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Esmesc - Info - Civil

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Escola Superior da Magistratura do Estado

de Santa Catarina

CURSO DE INFORMATIVOS
DOS TRIBUNAIS
SUPERIORES E DO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE
SANTA CATARINA

EMENTÁRIO
Direito Civil
Direito Processual Civil
Direito do Consumidor
Direito da Criança e do Adolescente

Professora: Larissa Correa Guarezi Zenatti Gallina


Sumário

1 DIREITO CIVIL ........................................................................................................... 5


1.1 Direitos da personalidade. Capacidade civil. Curatela. .......................................... 5
1.2 Responsabilidade Civil ........................................................................................... 5
1.2.1 Responsabilidade civil da arrendadora de aeronave em acidente aéreo ....................... 6
1.2.2 Perda de uma chance .................................................................................................... 7
1.2.3 Responsabilidade civil e internet .................................................................................. 8
1.3 Contratos............................................................................................................... 10
1.3.1 Alienação fiduciária de bens imóveis ......................................................................... 10
1.3.2 Lei de Locações .......................................................................................................... 11
1.3.3 Compra e venda.......................................................................................................... 11
1.4 Condomínio edilício residencial e contrato de hospedagem atípico .................... 13
1.5 Usucapião extraordinária. Área integrante de loteamento irregular. .................... 15
1.6 Direito de família .................................................................................................. 16
1.6.1 União estável .............................................................................................................. 16
1.6.2 Arbitramento de aluguel. Ex-cônjuge que reside no imóvel comum com a filha do ex-casal
............................................................................................................................................. 17
1.6.3 Parentesco................................................................................................................... 19
1.7 Sucessões .............................................................................................................. 20
1.7.1 Direito real de habitação ............................................................................................ 20
1.7.2 Sucessões. Partilha. Ausência de citação de litisconsorte necessário. Sentença juridicamente
inexistente. Aplicabilidade do Tema n. 809/STF. ............................................................... 21
1.7.3 Sucessões. Aplicabilidade do tema 809/STF aos processos em que não tenha havido trânsito
em julgado da sentença de partilha...................................................................................... 23
2. DIREITO PROCESSUAL CIVIL .............................................................................. 25
2.1 Competência ......................................................................................................... 25
2.1.1 Ação previdenciária. Competência federal delegada. ................................................ 25
2.1.2 Insolvência civil ......................................................................................................... 26
2.2 Procedimento. Termo inicial de contagem dos prazos processuais, em caso de duplicidade
de intimações eletrônicas. ........................................................................................... 26
2.3 Astreintes. Possibilidade de revisão do valor de ofício. ....................................... 27
2.4 Pedido reconvencional. Requisitos. Atendimento. Nomen iuris. Irrelevância. .... 28
2.5 Ação Civil Pública ................................................................................................ 28
2.5.1 Limite territorial dos efeitos das decisões em Ação Civil Pública (art. 16 da lei 7.37/1985)
............................................................................................................................................. 28
2.5.2 Ação Civil Pública manejada por associação na condição de substituta processual.
Legitimidade do não associado para a execução da sentença. ............................................ 29
2.6 Mandado de Segurança ......................................................................................... 31
2.6.1 (In)constitucionalidade de dispositivos da Lei do Mandado de Segurança................ 31
2.6.2 Inviabilidade de impugnação de decisões interlocutórias por mandado de segurança31
2.7 Recursos ............................................................................................................... 32
2.7.1 Técnica de julgamento ampliado em embargos de declaração contra acórdão que julgou
apelação ............................................................................................................................... 32
2.7.2 Interposição de REsp ou RE contra acórdão que julgou IRDR. Efeito suspensivo
automático. .......................................................................................................................... 33
2.7.3 Agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em ação de improbidade
administrativa ...................................................................................................................... 35
2.7.4 Cumprimento de sentença. Intimação do executado para pagamento, sob pena de multa e
fixação de honorários. Despacho de mero expediente. Descabimento de agravo de instrumento
............................................................................................................................................. 36
3. DIREITO DO CONSUMIDOR ................................................................................. 37
3.1 Tarifa de “cheque especial” .................................................................................. 37
3.2 Recusa ao cumprimento da oferta ........................................................................ 37
3.3 Dano moral coletivo e publicidade enganosa ....................................................... 39
3.4 Inversão do ônus da prova. Regra de instrução .................................................... 41
3.5 Incorporação imobiliária. Atraso na entrega do imóvel. ...................................... 42
3.6 Plano de saúde ...................................................................................................... 43
3.6.1 Reembolso de despesas médico-hospitalares ............................................................. 43
3.6.2 Sucessão de titulariedade e responsabilidade pelas dívidas do titular falecido. ......... 43
3.6.3 Plano de saúde coletivo empresarial. Resilição unilateral pela operadora ................. 44
3.6.4 Custeio de medicamento de uso domiciliar ................................................................ 46
3.7 Cartão de crédito. Débito em conta corrente do valor mínimo da fatura ............. 47
4. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE .................................................. 48
4.1 Competência. Ações envolvendo matrícula de crianças e adolescentes em creches ou
escolas......................................................................................................................... 48
4.2 Multa do art. 249 do ECA e advento da maioridade civil do adolescente ........... 52
4.3 Sentença concessiva de adoção e ação rescisória ................................................. 52
4.4 Guarda compartilhada. Genitores domiciliados em cidades distintas. ................. 54
4.5 Adoção. Relativização da regra que estabelece diferença mínima de idade entre adotante
e adotando ................................................................................................................... 55
4.6 Apuração de ato infracional e pedido de acesso aos autos pela vítima ................ 56
1 DIREITO CIVIL

