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Analise Real

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Ministério da Educação - MEC

Universidade Aberta do Brasil


Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
Diretoria de Educação a Distância

LICENCIATURA EM MATEMÁTICA
Ângelo Papa Neto
Zellaber Gondim Guimarães

Análise Real
FORTALEZA

2011

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Créditos
Presidente Maria Luiza Maia
Dilma Vana Rousseff Saskia Natália Brígido Batista
Ministro da Educação Equipe Arte, Criação e Produção Visual
Fernando Haddad Ábner Di Cavalcanti Medeiros
Benghson da Silveira Dantas
Secretário da SEED Cícero Felipe da Silva Figueiredo
Luís Fernando Massonetto Elson Felipe Gonçalves Mascarenha
Diretor de Educação a Distância Germano José Barros Pinheiro
Celso Costa Gilvandenys Leite Sales Júnior
José Albério Beserra
Reitor do IFCE
José Stelio Sampaio Bastos Neto
Cláudio Ricardo Gomes de Lima
Lucas de Brito Arruda
Pró-Reitor de Ensino Marco Augusto M. Oliveira Júnior
Gilmar Lopes Ribeiro Navar de Medeiros Mendonça e Nascimento
Diretora de EAD/IFCE e Coordenadora Samuel da Silva Bezerra
UAB/IFCE Equipe Web
Cassandra Ribeiro Joye Benghson da Silveira Dantas
Fabrice Marc Joye
Vice-Coordenadora UAB
Hanna França Menezes
Régia Talina Silva Araújo
Herculano Gonçalves Santos
Coordenador do Curso de Luiz Bezerra de Andrade FIlho
Tecnologia em Hotelaria Lucas do Amaral Saboya
José Solon Sales e Silva Ricardo Werlang
Samantha Onofre Lóssio
Coordenador do Curso de
Tibério Bezerra Soares
Licenciatura em Matemática
Priscila Rodrigues de Alcântara Revisão Textual
Aurea Suely Zavam
Elaboração do conteúdo Nukácia Meyre Araújo de Almeida
Ângelo Papa Neto
Zellaber Gondim Guimarães Revisão Web
Antônio Carlos Marques Júnior
Equipe Pedagógica e Design Instrucional Débora Liberato Arruda Hissa
Ana Claúdia Uchôa Araújo
Saulo Garcia
Andréa Maria Rocha Rodrigues
Carla Anaíle Moreira de Oliveira Logística
Cristiane Borges Braga Francisco Roberto Dias de Aguiar
Eliana Moreira de Oliveira Secretários
Gina Maria Porto de Aguiar Vieira Breno Giovanni Silva Araújo
Glória Monteiro Macedo Francisca Venâncio da Silva
Iraci Moraes Schmidlin
Irene Moura Silva Auxiliar
Isabel Cristina Pereira da Costa Ana Paula Gomes Correia
Jane Fontes Guedes Bernardo Matias de Carvalho
Karine Nascimento Portela Charlene Oliveira da Silveira
Lívia Maria de Lima Santiago Isabella de Castro Britto
Lourdes Losane Rocha de Sousa Nathália Rodrigues Moreira
Luciana Andrade Rodrigues Virgínia Ferreira Moreira
Maria Irene Silva de Moura Vivianny de Lima Santiago
Maria Vanda Silvino da Silva Wagner Souto Fernandes
Marília Maia Moreira

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Catalogação na fonte: Islânia Fernandes Araújo (CRB 3 - Nº 917)

213a Papa Neto, Ângelo.


Análise real: semestre VII / Ângelo Papa Neto, Zelalber Gondim
Guimarães; Coordenação Cassandra Ribeiro Joye. - Fortaleza: UAB/
IFCE, 2011.
150p. : il. ; 27cm.

1. MATEMÁTICA - NÚMEROS REAIS. 2. CONTINUIDADE. 3.


DERIVADA. 4. ANÁLISE REAL. I. Joye, Cassandra Ribeiro (Coord.).
II. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará –
IFCE. III. Universidade Aberta do Brasil – UAB. IV. Título.

CDD – 515

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Sumário
Aula 1 - Números reais – parte 1....................................................... 7
Tópico 1 - Os números irracionais..................................................................8
Tópico 2 - Propriedades dos números reais.....................................................18

Aula 2 - Números reais - parte 2......................................................27


Tópico 1 - Valor absoluto............................................................................28
Tópico 2 - Completude de um corpo K .........................................................36
Tópico 3 - Enumerabilidade........................................................................44

Aula 3 - Sequências e Séries ............................................................51


Tópico 1 - Definição de Sequência...............................................................52
Tópico 2 - Operações com Sequências..........................................................58
Tópico 3 - Sequências com Limites Infinitos....................................................64
Tópico 4 - Séries Numéricas........................................................................68

Aula 4 - Noções Topológicas na Reta Real......................................73


Tópico 1 - Conjuntos Abertos e Fechados.......................................................74
Tópico 2 - Conjuntos Fechados....................................................................78
Tópico 3 - Conjuntos Compactos.................................................................82

Aula 5 - Limites de Funções..............................................................85


Tópico 1 - Definição, propriedades e exemplos de limites de funções...................86
Tópico 2 - Limites laterais...........................................................................94
Tópico 3 - Limites no infinito e limites infinitos .............................................100

Aula 6 - Limites de Funções........................................................... 105


Tópico 1 - Definição e exemplos de funções contínuas....................................106
Tópico 2 - O Teorema do Valor Intermediário...............................................114

Aula 7 - A Derivada de Função Real............................................. 121


Tópico 1 - Conceitos de Derivada de Função Real..........................................122

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Tópico 2 - Propriedades Operatórias das Derivadas..........................................126
Tópico 3 - O Teorema do Valor Médio..........................................................132

Aula 8 - Integral de Riemann.......................................................... 135


Tópico 1 - A integral de Riemann.................................................................136
Tópico 2 - Propriedades da Integral..............................................................142
Tópico 3 - Teorema Fundamental do Cálculo..................................................146

Referências 150
Currículo 151

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Apresentação
Os números reais surgiram na Grécia Antiga, em conexão com o estudo de proble-
mas geométricos. Com o desenvolvimento da Geometria Analítica e do Cálculo a
partir do século XVII, os números reais passaram a ocupar uma posição central na
Matemática e em suas aplicações. Do tratamento matemático dado a problemas
clássicos da Física, emergiram as noções de função, continuidade, derivação e inte-
gração.

A partir do século XIX, houve uma crescente formalização destas noções, que pas-
saram a ser tratadas sob um novo padrão de rigor. Os personagens centrais destas
aulas serão os números reais e as funções reais de uma variável real que apresen-
tam alguma regularidade, seja do ponto de vista topológico (continuidade), seja
do ponto de vista geométrico (suavidade, ou seja, derivabilidade). Serão estudados
também os teoremas centrais do Cálculo, sob um ponto de vista mais geral e mais
profundo, dentro do espírito de crescente rigor que permeia o desenvolvimento dos
objetos matemáticos.

Em nossa disciplina, estudaremos aspectos importantes da construção dos números


reais; estudos sobre os conceitos de sequências e séries; limites, derivadas e integral
de uma função.

Bons estudos!

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Aula 1
Números reais – parte 1

Olá, aluno (a),

Iniciamos aqui o nosso curso introdutório de Análise Real. Estudaremos, ao longo do


curso, certas funções que possuem domínio e contradomínio formados por núme-
ros reais. Assim, é importante que tenhamos uma noção precisa do que é número
real e como estes números se organizam. Nesta primeira aula, estabeleceremos a
noção de número real. Veremos, no tópico 1, que os números racionais não são
suficientes para medirmos comprimentos de segmentos, o que nos dá uma motiva-
ção geométrica para a introdução dos números reais. No tópico 2, adotaremos um
ponto de vista mais formal, definindo o conjunto dos números reais através de suas
propriedades básicas.

Objetivos:
• Reconhecer a necessidade do estudo dos números reais;
• Identificar as propriedades que caracterizam o conjunto dos números reais;
• Perceber a conexão entre números reais e pontos em uma reta.

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01 OS NÚMEROS
TÓPICO

IRRACIONAIS
OBJETIVOS
··Identificar as questões geométricas que
motivaram o estudo de números não racionais;
··Compreender os princípios básicos da teoria de
Eudoxo sobre as proporções.

O s números naturais – 1,2,3, ... – são suficientemente adequados para


contar objetos e para enumerá-los. A geometria exige, a priori, a intro-
dução de números racionais, pois o processo de medida se dá por com-
paração com uma unidade. Cerca de 500 anos antes de Cristo, matemáticos gregos
perceberam que mesmo os números racionais não eram suficientes para realizar me-
dições. Percebeu-se, então, a existência de magnitudes incomensuráveis, interpreta-
das hoje como números irracionais.

1.1 A CRISE PITAGÓRICA

A descoberta, atribuída a Hipaso de Metaponto, um pitagórico que viveu no sé-


culo V a.C., de que existem segmentos de reta incomensuráveis causou uma profun-
da crise intelectual e filosófica na escola pitagórica. Para termos uma ideia da mag-

8 Licenciatura em Matemática

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nitude desta crise, basta lembrar que os pitagóricos não eram apenas um
grupo pioneiro na Filosofia e na Matemática, mas também adotavam certos
princípios matemáticos como dogmas religiosos. Um desses princípios era
o de que quaisquer medidas poderiam ser feitas usando-se apenas números
racionais, que podem ser obtidos a partir de uma unidade multiplicando-se
e dividindo-se essa unidade em partes iguais.
De um modo mais preciso, um segmento de reta a pode ser medido A
usando-se um outro segmento e como unidade de medida. Se e cabe um Hipaso de Metaponto 1
número inteiro n de vezes em a , isto é, se n cópias do segmento de reta e
, colocadas lado a lado, cobrem perfeitamente o segmento a , dizemos que T
a tem medida n , ou que mede n unidadesde e .
1
Dois segmentos a e b são ditos comensuráveis se existe um segmento e que,
quando tomado como unidade de medida, faça com que a e b tenham medidas in-
teiras, isto é, m

a = e ++ e ,

+
b = e + e ,

n

onde m e n são inteiros positivos.


O segmento e é chamado medida comum de a e b .
Uma maneira prática de encontrar a medida comum e de dois segmentos comen-
suráveis dados a e b é dada na proposição 3 do livro X dos Elementos de Euclides.
Trata-se, simplesmente, do algoritmo da divisão. Descrevemos, abaixo, o modo como
Euclides exibe o algoritmo:
1. Se a e b são segmentos congruentes, nada há a fazer. Suponhamos, pois, que
um dos segmentos é menor do que o outro, digamos a < b .
2. Retiremos de b o maior número possível n0 de segmentos congruentes a a ,
obtendo a1 , tal que
b = n0 a + a1 e 0 £ a1 < a.
Se a1 = 0 , então e = a e algoritmo termina.
3. Caso 0 < a1 < a , repitamos o procedimento anterior, para obtermos um seg-
mento a2 tal que
a = n1a1 + a2 e 0 £ a2 < a1 .
Se a2 = 0 , então e = a1 .
4. Repita os passos acima até que ai = 0 , para algum i ³ 1 . Quando isso ocorre,
a medida comum de a e b é e = ai-1 .

Análise Real 9

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A partir do algoritmo acima, podemos expressar a / b em função da sequência
n0 ,, ni :
a a 1 1 1
= = = =
b n0 a + a1 n + a1 n + 1 n0 +
1
0
a0
0
a 1
n1 + 2 n1 +  +
a1 1
ni-1 +
ni

A A combinação de frações
1
1 [0; n0 , n1 ,, ni ] =
1
n0 +
1
T n1 +  +
1
1 ni-1 +
ni
é chamada fração contínua.
Para os pitagóricos, o algoritmo descrito acima sempre terminava em um número
finito de passos. Assim, dados dois segmentos de reta, existiria sempre uma medida
comum e todos os segmentos de reta seriam comensuráveis. Isto também significa
que, para os pitagóricos, uma fração contínua sempre seria finita. Hipaso, no entan-
to, conseguiu produzir uma fração contínua infinita, gerada a partir de dois segmen-
tos de reta incomensuráveis.
A insígnia da escola pitagórica era o pentagrama �������������������������������
, que é a figura obtida traçan-
do-se as diagonais de um pentágono regular.

VOCÊ SABIA?

A figura do pentagrama foi largamente


difundida entre astrólogos e esotéricos
e, até a idade média, acreditava-se que
ela retinha grande poder místico. De
acordo com a lenda popular alemã,
Fausto exorcizou Mefistófeles usando
um pentagrama.
Figura 2 - Pentagrama
Dada a importância do pentagrama para a escola pitagórica, supõe-se que Hipaso
tenha descoberto a existência de segmentos incomensuráveis estudando esta figura.
Não há, porém, documentação que comprove isto. A seguir, mostraremos que o la-
do a e a diagonal d de um pentágono regular são segmentos incomensuráveis. De
d
fato, mostraremos que a razão j = , conhecida como razão áurea, ou número de
a
ouro, não é um número racional.

10 Licenciatura em Matemática

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VOCÊ SABIA?

O Número de Ouro é um número


irracional misterioso e enigmático
que nos surge numa infinidade de
elementos da natureza na forma de A
uma razão, sendo considerado por
muitos como uma oferta de Deus ao
1
mundo. T
Fonte: http://www.educ.fc.ul.pt/icm/ 1
icm99/icm17/ouro.htm
Figura 3 - Pentágono regular

Observando a Figura 3, vemos que a = AE e d = AD . O triângulo AEH é isós-


celes, com a = AE = AH . Os triângulos DEH e ADE são semelhantes, logo

AD AE
= .
DE DH

Como DH = AD - AH = AD - AE = d - a , a igualdade acima toma a forma



d a
= .
a d -a
Podemos, então, escrever

d a d 1 1 1 1
= =1 + =1 + =1 + =1 + =1 + .
a d -a d -a a d -a a -d 1
1- 1- 1+ 1+
d a a a
a-d
Este procedimento pode ser repetido, o que equivale a considerar um penta-
grama menor semelhante ao original (veja a Figura 3). Mais ainda, este procedimento
pode ser repetido indefinidamente. Assim, obtemos:

d 1
j= =1 + = [1;1,1,1,]
a 1
1+
1+

o que significa que o algoritmo de Euclides não termina em um número finito de


etapas.
Baseado em fatos deste tipo, Hipaso concluiu que existem segmentos de reta in-
comensuráveis, isto é, que não admitem uma medida comum. No exemplo descrito

Análise Real 11

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acima, a diagonal d e o lado a do pentágono regular são incomensuráveis.
As frações
1 1 3 1 5 1 8
1,1 + = 2,1 + = ,1 + = ,1 + =
1 1+1 2 1 3 1 5
1+ 1+
1+1 1
1+
1+1
são aproximações de j . Em geral, a sequência de frações contínuas finitas do
A tipo
1 1+
1
1
1+
T 1 ++
1
1 1+1
tem o seguinte aspecto:

3 5 8 13 F
1,2, , , , ,, n ,
2 3 5 8 Fn+1

onde F1 =1, F2 =1 e Fn+1 = Fn + Fn-1 , para todo n ³ 2 . A sequência F1 , F2 ,, Fn ,,


é chamada sequência de Fibonacci, em homenagem a Leonardo de Pisa, ou Leo-
nardo Fibonacci, pioneiro no seu estudo.
Mais adiante, discutiremos o comportamento desta
sequência quando n cresce. Veremos, em particular que
SAIBA MAIS
1+ 5
j= .
O matemático Leonardo Pisa, 2
conhecido como Fibonacci, propôs,
no século XIII, a sequência numérica 1.2 A teoria das proporções de Eudoxo
abaixo: (1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, No livro X dos Elementos de Euclides, há uma demons-
89, …)
tração de que a diagonal e o lado de um quadrado são seg-
Fonte: http://www.infoescola.com/ mentos incomensuráveis. A ideia, assim como no caso do
matematica/sequencia-de-fibonacci/
pentagrama de Hipaso, é mostrar que o algoritmo usado
para encontrar a medida comum dos dois segmentos não termina após um número
finito de passos.
Se a é a medida do lado de um quadrado e d é a medida de sua diagonal, o
d
Teorema de Pitágoras nos diz que a 2 + a 2 = d 2 , logo = 2 . Assim, afirmar que a
a
diagonal e o lado de um quadrado são incomensuráveis é equivalente a afirmar que
2 é irracional.
Não repetiremos aqui a demonstração clássica de Euclides. Em vez disso, da-
remos uma demonstração geométrica, no espírito da Matemática grega.
Consideremos, por uma questão de simplicidade e porque não há perda de

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generalidade, um quadrado de lado 1 e com diagonal d . Supor que 1 e d são co-
mensuráveis é equivalente a supor que existe uma medida comum e tal que d = ae
a
e 1= be , ou seja, d = , com a e b inteiros positivos.
b

A
1
T
1
Figura 4 – Quadrados semelhantes

Vamos, pois, supor que a diagonal do quadrado de lado 1 é um número racional


a / b . Podemos considerar um novo quadrado semelhante ao quadrado de lado 1,
de modo que a razão de semelhança seja b . Assim, o novo quadrado tem lado b e
diagonal a , como indicado na figura acima.
A seguir, indicaremos como construir um triângulo CEF , com lados intei-
ros, semelhante ao triângulo ABC (veja a Figura 5).

Figura 5 – Triângulos ABC e DEF com lados inteiros

Inicialmente, tracemos um arco de circunferência, com centro no ponto A e raio


AB = b . Seja E o ponto onde esse arco corta a diagonal AC do quadrado. Temos:
EC = AC - AE = a - b . Pelo ponto E , tracemos uma perpendicular à diagonal AC
, que corta o lado BC no ponto F . Como FE e FB são tangentes a uma mesma cir-
cunferência, temos FE = FB . Por outro lado, o triângulo CEF é retângulo e um de
seus ângulos internos mede 45 , logo é um triângulo isósceles, com FE = EC = a - b
. Assim, FB = FE = a - b e CF = BC - FB = b - (a - b) = 2b - a .

Análise Real 13

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Portanto, o triângulo CEF é semelhante ao triângulo ABC e possui os lados in-
teiros. Agora vamos ao passo crucial: podemos repetir este procedimento para o
triângulo CEF , de modo a obtermos um outro triângulo ainda menor, semelhante a
CEF , e com os três lados inteiros. Como este procedimento pode ser repetido indefi-
nidamente, podemos obter triângulos arbitrariamente pequenos com lados inteiros.
Em particular, existe um triângulo semelhante a ABC , com lados inteiros e contido
A em um círculo de diâmetro 1. Isso é impossível, pois os lados do triângulo, sendo
1 inteiros, devem ser necessariamente maiores ou iguais a 1, mas estando o triângulo
contido em um círculo de diâmetro 1, pelo menos um dos seus lados deve ser menor
T
1 do que o diâmetro, ou seja, menor do que 1. Evidentemente, isto é um absurdo, pois
não existem número inteiros positivos menores do que 1. A contradição veio de su-
pormos que a diagonal do quadrado de lado 1 é um número racional. Logo, 2 não
pode ser racional.
Cerca de dois séculos depois da descoberta de Hipaso, outro sábio grego, Eudoxo
de Knidos (408 a.C. - 355 a.C.), elaborou a teoria geométrica das proporções, ferra-
menta capaz de lidar com quantidades incomensuráveis. A seguir, descreveremos
brevemente as ideias centrais da teoria de Eudoxo e o modo como podem ser encon-
tradas no livro V dos Elementos de Euclides.
Para Eudoxo, magnitudes de um mesmo tipo podem ser somadas. Assim, pode-
mos somar os comprimentos de dois segmentos para obtermos o comprimento de
um terceiro segmento. Da mesma forma, a soma de áreas de figuras planas é igual
à área de alguma figura plana. Eudoxo assume implicitamente que esta soma de
magnitudes é associativa e comutativa. Magnitudes de um mesmo tipo podem ser
comparadas: dadas duas magnitudes a e b de um mesmo tipo (dois comprimentos,
por exemplo), temos a < b , a = b ou b < a . O produto de uma magnitude por um
número natural tem sentido: na = a +  + a ( n vezes). Vale, ainda, a seguinte pro-
priedade fundamental, conhecida como:

Princípio de Arquimedes: dadas duas magnitudes a e b ,


existe n natural tal que na > b .

No tópico seguinte, veremos como estas ideias podem ser formalizadas. Em lingua-
gem moderna, podemos dizer que Eudoxo considerava o conjunto das magnitudes
como um corpo ordenado arquimediano.
O objeto central da teoria de Eudoxo são as razões entre magnitudes de um mes-
mo tipo, comensuráveis ou não. Para permitir que razões possam ser comparadas, a
seguinte definição é introduzida:

14 Licenciatura em Matemática

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ma < nb ⇔ mA < nB,
a A 
= é equivalente a ma = nb ⇔ mA = nB, (1)
b B ma > nb ⇔ mA > nB

Na definição (1) está implícito o fato de que os racionais são densos na reta real.
Demonstraremos este fato no Teorema 1 da página 16, ��������������������������
ainda
�������������������������
nesta aula. Por en-
quanto, é suficiente notarmos que a densidade de Q em R significa que, entre dois A
números reais distintos, há pelo menos um número racional.
a A
1
Em particular, se ¹ , podemos supor que uma das frações é menor do
b B T
a A
que a outra, digamos
< . Então, existe
n
, com m e n inteiros positivos
1
b B m
(lembremos que estamos lidando com magnitudes que são positivas) tal que

Figura 6 – Entre a/b e A/B existe um número racional n/m

a n n A
Sendo assim, < implica que ma < nb e < implica que nB < mA
b m m B

, o que contradiz uma das equivalências de (1). Reciprocamente, se valem as três


a A
equivalências de (1), então não pode existir um número racional entre e que,
b B

portanto, correspondem a um mesmo ponto sobre a reta, isto é, são iguais.


a
De um modo mais preciso, o que Eudoxo afirma é que duas razões e
A b
são iguais se e somente se, para quaisquer m, n inteiros positivos,
B

n a n A
< é equivalente a < .
m b m B

É notável que esta seja exatamente a ideia sobre a qual R. Dedekind, no século
XIX (logo, mais de 2200 anos depois de Eudoxo!), se baseou para definir número real
como um corte, ou seção.
Concluímos aqui nosso primeiro tópico, que tratou da origem histórica do estu-
do dos números irracionais. A descoberta dos números irracionais, compreendidos
pelos antigos gregos como magnitudes incomensuráveis, trouxe à tona a necessi-
dade de se trabalhar com um conjunto de números mais amplo do que o conjunto

Análise Real 15

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dos racionais, mesmo para lidar com questões simples de geometria plana, como a
semelhança de triângulos. Este conjunto mais amplo passou, bem mais tarde, a ser
chamado de conjunto dos números reais, mas a determinação precisa do conjunto
dos números reais só se deu no final do século XIX. Vale notar ainda que, desde sua
origem, os números irracionais estão associados a processos, ou algoritmos, que não
cessam após um número finito de passos, ou seja, processos de interação que conti-
A nuam indefinidamente.
1 Assim, a descoberta dos números irracionais trouxe pela primeira vez à cena ma-
temática a presença do infinito, tão abominado pelos antigos gregos. Das várias ten-
T tativas de se encontrar modos eficazes para lidar com estes processos infinitos, nas-
1 ceu e se desenvolveu o que chamamos hoje de Análise Matemática.

16 Licenciatura em Matemática

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02
TÓPICO

PROPRIEDADES DOS NÚMEROS REAIS

OBJETIVOS
··Reconhecer as propriedades que definem o
conjunto dos números reais;
··Realizar intuitivamente a noção de completude
e perceber a necessidade de se considerar esta
noção.

N o Tópico 1 desta aula, vimos que os números racionais não são su-
ficientes para descrevermos todas as grandezas geométricas. Assim,
torna-se necessário o estudo de um conjunto numérico mais amplo,
mas que tenha ainda certas propriedades básicas.
Neste tópico, colocaremos de modo preciso que propriedades são essenciais para
a definição de número real. De um modo geral, os reais devem possuir uma estru-
tura algébrica (de corpo), uma estrutura combinatória (de conjunto totalmente or-
denado) e uma estrutura topológica (de conjunto completo), e estas três estruturas
devem ser compatíveis. Apresentaremos, então, a estrutura algébrica e a estrutura
combinatória dos reais, e assim veremos que os reais formam um corpo ordenado ar-
quimediano. Na Aula 2, estudaremos os aspectos topológicos do conjunto dos reais,
isto é, sua completude.

18 Licenciatura em Matemática

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2.1 OS NÚMEROS REAIS FORMAM UM CORPO
Ao estudar geometria, vemos que dois segmentos AB e CD podem ser somados
e que o resultado desta soma é um novo segmento. Fazemos isso da seguinte manei-
ra: consideramos, na semirreta AB , o único ponto X tal que B está entre A e X e
BX é congruente a CD . Chamamos o segmento AX de soma dos segmentos AB e
CD e denotamos AX = AB + CD .
Nos quatro primeiros livros dos Elementos, Euclides não faz menção alguma a A
medidas de segmentos. Ao contrário, ele desenvolve uma aritmética de segmentos 1
nos moldes da definição de soma, dada acima, obtendo assim uma teoria puramente
geométrica.
T
Entretanto, para lidar com a noção de semelhança, Euclides precisou associar a
2
cada objeto geométrico uma magnitude, que nada mais é do que sua medida. Assim,
a magnitude é um número associado a um objeto geométrico.
A um segmento de reta podemos associar um número que representa seu com-
primento; a uma figura plana como um círculo ou um quadrado, podemos associar
um número que representa sua área; a um ângulo associamos um número que re-
presenta sua medida (em graus ou em radianos); a uma figura no espaço, como um
cubo ou uma pirâmide, associamos um número que representa seu volume. Uma vez
que segmentos de reta podem ser somados, os números que indicam suas magnitu-
des devem admitir também uma operação de soma. Além disso, a área de um retân-
gulo é dada como o produto das medidas de dois de seus lados. Como a área de um
retângulo também é um número, precisamos definir sobre os números que indicam
magnitudes um produto.
Números racionais podem ser somados e multiplicados, mas, como já vimos no
tópico anterior, os números racionais são insuficientes para exprimir todas as pos-
síveis magnitudes. Dessa forma, as magnitudes devem ser elementos de um conjun-
to R que contenha os racionais e seja munido de duas operações, uma soma e um
produto. Devemos, ainda, exigir que as operações definidas sobre este conjunto nu-
mérico R tenham as mesmas propriedades das respectivas operações no conjunto
Q dos números racionais, ou seja, devemos exigir que R seja um corpo. Já encon-
tramos a noção de corpo nos cursos de Álgebra Linear e
de Estruturas Algébricas, mas vamos repetir a definição
de corpo aqui, por uma questão metodológica.
ATENÇÃO!
Definição de corpo
Um conjunto K , munido de duas operações binárias Revise o conteúdo de corpo no
+ : K ´ K ® K , chamada soma, e × : K ´ K ® K , chma- material da disciplina Estruturas
Algébricas
da produto, é denominado corpo, se são válidas as se-

Análise Real 19

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guintes condições:
1. A soma é associativa: a + (b + c ) = (a + b) + c , para quaisquer a, b, c Î K .
2. Existe um elemento neutro para a soma: existe e Î K tal que a + e = e + a = a ,
para todo a Î K . É possível demonstrar que este elemento neutro é único e o
denotamos por 0 .
3. Todo elemento de K possui inverso aditivo: dado a Î K , existe b Î K tal que
a + b = b + a = e . É possível demonstrar que, para cada a Î K , este inverso
A aditivo é único e o denotamos por -a .
1
4. A soma é comutativa: a + b = b + a , para quaisquer a, b Î K .
T 5. O produto é associativo: a(bc ) = (ab)c , para quaisquer a, b, c Î K .
2
6. Existe um elemento neutro para o produto: existe u Î K tal que au = ua = a ,
para todo a Î K . É possível demonstrar que este elemento neutro é único e o
denotamos por 1.
7. Todo elemento não-nulo possui inverso multiplicativo: dado a ¹ 0 , onde
0 Î K é a notação do elemento neutro estabelecida no item 2 acima; existe
b Î K tal que ab = ba =1 , onde 1 Î K é o elemento neutro do produto, como
no item 6 acima.
8. O produto é comutativo: dados a, b Î K , ab = ba .
9. Soma e produto satisfazem a distributividade: dados a, b, c Î K , temos
a(b + c ) = ab + ac .

Podemos falar, então, no corpo dos números reais, que denotaremos provisori-
amente por R .Assim, por exemplo, a medida do segmento AC na Figura 7 1 + 2
, em que esta soma corresponde à soma do segmento AB , cuja medida é 1, com o
segmento BC , cuja medida é 2 . Da mesma forma, o perímetro de um triângulo
retângulo isósceles de cateto igual a 1 pode ser calculado operando-se normalmente
com as medidas dos catetos e da hipotenusa, que são números reais.

Figura 7 - Segmento AC

O conjunto dos números que representam magnitudes de objetos geométricos


deve ser um corpo, como vimos acima, pois é conveniente que as propriedades ope-
ratórias que valem para os racionais e, consequentemente, para os segmentos cujas

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magnitudes são números racionais, sejam válidas para todos os segmentos, quer te-
nham magnitudes racionais ou não.

2.2 O CORPO R DOS REAIS É ORDENADO E ARQUIMEDIANO


Tão importante quanto somar ou multiplicar segmentos é comparar segmentos,
isto é, dizer, para dois segmentos dados, qual é o maior. Da mesma forma, é essen-
cial, em geometria, comparar ângulos, áreas e volumes. Isto implica automatica- A
mente que o corpo R , com as propriedades acima, deve ainda ser ordenado, o que 1
significa que, além de possuir duas operações + e × que o fazem ter estrutura de
corpo, sobre R também é preciso definir uma maneira de comparar seus elementos.
T
2
Fazemos isso do seguinte modo:
Chamamos de relação de ordem £ sobre R a uma relação que satisfaz, neces-
sariamente, as seguintes condições:
1. Reflexividade: dado a Î R , a £ a .
2. Antissimetria: se a, b Î R são tais que a £ b e b £ a , então a = b .
3. Transitividade: se a, b, c Î R são tais que a £ b e b £ c , então a £ c .
As relações acima podem ser interpretadas geometricamente, observando-se a, b
e c como medidas de segmentos, por exemplo.Dadas duas magnitudes, devemos
sempre poder decidir qual é a maior, ou se as duas são iguais. Assim, a relação de
ordem £ sobre R deve ser total, isto é, deve satisfazer a condição:
1. Ordem total: se a, b Î R , então a £ b ou b £ a .
Finalmente, a relação de ordem deve ser compatível com as operações no seguin-
te sentido:
1. Dados a, b, c Î R , se a £ b , então .
2. Dados a, b Î R , se 0 £ a e 0 £ b , então .
Outro princípio geométrico natural é o Princípio de
Arquimedes, sobre o qual já falamos na página 7 , quan-
do da exposição sobre a Teoria de Eudoxo sobre as pro- ATENÇÃO!
porções.
Usamos as notações usuais: a ³ b
1. Princípio de Arquimedes: dados a, b Î R , significa que b £ a , a < b significa
a > 0 , existe n natural tal que na > b . que a £ b e a ¹ b , a > b significa
que a ³ b e a ¹ b .
Podemos pensar no Princípio de Arquimedes do se-
guinte modo: seja b a distância do nosso planeta a es-
trela mais distante que se conhece e seja a o diâmetro
de um átomo de hidrogênio. Evidentemente, b é muito
grande e a é muito pequeno, mas é possível, pelo menos
teoricamente, enfileirar uma quantidade n de átomos de

Análise Real 21

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hidrogênio, mesmo que uma quantidade enorme, de modo a obter uma distância na
maior do que b . Isto é uma propriedade que se espera que nosso universo tenha, ou
seja, espera-se que não existam objetos infinitamente distantes. O Princípio de Ar-
quimedes capta esta propriedade do espaço geométrico.
Um subconjunto X Ì R é dito denso em R se, dados a, b Î R , com a < b , exis-
te x Î X tal que a < x < b . Usando o Princípio de Arquimedes, podemos demons-
A trar que o conjunto Q dos números racionais é denso em R .
1
Teorema 1 O conjunto Q dos racionais é denso em R .
T
2
Demonstração: Sejam x, y Î R , com x < y . Como a := y - x > 0 , pelo Princí-
1
pio de Arquimedes, existe um número natural n tal que na >1 . Logo, < a = y - x
n
. A ideia aqui é colocar, lado a lado, uma quantidade inteira de segmentos de medida
1
, de modo que o segmento resultante tenha medida maior do que x e menor do
n
que y , como indicado na Figura 8:

Figura 8 – m cópias justapostas de um segmento de medida 1/n

Novamente o Princípio de Arquimedes nos garante que existe um número na-


1
tural k tal que k × > x . Como todo subconjunto não-vazio de números naturais
n
possui um menor elemento (Princípio da Boa Ordem), existe um número natural
1 1 m
m tal que x < m × e (m - 1) × < x . Afirmamos que < y . De fato, se ocorresse
n n n
m 1 m -1 1 1
y £ , então y - < . Mas < y - x implica que x - y < - . Logo tería-
n n n n n
1 m -1
mos x = y + (x - y ) < y - < , contrariando a escolha de m . Isto posto, ve-
n n
m
mos que x < < y , o que mostra que Q é denso em R .
n
A relação de ordem em R nos permite definir a noção de intervalo. De fato,
dados a, b Î R , se a < b , chamamos de intervalos com extremo inferior em a e ex-
tremo superior em b , os seguintes conjuntos:
(a, b) ={x Î R|a < x < b},

22 Licenciatura em Matemática

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[a, b ] ={x Î R|a £ x £ b},

(a, b ] ={x Î R|a < x £ b},

[a, b) ={x Î R|a £ x < b}.

