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Medcel Ginecologia - Vol 1

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�HE�CEL

Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino


Jader Burtet
Anatomia, embriologia e
malformações do trato
reprodutivo feminino
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Márcia Pereira de Araújo
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Anatomia
Figura 1 - Anatomia do assoalho pélvico feminino

O trato reprodutivo feminino é composto por:

Estrutura pélvica: bacia óssea, ligamentos, músculos e estruturas de


sustentação;
Órgãos Genitais Internos (OGIs): ovários, tubas uterinas, útero e
vagina;
Órgãos Genitais Externos (OGEs): vulva, composta por lábios maiores
e menores, monte do pube (vênus), clitóris, vestíbulo e glândulas
vaginais maiores (Bartholin) e menores (Skene). E, ainda, o períneo e a
membrana himenal ou hímen, que oclui parcialmente a entrada da vagina
após sofrer rotura com o início da atividade sexual, passando a ser
constituída por resquícios, denominados carúnculas himenais;
Mamas.

Neste capítulo, serão abordados, exclusivamente, a estrutura pélvica e os


OGIs e OGEs.

2. Estrutura pélvica

A - Bacia óssea

A pelve é formada por ossos do quadril, sacro e cóccix, formando um anel


ósseo onde são encontrados o sistema reprodutor feminino, o reto e o canal
anal. Pode ser dividida também, didaticamente, em pelve verdadeira (menor)
e pelve falsa (maior). A linha arqueada, ou abertura superior da pelve (estreito
superior), divide a pelve em maior (superior à linha arqueada) e pelve menor
(abaixo da linha arqueada). A pelve verdadeira/menor é formada por 2 ossos
ilíacos, região sacrococcígea da coluna vertebral e sínfise púbica, sendo seus
diâmetros de extrema importância no parto vaginal. Esse assunto será mais
bem abordado em Obstetrícia, devido à sua importância no mecanismo de
parto.
Figura 2 - Bacia óssea

B - Estrutura pélvica muscular – estruturas de


sustentação da pelve

Os músculos da pelve feminina formam 2 importantes diafragmas: pélvico e


urogenital, que participam da formação e sustentação da pelve. Ambos são
importantes para as questões de prova e devem ser memorizados.
O diafragma pélvico é composto pelos músculos coccígeo e levantador do
ânus. Entretanto, o músculo levantador do ânus é formado por 3 músculos:
pubococcígeo, iliococcígeo e puborretal.
O músculo levantador do ânus, estrutura essencial de contenção das vísceras
pélvicas, é o principal elemento do aparelho de sustentação e é composto de 3
porções: mais interna, que circunda as rafes de abertura para os canais uretral,
vaginal e retal, chamada puborretal; e outras 2 laterais, chamadas
pubococcígea e iliococcígea (Figura 3).
O diafragma urogenital é composto pelos músculos transverso profundo do
períneo e esfíncter uretral.
Figura 3 - Aparelho de sustentação da pelve
Figura 4 - (A) Diafragma pélvico e (B) musculatura superficial do períneo

C - Estruturas de suspensão da pelve

O aparelho de suspensão da pelve é formado por ligamentos e composto pelo


ligamento uterossacro e cardinal (cervical lateral/paramétrios ou, ainda,
ligamentos de Mackenrodt). Como são responsáveis pela suspensão da pelve,
estão diretamente relacionados à fixação do útero intrapélvico, ou seja,
quando lesionados acarretam prolapso uterino. Os ligamentos que sustentam o
útero lateralmente são denominados cardinais ou paramétrios. Eles se
estendem das laterais do colo uterino até os ossos ilíacos. Outros ligamentos
também importantes para a suspensão do útero são os uterossacros (Figura 5),
que saem da região posterior do colo uterino e se estendem até o sacro,
mantendo o colo elevado e tracionado posteriormente.

Figura 5 - (A) Aparelho e (B) ligamentos de suspensão do útero: cardinais e uterossacros

3. Órgãos genitais internos


Os OGIs, como já citado, correspondem a ovários, tubas uterinas, útero e
vagina.

A - Vagina

Trata-se de um órgão tubular, constituído de parte muscular e parte


membranosa, que une a cérvice uterina (colo do útero) à vulva (porção distal).
O fórnice posterior, que corresponde ao espaço posterior entre a cérvice
uterina e a parede vaginal, é via de acesso fácil à cavidade peritoneal. Em
repouso, suas paredes estão em contato, deixando apenas uma cavidade
virtual. Tem em torno de 7 a 8cm de comprimento e sofre moldagem durante
o coito e o parto, podendo alongar-se.
A parede vaginal é formada pelas camadas mucosa, muscular e adventícia. A
camada mucosa é revestida por epitélio escamoso pavimentado estratificado
não queratinizado, composto pelas células basais internas, basais externas,
intermediárias e superficiais, e sofre influência hormonal, principalmente
estrogênica:

Sob ausência de estrogênio: predomínio de células basais;


Sob baixo estímulo estrogênico: predomínio de células intermediárias;
Sob elevadas taxas estrogênio: predomínio de células superficiais.

Observe, ainda, que esse epitélio não é glandular. A produção da secreção


vaginal advém das glândulas cervicais e da transudação por esse epitélio.
Anatômica e embriologicamente, os 2 terços superiores da vagina são
considerados genitália interna. O terço inferior da vagina é considerado
genitália externa. Esse conceito é fundamental para a compreensão dos
distúrbios do desenvolvimento sexual que serão explicados neste capítulo.

B - Útero

Trata-se do órgão pélvico, piriforme, de 7x4x2cm de dimensões, responsável


pelo armazenamento do produto conceptual durante a gestação. É dividido em
4 segmentos: fundo (contato com as tubas uterinas), corpo, istmo e cérvice
(porção uterina localizada na vagina). O corpo do útero é a estrutura
responsável por conter a gestação. Segue a formação da parede uterina:

Endométrio: parte interna do útero, com revestimento pelo epitélio


cilíndrico simples, com células secretoras e ciliadas, numerosas
glândulas tubulares simples e estroma de tecido conjuntivo celular
ricamente vascularizado. Sofre grande influência hormonal durante o
ciclo menstrual e é responsável pela menstruação. O evento hormonal no
endométrio será mais bem explicado no capítulo sobre ciclo menstrual;
Miométrio: formado por camada muscular lisa que sofre hiperplasia e
hipertrofia durante a gestação;
Serosa: constituída por tecido conjuntivo frouxo e mesotélio.

O colo uterino é a porção mais inferior do útero e é formado por tecido


conjuntivo e algumas fibras musculares, comunica-se com a cavidade uterina
e vagina e mede 3cm de comprimento, aproximadamente. O revestimento do
canal cervical é denominado endocérvice e formado por epitélio colunar
simples. Esse epitélio invagina-se formando as glândulas endocervicais,
produtoras de muco. A parte da cérvice que se projeta para a vagina é
denominada ectocérvice, formada por epitélio pavimentoso estratificado não
queratinizado. Há abrupta transição entre o epitélio pavimentoso estratificado
e o colunar simples – junção escamocolunar, que pode estar visível na
ectocérvice ou dentro do canal.
Figura 6 - Anatomia do aparelho reprodutor feminino

C - Tubas uterinas

São estruturas tubulares bilaterais, localizadas lateralmente ao útero com uma


extremidade aberta para a cavidade peritoneal (em contato com o ovário) e a
outra para a cavidade uterina (região cornual do útero). Medem de 10 a 15cm
de comprimento e 1cm de diâmetro, aproximadamente, e são responsáveis
pelo transporte do oócito durante o período ovulatório. São, ainda, importante
sítio de encontro dos gametas para a ocorrência da fecundação. Dividem-se
em 4 porções anatômicas, seguindo o sentido útero-ovário: intramural, istmo,
ampola e infundíbulo (Figura 7). A fecundação geralmente acontece na
porção ampular da tuba, que é também o sítio mais comum das gestações
ectópicas. A parede das tubas é constituída por 3 camadas:

Mucosa: recoberta por epitélio colunar simples, com células ciliadas e


não ciliadas (secretoras);
Muscular: composta por fibras musculares lisas;
Serosa: formada por tecido conjuntivo frouxo.

Figura 7 - Porções anatômicas do útero, trompas uterinas e ovários

D - Ovários

São órgãos sexuais endócrinos, pares, de 3 a 4cm de comprimento x 2cm de


largura x 1cm de espessura, que produzem e armazenam os gametas
femininos e comunicam-se com as tubas por meio das fímbrias na sua porção
distal. São formados pelo córtex (periférico), com elevado número de
folículos em estágios diferentes de desenvolvimento, e pela medula com
tecido conjuntivo, vasos sanguíneos, linfáticos e inervação. A mulher contém,
aproximadamente, 1 milhão de folículos primordiais ao nascimento, e, destes,
400 a 500 evoluirão até o estágio de ovulação e os demais sofrerão atresia
folicular. As fases de evolução folicular são: folículo primordial, folículo
primário, folículo secundário ou pré-antral, folículo maduro (Graaf) e folículo
atrésico. Essa evolução folicular hormônio-dependente será mais bem
abordada em ciclo menstrual.

Figura 8 - Evolução dos folículos ovarianos

E - Particularidades anatômicas

a) Ligamento largo

Trata-se da denominação dada à dobra do peritônio sobre si mesmo,


localizado logo abaixo das tubas e dirigindo-se ao ovário e à face lateral do
útero.

b) Paramétrios laterais

Também chamados ligamentos cardinais ou de Mackenrodt. Através deles


passam diversos nervos, vasos linfáticos, linfonodos, a artéria uterina e o
ureter. Há uma relação de proximidade importante entre a artéria uterina (que
passa por cima) e o ureter (que passa por baixo).

c) Períneo

O períneo tem a forma de um losango com limite superior na sínfise púbica,


limites laterais nas tuberosidades isquiáticas e limite inferior no cóccix. Os
músculos nele contidos são os do diafragma urogenital e outros na camada
superficial: bulboesponjoso (ou bulbocavernoso), isquiocavernoso e
transverso superficial do períneo (Figura 4 - B).

d) Centro tendíneo do períneo

Estrutura de confluência das fibras tendíneas dos músculos que compõem o


espaço perineal, localiza-se entre a fúrcula vaginal e o ânus.

4. Órgãos genitais externos


São constituídos pela vulva e pelo terço inferior da vagina. As estruturas da
vulva estão indicadas a seguir.

A - Clitóris

Órgão constituído por tecido erétil (2 corpos cavernosos que se fundem,


formando o corpo do clitóris) e pela glande, que pode ser vista na mulher em
posição de litotomia. É o órgão análogo do corpo esponjoso do pênis.

B - Grandes e pequenos lábios

São estruturas laterais ao introito vaginal, cuja extremidade inferior é


denominada fúrcula vulvar ou fossa navicular.

C - Glândulas de Bartholin e de Skene

As glândulas de Bartholin são estruturas que se localizam na região da


fúrcula, lateralmente ao introito vaginal, e têm a função de produzir a
lubrificação vulvovaginal. Por sua vez, as glândulas de Skene se localizam
nas laterais do meato uretral. Elas têm por função produzir a lubrificação do
meato (Figura 9).
Figura 9 - Glândulas de Bartholin e de Skene

D - Inervação, irrigação e drenagem linfática

a) Vulva e períneo

Inervação: basicamente, o nervo pudendo e seus ramos, derivados das raízes


sacrais S2-S4;
Irrigação: artéria pudenda interna (ramo da artéria ilíaca interna, também
conhecida como artéria hipogástrica);
Drenagem linfática: linfonodos inguinais e femorais.

b) Cavidade pélvica

Irrigação: os ovários são nutridos pelas artérias ovarianas, ramos diretos da


artéria aorta. Em algumas pacientes, a artéria ovariana esquerda pode ser
ramo da artéria renal esquerda. O útero e as tubas são irrigados pelas artérias
uterinas (ramos das artérias ilíacas internas). As ramificações das artérias
uterinas se anastomosam com as ovarianas. Já a vagina é irrigada por ramos
vaginais da artéria uterina e pela artéria vaginal (também ramo da ilíaca
interna).
Entretanto, a parte inferior da vagina é irrigada pelos vasos hemorroidários
inferiores e pelos ramos da artéria pudenda interna;
Drenagem linfática: linfonodos ilíacos, para-aórticos e inguinais.

Figura 10 - Sistema principal de irrigação uterina


5. Embriologia dos órgãos genitais
No início da vida intrauterina, nos embriões de ambos os sexos, existe um par
de gônadas indiferenciadas juntamente a um sistema de ductos: os ductos de
Müller (ou paramesonéfricos) e os ductos de Wolff (ou mesonéfricos). Os
ductos de Müller são o primórdio da genitália interna feminina, e os ductos de
Wolff, o primórdio da genitália interna masculina.

A - Gônadas

As gônadas, indiferenciadas até a 5ª semana de vida intrauterina, são


geneticamente programadas para diferenciação em tecido ovariano em todos
os indivíduos. Nos indivíduos que apresentam cromossomo Y, existe um gene
que não tem analogia com o cromossomo X, chamado SRY. Esse gene
transcreve a proteína fator de diferenciação testicular (TDF – do inglês Testis-
Determining Factor), cuja ação é diferenciar a gônada, que normalmente se
diferenciaria em ovário, em testículo. A presença de TDF leva ao
desenvolvimento testicular, e a sua ausência, ao desenvolvimento ovariano.
Outros genes gonadais importantes no desenvolvimento são SF-1, SOX9,
WT1, WNT4 e DAX-1. Assim, a formação testicular é um processo ativo,
dependente do SRY e do TDF, enquanto a diferenciação ovariana é um
processo passivo.

a) Testículos e genitália masculina interna e externa

Com a diferenciação da gônada em testículo, ocorre a formação das células de


Sertoli, as quais secretam o hormônio antimülleriano no período da 7ª a 8ª
semana de desenvolvimento. O hormônio antimülleriano provoca:

Regressão do sistema paramesonéfrico (ductos müllerianos) – e sua


involução se completa com 9 a 10 semanas de gestação;
Controla o desenvolvimento do gubernáculo, imprescindível para a
descida transabdominal dos testículos;
Produção da proteína ligadora de androgênios.

Na gônada indiferenciada, a partir das células mesenquimais, surgem as


células de Leydig (testiculares), que passam a secretar testosterona por volta
da 8ª semana de gestação. A testosterona age de forma parácrina nos ductos
mesonéfricos ipsilaterais (ductos de Wolff) para promover a diferenciação do
ducto em epidídimo, canal deferente, vesícula seminal e ducto ejaculatório. A
testosterona e a diidrotestosterona são essenciais para o desenvolvimento do
fenótipo masculino, controlando a diferenciação e o crescimento da genitália
interna e externa e a diferenciação masculina primária do cérebro.
Assim, na 7ª semana, por ação do TDF, ocorre a transformação dos cordões
sexuais em túbulos seminíferos, e, logo a seguir, as células de Sertoli passam
a secretar o hormônio antimülleriano. Paralelamente, inicia-se a produção de
testosterona no testículo, responsável pelo desenvolvimento dos ductos
mesonéfricos (ductos de Wolff) e pela virilização da genitália externa.
Informações importantes para quem vai prestar concurso médico pode ser
encontradas na Figura 11.

Figura 11 - Embriologia do aparelho reprodutor masculino

b) Ovários

Na ausência do gene SRY (cromossomo X), não há transcrição do TDF, assim


a gônada bipotencial se desenvolve para formar ovários. As células
germinativas nos embriões XX sofrem mitose e atingem de 6 a 7 milhões de
células (máximo) com 20 semanas de gestação, já apresentando estroma e
folículos primordiais com oócito. No 3º trimestre, o oócito sofre meiose, que
se interrompe na meiose I na fase de prófase I, até a menarca, quando há
ovulação. Vale ressaltar que a atresia dos oócitos inicia-se intraútero.
No período fetal, estima-se haver cerca de 7 milhões de células germinativas.
Por atresias sucessivas, na ocasião do nascimento, há cerca de 1 milhão
dessas células. Na puberdade, restam aproximadamente 400.000 células, das
quais cerca de 400 são ovuladas na menacma.
Figura 12 - Diferenciação gonadal

B - Útero, tubas uterinas e 2 terços superiores da


vagina

No embrião masculino, há a produção do hormônio antimülleriano, que


promove a regressão dos ductos de Müller. A testosterona secretada diferencia
os ductos de Wolff nos órgãos genitais internos masculinos (epidídimo, ducto
deferente, vesícula seminal, parte da próstata, uretra prostática e membranosa
e pênis), como já visto. Entretanto, os órgãos genitais internos femininos
desenvolvem-se passivamente; na ausência de hormônio antimülleriano, os
ductos de Müller seguem seu desenvolvimento, dando origem ao útero, às
trompas e aos 2 terços superiores da vagina. E, como não há secreção de
testosterona, os ductos de Wolff involuem.
Na 8ª semana, aproximadamente, inicia-se a fusão dos ductos de Müller pela
parte inferior, formando o útero, as tubas e os 2 terços superiores da vagina. O
terço distal da vagina provém do tubérculo genital, que passa a sofrer
diferenciação na genitália externa feminina no final do 3º mês. Em algumas
mulheres, os remanescentes embrionários dos ductos de Wolff podem ser
identificados como estruturas saculares nos fórnices vaginais. Essas estruturas
são denominadas cistos de Gartner (Figura 13), os quais podem ser
encontrados em algumas mulheres durante o exame especular, não provocam
nenhum sintoma nem necessitam de qualquer intervenção.

Figura 13 - Estrutura no fórnice vaginal direito (seta): são os cistos de Gartner, estruturas
remanescentes dos ductos de Wolff que podem ser encontradas em algumas mulheres durante o
exame especular

Em torno de 12 semanas de gestação, o corpo e o colo uterino sofrem


diferenciação, e o polo superior do útero mantém um septo espesso na linha
média, que regride por completo com 20 semanas de idade gestacional. Falhas
na fusão lateral dos 2 ductos müllerianos ou na reabsorção desse septo uterino
causam cornos uterinos separados ou algum grau de septo uterino persistente
mediano.
Figura 14 - Embriologia dos órgãos genitais
Figura 15 - Desenvolvimento dos órgãos genitais femininos na 11ª e na 14ª semana
Importante
Remanescentes vestigiais dos ductos de Wolff podem estar presentes no
sexo feminino como ductos de Gartner (encontrados na parede lateral
superior da vagina).

Tema frequente de prova


Os remanescentes vestigiais dos ductos de Wolff são um tema frequente
nas provas de concursos médicos.

C - Órgãos genitais externos


O tubérculo genital é uma estrutura existente nos embriões de ambos os
sexos. Se não houver estímulo hormonal, ocorrerá diferenciação na vulva e no
terço inferior da vagina. Todos os tubérculos genitais são biologicamente
programados para se diferenciar em genitália externa feminina. Nos embriões
XY, em que há produção de testosterona, ocorre a conversão periférica desse
hormônio em diidrotestosterona. A diidrotestosterona diferencia o tubérculo
genital em genitália externa masculina (pênis e bolsa escrotal). Portanto, para
a genitália externa ser masculina, é necessário o estímulo androgênico.

6. Distúrbios do desenvolvimento sexual e


malformações genitais
A fecundação define o sexo genético por meio dos cromossomos transmitidos
pelos pais, resultando em sexo feminino 46,XX ou sexo masculino 46,XY. Os
Distúrbios do Desenvolvimento Sexual (DDSs) podem ser classificados em
XY ou XX. O DDS XY (no passado, chamado pseudo-hermafroditismo
masculino) é o indivíduo geneticamente programado para ser do sexo
masculino que sofre feminização da sua genitália. O DDS XX (no passado,
chamado pseudo-hermafroditismo feminino) é o indivíduo geneticamente
programado para ser do sexo feminino que sofre masculinização da sua
genitália.

A - Distúrbios do desenvolvimento sexual

Os estados intersexuais são o resultado de uma diferenciação imperfeita ou


incompleta dos órgãos genitais, em nível genético ou inorgânico, resultando
em genitália ambígua. Geralmente, podem ser:
DDS ovotesticular (no passado, denominado hermafroditismo
verdadeiro): é a coexistência de ovários e testículos em um mesmo
indivíduo. É uma ocorrência rara e a sua etiologia é cromossômica;
DDS XX (no passado, denominado pseudo-hermafroditismo
feminino): são indivíduos geneticamente do sexo feminino que
apresentam virilização da genitália externa. Geralmente, estão associados
à hiperplasia congênita de suprarrenal;
DDS XY (no passado, denominado pseudo-hermafroditismo
masculino): são indivíduos geneticamente do sexo masculino que
apresentam feminilização da genitália externa.

Para um melhor entendimento das alterações apresentadas a seguir, a


compreensão de alguns conceitos é fundamental.
O sexo de um indivíduo é um conjunto de características genéticas, gonadais,
somáticas e biopsicossociais. Não basta apenas uma delas para que se
determine, com precisão, a sexualidade de uma pessoa.
O sexo genético é definido na fecundação: XX ou XY. Para o sexo gonadal, é
fundamental a presença ou a ausência do cromossomo Y. Quanto ao sexo
somático, os aspectos da genitália interna desenvolvem-se com a manutenção
ou a involução dos ductos de Wolff e Müller, levando à formação de
epidídimos, ductos deferentes ou então tubas, útero e porção superior da
vagina. No entanto, a morfologia da genitália externa caracteriza-se na
dependência da presença ou da ausência de androgênios: quando presentes, há
o desenvolvimento de falo e bolsa escrotal; quando ausentes, de clitóris e de
lábios maiores e menores.
Quando quaisquer dessas características sofrem alteração no seu curso normal
de desenvolvimento, temos os DDSs. Dentre eles, os mais comuns e
importantes estão descritos a seguir.

a) Distúrbio do desenvolvimento sexual ovotesticular

Antigamente denominado hermafroditismo verdadeiro, é uma doença rara que


se caracteriza por tecido gonadal masculino e feminino. Pode apresentar
cariótipo 46,XX (70% dos casos aproximadamente), 46,XY (7%) e
mosaicismo (10 a 40%). Pode, ainda, apresentar-se com genitália interna e
externa ambígua.
A quantidade de hormônio antimülleriano e de testosterona presentes
determina o grau de masculinização ou feminilização dos sistemas ductais
internos (genitália interna). Em geral, a genitália externa é ambígua e
submasculinizada devido à quantidade insuficiente de testosterona. A maioria
das pacientes apresenta vagina, e o útero pode ser normal e funcional,
hipoplásico, vestigial ou totalmente ausente; logo, há pacientes que
menstruam. O desenvolvimento genital externo reflete o nível de produção de
androgênio e de exposição a eles. Vale ressaltar que 3/4 desenvolvem
ginecomastia e metade menstrua após a puberdade.
A genética e a fisiopatologia da doença não estão bem estabelecidas, mas
acredita-se que há translocação dos genes determinantes de testículo do
cromossomo Y para o cromossomo X, ou um autossomo e mutações
autossômicas dominantes que promovam o desenvolvimento de testículos na
ausência de um cromossomo Y. O diagnóstico é firmado por cariótipo e
histopatológico das gônadas.
Figura 16 - Forma ovotesticular

b) Inversão de gênero 46,XX

Trata-se de uma síndrome rara de “inversão de gêneros”, em que o gênero


cromossômico 46,XX não é condizente com o gênero das gônadas, visto que
estas são testiculares. Em 90% dos casos, há transferência do gene SRY
(transcreve a proteína TDF) do cromossomo Y para o X durante a meiose
masculina. A maioria apresenta-se estéril, com desenvolvimento genital
normal, padrão normal de desenvolvimento de pelos, porém tem baixa
estatura. Na puberdade, apresentam ginecomastia, hipogonadismo e
infertilidade.

c) Distúrbio do desenvolvimento sexual XX

Nos DDSs XX, há discordância entre o sexo gonadal e a genitália externa.


Etiologia: hiperplasia adrenal congênita e ingestão materna de esteroides
androgênicos;
Cariótipo: 46,XX;
Gônadas: ovários;
Genitália interna: normal, pois não há produção do hormônio
antimülleriano. Assim, ocorre o desenvolvimento normal dos ductos
müllerianos e, consequentemente, formação da genitália interna feminina.
Vale ressaltar que os ovários não produzem quantidade suficiente de
androgênios para promover o desenvolvimento dos ductos de Wolff. Portanto,
as tubas uterinas, o útero e a parte superior da vagina são normais;
Genitália externa: como a genitália externa é suscetível à presença de
androgênios, há masculinização em graus variáveis pelo excesso desse
hormônio. Observam-se graus variados de aumento de clitóris, fusão labial e
anormalidades da uretra e vagina, dependendo do tempo e do grau de
exposição ao androgênio em fase intrauterina;
Hiperplasia congênita de suprarrenal (HCSR): é uma síndrome
caracterizada, principalmente, por deficiência no mecanismo que envolve, em
especial, a enzima 21-hidroxilase. Na falta ou na ausência dessa enzima, há
acúmulo da substância precursora (17-hidroxiprogesterona), cujos altos níveis
séricos confirmam o diagnóstico. A deficiência da 21-hidroxilase acarreta
redução na produção de cortisol, levando ao aumento na produção de ACTH
(hormônio adrenocorticotrófico), que estimula a produção hormonal da
suprarrenal – hiperplasia de suprarrenal, com aumento na produção de
androgênios. As deficiências de 11-beta-hidroxilase e 3-beta-hidroxiesteroide
desidrogenase são causas menos comuns de HCSR. A HCSR causada por
deficiência da 21-hidroxilase é a causa endócrina mais frequente de
ambiguidade sexual e pode apresentar-se clinicamente das seguintes formas:

A variedade perdedora de sal é a mais grave e caracteriza-se por grave


deficiência de cortisol e aldosterona, resultando em perda de sal e
desidratação, além de virilização;
A forma virilizante simples é menos grave, e níveis elevados de ACTH
são capazes de orientar suficiente produção de glicocorticoide e
mineralocorticoide, a ponto de impedir o colapso circulatório. Há
masculinização da genitália externa;
A forma não clássica não se torna aparente até a adolescência ou o início
da idade adulta, quando níveis anormalmente altos de androgênio
causam hirsutismo e irregularidade menstrual. Não há genitália externa
ambígua.
Figura 17 - Hiperplasia congênita de suprarrenal
Figura 18 - Forma XX

d) Distúrbio do desenvolvimento sexual XY

Etiologia: deficiência na síntese ou na ação da testosterona;


Cariótipo: 46,XY;
Gônadas: testículos;
Genitália interna: há involução dos ductos de Müller sem o
desenvolvimento normal dos ductos de Wolff por ação inexistente ou
incompleta da testosterona, com graus variáveis de feminilização;
Genitália externa: dúbia ou feminina;
Causas: diversas deficiências enzimáticas envolvidas na esteroidogênese
podem ser responsáveis pela incapacidade de síntese da testosterona. Já nas
causas de deficiência de ação desta, temos a síndrome do testículo
feminilizante ou síndrome de Morris (fenótipo completamente feminino,
cariótipo XY e testículos) como o exemplo mais comum.
e) Síndrome de Morris (síndrome da insensibilidade
completa aos androgênios)

Caracteriza-se pela atividade androgênica por insensibilidade completa aos


androgênios. A herança é recessiva, ligada ao X. Devem-se remover os
testículos após a puberdade (entre 16 e 18 anos) devido à chance de
malignização (por serem intraperitoneais e, com isso, sujeitos a temperaturas
mais elevadas do que as da bolsa escrotal). A reposição hormonal estrogênica
é obrigatória nesses casos.
Não há resposta aos androgênios, havendo aumento compensatório na
produção desse hormônio, que sofre aromatização periférica, formando
estrogênios, responsáveis pelo desenvolvimento sexual secundário feminino
(fenótipo feminino).
A genitália externa é claramente feminina, devido à insensibilidade completa
aos androgênios, e os pelos pubianos e axilares são escassos ou ausentes. As
mamas apresentam desenvolvimento normal.
Os testículos produzem fator antimülleriano, com regressão dos ductos de
Müller, logo a genitália interna não é feminina: vagina em fundo cego +
ausência de útero + ausência de tubas + 2 terços superiores da vagina são
ausentes (vagina curta). Como há insensibilidade ao androgênio, não há
resposta androgênica nos ductos de Wolff, acarretando ausência de genitália
interna masculina. Portanto, não há genitália interna masculina nem feminina.
Exames laboratoriais indicam testosterona normal para o sexo masculino,
bem como LH e FSH normais. O diagnóstico é feito com base nos seguintes
achados: amenorreia primária + desenvolvimento normal das mamas + pelos
axilares e pubianos escassos ou ausentes + vagina curta + ausência de útero +
alterações laboratoriais descritas + cariótipo 46,XY.
Constitui defeito na biossíntese da testosterona fenótipo feminino, porém sem
mamas desenvolvidas.
Na agenesia dos ductos de Müller, ocorrem quantidade normal de pelos
pubianos e axilares, concentrações femininas normais de testosterona e
cariótipo 46,XX.

f) Síndrome da insensibilidade incompleta aos androgênios

Dependendo do defeito do receptor, haverá maior ou menor resposta ao


androgênio. Apresenta-se, muitas vezes, com criptorquidia, ambiguidade
genital, pênis de tamanho variado, hipospádia e vagina rudimentar. Pode
haver diferenciação dos ductos de Wolff porque há alguma resposta à
testosterona, com desenvolvimento da genitália interna masculina. Entretanto,
o espectro da apresentação clínica pode variar de fenótipo feminino com leve
virilização a masculino subvirilizado, que pode ser fértil ou infértil. Logo,
alguns apresentam prole constituída.
Na genitália interna, não há estruturas müllerianas devido à ação do hormônio
antimülleriano, e a genitália interna é subdesenvolvida pela ação parcial dos
androgênios nos ductos de Wolff. Além disso, o desenvolvimento de mamas é
variável, o crescimento de pelos está alterado, e o tratamento é feito com
androgênio exógeno, de acordo com o sexo de criação.

g) Síndrome de Reifenstein

São indivíduos com insensibilidade androgênica parcial e fenótipo


predominantemente masculino e que são subvirilizados. Geralmente,
apresentam-se como homens inférteis com escroto bífido e hipospádias
perineoescrotais. O aspecto da genitália externa pode variar amplamente. A
genitália interna, por sua vez, é masculina, mas não completamente
desenvolvida. Os pelos axilares e pubianos são normais, porém há pouco ou
nenhum pelo no tórax ou na face. Comumente, apresentam ginecomastia.

Importante
O tratamento da síndrome de Morris engloba a gonadectomia (pelo risco de
gonadoblastoma), reposição de estrogênio e avaliação da necessidade de
neovagina.

h) Síndrome de Swyer

Corresponde a disgenesia gonadal em pacientes 46,XY, com anéis fibrosos


em substituição aos testículos; há, portanto, incapacidade de produção de
testosterona. Como há ausência de testosterona, a genitália externa é
feminina. Não há hormônio antimülleriano, logo a genitália interna também é
feminina. Alguns casos decorrem da mutação no gene SRY.
Quanto ao fenótipo, citam-se amenorreia primária, crescimento eunucoide,
trompas e úteros normais ou rudimentares, gônadas “em fita”, ausência de
caracteres sexuais secundários femininos ou masculinos e infantilismo
genital. A anatomia genital interna e a externa são normais, e o tratamento
baseia-se na reposição de estrogênio e remoção das gônadas “em fita”, devido
ao risco de neoplasias de células germinativas (20 a 30%).

i) Síndrome de Turner
Cariótipo: 45,X0;
Gônadas: “em fita” – disgenesia gonadal, logo, os ovários não funcionam.
Como não há cromossomo Y, não se forma o testículo; porém, para haver o
desenvolvimento de ovários, são necessários 2 cromossomos X. Logo, as
gônadas são indiferenciadas;
Fenótipo: pescoço alado, tórax “em escudo”, baixa estatura, afastamento dos
mamilos (hipertelorismo), nevos cutâneos, palato arqueado, unhas das mãos
pequenas e convexas; 4º e 5º metacarpiano curtos; implantação baixa de
cabelos; ausência de desenvolvimento puberal;
Infertilidade: útero e vagina são normais e respondem a hormônios
exógenos;
Mosaico para Turner: 45,X0/46,XX. O fenótipo semelhante ao da síndrome
de Turner, porém com maior estatura e menor número de anormalidades
cromossômicas. Há casos em que a infertilidade é o sintoma mais evidente;
Complicação para Turner: anomalias cardíacas, em especial coarctação da
aorta; anomalias renais; problemas auditivos; otite média; mastoidite; maior
incidência de hipertensão arterial, acloridria, diabetes e tireoidite de
Hashimoto.

Importante
A síndrome de Turner é o principal tipo de disgenesia gonadal. As gônadas
são indiferenciadas (“em fita”).
Figura 19 - Síndrome de Turner: pescoço alado e baixa implantação de cabelos>
Figura 20 - Síndrome de Turner: linfedema das mãos
Figura 21 - Síndrome de Turner: linfedema dos pés

j) Síndrome de Klinefelter

Trata-se da causa congênita mais comum de hipogonadismo no sexo


masculino, com incidência de 1:1.000 nascidos vivos. Está relacionada ao
cariótipo 47,XXY, mas também ocorre em 47,XXXY e mosaicos. A
concentração de testosterona sérica é baixa, reduzindo a virilização, e há
elevação nos níveis de gonadotrofina.
Cariótipo: 47,XXY;
Fenótipo: OGEs masculinos, testículos pequenos e endurecidos, com
produção baixa de espermatozoides, braços e pernas longos, tronco estreito,
baixa estatura e problemas psicossociais não relacionados com o
hipogonadismo;
Diagnóstico: clínico + cariótipo;
Tratamento: testosterona exógena;
Complicações: aumento na prevalência de doenças pulmonares, câncer de
mama e do mediastino, veias varicosas e diabetes.

Figura 22 - Síndrome de Klinefelter

B - Malformações genitais

São, normalmente, devidas a defeitos no desenvolvimento ou na fusão dos


ductos de Müller no período embrionário. Têm alta incidência populacional e
correspondem a 5% dos casos de infertilidade feminina.

a) Anomalias uterinas

Podem ser diversas, de acordo com o grau de fusão e a regressão dos ductos
müllerianos.
Útero didelfo: sem fusão dos ductos müllerianos na linha média;
Úteros bicorno, septado e unicorno: absorção incompleta do septo
resultante da fusão.
Se não há o desenvolvimento adequado dos ductos müllerianos na
embriogênese, pode haver diversas outras alterações. Sempre que estivermos
diante de um diagnóstico de malformação mülleriana, será imperativa a
análise minuciosa do trato urinário concomitante. Dada a peculiaridade do
desenvolvimento embrionário simultâneo dos tratos urinário e reprodutivo, a
associação a malformações do trato urinário é significativa.
O diagnóstico das anomalias uterinas deve ser obtido pela anamnese (que
eventualmente apresenta queixas referentes ao ciclo menstrual, dificuldades
para engravidar ou manter a gestação) e pelo exame físico complementado
por ultrassonografias pélvica e transvaginal. A ressonância magnética é o
melhor exame de imagem para o diagnóstico das malformações müllerianas
em geral. Quando possível, histerossalpingografia, histeroscopia e/ou
videolaparoscopia podem ser realizadas para elucidação diagnóstica, e
histeroscopia e/ou videolaparoscopia podem ser terapêuticas nos casos em
que a remoção do septo é possível.

b) Malformações vaginais

Síndrome de Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser ou agenesia uterina: mais


conhecida simplesmente por síndrome ou sequência de Rokitansky, é uma
malformação que ocorre por agenesia dos ductos de Müller. Ocorre em
1:4.500 nascimentos femininos. Está associada à agenesia uterina, tubária e
dos 2 terços superiores da vagina;

Importante
A síndrome de Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser é a 2ª maior causa de
amenorreia primária.

Septo vaginal vertical: falha na fusão dos ductos müllerianos; na maioria dos
casos, causa dispareunia e obstrução no canal do parto;
Septo vaginal transverso: falha na canalização vaginal quando deveria haver
a união da porção cranial oriunda dos ductos de Müller e da porção distal
oriunda do seio urogenital.
Figura 23 - Malformações uterinas e vaginais: (A) septo completo vaginal longitudinal + útero
didelfo; (B) septo vaginal longitudinal isolado; (C) septo parcial longitudinal e útero didelfo com um
dos lados atrófico
Figura 24 - Apresentação do hímen: (A) e (B) normal e de (C) a (I) com diferentes morfologias,
porém ressalte-se que são todos pérvios e permitem o escoamento do sangue menstrual
Figura 25 - Anomalias uterinas: (A) útero bicorno e septo vaginal longitudinal parcial; (B) útero
septado completo e septo vaginal longitudinal; (C) útero septado parcial; (D) útero didelfo e septo
vaginal longitudinal; (E) útero bicorno e septo vaginal longitudinal; (F) útero bicorno e vagina
normal; (G) útero normal; (H) septo vaginal longitudinal parcial; (I) útero unicorno; (J) útero
bicorno com um dos cornos atrofiado; (K) idem a (J); (L) útero bicorno e septo vaginal longitudinal
completo – um dos cornos apresenta criptomenorreia com retenção de sangue menstrual até a vagina
Figura 26 - Desenvolvimento gonadal
Figura 27 - Desenvolvimento da genitália interna
Figura 28 - Desenvolvimento da genitália externa

Figura 29 - Caracteres sexuais secundários

Resumo
Anatomia

Estrutura pélvica: a bacia óssea é formada por ossos do quadril, sacro e


cóccix. O diafragma pélvico é formado pelo músculo levantador do ânus
(músculo pubococcígeo, músculo iliococcígeo e músculo puborretal) e o
músculo coccígeo. O diafragma urogenital é formado pelo músculo
transverso profundo do períneo e esfíncter uretral. O aparelho de
suspensão da pelve, por sua vez, é formado pelos ligamentos uterossacro
e cardinal (cervical lateral/paramétrios);
OGIs: a vagina é um órgão tubular, que une a cérvice uterina (colo do
útero) à vulva (porção distal). O útero é dividido em 4 segmentos: fundo,
corpo, istmo e cérvice (porção uterina localizada na vagina); contudo,
também pode ser dividido em endométrio (camada mais interna),
miométrio e serosa. As tubas uterinas são responsáveis pelo transporte
do oócito durante o período ovulatório e são um importante sítio de
encontro dos gametas para a ocorrência da fecundação. Os ovários são
órgãos sexuais endócrinos;
OGEs: vulva, composta por lábios maiores e menores, monte do pube
(vênus), clitóris, vestíbulo e glândulas vaginais maiores (Bartholin) e
menores (Skene).

Embriologia

Até a 5ª semana, as gônadas são indiferenciadas; com a ação do TDF,


proteína expressa pelo cromossomo Y, que quando presente diferencia as
gônadas em testículos; na ausência do TDF, as gônadas diferenciam-se
em ovários;
Nos testículos, a partir da 7ª semana, formam-se 2 tipos de células: de
Sertoli, que produzem hormônio antimülleriano (que atrofiará os ductos
de Müller), e de Leydig, que produzem testosterona, responsáveis pela
manutenção e proliferação dos ductos de Wolff e seus órgãos derivados;
Nos ovários, o desenvolvimento é passivo, pois não há TDF (assim, não
há produção de testosterona) nem hormônio antimülleriano, então os
ductos de Müller se desenvolvem e geram o útero, as tubas e os 2 terços
superiores da vagina. Os oócitos ficam envoltos em folículos primários
até a puberdade.

Distúrbios do desenvolvimento sexual

Ovotesticular: coexistência de testículo e ovário no mesmo indivíduo;


XY – síndrome de Morris (46,XY): fenótipo totalmente feminino e
gônadas masculinas. Causa: resistência periférica total aos androgênios;
XX – hiperplasia adrenal congênita: fenótipo com graus variáveis de
virilização e genitália interna feminina. Causa: deficiência da enzima 21-
hidroxilase, que converte a 17-hidroxiprogesterona em androstenediona
e testosterona (depois convertidas em estradiol).
Fisiologia menstrual
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Definição
A compreensão dos mecanismos fisiológicos do ciclo menstrual é
fundamental para o entendimento das alterações ginecológicas. O ciclo
menstrual pode ser dividido em etapas, a serem comentadas separadamente:
esteroidogênese ovariana, ciclo menstrual propriamente dito, ciclo
endometrial e muco cervical.
2. Eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano
A interação entre o hipotálamo, a hipófise e o ovário é responsável pelo ciclo
menstrual. O hipotálamo regula toda a produção da hipófise por meio da
secreção dos fatores de liberação hipofisários: hormônio de liberação das
gonadotrofinas (GnRH), hormônio de liberação do hormônio do crescimento
(GH), hormônio liberador da tireotrofina e fator de liberação de
corticotrofina, além do fator inibidor da prolactina, que é a dopamina.
A hipófise pode ser dividida em adeno-hipófise (porção anterior da hipófise),
responsável pela secreção de hormônio folículo-estimulante (FSH), hormônio
luteinizante (LH), hormônio tireoestimulante (TSH), hormônio
adrenocorticotrófico (ACTH), GH e prolactina, e neuro-hipófise (porção
posterior da hipófise), que secreta ocitocina e hormônio antidiurético. As
gonadotrofinas (FSH e LH) são responsáveis pela estimulação folicular,
ovulação e regulação da esteroidogênese ovariana. Por outro lado, sua síntese
e secreção dependem dos níveis de estrogênios, progesterona e inibina.
O controle da secreção do GnRH se dá por meio de retrocontrole, ou
feedback, e acontece em 3 níveis: alça longa, por meio dos hormônios
ovarianos; alça curta, pelos hormônios hipofisários; alça ultracurta, na qual o
GnRH age no hipotálamo, controlando sua própria produção. O GnRH
controla a liberação de 2 hormônios pela adeno-hipófise: FSH e LH. Para a
correta liberação hormonal, a secreção do GnRH acontece de forma pulsátil
(intermitente) e varia em frequência e amplitude durante o ciclo menstrual, o
que determina a produção do FSH ou LH. O aumento na frequência e na
amplitude da secreção pulsátil do GnRH, na metade do ciclo, favorece o
aumento do LH necessário à ovulação e início da fase lútea (2ª fase do ciclo
menstrual).
Diversos fatores estimulam a secreção do GnRH: noradrenalina, histamina,
aminoácidos, neuropeptídios, adenosina, substância P, óxido nítrico e os
próprios esteroides ovarianos. Uma vez liberado, o GnRH atinge a hipófise
por meio do sistema porta-hipofisário e estimula os gonadotrofos (células
especializadas em produzir gonadotrofinas) a liberar o FSH e o LH.