1.1 Direitos da personalidade. Capacidade civil. Curatela.

RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. CURATELA. IDOSO. INCAPACIDADE TOTAL E


PERMANENTE PARA EXERCER PESSOALMENTE OS ATOS DA VIDA CIVIL.
PERÍCIA JUDICIAL CONCLUSIVA. DECRETADA A INCAPACIDADE ABSOLUTA.
IMPOSSIBILIDADE. REFORMA LEGISLATIVA. ESTATUTO DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA. INCAPACIDADE ABSOLUTA RESTRITA AOS MENORES DE 16
(DEZESSEIS) ANOS, NOS TERMOS DOS ARTS. 3° E 4° DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO
ESPECIAL PROVIDO.
1. A questão discutida no presente feito consiste em definir se, à luz das alterações promovidas
pela Lei n. 13.146/2015, quanto ao regime das incapacidades reguladas pelos arts. 3º e 4º do
Código Civil, é possível declarar como absolutamente incapaz adulto que, em razão de
enfermidade permanente, encontra-se inapto para gerir sua pessoa e administrar seus bens de
modo voluntário e consciente.
2. A Lei n. 13.146/2015, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Deficiência, tem por objetivo
assegurar e promover a inclusão social das pessoas com deficiência física ou psíquica e garantir
o exercício de sua capacidade em igualdade de condições com as demais pessoas.
3. A partir da entrada em vigor da referida lei, a incapacidade absoluta para exercer
pessoalmente os atos da vida civil se restringe aos menores de 16 (dezesseis) anos, ou seja,
o critério passou a ser apenas etário, tendo sido eliminadas as hipóteses de deficiência
mental ou intelectual anteriormente previstas no Código Civil.
4. Sob essa perspectiva, o art. 84, § 3º, da Lei n. 13.146/2015 estabelece que o instituto da
curatela pode ser excepcionalmente aplicado às pessoas portadoras de deficiência, ainda
que agora sejam consideradas relativamente capazes, devendo, contudo, ser proporcional
às necessidades e às circunstâncias de cada caso concreto.
5. Recurso especial provido (REsp 1.927.423/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira
Turma, por unanimidade, julgado em 27/04/2021 – Info 694).

1.2 Responsabilidade Civil

1.2.1 Responsabilidade civil da arrendadora de aeronave em acidente aéreo

RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE ATO


ILÍCITO. ACIDENTE AÉREO. COLISÃO DE AERONAVES DURANTE VOO. DIVERSAS
MORTES. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TRANSPORTADOR E DA
ARRENDADORA. SINISTRO OCORRIDO DURANTE AS COMEMORAÇÕES DO 55º
ANIVERSÁRIO DO AEROCLUBE DE LAGES. NEXO CAUSAL NÃO CONFIGURADO.
AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE.
1. Nos termos da jurisprudência do STJ, a responsabilidade do transportador aéreo é, em regra,
objetiva.
2. Especificamente no que toca às colisões aéreas, previu o Código Brasileiro de Aeronáutica
que "a responsabilidade pela reparação dos danos resultantes do abalroamento cabe ao
explorador ou proprietário da aeronave causadora, quer a utilize pessoalmente, quer por
preposto" (art. 274), tendo definido que "consideram-se provenientes de abalroamento os
danos produzidos pela colisão de 2 (duas) ou mais aeronaves, em vôo ou em manobra na
superfície, e os produzidos às pessoas ou coisas a bordo, por outra aeronave em vôo" (art.
273).
3. Diante da perspectiva conceitual ampla de abalroamento aéreo, poderão emergir, inclusive
no mesmo evento danoso, diferentes regimes de responsabilidade: a contratual e a
extracontratual.
4. Na espécie, apesar de incidir a responsabilidade objetiva – danos decorrentes de
abalroamento com passageiros –, além de haver previsão específica da responsabilidade do
proprietário – a responsabilidade pela reparação dos danos resultantes do abalroamento cabe ao
explorador ou proprietário da aeronave causadora, quer a utilize pessoalmente, quer por
preposto (CBA, art. 274), a chave para a definição da responsabilização está, em verdade, na
análise de seu liame causal.
5. "O ponto central da responsabilidade civil está situado no nexo de causalidade. Não
interessa se a responsabilidade civil é de natureza contratual ou extracontratual, de ordem
objetiva ou subjetiva, sendo neste último caso despicienda a aferição de culpa do agente se
antes não for encontrado o nexo causal entre o dano e a conduta do agente. Com efeito, para
a caracterização da responsabilidade civil, antes de tudo, há de existir e estar comprovado o
nexo de causalidade entre o evento danoso e a conduta comissiva ou omissiva do agente e
afastada qualquer das causas excludentes do nexo causal, tais como a culpa exclusiva da vítima
ou de terceiro, o caso fortuito ou a força maior, por exemplo" (REsp 1615971/DF, Rel. Ministro
Marco Aurélio Bellizze, terceira turma, julgado em 27/09/2016, DJe 07/10/2016).
6. A Segunda Seção do STJ, no âmbito de recurso repetitivo (REsp 1596081/PR, Rel. Ministro
Ricardo Villas Bôas Cueva), reconheceu que a ausência de nexo causal é apta a romper a
responsabilidade objetiva, inclusive nos danos ambientais (calcada na teoria do risco integral).
7. Ao contrário do que ocorre na teoria da equivalência das condições (teoria da
conditio sine qua non), em que qualquer circunstância que haja concorrido para produzir
o dano pode ser considerada capaz de gerar o dano, na causalidade adequada, a ideia
fundamental é que só há uma relação de causalidade entre fato e dano quando o ato
praticado pelo agente é de molde a provocar o dano sofrido pela vítima, segundo o curso
normal das coisas e a experiência comum da vida.
8. No caso, a recorrente, proprietária e arrendadora da aeronave, não pode ser
responsabilizada civilmente pelos danos causados, haja vista o rompimento do nexo de
causalidade, afastando-se o dever de indenizar, já que a colisão da aeronave se deu única
e exclusivamente pela conduta do piloto da outra aeronave, que realizou manobra
intrinsecamente arriscada, sem guardar os cuidados necessários, além de ter permitido o
embarque de passageiros acima do limite previsto para a aeronave.
9. Os fatos atribuídos à recorrente - ser proprietária da aeronave, ter realizado contrato de
arrendamento apenas no dia do evento (oralmente e sem registro), ter auferido lucro, bem como
ter contratado piloto habilitado para voos comerciais, mas sem habilitação específica para voos
com salto de paraquedismo - não podem ser considerados aptos a influenciar imediata e
diretamente a ocorrência do evento danoso, não sendo necessários nem adequados à produção
do resultado, notadamente porque o avião ainda estava em mero procedimento de decolagem.
Portanto, não há efetivamente uma relação de causalidade entre fato e dano, tendo em conta
que o ato praticado pelo agente não é minimamente suficiente a provocar o dano sofrido pela
vítima, segundo o curso normal das coisas e a experiência comum da vida, conforme a teoria
da causalidade adequada.
10. Recurso especial provido (REsp 1.414.803-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta
Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021 – Info 695).