Há também notações especiais para os chamados intervalos infinitos: A


1
(a, +¥) ={x Î R|x > a},
T
(-¥, b) ={x Î R|x < b}, 2
[a, +¥) ={x Î R|x ³ a},

(-¥, b ] ={x Î R|x £ b},

Também faz sentido falarmos em conjunto limitado: um subconjunto X Ì R


não-vazio é dito limitado se existe M Î R , M > 0 , tal que X Ì (-M , M ) , ou seja,
todo elemento x Î X satisfaz -M < x < M .
A ordem total em R nos fornece, ainda, uma representação linear do corpo dos
números reais. Mais precisamente, dada uma reta r , podemos escolher um ponto
O Î r e identificá-lo com o elemento neutro 0 de R . Este ponto é chamado ori-
gem. Escolhemos um segundo ponto U , à direita de O , e associamos a este ponto o
número 1. O segmento OU é tomado, então, como unidade de medida e tem, auto-
maticamente, medida igual a 1.
Os outros números reais são identificados com pontos da reta da seguinte manei-
ra: dado a Î R , a > 0 , escolhemos A Î r tal que o segmento OA tenha medida a e
A esteja à direita de O . No caso em que a < 0 , o ponto A é escolhido à esquerda
de O e o segmento OA tem medida igual a -a .

Figura 9 – Correspondência entre o número a e o ponto A sobre a reta


Dado um número inteiro positivo n , é tarefa fácil encontrar o ponto da reta que
lhe é correspondente: basta posicionar n cópias de OU justapostas à direita, de mo-
do a obter um segmento ON que tem medida igual à soma 1 +  + 1 com n parce-

Análise Real 23

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las. Logo, o ponto N corresponde ao número n . O número -n é representado de
modo similar, tomando as cópias justapostas do segmento OU à esquerda.
m
Para obtermos a representação de um número racional , devemos, primeiro,
n
dividir o segmento OU em n partes iguais. Cada parte é um segmento de medida
1
. Escolhemos o único destes segmentos que contém o ponto O , digamos OX . Ao
n
A tomarmos m cópias justapostas de OX , obtemos um segmento OY que tem medi-
1 1 1 m
da igual a +  + com m parcelas. Assim, a medida do segmento OY é eo
n n n
T ponto Y corresponde, portanto, ao número racional
m
.
2 n
A observação de Hipaso nos leva à conclusão de que existem segmentos de reta
cuja medida é incomensurável com OU . Mais especificamente, é possível encontrar
um ponto P da reta que não corresponda a número racional algum.

Figura 10 – O ponto P corresponde ao número irracional √2

Observando a Figura 10, onde OUAB é um quadrado construído sobre o seg-


mento OU , AP é um arco do círculo centrado em O e de raio OA igual à diagonal
do quadrado. Como sabemos que a diagonal do quadrado e seu lado são incomensu-
ráveis e OP tem a mesma medida de OA , pois ambos são raios, concluímos que o
ponto P não corresponde a número racional algum.
Dessa forma, o corpo ordenado dos racionais não é suficentemente grande para
descrever todos os pontos de uma reta. Em outras palavras, embora todo número ra-
cional corresponda a um ponto sobre a reta, existe pelo menos um ponto da reta que
não corresponde a um número racional. Surge, então o seguinte questionamento:
Existe um corpo ordenado cujos elementos estejam em correspondência bijetiva
com os pontos de uma reta?
Na próxima aula, veremos como colocar de modo preciso a questão geométrica aci-
ma e definiremos o corpo ordenado R dos números reais como aquele que satisfaz esta
condição, isto é, seus elementos correspondem bijetivamente aos pontos de uma reta.

24 Licenciatura em Matemática

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Concluímos aqui nossa primeira aula, que teve um caráter intuitivo e geométrico.
Exibimos aqui as origens geométricas que motivaram o estudo dos números reais. O
ponto principal é que os números racionais são insuficientes para o estudo da geo-
metria, mesmo em seu viés mais elementar. Assim, é necessário lançar mão de um
conjunto de números mais amplo, que deve ter as mesmas propriedades operatórias
de Q , ou seja, deve ser um corpo, que deve, assim como Q , ser totalmente ordena-
do, e cuja ordem deve ser arquimediana. Além disso, o corpo ordenado arquimedia- A
no de que precisamos, deve estar em correspondência bijetiva com os pontos de uma 1
reta. Esta última condição, que denominamos completude, será estudada na Aula 2.
T
2

ATIVIDADES DE APROFUDAMENTO

1. Considere o plano cartesiano Q ´ Q , ou seja, o conjunto de pontos do plano que têm coordenadas
racionais. Sejam O a origem (0,0) e A o ponto de coordenadas (0,1) . Existe algum triângulo equilátero
em Q ´ Q , tendo OA como um dos lados? Por quê?
2. Seja ABC um triângulo isósceles retângulo em A e AD a altura relativa à hipotenusa, como
mostrado na figura abaixo.
Verifique que os triângulos ABC e ABD são semelhantes e que os segmentos AB e BD não
incomensuráveis. Discuta como este exemplo justifica a necessidade de se assumir a existência de
números não racionais para se trabalhar com semelhança de triângulos.
3. Determine a expansão dos seguintes números racionais como frações contínuas:
17
(a)
7
13
(b)
31
55
(c)
34
158
(d)
49
4. Demonstração de Euclides da irracionalidade de 2.
a
(a) Para obter uma contradição, suponha que 2 seja racional, isto é, 2=
. Verifique que
b
é possível supor que a e b sejam primos entre si, isto é, o máximo divisor comum de a e b é 1.
a
(b) Mostre que a igualdade 2 = implica a 2 = 2b2 .
b
(c) Mostre que a 2 = 2b2 implica que a é par.
(d) Mostre que a par implica b par.
(e) Conclua que o mdc de a e b é maior ou igual a 2 , o que é uma contradição (por quê?).

Análise Real 25

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Considere o número 2 . Podemos escrever
1 1 1
2 =1 + 2 - 1=1 + =1 + =1 + .
1+ 2 2 + 2 -1 1
2+
1+ 2

A (a) Verifique que o procedimento acima pode ser repetido indefinidamente e conclua que 2 admite
uma representação como fração contínua infinita [1;2,2,2] .
1
(b) Use o item (a) acima para mostrar que 2 é irracional. (Sugestão: repita o argumento usado no texto
T para demonstrar que a razão áurea j é irracional).
2 (c) Encontre a expansão de 5 como fração contínua infinita. (Sugestão: comece escrevendo
5 = 2 + 5 - 2 e repita o procedimento usado para 2 ).

Teorema de Tales.

O Teorema de Tales afirma que, se duas retas transversais cortam um feixe de retas paralelas, as magnitudes
dos segmentos delimitados pelas transversais são proporcionais. Com a notação da figura anterior, temos:

AB A¢B ¢
= .
BC B ¢C ¢
A proposta deste exercício é apresentar uma demonstração do Teorema de Tales que englobe os casos
em que os segmentos são incomensuráveis.
(a) Suponha, primeiramente, que AB e BC são comensuráveis. Seja e a medida comum destes
dois segmentos, ou seja, AB = m × e e BC = n × e , onde m e n são números naturais. Trace
m + n retas paralelas a AA¢ , dividindo o segmento AC em m + n segmentos congruentes
de medida e . Mostre que estas retas paralelas dividem o segmento A¢B ¢ em m partes e o
segmento B ¢C ¢ em n partes, todas com medida e . Conclua que o teorema é válido neste caso.
(b)Procure adaptar o argumento acima para o caso em que os segmentos AB e BC são
incomensuráveis.

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Aula 2
Números reais - parte 2

Na aula 1, fornecemos justificativas geométricas para a necessidade de se considerar


um conjunto numérico mais amplo do que o conjunto dos racionais. Vimos ainda
que este conjunto numérico mais amplo deve ser um corpo ordenado arquimedia-
no. Há ainda, no entanto, uma questão importante por responder: que propriedade
adicional um tal corpo ordenado arquimediano deve ter para que haja uma corres-
pondência bijetiva entre seus elementos e os pontos de uma reta? Para responder
esta pergunta, precisamos de uma ferramenta que nos permita calcular distâncias
entre os elementos de um corpo ordenado arquimediano.

No tópico 1 desta aula, veremos que esta ferramenta é o valor absoluto. No tópico
2 desta aula, veremos que um corpo ordenado arquimediano tem seus elementos
correspondendo bijetivamente aos pontos de uma reta se, e somente se, satisfaz a
propriedade “dos intervalos encaixantes”. Finalmente, no tópico 3, estabeleceremos
a noção de conjunto enumerável e veremos que os reais formam um conjunto não-
-enumerável.

Objetivos:
• Utilizar a noção de valor absoluto como ferramenta para determinar distâncias sobre a reta;
• Compreender os rudimentos da topologia na reta: abertos, fechados, pontos de acumulação e
fechos;
• Assimilar a necessidade da introdução da noção de completude, para garantir a correspondência
bijetiva entre números reais e pontos sobre a reta orientada;
• Compreender a noção de enumerabilidade e justificar a não-enumerabilidade do conjunto dos
números reais.

27

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01
TÓPICO

VALOR ABSOLUTO
OBJETIVOS
··Identificar a noção de valor absoluto e suas
propriedades mais relevantes ;
··Perceber a possibilidade de existirem vários
valores absolutos definidos em um corpo
ordenado;
··Desenvolver a noção de espaço métrico a partir
da noção de valor absoluto sobre os reais.

N a aula 1, vimos que o conjunto dos números reais possui uma estrutura al-
gébrica (de corpo) e uma estrutura combinatória (de conjunto totalmente
ordenado e arquimediano). O valor absoluto de um número é a maneira
pela qual se pode calcular distâncias entre números reais. Uma vez definido o valor
absoluto sobre um corpo ordenado, podemos introduzir uma estrutura adicional neste
corpo: a de espaço métrico. Neste tópico, estudaremos as principais propriedades do
valor absoluto e algumas das propriedades dos reais como espaço métrico.
Consideremos um corpo ordenado arquimediano K , por exemplo, o corpo 
dos números racionais. Usamos a notação K + para indicar o conjunto dos elementos
não-negativos de K , ou seja,
K + ={a Î K |a ³ 0}.
Dado um elemento a Î K , um valor absoluto, ou módulo de a , é uma função

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f : K ® K + que satisfaz as seguintes condições:
1. Dado a Î K , f(a ) = 0 se, e somente se, a = 0 .
2. Dados a, b Î K , f(ab) = f(a )f(b) .
.
3. f(a + b) £ f(a ) + f(b)

O exemplo mais importante de valor absoluto é dado pela função f : K ® K + da-


A
da por f(a ) =|a |, onde, para cada a Î K ,
2
ìï a se a ³ 0 T
|a |= ïí
ï-
ïî a se a < 0
1
Vamos verificar que, de fato, a função f(a ) =|a | satisfaz as condições 1,2 e 3 aci-
ma e, portanto, é um valor absoluto.
Primeiramente, |a |³ 0 para todo a Î K e |a |= 0 implica a = 0 ou -a = 0 , isto
é, |a |= 0 implica a = 0 .
Para verificarmos a validade da condição 2, consideremos a, b Î K . Temos alguns
casos a considerar:
primeiro, se a ³ 0 e b ³ 0 , temos |a |= a e |b|= b e ab ³ 0 , logo
|ab|= ab =|a ||b|.
no caso em que a ³ 0 e b < 0 , temos |a |= a , |b|= -b e ab £ 0 , logo
|ab|= -ab = a(-b) =|a ||b|. O caso em que a < 0 e b ³ 0 é similar.
no caso em que a < 0 e b < 0 , temos |a |= -a , |b|= -b e ab > 0 , logo
|ab|= ab = (-a )(-b) =|a ||b|.
Finalmente, para verificarmos a validade de 3, devemos também considerar al-
guns casos:
primeiro, se a ³ 0 e b ³ 0 , então a + b ³ 0 e |a + b|= a + b =|a |+|b| . Note
que, neste caso, vale a igualdade.
Se a ³ 0 e b < 0 , então |a |= a e |b|= -b . Observe que, neste caso, b <|b|. Pode-
mos ter duas situações: a+b³0 ou a+b<0. Se a+b³0, então
|a + b|= a + b < a+|b|£|a |+|b|. Se a+b<0, então
|a + b|= -(a + b) = -a - b £|a |-b =|a |+|b|. O caso em que a < 0 e b ³ 0 é similar.
Enfim, se a < 0 e b < 0 , temos |a |= -a , |b|= -b e a + b < 0 , logo
|a + b|= -(a + b) = -a - b =|a |+|b|. Observe que, neste caso, também vale a
igualdade.
Vale ressaltar que outros valores absolutos podem ser definidos sobre corpos or-
denados arquimedianos . Podemos, por exemplo, definir sobre o corpo dos números
racionais um valor absoluto para cada número inteiro primo p , chamado valor ab-

Análise Real 29

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a
soluto p -ádico . De fato, fixado um inteiro primo p , seja r = um número racio-
b
nal, onde podemos supor que a fração é irredutível, ou seja, a e b são primos entre
si. Pelo Teorema Fundamental da Aritmética, existe um único número inteiro n tal
c
que r = pn × , com c e d inteiros não divisíveis por p . A função ||p :® + , da-
d
da por |r |p = p-n , satisfaz as condições 1,2 e 3 da definição de valor absoluto.
A Dizemos que |r |p é o valor absoluto p -ádico de r . Este valor absoluto tem papel
2 central na resolução de equa- ções diofantinas de grau 2,
em Teoria dos Números.
T Convém ressaltar que nosso interesse é o estudo do valor absoluto usual. Por isso,
1
não teceremos mais comentários sobre os valores absolutos
p -ádicos. O leitor interessado pode encontrar mais infor-
mações nos exercícios de aprofundamento.
SAIBA MAIS!
Continuamos a denotar por K um corpo ordenado ar-
Acesse o site www.ime.usp.br/~niski/ quimediano (podemos pensar momentaneamente em K
monitoria/corpoarq.pdf e obtenha mais
como sendo o corpo dos números racionais). Se
informações sobre as propriedades
arquimedianas a, b Î K , o que significa o valor absoluto da diferença
|a - b|? O exemplo a seguir é elucidativo nesse sentido.
Exemplo: Vamos resolver a equação
|x - 1|+|x - 3|= 2 em  . A princípio, por se tratar de
uma equação, pode parecer
VOCÊ SABIA?
estranho afirmar que o seu conjunto solução é o interva-
Em 1897, o método de Weierstrass de lo [1,3] ={x Î |1 £ x £ 3} . De fato, se x Î [1,3] , então
desenvolvimento de séries para funções
1 £ x £ 3 , logo x - 1 ³ 0 e
algébricas o conduziu à invenção
dos números p-adic. Hensel estava x - 3 £ 0 . Logo, |x - 1|= x - 1 e |x - 3|= 3 - x , donde
interessado no primo exato que divide o |x - 1|+|x - 3|= x - 1 + 3 - x = 2 . Assim, todo elemento
discriminante de um campo de número
do intervalo é solução da equação. Por outro lado, se x <1
algébrico. Os números p-adic podem
ser considerados como uma conclusão ou x > 3 , é possível determinar, de modo análogo ao que
dos números racionais, de um modo fizemos acima, que x não pode ser solução da equação (ve-
diferente da conclusão habitual que ja a questão 1 da tarefa).
conduz aos números reais.
Apresentaremos, agora, outra solução desse problema,
Fonte: http://www.somatematica.com.
que se baseia na interpretação geométrica da equação:
br/biograf/hensel.php
|x - 1| e |x - 3| podem ser vistos como as distâncias entre
x e os elementos 1 e 3 . Afirmar que |x - 1|+|x - 3|= 2 é
equivalente a afirmar que o ponto x está situado na reta de modo que sua distância ao
ponto correspondente a 1, somada à sua distância ao ponto correspondente a 3 , seja
constante e igual a 2 . Isso acontece exatamente para os números situ-

30 Licenciatura em Matemática

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ados no intervalo [1,3] , que correspondem aos pontos racionais situados no segmento
que liga os pontos correspondentes a 1 e 3 (veja a Figura 1).

A
Figura 1 – 2
Dessa forma, o valor absoluto |a - b| mede a distân-
T
cia entre a e b . Se assumirmos que os números reais estão
ATENÇÃO! 1
em correspondência com os pontos de uma reta, o número
|a - b| mede o comprimento do segmento cujas extremi- Nosso principal objetivo é obter
dades são os pontos da reta correspondentes a a e b . um corpo ordenado arquimediano
contendo o corpo dos racionais,
Vamos denotar por  o corpo dos números reais. Dado cujos elementos estejam em
um elemento a Î  , existe um único ponto da reta orien- correspondência com os pontos de
tada que corresponde a a . Por não haver risco de confu- uma reta. Este é exatamente o corpo
dos números reais. A partir deste
são, podemos denotar este ponto também por a . Seja
ponto, assumiremos que existe um
d > 0 um número real positivo, o conjunto dos pontos da corpo ordenado arquimediano cujos
reta que estão a uma distância menor do que d do ponto pontos estão em correspondência
bijetiva com os pontos de uma
a é representado pelo intervalo mostrado na Figura 2.
reta. No Tópico 2, exibiremos uma
condição suficiente para que exista
esta correspondência.

Figura 2
Podemos escrever o conjunto {x Î  |a - d < x < a + d} como um intervalo aber-
to (a - d , a + d ) , chamado intervalo aberto centrado em a . Outro modo de des-
crever este intervalo é
(a - d , a + d ) ={x Î  ||x - a |< d}
ou seja, (a - d , a + d ) é o conjunto dos números reais que estão a uma distância
menor do que d do número a .
O valor absolu- to usual que definimos sobre o conjunto  dos nú-

Análise Real 31

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meros reais nos permite calcular distâncias entre os elementos de  . Mais precisamente,
existe uma função d :  ´  ®  , dada por d (x, y ) =|x - y |, satisfazendo as seguin-
tes condições:
1. d (x, y ) ³ 0 , para quaisquer x, y Î  e d (x, y ) = 0 se, e somente se, x = y .
2. d (x, y ) = d ( y, x ) , para quaisquer x, y Î  .
3. d (x, y ) £ d (x, z ) + d (z, y ) , para quisquer x, y, z Î 
A Estas condições são consequências diretas das propriedades de valor absoluto
2 que vimos anteriormente (veja o exercício de aprofundamento 3). A função d , defi-
nida acima, é chamada métrica, e o par ( , d ) é chamado espaço métrico dos nú-
T meros reais. Em um espaço métrico, podemos definir as importantes noções de con-
1
junto aberto e de conjunto fechado.
Um subconjunto A Ì  é chamado aberto se, para cada a Î A , existe d > 0 tal
que (a - d , a + d ) Í A . Usando a noção de métrica dada acima, (a - d , a + d ) Í A é
equivalente a
d (x, a ) < d Þ x Î A.
Em outras palavras, todo elemento de  que está a uma distância menor do que
d do ponto a Î A , pertence necessariamente ao conjunto A .
Os conjuntos abertos de  satisfazem as seguintes condições:
1. Os subconjuntos Æ e  são abertos.
2. Se A e B são abertos, então A Ç B é aberto.
3. Se ( Ai )iÎI é uma família de abertos, então a união  i ÎI
Ai é um aberto.
A verificação destes fatos é uma tarefa de rotina e não será essencial para os obje-
tivos deste curso. Assim, não a faremos aqui (veja o exercício de aprofundamento 4).

Exemplos:
1. Todo intervalo aberto é um subconjunto aberto de  . De fato, se I = (a, b ) é
1
um intervalo aberto e a Î (a, b ) , então a < a < b . Se d = min {a - a, b - a}
, então a < a - d e a + d < b . Logo, (a - d , a + d ) Ì I , o 2que mostra que I é
um conjunto aberto.
2. Os intervalos (-¥, a ) e (a, +¥) são abertos. A verificação deste fato é simi-
lar à do exemplo anterior.
3. O conjunto  -  dos números reais não inteiros é aberto em  . De fato,
 -  =  nÎ(n, n + 1) é um união de intervalos abertos, logo, pelo exemplo 1
e pela condição (iii) acima,  -  é um aberto.
Um subconjunto F Í  é dito fechado se seu complementar  - F for um con-
junto aberto.

32 Licenciatura em Matemática

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Exemplos:
1. Todo intervalo fechado é um conjunto fechado em  . De fato, se J = [a, b ] ,
então  - J = (-¥, a ) È (b, +¥) , que é aberto, por ser um união de dois con-
juntos abertos.
2. Todo conjunto finito de números reais é um conjunto fechado em  . De fato,
se C ={a1 , a2 ,, an-1 , an } , então, supondo que a1 < a2 <  < an , temos
 - C = (-¥, a1 ) È (a1 , a2 ) È (a2 , a3 ) È  È (an-1 , an ) È (an , ¥)
A
é uma união de intervalos abertos, logo é um aberto.
2
3. O conjunto  dos números inteiros é fechado em  . De acordo com o exem-
plo 3 acima, o complementar  -  é aberto, logo,  é fechado. T
Dado um conjunto X Ì  , um elemento a Î  , não necessariamente um ele- 1
mento de X , é dito ponto de acumulação de X se, para cada d > 0 , existe x Î X
, x ¹ a , tal que |x - a |< d . Em outras palavras, se, para cada d > 0 ,
(a - d , a + d ) Ç X
contém algum ponto diferente de a . O conjunto dos pontos de acumulação de
um conjunto X é chamado conjunto derivado de X e denotado por X ¢ . A união
de um conjunto X com o conjunto X ¢ dos seus pontos de acumulação é chamado
fecho de X e é denotado por X , ou seja, X = X È X ¢ . O resultado abaixo caracteri-
za os conjuntos fechados.

Teorema 1 Um conjunto X Ì  é fechado se, e somente se, X = X .

Demonstração: Uma vez que X = X È X ¢ , a afirmação X = X é equivalente a


X¢ Ì X .
Vamos supor, de início, que X é fechado. Logo  - X é aberto. Dado a Î X ¢ ,
/ X . Então a Î  - X e, como
para obtermos uma contradição, vamos supor que a Î
este conjunto é aberto, existe d > 0 tal que (a - d , a + d ) Ì  - X . Por outro lado,
como a Î X ¢ , temos que a é um ponto de acumulação de X . Logo, existe
x0 Î X Ç (a - d , a + d ) . Mas, como (a - d , a + d ) Ì  - X , temos x0 Î X Ç (  - X ) = Æ
, o que é um absurdo. A contradição veio do fato de supormos que existe a Î X ¢ tal
/ X . Portanto X ¢ Ì X e X = X .
que a Î
Reciprocamente, suponhamos que X = X . Isso implica que X ¢ Ì X . Assim, dado
a Î  - X , seguramente temos a Î / X ¢ . Portanto existe d > 0 tal que
(a - d , a + d ) Ç X = Æ e isso é equivalente a afirmar que (a - d , a + d ) Ì  - X . Por-
tanto  - X é aberto e X é fechado. █
Com este resultado, encerramos o tópico 1. Cabe observar que as noções de con-
junto aberto e de conjunto fechado estudadas acima fazem parte de uma teoria mais

Análise Real 33

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geral, chamada topologia, que estuda os abertos e as funções que, de certo modo,
preservam abertos, chamadas funções contínuas, que estudaremos em uma aula pos-
terior. O espaço métrico dos números reais, ou, mais geometricamente, a reta real, é
uma espécie de protótipo de espaço onde se podem definir abertos e fechados. Um
ponto fundamental para estudarmos o conjunto dos reais como espaço métrico foi
assumir a identificação dos reais com os pontos de uma reta. Esta identificação será
A estabelecida de modo preciso no tópico 2 desta aula, que iniciaremos a seguir.
2
T
1

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02
TÓPICO

COMPLETUDE DE UM CORPO K

OBJETIVOS
··Compreender a noção de supremo e ínfimo de um
conjunto limitado e assimilar suas propriedades
básicas;
··Perceber que a completude de um corpo
ordenado é condição suficiente para que os
elementos de estejam em correspondência
bijetiva com os pontos de uma reta.

N este segundo tópico, veremos uma condição suficiente para que um cor-
po ordenado arquimediano K admita uma correspondência f : K ® t
bijetiva entre seus elementos e os pontos de uma reta t . Esta condição,
que chamamos completude, pode ser enunciada de diversas maneiras, dentre as
quais escolhemos, para o nosso texto, aquela que envolve a noção de supremo, que
será apresentada neste tópico. O principal resultado deste tópico é o Teorema 3, que
responde as perguntas levantadas na aula 1 e estabelece a representação geométrica
do corpo ordenado dos números reais.
Continuamos assumindo que existe um corpo  ordenado e arquimediano, cujos
elementos estão em correspondência bijetiva com os pontos de uma reta orientada.
Este corpo contém o corpo  dos números racionais e, pelo Teorema 1 da Aula 1,
 é denso em  . Isto significa que, para cada número real a e cada d > 0 , existe
um número racional r tal que |a - r |< d , ou seja,
r Î (a - d , a + d ) Ç 

36 Licenciatura em Matemática

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Dizemos que um subconjunto S Ì  é limitado superiormente quando existe
M Î  tal que s £ M , para todo s Î S . Dizemos que S é limitado inferiormente
se existe m Î  tal que m £ s , para todo s Î S . Os números M e m são chamados,
respectivamente, cota superior e cota inferior de S .

Exemplos:
1. O intervalo (0,1] é limitado superiormente e inferiormente. Os números
0,-1,-2 são cotas inferiores de (0,1]. Os números 1,2,3 são cotas superiores A
de (0,1]. 2
2. O conjunto  dos números naturais não admite cota superior, mas qualquer
número negativo é cota inferior de  .
T
2
3. O conjunto  dos inteiros não admite cota superior nem cota inferior.
4. O intervalo (-¥,0] não admite cota inferior, mas 1 é uma cota superior de
(-¥,0] .
5. O conjunto de números racionais S ={r Î |r 2 < 2} é limitado superiormen-
te e 2 é uma cota superior de S .
Consideremos um conjunto S Ì  limitado superiormente. O supremo S é a me-
nor entre todas as cotas superiores de S . O supremo de S é denotado por supS .
Como já foi observado no início deste tópico, o conjunto dos números reais, cuja
existência está sendo assumida a priori, tem em nossa discussão um caráter geomé-
trico, pelo menos provisoriamente. Mais precisamente, estamos assumindo a exis-
tência do corpo ordenado arquimediano  cujos elementos estão em correspondên-
cia com os pontos de uma reta. É natural, portanto, que interpretemos a noção de
supremo geometricamente.

Figura 3 -
Na Figura 3, cada um dos pontos marcados à direita do conjunto S é uma cota
superior de S . O supremo é o ponto da reta assinalado por uma seta. Assim, o su-
premo de S é o ponto da reta mais à esquerda que ainda está à direita de S .
Devemos observar que o supremo de um conjunto não necessariamente coincide com

Análise Real 37

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o máximo do conjunto. Por exemplo, o intervalo (0,1) ={x Î  |0 < x <1} não tem máxi-
x +1
mo, pois, dado x Î  , 0 < x <1 , temos x < <1 . Por outro lado, sup(0,1) =1 , pois
2
1 é cota superior de (0,1) e, dado d > 0 , 1 - d não pode ser cota superior de (0,1) , pois
existe x Î  tal que 1 - d < x <1 . Dessa forma, não existe cota superior de (0,1) menor
do que 1, sendo o número 1, portanto, o supremo de (0,1) .
A No caso em que S é limitado inferiormente, o ínfimo de S é a maior entre as
2 cotas inferirores de S . O ínfimo de S é denotado por inf S .
A mesma discussão que fizemos acima sobre a diferença entre supremo e máximo
T vale para ínfimo e mínimo. Convidamos o leitor a produzir um exemplo de um con-
2 junto que não tenha mínimo e tenha ínfimo (veja a tarefa 2, desta aula).
De um modo mais geral, podemos repetir a discussão acima para caracterizar o
supremo de um conjunto limitado superiormente. Faremos isso no teorema a seguir,
às vezes chamado propriedade de aproximação do supremo.

Teorema 2 Se S é um conjunto de números reais limitado superiormente, um


número real s é o supremo de S se, e somente se,
1. Para todo x Î S , x £ s , isto é, s é uma cota superior de S .
2. Para cada d > 0 , existe x Î S tal que s - d < x £ s .

Demonstração: Vamos, primeiro, supor que s é supremo de S , ou seja, que s é


a menor das cotas superiores de S . Sendo uma cota superior de S , o número s sa-
tisfaz automaticamente a condição 1. Como s é a menor entre todas as cotas superio-
res de S , se d > 0 , s - d não pode ser uma cota superior de S , ou seja, não pode
ocorrer x £ s - d , para todo x Î S . Isso significa que existe x Î S tal que s - d < x
. Como s é cota superior de S , temos s - d < x £ s e, portanto, vale a condição 2.

Figura 4 -
Reciprocamente, seja s um número real que satisfaz as condições 1 e 2. A
condição 1 implica imediatamente que s é uma cota superior de S . Se s ¢ < s , então
s ¢ = s - d , com d = s - s ¢ > 0 . A condição 2 implica, então, que existe x Î S tal que
s ¢ = s - d < x . Logo, s ¢ não pode ser cota superior de S . Mostramos assim que s é

38 Licenciatura em Matemática

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a menor cota superior de S , portanto s é o supremo de S . █
Vamos observar com um pouco mais de atenção o exemplo 5 dado acima. O con-
junto de números racionais S ={r Î|r 2 < 2} é limitado superiormente. Cabe aqui a
seguinte pergunta: S possui supremo? Em geral, o que garante que um determina-
do conjunto possua supremo? Podemos argumentar geometricamente, apelando pa-
ra a identificação de  com a reta. Essa identificação nos permite assegurar que ex-
iste um ponto correspondente a alguma cota superior de S , digamos o ponto A
correspondente ao número 2 , e que podemos “deslocar” este ponto para a esquer- 2
da, mantendo-o sempre à direita de S até uma “posição limite” (veja a Figura 5).
T
2

Figura 5 -
Devemos, no entanto, admitir que o argumento acima, embora tenha um forte
apelo à intuição geométrica, carece de precisão e rigor.
Voltando ao exemplo 5, vamos mostrar que o conjunto S não possui supremo em
 . Seja a = sup S , temos três possibilidades para a :
1. a 2 < 2 .
2. 2 < a 2 .
3. a 2 = 2 .
Se ocorre (i), consideremos o seguinte número racional
4a
b= > 0.
2 + a2
Podemos escrever 2
16a
b2 = < 2,
(2 - a 2 )2 + 8a 2
e esta última desigualdade é válida, pois, caso contrário, b2 ³ 2 implicaria
16a 2
³ 2 Þ 16a 2 ³ 2(2 - a 2 )2 + 16a 2 Þ 2(2 - a 2 )2 £ 0
(2 - a ) + 8a
2 2 2

um absurdo, pois a 2 < 2 implica 2(2 - a 2 )2 > 0 . Como b2 < 2 então b Î S . Por
outro lado, de a 2 < 2 temos

a2 a2 a2 1 1
a <2Û
2
<1 Û a 2 - <1 Û a 2 <1 + Û a 2 < (2 + a 2 ) < (2 + 2) = 2.
2 1 2 42 2 2
Segue daí que < , logo 1< o que é equivalente a
2 2+a 2
2+a 2

Análise Real 39

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4a
a< = b,
2 + a2
absurdo, pois b Î S e a é o supremo de S .
Por outro lado, se ocorre (ii) temos
2 + a2 2 + a2
2< < a2 Þ < a.
2 2a
A Como a = sup S , existe r Î S tal que
2 + a2
2
2a
<r £a
consequentemente
T æ 2 + a 2 ö÷
2
ç
2 çç
è 2a ÷÷ø
÷ < r 2 < 2,
já que r 2 < 2 . Por outro lado, temos
(2 - a 2 )2 + 8a 2
(2 - a 2 )2 ³ 0 Û (2 - a 2 )2 + 8a 2 ³ 8a 2 Û ³2 Û
4a 2
2
(2 + a 2 )2 æ 2ö
Û ³ 2 Û çç 2 + a ÷÷ ³ 2
èç 2a ø÷÷

4a 2
e chegamos novamente a uma contradição.
Assim, a = sup S satisfaz necessariamente a condição (iii): a 2 = 2 e, como já de-
monstramos na aula 1, nenhum número racional tem o quadrado igual a 2 . Conclu-
ímos que S não possui supremo em  .
Um corpo ordenado K é dito completo se satisfaz a se-
ATENÇÃO! guinte condição:
Todo subconjunto S Ì K limitado superiormente ad-
O exemplo acima mostra que existem mite supremo em K .
subconjuntos de que não admitem
supremo em Q. Esta condição, A condição acima é chamada condição de completu-
que falha no caso dos racionais, é de. Vamos exigir que o conjunto  dos números reais seja
precisamente aquela que deve ser um corpo, ordenado, arquimediano e que também seja
satisfeita por um corpo ordenado
completo.
arquimediano para que seus pontos
estejam em correspondência Repetindo o que fizemos na Aula 1, associamos os ele-
bijetiva com os pontos de uma reta. mentos de um corpo ordenado arquimediano R , conten-
Demonstrar que de fato existe esta
do  , aos pontos de uma reta t da seguinte forma: esco-
bijeção é nosso objetivo no restante
deste tópico. lhemos dois pontos O e U de t de modo que O esteja à
esquerda de U .
Consideramos, então, uma função f : R ® t , tal que f(0) = O e f(1) =U . Dado
um número natural n , seja f(n) = Un , onde Un é o ponto obtido justapondo-se n
cópias de OU à direita de O , de modo que OUn = OU +  + OU ( n vezes). Além
1
disso, f( ) = Vn , onde OVn +  + OVn = OU . Assim, todo número racional positivo
n
m / n tem como imagem o ponto P tal que OP = OVn +  + OVn ( m vezes). Se r é

40 Licenciatura em Matemática

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um número racional negativo, então f(r ) = Q , onde Q está à esquerda de O e os
segmentos QO e OP são congruentes, com P = f(-r ) .
Seja a Î R é um número (racional ou irracional). Consideremos o conjunto de
números racionais
Ea ={r Î |r < a}.
A condição de completude para R implica que sup Ea é um elemento de R . Va-
mos verificar que sup Ea = a . De fato, dado r Î Ea , temos A
r < a , logo a é um cota superior de Ea . Dado d > 0 , a 2
densidade de  em R (Teorema 1 da Aula 1) implica que ATENÇÃO! T
existe r Î  tal que a - d < r < a . Em particular, a - d
Para que as noções de esquerda e
2
não é cota superior de Ea . Pelo Teorema 2, a = sup Ea . Po- direita façam sentido, usamos aqui
demos, então, definir f(a ) = A , onde A é um ponto da a noção de reta orientada. Assim, a
reta t tal que reta possui uma orientação que fica
estabelecida quando os os pontos e
são escolhidos e fixados.

