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As Questões Étnico-Raciais No Contexto Do Currículo Escolar

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO I
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DE
JOVENS E ADULTOS - MESTRADO PROFISSIONAL

CELESTE APARECIDA PIMENTEL

A LEI Nº 10.639/03 E AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NO CURRÍCULO DO


CENTRO TERRITORIAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DO SERTÃO
PRODUTIVO – CAETITÉ/BA: UM ESTUDO NO CURSO TÉCNICO EM
SECRETARIADO – PROEJA

SALVADOR/BA

2016
5

CELESTE APARECIDA PIMENTEL

A LEI N°10.639/03 E AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NO CURRÍCULO DO


CENTRO TERRITORIAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DO SERTÃO PRODUTIVO
– CAETITÉ/BA: UM ESTUDO NO CURSO TÉCNICO EM SECRETARIADO – PROEJA

Texto de dissertação apresentado como parte dos requisitos para


obtenção do título de Mestra em Educação de Jovens e Adultos da
Universidade Estadual do Estado da Bahia – UNEB. Pesquisa
realizada pela mestranda Celeste Pimentel, no Programa de Pós-
Graduação em Educação de Jovens e Adultos – Mestrado Profissional
da Universidade Estadual do Estado da Bahia – UNEB.

Área de Concentração: Educação, Meio Ambiente e Trabalho.

Orientador: Prof. Dr. Antônio Pereira/UNEB

Coorientadora: Profa. Dra. Maria Hermínia Lage F. Laffin/UFSC

Salvador/BA

2016
6

FICHA CATALOGRÁFICA
Sistema de Bibliotecas da UNEB
Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592

Pimentel, Celeste Aparecida


A Lei nº10.639/03 e as questões étnico-raciais no currículo do Centro Territorial de
Educação Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA: um estudo no curso técnico em
secretariado – PROEJA / Celeste Aparecida Pimentel . – Salvador, 2016.
166f.

Orientador: Antônio Pereira.


Coorientadora: Maria Hermínia Lage F. Laffim.
Dissertação (Mestrado) - Universidade do Estado da Bahia. Programa de Pós- Graduação em
Educação de Jovens e Adultos . Campus I.

Contém referências e apêndices.


1. Brasil. [Lei nº10639 de 9 de janeiro de 2003]. 2. Programas de ação afirmativa. 3.
Currículos - Mudanças - Brasil. 3. Cultura afro-brasileira - Estudo e ensino. I. Pereira,
Antônio. II. Laffim, Maria Hermínia Lage F. III. Universidade do Estado da Bahia,
Departamento de Educação.

CDD: 344.81077
7
8

Dedicatória
Dedico esse trabalho à memória de todas as mulheres negras que
sentiram a dor da retirada abrupta do seu filho do seio da mãe África
para os abismos e incertezas do Atlântico.
9

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pela força dada na concretização deste sonho.


Aos meus pais Júlio e Isaura, In memoriam.
Aos meus filhos Zaíra e Saulo, pelo apoio e carinho nos momentos difíceis.
Aos familiares e amigos que sempre me incentivaram e me apoiaram nesta jornada.
Ao Fred pela paciência, à Ana pela correção das minhas pérolas e ao meu neto pelo sorriso
que transmite serenidade e paz.
À Bia, pelo carinho que me deu forças para o cumprimento de mais esta etapa em minha vida.
Ao Tubby pelo amor incondicional.
Ao professor orientador Antônio Pereira que ao longo do mestrado conquistou o meu respeito
e admiração, pela serenidade com que orientou a elaboração deste trabalho, transmitindo
compreensão, força e paz.
À professora Hermínia Laffin, pelas orientações e pelo esforço em acompanhar a produção
desta Dissertação mesmo tão distante fisicamente.
Ao professor Hélio Santos por seu apoio e amizade, além de sua dedicação, competência em
especial atenção nas revisões e sugestões, fatores fundamentais para a conclusão deste
trabalho.
A professora Graça Costa pela força afetuosa aliada à perseverança fortaleceram os meus
passos teóricos e metodológicos para trilhar no caminho do mestrado.
A todos os professores, gestores e colaboradores do mestrado MPEJA, dedico um lugar
especial no meu coração.
Aos amigos irmãos, colegas de tantas lutas que me apoiaram quando o desânimo teimava
aparecer em especial, Lúcia, Ana Tanure, Marlene, Cássia, Conceição, Thaíse Ana Helena,
Cínara, Daniela ...
À Universidade Estadual da Bahia- UNEB – Campus I, pela contribuição na construção do
meu conhecimento.
Agradeço a todos os meus colegas do CETEP pela inspiração e pela motivação constante para
minha busca por conhecimento.
A todos os entrevistados que me ofertaram o tempo, a presença e as histórias, as memórias, os
pensamentos e os sentimentos. Vocês, com certeza, são a melhor parte desse trabalho.
Agradeço, carinhosamente, a todos os estudantes do curso técnico em Secretariado do CETEP
por serem a inspiração que possibilitou um trabalho mais situado, libertador e mais humano.
Ao Núcleo Regional de Educação NRE- 13- Caetité- Bahia, pelo apoio.
Agradeço aos que estiveram nessa minha caminhada sem os quais a realização do presente
trabalho seria impossível.
10

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 15

1.2 Metodologia e os procedimentos de investigação 21

2. A EDUCAÇÃO E AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS 31

2.1 A relação entre etnia e a educação para a emancipação humana 31

2.2 A noção de educação no contexto das questões étnico-raciais 32

2.3 A diversidade e a Lei nº 10.639/03 38

3 AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS E A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LEI

Nº 10.639/03. 41

3.1 O processo de institucionalização da Lei nº 10.639/03 41

3.2 O lugar das questões étnico-raciais nas pesquisas contemporâneas 44

4. AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NO CONTEXTO DO CURRÍCULO

ESCOLAR. 59

4.1 Currículo e identidades: nexo das relações 60

4.2 A subjugação da identidade para a submissão cultural 71

5. O CURRICULO ESCRITO DO CETEP NO CURSO TÉCNICO EM

SECRETARIADO PROEJA: O QUE DIZ SOBRE A INSERÇÃO DAS QUESTÕES

ETNICOS-RACIAIS? 76

5.1 O CETEP no território do município de Caetité/Bahia: caracterização do locus de


pesquisa 76

5.2 A organização educacional do CETEP e as particularidades da proposta de ensino


técnico do PROEJA 81

5.3 A matriz curricular 85

5.4 O Projeto Político Pedagógico e o Regimento Escolar do CETEP e a Lei nº10.639/03


88
11

6. O CURRICULO PRATICADO E AS QUESTÕES ETNICOS-RACIAIS NO CETEP:

as contradições e limitações para efetivação da Lei nº 10.639/03. 93

6.1.1 A percepção dos estudantes em relação à construção de sua identidade étnico-


racial 93

6.1.2 A compreensão que os professores têm sobre a construção da identidade étnico-


racial dos estudantes 98

6.2 Ensino da história e cultura afro-brasileira e africana 99

6.2.1 O significado do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana para os


professores 100

6.2.2 A valorização dos conteúdos da história e cultura afro-brasileira e africana pelos


estudantes 102

6.3 O currículo praticado e sua relação com o ensino da história e cultura afro-brasileira
e africana 104

6.3.1 As questões étnico-raciais na prática docente 106

6.3.2 As percepções dos professores /as sobre as questões étnico-raciais na sua prática
docente 111

6.4 Racismo e educação 113

6.4.1 Racismo e a prática docente 114

6.4.2 Racismo e os estudantes 118

CONCLUSÃO 124

REFERÊNCIAS 126

APÊNDICES 141
12

ÍNDICE DE GRÁFICOS

Gráfico Título Pág.


01 Fator de identificação étnico- racial 96
02 A cor da pele como elemento para estabelecer diferenças 99

ÍNDICE DE TABELAS

Tabela Título Pag.


01 Identificação profissional 24
02 Identificação dos estudantes 25

LISTA DE ILUSTRAÇÕES E IMAGENS

Figura Título Pág.


Territórios de Identidade da Bahia, Conselho Estadual de
1 Desenvolvimento Territorial (CEDETER), 2011. Disponível em 81
http://www.seplan.ba.gov.br, acesso em 03 de junho de 2015.

Território de Identidade Sertão Produtivo (BAHIA, 2007) Disponível


2 82
em www.sei.ba.gov.br, acesso em 03 de junho de 2015.

LISTA DE QUADRO

Título Pág.
Quadro
Temática do grupo focal 29
1
13

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CETEP Centro Territorial de Educação Profissional


IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
NRE Núcleo Regional de Educação
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PPP Projeto Político Pedagógico
PROEJA Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação
Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos
UNEB Universidade Estadual do Estado da Bahia
SUPROF Superintendência de Educação Profissional da Bahia
14

RESUMO

Esta dissertação apresentada ao Mestrado Profissional em Educação de Jovens e Adultos


(MPEJA) da Universidade Estadual do Estado da Bahia – UNEB insere-se no campo do
currículo e das questões étnico-raciais. Objetiva compreender a institucionalidade da Lei nº
10.639/03 no currículo do CETEP, analisando de que modo professores/as e estudantes
percebem o desenvolvimento da temática das relações étnico-raciais afro-brasileira, a
construção da identidade do negro e o racismo no espaço escolar. Partindo-se desta
problemática, procurou-se aprofundar elementos teóricos voltados aos estudos das relações
étnico-raciais; analisando e sistematizando documentos da legislação brasileira e
organizativos do CETEP relativo às relações étnico-raciais e PROEJA; e investigar as
dimensões presentes ou não no contexto de documentos organizativos do CETEP e nos
discursos de professores/as e estudantes identificando os conteúdos e as abordagens acerca
das questões étnico-raciais do povo afro-brasileiro no contexto do curso técnico em
Secretariado do PROEJA- CETEP – Sertão Produtivo. Dessa forma, a pesquisa centra-se em
analisar como vem se constituindo no currículo praticado do CETEP – Sertão Produtivo,
curso Técnico em Secretariado - PROEJA o ensino da história e cultura afro-brasileira e
africana em cumprimento a Lei nº 10.639/03? Como são trabalhadas, pedagogicamente, as
questões de identidade do povo negro e de racismo nessa escola? Como os estudantes e
professores/as percebem o cumprimento dessa Lei, na construção da identidade do negro e do
racismo na escola? A pesquisa traz como suporte teórico Munanga (1994), Hélio Santos
(2001), (Freire 1982, 1993, 1999) Valente (1995), Tonet (2005), Laffin (2012) Sacristán (2000)
e Garcia (2007). Quanto à metodologia é do tipo estudo de caso, baseado Ludke e André
(2012), Oliveira (2002), Bogdan e Biklen (1994), Franco (2005) Yin (2001) e Trivinõs
(1987), dentre outros. Contou com a participação de 14 estudantes devidamente matriculados
no curso técnico em secretariado modulo III e 08 professores/as que atuam na referida turma,
sendo que houve a participação de 43 professores/as durante a Jornada Pedagógica em que
intervimos nesses momentos com a temática étnico-racial, mesmo a pesquisa focalizando
apenas os 08 professores/as do curso técnico em secretariado, optamos em aplicar um
questionário com os 43 docentes, com o objetivo de entender suas percepções da Lei nº
10.639/03 de maneira que nos dessem subsídios para melhor compreender a nossa amostra.
Aplicamos como técnica a analise de conteúdo do currículo da escola, a observação das aulas
dos docentes, o questionário com os professores, o grupo focal com os estudantes e uma
intervenção formativa com os docentes e estudantes previamente planejada. Os dados
coletados foram analisados por meio da Análise dos Conteúdos Bardin (2004). Os resultados
gerais foram: que a Lei nº 10.639/03 não é observada no currículo escrito do CETEP, pois não
encontramos a concretização dos Art. 26 alínea A e Art. 79 alínea A e B da citada Lei, como
consequência o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana fica aquém do
necessário. Em relação ao currículo praticado, a observação da práxis pedagógica nos permite
afirmar que existe uma priorização dos conteúdos do núcleo comum e específicos e uma
invisibilidade aos conteúdos referentes às questões étnico-raciais. Concluímos que existe uma
complexidade para adequar a Lei nº 10.639/03 ao currículo praticado no CETEP – do Sertão
Produtivo.
Palavras-chave: Étnico-raciais. Estudo de caso. Empoderamento. Educação. Currículo.
Identidade.
15

ABSTRACT

This paper presented to the Professional Masters In Youth and Adult education (MPEJA) of
The State University of Bahia – UNEB is part of the curriculum and ethnic – racial issues. It
is aimed to understand the establishment of Law 10.639 / 03 in CETEP curriculum, analyzing
how both teachers and students perceive the development of Afro- Brazilian ethnic - racial
relations, the construction of black people identity and racism in school environment. An
attempt was made in the sense of deepen theoretical elements directed to the studies of
ethnical-racial relations. Also, Analyzing and systematizing documents related to
organization, Brazilian legislation and of CETEP concerning ethnical-racial organizational
matters and PROEJA; finally, investigating the dimensions either present or not in the context
of CETEP organizational documents and on the speech of teachers and students identifying
the contents and approaches on the ethnic-racial issues of the Afro- Brazilian people in the
context of the technical course in secretariat of PROEJA – CETEP – Sertão Produtivo. Thus,
the research focuses on analyzing how has been established in the curriculum practiced by
CETEP – Sertão Produtivo, technical course in secretariat – PROEJA – the teaching of
history and African – Brazilian culture according to the Law 10.639/03 how are the issues of
identity of black people and racism dealt with peadagogically? How do students and teachers
comprehend the fulfillment of this Law, in the construction of black people´s identity and
racism at schools? The research brings as a theoretical support Munanga (1994), Hélio Santos
(2001), (Freire 1982, 1993, 1999), Valente ( 1995), Tonet ( 2005), Laffin ( 2012) Sacristán
(2000) and Garcia Oliveira (2002). Concerning methodology, it is a case study based on
Ludke and André (2012), Oliveira (2002), Bogdan and Biklen (1994), Franco (2005), Yin (
2001) and Trivinõs (1987), among others. It counted on the participation of 14 students
enrolled in technical course in secretariat module III and 08 teachers who work with this
group, add to this number the participation of 43 teachers during the Pedagogical Day in
which we intervene in those moments with the ethnic- racial theme. Even focusing the
research on the 08 teachers of secretariat course, we chose to apply a questionnaire to all the
43 teachers, in order to understand their perceptions of Law 10.639/03 so that it could give us
the proper subsides to better understand our sample. As a technique we applied the analysis
of the school curriculum content, the observation of teacher´s classes, the questionnaire with
the teachers, the focal group with the students and a formative intervention with the students
and teachers previously planned. The data collected were analyzed through the Bardin
Content Analysis (2004). Overall results were: that the Law 10.639/03 is not observed in the
written curriculum of CETEP, since we don´t find the implementation of the Art. 26 section A
and 79, sections A and B mentioned in the Law. As a consequence, the teaching of history
and Afro- Brazilian and African culture falls short to what is needed. In regards to the
practiced curriculum, the observation of the pedagogical praxis allows us to affirm that there
is a prioritization of the contents of the common and specific core and at the same time
invisibility to the contents related to ethnical- racial matters. We conclude that there is a
complexity to adapt Law 10.639/03 to the practiced curriculum in CETEP – Sertão
Produtivo.

Keywords: Ethinic- racial. Case Study. Empowerment. Education. Curriculum.Identity.


16

1. INTRODUÇÃO

Nos dias atuais a busca por igualdade e equidade implica respeito às diferenças. Para
tanto, se faz necessário reciprocidade nas relações e esta é uma das reivindicações dos
movimentos negros no Brasil, que galgam conquistas na busca por mudança para o rastro
histórico de injustiças que carrega a população negra. Assim, indignar-se diante das mazelas
impetradas contra a população negra tornou-se uma bandeira a ser defendida por aqueles que
acreditavam que as questões étnico-raciais fazem parte da sociedade brasileira. Em vista
disso, compreende-se que a questão da identidade negra é muito complexa, haja vista ser um
processo construído historicamente. Portanto, identificar-se como negro não significa somente
trajar roupas coloridas, trançar os cabelos, uma vez que não está no visual, mas em um
sentimento de pertencimento de que a herança não é só genética, ela é social, histórica e
cultural.
Nesse entendimento o presente tema trata da Lei n° 10.639/03 e as questões étnico-
raciais no contexto do currículo do Centro Territorial de Educação Profissional do CETEP
Sertão Produtivo, situado na Cidade de Caetité, Bahia. A intenção deste estudo é de
compreender como essa Lei vem se constituindo no currículo do Centro e seus impactos nas
questões étnico-raciais, como, a construção da identidade do negro entre os estudantes e o
desvelamento do racismo, como um preconceito inaceitável.

1.1 Aproximação ao tema da pesquisa

A escolha pelo tema se deu a partir da vivência como professora, trabalhando as


questões étnico-raciais com crianças e adolescentes em turmas de Educação de Jovens e
Adultos (EJA) nos municípios de Urandi e Caetité, na Bahia. Nesse ínterim, desenvolvi
atividades pedagógicas relacionadas à cultura afrodescendente, não apenas em datas
comemorativas, mas também durante todo o ano letivo com o objetivo de conscientizar os
estudantes, muitos deles negros/as, acerca do valor da própria cultura, etnia e religião.
No CETEP coordenei de 2002 a 2014 um projeto de Ressignificação da Aprendizagem,
o qual visava atender estudantes que não obtiveram aprovação nas unidades, sendo
reprovados em até três disciplinas em consonância com o Regimento Escolar e a Legislação
vigente. Desse universo, percebi que a maioria dos estudantes participantes do projeto eram
negros/as ou de origem negra. Além disso, verifiquei que a aprendizagem estava ligada às
17

questões familiares e de ordem econômica, social e política. Tal observação realizei em locus,
conforme visitas ocorridas durante as oficinas de ressignificação, constatada nas fotos das
oficinas durante o período de 2009 a 2014.
Na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), como professora, também procurei
inserir essa temática nas disciplinas lecionadas, participando de encontros, seminários,
oficinas, rodas de conversas dos mais variados temas relacionados à questão
afrodescendentes, como as relações de gênero, do trabalho e da profissionalização da
população negra, da violência juvenil, entre outros.
A trajetória como educadora me dizia que os professores/as, quando não trabalham com
essa temática em sua disciplina, não necessariamente desvalorizem a cultura afrodescendente,
mas desconhecem como trabalhar o tema. Em vista disso, utilizei metodologias e recursos
didáticos que possibilitasse a inserção do assunto na rotina da sala de aula e obtive tais
indícios, quando trabalhei na Plataforma Freire no Município de Bom Jesus da Lapa-Bahia.
Ao perceber como os professores/as estavam desejosos por uma formação que
caminhasse a esse viés, aproveitei para inserir nas minhas discussões pedagógicas a Lei nº
10.639/031 e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), bem como outros documentos
legais que orientassem a Educação nas relações étnico-raciais.
Mesmo insistindo em trabalhar com tais questões, socializei para além dos muros da
escola. Percebi que tais intervenções não resolveriam os problemas de discriminação em
Caetité/BA. Haja vista a necessidade de um trabalho em que a Lei nº 10.639/03 fosse
estudada em todas as escolas deste município, uma vez que traz em suas origens a
discriminação racial, fruto de um passado colonial, em que a cidade era o centro hegemônico
de uma elite branca, escravocrata.
Atualmente Caetité ainda carrega fortemente as marcas da escravidão nos seus casarões,
no culto à estrada real, à casa do Barão, à Casa de Anísio Teixeira2 - pedra monumental que
representa o Pelourinho em Caetité e demais ostentações, que me lembra o processo de
colonização brasileira. Como exemplo da resistência negra em Caetité, encontra-se um
conjunto de comunidades rurais remanescentes de quilombolas que lutam para o
reconhecimento desta comunidade enquanto outras já possuem as Certidões expedidas pelo
1
Contamos ainda com a Lei nº 11.645, de 10 março de 2008, no entanto nosso foco nesta dissertação serão as
questões afro-brasileiras em função de que a população baiana é em sua maioria negra. Essa lei “altera a Lei nº
9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da
temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11645.htm Acessada em novembro de 2015.
2
Anísio Spínola Teixeira nasceu na cidade de Caetité, sudoeste da Bahia foi um jurista, intelectual,
educador e escritor brasileiro , personagem central na história da educação no Brasil nas décadas de 1920 e
1930 difundiu os pressupostos do movimento da Escola Nova. A Casa Anísio Teixeira é uma entidade cultural
vinculada à Fundação Anísio Teixeira, localizada na cidade natal do educador. GOUVEIA NETO, 1973. 10p.
18

Ministério da Cultura - Palmares – Fundação Cultural, legalmente consideradas comunidades


remanescentes de quilombos (CRQS), já reconhecidas3: Contendas, Lagoa do Meio, Malhada,
Mercês, Olho D' Água, Pau Ferro, Sambaíba, Sapé, Vargem do Sal, Vereda do Cais.
Considero que há um número significativo de pesquisas que tratam das questões étnico-
raciais do povo afro-brasileiro e, na maioria delas, existe uma preocupação em revelar que as
questões raciais, no Brasil, ainda são discriminatórias e que essa população vivencia
situações, cotidianamente, no trabalho, nas ruas, na escola, na vida. Além disso, encontrei
argumentos que apontam para a necessidade de políticas afirmativas e reafirmem as
estratégias dos movimentos negros para a fixação de uma identidade positiva, considerando os
legados trazidos pelos africanos para as Américas.
Diante desse cenário, busquei meios para minimizar as situações de disparidade e uma
das principais estratégias está na educação como processo de emancipação humana que
segundo Tonet (2005, p. 469) é.
[...] uma forma de liberdade ilimitada, que abre a perspectiva de
autoconstrução infinita para o gênero humano. Não é um estado, um ponto
de chegada, mas um determinado patamar, uma determinada forma de
sociabilidade. A essência da emancipação humana está no domínio
consciente e coletivo dos homens sobre o seu processo de autoconstrução,
sobre o conjunto do processo histórico.

Nesse sentido considero que a identidade cultural, social e política dos estudantes
negros/as também se constroem na escola, portanto tornou-se urgente rever as nossas práticas
pedagógicas considerando que a nossa formação educacional está profundamente vinculada às
matrizes eurocêntricas e que, para fazer jus ao direito de liberdade de expressão que está
homologada na Constituição de 1988, a escola deve proporcionar a formação de cidadãos e
cidadãs, respeitando as diferenças, coibindo o preconceito advindo da visão discriminatória de
grupos sociais que tem como base etnia, crenças religiosas e aspectos culturais.
Nesse sentido, a Lei nº 10.639/03 busca valorizar a identidade do povo negro a partir da
valorização de sua cultura, iniciando esse processo por meio da escola – lugar por excelência
de socialização. Essa lei é fruto dos movimentos sociais, tendo em vista diversas políticas de
reparação, de reconhecimento e de valorização da população afro-brasileira e vem sendo
implantada em resposta aos anseios sociais do povo negro. Tendo em vista que essa
população em todo o mundo é chamada a assumir a sua negritude, ou seja, a personalidade e a
consciência negra, dando mais visibilidade à questão étnica e articulando o movimento no
plano internacional a fim de reaparecer as memórias e as dimensões históricas amputadas

3
Comunidades reconhecidas conforme as Certidões expedidas às comunidades remanescentes de quilombos
(CRQS) Ministério da Cultura - Palmares – Fundação Cultural - http://www.palmares.gov.br/wp-
content/uploads/2013/06/1-crqs-certificadas-ate-10-06-2013.pdf
19

pelos colonizadores. Assim, negritude é uma noção idealizada fora da África, nasceu em um
contexto de debates em 1943, mas só ganhou forças durante o pós-segunda Guerra Mundial.
A segunda Guerra Mundial tornou-se ponto de partida para o processo de
descolonização4 ou luta para a libertação, quando o povo negro começou a criticar e a
contestar o Império Britânico na África austral, estabelecendo uma relação com o domínio
dos alemães que, segundo os britânicos, não teriam o direito de dominar o mundo.
Em vista disso, o conceito de negritude que segundo Munanga (2009.p.51) “quer dizer,
a personalidade negra a consciência negra” passou a fazer parte dos debates no movimento de
negritude. O conceito possui um caráter multifacetado, dinâmico e político, que subsidiou as
ações do movimento negro, tendo como objetivo a organização ideológica entendida como
um processo de aquisição da consciência racial e cultural, que valoriza todas as manifestações
culturais de matriz africana.
Na construção desse conceito de negritude ressaltam as personalidades mundiais: o Dr.
Du Bois (W.E.B. Du Bois, nascido em 1863, realizou estudos nas Universidades de Fusk,
Harvard e Berlim, como historiador revelou aos companheiros negros um passado africano do
qual não se deviam envergonhar, exerceu ascendência sobre os escritores negros americanos);
o Langston Hughes, conhecido como o pai da Negritude, por ser o representante do
movimento intitulado Renascimento Negro; o guianense Leon Damas; e o senegalês Léopold
Sedar Senghor. Além de Léonar Sainville, Aristide Maugée, Birago Diop, Ousmane Soce e
dois irmãos Achille. Ao grupo, em especial, devem-se as obras da literatura negra africana de
expressão francesa e, ainda, por serem considerados os fundadores do movimento da
negritude.
É inegável que é oportuna a implementação da Lei nº 10.639/03 no currículo escolar do
município de Caetité como início a ruptura da história de 500 anos de escravidão de uma
noção positiva de negritude no espaço escolar como forma de empoderar5 os estudantes na
luta pela etnia e por um país melhor.
Nesse sentido, revelo a relevância social da pesquisa, o fato de possibilitar uma
discussão mais ampla nas escolas do município de Caetité/BA, em particular no CETEP, a

4
Organizados a partir da Conferencia de Berlim em 1885 , os impérios coloniais realizaram a Partilha da
África, duraram três gerações. No início de 1950, esses impérios entraram em colapso e desapareceram nos
anos de 1960. Apenas a África do Sul manteve suas fortificações na Namíbia até 1990. (SERRANO 1995,p.25)
5
“Dentre os termos discutidos por Freire, encontram-se dois de extrema importância: empoderamento (no inglês
empowerment) e a conscientização. Após o levantamento, então, entra-se no nível de revisão conceitual,
iniciando pela categoria analítica empoderamento, para seguir em direção à categoria conscientização, com o
intuito de mostrar a significância de ambos, especialmente para o campo da psicologia social. Nossa análise,
indica a relevância de incorporar a noção de empoderamento no processo de libertação, embora esse termo esteja
relacionado à ideia de autoemancipação e de progresso (perspectiva individualista). Considerando que a
libertação é sempre um ato social, o empoderamento é somente um pequeno passo em direção à libertação, sendo
a conscientização o processo que possibilita a transformação social.
20

partir de uma investigação que traga elementos de análise e de posicionamento críticos acerca
da execução dessa lei para os professores/as da região. Na medida em que é necessário haver
outro olhar sobre a África e para o povo afro-brasileiro, na certeza de melhorar as relações
sociais e pessoais nesse Centro Educacional entre os estudantes e professores/as, entre os
municípios, a fim de se expandir a negritude em cidades da região em que a maioria da
população é branca.
Diante dessas afirmações, as questões de investigação foram: como vem se constituindo
no currículo praticado do CETEP – Sertão Produtivo, Curso do PROEJA – Secretariado o
ensino da história e cultura afro-brasileira e africana em cumprimento a Lei nº10.639/03?
Como são trabalhadas, pedagogicamente, as questões de identidade do povo negro e de
racismo nessa escola? Como os estudantes e professores/as percebem o cumprimento dessa
Lei, na construção da identidade do negro e do racismo nessa escola?
Embora na sequência deste trabalho seja feita uma discussão sobre currículo, é
importante situar aqui o que se assume na compreensão sobre o termo currículo praticado.
Desse modo, para tal conceituação busca-se em Sacristán (2000) e Garcia (2007). Sacristàn
(2000, p. 102) situa que o currículo em ação, no âmbito da prática pedagógica, constitui "[...]
o resultado de uma série de influências convergentes e sucessivas, coerentes ou contraditórias,
adquirindo, dessa forma, a característica de ser um objeto preparado num processo complexo,
que se transforma e constrói a si mesmo".
Para Garcia (2007),
[...] o currículo praticado é lugar de reinvenção, e, [...] também um território
de conflitos, resistência, indisciplina. O currículo articula diferentes sujeitos,
dentre os quais destacamos professores e alunos. Os professores atuam de
diversas formas na configuração do currículo praticado. Podemos afirmar
que eles produzem transformações segundo diversas racionalidades,
justificativas e intencionalidades, as quais refletem, por exemplo, suas
identidades e perspectivas culturais, poder e autoridade, formação e
conhecimento especializado, expectativas e pressupostos em relação aos seus
alunos, experiência profissional e os próprios contextos onde atuam. Assim,
os professores desempenham um papel ativo nas decisões sobre currículo,
este entendido com algo bem mais amplo que um conjunto de
conhecimentos formais a serem ensinado em sala de aula - embora tais
conhecimentos sejam uma parte importante do currículo escolar. O currículo
também é regulação, e esta também é produzida pelas decisões dos
professores. (GARCIA 2007, p. 4 - 5

Garcia (2007), ainda aponta que, no currículo praticado, ocorrem as negociações entre
professores/as e os estudantes os quais o transformam. Mas esse é um processo nem sempre
claro e explicitado, uma vez que sobre ele incidem diferentes elementos, forças e
circunstâncias, que modificam o jogo das decisões sobre o currículo.
21

Nesse sentido, o objetivo geral desta investigação foi compreender a institucionalidade


da Lei nº 10.639/03 no currículo do CETEP, analisando de que modo professores/as e
estudantes percebem o desenvolvimento da temática das relações étnico-raciais afro-
brasileiras, a construção da identidade do negro e o racismo no espaço escolar. Partindo-se
desta problemática, procurou-se desenvolver a pesquisa examinando os seguintes objetivos
específicos:
 Identificar no Projeto Político-Pedagógico da instituição elementos que indiciam a
inserção das questões étnico-raciais, mais especificamente, particularmente, como se constitui
o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana.
 Analisar e sistematizar documentos organizativos do CETEP e da legislação
brasileira relativo às relações étnico-raciais e do PROEJA;
 Investigar as dimensões presentes ou não no contexto de documentos organizativos
do CETEP e nos discursos de professores/as e estudantes identificando os conteúdos e as
abordagens acerca das questões étnico-raciais do povo afro-brasileiro no contexto do curso do
PROEJA – Secretariado, do CETEP – Sertão Produtivo.
Tendo em vista as atividades de campo na área da pesquisa, seguem a metodologia e
os procedimentos de investigação.

1.2 Metodologia e os procedimentos de investigação

O presente estudo foi realizado na perspectiva da pesquisa qualitativa em educação


baseado nos estudos de Ludke e André (2012), Oliveira (2002), Bogdan e Biklen (1994), Yin
(2001) e Trivinõs (1987). A pesquisa qualitativa, segundo Oliveira (2002), possibilita ao
pesquisador apresentar contribuições, analisar e interpretar as relações existentes no objeto de
investigação, apresentando um caráter hermenêutico na interpretação dos fenômenos sociais,
culturais, educativos, éticos, políticos, dentre outros. Nesse sentido é que Trivinõs afirma que

[...] o pesquisador guia seu pensamento por determinadas formulações


conceituais que integram as teorias, quando maneja os tubos de ensaio,
procura obter conclusões no estudo da realidade social, etc. Os instrumentos
de pesquisa, o questionário, a entrevista etc. para a coleta de informações são
iluminados pelos conceitos de uma teoria. (TRIVINÕS, 1987, p. 101)
Inclusive, elencam-se cinco características básicas da pesquisa qualitativa ou
naturalística, conforme Ludke e André (2012 p. 12-14): (1) tem o ambiente natural como sua
fonte direta de dados e o pesquisador como o principal instrumento; (2) os dados coletados
pelo pesquisador são predominantemente descritivos; (3) a preocupação com o processo é
muito maior do que com o produto; (4) o “significado” que as pessoas dão às coisas e à vida
22

são focos de atenção especial pelo pesquisador e (5) a análise dos dados tende a seguir um
processo indutivo.
Acrescentam Ludke e André (2012) que há diferenciação entre pesquisa tradicional e
pesquisa qualitativa, considerando que aquela se fundamenta nos preceitos positivistas de
Comte e esta defende que o estudo do homem pode ser realizado por meio dos métodos das
Ciências Naturais seguindo a lógica. O método de estudo dos fenômenos sociais aproximam-
se daqueles utilizados pelas Ciências Físicas e Naturais, possuindo esquema simplificador de
análise próprio dessas ciências.
Portanto, se a pesquisa apresentar abordagem qualitativa, ela permitirá que o
pesquisador analise e interprete as relações entre o mundo real e os sujeitos da investigação,
sendo possível realizar a análise de dados com categorias mais gerais e deixando margem para
que dos dados possam emergir categorias empíricas. A pesquisa com esse enfoque permite
mais objetividade e compreensão da ação social dos indivíduos pesquisados. Nesse sentido,
Oliveira (2002) indica que

[...] as pesquisas que se utilizam da abordagem qualitativa possuem a


facilidade de poder descrever a complexidade de determinada hipótese ou
problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar
processos dinâmicos experimentados por grupos sociais, apresentar
contribuições no processo de mudança, criação ou formação de opiniões de
determinado grupo e permitir, em maior grau de profundidade, a
interpretação das particularidades dos comportamentos ou das atitudes dos
indivíduos. (OLIVEIRA, 2002, p. 61).
A pesquisa qualitativa pode assumir uma abordagem etnográfica em que leva o estudo a
um trabalho de campo, à revisão e à retomada do problema inicial sobre outro olhar. No
início, há questões ou focos de interesse muito amplos que, no final, tornam- se mais diretos e
específicos, em que ao se focar uma análise de um caso concreto, ganha notoriedade em
virtude da possibilidade de se aferir a realidade efetiva das questões escolares. Nessa
perspectiva trata-se de estudo de caso e, sobre isso Trivinõs nos orienta que

[...] o Estudo de Caso na pesquisa qualitativa caracteriza-se


fundamentalmente, do ponto de vista da medida dos dados que ele
apresentava, pelo emprego, de modo geral, de uma estatística simples,
elementar. [...] É uma categoria de pesquisa cujo objeto é uma unidade que
se analisa aprofundamento (TRIVINÕS, 1987, p. 133).
Como estratégia de pesquisa em educação, o estudo de caso contribui significativamente
para a compreensão de fenômenos complexos e das características mais significativas.
Segundo Yin (2001), ele é uma investigação empírica que investiga um fenômeno
contemporâneo dentro de um contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o
fenômeno e o contexto não estão claramente definidos (YIN, 2001, p. 32). Neste estudo de
caso, a pesquisa realizou-se no período compreendido entre 2015 a 2016, no CETEP,
23

particularmente junto ao curso do PROEJA em Técnico em Secretariado. Os sujeitos


pesquisados foram os professores/as e estudantes que vivenciam no cotidiano escolar as
questões étnico-raciais.
Ainda é importante situar que a pesquisa realizada partiu de um processo de
intervenção formativa. A intervenção se fundamenta no âmbito da pesquisa-ação6 e tem como
ideia a dialogicidade entre a pesquisa e a prática, ou seja, a ação e nos leva a pensar no papel
da pesquisa no sentido de ter como função transformar a realidade.

A partir das análises realizadas a respeito das possibilidades de intervenção


no campo educacional, entendemos que a perspectiva da pesquisa-ação pode
indicar um caminho mais dinâmico, pois a pesquisa-ação procura relacionar
o conhecimento da realidade da própria prática com a ação e os sujeitos, que
na pesquisa “tradicional” atuam simplesmente como informantes, na
pesquisa-ação participam também como sujeitos pesquisadores de sua
prática (BRACHT, 2002, p.9 ).
No caso desta investigação busquei a aproximação da temática das relações étnico-raciais
com a escola em foco, o CETEP. Segundo Costa (2011, p. 131-132),

Uma das formas que podemos considerar eficiente para a elaboração do


Projeto de Intervenção refere-se ao conhecimento prévio das dificuldades e
problemáticas enfrentadas pelos sujeitos da EJA, já que o pesquisador,
quando familiarizado com o tema, terá menos dificuldades para definir seu
problema de pesquisa. [...] Ao desenvolver o projeto de intervenção você
deverá ter como horizonte o cotidiano educacional, mais especificamente, o
local que você atua. Vale ressaltar a importância da participação dos
envolvidos, ou seja, dos pesquisadores no desenvolvimento desse projeto,
haja vista que estes serão agentes de um processo de mudança, podendo,
dessa forma, oportunizar não apenas a resolução de uma problemática, mas
também significativas aprendizagens para todos que compõem esse espaço.
Desse modo, para melhor análise das questões da educação e das relações étnico
raciais no CETEP – foi realizada a análise de documentos, os quais podem representar
elementos do currículo escrito, além de tentar identificar o que é praticado nesse o currículo
praticado, mediante encontros de estudos e de diálogos – os momentos de intervenção - e a
realização de coleta de dados mediante um conjunto de questionários semiestruturados com os
professores e professoras e com os estudantes.

1.2.1 Os sujeitos da pesquisa

Um grande desafio metodológico consiste em fundamentar a inserção da pesquisa-ação dentro de uma


perspectiva de investigação científica, concebida de modo aberto e na qual ciência não seja sinônimo de
positivismo, funcionalismo e de outros rótulos. (FRANCO, 2000 p, 20),
24

Com os professores/as, realizei duas participações em momentos específicos: a) em


fevereiro de 2016, durante a Jornada Pedagógica do CETEP, com a participação de 43
docentes, entre eles alguns estudantes do Programa de Iniciação à Docência – PIBID do curso
de História da Universidade do Estado da Bahia, dentre eles foram obtidas 32 repostas a um
questionário e, b) outro durante encontros de estudo e formação no período de março a maio
do mesmo ano envolvendo a equipe gestora e professores/as do Curso Técnico em
Secretariado. Desse grupo responderam ao questionário oito professores/as.
Escolhi numerais para representarem os/as professores/as participantes da pesquisa,
conforme tabela abaixo.

Tabela 01: Identificação dos professores

Ident. Idade Tempo de magistério Tempo na formação atual Formação acadêmica


1 52 29 27 Letras/Inglês
2 24 5 5 Bacharel em Direito
3 42 20 10 História
4 38 17 10 Física
5 53 27 24 Geografia
6 48 10 8 Letras/Português
7 56 23 20 Bacharel em Direito
8 56 17 17 Letras/Português e Literaturas
Fonte: Tabela elaborada pela pesquisadora a partir da recolha dos dados, 2016.

A tabela acima demonstra que todos os professores/as pesquisados possuem formação


universitária: uma professora possui bacharelado e licenciatura em Biologia, somente uma
professora possui apenas bacharelado o que é muito salutar já que a escola é um Centro de
Educação Profissional. A maioria deles apresenta mais de 10 anos no exercício do magistério.
Já o grupo de estudos junto aos estudantes com foco nas relações étnico-raciais era
formado por 14 pessoas. Mediante dados obtidos na Secretaria da Escola analisando as pastas
individuais dos estudantes turma é composta por 14 estudantes sendo 10 mulheres e 4
homens, e em relação à questão étnica eram 09 negros e 05 brancos e, desse modo, também
em relação aos estudantes escolhemos numerais para representá-los observamos na tabela 02.

Tabela 02: Identificação dos estudantes


25

Identificação Idade Cor Sexo Curso/Serie


1 28 anos Amarela F Técnico em Secretariado módulo III
2 20 anos Pardo M Técnico em Secretariado módulo III
3 21 anos Pardo M Técnico em Secretariado módulo III
4 22 anos Parda F Técnico em Secretariado módulo III
5 38 anos Branca F Técnico em Secretariado módulo III
6 19 anos Branco M Técnico em Secretariado módulo III
7 20 anos Negra F Técnico em Secretariado módulo III
8 22 anos Parda F Técnico em Secretariado módulo III
9 47 anos Negra F Técnico em Secretariado módulo III
10 31 anos Negra F Técnico em Secretariado módulo III
11 26anos Branca F Técnico em Secretariado módulo III
12 23anos Negra F Técnico em Secretariado módulo III
13 23anos Negra F Técnico em Secretariado módulo III
14 20 anos Negro M Técnico em Secretariado módulo III
Fonte: Tabela elaborada pela pesquisadora a partir da recolha dos dados, 2016.

A turma é composta em sua maioria pelo sexo feminino de pessoas negras, o que nos
remete as questões históricas do povo negro como evasão escolar, subemprego dentre outras.
Assim há uma necessidade imperativa da escola apreciar a relevância das questões étnico-
raciais, considerando a realidade socioeconômica, levando em conta os valores culturais e
ainda que alguns se identificassem como pardo a falta da afirmação da identidade e a forma
mais perversa que subordinam e subalternizam o povo negro.

