ALMEIDA, M. C. - 2014 - Colaboração Entre Pesquisadores e Professores de Ensino de Ciências e Biologia
ALMEIDA, M. C. - 2014 - Colaboração Entre Pesquisadores e Professores de Ensino de Ciências e Biologia
ALMEIDA, M. C. - 2014 - Colaboração Entre Pesquisadores e Professores de Ensino de Ciências e Biologia
Salvador
2014
Mariangela Cerqueira Almeida
Salvador
2014
Mariangela Cerqueira Almeida
Aos meus pais, Jivanildo e Hildete, pelo apoio em todas as minhas escolhas e por
estarem ao meu lado em todos os momentos da minha vida.
Ao meu sobrinho, o pequeno Pedro Lucca, pela felicidade que trouxe a toda família
desde a sua chegada a esse mundo. A presença e a doçura de uma criança nos dias da
etapa final de um trabalho é um presente! A tia te ama incondicionalmente, Pedrinho!
Aos meus irmãos, Ricardo, Danilo e Geovane, pelo companheirismo diário importante
para o equilíbrio necessário ao desenvolvimento de um trabalho acadêmico, já que
compartilhamos o mesmo lar.
A toda minha família, Cerqueiras e Almeidas, pelo carinho e pela compreensão das
ausências em prol do desenvolvimento desse trabalho
Àqueles que se tornaram mais que amigos e constituem hoje uma verdadeira família, o
ExtraBem: Paulinha, Ina, Mari, Thai, Leo e Alan; e, como família que é, acompanhou
e torceu pelo sucesso a cada etapa deste trabalho. E, como parte da família Extra, à
Vivi (a madrinha do ExtraBem), pela amizade cada dia mais forte e ao MEB: Gabi,
Celso e Mona.
A todos os meus amigos, e costumo dizer que tenho muitos e os melhores, por todas as
palavras de incentivo e força na trajetória acadêmica, Em especial a Binho, meu
amigo/irmão.
A Breno, Priscila e Thiago Hartz pela amizade e carinho que temos uns pelos outros e
que tem sido tão importante em muitos momentos das nossas carreiras acadêmicas.
As minhas pretas queridas, Mari Pinto e Yves pela amizade e recepção sempre tão
carinhosa sempre que chego à Salvador. Mari, obrigada por dividir comigo a sua
casa, amiga!
A Mari e Gabi, Ina e Celso, tia Lene e tio Naldo por desde sempre me receberem e
dividirem os seus lares comigo sempre que estou em Salvador.
A minha turma de mestrado 2012.1, fomos muito felizes em ter nos encontrado. Em
especial ao grupo de Feira que realizava as tão divertidas viagens à Salvador para as
aulas juntos: Paeta, Joubert, Lilian, Airam, Eider e Mateus. E aos queridos amigos
constituídos durante as aulas do mestrado: Wagner Aguiar, Thiago Lucena e Klayton
Ao professor e amigo Marco Barzano, não posso esquecer que sempre esteve presente
e contribuindo nos momentos mais importantes da minha trajetória acadêmica.
Por fim, a todos que direta e indiretamente contribuíram para a realização desse
trabalho.
RESUMO _______________________________________________________
The creation of collaborative research teams have been stimulated in the area of educational
study as a response to different problems in educational field, such as the gap between
research and practice in the professional development of teachers. So there exists a
proliferation of concepts and models of work about this nature in educational field. Given
such a scenario, it is imperative to recover these experiences in order to bring new theoretical,
methodological and epistemological background for these professional practice and research.
Therefore, this study aims to investigate how collaborative relationships are socially
organized in a collaborative research team in science and biology education. We adopt the
concept of Communities of Practice proposed by Lave and Wenger as analytical lens for the
interpretation of empirical data about the collaborative group concerned. Thus, this study was
made in two steps. The first one was composed of a theoretical analysis of the limits and
possibilities of the usage of the concept of community of practice to investigate the
collaborative teams. As a result, we proposed a theoretical and methodological framework to
guide qualitative and empirical studies about how collaborative teams socially organize
themselves and develop their practices. The second step was to apply this framework to the
empirical study of the organization of collaborative relationships and tensions or endemics
dualities. Data gathering and analysis were performed through the methodology of focus
groups. Data nature was audiovisual, interviews, informal conversation and documental
analysis. Summarizing, the results showed that the CoPPEC organize their collaboration
relations by a net. This teams is composed of a cooperation groups which investigates
educational innovations. These groups communicates themselves and with a nuclear group of
people that support these collaborative research. This nuclear group is unique, larger and
indivisible. Tension was identified as being connected to the social organization of the group.
For instance, tension was established due to the need of a variety of investigation themes and
due to the need to construct a common working axis and what we call "virtual silence". It was
concluded that such tensions when negotiable promote social developmental of the group by
means of the creation of shared vocabulary. These results provide cooperative tasks planners
and collaborators capable of identify patterns that may occur in their own communities.
Thereby they‘ll manage challenging situation in a more informed way. The theoretical and
methodological structure proposed aim to contribute to new empirical studies about the
principles of educational cooperative research group organization.
CAPÍTULO 1
Figura 01 - Quadro teórico para análise de dados e produção de resultados em estudos
empíricos sobre Comunidades de Prática e grupos colaborativos.
CAPÍTULO 2
Figura 01 - Imagens usadas como material de estímulo para a entrevista de grupo focal.
Figura 02 - Organização das relações de colaboração no CoPPEC
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS_____________________________
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................11
A relevância de estudos sobre grupos colaborativos na área de educação...............................11
O CoPPEC................................................................................................................................12
A minha trajetória de participação no grupo e delineamento da presente pesquisa.................14
Abordagem metodológica do estudo........................................................................................15
Organização da dissertação......................................................................................................19
Descrição dos capítulos ...........................................................................................................20
Referências................................................................................................................................22
CAPÍTULO 1..........................................................................................................................24
Artigo: Possibilidades e limites da aplicação do conceito de Comunidades de Prática em
investigações sobre organização e funcionamento de grupos colaborativos de professores e
pesquisadores
CAPÍTULO 2..........................................................................................................................65
Artigo: Organização das relações sociais e tensões na dinâmica de um grupo colaborativo de
pesquisa em ensino de ciências
CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................105
Retomada da pergunta de pesquisa........................................................................................105
Limitações da pesquisa e possíveis lacunas...........................................................................107
Contribuições do estudo.........................................................................................................108
Referências.............................................................................................................................110
APÊNDICE ...........................................................................................................................111
11
INTRODUÇÃO__________________________________________________
O CoPPEC
O CoPPEC se forma em torno de uma tarefa específica: a execução do projeto de
pesquisa ―Desenvolvimento e teste de sequências didáticas para o Ensino Médio de Biologia
em redes colaborativas de professores e pesquisadores‖, submetido e aprovado ao edital
008/2009 ―Inovações educacionais ‖ da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
(Fapesb), com duração de 12 meses.
O grupo inicia sua formação com a participação de dez professores que compunham o
quadro docente de três escolas da rede estadual de ensino da Bahia. Os professores Anna 1
Cássia Sarmento, Valter Alves, Cássia Muniz e Natália Rodrigues integram o corpo docente
do Colégio da Polícia Militar – Unidade Dendenzeiros, situado no município de Salvador.
Compunha o quadro de professores de Biologia do Instituto Educacional Gastão Guimarães,
1
A despeito de inicialmente o Termo de Consentimento Livre Esclarecido apresentado ao grupo garantir o
anonimato dos participantes da pesquisa, os copequianos, ao longo do desenvolvimento da pesquisa, optaram por
serem identificados nominalmente usando como justificativa a natureza colaborativa do trabalho que
desenvolvem e o aspecto autoral que este trabalho e a reflexão sobre ele representam para todos os membros do
grupo.
13
2
Os termos ―trabalho colaborativo‖, ―grupo colaborativo‖ e ―colaboração‖ serão tratados teoricamente no
capítulo 1 desta dissertação.
3
A expressão ―sequência didática‖ está sendo usada com sentido próximo ao proposto por Zabala (1898, p. 18),
referindo-se a um conjunto de atividades ordenadas, estruturadas e articuladas para a realização de certos
objetivos educacionais, que tem um princípio e um fim conhecidos tanto pelos professores como pelos alunos.
14
entre os membros do grupo. Entre as minhas atribuições como bolsista estavam acompanhar a
aplicação das sequências didáticas nas escolas participantes auxiliando os professores com os
registros audiovisuais de sala de aula e com as análises dos dados produzidos pela aplicação
das sequências didáticas, a apresentação de seminários e discussão de textos com todos os
membros do grupo em suas reuniões mensais, bem como a realização das filmagens dessas
reuniões e, a colaboração na escrita de artigos para a divulgação dos resultados das pesquisas
do grupo.
Ao final do projeto financiado pela FAPESB, o grupo possuía algumas decisões
formalizadas sobre a sua prática resultante do engajamento dos membros na negociação e
construção da prática de pesquisa colaborativa: (1) continuaria desenvolvendo as
investigações sobre as sequências didáticas; (2) manteria a cultura de compartilhamento de
informação e planejamento coletivo das intervenções educacionais; da mesma forma, (3)
manteria os encontros mensais com todos os membros; (4) buscaria financiamento de novos
editais para as pesquisas desenvolvidas; (5) se imbuiria em agregar mais pesquisadores e
professores à sua prática de pesquisa colaborativa e, (6) desenvolveria uma investigação com
foco no estudo da própria experiência de colaboração.
Essa última deliberação do grupo toma corpo com o projeto ―A dinâmica de um grupo
colaborativo de pesquisa e o desenvolvimento profissional de professores de ciências e
biologia‖ submetido e aprovado ao edital interno de pesquisa da UEFS (resolução CONSEPE:
06910/2011) coordenado pela pesquisadora Cláudia Sepúlveda e do qual fazem parte da
equipe executora alguns dos pesquisadores e professores do CoPPEC e eu, desde que ainda
era aluna de graduação.
Com vistas a esse projeto, dei início às análises das filmagens das reuniões mensais do
grupo para buscar entender como o grupo se organiza socialmente. E como desdobramento do
projeto citado desenhamos o projeto de pesquisa ―Colaboração entre pesquisadores e
professores de Ensino de Ciências e Biologia: um estudo da organização e desenvolvimento
da prática social do grupo CoPPEC‖ desenvolvido no meu curso de mestrado e sobre o qual
trata este manuscrito.
4
Este projeto está inserido em um projeto de pesquisa mais amplo ―A dinâmica de um grupo colaborativo de
pesquisa e o desenvolvimento profissional de professores de Ciências e Biologia‖, o qual foi submetido ao
Conselho de Ética em Pesquisa - UEFS. Registrado pelo CAAE - 0159.0.059.000-10 e aprovado em 21/10/2011.
17
grupo. À vista disso, a reunião em que ocorreu o grupo focal foi demandada pelo grupo com
objetivo de refletir sobre a sua prática colaborativa e sobre o episódio ocorrido. À esse tempo,
estávamos envolvidos com o projeto que deu origem à presente investigação e, por isso,
usamos a entrevista de grupo focal para que a reunião cumprisse um duplo papel: a reflexão
do grupo sobre seu processo de colaboração e as diretrizes para manter o amadurecimento da
prática social e desenvolvimento do grupo e a obtenção de dados para a pesquisa sobre a
colaboração no grupo. Para tanto, apresentamos as seguintes questões geradoras: Quais são os
requisitos para que um grupo seja colaborativo? Você considera que nosso grupo cumpre
todos esses requisitos? Caso contrário, quais requisitos não são satisfeitos? Como você
caracterizaria a dinâmica de colaboração que vivenciamos até o momento?
Além disso, algumas imagens retiradas da internet que se relacionavam à ideia de
colaboração ou grupo colaborativo (ver figura 01, p 73, do capítulo 2 desta dissertação) foram
expostas ao grupo em uma apresentação de Powerpoint como material de estímulo para a
entrevista. Foi sugerido que, para responder as questões acima, uma estratégia seria (1)
escolher e argumentar qual daquelas imagens seria a mais adequada para representar o
trabalho de um grupo colaborativo, e (2) qual delas representaria de modo mais aproximado a
experiência de colaboração vivenciada pelo grupo, especificamente.
As entrevistas individuais foram orientadas por um roteiro de entrevista. Esse roteiro
passou por um teste piloto realizado com um membro do grupo, a pesquisadora Izaura Cruz, e
após avaliação desse teste por mim e pelos orientadores da pesquisa, ele sofreu alterações e
foi reestruturado a fim de se constituir o roteiro definitivo.
O roteiro definitivo (Apêndice, p, 112) foi subdividido em quatro blocos de perguntas.