1. Se r Î  , A está à direita de f(r ) se, e somente se, r Î Ea .


2. Se A¢ está à esquerda de A , então existe r Î Ea tal que f(r ) é um ponto en-
tre A¢ e A .
O próximo resultado mostra que a completude, como definida acima, garante a
bijetividade de f .

Teorema 3 Seja R um corpo ordenado completo que contém o corpo dos


números racionais e seja t uma reta orientada, entendida aqui como um con-
junto de pontos, com dois pontos distinguidos O e U . A função ϕ : R → t
definida acima é uma bijeção.

Demonstração: Vamos, primeiro, mostrar que f está bem definida, o que sig-
nifica que, para cada a Î R , existe um único ponto A da reta t tal que f(a ) = A .
De fato, se a Î  , a construção que fizemos acima garante que f(a ) é único. Em
geral, se a é um elemento de R , não necessariamente racional, suponhamos que
f(a ) = A e f(a ) = B . Vamos mostrar que A = B . De fato, se A ¹ B , então um dos
dois pontos está à esquerda do outro. Para fixar ideias, podemos supor que B está à
esquerda de A . Como f(a ) = A , a condição (ii) e o fato de B estar à esquerda de A
implicam que existe r0 Î Ea tal que f(r0 ) está entre B e A , em particular, f(r0 )
está à direita de B . Por outro lado, como f(a ) = B , (i) implica que f(r ) está à es-
querda de B , para todo r Î Ea . Isto gera uma contradição, pois f(r ) estaria ao mes-

Análise Real 41

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mo tempo à direita e à esquerda de B . A contradição vem de supormos que A e B
são pontos distintos. Logo, A = B e f está bem definida.
Vamos, agora, mostrar que f é injetiva. Para isso, tomemos a, b Î R tais que
f(a ) = f(b) = A . Queremos mostrar que a = b . Sejam
Ea ={r Î |r < a} e Eb ={r Î |r < b}.
Se r Î Ea , então f(r ) é um ponto de t que está à esquerda de A = f(a ) . Como
A A também é igual a f(b) , a condição (i) implica que r Î Eb . Assim, Ea Í Eb . De
2 modo inteiramente análogo, podemos concluir que Eb Í Ea , logo Ea = Eb e, conse-
quentemente, a = sup Ea = sup Eb = b .
T Finalmente, mostraremos que f é sobrejetiva. Para isso, consideremos um ponto
2
A Î t . Seja EA ={r Î |f(r ) está à esquerda de A} . Pela condição de completude,
a = sup EA é um elemento de R . Seja f(a ) = A¢ . Pela condição (i), f(r ) é um ponto
situado à esquerda de A¢ , para todo r Î  , r < a . Em particular, f(r ) está à es-
querda de A¢ , para todo r Î EA , pois a = sup EA . Assim, o conjunto dos pontos do
tipo f(r ) , situados à esquerda de A , está contido no conjunto dos pontos do tipo
f(r ) situados à esquerda de A¢ . Como consequência deste fato, segue que A¢ não
pode estar à esquerda de A , pois isso implicaria a existência de um ponto do tipo
f(r ) entre A¢ e A , ou seja, f(r ) estaria à esquerda de A e não estaria à esquerda
de A¢ , o que é impossível, pelo que vimos acima. Por outro lado, se A estivesse à
esquerda de A¢ , então a condição (ii) implicaria a existência de f(r ) entre A e A¢
, com r Î Ea . Logo, f(r ) estaria à direita de A , o que implicaria r Î
/ EA . Mas r Î
/ EA
implica r ³ a = sup EA e r Î Ea implica r < a . Portanto a £ r < a é absurdo!
Concluímos, então, que A¢ não pode estar à esquerda nem à direita de A , ou
seja, f(a ) = A¢ = A e a função f é sobrejetiva, como queríamos demonstrar.█
Concluímos aqui o nosso segundo tópico desta aula. Vimos aqui a importante noção
de completude, que diferencia o corpo ordenado dos reais do corpo ordenado dos racio-
nais. Vimos que a condição de completude é exatamente aquela que nos permite iden-
tificar o conjunto dos números reais com o conjunto dos pontos de uma reta orientada.
Devido ao caráter introdutório destas aulas, não trataremos dois pontos impor-
tantes: a existência de um corpo ordenado completo e a unicidade de um corpo or-
denado completo. A questão da existência pode ser atacada construindo-se efetiva-
mente os números reais a partir dos números racionais. Existem dois modos clássicos
de se fazer esta construção: via sequências de Cauchy ou via cortes de Dedekind. Não
entraremos em detalhes, e o leitor interessado pode consultar um dos livros citados
nas referências. Quanto à unicidade, deve-se demonstrar que dois corpos ordenados
completos são essencialmente idênticos, diferindo apenas quanto à natureza dos seus
elementos. Para isso deve-se construir uma função bijetiva entre os dois conjuntos que

42 Licenciatura em Matemática

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preserve suas estruturas, ou seja, preserve as operações de
soma e de produto e preserve a relação de ordem. Para uma
construção deste tipo, remetemos o leitor interessado nova- SAIBA MAIS!
mente a uma das referências bibliográficas. Mais informações sobre as sequências
No tópico 3 a seguir, estudaremos o conjunto dos nú- de Cauchy no site www.ime.usp.
meros reais quanto à sua enumerabilidade. Veremos que br/~tonelli/map0151/pool/cauchy.pdf
esta é outra diferença marcante entre o conjunto dos reais Mais informações sobre os cortes de
Dedekind, acesse o site www.dme.ufcg.
A
e o conjunto dos racionais.
edu.br/sites_pessoais/professores/Marco/ 2
Dedekind.pdf
T
2

Análise Real 43

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03
TÓPICO

ENUMERABILIDADE

OBJETIVOS
··Compreender a noção de equivalência de
conjuntos;
··Saber justificar a enumerabilidade do conjunto
dos racionais e a não-enumerabilidade do
conjunto dos números reais.

Dados dois conjuntos finitos A e B , podemos decidir qual dos dois tem mais
elementos simplesmente contando o número de elementos de cada um. O matemáti-
co alemão, nascido na Rússia, Georg Ferdinand Ludwig Philipp Cantor (1845-1918)
estendeu esta possibilidade de comparação a conjuntos infinitos. Mais precisamen-
te, Cantor estabeleceu a noção de equivalência entre conjuntos (finitos ou infinitos),
que exploraremos, de maneira introdutória neste tópico.
Nosso principal objetivo é estabelecer que o conjunto dos números reais não é
equivalente ao conjunto dos números racionais: o primeiro possui “mais elementos”
do que o segundo, em um sentido que tornaremos preciso ao longo do tópico.
Dois conjuntos A e B são ditos equivalentes, de mesma cardinalidade, ou ain-
da equipotentes, se existe uma função bijetiva f : A ® B . A notação A ~ B indica
que A é equivalente a B . Notemos, primeiramente, que a equivalência entre con-
juntos, definida acima, tem as seguintes propriedades:

44 Licenciatura em Matemática

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1. A relação ~ é reflexiva, isto é, A ~ A , para todo conjunto A . De fato, a função
identidade Id : A ® A , dada por Id (a ) = a , é uma função bijetiva, logo A ~ A .
2. A relação ~ é simétrica, isto é, se A e B são conjuntos tais que A ~ B , então
B A . De fato, se A ~ B , então existe uma função bijetiva f : A ® B . Sendo
bijetiva, f admite uma inversa, f -1 : B ® A que também é bijetiva, logo
B~A.
3. A relação  é transitiva, isto é, se A, B e C são conjuntos tais que A ~ B e
B ~ C , então A ~ C . De fato, A ~ B implica que existe f : A ® B bijetiva e A
B ~ C implica que existe g : B ® C bijetiva. A composta g  f : A ® C é bije- 2
tiva, logo A ~ C .
T
Uma relação reflexiva, simétrica e transitiva, é chamada relação de equivalência.
3
Assim, podemos dizer que a relação definida acima é uma relação de equivalência.
Como notação complementar, escrevemos A  B se existe uma função injetiva
f : A ® B . Dizemos, neste caso, que a cardinalidade de A é menor do que a de B .
Escrevemos, ainda, A  B se existe uma função sobrejetiva f : A ® B . Dizemos,
neste caso, que a cardinalidade de A é maior do que a de B .
Um conjunto A é dito finito se existe um número natural n e uma função bijetiva
f :{1,, n} ® A.

O número n é chamado cardinalidade, ou número de elementos de A . Usamos a
seguinte notação:
|A|= n = número de elementos de A .
A seguir, faremos algumas observações para o caso em que os conjuntos A e B são finitos.

Teorema 4 Sejam A e B conjuntos finitos.


1. A ~ B se, e somente se, |A|=|B |.
2. A  B se, e somente se, |A|£|B |.
3. A  B se, e somente se, |A|³|B |.

Demonstração: (1) AB se, e somente se, existe uma funçao bijetiva f : A ® B .
Como A é finito, existe um número natural n e uma função bijetiva g :{1,, n} ® A
. A função
f  g :{1,, n} ® B
sendo a composta de duas funções bijetiva também uma função bijetiva. Logo
|B |= n =|A|.
Reciprocamente, se |A|=|B |= n , então existem funções bijetivas f :{1,, n} ® A
e g :{1,, n} ® B . Assim, a função g  f -1 : A ® B é uma bijeção, o que mostra que
A B .
(2) Suponha, primeiro, que A  B . Neste caso, existe uma função injetiva
f : A ® B . Supondo que |A|= m e |B |= n , existem bijeções g :{1,, m} ® A e

Análise Real 45

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h :{1,, n} ® B . Assim, a função composta h-1  f  g :{1,, m} ® {1,, n} é in-
jetiva (pois é a composta de três funções injetivas). Denotando F = h-1  f  g , te-
mos {F (1),, F (m)} Í {1,, n} , e, como F é injetiva, {F (1),, F (m)} possui m el-
ementos. Concluímos daí que m £ n .
Reciprocamente, se |A|= m £ n =|B |, então existem bijeções f :{1,, m} ® A
e g :{1,, n} ® B . Como m £ n , existe uma função injetiva I :{1,, m} ® {1,, n}
A , dada por I (k ) = k , para 1 £ k £ m . Assim, a função composta g  I  f -1 : A ® B
2 é injetiva (pois é composta de funções injetivas) e, daí, A  B .
T (3) O argumento é similar ao usado no item (2). Veja a tarefa 4. █
3 Passemos, agora, a considerar conjuntos infinitos. Um conjunto infinito A é dito
enumerável é equivalente ao conjunto  ={1,2,,} dos números naturais, isto é,
se existe uma função bijetiva f :  ® A . Um conjunto A é chamado contável se
for finito ou se for enumerável.
O exemplo evidente de conjunto enumerável é o próprio conjunto  dos números
naturais. Entretanto, é surpreendente que exista um conjunto infinito X equiva-
lente a um subconjunto próprio Y Ì X , como veremos no exemplo a seguir.
Exemplo: O conjunto 2 ={2,4,6,} dos números naturais pares é um subcon-
junto de  equivalente a  . De fato, a função f :  ® 2 , dada por f (n) = 2n é
bijetiva, logo 2 :  .
Um fato ainda mais surpreendente é que os conjuntos  e  sejam equipo-
tentes. Este é o resultado do Teorema a seguir.

Teorema 5 O conjunto  dos números racionais é enumerável.

Demonstração: Primeiramente, vamos mostrar que o conjunto + formado pe-


los números racionais positivos é enumerável. Lembremos que o conjunto + é for-
a
mado por frações do tipo , com a e b números naturais. Podemos, ainda, supor
a b
que a fração é irredutível, o que significa que o máximo divisor comum entre a
b
e b é igual a 1, ou seja, a e b não têm fatores comuns.

Para cada n Î  , seja An o subconjunto de  dado por

An = {ab Î 
a +
/ éirredutívele a + b = n + 1 .
b }
1 1 2 1 3 2 2
Por exemplo: A1 ={ } , A2 ={ , } , A3 ={ , } . Observe que Î / A3 pois
1 2 1 3 1 1 22 3 4 5 6 2
não é uma fração irredutível. Mais dois exemplos: A6 ={ , , , , , } ,
1 3 5 7 6 5 4 3 2 1
A7 ={ , , , } .
7 5 3 1

46 Licenciatura em Matemática

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Afirmamos que
+ = An
nÎ
e que esta união é disjunta. De fato, dado um número racional positivo, podemos
a a
escrevê-lo na forma irredutível, digamos . Então Î An , onde n = a + b - 1 .
a c a c b ab c
Além disso, se = , com Î Am e Î An , então = implica a = b e c = d ,
b d b d b d
pois estas frações são irredutíveis. Assim, m = a + b - 1= n . Isso mostra que, se
m ¹ n , então Am Ç An = Æ . A
Observemos, ainda, que An é finito para cada n Î  . Seja, agora,
1 1 2
2
f :  ®  nÎAn =  , dada por: f (1) = Î A1 , f (2) = Î A2 , f (3) = Î A2 e, em
+

1 2 1
geral, An ={ f (k ), f (k + 1),, f (m)} , onde k =|A1 |++|An-1 |+1 e m = k+|An | T
, para cada n ³ 2 . Como todos os elementos de cada An são distintos e dois conjun-
3
tos Ai e Aj , com i ¹ j , são distintos, temos que a função f é injetiva. Além disso,
como a união dos conjuntos An , n ³ 1 é igual ao conjunto + , a função f é sobre-
jetiva. Mostramos, assim, que a função f :  ® + , dada acima, é bijetiva. Logo 
é enumerável.
Seja, agora, - o conjunto dos números racionais negativos. A função
g :  ®  , dada por g (r ) = -r , é uma bijeção, logo  e - são equipotentes
+ - +

e, portanto, - também é enumerável.


O conjunto dos números racionais pode ser escrito como uma união
 = - È {0} È + . Como - e + são enumeráveis, podemos escrever
- ={a1 , a2 ,}e + ={b1 , b2 ,}.
Consideremos, então, a função F :  ®  , dada por, F (1) = 0 e, para cada k ³ 1
, F (2k ) = bk e F (2k + 1) = ak . Esta função é bijetiva (veja a tarefa 5). Desta forma, o
conjunto  dos números racionais é enumerável. █
Um conjunto infinito A é dito não-enumerável, se não existe uma bijeção
f :  ® A . Nosso próximo passo é demonstrar que o conjunto dos números reais
não é enumerável. Primeiramente, mostraremos que o conjunto dos números reais é
equipotente ao conjunto dos pontos do intervalo aberto (0,1) .

2x - 1
Lema A função f : (0,1) ®  , dada por f (x ) = , é bijetiva. Conse-
x(1 - x )
quentemente, os conjuntos (0,1) e  são equipotentes.
2x - 1 x 2 + (x - 1)2
Demonstração: A derivada da função f (x ) = é f ¢( x ) = 2 . Lo-
x(1 - x ) x (x - 1)2
go, f ¢(x ) > 0 , para todo x Î (0,1) , o que mostra que a função f (x ) é monótona cres-
cente, portanto injetiva, no intervalo (0,1) .

Análise Real 47

analisereal.indd 47 04/04/2012 15:17:17


Para demonstrar a sobrejetividade de f , basta notar que
2x - 1
lim+ f (x ) = lim+ = -¥
x®0 x®0 x (1 - x )
e, por outro lado,
2x - 1
lim- f (x ) = lim- = +¥.
x ®1 x ®1 x (1 - x )
Sendo assim, há uma bijeção entre o intervalo (0,1) e a reta  , o que mostra que
os conjuntos (0,1) e  são equipotentes.█
A
2
Teorema 6 O conjunto  dos números reais é não-enumerável.
T
3 Demonstração: Vamos demonstrar que o conjunto (0,1) , formado pelos números
reais maiores do que zero e menores do que 1, é não-enumerável. Isso mostra que 
é não-enumerável, pois  e (0,1) são equipotentes.
Suponhamos, por absurdo, que (0,1) seja enumerável, isto é, (0,1) ={x1 , x2 ,} .
Podemos escrever cada xi usando sua representação decimal:
xi = 0, ai1ai 2 ai 3 
onde aij Î {0,1,2,3,4,5,6,7,8,9} é um algarismo e podemos supor que esta repre-
sentação decimal é infinita. Devemos observar que, caso um número tenha represen-
tação decimal finita, como 0,5 , podemos escrever 0,5 = 0,499 .
Se dois números xk , xi Î (0,1) têm a mesma representação decimal infinita, então

xk = xi . De fato, se xk = 0, ak1ak 2  e xi = 0, ai1ai 2  , então


¥ a ¥ a
xk = å j e xi = å j .
kj ij

j =1 10 j =1 10
Se as representações decimais infinitas de xk e xi coincidem, então akj = aij , pa-
ra todo j ³ 1 . Assim, concluímos que xk = xi .
Usaremos, agora, uma ideia de Cantor conhecida como método da diagonal. Vamos
construir um número x Î (0,1) que não pertence à lista x1 , x2 , x3 , . Para tal, consid-
eremos x = 0, a1a2a3  onde ai ¹ aii , ou seja, ai é um algarismo diferente daquele
que ocupa a casa decimal i do número xi . Mais especificamente, podemos escolher
ai =1 , se aii ¹ 1 e ai = 2 se aii =1 . Assim, construímos um número x Î (0,1) cuja
representação decimal infinita é diferente da representação decimal infinita de qual-
quer elemento da lista x1 , x2 , . Isso mostra que vale a inclusão {x1 , x2 ,} Ì (0,1) e
que estes conjuntos não podem ser iguais, ou seja, (0,1) é não-enumerável.
Com este resultado encerramos o terceiro e último tópico de nossa segunda aula.
Vimos que o conjunto dos números racionais é enumerável e que o conjunto dos
números reais é não-enumerável. Isto estabelece uma diferença entre  e  como
conjuntos. Este fato também esclarece um ponto importante: os números irracionais,

48 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 48 04/04/2012 15:17:19


que historicamente surgiram como exceção, são, na realidade, maioria entre os reais,
no seguinte sentido: o conjunto  -  , sendo o complementar de um conjunto enu-
merável em um conjunto não-enumerável, é também não-enumerável, caso con-
trário, se  -  fosse enumerável, então  =  È (  - ) , sendo a união de dois
conjuntos enumeráveis, seria também enumerável, o que não ocorre. Desta forma é
possível concluir que os conjuntos  e  -  são equipotentes, ou seja, há tantos
números irracionais quanto números reais. A
2
T
3

Análise Real 49

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Aula 3
Sequências e Séries

Olá, aluno (a),

Nesta aula, iniciaremos o estudo de funções de variáveis reais com imagem no con-
junto dos reais. De início, tomaremos como domínio o conjunto dos naturais, em-
bora, nesse caso, o domínio seja um conjunto simples e com menos elementos que
a imagem. No entanto, já poderemos ver resultados bem interessantes e exemplos
de funções as quais você, aluno, teve oportunidade de estudar no ensino médio.

As sequências e séries proporcionam grandes aplicações na Física e nas engenharias,


como, por exemplo, as séries de Fourier e de Bessel. No tópico 1, daremos alguns
exemplos e definições; no tópico 2, veremos as propriedades e teoremas sobre se-
quências; no tópico 3, veremos as sequências com limites infinitos e analisaremos
alguns exemplos; no tópico 4, falaremos sobre séries e abordaremos também os
testes de convergências sobre séries e exemplos

Bons estudos!

Objetivos:
• Definir sequências e séries numéricas;
• Identificar as propriedades das sequências e séries;
• Reconhecer os principais teoremas sobre sequências e séries;
• Estabelecer relação entre teoria e prática.

51

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01
TÓPICO

DEFINIÇÃO DE SEQUÊNCIA

OBJETIVOS
··Estudar o comportamento de uma sequência;
··Entender o n-ésimo termo de uma sequência;
··Reconhecer os principais teoremas e aplicações.

N este tópico, iniciaremos o estudo de sequência. Começamos definindo o


conceito de sequência de números reais. Em seguida, introduziremos as
propriedades e os principais teoremas. Teremos também a oportunidade de
desenvolver algumas aplicações.
O estudo de sequências remonta desde o século V antes de Cristo, quando Zenão de
Elea (490 – 425 a. C.) propôs quatro paradoxos que mostravam a impossibilidade de se
descrever por meio de números o movimento contínuo. Esses quatro paradoxos são: a
dicotomia, o de Aquiles e a Tartaruga, o do Flecha e o do Estádio.

52 Licenciatura em Matemática

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No problema de “Aquiles e a tartaruga”, Zenão indagava se seria possível
Aquiles alcançar uma tartaruga, quando esta se deslocava. Ele concluiu que
a cada ponto que Aquiles chegasse já não alcançaria a tartaruga porque ela
teria se deslocado para outro ponto. Hoje sabemos que esse problema resulta
em uma sequência ou soma de termos infinitos. Nos trabalhos de Arquimedes
sobre o cálculo de áreas sob as curvas quadráticas, também surge a ideia de
sequências. Com a descoberta do cálculo feita por Newton e Liebniz, o estudo
de sequências obteve um grande impulso no seu desenvolvimento.
A
Figura 1: Zenão de Elea 3
T
Definição 1: Uma sequência é uma função com domínio no conjunto dos
1
números naturais e toma valores (ou imagem) no conjunto dos números reais.
Assim, temos
x: → 
n → x ( n) =
xn
Podemos ver uma sequência como uma lista de números reais em uma
dada ordem:
x1 , x2 , …, xn , …
onde o termo xn é chamado de termo geral ou n-ésimo termo da sequência.

Daqui em diante usaremos a seguinte notação para


representar uma sequência ( xn ) n∈ = ( xn ) n≥1 e muitas vezes
SAIBA MAIS
só representaremos por ( xn ) . O conjunto de seus termos
será representado por {xn } ⊂  .
Obtenha mais informações sobre o
Vejamos alguns exemplos de sequências: filósofo Zenão de Elea acessando o link
http://www.mundodosfilosofos.com.
br/zenao.htm
Exemplo 1: (um exemplo tratado no ensino médio) Uma
PA é uma sequência em que cada termo a partir do segundo
é obtido adicionando uma constante ao termo anterior.
xn +=
1 xn + r
r é chamado de razão da PA. ATENÇÃO!
Uma PG é uma sequência, em que cada termo a partir do O aluno do ensino médio toma o
segundo é obtido multiplicando-se uma constante q , isto é, primeiro contato com um tipo bem
xn +1 = xn .q especial de sequência quando estuda
PA e PG.
em que q é a razão da PG.

Análise Real 53

analisereal.indd 53 04/04/2012 15:17:20


1
Exmplo 2: x :  →  cujo termo geral é dado por: x(n=
) x=
n . O conjunto de
n
1 1 1 1
seus termos é dado por: {1, , , , …, , …} . E o gráfico do conjunto dos seus
2 3 4 n
pontos na imagem é dado abaixo. Como você pode perceber na Figura 2, esses pontos
tendem para zero quando n cresce arbitrariamente.
A
3
T
1

1
Figura 2: Gráfico da função x(n=
) x=
n
n

Exemplo 3: x :  →  dado por xn = n , cujo conjunto dos termos é


{1, 2,3, …, n, …} que é o conjunto dos naturais (na realidade você pode ver que
=xn Id = (n) n é a função identidade). Já neste caso os pontos tendem para pontos
arbitrariamente grandes.

Figura 3: Gráfico da função xn = n


Nem toda sequência x :  →  pode ser apresentada como uma expressão vista
nos exemplos acima.

54 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 54 04/04/2012 15:17:20


Exemplo 4: Para a sequência dos números que representa o π , dado por
x1 3,=
= x2 3,1,=
x3 3,14,=
x4 3,141,=
x5 3,1415,=
x6 3,14159 … , não existe
fórmula que possa representá-la.
Há, todavia, expressões diferentes que tendem para o mesmo número real como
veremos a seguir.

1 1 1 1
Exemplo 5: xn= (1 + ) n e yn = 1 + + +…+ .
n 2! 3! n! A
O principal fato a ser analisado sobre uma sequência é verificar se ela tende ou não
para um número real fixo. No primeiro caso, dizemos que a sequência é convergente;
3
no segundo, dizemos que é divergente. Podemos, então, enunciar a seguinte definição. T
1
Definição 2: Dizemos que uma sequência x = ( xn ) n≥1 converge para um nú-
mero real a , ou tem limite o número real a , se dado ε > 0 pode-se encontrar
n0 ∈  tal que para todo n ≥ n0 implica que∣xn − a∣< ε . Em termos simbóli-
cos tem-se
∀ε > 0, ∃n0 ∈  : ∀n ≥ n0 ⇒∣xn − a∣< ε
Denotaremos a definição acima simbolicamente da seguinte forma:
lim n→∞ xn = a ou xn → a
Quando uma sequência não for convergente, dizemos que é divergente e re-
presentamos por: lim n→∞ xn = ∞ .

Vamos agora aplicar a definição dada acima para mostrar que a sequência do
Exemplo 2 tende a zero, isto é, xn → 0 . De
fato, dado ò > 0 arbitrário, escolha n0 ∈ 
tal que n0 > 1/ ò (um tal n0 pode ser escolhido
de acordo com o Princípio de Arquimedes). Se
n ≥ n0 então ATENÇÃO!
1 1
xn − 0 = xn = ≤ <  Podemos afirmar, com base na definição dada
n n0 anteriormente, que o número real a ∈  é o
Um dos fatos que necessitamos mostrar é limite da sequência x = ( xn ) n ≥1 se, somente se,
se uma sequência tem apenas um único limite. para cada ε >0 o conjunto
Esse resultado garante que, não importa de
que maneira tentemos calcular o limite de uma x (a −  , a +  ) = {n ∈  : xn ∈ (a −  , a +  )}
−1

sequência, ele será sempre o mesmo. tem o complemento finito em  .

Análise Real 55

analisereal.indd 55 04/04/2012 15:17:22


lim n→∞ xn ae
Teorema 1: Se= =lim n→∞ xn b , então a=b .

a−b
Demonstração: Seja dado  = > 0 , então existe n0 ∈  tal que para todo
2
n1 ≥ n0 implica que . E para todo n2 ≥ n0 também implica que xn − b < / 2 . Agora
considere n = mín{n1 , n2 } , então para todo n ≥ n0 implica que
A a−b
3 a − b = a − xn + xn − b ≤ xn − a + xn − b <  =
2
T ∣a − b∣
o que dá um absurdo, pois teríamos∣a − b∣< .
1 2
Dizemos que uma sequência ( xn ) n≥1 é injetiva se n ≠ m implica que xn ≠ xm , ou ainda
que xn = xm ⇒ n = m . Neste caso, diremos que a sequência tem termos dois a dois
distintos.

Definição 3: Diz-se que uma sequência ( xn ) n≥1 é:


Limitada Superiormente quando existe um número real b tal que
xn ≤ b, ∀n ∈  .
Limitada Inferiormente quando existe um número real tal que a ≤ xn , ∀n ∈  .
Limitada quando é limitada superiormente e inferiormente, ou seja, quando
existem a, b ∈  tais que xn ∈ [a, b] para todo n ∈  . Observem que podemos
tomar∣xn∣≤ c , onde c = máx∣∣
{ a ∣∣
, b }.

Vejamos um exemplo de uma sequência limitada, mas que não é convergente.

Exemplo 6: Considere a sequência xn = (−1) n é óbvio que∣xn∣≤ 1 é uma sequência


limitada, porém não é convergente. Suponha, por absurdo, que ela converge, ou seja,
xn → a para um certo a ∈  . Então, dado  = 1 / 2 > 0 , por definição existe n0 ∈ 
tal que se n > n0 , portanto xn − a <  = 1 / 2 . No entanto, para cada n , temos
(1) xn − xn+1 ≤ xn − a + a − xn+1 <  +  = 1
E por outro lado, segue que
(2) xn − xn+1 = (−1)n − (−1)n+1 = 2
e de (1) e (2) acima chegamos na contradição 2 < 1 . Dessa forma, concluímos que a
sequência não é convergente.

56 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 56 04/04/2012 15:17:25


Definição 4: Dada uma sequência ( xn ) n≥1 , uma subsequência da sequência
( xn ) n≥1 é a restrição da função x :  →  a um subconjunto infinito  ' ⊂ 
dos naturais, em que  ' = {n1 < n2 <  < nk < } e denotaremos por ( xnk ) k∈ .

Dado a ∈  , temos que a é o limite de uma subsequência ( xnk ) k∈ de ( xn ) n≥1 se,
somente se, para todo  > 0 , o conjunto dos índices n tais que xn ∈ (a −  , a +  ) é A
infinito. E podemos dar a definição.
3
Definição 5: Dada uma sequência ( xn ) n≥1 , chamamos de valor aderente da se- T
quência ( xn ) n≥1 ao número real a ∈  que é o limite de uma subsequência 1
( xnk ) k∈ ⊂ ( xn ) .

Conforme o exemplo anterior, uma sequência pode ser limitada e não ser
convergente. Veremos, entretanto, que há tipos de sequências cuja limitação garante
que é convergente. Por enquanto, segue o seguinte teorema.

Teorema 2: Se∣xn∣≤ c é uma sequência limitada e lim n→∞ yn = 0 , então


lim n→∞ xn yn = 0 .

Demonstração: Dado  > 0 arbitrário, seja ∣xn∣≤ c e existe n0 ∈  tal que



yn < para todo n ≥ n0 , uma vez que o limite lim n→∞ yn = 0 . Então
c

ε
∣xn y=
n∣∣xn∣∣yn∣≤ c. <ε
∣∣c
Ou seja, dado  > 0 , mostramos que existe n0 ∈  tal que para todo n ≥ n0 implica
xn yn < . Isso quer dizer que lim n→∞ xn yn = 0 como queríamos provar.

Teorema 3: Toda sequência convergente é limitada.

Demonstração: Com efeito, dado  > 0 qualquer existe n0 ∈  tal que para todo
n ≥ n0 implica que xn − a <  ⇔ xn ∈ (a −  , a +  ) . Isso nos diz que, a partir do
índice n0 + 1 , a sequência é limitada inferiormente por a - e superiormente por
a + . Então, tomando M = min {x1 , x2 ,…, xn0 , a −  , a +  }
e , segue que
}
M = max {x1 , x2 ,…, xn0 , a −  , a +  m ≤ xn ≤ M , ∀n ≥ n0 .

Análise Real 57

analisereal.indd 57 04/04/2012 15:17:27


02
TÓPICO

OPERAÇÕES COM SEQUÊNCIAS

OBJETIVOS
··Entender as operações com sequências;
··Compreender a definição de subsequência;
··Conhecer as propriedades de sequência.

