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GLT/16

GRUPO DE ESTUDO DE LINHAS DE TRANSMISSÃO - GLT

MEDIÇÃO DE RESISTIVIDADE DO SOLO E PROJETO DO ATERRAMENTO DE TORRES DE LINHAS DE


TRANSMISSÃO EM SOLOS DE ALTA-RESISTIVIDADE

PAULO EDMUNDO DA F. FREIRE (1); PAULO CEZAR SOARES JUNIOR (2), ADILSON CORRÊA JUNIOR (2)
PAIOL ENGENHARIA (1); ELECNOR DO BRASIL LTDA (2)

RESUMO

A explosão dos aproveitamentos eólicos e fotovoltaicos na Região Nordeste resultou em novos desafios para o setor
elétrico. Do ponto de vista dos sistemas de aterramento destacam-se os projetos de plantas de geração de energia
de grande área e das linhas de transmissão associadas, que percorrem regiões do semiárido, com solos ressecados
e de elevada resistividade (> 1000 Ωm).
As técnicas tradicionais de medição de resistividade do solo frequentemente resultam em valores superiores aos
reais. Estes desvios podem ser atribuídos a diversos fatores, de maneira geral decorrentes das elevadas
resistividades das camadas de solo mais rasas. Dentre estes fatores cabe mencionar a limitada potência dos
terrômetros, a blindagem que as camadas superficiais de alta resistividade impõem às camadas mais profundas e
os desvios estáticos que distorcem as curvas de resistividade aparente medidas.
Para os projetos de linhas de transmissão, os elevados valores de resistividades do solo, frequentemente
superestimados devido aos problemas de medição acima mencionados, levam a projetos de fases de aterramento
envolvendo grandes extensões de contrapesos, de 100 m ou ainda mais longos, que eventualmente podem onerar
desnecessariamente o projeto. As restrições ambientais frequentemente impõem limitações para o desmatamento,
restringindo o lançamento de contrapesos à faixa de serviço da LT e limitando a abertura de picadas para a medição
da resistência de aterramento após o lançamento dos contrapesos.
O informe técnico aqui proposto vai detalhar as questões acima levantadas e vai apresentar sugestões para a
realização de campanhas de medição de resistividade do solo que proporcionem resultados mais confiáveis, assim
como técnicas de processamento dos parâmetros medidos que contribuam para a obtenção de modelos geoelétricos
mais representativos da geologia das regiões atravessadas pelas linhas de transmissão.
As sugestões apresentadas no informe técnico estão alinhadas que a recente revisão da norma NBR7117/2020 –
Medição de Resistividades do Solo e Modelagem Geoelétrica, que aborda aspectos das questões acima
mencionadas. O texto do IT considera, também, as propostas que estão sendo discutidas no âmbito do projeto de
norma CB-003 - PROJETO CE 003:102.001-011 - Aterramento de estruturas de linhas de transmissão aéreas.

PALAVRAS-CHAVE: aterramento, resistividade do solo, medição, modelagem geoelétrica, linhas de transmissão.