Figura 1 - Eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano


Figura 2 - Pulsos de hormônio liberador de gonadotrofinas durante as 2 fases do ciclo menstrual

A Figura 3 ilustra o processo de feedback hormonal no ciclo menstrual


normal.
Figura 3 - Feedback com a hipófise e o hipotálamo

As endorfinas, encefalinas e dimorfinas são opioides endógenos que


participam do controle da função hipotalâmico-hipofisária. As endorfinas
participam do controle de temperatura corpórea, apetite, humor e
comportamento, sua secreção central é aumentada por esteroides sexuais, e
apresentam a propriedade de inibição da liberação de GnRH, promovendo
redução na secreção de gonadotrofinas. Os níveis de endorfinas variam muito
durante o ciclo menstrual, com níveis máximos na fase lútea e mínimos
durante a menstruação, ajudando no controle dos níveis de LH e FSH durante
o ciclo, e podem contribuir para a disforia feminina na fase pré-menstrual do
ciclo associada à abstinência de opiáceos endógenos.
No ciclo menstrual, há produção hormonal cíclica ovariana com alterações
endometriais visando ao preparo para implantação do embrião. Há, portanto,
ciclo ovariano e ciclo uterino durante o ciclo menstrual. O ciclo menstrual
normal dura de 24 a 38 dias, com 4,5 a 8 dias de fluxo e perda sanguínea
média de 5 a 80mL.
Vale lembrar que a fase lútea tem duração fixa, em torno de 14 dias, enquanto
a fase folicular é variável, dependendo de quando acontece a ovulação. Em
ciclos de 28 dias, ambas as fases duram cerca de 14 dias, mas em ciclos de 21
dias, por exemplo, a fase folicular dura em torno de 7 dias, enquanto, em um
ciclo de 35 dias, ela dura cerca de 21 dias.

3. Ciclo menstrual propriamente dito


O ciclo menstrual inicia-se no dia em que começa o sangramento menstrual
(1º dia) e termina no dia imediatamente anterior ao sangramento seguinte.
Tem duração média de 24 a 38 dias em mulheres normais e pode ser dividido
em 2 fases (folicular e lútea); alguns autores consideram, também, a fase
menstrual. Na realidade, os dias de menstruação estão inseridos na fase
proliferativa. Alguns autores a consideram uma fase distinta, ou seja, fase
menstrual, fase folicular e fase lútea.
A fase folicular, também chamada proliferativa, inicia-se no 1º dia da
menstruação e caracteriza-se pela ação do FSH no recrutamento e
amadurecimento folicular ovariano. É a fase variável do ciclo menstrual e
dura em média 14 dias, correspondendo ao 1º dia da menstruação até o pico
do LH. Após a fase folicular, ocorre a ovulação, seguida da fase lútea.
Portanto, esta última inicia-se com a ovulação e termina com o último dia que
precede o aparecimento da menstruação, além de caracterizar-se pela
produção de progesterona e ter duração fixa de 14 dias.

Figura 4 - Ciclo menstrual

A - Fase folicular

O ciclo menstrual inicia-se no 1º dia da menstruação (1º dia do ciclo


menstrual), com baixos níveis de estrogênio e progesterona, resultando em
pulsos de GnRH a cada 90 a 100 minutos aproximadamente e lentidão na
frequência de pulsos do GnRH durante o sono, com consequente aumento do
FSH na fase folicular inicial, marcando o período de recrutamento folicular. O
FSH é essencial para o recrutamento folicular e a esteroidogênese. Cada um
dos folículos recrutados secreta níveis crescentes de estrogênio, à medida que
se desenvolvem durante a fase folicular. Esses níveis crescentes produzem
feedback negativo sobre a secreção hipofisária de FSH, que começa a reduzir
no meio da fase folicular.
O aumento progressivo do FSH inicia o processo de recrutamento folicular,
mobilizando, mensalmente, cerca de 8 a 10 folículos com diâmetros de 5mm
ou mais, que se desenvolverão, passando pelos estágios de folículo primário
(com a diferenciação de células do estroma em teca), pré-antral (caracterizado
pela produção de estrogênios estimulada pelo FSH) e antral (caracterizada
pelo acúmulo de líquido folicular rico em estrogênios), secretando
quantidades progressivamente maiores de estradiol (o estrogênio ovariano,
representado pela sigla E2) e fatores parácrinos e autócrinos dentro do
folículo, mantendo a sensibilidade folicular ao FSH (Figura 5).
Observe-se que a fase folicular é marcada por recrutamento folicular e
proliferação das células da granulosa. Um desses folículos será “eleito” o
Folículo Dominante (FD), e sua seleção é estabelecida em torno do 5º ao 7º
dia do ciclo. Os fatores determinantes da dominância folicular são o maior
número de receptores para FSH em sua membrana celular e fluxo sanguíneo
preferencial. O FD inibe o crescimento dos demais folículos recrutados pela
secreção de inibina B, atinge cerca de 18 a 19mm de diâmetro médio e secreta
cada vez mais E2. Os demais folículos regridem gradativamente.

Figura 5 - Estágios do desenvolvimento folicular

Os esteroides sexuais e as gonadotrofinas não são os únicos hormônios que


participam do controle do eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano. Há
peptídios produzidos pelas células da granulosa que exercem papel no
feedback hipofisário, sendo:

Inibina B: secretada principalmente na fase folicular e estimulada pelo


FSH;
Inibina A: ativada principalmente na fase lútea.

Ambas as formas inibem a síntese e a liberação do FSH.


Ativina: na fase folicular inicial, é produzida pelas células da granulosa
de folículos imaturos, que acentua a ação do FSH, promovendo aumento
da receptividade folicular ao FSH. Age, também, aumentando a
atividade da aromatase (elevando a produção de estrogênio), na
formação de receptores LH e FSH nos folículos ovarianos e suprimindo
a produção de androgênio pela teca;
IGF-II: é produzido nas células da teca em resposta ao estímulo
gonadotrópico. Essa resposta é acentuada pelo estrogênio. Em ação
autócrina, o aumento de IGF-II aumenta a estimulação de LH sobre a
produção de androgênio pelas células da teca, acentua a atividade da
aromatase, aumentando a produção de estrogênio, e estimula a síntese de
progesterona.

Figura 6 - Desenvolvimento folicular no ciclo menstrual


Figura 7 - Ovários e múltiplos folículos em diferentes fases no ciclo menstrual (de folículo
primordial a corpo lúteo)

Na fase folicular tardia (no meio do ciclo), em resposta ao aumento


exponencial na secreção de estradiol pelos folículos ovarianos recrutados,
ocorre aumento nos níveis de LH em 10 vezes ou mais, por um período de 2 a
3 dias, enquanto os níveis de FSH aumentam em 4 vezes. Essa presença do
LH no meio do ciclo é absolutamente requerida para o final da maturação do
oócito e início da ruptura folicular (ovulação), que geralmente ocorre 36 horas
após o início da elevação do LH e 12 horas após seu pico máximo. A ação do
FSH durante toda a fase folicular leva ao aparecimento dos receptores de LH
nas células da granulosa, sendo um pré-requisito para ovulação e luteinização.

B - Período ovulatório

A ovulação é engatilhada pelo rápido aumento dos níveis circulantes de


estradiol, provocando um feedback positivo no nível da pituitária anterior (e
do hipotálamo também), resultando no pico de LH no meio do ciclo
necessário ao final da maturação do folículo, expulsão do oócito (ovulação) e
formação do corpo lúteo.
A chave para o sucesso ovulatório e a função luteínica é o pico de LH. Ele
ocorre pelo pico de estradiol prévio, que por sua vez só é possível caso os
níveis de FSH estejam altos no início do ciclo menstrual.
Para que a ovulação aconteça, fatores induzidos pelo pico do LH devem
acontecer: há digestão da parede folicular simultânea à contração das células
musculares lisas locais e à expansão do líquido folicular. A digestão da parede
ovular ocorre pela liberação de enzimas lisossômicas e prostaglandinas, bem
como estrona (E1) e progesterona, que determinam a citólise local;
paralelamente, o LH determina a retomada da divisão meiótica no oócito.

C - Fase lútea
Ao término da ovulação e início da fase lútea, o corpo lúteo inicia a produção
de progesterona, e ocorre o 2º aumento no estradiol, mantendo a secreção
pulsátil do GnRH com maior amplitude, levando a maior liberação de LH,
quando comparado com a fase folicular. Dessa forma, os níveis de
progesterona aumentam subitamente após a ovulação e podem ser usados
como sinal presuntivo de que houve ovulação. O pico de progesterona ocorre
por volta do 8º dia após o pico de LH.
A manutenção nas taxas de estradiol no meio da fase lútea e a presença de
inibina A evita o aumento do FSH. A fase lútea é fixa e dura 14 dias. Portanto,
o tempo de permanência do corpo lúteo na superfície ovariana é de 14 dias.
Se não ocorre fecundação, o corpo lúteo sofre luteólise. Com a regressão do
corpo lúteo, no 14º dia da fase lútea, ocorre queda nos níveis de progesterona,
estradiol e inibina A, levando a descamação do endométrio (menstruação) e
escape do feedback negativo sobre o eixo hipotalâmico-hipofisário, com
consequente aumento na frequência dos pulsos de GnRH e FSH, iniciando um
novo ciclo. A Figura 8 ilustra, resumidamente, o eixo hipotalâmico-
hipofisário-ovariano.

Importante
Os níveis de progesterona aumentam subitamente após a ovulação e podem
ser usados como sinal presuntivo de que houve ovulação.

Importante
A fase folicular possui maior variabilidade em sua duração, portanto é
responsável pela variabilidade na duração do ciclo menstrual.
Figura 8 - Produção hormonal

Interferências nesse processo podem decorrer de processos infecciosos,


endometriose, modificações nos receptores hormonais tróficos quantitativa e
qualitativamente (insensibilidade ovariana), ou a necessidade de efeitos
biológicos podem ser bloqueados pela constituição molecular imprópria das
gonadotrofinas (heterogenicidade dos glicopeptídios hormonais).

Importante
O pico de estradiol fornece o sinal para o pico de LH, que ocorre cerca de
12 horas antes da ovulação e é considerado o evento fundamental para a
ovulação.
4. Ciclo endometrial
Os 2 terços superficiais do endométrio são a camada funcional (decídua
funcional), que se prolifera para receber o embrião e se descama, se não
houver gravidez, e a camada basal (decídua basal), mais profunda e que não
sofre proliferação significativa, mas é fonte de regeneração endometrial após
a menstruação.
Como já visto, são as diferentes concentrações de estradiol e progesterona ao
longo do ciclo menstrual que determinam as alterações endometriais. Na 1ª
fase do ciclo (fase folicular), ocorre a proliferação endometrial sob estímulo
estrogênico. O endométrio aumenta de espessura até cerca de 5mm, e suas
glândulas se apresentam estreitas e tubulares. Essa 1ª fase é conhecida como
proliferativa justamente por referir-se a esse padrão endometrial. Outra
característica importante é o aumento de células ciliadas e microvilosas,
responsáveis pela mobilização e distribuição das secreções endometriais na 2ª
fase (secretora).
Já na 2ª fase do ciclo (fase lútea), há acúmulo de glicogênio, e as glândulas
endometriais ficam edemaciadas e tortuosas, com arteríolas dilatadas e
espiraladas. Tal fase denomina-se secretora, também com alusão ao padrão
endometrial. O número de receptores de estrogênio cai, mas o de progesterona
permanece. A progesterona tem por função bloquear a maioria dos receptores
endometriais de estrogênio remanescentes.
A 3ª e última fase endometrial é a menstruação. Com a falta de esteroides
sexuais, há profundo espasmo vascular da artéria espiral, causando isquemia
endometrial. Simultaneamente, há ruptura dos lisossomas e liberação de
enzimas proteolíticas, que promovem destruição adicional do tecido. Essa
camada de endométrio é eliminada sob a forma de sangramento menstrual,
deixando a decídua basal como fonte para o crescimento endometrial
subsequente.

Figura 9 - Alterações hormonal, folicular e endometrial no ciclo menstrual normal


Figura 10 - Ciclo menstrual

5. Muco cervical
O muco cervical também sofre profundas alterações com as variações
hormonais, de modo a tornar-se mais receptivo à passagem dos
espermatozoides na fase pré-ovulatória e menos receptivo na fase lútea tardia.
Na 1ª fase, as concentrações crescentes de E2 determinam o aumento na
quantidade de muco, que também fica mais fluido e com maior filância
(Figura 11). Nessa etapa, cristaliza-se “em folha de samambaia” quando
colocado sobre uma lâmina e aquecido (Figura 12). Na 2ª fase, o aumento
progressivo da progesterona o torna mais viscoso e espesso, com aspecto
opaco.
Figura 11 - Filância do muco na fase fértil

Figura 12 - Cristalização do muco na lâmina

6. Esteroidogênese ovariana
Agora que já entendemos como ocorrem a regulação do eixo hipotalâmico-
hipofisário-ovariano e sua ação no endométrio, vamos compreender como
ocorre a produção dos hormônios femininos pelos ovários e suprarrenal.
A molécula-chave para a produção dos hormônios esteroides nos ovários e
nas glândulas adrenais é, principalmente, o LDL, absorvido da circulação
periférica. Por meio de vias (cascatas de reações) próprias de cada órgão, o
colesterol sofre transformações, chegando às moléculas finais. Há 2 vias
principais para a esteroidogênese – delta 4 e delta 5. O início delas e as
moléculas iniciais são semelhantes, mas a ativação preferencial de uma ou de
outra enzima determina a via a ser seguida, bem como os seus principais
produtos finais.
Figura 13 - Resumo da via de esteroidogênese

Nas adrenais, a via preferencial é a chamada delta 4, que transformará o


colesterol nos androgênios androstenediona e sulfato de
deidroepiandrosterona (S-DHEA). A produção androgênica será mais bem
descrita no final do capítulo.
Nos ovários, o mecanismo de esteroidogênese envolve as diferentes camadas
do órgão (teca e granulosa) com a produção de estrogênios e progesterona,
como veremos a seguir, pela via delta 5. O FSH encontra seus receptores na
camada granulosa do ovário e iniciará o estímulo para a etapa avançada do
desenvolvimento folicular e dominância. O LH alcançará os receptores da
teca para promover o amadurecimento final do folículo, o estímulo à
ovulação, a luteinização de suas células pós-ovulação e o funcionamento do
corpo lúteo. O próprio FSH é responsável pela indução do aparecimento de
seus receptores na camada granulosa e dos receptores de LH na camada da
teca.
A esteroidogênese ovariana ocorre nas células da granulosa e da teca, que
possuem papéis complementares, formando o sistema de 2 células-2
gonadotrofinas: as células da teca interna, sob o estímulo do LH, produzem os
substratos androgênicos (testosterona e androstenediona), que se difundem
para a camada das células da granulosa, onde sofrem ação da aromatase sob
estímulo do FSH, formando estradiol. Existe também, em uma proporção
significativamente menor, a produção de estrona pelas células da granulosa. A
Figura 15 ilustra o mecanismo 2 células-2 gonadotrofinas.

Figura 14 - Ciclo hormonal


Figura 15 - Teoria das 2 células-2 gonadotrofinas

A - Esteroidogênese ovariana – fase folicular


O FSH estimula o crescimento folicular e a aromatização (complexo
enzimático aromatase, que transforma a androstenediona e testosterona em
estradiol) nas células da granulosa no folículo pré-antral. Nessa fase, o LH
age sobre as células da teca estimulando a produção de androstenediona e
testosterona a partir do colesterol, formando, portanto, substratos para a
produção de estrogênio pelas células da granulosa.
É importante lembrar que a rota hormonal bioquímica é unidirecional, ou seja,
os androgênios são convertidos em estrogênios, mas os estrogênios, uma vez
formados, não voltam mais a ser convertidos em androgênios.
Os principais estímulos à aromatização são a presença do androgênio
produzido pelas células da teca e a ação do FSH nas células da granulosa.
Como coadjuvantes nesse processo, há a presença da ativina e da inibina. Esta
última aumenta o efeito da estimulação do LH sobre a síntese de androgênios
na teca, enquanto a ativina eleva a produção dos receptores FSH nas células
da granulosa e reduz a secreção de androgênios pela granulosa.
Como mencionado, o crescente aumento na produção de estrogênio pelo
folículo antral determina queda na secreção hipofisária de FSH, reduzindo a
atividade da aromatase, ocorrendo androgenização intrafolicular. Um dos
folículos recrutados não sofrerá influência da queda de FSH e continuará seu
crescimento, evoluindo para a ovulação.

B - Esteroidogênese – fase lútea

Após a ovulação, há a formação do corpo lúteo, que passa a produzir


estradiol, progesterona e inibina A sob estímulo do LH. Para a produção
hormonal na fase lútea ser adequada, é necessário que a fase folicular tenha
ocorrido normalmente. O acúmulo de receptores de LH nas células da
granulosa, na fase folicular, garante a luteinização do folículo roto e, portanto,
adequada esteroidogênese do corpo lúteo.
O LH estimula a produção de receptores de membrana para o colesterol LDL
no corpo lúteo, que funciona como substrato para a produção de estrogênio e
progesterona. Ainda sob o efeito do LH sobre o corpo lúteo, há produção de
desmolase e 17-hidroxidesidrogenase, com consequente aumento na produção
de estrogênio e progesterona (Figura 16).
Figura 16 - Esteroidogênese

Após 14 dias de corpo lúteo, o corpo lúteo degenera, formando o corpo


albicans. Caso haja gestação, a gonadotrofina coriônica humana (HCG) ocupa
os receptores do LH, mantendo a atividade do corpo lúteo até o momento em
que a placenta adquira a capacidade endócrina de produzir progesterona.

C - Produção extragonadal de estrogênio


A contribuição extragonadal para os níveis sanguíneos de estrogênio pode
alcançar significativas proporções. Entretanto, a suprarrenal contribui
indiretamente para o nível total de estrogênio, porém não secreta quantidades
apreciáveis deste na circulação. Isso é realizado pela conversão periférica de
precursores androgênicos, principalmente androstenediona, para estrogênio.
Dessa forma, os estresses físico e mental podem aumentar a contribuição
adrenal de precursor de estrogênio e subsequente conversão para estrogênios,
podendo sustentar um nível sanguíneo de estrogênio no momento em que o
seu declínio é necessário para ocorrer a ovulação. Isso acontece nas atletas,
por exemplo, que podem ficar meses sem ovular e, portanto, sem menstruar.
O tecido adiposo é capaz de converter androstenediona em estrogênio
(estrona). O percentual de conversão aumenta com o aumento da massa
corpórea, o que explica a associação de obesidade com anovulação e elevada
incidência de câncer de endométrio nessa população (devido ao hiperestímulo
pelas altas doses de estrogênio).

Dica
Existem 3 tipos de estrogênio: estradiol (E2), produzido pelos ovários;
estrona (E1), produzido predominantemente na periferia (tecido adiposo,
fígado e músculo); estriol (E3), produzido pela placenta.

D - Produção de androgênios
Os androgênios são produzidos exclusivamente pelos ovários e pelas
suprarrenais, em diferentes proporções. A regulação da síntese de androgênios
é realizada por LH, ACTH e fatores intraglandulares parácrinos.
Aproximadamente 80% da testosterona sérica circulam ligados à globulina
carreadora de hormônio sexual (SHBG, do inglês sex hormone-binding
globulin), 19% circulam ligados à albumina de forma instável e 1% na forma
livre (essa é a forma que tem atividade biológica). O SHBG apresenta síntese
hepática estimulada pelos estrogênios e pelo hormônio tireoidiano e inibida
pelos androgênios e pela insulina. Logo, a ação androgênica poderá ser
aumentada ou atenuada em função da produção de SHBG.
Outro fator que afeta clinicamente a resposta androgênica é a atividade da 5-
alfarredutase, encontrada nas células da unidade pilossebácea, que transforma
testosterona em diidrotestosterona (androgênio com atividade biológica mais
potente). Portanto, os níveis de SHBG e a atividade da 5-alfarredutase podem
modificar as ações da testosterona plasmática. Há, ainda, a conversão
periférica de androgênios em estrogênio realizado pela aromatase presente no
fígado, músculo e tecido adiposo.
As principais fontes androgênicas são testosterona, diidrotestosterona,
androstenediona, deidroepiandrosterona (DHEA) e S-DHEAS. A camada
reticular da suprarrenal sintetiza androgênios (esteroides C-19) a partir da
progesterona e da 17-hidroxiprogesterona, sob ação da 21-hidroxilase. Cerca
de 90% da secreção adrenal correspondem a DHEA ou S-DHEA.
Figura 17 - Produção da diidrotestosterona

Testosterona: principal androgênio circulante:


25% adrenal;
25% ovariano;
50% conversão periférica da androstenediona. A androstenediona
pode ser convertida no fígado e outros órgãos periféricos em
testosterona. Observe-se que a androstenediona também pode ser
convertida em testosterona, não só em estrona).
Androstenediona: sua produção é de 50% ovários e 50% adrenais. É
convertida perifericamente em testosterona, diidrotestosterona e estrona.
Sua potência é baixa, correspondendo a 10% da potência da testosterona;
DHEA:
80% adrenal;
20% ovários + hidrólise S-DHEA.
S-DHEA:
Quase 100% adrenal;
Marcador de produção androgênica adrenal primária;
64% conversão em DHEA.

Figura 18 - Produção de androgênios no sexo feminino

Os androgênios produzidos nos folículos ovarianos sofrem aromatização


induzida por FSH, formando estrogênio. Os androgênios em baixa
concentração potencializam a atividade da aromatase e produção de
estrogênio. Porém, em concentrações elevadas de androgênio, as células da
granulosa favorecem a conversão de androgênios para androgênio mais
potente que não pode ser convertido em estrogênio e são capazes de inibir a
formação dos receptores LH induzidos pelo FSH. Assim, aumentando a
concentração local de androgênios acima de um nível crítico, há inibição da
emergência do FD, levando a atresia folicular. Essa ação no ciclo normal pode
ser importante para assegurar que somente 1 folículo alcance o ponto de
ovulação, mas uma concentração excessiva de androgênios pode impedir o
ciclo normal e causar anovulação crônica, como nos casos de síndrome dos
ovários policísticos – vide capítulo sobre transtornos menstruais.

Dica
O excedente de androgênios produzidos pelas células da teca também pode
ser convertido em estrogênio na periferia (aromatização periférica). Os
órgãos e tecidos que apresentam aromatase são tecido adiposo, fígado e
músculo esquelético. Por isso, mulheres obesas ou com sobrepeso
apresentam maior conversão periférica de androgênios em estrogênio. O
estrogênio periférico é a estrona.

Resumo
Colesterol

É a molécula primordial para a produção de hormônios esteroidais;


São 2 as vias metabólicas para esteroides sexuais: delta 4 e delta 5;
Nos ovários, predomina a via delta 5 e, nas suprarrenais, a delta 4.

Teoria das 2 células-2 gonadotrofinas


O LH liga-se aos receptores da teca e transforma o colesterol absorvido do
sangue periférico em testosterona e androstenediona, por meio da via delta 4.
O FSH, na sequência, liga-se aos receptores da granulosa e, por meio da
enzima aromatase – estimulada pelo FSH –, transforma os androgênios em
estrogênios.
Funções do pico do hormônio luteinizante

Amadurecimento final do folículo;


Estímulo à ovulação pela lise de células parietais do folículo pré-
ovulatório;
Luteinização das células remanescentes do folículo, transformando-o em
corpo lúteo, com função de produção de E2 e progesterona;
A 1ª fase do ciclo menstrual é caracterizada por elevação do FSH,
recrutando folículos, entre eles o FD, responsável pelo aumento do
estrogênio, causando o pico de LH, evento que acarretará a ovulação;
Após a ovulação, ocorre a formação do corpo lúteo, principal
responsável pela manutenção do alto nível progestogênico da 2ª fase.
Dentro de 14 dias, ocorre a degeneração do corpo lúteo, causando
decréscimo nos níveis de estrogênio e progesterona, com consequente
isquemia e necrose do tecido endometrial proliferado, acarretando a
menstruação. Se houver fecundação e gestação, o HCG ocupa os
receptores de LH, mantendo a atividade do corpo lúteo.

Eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano

A interação entre o hipotálamo, a hipófise e o ovário é responsável pelo


ciclo menstrual;
O GnRH controla a liberação do FSH e do LH. A secreção do GnRH
acontece de forma pulsátil e varia em frequência e amplitude durante o
ciclo menstrual;
O aumento na frequência e na amplitude do GnRH, na metade do ciclo,
favorece a ovulação.

Ciclo menstrual

Inicia-se no dia em que começa o sangramento menstrual (1º dia) e


termina no dia imediatamente anterior ao sangramento seguinte;
Tem duração média de 24 a 38 dias;
Dividido em fases folicular e lútea:
Fase folicular: o aumento progressivo do FSH inicia o processo de
recrutamento folicular; um deles será o FD. A ovulação é
engatilhada pelo rápido aumento dos níveis circulantes de estradiol,
resultando no pico de LH, expulsão do oócito (ovulação) e
formação do corpo lúteo;
Fase lútea: início da produção de progesterona e 2º aumento no
estradiol, mantendo a secreção pulsátil do GnRH com maior
amplitude.

Ciclo endometrial

Fase proliferativa: proliferação endometrial sob estímulo estrogênico.


Suas glândulas se apresentam estreitas e tubulares;
Fase secretora: há acúmulo de glicogênio, e as glândulas endometriais
ficam edemaciadas e tortuosas, com arteríolas dilatadas e espiraladas;
Fase menstrual: descamação da camada superficial endometrial.

Muco cervical

1ª fase: as concentrações crescentes de E2 determinam o aumento na


quantidade de muco, que também fica mais fluido e com maior filância,
com cristalização “em folha de samambaia”;
- 2ª fase: o aumento progressivo da progesterona o torna mais viscoso e
espesso, com aspecto opaco.
Anticoncepção
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Definição
A anticoncepção consiste em permitir a uma mulher decidir quantos filhos
deseja ter e o momento de tê-los. Engloba, portanto, medidas contraceptivas e
progestacionais, alcançadas por meio de orientação adequada oferecida por
uma equipe multidisciplinar treinada para esse fim.
A paciente tem o direito de conhecer todos os métodos disponíveis, seus
riscos e benefícios para ter uma decisão livre e bem embasada. Esse
aconselhamento deve considerar as características próprias de cada mulher e
as de cada método.
Elaborado em 1933 por Raymond Pearl, o Índice de Pearl (IP) é o número de
falhas do método a cada 100 mulheres/ano. Objetivamente, acompanha-se
uma amostra de 100 mulheres usuárias do método por 1 ano. O número de
gestações ocorridas nesse intervalo de tempo é o IP. A Federação Brasileira
das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), em
concordância com a Organização Mundial da Saúde (OMS), considera que o
método é eficaz quando o IP é inferior a 1 (IP <1). Diversos métodos
apresentam IP superior a 1, especialmente os comportamentais. Entretanto, as
orientações médicas devem ser feitas respeitando-se a satisfação da paciente
com o método, bem como seus valores sociais, culturais e religiosos. É
importante ressaltar que o IP varia entre o uso perfeito (ideal) e o uso habitual
(real, considerando esquecimento, uso inadequado), ou seja, como deveria ser
usado na teoria e como ocorre na prática.
Observe-se que todos os métodos que possuem IP abaixo de 1 com uso
correto (todos os hormonais, o dispositivo intrauterino – DIU – de cobre, o
DIU com levonorgestrel e os métodos cirúrgicos) são considerados eficazes.

2. Métodos contraceptivos

A - Comportamentais
Os índices de falha são altos com esses métodos, pois dependem de intensa
motivação do casal e variações biológicas individuais.

a) Abstinência sexual periódica

Consiste na identificação do período fértil e consequente prática de


abstinência sexual nesse período. Existem várias formas de identificação do
período fértil, descritas a seguir.
- Tabelinha
A “tabelinha”, ou método de Ogino-Knauss, baseia-se na abstinência
periódica nos dias considerados férteis após o reconhecimento desse período.
A mulher deve anotar cerca de 6 a 12 ciclos menstruais com padrão regular.
Considere-se que:

A ovulação ocorre entre 12 e 16 dias antes da menstruação;


O óvulo pode ser fecundado no período de 12 a 24 horas após a
ovulação;
O espermatozoide pode fecundar até 72 horas após a ejaculação;

Na prática, a mulher observa o seu ciclo mais longo e o mais curto em 6 a 12


meses: do mais longo, subtraem-se 11 dias e, do mais curto, 18 dias. O
intervalo entre esses dias do ciclo é considerado o período fértil, quando a
mulher deverá abster-se de relações sexuais vaginais.
Exemplificando:
X = ciclo mais curto - 18 dias.
Y = ciclo mais longo - 11 dias.
Se uma paciente observou o padrão dos seus ciclos nos últimos 6 meses, o
mais curto foi de 26 dias e o mais longo de 30, calcula-se:
X = 26 - 18; X = 8.
Y = 30 - 11; Y = 19.
Inserindo os dias no ciclo, o casal deve evitar relações sexuais entre os dias 8
e 19 daquele ciclo. Lembrando que o 1º dia do ciclo é o 1º dia da
menstruação.
Uma atenção que se deve ter é que esse método só pode ser usado em
mulheres cuja menstruação adianta menos de 4 dias e atrasa menos de 2 dias,
ou seja, em ciclos entre 26 e 32 dias.
Tem elevada taxa de falha: cerca de 24 gestações/100 mulheres/ano de uso.
- Método da temperatura basal
O método da temperatura basal requer medidas diárias de temperatura oral,
retal ou vaginal em repouso pela manhã. Elevação de cerca de 0,5°C (0,3 a
0,8°C) na medida da temperatura basal é um indicativo de que ocorreu
ovulação. O casal deve abster-se de relações sexuais desde a menstruação até
3 dias após a elevação da temperatura. Esse fenômeno ocorre porque a
progesterona apresenta efeito termogênico. Portanto, se há aumento da
temperatura corpórea, há progesterona (ou seja, existe corpo lúteo proveniente
de uma ovulação).
- Método de Billings
O exame diário do muco cervical, também chamado método de Billings,
consiste na observação das suas características. O muco é mais fluido e
elástico no período fértil, semelhante à clara de ovo, e mais espesso e opaco
no período pós-ovulatório ou não fértil. Se a paciente nota a alteração
característica do muco, o casal deve evitar relações sexuais. A paciente deve
acompanhar as modificações do muco, que se torna mais fino, filante e
elástico, lembrando clara de ovo – essas 3 características sugerem a ação do
estrogênio no muco cervical. Quando a secreção se torna mais espessa e
opaca, o casal deve evitar relações por mais 4 dias. A progesterona torna o
muco opaco e mais espesso. A taxa de falha é de 5,3 a 32,1 gestações/100
mulheres/ano, ou seja, bastante variável, podendo ser muito elevada,
dependendo da capacidade da mulher em perceber e interpretar as
características do muco.
- Método sintotérmico
O método sintotérmico é a associação dos métodos de muco cervical e
temperatura basal ou muco cervical e “tabelinha”. Outros sinais sistêmicos
que sugerem ovulação, como dor ovulatória e sangramento intermenstrual,
também podem ser avaliados. A taxa de falha também é alta (cerca de 4,9 a
34,4 gestações/100 mulheres/ano).

b) Coito interrompido

O coito interrompido consiste na ejaculação extravaginal e tem altas taxas de


falha. O líquido pré-ejaculatório pode conter espermatozoides vivos, o que
aumenta o índice de falha desse método. Não protege contra as Infecções
Sexualmente Transmissíveis (ISTs), e há risco de disfunção sexual. A taxa de
falha é altíssima: de 4 a 27 gestações/100 mulheres/ano.

B - Barreira
São métodos anticoncepcionais que funcionam de forma mecânica ou
química, impedindo a ascensão dos espermatozoides pelo útero e pelas
trompas – não há fecundação do oócito nas tubas. A associação entre os
químicos e mecânicos aumenta a eficácia contraceptiva do método.
Além do preservativo feminino e do masculino, os métodos de barreira
cervical (diafragma, capuz cervical e esponjas) têm importante papel auxiliar
na redução da transmissão de ISTs, visto que a cérvice uterina é porta de
entrada para essas doenças.

Importante
O preservativo masculino e o feminino são os únicos métodos
anticoncepcionais que protegem contra infecções sexualmente
transmissíveis, inclusive HIV/AIDS.

a) Preservativos masculino e feminino

O preservativo masculino e o feminino não apresentam contraindicações; pelo


contrário, recomenda-se seu uso mesmo quando associado a outro método
contraceptivo. O IP do condom masculino é de 2 a 8. O preservativo feminino
apresenta limitação em seu uso em pacientes virgens. Não são tão eficazes
como métodos contraceptivos quanto os métodos hormonais. Falhas no uso de
condom masculino são associadas ao mau uso do método, na maioria das
vezes, e à lubrificação insuficiente durante seu uso ou preservativo
danificado. Deve-se evitar o uso de lubrificantes oleosos nos preservativos de
látex. Os únicos efeitos colaterais são sintomas alérgicos em indivíduos
sensíveis ao látex ou aos lubrificantes.
Os preservativos masculino e feminino devem ser utilizado em todo coito
com o objetivo de prevenir a transmissão e o contágio das ISTs, além de ser
alternativa a casais que não têm indicação de métodos irreversíveis e
apresentam contraindicação aos métodos hormonais e intrauterinos.
O preservativo masculino protege contra as seguintes ISTs: clamídia,
gonorreia, herpes genital, sífilis, tricomoníase, hepatite B e HIV. A eficácia
contraceptiva dos preservativos femininos pode aumentar quando utilizado
com lubrificantes íntimos, preferencialmente aqueles à base de água, com
nonoxinol-9. Os preservativos femininos não podem ser utilizados em
pacientes com prolapsos genitais.
Figura 1 - Preservativo feminino

Importante
Por apresentarem um Índice de Pearl (IP) inferior a 1, as questões de prova
costumam abordar casos de pacientes usuárias de condom como método
contraceptivo quando existe a possibilidade de gravidez. Gestação
ectópica, sangramento por abortamento e outras causas obstétricas devem
ser levados em conta como possibilidades diagnósticas. Dificilmente são
abordados casos de pacientes que usam métodos eficazes, como
anticoncepcionais hormonais ou DIU; em geral, o método citado é o
condom.

b) Capuz cervical
O capuz cervical, que não existe no Brasil, consiste em dispositivo de látex
que se adapta e adere ao colo uterino por sucção. Tem eficácia semelhante à
do diafragma, entretanto é bastante suscetível ao manuseio equivocado da
paciente. É contraindicado a casos de infecções vaginais ou Doença
Inflamatória Pélvica (DIP), virgens e quando há defeito anatômico que o
impeça de ser colocado.

c) Diafragma

O diafragma (Figura 2) é um objeto em formato de concha de látex ou


silicone, colocado sob o colo uterino, ocluindo o canal cervical. Sua eficácia é
baixa (de 6 a 12 gestações por 100 mulheres/ano). Pode ser usado associado
ao espermicida, a ser colocado em 2 etapas distintas: inicialmente na borda e
parte côncava do diafragma antes de ser inserido; posteriormente antes das
relações sexuais, com aplicador vaginal. O diafragma é colocado até 2 horas
antes das relações sexuais e deve permanecer após o coito, por 6 horas. Sua
vida média útil gira em torno de 3 anos.
São pontos importantes:

Contraindicações ao uso: infecção genital, DIP, virgens, alterações


anatômicas, alto risco ou portadoras de HIV, infecção urinária e
candidíase de repetição, história de síndrome do choque tóxico;
Possíveis candidatas ao uso: doença cardíaca valvar complicada e outras
condições clínicas em que o uso de hormônios ofereça riscos relevantes
(por não apresentar efeito sistêmico), baixo risco para infecções pelo
HIV e outras ISTs, quando a paciente não deseja fazer uso de hormônios;
Diminuição da ocorrência (porém sem eliminação do risco) das seguintes
ISTs: gonococo e clamídia;
Não proteção contra as seguintes ISTs: HIV, papilomavírus humano
(HPV), herpes genital e tricomoníase.

E ainda:

Pode ocorrer corrimento vaginal intenso de odor fétido caso o diafragma


seja deixado por muito tempo no local;
Pode provocar dor pélvica, cólicas e retenção urinária se mal colocado –
fator de risco para infecção de trato urinário;
Pode ocasionar síndrome do choque tóxico, que também pode ocorrer
durante o uso de absorventes internos;
Deve ser retirado durante a menstruação;
Não interfere no aleitamento materno.

Figura 2 - Diafragma

d) Espermicida

O espermicida (ou espermaticida) tem como ação imobilizar e destruir os


espermatozoides, e a substância mais frequentemente utilizada é o nonoxinol-
9. Geralmente, é utilizado em associação a outro método de barreira para
aumentar a eficácia. Não é muito efetivo se utilizado isoladamente e não
protege contra ISTs.
O uso repetitivo de espermicidas pode provocar lesões (fissuras e
microfissuras vaginais, cervicais e retais) nas mucosas vaginal e retal,
dependendo da frequência de uso e do volume aplicado. Esse fato aumenta o
risco de transmissão do HIV e outras ISTs. Logo, mulheres com risco
aumentado de IST e HIV, assim como aquelas com muitas relações sexuais
diárias, não devem fazer uso dessas substâncias. Outras contraindicações são
DIP e/ou cervicite atual ou nos últimos 3 meses, ou casos de alergia ao
produto.
Outras características:

Não interferência no aleitamento materno;


Irritação ou alergia na vagina ou no pênis: 1 a 5%;
Possível aumento do risco de candidíase, vaginose e infecção do tato
urinário na mulher.
e) Esponja vaginal

A esponja vaginal deve absorver o sêmen e bloquear a entrada dos


espermatozoides no canal cervical, contendo o nonoxinol-9. Contudo, não é
encontrada no Brasil.

f) Dispositivo intrauterino

O DIU é um método contraceptivo que fica alojado na cavidade uterina.


Atualmente, os modelos disponíveis são:
DIU de cobre – TCu 380A (modelo mais usado): altamente eficaz em
prevenir gestação. Nova T e Multiload são modelos que podem ser úteis em
mulheres com canal cervical estenótico, porém apresentam menor eficácia;
DIU hormonal – medicado com levonorgestrel: também chamado sistema
intrauterino liberador de levonorgestrel (SIU-LNG) – Mirena® (Figura 3).

Figura 3 - Modelos de dispositivos intrauterinos

- Mecanismo de ação
O mecanismo de ação do DIU é a reação do tipo corpo estranho. A presença
do corpo estranho no interior da cavidade uterina aumenta a concentração de
marcadores inflamatórios no líquido uterino e tubário e altera o seu pH; dessa
forma, cria um ambiente hostil à sobrevivência do espermatozoide e à
ocorrência da fecundação. Com esse mecanismo, a possibilidade de
fecundação é muito baixa. Os íons de cobre também têm efeito direto na
motilidade espermática, reduzindo a capacidade de penetração no muco
cervical. Para a OMS, há a interferência em etapas prévias à fertilização, por
isso é considerado método não abortivo.
- Eficácia
Alta, com taxas de 0,6 gestação por 100 mulheres/ano. Sua durabilidade varia
de 5 a 10 anos, dependendo do modelo estudado. O DIU de cobre TCu 380A
tem durabilidade de 10 anos. O modelo Multiload tem validade de 5 anos.
- Indicações
Qualquer mulher sem contraindicação ao seu uso, especialmente aquelas que
buscam contracepção não hormonal, confiável, reversível e que independa do
coito.
- Efeitos colaterais
Pode ocorrer perfuração uterina durante a inserção do DIU. Fatores como
inserção pós-parto, operador inexperiente e útero extremamente
anteversofletido ou retrovertido são fatores de risco para o evento.
A expulsão do DIU varia de 2 a 10% das usuárias e geralmente ocorre nos
primeiros dias após a inserção. As taxas de inserção costumam ser
inversamente proporcionais ao tempo de inserção. Pós-parto, nuliparidade e
expulsão prévia do DIU são fatores de risco para o evento.
Podem-se observar dismenorreia, aumento do fluxo menstrual e sangramento
intermenstrual.
- Contraindicações

Tema frequente de prova


As contraindicações para o uso do DIU são tema frequente nas questões
das provas de concursos médicos.

São contraindicações: gestação confirmada ou suspeita; presença de cervicite


purulenta; pacientes com dismenorreia moderada a grave; fluxo menstrual já
volumoso; alterações anatômicas, como útero bicorno ou didelfo, septo
longitudinal ou transverso; moléstia inflamatória pélvica aguda no último
mês; antecedentes de 2 ou mais episódios de moléstia inflamatória pélvica
aguda no último ano; sangramento genital não esclarecido; tuberculose
pélvica; câncer de colo, corpo uterino ou ovário.
As discrasias sanguíneas (doença de von Willebrand, e deficiência de fator
VIII) e a trombocitopenia também contraindicam o seu uso, devido ao risco
de hemorragia. A doença de Wilson é uma patologia em que existe
diminuição na capacidade de excreção do cobre, com isso também
contraindica o uso do DIU de cobre. A infecção pelo HIV levando ao quadro
de AIDS é outra contraindicação. Por outro lado, um conceito estigmatizado
de que o DIU não poderia ser utilizado por nuligestas é obsoleto. Diversos
estudos recentes têm demonstrado que o método é seguro e pode ser utilizado
tanto por pacientes que já gestaram quanto por pacientes que não gestaram.
- Informações importantes

Importante
O DIU não é considerado abortivo, pois previne a fertilização.