1.2.2 As técnicas de recolha de dados


Como técnicas de investigação utilizamos: a) analise documental do Centro, b)
intervenção formativa (Projeto em anexo) na jornada e nos momentos de Atividade
Complementares (ACs,) c) observação das aulas, d) questionário aberto com os professores,
e) grupo focal com os estudantes.
Na análise documental considerei o que nos indica Gil (2008, p. 51) [...] vale-se de
materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser
reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa. Nesse sentido analisei: o Regimento
escolar, Projeto Político Pedagógico, a Matriz Curricular e 03 planos anual do professor/a do
CETEP- Sertão Produtivo.
A intervenção formativa no CETEP ocorreu em dois momentos: na Jornada
Pedagógica e nas Atividades Complementares (AC). A Jornada Pedagógica ocorreu em 03
encontros entre 01/02 a 03/02/2016, quando realizei a apresentação do projeto de pesquisa e
apliquei um questionário aberto com os professores/as. Nas Atividades Complementares7

7
Denominação utilizada para nomear o horário de formação continuada dos professores/as. A Atividade
Complementar (AC) se constitui como um espaço/tempo inerente ao trabalho pedagógico do(a) professor/a
26

(AC) foram 14 encontros em que colocamos na pauta as discussões sobre as relações étnico-
raciais e as desigualdades socioeconômicas no Brasil, sempre buscando seguir as orientações
das atividades complementares (AC) quando diz que:
[...] um direito que faz parte do trabalho do professor/a, a AC também
pressupõe a responsabilidade e compromisso de cada educador com o
aprimoramento/qualificação das atividades desenvolvidas na escola, tanto no
que se refere ao planejamento específico do seu trabalho com a sua
disciplina/componente curricular, como também na articulação coletiva com
seus pares no esforço para realização de um trabalho colaborativo, em prol
do fortalecimento das aprendizagens dos estudantes. Orientações às
Atividades Complementares (2010, p. 01)

Destacamos que os ACs acontecem semanalmente no Centro, nas terças, quartas e


quintas-feiras nos turnos vespertinos e noturnos, contanto com a participação e a organização
da equipe gestora e de dois professores/as articuladores8 da Educação Profissional, conforme
atos expedidos pela Superintendência de Educação Profissional da Secretaria da Educação.
Tendo como meta a execução da pesquisa de campo durante as ACs, discutimos
questões sobre a Lei nº 10.639/03, que resultou da luta política em prol de um currículo
antirracista e de uma escola que tenha a diversidade respeitada. Dialogamos também acerca
das concepções que norteiam os currículos e principalmente a respeito da adequação da Lei
que considera as determinações da LDBEN e busca repensar posturas e práticas pedagógicas.
A observação como uma técnica de recolha dos dados, segundo Trivinõs (1987),
permite um olhar de forma sistemática e organizada, considerando que a proposta de pesquisa
objetiva.
[...] observar, naturalmente, não é simplesmente olhar. Observar é destacar
de um conjunto (objetos, pessoas, animais etc.) algo especificamente
prestando, por exemplo, atenção em suas características (cor, tamanho etc.).
Observar um fenômeno social significa, em primeiro lugar, que determinado
evento social, simples ou complexo, tenha sido abstratamente separado de
seu contexto para que, em sua dimensão singular, seja estudado em seus
atos, atividades, significados, relações etc. Individualizando-se os grupos ou

destinado ao planejamento e organização de suas atividades a ser realizada de forma individual ou coletiva. Um
dispositivo pedagógico de reflexão e formação continuada do/a professor/a com perspectiva de reorientação da
prática docente. Respaldada na LDB n° 9.394/1996, do Estatuto do Magistério do Estado da Bahia – Lei n°
8261/2002, das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para Educação Básica, conforme Resolução nº 4, de 13
de jul. de 2010, no Regimento Escolar unificado, conforme Portaria nº 5.872/2011 e pelo Manual de
Programação Escolar.
8
No Regimento escolar encontramos as atribuições dos professores/as articuladores/as da Educação Profissional
conforme Art.28 p.17: Art. 28. São atribuições do professor articulador de área do ensino médio: I - promover
articulações intra e inter áreas de conhecimento com objetivo, dentre outros, de selecionar os conteúdos dos
interrelacionamentos entre as áreas, bem como a contextualização dos assuntos de aula e de outras atividades de
aprendizagem; II - assegurar o desenvolvimento da interdisciplinaridade e da contextualização como princípios
pedagógicos fundamentais ao currículo; III - apoiar o coordenador pedagógico da unidade escolar nas atividades
afins; e IV - participar do Conselho de Classe, fornecendo subsídios para a análise e tomada de decisões sobre a
vida escolar dos estudantes. (Regimento Escolar 2011) Art.28 p.17. As articuladoras/os de áreas cumprem
com presteza todas as suas atividades e as ACs acontecem de maneira prazerosa, sempre cumprindo uma pauta
com princípios pedagógicos.
27

agrupando-se os fenômenos dentro de uma realidade que é indivisível,


essencialmente para descobrir seus aspectos aparências e mais profundos e
ampla, ao mesmo tempo, de contradições, dimensões, de relações etc.
(TRIVINÕS, 1987 p. 153)

O autor descreve que a observação tem na sua essência a capacidade de perceber a


escola nos diversos aspectos intrínsecos, podendo identificar ou chegar a conclusões
verdadeiramente valiosas para comprovar as hipóteses elencadas, uma vez que a observação
pode facultar ao observador fazer inferências racionais, tendo em vista que elas são reflexos
da informação oriunda da observação e apresentam a finalidade de responder, ainda que
parcialmente, à inquietação que é fruto do objeto da pesquisa.
A observação que realizei diz respeito às aulas dos professores/as do CETEP com o
objetivo de compreender como as questões étnico-raciais se faziam presente na prática
docente e como os estudantes percebiam essa temática no currículo. Para tanto, realizei as
observações das aulas no período de 01/03 a 29/04/2016 no curso Técnico em Secretariado
PROEJA, no período correspondente a I unidade do ano letivo 2016, no turno vespertino e
noturno.
Apliquei o questionário aberto com professores/as e estudantes acerca do conteúdo da
Lei nº 10.639/03 e sua implementação na escola. Entregamos a 43 questionários para os
professores/as, obtendo respostas de 32 professores/as. Em relação aos estudantes aplicamos
com todos os 14 que participaram do grupo focal. A importância do questionário como
técnica de investigação está, segundo Lakatos e Marconi (2003 em ser.
[...] um instrumento de coleta de dados, constituído por uma série ordenada
de perguntas, que devem ser respondidas por escrito e sem a presença do
entrevistador. Em geral, o pesquisador envia o questionário ao informante,
pelo correio ou por um portador; depois de preenchido, o pesquisado
devolve-o do mesmo modo. ( LAKATOS E MARCONI 2003, p. 201),

Realizei o grupo focal com os estudantes com o objetivo de perceber como eles pensam
as questões étnico-raciais e, ao mesmo tempo, possibilitar a discussão que viesse a ampliar
sua percepção critica em relação à temática étnico-racial. Nesse sentido, Gomes e Barbosa
definem grupo focal como sendo um

[...] grupo de discussão informal e de tamanho reduzido, com o propósito de


se obter informações de caráter qualitativo em profundidade. É uma técnica
rápida e de baixo custo para avaliação e obtenção de dados e informações
qualitativas, fornecendo aos gerentes de projetos ou instituições uma grande
riqueza de informações qualitativas sobre o desempenho de atividades
desenvolvidas, prestação de serviços, novos produtos ou outras questões
(GOMES; BARBOSA, 2001 p.1).
28

De maneira democrática convidei os estudantes a participarem do grupo focal e os 14


manifestaram desejo de fazer parte dessa pesquisa. Realizamos a apresentação do projeto de
intervenção e pesquisa para os do curso Técnico em Secretariado nos dias 01 e 02/03/2016
sensibilizamos quanto à urgência de se estudar as questões históricas, bem como as
organizações políticas e sociais criticando a chamada partilha9 imperialista europeia,
explicamos sobre a metodologia do grupo focal a ser desenvolvida durante a pesquisa e
escolhemos uma monitora entre os colegas, iniciamos as discussões.
Ponderei sobre a necessidade da participação efetiva de todos a fim de incentivar o
diálogo em todos os momentos. Organizamos 03 grupos, sendo dois com 5 e um de 4,
totalizando 14 estudantes. Acordamos que se totalizariam 12 encontros e cada um teria a
duração de 1h a 1h30min, esses aconteceriam nos turnos vespertinos e noturnos. Informamos
aos estudantes também que haveria a flexibilidade para mudar de grupo, conforme o desejo e
a proposta de atividade, e que se discutiriam em grupos, mas o questionário seria respondido
individualmente. Organizados em grupos, iniciamos o trabalho com as temáticas, conforme
demonstra o Quadro 1.

Quadro 1: Temática do grupo focal desenvolvida com os estudantes do CETEP sobre as


questões étnico-raciais
PERÍODO TEMÁTICA ATIVIDADE PROPOSTA

01/03/2016 Investigação das temáticas étnico- Dinâmica de apresentação do trabalho no contexto


e raciais que os estudantes gostariam do grupos que eles iriam participar, recolher das
02/3/2016 que fossem debatidos para temas e assuntos que eles gostariam de ser debatido,
ressignificar o planejamento das bem como apresentação de temas pela pesquisadora
atividades do grupo focal a partir dos interesses da pesquisa.
01/4/2016 Projeto do grupo focal Apresentação do projeto ressignificados a partir da
ressignificados investigação dos temas com os estudantes
06/04/2016 Identidade e pertencimento Leitura do texto “....” e em seguida a discussão do
e considerando a formação da grupo a partir das seguintes questões: Qual é a sua
07/04/2016 sociedade brasileira. cor? Você se identifica com ela? A cor da pele é um
elemento importante para o estabelecimento da
diferença entre negros e brancos na escola? De que
modo?
08/04/2016 Discriminação racial Apresentou-se um fragmento sobre a III
e Conferência Mundial, contra o racismo,
11/04/2016 discriminação racial, xenofobia e intolerâncias
correlatas, realizada em Durban, África do Sul,
informando que ela é um marco para que aconteçam
inúmeras discussões acerca das questões étnico-
raciais e as diversas formas de discriminação racial
no Brasil.

9
Ideia que carrega implicitamente uma concordância de que a história da colonização da África só inicia com a
chegada do europeu.
29

12/04/2016 Racismo, educação e prática Apresentação do documentário Vista a minha pele,


pedagógica dos professores/as realizou-se uma discussão nos grupos sobre o
racismo na escola, como seria possível a escola
contribuir para eliminar ações racistas dentro e fora
dessa instituição, como ocorre o racismo e se os
professores seriam ou não racista.
27/04/2016 Elementos da história e cultura Análise da poesia africana denominada O choro da
afro- brasileira e africana África do autor Agostinho Neto, com uma breve
a
explanação sobre o autor, ressaltou-se a importância
29/04/2016 das poesias africanas na valorização cultural e
ouviu-se atentamente cada inferência dos estudantes
sobre a poesia. Introduzimos elementos da história
da África e sua relação com a brasileira. O debate se
deu a partir dos questionamentos entre essas
histórias. Várias outras atividades foram realizada
para concretizar a temática, como filmes, pequenos
textos sobre a escravidão do negro pelos
portugueses, o significado da abolição da
escravatura etc.
5/5/2016 Avaliação das atividades Discussão das atividades realizadas objetivando
e como os estudantes passam a perceber as questões
6/5/2016 étnicas e raciais do povo negro.
Fonte: elaborada pela pesquisadora a partir do planejamento do grupo focal

Os dados foram analisados a partir da Análise de Conteúdo, que conforme Franco


(2005), trata-se de um procedimento analítico no qual seguem passos ou processos e é
realizado durante a pesquisa de campo, tendo como ponto de partida as mensagens coletadas.
Franco (2005) esclarece que a análise de conteúdo é uma concepção crítica e dinâmica de
compreensão de mensagens coletadas. Na mesma perspectiva, Bardin (2004) considera a
análise de conteúdo como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, sendo que os
objetivos superam as incertezas sobre a leitura feita do objeto de estudo, validando e
generalizando, além de buscar o enriquecimento da leitura, também, aprofunda a
compreensão dos significados dos assuntos estudados, aumentando assim a produtividade e a
pertinência das inferências que serão originadas.
Nesse sentido, Bardin (2004) sinaliza para os seguintes elementos de uma analise de
conteúdo, São eles: a) regra da exaustividade que envolve qualquer um dos elementos
justificáveis no plano do rigor a não seletividade; b) a regra da representatividade considera o
tamanho da amostra; c) a regra da homogeneidade obedece aos critérios das escolhas, d) regra
de pertinência faz correspondência ao objetivo da análise da pesquisa. O autor informa ainda
que para garantir a análise dos conteúdos é preciso organizar o processo de exploração do
material coletado: a) realizar uma leitura flutuante após uma pré-análise do material em
questão, b) criar categorias de análise para posteriormente proceder ao tratamento dos
resultados, C) interpretações.
30

As orientações de Bardin (2004) sobre as características e os procedimentos de


codificação e categorização se revelam na sequência abaixo, sendo que o primeiro antecede o
segundo. Para o processo de codificação, a ordem é a seguinte: (1) seleção das unidades por
meio do recorte; (2) a definição das regras de contagem mediante a enumeração e (3) a
elaboração das categorias pela classificação e pela agregação dos elementos semelhantes. Já a
categorização se refere à passagem dos dados em bruto para dados organizados, considerando
os elementos em agrupamento com características comuns.
Essa dissertação está estruturada em seis capítulos e a conclusão. Na introdução consta
a aproximação ao objeto de pesquisa e a identificação da opção metodológica do trabalho
realizado. No segundo capítulo, intitulado: A Educação e as questões étnico-raciais, no qual
se discute a formação da identidade da população negra e a Lei nº 10.639/03 como políticas
de ações afirmativas, no sentido de que sejam efetivamente praticadas dentro das escolas, em
especial, no CETEP a partir da construção de um currículo que atenda a essas demandas.
No terceiro capítulo, a discussão é sobre As questões étnico-raciais e a
institucionalização da Lei nº 10.639/03 travada no campo do currículo bem como sua
importância para a consolidação ou não de uma formação cidadã. O quarto capítulo emerge
no contexto da pesquisa no CETEP com o título: As questões étnico-raciais no contexto do
currículo escolar mediante análise documental do Projeto Político Pedagógico, da Matriz
Curricular e de outros documentos pertinentes ao campo da pesquisa. No quinto capítulo,
trata O currículo escrito do CETEP no Curso Técnico em Secretariado PROEJA: o que diz
sobre a inserção das questões étnico-raciais?
Finalmente no sexto capítulo, o olhar da pesquisa situa-se no âmbito da análise da
prática pedagógica, por meio das observações e da realização de ações de intervenção e
pesquisa de campo junto a professores/as e estudantes do CETEP sob o título O currículo
praticado e as questões étnico-raciais no CETEP: as contradições e limitações para
efetivação da lei nº 10.639/03 e, na sequência, apresentamos a conclusão.
31

2. A EDUCAÇÃO E AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS

Neste capitulo vamos discutir as relações entre educação e as questões étnico-raciais no


contexto da produção brasileira, realizando uma revisão bibliográfica a partir dos principais
estudiosos que pesquisam sobre essa relação, no intuito de melhor compreender o nosso
objeto de estudo.

2.1 A relação entre etnia e a educação para a emancipação humana

A discussão da relação entre etnia e educação, como requisito para a emancipação


humana, está na linguagem de Ivo Tonet que traz uma abordagem filosófica, histórica e
ontológica sobre a educação e a cidadania. Tonet (2005) traz uma reflexão sobre a
emancipação humana na perspectiva marxista informa que
[...] a emancipação política (da qual fazem parte a cidadania e a democracia)
é uma forma essencialmente limitada, parcial e alienada de liberdade, já que
está indissoluvelmente ligada ao ato fundante da sociabilidade capitalista. A
emancipação humana, ao contrário, por estar fundada no ato de trabalho
mais livre possível, que é o trabalho associado, representa o espaço onde os
homens podem ser efetivamente livres, onde eles podem realizar
amplamente as suas potencialidades e onde podem, de fato, ser senhores do
seu destino. (TONET 2005: p.482)

Em consonância com Tonet, Paulo Freire também pauta-se na concepção dialógica,


sendo um suporte teórico para estabelecer uma relação entre educação, alfabetização e
humanização para uma ação crítica na perspectiva da transformação como caminho para a
cidadania. Freire (1993) assevera sobre o significado de cidadão como “individuo no gozo dos
direitos civis e políticos de um Estado, e que cidadania tem a ver com a condição de cidadão,
quer dizer, com o uso dos direitos e o direito de ter deveres de cidadão”. (FREIRE 1993: p.45)
E, para se discutir o conceito de etnia, utilizar-se-á como referência Cashmore (2000)
que compreende que a etnia identifica um conjunto de pessoas em
[...] um grupo possuidor de algum grau de coerência e solidariedade,
composto por pessoas conscientes, pelo menos em forma latente, de terem
origens e interesses comuns. Um grupo étnico não é mero agrupamento de
pessoas ou de um setor da população, mas uma agregação consciente de
pessoas unidas ou proximamente relacionadas por experiências
compartilhadas. (CASHMORE, 2000: 196).

Com base nessas categorias consideramos que atualmente, são várias as pesquisas que
tratam das questões étnico-raciais acerca do povo afro-brasileiro e, na maioria delas, há uma
preocupação em revelar que tais questões raciais são discriminatórias, uma vez que a
população vivencia situações cotidianas no trabalho, nas ruas, na escola. Por esse motivo,
existem argumentos que apontam para a necessidade de políticas afirmativas que reafirmam a
32

necessidade de se criarem estratégias dos movimentos negros a fim de se fixar uma identidade
positiva, considerando os legados trazidos pelos africanos e para as Américas. Uma das
principais estratégias está na educação como processo de emancipação humana que
minimizará as situações de disparidade. Diante disso, Marx denominou como emancipação
política, pois considerava que a emancipação completa somente poderia ocorrer com o fim da
propriedade privada e com a produção comunista.
Já o filósofo Ivo Tonet (2005) traz uma abordagem filosófica, histórica e ontológica
sobre a educação e a cidadania. Seu estudo tem como base a análise de diversos textos de
educadores brasileiros da esquerda política e, desse modo, analisa as contradições do capital
na sociedade. Para tanto, ele conjectura que a junção entre educação e cidadania seria capaz
de sobrepujar as desigualdades sociais tão evidentes no capitalismo. Pensando assim, Tonet
afirma que a emancipação humana deve ser colocada como objetivo para a humanidade e
considera o trabalho como um ato ontológico da liberdade, pois acredita que é no seu controle
que se encontra a própria liberdade. O autor ainda propõe uma educação para além do capital
por considerar que quanto mais se intensifica a reprodução do capital, mais cresce a exclusão
social.
Tonet (2005) defende que somente uma educação humanizadora, solidária, democrática,
cidadã, que apresente o homem como um ser social, está balizada na formação humana.
A formação humana, pela visão de Tonet (2005), traz como perspectiva uma formação
integral, na qual preconiza que os indivíduos sejam formados conforme as condições do
idiossincrático, devendo respeitar o tempo formativo, a experiência social, tudo isso
favorecendo o desenvolvimento humano.
É possível traçar um paralelo entre as ideias de Tonet (2005) e a posição de Freire,
considerando que o primeiro foca os estudos nas questões econômicas e o reflexo social; e, o
segundo como o opressor subjuga o oprimido advindo assim às mazelas sociais. Apesar de
que ambos enfatizem as iniquidades do capitalismo e a necessidade da emancipação humana,
conceito que melhor será explicitado a seguir.

2.2 A noção de educação no contexto das questões étnico-raciais


Coadunamos com Freire, quando ele defende que o homem só é sujeito quando conhece
a própria história e, também, porque defende a educação como possibilidade para uma
reflexão crítica. Afirma, ainda, que por meio dela os indivíduos constroem novos saberes e
sobrevém a emancipação humana. Na concepção freiriana de educação e sociedade, fica claro
que não existe uma educação neutra, descomprometida, uma vez que a sociedade está
organizada em classes sociais e está marcada pela exploração que apresenta em seu bojo o
33

opressor e o oprimido.
Freire (1993, p. 45) concebe a educação como elemento para a formação do indivíduo
como cidadão, que significa indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado e
que cidadania tem que a ver com a condição de cidadão, quer dizer, com o uso dos direitos e o
direito de ter deveres de cidadão.
Nas reflexões sobre a alfabetização, Freire argumenta que ela pode ser um instrumento
para a formação da cidadania. Entretanto, para alcançar a cidadania plena é preciso que a
prática educativa esteja em consonância com a política e que o professor/a tenha um projeto
definido dentro dessa perspectiva, pois a educação precisa ser assumida como um “ato
político”. Portanto, ela não é neutra.
A compreensão dos limites da prática educativa demanda indiscutivelmente
a claridade política dos educadores em relação a seu projeto. Demanda que o
educador assuma a politicidade de sua prática. Não basta dizer que a
educação é um ato político assim como não basta dizer que o ato político é
também educativo. É preciso assumir realmente a politicidade da educação
(FREIRE 2011, p. 46).

A compreensão crítica dos limites para que aconteça uma educação emancipadora para
o estudante é a de que, por meio do fazer pedagógico, o professor/a exerça uma prática
libertadora que possibilite ao estudante a problematização dos conhecimentos implícitos e
consiga ressignificar a aprendizagem para que seja base para estabelecer uma relação com o
mundo de forma crítica e desalienante. Freire (2011) nos orienta quanto ao papel da educação
na sociedade, afirmando que ela deve ser humanizadora, além de nos alertar também sobre a
necessidade de dialogar, alegando que a negação do diálogo entre professor/a e estudante
reforça a educação bancária10. O autor assevera sobre a educação e as estruturas do poder na
sociedade, bem como da necessidade do diálogo, pois.

[...] não fazemos esta afirmação ingenuamente. Já temos afirmado que a


educação reflete a estrutura do Poder, daí, a dificuldade que tem um
educador dialógico de atuar coerentemente numa estrutura que nega o
diálogo. Algo fundamental, porém, pode ser feito: dialogar sobre a negação
do próprio diálogo (FREIRE 2011, p. 86).

A concepção de educação dialógica proposta por Freire (2011) contraria a educação


bancária e ressalta a necessidade de humanizar a educação para que esteja a serviço da

10
Enquanto na prática “bancária” da educação é antidialógica por essência, por isso não comunicativa, o
educador deposita no educando o conteúdo programático da educação, que ele mesmo elabora ou elaboram para
ele, na prática problematizadora, dialógica por excelência, este conteúdo, que jamais é “depositado”, se organiza
e se constitui na visão do mundo dos educandos, em que se encontram seus temas geradores (FREIRE, 2001,
p.102).
34

libertação do opressor e que garanta competência e formação cidadã ao oprimido. Assim, ele
nos chama atenção para o fato de que

[...] a concepção e a prática da educação que vimos criticando se instauram


como eficientes instrumentos para esse fim. Daí que um dos objetivos
fundamentais, mesmo que dele não estejam advertidos muitos do que a
realizam, seja dificultar, em tudo, o pensar autentico. Nas aulas verbalistas,
nos métodos de avaliação dos “conhecimentos”, no chamado “controle de
leitura”, na distancia entre o educador e os educandos, nos critérios de
promoção, na indicação bibliográfica, em tudo, há sempre a conotação
“digestiva” e a proibição ao pensar verdadeiro (FREIRE 2011, p.89).

A educação bancária de que fala Freire (2011) traz em seu bojo o não pensar neste
formato de educação, no qual os conteúdos são trabalhados de forma mecânica para atender a
demanda do mercado ou ao imediatismo, em que o pensar é imposto e o “homem é reduzido a
meras coisas”. A educação para a libertação precisa considerar que pela natureza e, também,
pela história da humanidade o homem é um ser inconcluso. Assim sendo, Freire (2001, p. 10)
diz que “[...] é historicamente que o ser humano veio virando o que vem sendo: não apenas
um ser finito, inconcluso, inserido num permanente movimento de busca, mas um ser
consciente de sua finitude”.
Nesse momento, o autor reitera acerca da relevância da educação na interface da
subjetividade histórica, resultando na incorporação e interações da vida do sujeito. Nesse
desígnio, a construção do conhecimento deve ser resultado do pensamento e das experiências
advindas da vida pessoal. Além disso, Freire (2009) afirma que saber ensinar não é transmitir
conhecimento, mas criar a possibilidade para a própria produção ou para a própria criação.
Portanto, a educação deve estar indissociável das organizações sociais e dos sujeitos. Para
tanto, é necessário que estas manifestações aconteçam dentro e fora do espaço escolar de onde
o indivíduo edificará uma visão questionadora e problematizadora do ensino-aprendizagem.
Ou seja, um eterno aprendiz em sociedade e na sociedade. Tal afirmação leva ponderar que
[...] se os seres humanos fossem puramente determinados e não seres
‘programados para aprender’ não haveria por que, na prática educativa,
apelamos para a capacidade crítica do educando. Não havia por que falar em
educação para a decisão, para a libertação. Mas, por outro lado, não havia
também por que pensar nos educadores e nas educadoras como sujeitos
(FREIRE 2001, p.12).

A construção do conhecimento, na perspectiva da educação freiriana, é que o ser


humano busque na educação a sua libertação e possa por meio dela construir sentidos e que
atribuam à própria vida um significado. Diante do exposto, ensinar é o encontro que precisa
ter como decorrência a aprendizagem significativa e, a partir daí, o aprendiz consiga recriar
ou refazer aquilo que lhe foi ensinado. Assim, Freire nos traz uma importante elucidação
35

quanto à importância do educador para a corporificação dos saberes mediante a prática


pedagógica na escola e como estes saberes poderão extrapolar os muros da escola, pois
[...] se houve tempo em que o papel do pedagogo parecia ser este, hoje, o
educador, o intelectual engajado, cimentado com o oprimido, não pode
limitar-se a conscientizar dentro da sala de aula. Deverá aprender a se
conscientizar com a massa (FREIRE 2001, p.12).

Tal afirmação nos leva a inferir que a educação pode ser capaz de realizar a mudança de
uma sociedade desde que seja pautada em ensinamento para a libertação do indivíduo
oprimido e que os saberes ensinados estejam preocupados em fazer questionamentos sobre os
arranjos sociais, privilegiando acima de tudo as práticas reflexivas. Numa tentativa de dar
mais visibilidade às questões étnico-raciais na escola e considerando as questões históricas e,
ainda, com o intuito de delimitar e abordar teoricamente de forma diferenciada a contribuição
do negro na sociedade brasileira, a Lei nº 10.639/03 veio homologar o que Freire por diversas
vezes defendia com veemência em seus discursos quanto à necessidade de mudança de uma
sociedade de oprimido para uma sociedade de iguais.
Freire (2001, p.11) reconhece que a educação é essencialmente um ato de conhecimento
e de conscientização e que, por isso, só ela pode levar uma sociedade a se libertar do opressor.
Compreende-se, a partir dessa concepção, que ele evitava as querelas políticas e buscava
entender o pedagógico da ação política bem como o politico da ação pedagógica. Entretanto,
o autor considera que a escola pode repetir a dinâmica reprodutiva da sociedade de classes por
meio das relações sociais e das ações pedagógicas.
Não podemos esperar que a escola seja “comunitária” numa sociedade de
classes. Não podemos esquecer que a escola também faz parte da sociedade.
Ela não é uma ilha de pureza no interior da qual as contradições e os
antagonismos de classe não penetram. Numa sociedade de classes toda
educação é classista. E na ordem classista, educar, no único sentido
aceitável, significa conscientizar e lutar contra essa ordem, subvertê-la.
(FREIRE 2011, p.13).

Assim, defendemos a necessidade de que todo educador e todos os profissionais da


educação buscam, na ação social, a possibilidade de transformação da sociedade opressora e
classista. É preciso que se desenvolva no Centro Territorial de Educação Profissional do
Sertão Produtivo a “curiosidade epistemológica”, sem a qual não se alcança o conhecimento
cabal do objeto aqui compreendido como a discriminação racial, que traz em sua magnitude a
exigência de ser discutida criticamente para que outra visão humana possa ser construída.
A propósito da necessidade de romper com os velhos padrões e construir práticas
educativas que possibilitem a emancipação do homem, Freire (2011, p.60) afirma que a partir
da modificação de atitudes, é possível construir um mundo melhor já que a “mudança e a
36

estabilidade resultam ambas da ação do trabalho que o homem exerce sobre o mundo. Como
um ser de práxis, o homem, ao responder aos desafios que partem do mundo, cria seu mundo:
o mundo histórico-cultural”.
Partindo dessas afirmações, acreditamos que a transformação da escola numa
perspectiva democrática implica a participação consciente de todos na busca da criticidade, do
respeito às diversidades, possibilitando a expressão cultural na sua essência para que aconteça
a conquista da educação libertadora. Freire (2011, p.67) fala acerca do trabalho social como
mudança e possibilidade de liberdade, para ele “o trabalhador social que opta pela mudança
não teme a liberdade, não prescreve, não manipula, não foge da comunicação, pelo contrário,
à procura e vive.”.
Nesse sentido, o professor/a percebe o inacabamento do seu planejamento pedagógico
ao considerar que na sala de aula a socialização da teoria lhe confere a possibilidade da
reflexão sobre as pluralidades e a riqueza dos saberes implícitos, que os estudantes trazem
como marcas de outros espaços e ou de outras gerações. Proporciona assim, o encontro dos
saberes que, segundo a visão de Freire, é próprio do ser humano, que ao se conscientizar dessa
posição humana de incompletude, deve buscar na ética a construção de um ser histórico-
social.
Entretanto, em razão dessa incompletude o homem precisa ter a capacidade para decidir,
romper, comparar, valorar, escolher, intervir na sociedade. Logo, “o respeito à autonomia e à
dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder
uns aos outros” (FREIRE 2009, p. 59). Daí, a necessidade da construção do conhecimento de
forma orientada que respeite os saberes implícitos para possibilitar a construção da autonomia
dos estudantes.
Ainda de acordo com Freire (1997, p. 14) é imprescindível “possibilitar a todos o acesso
aos conhecimentos necessários à leitura crítica da realidade e sua transformação”. Portanto,
acreditamos na continuidade da aprendizagem que tem como marco o nascimento do
indivíduo e que vai perdurar por toda a existência. Por conseguinte, pensando na essência
humana, é preciso que a escola possa dar vida às diferentes dimensões políticas, culturais,
econômicas e sociais, do estudante, que pode resultar na transformação da realidade social,
por meio de um processo de recriação e intervenção que considera a importância da presença
do indivíduo na sociedade como possibilidade para a construção de um mundo melhor para
todos, como nos assevera Freire:

Que a nossa presença no mundo, implicando escolha e decisão, não seja uma
presença neutra. A capacidade de observar, de comparar, de avaliar para,
decidindo, escolher, com o que, intervindo na vida da cidade, exercemos
nossa cidadania, se erige então como uma competência fundamental. Se a
37

minha não é uma presença neutra na história, devo assumir tão criticamente
quanto possível sua politicidade (FREIRE 2000, p. 33).
Para Freire e Shör, ao estabelecer relações em sociedade o homem difere dos demais
animais devido à racionalidade e por ela utiliza-se do diálogo para o estabelecimento das
relações. Assim sendo, é preciso que na escola o diálogo seja estabelecido e que a diversidade
social seja compreendida como riqueza cultural e social do seu povo, pois

[...] o conhecimento é um evento social ainda que com dimensões


individuais [...]. O diálogo deve ser entendido como algo que faz parte da
própria natureza histórica dos seres humanos. É parte de nosso progresso
histórico do caminho para nos tornarmos seres humanos (FREIRE E SHOR
1986, p. 122-123).
É importante mencionar que o discurso de Freire (1993) trouxe a teoria aliada à prática
e que a construção do conhecimento só é possível mediante uma trajetória profissional social,
considerando a existência de sujeitos em que a aprendizagem acontece de forma gnosiológica.
Ou seja, estabelecendo uma relação de saber entre o sujeito e o objeto do conhecimento.
Desse modo, ele nos fala sobre a sua trajetória profissional:

Uma das marcas mais visíveis de minha trajetória profissional é o empenho a


que me entrego de procurar sempre a unidade entre a prática e a teoria. É,
neste sentido, que meus livros, bem ou mal, são relatórios teóricos de que
fazeres com que me envolvi [...]. Vim me tornando desta forma no corpo das
tramas, na reflexão sobre a ação, na observação atenta a outras práticas ou à
prática de outros sujeitos, na leitura persistente, crítica, de textos teóricos,
não importa se com eles estava de acordo ou não (FREIRE 1993, p.87-88).

No contexto contemporâneo, a educação vem nos apresentando problemáticas e


desafios que precisam ser contemplados e enfrentados para que sejam superados, por meio da
prática do professor/a articuladas com os estudantes na intenção de promover a formação de
uma consciência coletiva para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Assim
descreve Freire (2009) que

[...] um professor que não leva a sério sua prática docente, que, por isso
mesmo, não estuda e ensina mal o que mal sabe, que não luta para que
disponha de condições materiais indispensáveis à sua prática docente, se
proíbe de concorrer para a formação da imprescindível disciplina intelectual
dos estudantes. Se anula, pois, como professor (FREIRE 2009, p. 83).
A escola, na atualidade, possui como meta romper com a memorização centrada em
conteúdos pouco significativos para o estudante, e apresenta na sua proposta pedagógica o
próprio estudante como possibilidade para a construção de saberes. Assim, essa instituição
busca estimular a curiosidade, a criatividade e a criticidade, além de trazer na sua essência um
fazer pedagógico dinâmico que comprova ao estudante o despertar da consciência ingênua
para consciência crítica, proposta por Freire (2003) que ainda nos alerta que
38

[...] a esperança na libertação não significa já, a libertação. É preciso lutar


por ela, dentro de condições historicamente favoráveis. Se elas não existem,
temos de pelejar esperançosamente para criá-las. A libertação é
possibilidade, não sina, nem destino, nem fado. Nesse contexto, se percebe a
importância da educação de decisões, da ruptura, da opção, da ética, afinal.
(FREIRE 2003, p. 30).

Freire, em sua caminhada pela educação transformadora, reitera a crença na educação


como tarefa histórica transformadora e humanizante do mundo. Ele considera o estudante
como sujeito do conhecimento cujos saberes e experiências da vida são fundamentais ao
ensino e aprendizagem. Do mesmo modo, o autor orienta para se transpuserem as
situações/problemas de maneira crítica visando à conquista de uma educação de qualidade,
reescrevendo a história da sociedade de modo viável.
Sobre o que ensinar, Freire orienta aos professores/as para estarem abertos ao novo,
correr riscos e rejeitar qualquer ato de discriminação, considerando que a construção do
conhecimento precisa ser de forma dialógica interagindo saberes cotidianos e aqueles
adquiridos na escola, na sociedade e na luta social.
Nesse sentido, é preciso apreciar a recorrente história de discriminação racial e da
desinformação sobre a cultura africana. Também, é prudente estabelecer relações de contexto
social e político brasileiro em que se deu a proposta de educação no Brasil. Inevitavelmente,
todo esse bojo de desinformações e segregação racial reflete negativamente na escola
brasileira na atualidade. Diante dessa conjuntura vivenciada pelas escolas brasileiras, Freire
propõe uma educação para a libertação dos oprimidos, considerando a necessidade de
enfatizar os valores étnicos e morais, por meio da valorização e da busca para resgatar a
autoestima do estudante negro.

2.3 A diversidade e a Lei nº 10.639/03


As discussões sobre as relações raciais e o racismo no Brasil são permeadas pelo uso
de termos e conceitos sobre a diversidade. Nesse momento, discutiremos o conceito de
diversidade cultural e diversidade humana. A diversidade cultural é a construção social,
histórica, política e cultural ela estará presente em todas as sociedades, no Brasil, ela está
intrinsicamente ligada às questões étnico-raciais. Consideramos que a diversidade humana são
todas as semelhanças e dessemelhanças tendo como marcas as particularidades físicas como:
formas de corpo, cores da pele, tipos de cabelo, formatos dos olhos, visualizam-se assim as
formas subjetivas e simbólicas.
Assim, a junção das diversidades humanas com as relações históricas de poder político
e submissões humanas começou a estabelecer semelhanças e diferenças conforme as ideias
39

das hierarquias sociais considerando o fenótipo branco como parâmetro para selecionar
inferioridade e superioridade; perfeição e imperfeição; beleza e feiura, esses parâmetros inclui
uns e exclui outros. Nesse sentido, o povo negro foi excluído dos padrões de beleza
eurocêntrico. Portanto, o racismo é um patrimônio político-ideológico construído nas bases
escravocratas que atravessou os séculos e ainda hoje influencia sobremaneira as relações
preconceituosas na sociedade brasileira.
Na busca para romper esses paradigmas historicamente construídos, pronuncia-se
Galeano (2002) ao retratar a crença na diversidade humana e cultural e justifica claramente a
inquietação para dialogar sobre a adequação da Lei nº 10.639/03 bem como a necessidade de
se valorizar a diversidade humana e cultural na escola. O autor comtempla a riqueza humana
caracterizada pela diversidade em que a “história” de vida individual constrói uma nova
história coletiva, assim utopicamente é possível construir na escola um fazer pedagógico
baseado em respeito às particularidades de cada personagem para compor um todo e, desse
todo pensado, organizado e coeso, constrói-se uma sociedade para a diversidade em um
ambiente escolar humano e harmonioso.
Assim, Galeano (2002) diz que
[...] cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem
duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e
fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o
vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos
bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com
tamanha vontade que e impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem
chegar perto pega fogo. (GALEANO 2002, p.11)

Com isso, o autor uruguaio celebra, por meio dos contos escritos e hachuras, a vida
humana e de forma lúdica expressa a beleza e a diversidade existente na raça humana. Além
disso, estabelece uma analogia entre a metáfora das fogueiras e o conjunto de elementos que
formam o povo afro-brasileiro, encontra-se em ambas as particularidades, e as singularidades
encontradas em um universo distinto. Considera-se também que na África eclodem
linguagens e modos de sociabilidade de povos milenares os quais caracterizam cada etnia
africana individualmente, embora exista um elo que permite relacionar, diferenciar e ainda
que na heterogeneidade exista homogeneidade.
Dessa forma, discorremos que a diversidade cultural, econômica e social deve servir
para compor um todo humano. Portanto, no fazer pedagógico é preciso estabelecer canais de
ponderação que desestabilize o recrudescer dos dogmas presentes no sistema oficial da escola.
Em vista disso, admite-se que por meio de cada fogueira presente na escola haja uma
possibilidade para criar e recriar dimensões éticas, estabelecendo um mosaico de ideias e
reflexões que rompam as barreiras impostas pelos mecanismos ideológicos e racistas.
40

Buscamos, então, a consonância com os movimentos negros que ressignificam e


politizam afirmativamente a ideia de raça, como ideal emancipatório, sendo uma construção
social que marca, de forma estrutural e estruturante, a sociedade brasileira.
Consequentemente, os movimentos negros vêm politizando o conceito de raça e rompem as
relações de poder e as visões preconceituosas quanto à história e a memória do povo negro,
dando mais visibilidade às questões étnico-raciais, ponderando o conceito de raça como uma
construção social em que se evidencia o mito da democracia racial e se busca a construção de
uma sociedade mais democrática.
41

3. AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS E A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LEI Nº


10.639/03.

Compreendemos que a identidade cultural do estudante também se constrói na escola,


tendo em vista que a formação educacional está profundamente vinculada às matrizes
eurocêntricas e que, para fazer jus ao direito de liberdade de expressão que está homologada
na Constituição de 1988, a escola deve proporcionar a formação de cidadãos, respeitando as
diferenças, coibindo o preconceito advindo da visão discriminatória de grupos sociais que tem
como base étnica as crenças religiosas e os aspectos culturais. É nessa intencionalidade que
Lei nº 10.639/03 foi instituída a partir do embate político e ideológico do Movimento Negro
em todo o país. É uma lei que vem garantir direitos a quem historicamente teve seus direitos
negados.

3.1 O processo de institucionalização da Lei nº 10.639/03


A Lei nº 10.639/03 enaltece a identidade do povo negro a partir do reconhecimento de
sua cultura, iniciando o processo pela escola – lugar por excelência de socialização. Essa Lei é
fruto das diversas políticas de reparação, reconhecimento e valorização da população afro-
brasileira que vem sendo implantada em resposta aos anseios sociais do povo negro,
principalmente devido à participação dos movimentos organizados. Convém mencionar
alguns momentos relevantes para a consolidação da lei como política pública, tais como a
criação em 1995 do Grupo de Trabalho Interministerial – (GTI). Naquele momento, o grupo
evidenciou a população negra e possibilitou que o debate saísse do seio da sociedade para o
âmbito das esferas estaduais.
Em 1995, o Deputado Humberto Costa criou um projeto versando sobre as questões
étnico-raciais, porém esse foi arquivado. Houve mais uma tentativa pelo então Deputado
Paulo Paim que apresentou um texto constitucional na Câmara Federal cuja proposição da lei
foi o embrião da Lei nº 10.639/03. Encaminhou-se esse projeto ao Senado, também arquivado
em 1995. Em 1996, o movimento negro contou com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDBEN, 1996) que vai nortear a educação brasileira e trazer já nos
Art. 1º e 3º a afirmação do direito da pessoa e seu pleno desenvolvimento para a cidadania e
para o trabalho.
Os artigos pressupõem ainda igualdade, liberdade, pluralidade, diversidade, respeito e
justiça social que corroboram também, para a sanção da lei e para criação dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN, 1997), evidenciando a proposição de temas transversais como
ética, saúde, orientação sexual, meio ambiente, trabalho, consumo e pluralidade cultural. Todo
42

esse cenário político e educacional consolidado pelos decretos e leis acrescidos do esforço e
da pressão do movimento negro. Dessa forma, a Lei nº 10.639/03 recebeu o primeiro grande
impulso com a aprovação, em março de 1999, do Projeto de Lei nº 259, formulado pelos
deputados Ben-Hur Ferreira e Esther Grossi.
Nesse momento, o Projeto de Lei nº259 que visa resgatar a contribuição do povo negro,
estabeleceu a obrigatoriedade da inclusão, no currículo oficial da rede de ensino, com a
temática História e Cultura Afro-Brasileira. No artigo primeiro desse projeto, encontra-se a
justificativa quanto à intenção de reconhecer a luta dos negros no Brasil para a formação da
sociedade nacional. (XAVIER & DORNELLES, 2009).
Outra contribuição relevante foi a da UNESCO, durante a III Conferência Mundial das
Nações Unidas contra o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância correlata,
realizada na cidade de Durban, na África do Sul, do dia 31 de agosto a 07 de setembro de
2001. Os países ex-colonialistas foram convocados durante a Conferência para estabelecerem
políticas públicas visando à reparação histórica junto à população escravizada no período de
colonização e para o combate ao racismo na atualidade.
Enfim, criou-se Lei nº 10.639/03 que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História
e Cultura Afro-brasileira nas escolas brasileiras. A Lei foi regulamentada pelo Parecer CNE/
CP/2004 e pela Resolução CNE/CP 01/2004 que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação das Relações étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
brasileira e Africana no âmbito de todo o currículo escolar.
Dessa maneira, o movimento negro no Brasil combateu fortemente nos últimos anos e
defendeu a questão da “democracia racial”, lutando contra o preconceito e contra a
discriminação. Além de pressionar politicamente o governo, tendo como resultado a Lei nº
10.639/03 que pretende minimizar as desigualdades entre negros e brancos no país. Dentre os
artigos que compõe a lei, destaca-se aqui o

Art. 2° As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações


étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e
Africanas constituem-se de orientações, princípios e fundamentos para o
planejamento, execução e avaliação da Educação, e têm por meta promover
a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade
multicultural e pluriétnica do Brasil, buscando relações étnico-raciais
positivas, rumo à construção de nação democrática. § 1° A Educação das
Relações étnico-raciais tem por objetivo a divulgação e produção de
conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem
cidadãos quanto à pluralidade étnico-raciais, tornando-os capazes de
interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos
direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da
democracia brasileira. § 2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana tem por objetivo o reconhecimento e valorização da identidade,
43

história e cultura dos afro-brasileiros, bem como a garantia de


reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas da nação
brasileira, ao lado das indígenas, europeias, asiáticas. (BRASIL, 2004, p.11)

A lei representa uma resposta à luta do povo negro em defesa da identidade, como
possibilidade real da revalorização cultural, como forma positiva de reconhecimento da
personalidade pessoal e coletiva. A lei faz parte de um programa de ações afirmativas
aprovada em 1999 e, promulgada em janeiro de 2003. Ainda, promoveu mudanças na
LDBEN, que passou a vigorar com alterações nos artigos 26-A, 79-A e 79-B, conforme reza o
próprio enunciado da Lei nº 10.639/03, segundo o qual a referida normativa legal altera a Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional (BRASIL, 2003a); ainda como forma de efetivar a lei em 2009, o Ministério da
Educação e Cultura (MEC) aprovou Plano Nacional de Implementação das diretrizes
Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-raciais e para o ensino de história
e cultura afro-brasileira e africana visando assegurar a manutenção, as metas e o
desenvolvimento do ensino nos diversos níveis, etapas e modalidades.
A importância das Diretrizes das questões étnico-raciais se dá à medida que a sociedade
brasileira reconhece o valor da história e da cultura africana que chegaram ao Brasil por meio
dos povos escravizados por um período de 1550 a 1850. É fato que a diversidade cultural dos
povos africanos refletirá na sociedade brasileira, pois os escravizados pertenciam às diversas
etnias, falavam vários idiomas e possuíam tradições distintas. Dessa riqueza étnico-racial,
advém a beleza cultural brasileira formada acerca dos alicerces escravocratas e ela as
desigualdades sociais..
A fundamentação teórica leva a afirmar de que os escravos vindos para o Brasil no
período do tráfico negreiro eram um contingente gigantesco de pessoas que amargavam um
espaço de convivência restrito e marginalizado. Aqui, escravos/as traziam consigo uma
cultura material e imaterial, cujas memórias e tradições foram introduzidas na sociedade
brasileira como forma de resistência à escravidão e à posição servil que tinham como proposta
atender às estruturas dos mais afortunados no Brasil. Para essa compreensão, analisam-se
criticamente as literaturas que falam acerca das questões étnico-raciais, uma vez que elas
refutam a inferioridade do povo negro como na obra “Casa–grande e senzala” que demonstra
que o processo de miscigenação levou a sociedade brasileira a uma interpenetração de
culturas, o que resulta nas singularidades da formação da população brasileira. Entretanto,
acredita-se que as relações sociais fundadas na América tenham sido sustentáculo na
concepção de raça conforme nos diz Quijano (2005, p.228-9) e que as relações sociais se
organizavam na égide da dominação, em que as identidades raciais estavam ligadas a
44

hierarquias de lugares e, consequentemente, de papéis sociais. Nesse sentido, raça e


identidade racial recebem classificação social.

