Psicologia Pastoral
Psicologia Pastoral
Psicologia Pastoral
À PSICOLOGIA:
APLICAÇÃO
PASTORAL
GRADUAÇÃO
Unicesumar
Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor de Administração
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor Executivo de EAD
William Victor Kendrick de Matos Silva
Pró-Reitor de Ensino de EAD
Janes Fidélis Tomelin
Presidente da Mantenedora
Cláudio Ferdinandi
Impresso por:
Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos
com princípios éticos e profissionalismo, não so-
mente para oferecer uma educação de qualidade,
mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in-
tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos
em 4 pilares: intelectual, profissional, emocional e
espiritual.
Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos
de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de
100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil:
nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba,
Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos
EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e
pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros
e distribuímos mais de 500 mil exemplares por
ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma
instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos
consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos
educacionais do Brasil.
A rapidez do mundo moderno exige dos educa-
dores soluções inteligentes para as necessidades
de todos. Para continuar relevante, a instituição
de educação precisa ter pelo menos três virtudes:
inovação, coragem e compromisso com a quali-
dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de
Engenharia, metodologias ativas, as quais visam
reunir o melhor do ensino presencial e a distância.
Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é
promover a educação de qualidade nas diferentes
áreas do conhecimento, formando profissionais
cidadãos que contribuam para o desenvolvimento
de uma sociedade justa e solidária.
Vamos juntos!
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está
iniciando um processo de transformação, pois quando
investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou
profissional, nos transformamos e, consequentemente,
Pró-Reitor de
Ensino de EAD
transformamos também a sociedade na qual estamos
inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportu-
nidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de
alcançar um nível de desenvolvimento compatível com
os desafios que surgem no mundo contemporâneo.
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo
Diretoria de Graduação
e Pós-graduação este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens
se educam juntos, na transformação do mundo”.
Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica
e encontram-se integrados à proposta pedagógica, con-
tribuindo no processo educacional, complementando
sua formação profissional, desenvolvendo competên-
cias e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em
situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado
de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal
objetivo “provocar uma aproximação entre você e o
conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento
da autonomia em busca dos conhecimentos necessá-
rios para a sua formação pessoal e profissional.
Portanto, nossa distância nesse processo de cresci-
mento e construção do conhecimento deve ser apenas
geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos
que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita.
Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu
Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns
e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das dis-
cussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe
de professores e tutores que se encontra disponível para
sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de
aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui-
lidade e segurança sua trajetória acadêmica.
AUTOR
http://lattes.cnpq.br/5398648892073626
APRESENTAÇÃO
SEJA BEM-VINDO(A)!
Estimado(a) aluno(a), seja muito bem-vindo! Um livro é como uma viagem, a cada nova
curva desvendamos paisagens novas. Algumas nos marcam para sempre, outras pas-
sam despercebidas em um primeiro momento, mas depois são relembradas com sauda-
de. É nesse espírito que te convido a percorrer as páginas deste livro: como se estivesse
iniciando uma viagem, na qual serei seu “guia turístico”, procurando chamar a atenção
para pontos que julgo relevantes e repassando informações que contribuirão para seu
crescimento acadêmico e pessoal.
Um livro de “Introdução à Psicologia: Aplicação Pastoral” é um trabalho que ajudará você
a compreender melhor alguns aspectos gerais da ciência psicológica e, especialmente
neste caso, sua aplicabilidade à tarefa pastoral.
Talvez uma primeira coisa a desmistificar, quando iniciamos a caminhada pelas pági-
nas deste livro, é que não se trata de um manual de autoajuda. Quando iniciamos um
estudo no campo da psicologia, possivelmente nos perguntamos se tal estudo é capaz
de ajudar-nos em nossas dificuldades pessoais e relacionamentos interpessoais ou se
estaremos mais capacitados para nos conhecer melhor e também aos demais etc.
Com certeza, ao percorrer as páginas deste livro, você será capaz de identificar muitas
situações pelas quais já tenha passado, bem como entender melhor alguns comporta-
mentos que você tenha observado em si mesmo ou nos outros. Contudo, há uma dife-
rença muito grande entre um conhecimento teórico e a aplicação deste conhecimento
na mudança do próprio comportamento ou do outro.
A intenção com as páginas que seguem neste livro não é de torná-lo um psicólogo ou
um expert em comportamento humano, mas de contribuir com a ampliação de seu co-
nhecimento sobre a ciência psicológica e o que ela tem a dizer sobre o comportamento
humano, de forma a poder conciliar este conhecimento com a tarefa pastoral no cuida-
do integral à pessoa humana.
Na primeira Unidade, falaremos sobre a ciência psicológica, em que veremos um pouco
de sua história, alguns de seus principais personagens e suas contribuições mais signifi-
cativas, especialmente, a inteface com a Teologia.
Na segunda Unidade, estudaremos alguns conceitos das Escolas Psicológicas Clássicas,
como a Psicanálise, o Behaviorismo e o Humanismo, enfatizando, especialmente, como
estas escolas influenciaram o que se conhece hoje como o Movimento de Aconselha-
mento Pastoral.
Na terceira unidade, resumiremos os principais conceitos da psicologia, tais como: as
percepções, as emoções, a motivação humana, a aprendizagem, a inteligência e a per-
sonalidade – procurando explanar a utilidade de cada um destes conceitos na prática
pastoral.
A quarta unidade é um convite ao novo, pois nessa unidade discorreremos especial-
mente sobre o entrelaçamento entre a psicologia e a teologia, o qual denominamos de
APRESENTAÇÃO
UNIDADE I
15 Introdução
16 Definição de Psicologia
43 Considerações Finais
50 Referências
53 Gabarito
10
SUMÁRIO
UNIDADE II
57 Introdução
83 O Gestaltismo
91 A Psicologia Humanista
94 Considerações Finais
103 Referências
106 Gabarito
UNIDADE III
109 Introdução
162 Referências
165 Gabarito
11
SUMÁRIO
UNIDADE IV
169 Introdução
204 Referências
207 Gabarito
UNIDADE V
211 Introdução
238 Referências
240 Gabarito
241 CONCLUSÃO
Professor Dr. Carlos Tadeu Grzybowski
I
A CIÊNCIA PSICOLÓGICA: SUA
UNIDADE
HISTÓRIA E A INTERFACE COM
A TEOLOGIA
Objetivos de Aprendizagem
■■ Conceituar psicologia.
■■ Compreender a relação entre a psicologia e a filosofia.
■■ Conhecer as duas escolas da etapa pré-científica da psicologia.
■■ Familiarizar-se com as principais escolas que deram início à etapa
científica da psicologia.
■■ Entender os quatro grandes grupos da psicologia moderna.
■■ Saber quais as principais áreas de atuação do psicólogo hoje.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Definição de psicologia
■■ A etapa Empírica e sua conexão com a filosofia grega
■■ A etapa pré-científica e suas principais teorias
■■ A etapa científica e as primeiras escolas
■■ A divisão da psicologia moderna
■■ Os ramos da psicologia moderna
15
INTRODUÇÃO
Em seguida, nossa viagem tem uma rápida passagem pela Idade Média,
na qual a psicologia e a teologia andavam totalmente mescladas e quase toda
a explicação da conduta têm um viés metafísico. O centro de toda a busca de
entendimento do comportamento era o entendimento da alma!
A grande mudança na paisagem acontece a partir do Iluminismo, com a
separação radical entre ciência e igreja, e com os primeiros intentos daqueles que
se preocupavam em entender o comportamento humano, de oferecerem expli-
cações à conduta desvinculadas da teologia e da metafísica, mas ainda sem um
corpo teórico que desse base a estas tentativas.
Finalmente, chegaremos chegar ao final desta primeira etapa de nossa via-
gem procurando contemplar a chegada da psicologia ao reconhecimento de
uma ciência reconhecida, por meio da criação de um laboratório científico para
executar experimentos que dessem validade acadêmica a este ramo da ciência.
Nesta época, surgem as duas primeiras escolas de psicologia: o Estruturalismo
e o Funcionalismo, sobre as quais discorreremos brevemente.
Ao longo do caminho, ofereço a você a oportunidade de refletir sobre como
esse desenvolvimento histórico tem seu impacto hoje na forma de agir e pensar
do homem do século XXI.
Introdução
16 UNIDADE I
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
DEFINIÇÃO DE PSICOLOGIA
Pode-se dizer que a história da psicologia é quase tão antiga quanto a história da
humanidade, ou melhor, a história da ciência. Tal como aconteceu com muitas
ciências contemporâneas, foi na Grécia Antiga, e atrelada à filosofia, que nas-
cem os primeiros intentos de se fazer psicologia.
A própria palavra Psicologia vem do grego, que é a união de dois termos:
Psiché, que significa alma, e Logos, que significa estudo. A psicologia surge como
o intento de se compreender a alma humana e por isso está originalmente atre-
lada à filosofia e à teologia (MESQUITA; DUARTE, 1996).
Desde o princípio da história, o homem tem se preocupado em conhecer e
compreender a si mesmo. Sócrates, filósofo grego, disse uma frase há 400 anos
antes de Cristo: “Conhece-te a ti mesmo”. Existem escritos anteriores a Sócrates
que já revelam tal preocupação. A Bíblia é um livro que contém muitas narra-
tivas na qual se colocam questões de caráter psicológico, como, por exemplo, o
livro de Jó e os Salmos.
A Etapa Empírica começa na Grécia Antiga e se estende até o final da Idade Média.
Os conhecimentos desta época são desordenados e baseados em experiências
pessoais ou observações do mundo ao redor, que era dividido em um mundo
material e uma realidade não material – a esta última categoria pertencia a alma!
Esse conceito de “alma” na Grécia Antiga era bastante diferente dos concei-
tos teológicos modernos que se referem a esse termo. Por exemplo: falava-se em
“alma das plantas” e “alma dos animais” – sem a conotação “religiosa” do termo.
Desta época vem um dos primeiros intentos de explicar as formas diferen-
tes de comportamento entre as pessoas. Hipócrates viveu na Grécia entre 460 e
370 a.C., é considerado o “Pai da Medicina” (RIBEIRO JR., 2003). Para ele, “o
temperamento dependia do equilíbrio de quatro humores básicos no corpo. O
acúmulo de algum dos elementos dos humores resultava no predomínio de deter-
minado temperamento” (TEIXEIRA; HASHIMOTO, 2006).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Assim, em virtude do limitado conhecimento de anatomia, Hipócrates acre-
ditava que em nosso organismo existiam quatro “líquidos” (ou humores) básicos:
o sangue, a fleuma, a bílis amarela (ou cólera) e a bílis negra (ou melanina),
que tinham características diferentes. A saber: o sangue seria quente e úmido;
a fleuma, fria e úmida; a bílis amarela, quente e seca; e a bílis negra, fria e seca.
O predomínio de um destes humores no organismo determinaria o comporta-
mento da pessoa: sanguíneo, fleumático, colérico ou melancólico.
Embora a teoria dos temperamentos de Hipócrates tenha prevalecido como
explicação do comportamento por toda a Antiguidade e boa parte da Idade
Média, com o conhecimento científico atual, esta explicação tornou-se obso-
leta. Segundo Fernandes (2015, on-line)1,
é uma teoria que hoje poderia receber o adjetivo de “holística”. O ho-
mem é estudado como um microcosmo, com a mesma constituição e é
regido por leis semelhantes ao do universo do qual faz parte. Estabelece
um paralelo entre a constituição e funcionamento do corpo humano
com a natureza ao redor e procura entender os fenômenos de forma
integrada e universal. Os filósofos da escola pitagórica concebiam o
mundo formado por quatro elementos: terra, ar, fogo e água, dotados
de quatro qualidades, opostas aos pares: quente e frio, seco e úmido. A
transposição da composição quaternária do mundo para a fisiologia
originou a teoria humoral. (...) Tamanha era a tendência à universali-
zação, que havia correlação também entre as quatro fases da vida e as
quatro estações do ano.
Quente e
Ar Sangue Infância Primavera Sanguíneo
Úmido
Quente e Bile
Fogo Juventude Verão Biloso/Colérico
Seco amarela
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Na Idade Média, falava-se bastante de “alma”, porém com uma conotação bem
distinta da utilizada pelos filósofos gregos. Nessa época, destacam-se os traba-
lhos de Agostinho (354-430 d.C.), que utilizou muito a introspecção para indagar
a vida interior e expressá-la em palavras. Assim, a chamada Psicologia, nessa
época, é apenas um departamento da Filosofia e da Teologia.
A ênfase de Agostinho é na memória como atividade psíquica. Ele se
indaga sobre os vestígios que as imagens deixam na alma. Explicita as
bases da introspecção, do exame de consciência. Faz uma versão da
trilogia de Cícero, propondo a tríade: memória, vontade e inteligência
(SMOLKA, 2000, p. 181).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Podemos dizer que, ao terminar a Idade Média, conclui-se também a etapa empí-
rica da Psicologia e, a partir do Renascimento, surge a inquietude por encontrar
causas racionais dos fenômenos. Começam a se desenvolver os métodos cientí-
ficos. Entramos na etapa pré-científica da Psicologia.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
mais complexos. Considerava-se que a vida mental (ou consciência) era uma
espécie de quebra-cabeças ou mosaico de elementos simples que entram pelos
sentidos e que estão unidos de forma rígida e mecânica. As características indi-
viduais são determinadas por fatores externos ao indivíduo. Nesta abordagem,
desenvolvimento e aprendizagem se confundem e ocorrem simultaneamente
(MORA, 1994).
Atribui-se à Franz Joseph Gall a Teoria das Faculdades. Segundo Sabbatini (1997,
on-line)2,
gall estudou medicina em Viena, e se tornou um renomado neuroana-
tomista e fisiologista. Ele foi pioneiro no estudo da localização das fun-
ções mentais no cérebro. Por volta de 1800, ele desenvolveu a “cranios-
copia”, um método para adivinhar a personalidade e desenvolvimentos
das faculdades mentais e morais com base na forma externa do crânio.
Cranioscopia (cranium = crânio, scopos = visão) foi posteriormente re-
nomeada como frenologia (phrenos = mente, logos = estudo) por seus
seguidores.
inclusive, chegaram a crer que era possível encontrar no cérebro o lugar preciso
dos centros destas faculdades. Posteriormente, alguns cientistas ficaram muito
insatisfeitos com esta teoria, pois a mesma não explicava nada a respeito da ati-
vidade mental, se limitando apenas a fazer uma mera classificação da mente.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Existe uma ideia corrente nos meios cristãos de que a mente do homem ain-
da funciona como propunha Gall, em compartimentos (ou caixinhas), sendo
a principal delas a “caixinha do nada”, na qual o homem se retira quando está
com problemas. Entendendo a Teoria das Faculdades, você acredita que ain-
da é possível sustentar essa ideia?
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A ETAPA CIENTÍFICA E AS PRIMEIRAS ESCOLAS
ciência e religião, pois com as fórmulas matemáticas de Newton não era neces-
sária nenhuma outra explicação de cunho sobrenatural para os fenômenos da
realidade.
O “mundo cartesiano” é concebido sempre como algo eterno e bem ordenado,
sendo regido por leis simples e imutáveis, o que leva o pesquisador a conside-
rá-lo cognoscível, desde que abordado de forma racional. Assim, a eleição das
situações estáveis tem sido o caminho do desenvolvimento e do “progresso”
científico, sempre com o objetivo de encontrar um princípio explicativo deco-
dificador da realidade. Estas situações estáveis seriam, então, fragmentadas em
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
múltiplas partes para serem objetos de análise – termo utilizado por Descartes
(1970) como oposição à síntese.
No sentido cartesiano, conhecer implicava necessariamente uma etapa
inicial de fragmentação (para ser mais claro de destruição) da coisa a
ser transformada em objeto de conhecimento. Este seria o preço mí-
nimo que se deveria pagar para ascender ao conhecimento racional.
Então o princípio da parcimônia, no sentido da simplificação reducio-
nista, validaria os modelos explicativos do novo modo de produção de
conhecimento – pois o conhecer reduzia o agora objeto aos seus com-
ponentes elementares (ALMEIDA FILHO, 2005, p. 32).
Assim, este mundo passa a ser “dominado” e descrito por um observador externo
a ele e que não pertence ou está inserido no mesmo, o qual tem uma visão abran-
gente e capaz de discernir – a partir de sua objetividade – o que é real e o que é
ilusório, ou seja, o que faz parte da realidade objetiva externa e o que faz parte
da realidade subjetiva interna. Desta forma, o caráter de ‘cientificidade’ é direta-
mente proporcional à eliminação do observador. Contudo, o modelo ideal que
uma ciência “objetiva” comporta é aquele no qual só se podem variar os fatores
um de cada vez, ou seja, os sistemas intrinsecamente simples, evitando os siste-
mas complexos, os quais não permitem a variação de apenas um fator de cada vez.
Para atingir seus objetivos últimos de modificação da natureza, de do-
minação de um mundo que seja manejável, a ciência depende da com-
preensão da realidade dessa natureza – distinta do próprio cientista –,
compreensão tornada possível pela descoberta dos princípios explicati-
vos ou leis naturais (ESTEVES DE VASCONCELOS, 1995, p. 37).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
uma publicação oficial do seu novo laboratório e da “nova ciência”. É
importante destacar que esse não foi o primeiro laboratório de psicolo-
gia experimental, tão pouco Wundt foi o precursor desses estudos. Ele
já havia instalado um laboratório para conduzir seus estudos iniciais
em Heidelberg antes de se mudar para Leipzig e, em relação aos estudos
da nova psicologia, foi Fechner com sua obra sobre a psicofísica que ini-
ciou os estudos em psicologia experimental, da qual Wundt teve conta-
to. Porém, Wundt é tido como pai da psicologia moderna pelo fato de
ter sido o promotor dessa nova psicologia. Foi ele quem a transformou
em disciplina formal acadêmica e, por isso, merece todo o mérito.
Wundt estabelece métodos e uma teoria para embasar suas pesquisas, além de
transformar seu laboratório em um centro internacional de formação de psicó-
logos. Por esta razão, ele é considerado o “Pai da Psicologia Moderna”.
Para Wundt, não era possível estudar os fenômenos mentais mais profundos,
tais como o pensamento, somente por meio da introspecção porque, segundo
Wundt, “a mente não pode voltar-se sobre si mesma e estudar aquilo de que ela
mesma é produto” (MOURA, 2008, on-line)4. Desta forma, ele desenvolve méto-
dos para estudar os processos sensoriais básicos em laboratório. No começo, ele
fez isso estudando o tempo de reação – sistematicamente mudando os estímu-
los que ele apresentava aos participantes e medindo quanto tempo eles levavam
para responder –, inferindo que, se fosse necessário mais tempo para respon-
der, mais processos mentais deveriam estar envolvidos.
Infelizmente, o trabalho de Wundt não teve uma continuidade e, apesar de
ser considerado o pai da psicologia moderna, sua influência sobre a psicologia
do século XX foi mínima.
O ESTRUTURALISMO
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textos de Wundt para o inglês, alterou o sistema deste para fazê-lo compa-
tível ao seu. Na verdade, os sistemas de Wundt e de Titchener são diferen-
tes, sendo a designação estruturalista apropriada apenas para a Psicologia
do último (para uma análise comparativa entre os sistemas de Wundt e
de Titchener, ver Leahy, 1981). A distorção no sistema Wundtiano foi
propagada por E. G. Boring, aluno de Titchener, que escreveu o livro A
History of Experimental Psychology (Boring, 1950), a principal referência
na formação de várias gerações de psicólogos (LEONARDI, 2011, p. 6).
O FUNCIONALISMO
Por sua vez, o Funcionalismo surge nos Estados Unidos, logo após à chegada do
Estruturalismo. Alguns psicólogos começaram a questionar se a Psicologia devia
restringir-se aos laboratórios ou deveria ser aplicada para a satisfação das múlti-
plas necessidades humanas. Ao invés de perguntarem: “o que é a consciência?”
ou “o que são os estados mentais?” como faziam os estruturalistas, os funciona-
listas perguntavam: “Para que serve a consciência?” ou “Para que são os estados
mentais?” “Qual é seu propósito ou função?”
Utilizaram não só a introspecção, mas também a observação da conduta
como método de trabalho. O ponto central do funcionalismo americano foi a
proposição de que a psicologia não tem como objetivo primário a descoberta
dos elementos da experiência, como postulava o Estruturalismo, mas a adapta-
ção dos seres humanos ao seu meio. Afirmava que a função da nossa consciência
é guiar-nos aos fins necessários para a sobrevivência. A consciência é vital para
as necessidades das pessoas em um ambiente complexo (BARRETO, 2008).
Dois nomes de destaque fazem parte desta escola: William James, que escre-
veu uma das obras clássicas sobre o estruturalismo e desenvolveu a Psicologia
da Religião, e John Dewey, que influenciou de forma decisiva nos sistema edu-
cacional norte-americano.
James sustentava que o significado das ideias está no plano das consequências
e se não houver efeitos, as ideias não têm sentido. Com isso, ele fazia uma crítica
a toda a metafísica, pois, para ele, seus postulados não podiam ser comprovados.
Ele questiona a existência de Deus, a imortalidade da alma, o livre-arbítrio e os
valores éticos. Escreveu dois livros importantes sobre o assunto: “A imortalidade
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Fonte: Santos (2005).
A DIVISÃO DA
PSICOLOGIA
MODERNA
OS MECANICISTAS
uns aos outros como os anéis de uma corrente. Dessa forma, se conhecermos
todos os fatores de uma dada situação em um determinado momento, podere-
mos prever os resultados.
A psicologia a qual eu tentaria construir tomaria como um ponto de
partida, primeiro, o fato observável de que organismos, seres humanos
e animais, igualmente, de fato, se ajustam ao seu meio ambiente através
de equipamentos de hábitos e hereditários. Estes ajustamentos podem
ser muito adequados ou tão inadequados que o organismo malmente
mantém sua existência; segundo, que certos estímulos levam os orga-
nismos a gerar as respostas. Em um sistema de psicologia completa-
mente elaborado, dada a resposta o estímulo pode ser previsto; dado o
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estímulo a resposta pode ser prevista (WATSON, 2008, p. 294).