Em virtude do maior risco de infecção ascendente pelo trato reprodutivo


feminino, deve-se orientar a paciente a procurar assistência médica sempre
que apresentar leucorreia, dor pélvica, sangramento vaginal anormal, febre
com suspeita de infecção pélvica ou atraso menstrual.
- Dispositivo intrauterino e infecção pélvica
De modo geral, o risco de aquisição de uma infecção pélvica em usuária de
DIU é o dobro em relação à população geral e muito mais elevado nas
semanas subsequentes à colocação, explicando-se, portanto, que a principal
causa de infecção seja diretamente relacionada à exposição prévia da paciente
a um agente sexualmente transmissível. Estudos recentes comprovam que o
maior risco de infecção pélvica ocorre até 20 dias após a sua inserção.
Portadoras de infecção assintomática por clamídia e gonococo tendem a
apresentar um quadro de DIP sintomática após a inserção do DIU. Mesmo
sabendo que as usuárias de DIU têm maior chance de infecção, as taxas dessa
complicação são baixas, diminuindo com o tempo. Um estudo da OMS
mostra que, após 7 anos de uso, a taxa foi de 1% das usuárias; outros estudos
americanos mostraram taxas de infecção de 1,6 a 1,8 vez maior em usuárias
de DIU de cobre (em comparação com as não usuárias do método).
O maior temor quando uma usuária de DIU é acometida por uma infecção
pélvica – chamada DIP ou moléstia inflamatória pélvica aguda – é que as
complicações, em longo prazo, podem ser graves, aumentando a chance de
esterilidade por dano irreversível ao epitélio endotubário nas tubas uterinas.
É comum a infecção por Actinomyces em pacientes usuárias de DIU. A
condição clínica é denominada actinomicose. Até 20% dos esfregaços
cervicais em usuárias de DIU de cobre são positivos para esse germe. O
tratamento é feito com antibiótico (penicilina G, tetraciclina ou doxiciclina).
- Dispositivo intrauterino e gestação
A remoção do DIU está indicada imediatamente, assim que o diagnóstico de
gestação intrauterina é confirmado, para evitar a principal complicação de
uma gestação com o método, que é o aborto espontâneo (50 a 60% dos casos).
A imensa maioria desses abortamentos ocorre no 2º trimestre, muitas vezes
em situação de infecção (aborto séptico). A retirada do DIU por si só pode
provocar um abortamento, porém permite aumentar as chances de sucesso da
gravidez. Após a remoção do dispositivo, o risco de abortamento é de,
aproximadamente, 30%, chegando a 75% com a manutenção do dispositivo,
que também está associado a parto prematuro. A retirada do DIU pode ser
feita por histeroscopia durante a gestação.
Com relação à gestação ectópica, o risco nas usuárias de DIU é menor do que
entre as mulheres que não usam nenhum método contraceptivo; por outro
lado, se uma usuária do método engravidar, será imperativo pensar em
gestação ectópica, pois a proteção concedida pelo DIU é maior para gravidez
tópica do que para ectópica. Logo, o DIU não aumenta o risco de gravidez
ectópica, mas, caso a gestação ocorra, há maior chance de que ela o seja.

Importante
O DIU não aumenta o risco de gravidez ectópica, mas, caso a gestação
ocorra, há maior chance de que ela o seja.
g) Dispositivo intrauterino medicado com progesterona
(sistema intrauterino liberador de levonorgestrel) –
Mirena®

O DIU com levonorgestrel, ou sistema intrauterino liberador de levonorgestrel


(SIU-LNG), é um reservatório de levonorgestrel (progestogênio sintético)
com liberação intrauterina, durabilidade de 5 anos, menos efeitos colaterais e
eficácia um pouco maior que a do DIU de cobre. O retorno à fertilidade após
a sua retirada é quase imediato. A liberação de progesterona intrauterina torna
o muco cervical espesso e hostil à penetração do espermatozoide, além de
inibir a resposta endometrial ao estradiol circulante (efeito antiproliferativo
endometrial).
Seguem características importantes do SIU-LNG:

Cerca de 20% das pacientes evoluem para amenorreia no 1º ano após a


inserção. Do 2º ao 5º ano, esse número aumenta para 50%;
Pode ser utilizado como veículo para terapia de reposição hormonal;
Pode ser utilizado no tratamento de sangramento uterino anormal,
hiperplasia endometrial e da adenomiose;
No tratamento da endometriose, observa-se redução da dor pélvica
crônica e da dismenorreia;
Há pouca absorção sistêmica da progesterona. Em consequência, pode
ocorrer inibição parcial do desenvolvimento folicular ovariano e da
ovulação; 15% das pacientes apresentam ciclos anovulatórios;
SIU-LNG e gravidez: o SIU também deve ser removido, como na
gestação com DIU de cobre e, se necessário, por via histeroscópica.
Entretanto, se gestação avançada (>12 semanas) e DIU distante do
orifício interno do colo, deve-se evitar a sua retirada, pois a taxa de
insucesso é bastante elevada. Neste caso, a gestação seguirá com o DIU
intracavitário e risco aumentado de abortamento, trabalho de parto
prematuro e infecções.

Cerca de 30% das usuárias apresentarão cistos ovarianos funcionais à


ultrassonografia. Esses cistos costumam ser assintomáticos e tendem a
desaparecer. Portanto, a conduta diante de um achado de cistos ovarianos
simples em usuárias de SIU-LNG é expectante.

Figura 4 - Sistema intrauterino com liberação contínua de levonorgestrel


As contraindicações do DIU com levonorgestrel são as mesmas do DIU de
cobre, com exceção dos casos de sangramento excessivo, dismenorreia e
doença de Wilson. O SIU-LNG foi desenvolvido justamente para diminuir o
sangramento excessivo. Portanto, pacientes que apresentam fluxo intenso e
pacientes com discrasias sanguíneas (doença de von Willebrand e deficiência
de fator VIII) podem usar o SIU-LNG. É importante lembrar que as alterações
anatômicas do útero que costumam provocar sangramento excessivo (miomas
submucosos grandes, por exemplo) seguem como contraindicação ao uso de
SIU-LNG, assim como do DIU de cobre.
Pacientes com dismenorreia intensa também podem usar SIU-LNG. A
liberação contínua de progesterona tende a diminuir a sintomatologia. A
doença de Wilson, que contraindica o uso de DIU de cobre, não contraindica
o uso de SIU-LNG.
A contraindicação ao uso do SIU-LNG que não se aplica ao DIU de cobre é o
câncer de mama atual ou tratado. Como ainda não existem estudos robustos
que afirmem não haver risco, o SIU-LNG permanece contraindicado a essas
pacientes. A outra contraindicação é a cirrose grave. Apesar de a absorção do
levonorgestrel ser baixa, o risco será aumentado em pacientes que
apresentarem essa condição.

h) Lactação e amenorreia

Em razão da hiperprolactinemia fisiológica e do hipoestrogenismo


decorrentes da amamentação, há inibição da função ovulatória quando o
aleitamento é exclusivo, normalmente nos primeiros 6 meses pós-parto, e se a
mulher se mantém em amenorreia. Nessas condições, a eficácia é alta, com
taxas de falha de 2 gestações por 100 mulheres/ano. A amamentação não tem
efeitos colaterais e estimula a formação e o vínculo mãe-bebê. Quando
quaisquer das condições descritas não estão mais presentes, o método deve
ser substituído por outro que não interfira na amamentação. Normalmente,
opta-se por métodos não hormonais ou com progestogênio exclusivo, uma vez
que o estrogênio influencia a redução da lactação.

Importante
Durante a amamentação, normalmente se opta por métodos não hormonais
ou com progestogênio exclusivo, uma vez que o estrogênio influencia a
redução da lactação.

C - Métodos hormonais

a) Contraceptivos hormonais orais

São as popularmente chamadas pílulas anticoncepcionais, que se dividem em


monofásicas (todos os comprimidos têm a mesma dosagem de
medicamentos), bifásicas (2 dosagens diferentes na cartela) e trifásicas (3
dosagens). Podem ser combinados quando são compostos de 2 esteroides
(estrogênio + progestogênio) ou de progestogênio exclusivo (Figura 5). A
composição estrogênica da maioria dos contraceptivos combinados é feita
com o etinilestradiol (estrogênio sintético), mas já existem pílulas com
valerato de estradiol e 17-betaestradiol (estrogênios com molécula similar ao
estrogênio endógeno natural). Os contraceptivos hormonais orais combinados
podem ser classificados quanto à dosagem de estrogênios.
Os contraceptivos de progestogênio exclusivo podem ser do tipo minipílula,
com dosagem de progestogênio que varia de 1/2 a 1/10 da quantidade de
progestogênio dos contraceptivos combinados e está indicada ao período de
amamentação, visto que sua eficácia menor pode ser compensada pelo efeito
anticoncepcional da lactação; e do tipo pílula, somente com desogestrel,
75µg, eficaz mesmo fora da lactação. Induzem amenorreia, logo são bastante
empregados em pacientes que se beneficiam dessa condição, como na
endometriose, anemia ferropriva por sangramento excessivo ou outras. As
pílulas de progestogênio exclusivo também são consideradas boa opção para
as pacientes com contraindicação ao uso de estrogênio: história pessoal
pregressa de tromboembolismo venoso, enxaqueca com aura, tabagismo
acima de 35 anos, cirrose hepática, hipertensão arterial descontrolada,
diabetes mellitus com lesão vascular etc.
O mecanismo de ação da pílula apenas de progesterona envolve:

Espessamento do muco cervical, dificultando a penetração e a ascensão


dos espermatozoides;
Inibição da ovulação pelo bloqueio do pico de hormônio luteinizante
(LH);
Alterações endometriais (hipo ou atrofia);
Alterações da motilidade tubária.
Figura 5 - Anticoncepcionais orais de progestogênio exclusivo

O mecanismo de ação da pílula combinada (estrogênio + progesterona)


envolve a supressão da ovulação, que acontece pela inibição da secreção
hipotalâmica dos fatores liberadores das gonadotrofinas, fundamentalmente o
GnRH, assim como pela inibição da síntese de gonadotrofinas hipofisárias. O
progestogênio inibe a secreção do LH, e o componente estrogênico promove
uma discreta proliferação endometrial para permitir que o sangramento ocorra
somente durante o período de pausa. Há, ainda, modificação no muco
cervical, redução na motilidade ciliar tubária e transformação inadequada do
endométrio, corroborando para a infertilidade reversível associada ao uso de
contraceptivo hormonal oral combinado.

Tema frequente de prova


Devem-se fixar as contraindicações aos métodos contraceptivos orais
combinados. O tema é bastante prevalente nas questões das provas de
concursos médicos.
Na Tabela 6, estão os efeitos colaterais dos contraceptivos hormonais orais
combinados (ACOs), lembrando que a intensidade desses efeitos depende da
dosagem hormonal e do tipo de progestogênio utilizado.
Importante
Recentemente, um estudo feito na Dinamarca encontrou um pequeno
aumento do risco de câncer de mama associado ao uso de anticoncepcional
hormonal. O risco relativo desse câncer em usuárias de anticoncepcional
hormonal foi de 1,09 para quem usou por menos de 1 ano e 1,38 para quem
o usou por mais de 10 anos. Apesar de haver um aumento de risco pela
conclusão desse estudo, ainda é considerado um aumento pequeno (13
casos a cada 100.000 mulheres/ano).
Importante
Anticoncepcionais hormonais orais combinados, sobretudo aqueles de dose
muito baixa, podem cursar com sangramentos de escape (spotting). Isso
pode ocorrer principalmente nos 3 primeiros ciclos, mas também ao longo
do uso prolongado, devido a hipotrofia endometrial.

A diferença no progestogênio tem grande influência no seu poder


androgênico; os derivados da 19-nortestosterona têm os maiores efeitos
androgênicos e diabetogênicos. Outras alterações indesejáveis são maior
ocorrência de hipercoagulabilidade e tendência à retenção hídrica, podendo
elevar os níveis tensionais.
O etinilestradiol é o principal estrogênio nos ACOs e cursa com aumento do
substrato de renina, elevando a síntese de angiotensina e a produção de
aldosterona, gerando vasoconstrição e retenção de sódio e água, com
consequente elevação pressórica. Entretanto, não é frequente a hipertensão
ocasionada pelo uso de ACO, mas pode haver piora de hipertensão
preexistente. O impacto hepático do estrogênio é dose-dependente. Apresenta,
ainda, perfil protrombótico dose-dependente, reduz o colesterol total e o LDL
e aumenta o HDL.
O componente progestacional dos anticoncepcionais é variável e apresenta
particularidades. Os principais progestogênios utilizados nos contraceptivos
hormonais são divididos em classes conforme a sua geração:

1ª geração – noretisterona: faz parte do grupo das primeiras


progesteronas sintéticas introduzidas. Possui efeito progestacional fraco
e elevada ação androgênica e está associado ao risco de eventos
trombogênicos em associação ao etinilestradiol. Há evidências de
diminuição do colesterol HDL, aumento do LDL e aumento de
triglicérides;
2ª geração – levonorgestrel: desenvolvido a partir da noretisterona,
apresenta maior seletividade pelo receptor da progesterona. Estudos
evidenciam diminuição considerável no risco de eventos
tromboembólicos em relação à noretisterona. Entretanto, apresenta
importante atividade androgênica. As evidências clínicas também
mostram piora no perfil lipídico (diminuição do HDL e aumento do LDL
e de triglicérides);
3ª geração – desogestrel e gestodeno: foram desenvolvidos para
diminuir o efeito androgênico e o impacto negativo no perfil lipídico e
possuem afinidade 2 vezes maior com o receptor de progesterona e 2
vezes menor com o receptor de androgênios. Além disso, evidenciam
melhora do perfil lipídico (aumento do HDL e diminuição do LDL e
triglicérides). Entretanto, um grande ensaio clínico realizado na
Inglaterra (Carper et al., 1995) evidenciou um aumento substancial no
risco tromboembólico em relação ao levonorgestrel e à noretisterona.
Estudos posteriores confirmaram o achado, e o risco trombogênico é 2
vezes maior em relação aos progestogênios noretisterona e
levonorgestrel;
4ª geração – drospirenona, dienogeste e nomegestrol: são
progestogênios com efeito antimineralocorticoide e antiandrogênico que
apresentam maior risco trombogênico do que o desogestrel e o
gestodeno. Em relação ao perfil lipídico, determina aumento do HDL e
diminuição do LDL e triglicérides.

Dessa forma, constata-se que, quanto mais antiandrogênico for um


progestogênio, maior será o seu risco tromboembólico. Conclui-se, portanto,
que o progestogênio de menor risco trombogênico é o levonorgestrel.
A ciproterona é um progestogênio derivado da 17-alfa-hidroxiprogesterona
que não se enquadra em nenhuma das gerações de progestogênios. Foi
desenvolvida com o intuito de apresentar o maior efeito antiandrogênico, o
que faz que, consequentemente, seja a que apresenta o maior risco
trombogênico. De qualquer forma, é importante lembrar que esses riscos
associados ao progestogênio isoladamente são baixos (quase desprezíveis)
quando comparados ao risco do componente estrogênico. Além disso, o risco
de fenômenos tromboembólicos da própria alteração fisiológica da gestação é
maior do que o risco do progestogênio isoladamente (isso significa que a
gravidez oferece maior risco do que usar uma progesterona de 4ª geração ou
ciproterona).
As contraindicações aos ACOs podem-se dividir em 2 subgrupos:
Aqueles considerados na categoria 3 de risco, denominados no passado como
contraindicação relativa, que correspondem ao grupo de pacientes em que o
método não é o mais apropriado;
Os pacientes na categoria 4, antes considerados como contraindicação
absoluta, em que o uso de ACO é inaceitável, definitivamente proibido.
b) Injetáveis

Podem ser mensais ou trimestrais. Os primeiros são combinados e compostos


de estrogênios naturais e progestogênios. Os trimestrais são exclusivos de
progestogênios – acetato de medroxiprogesterona de depósito (AMP-D).
O AMP-D tem eficácia semelhante à da esterilização e melhor que a dos
contraceptivos orais combinados. Sua maior vantagem está no fato de poder
ser usado em pacientes com contraindicações ao estrogênio, como mulheres
fumantes acima dos 35 anos, hipertensas e diabéticas. Há segurança também
em seu uso nos transtornos convulsivos, anemia falciforme, doença cardíaca
congênita, enxaqueca com aura e história prévia de tromboembolismo. Outras
características importantes:

Drogas antiepilépticas podem aumentar a atividade das enzimas


hepáticas, reduzindo a eficácia dos ACOs. Entretanto, o AMP-D
apresenta níveis hormonais muito elevados; assim, mesmo com a
atividade das enzimas hepáticas aumentada nesses pacientes, não há
redução da eficácia contraceptiva de AMP-D. Além disso, os
progestogênios aumentam o limiar convulsivo em pacientes epilépticas;
O AMP-D reduz as células vermelhas falciformes, bem como a
frequência e intensidade das crises falcêmicas, sendo o contraceptivo de
escolha a pacientes com anemia falciforme;
Pode ser utilizado com segurança durante a amamentação.
c) Transdérmicos, anel vaginal e implante

Os transdérmicos (adesivo) e o anel vaginal são compostos mistos de


estrogênios sintéticos e progestogênios, que diferem dos contraceptivos orais
por sua via de aplicação, que não têm a 1ª passagem hepática. Têm a
vantagem posológica de 1 aplicação por semana para o adesivo e 1 por mês
para o anel, e suas contraindicações são as mesmas dos contraceptivos
combinados orais. Os efeitos colaterais também costumam ser semelhantes
aos dos contraceptivos orais, diferindo apenas na sensibilidade gástrica, em
razão da via de administração. Os adesivos transdérmicos têm diminuição da
sua absorção em pacientes com 90kg ou mais de peso. Nessas pacientes, o
excesso de tecido adiposo pode diminuir a absorção hormonal e elevar a sua
taxa de falhas.
Os implantes contêm progestogênio exclusivo, que é liberado em microdoses
diárias. Sua ação ocorre por inibição da ovulação e espessamento do muco
cervical com alterações endometriais, diminuindo a espessura deste. São
altamente eficazes, com taxa de 0,05 gestação a cada 100 mulheres/ano. O
efeito colateral mais comum, que leva à interrupção do método, é o
sangramento uterino irregular, que pode ocorrer de forma imprevisível em
usuárias de implantes. Outros efeitos colaterais são alterações de humor,
cefaleia e diminuição da libido. São indicados para praticamente todas
aquelas que se adaptem ao método e têm duração de 3 anos.
Figura 6 - (A) Adesivo transdérmico; (B) anel vaginal; (C) implante
Importante
O retorno à fertilidade após a interrupção dos anticoncepcionais é imediato
em todos os métodos não hormonais (barreira, comportamentais e DIU de
cobre) e também nos hormonais de uso diário ou mensal (pílulas
combinadas ou de progestogênio exclusivo, anel, implante, transdérmico,
injetável mensal). Só não é imediato, podendo levar meses para ocorrer o
retorno à fertilidade, no injetável trimestral.

Importante
Têm sido discutidas políticas públicas para a implementação de métodos
de longa duração, mas reversíveis para pacientes do Sistema Único de
Saúde (SUS). São métodos eficazes, de longa duração e com completa
reversibilidade após a interrupção, por isso denominados LARCs (Long-
Acting Reversible Contraceptives). Incluem-se na definição de LARCs o
DIU de cobre, o DIU com levonorgestrel e o implante subdérmico. Alguns
serviços já dispõem dos LARCs, sobretudo para pacientes adolescentes,
pela baixa adesão aos demais métodos ou por desejo da paciente.

d) Contracepção de emergência

Está indicada para relações sexuais desprotegidas (falha do uso da


anticoncepção ou ausência dela) e casos de violência sexual. É considerada
não abortiva por não agir na implantação do blastocisto; atua inibindo a
ovulação ou o adequado desenvolvimento do corpo lúteo, do endométrio ou
do muco cervical, ou alterando a fisiologia das tubas uterinas ou dos
espermatozoides. Sua ação depende do momento do ciclo menstrual em que a
contracepção de emergência é administrada:

Se a mulher estiver na 1ª fase do ciclo, antes da ovulação: antes do pico


de LH, o Contraceptivo de Emergência (CE) altera o crescimento
folicular, impedindo ou retardando a ovulação por muitos dias;
Se ocorrer após a ovulação na 2ª fase do ciclo: o CE altera o transporte
dos espermatozoides e do óvulo pela tuba uterina, modificando o muco
cervical (hostil) e interferindo na capacitação do espermatozoide.

Podem ser feitos 2 esquemas: com contraceptivo combinado ou apenas com


levonorgestrel isolado. A eficácia é similar para ambos os métodos, porém
com menores efeitos colaterais no segundo.
No levonorgestrel isolado, utiliza-se 1 comprimido (0,75µg) a cada 12 horas
em 2 tomadas ou 2 comprimidos em dose única (o que equivale a 1,5mg de
levonorgestrel), o mais precocemente possível, de preferência nas primeiras
72 horas pós-coito. Pode ser associado ou não à ingestão de antiemético e
administrado até o 5º dia após a relação sexual. Entretanto, a sua eficácia é
inversamente proporcional ao tempo decorrido da atividade sexual. A taxa de
gestação é de 1,1%.
No regime contraceptivo combinado (método de Yuzpe), utiliza-se
levonorgestrel 500µg + etinilestradiol 100µg, em 2 tomadas (a cada 12 horas).
A 1ª dose deve ser oferecida, de preferência, nas primeiras 72 horas pós-coito.
A taxa de gestação é de 3,2%.
É importante lembrar que:

Mulheres com história de AVC, tromboembolismo, diabetes com


complicações vasculares e enxaqueca severa podem usar CE de
levonorgestrel isolado;
A única contraindicação ao uso de CE com levonorgestrel isolado é
gravidez confirmada;
Não há comprovação de teratogenicidade no uso de CE com
levonorgestrel isolado;
São efeitos colaterais do levonorgestrel isolado: náuseas (40 a 50%),
vômitos, vertigem, cefaleia e mastalgia, com remissão espontânea nas
primeiras 24 horas após a sua administração.

Há, também, a possibilidade de inserção de DIU de cobre como opção de CE.


A RU-486, ou mifepristona, inibe a ação da progesterona. Ingerida até 7
semanas, a contar do 1º dia da última menstruação, impede a fixação e a
manutenção do embrião no útero. A eficiência como abortivo sobe para 97%
quando associada à prostaglandina, substância que faz o útero contrair.
Adotada como alternativa ao aborto cirúrgico nos países que autorizam a
interrupção da gravidez, a RU-486 está proibida no Brasil, ao contrário do CE
à base de levonorgestrel.
D - Métodos definitivos de esterilização

a) Feminino: laqueadura tubária

Quando se opta pela Laqueadura Tubária (LT), o casal deve ter plena
consciência de que esse é um método definitivo (sua reversão é possível,
porém tem poucos resultados positivos) e requer intervenção cirúrgica e
anestesia (Figura 7). Quanto às técnicas, pode ser realizada por
videolaparoscopia, via abdominal (mini-Pfannenstiel ou periumbilical no
puerpério imediato) ou vaginal. As tubas podem ser cauterizadas,
seccionadas, ou pode-se optar pela utilização de um anel tubário ou grampo.
A Legislação Brasileira estipula que:

A LT só pode ser feita se a paciente tem plena capacidade civil ou sob


autorização judicial se for necessária a LT em mulheres consideradas
incapazes perante a lei;
A idade deve ser superior a 25 anos ou ≥2 filhos vivos (sem considerar o
feto da gestação em curso);
Deve-se respeitar um intervalo mínimo de 60 dias entre a manifestação
do desejo de LT e sua realização, período em que o casal deve conhecer
todos os métodos contraceptivos disponíveis, sendo realizado
aconselhamento multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização
precoce;
Consentimento pós-informado deve ser assinado pela paciente ou pelo
casal, em caso de relação conjugal estável. Logo, o cônjuge tem de
assinar o termo de consentimento para a LT;
Fora dessas situações, a LT só pode ser realizada se a paciente se
encontra em risco de morte ou nos casos de agravo à saúde em gestações
futuras, o que deve ser comprovado por um relatório assinado por 2
médicos;
A LT não pode ser realizada durante o parto ou aborto. Para que a LT
seja realizada no intraparto, após aborto ou período puerperal, deve ser
comprovada a necessidade, como risco iminente de ruptura uterina por
sucessivas cesáreas prévias (Lei nº 9.263, de 1996, que regulamenta o
planejamento familiar). O exemplo mais clássico é a LT durante a
cesariana. Não é possível realizá-la durante a cesariana, exceto se
comprovada necessidade por sucessivas cesarianas anteriores. O médico
deve registrar no prontuário que existia risco iminente de ruptura uterina
ou a ruptura ocorreu de fato e a realização da LT está legalmente
respaldada. A esterilização cirúrgica como método contraceptivo só pode
ser realizada por LT ou vasectomia. Não pode ser feita por histerectomia
ou ooforectomia.

Tema frequente de prova


É importante fixar a legislação vigente sobre a esterilização cirúrgica. A
idade mínima necessária ou o número de filhos vivos e o tempo de
assinatura do consentimento informado (mínimo de 60 dias antes do
procedimento) são temas muito frequentes em questões de prova de
concursos médicos.

Figura 7 - Laqueadura tubária

b) Masculino: vasectomia

Trata-se do método de esterilização definitiva oferecido aos homens. Devem


ser respeitadas as mesmas condições já colocadas para a esterilização
feminina. A legislação para a realização da vasectomia é a mesma da LT (em
se tratando de homens com mais de 25 anos ou com 2 filhos vivos, deve haver
um intervalo de 60 dias entre a assinatura do consentimento e a realização do
ato cirúrgico, além da assinatura da parceira no consentimento em caso de
relação conjugal estável).
Também apresenta alta eficácia, com taxas de falha de 0,1 a 0,15 gestação por
100 homens/ano. A reversão do método é possível, porém com poucos
resultados; logo, a decisão deve ser considerada definitiva.

c) Implante endotubário (Essure®)

Trazido ao Brasil em 2009, trata-se da colocação, por via endoscópica, de


dispositivos semelhantes a pequenas molas de metal inseridas nos óstios
tubários que promovem a fibrose local, com consequente obstrução tubária
definitiva. Tem a vantagem de ser um procedimento ambulatorial que
dispensa qualquer anestesia ou sedação e promove contracepção permanente.
Como é um método que envolve treinamento específico para inserção, tem
baixas taxas de utilização no Brasil.

Resumo
Índice de Pearl
Número de gestações ocorridas em 100 usuárias de um método
contraceptivo por ano
Classes de métodos contraceptivos
- Hormonais:
· Contraceptivos hormonais orais: contraceptivos de progestogênio
exclusivo (minipílula, indicada ao período de amamentação, ou
pílula de desogestrel, eficaz mesmo fora da lactação) e
contraceptivos orais combinados;
· Injetáveis: mensais (compostos de estrogênios naturais e
progestogênios) ou trimestrais (progestogênios exclusivos);
· Transdérmicos (adesivo) e anel vaginal: compostos mistos de
estrogênios sintéticos e progestogênios;
· Implantes: contêm progestogênio exclusivo liberado em
microdoses diárias;
· Contracepção de emergência: mais comumente, 1 comprimido de
levonorgestrel (750µg) a cada 12 horas em 2 tomadas ou 2
comprimidos em dose única (1,5mg), o mais precocemente
possível.
- Não hormonais:
· Barreira:
* Preservativos masculino e feminino: os únicos métodos
anticoncepcionais que protegem contra IST;
* Diafragma: objeto em formato de concha, colocado sobre o
colo uterino, ocluindo o canal cervical;
* Espermicida (ou espermaticida): tem como ação imobilizar e
destruir os espermatozoides;
* Esponja vaginal: absorção do sêmen e bloqueio da entrada
dos espermatozoides no canal cervical.
· DIU: método contraceptivo alojado dentro da cavidade uterina.
Atualmente, os modelos disponíveis são o DIU de cobre ou o SIU-
LNG (DIU com liberação de levonorgestrel);
· Comportamentais:
* “Tabelinha”: abstinência periódica nos dias considerados
férteis;
* Coito interrompido: ejaculação extravaginal;
* Muco cervical: observação das suas características, mais
fluido e elástico no período fértil;
* Temperatura basal: medidas diárias da temperatura basal,
elevação de cerca de 0,5°C é indicativa de ovulação (abster-se
de relações sexuais desde a menstruação até 3 dias após a
elevação da temperatura);
* Método sintotérmico: associação dos métodos do muco
cervical e temperatura basal ou muco cervical e “tabelinha”.
· Definitivos:
* LT: as tubas podem ser cauterizadas, seccionadas, ou pode-se
optar por um anel tubário ou grampo;
* Vasectomia: método contraceptivo definitivo masculino.
Mecanismos de ação dos métodos contraceptivos hormonais
combinados de estrogênios e progestogênios
(anticoncepcionais/injetáveis mensais/transdérmicos/anel vaginal)
- Espessamento do muco cervical;
- Hipotrofia endometrial;
- Alteração da motilidade tubária;
- Inibição da secreção de LH pela progesterona;
- Inibição do eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano.
Mecanismos de ação dos contraceptivos exclusivos de progestogênios
(minipílula, implante subcutâneo, SIU-LNG)
- Espessamento do muco cervical;
- Diminuição da motilidade tubária;
- Hipotrofia endometrial.
Amenorreias
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Introdução
Amenorreia é um dos assuntos mais frequentes nas questões das provas de
concursos médicos.

Quadro clínico
Amenorreia é a ausência de menstruação por 6 meses ou pelo tempo
correspondente a 3 ciclos consecutivos da paciente (é necessário avaliar, na
anamnese, o padrão habitual da paciente).

A definição de amenorreia de acordo com os 3 ciclos consecutivos deve ser


individualizada. Exemplos:

Pacientes que costumam menstruar de 24 em 24 dias apresentarão


amenorreia quando a menstruação faltar por 2 meses e 12 dias ou se
estiverem sem menstruar há 6 meses;
Se a ausência da menstruação não preencher os 2 critérios definidores de
amenorreia, caracteriza-se o quadro clínico como atraso menstrual.

Trata-se de um sintoma que pode ser proveniente de diversas causas no eixo


hipotalâmico-hipofisário-ovariano-uterino. A amenorreia pode ser dividida
em primária (quando a mulher nunca menstruou) e secundária (quando há a
interrupção temporária dos ciclos menstruais).

2. Classificação
Semiologicamente, a amenorreia é dividida em primária e secundária.

A - Primária

Ausência de menarca e caracteres sexuais secundários aos 14 anos, ou


ausência de menarca aos 16 anos, mesmo com desenvolvimento normal
desses caracteres. A prevalência é baixa: cerca de 0,4% das mulheres púberes.

B - Secundária
Ausência de menstruação por 3 ciclos consecutivos ou por 180 dias (6 meses).
Indubitavelmente, a ocorrência de amenorreia secundária é muito maior do
que a primária.

3. Etiologia
Primeiramente, precisamos compreender que a amenorreia pode advir de
alterações em um dos seguintes pontos:

Distúrbio do sistema genital (útero, endométrio) ou na saída do fluxo


menstrual (hímen imperfurado);
Distúrbios ovarianos;
Distúrbios da hipófise anterior;
Distúrbios hipotalâmicos ou do Sistema Nervoso Central (SNC).

Além dessa avaliação, podemos avaliar se a amenorreia apresenta cunho


hormonal ou anatômico. E, naquelas que apresentam alteração hormonal,
devemos definir se são hipogonadotróficas, eugonadotróficas ou
hipergonadotróficas, de acordo com os níveis de gonadotrofinas – hormônio
luteinizante (LH) e hormônio folículo-estimulante (FSH) – circulantes, a fim
de definir a localização no eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano. Já o termo
“gonadismo” diz respeito ao funcionamento do ovário (gônada).

Importante
Atenção ao significado dos termos na definição das amenorreias: híper,
hipo ou eugonadotrófico têm a ver com os níveis de gonadotrofinas
(hormônio luteinizante – LH – e hormônio folículo-estimulante – FSH)
circulantes; híper ou hipogonadismo dizem respeito ao funcionamento dos
ovários (gônadas).
Figura 1 - Exigências básicas para a função menstrual normal
Fonte: Endocrinologia Ginecológica Clínica e Infertilidade, 8ª edição.

Etiologias da amenorreia primária:

Hipogonadismo hipergonadotrófico:
45,X e variantes;
46,XX;
46,XY.
Eugonadismo:
Agenesia mülleriana;
Septo vaginal;
Hímen imperfurado;
Síndrome da insensibilidade androgênica;
Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP);
Hiperplasia de suprarrenal congênita;
Doença de Cushing;
Doença tireoidiana.
Níveis baixos de FSH sem o desenvolvimento das mamas:
Atraso constitucional;
Deficiência de hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH);
Outras doenças do SNC;
Doença hipofisária;
Transtornos alimentares, estresse, excesso de exercícios.

Etiologia de amenorreia secundária:

Níveis baixos ou normais de FSH:


Transtornos alimentares, estresse, excesso de exercícios;
Distúrbios hipotalâmicos inespecíficos;
Anovulação crônica, incluindo SOP;
Hipotireoidismo;
Síndrome de Cushing;
Tumor hipofisário/sela vazia;
Síndrome de Sheehan.
Níveis elevados de FSH: insuficiência gonadal:
46,XX;
Cariótipo anormal;
Falência ovariana precoce.
Níveis elevados de prolactina;
Anatômica:
Síndrome de Asherman.
Estados hiperandrogênicos:
Hiperplasia de suprarrenal congênita de início tardio (não clássica);
Tumor ovariano;
Sem diagnóstico.

E, finalmente, a classificação etiológica que vamos seguir, por uma questão


didática (Tabela 2).
A - Gestação

A principal suspeita diagnóstica em pacientes na menacma que apresentam


amenorreia é gestação.

Dica
A principal causa de amenorreia secundária é gestação.

Diagnóstico
A solicitação da fração beta da gonadotrofina coriônica humana (beta-
HCG) é o exame mandatório inicial na investigação da amenorreia
secundária.

B - Causas anatômicas
a) Herdadas

Geralmente, são causas canaliculares, ou seja, alterações anatômicas do útero


que cursam com obstrução da via de saída da menstruação e as agenesias
uterinas congênitas. Nesse grupo, encontram-se as anormalidades
müllerianas.

Importante
Os ductos müllerianos são responsáveis pela formação da genitália interna
feminina (útero, tubas e 2 terços superiores da vagina). A genitália externa
feminina desenvolve-se na ausência de androgênios; logo, na presença
destes, há formação de genitália externa masculina. O desenvolvimento dos
ductos de Wolff são responsáveis pela formação da genitália interna
masculina, e o desenvolvimento das mamas é um indicador confiável da
produção de estrogênio ou reposição exógena dele. Logo, se há
desenvolvimento da mama e não há menarca, possivelmente o distúrbio é
do sistema genital. O crescimento de pelos pubianos reflete a produção de
androgênios ou exposição exógena. Considere-se, ainda, que o
desenvolvimento mamário e de pelos deve ser proporcional, no mesmo
estágio. Assim, se há desenvolvimento das mamas, com pelos pubianos
reduzidos ou escassos, possivelmente há síndrome da insensibilidade
androgênica.

Hímen imperfurado: pacientes com hímen imperfurado apresentam


amenorreia primária, cariótipo normal 46,XX e função ovariana e
desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários também normais. O
sangramento menstrual não se exterioriza (criptomenorreia: o prefixo
“cripto” vem do grego e significa “escondido”). O sangramento
menstrual acumula-se na vagina (hematocolpo), no útero (hematométrio)
e nas tubas uterinas (hematossalpinge) e pode derramar no peritônio
(hematoperitônio). Acarreta dor abdominal que se acentua ciclicamente,
amenorreia primária, sintomas compatíveis com o período menstrual
(dismenorreia e eventuais sintomas de síndrome pré-menstrual) e
desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários normais. Ao exame
físico, pode ser observado abaulamento da membrana himenal
imperfurada. Pode complicar com endometriose. Não pode ser inserida
agulha com objetivo diagnóstico, pelo risco de converter hematocolpo
em piocolpo (infecção);
Septo vaginal transverso: a presença de septo transverso obstrui a saída
da menstruação na topografia da vagina. O quadro clínico também será
de amenorreia primária. As pacientes apresentam ciclicamente sintomas
de menstruação, mas também não ocorre a exteriorização do fluxo
(criptomenorreia);
Septo vaginal vertical: observa-se falha na fusão dos ductos
müllerianos; na maioria, causa dispareunia e obstrução no canal do parto;
Síndrome de Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser ou agenesia uterina:
é uma anomalia congênita em que não ocorre o desenvolvimento dos
ductos de Müller, logo não há desenvolvimento da genitália interna
feminina. A paciente apresenta agenesia/atresia dos 2 terços superiores
da vagina e agenesia/atresia uterina (útero rudimentar, geralmente sólido
e bipartido). Como os ovários são normais, há o desenvolvimento dos
caracteres sexuais secundários (mamas) e presença de pelos axilares e
pudendos normais. Nesses casos, não há sintomas uterinos relacionados
ao ciclo menstrual. A amenorreia, nesse caso, é primária. É a 2ª causa
mais frequente de amenorreia primária;
Figura 2 - Ressonância magnética de paciente com a síndrome de Rokitansky: note-se a
ausência de útero e tubas uterinas

Insensibilidade androgênica completa (distúrbio do desenvolvimento


sexual XY): síndrome de Morris – cariótipo 46,XY, com formação de
gônadas testiculares. Entretanto, há resistência completa aos
androgênios, assim a formação da genitália externa é feminina. Não há
desenvolvimento da genitália interna feminina nem masculina (produção
testicular do fator antimülleriano e ausência de resposta nos ductos de
Wolff aos androgênios). Há ausência de pelos, e as gônadas são
representadas por testículos; a amenorreia é primária, por agenesia
completa do útero. A síndrome de Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser e a
síndrome da insensibilidade completa ao androgênio (SIA) são
importantes diagnósticos diferenciais entre si; ambas cursam com
genitália externa feminina, ausência de genitália interna feminina e
desenvolvimento mamário presente. Entretanto, na SIA, há redução ou
ausência de pelos pubianos e axilares (caractere sexual secundário
androgênio dependente) e cariótipo 46,XY, com presença de gônadas
testiculares;
Figura 3 - Síndrome de Morris

Distúrbio do desenvolvimento sexual ovotesticular: é o antigo


hermafroditismo verdadeiro. A ausência de útero leva a amenorreia
primária;
Estenose cervical (atresia cervical): o estreitamento congênito do colo
uterino também provoca criptomenorreia. Nessas situações, a amenorreia
será primária;
Fusão labial: embora sejam estruturalmente normais, os lábios vaginais
de algumas meninas podem apresentar-se fortemente aderidos, levando à
obstrução e amenorreia. O tratamento é realizado com creme de
estrogênio tópico associado ou não à separação manual.

b) Adquiridas

Síndrome de Asherman: sinéquias intrauterinas que surgem após


curetagem, cesárea, extração manual da placenta ou endometrite e
Doença Inflamatória Pélvica (DIP). A realização de procedimentos
cirúrgicos pode levar à ocorrência de aderências endometriais, com
consequente colabamento do útero (Figura 4). A destruição do
endométrio basal impede o espessamento endometrial em resposta aos
esteroides ovarianos. A síndrome de Asherman é a causa canalicular
mais comum de amenorreia secundária. O procedimento mais associado
à síndrome é a curetagem uterina que, quando utilizada de forma
intempestiva, pode levar à destruição da lâmina basal do endométrio,
com geração de aderências intrauterinas. Além da amenorreia, as
pacientes podem se apresentar com dismenorreia, hipomenorreia,
infertilidade ou abortamento recorrente. Na realização do teste do
estrogênio (estrogênios conjugados 0,625mg/d por 10 a 14 dias, seguidos
de medroxiprogesterona 10mg/d por 5 a 7 dias), não há sangramento
menstrual, refletindo a resposta endometrial ausente ou reduzida ao
estímulo hormonal. O diagnóstico é sugerido pela histerossalpingografia
e firmado pela histeroscopia. A histeroscopia cirúrgica é o tratamento
primário, seguido da inserção de cateter intrauterino em balão por 7 a 10
dias para evitar recorrência das sinéquias. Observa-se, ainda, que a lesão
endometrial final do órgão e as sinéquias podem resultar de infecções
intrauterinas, como lesão bacteriana da camada funcional do endométrio,
tuberculose intrauterina e esquistossomose intrauterina. O diagnóstico de
tuberculose genital é realizado por biópsia endometrial (histopatológico
ou cultura) ou PCR em aspiração endometrial, e o diagnóstico de
esquistossomose é realizado pela detecção de ovos do parasita na urina,
fezes, raspagem retal, conteúdo menstrual ou no endométrio;
Figura 4 - Representação das sinéquias uterinas

Dica
Deve-se estar atento às questões que descrevem pacientes com
amenorreia submetidas a procedimentos cirúrgicos pélvicos, como
curetagem, parto cesárea e extração manual da placenta, além de
cicatrizes/sequelas de doença inflamatória pélvica aguda. O raciocínio
deve ser direcionado para a síndrome de Asherman caso o quadro
clínico seja compatível.