1.0 INTRODUÇÃO – MEDIÇÕES DE RESISTIVIDADES DO SOLO

O clássico método de medição da resistividade do solo, amplamente utilizado pelos engenheiros eletricistas, é o da
eletroresistividade, por meio da técnica da Sondagem Elétrica Vertical (SEV) com o arranjo de Wenner, que utiliza
quatro eletrodos alinhados e igualm ente espaçados, sendo os internos para a medição da diferença de potenciais
produzida no solo pela circulação da corrente injetada pelos eletrodos externos.
A expressão de Wenner (ρ = 2πaR) relaciona a resistência aparente (R = tensão medida/corrente injetada) resultante
da medição com a resistividade aparente do solo. Dentre os pressupostos básicos considerados na dedução desta
expressão, destacam-se: a premissa de um solo isotrópico, apresentando a mesma resistividade em todas as
direções, ou seja, é uniforme; e desprovido de quaisquer fontes de potencial, que não a fornecida pelo equipamento
de medição e aplicada entre os eletrodos de corrente.
Aqui cabe a pergunta - Qual é o preço a ser pago quando adotamos uma abordagem simplista de um problema que,
conforme exposto nos parágrafos que se seguem, de simples não tem nada!?
A natureza está longe de ser tão bem-comportada quanto o modelo de solo uniforme pressupõe. Solos uniformes
não existem, constituem um modelo prático para o estabelecimento de expressões matemáticas simples, como a
acima apresentada, porém super-simplificado com relação ao que existe na natureza. Os solos, quando muito bem-
comportados e associados a estruturas sedimentares, podem apresentar camadas aproximadamente horizontais.
Porém, usualmente, apresentam complexidades diversas, que variam de camadas inclinadas a estruturas 3D
complexas, com volumes de diferentes resistividades e formatos distribuídos em subsuperfície (lentes, intrusões etc.).
Inúmeros processos ionosféricos, atmosféricos e telúricos são responsáveis pelo surgimento de potenciais na crosta
terrestre, ditos potenciais naturais, que ocorrem em uma ampla faixa de frequências na faixa de 1000 Hz a 0,001 Hz
(subHertz). Aos potenciais naturais do solo, somam-se os antropogênicos, produzidos pelo homem, e associados a
fontes de corrente contínua (sistemas de proteção catódica, tração ferroviária, eletrodos HVDC etc.), e de corrente
alternada (normalmente as redes de energia em 50 Hz ou 60 Hz).

paulofreire@paiolengenharia.com.br
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Os potenciais telúricos naturais são utilizados por técnicas avançadas de geofísica para prospectar o subsolo (a
técnica magnetotelúrica, por exemplo). Porém, nas medições pelo método da eletroresistividade, com os arranjos de
Schlumberger ou de Wenner, estes mesmos potenciais surgem entre os eletrodos de tensão dos equipamentos de
medição (terrômetros ou resistivímetros) sob a forma de ruídos e, dependendo da relação sinal/ruído, podem
comprometer a medição.
Terrômetros, de maneira geral, são equipamentos regidos pela norma IEC-61557-5, que para segurança do operador
funcionam com fonte c.a. de baixa tensão (< 50 V) e de baixa potência (< 1 W), com corrente de curto-circuito inferior
a 10 mA. São bons equipamentos para medições em solos de baixa ou média-resistividade, com sistemas de
filtragem dos sinais de tensão que rejeitam boa parte dos ruídos, limitando a medição de potencial à frequência do
sinal injetado pelos eletrodos de corrente. Porém, que em solos de alta resistividade (> 1000 Ωm), os terrômetros
têm dificuldade de injetar no solo corrente suficiente para a obtenção de um sinal de tensão compatível com a
sensibilidade do seu voltímetro interno e com boa relação sinal-ruído, resultando em valores de resistência aparente
superiores aos reais e no consequente erros do cálculo da resistividade aparente.
Além da questão da má relação sinal-ruído, existem os potenciais eletroquímicos que surgem na interface das hastes
de potencial com o eletrólito do solo, e a circulação de correntes telúricas (inclusive a injetada pelo equipamento de
medição), resulta no acúmulo de cargas eletrostáticas nas interfaces de diferentes resistividades das camadas rasas
do solo. Estes potenciais telúricos, que violam a premissa inicial de inexistência de fontes de potencial em
subsuperfície, somam-se ao ∆V medido entre os eletrodos de potencial, acarretando os chamados “desvios estáticos”
(static-shift), que afetam todas as medições de campo elétrico na superfície do solo e que introduzem distorções nos
valores de resistividade aparente.
A consequência de todos os processos acima mencionados é que as técnicas tradicionais de medição de
resistividade, quando aplicadas em solos de alta-resistividade, podem resultar em leituras de resistências aparentes
superiores aos valores reais, distorcendo as curvas de resistividade aparente calculadas. Por este motivo recomenda-
se para as campanhas de medição de solos de elevada resistividade (> 1000 Ωm), a utilização de resistivímetros,
equipamentos que operam com fonte c.c. e de potência tipicamente bem mais elevada do que a dos terrômetros.