N este tópico, trataremos de algumas operações sobre as sequências, defi-


nições e a noção fundamental de subsequências e de suas propriedades.
Inicialmente, vejamos um teorema que estabelece as principais operações
sobre as sequências

Teorema 4: Sejam lim n→∞ xn = a e lim n→∞ yn = b sequências convergen-


tes, então temos:
a)
lim n→∞ ( xn + yn ) =lim n→∞ xn + lim n→∞ yn =a+b
lim n→∞ ( xn − yn ) =lim n→∞ xn − lim n→∞ yn =a −b
b)
= lim n→∞ ( xn . yn ) (lim
= n →∞ xn ).(lim n →∞ yn ) a.b
c)
x lim n→∞ xn a
d) lim=
n →∞ ( ) =
n
, desde que lim n→∞ yn= b ≠ 0
yn lim n→∞ yn b

58 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 58 04/04/2012 15:17:28


Demonstração:
a) Dado  > 0 , existem n1 , n2 ∈  tais que:

∀n ≥ n1 ⇒ xn − a < (i)
2

∀n ≥ n2 ⇒ yn − b < (ii)
2
Tomando n0 = máx{n1 , n2 } , então para todo n ≥ n0 implica de i) e ii) que
 
A
(xn + yn ) − (a + b) ≤ xn − a + yn − b < + = 
2 2
3
E, desse modo, estamos de acordo com a definição que lim n→∞ ( xn + yn ) =a+b. T
a) É análoga ao item a). 2
b) Por hipótese, temos que xn → a e yn → b e, portanto,∣yn∣≤ M ; então
c) xn yn − ab = (xn − a ) yn + a( yn − b) ≤ xn − a . yn + a . yn − b

o que resulta na desigualdade

 
≤ M. xn − a + a . yn − b ≤ M. +a. ≤
2.M 2. a
 ε
uma vez que podemos tomar xn − a ≤ e∣yn − b∣≤ , pois as sequên-
2.M 2.∣∣a
cias xn → a e yn → b .
d) Deixaremos como exercício para o aluno.
Vamos definir algumas sequências que serão importantes no decorrer do curso e
nos possibilitarão ver outros resultados.

Definição 6:
Diz-se que uma sequência ( xn ) n≥1 é crescente quando xn < xn +1 , ∀n ∈  ,
ou seja, x1 < x2 < x3 <  < xn <  . Se xn ≤ xn +1 , ∀∈  , a sequência é dita
não-decrescente.
Uma sequência ( xn ) n≥1 é decrescente quando xn > xn +1 , ∀n ∈  , isto é,
x1 > x2 >  xn >  . Agora, se xn ≥ xn +1 , ∀n ∈  , dizemos que a sequên-
cia é não-crescente.

Caro aluno, denominaremos os casos i) e ii) definidos acima como sequências mo-
nótonas. Assim, podemos enunciar o seguinte teorema.

Teorema 5: Toda sequência monótona limitada é convergente.

Análise Real 59

analisereal.indd 59 04/04/2012 15:17:29


Demonstração: Sem perda de generalidade, podemos supor que ( xn ) n≥1 é não-
-decrescente, ou seja, xn ≤ xn +1 , ∀n ∈  . Seja c ∈  tal que xn ≤ c, ∀n ∈  é limi-
=
tada e tomemos a Sup { xn : n ∈ } . Vamos mostrar que lim n→∞ xn = a . De fato,
dado  > 0 , como a −  < a , temos que a - não pode ser cota superior do con-
junto dos termos da sequência. Logo, existe n0 ∈  tal que a −  < xn0 ≤ a , como
xn ≥ xn0 para n ≥ n0 tem-se que a −  < xn ≤ xn ≤ a < a +  , ∀n ≥ n0 , ou seja,
A lim n→∞ xn = a .
0

3
1
T Exemplo 7: No exemplo 5, consideramos uma importante sequência xn= (1 + ) n
n
2 que define o número irracional e base dos logaritmos naturais. A primeira vez que
se teve notícia do surgimento desse número foi em um problema de juros compostos
contínuos (séc. XVII). Assim, temos que
1
=
e lim n→∞ (1 + ) n
n
Vamos mostrar que a sequência ( xn ) n≥1 dada acima é limitada e crescente e, por-

tanto, pelo Teorema 5, é convergente. De acordo com fórmula do binômio de Newton,

∑ n(n − 1)…(n − [k − 1]) . 1 (1)


n
1 n
n 1
xn =+
n

(1 ) n =   k =
k =1  k  n
1 + k =1
k! nk
n
1  1   2   k −1 
1 + ∑.
xn = 1 −  1 −  1 −  (2)
k =1 k ! n  n   n 

Se substituirmos n por n + 1 na expressão (2) acima, temos


n +1
1 1  2   k −1 
xn +1 1+
= k =1
. 1 − 1 −  1 − 
k !  n + 1  n + 1   n + 1 
Se desprezarmos o último termo na expressão acima, estaremos somando até o
termo k = n , como em (2). Observe que cada termo que aparece acima entre parên-
teses é maior que os termos em (2), donde concluímos que xn +1 > xn , ou seja, a se-
quência é crescente. Para provarmos que ela é limitada, basta observarmos que cada
parêntese que surge em (2) é menor do que 1, de maneira que, para n > 1 , segue que


n
1 1 1 1 1 1
xn < k =1
=2 + +  + < 2 + + 2 +  + n −1 < 3
k! 2! n! 2 2 2
1
Ora, sendo crescente e limitada, a sequência xn= (1 + ) n tem limite pelo Teorema 5 anterior.
n
O resultado que enunciamos a seguir é bastante importante, mas não será dada a
demonstração. Convidamos você, aluno, a vê-la nas referências que são dadas.

60 Licenciatura em Matemática

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Proposição 1 (Bolzano - Weierstrass): Toda sequência limitada de números
reais possui uma subsequência convergente.

O aluno pode perceber que essa afirmação é mais forte que a dada no Teorema 5.
Foi tentando prová-la que o matemático K. Weierstrass (1815 – 1897) viu a necessi-
dade de fundamentar o conceito de números reais.
A
3
Definição 7: Uma sequência ( xn ) n≥1 é chamada de sequência de Cauchy quan-
T
do, para todo  > 0 dado, existir n0 ∈  tal que xm − xn < para quaisquer
2
que sejam m, n > n0 . .

Teorema 6 (Cauchy): Uma sequência ( xn ) n≥1 é convergente se, e somente


se, é de Cauchy. Ou seja, uma sequência de Cauchy é uma condição necessária
e suficiente para ser convergente.

Demonstração: Iremos fazer a demonstração do teo-


rema de Cauchy. Provaremos primeiramente que a condi-
ção é necessária. Ou seja, se xn → a , então vale a defini- ATENÇÃO!
ção 6. De fato, dado  > 0 existe n0 ∈  tal que m > n0
e n > n0 implica xm − a < / 2 e xn − a < / 2 . Daí e Um corpo Κ (como exemplo  ) é dito
da desigualdade triangular, temos que completo quando toda sequência de
Cauchy em Κ é convergente. O teorema

xm − xn = (xm − a ) + (a − xn ) <  / 2 +  / 2 =  acima é válido, pois os números reais
é completo. Mas, veja que em
 , se
o que prova que a sequência é de Cauchy.
tomarmos uma sequência de números
Para provarmos que a condição é suficiente, admiti-
racionais convergindo para 2 ∉  ela
remos a hipótese de Cauchy e provaremos que a sequ-
será de Cauchy, pois não irá convergir em
ência é convergente. Queremos mostrar que xn → a .
 , uma vez que os racionais não é um
Ora, uma vez que a sequência é de Cauchy, temos que a conjunto completo.
sequência é limitada. De fato, tomando m
= n0 + 1 , te-
remos que xn0 +1 − xn < , logo xn0 +1 −  < xn < xn0 +1 +  , donde se conclui que a
sequência é limitada. Então, pelo Teorema de Bolzano-Weierstrass, temos uma sub-
sequência ( xnk ) que converge para um certo a e, portanto, xnk − a < / 2 para
nk > n0 . Assim, usando este fato e a desigualdade triangular, obtemos que
xn − a = (xn − xnk ) + (xnk − a ) ≤ xn − xnk + xnk − a <  / 2 +  / 2 = 
e isso mostra que a sequência é convergente.

Análise Real 61

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Uma sequência ( xn ) de Cauchy pode ser apresentada numa maneira equivalente
à apresentada na definição 6, anterior como: dado  > 0 , existe n0 ∈  tal que para
todo p ∈  ,
n > n0 ⇒ xn − xn+ p < 
Como sabemos do teorema anterior, as sequências de Cauchy são convergentes.
Esse tipo de sequência surgiu quando os matemáticos no século XVIII tentavam pro-
A cessos numéricos para resolver equações. Por exemplo, a equação x 3 − 9x + 2 =0
3 pode ser escrita x ( x 3 + 2) / 9 ou, ainda, x = f ( x) , onde
na forma equivalente =
3
x +2
T f ( x) =
9
. Dessa forma, pode-se construir uma sequência numérica infinita,
2 tomando inicialmente um certo valor x1 e em seguida tomar-se:
x2 = f ( x1 ), x3 = f ( x2 ), …, xn +1 = f ( xn ), …
O que se quer provar é se a sequência é de Cauchy, pois nesse caso temos que é
convergente para um certo x0 , que é solução da equação dada. Vejamos a seguir um
exemplo de uma aplicação dessa ideia que são as aproximações sucessivas.

Exemplo 8 (Aproximações Sucessivas): Seja dado 0 ≤ λ < 1 e suponhamos que a


sequência ( xn ) n≥1 satisfaz a seguinte condição:
∣xn + 2 − xn +1∣≤ λ∣xn +1 − xn∣, ∀n ∈ 
Então,∣xn +1 − xn∣≤ λ n −1∣x2 − x1∣, para todo n ∈  .
Com efeito, para n = 1 , temos que a desigualdade é válida como você pode ver
trivialmente. E se ∣xn +1 − xn∣≤ λ n −1∣x2 − x1∣, então
∣xn + 2 − xn +1∣≤ λ∣xn +1 − xn∣≤ λ ∣x2 − x1∣. Deste modo, para m, p ∈  arbitrários,
n

segue que

∣xn + p − xn∣≤∣xn + p − xn + p −1∣+  +∣xn +1 − xn∣≤ (λ n + p −1 + λ n + p − 2 +  + λ n −1 )∣x2 − x1∣(1)

=(1) λ n −1 (λ p −1 + λ p − 2 +  + λ + 1)∣x2 − x1∣(2)


1− λ p λ n −1
=
(2) λ n −1. ∣x2 − x1∣≤ ∣x2 − x1∣
1− λ 1− λ
limλ n −1
Assim, como ∣x2 − x1∣=0 , dado  > 0 , existe n0 ∈  tal que
1− λ
l n−1
0≤ x2 − x1 <  para todo n > n0 . Logo xn+ p − xn < para todo p ∈  e
1−l

n > n0 , ou seja, xm − xn < para quaisquer que sejam m, n > n0 . E portanto, a se-
quência ( xn ) n≥1 é de Cauchy e concluímos que é convergente.

62 Licenciatura em Matemática

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03
TÓPICO
SEQUÊNCIAS COM
LIMITES INFINITOS
OBJETIVOS
··Reconhecer uma sequência com limite infinito;
··Calcular os limites infinitos de algumas
sequências;
··Rever as propriedades de sequências com limites
infinitos.

N este tópico, trataremos de sequências que não são convergentes, mas têm
certa regularidade, ou seja, os seus limites tornam-se ou mantêm-se arbi-
trariamente grandes positivamente.
Como foi mencionado no tópico 1, nem toda sequência ( xn ) é convergente. Dessa for-
ma, há sequências que divergem e mantêm certa regularidade, pois seus termos permane-
cem arbitrariamente grandes positivamente ou arbitrariamente grandes negativamente.
Quando uma sequência de números reais ( xn ) torna-se arbitrariamente grande posi-
tivamente ou tende para mais infinito, a denotaremos por limxn = +∞ . Assim, dado
M > 0 arbitrariamente grande, temos um n0 ∈  tal que n > n0 que implica xn > M
. Há apenas um número finito de termos ( xn ) tal que xn < M . Na realidade, n0 termos.

64 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 64 04/04/2012 15:17:36


Exemplo 9: Como vimos no exemplo 3, a sequência
xn = n (e observamos o seu gráfico) trivialmente tem
lim n→∞ xn = +∞ . E também a sequência xn = a n tende ATENÇÃO!
para o infinito quando a > 1 . Como, de fato, seja Com limites infinitos para sequências,

a = 1 + r , com r > 0 , dado M > 0 , pela desigualdade podemos obter coisas indeterminadas,
como ∞ − ∞ , ou seja, se limxn = +∞
de Bernoulli, temos que a n = (1 + r ) n > 1 + nr > M .
M −1 e limyn = −∞ . Nada podemos afirmar A
Basta tomar n > . Assim, se tomarmos sobre lim( xn + yn ) , pois pode ser que 3
M −1 r
n0 > e n > n0 , teremos o que queríamos, ou se- a sequência ( xn + yn ) seja convergente,
r ou tenda para +∞ , ou tenda −∞ , ou T
ja, a n > M . De acordo com o que vimos anteriormen-
finalmente não tenha limite algum. 3
te, segue que lima n = +∞ .

Analogamente, pode-se enunciar que limxn = −∞ . Se dado M > 0 arbitraria-


mente grande existe n0 ∈  tal que n > n0 ⇒ xn < − M . Como você pode perceber,
limxn = −∞ ⇔ lim(− xn ) = +∞ . Desse modo, mostraremos somente o caso em que a
sequência tende para o infinito positivamente; o outro caso você poderá obter trivial-
mente dessa observação feita. Enfatizamos que os símbolos +∞ e −∞ não são números
reais. Vejamos algumas propriedades para a operação com limites infinitos.

Teorema 7 (Operações com Limites Infinitos):


Se limxn = +∞ e ( yn ) é limitada inferiormente, então lim( xn + yn ) = +∞ ;
Se limxn = +∞ e existe b > 0 tal que yn > b para todo n ∈  , então
limxn . yn = +∞ ;
1
Seja xn > 0∀n ∈  , então limxn = 0 ⇔ lim = +∞ ;
xn
Sejam ( xn ) e ( yn ) sequências de números positivos. Assim: (a) Se xn > c ,
x
∀n ∈  com c > 0 e limyn = 0 . Desse modo, temos que lim n = +∞ ; (b). No en-
x yn
tanto, se∣xn∣< c é limitada e limyn = +∞ , então lim n = 0 .
yn
Demonstração: Mostraremos apenas o item (4) e deixaremos para você as outras
demonstrações.
c
(4a) Seja dado M > 0 , existe n0 ∈  tal que n > n0 implica 0 < yn < e, por-
M
1 M xn c
tanto, > . Assim, segue que n > n0 implica > M , então
=
y c yn c / M
x n
lim n = +∞ .
yn
n∣ xn < c , uma vez que xn > 0 e é limitada. Dado
(4b) Existe c > 0 tal que∣x=
c
ò > 0 existe n0 ∈  tal que n > n0 implica que yn > uma vez que limyn = +∞ .
ò

Análise Real 65

analisereal.indd 65 04/04/2012 15:17:38


xn c x
Dessa maneira, para n > n0 , temos que 0 < < ò e então lim n = 0 .
=
yn c / ò yn
Exemplo 9: Se xn= n + a e yn = − n , então limxn = +∞ e limyn = −∞ , mas

lim( xn + yn ) =
a.
A
3 Exemplo 10: Se x=
n n + 1 e yn = − n , então limxn = +∞ e limyn = −∞ . Porém,
( n +1 + n ) 1
T lim( xn +=
yn ) lim( n + 1 −=
n ) lim( n + 1 − n ). = lim = 0
( n +1 + n ) n +1 + n
3
Exemplo 11: Sejam xn = n 2 e yn = − n , então limxn = +∞ e limyn = −∞ ; no
entanto lim( xn + yn ) = lim(n 2 − n) = +∞ , pois n 2 − n= n(n − 1) > n , para n ≥ 2
. Portanto, lim( xn + yn ) = −∞ .

Exemplo 12: Consideremos as sequências xn = n e yn =(−1) n − n , então é ób-


vio que limxn = +∞ e limyn = −∞ . Porém a sequência ( xn + yn ) =
(−1) n não pos-
sui limite como provamos no exemplo 6.

Há outras expressões indeterminadas que podemos analisar, tais como , quan-

do limxn = +∞ e limyn = +∞. Do mesmo modo, nada podemos afirmar sobre o li-
xn
mite da sequência ( ) . Para finalizar este tópico, vejamos um exemplo que dá ape-
yn
nas uma ilustração desse resultado. Outros serão tratados nos exercícios.

Exemplo 13: Sejam xn= n + 1 e yn= n − 1 , então limxn = limyn = +∞ , mas


xn n +1 n(1 + 1/ n) 1 + 1/ n
lim(
= ) lim
= lim = lim= 1 .
yn n −1 n(1 − 1/ n) 1 − 1/ n

66 Licenciatura em Matemática

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04
TÓPICO

SÉRIES NUMÉRICAS

OBJETIVOS
··Entender as somas infinitas de termos;
··Fazer operações com somas infinitas;
··Analisar a convergência ou não das séries
numéricas.

V ocê já está acostumado a fazer somas de dois termos x1 + x2 , três termos


x1 + x2 + x3 e até mesmo n termos como: sn = x1 + x2 +  + xn . As somas in-
finitas x1 + x2 +  + xn +  são um assunto com o qual você tomou contato
apenas como um caso simples que é o caso das somas de uma P.G. infinita. O nosso principal
objetivo neste tópico é leva-lo a entender as somas infinitas de termos bem gerais.
No ensino médio, o aluno deparou com somas do tipo: 1 + 1/ 2 + 1/ 4 +  + 1/ 2n + 
e aprendeu como calcular a soma desses termos infinitos. Aqui vamos iniciar um es-
tudo mais completo sobre essas somas, que chamamos de séries numéricas. Uma sé-
rie numérica

é uma soma infinita que representamos por:
∑x
n =1
= x1 + x2 +  + xn + 
n
onde os termos xn são números reais dados. E xn é chamado de termo geral da
série. A partir da sequência ( xn ) de números reais, podemos formar uma nova sequ-

68 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 68 04/04/2012 15:17:40


ência ( sn ) , onde sn = x1 + x2 +  + xn . Chamamos os números sn de reduzidas da

série ou soma parcial da série. Se a sequência ( sn ) tiver um limite limsn = s , dize-


∞ ∞
mos que a série ∑xn é convergente e s = ∑xn = x1 + x2 +  + xn +  = limsn , s
n =1 n =1 ∞
será a soma da série. No caso do limite limsn não existir, diz-se que a série ∑x é n
n =1 A
divergente. Você deve ficar atento, pois, às vezes, começaremos a série pelo termo x0 3
em vez de x1 , por uma questão de conveniência. T
4
1 − x n +1
Exemplo 14: Sabemos que 1 + x + x 2 +  + x n = , para todo n ∈  (Po-
1− x
x n = 0 se∣∣
de ser provado por indução!). Ora, temos que lim∣∣ x < 1 , então segue
2 2 n 1
que limsn = lim(1 + x + x +  + xn ) =1 + x + x +  + x +  = . Portanto,
1− x
segue que a série anterior, que é chamada de série geométrica, é convergente.

Exemplo 15: Agora, daremos um exemplo de uma série que não é convergente.

Considere a série ∑(−1)
n =1
n +1
= 1 − 1 + 1 − 1 +  . Se considerarmos a soma parcial sn ,
temos que essa soma é zero se n = par , ou seja, s2n = 0 e é igual a 1, quando
n = ímpar , isto é, s2n +1 = 1 . Portanto, ela é divergente, pois as subsequências pares
e ímpares da soma parcial convergem para valores distintos. Uma sequência é con-
vergente se toda subsequência converge para o mesmo valor.

Teorema 8: A série∑x converge se, somente se, dado ε > 0 existe n (ε )


n =1
n 0
m
(que pode depender de ε ) tal que∣∑x ∣< ε para todos m ≥ n > n .
i 0
i =n

Demonstração: A prova desse fato decorre do teorema sobre sequência de Cau-


chy e deixamos para você fazer

essa demonstração.
Corolário 1: Se a série ∑x é convergente, então limx
n =1
n n = 0 , ou seja, o termo
geral tende para zero.
Demonstração: Basta tomarmos m = n e n= n − 1 no teorema anterior, então

Análise Real 69

analisereal.indd 69 04/04/2012 15:17:42


∣xn∣< ε para todo n > n0 o que decorre o corolário.
como∣sn − sn −1∣=

1
Exemplo 16: Vamos mostrar que a série harmônica ∑ n é divergente. De fato,
n =1
2n
1 1 1 1 1 1 1
seja ∑
i =n i
= +
n n +1
+ + >
2n 2n
+ + = e pelo teorema 8, tomando
2n 2
ò < 1/ 2 vemos que a série não é convergente.
A Você pode ver com esse exemplo que a recíproca do corolário 1 não é verdadeira.
3 Podemos ter uma série divergente com o termo geral indo para zero. E mais, que não
precisamos ver o que ocorre com todos os termos de uma série; basta olharmos o que
T acontece com finitos termos da série. Porém, o exemplo a seguir restabelece o coro-
4
lário, mostrando que se o termo geral xn da série não tende para zero, então a série
diverge (temos aqui a contrapositiva).


nn nn n n n
Exemplo 17: Seja a série ∑ , como o termo geral xn = = . … >1
n =1 n ! n! 1 2 n
para todo n > 1 , segue do corolário 1 do teorema 8 que a série é divergente.

Teorema 9 (Critério de Comparação): Sejam ∑x e ∑y


n n séries de termos
não negativos. Se existem k > 0 e n0 ∈  tais que xn ≤ k . yn para todo n > n0 ,
então a convergência de ∑y n implica a convergência de ∑x e a di-
n
vergência de ∑xn implica a divergência de ∑ yn .
n n
Demonstração: Sejam as somas parciais sn = ∑xi e tn = ∑ y j tais que
i =1 j =1
sn ≤ k .tn , ∀n ∈  . Se tivermos que limtn = t , então sn ≤ k .t é crescente e limitada pa-

ra todo n ∈  ; logo, pelo teorema 5, é convergente. Por outro lado, se sn é divergente,

portanto é ilimitada e daí temos que tn ≥ sn / k é também ilimitada e assim divergente.

1
Exemplo 18: Vamos usar o teorema anterior para mostrar que a série ∑n é r
1 1
divergente para r < 1 , pois como 1/ n r > 1/ n para todo n ∈  , então ∑ > ∑ r
n n
. Como a série harmônica é divergente, segue que a série dada também diverge.

70 Licenciatura em Matemática

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Teorema 10 (Séries Alternadas): Seja a série ∑(−1) n +1
xn , com os termos
não-crescentes, ou seja, x1 ≥ x2 ≥ x3 ≥ … ≥ xn ≥ … e limxn = 0 , a série
∑(−1)n+1 xn é convergente.
Demonstração: Basta considerarmos as reduzidas de ordem par e ímpar da série
∑(−1) n +1
xn = x1 − x2 + x3 − x4 +… . Seja
A
s2n = ( x1 − x2 ) + ( x3 − x4 ) +…+ ( x2n −1 − x2n ) é formada por termos positivos e não- 3
-decrescentes. E a reduzida de ordem ímpar
s2n +1 =x1 − ( x2 − x3 ) − ( x4 − x5 ) −… ( x2n − x2n +1 ) é não-crescente. Observemos T
que s2n ≤ s2n +1 ≤ s1 e assim temos que possuem limites de acordo com o teorema 5. 4
Então, seja lims2n = r e lims2n +1 = s , mas como lim= s2n +1 lims2n + limx2n +1 e
limx2n +1 = 0 isso implica que r = s e, portanto, a série é convergente.

Teorema 11(Teste da Razão ou Teste de D’Alembert): Seja dada a série


xn +1
∑xn
e suponhamos que lim∣ ∣= r exista. Então: (a) a série é convergente se
x
r < 1 ; (b) a série diverge se nr > 1 ; (c) e nada podemos afirmar se r = 1 .
xn +1
Demonstração: Vamos demonstrar que (a) sabemos que lim∣ ∣= r , segue
xn +1 xn
que existe n0 ∈  tal que∣ ∣≤ k para n ≥ n0 onde r < k < 1 . Dessa desigualda-
xn
de obtemos as seguintes desigualdades abaixo:
∣xn0 +1∣≤ k∣. xn0∣
∣xn0 + 2∣≤ k∣. xn0 +1∣
∣xn0 +3∣≤ k∣. xn0 + 2∣

∣xn0 + p∣≤ k∣. xn0 + p −1∣
fazendo o produto dessas parcelas membro a membro, obtemos∣xn0 + p∣≤ k p∣xn0∣
e essa desigualdade mostra que a série ∑∣x ∣é limitada superiormente pela sé-
n0 + p
rie ∑∣x ∣.k
n0
p
=∣xn0∣∑k
,
p
que é convergente, pois 0 < k < 1 e, portanto, con-
cluímos que a série é convergente. Os outros casos deixamos para você verificar.

Dizemos que uma série converge



absolutamente, quando ∑∣x ∣é uma série
n
convergente. E quando a série
n
∑ ∑
xn é convergente, mas ∣xn∣não é convergente,
diz-se que a série é condicionalmente convergente. Um exemplo de série condicio-
=1

nalmente convergente, mas que não é absolutamente convergente, é a série alternada


dada no teorema 10. Você deve verificar que toda série absolutamente convergente é
condicionalmente convergente.

Análise Real 71

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Teorema 12(Teste da raiz ou Teste de Cauchy): Seja a série ∑x . Suponha que
n
n =1
o limite lim ∣xn∣= r exista. Então: (a) a série converge absolutamente
n se r < 1 ;
(b) a série diverge se r > 1 ; (c) e nada se pode afirmar quando r = 1 .

A
3 Demonstração: (a) Basta tomar n∣xn∣≤ k e isso existe porque a sequência con-
verge, com r < k < 1 . Disso segue que∣xn∣≤ k n para todo n ≥ n0 e, portanto, a série
T ∑
é limitada superiormente por uma série convergente k n
2 ∑
. Então ∣xn∣é convergente e, portanto, absolutamente
convergente. Os outros casos deixamos para você verificar
usando o teste de comparação.
Esperamos que você tenha achado interessantes os re-
SAIBA MAIS!
sultados de sequências e séries que tratamos nesta aula.
Mais informações sobre sequências e Recomendamos que procurem um livro de análise real pa-
séries acesse os links ra que possam se aprofundar mais no assunto e ver re-
sultados que, por falta de espaço neste material, não de-
www.ime.uerj.br/~calculo/LivroV/series.pdf
ram para ser tratados aqui. Na próxima aula, veremos uma
w w w. u f j f. b r / s a n d r o _ m a z o r c h e / pouco de noções topológicas na reta real.
files/2010/08/Séries.pdf

72 Licenciatura em Matemática

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Aula 4
Noções Topológicas na Reta Real

Olá, aluno(a),

Esta aula é uma preparação para a próxima aula, que tratará de limite de uma fun-
ção real. Embora o conceito de limite já tenha sido estudado por você, aluno, na
disciplina de Cálculo I, aqui você verá uma formulação mais rigorosa e cuidadosa de
algumas questões que não tinham sido formuladas, tais como os conjuntos em que
podemos tomar limites. Sabemos que, quando tomamos limites, os pontos tendem
para certo ponto. É sempre possível fazer isso, em qualquer conjunto? Essas e outras
são questões importantes, sinalizadas em Cálculo 1, serão agora vistas, pois naquela
disciplina não tínhamos como abordá-las.

A partir desses questionamentos, estudaremos, no tópico 1, a definição de conjunto


aberto, interior de um conjunto, e ilustraremos com exemplos. No tópico 2, vere-
mos conjuntos fechados, pontos aderentes e pontos de acumulação. Por último, no
tópico 3, definiremos os conjuntos compactos, que se traduzem em propriedades
importantes para as funções contínuas neles definidas.

O caráter desta aula é preparatório; não se trata, portanto, de uma abordagem com-
pleta e abrangente sobre a topologia da reta. No final desta aula, daremos algumas
referências para que você aprofunde seus conhecimentos.

Vamos lá?!

Objetivos:
• Compreender termos como conjuntos abertos, fechados, interior de um conjunto;
• Definir os principais conjuntos necessários à noção de limite;
• Reconhecer esses conjuntos e saber usá-los.

73

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01
TÓPICO
CONJUNTOS ABERTOS
E FECHADOS
OBJETIVOS
··Compreender a definição de conjunto aberto e
fechado;
··Entender os conceitos sobre subconjuntos da reta
real.

V ocê já deve ter visto a noção de intervalo aberto e intervalo fechado no


ensino médio e até mesmo neste curso de Matemática na disciplina “Ma-
temática Básica I”. O principal objetivo deste tópico é ampliar e dar um
tratamento mais rigoroso a essa noção intuitiva de intervalo aberto e consequente-
mente ampliar conceitos sobre conjuntos abertos para outros subconjuntos da reta.
Veremos também outras definições de subconjuntos da reta real, como interior, pon-
to aderente, ponto de acumulação.
De início, relembramos a noção de intervalo da reta, que denotaremos por:
(a, b) = {x Î  : a < x < b} Intervalo Aberto
[a, b ] = {x Î  : a £ x £ b} Intervalo Fechado
[ a, b) = {x Î  : a £ x < b} Semiaberto à Direita
(a, b ] = {x Î  : a < x £ b}Semiaberto à Esquerda

74 Licenciatura em Matemática

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Antes de partirmos para a definição de conjunto aberto em  , vejamos a noção de
interior de um conjunto X . Posteriormente estabeleceremos uma relação entre o inte-
rior de um conjunto X e o fato de ele ser aberto. O primeiro intervalo no ensino médio
é dito aberto, mas não se prova esse resultado. Aqui nós faremos a comprovação.

Definição 1: Consideremos X Ì e x Î X . Dizemos que x é um ponto inte-


rior de X quando existe um intervalo (a, b) tal que x Î (a, b) Ì X . Isto significa
A
que todos os pontos suficientemente próximos de x ainda pertencem ao con-
4
junto X . Com isso, podemos estabelecer que x Î X é um ponto interior de X se, T
somente se, existe  > 0 tal que (x −  , x +  ) ⊂ X . Com efeito, basta to- 1
mar  = min{x − a, b − x}> 0 para x Î (a, b) Ì X , então
a ≤ x −  ≤ x ≤ x +  ≤ b , ou seja, (x −  , x +  ) ⊂ (a, b) ⊂ X .

De agora em diante, representaremos o conjunto dos pontos x Î X Ì  , que são


interiores a X , por I ( X ) e o chamaremos de interior do conjunto X . É óbvio que
I ( X ) Ì X e, ainda, se X Ì Y Þ I ( X ) Ì I (Y ) . Vejamos os exemplos de interiores de
subconjuntos da reta.

Exemplo 1: X = (a, b) ou X = [a, b ] , ou X = (a, b ] , ou ainda X = [ a, b) . Temos


I ( X ) = (a, b) e supomos que X Ì  , para qualquer um dos casos dados anterior-
mente. Você pode verificar isso facilmente imitando a demonstração apresentada no
final da definição 1 anterior.

Exemplo 2: Se x0 Î I ( X ) , então existe  > 0 tal que (x0 −  , x0 +  ) ⊂ X e nesse


caso o conjunto X contém uma quantidade não enumerável de pontos e nesse con-
junto X tem que ter uma quantidade infinita de elementos (ou pontos). Portanto,
todo conjunto finito X = {x1 , x2 ,¼, xn } tem I ( X ) = Æ . Dessa forma, também temos
que I () = Æ , pois  é enumerável e não pode conter um intervalo só de racionais.
Analogamente, segue que I () = Æ . No entanto, mesmo que o irracional  - 
não seja enumerável, temos que I (  - ) = Æ , pois, para
todo , teremos que o intervalo (a - e, a + e) Ì (  - ) con-
tém (a −  , a +  ) ⊂ ( R − Q) algum número racional uma ATENÇÃO!
r ∈ (a −  , a +  ) que o racional é denso nos reais.
Se a Î I ( X ) , dizemos que o

conjunto X é uma vizinhança do

ponto a .

Análise Real 75

analisereal.indd 75 04/04/2012 15:17:48


ATENÇÃO:
Definição 2: Diz-se que um conjunto A Ì  é aberto, quando todos o seus
pontos são interiores. Em outras palavras, temos que, para todo x Î A , existe
ò > 0 tal que (a −  , a +  ) ⊂ A , ou ainda, I ( A) = A

É importante que você, aluno, lembre que a noção de limite de uma sequência
A lim n®¥ xn = a pode ser reformulada usando a definição de aberto. De fato, se fizermos
4 A = (a −  , a +  ) para ò > 0 dado, então existe n0 Î  tal que, para todo n > n0 , im-
plica que xn Î A . Agora, vejamos alguns exemplos de conjuntos abertos da reta real.
T
1
Exemplo 3: A reta real  é obviamente um conjunto aberto, pois contém todo
intervalo (a, b) . O conjunto vazio Æ também é aberto, pois, para não ser aberto, te-
ríamos que obter um ponto x em Æ que não seja interior, isto é, para todo ò > 0 , o
intervalo (a −  , a +  ) ⊄ ∅ , mas isso não é possível, porque um tal x não existe em
um conjunto vazio. Ou seja, não se pode mostrar que o conjunto vazio não possui
ponto que não seja interior. Desse modo, só podemos concluir que o vazio é aberto.