3.2 O lugar das questões étnico-raciais nas pesquisas contemporâneas


Diante da negação da cultura africana nas escolas e com base nos direitos garantidos por
lei, o povo negro vem, por meio dos movimentos sociais, reivindicar o reconhecimento e o
respeito pelo passado histórico. Assim, é prudente estabelecer relações acerca do contexto
social e político brasileiro em que se deu a proposta de educação no Brasil. Inevitavelmente, a
má informação e com ela a segregação racial e a invisibilidade do negro refletirá,
negativamente, na escola e na sociedade.
Hoje, a Lei nº 10.639/03 tornou-se mais um desafio para os movimentos sociais na
tarefa de efetivar as políticas públicas e as lutas de classes nos espaços escolares para a
população negra. Assim, a partir disso, redimensionar as propostas contidas nos documentos
públicos e, finalmente, no CETEP, a fim de facilitar aos estudantes do Proeja a construção da
aprendizagem de forma interdisciplinar e buscar a constituição de uma unidade social em uma
sociedade, cuja marca mais significativa tem sido olhar as desigualdades sociais no sentido da
emancipação dos sujeitos.
Nessa perspectiva, Freire (2009, p. 36) afirma que “a prática preconceituosa de raça, de
classe, de gênero ofende a subjetividade do ser humano e nega radicalmente a democracia”.
Nesse ponto, o autor evidencia a necessidade de se discutir temas referente aos preconceitos e
à discriminação racial, ancorando suas análises e interpretações nas posições pessoais de
forma contextualizadas e, também, bem como proposta inserida no universo social e político.
Freire (2001) ratifica a sua posição:
Não é possível entender-me apenas como classe, ou como raça ou como
sexo, mas, por outro lado, minha posição de classe, a cor da minha pele e o
sexo com que cheguei ao mundo não pode ser esquecida na análise do que
faço, do que penso, do que digo. Como não pode ser esquecida a experiência
social de que participo minha formação, minhas crenças, minha cultura,
minha opção política, minha esperança (FREIRE 2001, p. 15).

Consequentemente, faz-se necessário estabelecer um diálogo entre professor/a e


estudantes que propicie uma prática docente num dinamismo dialético diante da
desinformação e das mazelas históricas e sociais que se deu a organização da sociedade
brasileira. Essa realidade averiguada impulsionou os movimentos sociais reivindicatórios que,
inconformados com o contexto da educação no Brasil, demonstraram as resistências do povo
negro e postularam políticas públicas voltadas à população negra. E, ainda, lutaram em prol
de um Estado que promulgasse leis que minimizassem e/ou mitigassem as iniquidades que
45

geraram as distorções sociais. Também, os movimentos sociais buscaram coibir o tratamento


discriminatório e a desvalorização cultural que aconteceu de forma disfarçada, mas presente
no cotidiano do povo negro.
Os movimentos sociais argumentam contra o discurso de que no Brasil todos são iguais,
essa visão de igualdade, escamoteia uma realidade muito distante do praticado no cotidiano.
Reclama Santos Hélio (2013) que
[...] a ideia de tratar a todos igualmente no Brasil encarna um tipo de
isonomia cega, que não atende à efetiva desigualdade estrutural que atinge
determinados segmentos. Assim, a justificativa dos que apoiam as ações
afirmativas é de que nada é mais desigual do que tratar a todos igualmente.
(SANTOS 2013, p. 543 e 544).

Viver em uma sociedade que se diz democrática é tarefa complicada para a população
negra, mais difícil ainda é consolidar as leis que visam minimizar tais injustiças sociais,
portanto somente a existência da lei proibindo a discriminação não impede as atitudes
discriminatórias, há a necessidade da mudança de mentalidade das pessoas.
Nesse sentido, vale considerar ao que se posiciona Gomes (2001) sobre a discriminação
estrutural que se perpetua, por conseguinte, observa-se que
[...] somente a proibição da discriminação não tem surtido o efeito esperado
no que diz respeito à sua eficácia, é necessário ao Estado “renunciar a seu
histórico de neutralidade” em questões sociais, devendo assumir, ao
contrário, uma posição ativa, até mesmo radical se vista à luz dos princípios
norteadores da sociedade liberal clássica. (GOMES 2001, p. 37).
Reitirei uma parte aqui (Aquino)
Desde 2000, o censo do IBGE informou que o Brasil possuía 169,8 milhões de
habitantes, sendo 38,5% são pardos e 6,2% negros, dentre os quais 76,4 milhões eram negros
(pardos e negros). Sendo assim, 44,7% da população do país eram negros. Com base nos
dados, concluiu-se que o Brasil apresenta a maior população negra fora da África e a segunda
maior do planeta. Excetuando a Nigéria, pois é o único país do mundo com uma população
negra maior que a brasileira. No censo de 2010, demonstra-se que dos 191 milhões de
brasileiros, 47,7% (91 milhões) declararam ser da raça branca; 15 milhões disseram ser
pretos; 82 milhões pardos; 2 milhões amarelos e 817 mil indígenas. (IBGE, 2000)
Estabelecendo uma comparação entre o Censo realizado em 2000 e o de 2010
percebemos que o percentual de pardos cresceu de 38,5% para 43,1% (82 milhões de pessoas)
em 2010. Também a proporção de pretos subiu de 6,2% para 7,6% (15 milhões) no mesmo
período. Na Bahia, 17,1% da população se autodeclararam negros (2,4 milhões de pessoas). A
pesquisa do IBGE aponta que a população que se autodeclara branca caiu de 53,7% para
47,7% (91 milhões de brasileiros). Tais dados revelam que o país passa por uma mudança de
paradigmas e que a luta dos militantes e dos movimentos sociais contra o racismo consegue,
46

de certa maneira, o fortalecimento da identidade e quiçá do pertencimento.


As pesquisas do IBGE (2000 e 2010) informam a predominância da população negra no
Brasil. Portanto, é compreensivo afirmar que, no Estado brasileiro, o processo de
miscigenação ocorreu de forma significativa e que gerou uma identidade nacional singular
acerca de um povo marcadamente mestiço na aparência e na cultura. Contudo, a população
negra ainda sofre com a desigualdade social e racial e as crianças negras evadem das escolas
em maior índice do que as brancas por não se sentirem parte dela. Acerca disso, Freire (2009)
pronuncia-se quanto à responsabilidade enquanto brasileiro:
Na verdade seria incompreensível se a consciência da minha presença no
mundo não significasse já a impossibilidade da minha ausência na
construção da própria presença. Como presença consciente do mundo não
posso escapar à responsabilidade ética no meu mover-se no mundo. Se sou
puro produto da determinação genética ou cultural ou de classe, sou
irresponsável pelo que faço no mover-me no mundo e se careço de
responsabilidade não posso falar em ética. Isso não significa negar os
condicionamentos genéticos, culturais, sociais a que estamos submetidos.
Significa que somos seres condicionados, mas não determinados.
Reconhecer que a história é tempo de possibilidade e não de determinismo
que o futuro, permita-se-me reiterar, é problemático e não inexorável.
(FREIRE 2009 p.9 e 10).

A responsabilidade de que fala Freire (1996) é imperante aos professores/as que têm um
compromisso social, uma vez que a sociedade espera ávida por mudanças significativas em
todas as esferas. A educação precisa ser marco para efetivar as diversas conquistas dos
movimentos sociais. Dentre elas, a relevância da Lei nº 10.639/03, que tornou obrigatório o
ensino da História da África e da Cultura Afro-brasileiras nos currículos escolares. Isso é uma
vitória, mas para tanto é preciso que os professores/as e gestores/as cumpram a determinação
legal, adequando de forma efetiva os conteúdos das matrizes curriculares à referida lei. Por se
tratar de uma inquietação de ordem histórica, social e cultural, o tema que versa a Lei nº
10.639/03 vem sendo estudado por diversos pesquisadores no Brasil e no mundo, que
legitimam a inserção da lei na escola brasileira, como revelam as contradições e as práticas
educativas no contexto das questões étnico-raciais.
Tendo em vista que as pesquisas sobre a Lei nº 10.639/03 e as questões étnico-raciais no
país são fundamentais, considerando a busca da afirmação da identidade negra nas escolas e a
importância dos movimentos sociais para a efetivação das políticas públicas. Tais temas serão
abordados por Damasceno (2011), Pereira (2011) e Melo (2011), dentre outros que estudam
tais questões e defendem a adequação da Lei nos currículos escolares. Esses autores
consideram que o feito tornou-se imperativo no século XXI e, também, sinalizaram nos
estudos os entraves e as dificuldades para a efetivação da norma étnica nas escolas, além de
atentarem que a discriminação racial, mesmo tendo provocado um debate nacional, ainda faz
47

parte do cotidiano do povo negro.


Albuquerque (2003) estuda a organização espacial como elemento de exclusão da
população negra, considerando o contexto histórico e estabelecendo uma relação com a
identidade e pertencimento dos estudantes nas escolas públicas da periferia, como também
dos estudantes negros egressos de instituição pública, que frequentavam o cursinho pré-
vestibular para negros em Curitiba. Como base metodológica, a autora se utilizou da pesquisa
qualitativa com método dialético. No estudo, Albuquerque (2003) ressalta que a escola reforça
a ideologia branca introjetada na organização da cidade de origem europeia e fala do
branqueamento da população de Curitiba, discorrendo que o eurocentrismo está presente na
sociedade e que a ausência de referencial afro na vida dos negros curitibanos contribui para o
aumento da baixa estima do povo em questão.
A autora conclui que a organização espacial e a escola segregam a população
afrodescendente nas periferias nos espaços marginalizados e nas unidades escolares, em que
os recursos públicos são parcos e a invisibilidade do povo africano em sala de aula está
presente por meio da homogeneização desses estudantes – o que possibilita a manutenção da
exclusão social. Albuquerque (2003) ainda declara necessário rever o currículo das escolas e
contemplar a história multicultural e multirracial do povo brasileiro. Assim, faz-se necessário
trazer para as instituições de ensino informações sobre a afrodescendência e as africanidades
brasileiras como representações positivas, bem como o reconhecimento e a legitimação dos
saberes africanos.
Marques (2004) estuda a inserção dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs),
particularizando o tema transversal Pluralidade Cultural, como uma diretriz curricular que
orienta o programa curricular da escola. Além disso, a autora alega que as lutas e
reivindicações dos movimentos sociais, desde 1980, tiveram como conquista a elaboração dos
PCNs. Assim, para a realização dos estudos, Marques (2004) avalia a proposta pedagógica de
duas escolas estaduais no Mato Grosso do Sul: uma localizada na periferia e a outra
remanescente de quilombo. Concluindo que na escola da periferia denominada Rui Barbosa, o
tema transversal foi contemplado, mas de maneira incipiente; na outra instituição de ensino
denominada Zumbi dos Palmares, o tema não foi abordado sequer no projeto político-
pedagógico, uma vez que a maioria da população, devido à questão histórica, era formada por
negros. Somente se detectaram trabalhos pontuais com pequeno envolvimento de alguns
professores.
Desse modo, Marques (2004) afirma que o objetivo do tema transversal não está sendo
considerado nas duas escolas estudadas, além de ressaltar a necessidade de elas contemplarem
a cultura do estudante concomitante à da escola, possibilitando ao educando uma educação
48

inclusiva e plural. Ainda assim, assevera quanto à estrutura da escola estar intrinsicamente
ligada à organização da sociedade brasileira. A autora traz as questões étnico-raciais, mas
apenas menciona a Lei nº 10.639/03, que foi assinada um ano anterior ao seu trabalho.
Barros (2005) relata um contexto histórico sobre a escolarização da população negra em
São Paulo no período de 1870 e 1920, momento em que o Brasil vivia o entusiasmo pela
educação. Mesmo com esse cenário, a autora demonstra por meio dos dados bibliográficos e
estatísticos que as disparidades educacionais entre negros e brancos ao longo da história se
confirmam. Ela afirma que, ainda hoje, o nível de escolarização branca é muito maior que a
negra e considera que existiram duas concepções de educação: uma ação negra e outra branca,
as quais respondiam ao cenário econômico-social e político daquela época. Além disso, a
autora traz um rico apanhado histórico, em que deixa claro que a população negra sempre foi
preterida no campo educacional e enfatiza que na perspectiva histórica a educação escolar
inferiorizou o povo negro.
Nesse sentido, a pesquisa de Barros (2005) contribuiu para este estudo, pois demonstra
que as desigualdades raciais estão presentes na escola e que as questões raciais influenciam no
desempenho escolar e, ainda, que a Lei nº 10.639/03 contribui para minimizar uma dívida
social histórica.
Já Silva (2006) discutiu a implantação da Lei nº 10.639/03 na Rede Municipal de
Ensino em Recife e propôs mapear e caracterizar a implementação da temática. Aqui, tratou-
se de pesquisa qualitativa em educação a uma perspectiva de análise sobre a identidade e as
práticas pedagógicas desenvolvidas pelas professoras como, também, o sentimento de
pertencimento. A autora faz um estudo minucioso do contexto histórico em que se deu a
homologação da Lei e entende que ela é fruto da luta do Movimento Social Negro Brasileiro
no combate à discriminação racial nas escolas brasileiras. Silva (2006) reitera que a Lei
apresenta a iniciativa de minimizar a discriminação nas escolas estudadas e que as
dificuldades na implantação da legislação são devido às questões sociais, políticas e
econômicas arraigadas na sociedade brasileira ao longo da história, sendo mais um desafio
para os poderes públicos.
Nesse sentido, discorda-se da fala da autora de maneira parcial, tendo em vista que se
deve considerar a metodologia que o professor/a utiliza em sala de aula, ponderando que a
criatividade do professor/a é um diferencial significativo à produção do conhecimento. A
autora enxerga a escola para a população negra como uma possibilidade de ascensão social e
conquista da cidadania. Apostamos na escola como um instrumento de libertação ou
alienação, ou ainda de exclusão, sendo o fazer pedagógico decisivo para esse resultado.
Rocha (2006) realiza um importante trabalho ao pesquisar as contradições que estão
49

arraigadas no discurso político e as ações afirmativas pelas quais ele considera que as
desigualdades raciais sejam um subproduto do sistema capitalista. O autor analisa paradoxos e
possibilidades da Lei nº 10.639/03, estabelecendo um paralelo com a organização social, política e
econômica do capital. Desse modo, crê que a Lei nº 10.639/03 pode ser um instrumento de luta
questionadora da ordem vigente e apresenta como desafios a implementação da Lei para que
se possibilitem as transformações sociais, já que a norma não deve apenas reforçar algumas
teorias pós-modernas, ficando no campo apenas do discurso sobre a diversidade cultural.
Rocha (2006) ainda sinaliza quanto à necessidade de mudança nos currículos escolares para
oportunizar a superação da ideologia de dominação racial e, com isso, permitir a
desmistificação da ideológica igualdade racial no Brasil.
Assim, o autor julga necessário o estudo acerca das organizações internacionais e como
tais influenciaram os movimentos sociais brasileiros, buscando compreender a dinâmica do
trabalho e capital e o papel social das ações afirmativas no Brasil. Rocha (2006) enfatiza a
importância da Lei nº 10.639/03 para a classe trabalhadora como instrumento de luta.
Para Valentim (2006), os movimentos sociais estabelecem uma relação entre a educação
e o processo de implantação da Lei nº 10.639/03 no contexto histórico, entre o período de
1999 a 2006. O autor realizou entrevistas e aplicou questionários estruturados para os
participantes do movimento negro sul mato-grossense e considera a importância a e a luta dos
movimentos negros contra o racismo na defesa de ações afirmativas, apesar de ressaltar que a
discriminação e a submissão são históricas.
Santos (2007) corrobora com as discussões sobre as relações étnico-raciais e a formação
continuada de professores em um curso de pós-graduação lato sensu. Ela busca averiguar a
formação docente e também como a Lei nº 10.639/03 está sendo incorporada ao fazer
pedagógico. Sua pesquisa contribui com práticas pedagógicas significativas na tentativa da
construção da identidade, desmistificando as concepções pré-estabelecidas sobre a adequação
da Lei. Além disso, a autora defende que a identidade é construída no plano simbólico e nos
currículos escolares, bem como considera que as ações pedagógicas praticadas no curso
estudado estão em consonância com as reivindicações dos movimentos negros e com a Lei nº
10.639/03.
Também, Santos (2007) fala a respeito da importância da formação dos docentes que
atuavam no lócus da pesquisa e sinaliza quanto à necessidade de repensar a escola como a
única forma de o negro sair do anonimato inserindo-se nos saberes institucionalizados.
Portanto, ela considera valorosa a educação para a formação da identidade dos cidadãos, a
relevância das instituições para a formação docente e, também, destaca as políticas
educacionais para a efetivação das práticas pedagógicas mais democráticas. A autora ainda
50

pondera que antes das exigências explícitas na Lei nº 10.639/03 já havia a preocupação com
as questões étnico-raciais – fruto das reivindicações dos movimentos negros.
No entanto, a escola brasileira mantém em seus conteúdos programáticos a prática do
embranquecimento, o que por certo dificulta ao povo negro a autodeclaração identitária.
Santos ressalta que os professores/as especialistas do curso em Relações Raciais e Educação
possuem um diferencial na formação e, dessa forma, contribuirão de maneira significativa nas
suas instituições de origem.
A partir da realização dos projetos que envolvem órgãos estaduais e federais, Figueiredo
(2008) analisa como vem sendo implantada a Lei nº 10.639/03 na Secretaria de Educação de
Salvador e, também, o Programa de Educação e Profissionalização para a Igualdade Racial e
de Gênero. Para tanto, o autor utilizou como metodologia a abordagem qualitativa com
análise documental e pesquisa semiestruturada. Além disso, argumenta que a implantação se
deu a partir de um conjunto de ações que envolveram a sociedade civil e a gestão pública,
entretanto, não alcançou toda a rede municipal de ensino. Ele sinaliza positivamente quanto
ao protagonismo negro e dos movimentos sociais para desenvolver ações educativas de
valorização étnico-raciais e enfatiza que as construções dos currículos estão baseadas nas
teorias pós-crítica dos estudos culturais, o que possibilita ao professor a discussão sobre as
representações sociais.
Também, destaca que, para a formação inicial dos professores/as, é preciso as
universidades revejam os currículos e ressaltem que as questões propostas pela Lei nº
10.639/03 vêm sendo contempladas, embora careça de algumas ressalvas quanto ao
cumprimento da LDBEN.
Silva (2009) traz uma abordagem diferenciada ao analisar as práticas pedagógicas dos
professores/as brasileiros e dos professores/as estadunidenses, considerando as relações
étnico-raciais quanto ao ensino de Ciências. Os estudos compreendem como os conceitos
científicos influenciaram na formação da identidade e como o ensino de ciências e biologia
contribui para tanto. Além disso, traz contribuições das ciências naturais e do racismo
conforme a teoria do darwinismo social11.
A pesquisa é realizada a partir da análise de três abordagens: formação de professores,
ensino de ciências e relações étnico-raciais. Pondera, ainda, que a religiosidade afro-brasileira
é importante à formação da identidade étnico-racial, já que houve unanimidade no estudo
quanto à relevância dos africanos e dos afrodescendentes ao desenvolvimento das ciências

11
Darwinismo social: teoria defendida pelo naturalista Charles Darwin (1859) no livro A origem das espécies,
no qual explica a teoria da evolução das espécies por meio da seleção natural.
51

sociais. Finalmente, Silva (2009) traz as características bem parecidas para o lócus da
pesquisa afirmando que estas podem facultar o ensino de ciências, em que é pleiteada uma
educação que acate as relações étnico-raciais de maneira positiva, respeitando as
particularidades e o senso crítico de cada professor/a, bem como traz significativas sugestões
de atividades como ferramentas e/ou material didático que facilitam a prática docente.
Também declara que as práticas pedagógicas podem mudar as realidades as quais vivenciam
os estudantes negros nas escolas. Ressalta, ainda, o eurocentrismo presente no conhecimento
científico e a negligência com os demais saberes.
Souza (2009) apresenta um estudo utilizando uma metodologia qualitativa e destaca a
formação de professores/as como necessidade para que seja implementada a Lei nº 10.639/03
nos quilombos e nas escolas públicas de Porto Alegre. Ele conclui que apenas as ações
afirmativas não resolvem as questões étnico-raciais nas instituições escolares e salienta quanto
à importância dos movimentos sociais. Durante a pesquisa, o autor registra o desejo de todos
os participantes estudarem o contexto histórico africano, bem como a necessidade de eles
compreenderem as riquezas e as particularidades desse povo em todos os segmentos sociais.
No que tange à implantação da Lei n° 10.639/03 no ensino de Artes nas séries iniciais
em escola pública do Paraná, Santana (2010) traz, como preocupação para a efetivação da
referida norma, a necessidade de mudanças culturais de formação dos professores e de
investimentos financeiros. O autor, também, trata da sua trajetória como negro e analisa a
posição dos professores, chegando à conclusão de que a inserção da Lei, na escola estudada,
não se efetivou. O autor faz menção de que existe uma “Folclorização Racista” e ressalta que
não é essa a finalidade das políticas públicas que visam diminuir os preconceitos raciais.
Damasceno (2011) analisa a percepção de militantes do Movimento Negro na cidade de
Belém sobre a educação para relações étnico-raciais e, também, acerca do processo de
implementação da Lei nº 10.639/03, das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana
no estado do Pará e conclui que a educação é um instrumento da perpetuação e da
disseminação do preconceito e que pode ser um instrumento de transformação da própria
realidade.
No que se refere à educação para as relações étnico-raciais de acordo com os militantes,
ela tem em seus pressupostos o respeito pela diferença e pelo ensino da História da
contribuição do negro na formação da sociedade brasileira. Já com relação ao que tem sido
desenvolvido pelas instâncias governamentais no Pará para a implementação da Lei nº
10.639/03. Ainda segundo os militantes, poucas ações foram realizadas e ainda há um longo
caminho a ser percorrido.
52

Reitera Pereira (2011), a respeito da Lei nº 10.639/03 em uma escola de ensino médio
da rede pública estadual de Santa Catarina, em que trabalhou com as representações dos
educadores sobre as relações raciais na escola, na sociedade, no Projeto Político Pedagógico
(PPP) e no currículo praticado e concluiu que existe fragilidade no currículo praticado do
Ensino Médio quando se trata das relações étnico-raciais do povo afro-brasileiro. Dentre
outras questões, a autora demonstra também que as condições de trabalho e de precariedade
dessa escola, expressas na falta de material didático, na ausência de formação continuada,
bem como combina com a resistência de parte dos educadores e educandos, configurando-se
como os maiores entraves para a implementação da Lei.
Sob a visão da Secretaria de Educação - responsável por implementar ações de
orientação e divulgação da Lei - no Maranhão, Melo (2011) analisa os efeitos, limites e os
discursos relacionados à Lei nº 10. 639/03. Ele discute os processos sociais e discursivos que
levaram à existência da Lei nº 10.639/03, a construção da identidade nacional brasileira, que
culminou na representação da nação enquanto uma democracia racial e a história do
movimento negro, marcada por lutas que incidiram sobre a educação escolar como
possibilidade de enfrentamento do racismo e da discriminação no país.
No campo da relação entre a diversidade, a diferença e a desigualdade focadas nos
grupos historicamente discriminados, Negrão (2011) levanta tais questionamentos acerca dos
negros como objeto principal de estudo e objetiva analisar as políticas de diversidade na
educação brasileira durante o governo Lula (2003-2010), procurando pesquisar a diversidade
como um princípio capaz de orientar políticas públicas educacionais dentro de três sentidos
distintos: (1) a ideia da inclusão social; (2) as ações afirmativas; e (3) as políticas de
diferença. E, também, discute as relações entre políticas educacionais, cidadania (democracia,
participação), reconhecimento e redistribuição, além de investigar políticas de ação afirmativa
do governo Lula em torno das cotas raciais como acesso ao ensino superior.
Quanto ao processo histórico da Lei nº 10.639/03, Conceição (2011) investigou o que
resultou na sua aprovação, por meio de pesquisa bibliográfica, tendo como objetivo (1) refletir
acerca dos processos político-educacionais e sociais, que conduziram a definição do projeto
de Lei, sua aprovação e implantação e (2) identificar as diversas iniciativas legislativas
anteriores com propósitos semelhantes à Lei, em 2003, tendo como caminho para que se
efetivasse a elaboração, tramitação e aprovação no Congresso Nacional.
Santos (2011) desenvolveu estudos sobre os estudantes negros e sua aprendizagem em
sala de aula, além de enfatizar as analogias estabelecidas entre a matriz escolar e as questões
étnico raciais e, também, considerar que o fazer pedagógico influencia na aprendizagem do
educando afro-brasileiro. O resultado da pesquisa demonstra que o estudante negro vem-se
53

desencantando com a escola por não se sentir pertencente à instituição. Além disso, ele traz a
questão da identidade e das relações sociais apresentadas no livro didático e considera, ainda,
a inviabilidade do currículo homogêneo para uma sociedade multicultural e a relevância
social da promulgação da Lei nº 10.639/2003, mas pondera quanto às dificuldades de
implantação na escola do Ensino Fundamental.
Acrescenta Santos (2011) acerca das questões raciais e da aplicação da Lei nº 10.639/03
quanto ao estudo da língua inglesa. Esse trabalho se aproxima da proposta de estudo ao
investigar as atividades pedagógicas em sala de aula e a relação com a Lei. Também, em
consonância, traz a pesquisa qualitativa e o estudo de caso, diferindo apenas quanto à língua
inglesa e ao público-alvo. Na pesquisa, o autor pondera que as questões étnico-raciais exigem
do professor muito mais do que formação acadêmica e profissional para desenvolver a
temática, haja vista que a prática pedagógica relaciona-se com as crenças, os valores e os
posicionamentos ideológicos.
Em 2012, Santos apresenta no seu estudo as falas dos/as professores/as soteropolitanos
na escola pública e privada sobre a Lei nº 10.639/03, por meio da análise de discurso de
Michel Pêcheux e considera as materialidades discursivas, a partir da utilização de entrevistas
gravadas e escritas. O autor buscou esclarecer as práticas pedagógicas nas duas perspectivas, a
saber: (1) da Lei, como é vista pelos professores e das materialidades discursivas refletidas no
fazer pedagógico; e (2) como a esta pode influenciar na aprendizagem da aquela. Ele também
acredita que o debate acadêmico reflete na formação de profissionais da educação e que a
formação reflete na sala de aula.
Mendonça (2011) apresenta um estudo sobre a Lei nº 10.639/03 com foco em currículo
no Ensino Fundamental e discorre que a relevância da pesquisa foi ressignificar as questões
étnico-raciais no ensino da História da África e da Cultura Afro-brasileira, trazendo um novo
olhar para o combate ao racismo e à valorização do negro na sociedade.
Teixeira (2011) aborda a temática da educação e das relações raciais, tendo como objeto
de investigação o currículo do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Pará. O autor
busca a construção da identidade afrodescendente e elege categorias de análise: a identidade
cultural; o pertencimento; o espaço; a narrativa e o poder, além de articulá-las como
elementos de composição e significado do corpo teórico. O estudo é de caráter qualitativo e
fundamentado na etnopesquisa crítica e multirreferencial. Além disso, aponta
propositivamente para a participação, a interação e a implicação da academia nas
questões dos afrodescendentes em toda a complexidade que a envolve, acreditando no poder
do currículo como possibilidade para a construção identitariados afrodescendente.
No que diz respeito às instituições de Ensino Superior do sul do Brasil e dos efeitos da
54

Lei nº 10.639/03 na comunidade escolar, constatou que existe um esforço para a adequação,
mas que a inclusão dos afrodescendentes é uma questão de ética e de moral.
Já Toniosso (2011) traz o contexto histórico em que se deu a inserção da Lei nº
10.639/03 na legislação educacional brasileira e quais os reflexos nas práticas docentes. O seu
estudo trata-se de uma pesquisa qualitativa, bibliográfica com análise documental, coleta de
dados, entrevistas semiestruturadas com professores das disciplinas de História, Artes e
Língua Portuguesa da escola de Ensino Fundamental e Médio da rede estadual de ensino no
município de São Paulo. Assim, o autor concluiu que os professores reconhecem a
importância do trabalho, mas desacreditam quanto à eficácia da Lei para a superação do
preconceito e da discriminação em função das dificuldades de implementação. O autor
considera ainda que a Lei nº 10.639/03 é mais um entrave relacionado ao currículo.
Oliveira (2011) busca a aplicação da Lei Federal nº 10.639/03, por meio da realização
de oficinas na escola pública, em Fortaleza, nas turmas de 5º ano, trazendo mecanismos de
valorização da cultura negra na escola. A análise final do autor possibilitou verificar que os
estudantes reagiram de forma positiva ao dialogar sobre as populações africanas e
afrodescendentes. Por esse motivo, ele afirma que após a execução das oficinas aconteceram
mudanças significativas quanto à valorização da cultura negra na escola.
Novais (2011), em seu estudo, analisa os Planos Anuais e o currículo do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia - Campus Colorado do Oeste,
considerando a Lei nº 10.639/03 nos anos de 2009 e 2010, na turma de 3 º ano do Curso
Técnico Agrícola em Agropecuária Integrado ao Ensino Médio. Por meio de pesquisa
qualitativa, exploratória descritiva, utilizando questionários com questões semiestruturadas, o
autor concluiu que existem muitas falhas quanto à valorização da temática africanista nas
atividades pedagógicas no Instituto. Por isso, ele ressalta a necessidade do trabalho conjunto
para a implementação da valorização das múltiplas identidades dos estudantes no Campus e
defende a implantação de um currículo que atenda as diversidades culturais.
Regazoli (2011) versa sobre a educação para as relações étnico-raciais e pondera quanto
à necessidade do reconhecimento institucional, social, político e cultural da escola como lugar
das relações sociais conflituosas. Sua pesquisa analisou em quais condições a Lei nº
10.639/03 estava sendo inserida no contexto escolar da Escola Básica Lúcia do Livramento
Mayvorne e concluiu que existia uma interação entre o espaço escolar e o espaço comunitário
marcada por contradições e divergências, que podiam contribuir para a implementação da Lei
nº 10.639/03.
A construção da identidade negra nas escolas do município de João Pessoa é discurso de
Neri (2011) que traz o contexto histórico da abolição da escravatura e pondera sobre a
55

participação dos negros na sociedade de classes, conforme o olhar de Florestan Fernandes


(1997). O autor considera importante a implantação da Lei nº 10.639/03 nas escolas e seu
estudo se baseou nos conceitos de ideologia, identidade, multiculturalismo e
interculturalidade.
A pesquisa de Xavier (2011) apresenta a figura do negro, considerando os aspectos
linguísticos e discursivos nos livros: (1) kit de Literatura Afro-brasileira, volume II ao IV; (2)
Bonecas negras, cadê?, este está em consonância com a Lei nº 10.639/03; (3) O negro no
currículo escolar: sugestões práticas, de Maria Zilá Teixeira de Matos; e (4) Africanidade e
afro-brasilidade: orientações metodológicas para a implementação da Lei nº 10.639/03, de
Jorge Bezerra Arruda. O autor avaliou que Bonecas negras, cadê? Traz uma imagem negativa
do povo negro, que vai negar o anunciado e que em Africanidade e afro-brasilidade é
estabelecida uma imagem positiva do passado negro, com destaque para a importância do
negro na sociedade brasileira, enquanto que as demais obras estão apenas em concordância
com a Lei.
Vasconcelos (2011) traz o estudo da cultura afro-brasileira e indígena no ensino Técnico
em Agropecuária em Barreiros – IFPE. Seu propósito foi o de analisar os aspectos que
dificultam a implementação da Lei nº 10.639/03 e concluiu que a efetivação da diretriz passa
por um processo de conscientização da comunidade escolar, a partir da valorização e do
comprometimento com a construção de uma sociedade multicultural inclusiva no seu sentido
social. A abordagem da pesquisa é de cunho qualitativo e de caráter descritiva com análise nas
ações pedagógicas.
Silva (2011) propõe a implementação da Lei nº 10.639/03 no planejamento linguístico,
com alteração na matriz curricular no curso de licenciatura em Letras. A metodologia utilizada
é etnográfica com base na análise da aplicabilidade das Leis nº 10.639/03 e nº 9.394/96 (Lei
de Diretrizes e Bases do Conselho Nacional de Educação - LDBEN) e dos Parâmetros
Curriculares Nacionais. Para tanto, Silva (2011), recomenda um curso de extensão à distância.
Essa proposta aproxima da nossa pesquisa ao estudar a Lei e a mudança na matriz curricular.
Quanto às políticas curriculares, Costa (2011) discute o currículo e a Lei nº 10.639/03
no campo educacional e traz os embates que traduzem as demandas políticas do movimento
social e considera a centralidade e a temporalidade nas narrativas históricas. Também, o autor
faz uma abordagem considerando o ser negro em sala de aula branca por meio da análise das
narrativas colhidas durante a pesquisa.
Sberse (2012) investiga as políticas públicas e a implantação da Lei nº 10.639/03 e traz
os desafios e as perspectivas, além de ponderar que são muitas as barreiras para que haja a
efetivação da Lei. Ainda considera a existência de forças e agentes internos e externos da
56

escola e suas influências para a execução da referida Lei.


Por outro âmbito, Alves (2012) discute a implantação da Lei a partir da gestão escolar
nas escolas da rede municipal do Recife e, neste estudo, considera duas dimensões: (1) a
implementação da Lei nº 10.639/03, com destaque para o poder local e sua aplicabilidade; e
(2) o processo de efetivação da Lei, a partir da ação da gestão escolar. A autora problematiza,
também, sobre as contradições do racismo institucional e sobre as vivências antirracistas.
A implementação da Lei nº 10.639/03 e a Política de Educação das Relações Ètnico-
Raciais (ERER) é avaliada em uma escola pública municipal de Fortaleza. A abordagem da
sua pesquisa é qualitativa com análise documental, pesquisa de campo, entrevistas e aplicação
de questionário. A autora concluiu que é de ciência de todos que a implementação da Lei
acontece de forma pontual, com pouco alcance no currículo escolar, necessitando de formação
dos profissionais, de aquisição de materiais e recursos didáticos para possibilitar o fazer
pedagógico e a implementação da Lei nº 10.639/03.
Para Nascimento (2012) investigou o racismo do ponto de vista de todos os
participantes dos espaços educativos municipais do Rio de Janeiro, apreciando o
embasamento da Lei nº 10.639/03. Para tanto, realizou uma amostragem durante a pesquisa,
percebeu que o racismo ainda está arraigado nas escolas e que isso dificulta a diversidade
cultural e étnico-racial. Essa envergadura leva a população negra a ser vítima de preconceito
racial e, também, pode facultar a manutenção da base da pirâmide social brasileira.
Nessa dimensão, Eugenio (2013) apresenta no seu estudo a elaboração e a implantação
da Lei nº 10.639/03 e a atuação de ações afirmativas em Campinas. Ele analisa dois conceitos:
racismo e a luta por reconhecimento e considera importante investigar o rastro histórico que
carrega os movimentos negros, visando entender a sua atuação na elaboração e efetivação da
Lei. O autor julga que o cenário econômico, social e político em que o mundo vivencia foi
balizador para a elaboração de políticas públicas voltadas às questões étnico-raciais e
considera a importância da UNESCO e da III Conferência Mundial de Combate ao Racismo,
Discriminação Racial, Xenofobismo e Discriminações Correlatas realizada em 2001, Lei de
Diretrizes e Bases nº 9394/96, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e o Sistema de
Avaliação da Educação Básica (SAEB).
Eugênio ressalta que embora haja grande exclusão social, pensou-se minimizar tais
efeitos a partir de políticas públicas. Tendo em vista esse contexto, os políticos passaram a ter
um novo olhar para as questões étnico-raciais. O autor conclui que existe racismo na
sociedade brasileira e declara a importância dos movimentos sociais e do cenário político-
democrático como objeto propício para a concretização de ações afirmativas, além disso
enfatiza que a escola por meio do currículo reproduz a sociedade de classes.
57

A pesquisa que se propõe está respaldada na comunidade científica por suas


particularidades como: (1) a adequação da Lei nº 10.639/03 ao currículo do curso Técnico em
Secretariado do PROEJA, no Centro Territorial de Educação Profissional- Sertão Produtivo,
considerando as exigências das Diretrizes Curriculares Nacionais de forma interdisciplinar;
(2) o atendimento ao currículo oficial, que no CETEP é diferenciado e é determinado pela
Superintendência de Educação Profissional - SUPROF; (3) o cumprimento do Projeto Político
Pedagógico - PPP, que foi construído pela comunidade escolar e (4) o alcance de um público-
alvo já inserido no mercado de trabalho.
Nesse sentido, o retorno social da pesquisa é possível e a intervenção será mais rápida,
pois os estudantes poderão responder sobre tais percepções em relação à prática pedagógica e
aos conteúdos curriculares das questões étnico-raciais. Desse modo, a pesquisa confere a
participação ativa dos sujeitos envolvidos. Sobre os artigos e as dissertações analisados na
perspectiva teórica todos levantam aspectos acerca da realização de estudos com recorte
étnico-racial e da implantação da Lei nº 10.639/03, o que estabeleceu uma unicidade quanto à
temática abordada. Nesse seguimento, entende-se que há uma pequena vinculação entre raça,
cor e etnia. Quanto às bases documentais, quase todos versam sobre a análise da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação e alguns poucos tratam do Plano Político Pedagógico das
escolas.
Ressaltamos que existe um número insuficiente de estudos que investiga a questão do
currículo na escola e constatam-se apenas três que tratam acerca da temática, o que leva a
inferir que o assunto ainda é pouco estudado e/ou faz parte somente da gestão da unidade de
ensino, em distanciamento dos professores/as e dos pesquisadores/as que tem como foco de
pesquisa a Lei nº 10.639/03. Surge, então, a necessidade de aumentar o número de trabalhos
com enfoque no currículo e na adequação à Lei nº 10.639/03. Desse modo, acredita-se que a
transformação só acontecerá efetivamente se houver conscientização, identidade e alteração
do currículo.
58

4. AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NO CONTEXTO DO CURRÍCULO


ESCOLAR.

Neste capítulo, aborda-se, no campo do currículo escolar, a importância para a


construção de um diálogo para as possibilidades de análises, reflexões e discussões teóricas
para a consolidação ou não de uma formação cidadã. Para tanto, são importantes as
contribuições de Gimeno Sacristàn (1996), Silva (2000) e Lopes e Macedo (2011), ao falar de
cultura e currículo na escolarização é preciso estabelecer não apenas as relações entre ambos
os termos, haja vista que a cultura diz respeito aos conteúdos, processos ou tendências
externas à escola; já o currículo, aos conteúdos e aos processos internos à escola.
Abordar-se-á o contexto histórico como uma das facetas para a construção de um
currículo que pondere, ou não, as especificidades das questões raciais no Brasil. Em seguida,
discutir-se-ão as questões da subjugação da identidade étnica cultural negra por se acreditar
na importância dos ritmos e ritos culturais para a afirmação de uma identidade positiva.
Respeitamos, também, Freire (2004), ao dizer que a escola precisa desenvolver uma
pedagogia libertadora em superação a tradição pedagógica mecanicista e apolítica. No
processo de organização do conhecimento na escola, precisa valorizar as diversidades
culturais dos educandos e, nesse sentido, meditar acerca do que corrobora Freire e Shor (2003,
p.122), sendo o diálogo parte da natureza histórica dos seres humanos, portanto é caminho
para que se tornem humanos.
Nesse sentido, difere-se da técnica que pode ser usada para alcançar resultados ou
manipular enquanto que o diálogo é fundamentado na educação libertadora proposta por
Freire. Neste capítulo, a discussão é fundamentada na teoria para estabelecer uma prática
pedagógica em que
[...] por convicção política e razão pedagógica recusamos os “pacotes” com
receitas a ser seguidas à risca pelas educadoras que estão na base. Por isso
mesmo é que, nos momentos que se seguem, do processo de reformulação
curricular, estaremos conversando com diretoras, com professoras, com
supervisoras, com merendeiras, com mães e pais, com lideranças populares,
com as crianças. É preciso que falem a nós de como veem a escola, de como
gostariam que ela fosse; que nos digam algo sobre o que se ensina ou não se
ensina na escola, de como se ensina. Ninguém democratiza a escola sozinho,
a partir do gabinete do secretário. (FREIRE 2001, p.43).

Assim, propomos discutir a questão do currículo em uma perspectiva inclusiva


promovendo de forma ética, a valorização das diferenças, ousando para construir novas
posturas, vivenciando novas práticas pedagógicas, traduzindo uma educação para a
valorização humana.
59

4.1 Currículo e identidades: nexo das relações


A literatura revela por meio de relatos históricos em forma de denúncia, as mazelas
vividas pelo povo negro e pelos afrodescendentes no Brasil, desde a capturação na África,
passando pela migração forçada à escravidão e à fuga para os quilombos, bem como a Lei do
Ventre Livre, a Lei Áurea e, efetivamente, a “abolição da escravatura”. Desse modo, o negro
sai da senzala após anos de trabalho, forçado a deixar tudo para trás, encontrando apenas as
margens das estradas e a periferia das cidades existentes daquela época.
O processo de exclusão do povo negro possui cunho histórico, entretanto continua
presente na atualidade nas variadas formas: na educação, na saúde, no transporte e em outros
aspectos sociais em todas as cidades brasileiras. Em busca de minimizar tamanha injustica
social, ressalta-se a atuação dos movimentos sociais e dos militantes que lutam bravamente
em defesa do povo negro e contra todas as formas de ideologias de exclusão para que haja
mudanças significativas nas políticas públicas e, principalmente, nas escolas “para a
erradicação da maior das perversidades sociais do nosso país: as desigualdades raciais”
(SIQUEIRA, 2006, p.56).
Também, como modo de acusar a ausência e a necessidade da oferta da escola, o
jornal Quilombo12 publicou diversas matérias sobre a indispensabilidade da educação formal
para os negros, como meio de inclusão social. Santos (2005) relata
[...] Jornal Quilombo, dirigido pelo intelectual e militante negro Abdias do
Nascimento, já indicava a necessidade de educação formal para os negros
como uma condição necessária à superação da exclusão sociorracial a que
estavam submetidos. Afirmava o Quilombo, em sua primeira edição, na
coluna “Nosso Programa”, que era necessário lutar para que, enquanto não
for gratuito o ensino em todos os graus, sejam admitidos estudantes negros,
como pensionistas do Estado, em todos os estabelecimentos particulares e
oficiais de ensino secundário e superior do País, inclusive nos
estabelecimentos militares (SANTOS, 2005, p. 22).