Concluída a campanha de medições de resistividades do solo passa-se à fase seguinte, que é o processamento das
curvas de resistividades aparentes calculadas, tendo em vista o processo seguinte que é o da inversão, onde, por
meio de métodos matemáticos, obtém-se um modelo de solo, usualmente estratificado em camadas horizontais
paralelas (o conhecido modelo 1D).
O processamento das curvas de resistividades aparentes envolve a eliminação dos outliers, valores não
representativos do universo da amostragem disponível, e o cálculo de uma curva média, obtida a partira da média
geométrica das resistividades aparentes de cada espaçamento de medição. Alternativamente, a nuvem de valores
de resistividades do solo obtida a partir das medições de campo, após a eliminação dos outliers, pode ser fornecida
para um software, que por meio de métodos matemáticos extrai uma curva média e realiza a sua inversão para o
cálculo do modelo de solo. A disponibilidade de uma amostragem estatisticamente significativa de medições de
campo contribui para a redução dos desvios associados ao processo de medição com os arranjos de Wenner ou de
Schlumberger, assumindo-se que estes desvios têm distribuição Gaussiana.

O raciocínio usual dos profissionais que trabalham com aterramento é que as resistividades do solo são medidas.
Este raciocínio é equivocado, pois na verdade o que é medido são parâmetros elétricos na superfície do solo
(correntes e tensões). O processo matemático chamado inversão que resolve este problema, dito inverso, envolve a
determinação de um modelo a partir do conhecimento das entradas (correntes injetadas no solo) e saídas (diferenças
de potenciais medidas), onde o modelo desejado, que é a estrutura geoelétrica de subsuperfície, pode ser
considerado, a priori, uma caixa preta.
A modelagem geoelétrica é um problema inverso mal-posto - que admite distintos modelos que resultam na mesma
resposta em superfície, mas que não resultam necessariamente no mesmo desempenho do aterramento! Não se
pode superestimar a exatidão do modelo obtido, apesar da sofisticação dos métodos geofísicos e da complexidade
do processamento dos dados:
 medem-se parâmetros elétricos em superfície (que é 2D) e infere-se matematicamente uma estrutura de
subsuperfície (que é 3D) – existe aí um desbalanço de equações!
 a massa de dados é limitada (sub-amostragem), devido a limitações orçamentária e de prazos de execução, e
afetada por interferências e ruídos;
 as rotinas de processamento são limitadas por pressupostos de modelagem, que aproximam uma estrutura de
subsuperfície que é complexa e desconhecida por camadas horizontais com interfaces bem definidas;
 o parâmetro físico prospectado pode não ser bem resolvido para estruturas geológicas específicas, e sua
interpretação pode ser afetada por ambiguidades de equivalência ou supressão, o que significa que o método da
eletroresistividade é mais sensível à condutância das camadas (resistividade x condutância) do que à sua
resistividade;
 desvios galvânicos (static-shift) deslocam verticalmente as curvas de resistividade aparente, devido a potenciais
telúricos naturais ou associados ao equipamento de medição.

Para completar cabe observar que um significativo contraste entre as resistividades do solo e do subsolo pode
resultar no solo superficial blindando o subsolo e não permitindo que as camadas de subsuperfície sejam
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prospectadas, especialmente quando se utilizam equipamentos de baixa potência e com espaçamentos Wenner
limitados a 64 m. No caso de uma camada superficial de elevada resistividade, a medição pode indicar um valor de
resistividade bem mais elevado e uma espessura muito maior.
No caso de uma camada superficial de resistividade bem mais baixa do que as camadas mais profundas, a corrente
injetada pode restringir a sua circulação nas camadas mais rasas e não penetrar nas camadas mais profundas,
levando crer que a espessura da camada superficial de baixa resistividade é muito maior do que o é na realidade.

