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Livro Unico

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Química e Ciência

dos Materiais
Roberta Lopes Drekener
Éder Cícero Adão Simêncio
© 2019 por Editora e Distribuidora Educacional S.A.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida
ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico,
incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento
e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e
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Presidente
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Vice-Presidente Acadêmico de Graduação e de Educação Básica


Mário Ghio Júnior

Conselho Acadêmico
Ana Lucia Jankovic Barduchi
Danielly Nunes Andrade Noé
Grasiele Aparecida Lourenço
Isabel Cristina Chagas Barbin
Thatiane Cristina dos Santos de Carvalho Ribeiro

Revisão Técnica
Bárbara Nardi Melo
Éder Cícero Adão Simêncio
Roberta Lopes Drekener

Editorial
Elmir Carvalho da Silva (Coordenador)
Renata Jéssica Galdino (Coordenadora)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Drekener, Roberta Lopes
D771q Química e ciência dos materiais / Roberta Lopes
Drekener, Éder Cícero Adão Simêncio. – Londrina : Editora e
Distribuidora Educacional S.A., 2019.
208 p.

ISBN 978-85-522-1436-6

1. Química geral. 2. Ciência dos materiais.


3. Propriedades dos materiais. I. Drekener, Roberta Lopes.
II. Simêncio, Éder Cícero Adão. III. Título.

CDD 540
Thamiris Mantovani CRB-8/9491

2019
Editora e Distribuidora Educacional S.A.
Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza
CEP: 86041-100 — Londrina — PR
e-mail: editora.educacional@kroton.com.br
Homepage: http://www.kroton.com.br/
Sumário
Unidade 1
Átomos, moléculas e íons������������������������������������������������������������������������� 7
Seção 1.1
O átomo e a tabela periódica ........................................................ 9
Seção 1.2
Ligação química e estrutura molecular ����������������������������������� 26
Seção 1.3
Moléculas e íons��������������������������������������������������������������������������� 42

Unidade 2
Estudo de reações químicas e estados da matéria������������������������������ 57
Seção 2.1
Equações químicas���������������������������������������������������������������������� 59
Seção 2.2
Reações em solução aquosa�������������������������������������������������������� 74
Seção 2.3
Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos��������������������������� 92

Unidade 3
Estruturas cristalinas����������������������������������������������������������������������������111
Seção 3.1
Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos���������������������������112
Seção 3.2
Imperfeições cristalinas������������������������������������������������������������128
Seção 3.3
Difusão����������������������������������������������������������������������������������������140

Unidade 4
Propriedades, processamento e desempenho dos materiais�����������151
Seção 4.1
Propriedades, processamento
e desempenho dos materiais metálicos����������������������������������153
Seção 4.2
Propriedades, processamento
e desempenho dos materiais cerâmicos���������������������������������171
Seção 4.3
Propriedades, processamento
e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos������187
Palavras do autor

S
eja bem-vindo à disciplina de Química e Ciência dos Materiais. Aqui
você aprenderá as bases da química e da ciência dos materiais. Você
já se deu conta que, ao seu redor, estão ocorrendo várias reações e
processos químicos? Quer um exemplo? Para qualquer lado que você olhar,
irá notar alguma reação ou processo químico ocorrendo; seu próprio corpo é
composto de inúmeros reatores químicos: as células. Você também compre-
enderá as importantes relações entre as estruturas químicas, os processa-
mentos, as propriedades e o desempenho de um material. Mas onde identi-
ficamos isso em nosso cotidiano? Um exemplo são os tipos de materiais que
podem ir ao micro-ondas, pois dependendo do material podemos ter uma
explosão. Portanto, é muito importante para sua formação acadêmica conse-
guir associar determinados eventos de seu cotidiano aos conceitos que serão
apresentados ao longo da disciplina. A química esteve presente em toda a
história da humanidade. No início, a química não era vista como ciência,
mas como algo utilitarista, isto é, desenvolvia o conhecimento para resolver
problemas sociais. Foi assim com o desenvolvimento dos primeiros materiais
de argila obtidos pelo homem após descobrir o fogo, com o surgimento de
tintas primitivas e de produtos de cerâmica no final do período Neolítico e
com todo o avanço dos egípcios antigos, que desenvolveram os perfumes,
alguns remédios, papiros e diversas tintas, entre outras coisas. Hoje, a química
é uma ciência e seus avanços e descobertas permitiram muitas melhorias no
dia a dia, estando intrinsecamente relacionados com a melhora da qualidade
de vida.
Quando chegarmos ao final da disciplina, você será capaz de conhecer e
compreender os conceitos básicos sobre átomos, moléculas e íons, assim como sua
importância dentro do estudo da química. Aplicando este conhecimento você irá
avançar no sentido de compreender os principais conceitos de reações químicas e
os estados da matéria, assim como os diferentes arranjos atômicos e as imperfeições
presentes em sólidos, além de entender os mecanismos de difusão atômica. Após
estudar ciência dos materiais, você será capaz ainda de analisar e compreender as
propriedades dos materiais para seleção, de modo a atender às características de
desempenho e processamento.
Na primeira unidade desta disciplina você irá estudar os átomos, como eles
se conectam para formar as moléculas, ou ainda como os íons se formam. Na
segunda unidade da disciplina, você irá aplicar os conhecimentos adquiridos
estudando equações químicas e reações em solução aquosa, finalizando a
unidade com o estudo dos diferentes estados da matéria. Na terceira unidade
você compreenderá as principais estruturas cristalinas dos diferentes tipos
de materiais e seus sistemas cristalinos, assim como os tipos de imperfei-
ções ou defeitos estruturais que são importantes na difusão no estado sólido.
Por fim, na quarta unidade da disciplina você estudará as principais proprie-
dades dos materiais e como o tipo de processamento influencia diretamente
na obtenção dessas características.
Vamos começar nossa jornada pela química e pela matéria!
Unidade 1

Átomos, moléculas e íons

Convite ao estudo
Toda a matéria é constituída de pequenas partes, o átomo; e a química
estuda os átomos para então compreender como eles se conectam para
formar diferentes compostos, que apresentam diferentes propriedades. Por
exemplo, o sal se dissolve em água e permite que ocorra a condução de uma
corrente elétrica; já a glicose, embora se dissolva, não permite a condução
mencionada. O que estas duas moléculas têm de diferente? Os átomos que a
formam! Por isso um comportamento tão distinto.
Após estudar esta unidade de ensino você será capaz de conhecer e
compreender os conceitos básicos sobre átomos, moléculas e íons, assim
como sua importância dentro do estudo da química. Isso lhe permitirá saber
aplicar os conceitos de átomos, moléculas e íons em situações profissionais.
Imagine que você é um trainee em uma empresa que fabrica células
fotovoltaicas. Sua atribuição é acompanhar o processo de construção de
células fotovoltaicas, desde a preparação das placas até a montagem final e
manutenção. Em suas primeiras semanas, um lote de células fotovoltaicas
apresentou problema e foi devolvido. Seu gestor pediu que você investi-
gasse qual o problema, verificando se as células tinham como serem reapro-
veitadas. As células fotovoltaicas são constituídas de materiais com carac-
terísticas de semicondutores, como os que são utilizados em componentes
eletrônicos. Os principais semicondutores produzidos pela sua empresa são
silício (Si) com fósforo (P) e silício com boro (B). Você quer mostrar um
bom desempenho ao seu gestor, sendo assim, nada melhor que entender a
química envolvida neste processo. Nele, seu objetivo final é que as células
estejam funcionando, com o menor custo de manutenção possível. Mas
o que define o comportamento de um átomo? Como pode o comporta-
mento desses átomos afetar o funcionamento da célula? Qual o processo
que ocorre para que a célula funcione?
Para responder esta e outras perguntas, você deverá estudar sobre o átomo
e a tabela periódica, os conceitos de ligação química e estrutura molecular e
ainda as moléculas e íons.
Bons estudos!
Seção 1.1

O átomo e a tabela periódica

Diálogo aberto
Quando olhamos uma tabela periódica dos elementos químicos já nos acostu-
mamos com seu formato e também já pensamos em átomos e suas subpartí-
culas elétron, próton e nêutron. Mas você já parou para pensar que nem sempre
foi assim? Na maior parte da nossa história, não se tinha nenhuma evidência
do átomo, ou nem se quer se pensava sobre ele. Todo este conhecimento foi
construído em pequenos passos, ou melhor, experimentos. A análise dos dados
conhecidos permitiu que se chegasse em uma organização dos elementos, e
ela é totalmente lógica. Além disso, a análise da tabela periódica nos fornece
inúmeras informações.
Você é trainee em uma fábrica de células fotovoltaicas, que além da montagem,
também fabrica semicondutores do tipo silício-fósforo e silício-boro. Logo no
início do seu treinamento, um lote de células apresentou problemas e seu gestor
pediu que você avaliasse a situação. Para entender qual é o problema do lote, você
precisa compreender os princípios básicos do funcionamento geral destas células.
Um exemplo de células fotovoltaicas produzidas na empresa em que você trabalha
são as compostas por diodos, que consistem em duas placas, uma contendo elétrons
livres e outra com espaço para receber elétrons, colocadas em contato (Figura
1.1). Porém, é preciso uma etapa extra para gerar a corrente elétrica, a luz solar.
Como transformamos energia solar em corrente elétrica? Entendendo a estrutura
atômica, você será capaz de entender a primeira parte desse processo. Seu segundo
passo é estudar os elementos presentes nas células, fazendo sua distribuição
eletrônica. Lembre-se de que dois dos principais produtos são os semicondutores
Si-P e Si-B. Você se perguntou por que o
Figura 1.1 | Esquema geral de funciona-
silício precisa ser dopado? O silício é um mento de uma célula fotovoltaica
material classificado como semicondutor,
por isso a passagem de elétrons por ele é
facilitada com sistemas, como o explicado
para a célula fotovoltaica. Para construir
o material semicondutor, é necessário
conhecer as propriedades dos átomos
envolvidos no processo.
Em sua resolução considere que os
valores de afinidade eletrônica são de -27
kJ/mol, -72 kJ/mol e -134kJ/mol, respecti-
vamente, para boro, fósforo e silício. Com Fonte: elaborada pela autora.

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 9


relação à energia de ionização, temos para o boro 801 kJ/mol, para o silício 786 kJ/
mol e para o fósforo 1012 kJ/mol.
Para atender a este desafio, você irá estudar a evolução dos modelos atômicos até
a mecânica quântica, realizando a distribuição eletrônica dos elétrons em camadas,
subcamadas e orbitais, e entender o número atômico e a massa atômica. Será útil
também que você aprenda sobre a tabela periódica e as propriedades periódicas
dos elementos (raio atômico e iônico, afinidade eletrônica e energia de ionização).
Ao final, você deverá usar a tabela periódica como referência, lembrando-se de que
não é necessário decorar átomos e valores, é muito mais útil que você a entenda.

Não pode faltar


As primeiras considerações científicas sobre a constituição da matéria
foram feitas por Robert Boyle, em 1661, com a primeira definição de elemento
químico como um corpo não misturado ou simples, que não pode ser feito de
outro corpo, e também que a matéria era composta por várias combinações
de diferentes elementos (KOTZ et al., 2016). Embora tenha sido Demócrito
(460-370 a.C.) o primeiro a teorizar que a matéria podia ser dividida infinitas
vezes até chegar em partes indivisíveis, nomeadas de átomos, esta pergunta
foi respondida apenas em 1807 pelo cientista inglês John Dalton, ao realizar
experimentos medindo a massa de diversos compostos, observando que a
quantidade dos elementos permanecia sempre a mesma. Para a água, ele
observou que sempre eram encontrados 8 gramas (g) de oxigênio para 1 g de
hidrogênio. Com estes resultados, Dalton propôs um modelo para compo-
sição da matéria, que seria formada de minúsculas partículas indivisíveis,
sendo os átomos de cada elemento iguais. Para diferentes elementos, os
átomos teriam massas distintas e a combinação química ocorreria quando
os átomos formassem uma união firme, sendo que nestas reações os átomos
não seriam criados e nem destruídos. O modelo atômico de Dalton ficou
conhecido como bola de bilhar, por considerar o átomo uma bola maciça.
A descoberta de partículas com carga elétrica no átomo gerou um
outro modelo para o átomo, conhecido por pudim de passas, ou modelo de
Thomson (1898). Com o passar dos anos, os estudos da radiação e suas partí-
culas a (alfa), b (beta) e g (gama) por Henri Becquerel (1896) e Marie
e Pierre Currie (1898), permitiram que novos experimentos fossem reali-
zados, levando a novas dúvidas sobre como era o átomo. Ernest Rutherford
(1910) propôs um novo modelo, em que o átomo era composto por um
núcleo contendo partículas positivas, rodeado por elétrons, que são espécies
negativas. Se você considerar a interação eletrostática das cargas, para este
modelo surgem duas perguntas: 1. como espécies carregadas positiva-
mente não se repeliam no núcleo? 2. Por que os elétrons não eram atraídos

10 - U1 / Átomos, moléculas e íons


pelos prótons? Em resposta a primeira pergunta, foi proposto que existiam
outras espécies subatômicas que ficavam no núcleo, desta vez sem carga: os
nêutrons. Esse fato confirmado em 1932 com a determinação de sua massa
por James Chadwick.
Já a segunda pergunta era um pouco mais difícil e fez com que Niels Bohr
e Arnold Sommerfeld propusessem que os elétrons estavam em movimento,
percorrendo órbitas elípticas (1913). Bohr, utilizando alguns conceitos desen-
volvidos por Planck e Einstein em diversos experimentos, propôs que apenas
algumas trajetórias eram possíveis para o elétron, que são o que você conhece
por camadas eletrônicas, que compõem a eletrosfera. Você pode visualizar a
evolução dos modelos atômicos na Figura 1.2.
Figura 1.2 | Evolução dos modelos atômicos

Fonte: elaborada e adaptada pela autora.

No modelo de Bohr, os elétrons não emitem energia ao percorrer sua


trajetória, apenas para passar de uma camada interna para uma mais
externa é que ocorre a absorção de energia. A quantidade de energia
liberada, dependia do elemento que estava sendo avaliado e da cama-
da em que o elétron se encontrava, entretanto, era sempre múltiplo de
uma quantia fixa, o chamado quantum.

Reflita
A energia que é liberada varia de elemento para elemento. Você já
pensou em como esta energia pode ser liberada? A radiação eletro-
magnética, por exemplo, é uma maneira, calor é outra. Dependendo

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 11


da quantidade de energia, você pode observar diferentes cores, já que
diferentes comprimentos de onda possuem diferentes energias. Você
pode relacionar isso com os fogos de artifício?

Embora o modelo de Bohr seja uma maneira bastante visual de imaginarmos


um átomo, a eletrosfera não é exatamente tão organizada como na Figura 1.2. Não
há uma trajetória completamente definida para o elétron, apenas uma região em
que ele pode estar com maior probabilidade, que chamamos de orbital atômico
quando ultrapassa 90% de chance. Estes orbitais se organizam em camadas, de
acordo com o seu nível de energia. Você precisa agora parar de pensar no elétron
como uma partícula e começar a imaginá-lo com um comportamento dual partí-
cula-onda. Erwin Schrödinger (1926) descreveu o modelo ondulatório para
o elétron do hidrogênio utilizando uma função matemática (função de onda),
dando origem ao modelo atômico quântico, extrapolado para os demais átomos,
lembrando de que tudo isso é de maneira teórica! Como resultado da equação de
Schrödinger, foram obtidos 3 números quânticos (Quadro 1.1), que você pode
pensar como um endereço para o átomo. O quarto número quântico é definido
pelo giro de rotação do elétron.
Quadro 1.1 | Números quânticos

Número quântico Características


principal (n) Se refere à camada em que um átomo se encontra, sendo repre-
sentada por números inteiros (1, 2, 3...). Comumente as camadas
são também nomeadas com letras, sendo K (n=1), L (n=2), ..., Q
(n=7). A camada mais externa é chamada camada de valência.

momento angular (  ) São as subcamadas, ou orbitais, sendo que  = 0,1, 2,..., n -1 .


Além de números, as subcamadas foram nomeadas com letras: s (
 = 0 ), p (  = 1 ), d (  = 2 ) e f (  = 3 ). O número de orbitais
deve ser sempre n-1 (ou seja, n=2 temos os orbitais 0 e 1, corres-
pondentes a s e p, respectivamente).
Ele se refere à orientação do orbital no espaço, podendo assumir
magnético ( m ) valores de - a + . Para o orbital s (  = 0 ) temos m = 0; p
(  = 1 ), m = -1, 0, +1; d (  = 2 ), m = -2, -1, 0, +1, +2; e para
f (  = 3 ), m = -3, -2, -1, 0, +1, +2, +3. Como exemplo, o orbital p
apresenta 3 orientações: x, y e z (em um gráfico de coordenadas).
Diz respeito ao movimento do elétron ao longo do seu eixo. Apenas
spin ( ms ) dois valores são possíveis, +1/ 2 e -1/ 2 , uma vez que o elétron
pode girar apenas no sentido horário e anti-horário.

Fonte: elaborada pela autora.

Na Figura 1.3 você pode observar dois exemplos de formatos de orbitais


mais simples (s e p), assim como a representação deste movimento, sendo
que este giro faz com que o elétron se comporte como um pequeno ímã.

12 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Figura 1.3 | a) Orbitais atômicos s e p; b) Número quântico de spin ( ms ), giro do elétron em
seu eixo

Fonte: elaborada pela autora.

Segundo o princípio da exclusão de Pauling, dois elétrons não podem


ter o mesmo conjunto de números quânticos, ou seja, temos dois elétrons
com n=3 (os dois na camada 3),  = 1 (os dois no orbital p), m = 0 (os dois
com a mesma orientação espacial ou x, ou y, ou z), porém cada um gira em
um sentido ( ms = +1/ 2 e ms = +1/ 2 ). Em outras palavras, você pode dizer
que o princípio da exclusão de Pauling fala que apenas dois elétrons podem
ocupar 1 orbital.
Cada vez que formos dar a posição aproximada de um elétron não temos
que escrever todos os números quânticos, nem desenhar os orbitais. Utilizamos a
representação de orbitais por caixas, de elétrons por setas e usamos a nomenclatura
descrita na Figura 1.4 para indicarmos os números quânticos.
Figura 1.4 | Representação de orbitais, elétrons e números quânticos

Fonte: elaborado pela autora.

Então, como vimos na Figura 1.3, a descrição 2p 4 significa que temos


quatro elétrons em orbitais p na camada 2. Você já pensou sobre a energia
dos orbitais atômicos? Já falamos que as camadas mais internas têm menor
energia, sobre os orbitais; devido ao seu tamanho e presença de planos

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 13


nodais, cada tipo possui diferente energia, sendo s < p < d < f . Os orbitais
de um mesmo tipo (como os três orbitais p: px , p y e pz ) são chamados de
degenerados. O preenchimento de orbitais degenerados ocorre seguindo a
regra de Hund que diz que devemos colocar um elétron em cada orbital e
depois voltar ao primeiro e seguir preenchendo, como feito na Figura 1.4
para os quatro elétrons em orbitais p.
Como você distribuiria os elétrons ao longo das camadas e subcamadas?
Este processo é chamado de distribuição eletrônica, sendo que devemos
seguir o princípio da construção (aufbau), colocando os primeiros elétrons
na camada menos energética. A primeira camada possui n =1, apenas 1 orbital
s (pois  = n -1 ), com dois elétrons (lembre-se do princípio da exclusão de
Pauling). Na camada n=2, há 1 orbital s e 3 orbitais p, sendo o orbital s menos
energético que os orbitais p, sendo preenchidos primeiro. O preenchimento
dos orbitais p deve seguir a regra de Hund. Isto significa que um átomo com
seis elétrons tem 1s 2 (dois elétrons no orbital s da primeira camada), 2s 2
(dois elétrons no orbital s da segunda camada), 2p2 (dois elétrons no orbital
p da segunda camada, um em px e outro em p y ), processo representado na
Figura 1.5a. As energias das diferentes camadas e orbitais foram calculadas
experimentalmente e para você definir qual orbital é preenchido primeiro,
deve utilizar um diagrama de ordem de preenchimento das subcamadas
(Figura 1.5b). Neste diagrama, as camadas e subcamadas são preenchidas
seguindo as setas vermelhas, iniciando por 1s, depois 2s, depois, 2p, 3s,
seguido de 3p, 4s, etc.
Figura 1.5 | a) Distribuição eletrônica para um átomo com seis elétrons; b) Diagrama de distri-
buição eletrônica dos elétrons
a) b)

Fonte: a) elaborada pela autora; b) adaptado de Kotz et al. (2016, p. 312).

14 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Exemplificando
O argônio apresenta número atômico 18 ( 18 Ar ), o que significa 18
prótons, sendo este número igual ao de elétrons. Então pelo diagrama
da Figura 1.5b teremos 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p6 . Já o potássio ( 19 K ) tem como
distribuição eletrônica 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p6 4 s1 . Note que o potássio tem a
configuração do argônio, mais um orbital, podendo ser representado
como [Ar] 4s1 . Isso é possível de ser feito com todos os elementos,
usando o gás nobre anterior.

Continuando seu estudo do átomo, você deve aprender que o número


de prótons que um átomo possui é chamado de número atômico, enquanto
a massa de um átomo é chamada massa atômica (Figura 1.6). A massa
atômica é relativa, ou seja, determinada por convenção, foi atribuído uma
massa relativa igual a 1 aos prótons e aos nêutrons (massa real do próton é
1,672622´10-24 g , do nêutron é 1,674927´10-24 g , do elétron é desprezível –
9,109383´10-28 g ). Com isso, o carbono passa a ter massa igual a 12, com
seis prótons e seis nêutrons. Medidas experimentais determinaram que
o oxigênio é 1,33 vezes mais pesado que o carbono, de fato, com oito
prótons e oito nêutrons, e a massa do oxigênio é igual a 18. A unidade
de medida de massa atômica é o u (u.m.a), sendo que 1 u corresponde
a 1/12 da massa do carbono – em muitas fontes você irá encontrar esta
grandeza como adimensional.

Figura 1.6 | Representação dos átomos contendo seus números atômicos e massas atômicas

Fonte: elaborada pela autora.

Uma espécie que possui o mesmo número de prótons que outra,


porém, massas atômicas distintas, é chamada de isótopo, sendo exemplos
de isótopos os três diferentes átomos de hidrogênios, que pesam massa
1,00794 u, encontrados na natureza: o deutério (D, 21 H ), o trítio (T,
1 H ) e o hidrogênio (H, 1 H ). A porcentagem isotópica de cada elemento
3 1

consiste em sua abundância na natureza, para o H 99,985%, D 0,015%,


T 0% (não existe na natureza, apenas é gerado em laboratório). Quando
temos um elemento com diferentes isótopos, sua massa atômica é calcu-
lada por:

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 15


æ % isótopo A ö÷ æ % isótopo B ö÷
Massa atômica = ççç ÷÷´ massa isótopo A + çç ÷÷´ massa isótopo B + ...
è 100 ø÷ èç 100 ø÷

Saiba mais
Agora que você aprendeu sobre o átomo, suas subpartículas e sua massa
atômica, você pode acessar o simulador Phet para aplicar seus conhe-
cimentos sobre átomo, e também para aplicar conceitos de isótopos e
massa atômica.
Conhecimentos sobre o átomo:
PHET. Monte um átomo. [s.d.].
Conceitos de isótopos e massa atômica:
PHET. Isótopos e massa atômica. [s.d.].

Você já estudou um pouco sobre a tabela periódica durante seu ensino


médio. Alguma vez já parou para pensar por que os elementos estão organi-
zados daquela maneira? A primeira organização de elementos químicos data
de 1817 e, após muitas outras tentativas de organização de acordo com suas
características, somente em 1969 e 1970 os cientistas Dmitri Mendeleev e
Julius Lothar Meyer publicaram independentemente uma tabela conside-
rada efetiva, utilizando a massa atômica como critério de organização (Kotz
et al., 2016). Na proposta atual, Mendeleev organizou os elementos pelos seus
números atômicos, pois com a descoberta da radioatividade e dos isótopos,
descobriu-se que átomos de elementos diferentes poderiam possuir a mesma
massa. Com o modelo quântico do átomo, outras características passaram a
ser consideradas, como a distribuição eletrônica, passando as linhas da tabela
periódica a conterem determinado número de átomos até que suas proprie-
dades químicas e físicas começassem a se repetir.

Atualmente, a tabela periódica é dividida em grupos de elementos que apre-


sentam características em comum, como os gases nobres, que são espécies
não reativas (8 elétrons na camada de valência). A tabela periódica tem duas
linhas fora da tabela, estes elementos são chamados elementos de transição in-
terna. Você pode ver no QR Code. Observe que na tabela periódica as colunas
são chamadas de grupos e denominadas por números, e as linhas são chama-
das períodos, sendo que ao longo deles ocorre o aumento do número atômi-
co. A localização do elemento químico nos dá várias informações sobre a sua
distribuição eletrônica.

16 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Assimile
O período nos dá uma informação importante a respeito da distribuição
eletrônica. Elementos no primeiro período como o hidrogênio (H) e hélio
(He) utilizam apenas a primeira camada n=1. Elementos do segundo
período utilizam duas camadas n=2, etc. Os elementos do grupo principal
nos dizem se o átomo possui 1, 2, ..., 8 elétrons na camada de valência.
Por exemplo, o carbono (C) está no segundo período, portanto, tem n=2
(duas camadas) e no grupo 4, portanto, 4 elétrons na camada de valência.
Lembre-se de que a distribuição eletrônica do carbono é 1s 2 2s 2 2 p2 .

Você pode obter algumas informações sobre os elementos olhando


para a tabela periódica. Existem algumas propriedades que se repetem
de tempos em tempos, estas são as propriedades atômicas que possuem
tendências periódicas. São elas: tamanho atômico, tamanho iônico,
energia de ionização e afinidade eletrônica. Antes de começarmos
a falar destas propriedades, cabe ressaltar que os valores de proprie-
dades atômicas podem variar entre os livros didáticos, pois dependem
do artigo científico original, que depende de fatores como a técnica
aplicada e a precisão do equipamento. Nesta seção, usaremos os valores
apresentados por Kotz et al. (2016).
1) Tamanho atômico: você consegue dizer qual é a fronteira de um
átomo? Então, como poderíamos saber qual seu tamanho? Pela definição
de orbitais não podemos traçar uma linha e dizer que o átomo chega até
determinado ponto, nem matematicamente e nem com observações diretas.
Porém, podemos utilizar medidas indiretas para conseguirmos estas infor-
mações, como analisar moléculas compostas pelos mesmos átomos. Neste
caso, a definição de raio atômico ( ra ) é dada como metade da distância entre
os centros de dois átomos. Realizando experimentos com o gás cloro ( Cl 2 ) e
com o grafite (C), temos os valores de raio atômico dos dois elementos, como
na Figura 1.7. Com estes dados, podemos prever o tamanho da ligação C-Cl,
entretanto, temos que levar em conta que outros átomos próximos podem
afetar este tamanho de ligação.
Figura 1.7 | Exemplo de determinação de raios atômicos

Fonte: adaptada de Kotz et al. (2016, p. 323).

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 17


Analisando os diferentes raios atômicos, foi observado que à medida
que o valor de n aumenta, aumenta também o ra . Ou seja, o raio atômico
aumenta no mesmo sentido de aumento de período ao longo de um grupo.
Você deve pensar que quanto maior o n, maior o número de camadas, é
natural esta tendência em aumentar o tamanho do átomo de cima para baixo
na tabela periódica. Outra observação foi que o tamanho do átomo diminui
conforme adicionamos um próton (quando aumenta Z). Podemos simplificar
esta observação racionalizando que à medida que ocorre o aumento em um
próton, a atração com a eletrosfera é maior, o núcleo passa a atrair os elétrons
mais fortemente. Desta maneira, o raio atômico diminui à proporção que
aumenta o número atômico em um mesmo período.
2) Tamanho iônico: um íon é um elemento que perdeu ou ganhou
elétrons, sendo chamado de ânion ao ganhar elétrons (lembre-se de que os
elétrons têm carga negativa) e de cátion ao perder elétrons. Se ele perdeu
um elétron, a distribuição eletrônica corresponde à distribuição observada
para o elemento menos um elétron, como para o sódio (Na, 1s 2 2s 2 2 p6 3s1 )
e para o cátion sódio ( Na + , 1s 2 2s 2 2 p6 ). Já se ele ganhou um elétron, corres-
ponde à distribuição do elemento com um elétron adicional, como para o
cloro (Cl, 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p5 ), já para o ânion cloreto ( Cl- , 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p6 ).
Note que um cátion será sempre menor que o elemento de origem, enquanto
um ânion será sempre maior. O raio iônico ( ri ) também é uma propriedade
periódica em que o tamanho do íon aumenta ao longo do período. Agora se
compararmos íons O2- , F- , Na + e Mg 2+ que possuem o mesmo número
de elétrons (chamados isoelétricos), veremos que embora todos tenham
10 elétrons, eles apresentam diferentes raios atômicos ( O2- 8 prótons e
ri = 140 pm , F- 9 prótons e ri = 133 pm , Na + 10 prótons e ri = 98 pm e
Mg 2+ 12 prótons ri = 79 pm ). Podemos explicar os valores tão diferentes de
raio atômico pelo número de prótons: quanto maior, maior a atração núcleo-
-eletrosfera, portanto, menor o tamanho do íon.
3) Energia de ionização (EI): estando um átomo em fase gasosa, a EI é
a energia necessária para a remoção de um elétron da camada de valência,
levando à formação de cátions. Como é necessário fornecer energia para que
ocorra a abstração do elétron, este valor é positivo (energias positivas são
fornecidas ao sistema e energias negativas liberadas pelo sistema, no caso
sistema é a reação). Removendo gradativamente, em fase gasosa, 1, 2 e 3
elétrons do átomo de magnésio, temos:
+ + 2+
Mg (g) ® Mg (g) + e- EI = 738 kJ/mol Mg (g) ® Mg (g) + e- EI =1451 kJ/mol
2 2 6 2 2 2 6 1 2 2 6 1
1s 2s 2 p 3s 1s 2s 2 p 3s 1s 2s 2 p 3s 1s 2s 2 2 p6
2

2+ 3+
Mg (g) ® Mg (g) + e- EI = 7733 kJ/mol
2 2 6
1s 2s 2 p 1s 2 2s 2 2 p5

18 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Isso significa que é necessário fornecer ao sistema 738 kJ/mol para
remover o primeiro elétron do Mg, 1451 kJ/mol para remover o segundo
elétron (quase o dobro da primeira EI) e 7733 kJ/mol na terceira (mais
de cinco vezes a segunda EI). Se você olhar a distribuição eletrônica do
magnésio metálico, do cátion que perdeu um elétron e do cátion que perdeu
dois elétrons, verá que a primeira e a segunda perda ocorreram com elétrons
da 3ª camada, enquanto o terceiro elétron é retirado de uma camada mais
próxima ao núcleo. Elétrons de camadas mais internas são mais difíceis de
serem removidos, devido a sua proximidade com o núcleo.
Quanto maior for o raio atômico, menor será esta energia, já que os
elétrons da camada de valência estão mais afastados do núcleo. Com isso,
podemos dizer que para elementos do grupo principal, a energia de ionização
diminui com o aumento do período e aumenta com o aumento do número
atômico. Uma exceção é o valor da energia de ionização do átomo de oxigênio
que é menor que a do nitrogênio, voltando a aumentar no flúor. Você enten-
derá este resultado se utilizar diagrama de caixas para representar orbitais.

O(g) ® O+(g) + e- EI=1314 kJ/mol


2 4 2 3
2s 2 p 2s 2 p

2s 2p 2s 2p

Quando o átomo de oxigênio está com seis elétrons na camada de


valência, temos um orbital p com dois elétrons, isso causa uma certa repulsão.
Ao perder um elétron, cada orbital tem apenas um elétron, diminuindo esta
repulsão. Com isso, a abstração do primeiro elétron não é tão difícil como
no nitrogênio (N, EI = 1402 kJ/mol) e no flúor (F, EI = 1681 kJ/mol). Este
mesmo efeito é observado para o enxofre (S) e o selênio (Se) com relação aos
seus vizinhos nos períodos abaixo.
4) Afinidade eletrônica (AE): a formação de ânions ocorre quando um
átomo captura um elétron. A capacidade de um átomo capturar elétrons é
avaliada como afinidade eletrônica, quando o elemento está em fase gasosa.
Comumente, quando ocorre a adição de um elétron a um átomo, ocorre a
liberação de energia e, desta forma, quanto maior for a afinidade eletrônica,
mais negativo será seu valor. Já mencionamos que quanto maior o número
atômico de um elemento ao longo do período, menor o átomo, pois há mais
prótons para atrair os elétrons da camada de valência. Este mesmo efeito é
observado para afinidade eletrônica. Quanto maior o número atômico ao
longo do período, maior será a afinidade eletrônica. Seguindo a mesma linha
de raciocínio, em um mesmo grupo, quanto mais acima o átomo se encontra,

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 19


mais próximo do núcleo o elétron será adicionado, resultando em uma maior
afinidade eletrônica.
O elemento com maior afinidade eletrônica na tabela periódica é o flúor,
um átomo pequeno do segundo período, que ao adicionarmos um elétron
completa sua camada de valência. Um átomo como o boro (B) já possui uma
menor afinidade eletrônica que o flúor, pois, em comparação com o flúor,
possui menos prótons. O boro possui número atômico igual a cinco e flúor
possui número atômico igual a nove (B Z = 5 e F Z = 9).
- -
Cl (g) + e- ® Cl (g) EI = -328 kJ/mol B(g) + e- ® B(g) EI = -26,7 kJ/mol

A energia de ionização e afinidade eletrônica medem a capacidade de


um átomo perder e ganhar um elétron, respectivamente, formando íons.
Se um átomo possui elevada afinidade eletrônica, ele deve possuir baixa
tendência a formar cátion (o que corresponde a um elevado valor de energia
de ionização). Tenha claro que a energia de ionização e a afinidade eletrônica
estão relacionadas com a reatividade dos átomos em reações em que se doa
e recebe elétrons. Você não deve confundir afinidade eletrônica com eletro-
negatividade. Esta diz respeito à capacidade de um átomo atrair para si os
elétrons de uma ligação covalente. Para que estes valores sejam calculados,
propriedades como afinidade eletrônica são levadas em consideração.

Um resumo da variação das propriedades periódicas raio atômico,


energia de ionização e afinidade eletrônica que ocorre pode ser visto
ao acessar o QR Code.

Com os conhecimentos adquiridos até aqui, você não só conhece a estru-


tura do átomo e sua representação, mas também como eles são organizados
na tabela periódica e quais informações podemos extrair desta organização.

Sem medo de errar


Como trainee de uma empresa que fabrica células fotovoltaicas, você
precisa identificar o problema de um lote defeituoso. A célula fotovoltaica
produzida na empresa que você trabalha consiste em dispositivo composto
por duas camadas, uma contendo um semicondutor dopado com fósforo e
outra dopada com boro. O termo dopado em química consiste em adicionar
pequena quantidade de um elemento em uma estrutura, neste caso a placa de
silício está sendo dopada. Como você pôde observar na Figura 1.8, embora
tenhamos uma placa carregada com elétrons e outra placa com espaço para
receber elétrons, apenas na interface entre os dois ocorre interação eletrônica.

20 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Para gerar energia elétrica é preciso a luz do sol. Você aprendeu nesta seção
que fótons possuem energia quantizada e que esta energia é capaz de fazer
com que elétrons sejam transferidos para níveis mais externos de energia. O
sol é uma fonte de fótons, que faz com que elétrons do silício sejam promo-
vidos para níveis mais externos até serem ejetados, como no efeito fotoelé-
trico. Neste caso da célula fotovoltaica, os elétrons do silício da camada
negativa (N) são excitados e ao serem ejetados colidem com os elétrons já
existentes na camada. Isso resulta em um fluxo de elétrons (Figura 1.8).
Figura 1.8 | Célula voltaica em funcionamento

Fonte: elaborada pela autora.

Finalizando o estudo inicial, você deve fazer a distribuição eletrônica


dos elementos silício ( 14 Si ), fósforo ( 15 P ) e boro ( 10 B ). O boro possui
número atômico 10, portanto, 10 prótons e 10 elétrons. Seguindo o diagrama
de distribuição eletrônica temos B Þ 1s 2 2s 2 2 p1 , Si Þ 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p2 e
P Þ 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p3 .

Com os conhecimentos adquiridos na seção, ao olhar o silício na tabela


periódica, observamos que ele é um elemento do 3o período e do grupo, o
grupo principal. Portanto, ele possui três camadas de elétrons e sua camada
de valência tem quatro elétrons, com os orbitais 3p vazios. Na seção anterior,
você observou que a distribuição dos elétrons é 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p2 , o que
confere com as informações descritas. A camada de valência é a mais externa,
portanto, 3s 2 3 p2 . Sabendo que os orbitais p comportam seis elétrons, ainda
faltam quatro para completar esta camada de valência.
O boro está no 2o período da tabela periódica, possuindo então duas camadas.
Estando no grupo do grupo principal, possui três elétrons na camada de valência,
2s 2 2 p1 . Para completar a camada de valência faltam cinco elétrons. O fósforo
está no 3o período da tabela periódica, possuindo então três camadas. Estando
no grupo 5 do grupo principal, possui cinco elétrons na camada de valência,
3s 2 3 p3 , faltando três elétrons para completar os orbitais p.
Quando você consulta as tabelas dos livros didáticos, observa que os
valores de afinidade eletrônica são de -27 kJ/mol, -72 kJ/mol e -134 kJ/mol,

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 21


respectivamente, para boro, fósforo e silício. Embora o boro possua menos
camadas (elétron adicionado mais próximo ao núcleo), silício e fósforo
possuem maior número atômico, exercendo maior atração do núcleo com
o elétron adicionado. Você deve achar que este critério está errado ao anali-
sarmos fósforo e silício, mas pela camada de valência, observe que ao adicio-
narmos um elétron no fósforo, ele deve ocupar um orbital p que já contém
um elétron. Enquanto que no silício, um elétron será adicionado a um orbital
p vazio.
Com relação à energia de ionização, temos para o boro 801 kJ/mol, para
o silício 786 kJ/mol e para o fósforo 1012 kJ/mol. Podemos analisar que boro
e silício possuem energias de ionização semelhantes, porém é muito mais
difícil remover um elétron do fósforo, sendo necessário mais energia.
Um elemento da tabela periódica que possui uma baixa energia de
ionização é o sódio (495,8 kJ/mol), já o cloro possui uma grande afinidade
eletrônica da tabela periódica (349 kJ/mol). Estes elementos tendem a formar
os respectivos cátions e ânions. Porém, o silício, o boro e fósforo não têm
uma grande tendência a doar ou receber elétrons, portanto, eles não estão na
forma de íons.
Você deu mais um passo para entender o funcionamento das células e
assim identificar o problema do lote sinalizado.

Avançando na prática

Ímãs industriais – aplicando a


distribuição eletrônica

Descrição da situação-problema
Em vários processos industriais, a remoção de contaminantes é uma
etapa-chave do processo, melhorando a pureza de diversos produtos,
sendo que diferentes técnicas de purificação podem ser aplicadas.
Vamos nos colocar no lugar de uma engenheira que trabalha numa
fábrica de ração animal. Pelo processo de fabricação, muitos minérios
estavam contaminando o produto final e danificando alguns equipa-
mentos. Tentando uma alternativa para o problema, o diretor da
empresa lhe consultou sobre a compra de um tambor magnético de via
úmida. Para saber qual tipo de contaminantes o ímã irá remover, você
precisa saber quais substâncias apresentam atração por ímãs e assim
emitir um parecer sobre a compra do equipamento.

22 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Resolução da situação-problema
Substâncias químicas são em sua maioria diamagnéticas, ou seja, são
ligeiramente repelidas por ímãs. Porém, outras substâncias são atraídas por
eles, as paramagnéticas. A origem do paramagnetismo é o spin do elétron,
sendo que elétrons apresentam propriedades magnéticas. Quando um átomo
que possui um elétron desemparelhado é colocado em um campo magné-
tico, duas orientações são possíveis: alinhamento dos elétrons a favor do
campo ou contra o campo. Isto ocorre devido ao spin ter valor +1/ 2 ou
-1/ 2 . Cabe ressaltar que quando o campo magnético externo é removido, a
orientação dos spins permanece por pouco tempo. Algumas outras espécies,
no entanto, após submetidas a campos magnéticos, mantêm esta orien-
tação, os chamados ferromagnéticos (como ferro, cobalto e níquel). Embora
compostos paramagnéticos apresentem magnetismo fraco, esta proprie-
dade pode ser utilizada. Para determinar se o ímã industrial irá resolver o
problema de contaminação e deterioração de equipamentos, precisamos
definir se as impurezas do processo são paramagnéticas/ferromagnéticas ou
diamagnéticas.
Você observou que alguns dos seus contaminantes, além de compostos
contendo ferro, são sais de cobre ( Cu 2+ ) e sais de sódio ( Na + ). Para deter-
minar se estes cátions serão ou não atraídos por um ímã forte, temos que
fazer suas distribuições eletrônicas:
Cu 2+ Þ 1s 2 2s 2 2 p6 3s 2 3 p6 3d 9 , camada de valência 3s 2 3 p6 3d 9 , em que
orbital 3d é o mais energético ® . Por apresentar um elétron
desemparelhado, o cátion cobre +2 é paramagnético.
Na + Þ 1s 2 2s 2 2 p6 , camada de valência 2s 2 2 p6 , em que orbital 2p é o mais

energético ® . Por apresentar apenas elétrons emparelhados, o


cátion sódio é diamagnético.
Como compostos de ferro são um grande problema em seu processo e
também ocorre a remoção de sais de cobre com o uso do ímã na indústria,
você entregou um parecer favorável à compra do equipamento.

Faça valer a pena


1. Os números quânticos são resultados da equação de Schrödinger para tentar localizar o
elétron. Estes são três dados que funcionam como o endereço do elétron. Ao descrevermos
estes valores, saberemos qual é a região que tem maior probabilidade de encontrar determi-
nado elétron. Um quarto número quântico diz respeito ao spin do elétron.

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 23


Qual das opções relaciona corretamente os quatro números quânticos?
I- N o quântico principal (n).
II- N o quântico momento angular (  ).
III- N o quântico magnético ( m ).
IV- N o quântico de spin ( ms ).
a) É a camada na qual o elétron se encontra.
b) São sobre a rotação do elétron, sendo possíveis os valores de +1/ 2 e -1/ 2 .
c) Diz respeito ao número de subcamadas, sendo n-1.
d) Diz respeito aos orbitais, varia de - a + .

a) I-A, II-D, III-B, IV-C.


b) I-A, II-D, III-C, IV-B.
c) I-D, II-C, III-B, IV-A.
d) I-D, II-B, III-A, IV-C.
e) I-C, II-A, III-B, IV-D.

2. Com o desenvolvimento da química como ciência, novos experimentos foram


sendo realizados e os resultados obtidos levavam a novas conclusões sobre os modelos
atômicos, sendo que diversos modelos ao longo da história, em suas devidas épocas,
conquistaram a comunidade científica.

Sobre a evolução dos modelos atômicos, responda as opções como verdadeiras


ou falsas:
i - ( ) – O modelo de Dalton veio contrastar com a definição de átomo de Demócrito.
ii - ( ) – A utilização de partículas oriundas de radiação auxiliariam a Rutherford a
montar um novo modelo, no qual o átomo possuía os prótons no núcleo e os elétrons
o circundando. Para este modelo ser válido, foi considerado que o átomo possuía
partículas neutras em seu núcleo, evitando a repulsão entre os prótons.
iii - ( ) – Baseado no modelo de Rutherford, Bohr propôs que os elétrons na orbita
podiam circular livremente entre as órbitas, evitando que o átomo colapsasse.
iv - ( ) – A dualidade do elétron partícula-onda revolucionou o entendimento do
átomo, sendo que a função de onda de Schrödinger para o hidrogênio permitiu que
muito fosse entendido sobre todos os outros átomos.

a) i – F; ii – F; iii – F; iv – V.
b) i – V; ii – V; iii – F; iv – V.
c) i – F; ii – V; iii – F; iv – V.
d) i – V; ii – V; iii – V; iv – V.
e) i – F; ii – F; iii – F; iv – F.

24 - U1 / Átomos, moléculas e íons


3. Estando um átomo em fase gasosa, a energia de ionização é a energia necessária
para a remoção de um elétron da camada de valência. Como é necessário fornecer
energia para que ocorra a abstração do átomo, este valor é positivo. Já a capacidade de
um átomo capturar elétrons é avaliada como afinidade eletrônica, quando o elemento
está em fase gasosa.

Sobre energia de ionização e afinidade eletrônica, analise as sentenças a seguir:


I - A afinidade eletrônica diminui à medida que aumenta o período e aumenta à
medida que aumenta o número atômico.
II- O aumento da afinidade eletrônica ao longo do período ocorre, pois é mais fácil
adicionar um elétron em espécies com maior número de massa.
III- O valor de afinidade eletrônica corresponde à energia liberada ao adicionarmos
um elétron em um átomo no estado gasoso.
IV- Quanto mais positivo o valor da afinidade eletrônica, maior é a tendência em um
átomo receber elétrons no estado gasoso.
Assinale as alternativas que contêm as afirmações corretas:

a) I, II, III e IV.


b) I, II e III, apenas.
c) II, III e IV, apenas.
d) I e II, apenas.
e) III e IV, apenas.

Seção 1.1 / O átomo e a tabela periódica - 25


Seção 1.2

Ligação química e estrutura molecular

Diálogo aberto
Como um bom observador, você notou que dificilmente a matéria é composta
por um único tipo de átomo, mas, sim, pela combinação entre diferentes elementos.
Muitas perguntas podem ser realizadas a cerca dessa afirmação. Como esses
átomos se conectam? Qual a diferença entre sulfato de ferro e ferro metálico? Por
que eles se comportam de maneira tão diferente? Outra coisa que você já deve ter
observado é que um mesmo composto pode assumir mais de um estado, como a
água que pode ser sólida abaixo de 0 °C, líquida a temperatura ambiente e gasosa
acima de 100 °C, isso tudo claro, para a pressão atmosférica ao nível do mar. Mas o
que define se um composto será sólido, líquido ou gasoso a temperatura ambiente?
Para saber as repostas das duas perguntas, precisamos aprender sobre ligações
química e estrutura molecular.
Na indústria em que você é trainee, é sua responsabilidade encontrar a
razão de um lote de células fotovoltaicas ter apresentado problema. Até o
momento você entendeu o funcionamento básico de uma célula e compre-
endeu que a luz solar é responsável por gerar corrente elétrica no processo de
excitação de elétrons e que não são os átomos de B e P elementares que dão
as características necessárias para a célula fotovoltaica, devido a suas energias
de ionização e afinidades eletrônicas. Então, você precisa pensar em termos
de ligações químicas. O que são ligações químicas? Como fica o silício e os
átomos de fósforo e de boro? Eles estão conectados? Vamos entender esses
materiais e compreender os fundamentos químicos envolvidos no funciona-
mento desta forma limpa de geração de energia, podendo, assim, analisar o
lote problemático.
Para resolver esse problema, você precisa aprender sobre estruturas de
Lewis, ligações químicas iônicas, covalentes e metálicas, assim como polari-
dade e forças intermoleculares. Vamos ao trabalho?

Não pode faltar


Em 1916, os químicos Gilbert N. Lewis (1875-1946) e Walter Kossel (1888-
1956), independentemente, propuseram que a conexão dos átomos ocorria
de modo que os elementos adquirissem oito elétrons na camada de valência,
o que equivale a dizer que eles assumem a configuração do gás nobre mais
próximo (MAIA; BIANCHI, 2007; KOTZ et al. 2016). Para ambos, ligação
química é a força atrativa entre dois átomos, resultante da reorganização dos

26 - U1 / Átomos, moléculas e íons


elétrons de suas camadas de valência. Você deve lembrar que a camada de
valência consiste na camada eletrônica mais externa da eletrosfera, ou seja,
os elétrons das outras camadas não estão envolvidos nas ligações químicas.
Kossel propôs que átomos deveriam doar ou receber elétrons, enquanto a
teoria de Lewis falava em compartilhamento de elétrons entre dois átomos.
As duas situações são possíveis, a primeira hipótese é sobre como se formam
as ligações iônicas, já o compartilhamento de elétrons caracteriza uma
ligação covalente. Para representar unicamente a camada de valência de
um átomo, Lewis desenvolveu uma notação em que o símbolo do elemento
representa o número atômico e os elétrons internos das camadas eletrônicas,
já a camada de valência é representada por pontos.

Exemplificando
O sódio (Na) possui configuração eletrônica 1s 2 2s 2 2 p6 3s1 , em que 3s1 é a
camada de valência. Sua representação de Lewis é .
A configuração do oxigênio é 1s 2 2s 2 2 p 4 , sendo 2p 4 a camada de

valência. Sua representação de Lewis é . Para o enxofre (Z = 16), a


4
camada de valência é 3p e sua representação de Lewis é .