Síndrome de Youssef-Machado: amenorreia iatrogênica pós-cirúrgica


com formação de fístula vesicouterina. Nessas situações, ocorre um
trajeto fistuloso entre o útero e a bexiga, e a paciente apresenta hematúria
sempre que menstrua;
Estenose cervical (atresia cervical): o estreitamento iatrogênico do colo
uterino também pode provocar criptomenorreia. Nessas situações, a
amenorreia será secundária.
C - Causas hormonais

a) Hipogonadismo hipergonadotrófico

Os distúrbios ovarianos são as causas mais comuns de amenorreia e podem


levar a amenorreia primária ou secundária. Os distúrbios ovarianos que
cursam com hipogonadismo hipergonadotrófico decorrem, geralmente, de
falência ovariana (folículos ovarianos em pequena quantidade ou ausentes),
pois há baixo nível de esteroides, levando a diminuição do feedback negativo
e consequente aumento nos níveis do FSH e do LH. O hipogonadismo
hipergonadotrófico, geralmente, é disfunção primária ao nível ovariano –
menopausa, menopausa precoce ou Insuficiência Ovariana Prematura (IOP),
sendo, portanto, o principal diagnóstico etiológico. Entretanto, a falência
ovariana precoce possui inúmeras causas, podendo ser congênitas ou
adquiridas.
A relação entre os níveis elevados de gonadotrofinas e a ausência de folículo
ovariano devido à atresia folicular é bastante confiável, mas não totalmente.
Durante o período do climatério (perimenopausa), é normal o FSH subir antes
de parar a menstruação. É prematura quando ocorre antes dos 40 anos. Esse
aumento do FSH está associado à redução da inibina por menor competência
dos folículos ovarianos e porque há menor quantidade de folículos. É
importante salientar que FSH elevado não é um indicador absoluto de
infertilidade, logo pode ocorrer gestação nesses casos. A menopausa precoce
acontece quando a paciente tem menos de 40 anos e FSH >20 na 1ª fase do
ciclo menstrual (2 dosagens com intervalo ≥1 mês).

Figura 5 - Fisiologia do hipogonadismo hipergonadotrófico

O hipogonadismo hipergonadotrófico, geralmente, é causado por falência


ovariana, entretanto há exceções que são mencionadas a seguir. Muitas vezes
há, também, causas específicas para a falência ovariana precoce. Assim, por
questões meramente didáticas, vamos avaliar o hipogonadismo
hipergonadotrófico e possíveis etiologias: herdadas/congênitas (disgenesia
gonadal e distúrbios de genes isolados) ou adquiridas (infecção, autoimune,
iatrogênicas, ambientais ou idiopáticas).
Herdadas:

Disgenesia gonadal (síndrome de Turner – 45,X0): forma mais


comum de insuficiência gonadal primária, é a causa mais frequente de
falência ovariana precoce. Alguns estigmas, como baixa estatura,
pescoço alado, tórax “em escudo”, cúbito valgo, metacarpos curtos,
implantação baixa dos cabelos e palato curvo e alto são encontrados em
50% dessas pacientes. Também podem estar presentes malformações
cardiovasculares (coarctação da aorta), ausência de desenvolvimento das
mamas, hipertelorismo, anomalias renais, distúrbios autoimunes,
tireoidite autoimune e diabetes mellitus. Algumas pacientes apresentam
amenorreia primária, e outras podem ter alguns ciclos menstruais e, logo
após, entrar em falência ovariana precoce. Cerca de 10% possuem
folículos residuais suficientes para menstruar, mas raramente ficam
grávidas, e possuem vida menstrual e reprodutiva curta;
Mosaicismo cromossômico: cariótipo 45,X0 ou 46,XX. Apresenta
baixa estatura. Pode haver anormalidades somáticas e corpo eunucoide
(pernas e braços longos em relação ao corpo);
Disgenesia gonadal pura (46,XX ou 46,XY): fenótipo feminino,
infantilismo sexual, ausência de anormalidades cromossômicas.
Exemplo: síndrome de Swyer – mutações no SRY que resultam em
mulheres XY com disgenesia gonadal (um tipo de distúrbio do
desenvolvimento sexual XY);
Disgenesia gonadal mista (maioria XY): com genitália ambígua,
gônada em estria de um lado e testículo malformado de outro;
Deleção parcial do cromossomo X: fenótipo variável;
Síndrome do X frágil: pode levar a IOP; mutação com sequência tripla
repetida no gene FMR1 ligado ao X (>200 repetições CGG) +
deficiência mental + autismo. Se mulheres, apresentam de 13 a 26%
mais chances de evolução para IOP;
Deficiências enzimáticas:
Hiperplasia suprarrenal lipoide congênita: herança autossômica
recessiva, com incapacidade de converter colesterol em
pregnenolona;
Deficiência de 17-alfa-hidroxilase e de 17,20-desmolase:
hipertensão, hipocalemia, hipernatremia, diminuição do cortisol e
aumento do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH); mutação no
gene CYP17: diminuição da atividade da 17-alfa-hidroxilase →
diminuição do cortisol + diminuição de androgênios + diminuição
de estrogênio → aumento do ACTH → aumento de
mineralocorticoide → hipopotassemia + hipertensão. Infantilismo
sexual + amenorreia primária + hipertensão + hipopotassemia. Não
há o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários;
Deficiência de 21-hidroxilase: cerca de 90% dos casos de
Hiperplasia Adrenal Congênita (HAC);
Deficiência de aromatase: herança autossômica recessiva, com
virilização materna durante a gravidez (a placenta não pode
converter os androgênios fetais em estrogênios), ausência de telarca
na puberdade, virilização acentuada, atraso na idade óssea, ausência
de estirão de crescimento, ovários multicísticos, altos níveis de
testosterona e sulfato de deidroepiandrosterona (S-DHEA) e
estradiol indetectável;
Mutação no receptor de FSH/LH: acarreta síndrome do ovário
resistente (síndrome de Savage). O aumento no nível de FSH ou LH
e um nível basal ou baixo da outra gonadotrofina pode ocorrer em
rara condição devido a mutações homozigóticas no gene da
gonadotrofina. Heterozigotos apresentam problemas de infertilidade
relativa. O tratamento com gonadotrofina exógena permitirá
gestação nessas pacientes em raros casos.
Síndrome do ovário resistente ou insensível: apresenta-se
com amenorreia, crescimento e desenvolvimento normais,
aumento de gonadotrofinas, presença de folículos ovarianos e
ausência ou defeito nos receptores gonadotróficos nos folículos
ou defeito no sinalizador pós-receptor. Há casos raros de
pontos de mutações. Também pode ocorrer em uma subforma
de falência ovariana autoimune, sendo muito rara.
Galactosemia: bastante rara, é uma doença autossômica recessiva.
A alteração no gene GALT leva a deficiência da galactose-1-
fosfato-uridil-transferase. Seus metabólitos têm efeitos tóxicos
diretos sobre as células germinativas. Pode resultar em morte
neonatal, ataxia cerebelar, incapacidade cognitiva e catarata;
Síndrome de Perrault: autossômica recessiva, com falência
ovariana precoce e perda auditiva.

Adquiridas:

Tumores produtores de gonadotrofinas: geralmente associados a


câncer de pulmão. São muito infrequentes; logo, na presença de exame
físico e história normal, não é necessária a radiografia de tórax em
pacientes com amenorreia hipergonadotrófica;
Infecções: raras; podem ocorrer por ooforite por caxumba;
Doenças autoimunes:
40% dos casos de IOP;
Insuficiência poliglandular autoimune da hipófise, acompanhada de
hipotireoidismo e insuficiência suprarrenal;
Miastenia gravis;
Púrpura trombocitopênica trombótica;
Artrite reumatoide;
Vitiligo;
Anemia hemolítica autoimune. Assim, na ausência de diagnóstico
firmado, todas as mulheres com IOP devem ser investigadas para
doenças autoimunes.
Insuficiência ovariana iatrogênica: remoção cirúrgica dos ovários,
endometriose, DIP, radioterapia e quimioterapia (ciclofosfamida).
Agonista do GnRH durante ou antes da quimioterapia reduz as lesões
ovarianas provocadas por esta;
Adenomas hipofisários: o principal é o prolactinoma;
Aumento do FSH + LH normal ou baixo + massa pituitária =
adenoma gonadotrófico: não há sintomas complexos associados à
hipersecreção de gonadotrofinas. Assim, são geralmente diagnosticados
devido ao seu crescimento, que resulta em cefaleia e distúrbios visuais.
Em geral, são produtores de FSH e raramente LH. Esses tumores
secretam altos níveis da subunidade alfa do hormônio glicopeptídio e, às
vezes, somente a subunidade alfa. Logo, pacientes com tumor hipofisário
de natureza incerta devem ter os níveis de gonadotrofina e subunidade
alfa mensurados;
Tabagismo.
b) Hipogonadismo hipogonadotrófico hipotalâmico e
hipofisário

O Hipogonadismo Hipogonadotrófico (HH) é caracterizado por estradiol


<20pg/mL ou 0,02ng/mL + FSH <5UI/L e/ou LH <5. Geralmente, advém de
alterações centrais (hipotalâmicas ou hipofisárias) que podem ter as seguintes
etiologias:

Fisiológica: pré-puberdade e lactação;


Congênita: geralmente, não há outras alterações da pituitária;
Adquirida: pode cursar com outras alterações hormonais da pituitária,
como alterações de tireoide, prolactina e cortisol.
São causas: obesidade ou desnutrição, exercício, estresse,
medicações, tumores, doenças infiltrativas, infecção, trauma e
radiação.

O HH geralmente ocorre com doenças da pituitária devido a tumores e


acidente vascular encefálico, assim como outras desordens inflamatórias e
autoimunes.

Manifestações clínicas:

Pode haver fenótipo eunucoide clássico: segmento corpóreo inferior


>2cm do segmento corpóreo superior;
Desenvolvimento mamário moderado;
Amenorreia primária ou secundária;
O grau de desenvolvimento folicular depende da duração da deficiência
de gonadotrofinas: se congênito, poucos folículos além do estágio
primordial podem ser observados.

Avaliação das principais etiologias adquiridas associadas ao HH:

Lactação: eleva a produção de prolactina, que inibe a secreção pulsátil


de GnRH e mantém o FSH e LH dentro dos limites inferiores da
normalidade. Os baixos níveis de gonadotrofina não permitem que o
ovário apresente desenvolvimento folicular e secrete estrogênio. Pode
haver secura vaginal e dispareunia. Somente as mulheres em amenorreia
que amamentam exclusivamente no seio materno a intervalos regulares,
incluindo horários noturnos, durante os primeiros 6 meses após o parto,
apresentam proteção contraceptiva com a lactação, com 98% de eficácia;
Antes da puberdade: os níveis de gonadotrofina encontram-se baixos
(pré-púberes);
Atraso fisiológico ou puberdade tardia constitucional: reativação
tardia do gerador de pulsos do GnRH, geralmente com história familiar
prévia;
Hipotireoidismo: é uma das causas mais frequentes de amenorreia
secundária. A escassez dos hormônios T3 e T4 leva ao aumento do TSH,
cuja elevação é acompanhada de aumento do seu hormônio liberador no
hipotálamo (TRH). O excesso do TRH leva a uma diminuição na
pulsatilidade do GnRH;
Hiperprolactinemia: é uma das causas mais comuns de amenorreia
secundária e pode resultar em atraso na puberdade e amenorreia primária
quando surge antes da menarca. O aumento de prolactina altera ou inibe
o ritmo pulsátil normal do GnRH, levando a níveis baixos de
gonadotrofinas (FSH e LH), com consequentes anovulação e amenorreia.
Dosagens <15 a 20ng/mL excluem a hiperprolactinemia (na maioria dos
laboratórios). Caso haja prolactina na faixa de 20 a 40ng/mL, o exame
deve ser repetido e confirmado:
Hiperprolactinemia leve: prolactina sérica entre 20 e 50ng/mL.
Pode causar fase lútea curta;
Hiperprolactinemia moderada: prolactina 50 e 100ng/mL. Pode
causar oligomenorreia ou amenorreia;
Hiperprolactinemia alta: prolactina >100ng/mL. Resulta em
franco hipogonadismo, com baixos níveis de estrogênio e suas
consequências clínicas (ressecamento/atrofia vaginal e osteopenia).
Adenomas hipofisários: podem ser funcionantes (produtores de
hormônios hipofisários) ou não funcionantes (não produtores de
hormônios). Os funcionantes podem ser produtores de TSH (adenomas
tireotrofos funcionais), GH (adenomas somatotrofos) e ACTH
(corticotrofos) e são raros em mulheres com amenorreia. A maioria dos
adenomas gonadotrofos (produtores de gonadotrofinas) não é funcional,
e 80 a 90% de todos os adenomas hipofisários não funcionais derivam de
gonadotrofos, apesar de não produzirem quantidades significativas de
FSH e LH. Atenção: tumores hipofisários produtores de FSH são raros e
causam anovulação, amenorreia e múltiplos e grandes cistos ovarianos
por hiperestimulação ovariana. Os adenomas podem ser grandes
(macroadenomas >10mm) ou pequenos (microadenomas <10mm).
Quando macroadenomas, podem comprimir a haste hipofisária e
interferir no transporte dos fatores liberadores e inibidores
hipotalâmicos, ou comprimindo as células circulantes, levando a
deficiências hormonais hipofisárias (gonadotrofinas, TSH, ACTH e GH).
A deficiência de gonadotrofinas pode causar HH. Deficiências
moderadas de TSH, GH e ACTH geralmente causam pouco ou nenhum
sintoma;
Adenomas lactotrofos (prolactinomas): são comuns e representam
40% de todos os adenomas hipofisários reconhecidos clinicamente. Em
geral, os macroprolactinomas (>10mm) são produtores de prolactina em
níveis maiores que 200ng/mL. A hiperprolactinemia geralmente resulta
em distúrbios menstruais e é causa de amenorreia secundária em até 30%
das mulheres. Como citado, a hiperprolactinemia altera a produção de
GnRH (hipotalâmica), reduzindo a produção de gonadotrofinas
hipofisárias, com consequentes anovulação e amenorreia.
Aproximadamente 10% dos adenomas produtores de prolactina
produzem GH também. Assim, deve-se dosar IGF-1 em todas as
mulheres com prolactinoma, mesmo naquelas com microprolactinoma;
Síndrome da sela vazia: a sela turca é aumentada e parece vazia ao
exame de imagem porque contém líquido cerebrospinal. O tecido
hipofisário é achatado pelo líquido cerebrospinal contra o assoalho selar,
podendo ser “destruído”. Geralmente, resulta da remoção prévia ou da
destruição de um adenoma hipofisário por cirurgia, radiação ou infarto.
Pode, eventualmente, ser decorrente de defeito primário congênito no
diafragma selar (sela vazia primária). Na maioria das vezes, a condição é
benigna e não progride até a falha hipofisária. Pode, ainda, coexistir com
adenoma hipofisário, e, menos comumente, com deficiência na secreção
hormonal da glândula;
Síndrome de Sheehan: decorre do infarto agudo ou necrose isquêmica
hipofisária após hemorragia pós-parto ou de choque hipovolêmico. É
uma das causas mais comuns de hipopituitarismo. Ocorre falha na
lactação após o parto, e os demais sintomas variam de acordo com a
gravidade da lesão hipofisária. As deficiências de GH, prolactina e
gonadotrofinas (HH) são mais comuns. A maioria apresenta, ainda,
deficiência de ACTH e TSH. Um terço das pacientes pode apresentar
hiponatremia. Sela parcial ou completamente vazia é um achado tardio
comum;
Lesões infiltrativas hipofisárias: hemocromatose e hipofisite
linfocítica;
Tumores e processos inflamatórios ou degenerativos na porção
anterior do hipotálamo (lesões na porção posterior levam a
puberdade precoce): o craniofaringioma é o tumor mais comum;
Transtornos alimentares: comumente estão associados a perda
ponderal importante, com anorexia nervosa e bulimia nervosa. As
anormalidades metabólicas associadas à anorexia nervosa refletem a
regulação hipotalâmica do apetite, sede, temperatura, sono, equilíbrio
autonômico e secreção endócrina. Há baixas concentrações séricas de
FSH, LH estradiol, IGF-1 e leptina, assim como níveis elevados de
cortisol. Dessa forma, pode-se observar o desenvolvimento de HH nessas
pacientes. Com o ganho ponderal, todas as anormalidades
endocrinológicas se resolvem, mas 1/3 dessas pacientes permanece em
amenorreia por disfunção hipotalâmica persistente;
Estresse e exercícios físicos muito intensos: as catecolaminas e as
endorfinas liberadas nessas situações interferem na pulsatilidade do
GnRH; o estresse aumenta o CRH (hormônio liberador da
corticotrofina), que inibe diretamente o GnRH, assim como eleva
endorfina e ACTH. A endorfina elevada inibe o padrão de secreção do
GnRH. O ACTH elevado aumenta a produção de cortisol pela
suprarrenal, que também inibe a secreção de GnRH;
Iatrogênica: por medicamentos e drogas (metoclopramida, haloperidol,
clozapina, antidepressivos tricíclicos, bloqueadores dos canais de cálcio,
metildopa, digitálicos, maconha etc.)
Doenças crônicas terminais: câncer, AIDS e insuficiência renal
crônica. O organismo poupa-se da perda sanguínea menstrual,
armazenando energia para outros fins;
Doenças sistêmicas: obesidade, síndrome de Cushing, diabetes
descompensado, doença de Addison, insuficiência renal crônica e
insuficiência hepática crônica;
Pseudociese: são pacientes que acreditam estar grávidas e apresentam
sinais e sintomas de gestação, incluindo amenorreia, mas não se
encontram de fato gestantes. Há alterações na frequência de pulsos de
LH associadas a elevação nos níveis séricos de androgênios, levando a
amenorreia.
Algumas pacientes podem apresentar aumento de prolactina. Existe uma
ligação entre essas pacientes e o histórico de sofrimento obstétrico.

- Avaliação das principais etiologias


herdadas/congênitas associadas ao hipogonadismo
hipogonadotrófico

O HH Congênito (HHC) hipofisário habitualmente decorre de hipoplasia


hipofisária. As causas hipotalâmicas são as de maior repercussão e decorrem,
geralmente, do desenvolvimento anormal dos neurônios GnRH. Os neurônios
olfatórios têm uma embriologia similar à das células produtoras de GnRH. O
HHC com anosmia é causa rara de HH e acomete 1/50.000 mulheres.
Portanto, há 2 categorias de HHC: com anosmia (alteração olfativa),
denominada síndrome de Kallmann; e sem anosmia, denominada idiopática.
Com anosmia – síndrome de Kallmann: a maioria dos casos de síndrome
de Kallmann é esporádica e não pode ser passada por herança familiar. Há
associação aos seguintes genes:

KAL-1: migração neuronal GnRH incompleta. Herança ligada ao X;


A expressão do KAL-1 também ocorre nos seguintes tecidos: tubo
mesonéfrico, broto uretral e trato corticospinal, com 7 semanas de
gestação → agenesia renal unilateral (31%) + sincinesia (movimentos
involuntários da musculatura quando realizados movimentos rápidos ou
de repetição – 85%) + defeitos da linha média facial, como fenda
palatina;
Essas pacientes geralmente não apresentam puberdade, mas
desenvolvem algum grau de desenvolvimento mamário, pois a
deficiência de GnRH não é completa;
Ocorre em 3 a 15% dos casos de HH com anosmia.

KAL-2: associado a defeitos de face medial. Autossômica dominante;

De 7 a 10% das pacientes com síndrome de Kallmann;


Pode não haver anosmia;
Uma minoria das pacientes pode apresentar puberdade precoce ou
função reprodutiva normal;
Pode ter fenótipo reprodutivo normal;
HH é menos grave em pacientes com KAL-2 do que com KAL-1. Níveis
LH são menores em KAL-1 do que em KAL-2.
Síndrome CHARGE: HH + coloboma + doença cardíaca congênita
+ atresia coanal + retardo de crescimento + hipoplasia genital +
malformações do ouvido e surdez. Pode ocorrer anosmia.

Sem anosmia – HH idiopático:


Metade dos pacientes com HH não tem anosmia:

Somente HH: genes LH beta e FSH beta. Herança autossômica


recessiva, com associação a puberdade tardia. Apenas a subunidade beta
(comum ao LH, FSH, TSH e HCG) tem mutação;
HH + obesidade: gene da leptina. Herança autossômica recessiva, com
acometimento hipotalâmico. Obesidade + HH + diminuição do cortisol
(aumento pró-opiomelanocortina) + diminuição da insulina (aumento de
pró-insulina);
Hipoplasia congênita de adrenal – HH + insuficiência de adrenal: gene
AHC. Herança ligada ao X; mutação em DAX1: anormalidades
hipotalâmicas, adrenais e pituitárias;
HH + atrofia óptica (hipoplasia do nervo óptico e hipoplasia glandular de
pituitária) + anormalidade na linha média do SNC; displasia óptico-selar;
gene HESX1;
Combinação de deficiências hormonais com HH + baixa estatura +
hipotireoidismo: gene PROP1; autossômico recessivo;
HH com hipogonadismo severo: deficiência isolada de GnRH é rara.
Gene GnRH1 codifica o pré-hormônio do GnRH;
GnRH-R: corresponde à ausência de resposta do receptor de GnRH
(GnRH-R) ao hormônio (GnRH) devido a mutações no receptor. É uma
doença autossômica recessiva, portanto os heterozigotos não são
afetados. Assim, há HH, com atraso da puberdade ou ausência completa
no desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários. Apresenta-se
com amenorreia primária, telarca incompleta e puberdade tardia.
Apresenta secreção de LH e FSH sob GnRH exógeno, pois as altas taxas
de GnRH superam alterações no receptor. O tratamento é feito por
terapia hormonal e indução da ovulação com gonadotrofinas exógenas;
GPR54: alteração hipotalâmica autossômica recessiva;
Receptor GnRH normal: 2 a 5% dos HHs sem anosmia. A deficiência de
GPR54 leva ao HH + abertura vaginal tardia + maturação folicular
tardia. Ótima resposta ao GnRH exógeno, com ovulação;
Mutação TAC3: níveis basais de LH muito baixos. Normaliza-se com a
administração de GnRH pulsátil;
Mutação homozigótica na LHX3 – HH de FSH e LH.
Figura 6 - Manejo do hipogonadismo hipogonadotrófico

c) Amenorreia eugonadotrófica

A amenorreia eugonadotrófica corresponde às pacientes que mantêm a função


ovariana e hipotalâmica preservadas e, portanto, apresentam secreção de
estrogênio. A maioria dos casos é marcada por anovulação crônica com
estrogênio presente.
SOP: é a causa mais comum de anovulação crônica com estrogênio presente.
Como a mulher não ovula, não há formação de corpo lúteo, portanto não há
aumento importante na produção de progesterona. Assim, não ocorre a queda
importante nas taxas de progesterona necessária ao fluxo menstrual e a
mulher evolui com amenorreia. Ocorre, ainda, hiperestímulo do endométrio
pelo estrogênio (proliferação endometrial), com espessamento endometrial,
podendo ocorrer episódios de colapso estromal com descolamento, levando a
sangramento irregular e, muitas vezes, aumentado. Essas pacientes também
apresentam androgênio elevado que atrofia o endométrio, corroborando para a
amenorreia. Vale ressaltar que, eventualmente, essas mulheres apresentam
ciclos ovulatórios com sangramento menstrual normal. De modo geral, os
sintomas são decorrentes de hiperandrogenismo e anovulação;
Hiperplasia de suprarrenal congênita com início na vida adulta: há
mutação no gene CYP21, que codifica a enzima 21-hidroxilase, levando à
deficiência enzimática (principalmente da 21-hidroxilase), com acúmulo de
17-hidroxiprogesterona. Nessa situação, a esteroidogênese da suprarrenal é
extremamente alterada, bem como a ovariana. O quadro clínico é semelhante
ao da SOP (hiperandrogenismo e anovulação);
Deficiência de 5-alfarredutase (enzima que converte a testosterona em
sua forma mais potente – diidrotestosterona): pseudo-hermafroditismo
masculino, genótipo XY, as gônadas se apresentam como testículos e ausência
de estruturas müllerianas (genitália interna masculina). Não há útero, logo há
amenorreia. Estão presentes desenvolvimento mamário, genitália externa
feminina (pois não há ação da diidrotestosterona, fundamental na virilização)
e desenvolvimento masculino da massa muscular e do padrão masculino da
voz (dependentes de testosterona);
Tumor ovariano: tumores ovarianos produtores de estrogênio e androgênios
(tumores das células da granulosa, tumores das células da teca e teratomas
císticos maduros) podem cursar com anovulação crônica;
Hiperprolactinemia: é uma causa de HH, entretanto algumas pacientes
apresentam níveis gonadotróficos relativamente normais e níveis de
estrogênio discretamente reduzidos. Geralmente, a hiperprolactinemia é
provocada por medicações ou adenomas hipofisários funcionais. Os
medicamentos antipsicóticos são os mais associados à hiperprolactinemia.
Quando a hiperprolactinemia é provocada por medicamentos, costuma ser
baixa/leve. A seguir, encontra-se Tabela com as principais medicações
associadas à hiperprolactinemia;
Hipotireoidismo: eleva a produção do TRH hipotalâmico, que se liga aos
lactotrofos hipofisários, aumentando a secreção de prolactina. A
hiperprolactinemia secundária ao hipotireoidismo é inferior a 100ng/mL,
geralmente. Assim, a partir do aumento de prolactina, desenvolvem-se ciclos
anovulatórios no hipotireoidismo;
Imaturidade do eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano: após a menarca, é
comum um período de irregularidade menstrual por imaturidade do eixo. A
normalização dos ciclos leva, em média, 2 anos. Os folículos ovarianos ainda
são imaturos para produzir quantidades crescentes de estradiol e provocar o
pico desse hormônio no final da fase folicular do ciclo menstrual.
Consequentemente, não ocorre o pico de LH na metade do ciclo, o que
impede a ovulação. A anovulação inibe a ação da progesterona no
endométrio, o que impede a finalização do ciclo menstrual, com consequente
amenorreia. De fato, é comum que haja longos períodos de amenorreia após a
menarca;
Uso prévio de anticoncepcionais: amenorreia pós-pílula. Na maioria das
vezes, há normalização do ciclo em até 6 meses após a suspensão do
anticoncepcional;
Uso crônico de corticosteroide.

Dica
Falência ovariana prematura (ou precoce) é aquela que ocorre antes dos 40
anos.

4. Diagnóstico
São necessários, para o diagnóstico de amenorreia, anamnese completa e
exame físico, questionando e avaliando:

Idade de início da telarca/pubarca;


Desenvolvimento ponderal e estatural;
Sinais de acometimento do SNC: transtornos visuais no caso de tumores,
alterações olfatórias (hipo ou anosmia) e cefaleia persistente;
Antecedentes familiares;
Sinais de virilização;
Galactorreia;
Desenvolvimento de mamas e pelos sexuais, de acordo com os estágios
de Tanner;
Introito vaginal e avaliação hímen-clitóris, malformações.

- Exames complementares
Os exames que fazem parte da investigação da amenorreia dividem-se em:

Laboratoriais:
Gonadotrofinas séricas (FSH/LH): estão elevadas nos
hipogonadismos hipergonadotróficos e baixas nos
hipogonadotróficos;
Estradiol sérico: está baixo nos hipogonadismos;
Hormônios da tireoide (TSH/T4 livre): para afastar
hipotireoidismo, causa comum de transtorno menstrual;
S-DHEA: está elevado nas doenças da suprarrenal, visto que esse
hormônio é produzido principalmente por essa glândula;
Androstenediona: eleva-se tanto em doenças ovarianas como nas
da suprarrenal;
Testosterona: eleva-se em doenças ovarianas produtoras desse
hormônio;
Cortisol;
17-alfa-hidroxiprogesterona: está elevada na HAC;
Prolactina: a ser estudada no fim deste capítulo;
Cariótipo: nas situações de suspeita de disgenesias gonadais.
De imagem:
Ultrassonografia (USG) pélvica: verificar a presença e o aspecto
dos órgãos genitais internos e a presença de cistos ou de tumores
anexiais;
Tomografia Computadorizada (TC): complementar a USG em
casos difíceis ou naqueles em que a USG não foi suficiente para a
elucidação diagnóstica;
Ressonância Nuclear Magnética (RNM): complementar à TC
e/ou à USG;
Radiografia de sela túrcica: avaliar a sela túrcica e inferir sobre o
tamanho da hipófise;
Radiografia de mãos e punhos: avaliar a idade óssea, que será
discordante da idade cronológica em uma série de doenças. A idade
óssea geralmente é compatível com o grau de maturidade do eixo.
Idade óssea adiantada significa desenvolvimento puberal verdadeiro
de causa central;
Histerossalpingografia ou histeroscopia para causas uterinas:
exames que permitem a visualização da cavidade uterina.

Como os exames são indicados em situações específicas, o ideal é o


seguimento de um roteiro básico para investigação.

5. Roteiro básico para investigação


A investigação da amenorreia respeita uma sequência básica que obedece a
lógica do ciclo menstrual e a prevalência das alterações. Na abordagem inicial
da amenorreia secundária, o 1º passo da investigação é descartar as causas
mais prevalentes de amenorreia secundária: gestação, hipotireoidismo e
hiperprolactinemia.

Realizar exame físico pélvico: verificar alterações anatômicas;


Figura 7 - Investigação inicial da amenorreia

Descartadas as alterações anatômicas, deve-se solicitar o 1º exame


laboratorial: beta-HCG;
Caso a mulher não esteja grávida (beta-HCG negativo), devem-se
solicitar os seguintes exames laboratoriais: prolactina e TSH, pois há
suspeita de anovulação. Em caso de:TSH aumentado, inicia-se reposição
com levotiroxina;
Prolactina aumentada: opta-se por avaliação da sela túrcica com
ressonância magnética com contraste;
Prolactina e TSH normais: segue-se para o próximo passo.
Realização do teste da progesterona: indicar o teste da progesterona
oral – administram-se de 5 a 10mg de acetato de medroxiprogesterona
oral, durante 5 dias:
Após a suspensão do medicamento, verifica-se a presença ou a
ausência de sangramento vaginal. Quando presente, significa nível
estrogênico normal e provável distúrbio ovulatório; quando ausente,
interpreta-se como deficiência estrogênica. Se a paciente menstruar
cerca de 2 a 7 dias após a pausa da progesterona oral, o teste é
considerado positivo. Isso denota que a paciente produz estrogênio
endógeno (portanto, não há hipogonadismo), porém apresenta
deficiência de progesterona, produzida na 2ª fase do ciclo menstrual
pelo corpo lúteo. Conclui-se, então, que não esteja ocorrendo
ovulação. A anovulação é muito frequente nos extremos da vida
reprodutiva (na puberdade, pela imaturidade do eixo, e no
climatério, pelo esgotamento folicular). A causa patológica mais
frequente de anovulação é a SOP;
Caso a paciente não menstrue, o teste da progesterona será
considerado negativo. Nessa situação, a paciente não está
produzindo estrogênio ou há algum fator obstrutivo para a
exteriorização da menstruação. O próximo passo no roteiro da
investigação é a prescrição do teste do estrogênio + progesterona
(Tabela 7).
Em resumo:
Teste da progesterona positivo – presença de estrogênio:
anovulação sem alteração hipofisária/hipotalâmica. Principal causa:
SOP;
Teste da progesterona negativo – ausência de estrogênio ou
endométrio não responsivo aos hormônios: realizar o teste do
estrogênio.
Teste da progesterona normal (positivo) → suspeita de SOP: solicitar
testosterona e S-DHEA e 17-hidroxiprogesterona:
Testosterona aumentada: solicitar USG transvaginal ou pélvica (em
pacientes virgens) para avaliar presença de tumor ovariano ou de
ovários policísticos;
Testosterona normal a normal elevado: USG pélvica ou transvaginal
para avaliar ovário policístico;
S-DHEA aumentado: ressonância magnética de suprarrenal para
descartar tumor;
17-hidroxiprogesterona aumentada: sugere hiperplasia congênita de
suprarrenal;
Diagnóstico de SOP com 2 ou mais dos critérios a seguir:
Hiperandrogenismo (manifestações clínicas de hirsutismo ou
acne com ou sem aumento laboratorial de androgênios);
Oligo ou amenorreia (anovulação);
Ovário micropolicístico à USG (≥12 folículos de 2 a 9mm de
diâmetro ou volume ovariano >10cm3).
Teste da progesterona negativo → procede-se o teste do estrogênio +
progesterona oral: administram-se estrogênios conjugados 0,625mg/d
por 10 a 14 dias, seguidos por acetato de medroxiprogesterona 10mg/d,
por 5 a 7 dias. Na realidade, esse teste é um mimetismo do ciclo
menstrual fisiológico. Após a suspensão dos medicamentos, verifica-se a
presença ou a ausência de sangramento vaginal. Quando presente,
significa que os ovários da paciente não estão produzindo estrogênios (a
paciente está hipogonádica); quando ausente, significa que há alguma
obstrução anatômica no trato genital que está impedindo a saída da
menstruação;
Teste do estrogênio + progesterona positivo (houve sangramento
após a realização do teste): diante de um teste positivo, tem-se que a
paciente apresenta um quadro de hipogonadismo. O próximo passo é a
dosagem de FSH e LH.

Importante
O teste do estrogênio + progesterona é um mimetismo do ciclo menstrual
fisiológico.
Figura 8 - Investigação de hipogonadismo

Pacientes com FSH e LH altos apresentam quadro laboratorial de


hipogonadismo hipergonadotrófico. Nessa situação, o diagnóstico é falência
ovariana, cuja principal causa é genética, e o exame indicado é o cariótipo.
Dentre as causas genéticas que cursam com falência ovariana prematura, a
principal patologia envolvida é a síndrome de Turner.
Nas situações em que o FSH e o LH estiverem baixos, tem-se o HH. Nessas
situações, a causa da amenorreia é hipofisária ou hipotalâmica. Para o
diagnóstico diferencial, deve-se indicar o teste do GnRH. Deve-se, ainda,
coletar uma amostra de sangue periférico para avaliação dos níveis de FSH e
LH. Posteriormente, administram-se 100mg de GnRH por via intravenosa.
Logo após, coleta-se nova dosagem de FSH e LH. Se há aumento de, no
mínimo, 200% dos valores basais, o teste é considerado positivo. Nessa
situação, conclui-se que a causa da amenorreia é hipotalâmica, uma vez que a
hipófise respondeu ao estímulo com GnRH endógeno. Se não ocorrer
aumento dos níveis de FSH e LH, o teste será negativo e conclui-se que a
causa da amenorreia é hipofisária.
Quando de teste de estrogênio + progesterona negativo, tem-se a certeza de
que a causa da amenorreia é canalicular (o endométrio não está respondendo
ao estímulo hormonal ou há alguma obstrução ao fluxo menstrual). A
principal suspeita é a síndrome de Asherman. Nessa situação, a paciente
deverá ser encaminhada para histeroscopia.

Diagnóstico
Para o diagnóstico de amenorreia, devem-se solicitar beta-HCG, TSH
ultrassensível e prolactina sérica.

Diagnóstico diferencial
Para as causas de anovulação, devem-se considerar extremos da menacma
(puberdade e climatério) e síndrome dos ovários policísticos.

Dica
Em caso de teste do estrogênio + progesterona negativo, deve-se
encaminhar a paciente para histeroscopia.

Importante
Em caso de hipogonadismo hipergonadotrófico com falência ovariana
como causa da amenorreia, deve-se solicitar cariótipo.

Importante
O teste do GnRH está indicado para avaliar hipogonadismo
hipogonadotrófico diante de um quadro de amenorreia, para avaliar
resposta da hipófise.
Figura 9 - Roteiro para diagnóstico topográfico
Figura 10 - Diagnóstico etiológico

6. Tratamento
Sempre que possível, deve ser dirigido à causa-base. De acordo com a
etiologia, o tratamento geral constitui-se em:

A - Hipogonadismo hipergonadotrófico

Reposição hormonal para manter os caracteres sexuais secundários e prevenir


osteoporose e doenças cardíacas;
Se houver cromossomo Y, retirar gônadas, pelo risco de malignização, visto
que estas se encontram na cavidade abdominal e as altas temperaturas locais
favorecem a transformação maligna (gonadoblastoma);
GH, se necessário.
Tratamento
Pacientes com hipogonadismo hipergonadotrófico cujo cariótipo demonstra
a presença de cromossomo Y devem ser submetidas a gonadectomia, pelo
risco de malignização.

B - Hipogonadismo hipogonadotrófico
Quando a causa-base é a deficiência do GnRH, o tratamento consiste em
administrar GnRH; se é a deficiência de FSH/LH, devem-se administrar
gonadotrofinas exógenas.

C - Amenorreia primária com hiperandrogenismo

Cirurgia para exérese de gônadas; corticoides na HAC; anticoncepcional


hormonal oral ou acetato de medroxiprogesterona na 2ª fase do ciclo
menstrual para tratamento da SOP; perda de peso.

D - Situações específicas
Criptomenorreia: tratamento cirúrgico, com remoção do obstáculo à
menstruação;
Síndrome de Asherman: lise das aderências por histeroscopia e
colocação de dispositivo intrauterino (mantido por, pelo menos, 3
meses);
Tumores do SNC: tratamento com neurocirurgião;
Hiperprolactinemia: agonistas da dopamina (bromocriptina ou
cabergolina);
Síndrome de Sheehan e tireoidopatias: acompanhamento e tratamento
clínico com endocrinologista;
Atraso fisiológico: baixas doses de estrogênio até o sangramento;
posteriormente, terapêutica cíclica com estrogênios e progestogênios;
Síndrome de Kallmann: ciclos de estrogênios e progestogênios;
gonadotrofinas e GnRH para induzir ovulações;
Amenorreia pós-pílula: dispositivo intrauterino ou citrato de clomifeno.

Resumo
Classificação da amenorreia

Primária: ausência de menarca e de caracteres sexuais secundários aos


14 anos ou ausência de menarca aos 16 anos (mesmo com
desenvolvimento normal dos caracteres sexuais secundários). A
prevalência é baixa: cerca de 0,4% das mulheres púberes;
Secundária: ausência de menstruação por 3 ciclos consecutivos ou por
180 dias (6 meses). A prevalência é de cerca de 5%.

Investigação básica para qualquer disfunção menstrual

Anamnese e exame físico completos;


Beta-HCG para excluir ou confirmar gravidez;
TSH/T4 livre para descartar ou confirmar tireoidopatias;
Prolactina: valor de referência – 20 a 25ng/mL; valores superiores
indicam hiperprolactinemia e devem ser investigados. Quando os valores
estão entre 25 e 50ng/mL, as causas farmacológicas são as mais comuns,
entre 50 e 100ng/mL há variedade de fatores, e acima de 100ng/mL
indica adenoma de hipófise.
Exames laboratoriais:
FSH/LH para avaliação da função hipofisária: se FSH/LH
aumentados (>15UI/mL), ovários resistentes à ação das
gonadotrofinas – pensar em menopausa precoce/menopausa
fisiológica. Se FSH/LH normais (até 10UI/mL), dosar estradiol para
verificar se a função ovariana está preservada. Se estradiol normal,
o problema não é hormonal, e sim provavelmente uterino, que deve
ser investigado. Se o estradiol estiver muito baixo, investigar outras
glândulas (tireoide ou suprarrenal);
S-DHEA para avaliar defeito próprio da suprarrenal: caso os níveis
estejam elevados, a glândula deverá ser investigada por exames de
imagem, na busca de eventuais tumorações ou de outros transtornos
endócrinos próprios dela;
Androstenediona/testosterona livre e total: o aumento é indicativo
de hiperandrogenismo;
Glicemia de jejum/insulina basal: quando a relação entre glicemia e
insulina for inferior a 4,5, teremos o diagnóstico de
hiperinsulinemia, causa comum de SOP que deve ser tratada com
metformina;
SHBG: é a proteína carreadora dos hormônios sexuais; quanto
maior seu nível no plasma, menor a quantidade de esteroides
sexuais livres (justamente aqueles com valor de atividade
biológica). Aumenta nos estados hiperestrogênicos e com
hormônios da tireoide (hipertireoidismo) e diminui nos estados
hiperinsulinêmicos (exemplo: SOP com hiperinsulinemia), no
hiperandrogenismo e no hipotireoidismo.
Cortisol: demonstra problemas intrínsecos da suprarrenal;
17-hidroxiprogesterona: é um metabólito precursor dos esteroides
sexuais, acumulado quando há deficiência da enzima 21-hidroxilase, que
o converteria em deidroepiandrosterona → androstenediona →
testosterona – nessa sequência, na cascata delta 5 da suprarrenal. Dessa
forma, quando o metabólito está aumentado, fazemos o diagnóstico de
HAC forma não clássica ou de início tardio, que cursa com
hiperandrogenismo e distúrbios menstruais tipo espaniomenorreia.