1.1 Revisão dos Procedimentos de Modelagem Geoelétrica

A última revisão da norma NBR7117/2020 – Medição de Resistividades do Solo e Modelagem Geoelétrica, aborda
as diversas questões acima expostas, propondo formas de abordar as diversas limitações impostas pelas técnicas
de medição disponíveis. Uma primeira novidade desta norma foi a adoção da nomenclatura internacional utilizada
para medições por eletroresistividade, com arranjos de Schlumberger ou de Wenner, que nomeia os eletrodos de
corrente de A e B e os de potencial de M e N.
Para a melhoria da relação sinal/ruído, é previsto não somente o uso de terrômetros, mas também de resistivímetros,
equipamentos de amplo uso no âmbito da geofísica, que funcionam com fonte pulsada quase c.c. (sub-Hz), de
potência usualmente superior a 100 W, capazes de aplicar no solo até 1000 V. O uso do resistivímetro é indicado
sempre que a resistividade das camadas rasas do solo for superior a 1000 Ωm.
Os resistivímetros, usualmente, permitem a medição dos parâmetros elétricos que interessam, que são a corrente
que os eletrodos externos conseguem injetar no solo e a diferença de potencial que os eletrodos internos vão medir.
Um terceiro e importante parâmetro que pode ser medido é o potencial espontâneo (SP) que é o potencial telúrico
natural existente no solo sem a injeção de corrente pelo equipamento. Estes potenciais são de natureza contínua e
têm origem, principalmente, na circulação de águas subterrâneas. Alguns resistivímetros têm uma programação
interna que subtrai do ∆V medido com injeção de corrente, o potencial telúrico previamente medido, já fornecendo a
leitura do potencial efetivamente associado à corrente injetada no solo pelo equipamento de medição.
A disponibilidade destes três parâmetros (SP, I e ∆V), permite, além do cálculo da resistência aparente pela
expressão R = (∆V-SP)/I, um controle da qualidade das medições, pois as seguintes relações devem ser mantidas
em todas as medições: SP < ∆V e I > 10 mA. A necessidade de monitorar estes parâmetros exige a presença de
pelo menos um membro mais qualificado na equipe de medição, capaz de monitorar os parâmetros medidos e de
tomar providências caso em alguma medição uma destas relações não seja respeitada. Normalmente a providência
a ser tomada é a injeção de mais corrente no solo, seja pela aplicação de mais tensão entre os eletrodos de corrente,
quando possível, ou pela redução da resistência destes eletrodos, o que pode ser obtido pela cravação deles mais
profundamente, pelo umedecimento do solo nos pontos de cravação destes eletrodos por uma solução salina e, no
caso de aberturas entre eletrodos de corrente superiores a 10 m, pela cravação de eletrodos de corrente auxiliares.
Outra novidade da nova versão da norma é a adoção da média geométrica para o cálculo da curva média de
resistividades aparentes, ao invés da média aritmética estabelecida na versão anterior da norma. Esta mudança
justifica-se pelo fato de o parâmetro resistividade do solo ter distribuição log-normal, como ocorre com a maioria dos
parâmetros geológicos.
Conforme já dito, a disponibilidade de um conjunto de curvas de resistividades aparentes permite a eliminação dos
outliers e a obtenção de uma curva média geométrica, que reduz o desvio médio associado a desvios estáticos em
medições individuais. Ocorre que para o projeto de aterramentos de linhas de transmissão, é usual o tratamento
individual das duas sondagens geoelétricas feitas em cada locação de torre, o que dificulta a identificação dos outliers
e resulta em uma média de duas curvas, sem nenhum significado estatístico. Este tipo de procedimento, juntamente
com o uso de terrômetros, em alguns projetos de LTs tem resultado em projetos com fases de contrapesos
superdimensionadas, considerando o valor de projeto de resistência de aterramento das torres.
A sugestão, neste caso, é o agrupamento das torres por trecho de LT de topografia semelhante, com a análise do
conjunto de curvas de cada trecho identificado. Esta análise pode ser facilitada pela plotagem das curvas de
resistividades aparentes de trechos de LT em um único gráfico, com a separação das locações de torres com padrões
de resistividade do solo semelhantes, que podem ser agrupados em uma curva média.

2. MEDIÇÃO DE RESISTÊNCIA DE ATERRAMENTO DE TORRES DE LT

O critério de projeto de aterramento de LTs estabelece um valor máximo de resistência para as torres. Assim sendo,
não importa a fase de aterramento lançada para cada torre, espera-se que as resistências sejam sempre iguais ou
inferiores ao valor de referência estabelecido pelo projeto.
A técnica de medição de resistência de aterramento pelo método da queda de potencial considera as mesmas
premissas estabelecidas para as medições de resistividade do solo - solo ideal, uniforme e desprovido potenciais
telúricos, ruídos e/ou interferências. Como solos ideais não existem, as medições realizadas com baixa relação
sinal/ruído resultam em curvas de resistência aparente com distorções e de difícil interpretação.
As medições de resistência de aterramento de torres de LTs são afetadas pelas seguintes variáveis:
 complexidade da estrutura do solo e presença de ruídos e de tensões telúricas;
 fase de aterramento, associada à extensão dos cabos contrapesos e que vai afetar a distância adequada do
eletrodo de corrente na medição;
 configuração de medição – contrapesos interligados ou desconectados da base da torre;
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 tipo de equipamento de medição – terrômetro convencional ou de alta-frequência (25 kHz), ou resistivímetro.