O primeiro deles continha perguntas referentes à carreira profissional do entrevistado como,
por exemplo, o tempo de docência e a experiência em pesquisa acadêmica, para os
professores e, o tempo de atuação na pesquisa educacional e se possuía experiência em
docência no ensino médio de escolaridade, para pesquisadores. No segundo bloco, usamos
―ferramentas de provocação de conversação‖, uma técnica de entrevista qualitativa proposta
por Cobern (1993). Apresentamos ao entrevistado sentenças sobre pertencimento,
alinhamento e coesão de participantes a grupos colaborativos, tais como: ―Eu desejo continuar
sendo membro desse grupo‖; ―Eu não me importo com o que ocorre no grupo‖; ―A despeito
das diferenças individuais, existe um sentimento de unidade no grupo‖. As sentenças foram,
em grande parte, adaptadas da escala de atitude de grupo desenvolvida por Evans e Jarvis
(1986 apud MEIRINK, et al., 2010). Durante a entrevista, solicitamos que o membro do grupo
19
Organização da dissertação
Esta dissertação está organizada no modelo multipaper, ou seja, ela se configura como
um conjunto de artigos que apresentam uma temática ampla em comum, cada um dos quais
voltado para um aspecto particular do objetivo principal, conforme proposto por Paltridge
(2002). Segue disso, que a dissertação conta com esta introdução, dois capítulos em formato
de artigos e por fim uma seção de sistematização, por meio das considerações finais. Cada
capítulo dessa dissertação pode ser lido isoladamente, pois não apresentam dependência de
dados ou informações entre si.
O modelo adotado justifica-se pelas críticas ao modelo tradicional (organizado em
torno dos tópicos: introdução, metodologia, resultados, discussão e conclusão). Uma dessas
críticas defende que o público que terá contato a uma dissertação no formato tradicional é
muito restrito (DUKE; BECK, 1999). Um modelo que contemple diversos artigos, por sua
vez, pode ser mais facilmente difundido.
Se por um lado o modelo de manuscrito multipaper atende a essa demanda de acesso a
pesquisa da comunidade científica, por outro, ele apresenta algumas implicações inevitáveis
como, por exemplo, repetições de referencias e informações entre os artigos para garantir a
independência destes e perda de espaço e detalhamento em algumas seções dos artigos.
20
Figura 01 - Quadro teórico para análise de dados e produção de resultados em estudos empíricos
sobre CoP. Fonte: Elaborada pela pesquisadora.
REFERÊNCIAS
ATKINSON, P.; HAMMERSLEY, M. Ethnography: Principles in Practice. Taylor &
Francis, 266 p., 2007.
DUKE, N. K.; BECK, S. W. Education should consider alternative formats for the
dissertation. Educational Researcher, v. 28, n. 3, p. 31-36, 1999.
LAPLATINE, F., 1943. Aprender Antropologia. Tradução Marie Agnés Chauvel. Prefácio
Maria Isaura Pereira Queiroz. – São Paulo: Brasiliense, 2003.
23
MEIRINK, J. A.; IMANTS, J.; MEIJER, P.C.; VERLOOP, N. Teacher learning and
collaboration in innovative teams. Cambridge Journal of Education, v. 40, n. 2, p. 161–181,
2010.
MCINTYRE. D. Bridging the gap between research and Practice. Cambridge Journal of
Education, v. 35, n. 3, p. 357–382, 2005.
CAPÍTULO 1____________________________________________________
RESUMO
Este artigo discute as possibilidades e os limites do uso do conceito de Comunidades
de Prática em investigações a respeito da organização e desenvolvimento da prática social de
grupos colaborativos de professores e pesquisadores. Para tanto é realizada uma revisão da
literatura sobre grupos colaborativos. A polissemia encontrada na literatura em torno dos
termos grupo colaborativo e colaboração é interpretada e organizada por meio da noção
wittgensteiniana de semelhança de família, de modo a propor uma definição que permita a
identificação de diferentes grupos sociais como grupos colaborativos. Como resultado do
diálogo entre esta definição e a literatura sobre conceito de comunidade de prática, é proposta
uma estrutura teórico-metodológica para orientar estudos empíricos qualitativos a respeito do
modo como os grupos colaborativos se organizam socialmente e desenvolvem a sua prática.
PALAVRAS CHAVES
Grupos colaborativos, Comunidades de Prática, organização, funcionamento
INTRODUÇÃO
A formação de grupos colaborativos (GC) envolvendo professores de diferentes
níveis de ensino e entre professores e pesquisadores educacionais em torno da pesquisa
educacional têm sido proposta como uma forma de enfrentar diferentes problemas relativos à
produção de conhecimento na área de educação e desenvolvimento profissional docente. A
pesquisa colaborativa tem sido vista como um caminho para diminuir a lacuna pesquisa-
prática, ou seja, a distância entre a produção de conhecimento pela pesquisa educacional e as
práticas dos professores (HARGREAVES, 1999; MCINTYRE, 2005, EL-HANI; GRECA,
2011), para promover maior relevância social e qualidade da pesquisa educacional
(ZEICHNER, 1998) e progresso da pesquisa em educação científica (MOREIRA, 1988), para
promover o desenvolvimento profissional e o empoderamento do professor (GARRISON,
25
1988; ZEICHNER, 2003; LÜDKE, 2005; GOODCHILD, 2008) e para favorecer uma
mudança na cultura organizacional da escola (HARGREAVES, 1999; PIMENTA;
GARRIDO; MOURA, 2001).
Na área de ensino de ciências e matemática, no Brasil, podemos destacar algumas
experiências como a colaboração entre pesquisadores do Centro de Educação da Universidade
Federal de Alagoas (UFAL) e professores do ensino médio (DAMASCENO; ABREU, 2001),
a pesquisa realizada pelo Grupo de estudo e pesquisa sobre formação de professores de
matemática da Faculdade de Educação da Universidade de Campinas, São Paulo
(FE/Unicamp) (FIORENTINI, 2004), os projetos de investigação-ação realizados pelo Grupo
Interdepartamental sobre Educação em Ciências da Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul (Gipec-Unijuí) (MALDANER; ZANON; AUTH, 2006) e o
Grupo Colaboração em Pesquisa e Prática em Educação Científica (CoPPEC) formado por
pesquisadores universitários e professores do ensino fundamental e médio de instituições
públicas do estado da Bahia (EL-HANI et al., 2011; SEPULVEDA et al., 2012; ALMEIDA;
SEPULVEDA; EL-HANI, 2012; 2013).
Este movimento repercute não apenas na proliferação de concepções e modelos de
trabalhos colaborativos (FIORENTINI, 2009; MEIRINK, et al., 2010; MONTIEL-
OVERALL, 2005; FERREIRA, 2003), mas, sobretudo, nas diferentes formas de organizar e
investigar esses grupos o que inaugura uma agenda de pesquisa pautada na sistematização
destas experiências de modo a contribuir com novas bases teóricas, metodológicas e
epistemológicas para essa modalidade de prática profissional e de pesquisa (FIORENTINI,
2004).
Considerando essa agenda de pesquisa, pretendemos, nesse artigo, oferecer
contribuições teóricas e metodológicas que orientem investigações a respeito da organização e
desenvolvimento da prática social de GC formados por professores e pesquisadores.
O estudo sobre GC tem sido adotado por uma parcela significativa dos pesquisadores
que investigam a colaboração, devido a isso se tem traçado diferentes caminhos e perspectivas
para investigar esse tópico. Uma perspectiva que tem se tornado frequente na literatura é a
associação feita entre GC e o conceito de Comunidade de Prática - CoP (LAVE; WENGER,
1991; WENGER, 1998), e a aprendizagem situada em Comunidade de Prática (BARAB;
MAKINSTER; SCHECKLER, 2004; BARAB; BARNETT; SQUIRE, 2002; FIORENTINI,
2004, 2009; BELINI, 2012).
A despeito de esta abordagem ser frequentemente encontrada na literatura sobre GC,
essa literatura não apresenta análises do conceito de CoP de modo a levar-nos a entender o
26
uso desse conceito, bem como seus limites, para o entendimento da estrutura e
desenvolvimento de GC. Por esta razão, justifica-se o nosso empreendimento em propor
contribuições teóricas nesse campo.
Contemplando esta tendência e com vistas a uma contribuição teórica nesse campo,
buscamos, neste estudo, apresentar uma análise a respeito do poder explicativo do conceito de
CoP para o entendimento e caracterização da organização social de GC.
Para tanto, discutiremos inicialmente a polissemia em torno do conceito de
colaboração ou GC e os esforços presentes na literatura que visam organizá-la. Dialogaremos
com a noção wittgensteiniana de semelhanças de família (WITTGENSTEIN, 1999) com
vistas a uma proposta de definição de GC. Em seguida, apresentaremos as características de
CoP e examinaremos possibilidades e limites na aplicação do conceito de CoP em
investigações sobre GC.
Como resultado desta análise, seguiremos com a proposição de uma síntese teórica
para orientar estudos empíricos qualitativos a respeito do modo como os GC se organizam
socialmente e desenvolvem a sua prática.
"A colaboração não pode ser imposta, ela deve ser construída. Ela é
construída dentro de relacionamentos nos quais os indivíduos sentem
vontade de compartilhar suas diferenças, e, ao contrário das formas típicas
de autoridades atribuídas aos papeis e relacionamentos institucionais, busca
por formas mais inclusivas de envolver múltiplas perspectivas e fala através
das questões da confiança, mutualidade e equidade. Estabelecer
relacionamentos leva tempo. Os projetos podem parecer ineficientes e sem
foco, especialmente no começo, porque os aspectos relacionais devem ser
considerados bem como as metas e procedimentos do projeto"
(JOHNSTON; KIRSCHNER, 1996. p.146)
dizer que os jogos são pelo menos atividades (mentais ou físicas). No entanto, ser uma
atividade não define jogos nem especifica um critério de demarcação do conceito, pois há
muitas atividades que não são jogos, como trabalhar ou pegar ônibus (IRZIK; NOLA, 2010).
A análise da literatura sobre GC apresentada nessa seção nos permite propor uma
definição de GC ou colaboração por semelhanças de família no modelo politético. Todas as
tentativas de conceituar GC ou colaboração apresentadas acima apresentam em si a noção de
―compartilhamento de informações, ideias e artefatos entre os membros de um GC‖ o quê nos
leva ao entendimento de que uma ―cultura de compartilhamento‖ é uma característica
importante em GC. Além disso, podemos considerar que a característica ―apoio mútuo entre
os membros do grupo‖ é decorrente da primeira e também comporia o conjunto de
características de todos os GC. Por fim, seguindo a Hargreaves (1998), os membros dos GC
devem aderir ao grupo voluntariamente.
Não obstante, essas características por si só não definem GC ou colaboração. As
situações de compartilhamento no dia a dia de pessoas são enumeras, por exemplo, alunos em
uma sala de aula compartilham informações, ideias e artefatos entre si quando uma discussão
é levantada pelo professor ou pelos próprios alunos e, nesse caso, não se trata de um GC. Da
mesma forma, aderir voluntariamente a um grupo de teatro, por exemplo, não faz deste
obrigatoriamente um GC.
Se as características comuns não são suficientes para definir GC ou diferenciá-los de
outros grupos sociais, são as outras características que acompanham a cultura de
compartilhamento e a adesão voluntária que dão importantes contribuições para formar o
cluster das características representativas dos GC.
Tendo em vista a revisão de literatura apresentada nesta seção e aquela realizada por
Montiel-Overall (2005), é possível organizar um cluster de características, juntamente com as
características comuns, em torno das quais pode se formar uma rede complexa de
semelhanças que se entrecruzam ao acaso e que permitem identificarmos diferentes grupos
sociais como GC. A seguir organizamos esse cluster de características de GC em torno dos
aspectos elencados por nós nessa seção sobre os quais tratam cada uma das características de
GC.
Tomando-se de início que os GC são formados voluntariamente por seus membros e
que estes nutrem entre si uma cultura de compartilhamento de ideias, experiências e artefatos,
as demais características5 dos GC são relativas a: (1) composição do grupo em relação ao
5
Essas características são citadas por Montiel-Overal (2005).
35
com mais rigor que pelas demandas da empresa. A visão privilegiada do domínio é o que
orienta a aprendizagem efetiva da comunidade. Esta visão pode ou não ser facilmente
articulada por membros, mas, no entanto, molda os conhecimentos, valores e comportamentos
que mantêm cada um responsável (WENGER; MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
No contexto educacional e pedagógico podemos nos referir ao domínio de uma CoP
de professores de ciências, por exemplo, como sendo circunscrito pelo conhecimento da área
de ensino de ciências. A condição de professor de ciências pode unir os professores ou alguns
professores de uma escola em uma CoP. É a noção do domínio por cada um dos professores
que cria um sentimento de corresponsabilidade para com um corpo de conhecimento (teórico
ou tácito) da área de ensino de ciências que, em última análise é o quê vai orientar a
aprendizagem e dar significados às suas ações como professores de ciências e participantes de
uma CoP.
Uma vez mantido o interesse no domínio, os membros de uma CoP se engajam em
atividades e discussões conjuntas, ajudam uns aos outros, e compartilham informações.