Um dos principais expoentes desse grupo de psicólogos foi John Watson, que dizia
que se ele tivesse um grupo de crianças bem formadas e saudáveis para um experi-
mento, ele seria capaz de fazer com que cada uma dessas crianças, aleatoriamente,
e independente de seus antepassados, raça, talentos ou habilidades, se tornasse
um médico, um advogado, um artista ou até mesmo um mendigo ou um ladrão.
Watson sustentava que o homem é um mecanismo que pode ser manejado
como se queira, bastando se descobrirem os elementos simples de sua conduta
e condicioná-los, pois esta depende de causas materiais.
OS VITALISTAS
propriedade adicional que tem a vida, a qual foge à medida e à previsão, de forma
que para uma mesma circunstância podem corresponder diferentes modos de con-
duta. Este princípio de finalidade passa a ser um fator “X” e transforma-se em um
incômodo para as ciências exatas, pois lança por terra os cálculos experimentais.
Entretanto, não é possível negá-lo, pois é parte integrante da vida (BARBA, 2010,
on-line)5.
Linhas de trabalho da psicologia clínica moderna estão estruturadas sobre
essa escola de pensamento, dentre as quais podemos citar duas das mais relevan-
tes que são a terapia ‘reichiana’ (de Wilhelm Reich) e a terapia bioenergética (de
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
OS HUMANISTAS
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
de sentido: estas são as questões presentes, que surpreendem o homem como
existente (não apenas como natureza, como diria Merleau-Ponty).
OS RELACIONAIS
Um equívoco muito comum entre as pessoas leigas é acreditar que toda a ativi-
dade da psicologia limita-se ao trabalho clínico em consultórios psicológicos.
A verdade é que a psicologia hoje está dispersa por muitos campos de atividade
e quero apresentar a você alguns destes principais ramos ou o trabalho que rea-
lizam os psicólogos.
Efetivamente uma descrição completa de todos os campos de atuação dos
psicólogos é praticamente impossível, pois a diversidade de atividades dos profis-
sionais desta área é muito grande. Descreverei, a seguir, certas categorias maiores
ou subdivisões na psicologia.
A PSICOLOGIA CLÍNICA
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Os psicólogos clínicos
Psicólogos Clínicos são profissionais que têm sua formação básica em Psicologia
– um curso reconhecido pelo MEC e com duração de cinco anos. Após a con-
clusão de seu curso, a grande maioria destes profissionais realizam um curso de
especialização em uma das várias escolas de psicologia que atuam na área clínica.
Dentre estas várias escolas de especialização em psicologia clínica, pode-
mos destacar as seguintes: Logoterapia, Terapia Centrada na Pessoa, Terapias
de Base Analítica (jungiana, lacaniana, freudiana etc.), Terapia Cognitivo
Comportamental, Psicodrama, Gestalt terapia, Analise Transacional, Terapia
Familiar Sistêmica etc.
Ainda faz parte da área da psicologia clínica a aplicação e interpretação de testes
para diagnóstico, orientação vocacional e análise da personalidade. Por fim, o psi-
cólogo clínico pode igualmente desenvolver sua atuação por meio do trabalho em
pesquisa e investigação do comportamento considerado “desviante” ou “anormal”.
Os psicanalistas
Como foi citado, um psicólogo, após a conclusão de seu curso, pode fazer uma
especialização dentro da escola psicanalítica – a teoria de personalidade e método
de tratamento estabelecido pela Psicanálise (Freud e seus seguidores – ver deta-
lhes na Unidade II). Entretanto, essa escola de psicologia tem uma particularidade
que vale ser ressaltada.
Os terapeutas familiares
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
sariamente, tivessem formação em psicologia.
Posteriormente, criou-se uma Associação Brasileira de Terapia Familiar, a qual
regulamentou que a formação estaria restrita a pessoas com formação nas áreas
biopsicossociais. Ressalta-se que, diferente da psicanálise, um psicólogo que tenha
formação na área de Terapia Familiar não pode ensinar as técnicas desta forma
de atuação terapêutica a pessoas que não sejam psicólogos ou médicos psiquia-
tras, pois estará violando o código de ética dos psicólogos, que proíbe o ensino
de técnicas da profissão a qualquer pessoa que não tenha as formações citadas.
O foco de atendimento dos terapeutas familiares é a família e suas inter-
-relações, sendo que temas bastantes comuns em nossos dias, como conflitos
conjugais, divórcio, famílias reconstituídas, educação de filhos, entre outros, são
o principal campo de trabalho dos terapeutas familiares.
Os psiquiatras
Um grupo que, muitas vezes, é confundido com a psicologia clínica é o dos psi-
quiatras. No Brasil, os psiquiatras têm pouca (em algumas faculdades nenhuma)
formação na área de psicologia, pois seu curso básico é o de medicina. A maioria
das faculdades de medicina no Brasil tem uma visão bastante mecanicista e orga-
nicista da pessoa humana, ou seja, acreditam que os problemas de comportamento
se reduzem ao mau funcionamento das conexões neuronais (numa antropologia
marcadamente evolucionista e positivista) (PORTOCARRERO, 2002).
A partir desta concepção, utilizam medicamentos para regularizarem alte-
rações comportamentais. Alguns raros psiquiatras, após a conclusão de sua
residência médica (que é de três anos somados aos seis anos básicos do curso
de medicina), procuram, ainda, cursos de especialização na área da psicologia
clínica e, assim, integram em sua prática tanto as técnicas psicológicas como o
uso de medicação.
Na sociedade das soluções rápidas e mágicas, a medicalização de pacientes
com dificuldades emocionais/relacionais tem crescido muito. A indústria farma-
cêutica tem seduzido os profissionais da medicina com promessas de resultados
rápidos e eficazes, porém o que se constata é que tem havido um “envenena-
mento” progressivo da população, sem diferenças significativas que se traduzam
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mesmo com algum preparo mais específico dentro do aconselhamento pastoral.
A PSICOLOGIA EXPERIMENTAL
A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL
A PSICOLOGIA SOCIAL
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contribuem no amoldamento de nossa personalidade e determinam nossas ati-
tudes a respeito de muitas coisas. Os Psicólogos Sociais dedicam-se ao estudo
dos efeitos destes grupos sobre a conduta individual. Neste sentido, tem muita
relação com a Sociologia.
A Psicologia Social tem também seu lado prático. Agências preocupadas
no tratamento do crime e da delinquência empregam estes especialistas. Outra
aplicação importante consiste no recolhimento de informação a respeito das
atitudes da comunidade frente a um determinado assunto de interesse coletivo.
Com isso, tivemos um primeiro contato com a história da psicologia, suas
primeiras escolas e os diversos campos de atuação hoje em dia. Espero que você
tenha gostado do que aprendeu até aqui e seguiremos nesta caminhada na pró-
xima unidade. Até breve!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Então, como você tem se sentido até aqui nesta “viagem” pelos caminhos da psico-
logia? O que você achou de revisitar as paisagens que deram origem à psicologia
e fazem parte de sua etapa empírica? O que achou de percorrer a evolução do
conceito de alma para a mente ao final da Idade Média, com as primeiras teorias
que procuravam explicar a conduta humana, até chegar ao primeiro laboratório
de psicologia científica fundado por Wundt?
Também vimos que a paisagem muda com a etapa científica da psicologia e
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Considerações Finais
44
1. A palavra PSICOLOGIA:
a) Vem do grego e significa LOGOS = estudo + PSICHÉ = vida humana.
b) Vem do grego e significa LOGOS = estudo + PSICHÉ = alma.
c) Vem do latim e significa LOGOS = estudo + PSICHÉ = comportamento humano.
d) Vem do hebraico e significa LOGOS = estudo + PSICHÉ = mente.
e) Vem do grego e significa LOGOS = conhecimento + PSICHÉ = temperamento.
2. Os estudos sobre os quatro tipos de temperamento:
a) Foram desenvolvidos por Tim LaHaye e deram um grande avanço ao conhe-
cimento a respeito do comportamento humano.
b) Foram achados de Freud ao realizar os estudos sobre o inconsciente das pes-
soas.
c) Foram propostos por Hipócrates, no século IV antes de Cristo, e não têm cre-
dibilidade científica hoje nos meios científicos, embora tenha seu valor his-
tórico.
d) Deram início à etapa científica da psicologia, nos laboratórios de Wundt.
e) São uma descoberta recente no campo da psicologia.
3. A etapa pré-científica é demarcada por:
a) Se iniciarem os intentos de explicar os fenômenos psíquicos de forma racional.
b) Uma tentativa de sistematizar os conhecimentos psicológicos.
c) Suspeitar-se da possibilidade de observar objetivamente e medir os fenôme-
nos psíquicos.
d) As alternativas a b e c estão corretas.
e) Nenhuma é correta.
4. A etapa científica da psicologia começa com:
a) Wundt e seu primeiro laboratório de Psicologia.
b) Freud e seu descobrimento do inconsciente.
c) Pavlov e seus experimentos com cachorros.
d) Watson e seu experimento com ratos brancos.
e) Hipócrates e a teoria dos temperamentos.
45
Prezado(a) aluno(a), na leitura a seguir você terá uma reflexão da forma que o pensamento
científico se estruturou ao longo da história e, em seguida, uma nova perspectiva de perce-
ber a questão da saúde/doença. É um texto provocativo e espero que leve a muitas reflexões!
Boa leitura!
Até mesmo correntes da Psicologia adulta - antes continua até o final da vida,
moderna tomaram como base um pensa- sendo o sujeito agente que vai trabalhar
mento organicista de causa e efeito. Desta e intervir com o meio que o cerca, modifi-
forma, não só o conducionismo ou behavio- cando-o e sendo modificado pelo mesmo
rismo, que enquadra tudo na equação S-R numa relação dialética.
(estímulo/resposta), mas também sua mais
ferrenha opositora, a psicanálise, reduz as A determinação genética/organicista perde
possibilidades terapêuticas a uma relação sua força, passando a ser UM dentre mui-
T-C (trauma/conduta), iniciando, então, tos outros elementos que interferem no
uma busca arqueológica ao passado, na processo formacional da conduta do ser
investigação do momento traumático (ou humano. Fala-se, então, de uma VISÃO
momentos traumáticos) formacionais das HOLÍSTICA do ser humano, passando-se
distorções da personalidade adulta. a considerar a íntima relação entre o bioló-
gico, o emocional, o educacional, o social,
A partir de meados do século XX (1940-50), o cultural etc como sistemas de relação
começam a surgir pensadores que ques- interagindo entre si. Não se falam mais em
tionam este modelo de CAUSA-EFEITO “doenças dos nervos” e sim em sintomas
como sendo a única verdade absoluta de de sistemas em desequilíbrio.
reflexão científica e propõem alternativas,
baseando-se na cibernética, teoria geral Não se trata apenas de uma nova teoria
das comunicações e outras descobertas psicológica, mas de uma nova interpreta-
científicas proporcionadas pela Segunda ção da realidade, na qual, também, pela
Guerra Mundial. primeira vez no pensamento “científico”,
admite-se a realidade ESPIRITUAL do ser
A primeira e talvez a mais importante humano como elemento essencial no pro-
destas descobertas tenha sido a forma CIR- cesso de saúde/doença mental.
CULAR no processo de desenvolvimento
da personalidade e não mais a forma linear/ Temos, então, que o homem passa a ser
organicista de até então. Significava que a visto como uma unidade integral, muito
pessoa não estava sujeita a ser paciente/ mais que a soma de vários componentes
vítima de sua formação e dos eventos trau- em associação. Não é mais um estômago
máticos do passado, mas antes que estava que está com uma úlcera, ou um neurótico
em constante interação com o meio e tor- com os nervos desgastados, mas uma uni-
nava-se agente e senhor de sua história, por dade funcional, na qual cada fator interfere
meio do exercício do livre arbítrio. sobre outro e leva à hegemonia salutar ou à
patologia – unidade acima de tudo que tem
Em outras palavras, o processo de desen- valores que o destacam dos demais ani-
volvimento não se encerra na infância mais, pois é o único ser portador da IMAGO
ou adolescência – determinando a idade DEI (imagem de Deus).
Fonte: o autor.
MATERIAL COMPLEMENTAR
Material Complementar
50
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS ON-LINE:
¹Em: <https://psiquiatriaonlinebr.wordpress.com/2015/06/25/parte-3-hipocrates-
-e-a-teoria-humoral/>. Acesso em: 25 set. 2018.
²Em: <http://www.cerebromente.org.br/n01/frenolog/frengall_port.htm>. Acesso
em: 25 set. 2018.
³Em: <http://blogpsicologos.com.br/psicologia/historia-da-psicologia/item/11-wi-
lhelm--wundt-o-pai-da-psicologia-moderna>. Acesso em: 25 set. 2018.
⁴Em: <https://psicologado.com/psicologia-geral/historia-da--psicologia/wundt-e-
-a-criacao-do-primeiro-laboratorio-de-psicologia-na-alemanha>. Acesso em: 25
set. 2018.
⁵Em: <http://www.redepsi.com.br/2010/08/18/mecanicismo-louren-o-barba>.
Acesso em: 25 set. 2018.
53
REFERÊNCIAS
GABARITO
1. B
2. C
3. D
4. A
5. D
6. A
7. B
8. B
9. B
10. C
Professor Dr. Carlos Tadeu Grzybowski
II
AS ESCOLAS CLÁSSICAS DE
UNIDADE
PSICOLOGIA E SUA INFLUÊNCIA
NO MOVIMENTO DE
ACONSELHAMENTO PASTORAL
Objetivos de Aprendizagem
■■ Conhecer as principais escolas da psicologia moderna.
■■ Compreender os principais conceitos de cada ums das escolas
clássicas da psicologia.
■■ Entender como surgiu o movimento de aconselhamento pastoral.
■■ Avaliar a interferência que cada uma das escolas clássicas de
psicologia teve sobre o movimento de aconselhamento pastoral.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ O ‘behaviorismo’: suas origens, pressupostos e principais conceitos.
■■ A psicanálise: Freud e seus discípulos.
■■ O Gestaltismo.
■■ A psicologia humanista.
57
INTRODUÇÃO
Depois desta pausa na primeira estação para um breve descanso, sigamos nessa
viagem fascinante pelos caminhos da psicologia.
Neste trecho da viagem, veremos paisagens da América do Norte com sua
ciência obcecada por resultados imediatos, que no campo da psicologia se tra-
duziu em uma das escolas clássicas denominada de “Behaviorismo” – termo
derivado do inglês (behavior = comportamento). Essa escola importa-se basi-
camente com o condicionamento do comportamento e entende que a mente
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
humana é uma tábula rasa sobre a qual vai sendo modelada a conduta.
Da América do Norte, passamos para a Europa e ali encontramos mais duas
escolas clássicas da psicologia. A mais conhecida delas é a Psicanálise, criada pelo
médico alemão Sigmund Freud, que se preocupa especialmente pelos aspectos
inconscientes que interferem no comportamento humano. Outro grupo impor-
tante dentro das escolas clássicas de psicologia é a “Gestalt”, termo derivado do
alemão (gestalt = forma), que se preocupava com a maneira como as pessoas
percebem a realidade.
Ainda neste passeio, conheceremos as escolas denominadas humanistas, que
dão ênfase na dimensão dos valores na convivência humana e sua importância
na expressão do comportamento.
Toda essa paisagem está ligada ao desenvolvimento da psicologia no século
XX. Entretanto, como o interesse maior de nossa viagem acadêmica é a relação
entre a psicologia e a teologia, nos deteremos em apreciar como estas escolas
irão, ao longo do século passado inteiro, ter profundo impacto dentro de um
movimento que emergiu no campo da teologia no século passado e que ficou
conhecido como “movimento de aconselhamento pastoral”.
Na estação final de nosso segundo trecho da viagem, nós nos depararemos
com o belo texto do psiquiatra argentino Dr. Carlos José Hernandez sobre a psi-
coterapia e a igreja, que servirá de ponto de parada e contemplação.
Então, vamos lá, suba a bordo!
Introdução
58 UNIDADE II
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O ‘BEHAVIORISMO’: SUAS ORIGENS,
PRESSUPOSTOS E PRINCIPAIS CONCEITOS
Esta escola de psicologia clássica surge nos Estados Unidos e tem como “pano
de fundo” o Funcionalismo de William James, visto que surge exatamente como
uma forma de oposição aos pressupostos dele. Seu ‘idealizador’ foi John Watson
(1878-1952), que se interessava pelo comportamento aparente da pessoa humana.
Justamente pela ênfase nesse interesse, esta escola de psicologia ficou conhecida
como Comportamental (MESQUITA; DUARTE, 1996).
Watson foi influenciado pelos experimentos de um fisiologista russo cha-
mado Ivan Pavlov (1849-1936), que descobre, quase que acidentalmente - pois
seu campo de estudo não era a psicologia, e sim a fisiologia - um comportamento
animal que ficou conhecido como Reflexo Condicionado.
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
59
IVAN PAVLOV
Assim, Pavlov cria uma fórmula a respeito das respostas que ele denominou de
Condicionadas: um estímulo não condicionado ou ‘incondicionado’ (SN) (carne)
provoca uma resposta “natural” ao que chamou de resposta ‘incondicionada’
(RI). Entretanto, quando a salivação acontecia associada ao som da campainha
ou a simples visão da carne, Pavlov denomina esse fato de ‘resposta condicio-
nada’ (RC) e o som da campainha de ‘estímulo condicionado’ (RC). A fórmula
pode transformar em: SN = RI, então, SN + SC = RI e logo SC = RC:
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tia, inicialmente, na apresentação de um pedaço de carne a um animal
experimentalmente ingênuo e privado de alimento. Logo em seguida,
permitia-se que o sujeito experimental o comesse. Com a repetição do
procedimento, bastava a visão do alimento para que o animal salivasse
abundantemente. Sabia-se que ao mastigar alimento qualquer mamífe-
ro secretaria bastante saliva, fato que ficou devidamente registrado no
recipiente que continha a saliva secretada no experimento. Contudo, o
reflexo salivar mediante a visão do alimento só foi obtido após algumas
repetições do procedimento. Este processo demandou uma aprendiza-
gem ou condicionamento, como Pavlov preferiu chamar o fenômeno. Se
a secreção salivar ocorrida mediante a estimulação bucal exercida pelo
alimento é um tipo de reação inata, Pavlov denominou a resposta sali-
var incondicionada. Nestas circunstâncias, o alimento na boca do ani-
mal foi chamado de estímulo incondicionado, que eliciava uma resposta
também incondicionada. Por outro lado, a salivação ocorrida após a
visão do alimento demandou aprendizagem e, portanto, foi denomina-
da resposta condicionada, eliciada por um estímulo condicionado (neste
caso, a visão do alimento) (SOUZA JR.; CIRINO, 2009, p. 143-144).
JOHN WATSON
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
61
Por causa deste experimento, Watson foi muito criticado nos meios acadê-
micos, porque não levou em consideração as questões éticas envolvidas e,
especialmente, porque o condicionamento do bebê (medo) nunca foi des-
feito. Recentemente (em 2009), alguns pesquisadores identificaram o refe-
rido bebê, que na realidade chamava-se Douglas Merritte e que o mesmo
morreu de hidrocefalia aos seis anos de idade. Em função desta descoberta,
todo o experimento de Watson foi colocado em cheque, pois em 2012 al-
guns investigadores apresentaram provas de que Merritte não era um bebê
“normal e saudável” como ele afirmara, dado que sofria de deficiências neu-
rológicas no momento do experimento e que os pesquisadores podem ter
conscientemente deturpado os resultados.
Fonte: Cherry (2016, on-line)1.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
SKINNER
Embora tenha Watson como seu fundador, o psicólogo que se tornou mais
conhecido dentro do Behaviorismo foi Buhrrus Frederic Skinner (1904-1990).
Skinner parte dos pressupostos de Watson sobre o condicionamento e propõe
o que ele denomina de Comportamento Operante – ou seja, o comportamento
pode ser controlado a partir das experiências positivas ou negativas decorren-
tes do mesmo (MESQUITA; DUARTE, 1996).
Nesse tipo de comportamento, de forma distinta do comportamento res-
pondente de Pavlov, no qual a resposta emitida vem imediatamente após a
apresentação do estímulo (carne/salivação), as respostas que gerem alguma
consequência que aumente a probabilidade das mesmas se repetirem (reforço)
tendem a ser novamente emitidas. Um dos conceitos principais do condiciona-
mento operante é o reforço, pois este aumenta a possibilidade de ocorrência de
uma resposta em uma determinada situação.
Assim, Skinner acreditava que poderia modelar as respostas do comporta-
mento por meio do reforço. Na medida em que o comportamento fosse sendo
modelado, ele estaria sendo condicionado pela resposta, ao que Skinner denomi-
nou de Condicionamento Operante (SKINNER, 2003). Exemplificando: no caso
do condicionamento respondente, a resposta (salivação do cão) ao estímulo (cam-
painha) é fisiológica natural, que foi condicionada por um estímulo associado.
No caso do comportamento operante, um sujeito recebe um elogio (denomi-
nado reforço) por ter feito um bom trabalho e, então, passa a esforçar-se para
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
63
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Na sua aplicação clínica, o Behaviorismo desenvolveu a Terapia Comportamental
e, mais recentemente, a Terapia Cognitivo-comportamental, muito popular nas
faculdades hoje em dia. A aplicação clínica dos pressupostos do behaviorismo
inicia com o próprio Skinner em meados do século XX.
Em 1953, Skinner concentrou-se em escrever Ciência e comportamen-
to humano e aplicar os princípios do condicionamento operante à edu-
cação, à psicoterapia, e a outras iniciativas sociais amplas. A carreira
daqueles que, como Azrin, Ferster e Sidman, passaram de uma intensa
dedicação à pesquisa básica com animais, para o trabalho em hospitais
de doenças mentais, escolas para retardados, educação, psicoterapia, e
extensões teóricas dos princípios de reforçamento operante aos proble-
mas de depressão, obesidade, e da origem da doença mental, espelhou-
-se na carreira dividida de Skinner. Para cada um desses cientistas, os
resultados conseguidos com a pesquisa animal levaram à convicção de
que os métodos poderiam ser expandidos de modo efetivo e poderoso
para as preocupações com os humanos (FERSTER, 2007, p. 122).