Exames de imagem

Devem ser adequados a cada caso, mas sempre se deve solicitar USG
pélvica ou transvaginal para avaliação uterina e ovariana, presença de
cistos etc., que pode ser complementada com TC de pelve ou RNM de
pelve para melhor acurácia em casos duvidosos e TC ou RNM
abdominal se há a necessidade de avaliar as suprarrenais na suspeita de
tumores.
Transtornos menstruais
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Introdução
Transtornos menstruais, como a hemorragia uterina disfuncional, o
hiperandrogenismo, a Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP) e a
hiperprolactinemia, constituem causas frequentes de procura aos serviços de
Ginecologia. Para o seu total entendimento, apresentaremos os conceitos de
normalidade do ciclo menstrual e os seus respectivos desvios.
2. Sangramento uterino anormal
Todo e qualquer tipo de alteração do padrão usual do ciclo menstrual recebe o
nome de Sangramento Uterino Anormal (SUA). Cada transtorno recebe uma
classificação semiológica, de acordo com o tipo de alteração. As alterações da
ciclicidade e do tempo de sangramento são definidas na anamnese de acordo
com o relato da paciente. As alterações de fluxo são mais bem qualificadas
pelo número de absorventes trocados diariamente. Apesar de cada alteração
representar uma variação de padrão, existem algumas divergências de acordo
com a bibliografia científica utilizada pela instituição que elabora a prova.
Todavia, essas diferenças são conceituais, e a grande maioria das questões não
se fixa nesses detalhes, visto que o intuito é entender qual é o padrão de ciclo
menstrual que o termo semiológico representa.
A etiopatogenia do SUA varia muito, de acordo com a faixa etária da
paciente. De modo geral, observamos:

Infância: o SUA à menarca é anormal. Nessa faixa etária, a vagina é a


principal fonte de sangramento, e não o útero. As vulvovaginites são as
causas mais frequentes de sangramento genital. Podem-se considerar,
ainda, condições dermatológicas, crescimento neoplásico, trauma por
acidente, abuso sexual e corpo estranho;
Adolescência: o SUA resulta de anovulação ou defeitos na coagulação
sanguínea. Gestação, Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) e
abuso sexual devem ser avaliados;
Idade reprodutiva: há aumento na taxa de sangramento uterino
disfuncional por gravidez e ISTs, assim como leiomiomatose e pólipos
endometriais;
Perimenopausa: geralmente, o sangramento uterino disfuncional nessa
fase é causado por ciclos anovulatórios, porém é preciso avaliar a
possibilidade de neoplasias benignas e malignas;
Menopausa: a maioria dos casos de sangramento é atrofia do
endométrio e vagina por ausência de estrogênio. Entretanto, pode ser
decorrente de pólipos endometriais, carcinoma endometrial (mais
frequente nessa faixa etária), tumor ovariano produtor de estrogênio e
neoplasias ulcerativas vulvar, vaginal e cervical.
Seguem as principais causas de SUA:

Gravidez: sangramento anormal no início da gestação é encontrado em


15 a 20% das gestações. Na maioria das vezes, não há identificação de
qualquer problema associado. Entretanto, deve-se estar atento às
possibilidades de abortamento, gestação ectópica, mola hidatiforme,
eversão do colo uterino ou pólipos;
Hiperplasia endometrial: resulta da estimulação estrogênica crônica do
endométrio sem a oposição da progesterona. Portanto, é comum em
ciclos anovulatórios crônicos. Pode ser simples ou complexa, com ou
sem atipias. O diagnóstico pode ser realizado por ultrassonografia (USG)
transvaginal com espessamento endometrial ou histeroscopia. A biópsia
de endométrio pode ser realizada por curetagem ou histeroscopia:
Hiperplasia simples: glândulas dilatadas sem ramificações ou
ramificações ocasionais;
Hiperplasia complexa: glândulas endometriais mais próximas
entre si, com menos estroma interposto, com ramificações. Suas
células podem ou não exibir mitoses;
Lesões sem atipia: formas excessivas de endométrio proliferativo;
regridem espontaneamente, após curetagem ou uso de
progestogênios. Há baixo risco de progressão para adenocarcinoma
(de 1 a 3%). Independentemente de serem simples ou complexas, o
tratamento consiste em progestogênios – acetato de
medroxiprogesterona 5 ou 10mg/d por 14 dias por mês por 3 a 6
meses ou noretindrona 5mg no mesmo esquema. Uma opção é o
DIU com liberação de levonorgestrel (Mirena®);
Lesões atípicas: em geral, não regridem espontaneamente e podem
ser bastante resistentes a curetagens repetidas ou aos
progestogênios. Oferecem elevado risco de progressão para
adenocarcinoma (de 10 a 30%) e são consideradas lesões pré-
malignas. O tratamento preferencial é a histerectomia. Nas
mulheres que desejam manter a fertilidade, pode-se tentar o
progestogênio em altas doses – acetato de megestrol 80mg, 2x/d,
por 6 a 9 meses, e com biópsias sequenciais de endométrio para
monitorizar a resposta ao tratamento. Pode-se tentar a inserção do
DIU com a liberação de levonorgestrel (Mirena®). A recorrência é
comum, e as pacientes que não respondem bem ao tratamento
clínico têm indicação de histerectomia;
Pólipos endometriais: podem causar SUA devido a fragilidade vascular,
inflamação crônica e erosões na superfície. São diagnosticados por USG
transvaginal, histerossonografia, histeroscopia. A histeroscopia cirúrgica
fornece tratamento simples e altamente efetivo. Fatores de risco são
idade avançada, obesidade e uso de tamoxifeno. Na maioria das vezes,
os pólipos são benignos, mas há transformação pré-maligna ou maligna
em 4 a 5% dos casos. Assim, recomenda-se a polipectomia
histeroscópica às pacientes:
Sintomáticas;
Assintomáticas com fatores de risco para transformação maligna:
Pós-menopausa;
>60 anos;
Pólipo ≥1,5cm;
Uso de tamoxifeno.
O tamoxifeno é um modulador seletivo do receptor de estrogênio,
utilizado para tratamento de câncer de mama, visto que reduz a ação do
estrogênio no tecido mamário, mas estimula a proliferação endometrial,
causando hiperplasia endometrial, pólipos endometriais, carcinoma
endometrial e sarcoma uterino;
Pólipos endocervicais: também denominados pólipos cervicais,
geralmente são diagnosticados no exame especular. São assintomáticos,
mas podem causar hemorragia, sangramento pós-coito e leucorreia
vaginal sintomática. São, em sua maioria, benignos, e podem malignizar
em menos de 1% dos casos. Entretanto, o câncer de colo de útero pode
se apresentar na forma de massa polipoide, assim pode haver confusão
entre ambos. Por isso, faz-se a retirada do pólipo cervical no consultório
(com pinça fórcipe “em anel” ou extratora de pólipos – o pólipo é
pinçado e torcido junto à sua base para estrangular seus vasos superiores)
seguida da avaliação histológica do material. A recorrência está entre 6 e
15%;
Miomatose uterina (leiomioma uterino): é extremamente comum, e o
SUA é a sua principal manifestação clínica. Entretanto, a maioria das
pacientes com miomatose uterina não apresenta SUA. Assim, os miomas
não podem ser considerados a causa de sangramento anormal antes que
outras possibilidades tenham sido excluídas, especialmente quando não
invadem ou deslocam a cavidade uterina. Os que causam SUA são
aqueles com componente submucoso, miomas submucosos e intramurais
grandes que distendem o endométrio adjacente. Não é qualquer mioma
que provoca sangramento; a compressão inferior e o trauma pela fricção
intracavitária na superfície epitelial causam inflamação crônica focal ou
ulceração, resultando em sangramento. Pode, ainda, haver erosão e
ruptura de vasos superficiais. O diagnóstico é feito por USG transvaginal
(tamanho, número e localização dos miomas) e histerossonografia. O
tratamento é composto de contraceptivos combinados que reduzem o
volume e a duração do sangramento, embora sejam menos efetivos em
miomas submucosos. Anti-Inflamatórios Não Esteroides (AINEs) podem
participar do tratamento, enquanto os agonistas de GnRH formam outra
linha terapêutica. Tratamentos cirúrgicos são geralmente reservados para
sintomáticos:
Miomas submucosos únicos: miomectomia histeroscópica.
Preservam a fertilidade;
Miomas submucosos múltiplos e grandes: miomectomia
histeroscópica. Requerem maior experiência técnica e podem
evoluir com sinéquias intrauterinas que causem infertilidade;
Miomatose intramural: miomectomia histeroscópica subtotal,
miomectomia abdominal ou histerectomia. São indicações de
histerectomia: SUA, miomas grandes e múltiplos e ausência de
interesse em gravidez.
Adenomiose: observa-se infiltração de tecido endometrial no miométrio.
Algumas mulheres desenvolvem lesões nodulares focais, que
correspondem à proliferação miometrial excessiva em torno de focos do
endométrio ectópico – adenomiomas. A doença pode desenvolver-se a
partir da invaginação endomiometrial do endométrio ou de restos
müllerianos. Quanto ao diagnóstico, a USG transvaginal apresenta cistos
miometriais. A ressonância magnética de pelve, por sua vez, é o melhor
exame de imagem, e o tratamento é composto de:
Uso contínuo de progestogênio;
Agonista de GnRH;
Inibidores da aromatase;
DIU com liberação de levonorgestrel – Mirena®;
Histerectomia (tratamento definitivo).
Endometrite crônica: a condição pode resultar de infecções (clamídia,
tuberculose, micoplasma), corpos estranhos (DIU), tumores intrauterinos
(mioma submucoso) e exposição à radiação. Entretanto, em 1/3 das
pacientes, não é possível identificar o fator causal. As pacientes podem
apresentar-se assintomáticas (maioria) ou sintomáticas: dor à
mobilização do colo uterino (sintoma mais comum), SUA (sangramento
intermenstrual ou pós-coito ou menorragia) e dor pélvica vaga do tipo
cólica. Geralmente, a endometrite crônica não é a causa direta do SUA,
mas é a causa indireta ou contribuinte dele;
Malformações arteriovenosas: mistura de canais arteriais, venosos e
capilares com ligações fistulosas. Podem ser congênitas ou adquiridas;
quando adquiridas, são formadas por vasos únicos de grande calibre que
se formam após trauma de cesárea ou associado a câncer de colo de útero
ou endométrio, doença trofoblástica gestacional e uso de DIU. São raras
e acometem mais o corpo uterino, mas também podem ser encontradas
no colo. Manifestação clínica é menorragia ou menometrorragia após
abortamento, curetagem ou outra cirurgia uterina intracavitária. Há
sangramento uterino intenso não associado a trauma, que pode se instalar
lenta ou subitamente com sangramento potencialmente fatal. A USG
transvaginal revela estruturas tubulares hipoecoicas dentro do miométrio,
e, ao Doppler, notam-se vasos de grande calibre e reversão do fluxo
sanguíneo (cores “em mosaico”). A confirmação diagnóstica se dá por
angiografia, e o tratamento consiste em embolização arterial ou
coagulação cirúrgica dos vasos arteriais da malformação arteriovenosa;
DIU: com ele, pode haver desequilíbrio entre prostaglandinas e
tromboxano. Há, ainda, aumento na vascularização endometrial,
congestão e degeneração no tecido endometrial. Esses fatores
corroboram para o sangramento. A conduta envolve descartar infecção,
gravidez, doença estrutural e rotação, perfuração ou fixação do DIU.
Iniciam-se AINEs;
Contracepção hormonal e terapia de reposição hormonal:
sangramento uterino normal pode ocorrer com métodos contraceptivos
de progesterona apenas, além de sangramentos de escape irregulares e
leves. Na contracepção hormonal combinada, também é comum
sangramento de escape, principalmente no 1º mês de uso da medicação
(de 30 a 50% das pacientes), sendo atribuído à atrofia endometrial. A
terapia de reposição hormonal, especialmente aquelas que usam esquema
contínuo, provoca sangramento uterino irregular. Entretanto, quando esse
sangramento persiste por mais de 6 meses após seu início, deve-se
descartar patologia uterina que o justifique;
Doenças renal e hepática: a doença renal pode ser acompanhada de
hipoestrogenismo, amenorreia e infertilidade, possivelmente devido à
desregulação hipotalâmica da secreção de GnRH. Há, ainda, piora da
anemia dessas pacientes com o fluxo menstrual. Nesses casos, a 1ª opção
é a progesterona contínua ou intramuscular a cada 3 meses. Outra opção
é o DIU com liberação de levonorgestrel (Mirena®). As pacientes com
doença hepática apresentam níveis altos de estrogênio circulante (devido
à redução na depuração do hormônio), levando a níveis baixos de LH e
FSH e acarretando alteração no eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano,
ciclos anovulatórios e SUA. Além disso, essas pacientes apresentam
alteração na hemostasia. Como proceder com hepatopatas, então?
Hepatite viral crônica ou cirrose leve compensada:
contraceptivos hormonais;
Hepatite viral ativa ou agudização de doença viral crônica:
apenas contraceptivo de progesterona;
Cirrose grave descompensada: evitar qualquer tipo de
contracepção hormonal.
Coagulopatias: alterações na coagulação provocam SUA. A doença de
von Willebrand é a anormalidade hematológica que mais afeta as
mulheres. O tratamento em pacientes com essa doença e sangramento
menstrual intenso envolve desmopressina, terapia antifibrinolítica, ácido
tranexâmico, contraceptivos com estrogênio e progesterona ou DIU com
liberação de levonorgestrel (Mirena®);
Doença tireoidiana: no hipertireoidismo, há hipomenorreia e
amenorreia em 5% das pacientes. No hipotireoidismo, observam-se
anovulação, amenorreia e defeito de hemostasia por redução em fatores
de coagulação. O tratamento consiste em reverter o quadro de hipo ou
hipertireoidismo.

Figura 1 - Causas usuais de sangramento anormal por idade


Fonte: Endocrinologia Ginecológica Clínica e Infertilidade, 8ª edição.

3. Sangramento uterino disfuncional

A - Definição

O Sangramento Uterino Disfuncional (SUD), ou hemorragia disfuncional, é o


sangramento vaginal devido às alterações nos mecanismos neuroendócrinos
que controlam o ciclo menstrual. Os sangramentos excessivos provocados por
alterações anatômicas não fazem parte do conceito de SUD. É, portanto, um
diagnóstico de sangramento de causa hormonal, firmado somente quando as
causas orgânicas são afastadas. O SUD é um tipo de sangramento de duração
prolongada e/ou fluxo intenso, cuja principal causa é a anovulação.
O SUD com ciclos anovulatórios, por sua vez, corresponde a mais de 90% das
pacientes com SUD. São comuns nos extremos reprodutivos: imaturidade do
eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano na adolescência e falência ovariana no
climatério. Muitas mulheres com anovulação apresentam amenorreia de
semanas a meses, seguida de sangramento intenso, irregular e prolongado,
devido ao estímulo endometrial pelo estrogênio sem ação da progesterona
(intensa proliferação endometrial). Nesse caso, há alteração no eixo
hipotalâmico-hipofisário-ovariano. Vale lembrar que alterações ponderais
excessivas aumentam o tecido gorduroso, que é produtor de estrogênios (ação
da aromatase) e provoca resistência a insulina, ambos relacionados com
anovulação.
O SUD com ciclos ovulatórios acontece com ciclos normais, e o sangramento
origina-se em falhas nos mecanismos de controle do sangramento menstrual.
Vasos que nutrem o endométrio apresentam menor tônus vascular e,
consequentemente, maiores vasodilatação e perda sanguínea. Acredita-se que
as prostaglandinas intrauterinas estejam fortemente envolvidas nesse
processo. Compreendem aumento das prostaglandinas e das suas inter-
relações, com tendência ao sangramento – aumento da relação PGE2-PGF2 e
da relação PGI2-TxA2. Tais prostaglandinas proporcionalmente mais
elevadas têm ação anticoagulante e favorecem o sangramento uterino ou não
o estancam no momento adequado.
Em resumo, o SUD tem mecanismos fisiopatológicos diferentes, de acordo
com a etapa da vida da mulher. São eles:

Na adolescência: ciclos anovulatórios por imaturidade do eixo


hipotalâmico-hipofisário-ovariano;
Na menacma: SUA por causas anovulatórias (SOP, hiperprolactinemia,
insuficiência ovariana e estresse) ou ovulatórias (alterações na produção
de prostaglandinas);
No climatério: insuficiência ovariana (anovulatória).

Dica
A anovulação é a principal causa de sangramento uterino disfuncional nos
extremos da vida reprodutiva (adolescência e climatério).

B - Apresentação clínica
O SUD pode ter diversas intensidades, desde leve e insidiosa até grave e
emergencial. Comumente leva à instalação de um quadro anêmico agudo ou
crônico.
Quando a hemorragia é grave, a paciente apresenta alterações
hemodinâmicas, como hipotensão, taquicardia, vasoconstrição periférica e
palidez cutâneo-mucosa. Nesse caso, a conduta emergencial é restabelecer a
homeostase. Quando o SUD tem longa duração e menor intensidade, instala-
se a anemia ferropriva.
Quando a causa provável é ovulatória, o SUD apresenta-se com ciclicidade de
sangramento, podendo haver dismenorreia e alterações comportamentais
relacionadas ao ciclo. Nas formas anovulatórias, o sangramento profuso
costuma ser precedido de períodos de amenorreia e/ou menstruações
infrequentes.
Quando a causa é um distúrbio de outra glândula, outros sinais podem estar
presentes, como galactorreia na hiperprolactinemia; hirsutismo, acne e
obesidade na SOP; sinais de hipoestrogenismo na insuficiência ovariana. É
necessário descartar as principais causas de SUA (Tabela 3) antes de
diagnosticar SUD (diagnóstico de exclusão), por meio de anamnese, exame
físico e exames complementares:

Gravidez/abortamento: caracterizam atraso menstrual, e solicita-se


beta-HCG. Trata-se do principal diagnóstico diferencial nos casos de
sangramentos excessivos;
Doença inflamatória pélvica aguda: corrimento vaginal possivelmente
presente ou ausente + dor abdominal + dor à mobilização do colo uterino
e à palpação dos anexos;
Mioma uterino: afastado pelo exame físico + USG + exame da
cavidade endometrial (histeroscopia ou histerossalpingografia) na
suspeita de mioma submucoso;
Câncer de colo uterino: afastado pela colpocitologia oncótica e
colposcopia com biópsia (se necessário);
Câncer de endométrio: afastado por obtenção de amostra endometrial,
biópsia aspirativa, dilatação e curetagem ou histeroscopia com biópsia;
Coagulopatia: afastada por provas laboratoriais de avaliação da
coagulação;
Hipotireoidismo: afastado pela dosagem de TSH e T4 livre;
Doença hepática: afastada pela clínica e por provas laboratoriais de
função hepática;
Sangramentos de tratos digestivo e urinário: necessitam de avaliações
próprias com colonoscopia, exames de urina e do trato urinário;
Corpos estranhos: geralmente provocam sangramento e leucorreia
purulenta;
Pólipos endometriais e cervicais: os mesmos exames para o diferencial
de miomas; o exame complementar ideal para diagnosticar pólipos
endometriais é a histeroscopia.
DIU;
Uso de medicamentos, como anticoagulantes.

O exame padrão-ouro para avaliação da cavidade uterina é a histeroscopia.


É difícil caracterizar perda por sangramento superior a 80mL. O método ideal
é corar a hematina (produto de conversão da hemoglobina), porém é algo
muito trabalhoso e pouco prático. No dia a dia, caracteriza-se como perda de
coágulos >2,5cm, sangramento intenso vermelho-vivo, troca de absorvente ou
tampão a cada 3 horas (ou em menor período), >20 absorventes durante a
menstruação, duração >7 dias ou anemia.

Importante
O exame padrão-ouro para avaliação da cavidade intrauterina é a
histeroscopia.

C - Conduta
Anamnese e exame físico;
Avaliação de doença sistêmica subjacente (renal, hepática, hematopoética e
tireoide) e uso de medicações (hormonais, anticoagulantes, outras medicações
que possam alterar o eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano);
Laboratório: beta-HCG e hemograma (avaliar anemia e trombocitopenia).
A paciente está ovulando?

Sangramento menstrual infrequente, irregular imprevisível e variação no


fluxo e na duração, sem síndrome pré-menstrual importante e sem
anormalidade visível ou palpável no trato genital: sangramento
anovulatório;
Sangramentos mensais regulares, intensos e/ou prolongados: por lesão
anatômica ou por disfunção hemorrágica;
Sangramento intermenstrual (no meio do ciclo): doença intrauterina;
USG transvaginal e/ou histeroscopia;
Se, pelo padrão de sangramento, não for possível definir ciclos
ovulatórios ou anovulatórios, deve-se dosar a progesterona na fase lútea
do ciclo (do 22º ao 24º dia do ciclo). Se >3ng/mL, há ovulação.

Para pacientes anovulatórias:


TSH;
Tratamento empírico das pacientes com anovulação.

USG transvaginal – quando solicitar?

Ciclos menstruais regulares com aumento no volume e na duração do


sangramento;
Ciclos menstruais regulares complicados por sangramento
intermenstrual, na ausência de lesão vaginal ou cervical;
Sangramento anormal, apesar de evidências de ovulação: dosagem da
progesterona (>3ng/mL) ou amostragem endometrial (endométrio
secretor);
Falha no tratamento clínico empírico para anovulação.

Quando fazer histeroscopia com biópsia endometrial (para descartar


hiperplasia endometrial, pólipo de endométrio e câncer endometrial)?

Pacientes com sangramento anormal >35 ou 40 anos e com endométrio


normal (5 a 12mm à USG transvaginal);
Pacientes com sangramento anormal e histórico de exposição em longo
prazo ao estrogênio sem oposição da progesterona (ciclos anovulatórios
crônicos) + endométrio normal (5 a 12mm à USG transvaginal);
Pacientes com endométrio >12mm à USG transvaginal;
Se endométrio <5mm à USG transvaginal, isso significa que o
endométrio está atrófico ou hipotrófico, dispensando essa avaliação por
histeroscopia. Não se realiza biópsia endometrial por histeroscopia.

A histeroscopia é o método definitivo para diagnóstico e tratamento (retira a


lesão) da doença intrauterina sintomática.
A ressonância magnética de pelve apresenta boa acurácia para avaliar a
anatomia uterina, distinguir adenomiose de miomatose uterina e avaliar as
proximidades dos miomas da cavidade uterina. Geralmente, é solicitada
quando há necessidade de complementar a avaliação realizada pela USG
transvaginal ou quando esta não pode ser realizada. Se vaginite ou cervicite:
pesquisar clamídia, gonococo e tricomoníase; se houver doença conhecida ou
forte suspeita: funções hepática e renal.
Quando solicitar coagulograma?

Adolescentes, mulheres com história pessoal ou familiar de sintomas de


sangramento (sangramentos fáceis, gengivorragia, epistaxe) e mulheres
com menorragia não explicada;
Solicitar: contagem de plaquetas, tempo de sangramento ou analisador
da função plaquetária, tempo de atividade da protrombina, PTT, fator de
von Willebrand (nos primeiros dias do ciclo), atividade do cofator da
ristocetina (atividade do fator de von Willebrand), fator VIII e tipagem
sanguínea;
Pacientes com tipagem sanguínea tipo O apresentam fator de von
Willebrand e fator VIII mais baixo (25%).
Figura 2 - Investigação para sangramento uterino disfuncional

D - Tratamento

Dependendo da gravidade do caso, pode ser clínico ou cirúrgico.

a) Clínico

Diversas classes de medicamentos podem ser empregadas:

Anti-inflamatórios não hormonais: inibem a síntese de


prostaglandinas, sendo mais eficazes nos sangramentos de causas
anatômicas (mioma, DIU) do que nos sangramentos anovulatórios;
Progestogênios: decidualizam e diminuem a espessura endometrial;
podem ser usados isolados em sangramentos anovulatórios, mas não são
eficazes nos sangramentos de causas anatômicas. Quando utilizados para
o tratamento de ciclo anovulatórios, são usados por 2 semanas ao mês. O
uso cíclico de progesterona oral leva a sangramento após a sua
interrupção (curetagem clínica ou química). Seu uso contínuo pode
provocar amenorreia;
Danazol: derivado da testosterona, tem ações antiestrogênica e
antigonadotrófica e deve ser usado por curto período, para não aumentar
os riscos de osteopenia/osteoporose;
Anticoncepcionais hormonais combinados: atrofiam o endométrio e
são eficazes nos sangramentos anovulatórios e em alguns casos de
miomatose. Introduz-se 1 comprimido, 2 a 3x/d, por 7 dias. O
sangramento (curetagem química) ocorre após 2 a 5 dias da suspensão.
Reintroduz-se 1x/d, no 5º dia de fluxo, por 21 dias, com pausa de 7 dias,
e mantém-se por, no mínimo, 3 meses;
Análogos de GnRH: para bloqueio do eixo hipotalâmico-hipofisário-
ovariano, devem ser usados por curto período, para não aumentarem o
risco de osteopenia/osteoporose (exemplos: leuprolida 1mg/d, SC, e
gosserrelina 3,6mg/mês, SC, nafarrelina, spray nasal). Apresentam taxa
considerável de efeitos adversos, como fogachos e sintomas urogenitais
de atrofia; são utilizados antes do procedimento cirúrgico para redução
do volume uterino e controle prévio da anemia;
Sistema intrauterino (SIU) medicado com progesterona: 96% das
usuárias apresentam redução do fluxo, e cerca de 40% entram em
amenorreia. A eficácia é semelhante à da histerectomia.

b) Cirúrgico

São indicações do tratamento cirúrgico:

Causas estruturais e neoplasias;


Falha no tratamento clínico;
Miomas grandes >3cm, submucosos, distorção da cavidade endometrial:
embolização da artéria uterina, miomectomia por histeroscopia ou
abdominal ou histerectomia.

Os tratamentos cirúrgicos possíveis são:

Ablação endometrial (Figura 3): remoção do endométrio em toda a sua


espessura e extensão por meio de histeroscopia, ou não. Nesse caso,
pode ser feita por meio de balão térmico, crioablação, micro-ondas ou
outros menos utilizados; promove redução do fluxo semelhante ao obtido
pelo DIU liberador de levonorgestrel (Mirena®);
Figura 3 - Ablação endometrial

Curetagem uterina: raspagem da camada interna do útero por meio de


cureta;
Histerectomia: retirada cirúrgica do útero. Pode ser realizada pelas vias
abdominal, vaginal ou laparoscópica.

c) Na Emergência

Reposição volêmica:

Repouso;
Estrogenoterapia intensiva: estrogênios conjugados 2,5mg VO a cada 4
horas, até cessar o sangramento ou até 3 doses. Em situações de menor
sangramento, pode ser prescrito 1,25mg de estrogênio conjugado por 7 a
10 dias. A terapia estrogênica deve ser seguida de progesterona. Pode ser
associada a terapia antifibrinolítica por curto período de tempo;
Em hemodinamicamente instáveis, pode-se optar por estrogênio equino
conjugado 25mg a cada 4 horas, até o sangramento desaparecer, por até
24 horas. Realiza-se terapia hormonal com progesterona posterior. O
estrogênio intravenoso provoca proliferação endometrial, ocasionando a
sua estabilização. Consequentemente, a paciente interrompe o
sangramento;
O tratamento com altas doses de estrogênio aumenta notavelmente o
risco de tromboembolismo;
A curetagem uterina é utilizada, se necessário, para estancar a
hemorragia. Deve-se sempre solicitar exame anatomopatológico do
produto obtido para diagnóstico etiológico;
Tratamento hormonal de manutenção com progestogênio na 2ª fase.

4. Síndrome dos ovários policísticos

A - Definição
Compreende uma forma de hiperandrogenismo acompanhada por anovulação
crônica. É conhecida, também, como síndrome de Stein-Leventhal, por causa
dos 2 autores que a descreveram, em 1935, notando a associação entre
amenorreia, hirsutismo, obesidade e ovários policísticos. Outra denominação
mais recente, usada por alguns centros de referência, é a síndrome da
anovulação hiperandrogênica. Além disso, cursa com aumento do risco de
diabetes e doença cardiovascular.

B - Etiopatogenia

Sua etiopatogenia exata não está definida, mas é aceitável uma desordem no
processo normal de maturação folicular e ovulação, passando pelos seguintes
processos, basicamente: disfunção na produção de androgênios, anovulação,
hiperinsulinemia e obesidade.
Há uma disfunção primária na enzima CYP17 e no citocromo, com alteração
na produção de androgênios, levando a atresia folicular prematura e
anovulação. Portanto, não há pico na taxa de progesterona na fase lútea, mas
há manutenção na produção estrogênica ovariana, culminando com alterações
na produção de GnRH e aumento na produção de hormônio luteinizante (LH).
O LH encontra-se aumentado em relação ao hormônio folículo-estimulante –
FSH (relação >2:1). Há aumento da produção androgênica pela hiperplasia
das células tecais sob estímulo do LH. Os níveis relativamente baixos de FSH
inibem a maturação folicular adequada e o fenômeno de dominância folicular,
persistindo folículos em estágios iniciais da maturação e folículos atrésicos, o
que forma o aspecto policístico.
Com o estado hiperandrogênico, há diminuição da Sex Hormone-Binding
Globulin (SHBG) e aumento dos esteroides sexuais livres. O estrogênio livre
aumentado age na hipófise, estimulando a secreção ainda maior de LH,
perpetuando o ciclo vicioso. A produção excessiva de androgênios e a sua
conversão em estrogênios constituem o substrato fisiopatológico da
anovulação crônica.
Figura 4 - Fisiopatologia da síndrome dos ovários policísticos

Figura 5 - (A) Desenvolvimento folicular normal e (B) anovulação proposta em paciente devido à
insulinemia

O hirsutismo ocorre em 70% das pacientes com SOP, e sua manifestação


depende da atividade cutânea da 5-alfarredutase. O diagnóstico pode ocorrer
pela presença de sinais clínicos ou aumento androgênico em exames
laboratoriais. O aumento anormal de androgênios leva a pelos na face, região
cervical, tórax e abdome inferior, e a acne é intensamente causada pela DHT
(diidrotestosterona). A distribuição de pelos é tipicamente masculina, com
índice de Ferriman-Gallwey ≥8. De 15 a 30% das mulheres com hirsutismo
leve a moderado não apresentam alterações laboratoriais, sendo essa
manifestação em razão de hiperatividade da 5-alfarredutase na pele
(transforma a testosterona e DHT, androgênio mais potente). Também se
observam mulheres com sinais de hirsutismo e dosagens hormonais normais,
podendo ser decorrentes da redução da SHBG com consequente aumento da
fração livre de androgênio ou de aumento na sensibilidade do receptor. A
redução na SHBG, por sua vez, aumenta a fração livre do androgênio e sua
bioatividade nos receptores.
↑ atividade de 5-alfarredutase na pele + ↓ SHBG = hirsutismo sem
aumento de androgênios totais séricos
Vários mecanismos têm sido propostos para explicar esse desequilíbrio
funcional. Atualmente, uma hipótese bastante defendida e aceita é a da
hiperinsulinemia (por aumento da produção pancreática, diminuição da
depuração hepática ou, principalmente, resistência dos tecidos periféricos à
sua ação). No caso da síndrome, parece que a resistência periférica à ação da
insulina – causada por diminuição dos receptores para insulina ou mecanismo
defeituoso pós-receptor – é a hipótese mais provável.

C - Hiperinsulinemia

A hiperinsulinemia determina o estado anovulatório por ação direta e


sinérgica com o LH nos ovários e por diminuição da produção hepática da
SHBG. Pacientes com essa condição apresentam maior risco de doenças
cardiovasculares (por alteração do metabolismo lipídico – aumento do
colesterol LDL e triglicérides) e doenças tromboembólicas por estímulo à
coagulação.
Figura 6 - Insulinemia
Figura 7 - Resumo da ação da hiperinsulinemia e aumento na produção de androgênios

Observam-se ainda, na obesidade, aumento na aromatização periférica,


aumento na produção de insulina e redução na SHBG, culminando com
elevada produção androgênica e maior fração de androgênios
livres/biodisponíveis.

D - Quadro clínico e diagnóstico


A síndrome é a principal causa de infertilidade endócrina, responsável por
cerca de 25% dos casos de infertilidade feminina. Além disso, é a principal
doença endócrina da mulher na menacma, com prevalência de cerca de 8%
nessa população.
Em 2004, o Consenso de Rotterdam estabeleceu critérios para definir a
doença, normatizando condutas e determinando a necessidade de controlar as
pacientes com a síndrome, visando à regularização das funções menstrual e
ovulatória, ao controle do hirsutismo e de outros aspectos do
hiperandrogenismo e à reversão da infertilidade. Além disso, esse controle
permite a diminuição da resistência a insulina e seus riscos associados, como
diabetes mellitus tipo 2, dislipidemias e doenças cardiovasculares.

Importante
O diagnóstico diferencial da síndrome dos ovários policísticos deve ser
feito com outras causas frequentes de hiperandrogenismo, como
hiperplasia suprarrenal de início tardio, neoplasia ovariana e de suprarrenal
produtoras de androgênios, síndrome de Cushing e uso de androgênio
exógeno.

Importante
A ultrassonografia transvaginal comprovando o aspecto polimicrocístico do
ovário não é mais imprescindível para o diagnóstico. Se a paciente
apresentar a alteração menstrual característica e sinais de hirsutismo, já
preencherá 2 dos 3 critérios diagnósticos da síndrome, e a comprovação
ultrassonográfica será desnecessária. Convém atentar-se para esses detalhes
nas questões de provas de concursos médicos.

- Exames laboratoriais

Exclusão de diabetes e pré-diabetes:

Razão glicose-insulina de jejum <4,5: resistência a insulina;


Glicemia de jejum/HbA1c/Teste de Tolerância a Glicose Oral (TTGO)
de 75g.

Lipidograma completo e triglicérides:

Perfil lipídico, devido à associação de SOP a síndrome metabólica e


dislipidemia.

USG transvaginal/pélvica (só indicada se houver apenas 1 dos outros 2


critérios diagnósticos):

12 ou mais folículos de 2 a 9mm em cada ovário e/ou aumento do


volume ovariano superior a 10cm3.
Figura 8 - Ovários policísticos à ultrassonografia

E - Tratamento das síndromes hiperandrogênicas

Deve-se sempre orientar perda de peso para aumentar SHBG, melhorando a


resistência a insulina e diminuindo a conversão periférica dos androgênios;
Utilizam-se anticoncepcionais orais para supressão da função ovariana. Dá-se
preferência àqueles com progestogênios com ação antiandrogênica, como
acetato de ciproterona e drospirenona;
São drogas antiandrogênicas: acetato de ciproterona, espironolactona,
flutamida e finasterida;
São indutores da ovulação: citrato de clomifeno ou gonadotrofinas, usados em
pacientes que desejam engravidar;
Recorre-se a cauterização laparoscópica dos ovários (microperfurações) e
ressecção “em cunha” dos ovários (cirurgia de Thaler);
Tratamento estético para hirsutismo com diversas técnicas de depilação (além
dos tratamentos mencionados das causas);
Tratamento estético para acne e acompanhamento dermatológico;
É importante lembrar que as pacientes apresentam incidência aumentada de
hipertensão, dislipidemia, diabetes e doenças cardiovasculares, o que aponta
para a importância de um acompanhamento multiprofissional. Além disso,
entre as pacientes sem tratamento, os estímulos estrogênico e
hiperandrogênico sem oposição da progesterona aumentam os riscos de
câncer de endométrio, mama e ovário.

Dica
A metformina é usada para diminuição da resistência a insulina e pode
restaurar os ciclos ovulatórios. Esse medicamento é considerado excelente
tratamento para pacientes com síndrome dos ovários policísticos.

- Complicações da síndrome dos ovários policísticos

Figura 9 - Complicações relacionadas à síndrome dos ovários policísticos

Seguem respostas rápidas:


Hormônio responsável pela hiperplasia de células do estroma ovariano
com produção androgênica na teca: LH;
Enzima transformadora de androgênio em estrogênio: aromatase;
Enzima relacionada ao hirsutismo na SOP: 5-alfarredutase;
Hormônios que participam da regulação da síntese de androgênios: LH,
hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), IGF e inibina;
Disfunção específica na produção de androgênios: citocromo p450c17 e
enzima CYP17;
Androgênio geralmente não elevado na SOP: sulfato de
deidroepiandrosterona (S-DHEA); deidroepiandrosterona (DHEA) – pouco
elevado;
Alterações típicas na hiperinsulinemia: ↓ SHBG, ↑ LH, ↑ resposta ao LH;
Papel da obesidade na SOP: hiperinsulinemia, ↓ SHBG, ↑ aromatização
periférica;
Relação LH-FSH: elevada 2:1, FSH normal ou diminuído, LH elevado;
Estrogênio na SOP: elevado, principalmente estrona;
PRL na SOP: pode estar levemente elevada;
SHBG na SOP: reduzida;
Progesterona na SOP: baixa, compatível com a 1ª fase do ciclo;
Diagnóstico da SOP: ciclos menstruais
irregulares/hiperandrogenismo/ovários policísticos à USG; ≥2 critérios de
Rotterdam;
Diagnóstico de ovário policístico: USG de 1 ou 2 ovários – ≥12 folículos
com 2 a 9mm diâmetro ou volume ovariano >10cm3; o diagnóstico é feito
quando há 1 achado em 1 dos ovários.

5. Hiperandrogenismo

A - Definição

O hiperandrogenismo é o excesso da concentração ou da ação dos


androgênios na mulher, produzidos a partir do colesterol pelas glândulas
suprarrenais e pelos ovários. Em grande parte (80%), está ligado à SHBG ou à
albumina (19%), restando pequena fração livre no plasma (1%), responsável
pelas manifestações do hiperandrogenismo.
A quantidade de SHBG é um fator importante, pois determina a fração ligada
e a fração livre dos hormônios. Além disso, aumenta com estrogênios
(anticoncepcionais orais, por exemplo) e a administração de hormônio
tireoidiano (por exemplo, no controle do hipotireoidismo) e diminui na
obesidade, nos estados hiperinsulinêmicos (como SOP) e com a
administração de androgênios.
O androgênio mais potente é a DHT, resultado da conversão periférica da
testosterona pela enzima 5-alfarredutase.

B - Etiopatogenia

Diversos fatores podem levar ao hiperandrogenismo. Os mais importantes


são:

Aumento da produção de androgênios ovarianos (por exemplo, tumores


de ovário, SOP – hiperandrogenismo funcional) e suprarrenal (como
síndrome de Cushing);
Uso de substâncias androgênicas (anabolizantes; progestogênios
derivados da 19-nortestosterona);
Diminuição da SHBG com aumento das taxas livres de androgênios
circulantes. Exemplos: obesidade, hiperinsulinemia;
Diminuição do catabolismo e depuração dos androgênios;
Aumento da resposta do tecido-alvo.

C - Apresentação clínica

- Aspectos fenotípicos relacionados ao hiperandrogenismo


(“maçã”) e mulher normal (“pera”)

O hiperandrogenismo leva tanto à redução dos caracteres essencialmente


femininos (desfeminilização) quanto à virilização. Os principais sinais são:

Alopecia androgenética;
Aumento da massa muscular;
Aumento da gravidade da voz;
Aumento do clitóris;
Alterações menstruais: de menstruações infrequentes a amenorreia –
ciclos anovulatórios.
Esterilidade por fator ovulatório;
Abortamentos de 1º trimestre por insuficiência lútea;
Hirsutismo;
Acne;
Obesidade centrípeta;
Acantose nigricans – marcador de resistência a insulina.

Figura 10 - Escala de Ferriman-Gallwey para hirsutismo. Interpretação: abaixo de cada figura, de


acordo com a porcentagem de pelos, atribui-se nota de 1 a 4, e somam-se os pontos (total <8 =
normal, 8 a 16 = hirsutismo leve, 17 a 25 = hirsutismo moderado, >25 = hirsutismo grave)

No entanto, deve-se observar que a virilização é marcada por aumento da


massa muscular, redução das mamas, engrossamento da voz e clitoromegalia.
O clitóris normal tem de 1 a 1,5cm de comprimento e 0,5cm de largura.
Quando ocorre virilização, deve-se pensar em tumores produtores de
androgênios ovarianos ou de suprarrenal. Na SOP, é comum haver hirsutismo,
acne e alopecia androgênica.

D - Principais causas de hiperandrogenismo


SOP (mais comum);
Hiperplasia de suprarrenal congênita de início tardio (não clássica): trata-se
de uma doença congênita marcada por deficiência parcial ou total da 21-
hidroxilase (mais comum) ou 11-hidroxilase. Na forma tardia, ocorre
deficiência apenas do cortisol, com consequente aumento no ACTH, que é
capaz de normalizar a produção de cortisol e provoca hiperplasia de
suprarrenal com aumento de androgênios. Há aumento nas taxas de
testosterona, androstenediona e S-DHEA. Nessa forma tardia da doença,
também chamada não clássica, não há alteração no cortisol e aldosterona
séricos.

Figura 11 - Mecanismo de hiperandrogenismo na hiperplasia de suprarrenal congênita

O diagnóstico presuntivo é realizado pela dosagem da 17-hidroxiprogesterona


sérica >200ng/dL e confirmado pelo teste de estimulação com ACTH.

Figura 12 - Diagnóstico pela dosagem de 17-hidroxiprogesterona 60 minutos após estimulação com


hormônio adrenocorticotrófico

a) Tumor ovariano e de suprarrenal secretor de androgênio

Como mencionado, sinais de virilização são indicativos clínicos de produção


tumoral de androgênios. Devem-se, nesses casos, dosar os androgênios
séricos;
A dosagem de testosterona total sérica é utilizada para excluir tumores
ovarianos. Testosterona total sérica >200ng/mL sugere neoplasia ovariana,
devendo-se evoluir com exames de imagem para elucidação diagnóstica;
S-DHEA >700µg/dL sugere a presença de neoplasia suprarrenal, devendo ser
realizada Tomografia Computadorizada (TC) ou Ressonância Nuclear
Magnética (RNM) para esses pacientes.

b) Síndrome de Cushing

Trata-se do resultado da exposição prolongada a níveis elevados de


glicocorticoides exógenos ou endógenos. São manifestações clínicas:
disfunção menstrual, acne, hirsutismo, obesidade centrípeta, dislipidemia,
intolerância a glicose, fácies “em lua cheia”, estrias abdominais, gordura com
distribuição central, perda da força muscular nos músculos proximais,
facilidade para desenvolver hematomas;
Em pacientes com essas características, é mandatória a dosagem de cortisol
livre na urina de 24 horas: <90µg – normais; >300µg – síndrome de Cushing.
Uma opção diagnóstica é o teste de supressão com dexametasona.
c) Androgênios exógenos

Pacientes que fazem uso exógeno de androgênios podem evoluir com sinais e
sintomas de hiperandrogenismo.