Trabalhar em direção a uma visão comum é o que lhes permite construir confiança e
relacionamentos. As relações construídas são do tipo que lhes permitem aprender uns com os
outros mesmo que não trabalhem juntos diariamente. Constitui-se assim a comunidade.
A comunidade é o elemento fundamental para uma estrutura de conhecimento eficaz.
Uma CoP não é apenas um site, um banco de dados, ou um conjunto de melhores práticas. É
um grupo de pessoas que interagem, aprendem juntos, constroem relacionamentos, e no
processo desenvolvem um sentimento de pertencimento e compromisso mútuo (WENGER;
MCDERMOTT; SNYDER, 2002)
Para construir uma CoP, os membros devem interagir regularmente em torno de
questões importantes para o seu domínio. Ter o mesmo título, por exemplo, não é suficiente.
Os gerentes de segurança em diferentes unidades de negócios que não interagem entre si não
formam uma CoP. Assim como em nosso exemplo, professores de ciências que não interagem
entre si não constituem uma CoP. Além disso, estas interações devem ter certa continuidade,
pois ao interagir regularmente, os membros de uma CoP desenvolvem um entendimento
compartilhado do seu domínio e uma abordagem para a sua prática. Nesse processo, eles
constroem valiosas relações baseadas no respeito e na confiança. Com o tempo, eles
constroem um sentido da história e da identidade comum (WENGER; MCDERMOTT;
SNYDER, 2002).
Uma CoP não é apenas uma comunidade de interesse. Seus membros são praticantes.
Eles desenvolvem um repertório compartilhado de recursos: experiências, histórias,
39
O autor descreve três características da prática que fazem dela a fonte de coerência da
comunidade, quais sejam: engajamento mútuo, empreendimento conjunto e repertório
compartilhado.
40
A prática não reside no vazio, ela existe porque pessoas estão engajadas em ações
cujos significados elas negociam umas com as outras. Sendo assim, a prática reside numa
comunidade de pessoas e nas relações de engajamento mútuo por meio das quais elas fazem o
que fazem. Ser membro de uma CoP implica engajar-se de uma maneira fundamental dentro
deste sistema da comunidade. O que está em jogo aqui não é apenas a nossa própria
competência, mas também as competências dos outros. Por isso, as relações de engajamento
mútuo inspiram-se sobre o que fazemos e o que sabemos, bem como em nossa capacidade de
conectar-se de forma significativa ao que não fazemos e o que não sabemos - ou seja, nas
contribuições e conhecimentos dos outros. Por este motivo, desenvolver uma prática
compartilhada depende do engajamento mútuo.
Uma prática compartilhada conecta participantes da CoP uns aos outros de diversas e
complexas formas. As relações resultantes refletem a complexidade de trabalhar
conjuntamente. Tais relações não são facilmente redutíveis a um único princípio, tais como o
poder, o prazer, a concorrência, a colaboração, o desejo, as relações econômicas, acordos
utilitários, ou processamento de informações. Na vida real, as relações mútuas entre os
participantes são misturas complexas de poder e dependência, prazer e dor, experiência e
desamparo, sucesso e fracasso, aliança e competição, facilidade e luta, autoridade e
coleguismo, resistência e conformidade, raiva e ternura, atração e repulsa, diversão e tédio,
confiança e desconfiança, amizade e ódio (WENGER, 1998).
Os membros de uma CoP estão unidos pelo entendimento sobre o empreendimento
conjunto. Wenger (1998) elenca três pontos sobre o empreendimento que mantém uma CoP
unida: (1) O empreendimento conjunto é o resultado de um processo coletivo de negociação
que reflete a complexidade do engajamento mútuo; (2) é definido pelos participantes da CoP
no próprio processo de executá-lo. É a resposta negociada dos participantes para a sua própria
situação e, portanto, pertence a eles no sentido profundo, apesar de todas as forças e
influências que estão além do seu controle; (3) não é apenas um objetivo declarado, mas cria
entre os participantes relações de corresponsabilidade que se tornam parte integrante da
prática.
É apenas quando negociados pela comunidade que as condições, recursos e demandas
moldam a prática. O empreendimento nunca é completamente determinado por uma demanda
externa, por uma prescrição, ou por qualquer participante. Mesmo quando uma comunidade
de prática surge em resposta a uma demanda externa, a prática se transforma como resposta
da própria comunidade para essa demanda. Mesmo quando membros específicos têm mais
poder do que outros, a prática se torna uma resposta comum a essa situação. Mesmo quando
41
submissão estrita é a resposta, a sua forma e interpretação na prática deve ser vista como uma
criação coletiva local da comunidade. Como os membros produzem uma prática para lidar
com o que eles entendem ser o seu empreendimento, a prática como um desenvolvimento da
comunidade pertence a ela em um sentido fundamental.
Dizer que as comunidades de prática produzem sua prática não é dizer que elas não
podem ser influenciadas, manipuladas, enganadas, intimidadas, exploradas, debilitadas, ou
coagidas à submissão; nem é dizer que elas não podem ser inspiradas, ajudadas, apoiadas,
iluminadas, ou empoderadas. Mas é dizer que o poder - benevolente ou malévolo - que as
instituições, prescrições ou indivíduos têm sobre a prática de uma comunidade é sempre
mediado pela produção da sua própria prática pela comunidade. As forças externas não têm
poder direto sobre esta produção, porque, em última análise (ou seja, no fazer através do
engajamento mútuo na prática), é a comunidade que negocia seu empreendimento
(WENGER, 1998).
Depois de algum tempo, a busca conjunta por um empreendimento gera recursos para
a negociação de significados, um processo que dá origem a elementos constituintes do
repertório compartilhado de uma CoP que pode ser muito diverso. Esses elementos não são
coerentes em si mesmos como atividades específicas, símbolos ou artefatos, mas pelo fato de
que eles pertencem à prática de uma comunidade em busca de um empreendimento. Esse
repertório inclui rotinas, palavras, ferramentas, formas de fazer as coisas, gestos, símbolos,
gêneros, ações ou conceitos que a comunidade produziu ou adotou no decorrer de sua
existência, e que se tornaram parte da sua prática.
O repertório combina aspectos de reificação e participação. Wenger (1998) usa o
termo reificação genericamente para se referir ao processo de ―coisificação‖, o mesmo que
dar forma a experiências da CoP por meio da produção de objetos que capturam essas
experiências. De outra forma, Wenger usa o termo participação para descrever a experiência
social de viver no mundo em termos de filiação em comunidades sociais e envolvimento ativo
nos empreendimentos sociais. Participação nesse sentido é tanto pessoal quanto social. Ela é
um complexo processo que combina fazer, falar, pensar, sentir e pertencer (WENGER, 1998).
O repertório compartilhado ainda inclui o discurso pelo qual os membros criam
afirmações significativas sobre o mundo, bem como os estilos pelos quais eles expressam suas
formas de filiação e suas identidades como membros (WENGER, 1998).
Barab e Duffy (2000) em diálogo com Wenger (1998) e outros autores (BROWN;
DUGUID, 1991; BEREITER, 1994, 1997) discutem mais amplamente a ideia de repertório
compartilhado descrevendo o que denominam de patrimônio cultural e histórico comum de
42
uma CoP. Segundo os autores, a comunidade tem uma história significativa, um patrimônio
cultural e histórico comum. Este patrimônio inclui os objetivos compartilhados, sistemas de
crenças e histórias coletivas que capturam prática canônica [da CoP]. Essas experiências
compartilhadas vêm a constituir uma base de conhecimento coletivo que é continuamente
negociado através de cada interação.
Ao aprender como parte de uma CoP, o novato tem acesso a essa história de
negociações anteriores, bem como capacidade de resposta a partir do contexto atual sobre o
valor funcional de um significado particular. Através deste contar e recontar, os indivíduos
fazem mais do que transmitir conhecimentos. Eles contribuem para a construção de sua
própria identidade em relação à CoP e, reciprocamente, a construção e desenvolvimento da
comunidade da qual fazem parte (LAVE; WENGER ,1991).
É também através deste patrimônio que os participantes de comunidades encontram
legitimidade. Quando os indivíduos se tornam membros plenos da comunidade, eles herdam
este patrimônio comum, que se torna interligado com as suas identidades como membros da
comunidade. Este é um componente central no autodesenvolvimento. Indivíduos desenvolvem
um sentido de si em relação à CoP, e isso só pode surgir por enculturação na história da
comunidade, ou seja, no processo de tornar a cultura da CoP sua própria cultura. O seguinte
exemplo é apresentado por Barab e Duffy (2000): jovens cientistas não desenvolvem um
sentido de si próprios como cientista simplesmente por se envolver em problemas científicos,
mas sim por meio do engajamento no discurso da comunidade científica e no contexto dos
valores daquela comunidade quando eles se tornam membros da comunidade. Através da
participação como um participante periférico na comunidade da prática, regras e expectativas
de comportamento podem a priori parecer arbitrárias, artificiais, e até mesmo desnecessárias.
No entanto, através da participação na comunidade ao longo do tempo, o indivíduo passa a
aceitar o contexto histórico e a importância de normas socialmente negociadas para a
definição da comunidade e da sua própria identidade. É somente através da participação
alargada em uma comunidade que esta história e, portanto, um sentido de si mesmo, pode se
desenvolver (BARAB; DUFFY, 2000).
Além da prática que confere coerência as CoP, outra característica própria das
comunidades de práticas são os ciclos de reprodução social por meio dos quais se revela a
aprendizagem e é possível a permanência das CoP ao longo do tempo (LAVE; WENGER,
1991; WENGER, 1998; BARAB; DUFF, 2000).
A comunidade está constantemente reproduzindo-se de tal forma que novos membros
contribuem, apoiam e, eventualmente, levam a comunidade para o futuro. Nesse processo os
43
eles também serão beneficiados. Este tipo de reciprocidade não é abnegação, mas uma
compreensão mais profunda de valor mútuo, que se estende ao longo do tempo (WENGER;
MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
Aprender requer uma atmosfera de abertura. Cada comunidade desenvolve uma
atmosfera única - intensa ou descontraída, formal ou informal, hierárquica ou democrática.
Seja quais forem as normas estabelecidas pelos membros, a chave é construir uma base para a
participação coletiva. Uma CoP eficaz oferece um local de exploração onde é seguro falar a
verdade e fazer perguntas difíceis. A confiança é a chave para este processo. As reuniões são
intensas, ricas em conteúdo, envolvendo membros em boas discussões.
Na verdade, o forte de uma comunidade é a capacidade de lidar com o dissenso e
torná-lo produtivo. Em boas CoP, laços fortes entre os membros suportam o desacordo, e os
membros podem até mesmo usar o conflito como uma maneira de aprofundar o seu
relacionamento e sua aprendizagem (WENGER; MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
O sucesso da prática construída caminha lado a lado com a construção da comunidade.
Esse processo deve dar aos praticantes uma chance para ganhar uma reputação como
construtores da prática da comunidade. Debates sobre o framework e métodos da prática
permitem que a comunidade estabeleça seus próprios padrões. Estabelecer acordos sobre
normas ou melhores práticas inevitavelmente envolve desacordos e conflitos. Quando esse
processo ocorre em uma comunidade em andamento, contudo, cada debate específico é parte
de um longo debate com os quais os membros se comprometeram. Este compromisso
contínuo coloca o processo de lidar com a discordância na perspectiva da CoP (WENGER;
MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
Barab e colaboradores (2002, 2004) baseados, principalmente, em Lave e Wenger
(1991) e Wenger (1998, 2006) sistematizam em uma lista outras características além daquelas
que discutimos aqui, e nos oferece as propriedades necessárias para que um agrupamento de
pessoas seja considerado uma CoP: (1) a posse de uma história significante, a qual sugere
sobreposição do patrimônio histórico e cultural com os quais os membros podem se
identificar (WENGER, 1998); (2) uma cosmologia compartilhada, especialmente relacionada
com metas compartilhadas, práticas, sistema de crenças e histórias coletivas que capturam
práticas canônicas (BROWN; CAMPIONE, 1990); (3) a noção e o sentimento de formação de
um todo irredutível, ―os vários membros formam um todo coletivo a medida que trabalham
em direção a metas da comunidade ou de seus membros‖ (LEMKE, 1997; ROGOFF, 1990);
(4) a capacidade de se reproduzir a si mesmo e de evoluir, a medida que novos membros
contribuem, sustentam e eventualmente se movem de participante periférico para membro
45
pleno por meio de um processo de enculturação (LAVE, 1993); (5) uma prática comum ou
empreendimento mútuo; (6) a capacidade de prover oportunidades de interação e participação;
(7) a propriedade de envolver relações significantes; e de (8) pautar-se no respeito a
perspectivas diversas e visões minoritárias (BARAB; MAKINSTER et al., no prelo).
A despeito de propor que as CoP compartilham uma estrutura básica que as definem
como tal, Wenger e colaboradores (2002) atentam para possíveis variações das CoP em
diferentes organizações. De acordo com os autores, as CoP podem ser: pequenas ou grandes;
duradouras ou de curta duração; localizadas ou distribuídas; homogêneas ou heterogêneas;
demarcadas ou de fronteiras; espontâneas ou intencionais e de não reconhecida a
institucionalizada.