Terapia Comportamental
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
49), “A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma intervenção semiestrutu-
rada, objetiva e orientada para metas, que aborda fatores cognitivos, emocionais
e comportamentais no tratamento dos transtornos psiquiátricos”.
PENSAMENTOS SENTIMENTOS
gerando b ra r o c i c gerando
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Sentimentos ar v Comportamento
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COMPORTAMENTO
gerando
Pensamentos
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
67
e utilizar técnicas racionais para eliminar as falsas crenças que geram perturba-
ção da conduta. Segundo Kerauby (1983, p. 14):
Na TCC, o cliente identifica seus pensamentos errôneos, que ocorrem
em situações específicas e são responsáveis pelos problemas emocio-
nais. O cliente é encorajado a perceber e, se necessário, anotar os pen-
samentos anteriores ao seu comportamento.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ção de métodos científicos, a definição de metas terapêuticas no tratamento, a
estruturação das sessões terapêuticas e de todo o processo clínico, foco nos ele-
mentos que mantém o sintoma (em contraposição aos elementos que dão origem
ao mesmo), uso da terapia breve e a proposta de alcançar mudanças comporta-
mentais como um meio para produzir mudanças cognitivas.
Apesar de algumas diferenças conceituais, essas duas linhas de terapia prove-
nientes do behaviorismo seguem caminhos paralelos, tendo como último objetivo
o foco no sintoma e na sua eliminação. Muito distinto disso é a Psicanálise, que
veremos a seguir!
E então, prezado(a) estudante, gostou das paisagens da psicologia na América
do Norte vistas até aqui? Agora, nossa viagem segue pelos campos europeus e
vamos conhecer como a psicologia cresceu por lá a partir da psicanálise. Vem
comigo!
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
SIGMUND FREUD
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
muda-se para Paris, onde vai apren-
der com o Dr. Charcot, diretor do
Hospital Salpêtrière, as técnicas de
hipnose para o tratamento de cer-
tas paralisias de fundo emocional.
Retorna então a Viena e vai trabalhar
com o Dr. Breuer, aprofundando seus
estudos sobre certas doenças (princi-
palmente as paralisias) de fundo emocional - que predominantemente afetavam
as mulheres - as quais era dado o nome de “histerias” (do grego: hysteros = útero).
Inicialmente, Freud tratava essas paralisias, chamadas de histeria de conversão,
por meio da hipnose – um método chamado de catarse, buscando no passado
um evento traumático que pudesse ter sido o desencadeador das paralisias:
As descobertas de Breuer já foram descritas tantas vezes que posso dis-
pensar um exame detalhado das mesmas aqui. O fundamental delas
era o fato de que os sintomas de pacientes histéricos baseiam-se em
cenas do seu passado que lhes causaram grande impressão, mas foram
esquecidas (traumas); a terapêutica, nisto apoiada, que consistia em fa-
zê-los lembrar e reproduzir essas experiências num estado de hipnose
(catarse); e o fragmento de teoria disto inferido, segundo o qual esses
sintomas representavam um emprego anormal de doses de excitação
que não haviam sido descarregadas (conversão) (FREUD, 1974, p. 17).
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
71
Freud, nas suas investigações, atribuiu a origem dessas patologias mentais – que
ele denominava de neuroses – a algum distúrbio da sexualidade. Primariamente,
ele acreditava que os pacientes que apresentavam algum quadro neurótico haviam
sofrido algum tipo de trauma de conteúdo sexual ao longo de sua vida, pelo que
ele foi muito criticado pela sociedade científica de sua época. Com o passar do
tempo, ele abandona essa ideia de um evento traumático e concentra-se na pos-
sibilidade de uma estrutura maior:
Durante os anos que se seguiram à publicação dos Estudos, tendo che-
gado a essas conclusões sobre o papel desempenhado pela sexualidade
na etiologia das neuroses, li alguns artigos sobre o assunto perante vá-
rias sociedades médicas, mas só me defrontei com incredulidade e con-
tradição. Breuer (...) também ele se esquivou de reconhecer a etiologia
sexual das neuroses (FREUD, 1976a, p. 39).
Como além de pesquisador, Freud era também um clínico, ele começa a questio-
nar a efetividade do método catártico no tratamento de seus pacientes, pois os
mesmos, após serem despertos da hipnose, apresentavam alguma melhora, mas
esta melhora declinava nos dias subsequentes e acabava sumindo completamente
após algum tempo. Torna-se, então, imperativo, ao já eminente pesquisador,
encontrar uma forma mais efetiva de tratamento e de explicação do que acontecia.
Recalque e Pulsão
Freud observa que havia algo no paciente que procurava evitar que as lembran-
ças doloridas viessem à consciência e, a esta força, denomina-se de repressão.
Esse foi o primeiro de uma série de mecanismos que ele denomina “de defesa”,
os quais, segundo ele, são articulados na mente para manter fora do consciente
alguns impulsos que a pessoa tem e que lhe causam muita dor emocional. Outros
mecanismos seriam posteriormente adicionados à lista, todos com o mesmo
objetivo (LAPLANCHE; PONTALIS, 1992).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Aprofundando um pouco mais a sua teoria, Freud postula que existe um
mecanismo estrutural que independe de forças externas, e que esse mecanismo
estrutural é o principal responsável por manter no inconsciente as experiências
traumáticas. A este mecanismo estrutural ele denomina de recalque e desenvolve
toda uma teoria, intitulada a teoria do recalque. A distinção para o mecanismo de
defesa da repressão é exatamente que a repressão depende de uma ação externa
coercitiva:
Antes de mais nada, há que ser feita uma distinção entre os mecanis-
mos do recalque, Verdrangung, e a repressão, sem a qual deixamos de
perceber que o recalque ocorre entre diferentes sistemas psíquicos,
produzindo a mudança de algum elemento de um sistema para outro.
O recalque independe de uma ação externa coercitiva, pela qual se ca-
racteriza a repressão: ele é um mecanismo estrutural, independente da
ação externa e, além disso, estruturante (JORGE, 2008, p. 22).
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
73
Com o tempo, Freud verifica que não eram as experiências traumáticas que pro-
vocavam os comportamentos disfuncionais (pois alguns pacientes pareciam não
encontrar estas experiências em seus históricos), mas uma espécie de fantasia
destas experiências. Assim, ele vai trabalhando na ideia que tais fantasias acon-
teciam em etapas cada vez mais precoces da vida da pessoa e desenvolve a teoria
da sexualidade infantil – que gerou um escândalo para a sociedade médica da
época (FREUD, 1972).
Para fundamentar a sua teoria do recalcamento, Freud recorrera pri-
meiramente à hipótese da sedução, acreditando que o recalque se apli-
cava às lembranças de atentados sexuais perversos sofridos de forma
passiva pelo sujeito em sua infância. Concebido o inconsciente como
resultado do recalque das cenas de sedução no psiquismo, a teoria da
sedução não sobreviveu ao impacto de novas descobertas freudianas:
o papel da sexualidade infantil e da fantasia na vida psíquica. Segundo
essa nova perspectiva, a criança não seria desprovida de atividade se-
xual, no sentido de ser reconhecidamente capaz de construir, num pla-
no inconsciente, inúmeras fantasias sexuais, apesar de sua imaturidade
biológica (PADILHA NETTO; CARDOSO, 2012, p. 530).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
então, entra na puberdade e o organismo coloca em ação os hormônios ligados
ao desenvolvimento da sexualidade. A pessoa irá chegar à sua maturação sexual
desembocando na fase genital do desenvolvimento psicossexual (FREUD, 1972).
Na primeira fase de desenvolvimento infantil, o órgão de sensibilidade mais
acurado da criança é a boca – justamente por isso essa fase é denominada de
oral. Durante toda a gestação, a criança está envolta na placenta, dentro do útero
materno e, ali, a temperatura é estável, as luzes e os sons são filtrados e a alimen-
tação vem por meio do cordão umbilical. Quando a criança nasce, é impactada
por sons e luzes intensos e variação da temperatura, tudo isso produz descon-
forto. Logo virá a sensação de maior desconforto, que é a fome (FREUD, 1972).
Quando sente desconforto, a criança chora e a mãe a coloca junto de seu peito
e a amamenta. A boca da criança – que já possui o movimento inato de sucção
– aprende rapidamente a sugar o leite e percebe que essa experiência lhe pro-
porciona uma sensação de conforto e prazer (lhe dá calor e acaba com a fome).
Assim, a boca se torna um meio de obter uma sensação prazerosa e vai desen-
volvendo uma sensibilidade especial.
Na medida em que a criança cresce, ela vai reconhecendo os objetos ao seu
redor e este reconhecimento se dá principalmente por meio da boca – o órgão
sensorial mais desenvolvido:
Foi a sua primeira e mais vital atividade, sugando o seio da mãe ou subs-
titutos dele, que deve tê-la familiarizado com este prazer. Os lábios da
criança, a nosso ver, comportam-se como uma zona erógena, e sem dú-
vida o estímulo do morno fluxo do leite é a causa da sensação de prazer.
A satisfação da zona erógena se associa, no primeiro caso, à satisfação
da necessidade de nutrição. De início, a atividade sexual se liga a fun-
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
75
Para concluir estas fases pré-genitais, a criança entra na fase fálica, que é assim
denominada porque é a etapa na qual a criança descobre a diferença sexual entre
meninos e meninas, sendo os primeiros portadores de um “falo” (o pênis) e as
últimas não. Freud irá afirmar que essa descoberta gera um forte sentimento
nos meninos que ele denomina de Complexo de Castração, no qual os meninos
temem que possam ‘perder o falo’ e assim ficarem iguais às meninas:
E é nesse período que surge a curiosidade por ver os órgãos genitais
de seus pares. Sobre o entusiasmo da sedução, o desejo de ver passa a
apresentar grande importância na vida sexual da criança. Nesta fase,
as crianças começam a perceber as diferenças em termos de gênero:
masculino e feminino (COSTA; OLIVEIRA, 2011, p.11).
Para Freud, essa era uma forma dos antigos descreverem – miticamente – o que
ocorre nesse período da infância, no qual o apego da criança à mãe suscita o
desejo da morte do pai (que é visto como intruso na relação). Contudo, como
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a criança não logra seu objetivo, vai a busca de outra mulher que substitua as
características maternas e lhe proporcione o prazer que ele busca:
Em sua forma simplificada, o caso de uma criança do sexo masculi-
no pode ser descrito do seguinte modo. Em idade muito precoce, o
menininho desenvolve uma catexia objetal pela mãe, originalmente
relacionada ao seio materno, e que é o protótipo de uma escolha de
objeto segundo o modelo anaclítico; o menino trata o pai identifican-
do-se com este. Durante certo tempo, esses dois relacionamentos avan-
çam lado a lado, até que os desejos sexuais do menino em relação à
mãe se tornam mais intensos e o pai é percebido como um obstáculo
a eles; disso se origina o complexo de Édipo. Sua identificação com o
pai assume então uma coloração hostil e transformasse num desejo de
livrar-se dele, a fim de ocupar o seu lugar junto à mãe. Daí por diante,
a sua relação com o pai é ambivalente; parece como se a ambivalência,
inerente à identificação desde o início, se houvesse tornado manifesta.
Uma atitude ambivalente para com o pai e uma relação objetal de tipo
unicamente afetuoso com a mãe constituem o conteúdo do complexo
de Édipo positivo simples num menino (FREUD, 1976b, p. 46).
Freud vai ainda afirmar que a resolução deficitária de alguma destas fases, por
ele denominada de fixação, irá gerar problemas para a pessoa na vida adulta. A
fixação é um foco persistente em um estágio psicossexual. Até que este con-
flito seja resolvido, o indivíduo mantém-se “preso” nesta fase. Por exemplo, uma
pessoa que está fixada na fase oral pode ser mais dependente dos outros e pode
buscar estimulação oral por meio de fumar, beber ou comer.
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77
EGO, ID e SUPEREGO
Por fim, Freud também vai afirmar que a mente ou o aparelho psíquico, como
ele gostava de afirmar (dando um caráter mais meta aos processos mentais),
além de dividir-se em consciente e inconsciente, está dividido em três instân-
cias, a saber: ego, ID e superego, que estruturam a personalidade do indivíduo.
O ID é a parte mais primitiva da personalidade e consiste nos impulsos mais
primitivos (pulsões): comer, dormir, agressividade, sexualidade, eliminar resíduos,
evitar dor, obter prazer. Ele é, segundo Freud, regido pelo princípio do prazer. Já
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fisicamente um semelhante, pode expressar tal pulsão por meio de jogos com-
petitivos, observações sarcásticas etc.
Pessoas que têm o desejo de fazer algo proibido experimentam a ansie-
dade, e uma maneira de diminuir a ansiedade é expressar o impulso de forma
disfarçada para evitar a punição da sociedade ou a culpa. Estas estratégias de
impedir ou reduzir a ansiedade foram chamadas por Freud de mecanismos de
defesa. Alguns destes mecanismos de defesa são: a repressão; a racionaliza-
ção; a formação reativa; a projeção; o deslocamento e a negação, entre outros
(LAPLANCHE; PONTALIS, 1992).
Jung (1875-1961) foi um discípulo de Freud e inicialmente era considerado por este
seu sucessor natural. Ele era suíço e filho de um pastor luterano, mas, apesar de cres-
cer em um lar norteado por um modelo de espiritualidade, Jung sofreu bastante com
conflitos familiares. Seu pai lhe impunha uma fé cega que desqualificava a ciência e,
diante disso, Jung resolve desenvolver uma atitude cognitiva, olhando para a Bíblia
e, posteriormente, outros textos sagrados como suporte de toda sua teoria a respeito
da mente humana. Já em seus primeiros escritos, Jung mostra-se perplexo e inquieto
diante da falta de diálogo entre Ciência e Religião, e essa inquietude o leva a buscar
na psiquiatria o elo de conexão entre estas formas de abordagem da realidade. Um
de seus primeiros escritos de 1902 “Sobre a Psicologia e Patologia dos Fenômenos
Chamados Ocultos” (1994) já revela esse viés (JUNG, 1994).
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79
O próprio Jung, ao longo de sua vida, tem sonhos que o impactaram, os quais
estavam repletos de imagens mitológicas que levam o pesquisador a desenvolver
um grande interesse pelo tema. Reflexo disso foi que muitos dos estudos desen-
volvidos por Jung brotaram de suas próprias experiências pessoais, retratados
em sua autobiografia Memórias, sonhos, reflexões (1986).
Nos primeiros anos do século XX, tem contato com a obra de Freud e, pos-
teriormente, se encontram (em 1907) e desenvolvem uma amizade na qual
debatem casos clínicos e trocam ideias e confidências. Contudo, Freud, como
ateu declarado e positivista extremado, não aceitava o interesse de Jung pela espi-
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ritualidade como uma fonte de pesquisa dos fenômenos psíquicos. Por outro
lado, Jung mostra-se reticente com a teoria freudiana da sexualidade infantil, e
a amizade termina abruptamente (FREUD, 1974).
A ruptura da amizade com Freud leva Jung a desenvolver sua própria linha de
trabalho, a qual ele denominou de “Psicologia Analítica”. Dentro desta perspec-
tiva, Jung postula que, além do inconsciente pessoal, que contém basicamente
o material resultante do recalque (ponto no qual ele converge totalmente com
Freud), a pessoa possui também um inconsciente coletivo, o qual é depositário
de símbolos e imagens de caráter universal – que ele denomina de arquétipos:
O inconsciente coletivo é uma parte da psique que pode distinguir-
-se de um inconsciente pessoal pelo fato de que não deve sua existên-
cia à experiência pessoal, não sendo, portanto uma aquisição pesso-
al. Enquanto o inconsciente pessoal é constituído essencialmente de
conteúdos que já foram conscientes e, no entanto, desapareceram da
consciência por terem sido esquecidos ou reprimidos, os conteúdos do
inconsciente coletivo nunca estiveram na consciência e, portanto não
foram adquiridos individualmente, mas devem sua existência apenas
à hereditariedade. Enquanto o inconsciente pessoal consiste em sua
maior parte de complexos, o conteúdo do inconsciente coletivo é cons-
tituído essencialmente de arquétipos (JUNG, 2002, p. 53).
Segundo Jung, estes elementos que ele denomina de arquétipos são imagens
latentes e universais que a pessoa traz de seus ancestrais sem ter consciência
disto. Eles são idênticos em todas as pessoas e se manifestam de forma
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O inconsciente da pessoa se projeta sobre outra pessoa. Aquilo que alguém
não vê em si mesmo, censura no outro. Antes de criticar os outros, pense se
a carapuça que quer atribuir ao outro não é a que se ajusta a si.
(Carl Gustav Jung)
Tipos Psicológicos
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81
órgãos do sentidos que captam a realidade e as informações do meio que nos cir-
cunda. Pessoas com esta função são muito focadas no real, nos fatos e na atenção
ao aqui e agora, geralmente são práticas, realistas e preocupadas em manter as
coisas em funcionamento, não em sonhos ou inovações (JUNG, 2011).
Já pessoas com a Função Intuição captam a realidade por meio de “pressen-
timentos” e outros elementos não lógicos, como sonhos e “inspirações”. Tendem
a perceber a realidade como uma totalidade organizada, mais que a soma de par-
tes e, portanto, são pouco atentas a detalhes.
A Função Pensamento cria uma conexão lógica entre os fatos percebidos,
e as pessoas que se utilizam desta função tendem a analisar os fatos de maneira
lógica e racional, procurando classificar e discriminar uma coisa de outra, sem
muito interesse pelo valor afetivo das mesmas. Normalmente, são orientadas
por leis gerais não levando em conta os valores pessoais no juízo de situações
específicas, tornando-as extremamente racionais e constantemente buscando a
imparcialidade em seus julgamentos (JUNG, 2011).
Por fim, a Função Sentimento é oposta à Função Pensamento, e as pessoas
que a utilizam tendem a valorizar primariamente o sentimento em suas avalia-
ções da realidade. Tais pessoas preocupam-se mais em manter a harmonia no
meio em que estão inseridas e tomam decisões baseadas em valores pessoais
(próprios ou dos outros), mesmo em detrimento da lógica causal. Seu juízo da
realidade foca o valor intrínseco das coisas. Para a pessoa que utiliza a função
Sentimento, “estabelece julgamentos como o pensamento, mas a sua lógica é toda
diferente. É a lógica do coração” (SILVEIRA, 1968, p. 48).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
JAQUES LACAN
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O GESTALTISMO
TODO E PARTE
Gestalt é uma expressão alemã que significa forma, atribui-se ao alemão Frederick
Salomon (Fritz) Perls (1893-1970) as suas primeiras proposições. A ideia é
que ao juntarmos elementos simples obtemos um terceiro elemento que ultra-
passa em essência essa soma simples, como, por exemplo, ao juntarmos letras e
O Gestaltismo
84 UNIDADE II
constituirmos uma palavra – essa palavra não é somente a expressão dos sons
emitidos na junção das letras, mas evoca em nossas mentes significados com-
plexos ligados às memórias sensoriais:
A gestalt-terapia é integralmente ontológica, pois reconhece tanto a
atividade conceitual quanto a formação biológica de Gestalten. É, por-
tanto, autossustentada e realmente experiencial. Nosso objetivo como
terapeutas é ampliar o potencial humano através do processo de inte-
gração (PERLS apud STEVENS, 1977, p. 19).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
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85
LEIS DA GESTALT
A Lei da Semelhança preconiza que nossa percepção tende a agrupar objetos que
têm similaridade entre si e a constituírem um todo ou unidades dentro do todo.
Por exemplo, se tivermos linhas horizontais idênticas alternando quadrados e
círculos, tendemos a perceber primariamente as linhas verticais de quadrados
alternando-se com as linhas verticais de círculos (VIANA, on-line)3.
A Gestalt também vai afirmar que nossa percepção tende a agrupar elementos
que estejam próximos entre si e a formar uma imagem única, por similaridades
de forma ou de cor – essa é a Lei da Proximidade. Um clássico exemplo disso é
o cartaz do filme “O senhor das armas”, com Nicolas Cage (Figura 2), em que
nossa percepção não capta uma imagem de milhares de balas agrupadas, mas
sim o rosto do ator (VIANA, on-line)3.
O Gestaltismo
86 UNIDADE II
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Figura 2 - Lei da Proximidade
Fonte: Sinopse Netflix Br (2016, on-line)4.
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87
O Gestaltismo
88 UNIDADE II
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
e algumas manchas, mas a figura do
conhecido maltrapilho Carlitos, persona-
gem de Charles Chaplin (DENVIR, on-line)7.
Wertheimer estava viajando num trem e olhou para um sinal ferroviário que
continha duas lâmpadas. Uma lâmpada se acendia e pouco depois se apa-
gava. Em seguida, a outra lâmpada fazia o mesmo e novamente a primei-
ra lâmpada acendia e apagava, e assim por diante. Wertheimer via apenas
uma luz que ia continuamente no espaço entre as duas lâmpadas, para um
lado e a seguir para o outro. Ele desceu do trem, comprou cartolinas e um
estroboscópio e começou a construir algumas figuras em duplicidade que
deixassem a luz passar num tempo muito curto. Se a luz se acendesse e se
apagasse numa figura e, a seguir, se acendesse e apagasse na outra, com in-
tervalo entre elas de mais ou menos 60 milissegundos, enxergava-se apenas
a figura indo de um lugar para outro. Telefonou para o Instituto de Psico-
logia da Academia Comercial e explicou seu experimento a Köhler. Köhler
arranjou um espaço para Wertheimer no laboratório, arrumou um aparelho
que permitisse a visão rápida de figuras e serviu-lhe como sujeito.
Fonte: Engelmann (2002).
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
89
FIGURA E FUNDO
ção dinâmica com o fundo. Muito simplesmente, o que não pode estar
aqui, está lá. O fundo é todo o resto, o mundo externo (PERLS apud
STEVENS, 1977, p. 100-101).
