcal"·
A - El"as novo . Mas podes estai" tão feliz , tão feliz , até
mesmo mais feliz do que estavas aqui na Tel"ra . Não achas
que 1sso n3o é nada mau?
E - Era bom !
A -Pois não, n3o é. Mas podes ser muito fel 1z, muito fel 1z
a i nda .
E - Está bem .
E - Vem lá um rapaz
E - Obrigada ,
S.M . A - Vai irmã. S6 o que é que andava muito sobre ele. E agora
vai me I h orar .
2ª Sessão
3ª Sessão
---------
A - E quando é que vem essa outra mulher ? Aque l a que t u
dizes que está muito mal da barriga . Desconfia-se que
é um cancr o
S.M.A~ - lrm~ , já se sabe que pode anu l ar , não digo que não se-
ja grave , mas neste momento está melhorzinha ·
4!! Sessão
r i do •••
S . M.A. - ••• Pois é, mas não ralhes com ninguém que a tua carrel
ra está perto. Fiqueis com Deus e que o Senhor vos acom-
panhe .
E - Não, ~ do tabaco •
E - De i xas-me andar ~
E - Era.
E Eu era amigo dele. ~ão lhe sou nada de famfl ia! Sou
Joaquim.
A - Eu quero-te é ajudar!
E - Eu ando mais ele, n3o ~ por mal que lhe queira. Sinto-
-me bem mais ele!
E Pois, mas não I igavas nada. 96 dizias que ele que era
este, que era aquele!
E - Pois é por ele, bem: aqui lo não era ele. Era eu que não
o deixava. Eu andava sempre ma is ele e depois a gente
puxava-o sempre para trás .
A - Então esse outro, a gente também tem que falar com ele,
não achas?
Voz- Eu não sei, mas se ele diz que é o pa1, será o pat mes-
mo? O Sr. Joaquim?
E - Sou .
E - Sabia ·
E - Estou .
E - Do coração·
E - Eu perdoo ·
Voz - Eu n!o lhe disse que ele se tentou matar, v~ ele tentou
-se matar!
E - Pois eu estou.
E-Nl!o ·
Agora olha: diz-me quem ' que vem ar. Olha be~ para a
frente.
E Perdoa-me, 6 rapariga.
A - Qeus te abençoe ·
(ouve-se um suspiro)
E - Já af bem? Já af bem?
E - O comboio .
E -Agora ando aqui por que eu n3o era mau, mas fiz o que fiz .
N~o me devia ter matado •••
E -Queria ·
A - Então vês . Vamos então falar com Deus . Diz : "Meu Deus/
Eu fui um grande pecador cá na Terra/ Ti r ei a minha vi-
da / Que ela não era minha mas sim tua/ Peço-te perdão
meu Deus/ Porqu~ e u estou muito arr epend i do/ Se fosse
131.
E - f a minha mãe!
A- Ai a mãe , que bom! a mãe vem buscar o seu filho! Que
Deus te abençoe.
Portanto minha
...
1rma, d~-lhe a mão ( I ) e pergunte de SI
(I)~ espfrita
Voz- Estes são os filhos, n3o ~? f um maior e outro ~ais
A - Pronto.
JD Sessão
I evantou .
A - Já levantou?
• • • • oCo ••••
183.
B I B L I OG R A F I A
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