As CoP pequenas são constituídas por alguns poucos membros e as grandes por até
mesmo centenas de pessoas. Diante desta variação, Wenger e colaboradores (2002)
esclarecem que é difícil estabelecer um tamanho ideal de CoP, em termos de números
absolutos. Por um lado, é preciso uma massa crítica de pessoas para sustentar a interação
regular e oferecer perspectivas múltiplas. Por outro lado, se a comunidade torna-se muito
grande, pode inibir a interação direta. Comunidades mudam sua estrutura e características à
medida que crescem. Se elas têm menos de quinze membros tendem a ser muito íntimas.
Entorno de cinquenta participantes o relacionamento torna-se mais fluido e diferenciado.
Entre cinquenta e cento e cinquenta, as comunidades tendem a se dividir em grupos em torno
de temas ou localização geográfica, e para além dos cento e cinquenta membros, os subgrupos
geralmente desenvolvem fortes identidades locais. Essas subcomunidades aninhadas dentro de
uma única grande comunidade permitem que os membros sejam muito empenhados no local,
mantendo um sentido de pertencimento a uma comunidade maior (WENGER;
MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
É certo que há um tempo mínimo para que uma CoP negocie e desenvolva sua prática,
mas ainda considerando esse tempo as CoP têm tempos de vida muito variáveis. As
duradouras existem por séculos - é o caso, por exemplo, das CoP de artesãos que passam seu
ofício de geração a geração. As de curta duração, no entanto, duram menos tempo, mas
tempo suficiente para o desenvolvimento de uma prática social – por exemplo, a comunidade
de programadores de computadores que se desfaz quando seus programas ficam obsoletos.
Compartilhar uma prática requer interações regulares, motivo pelo qual algumas CoP
são formadas entre pessoas que trabalham ou vivem juntas, as CoP localizadas. Mas
convivência direta não é um requisito necessário. Muitas CoP são distribuídas em vastas
áreas. Por exemplo, cientistas formam CoP há muito tempo comunicando-se em todo o
46
mundo (antes por cartas e atualmente por e-mail). Em outras CoP, seus participantes se
comunicam por telefone ou se encontram uma ou duas vezes por ano. O requisito para que
membros de uma CoP compartilhem conhecimento não é a escolha de uma forma de
comunicação específica, mas a existência de uma prática compartilhada – um quadro comum
de situações, problemas e perspectivas. Se algumas interações face a face são absolutamente
necessárias o são para resolução de um mínimo de questões. No entanto, novas tecnologias e a
necessidade de globalização estão rapidamente tornando as CoP distribuídas o padrão ao
invés de exceção.
Algumas CoP são homogêneas, composta por pessoas da mesma formação ou função.
Outras, as heterogêneas, diferentemente, agrupam pessoas com diferentes formações e
funções – por exemplo, todas as pessoas de diferentes funções que lidam com um grande
comprador ou com certo país.
Equivoca-se quem assume que a marca registrada de uma CoP ideal é a
homogeneidade. Embora a interação de longo prazo crie uma história comum e identidade
comum, ela também estimula a diferenciação entre os membros. Eles podem assumir vários
papéis, oficialmente e não oficialmente, criar as suas próprias especialidades ou estilos,
ganhar reputação, alcançar um status e gerar sua própria esfera de influência pessoal. Em
outras palavras, cada um dos membros desenvolve uma identidade individual única em
relação à comunidade. Suas interações ao longo do tempo são uma fonte de comunhão e
diversidade. Homogeneidade de formação, habilidades ou ponto de vista pode ser condição
facilitadora para começar uma CoP, mas não é uma condição exigida nem é um resultado
necessário. Na verdade, nem sequer é um indicador de que a comunidade será mais
firmemente coesa ou mais eficaz. Uma vez que os membros da CoP tenham empreendimento
comum suficiente para o engajamento mútuo, uma boa dose de heterogeneidade contribui
para a aprendizagem mais rica, relações mais interessantes e maior criatividade (WENGER;
MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
CoP podem existir completamente dentro de limites, ou seja, podem ser bem
demarcadas em instâncias organizadas, mas podem também se ramificar por limites
departamentais, ou até mesmo se organizar para além das fronteiras entre organizações. Elas
podem ser tanto espontâneas quanto intencionais.
Muitas CoP começam sem qualquer intervenção ou esforço de desenvolvimento da
organização. Os membros espontaneamente se juntam porque precisam uns dos outros como
pares e parceiros de aprendizagem. Em outros casos, organizações têm intencionalmente
47
regras podem ser formais ou informais. Elas podem estar concentradas em um pequeno
subgrupo ou amplamente distribuídas. Mas, em todos os casos, aqueles que assumem funções
de liderança devem ter legitimidade interna na comunidade (WENGER; MCDERMOTT;
SNYDER, 2002).
Depreendemos dessa descrição de CoP que características como a posse de um
domínio compartilhado de interesse em torno do qual os membros se engajam formando uma
comunidade que se mantém no tempo em decorrência dos seus ciclos de reprodução e,
sobretudo, da negociação de uma prática conjunta são necessárias à caracterização de grupos
sociais como CoP, e que a partir delas é certo que todos os desdobramentos do trabalho
conjunto naturalmente se desenvolvem na comunidade.
O exame das características que formam o perfil de dado grupo social para que esse
seja considerado uma CoP nos fornece elementos para analisar que relações podemos
estabelecer entre os conceitos de GC e de CoP. E enfrentar questões como: Um GC pode ser
considerado uma CoP? Toda CoP é um GC?
Na próxima seção nos dedicaremos ao exame destas questões e a argumentação de
quais são as possibilidades e limites de empregar-se o conceito de CoP e a estrutura conceitual
que tem sido construída para descrever o funcionamento deste tipo de grupo social para a
investigação da organização e funcionamento de GC.
síntese teórica realizada por nós por meio da nossa interpretação dos trabalhos de Lave e
Wenger (1991), Wenger (1998), Wenger e colaboradores (2002) e diálogo com a bibliografia
sobre GC.
Propomos que para fins de análises empíricas o ―domínio organização social‖ é
composto por três dimensões inter-relacionadas: (a) Relação dos membros entre si e deles
com a comunidade, interpretada por meio dos três modos de pertencimento dos membros de
uma CoP propostos por Wenger (1998) – alinhamento, engajamento e imaginação – e, pelas
fontes de coesão de GC (MEIRINK, et al., 2010); (b) Aprendizagem dos membros da
comunidade, descrita em termos das condições para a aprendizagem em CoP dadas pela
transparência, acesso aos recursos e legitimação da participação periférica (LAVE;
WENGER, 1991); e a (c) Organização das relações de colaboração na comunidade. Essa
terceira dimensão diz respeito ao modo como os membros da CoP se organizam socialmente
para desempenhar a prática social e às tensões ou dualidades (WENGER, 1998) que causam
―(re)configuração‖ na comunidade (BARAB; BARNETT; SQUIRE, 2002). A sistematização
dessa síntese teórica para orientar a análise dos dados e a produção dos resultados em
trabalhos empíricos gerou o quadro apresentado na figura 01.
Figura 1 - Quadro teórico para análise de dados e produção de resultados em estudos empíricos sobre
Comunidades de Prática e grupos colaborativos.
muito poderosos e outros impotentes. Ele pode ser a violação do nosso sentido de si próprio
que esmaga nossa identidade (WENGER, 1998).
Embora engajamento, imaginação e alinhamento sejam modos distintos de
pertencimento, eles não são mutuamente excludentes. Uma dada comunidade pode ser
constituída por todos os três em variadas proporções, e a variedade dessas combinações
resulta em comunidades com qualidades distintas. Dada uma comunidade, podemos perguntar
quais são as possibilidades de engajamento mútuo, quais materiais suportam a imaginação, e
como o alinhamento é assegurado. As respostas a essas questões dizem respeito ao
mecanismo de formação da comunidade e aos tipos de trabalho envolvido (WENGER, 1998).
Wenger (1998) esclarece que o trabalho de engajamento é, basicamente, o trabalho de
formação de CoP. Como tal, ele requer habilidade de tomar parte nas interações e atividades
interativas, na produção de artefatos compartilháveis, na construção da comunidade, e na
negociação de novas situações. Ele implica em intensidade sustentada e relações de
mutualidade.
Contudo, é somente por meio da imaginação que os membros de uma comunidade
podem conceber sua ideia como membro de tal coletividade (WENGER, 1998). O ponto aqui
é que a ligação mútua entre os membros para um fim comum cria uma espécie de comunidade
a que se veem como pertencentes.
O alinhamento também cria uma espécie de comunidade. Os compromissos que unem
os participantes de uma CoP, muitas vezes têm pouco a ver com comunhão pessoal ou
diferenças. As formas que esses compromissos tomam, e sua raiz em experiências específicas,
podem ser inimagináveis e terem origens nas mais diversas situações. No entanto, é o
alinhamento entre os participantes e dos participantes com a comunidade que importa. É o
alinhamento que cria uma grande comunidade unida por um objetivo comum. Ao superar as
diferenças individuais e unir forças em torno de um objetivo comum cria-se um tipo de
fidelidade entre os participantes de uma CoP que, segundo Wenger (1998), pode potencializar
as energias de forma a criar uma comunidade forte.
É dessa perspectiva que entendemos que ao analisar as declarações dos participantes
de grupos colaborativos sobre o sentimento particular de pertencimento à comunidade e os
elementos que conferem coesão (MEIRINK et al., 2010) ao grupo, ou seja, que mantém esses
participantes unidos, compreenderemos como a comunidade se formou e quais elementos
presentes nas relações entre seus membros possibilitaram a sua consolidação.
social, e ainda a relação dos novatos entre si, é decisiva no que se refere ao acesso às
atividades em andamento, aos próprios veteranos, aos outros membros da comunidade, a
informação, recursos e oportunidades de participação e implica diretamente na manutenção e
reprodução da CoP.
De acordo com Lave e Wenger (1991), os artefatos empregados na prática social da
CoP, a tecnologia da prática, proporcionam uma boa arena para analisar o problema do acesso
ao conhecimento. Tornar-se um participante pleno certamente inclui envolvimento com as
tecnologias da prática diária, bem como participar nas relações sociais, processos de
produção, e outras atividades das CoP. Mas o conhecimento a ser adquirido com o
envolvimento com a tecnologia pode ser extremamente variado, dependendo da forma de
participação habilitada pelo seu uso.
Participação envolvendo tecnologia é especialmente significativa porque os artefatos
utilizados em uma prática cultural transportam uma parte substancial do patrimônio dessa
prática. A compreensão da tecnologia da prática é mais do que aprender a usar as ferramentas,
é uma maneira de se conectar com a história da prática e de participar mais diretamente na sua
vida cultural.
O significado de artefatos em toda a complexidade de suas relações com a prática pode
ser mais ou menos transparente para os novatos. Obviamente, a transparência de qualquer
tecnologia sempre existe em relação a algum propósito e está intrinsecamente ligada à prática
cultural e organização social da função que a tecnologia se destina. Ela não pode ser vista
como uma característica de um artefato em si, mas como um processo que envolve formas
específicas de participação, em que a tecnologia cumpre uma função mediadora.
Enfocando o papel epistemológico de artefatos no contexto das organizações sociais
do conhecimento, essa noção de transparência constitui, por assim dizer, a organização
cultural de acesso. Como tal, não se aplica a tecnologia apenas, mas a todas as formas de
acesso à prática.
Atividade produtiva e conhecimento não são separados, ou mesmo separáveis, mas
dialeticamente relacionados. Assim, o termo transparência quando utilizado aqui em ligação
com tecnologia refere-se ao modo pelo qual usar artefatos e compreender a sua importância
interagem tornando-se um processo de aprendizagem.
Considerando o exposto, compreendemos que para o entendimento sobre o processo
de aprendizagem em CoP é necessário que se tenha em conta a dinâmica de participação dos
membros na prática social no que diz respeito as possibilidades de participação criadas pela
comunidade e pelos seus membros por meio do acesso ao conhecimento e da transparência do
59
uso e constituição dos artefatos da prática. Em outras palavras, para tanto, é necessário
conhecer a organização cultural de acesso de uma CoP.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise teórica dos limites e possibilidades do uso do conceito de CoP em estudos
sobre GC nos possibilitou desenvolver a argumentação de que o conceito de CoP pode
apresentar poder explicativo em estudos que visam discutir o desenvolvimento de GC e a
manutenção da sua prática.
Um passo importante para essa argumentação foi a proposição do conceito de GC por
meio da abordagem de semelhança de família. Ao propor uma definição que permita a
identificação de diferentes grupos sociais como grupos colaborativos pudemos então discutir
essas possibilidades e limites do uso do conceito de CoP em investigações sobre organização
e funcionamento de GC.