Nas ligações iônicas os elétrons são transferidos de um átomo para outro.


Com isso são formadas uma carga negativa no átomo que recebe elétrons e
uma carga positiva no átomo que perde elétrons, sendo que a ligação química
é a força de atração entre os íons positivo (cátion) e negativo (ânion). Um
exemplo deste tipo de reação ocorre entre o sódio e o cloro, formando o
composto iônico cloreto de sódio (Figura 1.9).
Figura 1.9 | Formação de ligação iônica entre sódio e cloro

Fonte: adaptado de Kotz et al. (2016, p. 350).

Assimile
Elementos do grupo principal tendem a perder ou ganhar elétrons,
adquirindo a configuração de gás nobre. Átomos que perdem elétrons
formam cátions que são representados pela carga positiva (+), assim

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 27


a perda de um elétron forma um cátion +1, dois elétrons levam a um
cátion a +2.
Átomos que ganham elétrons formam ânions, sendo que ganhar um
elétron leva a ânions com carga -1, ganhar dois elétrons leva a ânions
com carga -2.

Você pode explicar esta reação com base nas propriedades periódicas
estudadas anteriormente: elementos do grupo 1 e 2, do grupo principal,
apresentam energias de ionização baixas (tendem a perder elétrons facil-
mente), enquanto elementos do grupo 6 e 7 têm elevadas afinidades eletrô-
nicas (tendem a receber elétrons). Estas características explicam também a
reação de cálcio e oxigênio, levando à formação do composto iônico óxido
de cálcio ( Ca 2+O2- ). Compostos como Ca 2O não existem, pois nenhum dos
dois átomos está com a camada de valência completa pela doação/recebi-
mento de elétrons. Pela mesma razão Na 2Cl não existe, portanto, é de grande
importância sabermos a configuração eletrônica dos elementos.

Reflita
Compostos como Ca 2O não existem, pois nenhum dos dois átomos
está com a camada de valência completa pela doação/recebimento de
elétrons. Pela mesma razão Na 2Cl não existe, portanto, é de grande
importância sabermos a configuração eletrônica dos elementos.

A ligação covalente se dá pelo compartilhamento de elétrons entre


átomos, podendo ocorrer o compartilhamento de um ou mais pares de
elétrons. Esta ligação ocorre na formação de compostos como H2 , H2O
e CH 4 . A representação dessas moléculas ocorre utilizando estruturas
de Lewis em que os pares de elétrons podem ser representados por traços
(Figura 1.10).
Figura 1.10 | Estrutura de Lewis de algumas moléculas

Fonte: elaborada pela autora.

Para desenharmos estruturas de Lewis dessas moléculas, devemos seguir a


regra do octeto que consiste em deixar todos os átomos com configuração de gás
nobre, ou seja, oito elétrons na camada de valência. Com exceção do H, Li e Be que
tendem a ficar com dois elétrons, configuração do gás nobre He.

28 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Exemplificando
Para construir estruturas de Lewis devemos:

1) Determinar a conectividade entre os átomos, por exemplo, para


o NH3 , temos o nitrogênio como átomo central, comumente são

átomos centrais C, N, P e S.
2) Contar o número total de elétrons de

valência de todos
os átomos. 3) Colocar um par de elétrons entre

cada par de átomos ligados para formar uma


ligação simples.
4) Completar os elétrons de valência.

Você pode verificar como são estes passos para o CH2O , aces-
sando o QR Code. Note que até no passo quatro, embora H e O
estejam com a camada de valência completa, o carbono não está.
Neste caso, mova um par de elétrons de um dos átomos terminais
para uma nova ligação, como no passo cinco.

Em algumas estruturas como o HCN, carbono e nitrogênio


compartilham três pares de elétrons, formando uma ligação tripla
( H - C º N ). Para o gás ozônio ( O3 ) existem duas possibilidades de
estruturas de Lewis, A e B, que se interconvertem, como descrito na
Figura 1.11. As duas estruturas são equivalentes, entretanto, nenhuma
delas representa corretamente a molécula de ozônio que possui ligações
O-O apenas de um tamanho, intermediário à ligação simples e dupla.
A estrutura correta que representa esta molécula é um híbrido entre
as duas estruturas, chamado híbrido de ressonância. A interconversão
entre estruturas equivalentes é chamada de ressonância, note que a seta
que representa a ressonância deve sempre ser « .

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 29


Figura 1.11 | Estrutura de Lewis e híbrido de ressonância para O3

Fonte: elaborada pela autora.

Embora a regra do octeto funcione a maioria das vezes, algumas


moléculas atingem estabilidade com menos ou mais de oito elé-
trons na camada de valência. Você pode observar isso acessando
o QR Code.

Você deve usar estruturas de Lewis como uma boa representação das
moléculas, sendo elas neutras ou não. Utilizando estruturas de Lewis para
moléculas como HNO-3 , há diferença em qual átomo a carga negativa está?
Sim, as cargas negativas e positivas influenciarão onde as reações devem
ocorrer. Determinar a posição da carga consiste em calcular a carga formal
(CF) dos átomos em uma estrutura de Lewis: CF = ECV - [EI + 1 2 EL] , em
que ECV são os elétrons da camada de valência, EI elétrons isolados e EL
elétrons ligantes. EI são os elétrons não compartilhados em ligações e EL são
os elétrons que são compartilhados com outros átomos, lembre-se de que a
ligação representa sempre dois elétrons.
Vamos analisar três moléculas, água, uma das estruturas de ressonância
do CO23- e NO-3 . A água é uma molécula neutra, portanto, a soma de todas
as suas cargas formais deve ser 0, sendo que aqui todos os átomos possuem
CF =0 (Figura 1.12). Já no CO23- , a carga total deve ser 2-, pois como vemos
na Figura 1.12, temos dois oxigênios com carga -1 cada um. Finalizando, o
ânion NO-3 possui carga formal em todos os átomos, entretanto, a soma total
é a carga da molécula.
Figura 1.12 | Exemplos de cálculo de cargas formais

Fonte: elaborada pela autora.

30 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Embora até agora não tenhamos mencionado nada sobre ângulo
entre as ligações em moléculas, estes ângulos podem variar, levan-
do a diferentes geometrias moleculares. Um modelo que serve
para prever a geometria de uma molécula é baseado na repulsão
dos pares de elétrons das camadas de valência (RPECV), em que a
geometria depende do número de ligantes e também do número
de pares de elétrons que não participam de ligações (isolados) no
átomo central da molécula. Você pode ver as geometrias mais co-
muns para diversas moléculas acessando o acessando o QR Code.

Até agora, vimos ligações covalentes como puras (apolares), ou seja, os átomos
dividem igualmente o par de elétrons. Entretanto, isso é válido apenas quando
temos dois átomos idênticos, como na molécula do gás cloro (Cl-Cl). Ligações
como O-H presentes na água são ditas ligações covalentes polares, ou seja, um
dos átomos atrai o par de elétrons com maior força. Lembre-se de que átomos
diferentes seguram seus elétrons da camada de valência com diferentes forças,
ou aceitam elétrons extras com maior ou menor facilidade (energia de ionização
e afinidade eletrônica), isso ocorre mesmo eles estando ligados. Linus Pauling
(1901-1994) propôs um parâmetro calculado a partir de Afinidade Eletrônica
(AE) e Energia de Ionização (EI), capaz de prever a polarização da ligação, a eletro-
negatividade ( c ). Os valores de eletronegatividade são conhecidos e tabelados,
podendo ser consultados na bibliografia sugerida na unidade. A eletronegatividade
dos átomos também é uma propriedade periódica, aumentando da direita para
a esquerda na tabela periódica e diminuindo de cima para baixo. Ligações como
HF são altamente polarizadas, pois a eletronegatividade do F é a maior da tabela,
4,0, e H é 2,2. Quando a diferença de eletronegatividade é muito grande, ocorre a
transferência total do par de elétrons, formando um composto iônico, como no
caso do NaCl (valores de eletronegatividade Na = 0,9 e Cl = 3,2). Na Figura 1.13,
vemos a diferença entre os tipos de ligações, note que como o átomo apresenta
apenas uma carga parcial na ligação covalente polar e não total como na ligação
iônica, o símbolo utilizado é d + ou d - para cargas parciais positivas ou negativas,
respectivamente (KOTZ, 2016, p. 387).
Figura 1.13 | Exemplos de ligações covalentes e iônica

Fonte: elaborada pela autora.

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 31


Saiba mais
Você lembra que mencionamos que moléculas apresentam diferentes
geometrias? Para determinarmos a polaridade de uma molécula com
mais de 2 átomos, precisamos saber sobre esta geometria e somar o
efeito de polaridade de todas as ligações. Assim, sabemos se moléculas
são polares como a água, ou apolares como o metano. Você pode
aprender mais sobre isso consultando ATKINS, P.; Jones, L. Princípios de
química: questionando a vida moderna e o meio ambiente. 5. ed. Porto
Alegre: Bookman, 2009.

Lembre-se de que você tem acesso ao livro pela biblioteca virtual na sua
área do aluno.
Então, vimos que moléculas podem ser formadas por ligações covalentes
e compostos iônicos por ligações iônicas. Como ocorre a ligação nos metais?
Os compostos metálicos são bons condutores elétricos e térmicos, brilhosos
e flexíveis. Características que não encaixam como compostos formados
por ligações covalentes nem como nos formados por ligações iônicas, em
sua totalidade. Realmente, entre átomos metálicos temos outros tipos de
ligações, as ligações metálicas.
Para você começar a entender a ligação metálica, precisa lembrar que
elementos pertencentes aos metais possuem baixa energia de ionização,
ou seja, eles perdem elétrons da camada de valência com facilidade. Agora,
vamos analisar o elemento lítio, ele possui apenas um elétron na camada de
valência e para atingir a regra do octeto, precisa de mais sete elétrons. Os
elétrons da camada de valência do lítio têm liberdade de movimento, devido
a sua baixa energia de ionização. Neste contexto, se tivermos oito átomos
de lítio, teremos uma camada de valência completa, sendo que os elétrons
estarão livres em torno dos átomos, formando um mar de elétrons. Uma
representação da ligação metálica está descrita na Figura 1.14.
A força da ligação metálica é maior em elementos que perdem mais
elétrons com facilidade, como o alumínio que forma o cátion Al 3+ , pois há
uma maior interação do cátion
Figura 1.14 | Representação da ligação metálica
com os elétrons quando compa-
rado com cátions de carga +1.
Agora que você sabe o que é
uma ligação metálica, podemos
analisar um pouco algumas
propriedades desses compostos.
O fato dos elétrons estarem se
movendo em torno dos cátions
Fonte: adaptada de Maia e Bianchi (2007, p. 109-110).

32 - U1 / Átomos, moléculas e íons


faz com que ao aplicarmos pressão não ocorra o mesmo efeito que em
compostos iônicos, a repulsão. Com isso, os compostos metálicos são flexí-
veis e não quebradiços.
O mar de elétrons explica também a boa condutividade elétrica, pois
independente do movimento dos elétrons, sempre haverá núcleos positivos
em sua volta. Ao aquecermos um pedaço de metal, fornecemos energia para
os elétrons, que aumentam sua energia cinética. Uma vez que existe mobili-
dade, esses elétrons transferem a energia a outros pontos, aquecendo todo o
metal após algum tempo.
Se analisarmos as propriedades periódicas de energia de ionização, ao
compararmos átomos mais à direita da tabela periódica com átomos do
grupo 1 e 2, as propriedades metálicas vão modificando, ou seja, compostos
metálicos do grupo 1 e 2 tendem a ser mais maleáveis que compostos metálicos
de cobre, por exemplo. Para unir propriedades de diferentes metais, ou ainda
modular propriedades de interesse, utiliza-se a formação de ligas metálicas.
Estas ligas nada mais são que uma mistura de dois ou mais metais, ou metais
e não metais (sempre com a predominância de metais) em estado líquido,
com posterior resfriamento. Um exemplo de liga bastante utilizado é o ouro
18 quilates, em que prata ou cobre são adicionados para deixar o ouro menos
maleável, possibilitando sua aplicação na fabricação de joias. No Quadro 1.2
podemos conhecer alguns tipos de ligas.
Quadro 1.2 | Exemplos de ligas metálicas
Liga Composição
Aço Ferro e carbono
Aço inoxidável Ferro, carbono, níquel e crômio
Bronze Cobre e estanho
Latão Cobre e zinco
Ouro 18 K Ouro (75%) e prata e/ou cobre (25%)

Fonte: Maia e Bianchi (2007, p. 111).

Além das ligações químicas, consideradas fortes, existem forças


entre moléculas próximas que não são tão intensas quanto uma ligação,
as chamadas interações ou forças intermoleculares. Estas forças são
responsáveis pela solubilidade de um composto em outro (em qualquer
um dos estados), ou ainda pela forma que as moléculas adotam no
espaço, como o DNA que existe como uma dupla hélice. Veremos as
interações intermoleculares uma a uma:
1) Ligação de hidrogênio: das forças intermoleculares, esta é a mais
forte, ocorrendo apenas em moléculas que contenham as ligações N-H,

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 33


O-H e F-H. Nestas moléculas o hidrogênio está ligado a átomos bastante
eletronegativos, levando a ligações fortemente polarizadas. Isso resulta
em uma elevada deficiência de carga no átomo de H, que assume uma
carga positiva parcial, enquanto o elemento eletronegativo assume uma
carga parcial negativa. Com isso, ocorre uma atração entre as cargas
opostas de moléculas vizinhas, levando a uma forte interação entre
elas. Até pouco tempo, esta interação era chamada de ponte de hidro-
gênio, porém devido à sua força, passou a ser nomeada como ligação de
hidrogênio. Por exemplo, para a água temos a Figura 1.15a, mostrando
como as moléculas se ligam, em 1.15B mostramos a interação dos pares
de elétrons. A ligação de hidrogênio é representada por uma ligação
pontilhada para qualquer um dos três átomos eletronegativos, como
desenhado na Figura 1.15C.
Figura 1.15 | Ligações de hidrogênio: A) olhar geral, B) pares de elétrons e C) ligação de hidrogênio

Fonte: elaborada pela autora.

É esperado que moléculas semelhantes contendo átomos de um


mesmo grupo apresentem um padrão de aumento do ponto de fusão
e de ebulição à medida que aumenta o tamanho molecular. Ao compa-
rarmos moléculas semelhantes do grupo do carbono (4A), observamos
esta tendência, sendo que o metano ( CH 4 ) apresenta o menor ponto de
ebulição, enquanto SnH 4 apresenta o maior ponto de ebulição (Figura
1.16). Entretanto, ao compararmos moléculas do grupo do oxigênio
(6A), o esperado era que a água apresentasse o menor ponto de ebulição
e H2Te o maior, porém a água tem o maior ponto de ebulição entre as
moléculas semelhantes deste grupo. O mesmo ocorre nos grupos 5A
(do nitrogênio) e 7A (do flúor). Esta observação experimental pode ser
justificada pela presença de ligações de hidrogênio, já que os elementos
que formam moléculas com esta alteração são os mais eletronegativos
(O, F, N). A presença de interações intermoleculares faz com que seja
necessária mais energia para separar as moléculas e elas passarem ao
estado gasoso.

34 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Figura 1.16 | Pontos de ebulição de moléculas dos grupos 4, 5, 6 e 7A

Fonte: adaptada de Kotz et al. (2014, p. 527).

2) Interação íon-dipolo: quando falamos em ligações covalentes polares,


você aprendeu que a diferença de eletronegatividade levava à formação de
polos de cargas parciais negativa ( d - ) e positiva( d + ). Quando temos um
íon na presença de uma molécula polar, ocorre uma interação entre este íon
com o polo de carga oposta à sua. Cátions serão atraídos pela carga parcial
negativa, enquanto ânions serão atraídos para a carga parcial positiva. Esta
interação é eletrostática, portanto, quanto mais próximos estiverem o íon
e o dipolo, maior será a atração, para íons com maiores cargas, a atração
também será maior, valendo o mesmo para o momento de dipolo, quanto
maior, maior a força atrativa (Figura 1.17). Quando estamos dissolvendo íons
em água, é esta força que está em vigor. Este processo sofre uma variação de
entalpia, conhecida como energia de solvatação, ou entalpia de hidratação.
Quanto mais energia é liberada no processo de solvatação, maior a interação
entre o íon e a molécula.
Figura 1.17 | A) Solvatação do NaCl pela água e B) interação água ´ cátions

Fonte: elaborada pela autora.

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 35


3) Interação dipolo-dipolo: em moléculas polares, quando a diferença de
eletronegatividade não é tão grande, não ocorre a formação de ligações de hidro-
gênio, mesmo havendo polos parciais positivos e negativos. Este é o caso de ligações
como H-Cl, onde ocorre a formação de polos, que levam a interações eletrostáticas
entre as moléculas, chamada dipolo-dipolo, podendo ser representada como na
Figura 1.18. Quando duas moléculas estão com os polos opostos próximos, elas
se mantêm nesta posição mais tempo que quando temos polos de mesmo sinal
próximos, este efeito resulta em uma força líquida atrativa, mantendo as moléculas
unidas. Fique atento, pois a fase gasosa apresenta maior liberdade de organização
que a líquida, sendo a menor liberdade observada na fase sólida.

Com relação ao ponto de


Figura 1.18 | Interação dipolo-dipolo para a mo-
ebulição, quanto maior o momento lécula de HCl
de dipolo de uma molécula ( m ),
maior será o seu ponto de ebulição,
pois maior será a interação dipolo-
-dipolo. Para podermos realizar
esta comparação, devemos utilizar
moléculas de massa molar (MM)
semelhantes, como na série de
Fonte: adaptada de Maia e Bianchi (2007, p. 527).
moléculas: propano ( CH3CH2CH3 ,
m = 0,1 D e PE = -42 °C), éter dimetílico ( CH3OCH3 , m = 1,3 D e PE = -25°C),
cloreto de metila ( CH3Cl , m = 1,9 D e PE = -24 °C), acetaldeído ( CH3CHO ,
m = 2,7 D e PE = 21 °C) e acetonitrila ( CH3CN , m = 3,9 D e PE = 82 °C).
4) Interação dipolo-dipolo induzido: moléculas que possuem um dipolo
permanente podem induzir dipolos temporários em moléculas apolares. Isso
ocorre porque a nuvem eletrônica da molécula polar, ao se aproximar da molécula
apolar, induz uma alteração nesta segunda nuvem, como quando temos água na
presença de O2 . Oxigênio é uma molécula apolar (nuvem eletrônica igualmente
dividida entre os dois átomos) e a água já sabemos que é polar. Ao se aproxi-
marem, estas duas moléculas se atraem, pois o polo negativo da água induz um
polo positivo na molécula de oxigênio, isto permite, por exemplo, dissolvermos
oxigênio em água (Figura 1.19). Esta indução de uma nuvem eletrônica em outra
é a polarização, e quanto mais facilmente isso ocorre, mais polarizável é a molécula
que tem a nuvem influenciada.
Figura 1.19 | Interação água – oxigênio gasoso 5) Interações
de London (dipolo
induzido-dipolo
induzido): embora
moléculas apolares
possuam nuvens
Fonte: elaborada pela autora.

36 - U1 / Átomos, moléculas e íons


eletrônicas igualmente divididas entre os dois átomos, em determinados
momentos, atrações e repulsões instantâneas entre núcleos e elétrons vizinhos
fazem com que ocorram dipolos momentâneos; quando moléculas vizinhas
apresentam este dipolo momentâneo induzido pela vizinhança ocorre
interação dipolo induzido-dipolo induzido (Figura 1.20). Estas interações
levam à diminuição da energia do sistema, estabilizando-o.
Figura 1.20 | Interações de London

Fonte: elaborada pela autora.

As forças intermoleculares apresentam energias diferentes, sendo que


quanto maior a energia típica, maior a sua força. A energia de uma interação
eletrostática forte íon-íon apresenta energia típica de 250 kJ/mol. As ligações de
hidrogênio são em média 10 vezes mais fracas (cerca de 20 kJ/mol). Interações
entre moléculas polares íon-dipolo e dipolo-dipolo possuem energia de 15 e
2 kJ/mol, respectivamente. Nas moléculas apolares (dipolo induzido-dipolo
induzido e de London) apresentam energia típica de 2 kJ/mol (ATKINS; DE
PAULA, 2010, p. 172). As interações íon-dipolo, dipolo-dipolo, dipolo-indu-
zido e London são conhecidas como forças de van der Walls.

Sem medo de errar


Você precisa resolver o problema na empresa em que você é trainee, anali-
sando o lote de células fotovoltaicas. Até aqui você entendeu o processo de
funcionamento como um fluxo de elétrons e também algumas características
dos elementos envolvidos. Contudo, ainda não entendeu por que uma placa
possui átomos de silícios e fósforo, quanto outra possui átomos de silício e
boro. As placas de silício, sem nenhum outro elemento, são átomos de silício
conectados entre si por ligações covalentes simples. Como os átomos estão
conectados? Esta é a primeira pergunta que você precisa responder. Temos o
boro e o fósforo ligados ao silício, então sabemos que não é ligação metálica,
pois não ocorre entre metais. As eletronegatividades dos elementos são: B
c = 2,0 ; P c = 2,2 e Si c =1,9 . Observe que como Dc (entre silício e os
outros dois elementos) não é grande, não temos ligações iônicas, estando
o silício ligado ao P e ao B por ligações covalentes. Como vimos na seção
anterior, o silício possui camada de valência 3s 2 3 p2 , tendo quatro orbitais
vazios, podendo realizar quatro ligações. Logo, temos um átomo de silício
ligado a outros quatro.

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 37


Quando substituímos um átomo de silício por fósforo, temos uma
ligação silício-fósforo. O fósforo apresenta camada de valência 3s 2 3 p3 ,
podendo realizar três ligações, porém, por estar no 3o período, o fósforo
pode expandir sua camada de valência e receber quatro elétrons. Ao substi-
tuirmos um átomo de silício por um fósforo, temos o fósforo com um elétron
excedente, como na Figura 1.21.
Figura 1.21 | Cristal de silício dopado com fósforo

Fonte: elaborada pela autora.

Com relação ao boro, vimos, nesta seção, que ele foge à regra do octeto
por permanecer estável mesmo com um orbital vazio. Ao substituirmos um
átomo de silício por um átomo de boro no cristal, teremos orbitais vagos para
receber elétrons (Figura 1.22).
Você lembrou que para Figura 1.22 | Cristal de silício dopado com boro
ocorrer o funcionamento
da célula, a placa contendo
elétrons livres deve ficar
voltada para o sol, para que
o processo de excitação de
elétrons movimente e faça com
que ocorra o fluxo para a placa
que possui a capacidade de
receber elétrons. Agora você
sabe que a placa contendo Si-P
possui elétrons livres e que a
placa Si-B recebe elétrons. Com
estas informações, você foi até a
linha de produção e evidenciou
que no dia de fabricação do
lote não funcional de células, Fonte: elaborada pela autora.

38 - U1 / Átomos, moléculas e íons


ocorreu a troca de placas contendo Si-P por placas de silício apenas, que
não possuem características suficientes para tornar a célula efetiva. Bastou,
então, trocar uma parte das células do lote em destaque para que nem todo o
trabalho fosse perdido.
Entretanto a eficiência da célula ainda não está de acordo. Apesar de ter
solucionado parte do problema, algo pode ainda estar impedindo o funcio-
namento correto das células.

Avançando na prática

Escolha de solventes: polaridade de ligações

Descrição da situação-problema
Vamos imaginar que você está trabalhando em uma fábrica de insumos
químicos aplicados à agricultura e seu gestor solicitou que você selecione
solventes a serem aplicados em diferentes reações químicas, entre uma lista
de três solventes: água, cicloexano e etanol. Ele também disse a você que a
água é um solvente polar, seguido em polaridade pelo etanol. Já o cicloexano
é um solvente apolar. Sabendo que você estava no início do seu aprendizado
em química, ele informou que sais (compostos iônicos) são bastante solúveis
em água e que compostos polares dissolvem moléculas polares, assim como
apolares dissolvem moléculas apolares. Para selecionar os solventes a serem
empregados, você deve pegar a lista de compostos químicos e analisar quais
as ligações envolvidas em cada molécula. Sua lista de reagentes continha:
eteno ( H2C = CH2 ), cloreto de alumínio ( AlCl 3 ) e cloreto de metila
( CH3Cl ). Vamos começar nossa análise e escolher quais os solventes que
atuam melhor na solubilização de cada molécula.

Resolução da situação-problema
Inicialmente precisamos avaliar a eletronegatividade dos átomos envol-
vidos em cada molécula e determinar se as ligações são iônicas ou covalentes.
Vamos utilizar os dados da tabela a seguir:
Tabela 1.1 | Eletronegatividade de elementos selecionados

Elemento Eletronegatividade ( c )
Carbono (C) 2,5
Hidrogênio (H) 2,2
Alumínio (Al) 1,6

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 39


Elemento Eletronegatividade ( c )
Enxofre (S) 2,6
Cloro (Cl) 3,2
Fonte: Kotz et al. (2016, p. 382).

Analisando esta tabela, você observa que das moléculas mencionadas,


apenas o alumínio e o cloro apresentam grande Dc , sendo este composto
o único iônico da lista. O alumínio apresenta camada de valência contendo
3s²3 p¹ , já o cloro apresenta camada de valência 3s²3 p5 . Como temos três
átomos de cloro e um de alumínio, este perde três elétrons de sua camada de
valência. Como seu gestor informou, compostos iônicos são solúveis em água.
Os compostos H2C = CH2 e CH3Cl são moléculas contendo ligações
covalentes. As diferenças entre as duas é que, a ligação C-Cl apresenta uma
maior polaridade que C-H. Fazendo a estrutura de Lewis e consultando a
geometria das moléculas, temos as estruturas descritas na Figura 1.23.
Figura 1.23 | Estruturas de Lewis e geometria molecular de eteno e clorometano

Fonte: elaborada pela autora.

Com estes dados, observamos que devido ao fato do eteno ser simétrico,
ele é apolar. Já o clorometano é uma molécula polar. Com isso, para solubi-
lizar essas moléculas devemos usar cicloexano e etanol, respectivamente.

Faça valer a pena


1. Em 1916, os químicos Gilbert N. Lewis (1875-1946) e Walter Kossel, independente-
mente, propuseram que a conexão dos átomos ocorria de modo que os elementos adquirem
oito elétrons na camada de valência, o que equivale a dizer que eles assumem a configuração
do gás nobre mais próximo (MAIA; BIANCHI, 2007; KOTZ et al. 2016).

A ligação iônica ocorre quando os elétrons são totalmente transferidos de um elétron


para outro. Sobre este tipo de ligação, é correto afirmar:

a) Átomos não metálicos comumente realizam ligações iônicas, formando cátions.


b) Na ligação iônica, a atração entre os átomos é fraca.
c) A ligação iônica é a força da atração eletrostática (interação entre cargas opostas).
d) Compostos que perdem elétrons na ligação iônica formam ânions.
e) Compostos que ganham elétrons na reação iônica formam cátions.

40 - U1 / Átomos, moléculas e íons


2. Compostos metálicos são bons condutores elétricos, bons condutores térmicos,
brilhosos e flexíveis. Características que não encaixam nem nas ligações covalentes
nem nas ligações iônicas em sua totalidade. Realmente, entre átomos metálicos temos
outros tipos de ligações, as ligações metálicas.
O elemento lítio possui apenas _____ na camada de valência e para preencher a
última camada precisa de mais ___________. Os elétrons da camada de valência do
lítio têm liberdade de movimento, devido a sua baixa _________________. Neste
contexto, se tivermos oito átomos de lítio, teremos uma camada de valência completa,
sendo que os elétrons estarão livres em torno dos átomos. De fato, isto define bem
uma ligação_________: íons positivos sendo parte de uma rede cristalina, rodeados
por elétrons.

Qual das alternativas completa corretamente a sentença?

a) três elétrons, cinco elétrons, energia de ionização, iônica.


b) três elétrons, cinco elétrons, afinidade eletrônica, covalente.
c) quatro elétrons, quatro elétrons, energia de ionização, metálica.
d) dois elétrons, seis elétrons, afinidade eletrônica, covalente.
e) um elétron, sete elétrons, energia de ionização, metálica.

3. As interações intermoleculares ocorrem tanto em moléculas polares quanto


apolares. Elas são responsáveis por inúmeras propriedades dos líquidos e isso explica
diversos comportamentos, mas também torna uma descrição precisa dos líquidos
mais difícil.

Sobre as interações intermoleculares, a alternativa que contém alguns dos tipos de


interação da mais fraca para a mais forte é:

a) Dipolo-dipolo, íon-dipolo, induzido-dipolo.


b) London, ligação de hidrogênio, íon-dipolo.
c) Íon-íon, London, ligação de hidrogênio.
d) London, íon-dipolo, ligação de hidrogênio.
e) Ligação de hidrogênio, London, íon-dipolo.

Seção 1.2 / Ligação química e estrutura molecular - 41


Seção 1.3

Moléculas e íons

Diálogo aberto
Quando você vai ao supermercado, como você compra os produtos
da sua lista? Alguns são por unidades, alguns por peso e outros
agrupados em pacotes, como é o caso dos ovos, que você pode comprar
em dúzia. Tudo isso diz respeito à quantidade de matéria, como neste
último exemplo dos ovos. Mas você já se perguntou como vemos a
quantidade de matéria ao falarmos de átomos, moléculas e íons, que são
espécies de tamanho tão pequeno que não conseguimos contar? E você
já se perguntou por que compostos químicos podem ser tão diferentes?
Agora falaremos sobre isso, os compostos que as diferentes ligações
fornecem e como fazemos para saber a sua quantidade de matéria.
Na indústria que você está trabalhando, ficou sob sua responsabili-
dade analisar a razão de um lote de células fotovoltaicas não estar funcio-
nando. Inicialmente você estudou o processo e os materiais envolvidos,
entendendo como que a célula funcionava. Na sequência, você desco-
briu que a montagem da célula estava incorreta. Porém, ao inverter as
placas o rendimento da célula continuou abaixo do esperado. Como a
célula fabricada pela empresa envolve placas de silício (Si) dopadas com
fósforo (P) e boro (B), você resolveu verificar o processo de fabricação
das placas. As pesquisas realizadas pela empresa no desenvolvimento
das suas células fotovoltaicas, indicaram que a dopagem ideal consiste
em 1 parte por milhão (ppm) do agente dopante em relação ao silício.
Você verificou no setor de produção das placas que no processo de
obtenção das placas estavam sendo adicionados 8´10-5 mol de fósforo
para 1 mol de silício para uma placa, e 3´10-6 mol de boro por mol de
silício para outra. Seu trabalho consiste em verificar se estas quanti-
dades estão corretas e tentar resolver o problema de baixo rendimento
das placas, mantendo a premissa inicial de baixo custo para a resolução
do problema.
Você vai precisar do conceito de mol que será visto nesta seção.
Além de prover medidas, o conceito de mol também permitirá que você
determine fórmulas moleculares. Outro ponto importante que veremos
nesta seção é sobre como descrevemos a quantidade de reagentes
em soluções.
Vamos começar a construir os conhecimentos necessários para
entender e acompanhar reações químicas!

42 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Não pode faltar
Agora você já sabe que os átomos se conectam através de ligações
químicas (chamadas primárias) que podem ser iônicas, covalentes ou
metálicas. Dependendo do tipo de ligação, os compostos terão características
e propriedades diferentes.
Os compostos iônicos não são moléculas, ou seja, não são pares ânions-
-cátions isolados, mas sim íons arranjados em um retículo tridimensional,
sendo que cada um está em contato com mais de um vizinho. A estrutura
de cada retículo depende da carga dos íons e de seus tamanhos. Embora
NaCl seja representado como molécula, precisamos saber que esta é apenas a
proporção entre Na + e Cl - no retículo (Figura 1.24).
A formação destes retículos Figura 1.24 | Retículo cristalino NaCl
aumenta a estabilidade das
espécies formadas na ligação
iônica. Podemos dizer que a
formação do retículo cristalino
libera energia para o meio ao
ser formado, sendo que quanto
maior este valor, mais estável o
retículo é e mais fácil ocorre a
sua formação. Fonte: elaborada pela autora.

Compostos iônicos possuem como características serem duros e quebra-


diços, o que podemos explicar devido à interação de cargas. A dureza se
dá pela interação entre cargas negativas e positivas, porém, ao aplicarmos
pressão em um retículo cristalino, ocorre o deslizamento entre camadas,
levando à interação entre cargas de mesmo sinal, que se repelem, resultando
na quebra (clivagem) (Figura 1.25).
Figura 1.25 | Clivagem de um cristal iônico com apli- Outras características
cação de força dos compostos iônicos
- + - + - + - + - - + - dizem respeito a elevados
+
- + - + - +
- + + - + pontos de fusão e ebulição,
- + - + - + - + - - + - já que a atração entre íons
- - - - + + - + no retículo é grande, sendo
+ + + +
necessária mais energia para
Força Força Ponto de quebra romper as ligações interiô-
nicas. Compostos iônicos
Fonte: adaptada de Maia e Bianchi (2007, p. 80).
são péssimos condutores de
eletricidade devido à sua estrutura rígida, que não permite o movimento
de elétrons. A solubilidade de compostos iônicos em água é grande, o que
pode ser explicado pela interação de cátions com a densidade de carga ( d )

Seção 1.3 / Moléculas e íons - 43


negativa da água (sobre o átomo de oxigênio) e de ânions com a densidade de
carga positiva da água (sobre os átomos de hidrogênio), como representado
na Figura 1.26.
A água que solubi- Figura 1.26 | Solubilização de compostos iônicos
liza os íons de compostos em água
iônicos é um composto
molecular, formado por
ligações covalentes. Estes
compostos são repre-
sentados por fórmulas
moleculares condensadas,
sendo a molécula a menor
parte identificável de uma
substância pura, ou uma
Fonte: elaborada pela autora.
substância complexa, como
a glicose ( C 6H12O6 ) ou a
água ( H2O ). Precisamos tomar cuidado quando falamos em fórmula conden-
sada, pois algumas fórmulas podem descrever compostos bem diferentes em
termos de propriedades, como C 2H6O que descreve tanto o etanol, quanto o
éter dimetílico (Figura 1.27).
Figura 1.27 | Fórmula molecular C 2 H6O , etanol ou éter dimetílico?

Fonte: elaborada pela autora.

Saiba mais
Você pode aprender mais sobre a construção de moléculas utilizando o
simulador no site do Phet. da Universidade do Colorado.
PHET Interactive Simulations. Build a Molecule.

Nas moléculas covalentes, o tamanho das ligações entre os átomos


depende de uma série de fatores, como o tamanho dos átomos e o tipo de
ligação. Você lembra que o raio atômico é medido como a distância entre os
núcleos dos átomos da ligação? Então, quanto maior o raio atômico, maior
a ligação. Podemos observar isso claramente nas ligações entre halogênios
(representados por X) e hidrogênio. O flúor é elemento que apresenta o
menor raio atômico, portanto, o menor átomo, assim a ligação H-F é a menor

44 - U1 / Átomos, moléculas e íons


ligação realizada pelo átomo de hidrogênio, já iodo é o maior átomo, logo
H-I é a maior. O tamanho das ligações X-H é H-F < H-Cl < H-Br < H-I . O
comprimento de ligação é importante na determinação do tamanho total e
da forma de uma molécula.
Quando falamos de estruturas de Lewis, vimos que algumas ligações eram
simples (com apenas um par de elétrons compartilhados), duplas ou triplas.
Estas últimas, com dois pares de elétrons e três pares, respectivamente.
Assim, chamamos de ordem da ligação o número de pares de elétrons que é
compartilhado em uma ligação por dois átomos, como vemos na Figura 1.28.
Figura 1.28 | Ordem da ligação

Fonte: elaborada pela autora.

Como foi mencionado, o tamanho da ligação sofre influência da ordem da


ligação, sendo que quanto maior a ordem da ligação, menor o tamanho da ligação.
A ligação simples carbono-oxigênio tem tamanho de 143 pm (picômetro), a
ligação dupla carbono-oxigênio 122 pm e a ligação tripla 113 pm.

Reflita
O ozônio apresenta uma fórmula molécula O3 . Como os átomos estão
ligados? A melhor representação para esta molécula é através de uma
estrutura de ressonância (Figura 1.29). Neste caso, as ligações entre
o átomo central e os átomos de cada ponta apresentarão tamanhos
diferentes entre si? E com relação a uma típica ligação entre átomos de
oxigênio, qual é o tamanho destas ligações?

Figura 1.29 | Ozônio – estrutura de ressonância

Fonte: elaborada pela autora.

Outra característica importante de compostos covalentes é que a ligação


possui uma energia, que é absorvida ou liberada quando a rompemos. Esta
energia é chamada de energia de dissociação de ligação (D) e ocorre quando
os reagentes e produtos estão em fase gasosa. Quando a energia é fornecida
ao sistema, temos um valor positivo e quanto mais positivo o valor, mais forte

Seção 1.3 / Moléculas e íons - 45


é a ligação que se rompeu. Se observarmos a quebra das ligações carbono-
-carbono, veremos que a ligação tripla é mais estável que a dupla, que é mais
estável que a simples (KOTZ et al., 2016, p. 394):
H3C-CH3 (g) ® H3C (g) +CH3(g) D = +346 kJ
H2C=CH2 (g) ® H2C (g) +CH2(g) D = +610 kJ
HC º CH (g) ® HC (g) +CH(g) D = +835 kJ

Sobre as propriedades físicas, os compostos moleculares mais simples são


comumente gases ou líquidos, sendo sólidos apenas em estruturas maiores,
como a mencionada glicose ( C 6H12O6 ).
Quando falamos em moléculas e compostos iônicos, como podemos
nos referir às quantidades? Quando você vai ao supermercado, você compra
ovos em dúzias, não é? Dúzia é uma unidade de medida que corresponde
a 12 unidades de ovos. Para moléculas, utilizamos o mol, que corresponde
a 6,022 ´ 1023 moléculas. Se você compra um pacote de 12 latas de refrige-
rantes e pesa, você determina o peso de uma dúzia de refrigerantes.

Assimile
1 mol de qualquer matéria contém o mesmo número que existem de
átomos em 12 g de carbono-12.
Se em 12 g de carbono-12 existem 6,022 ´ 1023 moléculas, 1 mol de
canetas, por exemplo, corresponde a 6,022 ´ 1023 canetas. A massa
deste 1 mol de canetas dependerá do peso individual de cada caneta.

Assim, 1 mol de átomos, moléculas ou íons, corresponde a 6,022 ´ 1023


átomos, moléculas ou íons. O número de íons, moléculas ou átomos por mol,
6,022 ´ 1023 mol -1 , é chamado de constante de Avogadro ( N A ), em homenagem
a Lorenzo Romano Amedeo Carlo Avogadro, que no século XIX estudou o
átomo. Lembre-se de que por ser uma unidade de medida, o mol pode ser usado
com prefixos, sendo o mmol = 1´10-3 mol e m mol = 1´10-6 mol.

Exemplificando
Em uma amostra de rocha foram encontrados 2,34´1025 átomos
de ferro. Isso corresponde a quantos mols de átomos de ferro?
Para responder a esta pergunta, precisamos estabelecer a
seguinte relação:

46 - U1 / Átomos, moléculas e íons


6,022´10 23 ___________1 mol
2,34´1025 _____________ x mol
25
2,34´10 × 1
x mol = = 38,8 mol
6,022´1023

Atenção
Ao falarmos em gramas estamos utilizando o plural, como na pergunta
“quantos gramas?” Mas ao utilizarmos a unidade de medida usamos no
singular 43 g. Para o mol é a mesma coisa, o plural de mol é mols (ou
moles), como na pergunta “quantos mols?” Mas quando utilizamos a
unidade de medida, como em 38,8 mol, não devemos colocar no plural.

Como não é possível contarmos os átomos diretamente com facili-


dade, para sabermos quantos átomos existem em uma determinada massa
de amostra, precisamos apenas saber a massa molar (MM), sua fórmula
molecular. Sendo que a massa molar de um elemento (em gramas) é a
quantidade de massa por mol de seus átomos, numericamente igual à massa
atômica em unidades de massa atômica: 1 mol de magnésio possui massa
molar de 24,3 g; 1 mol de carbono possui massa molar de 12 g; 1 mol de
silício possui massa molar de 28,09 g.

Exemplificando
- O chumbo possui massa atômica 207,2 u, portanto, 207,2 g de massa
molar. Isso significa que 1 mol de átomos de chumbo tem massa de 180
g, sendo que este é o peso de 6,022 ´ 1023 átomos de chumbo.
- A molécula de glicose ( C 6H12O6 ) possui 6 átomos de carbono, 12 de
hidrogênio e 6 de oxigênio, utilizando a massa molar de cada um dos
elementos, multiplicando pelo número de vezes que aparece, chegamos
a massa molar da glicose: 12×6 + 1×12 + 16×6 = 180 g .
1 mol de glicose contém 180 g de glicose, que corresponde a 6,022 ´ 1023 .
- Para compostos iônicos, devemos usar a representação da proporção
mínima entre o cátion e o ânion, a unidade-fórmula. Assim, a massa
molar do cloreto de sódio é dada pela soma das massas molares dos
átomos de sódio e cloro: 23 + 35,5 = 58,5 g/mol de cloreto de sódio.
- Já o cloreto de cálcio apresenta uma proporção de dois átomos de cloro
para um de cálcio (lembre-se de que o cálcio possui 2 elétrons na camada
de valência, sendo um elétron doado a cada átomo de cloro). Assim, a
massa molar do CaCl 2 é 35,5 × 2 + 40 = 111 g/mol de cloreto de cálcio.

Seção 1.3 / Moléculas e íons - 47


Quando falamos em mols, podemos fazer uma relação entre compo-
nentes que levam à formação de uma molécula, por exemplo, o metano,
constituído de átomos de carbono e hidrogênio (KOTZ et al., 2016):

Se voltarmos para a molécula de glicose ( C 6H12O6 ), é possível você calcular


a massa de carbono, hidrogênio e oxigênio em 1 mol de glicose. Basta usar as
relações que já conhecemos, envolvendo mol e a relação recém-apresentada, que
nos diz que 1 mol de glicose é obtido a partir de 6 mol de carbono:
12g C
Massa de C em 1 mol de glicose = 6 mol C × =72 g C/mol de glicose
1 mol C

Aplicando a mesma relação para H e O, temos que a massa de hidrogênio é 12


g e de oxigênio 96 g, ambas em 1 mol de glicose (180 g).
A composição molecular pode ser apresentada de três maneiras: 1) número de
átomos de cada tipo por molécula (ou unidade-fórmula), que é a fórmula molecular
do composto; 2) termos de massa de cada elemento por mol do composto, como
calculamos para o carbono, hidrogênio e oxigênio; 3) termos de porcentagem
em massa.
A porcentagem em massa consiste em quantos % da massa total temos de
massa do elemento. Sabendo que a massa da glicose é de 180 g temos:

massa de C em 1 mol de glicose 72


% em massa de C = ´ 100 = ´ 100 = 40%
massa de 1 mol de gllicose 180

Repetindo o cálculo, temos a porcentagem em massa para o hidrogênio e o


oxigênio de 6,67% e 53,3 %, respectivamente.
O cálculo inverso também pode ser realizado, sabendo a porcentagem em
massa de cada elemento, podemos chegar à fórmula molecular (ou unidade-fór-
mula) de um composto, basta sabermos a sua massa. Podemos usar o esquema da
Figura 1.30 para realizarmos este cálculo:
Figura 1.30 | Esquema para calcular a fórmula molecular a partir da porcentagem

Fonte: adaptada de Kotz et al. (2016, p. 96).

48 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Exemplificando
A análise de espectrometria de massas de um determinado composto
determinou sua massa molecular como sendo 206 g/mol. Já a análise
elementar deste composto apresentou 75,73% de carbono, 8,74% de
hidrogênio e 15,53% de oxigênio.
Para sabermos a fórmula molecular, precisamos verificar quanto de
massa corresponde a cada uma destas porcentagens:
206 g ______ 100 % da massa 1 mol de C _____ 12 g
x _______ 75,73 % de massa de C y _______ 156 g de C
x = 156 g de carbono y = 13 mol de átomos de C

206 g ______ 100 % da massa 1 mol de H _____ 1 g


x _______ 8,74 % de massa de H y _______ 18 g de C
x = 18 g de hidrogênio y = 18 mol de átomos de H

206 g ______ 100 % da massa 1 mol de O _____ 16 g


x _______ 15,53 % de massa de O y _______ 32 g de O
x = 32 g de oxigênio y = 2 mol de átomos de O
A proporção de átomos é 13 mol de carbono para 18 mol de H e 2
mol de oxigênio. Como esta é a menor proporção possível, mantendo
os números inteiros, temos que a fórmula molecular é C13H18O2 . Esta
fórmula pode corresponder ao composto ibuprofeno, molécula bioativa
com ação anti-inflamatória.

Estas relações entre massa e número de mols, assim como número de


mols dos produtos e reagentes, são o primeiro passo para aprendermos sobre
relações estequiométricas.

Sem medo de errar


Trabalhando em uma indústria fotovoltaica, você conseguiu descobrir
porque as células com defeito não estavam funcionando, mas mesmo assim
o rendimento encontrado foi baixo. Então, você resolveu investigar o proce-
dimento de fabricação das placas, em outro setor da indústria. O processo
utilizado tinha as proporções de 8´10-5 mol de fósforo para 1 mol de silício
em uma placa e 3´10-6 mol de boro para 1 mol de silício em outra. Foi lhe
passado que o ideal para o funcionamento da célula fotovoltaica da empresa
é de 1 ppm (em massa) de dopante no silício, garantindo o bom rendimento.
Para saber se o processo estava ocorrendo de maneira correta, você precisa
descobrir quantos mols teóricos de fósforo e boro devem ser utilizados para

Seção 1.3 / Moléculas e íons - 49


comparar os valores experimentais que lhe foram passados pelo setor de
fabricação das placas na empresa.
1) Fósforo: primeiro devemos saber quanto corresponde 1 parte por
milhão de fósforo em silício.
1 ppm = 1 g em 1000000 g ( 1´106 g) de silício. Vamos supor que uma
quantidade de silício utilizada no processo é de 100 kg, que devem ser
passados para gramas. Fazendo a conta de quanto seria 1 parte por milhão
desta massa temos:
1 g P ____ 1´106 g Si ___ 1 ppm de P em Si
x g P ____1´105 g Si
x = 0,1 g de P

Continuando a análise, será necessário passar estes valores para mol.


Consultando a tabela periódica, você irá observar que a massa molecular do
fósforo é de 31 g/mol, e do silício é de 28 g/mol. Então você terá:

31 g de fósforo _____ 1 mol 28 g de silício _____ 1mol


0,1 g _____ x mol de P 1´105 g _____ x mol de Si
x = 0,0028 mol de P x = 3,6´102 mol de Si

Como temos o procedimento em proporção de mols de fósforo para 1


mol de silício, devemos concluir:

0,0028 mol P ______ 3,6´102 mol de Si


x mol P ______ 1 mol de Si
x = 7,8´10-6 mol de P para 1 mol de Si

2) Boro: você deverá seguir os mesmos passos anteriores para saber as


quantidades. Como passo inicial, você deve saber quanto de massa corres-
ponde 1 ppm de boro em silício. Vamos supor o mesmo processo que utiliza
100 Kg de silício (você poderia usar qualquer valor, pois assim como no
resultado do fósforo, obteremos no final uma proporção).

1 g Boro ____ 1´106 g Si ___ 1 ppm de B em Si


x g B ____1´105 g Si
x = 0,1 g de B

Agora, você deverá passar estes valores para mol. Novamente, consultando a
tabela periódica, você sabe que a massa molar do boro é de 10,8 g/mol. Realizando
os cálculos para o boro e repetindo a conta do silício teremos:

50 - U1 / Átomos, moléculas e íons


10,8 g de boro _____ 1 mol 28 g de silício _____ 1mol
0,1 g _____ x mol de Boro 1´105 g _____ x mol de Si
x = 0,0093 mol de B x = 3,6´102 mol de Si

Então, deverá ser obtida a proporção entre os dois valores:

0,0093 mol B ______ 3,6´102 mol de Si


x mol B ______ 1 mol de Si
x = 2,6´10-5 mol de B para 1 mol de Si

Com os resultados das proporções calculados para os dois agentes


dopantes, você deve comparar com os valores passados pelo setor de fabri-
cação das placas. Para o fósforo, eles utilizaram 8´10-5 mol de P para cada
mol de silício, quantidade acima da calculada ( 8´10-6 mol ). Já para o boro
foram utilizados 3´10-6 mol para cada mol de silício, quantidade abaixo da
necessária ( 2,5´10-5 mol ). Analisando a grandeza dos dois valores, você
pode supor que desde a fabricação ocorreu um erro de processo, em que as
placas foram interpretadas de maneira invertida, não apenas na montagem.
Com estes resultados, você pode apresentar para seu gestor uma proposta
que consiste em produzir placas de silício dopado com boro novas e substi-
tuir apenas esta parte nas peças do lote defeituoso. Obviamente, antes disso
você deve realizar um teste se o excesso de P utilizado não afetará o funcio-
namento da célula fotovoltaica. Este teste dando um resultado positivo, você
resolveu o problema da empresa, economizando ao máximo recursos.