Exemplo 4: Todo conjunto aberto não-vazio é não enumerável. Portanto  e to-


dos os subconjuntos finitos de  não são abertos.

Exemplo 5: Nenhum subconjunto do conjunto dos números irracionais  - 


é aberto, uma vez que todo intervalo aberto contém um número racional, pois  é
denso em  .

Teorema 1: A intersecção de um número finito de conjuntos abertos é um con-


junto aberto.

Demonstração: Sejam A1 , A2 ,¼, An Ì  subconjuntos abertos. Considere o con-


junto A = A1 ÇA2 ÇA3 ÇÇAn e seja x Î A um ponto qualquer, então x Î Ai para
todo i = 1,2,¼, n e assim temos que (x − i , x + i ) ⊂ Ai , ∀i = 1, 2,…, n , pois todos os
Ai são abertos. Tomando e = min1£i£n{ei } teremos que
(x −  , x +  ) ⊂ (x − i , x +  ) ⊂ Ai para todo 1 £ i £ n e consequentemente segue
que (x - e, x + e) Ì A e consequentemente a conclusão de que A é aberto.

76 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 76 04/04/2012 15:17:50


Teorema 2: Seja ( Aa )aÎL uma família arbitrária de subconjuntos abertos em  .
Então a união arbitrária de abertos, A = ÈAa é um aberto.
aÎL

Demonstração: Com efeito, seja x Î A = ÈAa qualquer, então x Î Aa0 para al-
aÎL
gum a0 Î L . Ora, como Aa0 é aberto, segue que existe  > 0 tal que e, portanto, A
(x −  , x +  ) ⊂ Aa0 ⊂ A é aberto, como queríamos provar. █ A
4
Observação 3: Um espaço topológico G é uma coleção de subconjuntos abertos
da reta que satisfaz às seguintes condições: T
Æ e  são abertos;
1
A intersecção de finitos abertos é também um conjunto aberto;
A união de uma família arbitrária de abertos é também um conjunto aberto.

Exemplo 6: Seja X = {x1 , x2 ,¼, xn } um conjunto finito de números reais com


x1 < x2 <  < xn . Então, o complemento do conjunto X, que é
 - X = (-¥, x1 )È(x1 , x2 )ÈÈ(xn-1 , xn )È(xn , +¥) , é um conjunto aberto de
acordo com o teorema 2. Assim, o complemento de um conjunto finito de números
reais é um conjunto aberto.

Análise Real 77

analisereal.indd 77 04/04/2012 15:17:51


02 CONJUNTOS FECHADOS

OBJETIVOS
··Compreender a noção de fechados na reta real;
··Relacionar os conjuntos fechados com os
conjuntos abertos;
··Perceber a diferença entre conjuntos fechados e
abertos.

N este tópico, veremos que a definição de conjuntos fechados é comple-


mentar à definição de conjuntos abertos. Mudando um pouco a relação
de operações entre conjuntos (trocando intersecção por união), podería-
mos definir um espaço topológico através dos conjuntos fechados. Os resultados se-
guem bem parecidos aos dados anteriormente em conjuntos abertos.
Começaremos a caminhada definindo um ponto aderente a um subconjunto
X Ì  , que é uma noção fundamental para expressarmos e provarmos as proprie-
dades relativas a conjuntos fechados.

Definição 3: Dizemos que um ponto a é aderente ao conjunto X Ì  , quan-


do limxn = a com os pontos da sequência (xn ) todos pertencentes xn Î X , "n
ao conjunto X Ì  .É óbvio que o ponto a Î X que pertence a um conjunto X
é ponto aderente dele .Basta tomarmos a sequência constante xn = a, "n Î 
.

78 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 78 04/04/2012 15:17:52


Outra definição importante para caracterizar um conjunto fechado é o fecho de
um conjunto X , que definimos como:

Definição 4: Chamamos fecho de um conjunto X Ì  , que representamos por


X , ao conjunto formado por todos os pontos aderentes a X Ì  . É evidente
que, se X Ì Y Þ X Ì Y e X Ì X , dizemos que um conjunto X é fechado quan-
do X = X , isto é, ele contém todos os seus pontos aderentes ( X É X ). A
4
Fica claro, pela definição anterior, que, se X Ì  é fechado se, só se, para toda
sequência (xn ) Ì X convergente, tem-se que limxn = a Î X . T
Outra maneira de caracterizar se um conjunto X é denso em um conjunto Y é
2
quando Y Ì X , ou seja, se, para todo a Î Y , tivermos que limxn = a com xn Î X é
um ponto aderente de X . Desse modo, concluímos que  =  , pois todo número
real é limite de uma sequência de números racionais.

Teorema 3: Um ponto a é aderente ao conjunto X , se, somente se, para toda


vizinhança V (a ) = (a −  , a +  ) do ponto a , houver algum ponto de X .

Demonstração: A afirmação é suficiente, seja a um ponto aderente a X . Então,


limxn = a , com xn Î X . Assim, pela definição de convergência de uma sequência,
dado  > 0 , a vizinhança xn ∈ V (a ) = (a −  , a +  ) contém infinitos pontos para
todo n > n0 , ou seja, temos que Vò (a )ÇX ¹ Æ .
Agora a necessidade da afirmação: se toda vizinhança Vò (a ) do ponto a contiver
1 1
ontos de X , escolhemos as vizinhanças do tipo xn Î (a - , a + ) com xn Î X e as-
1 n n
sim temos que∣xn - a∣< , e então limxn = a e a é aderente a X .
n
De outra maneira, o que o teorema anterior afirma é que qualquer vizinhança de um
ponto a Î X deve ter intersecção com o fecho do conjunto. Ou, ainda,
a Ï X Û a Î Vò (a )ÇX = Æ . Agora podemos enunciar o principal teorema deste tópico,
que caracteriza um conjunto fechado como o complementar de um conjunto aberto.

Teorema 4: Um conjunto F Ì  é fechado se, e somente se, seu complemento


A =  - F é aberto.

Demonstração: Consideremos F fechado e a Î A um ponto qualquer em A . Vamos


mostrar que A é aberto. Com efeito, temos que a Ï F , então pelo Teorema 3 demonstra-
do anteriormente, verificamos que existe uma vizinhança a Î Vò (a ) que não contém
pontos de F . Assim podemos concluir que a Î Vò (a ) Ì A e, portanto, A é aberto.

Análise Real 79

analisereal.indd 79 04/04/2012 15:17:54


Reciprocamente, suponhamos que o conjunto A é aberto e a é um ponto aderen-
te ao conjunto F =  - A , então, do Teorema 3, segue que toda vizinhança de a
contém pontos de F , e assim a Î Vò (a ) Ë A e a não é um ponto interior a A . Ora,
como A é aberto, temos que a Ï A e, consequentemente, a Î F . E assim todo ponto
aderente a F pertence a F , então F é fechado.

A Exemplo 7: Se X = (a, b) , então X = [a, b ] . De fato, basta tomar as sequências


4 1 1 1 1
em X , a + e b - e como a + ® a e b - ® b , logo [a, b ] Ì (a, b) .
n n n n
T
Exemplo 8: De maneira mais geral, temos que, para um subconjunto, X Ì  limi-
2
tado e X ¹ Æ . Então a = Inf ( X ) e b = Sup( X ) são pontos aderentes a X . Uma vez
1
que, podemos tomar a sequência xn Î X com a £ xn < a + , logo limxn = a e desse
n
modo segue que a Î X . E de maneira análoga, tomamos yn Î X , com limyn = b .

Usando a relação de complementar de um conjunto, pode-se provar facilmente que:


1. Æ e  são fechados;
2. A união finita de fechados é um conjunto fechado (nos abertos é a intersecção);
3. A intersecção de uma família de fechados é um conjunto fechado.
Faremos a prova de 2 e deixamos para você a jus-
tificativa dos outros casos. Com efeito, sejam
ATENÇÃO! F1 , F2 ,¼, Fn fechados de  . Então, pelo Teorema 4,
segue que os conjuntos
Você deve notar que, na justificativa da
A1 =  - F1 , A2 =  - F2 ,¼, An =  - Fn s ã o
afirmação 2 anterior, fizemos o uso da Lei de
abertos. Então, conforme o Teorema 2, temos que
Morgan, que afirma que (ÈXi ) = ÇX ou
C C
i
A1 ÇA2 ǼÇAn =  - ( È F )é i aberto. Por-
1£i£n
(ÇXi ) = ÈX No caso acima, usamos na forma
C C
i tanto segue novamente, pelo Teorema 4, que ÈF
1£i£n
i

A1 ÇA2 ǼÇAn = [ Ç ( - F )] i
C
=  -( ÈF) i
é fechado como o complemento de um aberto.
1£i£n 1£i£n

. Repetindo esses argumentos de maneira análoga,


Concluiremos este tópico com uma defini-
você vai obter as outras demonstrações dos outros ção de pontos de acumulação que tem uma
grande importância na definição de limites de
casos. Poderíamos fazer a mesma observação sobre um
uma função f com domínio nos reais. Na de-
espaço topológico G com fechados em vez de abertos. finição do limite de função real, faz-se uso ex-
plícito de pontos de acumulação como você

80 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 80 04/04/2012 15:17:56


poderá ver na aula seguinte.
Agora podemos enunciar um teorema que elenca algumas equivalências sobre a
definição de pontos acumulação.

Teorema 5: Sejam X Ì  e x0 Î  , então as seguintes afirmações são equivalentes:


x0 é um ponto de acumulação de X ;
1.
A
2. x0 é o limite de uma sequência de pontos xn Î X -{x0 }; 4
3. Todo intervalo aberto de centro em x0 contém uma infinidade de pontos de X . T
2
Demonstração: Para provarmos que (i) Þ (ii) supondo que (i) ocorre, tomamos
1 1
os intervalos do tipo (x0 - , x0 + ) com xn ¹ x0 e xn Î X . Logo, teremos que
n n
limxn = x0 , o que prova (ii) .
Por outro lado, se admitirmos (ii) , devemos provar (iii) . Mas isso é fato, pois o
conjunto {xn : n > n0 } é infinito , porque, do contrário, existiria um termo xi , i ³ n
que se repetiria infinitas vezes e isso acarretaria que a sequência (xn ) seria constante
e convergente para x0 , mas com xn ¹ x0 por hipótese. O que resultaria um absurdo!
Portanto, segue que (ii) Þ (iii) . Por último, a implicação (iii) Þ (i) é óbvia da defini-
ção de pontos de acumulação.

Exemplo 9: Se um subconjunto X Ì  é finito, então X a = Æ , o conjunto dos


pontos de acumulação, é vazio. Mesmo o conjunto dos inteiros  , que é infinito,
tem o conjunto dos pontos acumulação  a = Æ , uma vez que todos os seus pontos
1
n Î  são isolados, pois basta tomar intervalos com comprimento  = > 0 que te-
2
remos que (n - ò, n + ò)Ç = {n} e a =  .

Análise Real 81

analisereal.indd 81 04/04/2012 15:17:58


03 CONJUNTOS
COMPACTOS
OBJETIVOS
··Distinguir entre um conjunto fechado e um
compacto;
··Compreender a noção de compacto de um
conjunto;
··Saber relacionar a noção de subconjuntos
compactos com suas aplicações.

N este último tópico desta aula, analisaremos os subconjuntos da reta que


têm grande importância na análise de convergência de sequências, sejam
numéricas, sejam de funções que não serão vistas neste curso. Além dis-
so, os conjuntos compactos são importantes também quando analisamos as funções
contínuas definidas sobre eles, pois isso nos garante a existência de máximos e míni-
mos para uma função contínua. E é óbvio que saber se uma função tem um máximo
ou mínimo é uma das questões mais relevantes tanto em estudos teóricos, quanto em
estudos práticos. Na verdade, você pode rever alguns dos interessantes resultados
sobre essa questão de máximos e mínimos de uma função contínua sobre um com-
pacto no curso de cálculo numérico.

82 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 82 04/04/2012 15:17:58


Definição 6: Um subconjunto X Ì  é dito compacto, quando é limitado e fe-
chado em  .

Exemplo 10: Todo subconjunto X = {x1 , x2 ,¼, xn } Ì  fi-


ATENÇÃO!
nito é compacto, pois é fechado, uma vez que seu comple- A
mento  - X = (-¥, x1 )È(x1 , x2 )ȼ(xn-1 , xn )È(xn , +¥) é Advertimos que essa definição 6 de 4
aberto e é limitado (você deve justificar!) e, portanto, pela um conjunto compacto só é válida
definição é compacto. Outro exemplo trivial é o intervalo em  . Se o subconjunto estivesse T
[a, b ] , que é fechado e limitado na reta. Por outro lado, o in-
em um espaço de dimensão infinita, 3
essa definição não seria verdadeira.
tervalo (a, b) é limitado, mas não é fechado e, portanto, não Porém, em espaço de dimensão
é compacto. Os números inteiros  não é conjunto compac- finita, ela é perfeitamente válida.
to; é fechado, mas não é limitado.

Teorema 6: Um conjunto X Ì  é compacto, se somente se, toda sequência de


pontos em X possuir uma subsequência que converge para um ponto de X .

Demonstração: Se X é compacto, então toda sequência (xn ) Ì X é limitada, por-


tanto, pelo Teorema de Bolzano-Weierstrass, temos que existe uma subsequência
convergente xn j ® x0 Î X , cujo limite está em X , pois X é fechado.
Reciprocamente, se X Ì  é um subconjunto, toda sequência (xn ) Ì X possui
uma subsequência convergente para um ponto dele xn j ® x0 Î X . Então, afirmamos
que X é limitado, pois, do contrário, teríamos para cada n um termo da sequência
(xn ) Ì X com∣xn∣
> n e desse modo a sequência obtida não possuiria subsequência
limitada e, portanto, não seria convergente. Além disso, X é fechado, porque, caso
contrário, existiria um ponto x0 Ï X com limxn = x0 com xn Î X , "n e dessa forma a
sequência (xn ) não teria subsequência nenhuma convergindo para um ponto de X ,
uma vez que todas as subsequências teriam como limite o ponto x0 o que nos leva a
uma contradição. Assim, X é fechado e limitado, logo é compacto.
Deste ponto, podemos enunciar um resultado que já foi
visto com intervalos encaixados, e que agora podemos ge-
neralizar para conjuntos compactos. Assim, dada uma se- SAIBA MAIS!
quência decrescente de conjuntos compactos
X1 É X2 É X3 É¼É Xn ɼ , então existe pelo menos um Para revisar o Teorema de Bolzano-
Weierstrass, acesse o site: wwmat.mat.
número real que pertence a todos os conjuntos compactos fc.ul.pt/aninf/2003_2/aninf2/notas/
Xn . Para sua demonstração, nos valemos do fato de eles pcomp/Similares
serem compactos e do teorema de Bolzano-Weierstrass.

Análise Real 83

analisereal.indd 83 04/04/2012 15:17:59


Para finalizar esta aula, enunciamos, sem demonstração, um resultado bastante
importante, que é o chamado Teorema de Borel-Lebesgue.

Teorema 7 (Borel-Lebesgue): Toda cobertura aberta de um conjunto compac-


to possui uma subcobertura finita.
A prova pode ser vista nos livros que colocamos nas
referências.
A
4 SAIBA MAIS!
Entendemos uma cobertura de um conjunto X como
uma família de abertos ( Al )lÎL tal que X Ì ÈAl . Se o nú-
T Para mais informações sobre tópicos lÎL
mero de aberto L = {l1 ,¼,ln } é finito, diz-se que a cober-
2 importantes de análise real, acesse o
tura é finita.
material elaborado pelo Prof. Adriano
Pedreira Cattai, disponível no link
cattai.mat.br/site/files/AnaliseReal/ Exemplo 11: Os intervalos abertos In = (1 / n,2) , n Î  é
AnaliseReal_cattai_uneb.pdf
uma cobertura de abertos do conjunto X = (0,1] , uma vez que
X = (0,1] Ì ÈAn . Entretanto, você pode ver facilmente que o
n Î
conjunto X = (0,1] não admite uma subcobertura finita.

84 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 84 04/04/2012 15:18:00


Aula 5
Limites de Funções

Olá, aluno(a),

Nesta aula, estudaremos a noção de limite, de que já tratamos na aula 3, em um


contexto mais geral. Em vez de considerarmos somente sequências, que são funções
s :  ®  , cujo domínio é o conjunto dos números naturais, consideraremos fun-
ções f : X ®  , em que X é um subconjunto arbitrário de  . Devemos observar
que o conjunto X pode ser igual ao conjunto  dos números naturais, o que inclui
as sequências como um caso particular das funções a serem estudadas nesta aula. O
outro caso relevante é aquele em que X é um intervalo, aberto ou fechado, de  .

No primeiro tópico, veremos a definição, as propriedades básicas e alguns exemplos


de limites de funções. No tópico 2, estudaremos a noção de limite lateral e obtere-
mos um critério para a existência de limites de funções. Apresentaremos, também
neste tópico, os limites infinitos e os limites no infinito.

Bons estudos!

Objetivos:
• Compreender a noção de limite de função;
• Identificar a noção de limite de sequências como caso particular da noção de limite de funções;
• Saber aplicar as propriedades de limites;
• Compreender as noções de limite lateral, limite infinito e limite no infinito.

85

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01
TÓPICO
DEFINIÇÃO, PROPRIEDADES E EXEM-
PLOS DE LIMITES DE FUNÇÕES

OBJETIVOS
··Compreender a definição de limite.
··Obter, a partir da definição de limite, suas
propriedades.

N este primeiro tópico, veremos a definição formal de limite de uma função,


que faz uso da ideia de valor absoluto de números reais como maneira de
medir distâncias sobre a reta, ideia essa que foi introduzida na aula 2. Mais
precisamente, a noção de limite de uma função formaliza a seguinte ideia: se x se apro-
xima de um número real a , então f (x ) se aproxima de algum número real L . Para
que um número real x pertencente ao domínio X da função f se aproxime do núme-
ro real a , é necessário que a seja um ponto de acumulação de X , noção que foi apre-
sentada na aula 2.
A partir da definição de limite, obteremos as propriedades que nos permitem
operar com este conceito de modo mais eficaz, sem precisarmos recorrer sempre à
definição. Esta tarefa é uma tanto quanto delicada, e, como você deve notar, teremos
aqui uma dose maior de formalismo, característico da Análise Matemática.

86 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 86 04/04/2012 15:18:00


Seja X um subconjunto de  . Vimos, na aula 2, que um elemento a Î  é cha-
mado ponto de acumulação de X quando, dado d > 0 , existe x Î X , x ¹ a , tal que
|x - a |< d . Isto significa dizer que existem elementos de X arbitrariamente próxi-
mos de a . Assim como na aula 2, denotaremos o conjunto dos pontos de acumulação
de X por X ¢ .
Seja f : X ®  e a Î X ¢ , ou seja, a é um ponto de acumulação de X . Queremos
estudar o comportamento de f (x ) quando x é um elemento de X próximo de a . A A
princípio, estudaremos o caso em que f (x ) é estável quando x está próximo de a , ou 5
seja, o caso em que f (x ) se aproxima de um número real, quando x se aproxima de a .
T
Um número L Î  é dito limite de f (x ) , quando x tende a a se, para todo
1
e > 0 , existe d > 0 tal que 0 <|x - a |< d implica | f (x ) - L|< e . Usamos a notação
lim f (x ) = L
x®a
para sintetizar as informações acima.
• As afirmações |x - a |< d e | f (x ) - L|< e são equivalentes, respectivamente, a
x Î (a - d , a + d ) e f (x ) Î (L - e, L + e) . Assim, a definição de limite pode ser
reescrita da seguinte forma: para cada J = (L - e, L + e) , existe
I = (a - d , a + d ) -{a} tal que f ( I ) Ì J , em que f ( I ) indica o conjunto forma-
do pelas imagens dos elementos de I pela função f , isto é, f ( I ) ={ f (x )|x Î I }
. Em outras palavras, todo intervalo aberto J centrado em L contém a imagem,
por f , de um intervalo aberto I centrado em a , excluído o ponto central a .
• A desigualdade 0 <|x - a | é equivalente a x ¹ a . Em termos de intervalos,
isto significa que podemos tomar o conjunto I = (a - d , a + d ) -{a} , em vez
do intervalo (a - d , a + d ) . Isto se dá porque não nos interessa o comporta-
mento da função f no ponto a , e sim o seu comportamento numa vizinhan-
ça I de a . Outro modo de interpretar esta informação é dizer que o limite
lim x®a f (x ) não nos dá informação alguma sobre f (a ) , que pode, inclusive,
não existir. Veremos, mais adiante, que existem funções f para as quais po-
demos inferir o valor f (a ) a partir do limite lim x®a f (x ) . Tais funções são cha-
madas contínuas e serão o objeto de estudo da aula 6.

Exemplos:
1. Seja f : (0,1) ®  , dada por f (x ) = 2x + 1 . O número real 1 é um ponto de acu-
mulação de (0,1) . Assim, faz sentido calcularmos o limite lim(2x + 1) embora 1
x ®1
não seja um elemento de (0,1) . Em geral, para que o limite lim x®1f (x ) , com
f : X ®  , faça sentido é suficiente que a seja um ponto de acumulação de X ,
mas a não precisa ser um elemento de X .
Para demonstrarmos que lim x®1(2x + 1) = 3 , procedemos da seguinte maneira:
e
dado e > 0 , existe d = > 0 tal que
2

Análise Real 87

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e
|x - 1|< d Þ|x - 1|< Þ 2|x - 1|< e Þ|2x - 2|< e Þ|2x + 1 - 3|< e Þ| f ( x ) - 3|< e.
2
Assim, de acordo com a definição de limite, f (x ) tende a 3 quando x tende a 1.
2. Além de ser uma condição suficiente para que o limite lim x®a f (x ) faça senti-
do, o fato de a ser um ponto de acumulação do domínio de f é também uma
condição necessária, isto é, se a não é ponto de acumulação de f , o limite
lim x®a f (x ) não pode ser definido. Para ilustrar este fato, exibimos a seguir um
A exemplo: seja f : (0,1) È {2} ®  , dada por f (x ) = x . A figura 2 é um esboço
5 do gráfico de f .
T
1

Figura 1 – Gráfico da função f

/ X ¢ , ou seja, 2 não é ponto de


Devemos notar que, se X = (0,1) È {2} , então 2 Î
acumulação de X . Isso se dá porque, por exemplo, o intervalo (2 - d ,2 + d ) , com
1
d = , é disjunto de X , isto é, (2 - d ,2 + d ) Ç X ={2} . Neste caso, dizemos que 2 é
2
um ponto isolado de X .
Observemos que |x - 2|< d é equivalente a x Î (2 - d ,2 + d ) . Além disso, f (x )
só está definida para x Î X e, se I = (2 - d ,2 + d ) -{2} , então I Ç X = Æ , logo
f ( I ) = Æ . Como o conjunto vazio está contido em qualquer conjunto, para qual-
quer número real L e qualquer e > 0 , se J = (L - e, L + e) , então f ( I ) Ì J . Isso
mostra que qualquer número real pode ser considerado o limite de f (x ) quando x
tende a 2 . É claro que este é um caso que devemos evitar, pois queremos que o li-
mite seja um número real bem definido. Por isso, vamos sempre considerar limites
de funções quando a variável x tende a um elemento a que é ponto de acumulação
do domínio da função.
O resultado a seguir esclarece a questão da unicidade do limite de uma função.

88 Licenciatura em Matemática

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Teorema 1 (Unicidade do limite) Dados X Í  , f : X ®  e a Î X ¢ , se
lim x®a f (x ) = L1 e lim x®a f (x ) = L2 , então L1 = L2 .

Demonstração: Dado e > 0 , existem d1 > 0 e d2 > 0 tais que |x - a |< d1 implica
| f (x ) - L1 |< e / 2 e |x - a |< d2 implica | f (x ) - L2 |< e / 2 . Se d = min{d1 , d2 } , então
existe x Î X tal que |x - a |< d , pois a Î X ¢ . Para x Î X tal que |x - a |< d , temos
|x - a |< d1 e |x - a |< d2 . Logo, | f (x ) - L1 |< e / 2 e | f (x ) - L2 |< e / 2 . A
e e
5
Assim, |L1 - L2 |=|L1 - f (x ) + f (x ) - L2 |£| f (x ) - L1 |+| f ( x ) - L2 |< + = e ,
onde a primeira desigualdade é a desigualdade triangular.
2 2 T
Mostramos, dessa maneira, que |L1 - L2 |< e para todo e > 0 . Como L1 - L2 é um número
1
real fixado, a única possibilidade é que L1 - L2 = 0 , logo L1 = L2 , como queríamos demonstrar.

Teorema 2 Dados X Í  , f : X ®  e a Î X ¢ , se lim x®a f (x ) existe, então


f é limitada em alguma vizinhança de a .

Demonstração: Por hipótese, lim x®a f (x ) = L , onde L


é um número real. Dado e =1 , existe d > 0 tal que ATENÇÃO!
0 <|x - a |< d implica | f (x ) - L|<1 , isto é, se
Uma função f : X ®  é dita limi-
x Î (a - d , a + d ) e x¹a, então
tada em Y Í X , se existe M Î  ,
| f (x )|=| f (x ) - L + L|£| f (x ) - L|+|L|<1+|L|. Fazendo M > 0 , tal que | f (x )|£ M para to-
M =1+|L|> 0 , obtemos | f (x )|< M , para todo x Î I , do x Î Y . O resultado a seguir mos-
onde I = (a - d , a + d ) -{a} é uma vizinhança de a . Isso tra que, se uma função f tem limite
encerra a demonstração. quando x tende a a , então f é li-
mitada em alguma vizinhança de a .

O resultado a seguir, conhecido como Teorema do Confronto, ou Teorema do San-


duíche, garante que é possível calcular o limite de uma função f que é limitada su-
perior e inferiormente por duas outras funções, g e h, cujos comportamentos para x
próximo a um ponto a são controlados.

Teorema 3 (Teorema do confronto) Dados X Ì  , f , g , h : X ®  e a Î X ¢ ,


suponhamos que
g ( x ) £ f ( x ) £ h( x )
para todo x Î X , x ¹ a . Se lim x®a g (x ) = lim x®ah(x ) = L , então lim x®a f (x ) = L .

Análise Real 89

analisereal.indd 89 04/04/2012 15:18:08


Demonstração: A figura abaixo dá uma ideia do comportamento da função f nu-
ma vizinhança do ponto a. Note que o gráfico de f é “sanduichado” pelos gráficos de
g e de h. Como lim x®a g (x ) = lim x®ah(x ) = L , pela definição de limite, para cada e > 0
, existem d1 > 0 e d2 > 0 tais que
|x - a |< d1 Þ| g (x ) - L|< e,
|x - a |< d2 Þ|h(x ) - L|< e.
A Assim, se d = min{d1 , d2 } , então |x - a |< d implica que | g (x ) - L|< e e
5 |h(x ) - L|< e .
Podemos reescrever as duas últimas desigualdades como
T
1

L - e < g (x ) < L + e, L - e < g (x ) < L + e.

Figura 2 – Teorema do Confronto

Uma vez que, por hipótese, g (x ) £ f (x ) £ h(x ) , temos


L - e < g (x ) £ f (x ) £ h(x ) < L + e.
Logo, L - e < f (x ) < L + e , ou seja, | f (x ) - L|< e sempre que |x - a |< d . Isso
mostra que lim x®a f (x ) = L , como queríamos demonstrar.

Devemos observar que não é necessário que as desigualdades g (x ) £ f (x ) £ h(x )


valham para qualquer ponto x do domínio X. De fato, a mesma demonstração dada
acima continua válida se tivermos g (x ) £ f (x ) £ h(x ) para todo x Î I , onde I Í X
é um intervalo da reta tal que a Î I . Como aplicação do Teorema do Confronto, va-
mos demonstrar um corolário muito útil no cálculo de limites.

Corolário 4 Sejam X Ì  , a Î X ¢ e f , g : X ®  funções, com f limitada


e lim x®a g (x ) = 0 . Então

lim ( f (x ) × g (x )) = 0
x®a

90 Licenciatura em Matemática

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Demonstração: Como f é limitada, existe um número real positivo M tal que
0 £| f (x )|£ M ,
para todo x Î X .
Por hipótese, suponhamos que lim x®a g (x ) = 0 , logo lim x®a | g (x )|= 0 (veja o
exercício 2a desta aula). Como | g (x )|³ 0 , podemos multiplicar as desigualdades
0 £| f (x )|£ M por | g (x )| para obtermos
0×| g (x )|£| f (x ) × g (x )|£ M×| g ( x )|. A
As funções G(x ) = 0 (identicamente nula) e H (x ) = M×| g (x )| são tais que 5
lim x®aG(x ) = 0 e lim x®aH (x ) = 0 . Pelo Teorema do Confronto, lim x®a | f (x ) × g (x )|= 0 T
. Portanto, lim x®a( f (x ) × g (x )) = 0 (veja o exercício 2b desta aula). 1
O resultado a seguir mostra que, se o limite de uma função é positivo, então a
função é positiva em algum intervalo suficientemente pequeno.

Teorema 5 (Conservação do sinal) Sejam X Ì  , a Î X ¢ e f : X ® 


uma função, tais que lim x®a f (x ) = L , onde L Î  e L > 0 . Então existe d > 0 tal
que f (x ) > 0 , para todo x Î (a - d , a + d ) .

Demonstração: Seja e = L / 2 > 0 . Pela definição de limite, existe d > 0 tal que, se
L 3L L
x Î (a - d , a + d ) então f (x ) Î (L - e, L + e) = ( , ) . Logo 0 < < f (x ) , o que im-
2 2 2
plica que f (x ) > 0 , para x Î (a - d , a + d ) .

Observemos que, se lim x®a f (x ) = L e L < 0 , então vale um resultado análogo ao


do Teorema 5. De fato, neste caso, existe d > 0 tal que f (x ) < 0 para x Î (a - d , a + d )
. A demonstração deste fato é inteiramente análoga à do Teorema 5 (veja o exercício
de aprofundamento 1).
A seguir, demonstraremos as propriedades operatórias básicas dos limites.

Teorema 6 Sejam X Ì  , a Î X ¢ e f , g : X ®  funções. Suponha que


lim x®a f (x ) e lim x®a g (x ) existam. Então

1. lim x®a( f (x ) + g (x )) = lim x®a f (x ) + lim x®a g (x )


, onde k Î R é uma constante.
2. lim x®a(k × f (x )) = k × lim x®a f (x )
.
3. lim x®a( f (x ) × g (x )) = lim x®a f (x ) × lim x®a g (x )

f (x ) lim x®a f (x )
lim x®a = , desde que lim x®a g (x ) ¹ 0 .
4. g (x ) lim x®a g (x )

Análise Real 91

analisereal.indd 91 04/04/2012 15:18:11


Demonstração: Vamos fixar, ao longo da demonstração, a notação lim x®a f (x ) = L1 e
lim x®a g (x ) = L2 .
(1) Observemos que, dado e > 0 , existem d1 > 0 e d2 > 0 tais que
|x - a |< d1 Þ| f (x ) - L1 |< e / 2 e |x - a |< d2 Þ| g (x ) - L2 |< e / 2 . Assim, se
d = min{d1 , d2 } , então
e e .
|x - a |< d Þ| f (x ) + g (x ) - (L1 + L2 )|=| f (x ) - L1 + g (x ) - L2 |£| f ( x ) - L1 |+| g ( x ) - L2 |< + = e
A Isso mostra que, pela definição de limite, vale a identidade (1).
2 2

5 (2) Usaremos novamente a definição de limite. Se a constante k for igual a zero,


T então lim x®a(k × f (x )) = lim x®a 0 = 0 = 0 × L1 , ou seja, a identidade (2) é verdadeira
1 neste caso. Podemos supor, então, que k ¹ 0 . Dado e > 0 , existe d > 0 tal que
|x - a |< d Þ| f (x ) - L1 |< e /|k |. Assim,
e
|x - a |< d Þ|k × f (x ) - k × L1 |=|k |×| f (x ) - L1 |<|k |× = e.
|k |
Isso mostra que lim x®a(k × f (x )) = k × lim x®a f (x ) .
(3) Comecemos observando que
| f (x ) g (x ) - L1L2 |=| f (x ) g (x ) - L1 g (x ) + L1 g (x ) - L1L2 |£| g ( x )|×| f ( x ) - L1 |+|L1 |×| g ( x ) - L2 | (1)
Primeiramente, se L1 = 0 (ou L2 = 0 ) então o resultado que queremos demons-
trar é consequência do Teorema 2 e do Corolário 4. Podemos supor, então, que
L1 ¹ 0 e L2 ¹ 0 . É
possível escolher d1 > 0 de modo que
e
|x - a |< d1 Þ| g (x ) - L2 |< .
2|L1 | e
Por outro lado, se |x - a |< d1 , então a desigualdade | g (x ) - L2 |< pode
2|L1 |
ser reescrita como
e e
L2 - < g (x ) < L2 + ,
2|L1 | 2|L1 |
donde deduzimos que
ïì e e ïüï
| g (x )|< m = max ïí L2 - , L2 + ý.
ïï 2| L | 2| L | ïï
î 1 1 þ
Dessa forma, | g (x )|×| f (x ) - L1 |< m×| f (x ) - L1 |. Podemos, então, escolher d2 > 0
e
tal que |x - a |< d2 implica | f (x ) - L1 |< . Juntando estas informações com as
2m
desigualdades de (1) vemos que, para todo x Î  tal que |x - a |< d , onde
d = min{d1 , d2 } , temos
| f (x ) g (x ) - L1L2 |£| g (x )|×| f (x ) - L1 |+|L1 |×| g ( x ) - L2 |< m×| f ( x ) - L1 |+|L1 |×| g ( x ) - L2 |<

e e e e
< m× +|L1 |× = + =e
2m 2|L1 | 2 2

o que demonstra a igualdade em (3).