Ademais, essa proposta contribui na organização da polissemia em torno do conceito
de GC em dois importantes aspectos: responde positivamente a demanda de defini-lo de
maneira que a riqueza, a complexidade e o caráter dinâmico de um grupo social sejam levados
em conta e, substitui, com vantagem, a frustrante expectativa de encontrar características que
sejam necessárias e suficientes para conceituá-los e que dêem conta de todos os casos desse
conceito.
Diante da proposta do uso conceito de CoP e a sua estrutura descrita na literatura na
compreensão e descrição do desenvolvimento e funcionamento de GC, e preciso ter clareza
dos limites desta aplicação, uma vez que a despeito de GC e CoP compartilharem um
conjunto de características que os definem como um tipo específico de agrupamento social,
existem algumas características necessárias para que um grupo seja considerado como CoP
que necessariamente não emergem em GC. A prática social instituída pela negociação de seus
membros e a capacidade de reproduzir-se a si mesmo são características definidoras de CoP
que não são necessariamente desenvolvidas por GC.
Ante esses limites, a prerrogativa é que: para que GC sejam tomados como CoP é
necessário que a realização do trabalho conjunto entre seus membros tenha gerado uma
prática social, um repertório compartilhado, e ainda que tenham adquirido uma vida estendida
ao longo do tempo, como resultado da negociação desta prática entre seus membros e da
adesão de novos participantes.
Esta prerrogativa esta baseada teoricamente na questão colocada por Wenger (1998)
ao frisar que diferentes agrupamentos sociais podem desenvolver na busca conjunta por um
60
interesse comum, uma prática e gerar aprendizagem de forma que se possa identificar esse
agrupamento como uma CoP. E empiricamente, na caracterização do Grupo de sábado como
CoP oferecida por Fiorentini (2009).
A partir da interpretação da literatura sobre CoP e GC propusemos uma síntese teórica
a fim de servir como orientação para estudos empíricos focados no desenvolvimento e
manutenção da prática de GC e CoP. Essa proposta é a operacionalização teórica do domínio
―organização social‖ um dos domínios propostos por Barab e colaboradores (2002) como
domínios da vida de uma CoP.
A contribuição teórica apresentada se refere a caracterização do domínio organização
social a partir de três dimensões: relação dos membros entre si e deles com a comunidade;
aprendizagem dos membros da comunidade e; organização das relações de colaboração na
comunidade.
A caracterização dos outros domínios de vida de CoP – cosmologia, ecologia e ciclo
de desenvolvimento – propostos como agenda de pesquisa por Barab e colaboradores (2002),
certamente informará aspectos do domínio organização social dado que os quatro domínios
são inter-relacionados. O que fizemos aqui foi uma tentativa de individualizar o domínio
―organização social‖ por entender que sua caracterização informaria substancialmente sobre o
desenvolvimento e a manutenção da prática em GC. Estudos posteriores, no entanto, devem
oferecer refinamento ao quadro teórico que resultou da nossa interpretação da literatura sobre
CoP e GC.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, M. C.; SEPÚLVEDA, C. A. S.; EL-HANI, C. N. Organização social, identidade
e manutenção de um grupo colaborativo de pesquisa em ensino de ciências: a experiência do
CoPPEC In: XVI Seminário de Iniciação Científica da UEFS, Feira de Santana. Anais do
XVI Seminário de Iniciação Científica da UEFS: Sustentabilidade Erradicação da
pobreza Economia verde, v.1, p.487-490, 2012.
DAY, C. Developing teachers: the challenges of lifelong learning. London: Flamer, 1999.
MEIRINK, J. A.; IMANTS, J.; MEIJER, P. C.; VERLOOP, N. Teacher learning and
collaboration in innovative teams. Cambridge Journal of Education, v. 40, n. 2,p.161–181,
2010.
63
MCINTYRE. D. Bridging the gap between research and Practice. Cambridge Journal of
Education, v. 35, n. 3, p. 357–382, 2005.
ZEICHNER, K.M.. Teacher research as professional development for P-12 educators in the
USA.Educational Action Research, v. 11, n. 2, p. 301–25. 2003.
CAPÍTULO 2____________________________________________________
RESUMO
Neste artigo apresentamos um estudo sobre a organização das relações sociais e as
tensões internas a um grupo colaborativo de pesquisa formado por professores e
pesquisadores do ensino de ciências. Seguindo a abordagem metodológica etnográfica,
utilizamos como fontes de produção de dados a observação participante, uma entrevista de
grupo focal e entrevistas individuais com os membros do grupo em questão. A interpretação
dos dados foi orientada pelo aporte da literatura sobre comunidades de prática. Em linhas
gerais, nossos resultados revelam que o grupo estudado organiza socialmente as suas relações
de colaboração por meio de uma rede fluida de (sub)grupos de trabalho conjunto que
investigam inovações educacionais e se comunicam entre si e com um núcleo central de
pessoas que dão apoio a estes (sub)grupos, os quais em última instância formam um grupo
maior, único e indivisível. Quatro tensões foram identificadas e caracterizadas, três delas
estão intimamente ligadas ao modo como o grupo tem se organizado socialmente, por
exemplo, as tensões relativas a ―diversidade de temas pesquisados nas inovações educacionais
desenvolvidas pelo grupo e a necessidade de construção de um eixo comum de trabalho‖ e
aquela que denominamos de ―silêncio virtual‖.
PALAVRAS CHAVES
Grupo Colaborativo, Comunidades de Prática, professores de ciências e biologia;
pesquisadores em ensino de ciências; relações de colaboração; tensões
INTRODUÇÃO
O trabalho colaborativo entre professores de diferentes instituições e níveis de ensino
têm sido proposto como uma forma de enfrentar diferentes problemas relativos à produção de
conhecimento na área de educação, a exemplo da lacuna pesquisa-prática (HARGREAVES,
1999; MCINTYRE, 2005, PENA; RIBEIRO FILHO, 2008, EL-HANI; GRECA, 2011) e ao
desenvolvimento profissional docente (GARRISON, 1988; ZEICHNER, 2003; LÜDKE,
2005; GOODCHILD, 2008), em âmbito nacional e internacional.
Este movimento tem gerado uma proliferação de concepções e modelos de grupos e
66
O domínio de uma comunidade pode ser descrito sucintamente como a razão pela qual
ela existe. Uma CoP tem sua identidade definida pelo domínio compartilhado de interesse que
cria uma base comum e um sentimento de identidade compartilhada por seus membros. Um
domínio compartilhado cria um senso de responsabilidade para com um corpo de
conhecimento e, portanto, para o desenvolvimento de uma prática.
Prosseguindo o interesse no domínio, os membros engajam-se em atividades e
discussões conjuntas, ajudam uns aos outros, e compartilham informações. Trabalhar em
direção a uma visão comum é o que lhes permite construir confiança e relacionamentos. As
relações construídas são do tipo que lhes permitem aprender uns com os outros mesmo que
não trabalhem juntos diariamente. Constitui-se assim a comunidade.
Uma CoP não é apenas uma comunidade de interesse. Seus membros são praticantes.
Eles desenvolvem um repertório compartilhado de recursos: experiências, histórias,
ferramentas, formas de abordar os problemas recorrentes – ou seja, uma prática
compartilhada. Isso leva tempo e interação sustentada.
O termo prática denota um conjunto de formas socialmente definidas – razão pela qual
temos usado a expressão ―prática social‖ - de operar em um domínio específico: um conjunto
de abordagens comuns e de normas partilhadas que criam uma base para a ação,
comunicação, resolução de problemas, desempenho e prestação de contas. Estes recursos
comuns incluem uma variedade de tipos de conhecimento: casos e histórias, teorias, regras,
estruturas, modelos, princípios, ferramentas, especialistas, artigos, lições aprendidas, melhores
práticas e heurísticas. Esses recursos incluem tanto aspectos tácitos quanto explícitos do
conhecimento da comunidade. Eles variam de objetos concretos, como ferramenta ou manual
especializado, a aparatos menos tangíveis de competência, tais como a capacidade de
interpretar uma ligeira mudança no som de uma maquina como indicador de um problema
específico (WENGER, 1998).
A prática inclui os livros, artigos, bases de conhecimento, sites e outros depósitos que
os membros compartilham. Também inclui certa maneira de se comportar, uma perspectiva
sobre os problemas e ideias, um estilo de pensamento, e até mesmo, em muitos casos a
postura ética. Neste sentido, a prática é uma espécie de minicultura que mantém a
comunidade unida.
Diferente do conceito de CoP o qual apresenta uma delimitação clara e características
próprias, o conceito de colaboração e de grupo colaborativo (GC) está envolto em uma
polissemia em diversas áreas de conhecimento, dentre outros motivos, em função do seu uso
cotidiano indiscriminado (JOHN-STEINER; WEBER; MINNIS, 1998; MONTIEL-
68
De acordo com Barab e colaboradores (2004), as CoP são muito parecidas com um
organismo vivo, são auto-organizadas, e não podem ser concebidas a primeira vista. Elas
crescem, evoluem e mudam dinamicamente, transcendendo qualquer membro particular e
sobrevivendo a qualquer tarefa particular. Além disso, uma CoP tende a encorajar todos os
membros a assumir a responsabilidade pela troca de informações e resolução de problemas,
para desenvolver suas identidades pessoais na comunidade, e promover a unificação da
comunidade (YANG, 2009).
De acordo com Lave e Wenger (1991), a organização da CoP dá-se em torno do seu
domínio de interesse, o que nos faz pensar que entender como a CoP organiza as relações
internas ao seu domínio no espaço e no tempo facilita a compreensão de como ela se estrutura
para desempenhar a sua prática social e ao mesmo tempo oferecer oportunidades de
aprendizagem aos seus participantes.
Uma via para a compreensão de como uma CoP se organiza socialmente para
desenvolver a sua prática é descrever e analisar a estrutura de trabalho formada pelos
participantes ao desempenhar a prática social e analisar como os seus membros trabalham e
consequentemente mantém as relações entre veteranos e novatos e novatos entre si no
ambiente social e, além disso, identificar e caracterizar as tensões ou dualidades internas
(WENGER, 1998; BARAB; BARNETT; SQUIRE, 2002; BARAB; MAKINSTER;
SCHECKLER, 2004) ao sistema, bem como as estratégias desenvolvidas pela comunidade na
tentativas de balancear as tensões.
Wenger (1998) discute a utilidade da compreensão da comunidade em termos de um
jogo de dualidades do sistema. Para ele, uma das condições fundamentais para entendermos
os construtos teóricos por meio dos quais descrevemos uma CoP consiste em não interpretar a
dualidade em termos de uma oposição simples, mas pensar em termos de dualidades
complexas.
As dualidades são um aspecto fundamental da constituição de CoP, de sua evolução ao
longo do tempo, das relações entre as práticas, das identidades de participantes e das
organizações mais amplas em que existem CoP. Segundo Wenger (1998), uma dualidade é
uma unidade conceitual que é formada por dois elementos inseparáveis e mutuamente
constitutivos cuja tensão e complementaridade inerente dão riqueza e dinamismo ao conceito.
Barab e colaboradores (2002; 2004) consideram fundamental a caracterização de
tensões internas para a compreensão do modo como as comunidades sustentam processos de
aprendizagem de seus participantes. Os autores entendem as tensões como necessidades
70
METODOLOGIA
Esse estudo configura-se como etnografia que é a abordagem metodológica mais
utilizada na antropologia para caracterizar a vida de uma comunidade (LAPLATINE, 2003,
BARAB; BARNETT; SQUIRE, 2002; BARAB; MAKINSTER; SCHECKLER, 2004;
ATKINSON; HAMMERSLEY, 2007). Laplatine (2003), explica que a preocupação da
etnografia é antes a experiência de uma imersão total, consistindo em uma verdadeira
aculturação invertida, na qual, longe de compreender uma sociedade apenas em suas
manifestações "exteriores", deve-se interiorizá-la nas significações que os próprios indivíduos
atribuem a seus comportamentos. Essa apreensão da sociedade tal como é percebida de dentro
pelos atores sociais com os quais o etnógrafo mantém uma relação direta é que distingue
essencialmente a prática etnográfica das práticas de pesquisa de outras ciências sociais, como,
por exemplo, história e sociologia.
Nesse sentido, entendemos que a pesquisadora do estudo que está sendo relatado
possui uma posição privilegiada no contexto da comunidade. Mariangela Almeida é, ao
mesmo tempo, observadora participante e, de certa forma pesquisadora desde a fundação do
71
CoPPEC. Ingressou no grupo como bolsista de iniciação científica do projeto que deu origem
a ele, e desde muito cedo, teve a atribuição de registrar as reuniões por meio de filmagens e
organizar os dados, inicialmente, aqueles relativos à investigação das inovações educacionais
e posteriormente, os dados relativos ao estudo da própria experiência de colaboração do
CoPPEC, no projeto ―guarda-chuva‖ que abriga essa investigação. A condição de observadora
participante e pesquisadora da rotina do CoPPEC é privilegiada, pois favorece uma
inquestionável imersão na cultura dessa comunidade, condição crucial para o
desenvolvimento da etnografia (LAPLAINE, 2003).