1.2.2 Perda de uma chance

RECURSO ESPECIAL. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. NEGLIGÊNCIA. PERDA DE


PRAZO. RESPONSABILIDADE CIVIL. PERDA DE UMA CHANCE. PRESCRIÇÃO.
TERMO INICIAL. CONHECIMENTO DO DANO. ACTIO NATA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo
Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a definir o termo inicial da prescrição da pretensão de obter
ressarcimento pela perda de uma chance decorrente da ausência de apresentação de agravo de
instrumento.
3. O prazo prescricional é contado, em regra, a partir do momento em que configurada
lesão ao direito subjetivo, sendo desinfluente para tanto ter ou não seu titular
conhecimento pleno do ocorrido ou da extensão dos danos (art. 189 do CC/2002).
4. O termo inicial do prazo prescricional, em situações específicas, pode ser deslocado
para o momento de conhecimento da lesão ao seu direito, aplicando-se excepcionalmente
a actio nata em seu viés subjetivo.
5. Na hipótese, não é razoável considerar como marco inicial da prescrição a data limite
para a interposição do agravo de instrumento, visto inexistirem elementos nos autos - ou
a comprovação do advogado - evidenciando que o cliente tenha sido cientificado da perda
de prazo para apresentar o recurso cabível.
6. No caso dos autos, com o término da relação contratual, o cliente lesionado teve (ou
poderia ter tido) ciência da atuação negligente do advogado anterior, sendo este o marco
inicial da prescrição. 7. Recurso especial não provido.
REsp 1.622.450-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade,
julgado em 16/03/2021 - Info 689).

1.2.3 Responsabilidade civil e internet

RECURSO ESPECIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS.


POSTAGEM DE VÍDEO CONTENDO INFORMAÇÕES ALEGADAMENTE FALSAS,
PREJUDICIAIS À IMAGEM DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA AUTORA, EM REDE
SOCIAL. QUEBRA DO SIGILO DE TODOS OS USUÁRIOS QUE COMPARTILHARAM
O CONTEÚDO POTENCIALMENTE DIFAMATÓRIO NA PLATAFORMA DO
FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. PLEITO SEM EXPOSIÇÃO DE FUNDADAS RAZÕES
PARA A QUEBRA. MARCO CIVIL DA INTERNET (LEI N. 12.965/2014, ART. 22).
PRESERVAÇÃO DA PRIVACIDADE E DO DIREITO AO SIGILO DE DADOS.
1. O Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014) estabelece que, na provisão de conexão à
internet, cabe ao administrador de sistema autônomo respectivo o dever de manter os registros
de conexão sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 1 ano, nos termos
do regulamento (art. 13); e o provedor de aplicações de internet, custodiar os respectivos
registros de acesso a aplicações de internet pelo prazo de 6 meses (art. 15).
2. O propósito da norma foi criar instrumental que consiga, por autoridade constituída e
precedida de autorização judicial, acessar os registros de conexão, rastreando e sancionando
eventuais condutas ilícitas perpetradas por usuários da internet e inibindo, de alguma forma, a
falsa noção de anonimato no uso das redes. Por outro lado, a Lei n. 12.965/2014 possui viés
hermenêutico voltado ao zelo pela preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da
imagem do usuário (art. 23), com a previsão de cláusula de reserva judicial para qualquer quebra
de sigilo.
3. Portanto, se é certo afirmar que o usuário das redes sociais pode livremente reivindicar seu
direito fundamental de expressão, também é correto sustentar que a sua liberdade encontrará
limites nos direitos da personalidade de outrem, sob pena de abuso em sua autonomia, já que
nenhum direito é absoluto, por maior que seja a sua posição de preferência, especialmente se
tratar-se de danos a outros direitos de elevada importância.
4. No caso, a autora requereu a suspensão imediata do vídeo disponibilizado em redes sociais
no qual um homem, anonimamente, afirmava ter comprado um lanche que estaria contaminado
com larvas nas dependências da sua empresa, não sendo tal notícia verdadeira, já que a refeição
jamais fora adquirida no estabelecimento da requerente, que, em razão disso, foi afetada em
seus negócios e em sua imagem. Além disso, requereu fosse a empresa de rede social obrigada
a fornecer o IP de todos os responsáveis pelo compartilhamento do vídeo difamador.
5. Nos termos da Lei n. 12.965/2014 (art. 22), a parte interessada poderá pleitear ao juízo, com
o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial cível ou penal, em caráter
incidental ou autônomo, que ordene ao responsável pela guarda o fornecimento de registros de
conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet. Para tanto, sob pena de
admissibilidade, exige a norma que haja: I - fundados indícios da ocorrência do ilícito; II -
justificativa motivada da utilidade dos registros solicitados para fins de investigação ou
instrução probatória; e III - período ao qual se referem os registros (parágrafo único).
6. É vedado ao provedor de aplicações de internet – em pedido genérico e coletivo, sem a
especificação mínima de uma conduta ilícita realizada – fornecer dados, de forma
indiscriminada, dos usuários que tenham compartilhado determinada postagem.
7. Na espécie, a recorrida não trouxe nenhum elemento, nem sequer descreveu indícios de
ilicitude da conduta dos usuários que, por qualquer motivo, acabaram por apenas compartilhar
o vídeo com conteúdo difamador, limitando-se a identificar a página do autor da postagem e de
um ex-funcionário que também teria publicado o vídeo em seu perfil.
8. Assim, sopesados os direitos envolvidos e o risco potencial de violação de cada um deles,
deve prevalecer a privacidade dos usuários. Não se pode subjugar o direito à privacidade a
ponto de permitir a quebra indiscriminada do sigilo dos registros, com informações de foro
íntimo dos usuários, tão somente pelo fato de terem compartilhado determinado vídeo que,
depois se soube, era falso.
9. Recurso especial provido. (REsp 1.859.665-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta
Turma, por unanimidade, julgado em 09/03/2021 - Info 688).