A afirmativa supracitada compreende a necessidade da educação formal para o povo


negro como requisito à inserção social, conforme noticiava o Jornal Quilombo, que já
reivindicava a admissão dos estudantes negros em espaços educativos como pensionistas do
Estado, visto que lutavam pela gratuidade do ensino.

12
(...) o quilombo já surge como sobrevivência, como “remanescente”. Reconhece-se o que sobrou, o que é visto
como residual, aquilo que restou, ou seja, aceita-se o que já foi. Julgo que, ao contrário, se deveria trabalhar com
o conceito de quilombo considerando o que ele é no presente. Em outras palavras, tem que haver um
deslocamento. Não é discutir o que foi, e sim discutir o que é e como essa autonomia foi sendo construída
historicamente. Aqui haveria um corte nos instrumentos conceituais necessários para se pensar a questão do
quilombo, porquanto não se pode continuar a trabalhar com uma categoria histórica acrítica nem com a definição
de 1740. (Almeida, 2002, pp. 53-54)
60

Ainda com base na necessidade da escola estabelecer laços para que seja possível a
construção e afirmação da identidade do estudante, Silva (2000, p. 74) fala que “[...] as
afirmações sobre a diferença só fazem sentido se compreendidas em sua relação com as
afirmações sobre a identidade, que é autossuficiente, enquanto a diferença é
autorreferenciada, é aquilo que o outro é”. Portanto, é preciso que o estudante negro tenha
garantido o direito à memória e ao conhecimento da verdadeira história que difere bastante da
ótica do colonizador, tanto negro quanto do reconhecimento do branco a respeito dessa
identidade.
Na vida e na escola, registra-se que a afirmação identitária é compreendida como um
entrave ao desenvolvimento da cidadania. O preconceito e a discriminação raciais, além do
processo de negação do negro, tanto pela invisibilidade ou pela indiferença, são obstáculos
que comprometem o desenvolvimento intelectual do estudante negro. Munanga, ao falar sobre
identidade, destaca que

[...] a identidade é uma realidade sempre presente em todas as sociedades


humanas. Qualquer grupo humano, através do seu sistema axiológico sempre
selecionou alguns aspectos pertinentes de sua cultura para definir-se em
contraposição ao alheio. A definição de si (autodefinição) e a definição dos
outros (identidade atribuída) têm funções conhecidas: a defesa da unidade do
grupo, a proteção do território contra inimigos externos, as manipulações
ideológicas por interesses econômicos, políticos, psicológicos etc
(MUNANGA, 1994, p. 177-178).
Gomes (2001) corrobora inferindo sobre as questões de identidade e estabelecendo uma
relação com as práticas educativas para o reconhecimento das diferenças:

[...] as práticas educativas que se pretendem iguais para todos acabam sendo
as mais discriminatórias. Essa afirmação pode parecer paradoxal, mas,
dependendo do discurso e da prática desenvolvida, pode-se incorrer no erro
da homogeneização em detrimento do reconhecimento das diferenças
(GOMES, 2001, p. 86).
Dessa forma, a efetivação de práticas pedagógicas educativas que reconheça as
diferenças e que busque a equidade, possibilita ao estudante refletir sobre a construção da
identidade negra. Também, faculta compreender que essa construção parte de um
posicionamento político e histórico-cultural, além de permitir a concepção da identidade
social e étnica que oportuniza apreender a própria etnicidade. Abaixo, Gomes (2005) dá um
destaque significativo que evidencia a necessidade de construção da identidade humana.
A identidade não é algo inato. Ela se refere a um modo de ser no mundo e
com os outros. É um fator importante na criação das redes de relações e de
referências culturais dos grupos sociais. Indica traços culturais que se
expressam através de práticas linguísticas, festivas, rituais, comportamentos
alimentares, tradições populares e referências civilizatórias que marcam a
condição humana (GOMES, 2005, p. 41).
61

A história de vida do povo africano e dos afrodescendentes no Brasil possibilita


compreender que essa memória está no cerne da sociedade brasileira e que, por isso, é
necessário romper a barreira do silêncio que penetra no corpo e na alma do povo negro como
negação à própria trajetória. Portanto, o motivo de estudar as questões étnico-raciais é nobre e
tomou a relevância necessária para a sociedade, já que não existe mais “dono da causa”. Esta
é do povo brasileiro que precisa aprender que a diáspora só trouxe mazelas e tristezas, mas
também se construiu um espaço de apropriação positiva em que houve a valorização e o
reconhecimento da cultura.
Munanga e Gomes (2006), que nos leva a refletir sobre outra África, em que é possível
focar aspectos positivos que ampliem as discussões, possibilitando suplantar os conteúdos
propostos nas disciplinas curriculares. Desse modo, oportunizando a construção de
subjetividades, pois

[...] não faltam imagens e registros históricos capazes de mostrar a África


autêntica em sua múltipla realidade, que possam até criar um sentimento de
solidariedade com os países africanos. Essas imagens de uma África
autêntica pululam nos testemunhos dos viajantes árabes que se aventuraram
nos países da África ocidental entre os séculos IX e XI e dos navegadores
portugueses.[...] Muitos falam com admiração das formas politicas africanas
altamente elaboradas e socialmente aperfeiçoadas, entre as quais se
alternavam reinos, impérios, cidades-estados e outras formas políticas
baseadas no parentesco, como chefias, clãs, linhagens etc (MUNANGA e
GOMES, 2006, p. 32).
É preciso que no currículo escolar estejam garantidos os diálogos que possibilitem ao
estudante negro a construção de uma identidade positiva e ainda permita na escola um
ambiente de respeito às diversidades. Nesse sentido, compreende-se que o currículo escolar é
o instrumento que contribui para a construção da identidade e tem sido considerado por vários
autores como um dos elementos essenciais para se alcançar a aprendizagem desejada.
Portanto, não se concentra meramente no campo teórico, uma vez que faz parte da prática
educacional, ou seja, do fazer pedagógico permitir à escola o desafio de construir e reconstruir
saberes.
Reconhecer a importância do currículo é pensar em todo arcabouço teórico que nele está
contido, mas também é preciso considerar as políticas educacionais, bem como inserir, nos
Projetos Políticos Pedagógicos das escolas, os objetivos desejados e ou homologados para que
aconteça a aprendizagem. Portanto, pensar a adequação da Lei nº 10.639/03 ao currículo do
CETEP vai atender a algumas demandas como: contemplar a visão histórica e atual, buscando
assim uma sociedade mais justa; ter como ênfase o cumprimento legal e de orientação da
LDBEN; atender a uma demanda social, política e econômica, agregando elementos à
compreensão da problemática acerca dos afrodescendentes e do racismo disfarçado na escola
62

e na sociedade e, ainda, estabelecer um diálogo na comunidade escolar dentre outras. Nesse


propósito Pereira (2001) orienta que
[...] a interação professor e aluno se constrói através do diálogo e essa prática
não é neutra. Há uma política de sentidos nesse processo dialógico que o
configura como ideológica e interessada; a interlocução se dará em função
da interpretação e negociação de sentidos entre os sujeitos do processo
ensino-aprendizagem; desse modo, o processo de produção de sentidos e
significados no currículo autoriza, desautoriza, inclui ou exclui as
singularidades culturais. (PEREIRA, 2001, p.150)
Dessa maneira, adequar o currículo do curso técnico em Secretariado no CETEP é
examinar esse diálogo proposto por Pereira (2001) que enfatiza a necessidade de incluir o
sujeito que historicamente foi excluído na escola e na sociedade. Além disso, é repensar as
singularidades culturais que caracterizam o município de Caetité e homologar ao estudante
negro uma visão de sociedade que lhe permita empoderar para construir a identidade negra
com seus signos e significados.
Por conseguinte, sabemos da importância do currículo na formação do indivíduo não
trata de uma novidade ou modismo, mas de uma questão de preocupação histórica e mundial
que vem desde o Antigo Egito, Grécia e Suméria em que os menos favorecidos que
conseguiam estudar tinham o direito apenas de aprender a ler; já os mais abastados aprendiam
a ler, a escrever e a tocar instrumentos musicais dentre outros. Além disso, os currículos eram
organizados, ainda, para atender a ideologia dominante da época.
Nesse sentido, ao se pensar em currículo na escola, é preciso retomar a história.
Tendo em vista que as definições de currículo são muitas e, na maioria das vezes, sempre
voltam para atender às urgências do desenvolvimento econômico e social de uma sociedade.
Nessa conjuntura, surge a visão pragmática utilitarista do currículo com John Dewey (1902),
visto como conteúdos e atividades. Por outro lado, a elite dedicava‐se ao estudo das Artes
Liberais, enquanto o povo tinha sua forma própria de adquirir habilidades e técnicas
artesanais para o trabalho no campo e no lar. Assim, muitos estudiosos tem-se voltado para
conceituar currículo, embora não seja algo fácil.
A cada novo conceito aparecem novas tensões entorno da elaboração e da efetivação
da proposta curricular de cada segmento, pois se assumem também novos posicionamentos
em relação aos elementos norteadores da prática pedagógica e da sociedade. Assim, esse
conceito foi se modificando conforme mudam os padrões vigentes da sociedade. Aqui se
escolhe a concepção de Silva (2010, p 4828) que
[...] o reconhecimento das conexões históricas entre concepções de currículo,
transformações no mundo do trabalho, arcabouço ideológico e grupos que
detêm o poder e a cultura hegemônica, constitui o primeiro passo para se
avançar em direção a elaboração de propostas curriculares e à construção de
instituições mais sensíveis aos apelos de emancipação humana.
63

As práticas pedagógicas, os currículos e as orientações das Diretrizes Curriculares


sofrem a interferência do contexto social, político e econômico vigente no país, mas vale
considerar que as marcas do passado excludente da população negra e das camadas populares
estão presentes ainda hoje na sociedade brasileira e, portanto, nos currículos escolares. Nesse
contexto, demonstra-se, rapidamente, o processo histórico em que se deu a organização da
educação escolar brasileira em 1549, que tem como princípio balizador a Educação Jesuítica,
que era uma educação escolástica pública religiosa voltada aos índios, em que os dogmas
preponderavam no método Ratio Studiorum, método pedagógico que estabelecia o currículo
nas escolas brasileiras até a expulsão dos Jesuítas em 1759. No século XVII, surge a
Educação Pública Estatal e nos fins desse século, a Educação Pública Nacional, e chega-se ao
século XIX com a participação do povo no governo e emergia a educação pública
democrática com pequenas mudanças, mas sempre com os currículos voltados a atender a
elite conservadora.
Assim, o povo negro esteve à margem do processo educacional, sempre em
condições bastante desfavoráveis desde a precariedade de infraestrutura de moradia, de
subsistências, de educação e até as exigências severas ditadas pelo próprio regime
escravocrata e seus reflexos após a abolição da escravatura. Já, no século XX, eclodia o
período militar de 1964 até 1985, contando com 21 anos de autoritarismo e violência com o
apoio da tecnocracia militar e civil representada pela burguesia nacional e pelas empresas
multinacionais. O Estado militar mantinha uma ampla intervenção na economia com o
crescimento das forças produtivas e com grande concentração de renda e fortalecimento do
capitalismo. Nesse cenário, os currículos atendiam à hegemonia das classes dominantes. Ao
findar o período militar, apareciam os movimentos em prol da democracia, mas o estado
administrativo garantia os fluxos normais e não se preocupava com novos investimentos na
educação. Entretanto, as escolas particulares preenchiam uma lacuna deixada por ele e
tomavam espaço na educação brasileira.
Na década de 1980, a política educacional brasileira mais uma vez esteve arraizada
com os interesses políticos e econômicos do capitalismo, fortemente sustentada no país pelas
forças políticas predominantes. Mais uma vez os currículos respondiam aos ditames dessa
forma de governo, exercendo papel de mantenedor da ordem social vigente incluindo ou
excluindo, aparentando neutralidade, querendo convencer inaptos de que eram inaptos,
sujeitando-os voluntariamente à dominação. No fim do século XX e início do XXI, a
educação brasileira da ideia humanista tendo como principal defensor Paulo Freire, Ele teve
grande presença nos discursos, mas ainda hoje encontramos na escola uma distância entre o
discurso e a prática; o fazer e o saber.
64

Nessa perspectiva, pode-se afirmar, portanto, que o currículo não é elemento


inocente e neutro, nem estanque, mas está vinculado às relações de poder e de produtividade
(dominados e dominantes), transmitindo visões sociais particulares e intencionais e
influenciando a construção das identidades individuais e sociais.
Nesse contexto dos anos noventa, os currículos escolares ainda eram e são
estruturados tendo como referência o europrocentrismo, expressando a cultura branca da
eleite, deixando a cultura do povo negro excluída, reforçando um conjunto de estigmas e
dogmas que afastava a presença negra dos bancos escolares sobre a forma de um relativo
isolamento social. Os negros foram condenados primeiro à escravidão e no segundo momento
ao silêncio e ao esquecimento. Esses elementos se evidenciam ao se situar a questão da
cultura negra e comparecem no âmbito das representações de uma forma extremamente pálida
ou nem localizados nos currículos das escolas brasileiras. Mesmo diante da homologação da
Lei nº 10.639/03, ainda nas escolas prevalece uma invisibilidade social e simbólica dos
negros.
Por conseguinte, a operacionalização de um currículo integrado na escola precisa
estar em consonância com a transformação no modelo pedagógico e administrativo, ou seja,
em toda a escola, é preciso que ocorra a flexibilidade, a autocrítica e, principalmente, uma
gestão democrática de que as escolas busquem a reflexão sobre o currículo e que ela perpassa
desde a construção do projeto político-pedagógico até a elaboração dos planejamentos por
disciplinas ou por atividades interdisciplinares. Portanto, buscam-se respostas no “chão da
escola” para as indagações de muitos pesquisadores, estudiosos e até mesmo para as mais
leigas das pessoas que questionam como ensinar e o que ensinar. Essas perguntas nos
apresentam Lopes e Macedo (2011, p. 21): “Mas como definir o que é útil? Útil para quê?
Quais as experiências ou conteúdos mais úteis? Como podem ser ordenados
temporariamente? Por onde começar?” Isso leva a pensar que o currículo não é apenas a
listagem de conteúdos a serem transmitidos aos estudantes, é preciso que sejam pensados e
executados na busca da transformação como forma de prezar pela liberdade humana, uma vez
que a palavra currículo, etimologicamente, quer dizer um caminho a ser percorrido, um
percurso. Precisa ser um percurso humano que atenda às diversidades humanas, buscando
assim a equidade social.
Quando se trata de currículo escolar, fala-se de um percurso de formação escolar.
Um dos estudiosos do currículo no Brasil - Tadeu Silva - diz que uma questão fundamental
responde o porquê de que o conhecimento deve ser ensinado e para que será ensinado, haja
vista que
65

[...] o currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O


currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa
vida, curriculum vitae: no currículo se forja a identidade. O currículo é texto,
discurso, documento. O currículo é documento de identidade. (SILVA, 2002,
p.150).

Aqui convêm mencionar a origem da palavra currículo que vai aparecer pela primeira
vez relacionada à educação em 1633, na Universidade de Gracow e concebida não como um
campo de estudos, mas segundo Macedo & Lopes (2011) como respeito à organização da
experiência escolar de sujeitos agrupados, característica presente em um dos mais
consolidados sentidos de currículo. Sequência, terminalidade, completude e integralidade são
ideias que perpassam o conceito de currículo ao longo dos anos.
Partindo da visão de que, no Brasil, presencia-se um momento em que as discussões
acerca das concepções e das finalidades de um currículo ganham destaque em escolas e nos
meios acadêmicos, devido dentre outras coisas, a Lei nº 10.639/03 que exige mudanças de
paradigmas nas escolas, bem como da discussão das diretrizes do Plano Nacional de
Educação (PNE 2014-2024) discutido em todos os municípios do país. Certamente,
representantes dos envolvidos questionam e buscam possibilidades de currículo: O que é?
Para que serve? A quem se destina? Como se constrói? Como se implementa? Várias são as
teorias do currículo, muitos são os teóricos. Entretanto, não se pode perder de vista o que nos
orienta Silva, (2002, p.150) quanto ao poder, o caminho e a autoridade exercida por meio dos
currículos e como a ação deles vai refletir na sala de aula e, consequentemente, na
organização social da sociedade.
Para o diálogo, é importante trazer Lima (2007) ao afirmar que um currículo com
pretensão democrática deve visar à humanização de todos. E também, Sacristán (2000, p.15)
afiançará que “o currículo é a forma de ter acesso ao conhecimento, não podendo esgotar seu
significado em algo estático, mas através das condições em que se realiza e se converte em
uma forma particular de entrar em contato com a cultura”.
Ainda, Macedo (2012, p.18) acredita que o currículo deve ser pensado com foco nas
pessoas, suas histórias, necessidades e especificidades demandadas. O currículo não pode ser
um modelo a ser seguido, porque se assim for, será homogeneizado e não atenderá as
particularidades do sujeito aprendente. Logo se distanciará da proposta política pedagógica
que gira entorno da escola e da compreensão das realidades presentificadas.
[...] o currículo é, para nós, o principal artefato de concepção e atualização
das formações e seus interesses sócio educacionais. O que tem sido chamado
de currículo no seio da educação contemporânea é simplesmente a
homogeneização de procedimentos, conteúdos, atividades, carga horaria e
outros elementos que fazem parte da organização/modelo de educação
instituída por estudiosos que silenciam a voz, a participação do sujeito
66

aprendente – principal interessado nos processos de ensino e de


aprendizagem (MACEDO 2012, p.25).

Considerando esses elementos, é preciso dar vez e voz a todos os envolvidos no


processo ensino-aprendizagem. Nessa acepção, o currículo não pode ser estático, deve ser
dinâmico, sendo a expressão das especificidades e das realidades de uma modalidade de
ensino. Para Silva,

[...] o currículo é sempre o resultado de uma seleção: de um universo mais


amplo de conhecimentos e saberes seleciona‐se aquela parte que vai
constituir, precisamente, o currículo. As teorias do currículo, tendo decidido
quais conhecimentos devem ser selecionados, buscam justificar por que
“esses conhecimentos” e não “aqueles” devem ser selecionados (SILVA
2007, p. 15-16).
Assim, o currículo é a expressão das funções da escola socializadora, cultural e está
carregado de ideologias, de discursos, de tensões entre o instituído e o instituinte. Nele se
reverberam as vozes dos atores envolvidos em sua construção. Não se pode permitir que
apenas os técnicos e burocratas sejam os reais protagonistas da escola e que o currículo
escolar seja reduzido a um simples modelo a ser seguido. Sobre a necessidade da construção
participativa na escola e, por consequência do currículo, Freire nos pergunta:

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva
associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a
violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a
morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária
“intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a
experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não discutir as
implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas
áreas pobres da cidade? Há ética de classe embutida neste descaso? Porque,
dirá um educador reacionariamente pragmático, a escola não tem nada que
ver com isso. A escola não é partido. Ela tem que ensinar os conteúdos,
transferi-los aos alunos. Aprendidos, estes operam por si mesmos. Nesse
sentido, devemos dar importância à individualidade do aluno e ao contexto
social e cultural do ensino, visando promover conexões e significados
pessoais no processo de aprendizagem (FREIRE 1996, p. 33-34).

Nesse sentido, o dialogismo deve ser o foco para a construção e efetivação do currículo
na EJA e no PROEJA. É imprescindível que os atores do processo de ensino e de
aprendizagem não sejam silenciados pela ausência de democratização da educação. Desse
modo, as perspectivas temporal e espacial tornam-se fundamentais nesse processo, pois tanto
o currículo quanto os protagonistas precisam estar situados tanto espacialmente como
historicamente para haver uma articulação entre os saberes construídos a partir da vivência
dos estudantes e os saberes formais/curriculares. Necessariamente, é fazer a contextualização
dos conteúdos, é tornar o cotidiano do estudante em conteúdo de aprendizado; é humanizar a
educação de forma a ser transformadora, é dar possibilidades de o estudante ser sujeito da sua
67

própria história, construindo a partir dela a sua identidade. Essa é autonomia de Paulo Freire,
assim como apontam Giroux e McLaren (1995):
Entender a voz do estudante é lidar com a necessidade humana de dar vida
ao reino dos símbolos, linguagem e gestos. A voz do estudante é um desejo,
nascido da biografia pessoal e da história sedimentada; é a necessidade de
construir-se e afirmar-se em uma linguagem capaz de reconstruir a vida
privada e conferir-lhe significado, assim como de legitimar e confirmar a
própria existência no mundo. Logo, calar a voz de um aluno e destituí-lo de
poder (GIROUX; MCLAREN, 1995, p. 137).

Para tanto, Laffin nos fala sobre a necessidade de formação do professor/a e a


adequação da proposta curricular para a Educação de Jovens e Adultos, considerando as
especificidades desse estudante-trabalhador. A autora

[...] aponta a necessidade de uma docência que considere as particularidades


do ensino de jovens e adultos, tanto da diversidade cultural, do mundo de
trabalho, quanto da necessidade de metodologias e currículos adequados.
Além disso, com um reconhecimento de uma área/modalidade de ensino que
precisa ser estudada e que se encontra em um processo recente de
construção. (LAFFIN 2012, p. 215).
Na perspectiva do currículo e ainda para atender as particularidades do estudante-
trabalhador, é relevante o papel do professor/a consciente da sua metodologia e da prática
cotidiana do currículo para que seja efetivada na escola a valorização deste estudante. Ainda,
considera-se Amorim (2012), ao situar a necessidade de que a escola possibilite ao estudante
o protagonismo da sua história e construa saberes para a vida em sociedade, trazendo na sua
essência a identidade para o exercício consciente da cidadania, e de que
[...] é preciso que a escola esteja sempre aberta para compreender as dúvidas
dos alunos, para valorizar as diferentes interrogações que surgem no
contexto da aprendizagem, para vencer os desafios colocados no dia-a-dia de
uma instrução de ensino que trabalha com a complexidade do conhecimento
e das relações humanas. (AMORIM 2012, p.93).
De certa maneira, os autores citados afirmam que o currículo da EJA, portanto também
os cursos do PROEJA têm suas especificidades e sofrem interferências do dinamismo dos
atores envolvidos, assim como de suas experiências dentro e fora do ambiente escolar, sua
história, ideologias, experiências, crenças e tantos outros elementos. Todavia, cada autor faz
seu delineamento sobre o mesmo tema, dialogando na sua diversidade. Assim reconhece-se
que
[...] o currículo não é um conceito, mas uma construção cultural. Isto é, não
se trata de um conceito abstrato que tenha algum tipo de existência fora e
previamente à experiência humana. É, antes, um modo de organizar uma
série de práticas educativas. (GRUNDY apud SACRISTÁN, 2000, p.1).
Nesse sentido, é fundamental que na escola a construção do currículo esteja sempre
aberta para compreender as peculiaridades dos estudantes, valorizando as diferenças, bem
68

como as suas interrogações, buscando vencer os desafios cotidianos, considerando a


complexidade da construção do conhecimento e das relações humanas.
O cenário educacional brasileiro nos convida a pensar que o currículo pode ser uma
ferramenta apropriada para que aconteça o ensino politizado quanto às questões étnico-raciais,
à medida que se percebe como artifício que lida diretamente com as questões de saber
acadêmico. Também, constroem-se laços de pertencimento, identidade, resistência à opressão,
ao passado histórico e, assim busca-se por meio das reminiscências históricas a auto
atribuição em um processo construído mediante as informações.
Dessa forma, reafirmamos, o currículo como artefato que lida com questões de saber,
poder e identidade. Assim sendo, é fundamental considerar no currículo do CETEP o que
determina a Lei nº 10.639/03 e as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, concretizando o
que determina o artigo 26 A e 79 A e B, que versa sobre a obrigatoriedade de ser contemplado
no currículo oficial da rede de ensino a temática "História e Cultura Afro-brasileira”. Esta
obrigatoriedade de reestruturação curricular propõe conteúdos que devem incorporar a
história do povo negro, oportunizando o conhecimento e respeitando as diferenças.
Desse modo, é necessário garantir no CETEP a determinação legal, mas também
considerar e respeitar, além de compreender o papel social e histórico dos movimentos negros
no Brasil para que as esferas políticas possam homologar um direito que é intrinsicamente
humano: o direito à liberdade, que foi negada ao povo negro durante a escravidão e que, ainda
hoje, essa exclusão social se reflete nas diversas formas de discriminação social.
Portanto, não pensar na adequação da Lei nº 10.639/03 ao currículo do PROEJA
mantém-se hoje o que diz Moura (1994), no período escravocrata, ao negro era imposta a
cultura branca e, desde então, busca-se manter a identidade. Logo, precisamos debater e
pensar essa relação. Coaduna-se com Arendt (2008), quando ela explica que o esquecimento
compromete ou “caso contrário é esquecido”. Nesse sentido, é necessário tratar das questões
étnico-raciais na sala de aula e buscar no contexto histórico o real significado da escravidão,
fazendo uma releitura da participação do povo africano para a formação da sociedade
brasileira, considerando ainda a riqueza usurpada da África no contexto mundial.
Apesar de que, na escola, seja preciso considerar que a Educação de Jovens e Adultos
esteja ligada ao processo de conscientização do indivíduo quanto à importância da relação
sujeito-objeto de forma reflexiva, objetiva-se a formação humana e o reconhecimento do
continente africano que se vincula conosco, também, pelas fronteiras atlânticas. Portanto, é
indispensável ao desenvolvimento da aprendizagem no PROEJA, a valorização do
conhecimento intrínseco e das relações que se estabelecem nas diferentes áreas do
conhecimento.
69

Nessa perspectiva, novos caminhos precisam ser trilhados e as lutas sociais


impulsionam para um novo olhar quanto às questões relacionadas à Educação de Jovens e
Adultos. Haja vista que questões étnico-raciais tornaram-se urgentes sendo necessário
reconhecer uma “outra” África, como na viagem de Túlio – um jovem brasileiro que visita as
civilizações dos antepassados africanos com seu tapete mágico e descobre que a África era
rica e que o ouro de Gana foi levado pelos europeus por meio do Saara. Túlio ressalta a
riqueza do monarca negro KanKan, Musa de Tambúctu, sua generosidade e as escolas da
África como centro de saber que estudava o Alcorão, História, Geografia, Gramática, Lógica,
Matemática, Astronomia e Astrologia. É imprescindível mostrar aos estudantes que o povo
africano tem uma história, rica de conhecimentos e que antes da invasão do Brasil já havia,
inclusive, a Universidade de SanKuré no país. É preciso, também, ensinar a verdadeira
história da África e do povo africano que lutou bravamente contra a escravidão nos diversos
quilombos espalhados no Brasil.
Evocar o tráfico, lembrar constantemente a escravidão, deve constituir para
os brasileiros uma obrigação permanente e diária, sem que isso represente
nenhuma forma de autoflagelação patológica e muito menos o
extravasamento de um pieguismo lacrimogênico. [...] O tráfico e escravidão
formam parte inalienável do ser total dos afro-brasileiros. Erradicá-los da
nossa bagagem espiritual e histórica é o mesmo que amputar o nosso
potencial de luta libertária, desprezando o sacrifício dos nossos antepassados
para que nosso povo sobrevivesse. (NASCIMENTO 2002, p.98).
Concretizar a proposta da Lei nº 10.639/03 ao currículo escolar torna-se um desafio
pedagógico e político para todos os professores/as que desejam transformar este país dentro
de uma perspectiva de desenvolvimento e justiça social. É imprescindível lutar para eliminar
e/ou minimizar o foco eurocêntrico da educação no Brasil, diversificando os currículos
escolares brasileiros para contemplar as diversidades e buscar a equidade. Nesse sentido,
salientamos a necessidade de averiguar a efetivação da Lei nº 10.639/03 no CETEP, tendo
como balizador o currículo praticado e a modificação indicada pela LDBEN que traz para a
educação a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana, cuja
proposta objetiva o reconhecimento e a valorização da identidade histórica e cultural dos afro-
brasileiros. Ainda se está em harmonia com o Documento-Base PROEJA (2007, p. 11-12)
que esclarece quanto à necessidade da formação humana e do acesso ao universo de saberes e
de conhecimentos científicos e tecnológicos que foram construídos pela humanidade ao longo
da história. E, também, ressalta-se a formação profissional como subsídio para a intervenção
social e melhorias na qualidade de vida, bem como buscar por uma sociedade mais igualitária.
Ainda sobre a valorização da identidade do estudante do PROEJA, suscita-se a
orientação do Documento-Base (2007 p. 33) acerca do projeto político-pedagógico, que
afirma a necessidade de praticar na escola um currículo integrado contemplando o ensino
70

médio e o profissional, além de indicar que esta integração precisa ser de forma
epistemológica, de conteúdos, de metodologias e de práticas educativas, em que seja possível
acontecer a junção teoria-prática, entre o saber e o saber-fazer.
Essa integração entre a teoria e a prática, o saber e o saber-fazer torna-se relevante na
Educação Profissional, pois nessa modalidade de ensino é preciso trilhar um caminho “...
tendo como horizonte a universalização da educação básica, aliada à formação para o mundo
do trabalho, com acolhimento específico a jovens e adultos com trajetórias escolares
descontínuas” (BRASIL, 2007, p.11). Contudo, a contextualização do processo histórico da
educação brasileira nos leva afirmar que a ideologia é arraigada nos currículos escolares, mas
essa ideologia pode ser suplantada por meio do uso do currículo multicultural, conforme
defende Pereira (2001):
[...] um currículo multicultural possibilitará ao educador um exame dos
interesses ideológicos e políticos do “currículo oficial”, ou seja, do
documento escrito onde consta a exposição dos objetivos, conteúdos,
métodos que devem ser trabalhados na sala de aula, oferecendo
oportunidades de desafiar ideologias hegemônicas, interpretar a cultura de
maneira contrastante, identificar as relações de poder nas situações
discriminatórias, compreender a diferença como política de significação.
(PEREIRA 2001, p.150-151).
Dado isso, fazemos questão de afirmar, mais uma vez, a importância de se estudar as
questões étnico-raciais no currículo praticado no curso técnico em Secretariado do PROEJA
no CETEP do Sertão Produtivo em Caetité/BA, como possibilidade para contribuir com uma
aprendizagem significativa, com a interculturalidade, além de permitir a mudança de
paradigmas para a construção de uma sociedade mais igualitária e de servir como resposta às
inquietações sociais do povo negro, que vivencia a formação educacional nessa instituição e
quiçá a todo o povo brasileiro.

4.2 A subjugação da identidade para a submissão cultural


Compreendemos aqui algumas formas de subjugação impostas pelos escravocratas ao
povo negro escravizado como o batismo dos escravos antes de chegarem ao Brasil, o “ritual”
da “árvore do esquecimento”, a desagregação dos grupos de parentesco e das etnias, a
imposição de uma nova religião oficial, dentre outras. Nesse cenário de incertezas e dogmas o
povo negro luta para manter as suas raízes culturais, religiosas em uma terra em que o
fenótipo traz na sua essência a brutalidade da escravidão. Igualmente, é preciso considerar que
a África possuía muito antes do processo de exploração europeia uma organização política
com clã, reis e organização social muito anterior ao processo de colonização europeia
empreendido no século XVI e que muitos negros, que foram escravizados nas senzalas
71

brasileiras, eram reis e rainhas na mãe África.


Partindo da premissa que a África antes do processo de escravidão era o “celeiro da
humanidade” Dave (2013) reafirma:
Os Kanem-bornu extraíam cobre e cavalgavam montados em cavalos com
cotas de malhas de ferro. Os oba construíram cidades muradas e organizaram
o seu exército em legiões. Os yoruba faziam esculturas com ouro e bronze e
circulavam gritando “Yorbauuuuba! Somos yoruuuu!’’ uns para os outros
porque gostavam do som da palavra. Todos esses grandes reinos seriam, é
claro, dizimados pela escravidão nos séculos seguintes, e as pessoas se
esqueceram alegremente de que eles existiram. (REAR, DAVE 2013, p.
112).

O autor no fala do século XVI, do comércio de livros em especial do Código


Justiniano13 que era campeão de vendas naquela época. Ressalta a prosperidade e a riqueza
que teve o povo africano que nela viveu antes da dominação, exploração e escravização que
destruiu o império que o povo africano tinha construído com tanto esmero.
Mesmo com todo o infortúnio, o povo africano que imigrou forçadamente para o Brasil
lutou bravamente contra a escravidão e todas as maldades advindas deste processo. Sobre esse
passado escravocrata, Santos (2003, p. 10) reforça que “as pessoas e os grupos sociais têm o
direito de ser iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito de ser diferentes quando a
igualdade os descaracteriza”.
A população negra foi e continua discriminada nos diversos locais e momentos sociais.
Assim sendo, a cultura do racismo está arraigada à sociedade brasileira e, por isso, é
necessário ponderar a respeito da forma de que é tratado esse preconceito por aqueles que
desconhecem a riqueza histórica e a importância das matrizes africanas, o racismo é velado,
lidado de maneira dissimulada. Desse modo, procuram mascarar os fatos e se esconder,
mantendo na indiferença quanto às questões econômicas, políticas e sociais.
Vale ressaltarmos que era na colônia que os negros aprendiam o português e recebiam o
batismo com nomes portugueses, sendo obrigados a se converterem à religião católica. Como
forma de resistências de toda ordem aos mecanismos e práticas de esquecimento e renegação
da identidade que tentaram dominar a mente e o coração do povo negro - escravizados e
traficados para o Brasil, eles utilizavam do sincretismo religioso. Assim, os escravos
adoravam seus orixás por meio dos santos católicos o que originará as religiões afro-

13
O Código Justiniano publicado em 529 em substituição ao Gregoriano, Hermogeniano e Teodosiano é uma
compilação apresentada em 50 tomos sendo divididos em títulos, cada qual dedicado a um objeto do direito. A
legislação moderna de alguns países segue a mesma maneira criando os códigos.
72

brasileiras como a umbanda14 e o batuque15.


Toda essa herança cultural negra presente na sociedade brasileira foi conquistada por
intermédio das lutas, de resistências e, por meio delas algumas conquistas significativas.
Conforme explicita Valente (1995).

Durante a escravidão, manifestações de protesto, como fugas, insurreições,


organizações de quilombos ou demonstrações de resistência cultural foram
constantes no Brasil. [...] Abolida a escravidão, tendo sido lançados a uma
situação de miséria absoluta, os negros procuraram se organizarem [...]
foram várias as associações que surgiram para combater o preconceito e a
descriminação racial. (VALENTE 1995, p.62)
Hoje toda essa organização histórica vai refletir na sociedade e as marcas das
desigualdades econômicas são perceptíveis nos índices do Instituto de Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) quer seja na educação, moradia, distribuição de rendas e mão de obra
ativa e inativa.
Diante disso, os afrodescendentes são os legítimos representantes destes escravizados e
a cada um deles cabe a tarefa de apreciar a recorrente história de discriminação racial e da
desinformação sobre a cultura africana, contudo não se pode partir do senso comum e dizer
que o problema do preconceito da discriminação e da busca por uma sociedade mais justa é
problema do negro, pois é preciso considerar que na sociedade brasileira mesmo aqueles que
trazem na epiderme a cor branca, há na sua ancestralidade as raízes africanas. Embora, eles
tenham se afastado de toda a representação cultural da matriz africana, a sua origem é
irreversível e não é determinada pela cor, mas pelo processo de miscigenação ocorrido no
Brasil que teve na sua formação populacional o negro escravizado, o índio subjugado e o
europeu colonizador, prioritariamente.
Diante desse quadro, encontram-se na sociedade brasileira profundas desigualdades
materiais e simbólicas decorrentes do preconceito e da discriminação racial. Portanto, para
aqueles que buscam uma sociedade mais justa, a defesa do povo negro e indígena é uma
questão de coerência como a ancestralidade. É postura política, haja vista que é necessário
pensar a educação como possibilidade de transformação social e para tanto é necessário ter
uma visão transformadora que desempenhe um papel essencialmente crítico e criativo.
Conforme nos orienta Frigotto e Chiavatta (2003)

14
MUNANGA &GOMES (2006 p.141) (...) a umbanda, tem sido identificada como sendo a religião brasileira,
por excelência, pois, nascida no Brasil, ela resulta do encontro de tradições africanas, espiritas e católicas.
15
CORREA (2007 p.37/44) Batuque é uma Religião Afro-brasileira de culto aos Orixás encontrada
principalmente no estado do Rio Grande do Sul, se estendeu para os países vizinhos tais como Uruguai e
Argentina. Batuque é fruto de religiões dos povos da Costa da Guiné e da Nigéria, com as nações Jêje, Ijexá,
Oyó, Cabinda e Nagô. Cultua doze orixás: Bará, Ogum, Iansã (ou Oiá), Xangô, Oba, Odé/Otim, Ossanha.
Xapanã, Oxum, Iemanjá e Oxalá. São atribuídas características específicas, símbolos, animais sacrificados e
correspondências com santos católicos, resultantes dos mitos relatados nas duas tradições religiosas.
73

[...] a educação é tanto um direito social básico e universal quanto vital para
romper com a histórica dependência científica, tecnológica e cultural do
país, e fundamental para a construção de uma nação autônoma, soberana e
solidária na relação consigo mesma e com outras nações. A educação é,
portanto, ao mesmo tempo determinada e determinante da construção do
desenvolvimento social de uma nação soberana. Além de ser crucial para
uma formação integral humanística e científica de sujeitos autônomos,
críticos, criativos e protagonistas da cidadania ativa, é decisiva, também,
para romper com a condição histórica de subalternidade e de resistir a uma
completa dependência científica, tecnológica e cultural (FRIGOTTO E
CHIAVATTA 2003, p.93-130).

Para romper as contradições históricas e sociais, as escolas brasileiras precisam dar


conta de cumprir a obrigatoriedade da lei e assumir de fato o seu papel social no que diz
respeito à conscientização dos estudantes e professores/as para que reconheçam a presença
negra na sociedade brasileira valorizando a matriz africana já que
o racismo16 entre negros e brancos teve origem no escravismo e foi mantido
nas relações de produção posteriores, adquirindo então novas formas.
Mesmo com as mudanças nos sistemas econômicos, nas relações de trabalho
e nas formas de opressão, verificamos que os negros continuaram e
continuam a ser ideologicamente definidos como “inferiores”. (VALENTE,
1995, p. 14).

Assim, o professor/a que acredita em uma sociedade mais justa e que tenha
compromisso social e político precisa repensar a sua prática pedagógica e, essa reflexão é
essencial para que o mito da democracia racial venha à tona numa retomada pela
ressignificação da identidade negra. Sobre a identidade nos fala Castells (1999, p.22),
“Identidade é o processo de construção de significados com base num atributo cultural, ou
ainda um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, os quais prevalecem sobre outras
fontes de significado”.
Com o propósito de conhecer um pouco mais sobre identidade, Valente (1995) diz que
também sobre essa questão e orienta que mesmo se tratando de cor da pele, a pessoa pode não
se reconhecer dentro de um grupo étnico já que o “conceito de raça é ambíguo’’ ao nascer o
indivíduo não tem a sua identidade formada daí a importância dos espaços sociais para a
formação da identidade. Nesse sentido, ela argumenta que “se raça é um conceito ambíguo e
se indivíduos de cor branca podem estar geneticamente incluídos no grupo de negros, isso não
deveria causar estranheza”. A autora é enfática ao afirmar que

[...] existem brancos que são muito mais conscientes do problema do


racismo no Brasil do que muitos negros e, que por isso estariam dispostos a
lutar junto com o negro contra o preconceito e discriminação racial. Nesse
caso, o aspecto mais importante é o comprometimento com a questão racial.
A cor não é elemento decisivo. (VALENTE 1995, p.46).

16
VALENTE (1995 p.86) racismo: afirmação da superioridade de uma raça sobre outras. Pode tomar diversas
formas, como o preconceito, a discriminação, sendo que a segregação é a mais ostensiva delas.
74

Considerando a fala de Valente (1995) a identidade cultural possui caráter dinâmico,


multidimensional, definida por diversos fatores sociais e subjetivos assim a identidade
cultural não é atributo do fenótipo, mas sim do caráter político social e cultural.
75

5. O CURRICULO ESCRITO DO CETEP NO CURSO TÉCNICO EM


SECRETARIADO PROEJA: O QUE DIZ SOBRE A INSERÇÃO DAS
QUESTÕES ETNICOS-RACIAIS?

Analisa-se neste capítulo o currículo escrito do CETEP no Curso Técnico em


Secretariado - PROEJA para identificar no Projeto Político-Pedagógico da instituição
elementos que indiciam a inserção das questões étnico-raciais, mais especificamente,
particularmente, como se constitui o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana.
O estudo dialoga com as seguintes categorias analíticas ou filosóficas: as relações
étnico-raciais e história e cultura afro-brasileira na escola e a construção e pertencimento da
identidade étnico-racial na escola e na sociedade. Já as categorias empíricas se caracterizam
em: Lei nº 10.639/03; Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o ensino de história e cultura
afro-brasileira e africanas; Matriz Curricular; Projeto Político Pedagógico; Regimento
Escolar; Plano de curso; pasta individual do estudante; currículo praticado e vivido na escola;
percepção dos professores/as e estudantes quanto as questões étnico-raciais e o racismo
institucional e escola.

5.1 O CETEP no território do município de Caetité/Bahia: caracterização do locus de


pesquisa
Caetité, com mais de dois séculos de emancipação política, é conhecida nacionalmente
como a Princesa do Sertão e, também, berço da cultura da região sudoeste, por conta de seus
filhos ilustres, tais como: o grande educador, Anísio Teixeira; o ex-governador da Bahia,
Paulo Souto; o médico e político, César Zama, o professor e jornalista, João Gomes; o ex-
ministro, Prisco Viana, dentre outros.
Além do mais, a Cidade apresenta um passado histórico digno de orgulho representado
pelas dez Comunidades remanescentes de quilombos17 já certificadas, sendo elas símbolo da
luta do povo negro contra a tirania, o poder econômico e político daquelas famílias
escravocratas que tinham, nos casarões e nas senzalas, a construção de um égide de exclusão e
dominação.
A cidade foi pioneira da educação regional com a primeira Escola Normal do sertão
baiano e, ainda hoje, é considerada um polo cultural e educacional, sendo destaque no ensino
o Centro Territorial de Educação Profissional do Sertão Produtivo – sede do Território de
Identidade do Sertão Produtivo.