E - Diagnóstico clínico e laboratorial

O diagnóstico do hiperandrogenismo deve ser feito por avaliação clínica e


laboratorial:

Clínica: na anamnese, questiona-se sobre oleosidade de pele e cabelos,


alteração da libido, irregularidade menstrual, acne, hirsutismo etc. No
exame físico, verificam-se hirsutismo, clitoromegalia, timbre da voz e
distribuição da gordura corpórea;
Exames laboratoriais: dosagens séricas dos androgênios
(androstenediona, S-DHEA, testosterona total e livre), PRL, hormônios
tireoidianos, FSH e LH para avaliar SOP; exames de imagem para
avaliar ovários e suprarrenais (USG/TC/RNM), a fim de excluir as
neoplasias.

6. Hiperprolactinemia

A - Definição

A PRL é um hormônio polipeptídio secretado pela adeno-hipófise. Sua


secreção é controlada por meio da constante inibição exercida pela dopamina.
Há um fator estimulador da secreção de PRL, que é o TRH (fator liberador do
hormônio tireotrófico). A ação da PRL difere na gestante e na não gestante.
Durante a gestação, seus níveis crescem constantemente até o termo, mas não
ocorre lactação, devido à inibição exercida pelos estrogênios nos receptores
mamários de PRL. Quando ocorre a dequitação (saída da placenta), há a
liberação da ação da PRL na mama, permitindo a lactação.
Na não gestante, a hiperprolactinemia pode inibir a secreção pulsátil do
GnRH. Dessa forma, ocorre bloqueio do eixo do ciclo menstrual, e a paciente
entra em hipogonadismo hipogonadotrófico.

B - Apresentação clínica

Os sinais e sintomas da hiperprolactinemia são:


Galactorreia: ação direta do aumento de PRL na mama;
Amenorreia: bloqueio do eixo;
Infertilidade: não ocorrência de ovulação;
Distúrbios visuais: se a etiologia é tumoral, há aumento da hipófise e
compressão do quiasma óptico, levando a hemianopsia bitemporal. Pode
ocorrer nos macroadenomas (tumores maiores de 1cm);
Sinais de hipoestrogenismo;
Diminuição da libido.

C - Etiologia

a) Uso de medicamentos

Psicotrópicos (antidepressivos tricíclicos, inibidores da


monoaminoxidase);
Antidopaminérgicos (clorpromazina, haloperidol, metoclopramida,
veraliprida, alfametildopa, reserpina);
Estrogênios;
Progestogênios;
Opiáceos;
TRH;
Cocaína.
b) Tumores

No adenoma de hipófise (prolactinoma), os microadenomas são tumores


hipofisários menores de 1cm, e os macroadenomas, tumores de 1cm ou mais.
Ambos podem ser secretores de PRL. Suspeita-se de adenomas quando a
dosagem de PRL está acima de 100ng/dL.
c) Alterações fisiológicas

Alterações fisiológicas do sono e do exercício físico, gravidez, lactação,


situações de estresse, coito e manipulação mamária.

d) Doenças endócrinas

Hipotireoidismo, hiperplasia adrenal e insuficiência hepática.

e) Alterações da parede torácica

Mastectomia, herpes-zóster, mastoplastia e traumas, principalmente


queimaduras.

D - Diagnóstico

A hipótese de hiperprolactinemia deve ser investigada sempre que a paciente


apresenta queixa de alteração menstrual, principalmente se tende a
oligomenorreia ou mesmo amenorreia e, também, galactorreia e esterilidade.
Inicia-se com anamnese completa, afastando-se outras possibilidades, como o
uso de medicações e gestação atual. Devem-se, também, pesquisar doenças
que possam explicar as manifestações apresentadas, como hipotireoidismo,
alterações hepáticas etc.
O roteiro diagnóstico compreende dosagem de PRL + dosagem de TSH para
afastar hipotireoidismo.

Se PRL <25mg/mL: normal;


Se PRL >100mg/mL: provável etiologia tumoral que deverá ser
investigada mais profundamente com radiografia de sela túrcica, TC de
crânio e RNM (melhor exame);
Se PRL entre 25 e 100mg/mL: procurar causas diversas, desde uso de
medicamentos a outras doenças endócrinas e doenças da parede torácica.

E - Tratamento

O tratamento está indicado para sintomáticas ou pacientes com tumor de


hipófise de grande extensão (macroadenoma hipofisário). Já as pacientes com
microadenomas de hipófise assintomáticos não têm indicação de tratamento,
mas deve-se realizar acompanhamento clínico. Quando há indicação, o
tratamento pode ser clínico, cirúrgico ou radioterápico:
Clínico: o mais indicado inicialmente, com boa resposta terapêutica na
maioria dos casos. As drogas mais utilizadas são a bromocriptina, com
posologia diária e efeitos colaterais como tontura, cefaleia, náuseas,
depressão, alucinações, hipotensão ortostática, e a cabergolina, com
posologia semanal e menor incidência de efeitos colaterais;
Cirúrgico: ressecção transesfenoidal seletiva, reservada aos casos de
tumor de hipófise extenso (macroadenoma) refratário ao tratamento
clínico, ou a pacientes com intolerância à medicação. Pode trazer
complicações como meningite, diabetes insipidus, fístulas liquóricas e
pan-hipopituitarismo;
Radioterapia: reservada aos casos de recidiva de tumores após
ressecção cirúrgica, para tentar reduzir tumores irressecáveis refratários à
medicação e para os casos de tumores mistos. Seus resultados são menos
eficientes do que o tratamento cirúrgico, com resposta lenta e
insatisfatória na maioria dos casos.

Resumo
Sangramento uterino anormal

Origem: possivelmente, ciclos ovulatórios ou anovulatórios. Estes


últimos (90%) são comuns nos extremos reprodutivos: imaturidade do
eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano na adolescência e falência
ovariana no climatério. O SUA, devido a ciclos ovulatórios, acontece por
produção inadequada de estrogênio e progesterona;
Etiopatogenia: distúrbios no eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano,
excesso de ou falta de estrogênios, aumento das prostaglandinas,
distúrbios de outros órgãos, insuficiência hepática/cirrose,
hipertireoidismo, hipotireoidismo;
Apresentação clínica: alterações da ciclicidade, duração e intensidade do
fluxo;
Diagnóstico: afastar quaisquer patologias orgânicas por meio de
anamnese/exame físico e exames complementares;
Tratamento: clínico (anti-inflamatórios não hormonais – progestogênios:
danazol; anticoncepcionais hormonais combinados – análogos de GnRH:
SIU medicado com progesterona); cirúrgico (ablação endometrial,
curetagem uterina, histerectomia).

Hiperandrogenismo

Trata-se do excesso da concentração ou da ação dos androgênios na


mulher, produzidos a partir do colesterol pelas glândulas suprarrenais e
pelos ovários, em grande parte (80%) ligado à SHBG ou albumina
(19%), restando pequena fração livre no plasma (1%);
Diversos fatores podem levar ao hiperandrogenismo. Os mais
importantes são aumento da produção de androgênios ovarianos e
suprarrenal, uso de substâncias androgênicas, diminuição da SHBG com
aumento das taxas livres de androgênios circulantes;
Apresentação clínica: alopecia androgenética, aumento da massa
muscular, engrossamento da voz, aumento do clitóris e alterações
menstruais – de ciclos oligomenorreicos a amenorreia, esterilidade por
fator ovulatório, abortamentos de 1º trimestre por insuficiência lútea,
hirsutismo, acne, obesidade centrípeta, acantose nigricans;
Diagnóstico clínico: anamnese e exame físico;
Laboratório: dosagens séricas dos androgênios (androstenediona, S-
DHEA, testosteronas total e livre), PRL, hormônios tireoidianos, FSH e
LH para avaliar SOP; exames de imagem para avaliar ovários e
suprarrenais (USG/TC/RNM), a fim de excluir as neoplasias.

Síndrome dos ovários policísticos

Corresponde ao hiperandrogenismo acompanhado por anovulação


crônica com etiopatogenia ainda não definida;
Há aumento na produção androgênica, devido a hiperplasia das células
tecais sob estímulo do LH que está aumentado em relação ao FSH
(relação LH-FSH >2:1). Os níveis relativamente baixos de FSH inibem a
maturação folicular adequada e o fenômeno de dominância folicular,
persistindo folículos em estágios iniciais da maturação e em atresia, o
que oferece o aspecto policístico aos ovários;
O quadro clínico é composto por ciclos menstruais irregulares
(espaniomenorreia ou amenorreia), hirsutismo, acne, alopecia, obesidade
e ovários aumentados com múltiplos cistos;
O tratamento envolve perda de peso, drogas antiandrogênicas (o acetato
de ciproterona é o mais utilizado), metformina (quando houver
resistência periférica a insulina) e citrato de clomifeno (indutor da
ovulação) nas pacientes que desejem engravidar.

Hiperprolactinemia

A PRL é secretada pela adeno-hipófise. Sua secreção é controlada por


meio da constante inibição exercida pela dopamina. Há um fator
estimulador da secreção de PRL, que é o TRH;
A PRL atua no crescimento e na dominância folicular com papel
sinérgico às gonadotrofinas. Se a PRL estiver elevada, determinam-se
bloqueio da ação da aromatase, bloqueio da ação do FSH em seus
receptores e atresia folicular por bloqueio da maturação. Além da ação
direta nos ovários, a hiperprolactinemia pode inibir a secreção pulsátil do
GnRH, alterando a função ovariana, indiretamente;
Os sinais e sintomas são galactorreia (ação direta do aumento de PRL na
mama), amenorreia, esterilidade, acne, hirsutismo, distúrbios visuais,
sinais de hipoestrogenismo, outros distúrbios menstruais
(espaniomenorreia, oligomenorreia, insuficiência lútea) e redução da
libido;
A etiologia envolve o uso de medicamentos (psicotrópicos,
antidopaminérgicos, estrogênios, progestogênios, antidepressivos
tricíclicos), tumores, doenças endócrinas (hipotireoidismo, hiperplasia
adrenal, insuficiência hepática);
O roteiro diagnóstico compreende dosagem de PRL + dosagem de TSH
para afastar hipotireoidismo:
Se PRL <25mg/mL: normal;
Se PRL >100mg/mL: provável etiologia tumoral que deverá ser
investigada mais profundamente com radiografia de sela túrcica, TC
de crânio, RNM (melhor exame) e avaliação de campo visual;
Se PRL entre 25 e 100mg/mL: procurar causas diversas, desde uso
de medicamentos, outras doenças endócrinas e doenças da parede
torácica.
No tratamento clínico, a droga mais utilizada é a bromocriptina. O
tratamento cirúrgico consiste na ressecção transesfenoidal seletiva,
reservada aos casos de tumor de hipófise extenso (macroadenoma)
refratário ao tratamento clínico, ou a pacientes com intolerância à
medicação;
A radioterapia está reservada aos casos de recidiva de tumores após
ressecção cirúrgica, para tentar reduzir tumores irressecáveis refratários à
medicação e para os casos de tumores mistos.
Climatério
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Introdução
O climatério pode ser compreendido como o período da vida da mulher em
que há um declínio acentuado e progressivo da função ovariana, que tende ao
fim do patrimônio folicular e, com isso, da sua capacidade reprodutiva.
Representa a passagem do período reprodutivo (menacma) ao não
reprodutivo.
A síndrome do climatério corresponde ao conjunto de sinais e sintomas que
podem acompanhar essa fase e que estão relacionados à queda da função
ovariana, mas que nem sempre se manifestam.

Figura 1 - Climatério
Figura 2 - Variações hormonais no climatério
2. Definições pertinentes

A - Menopausa

Trata-se da última menstruação espontânea da mulher, associada a amenorreia


por 12 meses consecutivos. Em geral, ocorre por volta dos 51,5 anos, sendo
precoce quando ocorre antes dos 40. É importante destacar que a menopausa
é, portanto, um evento pontual, análogo à menarca, que é a 1ª menstruação da
vida da mulher.
O diagnóstico de menopausa é sempre feito retrospectivamente, uma vez que
as irregularidades menstruais são muito comuns nesse período. Muitas
pacientes podem ficar longos períodos sem menstruar (6, 8, 11 meses) e voltar
a apresentar sangramento. Para que se defina menopausa, é necessário 1 ano
(12 meses) de amenorreia. Portanto, se uma paciente de 51 anos teve sua
menstruação em maio, por exemplo, e até maio do próximo ano ficar em
amenorreia, pode-se dizer que houve menopausa aos 51. Porém, nesse
momento do diagnóstico, essa paciente hipotética já terá 52; por isso,
considera-se sempre que o diagnóstico é retrospectivo.
B - Pré-menopausa

Trata-se do período em que se iniciam os primeiros sintomas do climatério até


a ocorrência da menopausa.

C - Pós-menopausa

Corresponde aos anos que se seguem à menopausa.

D - Menopausa ou falência ovariana precoce

Acontece quando a menopausa ocorre antes dos 40 anos. Sua suspeita é


confirmada pela dosagem alta de FSH.

3. Propedêutica
Não há necessidade de dosagem de FSH, LH e estrogênios a pacientes com
idade considerada própria do climatério e com anamnese sugestiva, já que o
resultado não traz informações relevantes diante do que já foi obtido. Só há
indicação se há uma dúvida diagnóstica ou em pacientes com menos de 40
anos (nas pacientes com falência ovariana precoce, é necessário documentar o
diagnóstico com a dosagem de FSH). Segundo o Ministério da Saúde, a
propedêutica nessa fase engloba 4 etapas:

1 - Avaliação da síndrome climatérica.


2 - Identificação e rastreamento de doenças crônicas: obesidade,
hipertensão, diabetes, dislipidemia, doença cardiovascular e disfunção
tireoidiana.
3 - Rastreamento de câncer: mama, ovário, colo do útero, endométrio e
cólon.
4 - Avaliação do risco para osteoporose.

A - Fatores de risco para menopausa precoce

Doenças genéticas;
Tabagismo;
Quimioterapia;
Radioterapia pélvica;
Cirurgias ovarianas.

B - Avaliação da síndrome climatérica


No início da transição menopáusica, os ciclos menstruais permanecem
regulares, porém os intervalos entre eles podem ser alterados em 7 dias ou
mais, em geral, com ciclos mais curtos, marcando o início de alguns ciclos
anovulatórios. Entretanto, há, ainda, alguns ciclos ovulatórios, podendo
ocorrer a concepção. No final desse período, com o avanço da falência
ovariana, existem 2 ou mais falhas na menstruação, com pelo menos 1
intervalo intermenstrual de 60 dias ou mais, devido a períodos mais longos de
anovulação.
Os sinais e sintomas do climatério, menopausa e pós-menopausa devem ser
questionados em uma anamnese completa e procurados em um exame físico
minucioso, pois nem sempre a paciente sabe que as alterações sofridas estão
relacionadas com o climatério. Os sintomas podem ser divididos em:

Agudos: vasomotores (fogachos, sudorese e calafrios);


Crônicos ou tardios: atrofia cutânea (queda de pelos e cabelos) e
urogenital (ressecamento vaginal, dispareunia, prurido vulvar, polaciúria,
disúria, urgência miccional, incontinência urinária), doença de
Alzheimer, osteoporose e doença aterosclerótica;
Outros sintomas comuns: palpitação, cefaleia, tontura, insônia,
parestesia, diminuição da memória, humor depressivo, irritabilidade,
diminuição da libido, mastalgia, dor óssea, artralgia, mialgia e
irregularidade menstrual.

a) Sintomas vasomotores

Pela queda abrupta do nível estrogênico, temos os sintomas vasomotores


como os mais característicos e os que mais levam a queixas. O fogacho é uma
sensação súbita e transitória de calor, que se inicia na região da cintura e se
espalha pelo tórax, pescoço e face (caráter ascendente), geralmente mais
intensa e frequente à noite, e que pode ser acompanhada por sudorese e
vermelhidão da pele na cabeça, no pescoço e no tórax. O mecanismo
fisiopatológico básico envolvido nas ondas de calor parece estar relacionado
com a disfunção térmica no hipotálamo; alguns autores defendem a teoria de
que cada onda de calor corresponderia a um pulso de LH, além de ser
precedida por aumento de noradrenalina no hipotálamo, determinando
alterações na termorregulação com tendência a hipertermia. Outros autores
sugerem que o hipoestrogenismo provoca vasoespasmos, o que poderia alterar
o eixo termorregulador.
A duração média dos sintomas vasomotores é de 5,2 anos para mulheres não
usuárias de Terapia de Reposição Hormonal (TRH) e de 5,5 anos naquelas
submetidas à TRH. Deve-se estar atento, ainda, às demais causas de flash de
calor, como feocromocitoma, tumor carcinoide, leucemias, tumores
pancreáticos e anomalias da tireoide.

b) Irregularidade menstrual

O sangramento uterino anormal é comum durante a fase de transição


menopáusica, podendo ocorrer em mais de 50% das mulheres. A
irregularidade menstrual pode apresentar-se inicialmente como tendência ao
encurtamento gradativo do intervalo (menstruações frequentes), devido a
maturação folicular acelerada (altos níveis de FSH) e consequente ovulação
precoce (encurtamento da fase folicular). Após a fase inicial, passam a ocorrer
ciclos anovulatórios, com menstruações infrequentes, em razão de
persistência folicular longa. A produção irregular de estrogênios, associada a
ausência de progesterona pela inexistência da fase lútea, pode provocar o
aumento da duração e da intensidade do fluxo menstrual.
E o endométrio? Como o endométrio é responsivo às alterações hormonais,
sofre alterações de acordo com a fase reprodutiva da mulher:

Fase inicial da transição menopáusica: o endométrio reflete ciclos


ovulatórios;
Fase final da transição menopáusica: o endométrio reflete ciclos
anovulatórios, com alterações proliferativas endometriais, como as
hiperplasias endometriais;
Menopausa e pós-menopausa: endométrio atrófico (endométrio
<5mm).

Essas mudanças no perfil endometrial são fundamentais para definir as causas


prováveis de sangramento uterino anormal e a conduta.

c) Alterações cardiovasculares

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte após a menopausa


entre as mulheres no Brasil e nos Estados Unidos. O estrogênio protege os
vasos sanguíneos da formação de placas ateroscleróticas, além de promover
melhora do perfil lipídico e ter efeito vasodilatador. O estrogênio também tem
ação redutora nos níveis de renina, enzima conversora de angiotensina, P-
selectina e homocisteína. Por todos esses fatores, deve-se dar especial atenção
a alterações cardiovasculares na menopausa.
O preditor mais forte de doença coronariana em mulheres é o HDL baixo
(<50mg/dL). Além disso, o aumento na obesidade centrípeta e a síndrome
metabólica são outros fatores de risco para doença coronariana e estão
relacionados ao aumento na relação androgênio-estrogênio que ocorre nas
mulheres em transição menopáusica. Entretanto, o ganho de peso na
menopausa não é um efeito das alterações hormonais, e sim da dieta, do
exercício e do envelhecimento. Por fim, as mulheres com falha ovariana
prematura estão sob risco aumentado de doença cardiovascular.
São fatores que contribuem para o risco de doença cardiovascular:

Idade >45 anos;


Dislipidemia;
Hipertensão arterial sistêmica;
Diabetes mellitus;
Tabagismo;
Sedentarismo.

d) Osteopenia e osteoporose

A osteoporose deve ser avaliada com frequência nessa fase, assim como os
fatores de risco e as medidas preventivas. Pela privação estrogênica, há o
favorecimento da reabsorção óssea em detrimento da formação, já que os
estrogênios sabidamente inibem tal reabsorção quando em níveis normais. Na
pós-menopausa, notam-se elevação do cálcio sérico e da sua excreção
urinária, além de aumento da concentração plasmática de fósforo e
hidroxiprolina, que refletem o aumento do turnover de massa óssea. Isso
culmina com perda óssea progressiva, que pode ser percebida com
acompanhamento por densitometrias ósseas sucessivas. As fraturas mais
comuns nessa época são dos corpos vertebrais, do rádio distal e do colo
femoral.
A osteoporose é conhecida como doença silenciosa, pois as primeiras
manifestações ocorrem após 30 a 40% de perda óssea. As fraturas mais
comuns decorrentes são as de quadril, punho, corpos vertebrais e fêmur. O
médico que vem acompanhando a paciente nessa fase da vida deve identificar
o risco e prevenir ou diminuir os efeitos deletérios do hipoestrogenismo sobre
a massa óssea.
Figura 3 - Principais sintomas da menopausa
e) Alterações no sistema nervoso central e psicogênicas

A queda dos níveis de estrogênios tem efeito significativo sobre o sistema


nervoso central, como dificuldade de concentração, diminuição da cognição e
perda de memória recente, aumentando o risco de doença de Alzheimer.
Alterações psicogênicas relacionadas ao climatério incluem diminuição da
autoestima, irritabilidade, labilidade afetiva, sintomas depressivos,
dificuldades sexuais e insônia. Tais queixas, assim como a diminuição do
desejo sexual, rejeição do parceiro e outras relacionadas à sexualidade, são
comuns nesse período e não devem ser entendidas e abordadas apenas como
decorrentes das mudanças biológicas (hormonais) no período do climatério;
deve-se realizar abordagem ampliada da mulher, sua família e rede social,
abordando aspectos biopsicossociais.

Figura 4 - Ações dos estrogênios

C - Identificação e rastreamento de doenças


endocrinológicas

As portadoras de insuficiência coronariana prévia, hipertensão arterial,


diabetes mellitus, tabagismo, obesidade, ou com antecedente de doença
cerebrovascular ou vascular periférica, apresentam risco potencial de
desenvolvimento ou de piora da doença cardiovascular. O médico deve estar
atento às doenças cardiovasculares, diabetes, doença tireoidiana e
osteoporose. A propedêutica de exames a serem solicitados de acordo com o
Ministério da Saúde encontra-se a seguir.

a) Avaliação do risco para osteoporose


Importante
Têm maior risco de osteoporose pacientes com baixa estatura, menor peso,
etnia ocidental, antecedente familiar de osteoporose, ingestão excessiva de
álcool ou de cafeína, tabagismo, sedentarismo, uso de medicação
anticonvulsivante e antiácida e de hormônios tireoidianos, além de
portarem outros agravos sistêmicos, como insuficiência renal crônica,
diabetes, síndrome de má absorção intestinal, hiperparatireoidismo,
hipertireoidismo, gastrectomia e anastomoses intestinais.

O melhor método diagnóstico de osteoporose é a densitometria óssea de


coluna vertebral e fêmur. Os resultados são comparados com a curva de
distribuição da população normal de mesma idade e de adultos jovens e
expressos em escore T (desvio-padrão em que a massa óssea medida em um
determinado indivíduo difere da média da massa óssea de um indivíduo
jovem).

A radiografia simples da coluna dorsal e lombar pode detectar osteoporose na


fase tardia, com perda de 30 a 40% de massa óssea. Os principais sinais
radiológicos são redução da densidade óssea, acentuação das corticais dos
corpos vertebrais e alterações das formas dos corpos vertebrais.
b) Avaliação de tireoidopatia

Caso o TSH realizado de rotina esteja alterado, deve-se seguir a propedêutica


com a solicitação de T4 livre e T3. Deve-se, também, estar atento ao
hipotireoidismo após 50 anos, devido à elevada prevalência da doença nessa
faixa etária. Na ocorrência de menopausa precoce, pela associação de
tireoidites a amenorreia, deve-se solicitar investigação mais detalhada,
incluindo anti-TPO e antitireoglobulina (anti-Tg). Todavia, o Ministério da
Saúde não preconiza TSH de rotina no acompanhamento das pacientes em
climatério/menopausa.

D - Rastreamento de câncer

Os sítios dos principais tumores malignos que acometem essa faixa etária são
mama, colo e corpo do útero, ovários e cólon.

a) Mama
Realiza-se rastreamento por meio de mamografia (MMG) periódica, que deve
ser solicitada a cada 2 anos entre 50 e 69 anos, segundo as diretrizes do
Ministério da Saúde de 2016.
A ultrassonografia (USG) de mama é realizada de forma complementar à
MMG em situações específicas, como mamas densas e diferenciação entre
lesões císticas e sólidas, não sendo utilizada como método de rastreio de
câncer de mama. O Ministério da Saúde desencoraja o ensino do autoexame
de mama no rastreamento.

Dica
O Ministério da Saúde alterou as diretrizes para o rastreamento do câncer
de mama em 2015 e o manteve no protocolo de Atenção Básica à Saúde da
Mulher de 2016: a recomendação oficial é início aos 50 anos, com 1 exame
a cada 2 anos até os 69 anos.

b) Colo do útero

Promove-se rastreamento pelo exame citopatológico do colo uterino


periódico, que pode ser complementado por colposcopia com biópsia dirigida
quando necessário. Em caso de atrofia importante, deve-se utilizar
estrogenoterapia tópica previamente à coleta, para evitar desconforto
excessivo e comprometimento da qualidade do exame.
Qual é o intervalo de coleta do colpocitopatológico?
Os 2 primeiros exames devem ser realizados com intervalo anual, e, se ambos
os resultados forem negativos, os próximos deverão ser realizados a cada 3
anos;
Qual é a idade de avaliar a suspensão da coleta do colpocitopatológico?
Segundo as diretrizes do Ministério da Saúde, a idade é de 64 anos.
Quando se deve suspender o colpocitopatológico em mulheres acima de
64 anos, de acordo com o Ministério da Saúde?
Para mulheres sem história prévia de doença neoplásica pré-invasiva + 2
exames ou mais negativos consecutivos nos últimos 5 anos;
Mulheres com mais de 64 anos e que nunca se submeteram ao exame
citopatológico devem fazer 2 exames com intervalo de 1 a 3 anos. Caso
ambos os exames sejam negativos, essas mulheres podem ser dispensadas de
exames adicionais.
c) Corpo uterino

A pesquisa pode ser realizada por USG transvaginal (USGTV) e


colpocitologia oncótica periódicas (não deve haver a presença de células
endometriais na citologia; quando presentes, sugerem descamação de um
endométrio ativo, o que não é esperado nessa faixa etária). Na USGTV,
utiliza-se a medida do eco endometrial, <4mm na pós-menopausa e <8mm em
caso de terapia hormonal. Valores maiores indicam prosseguimento da
investigação, geralmente por meio de histeroscopia. O rastreamento não tem
eficácia na redução da mortalidade. Por isso, o Ministério da Saúde
recomenda USGTV apenas em caso de sangramento uterino anormal para a
avaliação de lesões endometriais/corpo uterino, e não de rotina a todas as
mulheres climatéricas.

A biópsia de endométrio pode ser feita por histeroscopia, curetagem


diagnóstica (sucção ou cureta) ou trocarte plástico de Pipelle. O sangramento
pós-menopáusico sempre deve ser cuidadosamente avaliado. A principal
causa de sangramento na pós-menopausa é a atrofia de endométrio. A
hiperplasia endometrial e o carcinoma de endométrio são mais comuns na
fase de transição menopáusica por ciclos anovulatórios.
d) Ovários

O rastreamento também não é recomendado pelo Ministério da Saúde. O


volume médio dos ovários reduz de 8 a 9cm3, na menacma, para 2 a 3cm3
alguns anos após a menopausa. Alguns autores defendem a USGTV periódica
avaliando os anexos, enquanto outros aconselham seguir também com
marcadores tumorais (CA-125, antígeno carcinoembrionário,
alfafetoproteína). Porém, tais métodos não são eficazes e apresentam pouco
impacto na prevenção secundária. Por isso, não está indicada USGTV de
rotina para rastreamento de câncer de ovário em mulheres assintomáticas.
e) Cólon

Não se trata de um tumor ginecológico, mas, por sua alta prevalência, também
deve ser objeto de rastreamento. Sugere-se a Pesquisa de Sangue Oculto
(PSO) nas fezes anualmente a partir dos 50 anos e, em casos positivos,
colonoscopia. Alguns recomendam associar PSO anual a colonoscopia a cada
5 anos, pela sua maior sensibilidade.

4. Rotina propedêutica básica


A pressão arterial e o peso devem ser aferidos em todas as consultas.
Exames laboratoriais não são obrigatórios, mas devem ser considerados em
pacientes com comorbidades e quando se deseja escolher a via de
administração da TRH.

São fundamentais as orientações dietéticas e com relação aos hábitos de vida.


No caso de alterações nos exames solicitados, a investigação deve ser
complementada.

5. Tratamento
O tratamento visa à remissão dos principais sintomas referidos, além da
prevenção de eventos mórbidos e da melhora da qualidade de vida.

A - Orientações dietéticas

A cada década, ocorre redução em cerca de 25% das necessidades energéticas.


Além disso, na pós-menopausa, as alterações hormonais levam a perda de
massa muscular e óssea. Com tudo isso, há aumento do risco de obesidade e
doenças associadas, como dislipidemia, diabetes e doenças cardiovasculares.
Assim, o controle de peso faz parte da rotina de atendimento no climatério,
assim como as orientações dietéticas e com relação aos hábitos de vida.
Deve-se estimular o consumo de vegetais verdes, frutas, leite desnatado,
queijos brancos, carnes mais magras e aves sem pele. Ainda nesse sentido,
deve-se incentivar a exposição solar, sem fotoproteção, por pelo menos 15
minutos, diariamente, antes das 10 ou após as 16 horas. A suplementação de
cálcio e vitamina D só estará recomendada se não houver aporte dietético e/ou
exposição solar:

Cálcio: 1.200mg/d. Fontes: derivados de leite, folhas verdes, sardinha.


Evitar alimentos que diminuam a sua absorção, como cafeína, bebidas
alcoólicas, refrigerantes, excesso de proteínas, fibras e sódio. Os
suplementos de cálcio devem ser administrados após as refeições.
Náusea, dispepsia e constipação intestinal são os principais efeitos
colaterais;
Vitamina D: de 800 a 1.000mg/d. Fontes: derivados do leite,
margarinas, óleos de peixe. Pode ser de origem vegetal (D2 –
ergocalciferol) ou animal (D3 – colecalciferol). Seu papel na forma
biologicamente ativa, após a 1ª conversão hepática em 25-
hidroxivitamina D e a 2ª conversão renal em 1,25-diidroxivitamina D, é
incrementar a absorção intestinal de cálcio entre 30 e 40%, e a de
fósforo, em 80%.

B - Orientações com relação aos hábitos de vida

Bebidas alcoólicas (fator de risco para osteoporose): diminuir o consumo e


evitar o abuso;
Tabagismo (fator de risco para infarto, por aumento do colesterol LDL e
da agregação plaquetária, e para osteoporose): diminuir ou,
preferencialmente, cessar;
Atividade física: reduz o risco de doenças crônicas, câncer de cólon e
osteoporose. Além disso, o fortalecimento da massa muscular melhora a
coordenação, o equilíbrio e a resistência, reduzindo o risco de quedas e
fraturas. As mais indicadas são caminhadas, natação e hidroginástica – as
primeiras devem ser de, no mínimo, 30 a 45 minutos, sem interrupções, de 5 a
7 vezes por semana. É importante lembrar que alguns estudos sugerem que as
caminhadas não estimulam a mineralização óssea, sendo os exercícios com
resistência (musculação) mais eficazes nesse quesito.
C - Terapia hormonal

Em 2002, nos Estados Unidos, foi publicado o maior estudo prospectivo sobre
Terapia Hormonal (TH) do mundo. O WHI (Women’s Health Initiative)
apontou aumento da incidência de câncer de mama nas usuárias de TH e
aumento dos eventos cardiovasculares. Há uma série de vieses,
principalmente a faixa etária avaliada (média superior a 60 anos), o tempo de
início da TH pós-menopausa e características próprias prévias, como IMC,
pressão arterial etc. Mesmo assim, após a publicação do estudo, ocorreu uma
mudança nas indicações do tratamento, que ficaram restritas ao dos sintomas
vasomotores, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida.
A diretriz atual da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e
Obstetrícia (FEBRASGO) e da Associação Médica Brasileira (AMB) é
bastante clara: “a TH é eficaz no tratamento dos sintomas neurovegetativos,
neuroendócrinos e urogenitais. Assim, define-se que, quando houver
sintomas, haverá indicação para o uso de TH, pelo menos por curto período;
no entanto, esta não deverá ser prescrita na existência de alguma
contraindicação ou se a paciente, apesar de adequadamente informada, optar
por não usá-la. Assim, a TH será individualizada, com base em comum
acordo entre o médico e a paciente, em conformidade com os riscos e
benefícios particulares da mulher”.
De acordo com o Consenso Brasileiro da FEBRASGO 2014, as indicações
para TH sistêmica são:

O tratamento com TH deve ser iniciado apenas em mulheres com menos


de 60 anos e com menos de 10 anos de menopausa. Deve-se optar pela
menor dose efetiva e pelo menor período de tempo necessário. Sempre
avaliar se há contraindicações à TH. O tratamento deve ser
individualizado;
O tratamento dos sintomas vasomotores intensos e moderados
permanece como indicação primária da TH e é o mais efetivo para esse
sintoma;
A TH ou o estrogênio local podem melhorar a satisfação sexual devido à
redução da dispareunia e ao aumento da lubrificação vaginal. A TH com
tibolona ou estrogênio associado a metiltestosterona sistêmica apresenta
melhora na função sexual (desejo e orgasmo);
A TH é eficaz na prevenção de perda óssea associada à menopausa. Com
a descontinuação do tratamento, o efeito protetor regride rapidamente. A
TH é efetiva e apropriada para prevenir fraturas osteoporóticas em
mulheres na pós-menopausa;
A TRH melhora a qualidade de vida da paciente sintomática, visto que
alivia sintomas de desordem do sono, humor e função sexual;
Os sintomas urogenitais respondem à TH sistêmica. Entretanto, se o
objetivo for apenas tratá-los, deve-se optar pelo estrogênio vaginal (que
ajuda na falta de lubrificação e dispareunia), cursando com menos efeitos
colaterais. O estrogênio vaginal pode, ainda, apresentar benefícios sobre
os sintomas de urgência urinária, bexiga hiperativa e redução de infecção
do trato urinário.

Para o tratamento das demais condições, devem ser usadas medicações


específicas, como as estatinas para hipercolesterolemia, alendronato ou
risedronato para osteoporose e antidepressivos para transtornos do humor.
Conforme discutido, há diversos benefícios na melhoria da qualidade de vida
da mulher.

Tratamento
Algumas condições são consideradas indicações de terapia de reposição
hormonal, como síndrome do climatério com sintomas pronunciados,
prevenção e manutenção da saúde sexual e mental (doença de Alzheimer),
da atrofia urogenital e tegumentar, da osteoporose e, discutivelmente, da
prevenção primária dos distúrbios coronarianos.

Os esquemas de TH podem ser cíclicos ou contínuos. Nos primeiros, a


paciente continua a menstruar. Esse esquema é preferido na pré-menopausa
quando há irregularidade menstrual. Os esquemas contínuos são indicados
principalmente após a menopausa, ou em mulheres que tenham miomas,
endometriose ou não desejam menstruar.
A via de administração pode ser oral, transdérmica, intramuscular,
intrauterina, intranasal e vaginal. Dá-se sempre preferência aos estrogênios
naturais, com menor potencial de desencadear fenômenos tromboembólicos e
de alterar o perfil lipídico (estrogênios equinos conjugados, 17-betaestradiol,
estrona, valerato de estradiol e benzoato de estradiol); são o tratamento de
escolha para sintomas vasomotores.
A via vaginal está indicada quando os sintomas são exclusivamente de atrofia
urogenital. Os cremes vaginais de estrogênio têm a vantagem de muito pouco
ou quase nenhum efeito sistêmico.
Tema frequente de prova
A indicação de progestogênios na terapia hormonal é um tema frequente
nas provas de concursos médicos.

Dica
Paciente histerectomizada não precisa de progestogênio na terapia
hormonal. O estrogênio é que reduz sintomas e riscos cardiovasculares e de
osteoporose. O progestogênio apenas protege o endométrio de hiperplasia
endometrial e possível câncer de endométrio.

O que definitivamente acaba se tornando resolutivo para a sintomatologia da


paciente é a reposição estrogênica. A reposição de progesterona não é eficaz
em reduzir nenhum dos sintomas associados ao climatério. Todavia, é preciso
lembrar-se de que o estrogênio tem efeito proliferativo sobre o endométrio. Se
ele for prescrito isoladamente, pode levar a hiperplasia ou câncer de
endométrio. Portanto, é fundamental a prescrição de um progestogênio em
associação ao estrogênio, uma vez que a progesterona tem efeito
antiproliferativo sobre o endométrio. Quando a paciente apresenta útero
funcionante, é fundamental a associação de progestogênios em esquema
contínuo ou intermitente para a proteção endometrial.
Para histerectomizadas, preconiza-se TH com estrogênios exclusivos. A
função da progesterona nos esquemas de TRH é exclusivamente evitar a
hiperplasia ou mesmo o câncer do endométrio. Pode ser ofertada de maneira
contínua ou cíclica (de 10 a 14 dias por mês).
Dica
Pacientes histerectomizadas devem usar estrogênio exclusivo. Entretanto, é
preciso lembrar-se de que pacientes com história de endometriose tendem a
refazer os focos desta caso usem terapia hormonal com estrogênio
exclusivo. Portanto, em pacientes com história de endometriose, mesmo
que histerectomizadas, deve-se iniciar terapia hormonal combinada
contínua; essa é a exceção à regra dessa terapia.

Quanto aos riscos e benefícios da administração da TH:

Sobre o risco cardiovascular: observam-se benefícios quando a TH é


iniciada precocemente, na transição menopausal ou nos primeiros anos
de pós-menopausa (janela de oportunidade). Há aumento do risco
cardiovascular em mulheres com muitos anos de menopausa. Não se
deve administrar TH em mulheres saudáveis e assintomáticas a fim de
reduzir o risco cardiovascular. A TH realizada em pacientes com doença
cardiovascular prévia aumentou o risco de novos eventos
cardiovasculares no 1º ano de uso;
Colesterol: os estrogênios administrados por via oral ou não oral
parecem reduzir os níveis de colesterol total e colesterol LDL e aumentar
os níveis de HDL e triglicérides;
Hipertensão: estrogênios endógenos e exógenos podem estimular a
síntese hepática de angiotensina, com aumento da aldosterona e
consequente retenção de sódio e água, seguidos de aumento pressórico
em mulheres com predisposição a hipertensão arterial. A didrogesterona
e a drospirenona têm efeito antimineralocorticoide, antagonizando o
efeito de retenção de sódio promovido por estrogênios, especialmente
em hipertensas. Quando administrados por via não oral, os estrogênios
não têm os mesmos efeitos sobre a ativação da renina-angiotensina-
aldosterona, sendo mais recomendáveis a pacientes hipertensas e com
colesterol LDL e triglicérides aumentados;
Diabetes mellitus tipo 2: a TH reduz o risco de novos casos. Há,
também, redução da obesidade abdominal, resistência a insulina, redução
de lipídios e lipoproteínas;
Síndrome metabólica: deve-se ter cautela na administração de TH em
pacientes com essa síndrome e dar preferência à via transdérmica;
Tromboembolismo venoso: seu risco eleva-se em usuárias de TH,
particularmente entre aquelas que usam estrogênio pela via oral;
Câncer:
O risco de câncer de mama associado à TH é pequeno (1/1.000
mulheres). O tipo de progesterona utilizada na TH, provavelmente,
tem associação ao desenvolvimento de câncer. Observa-se aumento
no risco após 5 anos de TH. A terapia com apenas estrogênio,
combinada ou por tibolona está contraindicada àquelas com
antecedentes pessoais de câncer de mama, e a segurança do
esquema terapêutico está diretamente relacionada à dose de
hormônios empregada, ressaltando que deve ser sempre a menor
necessária para o controle da sintomatologia;
Há aumento do risco de meningiomas em mulheres em TH
combinada, devido ao efeito da progesterona;
A TRH combinada contínua reduz o risco de câncer de endométrio,
e a terapia combinada sequencial não eleva o risco. Entretanto, a
TH é contraindicada àquelas com história de câncer de endométrio;
A TH não aumenta o risco de câncer de ovário, exceto o subtipo
endometrioide;
A TH não altera a incidência de câncer de colo de útero;
A TH combinada tem efeito protetor sobre a incidência de câncer
colorretal;
A TH é relacionada ao câncer de mama (combinada);
Os cânceres que contraindicam o uso de TH são os de mama e
endométrio.

Consegue-se prevenir o câncer de endométrio com a adição de progesterona


ao esquema de TH, conforme já foi discutido. A adição de progestogênios na
forma contínua está indicada àquelas com antecedente de endometriose,
adenomiose, miomatose ou àquelas que não desejam mais o sangramento
cíclico.
Por fim, com relação ao ganho de peso, houve muita polêmica sem nenhuma
conclusão. Pelas próprias alterações metabólicas do climatério, há
favorecimento ao ganho de peso; a comparação entre o ganho de peso de
usuárias de TH e não usuárias não mostrou diferenças estatisticamente
significativas. Logo, não se deve atribuir o aumento ponderal à TRH.