A resistividade do solo e a fase de aterramento são variáveis usualmente correlacionadas – se a resistividade é mais
baixa (< 1000 Ωm) são utilizadas as fases iniciais de contrapesos, com menor extensão de cabos enterrados. A
recíproca é verdadeira para os solos de resistividade mais elevada (> 1000 Ωm), com contrapesos que atingem mais
de 100 m de extensão.
A distância do eletrodo remoto de corrente é uma variável correlacionada com a fase de aterramento. Para a
aplicação do método clássico de medição pela técnica da queda de potencial, a NBR-15749 estabelece que a
distância mínima entre o aterramento a ser medido e o eletrodo de corrente é de 3 vezes a maior dimensão do
aterramento (normalmente a maior diagonal), sendo desejável uma distância de 5 vezes. Este distanciamento é
necessário que que ocorra a formação do patamar de resistência aparente, que caracteriza a resistência do
aterramento sob medição. Verifica-se que o atendimento deste requisito é inviável no caso das medições de
resistência de aterramento de torres, especialmente no caso de solos de elevada resistividade.
De maneira geral, os erros nas medições feitas com terrômetros são para mais, tanto para as medições de
resistividade do solo como de resistência de aterramento. Isto significa que o equipamento lê valores cada vez mais
superiores aos reais à medida que aumenta a resistividade do solo, a partir de 1000 Ωm.
Considerando os contrapesos desconectados das bases das torres, cabe observar que em solos de baixa ou média-
resistividade (< 1000 Ωm) as resistências medidas com um terrômetro convencional ou de alta-frequência pouco
diferem, sendo as segundas um pouco mais altas. Porém, no caso de solos de alta-resistividade (> 1000 Ωm) as
resistências medidas com um terrômetro de alta-frequência tendem a apresentar valores um pouco mais elevados
do que as medidas com um terrômetro convencional.
Se os contrapesos estiverem conectados às torres, tem-se o terrômetro de alta-frequência como o equipamento
adequado para esta medição, supondo-se que devido à elevada impedância de aterramento dos cabos para-raios
na frequência de 25 kHz, a corrente não se propaga para as torres vizinhas, fluindo em sua quase totalidade para o
solo pelo aterramento da torre objeto da medição. Na prática sabe-se que a premissa acima nem sempre vai
corresponder à realidade, e que uma parcela significativa da corrente de medição pode fluir pelos cabos para-raios
para as torres vizinhas, especialmente no caso de cabos para-raios de boa condutividade (aço-alumínio), resultando
na leitura de um valor de impedância de aterramento inferior à real, pois o ∆V no solo é produzido por apenas uma
fração da corrente injetada pelo equipamento de medição.
Como o subsolo nunca é uniforme, a corrente injetada pelo equipamento de medição vai dar origem a potenciais
elétricos nas interfaces de volumes de diferentes resistividades nas camadas rasas do solo. Estes potenciais são
superpostos à ddp medida entre os eletrodos de potencial e, dependendo da sua magnitude, podem resultar em
desvios estáticos, que se manifestam por descontinuidades e saltos súbitos no eixo vertical da curva de resistências
aparentes, que descaracterizam o padrão bem-comportado da curva retratada na norma NBR-15749.
Potenciais telúricos e ruídos podem resultar em falsos patamares de resistência que não tem nenhum significado
físico, mas que frequentemente são interpretados como o valor medido de resistência de aterramento. Estes falsos
patamares frequentemente são interpretados à luz do tradicional critério de cálculo da média dos valores medidos
no entorno da distância de 62% da posição do eletrodo de potencial, que somente valeria para um solo uniforme,
mas que é muito utilizado, levando a avaliações equivocadas de valores de resistência de aterramento.