1.3 Contratos
1.3.1 Alienação fiduciária de bens imóveis

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO


PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL C/C PEDIDO DE DEVOLUÇÃO
DAS QUANTIAS PAGAS. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA.
AUSÊNCIA DE REGISTRO. GARANTIA NÃO CONSTITUÍDA. VENDA
EXTRAJUDICIAL DO BEM. DESNECESSIDADE.
1. Ação ajuizada em 01/08/2017. Recurso especial interposto em 27/05/2019 e concluso ao
Gabinete em 03/09/2019. Julgamento: CPC/2015.
2. O propósito recursal consiste em dizer se a previsão de cláusula de alienação fiduciária em
garantia em instrumento particular de compra e venda de imóvel impede a resolução do ajuste
por iniciativa do adquirente, independentemente da ausência de registro.
3. No ordenamento jurídico brasileiro, coexiste um duplo regime jurídico da propriedade
fiduciária: a) o regime jurídico geral do Código Civil, que disciplina a propriedade fiduciária
sobre coisas móveis infungíveis, sendo o credor fiduciário qualquer pessoa natural ou jurídica;
b) o regime jurídico especial, formado por um conjunto de normas extravagantes, dentre as
quais a Lei 9.514/97, que trata da propriedade fiduciária sobre bens imóveis.
4. No regime especial da Lei 9.514/97, o registro do contrato tem natureza constitutiva,
sem o qual a propriedade fiduciária e a garantia dela decorrente não se perfazem.
5. Na ausência de registro do contrato que serve de título à propriedade fiduciária no
competente Registro de Imóveis, como determina o art. 23 da Lei 9.514/97, não é exigível
do adquirente que se submeta ao procedimento de venda extrajudicial do bem para só
então receber eventuais diferenças do vendedor.
6. Recurso especial conhecido e não provido (STJ, REsp 1.835.598-SP, Rel. Min.
Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 09/02/2021 – Info 685)

1.3.2 Lei de Locações

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. LOCAÇÃO. PRAZO INDETERMINADO. DENÚNCIA


VAZIA. ART. 47, V, DA LEI DE LOCAÇÕES (L. 8.245/1991). TERMO INICIAL.
VIGÊNCIA DA LOCAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
1. O lapso previsto no art. 47, V, da Lei de Locações (Lei Federal n. 8.245/1991) é o somatório
total do vínculo contratual, independentemente de se tratar de locação por prazo determinado
ou indeterminado.
2. Portanto, o termo inicial de contagem do prazo para a denúncia vazia, nas hipóteses de
que trata o art. 47, V, da Lei de Locações coincide com a formação do vínculo contratual.
3. No caso concreto, a locação teve início em 5/3/2007, de modo que o ajuizamento da ação,
em 28/3/2012, observou o prazo legal.
4. Recurso especial a que se nega provimento (REsp 1.511.978-BA, Rel. Min. Antônio Carlos
Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 02/03/2021 – Info 687)

1.3.3 Compra e venda

PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL.


AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALOR PAGO POR ÁREA EXCEDENTE. IMÓVEL
ENTREGUE EM METRAGEM A MENOR. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL.
COMPROVAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. DECISÃO UNIPESSOAL. IMPOSSIBILIDADE.
VÍCIO APARENTE. PRETENSÃO DE ABATIMENTO PROPORCIONAL DO PREÇO.
VENDA AD MENSURAM. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA MANTIDA. 1. Ação de
restituição de valor pago por área excedente, em virtude da entrega de imóvel em metragem
menor do que a contratada. 2. Ação ajuizada em 02/07/2018. Recurso especial concluso ao
gabinete em 19/10/2020. Julgamento: CPC/2015. 3. O propósito recursal é o afastamento da
prejudicial de decadência em relação ao pedido do recorrente de restituição de valor pago por
área excedente, decorrente da aquisição de imóvel entregue em metragem menor do que a
contratada. 4. A comprovação da divergência jurisprudencial exige o confronto entre acórdãos,
motivo pelo qual é inadmissível o uso de decisão unipessoal para essa finalidade. 5. A entrega
de bem imóvel em metragem diversa da contratada não pode ser considerada vício oculto, mas
sim aparente, dada a possibilidade de ser verificada com a mera medição das dimensões do
imóvel – o que, por precaução, o adquirente, inclusive, deve providenciar tão logo receba a
unidade imobiliária. 6. É de 90 (noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por vícios
aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si adquirido, contado a partir da efetiva entrega
do bem (art. 26, II e § 1º, do CDC). 7. O prazo decadencial previsto no art. 26 do CDC relaciona-
se ao período de que dispõe o consumidor para exigir em juízo alguma das alternativas que lhe
são conferidas pelos arts. 18, § 1º, e 20, caput, do mesmo diploma legal (a saber, a substituição
do produto, a restituição da quantia paga, o abatimento proporcional do preço e a reexecução
do serviço), não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para
pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato. 8. Para as situações em que as
dimensões do imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço
da venda foi estipulado por medida de extensão ou com determinação da respectiva área
(venda ad mensuram), aplica-se o disposto no art. 501 do CC/02, que prevê o prazo
decadencial de 1 (um) ano para a propositura das ações previstas no antecedente artigo
(exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento
proporcional do preço). 9. Na espécie, o TJ/SP deixou expressamente consignada a natureza
da ação ajuizada pelo recorrido, isto é, de abatimento proporcional do preço, afastando-se, por
não se tratar de pretensão indenizatória, o prazo prescricional geral de 10 (dez) anos previsto
no art. 205 do CC/02. 10. Ao mesmo tempo em que reconhecida, pela instância de origem, que
a venda do imóvel deu-se na modalidade ad mensuram, não se descura que a relação havida
entre as partes é, inegavelmente, de consumo, o que torna prudente a aplicação da teoria do
diálogo das fontes para que se possa definir a legislação aplicável, com vistas a aplicar o prazo
mais favorável ao consumidor. 11. De qualquer forma, ainda que se adote o prazo decadencial
de 1 (um) ano previsto no CC/02, contado da data de registro do título – por ser ele maior que
o de 90 (noventa) dias previsto no CDC – impossível afastar o reconhecimento da
implementação da decadência na espécie, vez que o registro do título deu-se em 18/07/2016 e
a ação somente foi ajuizada em 02/07/2018. 12. Recurso especial parcialmente conhecido e,
nessa extensão, não provido. (REsp 1.890.327/SP, Rel. min. Nancy Andrighi, Terceira Turma,
por maioria, julgado em 20/04/2021 – Info 693).

1.4 Condomínio edilício residencial e contrato de hospedagem atípico

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO RESIDENCIAL.


AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. LOCAÇÃO FRACIONADA DE IMÓVEL
PARA PESSOAS SEM VÍNCULO ENTRE SI, POR CURTOS PERÍODOS.
CONTRATAÇÕES CONCOMITANTES, INDEPENDENTES E INFORMAIS, POR
PRAZOS VARIADOS. OFERTA POR MEIO DE PLATAFORMAS DIGITAIS
ESPECIALIZADAS DIVERSAS. HOSPEDAGEM ATÍPICA. USO NÃO RESIDENCIAL
DA UNIDADE CONDOMINIAL. ALTA ROTATIVIDADE, COM POTENCIAL AMEAÇA
À SEGURANÇA, AO SOSSEGO E À SAÚDE DOS CONDÔMINOS. CONTRARIEDADE
À CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO QUE PREVÊ DESTINAÇÃO RESIDENCIAL.
RECURSO IMPROVIDO.
1. Os conceitos de domicílio e residência (CC/2002, arts. 70 a 78), centrados na ideia de
permanência e habitualidade, não se coadunam com as características de transitoriedade,
eventualidade e temporariedade efêmera, presentes na hospedagem, particularmente naqueles
moldes anunciados por meio de plataformas digitais de hospedagem.
2. Na hipótese, tem-se um contrato atípico de hospedagem, que se equipara à nova modalidade
surgida nos dias atuais, marcados pelos influxos da avançada tecnologia e pelas facilidades de
comunicação e acesso proporcionadas pela rede mundial da internet, e que se vem tornando
bastante popular, de um lado, como forma de incremento ou complementação de renda de
senhorios, e, de outro, de obtenção, por viajantes e outros interessados, de acolhida e abrigo de
reduzido custo.
3. Trata-se de modalidade singela e inovadora de hospedagem de pessoas, sem vínculo entre si,
em ambientes físicos de estrutura típica residencial familiar, exercida sem inerente
profissionalismo por aquele que atua na produção desse serviço para os interessados, sendo a
atividade comumente anunciada por meio de plataformas digitais variadas. As ofertas são feitas
por proprietários ou possuidores de imóveis de padrão residencial, dotados de espaços ociosos,
aptos ou adaptados para acomodar, com certa privacidade e limitado conforto, o interessado,
atendendo, geralmente, à demanda de pessoas menos exigentes, como jovens estudantes ou
viajantes, estes por motivação turística ou laboral, atraídos pelos baixos preços cobrados.
4. Embora aparentemente lícita, essa peculiar recente forma de hospedagem não encontra,
ainda, clara definição doutrinária, nem tem legislação reguladora no Brasil, e, registre-se, não
se confunde com aquelas espécies tradicionais de locação, regidas pela Lei 8.245/91, nem
mesmo com aquela menos antiga, genericamente denominada de aluguel por temporada (art.
48 da Lei de Locações).
5. Diferentemente do caso sob exame, a locação por temporada não prevê aluguel informal e
fracionado de quartos existentes num imóvel para hospedagem de distintas pessoas estranhas
entre si, mas sim a locação plena e formalizada de imóvel adequado a servir de residência
temporária para determinado locatário e, por óbvio, seus familiares ou amigos, por prazo não
superior a noventa dias.
6. Tampouco a nova modalidade de hospedagem se enquadra dentre os usuais tipos de
hospedagem ofertados, de modo formal e profissionalizado, por hotéis, pousadas, hospedarias,
motéis e outros estabelecimentos da rede tradicional provisora de alojamento, conforto e
variados serviços à clientela, regida pela Lei 11.771/2008.
7. O direito de o proprietário condômino usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel,
nos termos dos arts. 1.228 e 1.335 do Código Civil de 2002 e 19 da Lei 4.591/64, deve
harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas
propriedades abrangidas no Condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela
maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em
regime de condomínio edilício.
8. O Código Civil, em seus arts. 1.333 e 1.334, concede autonomia e força normativa à
convenção de condomínio regularmente aprovada e registrada no Cartório de Registro
de Imóveis competente. Portanto, existindo na Convenção de Condomínio regra impondo
destinação residencial, mostra-se indevido o uso de unidades particulares que, por sua
natureza, implique o desvirtuamento daquela finalidade (CC/2002, arts. 1.332, III, e
1.336, IV).
9. Não obstante, ressalva-se a possibilidade de os próprios condôminos de um condomínio
edilício de fim residencial deliberarem em assembleia, por maioria qualificada (de dois
terços das frações ideais), permitir a utilização das unidades condominiais para fins de
hospedagem atípica, por intermédio de plataformas digitais ou outra modalidade de
oferta, ampliando o uso para além do estritamente residencial e, posteriormente,
querendo, incorporarem essa modificação à Convenção do Condomínio.
10. Recurso especial desprovido. (REsp 1.819.075-RS, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo,
Quarta Turma, por maioria, julgado em 20/04/2021 – Info 693)