17
Ministério da Cultura - Palmares – Fundação Cultural
76

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o município de


Caetité localiza-se na latitude: 14º 04' 10" S e longitude: 42º 28' 30’’W, distante 757 km de
Salvador, capital do Estado, com área da unidade territorial (km²) 2.651,537, sítio
montanhoso a 827 metros de altitude, clima ameno, apesar de situada no semiárido. Os
períodos de maior insolação são nos meses de abril e agosto (200 horas) e sua temperatura
média anual é de 21,4°C (média máxima de 26,8°C e mínima de 16,4°C). Localizada na
microrregião da Serra Geral, na zona de transição entre o planalto e a depressão do São
Francisco. Caetité possui uma vegetação diferenciada em função da posição geográfica, em
que se encontram a caatinga e os cerrados, escassamente produtivos, além de capões de mato
espalhados em sítios úmidos, do norte de Minas à Chapada Diamantina. Já pelo lado oeste,
descendo a serrania, situa-se o vale do São Francisco.
Ainda segundo o Censo do IBGE, em 2010, o município possuía 47.524 habitantes com
densidade demográfica hab./km² de 19,45. Em 2016, a estimativa era de 52.696/habitantes, o
que permitiu à cidade pleitear vários projetos e possibilitar o aumento da arrecadação por
meio do Fundo de Participação Municipal (FPM). Devido ao aumento da população, Caetité
teve um crescimento na arrecadação, passando de 2,0 para 2,2. Aqui, é preciso considerar que
esse número pode ser alterado para mais em função da migração, já que o município é polo de
atração mineral desde o período colonial, com a exploração da ametista no Distrito de
Brejinho das Ametistas, atualmente os garimpeiros estão em sua maioria associados à
Cooperativa Mista Agropecuária e de Mineração de Brejinho das Ametistas – COOAMAC.
Na década de 1970, com a descoberta do urânio, a cidade recebeu um número
significativo de pessoas para trabalharem na exploração mineral. Os imigrantes fixaram
residência principalmente na sede, já que a mineração se enquadra como atividade organizada
em turnos e, assim, os trabalhadores podiam residir na cidade e se deslocarem para o local de
trabalho no expediente previamente planejado. Na ocasião, esses imigrantes foram atraídos
pela oferta de emprego ou por promessas de uma vida melhor.
Cabe ressaltar aqui que, historicamente, no Brasil as áreas de mineração sempre foram
consideradas como eldorados ou como promessas de riquezas, que nem sempre eram
cumpridas. Também, vale considerar que, o município, ao possuir a única mina de urânio em
produção/exploração no Brasil, já detinha em seus quadros uma parcela significativa de
trabalhadores/as mineradores/as dos diversos locais do país e que chegaram à cidade em
virtude do fechamento da mina em Poços de Caldas, no Estado de Minas Gerais. A estatal-
explora o urânio no território de Caetité, considerado um polo mineral e energético- faz parte
77

das Indústrias Nucleares do Brasil (INB), a jazida ferrífera da companhia mineradora indiana
instalada em joint venture18, a Bahia Mineração Ltda.
A região abriga, também, a instalação do terceiro maior complexo gerador de energia
eólica do Brasil. O depósito de ferro encontrado no município, por exemplo, possui de 4 a 6
bilhões de toneladas e tem uma produção anual estimada em cerca de 12 000 000 de toneladas
anuais.
Caetité, atualmente, recebe uma parcela significativa de imigrantes, por vez temporária,
mas muitos deles se encantam com a vida calma do lugar e fixam residência. É importante
destacar aqui que grande parte desses migrantes, oriundos de diversas regiões do país,
afastaram-se do processo educacional há algum tempo e chegaram à cidade em busca de
trabalho ou já empregados. Desse modo, na sua maioria, conhecem o ofício profissional, mas
ainda assim buscam certificações. Ou seja, o indivíduo tem conhecimento técnico/prático, no
entanto não possui o conhecimento teórico e, por consequência, o diploma. Por esse motivo,
ele ingressa no CETEP em busca do ensino profissionalizante, por meio do PROEJA, que
pode oportunizar o seu aprimoramento pessoal e profissional.
O nascimento do Centro Territorial de Educação Profissional do Sertão Produtivo tem
como marco o período de 2008 a 2011, quando o governador Jacques Wagner propôs uma
nova divisão territorial do Estado da Bahia, por meio do Plano Plurianual 2008/2011. Nesse
primeiro momento, o Estado foi dividido em 26 territórios de identidade. Segundo o discurso
oficial, para realizar a divisão territorial no Estado da Bahia, considerou-se o sentimento de
pertencimento, de identidade e das questões socioeconômicas da população de cada território.
O governo defendeu que essa divisão possibilitaria a construção de políticas de planejamento
e estratégias para atender a população (PERAFÁN, 2013).
O território emerge a partir das relações sociais, relações que não são neutras
ou livres de tensões e conflitos, o que nos leva a afirmar que tal emergência
é produto de relações do poder exercidas em vários níveis da cadeia social.
O poder manifesta-se nas diferentes formas de ocupação e uso dos espaços
regionais e locais. Podemos dizer que o território é a expressão política de
organização desses espaços para alcançar objetivos comuns e que nele se
evidenciam mobilizações concretas frente a finalidades concretas. Nesta
construção são definidos limites que, em vez de isolar os territórios,
deveriam favorecer a necessária interação entre eles (PERAFRAN 2013,
p.9).

Entretanto, considera-se que uma das características marcantes dos Territórios de


Identidade organizados são as disparidades econômicas. Assim Perafran (2013) orienta acerca
de que

18
Termo inglês que significa empreendimento conjunto e que é utilizado para definir uma associação de
empresas que pode ser definitiva ou não, com fins lucrativos e com o objetivo de explorar determinado negócio
sem perda de personalidade jurídica.
78

[...] os territórios vão além de um espaço geográfico delimitado por regras


político-administrativas e representam nosso espaço de vida. Ele é um
espaço construído pelas relações que estabelecemos e a partir das quais é
possível alcançar nossos objetivos, assim como contribuir com os objetivos
dos outros (PERAFRAN 2013, p.8).
Atualmente, criou-se mais um Território de Identidade denominado Costa do
Descobrimento. Assim, passando de 26 para 27 Territórios, conforme o mapa abaixo:

Figura 1- Territórios de Identidade da Bahia

Fonte: CEDETER, 2011.

O locus da pesquisa é o Centro Territorial de Educação Profissional - sede do Sertão


Produtivo, que se encontra dentro da Serra Geral. Podendo ser considerado como um
elemento de ligação entre a Chapada Diamantina e a Serra do Espinhaço, composto por 19
municípios. São eles: Brumado, Caculé, Caetité, Candiba, Contendas do Sincorá, Dom
Basílio, Guanambi, Ibiassucê, Ituaçu, Iuiú, Lagoa Real, Livramento de Nossa Senhora,
Malhada de Pedras, Palmas de Monte Alto, Pindaí, Rio do Antônio, Sebastião Laranjeiras,
Tanhaçu e Urandi. Em 17/04/2009, o Centro recebe a autorização para funcionamento por
meio da Portaria Nº 8677/09 – Diário Oficial de 17/04/2009.
79

Atualmente, o Centro possui 712 estudantes devidamente matriculados nos turnos


matutino, vespertino e noturno, sendo 239 estudantes sexo masculino e 473 estudantes do
sexo feminino e atende todo o Território do Sertão Produtivo, oferecendo cursos
profissionalizantes na área de mineração bem como nas necessidades da cadeia produtiva da
população que convive com o semiárido nordestino. Este estudo envolve gestores,
professores/as e estudantes participantes do curso Técnico em Secretariado do PROEJA,
terceiro módulo, noturno. Abaixo, o mapa do Território do Sertão Produtivo.

Figura 2: Mapa do Território do Sertão Produtivo

Fonte: Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), 2012. Disponível em


www.sei.ba.gov.br. Acesso em 03 de junho de 2015.

O Sertão Produtivo se destaca na Bahia como zona de maior exploração de minérios


do Estado, como urânio, ferro, manganês, mármores, granitos diversos, pedra-giz, magnesita e
talco. Nesse ponto, encontrou-se semelhança entre os municípios de Caetité e Brumado, que
se tornaram polos de desenvolvimento mineral e, por isso, impulsionaram a abertura de
indústrias dos ramos. Nesse cenário, o CETEP responde às demanda por mão de obra
especializada de modo que o cotidiano em sala de aula demonstrou a existência de uma
tendência para a construção de novas metodologias de ensino e de busca de inovações que
80

visam superar as práticas voltadas à repetição dos conteúdos, tornando assim a instituição um
lugar de referência para a formação do estudante-trabalhador.

5.2 A organização educacional do CETEP e as particularidades da proposta de ensino


técnico do PROEJA
De forma generalizada, organizaram-se os Centros a partir da nova divisão territorial do
Estado da Bahia em consonância com o Conselho Nacional de Educação (CNE) e se
dividiram em 10 Eixos Tecnológicos. São eles: ambiental; saúde e segurança; controle e
processos industriais; gestão e negócios; hospitalidade e lazer; informação e comunicação;
infraestrutura; produção cultural e design; produção industrial; recursos naturais.
Após a divisão em eixos, o Ministério da Educação (MEC) apresentou mudanças e um
novo catálogo já com os ajustes sugeridos para implantação nos Centros e posterior execução
nos cursos técnicos profissionalizantes. Esses catálogos trouxeram o Núcleo Politécnico
Comum e os Eixos Tecnológicos com a justificativa de tornar o processo educativo mais
sintonizado e, ainda, oferecer um melhor detalhamento nas atividades do perfil profissional;
possibilidades de temas para serem discutidos na formação, tendo em vista as oportunidades
de atuação profissional e as orientações quanto à infraestrutura recomendada e a carga horária
mínima para a formação profissional.
Diante do exposto, o MEC considera as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Profissional de Nível Tecnológico. Assim, o CETEP oferece os cursos Técnicos
Profissionais de forma crítica, buscando sempre a melhoria nos padrões de qualidade de
ensino e aprendizagem, a fim de possibilitar uma visão ampla e reflexiva das relações entre a
sociedade, trabalho, natureza, cultura, tecnologia e ciência. Também, de maneira sólida no
sistema de valores comprometido com as transformações sociais e a emancipação humana.
Para tanto, a Educação Profissional Técnica de Nível Médio foi incluída pela Lei nº 11.741,
de 2008, que alterará os dispositivos da Lei nº 9394 de 20 de dezembro de 1996, para
redimensionar, institucionalizar e integrar as ações da Educação Profissional Técnica de Nível
Médio, da Educação de Jovens e Adultos e da Educação Profissional e Tecnológica e,
portanto, a Lei Federal disciplinará a Educação de Jovens e adultos, trazendo as seguintes
alusões:

Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não
tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio
na idade própria.
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos
adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades
81

educacionais apropriadas, consideradas a características do alunado, seus


interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.
§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do
trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si.
§ 3o A educação de jovens e adultos deverá articular-se, preferencialmente,
com a educação profissional, na forma do regulamento. (Incluído pela Lei nº
11.741, de 2008)
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que
compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao
prosseguimento de estudos em caráter regular.
§ 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:
I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze
anos;
II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos.
§ 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios
informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames.

Traz ainda o Decreto nº 5.840/2006, no âmbito da Educação Profissional integrada com


a Educação Básica na modalidade PROEJA que determina o

Art. 1º Fica instituído, no âmbito federal, o Programa Nacional de Integração


da Educação Profissional à Educação Básica na Modalidade de Educação de
Jovens e Adultos - PROEJA, conforme as diretrizes estabelecidas neste
Decreto.
§ 1º O PROEJA abrangerá os seguintes cursos e programas de educação
profissional:
I - formação inicial e continuada de trabalhadores; e
II - educação profissional técnica de nível médio.
§ 2º Os cursos e programas do PROEJA deverão considerar as características
dos jovens e adultos atendidos, e poderão ser articulados:
I - ao ensino fundamental ou ao ensino médio, objetivando a elevação do
nível de escolaridade do trabalhador, no caso da formação inicial e
continuada de trabalhadores, nos termos do art. 3º, § 2º, do Decreto nº 5.154,
de 23 de julho de 2004; e
II - ao ensino médio, de forma integrada ou concomitante, nos termos do art.
4o, § 1o, incisos I e II, do Decreto nº 5.154, de 2004.
§ 3º O PROEJA poderá ser adotado pelas instituições públicas dos sistemas
de ensino estaduais e municipais e pelas entidades privadas nacionais de
serviço social, aprendizagem e formação profissional vinculadas ao sistema
sindical (“Sistema S”), sem prejuízo do disposto no § 4º deste artigo.
§ 4º Os cursos e programas do PROEJA deverão ser oferecidos, em qualquer
caso, a partir da construção prévia de projeto pedagógico integrado único,
inclusive quando envolve articulações interinstitucionais ou
intergovernamentais.

Ainda atendendo às determinações e às bases legais para o Ensino Profissional, faz-se


necessário considerar as particularidades do PROEJA, um programa do MEC, em parceria
com a Secretaria de Estado da Educação, fundamentado pelo Decreto n° 5154 de 23 de julho
de 2004 e instituído pelo Decreto n° 5840/2006. Tais documentos orientam, em um contexto
de embates, a superação histórica da dicotomia entre formação profissional e educação geral.
82

O PROEJA é, pois, uma proposta constituída na confluência de ações


complexas. Desafios políticos e pedagógicos estão postos e o sucesso dos
arranjos possíveis só materializar-se-á e alcançará legitimidade a partir da
franca participação social e envolvimento das diferentes esferas e níveis de
governo em um projeto que busque não apenas a inclusão nessa sociedade
desigual, mas a construção de uma nova sociedade fundada na igualdade
política, econômica e social; em um projeto de nação que vise uma escola
vinculada ao mundo do trabalho numa perspectiva radicalmente democrática
e de justiça social (BRASIL, 2007 p. 08).
Em consonância com as Diretrizes Curricular, busca-se uma identidade para a Educação
de Jovens e Adultos uma vez que os sujeitos por ela atendidos se constroem no querer e no
desejo que os impulsionam para adquirirem novos conhecimentos e significar tantos outros
que já possuem. Com esse intuito, considera-se o que traz o art.5º do parágrafo único e os
incisos I e II sobre o modelo pedagógico a ser desenvolvida na Educação de Jovens e Adultos:

Art. 5º Os componentes curriculares consequentes ao modelo pedagógico


próprio da educação de jovens e adultos e expressos nas propostas
pedagógicas das unidades educacionais obedecerão aos princípios, aos
objetivos e às diretrizes curriculares tais como formulados no Parecer
CNE/CEB 11/2000, que acompanha a presente Resolução, nos pareceres
CNE/CEB 4/98, CNE/CEB 15/98 e CNE/CEB 16/99, suas respectivas
resoluções e as orientações próprias dos sistemas de ensino.
Parágrafo único. Como modalidade destas etapas da Educação Básica, a
identidade própria da Educação de Jovens e Adultos considerará as
situações, os perfis dos estudantes, as faixas etárias e se pautará pelos
princípios de equidade, diferença e proporcionalidade na apropriação e
contextualização das diretrizes curriculares nacionais e na proposição de um
modelo pedagógico próprio, de modo a assegurar:
I - quanto à equidade, a distribuição específica dos componentes curriculares
a fim de propiciar um patamar igualitário de formação e restabelecer a
igualdade de direitos e de oportunidades face ao direito à educação;
II- quanto à diferença, a identificação e o reconhecimento da alteridade
própria e inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da
valorização do mérito de cada qual e do desenvolvimento de seus
conhecimentos e valores. (BRASIL, 2000, p.1)
O PROEJA tem a proposta baseada na formação dos estudantes conforme as
particularidades da Educação de Jovens e adultos para que o ensino atenda às demandas do
mercado de trabalho, mas que também possibilite a formação do indivíduo a fim de que haja o
exercício pleno da cidadania e garanta o direito fundamental do estudante - a escolarização. O
projeto educacional do PROEJA traz como documento básico

[...] a concepção de uma política, cujo objetivo da formação está


fundamentado na integração de trabalho, ciência, técnica, tecnologia,
humanismo e cultura geral, pode contribuir para o enriquecimento científico,
cultural, político e profissional das populações, pela indissociabilidade
dessas dimensões no mundo real. Ademais, essas dimensões estão
estreitamente vinculadas às condições necessárias ao efetivo exercício da
cidadania (BRASIL, 2007, p. 25).
83

A proposta para a Educação Profissional considera que a escolha da profissão precisa


ser um processo que envolva diferentes conhecimentos e vivências e/ou dinâmicas de
autoconhecimento capaz de construir no educando a noção de sujeito, a fim de se erguer a
própria história. Nesse sentido, é necessário que o CETEP proporcione um diálogo por meio
das atividades pedagógicas, oportunizando aos estudantes a divisão das dúvidas, a ampliação
da visão e a reflexão sobre o mundo ocupacional, deixando o espaço para a construção da
identidade profissional. Daí a importância da Lei nº 10.639/03 neste contexto, já que é preciso
reconstruir a história de atores sociais que, historicamente, tiveram menos poder na sociedade
e assim menos possibilidades de decisão nos processos coletivos.
Convém mencionar que a maioria dos estudantes atendidos no PROEJA no curso
técnico em Secretariado é, principalmente, do sexo feminino. Crê-se ser devido às questões de
gênero, haja vista que, no Brasil, se encontram ainda fortes resquícios de uma sociedade
patriarcal que impede as práticas educativas para as meninas. Também faz parte dessa
clientela a população negra que foi excluída das escolas por questões econômicas ou por não
se identificarem com as propostas pedagógicas de maneira eurocêntrica, em que a cor branca
prevalece à cor negra. Assim, as mulheres e o povo negro constituem a maioria dos estudantes
atendidos/as nessa modalidade de ensino. Sobre as mazelas do analfabetismo. Couto nos fala
que

[...] o analfabetismo é o cancro que aniquila o nosso organismo, com suas


múltiplas metástases, aqui a ociosidade, ali o vício, além o crime. Exilado
dentro de si mesmo como em um mundo desabitado, quase repelido para
fora da espécie pela sua inferioridade, o analfabeto é digno de pena e a nossa
desídia indigna de perdão enquanto não lhe acudirmos com o remédio do
ensino obrigatório (COUTO, 1933, p.190).
Dessa maneira, é imprescindível diminuir as desigualdades sociais por meio das
políticas de inclusão e da constituição de ações que envolvam uma educação integral, visto
que o estudante que busca a educação profissional está desejando a elevação de escolaridade e
a dignidade pessoal. Por conseguinte, Laffin (2012) considera importante

[...] reconhecer que os jovens e adultos vivenciam cotidianamente


desigualdades sociais perante o mundo não significa acreditar em um
determinismo causal de insucesso na escola. No caso da EJA, não pode
significar uma fragilização e aligeiramento da escolarização e da relação
com o conhecimento (LAFFIN 2012, p. 225).
Ademais, é preciso que os professores/as do CETEP desenvolvam alternativas em
consonância com as Diretrizes Curriculares e a Lei nº 10.639/03 para que possibilite
considerar os saberes implícitos e que, por sua vez, as experiências trazidas pelos estudantes e
professores/as sejam consideradas e incluídas nas proposições curriculares e nas práticas
pedagógicas. Laffin (2012, p. 221) fala acerca dos tempos escolares e sinaliza quanto à
84

“necessidade de flexibilização, tanto curricular como de organização e validação dos tempos


escolares”.
Além de tudo isso, a África é um importante campo de pesquisa para se compreender a
história da humanidade. Por esse motivo, torna-se necessário eliminar e ou minimizar o foco
eurocêntrico da educação brasileira, contemplando as diversidades culturais, raciais, sociais e
políticas nos currículos escolares brasileiros.

5.3 A matriz curricular


O currículo escrito contribui, historicamente, para organizar as atividades educativas nas
escolas. Portanto, podemos dizer que a identidade social e individual dos estudantes pode ser
construída tendo o currículo como base, pois ele “[...] é trajetória, percurso. O currículo é
autobiografia, é a nossa vida, o curriculum vitae: no currículo forja‐se a nossa identidade […]
O currículo é documento de identidade.” (SILVA, 2003, p. 150). E ainda diz Silva (2002) que
“[...] o currículo está inextricavelmente, centralmente, vitalmente envolvido naquilo que
somos, naquilo que nos tornamos, na nossa identidade, na nossa subjetividade” (SILVA,
2002, p. 15).
Buscamos analisar o currículo escrito por tratar-se de uma fonte de pesquisa documental
importante. Quanto à organização no currículo escrito, identificam-se três eixos temáticos e
neles se contemplam: a) as disciplinas teóricas e práticas relacionadas ao ensino médio e ao
ensino profissional; b) os elementos de integração do conhecimento como: Estudos
Orientados e, c) o estágio que está dividido em estágio de observação e estágio de
participação.

Empenhamos para compreender o que está presente no currículo em relação às questões


étnico-raciais e buscar a inclusão é partir do pressuposto que nos aponta Freire (2001) ao
alertar que
[...] a reformulação do currículo não pode ser algo feito, elaborado, pensado
por uma dúzia de iluminados cujos resultados finais são encaminhados em
forma de ‘pacotes’ para serem executados de acordo ainda com as instruções
e guias igualmente elaborados pelos iluminados. A reformulação do
currículo é sempre um processo político-pedagógico e, para nós,
substantivamente democrático. (FREIRE, 2001, p. 24).
Assim, defendemos que o currículo vai orientar as formulações teóricas e cumprir a
proposta de ensino no âmbito da oficialidade, ou tornar-se uma possibilidade de resistência e
conquista da identidade no âmbito escolar. Nesse sentido, analisamos, na sequência, os
elementos do Projeto Político Pedagógico e a Lei n° 10.639/03.
A Matriz curricular proposta pela SUPROF para o Curso Técnico em Secretariado na
Modalidade PROEJA médio como eixo Gestão e Negócio (em anexo) está organizada em
85

cinco módulos com respectiva carga horária, de forma a contemplar a Base Nacional Comum
(BNC), Formação Técnica Geral (FTG), Formação Técnica Específica (FTE). Ressalta-se que
os Estudos Orientados (OE), Estudos Interdisciplinares (EI) e Estudos Complementares (EC);
os Estudos Orientados (OE) são horas extraclasse, destinadas a realização de atividades e
relacionadas aos três componentes curriculares, com objetivo de ampliar os conhecimentos
práticos e teóricos, a fim de possibilitar a realização de roteiro de estudos, visitas técnicas,
participação em seminários, congressos, encontros e feiras.
Já os Estudos Interdisciplinares (EI) são horas semanais presenciais e adicionais
extraclasse, que tem o intuito de integrar o currículo por meio de práticas pedagógicas de
pesquisa e mediante a iniciação científica, a orientação profissional, a intervenção social, o
desenvolvimento de tecnologias sociais, atividades de campo e visitas técnicas e ainda cos
Estudos Complementares (EC) apenas aos/às estudantes que necessitam rever os
conhecimentos que não lograram aprovação em qualquer um dos módulos ou semestre para
cumprirem da carga horária deficitária de algum componente Curricular da BNC, FTG e ou
FTE.
O Estágio que é dividido em dois momentos como:
 Estágio de observação trata-se da etapa inicial em que o estudante observa indaga
questiona as rotinas, os procedimentos e as práticas relacionadas ao trabalho técnico e ao
Estágio de participação, sendo na etapa conclusiva o momento em que o estudante vivência
momentos e práticas reais do trabalho, supervisionado e orientado/a por um professor/a. Este
estágio ocorre em empresas públicas e privadas, ONGS, Cooperativas e Associações.
 O estágio de participação é caracterizado como estágio social quando se realiza
em comunidades, assentamentos e/ou em movimentos sociais.
O currículo escrito tem integralização de dois anos e seis meses, com carga horária
formativa de 2.620 horas acrescida do estágio com 400 horas, totalizando 3.020 horas. Ele
leva a uma reflexão sobre os limites e as possibilidades de implantação da Lei nº 10.639/03 na
escola. Na matriz curricular do Curso técnico em Secretariado, ele apresenta-se de maneira
explícita na formação profissional para o mundo do trabalho, respeitando o núcleo comum, ou
seja, o ensino médio, mas não contempla a sanção da Lei nº 10.639/03 que há 13 anos alterou
a Lei nº 9394/96 acrescentando os seguintes arts: 26 A, 79 A, 79B.
Tendo em vista que os documentos legais precisam ser estudados, uma vez que
possibilita a sua inserção ao currículo escrito do Centro como forma de garantir ao currículo
praticado a construção de uma educação antirracista por meio de uma releitura sobre o
continente e o povo africano, na busca da superação do racismo para a construção da
86

cidadania. Inserir à Lei nº 10.639/03 as concepções e perspectivas para a Educação de Jovens


e Adultos é atender as pluralidade das vivências humanas.
O principal módulo pesquisado e analisado é o que se refere ao módulo III que possui
uma carga horária de 620 horas e oferece as seguintes disciplinas: Geografia, Língua
Portuguesa e Redação, Biologia, Física e Matemática. A Formação Técnica Comum é
composta por meio ambiente, saúde e Segurança do Trabalho, Sociologia, Organização dos
Processos de Trabalho, Formação Técnica Geral (FTG) Biologia, Filosofia, Ética e Direito do
Trabalho Metodologia do trabalho científico, Informática- Inclusão Digital Sociologia –
Organização dos Processos de Trabalho e Sociologia – Organização Social do Trabalho e a
Formação Técnica Específica por Fundamentos de Operações, Contabilidade Geral,
Organização e Técnicas Secretariais, Estudos interdisciplinares e Estágio de Participação.
Os Estudos Orientados (EO) permeiam todas as atividades. Godos (1995) sintetiza o
currículo escrito:
[...] em síntese, o currículo escrito nos proporciona um testemunho, uma
fonte documental, um mapa do terreno sujeito a modificações; constitui
também um dos melhores roteiros oficiais para a estrutura institucionalizada
da escolarização. (GOODSON, 1995, p. 21).

O posicionamento de Goodson (1995) faz referência ao testemunho como fonte


documental e constata que o documento denominado pela SUPROF como Matriz curricular
2014, não atenta para a determinação do Regimento Escolar e para as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação das Relações étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-brasileira e Africana. Nesse sentido, afirmamos que o currículo escrito não apresenta
claramente a contemplação da Lei nº 10.639/03 e a determinação da LDBEN não está sendo
cumprida. No currículo escrito e nos programas e ementas analisadas não se encontra
nenhuma inferência sobre a questão do povo negro, parece que a determinação legal fica em
segundo plano.
Ponderamos que a invisibilidade apresentada do currículo escrito corrobora para que no
currículo praticado as questões fiquem esquecidas. Tais constatações leva a perquirir o
currículo escrito e a Lei n° 10.639/03 homologada, estabelecendo uma relação entre o veto e o
cenário que ora apresenta no CETEP.
A Lei nº 10.639/03 no projeto inicial determinava que as disciplinas História do Brasil e
Educação Artística no ensino médio dedicam-se pelo menos a dez por cento (10%) do
conteúdo programático anual ou semestral à temática africana e à afro-brasileira. Entretanto, a
proposta foi considerada inconstitucional e rejeitada nos despachos da Presidência da
República. Esse veto não traz a obrigatoriedade de dedicação em porcentagem assim como
87

não fica determinado no currículo escrito; essa brecha leva as escolas e ou os/as
professores/as a discutirem, a focarem a Lei e/ou as questões étnico-raciais, apenas no dia 20
de novembro e não se pode afirmar que a determinação da LDBEN não está sendo
contemplada. Conforme veto abaixo:
O referido parágrafo [relativo à dedicação de dez por cento de seu conteúdo
programático à temática mencionada] não atende ao interesse público
consubstanciado na exigência de se observar, na fixação dos currículos
mínimos de base nacional, os valores sociais e culturais das diversas regiões
e localidades de nosso país. (BRASIL, 2003b, p. 01).

Ainda, como entrave para a efetivação da Lei nas escolas, lê-se o segundo veto
que a lei nº 9.394, de 1996, não disciplina e nem tampouco faz menção, em
nenhum de seus artigos, a cursos de capacitação para professores. O art. 79-
A, portanto, estaria a romper a unidade de conteúdo da citada lei e,
consequentemente, estaria contrariando norma de interesse público da Lei
Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1988, segundo a qual a lei não
conterá matéria estranha a seu objeto. (BRASIL, 2003b, p. 01)

Compreendemos que os dois vetos trazem em seu bojo uma essência forte para a não
efetivação da Lei. O primeiro é a não determinação quantitativa que traz a inteira justeza
quanto à quantidade dos conteúdos que deveriam ser trabalhados em sala de aula. O segundo
está concomitantemente ligado ao primeiro já que não há uma definição de percentual dos/das
professores/as que justificam ainda a ausência da formação profissional.
Esse fato reitera os dados que se apresentará na continuidade deste texto ao se tomar
os relatos dos/das professores/as pesquisados/as em que há concordância explícita quanto à
necessidade de capacitação profissional, já que o desconhecimento do tema é um entrave para
a inserção dos conteúdos programáticos e das questões étnico-raciais.

5.4 O Projeto Político Pedagógico e o Regimento Escolar do CETEP e a Lei nº 10.639/03

Nesse sentido analisamos o parecer das Diretrizes Curriculares Nacionais para a


Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e
Africana. Resolução CNE/CP nº 1/2004, publicada no Diário Oficial da União (DOU) em
22/6/2004, instituíram-se as Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação das relações
Ètnico-Raciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana.
Para análise do Regimento Escolar realizamos um trabalho investigativo a cada
momento procurávamos não nos deixar levar pela empolgação ou concepção preestabelecida,
portanto consideramos que o uso das fontes documentais tem uma história que varia no tempo
e no espaço, mas também uma identidade e ou uma relação direta com minha trajetória
88

profissional na escolar. Nesse sentido difícil foi afastar do pessoal para cumprir o objetivo
proposto e a dimensão do nosso interesse.
O Regimento Escolar é instituído para as unidades escolares que integram o Sistema
Público Estadual de Ensino conforme a Portaria nº 5.872, de 15 de julho de 2011 assim
sendo da Secretaria da Educação em consonância com:
[...] o disposto na Lei Federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, no
§2º do art. 3º da Resolução CEE nº 127/1997, no art. 2º da Resolução
CEE nº 163/2000 e demais Resoluções e Pareceres dos Conselhos
Nacional e Estadual de Educação, leis e atos normativos
complementares, aplicáveis à Educação, atos administrativos do Poder
Público Estadual, por seus órgãos próprios. [...] Parecer CEE Nº.
82/2011, publicado no DOE em 19 e 20/03/2011. (REGIMENTO
ESCOLAR 2011 p.01).

Constituem-se como um norteador das atividades educacionais na escola, o Regimento


Escolar engloba todas as atividades a ser desenvolvidas na escola considera sua organização
de caráter, administrativo-financeiro, pedagógica versa sobre os Sistemas de Avaliação
Institucional e da Avaliação da Aprendizagem. No capitulo I no Regimento Escola orienta
sobre o Projeto Politico Pedagógico, Art. 32 destaca que:

O projeto político-pedagógico é o instrumento indispensável à


organização e funcionamento da unidade escolar, expressando a sua
identidade e definindo as bases políticas, filosóficas e pedagógicas que
fundamentam a sua ação educativa no exercício da sua autonomia
pedagógica e administrativa, com vistas à garantia do padrão de
qualidade no processo educativo. (Regimento Escolar 2011, p.19).

Para a fundamentação curricular Seção II informa que:


Art. 34. Os currículos da Educação Básica compreendem os processos
educacionais, sejam os do sistema regular da educação infantil, do
ensino fundamental e do ensino médio, sejam os das modalidades do
âmbito da educação especial, educação de jovens e adultos, educação
do campo, educação quilombola, educação escolar indígena, educação
à distância e, também, os da educação profissional, na forma definida
pelos instrumentos legais vigentes.

Art. 35. Os currículos referidos no artigo anterior terão sua


organização construída a partir das orientações postas pelas diretrizes,
parâmetros e referenciais curriculares de nível nacional e estadual,
bem como a partir do Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos de
Nível Médio. (Regimento Escolar 2011, p.20).

Na Seção III que versa sobre Estrutura, Fundamentação e Composição Curricular da


Educação Profissional diz:
89

Art. 36. A estrutura, fundamentação e composição curricular da Educação


Profissional serão disciplinadas mediante ato da Secretaria da Educação em
conformidade com as normas expedidas pela União, o Conselho Nacional de
Educação e o Conselho Estadual de Educação. (Regimento Escolar 2011,
p.20).

No capítulo III aborda o planejamento de ensino e informa que:

Art. 37. O planejamento de ensino compreende a definição pelos professores


dos conteúdos que serão trabalhados por unidade didática, das habilidades a
serem desenvolvidas pelos estudantes, dos objetivos e metas a serem
alcançados no processo de ensino e de aprendizagem, dos nexos
interdisciplinares e as correspondentes interfaces entre as disciplinas, dos
recursos didáticos, dos procedimentos de avaliação, incluída a recuperação
paralela, e das referências bibliográficas por cada componente curricular.
(Regimento Escolar 2011, p.20).

O Regimento Escolar no capítulo I das disposições gerais traz explicito as questões


étnico-raciais no título IV ao enfatizar sobre as normas de convivência escolar nos orienta
que:
Art. 60. As normas de convivência escolar orientam as relações
profissionais e interpessoais que ocorrem na unidade escolar e pautam-se em
princípios de responsabilidades individual e coletiva, de solidariedade, de
direito, de ética, de pluralidade cultural, de autonomia e gestão democrática,
sem prejuízo do disposto nas legislações específicas atinentes aos direitos e
deveres dos componentes da direção da unidade escolar, professores,
servidores administrativos, bem como da criança e do adolescente e seus
pais ou responsáveis. (Regimento Escolar 2011, p.24).

Ainda no capítulo I no Art. 60 que fala sobre as normas de convivência e no capítulo II


que versa sobre o corpo docente é vedado aos professores/as e ao corpo técnico-pedagógico,
além do descumprimento do artigo e do paragrafo único do inciso II abaixo apresentado: II - o
dever de não discriminação por raça, condição social, gênero, orientação sexual, credo ou
ideologia política. (REGIMENTO ESCOLAR, 2011, p.25).
No capítulo I no Art. 60 fala sobre as normas de convivência e também no capítulo II
vai versar sobre o corpo docente encontramos aqui a menção sobre a discriminação racial. E
também considera o Projeto Político Pedagógico como um instrumento indispensável à
organização e funcionamento da unidade escolar.
Vale mencionar que o Regimento Escolar é um instrumento que possibilita o dialogo
entre a Secretaria da Educação com gestores escolares e especialistas para organizar a escola
as questões gerencias, as normas pedagógicas, considerando os direitos e deveres dos sujeitos
utilizados em todas as unidades de ensino no Estado de Bahia contemplando o ensino
fundamental, médio e o ensino técnico profissional. Ele apresenta pontualmente as questões
étnico raciais, entretanto quando faz menção ao currículo, informa que cabe aos
90

professores/as a escolha dos conteúdos a serem ministrados em sala de aula, informa apenas
sobre nexos interdisciplinares. Afirma que o currículo deve estar em consonância com as
diretrizes, parâmetros e referenciais curriculares de nível nacional e estadual.
Procuramos analisar o Projeto Politico Pedagógico (PPP), considerando a Lei
n°10.639/03 e a determinação da LDBEN, buscando ainda a consonância com a determinação
do Regimento Escolar. Elege-se como categoria para a análise a identidade e o pertencimento
e nível de elucidação sobre as questões étnico-raciais.
Na apreciação do PPP mostra que ele tem caráter didático, quando explica a forma
como cada atividade deverá ser desenvolvida, além de possuir o caráter pedagógico que busca
orientar toda a equipe escolar sobre quais e quando cada atividade deverá ser realizada e ainda
vem referendando o pluriculturalismo, considerando importante para a realização de
atividades pedagógicas. Apresenta uma proposta filosófica clara, visando atender a demanda
do mundo do trabalho e sobre a fundamentação teórica divulga o conhecimento científico.
Além disso, adota como referência teórica para o seu trabalho pedagógico a Teoria
Interacionista com a abordagem socioconstrutivista.
Reflete-se, então, que em relação à organização e à distribuição das atividades
pedagógicas o PPP prima pela fundamentação teórica de maneira detalhada em que todas as
ações a serem desenvolvidas no CETEP estão planejadas e ordenadas. Quanto aos aspectos
sociológicos as atividades estão pautadas no respeito aos direitos humanos e a inclusão social.
Contudo, durante a análise não se encontra nenhuma alusão à Lei n° 10.639/03, também
não se mencionam as alterações propostas dos artigos da LDBEN. Nos anexos do PPP,
encontra-se o plano de ação datado de 16/01/2009 dentre as propostas de trabalho elencadas
faz-se menção acerca da Semana da Consciência Negra:
Elaboração, durante a jornada pedagógica de projetos contextualizados que
abram espaços para que os alunos possam desenvolver e apresentar
habilidades diversas, garantindo a valorização da cultura local, como: Mostra
de Conhecimento, Gincana Estudantil, Semana da Consciência Negra, Forró
Modelo, Caetité: memórias e outras histórias e outros. (PPP, 2011 p. 55
(grifo acrescentado).

Nas discussões apresentadas no PPP do CETEP, fica claro o respaldo da Constituição


Federal de 1988 e também na Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDBEN. No entanto, o
Centro não se refere aos artigos 26-A, 79-A e 79-B, portanto sinaliza-se a necessidade de
adequação do PPP do Centro e a alteração do plano de ação que traz como proposta a
elaboração de projeto durante a semana de Consciência Negra.
91

Ressaltamos que consideramos a luta dos movimentos sociais e dos militantes da causa
negra quanto à importância da semana da consciência negra, entretanto enfatizamos quanto à
adequação da Lei nº 10.639/03 no currículo escrito e praticado na escolar.
Certificamos que, a partir dos anexos apresentado no PPP do CETEP que ele foi
construído coletivamente em 2011, estando em conformidade com Regimento Escolar que
considera a importância da participação de todos para a sua elaboração.
A Matriz curricular Curso do Técnico em Secretariado na Modalidade PROEJA médio
como eixo Gestão e Negócio, do CETEP é proposta pela SUPROF o módulo III foi
pesquisado e analisado considerando as categorias de análises e em consonância com a Lei n°
10.639/03, identidade e pertencimento. Para tanto realizamos uma leitura minuciosa,
transcrevendo para o diário de bordo os dados observados.
Durante a pesquisa realizada na Secretaria da Escola, analisamos as pastas individuais
dos estudantes de uma turma composta por 14 estudantes devidamente matriculados sendo 10
alunas e 04 alunos, 09 negros e 05 brancos. Considerou-se o fenótipo, a partir das fotografias
disponibilizadas nas pastas individuais de cada estudante, confirmando que a maioria dos
estudantes é negro.
92

6. O CURRICULO PRATICADO E AS QUESTÕES ETNICOS-RACIAIS NO CETEP:


as contradições e limitações para efetivação da Lei nº 10.639/03.

Este capítulo aborda as relações entre o currículo praticado e as questões étnico-raciais


no contexto do CETEP do sertão produtivo – Caetité/BA, sempre na busca de visibilizar as
vozes dos sujeitos da pesquisa a partir das categorias analíticas e ou filosóficas e empíricas
deste estudo. Nesse sentido, cada categoria analítica reporta a uma série de categorias
empíricas que emergiram dos dados coletados, organizados, interpretados, como nos ensina
Franco (2005). A compreensão do currículo praticado se deu a partir das questões da
identidade étnico-racial dos estudantes, do racismo, da visão dos professores/as sobre tais
questões, dos sentidos do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana e da prática
pedagógica na perspectiva dos professores/as e estudantes do CETEP.

6.1 Identidade étnico-racial do povo negro

A sociedade brasileira é construída em contextos históricos, socioeconômicos e


políticos tensos, marcados por processos de colonização e dominação assim sendo a
identidade e a diversidade não se construíram sozinhas, mas trouxe com elas as marcas das
desigualdades e das diferenças. Lima (2006, p.17) fala que a diversidade é parte da espécie
humana desde as suas experiências culturais, suas personalidades e nas formas de perceber o
mundo e, sobretudo na diversidade biológica dai a necessidade do currículo atender a essa
diversidade na construção positiva de identidades étnico-raciais.

6.1.1 A percepção dos estudantes em relação à construção de sua identidade étnico-


racial
Para Munanga (2009), Gomes (2001) e outros pesquisadores do campo das questões
étnico-raciais a identidade é auto definição de si em que cada um ou grupo étnico se define
com o objetivo de unicidade do grupo para preservar seus aspectos físicos, culturais, sociais e
isso precisa ser aceito por todos aqueles que fazem parte do grupo. Assim, que a partir dessa
ideia observamos que os estudantes, em sua maioria, possui fenótipo negro, mas quando
perguntamos sobre a cor que o classifica, observamos que ainda uma boa parte se classifica
como pertencentes a uma cor variante da preta (43%), enquanto 36% se auto classifica como
cor preta, como demonstra o Gráfico 1.
93

Gráfico 01: Fator de identificação étnico-racial dos estudantes do CETEP

Fator de identificação
Orgulho
Branco
21% Traços
misturados
43%

Orgulho
Negro
36%

Fonte: Gráfico elaborado pela autora a partir da organização dos dados

Consideramos a identificação pessoal ser suma importância para o individuo na


sociedade. Santos (2003) nos fala da importância da identidade para o povo negro
considerando que ela permite construir um referencial de grupo e de pertencimento assim

[...] a identidade de uma pessoa é algo que se constrói ao longo do tempo e


que se transforma continuamente pela vida afora. É na minha relação com o
mundo que eu vou tecendo minhas referências, as quais vão permitir que eu
me reconheça enquanto pessoa. A identidade é ainda algo que possibilita
diferenciarmos dos demais. (SANTOS 2003, p.1)
Portanto quanto o nosso estudante disse possuir traços misturados acreditamos que
lhe falta uma referência para se associar a um grupo, ou o reconhecimento étnico-racial, dai a
importância da autoafirmação da identidade independente de seus atributos físicos.
Na identificação da cor preta e das variantes dessa cor, como a parda observamos que os
estudantes demonstravam certo orgulho em ter a sua cor miscigenada com a branca,
evidenciando certo valor ao processo de embranquecimento ocorrido na família via algum
membro, sinalizamos, dois depoimentos dos estudantes que demonstram essa questão:
Meu registro de nascimento diz que sou de cor parda. Mas em minha família
é uma mistura, meus avós paternos são brancos, meu avô paterno é negro
(descendente de escravos) minha avó branca. Minha mãe é morena e meu
pai branco. E eu sou morena, mas me considero negra, corre o sangue negro
em minhas veias [...] (Estudante 5)

Eu me considero negro, porque apesar da minha pele não ser muito escura eu
sou neta e bisneta de índios. No Brasil principalmente todos que tem pele
clara branca ou negra é fruto do processo de miscigenação e nem sempre é a
aparência que conta. Acho um absurdo quando pessoas da pele clara se acha
no direito de ofender alguém que não é da sua cor.[...]. (Estudante 9)

Entendemos que a identidade é um processo de construção social, é um processo


dialético, mas que esbarra no mito da democracia racial e que devido aos sucessivos processos
de discriminação racial existente na sociedade brasileira, não é difícil perceber que ainda,
94

parte dos estudantes, não se sente a vontade para orgulhosamente anunciarem que são da cor
preta e que estão dispostos a lutar pelos seus direitos étnico-raciais.
A construção de uma identidade positiva, segundo Munanga (1994), engloba vários
fatores, como: os históricos, psicológicos, linguísticos, culturais, político-ideológicos e
raciais. Verificou-se também que os estudantes mostram a cor da pele como identidade
quando sabemos que não é bem assim, como afirma Valente (1995), que diz não ser somente
a cor um elemento decisivo e que é preciso um comprometimento com as questões raciais,
pois.
ser negro no Brasil hoje significa esclarecer aos outros negros e seus
descendentes, o papel fundamental que eles têm a desempenhar para mudar a
situação racial. Significa, também, conhecer quem está ou pode contar na
sua luta, ou seja, conhecer quem está comprometido com a luta do negro.
Em outras palavras, é uma questão de identidade étnica e de identidade de
princípios e objetivos. (VALENTE 1995, p. 46).