O Gestaltismo
90 UNIDADE II
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
De forma distinta da psicanálise que buscava no passado e no inconsciente os
elementos explicativos da conduta, a Gestalt foca-se apenas no presente, preo-
cupando-se mais com a estrutura do que com o conteúdo da fala:
Meio e mensagem, forma e conteúdo tem relação quase que oposta à
da psicanálise tradicional, onde o relato do paciente e a interpretação
do terapeuta são o material básico. A maneira pela qual o paciente se
apresenta permanece periférica. A busca de uma solução terapêutica
trabalhável no presente dá à Gestalt-Terapia seu ímpeto para improvi-
sar e experimentar, mais que explicar. A vivência, o acontecimento são
as melhores explicações (JULIANO, 2004, p. 5).
Assim, prezado(a) aluno(a), terminamos nosso passeio pelos campos das esco-
las de psicologia europeias e espero que você tenha gostado do que viu até aqui.
Retornamos à América do Norte, pois ainda há um pequeno trecho a ser visto:
a psicologia humanista.
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A PSICOLOGIA HUMANISTA
A Psicologia Humanista
92 UNIDADE II
Como o próprio nome já sugere, essa escola de psicologia propõe que o ser
humano seja protagonista de si mesmo, possuindo o que os teóricos denomi-
nam de forças autorrealizadoras, que precisam ser “liberadas” para que o sujeito
se desenvolva em todo seu potencial, o que não ocorre somente por causa dos
fatores limitantes que o meio impõe.
Dois nomes destacam-se dentre os vários que podem ser citados como per-
tencentes a esta escola: Carl Rogers e Abraham Maslow. Sobre Maslow não iremos
discorrer agora, pois veremos detalhadamente a sua teoria sobre as necessidades
humanas na próxima unidade. Assim, vamos nos deter nos principais conceitos
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
trazidos por Carl Rogers.
CARL ROGERS
O psicólogo Carl Rogers (1902-1987) foi o criador de uma nova abordagem den-
tro da psicologia, que ficou conhecida como “Abordagem Centrada na Pessoa”.
Ele recebeu forte influência da teologia cristã – de linha mais liberal –, quando
estudou no Seminário Teológico Unido, em Nova York (MESQUITA; DUARTE,
1996).
Rogers propunha uma tese frontalmente contrária a Freud, na qual ele afir-
mava que as pessoas, ao contrário do que postulava a psicanálise, não tinham
uma tendência à neurose ou à psicose em sua estruturação da personalidade,
mas sim uma tendência à saúde. A valorização da pessoa humana está no cen-
tro de toda a teoria e prática de Rogers:
Essa mudança radical de ponto de vista é o que mais caracteriza a psi-
cologia humanista; o sentido do humanismo (no nosso caso enquan-
to aplicado à Psicologia) é essa mudança de perspectiva. Não se trata,
com efeito, nem de uma mudança de objeto, nem de uma mudança de
método, e nem mesmo, quem sabe, de uma mudança teórica. Trata-se
na realidade de uma mudança na relação com o objeto (AMATUZZI,
1989, p. 88).
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
93
Mais tarde, na construção de sua teoria, Rogers vai afirmar que o processo psi-
coterápico é um encontro existencial, no qual o terapeuta utiliza-se de seus
sentimentos, dirigidos de forma autêntica ao paciente (a quem Rogers chama
de cliente) e, assim, desenvolvendo um diálogo íntimo e intersubjetivo entre
ambos. Dessa forma, o modelo rogeriano adquire matizes bastante fenomenoló-
gicos, em que o foco não é tanto a pessoa, mas sim a experiência intersubjetiva.
Aqui terminamos essa segunda etapa de nosso passeio pela psicologia!
A Psicologia Humanista
94 UNIDADE II
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
procura habilitar-se ao trabalho com o ser humano – esse precioso e complexo
ser portador da “imagem e semelhança de Deus”.
Surgem, muitas vezes, modelos de aconselhamento que são intitulados como
“aconselhamento bíblico”, trazendo no nome a prerrogativa que o mesmo seria
estruturado sobre um modelo contido nas Sagradas Escrituras. Contudo, quando
conhecemos as escolas de psicologia, vamos reconhecendo que os modelos
intitulados de ‘bíblicos’ trazem fortes matizes das distintas vertentes da ciência
psicológica. Não que estruturar um modelo em cima dos conceitos das escolas
de psicologia seja algo errado – longe disso! Na verdade, essa estruturação pode
ajudar muito o conselheiro. O que é um equívoco é pensar que, ao denominar-
-se ‘bíblico’, aquele modelo é o único possível e correto.
Na verdade, existem ainda outras escolas de psicologia que não foram pos-
síveis serem analisadas mais detalhadamente em virtude do espaço que temos
disponível e também porque não é o foco principal desse nosso curso de teo-
logia. Só para citar algumas: Psicodrama; Psicologia Sócio-histórica; Psicologia
cognitivista; Psicologia Reichiana (ou corporal); Logoterapia etc.
Na próxima etapa de nossa viagem, estaremos viajando pelos campos do inte-
rior da psicologia, buscando conhecer os principais conceitos ligados ao campo
das teorias “psi”, procurando sempre refletir de como esse conhecimento pode
nos ajudar em nossa prática dentro do campo pastoral!
Vamos seguir viagem?
ASESCOLASCLÁSSICASDEPSICOLOGIAESUAINFLUÊNCIANOMOVIMENTODEACONSELHAMENTOPASTORAL
95
5. Jung afasta-se de Freud e cria uma linha de psicologia cujos principais conceitos
são:
a) Ego, Id e Superego.
b) Arquétipos e Inconsciente Coletivo.
c) Figura e Fundo.
d) Condicionamento Operante e Respondente.
e) Sexualidade Infantil e interpretação dos sonhos.
6. A teoria dos Tipos Psicológicos de Jung propõe que:
a) As funções Sentimento e o Pensamento são superiores às funções de Sensa-
ção e Intuição.
b) As funções psicológicas são herdadas e imutáveis.
c) As funções são dinâmicas e, mesmo tendo uma estrutura e uma função prin-
cipal, as demais também atuam na personalidade.
d) As funções Sensação e Intuição são superiores às funções de Sentimento e
Pensamento.
e) Todas as funções psicológicas são idênticas.
7. A proposição central da Gestalt é:
a) A pessoa é o centro de toda a teoria.
b) Todo comportamento pode ser modelo pelo condicionamento.
c) Uma teoria da sexualidade infantil.
d) O todo é mais que a soma das partes.
e) As três instâncias da mente – id, ego e superego.
8. Figura e fundo são:
a) Fixos e determinados pelo meio.
b) Alternam-se dinamicamente de acordo com o contexto.
c) Fixos e determinados pela capacidade perceptiva da pessoa.
d) Alternam-se na percepção de cada pessoa em função de disposições gené-
ticas.
e) Ilusões de ótica de pessoas mentalmente perturbadas.
97
9. Segundo Rogers:
a) O terapeuta deveria interferir o mínimo possível na condução do processo
terapêutico.
b) O terapeuta deveria ter o controle total na condução do processo terapêu-
tico.
c) O terapeuta deve sempre questionar os valores do paciente buscando cen-
trá-los na Palavra de Deus.
d) O terapeuta nunca deve falar nada para o paciente, apenas concordar com
ele.
e) O terapeuta deve interpretar tudo que o paciente fala em termos de sexua-
lidade reprimida.
10. A proposição de trabalho do Dr. Hernández é de que:
a) Todos os pastores façam um curso de Psicologia e apliquem em suas comu-
nidades.
b) Todos os psicólogos sejam também pastores.
c) Haja uma equipe integrada de trabalho visando a saúde e o crescimento da
pessoa que busca ajuda.
d) Psicólogos e pastores desenvolvam trabalhos completamente independen-
tes.
e) Pastores e psicólogos desenvolvam juntos uma nova teoria de psicologia.
98
Prezado(a) aluno(a), no texto a seguir você terá uma belíssima reflexão sobre a relação que
deve existir entre a igreja e os trabalho psicológico. Boa Leitura!
A PSICOTERAPIA E A IGREJA
à limitação do seu campo de observação. minha vida tem me mostrado com quanta
Com frequência, em psicologia, se fazem facilidade tenho caído numa redução psi-
simplificações de realidades que não são cológica.
objeto de estudo psicológico, caindo-se
num mal muito frequente que é o psico- A ação do Espírito Santo na vida pessoal
logismo. é o fator principal do ato criativo. É com
referência ao Espírito Santo que podemos
Se por um lado cometem-se erros a partir dar objetividade à tarefa psicológica. Ren-
do campo terapêutico, reduzindo a psicolo- der nossos conhecimentos psicológicos
gismos aspectos teológicos ou sociológicos ao Senhor é parte de nosso culto racional
da realidade, existem também perigos a (Romanos 12:1).
partir do campo pastoral. É o caso do pas-
tor que lê e se entusiasma com psicologia As necessidades afetivas do psicoterapeuta
e que aplica na congregação técnicas psi- devem ser consideradas com tanta serie-
cológicas. dade como seus próprios conhecimentos
científicos e levadas em conta com tanto
É necessário que se façam distinções. Cada rigor como sua competência profissional.
campo é próprio e tem regras e procedi-
mentos particulares. Daí a necessidade de A tarefa psicoterapêutica compromete e,
abordagens interdisciplinares, nas quais afirmamos agora, que um dos aspectos do
apareçam os diferentes papéis e os diferen- compromisso é o compromisso de sua vida
tes objetos de estudo. É necessário, ainda, afetiva e emocional. Com muita frequência,
que as diferentes formações não careçam as emoções que o terapeuta recebe em seu
de adequadas fundamentações antropoló- trabalho transtornam sua afetividade para
gicas, epistemológicas e teológicas. com sua própria família e afetam a sexua-
lidade do casal.
Creio que o trabalho conjunto e integrado
de equipes em que apareçam delimitados É necessário que a saúde se expresse em
os diferentes métodos, todos contribuindo uma variedade de papéis: membro de uma
para a afirmação da fé e saúde do homem, família (filho(a), esposo(a) etc.), membro de
é uma rica possibilidade a ser explorada. uma igreja, amigo das pessoas, terapeuta.
Deve-se considerar, ainda, a importância
A análise psicológica é algo que da participação do terapeuta em lugar
compromete o psicoterapeuta, indepen concreto de culto. É somente a vivência
dentemente dele querer ou não. A comunitária da fé que outorga uma dimen-
preocupação por desarticular a culpa pato- são real à crença.
lógica, a tarefa de discriminar as fantasias
e a realidade, com frequência, leva o tera- O episódio relatado em Atos 21:37-40, onde
peuta a reduzir sua atitude de fé. Paulo fala em grego ao comandante do
batalhão e em hebraico aos judeus dizendo
Para lidar com estes fenômenos, sugiro que “irmãos...”, ilustra o que quero dizer.
o terapeuta, além de ter sua supervisão
terapêutica, deveria manter sua supervisão
pastoral. Muitas vezes, o apoio pastoral na
100
Nós, os psicoterapeutas, temos uma lingua- A capacidade para usar uma linguagem
gem técnica e que entendemos claramente simples, traduzindo elementos técnicos a
dentro de parâmetros científicos – que uma linguagem usual da igreja, demons-
com frequência não é entendida por lei- trará seu interesse. Escutar o pastor em suas
gos. E também, com frequência, tem se inquietações, desenvolver palestras nas
convertido numa tribuna antirreligiosa, quais se apresentem casos concretos para
dando ênfase aos aspectos conflitivos da se analisar problemas de aconselhamento
Igreja. Deste modo, tem-se esquecido o pastoral serão formas por onde se poderá
valor fundamental que a religião tem em ir elaborando esta comunicação entre psi-
toda civilização, como reestruturadores do coterapeutas e pastores.
campo psicológico.
Fonte: o autor.
MATERIAL COMPLEMENTAR
Escarafunchando Fritz
Frederick S. Perls
Editora: Summus Editorial
Sinopse: Autobiografia em que Frederick S. Perls, criador da
Gestalt-terapia, deixa fluir seu foco de consciência e “escreve
tudo que quiser ser escrito”. Parte em forma poética, muitas vezes
divertido, o livro é um mosaico multifacetado de memórias e
reflexões sobre sua vida, bem como um interessante relato de como surgiram as ideias e os conceitos
que deram origem e fizeram evoluir a Gestalt-terapia.
Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR
Tornar-se Pessoa
Carl R. Rogers
Editora: Martins Fontes
Sinopse: Este livro constitui uma introdução indispensável ao
processo do tornar-se. Destina-se não apenas a psicólogos e
psiquiatras, mas a todos os que se interessam pelo desenvolvimento
do homem e de sua personalidade.
REFERÊNCIAS ON-LINE
¹Em: <https://psicoativo.com/2016/04/john-b-watson-biografia-experimentos-beha-
viorismo.html>. Acesso em: 26 set. 2018.
²Em: <https://psicologado.com/abordagens/humanismo/exemplificacoes-sobre-as-
--leis-da-gestalt>. Acesso em: 26 set. 2018.
³Em: <https://psicologado.com.br/abordagens/humanismo/gestalt-leis-da-gestalt>.
Acesso em: 26 set. 2018.
⁴Em: <http://sinopsenetflixbr1.blogspot.com/2016/08/o-senhor-das-armas.html>.
Acesso em: 26 set. 2018.
⁵Em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Gestalt_cierre.png>. Acesso em: 26
set. 2018.
⁶Em: <https://ppunipar.wordpress.com/2016/07/02/gestalt-lei-do-fechamento/>.
Acesso em: 26 set. 2018.
⁷Em: <https://designculture.com.br/leis-da-gestalt-unificacao-e-fechamento>. Aces-
so em: 26 set. 2018.
GABARITO
1. C.
2. A.
3. D.
4. A.
5. B.
6. C.
7. D.
8. B.
9. A.
10. C.
Professor Dr. Carlos Tadeu Grzybowski
III
OS PRINCIPAIS CONCEITOS NA
UNIDADE
PSICOLOGIA E SUA APLICAÇÃO
NA TEOLOGIA PASTORAL
Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender o que é a percepção humana e como ela atua em
nosso comportamento.
■■ Entender a motivação humana e sua conexão com as necessidades
básicas.
■■ Analisar como o afeto e as emoções interferem na conduta.
■■ Conhecer o funcionamento da memória e sua atuação na
aprendizagem.
■■ Conceituar inteligência e personalidade.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ A Percepção Humana
■■ A Motivação e as Necessidades Humanas Básicas
■■ O Afeto e as Emoções
■■ A Memória e a Aprendizagem
■■ A Inteligência e a Personalidade
109
INTRODUÇÃO
fica bloqueado!
Quantas vezes temos que realizar alguma tarefa e não nos sentimos moti-
vados para isso; já em outros momentos parece que temos muita disposição e
energia – você já parou para se perguntar o por quê? De onde vem a nossa moti-
vação para o trabalho e para outras tantas atividades que realizamos diariamente?
E aquela máxima que ouvimos muito ao longo de nossas vidas: “homem
não chora!” Será que ela é verdadeira? Esse conceito popular de que as mulhe-
res são emocionais e os homens são racionais, de onde provém? Tem alguma
base científica nessa afirmação ou trata-se somente de um mito que não deve
ser levado em consideração?
Talvez você já tenha se apaixonado algum dia e ficou se perguntando: exis-
tem tantas pessoas no planeta e o que nos faz encantar-se por uma pessoa e não
pela que está ao lado? É somente uma questão estética? Mas... e os feios – têm
pessoas que também se apaixonam por eles, e algumas vezes pessoas bem lin-
das. Como explicar essa dimensão do afeto?
Por fim, existem pessoas que consideramos muito inteligentes e já outras pes-
soas, coitadas, nós chamamos de “esforçadas”... mas, ao que exatamente estamos
nos referindo quando chamamos alguém de inteligente? Será só o grau de esco-
laridade que a pessoa tem? Ou serão suas habilidades e talentos?
Estas perguntas são as que tentarei responder ao longo desta unidade, via-
jando pelos recônditos da mente humana! Ficou entusiasmado com a proposta?
Então vem comigo!
Introdução
110 UNIDADE III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A PERCEPÇÃO HUMANA
Além dos estímulos da retina, por meio da luz que incide nos objetos e
se reflete incidindo posteriormente no olho humano, denominado de
forças externas (...) o homem está sujeito a forças internas de organiza-
ção que estruturam as formas em determinada ordem. Essas forças in-
ternas de organização da mente humana estão baseadas em constantes
denominadas “padrões” ou leis de organização da forma perceptual da
Gestalt. (...) são essas forças ou esses princípios que explicam porque
vemos as coisas de uma determinada maneira e não de outra (WA-
CHOWICZ; ARBIGAUS, 2003, p. 97-98).
não requer ser explicado, mas que se justifica por si mesmo. Entretanto, nem
sempre existe uma correspondência entre a realidade física e a nossa percepção
desta realidade.
Por exemplo: no clássico filme “O Pescador de Ilusões” (The Fischer King),
há uma cena em que um dos atores (Parry – Robin Williams) convida seu amigo
(Jack – Jeff Bridges) para deitar-se à noite no Central Park e “mover as nuvens
com o poder do pensamento”. Ambos ficam olhando para a lua e o céu parcial-
mente coberto de nuvens, que dá a impressão de que a lua se move em velocidade,
quando, na verdade, são as nuvens que estão se movendo.
Todos nós já experimentamos também “quão longe” é um banheiro quando
estamos com dor de barriga ou “quão rápido” passa um minuto de diversão.
A Percepção Humana
112 UNIDADE III
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redor acontecendo neste exato momento, que sequer nos damos conta, como,
por exemplo, um barulho do lado de fora da porta.
As portas sensoriais que nos colocam em comunicação com o meio ambiente
nem sempre estão abertas de par em par. Umas abrem-se e outras se fecham em
função do que o organismo necessite fazer em cada instante. Os mecanismos de
atenção encarregam-se de filtrar a informação que nos chega, reforçando alguns
de seus aspectos e ignorando ou minimizando outros.
Nosso cérebro, ao mesmo tempo em que registra, também interpreta, orga-
niza, completa e retifica os estímulos de acordo com nossos desejos, necessidades,
experiências e imaginação. Experimentos têm demonstrado que a percepção de
fatos e objetos se desfigura por temores, desejos e expectativas. Em geral, perce-
bemos aquilo que estamos preparados ou dispostos. Esse é, por exemplo, o caso
de pessoas que sofrem de anorexia e bulimia – embora magérrimas, estas pes-
soas se olham no espelho e veem a imagem de uma pessoa obesa:
Distorção da imagem corporal é uma alteração da sensopercepção
(percepção de si mesmo) e está presente nas pessoas com anorexia
nervosa, como critério diagnóstico inclusive. A percepção distorcida
do corpo é a única distorção que essas pessoas têm da realidade, sen-
do que invariavelmente se sentem e se percebem mais gordos do que
são. Essa percepção distorcida não se modifica, quando o profissional
utiliza técnicas de influenciação ou persuasão para “convencer” seu pa-
ciente da real imagem (CABRERA, 2006, p. 376).
Da mesma forma, resistimos à percepção do que nos desagrada. Existe muita ver-
dade no ditado popular que afirma: “Não existe pior surdo do que aquele que não
quer ouvir, nem pior cego do que aquele que não quer ver”. Tem se demonstrado
A Percepção Humana
114 UNIDADE III
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Só quero repassar algumas características principais de uma estrutura
(ANDRADE, 2016, on-line)2.
1. Todas as partes de uma estrutura (ou Gestalt) têm seu valor
específico somente em uma configuração única. Uma estru-
tura é percebida antes pela relação constante entre suas partes
que pela soma delas.
2. Uma estrutura não pode dividir-se em seus elementos sem que
perca seu significado como uma totalidade e sem que mude
o valor de cada parte.
3. Ao mudarmos uma parte significativa de uma estrutura, muda-
mos o todo. Se acrescentar uns poucos elementos que alteram
a estrutura básica, a figura muda por completo. Ao contrário,
pode-se acrescentar muitos elementos secundários e a figura
permanece inalterada.
4. Podem-se mudar todos os elementos sem mudar a gestalt, sem-
pre e quando a estrutura ou desenho tenha sido respeitado.
5. Percebemos os objetos sempre em um contexto. A este con-
texto conhecemos com o nome de fundo, cenário ou ambiente.
Este fundo influi poderosamente na maneira como percebe-
mos os estímulos.
6. A relação entre figura e fundo não é permanente. Em qual-
quer momento, o fundo pode destacar-se e converter-se em
figura. Isto é, o enfoque de nossa atenção sobre um objeto faz
com que este se converta em figura. Como o enfoque da aten-
ção não é permanente sobre um só objeto, a relação de figura
e fundo não é permanente.
A Percepção Humana
116 UNIDADE III
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Existem, também, fatores sociais que interferem em nossa percepção da reali-
dade, dentre os quais destacamos a sugestão e a influência do grupo. A sugestão
é a ação de dominar a vontade de outra pessoa, levando-a a atuar em determi-
nado sentido. O poder de sugestão sobre uma pessoa é muito grande na hipnose.
Como sabemos, a hipnose é uma espécie de sono artificial induzido, no qual a
pessoa perde o domínio de sua vontade e atua de acordo com as ordens do hip-
notizador. Uma pessoa hipnotizada é capaz de perceber coisas que não existem
ou percebê-las de forma muito estranha. Por exemplo: se o hipnotizador lhe diz
que faz frio, mesmo que esteja muito calor, a pessoa hipnotizada irá tremer de
frio, ou se lhe der água para beber e lhe disser que é leite, a pessoa hipnotizada
a perceberá como tal (SOUZA FILHO, 2007).
A influência do grupo consiste na força que tem a comunidade ou o con-
junto de pessoas achegadas sobre o indivíduo. Essa força é capaz de mudar a
forma da pessoa perceber o mundo. A Psicologia Social reconhece um fenômeno
muito comum em grupos e reuniões massivas, que é a perda da individualidade,
a ponto das pessoas atuarem na direção que “todos” atuam. Conceitos como “his-
teria coletiva” e “psicologia de massas” surgiram da análise destes fenômenos.
Sabe-se que um grupo de pessoas pacíficas pode tornar-se um bando criminal
por influência social num dado momento (FREUD, 1976).