• O TJSC, diversamente do julgado acima, já entendeu que:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE


CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO C/C OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. CLÁUSULA QUE
PROÍBE A LOCAÇÃO DAS UNIDADES CONDOMINIAIS POR INTERMÉDIO DE
APLICATIVO DE INTERNET (AIRBNB). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO
DO RÉU. SUSTENTADA A LEGALIDADE DA ALTERAÇÃO DA CONVENÇÃO
CONDOMINIAL AO ARGUMENTO DE QUE A LOCAÇÃO VIA APLICATIVOS
DESVIRTUA A FINALIDADE RESIDENCIAL DO EDIFÍCIO. ALEGAÇÃO DE QUE A
ALTA ROTATIVIDADE DE PESSOAS ESTRANHAS NO CONDOMÍNIO AMEAÇA A
SEGURANÇA E BEM-ESTAR DOS MORADORES E FUNCIONÁRIOS. TESE DE QUE O
DIREITO DE PROPRIEDADE DO CONDÔMINO NÃO É ABSOLUTO E DEVE
RESPEITAR AS NORMAS ESTABELECIDAS PELA ASSEMBLEIA CONDOMINIAL.
INSUBSISTÊNCIA. PRÁTICA QUE NÃO CONFIGURA CONTRATAÇÃO DE
HOSPEDAGEM, TAMPOUCO DESVIRTUA A FINALIDADE RESIDENCIAL DO
CONDOMÍNIO. ADEMAIS, RISCO À SEGURANÇA E AO SOSSEGO DOS DEMAIS
CONDÔMINOS NÃO DEMONSTRADO. PREVALÊNCIA DO DIREITO
FUNDAMENTAL À PROPRIEDADE (ART. 5º, CAPUT E XXII DA CF) E DO
DIREITO INDIVIDUAL DO CONDÔMINO DE USAR, FRUIR E LIVRE DISPOR DA
UNIDADE (ART. 1.335, I DO CC). FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS.
SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000710-
56.2019.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Marcus Tulio Sartorato,
Terceira Câmara de Direito Civil, j. 28-07-2020).

No mesmo sentido, da Quarta Câmara de Direito Civil do TJSC: Agravo de Instrumento n.


4014239-84.2018.8.24.0900, de São José, rel. Selso de Oliveira, Quarta Câmara de Direito
Civil, j. 28-02-2019.

1.5 Usucapião extraordinária. Área integrante de loteamento irregular.

RECURSO ESPECIAL CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO NO JULGAMENTO DE IRDR.


USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. BEM IMÓVEL URBANO. ÁREA INTEGRANTE DE
LOTEAMENTO IRREGULAR. SETOR TRADICIONAL DE PLANALTINA.
PRESCRIÇÃO AQUISITIVA. FORMA ORIGINÁRIA DE AQUISIÇÃO DE
PROPRIEDADE. POSSIBILIDADE DE REGISTRO. O RECONHECIMENTO DO
DOMÍNIO DO IMÓVEL NÃO INTERFERE NA DIMENSÃO URBANÍSTICA DO USO DA
PROPRIEDADE. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO.
1. As disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos,
são aplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado nº 3, aprovado pelo Plenário do
STJ na sessão de 9/3/2016.
2. A possibilidade de registro da sentença declaratória da usucapião não é pressuposto ao
reconhecimento do direito material em testilha, o qual se funda, essencialmente, na posse
ad usucapionem e no decurso do tempo.
3. A prescrição aquisitiva é forma originária de aquisição da propriedade e a sentença judicial
que a reconhece tem natureza eminentemente declaratória, mas também com carga
constitutiva.
4. Não se deve confundir o direito de propriedade declarado pela sentença proferida na
ação de usucapião (dimensão jurídica) com a certificação e publicidade que emerge do
registro (dimensão registrária) ou com a regularidade urbanística da ocupação levada a
efeito (dimensão urbanística).
5. O reconhecimento da usucapião não impede a implementação de políticas públicas de
desenvolvimento urbano. Muito ao revés, constitui, em várias hipóteses, o primeiro passo para
restabelecer a regularidade da urbanização.
6. Impossível extinguir prematuramente as ações de usucapião relativas aos imóveis situados
no Setor Tradicional de Planaltina com fundamento no art. 485, VI, do NCPC em razão de uma
suposta ausência de interesse de agir ou falta de condição de procedibilidade da ação.
7. Recurso especial não provido, mantida a tese jurídica fixada no acórdão recorrido: É cabível
a aquisição de imóveis particulares situados no Setor Tradicional de Planaltina/DF, por
usucapião, ainda que pendente o processo de regularização urbanística.
(REsp 1.818.564-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em
09/06/2021 - Tema 1025 – info 700)