Avançando na prática

Refino de titânio – processo Kroll

Descrição da situação-problema
O titânio é o nono elemento mais abundante na Terra, sendo bastante
aplicado na obtenção de ligas metálicas devido às suas características de
leveza e resistência térmica, sendo bastante empregado na aeronáutica. O
principal processo industrial para obtenção do titânio a partir de minerais é
o processo Kroll, que consiste em duas etapas:
FeTiO3 (s) + 7 Cl 2 (g) + 6 C (s) ® 2 TiCl 4(l) + 2 FeCl 3 (l) + 6 CO(g)
2 Mg (l) + TiCl 4(g) ® 2 MgCl 2 (l) + Ti(s)

Seção 1.3 / Moléculas e íons - 51


Em uma indústria de processamento de titânio, como responsável pelo
processo de obtenção, você precisa saber o que esperar deste processo, ou
seja, quanto de titânio puro você obtém a partir de determinada quantia
de mineral. Supondo que não há perdas no processo e que toda ilmenita
( FeTiO3 ) é convertida em titânio sólido, qual a massa de titânio obtida a
partir de 345 g de mineral? Quanto de carbono é utilizado na reação?

Resolução da situação-problema
Para mapear o processo de obtenção de titânio, no primeiro ponto de
mapeamento, você pode adotar duas abordagens, como visto anteriormente:
1) A partir do mol: você sabe que 1 mol de FeTiO3 tem massa molar de
151,8 g ( 55,8(Fe)+48(Ti)+3´16(O)=151,8 g/mol ), então 345 g correspondem a
2,27 mol de moléculas de FeTiO3 (regra de 3).
Se 1 mol de FeTiO3 leva a 1 mol deTi, ao reagirmos 2,27 mol de minério,
vamos obter a mesma quantidade de Ti em mols, portanto 2,27 mol.

1 mol de Ti _____ 48 g
2,27 mol _____ x g de Ti
x = 109 g de Ti

2) A partir da massa: basta você utilizar as massas molares calculadas:

151,8 g de FeTiO3 _____ 48 g


345 g _____ y g de Ti
y = 109 g de Ti

O segundo ponto de mapeamento do processo é saber quanto de carbono


é utilizado. Vamos resolver esta questão utilizando o conceito de mol: 1
mol de FeTiO3 reage com 6 mol de carbono, sendo que 345 g de FeTiO3
correspondem a 2,27 mol. Como devemos consumir 6 vezes esta quantia de
carbono, temos 6 ´ 2,27 = 13,62 mol de C. Concluindo:

1 mol de C _____ 12 g (massa molar)


13,62 mol de C _____ x g de C
x = 163,4 g de carbono

Com isso, você definiu as quantidades de massa que devem ser utilizadas
de cada reagente, realizando o mapeamento inicial do processo.

52 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Faça valer a pena
1. Compostos iônicos não são moléculas, ou seja, não são pares ânions-cátions
isolados, mas, sim, íons arranjados em um retículo tridimensional, sendo que cada
íon está em contato com mais de um íon vizinho. A estrutura de cada retículo
depende da carga dos íons e de seus tamanhos. Este é o caso do cloreto de sódio
(NaCl), embora ele seja representado como molécula, precisamos saber que esta é na
verdade a proporção entre Na + e Cl - no retículo.

Sobre compostos iônicos, assinale a afirmação correta:

a) São comumente gases ou líquidos, quando apresentam baixo peso.


b) São duros e resistentes à pressão.
c) São quebradiços devido a interações eletrostáticas desfavoráveis após
aplicação de pressão.
d) São considerados moléculas, sendo representados por fórmulas moleculares.
e) São praticamente insolúveis em água.

2. A água é um composto molecular formado por ligações covalentes. Estes


compostos são representados por fórmulas moleculares, sendo a molécula a
menor parte identificável de uma substância pura, complexa como para a glicose
( C 6H12O6 ) ou simples como para a água ( H2O ).

Assinale a alternativa que melhor completa a sentença:


_________ de aspirina contém _______ moléculas de aspirina. Tendo esta molécula
a fórmula C 9 H8O3 , podemos dizer que temos 9 mol de átomos de ________
_________ a molécula de aspirina.

a) 1 molécula; 6,022 ´ 1023 ; hidrogênio; substituindo.


b) 1 mol; várias; carbono; constituindo.
c) 1 molécula; 6,022 ´ 1023 ; oxigênio; substituindo.
d) 1 mol de moléculas; 6,022 ´ 1023 ; carbono; constituindo.
e) 1 g; 6,022 ´ 1023 ; oxigênio; substituindo.

3. A composição molecular pode ser apresentada de três maneiras: 1) números de átomos


de cada tipo por molécula (ou unidade-fórmula), que é a fórmula molecular do composto;
2) em termos de massa de cada elemento por mol do composto, como calculamos para o
carbono, hidrogênio e oxigênio; 3) em termos de porcentagem em massa.

A composição em porcentagem mássica de uma determinada molécula em uma


amostra desconhecida foi determinada experimentalmente como sendo C 80%, H

Seção 1.3 / Moléculas e íons - 53


9,3% e O 10,7%. Uma análise em um espectrômetro de massas determinou que a
massa molar deste composto é 150 g/mol. Qual das opções contempla a fórmula
molecular deste composto?

a) C 9 H8O3 .
b) C 9 H8O3 .
c) C 9H12 NO .
d) C 9H10O2 .
e) C 8H6O3 .

54 - U1 / Átomos, moléculas e íons


Referências
ATKINS, P.; DE PAULA, J. Físico-Química. v. 1. 9. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2010. 1048 p.

DREKENER, R. L. Química Geral. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2017.


208 p.

KOTZ, J. C. et al. Química Geral e Reações Químicas. v. 1. 3. ed. São Paulo: Cengage Learning;
2016. 864 p.

MAIA, D. J.; BIANCHI, J. C. de A. Química Geral e Fundamentos. São Paulo: Pearson Prentice
Hall, 2007. 448 p.
Unidade 2

Estudo de reações químicas e estados da matéria

Convite ao estudo
Você usa a água diariamente em sua vida, comumente para beber ou gelar
bebidas. Ou seja, você usa a água nos estados líquido e sólido. E quantas reações
você já fez com água? Se já tomou um remédio efervescente ou usou fermento
químico, várias. Mas você já pensou em como controlamos os reagentes químicos
em uma reação? Será que o conceito de massa atômica sozinho consegue nos
dar a ideia de quantidade para uma reação? Nesta unidade, você será apresen-
tado ao conceito de mol e a partir daí irá trabalhar com reações químicas, apren-
dendo como medir os reagentes e acompanhando os processos de modo a obter
o melhor resultado. Afinal, química não consiste apenas em misturar reagentes
de qualquer maneira. Já pensou em todas as condições que você deve controlar
em uma reação além das quantidades de reagente? Temperatura e pressão são
exemplos disso. Afinal, o estado em que os compostos utilizados estarão, depende
dessas duas variáveis.
Por isso, é necessário que você compreenda os principais conceitos de
reações químicas e conheça os estados da matéria, a fim de que esteja capaci-
tado a acompanhar os processos químicos de sua prática profissional de
maneira eficaz em termos de resultados e segurança.
Para guiar nosso estudo, vamos nos colocar no lugar de um engenheiro
responsável por processos químicos, recém-contratado em uma indústria
de produtos químicos que está montando uma nova linha de produção. O
produto que será obtido é o hidróxido de sódio, também conhecido como
soda cáustica, produzida pela hidrólise aquosa de NaCl. Sua função como
responsável químico é estruturar o processo, através do cálculo de reagentes
envolvidos e da avaliação do rendimento, sendo que deverá controlar os
fatores temperatura e pressão após a reação, uma vez que os gases, que temos
como subprodutos, também podem ser reaproveitados. Como ocorre essa
reação? Como se medem reagentes químicos? Como calculamos o rendi-
mento da reação? Como podemos prever as condições finais de uma reação?
É necessário o controle de temperatura ou de pressão? Responder a essas
perguntas vai fornecer os detalhes que resultarão em um processo eficiente,
convertido em lucro para a empresa e também em segurança.
Na primeira seção, você aprenderá sobre o balanceamento de equações e
rendimento; na segunda seção estudará reações em meio aquoso; e finalizará
esta unidade com o estudo dos estados da matéria. Lembre-se de que estes
conceitos vão acompanhá-lo independentemente do processo químico, ou
seja, em escala laboratorial ou industrial. Então vamos aprender um pouco
mais sobre química!
Seção 2.1

Equações químicas

Diálogo aberto
Quantas reações químicas você vê ao seu redor? Ao fazer um bolo e
usar um fermento químico, por exemplo, você está reagindo um ácido
(comumente o ácido citríco) com uma base, o bicarbonato de sódio
( NaHCO3 ). Isso tudo para produzir gás carbônico ( CO2 ), que irá fazer
a massa do seu bolo crescer. Mas o que ocorre se você colocar muito
fermento? Ou se colocar pouco? Ou seu bolo crescerá muito e derra-
mará, ou não crescerá o suficiente. Nenhum desses casos é desejado. O
ideal é que você saiba a quantidade de fermento que deve ser adicionada
para saber quanto de CO2 será produzido. No caso do bolo, você não
precisa nem conhecer a reação, basta seguir a receita. Mas em reações
químicas, para obter melhores resultados, você deve saber qual a reação
envolvida no processo. Isso também implica em saber a quantidade de
reagentes que se deve usar para saber quanto de produto será obtido.
Você está se colocando no lugar de um engenheiro responsável pelo
processo químico, tendo sido contratado em uma fábrica que está implemen-
tando o processo de produção de NaOH a partir de NaCl e água via hidró-
lise eletrolítica, inicialmente à pressão atmosférica e à temperatura ambiente.
Esse processo pode ser descrito pela equação abaixo:
NaCl (aq) + H2O( ) ® NaOH(aq) + H2(g) + Cl 2(g)

Nessa reação, o NaCl está em menor quantidade, em concentração


máxima de 360 g por litro de água (solubilidade máxima deste sal em água).
Como essa ideia está apenas em fase inicial de levantamento de processo,
você deverá começar seu estudo do zero. Isso significa que sua primeira
função é escrever a equação corretamente. Ela está balanceada?
Seu gestor pede uma produção inicial para teste da planta de 100 kg de
NaOH. Quanto de NaCl você deve reagir considerando o rendimento real da
reação? Quanto NaCl realmente produz 100 kg de NaOH? Para saber o rendi-
mento real da equação, foi solicitado à equipe de laboratório que realizasse
a reação em pequena escala. Os resultados passados são que, para reagente
com 99,9% de pureza, a reação ocorreu com 83% de rendimento, tendo o
NaCl como reagente limitante, em concentração de 360 g/L.
Para saber como realizar essa etapa do projeto, você deverá estudar o
processo de balanceamento de equações que aprenderá nesta seção. Há

Seção 2.1 / Equações químicas - 59


outro ponto com o qual você deve ficar atento em um processo químico:
nem sempre todo reagente formará produto, portanto, você precisa aprender
sobre rendimento químico. Vamos adquirir novos conhecimentos?

Não pode faltar


Uma equação química descreve a transformação de moléculas em outras,
ou seja, de reagentes em produtos. Para que esta descrição seja completa, você
deve descrever o estado de cada um dos envolvidos, assim como a quanti-
dade de moléculas envolvidas nesta equação. Mas como saber se nossa repre-
sentação está correta? Com relação aos estados físicos, você deve procurar as
propriedades físicas dos compostos envolvidos para a temperatura e para a
pressão que estão sendo utilizadas. Para as quantidades, você deve aprender
sobre a lei da conservação da massa e a lei das proporções definidas.
Quando Antoine Laurent de Lavoisier (1743-1794) (KOTZ et al., 2016)
começou a pesar os reagentes, a química passou a ter uma relevância cientí-
fica e não apenas especulativa. Um de seus estudos diz que a quantidade de
massa dos produtos deve ser igual à quantidade de massa dos reagentes, sendo
considerada uma reação química em sistema fechado. Esta ficou conhecida
como a lei da conservação de massas. Pelo ponto de vista atômico, essa
afirmação consiste em dizer que os átomos que se encontram nos reagentes
devem estar contidos nos produtos, em número e tipo (exceto em reações
nucleares, que você verá em outros momentos).
Você viu que Dalton definiu um elemento químico como uma unidade
que repetia sua massa constantemente, observação muito semelhante à de
seu contemporâneo, Joseph Louis Prost (1754-1826), que ao trabalhar com
minerais (moléculas) observou que compostos purificados contêm sempre
os mesmos elementos, e na mesma razão entre as massas, que ficou conhe-
cida como a lei das proporções definidas (KOTZ et al., 2016). Portanto,
dizer que uma molécula de água será sempre composta por dois átomos de
hidrogênio e um de oxigênio, mantendo fixa a proporção de massa, é utilizar
a lei das proporções definidas.

Veja a reação de formação da amônia ( NH3 ), um composto bastante


empregado na indústria de fertilizantes. Sua produção via síntese de Haber-
Bosch ocorre pela reação do gás nitrogênio com o gás hidrogênio. Se você
analisar a reação, irá observar que uma molécula do gás nitrogênio reage
com três moléculas do gás hidrogênio, formando duas moléculas de amônia;
ou ainda que dois átomos de nitrogênio reagem com seis átomos de hidro-
gênio, formando duas moléculas de amônia, cada uma delas composta por
um nitrogênio e três hidrogênios (Figura 2.1)

60 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Figura 2.1 | Formação da amônia

Fonte: elaborada pela autora.

Note que nessa equação temos a mesma quantidade de átomos de nitro-


gênio e hidrogênio nos reagentes e nos produtos, então, podemos chamá-la
de equação balanceada.
O hexafluoreto de enxofre é utilizado como gás inerte principalmente na
indústria de eletrônicos. Sua obtenção é realizada pela queima de enxofre
com gás flúor, como mostra a Figura 2.2.
Figura 2.2 | Reação de obtenção do hexafluoreto de enxofre

Fonte: elaborada pela autora.

Para sabermos quantas moléculas do gás flúor reagem, precisamos


analisar a equação inteira. Note que o gás enxofre apresenta em sua fórmula
oito átomos e que são formadas oito moléculas de hexafluoreto de enwxofre.
Cada molécula de hexafluoreto de enxofre tem seis átomos de flúor, 48 átomos
de enxofre no total. Para que essa reação ocorra, precisamos ter também nos
reagentes 48 átomos de flúor. Como cada molécula de gás flúor possui dois
átomos, precisamos de 24 moléculas de gás flúor para que a reação ocorra.
O método que realizamos para encontrar a quantidade de moléculas
do gás flúor foi contarmos os átomos dos dois lados, reagentes e produtos.
Neste caso é bastante simples, pois dois reagentes ( S8 e F2 ) formam um
único produto ( SF6 ). Quando temos uma reação de queima de combustível
(como o octano – presente na gasolina), em que dois reagentes levam a dois
produtos, o balanceamento é mais complicado. Para a combustão do octano,
temos a reação a seguir, já balanceada.
2C 8H18 ( ) + 25O2 (g) ® 16CO2 (g) + 18H2O ( )

Seção 2.1 / Equações químicas - 61


Reações de combustão envolvem a queima de um combustível na
presença de oxigênio, levando à formação de um composto contendo
oxigênio (e para o octano temos o gás carbônico) e água.

Assimile
Independentemente do tipo de reação, para se realizar o balancea-
mento, devemos ter certeza de que as fórmulas estão corretas e elas
não podem ser alteradas. Por exemplo, CO2 não pode se transformar
em CO apenas para finalizar o balanceamento.

Para balancear uma equação química, utiliza-se o método da tentativa e


erro. Sendo que alguns passos tornam o processo mais assertivo. Para reações
de combustão, você pode seguir as seguintes etapas:
1) Escreva corretamente a fórmula dos compostos (reagentes e produtos).
2) Inicie pelo elemento que formará o óxido, depois pelos átomos de
hidrogênio e, então, oxigênio.
3) Confira se os elementos envolvidos estão no mesmo número de
átomos dos dois lados da equação.
Para a combustão do propano, temos:
reação não balanceada
C 3 H8 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾ ® CO2 (g) + H2O (g)

Seguindo, devemos primeiro balancear os átomos de carbono, seguido


dos átomos de hidrogênio e, então, oxigênio:
Carbono: C 3 H8 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾
reação não balanceada
® 3 CO2 (g) + H2O (g)
Hidrogênio: C 3 H8 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾
reação não balanceada
® 3 CO2 (g) + 4 H2O (g)
Oxigênio: C 3 H8 (g) + 5 O2 (g) ¾¾¾¾¾¾
reação não balanceada
® 3 CO2 (g) + 4 H2O (g)
Agora, conte os átomos:
Reagentes: 3 C, 8 H e 10 O.
Produtos: 3 C, 8 H e 6 + 4 O.
Portanto, a reação balanceada correta é:
C 3 H8 (g) + 5 O2 (g) ® 3 CO2 (g) + 4 H2O (g)

62 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Reflita
Quando você erra a proporção entre os compostos utilizados, como esse
erro pode impactar num processo químico?

Os índices em frente a cada um dos reagentes são chamados coefi-


cientes estequiométricos.
Durante o processo de balanceamento, quando tivermos um número
ímpar de átomos de um lado e par de outro, para darmos continuidade
no processo, devemos multiplicar os átomos do lado ímpar por dois e
repetir o balanceamento.

Exemplificando
Para a combustão da amônia temos:
equação não balanceada
NH3 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾¾ ® NO (g) + H2O (g)
1) N está correto.
2) H: para termos o mesmo número de H dos dois lados, precisamos
multiplicar o lado da equação que apresenta número ímpar de átomos
por dois, logo, teremos duas moléculas de amônia, dando seis átomos de
H, portanto, devemos multiplicar a água por três.
equação não balanceada
2 NH3 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾¾ ® NO (g) + 3 H2O (g)
3) Devemos voltar e corrigir N:
equação não balanceada
2 NH3 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾¾ ® 2 NO (g) + 2 H2O (g)
4) O: novamente, o lado ímpar deve ser multiplicado por dois. Com isso
o número de hidrogênios deverá ser corrigido, multiplicando a amônia
e o NO por dois.
equação não balanceada
4 NH3 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾¾ ® 4 NO (g) + 6 H2O (g)
5) Agora, precisamos balancear o oxigênio e podemos contar os átomos:
equação não balanceada
4 NH3 (g) + 5 O2 (g) ¾¾¾¾¾¾¾ ® 4 NO (g) + 6 H2O (g)
Reagentes: 4N, 12H, 10 O.
Produtos: 4N, (4O + 6O) e 12H.
4 NH3 (g) + 5 O2 (g) ® 4 NO (g) + 6 H2O (g)

Seção 2.1 / Equações químicas - 63


Para facilitar o balanceamento de equações, você deve começar pelo
átomo que aparece em menor número de compostos. Se mais de um átomo
aparece apenas uma vez, ou se todos aparecem mais de uma vez, comece pelo
que tem maior número de átomos.

Faça você mesmo


Faça o balanceamento da equação a seguir, conforme os passos
descritos anteriormente:
reação não balanceada
FeS2 (g) + O2 (g) ¾¾¾¾¾¾ ® Fe2O3 (g) + SO2 (g)

Começamos falando da observação de Lavoisier, obtida em seus


experimentos sobre o oxigênio, não é mesmo? Então, até agora
pensamos na conservação mais como número de átomos do que como
massa. Mas e se analisarmos a massa? A conclusão de conservação de
massa entre reagentes e produtos iria se manter, já que temos o mesmo
número de átomos. Ao utilizar uma equação química balanceada, a lei
da conservação das massas e a lei da proporcionalidade, você pode
realizar vários cálculos, que são chamados de cálculos estequiomé-
tricos (ATKINS; DE PAULA, 2010).
Com eles, podemos saber o quanto de reagentes leva ao tanto de
produtos em termos de massa, ou quantos mols de um produto podem
ser obtidos a partir de tantos mols dos reagentes utilizados. Podemos,
também, transformar essas massas em volume (ATKINS; DE PAULA,
2010). Para gases, sabemos que um mol de qualquer gás ideal, nas
condições normais de temperatura e pressão (CNTP), é igual a 22,7 L.
Para líquidos, podemos relacionar massa e volume utilizando a densi-
dade ( d=m/v , em que d é densidade, m, a massa em gramas e v, o
volume em mL).
Quando trabalhamos com reações químicas, devemos estabe-
lecer uma relação entre os reagentes e produtos em uma tabela.
Para a equação balanceada de combustão do álcool etílico (etanol)
® 2 CO2 (g) + 3 H2O (g) , podemos estabelecer
CH3CH2OH ( ) + 3 O2 (g) ¾¾
relação descrita na Tabela 2.1.

64 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Tabela 2.1 | Relação estequiométrica de massa e mols para combustão de etanol

CH3CH2OH ( ) + 3 O2 (g) ® 2 CO2 (g)


¾¾ + 3 H2O (g)

1 mol 3 mols 2 mols 3 mols


46 g 3 X 32 = 96 g 2 X 44 = 88 g 3 X 18 = 54 g
d (25 °C) =0,789 g/mL 3 X 22,7 = 68,1 L 2 X 22,7 = 45,4 L 3 X 22,7 = 68,1 La
0,789 g ------ 1 mL
46 g --------- X mL
X = 58,3 mL
Fonte: elaborada pela autora.

Atenção
Elaborar esse tipo de tabela (relação estequiométrica de massa e mols
– e, às vezes, volume) auxilia bastante no trabalho com os cálculos
estequiométricos. A utilização da regra de três evita que você decore
fórmulas desnecessárias.

Até o momento, vimos reações em que os reagentes eram colocados na


proporção exata de reagir. A partir da equação balanceada para a combustão
do álcool etanol, temos exatos 1 mol de etanol para 3 mols de oxigênio. Essa
relação é chamada proporção estequiométrica e define um caso em que
todos os reagentes são consumidos. Entretanto, podemos ter uma situação
em que as quantidades de mols de um reagente não respeitam a proporção
estequiométrica. Ainda utilizando a equação de combustão do álcool etílico
como exemplo, isso significa ter na reação 1 mol de etanol e 5 mols de
oxigênio. O reagente utilizado em menor proporção será totalmente consu-
mido, sendo denominado reagente limitante. Já o reagente utilizado em
excesso irá sobrar, sendo denominado reagente em excesso.
O reagente limitante define a extensão da reação, ou seja, quanto de
produto será formado. Você deve estar se perguntando: por que colocar um
dos reagentes em excesso em relação ao outro? A resposta pode envolver
diversos fatores, como o preço de um dos reagentes ser muito elevado em
relação ao outro, de forma que não se pode ter nenhum tipo de perda. Outra
razão é a purificação do produto, o reagente em excesso pode ser facilmente
removido do meio reacional, facilitando a obtenção do produto em sua
forma pura.

Exemplificando
Considere a equação balanceada da amônia:
N 2 (g) + 3H2 (g) ® 2NH3 (g)

Seção 2.1 / Equações químicas - 65


Se utilizarmos 70 g de nitrogênio e 18 g de hidrogênio, todo hidrogênio
ou todo o nitrogênio irá reagir? Quanto de amônia será obtido?
Inicialmente, vamos verificar qual é o reagente em excesso e qual é o
reagente limitante. Para isso, vamos elaborar uma tabela de conversão
de massa e mols (Tabela 2.2).

Tabela 2.2 | Relação estequiométrica de massa e mols para obtenção de amônia

N2 (g) + 3H2 (g) ® 2NH3 (g)

1 mol 3 mols 2 mols


28 g 3 ´2 = 6 g 2 ´ 17= 34 g
Fonte: elaborada pela autora.

Sabemos que 28 g de amônia reagem com 6 g de hidrogênio. Para saber


qual o reagente limitante, você pode utilizar a massa de nitrogênio ou
de hidrogênio
Para massa de nitrogênio:
28 g de N 2 reagem com 6 g de H2
70 g ------------------ X

70 ´ 6
X= = 15 g de H 2
28
Para massa de hidrogênio:
6 g de H2 reagem com 28 g de N 2
17 g ------------------ X

17 ´ 28
X= = 79,3 g de N2
6
Pela massa de nitrogênio, vemos que temos excesso de hidrogênio
na reação (17 g, sendo necessários 15 g). Pela massa de hidro-
gênio, seriam necessários 79,3 g de nitrogênio para que a reação
ocorresse. Logo, hidrogênio é o reagente em excesso e nitrogênio é
o reagente limitante.
Para calcular a massa de amônia obtida, devemos sempre utilizar o
reagente limitante, o nitrogênio. Como 28 g de nitrogênio formam 34 g
de amônia, podemos fazer outra regra de 3:

28 g N 2 ------------- 34 g NH3
70 ´ 34
70 g ------------------X g X= = 85 g de NH 3
28
Portanto, em uma reação com 70 g de nitrogênio e 17 g de hidrogênio,
serão obtidas 85 g de amônia e sobrarão 2 g de hidrogênio.

66 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Quando utilizamos reagentes químicos, você deve ficar atento a seu grau de
pureza. Se você estiver tentando usar a hematita ( Fe2O3 ) como fonte de ferro,
atente-se ao fato de que a pureza dela comumente extraída no Brasil é de 85%
(MAIA; BIANCHI, 2007), ou seja, em gramas, se 100 g de minério forem utili-
zados, apenas 85 g são de hematita realmente. A pureza de um composto comer-
cial é obtida no rótulo de um produto; para produtos obtidos em laboratório, a
pureza deve ser medida através do uso de diversos equipamentos.
Em todos os exemplos dados, estávamos considerando que uma reação
ocorre envolvendo a completa transformação dos reagentes em produtos,
o chamado rendimento teórico. Porém, ao realizarmos uma reação na
bancada, observamos que nem todo regente se transforma em produto,
sendo que a quantidade de produto obtida é o rendimento real da reação. Os
rendimentos teóricos e reais podem ser calculados utilizando a massa, o mol
ou o volume do produto obtido. O rendimento percentual é obtido quando
dividimos o rendimento real pelo teórico, multiplicando por 100. Lembre-se
de que esta fórmula pode ser substituída por uma regra de três simples.
rendimento real
Rendimento % = ´ 100
rendimento teórico

Exemplificando
Quando você usa fermento químico em bolo, você está realizando a
decomposição de bicarbonato de sódio pelo calor, produzindo carbo-
nato de sódio, gás carbônico e água. O gás carbônico é responsável por
fazer a massa do bolo crescer.
4NaHCO3 (aq) ® 2Na 2CO3 (aq) + 2CO2 (g) + 2H2O ( )

Se a reação ocorre com 85% de rendimento, quanto de CO2 será obtido


na decomposição de 20 g de bicarbonato de sódio?
Para resolvermos esse cálculo, precisamos focar na relação de conversão
entre bicarbonato e gás carbônico, construindo uma tabela de relação
estequiométrica de massa (Tabela 2.3).

Tabela 2.3 | Relação estequiométrica de massa entre bicarbonato de sódio e gás


carbônico

4NaHCO3 (aq) ® 2CO2 (g)

4 mols 2 mols

4 ´ 84 = 336 g 2 ´ 44 = 88 g
Fonte: elaborada pela autora.

Seção 2.1 / Equações químicas - 67


Sabemos que 336 g de NaHCO3 produzem 88 g de CO2 . Ao conside-
rarmos os 2 g, podemos calcular o rendimento teórico.
336 g de NaHCO3 ------- 88 g de CO2
2 g -------- X X = 0,524 g Þ 100 %
Considerando um rendimento teórico de 100 %, serão produzidos 0,524
g de CO2 . Entretanto, o rendimento é de 85%, logo, temos que calcular
quanto de massa será obtida tendo esse rendimento.

Pela fórmula do rendimento %: Utilizando regra de três:

rend. real
Rend. % = ´ 100
rend. teórico 0,524 g CO2 ---- 100 %
X ------------ 85 %
rend. real
85 % = ´ 100
0,524 g 85 ´ 0,524
X= = 0,445 g de CO 2
Rend. real = 0,445 g de CO2 100

Como CO2 é um gás, o melhor é expressar a quantidade obtida em


volume. 1 mol de CO2 tem 22,4 L de volume; para sabermos quanto
foi obtido nessa reação em volume, precisamos saber a quantos mols
correspondem 0,445 g.

Cálculo do mol: Cálculo do volume:

44 g CO2 ------ 1 mol 1 mol de CO2 ------ 22,4 L


0,445 g -------- X 0,01 mol -------- X
0, 445´1 0,01´22, 4
X = = 0,01 mol de CO2 X = = 0,226 L de CO2
44 1

Estudando as relações estequiométricas em equações químicas balan-


ceadas, você é capaz de entender os processos químicos que farão parte de
diferentes momentos de sua carreira, que poderá estar ligada diretamente à
química, ou não.

Sem medo de errar


Você é o profissional responsável por um processo químico contra-
tado em uma fábrica que está implementando o processo de produção de
NaOH a partir da reação de NaCl e água, à pressão atmosférica e tempera-
tura ambiente. Iniciando seu estudo você precisa verificar se a equação está

68 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


balanceada. Como foi solicitada uma produção inicial para teste da planta de
100 kg de NaOH, você deverá dizer quanto de NaCl você deve reagir (consi-
derando que o rendimento dessa reação é de 83%), respondendo quanto
NaCl realmente produz 100 kg de NaOH.
Para isso, você precisa escrever a equação química deste processo. Como
o NaCl está em água (em estado líquido), você diz que seu estado é aquoso
(diluído em água). Como a água é utilizada como solvente, é o reagente em
excesso e os produtos que deveriam ser sólidos que estarão diluídos em água
após a reação. O produto obtido é o hidróxido de sódio (NaOH), porém
temos ainda hidrogênio e cloro sobrando na reação. O produto poderia ser o
HCl, porém esta é uma reação de hidrólise eletrolítica, ou seja, não é apenas
a dissolução. Como apresentado, a reação química que descreve o processo é:
NaCl (aq) + H2O( ) ® NaOH(aq) + H2(g) + Cl 2(g)

Mas ela está balanceada? Você viu que o balanceamento de uma equação
ocorre através do método da tentativa e erro. Para isso, devemos começar por
um elemento que apareça menos vezes, como o sódio.
Sódio: temos um átomo nos reagentes e um no produto, portanto está ok.
Cloro: temos um átomo no reagente e dois no produto, portanto devemos
alterar esta estequiometria, sendo necessário rever o Na.
reação não balanceada
2 NaCl (aq) + H2O ( ) ¾¾¾¾¾¾ ® NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g)

reação não balanceada


2 NaCl (aq) + H2O ( ) ¾¾¾¾¾¾ ® 2 NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g)

Então, os átomos de H e O:
reação não balanceada
2 NaCl (aq) + 2 H2O ( ) ¾¾¾¾¾¾ ® 2 NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g)
Conte os átomos e verifique que agora sua equação está balanceada:
2 NaCl (aq) + 2 H2O ( ) ® 2 NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g)
Como 2 mols de NaCl produzem 2 mols de NaOH, temos que:
117 g NaCl------ 80 g NaOH
x g -------- 100000 g NaOH x = 146250 g de NaOH = 146,25 kg de NaCl
Nesse resultado é considerado o rendimento teórico, ou seja, uma
conversão de 100%, na qual todo reagente se transforma em produto. Mas
lembre-se de que você foi informado pela equipe de laboratório que o rendi-
mento desta reação é de 83% utilizando reagentes com pureza de 99,9%.
Como a água é o solvente da reação, você pode deduzir que o NaCl é o
reagente limitante. Isso significa que os cálculos devem ser sempre realizados

Seção 2.1 / Equações químicas - 69


com relação a ele. Se o resultado do laboratório for transposto para a planta
industrial, os 100,00 kg não serão obtidos e sim a massa correspondente a
83% deste valor, 83,00 kg.

Pela fórmula do rendimento %: Utilizando regra de três:

rend. real
Rend. % = ´ 100 100 kg NaOH ---- 100%
rend. teórico
x kg ----- 83% x = 83 kg de NaOH
rend. real
83 % = ´ 100
100 kg

Rend. Real = 83 kg de NaOH

Portanto, para planejar seu processo você precisa aumentar a quantidade de


NaCl, uma vez que a massa de 146,25 kg de NaCl irá produzir apenas 83 kg de
NaOH. Portanto, levando em conta o rendimento obtido no laboratório, temos:
146,25 kg NaCl ---- 83 kg de NaOH
X ------------ 100 kg
X= 176,2 kg de NaOH
Após essa análise, você conclui que para obter 100 kg de NaOH, você deve usar
176,2 kg de NaCl, considerando este o reagente limitante e o rendimento da reação
de 83%, obtido em pequena escala.
Quando a equipe de laboratório enviou os resultados de rendimento, algumas
informações, como a concentração, o surpreenderam. O que significa essa concen-
tração? Qual o tamanho necessário do reator para que se utilize 176,2 kg de NaCl,
mantendo a mesma concentração? Qual sua influência no processo? E ainda,
como essa reação realmente ocorre? Vamos para a próxima seção aprender mais
sobre o processo de obtenção de NaOH a partir de NaCl e assim implementá-lo na
indústria em que você atua.

Avançando na prática

Poluição atmosférica – determinação de SO2


Descrição da situação-problema
Como analista em um laboratório de controle de poluição ambiental,
você foi encarregado de realizar a quantificação de enxofre em amostras de

70 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


ar atmosférico solicitada por uma ONG relacionada à proteção de plantas
endêmicas da região. A poluição atmosférica é causada pela dissolução de
diversos gases no ar atmosférico, sendo um problema recorrente em cidades
com alta produção industrial ou com grande circulação de carros. A liberação
de enxofre na atmosfera ocorre principalmente na forma de dióxido de
enxofre ( SO2 ), como a partir da combustão de combustíveis fósseis que
contêm enxofre em sua composição. Dióxido de enxofre reage com água,
formando o ácido sulforoso ( H2SO3 ), que frente a outros compostos na
atmosfera formam ácido sulfúrico ( H2SO4 ), componente da chuva ácida.
A análise da quantidade de dióxido de enxofre é realizada utilizando
três equações químicas: reação da amostra da atmosfera com água (Equação
2.1), seguida pela oxidação do ácido sulforoso com água oxigenada ( H2O2 ),
formando o ácido sulfúrico (Equação 2.2). Esse ácido reage com cloreto de
bário ( BaCl 2 ), formando um sólido sulfato de bário ( BaSO4 ), que pode ser
pesado (Equação 2.3).
SO2 (g) + H2O ( ) ® H2SO3 (aq) (2.1)
H2SO3 (aq) + H2O2 (aq) ® H2SO4 (aq) + H2O ( ) (2.2)
H2SO4 (aq) + BaCl 2 (aq) ® BaSO4 (aq) + 2HCl (aq) (2.3)

Outra alternativa é reagir ácido sulfúrico com hidróxido de sódio em


uma reação de neutralização:
equação não balanceada
H2SO4 (aq) + NaOH (aq) ¾¾¾¾¾¾¾ ® Na 2SO4 (aq) + H2O ( ) (2.4)

Após você realizar a análise de uma amostra de ar com as sequências das


Equações 2.1, 2.2 e 2.3, foram obtidas 43 mg de sulfato de bário em análise de
1 m 3 de ar. Para entregar o relatório da análise do ar, você precisa calcular qual
a quantidade de dióxido de enxofre na amostra de ar. Para conferir o resul-
tado, você deve realizar a reação da Equação 2.3 para a mesma amostra de ar.
Programando o experimento, qual quantidade de hidróxido de sódio deve ser
consumida? Lembre-se de balancear a equação. Como a ONG está preocu-
pada com as plantas, considere que danos nas folhas ocorrerão quando o
valor estiver acima de 80 mg de SO2 / m3 de ar (CARDOSO; FRANCO, 2002).

Resolução da situação-problema
Pela Equação 2.3, temos que 1 mol de sulfato de bário é obtido a partir de
1 mol de ácido sulfúrico. Então temos: 1 mol de BaSO4 --- 233,4 g
X ---- 43 mg ( 4,3´10-3 g )
X = 1,84´10-7 mol = 0,184 mmol de BaSO4

Seção 2.1 / Equações químicas - 71


Com isso, podemos estabelecer as relações a seguir:
0,184 mmol de BaSO4 formado a partir de 0,184 mmol de H2SO4
0,184 mmol de H2SO4 obtido a partir de 0,184 mmol de H2SO3
0,184 mmol de H2SO3 obtido a partir de 0,184 mmol de SO2
Portanto,
1 mol de SO2 ------- 64 g de SO2
1,84´10-7 mol -------- X X = 1,178 mg @ 1,18 mg de SO2

Isso significa dizermos que será emitido 1,18 mg de SO2 / m3 de ar . Esta


quantidade não leva a danos em plantas, já que os danos surgem apenas
acima de 80 mg de SO2 / m3 de ar (CARDOSO; FRANCO, 2002).
Para a Equação 2.3, devemos iniciar o balanceamento pelo sódio,
colocando coeficiente estequiométrico 2 no NaOH, o que altera as quanti-
dades de hidrogênio, devendo ter também o coeficiente estequiométrico 2 na
água. Resultando em:
H2SO4 (aq) + 2NaOH (aq) ® Na 2SO4 (aq) + 2 H2O ( ) (Equação 2.4 - balanceada)

Com isso, 1 mol de ácido sulfúrico reage com 2 mols de hidróxido de sódio.

1 mol de H2SO4 ------- 2 mol de NaOH 1 mol de NaOH ------- 40 g de NaOH


0,368 mmol -------- X
0,184 mmol -------- X
X = 14,72 mg de NaOH devem ser consumidos
X = 0,368 mMOL de NaOH
nessa análise, de acordo com a Equação 2.4

Assim você terá não apenas o resultado da análise, mas saberá também
quanto de NaOH será formado.

Faça valer a pena


1. Quando Antoine Laurent de Lavoisier (1743-1794) (KOTZ et al., 2016)
começou a pesar os reagentes, a Química passou a ter uma relevância científica e
não apenas especulativa. Um de seus estudos diz que a quantidade de massa dos
produtos deve ser igual à quantidade de massa dos reagentes, sendo considerada
uma reação química em sistema fechado. Por exemplo, para a reação de hidróxido
de alumínio, um floculante utilizado no tratamento de água, é obtido pela equação
Al 2 (SO4 )3 + 3Ca(OH)2 ® 2Al(OH)3 + 3CaSO4 . Segundo Lavoisier, a quantidade
de massa dos reagentes sulfato de alumínio e hidróxido de cálcio é igual à de hidró-
xido de alumínio e sulfato de cálcio com um rendimento de 100%.

72 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Analisando a reação de obtenção de hidróxido de alumínio, utilizando 684 g
de Al 2 (SO4 )3 e quantidade estequiométrica de 3Ca(OH)2 , obtendo 234 g de
2Al(OH)3 , podemos dizer que:
(Dados: Ca = 40 g/mol, O = 16 g/mol, H = 1 g/mol, S = 32 g/mol e Al = 27 g/mol).
a) Hidróxido de cálcio é o reagente limitante.
b) Foram obtidos 2 mols de hidróxido de alumínio.
c) Hidróxido de alumínio foi obtido com 75% de rendimento teórico.
d) Foram utilizados 2,5 mols de sulfato de alumínio.
e) Hidróxido de alumínio foi obtido em 75% de rendimento real.

2. Reações de combustão envolvem a queima de um combustível na presença de


oxigênio, levando à formação de um composto contendo oxigênio (para compostos
de carbono, como octano ou etanol, o composto de oxigênio formado é o gás carbô-
nico) e água. Por exemplo, temos a reação de combustão do etanol dada pela equação
CH CH OH + 3 O
3 2 ( ) 2 (g)¾¾® 2 CO + 3 H O .
2 (g) 2 (g)

Considerando essa reação, ao utilizarmos 92 g de etanol e 156,8 L de oxigênio,


podemos dizer que:
(Dados: C = 12 g/mol, O = 16 g/mol, H = 1 g/mol).
a) Foram utilizados 9 mols de oxigênio.
b) Etanol foi utilizado como reagente limitante.
c) Foram formados 6 mols de CO2 .
d) Oxigênio é o regente limitante da reação.
e) Foram formados 9 mols de água.

3. Nem toda equação química é escrita de maneira balanceada, como a


reação de obtenção do cromo pelo processo de Goldschimidt, dado pela reação
x Cr2O3 (s) + y Al (s) ® w Cr ( ) + z Al 2O3 (s) , que não está balanceada. O balancea-
mento de equações é necessário para que os cálculos estequiométricos sejam reali-
zados de maneira correta. Para balancear uma equação química, utiliza-se o método
da tentativa e erro. Sendo que alguns passos tornam o processo mais assertivo.

Para balancear a reação de obtenção do cromo pelo processo Goldshimidt, os coefi-


cientes estequiométricos x, y, w e z são, respectivamente:
a) 2, 2, 1, 2.
b) 3, 2, 1, 2.
c) 2, 1, 1, 2.
d) 1, 2, 2, 1.
e) 2, 1, 3, 2.

Seção 2.1 / Equações químicas - 73


Seção 2.2

Reações em solução aquosa

Diálogo aberto
Vamos pensar no uso de sal de cozinha (NaCl), por exemplo, em uma
sopa. Embora você apenas coloque o sal na água da sopa sem pensar na
química envolvida, você está falando de solubilizar o sal na água. E o que
acontece se o saleiro abrir e cair muito sal de uma única vez? Além de uma
sopa salgada, pode acontecer de o sal ficar no fundo da panela. Você talvez
não saiba, mas está trabalhando com conceitos de soluções aquosas nesse
processo todo. Mas soluções aquosas estão presentes em diversos outros
pontos de sua vida e você pode nem notar.
Alguma vez você já comprou dipirona líquida para tratar uma febre?
Você reparou que no rótulo tem um dado muito importante, quanto de
medicamento temos em 1 mL, por exemplo, 500 mg/mL. Este valor é a
concentração do medicamento, no caso uma solução aquosa. Normalmente
os medicamentos de uso oral líquidos, são diluídos em água. Para a
dipirona, o composto ativo é um sólido, diluído em um líquido. Quando
ingeridos, os medicamentos irão, em alguns casos, sofrer reações químicas
em nossos corpos, que são constituídos de água. Portanto, irão ocorrer
reações aquosas de diferentes tipos, de acordo com o método de ação do
medicamento inserido. Fora do seu corpo, reações aquosas também são
bastante úteis, como em alguns tipos de pilhas utilizadas para gerar energia.
Agora, você aprenderá sobre os processos que envolvem soluções aquosas,
solubilidade e reações aquosas, e isso fará você olhar o mundo ao seu redor
de um jeito diferente.
Você está se colocando no lugar do responsável químico por um
processo contratado para implementando da produção de NaOH a partir
de NaCl em uma fábrica. Você está na etapa final de implementação do
processo e precisa dimensionar o reator químico e conferir se as equações
utilizadas até o momento estão corretas, já que um erro na estequiometria
do processo acarreta em um erro de produção com grande impacto econô-
mico. Na segunda etapa de implementação do processo você aprendeu a
balancear a equação ( 2 NaCl (aq) + 2 H2O ( ) ® 2 NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g) ) e a
utilizar os conceitos estequiométricos de rendimento. Você já sabe qual o
tipo de reação que está ocorrendo? Você consegue descrever o processo
químico? Para isso, antes, será preciso calcular a concentração da solução.
Como se calcula a concentração de uma solução? Qualquer concentração
é aceita em uma solução? Quais são os limites de concentração a serem

74 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


utilizados? Qual volume da solução preparada deve ser utilizado para que
se obtenha a massa desejada? Qual característica o reator deve ter frente
ao produto formado? Lembre-se, você já obteve que para produzir 100
kg de NaOH, devem ser utilizados 176,2 kg de NaCl e que a solubilidade
máxima deste sal é de 360 g/L.
Para auxiliá-lo na resolução desta etapa, nesta seção, veremos a concen-
tração em gramas por litro (g/L) e número de mols por litro (mol/L), assim
como as reações em solução aquosa: precipitação, neutralização e oxirredução.
Vamos aprender um pouco mais sobre a química e resolver as perguntas para
avançar na implementação do processo de obtenção de NaOH.

Não pode faltar


Você já sabe que trabalhar a estequiometria de uma reação é impor-
tante, entretanto, nem sempre o valor de mols envolvidos em uma equação
é descrito de maneira direta. Isso porque soluções são comumente utilizadas
para montar uma reação química. O uso de soluções ocorre para que você
possa utilizar quantidades muito pequenas de um composto, como pesar
0,0005 g de NaCl, ou ainda, para evitar que uma reação ocorra de maneira
violenta, ou seja, evitar que reações que liberam energia ocorram em grande
extensão. Pense no que ocorreria se reagíssemos um pedaço de sódio do
tamanho de 0,1 cm² e outro de 10 cm²? O primeiro irá reagir, liberando uma
fumaça, talvez uma breve chama; e o segundo reagiria mais violentamente,
com grande potencial de provocar um acidente.
Por serem bastante usuais em química, conhecer diferentes maneiras de definir
a concentração de uma solução pode ajudar muito o dia a dia de profissional
envolvido com processos químicos. Quando escrevemos uma equação química,
colocamos o estado físico de cada reagente (sólido, líquido e gasoso) e ainda
descrevemos se está em solução. Na reação de obtenção do pentacarbonilo de ferro
( Fe (s) + 5 CO (g) ® Fe(CO)5 ( ) ), por exemplo, não temos nenhuma solução, mas
os três estados da matéria estão presentes. Para muitos processos em solução, a
solução aquosa é a mais comum, porém temos ainda soluções gás/gás (como o
ar que respiramos), gás/líquido (como os refrigerantes), líquido/líquido (etanol
em água, como o álcool comercial vendido nos supermercados), sólido/líquido
(como o preparo de uma salmoura), gás/sólido ( H2 em platina), líquido/sólido
(mercúrio em ouro) e sólido dissolvido em sólido (como nas ligas metálicas; o ouro
18 quilates, por exemplo, é formado por 75% de ouro puro + 25% de prata e cobre
em mesma quantidade).
Para soluções, o composto que se encontra em maior quantidade é
o solvente, enquanto o soluto está em menor quantidade. O solvente é a

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 75


espécie capaz de separar as moléculas de soluto, impedindo sua agregação,
que leva à formação de outra fase. Você precisa pensar que não é em todas
as soluções que o solvente é líquido, sendo que o estado físico do solvente irá
definir se você está tratando de uma solução líquida, sólida ou gasosa. A água
é o solvente líquido mais utilizado, denominado como solvente universal por
dissolver diversos compostos. Quando tratamos de reações líquidas em água,
falamos sempre em soluções aquosas.
A solubilidade de determinado soluto na solução define a quantidade
máxima deste componente, sem que haja separação de fases em determinada
temperatura e pressão.

Reflita
Para o cloreto de sódio, a 20 °C, a solubilidade em água é descrita como
36 g em 100 g de água, sendo que um aumento da temperatura leva a um
aumento da solubilidade. O mesmo ocorre para a maioria dos sólidos.
O que acontece quando aquecemos um copo de refrigerante? Teremos
mais ou menos gás dissolvido no líquido? O que leva a estes resultados?

Para soluções aquosas, algumas notações de concentração são bastante


usuais, como a concentração em massa de soluto por volume de solução:
C = m soluto / Vsolução .

Exemplificando
Se você estiver trabalhando com uma solução de concentração 5 g/L de bicar-
bonato de sódio, quanto terá deste sal em 500 mL? Não se esqueça de passar
todas as medidas para a mesma unidade de medida (500 mL = 0,5 L).
Pela fórmula: Utilizando regra de 3:

m soluto m soluto 5 g ------ 1 L


C = 5=
Vsolução 0,5 L x g ----- 0,5 L
x = 2,5 g/ 1 L
m soluto = 2,5 g

(Lembre-se de mudar de mL para L).


Com este dado, você pode começar a trabalhar os cálculos estequiométricos.

A relação entre massa e mol deve estar clara para você, sendo assim,
também podemos descrever a relação de concentração como mol × L-1 , que
leva o nome de molaridade (M) e é uma das descrições de concentração

76 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


mais utilizadas. A molaridade é dada pela razão entre o número de mols
hsoluto
( h ) e o volume (V) em litros e é representada pela expressão M = ,
Vsolução
ou ainda, resolver aplicando regra de três simples. Considere para cobre MM
= 159,6.