Nos grupos de adolescentes, é muito comum que eles se comportem de
acordo com o que o grupo acredita como valores importantes, como, por exem-
plo, nos modelos estéticos:
OS ENGANOS DA PERCEPÇÃO
A Percepção Humana
118 UNIDADE III
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disso, tem suas aplicações práticas, como a maquiagem, por exemplo. Diz um
ditado popular que “não existe mulher feia, só mal maquiada”. O cinema tam-
bém não é outra coisa, além de uma ilusão de movimento, já que consiste em
uma série de fotografias imóveis que passam em sequência por uma lente a uma
determinada velocidade (AZAMBUJA, 2015).
Enquanto as ilusões são frequentes nas pessoas normais, as alucinações são
raríssimas. Alucinações são casos de percepção imaginária. Consistem em “cap-
tar” um estímulo quando, na realidade, este estímulo não existe. Uma pessoa
que sofre de alucinações está certa de ouvir, ver ou tocar algo, quando objetiva-
mente não existe tal realidade. Existem enfermidades que se caracterizam por
alucinações, tais como a paranóia; o uso de certas drogas também ocasiona alu-
cinações. Pessoas que sofrem de alucinações necessitam de tratamento e cuidado
especial (SANTOS, 2006).
Um tipo especial de alucinação “normal” ocorre após a perda de uma pes-
soa querida e se tem visões, ou sente-se o perfume, ou os passos do falecido. Isso
tem mais a ver com a memória que está reativada pelos processos emocionais do
que pelos órgãos dos sentidos. Tais pessoas estão fragilizadas pela perda e, assim,
a memória dela “prega peças” perceptivas, que se confundem com a realidade
externa – o grande perigo nesse momento é a pessoa fragilizada ser influen-
ciada por outras pessoas, que tais fenômenos são de ordem do sobrenatural e
não como reações normais a uma perda significativa (MALDONADO, 2005).
Bem, estimado(a) aluno(a), iniciamos nosso passeio pelos subúrbios da mente
humana conhecendo os fenômenos perceptivos. Você gostou? Espero que sim! Então,
convido você a visitar outro setor da mente que é o das motivações. Vamos junto?
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lho, por isso que incentivo tem grande influência na indústria moderna:
Muitas vezes, uma pessoa tem o desejo de realizar algo para evitar uma pu-
nição, ou para conquistar uma recompensa. Nestes casos, a iniciativa para
a realização da tarefa não partiu da própria pessoa, mas de um terceiro
(fator extrínseco), que a estimulou de alguma forma para que ela se movi-
mentasse em direção ao objetivo pretendido (...). A pessoa não teria cami-
nhado em direção ao objetivo caso não houvesse a punição ou a recom-
pensa. As pessoas podem, também, agir levadas por um impulso interno
(fator intrínseco), por uma necessidade interior. Neste caso, existe vontade
própria para alcançar o objetivo, existe motivação (BUENO, 2002, p. 6).
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humano está desejando algo, porque é um animal volitivo e raramente alcança
um estado de completa satisfação, ele afirma: “O homem é um animal desejante
e raramente atinge um estado de completa satisfação, exceto por um curto perí-
odo de tempo. Assim que um desejo é satisfeito, outro explode e assume o seu
lugar” (MASLOW, 1954, p. 69).
Autorrealização
Estima
Amor e pertença
Segurança
Fisiológica
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como o desejo de obter confiança, competência, perícia, suficiência, autonomia e
liberdade. A estima por parte dos demais inclui conceitos como prestígio, reco-
nhecimento, aceitação, deferência, status, reputação e apreço. Uma pessoa com
suficiente autoestima é mais segura, mais capaz e, portanto, mais produtiva.
A identificação da necessidade psicológica referente a crescimento, desen-
volvimento e utilização do potencial foi denominada por Maslow (1954) de
Autorrealização ou atualização do eu:
Necessidades de autorrealização ou autoatualização – compre-
endem a ideia, defendida por muitos autores (como Jung, 1987, por
exemplo), de que as pessoas têm um potencial interno que necessi-
ta tornar-se ato. Maslow dedica dois capítulos à autorrealização, nos
quais mostra dados colhidos a partir de análises biográficas de figuras
históricas, estudo de pessoas contemporâneas de destaque e jovens
que pareciam estar se desenvolvendo rumo à autoatualização (DOS
REIS SAMPAIO, 2009, p. 9).
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funcionamento.
6. Riqueza: diferenciação, complexidade.
7. Simplicidade: honestidade, transparência, abstrato, essencial.
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O AFETO E AS EMOÇÕES
A característica mais importante que distingue o ser humano dos animais é sua
capacidade de raciocinar. Entretanto, suas reações emocionais surgem cronológica
e fenomenologicamente antes da razão e da reflexão. O papel que desempenham
na conduta é enorme, muitas vezes dominam a personalidade, obscurecendo a
razão. Os defensores da psicologia profunda ou psicanálise asseguram que nos-
sos impulsos e emoções são responsáveis últimos pelos nossos atos. Deste ponto
de vista, o ser humano como ser emocional é muito mais importante que o ser
humano como ser racional (MESQUITA; DUARTE, 1996).
Já vimos na Unidade II que, para a psicanálise, os nossos impulsos e emoções
são os responsáveis últimos pelos nossos atos. As emoções não são fenômenos iso-
lados, mas estão em conexão com o todo do nosso ser, de tal forma que indícios
de alterações emocionais manifestam-se por meio de mudanças da respiração; dos
batimentos cardíacos; da pressão arterial; da temperatura do corpo; da secreção glan-
dular e até pode ocorrer uma maior fluidez de energia elétrica na pele, de forma que
as emoções podem ser definidas basicamente com um desequilíbrio do organismo.
Uma definição do que são emoções nos é trazida por Oliveira e Jaques (2008, p. 157):
em atividades sexuais podemos nos excitar etc. Por outro lado, as emoções estão
intimamente ligadas entre si. O amor pode estar associado com a alegria, com
o medo, às vezes com a ansiedade e até o ódio. A ira pode transformar-se em
pena, a vergonha em agressividade etc. Às vezes, dois estados emocionais opos-
tos formam duas faces de uma mesma moeda.
As causas das emoções podem ser muito diversas e tornam-se visíveis por meio
de reações corporais características. As emoções têm uma “linguagem” interna
e outra externa. Algumas “palavras” da linguagem interna são: as mudanças do
batimento cardíaco, a secreção de saliva, as mudanças de temperatura da pele
e muitas outras supramencionadas. A linguagem externa é muito mais visível e
compreensível e consiste em choro, sorrisos, gestos, brincadeiras, gritos, estados
depressivos, imobilidade etc. Existem muitas manifestações emocionais que par-
ticipam de ambas as linguagens (MESQUITA; DUARTE, 1996).
Damásio (2000) afirma que as emoções devem ser entendidas como pro-
cessos e que as mesmas têm um papel fundamental na preservação da vida do
organismo e são determinadas biologicamente por certos mecanismos cerebrais
inatos. Entretanto, o autor ressalta a importância da cultura e do processo de
desenvolvimento da criança na modelagem das emoções, na forma de modelar
os aspectos de sua expressão.
O Afeto e as Emoções
130 UNIDADE III
Ainda que seja muito difícil fazer uma classificação das emoções, em geral os
psicólogos diferenciam dois grandes grupos: as “emoções primárias” e os “esta-
dos afetivos complexos”. As emoções primárias representam os aspectos mais
gerais e básicos da vida afetiva. São o prazer e a dor, o agradável e o desagradá-
vel, o bem-estar e o mal-estar; que são variantes do mesmo sentir. As emoções
primárias ou afetos básicos estão diretamente relacionados com as necessidades
básicas. Quando estas alcançam seu objetivo, se produz um estado agradável, de
bem-estar ou prazer, mas quando elas não são satisfeitas (por exemplo: a criança
que tem fome e não recebe ali-
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mento) se produz um estado
desagradável, de mal-estar
ou dor, o qual é conhecido
com o nome de “frustração”
(BERKOWITZ, 1989).
As causas mais graves das
frustrações são encontradas
nos conflitos, ou seja, quando
duas ou mais tendências dis-
putam entre si o predomínio
da pessoa. Por exemplo: um
estudante encontra-se entre
duas situações difíceis: um estudo chato ou a perda do ano. Pode acontecer
também que um mesmo objeto desperte simultaneamente o desejo e a repulsa,
como o caso de uma pessoa que gostaria muito de receber uma promoção de
cargo em sua empresa, mas, ao mesmo tempo, receia que as demandas de uma
nova função lhe roubem tranquilidade e tempo de qualidade.
As frustrações desempenham um papel muito importante na vida, porque
são profundamente sentidas e causam tristeza, temor, ira e até sérias complica-
ções afetivas, dependendo da personalidade da pessoa e da gravidade da situação.
Quando a frustração se agrava ou se repete e não é resolvida de uma maneira
positiva, ela pode causar angústia. Esta é um medo vago e generalizado que
invade a pessoa de forma desagradável quando ela se sente incapaz de enfrentar
as tarefas e situações da vida (MESQUITA; DUARTE, 1996).
As emoções complexas, como o nome indica, são estados afetivos mais ela-
borados, tais como o ódio e o amor, a alegria e a tristeza, o orgulho e a vergonha
etc. Estes tipos de emoções subdividem-se em duas classes: as chamadas emo-
ções-choque e as emoções-sentimento. A emoção-choque consiste em uma
manifestação afetiva violenta, mas pouco duradoura. Por exemplo: um susto
quando um cão avança sobre nós latindo; uma explosão de raiva diante de uma
situação que nos desagrada etc. Este tipo de emoção vem acompanhado de alte-
rações fisiológicas e psicológicas características, como a agitação, a imobilidade
entre outras. A emoção-sentimento é a emoção suave, relativamente estável e
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O Afeto e as Emoções
132 UNIDADE III
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“Chorar de alegria”. A família temia que se mostrasse alegria de
Falsa Tristeza
forma direta, algo ruim iria acontecer. Expressavam por choro.
AFETO
Falsa raiva Brigavam para evitar intimidade.
AMOR
Falsa Raiva, Se estava triste, perturbavam-no até que se irritava. Além disso,
TRISTEZA
ressentimento outro elemento da família “elegia” a tristeza, monopolizando-a.
No estudo das emoções, tem se podido reconhecer certos fatores que, somente
por motivo didáticos, foram nomeados de forma isolada. Na dinâmica real dos
fenômenos vitais, estes fatores encontram-se fortemente entrelaçados uns com
os outros de tal forma que é muito difícil separá-los. Encontramos que os prin-
cipais fatores que influem nas emoções são: a hereditariedade, a maturidade,
a aprendizagem e o inesperado (MALDONADO, 1991).
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A hereditariedade
O Afeto e as Emoções
134 UNIDADE III
A MATURIDADE
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chamada excitabilidade:
■■ Aos três meses: excitabilidade, prazer, pena.
■■ Aos seis meses: excitabilidade, prazer, pena, ira, asco, medo.
■■ Aos doze meses: excitabilidade, prazer, pena, ira, asco, medo, alegria,
afeto (carinho ou amor).
■■ Aos dezoito meses: excitabilidade, prazer, pena, ira, asco, medo, alegria,
afeto, ciúmes.
A Aprendizagem
O ser humano também pode aprender certas reações emocionais por influên-
cia do meio que o rodeia. Esta aprendizagem se dá de diferentes maneiras. As
principais são: condicionamento direto, condicionamento indireto, condi-
ções sociais e identificação:
■■ Condicionamento direto: um condicionamento direto realiza-se quando
um estímulo que provoca uma reação emocional vem associado com outro
estímulo qualquer, em uma quantidade de vezes necessárias para desper-
tar no indivíduo uma reação emocional própria do primeiro objeto, mas
na presença do segundo (como no caso do experimento de Watson com
o menino Albert visto na Unidade I – lembra?).
O INESPERADO
Constitui um forte estímulo tanto para as emoções positivas como para as nega-
tivas. Quando o filho que esteve ausente do lar por muito tempo retorna sem
aviso prévio, sua visita inesperada produz uma impressão emocional forte que
faz com que algumas mães chorem e outras riam.
Bem, agora que caminhamos um pouco pelo campo das emoções e enten-
demos a sua importância no comportamento humano, vamos adiante e vejamos
como estas emoções ficam gravadas em nossa memória e como isso vai gerando
certas aprendizagens que levamos pela vida afora. Sigamos em nossa viagem!
O Afeto e as Emoções
136 UNIDADE III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A MEMÓRIA E A APRENDIZAGEM
Se não tivéssemos memória, apesar dos órgãos dos sentidos, não seríamos cons-
cientes do que vemos, ouvimos ou percebemos, porque os estímulos passariam
através de nós sem deixar impressões. Graças à memória, podemos conhecer o
mundo que nos rodeia e acumular experiências. A memória é a função do orga-
nismo que conserva o passado em forma de experiências e conhecimentos para
usá-los na vida presente e futura.
A memória não é somente uma atividade da mente, mas de todo o orga-
nismo. “Guardamos” o passado em nossos costumes, em nossos hábitos, em nossa
maneira de reagir diante das coisas, na atitude perante a vida etc... Manejamos
diferentes tipos de memória: a que nos faz recordar um acidente que tivemos
há alguns dias; a que nos capacita a recitar uma poesia decorada; a que nos per-
mite reconhecer um amigo em uma foto de 10 anos atrás; a memória habitual
que nos lembra de que almoçamos às 12:00 horas; a que nos permite reapren-
der algo que soubemos algum dia e que requer muito pouco esforço para ativar
tal conhecimento, entre outros.
Por outro lado, não podemos reter tudo na memória. Quando andamos pela rua,
vemos centenas de rostos, ouvimos inumeráveis ruídos, percebemos um grande
número de estímulos, mas só nos lembramos de muito pouco de tudo isso. Nossa
mente armazena, em alguma parte, uma enorme quantidade de informação.
Alguns fatos ou impressões que retemos na memória ficam na superfície ou
no consciente e são facilmente lembrados. Essas impressões são fáceis de recor-
dar porque são mais recentes, são de interesse da pessoa ou estão associados com
aspectos diários da vida. Outras impressões não aparecem espontaneamente,
mas depois de algum esforço. Podemos dizer que estas impressões encontram-
-se em uma segunda camada, mais profunda que a anterior. Algumas coisas que
cremos esquecidas, como o nome de uma pessoa, realmente não se perderam,
mas encontram-se em alguma parte da memória. Por último, existem impres-
sões que permanecem em camadas mais profundas e não podem ser lembradas
A Memória e a Aprendizagem
138 UNIDADE III
a não ser sob certas circunstâncias. Muitas destas impressões são guardadas na
memória sem que nos demos conta delas. Alguns psicólogos chamam de incons-
ciente esta terceira camada (IZQUIERDO, 1989).
A memória atua dinamicamente e está em contínua atividade. Comprovamos
isto no seguinte exemplo: uma pessoa se esquece do nome de um amigo que
encontra na rua; faz um esforço para lembrá-lo, mas não pode; por fim decide
deixar de esforçar-se para lembrar. Então, repentinamente, o nome da pessoa apa-
rece de súbito e de forma bem clara em sua mente. É como se a mente estivesse
“procurando” no subconsciente ou no inconsciente o que não pode encontrar
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
conscientemente.
Também a memória, como já visto com as outras dimensões da mente
humana, não está desconectada do TODO de nosso ser, antes tem ligação íntima
com as emoções, as motivações, as percepções etc:
Que efeito uma espantosa capacidade de memória tem em outros as-
pectos da personalidade, nos hábitos de pensamento e imaginação de
um indivíduo, em seu comportamento e desenvolvimento da persona-
lidade? Que mudanças ocorrem no mundo interno da pessoa, nas suas
relações com os outros, no seu estilo de vida, quando um elemento do
seu psiquismo – sua memória – desenvolve a um ponto tão incomum
que começa a alterar cada um dos outros aspectos de sua atividade?
(LURIA, 1968, p. 13).
A Memória e a Aprendizagem
140 UNIDADE III
O ESQUECIMENTO
A memória do ser humano não age como um viajante inexperiente que enche sua
mala com todos os objetos que estão à mão, mas como aquele que sabe escolher seu
equipamento e seleciona o que levar consigo, colocando na mala somente aquilo
que vai ser útil durante a viagem. Se não esquecêssemos, viveríamos em um con-
tínuo estado de confusão. Esquecer também é essencial para sobrevivermos. Por
outro lado, nem tudo que percebemos podemos reter na memória. Grande parte do
que vemos e ouvimos não assimilamos ou “perdemos” depois de haver aprendido.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Além disso, as impressões que são guardadas na memória podem sofrer deforma-
ções. Estes fenômenos também podem ser considerados com “esquecimentos”:
Muitas pessoas acreditam que o esquecimento seja algo ruim, indeseja-
do, e afirmam que gostariam de ter uma memória melhor. Isso é perfei-
tamente compreensível, se pensarmos nas diversas vezes em que fica-
mos frustrados por esquecermos de algumas coisas, como um conteúdo
que caiu numa prova ou o telefone de uma pessoa que conhecemos.
Todavia, um outro aspecto do esquecimento, aquele que diz respeito
às vantagens de esquecer, é frequentemente negligenciado. Imagine se
você tivesse uma memória perfeita e se lembrasse de absolutamente
tudo aquilo que já vivenciou. Embora imaginar tal fato seja um tanto
quanto difícil, uma conclusão pode ser tirada: você não conseguiria ter
ideias do genérico, não conseguiria trabalhar com o abstrato, você seria
“escravo do particular” (PERGHER; STEIN, 2003, p.130).
A APRENDIZAGEM
A Memória e a Aprendizagem
142 UNIDADE III
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cos, mas sim mentais. Podemos afirmar que o homem sabe “calcular” as coisas
para não errar.
Os animais superiores não aprendem somente por ensaio-erro, mas usam
também algum tipo de discernimento e este tipo de aprendizagem também é a
que predomina no ser humano. O homem se vale de princípios gerais extraídos
das situações concretas e das experiências passadas fazendo abstrações e, tam-
bém, podendo fazer transferência de conhecimentos que tem em um campo
determinado e aplicá-lo em outro. Podemos afirmar que a maior parte da apren-
dizagem humana deve-se a reações inteligentes:
Aprendizagem, também, relaciona-se à vivência individual. Remete ao
uso de conhecimentos e experiências passadas que foram incorporadas
pelo indivíduo, auxiliando-o em suas novas aquisições. Este passaria
a aprender, segundo esta perspectiva, de acordo com aquilo que já vi-
venciou, e tal aprendizagem seria capaz de nortear sua ação futura (JU-
NIOR; BORGES-ANDRADE, 2008, p. 224-225).
Alguns animais superiores aprendem por imitação, e no ser humano esta é uma
maneira importante de aprender. Já vimos que desde criança temos a tendência
de imitar para aprender e sermos aceitos no grupo ao qual pertencemos. Acima
de tudo, entretanto, o ser humano vale-se da linguagem para realizar sua apren-
dizagem, ou seja, tem a capacidade de expressar-se gráfica e verbalmente, fator
que não possuem os animais (pelo menos não no grau que possui o homem) e
isto faz toda a diferença entre a aprendizagem animal e a aprendizagem humana
(SOUZA et al., 2013).
A maturação
fisicamente para que possa aprender. Por exemplo: para uma criança aprender
a caminhar necessita de certa maturação de todo seu corpo, especialmente de
suas extremidades inferiores – e neste caso, não devemos confundir maturação
com maturidade. Maturidade, ou que também podemos chamar de maturação
emocional, é também um elemento necessário para certas aprendizagens, como
aprender a aceitar os demais tais como são e amá-los com todos os seus defeitos.
Antigamente, havia firmemente a ideia de que quanto mais prática, mais apren-
dizagem ocorria, sendo essa considerada como o principal requisito para a
aprendizagem. Hoje em dia, sabe-se que nem sempre aprende melhor aquele
que mais praticou, mas sim pessoas que estão altamente motivadas e que gos-
tam do que fazem.
A prática tem uma posição importante, especialmente na aprendizagem de
atividades que requerem movimento, pois, para aprender certas coisas, necessi-
ta-se de repetição do mesmo ato até fixá-lo. Vemos a importância da prática na
formação dos hábitos, que é uma das formas mais comuns de aprendizagem. Por
exemplo: aprendemos a dirigir um carro, por meio da prática.
A Memória e a Aprendizagem
144 UNIDADE III
O discernimento
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
mente intervém na aprendizagem para “selecionar” os estímulos que quer reter.
As motivações
A INTELIGÊNCIA E A PERSONALIDADE
A inteligência parece ser o dom mais elevado que o ser humano possui, já que
ela nos diferencia dos animais. Ao mesmo tempo, dizemos que os cachorros e
os cavalos são animais mais inteligentes. No plano humano se afirma que uma
pessoa é mais inteligente que outra, porque pode realizar certo tipo de atividade,
ou porque pode aprender com maior facilidade as lições da escola. Como vemos
nos exemplos citados, a inteligência é um aspecto da experiência humana muito
difícil e complexo de definir, pois pode ser visto de diferentes ângulos e porque
encerra uns cem número de fatores e capacidades humanas. Segundo Miranda
(2002, p. 19), “na linguagem comum, a palavra inteligência refere uma qualidade
dos indivíduos. Na linguagem científica, refere uma qualidade do comportamento”.
Em primeiro lugar, a inteligência não é igual ao acúmulo de conhecimentos.
Uma pessoa com conhecimentos enciclopédicos e com vários títulos acadêmicos
não é, necessariamente, mais inteligente que outros que não tiveram a oportuni-
dade de escolarizar-se. A inteligência dependerá do uso que a pessoa faça de seus
conhecimentos e da forma que os relacione e os aplique na vida prática. Sendo
A Inteligência e a Personalidade
146 UNIDADE III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A inteligência é o resultado da interação de fatores psíquicos, biológicos e
sociais. Entre os fatores psíquicos, encontramos a atenção, a memória, a com-
preensão, a imaginação, a associação de imagens, o raciocínio, a capacidade de
síntese etc. Os fatores biológicos que intervêm na inteligência são, entre outros,
a herança, o sistema nervoso e a atividade das glândulas endócrinas. Entre os
fatores sociais, podemos enumerar o meio ambiente, a formação cultural, a posi-
ção econômica, as circunstâncias do momento etc. Embora possamos nomear
todos estes fatores, não podemos separá-los, nem sequer considerar que atuam
de forma isolada. Todos estão inter-relacionados, interferindo uns sobre os
outros e atuando como uma unidade. Desta forma, podemos dizer que a inte-
ligência não depende tanto da soma de capacidades como da harmonia entre
elas (MIRANDA, 2002).
INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS
Desta forma, Gardner (1994) conclui que existem sete tipos de inteligência, a saber:
1. Lógico-matemática: é a capacidade de realizar operações numé-
ricas e fazer deduções;
2. Linguística: é a habilidade de aprender idiomas e de usar a fala
e a escrita para atingir objetivos;
3. Espacial: é a disposição para reconhecer e manipular situações
que envolvam apreensões visuais;
4. Físico-cinestésica: é o potencial para usar o corpo com o fim
de resolver problemas ou fabricar produtos;
5. Interpessoal: é a capacidade de entender as intenções e os dese-
jos dos outros e, consequentemente, de se relacionar bem em
sociedade;
6. Intrapessoal: é a inclinação para se conhecer e usar o entendi-
mento de si mesmo para alcançar certos fins;
7. Musical: é a aptidão para tocar, apreciar e compor padrões
musicais.
A Inteligência e a Personalidade
148 UNIDADE III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Uma das consequências da valorização da inteligência lógico-matemática
é a tendência de definir o desempenho do aluno mais pelo que ele não é
do que pelo que é. Você acha que isso pode começar a ser mudado? Como?
(Márcio Ferrari)
A PERSONALIDADE
A personalidade não pode ser medida nem pesada, mas deduzida a partir
do comportamento do indivíduo. Porém, o resultado obtido na observação da
conduta de uma pessoa num determinado momento não nos dirá como é sua
personalidade, porque teremos observado somente certos traços da mesma mani-
festados naquele instante. A atuação da personalidade em diferentes momentos
da vida e em diferentes circunstâncias nos revelará outros traços. O conjunto
destes traços, qualidades e condutas nos levarão a formarmos um juízo do que
é sua personalidade, sem, contudo, termos uma noção completa e absoluta-
mente correta de toda a personalidade de um indivíduo (HALL; LINDZEY;
CAMPBELL, 2000).
Se personalidade, desde o ponto de vista psicológico, inclui todo o con-
junto de qualidades, traços e condutas de uma pessoa, realmente é um conceito
muito amplo e muito complexo. A totalidade dos traços que compõe a persona-
lidade pode ser observada somente quando existe certa continuidade no tempo.
Ademais, a conduta de uma pessoa desenvolve-se em vários planos: o social, o
político, o religioso, o familiar, etc. Em cada um deles, a personalidade se mani-
festa de forma particular. Encontramos, então, a dificuldade de formular uma
definição exata de personalidade:
Assim, acreditamos que a personalidade é definida pelos conceitos empí-
ricos específicos que fazem parte da teoria da personalidade empregada
pelo observador. A personalidade consiste concretamente em uma série
de valores ou termos descritivos que descrevem o indivíduo que está
sendo estudado em termos das variáveis ou de dimensões que ocupam
uma posição central dentro de uma teoria específica (HALL; LIND-
ZEY; CAMPBELL, 2000, p. 33).
A Inteligência e a Personalidade
150 UNIDADE III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
pessoa. É o conjunto de características que permitem diferenciar-nos dos outros
habitantes da Terra (MESQUITA; DUARTE, 1996).
O processo de formação da personalidade inicia com o nascimento (alguns
afirmam com a concepção) e está calcado nas características hereditárias, ou
seja, os caracteres hereditários recebidos de nossos antepassados servem de
“matéria-prima” sobre a qual irá atuar o meio ambiente, modelando e modifi-
cando-nos ao longo de toda nossa vida. Esta integração entre hereditariedade e
meio ambiente pode ser nitidamente observada em gêmeos univitelinos (nas-
cidos do mesmo óvulo) que, em virtude das inúmeras experiências individuais
sofridas ao longo da vida, desenvolvem traços de personalidade bastante dife-
renciados (MALDONADO, 1991).
NORMALIDADE E ANORMALIDADE
dos por ano, isto ocorre a um grande número de pessoas “normais”. Analogamente
poderíamos dizer que, embora não sejam saudáveis, as crises de ansiedade ou
depressão ocorrem em indivíduos “normais”. Da mesma forma, a pessoa que
sofre de resfriado tem de tratar-se para eliminá-lo do organismo, o mesmo
ocorre com alguém que passa por uma depressão e consegue reabilitar-se total-
mente após o tratamento.
Existem certas enfermidades crônicas que necessitam constante vigilância
(como a diabetes, por exemplo). Certos indivíduos também precisam de vigi-
lância mais ou menos constante sobre seus transtornos de personalidade (no
caso de depressões crônicas).
Existem estados de desajuste da personalidade que não estão ligados a fato-
res formacionais da personalidade (na infância), mas sim a crises enfrentadas
na vida real (perdas, violências entre outras). Os seres humanos são animais
sociais e, talvez, a característica mais importante de uma personalidade sadia
seja a capacidade para estabelecer relações profundas e duradouras com outras
pessoas, de forma adulta e madura.
Muitas atitudes dogmáticas, crenças falsas e sarcásticas contribuem para a
manutenção do temor às enfermidades mentais. O mistério inato de suas con-
dições e causas também atormentam as pessoas. É experiência comum termos
nos deparado com alguém cuja conduta nos chamava a atenção pelo padrão
desviante do corriqueiro, à qual denominamos de patológica. Contudo, existem
certos comportamentos que nós não nos atreveríamos a denominar de “loucura”,
mas que também não se enquadram nos padrões usuais (SILVA, 2008).
A Inteligência e a Personalidade
152 UNIDADE III
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
É difícil de entendermos normalidade somente a partir daquilo que é comum
para um determinado grupo humano, pois um soldado que se adapte per-
feitamente às normas de matar todo aquele que não use o mesmo uniforme
deve ser considerado perfeitamente equilibrado, ainda que ceife a vida de seus
semelhantes.
Muitos psicólogos e psiquiatras definem “normal” a partir de um ponto
de vista pragmático: “toda a pessoa que busca ajuda é candidata a um trata-
mento terapêutico e as etiquetas de normal e anormal tornam-se desnecessárias”
(MALDONADO, 1991, p. 233).
Durante muitos anos, o modelo médico elaborado pela psiquiatria definiu
quem era normal e anormal. Esse modelo tinha como pressuposto que todas as
enfermidades mentais se originavam por um mau funcionamento orgânico ou
déficit genético, o que levava a tratar os pacientes em hospitais.
Um movimento contrário ao estabelecimento de padrões do que é normal
ou anormal, denominado de anti-psiquiatria, que tem nas pessoas de R.D. Laing
e Thomas Szasz seus nomes mais expressivos, critica os conceitos tradicionais de
“rotulamento” e tratamentos psiquiátricos propondo o fechamento dos hospitais
A Inteligência e a Personalidade
154 UNIDADE III
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta unidade, procuramos conduzir você por meio das paisagens da mente
humana em toda sua complexidade. Iniciamos esta maravilhosa viagem pelas
trilhas da percepção e como somos enganados pelas mesmas. Parece engraçado
que a realidade é mais do que aquilo que podemos apreender dela, não é ver-
dade? Pensar que existem tantas coisas que “enxergamos com as cores que nossos
olhos dão a elas” parece meio surreal, mas é a pura verdade!
O Bispo anglicano Don Robinson Cavalcanti, em uma conversa pessoal, me
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disse certa vez: “isso resolve o problema da inerrância da Bíblia. A Bíblia é a abso-
luta verdade de Deus, mas como todos seus intérpretes são pecadores e, portanto,
falhos na sua percepção e interpretação, nenhuma interpretação é 100% correta!”.
Nossa viagem também percorreu as paisagens da motivação humana e
como as mesmas estão intimamente conectadas às nossas necessidades. Claro,
não devemos esquecer que a forma que percebemos também está ligada à nossa
motivação: muitas vezes enxergamos o que queremos ver!
Nossas emoções igualmente estão conectadas com o todo de nosso ser, inter-
ferem e são afetadas tanto pelas nossas motivações como pelas nossas percepções
da realidade. A velha piada da diferença entre o otimista e o pessimista revela
isso: o pessimista sempre vê um copo pela metade como “meio vazio”, enquanto
o otimista o percebe como “meio cheio”!
Todas as nossas experiências, sejam elas perceptivas, afetivas, emocionais,
etc., ficam gravadas em nossa memória e vão construindo nossa forma de lidar
com a realidade – que denominamos de aprendizagem. O conjunto de todas
estas habilidades utilizadas para a resolução de novas situações constitui o que
a psicologia chama de inteligência!
Por fim, a integração de todas as nossas capacidades forma aquilo que conhe-
cemos como “personalidade”, que pode adequar-se ou não ao meio em que
está inserida e aí usamos as expressões “normal” e “anormal” para definir essas
adequações.
Agora, convido você a uma “viagem ao novo”, na qual vamos percorrer cami-
nhos diferentes e deslumbrantes – vamos juntos para a próxima unidade!
1. Não percebemos as coisas como elas são, antes como nós somos, porque:
a) Os órgãos dos sentidos não são suficientemente refinados.
b) Nem toda informação que chega a nossos sentidos, em termos de energia
estimulante, é registrada em nossa mente.
c) Nossa mente registra, interpreta, completa e retifica os estímulos de acordo
com nossas necessidades, experiências e imaginação.
d) Existem leis da percepção que obrigam o indivíduo a perceber subjetiva-
mente.
e) A percepção é somente uma projeção do inconsciente.
2. As ilusões e alucinações diferenciam-se no fato que:
a) Ambas se dão em doentes mentais, só que em diferentes graus.
b) Ambas significam diferentes graus de desequilíbrio emocional devido a uma
perda.
c) As ilusões ocorrem em doentes mentais, enquanto as alucinações surgem
em pessoas normais.
d) As ilusões ocorrem em pessoas normais, enquanto as alucinações surgem em
estados de desequilíbrio mental ou em decorrência de perdas significativa.
e) Uma tem origem no Superego e outra no ID.
3. Uma “Gestalt” ou configuração básica é:
a) A soma ordenada de sensações.
b) A soma de elementos intercambiáveis com os de outra gestalt sem perder
seu significado.
c) Um conjunto de elementos em relação constante que formam um todo.
d) Um agregado de elementos simples que, ao unirem-se como elementos
afins, formam uma configuração.
e) Uma falsa percepção da realidade.
4. A motivação, como força que impulsiona um ser vivo, é um fenômeno ligado:
a) Com as necessidades biológicas dos seres vivos.
b) Com as necessidades afetivas dos seres humanos.
c) Com as necessidades intelectuais do homem e da mulher.
d) Com as necessidades totais do organismo em sua complexidade global.
e) Com a memória e as reminiscências.
156
158
O CRISTÃO E AS EMOÇÕES
responsável por aquilo que sente. Muitas um crente nunca deve permitir-se reações
emoções desagradáveis são produzidas emocionais; ou que o pecado é o único
por um mau funcionamento do orga- que produz desordens emocionais; ou que
nismo; quando ocorre uma disfunção das nossos pais são culpados de todos nossos
glândulas endócrinas ou o desequilíbrio mal-estares emocionais. Estas e outras
do sistema nervoso autônomo, gerando ideias errôneas acerca das emoções cau-
mudanças de estados de ânimo. sam sentimentos de culpa e sofrimentos
desnecessários.
Somos seres complexos e são muitos os
fatores que contribuem para nossos esta- Ser cristão não implica em deixar de ser
dos emocionais. Ao mesmo tempo, cada humano e estar sujeito a todas as emoções
ser humano é único no que diz respeito que são normais. É certo que um cristão
às emoções. A idade, a condição física, tem à sua disposição muitos recursos para
a personalidade e muitos outros fatores enfrentar os problemas da vida, mas nem
têm uma influência na maneira como se por isso deixará de sentir e experimentar as
experimentam as emoções. Deus nos deu emoções. Lembremos de que as emoções
a capacidade de usar nosso complexo sis- nos foram dadas por Deus para nosso bem.
tema emocional para benefício próprio;
Passar a vida controlando ou reprimindo as
uma força que nos atraia mais para Ele e
emoções consome muita energia – a pes-
não um meio de destruição, como ocorre
soa que vive deste modo pode desenvolver
com frequência.
um estilo de vida neurótico. Com frequên-
Existem muitas falsas ideias sobre a natu- cia, este controle generaliza-se para todas
reza das emoções. Estas ideias tendem a as emoções. Se não nos permitimos sentir
criar problemas, porque tem o poder de raiva, é possível que também não nos per-
influenciar poderosamente nosso compor- mitamos amar ou ser amados.
tamento. Por exemplo: uma ideia errônea,
Nossa cultura nos treina para controlar
mas muito comum, é de que a ira pode ser
nossas emoções. Necessitamos, então,
acumulada e se não é descarregada perio-
encontrar maneiras de experimentá-las e
dicamente pode nos causar dano. Esta ideia
expressá-las de forma mais livre. Infeliz-
enfoca a ira como algum tipo de energia
mente, para muitos, o único lugar seguro
que pode acumular-se e nos leva a pensar
onde isto pode ocorrer é na relação tera-
que não se pode fazer nada para deter o
pêutica profissional e de confiança. Para o
processo, e que uma vez cheio, o “reserva-
cristão, existe outro lugar onde ele pode
tório de ira” deve ser esvaziado. Emoções
ser completamente ele mesmo e ter plena
simplesmente não se acumulam porque
liberdade para expressar suas emoções: a
não são energias mas sim o produto final
oração. Para muitos cristãos, a oração repre-
de uma série de interações complexas entre
senta, talvez, a experiência terapêutica mais
nossa mente e nosso corpo.
eficaz que encontraram.
Algumas ideias errôneas que com frequ-
Fonte: adaptado de Maldonado (1991).
ência se observam entre cristãos são que
MATERIAL COMPLEMENTAR
A Psicologia Da Percepção
Manuel Jimenez
Editora: Instituto Piaget
Sinopse: Se a percepção humana do meio ambiente parece ser,
ao mesmo tempo, imediata e evidente, ela é, contudo, muito mais
uma construção mental do que um simples dado. Manuel Jimenez
pretende mostrar que os conhecimentos prévios desempenham
um papel importante no momento do processo perceptivo. Ele
ilustra isso por meio do estudo dos testemunhos de fenômenos aéreos raros.
Teorias Da Personalidade
Schultz, Duane P. E Schultz, Sydney Ellen
Editora: Cengage Do Brasil
Sinopse: Repleto de pesquisa e achados atualizados, esta
edição de “Teorias da Personalidade”, de Schultz e Schultz, dá aos
alunos uma introdução clara e convincente a esta área dinâmica.
Organizado por teoria, este texto popular discute grandes teóricos
que representam as abordagens psicanalíticas, neopsicanalíticas,
do curso da vida, dos traços, humanísticas, cognitivas, comportamentais e de aprendizagem social,
enquanto demonstra a influência dos eventos nas vidas pessoais e profissionais dos teóricos no
desenvolvimento dessas teorias. O livro também explora as formas em que questões raciais, sexuais e
culturais desempenham um papel no estudo da personalidade e na avaliação da personalidade e inclui
inúmeros exemplos, tabelas e figuras que aprimoram ainda mais a compreensão do conteúdo pelos
alunos. O último capítulo, “Personalidade em Perspectiva”, integra tópicos explorados nos capítulos
anteriores e sugere conclusões que podem ser tiradas do trabalho dos muitos teóricos.
Divertida Mente
Com a mudança para uma nova cidade, as emoções de Riley, que
tem apenas 11 anos de idade, ficam extremamente agitadas. Uma
confusão na sala de controle do seu cérebro deixa a alegria e a
tristeza de fora, afetando a vida de Riley radicalmente.
MATERIAL COMPLEMENTAR
Pescador De Ilusões
Jack Lucas é um locutor de rádio que fala o quer em seu programa.
Um dia um ouvinte conversa com ele ao vivo, dizendo que conheceu
uma mulher por quem se apaixonou em um bar yuppie. Jack de
imediato descarta que ela tenha se interessado por ele, dizendo
que todos os yuppies deveriam morrer. O ouvinte não pensa duas
vezes: pega o rifle, vai até o bar e mata seis pessoas, antes de se
suicidar. A tragédia provoca forte impacto em Jack, que desaba no
alcoolismo e larga a carreira.
O vídeo a seguir, embora de curta duração, é um trecho de uma palestra do Dr. Thomas
Szsaz, um dos pais da anti-psiquiatria e é importante entender qual o conceito dele de
doença mental! Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=CzQj9V0f9Vs>.
No vídeo a seguir, você pode fazer a experiência de uma ilusão de ótica. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=Rl4jpxB_jug>.
Material Complementar
162
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIA ON-LINE
1. C.
2. D.
3. C.
4. D.
5. A.
6. A.
7. A.
8. C.
9. D.
10. C.
Professor Dr. Carlos Tadeu Grzybowski
IV
A PSICOTEOLOGIA E A
UNIDADE
PERSPECTIVA SISTÊMICA
NA PSICOLOGIA PASTORAL
Objetivos de Aprendizagem
■■ Entender a interface entre a psicologia e a teologia como ciências
que estudam o ser humano e o conceito de psicoteologia.
■■ Conhecer os principais conceitos do pensamento sistêmico e do
pensamento complexo.
■■ Compreender como o pensamento sistêmico se aproxima da leitura
antropológica hebraico-cristã.
■■ Verificar qual a relevância de tais conceitos para uma pastoral.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ A Psicoteologia e a Perspectiva Sistêmica na Psicologia Pastoral
■■ O surgimento de um novo modelo nas ciências
■■ Teologia, ciência e abordagens epistemológicas
■■ Novos paradigmas para novos tempos
169
INTRODUÇÃO
Essa nova forma de fazer ciência traz uma agradável aproximação com a
perspectiva antropológica hebraico-cristã, que entende que a pessoa humana
foi criada para viver em relação com seu próximo: “não é bom que o homem
esteja só” (GÊNESIS 2:18).
Um segundo campo a ser apreciado na interface entre a psicologia e a teo-
logia, a partir da perspectiva sistêmica, é a noção de unidade de unidades
– conceito difícil de ser compreendido dentro da perspectiva cartesiana ociden-
tal. Entretanto, a dimensão relacional proposta na antropologia hebraico-cristã
é exatamente esta: “e eles se tornarão uma só carne” (GÊNESIS 2:24).
O carro condutor que nos levará por esta viagem é o emergente conceito
de transdisciplinaridade, conforme proposto por Nicolescu (1999), que indica
um estudo não somente que aproxima as disciplinas, mas que as atravessa e está
além do campo exclusivamente disciplinar, “e seu objetivo é a compreensão do
mundo presente, para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento”
(NICOLESCU, 1999, p. 51).
Assim, quero propor, nesta unidade, não apenas uma exposição de como a
psicologia entende a pessoa humana, mas um aprofundamento no estudo do ser
a partir de uma forma de pensamento que perpassa a psicologia, a antropologia,
a teologia e outras ciências para emergir em uma nova compreensão da realidade.
Embarque nesse carro-chefe e venha comigo nesta descoberta!
Introdução
170 UNIDADE IV
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
sobre a interface entre psicologia e fé cristã. Entre os expositores do grupo estava
um psicólogo norte-americano chamado J. Harold Ellens e foi justamente ele o
autor desta expressão, já utilizada em seu livro God’s Grace & Human Health.
Posteriormente, este livro foi traduzido para o português e dividido em dois
escritos, a saber: Graça de Deus e Saúde Humana e Psicoteologia, aspectos bási-
cos, ambos editados pela editora Sinodal.
Esse grupo de psicólogos pertencia a uma associação que existe até os dias
de hoje, intitulada Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos. Seus membros
regularmente se reúnem e convidam pensadores para a continuidade da refle-
xão sobre essa interface entre as duas ciências.
É importante ressaltar que o objetivo destes encontros não é criar uma nova
escola de psicologia ou desenvolver uma “psicologia cristã”. A psicologia, como
nós estudamos nas unidades anteriores, ao longo do tempo tem claramente defi-
nido seu campo de estudo, cujo objeto de estudo é o ser humano. Contudo, este
ser tem uma dimensão existencial religiosa – ainda que algumas metateorias ten-
tem reduzi-la ao campo da psicopatologia, intitulando como uma neurose – que
também é parte essencial de sua vida, de forma que a busca do entendimento da
religião cristã torna-se significativa na construção do sentido existencial e valo-
rativo para um grupo expressivo de pessoas, passando a ser campo de interesse
da psicologia. E o diálogo desarmado e fecundo com a teologia, que constrói
tais valores, tem grande relevância na busca da compreensão da integralidade
da pessoa.
Assim, essa discussão tem sido fomentada por pensadores das mais distintas
correntes de psicologia, os quais, a partir dos pressupostos teóricos das escolas
que seguem, refletem quais os benefícios e/ou malefícios que a visão antropo-
lógica hebraico-cristã tem trazido para a pessoa humana. Nesse sentido, essa
discussão tem um caráter essencialmente transdisciplinar e é a partir desta pers-
pectiva que vamos entender esta interseção.
O ponto de partida para a compreensão da transdisciplinaridade é o modelo
sistêmico de reflexão da realidade.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O SURGIMENTO DE UM
NOVO MODELO NAS
CIÊNCIAS
Desde a Antiguidade, o
pensamento científico foi
muito influenciado por uma
visão linear de causa-efeito.