D - Moduladores seletivos dos receptores estrogênicos

Compreendem o raloxifeno e o tamoxifeno. Dependendo do tecido, sua ação é


estrogênica ou antiestrogênica. Não têm ação sobre os sintomas vasomotores.
O tamoxifeno, na dose de 10 a 20mg/d, tem ação estrogênica sobre ossos,
metabolismo lipídico e endométrio e atividade antiestrogênica sobre as
mamas e o sistema nervoso central. É a medicação de escolha àquelas com
câncer de mama, porém requer vigilância cuidadosa do endométrio.
O raloxifeno, na dose de 60mg/d, tem atuação ainda maior sobre o
metabolismo ósseo e não estimula o endométrio.

E - Tibolona
Trata-se de um derivado sintético da 19-nortestosterona, com ação
estrogênica, progestogênica e androgênica. A dose varia entre 1,25 e 2,5mg/d
e propicia alívio dos sintomas climatéricos, atuando sobre a massa óssea e
agindo favoravelmente sobre a libido. É o método de escolha quando há
sintomas de desejo sexual hipoativo. O efeito da tibolona sobre o perfil
lipídico é contrário à TH estroprogestacional. Podem ocorrer aumento
discreto do LDL e do colesterol total e diminuição discreta do HDL e dos
triglicérides.

6. Tratamentos não hormonais


Todas as medidas que visem a um hábito de vida saudável devem ser
estimuladas em todas as fases da vida da mulher, principalmente no
climatério, em que são maiores os riscos de desenvolvimento de uma série de
doenças decorrentes do próprio envelhecimento. Desse modo, a prática de
atividade física regular e de dieta pobre em gorduras saturadas e carboidratos
e rica em cálcio e vitaminas A, B1, B6, B12, C, D e E deve ser sempre
estimulada.

A - Fitoestrogênios

Quanto ao emprego dos fitoestrogênios (estrogênios derivados de plantas),


diversos esforços têm sido realizados para a avaliação de sua real importância
na pós-menopausa e de seus benefícios. Existe a crença de que teriam a
capacidade de agir como antiestrogênios na pré-menopausa (por competição
com os altos níveis de estrogênios endógenos) e como estrogênios na pós-
menopausa, porém com atividade mais fraca que os endógenos. Dada a sua
potência farmacológica inferior à de compostos com estrogênios de TH
clássica, as doses necessárias para o controle dos sintomas da síndrome do
climatério com os fitoestrogênios são elevadas, o que torna difícil seu
emprego quando a sintomatologia é muito intensa. As pesquisas com tal
classe de fitoterápicos são recentes, e muitos outros estudos são necessários
para uma conclusão definitiva. Os ensaios clínicos randomizados duplo-cegos
não demonstraram superioridade dos fitoestrogênios em relação ao placebo.
Alguns exemplos são isoflavonas de soja (grão de soja), Cimicifuga, trevo
vermelho, hipérico, valeriana e melissa.

Importante
Nos ensaios clínicos randomizados com fitoestrogênios, não houve
melhora estatisticamente comprovada em relação ao placebo. Portanto, não
há evidência científica que justifique o seu uso.

B - Tratamento dos sintomas vasomotores e psíquicos


Para mulheres com contraindicação ou intolerância a TH, ou para as que não
desejam tratamento hormonal, pode-se prescrever uma série de drogas, como
dopaminérgicos, antidepressivos, sedativos, vasomotores ou substâncias com
ação no eixo hipotalâmico-hipofisário, a fim de aliviar esses sintomas. A
principal terapia farmacológica não hormonal para sintomas vasomotores são
inibidores seletivos da recaptação de serotonina, norepinefrina e gabapentina.
Paroxetina e fluoxetina não devem ser utilizadas em usuárias de tamoxifeno,
pela possibilidade de interferirem negativamente em seu efeito no tratamento
do câncer de mama. Outras medicações com ação vasoativa são cinarizina,
clonidina e propranolol.
Os sintomas depressivos, em especial, não constituem por si só indicação de
TH, e, nesse caso, podem-se utilizar as medicações antidepressivas.
Antidopaminérgicos como sulpirida, domperidona e veraliprida melhoram os
sintomas de alteração de humor.
C - Tratamento da osteoporose
Para pacientes com risco de desenvolver osteoporose: medidas de
intervenção para prevenção;
Para pacientes com osteopenia: tratamento para prevenção de perda
óssea;
Para pacientes com osteoporose: medidas não medicamentosas e
medicamentosas;
Pacientes de risco ou pacientes com osteopenia:
Estímulo a dieta adequada;
Exposição solar da face, do tronco e dos braços antes das 10 e após
as 16 horas por 15 minutos ou mais, de 2 a 4 vezes por semana;
Atividade física;
Suspensão do tabagismo e álcool;
Medidas para prevenir quedas e melhora para a visão;
Cálcio de 1.000 a 1.500mg/d VO;
Vitamina D 400 a 800UI/d para adultos com 50 anos ou mais.
Quanto ao tratamento para osteoporose:
Medidas já citadas;
Bisfosfonatos orais – 1ª linha (único), alendronato de sódio
(70mg/sem) ou risedronato (5mg/d ou 150mg em dose única
mensal). Para evitar o risco de ulceração de esôfago, o indivíduo
deve permanecer sentado ou em pé por até 30 minutos após a
ingestão do medicamento;
Na ausência de contraindicações, sabe-se que a prescrição de TH
tem alto impacto na prevenção da osteoporose, assim como o uso de
tibolona. A dose é individualizada pelo menor tempo possível e
administrada em mulheres com sintomas vasomotores e osteoporose
concomitante. Medicação de 2ª linha;
Raloxifeno – modulador seletivo do receptor de estrogênio,
utilizado para o tratamento de osteoporose na pós-menopausa.
Aumenta o risco de tromboembolismo e constitui medicação de 2ª
linha no tratamento da osteoporose;
A calcitonina, na dose de 100 a 200UI/d, nasal ou subcutânea, inibe
a reabsorção óssea e tem efeito no controle da dor óssea. A droga
constitui alternativa a pacientes com contraindicação aos
bisfosfonatos, TRH e raloxifeno, além de ser de 2ª linha;
O paratormônio, ou teriparatida, na dose de 20mg/d SC, estimula a
formação óssea, além de ser de 2ª linha;
Opções são ácido zoledrônico, ranelato de estrôncio, ibandronato e
denosumabe – todos de 2ª linha.

Resumo
Vulvovaginites e cervicites
Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino
Camila Martim Sequeira Neto
Aline Calixto
Jader Burtet

1. Introdução
Denominam-se vulvovaginites os processos infecciosos que acometem a
vulva e a vagina, incluindo a ectocérvice.
Vulvovaginite é toda manifestação inflamatória e/ou infecciosa do trato
genital inferior (vulva, vagina e ectocérvice), que se manifesta por meio de
corrimento vaginal associado ou não a prurido, dor ou ardor ao urinar ou à
relação sexual e sensação de desconforto pélvico. Alguns casos, porém, são
assintomáticos.
Quando a infecção se localiza no canal endocervical, isto é, entre os orifícios
externo e interno do colo uterino, temos a cervicite, geralmente cursando com
saída de secreção pelo orifício externo do colo.
É importante compreender que vaginose bacteriana, candidíase vaginal,
vaginose citolítica, vaginite atrófica e vulvovaginites inespecíficas não são
consideradas Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs). A tricomoníase,
por sua vez, é considerada e deve ser abordada como IST.
A - Fluxo vaginal fisiológico
O fluxo vaginal fisiológico é branco ou transparente, homogêneo e inodoro e
possui pH ácido (de 4 a 4,5). Seu volume é variável, de acordo com o período
do fluxo menstrual, o emprego de hormônios, a excitação sexual etc. É
composto por muco cervical, células vaginais descamadas, secreções
glandulares (glândulas de Skene e de Bartholin) e micro-organismos da flora
normal.

Tema frequente de prova


Questões em que o examinador elabora um caso clínico longo e o
diagnóstico é corrimento vaginal fisiológico são frequentes nas provas de
concursos médicos.
Figura 1 - Fluxo vaginal normal

B - Microbiota vaginal

A microbiota vaginal normal é composta 90% por lactobacilos (aeróbios),


responsáveis pelo pH ácido que inibe o crescimento de bactérias patogênicas.
Essas bactérias também podem ser chamadas bacilos de Döderlein ou, ainda,
Lactobacillus acidophilus e transformam o glicogênio existente no epitélio
escamoso da vagina e da ectocérvice em ácido láctico, o que mantém o pH
vaginal sempre abaixo de 4,5.
Além dos lactobacilos, outros micro-organismos estão presentes na
microbiota vaginal normal. A Candida sp. é um fungo Gram positivo
comensal, que pode multiplicar-se e tornar-se patogênico. Além dessa
população, há imensa quantidade – em menor proporção individual – de
outras bactérias, conforme demonstrado na Figura 2, o que significa que o
simples encontro desses elementos, sem queixa clínica concomitante, não
deve ser considerado patológico. Os níveis séricos de estrogênio alteram a
microbiota vaginal, variando, portanto, de acordo com a faixa etária da
paciente:
Na infância (hipoestrogenismo): colonização pelas bactérias Gram negativas
e anaeróbias intestinais;
Na puberdade (aumento dos níveis de estrogênio): proliferação epitelial
pela ação do estrogênio → produção de glicogênio, necessário à proliferação
dos lactobacilos;
Período menstrual, uso de progestogênios, lactação e pós-parto
(hipoestrogenismo transitório): redução acentuada dos lactobacilos, com
predomínio de outras bactérias e alcalinização do pH vaginal;
Gestação (altos níveis de estrogênio placentário): acentuado crescimento
dos lactobacilos.

Figura 2 - Microbiota vaginal normal

2. Vulvovaginites
De maneira geral, as vulvovaginites são representadas por 3 patologias
principais: candidíase (Candida sp.), tricomoníase (Trichomonas sp.) e
vaginose bacteriana (flora polimicrobiana com predomínio de Gardnerella
vaginalis). Delas, a mais comum, atualmente, é a vaginose, que corresponde a
40 a 50% das infecções vaginais, seguida da candidíase. A tricomoníase, por
sua vez, é a única globalmente aceita como IST, tornando obrigatório o
tratamento do parceiro sexual. Esta recebe maior atenção em razão da
possibilidade de coinfecção com outras ISTs, especialmente HIV/AIDS e
sífilis. Outras causas de vulvovaginite são vaginose citolítica, vaginite
atrófica, vaginite inflamatória e vaginite por corpo estranho.

A - Vaginose bacteriana
É a vulvovaginite mais frequente.

a) Agentes

A vaginose bacteriana decorre de alteração na flora bacteriana vaginal normal


que resulta na perda de lactobacilos e aumento de 100 a 1.000 vezes na
concentração de anaeróbios. A principal bactéria anaeróbia a proliferar é a
Gardnerella vaginalis. Também pode haver a proliferação de outras bactérias,
como Prevotella sp., Bacteroides sp., Mobiluncus sp. e Peptostreptococcus
sp.; dessa forma, não é considerada IST. Essa modificação na composição da
microbiota vaginal ocorre nas situações em que há aumento do pH vaginal
(>4,5). A proliferação dos anaeróbios leva ao quadro clínico de corrimento
vaginal branco-acinzentado, fluido, que costuma revestir finamente as paredes
vaginais. A característica mais marcante é o odor de tipo peixe podre,
particularmente notável após o coito. O odor fétido deve-se à putrescina e à
cadaverina, compostos frequentemente liberados pelo metabolismo anaeróbio.

b) Queixa clínica

A queixa clínica envolve corrimento vaginal homogêneo, fino, branco-


acinzentado, às vezes com microbolhas, não aderente à parede vaginal, de
odor fétido (peixe podre) que se exacerba após o coito e durante a
menstruação. Em regra, a vagina não se encontra eritematosa, e o exame do
colo uterino não apresenta anormalidades.
É importante ressaltar que não é cervicite, logo não há corrimento pelo
orifício externo do colo. O corrimento é vaginal, apenas. Além disso, trata-se
da causa mais comum de corrimento vaginal, que afeta de 10 a 30% das
gestantes e 10% das mulheres atendidas na atenção básica. Em alguns casos,
pode ser assintomática.

c) Etiopatogenia

Observa-se desequilíbrio da flora normal, com a redução acentuada dos


lactobacilos (bacilos de Döderlein) e intensa proliferação de outros micro-
organismos. Ocorre tipicamente em pacientes submetidas a sucessivos
episódios de alcalinização do meio vaginal como coito frequente com
ejaculação vaginal (o sêmen é alcalino), pacientes que costumam realizar
duchas vaginais e pacientes que recebem sexo oral frequentemente (o pH da
saliva é mais alcalino do que o da vagina). Muitas vezes, a alcalinização do
ambiente vaginal ocorre sem nenhum fator predisponente.

Dica
Algumas questões de prova perguntam quais fatores aumentam o risco de
vaginose bacteriana. Convém atentar-se para o sexo oral, para as sucessivas
ejaculações intravaginais e pacientes que costumam realizar duchas
vaginais.

d) pH vaginal

Acima de 4,5.

e) Época preferencial de maior sintomatologia

Pós-coito ou período pós-menstrual.

f) Corrimento

Fluido branco-acinzentado, de quantidade discreta a moderada, sem sinais


inflamatórios em paredes vaginais, ectocérvice ou vulva, porém muito fétido
(odor de peixe podre).
Figura 3 - Corrimento causado por Gardnerella vaginalis

g) Diagnóstico

Características clínicas da secreção vaginal e pH alcalino associado à


microscopia com leucócitos ausentes (“não é vaginite, e sim vaginose”);
Geralmente, não há sinais de irritação vulvar;
Realiza-se também o teste do KOH (teste das aminas) com liberação de odor
de peixe semelhante ao das aminas. No teste das aminas positivo, coloca-se a
secreção vaginal em uma lâmina e adiciona-se uma gota de KOH (hidróxido
de potássio) a 10%, conseguindo a liberação das aminas voláteis (putrescina e
cadaverina), que têm odor extremamente desagradável;
A cultura da Gardnerella vaginalis não é recomendada como método
diagnóstico, em razão de sua falta de especificidade;
No exame a fresco, observam-se células indicadoras – clue cells (células
epiteliais vaginais com a membrana recoberta por bactérias, tipicamente de
aspecto granular e cujas membranas apresentam bordos não nítidos. Também
são chamadas de células-guia, células indicadoras ou células-alvo);
São critérios diagnósticos 3 dos critérios de Amsel.
As pacientes com vaginose bacteriana estão sob maior risco de Doença
Inflamatória Pélvica (DIP), infecções pós-operatórias da cúpula vaginal após
histerectomia, DIP pós-abortamento e citologia cervical anormal. Há também
aumento nas taxas de infecção pelo HIV. As gestantes apresentam maior risco
de ruptura prematura de membrana, parto pré-termo, corioamnionite e
endometrite pós-cesárea.

Diagnóstico
O pH >4,5 é o critério mais sensível para vaginose bacteriana, porém o
menos específico, pois pode ser influenciado por sangramento, duchas e
coito. Já a presença de clue cells é o critério mais específico, contudo pode
estar ausente em até 40% dos casos.

h) Tratamento

Devem ser tratadas:

Mulheres sintomáticas;
Grávidas;
Mulheres com comorbidades;
Mulheres que serão submetidas à inserção de dispositivo intrauterino;
Mulheres que serão submetidas a cirurgias ginecológicas;
Mulheres que serão submetidas a exames invasivos no trato genital (por
exemplo, histeroscopia).

Não há indicação de tratamento do parceiro sexual;


A recorrência é comum;
Para as puérperas, recomenda-se o mesmo tratamento das gestantes;
Nos casos recorrentes, metronidazol 500mg VO a cada 12 horas, por 10 a 14
dias, ou metronidazol creme vaginal 100mg/g, por 10 dias, seguido de 2
aplicações semanais por 4 a 6 meses.

Figura 4 - Vaginose bacteriana (evidência das clue cells)

B - Candidíase vulvovaginal

Candidíase vulvovaginal é uma infecção da vulva e vagina causada por


Candida albicans em 80 a 90% dos casos e, em outras espécies, em 10 a 20%
dos casos. Estima-se que cerca de 75% das mulheres tenham pelo menos 1
episódio de candidíase vulvovaginal durante a vida. Além disso, é a 2ª causa
mais comum de corrimento vaginal.
A relação sexual não é a principal forma de transmissão da doença, visto que
esses micro-organismos podem fazer parte da flora endógena em até 50% das
mulheres; portanto, não é IST. São fatores associados ao desenvolvimento de
candidíase o uso de antibióticos, gravidez, diabetes, corticoide, contraceptivo
hormonal combinado, estresse e imunossupressão.

a) Agente

Candida albicans: de 80 a 90% dos casos; outras espécies (C. glabrata, C.


tropicalis, C. krusei, C. parapsilosis): de 10 a 20%.

b) Queixa clínica

Prurido vaginal, corrimento vaginal tipo queijo cottage, branco, grumoso,


inodoro. Pode haver dispareunia, queimação vulvar e irritação, disúria externa
ou terminal (ao final da micção) e prurido vulvar. As manifestações
intensificam-se no período pré-menstrual. Ao exame clínico, observam-se
eritema e edema da pele dos lábios e vulvar, com possíveis fissuras e
maceração da vulva, bem como corrimento esbranquiçado e aderido à
mucosa, vagina eritematosa, colo do útero sem alterações, pH vaginal ácido
(<4,5), teste de aminas negativo e exame microscópico com evidência de
elementos fúngicos. O colo uterino e a vagina podem estar recobertos por
placas brancas, aderidas à mucosa.
Lembrando que se trata de uma vulvovaginite, ou seja, há processo
inflamatório com sinais flogísticos na vulva e na vagina.

c) Etiopatogenia

Observa-se intensa proliferação pela esporulação desse patógeno, levando a


leucorreia característica.

d) pH vaginal

Ácido (pH entre 3,5 e 4,5).

e) Época preferencial de aparecimento

Período pré-menstrual, quando a concentração dos hormônios esteroides é


máxima, com altas taxas de glicogênio, que se converte em ácido láctico,
acidificando o meio vaginal. Assim, a candidíase é mais frequente em
mulheres em idade reprodutiva.

f) Candidíase recorrente

Consideramos candidíase vaginal recorrente como 4 ou mais episódios


sintomáticos no último ano, sendo necessária a investigação de fatores de
risco.

g) Fatores de risco

Dica
Convém atentar-se para os casos clínicos que direcionam para o
diagnóstico de candidíase. Os casos mais frequentemente abordados nas
provas de concursos médicos são pacientes com história de uso de
antibióticos.

h) Corrimento

Branco ou branco-amarelado, grumoso, em placas aderentes, com aspecto “de


leite talhado”. O processo inflamatório é exuberante, com ardor, hiperemia e
pruridos vaginais e vulvares (Figura 5).
Figura 5 - Vulvite por Candida sp.
Figura 6 - Aspecto da candidíase vaginal ao exame especular

i) Diagnóstico

O diagnóstico baseia-se no quadro clínico e no exame a fresco. O exame a


fresco do conteúdo vaginal é feito por meio de microscopia óptica comum,
com visualização dos filamentos do fungo (pseudo-hifas para C. albicans e
ausência delas com apenas esporos birrefringentes para infecções por cepas
não albicans, como C. glabrata). Coloca-se o conteúdo vaginal sobre uma
lâmina com 1 gota de soro fisiológico ou hidróxido de potássio a 10%, que
auxilia na visibilização das hifas e dos esporos, pois destrói elementos
celulares. O pH vaginal é inferior a 4,5. Pode-se, também, solicitar cultura
para fungos em meio de Sabouraud ou Nickerson. A cultura está indicada aos
casos de resistência aos tratamentos convencionais ou de recidivas sucessivas.
Em face de quadro clínico típico e em infecção esporádica, tornam-se
desnecessários esses exames, podendo-se instituir diretamente a terapêutica.
Na vigência de candidíase recorrente (≥4 episódios/ano), realiza-se cultura
para avaliar a presença de espécies não albicans.

j) Tratamento
O tratamento recomendado pelo Ministério da Saúde é o miconazol a 2% na
forma de creme vaginal por 7 dias ou a nistatina 100.000UI, por via vaginal,
por 14 dias, à noite. Fluconazol 150mg VO dose única é considerado
tratamento de 2ª opção – na realidade, todos os medicamentos derivados azóis
podem ser utilizados na candidíase.
São efeitos colaterais das medicações tópicas: ardência e irritação locais; são
efeitos colaterais do fluconazol: náuseas, dor abdominal, cefaleia e elevação
transitória das transaminases hepáticas (rara).
Durante a gestação e a lactação, o tratamento só pode ser realizado pela via
vaginal. São muito comuns recidivas na gestação.
Em casos de candidíase recorrente, pode-se indicar terapia de supressão com
fluconazol 150mg/d VO 1 vez por semana, por 6 meses.
Outras espécies de Candida, como glabrata e tropicalis, podem causar
sintomas vulvovaginais e tendem a ser resistentes ao tratamento. São mais
comuns em pacientes diabéticas, imunossuprimidas ou casos resistentes ao
tratamento com os antifúngicos convencionais. O tratamento indicado às
candidíases por espécies não albicans é o ácido bórico 600mg/d por via
vaginal por 7 dias. O tratamento do parceiro, por sua vez, não é recomendado.

Tratamento
Na gravidez, a ocorrência de candidíase vulvovaginal é alta. A
imunossupressão fisiológica da gestação é responsável por essa maior
incidência. O tratamento recomendado é o mesmo da não gestante.
Figura 7 - Candidíase, com realce para as pseudo-hifas

C - Tricomoníase
A vaginite por Trichomonas é causada pelo parasito Trichomonas vaginalis,
flagelado e transmitido sexualmente. Trata-se da IST não viral mais comum
no mundo.

a) Agente

Trichomonas vaginalis.

b) Queixa clínica

Corrimento vaginal abundante, verde-amarelado e bolhoso, que pode estar


acompanhado de irritação vulvar, prurido, dispareunia superficial, dor pélvica
e sintomas urinários (disúria e polaciúria). A leucorreia pode ser fétida. Outra
característica possivelmente presente é a colpite tigroide (colo “em morango”
ou “em framboesa”). Os sintomas intensificam-se no período pós-menstrual.
Observam-se, ainda, teste de Schiller “em pele de onça”, pH vaginal >5 e, à
microscopia das secreções (exame a fresco), Trichomonas móvel e números
aumentados de leucócitos, além de teste de aminas positivo.
c) Etiopatogenia

A transmissão é sexual; portanto, é considerada uma IST.

d) pH vaginal

pH vaginal >5.

e) Época em que os sintomas costumam ser mais


pronunciados

Período pós-menstrual.

f) Corrimento

O corrimento é amarelo ou amarelo-esverdeado, abundante, fluido, bolhoso e


fétido, acompanhado de sinais inflamatórios exuberantes, como colpite e
mucosa com aspecto “em framboesa”. O colo pode apresentar aspecto
tigroide (Figura 8). Prurido pode estar presente, além de irritação vulvar e
dispareunia superficial. Observam-se, também, teste de Schiller “em pele de
onça”, sintomas que se intensificam no período pós-menstrual e teste de
aminas positivo.

g) Diagnóstico

Compõe-se de quadro clínico e exame a fresco. A cultura pode ser


recomendada somente nos casos duvidosos. Como o quadro clínico costuma
ser muito exuberante, a cultura é desnecessária na grande maioria dos casos.
O exame a fresco do conteúdo vaginal evidencia meio rico em leucócitos,
podendo também ser vistos protozoários com flagelos. Os protozoários
costumam ser móveis no exame a fresco, e o aquecimento da lâmina pode
aumentar essa movimentação.

h) Tratamento

O tratamento deve ser sistêmico. Utiliza-se metronidazol 2g VO, dose única,


ou metronidazol 500mg VO, a cada 12 horas, por 7 dias. O parceiro sexual
também deve ser convocado para tratamento.
Gestantes e puérperas, por sua vez, devem ser tratadas com metronidazol 2g
VO, dose única, ou metronidazol 400mg VO, a cada 12 horas por 7 dias, ou
metronidazol 250mg VO, a cada 8 horas, por 7 dias.
Por ser uma IST, o parceiro sexual deve ser sempre tratado de forma similar à
paciente.

Importante
Tanto a tricomoníase quanto a vaginose bacteriana podem ser tratadas com
metronidazol. É importante alertar a paciente de que o consumo de álcool
associado pode provocar o famoso efeito dissulfiram-like ou efeito
Antabuse, que costuma cursar com cefaleia intensa, confusão mental,
tremores e sensação de morte iminente. Deve-se orientar a não consumir
álcool durante o tratamento com metronidazol e até 48 horas após o seu
término.
Figura 8 - Aspecto tigroide: colo com infecção por Trichomonas

i) Complicações

Durante o período gestacional, está associado a ruptura prematura de


membrana, parto pré-termo e recém-nascido de baixo peso. Frequentemente a
tricomoníase está associada a outras ISTs. Recomenda-se rastrear a presença
de gonococo e Chlamydia trachomatis em pacientes com tricomoníase.

D - Vulvovaginites não infecciosas

a) Vaginite atrófica

A vaginite atrófica ocorre por deficiência de estrogênio pós-parto e


menopausa. Observa-se corrimento vaginal purulento, correspondente a
vaginite inflamatória. Associa-se a dispareunia e sangramento pós-coito
devido à atrofia do epitélio vaginal e vulvar e prurido vaginal. Ao exame
clínico, podem-se observar atrofia vaginal e mucosa friável. A mucosa
vaginal apresenta-se pálida, seca, delgada, com diminuição da rugosidade e
elasticidade. O pH vaginal tende a ser superior a 4,5, pela diminuição da
população de lactobacilos. O tratamento é feito com creme de estrogênio
tópico, 1 a 2 vezes/semana, e lubrificantes íntimos.

b) Vaginose citolítica

Surge devido à elevação da população de lactobacilos e diminuição do pH


vaginal. Os sintomas são corrimento vaginal branco e grumoso, ardor e
prurido genital que ocorrem tipicamente no período pré-menstrual. O
diagnóstico é clínico e microscópico. O esfregaço mostra aumento dos
lactobacilos, evidências de citólise e ausência de micro-organismos
patogênicos. O tratamento, por sua vez, consiste em alcalinizar o meio
vaginal, por meio de duchas ou banhos de assento com bicarbonato de sódio
(30 a 60g em 1L de água) 2 a 3 vezes por semana. Com muita frequência é
confundida com candidíase.

c) Vaginite inflamatória

A vaginite inflamatória caracteriza-se por vaginite exsudativa difusa, com


corrimento vaginal purulento abundante, associado a queimação ou irritação
vulvovaginal e dispareunia. Pode haver eritema com manchas equimóticas
vulvovaginais. No colo, observa-se colpite macular, e o pH da secreção
vaginal é alcalino, >4,5. A causa parece ser a substituição dos lactobacilos por
Streptococcus do grupo B. A coloração pelo Gram revela ausência de
lactobacilos e substituição por cocos Gram positivos, e o tratamento é
composto por clindamicina tópica (vaginal) por 7 dias.

Diagnóstico diferencial
A vaginose citolítica é uma condição subdiagnosticada, que pode ser
erroneamente interpretada como candidíase recorrente.
Figura 9 - Abordagem dos corrimentos vaginais
3. Cervicites
Cervicites são processos infecciosos e inflamatórios alojados dentro do canal
endocervical ou inflamações da mucosa endocervical, que, embora sejam
assintomáticas em 70 a 80% dos casos, se não tratadas acarretam DIP,
infertilidade, dor pélvica crônica e gestação ectópica. Os agentes etiológicos
mais comuns são Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis, embora
outros agentes possam estar envolvidos no processo infeccioso (Mycoplasma
hominis e Ureaplasma urealyticum). Portanto, trata-se de IST.

A - Fatores de risco
Mulheres sexualmente ativas <25 anos;
Novo parceiro sexual;
Múltiplos parceiros sexuais;
Mulheres com parceiros com IST;
História prévia ou presença de outra IST;
Uso irregular de preservativos.

B - Manifestação clínica
Secreção mucopurulenta com descarga presente pelo orifício externo do colo
do útero, sangramento devido a colo friável; possíveis prurido, disúria,
urgência miccional, dispareunia, sangramento intermenstrual ou pós-coito. A
presença de dor sugere comprometimento do trato genital acima do orifício
interno do colo uterino. À microscopia, observam-se leucócitos
polimorfonucleares.

C - Exame físico

Material mucopurulento pelo orifício externo do colo, sangramento ao toque


da espátula ou swab, com possibilidade de dor à mobilização do colo.

Quadro clínico
Um número significativo de portadores é assintomático quanto a gonococo
ou Chlamydia. Deve-se convocar o parceiro sempre, para avaliação e
possível tratamento.

Ao exame físico, observam-se corrimento mucopurulento pelo orifício


externo do colo e colo edemaciado, eritematoso e friável. É importante
lembrar, também, que a ausência de secreção mucopurulenta fluindo pelo colo
não exclui a possibilidade de cervicite se outros sintomas estão presentes.

Figura 10 - Cervicite

D - Diagnóstico

O diagnóstico é feito pela clínica. Gram para o diagnóstico de diplococo


Gram negativo (gonococo) não é mais realizado, pela sua baixa sensibilidade
na mulher (30%). Se houver dúvida, pode-se realizar cultura de amostras
endocervicais e uretrais no meio específico de Thayer-Martin para gonococo,
e, no caso de Chlamydia, PCR para essa bactéria na secreção cervical é o
padrão-ouro. Todavia, a clínica da paciente costuma ser suficiente para o
diagnóstico na grande maioria dos casos. Devem-se realizar cultura para
gonococo e PCR para Chlamydia nos casos duvidosos.
E - Tratamento

Se houver diplococo Gram negativo intracelular no Gram, devem-se tratar


gonococo e Chlamydia. Na ausência do diplococo Gram negativo intracelular
no Gram, deve-se tratar apenas Chlamydia.
Dada a alta prevalência de infecção coexistente por gonococo e Chlamydia
(cerca de 40 a 50% dos casos), recomenda-se sempre o tratamento combinado
para os 2 agentes.

Importante
Dada a alta prevalência de infecção coexistente por gonococo e Chlamydia
(cerca de 40 a 50% dos casos), recomenda-se sempre o tratamento
combinado para os 2 agentes.

Para infecção gonocócica disseminada, utiliza-se ceftriaxona 1g IM ou IV, a


cada 12 horas. Mantém-se por 24 a 48 horas após a melhora, quando o
tratamento pode ser trocado para ciprofloxacino 500mg a cada 12 horas, para
completar ao menos 7 dias de tratamento. Para conjuntivite gonocócica no
adulto, utiliza-se, por sua vez, ceftriaxona 1g IM, dose única.
É preciso lembrar que o tratamento recomendado para as infecções por
Chlamydia é a azitromicina, pela sua praticidade posológica. Todavia, a
doxiciclina por 7 dias também é um excelente tratamento. Lembre-se de que
essas recomendações servem para as cervicites por Chlamydia quando não há
diagnóstico de DIP. Quando a paciente com cervicite fecha esse diagnóstico, o
tratamento recomendado é doxiciclina por 14 dias associada à ceftriaxona e
ao metronidazol. Uma sugestão é fazer a revisão do capítulo sobre DIP
quando possível.
Durante o parto vaginal, o risco de transmissão vertical do gonococo e
Chlamydia ao recém-nascido é de 30 a 50%.

4. Síndrome uretral
Denomina-se síndrome uretral a ocorrência de sintomas sugestivos de
infecção do trato urinário (disúria, polaciúria e urgência miccional) cujo
exame de urina tipo I apresenta leucocitúria e a urocultura é negativa. Essas
pacientes são frequentemente tratadas para infecção urinária sem melhora do
quadro clínico. Trata-se de uma infecção uretral pela Chlamydia trachomatis.
Como a bactéria tem comportamento intracelular obrigatório, não costuma ser
detectada na urocultura. A paciente deve ser tratada com azitromicina ou
doxiciclina.

Resumo
Vulvovaginites

Processos inflamatórios e infecciosos da vulva e das paredes vaginais,


principalmente representados por candidíase, vaginose bacteriana e
tricomoníase

Cervicites

Processos infecciosos e inflamatórios do canal endocervical, causados


principalmente pela Chlamydia e pelo gonococo

Características principais

Candidíase: corrimento branco grumoso, pruriginoso, período pré-


menstrual, pH <4,5, sintomas irritativos locais, recidivas frequentes;
Vaginose: corrimento branco-acinzentado, fétido, pH >4,5, período pós-
menstrual ou pós-coito, redução acentuada de lactobacilos e proliferação
de Gardnerella vaginalis;
Tricomoníase: IST, corrimento amarelado, bolhoso, fétido, com intensa
colpite associada podendo ocasionar sinusorragia, pH >4,5, período pós-
coito e pós-menstrual, sendo obrigatório tratar o parceiro sexual;
Cervicite gonocócica ou gonorreia: é a cervicite causada por gonococo
ou Neisseria gonorrhoeae, que costuma ter corrimento abundante
purulento; considerada IST;
Cervicite por Chlamydia: corrimento menos intenso e abundante,
persistente por mais tempo.
Infecções sexualmente
transmissíveis
Rodrigo Antônio Brandão Neto
Ralcyon F. A. Teixeira
Durval A. G. Costa
Carolina dos Santos Lázari
Jader Burtet

1. Sífilis adquirida

A - Introdução e definições
Trata-se de uma doença infecciosa, de transmissão sexual e, eventualmente,
transplacentária (representando, na criança, a síndrome da sífilis congênita). A
doença caracteriza-se por longos períodos de silêncio clínico e pela
capacidade de atingir múltiplos sistemas orgânicos. Além disso, apresenta
evolução crônica, sujeita a surtos de agudização e períodos de latência.

Dica
A sífilis é uma doença de notificação compulsória quando na gestação ou
congênita.

O número de casos de sífilis mantém-se em crescimento no Brasil nos últimos


5 anos, o que preocupa o controle da doença. Algumas medidas estão sendo
tomadas para melhorar o diagnóstico, que inclui a testagem rápida de sífilis,
oferecida com a testagem rápida de HIV em centros de testagem anônima. O
aumento de triagem pré-natal ainda é meta para o diagnóstico durante a
gestação e o tratamento a tempo de evitar transmissão vertical da doença.

B - Etiologia

O agente etiológico é o Treponema pallidum, espiroqueta de transmissão


predominantemente sexual ou materno-fetal que pode produzir,
respectivamente, forma adquirida ou congênita da doença. Sua transmissão
sexual acontece por contato direto com lesões abertas e fluidos genitais. A
transfusão de sangue contaminado também é via de transmissão, apesar de
cada vez mais rara atualmente. O Treponema é capaz de penetrar na pele e nas
mucosas íntegras, porém a penetração é facilitada quando há solução de
continuidade na pele ou mucosa.
Após alcançar tecidos subcutâneos em relações sexuais, devido às
microabrasões que ocorrem no ato, a infecção é iniciada com resposta local,
que resulta na formação de uma lesão ulcerada considerada a forma primária
da sífilis: o cancro duro. Em quase todos os casos novos, é adquirida por via
sexual, e, após a manifestação inicial genital, a doença pode tornar-se
sistêmica, com o aparecimento da sífilis secundária e outras complicações.

Figura 1 - Espiroqueta vista à microscopia: lembrar que os espiroquetas (como as bactérias


causadoras da sífilis e da leptospirose) são bactérias muito pequenas e de difícil visualização por
métodos de Gram, motivo pelo qual têm diagnóstico mais complicado à microscopia

C - Classificação segundo o Ministério da Saúde

A sífilis pode ser classificada de acordo com o tempo de evolução e o tipo de


transmissão.
Como a lesão primária não é dolorosa (veja descrição das manifestações
clínicas), essa classificação é muito complicada de ser feita no dia a dia,
porque o paciente não sabe contar que teve lesão inicial (por ser indolor e, na
mulher, pela localização da lesão muitas vezes ser intravaginal). Por esse
motivo, muitas vezes, os casos são considerados como sífilis latente tardia do
ponto de vista de tratamento, para não haver risco de o tratamento não ser
efetivo.

D - Achados clínicos

a) Sífilis primária

Aparece no ponto de inoculação do Treponema, após o período de incubação


médio de 10 a 21 dias, e se caracteriza por lesão ulcerada, rósea, de fundo
limpo e muitas vezes brilhante, sem fenômenos inflamatórios, bordas
infiltradas (elevadas) e duras; geralmente, é única e indolor, mesmo quando
manipulada. É denominada cancro duro.
Por serem indolores, os cancros localizados fora do alcance da visão do
paciente podem passar despercebidos. O cancro duro pode surgir na vulva,
vagina ou pênis. Há possibilidade de ocorrências em sítios extragenitais, com
as mesmas características. As localizações extragenitais mais importantes são
a anal, a retal com ou sem proctite, a oral e a mamária.

Dica
É conveniente lembrar as principais características da sífilis: lesão
ulcerada, rósea, de fundo limpo, por vezes brilhante, sem fenômenos
inflamatórios, com bordas elevadas, única e indolor.

Pode ser acompanhada de adenopatia-satélite, que é caracterizada pela


presença de linfadenomegalia regional não supurativa, móvel, indolor e
múltipla. Essa adenopatia não é acompanhada de fenômenos inflamatórios na
pele suprajacente aos linfonodos acometidos.

Importante
A adenopatia pode ser o 1º sinal visível na sífilis primária. Como a úlcera
pode não ser percebida, o diagnóstico deve ser lembrado em casos de
adenopatia inguinal.

O cancro duro tende à cura espontânea, mesmo sem tratamento, e não


costuma deixar cicatrizes.
Figura 2 - Lesão de sífilis primária em pênis (cancro duro): apesar da apresentação sangrante, na
maioria das vezes, é visualizada apenas ulcerada. Devem-se, ainda, lembrar as lesões de
apresentação única e indolor

b) Sífilis secundária

Importante
A sífilis secundária aparece de 4 a 8 semanas após o surgimento do cancro
duro, causando lesões denominadas roséolas.

As lesões representam reação dos tecidos à presença do Treponema, veiculado


pelas vias linfática e hematogênica. São, ainda, usualmente acompanhadas de
micropoliadenopatia generalizada. Ocasionalmente, observam-se artralgias,
febre baixa, cefaleia e adinamia. É raro haver comprometimentos hepático e
ocular, como uveíte.
As lesões, também denominadas roséolas, são caracterizadas pela presença de
máculas eritematosas, ovaladas ou arredondadas, isoladas e/ou confluentes,
levemente descamativas, que acometem todo o tegumento, incluindo as
regiões palmoplantares (roséola sifilítica ou sifílides papulosas), localização
altamente sugestiva do diagnóstico.
As lesões mucosas podem ocorrer na cavidade oral, especialmente na língua e
na face interna dos lábios. São ricas em Treponema e bastante contagiosas.
Nas mucosas, podem ocorrer, ainda, lesões elevadas em platô e de superfície
lisa (placas mucosas). Na genitália, a confluência das lesões papulosas pode
formar uma placa secretante denominada condiloma plano ou lata.
Nas regiões perianais, extremamente úmidas, as lesões sofrem maceração de
sua superfície, com a formação de pápulas hipertróficas, que são ricas em
Treponema e ocorrem, principalmente, em regiões de dobras ou atrito. Os
pacientes podem, também, apresentar alopecia mais evidente no couro
cabeludo e nas porções distais das sobrancelhas, a chamada alopecia “em
clareira”.
A doença cursa com manifestações inespecíficas, como cefaleia, mal-estar,
artralgias por vezes proeminentes e, raramente, febre.
Lesões viscerais acontecem em cerca de 2% dos pacientes com sífilis
secundária, com comprometimento gástrico simulando linfoma com
infiltração extensa; hepatites, principalmente com colestase; síndrome
nefrótica, principalmente na forma de nefrite membranosa e glomerulonefrite
por imunocomplexos, todas tendendo a transitoriedade. Pode haver, ainda,
miosite, neurite de nervo vestibulococlear e anormalidades oculares, como
uveíte e coriorretinite.

Dica
Em lesões de pele com descamação em extremidades, palmas das mãos e
plantas dos pés, deve ser investigada sífilis.
Figura 3 - A característica de lesões nas palmas das mãos e nas plantas dos pés é bastante indicativa
de sífilis secundária, principalmente se associada a úlceras descamativas; é o que faz diagnóstico
diferencial com outras infecções que podem causar úlceras pelo corpo (como varicela ou herpes-
simples disseminado)
Figura 4 - As lesões de pele da sífilis secundária são ricas em Treponema, e um eventual exame
direto nas lesões encontra o espiroqueta. Nessa fase, também são encontrados os maiores valores de
VDRL. Lembrar que, no diagnóstico diferencial com varicela e herpes-simples, os 2 últimos não
acometem a palma da mão e a planta do pé

c) Sífilis latente (recente e tardia)

É a forma da sífilis adquirida em que não se observam sinais e sintomas


clínicos e, portanto, tem diagnóstico obtido por meio de testes sorológicos.
Sua duração é variável, e seu curso pode ser interrompido por sinais e
sintomas da forma secundária ou terciária. As lesões de sífilis secundária
podem recidivar. Geralmente em paciente que vem com sorologia positiva
sem se dar conta de quando teve a infecção, considera-se como sífilis latente
tardia para não correr o risco de subtratar.

d) Sífilis terciária

Surge após períodos extremamente variados de latência e pode acometer até


30% dos pacientes que não sofrem qualquer tipo de tratamento. Clinicamente,
o quadro dermatológico caracteriza-se por lesões nodulares, noduloulceradas
e gomas, que podem surgir na pele, nos ossos e órgãos internos e
correspondem histologicamente a granulomas. Quando ocorrem nas mucosas,
as lesões podem produzir alterações na língua, constituindo a glossite
intersticial crônica, e provocar perfurações no palato e destruição do septo
nasal cartilaginoso e de áreas ósseas adjacentes. As lesões podem, ainda,
apresentar-se serpiginosas, o que tem se tornado raro com o advento da
penicilina. A sífilis terciária é considerada rara, devido ao fato de que a
maioria da população recebe indiretamente, ao longo da vida, antibióticos
com ação sobre o T. pallidum, que levam à cura da infecção.