3. SIMULAÇÃO DA MEDIÇÃO DE RESISTÊNCIA EM TORRE DE LT 500 KV

A Figura 1 ilustra a configuração de aterramento de uma torre estaiada de uma LT de 500 kV, que possui quatro
contrapesos de 125 m lançados apenas na faixa de serviço, com 4 m de espaçamento, em solo uniforme de 2800
Ωm, que resulta na resistência de 20 Ω. A figura ilustra também as curvas de resistências aparentes calculadas com
base em simulações de medição da resistência (na direção tracejada), com o eletrodo de corrente situado a 250 m,
500 m e 750 m de distância da base da torre e com o eletrodo de tensão sendo deslocado na direção do eletrodo de
corrente e na direção oposta (curva verde). Observa-se que apesar das condições ideais (solo uniforme e desprovido
de ruídos), apenas com o eletrodo de corrente a 3x a extensão de contrapesos, começa a surgir um patamar no valor
da resistência de 20 Ω.
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Figura 1: curvas de resistência aparente correspondentes à medição de resistência do aterramento de uma estrutura de LT
de 500 kV com 4 x 125 m de contrapesos com o eletrodo de corrente a 250 m, 500 m e 750 m de distância do eixo da LT.

As simulações foram feitas com o programa MultiGroundZ, integrante do pacote computacional CDEGS - Current
Distribution, Electromagnetics, Grounding and Soil Structure Analysis, desenvolvido pela SES - Safe Engineering
Services & technologies ltd (www.sestech.com), empresa canadense fundada em 1978 pelo Prof. Farid P. Dawalibi.
A medição com os eletrodos de corrente e tensão em direções opostas facilita a formação do patamar, pois não sofre
a influência do acoplamento com o eletrodo de corrente, porém, para a condição de solo de alta resistividade, exige
um eletrodo de corrente situado a pelo menos 250 m de distância e vai exigir a abertura de meio quilômetro de picada
no mato para o lançamento das duas linhas de medição, o que inviabiliza a medição pelo custo e tempo, dificuldades
de campo, assim como pelas restrições impostas pelos órgãos ambientais.
Os resultados destas simulações revelam a inviabilidade prática da realização de medições de resistências de
aterramento de torres de LTs em solos de alta resistividade, não somente pelas grandes distâncias que seriam
necessárias para a alocação do eletrodo de corrente, mas também pela fragilidade do sinal de tensão a grandes
distâncias das extremidades da linha de corrente, que acaba por ficar abaixo da sensibilidade do voltímetro do
equipamento. Neste caso seria necessária a utilização de medição com resistivímetro, com potência bem mais
elevada do que as dos terrômetros tradicionalmente utilizados.

4. METODOLOGIA ALTERNATIVA DE AVALIAÇÃO DAS MEDIÇÕES DE RESISTÊNCIA DE TORRES DE LT

As técnicas de medição de resistividade do solo e de resistências de aterramento, baseiam-se na premissa de solo


ideal - homogêneo e livre de ruídos e interferências. Na prática estas premissas não têm como ser atendidas e as
distorções nas medições são inevitáveis.
Devido à inviabilidade prática de se lançar uma linha de eletrodo de corrente com mais de 500 m de extensão tendo
em vista a formação do patamar de medição, optou-se pela análise das curvas medidas com o auxílio de curvas
padrão de medição. Estas curvas são calculadas por simulação em software para as configurações de contrapesos
de cada fase de aterramento e de acordo com as seguintes premissas:
 solo de resistividade uniforme - calculado de modo a resultar na resistência de aterramento de 20 Ω estabelecida
pelo critério de projeto da LT;
 configuração de medição tipicamente utilizada pelas equipes de campo - 100 m de distância entre o limite da
faixa de servidão e o eletrodo de corrente.