(4) Para demonstrarmos o último item, notemos, primeiramente, que, se L2 ¹ 0 , então

92 Licenciatura em Matemática

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æ 1 1ö æ L - g (x ) ö÷ é 1 úù
lim ççç - ÷÷÷ = lim ççç 2 ÷÷ = lim ê(L2 - g (x )) × .
x®a èç g (x ) L2 ø÷ x®a çè g (x )L2 ÷ø x®a êë g (x )L2 úû
Notemos que lim x®a(L2 - g (x )) = 0 , pois lim x®a g (x ) = L2 . Por outro lado, como
L2 ¹ 0 , o Teorema 5 e os comentários feitos logo após a sua demonstração nos per-
mitem concluir que | g (x )|³ N > 0 , para x Î (a - d , a + d ) , com d > 0 suficiente-

mente pequeno. Logo,


A
1 1
5
£
g (x )L2 |N × L2 |
1
T
o que significa que a função
g (x )L2
é limitada. Pelo Corolário 4, temos 1
æ 1 1ö é 1 úù
lim ççç - ÷÷÷ = lim ê(L2 - g (x )) × =0
x®a çè g (x ) L2 ø÷ x®a êë g (x )L2 úû
1 1
e, portanto, lim x®a = , se L2 ¹ 0 .
g (x ) L2
Usando, agora, o item (3), obtemos:
f (x ) æ 1 ö÷ æ 1 ö÷ 1 L
lim = lim ççç f (x ) × ÷÷ = lim f (x ) × lim çç
ç
÷÷ = L1 × = 1 .
x®a g (x ) x®a è ç g (x ) ø÷ x®a x®a èç g (x ) ø÷ L2 L2
Com isso, concluímos a demonstração.

Com este resultado, chegamos ao final do nosso primeiro tópico desta aula 5. Exi-
bimos a definição formal de limite e usamos esta definição para demonstrarmos al-
guns teoremas fundamentais, como o Teorema do Confronto (Teorema 3) e o Teorema
da conservação do sinal (5). Obtivemos também algumas propriedades operatórias
do limite que serão úteis mais adiante.

Análise Real 93

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02
TÓPICO

LIMITES LATERAIS
OBJETIVOS
··Assimilar a noção de limite lateral;
··Usar a noção de limite lateral como critério para a
existência de limite bilateral em um ponto.

E xistem exatamente duas maneiras de acessar um ponto a da reta real por


caminhos contidos na reta. Podemos nos aproximar de a vindo pela es-
querda ou pela direita de a . A ideia de limite lateral é observar o compor-
tamento de uma função f (x ) quando x tende a a mas está restrito a uma das semir-
retas determinadas por a sobre a reta real, isto é, forçamos x a ser maior do que a
ou a ser menor do que a . Veremos, neste tópico, que os limites laterais pela esquer-
da e pela direita coincidem se, e somente se, o limite (bilateral, ou seja, no sentido
usual definido no tópico anterior) existe.
Seja X Ì  e X ¢ o conjunto dos pontos de acumulação de X . Em geral, X ¢ po-
de ser vazio, por exemplo, se X é finito ou se X =  , o conjunto dos número intei-
ros. Para que faça sentido o cálculo de limites, estamos supondo, ao longo desta aula,
que X ¢ ¹ Æ , ou seja, os conjuntos de números reais considerados nesta aual têm

94 Licenciatura em Matemática

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pontos de acumulação. O caso mais importante é, sem dúvida, aquele em que X é
um intervalo.
Os conjuntos X+¢ ={a Î  | X Ç (a, a + d ) ¹ Æ,"d > 0} e
X-¢ ={a Î  | X Ç (a - d , a ) ¹ Æ,"d > 0} são chamados, respectivamente, conjuntos
dos pontos de acumulação à direita e à esquerda. É claro que X ¢ = X-¢ È X+¢ , e esta
reunião não precisa ser necessariamente disjunta.
Seja f : X ®  e a Î X+¢ . Um número real L é dito limite à direita de f (x ) , de- A
notado por lim x®a+ f (x ) = L , quando x tende a a se, para todo e > 0 , existe d > 0 5
tal que
x Î (a, a + d ) Þ| f (x ) - L|< e.
T
2
A condição x Î (a, a + d ) é equivalente a 0 < x - a < d .
Seja f : X ®  e x Î X-¢ . Um número real L é dito limite à esquerda de f (x ) ,
denotado por lim x®a- f (x ) = L , quando x tende a a se, para todo e > 0 , existe
d > 0 tal que
x Î (a - d , a ) Þ| f (x ) - L|< e.
A condição x Î (a - d , a ) é equivalente a 0 < a - x < d .
O resultado a seguir caracteriza a existência do limite de uma função em um pon-
to a Î X+¢ Ç X-¢ .

Teorema 7 Sejam X Ì  , f : X ®  e a Î X-¢ Ç X+¢ . Então o limite lim x®a f (x )


existe se, e somente se, os limites laterais lim x®a+ f (x ) e lim x®a- f (x ) existem e
são iguais. Se lim x®a+ f (x ) = lim x®a- f (x ) = L , então lim x®a f (x ) = L .

Demonstração: Suponha que lim x®a f (x ) = L . Pela definição de limite, isto significa
que, dado e > 0 , existe d > 0 tal que x Î (a - d , a + d ) implica | f (x ) - L|< e . Em
particular x Î (a - d , a ) implica | f (x ) - L|< e , logo lim x®a- f (x ) = L e x Î (a, a + d )
implica | f (x ) - L|< e , logo lim x®a+ f (x ) = L .

Reciprocamente, se lim x®a+ f (x ) = lim x®a- f (x ) = L , então, dado e > 0 , existem


d1 > 0 e d2 > 0 tais que
a < x < a + d1 Þ| f (x ) - L|< e,
a - d2 < x < a Þ| f (x ) - L|< e.
Seja d = min{d1 , d2 } , então (a - d , a + d ) Ì (a - d2 , a + d1 ) . A figura a seguir ilustra

o caso em que d = d1 .

Figura 3 – O caso em que d = min{d1 , d2 } = d1

Análise Real 95

analisereal.indd 95 04/04/2012 15:18:18


Podemos concluir que, se 0 <|x - a |< d , então x¹a e
x Î (a - d , a + d ) Ì (a - d2 , a + d1 ) , o que implica x Î (a - d2 , a ) È (a, a + d1 ) . Logo,
| f (x ) - L|< e . Isso mostra que lim x®a f (x ) = L . █
Exemplo 1: Sejam L, M , a Î  , com a ¹ 0 . Consideremos a função
f :  -{a} ®  , dada por
1æM + L x - a ö÷
A f (x ) = çç × x + ( M - L) × ÷.
2 èç a |x - a |ø÷÷
5 Se x < a , então x - a < 0 e, consequentemente,
x-a
= -1 . Logo, neste caso,
|x - a |
T
1æM + L
f (x ) = çç
ö
× x - ( M - L)÷÷÷.
2 2è a
1
ø
Assim, lim x®a- f (x ) = × ( M + L - M + L) = L .
2
x-a
Analogamente, se x > a , então x - a > 0 e =1 . Logo, neste caso,
|x - a |
1 æM + L ö
f (x ) = × çç × x + ( M - L)÷÷÷.
2 è a ø
1
Portanto, lim x®a+ f (x ) = × ( M + L + M - L) = M .
2
Mostramos, portanto, que, dados L e M reais, é possível produzir uma função
que tenha limite lateral pela esquerda igual a L e limite lateral pela direita igual a
M , em um ponto a ¹ 0 . Como consequência do Teorema 7, o limite lim x®a f (x ) ex-
iste se, e somente se, L = M .

Exemplo 2: A função logaritmica L : (0, +¥) ®  , dada por L(x ) = ln x , tem


como domínio o intervalo aberto I = (0, ¥) . Logo, I-¢ = Æ e I ¢ = I+¢ = [0, +¥) . Por-
tanto lim x®0-L(x ) não existe e só faz sentido considerarmos o limite lateral
lim x®0+L(x ) . No entanto, mesmo este limite não é um número real. De fato, se
p
lim x®0+L(x ) = p Î  então, para e = , existiria d > 0 tal que
p 2
0 < x < d Þ = p - e < L(x ) < p + e.
2
p
Porém, < L(x ) implicaria 0 < e1/ p < x , onde e » 2,718 é o número de Euler.
2
Mas isso contraria o fato de x poder ser qualquer elemento no intervalo (0, d ) . A
contradição veio de supormos o limite finito, o que não ocorre. Trataremos de lim-
ites deste tipo no próximo tópico.
O exemplo 2 acima exibe o caso em que o domínio de uma função não possui
pontos de acumulação à esquerda e, portanto, o limite lateral à esquerda não existe.
O resultado a seguir mostra que, se X-¢ ¹ Æ e a Î X-¢ , então o limite lateral
lim x®a- f (x ) existe, para uma função monótona e limitada f definida em X , o mes-
mo valendo para um ponto de acumulação à direita.

96 Licenciatura em Matemática

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Uma função f : X ®  é dita estritamente crescente se, dados x1 , x2 Î X , com
x1 < x2 , temos f (x1 ) < f (x2 ) . Se, para x1 , x2 Î X , com x1 < x2 , ocorre f (x1 ) > f (x2 ) ,
dizemos que f é estritamente decrescente. Se, para x1 , x2 Î X ocorre f (x1 ) £ f (x2 ) ,
dizemos que f é crescente e se, para x1 , x2 Î X ocorre f (x1 ) ³ f (x2 ) , dizemos que f
é decrescente. Se f é de um dos tipos acima, dizemos que f é uma função monótona.

Teorema 8 Sejam X Ì  , f : X ®  uma função monótona limitada, a Î X+¢ A


e b Î X-¢ . Os seguintes limites laterais existem:
5
L = lim f (x ), T
2
+
x®a
M = lim f (x ).
-
x®a

Demonstração: Vamos supor que a função f é cres-


cente, sendo os demais casos análogos. Seja
L = inf{ f (x )|x Î X ,x > a} . Vamos mostrar que
SAIBA MAIS
L = lim x®a+ f (x ) . De fato, pela definição de ínfimo, dado
e > 0 , existe b Î X , b > a tal que L £ f (b) < L + e . Como Heinrich Eduard Heine, matemático
alemão, nasceu em 1821 e faleceu
f é crescente, se a < x < b , então L £ f (x ) £ f (b) < L + e
em 1881. Em sua homenagem, a
. Tomando d = b - a > 0 , vemos que, se a < x < a + d , en- definição de limite de uma função foi
tão L - e < L £ f (x ) < L + e , ou seja, | f (x ) - L|< e . De chamada definição de Heine. Para
mais informações, consulte a página
modo inteiramente análogo, vemos que, se
http://www-history.mcs.st-and.ac.uk/
M = sup{ f (x )|x Î X ,x < b} , então lim x®b- f (x ) = M . Biographies/Heine.html.

Na aula 4, vimos que uma função x :  ®  , cujo do-


mínio é o conjunto  ={1,2,3,} dos números naturais, é
chamada sequência de números reais. Para cada n Î  , ATENÇÃO!
usamos a notação xn em vez da notação usual x(n) para o
Na demonstração do teorema 8, usa-
valor da função x em n , e usamos a notação (xn ) para in-
mos, de modo essencial, a propriedade
dicar a sequência x :  ®  . Dizemos que o limite de xn de completude dos reais, vista na aula 2.

é igual a L se, para cada e > 0 , existe N Î  tal que


n ³ N Þ|xn - L|< e.
Usamos as notações lim n®¥xn = L , ou lim nxn = L , ou lim xn = L .
A seguir, obteremos uma caracterização de limite de uma função, dada no Teore-
ma 9, chamada definição de limite segundo Heine.

Análise Real 97

analisereal.indd 97 04/04/2012 15:18:23


Teorema 9: Sejam X Í  , f : X ®  uma função e a Î X ¢ . Vale a seguinte
equivalência

lim f (x ) = L Û lim f (xn ) = L


x®a n
Para toda sequência (xn ) tal que lim nxn = a .

A
5 Demonstração: (Þ) Suponhamos que lim x®a f (x ) = L . Seja (xn ) uma sequência
que converge para a . Dado e > 0 , existe d > 0 tal que |x - a |< d implica
T | f (x ) - L|< e e, para cada d > 0 , existe N natural tal que n ³ N implica
2 |xn - a |< d . Temos, então, as seguintes implicações:
n ³ N Þ|xn - a |< d Þ| f (xn ) - L|< e.
Mostramos, assim, que, dado e > 0 , existe um número natural N tal que n ³ N
implica | f (xn ) - L|< e . Portanto lim f (xn ) = L .
(Ü) Reciprocamente, vamos supor que lim x®a f (x ) ¹ L e, a partir deste fato,
produziremos uma sequência (xn ) que converge para a tal que lim f (xn ) ¹ L . De
1
fato, para cada n ³ 1 natural, consideremos xn = a + . Dado d > 0 , existe (pela
1 n 1
propriedade arquimediana dos reais) n ³ 1 tal que < d , logo a - d < a < a + < a + d
n n
. Isso mostrea que lim xn = a . Por outro lado, como lim x®a f (x ) ¹ L , existe e > 0 tal
que, para todo d > 0 , a - d < x < a + d implica f (x ) Î / (L - e, L + e) , isto é,
| f (x ) - L|³ e . Em particular, xn Î (a - d , a + d ) , para n natural suficientemente
grande. Logo, f (xn ) Î
/ (L - e, L + e) , para n suficientemente grande, o que nos leva
a concluir que lim f (xn ) ¹ L . v

Encerramos aqui nosso segundo tópico, que tratou de limites laterais. Vimos que
é possível usar a ideia de limite lateral para testar se uma função possui limite em
um determinado ponto. Vimos, ainda, um resultado (Teorema 9), que nos permite
usar sequências para testar se um determinado limite existe ou não.

98 Licenciatura em Matemática

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03
TÓPICO
LIMITES NO INFINITO
E LIMITES INFINITOS

OBJETIVOS
··Compreender as noções de limite no infinito e de
limite infinito;
··Calcular limites no infinito de funções racionais.

A té aqui vimos a noção de limite como uma ferramenta para analisar o


comportamento de uma função na vizinhança de um ponto fixado sobre
a reta real. Neste tópico, veremos que é possível adaptar a definição de
limite de modo a nos permitir a análise do comportamento de uma função quando o
valor absoluto |x | da variável torna-se “arbitrariamente grande”. Veremos ainda
que existem funções que assumem valores arbitrariamente grandes (em valor abso-
luto) quando a variável x se aproxima de algum ponto a da reta real.
Vamos, agora, considerar limites quando a variável x torna-se muito grande em
valor absoluto. Estes limites são chamados limites no infinito. Suponhamos que
X Ì  não seja limitado superiormente. Consideremos a função f : X ®  . Dado
L Î  , dizemos que f (x ) tende a L quando x tende ao infinito positivo, ou a
“mais infinito”, quando

100 Licenciatura em Matemática

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Dado e > 0 , existe N Î  , N > 0 , tal que x > N Þ| f (x ) - L|< e .
Indicamos este limite por lim x®+¥ f (x ) = L .
De modo análogo, se X não é limitado inferiormente e f : X ®  é uma função,
então o número M é dito limite de f (x ) quando x tende ao infinito negativo, ou a
“menos infinito”, quando
Dado e > 0 , existe N Î  , N > 0 , tal que x < -N Þ| f (x ) - M |< e .
Indicamos este limite por lim x®-¥ f (x ) = M . A
5
Exemplos:
T
1 1
1. Temos lim x®+¥ = 0 e lim x®-¥ = 0 . De fato, dado e > 0 , existe N = > 0
1 3
x x e
1 1
tal que x > N = implica 0 < f (x ) = < e , ou seja, | f (x ) - 0|< e . O caso
e x
x ® -¥ é análogo.
2. Se f (x ) = e x , então lim x®-¥ f (x ) = 0 . De fato, dado e > 0 , existe N = - ln e tal
que x < -N = ln e implica 0 < e x < e ln e = e , ou seja, x < -N implica
|e x - 0|< e .
a
lim x®+¥ n = 0 , para todo n ³ 1 natural e todo a Î  constante. De fato, as
x operatórias de limite implicam que
3. propriedades
n n
a æ1ö æ 1ö
lim = a lim çç ÷÷÷ = a çç lim ÷÷÷ = a × 0n = 0.
x ®+¥ è x ø èx®+¥ x ø
n
x ®+¥ x

4. Se p(x ) e q(x ) são funções polinomiais, então


p( x )
lim = 0,
x ®+¥ q( x )

se o grau do polinômio q(x ) é maior do que o grau do polinômio p(x ) . De fato, se-
jam p(x ) = a0 + a1x +  + an x n e seja q(x ) = b0 + b1x +  + bm x m , com m > n . Então
a0 a a
p( x ) + m1-1 +  + mn-n
a0 + a1x +  + an x n m 0
lim = lim = x x x = = 0.
x ®+¥ q( x ) x ®+¥ b + b x +  + b x
m b b b
0 1 m 0
+ 1 +  + m-1 + bm bm
x m x m-1 x

No limite acima, usamos diversas vezes o resultado exibido no exemplo anterior.


5. Se p(x ) e q(x ) são funções polinomiais onde p e q são polinômios de mesmo
grau, com coeficientes líderes an e bn , respectivamente, então
p(x ) an
lim = .
x ®+¥ q( x ) bn
Veja o exercício de aprofundamento 2.

Análise Real 101

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Dada uma função f : X ®  , onde X Ì  , e dado
a Î X ¢ , pode ocorrer a seguinte situação:
ATENÇÃO! Dado N > 0 , existe d > 0 tal que |x - a |< d Þ f (x ) > N
p( x ) . Neste caso, dizemos que f (x ) tende a “mais infinito” quan-
As funções do tipo f (x ) = , on-
q(x ) do x tende a a e escrevemos lim x®a f (x ) = +¥ .
de p(x) e q(x) são polinômios e q(x)
Se, por outro lado, ocorre o seguinte:
A não é identicamente nulo, são cha-
Dado N >0, existe d>0 tal que
5 madas funções racionais.
|x - a |< d Þ f (x ) < -N , dizemos que f (x ) tende a “me-
T nos infinito” quando x tende a a e escrevemos
3 lim x®a f (x ) = -¥ .

ATENÇÃO! Exemplos:
1
Os símbolos -¥ e +¥ não indi- 1. Se f :  -{0} ®  é dada por f (x ) = , então
x2
cam números. São símbolos que in- lim x®0 f (x ) = +¥ . Observemos, primeiramente, que
dicam o comportamento da função 0 não pertence ao domínio de f , mas 0 é ponto de
quando x tende a a . acumulação do conjunto  -{0} . Dado N > 0 , seja
1
d= . Consequentemente, se |x - 0|< d , então
N

1 1 1
|x |< d Þ|x |< Þ x 2 < Þ f (x ) = 2 > N.
N N x
Isso mostra que lim x®0 f (x ) = +¥ , como queríamos.
(ln x ) = -¥ . De fato, dado N > 0 , seja d = e -N > 0 . Se 0 < x < d = e -N
2. lim x®0+
, então ln x < ln(e -N ) = -N , e isso mostra que lim x®0+ (ln x ) = -¥ .
Com estes exemplos, encerramos nosso terceiro tópico e nossa aula 5. Discutimos
a definição e as propriedades do limite de funções. Estudamos, também, os casos es-
peciais em que o limite é lateral, quando o limite ocorre com x tendendo a +¥ ou
a -¥ e ainda o caso em que o limite é infinito.

102 Licenciatura em Matemática

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ATIVIDADES DE APROFUDAMENTO

1. Sejam X Ì  , a Î X ¢ e f : X ®  uma função, tais que lim x®a f (x ) = L , onde L Î  e


L < 0 . Mostre que existe d > 0 tal que f (x ) < 0 , para todo x Î (a - d , a + d ) . (Sugestão:
A
proceda como na demonstração do Teorema 5).
5
2. Usando o mesmo raciocínio do exemplo 4, mostre que, se p(x ) e q(x ) são funções polin-
miais onde p e q são polinômios de mesmo grau, com coeficientes líderes an e bn , res- T
pectivamente, então 3
p(x ) an
lim = .
x ®+¥ q(x ) bn
3. Dada uma função polinomial p :  ®  , p(x ) = an x n +  + a1x + a0 , com an ¹ 0 , mostre
que
d) Se an > 0 e n é par, então lim x®+¥ p(x ) = +¥ e lim x®-¥ p(x ) = +¥ .
e) Se an > 0 e n é ímpar, então lim x®+¥ p(x ) = +¥ e lim x®-¥ p(x ) = -¥ .
f) Se an < 0 e n é par, então lim x®+¥ p(x ) = -¥ e lim x®-¥ p(x ) = -¥ .
g) Se an < 0 e n é ímpar, então lim x®+¥ p(x ) = -¥ e lim x®-¥ p(x ) = +¥ .

Análise Real 103

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analisereal.indd 104 04/04/2012 15:18:33
Aula 6
Limites de Funções

Olá, aluno (a),

Nesta aula, estudaremos as funções contínuas. Intuitivamente, podemos imaginar


uma função contínua em um ponto a de seu domínio como sendo uma função que
tenha comportamento estável em uma vizinhança de a . Mais precisamente, uma
função é contínua em a se pequenas variações de um número real x próximo ao
ponto a causam pequenas variações de f (x ) em torno de f (a ) . Para colocar isso de
um modo claro, devemos usar a noção de limite, desenvolvida na aula 5. As funções
contínuas têm propriedades adequadas ao estudo de fenômenos físicos. Estudare-
mos nesta aula a principal destas propriedades: o Teorema do Valor Intermediário.

Objetivos:
• Compreender a definição de função contínua e interpretar geometricamente esta definição.
• Identificar se uma dada função é ou não é contínua.
• Enunciar, demonstrar e aplicar o Teorema do valor Intermediário.

105

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01
TÓPICO
DEFINIÇÃO E EXEMPLOS
DE FUNÇÕES CONTÍNUAS

OBJETIVOS
··Identificar funções contínuas e funções
descontínuas.
··Reconhecer e aplicar as propriedades das funções
contínuas.

N este primeiro tópico, definiremos, de modo preciso, a noção de função contínua


e veremos suas propriedades básicas. As funções contínuas surgem naturalmen-
te na descrição de fenômenos naturais, como indica o seguintes exemplo.
Suponhamos que um ponto material esteja sujeito a uma força constante e não-
-nula. Como consequência da segunda lei de Newton, este ponto tem o seu movi-
mento uniformemente acelerado, com aceleração a ¹ 0 . Sua velocidade é dada pela
equação v(t ) = v0 + at . Se o tempo é medido em segundos, após a passagem de 1 se-
gundo, a velocidade do ponto material é de v(1) = v0 + a . Dizemos que o ponto ma-
terial sofreu uma aceleração e sua velocidade variou de v0 a v0 + a . Se a > 0 , então
v0 < v0 + a .
É natural se pensar que o ponto material assumiu, no intervalo de tempo entre
0 e 1, todas as possíveis velocidades entre v0 e v0 + a . Para exprimirmos este fato,

106 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 106 04/04/2012 15:18:34


dizemos que a função v(t ) = v0 + at , que fornece a veloci-
dade a cada instante de tempo entre 0 e 1, é uma função
contínua.
SAIBA MAIS
Exemplos deste tipo são abundantes na natureza: se
uma pessoa nasce com 40cm e quando adulto tem 170cm Para revisar o conteúdo sobre a Lei de
Newton, acesse o site http://efisica.
, em algum momento da vida teve exatamente 100cm de
if.usp.br/mecanica/basico/2a_lei_de_
altura. Se um recipiente, a princípio vazio, é cheio em uma newton/seg_lei_Newton/
A
hora, em algum instante dessa hora esteve exatamente com 6
medade da capacidade ocupada. Nestes dois casos, as funções que regem a variação T
da grandeza (altura da pessoa ou volume ocupado no recipiente) são contínuas. 1
Consideremos um subconjunto X Ì  e um ponto a Î X que também seja pon-
to de acumulação X , isto é, a Î X ¢ . Dizemos que uma função f : X ®  é contí-
nua em a , se
1. o limite lim x®a f (x ) existe e
2. vale a igualdade

lim f (x ) = f (a ).
x®a

Uma função f : X ®  é dita contínua se é contínua em todo ponto a Î X .


A continuidade é uma propriedade preservada pelas operações elementares, co-
mo podemos ver no resultado a seguir.

Teorema 1 Sejam X Í  , a Î X e f , g : X ®  duas funções contínuas em


a . Então
1. A função f + g : X ®  , dada por ( f + g )(x ) = f (x ) + g (x ) , é contínua
em a .
2. Dada uma constante k Î  , a função kf : X ®  , dada por (kf )(x ) = k × f (x )
, é contínua em a .
3. A função fg : X ®  , dada por ( fg )(x ) = f (x ) × g (x ) , é contínua em a .
f (x )
4. A função f / g : X ®  , dada por ( f / g )(x ) = , é contínua em a ,
desde que g (a ) ¹ 0 . g (x )

Demonstração: Todos os itens são consequências do Teorema 6, que vimos na


Aula 5, e da hipótese de f e g serem contínuas no ponto a . No último item, vale
ressaltar que, pela continuidade lim x®a g (x ) = g (a ) , logo supor que g (a ) ¹ 0 equi-
vale a supor que lim x®a g (x ) ¹ 0 .
Exibiremos, a seguir, alguns exemplos de funções contínuas. De especial impor-
tância é o exemplo 4, que mostra que toda função polinomial é contínua.

Análise Real 107

analisereal.indd 107 04/04/2012 15:18:36


EXEMPLOS:
1. A função constante f : R ®  , f (x ) = k , pa-
ATENÇÃO! ra todo x Î  , é contínua. De fato, se a Î  ,
lim x®a f (x ) = lim x®ak = k = f (a ) .
À primeira vista, pode parecer es- 2. A função identidade f :  ®  , f (x ) = x
f
tranho que a função do exemplo , é contínua. De fato, dado aÎ ,
5 seja contínua. Ocorre que o único lim x®a f (x ) = lim x®ax = a = f (a ) .
A ponto a da reta real onde o limi- 3. Dado um número inteiro n ³ 2 , seja f :  ®  , da-
6 te lim x®a
f (x )
não existe é o pon- da por f (x ) = x n . Aplicando o item 3 do Teorema 1,
n - 1 vezes, e o resultado do exemplo anterior, con-
T to a = 0 , que não faz parte do do-
f cluímos que a função f é contínua.
1 mínio de . Assim, não faz sentido
f 4. Seja p :  ®  uma função polinomial, dada por
perguntar se é ou não e contínua
em a = 0 , pois este ponto não faz p(x ) = an x n + an-1x n-1 +  + a1x + a0 .
f Aplicando n vezes os itens 1 e 2 do Teorema 1 e usando
parte do domínio da função . No
exemplo 6, em que 0 faz parte do os resultados dos exemplos acima, concluímos que a fun-
domínio, a função em questão não é ção p é contínua.
contínua neste ponto. 1
5. A função f :  -{0} ®  , dada por f (x ) =
x
é contínua. De fato, dado a Î  -{0} , temos
1 1
lim x®a f (x ) = lim x®a = = f (a ) . Logo, a função f
x a
é contínua.
1
6. A função f :  ®  , dada por f (x ) = , se x ¹ 0 e f (0) = 0 não é con-
x
tínua. De fato, 0 é um ponto do domínio de f e lim x®0+ f (x ) = +¥ en-
quanto lim x®0- f (x ) = -¥ . Como os limites laterais não coincidem, o limite
lim x®0 f (x ) não existe. Portanto, f não é contínua em 0 .

EXEMPLOS:
1. A função f (x ) = senx é contínua. De fato, dadox -aaÎ  ,
sen
x-a x+a 2 |×|cos x + a |×|x - a |.
|senx - sena |=|2sen cos |=|
2 2 x-a 2
2

Usando o limite trigonométrico fundamental, estudado no curso de Cálcu-


x-a
sen
lo 1, obtemos lim x®a 2 =1 . Como a função cos x + a é limitada e |x - a |
x-a 2
2
tende a zero quando x tende a a , obtemos lim x®a |senx - sena |= 0 , ou seja,

lim x®a(senx ) = sena .

108 Licenciatura em Matemática

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2. A função E (x ) = e x é contínua. De fato, dado a Î  ,
ex - ea
|e x - e a |=| |×|x - a |.
x-a ex - ea
Sabemos, do curso de Cálculo I, que lim x®a é a derivada de e x em x = a
x - a
, isto é, é igual a e a . Assim,
æ ex - ea ö
lim | e x
- e a
|= lim ççç| |×|x - a |÷÷÷ = e a × 0 = 0,
x®a è x - a ø÷
A
x®a

o que mostra que e x é contínua.


6
Dadas duas funções f : X ®  e g : Y ®  , tais que a imagem f ( X ) de f es- T
tá contida em Y , ou seja, f ( X ) Í Y , então podemos considerar a função composta 1
g f :X®

Figura 1: Gráfico da função g  f : X ® 

A seguir, mostraremos que a composta de duas funções contínuas também é contínua.

Teorema 2 Dadas duas funções contínuas f : X ®  e g : Y ®  , tais que


f ( X ) Í Y , a função composta g  f : X ®  é contínua.

Demonstração: Queremos mostrar que, para todo a Î X , lim x®a g ( f (x )) = g ( f (a ))


. Como g é contínua, dado e > 0 , existe e ¢ > 0 tal que, se y Î Y e | y - f (a )|< e ¢
, então | g ( y ) - g ( f (a ))|< e . Como f também é contínua, existe d > 0 tal que, se
|x - a |< d , então | f (x ) - f (a )|< e ¢ . Consequentemente,
|x - a |< d Þ| f (x ) - f (a )|< e ¢ Þ| g ( f ( x )) - g ( f ( a ))|< e.
Isso mostra que a função g  f é contínua em todo a Î X .

Um ponto a Î X onde uma função f : X ®  não é contínua é chamado pon-


to de descontinuidade de f . Uma função que apresenta pelo menos um ponto de
descontinuidade é chamada função descontínua.

Análise Real 109

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EXEMPLOS:
1. A função f :  ®  , dada por
ì-
ï 1 se x £ 0
f (x ) = ïí
ïïî 1 se x > 0
é descontínua em 0 . De fato, lim x®0- f (x ) = -1 ¹ 1= lim x®0+ f (x ) , logo
lim x®0 f (x ) não existe e, portanto, f não é contínua em 0 .

A
6
T
1

Figura 2: Gráfico de função descontínua

2. Uma função com uma infinidade de descontinuidades. Dado um número


real x , a notação êëx úû , indica o maior número inteiro que não supera x , ou seja,
x  = max{n ∈  |n ≤ x}.
ê1ú
Por exemplo, êêë 2 úúû =1 , êëp úû = 3 , êëe úû = 2 , ê ú = 0 , êë5úû = 5 , ëê-2,1ûú = -3 .
ëê 2 ûú
A função f :  ®  , dada por
f (x ) = x - êëx úû
é descontínua em n , para todo n inteiro. De fato, se n Î  , então
lim x®n- f (x ) = lim x®n (x - êëx úû ) = lim x®n(x - (n - 1)) =1 . Isso ocorre porque, como
x <n
x ® n e x < n , podemos supor que n - 1< x < n , logo êëx úû = n - 1 .
Por outro lado, lim x®n+ f (x ) = lim x®n (x - êëx úû ) = lim x®n(x - n) = 0 . Isso ocorre
x >n
porque, como x ® n e n < x , podemos supor que n < x < n + 1 .
Como os limites laterais são diferentes, lim x®n f (x ) não existe, logo f é descontí-
nua em n , para cada n inteiro.