Por outro lado, o papel de participantes fundadores da comunidade pode comprometer
a sensibilidade de enxergarmos certas nuances da vida da comunidade que seriam importantes
para a caracterização etnográfica dela. Mas como advertem Barab e colaboradores (2004) a
adoção de uma base de literatura bem documentada e uma lente analítica pré-existente, em
nosso caso, a teoria da aprendizagem situada em Comunidades de Prática e todos os
construtos teóricos derivados dela, minimizam os limites impostos a nós como participantes e
pesquisadores do CoPPEC e, sobretudo, constitui uma vantagem para a pesquisa qualitativa
que toma um compromisso com um quadro analítico que guia tanto a observação quanto
proporciona uma lente útil por meio da qual os dados podem ser interpretados (SCHWANDT,
1997).
A produção dos dados dessa pesquisa deu-se por meio dos procedimentos amplamente
utilizados em pesquisas etnográficas, quais sejam, a participação dos pesquisadores como
observadores participantes nas reuniões presenciais mensais do CoPPEC e registros áudio
visuais destas, a realização de entrevistas semiestruturadas individuais e de grupo focal
(BARBOUR, 2009), bem como conversas informais com os participantes e, a análise
documental de atas de reuniões e históricos de mensagens trocadas entre os participantes do
grupo colaborativo por meio de correio eletrônico.
É importante sublinhar que foram tomados todos os cuidados éticos6 que o estudo
requer como informar aos participantes sobre propósitos do estudo, procedimentos
metodológicos, riscos e benefícios previstos. Os dados somente foram coletados após o
consentimento de todos os envolvidos.
6
A despeito de inicialmente o Termo de Consentimento Livre Esclarecido apresentado ao grupo garantir o
anonimato dos participantes da pesquisa, os copequianos ao longo do desenvolvimento da pesquisa optaram por
serem identificados nominalmente pela natureza colaborativa do trabalho que desenvolvem e pelo aspecto
autoral que o seu trabalho e a reflexão sobre ele representam para todos os membros do grupo.
72
As observações participantes não foram acompanhadas por roteiro, mas é certo que a
medida que nos familiarizávamos com a literatura sobre GC e CoP elas foram acontecendo
com foco em alguns aspectos como a própria organização das relações de colaboração, a
relação colaborativa entre professores de diferentes escolas e entre professores e
pesquisadores, nas dualidades que se colocavam a medida que o grupo de desenvolvia ou
tomava decisões, etc.
A entrevista de grupo focal foi realizada com a intenção de promover uma reflexão
sobre o modelo de colaboração do grupo. Para isso, apresentamos as seguintes questões
geradoras: Quais são os requisitos para que um grupo seja colaborativo? Você considera que
nosso grupo cumpre todos esses requisitos? Caso contrário, quais requisitos não são
satisfeitos? Como você caracterizaria a dinâmica de colaboração que vivenciamos até o
momento?
Além disso, algumas imagens retiradas da internet que se relacionavam à ideia de
colaboração ou GC (Figura 01) foram expostas ao grupo em uma apresentação de
Powerpoint como material de estímulo para a entrevista. Foi sugerido que, para responder
as questões acima, uma estratégia seria (1) argumentar qual destas imagens seria a mais
adequada para representar o trabalho de um grupo colaborativo, e (2) qual delas representaria
de modo mais aproximado a experiência de colaboração vivenciada pelo grupo,
especificamente.
Figura 01: Imagens usadas como material de estímulo para a entrevista de grupo focal.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os resultados serão apresentados e discutidos em dois blocos. O primeiro apresentará
a narrativa de como o CoPPEC formou-se e tratará sobre o modo como as relações de
colaboração estão organizadas internamente ao grupo. O segundo bloco, discutirá as
principais tensões internas ao CoPPEC, processos de negociação das mesmas no grupo e
papel que cumprem na reconfiguração e fortalecimento das relações de colaboração, produção
de repertório compartilhado e novas rotinas, ou seja, na evolução da colaboração no grupo.
74
A estudante Maria afasta-se do grupo tão logo termina o projeto que deu origem a ele,
tempos depois o mesmo acontece com a estudante Maria Daniela, ambas mudaram de área de
interesse de pesquisa.
Como pano de fundo da formação do CoPPEC estava a preocupação premente dos
pesquisadores com a diminuição da lacuna pesquisa-prática por meio do envolvimento dos
professores da escola básica de modo mais protagonista na pesquisa em ensino de ciências e
biologia e, intimamente ligado a isso, o aperfeiçoamento da prática social de fazer pesquisa
em educação de modo a torná-la mais legítima e útil socialmente, estas preocupações
estavam, em certa medida, postas desde a fundação da Comprática. Por sua vez, os
professores da educação básica que se engajam no CoPPEC se mobilizam por demandas de
desenvolvimento profissional e valorização que os retirem da margem de desistência da
docência nesse nível de ensino e por realização de anseios profissionais já em curso como a
inovação da prática pedagógica.
Foram estabelecidas, desde o início do funcionamento do grupo, reuniões gerais
mensais com todos os participantes, estas ocorrem na cidade de Salvador, nas instalações do
LEFHBio, locado no Instituto de Biologia da UFBA. Nestas reuniões têm sido negociados
coletivamente aspectos relativos ao planejamento da pesquisa, a exemplo da metodologia de
coleta e análise de dados, cronograma de execução. Informes são dados acerca do andamento
da pesquisa nas comunidades escolares, são apresentados e discutidos a análise dos dados e
textos já produzidos para elaboração de artigos acadêmicos para comunicação dos resultados
de pesquisa. Algumas das reuniões têm sido destinadas exclusivamente para o estudo e
discussão sobre o estatuto da pesquisa docente. É comum que os participantes façam relatos
sobre o que o processo tem significado para sua vida pessoal e profissional.
Cotidianamente, a comunicação entre os copequianos – os participantes costumam se
denominar assim principalmente nas mensagens virtuais - tem sido realizada via lista de
emails interna ao grupo, mensagens postas na Comprática e, além disso, os professores em
suas respectivas escolas criaram uma rotina de reuniões internas semanais (chamadas por eles
de reuniões setoriais) para tratarem das demandas advindas da pesquisa colaborativa.
Desde o início das reuniões presenciais quando o grupo é formado em 2009, iniciou-se
a negociação de metas, gerando práticas que extrapolaram o projeto inicial. Processos de
desenvolvimento de metodologia própria de fazer pesquisa, amadurecimento de critérios
próprios de rigor e qualidade cabíveis a esta pesquisa, e as definições sobre o andamento do
grupo como agendas de pesquisa e pautas para as reuniões, são exemplos dos processos de
negociação que inicialmente aconteceram no grupo.
77
desenvolvidas no projeto inicial financiado pela Fapesb, e elaborou alguns artigos científicos
que comunicam os resultados das aplicações das sequências didáticas desenvolvidas e
implementadas em sala de aula com posterior submissão à apreciação e publicação em
periódicos, congressos e encontros da área de ensino de ciências no Brasil (SARMENTO, et
al., 2011; MUNIZ et al., 2012; SARMENTO et al., 2013; ALMEIDA et al., 2011; EL-HANI,
et. al. 2011; SEPULVEDA, et al., 2011, 2012; ALMEIDA; SEPULVEDA; EL-HANI, 2013).
Todos os professores e pesquisadores do grupo inicial e os estudantes de pós-
graduação Thiago e Mariangela permanecem como membros do grupo. Além deles, o
CoPPEC agregou a si outros pesquisadores e professores que ingressam no grupo ao longo
dos cinco anos de funcionamento deste. No primeiro semestre de 2011, Rosiléia Almeida e
Izaura Cruz, pesquisadoras da área de ensino, história e filosofia das ciências, Márcia Neves
professora do Colégio Estadual Pedro Calmon na cidade de Amargosa - BA e, Andrea Cunha
professora do Colégio Plataforma em Salvador – BA passam a participar dos encontros
mensais do CoPPEC. As professoras Andreia e Márcia não desenvolveram pesquisa em suas
unidades escolares. Encontraram grandes dificuldades institucionais por estarem sozinhas em
suas escolas mas, ainda assim, elas participam das reuniões gerais do CoPPEC e desenvolvem
uma colaboração mais ampla com os membros do grupo e, em alguma medida,
recontextualizam algumas das inovações em desenvolvimento em suas práticas pedagógicas
nas suas comunidades escolares. Em 2013, a professora Márcia foi aprovada e convocada no
concurso para professor efetivo no quadro docente da Universidade Federal do Recôncavo da
Bahia (UFRB) e não mais leciona da educação básica, um motivo pelo qual tem tido pouca
frequência nos encontros mensais do grupo.
E no final de 2011, o pesquisador Juanma da área de história e filosofia das ciências,
os estudantes do PPGEFHC – UFBA/UEFS Priscila e Diego e os professores do Instituto
Federal Baiano (IFBA) da cidade de Camaçari – BA, Ana Paula e Alessandro ingressam no
CoPPEC e passam a participar dos encontros mensais do grupo, bem como a desenvolver a
prática da pesquisa colaborativa em inovações educacionais situada na escola.
O pesquisador Juanma tem colaborado com pesquisas no ensino médio e superior
sobre ―racismo científico‖. E é um dos idealizadores, juntamente com a pesquisadora Claudia,
da exposição itinerante ―Ciência, raça, literatura e sociedade‖ que tem visitado as
universidades e escolas que compõem o CoPPEC. Esses dois pesquisadores também
desenvolveram e implementaram uma sequência didática sobre ―racismo científico‖ para o
ensino superior de biologia.
79
8
Utilizamos a expressão ―trabalho conjunto‖ ao nos referirmos aos subgrupos formadores do CoPPEC pois estes
não se configuram em si objetos desta investigação, ou seja, as reuniões dos subgrupos não foram
sistematicamente filmadas e analisadas para que se constituíssem dados desta pesquisa. Portanto, o quê
caracterizamos aqui como grupo colaborativo é a constituição do CoPPEC em sua totalidade, especificamente o
grupo que se reúne mensalmente.
81
estudantes que colaboram mais sistematicamente e de modo mais próximo com os projetos
destes subgrupos.
[...] eles [CPM] já têm mais experiência em escrever. Porque eu vejo a Anna
Cássia e a Cássia, a gente discutindo esse artigo do ENPEC, elas estavam me
83
Sim, eu acho que os professores da universidade estão no núcleo não por ser
algo mais autoritário ou de importância mesmo, mas porque aquilo que eu
falei, eles têm a base da pesquisa. Eles também têm essa coisa do apoio
institucional bem mais forte do que as escolas, então eu acho que por isso
que eles estariam no núcleo [...]. Mas não por serem mais importantes, acho
que por isso, por esse apoio maior que eles dão, as bases, né? As bases
teóricas de pesquisa e o apoio institucional. [Ana Paula, IFBA]
Nas reuniões mensais com todos os membros do CoPPEC observamos relações mais
claras de colaboração, sobretudo, entre subgrupos e núcleo central. As decisões sobre
próximos passos da pesquisa, metodologia de coleta e análise de dados, publicação dos
resultados por cada um dos subgrupos são tomadas colaborativamente após todo o grupo
conhecer os processos que acontecem nos subgrupos a partir do relato destes.
Por outro lado, uma característica da organização das relações de colaboração no
CoPPEC é a fragilidade e a escassez das relações de colaboração existentes entre os
subgrupos. Representamos essas inter-relações entre os subgrupos na figura 02 com linhas
pontilhadas que ligam os subgrupos de trabalho colaborativo para dá a visão de que elas são
pouco frequentes.
A despeito da relação de colaboração negociada entre CPM e o IFBA, discutida acima,
nós pesquisadores e todos os membros do grupo entendemos que cotidianamente esses
84
subgrupos interagem colaborando mais efetivamente com o grupo central. Tendo em vista os
cinco anos de funcionamento do grupo, os subgrupos estabelecem e estabeleceram raras
relações de colaboração entre si. As respostas da pesquisadora Rosiléia e de Cássia à pergunta
sobre estar de acordo com a figura 02, sintetizam bem como nós concebemos a colaboração
intersubgrupos no CoPPEC.
Acho que pela figura, talvez na minha forma de ver né? Talvez esses traços
[que ligam os subgrupos] sejam tracejados né? Porque existe muito pouco,
existem alguns momentos de compartilhamento, como essas reuniões que
você falou [reuniões gerais], mas é que cada escola ela se mostra ou se
envolve pouco dando contribuições. Nesse momento são muito mais essas
pessoas que são centrais, que fazem intervenções. Então eu colocaria mais
tracejado, mas é notório que existe uma unidade, existem objetivos que são
comuns, a todo grupo. [Cássia Muniz, CPM]
Eu ouvi de uma colega dizendo que o grupo fez ela continuar na educação,
que ela já estava para desistir. Mas ela viu essa possibilidade de melhorar a
prática, motivar os alunos, de reformular. Então, eu acho que é esse
sentimento de unidade, todo mundo tá com a mesma frustração, e tá todo
mundo ali discutindo experiência. O que eu fiz? O que não funcionou?