A Figura 2 apresenta as curvas de resistências aparente medidas para as 244 torres de uma LT de 500 kV localizada
na Região Nordeste. A curva vermelha identifica a curva padrão, calculada para a fase IV de aterramento, com quatro
contrapesos de 125 m de extensão, lançados na faixa de serviço, com espaçamento de 4 m e em solo uniforme de
2800 Ωm, com uma resistência de aterramento de 20 Ω. Nesta curva o valor de 20 Ω ocorre na distância de 43 m,
bem inferior ao 25 Ω que seria interpretado pelo equivocado método do 62%.
As medições foram feitas com terrômetros convencionais e desconexão dos contrapesos das bases da torres, com
o eletrodo de corrente situado a 100 m de distância do eixo da linha e com o eletrodo de potencial deslocando-se no
mesmo alinhamento e na mesma direção do eletrodo de corrente, com medições realizadas a cada 5 m.
A avaliação a ser realizada é bastante simples:
 curva medida abaixo da curva padrão – indicativo que a resistência de aterramento da torre é inferior ao valor da
resistência de projeto de 20 Ω;
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 curva medida com partes acima e partes abaixo da curva padrão – tem que ser analisada individualmente para
ver em qual categoria ela se enquadra – boa (< 20 Ω) ou ruim (> 20 Ω);
 curva medida acima da curva padrão – indicativo que a resistência de aterramento da estrutura é > 20 Ω ou que
medição se encontra afetada por desvios e interferências e não permite nenhuma conclusão quanto à resistência
da torre – recomenda-se uma nova medição com procedimentos para aumentar a corrente de medição.
Para melhorar a corrente injetada pelo equipamento de medição pode-se adotar as seguintes medidas para reduzir
a resistência do eletrodo remoto de corrente: utilização de três ou mais hastes em paralelo; cravação das hastes
mais profundamente; e umedecimento do solo no ponto de cravação das hastes com uma solução salina.
Se estes recursos não adiantarem para a obtenção de uma boa curva de resistências aparentes, então resta fazer a
medição com o eletrodo de potencial sendo deslocado na direção oposta à do eletrodo de corrente, condição esta
que facilita a formação de um patamar de resistência, que, porém, tende a se formar um pouco mais baixo do que o
correspondente ao valor real.

A Figura 3 apresenta a separação das curvas boas, com resistência inferior a 20 Ω, das curvas ruins, que demandam
medições complementares para uma melhor avaliação. O fato de curvas consideradas boas apresentarem eventuais
pontos acima da curva padrão não invalida a medição, pois estes valores certamente estão afetados por ruídos ou
problema de medição.
Diversas curvas consideradas ruins apresentam patamares que poderiam ser confundidos com o patamar de
medição, mas que, de maneira geral, são causados por desvios estáticos e ruídos que afetaram as medições.
O gráfico das curvas boas revela que em muitas torres em que foi utilizada a fase IV de aterramento, poderia ter sido
utilizada uma fase mais baixa, com economia de material e de trabalho. A adoção de uma fase superior à necessária
pode ser atribuída a medições de resistividades do solo feitas com terrômetros em solos de resistividade superior a
1000 Ωm, que mediram valores superiores aos reais e levaram ao superdimensionamento dos contrapesos.

Figura 2: curvas de resistência aparente medidas para as 244 torres de uma LT de 500 kV.
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Figura 3: separação das curvas boas, com resistência inferior a 20 Ω, e das curvas ruins, que demandam medições
complementares para uma melhor avaliação da resistência de aterramento.