Nesse sentido, foi que na discussão temática ocorrida com os estudantes buscamos
explicitar para os estudantes que ser negro/a não é só a questão do fenótipo, mas de política,
de identidade étnica racial e que para tanto é preciso compreender responsabilidade social e
política que cada um de nós tem para com as questões raciais, particularizando o racismo que
ainda segundo Valente (1995 p.45) é “uma agressão surda, silenciosa ou sentida nos olhares
desconfiados e no tratamento desdenhoso”. Hélio Santos (2008) estabelece uma diferença
entre preconceito racial e racismo afirmando que
[...] o preconceito racial ocorre quando uma pessoa ou mesmo um grupo
sofre uma atitude negativa por parte de alguém que tem como padrão de
referência o próprio grupo racial. [...] racismo e preconceito racial não são
coisas equivalentes [...]. O racismo ocorre quando se atribui a um grupo
determinados aspectos negativos em razão de suas características físicas ou
culturais. (SANTOS 2008, p. 3)

Além dessa questão inserimos o discurso do mito da democracia racial que foi
incorporada por meio das ideias e do ideal de branquitude que teve como marco o processo de
migração europeia, iniciado logo após a abolição da escravatura. Esse mito em seu sentido
ideológico falseia uma realidade vivenciada pelos negros no país, como se todos fossem
iguais e tivessem os mesmos direitos, quando não tem, por conta da cor. Sobre o mito do
branqueamento Souza (1983) indica que ele objetiva:
[...] escamotear o real, produzir o ilusório, negar a história e transformá-la
em ‘natureza’. Instrumento formal da ideologia um mito é um efeito social
que pode entender-se como resultante da convergência de determinações
econômico-político-ideológicas e psíquicas. Enquanto produto econômico
político- ideológico, o mito é um conjunto de representações que expressa e
oculta uma ordem de produção de bens de dominação e doutrinação.
(SOUZA, 1983: 25).
95

O relato de uma estudante sobre sua percepção de negritude e questões raciais e sociais
é sintomático de que o mito de democracia racial é percebido como algo falso, que não se
sustenta, pois as desigualdades sociais são alarmantes que não tem ideologia que consiga
esconder:

Professora muitos negros perambulam pelas ruas sem qualquer expectativa


de melhoria das condições de vida, sem estudar, sem trabalhar, é claro que
não são só negros, mas principalmente negros e ai todos da sociedade lhe
viram as costas, isso é discriminação ou não é? (Estudante 1)
Esse depoimento sinaliza também que a defesa da causa do povo negro não deve ser
apenas um discurso dos militantes dos movimentos negros, mas, também uma bandeira posta
na escola que contribua para redefinir as práticas sociais, superando a visão neutra na
sociedade, superando o marco excludente, restritivo, autoritário e elitista que marcou a
história do povo brasileiro. Sobre o movimento negro Gomes (2011) diz:

O movimento negro é entendido como um sujeito político, com uma


trajetória histórica, integrante do contexto atual da organização dos
movimentos sociais e participante da articulação transnacional com outros
movimentos e ONGs na luta pela construção de uma sociedade democrática.
(GOMES 2011, p. 1)
A autora destaca a participação e as contribuições dos movimentos sociais negros na
formulação das Políticas Públicas voltadas para a superação das desigualdades e
discriminação racial no Brasil.
Quando perguntamos aos estudantes se eles percebiam diferenças entre brancos e pretos
na sociedade brasileira em termos de oportunidades sociais, eles foram categóricos em
responder que existe, pois a cor da pele é um elemento decisório de inclusão e exclusão
social, como afirmou um dos estudantes ao dizer que,

“Existem diferenças entre aqueles que são brancos e os que são negros, pois
muitas vezes os negros são insolados, não tem muita oportunidade de
trabalho, de um bom emprego e até na escola ele precisa de cotas para
entrar.” (Estudante 8)
Ainda sobre as oportunidades sociais a partir da cor da pele, observamos no Gráfico 2,
que 36% dos estudantes responderam que necessariamente que a cor da pele não é um
determinante nas oportunidades sociais, isso nos faz inferenciar que talvez esses estudantes
precisem construir uma noção critica dos problemas reais enfrentados pelo povo negro no
país.
96

Gráfico 02 A cor da pele como elemento para estabelecer diferenças


A cor da pele é um elemento importante para o
estabelecimento da diferença entre negros e
brancos na escola?
Não
36%
Sim
64%

Fonte: Gráfico elaborado pela autora a partir da organização dos dados

Não temos dúvidas que os sujeitos constroem a sua história e a sua identidade de forma
singular e, que mesmo diante dos preconceitos raciais, o país tem uma diversidade étnica-
racial grande que nenhum preconceito conseguiu eliminar, porque as raças são antropológicas,
como bem salienta Fernandes (2005) ao afirmar que o colonizador não conseguiu

[...] apagar as culturas indígena e africana. Muito pelo contrário, o


colonizador europeu deixou-se influenciar pela riqueza da pluralidade
cultural de índios e negros. No entanto, o modelo de organização implantado
pelos portugueses também se fez presente no campo da educação e da
cultura. Apesar desse fato incontestável de que somos, em virtude de nossa
formação histórico-social, uma nação multirracial e pluriétnica, de notável
diversidade cultural, a escola brasileira ainda não aprendeu a conviver com
essa realidade e, por conseguinte, não sabe trabalhar com as crianças e
jovens dos estratos sociais mais pobres, constituídos, na sua grande maioria,
de negros e mestiços. (FERNANDES, 2005, p. 379).
Nesse aspecto, o papel da escola é fundamental para valorização das culturas, Freire
(2011) enfatiza que escola está inserida em uma sociedade de classe, portanto a educação é
classista e que nela encontramos os antagonismos sociais, mas que também é nesse processo
de antagonismo que é possível exercer uma pedagogia libertadora, em que o respeito às
diferenças seja não apenas um conteúdo, mas uma concepção educativa. Os estudantes
afirmam que é importante que a escola discuta as questões étnico-raciais do povo negro, pois
assim eles teriam uma compreensão maior das questões envolvendo suas origens.
Penso que temos que compreender esses conteúdos envolvendo o negro na
sociedade, pois só assim, vamos entender o racismo e podemos lutar contra
ele, na vida das pessoas (Estudante 5).

Acho importante porque vai diminuir o racismo e também a sociedade fica


bem informada, assim como os estudantes. (Estudante 10)

Quando a escola ensina esses temas nos ajuda a promover a igualdade e a


necessidade da valorização dos negros e da cultural que é de todos nos.
(Estudante 11)
97

É importante sim, pois assim aprendemos sobre as origens da nossa cor e


diminuir a discriminação para com essas pessoas. (Estudante 12)

Buscamos estabelecer uma relação entre o posicionamento dos estudantes com a


posição de Santos (2003 p. 159) quando ele fala sobre a negação da identidade negra nos
diversos setores do país ou nas patentes, está afirmativa é fortemente constada na fala dos
estudantes quanto eles clamam pelo ensino como recurso para promover a igualdade, diminuir
o racismo na sociedade o que nos leva a inferir que esses estudantes carecem na sociedade e,
principalmente na escola, informações positivas sobre a sua origem já que:

Não há setor da vida nacional – publico ou provado, civil ou militar, laico ou


religioso- no qual o racismo brasileiro, simulado ou mais explicito, não
opere contra os negros-descendentes. Não estamos aqui fazendo uma
afirmação ideológica; trata-se de uma constatação cientifica aferida e
quantificada por inúmeras pesquisas das mais diferentes áreas. (SANTOS,
2003 p. 160)
Os dados da nossa pesquisa corroboram com a afirmação do autor quando diz que a
alta-baixa-estima e a falta de uma identidade positiva leva o individuo a rejeitar ou não se
identificar com o seu grupo étnico. Ressaltamos que ao sinalizarmos que a escola precisa
desenvolver práticas pedagógicas que denuncie o tipo sofisticado, dissimulado e
segregacionismo que o racismo se arquitetou no Brasil.

6.1.2 A compreensão que os professores têm sobre a construção da identidade étnico-


racial dos estudantes
Os dados demonstram que os estudantes tem certa consciência da sua identidade negra,
mas que ainda precisa de um trabalho efetivo para a construção de uma consciência critica de
sua identidade a ponto de os mobilizarem para uma luta de valorização de sua etnia. Mas, em
relação ao professorado, como ele percebe essa construção? E se percebe como professor/a
que também faz parte dessa etnia? Essas são questões que influenciam na forma do
professor/a lidar com a história e cultura afro-brasileira e se colocar em sala de aula a ponto
dos estudantes terem orgulho de sua cor.
Ao perguntar aos professores/as sobre a formação da sociedade brasileira, eles
responderam que trata de uma sociedade miscigenada, portanto formada pelos diversos povos,
como os índios, os negros, os brancos. Os depoimentos constatam essa questão quando dizem
que,
A sociedade brasileira é formada pela miscigenação de índios, brancos e
negros como grupo formador e a intensificação com a participação de
imigrantes primeiro vindos da Espanha, Holanda, Itália, Alemanha, enfim,
imigrantes de todos os continentes da Terra, originando assim um país de
negros. (Professor 3)
98

A sociedade brasileira é miscigenada, devido às inúmeras raças que formam


a população do país. A diversidade de raça cultura e etnias promove a
riqueza cultural. (Professor 6)

É indiscutível o papel do negro na formação da sociedade brasileira que se


constitui hoje por um povo miscigenado, deixando marcas na construção de
um país diversificado devido à influência africana na cultura e na religião.
(Professor 7)

Fica evidencia que os professores/as tem consciência da origem do povo brasileiro e


falam da indiscutível contribuição dos povos africanos no país, mesmo em situação de
escravidão, entretanto durante as observações em sala de aula, essa consciência não é
traduzida na prática pedagógica, desconsiderarem a presença das questões raciais ao
ministrarem os conteúdos curriculares na escola sem inserir de maneira transversal ao
conteúdo que leciona as questões étnico-raciais. Como reforçar que os estudantes construam
suas identidades de maneira positiva se a prática pedagógica não está a serviço dessa
construção?
Nessa perspectiva trazemos para a discussão as contribuições de Santos (2008) que nos
fala da invisibilidade das questões raciais na escola e que

[...] deve ser interpretada aqui como um fato que não se nota, não se discute
e nem se deseja notar ou discutir. É como se não existisse. A história narrada
nas escolas é branca, a inteligência e a beleza mostradas pela mídia também
o são. Os fatos são apresentados por todos na sociedade como se houvesse
uma preponderância absoluta, uma supremacia definitiva dos brancos sobre
os negros. Assim, o que se mostra é que o lado bom da vida não é e nem
deve ser negro. (SANTOS 2008, p. 1)
Assim sendo, quando o professor/a não fortalece os laços indenitários em relação à etnia
dos estudantes, termina contribuindo para que esconder o problema do racismo existente, já
que não aborda as questões cruciais envolvendo a população negra do país, por estar mais
preocupado com os seus conteúdos específicos, mas não pode esquecer que o estudante vive
em uma sociedade desigual e que cabe a ele o processo de conscientização.
Para Munanga (2001), a escola reproduz o preconceito e a discriminação que está
presente na sociedade, utilizando mecanismo de reprodução no interior das práticas
pedagógicas, muitas vezes contribuindo para um sentimento de inferioridade e fracasso dos
estudantes diante da vida, pois é comum os estudantes não se perceberem capaz de uma
promoção social digna. Mas, outra prática de construção identitária é possível na perspectiva
de Freire (2009) quando fala da conscientização critica que a prática docente deve assumir.
Ele sinaliza que

[...] a prática docente critica, implicante do pensar certo, envolve o


movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer [...] o
que se precisa é possibilitar, que, voltando-se sobre si mesma, através da
99

reflexão sobre a prática, a curiosidade ingênua, percebendo-se como tal, se


vá tornando critica. [...] Por isso é que, na formação permanente dos
professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática.
(FREIRE, 2009, p.38-39)
Nas intervenções das Atividades Complementares (ACs) em que trabalhávamos com
temas sobre as questões étnico-racial do povo negro ficou evidenciado que os professores/as
têm uma grande dificuldade adequar a Lei nº 10.639/03 ao núcleo comum e específico no
currículo do Centro. Sinalizaram para uma urgente formação continuada para a efetivação de
uma práxis pedagógica com vista para desafiar as bases eurocêntricas e os paradigmas racistas
conforme nos orienta Giroux (1995):

[...] Todas as escolas deveriam fazer os professores e os alunos participarem


do currículo antirracistas. Esta abordagem redefine não somente a autoridade
do professor e a responsabilidade dos alunos, mas situa a escola como uma
força importante na luta por justiça social, econômica e cultural. (GIROUX,
1995, p.166).
Ainda sobre formação do educador Freire, (2009, p.58) ele diz: “Ninguém nasce
educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como
educador permanentemente, na prática e na reflexão da prática”. Freire (2009) nos orienta
que quanto mais o educador se conhece, se percebe, sabe como é e porque o é, maior sua
capacidade de mudar, torna-se melhor, e assim é capaz de promover da curiosidade ingênua
para a curiosidade epistemológica. Assim ele diz: “Ensinar exige reflexão crítica sobre a
prática”. Enfatiza ainda que “Ensinar exige o reconhecimento e assunção da identidade
cultural”. (FREIRE, 1996, p.30) Ainda que “Ensinar não é transferir conhecimentos”
(FREIRE 1996, p.52). Nesse sentido, as ACs tornam-se uma oportunidade de formação
continuada em busca da construção identidade cultural, social política e econômica.

6.2 Ensino da história e cultura afro-brasileira e africana

No processo de construção positiva da identidade do povo negro de maneira que os


estudantes tenham orgulho de sua cor e de tudo o que ela representa é preciso que os
conhecimentos históricos, culturais, religiosos afro-brasileiros e africanos estejam nos
currículos da escola e que sejam trabalhados efetivamente pelos professores, como forma de
neutralizar o racismo ainda presente em nossa sociedade. E quais são os conteúdos da história
e cultura afro-brasileira que devem ser ensinados na escola para que tenhamos uma sociedade
menos racista?
Destacamos aqui alguns conhecimentos históricos e culturais afro-brasileira e africano
que consideramos sua relevância a ser contemplados no currículo escrito e a serem discutidas
100

em sala de aula, para tanto buscamos Hélio Santos (2003) que fala da importância de dar ao
negro a visibilidade na sala de aula; compreender a forma particular de racismo, caracterizada
pelo racismo cordial com Florestan Fernandes (1997), Thales de Azevedo (1951); a
mestiçagem pregada por Gilberto Freire no século XX em vários dos seus trabalhos que
tinham como pano de fundo para os seus estudos a busca de uma “identidade para o Brasil”.
Dialogar com os estudantes baseando-se em José Rufino Santos (1990) que conceitua o
racismo com base nas características biogenéticos como fenômenos puramente sociais e
culturais. Reconstruir o conceito de minoria e pobreza com base em Ana Célia da Silva
(2008). Importante também é trazer para a sala de aula o culto da ancestral afro-brasileiro
baseado no contexto histórico e filosófico retratando a beleza dos terreiros com suas canções e
narrativas, também encontramos em Sobrinho (2015) uma leitura clara e precisa desta
questão. E sobre esses conteúdos, Munanga (2000) diz que a intenção é que

[...] os preconceitos e discriminações que permeiam a sociedade brasileira


são encontrada na escola, cujo papel deve ser o de preparar futuros cidadãos
para a diversidade, lutando contra todo o tipo de preconceito. Mas na prática
ela acaba é reforçando o racismo. (MUNANGA 2000, p. 14)
Acreditamos na riqueza dos povos afrodescendentes e dos escritores negros e militantes
da causa negra que nos brindam com um arsenal bibliográfico possibilitando aos
professores/as utilizar o livro didático de forma critica e transformando toda material didático
eurocêntrico em um instrumento gerador da consciência facilitando o dialogo dentro de uma
perspectiva de equidade na diversidade visando a continuidade civilizatória nas relações
sociais no Brasil.

6.2.1 O significado do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana para os


professores
Partindo dessas referências de conteúdo é que observamos no currículo oficial do
CETEP, que as disciplinas do núcleo comum e especifico e a parte diversificada não explicita
os conteúdos da história e cultura afro-brasileira e africana. Isso vai de encontro à ideia de
Gomes quando diz que a
[...] escola e seu currículo são impelidos, na atualidade, a incluir tal
discussão não só na mudança de postura dos profissionais da educação
diante da diversidade étnico‐racial, como também na distribuição e
organização dos conteúdos curriculares; para tal, será necessário o
investimento na formação inicial e continuada dos professores (GOMES,
2008, p.78).

Nas observações das aulas não contemplamos tais conhecimentos na prática docente e
que quando questionado do por que dessa ausência, os professores/as falam das dificuldades
101

em operacionalizar em suas práticas esses conteúdos, ao mesmo tempo, sinalizam que


precisam de uma formação para um trabalho efetivo e de qualidade. Nas intervenções de ACs
buscamos trazer tais conteúdos da história e cultura do povo negro no entendimento não
apenas das narrativas europeia ou euro-americana, mas sobretudo na ótica da África, sem
apresentação estereotipada, folclorizada e pejorativa.
Mas, ainda assim as dificuldades continuam, pois entendemos que não é uma discussão
no âmbito de uma pesquisa que irá resolver a questão formativa do professores/as do Centro,
pois demanda tempo e uma sistemática formação continuada, que traga uma ampla
compreensão da história da África e do Brasil em seus aspectos políticos, econômicos,
culturais. Entendendo que a ressignificação do pensamento do povo brasileiro em relação à
identidade do negro requer, como afirma Gomes, um

[...] maior conhecimento das nossas raízes africanas e da participação do


povo negro na construção da sociedade brasileira haverá de nos ajudar na
superação de mitos que discursam sobre a suposta intolerância do africano
escravizado e a visão desse como selvagem e incivilizado. Essa revisão
histórica do nosso passado e o estudo da participação da população negra
brasileira no presente poderá contribuir também na superação de
preconceitos arraigados em nosso imaginário social e que tendem a tratar a
cultura negra e africana como exóticas e/ou fadadas ao sofrimento e à
miséria (GOMES, 2008, p.72).
A negação da história africana enquanto formadora das bases culturais e estruturais de
nosso país fortalece o mito da democracia racial contribuindo a proliferação do racismo,
portanto, é necessário trazer para a sala de aula os legados africanos para a sociedade
brasileira, para tanto se faz necessário mostrar a riqueza cultural, social politica e econômica
do continente africano antes da “colonização” europeia. A África era organizada em reinos
prósperos, o rio Nilo tinha em suas margens uma rica e prospera agricultura, ressaltar também
os avanços na medicina. Tais posicionamentos permite romper com o “circulo vicioso” que
demonstra uma África pobre e possibilita a construção de uma identidade positiva já que

A não-identidade racial é o resultado da “visão de sociedade que não tem o


negro, com os seus valores , em boa conta e o discrimina. O instrumento
usado para consolidar essa visão são os meios de comunicação. Ao
desvalorizar a sim mesmo (autoestima negativa), o negro possibilita um
vazio que é preenchido pela internalização daqueles falsos conceitos
(ideias) armados pelo “racismo cordial” expresso pela sociedade.
(SANTOS, 2001, p. )
Nesse sentido deve-se advertir que as mazelas advindas da invasão do colonizador foi
quem fomentou a vinda involuntária do africano para o Brasil e para outros países naquela
época. O negro escravizado foi obrigado a sair da sua pátria através de migração forçada com
rituais de esquecimento como as voltas ao baobá, a negação da religiosidade e o batismo
102

dentre outros. Aqui escravos consideramos o “pão” nosso de cada dia na senzala e hoje nas
periferias a culinária hoje rica e farta símbolo de resistência cultural.
Para Fausto (2003), é preciso conhecer os heróis negros da resistência como, Zumbi dos
Palmares que foi um líder da maior comunidade de escravos fugitivos do Brasil. O Quilombo
de Palmares resistiu por 65 anos e chegou a ter de cerca de 30 mil habitantes; João Cândido,
marinheiro negro comandou a Revolta da Chibata, no Rio de Janeiro em 1910, sua luta foi
contra os castigos sofridos e pela ausência de marinheiros negros nos altos cargos na
hierarquia da Marinha daquela época; Chico Rei segundo o autor não existe documento e sim
história oral oficial sobre a sua existência apenas uma lenda contando que ele foi um
destemido rei pertencente a uma tribo do Congo que veio como escravo para o Brasil, ele
consegue comprar a sua alforria e ajuda muitos negros a se libertarem em Ouro Preto - Minas
Gerais.
Lembramos também das personalidades negras: Dandara, Rainha Nzinga, Tia Ciata,
Carolina Maria de Jesus, Maria Firmina, dentre outros. Nesse sentido podemos apresentar os
quilombos como uma organização negra de resistência as mazelas da escravidão as conquistas
como a Lei do ventre livre, sexagenário e finalmente a pressão para a abolição da escravatura
na ótica do liberalismo econômico e os seus reflexos sócias no capitalismo atual.
Como o povo negro “saiu” da senzala para vaguear as margens das fazendas e estradas
hoje vivendo nas periferias das cidades sem que houvesse nenhuma preocupação com a
integração socioeconômica pelo estado brasileiro os reflexos vivenciaram hoje nas
desigualdades sociais e econômicas na criminalidade e no mito da democracia racial. É
preciso mostrar aos estudantes a força dos movimentos sociais e dos militantes negros para
que o estado homologasse algumas políticas públicas como reparação a exploração e exclusão
social.

6.2.2 A valorização dos conteúdos da história e cultura afro-brasileira e africana pelos


estudantes
Consideramos que a escola e toda a engrenagem curricular que dificulta a valorização
do pungente legado que o povo africano vem contribuindo para a sociedade brasileira. Assim
sendo buscamos durante a pesquisa perceber como estudante valoriza a cultura do povo
negro. Nesse intuito perguntamos aos estudantes sobre a relevância da discussão sobre as
questões étnico-raciais na escola todos afirmaram positivamente e algumas respostas são
instigantes, do tipo:
Sim, porque quem sabe assim as pessoas passam a respeitar o próximo
independente da cor. (Estudante 3)
103

Sim, pois temos que compreender que a cor da pele não interfere em nada
na vida das pessoas . (Estudante 5)

-Sim, porque com essas discussão ajuda a ter noção de como que todos
somos iguais independente da cor . (Estudante 6).

Sim, promover a igualdade parte da necessidade da valorização via cultural


de todos. (Estudante 11)

Tais respostas identificam certa ideologia pelo fato de respeito a cor, portanto, a
valorização da história e cultura afro-brasileira e africana que teríamos igualdade social,
produtiva, quando não é bem assim, pois vivemos em uma sociedade capitalista em que
impera as desigualdades e que além da valorização étnica-racial outros elementos seriam
importantes nesse processo, principalmente a questão econômica. Outra ideia é que somos
iguais quando não é assim, somos diferentes e é essa diferença que a escola precisa ensinar o
respeito a todas as diferenças. Assim sendo Santos (2008) nos fala que
De todas as grandes questões nacionais nenhuma outra é tão dissimulada
quanto à racial em nosso país. O negro não está ausente apenas dos meios de
comunicação em geral, mas também não comparece como uma entidade
importante da vida nacional. ( SANTOS 2008, p. 2-3)

Portanto é preciso que na escola o povo negro tenha a devida visibilidade já que a
nossa pesquisa encontramos na fala dos estudantes depoimentos de lacunas quanto ao estudo
sobre o povo negro tal afirmativa está embasada quando perguntamos aos estudantes em
relação se os conteúdos da história e cultura afro-brasileira e africana na escola eles informa
que não são trabalhados no CETEP, como observamos em dois depoimentos
Eu não sei muito sobre esses conteúdos, algumas coisas sabemos da África
nas aulas de história, agora da forma que está sendo falado no grupo não
sabia. A nossa escola não trabalha quase essa Lei, quando fala alguma coisa
é muito pouco, os professores comentam, mas não assim. (Estudante 8)

Sim, esses conteúdos são importantes porque passamos a saber sobre a


história dos negros e tudo mais, mas na escola quase que não discuti essas
questões raciais. (Estudante 14)

No debate com o grupo, a questão dos conteúdos da história e cultura-afro-brasileira e


africana aflorou muitas opiniões e reflexões positivas, por exemplo, em uma das atividades
temática do grupo apresentamos a poesia africana, os grupos exploraram a densidade poética
da musica, recortando os seus versos e estabelecendo entre eles um intercambio com a sua
realidade social, o que gerou um grande debate e íamos inserindo questões sobre a história,
política e cultura africana e as respostas sinalizam para um despertar, por parte dos estudantes,
em relação a esses conhecimentos, muitos ficaram surpresos com a riqueza dos contextos do
continente africano e sua relação com o Brasil, ao mesmo tempo, eles reforçam que tais
104

conteúdos não são trabalhados em sala de aula, por exemplo, três depoimentos são
representativos quando dizem:
E muito importante a discussão dessa Lei, mas aqui não se discuti, se fosse
ia nos ajudar a agir contra o racismo, não temos força para mudar nada.
(Estudante 01)

Não vem sendo estudado, talvez se fosse estudado o racismo não acontecia
a qualquer hora, o xingamento, as brigas [...]. Na sala de aula não se discuti
isso. (Estudante 02)

Nenhum professor discutiu o assunto. Muito raro. No dia a dia das aulas
não ouço falar dessa lei. (Estudante 3)

Quando os conteúdos da história e cultura afro- brasileira e africana estão ausentes do


currículo escolar não temos a garantia da valorização da identidade do povo negro, os
estudantes não podem lutar contra o racismo, porque lhes faltam as condições dadas pelo
conhecimento e por uma prática educativa conscientizadora no contexto de Paulo Freire.
Quando os estudantes falam que tais conteúdos não são trabalhados, isso significa uma
denuncia para o aprimoramento do currículo do Centro, no sentido de inserção urgente desses
conhecimentos e o exercício de um trabalho pedagógico eficiente que ajude esses estudantes a
ter um sentimento positivo em relação a sua cor.

6.3 O currículo praticado e sua relação com o ensino da história e cultura afro-brasileira
e africana
Os dados demonstram que os conteúdos da história e cultura afro- brasileira e africana
ainda não é uma realidade no CETEP, como exceção daqueles professores/as que trabalham
com conteúdos históricos e geográficos, mas que não representa um processo continuo e
mesmo sistematizado dos conhecimentos do povo negro, entra transversalizado a outros
conteúdos. Mas, ainda assim tal afirmação carecia de uma compreensão a partir do currículo
praticado, que significa aquele que é efetivamente posto na sala de aula, na relação
professor/a e estudante, realizado no contexto cotidiano, implementado nas práticas
pedagógicas na escola.
Nesse sentido, Sacristán (2000) conceitua esse tipo de currículo como o resultado das
experiências, das identidades construídas no cotidiano da sala de aula, ao longo do labor
diário professor/a- estudantes, contendo
[...] uma série de influências convergentes e sucessivas, coerentes ou
contraditórias, adquirindo, dessa forma, a característica de ser um objeto
preparado num processo complexo, que se transforma e constrói a si mesmo
(SACRISTÁN 2000, p. 102).
105

O currículo praticado é um território que articula o fazer pedagógico na escola contando


com os diferentes sujeitos que participam das atividades escolares. Munanga e Gomes (2006,
p.32) sinalizam quanto a necessidade de recorrer aos registros histórico para dialogar com os
estudante sobre os reinos e riquezas políticas econômicas e sociais da África. Nessa
perspectiva Pereira (2001, p.150) considera importante a interação professor/as, estudantes
durante a prática pedagógica para construir um diálogo positivo quanto à identidade negra.
Para Moreira (1999, p.21) o Currículo praticado recebe também a denominação de
currículo em uso, que se refere ao currículo efetivamente trabalhado pelos professores/as em
sala de aula. Sabemos que o currículo praticado nas escolas é um instrumento prescritivo é
executado monocultural carregando consigo as marcas da formação acadêmica ou de um
ideário construindo socialmente. Nesse sentido, as observações apontaram que os
professores/as observados dão uma demasiada importância aos conteúdos específicos e do
núcleo comum enquanto que as questões raciais são invisibilizadas durante as aulas. Portanto
consideramos ser necessário na escola colocar “[...] em xeque a hegemonia da cultura
ocidental no currículo, do qual se encontram ausentes outras vozes, particularmente as que se
referem às culturas originárias do continente americana, à cultura negra e de outros grupos
marginalizados.” (MOREIRA E MACEDO, 2001, p.133)
Os autores sinalizam quanto à necessidade de romper com o currículo monocultural,
considerando os diferentes grupos socioculturais na perspectiva da diversidade e da equidade.
Assim sendo consideramos que a escola deve reconhecer e dar maior visibilidade as questões
étnico-raciais. Nesse sentido a observação da prática pedagógica demonstrou que o currículo
praticado no CETEP no Curso técnico em secretariado está aquém das discussões sobre o
povo negro no Brasil.
Isso não quer dizer que os professores/as não desempenham um trabalho relevante no
curso técnico em secretariado, mesmo as questões do povo negro passando distante do
currículo escrito e praticado. Eles praticam o currículo eurocêntrico e conteudista atendendo
ás expectativas do sistema capitalista. Claro que esse executar um currículo eurocêntrico não
se dá sem as contradições do processo pedagógico e, assim como os professores/as seguem o
currículo estabelecido, mas não é de maneira acrítica, ou pelo menos percebem as ideologias e
contradições subjacentes, como bem explicita dois professores quando dizem que,

Percebo que há certo “sigilo” no trato dessas questões para se preservar a


integridade daqueles que sofrem com algum tipo de discriminação. Por outro
lado existe a necessidade de aprofundamento da discussão da legislação que
trata dessas questões para que se garanta o seu cumprimento. É preciso,
ainda, um maior compromisso de toda a comunidade escolar nas questões
que envolvem as etnias raciais. (Professora 03)
106

é nesta instituição que devemos e podemos abordar e levar ao conhecimento


de todos os discentes o poder a Lei nº 10.639/03, falta a formação dos
professores para este processo de aprendizagem. (Professor 1)

As falas da professora ressalta a questão do sigilo para preservar a integridade daqueles


discriminado, porém para Walsh (2009, p. 25), a “[...] interculturalidade crítica como
ferramenta pedagógica questiona continuamente a racialização, subalternização,
inferiorização e seus padrões de poder”. Silva (2004, p. 98) afirma que considerando como a
escola trata as diferenças nos alerta quanto à psicologização das diferenças, os processos de
inferiorização pode parecer apenas uma questão de auto estima e que é preciso “[...]
estratégia pedagógica correspondente, consistiria em ‘tratar’ psicologicamente essas atitudes
inadequadas”. Portanto é necessário reforçar que as posições ocupadas pelos sujeitos na
sociedade são socialmente construídas.

6.3.1 As questões étnico-raciais na prática docente


Durante as aulas observadas, deparou-se com o paradoxo de que a Lei nº 10.639/03 foi
homologada há 13 anos e alterou a LDBEN 9394/96 nos Art. 26, alínea “a” e Art. 79, alíneas
“a” e “b”, mas não contemplada no currículo praticado nem se menciona no currículo escrito
do curso Técnico em Secretariado. Esse cenário é marcado pela problemática apresentada
pelos/as professor/as durante a Jornada Pedagógica quando eles/as afirmam não possuírem
formação para adequar a Lei ao currículo praticado e, portanto, não trabalham. O depoimento
de uma professora é esclarecedor quando diz que

Agente espera que com o que vocês estão vendo estão enfrentado que agente
supere esses problemas e nossa educação e a nossa cultura permita uma
mudança. Olha isso ai eu sinceramente não sei lidar com isso, eu acho que
isso exige formação exige estudo, maneiras de lidar com isso. Que eu
particularmente não sei. Eu não me atrevo ainda porque eu ainda não sei de
que forma você não vai ferir ou você está entrando não sei até que ponto as
pessoas ainda se ofendem. Se eu fosse trabalhar com isso eu precisaria de
ajuda de formação de alguma coisa que me dissesse e ou subsidio para falar
sobre (Professora)
A professora nos remete a uma reflexão sobre a formação de professores críticos e
reflexivos, para tratar de forma pedagogicamente adequada às questões raciais no espaço
escolar. Munanga (2005) considera que a formação de professores meramente técnica que não
tiveram em sua formação acadêmica embasamento teórico sobre a história da África, a cultura
do negro no Brasil pode tornar um entrave para a implementação a Lei nº 10.639/03 na
escola. A posição da professora revela o desconhecimento teórico quanto a temática mas
sobretudo a prevalência do mito da democracia racial que paira sobre o imaginário da
sociedade.
107

Buscando subsídio para compreender questões étnico-raciais na escola trazemos a


fala da professora 1, ela considera a importância do estudo da temática não apenas na sala de
aula mas na convivência na sociedade. Nesse sentido coadunamos com a professora
enfatizando que os pressupostos da lei tem como meta promover a equidade social, formação
de uma nova consciência sobre as matrizes étnicas e culturais africanas Assim
O estudo destas questões requer pensar para além da sala de aula. Os
embates tem nascença no convívio cotidiano do indivíduo e ato
compulsório são trazidos por estes para os momentos de aprendizagens
sejam eles dentro de um contexto de currículo ou as aprendizagens não
previstas em um calendário fixo , o escolar. Na esteira das discussões a
escola ainda precisa reconhecer neste contexto através do seu
planejamento e, por conseguinte, a aceitação e burilamento dos entraves
que impedem a pontualidade deste componente no currículo, não somente
pelo cumprimento arguido pela lei. (Professora 1)

As duas professores divergem ao posicionar-se quanto a questão racial da escola a


primeira espera que os estudantes percebam as mazelas do racismo mas assume que não
possui formação profissional para oportunizar aos estudantes os saberes cruciais para lidar
com a questão racial. A segunda reconhece a necessidade de pensar as questões raciais para
além da sala de aula, entretanto afirma que o currículo o calendário escolar e o planejamento
estão aquém do que propõe a LDBEN.
Os professores/as reconhecem que a história e cultura afro-brasileira e africana ainda é
pouco estudadas nas escolas, esse um fato, mas o interessante é que uma das professoras
acredita que seria preciso uma disciplina especial que aborde isso no currículo para que não
fique a desejar esse ensino para os estudantes.
É perceptível que as questões étnico-raciais são pouco estudadas na escola.
Existe uma necessidade professores que trabalhem uma disciplina voltada
para o assunto, para que haja uma discussão ampliada. Desconstruindo a
ideia de que existe uma raça buscando discutir a realidade em que os
alunos vivem; trabalhar as questões de preconceito ; ampliar as discussões
em sala de aula. (Professora 20)

As questões levantadas acima encontramos ressonância em Silva (2001,p.150) quando


ele nos fala do currículo e suas formas de dominação, nele a identidade é construída ou
maquinada. Ao afirmarmos que o CETEP precisa atentar para as questões raciais no currículo
escrito e praticado, no planejamento da pratica pedagógica. Nas arguições dos professores/as
evidenciamos o distanciamento quanto a responsabilidade do “eu” profissional para o
“outro”. Existe um silenciamento aceito pela escola quanto às discussões sobre as questões
raciais.
108

A observação da prática pedagógica vem reafirmar o que nos diz Gomes (2001, p.86)
que as práticas pedagógicas que não contemplam a diversidade da escola pode tornar-se
discriminatória ao não reconhecer as diferenças.
Sobre a formação dos professores Munanga (2005, p.16) ressalta a importância da
formação dos professores/as cuja base teórica de formação acadêmica não tiveram a formação
de História da África, a cultura do negro no Brasil e ainda a história do negro esse déficit na
formação. Segundo ele a ausência dessa formação constitui no problema crucial para a
implantação das políticas públicas nas escolas. Sinalizamos aqui como insuficiente na prática
pedagógica do CETEP as questões étnico-raciais e nesse sentido o fato se dar em razão da
falta do conhecimento teórico sobre o tema e formação especificas para atuarem em sala de
aula. Nesse sentido, Valente (1995, p.33) nos fala com muita autoridade que “ o discurso
científico determinista, elaborado pelos europeus e que afirmava a inferioridade da raça,
negra, foi incorporado por intelectuais brasileiros”, os currículos escolares bem suas bases no
discurso cientifico eurocêntrico e assim Valente 1995, p.37 reafirma que “a situação do
negro, no final do século XX, embora diferente , guarda muitas semelhanças com aquela
vivida durante a escravidão”.
Outro entrave que sinalizamos é que o mito da democracia racial que está arraigada no
imaginário de muitos/as professores/as. Assim sendo Freire (2009) diz que...

Mulheres e homens, seres histórico-sociais, nos tornamos capazes de


comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de romper, por tudo
isso, nos fizemos seres éticos. Só somos porque estamos sendo. Estar sendo
é a condição, entre nós, para ser. Não é possível pensar os seres humanos
longe, sequer, da ética, quanto mais fora dela. Estar longe ou pior, fora da
ética, entre nós, mulheres e homens é uma transgressão. É por isso que
transformar a experiência em puro treinamento técnico é amesquinhar o que
há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter
formador. Se se respeita a natureza do ser humano, o ensino dos conteúdos
não pode dar-se alheio à formação moral do educando. Educar é
substantivamente formar. Divinizar ou diabolizar a tecnologia ou a ciência é
uma forma altamente negativa e perigosa de pensar errado. (FREIRE, 2009,
p. 33).
Reafirmando nosso posicionamento acima verificamos que os/as professores/as na sua
imensa maioria não tiveram formação sobre história e cultura africana o que por certo
compromete a adequação da Lei aos conteúdos específicos e/ou o núcleo comum e isso gera
consequências à realização do fazer pedagógico, como fica demonstrada nos depoimentos de
dois professores quando alegam que

[...] é preciso ter sensibilidade para lidar com a questão racial e entender que
não é fácil e nem tão simples falar espontaneamente sobre situações de
racismo, discriminação racial e preconceito. Muitas vezes, a opção é pelo
silêncio e o ocultamento. (GOMES, 2000, p.155).
109

Os docentes também afirmam ser sensíveis à causa do povo negro e não enfatizam o
direito ao estudo, apontando que realizam ações descontínuas, mas reconhecem a necessidade
de assegurar de forma concreta a integração e a valorização das questões do povo afro-
brasileiro. Nessa abordagem, um dos professores entrevistados afirma que.

Considero a temática das questões étnico raciais de suma importância para


serem discutidas e trabalhadas na escola. A escola é um espaço de
formação de valores e, portanto, deve contemplar essas questões, pois o
respeito à diversidade e o conhecimento das nossas origens favorece a
construção de uma sociedade mais justa, que repudie atitudes de
descriminação e preconceito. Creio que as questões étnico-raciais precisam
estar inseridas de forma interdisciplinar, não só nos conteúdos curriculares
programáticos, mas nos projetos e em todas as ações desenvolvidas na
escola, como um princípio inerente à formação dos nossos alunos.
(Professora 4)
Nesse sentido, é que Cavalleiro (2001), afirma que o professor/a pode ser mantenedor
difusor do preconceito racial a depender da sua postura diante dos estudantes quando ele é
omisso ou deixar que o estudante reserve-se a um papel subalterno dos colegas. Considera
que

É flagrante a ausência de um questionamento crítico por parte das


profissionais da escola sobre a presença de crianças negras no cotidiano
escolar. Esse fato, além de confirmar o despreparo das educadoras para
relacionarem com os alunos negros evidencia, também, seu desinteresse em
incluí-los positivamente na vida escolar. Interagem com eles diariamente,
mas não se preocupam em conhecer suas especificidades e necessidades
(Cavalleiro, 2001, p.35).
Ressaltamos que é inegável que tais atitudes na prática pedagógica e no cotidiano da
escola vai trazer como consequência o reforço da postura preconceituosa e das discriminações
refletindo nos relacionamentos sociais.
Nesse sentido, não temos dúvidas de que a articulação teoria-prática docente
envolvendo o contexto das questões do povo afrodescendente possibilitará uma formação
pessoal e profissional dos estudantes e professores/as, tornando as relações sociais mais
humanas no respeito das diferenças culturais. Saviani (1981, p. 61) ressalta a importância da
apropriação dos conteúdos escolares para a formação e desenvolvimento humano, pois “os
conteúdos são fundamentais e, sem conteúdos relevantes, conteúdos significativos, a
aprendizagem deixa de existir, ela se transforma num arremedo, ela se transforma em uma
farsa”. Nesse contexto, Gonçalves (1987), afirma que

As práticas pedagógicas continuarão punindo as crianças negras que o


sistema de ensino não conseguiu ainda excluir, aplicando-lhes o seguinte
castigo: reclusão, ritualização em procedimentos escolares de efeito
impeditivo, cujo resultado imediato é o silêncio da criança negra, em curto
prazo, e do cidadão, para o resto da vida (GONÇALVES, 1987, p. 29).
110

Os dados da observação nos levam a afirmar que no CETEP o conhecimento científico


técnico desenvolvido em sala de aula vislumbra uma possibilidade de formação profissional
de excelência para atuação profissional do/a estudantes para o exercício laboral no mundo do
trabalho, porém fica a desejar em termos de inserção dos conhecimentos de valorização da
história e cultura afro, como se essas questões não fossem basilar para o sujeito estar no
mundo de maneira empoderada, ainda mais quando se trata de um contingente populacional
pertencente a etnia negra. Sobre essa questão o depoimento de dois professores é
esclarecedor.