Gente, eu não sei como resolver esse problema, o que vocês acham? E é isso,
né? Objetivo. É uma grande congruência nos objetivos que todo mundo tem
ali, seja por uma frustração pessoal, seja um idealismo de melhorar a
educação no Brasil [Thiago, PPGEFHC].
Essa percepção de que objetivos comuns e histórias compartilhadas são fatores que
favorece a coesão dos participantes do CoPPEC e reafirma o sentimento de unidade entre os
participantes é também compartilhada pelos pesquisadores do grupo. Respostas nesse sentido
foram recorrentes nas entrevistas individuais, no entanto a fala que sintetiza bem a noção de
compartilhamento de história e de objetivos apresentada a seguir é da pesquisadora Claudia e
foi proferida em conversa informal ao discutirmos sobre a prática social do CoPPEC. Ela
aponta o desejo de resolver as frustrações profissionais como um forte elemento da coesão
entre os participantes do grupo:
É, me sinto incluída, acho que esse grupo tem um diferencial né? Acho que
todos são ouvidos, todas as vozes são consideradas. Acho que isso é
importante, acho que isso que dá essa unidade e faz com que a gente tenha
durado tanto tempo, e dure tanto tempo. [Cássia, CPM]
Mesmo não evidente no cotidiano dos copequianos, a hierarquia das posições sociais
pareceu ter moldado um episódio particular ocorrido no grupo.
Trata-se das decisões a respeito da resposta do grupo ao edital 29/2010 ―Popularização
da Ciência‖ publicado pela Fapesb. Esse edital contemplava duas vias de submissão de
projetos: uma pelas universidades em rede colaborativa com as escolas e outra, as escolas
como proponentes dos projetos em parceira com as universidades.
O CoPPEC institui em uma das suas reuniões gerais a discussão sobre em qual das
duas linhas de submissão iria propor o projeto.
O grupo apresenta-se dividido com opiniões favoráveis e contrárias as duas linhas de
submissão. Em meio ao processo de argumentação, a pesquisadora Claudia argumenta que a
proposição dos projetos pelas escolas individualmente, como uma ação política, impulsionaria
as agências de fomento à pesquisa a publicação de mais editais nessa linha, visto que as
escolas teriam respondido a esse primeiro edital. Tal argumento não encontrou um contra-
argumento e resultou na opção do grupo pela proposição dos projetos pela segunda via de
submissão, ou seja, cada uma das escolas individualmente proporia um projeto à seleção da
Fapesb.
Após a decisão, em conversas particulares com alguns professores membros do grupo,
percebemos um sentimento de descontentamento em relação à decisão tomada. Essa
percepção gerou a reação do subgrupo Gastão de enviar uma mensagem eletrônica a todo o
CoPPEC com uma reflexão sobre o caráter colaborativo do grupo no processo de elaboração
dos projetos pelas escolas.
O Gastão recebeu mensagens de outros pesquisadores do CoPPEC considerando que a
colaboração estava mantida e que a elaboração dos projetos pelos subgrupos estava em
andamento, e além dessas, o silêncio dos membros descontentes com a decisão, se
configuraram como respostas à primeira mensagem.
As três escolas submeteram os projetos como proponentes, mas apenas uma delas foi
contemplada com o financiamento. De posse dos resultados e dos pareceres sobre os projetos
não contemplados, o CoPPEC se reuniu para discutir os problemas apontados pela Fapesb nos
projetos.
Ao final dessa reunião, a professora Márcia questionou o porquê dessa iniciativa não
ter sido tomada antes da submissão dos projetos ao edital. Nesse momento, alguns membros
do grupo apresentaram seus descontentamentos com todo o processo que levou a decisão pela
linha de submissão na qual as escolas proporiam os projetos individualmente. Foi
apresentado, inclusive, o sentimento de que o grupo, nesse episódio, tinha infringido o seu
92
caráter colaborativo, o que gerou o desejo de abandono do grupo por alguns membros. Segue
trecho da reunião na qual os professores explicitam o descontentamento com o episódio.
Márcia: [...] já que a decisão foi que cada escola tivesse autonomia para
encaminhar seus projetos, eu acho que ficou muito solto pra cada um
escrever...
Cláudia: [...] eu acho muito importante esse tipo de reflexão pra gente situar
problemas que aconteceram no processo de colaboração. Eu acho que teve
essa falha, tem que saber o porquê, se foi uma questão de não ter condição
de tempo, uma série de outras coisas [...] eu acho que há um excesso de
trabalho, mas acho que a gente tem que ter uma metodologia também de
colaboração, por exemplo, ter uma reunião inicial pra discutir isso assim, né?
Pra dizer assim olha, vamos analisar aqui o edital juntos [...]
Anna Cássia: Mas Cláudia no dia que se decidiu isso se decidiu tão
arbitrariamente, eu tomei um susto! Que grupo é esse que tá me deixando
sozinha agora pra fazer o negócio que eu não sei fazer? Eu sair daqui
arrasada.
Cláudia: Certamente foi um dos pontos de mais estresse que aconteceu. [...]
A gente teve essa impressão de que a primeira vez que teve um ruído forte
no grupo foi esse momento da decisão do Popciências.
Esse episódio foi reiteradas vezes mencionado pelos participantes do grupo nas
entrevistas individuais como exemplo ilustrativo do único momento em que o processo de
tomada de decisão no grupo foi arbitrário e não participativo, contrário a cultura do grupo de
discutir exaustivamente as propostas entre os participantes e só após o amadurecimento do
entendimento coletivo sobre o assunto proceder a tomada de decisão.
Além disso, o silenciamento imediato dos professores frente a argumentação da
pesquisadora em defesa da submissão dos projetos pelas escolas, pode demonstrar o peso que
as posições socialmente hierárquicas representam e a inexperiência dos professores em como
reagir em situações como essa.
Por outro lado, o fato de os professores terem expostos seus descontentamentos,
mesmo tardiamente, demonstra que o grupo é aberto a autocríticas e que há um sentimento de
mutualidade e confiança entre os participantes a ponto de terem a liberdade de questionar
atitudes do próprio grupo ainda que isso signifique rediscutir decisões que já tenham sido
tomadas.
Passado o evento apresentado, o grupo, de acordo com os copequianos, voltou à sua
rotina normal e não há resquícios desse evento nas relações internas de colaboração no grupo.
Um segundo episódio revela o reestabelecimento da rotina do grupo e pode configurar
como aprendizado a partir da experiência anteriormente apresentada no processo de tomada
de decisões e, além disso, demonstra o protagonismo do professor do ensino básico na
pesquisa realizada pelo grupo. Trata-se de uma reunião agendada para decidir quais novos
projetos seriam realizados pelo grupo após a finalização do projeto que lhe deu origem.
Os pesquisadores apresentaram ao grupo um projeto de pesquisa que submeteriam ao
edital UEFS (resolução CONSEPE: 06910/2011) de financiamento interno da UEFS. A
proposta era que esse projeto fosse implementado nas escolas participantes do CoPPEC, isto
é, tratava-se de uma proposta formulada pelos pesquisadores para ser implementada nas
escolas.
Enquanto Claudia apresentava a proposta, a professora Anna Cássia faz a seguinte
ponderação: ―esse grupo colaborativo tem como objetivo pesquisar questões importantes para
a escola, que digam respeito aos problemas legítimos da escola, e esse projeto não está em
consonância com o objetivo do grupo, esse projeto é uma proposta vinda da universidade‖.
94
Essa reflexão resultou no entendimento de todo grupo de que aquele projeto não atendia aos
interesses do CoPPEC e, portanto, não seria desenvolvido pelo grupo.
No que diz respeito às contribuições dos diferentes sujeitos para o desenvolvimento da
prática social do grupo, professores e pesquisadores apresentam aportes bem delimitados e
distintos entre si.
Enquanto os professores colaboram com o seu conhecimento experiencial, saber de
quem é um profundo conhecedor da sua sala de aula e que, portanto, direciona as questões de
pesquisa, avalia a viabilidade das abordagens metodológicas, por sua vez, os pesquisadores,
apóiam o processo de pesquisa do ponto de vista teórico e metodológico, sugerindo
bibliografias, apresentando e esclarecendo abordagens metodológicas, orientando processos
de coleta e analises de dados e escrita de artigos. Essa não é uma compreensão nossa apenas
como autores da pesquisa apresentada nesse artigo, é antes, uma compreensão coletiva dos
membros do grupo.
O CoPPEC legitimou durante essa pesquisa os papeis apresentados pelos diferentes
sujeitos sociais que o compõe. Como exemplo segue a fala da professora Ana Lúcia em
entrevista individual. Ela percebe claras distinções entre as contribuições dadas por
professores e aquelas realizadas por pesquisadores no processo da prática de pesquisa
colaborativa,
Podemos analisar essa tensão como sendo um reflexo das múltiplas filiações a CoP
(WENGER, 1998) e, consequentemente, o ônus em assumir vários e diversos papeis sociais
como demanda dessas filiações.
Os participantes do CoPPEC fazem parte de diversas comunidades
concomitantemente, a comunidade familiar, muitos estão ligados a comunidades religiosas e a
outras comunidades que existem no ambiente escolar. Todas essas filiações demandam papeis
a serem desenvolvidos em cada uma das comunidades, motivo pelo qual, ainda que
individualmente as reuniões mensais do CoPPEC não pareçam a primeira vista ser uma
grande ocupação, somada a todas as outras atividades comunitárias elas se tornam, em alguma
medida, onerosas para os membros do grupo.
Apesar de termos identificado essa tensão, os participantes do grupo parecem estar
cientes da necessidade de negociação dela em prol do desenvolvimento e andamento das
metas do grupo e por se sentirem corresponsáveis por elas.
Nesse sentido, o grupo tem negociado as impossibilidades da presença dos membros
em reuniões gerais e, por exemplo, muitas vezes remarca as datas das reuniões mensais
quando muitos membros não podem comparecer. Na ausência de alguns membros nessas
reuniões, o grupo tem dado continuidade aos trabalhos e sempre é feito o repasse das
deliberações tomadas em reunião. De seu lado, os membros que não comparecem às reuniões
sempre justificam a ausência e contribuem com opiniões e sugestões por meio de mensagens
eletrônicas, uma vez que a pauta da reunião é sempre acordada anteriormente pelo grupo.
A segunda tensão constitui a ―diversidade de temas pesquisados nas inovações
educacionais desenvolvidas pelo grupo/necessidade de construção de um eixo comum de
trabalho‖. A maior parte dos membros do grupo, a despeito de considerar positiva e em certa
medida necessária a grande diversidade de temas pesquisados pelos subgrupos, também a
consideram um dos principais fatores que dificultam a colaboração e sentem a necessidade de
um eixo comum de trabalho, que gere oportunidades de participação plena na prática de
trabalho e pesquisa colaborativa:
Nós temos vários trabalhos e isso é uma coisa interessante, positiva, por um
lado, por outro também a gente fica: Peraê, o grupo tá fazendo um trabalho
com metabolismo, que é o grupo da gente junto com o CPM, um grupo tá
fazendo um trabalho com evolução, né? Já tem outro norte... Então ficam
vários nortes para um trabalho que deveria tá sendo compartilhado [...] pra
gente realmente estar sintonizado e trabalhando numa linha, dando
97
Essa tensão se articula intimamente com uma terceira, relativa ao fenômeno que foi
denominado pelo grupo de ―silêncio virtual‖. De um lado, os membros do grupo reclamam do
silêncio que se instala, com alguma frequência, nas comunicações e consultas virtuais sobre
os trabalhos realizados. De outro lado, sentem dificuldade em participar plenamente das
discussões sobre os diferentes projetos de inovação educacional em desenvolvimento no
grupo e dos respectivos temas que enfocam. A fala que reproduzimos abaixo é representativa
da expectativa e necessidade que os professores têm de receberem contribuições às suas
consultas ao grupo pelo meio virtual:
A gente precisa do olhar do outro até da aprovação do outro para que aquilo
seja validado pra gente, entendeu? Essa insegurança que a gente traz porque
a gente não tem formação para a pesquisa, a gente não tem conhecimento
teórico pra isso. A gente coloca um negócio lá [no email do grupo] e a gente
fica doido para que os outros comentem, mesmo que critique. Poxa gente,
ninguém comentou, ninguém entrou no chat! Isso aí deixa a gente
angustiado. Porque a gente não sabe se o que a gente fez tá certo, entendeu?
A gente não sabe se aquilo ali tá certo pra chegar na meta que a gente traçou
[Anna Cássia, CPM].
Outras falas apresentam razões para que o silêncio virtual se instale. Grande parte
delas aponta a insegurança em colaborar, gerada pela falta de conhecimento apropriado sobre
o projeto em discussão – seus objetivos, o detalhamento de sua proposta pedagógica, os
pressupostos teóricos e metodológicos que o fundamentam. Nestas circunstâncias, alguns
participantes receiam que seus comentários e suas sugestões sejam impertinentes e gerem
mais problemas do que contribuição.