Exemplificando
Qual a quantidade, em gramas, de sulfato de cobre ( CuSO4 ) em 100 mL
de uma solução com concentração 0,45 M? Considere, para CuSO4 , MM
= 159,6 g/mol.
Resposta:
Pela fórmula: Utilizando regra de 3:
1M -------- 1mol ------ 1 L
0,45 M ----- X mol ----- 1L
m soluto h X = 0,45 mol
M= = 0,45 = soluto então,
Vsolução 0,1 L 0,45 mol ----- 1L
Y mol ----- 0,1 L
Y = 0,045 mol
hsoluto =0,045 mol 1 mol ------- 159,6 g
0,045 mol --- Z
m (g) Z = 7,18 g
hsoluto =
MM (g/mol)
m (g)
0,045 = m = 7,18 g
159,6 g/mol

(Lembre-se de passar mL para L).

Saiba mais
Podemos, ainda, representar a concentração em quantidade de matéria,
como fração molar, porcentagem em massa, porcentagem em volume,
partes por milhão (ppm) e partes por bilhão (ppb). Você pode ler mais
sobre estas representações em Soluções aquosas: concentrações e
reações nas páginas de 208 a 216 do livro de Maia e Bianchi.
MAIA, D. J.; BIANCHI, J. C. de A. Química geral e fundamentos. São
Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
Lembre-se de que você tem acesso a esse livro na biblioteca virtual, em
sua área do aluno.

O que acontece se pegarmos 100 mL de uma solução 2 M e acrescentarmos 100


mL de água? Uma solução 2 M possui dois mols em 1 L de solução, portanto, 0,2

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 77


mol em 100 mL. Se adicionarmos mais 100 mL, o novo volume da solução passa
a ser 200 mL. Note que não foi alterada a quantidade de soluto, então, ainda temos
0,2 mol, agora em 200 mL e, pela fórmula M = hsoluto / Vsolução , temos que a nova
concentração é 1 M, ou seja, ao dobrar o volume, você está reduzindo a concen-
tração pela metade, realizando uma diluição.
Se você isolar o número de mols do soluto na fórmula da molaridade, terá
hsoluto = Vsolução ´ M , sendo que hsoluto permanece constante em uma diluição;
dessa forma, podemos dizer que o produto do volume pela molaridade da
situação inicial deve ser igual ao produto da molaridade e volumes após a
alteração (Situação 1 - Figura 2.3). Agora, se você manter o volume constante
e alterar o número de mols, terá uma outra relação envolvendo a situação
inicial e final (Situação 2 - Figura 2.3), isso consiste em adicionar mais soluto
à solução, o que a faz estar concentrando e não diluindo. Você também pode
ter a mesma molaridade em soluções preparadas com volume e números de
mols diferentes (Situação 3 - Figura 2.3). As mesmas relações valem para
concentração em g/L.
Figura 2.3 | Relações de diluição, concentração e preparo de soluções

Fonte: elaborada pela autora.

Outra situação para aumentar a concentração de uma solução, além de


adicionar mais soluto, como mencionado, é realizar a evaporação do solvente,
reduzindo o volume da solução.
Agora que você já consegue descrever corretamente concentrações de
soluções, podemos avançar em nosso estudo de soluções aquosas. Vamos
começar com uma situação simples: dissolução de um sal em água.
Mencionamos no texto que 36 g de NaCl é a quantidade máxima de sal
solúvel em 100 mL de água e, agora, vamos entender o que isso significa.
Se adicionarmos 1 g de sal em 100 mL de água, ele será solubilizado, tendo

78 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


assim uma solução insaturada. Se adicionarmos 37 g de NaCl, 1 g perma-
necerá precipitado, tendo então uma solução saturada. Lembre-se de que a
solubilidade depende da temperatura, então, se aquecermos esta solução com
37 g de NaCl, atingiremos uma temperatura em que teremos uma solução
novamente; ao baixarmos a temperatura a 20 °C, ainda se tem uma solução,
porém instável (já que está acima do seu ponto de saturação), sendo assim
supersaturada. Escrevendo a equação de solubilidade do NaCl temos:
água

NaCl ( s )   Na +(aq ) + Cl -(aq )

Esse processo está em equilíbrio (representado pela seta  ), ou seja,


depois de um determinado tempo, para que novas moléculas de sal se disso-
ciem, novas moléculas devem se associar, formando mais sólido. Para o
sódio, o equilíbrio é atingido com a adição de 36 g de sal em 100 mL de água.

Assimile
Equilíbrio químico não significa que nada está acontecendo e sim que
a concentração de reagentes e produtos se mantém inalterada. Como
você viu, para que moléculas passem a sólido, outras moléculas devem
se dissociar.

Quando uma determinada reação química está em equilíbrio, a relação


entre as concentrações de produtos e reagentes é dada através da constante de
equilíbrio. Em uma determinada reação em que: aA + bB  cC + dD , temos
[C]c ×[D]d
a constante de equilíbrio ( K eq ) calculada por K eq = . A constante
[A]a ×[B]b
de equilíbrio pode ser calculada na solubilização de sais como o cloreto
de sódio (NaCl), que é um sal bastante solúvel, e também para os sólidos
iônicos que apresentam pouca solubilidade. O brometo de prata (AgBr),
por exemplo, é um sólido pouco solúvel e, neste caso, o equilíbrio é rapida-
água
mente atingido. Para ele, temos a equação AgBr ( s ) 
  Ag +(aq ) + Br -(aq ) ,
e quando se atinge o máximo de íons prata e brometo na solução, temos
a condição de uma solução saturada. Experimentalmente, as concentrações
de íons prata em solução foram determinadas como sendo 7,35 ´ 10-7 M, a
25 °C. Você deve notar que devido à estequiometria da equação, a cada íon
prata temos um íon brometo, portanto, a concentração de brometo em uma
solução de AgBr é idêntica a Ag + , logo, 7,35 ´ 10-7 M a 25 °C.
A multiplicação das duas concentrações nos dá a constante do produto
de solubilidade ( K ps ), no caso do brometo de prata essa constante é
dada por K ps = [Ag + ]×[Br - ] = 5,4 ´ 10-13 , a 25 °C. Essa é a mesma fórmula

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 79


do equilíbrio químico, entretanto, como a concentração de um sólido
pouco solúvel é sempre muito maior que a concentração dos íons, os
reagentes são omitidos da equação. Os valores dos produtos de solubili-
dade são tabelados e encontrados nos livros didáticos, como os que usamos
como referência da disciplina. De uma maneira geral, temos a equação
A x B y  xA y+(aq ) + yB x-(aq ) , sendo K ps = [A y+ ]x ×[B x- ]y . Aplicando esta regra
para o fluoreto de cálcio e sulfato de prata, temos:
água

CaF2 ( s )   Ca 2+(aq ) + 2 F-(aq ) K ps = [Ca 2+ ]×[F- ]2 = 5,3 ´ 10-11

água

Ag 2SO4(s)   2Ag +(aq ) + SO24-(aq ) K ps = [Ag + ]2 ×[SO4 2- ] = 1,2 ´ 10-5

Atenção
Como demonstrado para o AgBr, podemos calcular o K ps a partir das
concentrações de íons em solução, mas podemos, com base no valor
de K ps , calcular a concentração dos íons em solução. Para o sulfato
de bário temos que para cada cátion bário é formado um ânion sulfato:
BaSO4 ® Ba 2+(aq ) + SO24-(aq ) . No início do processo de solubilização,
a concentração de cátions e ânions é zero, e, após atingir o equilíbrio,
tem-se uma concentração x de íons bário. Portanto, x também será
a concentração de ânions sulfato. Com K ps = 1,1´ 10-10 podemos
escrever K ps = x × x = 1,1´ 10-10 \ x 2 = 1,1´ 10-10 . Ao calcularmos
a raiz quadrada, temos x = 1,10´ 10-5 , sendo esta a concentração de
íons bário em solução e também de íons sulfato.
Lembrando da estequiometria, 1 mol de sulfato de bário formará 1 mol
de íons bário e 1 mol de íons sulfato. Portanto, no equilíbrio, temos que
1,10´ 10-5 mol de sulfato de bário foi solubilizado a cada litro de água.
Para você saber a solubilidade em gramas por litro, basta multiplicar este
valor pela massa molar (MM) do BaSO4 :

Solubilidade g/L = (1,0 ´ 10-5 mol/L) × (233 g/mol) = 0,0024 g/L

Você já pensou no que ocorre quando misturamos duas soluções de


espécies bastante solúveis, como o NaCl e o AgNO3 ? Passamos a ter os dois
cátions e os dois ânions em solução, entretanto, quando Ag + está em solução
com Cl- , ocorre a formação de cloreto de prata, um sólido pouco solúvel.
Visualmente, teremos a formação deste sal como um sólido, sendo esta uma
reação de precipitação.

Exemplificando
Observe as reações:

80 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


água
NaCl (aq ) + AgNO3 ( aq )

  Ag +(aq ) + Cl -(aq ) + Na +(aq ) + NO-3 (aq )
Ag +(aq ) + Cl -(aq ) + Na +(aq ) + NO-3 (aq ) ® AgCl ( s ) ¯ + Na +(aq ) + NO-3 (aq )

Com a molaridade das duas soluções de sais e utilizando reações


estequiométricas que já estudamos, é possível calcular quanto de sólido
será formado. Por exemplo, em 100 mL de uma solução 0,1 M, temos
0,01 mol de sal dissolvido, então se reagirmos 100 mL de uma solução
0,1 M de cloreto de sódio, teremos, em solução, 0,01 mol de íons cloreto.
Seguindo o mesmo raciocínio, 100 mL de uma solução 0,1 M de nitrato
de prata terá 0,01 mol de íons prata dissolvidos. Logo, teremos 0,01 mol
de cloreto reagindo com 0,01 mol de íons prata, formando 0,01 mol de
cloreto de prata, como a massa molar do cloreto de prata é 143,3 g/mol,
teremos 1,43 g de sólido formado ao misturarmos as duas soluções.

Assim como o processo de solubilização, muitas outras reações químicas


são reversíveis e atingem o equilíbrio, como a autoionização da água. Neste
caso, uma constante de equilíbrio também pode ser calculada omitindo a
concentração de água que não se dissocia, já que é muito elevada com relação
à concentração dos íons gerados no processo, levando assim a uma constante
de equilíbrio chamada de constante de dissociação da água K w .
H2O (  ) + H2O (  )  H 3 O+(aq ) + OH -(aq ) K w = 1,00 ´ 10-14 (25 °C)

A água neutra tem a mesma concentração de ânions hidroxila e cátions


hidrônio (note que H+ não existe se não associado a uma outra molécula de
água). Neste caso temos que [H3O+ ] = [OH- ] = 1 ´ 10-7 molL-1 . Tendo pH
como - log [H3O+ ] , em uma solução neutra o pH é igual a 7. À medida que
perturbamos o equilíbrio, adicionando mais H3O+ na água, fazemos com
que estes íons hidrônio em excesso reajam com os íons hidróxido, formando
mais moléculas de água. Este processo afeta o equilíbrio e deixa a concen-
tração de H3O+ maior, ou seja, pH menor que 7.
O pH é um conceito utilizado apenas para soluções aquosas e sua variação
ocorre entre 0 e 14, pois a concentração máxima de H3O+ é 1,00 ´ 10-14 M
e a mínima é 10° . Isto ocorre por que K w é sempre o mesmo a uma mesma
temperatura, o que varia são as concentrações de H3O+ e OH- . Desta forma,
a escala de pH varia de 1 a 14 e o mesmo acontece para a escala de pOH
( - log [OH- ] ), sendo que a soma de pH e pOH deve ser sempre 14.
Como a água, outras espécies se dissociam, liberando H3O+ ou OH- ; elas são
respectivamente os ácidos e bases de Arhenius. Quando uma espécie ácida ou
básica se encontra totalmente dissociada em água, temos um ácido ou uma base

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 81


forte, sendo que a reação entre os dois resulta em um pH neutro, ou seja, ocorre
uma reação de neutralização. Portanto, você pode escrever a reação entre HCl e
NaOH na forma de seus íons, ou como as espécies iônicas (a fim de facilitar a repre-
sentação, mostraremos os íons H+ , porém, lembre-se de que eles sempre estarão
associados a uma molécula de água como H3O+ ):
água água

HCl (aq)   H+(aq) + Cl - (aq) 
NaOH (aq)   Na +(aq) + OH-(aq)
água
 H2O ( ) + Na +(aq) + Cl - (aq)
H+(aq) + Cl - (aq) + Na +(aq) + OH-(aq) 
água
 H2O ( ) + NaCl (aq)
HCl (aq) + NaOH(aq) 

Para sabermos quando a neutralização será completa, temos que observar a


estequiometria da equação, por exemplo, 1 mol de HCl reage com 1 mol de NaOH,
ou seja, para você neutralizar uma solução 1 M de HCl, precisamos da mesma
quantia de uma solução 1 M de NaOH. Outro exemplo é a neutralização do
óxido de cálcio (bastante utilizados no controle da poluição), sendo amplamente
aplicados na remoção de compostos de enxofre em filtros industriais (KOTZ et
al, 2016), que, como vimos, formam ácido sulfúrico. Para neutralizar 1,4 mols de
ácido sulfúrico, são necessários quantos mL de uma solução 0,7 M de hidróxido
de cálcio? Analisando a equação Ca(OH)2 (aq) + H2SO4 (aq) ® CaSO4 (aq) + 2H2O( )
, temos que para neutralizar 1,4 mols de ácido, precisamos de 1,4 mol de base
(estequiometria 1:1), se temos uma solução 0,7 M de base, temos 0,7 mol em 1 L,
portanto precisaremos de 2 L da solução.
O ácido acético é um ácido que, ao contrário do HCl, não se encontra
totalmente dissociado em água; apenas algumas moléculas de ácido se disso-
ciam e formam os íons em solução. Entretanto, quando reagimos esse ácido
fraco com uma base forte, a reação ocorre totalmente, como na reação entre
ácido acético e carbonato de cálcio.

CH3COOH (aq)  CH3COO- (aq) + H+(aq)


2CH3COOH (aq) + CaCO3 (s) ® Ca(CH3COO)2 (aq) + H2O( ) + CO2 (g)
+
2CH3COOH (aq) + CaCO3 (s) ® Ca (aq) + 2CH3COO-(aq) + H2O( ) + CO2 (g)

Note que carbonato de cálcio é um sólido insolúvel, portanto, não se


dissocia em água; já o produto da reação ( Ca(CH3COO)2 ) é um sólido solúvel
e isso deve ser levado em conta quando você escreve a equação.

Saiba mais
A força de ácidos em bases fracas dissociadas em qualquer solvente
é dada pela constante de acidez K a , que leva em conta o equilíbrio

82 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


químico. Você pode aprender mais sobre força dos ácidos e bases lendo
as páginas de 722 a 724.
KOTZ, J. C. et al Química geral e reações químicas. São Paulo: Cengage,
2016. v. 2.
Lembre-se de que você tem acesso a este e outros livros didáticos em
sua área do aluno, em Minha Biblioteca.

Algumas espécies, como a amônia ( NH3 ), não liberam OH- quando


dissociadas em água, porém atuam como bases. Neste caso, essas espécies que
têm a característica de se ligar a hidrogênios são classificadas como bases de
Brfnsted-Lowry . Nessa classificação, ácidos são espécies que liberam cátions
hidrogênio. Por ser uma base, a amônia reage com ácido clorídrico, formando o
sal cloreto de amônio: NH 3 (aq) + HCl (aq)  NH 4Cl (aq) . Mesmo sendo uma base
fraca, a amônia reage completamente com HCl, pois este é um ácido forte.
A força motriz em uma reação de precipitação é a formação do sólido
insolúvel de uma reação ácido-base em água, e é a transferência de íons
hidrônio. Existe ainda um terceiro tipo de reação aquosa que veremos nesta
seção, a reação de oxirredução, cuja força motriz é a transferência de elétrons.
A formação de ferro metálico é um exemplo de reação de oxirredução
bastante interessante, partindo do minério óxido de ferro, em reação com CO,
é obtido ferro metálico e gás carbônico: Fe2O3 (s) + 3CO (g) ® 2Fe (s) + 3 CO2 (g) .
O óxido de ferro perde oxigênio, portanto, é reduzido, enquanto a outra
espécie ganha oxigênio e é oxidada. Nem toda reação de oxirredução
envolve oxigênio, mas todas envolvem o movimento de elétrons.
Quando uma espécie recebe elétrons, dizemos que ela é reduzida,
pois há uma redução na carga positiva, já uma espécie que perde
elétrons é oxidada. Veja a reação entre ións prata e cobre metálico:
2Ag +(aq) + Cu (s) ® 2Ag (s) + Cu 2+(aq) . As duas semirreações são
Ag +(aq) + e- ® Ag (s) e Cu (s) ® Cu 2+(aq) + e- . Na primeira semirreação, os íons
prata recebem elétrons formando prata metálica (estado de oxidação 0). Para
o cobre, na segunda semirreação, você pode observar que ele perde elétrons
para o meio. O cobre que doa elétrons é chamado agente redutor, a prata que
recebe elétrons é chamada agente oxidante. Você deve sempre lembrar que
para uma espécie ser oxidada, outra deverá ser sempre reduzida.
O balanceamento de equações de oxirredução deve ser feito levando em
conta o movimento de elétrons. Note que nas semiequações, a prata recebe
apenas um elétron por átomo, enquanto o cobre transfere dois elétrons. Desta
forma, a equação final deve ter dois mols de prata reagindo com um mol
de cobre. De maneira geral, o balanceamento destas equações deve seguir a
regra de transferência de elétrons descrita na Figura 2.4.

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 83


Figura 2.4 | Transferência de elétrons em semiequações

Fonte: elaborada pela autora.

Assimile
Na semiequação de oxidação do magnésio metálico, temos:
Mg (s) ® Mg 2+ + 2 e-
Na semiequação de redução do oxigênio, temos: O2 (g) + (2 e- )´ 2 ® 2O2-
A equação de oxirredução deve ser: 2 Mg (s) + O2 (g) ® 2MgO (s)

A variação de carga negativa ou positiva de um átomo é chamada de número


de oxidação (NOX), e é importante que você entenda que o número de oxidação
de um determinado elemento ou substância simples é zero, como no cobre
metálico (Cu) ou na molécula de I2 . Como substâncias simples são formadas por
átomos de um único elemento, não há diferença de eletronegatividade, portanto, os
átomos não ganham nem perdem carga. Para espécies monoatômicas, o número
de oxidação é igual à carga do íon, elementos do grupo I principal tendem a perder
um elétron, do grupo II, dois elétrons, já o alumínio, elemento do grupo III, tende
a perder três elétrons.
Para os halogênois, o flúor (halogênio mais eletronegativo) apresenta sempre
NOX igual -1. O bromo, cloro e iodo também apresentam NOX igual -1, exceto
quando combinados com átomos de óxigênio e flúor (no ClO- o cloro apresenta
NOX igual a +1, no NaCl apresenta NOX -1). Já para o hidrogênio e oxigênio, os
números de oxidação são comumente iguais a +1 e -2, respectivamente. Para o
hidrogênio, o NOX é comumente +1, e para oxigênio -2. A exceção para o átomo
de hidrogênio é quando o componente de um composto binário com não metais,
como o NaH, tem o NOX de hidrogênio com valor -1. Já a exceção para o oxigênio
são os peróxidos, quando assume o NOX -1, como em H2O2 .
Não esqueça que a soma dos números de oxidação de um composto neutro
deve ser zero, e em um íon poliatômico, a soma deve ser igual à carga do íon
(KOTZ et al., 2016).

Atenção
Para a molécula Al 2O3 , você deve assumir um NOX de -2 para cada
átomo de oxigênio; sendo três átomos, temos -6, portanto, esta

84 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


deve ser a carga dos dois átomos de alumínio, dando NOX -3 para
cada um.
Para o Cr2O7 2- , você deve seguir o mesmo processo. Assumindo um
NOX -2 para o oxigênio, temos 14 elétrons neste elemento. Como há a
carga -2 na molécula, sobram 12 elétrons, que são divididos pelo número
de átomos de cromo. O NOX do cromo nesta molécula é +6 (carga
= (+6´2) + (-2´7)= -2 ).

Algumas reações de oxirredução são espontâneas, como o processo


de ferrugem (oxidação do ferro e redução do oxigênio). A reação entre
zinco e cobre também ocorre espontaneamente, como ao colocarmos
uma placa de zinco em uma solução de cobre. Como os íons cobre
recebem elétrons dos átomos de zinco, ocorre o depósito de cobre
(sólido vermelho) sobre a placa de zinco com o passar o tempo (Figura
2.5). Isso acarreta também a alteração da cor da solução, antes azul,
devido à presença de cátions cobre.

Figura 2.5 | Transferência de elétrons em semiequações

Fonte: elaborada pela autora.

Esse processo gera energia, e embora a reação seja espontânea,


a energia não está sendo aproveitada. Para que isso ocorra, é neces-
sário montar uma pilha, como a pilha de Daniell (Figura 2.6). Em
uma pilha, as reações devem ocorrer em recipientes separados, assim,
elétrons provenientes da reação circulam por um fio externo, realizando
trabalho elétrico. Em uma pilha, com o passar do tempo, a concentração
de cargas negativas (na redução) ou positivas (na oxidação) aumenta,
sendo que a ponte salina tem como função equilibrar estas cargas com o
deslocamento de cátions e ânios para as soluções deficientes em cargas
positivas ou negativas, respectivamente.

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 85


Figura 2.6 | Pilha de Daniell

Fonte: adaptada de https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Galvanic_cell_labeled.svg. Acesso em:


23 nov. 2018.

Em uma pilha, o ânodo é onde ocorre a semirreação de oxidação e o


cátodo é onde ocorre a semirreação de redução. Para representar uma pilha,
segundo a IUPAC, usamos Zn (s) Zn2+(aq) Cu 2+(aq) Cu (s) .
Para sabermos se uma reação é espontânea ou não, devemos consultar
seus potenciais padrões de redução, os quais nos indicam a tendência em
espécies de serem oxidadas ou reduzidas, sendo que quanto mais positivo
este valor, maior a tendência da semirreação ocorrer como está escrita. Esses
valores são tabelados e podem ser encontrados nos livros didáticos citados
como referência desta seção. Por exemplo, o valor do potecial padrão de
redução do ferro é -0,44 Ev, já o de redução da prata é 0,80 Ev, isso signi-
fica que a prata é reduzida com maior facilidade, enquanto o ferro, neste
processo, será oxidado.

Saiba mais
Cada espécie apresenta um potencial padrão de redução que determina
o quanto a reação será espontânea e quanto de energia a pilha produz.
Por exemplo, a reação de oxidorredução Cl 2 (g) Cl 2+(aq) 2H+(aq) H2 (g)
não é espontânea, e necessita que uma corrente seja passada por ela.
Você pode ver mais sobre diferença de potencial (ddp) de uma pilha,
assim como funcionamento de outras pilhas nas páginas de 890 a 896
do livro a seguir. KOTZ, J. C. et al. Química geral e reações químicas. São
Paulo: Cengage, 2016. v. 2.
Lembre-se de que você tem acesso a este e outros livros didáticos em
sua área do aluno, em Minha Biblioteca.

86 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Sem medo de errar
Você está estudando a implementação do processo de obtenção de soda
cáustica a partir de cloreto de sódio. Você já sabe qual o tipo de reação que
está ocorrendo? Você consegue descrever o processo químico? Para isso,
antes, será preciso calcular a concentração da solução. Como se calcula a
concentração de uma solução? Qualquer concentração é aceita em uma
solução? Quais são os limites? Qual volume da solução preparada deve ser
utilizado para obter a massa desejada? Qual característica o reator deve ter
frente ao produto formado?
Até o momento, você conseguiu balancear a equação e descobrir que uma
planta piloto obterá aproximadamente 100 kg de NaOH a partir de 176,2 kg
de NaCl. Agora, você deve analisar a equação química. Qual reação ocorre?
Sabemos que é uma reação aquosa, porém não há precipitação nem neutra-
lização. Então é possível que seja uma reação de oxirredução. Você pode
separar a equação principal em semirreações:


2NaCl (aq) + 2H2O (l)  2NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g)

2 NaCl (aq)  2Na +(aq) + 2Cl -(aq) dissolução


+ -
H 2O (  ) + H 2O (  )  H 3 O ( aq ) + OH ( aq ) autoionização da água
+ -
2H (aq) + 2e ® H2(g) semirreação de redução
2Cl -(aq) ® 2Cl 2(g) + 2e- semirreação de oxidação

Separando todas as etapas, fica evidente que a reação é de oxirredução


entre o cloro e o hidrogênio, sendo que gás cloro é formado no ânodo e o
Figura 2.7 | Eletrólise aquosa de NaCl gás hidrogênio é formado no
Corrente cátodo. Reações de oxirredução
elétrica
em meio aquoso são chamadas
Elétrons de eletrólise e são representadas
Grafita ou platina
como na Figura 2.7. Esta é uma
equação de oxirredução que não
é espontânea, ocorrendo apenas
quando uma corrente elétrica é
Ânodo Cátodo passada entre os eletrodos.
Com a formação dos dois
gases em solução, teremos
Cl2(g) H2(g)
íons sódio e hidróxido que,
CI-
Na+
H
+
após evaporação do solvente,
HO-
levam à formação de hidró-
Fonte: elaborada pela autora. xido de sódio sólido.

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 87


Com relação à concentração, o que significa uma diluição máxima de
NaCl de 360 g/L de água?
Aprendemos nesta seção que a solubilidade máxima de NaCl é 36 g
em 100 mL de água. Então, para termos 176,2 kg de NaCl em solução,
devemos calcular:
0,036 kg ------ 0,1 L
176,2 kg ------ X X = 489,44 L
Isso significa que você deve adicionar 146,3 kg de NaCl em 489,44 L de
água para garantir que haja uma solução saturada, ou seja, este é o volume
mínimo para solubilizar todo NaCl. Com essa massa, nesse volume, teremos
uma concentração de 360 g/L. Você pode ainda expressar esse resultado em
molaridade, como para o NaCl MM = 58,5 g/mol:

0,0585 kg ------ 1 mol 3012 mol ------ 489,44 L


176,2 kg ------ X X = 3012 mol X ------ 1 mol X = 6,15 M

Com os dados de massa e volume, você terá definido que o reator deve
possuir um tamanho suficiente para esta quantidade de água, mais a adição
de sólidos. Como o sólido, ao ser adicionado na água, fará o nível de água
subir, devido à produção de gases na reação, para operar com segurança
você deve escolher um volume maior que o de solvente (aproximadamente
500 L). Então você pode requisitar um reator de, no mínimo, 600 L para
realizar a reação.
E sobre as especificações do reator, além de ser antioxidante (para
garantir que não ocorram reações paralelas de oxirredução, já que estamos
trabalhando com uma reação de oxirredução), qual outra característica é
necessária? Para responder a essa pergunta, precisamos calcular o pH da
solução após a reação, e, para isso, precisamos da concentração aproximada
de NaOH.
Como calculado anteriormente, essa massa produzirá 100 kg de NaOH
(83% de rendimento), sendo a massa molar do NaOH 50g/mol; assim,
teremos ao final da reação 2 Kmol de base, ou seja, 2 kmol de íons OH- . Para
calcularmos o volume final da solução, devemos pensar que 2000 mols de
água sofreram autoionização completa, sendo que os íons hidrônio reagiram
e os íons hidroxila permaneceram em solução. Como a massa molar da água
é 18g, 36.000 g de água autoionizaram ( 36 Kg » 36 L ), dando um volume
final de água de 405,5 - 36 » 369 L (levando em consideração que não houve
evaporação da água adicionalmente). Como temos 2000 mols de OH- em
489,44 L de água, a molaridade da solução de NaOH será 4,09 M.

88 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


Com essa concentração de íons hidróxido em solução, o equilíbrio de
dissociação da água se encontra praticamente todo deslocado no sentido
dos reagentes, com isso a concentração de íons hidrônio é praticamente
zero, sendo, então, pH de aproximadamente 14 unidades. Esse dado é muito
importante na escolha do reator, pois a especificação do material utilizado
deve ser de resistência química a meios reacionais altamente básicos.
Agora você mapeou todas as etapas reacionais do processo, calculou a
massa a ser reagida, visando uma quantidade de produto especificada, e,
com isso, entendeu a importância de cálculos estequiométricos em processos
químicos. Também compreendeu a reação que estava sendo realizada e
conseguiu dimensionar o tamanho do reator a ser utilizado, além de algumas
características. Porém, seu gestor quer reaproveitar os gases produzidos, e
este será seu próximo desafio.

Avançando na prática

Análise de ferro em minérios: oxirredução

Descrição da situação-problema
Você trabalha como analista júnior em um laboratório de análises
químicas e chegou uma amostra de minério de ferro para ser analisada.
Sabendo que o ferro pode ser convertido em ferro (II) de maneira quantita-
tiva, você propôs analisar este cátion, uma vez que ele pode ser novamente
oxidado a ferro (III) pelo permanganato de potássio, segundo reação não
balanceada a seguir:

MnO4 -(aq) + Fe2+(aq) + H+(aq)  2+ 3+
 Mn (aq) + Fe (aq) + H2O ( )

Para uma amostra de 2,3 g do minério de ferro foram utilizados 60 mL de


permanganato de potássio ( KMnO4 ) 0,021 M para atingir o ponto de equiva-
lência (quando ocorre a neutralização). Você precisará balancear a equação e
então utilizar os conceitos de concentração e estequiometria para entregar o
relatório de porcentagem de ferro na amostra de minério.

Resolução da situação-problema
Inicialmente você precisa balancear a equação. Levando em conta o
movimento de elétrons, note que o manganês está ligado a quatro átomos
de oxigênio (NOX -2 cada um, portanto, -2´ 4 = -8 ), sendo que a carga do
íon era -1, logo, o NOX do Mn nos reagentes é +7, no produto +2, ou seja, foi

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 89


reduzido. Já o ferro passou de Fe (II) para Fe (III), portanto, foi oxidado. Com
essas informações, podemos escrever as semirreações:
MnO-4 (aq) + 5 e- + 8H+(aq) ® Mn2+(aq) + 4H2O
Fe2+(aq) ® Fe3+(aq) + e- (´5 toda equação)

Com isso, temos a equação balanceada:


MnO-4 (aq) + 5 Fe2+(aq) +8H+(aq) ® Mn2+(aq) +5Fe3+(aq) +4H2O ( )

Na determinação da quantidade de ferro, você utilizou 60 mL de uma


solução 0,021 M de KMnO4 ; para encontrar o número de mols, pode utilizar
a fórmula M = hsoluto / Vsolução , em que, ao isolar o número de mols, você
terá hsoluto = 0,021 mol/L ´ 0,06 L = 1,26 ´ 10-3 = 1,26 mmol de KMnO4 . Pela
equação, você sabe que cada mol de permanganato reage com cinco mols de
ferro (II), portanto, deve usar o fator estequiométrico e determinar que havia
na amostra 5 x 1,26 µmol = 6,3 µmol = 0,0063. A massa de ferro na amostra
pode ser calculada utilizando a massa molar do ferro, sendo que:

1 mol Fe ----- 55,85 g Como a massa de minério total era de 2,3 g,


podemos calcular a porcentagem massa/massa
0,0063 mol --- X
de ferro:
X= 0,352 g
2,3 g ------- 100%
0,352 g ---- X X = 15,3% de ferro (m/m)

A quantidade de ferro presente na amostra é de 15,3%. Agora você deve


elaborar seu relatório da análise.

Faça valer a pena


1. Muitas reações ocorrem com os reagentes em soluções aquosas, sendo a água conhecida
como o solvente universal. Em processos industriais, utilizar água é desejável não apenas
pelo ponto de vista ambiental, mas também de custos e segurança.
Sobre as reações aquosas, é correto afirmar:
I - As reações de solubilização de sólidos pouco solúveis não ocorrem em equilíbrio.
II - A força motriz das reações de precipitação é formação de um sólido insolúvel,
que precipita.
III - A força motriz de reações ácido-base é a transferência de elétrons.
IV - A força motriz de reações de oxirredução é a transferência de elétrons.

Assinale a opção que contém apenas as afirmações corretas.

90 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


a) I, II e III.
b) I, III e IV.
c) II, III e IV.
d) III e IV.
e) II e III.

2. Comumente soluções são utilizadas para montar uma reação química ou utilizar
quantidades muito pequenas de um composto, ou para evitar que reações ocorram
violentamente (liberando muita energia) e que ocorram em grande extensão, de
maneira muito rápida, evitando acidentes.

Uma solução de bissulfito de sódio ( NaHSO3 ) foi preparada adicionando 0,208 g em


100 mL de água. Sobre esta solução, é correto afirmar:
(Dados: massa para 1 mol Na = 23 g, H= 1 g, S = 32 g, O = 16 g).
a) A concentração é 2,08 g/L e a molaridade é 0,02 M.
b) A concentração é 0,208 g/L e a molaridade é 2 M.
c) A concentração é 20,8 g/L e a molaridade é 0,2 M
d) A concentração é 1,04 g/L e a molaridade é 0,1 M.
e) A concentração é 0,104 e a molaridade é 0,02 M.

3. Reações de oxirredução envolvem a transferência de elétrons entre duas


espécies químicas. Sendo que para que uma espécie se oxide, outra deve obriga-
toriamente ser reduzida. Uma equação de oxirredução pode ser dividida em
duas semiequações, ou semirreações.
Para as semiequações a seguir, é correto afirmar:
Sn s  Sn2+ aq + 2e
Ag + aq + e-  Ag s
I - O estanho (Sn) está perdendo elétrons, portanto, é oxidado.
II - A prata está ganhando elétrons, portanto, é reduzida.
III - Se ambos estivessem em uma pilha de Daniell, o estanho seria o ânodo e a prata
o cátodo.

Sobre as asserções acima, estão corretas:


a) I apenas.
b) I e II apenas.
c) I e III apenas.
d) II e III apenas.
e) I, II e III.

Seção 2.2 / Reações em solução aquosa - 91


Seção 2.3

Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos

Diálogo aberto
Você já parou para pensar que todos os elementos puros podem ser
encontrados como gases líquidos ou sólidos? Veja a água: no nosso dia a
dia a conhecemos em seus três estados: o gelo que utilizamos, a água que
bebemos e o vapor quando a fervemos. Mas você já pensou nos fatores que
definem o estado da matéria? A estrutura do composto é responsável por
essas propriedades físico-químicas, sendo que o estado em que se encontram
depende também da temperatura e da pressão. Como o grau de compactação
(moléculas por m³) varia, isso confere a cada estado da matéria comporta-
mentos únicos e também pontos de estudo diferentes. O que torna os três
estados únicos e interessantes por diversos pontos de vista.
Você está trabalhando em uma indústria que está implementando a
síntese de NaOH via eletrólise da água. Nesse processo os reagentes são NaCl
e água, ocorrendo a liberação dos gases hidrogênio e cloro, como descrito
na reação: 2NaCl (aq) + 2H2O (l)  2NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g) . Até o momento

você trabalhou no estudo do processo pensando em quantidade de insumos
para produzir a quantia necessária ao teste da planta em termos de NaOH,
definida como 100 kg. O processo pode, neste momento, estar operacional
para testes, porém seu gestor pede uma análise da volumetria do reator que
você precisa utilizar devido à produção de gases. Lembre-se de que, para
executar a planta piloto, você já sabe que serão utilizados 176,2 kg de NaCl,
aproximadamente 450 mL de água e um reator de 600 L, com volume de
solução de aproximadamente 410 L. Quanto de gás será obtido em volume?
Quanta pressão o reator deve aguentar para trabalhar com segurança? O
volume do reator afetará a pressão? Sabendo que o reator que a indústria já
possui, opera em segurança com 200 atm, como você sugere que o teste seja
realizado? Para facilitar a análise, considere os gases obtidos como ideais,
trabalhe com duas temperaturas de processo (30 °C e 70 °C) e utilize como
tamanho base do reator o valor sugerido na seção anterior de 600 L. Em
L × atm
seus cálculos considere R = 0,082057 e desconsidere a solubilidade
K × mol
dos gases no solvente da reação, pois esta é uma aproximação.
Nesta seção, estudaremos os três estados da matéria: gases, líquidos e
sólidos; aprenderemos como medir a matéria em cada estado, como cada
estado se comporta, o que muda em cada um e quais pontos devem ser
observados com cuidado por serem mais importantes. Você terá, ainda,

92 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


a oportunidade de compreender um pouco mais os fenômenos químicos,
sendo que ao final do seu estudo deverá conhecer as principais características
dos três estados da matéria.

Não pode faltar


No nosso cotidiano, a matéria pode ser encontrada em três estados:
sólido, líquido e gasoso; ao analisá-los podemos dizer que a fase adotada por
uma molécula em determinada condição está relacionada com sua proximi-
dade com outras moléculas, sua energia cinética e as forças intermoleculares.
Por isso moléculas que apresentam uma forte atração entre si, como a água,
precisam estar a 0 °C para passar para o estado líquido e a 100 °C para passar
para o gasoso. Agora, ao analisarmos o gás cloro ( Cl 2 ), ele passa de sólido para
líquido a uma temperatura de -101 °C e de líquido para gás a -34 °C, sendo
um gás nas condições normais de temperatura e pressão (CNTP). Como a
pressão e a temperatura afetam a energia cinética das moléculas (aumento/
diminuição da velocidade delas), se você as observa com forças intermole-
culares fortes (ligações de hidrogênio) como a água, à pressão e temperatura
ambientes, você tem a água líquida. Mas basta aumentar a temperatura, e ela
passa para gás; ao diminuir, ela passa para sólido. Elevadas pressões, a 25 °C,
nos permitem obter água sólida, enquanto em baixas pressões encontramos
a água gasosa. Em um gás, a força atrativa entre as moléculas é menor que a
energia cinética, o que não permite que elas fiquem próximas, enquanto que
em líquidos e sólidos esta atração supera a energia cinética, mantendo as
moléculas próximas.
O estudo de gases é mais simples que o de líquidos e de sólidos, e até por
isso eles são bastante compreendidos. O ar que respiramos é composto por
gases; a água se torna gás com facilidade, e nossa atmosfera é composta por
gases, então, literalmente, os gases estão por todos os lados. Para iniciar seus
estudos sobre os gases, você precisa lembrar o conceito de pressão.
A pressão é a relação entre a força exercida e a área em que se exerce esta
força (Pressão = força/área). Para a atmosfera, costumamos medir a pressão
utilizando um barômetro. Para medir a pressão de gases, é comum o uso de
tubos em U preenchidos.

Você pode observar um barômetro e o tubo em U acessando o


QR Code.

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 93


Quando temos uma quantidade de gás confinado em um frasco de
volume V1 , ele terá uma determinada pressão. Ao alterarmos o volume para
V2 , a pressão também irá variar. Se o volume do frasco aumentou, o gás
ocupará mais espaço e a pressão será menor; agora, se o volume diminuir,
o gás ocupará menos espaço e a pressão aumentará. Ocupar mais ou menos
espaço são propriedades dos gases chamadas de expansibilidade e compres-
sibilidade, respectivamente. Além da pressão, a temperatura também afeta
o volume; quando você infla um balão em uma casa quente, por exemplo, e
vai para uma área externa fria, o balão murcha. Tanto a temperatura quanto
a pressão, são relacionadas com o volume pelas leis de Boyle e de Charles,
respectivamente (Quadro 2.1). Pela lei de Boyle podemos concluir que se a
pressão e o volume de um gás de quantia n, a uma temperatura T é conhe-
cida, um segundo conjunto de condições também será: P1V1 = P2 V2 . Pela lei de
Charles podemos dizer que, com uma quantia e pressão constantes, o volume
e a temperatura de uma condição inicial estão relacionadas com o volume
V1 V
e a temperatura de uma condição final: = 2 . Juntando essas duas
T1 T2
equações, podemos chegar na lei geral dos gases, que permite estudarmos
um gás quando os três parâmetros variam: pressão, volume e temperatura
(Quadro 2.1). Outra relação mostrada envolve o volume e a quantidade de
gás, mais precisamente sobre a quantidade de mols de um gás.
Quadro 2.1 | Leis dos gases e hipóteses de Avogadro

Lei de Boyle: “Para uma determinada quantia de gás (n) a uma 1


temperatura fixa (T), o volume do gás diminui se a pressão au- P = CB ´
menta. Por outro lado, se a pressão diminui, o volume do gás V
aumenta” (KOTZ et al., 2016, p. 456). n e T constantes
Lei de Charles: para uma determinada quantia de gás (n) a uma
V = CC ´ T
pressão fixa (P), o volume do gás diminui se a temperatura dimi-
nui. Já, se a temperatura aumenta, o volume do gás também irá n e P constantes
aumentar. T em Kelvin
Lei Geral dos Gases: baseada nas observações de Boyle e Char- P1 ´ V1 P ´ V2
les, relaciona pressão (P), volume (V) e temperatura (T). = 2
T1 T2
Para uma quantia n de
gás sendo T em Kelvin
Hipótese de Avogadro: “volumes iguais de gases sob a mesmas
V µ n
condições de temperatura e pressão possuem iguais números de
partículas” (KOTZ et al., 2016, p. 462). T e P constantes
Fonte: elaborada pela autora.

Assimile
As leis de Charles e Boyle não dependem da natureza do gás
estudado, ou seja, valem para todos os gases, descrevendo qualquer

94 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


substância gasosa, independentemente, também, das condições
iniciais e finais.

A proposta de Avogadro diz que o volume de gás é proporcional ao número


de mols, desta forma, em uma reação química podemos substituir volume
por número de mols. Como por exemplo na reação de formação da amônia:
N 2 (g) + 3 H2 (g) ® 2NH3 (g) . Podemos dizer que 1 mol de gás nitrogênio reage com
3 mols de gás hidrogênio, formando 2 mols de amônia gasosa. Segundo Avogadro,
também podemos dizer que 5 L de gás nitrogênio reagem com 15 L de gás hidro-
gênio, formando 10 L de amônia gasosa. Basta mantermos a proporção dos coefi-
cientes estequiométricos.
As equações do Quadro 2.1 permitem que obtenhamos a lei dos gases ideais
ao utilizarmos uma constante de proporcionalidade R, PV = nRT . Essa constante
R é universal, chamada de constante dos gases, e pode ser calculada sabendo que
nas CNTP (P = 1 atm e T = 273,15 K) 1 mol de gás ocupa 22,4 L. Pelo cálculo, a
L × atm
constante será R = 0,082057 .
K × mol
Utilizando a lei universal dos gases ideais, com três parâmetros conhecidos,
podemos calcular o quarto parâmetro. Sabendo o número de mols de um gás e sua
massa molar (MM), podemos obter a massa de composto (m), calculando, assim,
m P(MM)
sua densidade. Temos, então, PV= RT , com densidade = m/V, d= .
MM RT
Em reações químicas, como a formação de amônia, podemos descobrir
diversas informações, como apresentado no diagrama descrito na Figura 2.8, e,
então, relacionarmos com a lei geral dos gases.
Figura 2.8 | Diagrama de diferentes caminhos para obter informações sobre quantidade de
reagentes e produtos, assim como suas relações estequiométricas

Fonte: adaptada de Kotz et al. (2016, p. 468).

Exemplificando
A reação de decomposição de bicarbonato de sódio é descrita pela
reação: 4NaHCO3 (aq) ® 2Na 2CO3 (aq) + 2CO2 (g) + 2H2O ( ) . A completa

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 95


decomposição de 3,36 g de bicarbonato de sódio, a 318,3 K, produz
CO2 que é coletado em um frasco de 10 L. Com esses dados, podemos
calcular a pressão de gás carbônico no frasco.
Esta massa de bicarbonato corresponde a 0,04 mol, uma vez que
MM = 84 g/mol. Cada 4 mols de bicarbonato produzem 2 mols de gás
carbônico, portanto serão produzidos 0,02 mol de CO2 . Utilizando
PV = nRT , temos:
L × atm
0,02 mol ´ 0,082057 ´ 318,2 K
P= K × mol = 0,052 atm .
10 L
Portanto, a pressão no frasco será 0,052 atm.

O ar que você respira não é puro; ele é, na verdade, uma mistura de


diversos gases. A pressão dessa mistura ( PTotal ) é dada pela soma das pressões
parciais de todos os gases da mistura ( Ptotal = P1 + P2 + P3 +... ). Pela análise do
ar a sua volta, você pode notar que os gases se misturam muito bem, e nessas
misturas o comportamento de cada um dos gases independe dos outros
componentes. Assim como temos a pressão total sendo a soma das pressões
parciais, também temos que o número total de mols é a soma do número
de mols de cada um dos componentes ( n total = n1 + n2 + n3 + ... ). Desta forma,
podemos obter a lei dos gases ideias para cada um dos componentes, ou
de uma maneira total, já que para todos os gases da mistura, o volume e a
temperatura são iguais:
PA V=n A RT PB V=nBRT PC V=nC RT \ Ptotal V=ntotal RT

A fração molar X de um composto (número de mols de um determi-


nado composto dividido pelo número total de mols de todas as substâncias
presentes) é uma ferramenta útil para encontrar a pressão parcial de cada um
dos componentes:
nA
X A= e PA = X A ´ Ptotal
n A +nB +nC +...
Você viu até agora propriedades macroscópicas dos gases, como volume,
temperatura e pressão, mas não podemos esquecer que estamos falando de
moléculas e que o comportamento microscópico resulta nas propriedades
que vimos. Analisar os gases, observando seus átomos, consiste na Teoria
Cinético-Molecular dos Gases, e, para isso, você precisa levar em conta
algumas considerações:
a) Gases são constituídos de partículas (moléculas ou átomos) em
grande número e sempre em movimento.

96 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


b) As partículas de um gás são pequenas, e a distância entre elas é maior
que seu tamanho.
c) Os movimentos dessas partículas ocorrem em linha reta, exceto
quando as moléculas se chocam umas com as outras ou com as
paredes dos recipientes. Quando isso ocorre, a energia cinética é
conservada. E esta é a única interação entre as partículas.
d) A energia cinética média de todas as partículas de um gás é igual
para todas elas, independentemente da massa molecular, sendo
proporcional à temperatura desse gás.
Você pode perceber que as partículas de um gás estão em movimento
quando, por exemplo, sente o perfume de alguém que acabou de entrar
em uma grande sala. O aroma que seu olfato detecta são moléculas que
se tornaram gasosas e se moveram pelo ar. O movimento de moléculas de
gás ocorre em diferentes velocidades. Em uma determinada temperatura
a maioria das moléculas percorre uma velocidade intermediária, algumas
poucas uma velocidade menor e outras uma velocidade maior, sendo que
a velocidade das moléculas de um gás pode ser descrita como apresentando
uma distribuição normal. A velocidade das moléculas de um gás está relacio-
nada com a temperatura e o tamanho das moléculas do gás. Por exemplo,
a distribuição das velocidades do gás nitrogênio na temperatura de 100 K,
apresenta uma velocidade de cerca de 250 m/s; poucas moléculas apresentam
uma velocidade baixa e poucas chegam a 500 m/s. Dessa forma, você pode
dizer que a velocidade mais provável das moléculas desse gás, nessa tempera-
tura, é de cerca de 250 m/s.

Você pode observar o efeito da temperatura na velocidade das


moléculas ou ainda a análise de diferentes massas acessando o
QR Code.

Você consegue explicar a lei dos gases pelo movimento das moléculas,
como descrito no quadro 2.2?
Quadro 2.2 | Análise da lei dos gases pelo movimento das moléculas
T e n constantes: ao diminuirmos o volume do recipiente que arma- æ1ö
zena um gás, aumentamos as colisões das moléculas com as paredes P = çç ÷÷÷× nRT
çè V ø
do recipiente, de modo que aumentamos a pressão.

T e V constates: ao aumentarmos o número de moléculas em um æ RT ö


recipiente de volume fixo, aumentamos os choques moleculares, P = n ×çç ÷÷÷
çè V ø
portanto aumentamos a pressão.

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 97


n e V constantes: a pressão é decorrente da razão entre a força das
colisões e a área. Ao aumentarmos a temperatura, aumentamos a æ nR ö
P = T ×çç ÷÷÷
energia cinética das moléculas, portanto aumentamos a força das çè V ø
colisões, aumentando, assim, a pressão.
P constante: ao aumentarmos o número de moléculas, aumenta-
mos os choques; para que a pressão permaneça constante, ou o æR ö
V = nT çç ÷÷÷
volume aumenta, ou a temperatura, esta devido à maior energia çè P ø
cinética média do sistema.

Fonte: elaborado pela autora.

Como foi mencionado, os gases se misturam com facilidade. Você pode


racionalizar este fenômeno pensando no movimento aleatório das moléculas
de todos os gases. O movimento natural dos gases é chamado difusão. Já se
você colocar gases diferentes em câmaras separadas por um pequeno orifício,
você observará o movimento de difusão.

Você pode observar a representação gráfica do processo de


efusão acessando o QR Code.