110 Licenciatura em Matemática

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A
6
T
1
Figura 3: Gráfico da função f (x ) = x - êëx úû

3. Uma função descontínua em todos os pontos da reta. Seja f :  ®  , da-


/  e f (x ) =1 , se x Î  . Vamos mostrar que a função
da por f (x ) = 0 , se x Î
f é descontínua em a , para todo número real a . Uma vez que o conjunto 
dos números racionais é denso em  , dados a Î  e d > 0 , existem r Î 
e t Î  -  , tais que |r - a |< d e |t - a |< d . Se lim x®a f (x ) existisse e fos-
1
se igual a L , então existiria d > 0 tal que | f (x ) - L|< para todo x Î  tal
2
1 1
que |x - a |< d . Em particular, teríamos | f (r ) - L|< e | f (t ) - L|< . Mas,
2 2
sendo r racional e t irracional, temos f (r ) =1 e f (t ) = 0 , logo
1 1
1=|1 - 0|=| f (r ) - f (t )|£| f (r ) - L|+| f (t ) - L|< + =1,
2 2
o que é um absurdo. A contradição veio de supormos que o limite lim x®a f (x )
existia. Logo este limite não existe, para qualquer a Î  o que mostra que f não
pode ser contínua em ponto algum da reta real.

Dada uma função f : X ®  e Y Í  , usamos a seguinte notação


f -1 (Y ) ={x Î X | f (x ) Î Y }.
Este conjunto é chamado imagem inversa ou pré-imagem de Y . O conjun-
to f -1 (Y ) pode ser, inclusive, o conjunto vazio, como mostra o primeiro exemplo
abaixo.

EXEMPLOS:

Análise Real 111

analisereal.indd 111 04/04/2012 15:18:45


1. Seja f :  ®  , dada por f (x ) = x 2 e seja Y = (-1,0) ={x Î  |-1< x < 0} .
Então f -1 (Y ) = Æ . De fato, se x Î f -1 (Y ) , então f (x ) Î Y , ou seja, x 2 Î (-1,0)
. Mas isso implicaria -1< x 2 < 0 , o que é uma contradição, pois x 2 ³ 0 , para
todo x Î  . A contradição vem de supormos que existe algum elemento em
f -1 (Y ) . Portanto, este conjunto é vazio.
2. Se f :  ®  é a função constante f (x ) =1 , então f -1 ({1}) =  .

A
6 Na aula 2, vimos a definição de conjunto aberto. Vamos usar esta definição para
caracterizar, no Teorema abaixo, as funções contínuas.
T
1
Teorema 3 Dado X Í  , uma função f : X ®  é contínua se, e somente se,
f -1 ( A) é um aberto, para todo aberto A Í  .

Demonstração: Inicialmente, suponhamos que f é contínua. Isto significa


que, dado a Î X , lim x®a f (x ) = f (a ) . Seja A Í  um aberto. Queremos mostrar
que f -1 ( A) é um aberto. Para tal, tomemos a Î f -1 ( A) . Então, f (a ) Î A . Como
A é aberto, existe e > 0 tal que y Î A , sempre que | y - f (a )|< e . Uma vez que
lim x®a f (x ) = f (a ) , existe d > 0 tal que |x - a |< d implica | f (x ) - f (a )|< e . Logo,
|x - a |< d implica f (x ) Î A , ou seja, x Î f -1 ( A) . Dessa forma, mostramos que, da-
do a Î f -1 ( A) , existe d > 0 tal que (a - d , a + d ) Ì f -1 ( A) . Isso mostra que f -1 ( A)
é um aberto.
Reciprocamente, suponhamos que f -1 ( A) é aberto para todo aberto A Í  . Da-
do a Î X e e > 0 , o intervalo I = ( f (a ) - e, f (a ) + e) é um aberto de  . Assim, por
hipótese, f -1 ( I ) é um aberto e a Î f -1 ( I ) , o que significa que existe d > 0 tal que
(a - d , a + d ) Ì f -1 ( I ) . Logo, dado e > 0 , existe d > 0 tal que
|x - a |< d Þ x Î (a - d , a + d ) Ì f -1 ( I ) Þ f (x ) Î I = ( f ( a ) - e, f ( a ) + e) Þ| f ( x ) - f ( a )|< e.
Portanto lim x®a f (x ) = f (a ) .

Com esta caracterização, encerramos o primeiro tópico da aula 6. Vimos aqui a


definição e propriedades das funções contínuas. No próximo tópico, exibiremos al-
guns teoremas importantes sobre funções contínuas.

112 Licenciatura em Matemática

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02
TÓPICO
O TEOREMA DO VALOR
INTERMEDIÁRIO
A
5 OBJETIVOS
·· Compreender o Teorema do Valor Intermediário.
T ··Exibir exemplos para os quais o Teorema do Valor
1 Intermediário não é válido.
··Aplicar o Teorema do valor Intermediário na
localização de raízes reais de polinômios.

N este tópico, estudamos o Teorema do valor intermediário (Teorema 4) e


algumas de suas consequências. O Teorema do valor Intermediário é a
propriedade fundamental das funções contínuas de uma variável real.
Ele garante que as funções contínuas se comportam como se espera, ou seja, que de-
screvem de modo adequado certos fenômenos naturais, como aqueles expostos na
introdução do tópico anterior.
Costuma-se afirmar, nos cursos de Cálculo, que o gráfico de uma função contínua
não apresenta saltos. Evidentemente, este não é um bom critério para verificar se
uma dada função é ou não é contínua. De fato, a função tangente , embora contínua,
tem saltos em seu gráfico. Isso cocorre porque seu dominio é formado por vários in-
travalos disjuntos, e não por um intervalo só. Assim, um critério mais conveniente
para verificarmos se uma dada função é contínua é, primeiramente, olhá-la como

114 Licenciatura em Matemática

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uma transformação. Podemos dizer, então, que uma função é
contínua se leva intervalos da reta em intervalos da reta. Para
SAIBA MAIS
garantir que a imagem de um dado intervalo por uma função
contínua não contenha ``falhas’’, precisamos do seguinte resul- Faça uma revisão sobre função
tado fundamental. tangente acessando o site http://
ecalculo.if.usp.br/funcoes/
trigonometricas/ftangente/
ftangente.htm A
6
T
Teorema 4 (Teorema do Valor Intermediário) Seja f : [a, b ] ®  uma 1
função contínua. Se f (a ) < d < f (b) então existe tal que f (c ) = d .

Demonstração: Seja A ={x Î [a, b ]| f (x ) < d } . Como, por hipótese, f (a ) < d , te-
mos a Î A , logo A ¹ Æ . Tomemos a Î A . Uma vez que f (a ) < d e d < f (b) , temos
que a ¹ b . Mais precisamente, a Î [a, b ] e a ¹ b implicam a < b .
A função f é contínua em a , logo, dado e = d - f (a ) > 0 , c Î (a, b) existe d > 0
tal que [a, a + d ) Ì [a, b ] e
x Î [a, a + d ) Þ f (x ) Î [ f (a ), f (a ) + e).
Em particular, f (x ) < f (a ) + e = d . Assim, se x Î [a, a + d )
, então f (x ) < d , o que significa que [a, a + d ) Ì A . Disso con-
cluímos que o conjunto A não possui elemento máximo. SAIBA MAIS
Seja c = sup A . Dado n ³ 1 , existe xn Î A tal que Obtenha mais informações
1
c - < xn £ c . Logo, lim xn = c . Pelo Teorema de Heine (Teo- sobre o Teorema do Valor
n Médio assistindo ao vídeo
rema 9 da aula 5), f (c ) = lim f (xn ) £ d . Se f (c ) < d , então c per-
h t t p : / / w w w. y o u t u b e . c o m /
tenceria ao conjunto A , logo teríamos c = max A . Mas o con-
watch?v=Da84AXj2rvA
junto A não possui elemento máximo. Portanto, f (c ) < d não
ocorre. Como f (c ) £ d , deve necessariamente ocorrer a igual-
dade f (c ) = d , como queríamos.
Uma consequência importante do Teorema do Valor Interme- ATENÇÃO!
diário é o resultado abaixo, devido ao matemático Bernard Placi-
O Teorema 4 continua válido,
dus Johann Nepomuk Bolzano (1781-1848). com a mesma demonstração, no
caso em que f (b) < d < f (a ) .
Teorema 5 (Bolzano) Seja f : [a, b ] ®  uma função
contínua. Se f (a ) e f (b) são números reais com
sinais contrários, então existe c Î [a, b ] tal que
f (c ) = 0 .

Análise Real 115

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Demonstração: Para fixar ideias, suponhamos que f (a ) < 0 e f (b) > 0 . Pode-
mos usar o Teorema 4, com d = 0 , obtendo então c Î (a, b) tal que f (c ) = 0 .

O Teorema 6 abaixo garante que uma função contínua leva intervalos em intervalos.

Teorema 6 Seja I um intervalo. Se f : I ®  é uma função contínua,


A
6 então f (I ) é um intervalo.

T Demonstração:
2 Primeiramente, suponhamos que f é limitada em I . Se-
ATENÇÃO! jam a = inf xÎI f (x ) e b = sup xÎI f (x ) . Temos f ( I ) Í (a, b )
. Se d é um número real tal que a < d < b , então existe
O Teorema 5 nos dá um método pa-
c Î I tal que f (c ) = d . Isso mostra que (a, b ) Í f ( I ) . As-
ra decidir se há alguma raiz de uma
equação do tipo f (x ) = 0 , com f sim, pode ocorrer f ( I ) = (a, b ) , f ( I ) = [a, b ) , f ( I ) = (a, b ]
contínua, em um dado intervalo ou f ( I ) = [a, b ] .
I = [a, b ] . Se f (a ) = 0 , ou f (b) = 0 , No caso em que f não é limitada, a única diferença
então a , ou b , é uma raiz da equa- é que f ( I ) pode ser um intervalo do tipo (a, +¥) ou
ção. Caso f (a ) ¹ 0 e f (b) ¹ 0 te- (-¥, b ) .
nham sinais contrários, o Teorema
de Bolzano afirma que há pelo me- Exemplos:
nos uma raiz de f (x ) = 0 no inte-
1. Considere a função polinomial P :  ®  , dada
rior do intervalo I .
por P (x ) = x 3 - 2x 2 - 3x + 1 . Temos P (0) =1> 0 e

P (1) = -3 < 0 . Pelo Teorema 5, existe c , 0 < c <1 , tal que P (c ) = 0 .


2. A função f : [0,1] ®  , dada por
ìï 1 se
ïï x=0
ï
f (x ) = í x se 0 < x <1
ïï
ïîï-1 se x =1

é contínua em (0,1) mas não é contínua em [0,1] . Note que o Teorema do Valor
Intermediário não é válido para esta função, pois ela não é contínua em [0,1] . De
fato, d = -1 / 2 satisfaz f (0) < d < f (1) e não existe c Î [0,1] tal que f (c ) = -1 / 2 .

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3. Se I Ì  é um intervalo e f : I ®  é uma função contínua cuja imagem é for-
mada apenas por números inteiros, então f é constante. De fato, pelo Teorema 6,
f ( I ) deve ser um intervalo contido no conjunto dos números inteiros, logo é de-
generado, isto é, reduz-se a um ponto. Portanto, a função f é constante.
Outra aplicação interessante do Teorema 4 é o resultado abaixo, conhecido como
Teorema do Ponto Fixo para intervalos. A
6
Teorema 7 Seja f : [a, b ] ® [a, b ] uma função contínua. Mostre que existe
c Î [a, b ] tal que f (c ) = c . Um número real c tal que f (c ) = c é chamado T
ponto fixo de f .
2

Demonstração: Se f (a ) = a ou f (b) = b , não há nada a


demonstrar, pois basta escolhermos c = a ou c = b , respectiv-
f ( b) ¹ b ATENÇÃO!
amente. Suponhamos, pois, que f (a ) ¹ a e . Como o
contradomínio de f é o intervalo [a, b ] , sabemos que f (a ) ³ a O Teorema 7 acima é um caso
e que f (b) £ b . Como não podem ocorrer igualdades nestas particular do “Teorema do Pon-
desigualdades, temos f (a ) > a e f (b) < b . to Fixo de Brouwer’’, descoberto
Consideremos, agora, a função h : [a, b ] ®  , dada por por Luitzen Egbertus Jan Brouwer
(1881 - 1966), que garante a exis-
h(x ) = x - f (x ) . Como f é contínua, h também é uma função
tência de um ponto fixo para uma
contínua. Além disso, h(a ) < 0 e h(b) > 0 . Pelo Teorema 5, existe
função contínua f : C ® C , on-
c Î (a, b) tal que h(c ) = 0 , o que implica f (c ) = c , como quería- de C é um conjunto compacto e
mos demonstrar. convexo. Este resultado mais geral
Encerramos este tópico com um importante teorema devido tem aplicações à teoria das equa-
a Karl Theodor Wilhelm Weierstrass (1815-1897). O Teorema de ções diferenciais ordinárias.
Weierstrass trata de funções contínuas cujos domínios são com-
pactos. Relembremos que um conjunto C , contido na reta, é chamado compacto
se é um conjunto fechado e limitado. Isto significa que C contém todos os seus
pontos de acumulação (pois é fechado) e existe um número real positivo M tal que
|x |£ M , para todo x Î  (pois  é limitado). Podemos enunciar o teorema da se-
guinte maneira:

Teorema 8 Seja C Ì  um conjunto compacto e f : C ®  uma função con-


tínua. Então:
1. a imagem f (C ) da função f é um compacto.
2. existem a, b Î C tais que f (a ) £ f (x ) £ f (b) , para todo x ÎC .

Análise Real 117

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Demonstração: (1) Seja ( yn ) uma sequência em f (C ) . Para cada n ³ 1
, existe xn Î C tal que f (xn ) = yn . Como C é compacto, a sequência (xn ) é lim-
itada, logo admite uma subsequência convergente (xnk ) , digamos, xnk ® x
. Como C é fechado, temos x Î C . Sendo f uma função contínua, obtemos
lim ynk = lim f (xnk ) = f (x ) = y Î f (C ) . Mostramos, assim, que toda sequência em
f (C ) possui uma subsequência que converge para um ponto de f (C ) . Isso implica
A de imediato que f (C ) é fechado, pois qualquer ponto de acumulação L de f (C ) é
6 limite se uma sequência de pontos em f (C ) . Esta sequência de pontos admite uma
T subsequência que converge para um ponto de f (C ) , necessariamente igual a L . Lo-
2 go, todo ponto de acumulação L de f (C ) é um elemento de f (C ) .
Por outro lado, se f (C ) não fosse limitado, seria possível produzir uma sequência
divergente em f (C ) sem pontos de acumulação, ou seja, sem subsequências conver-
gentes. Como isso não pode ocorrer, segue que f (C ) é limitado. Logo f (C ) é com-
pacto, como queríamos demonstrar.
(2) Pelo item (1), f (C ) é um compacto de  . Logo, A = inf f (C ) existe, pois f (C )
é limitado, e A Î f (C ) , porque o ínfimo de um conjunto é um de seus pontos de acu-
mulação e f (C ) é fechado. Analogamente, B = sup f (C ) Î f (C ) . Como A, B Î f (C ) ,
existem a, b Î C tais que f (a ) = A e f (b) = B . Portanto f (a ) £ y £ f (b) , para todo
y = f (x ) Î f (C ) . Isso encerra a demonstração do Teorema.

Com este resultado, encerramos a aula 6, que tratou das funções contínuas e de suas
propriedades, em especial do Teorema do Valor Intermediário e suas consequências.

ATIVIDADES DE APROFUDAMENTO

Funções continuas
(Elaborado pelo professor Ângelo Papa Neto)
1. Seja I Ì  , f : I ®  uma função e a Î I tal que f é descontínua em a .
- O ponto a Î I é chamado ponto de descontinuidade de primeira ordem se os limites laterais
L+ = lim x®a+ f (x ) e L- lim x®a- f (x ) existem. Se L+ = L- ¹ f (a ) , dizemos que a é uma
descontinuidade removível. Se L+ ¹ L- , dizemos que a é uma descontinuidade não-removível. Neste
caso, a diferença L+ - L- é chamada salto de descontinuidade de f em a .
- O ponto a Î I é chamado ponto de descontinuidade de segunda ordem se pelo menos um dos limites
laterais L+ ou L- não existe ou é infinito.
Para cada função f :  ®  abaixo, encontre (se existirem) os pontos de descontinuidade e verifique
se são de primeira ou de segunda ordem. No caso de existirem pontos de descontinuidade de primeira

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ordem, determine se tais pontos são descontinuidades removíveis e, se for caso, encontre o valor do salto
de descontinuidade:

ìï1 2
ïï (2x + 3) se -¥ < x £ 1
ïï 5
a) f ( x ) = ï í 6 - 5x se 1< x < 3
ïï
ïï x - 3 se 3 £ x < ¥
ïï
î
A
6

b) f ( x ) = ï
ì
ï-2x 2 se x £ 3 T
í
ïïî 3x se 3 < x 2
|2x - 3|
c) f ( x ) =
2x - 3

d) f ( x ) = x - êë x úû

x +2
e) f (x ) = x +
|x + 2|

ì
ï senx
ï
ï se x ¹ 0
f) f (x ) = í x
ï
ï
î 1
ï se x=0

d :  ® {0,1}
2. A função , dada por
ïì1 se x Î 
d (x ) = ïí
ïïî0 se x Î
/

é chamada função de Dirichlet, em homenagem a Johann Peter Gustav Lejeune Dirichlet (1805 – 1859).
Mostre que d é descontínua em cada x Î  .
(Confira a biografia de Dirichlet, acessando o link
http://www-history.mcs.st-and.ac.uk/Biographies/Dirichlet.html)

3. Seja a Î  e seja f :  ®  , dada por f ( x ) = ( x - a ) (2d ( x ) - 1) , onde d é a função de Dirichlet,


2

definida no problema anterior. Mostre que esta função é contínua em apenas um ponto e encontre esse
ponto.
1
4. Considere a função f :  -{1} ®  , dada por f ( x ) = 1 - x . Encontre os pontos de descontinuidade
da função composta y = f ( f ( f ( x ))) . Esses pontos são descontinuidades removíveis?
5. Um monge tibetano deixa o monastério às 7 horas da manhã e segue sua caminhada usual para o topo

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da montanha, chegando lá às 19h. No dia seguinte, ele acorda cedo e às 7h desce do topo do monte
pelo mesmo caminho que usou na ida, chegando ao monastério às 19h. Mostre que existe um ponto no
caminho em que o monge passará exatamente na mesma hora do dia na ida e na volta.
6. Admitindo que a temperatura T de um ponto qualquer do equador da terra seja uma função contínua,
demonstre que, em qualquer instante, existem pontos antípodas do Equador que estão a um mesma
temperatura. Sugestão: Se P é um ponto sobre o equador, sua posição é determinada por sua longitude
A q . Pontos antípodas são pontos diametralmente opostos. Logo se P e Q são antípodas e q é a longitude
de P , então a longitude de Q é q + p .
6
7. Seja S ={( x, y ) Î  |x + y =1} o círculo de raio 1 centrado na origem. Se f : S ®  é
1 2 2 2 1

T contínua, mostre que existe (x, y ) Î S tal que f (x, y ) = f (-x,- y ) . Sugestão: Mesma ideia do
1

2 exercício anterior.
8. Sejam A e B duas regiões limitadas, com áreas finitas, de um mesmo plano. Mostre que existe uma
reta  que divide A e B simultaneamente ao meio.

120 Licenciatura em Matemática

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Aula 7
A Derivada de Função Real

Nessa aula apresentaremos as funções que possuem derivadas sobre subconjuntos


dos números reais. Veremos que essas funções possuem importantes propriedades e
aplicações. Estabeleceremos as propriedades e aplicações das funções deriváveis em
um intervalo da reta e poderemos observar que isso garante algumas consequências
e resultados em aplicações tanto na matemática quanto em áreas afins como a Físi-
ca. Exemplos dessas aplicações são: determinar o máximo e mínimo de uma função
real, estabelecer correlação com a noção de velocidade e aceleração da Física, fazer
aproximações de funções por derivadas.

No mesmo espirito de aulas anteriores, não temos o objetivo de esgotar todo o as-
sunto, apresentaremos somente os principais resultados e deixaremos alguns para
o aluno fazer a pesquisa na literatura recomendada sobre o assunto para maiores
aprofundamentos.

Objetivos:
• Identificar as propriedades das funções deriváveis.
• Entender as aplicações das funções deriváveis.
• Relacionar as derivadas de uma função ao máximo e mínimo de uma função.

121

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01
TÓPICO
CONCEITOS DE DERIVADA
DE FUNÇÃO REAL

OBJETIVOS
··Compreender a definição de derivada de uma
função real.
··Saber reconhecer quais funções tem derivada.

A ssim como no Cálculo I, em que fazemos um grande apelo à noção geomé-


trica na definição da derivada de uma função real f : I Ì  ® , aqui
também, a noção da derivada de uma função ganha uma grande importân-
cia geométrica, que estabelecemos logo a seguir. Dizemos que uma função f é derivá-
vel em ponto x0 Î I e x = x0 + h Î I , I Ì  aberto, se goza da seguinte condição:
f ( x ) - f (x0 ) f (x0 + h ) - f ( x0 )
f ' (x0 ) = lim = lim
x ® x0 x - x0 h®0 h
se existe e é finito o limite da razão incremental dada acima. O quociente
q (x) = éë f (x) - f (x0 )ùû / (x - x0 ) ou razão incremental para x ¹ x0 é conhecido como
quociente de Newton. O mesmo é uma função que determina o valor da secante que
passa pelos pontos (x0 , f (x0 )) e (x, f (x)) . Geometricamente, as retas secantes pas-
sando pelos pontos A = (x, f (x)) , B = (x0 , f (x0 )) tendem para a tangente ao gráfico
da função f . Conforme representado na figura abaixo:

122 Licenciatura em Matemática

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A
7
T
1
Figura 1 – retas secantes que passam por A e B

ATENÇÃO!
De forma análoga à derivada ordinária de uma função f , po-
A partir daqui, faremos o uso de
demos definir as derivadas à direita e a esquerda, respectivamen-
várias notações para representar
te, por:
f (x0 + h) - f ( x0 ) a derivada de uma função, entre
f ' (x0 +) = lim
h® 0 + h dy
elas f ', , Dx0 f ou x
f (x0 + h ) - f ( x0 ) dx
f ' (x0 -) = lim
h ® 0- h
no caso dos limites existirem e fazendo as necessárias alterações na definição da
derivada ordinária, teremos a seguinte condição: A derivada ordinária existirá, se as
derivadas dos limites laterais existirem e forem iguais, ou seja,
f (x0 + h) - f ( x0 ) f (x0 + h ) - f ( x0 )
f ' (x0 +) = lim = f ' (x0 -) = lim
h® 0 + h h ® 0- h
Exemplo 1: Seja a função dada pela expressão f (x) = x , a função modular,
cujas derivadas laterais são representadas pelo gráfica abaixo:

Análise Real 123

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f (x) - f (0) x
O aluno pode verificar como exercício que lim = lim = -1 e que
x ® 0- x x
f (x) - f (0) x x ® 0-
lim = lim+ = 1 , portanto, as derivadas laterais existem, mas não são
x®0+ x x®0 x

iguais. Portanto, concluímos que a função dada acima não é derivável na origem.

A Observação 1: Uma condição necessária e suficiente para que uma função


7 f : I Ì  ®  , x0 Î I e x = x0 + h Î I , I Ì  aberto, seja derivável no ponto x0 Î I
r (h)
T é que f (x0 + h) = f (x0 ) + f ' (x0 ).h + r (h) , com lim
h® 0 h
=0.
1 r ( h ) f (x0 + h ) - f ( x0 )
De fato, basta observar que = - f '(x0 ) , logo
h h
r (h) é f (x0 + h) - f ( x0 ) ù
lim = 0 Û lim ê - f '(x0 )ú = 0 e decorre da definição da deri-
h® 0 h h® 0 ê h ú
ë û
vada de uma função.

Teorema 1: Se f é derivável no ponto x0 Î I Ì , então f é contínua em x0 .

Demonstração:Sabemosqueumafunção f écontínuaem x0 Î I Ì ,se lim f (x) = f (x0 )


x ® x0

f ( x ) - f ( x0 )
, então como f é derivável no ponto x0 , temos lim = f '(x0 ) . Daí segue que
x ® x0 x - x0
é f ( x ) - f (x0 ) ù
lim éë f (x) - f (x0 )ùû = lim ê ú .(x - x0 ) =
x ® x0 ê ú
ë x - x0
x ® x0
û
é f ( x ) - f ( x0 ) ù
= lim ê ú . lim (x - x0 ) = f ' (x0 ).0 = 0
x ® x0 ê ú x ® x0
ë x - x0 û
Logo f é contínua em x0 como queríamos provar.

  . Então
Exemplo 2: Seja a função constante f (x) = c (constante ) para todo xÎ
f ' (x) = 0 . Com efeito, por definição temos:
f ( x ) - f ( x0 ) c -c
lim = lim =0
x ® x0 x - x0 x ® x0 x - x
0

Se f (x) = ax + b é uma função afim, tem-se que f ' (x) = a . Por definição, segue que:
f ( x ) - f ( x0 ) (ax + b) - (ax0 + b) a ( x - x0 )
lim = lim = lim =a
x ® x0 x - x0 x ® x0 x - x0 x ® x0 ( x - x )
0

em que na última igualdade fizemos o cancelamento do termo comum no deno-


minador e numerador.

124 Licenciatura em Matemática

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Vejamos agora a derivada da função quadrática f (x) = x 2 , utilizando a definição.
Com efeito,
( x + h)2 - x 2 x 2 + 2hx + h2 - x 2 (2x + h).h
lim = lim = lim = lim (2x + h) = 2x
h® 0 h h ® 0 h h ® 0 h h® 0 .
E em geral, podemos ver que, f (x) = x n , f ' (x) = n.x n-1 o que o aluno pode verifi-
n æn ö
car facilmente, utilizando o binômio de Newton, (x + h) = å çç ÷÷÷ x n-k h k .
n
ç ÷
k =1 èk ø A
7
Exemplo 3: (A Regra de L’Hôpital) Muitas vezes nos deparamos com o cálcu-
f (x ) f (a)
T
lo de limites indeterminados como: lim
x®a
=
g (x ) g (a )
com f (a) = g (a) = 0 , se as fun- 1
ções f e g são deriváveis em a . Podemos obter uma aplicação interessante da deriva-
f (x ) - f ( a ) f (x)
da. De fato, sabemos que f' (a) = lim = lim e da mesma forma
x®a x-a x®a x - a
g (x ) - g ( a ) g (x )
g ' (a) = lim = lim , pois temos que f (a) = g (a) = 0 . Então segue que
x®a x-a x ® a x-a

f (x ) f (x)
lim
f (x ) x - a = f '(a )
= lim x - a =
x ® a
lim
x®a g (x ) x®a g (x ) g (x ) g '(a )
lim
x-a x ® a x -a

desde que, g '(a ) ¹ 0 . Podemos exemplificar essa regra, através da seguinte ques-

tão, que você teve a oportunidade de ver no Cálculo I, que é calcular o limite de
sen x (sen x )' x=0 cos 0
lim = = = 1 . Você deve observar que nesse exemplo fizemos
x®0 x (x )' x=0 1
uso da derivada da função (sen x) ' = cos x . Essa derivada pode ser provada usan-

do a definição de derivada da função seno na origem e a identidade trigonométrica

sen (x + h) = sen x.cos h + sen h.cos x .

Análise Real 125

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02
TÓPICO
PROPRIEDADES OPERATÓ-
RIAS DAS DERIVADAS

OBJETIVOS
··• Analisar as propriedades operatórias da
derivada;
··• Estudar as propriedades operatórias através de
exemplos;
··• Fazer aplicações utilizando essas operações.

N esse tópico abordaremos as propriedades operatórias das derivadas de


uma função real. Além disso, analisaremos a derivada de uma composta
e de uma inversa de uma função real. E por fim, daremos exemplos que
ilustraram a teoria tratada nesse tópico.

Teorema 2: Sejam as funções f : I Ì  ®  e g : I Ì  ®  diferenciáveis


no ponto x0 Î I . Então temos as seguintes propriedades:

( f ± g )'(x0 ) = f ' (x0 ) ± g '(x0 ) ;


( f . g)’( x0 ) = f ' (x0 ). g (x0 ) + f (x0 ). g '(x0 ) ;
æ f ö÷
çç ÷ '(x ) = f (x0 ). g (x0 ) - f (x0 ). g '(x0 ) , desde que
'

ççè g ÷÷ø 0 g ( x0 ) ¹ 0 .
g ( x )2
0

126 Licenciatura em Matemática

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Demonstração:

1. A prova de (1) é imediato se observarmos que


( f + g )(x) - ( f + g )(x0 ) f ( x ) - f ( x0 ) g ( x ) - g ( x0 )
= + , aplicando o limite
x - x0 x - x0 x - x0
em ambos os membros dessa identidade, obtemos o resultado para a derivada
da soma. E de maneira análoga, o aluno pode ver que a derivada da diferença
é facilmente obtida. A
2. Para provarmos a derivada do produto, observemos a seguinte identidade
7

( f . g )(x) - ( f . g )(x0 ) f ( x ) g ( x ) - f (x 0 ) g ( x ) + f (x 0 ) g ( x ) - f (x 0 ) g ( x 0 )
T
= = 2
x - x0 x - x0
f ( x ) - f (x0 ) g ( x ) - g ( x0 )
= g ( x ) + f ( x0 )
x - x0 x - x0
então aplicando o limite no primeiro e terceiro membro da identidade anterior.
Ou seja,

( f . g )(x) - ( f . g )(x0 ) f ( x ) - f (x0 ) g ( x ) - g ( x0 )


lim == lim g (x) + f (x0 ) lim
x ® x0 x - x0 x ® x0 x - x0 x ® x0 x - x0
teremos o resultado que queríamos.

E finalmente, para a prova de (3), devemos primeiramente notar que a se-


1 1
-
f ( x ) f (x 0 ) f ( x ) - f (x 0 ) 1
guinte identidade é válida: =- . pa-
x - x0 x - x0 f ( x ). f ( x 0 )

ra todo x Î I em que f (x) ¹ 0 . Então, aplicando o limite a essa identidade, te-


1 1
-
æ 1 ö÷ f ( x ) f ( x0 ) f ( x ) - f (x0 ) 1 f '(x0 )
mos ççç ÷ ' = lim
÷ = lim - . =- e
çè f (x0 ) ø÷ x® x0 x - x0 x ® x 0 x - x0 f ( x ). f (x 0 ) f ( x0 ) 2
f (x ) 1
no caso geral do quociente basta observarmos que = f ( x ). , assim apli-
g (x ) g (x )

cando a fórmula já provada em (2) para a derivada de um produto. Segue que,


æ f ÷ö æ ö æ ö æ ö
çç ÷ ' = f '.çç 1 ÷÷ + f .çç 1 ÷÷ ' = f ' + f .çç- g ' ÷÷ , basta fazer as operações que obte-
÷
çèç g ÷ø ÷
ççè g ÷ø ÷
ççè g ÷ø ççè g 2 ÷÷ø
g

mos a fórmula da derivada do quociente. Agora, para os casos em que f (x0 ) = 0

e g (x0 ) = 0 , tomamos sequências tendendo para xn ® x0 , mas que f (xn ) ¹ 0 e

g (xn ) ¹ 0 e o resultado segue naturalmente.

Análise Real 127

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Exemplo 4: Já vimos no exemplo (2) anteriormente, que a derivada da fun-

ção f (x) = x n , " n Î  é dada por f ' (x) = nx n-1 . Vamos aplicar a regra 3 da de-

rivada de um quociente para calcularmos a derivada da função f (x) = x-n


1
, ora temos que f (x) = x-n = , aplicando a derivada do quociente obte-
xn
A mos f ' (x) =
(1) ' x n - 1.(x n )'
= -
nx n-1
= -
nx n-1 n
=- n+1 . Mesmo quando,
7
n 2 2n n-1 n +1
(x ) x x x x
m
f (x) = x r , com r = . De fato, basta ver que, x m =(x m / n ) , então derivando em
n

T n
é m ù
n-1

2 ambos os membros da igualdade temos que (x m )' = mx m-1 = n. ê(x n )'ú e daí ex-
ê ú
æ m ö÷ m m -1 ë û
'
ç n ÷
traindo a raiz e dividindo por n obtemos que ççx ÷ = (x ) , e então vale para
n

è ÷ø n
  ,
todo racional r . E podemos estender este resultado para os números reais aÎ

pois sabemos que existe uma sequência de racionais rn ® a como a afirmação é vá-

lida para (x rn )' = rn .x rn -1 aplicando o limite resulta na afirmação para (x a )' = a.x a-1

  .
para todo aÎ
Agora faremos uma importante propriedade que é a derivada da inversa de uma
função. Temos que toda função f : I ® contínua e injetiva sobre sua imagem
J = f ( I ) (poderíamos considerar, ao invés da injetividade, que f fosse monótona
em I ) tem uma inversa contínua f -1 : J ® I , admitiremos que f é derivável em
I e analisaremos a derivada da função inversa ( f -1 )' . Portanto, podemos enunciar.

Teorema 3: Seja f : I ® uma função monótona em um intervalo aberto


I . Supondo que f seja derivável em I e f ' (x) ¹ 0 , " x Î I . Então a função
inversa f -1 : J = f (I ) ® é também derivável no intervalo (aberto) J . E te-
1
mos a fórmula seguinte: ( f -1 ) ( y) =
'
," yÎ J
f '( f ( y))
-1

Antes de demonstrarmos o teorema acima apresentaremos a regra da cadeia que


nos auxiliará na demonstração do teorema 3 acima.