6. CONCLUSÕES

O método proposto de avaliação das medições de resistências de aterramento de torres de linhas de transmissão
viabiliza a medição com o eletrodo de corrente posicionado a uma distância inferior à mínima estabelecida pela norma
NBR-15.749 para a aplicação do método da queda de potencial, com a utilização de um terrômetro ou de um
resistivímetro.
O método permite a identificação das torres com resistência abaixo do valor de projeto, e das torres com medições
de resistência de aterramento suspeitas, que precisam ser objeto de novas medições, com a eventual utilização de
um equipamento de medição mais potente e/ou a adoção de recursos que possibilitem uma maior injeção de corrente,
com um eletrodo de corrente mais afastado da torre e/ou com o eletrodo de tensão sendo deslocado na direção
oposta à do eletrodo de corrente.
Verificam-se muitas curvas bem abaixo da curva padrão, denotando torres onde as medições de resistividades do
solo revelaram valores mais elevados do que os reais, indicando uma fase de aterramento mais longa do que o
necessário. O superdimensionamento dos aterramentos das torres pode ser significativamente reduzido com a
adoção de duas providências:
 uso de resistivímetros para a realização de medições de resistividades em regiões de solos de alta resistividade;
 adoção da prática de elaborar os projetos de aterramento de torres com base em curvas médias de resistividades
aparentes de grupos de torres, que tendem a reduzir as distorções existentes em medições individuais.
Cabe destacar que o uso de um resistivímetro exige uma equipe de campo mais qualificada do que a que está
acostumada a utilizar um terrômetro. A medição feita com um terrômetro fornece apenas uma parâmetro, que é a
resistividade aparente (relação entre a tensão medida e a corrente injetada), parâmetro este que não tem significado
físico e que, portanto, é de difícil avaliação no campo. Fica praticamente impossível uma avaliação da qualidade da
medição realizada.
O resistivímetro permite a monitoração dos parâmetros básicos da medição, que são o potencial espontâneo (SP), a
corrente injetada nos eletrodos AB e a tensão medida entre os eletrodos MN. É necessário que um membro da equipe
de medição esteja capacitado para fazer uma avaliação crítica destes parâmetros e que tenha condições de tomar
as providências necessárias para refazer a medição e obter um resultado mais confiável.
A adoção da prática de elaborar os projetos de aterramento de torres com base em curvas médias de resistividades
aparentes de grupos de torres exige um trabalho de agrupamento das torres em lotes com estrutura geoelétrica do
solo semelhante. A plotagem do conjunto de curvas de resistividades aparentes em um mesmo gráfico, da mesma
forma que foi apresentado na Figura 2, facilita o trabalho de agrupamento dos lotes de torres.

7. REFERÊNCIAS

 NBR-7117/2020 – Medição de resistividades do solo e modelagem geoelétrica


 NBR-15749/2020 – Medição de resistência de aterramento e de potenciais na superfície do solo em sistemas de
aterramento
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DADOS BIOGRÁFICOS

Paulo Edmundo da Fonseca Freire (paulofreire@paiolengenharia.com.br) - nasceu em 1955,


Diretor da PAIOL Engenharia. Engenheiro Eletricista (1978) e Mestre em Sistemas de Potência
(1984) pela PUC-RJ, Doutor em Geociências pela Unicamp (2018). 40 anos de experiência em
estudos e projetos de sistemas de aterramento e de spda para redes de energia e instalações
comerciais, industriais e de transportes. Ex-professor da Universidade Gama Filho,
instrutor/palestrante de cursos e eventos, e autor de trabalhos apresentados em congressos e
seminários. Serviços prestados no Brasil, Chile, Angola, Quênia e Etiópia. Membro de comitês
da ABNT/COBEI, IEC, Cigre e IEEE.

(2) PAULO CEZAR SOARES JUNIOR Engenheiro Civil, graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina
Gerente de Engenharia da Elecnor do Brasil Profissional com 12 anos de carreira com Linhas de Transmissão,
envolvendo aspectos técnicos, construtivos, administrativos e jurídicos para contratos EPC Atuação em projetos de
Linhas de Transmissão aérea e subterrâneas de 13,8 até 500 kV, cobrindo mais de 5000 km de projetos no Brasil e
em outros países (Austrália, Chile, Peru, Costa Rica e Angola) Principais empresas e clientes no Brasil e no exterior:
Celeo Redes, Neoenergia, EDPR, AES Brasil, EDF, Sterlite, Equatorial, TAESA, Furnas, Eletrosul, Eletronorte, Chesf,
Copel, Isolux, Abengoa, Engevix, Fasttel, WEG.

(3) ADILSON JOSÉ CORRÊA JUNIOR - Geólogo, graduado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, pós
graduado em Engenharia Geotécnica pela Unyleya. Supervisor de Geologia da Elecnor do Brasil. Profissional com
seis anos de carreira com Linhas de Transmissão, envolvendo aspectos técnicos construtivos para implantação de
traçado. Plenos conhecimentos em estudos geotécnicos do solo como; sondagem elétrica vertical, sondagens
geotécnicas, características geomecânicas das rochas, ensaios tecnológicos em solos moles e geoprocessamento
aplicados em Estudo de Impacto Ambiental.

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