Levando em conta que não podemos supervalorizar as minorias em


detrimento dos que promovem o desenvolvimento. (Professor 5)
se houvesse práticas pedagógicas voltadas à história da cultura étnico-racial
e a sua importância na formação da cultura brasileira, seria uma forma de
buscar o reconhecimento da igualdade social, reduzindo a discriminação.
(Professor 6)
Precisamos compreender que o empoderamento não é apenas uma palavra sem sentido,
mas diz muito em relação a autonomia dos sujeitos coletivos, de mudança radical de um
grupo, em Paulo Freire significa um processo educativo de “desenvolvimento crítico desses
estudantes é fundamental para a transformação radical da sociedade. Sua curiosidade, sua
percepção crítica da realidade são fundamentais para a transformação social, mas não são, por
si sós, suficientes” (Freire & Shor, 1986, p. 71). O empoderamento é algo intrínseco de dentro
para fora, portanto uma tomada de consciência acompanhada de mudança de atitude, do
oprimido frente ao opressor, implica em conquista da liberdade, superação da subordinação
seja ela uma dependência econômica, física.
Assim, se por um lado os conteúdos e prática pedagógica observada atendem às
necessidades do desenvolvimento profissional dos estudantes do CETEP, por outro lado,
carece de outros conhecimentos que venham a trabalhar com a valorização da cultura de um
povo historicamente invisibilizado. Como estabelecer a relação de paz entre as culturas se elas
não são trabalhadas na escola e apenas uma cultura está presente nesse currículo? Sobre isso,
Charlot (2000), afirma que o objetivo do processo de escolarização é fazer com que o
estudante aprenda para construir seu

[...] triplo processo de hominização (tornar-se homem), de singularização


(tornar-se um exemplo único de homem), de socialização (tornar-se membro
de uma comunidade, partilhando seus valores e ocupando um lugar nele).
Aprender para a viver com outros homens com quem o mundo é partilhado.
Aprender para apropriar-se do mundo [...] aprender em uma história
(CHARLOT 2000, p.53).
É preciso pensar na valorização humana em detrimento à valorização do capital pois,
“todo ser humano aprende: se não aprendesse, não se tornaria humano”, como afirma Charlot
111

(2000, p.65). Nas aulas observadas é nítida a carência da valorização da identidade negra, isso
coaduna com as afirmações de Gomes (2005, p. 227) quando diz que a escola deve ser “[...]
um espaço em que aprendemos e compartilhamos não só conteúdos e saberes escolares, mas
também valores, crenças, hábitos e preconceitos raciais, de gênero, de classe e de idade.”.
Com base nas afirmações de Gomes (2005) observamos que as determinações da
LDBEN 9394/96 quanto à Lei nº 10.639/03 no que diz sobre a formação docente para o
trabalho pedagógico com as questões étnico-raciais do povo negro e indígenas, não estão
sendo cumpridas de maneira rigorosa nos cursos de formação docente, visto que são muitas as
dificuldades na operacionalização dos conhecimentos étnico-raciais em sala de aula. Contudo,
é preciso considerar o que nos fala Gomes (2005, p.150) ao afirmar que “todos nós estamos
desafiados a pensar diferentes maneiras de trabalhar com a questão racial na escola”. E isso se
faz urgente, caso contrário continuaremos a estar uma sociedade em que o racismo se
fortalece e se naturaliza nas nossas instituições.

6.3.2 As percepções dos professores /as sobre as questões étnico-raciais na sua prática
docente
A formação docente é de suma importância para existir uma prática pedagógica de
qualidade e conteúdos escolares eurocêntrica e, é claro, de que nos últimos anos a valorização
de uma formação docente plural e humana é solicitada a universidade, pois é ela que forma os
nossos profissionais. No caso dos docentes do CETEP observamos que muitos tem mais de 10
anos de formados, quando as questões étnico-raciais eram praticamente ignorados na
acadêmica e o mito da democracia racial persistiam no fazer pedagógica.
Sobre isso, Santos (2006) nos fala que a história narrada nas escolas é branca, a
inteligência e a beleza mostradas pela mídia também o são, portanto, as relações sociais
enfatizam a supremacia do povo branco sobre o povo negro e indígena. Ratificando a questão
da formação docente, Gomes, Oliveira & Souza (2010) também afirmam que

[...] educadores e as educadoras brasileiros não receberam na sua educação e


formação de cidadãos, de professores/as o necessário preparo para lidar com
o desafio da problemática da convivência com a diversidade. Os resultados e
as manifestações de discriminação resultantes dessa situação colocam o
nosso discurso em prol de uma escola democrática quotidianamente em
xeque e indagam a nossa postura profissional. (GOMES, OLIVEIRA &
SOUZA, 2010, p. 54).
É real o despreparo docente para lidar com a diversidade em sala de aula a ponto de
muitas vezes o professor/a não se perceber como o responsável na abordagem e ensinamento
das questões étnico-raciais principalmente do povo negro, sendo esse docente também, em
sua maioria negro, por exemplo, quando interrogados sobre a sua percepção de como o
112

estudante se comporta quando ele tematiza em suas aulas a história e cultura do provo negro,
os professores, em sua maioria, não afirmam que fazem um trabalho sistemático e quando
fazem dizem que os estudantes não valorizam a inserção desse tema nas aulas, como
observamos nos fragmentos abaixo:
Durante as minhas aulas não prendo as questões étnico-raciais apesar de
existirem. (Professor 1).

Não percebem, apesar da existência da Lei o currículo não contempla tais


questões. (Professor 2)

Não aprenderam a fazer uso dos princípios das relações raciais e não se
importam em conhecer.(Professor 5).

Os alunos preocupam-se e demonstram insegurança quando são discutidas


questões étnico- raciais. Não gostam de falar sobre o tema, mas tem
conhecimento da lei antirracismo (Professor 8).

Consideramos que independente do estudante valorizar ou não os conteúdos da


história e da cultura do povo negro, cabe a escola na pessoa do professor/a e dos gestores/as
inserir esse conhecimento instituído pela Lei nº 10.639/03. Freire (2009, p.38-39) fala da
importância da prática docente critica, considera importante a formação permanente dos
professores/as para atuação docente. Assim sendo

[...] a educação é permanente não por que certa linha ideológica ou certa
posição política ou certo interesse econômico o exijam. A educação é
permanente na razão, de uma lado, da finitude do ser humano, de outro, da
consciência que ele tem de finitude. Mas ainda, pelo falto de, ao longo da
história, ter incorporado à sua natureza não apenas saber que vivia mas saber
que sabia e, assim, saber que podia saber mais. A educação e a formação
permanente se fundam aí. (FREIRE, 1993 p. 20)
Tomando essa a direção, a formação continuada de professores/as deve incentivar a
apropriação dos saberes pelos professores/as rumo à autonomia considerando a prática
crítico-reflexiva para contemplar as determinações legais mais especial as questões
humanitárias.
É interessante observar que mesmo o professor/a não trabalhando continuamente os
conteúdos determinados pela Lei nº 10.639/03, mas percebe que a escola deve ser uma
instituição que neutraliza o racismo quando efetiva um trabalho nessa direção, porém ela não
faz esse trabalho porque é uma escola burguesa na sua concepção. Sobre esse entendimento,
um dos professores tem clareza disso e afirma que a
[...] instituição escolar que temos, desde o trabalho desenvolvido pelos
Jesuítas já apresenta o racismo. Ao mesmo tempo em que se trabalha o
racismo e o preconceito, ela reproduz a ideologia dominante do capitalismo
e do poder burguês. Ai escola pode seguir dois caminhos: a função de atuar
como emancipação humana e / ou como instrumento de dominação .O
113

racismo está imbricado nesse processo. Por isso é necessário uma nova
estrutura antirracista e democrática. (Professor 3)

Ainda nessa questão, podemos observar que também os depoimentos dos professores
dão conta das dificuldades na implementação da Lei nº 10.639/03 em sala de aula devido a
ausência de uma formação continuada nos conteúdos e práticas das questões étnico-raciais do
povo negro. Não participaram de nenhuma formação, curso, seminários, oficinas sobre o
tema, portanto desconhecem como trabalhar pedagogicamente esses conteúdos, mas
reconhecem que isso precisa ser resolvido com urgência para a efetivação dessa Lei em sala
de aula. Um dos depoimentos dá conta dessa questão:
As questões étnico raciais são um importante ponto para discussão e um
grande desafio na educação brasileira Enquanto pensamos na escola como
espaço de igualdade não reconheceremos as diferenças pessoais de nossos
alunos e não aprendemos a trabalhar com isso em sala de aula. Nós
professores, conhecemos o tema, mas não fazemos a devida abordagem nas
aulas, infelizmente. A temática precisa ser estudada de maneira
multidisciplinar, buscando perpassar conteúdos e disciplinas. (Professora 10)

Essas questões precisam ser estudadas nas turmas do PROEJA, porque os


estudantes são adultos e possuem uma vida social, pois além de estudantes
são pais, trabalhadores, possuem formação social. Logo, muitos sofrem
discriminações ou são excluídos. São temas que devem ser tratados nas
disciplinas de forma interdisciplinar, por meio de projetos. (Professora 6)

Kabengele (2005), afirma que é preciso que a escola tenha uma estrutura antirracista,
seja na prática educativa, seja na forma de gerenciar a escola e a educação, presente em
funcionários, estudantes, professores/as, comunidades, todos, pois os indivíduos são racista
porque vivem uma sociedade racista e o professor/a não está imune a isso. Nesse sentido, é
que ele diz que
[...] não precisamos ser profetas para compreender que o preconceito
incutido na cabeça do professor e sua incapacidade em lidar
profissionalmente com a diversidade, somando-se ao conteúdo
preconceituoso dos livros e materiais didáticos e às relações preconceituosas
entre alunos de diferentes ascendências étnico-raciais, sociais e outras,
desestimulam o aluno negro e prejudicam seu aprendizado. (KABENGELE,
2005. p.16)

6.4 Racismo e educação


Entendemos que o racismo só pode ser compreendido por meio de uma análise e
abordagem da sua formação particular em seu contexto histórico e geográfico diferenciado,
assim Munanga (2000, p. 21), demonstra o racismo trazendo dois aspectos : com discurso
doutrinário em forma de ideias apresentadas friamente nos livros o que chamamos de
científico ou racialismo elaborado no final do século XIX e o segundo aspecto ele é
entendido como uma prática política traduzida em discriminações concretas.
114

Nesse contexto o racismo brasileiro é entendido conforme Moura, (1994, p.160) como
uma estratégia que camufla o seu efeito perverso mas que possui uma eficiência para chegar
aos seus objetivos considerando que [...] não podemos ter democracia racial em um país onde
não se tem plena e completa democracia social, política, econômica, social e cultural. Para
Munanga (2006, p.9) o racismo e o preconceito racial excluem e dificultam a população negra
do acesso a escola e ao mercado de trabalho. Hélio Santos (2003 p.186-190) fala da
distribuição desigual de rendas no Brasil, reporta a impunidade quanto aos crimes de
“colarinho branco” e afirma que o pescoço também o é, reforça que a cadeia aqui é para os
“dois “pês” preto e pobre” e ainda que o pais possua uma “economia possante” assim sendo,
“essa brutal concentração de riquezas, apontada pelos técnicos estrangeiros e nacionais, só se
consolida e se perpetua em virtude das desigualdades raciais, que tiveram seu inicio há quase
meio milênio.” (SANTOS 2003, p.190).
Nesse bojo acreditamos que os nossos estudantes do PROEJA cuja maioria é negra e
traz em sua trajetória escolar as marcas do tratamento discriminatório que tem como
sustentáculo a concentração de renda no Brasil considerando que a nossa pobreza esta
“cristalizada na mão-branca.” Nesse sentido afirmamos que a “pobreza tem cor” portanto é
impossível não estabelecer uma comparação entre o racismo e a exploração capitalista no
Brasil.

6.4.1 Racismo e a prática docente

Os dados da pesquisa demonstraram uma prática pedagógica que muitas vezes traduz as
mazelas raciais presente nas sociedades. Tal postura é perceptível também nos discursos dos
professores/as arraigados de valores culturais preconceituosos, por exemplo, quando afirmam
que os estudantes não se interessam pelas questões étnico-raciais do povo negro, quando na
verdade são os professores/as que devem inserir esses conhecimentos em sua prática, mas,
como eles também não aprenderam a fazer o uso dos princípios das relações raciais fica mais
difícil resolver a questão no nível pedagógico, logo deve ser resolvido no nível curricular, em
que a escola deve seguir o reza a LDBEN 9394/96 quanto a inserção dos conteúdos da
história e cultura afro-brasileira e africana.
Quando perguntamos aos professores/as como eles/elas trabalham as questões de
racismo em sala de aula e ainda se eles/ elas percebem se os estudantes tem noção desse tipo
de preconceito? Todos os interrogados foram unanimes em afirmar que compreendem que
seus estudantes percebem as atitudes que denotam o racismo quando ele ocorre em sala de
aula mas também em outros espaços fora da escola. Um professor afirma que quando ocorre
115

alguma atitude racista em sala de aula ele interrompe a prática pedagógica para colocar o
debate em discussão. Como depoimento ilustrativo dessa questão, o Professor 3 diz que:
Os alunos percebem as questões étnico-raciais nos diferentes textos que
abordam sobre o assunto, nas correntes de pensamento de seus professores
nas disciplinas correlatas a exemplo de história afro-brasileira, na Lei 10.000
além de outros. Com relação ao currículo os alunos se sentem a e até
desiludidos porque o racismo nunca deixou apesar de inúmeros trabalhos e
discussões sobre o tema. Só que acontece na maioria das vezes de forma
sutil, camuflada, em receio a legislação antirracista que aponta o racismo
como crime. (Professor 3)

Os estudantes ao falarem dessa questão afirmam que os professores/as não mencionam


as questões étnico-raciais e quando aparece algum conflito e que tem relação com alguma
manifestação racista, geralmente os professores/as param as aulas para conversas sobre o
assunto, outras vezes não, continua suas aulas. Quando os estudantes foram interrogados
como eles viam o racismo na sociedade e na escola, comumente, respondem se tratar de um
preconceito que não ajuda a sociedade a superar as discriminações. Mas, as suas falas
demonstram uma serie de ideologias e de elementos racistas, por exemplo, eles afirmam que
todos são iguais, isso faz parte do mito da igualdade racial, observamos nos depoimentos essa
questão:
[...] porque somos todos iguais, independente da cor. (Estudante 03)

Para mim não vejo preconceito de cor, não tenho, mas vejo que para algumas
pessoas que não sabem ser felizes com as pessoas, existe sim. (Estudante
01)

Existe preconceito sim e muitas vezes envolve preconceito racial.


(Estudante 02)

Ao pensar a cor da pele e a identificação como elemento importante para o


estabelecimento de diferenças na escola percebemos a demarcação do lugar social do negro
na escola. Nesse sentido retomamos conforme nos orienta (SILVA, 2001 p. 157). o contexto
histórico quando ao direito à educação para os não brancos através da Lei nº 5.892/71 desde
então é facultado o acesso onde a lei reconhece o direito a escola para o povo negro.
Entretanto, a lei não veio acompanhado de formação acadêmica para os professores e nem
mudanças quanto ao livro didático trabalhado nas escola tais distorções ainda hoje reflete
nas escolas brasileira onde a ‘democratização’ foi feita nos moldes da qualidade de estudantes
atendidos e não da qualidade do ensino ministrado. Retomamos a Freire (2009 p.22,23) para
lembrar que ao longo da história da educação brasileira se atribui “a educação um poder que
ela não tem” ou que seja “ nega qualquer poder a ela”. Nesse sentido a educação brasileira
116

está marcada pelo antagonismo das concepções históricas das bases legais e principalmente
do ser humano.
Contudo sabemos que o racismo imprime marcas negativas para qualquer grupo étnico,
entretanto o povo negro são vítimas diárias. Nesse sentido para contrapor ao racismo faz-se
necessário formação profissional, construção de estratégias, praticas pedagógicas, releitura
histórica, sociológica, antropológica que compreendendo as particularidades do povo negro,
valorizando e reconhecendo a importância da ascendência africana. Consideramos que o
racismo é a mais cruel forma de discriminação já que o negro discriminado não pode mudar o
seu fenótipo e também porque

O racismo, como ideologia elaborada, é fruto da ciência europeia a serviço


da dominação sobre a América, Ásia e África. A ideologia racista se
manifesta a partir do tráfico escravo, mas adquire o status de teoria após a
revolução industrial europeia. Aimé Césaire, em seu Discurso sobre o
Colonialismo, escrito no imediato do pós-guerra, salienta que Cortez e
Pizarro pilhavam e matavam na conquista da América, mas que nunca
afirmaram “ser mandatários de uma ordem superior...os hipócritas só vieram
mais tarde. (MEMMI apud PEREIRA, 1978, p.22 ).
Assim sendo o racismo é um fenômeno ideológico tendo como base o preconceito e a
discriminação ele é carregada de equívocos doutrinários , ideológicos que tiveram no seu
passado bases “científicas” que já formam suplantadas ao longo da história do povo negro
mas as suas mazelas ainda estão presentes na sociedade. E como o professor/a esta imerso em
uma sociedade contraditória ele também age muitas vezes fortalecendo e disseminando
preconceitos, como o racismo. Em seus discursos aparentemente não-racista esconde o
racismo, observamos isso em uma das falas da professora do Centro quando diz,
[...] A questão agora é cultural. A gente agora tem que aprender a lidar com
isso. Já tem leis que proíbe esse tipo de coisas. Então a gente agora não só
por leis, mas por educação e por a gente pensar de outra maneira de outra
forma. Os filhos da gente agora. Na minha época meus pais não eram de
ruindade, tinham brincadeirinhas, tinham piadinhas. Hoje os meus filhos
jamais, não permite nem ouvir quanto mais falar uma piadinha a respeito
disso. Ave Maria se eles ouvirem. Hum. Já é uma questão assim que eu acho
de geração em geração nós vamos chegar e claro que vai ter sempre pessoas
que tenha preconceito, mas isso ai elas teriam preconceito por qualquer
coisa e que elas são pessoas realmente preconceituosas. (Professora 6).

Essa professora embora tenha uma preocupação com a não disseminação do racismo e
reconhece que ele é um prejuízo para a sociedade e que seus filhos não admitem qualquer tipo
de preconceito, mas o que podemos observar é que ela não percebe a presença dos
estereótipos e do preconceito para com o povo negro, desta forma o seu discurso reforça a
transmissão do preconceito. A sua fala também mostra que as novas gerações estão lidando
melhor com os preconceitos não admitindo-os do que as velhas gerações que foram criadas no
circulo de preconceitos.
117

Silva (2008, p.17 a 29) traz um relato sobre a ideologia e os estereótipos que são
reforçados através do livro didático que apresentam textos escritos e imagens que disfarçam a
imposição religiosa, invisibiliza a diversidade étnica, omite as questões sociais bem como o
reflexo histórico na sociedade e como consequência a vitima do racismo torna-se réu.
Sabiamente a autora orienta aos professores/as como corrigir ou reconstruir sua prática
pedagógica tendo o livro como embasamento teórico mas, recheando as suas paginas de
criticidade tornando ele um facilitador para a construção de uma consciência critica.
Quando perguntamos aos professores/as sobre a necessidade de construir na escola
como uma estrutura antirracista e democrática, todos respondem que sim, porém quando
justificam suas nem sempre estas confirmam o sim, mas um pensamento com elementos de
preconceitos. A título de exemplificação, um dos professores responde que “sim”, mas que se
deve levar “em conta que não podemos supervalorizar as minorias em detrimento dos que
promovem o desenvolvimento.” (Professor 5), esse mesmo professor afirmar ainda que “as
normas institucionais são reflexo da sociedade atual em detrimento de uma base de
desenvolvimento no geral inexiste o racismo institucionalizado” (Professor 5).
É interessante colocar que em relação à população negra no Brasil, ela não é uma
minoria em termos quantitativo, somos 51% dos 200,4 milhões de brasileiro, segundo o
Fundo Boabá (2015) contudo essa população ainda não é reconhecida pelo legado história,
social, cultural, política e econômica, toda essa riqueza ainda hoje está presente no cotidiano
do povo brasileiro.
O povo negro escravizado participou ativamente do processo de “colonização”
brasileira quanto escravo e na abolição quando deixamos as senzalas para vivermos as
margens de uma sociedade capitalista que continuou nos “escravizando” utilizando-se de
novas estratégias de exploração.
Nesse sentido o racismo tronou-se institucionalizado em forma de escola, trabalho e
oportunidade sociais. Nos discursos dos professores/as encontramos um discurso de que o
racismo precisa ser eliminado, mas ao mesmo tempo elementos racistas no discurso, seria essa
contradição que está impedindo dele concretizar em sua pratica pedagógica os conteúdos
étnicos raciais afro-brasileiro e africano? Precisamos pensar sobre isso.
“[...] ninguém nega que exista racismo no Brasil, mas sua prática é sempre
atribuída a ‘outro’. Seja da parte que age de maneira preconceituosa, seja
daquela de quem sofre com o preconceito, o difícil é admitir a discriminação
e não o ato de discriminar. Além disso, o problema parece ser o de afirmar
oficialmente o preconceito e não o de reconhecê-lo na intimidade. Tudo isso
indica que estamos diante de um tipo particular de racismo, um racismo
silencioso e sem cara que se esconde por trás de uma suposta garantia da
universalidade e da igualdade das leis e que lança para o terreno privado o
jogo da discriminação.
118

Esse autor continua falando que

Com efeito, em uma sociedade marcada historicamente pela desigualdade,


pelo paternalismo das relações e pelo clientelismo, o racismo só se afirma na
intimidade. E da ordem do privado, pois não se regula pela lei, não se afirma
publicamente. No entanto, depende da esfera pública para sua explicitação,
numa complicada demonstração de etiqueta que mistura raça com educação
e com posição social e econômica. ‘Preto rico no Brasil é branco, assim
como branco pobre é preto’, diz o dito popular. Não se ‘preconceitua’ um
vereador negro, a menos que não se saiba que é um vereador; só se
discrimina um estrangeiro igualmente negro enquanto sua condição estiver
pouco especificada. (SCHUWARCZ, 1998, p.181)

Consideramos que escola inserida nesse contexto traz uma ideologia racista muito forte
apresentado na fala dos professores/as na prática às vezes é camuflada pela crença na
democracia racial. Ponderamos que a escola exerce influência intelectual, cidadã e identitária
estudantes já que a identidade é definida pelos comportamentos, atitudes e costumes na
sociedade e pode modificar através do convivência social. Assim sendo acreditamos que
quando os temas sobre a diversidade étnico-racial, racismo e identidade não serem
abordados na sala de aula, pode acarreta a não-valorização da pessoa negra na sociedade.
Nesse sentido registramos que a mera obrigatoriedade da Lei nº10.639/03 não garante
que seja contemplada na prática pedagógica tais conteúdos, por outro lado o debate sobre a
Lei nº 10.639/03 na escola pode provocar reflexões sobre as concepções de diversidade que
permeiam as nossas práticas e os nossos currículos.

6.4.2 Racismo e os estudantes

Os estudantes reconhecem a existência do preconceito racial contra o povo negro e


falam das origens do racismo no Brasil, salientando sempre a história de escravidão do povo
africanos, pelos brancos da Europa, um dos depoimentos é representativo desse conhecimento
quando o Estudante 5, diz que conhece e que já estudou sobre a escravidão quando “os negros
foram trazidos pelos portugueses para serem escravizados no Brasil, pelos portugueses”. E
quando perguntamos sobre os legados do povo negro no Brasil, os estudantes respondem que
são muitos, como a “capoeira, candomblé, porem o candomblé não mostra boas intenção”
(Estudante 10), a “luta para alcançar a liberdade , a capoeira que é muito importante”
(Estudante 12), também a “dança , a crença no candomblé, embora não seja visto como boa
coisa” (Estudante 14).
Os depoimentos dão conta de que embora o candomblé seja um legado religiosos do
povo africano, também é o mais discriminado socialmente. Segundo Bastide (2001)
119

[...] foi no candomblé: [...] que o negro manteve vivo na sua memória uma
África mítica e guardando na religião seu antepassado, nas cerimônias cada
foguete era sinal que uma divindade veio da África possuir um de seus filhos
na terra do exílio; cada estrela que repentinamente cintilava acima das
plantas em germinação indica a quem passa que uma divindade “montou em
seu cavalo”, fazendo-o reviravoltear em torno do poste central, mergulhando
na noite de êxtase. (BASTIDE, 2001, p. 30)
A discriminação retratada na fala dos estudantes tem como resultado, segundo Póvoas
(2006, p 214), “todo um modo sui generis de pensar, de interpretar, de agir, curar, comunicar-
se com o sagrado era posto em prática no terreiro, cuja vida transcorria à margem da
civilização branca que, a todo custo, tentava sufocá-lo”.
Encontramos também nos depoimentos dos estudantes uma clareza de que o povo
africano contribui decisivamente para a cultura brasileira e para além da questão religiosa,
incorporando diversos outros elementos da civilização africana, como podemos observar em
dois depoimentos:
Sim, afinal a cultura africana ajuda muito a crescer culturalmente no Brasil.
(Estudante 03)

As contribuição da cultura de origem africana foi importante para a


construção da personalidade brasileira. Que são lindos. (Estudante 07).

No processo da produção discursiva dos estudantes sobre as questões raciais


introduzimos no diálogo uma atividade com poesia para aflorar aquilo que tínhamos como
intenção compreender, qual seja, como o racismo se fazia presente na escola e como era
trabalhado pela instituição. Trabalhamos com a poesia africana O choro da África de
Agostinho Neto, e em seguida fizemos o debate bastante enriquecedor e nesse processo íamos
inserindo questões de como o racismo se constitui e como fazer para amenizar seus efeitos e
sua força. No debate saiu discursos do tipo:
É muito importante a discussão desse assunto, porem não se discuti e aqui
nos temos racismo sim, porem deveriam agir contra e não só discutir.
(Estudante 01)

Não vem sendo estudado e ele existe sim e pode acontecer a qualquer hora e
não importa o lugar, acontecendo através brigas, preconceitos e
xingamentos. (Estudante 02)

Nenhum professor no meu curso tirou o tempo da aula para discutir sobre
o racismo na escola. Muito raro falar sobre o assunto. O racismo existe sim,
não só na escolar, mas praticamente em todo lugar. Na escola podemos
identificar quando encontramos uma pessoa negra e colegas colocam
apelidos. (Estudante 04)

Quando perguntamos nessa atividade com poesia se a Lei nº 10.639/03 fosse debatida
na escola ajudaria a ter uma atitude menos racista a ponto de não permitir nenhum apelido ou
120

forma preconceituosas de tratar os colegas, principalmente aqueles que são da cor preta, eles
responderam que sim, como podemos observar:

Simplesmente não se discuti está questão na escola e sei que é importante


discutir. Muito raro deveria ser discutido mais. Sim. Porque as oportunidades
deverias ser iguais para todos. (Estudante 07)

sim, mas não foi discutida em sala de aula, pois eu não conheço essa Lei.
Nas aulas não se discuti , não aborda, nenhum texto explicativo. (Estudante
10)

[...] se a Lei fosse ensinada podia ter mudança entre agente, mas ainda hoje
não se fala das questões étnico-raciais como estamos vendo nesse grupo.
(Estudante 04)

Sim, mas essa Lei não é discutida na escola e desconhecida, então não da
pra mudar a nossa forma de agir com os preconceitos. (Estudante 07)

Essas respostas nos instigam a pensar no papel da escola quanto a produção de outro
pensamento entre os estudantes no que diz respeito aos preconceitos e discriminações que
eles manifestam e, ao mesmo tempo, sofrem. O professor/a tem papel decisivo nesse
processo, como bem afirma Melo (2002, p. 101), quando diz que “[...] todos atribuem aos
professores um papel determinante e crucial, ainda que não exclusivo, para o futuro das
sociedades que lutam para alcançar uma educação de qualidade”. Coadunamos com o autor e
ressaltamos também que é preciso investir na formação e em práticas pedagógicas que
considerem os modos de pensar e fazer do povo afro- brasileiro.
Em relação ao que fazer contra as práticas racistas, utilizamos um documentário Vista a
minha pele, realizamos uma discussão nos grupos sobre o racismo na escola, como seria
possível a escola contribuir para eliminar ações racistas dentro e fora dessa instituição, e
ainda como ocorre o racismo na escolas. Para suscitar o debate a cerca das providencias
contra o racismo, os estudantes começaram a tomar consciência do que é possível fazer, por
exemplo, um dos depoimentos representa bem o nível de conscientização possibilitado pela
atividade:

O documentário é muito interessante, pois a questão racial é abordada de


forma invertida, como a história nunca contou. O filme mostra uma menina
branca que estuda onde predomina a cor negra. [...]o racismo deixou de ser
oculto no momento que a parte agredida não deixa que o autor fique
empune. (Depoimento da aluna do curso técnico em secretariado – CETEP-
2016).
Sobre o processo de conscientização, Freire diz que se trata de uma possibilidade de sair
de um pensamento ingênuo, para um pensamento critico através de uma pratica pedagógica
política, portanto trata-se de uma proposta filosófica, social, fundamentalmente uma tarefa
educacional, direcionada especificamente para a práxis pedagógica com finalidade
121

emancipadora, humanizadora. A humanização é para Freire (2001) uma luta contra a


desumanização, sendo que o caminho da emancipação humana se dá pelo resgate da sua
humanização e a educação é um desses caminhos.
Ainda sobre a situação do racismo apresentado no documentário exibido solicitamos
que os estudantes falassem sobre a narrativa do documentário, como eles se sentiam em
presenciar momento de preconceitos. Os relatos abaixo externalizam seus sentimentos em
relação ao racismo:
[...] É muito revoltante saber e ver em pleno século XXI acontecer tanta
descriminação no mundo. (Estudante 14)

[...] As questões raciais que são relatadas nos permite pensar nossa própria
realidade, nossa vida e como tratamos os outros. Tentamos ser uma garota
normal, que faz parte de um grupo, não somos aceitas por causa da cor da
pele. (Estudante 12)

[...] Achamos o filme interessante assim conseguimos perceber e entender


como se sente os negros sendo discriminados, porque só estando na pele para
sentirmos. É muito revoltante saber e ver em pleno século XXI acontecer
tanta discriminação no mundo. (Estudante 8)

Os estudantes demonstram revolta quando viram que na narrativa do filme os


personagens passam por momentos de discriminação racial. Consideramos esse primeiro
momento basilar para que haja uma mudança na postura desses estudantes quando tomam
consciência que o racismo é desumanizador, perverso e que não serve para ninguém. Mesmo
diante da farsa da democracia racial existe de que todos são iguais, os estudantes a partir das
atividades conscientizados perceberam que a grande mentira desse mito. Para Gomes (2008 )
a escola precisa,
Para que a escola consiga avançar na relação entre saberes
escolares/realidade social/diversidade étnico-cultural é preciso que
os(as)educadores(as) compreendam que o processo educacional também é
formado por dimensões como a ética, as diferentes identidades, a
diversidade, a sexualidade, a cultura e as relações entre outras.[...] Dessa
maneira, poderemos construir coletivamente novas formas de conivência
e de respeito entre professores, alunos e comunidade. (GOMES 2008, p.
143)

Consideramos que o documentário foi um elemento motivador que aguçou os


sentimentos já que é impossível não se indignar com a discriminação racial, levando os
estudantes a refletirem sobre o preconceito e o racismo na escola.
122

CONCLUSÃO

Diante da necessidade de compreender como está sendo implantada a Lei nº


10.639/03 e as questões étnico-raciais no currículo do curso do Centro Territorial de
Educação Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA no Curso de Secretariado –
PROEJA, nossa pesquisa buscou responder as questões: como vem se constituindo no
currículo praticado do CETEP – Sertão Produtivo, Curso Técnico do PROEJA – Secretariado
modulo III o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana em cumprimento a Lei nº
10.639/03? Como são trabalhadas, pedagogicamente, as questões de identidade do povo negro
e de racismo nessa escola? Como os estudantes e professores/as percebem o cumprimento
dessa Lei, na construção da identidade do negro e do racismo na escola?
Os objetivos foram compreender a institucionalidade da Lei nº 10.639/03 no
currículo do CETEP, analisando de que modo professores/as e estudantes percebem o
desenvolvimento da temática das relações étnico-raciais afro-brasileira, a construção da
identidade do negro e o racismo no espaço escolar, aprofundando os elementos teóricos
voltados aos estudos das relações étnico-raciais, analisando e sistematizando documentos
organizativos e da legislação brasileira e do CETEP relativo às relações étnico-raciais e
PROEJA, investigando as dimensões presentes ou não no contexto de documentos
organizativos do CETEP e nos discursos de professores/as e estudantes identificando os
conteúdos e as abordagens acerca das questões étnico-raciais do povo afro-brasileiro nas no
contexto do curso Técnico do PROEJA – Secretariado, do CETEP – Sertão Produtivo.
Elencamos para análises dos dados pesquisados duas categorias analíticas ou
filosóficas tais como: as relações étnico-raciais e história e cultura afro-brasileira na escola e
a construção e pertencimento da identidade étnico-racial na escola e na sociedade e como
categorias empíricas referem-se ao estudo da legislação, particularmente: a Lei no 9.394, de
20 de dezembro de 1996; a Lei de diretrizes e bases da educação nacional a Lei nº 10.639/03,
que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da
Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira; Matriz
Curricular; Projeto Político Pedagógico; Regimento Escolar; plano de curso; pasta individual
do estudante; currículo praticado e vivido na escola; percepção dos professores/as e
estudantes quanto as questões étnico-raciais e o racismo institucional e escola.
A pesquisa foi na concepção qualitativa em educação e os instrumentos utilizados
foram o questionário aberto, a observação, o grupo focal, a intervenção formativa com
estudantes e professores e a analise documental. Realizamos a pesquisa no primeiro semestre
de 2016.
123

Em linhas gerais, os dados demonstraram que os professores/as consideram


importantes as discussões sobre as questões étnico-raciais e afirmaram haver a ausência no
currículo praticado de uma visão histórica positiva sobre a história da África, que por certo
dificulta a construção de uma educação escolar que possibilite a inclusão social e o
desenvolvimento igualitário de todos/as. Tendo como base a análise das discussões durante a
entrevista semiestruturada com os professores, elencamos algumas dificuldades como: a) o
desconhecimento da temática étnico-racial e o significado do ensino da história afro-brasileira
e africana, b) dificuldades para buscar metodologias de ensino adequadas aos conteúdos
étnico-raciais, c) ausências de estratégias para orientação de estudantes em sala de aula sobre
as ocorrências racistas, d) formação profissional docente deficitária quanto ao tema, e) as
especificidades dos conteúdos principalmente do núcleo específico não possibilitam a
culminam no conteúdo étnico-racial.
Nesse sentido, reafirmamos a necessidade de estudar o povo negro como sujeitos
históricos, envolvidos num processo capitalista gerador e aprofundador de desigualdades
sociais, busca-se uma identidade negra positiva. Pondera-se ainda sobre a importância da
adequação da Lei ao currículo escrito e praticado, atendendo que os estudantes já estão
inseridos no mundo do trabalho, portanto é necessário a escola considerar o contexto da
sociedade caetitense bem como as vivências dos trabalhadores/as estudantes.
Avaliamos que, durante as ACs, contribuiu-se com a formação profissional dos/das
professores/as participantes, com as discussões teóricas e a escuta das dificuldades
apresentadas. Dialogamos com os professores/as sobre as dificuldades de adequação entre a
Lei e o núcleo comum e específico, eles/elas sinalizavam quanto à necessidade de formação
para atuação profissional, pondera-se acerca de dois vetos que incidiram na Lei nº 10.639/03,
mas ressalta-se a importância social afirmando que a Lei traz consigo uma seleção de
possibilidades para a realização de ações educativas que possibilite uma educação para a
libertação dos preconceitos raciais.
Nessa perspectiva, a lei perpassa o currículo escrito e, principalmente, o praticado e
clama por mudanças estruturais e institucionais, entretanto cabe aos professores/as a tomada
de atitudes para a efetivação das mudanças, buscando validar a luta dos movimentos sociais
pelo reconhecimento do direito do povo negro. Ressaltamos a importância de reconhecer e
profissionalizar as questões étnico-raciais aos conteúdos específicos e ao núcleo comum.
Desse modo, é preciso considerar o movimento de objetivação do currículo
(SACRISTÁN, 2000, p. 105) no sentido de compreender de que na ação docente há um
processo de modelar o currículo, o qual se dá não só em relação aos saberes curriculares, mas
também incorporando as experiências e trajetória de vida são incorporados nesse processo, em
124

que o docente é agente ativo, uma vez que “O plano que os professores fazem do ensino, ou que
entendemos por programação, é um momento de especial significado nessa tradução” (SACRISTÁN,
2000, p. 105).
Nessa perspectiva, destacamos aos professores/as que, durante as ações pedagógicas, é
preciso considerar o contexto das políticas de ações afirmativas e atentar à Lei n°10.639/03,
haja vista ser o resultado das lutas dos movimentos sociais e dos militantes da causa negra em
prol de uma educação de qualidade e de um currículo escolar com inserção na diversidade.
Isso significa estabelecer no Território de identidade – Sertão Produtivo, diretrizes e
com elas práticas pedagógicas que reconheçam a turbulência que marcou o processo de
escravidão no Brasil como uma época de conflitos e contradições.
Os dados da pesquisa demonstram que as questões étnico-raciais e o combate ao
racismo são considerados pouco evidentes em sala de aula, mas ao serem questionados os
estudantes trazem em suas memórias afirmativas voltadas à escravidão, à senzala e ao
pelourinho. Reafirmamos no CETEP que as questões afro-brasileira devem compor a
formação técnico-profissional dos estudantes, possibilitando refazer as concepções relativas à
população negra no sentido da construção de uma identidade positiva.
Assim, as reflexões estabelecidas a partir desse estudo permite pontuar algumas
sugestões para o Centro, tais como:
o adequar do currículo escrito e praticado às determinações da LDBEN;
o elaborar metas no plano de ação do PPP da escola que atenda às
especificidades do povo negro;
o articular, com a Universidade do Estado da Bahia- UNEB, cursos, oficinas,
rodas de leituras para possibilitar a formação profissional em relação à temática.
o aproximar a escola dos movimentos sociais para que ela inclua discussões
sistemáticas voltadas à superação do racismo e à diversidade étnico-cultural.
A pesquisa evidenciou ainda na fala dos/as estudantes que na sociedade brasileira, ainda
se sente o peso das restrições de uma sociedade escravocrata, organizada em classes sociais, o
peso da riqueza construída com as desigualdades econômicas, o peso da miséria e da fome, da
“má sorte de alguém para a “boaventura” do outro, representada pela exploração e pela
alienação do trabalho servil. Quanto ao sentimento de indignação e de espanto, as
personagens escravas ganharam “corpo”, reafirmando a cada dia o compromisso e a garantia
que jamais seriam esquecidos, a fim de superar, de qualquer maneira, a formação histórica
que edifica a invisibilidade e o isolamento do povo negro na literatura apresentada na
academia. Percebemos durante os encontros em grupos focais o empoderamento e o desejo
dos estudantes em buscar conhecimento sobre a sua ancestralidade de forma positiva.
125

Faz-se necessária a adequação da Lei nº 10.639/03, proporcionando o reconhecimento e


a importância do estudo da África para a compreensão social e política do Brasil. Deste modo,
afirma-se a necessidade de formação profissional, uma vez que durante a Jornada Pedagógica
os debates e os questionários realizados com os/as professores/as sinalizaram a necessidade de
uma formação profissional para toda a comunidade escolar que atua no CETEP. Ademais,
os/as professores/as reafirmam que exercem uma prática pedagógica pautada nas reflexões,
mas que carecem de conhecimentos sobre a Lei n° 10.639/03 e, portanto consideram a
necessidade de formação continuada.
Apontamos como encaminhamentos à necessidade de adequação da Lei n°10.639/03
no currículo escrito e praticado no curso Técnico em Secretariado modulo III. Por tratar-se de
um direito social e subjetivo, ou seja um pré-requisito a possibilidade da conquista da
emancipação humana. E ainda para estudos futuros, sugerimos a realização de estudos com
um maior número de cursos a fim de evidenciar como a Lei está sendo implementada nos
currículos do ensino técnico profissionalizante.
Portanto, há a necessidade de intervenção efetiva dos órgãos estatais para garantir a
formação profissional na escola e a equidade de direitos que promova o atendimento das
demandas dos movimentos sociais já que a promulgação da Lei é o reconhecimento da
contribuição cultural dos afro-brasileiros.
Acreditamos não ser possível pensar em políticas públicas sem considerar os sujeitos a
quem elas beneficiarão, ponderando a respeito da importância da pesquisa como possibilidade
para o embasamento teórico e, também como possibilidade oferecida para estudos vindouros.
Haja vista que esta pesquisa é o começo de uma longa história carregada de paixões e
desencantos que tem as suas raízes na África, mas os tentáculos em todos os rincões do Brasil.
Portanto, parafraseamos Paulo Freire ao se sentir “inconcluso” reafirma que a educação é
capaz de mudar paradigmas. Assim, estudar e defender as questões étnico-raciais é pontuar o
erro imediatamente e dar o exemplo de assertividade com bom senso e justiça – é dever do
povo brasileiro.
Defendemos a posição favorável à convivência respeitosa e digna entre todos os
segmentos sociais, buscando formas de superação do racismo para a construção de uma
verdadeira democracia racial na qual se ressalta a importância de se implementar ações
afirmativas a fim de superar e ou de romper com o mito da democracia racial tão divulgada no
Brasil. Embora deva se denunciar o racismo e a discriminação racial sempre que se fizer
necessário.
126

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APÊNDICES

APENDICE A –

. CRONOGRAMA DAS VISITAS AO LÓCUS DA PESQUISA


138

Etapas de realização da Pesquisa


01/02 a 29/04/2016
Data Evento Atividade Resultado
01/02 a Jornada Pedagógica Socialização do projeto. Sensibilização dos
03/02/2016 Aplicação de questionário professores/as para a
aberto realização da pesquisa;
Registros dos diálogos;
Coleta de dados.
01/ 03/a04 Aplicação do questionário Diálogo com as gestoras; Aplicação de
/03/2016 com as gestoras; Dialogando com a turma; questionário;
Apresentação do projeto Organização do grupo focal; Estabelecendo parceria
para os estudantes; Observação de aula; com os estudantes;
Observação da práxis Diálogo sobre a formação da Discussão sobre o
pedagógica. sociedade brasileira; projeto de pesquisa
Aplicação da pesquisa (professora / estudantes);
semiestruturada Informações sobre a
Participação nas ACs tramitação da Lei;
Diálogo com os
professores sobre a
importância da Lei nº
10.639/03;
Registros dos diálogos.

15/03 a Paralisação
19/03
29/03 a Aplicação de questionário Diálogo sobre a Lei n° Reflexão sobre a Lei
01/04/2016 com as gestoras 10.639/03. com os professores;
Grupo focal Estabelecimento de
Apresentação da Lei relações entre a Lei
n°10.639/03 n°10.639/03 e a práxis.
Discussão sobre a
Participação nas ACs importância da Lei
(professor/a estudantes);
Registros dos diálogos.

06/04 a Apresentação do vídeo: Assistir ao vídeo; Discussão sobre o vídeo


08/04/2016 Vista a minha pele Diálogo com os (Professor/a /estudante /
Observação da práxis estudantes/alunas estudantes)
pedagógica. Diálogo sobre a Lei Registros dos diálogos;
Aplicação questionário n°10.639/03;
Participação nas ACs Considerações sobre Resolução de questões
currículo e a determinação propostas pelos
da LDBEN e as práticas estudantes;
docentes; Reflexões durante as
ACs.
13/04 a Paralisação
15/04/2016
27/04 a Grupo Focal Analise da Leitura do texto; Reflexões e análise
29/04/2016 poesia africana. (O choro da Analise do texto; sobre o texto;
África) Elaboração de relato Registros dos diálogos;
Observação da práxis Socialização dos relatos;
pedagógica. Resolução de questões
Aplicação do questionário propostas pelos
Participação nas ACs estudantes.
139

04/05 a Entrevista com a monitora Questionário; Registros dos diálogos;


06/05/2016 dos Centros de Educação Finalização da pesquisa e
Profissional da Região Considerações finais.
Sudoeste .
Observação da práxis
pedagógica.
Aplicação d3 questionário;

Participação nas ACs;


Finalização da pesquisa de
campo

APÊNDICE B
140

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS
MESTRADO PROFISSIONAL MPEJA/DEDC-I

CELESTE APARECIDA PIMENTEL

PROJETO DE INTERVENÇÃO COM OS DOCENTES

A ÁRVORE DOS MEUS SONHOS NÃO FICOU LÁ ÁFRICA...FOI ALÉM DO


ATLÂNTICO...