A lei dos gases ideais é completamente aplicável para gases próximos


à temperatura ambiente, com uma pressão de 1 atm. Em outras condi-
ções ocorrem alguns desvios na relação PVT, isso devido à suposição
de que moléculas de gases têm volumes desprezíveis e de que não há
nenhum tipo de força entre elas. Pressões muito elevadas fazem com
que o espaço disponível para movimento das moléculas seja menor.
Embora com volume pequeno, nas suposições realizadas nesta seção, em
nenhum momento se levou em conta que as moléculas ocupam uma parte
do volume disponível para o movimento. Porém, se elevarmos muito a
pressão, mais o volume da molécula influenciará no volume do gás e na
temperatura, levando a alterações na lei dos gases ideais. Se conside-
rarmos as interações intermoleculares que ocorrem entre as moléculas de
gases ao se chocarem, teremos uma variação na energia cinética, sendo
que até agora consideramos que não ocorria nenhuma variação. Quanto
mais baixa a temperatura, mais este tipo de interação é observado e
maior será o desvio da lei dos gases ideais.
Quando estudamos os gases vimos que eles são facilmente descritos
devido à distância entre as moléculas ser relativamente grande, o que lhes
confere compressibilidade. Já os líquidos e os sólidos resistem a essa força,
apresentando uma falta de compressibilidade. Além disso, a aproximação
existente entre as moléculas torna a descrição de sólidos e líquidos mais

98 - U2 / Estudo de reações químicas e estados da matéria


complexa que para os gases. Dos três estados, o líquido é o mais difícil
de ser descrito, pois as moléculas não são completamente independentes,
como nos gases ideais, e nem tão próximas, como nos sólidos.
Para os líquidos, a dualidade entre as forças intermoleculares e a
liberdade de movimento das moléculas leva a propriedades interes-
santes, são elas:
a) Viscosidade: consiste na resistência de um líquido ao escoamento.
Quanto maior for a viscosidade, mais lento um líquido escoa.
É causada pelas interações entre as moléculas do líquido: quanto
mais intensas forem as forças intermoleculares, maior a viscosidade, pois
haverá menos liberdade de movimento entre as moléculas.
Normalmente o aumento da temperatura, resulta em menor visco-
sidade: a energia das moléculas cresce com o aumento da tempera-
tura, levando a uma maior movimentação molecular e facilitando
o escoamento.
b) Tensão superficial: a interação entre as moléculas dentro de um
líquido faz com que elas se mantenham juntas e sejam conduzidas para o
centro do líquido.
Define a superfície de um líquido e faz, por exemplo, com que líquidos
de interações intermoleculares fortes formem esferas (a gota é resultado
da ação da gravidade).
O esperado é que líquidos com interações intermoleculares mais
fortes apresentem maior tensão superficial.
O aumento da temperatura leva a uma diminuição da tensão superfi-
cial (mesma causa da viscosidade).
c) Ação capilar: faz com que o líquido se eleve nas paredes de um
tubo estreito e ocorre devido ao que nada mais é que a interação entre
as moléculas do líquido com as moléculas da parede do tubo. A força
que mantém juntas as moléculas do líquido e da superfície do tubo é
chamada de adesão. Já as interações que ocorrem entre moléculas de um
mesmo material (líquido-líquido ou superfície-superfície) são chamadas
de forças de coesão. A diferença entre essas forças leva à formação de
meniscos (superfícies curvas) nos líquidos desses tubos. Quando as
forças de adesão se sobrepõem às forças de coesão, há a formação de um
menisco côncavo, como na água em um tubo de vidro. Agora, quando as
forças de coesão são mais fortes que as forças de adesão, há a formação de
meniscos convexos, como o mercúrio em um tubo de vidro.

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 99


Você pode observar os dois casos de formação do menisco
acessando o QR Code.

Para qualquer estado da matéria, quanto mais temperatura forne-


cemos, maior é a energia cinética das moléculas deste líquido. Quando
as moléculas possuem energia cinética o bastante para escapar das
interações com as moléculas vizinhas, elas passam do estado líquido
para o estado gasoso. Este processo é chamado de vaporização (ou
evaporação), ou seja, para que uma substância passe do estado líquido
para o gasoso, é preciso adicionar calor (essa variação de energia é
conhecida como entalpia molar de vaporização padrão, DH0vap ). Na
vaporização, como estamos fornecendo energia ao sistema, o valor da
entalpia é positivo, temos um processo endotérmico. Quanto maior
forem as atrações entre as moléculas, maior deve ser a entalpia molar
de vaporização, ou seja, mais energia deve ser fornecida ao sistema para
que passe para a fase gasosa. O processo inverso da vaporização é a
condensação, sendo este um processo exotérmico, ou seja, que libera
calor para o meio.
Quando temos água em um béquer selado, mesmo sem aquecimento,
um pouco de água irá evaporar até que nada mais seja observado a olho
nu. Neste ponto, a taxa de evaporação é igual à taxa de condensação, ou
seja, a quantidade de água que evapora é igual à quantidade de água que
condensa (escrevemos Líquido  Vapor, que caracteriza um equilíbrio
dinâmico). Você não observa nenhuma mudança macroscópica porque
a velocidade das moléculas que passam do líquido para o vapor é igual
à velocidade das moléculas que passam do vapor para o líquido. Em um
sistema fechado como o béquer, após atingido o equilíbrio, a pressão
que o vapor exerce sobre o líquido é denominada pressão de vapor
de equilíbrio. Se você pensar que quanto mais vapor tivermos, maior
será a pressão exercida, a pressão de vapor nos diz a tendência que as
moléculas têm de evaporarem, de modo que quanto maior a pressão de
vapor, mais volátil o composto. Em um líquido, a energia cinética das
moléculas se assemelha à distribuição de energia de gases (uma curva
normal de distribuição). Portanto, quanto maior a temperatura, maior
será a energia cinética média das moléculas, com isso maior será o
número de moléculas com energia suficiente para escapar da superfície
do líquido. Essa relação nos diz que a pressão de vapor deve aumentar
com o aumento da temperatura até atingir a pressão atmosférica,
ocorrendo nesse momento a evaporação.

100 U2
- / Estudo de reações químicas e estados da matéria
Figura 2.9 | Curvas de pressão de vapor do éter etílico, do etanol e da água

Fonte: adaptada de Kotz et al. (2016, p. 518).

A temperatura em que a pressão de vapor se iguala à pressão atmosférica


é denominada de ponto de ebulição (chamado normal a 760 mmHg). Como
a pressão atmosférica varia de acordo com a altitude, o ponto de ebulição
também irá variar, sendo que, em lugares altos com pressão atmosférica
maior que o nível do mar, a água ferverá a uma temperatura menor que
100 °C; já em lugares abaixo do nível do mar, em que a pressão é maior, a
água ferve a temperaturas mais baixas. No nível do mar (P = 760 mmHg), o
ponto de ebulição da água é exatamente 100 °C (ponto de ebulição normal).

Reflita
No nível do mar (P = 760 mmHg), o ponto de ebulição da água é exata-
mente 100 °C (ponto de ebulição normal). Como você seca sua roupa
sem ter que aquecê-la até a temperatura de vaporização da água?

Voltando ao béquer selado e ao equilíbrio entre líquido e vapor, se


o abrirmos, o equilíbrio não será atingido, pois a água gasosa formada se
mistura com as moléculas de ar, sendo que mais moléculas gasosas são
formadas. Será que é assim que você consegue secar roupa? Até agora falamos
bastante em forças intermoleculares. Para discutirmos essas interações, você
precisa ter claro que à medida que moléculas se aproximam, ocorre uma
força atrativa entre elas, a qual leva a uma diminuição da energia do sistema
(maior estabilidade). Porém, quando esta distância se torna muito pequena,

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 101


passam a ocorrer forças de repulsão, que levam a um aumento de energia
potencial, ou seja, para cada tipo de interação existe uma distância mínima
entre as moléculas quando o sistema se encontra mais estável.

Assimile
“Quando forças atrativas juntam as moléculas, formam-se fases conden-
sadas. As repulsões dominam em distâncias pequenas” (ATKINS; JONES,
2012, p. 172). Fase condensada refere-se à fase sólida ou líquida.

Até agora, você estudou compostos nos estados gasoso e líquido, ou seja,
compostos com possibilidade de movimento das moléculas.
Agora, ao reduzir a temperatura de um composto até o ponto de as
moléculas terem energia cinética tão baixa que não “escapam” dos seus
vizinhos, obtém-se um composto na sua forma sólida. A temperatura varia de
molécula para molécula; por exemplo, a água é sólida a temperaturas abaixo
de 0 °C, já o alumínio é sólido até aproximadamente 660 °C. Os sólidos são
classificados de acordo com o tipo de ligação que mantém a conectividade
dos seus constituintes: moleculares, reticulares, metálicos ou iônicos. A
natureza dos sólidos (metálicos, iônicos ou moleculares) define suas caracte-
rísticas físico-químicas.
Um sólido cristalino é aquele em que os átomos, íons ou moléculas se
encontram em um arranjo ordenado; já um sólido amorfo é aquele que
não apresenta nenhum tipo de organização periódica ou regular dos consti-
tuintes do sólido. Você aprenderá muito mais sobre estrutura de sólidos na
próxima seção.
A transformação do estado sólido para o estado líquido é denominada
de fusão. Nesse processo, energia deve ser fornecida ao sistema para que as
moléculas aumentem sua energia cinética e passem a líquidos, estado em que
essa energia é absorvida como energia térmica na fusão, e sua variação é a
entalpia de fusão ( DHo fusão em kj/mol).
O processo inverso à fusão é a cristalização, e sua energia corresponde a -
DHo fusão , ou seja, a energia é liberada no processo. O ponto de fusão corresponde
à temperatura em que ocorre a passagem de um sólido para um líquido. Baixos
pontos de fusão correspondem a entalpias de fusão menores, assim como pontos
de fusão elevados indicam entalpias de fusão elevadas. Sólidos cristalinos puros
apresentam ponto de fusão bem definidos, sendo usualmente utilizado como dado
de caracterização de um composto. Já sólidos amorfos fundem ao longo de uma
faixa de temperatura, como é o caso do vidro. Lembre-se de que sólidos amorfos
não apresentam organização molecular repetida.

102 U2
- / Estudo de reações químicas e estados da matéria
Além de dados sobre a pureza, como no ponto de ebulição, a temperatura
em que uma amostra funde revela informações sobre as forças intermole-
culares. Compostos que se mantêm unidos por interações fortes, como os
sólidos iônicos, apresentam pontos de fusão maiores que compostos molecu-
lares (interações eletrostáticas são mais fortes que as forças de Van der Walls
ou que ligações de hidrogênio). À medida que ocorre o aumento da massa
molecular em uma série de compostos, o ponto de fusão também aumenta,
devido às forças de London serem mais intensas em moléculas maiores. Em
sólidos iônicos, quanto menor o tamanho do íon ou maior sua carga, maior
será a interação eletrostática, sendo, portanto, maior o ponto de fusão. Isso
pode ser observado na série de sais NaF (996 °C), NaCl (801 °C), NaBr (747
°C) e NaI (660 °C). Para os sólidos metálicos, alguns como o mercúrio (PF
-36 °C) são líquidos à temperatura ambiente; já outros como o tungstênio
(1908 °C) são sólidos a temperaturas bem elevadas. Essas características
definem muito suas aplicações.
Alguns compostos podem passar diretamente da fase sólida para a fase
gasosa em um processo conhecido como sublimação, energia que deve ser
fornecida para o sistema ( DHosublimação ).
Como mencionamos no início de nosso estudo desta unidade, as condi-
ções de temperatura e pressão influenciam se um composto será sólido,
líquido ou gasoso, e em algumas condições, mais de um estado pode coexistir.
Podemos representar todas essas informações em um único gráfico chamado
de diagrama de fases. A partir de um diagrama de fases você consegue obter
informações sobre qual será o estado da matéria em diferentes temperaturas
e pressões.
Para a água, você pode observar o diagrama de fases na Figura 2.10. As
curvas A-B, A-C e A-D demarcam o equilíbrio entre as fases. Note que a
inclinação da reta A-C é negativa e isso pode ser explicado pelo fato do gelo
apresentar maior volume que a água. A pressões maiores, a água apresenta
uma maior tendência a ser líquida, pois ocupa menos volume que quando
sólida, logo precisamos de uma temperatura ligeiramente maior para realizar
a fusão. Note que em combinações de pressão e temperatura que fiquem entre
as linhas A-C e A-D, você terá água líquida (por exemplo, pressão ambiente
de 1 atm e temperatura de 25 °C). Seguindo essa análise, o ponto a determina
uma condição em que a água está na forma sólida. Ao aumentarmos a tempe-
ratura, mantendo a pressão constante, chegaremos até o ponto b, em que há
equilíbrio entre as fases sólida e líquida. Seguindo o aumento da tempera-
tura, chegamos a uma condição em que a água é como um líquido até o ponto
c, no qual ocorre a passagem para a fase gasosa e, a partir deste ponto, em
qualquer temperatura a água será um gás.

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 103


Figura 2.10 | Diagrama de fases da água

Fonte: adaptada de https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/12/Diag_phase_eau.svg. Acesso


em: 12 dez. 2018.

Cabe ressaltar ainda que o ponto de fusão e ebulição normais (pressão


ao nível do mar) são as temperaturas em que a água muda de fase (fusão e
evaporação, respectivamente). O ponto triplo é aquele em que as três fases
estão em equilíbrio, e ponto crítico define que a partir dali não há mais
separação entre as fases líquida e vapor.
Agora é aprofundar seus estudos sobre os sólidos!

Sem medo de errar


Você está trabalhando em uma indústria, mais especificamente no
processo de implementação da produção de NaOH. No estudo deste processo
é importante utilizar as informações que você já tem: serão utilizados 176,2
kg de NaCl, aproximadamente 450 mL de água e um reator de 600 L. Para
saber qual a pressão que será obtida dentro do reator após a reação e escolher
o modelo a ser utilizado, você precisa utilizar as relações estequiométricas de
maneira análoga à Figura 2.8.
Você tem a reação 2NaCl (aq) + 2H2O (l) 
 2NaOH (aq) + H2 (g) + Cl 2 (g) e
deve considerar a massa utilizada de 176,2 kg de NaCl e a massa molar do
sal como 58,5 g/mol. Você deverá realizar o cálculo para obter a quantidade
utilizada em mols de NaCl.

104 U2
- / Estudo de reações químicas e estados da matéria
0,0585 kg NaCl ---- 1 mol
176,2 kg NaCl ---- x mol
x = 3012 mol de NaCl
Pela estequiometria da reação, cada mol de NaCl irá produzir 0,5 mol de
gás hidrogênio, 0,5 mol de gás cloro e 1 mol de NaOH. Ou seja, utilizando
3012 mol de NaCl, você obterá 3012 mol de NaOH, 1506 mol de gás hidro-
gênio (MM= 2 g/mol, 3 kg) e 1506 mol de gás cloro (MM = 70,9 g/mol,
106,8 kg). Observando as análises anteriores do processo, já temos o volume
total do reator (600 L) e um volume aproximado de 410 L de solução. Vamos
considerar, então, esse volume como o final ocupado no tanque, tendo
volume livre de 600 - 410 = 190 litros para os gases formados.
A fórmula ideal dos gases ideais é PV = nRT , na qual, ao se isolar a
nRT
pressão tem-se P = . Como a natureza dos gases independe, podemos
V
trabalhar com a soma dos valores de mol dos dois gases nesta equação
( 3012 mol + 3012 mol = 6024 mol ). Agora você deve ficar atento, pois
temos duas temperaturas a serem estudadas: 30 °C e 60 °C, que devem
estar em Kelvin, sendo que as temperaturas convertidas são 303,15 K
( 30 °C + 273,15 ) e 333,15 K ( 60 °C + 273,15 ). A Tabela 2.4 mostra os cálculos
L × atm
de pressão para cada temperatura, considerando R = 0,082057 .
K × mol

Tabela 2.4 | Cálculo de pressão dos gases hidrogênio e cloro


T = 303,15 K T = 333,15 K

L × atm L × atm
0,082057 × 3012 mol × 303,15 K 0,082057 × 3012 mol × 333,15 K
P= K × mol P= K × mol
190 L 190 L
74925,2 L × atm 82339,9 L × atm
P= = 394,3 atm P= = 433, 4 atm
190 L 190 L

Fonte: elaborada pela autora.

Para as duas temperaturas, teremos pressões acima dos 200 atm


em que o reator opera. Então você deve analisar possibilidades para
resolver este problema.
1) Redução da massa do material: vamos manter a temperatura de 303,15
K, o volume livre do reator (190 L) e a pressão como 200 atm. Utilizando a
fórmula PV = nRT podemos obter a quantidade máxima de mols que podem
ser obtidos.

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 105


200 atm ×190 L
n=
L × atm
0,082057 × 303,15 K
K × mol
38000 atm × L
n= = 1527,6 mol
L × atm
24,87
mol
Sendo 763,8 mol de cada gás, pouco mais da metade da proposta de massa
utilizada na reação anterior. Ou seja, diminuir a massa de NaCl pela metade,
mantendo o restante das condições. Se você alterar a concentração, o volume
de solvente diminuirá também, portanto a pressão deverá ser ainda menor.
2) Reduzir a temperatura: vamos manter a quantidade de mols dos dois
gases (3012 mol), a pressão de 200 atm, o volume de 190 L. Assim teremos:
200 atm ×190 L
T=
L × atm
0,082057 × 3012 mol
K × mol
38000 atm × L
T= = 153,7 K
L × atm
247,16
K

Esta temperatura equivale a -119 °C ( 153,7 K - 273,15 ), uma condição


bastante extrema. Logo, você deve verificar se a reação ocorre a essa tempe-
ratura para verificar se a alteração é viável. Mas pense que aquecer e resfriar
reações são processos que geram custo.
3) Manter todas as condições originais e ir removendo o gás para as
etapas de purificação na medida que a reação vai ocorrendo: essa alternativa
deve ser operacionalmente possível, ou seja, condições da planta piloto da
empresa devem ser estudadas. Lembrando que o gás cloro é bastante tóxico.
4) Aumentar o volume: neste caso você pode pensar em alterar a
concentração da reação, de maneira a diminuir o volume de líquido no
reator, aumentando o volume livre. Porém, lembre-se de que o NaCl
e o NaOH apresentam concentrações máximas em água. Neste caso
uma análise complexa do processo é necessária, pois precipitações do
reagente podem ser prejudiciais para a reação. Outra opção é utilizar
um reator de maior capacidade.
5) Alterar a pressão limite: aqui você deve avaliar se existe a possibilidade
de aquisição/disponibilidade de um reator que suporte maior pressão.

106 U2
- / Estudo de reações químicas e estados da matéria
Você deve elaborar um relatório contendo todas estas observações e, junto
ao seu gerente, tomar a decisão que melhor se adequa à empresa. Sua análise
ficou bem completa e você está quase no momento de montar o processo e
executar a implementação. Parabéns!

Avançando na prática

Projetando um airbag

Descrição da situação-problema
Quando há um choque violento de um carro com um muro, por exemplo,
o airbag é acionado e o motorista sofre menos danos. O funcionamento de
airbags é bem conhecido e envolve a reação de decomposição de azida de
sódio iniciada por um impulso elétrico acionado pelo choque da batida.
Nesta reação são produzidos sódio e gás nitrogênio que inflam o airbag. A
reação do airbag é:
2 NaN 3 (s) ® 2 Na (s) + 3 N2 (g)

Como o sódio metálico é muito reativo, no airbag há ainda KNO3 para


inativá-lo e SiO2 para garantir que os óxidos formados nesta inativação
levem a compostos que não irão ferir os passageiros. Porém, estas reações
são secundárias e não formam gases (MORAIS, 2018).
Você está trabalhando em uma empresa que produz airbags para diversos
compradores, com as mais diferentes aplicações, não apenas em veículos
automotores. Um deles solicitou um airbag para teste, que inflado ficasse
com um volume de 8 L. O comprador solicitou que a pressão dentro do
airbag fosse de 840 mmHg. Você deve, a partir das especificações do cliente,
calcular a quantidade de reagentes que deve ser utilizada.

Resolução da situação-problema
Para resolver este problema, você deve utilizar os conceitos estequio-
métricos, partindo dos dados do gás, para chegar a quantos mols de gás
nitrogênio devem ser obtidos; e utilizando os fatores estequiométricos deve
descobrir quantos mols de azida de sódio devem ser utilizados.
PV
Sobre o gás, usaremos n= , sendo que você deve considerar a tempera-
RT
tura ambiente de 22 °C (295,215 K) e a pressão para atm (se 1 atm = 760 mmHg,

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 107


1,1 atm ´ 8 L
840 mmHg = 1,1 atm) n= = 0,36 mol de
0,082057 L × atmK -1mol -1 ´ 295,15 K
gás nitrogênio.
Se 2 mols de NaN3 formam 3 mols de N2 , para formar 0,36 mol de gás,
deve-se reagir 0,24 mol de azida de sódio. Como a massa molar da azida de
sódio é 65 g/mol, 0,24 mols correspondem a 15,6 g de reagente. Utilizando
esta quantia, em um saco de airbag de 8 L, ao ocorrer o choque e, em decor-
rência, a decomposição da azida, será formado gás suficiente para que o
airbag tenha uma pressão de 840 mmHg.

Faça valer a pena


1. Ao fornecermos energia térmica para um líquido, as moléculas aumentam sua
energia cinética e escapam da superfície do líquido, superando assim a força das
interações intermoleculares. As forças intermoleculares variam de intensidade,
portanto para líquidos diferentes, a energia necessária para que as moléculas escapem
de sua superfície, será diferente.

O conceito descrito diz respeito à propriedade dos líquidos, estando relacionado com:
a) Adesão.
b) Tensão superficial.
c) Vaporização.
d) Pressão de vapor.
e) Coesão.

2. Ao mantermos o número de mols e o volume constantes, a pressão, que está


relacionada com a razão entre a força das colisões e a área, aumenta na medida que
aumenta a temperatura devido ao aumento da energia cinética das moléculas.

Esta afirmação da teoria cinética dos gases diz respeito à:


a) Lei de Boyle.
b) Lei de Dalton.
c) Lei de Charles.
d) Lei de Graham.
e) Hipótese de Avogadro.

3. Assim como gases apresentam a propriedade de expansibilidade (ocupam todo


volume disponível), eles também possuem uma propriedade chamada compressibi-
lidade. Pode-se evidenciar isso ao apertar uma bola de borracha, pois uma força é

108 U2
- / Estudo de reações químicas e estados da matéria
exercida na bola, e ela diminui de volume, mantendo as mesmas moléculas de gás que
havia no início do processo.
Sobre a pressão de gases e a teoria cinética molecular, temos:
I- Ao aumentarmos o volume de um gás, a pressão aumenta, pois assim as moléculas
têm maior espaço para desenvolverem trajetórias.
II- Ao aumentarmos a temperatura, a energia cinética das moléculas aumenta, aumen-
tando assim sua velocidade, o choque com as paredes do frasco e também a pressão.
III- Ao adicionarmos mais gás em um recipiente, mantendo seu volume e
temperatura constantes, a pressão aumentará, pois haverá mais choque com as
paredes do recipiente.

Sobre a pressão de gases e a teoria cinética molecular, assinale a alternativa que


apresenta as afirmativas corretas:
a) Apenas I.
b) Apenas I e III.
c) Apenas I e II.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.

Seção 2.3 / Estados da matéria: gases, líquidos e sólidos - 109


Referências
ATKINS, P.; DE PAULA, J. Físico-Química. 9. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2010. 1048 p. v. 1.

ATKINS, P.; JONES, L. Princípios de Química - Questionando a vida moderna e o meio


ambiente. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2012.

BROWN, L. S.; HOLME, T. A. Química Geral Aplicada à Engenharia. 3. ed. São Paulo:
Cengage Learning, 2016.

CARDOSO, A. A.; FRANCO, A. Algumas reações do enxofre de importância ambiental.


Química Nova na Escola, n. 15, p. 39-41, 2002.

DREKENER, R. L. Química Geral. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S/A,


2017. 208p.

KOTZ, J. C. et al. Química Geral e Reações Químicas. 3. ed. São Paulo: Cengage Learning,
2016. 864p. v. 1.

KOTZ, J. C. Química Geral e Reações Químicas. 3. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2017.
864 p. v. 2.

MAIA, D. J.; BIANCHI, J. C. de A. Química Geral e Fundamentos. São Paulo: Pearson Prentice
Hall, 2007. 448 p.

MORAIS, M. L. B. O que Acontece no interior de um airbag. PET Química, Fortaleza, 5 jan.


2018. Disponível em: http://www.petquimica.ufc.br/2018/01/o-que-acontece-no-interior-de�
-
-um-airbag/. Acesso em: 16 jan. 2019.
Unidade 3

Estruturas cristalinas

Convite ao estudo
Em algum momento você já se questionou sobre a importância dos
diversos tipos de materiais em nosso cotidiano e em como eles impactam
nossa vida? Quer um exemplo simples? A maneira como você tem acesso
ao seu material de estudo: você pode tê-lo impresso em papel, ou como um
e-book para acessá-lo através de um computador, tablet ou smartphone.
Esses aparelhos normalmente são fabricados com diversos tipos de plásticos e
diferentes metais. Mas você já se questionou por que temos plásticos e metais
com propriedades tão distintas? Por exemplo, por que alguns plásticos podem
ir ao micro-ondas e outros não? Por que alguns metais são duros enquanto
outros são extremamente maleáveis? Esses e outros questionamentos serão
respondidos a partir dos estudos da Ciência dos Materiais.
Então vamos ao nosso desafio. Uma grande empresa metalúrgica produz
diversas ligas metálicas e recentemente investe na produção de ferro alfa
(ferro a ). Um comprador interessado nessa produção pretende utilizar a
propriedade ferromagnética do ferro a em aplicações que utilizam diferentes
temperaturas de trabalho. Você, como vendedor técnico da metalúrgica,
irá conduzir essa negociação. É possível realizar a caracterização da estru-
tura cristalina do ferro a ? Quais fenômenos podem estar envolvidos nesse
processo? Quais as possíveis imperfeições que os sólidos cristalinos podem
apresentar? Como o transporte de matéria por movimento é importante para
os metais e suas ligas? Assim, para responder a esses questionamentos, nesta
unidade daremos ênfase ao estudo da estrutura cristalina e conheceremos
as diversas maneiras em que os átomos estão arranjados; vamos aprender
os conceitos de célula unitária, polimorfismo, alotropia e conheceremos
os diferentes sistemas cristalinos. Por fim, veremos os tipos de imperfei-
ções presentes nos sólidos e compreenderemos o fenômeno de difusão. A
partir desses estudos você compreenderá os diferentes arranjos atômicos e
as imperfeições presentes em sólidos, assim como os mecanismos de difusão
atômica. Dessa forma, ao final dos estudos desta unidade, você será capaz de
identificar as principais estruturas e sistemas cristalinos, assim como identi-
ficar as principais imperfeições em cristais.
Bons estudos e boa negociação!
Seção 3.1

Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos

Diálogo aberto
No universo da Ciência dos Materiais estudamos a inter-relação entre
desempenho/custo, síntese/processamento, estrutura/composição e proprie-
dades. Vamos ver como essas relações são importantes? Você sabia que o
diamante e a grafita, por exemplo, são materiais compostos exclusivamente
por átomos de hidrogênio e carbono? No entanto, eles se diferem apenas em
relação ao tipo de ligação intermolecular e ao arranjo espacial, isto é, à estru-
tura, o que faz toda a diferença! Os diamantes apresentam elevada resistência
e rigidez, excelente condutividade térmica e baixa condutividade elétrica.
Já a grafita, é relativamente macia, apresenta baixa condutividade térmica
e elevada condutividade elétrica. Esse é um exemplo clássico de como as
inter-relações estudadas na Ciência dos Materiais são importantes para
determinação das aplicações dos materiais. Agora, imagine você atuando em
uma metalúrgica como vendedor técnico que atenderá uma empresa cliente
fabricante de discos rígidos. Esse cliente informou previamente que o metal
será utilizado em aplicações que requerem a retenção de memória. Entre os
diversos tipos de metais comercializados pela empresa em que trabalha, qual
metal poderia ser indicado para esse cliente? Quais as propriedades especí-
ficas necessárias para essa aplicação? A variação da temperatura influenciará
no comportamento metalúrgico do metal? Antes de quaisquer respostas
será importante você compreender de que maneira os átomos estão organi-
zados tridimensionalmente em um material, isto é, entender o conceito de
célula unitária.
Os átomos serão considerados esferas rígidas para que se compreenda
a organização atômica, para que seja possível calcular o volume de cada
célula unitária, e para que se possa prever o número de átomos internos
na célula e determinar a quantidade de átomos vizinhos, o que é chamado
de número de coordenação. Posteriormente, você compreenderá o fator
de empacotamento atômico e a densidade específica dos elementos
químicos a partir do seu arranjo atômico. Nesta seção, também serão
abordados dois conceitos muito parecidos e que estão relacionados ao
estudo da estrutura cristalina: o polimorfismo e a alotropia. Em seguida
você estudará os sete diferentes sistemas cristalinos e verá que na prática
todos os cristais se formam em um desses sistemas. Posteriormente você
será capaz de compreender que a partir dos sete sistemas cristalinos
existem 14 possíveis redes cristalinas e que normalmente, ao se trabalhar
com materiais sólidos, é necessário especificar uma posição atômica no

112 U3
- / Estruturas cristalinas
interior da célula unitária, uma direção ou plano cristalográfico. Mãos à
obra e seja persistente.
Bom trabalho!

Não pode faltar


As propriedades exibidas pelos materiais são o resultado da combinação
entre suas características atômicas, como composição, ligação interatômica e
estrutura cristalina.
A estrutura cristalina refere-se aos arranjos que os átomos podem
assumir quando os materiais estão no estado sólido, e descreve uma estru-
tura altamente ordenada devido à natureza dos seus constituintes em formar
padrões simétricos. Na grande maioria, as partículas que compõem um
material sólido iônico, molecular, covalente ou metálico são mantidas unidas
por forças atrativas intensas e, para efeito de estudo, consideramos que as
posições atômicas dos átomos, moléculas ou íons são fixas no espaço. Os
constituintes de um sólido podem ser dispostos de duas maneiras: a) quando
formam um padrão tridimensional repetitivo de longo alcance denominado
rede cristalina, produzindo, assim, um sólido cristalino e b) quando não há
um padrão tridimensional repetitivo de longo alcance, formando assim um
sólido amorfo, do grego amorphos, que significa “sem forma” (CALLISTER;
RETHWISH, 2018, p. 84). A Figura 3.1 (a) traz a pedra preciosa opala,
exemplo de um sólido amorfo utilizado na fabricação de joias (Figura 3.1
(b)), já na Figura 3.1 (c) temos a stibnite que é um sólido cristalino consti-
tuído por antimônio e enxofre.
Figura 3.1 | Exemplos de sólidos amorfos e cristalinos: (a) opala; (b) pingente de opala e dia-
mantes; (c) stibnite

Fonte: (a) https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/3/32/Opal-rock_hg.jpg; (b) https://upload.


wikimedia.org/wikipedia/commons/e/e4/Jupiter_20_Opal_and_Diamond_Pendant.jpg; (c) https://
c1.staticflickr.com/1/286/18899972316_bdfa744b2a_b.jpg. Acesso em: 3 out. 2018.

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 113


Saiba mais
O artigo intitulado Química de (nano) materiais traz uma visão geral dos
diferentes aspectos relacionados à Química dos Materiais e Nanomateriais.
ZARBIN, Aldo J. G. Química de (nano) materiais. Quím. Nova, São Paulo, v.
30, n. 6, p. 1469-1479, dez. 2007.

Os sólidos cristalinos, ou cristais, apresentam estruturas internas distintas


que resultam em diferentes superfícies planas, também conhecidas como
faces. As faces se interceptam em ângulos característicos de cada substância
e, quando expostos a raios-X, cada estrutura também produz um padrão
distinto que pode ser utilizado para identificar o material. Esses ângulos
característicos refletem a regularidade espacial do arranjo periódico dos
átomos, das moléculas ou íons. Dessa forma, representa-se a totalidade de
um cristal a partir da sua menor unidade de repetição denominada célula
unitária. Por exemplo, se uma pilha de tijolos fosse um cristal, qual seria sua
célula unitária (unidade de repetição)? É muito fácil, seria um único tijolo
que se repete tridimensionalmente (Figura 3.2).
Figura 3.2 | Representação de uma célula unitária de uma pilha de tijolos

Fonte: adaptada de https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5d/Stapel_bakstenen_-_Pile_of_


bricks_2005_Fruggo.jpg. Acesso em: 3 out. 2018.

As células unitárias, para a maioria das estruturas cristalinas, têm seis


lados, e cada lado é um paralelogramo. Por convenção, admite-se que
os átomos ou íons são esferas sólidas e com diâmetros definidos, e que os
vértices do paralelogramo devem coincidir com os centros de massa dos
átomos (CALLISTER; RETHWISH, 2018, p. 48). Os materiais metálicos,
por exemplo, podem se solidificar em estruturas cristalinas que apresentam
quatro tipos de células unitárias:
Cúbica Simples (CS): na CS cada átomo possui seis átomos vizinhos
mais próximos (Figura 3.3) e estão localizados nos oito vértices do cubo e
apenas 1/8 de sua massa se encontra dentro da célula unitária em um arranjo
octaédrico. Dessa maneira, tem-se somente um átomo no interior da célula
unitária CS, razão pela qual os metais não se cristalizam nessa estrutura
devido ao ineficiente empacotamento atômico, já que somente 52% do seu

114 U3
- / Estruturas cristalinas
volume total é preenchido. A quantidade de átomos vizinhos também é
denominada número de coordenação; assim a célula cúbica simples possui
número de coordenação igual a seis. O arranjo atômico de uma célula unitária
cúbica simples é representado em diferentes perspectivas na Figura 3.3.
Figura 3.3 | Célula unitária cúbica simples (CS)

Fonte: elaborada pelo autor.

O único elemento que se cristaliza em uma célula unitária cúbica simples


é o polônio (Po), elemento radioativo e extremamente tóxico.
Cúbica Corpo Centrado (CCC): a célula unitária CCC é uma maneira
mais eficiente de empacotamento atômico e muito mais comum entre os
elementos puros. Nela, cada átomo tem oito átomos vizinhos mais próximos
(Figura 3.4), portanto, número de coordenação igual a oito e 68% do seu
volume ocupado. A célula unitária cúbica de corpo centrado, além dos
átomos nos vértices, possui um átomo central, de forma que se tem dois
átomos na célula unitária CCC. A Figura 3.4 apresenta o arranjo atômico de
uma célula unitária cúbica de corpo centrado.
Figura 3.4 | Célula unitária cúbica de corpo centrado (CCC)

Fonte: adaptada de https://commons.wikimedia.org/wiki/File:BCC_crystal_structure.svg. Acesso em: 18 jan. 2019.

Os metais alcalinos, o bário e vários metais de transição são exemplos


de sólidos cristalinos que se solidificam em estruturas com células
unitárias CCC.
Cúbica de Face Centrada (CFC): outra maneira bastante eficiente de
empacotamento atômico muito encontrada nos metais é a estrutura crista-
lina de célula unitária cúbica de face centrada. Na CFC os átomos estão
localizados em cada um dos vértices e nos centros de todas as faces do cubo

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 115


(CALLISTER; RETHWISH, 2018, p. 49). A Figura 3.5 traz representações do
arranjo atômico de uma célula unitária cúbica de face centrada. Os átomos
nos vértices são compartilhados por oito células unitárias, enquanto os
átomos no centro das faces são compartilhados por duas células unitárias;
adicionalmente cada átomo apresenta número de coordenação igual a 12.
A célula CFC tem quatro átomos e 74% do seu volume total ocupado. O
alumínio, o cobre, a prata e o ouro são alguns dos metais que apresentam
estruturas cristalinas CFC.
Figura 3.5 | Célula unitária cúbica de face centrada (CFC)

Fonte: adaptada de https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/fa/FCC_crystal_structure.svg.


Acesso em: 18 jan. 2019.

Hexagonal Compacta (HC): a maneira mais eficiente de empacotamento


atômico nas estruturas cristalinas é a célula hexagonal compacta (Figura 3.6).
A célula HC é formada por camadas atômicas alternadas, na qual a primeira e
a terceira camadas ocupam os vazios tetraédricos em que cada átomo toca seis
átomos no seu próprio plano, três átomos na camada acima e três abaixo do seu
plano; dessa forma a HC possui número de coordenação igual a 12. A célula HC
contém um átomo em cada vértice e em cada centro da face hexagonal, podendo
ser descrita com ordenação atômica “a-b-a-b-a-b”. Na célula hexagonal compacta
os átomos ocupam 74% do volume total da célula unitária.
Figura 3.6 | Célula unitária hexagonal compacta (HC)

Fonte: adaptada de https://commons.wikimedia.org/wiki/File:HCP_crystal_structure.svg. Acesso em: 18 jan. 2019.

Além do número de coordenação característico para cada célula unitária,


outra característica muito importante das estruturas cristalinas é o fator de
empacotamento atômico (FEA), que é a razão entre a soma dos volumes das
esferas de todos os átomos internos de uma célula unitária ( VE ) pelo volume
da célula unitária ( Vc ), como apresentada em:

116 U3
- / Estruturas cristalinas
VE
FEA =
Vc

No entanto, anteriormente ao cálculo do FEA das estruturas cristalinas, é


necessário calcular VE e Vc para cada célula unitária. O volume dos átomos
em uma célula unitária ( VE ) é dado por:

VE = n 4 pR 3
3
4 pR 3
Em que: n é o número de átomos no interior da célula unitária e 3
é o volume de uma esfera.
Para cada tipo de célula unitária existe uma relação distinta do compri-
mento da aresta (a) e o raio atômico (R), assim como uma relação distinta
para o cálculo do volume da célula unitária, como são apresentadas na
Tabela 3.1:
Tabela 3.1 | Tipos, comprimentos e volumes das células unitárias

Célula unitária Comprimento da aresta (a) Volume ( erf ( x 2 Dt ) )


CS 2R 8R 3
CCC 4R 64 R 3
3 3 3
CFC 3
2R 2 16R 2
HC 2R >* 24 R 3 2
c @1,633a *
Fonte: adaptada de Askeland e Wright (2014, p. 50).

O conhecimento do tipo de célula unitária e da estrutura cristalina de


um sólido possibilita o cálculo da sua massa específica teórica r através da
expressão:
nA
r=
Vc N A
Onde n = número de átomos associado a cada célula unitária; A = peso
atômico; Vc = volume da célula unitária e N A = 6,023´1023 átomos
mol
(Número de Avogadro).

Exemplificando
O ródio apresenta raio atômico 0,134 nm, estrutura cristalina CFC e
peso atômico de 102,91 g/mol. Calcule sua massa específica.

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 117


Resolução:
São dados que a estrutura CFC possui n = 4, Vc = 16R 3 2 , e o Rh
massa atômica A = 102,91 g/mol e o número de Avogadro. Sabendo
3
que a massa específica é dada em g cm , primeiramente vamos
transformar a unidade de raio atômico:
R = 0,134 nm = 1,34´10-8 cm .
Assim temos:
nA nA
r= = =
Vc N A 16R 3 2 N A
(4 átomos/célula unitária)(102,91 g/mol)
= =
ê16 × (1,34´10-8 cm)3 2 ú / célula unitária 6,023´1023 átomos/mol
ëê ûú
411,64
= = 12,55 g/cm3
32,79

Uma característica interessante dos materiais é a de que muitas vezes,


um determinado material se solidifica com diferentes estruturas cristalinas,
fenômeno que é conhecido como polimorfismo. O polimorfismo é muito
semelhante à alotropia, no entanto, esta é usada para descrever sólidos elemen-
tares, enquanto aquele é utilizado para compostos. Em geral, para qualquer
material cristalino utiliza-se o termo polimorfismo. Por exemplo, as formas
alotrópicas do carbono incluem o diamante (em que os átomos de carbono estão
ligados em um arranjo de estrutura tetraédrica); a grafita (na qual os átomos
de carbono estão ligados em conjuntos de camadas em uma rede hexagonal);
a lonsdaleíta (os átomos encontram-se em um arranjo hexagonal); o grafeno
(camadas soltas de grafite) e os fulerenos (em que os átomos de carbono estão
ligados em um conjunto esférico, tubular ou em formações elipsoidais). Mais
recentemente foram conhecidos outros alótropos como o buckminsterfulereno,
também conhecido como buckyball, e os nanotubos de carbono sintetizados.
O buckminsterfulereno, em um padrão bidimensional, apresenta um
padrão de 12 pentágonos regulares e 20 hexágonos regulares. Já os nanotubos
de carbono são folhas de grafita, isto é, são grafenos enrolados em diferentes
direções que produzem tubos com tampas hemisféricas de fulerenos em suas
extremidades. Na transformação alotrópica todos os alótropos do carbono
apresentam a mesma composição, ou seja, são de carbono puro, porém
os materiais apresentam propriedades drasticamente distintas devido aos
diferentes arranjos atômicos em cada alótropo, isto é, aos diferentes sistemas
cristalinos (ASKELAND; WRIGHT, 2014, p. 61). A Figura 3.7 apresenta oito
alótropos do carbono puro, os quais são representados, respectivamente,
por: a) diamante; b) grafita; c) lonsdaleíta; d) buckminsterfulereno; e) C540
fulereno; f) C70 fulereno; g) carbono amorfo; e h) nanotubos de carbono.

118 U3
- / Estruturas cristalinas
Figura 3.7 | Representação de oito alótropos do carbono puro

Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/File:Eight_Allotropes_of_Carbon.png. Acesso em: 9 out. 2018.

Muitas cerâmicas, como a sílica ( SiO2 - óxido de silício) e a zircônia (


ZrO2 - dióxido de zircônio), são exemplos de materiais polimórficos. Neste
caso, a mudança de volume acompanha a transformação da estrutura crista-
lina durante o resfriamento ou aquecimento e, se essas condições não forem
controladas corretamente, a mudança de volume pode tornar o material
cerâmico frágil e quebradiço. A Figura 3.8 mostra o arranjo atômico da
zircônia, que apresenta estrutura cristalina monoclínica estável entre 25
e 1170 °C. Acima dessa temperatura e até 2370 °C, o dióxido de zircônio
monoclínico transforma-se em uma estrutura tetragonal estável. Acima de
2370 °C a zircônia tetragonal se transforma em uma forma cúbica estável
até 2370 °C para uma temperatura de fusão de 2680 °C. A zircônia também
pode ter a forma ortorrômbica quando submetida a elevadas pressões
(ASKELAND; WRIGHT, 2014, p. 61). Esse material é muito utilizado em
substituição aos materiais metálicos em próteses dentárias devido à elevada
resistência e por ser inerte em meio fisiológico.
Figura 3.8 | Estruturas cristalinas da zircônia em diferentes temperaturas

Fonte: elaborada pelo autor.

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 119


Saiba mais
Assim como a zircônia, o ferro puro apresenta diferentes estruturas
cristalinas de acordo com a faixa de temperatura em que se encontra.
Aprofunde seus conhecimentos a partir dos estudos do Capítulo 3, Estru-
turas dos Sólidos Cristalinos, páginas 55 e 56 do livro Ciência e Engenharia
de Materiais – uma introdução, disponível em sua biblioteca virtual.
CALLISTER, W.; RETHWISH, D. G. Ciência e Engenharia de Materiais: uma
introdução. 9. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2018. 861p.

As estruturas de todos os cristais que conhecemos podem ser classificadas


de acordo com a simetria das células unitárias e existe um total de sete tipos
fundamentalmente distintos dessas células que diferem nos comprimentos
relativos das arestas e dos ângulos formados entre elas. Os arranjos atômicos
ou iônicos dos materiais cristalinos são descritos por sete sistemas crista-
linos apresentados na Figura 3.9: cúbico, hexagonal, tetragonal, romboédrico
(trigonal), ortorrômbico, monoclínico e triclínico. A estrutura cristalina é
caracterizada pelos comprimentos a, b e c, e pelos três ângulos a , b e g .
Esses parâmetros são denominados parâmetros de rede cristalina.
Figura 3.9 | Sistemas cristalinos

Fonte: adaptada de: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9c/Sistemas_cristalinos.jpg.


Acesso em: 9 out. 2018.

Assimile
Algumas propriedades como a deformação sob carga, condutividade
elétrica e térmica e o módulo de elasticidade podem variar de acordo
com a orientação do cristal, assim como as propriedades do ferro.

120 U3
- / Estruturas cristalinas
Entre os sistemas cristalinos, o sistema cúbico é o que apresenta maior
grau de simetria, enquanto o sistema triclínico apresenta a menor simetria.
Embora existam apenas sete sistemas de cristais ou formas, existem 14 redes
cristalinas distintas, chamadas rede de Bravais, em homenagem a Auguste
Bravais (1811-1863), que foi um dos primeiros cristalógrafos franceses. A
rede de Bravais apresenta as seguintes redes cristalinas: três tipos cúbicos,
um tipo romboédrico, quatro tipos ortorrômbicos, dois tipos tetragonais, um
tipo hexagonal, um tipo triclínico e dois tipos monoclínicos (Figura 3.10).
Figura 3.10 | Rede de Bravais

Fonte: adaptada de http://sites.poli.usp.br/d/pmt2100/Aula02_2005%201p.pdf. Acesso em: 13 nov. 2018.

Na prática todos os cristais apresentam um desses tipos de sistemas crista-


linos. No entanto, alguns compostos que têm o mesmo sistema apresentam
diferentes parâmetros de redes, fatores que dependem da composição
química e dos tamanhos dos átomos na célula unitária.

Reflita
A mudança nas estruturas e redes cristalinas sempre envolvem uma
transformação nas propriedades dos materiais?

Normalmente é necessário especificar um ponto, uma direção ou um plano


cristalográfico dos átomos já que algumas propriedades como a deformação
sob carga, a condutividade elétrica e térmica e o módulo de elasticidade podem
variar de acordo com a orientação do cristal de um material sólido. A posição
de qualquer ponto dentro da célula unitária pode ser especificada em termos
de suas coordenadas na forma de múltiplos fracionários dos comprimentos
das arestas da célula unitária. A Figura 3.11 apresenta uma célula unitária com
as respectivas coordenadas dos átomos localizados nos vértices do cubo e os
parâmetros de rede, assumindo uma unidade de aresta igual a 1.

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 121


Figura 3.11 | Célula unitária com as coordenadas atômicas dos vértices e parâmetros de rede

Fonte: elaborada pelo autor.

Algumas “regras” gerais são utilizadas para determinação de um ponto,


uma direção ou um plano cristalográfico:
• Os índices de Miller (notações para definir famílias de planos na rede
de Bravais) são utilizados para expressar planos de rede e direções;
x, y e z são os eixos.
• a, b e c são os parâmetros de rede (comprimento da célula unitária
ao longo de um lado).
• h, k e l são os índices de Miller para planos e direções expressas como
planos (hkl) e direções [hkl].
• Não existem vírgulas entre os índices.
• Números negativos são representados com uma barra acima do
número. Exemplo: -2 é representado 2 .
Os índices de Miller são determinados a partir de alguns procedimentos:
• Se o plano passar pela origem, selecione um plano equivalente ou
mova a origem.
• Determine a intersecção do plano com os eixos em função de a, b e c.
• Um plano que é paralelo a um eixo pode ser considerado como tendo
uma intersecção no infinito 1 = 0 .
¥
• Converter os valores para o menor número inteiro e representá-lo
entre parênteses.
A Figura 3.12 apresenta os índices de Miller para os diferentes planos
cristalográficos, onde as setas apontam as origens utilizadas para a determi-
nação dos índices de Miller.

122 U3
- / Estruturas cristalinas
Figura 3.12 | Planos cristalográficos

Fonte: elaborada pelo autor.

Uma característica interessante e única dos cristais cúbicos é o fato de que


os planos e direções com índices iguais são perpendiculares entre si; entre-
tanto, para os demais sistemas cristalinos, não existem relações geométricas
simples entre planos e direções com índices iguais.

Sem medo de errar


Você está atuando em uma metalúrgica como vendedor técnico, e uma
empresa fabricante de discos rígidos o procura, pois necessita de um material
metálico que tenha como propriedade a retenção de memória. Neste caso, qual
metal pode ser indicado? Quais propriedades são esperadas desse material?
Antes de quaisquer respostas será importante você compreender de que
maneira os átomos estão organizados tridimensionalmente em um material,
isto é, entender o conceito de célula unitária. Os conteúdos abordados lhe
permitiram identificar que existem os sólidos amorfos, quando não há um
padrão tridimensional repetitivo de longo alcance, e cristalinos, que formam
um padrão tridimensional repetitivo de longo alcance e que são denomi-
nados rede cristalina.
A célula unitária é a menor unidade de repetição que descreve comple-
tamente o padrão de rede cristalina. Assim, a caracterização do ferro a é
possível a partir dos estudos da estrutura cristalina. O ferro a é estável a
temperaturas inferiores a 910 °C, possui estrutura cristalina de célula unitária
CCC e nestas condições uma de suas principais propriedades é ser ferromag-
nético. No entanto, em temperaturas acima de 910 °C até 1390 °C, o ferro a
não é mais estável e forma o ferro g de célula unitária CFC; em temperaturas
acima de 1390 °C até atingir o ponto de fusão a 1539 °C ocorre uma nova
transformação para o ferro d , que possui célula unitária CCC igual ao ferro
a , porém, em temperaturas acima de 771 °C o ferro a não apresenta mais a
característica de ser ferromagnético e torna-se paramagnético. A Figura 3.13
apresenta um gráfico das células unitárias do Fe em função da temperatura.