A explicação de um dos professores para sua postura de se manter em silêncio, no
entanto, revela uma perspectiva distinta e positiva do silêncio virtual, ao concebê-lo como
uma oportunidade de aprendizagem que pode ser interpretada por meio do conceito de
participação periférica legítima (LAVE; WENGER, 1991):
98
reflexão: Tá, a gente tá aplicando uma sequência, tem resultado... Certo, ela
teve um resultado, já tem uma publicação aí... Mas e para o grupo? E para as
diferentes realidades desse grupo do qual eu pertenço, como o professor
Jorge disse aí, como é que essas questões são colocadas para o grupo? Que
reflexões a gente tá fazendo sobre isso? [...] Sinceramente, eu não sei o
quanto esses resultados das pesquisas de fato, ou se a metodologia das
sequências em si, só isso é inovação [Márcia, Pedro Calmon].
A partir da discussão gerada por estas falas na ocasião da entrevista de grupo focal, o
próprio grupo reconheceu essa tensão e tomou o tema do conceito de inovação educacional
como a próxima agenda de estudo e trabalho do grupo. Ao longo de três reuniões mensais, o
grupo produziu um conceito próprio de inovação educacional, capaz de oferecer parâmetros
teóricos e metodológicos para a avaliação do caráter inovador das sequências didáticas, ou de
qualquer outra artefato desenvolvida pelo grupo.
O esforço do grupo para balancear essa tensão foi além de produzir um conceito
próprio de inovação educacional para balizar a pesquisa do grupo. O CoPPEC se engajou em
estudos sobre etnografia e descrições etnográficas para desenvolvê-las nos contextos escolares
pesquisados e nos processos de elaboração das sequências didáticas, bem como das
adaptações realizadas nas sequências quando estas são aplicadas em contexto diferente
daquele em que foi inicialmente aplicada. Dessa forma, contribui para que os temas das
diferentes inovações educacionais desenvolvidas pelo grupo, bem como outros aspectos
envolvidos nessa elaboração - proposta pedagógica, pressupostos teórico-metodológicos, por
exemplo, sejam pormenorizadamente conhecidos pelos outros membros do grupo e auxiliem
na avaliação sobre o caráter inovador da intervenção dado contexto. Como resultado da
100
negociação dessa tensão o grupo incorporou a prática etnográfica à sua prática de pesquisa
colaborativa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apoiados na prerrogativa teórica colocada por Wenger (1998) de que diferentes
agrupamentos sociais podem desenvolver na busca conjunta por um interesse comum, uma
prática e gerar aprendizagem de forma que se possa identificar esse agrupamento como uma
CoP avaliamos positivamente a pertinência de estudar o CoPPEC por meio da noção de CoP e
do arcabouço teórico presente na literatura sobre elas (LAVE; WENGER, 1991; WENGER,
1998; WENGER; MCDERMOTT; SNYDER, 2002).
Este estudo empírico foi orientado pela estrutura teórico-metodológica proposta e
descrita por nós (CAPÍTULO 1) para análise de dados e produção de resultados em estudos
empíricos sobre CoP e GC. Especificamente fomos orientados por uma das dimensões dessa
estrutura, a dimensão ―organização das relações de colaboração na comunidade‖.
Avaliamos que o estudo empírico dessa dimensão da organização social de CoP nos
oferece elementos composicionais, como os descritos nesse artigo, que contribuem para
outros estudos acerca de GC e CoP e, são especialmente importantes para iniciativas de
planejar e iniciar trabalhos colaborativos que reúnam professores e pesquisadores.
Ademais, estudar os grupos sociais em termos de tensões endêmicas como dualidades
necessárias do sistema, um investimento nosso inspirados em Barab e colaboradores (2002),
prover planejadores de trabalhos colaborativos, bem como colaboradores, de um estudo de
caso esclarecedor a partir do qual eles possam generalizar, ou seja, usar estas discussões mais
prontamente para identificar padrões que ocorrem em suas próprias comunidades e enfrentar
mais informadamente os desafios que encontram (WENGER; MCDERMOTT; SNYDER,
2002).
A abordagem etnográfica nos proporcionou reflexões de como a forma como a
comunidade se formou e está organizada socialmente gerou determinadas tensões internas.
Tomar essas tensões como um componente da vida de comunidades entendendo-as como
dualidades necessárias nos conduziu a reflexões acerca de como o grupo tem negociado essas
tensões e como essa negociação tem gerado desenvolvimento do/para o próprio grupo.
No caso particular do CoPPEC, sistematizar o modo como a comunidade se organiza
socialmente para desenvolver e manter a sua prática social se configura para nós como uma
possibilidade de munir a esta comunidade de conhecimento de si própria e, de certa forma,
101
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, M. C.; SEPÚLVEDA, C. A. S.; EL-HANI, C. N. Colaboração entre professores
de ciências e pesquisadores universitários: organização social e tensões na dinâmica de um
grupo colaborativo de pesquisa In: IX Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em
Ciências, Águas de Lindóia - SP. Anais do IX Encontro de Pesquisa em Educação em
Ciências, 2013.
ALMEIDA, M. C.; SEPÚLVEDA, C. A. S.; REIS, V.; MUNIZ, C.; EL-HANI, C. N. Design
Research e a busca de um grupo colaborativo por rigor, qualidade e credibilidade da pesquisa
situada em sala de aula. In: XV Seminário de Iniciação Científica da UEFS, 2011, Feira de
Santana. Anais do XV SEMIC Seminário de Iniciação Cientifica: Semiárido e as
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CONSIDERAÇÕES FINAIS_______________________________________
A pergunta inicial que balizou essa investigação foi: como o grupo Colaboração em
Pesquisa e Prática em Educação Científica – CoPPEC, se organiza socialmente e mantém a
sua prática?
Procuramos respondê-la seguindos dois percursos. O primeiro deles, o percurso
teórico apresentado no capítulo 1 da dissertação. A premente necessidade de segui-lo nos foi
posta ao nos depararmos com a ausência de uma estrutura teórico-metodológica descrita
pela/na literatura sobre grupos colaborativos e Comunidades de Prática que orientasse estudos
sobre a organização desses grupos sociais.
Ante esse cenário teórico, nos engajamos em uma revisão não exaustiva da literatura
sobre colaboração e grupo colaborativo e nos deparamos com uma grande polissemia
instalada em torno desse conceito. A literatura também apontava alguns esforços teóricos na
direção de organizar essa polissemia e, nesse sentido, a nossa contribuição foi a proposta de
interpretar e organizar o conceito de grupos colaborativos a partir da noção de semelhança de
família de Wittgenstein.
Estruturar o conceito de grupo colaborativo por meio da noção de semelhança de
família nos permitiu capturar a complexidade, riqueza, ao caráter dinâmico e variado dos
grupos colaborativos. Ademais nos possibilitou estabelecer um diálogo mais produtivo entre a
literatura sobre grupos colaborativos e aquela sobre Comunidades de Prática. Ao propor uma
definição que permita a identificação de diferentes grupos sociais como grupos colaborativos
pudemos então discutir e analisar as possibilidades e limites do uso do conceito de
Comunidade de Prática em investigações sobre organização e funcionamento de grupos
colaborativos.
Esta análise culminou na proposta e descrição teórica de uma estrutura teórico-
metodológica organizada em torno de três dimensões que podem orientar a investigação
empírica qualitativa do modo como grupos colaborativos organizam suas relações de sociais
de modo manter-se a si mesmos e desenvolver uma prática social que lhes confira identidade.
Esta estrutura encontra-se sistematizada na figura 1 do capítulo 1 dessa dissertação. É certo
que esta proposta está mais fortemente baseada no arcabouço teórico em torno do conceito de
Comunidade de Prática. A razão para isso é simples: por ser uma literatura de cunho mais
estruturalista, a literatura sobre Comunidades de Prática facilita a compreensão de elementos
constitutivos desses grupos. Essa característica da literatura sobre Comunidade de Prática
106
organização das relações de colaboração no CoPPEC não dissolvem a noção de que o grupo é
um todo indivisível compartilhada por todos os seus membros.
Outro tópico que nos auxiliou na compreensão de como o CoPPEC se organiza
socialmente e mantém a sua prática foi a descrição dos papeis assumidos por professores e
pesquisadores no desenvolvimento da prática de pesquisa colaborativa. Sobre esse tópico
podemos dizer também em linhas gerais que as contribuições são especificas visto que os
professores protagonizam o desenvolvimento da pesquisa colaborativa desenvolvida pelo
grupo por contribuírem com o seu conhecimento experiencial de sala de aula e, entre outras
contribuições, por exemplo, identificarem os problemas reais de sala de aula e apontá-los
como problemas de pesquisa para o grupo, uma vez que investigar os problemas reais das
escolas é um dos focos do grupo. Por sua vez, os pesquisadores têm contribuído com aportes
teóricos e metodológicos para a pesquisa e com apoio institucional ao grupo. Por meio deste
suporte, os professores têm desenvolvido ferramentas teórico-metodológicas para a
investigação das inovações educacionais aplicadas em sala de aula que possam responder as
questões de pesquisa, mas adequando-se também ao cotidiano de seu trabalho pedagógico na
escola.
As discussões teóricas sobre tensões nos permitiu identificar aquelas que geram
desenvolvimento no grupo colaborativo e, além disso, são decorrentes da organização social
das relações de colaboração do CoPPEC.
A perspectiva de tomar as tensões como um aspecto importante da vida de
comunidades de prática (BARAB; BARNETT; SQUIRE, 2002) e tratá-las não como
oposições, mas como dualidades (WENGER, 1998), nos conduziram a reflexões acerca de
como o grupo tem negociado essas tensões e como essa negociação tem gerado
desenvolvimento do próprio grupo, como no caso da produção de um conceito de inovação
educacional a ser adotado pelo grupo como orientador de sua prática social, fortalecendo seu
repertório cultural compartilhado.
Essa discussão corrobora a ideia teórica de que uma comunidade como um sistema de
relações entre indivíduos apresenta tensões internas que são endêmicas a esse sistema.
Os percursos teórico e empírico brevemente sumarizados aqui nos permitem julgar
termos respondido a pergunta que motivou a presente investigação.
A pesquisa apresenta alguns limites, dois deles nos são mais explícitos. No capítulo 1
a estrutura teórico-metodológica desenvolvida para orientar estudos empíricos sobre
organização de grupos colaborativos, é baseada no domínio de vida ―organização social‖ da
Comunidade de Prática. Contudo, Barab e colaboradores (2002) ao delinearem os quatro
domínios de vida de uma comunidade têm em vista as inter-relações entre eles, de modo que,
em alguma medida, eles informam uns aos outros.
Isso pode apontar que as possíveis dimensões que compõem os outros três domínios –
cosmologia, ciclo de desenvolvimento e ecologia - da vida de uma comunidade, as quais não
foram estudadas por nós podem, em alguma medida, informar sobre o domínio organização
social. Portanto, este domínio pode não ser exclusiva e suficientemente responsável pela
descrição da organização social de uma comunidade.
Ligado a isso, o estudo empírico da dimensão ―organização das relações de
colaboração na comunidade‖ desenvolvido no capítulo 2 é insuficiente para que avaliemos a
heurística da estrutura teórica na orientação de estudos empíricos sobre o tema.
Compreendemos esse limite, uma vez que a estrutura é formada por três dimensões e apenas
uma delas foi investigada empiricamente. Em vista disso, não foi possível qualquer
consideração sobre a avaliação da estrutura teórico-metodológica baseada na investigação de
dados empíricos.
Contribuições do estudo
REFERÊNCIAS
APÊNDICE______________________________________________________
ROTEIRO DE ENTREVISTA
I. DADOS PESSOAIS:
- Adesão ao grupo
1. Ao analisarmos os dados da entrevista de grupo focal, concluímos que o modo como nosso
se organiza pode ser caracterizado do seguinte modo: consiste em uma rede fluída de
subgrupos de pesquisa colaborativa de inovações educacionais, que se inter-comunicam entre
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si, ligados a um núcleo central de pessoas que dão apoio a estes trabalhos colaborativos. Esta
rede encontra-se representada graficamente na figura D desta prancha (semelhante a figura 2
apresentada no capítulo 2). Estes subgrupos e núcleo central, no entanto, em última instância
formam um grupo maior, único e indivisível. Você considera esta descrição adequada para
caracterizar a dinâmica de trabalho do grupo? Por que?
2. Para você quais são os requisitos para que um grupo seja colaborativo?
3. Você considera que nosso grupo cumpre todos estes requisitos? Caso contrário, quais
requisitos não são satisfeitos?
5. Você acha que na pesquisa colaborativa realizada no grupo há contribuições que são
específicas dos pesquisadores e outras que são específicas dos professores-pesquisadores?
Quais são elas? Como elas se articulam?
- Desenvolvimento profissional
2. Como você descreveria sua trajetória de participação desde seu ingresso no grupo?