Importante
A sífilis terciária aparece depois de um período de latência variado e
acomete múltiplos órgãos e sistemas, como pele, sistema cardiovascular
(causando insuficiência aórtica e aneurisma aórtico), sistema nervoso
central (causando neurossífilis) e medula espinal (tabes dorsalis).

A sífilis cardiovascular apresenta incidência de 10%, e suas principais


manifestações são insuficiência aórtica e aneurismas de aorta torácica e
abdominal, que raramente evoluem com dissecção e estenose do óstio da
coronária, resultando em quadros de angina. O aparecimento é tipicamente
insidioso, de 15 a 30 anos após a infecção inicial do paciente.
A neurossífilis representa uma incidência de 8% e pode ser assintomática ou
apresentar quadros de meningite sifilítica aguda, encefalomalácia com afasias
e hemiplegias, tabes dorsalis e demência paralítica. Ela pode ser precoce em
qualquer paciente que tenha tido contato com o Treponema; na verdade, pode
ocorrer em qualquer momento após o contato inicial. A neurossífilis precoce
não apresenta sinais de doença, e o diagnóstico baseia-se no liquor com
pleocitose e VDRL positivo. Os pacientes podem apresentar meningite
sintomática com sintomas clássicos de irritação meníngea, podendo, ainda,
cursar com lesões isquêmicas em coluna vertebral. Outra forma de
acometimento é a sífilis neurovascular, com aparecimento de arterite, e que
pode se apresentar como acidente vascular cerebral isquêmico.
Pacientes com formas tardias de neurossífilis podem apresentar-se com
quadro demencial progressivo, associado ao aparecimento de paresias,
disartria, tremores e, em alguns casos, com as pupilas de Argyll Robertson,
mais comuns na tabes dorsalis.
A tabes dorsalis é uma doença com acometimento do corno posterior da
medula espinal, assim como das raízes dorsais. Ocorre, em média, após 20
anos da infecção inicial, embora alguns casos aconteçam em poucos anos. Os
indivíduos apresentam quadro de ataxia e dores lancinantes de curta duração.
As pupilas de Argyll Robertson não respondem à luz, são pequenas,
contraem-se normalmente, apresentam dilatação parcial com colírios
midriáticos e não se dilatam com estímulos dolorosos. Tais pacientes
apresentam, ainda, diminuição de reflexos nos membros inferiores e alteração
de sensações vibratórias e da propriocepção.
A goma sifilítica é um tópico importante dentro das sífilis terciárias, apesar de
ser cada vez mais rara. São lesões nodulares que sofrem processo de
degeneração e correspondem à reação de hipersensibilidade ao Treponema,
portanto não são infectantes. Possuem 5 fases: infiltração, amolecimento,
supuração, ulceração e cicatrização. A Figura 5 representa um caso de sífilis
tardia com goma sifilítica.
Figura 5 - Lesões causadas por sífilis tardia com goma sifilítica
E - Sífilis no imunodeprimido

Quando é citada a sífilis no imunodeprimido, entenda-se, na verdade, o termo:


“manifestações da sífilis no HIV”. O subtítulo só não é esse porque alguns
pacientes com neoplasias e outras doenças imunossupressoras (não HIV)
também desenvolvem manifestações diferentes da sífilis. Como a prevalência
de sífilis na população brasileira não é pequena, não é incomum que pacientes
com sífilis latente desenvolvam lesões atípicas quando ficam em estado de
imunodepressão.
As principais lesões são as de pele. Um paciente imunodeprimido pode
apresentar lesões difusas, com características diferentes das da população
normal. Dessa forma, mesmo um paciente com sífilis latente pode apresentar
lesões de pele que pareceriam de sífilis secundária, mesmo com títulos baixos
de VDRL (a sífilis secundária tem uma das maiores treponemias possíveis,
com consequentes títulos altos de VDRL). Outra lesão de pele que
normalmente ocorre é a goma sifilítica, já que a resposta celular é errática
nesses tipos de pacientes.
No paciente HIV positivo, a principal característica é a infecção que pode ir
para o SNC antes dos 40 a 50 anos, que levaria à sífilis terciária e causaria
problemas. Por esse motivo, todo paciente HIV positivo que venha com
diagnóstico de sífilis ao exame de sangue deve obrigatoriamente fazer exame
de liquor, para avaliar a possibilidade de infecção também no liquor. Isso é
importante porque o tratamento habitualmente proposto para sífilis não
penetra a barreira hematoencefálica (vide parte de tratamento).
Outro problema no HIV é o controle de tratamento, pela dúvida entre cicatriz
sorológica, reinfecção ou reservatório de Treponema no SNC não pesquisado
(vide parte diagnóstica).

Importante
Todo paciente HIV positivo com infecção por sífilis deve realizar exame de
liquor para avaliação de infecção no sistema nervoso central.
Figura 6 - Mão e pé de paciente com AIDS, VDRL 1/1, conhecimento de sífilis primária há 5 anos,
tratamento prévio, mas que reativou lesões como sífilis secundária. A investigação de infecção
escondida no sistema nervoso central é essencial nesse perfil de paciente

Dica
Na sífilis no paciente imunodeprimido, as lesões principais são as de pele,
apresentando-se como difusas ou na forma de goma sifilítica.

- Sífilis congênita

A sífilis tem triagem obrigatória entre as gestantes, para evitar a transmissão


intraútero. A gestante deve ser tratada até a 37ª semana (pelo menos 2
semanas antes do parto) para se considerar que a criança não deve receber
tratamento.
A sífilis congênita pode ser precoce ou tardia. Precoce é a que ocorre até o 2º
ano de vida. Prematuridade e baixo peso ao nascimento são algumas das
possíveis características. Entretanto, pode haver, ainda, hepatomegalia com ou
sem esplenomegalia, osteíte, lesões cutâneas, rinite serossanguinolenta,
sofrimento respiratório com ou sem pneumonia, hidropisia e fissura peribucal.
Na sífilis congênita tardia, os sintomas ocorrem após o 2º ano de vida. Nesse
caso, ocorrem tíbia “em lâmina de sabre”, fronte olímpica e nariz “em sela”.
Citam-se, ainda, dentes incisivos superiores alterados (dentes de Hutchinson),
molares “em amora”, surdez neurológica e dificuldade no aprendizado.
Em todos os casos, quando a sífilis não é tratada e ocorre a transmissão, na
maioria das vezes, o recém-nascido não apresenta qualquer sintoma.

F - Exames complementares

Na sífilis primária:

Exame de campo escuro ou pesquisa direta: tal exame, que exige


técnica específica de coleta para microscopia em campo escuro, é
indicado para material de lesão ulcerada suspeita. Pode ser positivo em
material do cancro duro. A sensibilidade é de 70 a 95%;
Pesquisa direta com material corado: pode ser feita a impregnação
pela prata de Fontana e coloração pelo Giemsa. Essa pesquisa pode
aumentar a sensibilidade do exame em campo escuro.

A seguir, as provas sorológicas.

a) Testes antigênicos não treponêmicos

- Provas de floculação (VDRL)

Os testes não treponêmicos baseiam-se na presença de reatividade do soro a


um antígeno cardiolipina-lecitina. O teste mensura anticorpos IgG e IgM. O
VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) e a reação de Wassermann,
ou sua variante RPR (Rapid Plasma Reagin), são exames qualitativos e
quantitativos, importantes para o diagnóstico e o seguimento pós-terapêutico,
que devem ser solicitados na suspeita do diagnóstico de sífilis. Podem ser
utilizados em quaisquer de suas fases, para todos os portadores de Infecção
Sexualmente Transmissível (IST) e na rotina do pré-natal.
O VDRL torna-se reativo a partir da 2ª semana após o aparecimento do
cancro (sífilis primária) e, em regra, está mais elevado na fase secundária da
doença. Os títulos começam a diminuir a partir do 1º ano de evolução.
Instituído o tratamento correto, uma queda para 1/4 dos valores iniciais é
esperada em 6 meses, e a maioria dos casos apresenta negativação entre 9 e
12 meses, podendo permanecer, ainda, com títulos baixos por longos
períodos, ou até por toda a vida (cicatriz sorológica).
Assim, títulos baixos podem significar doença recente ou muito antiga,
tratada ou não. A anamnese, o exame físico e a repetição periódica dos testes
não treponêmicos (2 títulos baixos em intervalo de 30 dias excluem sífilis
recente), ou a realização de provas de sorologia treponêmica qualitativas,
ajudam a esclarecer dúvidas. As provas treponêmicas, se negativas, excluem
sífilis em atividade; se positivas, a dúvida pode permanecer, sendo
recomendável repetir o tratamento.
Pacientes com 3 dosagens de títulos sucessivamente baixos (≤1/8), sem
qualquer indício de reinfecção, apresentam, provavelmente, “memória”
sorológica. O paciente pode receber alta, e a ele deve ser avisado que, por
muito tempo, ou até por toda a vida, apresentará sorologia não treponêmica
reativa.
Pode ocorrer efeito prozona, quadro que pode confundir o médico
examinador, em pacientes com alta quantidade de anticorpos contra o
Treponema no sangue (o que geralmente ocorre quando há grande quantidade
de bactérias no sangue), podendo levar a falso negativo no soro puro. Se a
suspeita for forte, sugere-se diluir a amostra de sangue recebida, e o VDRL
que antes era negativo mostrará altos valores (geralmente acima de 1/64).

Importante
O VDRL é um teste não treponêmico que mensura anticorpos IgM e IgG
no soro, contra um antígeno cardiolipina-lecitina.

O teste rápido para sífilis tem resultado em até 15 minutos. É um teste


treponêmico, cuja principal finalidade é realizar triagem. A sua importância,
neste capítulo, é que, a partir de 2012, o SUS assumiu esse teste para ser
realizado com a triagem de HIV, nos casos de gestantes. Haverá treinamento
de profissionais em todo o Brasil para que esse teste entre na rotina de
consultas do pré-natal. Entretanto, exames de falso positivo podem ocorrer
(feitos para terem alta sensibilidade). Nesse caso, os demais exames podem
ser realizados para confirmação (apesar de poderem servir para conduta de
emergência).

- Provas de fixação de complemento (Wassermann)


Possuem as mesmas características do VDRL. Reações falsas positivas
podem ocorrer nas situações descritas na Tabela 3.

b) Testes treponêmicos

Dica
Os testes treponêmicos utilizam a imunofluorescência, são qualitativos e
importantes na confirmação da sífilis e incluem o FTA-ABS e o ELISA.

TPI (prova de imobilização do Treponema);


RPCF (prova de fixação de complemento com proteína de Reiter);
FTA-ABS (fluorescent treponemal antibody absorption);
MHA-TP (micro-hemaglutinação para Treponema pallidum): apresenta
sensibilidade semelhante à do FTA-ABS e é de execução tecnicamente mais
simples;
ELISA (teste imunoenzimático).
Os testes treponêmicos, feitos por imunofluorescência, como o FTA-ABS ou
o MHA-TP, são qualitativos e importantes para a confirmação da infecção. Os
anticorpos treponêmicos tendem a permanecer no soro por período de tempo
maior do que os não treponêmicos ou lipídicos e têm diminuição de títulos,
em resposta à terapia, muito mais lenta; não servem, portanto, para o
acompanhamento. Podem ocorrer resultados falsos positivos em algumas
situações, como hanseníase, malária, mononucleose, leptospirose e lúpus
eritematoso sistêmico. São exames com alta especificidade e, em situações
como na sífilis terciária, podem ser o único exame positivo (já que o VDRL
pode sumir com o passar dos anos).

G - Diagnóstico de neurossífilis
O 1º passo é determinar se o paciente apresenta ou não sífilis, que pode ser
confirmada por meio da presença de testes não treponêmicos e treponêmicos
positivos, que ocorrem, virtualmente, em todos os casos de neurossífilis
recente, mas podem ser negativos em tabes dorsalis e outras formas tardias.
O diagnóstico pode ser confirmado com a punção liquórica, que demonstra
pleocitose linfocítica, elevação de proteínas ou VDRL reativo. O VDRL no
liquor é considerado o teste padrão-ouro, embora possa apresentar falsos
positivos em pacientes com sangramento durante a punção. Já o FTA-ABS é
muito sensível, porém pouco específico, e deve ser usado como exame
confirmatório.
Todos os portadores de HIV com VDRL e FTA-ABS positivos no sangue têm
indicação de punção liquórica, já que existe risco de evolução para sífilis
terciária com aumento de 19 vezes em relação à população em geral.
Recém-nascidos de mães não tratadas, mesmo que assintomáticos, devem ser
submetidos à coleta do líquido cerebrospinal para avaliação de alterações no
SNC, muito frequentes na sífilis.
Em pacientes que tenham VDRL sérico com valores muito altos, em especial
acima de 1/16 (ou seja, 1/32 ou maior), é fortemente recomendada (mesmo
sem infecção pelo HIV) a punção liquórica para descartar sífilis no SNC
precoce.

H - Avaliação das sorologias para controle de


tratamento

Importante
O FTA-ABS é um teste que pode ficar positivo pelo resto da vida. Não
pode, portanto, ser utilizado para avaliar resposta ao tratamento da sífilis.
Deve-se utilizar, para isso, o VDRL, entretanto este também pode demorar
a diminuir, dificultando a avaliação da terapêutica empregada.

A principal dificuldade de tratamento na sífilis é, sem dúvida, o exame que


poderia ser utilizado para confirmar o tratamento. Como o FTA-ABS pode
ficar positivo pelo resto da vida, não pode ser usado para indicar resposta ao
tratamento. Normalmente, o que se usa é a titulação de VDRL para o controle
de tratamento. Entretanto, em diversas situações, o VDRL demora a diminuir.
Em geral, para sífilis latente, leva entre 3 e 6 meses para queda de VDRL.
No caso de sífilis no SNC, levaria entre 6 e 12 meses para avaliar resposta ao
tratamento e mudança do VDRL. Nesse caso, há melhora do liquor (queda de
proteína e celularidade é um padrão indireto de melhora).
No paciente HIV positivo, a redução do VDRL pode demorar até 18 meses
para acontecer, independentemente do local da infecção inicial. Isso é
importante porque, muitas vezes, a ansiedade do médico leva a tratamentos
novos indiscriminados.
A regra básica, nesse contexto (controle de tratamento), é que o título não
pode aumentar muito. Em geral, 2 vezes acima do valor pré-tratamento já
indica reinfecção, o que não é incomum. Nesse caso, o tratamento deveria ser
refeito.
Apesar de ser dito que pacientes com títulos acima de 1/4 não podem ser ditos
como falsos positivos, alguns mantêm títulos altos (mas menores do que o
valor pré-tratamento) por toda a vida.

I - Diagnóstico diferencial

O diagnóstico diferencial de sífilis depende muito do estágio da doença.


Quando a lesão é de sífilis primária, o diagnóstico diferencial se restringe
apenas a ISTs (com exceção à doença de Behçet, que pode causar lesões
genitais). Entretanto, quando se fala de sífilis secundária, pode-se confundir
com diversas outras doenças dermatológicas. Muitas vezes, o paciente
procura o dermatologista por conta de manchas ou exantemas na suspeita de
alergia, mas trata-se de sífilis secundária. A Tabela 4 exemplifica as doenças
diferenciais.
Figura 7 - Curso da sífilis se não tratada
J - Tratamento

O tratamento da sífilis dependerá do tempo de doença e da condição da


paciente (gestante ou não). Como a sífilis não é percebida algumas vezes na
sua lesão inicial (pois é indolor, e muitos pacientes não sabem há quanto
tempo têm a doença), o tratamento, nesses casos, deve ser feito como se fosse
a forma latente tardia, para diminuir a chance de falha.

Na reação de Jarisch-Herxheimer, pode ocorrer exacerbação das lesões


cutâneas, com eritema, dor ou prurido, as quais regridem espontaneamente
após 12 a 24 horas, sem a necessidade da descontinuidade do tratamento.
Muitas vezes essa situação é confundida com alergia a penicilina. Ocorre
como resposta inflamatória pela quebra de proteínas e outras estruturas dos
treponemas mortos pela penicilina na corrente sanguínea e é mais comum em
pacientes que recebem tratamento na fase secundária da sífilis. Tipicamente,
vem acompanhada de febre, artralgia e mal-estar. Gestantes que apresentam
essa reação podem ter risco de trabalho de parto pré-termo, pela liberação de
prostaglandinas em altas doses. Se houver esse desfecho, devem-se seguir
cuidadosamente os protocolos recomendados para inibição do trabalho de
parto prematuro.
Em crianças com sífilis comprovada por exame laboratorial alterado em
líquido cerebrospinal ou por quadro clínico, o tratamento é feito com
penicilina cristalina por 10 dias, na dose de 50.000UI/kg a cada 12 horas nos
7 primeiros dias e a cada 8 horas até o 10º dia. Pode ser feito, ainda,
tratamento com penicilina procaína IM 50.000U 1x/d, caso não haja
alterações liquóricas.
Em crianças que não tenham alterações clínicas, radiológicas, neurológicas e
laboratoriais, mas sejam filhas de mães que não fizeram tratamento da sífilis
da maneira correta ou em tempo hábil até o parto, é necessário fazer
penicilina benzatina 50.000UI/kg em dose única.

2. Cancro mole

A - Introdução e definições

Trata-se de uma IST, com contágio exclusivo por essa via. Apresenta
evolução aguda e é mais frequente nas regiões tropicais, com alta
infectividade e baixa patogenicidade. Sua ocorrência é maior no sexo
masculino, a uma proporção de 10 a 20 casos em homens para 1 em mulheres.
A doença é denominada, ainda, cancroide, cancro venéreo e cancro de
Ducrey, e é conhecida, popularmente, por “cavalo”. O período de incubação
é, geralmente, de 3 a 5 dias e pode estender-se por até 2 semanas.

B - Etiologia

A doença é produzida por bacilo Gram negativo denominado Haemophilus


ducreyi.

C - Achados clínicos
Importante
O cancro mole apresenta-se como lesão ulcerada de base mole, rasa, com
bordas irregulares, envolta por halo eritematoso e recoberta por exsudato
necrótico e purulento. As lesões são dolorosas e podem ter odor fétido.

Apresenta período de incubação curto, que varia de 3 a 5 dias, surgindo,


posteriormente, lesão ulcerada de base mole, rasa, com bordas irregulares,
envolta por halo eritematoso vivo e recoberta por exsudato necrótico e
purulento. As lesões são dolorosas, geralmente múltiplas, com apresentação
em número, formas e tamanhos variados. A borda é irregular, apresentando
contornos eritematoedematosos e fundo irregular recoberto por exsudato
necrótico, amarelado, com odor fétido que, removido, revela tecido de
granulação com sangramento fácil.
Nos homens, as lesões localizam-se, principalmente, junto ao frênulo, sulco
balanoprepucial, glande e face interna do prepúcio. Nas mulheres, acomete,
preferencialmente, a região do fórnice vaginal e pequenos e grandes lábios.
Em 30 a 50% dos casos, ocorre enfartamento ganglionar regional, formando o
chamado “bubão”; 2/3 destes evoluem com flutuação e fistulização, com
drenagem de material purulento, caracteristicamente através de um único
orifício. São unilaterais na maioria dos casos.
As lesões não evoluem para cura espontânea e, geralmente, deixam pequena
cicatriz após a cura.

Figura 8 - Lesões genitais de cancro mole


Figura 9 - Lesões de cancro mole no prepúcio e na glande

Importante
No caso do cancro mole, deve-se lembrar que as lesões têm aspecto mais
raso e são muito dolorosas, com a base mole e irregular. Além disso, pode
haver mais de 1 lesão, e existe cicatriz residual, o que não ocorre na sífilis.

D - Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial é feito com cancro duro, linfogranuloma venéreo,
donovanose, herpes genital infectado, leishmaniose tegumentar americana,
paracoccidioidomicose e cancro misto de Rollet (coexistência do cancro mole
e duro). Como o principal diferencial do cancro mole é com a sífilis, a Tabela
6 mostra as principais diferenças entre as 2 doenças.

E - Exames complementares
Pesquisa direta: coleta do pus da lesão com coloração de Gram, o que revela
a presença de bacilos Gram negativos, dispostos em fila indiana ou formando
paliçadas no interior de polimorfonucleares, habitualmente aparecendo em
cadeias paralelas e acompanhados de cocos Gram positivos (fenômeno de
satelitismo);
Cultura: de difícil realização, mas é o exame diagnóstico mais sensível;
Biópsia: não recomendada de rotina, pois a histologia não é conclusiva.

F - Tratamento

Segundo o Ministério da Saúde, o tratamento dos parceiros sexuais está


recomendado mesmo que a doença clínica não seja demonstrada, em razão da
existência de portadores assintomáticos, principalmente entre mulheres.
Cuidados locais: lavagem frequente com água e sabão;
Escolha: azitromicina 1g VO, dose única; ou ciprofloxacino 500mg VO, a
cada 12 horas, por 3 dias (contraindicado para gestantes, nutrizes e menores
de 12 anos);
Opções: ceftriaxona 250mg IM, dose única; eritromicina 500mg VO, a cada 6
horas, por 15 dias; doxiciclina 100mg VO, a cada 12 horas, por 10 dias.

3. Uretrite gonocócica

A - Introdução e definições
Trata-se de uma doença infectocontagiosa, pandêmica, transmitida por relação
sexual, sendo excepcional a contaminação acidental. Em alguns casos, pode
ser transmitida por sexo oral, originando faringite gonocócica.

B - Etiologia

O agente é a Neisseria gonorrhoeae, que se apresenta como diplococos Gram


negativos, reniformes e agrupados 2 a 2, com as faces côncavas adjacentes.
Caracteristicamente, são intracelulares, contudo podem ter suas características
morfotintoriais alteradas nos processos crônicos ou após uso de
antimicrobianos. Convém lembrar que o risco de transmissão de um parceiro
infectado a outro é de 50% por ato sexual.
O período de incubação é variável; em média, de 3 a 10 dias. A Neisseria
gonorrhoeae pode ser encontrada, também, no epitélio da orofaringe e no
canal anal, em razão do comportamento sexual dos hospedeiros.

C - Achados clínicos
Os sinais e os sintomas iniciais traduzem-se por prurido intrauretral, disúria,
eritema e edema do meato uretral, seguido de fluxo uretral mucoso que,
rapidamente, torna-se mucopurulento, de cor amarelo-esverdeada, com
eliminação de secreção de forma abundante e espontânea ou à mais leve
pressão. Caso a infecção atinja a uretra posterior, o quadro clínico pode estar
acompanhado de urgência miccional e polaciúria.
Nas mulheres, o quadro não apresenta exuberância clínica como nos homens.
Cerca de 60 a 80% das mulheres são assintomáticas. As pacientes que têm
sintomas podem apresentar disúria, urgência urinária e, menos
frequentemente, secreção amarelada. Nesse grupo, ocorrem, com maior
frequência, uretrites pouco sintomáticas, por esse motivo, semanas após a
uretrite, pode haver casos de artrite gonocócica.
As principais complicações nos homens são traduzidas por balanopostite,
particularmente em indivíduos com excesso de prepúcio, que se apresentam
com grande edema, intenso eritema e grande quantidade de secreção
purulenta; litrites, por infecção nos canais e glândulas de Littré; cowperites
(inflamação das glândulas de Cowper); prostatite; epididimite; raramente,
estenose de uretra (habitualmente, após múltiplos episódios de uretrite). Em
homossexuais masculinos, há corrimento anal, com frequente aparecimento
de fístulas e dores lancinantes.
Nas mulheres, as principais complicações são bartolinite, salpingite, gravidez
tubária, esterilidade e doença inflamatória pélvica. As pacientes podem
apresentar, ainda, peri-hepatite, que é a denominada síndrome de Fitz-Hugh-
Curtis.

Importante
Os sintomas clínicos da uretrite gonocócica incluem disúria, prurido
intrauretral, com eritema e edema do meato, com saída de secreção
mucopurulenta de cor amarelo-esverdeada e abundante.

A Figura 10 mostra o corrimento típico na uretrite gonocócica quando se


realiza a expressão peniana.
Figura 10 - Corrimento típico na uretrite gonocócica

D - Exames complementares

Pesquisa direta por exame bacterioscópico com material corado pelo Gram e
cultura em meio de Thayer-Martin modificado (exame de escolha).

E - Diagnóstico diferencial

Como as uretrites gonocócicas e não gonocócicas têm diagnóstico difícil,


convém lembrar que, na suspeita de corrimento, o Ministério da Saúde indica
o tratamento empírico das causas mais frequentes. Os principais diagnósticos
diferenciais são descritos a seguir.

a) Bacteriana

Chlamydia trachomatis;
Ureaplasma urealyticum;
Haemophilus vaginalis;
Streptococcus;
Enterococcus.
b) Parasitária

Trichomonas vaginalis.

c) Viral

Herpes-vírus.

d) Fúngica

Candida albicans.

e) Metabólica

Diabetes.

f) Traumática

Pelo hábito comum de expressão da glande para evidenciar secreção


(“ordenha”).

F - Tratamento

Tratamento
O tratamento da uretrite gonocócica é feito com ceftriaxona, na dose única
de 250mg.

A principal medicação utilizada para o tratamento de gonorreia é a


ceftriaxona, na dose única de 250mg. São opções possíveis, ainda:
Ciprofloxacino: 500mg, dose única, VO (cautela ao utilizar a droga em
jovens); há relatos de resistência importante da Neisseria gonorrhoeae a essa
droga em vários países do mundo nos últimos anos (desde 2007 até 2010).
Por esse motivo, seu uso tem sido desaconselhado para tratamento de
gonorreia;
Ofloxacino: 40mg VO, dose única. Também tem sido desaconselhado o uso
atualmente, pelo mesmo motivo do ciprofloxacino;
Eritromicina: 500mg VO, a cada 6 horas, durante 7 dias.
A abordagem sindrômica de pacientes com corrimento uretral causado por
uretrite não gonocócica ou gonocócica depende da possibilidade de
bacterioscopia. Caso não seja possível, tanto uretrite não gonocócica quanto
gonorreia devem ser tratadas. Se a bacterioscopia apresenta diplococos Gram
negativos, tratam-se clamídia e gonorreia; caso diplococos Gram negativos
estejam ausentes, trata-se apenas clamídia.

4. Linfogranuloma venéreo

A - Introdução
Trata-se de uma IST, com contágio exclusivo por essa via, de distribuição
mundial e etiologia bacteriana, também conhecida como doença de Nicolas-
Favre-Durand.

B - Etiologia
Tem como agente etiológico a Chlamydia trachomatis, espécie sorológica e
biologicamente distinta das demais espécies de Chlamydia. Os sorotipos
responsáveis são L1, L2 e L3.

C - Achados clínicos

Importante
O linfogranuloma venéreo, em seu estágio primário, é indolor e pode se
apresentar como pápula, ulceração superficial, involuindo sem deixar
cicatriz. No estágio secundário, ocorre disseminação linfática,
apresentando gânglios firmes, dolorosos, móveis, que rapidamente se
aderem à pele, a qual se torna eritematoedematosa e descamativa. Quando
a ruptura ocorre, há vários pontos de drenagem de secreção purulenta.

O linfogranuloma venéreo é, eminentemente, uma doença do tecido linfático,


uma vez que a infecção genital provoca linfangite e linfadenite supurativa,
com eventual disseminação do processo inflamatório para o tecido adjacente.
Os linfonodos acometidos aumentam de volume, com formação de abscessos
necrosantes, que, por sua vez, coalescem, rompem-se e formam fístulas que
drenam grande quantidade de material purulento. Como consequência,
fibroses e cicatrizes superpõem-se, com aparecimento de isquemia, ulceração
e, em casos avançados, linfedema. De maneira geral, seu curso clínico pode
ser dividido em 3 estágios, relatados a seguir.

a) Estágio primário
O período de incubação é variável, em geral de 3 a 30 dias; ocorre a chamada
lesão de inoculação. Nos homens, a lesão primária localiza-se, com maior
frequência, na glande, no frênulo, no prepúcio ou no escroto. Nas mulheres, o
local mais frequentemente acometido é a parede posterior da vagina e a
cérvice.
A lesão primária é indolor, transitória e, muitas vezes, imperceptível. Pode
apresentar-se como pápula, ulceração superficial ou erosão, ou, ainda, como
uma lesão herpetiforme, que, em geral, involui rapidamente sem deixar
cicatriz e frequentemente não é notada pelo paciente, nem pelo médico.

b) Estágio secundário – síndrome inguinal

Cerca de 2 a 6 semanas após o surgimento da lesão primária, ocorre


disseminação linfática, com aparecimento de linfadenite inguinal, que se
desenvolve entre o sexo masculino. O acometimento ganglionar é usualmente
unilateral. Nas mulheres, por sua vez, a drenagem linfática do terço superior
da vagina e a cérvice uterina faz-se primordialmente para linfonodos
localizados entre as artérias ilíacas; o terço médio vaginal drena para
linfonodos localizados entre a artéria ilíaca interna e o reto; o terço inferior
drena para linfonodos pélvicos e inguinais; e a genitália externa drena para
linfonodos inguinais.
Os gânglios acometidos são firmes, dolorosos, móveis e rapidamente se
aderem à pele, configurando o chamado bubão inguinal. A pele torna-se
eritematoedematosa, descamativa, seguida por ruptura dos linfonodos em 1/3
dos casos. Quando a ruptura ocorre, faz-se por meio de vários pontos de
drenagem de secreção purulenta, conferindo ao bubão o aspecto de uma
escumadeira.
Manifestações sistêmicas inespecíficas podem ocorrer, como febre, mal-estar,
anorexia, cefaleia, artralgias, emagrecimento, sudorese noturna e
hepatoesplenomegalia. Também podem acontecer manifestações
dermatológicas, incluindo-se eritema nodoso, eritema polimorfo, urticária e
exantema maculopapular.
Figura 11 - Estágio secundário

c) Estágio terciário – síndrome anogenital

Também chamada fase de sequelas, com grandes variações, que, em geral, são
resultados de lesões progressivas, hipertróficas e necróticas, ocorre
principalmente com as mulheres, uma vez que a drenagem linfática se faz,
preferencialmente, para o retroperitônio.
Caracteriza-se por proctite leve com muco, sangue e pus nas fezes,
acompanhada de tenesmo, febre, emagrecimento e dor. Evolui com fibrose e
estenose retal, fístulas reto e anovaginais, compressão vesical, abscessos
peritoneais e linfedema da genitália externa, que pode exibir o aspecto de
elefantíase (estiomene).

D - Exames complementares

Na maioria dos casos, o diagnóstico é clínico, e não é necessária a


confirmação laboratorial. Os exames complementares incluem:

Exame direto do esfregaço, com coloração de Giemsa;


Imunofluorescência direta;
Sorologia para Chlamydia trachomatis por imunofluorescência indireta;
Cultura em meios de McCoy e HeLa 229 com material obtido pela
aspiração do linfonodo, sendo baixa a positividade.

E - Diagnóstico diferencial
Deve ser obtido com outras causas de úlceras genitais, com ou sem
linfadenopatia inguinal, como cancroide, sífilis primária, herpes genital e
donovanose. Doença da arranhadura do gato e infecções bacterianas
associadas à linfangite também devem ser ressaltadas no diagnóstico
diferencial.

F - Tratamento

Escolha: doxiciclina 100mg VO, a cada 12 horas, por 21 dias;


Opção: eritromicina (estearato) 500mg VO, a cada 6 horas, por 21 dias.

5. Donovanose

A - Introdução

A donovanose é uma doença de evolução progressiva e crônica, de


localização genital, que ocasiona lesões granulomatosas e destrutivas. Os
mecanismos de transmissão são pouco conhecidos, e a contagiosidade é
baixa. O período de incubação é de 30 dias a 6 meses. É pouco frequente, mas
é mais comum em climas tropicais e subtropicais. Também pode ser
conhecida como granuloma inguinal.

B - Etiologia

É causada por Klebsiella granulomatis (também denominada


Calymmatobacterium granulomatis), bactéria Gram negativa que se cora com
maior intensidade nas extremidades do que no centro. Nas lesões, tais micro-
organismos são encontrados no interior de macrófagos, sob a forma de
pequenos corpos ovais denominados corpúsculos de Donovan. São corados
com relativa facilidade pelos métodos de Giemsa, Leishman e Wright.

C - Achados clínicos

O período de incubação varia de 30 dias a 6 meses. A doença inicia-se por


lesão nodular, única ou múltipla, de localização subcutânea, que evolui
produzindo ulceração bem definida, com fundo granulomatoso, de
crescimento lento, que sangra com muita facilidade. A partir desse ponto, as
manifestações clínicas estão diretamente ligadas às respostas tissulares do
hospedeiro, originando formas localizadas ou extensas e, até mesmo, lesões
viscerais por disseminação hematogênica.
Comumente, as formas ulcerosas são as de maior dimensão, com secreção
abundante e de crescimento por expansão, por meio de autoinoculação.

Importante
As formas ulcerosas da donovanose são geralmente aquelas de maior
dimensão, com secreção abundante e de crescimento por expansão, por
meio de autoinoculação.

As ulcerações podem progredir para as formas ulcerovegetantes, em que


ocorre abundante tecido de granulação no fundo da lesão. As lesões
vegetantes, por serem quase desprovidas de secreção, são, habitualmente,
pequenas e bem delimitadas.
As manifestações com linfedema acontecem, quase sempre, após formas
ulcerativas, que promovem alterações linfáticas obstrutivas que determinam
fenômenos de estase. São encontradas principalmente na genitália feminina e
excepcionais em pacientes do sexo masculino.
As localizações extragenitais podem ocorrer dependendo das práticas sexuais
do paciente ou por extensão do foco inicial por autoinoculação. Há relatos de
localizações nas gengivas, axilas, parede abdominal etc.
As formas sistêmicas são encontradas, em geral, em áreas endêmicas, tendo
sido descritas manifestações ósseas, articulares, hepáticas, esplênicas,
pulmonares e outras. A Figura 12 mostra lesões típicas de donovanose, com
quadro de destruição importante de tecidos e formação de granuloma.

Figura 12 - Lesões típicas


D - Diagnóstico diferencial

O diagnóstico diferencial é feito com cancro mole, algumas formas de sífilis


secundária, condiloma acuminado nas suas formas gigantes e de localização
vulvar, carcinoma espinocelular do genital, leishmaniose tegumentar
americana, paracoccidioidomicose e úlcera fagedênica tropical.

E - Exames complementares

O diagnóstico é estabelecido por meio da demonstração dos corpúsculos de


Donovan, em esfregaço de material proveniente da lesão suspeita ou cortes
tissulares. O material para o exame de esfregaço deve ser, preferencialmente,
oriundo de parte do material destinado para exame histopatológico. Caso o
material seja proveniente da lesão suspeita, sua coleta deve ser realizada em
área de lesão livre de infecção secundária e com granulação ativa.
O exame histopatológico é indicado para casos duvidosos e para afastar
malignidade. Para a visualização dos corpúsculos de Donovan, tanto no
esfregaço, como no material de biópsia, são necessárias colorações
específicas, como de Giemsa (os corpúsculos coram-se de maneira bipolar, de
forma mais intensa na periferia do que no centro), coloração pela prata (em
que os corpúsculos se coram em negro) ou com azul de toluidina (para
microscopia eletrônica).

F - Tratamento

Escolha: doxiciclina 100mg VO, a cada 12 horas, por 21 dias.


Opções:

Azitromicina: 1g VO, 1x/sem, por 3 semanas;


Ciprofloxacino: 750mg VO, a cada 12 horas, por 21 dias;
Eritromicina (estearato): 500mg VO, a cada 6 horas, por 21 dias;
Sulfametoxazol-trimetoprima: 800/160mg VO, a cada 12 horas, por 21
dias ou até a cura clínica das lesões.

6. Herpes genital
A - Introdução
O herpes genital é transmitido, predominantemente, pelo contato sexual
(inclusive orogenital), com período de incubação de 3 a 14 dias, no caso de
primoinfecção sintomática; a transmissão pode acontecer, também, pelo
contato direto com lesões ou objetos contaminados. É necessária a presença
de solução de continuidade, pois o vírus não atravessa pele ou mucosas
íntegras.

B - Etiologia
Vírus herpes-simples (HSV), tipos 1 e 2 (o 1 é mais comumente relacionado a
herpes labial, e o 2, a herpes genital), pertencentes à família Herpesviridae.

C - Quadro clínico
Pode ser assintomático. Na fase prodrômica, ocorrem aumento de
sensibilidade, formigamento, mialgias, ardência ou prurido antecedendo o
aparecimento das lesões. Localiza-se, nos homens, mais frequentemente na
glande e no prepúcio; nas mulheres, nos pequenos e grandes lábios, clitóris,
fúrcula e colo do útero. As lesões iniciais são pápulas e vesículas agrupadas
com conteúdo claro ou citrino, que se rompem, originando ulcerações,
posteriormente recobertas por crostas sero-hemáticas. É comum a
coexistência dos três estágios de lesões (vesículas, úlceras e crostas).
Adenopatia inguinal dolorosa bilateral pode ocorrer em 50% dos casos.
Ocasionalmente, secreção uretral clara e, até mesmo, ardência miccional
podem estar presentes, consequentes de lesões intrauretrais. Além disso, é
possível que apareçam sintomas gerais, como febre e mal-estar. Assim como
no herpes-zóster, pacientes que têm infecção de repetição podem apresentar
quadros de lesões mais intensas, formando aspecto serpiginoso, semelhante ao
“cobreiro” do zóster.
No fim da infecção, mesmo assintomática, o HSV ascende pelos nervos
periféricos sensoriais, penetra nos núcleos das células ganglionares e ali
permanece em estado de latência.
As infecções podem ser recorrentes, e 60 a 90% dos pacientes apresentam
novos episódios nos primeiros 12 meses, por reativação dos vírus. A
recorrência das lesões pode associar-se a episódios de febre, exposição à
radiação ultravioleta, traumatismos, menstruação, estresse físico ou
emocional, antibioticoterapia prolongada e imunodeficiência. O quadro
clínico das recorrências é menos intenso do que o da primoinfecção e é
precedido de pródromos característicos, como aumento de sensibilidade no
local, prurido, “queimação”, mialgias e “fisgadas” nas pernas, nos quadris e
na região anogenital.

Figura 13 - Vesículas típicas em lesão peniana por herpes-vírus

D - Exames complementares

O diagnóstico, na maioria das vezes, pode ser realizado unicamente com a


inspeção. Os procedimentos complementares que podem ser realizados estão
descritos na Tabela 7.
E - Diagnóstico diferencial

Deve ser feito com cancro mole, sífilis, linfogranuloma venéreo, donovanose
e ulcerações traumáticas.

F - Tratamento

Vários medicamentos foram utilizados para o tratamento das infecções


herpéticas, mas nenhum se provou completamente eficaz, uma vez que não há
como realizar a erradicação do vírus. Não existe tratamento que proporcione
cura definitiva.
Gestantes que estejam com lesões ativas na região vaginal no momento do
parto devem ter o parto natural contraindicado, e a via alta deve ser escolhida.
Caso seja necessário tratamento com aciclovir durante a gestação, o
medicamento pode ser utilizado sem problemas.
Pode-se valer de tratamento sintomático com limpeza da lesão, uso de
analgésicos e anti-inflamatórios no herpes genital. No 1º episódio, podem ser
utilizados:

Aciclovir: 400mg VO, a cada 8 horas, por 7 a 10 dias; ou 200mg VO, a


cada 4 horas, por 7 a 10 dias;
Valaciclovir: 1g VO, a cada 12 horas, por 7 a 10 dias;
Fanciclovir: 250mg VO, a cada 8 horas, por 7 a 10 dias.

Nas recorrências de herpes genital, o tratamento deve ser iniciado, de


preferência, com o aparecimento dos primeiros pródromos.

Aciclovir: 400mg VO, a cada 8 horas, por 5 dias; ou 200mg VO, a cada
4 horas, por 5 dias;
Valaciclovir: 500mg VO, a cada 12 horas, por 5 dias;
Fanciclovir: 125mg VO, a cada 12 horas, por 5 dias.

7. Abordagem sindrômica
O Ministério da Saúde propõe que as ISTs sejam abordadas de maneira
sindrômica, isto é, na impossibilidade de diagnóstico etiológico imediato, que
o paciente receba tratamento empírico de acordo com a síndrome clínica, para
que não se perca a oportunidade de tratamento de sua afecção e haja
interrupção da cadeia de transmissão.
O tratamento imediato das ISTs tem importância epidemiológica não somente
na transmissão delas próprias, mas também na transmissão do HIV. A
infecção genital ativa facilita tanto a transmissão quanto a aquisição do vírus
por via sexual. O paciente infectado pelo HIV apresenta maior quantidade de
partículas virais em seus fluidos genitais quando tem uma infecção genital
ativa, em virtude da maior replicação viral e de microssangramentos
provocados pela coinfecção, o que facilita a transmissão do vírus.
O paciente HIV negativo com IST tem maior predisposição a adquirir o HIV
por via sexual se exposto, seja pela solução de continuidade mucosa
ocasionada pela infecção, seja porque suas células imunológicas do trato
genital, ativadas pela presença de IST ativa, são mais suscetíveis à invasão
por esse vírus.
A seguir, recomendações feitas pelo Ministério da Saúde para a abordagem
sindrômica das ISTs.
Figura 14 - Abordagem sindrômica das úlceras genitais
Fonte: Ministério da Saúde, 2016.
Figura 15 - Abordagem sindrômica dos corrimentos uretrais
Fonte: Ministério da Saúde, 2016.

O tratamento de corrimentos deve ser guiado pela Tabela 11.


Resumo

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