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 123


Figura 3.13 | Transformações das células unitárias em função da temperatura

Fonte: elaborada pelo autor.

O ferro a , em temperaturas inferiores a 771 °C, apresenta estrutura


cristalina CCC e sistema cristalino cúbico, o qual apresenta os três eixos
cristalográficos a, b e c de mesmo tamanho e mutuamente perpendiculares,
isto é, a, b e g apresentam ângulos iguais a 90°. A estrutura cristalina do
ferro a faz parte da chamada rede de Bravais. A Figura 3.14 apresenta a
estrutura cristalina ferro a , também chamada de ferrita, em que os átomos
de ferro estão dispostos em um arranjo CCC (átomos maiores) e os átomos
de carbono (átomos menores) estão em espaços vazios da célula unitária.

Figura 3.14 | Estrutura cristalina do ferro a

Fonte: https://it.wikipedia.org/wiki/Ferrite_(siderurgia). Acesso em: 9 out. 2018.

Assim, o cliente poderá utilizar ferro a na fabricação de discos rígidos,


uma vez que esse material apresenta a propriedade de ferromagnetismo em
temperaturas até 910 °C.

124 U3
- / Estruturas cristalinas
Avançando na prática

Estruturas cristalinas

Descrição da situação-problema
Recentemente você foi contratado como analista em uma empresa que
fabrica cartões de crédito. Para a confecção dos cartões são utilizados alguns
tipos de plásticos e metais; para a tarja magnética são utilizados metais que
requerem a capacidade de armazenar dados como as informações do cliente,
as funções do cartão e as transações realizadas. Assim como o ferro a , o
cobalto é ferromagnético e essa característica, no primeiro caso, está relacio-
nada à temperatura e ao tipo de célula unitária. É possível afirmar que o
cobalto possui os mesmos tipos de células unitárias que o ferro nas mesmas
condições de temperatura? O cobalto poderia ser utilizado nessas aplicações?

Resolução da situação-problema
O cobalto é um elemento químico de símbolo Co e número atômico 27.
Tal como o níquel, o cobalto não é encontrado puro na natureza, sua forma
pura é obtida por fusão, isto é, por metalurgia extrativa. O cobalto é um metal
cinza-prateado, brilhante e duro; e assim como o ferro, é ferromagnético e
ocorre em duas estruturas cristalográficas: hexagonal compacta e cúbica
de face centrada. Da temperatura ambiente até 477 °C apresenta estrutura
HC; já em temperaturas superiores, na faixa de 477 °C a 1490 °C, é CFC;
no entanto, a diferença de energia é tão pequena que, na prática, é comum
o intercrescimento aleatório das duas estruturas. Assim, podemos concluir
que a característica ferromagnética dos metais não depende unicamente do
tipo de estrutura. Ao compararmos o ferro com o cobalto observa-se que os
metais apresentam estruturas cristalinas distintas: enquanto o ferro a 477 °C
possui estrutura cúbica de corpo centrado e não se observam quaisquer tipos
de transformação de célula unitária, o cobalto, nessa temperatura, possui
célula unitária hexagonal compacta (Figura 3.15).

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 125


Figura 3.15 | Comparação entre as estruturas cristalinas do cobalto e ferro

Fonte: elaborada pelo autor.

Assim, é possível concluir que o cobalto pode ser utilizado na fabricação


de tarjas magnéticas de cartão de crédito, uma vez que é ferromagnético
mesmo em elevadas temperaturas.

Faça valer a pena

1. A estrutura cristalina refere-se aos arranjos que os átomos podem assumir quando
os materiais estão no estado sólido, e descreve uma estrutura altamente ordenada
devido à natureza dos seus constituintes em formar padrões simétricos.

Assinale a alternativa que denomina corretamente a menor unidade de repetição e


que descreve completamente o padrão de uma estrutura cristalina.
a) Parâmetro de rede.
b) Célula unitária.
c) Ligação iônica.
d) Átomo.
e) Elétron.

2. A célula unitária pode ser definida como o menor agrupamento de átomos no


espaço, possuindo a simetria do cristal que, quando repetido em todas as direções,
resultará na estrutura cristalina original. “A célula _________ é formada por camadas
atômicas __________, nas quais a primeira e a terceira camada ocupam os vazios
tetraédricos, onde cada átomo toca ___________ no seu próprio plano, três átomos
na camada acima e três abaixo do seu plano; essa célula unitária apresenta número de
coordenação igual a _____________”.

126 U3
- / Estruturas cristalinas
Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas:
a) cúbica de corpo centrado; alternadas; quatro átomos; dois.
b) hexagonal compacta; lineares; seis átomos; quatro.
c) cúbica de face centrada; regulares; quatro átomos; 12.
d) cúbica simples; lineares; dois átomos; quatro.
e) hexagonal compacta; alternadas; seis átomos; 12.

3. A prata é um metal de transição que ocorre naturalmente em sua forma pura


e dentre suas principais propriedades destaca-se a ótima condutividade elétrica. A
prata tem uma estrutura cristalina CFC, massa específica igual a 10,5 g cm 3 e peso
atômico igual a 107,87 g mol .

A partir da estrutura cristalina e dos dados fornecidos sobre a prata, é correto afirmar
que o volume de sua célula unitária, em m 3 igual a:
a) 6,83´10-23
b) 6,32´1024
c) 6,83´10-29
d) 6,83´1023
e) 6,83´1029

Seção 3.1 / Estruturas cristalinas e sistemas cristalinos - 127


Seção 3.2

Imperfeições cristalinas

Diálogo aberto
O estudo da Ciência dos Materiais é dinâmico e muito interessante,
pois a cada dia surgem novas ideias e novas necessidades que resultam no
desenvolvimento de novos materiais. Os metais e as ligas metálicas, por
exemplo, apresentam diversas propriedades. Você sabia que em algumas
marcas de smartphones são utilizados alguns metais como ouro e prata por
apresentarem uma ótima condutividade elétrica e maleabilidade? Já o ferro
nodular, por apresentar uma elevada resistência, é utilizado na fabricação
de virabrequins, engrenagens e outros componentes automotivos. Nesta
seção, vamos estudar sobre as imperfeições nos sólidos, isto é, os defeitos
nos materiais sólidos. No entanto, vamos compreender quão importante é a
presença desses defeitos nas propriedades dos materiais. Se não existissem
defeitos, os cristais não teriam cores, não existiriam os dispositivos eletrô-
nicos do estado sólido e alguns metais seriam tão resistentes que não
poderiam ser utilizados.
Portanto, é chegado o momento em que você, como vendedor técnico
de uma metalúrgica, está negociando a venda de um lote de ferro a para
um cliente bem exigente e que a cada momento tem uma nova dúvida.
Essa venda é muito importante para a metalúrgica, já que a empresa está
passando por uma expansão e precisa aumentar suas vendas. O cliente
utilizará o ferro a em diversas aplicações e em diferentes condições de
temperatura e você já esclareceu que o ferro a só apresenta a proprie-
dade de ser ferromagnético em temperaturas inferiores a 771 °C e, poste-
riormente, explicou porque esse metal de estrutura cúbica de corpo
centrado é maleável, flexível e apresenta baixa rigidez e propriedades
que estão relacionadas com o sistema cristalino. Pensando em novas
aplicações, o cliente questionou se existe a possibilidade de aumentar
a dureza do ferro a . Mas como é possível modificar a propriedade do
metal? Os metais apresentam algum tipo de impureza ou defeito? Quais
tipos de defeitos o ferro a pode apresentar? No estudo desta seção você
compreenderá o que significam as impurezas nos materiais sólidos e
também compreenderá que a adição de impurezas pode ser intencional
quando queremos alterar algumas propriedades iniciais dos materiais.
Você entenderá que os sólidos apresentam diferentes tipos de defeitos e
será capaz de identificá-los e distingui-los. Mais uma vez você recorrerá
aos estudos da Ciência dos Materiais para responder a essas questões
e, no final, conhecerá conceitos e aspectos importantes que devem ser

128 U3
- / Estruturas cristalinas
considerados na seleção de um material adequado para uma determi-
nada aplicação.
Então, vamos iniciar nossos estudos?
Boa sorte!

Não pode faltar


As estruturas cristalinas estudadas anteriormente são estruturas ideali-
zadas e simplificadas, de maneira que possam ser utilizadas para compre-
endermos muitos princípios importantes que regem o comportamento de
sólidos. Em contraste, os cristais reais contêm um grande número de defeitos
que variam desde a quantidade de impurezas até a falta de átomos ou íons e
que contribuem para as propriedades dos materiais. É verdade que a palavra
“defeito” nos remete a algo ruim ou indesejável, no entanto, nos estudos
sobre materiais, os defeitos são intencionalmente utilizados para manipular
as propriedades de um material. Por exemplo, a adição de elementos de liga
em um metal é um modo de introduzir um defeito no cristal. Há alguns
tipos básicos de defeitos em um sólido cristalino: defeitos pontuais, defeitos
lineares, defeitos interfaciais e defeitos volumétricos.
Os defeitos pontuais são regiões em que há ausência de um átomo ou o
átomo encontra-se em uma região irregular na estrutura cristalina. Entre os
defeitos pontuais incluem-se: lacunas, autointersticial, impurezas substitu-
cionais e intersticiais. A lacuna é o defeito mais simples e, como o próprio
nome sugere, pode-se observar a ausência de um átomo na rede cristalina
(Figura 3.16).
Figura 3.16 | Representação bidimensional de uma lacuna

Fonte: elaborada pelo autor.

As lacunas são defeitos comuns, especialmente em altas temperaturas,


quando os átomos estão frequentemente em movimento e mudam de posições
aleatoriamente, deixando para trás sítios da rede vazios. A maioria dos casos
em que temos difusão (transporte de massa por movimento atômico), esta
só ocorre devido à presença de lacunas. É possível determinar o número de
lacunas em uma rede cristalina utilizando a equação:

Seção 3.2 / Imperfeições cristalinas - 129


æ Q ö
N l = N exp çç- l ÷÷
çè kT ÷ø

Em que N é o número total de sítios atômicos, Ql é a energia necessária


para a formação de uma lacuna, T é a temperatura absoluta em Kelvin e k é
-23
a constante de Boltzmann ( 8,62´10-5 eV átomo × K ou 1,38´10 J átomo × K
). O número total de sítios atômicos é calculado a partir da equação:

N Ar
N=
A

Nessa expressão N A é o número de Avogadro, r é a massa específica


e A peso atômico. Assim observa-se que a quantidade de lacunas aumenta
exponencialmente em função da temperatura.

Exemplificando
Vamos determinar o número de lacunas no ferro em 900 °C, sabendo que
a massa específica do ferro é igual a 7,65 g cm3 , peso atômico igual a
55,85 g/mol, o número de Avogadro igual a 6,023´1023 átomos mol e
energia de formação de uma lacuna é 1,08 eV/átomo.
æ Q ö N r æ Q ö
N l = N exp çç- l ÷÷ = A exp çç- l ÷÷
çè kT ÷ø A çè kT ÷ø
(6,023 ´1023 átomos/mol)(7,65 g/cm 3 ) æ 1,08 eV/átomo ö÷
= exp çç- ÷
55,85 g/mol èç (8,62´10 eV/átomo × K)1173K ø÷
-5

4,61 ´1024 æ 1,08 eV/átomo ö÷


= exp çç- ÷
55,85 èç (8,62´10-5 eV/átomo × K)1173K ø÷
= (8,25 ´1022 )exp -10,68 = (8,25 ´1022 ) × (2,30´10 5 )
= 1,9´1018 lacunas × cm 3

O número de lacunas é comumente representado das seguintes


maneiras:
Em função de centímetros cúbicos 1,9´1018 lacunas cm3
ou 1,9´10 cm , ou metros cúbicos 1,9´1024 lacunas m3
18 -3

ou 1,9´1024 m-3 .

Outro tipo de defeito pontual é o autointersticial, no qual um átomo da


rede cristalina se desloca e fica comprimido em um sítio intersticial, uma
região que, sob condições normais, não estaria ocupada. As impurezas
também são consideradas defeitos pontuais e são do tipo impureza substitu-
cional, em que um átomo, diferente daqueles que formam a rede cristalina,
substitui outro átomo da estrutura e geralmente apresenta diferença de no
máximo 15% do raio do átomo da estrutura original. Um exemplo de átomos

130 U3
- / Estruturas cristalinas
de impureza substitucional são os átomos de zinco no latão, os quais têm raio
igual a 0,133 nm e substituem alguns átomos do cobre que têm raio 0,128
nm; e impureza intersticial, na qual os átomos são muito menores do que
os da rede cristalina. Esses tipos de átomos de impurezas intersticiais encai-
xam-se no espaço vazio entre os átomos da estrutura cristalina. É importante
destacar que a adição de impurezas também pode resultar na formação de
uma solução sólida que se forma quando a adição de soluto (elemento em
menor quantidade) ao material hospedeiro (solvente – material em maior
quantidade) não provoca nenhuma mudança na estrutura cristalina. A
Figura 3.17 apresenta os diferentes tipos de defeitos pontuais.
Figura 3.17 | Defeitos pontuais

Fonte: adaptada de https://sites.google.com/site/danamaterials/imperfections/Fracture_Eng003.jpg. Acesso


em: 17 out. 2018.

Outros tipos de defeitos são os defeitos lineares e as discordâncias. As


discordâncias são defeitos em que alguns átomos se encontram fora da sua
posição na estrutura cristalina, e sua principal função na microestrutura é
controlar a resistência ao escoamento e a subsequente deformação plástica
dos sólidos cristalinos a temperaturas normais, isto é, temperaturas em que
não são observadas transformações do estado da matéria. As discordâncias
também participam do crescimento dos cristais e das estruturas de inter-
faces entre eles e são geradas e movidas quando uma tensão é aplicada.
Existem dois tipos básicos de discordâncias: a discordância aresta e a discor-
dância espiral. Na verdade, a maioria das discordâncias é, provavelmente,
um híbrido das formas de aresta e espiral. A discordância aresta pode ser
facilmente visualizada como um semiplano extra de átomos em uma estru-
tura cristalina. Muitas vezes esses semiplanos são chamados de linhas da
discordância devido ao alinhamento dos átomos estarem alinhados ao longo
de uma linha (Figura 3.18). Na discordância em aresta as ligações interatô-
micas são significativamente distorcidas nas imediações da linha de discor-
dância. Compreender o movimento de uma discordância é fundamental
para entender a deformação plástica nos materiais, que corresponde ao
movimento de grandes números de discordâncias.

Seção 3.2 / Imperfeições cristalinas - 131


Figura 3.18 | Discordância aresta

Fonte: adaptada de https://de.wikipedia.org/wiki/Versetzung_(Materialwissenschaft)#/media/File:Burgers_


vektor.svg. Acesso em: 17 out. 2018.

A discordância se move de forma semelhante a uma lagarta, ou seja, uma


pequena quantidade por vez. A discordância na metade superior do cristal
está deslizando plano por plano, da esquerda para a direita, iniciando na
posição A, passando por B até formar uma unidade de distância interatômica
à direita do cristal. Assim, uma pequena fração das ligações interatômicas são
quebradas durante o movimento da discordância. Na Figura 3.19 se observa
o movimento de uma discordância quando o cristal é sujeito a uma tensão de
cisalhamento, formando uma unidade de distância interatômica.
Figura 3.19 | Movimento de discordância

Fonte: adaptada de https://e5a5e21295859d53b15f-83f0bd7793a5a4b61ea12de988b1f44d.ssl.cf2.rackcdn.


com/noticias/imagem/Image/con-515.gif. Acesso em: 17 out. 2018.

A magnitude e a direção da distorção de rede associada a uma discor-


dância são expressas em termos de um vetor de Burgers representado por b ,
como mostra a Figura 3.20 (CALLISTER; RETHWISH, 2018).

132 U3
- / Estruturas cristalinas
Figura 3.20 | Vetor de Burgers

Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/dd/Burgers_vektor.svg. Acesso em: 17 out. 2018.

Reflita
Como o movimento das discordâncias podem ser fundamentais para a
deformação e aumento da resistência dos materiais?

Já a discordância do tipo espiral é um pouco mais difícil de visualizar. A


natureza de uma discordância é definida pelas orientações relativas da linha
da discordância e do vetor de Burgers. Em uma discordância aresta elas são
perpendiculares, enquanto em uma discordância espiral elas são paralelas
(CALLISTER; RETHWISH, 2018, p.). A Figura 3.21 mostra a representação
do movimento de uma discordância espiral.
Figura 3.21 | Movimento de uma discordância espiral

Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Dislocation_vis_et_deformation_3d.svg. Acesso em: 17


out 2018.

Seção 3.2 / Imperfeições cristalinas - 133


Os defeitos interfaciais são defeitos bidimensionais que aparecem em
cristais em que normalmente o material apresenta estruturas cristalinas ou
orientações cristalográficas diferentes. Esses defeitos podem ser divididos
em: superfícies externas, contornos de grão contornos de fase e contornos
de macla. Nos defeitos de superfície externa, cada átomo na superfície já não
apresenta o número de coordenação adequado e as ligações atômicas já se
encontram rompidas, de modo que os átomos encontram-se em estado de
maior energia.
Outro tipo de defeito interfacial é o contorno de grão, que é o limite onde
termina e começa outro grão; os sólidos são geralmente constituídos por um
número de grãos que podem variar em comprimento e na transição de suas
orientações cristalinas em relação a um grão adjacente. Quando a diferença
entre as orientações cristalinas dos grãos é pequena, utiliza-se o termo
contorno de grão de baixo ângulo, e quando esse desajuste de orientação é
grande, utiliza-se o termo contorno de grão de alto ângulo.
A Figura 3.22 apresenta um esquema dos contornos de grão e a micro-
grafia de um metal policristalino com os limites de grão evidenciados por
ataque ácido.
Figura 3.22 | Esquemático mostrando os contornos de grão baixo e alto e micrografia eletrônica

Fonte: adaptada de Callister e Rethwish (2018, p. 108); Simêncio (2016, p. 89).

O tamanho dos grãos pode ser controlado pela taxa de resfriamento


quando um material é fundido ou tratado termicamente. Geralmente um
resfriamento rápido produz grãos menores, enquanto um resfriamento lento
produz grãos maiores. O tamanho do grão pode ser determinado utilizando
o método desenvolvido pela Sociedade Americana para Testes e Materiais
(ASTM – do inglês American Society of Testing and Materials), no qual se
utilizam vários quadros comparativos com números atribuídos de 1 a 10,
que são chamados números do tamanho do grão. Para usar esse método
uma amostra deve ser preparada adequadamente e fotografada com uma
ampliação de 100´ , assim o tamanho do grão é determinado pelos grãos que

134 U3
- / Estruturas cristalinas
mais se assemelham aos grãos da micrografia. A comparação dos quadros
para determinação do tamanho de grão está relacionada ao número médio
de grãos por polegada quadrada sob ampliação de 100´ . Esses parâmetros
estão relacionados pela equação:
N = 2n-1

Em que n representa o número do tamanho do grão.


Outro tipo de defeito interfacial é o contorno de macla, que é um tipo
especial de contorno de grão. Nesse defeito existe uma específica simetria
em espelho da rede cristalina, onde os átomos em um dos lados do contorno
estão localizados em posições de imagem em espelho em relação aos átomos
do outro lado do contorno. Por fim, os defeitos denominados contornos de
fase são aqueles nos quais existe uma fase distinta em cada lado do contorno,
em que cada uma das fases constituintes tem suas próprias características
físicas e/ou químicas distintas.

Saiba mais
Quer aprender mais sobre os defeitos interfaciais? Acesse em sua biblio-
teca digital o Capítulo 4, Imperfeições nos Sólidos, de Callister e Rethwish
(2018), nas páginas de 108 a 110.
CALLISTER, W.; RETHWISH, D. G. Imperfeições nos Sólidos. In: CALLISTER,
W.; RETHWISH, D. G. Ciência e Engenharia de Materiais: uma intro-
dução. 9. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2018. p. 108-110.

Outro tipo de defeito encontrado nos materiais sólidos são os defeitos


volumétricos. É comum dividi-los em quatro classes, que se baseiam na
combinação do tamanho e do efeito da partícula:
• Precipitados: são pequenas partículas introduzidas na matriz de
uma reação no estado sólido e que aumentam a resistência das ligas
estruturais.
• Dispersantes: são partículas maiores que se comportam como uma
segunda fase e que adicionalmente influenciam o comportamento
da fase primária.
• Inclusões: são geralmente constituintes indesejáveis na
microestrutura.
• Vazios (ou poros): são causadas por gases que ficaram presos
durante a solidificação, ou por condensação vaga no estado sólido, e
são quase sempre defeitos indesejáveis.

Seção 3.2 / Imperfeições cristalinas - 135


Sem medo de errar
Chegamos ao final do estudo desta seção e, neste momento, como
vendedor técnico da metalúrgica, você deve ser capaz de responder às dúvidas
do cliente: é possível manipular a propriedade do metal? Quais impurezas ou
defeitos podem haver no ferro a ?
As impurezas também são consideradas defeitos pontuais e são do tipo
impureza substitucional em que um átomo, diferente daqueles que formam
a rede cristalina, substitui outro átomo da estrutura e geralmente apresenta
diferença de no máximo 15% do raio do átomo da estrutura original. Um
exemplo de átomos de impureza substitucional são os átomos de zinco no
latão, os quais têm raio igual a 0,133 nm e substituem alguns átomos do
cobre que têm raio 0,128 nm. Já átomos de impurezas intersticiais são muito
menores do que os átomos da rede cristalina e por isso encaixam-se no espaço
vazio entre os átomos dessa estrutura cristalina. É importante destacar que
a adição de impurezas também pode resultar na formação de uma solução
sólida que se forma quando a adição de soluto (elemento em menor quanti-
dade) ao material hospedeiro (solvente – material em maior quantidade) não
provoca nenhuma mudança na estrutura cristalina. A Figura 3.23 apresenta
um esquema do que poderia acontecer com o ferro a e os átomos de carbono.
A rede cristalina é “esticada” por meio da adição de soluto intersticial, o que
provoca uma tensão. No caso do ferro a , o soluto seria o carbono e o ferro,
o solvente. Os átomos de carbono nos locais intersticiais da rede criam um
campo de tensão que impede o movimento de deslocação e consequente-
mente aumenta a resistência mecânica.
Figura 3.23 | Esquemático de impurezas intersticiais

Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Strengthening_mechanisms_of_materials. Acesso em: 17 out. 2018.

136 U3
- / Estruturas cristalinas
O ferro a , assim como os outros materiais sólidos, pode apresentar
diversos tipos de defeitos, tais como: defeitos pontuais, defeitos lineares,
defeitos interfaciais e defeitos volumétricos. E como observamos, muitas
vezes a presença desses defeitos é imprescindível para termos materiais
com determinadas propriedades. Dessa forma, você foi capaz de explicar ao
cliente a maneira correta de manipular as propriedades do ferro a .

Avançando na prática

Imperfeições cristalinas

Descrição da situação-problema
Atuando em um laboratório de análise por microscopia eletrônica de
varredura (MEV), você obteve a micrografia apresentada na Figura 3.24.
Como responsável técnico pelo laboratório, você deve emitir um laudo
sobre os defeitos encontrados no material analisado: o dissulfeto de molib-
dênio ( MoS2 ) – um sólido branco utilizado como lubrificante devido às suas
propriedades de baixo atrito.
Figura 3.24 | Micrografia obtida por microscopia eletrônica de varredura (MEV)

Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/File:MoS2_antisites%26vacancies.jpg. Acesso em: 17 out. 2018.

A partir da análise das micrografias, quais os defeitos que estão presentes


na estrutura cristalina do dissulfeto do molibdênio?

Resolução da situação-problema
A micrografia apresentada do dissulfeto de molibdênio traz dois tipos
de defeitos: na Figura 3.24 (a) os átomos de molibdênio (Mo) substituem
os átomos de enxofre (S), ou seja, são considerados impurezas e defeitos
pontuais. Os defeitos pontuais do tipo impureza substitucional é quando um

Seção 3.2 / Imperfeições cristalinas - 137


átomo diferente daqueles que formam a rede cristalina substitui um átomo
da estrutura e geralmente apresenta diferença de no máximo 15% do raio
do átomo da estrutura original. Já na Figura 3.24 (b) temos outro tipo de
defeito pontual, as lacunas. Esse tipo de defeito é muito comum especial-
mente em altas temperaturas e ocorre quando os átomos estão frequente-
mente em movimento e mudam de posições aleatoriamente, deixando para
trás sítios da rede vazios. Na micrografia apresentada na Figura 3.24 (b) é
possível observar a ausência de átomos de enxofre (S) originando a lacuna.

Faça valer a pena

1. Os cristais reais contêm um grande número de defeitos que variam desde quanti-
dades de impurezas à falta de átomos ou íons. Esses defeitos ou imperfeições contri-
buem para as propriedades dos materiais. Os defeitos pontuais são regiões em que
há a ausência de um átomo ou o átomo encontra-se em uma região irregular na
estrutura cristalina.

Assinale a alternativa que apresenta somente tipos de defeitos pontuais.


a) Lacunas e trincas.
b) Autointersticial e impurezas substitucionais.
c) Lacunas e poros.
d) Autointersticial e contornos de grãos.
e) Impurezas intersticiais e trincas.

2. Analise as afirmações abaixo e classifique-as entre falsas (F) ou verdadeiras (V)


I. A discordância aresta pode ser facilmente visualizada como um semiplano extra
de átomos em uma estrutura cristalina.
II. A natureza de uma discordância é definida pelas orientações relativas da linha da
discordância e do vetor de Burgers.
III. O movimento de uma discordância quando o cristal é sujeito a uma tensão de
cisalhamento, forma uma célula unitária.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta:


a) I-V; II-V; III-F.
b) I-V; II-V; III-V.
c) I-F; II-F; III-F.
d) I-F; II-V; III-F.

138 U3
- / Estruturas cristalinas
3. A classificação de imperfeições cristalinas é feita, frequentemente, de acordo com
a geometria ou com a dimensionalidade do defeito. As lacunas são defeitos comuns,
especialmente em altas temperaturas, quando os átomos estão frequentemente em
movimento e mudam de posições aleatoriamente, deixando para trás sítios da rede
vazios.

3
Sabendo que a massa específica da prata é igual a 9,5 g cm , peso atômico igual a
23
107,9 g/mol, o número de Avogadro igual a 6,023´10 átomos mol e energia de
formação de uma lacuna é 1,10 eV/átomo, o número de lacunas da prata a 800 °C é
igual a:
a) 3,63´1017 lacunas × m-3 .
b) 36,3´1017 lacunas × cm-3 .
c) 3,63´1017 lacunas × cm-3 .
d) 3,63´1019 lacunas × cm-3 .
e) 36,3´1019 lacunas × m-3 .

Seção 3.2 / Imperfeições cristalinas - 139


Seção 3.3

Difusão

Diálogo aberto
No nosso dia a dia é muito comum usufruirmos de equipamentos em que
algumas peças ou materiais dependeram do processo que envolva a movimen-
tação atômica, antes de sua aplicação/utilização. E onde podemos encontrar
essas peças ou materiais no nosso cotidiano? Um exemplo de um objeto em
que ocorre esse fenômeno é a garrafa plástica. Em seu processo de fabri-
cação ocorre a movimentação do dióxido de carbono ( CO2 ). Nesta última
seção vamos estudar sobre esse movimento que é conhecido como difusão
atômica, um fenômeno muito importante que nos ajuda a compreender
por que os materiais submetidos a tratamentos térmicos, como os metais,
apresentam melhoras em suas propriedades. O estudo da difusão nos ajuda
analisar a inter-relação entre a estrutura, o processamento, as propriedades e
o desempenho de um material. A partir dos mecanismos de difusão vamos
entender como é possível introduzir átomos de impurezas em sólidos crista-
linos e qual a relação com o tempo e a temperatura. Adicionalmente vamos
compreender que, para ocorrerem os fenômenos da difusão, é necessária a
presença de imperfeições na rede cristalina, como os defeitos de lacunas e os
defeitos em que átomos estão localizados em uma posição intersticial. Agora
vamos iniciar seu último desafio desta unidade: você, como vendedor técnico
de uma metalúrgica, está negociando a venda de um grande lote de ferro a
para um cliente bem exigente. O ferro alfa será utilizado em diversas aplica-
ções e em diferentes condições de temperatura, mas, por sigilo empresarial,
o cliente não lhe informou a aplicação exata. Justamente por esse motivo
você tem sido questionado sobre algumas características do material, como
as propriedades exibidas em certas temperaturas. No último contato você
esclareceu que o ferro alfa, assim como os outros materiais sólidos, pode
apresentar diversos tipos de defeitos, tais como: defeitos pontuais, defeitos
lineares, defeitos interfaciais e os defeitos volumétricos. E que muitas vezes
a presença desses defeitos são imprescindíveis para termos materiais com
determinadas propriedades. Mas, além de exigente, o cliente é muito curioso
e lançou uma nova pergunta: como é possível aumentar a dureza do ferro
alfa? É possível aumentar a dureza de uma engrenagem de aço, por exemplo?
No estudo desta seção você será capaz de descrever os dois mecanismos
da difusão e apontar as principais diferenças entre eles. Você também irá
adquirir a habilidade de calcular o coeficiente de difusão para um deter-
minado material a uma temperatura conhecida. Ao final desta seção, você
conhecerá os conceitos de difusão atômica e o movimento de átomos, assim

140 U3
- / Estruturas cristalinas
como a importância desses movimentos para a manipulação das proprie-
dades dos materiais.
Lembre-se, essa é sua última oportunidade de convencer o cliente e fechar
a venda.
Bons estudos e boa sorte!

Não pode faltar


A difusão é um fenômeno que ocorre no interior de materiais sólidos,
líquidos e gasosos e, genericamente, pode ser definida como o fluxo de átomos
ou espécies de uma região de elevada concentração a uma região de baixa
concentração, dependendo essencialmente do gradiente de concentração e
da temperatura (ASKELAND, 2014, p. 124). Nos casos em que o conceito de
difusão está associado a um determinado tipo de material, é comum encon-
trarmos definições que utilizam termos mais específicos quanto à natureza
do material como:
A difusão é o fenômeno de transporte de matéria por movimento: atômico
(nos metais), íons (nas cerâmicas) e macromoléculas (nos polímeros) que
dependem do gradiente de concentração e temperatura. Atualmente vários
processos tecnológicos importantes necessitam do controle do aumento ou da
diminuição da difusão, como o endurecimento superficial de aços na condu-
tividade elétrica de materiais cerâmicos condutores, em componentes micro-
eletrônicos e fibras ópticas (ASKELAND, 2014). A Figura 3.25, apresenta um
contexto em que ocorre a difusão. Nela temos algumas partículas dissolvidas
em um copo com água. Inicialmente essas partículas se encontram próximas
ou agrupadas (Figura 3.25a), posteriormente, observa-se que se todas as
partículas se movem aleatoriamente em torno da água, as partículas irão
eventualmente se distribuir de forma aleatória e uniforme e seu movimento
continuará ocorrendo mesmo sem o fluxo da água (Figura 3.25b).
Figura 3.25 | Representação esquemática da difusão de partículas em meio líquido

Fonte: adaptada de: https://goo.gl/LcP7C5. Acesso em: 22 out. 2018.

Seção 3.3 / Difusão - 141


Nos materiais sólidos o fenômeno é o mesmo, no entanto, não é tão
simples de se observar. Vamos imaginar uma barra de cobre e uma barra de
estanho que estão intimamente em contato entre as duas faces (Figura 3.26).
Figura 3.26 | Representação esquemática das barras de cobre (Cu) e estanho (Sn) e seus res-
pectivos átomos

Fonte: elaborada pelo autor.

Se as barras fossem aquecidas a uma temperatura elevada (inferior à


temperatura de fusão) durante um certo período de tempo e posteriormente
fossem resfriadas, uma análise química indicaria o que está representado na
Figura 3.27, ou seja, os átomos de cobre se difundiram entre os átomos de
estanho e os átomos de estanho se difundiram entre os átomos de cobre. Esse
processo em que átomos de um metal difundem (migram) para o interior de
outro metal é denominado interdifusão ou difusão de impurezas.
Figura 3.27 | Representação esquemática da difusão de impurezas (Cu-Sn)

Fonte: elaborada pelo autor.

Saiba mais
O artigo intitulado Difusão em Materiais Cerâmicos: um estudo preliminar
apresenta e discute o fenômeno da difusão nos materiais cerâmicos em
que foi possível constatar a ocorrência da interdifusão.

BERNARDIN, A. M.; RIELLA, H. G. Difusão em Materiais Cerâmicos: um


estudo preliminar. Cerâmica Industrial, v. 4, p. 25-30, 2002.

A difusão não ocorre somente entre diferentes metais ou diferentes


sólidos, esse fenômeno também ocorre em sólidos puros, nos quais os
átomos mudam de posição e são do mesmo tipo, não havendo mudanças na
composição. Esse tipo de difusão é denominado autodifusão. Para que um
átomo ou espécie mude de posição são necessárias duas condições: primeiro
deve haver uma posição adjacente (vizinha) vazia e o átomo deve ter uma
quantidade de energia capaz para romper as ligações químicas entre os seus
átomos vizinhos causando uma distorção na rede cristalina durante seu

142 U3
- / Estruturas cristalinas
movimento. Essa energia é de origem vibracional e possibilita que o átomo
se desloque ao longo da rede cristalina, porém, apenas uma pequena fração
de átomos é capaz de se mover devido à magnitude das energias vibracionais.
A fração de átomos aumenta com o aumento da temperatura (CALLISTER,
2018, p.49). Especificamente nos materiais metálicos, os movimentos dos
átomos acontecem prioritariamente por difusão em lacunas e difusão
intersticial. Como o próprio nome sugere, na difusão em lacunas ocorre o
movimento do átomo e da lacuna existente na rede cristalina do metal, em
que o átomo ocupa a posição da lacuna e a lacuna passa a ocupar a posição
do átomo (Figura 3.28).
Figura 3.28 | Difusão por lacunas

Fonte: https://goo.gl/ikbtJm. Acesso em: 22 out. 2018.

Reflita
A quantidade de lacunas aumenta em função da temperatura. De que
forma esse fenômeno está relacionado à difusão?

A difusão intersticial é outro tipo de movimento atômico no qual os


átomos, inicialmente localizados em uma posição intersticial, migram para
uma posição intersticial adjacente e vazia (Figura 3.29).
Figura 3.29 | Difusão intersticial

Fonte: elaborada pelo autor.

Esse mecanismo é observado na interdifusão de impurezas que possuem


raios suficientemente pequenos para ocupar esses interstícios, como os
átomos de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio. Nesse mecanismo
não é preciso ter lacunas para que ocorra a movimentação das espécies. Na
maioria dos metais esse tipo de difusão ocorre mais rapidamente do que a

Seção 3.3 / Difusão - 143


difusão por lacunas, justamente pelos menores tamanhos atômicos e conse-
quentemente pela fácil movimentação. Nos materiais cerâmicos, os cátions,
que são menores, difundem-se mais rapidamente que os ânions (ASKELAND,
2014, p.128). A movimentação atômica ou de íons só é possível quando é
fornecida uma energia suficiente e capaz de fazer com que essas espécies
saltem para uma nova posição, no entanto, para que as espécies ocupem essa
nova posição, antes, é necessário vencer uma barreira de energia denomi-
nada energia de ativação (Q). A taxa que os átomos, íons e outras partículas
se difundem em um material pode ser aferida pelo fluxo J, no entanto, para
melhor compreensão, vamos nos referir apenas a átomos. O fluxo J corres-
ponde ao número de átomos que se movimentam por unidade de área, por
unidade de tempo em regime estacionário ao longo de uma única direção (x)
e é determinado pela equação também conhecida como primeira lei de Fick:

dC
J = -D
dx
2
em que D é a constante de proporcionalidade ( m s ), o sinal negativo
indica a direção da difusão que se dá contra o gradiente de concentração
dC
, isto é, da concentração mais alta para a mais baixa (CALLISTER, 2013,
dx
p. 130). No entanto, na maioria das situações ocorre a difusão em regime
transiente ou não estacionário em que o fluxo de difusão e a concentração
de gradiente em um determinado ponto no interior do sólido variam com o
tempo. Assim, faz-se necessária a segunda lei de Fick, expressa por:
¶c ¶ æ ¶C ÷ö
= ççD ÷
¶t ¶x çè ¶x ÷ø

Caso seja estabelecido que o coeficiente de difusão D não é uma função da


posição x e da concentração C do átomo em difusão, a equação que corresponde
à segunda lei de Fick pode ser reescrita de maneira simplificada conforme:
¶c æ ¶ 2C ö
= D ççç 2 ÷÷÷
¶t çè ¶x ÷ø

A solução dessa expressão depende das condições inicias e de contorno


em cada situação específica e uma das soluções é expressa:
C x - C0 æ x ÷ö
= 1- erf çç ÷
C s - C0 èç 2 Dt ÷÷ø

Na qual Cx representa a concentração em uma profundidade x após um


tempo t, Cs é a concentração constante na superfície, C0 é a concentração
uniforme inicial dos átomos em difusão no material e erf (x 2 Dt ) é a
função erro de Gauss.

144 U3
- / Estruturas cristalinas
Assimile
A função erro de Gauss, também conhecida apenas como função erro, foi
desenvolvida para elaborar o cálculo da integral da distribuição normal.

Alguns fatores influenciam a difusão, como a temperatura. O aumento


da temperatura fornece a energia térmica necessária para os átomos e íons
vencerem a energia de ativação. A dependência dos coeficientes de difusão se
relacionam com a temperatura ou a energia de térmica por meio da equação:
æ -Q ö
D = D0 exp çç d ÷÷
èç RT ø÷

onde D0 é uma constante pré-exponencial independente da tempera-


1,987cal 8,314J
tura (m2/s), R é a constante universal dos gases ideais ( ou ou
mol × K mol × K
8,62eV
), T é a temperatura absoluta (K) e Qd é a energia de ativação para
átomo × K a
difusão. Em via de regra, as energias de ativação são menores na difusão inters-
ticial quando comparadas à difusão por lacunas. A Tabela 3.2 apresenta alguns
valores das energias de ativação para a difusão de átomos em alguns materiais
que são representados em pares, denominados pares de difusão, os quais
apresentam a combinação do átomo de um elemento químico em difusão em
uma certa matriz (metal hospedeiro). Valores baixos de energia de ativação
indicam uma difusão mais fácil enquanto valores elevados indicam uma
difusão mais difícil. No caso da autodifusão, a energia de ativação é a energia
necessária para se criar uma lacuna e assim ocorrer o movimento do átomo.

Figura 3.29 | Difusão intersticial

Espécie em difusão Metal hospedeiro D0 (m²/s) Qd (kJ/mol)

Fe Fe- α 2,8´10-4 251


-5
Zn Cu 2, 4´10 189

Cu Cu 7,8´10-5 211
-5
Al Al 2,3´10 144
-4
C Fe- α 2,8´10 251

Fonte: adaptada de Callister (2018, p. 136).

Exemplificando
É possível determinar o coeficiente de difusão do carbono a 600 °C?
Resposta: utilizando a equação abaixo e os dados da Tabela 3.2 temos:

Seção 3.3 / Difusão - 145


æ -Q ö
D=D0exp çç d ÷÷
çè RT ÷ø
é (251000J/mol) ù
D=(2,8×10-4 m 2 /s)exp ê- ú
êë (8,31J/mol.K)(600+273K) úû
D=(2,8×10-4 m 2 /s)exp[-34,6]
D=2,63×10-19m 2 /s

Os cálculos dos coeficientes de difusão mostram como a temperatura


altera a magnitude da difusão.

Sem medo de errar


Hoje certamente foi o seu grande dia na empresa. Você, como vendedor
técnico de uma metalúrgica, estava atendendo um cliente muito exigente e
muito curioso e foi questionado por que o ferro a apresenta determinadas
características. Você explicou o que são impurezas em sólidos cristalinos
e o seu último desafio foi explicar se era possível aumentar as durezas do
ferro alfa e de peças como as engrenagens de aço. Como um bom vendedor,
você estudou, ao longo desta seção, a difusão, que é definida para os metais
como o transporte de matéria por movimento atômico. Atualmente vários
processos tecnológicos necessitam do controle do aumento ou da diminuição
da difusão, como o endurecimento superficial de aços e, neste caso, objetiva-
mente, você pode dizer ao cliente que é possível aumentar a dureza do ferro α
e a superfície de uma engrenagem de aço, graças à difusão, e utilizou a Figura
3.30 para explicar melhor esse fenômeno para o cliente.
Figura 3.30 | Corte esquemático de uma engrenagem metálica com superfície endurecida

Fonte: https://goo.gl/hgwqb2. Acesso em: 6 nov. 2018.

146 U3
- / Estruturas cristalinas
Na Figura 3.30 é possível observar que a superfície da engrenagem foi
endurecida, isto é, houve o aumento da dureza superficial. A camada mais
externa da superfície foi endurecida por um tratamento térmico adequado
e em elevada temperatura, e permitiu que átomos de carbono da atmosfera
se difundissem, ou seja, se movimentassem para o interior da superfície da
engrenagem. A superfície que apresenta maior dureza é destacada na figura
como uma borda escura. O aumento do teor de carbono é o responsável
pelo aumento da dureza. Dessa forma, temos uma engrenagem de aço que
apresenta uma elevada resistência ao desgaste. Adicionalmente você foi capaz
de explicar que a difusão apresenta dois mecanismos: difusão por lacunas e
difusão intersticial. E explanou que quando o fluxo não varia com o tempo
ocorre a difusão em regime estacionário, e quando existe a variação do fluxo
a difusão ocorre em regime não estacionário. Você como um excelente e
dedicado vendedor conquistou a confiança do cliente e finalmente fechou a
venda do lote de ferro a .
Parabéns!

Avançando na prática

Difusão

Descrição da situação-problema
Atuando em uma empresa de telefonia, você foi acionado pelo gestor
pois um lote de sim card fabricado a partir de monocristais de silício (Figura
3.31) apresentou problemas quando testado em diversos smartphones. Para
que funcionem adequadamente, os chips foram submetidos a tratamentos
térmicos e você recebeu apenas a informação de que esses tratamentos são
utilizados em razão das impurezas. Mas o qual a função dessas impurezas
nessa aplicação? Os tratamentos térmicos promovem algum fenômeno
conhecido? Como eles funcionam? Sua hipótese será importante para
direcionar a investigação do problema.

Seção 3.3 / Difusão - 147


Figura 3.31 | Sim card

Fonte: iStock .

Resolução da situação-problema
Os chips são encontrados em celulares, computadores, televisões e
smartphones; são fabricados por materiais semicondutores, como os
monocristais de silício. Para que os chips funcionem adequadamente eles são
submetidos a dois tratamentos térmicos: no primeiro, átomos de impurezas
são difundidos no silício a partir de uma fase gasosa cuja pressão é mantida
constante; já o segundo tratamento é utilizado para migrar os átomos das
impurezas que estão inicialmente na superfície para o interior do silício,
com o objetivo de obter uma distribuição de concentração de impurezas
mais uniforme sem o aumento do teor global das impurezas. Esse trata-
mento é conduzido a uma temperatura mais elevada que a primeira etapa
e exposto a uma atmosfera oxidante formando uma camada de óxido na
superfície. Qualquer tipo de problema durante os tratamentos térmicos
podem ocasionar o mau funcionamento dos sim cards. Nos dois tratamentos
térmicos observa-se o fenômeno da difusão, utilizada para manipular as
características do material.

Faça valer a pena

1. A difusão é o fenômeno de transporte de matéria por movimento atômico, de


íons e de macromoléculas. A difusão não ocorre somente entre diferentes metais ou
diferentes sólidos, esse fenômeno também ocorre em sólidos puros, em que os átomos
mudam de posição e são do mesmo tipo, não havendo mudanças na composição.

Assinale a alternativa correta que apresenta a qual fenômeno o texto-base se refere:


a) Interdifusão.
b) Difusão de impurezas.

148 U3
- / Estruturas cristalinas
c) Difusão por lacunas.
d) Difusão intersticial.
e) Autodifusão.

2. A difusão é um fenômeno que ocorre no interior de materiais sólidos, líquidos


e gasosos e, genericamente, pode ser definida como o fluxo de átomos ou espécies
de uma região de elevada concentração a uma região de baixa concentração, depen-
dendo essencialmente do gradiente de concentração e da temperatura. Dada as
seguintes afirmações:
I. Para que um átomo ou espécie mude de posição é necessário, apenas,
haver uma posição adjacente vazia e o átomo ter uma energia suficiente capaz de
quebrar as ligações químicas entre os átomos adjacentes.
II. A energia vibracional possibilita que o átomo se desloque ao longo da rede
cristalina, movendo uma fração significativa de átomos devido à magnitude das
energias térmicas.
III. O fluxo atômico, no regime estacionário, corresponde a uma constante
pré-exponencial que independe da temperatura e da concentração do gradiente.

É correto somente o que se afirma em:


a) I, II e III estão corretas.
b) Apenas II e III estão corretas.
c) Apenas I e II estão corretas.
d) Apenas I está correta.
e) Apenas II está correta.

3. Uma placa de ferro é exposta a 820 °C a uma atmosfera rica em carbono em um de


seus lados e a uma atmosfera deficiente em carbono no outro lado. Se uma condição
de regime estacionário é atingida, calcule o fluxo difusional do carbono por meio do
carbono pela placa, caso as concentrações de carbono nas posições a 10 e a 20 mm
abaixo da superfície carbonetante sejam de 1,5 e 1,0 kg m3 , respectivamente. Consi-
dere um coeficiente de difusão de 3´10-11 m2 s nessa temperatura.
Assinale a alternativa que apresenta o valor do fluxo difusional:
a) 2,0´10-9 kg / m2 × s .
b) -2,5´10-9 kg / m2 × s .
c) -1,5´10-9 kg / m2 × s .
d) 1,5´10-9 kg / m2 .s .
e) 2,5´10-9 kg / m2 × s .

Seção 3.3 / Difusão - 149


Unidade 4

Propriedades, processamento e desempenho dos


materiais

Convite ao estudo
O desenvolvimento e a pesquisa de novos materiais nos asseguram mais
conforto devido à melhora da qualidade de vida. Você conseguiria viver em
mundo sem a internet e outras tecnologias que nos proporcionam conforto
e praticidade? Certamente teríamos muita dificuldade, mas o fato é que
muitos avanços tecnológicos nos proporcionaram uma expectativa de vida
maior e melhor. Graças a materiais inovadores conseguimos captar a energia
solar e converter em energia elétrica, produzimos meios de transportes cada
vez mais velozes e seguros e meios de se comunicar mais eficientes, como
os celulares e smartphones. Neste momento talvez você esteja se questio-
nando: como é possível descobrir novos materiais ou então inovar os que
já conhecemos? E como é possível fabricar componentes, peças e produtos
que atendam às necessidades de uma aplicação específica? Se interpretarmos
as informações que já temos é possível concluirmos que a procura de um
determinado material surge da necessidade do homem, posteriormente, é
necessário compreender a estrutura e as propriedades para que possamos
estudar outros dois componentes muito importantes, o processamento e o
desempenho destes materiais. Assim, nessa unidade de ensino vamos estudar
alguns dos princípios fundamentais da ciência dos materiais: as propriedades,
os processamentos e o desempenho dos materiais metálicos, cerâmicos,
poliméricos e compósitos. Ao final desta unidade, você terá conhecido mais
alguns conceitos que lhe permitirão a análise e compreensão das proprie-
dades dos materiais para seleção, de modo a atender às características de
desempenho e processamento. Dessa forma, você será capaz de utilizar e
aplicar diferentes tipos de materiais de acordo com um determinado projeto.
É hora de enfrentarmos nosso próximo desafio: você foi contratado
como analista em um laboratório de análise de materiais que presta serviços
para diversas empresas. Em um primeiro momento, você será desafiado a
auxiliar uma empresa fabricante de componentes utilizados em motores de
combustão interna. Mas quais são as propriedades dos materiais metálicos?
Todos os componentes de um motor podem ser produzidos com o mesmo
metal ou liga metálica? Quais os processamentos utilizados para a obtenção
das peças com as propriedades desejadas? Em um segundo momento, será
a vez de auxiliar no projeto de órgãos artificiais e na utilização de materiais
cerâmicos empregados como implantes. Posteriormente, você auxiliará uma
empresa fabricante de próteses utilizadas na artroplastia do joelho ou do
quadril. Mas quais materiais podem ser utilizados nessa aplicação? Quais
as características de interesse desses materiais? Por fim, você ajudará uma
empresa na avaliação de dois materiais compósitos utilizados na fabricação
de componentes primários e secundários de aeronaves comercias. Mas como
você conseguirá prestar essas consultorias? Quais as características que
deverão ser avaliadas? Esses são alguns questionamentos que você será capaz
de responder ao concluir os estudos dessa unidade, portanto, seja persistente
e desenvolva um raciocínio crítico capaz de trazer sempre a resolução de
vários problemas.
Seção 4.1

Propriedades, processamento e desempenho dos


materiais metálicos

Diálogo aberto
Caro aluno, iniciamos mais uma etapa rumo ao final do semestre. No
nosso dia a dia, utilizamos diversos tipos de materiais metálicos, não é
mesmo? Desde as estruturas metálicas utilizadas para construir nossas casas
aos talheres que utilizamos nas refeições, sempre temos a presença dos metais.
Nesta seção vamos conhecer as propriedades, processamentos de alguns
metais e suas ligas metálicas normalmente utilizadas em diversos setores
industriais. Vamos conhecer a composição, os agrupamentos de diversas
ligas metálicas e seus respectivos agrupamentos, aprender sobre os sistemas
de especificações e introduzir alguns dos principais métodos de processa-
mento. Dessa forma, você compreenderá a importância de termos estudado
todos esses temas e será capaz de selecionar os metais adequados para uma
determinada aplicação, que atenda todas as especificidades de utilização.
Você, recém contratado como analista em um laboratório de análise de
materiais, recebeu uma demanda para auxiliar uma fabricante de peças para
motores automotivos na escolha dos possíveis materiais utilizados na fabri-
cação de engrenagens e virabrequins. A Figura 4.1a apresenta um virabre-
quim, enquanto a Figura 4.1b apresenta uma engrenagem.
Figura 4.1 | Peças para motores automotivos (a) virabrequim; e (b) engrenagens

Fonte: (a) https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Crankshaftrendering.png; (b) https://cdn.pixabay.com/


photo/2013/07/12/14/18/gears-148196_960_720.png. Acesso em: 26 fev. 2019.