Embora tenha passado por
distintos paradigmas ao longo
da história (ANDOLFI, 1996), a
explicação da realidade geralmente
aconteceu em termos de regras e leis. Os
filósofos gregos procuravam explicar a realidade e os fenômenos da natureza a
partir de um método dedutivo, que partia do universal para se chegar ao parti-
cular, no qual o efeito estava sempre contido na causa. Desenvolveu-se, assim, a
chamada Lógica Aristotélica. Essa lógica serviu de base para toda a construção
da ciência ocidental por séculos. Entretanto, este modelo de abordagem cientí-
fica é limitado em vários aspectos. Para pensadores como Bateson (1987, p. 66),
“a lógica é um modelo medíocre de causa e efeito”.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ças, energias e causas, criando-se leis para definir os fenômenos. Os elementos que
não se encaixavam dentro dos modelos do racionalismo científico eram conside-
rados não científicos e aí se incluíam todo o campo das chamadas “humanidades”
e também o “senso comum”:
É, portanto, uma negação da complexidade humana e um triunfo da
racionalidade instrumental que favorece um desvio da ciência, afir-
mando sua legitimidade de maneira tautológica e sem oposição: é ela
que edita o que é tomado por verdadeiro, tornando-se o critério das
‘boas práticas’ de cuidado, isto é, aquelas valorizadas e autorizadas
pelo sistema. Inversamente, tudo aquilo que não é assim validado
torna-se suspeito, residindo o sucesso na única finalidade do pensa-
mento dominante, com os meios tornando-se a razão dos fins, mes-
mo que numerosas situações contradigam essas ‘verdades’ (PAUL,
2005, p. 74).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
psicanalistas judeus-europeus refugiados), o descontentamento com o modelo
também crescia. Além das questões já mencionadas, agregavam-se outras duas:
1. A visão do feminino dentro da teoria psicanalítica, que começava a ser
vista como vitoriana e preconceituosa numa sociedade que cada vez mais
precisava do envolvimento da mulher no mercado de trabalho. O ingresso
massivo de mulheres no mercado de trabalho competente (que gerou o
que se conhece hoje como a primeira onda da revolução feminista logo
após a Primeira Guerra Mundial), ocupando cargos-chaves e reivindi-
cando direitos em uma Europa com população masculina reduzida pela
guerra, mostrava os limites do modelo freudiano.
2. As noções de saúde mental embutidas no paradigma psicanalítico mos-
travam-se muito específicas ao contexto no qual a teoria foi elaborada.
Comportamentos culturais de tribos e povos distantes do modelo euro-
peu colocavam em cheque a universalidade dos conceitos da Psicanálise.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
é um item de comportamento que comunica algo ao cão e este reage à
comunicação com outro item de comportamento-comunicação. Eis aí,
essencialmente, a diferença entre a psicodinâmica freudiana e a teoria
da comunicação, como princípios explicativos do comportamento hu-
mano. Como se vê, eles pertencem a diferentes ordens de complexida-
de; o primeiro não pode abranger o segundo e nem o segundo pode ser
derivado do primeiro: mantêm-se numa relação de descontinuidade
conceitual (WATZLAWICK et. al, 2011, p. 25-26).
Por fim, a Teoria Geral dos Sistemas, proposta por Ludwig Von Bertalanffy, que
visa o entendimento de uma realidade externa mais complexa e menos contro-
lável de que aquela oferecida pelo modelo freudiano.
O MODELO SISTÊMICO
Este “novo modo de pensar” almeja ser aplicado tanto às ciências exatas como
às ciências naturais e, inclusive, às ciências sociais, parecendo, portanto, propor-
cionar um marco teórico unificador para o conhecimento humano. Engloba no
que Kuhn (1975) descreveu como uma “revolução científica”. Segundo Kuhn,
quando os esquemas conhecidos já não são suficientes para explicar a comple-
xidade do mundo e suas relações, surge a necessidade de novos paradigmas.
Pineau (2005, p. 107), a partir das proposições de Kuhn, afirma que:
[...] por paradigmas entendemos uma matriz disciplinar compreenden-
do o conjunto de elementos práticos (quem investiga o quê?), ideológi-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
cos (por quê?) metodológicos e epistemológicos (como?) que estrutu-
ram e legitimam em um certo momento um campo científico.
Assim, o paradigma sistêmico emerge no campo das ciências para tentar respon-
der as necessidades de compreensão dos elementos complexos vindos à tona a
partir das novas descobertas em várias disciplinas.
A partir da proposição de Bertalanffy, estima-se que o enfoque sistêmico
passou a afetar toda a produção científica, passando a ocupar o lugar das teorias
baseadas na termodinâmica no campo da física e o lugar das teorias mecanicis-
tas no campo da psicologia. Segundo Grzybowski (2005, p. 89-90),
[...] diante do paradigma analítico, fragmentário, mecanicista e de cau-
salidade linear das ciências clássicas baseadas na física de Newton e na
filosofia de Descartes, o enfoque sistêmico implementou a necessidade
da exploração científica de totalidades, de organização, de relações e
das dimensões holísticas do mundo.
de um modelo simplificador
é somente o “saber manipular”,
operacionalizar ou reduzir a simpli-
ficações, admitindo-se que certas “forças”
estão agindo aos pares. “Claro que conhecer, no
decurso dos três últimos séculos, foi muitas vezes identificado
com ‘saber manipular’” (PRIGOGINE; STENGERS, 1984, p. 205). Exatamente
pela dificuldade de se trabalhar com sistemas complexos, a ciência cartesiana
e positivista acaba trabalhando apenas frações do sistema e, como consequên-
cia natural, chegando a conclusões e princípios parciais, o que não impede de
trabalhar com tal conhecimento. Entretanto, o resultado da fragmentação e sim-
plificação é a super-especialização e o não diálogo entre os distintos campos da
ciência, criando, inclusive, linguagens muito específicas para descrever as rea-
lidades parciais.
O enfoque sistêmico tem seu corpo de conceitos que o identifica e explica.
Faremos, a seguir, uma breve descrição dos termos que são de maior relevân-
cia para o estudo do modelo sistêmico em base da didática descrição feita por
Friesen e Grzybowski (2006).
Sistemas e subsistemas
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
que, por sua vez, também contém em si sistemas menores ou hierarquicamente
inferiores (BERTALANFFY, 2008).
Uma forma de exemplificar isto seria o corpo humano, que em si é um sis-
tema vivente, composto de sistemas de órgãos (nervoso, circulatório, respiratório),
que seriam subsistemas do corpo, mas que também são constituídos por órgãos
(cérebro, medula, bulbo, pulmão, coração, entre outros), os quais são constituí-
dos por tecidos e assim consecutivamente.
Homeostase
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■■ Exercer retroalimentação negativa para manter o “status quo”, cujo caso
a homeostase se converte em um meio.
Para tornar claro esse conceito, vejamos o exemplo que segue: um membro de
uma família muda sua conduta e esta mudança desestabiliza (afeta) aos outros
elementos do sistema familiar. Diante desta nova conduta, surgem as reações
(retroalimentações) algumas podem ser positivas - são as que irão apoiar a nova
conduta do membro mutante - desestabilizando ainda mais o sistema. Outras
podem ser negativas, procurando opor-se à mudança, a fim de manter a estabi-
lidade do sistema. A este último esforço, denomina-se homeostase como meio,
para manter o status quo. A este tipo de homeostase chamamos “pura” e tem
sido questionada se, apesar da retroalimentação negativa, produzem mudanças; e
apesar das mudanças, a família, não necessariamente, perde a estabilidade – não
se desintegra – como poderia supor-se. Desta forma, o conceito de homeostase
como um fim, isto é, manter a constância, o status, o equilíbrio das forças inter-
nas e externas, é o que continua em vigência (TIPIA, 2008).
Equifinalidade
Calibração
Este termo é utilizado para explicar o equilíbrio que alcançava uma família
diante de retroalimentações positivas, negativas e outros mecanismos. O uso
do termo homeostase, com o sentido de meio e fim, levantou algumas dúvidas
sobre a capacidade fundamental do ser humano para a mudança sem se dese-
quilibrar. Tal capacidade denomina-se calibração. Podemos fazer uma analogia
com o termostato de uma geladeira.
Suponhamos que o termostato de uma geladeira está calibrado para manter-la
funcionando normalmente (internamente) para um nível de 20 ºC na tempera-
tura ambiente. Ocorre, então, uma subida na temperatura externa. O termostato
irá modificar sua calibração até colocar-se de acordo com o nível “regulado”. O
conflito aparece quando se necessita regulá-lo mais alto ou mais baixo que o
grau de temperatura habitual. Ali se coloca à prova a capacidade calibradora do
sistema. Este experimenta alterações; as retroalimentações continuam sendo
as mesmas; existem razões que impossibilitam colocar de novo o termostato a
20 ºC. Somente permanece a capacidade calibradora do sistema. Aqui entra em
função um procedimento escalonado, dando passos progressivos de ajuste até
obter o ajuste do sistema à nova regulação. Esta analogia serve para observar a
família em um constante calibrar-se às novas regulações. O crescimento de um
filho, o casamento de outro, entre outras coisas, são mudanças reais e inevitáveis.
Uma calibração não escalonada, drástica, desequilibra o sistema (TIPIA, 2008).
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relevância para a psicologia e psiquiatria (TIPIA, 2008).
O sistema estável pode romper-se e, por conseguinte, existem rupturas nas rela-
ções estáveis. Embora esta área do enfoque sistêmico já pertença ao campo da
psicopatologia da família, convém fazer uma revisão sumária das principais for-
mas de rupturas. As principais formas de rupturas do sistema familiar são três
(TIPIA, 2008):
1. A Coalizão, que significa a confrontação de um subsistema contra outro
subsistema ou o sistema total. Lembremos que um subsistema pode ser
formado de um ou vários membros familiares.
2. Coalescência significa um problema comum e orienta a formação de um
grupo, que atuará em coalizão. Por exemplo, agrupam-se os que pensam
que são explorados pelos demais (coalescência) e confrontam (coalizão)
os exploradores reclamando de tal discriminação.
3. A Coagulação significa que um subsistema, em relação ao sistema total,
diante de uma ameaça comum, se estanca. Aparentemente, ocorre uma
integração, mas efetivamente o que acontece é uma postergação da rup-
tura ou conflito até que passe a emergência.
A Teoria Sistêmica hoje não se restringe somente ao campo das ciências humanas,
mas tem pensadores nos campos das ciências exatas, das ciências biológicas e em
todos os outros campos do saber humano, incluindo as artes e a filosofia. Esta incur-
são do pensar sistêmico nos diversos campos da ciência tem recebido o nome de
“paradigmas”, mas que em sua essência vislumbram uma concepção única, ou seja,
a complexidade dos sistemas vivos e a necessidade da análise de suas totalidades e
dos padrões que unificam esta totalidade (ESTEVES DE VASCONCELOS, 1995).
Se quiséssemos apontar a disjunção, falaríamos de diversos “paradigmas”:
diríamos que Morin, por exemplo, tem pensado o “paradigma da complexidade”;
que Prigogine e seus colaboradores têm pensado o “paradigma da instabilidade”
ou “paradigma da ordem a partir da flutuação”; que Von Glasersfeld e Pearce,
entre outros, têm questionado a objetividade e pensado o “paradigma do cons-
trutivismo”, de uma realidade construída. E poderíamos, também, nos referir
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O PENSAMENTO COMPLEXO
A partir da reflexão sobre a Teoria dos Sistemas, o sociólogo francês Edgar Morin
(2006b) postula que a chave de toda a compreensão do enfoque sistêmico está
no conceito de complexidade e propõe uma compreensão da realidade fundada
no entendimento das relações dinâmicas entre as partes que compõem esta rea-
lidade e a totalidade resultante da interação das partes. O termo complexidade já
havia sido utilizado na ciência por pensadores, como o filósofo G. Bachelard, o
criador da teoria da informação Claude Shannon e o matemático e um dos pio-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
neiros da cibernética Warren Weaver. Contudo, foi Morin que desenvolveu os
principais postulados do pensamento complexo e exerceu o papel de seu “grande
artesão”. A ideia de complexidade, antes de ser um postulado teórico ou um para-
digma, está presente no cotidiano ao nosso redor, desde a estrutura do átomo
mais simples à organização das sociedades mais desenvolvidas.
Todo fato tem uma causa que o precede e as mesmas causas, nas mes-
mas condições, produzem os mesmos efeitos. Mas, para conhecer e
analisar, é necessário dividir. A realidade deve não somente existir fora
e independentemente do observador, mas ela deve, também, ser de-
componível e analisável em partes, o todo se recompondo depois pela
soma de suas partes (PAUL, 2005, p. 76-77).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
continuidade e outra geradora de descontinuidade, ou em outros termos, uma
promotora de estabilidade e outra promotora de instabilidade.
Estas duas lógicas não são simplesmente justapostas, mas necessárias uma
à outra, como no caso do organismo vivo, o qual nasce do encontro de um
elemento estável – o DNA, e de um elemento instável – os aminoácidos que for-
mam as proteínas. A proteína instável vive em contato com o meio e permite a
existência fenomênica e o DNA assegura a reprodução. “O princípio dialógico
nos permite manter a dualidade no seio da unidade. Ele associa dois termos ao
mesmo tempo complementares e antagônicos” (MORIN, 2006a, p. 74). O prin-
cípio dialógico não coloca em oposição fenômenos como ordem e desordem ou
natureza e cultura, mas entende os mesmos como simultaneamente concorren-
tes, antagônicos e complementares.
Um terceiro conceito ou princípio-chave do paradigma da complexidade é o
da recursividade organizacional, ou “Princípio Recursivo”, que pode ser compre-
endido como “um processo onde os produtos e os efeitos são simultaneamente
causas e produtores do que os produz” (MORIN, 2006a, p. 74), negando a cadeia
linear de causa-efeito. Tal ideia permeia todos os campos do saber humano, da
biologia à sociologia, passando pela linguagem. Para Morin (2006a), a sociedade
é resultado da interação entre os indivíduos por meio da linguagem e, simul-
taneamente os indivíduos estão sendo formados dentro da sociedade que eles
produziram e que os produz, ou seja, os indivíduos produzem a sociedade que
produz os indivíduos em um contínuo, que visualmente poderia ser represen-
tado em um espiral ascendente que vai se ampliando:
Claro que não se pode explicar de maneira lógica as relações deste todo
e de suas partes e vice-versa. É por isso que se chama pensamento com-
plexo, pois parece não haver uma lógica para estas relações aparente-
mente sistêmicas, é o que Morin denomina a ‘ordem dentro da desor-
dem’ ou a ‘certeza da incerteza’, e é justamente por este motivo que se
chama complexidade (FRANCELIN, 2003, p. 64).
O pensamento complexo não se propõe a ser uma teoria que responda a todas as
inquietudes da ciência pós-moderna, isso porque na essência do próprio para-
digma está incluída, obrigatoriamente, a ideia de que todo o saber é sempre
inacabado e incompleto e, portanto, não poderia haver um paradigma que abar-
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casse a completude dos saberes. “O pensamento complexo também é animado
por uma tensão permanente entre a aspiração a um saber não fragmentado, não
compartimentado, não redutor, e o reconhecimento do inacabado e da incom-
pletude de qualquer conhecimento” (MORIN, 2006a, p. 7).
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TEOLOGIA, CIÊNCIA E ABORDAGENS
EPISTEMOLÓGICAS
Quero trazer a você algumas ideias sobre a interface entre a teologia e os mode-
los sistêmico e da complexidade. Tais pensamentos foram, em parte, publicados
na revista Vox Escripturae (GRZYBOWSKI, 2006) e atualizados pelo autor neste
trabalho.
A ciência tem procurado cada vez mais se conscientizar de que os fenôme-
nos observáveis têm várias formas de serem explicados – a partir de distintas
linguagens, as quais, antes de serem excludentes, nos desafiam a uma compreen-
são ampliada do universo e a uma postura menos dogmática e, por conseguinte,
mais abrangente.
A teologia, assim como a maioria das ciências humanas, por muitos anos
seguiu o modelo das Ciências Naturais, limitando seu estudo e compreensão
pela metodologia com a qual se procurava entendê-la. Em particular, a teolo-
gia hebraico-cristã nasce e se desenvolve a partir de uma concepção não grega
da realidade.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
dentro da rede” (FRIEDMAN, 1997, p. 30-31).
A vida abundante, no conceito trazido por Cristo em João 10:10, não se limita
à ideia da vida eterna e, muito menos, ao conceito da teologia da prosperidade,
em acúmulo de bens materiais, antes enfatiza a perspectiva de saúde integral.
Zandrino (1998, p. 25), em um artigo sobre saúde integral, afirma que “segundo
o conceito judeu, não se separava a saúde física da psíquica nem da espiritual”.
Para Hernandéz (2008, p. 131):
[...] o pensamento sistêmico é um sistema aberto, que se desenvolve de
forma espiral através de conceitos, experiências, incorporando novos
conceitos e experiências. Tem a complexidade acompanhada de flexibi-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Temos, então, que o homem passa a ser visto como uma unidade integral, muito
mais que a soma de vários componentes em associação. Não é mais um estô-
mago que está com uma úlcera, ou um neurótico com os nervos desgastados,
mas uma unidade funcional onde cada fator interfere sobre outro e leva a hege-
monia salutar ou à patologia – unidade, acima de tudo, que tem valores que o
destacam dos demais animais, pois é o único ser portador da Imago Dei.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
NOVOS PARADIGMAS PARA NOVOS TEMPOS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
cas e exatas é limitado para a compreensão dessa interface. Convidei, então, você
a conhecer uma nova forma de pensar a realidade que vem progressivamente
tomando conta dos vários campos da ciência, a partir de meados do século XX,
denominada de Pensamento Sistêmico.
Diante do modelo fragmentário analítico de compreensão do ser, o pen-
samento sistêmico propõe a percepção das complexas interconexões nas quais
cada pessoa está inserida.
Entender a pessoa humana a partir do Pensamento Sistêmico e do Pensamento
Complexo traz uma interessante aproximação com a teologia hebraico-cristã,
conforme rapidamente elucidamos na parte final da unidade e, naturalmente
distancia-se do pensamento filosófico-teológico grego, com sua compreensão
dicotômica Aristotélica da realidade. Entretanto, isso não significa absoluta-
mente a criação de um novo saber humano, antes e principalmente, implica na
utilização de uma nova metodologia, a saber, a transdisciplinaridade, que nos
tira de nossos “guetos de pretenso saber” e nos impulsiona a novas e interessan-
tes construções.
Para finalizar, quero te desafiar, estimado(a) aluno(a), a aprofundar-se na lei-
tura a respeito do pensamento sistêmico e do pensamento complexo e, ao mesmo
tempo, entender como essa forma de compreensão da realidade pode ser extre-
mamente útil para a aplicação pastoral da atividade teológica em favor último
da pessoa humana, razão principal de nosso labor científico.
Considerações Finais
198
O PAPEL DO TERAPEUTA
paciente, isto é lindo, surgem coisas boas”. forma distinta, pois sai da repetição e traz
aspectos novos e criativos de mudanças
A criatividade é gestáltica. Desobstrui, abre, para dentro da família. O terapeuta precisa
cria novas formas e possibilidades de atua- tentar entrar e abrir a família.
ção, novas formas de relação. Isto acontece
assim porque se constata uma mudança O sistêmico é um sistema aberto, que se
sem se importar o porquê fez assim. O apa- desenvolve de forma espiral a partir de con-
recimento da criatividade faz neutralizar ceitos, experiências, ou seja, incorporando
o sintoma e, por fim, desmancha esse sin- novos conceitos e experiências. Tem a com-
toma até desaparecer. A criatividade nasce plexidade acompanhada de flexibilidade. O
de gestalts e com isto já se forma novos outro se manifesta à medida que eu o deixo
modos de se “mover” e se relacionar com o ser, e eu mesmo na medida em que me dou.
meio e no meio. Amplia as relações, aumen-
tando a rede relacional. Os pacientes preferem mais o modelo car-
tesiano, o mais lógico, quer ser enquadrado,
O indivíduo não é algo concreto que se ter um medicamento (isto é concreto e
possa “abarcar”. O indivíduo é uma rede “parece” ser mais direto). O indivíduo tem
de relações, sua família está sob os seus dificuldade de lidar com esta liberdade e
ombros. Não se pode separá-lo de sua famí- abertura. O terapeuta precisa trabalhar esta
lia. E sim, se trabalha com suas más relações. atitude de querer uma resposta. É necessá-
rio construir esta descoberta.
No sentido sistêmico, não se trabalha o indi-
víduo isolado, mas sim aberto à sua família. Fonte: Hernandez (2005).
Então o indivíduo volta se movendo de
MATERIAL COMPLEMENTAR
Mente E Natureza
Gregory Batenson
Editora: Francisco Alves
Sinopse: O livro sintetiza a essência do pensamento sistêmico, no
qual o autor coloca em questionamento a proposta cartesiana de
fragmentar a realidade em partes cada vez menores para se chegar
à compreensão da mesma e propõe um novo paradigma para essa
compreensão, que é a busca pelos padrões relacionais, ou seja, como os elementos da realidade estão
conectados entre si e de que forma a compreensão destas interconexões leva a um conhecimento
mais profundo da realidade.
A Árvore Do Conhecimento
Humberto Maturana E Francisco Varella
Editora: Palas Athena
Sinopse: A nossa vida vista por estes grandes cientistas e filósofos,
como um processo de busca e aquisição de conhecimento
construído ao longo das interações no mundo. Uma concepção
original e desafiadora – criada no rigor científico, mas ao mesmo
tempo na combustão calorosa da insondável e arriscada aventura humana – cujas consequências
éticas começam a ser percebidas com crescente nitidez, que faz repensar a pedagogia, a psicologia, a
sociologia, a economia e a comunicação.
Manifesto da Transdisciplinaridade
Barsab Nicolescu
Editora: Triom
Sinopse: Nicolescu (2001) propõe o surgimento do homem
com espírito investigativo e criativo para que possa situar-se e
reconhecer-se perante o outro como humano em sua dignidade,
a fim de que a educação integral do ser humano harmonize
efetividade, sendo capaz de apontar caminhos a uma vida plena.
A obra contribui para uma reflexão sobre a relevância de novos métodos a serem utilizados por
professores e pesquisadores, que venham a facilitar a compreensão dos eventos a serem registrados,
com os dados coletados que levam ao fazer por meio do pensar
MATERIAL COMPLEMENTAR
Apresentação: uma ecologia da mente – Uma das filhas de Gregory Bateson filmou
um documentário a respeito da obra de seu pai, que é muito elucidador sobre
a centralidade de todo o pensamento sistêmico. O vídeo a seguir tem duração
aproximada de uma hora e mostra a trajetória de um dos maiores pensadores
sistêmicos do século XX – Gregory Bateson.
Disponível em: <https://vimeo.com/142576244>.
Material Complementar
204
REFERÊNCIAS
1. C
2. A
3. B
4. D
5. A
6. C
7. C
8. B
Professor Dr. Carlos Tadeu Grzybowski
V
POSTURAS NO
UNIDADE
ACONSELHAMENTO E
CAPELANIA
Objetivos de Aprendizagem
■■ Levar o aluno ao conhecimento do Movimento de Aconselhamento
Pastoral.