1.6 Direito de família


1.6.1 União estável

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 529.


CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RATEIO ENTRE
COMPANHEIRA E COMPANHEIRO, DE UNIÕES ESTÁVEIS CONCOMITANTES.
IMPOSSIBILIDADE. 1. A questão constitucional em jogo neste precedente com
repercussão geral reconhecida é a possibilidade de reconhecimento, pelo Estado, da
coexistência de duas uniões estáveis paralelas, e o consequente rateio da pensão por morte
entre os companheiros sobreviventes - independentemente de serem
relações hétero ou homoafetivas. 2. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL tem
precedentes no sentido da impossibilidade de reconhecimento de união estável, em que
um dos conviventes estivesse paralelamente envolvido em casamento ainda válido, sendo
tal relação enquadrada no art. 1.727 do Código Civil, que se reporta à figura da relação
concubinária ( as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar,
constituem concubinato ). 3. É vedado o reconhecimento de uma segunda união estável,
independentemente de ser hétero ou homoafetiva, quando demonstrada a existência de
uma primeira união estável, juridicamente reconhecida. Em que pesem os avanços na
dinâmica e na forma do tratamento dispensado aos mais matizados núcleos familiares, movidos
pelo afeto, pela compreensão das diferenças, respeito mútuo, busca da felicidade e liberdade
individual de cada qual dos membros, entre outros predicados, que regem inclusive os que
vivem sob a égide do casamento e da união estável, subsistem em nosso ordenamento
jurídico constitucional os ideais monogâmicos, para o reconhecimento do casamento e da
união estável, sendo, inclusive, previsto como deveres aos cônjuges, com substrato no
regime monogâmico, a exigência de fidelidade recíproca durante o pacto nupcial (art.
1.566, I, do Código Civil). 4. A existência de uma declaração judicial de existência de união
estável é, por si só, óbice ao reconhecimento de uma outra união paralelamente estabelecida
por um dos companheiros durante o mesmo período, uma vez que o artigo 226, § 3º, da
Constituição se esteia no princípio de exclusividade ou de monogamia, como requisito para o
reconhecimento jurídico desse tipo de relação afetiva inserta no mosaico familiar atual,
independentemente de se tratar de relacionamentos hétero ou homoafetivos. 5. Tese para fins
de repercussão geral: “A preexistência de casamento ou de união estável de um dos
conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, § 1º, do Código Civil, impede o
reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins
previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo
ordenamento jurídico-constitucional brasileiro”. 6. Recurso extraordinário a que se nega
provimento. (STF. RE 1045273, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno,
julgado em 21/12/2020, REPERCUSSÃO GERAL - PUBLIC 09-04-2021 – Tema 529 - Info
1003)