Quais os materiais mais indicados para a fabricação desses componentes


metálicos? Quais suas propriedades? Ao longo desta seção, vamos estudar
os principais tipos de ligas ferrosas e ligas não ferrosas, compreender as
diferenças entre os aços com baixo, médio e alto teor de carbono e conhecer

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 153


suas aplicações típicas. Você será introduzido sobre alguns tipos de fabri-
cação de metais e operações de conformação a quente e a frio. Lembre-se
de que as decisões sobre a seleção de um determinado material também são
influenciadas pelas facilidades de processamento, mas, como sabemos, todas
as escolhas devem ser pautadas na inter-relação entre composição, proprie-
dades, processamento e desempenho.
Ao final deste estudo, você será capaz de selecionar o material ideal na
fabricação das engrenagens e virabrequins, assim como indicar o tipo de
processamento e as propriedades desse material.
Bons estudos!

Não pode faltar

A versatilidade da utilização dos materiais metálicos comprova a


grande variedade das propriedades dos mais de 70 metais encontrados
na tabela periódica. As principais propriedades exibidas por esses
materiais são químicas, mecânicas, elétricas, térmicas, magnéticas e
ópticas.
A propriedade química fundamental dos metais é a habilidade
desses elementos se combinarem com outros metais ou elementos não
metálicos e formarem um grande número de ligas que melhoram suas
propriedades iniciais para utilizá-las em aplicações específicas, por
exemplo, com a combinação de ferro, níquel e crômio temos uma série
de ligas de aço inoxidável que são comumente encontradas. Os aços
austeníticos, por exemplo, são utilizados na construção civil para fins
estruturais, os aços ferríticos são empregados em sistemas de exaustão
de gases em motores de combustão e os aços martensíticos são utilizados
em áreas de mineração e instrumentos odontológicos. Metais como o
níquel, vanádio, molibdênio, cobalto, terras-raras e do grupo da platina
ativam reações catalíticas para a síntese de muitos produtos químicos
orgânicos obtidos a partir do petróleo e uma grande variedade de sais e
compostos metálicos melhoram as propriedades de produtos plásticos
em termos de cor, brilho, resistência à chama e resistência à degradação.
A Figura 4.2 apresenta as cores de íons metálicos de transição quando
estão em solução aquosa e evidencia a razão pela qual vemos compostos
e complexos de metais de transição coloridos.

154 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.2 | Coloração de íons metálicos em solução aquosa

Fonte: adaptada de: https://goo.gl/CRNCLi. Acesso em: 9 nov. 2018.

Isso ajuda a explicar, por exemplo, por que a ferrugem ( Fe2O3 - óxido
de ferro) apresenta cor laranja (Figura 4.3a) e a Estátua da Liberdade,
feita de cobre (Figura 4.3b1), não apresenta mais a cor laranja brilhante
e metálica do cobre, mas uma cor verde pálida dada pela formação de
carbonato de cobre ( CuCO3 ), produto constituído a partir de oxidações
parciais que revestem as superfícies de metais como o cobre, bronze ou
latão (Figura 4.3b2).
Figura 4.3 | Ferrugem e Estátua da Liberdade

Fonte: (a) https://pxhere.com/pt/photo/1128315; (b1) https://goo.gl/bPp85A; (b2) https://goo.gl/WWiiFm.


Acesso em: 9 nov. 2018.

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 155


A grande utilização dos metais também é justificada pelas
diversas propriedades mecânicas, possibilitando sua aplicação nos
mais diferentes contextos. Entre as propriedades mecânicas exibidas
por esses materiais, podemos citar a resistência e a ductilidade, que
permitem o uso desses materiais em máquinas e estruturas. Os metais
e suas ligas exibem ductilidade, maleabilidade e a capacidade de serem
deformados plasticamente (isto é, sem quebrar), tornando-os fáceis de
moldar em vigas (vigas de aço para a construção), extrusões (esquadrias
de alumínio para portas e janelas), moedas, latas de metal e uma varie-
dade de elementos de fixação (pregos e clipes de papel). As proprie-
dades mecânicas de um material são aquelas que envolvem uma reação
a uma carga aplicada.

Assimile
As propriedades mecânicas de um material são aquelas que envolvem
uma reação a uma carga aplicada.

As propriedades mecânicas dos metais, por exemplo, determinam sua


gama de utilidades e estabelecem a vida útil esperada de um material.
Essas propriedades também são utilizadas para ajudar a identificar e
classificar o material e as mais comuns, além da resistência e ductilidade,
são dureza, resistência ao impacto e resistência à fratura. A maioria
dos materiais metálicos são anisotrópicos, o que significa que as suas
propriedades variam de acordo com a orientação/direção em que são
medidas. A variação nas propriedades ocorre, por exemplo, devido à
direcionalidade da microestrutura (textura) formada durante a confor-
mação mecânica ou em operações de trabalho a frio. As propriedades
mecânicas são geralmente específicas para a forma do produto, tais
como placas, chapas, extrusão, moldagem, forjamento etc. Além disso,
é comum ver propriedades mecânicas devido à direção da estrutura
dos grãos. Em produtos como chapas e placas, a direção de rolamento
é chamada de direção longitudinal, enquanto a largura do produto é
chamada de direção transversal e a espessura, de direção transversal
curta. As orientações dos grãos em produtos metálicos de acordo com
diferentes processamentos são apresentadas na Figura 4.4.

156 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.4 | Orientações dos grãos em componentes metálicos

Fonte: adaptada de Primo (2012, p.12).

Reflita
Uma peça de metal fabricada por diferentes processos apresentam,
necessariamente, as mesmas propriedades mecânicas?

As propriedades mecânicas de um material não são constantes e


muitas vezes mudam em função de temperatura, taxa de carregamento
e outras condições. Por exemplo, temperaturas inferiores à temperatura
ambiente geralmente causam um aumento na resistência mecânica das
ligas metálicas; enquanto ductilidade, resistência à ruptura e alonga-
mento, normalmente, diminuem. Temperaturas acima da tempera-
tura ambiente costumam causar uma diminuição nas propriedades de
resistência das ligas metálicas. Deve também notar-se que há, muitas
vezes, uma variação significativa nos valores obtidos na medição das

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 157


propriedades mecânicas. Assim, as propriedades mecânicas podem ser
avaliadas a partir de ensaios, nos quais são utilizadas as cinco condi-
ções de carregamento. A resistência de metais sob pressão (compressão),
alongamento (tração) e forças de corte os torna ideais para fins estru-
turais em edifícios, automóveis, quadros de aeronaves, gasodutos,
pontes, cabos e alguns equipamentos desportivos. A tensão é um tipo
de carregamento no qual as duas seções de material em cada lado de um
plano tendem a ser separadas ou alongadas. A compressão é o inverso
da carga de tração e envolve a prensagem do material. O carregamento
por flexão envolve a aplicação de uma carga de modo que cause uma
curva no material, resultando na compressão de um de seus lados e no
estiramento do outro. O cisalhamento envolve a aplicação de uma carga
paralela a um plano, que faz com que uma das partes adjacentes de um
mesmo corpo do material se deslize sobre a outra. A torção é a aplicação
de uma força que causa uma “torção” no material. A Figura 4.5 apresenta
as forças das cinco condições de cargas fundamentais, e a linha ponti-
lhada indica a metade do comprimento do corpo de prova.
Figura 4.5 | Forças de carregamentos fundamentais

Fonte: adaptada de https://goo.gl/JZNnWS. Acesso em: 19 dez. 18.

A resistência ao desgaste é crítica em rolamentos para todos os meios


de transporte e de máquinas/ferramentas, e a resistência à fadiga é a
capacidade de o metal resistir à fratura após repetidas deformações, tais
como flexão, permitindo o uso de metais em molas, alavancas e engrena-
gens. Outras propriedades importantes dos metais são as elétricas, com
destaque para a condutividade. Os metais são excelentes condutores de

158 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
calor e eletricidade. Em geral, a condutividade desses materiais aumenta
com a diminuição da temperatura, de modo que no zero absoluto (-273°C)
a condutividade é infinita; isto é, os metais se tornam supercondutores.
A condutividade térmica é aproveitada em radiadores de automóveis
e utensílios de cozinha enquanto a condutividade elétrica possibilita
que as distribuidoras de energia consigam transmitir eletricidade por
longas distâncias para fornecer luzes e energia elétrica às cidades mais
remotas a partir de estações de geração de eletricidade. Os circuitos em
aparelhos domésticos, aparelhos de televisão e computadores dependem,
por exemplo, da condutividade elétrica. Entre os metais, os condutores
de eletricidade mais eficazes são aqueles que têm um único elétron de
valência, que é livre para se movimentar e, assim, promove fortes reações
de repulsão entre os outros elétrons. Temos também os metais semicon-
dutores (ou metaloides) que possuem um número maior de elétrons de
valência (normalmente quatro ou mais) e são ineficientes na condução
de eletricidade. No entanto, quando são aquecidos ou dopados com
outros elementos semicondutores, como silício e germânio, tornam-se
condutores elétricos extremamente eficientes. A Figura 4.6 apresenta um
ímã flutuando sobre um supercondutor de alta temperatura, resfriado
com nitrogênio líquido.
Figura 4.6 | Imã flutuando sobre um supercondutor

Fonte: https://goo.gl/fnxCL5. Acesso em: 9 nov. 2018.

O fenômeno observado na Figura 4.6 ocorre devido à corrente


elétrica constante que flui sobre a superfície do supercondutor, agindo
na exclusão do campo magnético do ímã. A resistividade é outra proprie-
dade elétrica muito importante dos materiais metálicos e é o oposto da
condutividade; essa propriedade avalia o quão fortemente um metal se
opõe ao fluxo de corrente elétrica. Esta corrente efetivamente constitui
o eletroímã e repele o ímã que está sobre a superfície do supercondutor.
Os metais também apresentam outras propriedades, como as magné-
ticas. O ferromagnetismo, por exemplo, é uma propriedade encontrada
no ferro e em vários outros metais. Além disso, metais e ligas podem

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 159


ser magnetizados em um campo elétrico e exibem uma propriedade
denominada paramagnetismo. As propriedades magnéticas são empre-
gadas em motores, geradores e sistemas de alto-falantes elétricos para
equipamentos de áudio. Os metais emitem elétrons quando expostos
à radiação (por exemplo, luz) de um curto comprimento de onda ou
quando aquecidos a temperaturas suficientemente elevadas.
No entanto, a capacidade de metais, como o chumbo, em absorver a
radiação é denominada blindagem. Considere, por exemplo, o avental
fornecido pelos dentistas durante um exame de raios X. Os metais
também apresentam propriedades ópticas: são uniformemente brilhantes
e, com exceção de cobre e ouro, são prateados ou acinzentados. Isso
ocorre porque todos esses elementos absorvem a luz em todas as frequ-
ências e a irradiam imediatamente. Os metais formam espelhos com sua
superfície reflexiva e o seu brilho lhes dá a aparência atraente, que é tão
importante em joias e moedas. As propriedades dos materiais metálicos
podem ser melhoradas ou modificadas a partir de várias maneiras, seja
pelos diferentes tipos de processamento ou pela adição de impurezas de
tamanhos de macro a nanoescala. Dessa forma é possível melhorar as
propriedades de um metal e obter as características adequadas e necessá-
rias para uma determinada aplicação. Assim, a seleção de um material é,
frequentemente, um problema a ser resolvido dentro de projetos indus-
triais e aplicações específicas. Os materiais devem atender às caracte-
rísticas do projeto, assim como apresentar as propriedades requeridas.
Os materiais metálicos e suas ligas são os mais utilizados nas diversas
áreas das ciências e engenharias e são agrupados em duas classes: metais
ferrosos e não ferrosos. Essa classificação baseia-se principalmente
na composição química desses materiais. Os metais ferrosos ou ligas
ferrosas são aqueles nos quais o ferro (Fe) é o principal constituinte,
enquanto que os demais metais e ligas são denominados como metais ou
ligas não ferrosas. Os materiais ferrosos são produzidos em quantidades
superiores a de qualquer outro material metálico, em virtude da dispo-
nibilidade abundante de matéria-prima, facilidade de conformação,
viabilidade econômica e, por fim, pela versatilidade de suas proprie-
dades físicas e mecânicas. No entanto, os metais ferrosos apresentam
algumas desvantagens, como densidade relativamente elevada e susceti-
bilidade à corrosão. Em materiais ferrosos, o principal elemento de liga
é o carbono (C) e, de acordo com a quantidade de carbono presente,
as ligas ferrosas apresentarão propriedades distintas, especialmente
quando o teor de carbono é inferior ou superior a 2,14%. De maneira
geral, as ligas ferrosas com quantidade de carbono inferior a 2,14% são
denominadas aços, enquanto que as ligas ferrosas com teor de carbono

160 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
acima de 2,14% são denominadas ferros fundidos. Já os aços são ligas de
ferro-carbono que contêm outros elementos químicos em sua compo-
sição, como crômio (Cr), níquel (Ni), molibdênio (Mo), tungstênio (W),
entre outros. Nos aços, as propriedades mecânicas são sensíveis ao teor
de carbono, isto é, quanto maior a concentração de carbono mais duro e
menos dúctil é o aço. Dessa forma, os aços são classificados em aços com
baixo, médio e alto teor de carbono. Os aços com baixo teor de carbono
apresentam menos de 0,25% em peso de carbono (%p C), os com médio
teor de carbono possuem concentrações de 0,25 a 0,6 %p C e, finalmente,
os aços com alto teor de carbono apresentam concentrações superiores
a 0,6%p C. Nos aços, os átomos de carbono ocupam os interstícios da
estrutura cristalina do ferro, como mostra a representação da Figura 4.7,
porém, outros elementos de liga são adicionados propositalmente, por
diversas razões, a fim de melhorar as propriedades mecânicas dos aços e
a resistência à corrosão, como observado nos aços-ligas.
Figura 4.7 | Representação para estrutura CCC do Fe-C, por meio de esferas rígidas

Fonte: adaptada de https://goo.gl/aknKGg. Acesso em: 19 dez. 18.

Os aços com baixo teor de carbono são os mais produzidos e, por


apresentarem uma baixa concentração de carbono, não respondem
eficientemente a tratamentos térmicos para o aumento de resistência
mecânica, mas isso é possível por meio do trabalho a frio. A microes-
trutura é basicamente composta por ferrita e perlita, o que faz desses
aços relativamente macios, frágeis e com uma excelente ductilidade
combinada à elevada tenacidade. Assim, esses materiais são facilmente
usinados e soldados e dentre todos os tipos de aços são os mais baratos
de serem produzidos. Os aços e as ligas com baixo teor de carbono são
tipicamente aplicados na construção de edifícios, pontes, perfis estrutu-
rais, carcaças e componentes de automóveis, entre outras. Na Tabela 4.1
é possível analisarmos a especificação, o limite de resistência à tração,
limite de escoamento e ductilidade de alguns aços-carbono comuns com
baixo teor de carbono. No gráfico da Figura 4.8 é possível visualizar como

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 161


o aumento da quantidade de carbono afeta as propriedades mecânicas
dos aços, aumentando também o limite de resistência e diminuindo a
ductilidade.
Tabela 4.1 | Composição e propriedades mecânicas de Aços-Carbono Comuns com baixo teor
de carbono e laminados a quente

Especificação Composição (%p) Propriedades Mecânicas


Limite de
Número AISI/ LRT* %AL em
C Mn Outros Escoamento
SAE ou ASTM (MPa) 50 mm
(MPa)
1010 0,10 0,45 - 325 180 28
1020 0,20 0,45 - 380 210 25
0,20 Cu
A36 0,29 1,00 400 220 23
(min)
A516 Classe
0,31 1,00 0,25 Si 485 260 21
70

Fonte: Adaptado Callister, 2018, p. 376.

Figura 4.8 | Propriedades mecânicas de aços-carbono comuns em função da quantidade de carbono

Fonte: elaborada pelo autor.

Um grupo especial de ligas ferrosas com uma quantidade notável de


elementos de liga são conhecidas como HSLA (high-strength, low-alloy)
ou ARBL (aços de alta resistência e baixa liga). Os elementos de liga
mais comuns são: Cu, V, Ni, W, Cr, Mo etc. Estas ligas podem ter sua
resistência aumentada através de tratamento térmico, ao mesmo tempo
que são dúcteis, usinados e conformados. Em condições atmosféricas
normais estes aços ou ligas apresentam maiores resistência à corrosão
quando comparados aos aços-carbono comum.

162 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
O Quadro 4.1 apresenta as principais aplicações de aços-carbono
comuns com baixo teor de carbono e de aços de alta resistência e baixa liga.
Quadro 4.1 | Principais aplicações de Aços-Carbono Comuns com baixo teor de carbono e la-
minados e aços ARBL

Aços
Número
AISI/SAE ou Aplicações
ASTM
Aços-Carbono com Baixo Teor de Carbono
1010 Painéis de automóveis, arames e pregos
1020 Aço estrutural, chapas e tubos
A36 Estrutural (pontes e edificações)
A516 Classe
Vasos de pressão para baixas temperaturas
70
Aços de Alta Resistência e Baixa Liga
A440 Estruturas rebitadas ou aparafusadas
A633 Classe E Estruturas utilizadas em baixas temperaturas
A656 Classe 1 Chassis de caminhões e vagões de trem

Fonte: adaptado de Callister (2018, p. 376).

Os aços com médio teor de carbono (0,25 a 0,6 %p C) são mais resis-
tentes e menos dúcteis quando comparados aos aços de baixo teor de
carbono. Esses aços apresentam baixa temperabilidade e, assim, podem
ser tratados termicamente com sucesso em seções muito finas e com
elevada taxa de resfriamento. No entanto, a adição de elementos de liga,
como o níquel, cromo e molibdênio, melhora sua temperabilidade. Entre
as aplicações de aços com médio teor de carbono, temos a utilização
em vias e rodas férreas, componentes estruturais de elevada resistência,
na fabricação de engrenagens e virabrequins. A AISI, SAE e ASTM são
responsáveis por classificar e especificar os aços e ligas metálicas. As
especificações AISI/SAE consistem em um número com quatro dígitos,
os quais os dois primeiros correspondem ao tipo de liga, enquanto os
últimos dois dígitos representam a quantidade de carbono multiplicada
por 100. Para os aços-carbono comuns, os dois primeiros dígitos são 1
e 0, já para os aços-liga são especificadas outras combinações dos dois
dígitos iniciais.

Exemplificando
Os aços AISI/SAE 1020, 1045 e 1060 são exemplos de aços-carbono
comuns e possuem, respectivamente, 020, 0,45 e 0,60 % p C.

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 163


Além dessas classificações também é utilizada a especificação UNS
(Unified Numbering System), que é um sistema de numeração unificado tanto
de ligas ferrosas como não ferrosas. Nesse sistema cada família de metais é
indicada por uma letra, seguida do número AISI/SAE, acrescentado de um
quinto dígito igual a zero. Assim, o aço AISI/SAE 1020 na especificação UNS
é G10200. Os aços com elevado teor de carbono são mais resistentes e duros,
consequentemente, apresentam a ductilidade muito limitada. Eles são tratá-
veis termicamente e utilizados principalmente em condições endurecidas
e revenidas. Além disso, têm elevada resistência ao desgaste e são capazes
de manter a aresta de corte afiada, característica utilizada na fabricação de
ferramentas, como facas, lâminas de barbear, lâminas de serra, entre outras.
A adição de elementos de liga como o Cr, V, Mo, W, reagem com o carbono
produzindo carbonetos duros e resistentes ao desgaste. O aço inoxidável
é outro tipo de aço que apresenta elevada resistência à corrosão, ou seja,
dificulta a formação de ferrugem em virtude da adição de elementos de liga,
principalmente, um mínimo de 11% p de Cr.
Os aços inoxidáveis são utilizados em componentes de exaustão automo-
tiva, câmaras de combustão, construções com solda, peças de motores a
jato, instrumentos cirúrgicos, vasos de pressão, entre outros. Além dos aços,
fazem parte das ligas metálicas ferrosas os ferros fundidos, que são ligas
com teor superior a 2,14% p C, no entanto, na prática, os ferros fundidos
apresentam entre 3 a 4,5% p C. As ligas metálicas com esse teor de carbono
são facilmente fundidas em temperaturas inferiores às dos aços, o que viabi-
liza a utilização destes na produção de peças fundidas. A cementita ( Fe3C
) é uma fase metaestável, dura e quebradiça que está presente nos ferros
fundidos e em determinadas condições de decomposição para formar ferrita
( a ) e grafita. A tendência de ferros fundidos formarem grafita é geralmente
controlada por sua composição e taxa de resfriamento. Com base na forma
de carbono presente, os ferros fundidos são classificados como cinzento,
nodular, branco, maleável e vermicular.
Os tipos de ferros fundidos:
Ferro cinzento: essas ligas são constituídas de grafita em forma de flocos
envoltos por uma matriz de ferrita ( a ) ou perlita. Em virtude da presença de
grafita, quando a superfície é fraturada ela fica acinzentada. Esses metais têm
boas propriedades de amortecimento e algumas aplicações típicas incluem:
estruturas de base, cama para máquinas pesadas etc.
Ferro nodular: adições de magnésio e cério ao ferro cinzento durante a
fundição resultam na formação de microestrutura e de grafita em forma de
aplicações típicas que incluem: corpos de bomba, eixos de manivela, compo-
nentes automotivos etc.

164 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Ferro branco: quando o teor de silício é inferior a 1%, em combinação
com taxas de resfriamento rápidas, não há tempo suficiente para a cemen-
tita se decompor, fazendo com que grande parte se conserve. A presença da
cementita torna a superfície fraturada esbranquiçada. Esse metal é utilizado
em cilindros de laminação em laminadores.
Ferro maleável: esses metais são formados após o tratamento térmico do
ferro fundido branco que é mantido por horas em uma temperatura de 800
a 900 °C. Posteriormente, o material é resfriado na temperatura ambiente,
promovendo a decomposição da cementita e, consequentemente, a formação
de grafita na forma de aglomerados envolvidos por uma matriz de ferrita ou
perlita, de acordo com a taxa de resfriamento. Algumas aplicações típicas
incluem: estradas de ferro e outros serviços pesados.
Ferro vermicular: como o próprio nome sugere, nesse tipo de liga a
grafita está disposta em forma de vermes em uma matriz perlítica ou ferrítica/
perlítica. A Figura 4.9 apresenta alguns exemplos da disposição das grafitas.
Figura 4.9 | Micrografia eletrônica de varredura mostrando da esquerda para a direita a grafita
lamelar, nodular e vermicular, respectivamente.

Fonte: adaptada de Colpaert (2008, p. 123).

Outra classe dos materiais metálicos são os metais ou ligas não ferrosas. Estes
são fabricados com facilidade e de forma econômica. Entre eles destacam-se
as ligas de alumínio e cobre. As ligas de alumínio são caracterizadas pela baixa
densidade, alta condutividade térmica e elétrica, e boa resistência à corrosão. As
aplicações comuns de ligas de alumínio são: latas de bebidas, peças automotivas,
blocos de motores, carrocerias, estruturas de aeronaves etc. Algumas das ligas
de alumínio são capazes de aumentar a resistência por precipitação, enquanto
outras são reforçadas por trabalho a frio ou métodos de solução sólida.
As ligas de cobre são caracterizadas por apresentarem boa resistência à
corrosão em diversas atmosferas. Assim como as de alumínio, a maioria dessas
ligas são reforçadas por um ou outro trabalho a frio ou método de solução sólida.
O latão e o bronze são exemplos de ligas de cobre. O latão é uma liga de cobre e
zinco, enquanto o bronze é uma liga de cobre e estanho. Entre as principais aplica-
ções destacam-se o uso em bijuterias, moedas, instrumentos musicais, eletrônicos,
molas, instrumentos cirúrgicos e odontológicos, radiadores, entre outros.

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 165


Todos esses metais e ligas são submetidos a diferentes processos para a obtenção
de uma determinada peça, o processamento mais adequado será definido com base
nas propriedades dos metais, o tamanho e forma acabada, assim como o custo. A
Figura 4.10 apresenta as principais técnicas de fabricação de peças metálicas.
Figura 4.10 | Principais técnicas de fabricação de peças metálicas.

Fonte: adaptada de Colpaert (2008, p. 123).

Os métodos escolhidos dependem de vários fatores, sendo os mais


importantes as propriedades do metal, o tamanho e a forma da peça acabada,
e, obviamente, o custo.

Sem medo de errar

Atuando como analista em um laboratório de análise de materiais, você


recebeu a missão de auxiliar uma empresa que atua na fabricação de compo-
nentes metálicos utilizados em motores de combustão interna. Os principais
componentes que a empresa fabrica são os virabrequins e engrenagens.
Figura 4.1 | Peças para motores automotivos (a) virabrequim; e (b) engrenagens

Fonte: a) https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Crankshaftrendering.png; (b) https://cdn.pixabay.com/


photo/2013/07/12/14/18/gears-148196_960_720.png. Acesso em: 26 fev. 2019.

166 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Quais os materiais mais indicados para essa fabricação? Quais os
métodos de processamento? Ao longo desta seção estudamos os principais
tipos de metais e vimos que esses materiais podem ser classificados de acordo
com sua composição em ligas metálicas ferrosas e não ferrosas, sendo que
a principal diferença entre elas é a quantidade de Fe. Você aprendeu que
as chamadas ligas ferrosas são diferenciadas com base na concentração de
carbono presente nesses metais entre aços com baixo, médio e alto teor de
carbono. As engrenagens e virabrequins são componentes mecânicos que
tipicamente são fabricados com aços com médio teor de carbono (0,25 a 0,6
%p C), apresentam baixa temperabilidade e podem ser tratados termicamente
com sucesso em seções muito finas e com elevada taxa de resfriamento. Essas
são características necessárias na fabricação de virabrequins e engrenagens,
que precisam apresentar elevada dureza superficial e núcleo mais dúctil e
tenaz para que a peça suporte os esforços solicitados e não frature. A Figura
4.11 apresenta uma engrenagem submetida a um tratamento térmico de
superfície.
Figura 4.11 | Engrenagem submetida a tratamento térmico de superfície.

Fonte: Marquezi e Ceccato (2011, p. 93).

Na Figura 4.11 é possível observar que os dentes da engrenagem


apresentam uma microestrutura diferente da microestrutura presente no
núcleo da peça, que é evidenciado pela diferença de coloração. Essa formação
corresponde a uma estrutura que apresenta elevada dureza e resistência
mecânica, no entanto, baixa ductilidade. As engrenagens e virabrequins
podem ser fabricados, por exemplo, por usinagem e por forjamento (confor-
mação mecânica).

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 167


Avançando na prática

Processamento e desempenho dos materiais


metálicos

Descrição da situação-problema
A empresa fabricante de componentes para motor está estudando a linha
de produção de blocos de motores. Você foi acionado para auxiliar nas etapas
de produção desse componente. O bloco do motor é a peça que aloja os cilin-
dros de um motor de combustão interna (Figura 4.12). Ele é chamado de
“bloco” porque geralmente é uma peça sólida do carro que abriga os cilindros
e seus componentes dentro de um cárter refrigerado e lubrificado.
Figura 4.12 | Bloco de um motor

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Bloco_do_motor. Acesso em: 9 nov. 18.

Quais materiais e processos podem ser utilizados para a obtenção desta


peça? Quais as características que esses materiais devem ter?
Resolução da situação-problema
As indústrias automobilísticas sempre buscam materiais que apresentam
boa resistência mecânica associada à baixa densidade. Na produção de
blocos de motores, as ligas de alumínio e os ferros fundidos são os materiais
tipicamente utilizados. As ligas de alumínio apresentam baixa densidade, alta
condutividade térmica e elétrica, e boa resistência à corrosão. Assim, essas
ligas se destacam em relação ao ferro fundido, pela menor densidade, isto
é, são mais leves e têm melhores propriedades dissipadoras, propriedades
ideais para o uso na fabricação de blocos de motores. Como desvantagem,
as ligas de alumínio apresentam um custo mais elevado que o ferro fundido.

168 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Faça valer a pena

1. As propriedades mecânicas de um material não são constantes e muitas vezes


mudam em função de temperatura, a taxa de carregamento, e outras condições.
Normalmente, é possível aumentar a resistência mecânica de uma barra metálica
quando esta é submetida a temperaturas inferiores à temperatura ambiente.

Assinale a alternativa que apresenta as alterações corretas quanto às propriedades


mecânicas dos materiais.
a) O aumento da resistência mecânica provoca a diminuição da ductilidade e alongamento.
b) O aumento da resistência mecânica provoca o aumento da ductilidade e alongamento.
c) O aumento da resistência mecânica provoca a diminuição da dureza superficial da barra.
d) A ductilidade é a capacidade do metal resistir à fratura após repetidas deformações.
e) A ductilidade é a capacidade do metal deformar plasticamente em um ponto
específico, mediante a uma aplicação de carga pontual.

2. A seleção de um material é frequentemente um problema a ser resolvido dentro de


projetos industriais e aplicações específicas. Os materiais devem atender às características
do projeto, assim como apresentar as propriedades requeridas e, os materiais metálicos e
suas ligas são os mais utilizados nas mais diversas áreas das ciências e engenharias.

Assinale a alternativa que apresenta a classificação dos metais e suas ligas de acordo
com a sua composição química:
a) Aços inoxidáveis e aços.
b) Aços e ligas.
c) Ferros fundidos e ferro nodular.
d) Metais ferrosos e não-ferrosos.
e) Ligas não ferrosas e aços inoxidáveis.

3. Os aços são ligas de ferro-carbono que contêm outros elementos químicos em sua
composição, como crômio (Cr), níquel (Ni), molibdênio (Mo), tungstênio (W), entre
outros. Nos aços, as propriedades mecânicas são sensíveis ao teor de carbono.
Analise as informações das colunas A e B:
Coluna A Coluna B
A. Baixo teor de carbono I Elemento predominante é o cromo.
B. Médio teor de carbono II Baixa temperabilidade mas eficiente têmpera superficial.
C. Alto teor de carbono III Resistentes ao desgaste e pouco dúcteis.
D. Aço inoxidável IV Microestrutura é basicamente composta por ferrita e perlita.

Assinale a alternativa que apresenta a relação correta entre as colunas:


a) A- I, B- II, C- III, D- IV.
b) A- III, B- II, C- IV, D- I.

Seção 4.1 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais metálicos - 169


c) A- IV, B- II, C- III, D- I.
d) A- II, B- III, C- IV, D-I.
e) A- II, B- I, C- III, D- IV.

170 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Seção 4.2

Propriedades, processamento e desempenho dos


materiais cerâmicos

Diálogo aberto
Quando falamos em material cerâmico, o que lhe vem à cabeça?
Normalmente, já pensamos nos materiais que estão a nossa volta como
os pisos, azulejos, telhas e louças. Esses são alguns exemplos de materiais
cerâmicos muito importantes, visto que sem eles não teríamos nossas habita-
ções da forma que conhecemos e nossa qualidade de vida seria afetada. No
entanto, existem diversos materiais cerâmicos que vão muito além dessas
aplicações. Por exemplo, para produzir as ligas metálicas é necessário a utili-
zação de containers revestidos por cerâmicas para reter o metal fundido, pois
o material cerâmico suporta temperaturas bem acima da temperatura de
fusão dos metais. Assim, nessa unidade de ensino vamos estudar sobre as
propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos e para
iniciarmos nossos estudos imagine que você está atuando como analista em
um laboratório de análise de materiais que presta serviços para empresas
de diversos ramos. Nesse momento, você foi acionado por uma empresa
fabricante de próteses usadas na artroplastia do quadril ou do joelho (artro-
plastia é uma cirurgia indicada a pacientes com quadro crônico de artrite).
Nos joelhos, por exemplo, a lesão ou o desgaste da cartilagem entre os ossos
resulta no atrito ósseo, o que ocasiona dores e dificuldade de locomoção.
Assim, a superfície da cabeça dos ossos é substituída por superfícies metal-
-polietileno (Figura 4.13).
Figura 4.13 | Artroplastia do joelho (sequência do implante metal-polietileno)

Fonte: (a) e (d) https://goo.gl/rjXMZd; (b) e (c) https://goo.gl/d2DPrJ. Acesso em: 29 out. 2018.

A empresa procurou o laboratório para encontrar alternativas de


materiais como substitutos ao uso do metal-polietileno. Nessas aplicações,
quais outros tipos de materiais poderiam ser utilizados? As cerâmicas seriam

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 171


uma opção? Quais as propriedades gerais desses materiais? E quais seriam as
características específicas e desejáveis dessas cerâmicas para essas aplicações?
Nesta seção, vamos estudar sobre o caráter iônico e as propriedades
mecânicas das cerâmicas, também vamos conhecer algumas propriedades
elétricas dessa classe de materiais como a condutividade elétrica, piezo-
eletricidade, piroeletricidade. Por fim, vamos conhecer a classificação e as
principais técnicas de fabricação dos materiais cerâmicos. Ao fim do estudo
dessa unidade, você será capaz de identificar as principais propriedades
dos materiais cerâmicos, os tipos de processamento e suas aplicações. Você
compreenderá a versatilidade dessa classe de materiais, que vai desde a utili-
zação como isolantes elétricos e térmicos em ônibus espaciais até a aplicação
em implantes dentários ou próteses. Assim, você será capaz de auxiliar a
empresa fabricante de próteses identificando o material mais adequado e que
atenda às especificações de utilização para próteses.
Bons estudos!

Não pode faltar

As cerâmicas são materiais inorgânicos formados entre elementos


metálicos e não metálicos, como por exemplo, o óxido de alumínio ( Al 2O3 ),
que é composto por átomos de alumínio (metal) e de oxigênio (não metal).
Os materiais cerâmicos são constituídos basicamente por óxidos, carbetos e
nitretos, e normalmente são quebradiços (frágeis) e utilizados como isola-
dores térmicos e elétricos. Nesses materiais, as ligações atômicas podem ser
de natureza iônica, covalente ou uma mistura entre esses dois tipos. Sabendo
os valores de eletronegatividade, pode-se dizer que quanto maior for a
diferença de eletronegatividade dos elementos, mais iônicas serão as ligações;
em contrapartida, quanto menor for essa diferença, mais covalente serão. Por
meio da equação a seguir é possível calcular o percentual de caráter iônico
(%CI) de cada cerâmica, que dependerá da diferença de eletronegatividade
( Xn ) entre os átomos (A e B), segundo:
%CI = 1- exp éëê-0,25( X A - X B )2 ùûú ´100

Exemplificando
Vamos pensar no óxido de alumínio, qual deve ser o caráter iônico
desse composto? Sabendo que os valores de eletronegatividade do
alumínio (Al) e do oxigênio (O) são, respectivamente, 1,61 e 3,44. A
partir dessas informações temos:

172 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
%CI = 1- exp éëê-0,25( X A - X B )2 ùûú ´100
%CI = 1- exp éêë-0,25(3, 44 -1,61)2 ùúû ´100
%CI = 1- exp éëê-0,25(1,83)2 ùûú ´100
%CI = 1- exp -0,25(3,35) ´100
%CI = 1- exp -0,84 ´100
%CI = 1- 0, 43 ´100
%CI = 57%
O óxido de alumínio é um exemplo de material cerâmico que
apresenta um bom percentual das duas ligações (iônicas e
covalentes), 57% iônica e 43% covalente.

Os compostos cerâmicos que possuem um elevado percentual de caráter


iônico apresentam uma estrutura que depende do tamanho relativo dos
íons e, consequentemente, do balanço eletrostático, enquanto os compostos
cerâmicos que têm um elevado percentual de caráter covalente possuem
estruturas dependentes da direcionalidade das ligações. As ligações iônicas e
covalentes presentes nessa classe de materiais são mais fortes que as ligações
metálicas, e devido a essa característica as cerâmicas são frágeis, como por
exemplo, pratos, vidros e louças quebradas enquanto os metais são dúcteis.
As propriedades físicas de qualquer cerâmica são consequência direta
da sua estrutura cristalina e composição química. O óxido de alumínio ou
alumina, por exemplo, apresenta estrutura cristalina hexagonal compacta
e elevada dureza, resistência à abrasão e compressão; e quando polida,
possui excelente acabamento superficial. As fortes ligações iônicas tornam
a alumina um material quimicamente inerte, apresentando grande estabi-
lidade em meios fisiológicos. Quando peças de alumina para próteses são
polidas e utilizadas como par, o coeficiente de atrito entre essas diminui
com o tempo, aproximando-se ao de uma articulação normal. Assim, fica
evidente a relação entre a microestrutura e as propriedades, tais como varia-
ções localizadas de densidade, granulometria, tipo de porosidade e a compo-
sição de segunda fase, que podem ser correlacionadas com as propriedades
das cerâmicas, como a resistência mecânica, dureza, tenacidade, constante
dielétrica, densidade e elevados pontos de fusão e ebulição.

Saiba mais
O artigo de:
PIRES, A. L. R; BIERHALZ, A. C. K.; MORAES, A. M. Biomateriais: tipos,
aplicações e mercado. Química Nova, v. 38, n. 7, p. 957-971, 2015, traz

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 173


alguns exemplos de diversos materiais denominados biomateriais e que
são utilizados em várias áreas da saúde.

As propriedades mecânicas das cerâmicas são importantes em


materiais estruturais e de construção e incluem elasticidade, resistência à
tração, resistência à compressão, resistência ao corte, resistência à fratura,
ductilidade (baixa em materiais quebradiços) e dureza. No entanto,
diferentemente dos metais, as propriedades mecânicas das cerâmicas
não são avaliadas por meio de um ensaio de tração devido à dificul-
dade em produzir corpos de prova que possuam a geometria exigida. A
fixação adequada desses materiais pode ocasionar fraturas e, por fim,
as cerâmicas falham após uma deformação de aproximadamente 0,1%
(CALLISTER; 2018, p. 453). Assim, é mais conveniente utilizar um ensaio
de flexão transversal no qual um corpo de prova de seção retangular ou
circular é flexionado até sua fratura. A Figura 4.14 apresenta um esquema
do ensaio de flexão, enquanto a Figura 4.15 mostra uma viga de concreto
(4.15a) e um corpo de prova de uma rocha ornamental (Figura 4.15b),
ambos submetidos a um ensaio de flexão.
Figura 4.14 | Esquema de um ensaio de flexão

Fonte: https://goo.gl/3hWhTd. Acesso em: 29 out. 2018.

174 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.15 | Materiais cerâmicos submetidos a ensaios de flexão

Fonte: (a) https://goo.gl/Y69vfH; (b) https://goo.gl/q6R3WC. Acesso em: 29 out. 2018.

A fim de melhorar o comportamento frágil dos materiais cerâmicos, desen-


volveram-se compósitos com matriz cerâmica. Esse mecanismo aumenta
substancialmente a resistência à fratura desses materiais. Os freios a disco são
um exemplo desses compósitos que utilizam matrizes cerâmicas e são fabricados
a partir de processos específicos. Esse tipo de pastilha é muito eficiente quando
comparada aos discos de freios de ferro fundido, devido à excelente dissipação de
calor do material cerâmico e à elevada resistência ao desgaste, sem experimentar
perda de capacidade de frenagem quando em elevadas temperaturas.
Como vimos anteriormente, as cerâmicas, em sua maioria, apresentam
comportamento frágil, no entanto, definitivamente não cabe a elas o sinônimo de
delicadas. Esses materiais são muito resistentes a altas temperaturas e a ambientes
severos. O ônibus espacial Discovery, por exemplo, possuía um sofisticado sistema
térmico de proteção nos cones de exaustão do foguete, telhas de isolamento, compo-
nentes de motor e revestimentos cerâmicos embutidos no vidro do para-brisa.
Além das propriedades mecânicas, os materiais cerâmicos apresentam diversas
propriedades elétricas. Com o aumento da temperatura, por exemplo, as cerâmicas
iônicas (que são isolantes à temperatura ambiente) experimentam um aumento da
condutividade elétrica que pode ser maior que a condutividade apresentada por
semicondutores. A Tabela 4.2 traz alguns materiais cerâmicos e seus respectivos
valores de condutividade à temperatura ambiente.
Tabela 4.2 | Condutividade térmica de alguns materiais cerâmicos
-1
Materiais cerâmicos Condutividade elétrica [(W- m) )]
-9
Concreto (seco) 10
-10
Vidro de cal de soda 10 -10-11
-10
Porcelana 10 -10-12
Vidro borossilicato » 10-13
Óxido de alumínio < 10-13
Sílica fundida < 10-18
Fonte: Callister (2018, p. 698).

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 175


É interessante compararmos a magnitude dos valores da condutividade
elétrica dados na Tabela 4.2 com o valor da condutividade da grafita, que é
igual a 3´104 - 2´105 e é considerada um bom condutor elétrico, observe
que os expoentes dos materiais dados na tabela são negativos, evidenciando
as propriedades como materiais isolantes. Algumas cerâmicas são semicon-
dutoras e a maior parte é formada por óxidos de metais de transição que
são semicondutores, como o óxido de zinco (ZnO). As cerâmicas semicon-
dutoras são aplicadas em subestações de distribuição de energia elétrica e
protegem a infraestrutura de relâmpagos, pois apresentam resposta rápida
ao dissipar uma grande quantidade de energia, são de baixa manutenção e
não se degradam. A Figura 4.16 mostra uma subestação de energia elétrica
protegida por peças de material cerâmico.
Figura 4.16 | Cerâmicas utilizadas na proteção de subestações de energia elétrica e linhas de
transmissão

Fonte: iStock.

As cerâmicas semicondutoras também são empregadas como sensores de gás,


em que a passagem de gases altera a resistência elétrica da cerâmica policristalina.

Assimile
A resistividade elétrica é definida como a medida da oposição que um
material apresenta em relação ao fluxo de corrente elétrica. Essa proprie-
dade pode ser compreendida como o oposto da condutividade elétrica.

A piezoeletricidade, que pode ser definida como a habilidade de alguns


cristais produzirem tensão elétrica a partir de uma pressão mecânica, é
outra propriedade exibida por um grande número de materiais cerâmicos,
incluindo o quartzo utilizado em relógios para medir o tempo e em
outros equipamentos. Esses dispositivos empregam as propriedades da

176 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
piezoeletricidade utilizando a energia elétrica para criar um movimento
mecânico (alimentando o dispositivo) e depois, a partir desse movimento,
produzem eletricidade (gerando um sinal). A piezoeletricidade é geralmente
mais forte em materiais cerâmicos que também exibem piroeletricidade,
e todos os materiais piroelétricos são, do mesmo modo, piezoelétricos. A
piroeletricidade é a habilidade de alguns materiais produzirem temporaria-
mente um potencial elétrico quando aquecidos ou resfriados. Esses materiais
podem ser utilizados para converter energia térmica em mecânica ou elétrica.
Um cristal piroelétrico, após síntese em um forno, deixado para resfriar
sem nenhuma tensão aplicada, geralmente acumula uma carga estática de
milhares de volts. Esses materiais são utilizados em sensores de movimento,
em que um pequeno aumento da temperatura, a partir de um corpo quente
ao entrar em uma sala, é suficiente para produzir uma tensão mensurável no
cristal (Figura 4.17).
Figura 4.17 | Sensor de movimento com cerâmica piroelétrica

Fonte: adaptada de https://goo.gl/h2Tu9r. Acesso em: 21 nov.18.

Por sua vez, a piroeletricidade é vista mais fortemente em materiais que


também apresentam o efeito da ferroeletricidade, em que um dipolo elétrico
estável pode ser orientado ou revertido através da aplicação de um campo
eletrostático. A piroeletricidade é uma consequência necessária da ferroeletri-
cidade, que é utilizada para armazenar informações em capacitores ferroelé-
tricos e elementos ferroelétricos de memória RAM (random-acess memory).
Outra característica importante é que as cerâmicas não possuem elétrons
livres, que são responsáveis por absorver fótons de luz, assim, esses materiais
podem ser transparentes à luz visível e apresentam os fenômenos de reflexão,
refração, transmissão e absorção. Na formação de cerâmicas policristalinas,

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 177


o tamanho dos grãos é determinado pelo tamanho das partículas cristalinas
presentes na matéria-prima, durante a formação (ou compressão) do objeto.
Dessa forma, uma redução do tamanho da partícula original pode eliminar
qualquer dispersão de luz, resultando em um material transparente.
Os materiais cerâmicos são utilizados nas mais diversas aplicações de
engenharia em virtude da diversidade das composições básicas e ligações
interatômicas, que resultam em diferentes propriedades do material final.
Esse material pode ser classificado de acordo com sua composição específica
ou com base em suas aplicações. A Figura 4.18 apresenta a classificação dos
materiais cerâmicos de acordo com suas aplicações.
Figura 4.18 | Classificação dos materiais cerâmicos

Fonte: Callister (2018, p. 467).

Em geral, os materiais cerâmicos utilizados para aplicações de engenharia


podem ser divididos em dois grupos: cerâmicas tradicionais e cerâmicas de
engenharia. Normalmente, as cerâmicas tradicionais são feitas de três compo-
nentes básicos: argila, sílica e feldspato, produzindo produtos como tijolos,
telhas e artigos de porcelana. Já as cerâmicas de engenharia são compostos
altamente puros de óxido de alumínio ( Al 2O3 ), carboneto de silício (SiC) e
nitreto de silício ( Si 3 N 4 ).
O vidro é um dos tipos de materiais cerâmicos com o qual temos contato
diariamente: o vemos em recipientes, janelas, espelhos, utensílios domés-
ticos, entre outros. Os vidros são silicatos não cristalinos com adição de
outros óxidos que influenciam suas propriedades finais. Entre os óxidos
mais utilizados destacam-se CaO (óxido de cálcio), Na 2O (óxido de sódio),
K 2O (óxido de potássio) e o óxido de alumínio. Os vidros são uma linha
exclusiva de materiais cerâmicos definidos principalmente por sua estru-
tura atômica, que não é cristalina e ordenada, como a maior parte das outras
cerâmicas, mas apresentam uma estrutura amorfa altamente desordenada.
Já os denominados vidrocerâmicos são, em sua grande maioria, vidros
inorgânicos submetidos a tratamentos térmicos em elevadas temperaturas.

178 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
A Figura 4.19 apresenta as estruturas da sílica amorfa ( SiO2 ), estrutura típica
de um vidro, e a estrutura desse mesmo material, mas como sólido cristalino.
Figura 4.19 | Estruturas atômicas da sílica

Fonte: https://goo.gl/4hmDP5; https://goo.gl/pM9doZ . Acesso em: 22 nov. 18.