SALVADOR/BA

2016

APRESENTAÇÃO

Nome do projeto: A Lei nº 10.639/03 e as questões étnico-raciais no currículo do curso do


Centro Territorial de Educação Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA. Um estudo no
curso Técnico em Secretariado – PROEJA
141

Nome da intervenção - A árvore dos meus sonhos não ficou lá África... Foi além do
Atlântico...

Área de Concentração: Educação, Meio Ambiente e Trabalho.

Área do conhecimento: Humanas, Exatas, Ciências da natureza e Linguagens

Localização: CETEP – do Sertão Produtivo

APRESENTAÇÃO

Concomitante a realização do projeto de pesquisa como o tema : A Lei nº 10.639/03


e as questões étnico-raciais no currículo do curso do Centro Territorial de Educação
Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA. Um estudo no curso Técnico em Secretariado
– PROEJA. Sentimos a necessidade de elaborar um instrumento pedagógico que pudesse ser
norteador para a construção e reconstrução de saberes para a valorização da riqueza cultural,
politicas e econômica do continente africano. Assim idealizamos o projeto de intervenção
denominada A árvore dos meus sonhos não ficou lá África... Foi além do Atlântico...
teremos como objetivo subsidiar ações para o enfrentamento do preconceito racial , através da
capacitação dos professores /as para a construção da identidade positiva através da prática
pedagógica. As intervenções estão organizadas em 12 encontros realizados durante a I
unidade de 2016, com duração entre 1:00 a 1:50 horas totalizando 16:00 de formação,
envolvendo os professores /as em ACs e os professores/as que atuam no curso técnico em
secretariado modulo III e a pesquisadora. Trata-se de uma pesquisa qualitativa baseada em
Ludke e André (2012) como estratégias para o trabalho investigativo elegeram o grupo
dialogal durante as ACs, conforme Domingues (2006). Na fundamentação teórica traremos
Freire sobre humanização e contextualização dos conteúdos. Munanga e Gomes (2006)
Gomes (2007) e outros que nos darão sugestões e informações sobre prática pedagógicas que
enriquecera a nossa visão de mundo e de humanidade.

INTRODUÇÃO

A população brasileira possui como característica básica a diversidade étnica, fruto do


processo histórico construído pelas relações inter-raciais, contudo evidencia dominação do
142

colonizador sobre os povos colonizados essas mazelas reaparecem hoje em forma de


discriminação racial. O projeto de intervenção tem como público alvo os 08 professoras /as
do Curso Técnico em Secretariado do CETEP- do Sertão Produtivo, no período de 01/03 a
05/05/2016, perfazendo 12 encontros com duração entre 1h a 1h50 horas totalizando 16h de
formação. Por ter como espaço de dialogo durante as ACs construímos saberes com todos os
professores/as e articuladores/as que participavam desta atividade.
As questões que orientam o nosso projeto são: Os professores/ as do módulo III curso
técnico em Secretariado-CETEP- Sertão Produtivo conhecem as políticas públicas que
norteiam a educação no Brasil? O currículo do CETEP atende as especificidades da LDBEN?
Como são trabalhadas as questões étnico-raciais na escola? Assim sendo o nosso objetivo é
subsidiar ações para o enfrentamento do preconceito racial, através da capacitação dos
professores/as para a construção da identidade positiva. A metodologia proposta é uma
abordagem com método qualitativo, baseado em Ludke e André (2012) como estratégia de
pesquisa utilizará o grupo dialogal conforme Domingues (2006). O projeto contará com 12
intervenções durante as atividades complementares com início em 01/03 a 05/05/2015
totalizando 16h horas de formação sobre as questões étnico-raciais no currículo do CETEP.

JUSTIFICATIVA

Ao povo negro foi negado diversos direitos sociais e politicas entre eles o
direito a educação. Em oposição a está realidade os movimentos negro da vai denunciar o
mito da democracia racial e assim reivindica ao Estado leis antissegregacionistas, como
também assumir um compromisso para promover melhores condições de vida da população
negra, nesse sentido nosso objetivo é subsidiar as professores/as o conhecimento sobre a Lei
nº 10.639/03 e a LDBEN para a construção de uma identidade positiva .
As intervenções propostas fundamentaram-se nos conceitos de ensino, identidade,
pertencimento currículo escrito e praticado estabelecendo relações com as questões étnico-
raciais buscando superar toda e qualquer forma de preconceito e discriminação.

Na perspectiva de luta pela equidade e valorização das diferenças afirmando a


identidade e caminhando na construção de uma escola multiplica , Freire (2009 ) traz em
seus diálogos que o estudo crítico corresponde um ensino igualmente crítico que demanda
necessariamente uma forma crítica de compreender e de realizar a leitura da palavra e a leitura
do mundo, leitura do texto e leitura do contexto (FREIRE, 2009, p.33).
Assim sendo o projeto de intervenção se justifica pela necessidade de abordar as
temáticas raciais que envolvem o cotidiano e na prática pedagógica dos professores/as
143

promovendo uma discussão sobre a realidade para fortalecer em busca da equidade étnico-
racial e da valorização da diversidade. Considerarmos ainda que o estudante do PROEJA já
está inserido no mundo do trabalho portanto é necessário fortalecer o papel do professor/a
para que através da prática pedagógica possibilite os estudantes a intervenção nos diversos
espaços sociais, políticos e econômicos possibilitando o respeito as questões da equidade
étnico-racial e da valorização multiculturais, como definido por Gonçalves & Silva, (2003):

O multiculturalismo é o jogo das diferenças, cujas regras são definidas nas


lutas sociais por atores que, por uma razão ou outra, experimentam o gosto
amargo da discriminação e do preconceito no interior das sociedades em que
vivem (...). Isto significa dizer que é muito difícil, se não impossível,
compreender as regras desse jogo sem explicitar os contextos sócio
históricos nos quais os sujeitos agem, no sentido de interferir na política de
significados em torno da qual dão inteligibilidade a suas próprias
experiências, construindo-se enquanto atores (GONÇALVES & SILVA,
2003, p. 111).

Ressaltamos que várias políticas públicas de reparações, e reconhecimento e


valorização do povo negro são implementadas no âmbito educacional, visando o combate ao
racismo e discriminação como informa os Parâmetros Curriculares Nacionais PCN’s:19 que
traz.

Uma proposta curricular voltada para a cidadania deve preocupar-se


necessariamente com as diversidades existentes na sociedade, uma das bases
concretas em que se praticam os preceitos éticos. É a ética que norteia e
exige de todos, e da escola e educadores em particular, propostas e
iniciativas que visem à superação do preconceito e da discriminação.
(BRASIL, 1997, p. 129)

Ainda nesse sentido em janeiro de 2003 foi promulgada a Lei nº 10.639/03 que
estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira nas escolas
brasileiras. A Lei foi regulamentada pelo Parecer CNE/ CP/2004 e pela Resolução CNE/CP
01/2004 que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana no âmbito de
todo o currículo escolar. A lei é uma medida de ação afirmativa que altera a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 9.394/1996, através do seu Artigo 26 A e 79
A e B estabelece obrigatoriedade da inclusão do ensino da História da África e da Cultura
Afro- Brasileira e Africana. Com a aprovação da lei, foi criada, em 2003, a Secretaria

19
PCN’s - Os Parâmetros Curriculares Nacionais são referenciais para o Ensino Fundamental e Médio do país,
elaborado pelo
Governo Federal, com o objetivo de propiciar subsídios à elaboração e reelaboração do currículo, tendo em vista
um projeto
pedagógico em função da cidadania .
144

Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), objetivo de corrigir as


mazelas de passado escravocrata, que tem como herança a discriminação e o racismo.
Ainda nessa perspectiva a Lei Federal nº 12.288/10 que institui o Estatuto da Equidade
Racial política de ação afirmativa deixa claro no Art. 4º caput e seus Incisos a garantir a
participação da população negra em condições de igualdade de oportunidade sendo
prioritariamente por meio de políticas públicas. Para tanto determina a modificação das
estruturas institucionais do Estado para adequar e superar as desigualdades étnicas decorrentes
do preconceito e da discriminação, eliminação de obstáculos históricos, socioculturais e
institucionais nas esferas públicas e privadas.

Essas leis são fruto da luta dos movimentos sociais buscando forma de ressarcir
a população negra de danos sociais, políticos e educacionais sofridos ao longo de décadas.
Assim sendo a escola precisa ser veiculo para a superação do preconceito e da discriminação
étnica já que
não precisamos ser profetas para compreender que o preconceito incutido na
cabeça do professor e sua incapacidade em lidar profissionalmente com a
diversidade, somando-se ao conteúdo preconceituoso dos livros e materiais
didáticos e às relações preconceituosas entre alunos de diferentes
ascendências étnico-raciais, sociais e outras, desestimulam o aluno negro e
prejudicam seu aprendizado. (KABENGELE, 2005. p.16)

Nesse sentido é papel do estado a implementação de ações afirmativas e programas


destinados a reparar as distorções, desigualdades e práticas discriminatórias.
No caso específico do problema da desigualdade e da discriminação racial
no sistema escolar, é flagrante o hiato que separa os enunciados legais, os
direitos anunciados nos tratados internacionais da alarmante realidade,
visível a olho nu, diagnosticada nos estudos e pesquisas sobre o tema e
denunciada, há décadas, pelas entidades do Movimento Negro. (SILVA JR,
2002: pg. 11).
Assim sendo a luta do movimento negro para romper com o paradigma da
discriminação e por uma vida mais digna da população negra é por vez ignorada nas práticas
pedagógicas e nos currículos escritos e praticados nas escolas brasileiras o que vai contribuir
para legitimar vivências de discriminação em virtude da cor, preconceito, descrédito,
evidenciando a exclusão do negro/a da igualdade de oportunidades.

OBJETIVO GERAL
Subsidiar ações para o enfrentamento do preconceito racial, através da capacitação dos
professores /as para a construção da identidade positiva no processo pedagógico.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
145

Estimular interferências contra atitudes e comportamentos racistas para um novo


enfoque no processo pedagógico.
Buscar condições necessárias para o enfrentamento ao racismo e discriminação;
Discutir sobre os preconceitos e os estereótipos na sala de aula;
Refletir sobre o currículo como protagonista para construção de práticas pedagógicas.

META/ FINALIDADES
Construção coletivamente conhecimento histórico, político e social visando o
fortalecimento de uma identidade positiva;
Compreensão sobre o currículo escrito e praticado;
Contribuições para a formação dos/as professores /as tendo como base a Lei nº
10.639/03;
Reflexão sobre o racismo, discriminação e exclusão social para intervir de forma
consciente;
Reconhecimento o racismo, opondo se a ele e valorizando as diferenças;
Afirmar a identidade para a construção de possíveis interlocutores;
Compreensão para o respeito as expressões culturais do povo negro que compõem a
história do país.
CONTEÚDOS

O currículo escrito e praticado.

A Lei n° 10.639/03, Lei nº 12.288/10 e a LDBEN 9394/96.

As questões culturais do povo negro.

A identidade como requisito para arguir contra a discriminação racial.

METODOLOGIA E PROCEDIMENTO METODOLÓGICOS

O Projeto de intervenção está em consonância com a dissertação de mestrado


profissional MPEJA cujo tema é A Lei nº 10.639/03 e as questões étnico-raciais no currículo
do curso do Centro Territorial de Educação Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA.
Um estudo no curso Técnico em secretariado – PROEJA.
O projeto contará com a participação dialógica de todos os professores/as que
participarem da atividade complementar entretanto o projeto de intervenção será executado
com os professores/as que atuam no III modulo do curso técnico em secretariado.
Contaremos com a participação de 08 professores/as, realizaremos 12 intervenções durante e
146

após as Atividades Complementares com duração de 1h a 1h50 nos turnos vespertinos e


noturnos totalizando 16 horas de formação. A metodologia proposta é pesquisa com método
qualitativo, baseado em Ludke e André (2012). Os autores nos informam que a pesquisa
qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador com seu
principal instrumento (LUDKE E ANDRÉ, 2012 p. 12).
Ainda sobre o pesquisador, Ludke e André (2012 p. 05) orientam que não existe
possibilidade de se estabelecer uma separação nítida e asséptica entre o pesquisador e o que
ele estuda e também os resultados do que ele estuda. Assim sendo para o desenvolvimento da
pesquisa utilizaremos o referencial teórico, análise documental, observações e grupo dialogal,
buscando através das arguições orais ações que permitirão entrar em contato direto com o
tema investigado, oportunizando através dos meios disponibilizados o atendimento das
necessidades dos professores/as. Nesta perspectiva desenvolveremos tarefas de planejar,
operacionalizar ações de formação, como estratégia utilizaremos o grupo dialogal conforme
Domingues (2006) por trata-se de

“[...] uma estratégia para o trabalho investigativo, alicerçado num conjunto


de técnicas (entrevistas livres e semiestruturadas) que se assemelha, em
alguns aspectos, ao grupo de opinião, principalmente pela oportunidade dada
aos entrevistados/participantes para dividirem suas opiniões, discutirem e
trazerem à tona fatores críticos. No entanto, inova na inserção da
pesquisadora assumindo o papel de coordenação ao mesmo tempo em que
participa das discussões, e também pela sobreposição do espaço institucional
de encontro dos grupos (o local de formação e o local do debate e da
pesquisa)” (DOMINGUES, 2006, p.170).

Assim sendo desenvolveremos o projeto estabelecendo o dialogo com os/as


professores/as estando em consonância com (Freire, 2009, p. 79) que nos fala “[...] o diálogo
é uma exigência existencial”. Para tanto contando com cinco etapas: a) apresentação do
projeto de intervenção, b) sensibilização para a participação c) teórica com leituras, análise e
coleta de dados, d) resolução individual do questionário semiestruturado ao final de cada
encontro e) avaliação dos trabalhos. Para nortear a discussão, elaboramos um roteiro de
perguntas para ser respondidas individualmente O roteiro foi utilizado de forma flexível e
continha questões referentes as questões étnico- raciais .

Desenvolveremos as atividades seguindo o cronograma, assim no dia 01/03/a


03/03/2016 realizaremos a apresentação do projeto de pesquisa, sensibilização quanto a
necessidade de participação de todos e proposta das atividades durante as ACs, com todos os
professores participantes, leitura e assinatura do termo de consentimento para a realização da
147

pesquisa. Realizaremos um dialogo sobre identidade e pertencimento. Buscando compreender


como os /as professores /as pesquisados/as se identificam apresentaremos um questionário
semiestruturado. Em 29/03/ a 31/03/2016, apresentação e discussão sobre a Lei nº 10.639/03 e
a Lei nº 12.288/10 que institui o Estatuto da Equidade Racial são políticas de ações
afirmativas, fruto de anos de luta do Movimento Negro no Brasil.

Em 06/04/08/04 /2016 discussão sobre III Conferência Mundial 20, contra o racismo,
discriminação racial, xenofobia e intolerâncias correlatas; 27/04/29/04/2016, analise e
discussão sobre a LDBEN e o currículo escrito e praticado; 05/05/2016 culminância do
projeto.

Ressaltamos que realizaremos os encontros dialógicos com todos os professores/as que


participarem das atividades complementares, mas particularizaremos os professores/as que
atuam no III módulo do curso técnico em Secretariado para responderem o questionário
semiestrurado.

Os resultados da pesquisa serão apresentados em forma de gráficos e ou tabela e as


arguições serão transcritas para a dissertação de mestrado.

CRONOGRAMA DE ATIVIDADES

Mês Data Duração Atividade


Março 01/03/2016 a 3:50 Apresentação do projeto
03/03/2016 Sensibilização
Discussões
Resoluções do roteiro de entrevista
Avaliação dos trabalhos
29/03/2016 a 3:00 Leitura e interpretação de textos ;
31/03/2016 (Apresentação da Lei nº 10.639/03 e Lei nº 12.888/10 )
Discussões,
Resoluções do roteiro da entrevista
Avaliação dos trabalhos
Abril 06 a 08/04 3:50 Leitura e interpretação de textos (III Conferência Mundial)
Discussões
Resoluções do roteiro da entrevista
Avaliação dos trabalhos
27 a 29/04 3;50 Leitura e interpretação da LDBEN e Currículo escrito e
praticado
Resoluções do roteiro da entrevista
Avaliação dos trabalhos
Maio 05/05 1:50 Culminância
Avaliação dos trabalhos

CONSIDERAÇÕES FINAIS

20
A Declaração e o Programa de Ação de Durban constam do Relatório da Conferência Mundial contra o
Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Intolerância Correlata, documento das Nações Unidas
A/CONF.189/ 12.
148

A escola brasileira ao longo da sua caminhada possui uma visão eurocêntrica e um


projeto educacional que tem como ideal a homogeneização, esse falso ideário de igualdade
legitimado pelo “mito da democracia racial” constitui nossa nação equivocado na escola.
Assim sendo buscaremos reconhecer através da fundamentação teórica que as mazelas
advindas do racismo podem e deve ser suplantada através da construção de uma identidade
positiva com a valorização da multiculturalidade .
Acreditamos que essa intervenção contribuirá para a formação de uma identidade
positiva dos/as professores/as possibilitando arguições contra o racismo, discriminação e
exclusão social e ainda a construção de possíveis interlocutores contra toda forma ideológica
de submissão. Buscaremos atender o que reza os PCN’s (1997)
A intencionalidade se faz necessária como produto de uma reflexão que
permita ao professor perceber o papel que desempenha nessa questão. É
também a capacidade de perceber que tem o que trabalhar em si mesmo, e
isso não o impede de trilhar, junto com seus alunos, o caminho da superação
do preconceito e da discriminação. Trata-se de ter a certeza de que cada um
de seus gestos pode fazer a diferença entre o esforço de atitudes inadequadas
e a chance de abrir novas possibilidades de diálogo, respeito e solidariedade.
(PCN’s 1997: pg. 139)
Portanto consideramos grandes os desafios para a realização da formação de
professores/as, para atender a determinação da LDBEN e dos PCN’s, quanto às questões
étnico-raciais, entretanto é necessário romper com as barreiras e promover uma formação
buscando a conscientizar dos professores/as para o combate a discriminação e o preconceito
que afasta e estigmatiza o povo negro nas escolas brasileira .

REFERÊNCIAS
BRASIL, Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9.394,
de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
1996.
BRASIL, Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a lei n. 9.394, de 20 de dezembro de
1996. [200-]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ civil_03/Leis/2003/L
10.639.htm>. Acesso em 20 de maio de 2015.
BRASIL. Lei 12.288,/2010 Estatuto da Igualdade Racial . Disponível em
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/.../L12288.htm> acessado em 10 de
Janeiro 2016.
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
pluralidade cultural, orientação sexual / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF, 1997.
149

DOMINGUES, I. Grupos dialogais: compreendendo os limites entre pesquisa e formação. In:


PIMENTA, S. G.; GHEDIN, E.; FRANCO, M. A. S. Pesquisa em educação: alternativas
investigativas com objetos complexos. São Paulo: Edições Loyola, 2006, p. 165-182.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 40. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2009.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 26. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
LAFFIN, Maria Hermínia Lage Fernandes. Currículo sem Fronteiras, v.12, n.1, pp. 210-228,
Jan/Abr 2012. Acessada em 06/11/2015. Disponível em
http://www.curriculosemfronteiras.org/vol12iss1articles/laffin.pdf
KABENGELE Munanga, org. Superando o Racismo na escola. 2ª edição revisada /. –
[Brasília]: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade, 2005. 204p.
GONÇALVES, L.A.O.; SILVA, P.B.G. O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus
contextos. 3.ed., Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo: uma reflexão sob a prática. Porto Alegre: Artmed.
2000.
SILVA Jr. Hédio. Discriminação racial nas escolas: entre a lei e as práticas sociais. Brasília:
UNESCO, 2002.
150

APÊNDICE C

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS - MESTRADO PROFISSIONAL
MPEJA/DEDC-I

CELESTE APARECIDA PIMENTEL

PROJETO DE INTERVENÇÃO COM OS ESTUDANTES

A ÁRVORE DOS MEUS SONHOS NÃO FICOU LÁ ÁFRICA...


FOI ALÉM DO ATLÂNTICO...

SALVADOR/BA, 2016
151

APRESENTAÇÃO

Concomitante a realização do projeto de pesquisa como o tema : A Lei nº 10.639/03


e as questões étnico-raciais no currículo do curso do Centro Territorial de Educação
Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA. Um estudo no curso Técnico em secretariado
– PROEJA. Sentimos a necessidade de elaborar um instrumento pedagógico que pudesse ser
norteador para a construção e reconstrução de saberes para a valorização da riqueza cultural,
politicas e econômica do continente africano.
Assim idealizamos o projeto de intervenção denominada A árvore dos meus sonhos não
ficou lá África... Foi além do Atlântico... temos como objetivo subsidiar ações para o
enfrentamento do preconceito racial , através da capacitação dos estudantes para a construção
da identidade positiva. As intervenções estão organizadas em 12 encontros realizados durante
a I unidade de 2016, com duração de 1:30h, envolvendo os estudantes e pesquisadora.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa baseada em Ludke e André (2012) como
estratégias para o trabalho investigativo elegeram o grupo dialogal conforme Domingues
(2006). Na fundamentação teórica traremos Freire sobre humanização e contextualização dos
conteúdos. Munanga e Gomes (2006) Gomes (2007) e outros que nos darão sugestões e
informações sobre prática pedagógicas que enriquecera a nossa visão de mundo e de
humanidade

INTRODUÇÃO

A população brasileira possui como característica básica a diversidade étnica, fruto do


processo histórico construído pelas relações inter-raciais, contudo evidencia dominação do
colonizador sobre os povos colonizados essas mazelas reaparecem hoje em forma de
discriminação racial. O projeto de intervenção tem como público alvo os 14 estudantes do
Curso Técnico em Secretariado do CETEP- do Sertão Produtivo, no período de 01/03 a
05/05/2016, perfazendo 12 encontros com duração entre 1:00 a 1:30 horas totalizando 16:00
de formação sobre as questões étnico-raciais.
As questões que orientam o nosso projeto são: Os estudantes do módulo III curso
técnico em Secretariado-CETEP- Sertão Produtivo possuem uma identidade positiva? Os/as
estudantes do CETEP- Sertão Produtivo conhecem as políticas públicas que norteiam a
educação no Brasil? Assim sendo o nosso objetivo é subsidiar ações para o enfrentamento do
preconceito racial, através da capacitação dos estudantes para a construção da identidade
152

positiva. A metodologia proposta é uma abordagem com método qualitativo, baseado em


Ludke e André (2012) como estratégia de pesquisa utilizará o grupo dialogal conforme
Domingues (2006).
Ao povo negro foi negada diversos direitos sociais e politicas entre eles o direito a
educação. Em oposição a está realidade os movimentos negro da vai denunciar o mito da
democracia racial e assim reivindica ao Estado leis antissegregacionistas, como também
assumir um compromisso para promover melhores condições de vida da população negra,
nesse sentido nosso objetivo é subsidiar os estudantes o conhecimento sobre a Lei nº
10.639/03 para a construção de uma identidade positiva .
Na perspectiva de luta pela equidade e valorização das diferenças afirmando a
identidade e caminhando na construção de uma escola multiplica , Freire (2009 ) traz em
seus diálogos que o estudo crítico corresponde um ensino igualmente crítico que demanda
necessariamente uma forma crítica de compreender e de realizar a leitura da palavra e a leitura
do mundo, leitura do texto e leitura do contexto (FREIRE, 2009, p.33).
Assim sendo o projeto de intervenção se justifica pela necessidade de abordar as
temáticas raciais que envolvem o cotidiano dos estudantes promovendo uma discussão sobre a
realidade para fortalecer em busca da equidade étnico-racial e da valorização da diversidade
considerarmos ainda que estudante do PROEJA já está inserido no mundo do trabalho
portanto é necessário fortalecer o papel que exercem nos diversos espaços sociais, políticos e
econômicos possibilitando estudantes o respeito as questões da equidade étnico-racial e da
valorização multiculturais, como definido por Gonçalves & Silva, (2003):
O multiculturalismo é o jogo das diferenças, cujas regras são definidas nas
lutas sociais por atores que, por uma razão ou outra, experimentam o gosto
amargo da discriminação e do preconceito no interior das sociedades em que
vivem (...). Isto significa dizer que é muito difícil, se não impossível,
compreender as regras desse jogo sem explicitar os contextos sócio
históricos nos quais os sujeitos agem, no sentido de interferir na política de
significados em torno da qual dão inteligibilidade a suas próprias
experiências, construindo-se enquanto atores (GONÇALVES & SILVA,
2003, p. 111).

Ressaltamos que várias políticas públicas de reparações, reconhecimento e valorização


do povo negro são implementadas no âmbito educacional, visando o combate ao racismo e
discriminação como: os PCN’s:21 que traz

21
PCN’s - Os Parâmetros Curriculares Nacionais são referenciais para o Ensino Fundamental e Médio do país,
elaborado pelo Governo Federal, com o objetivo de propiciar subsídios à elaboração e reelaboração do currículo,
tendo em vista um projeto pedagógico em função da cidadania
153

Uma proposta curricular voltada para a cidadania deve preocupar-se


necessariamente com as diversidades existentes na sociedade, uma das bases
concretas em que se praticam os preceitos éticos. É a ética que norteia e
exige de todos, e da escola e educadores em particular, propostas e
iniciativas que visem à superação do preconceito e da discriminação.
(BRASIL, ano 1997, p. 129)

Ainda nesse sentido em janeiro de 2003 foi promulgada a Lei nº 10.639/03 que
estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira nas escolas
brasileiras. A Lei foi regulamentada pelo Parecer CNE/ CP/2004 e pela Resolução CNE/CP
01/2004 que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana no âmbito de
todo o currículo escolar. A lei é uma medida de ação afirmativa que altera a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 9.394/1996, através do seu Artigo 26 A e 79
A e B estabelece obrigatoriedade da inclusão do ensino da História da África e da Cultura
Afro- Brasileira e Africana. Com a aprovação da lei, foi criada, em 2003, a Secretaria
Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), objetivo de corrigir as
mazelas de passado escravocrata, que tem como herança a discriminação e o racismo.
Ainda nessa perspectiva a Lei Federal nº 12.888/10 que institui o Estatuto da Equidade
Racial política de ação afirmativa deixa claro no Art. 4º caput e seus Incisos a garantir a
participação da população negra em condições de igualdade de oportunidade sendo
prioritariamente por meio de políticas públicas. Para tanto determina a modificação das
estruturas institucionais do Estado para adequar e superar as desigualdades étnicas decorrentes
do preconceito e da discriminação, eliminação de obstáculos históricos, socioculturais e
institucionais nas esferas públicas e privadas.
Essas leis são fruto da luta dos movimentos sociais buscando forma de ressarcir a
população negra de danos sociais, políticos e educacionais sofridos ao longo de décadas.
Assim sendo a escola precisa ser veiculo para a superação do preconceito e da discriminação
étnica já que
não precisamos ser profetas para compreender que o preconceito incutido na
cabeça do professor e sua incapacidade em lidar profissionalmente com a
diversidade, somando-se ao conteúdo preconceituoso dos livros e materiais
didáticos e às relações preconceituosas entre alunos de diferentes
ascendências étnico-raciais, sociais e outras, desestimulam o aluno negro e
prejudicam seu aprendizado. (KABENGELE, 2005. p.16)

Nesse sentido é papel do estado a implementação de ações afirmativas e programas


destinados a reparar as distorções, desigualdades e práticas discriminatórias.
154

OBJETIVOS GERAL

Subsidiar ações para o enfrentamento do preconceito racial , através da capacitação dos


estudantes para a construção da identidade positiva.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Estimular interferências contra atitudes e comportamentos racistas.
Buscar condições necessárias para o enfrentamento ao racismo e discriminação.
Discutir os preconceitos e os estereótipos no cotidiano do estudantes
META/ FINALIDADES
Construir conhecimento histórico, político e social visando o fortalecimento de uma
identidade positiva;

Contribui para a formação dos estudantes tendo como base a Lei nº10.639/03;

Reflexão sobre o racismo, discriminação e exclusão social;

Reconhecimento do racismo, opondo se a ele e valorizando as diferenças;

Afirmação da identidade para a construção de possíveis interlocutores;

Compreender e respeitar as expressões culturais do povo negro que compõem a


história do país.

CONTEÚDOS

A Lei nº 10.639/03 e a Lei nº 12.288/10

As questões culturais do povo negro.

A identidade como requisito para arguir contra a discriminação racial.

METODOLOGIA E PROCEDIMENTO METODOLÓGICOS

O Projeto de intervenção está em consonância com a dissertação de mestrado


profissional MPEJA cujo tema é A Lei nº 10.639/03 e as questões étnico-raciais no currículo
do curso do Centro Territorial de Educação Profissional do Sertão Produtivo – Caetité/BA.
Um estudo no curso Técnico em secretariado – PROEJA. O projeto de intervenção será
executado no III modulo do curso técnico em secretariado contando com a participação de 14
estudantes, organizados em 03 grupos, realizaremos 12 intervenções com duração de 1:00 a
1:300 horas nos turnos vespertinos e noturnos totalizando 16:00 horas de formação.
155

A metodologia proposta é pesquisa com método qualitativo, baseado em Ludke e André


(2012). Os autores nos informa que a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua
fonte direta de dados e o pesquisador com seu principal instrumento (LUDKE E ANDRÉ,
2012 p. 12).

Ainda sobre o pesquisador, Ludke e André (2012 p. 05) nos orienta que não existe
possibilidade de se estabelecer uma separação nítida e asséptica entre o pesquisador e o que
ele estuda e também os resultados do que ele estuda. Assim sendo para o desenvolvimento da
pesquisa utilizaremos o referencial teórico, análise documental, observações e grupo dialogal,
buscando através das arguições orais ações que permitirão entrar em contato direto com o
tema investigado, oportunizando através dos meios disponibilizados o atendimento das
necessidades dos professores/as. Nesta perspectiva desenvolveremos tarefas de planejar,
operacionalizar ações de formação, como estratégia utilizaremos o grupo focal conforme
informa Gomes; Barbosa, (1999) a respeito do objetivo do grupo focal que é estimular os
participantes a falar e que os sentidos e as representações são influenciados pela natureza
social e pela interação do grupo. Nesse sentido, Gomes e Barbosa definem grupo focal como
sendo o

[...] grupo de discussão informal e de tamanho reduzido, com o propósito de


se obter informações de caráter qualitativo em profundidade. É uma técnica
rápida e de baixo custo para avaliação e obtenção de dados e informações
qualitativas, fornecendo aos gerentes de projetos ou instituições uma grande
riqueza de informações qualitativas sobre o desempenho de atividades
desenvolvidas, prestação de serviços, novos produtos ou outras questões
(GOMES; BARBOSA, 1999 p.1).

Assim sendo desenvolveremos o projeto estabelecendo o dialogo com os estudantes


estando em consonância com (Freire, 2001, p. 79) que nos fala “[...] o diálogo é uma
exigência existencial”. Para tanto contando com cinco etapas: a) apresentação do projeto de
intervenção, b) sensibilização para a participação c) teórica com leituras, análise e coleta de
dados, d) resolução individual do questionário semiestruturado ao final de cada encontro e)
avaliação dos trabalhos. Para nortear a discussão, elaboramos um roteiro de perguntas para ser
respondido individualmente O roteiro foi utilizado de forma flexível e continha questões
referente às questões étnico-raciais.
Desenvolveremos as atividades seguindo o cronograma, assim no dia 01/03/a
03/03/2016 realizaremos a apresentação do projeto de pesquisa, sensibilização quanto a
necessidade de participação de todos e proposta das atividades em grupos, leitura e assinatura
do termo de consentimento para a realização da pesquisa. Realizaremos um dialogo sobre
156

identidade e pertencimento. Buscando compreender como os estudantes se identificam


apresentaremos um questionário semiestruturado.
Em 29/03/ a 31/03/2016, apresentação e discussão sobre a Lei nº10.639/03. 06/04/08/04
/2016 discussão sobre III Conferência Mundial22, contra o racismo, discriminação racial,
xenofobia e intolerâncias correlatas e apresentação do documentário “Vista a minha
pele”;27/04/29/04/2016, analise e discussão da poesia Africana; 05/05/2016 culminância do
projeto.
Os resultados da pesquisa serão apresentados em forma de gráficos e ou tabela e as
arguições serão transcritas para a dissertação de mestrado.

CRONOGRAMA DE ATIVIDADES

Mês Data Duração Atividade


Março 01/03/2016 a 3:50 Apresentação do projeto
03/03/2016 Sensibilização
Resoluções do roteiro de entrevista
Discussões: Preconceito discriminação e identidade. Gomes
(2001), Santos (2013) e Munanga (1994).
Avaliação dos trabalhos
29/03/2016 a 3:00 Leitura e interpretação de textos (Apresentação da Lei
31/03/2016 nº10.639/03 e 12.288/10)
Leitura e interpretação de textos (III Conferência Mundial)
Discussões,
Resoluções do roteiro da entrevista
Avaliação dos trabalhos
Abril 06 a 08/04 3:50 Leitura e interpretação de textos (Vídeo Vista a minha pele)
Discussões
Resoluções do roteiro da entrevista
Avaliação dos trabalhos
27 a 29/04 3;50 Leitura e interpretação de textos (Poesia Africana)
Discussões,
Resoluções do roteiro da entrevista
Avaliação dos trabalhos
Maio 05/05 1:30 Culminância
Avaliação dos trabalhos
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola brasileira ao longo da sua caminhada possui uma visão eurocêntrica e um


projeto educacional que tem como ideal a homogeneização, esse falso ideário de igualdade
legitimado pelo “mito da democracia racial” constitui nossa nação equivocado na escola.
Assim sendo buscaremos reconhecer através da fundamentação teórica que as mazelas
advindas do racismo pode e deve ser suplantada através da construção de uma identidade
positiva com a valorização da multiculturalidade .

22
A Declaração e o Programa de Ação de Durban constam do Relatório da Conferência Mundial contra o
Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Intolerância Correlata, documento das Nações Unidas
A/CONF.189/ 12.
157

Acreditamos que essa intervenção contribuirá para a formação de uma identidade


positiva dos/as estudantes possibilitando arguições contra o racismo, discriminação e
exclusão social e ainda a construção de possíveis interlocutores contra toda forma ideológica
de submissão. Buscaremos atender o que reza os PCN’s (1997)
intencionalidade se faz necessária como produto de uma reflexão que
permita ao professor perceber o papel que desempenha nessa questão. É
também a capacidade de perceber que tem o que trabalhar em si mesmo, e
isso não o impede de trilhar, junto com seus alunos, o caminho da superação
do preconceito e da discriminação. Trata-se de ter a certeza de que cada um
de seus gestos pode fazer a diferença entre o esforço de atitudes inadequadas
e a chance de abrir novas possibilidades de diálogo, respeito e solidariedade.
(PCN’s 1997: pg. 139)

Portanto consideramos grandes os desafios para a realização da formação dos


estudantes, para atender a determinação dos PCN’s, quanto às questões étnico-raciais,
entretanto é necessário romper com as barreiras e promover uma formação buscando a
conscientizar dos estudantes para o combate a discriminação e o preconceito que afasta e
estigmatiza o povo negro nas escolas brasileira.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9.394,


de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
1996.
BRASIL, Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a lei n. 9.394, de 20 de dezembro de
1996. [200-]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ civil_03/Leis/2003/L
10.639.htm>. Acesso em 20 de maio de 2015.
BRASIL. Lei nº12.288,/2010 Estatuto da Igualdade Racial . Disponível em
<www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/.../L12288.htm> acessado em 10 de
Janeiro 2016.
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
pluralidade cultural, orientação sexual / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF, 1997.

GOMES. M.E.S.;BARBOSA E. F. A. Técnica de grupos focais para obtenção de dados


qualitativos. Instituto de Pesquisas e Inovações Educacionais. Educativa. Publicação interna
1999.Disponível:file:///C:/Users/Celeste/Downloads/Tcnica%20de%20Grupos%20Focais%20
para%20Obteno%20de%20Dados%20Qualitativos%20LEITURA.pdf. Acesso em dezembro
de 2015

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 40. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2009.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 26. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
LAFFIN, Maria Hermínia Lage Fernandes. Currículo sem Fronteiras, v.12, n.1, pp. 210-228,
Jan/Abr 2012. Acessada em 06/11/2015. Disponível em
http://www.curriculosemfronteiras.org/vol12iss1articles/laffin.pdf
158

KABENGELE Munanga, org. Superando o Racismo na escola. 2ª edição revisada /. –


[Brasília]: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade, 2005. 204p.
GONÇALVES, L.A.O.; SILVA, P.B.G. O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus
contextos. 3.ed., Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo: uma reflexão sob a prática. Porto Alegre: Artmed.
2000.
SILVA Jr. Hédio. Discriminação racial nas escolas: entre a lei e as práticas sociais. Brasília:
UNESCO, 2002.

APENDICE C

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB


MESTRADO PROFISSIONAL MPEJA/DEDC-I
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO I
159

ROTEIRO DO QUESTIONÁRIOS ABERTO

Esta entrevista/questionário é parte da coleta de dados do projeto de


pesquisa As questões étnico-raciais no currículo do PROEJA: um
estudo de caso no CETEP do Sertão Produtivo- Caetité/BA,
desenvolvida no curso de Mestrado Profissional MPEJA e objetiva
fazer um levantamento de informações relevantes acerca do
desenvolvimento do trabalho junto ao CETEP. Os dados coletados
terão destinação puramente acadêmica sem a divulgação da identidade
dos participantes.

Antecipadamente, agradeço sua importante contribuição.

QUESTÕES ABERTAS

01- Dados pessoais (idade, tempo de magistério, tempo na função atual, formação
acadêmica).

02- Como você avalia a formação da sociedade brasileira?

03- Em sua opinião como os estudantes percebem as questões étnico-raciais no currículo


praticado e como se sentem em relação a esse currículo/ aulas?

04- Você considera que escola é o espaço no qual uma nova estrutura antirracista e
democrática precisa ser construída?

05- Você considera que o racismo institucional é um fenômeno que reproduz as


desigualdades na sociedade brasileira?

APENDICE D
160

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA


MESTRADO PROFISSIONAL MPEJA/DEDC-I
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO

ROTEIRO DO GRUPO FOCAL

Caro estudante, sua participação nesse grupo é muito importante e as


opiniões divergentes são bem-vindas. Nossas discussões serão
gravadas ou anotadas no diário de bordo e são de uso exclusivo da
pesquisa, deste modo é assegurado a todos os participantes o
anonimato. A organização em grupo tem o fito de colher informações
relevantes acerca das atividades educacionais, desenvolvidas no
CETEP especificadamente no Curso Técnico em Secretariado -
PROEJA.

Período da Pesquisa: 02 a 03 de março de 2016.

Agradeço a contribuição dos participantes.


QUESTÕES

Qual é a sua cor?


Você se identifica com ela?
A cor da pele é um elemento importante para o estabelecimento da diferença entre negros e
brancos na escola? De que modo?
Na sala de aula, como são discutidas às questões raciais?
Você já tinha ouvido falar acerca da Lei nº 10.639/03? Quando? E onde?

Você entende que a Lei n° 10.639/03 é uma política pública fruto da luta dos movimentos
sociais?

Como esta temática vem sendo estudada na escola?

Durante as aulas é discutido/ falado sobre o racismo e preconceito racial?

Podemos evidenciar que o racismo é uma ideologia que ainda persiste no cotidiano escolar?
Como?

Com a promulgação da Lei n° 10.639/03 (Que estabelece as diretrizes e bases da educação


nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática
"História e Cultura Afro-Brasileira) houve alguma mudança em relação à história de 500
anos de escravidão?
161

APENDICE E

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB


MESTRADO PROFISSIONAL EM EJA MPEJA
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO DEDC-I

ROTEIRO DA OBSERVAÇÃO
162

Aspectos pedagógicos da aula:


a) A prática pedagógica do professor
b) Os conteúdos trabalhados
c) A inserção de conteúdos sobre a história e cultura da África e Brasil
d) Interação professor e estudante
e) A metodologia de ensino

Aspectos relação professor e estudante


a) A interação professor e estudante
b) Os conflitos envolvendo estudante X estudante
c) Os conflitos em torno da cor, do racismo, dos preconceitos

Aspectos raciais
a) Como o professor compreende o ensino da historia e cultura da África
b) Como o professor lida com o racismo, a identidade dos estudantes, a questão da
diversidade
c) Como os estudantes percebem no processo de aula a questão racial

APENDICE F
163

APÊNDICE –G Matriz Curricular


164

SUPROF- Superintendência de Educação Profissional


NRE 13 TERRITÓRIO DE IDENTIDADE: Sertão Produtivo
Eixo: Gestão e Negócios
Curso: Técnico em Secretariado

Turno: Noturno Modalidade: PROEJA Médio

DATA DE INICIO DA MATRIZ CURRICULAR NA UNIDADE DE ENSINO: 2014


BASE NACIONAL
DISCIPLINAS MODULO CH TOTAL
COMUM
Filosofia Geografia,
Ciências Humanas e suas
História e I, II, III e IV 240
Tecnologias.
Sociologia,
Artes, Língua
Estrangeira
Linguagens, Códigos e
Moderna, Língua I, II, III, IV e V 280
suas Tecnologias.
Portuguesa e
Redação,
Ciências da Natureza Biologia, Física,
Matemática e suas Matemática e I, II, III, IV e V 360
Tecnologias Química.
Estudos Orientados (OE) 120
Carga horaria de BCN- Subtotal 1000

DISCIPLINAS MODULO CH TOTAL

Biologia- Meio
Ambiente,, Saúde e
Segurança do
Trabalho;
Filosofia- Ética e
Direito do Trabalho;
Filosofia –
FORMAÇÃO TÉCNICA
Metodologia do
GERAL FTG
Trabalho Científico
I, II, III, IV e V 240
Informática-
Inclusão Digital
Sociologia-
Organização dos
Processos de
Trabalho;
Sociologia-
Organização Social
do Trabalho.
Estudos Orientados (OE) I, II, III, IV e V 100
Carga Horária da FTG I, II, III, IV e V 340
FORMAÇÃO TÉCNICA
ESPECIFICA – FTE DISCIPLINAS MODULO CH TOTAL
Categorias curriculares
Contextualização Economia e Mercado I 40
165

Fundamentos da
Administração;
Fundamentos de
Operações
Logísticas;
Psicologia das
Fundamentos I, II, III, IV e V 320
Relações Humanas e
Ética Profissional;
Direito
Previdenciário e
Trabalhista
Contabilidade Geral
Gestão de Qualidade
e Produtividade;
Informática
Tecnologias Aplicada; III, IV e V 120
Sistemas de
Informações
Gerenciais.

Organização
Técnicas
Secretariais;
Etiqueta, Cerimonial
Instrumentais e Protocolo; III, IV e V 240
Redação Comercial;
Inglês Instrumental;
Gestão Documental e
Técnicas de Arquivo.

Estudos Orientados (OE) I, II, III, IV e V 400


Carga Horária da FTE I, II, III, IV e V 1120
Estudos Interdisciplinares II, III, IV e V 160
Estudos Complementares BNC/FTG 2620
Estágio de Observação 100
II, III e V
Estágio de Participação 300
Carga Horária total 3020
Matriz Curricular 2014- Modalidade PROEJA Médio
Fonte: Superintendência de Educação Profissional (2014)

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