■■ Refletir sobre a importância da utilização dos conceitos de psicologia
no trabalho de aconselhamento e capelania.
■■ Compreender a influência do Movimento de Aconselhamento
Pastoral na realidade da igreja brasileira hoje.
■■ Avaliar os elementos de interseção entre a teologia e a psicologia.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ O Movimento de Aconselhamento Pastoral
■■ Onde a psicologia e a teologia se encontram
211
INTRODUÇÃO
nos ajuda a entender mais profundamente a beleza deste ser criado por um Deus.
Depois visitamos alguns lugares novos, pouco explorados, como a teoria sis-
têmica, o pensamento complexo, a transdisciplinaridade e a psicoteologia, que
para alguns pode ter parecido uma paisagem muito estranha e para outros uma
visão fascinante!
Nesta reta final de nossa empreitada, eu convido você a fazer uma espécie de
“álbum de viagem”! Explico melhor a metáfora: vamos tentar lembrar todos os
conceitos vistos (como se estivéssemos olhando para as fotos de nossa viagem)
e integrar isso no todo de nosso labor pastoral e ministerial.
Naturalmente, esse álbum terá aspectos mais genéricos (o entendimento
geral das pessoas com as quais trabalhamos em nosso dia a dia) e aspectos mais
específicos (a aplicação no aconselhamento e no serviço de capelania dos con-
ceitos vistos até aqui).
Para isso, vamos, primeiramente, situar historicamente o movimento de acon-
selhamento pastoral e as influências que recebeu, especialmente no decorrer do
século XX, das correntes da psicologia moderna. Depois, vamos fazer uma aná-
lise crítica do excesso de “psicologismo” dentro da teologia, causando alguma
descaracterização deste ramo da ciência e gerando alguma confusão termino-
lógica. Finalizando, vamos chegar ao ponto final de nossa viagem, analisando o
ponto no qual a teologia e a psicologia se encontram!
Venha junto nesse trecho final e descubra comigo as aplicações práticas de
tudo que vimos nas unidades anteriores!
Introdução
212 UNIDADE V
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O MOVIMENTO DE ACONSELHAMENTO PASTORAL
OS EXEMPLOS LITERÁRIOS
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
astros, mas se descuida de si mesmo. Aquele que se conhece bem se
despreza e não se compraz em humanos louvores. Se eu soubesse quan-
to há no mundo, porém me faltasse a caridade, de que me serviria isso
perante Deus, que me há de julgar segundo minhas obras? (KEMPIS,
[2017], p. 2, on-line)4.
O reformador Martinho Lutero também possui, entre seus escritos, vários textos
que denotam a preocupação com o cuidado pastoral. Definitivamente, Lutero
mostra-se um homem muito à frente de seu tempo ao propor que a postura
diante dos fracos e frágeis deveria: “não devem abordá-los áspera e grosseira-
mente com insistência e imposição, nem com condenações… mas agir delicada
e cuidadosamente com eles, carregando a sua fraqueza até que se fortaleçam”
(WEINGAERTNER, 2017, p. 3).
O contra-reformista Inácio de Loyola também denota uma preocupação pas-
toral em seus “Exercícios espirituais”, escritos em 1522 e publicados em 1548,
após ser impactado pela leitura de “Imitação de Cristo”, nos quais ele insiste em
que as pessoas devam continuamente examinar a sua interioridade, a fim de bus-
carem uma vida de maior integridade.
Por fim, temos o belo texto do reformador e puritano Richard Baxter sobre o
encargo pastoral. A respeito deste livro, o teólogo contemporâneo Dr. J. I. Packer
descreve o mesmo como sendo um dos melhores escritos sobre temas práticos
e devocionais que o puritanismo produziu.
Desta forma, a história nos revela que a preocupação com a saúde integral da
pessoa humana sempre esteve presente no exercício pastoral da igreja cristã, seja
ela romana, reformada ou ortodoxa. Contudo, como já estudamos nas unidades
anteriores deste livro, houveram mudanças significativas a partir do Iluminismo.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Anton Boisen
Boisen (1995) acreditava que as crises que nos sobrevêm durante a vida tem
imensas possibilidades criativas e trazem mudanças, tanto para melhor quanto
para pior, e que é justamente no meio da crise que ideias novas invadem nossa
mente. Segundo ele, estas ideias podem surgir de forma tão vívida que parecem
vir de uma fonte externa.
Com o apoio e a tutela do Dr. Bryan, o capelão Boisen desenvolveu um pro-
grama no qual os alunos atuavam como atendentes nas alas do hospital e, à noite,
participavam de seminários com ele e com outros membros da equipe profissio-
nal. Esse programa cresceu e recebia anualmente um contingente cada vez maior
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Leslie Weaterhead
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
da personalidade através de Cristo” (BISHOP, [2018], on-line)⁴.
teorias. Newton era um grande cientista, mas não é tratar Newton com
menosprezo ao afirmar que mesmo os alunos secundaristas de hoje sa-
bem mais do que ele afirmou sobre os átomos. O pensamento se move
em todos os campos de pesquisa. - Tradução do autor) (WEATERHE-
AD, 1965, p. 117).
Bem, talvez você esteja pensando que estes sujeitos nos Estados Unidos e na
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Inglaterra, no começo do século XX, não têm nada a ver com a realidade bra-
sileira de hoje em dia. De certa forma, isso é verdadeiro e de certa forma não.
Um fato muito interessante a respeito do tema de aconselhamento pastoral
no Brasil é que essa matéria não fazia parte de nenhum currículo de seminá-
rio cristão, seja evangélico ou católico, até o final dos anos 70, do século XX, ou
seja, de alguma forma, parece que não se dava nenhuma importância ao papel
do pastor/teólogo enquanto conselheiro, acreditando-se que, uma vez que a pes-
soa tivesse uma boa formação teológica, o aconselhamento seria um resultado
“natural” do domínio da teologia.
Jay Adams
Foi com o advento da tradução do livro Conselheiro Capaz, de Jay Adams, que a
temática veio à tona. Entretanto, por um viés bastante conservador, pois Adams
afirmava em seu livro que toda a expressão da psicologia era satânica – embora
sua abordagem reducionista limitasse a psicologia à escola psicanalítica. Chega
a afirmar em seu livro que Freud criou a psicanálise para “vingar-se dos cristãos”
por terem feito bullying com ele quando criança pelo fato dele ser judeu – uma
afirmação deveras imaginativa, haja visto que Freud jamais mencionou tal fato
em seus livros, tampouco isso é mencionado em suas biografias (ADAMS, 1977).
Contudo, o livro de Adams foi rapidamente adotado na maioria dos seminá-
rios evangélicos denominacionais da época e seu conteúdo passou a ser fortemente
disseminado dentro das igrejas como sendo a única forma de abordagem dentro
do aconselhamento – denominado pelo próprio Adams de noutético, ou seja, de
Livros de autores, como Larry Crabb, Gary Collins, David Seamands, Tim LaHaye,
Howard Clinebell, John White e Paul Tournier passaram a fazer parte das estan-
tes das livrarias evangélicas e, gradualmente, foram surgindo autores brasileiros
e latino-americanos, como Daniel Schipanni, Carlos José Hernandéz, Karin
Wondracek, Roseli Oliveira e outros, que também deram contribuições signi-
ficativas ao tema.
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Assim, a temática do aconselhamento cristão cresceu bastante nos últimos anos,
seja no ensino dentro dos seminários, seja na prática pastoral nas igrejas, hospi-
tais e nos outros serviços de capelania. Contudo, junto com todo esse crescimento
vieram também algumas distorções.
Em meados dos anos 90, surge no Brasil, um movimento independente que
promete uma formação e uma titulação dirigida principalmente a pastores inti-
tulada “Psicanálise para pastores”. Essa formação, oferecida inicialmente por uma
instituição específica e hoje oferecida por várias instituições distintas, propunha
formar psicanalistas em cursos com 12 encontros. No conteúdo de seus cursos
tratava de temas que jamais seriam/serão reconhecidos pelas sociedades psica-
nalíticas internacionais (como PNL, por exemplo). A maioria destas instituições
que oferecem tais cursos também não está vinculada a nenhuma das Sociedades
Psicanalíticas reconhecidas mundialmente e que autorizam a abertura de cursos
e certificam a formação de psicanalistas ao redor do mundo.
Cabe aqui um breve esclarecimento: a formação de um psicanalista, em
qualquer sociedade psicanalítica reconhecida, é um processo longo e dispen-
dioso, pois além do postulante, o psicanalista precisa fazer a formação teórica
do curso, além de submeter-se à análise pessoal e, posteriormente, à análise
didática, com sessões semanais (em geral mais de uma sessão por semana) ao
longo de vários anos (em geral de 3 a 10 anos). Isso significa um investimento
altíssimo de tempo e dinheiro, e não se obtém uma formação de qualidade em
cursinhos de poucos encontros (alguns não presenciais) e sem nenhuma super-
visão/acompanhamento do trabalho e do aluno.
CENTROS DE ACONSELHAMENTO
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ONDE A PSICOLOGIA E A TEOLOGIA SE ENCONTRAM
envolvente, exigindo do
cientista uma postura fle-
xível e não dogmática, e
em alguns momentos
mais contemplativa que
dedutiva, na percepção do
que Gabriel Marcel (1952)
denomina de “mistério”.
Marcel indica que há duas
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
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3. em profundidade;
4. com o amor e o interesse de Deus.
de ajuda e pode ser a evidência de uma enfermidade que envolve todo o sistema
familiar – crianças e adolescentes são bons porta-vozes. Assim, antes de catego-
rizar ou diagnosticar, o que precisamos é decodificar o sintoma, ou seja, buscar
compreender o que a pessoa quer dizer com aquilo.
Em quarto lugar, é preciso acolher a pessoa a ser aconselhada com o entendi-
mento de que ela nos foi “encomendada”, ou seja, diante de inúmeras possibilidades
que a pessoa tinha para buscar ajuda, por algum motivo que nos é desconhecido,
ela chega até nós. Em virtude disso, devemos receber a pessoa como ela se encon-
tra naquele momento, sem impor pré-condições para recebê-la ou nos colocando
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caminhar com essa pessoa para ajudá-la a ver alternativas, além daquelas visões
que ela já tentou oferecer sobre a problemática.
Lembre-se de que o conselheiro deve oferecer alternativas, mas a escolha
final do caminho a seguir é sempre do aconselhado.
Por fim, precisamos ter a crescente consciência de que nem todos querem
mudar. Por mais paradoxal que possa parecer, muitas vezes a intenção das pes-
soas não é a de mudança, mas de alguém que referende seu comportamento, que
lhe diga que está certa naquilo que está fazendo (mesmo quando é algo moral-
mente dúbio ou mesmo incorreto). Existem outros que simplesmente vêm ao
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aconselhamento para desqualificar o conselheiro. Com esse comportamento,
tais pessoas realçam sua importância, pois afinal “os melhores conselheiros não
conseguiram ajudá-la”.
Como citado, o comportamento humano é algo complexo e definitivamente
não existem respostas fáceis para o sofrimento humano. Então, podemos nos
questionar: onde está a verdade, na teologia ou na psicologia? Qual descreve
melhor a condição humana?
Diante da complexidade da pessoa humana e do “não saber” efetivamente
tudo que se passa na mente deste ser complexo, utilizaremos de uma linguagem
que está ao nosso alcance para descrever esta realidade. Toda a linguagem con-
diciona a percepção da realidade, entretanto as realidades são sempre descritas
de forma parcial, são fragmentos da verdade, cuja descrição está atrelada a nos-
sas ideologias.
Assim, quando “diagnosticamos” um comportamento dentro de um referen-
cial teórico que “dominamos”, também condicionamos alguma ação a ser tomada
em função daquele “diagnóstico”. Por exemplo: se estou diante de uma pessoa que
se joga ao chão, se retorce e balbucia expressões não inteligíveis, eu posso respon-
der com várias ações: se eu for um médico com uma formação em psiquiatria,
posso afirmar que a pessoa está tendo um “surto” e a minha ação imediata será
medica-la para interromper o surto; entretanto, se eu for um psicólogo de linha
mais humanista, minha tendência será descrever tal conduta como uma “crise” e
o procedimento decorrente disto seria tentar conversar com a pessoa e acalmá-la
até que saia da crise; por fim, se eu for um pastor de transfundo mais fundamen-
talista, eu afirmaria categoricamente que tal pessoa está endemoninhada e a ação
soa, que nos evangelhos é descrito com o nome de amor incondicional. O maior
de todos os mandamentos, segundo Jesus, é o amor, e na passagem de Mateus
22:37-40 ele faz uma equivalência impactante ao afirmar que o mandamento de
amar ao próximo é equivalente ao mandamento de amar a Deus – afirmativa
posteriormente reforçada na epístola de I João 4:12 e 4:20.
Se aquele psiquiatra, aquele psicólogo ou aquele pastor descritos não se dis-
puserem a caminhar com a pessoa que eles “diagnosticaram”. a situação da pessoa
não melhorará (em alguns casos, até irá piorar – Mateus 12:43-45). Essa cami-
nhada pressupõe um interesse, um cuidado, uma atenção diferenciada por esta
pessoa que vem a nós, que misteriosamente nos é encomendada – ou seja, pres-
supõe um amor incondicional!
No amor ao necessitado é onde psicologia e a teologia se encontram!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste último trecho de nossa viagem, nós visitamos dois centros impor-
tantes que deram o início aquilo que hoje conhecemos como o “Movimento de
Aconselhamento Pastoral”.
Da América do Norte, aprendemos que Anton Boisen, a partir de suas pró-
prias experiências de crises emocionais, elabora um currículo de treinamento
de capelães para atenderam, nos hospitais, as pessoas que sofriam de alguma
dificuldade mental.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Na Inglaterra, encontramos o controverso pastor Leslie Weaterhead, que
impactado por suas experiências no oriente e pelas leituras dos escritores psi-
canalíticos, passa a utilizar estas em sua prática de aconselhamento e adapta a
linguagem dos postulados da Psicanálise em seus sermões.
Retornando ao Brasil, constatamos como o tema do aconselhamento chega
ao nosso território tardiamente e por meio da tradução de escritores radicais,
como Jay Adams. Por outro lado, um movimento pioneiro (CPPC) já procurava
estudar a interface entre a psicologia e a teologia.
Concluímos nossa viagem no seu destino final, propósito pelo qual a inicia-
mos, que é saber onde a teologia e a psicologia se encontram, ou seja, na ajuda
à pessoa que sofre. Neste ponto derradeiro, pudemos entender que a complexi-
dade da pessoa humana não permite tratar com a mesma apenas de uma forma
tecnicista, antes é preciso uma nova visão, que contemple dimensões que vão
além do operacional. É preciso acreditar nos potenciais da pessoa, entendendo
que o sintoma que ela apresenta é, muitas vezes, a única possibilidade daquele
momento, acolhendo a pessoa em seu sofrimento e entendendo que, infeliz-
mente, nem todas as pessoas estão dispostas a mudar.
Assim, no nosso destino final, pudemos constatar que tudo que sabemos,
seja no campo da psicologia, da teologia ou de outras áreas da ciência sobre essa
maravilhosa obra da criação que é a pessoa humana, ainda é somente algo par-
cial, o início de uma viagem ainda mais grandiosa e fantástica, a qual podemos
seguir por toda a vida!
Cuidado Pastoral não é um tema novo no vocês mesmos e de todo o rebanho”. Den-
contexto da fé cristã, pelo contrário, é intrín- tro da igreja cristã, tal cuidado é tão antigo
seco à natureza da própria igreja. A Bíblia quanto a própria igreja e é impossível dis-
(2000, p. 890) cita em Atos: “Cuidem de sociar ambas. Blazer afirma que:
[...] o sacerdócio cristão esteve, através da história, entre os primeiros a ou-
vir os problemas emocionais das pessoas. (...) Os pastores viram sua tarefa
como cura de almas e escreviam exaustivamente sobre suas teorias para a
cura de almas feridas. Muitos desses escritos enfatizavam orientação par-
ticular e penitência pública (BLAZER, 2002, p. 64-65).
Entretanto, aquilo que conhecemos hoje Entretanto, também não se deve incorrer
como “aconselhamento pastoral”, como no erro de tornar o cuidado pastoral como
sendo uma das vertentes mais expressi- sinônimo de atendimento psicoterápico.
vas do cuidado pastoral não é algo tão Maldonado (2004, p. 22) afirma que: “As
antigo assim. Segundo o Hurding (1995), diversas abordagens, escolas, teorias e téc-
com o advento do modelo cartesiano como nicas no terreno da saúde mental são – e
padrão para o reconhecimento que qual- sempre têm sido – relativos. As ciências
quer expressão da ciência como “verdade”, são aproximações da realidade e nenhuma
surgem os primeiros intentos de estudo da pode pretender ter a última palavra sobre
relação de ajuda desvinculados do campo o ser humano”.
religioso e estruturados de forma autô-
noma sob a bandeira da psicologia. A partir Embora alguns como Collins (1982) e
de então a psicologia, em suas mais dis- Mulholland (1984) procurem enquadrar as
tintas correntes teóricas, passa a exercer diversas linhas de aconselhamento debaixo
grande influência sobre o campo do cui- de grandes “guarda-chuvas” ideológicos, a
dado pastoral. grande maioria dos escritores que abordam
esse temática não deixam claro de onde
Esta influência não deve ser vista apenas surgem seus pressupostos.
de uma perspectiva negativa, como afirma
Adams (1977), mas como uma contribuição Machado utiliza a expressão “psicoterapia
positiva, desde que delimitados os cam- centrada na Bíblia” e afirma o seguinte:
pos de atuação destas áreas de relação de
ajuda.
[...] toda a técnica psicoterápica centrada na Bíblia tem como propos-
ta uma investigação em profundidade da vida do nosso analisado, para
detectarmos todo seu procedimento que está em desarmonia com as
leis de Deus e tentar mudá-lo, fazendo com que ele venha a entrar em
sintonia com o seu Criador (MACHADO, 1993, p. 110).
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O autor faz uma crítica a várias escolas de Outros autores nem procuram refletir
psicologia, entretanto não consegue afir- sobre o assunto e afirmam que todo cui-
mar com exatidão de que forma construiu dado pastoral nada tem a ver com as teorias
sua metodologia, a qual deixa transpare- e ideologias das correntes psicológicas
cer muito claramente raízes psicanalíticas. modernas. Veja-se o exemplo de Andrade
que afirma:
[...] cura interior não é um processo psicológico, não se faz através de
técnicas de convencimento, não é regressão, não ocorre por meio de
simples orações de intercessão, não é aconselhamento e não é apenas
participar de um grupo de apoio (ANDRADE, 2002, p. 145).
A Árvore da Cura
Roger F. Hurding
Editora: Vida Nova
Sinopse: Este livro divide-se em duas partes: a primeira apresenta o
desenvolvimento das psicologias seculares, com raízes em Freud e
com posteriores ramificações, como a psicanálise, o behaviorismo,
a psicologia humanista e existencialista e as “novas terapias”. A
segunda parte põe diante do leitor a resposta cristã, muito bem representada por figuras como
Anton Boisen (pai de uma teologia pastoral que leva em conta as teorias de aconselhamento e de
psicoterapia), Leslie Weatherhead, Paul Vitz, Jay Adams, Gary Collins, Larry Crabb, Selwyn Hughes, Paul
Tournier, Bruce Narramore e Frank Lake, além de vários outros, de menor expressão no Brasil, cujos
pensamentos, entretanto, também são merecedores de atenção e de estudo.
Gênio Indomável
Matt Damon e Ben Affleck escreveram e estrelaram este drama
sobre o rebelde Will Hunting (Damon), um garoto dotado de grande
inteligência, mas que vive se metendo em encrenca. Sem família e
com pouca educação formal, ele devora livros, mas guarda tudo que
aprende para si e procura empregos que dispensam qualificação.
Um professor do MIT descobre que Will é um gênio e quer o garoto
em sua equipe de matemática, mas, como Will tem problemas com
a polícia, é preciso fazer um acordo com a justiça. São impostas
duas condições: ele tem que trabalhar com o professor e fazer terapia. Sean McGuire (Robin Willians) é
o terapeuta chamado para domar o difícil temperamento do rapaz. Ambos são igualmente teimosos,
mas surge uma amizade que convence Will a encarar seu passado e seu futuro.
Material Complementar
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS ON-LINE
1. C
2. B
3. D
4. B
5. A
6. D
7. A
8. E
9. C
10. A
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CONCLUSÃO
Uma viagem – metáfora que usamos para nos referir ao estudo da psicologia – é
sempre uma oportunidade de conhecermos algo novo. O novo sempre nos gera
alguma apreensão, mas se soubermos nos abrir às possibilidades que se apresen-
tam, teremos muito a desfrutar.
A cada novo local que chegamos, vamos poder conhecer algo daquela cultura,
costumes e forma de ser das pessoas do local. Assim, também quando iniciamos
uma viagem de estudos por um campo do saber humano, vamos conhecendo
novas ideias, novos conceitos e uma maneira nova que os autores enxergam a
realidade.
Numa viagem a um lugar novo, alguns costumes que observamos podem nos
chocar, outros nos farão rir e há, ainda, outros que nos deixarão deslumbrados.
Há sabores que acharemos exóticos e outros definitivamente não nos apetecerão.
Também o conhecimento exposto ao decorrer das unidades deste livro podem
ter causado diferentes impressões aos diferentes leitores. Talvez você tenha acha-
do a psicanálise complicada demais, ou então o behaviorismo muito seco, mas,
com certeza, ao experimentar estes diversos “sabores” que a psicologia oferece,
você pode adquirir um aprendizado único, pois percorrer certos lugares, por si
só já é um aprendizado.
Concluo lançando a você um desafio: que não somente com esta matéria você
trate como uma viagem, mas todas as matérias ao longo do curso! Você estará
caminhando sempre por territórios novos e alguns que podem parecer bastante
estranhos, mas não deixe de percorrê-los. Nem que seja para ao final da cami-
nhada dizer que conheceu um local e não gostou, e que não desejaria morar ali.