A utilização de vidros é importante, principalmente em aplicações que


envolvam sua resposta ao aquecimento, pois, diferentemente dos materiais
cristalinos, não existe uma temperatura em que o líquido se transforma em
sólido. A temperatura específica, denominada temperatura de transição
vítrea ( Tg ) ou temperatura fictícia é definida com base na viscosidade, isto é,
o volume diminui continuamente com a redução da temperatura, enquanto
que nos materiais cristalinos ocorre uma redução descontínua do volume na
temperatura de fusão. O gráfico apresentado na Figura 4.20 apresenta um
contraste entre o comportamento do volume específico versus temperatura
para os materiais cristalinos e não cristalinos.
Figura 4.20 | Comportamento do volume específico versus temperatura para os materiais cris-
talinos e não cristalinos

Fonte: adaptada de Callister (2018, p. 550).

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 179


No caso dos materiais vítreos, a partir da temperatura de transição vítrea
até a temperatura de fusão ( Tf ), o material é denominado como líquido
super-resfriado e, após a Tf , é denominado líquido, enquanto que para
temperaturas abaixo da Tg o material é denominado vidro.
Os produtos à base de argila são materiais muito utilizados e encontrados
em abundância em virtude da facilidade que esses são feitos. Esses produtos
são basicamente de dois tipos: os produtos estruturais (tijolos, telhas, tubos
de esgoto) e louças brancas (porcelana, louças, cerâmicas etc). Os produtos
estruturais, como o próprio nome já indica, têm como característica mais
importante a integridade estrutural do material. Já as louças brancas recebem
esse nome pela característica desses materiais quando submetidos ao
cozimento em elevadas temperaturas, que tornam-se brancos.
Os materiais refratários pertencem a outra classe de materiais cerâmicos
e são descritos pela sua capacidade de suportar altas temperaturas sem fundir
ou se decompor, eles mantêm-se inertes quando expostos a ambientes severos
e são bons isolantes térmicos. Essas propriedades descritas dependem da
composição química, fazendo com que esses materiais sejam classificados
em argila refratária, à base de sílica, básicos e especiais.
As cerâmicas abrasivas são materiais que se destacam pela elevada dureza
e resistência ao desgaste, além de alta tenacidade. Esses materiais são utili-
zados no desgaste, corte ou polimento de materiais com menor dureza. O
diamante, carboneto de silício, carboneto de tungstênio, areia de sílica e óxido
de alumínio são alguns exemplos típicos de materiais cerâmicos abrasivos,
que podem ser empregados em várias formas, como: grãos soltos, abrasivos
revestidos e colados a discos de esmirilhamento.
Os cimentos constituem outra classificação de material cerâmico. Estes,
ao serem misturados em água, formam inicialmente uma pasta que, poste-
riormente, pega e seca. Essa propriedade do cimento é muito útil, pois
permite que materiais sólidos com diferentes geometrias sejam moldados,
além de ser utilizado como fase de ligação entre os tijolos em construção. O
cimento, cimento portland, gesso e cal são materiais que fazem parte desse
grupo de materiais cerâmicos.
As cerâmicas avançadas são mais recentes e fabricadas em aplicações
específicas. Normalmente, as propriedades ópticas, magnéticas e elétricas são
as mais exploradas. Motores de combustão, fibras ópticas e sistemas micro-
eletromecânicos são algumas aplicações típicas. Os materiais cerâmicos
podem ser processados por diversas técnicas. A Figura 4.21 apresenta um
esquema dos principais processos de fabricação desses materiais.

180 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.21 | Técnicas de fabricação de cerâmicas

Fonte: Callister (2018, p. 480).

As cerâmicas apresentam temperaturas de fusão elevadas e exibem um


comportamento frágil sob tensão. Como resultado, a fusão convencional,
a fundição e rotas de processamento termomecânicos não são técnicas de
fabricação adequadas para o processamento de cerâmicas policristalinas.
Porém, os vidros inorgânicos apresentam temperaturas de fusão mais
baixas em virtude da formação de eutéticos. Assim, a maioria dos produtos
cerâmicos é fabricada com base no processamento de pós-cerâmicos. Esse
processamento é muito similar ao denominado de metalurgia do pó, que é
empregado na fabricação de peças metálicas. No entanto, há uma conside-
ração na formação de cerâmica que é mais proeminente do que na confor-
mação de metal: a tolerância dimensional. Os vidros, no entanto, são produ-
zidos pelo aquecimento das matérias-primas acima da temperatura de fusão.
Diferentes técnicas de fabricação são utilizadas na fabricação dos vidros, por
exemplo, objetos de vidro com paredes grossas, como pratos e louças, são
produzidos por prensagem, na qual a peça é conformada pela aplicação de
pressão em um molde de ferro fundido revestido com grafita (CALLISTER,
2018, p. 482), enquanto que o sopro é utilizado para produzir objetos como
jarros, garrafas e ampolas. Neste processo, um tarugo de vidro é submetido a
um processo de prensagem em molde temporário (parison), posteriormente,
é inserido em um molde de acabamento. A peça é forçada a obter as formas
do contorno do molde por causa da pressão criada pela injeção de ar, como
mostra a Figura 4.22.

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 181


Figura 4.22 | Técnica de prensagem e sopro

Fonte: Callister (2018, p. 482).

Entre as técnicas utilizadas na fabricação de particulados, destaca-se a


conformação hidroplástica e a colagem de barbotinas. A conformação hidro-
plástica mais comum é a extrusão, na qual a massa cerâmica é forçada por meio
do orifício de uma matriz que apresenta uma geometria desejada. Na colagem
de barbotinas, utiliza-se uma suspensão de argila que é derramada no interior
de um molde poroso, a água é absorvida formando uma camada sólida sobre a
parede do molde (drenagem) ou uma peça toda preenchida (sólida). A Figura
4.23 apresenta as etapas da colagem de barbotinas.
Figura 4.23 | Etapas da colagem de barbotinas em (a) suspensão sólida e (b) com drenagem

Fonte: Callister (2018, p. 487).

182 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Uma das técnicas mais populares para produzir formas relativamente simples de
produtos cerâmicos em grandes números é uma combinação de compactação e sinte-
rização, denominada como prensagem de pós. Basicamente, esse processo envolve a
aplicação de uma pressão igual em todas as direções a uma mistura de pó cerâmico,
a fim de aumentar sua densidade. Posteriormente, a peça moldada é submetida ao
cozimento, nessa etapa a peça se contrai e reduz a presença de porosidade.

Sem medo de errar

O laboratório de análise de materiais em que você atua como analista foi


acionado para atender uma empresa fabricante de próteses utilizadas na artro-
plastia de joelhos e quadril que pretende utilizar outro material das próteses em
substituição ao metal-polietileno. Neste caso, qual material poderia ser utilizado
como alternativa? Existem materiais cerâmicos que podem ser utilizados nessa
aplicação? Quais as propriedades dessa classe de materiais? Quais seriam as carac-
terísticas específicas e desejáveis dessas cerâmicas para essas aplicações?
Ao longo desta seção vimos que os materiais cerâmicos apresentam diferentes
propriedades, como resistência mecânica, dureza, tenacidade e elevados pontos de
fusão e ebulição. Especificamente em nosso desafio, o material cerâmico alumina é
utilizado na fabricação de acetábulos e cabeças femorais usados na artroplastia do
quadril e do joelho. A alumina apresenta estrutura cristalina hexagonal compacta,
o que lhe confere elevada dureza, resistência à abrasão e compressão. As peças
polidas têm excelente acabamento superficial e as fortes ligações iônicas fazem
com que a alumina seja um material quimicamente inerte e com boa estabilidade
em meios fisiológicos. Ao serem polidas, o coeficiente de atrito entre as peças de
alumina utilizadas em pares diminui com o tempo, aproximando-se ao de uma
articulação normal. A Figura 4.24 apresenta um esquema da artroplastia do quadril
evidenciando as partes em que é utilizada a alumina.
Figura 4.24 | Esquema da artroplastia do quadril evidenciando as partes de alumina

Fonte: adaptada de https://goo.gl/Z1WMTU. Acesso em: 22 nov. 18.

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 183


A alumina se apresenta como alternativa ideal em substituição ao metal-
-polietileno em próteses utilizadas na artroplastia de joelhos e quadril,
devido a suas propriedades. Por exemplo, a resistência ao desgaste de super-
fícies alumina-alumina são aproximadamente 10 vezes menor que o das
superfícies metal-polietileno. Outras aplicações clínicas da alumina incluem
próteses de joelho, parafusos para ossos e implantes dentários. Assim, você
foi capaz de indicar um novo material para ser utilizado em substituição ao
metal-polietileno em próteses utilizadas na artroplastia de joelhos e quadril.

Avançando na prática

Propriedades dos materiais cerâmicos

Descrição da situação-problema
Uma empresa automobilística atualmente trabalha em um projeto com
diversos materiais aplicados ao sistema de frenagem. Os primeiros carros
utilizavam pastilhas de freios formados por placas metálicas de fricção à base
de resina e partículas metálicas que envolvem o disco de freio (Figura 4.25).
Figura 4.25 | Pastilhas de freios com material metálico

Fonte: https://goo.gl/4g9MWJ. Acesso em: 22 nov. 18.

Ao acionar o pedal de freio, um circuito hidráulico aciona as pastilhas


que comprimem o disco resultando na frenagem do automóvel. As pastilhas
de freios são fabricadas a partir do processo de sinterização de uma mistura
de pó metálicos, tipicamente bronze, alumínio, ferro e cobre. No entanto, a
empresa constatou que estas pastilhas não apresentavam frenagem eficiente
quando frias e eram agressivas ao disco de freios. Para sanar esse problema,
qual tipo de material poderia ser utilizado?

184 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Resolução da situação-problema
Os materiais cerâmicos já são utilizados em pastilhas e discos de freios,
como por exemplo, em aviões-caça de combate, em porta-aviões. Esses
materiais possibilitam frear as aeronaves em um trecho de 100 metros a
uma velocidade de 240 km/h. Não muito distante, a indústria automobilís-
tica de automóveis de luxo como a Porsche e a Mercedes já equipam alguns
modelos que utilizam materiais cerâmicos no sistema de freios. Nos carros
populares são utilizados discos de freios de ferro fundido e quando muito
exigidos atingem uma temperatura de até 500 °C. A utilização dos materiais
cerâmicos aumentam em até 25% a eficiência em relação ao sistema de ferro
fundido e por ter um coeficiente de atrito maior que o ferro fundido requer
uma distância muito menor para o automóvel parar. Os discos de cerâmicas
são capazes de atingir até 1400 °C e mantêm sua eficiência mesmo com
chuva, já que esses materiais não absorvem água. O sistema com material
cerâmico é aproximadamente 20 quilos mais leve do que o sistema de ferro
fundido e apresenta uma durabilidade aproximada de 300.000 quilômetros
para os discos e 60.000 quilômetros para as pastilhas.

Faça valer a pena

1. Os materiais cerâmicos apresentam diferentes propriedades como resistência


mecânica, dureza, tenacidade e elevados pontos de fusão e ebulição. A alumina é
utilizada na fabricação de acetábulos e cabeças femorais utilizadas na artroplastia do
quadril e do joelho.

Assinale a alternativa correta, que apresenta a justificativa do emprego da alumina em


próteses utilizadas na artroplastia de quadril e joelho.
a) As estruturas cristalinas cúbicas de corpo centrado presentes neste composto e que
lhe confere excelente dureza.
b) As fortes ligações iônicas que a tornam um material quimicamente inerte apresen-
tando grande estabilidade em meios fisiológicos.
c) As fortes ligações covalentes que a tornam um material inerte a qualquer tipo de ambiente.
d) A estrutura hexagonal compacta que lhe confere baixa resistência à abrasão.
e) A baixa densidade e as ligações secundárias que as tornam inertes.

2. Avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas:


I. A fusão convencional, a fundição e rotas de processamento termomecânicos são
técnicas de fabricação adequadas para o processamento de cerâmicas policristalinas.
PORQUE
II. As cerâmicas apresentam temperaturas de fusão elevadas e exibem um comporta-
mento frágil sob tensão.

Seção 4.2 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais cerâmicos - 185


A respeito das asserções expostas, assinale a alternativa correta.
a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa da I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) As asserções I e II são proposições falsas.

3. O óxido de zinco (ZNO) é um composto inorgânico com fórmula ZnO que é ampla-
mente usado como um aditivo em vários materiais e produtos, incluindo borrachas,
plásticos, cerâmicas, vidro, cimento, lubrificantes, tintas, pomadas, adesivos, entre outros.

A partir das eletronegatividades do zinco e oxigênio, respectivamente, iguais a 1,65 e


3,44, assinale a alternativa correta.
a) As ligações interatômicas no óxido de zinco apresentam percentual iônico aproxi-
madamente igual a 60%, sendo predominantemente iônicas.
b) As ligações interatômicas no óxido de zinco são predominantemente covalentes e
apresentam um percentual iônico aproximadamente igual a 2%.
c) As ligações interatômicas no óxido de zinco apresentam aproximadamente 55%
natureza iônica e 45% natureza covalente.
d) As ligações interatômicas no óxido de zinco são predominantemente metálicas.
e) As ligações interatômicas no óxido de zinco são predominantemente covalentes e
apresentam um percentual iônica aproximadamente igual a 55%.

186 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Seção 4.3

Propriedades, processamento e desempenho dos


materiais poliméricos e compósitos

Diálogo aberto
Em nosso dia a dia utilizamos diversos tipos de materiais. Mas você,
por exemplo, já se questionou o porquê alguns plásticos podem ir ao
micro-ondas e outros não? E que existem diferentes tipos de plásticos?
O material plástico utilizado na fabricação de garrafas de refrigerantes,
não é o mesmo tipo de plástico utilizado em cabos de panelas e, esses
dois tipos de plásticos são diferentes daqueles utilizados no solado de um
calçado, não é mesmo?
Nessa seção vamos estudar os materiais poliméricos também conhe-
cidos como plásticos, mas além desse tipo de material, você conhece
outra classe de material diferente dos metais ou cerâmicos? Vamos pensar
em duas aplicações: coletes à prova de balas e um carro de corrida. Nessas
aplicações temos algumas características parecidas, tanto o colete à prova
de balas quanto o carro de corrida devem ser os mais leves possíveis,
ao mesmo tempo que precisam de resistência ao impacto. Se usássemos
metais nessas aplicações teríamos um problema, a quantidade de aço
necessária para resistir ao impacto de uma bala tornaria inviável o uso de
coletes, da mesma forma que o peso do carro de corrida seria tão elevado
que talvez nem poderíamos mais chamá-los assim.
Nessa seção, além dos materiais poliméricos vamos conhecer os
materiais compósitos. Esses materiais são utilizados principalmente em
aplicações que necessitam de elevada resistência e baixo peso. Assim, para
iniciarmos nossos estudos, imagine que você está atuando em um labora-
tório de análise de materiais que presta consultoria para diversos clientes.
Nesse momento, você recebeu uma demanda de uma indústria aeronáutica
que atua na fabricação de componentes utilizados em aeronaves comer-
ciais. A empresa enviou duas amostras de materiais que foram subme-
tidas a um ensaio de impacto, no qual um pêndulo de impacto de massa,
comprimento, energia e altura conhecidos é solto, impactando o material
e causando uma deformação. O objetivo é verificar as propriedades dos
materiais (a) e (b) (Figura 4.26), uma vez que a empresa pretende utilizar
o material (b) como alternativa ao material (a).

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 187
Figura 4.26 | Amostras dos materiais (a) e (b)

Fonte: acervo do autor.

A qual classificação pertencem esses materiais? Quais as proprie-


dades de interesse para a aplicação em componentes de aeronaves? Esses
materiais apresentam as mesmas propriedades? Qual a diferença entre
eles? O material (b) poderá ser utilizado como alternativa à utilização do
material (a)?
Para responder a esses questionamentos vamos conhecer os materiais
poliméricos e compósitos e suas principais características.
Bons estudos.

Não pode faltar

Os materiais poliméricos podem ser definidos como materiais que


possuem várias partes quimicamente ligadas. A própria palavra polímero
significa “muitas partes”. Os polímeros são compostos orgânicos de
elevada massa molecular formados por unidades que se repetem, denomi-
nadas monômeros, formando cadeias de longa extensão (CANEVAROLO,
2006). Os materiais poliméricos podem ser de ocorrência natural, como
as proteínas, a celulose e a borracha, ou sintética, como o polietileno (PE).
Os materiais poliméricos também podem classificados pela forma em
que as moléculas estão estruturadas. Por exemplo, os polímeros denomi-
nados lineares (Figura 4.27a) consistem em longas cadeias poliméricas
dispostas aleatoriamente, enquanto que os polímeros ramificados (Figura
4.27b) possuem as cadeias poliméricas principais e ramificações secun-
dárias na forma de cadeias menores que se originam a partir das cadeias
principais (CALLISTER, 2018).

188 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.27 | Estruturas poliméricas (a) linear, (b) ramificada

Fonte: elaborada pelo autor.

Industrialmente, os polímeros são classificados em duas classes


principais: plásticos e elastômeros. Os plásticos são resinas orgânicas
moldáveis, podem ser de ocorrência natural ou sintética e o método mais
comum de fabricação destes é a moldagem. Esses materiais são impor-
tantes na engenharia por muitas razões: apresentam uma ampla gama de
propriedades e na maioria dos casos, são de custo relativamente baixo.
Entre essas destacam-se: baixa densidade, baixa condutividade térmica
e elétrica, boa tenacidade, boa resistência a ácidos, bases e umidade,
alta rigidez dielétrica (uso em isolamento elétrico) etc. Esses materiais
também apresentam um comportamento tensão-deformação semelhante
aos metais, que é a capacidade de o material suportar um esforço que
tende a alongá-lo até a ruptura. Assim, os polímeros podem ser frágeis,
altamente elásticos e plásticos. As magnitudes da tensão de ruptura
para os materiais poliméricos são menores quando comparadas com os
metais, no entanto, o alongamento pode ser na ordem de 1000% maior.
Essas propriedades alteram drasticamente com a temperatura, indo de
um comportamento frágil igual a um vidro à baixa temperatura ou a um
comportamento semelhante à borracha em elevadas temperaturas. Dessa
forma, o aumento da temperatura torna o polímero mais macio e dúctil.

Saiba mais
Ficou curioso sobre as propriedades mecânicas dos materiais polimé-
ricos? Pesquise mais sobre esse comportamento consultando a página
532 do livro:
ASKELAND, D. R.; WRIGHT, W. J. Ciência e engenharia dos materiais. São
Paulo: Cengage Learning, 2014.

Os polímeros são classificados de acordo com suas propriedades


mecânicas, estruturas e ligações interatômicas, em: termorrígidos, termo-
plásticos e termofixos.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 189
A maioria dos polímeros produzidos são termoplásticos, o que signi-
fica dizer que, uma vez que o polímero é formado, ele pode ser fundido e
reutilizado, isto é, pode ser reciclado e novamente processado com facili-
dade. Polietileno tereftalato (PET), polipropileno (PP), poliestireno (PS)
e policloreto de vinila (PVC) são alguns exemplos de materiais termo-
plásticos. Esses materiais são normalmente fabricados pela aplicação
simultânea de calor e pressão. Os termoplásticos são polímeros lineares
sem qualquer ligação cruzada na estrutura, no qual longas cadeias
moleculares estão ligadas umas às outras por ligações secundárias e têm a
propriedade de aumentar a plasticidade com o aumento da temperatura,
que rompe as ligações secundárias entre cadeias moleculares. Outras
propriedades mecânicas dos polímeros termoplásticos como fluência,
tração, tenacidade, são afetadas pelo grau de polimerização, que pode ser
obtido a partir da equação:
massa molecular do polímero
Grau de polimerização =
massa molecular da unidade repetitiva

À medida que ocorre o aumento da massa molecular média do polímero,


a temperatura de fusão desse polímero aumenta. A polimerização ou síntese
é o conjunto de reações químicas que promove a união dos monômeros
ou oligômeros para criar as macromoléculas, que se inicia com a produção
de grandes cadeias nas quais os átomos estão fortemente unidos por
ligações covalentes (ASKELAND, 2014). A polimerização pode ocorrer
por adição, em que as unidades monoméricas são ligadas uma de cada vez,
ou por condensação, através de reações químicas que ocorrem por etapas
e produzem estruturas com propriedades semelhantes às dos polímeros de
adição. Os termoplásticos mais comuns são: acrílicos, cloreto de polivinila
(PVC), nylon, polipropileno, poliestireno, polimetilmetacrilato (PMMA).
Já os materiais termorrígidos são aqueles que requerem calor e
pressão para moldá-los. Eles são produzidos em uma forma perma-
nente e curados ou “ativados” por meio de reações químicas, como a
reticulação. Os termorrígidos não podem ser refundidos ou reformados
em outra forma, isto é, não podem ser reciclados, uma vez que foram
moldados e quando são novamente submetidos a elevadas temperaturas
esses polímeros se decompõem. A maioria dos termoendurecíveis são
compostos de longas cadeias que são fortemente reticuladas (Figura 4.28)
(e/ou ligada de forma covalente) umas às outras para formar estruturas
de rede 3-D, um sólido rígido.

190 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.28 | Estrutura polimérica reticulada típica de um termofixo

Fonte: elaborada pelo autor.

Em sua grande maioria, os termofixos são mais duros (elevada resistência


mecânica) e mais frágeis, quando comparados aos termoplásticos. Algumas
vantagens desses polímeros incluem: elevada estabilidade térmica, dimen-
sional, baixa densidade, boas propriedades de isolamento elétrico e térmico,
resistência à deformação e deformação sob carga.
Existem dois métodos pelos quais as reações de reticulação podem ser
iniciadas: a ligação cruzada, também denominada crosslinking, que pode ser
obtida por aquecimento da resina em um molde apropriado (por exemplo, a
baquelite). No segundo método, as resinas, como a epóxi, são curadas em baixa
temperatura pela adição de um agente de ligação cruzada, por exemplo, uma
amina. Epóxis, borrachas vulcanizadas, fenólicos, resinas de poliéster insatu-
radas, resinas de amino (ureias e melaminas) são exemplos de termofixos. Outro
tipo de polímero são os elastômeros, popularmente conhecidos como borrachas.
Eles são polímeros que, em temperatura ambiente, suportam grandes alonga-
mentos sob carga e retornam à condição original quando a carga é liberada. O
processamento dos polímeros envolve a preparação e síntese de matérias-primas
derivadas de carvão e de produtos petrolíferos em substâncias menores por meio
da polimerização. A polimerização dessas macromoléculas pode acontecer por
adição onde as unidades dos monômeros são ligadas uma de cada vez, encadean-
do-se para formar uma macromolécula linear ou por condensação na qual geral-
mente envolve mais do que uma espécie de monômero e normalmente existe
um subproduto que é eliminado, isto é, condensado, um exemplo comum de
subproduto é a condensação da água.

Exemplificando
As proteínas, por exemplo, são polímeros de condensação feitos a partir
de monômeros de aminoácidos, enquanto que os carboidratos são um
exemplo de polímero de condensação obtidos a partir de monômeros de
açúcares, como a glicose.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 191
O tempo das reações de polimerização por condensação é maior quando
comparado ao das reações de polimerização por adição. Os fenóis-formal-
deídos, nylons e policarbonatos são exemplos de polímeros produzidos por
condensação. As reações de polimerização também ocorrem na técnica
sol-gel utilizada no processamento de materiais cerâmicos.
A maioria das propriedades dos polímeros são características intrín-
secas, isto é, de um polímero específico. As substâncias denominadas como
aditivos são introduzidas para melhorar ou modificar as propriedades dos
polímeros. Esses aditivos incluem cargas, plastificantes, estabilizadores,
corantes e retardantes de chama (CALLISTER, 2018). As cargas são usadas
para melhorar a resistência à tração e à compressão, a abrasão, a tenacidade
e a estabilidade dimensional e térmica. Pó de madeira, areia, argila, talco,
entre outros são alguns exemplos desses aditivos. Já os aditivos plastificantes
são utilizados quando o objetivo é melhorar a flexibilidade, ductilidade e a
tenacidade dos polímeros, diminuindo a temperatura de transição vítrea do
polímero. Os aditivos plastificantes são, geralmente, líquidos de baixo peso
molecular e utilizados em polímeros que são frágeis a uma temperatura
ambiente, o que melhora a tenacidade, ductilidade e flexibilidade e, conse-
quentemente, diminui a dureza e rigidez. Os estabilizadores são outro tipo
de aditivo polimérico que neutraliza os processos de deterioração como a
oxidação e radiação. Os corantes são os responsáveis por dar uma cor especí-
fica a um polímero. Esses corantes são adicionados na forma de pigmentos,
que permanecem como uma fase distinta ou tintas (matiz) que se dissolvem
no polímero.
Por fim, os aditivos retardantes de chama são usados para aumentar
a resistência ao fogo dos polímeros combustíveis, já que a maioria dos
materiais poliméricos é inflamável na forma pura. Esses aditivos interferem
no processo de combustão por meio da fase gasosa ou pela iniciação de uma
reação de combustão que gera menos calor (CALLISTER, 2018).
Outras propriedades interessantes dos materiais poliméricos são as visco-
elásticas, isto é, a capacidade que ao se deformar, simultaneamente sofrem
deformações elásticas e viscosas. Essas propriedades podem ser modifi-
cadas utilizando catalisadores que podem formar a chamada memory foam,
também conhecida como espuma de memória. Esse tipo de espuma é muito
mais macio à temperatura da pele humana quando comparado à tempe-
ratura ambiente. Um exemplo de polímeros viscoelásticos são as popular-
mente conhecidas espumas da NASA (National Aeronautics and Space
Administration), desenvolvidos por essa agência norte-americana em 1966.
Os materiais poliméricos podem ser processados por diversas técnicas
que serão determinadas com base em alguns fatores, como a natureza do

192 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
material (ser termoplástico ou termorrígido), a temperatura de fusão (para
os termoplásticos) e a degradação (para os termorrígidos).

Assimile
A baquelite é um polímero termofixo utilizado na fabricação de peças de
automóveis, cabos de panela, entre outros. Lembrando que termofixo,
termorrígido e termoendurecível são sinônimos.

Existem diversas técnicas para a fabricação de polímeros e a escolha


do processamento correto dependerá de alguns fatores, como: o material
é termoplástico ou termoendurecível, temperatura de fusão/degradação,
estabilidade atmosférica quando está sendo conformado e as dimensões,
forma e complexidade do produto acabado.
Os polímeros termoplásticos são conformados acima da temperatura de
transição vítrea, quando amorfos, ou acima da temperatura de fusão, quando
semicristalinos. Os termofixos são conformados em duas etapas, na primeira,
prepara-se um polímero líquido de baixa massa molecular que, posterior-
mente, é curado, isso pode ocorrer pelo aquecimento ou pela adição de catal-
isadores, posteriormente o termofixo é submetido à pressão, moldando-o.
Entre os diversos processos de fabricação dos materiais poliméricos, desta-
ca-se a moldagem por compressão que envolve uma quantidade apropriada com
um pequeno excesso do polímero e de aditivos que são colocados entre as partes
“macho” e “fêmea” do molde já aquecidas. O molde é fechado e o calor e a pressão
são aplicados, tornando o polímero viscoso e, consequentemente, preenchendo o
molde. O produto final é obtido com uma possível pequena rebarba de material.
A Figura 4.29 apresenta um esquema de um equipamento de compressão.
Figura 4.29 | Moldagem por compressão

Fonte: adaptada de https://goo.gl/AzFYG1. Acesso 28 nov. 18.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 193
A moldagem por transferência difere da moldagem por compressão na
forma como os materiais são introduzidos na cavidade do molde, já que
o polímero é, primeiramente, fundido em uma câmara de transferência
aquecida e externa às cavidades do molde no qual será introduzido. Quando o
molde está fechado, um êmbolo força o material para o interior das cavidades
do molde, no qual o material é curado e moldado. Já a moldagem por injeção,
amplamente utilizado na fabricação de termoplásticos no qual a quantidade
correta do material peletizado é alimentada por uma moega de carregamento
para o interior de um cilindro, pelo movimento de um êmbolo ou pistão
(CALLISTER, 2018), conforme apresentado na Figura 4.30.
Figura 4.30 | Esquema de um equipamento de moldagem por injeção

Fonte: https://goo.gl/HhMbXj. Acesso em: 28 nov.18.

Além dos materiais metálicos, cerâmicos e poliméricos, uma classe


muito importante são os materiais compósitos. Um compósito geralmente
é definido como a combinação de dois ou mais materiais distintos, cada
um com suas propriedades específicas que, juntas, criam um novo material
com combinações de propriedades não observadas nos materiais isolados.
Assim, esses materiais são possíveis por meio da combinação entre metais,
cerâmicas e polímeros. Em sua grande maioria, consistem de uma fase de
reforço (fase dispersa) composta por partículas, fibras ou folhas envolvidas
por uma matriz (fase contínua). Os materiais compósitos podem ser classi-
ficados como: reforçados com partículas: partículas grandes ou reforçados
por dispersão; reforçados com fibras: contínuo ou descontínuo (alinhado ou
orientado aleatoriamente); estrutural: laminados ou painéis sanduíche. Os
compósitos reforçados com partículas são divididos em dois tipos, de acordo
com o tamanho das partículas: as partículas grandes atuam na restrição
do movimento da matriz, mas não impedem de modo eficaz o movimento
de defeitos denominados discordâncias (ASKELAND, 2014). Já os compó-
sitos reforçados por dispersão contêm partículas na escala de 10 a 250 nm
(nanômetros) de diâmetro. Nesse compósito, a matriz suporta a maior parte

194 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
da carga aplicada enquanto as partículas impedem o movimento das
discordâncias, limitando a deformação permanente (plástica). O concreto
é um exemplo de compósito reforçado por partículas grandes, feito
de uma matriz de cimento que une partículas de diferentes tamanhos,
como areia e brita. As propriedades do cimento dissolvido em água, com
os materiais particulados, dependem do quão bem os materiais foram
misturados, do tamanho dos materiais particulados e da quantidade de
água. Água demais resulta em uma porosidade excessiva do concreto
solidificado, em contrapartida, com água insuficiente o concreto tende a
ficar com a superfície porosa e a compactação comprometida. O uso de
diferentes tamanhos de pedra e areia permite uma melhor compactação
do que quando são usadas partículas de tamanho semelhante, agora
ficou fácil compreender por que temos as popularmente chamadas areias
fina, média e grossa, por causa das diferentes granulometrias. Para os
compósitos reforçados por dispersão, o exemplo clássico é o compósito
à base de pó de alumínio sinterizado, no qual a matriz de alumínio é
endurecida com até 14% de óxido de alumínio. Esse compósito é utilizado
em reatores nucleares.

Reflita
Um reator nuclear é um sistema que contém e controla reações nucle-
ares em cadeia. Estes reatores são usados para geração de eletricidade,
movimentação de porta-aviões e submarinos, produção de radioisó-
topos para tratamentos médicos, entre outras aplicações. Com base
nestas informações, quais devem ser as propriedades dos materiais
compósitos que são utilizados na fabricação desses sistemas?

As propriedades físicas dos materiais compósitos em geral, na natureza,


não são isotrópicas (independentes da direção da força aplicada), mas são
tipicamente anisotrópicas (diferentes, dependendo do sentido da força ou
carga aplicada), isto é, o compósito é mais resistente ao longo da direção de
orientação das fibras e mais fraco na direção perpendicular à fibra. A rigidez
de um painel composto (anisotrópico), por exemplo, além da orientação das
forças e/ou momentos aplicados, também depende do desenho do painel,
reforço de fibra, matriz, método de construção do painel, tipo de tecido e
a orientação do eixo da fibra em relação à força primária. Em contraste,
os materiais isotrópicos, como o alumínio e o aço já forjados, tipicamente
apresentam a mesma rigidez independentemente da orientação e direção das
forças ou dos momentos aplicados.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 195
As propriedades dos compósitos dependem da natureza dos materiais
que são utilizados, isto é, das propriedades da fase matriz e da fase de reforço,
da geometria da fase dispersa e do grau de ligação entre as interfaces. Nos
compósitos as funções da matriz são: absorver as deformações, dar suporte
às fibras, partículas ou folhas e conferir resistência mecânica quando subme-
tidas à compressão.
Nos materiais compósitos termoendurecíveis são utilizadas resinas em
forma de reagentes, que são inseridas no molde e posteriormente curadas.
Além dos compósitos de matriz polimérica, temos os compósitos de matriz
cerâmica: estes materiais são leves, apresentam boa resistência e dureza.
Nos compósitos cerâmicos são utilizadas como fases de reforço fibras
de carbono, fibras de vidro, fibras de carbeto de silício, entre outros. Por
fim, temos os compósitos de matriz metálica, nos quais são utilizadas como
matrizes ligas metálicas de baixa densidade à base de alumínio, titânio e
magnésio. Nesse tipo de compósito, a maior parte dos materiais de reforço
empregados é cerâmica, como partículas de alumina, fibras de grafita e
filamentos de boro etc. A fibra de vidro é um exemplo muito comum de
materiais compósitos. Essa fibra é feita com pequenas fibras de vidro que
são envolvidas por uma resina polimérica. É um material de baixa densi-
dade, reciclável, apresenta pouca condutividade térmica, boa resistência à
corrosão e é um bom isolante elétrico. Apesar de não serem tão resistentes e
duras como os compósitos de fibra de carbono, as matérias-primas da fibra
de vidro são baratas e, quando comparada com alguns metais, esse compó-
sito apresenta melhores propriedades em termos de peso em massa, resis-
tência mecânica e facilidade de ser moldado em formas complexas. A fibra
de vidro pode estar disposta de forma aleatória, achatada para formar uma
folha ou em tecido e a matriz polimérica pode ser um polímero termoen-
durecível. Na maioria das vezes são utilizadas resinas epóxi, de poliéster ou
então um termoplástico.
Outro tipo de compósito muito importante são aqueles que possuem
como fase de reforço fibras ou mantas de carbono, como por exemplo, o
compósito carbono/epóxi que é classificado como um compósito estrutural.
Nesse tipo de compósito, além das propriedades dos materiais, o projeto
geométrico dos elementos estruturais é extremamente importante. Os
materiais compósitos podem ser classificados em duas categorias de acordo
com a construção do material: laminados, que têm camadas ligadas em
conjunto com orientações específicas da disposição das fibras (Figura 4.31),
e painéis sanduíche, que são materiais estruturais de múltiplas camadas
contendo um núcleo de baixa densidade entre camadas finas de materiais
compósitos, como visto anteriormente.

196 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Figura 4.31 | Compósito laminado

Fonte: Askeland (2014, p. 569).

Os compósitos reforçados com fibras de carbono são resistentes e podem


ser utilizados em ambientes com altas temperaturas. A Figura 4.32 apresenta
um laminado carbono/epóxi utilizado na indústria aeronáutica e produzido
a partir de camadas sobrepostas de mantas de fibra de carbono envolvidas
em resina epóxi.
Figura 4.32 | Laminado carbono/epóxi

Fonte: acervo do autor.

Nessa indústria, os laminados compósitos são importantes na substi-


tuição de ligas metálicas e exibem excelentes características, como rigidez,
resistência mecânica, resistência a elevadas temperaturas em condições de
trabalho, além de exibir um bom desempenho sob fadiga (CALLISTER,
2018). Outro tipo de compósito estrutural muito importante são os painéis,
que consistem basicamente em duas placas finas de um material resistente
intercaladas por um outro material (núcleo), que geralmente apresenta uma
baixa densidade e baixo módulo de elasticidade. Normalmente são utilizadas
espumas poliméricas rígidas, madeira balsa e colmeias.
A Figura 4.33a apresenta um esquema de painel sanduíche do tipo honey-
comb (colmeia) e a Figura 4.33b mostra um painel sanduíche do tipo honey-
comb desenvolvido pela NASA.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 197
Figura 4.33 | Painéis sanduíche (honeycomb)

Fonte: (a) https://goo.gl/d5uR6o; (b) https://goo.gl/k9zwDt. Acesso em: 29 nov. 18.

A Figura 4.33a apresenta um painel que está estruturado da seguinte


maneira: (1) representa um esquema do painel sanduíche; (2) corresponde
às placas de um determinado material, isto é, a face da lâmina, enquanto
(3) refere-se ao núcleo (colmeia) que adere às placas por meio de adesivos.
Ao final, o painel sanduíche apresenta, em determinadas condições, resis-
tência à flexão bem maior que placas maciças dos mesmos materiais e da
mesma densidade. Nesse compósito as faces suportam as tensões normais de
compressão, tração ou cisalhamento que estão associadas à flexão e são fabri-
cadas de materiais relativamente resistentes, como ligas de alumínio, aços,
madeiras compensadas ou plásticos reforçados com fibras. O núcleo deve
manter as faces afastadas em uma determinada espessura, ser suficiente-
mente rígido na direção perpendicular a elas, a fim de evitar o esmagamento.
Nos materiais compósitos podemos usar os diferentes tipos de fibras
que podem ser orgânicas naturais (coco, sisal, bambu) e sintéticas (carbono,
aramida, poliamida) ou inorgânicas (metálicas, bora, vidro). Os compósitos
estruturais mais avançados utilizam-se de fibra de vidro, carbono/grafite,
boro e outros materiais orgânicos, resultando em materiais leves e que ao
mesmo tempo apresentam elevada resistência e dureza. Além dos diferentes
tipos de fibras, na fabricação de um material compósito vários materiais,
como polímeros, metais e não metais podem ser utilizados como matrizes.
Alguns dos métodos mais comuns de fabricação de compósitos são:
laminação manual e automática (hand lay-up e automatized lay-up), spray
up, enrolamento filamentar (filament winding), modelagem por transferência
de resina (resin transfer molding) e pultrusão.
Na laminação manual ou hand lay-up deve-se cortar o material de reforço
do tamanho adequado e colocar as fibras dispostas como tecidos ou mantas.
As peças cortadas são molhadas e impregnadas no material da matriz e são
colocadas sobre a superfície de um molde aberto que é coberta com um
gel-coat. A acomodação da manta impregnada é realizada com o auxílio
de um rolete, garantindo a distribuição uniforme da matriz e a remoção de

198 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
ar retido. Terminada essa etapa, o compósito é deixado em repouso até a
completa secagem da matriz. O tempo de espera para secagem irá variar de
acordo com a espessura do compósito fabricado, quanto maior a quantidade
de camadas mais tempo para secagem. A Figura 4.34 apresenta algumas
dessas etapas da laminação manual para um corpo de prova utilizando uma
manta de fibras de carbono.
Figura 4.34 | Laminação manual (a) distribuição da resina polimérica e remoção de ar retido;
(b) secagem e compósito final.

Fonte: acervo do autor.

A produtividade da laminação manual pode ser automatizada usando


máquinas CNC (Comando Numérico Computadorizado). Essas máquinas
são utilizadas tanto para a pré-impregnação das fibras quanto das mantas, e
normalmente a indústria aeroespacial faz uso dela. Na técnica de spray up a
resina é pulverizada sobre a superfície e preparada do molde por uma pistola
especialmente projetada.
A técnica conhecida como enrolamento filamentar ou filament winding
consiste no enrolamento de fibras contínuas impregnadas de resina em torno
de um cilindro, mandril ou do perfil que se deseja (Figura 4.35). Assim, após
a remoção do molde (cilindro), tem-se como resultado uma forma oca. As
aplicações mais comuns para essas técnicas são as fabricações de tubulação,
tubos, vasos de pressão, tanques, entre outras.
Figura 4.35 | Enrolamento filamentar

Fonte: https://goo.gl/Y4YUpB. Acesso em: 29 nov. 18.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 199
A pultrusão é um processo de laminação contínuo utilizado principal-
mente para produção de longos perfis lineares de seção transversal constante.
Essa técnica de fabricação é muito semelhante à extrusão, exceto pelo fato
de que o material compósito deve ser puxado ao invés de ser empurrado
por meio de uma matriz, como acontece na extrusão. Na pultrusão as fibras
contínuas são impregnadas pela matriz, em seguida, moldados e curados
por um molde pré-aquecido ou um conjunto de fieiras. Uma vez curado,
o material é cortado. Algumas das aplicações típicas dessa técnica é a fabri-
cação de tubulação, tubos, escada e degraus, entre outros. A Figura 4.36
apresenta um esquemático da pultrusão.
Figura 4.36 | Processo de pultrusão

1 – Fibras contínuas / tapete de fibra tecida; 2 - rolete de tração, 3 – banho de resina; 4 – fibra embebida de
resina; 5 - matriz e fonte de calor; 6 – rolos de laminação; 7 – Polímero reforçado com fibras.
Fonte: adaptado de: https://goo.gl/u2zRuh. Acesso em: 29 nov. 18.

A moldagem por transferência de resina (Figura 4.38) ou RTM (resin transfer


molding) é utilizada na fabricação de itens complexos e com grandes dimensões,
como banheiras, armários, peças de aeronaves e componentes automotivos.
Figura 4.37 | Moldagem por transferência de resina

Fonte: adaptada de https://goo.gl/VAMu2f. Acesso em: 19 dez. 2018.

200 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Nesse processo de fabricação, um conjunto de metades de molde são carre-
gados com o material de reforço e, em seguida, fechados em conjunto. A resina
é então injetada sob pressão na cavidade do molde fechado contendo a manta
de fibras. O molde preenchido de resina é curado e após essa etapa as metades
do molde são separadas e a peça é removida para corte ou acabamento final.

Sem medo de errar

Como analista de um laboratório que trabalha com análises de amostras


de materiais, você recebeu amostras de materiais de uma empresa cliente que
atua na fabricação de componentes para aeronaves comerciais. Você recebeu
duas amostras de materiais deformados, a partir de um ensaio de impacto. A
empresa pretende substituir o material (a) pelo material (b).
Figura 4.26 | Amostras dos materiais (a) e (b)

Fonte: acervo do autor.

Como esses materiais são classificados? Quais as propriedades interes-


santes para a aplicação em componentes de aeronaves? Esses materiais
apresentam as mesmas propriedades? Qual a diferença entre eles? O material
(b) poderá ser utilizado como alternativa à utilização do material (a)?
As amostras recebidas são de materiais denominados compósitos.
Material compósito pode ser definido como a combinação entre diferentes
materiais que, quando juntos, apresentam propriedades características e
distintas daquelas dos materiais isolados. Assim, o material apresentará a
combinação das melhores propriedades daqueles que o compõem. Existem
diversos tipos de compósitos, como o concreto, a fibra de vidro e as fibras de
carbono; e cada um desses materiais apresentará uma determinada proprie-
dade que atenderá a uma necessidade específica.
Os compósitos podem ser do tipo reforçado por partículas, por fibras
e estruturais (painéis e laminados). Um compósito termoplástico pode ser

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 201
entendido como um material que utiliza uma resina termoplástica, isto é,
uma resina que quando atinge determinada temperatura apresenta alta
viscosidade e facilidade para ser moldada e conformada, como a poli-éter-
-éter-cetona (PEEK), o sulfeto de polifenileno (PPS) e a polieterimida (PEI).
Já um compósito termorrígido utiliza-se de resinas que, uma vez aquecidas,
não podem ser mais remodeladas, como as resinas epóxis. Os compósitos
termorrígidos apresentam melhores propriedades mecânicas e maior resis-
tência à umidade quando comparados aos termoplásticos. Os dois materiais
apresentados na Figura 4.26 são compostos por camadas de fibra de carbono,
diferenciando o tipo de resina utilizado. A Figura 4.26a apresenta um compó-
sito termorrígido de carbono epóxi enquanto a Figura 4.26b um compósito
termoplástico (PPS), ambos foram sujeitos a um ensaio de impacto com
mesma energia no centro dos espécimes. Pela análise visual das figuras,
podemos concluir que o compósito-PPS (Figura 4.27b) apresenta uma região
de deformação maior quando comparado ao carbono epóxi (Figura 4.27a),
corroborando a premissa de que os compósitos termorrígidos têm melhores
propriedades mecânicas. Assim, a partir das características desses materiais,
você foi capaz de concluir que o material (b) pode ser utilizado como alter-
nativa à utilização do material (a) em aplicação que requerem uma menor
resistência ao impacto, já que esse material apresenta uma maior área de
deformação quando submetidos a diferentes níveis de energia.

Avançando na prática

Processamento e desempenho dos materiais


compósitos
Descrição da situação-problema
Atuando em uma empresa que fabricava caixas d’água à base de amianto
e que teve a linha de produção encerrada, devido à proibição do uso de
amianto no país, você foi acionado pelo gestor, pois a empresa fará um inves-
timento em uma nova linha de produção para fabricar banheiras em que
se utiliza fibras de vidro. Você será o encarregado em propor um método
de fabricação que seja eficiente e rápido, ao mesmo tempo que o produto
final apresente boa resistência mecânica. Mas qual seria um método eficiente
nessa produção?
Resolução da situação-problema
Entre os métodos de fabricação, você concluiu que a técnica spray up
é indicada na fabricação de banheiras. Nessa técnica, a aplicação da fibra

202 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
de vidro e da resina é realizada sobre a superfície preparada do molde por
uma pistola laminadora especialmente projetada. Nessa técnica são obtidas
peças com bom acabamento e alta resistência. A Figura 4.39 apresenta uma
banheira fabricada a partir desse método de fabricação.
Figura 4.38 | Banheira fabricada pela técnica de spray up.

Fonte: adaptada de https://www.youtube.com/watch?v=wZDpsTBdwgs. Acesso em: 19 dez. 18.

Assim, você foi capaz de indicar um processo de fabricação para a nova


linha de produção, obtendo peças com as propriedades desejadas.

Faça valer a pena

1. Os vidros são uma linha exclusiva de materiais cerâmicos definidos principal-


mente por sua estrutura atômica e não apresentam a estrutura cristalina ordenada
como a maior parte das outras cerâmicas, os vidros apresentam uma estrutura amorfa
altamente desordenada.
Analise as afirmações abaixo:
I. Os vidrocerâmicas são na grande maioria vidros inorgânicos submetidos a trata-
mentos térmicos em elevadas temperaturas.
II. A utilização de vidros é importante, principalmente em aplicações que envolvam
sua resposta ao aquecimento.
III. Nos vidros destacam-se a adição do CaO, Na 2O , K 2O e Al 2O3 .

Assinale a alternativa que apresenta a(s) afirmação(ões) correta(s):

a) I, II e III são corretas.


b) Somente II é correta.
c) Somente III é correta.
d) Somente I e III são corretas.
e) Somente II e III são corretas.

Seção 4.3 / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais poliméricos e compósitos - 203
2. Os materiais compósitos são materiais típicos do consumo da indústria de tecno-
logias avançadas como a aeronáutica, automóveis, barcos, peças de esportes e dispo-
sitivos médicos. Os materiais compósitos, muitas vezes, são utilizados na substituição
de outro material como, por exemplo, os metais.

Assinale a alternativa que apresenta desvantagens na utilização de compósitos.


a) Baixa densidade, baixa condutividade e baixa rigidez dielétrica.
b) Custo de materiais, longo tempo de preparação e danos invisíveis.
c) Baixa dureza, densidade, condutividade elétrica.
d) Não podem ser utilizados na fabricação de formas com geometria complexa.
e) Baixa condutividade térmica, baixa expansão térmica e baixa resistência à fadiga.

3. Os materiais compósitos podem ser classificados em duas categorias de acordo


com a construção do material em: laminados, que têm camadas ligadas em conjunto
com orientações específicas da disposição das fibras, e painéis sanduíche, que são
materiais estruturais de múltiplas camadas contendo um núcleo de baixa densidade
entre camadas finas de materiais compósitos.

Sobre as fibras dispostas unidirecionalmente é correto apenas o que se afirma em:


a) Produzem propriedades anisotrópicas com boa resistência mecânica paralelas às fibras.
b) Quando designadas 90° indicam que todas as fibras estão alinhadas com a direção
da tensão aplicada.
c) A resistência mecânica elevada é obtida em duas direções perpendiculares.
d) Fibras dispostas desta maneira fornecem reforço em múltiplas direções.
e) Essas fibras resultam em elevadas propriedades se a carga for perpendicular às fibras.

204 U4
- / Propriedades, processamento e desempenho dos materiais
Referências
ASKELAND, D. R.; WRIGHT, W. J. Ciência e engenharia dos materiais. 2. ed. São Paulo:
Cengage Learning, 2014. 633p.
CALLISTER, W.; RETHWISH, D. G. Ciência e Engenharia de Materiais: uma introdução. 9.
ed. Rio de Janeiro: LTC, 2018. 861p.
COLPAERT, H.; COSTA E SILVA, A. L. V. Metalografia dos Produtos Siderúrgicos Comuns.
4. ed. São Paulo: Blucher, 2008. 653p.
MARQUEZI, S. L.; CECCATTO, S. L. A usinabilidade nos aços para cementação SAE 8620 e
DIN 20MNCR5. Unoesc & Ciência – ACET, v. 3, n. 1, p. 91-108, 2011.
PRIMO, J. Welding Inspection Qualifications & Testing Procedures, 2012. 116p. Disponível
em: http://www.pdhcenter.com/courses/m415/m415content.pdf. Acesso em: 5 dez. 18.
SIMÊNCIO, E. C. A. Ciência dos materiais. 1. ed. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional
S.A., 2016. 216p.
SHACKELFORD, J. F. Ciência dos Materiais. 6. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil,
2008. 576p.

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