Teorema 4 (Regra da Cadeia): Consideremos as funções f : I ® e


g : J ® , com f (I ) Ì J e f (x0 ) = y0 . Se f é derivável em x0 e g é derivá-
vel no ponto y0 , então a composta ( g o f ) : I ® é derivável no ponto x0 ,
com ( g o f )'(x0 ) = g '( f (x0 )). f '(x0 ) .

128 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 128 04/04/2012 15:19:22


Demonstração: Como g é derivável no ponto y0 , podemos, de acordo com a
observação 1 dessa aula, colocar na forma:
g ( y0 + k ) - g ( y0 )
= g ' ( y0 ) + r2 (k )
k
onde r2 (k) ® 0 , quando k ® 0 . Pondo r2 (0) = 0 podemos escrever essa equa-
ção na forma: g ( y0 + k) - g ( y0 ) = k[ g ' ( y0 ) + r2 (k)] , que continua válida mesmo
que k = 0 . Considere, k = f (x0 + h) - f (x0 ) . Então, A
7
g ( f (x0 + h)) - g ( f (x0 )) g ( y0 + k ) - g ( y0 ) é g ' ( y0 ) + r2 (k)ù k
h
=
h

h
û T
f (x0 + h) - f ( x0 )
2
== éëê g ' ( f (x0 )) + r2 (k)ùûú .
h

Em que o aluno deve lembrar que, como f é derivável no


ponto x0 , então f é continua no mesmo. Desse modo, temos que ATENÇÃO!
k ® 0 , quando h ® 0 . Assim se tomarmos h tendendo para ze-
A condição para que a derivada (
ro na expressão anterior, obteremos o resultado que queríamos.
f ' (x) ¹ 0, " x Î I ), seja não nu-
la, é essencial no teorema 3. Uma
Agora podemos proceder à demonstração do teorema 3.
vez que a função f (x) = x é
3
Com efeito, temos
( f -1 o f )(x) = x crescente e derivável para todo

Derivando a expressão acima e usando a regra da cadeia, ob-   e f ' (x) = 3x 2 = 0 pa-

temos ra x = 0 . Mas, a função inversa
(f o f ) (x ) = 1
'
f -1 ( y) = 3 y não é derivável
-1

que resulta (pela regra da cadeia) em ( f -1 '


) ( y). f '(x) =1 que em y = 0 .
é o resultado que queríamos provar.

Temos que uma função f : I ® tem um máximo local no ponto x0 Î I se


existe d > 0 tal que para todo x Î I , com x Î (x0 - d , x0 + d )  I implica que
f (x) £ f (x0 ) . E um ponto x0 Î I é um mínimo local se existe d > 0 tal que para to-
do x Î (x0 - d , x0 + d )  I implica que f (x) ³ f (x0 ) . Os pontos máximo e mínimo
locais são ditos estritos, quando ocorrem as desigualdades estritas, f (x) < f (x0 ) e
f (x) > f (x0 ) , respectivamente. Agora, quando uma função tem um máximo ou mí-
nimo em todo o seu domínio, dizemos que a função tem um máximo ou mínimo ab-
soluto. Como vimos na definição de derivada de uma função é local, e uma maneira
de determinarmos se um ponto é o máximo ou mínimo local de uma função derivá-
vel é respondida pelo seguinte teorema.

Análise Real 129

analisereal.indd 129 04/04/2012 15:19:25


Teorema 5: Se uma função f é derivável em um ponto x0 , onde ela assume
valor máximo ou mínimo, então f ' (x0 ) = 0 .

Demonstração: Considere x0 um ponto de máximo, então para h arbitra-


riamente pequeno, temos que f (x0 + h) - f (x0 ) £ 0 implica que o quociente de
newton:
A
7 f (x0 + h ) - f ( x0 )
£ 0, para h > 0
h
T f (x0 + h ) - f ( x0 )
2 Ou
h
³ 0 , para h < 0

f (x0 + h) - f ( x0 )
E como consequência, o limite lim = 0 , onde concluímos que
h
h® 0
f ' (x0 ) = 0 . E de maneira completamente análoga provamos quando x0 é um ponto
de mínimo.
A recíproca desse teorema não é válida, pois podemos ter f ' (x0 ) = 0 sem que o
ponto x0 seja um máximo ou um mínimo. Conforme vimos, a função f (x) = x 3 tem
derivada nula em x0 = 0 , mas esse ponto não é máximo, nem mínimo, como você
pode ver no gráfico abaixo:

é pù
Exemplo 5: Seja a função f : ê 0, ú ®  com f (x) = x cos x , podemos ter que a
êë 4 úû
derivada não é necessariamente nula em todos os pontos de máximo ou de mínimo,
se estes são os extremos do intervalo. Pois, a função f (x) = x cos x tem um mínimo
em x = 0 (veja o gráfico a seguir) e um máximo em x = p / 4 , porém a sua derivada
não se anula nesses pontos. Uma vez que f ' (x) = cos (x) - xsen(x ) e f ' (0) = 1 > 0 e

130 Licenciatura em Matemática

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æpö 2 p 2 .
f ' çç ÷÷÷ = - . >0
è4ø 2 4 2

A
7
T
2

Análise Real 131

analisereal.indd 131 04/04/2012 15:19:28


03
TÓPICO
O TEOREMA DO
VALOR MÉDIO
OBJETIVOS
··Compreender o teorema do valor médio;
··Fazer aplicações desse teorema;
··Estudar alguns exemplos que ilustrem o teorema.

N esse tópico, trataremos de um dos tópicos centrais sobre a derivada de uma


função real, que é o Teorema do Valor Médio. Esse será obtido como uma
consequência do Teorema de Rolle. E em paralelo obteremos aplicações so-
bre o Teorema do Valor Médio.
O teorema que tratamos a seguir é uma consequência do teorema 5 do tópico anterior.

Teorema 6 (de Rolle): Seja f : [ a, b ] ® uma função contínua e derivável


em (a, b) , com f (a) = f (b) . Então, existe pelo menos um c Î (a, b) tal que
f ' (c ) = 0 .

Demonstração: Se a função é constante, segue imediatamente que f ' (x) = 0 pa-


ra todo x Î [a, b ] . Se a função f não é constante, por ser contínua em um intervalo
compacto, terá de assumir um valor máximo e um mínimo. Então, se f assumir valo-

132 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 132 04/04/2012 15:19:28


res maiores do que f (a ) , ela atingirá um máximo num ponto interno c . E se assumir
valores menores do que f(a), essa função assumirá seu mínimo num ponto interno c
em (a, b) . E em qualquer caso, f ' (c ) = 0 , de acordo com o teorema 5.

Teorema 7 (do Valor Médio ou de Lagrange): Seja uma função


f : [ a, b ] ® contínua em [ a, b ] e derivável no aberto (a, b) . Então existe um
ponto c Î (a, b) tal que
A
7
f (b) - f (a) = f '(c )(b - a )
T
3
Demonstração: Basta aplicar o teorema de Rolle à função
f ( b) - f ( a )
q (x ) = f (x ) - f (a ) - (x - a ) . É claro que q (a) = q (b) = 0 . Então, exis-
b-a
te c Î (a, b) tal que q ' (c ) = 0 , e isso significa que temos:
f ( b) - f ( a )
= f '(c )
b-a
que é equivalente à fórmula que queríamos.

Em termos geométricos, o Teorema do Valor Médio significa que existe um nú-


mero c Î (a, b) tal que a reta tangente à curva y = f (x ) no ponto (c , f (c )) é para-
lela à reta secante que passa pelos pontos (a, f (a)) e (b, f (b)) . O teorema do valor
médio tem uma importante aplicação. Com ele é possível determinar se uma função
f é crescente ou decrescente. Conforme a sua derivada seja positiva ou negativa,
respectivamente.
Assim, se f ' (c ) > 0 para todo c Î (a, b) , então se x1 < x2 implica que
f (x2 ) - f (x1 ) = f ' (c )(x2 - x1 ) > 0 , logo f (x1 ) < f (x2 ) . E analogamente, se f ' (c ) < 0
para todo c Î (a, b) , então segue que se x1 < x2 Þ f (x2 ) - f (x1 ) = f ' (c )(x2 - x1 ) < 0 ,
logo f (x1 ) > f (x2 ) .
Você deve notar que o conhecimento do sinal da derivada em um único ponto
não permite concluir que a função é crescente ou decrescente em todo o seu domí-
nio. Apenas podemos concluir em uma vizinhança desse ponto.

O Teorema do Valor Médio tem uma generalização que estabelecemos a seguir.


Teorema 8 (do Valor Médio Generalizado ou de Cauchy): Sejam f e g
funções contínuas no intervalo [a, b ] e deriváveis no intervalo aberto (a, b) e
além disso, suponha que g ' (x)¹ 0 e g (b) - g (a) ¹ 0 . Então existe c Î (a, b)
tal que
f (b) - f (a ) f '(c )
=
g (b) - g (a ) g '(c )

Análise Real 133

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Demonstração: Basta considerar a função
f ( b) - f ( a )
F (x ) = f (x ) - f (a ) - .( g (x) - g (a)) , então podemos observar que
g ( b) - g ( a )
F (a) = F (b) = 0 e aplicar o teorema de Rolle.

3.1 DERIVADA DE 2ª ORDEM


A derivada de segunda ordem é dada por f '' (x0 ) = ( f ')'(x0 ) como a derivada da
A derivada de uma função. Se procedermos indutivamente dessa maneira obtemos a
7 n-ésima derivada de uma função f , como sendo f n (x0 ) = ( f n-1 (x0 ))' , desde que a
T derivada (n-1)-ésima exista. Um resultado bem conhecido sobre as derivadas supe-
3 riores de uma função real é a conhecida fórmula de Taylor infinitesimal, que diz que
se uma função f : I ® é n-vezes derivável em um ponto x0 Î I , podemos apro-
ximar uma função pelo “polinômio” de Taylor que é dado por:

f n ( x0 ) n
f (x0 + h) = f (x0 ) + f ' (x0 ).h + f "(x0 ) / 2.h2 + + .h + r (h)
n!
r (h)
onde lim = 0 . Chamamos de polinômio, pois podemos expressar uma fun-
h® 0 hn
ção f no ponto x0 por:
n
f i ( x0 ) i
p (h) = å .h
i=0 i!
que aproxima essa função até a ordem n.

134 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 134 04/04/2012 15:19:32


Aula 8
Integral de Riemann

Olá, aluno(a),

Estamos chegando ao final de nossa disciplina. Nesta aula, estudaremos al-


guns aspectos que envolvem o estudo da integral de Riemann. Dentro de uma cro-
nologia histórica, a ideia da integral é um conceito mais antigo que o de derivada.
Enquanto o conceito de derivada é do século XVII, o conceito de integral teve um
razoável desenvolvimento com o cálculo de áreas de figuras planas, ou volume de
sólidos através de um método conhecido como método da exaustão, que teve em
Arquimedes um dos seus principais divulgadores.

Nesse período, a Matemática era muito geométrica e não havia simbologia que
possibilitasse um maior desenvolvimento do cálculo integral. Ainda nesta aula, trata-
remos dos seguintes conceitos: no tópico 1, veremos a definição da integral de Rie-
mann e o critério para uma função real ser integrável; no tópico 2, apresentaremos
as propriedades da integral; no tópico 3, teremos o principal resultado desta aula,
que é o teorema fundamental do cálculo, e também faremos algumas aplicações.

Bons estudos!

Objetivos:
• Estudar os conceitos sobre a Integral de Riemann;
• Compreender e aplicar as definições da integral de Riemann.

135

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01
TÓPICO

A INTEGRAL DE RIEMANN

OBJETIVOS
··Definir a integral como soma de retângulos sob o
gráfico da função;
··Analisar quando uma função real é integrável;
··Dar alguns exemplos de funções integráveis..

N este tópico, começamos a definir o conceito da integral de Riemann e os


aspectos que determinam quando uma função real é integrável. Veremos
que o problema original se inverteu. No início, o cálculo de áreas utiliza-
va diretamente à integral, hoje definimos primeiro a integral em termos numéricos,
para depois definirmos a área em termos da integral.
Consideraremos que as funções tratadas a seguir são sempre definidas e limitadas
num intervalo I = [a, b ] , a menos que seja estabelecido ao contrário. Uma partição
P desse intervalo é um conjunto finito de pontos dados por:
P = {x0 , x1 ,¼, xn } , com a = x0 < x1 <¼< xn = b e denotaremos por
Dxi = xi - xi-1 o comprimento do i-ésimo subintervalo [ xi-1 , xi ] da partição P.
Diz-se que uma partição P ' é um refinamento de uma partição P se ti-
vermos que P Ì P ' , ou seja, todos os pontos de P estão em P ' . Como a fun-

136 Licenciatura em Matemática

analisereal.indd 136 04/04/2012 15:19:32


ção f : [ a, b ] ®  é limitada, consideremos mi = inf { f (x) : xi-1 £ x £ xi } e
Mi = sup { f (x) : xi-1 £ x £ xi } . Define-se a soma inferior da função f com relação à
n
partição P e que denotamos por s( f , P ) como sendo s ( f , P ) = åmi (xi - xi-1 ) .
i =1
De maneira análoga, temos a soma superior de f , com relação à mesma partição
n
P dada por S ( f , P ) = åMi (xi - xi-1 ) . Em termos geométricos, podemos represen-
i =1
tar essas ideias conforme figuras 1e 2, respectivamente.
A
8
T
1

Figura 1: Partições retangulares Figura 2: Partições retangulares menores

Supondo que a função f : [ a, b ] ®  é contínua no inter-


valo [a, b ] , então sabemos, pelo teorema de Weierstrass, que a
função assume um mínimo e um máximo no intervalo compac-
to [a, b ] . Sejam m = min f (x ) e M = max f (x ) em [a, b ] , assim
temos que m £ mi £ Mi £ M e é claro que decorre dessa desi- SAIBA MAIS
gualdade a seguinte desigualdade:
Faça uma revisão do teorema

m (b - a ) £ s ( f , P ) £ S ( f , P ) £ M ( b - a ) de Weierstrass acessando o
site http://ecalculo.if.usp.br/
Na Figura 1, cada soma inferior é um valor aproximado por derivadas/estudo_var_fun/
teorema_vm/teoremas/teo_
falta do que devemos entender por área da figura geométrica
weierstrass.htm
limitada pelo gráfico de f , pelo eixo dos x e pelas retas x = a

e x = b . Analogamente, cada soma superior é um valor aproximado por excesso da


mesma área.
Agora, mostraremos um resultado que diz que o supremo do conjunto das somas
inferiores é igual ao ínfimo do conjunto das somas superiores, e esse valor comum é
usado para definir a integral de uma função no intervalo I = [a, b ] e tal que f seja
contínua nesse intervalo. Na verdade, esse resultado se estende para um conjunto
mais amplo do que o das funções contínuas, como, por exemplo, o conjunto das fun-

Análise Real 137

analisereal.indd 137 04/04/2012 15:19:35


ções integráveis.

Teorema 1: Seja P = {x0 , x1 ,¼, xn } uma partição qual-


quer do intervalo I = [a, b ] e P ' um refinamento de P . Então,
s ( f , P ) £ s ( f , P ') e S ( f , P ') £ S ( f , P ) , ou seja, ao se refinar uma
partição, a soma inferior só pode crescer e a soma superior só pode
decrescer.
A
8 Prova: Seja um refinamento da partição P , dada por P ' = P È{x '} , isto é, P '
é formada por mais um ponto. Suponha que x ' Î [xi-1 , xi ] da partição P . Conside-
T
1 remos Mi = sup { f (x) : x Î [xi-1 , xi ]} e ainda sejam M e M os supremos de f nos
' ''
i i

subintervalos [xi-1 , x '] e [x ', xi ], respectivamente. É evidente que, Mi' £ Mi e tam-


bém que Mi'' £ Mi . Vemos ainda que xi - xi-1 = (xi - x ') + (x '- xi-1 ) , então
S ( f , P ) - S ( f , P ' ) = Mi (xi - xi-1 ) - Mi' (xi - x ' ) - Mi'' (x ' - xi-1 ),
que resulta em:

S ( f , P ) - S ( f , P ') = (Mi - Mi' )(xi - x ') + (Mi - Mi'' )(x '- xi-1 ) ³ 0 ,o que prova a
segunda desigualdade da soma superior dada no teorema 1. Deixamos para você,
aluno, fazer a prova da desigualdade da soma inferior que é feita de forma análoga. █

Teorema 2: Toda soma inferior é menor ou igual a toda soma supe-


rior, isto é, sejam P e Q partições quaisquer do intervalo [a, b ] , então
s ( f , P ) £ S ( f ,Q ) .

Prova: Com efeito, consideremos a partição P ÈQ É P e P ÈQ É Q


que refina as partições P e Q. Desse modo, temos pelo teorema 1, que
s ( f , P ) £ s ( f , P ÈQ) £ S ( f , P ÈQ ) £ S ( f ,Q) , que é o que queríamos demonstrar. █
Como m (b - a) £ s ( f , P ) £ S ( f , P ) £ M (b - a ) , temos que o conjunto das somas
inferiores é limitado superiormente por M (b - a ) , de maneira que o seu supremo é
finito. Este supremo é chamado a integral inferior da função f , ou seja,
b

ò f (x) dx = sup s( f , P )
a

E analogamente, o conjunto das somas superiores é limitado inferiormente por m(b - a )
, logo tem um ínfimo finito, chamado a integral superior de f , que é dada por:

b

ò f (x) dx = inf S( f , P )
a

138 Licenciatura em Matemática

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De acordo com o teorema 2 dado anteriormente,segue que:
b b

ò f £ò f
a a

Dizemos que uma função f : [ a , b ] ®  é integrável quando essas duas inte-
grais dadas acima são iguais. E nesse caso, o valor comum da integral inferior e su-
perior é chamado a integral da função f e que denotaremos por:
A
b
ò f ( x) dx
a 8
Exemplo 1: Seja a função f : [ a, b ] ®  definida por:
ì 0, 0 £ x 1
T
ï
f (x ) = ï
í
ï
1
î1, 1 £ x £ 2
ï
Seja uma partição P arbitrária do intervalo [a, b ] , como cada intervalo [xi-1 , xi ]
da partição contém números racionais e irracionais, logo mi = 0 e Mi = 1 . Portan-
to, s ( f , P ) = 0 e S ( f , P ) = b - a . Desse modo, f não é integrável, uma vez que
¯
b b

ò f (x) dx = 0 e ò f (x) dx = b - a .
a a

Vejamos um exemplo de uma função integrável, a função constante.


Exemplo 2: Seja a função constante f (x) = c (constante ) para todo x Î [a, b ] .
Então para toda partição P, temos que mi = Mi = c em todos os intervalos, logo
s ( f , P ) = S ( f , P ) = c (b - a ) . Desse modo, decorre que
¯
b b b

ò f (x) dx = ò f (x) dx = ò f (x) dx = c(b - a)


a a

a
Uma pergunta imediata que nos vem é: que condições uma função deve satisfazer
para ser integrável? Baseados nisso, enunciaremos o teorema 3.

Teorema 3: Seja f : [ a , b ] ®  uma função limitada. As afir-


mações seguintes são equivalentes:
f é integrável;
Para todo e > 0 , existem partições P,Q de [a, b ] tais que
S ( f ,Q) - s ( f , P ) < e .Para todo e>0, existe uma partição
P = {x0 , x1 ,¼, xn } de [a, b ] tal que
n
S ( f , P ) - s ( f , P ) = åwi (xi - xi-1 ) < e , onde wi = Mi - mi e é chama-
i =1
da de oscilação de f .

Análise Real 139

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Prova: Sejam L = {s ( f , P ) : P é uma partição de [a, b ]} o conjunto das somas in-
feriores e U = {S ( f , P ) : P é uma partição de [a, b ]} o conjunto das somas superiores.
Sabemos que s £ S para toda partição de P de [a, b ] . Então se i) é válida, temos que
sup L = inf U , portanto podemos concluir que existe ò > 0 tal que S ( f ,Q) - s ( f , P ) < e
e assim temos que i)Þ ii) . Agora, provaremos que ii)Þ iii) , basta observar que se
A S ( f , P ') - s ( f , P ') < e , então tomando P ' = P ÈQ que é um refinamento das duas
8 partições e segue do teorema 1 que s ( f , P ) £ s ( f , P ') £ S ( f , P ') £ S ( f ,Q) , donde

T concluímos que S ( f , P ') - s ( f , P ') < e . E por fim, a implicação iii)Þ i) segue natu-
1 ralmente da definição da soma superior e inferior.
Com esse resultado fechamos este tópico sobre definição de funções integráveis e
passaremos agora às propriedades da integral no tópico seguinte.

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02
TÓPICO

PROPRIEDADES DA INTEGRAL

OBJETIVOS
··Compreender as propriedades da integral;
··Aplicar tais propriedades em alguns exemplos.

A partir daqui veremos as propriedades da integral e aplicaremos essas


propriedades em alguns exemplos. Poderemos perceber que as pro-
priedades da integral facilita-nos a vida ao fazermos o cálculo de al-
gumas integrais.
A primeira propriedade da integral de que tratamos é a que expressa o fato de
que a integral pode ser calculada sobre subintervalos que compõem um intervalo
maior. É importante no caso em que uma função não é contínua em um ponto inter-
no de um intervalo.

Teorema 4: Seja a < c < b . A função f : [ a, b ] ® limitada


é integrável, se somente se, as restrições f |[ a ,c ] e f |[ c , b ] são
integráveis . Portanto, temos

142 Licenciatura em Matemática

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¯ ¯
c c b b

Prova: Sejam a = ò f , A = ò f , b = ò f e B = ò f . Então, decorre da de-


a a c c
 
finição da integral
¯
de Riemann, e tomando uma partição que refina a partição dada,
b b

que: A + B = ò f e a + b = ò f . Para isso basta tomar uma partição que contém


a a

o ponto c e seja um refinamento das anteriores. Muito bem, sabemos que a £ A e

b £ B , sendo assim temos que a + b = A + B Û a = Ae b = B , ou seja, f é integrá-


A
8
vel se, somente se, f |[ a ,c ] e f |[ c , b ] são integráveis. █
T
Teorema 5: Sejam f , g : [ a, b ] ® funções integráveis.
2
Então:
b b b

f ± g é integrável e vale:
b
ò [ f (x) ± g (x)]dx = ò f (x) dx ± ò g (x) dx ;
b
a a a
Se c Î , temos que ò c. f (c) dx = c ò f (x) dx ;
a a b b

Se f (x) £ g (x ) para todo x Î [a, b ] , então ò f (x) dx £ ò g (x) dx ;


b a b a
Se f (x ) é integrável, então temos ò f (x) dx £ ò f (x) dx .
a a

Prova: Nós nos preocuparemos em fazer as demonstrações dos itens a) e d) ; os

itens b) e c) deixaremos para você, aluno, como exercício.


''
Seja uma P partição arbitrária do intervalo [a, b ] , se denotarmos por m 'i , mi e

mi os ínfimos de f , g e f ± g , respectivamente, no i-ésimo intervalo [xi-1 , xi ] . É fácil


b

ver que m 'i + mi'' £ mi , assim temos que s ( f , P ) ± s ( g , P ) £ s ( f ± g , P ) £ ò ( f ± g )


a

para toda partição P. Se tomarmos duas partições obteremos ainda que:
b

s ( f , P ) ± s ( g ,Q) £ s ( f , P ÈQ) ± s ( g , P ÈQ) £ ò ( f ± g ) . Então tomando o supremo


a b b b

ò f ± ò g £ò f ± g

sobre todas as partições P do intervalo, teremos que e o mesmo
a a a
  
se pode concluir para a integral da soma superior e consequentemente:
¯ ¯
b b b b b b

ò f ± ò g £ò f ± g £ò f ± g £ò f ± ò g
a a a a a a
 
e quando as funções f e g são integráveis as três desigualdades se reduzem a
uma igualdade e daí segue o resultado.

Análise Real 143

analisereal.indd 143 04/04/2012 15:19:45


Basta observarmos que: - f (x) £ f (x) £ f (x ) e, como por hipóte-
f
se é integrável, segue que se usarmos duas vezes o item c) teremos que
b b b

-ò f (x) dx £ ò f (x) dx £ ò f (x) dx, e pela definição do módulo teremos o resul-


a a a
tado. █

A Teorema 6: Toda função f : [ a, b ] ®  contínua é integrável.


8
T Prova: Como uma função contínua em um intervalo compacto é uniformemente
2 contínua, dado ò > 0 arbitrário, existe d > 0 tal que
x , y Î [ a , b ], x - y < d Þ f ( x ) - f ( y ) < e
Seja P uma partição do intervalo [a, b ] cujos subintervalos da partição têm com-
primentos Di x = xi - xi-1 < d e nesse subintervalo a função um valor máximo e um
valor mínimo que são respectivamente Mi e mi e daí segue que wi = Mi - mi < e e
desse modo obteremos que
n n
S ( f , P ) - s ( f , P ) = åwi (xi - xi-1 ) <ò å (xi - xi-1 ) = e(b - a )
i =1 i =1

e conforme o teorema 3 segue o que queríamos demonstrar. █


1
Exemplo 3: Considere a função f : [-1,1] ®  , definida por f (x) = sen se
x
x ¹ 0 e f (0) = 0 . Temos que a função é limitada e descontínua apenas em x = 0 ,
logo f é integrável.
Você pode verificar facilmente que, se a função é monótona no intervalo [a, b ] , en-
tão de maneira análoga pode-se mostrar que a função é também integrável. Deixa-
mos para você a verificação desse resultado. E com isso finalizamos este tópico 2 e
partimos para o tópico 3 para demonstrarmos o teorema mais importante dessa aula:
o Teorema Fundamental do Cálculo.

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03
TÓPICO

TEOREMA FUNDAMENTAL DO CÁLCULO

OBJETIVOS
··Realizar o cálculo explícito da integral de uma
função;
··Compreender a integral como o valor da primitiva
de uma função;
··Entender algumas aplicações sobre o cálculo de
integrais.

A qui apresentamos o principal resultado desta aula: Oo Teorema Fun-


damental do Cálculo, que expressa a maneira como se deve fazer para
calcular uma integral de uma função. Nos tópicos anteriores, vimos
quais funções são integráveis, mas não sabemos como fazer para obter a integral de
uma função. A partir deste tópico, nós saberemos como fazer para calcular a integral
de uma função.

Teorema 7 (Fundamental do Cálculo): Seja f : [ a, b ] ® 


uma função contínua, então:
x

A função G (x) = ò f (t) dt é derivável para a < x < b com


a
G ' (x) = f (x ) e é contínua em [a, b ] e G (a) = 0 .
Para qualquer função F contínua sobre o intervalo [a, b ] e que di-
ferenciável em ( a, b) com F ' (x ) = f ( x ) e em que
b

ò f (x) dx = F (b) - F (a) .


a

Prova: a) Como f : [ a, b ] ®  é contínua, segue que f é integrá-


vel. Para h > 0 suficientemente pequeno, tome x + h < b . Então

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x +h x

G (x + h) - G ( x ) ò f (t) dt - ò f (t) dt 1
x +h x +h

h
- f (x ) = a

h
a
- f (x ) =
h ò f (t) dt - f (x) = ò [ f (t) - f (x)]dt
x x

x +h
e portanto temos que G (x + h) - G(x ) - f (x ) £ 1 f (t) - f (x ) dt . Se dado e > 0 ,
h h ò
x

escolhemos d > 0 para a função f contínua tal que f (x) - f (t ) < e com 0 < h £ d
A
G (x + h) - G ( x ) 1
x +h 8
, assim obtemos que - f (x) £ ò f (t) - f (x ) dt < e , como que-
h h x T
ríamos provar. 3

As funções F e G são duas funções contínuas sobre [a, b ] com deriva-


das iguais em (a, b) . Isso significa que G (x) = F (x) + c , para algum c . Então
b
.
ò f = G ( b ) - 0 = G ( b) - G ( a ) = F ( b) + c - F ( a ) - c = F ( b) - F ( a )
a

Corolário 1(Integração por Partes): Sejam f e g funções reais


definidas e tendo derivadas contínuas sobre [a, b ] . Então
b b

ò f (x) g '(x) dx =[ f (x). g (x) ] - ò f '(x) g (x)dx


b
a
a a

Prova: Sabemos que, da regra da derivada do produto, temos que


d
[ f (x). g (x)] = f '(x). g (x) + f (x). g '(x ) aplicando a integral e usando o teorema
dx
fundamental do cálculo
b b b
d
ò dx [ f ( x ) . g ( x )] dx = ò f ' ( x ) . g ( x ) dx + ò f (x). g '(x) dx ,
a a a

que dá o resultado. . █

Exemplo 4: Seja a função f : [ 0, 2] ®  definida por:

ì 0, 0 £ x 1
ï
f (x ) = ï
í
ï
î1, 1 £ x £ 2
ï
x

tomando F : [ 0, 2] ®  dada por F (x) = ò f (t) dt onde F (x) = 0 se 0 £ x £ 1 e


0

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F (x) = x -1 se 1£ x £ 2 . É fácil ver que F é contínua no intervalo [0, 2] , enquanto

a função f não é contínua em x = 1 .

Teorema 8 (Mudança de Variável): Sejam f : [ a, b ] ®  contínua e


g : [ c , d ] ®  derivável, com g ' integrável e g ([ c , d ]) Ì [a, b ] . Então
A g (d )
8 d

ò f (x) dx = ò f ( g (t)) g ' (t) dt

T
g (c) c

3
Prova: Como f é uma função contínua, temos que f possui uma primitiva

F : [ a, b ] ®  . Pelo Teorema Fundamental do Cálculo podemos observar que:


g (d )

ò f (x) dx = F ( g (d )) - F ( g (c)) (1)


g (c)

Mas, por outro lado, a regra da cadeia dá (F  g ) ' (t) = F ' ( g (t)). g ' (t) = f ( g (t)). g '(t )
e vemos que a função (F  g ) é uma primitiva da função integrável f ( g (t)). g '(t ) .
Então, integrando e usando o teorema fundamental do cálculo, chegamos ao resul-
tado desejado:
d d

ò f ( g (t)). g '(t) dt = ò (F  g )'(t) dt = F ( g (d )) - F ( g (c)) (2).


c c

Basta igualar a igualdades (1) e (2) e teremos o resultado, veja abaixo.


g (d ) d

ò g (c)
f (x )dx = ò f ( g (t )). g '(t )dt
c

Com esse resultado, chegamos ao fim de mais uma disciplina. Espero que você
tenha apreciado a consistência e a produtividade dos argumentos que apresentamos
para caracterizar o conceito de uma função real, limites, derivadas e integrais. Es-
ses conceitos mudaram a visão e a forma de encarar os problemas em Matemática.
A Matemática deixa de tratar de objetos estáticos e passa a abordar objetos em mo-
vimento. Por isso, com essa ferramenta matemática, o homem tem conseguido feitos
inimagináveis.

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Referências
ÁVILA, Geraldo. Introdução à análise matemática. 2. ed. São Paulo: Editora Edgard Blücher,
1999.
FIGUEIREDO, D. Guedes. Análise I. 2.ed. Rio de Janeiro: LTC, 1996.
HAZZAN, Samuel. Fundamentos de Matemática Elementar. 3. ed. Ed. Atual v. 5, São Paulo, 1977
IEZZI, Gelson. Fundamentos de Matemática Elementar 3. ed. v.6, Atual, São Paulo, 1977.
LIMA, Elon Lages. A matemática do Ensino Médio. 3. ed.v.3, SBM, São Paulo, 2000.
LIMA, Elon Lages. A matemática do Ensino Médio. 3.ed. Local: SBM, ano. v.2.
LIMA, Elon Lages. Análise Real. Rio de Janeiro: SBM, 2004. V.1

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CURRÍCULO

ANGELO PAPA NETO


Angelo Papa Neto nasceu em Fortaleza, onde fez seus estudos básicos e sua graduação. É licencia-
do em Matemática pela Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também fez seu mestrado. Con-
cluiu o doutorado em Matemática em 2007 na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Sua
área de pesquisa é a Álgebra Comutativa, área em que nutre especial interesse pela Teoria de Valo-
rizações, pela Teoria das Formas Quadráticas e pela Álgebra Real. É professor efetivo do IFCE desde
1997. Casado desde 2000, é pai de dois filhos. Na música, é um grande admirador de J. S. Bach, L.
Beethoven e Dimitri Shostakovich; no cinema, de F. W. Murnau, Fritz Lang e A. Hitchcock; na lite-
ratura, de F. Kafka, A. Tchekov e Guimarães Rosa; na gastronomia, de sua esposa Sueli.

CURRICULO ZELALBER GONDIM GUIMARÃES


Possui mestrado em Matematica pela Universidade Federal do Ceará (1998) . Atualmente é profes-
sor titular da Universidade Regional do Cariri. Tem experiência na área de Matemática , com ênfase
em Geometria e Topologia.

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