1.6.2 Arbitramento de aluguel. Ex-cônjuge que reside no imóvel comum com a filha do ex-
casal

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL. EX-CÔNJUGE QUE


RESIDE NO IMÓVEL COMUM COM A FILHA DO EX-CASAL, PROVENDO O SEU
SUSTENTO. USO EXCLUSIVO E ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. NÃO
CARACTERIZAÇÃO.
1. O uso exclusivo do imóvel comum por um dos ex-cônjuges — após a separação ou o divórcio
e ainda que não tenha sido formalizada a partilha — autoriza que aquele privado da fruição do
bem reivindique, a título de indenização, a parcela proporcional a sua quota-parte sobre a renda
de um aluguel presumido, nos termos do disposto nos artigos 1.319 e 1.326 do Código Civil.
2. Tal obrigação reparatória — que tem por objetivo afastar o enriquecimento sem causa do
coproprietário — apresenta como fato gerador o uso exclusivo do imóvel comum por um
dos ex-consortes, a partir da inequívoca oposição daquele que se encontra destituído da fruição
do bem, notadamente quando ausentes os requisitos ensejadores da chamada "usucapião
familiar" prevista no artigo 1.240-A do citado Codex. Precedentes.
3. Na hipótese dos autos, desde o divórcio das partes, o ex-marido reside no imóvel comum em
companhia da filha (cujo sustento provê quase que integralmente), sem efetuar nenhum
pagamento a ex-esposa (coproprietária) a título de aluguel.
4. Como é de sabença, enquanto o filho for menor, a obrigação alimentícia de ambos os
genitores (de custear-lhe as despesas com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer,
vestuário, higiene e transporte) tem por lastro o dever de sustento derivado do poder familiar,
havendo presunção de necessidade do alimentando; ao passo que, após a maioridade civil
(dezoito anos), exsurge o dever dos pais de prestar alimentos ao filho — em decorrência da
relação de parentesco — quando demonstrada situação de incapacidade ou de indigência não
proposital, bem como por estar o descendente em período de formação escolar
profissionalizante ou em faculdade, observado o trinômio "necessidade de quem recebe,
capacidade contributiva de quem paga e proporcionalidade". Inteligência da Súmula 358/STJ.
5. A prestação alimentícia, por sua vez, pode ter caráter pecuniário — pagamento de certa soma
em dinheiro — e/ou corresponder a uma obrigação in natura, hipótese em que o devedor fornece
os próprios bens necessários à sobrevivência do alimentando, como moradia, saúde e educação.
6. A despeito da alternatividade característica da obrigação de prestar alimentos, o artigo 1.707
do Código Civil enuncia o princípio da incompensabilidade, que, nos termos da jurisprudência
desta Corte, admite mitigação para impedir o enriquecimento indevido de uma das partes,
mediante o abatimento de despesas pagas in natura (para satisfação de necessidades essenciais
do alimentando) do débito oriundo de pensão alimentícia.
7. Nesse contexto normativo, há dois fundamentos que afastam a pretensão indenizatória
da autora da ação de arbitramento de aluguel. Um principal e prejudicial, pois a utilização
do bem pela descendente dos coproprietários — titulares do dever de sustento em razão
do poder familiar (filho menor) ou da relação de parentesco (filho maior) — beneficia a
ambos, motivo pelo qual não se encontra configurado o fato gerador da obrigação
reparatória, ou seja, o uso do imóvel comum em benefício exclusivo de ex-cônjuge.
8. Como fundamento secundário, o fato de o imóvel comum também servir de moradia
para a filha do ex-casal tem a possibilidade de converter a "indenização proporcional
devida pelo uso exclusivo do bem" em "parcela in natura da prestação de alimentos" (sob a
forma de habitação), que deverá ser somada aos alimentos in pecunia a serem pagos pelo
ex-cônjuge que não usufrui do bem — o que poderá ser apurado em ação própria —,
sendo certo que tal exegese tem o condão de afastar o enriquecimento sem causa de
qualquer uma das partes.
9. Ademais, o exame do pedido de arbitramento de verba compensatória pelo uso exclusivo de
imóvel comum por ex-cônjuge não pode olvidar a situação de maior vulnerabilidade que
acomete o genitor encarregado do cuidado dos filhos financeiramente dependentes, cujas
despesas lhe são, em maior parte, atribuídas.
10. Hipótese em que o provimento jurisdicional — pela improcedência da pretensão autoral —
submete-se à regra rebus sic stantibus, notadamente por se tratar de controvérsia que guarda
relação com institutos de direito de família.
11. Recurso especial não provido.
(REsp 1.699.013-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado
em 04/05/2021 - info 695).

1.6.3 Parentesco

DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE


PATERNIDADE C/C NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO DA DEFESA.
OBSERVÂNCIA. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. INEXISTÊNCIA. RELAÇÃO
SOCIOAFETIVA. PRESENÇA. JULGAMENTO: CPC/2015.
1. Ação de investigação de paternidade cumulada com negatória de paternidade proposta em
05/04/2012, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 24/05/2018 e
atribuído ao gabinete em 13/08/2019.
2. O propósito recursal é dizer se a) houve negativa de prestação jurisdicional, b) foi observado
o princípio da concentração da defesa, c) o registro de nascimento do recorrido foi formalizado
mediante vício de consentimento e d) há relação de socioafetividade entre as partes.
3. A alegada violação a dispositivo constitucional não pode ser apreciada em sede de recurso
especial, sob pena de usurpação da competência do STF.
4. Os fundamentos para o afastamento da alegação de preclusão bem como para a rejeição da
pretensão estão expostos no acórdão recorrido, não havendo que se falar em violação aos arts.
489 e 1.022 do CPC/2015. Ademais, “em função do princípio do livre convencimento motivado,
o magistrado não está vinculado aos relatórios técnicos apresentados pelas equipes de
avaliação psicossocial, uma vez que a manifestação da equipe multidisciplinar consubstancia
apenas um dos elementos de convicção do juízo” (HC 513.811/SP).
5. O princípio da concentração da defesa ou da eventualidade impõe ao réu o ônus de alegar,
na contestação, toda a matéria de defesa (art. 336 do CPC/2015). Se o tema, ainda que não
desenvolvido com profundidade, foi suscitado na defesa, inexiste violação a tal princípio.
6. O art. 1604 do CC/02 dispõe que “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do
registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro”. Vale dizer, não é
possível negar a paternidade registral, salvo se consistentes as provas do erro ou da falsidade.
7. Esta Corte consolidou orientação no sentido de que para ser possível a anulação do
registro de nascimento, é imprescindível a presença de dois requisitos, a saber: (i) prova
robusta no sentido de que o pai foi de fato induzido a erro, ou ainda, que tenha sido
coagido a tanto e (ii) inexistência de relação socioafetiva entre pai e filho. Assim, a
divergência entre a paternidade biológica e a declarada no registro de nascimento não é
apta, por si só, para anular o registro. Precedentes.
8. Na hipótese, o recorrente refletiu por tempo considerável e, findo esse período, procedeu à
realização do registro de forma voluntária. Não há elementos capazes de demonstrar a
existência de erro ou de outro vício de consentimento, circunstância que impede o desfazimento
do ato registral. Não só, as provas examinadas pelo Tribunal local apontam para a existência de
vínculo socioafetivo entre as partes, o que corrobora a necessidade de manutenção do registro
tal qual realizado.
9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido (REsp 1.829.093-
PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 01/06/2021
- info 699).

1.7 Sucessões
1.7.1 Direito real de habitação

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE


CONDOMÍNIO CUMULADA COM COBRANÇA DE ALUGUÉIS. DIREITO REAL DE
HABITAÇÃO. COMPANHEIRA SUPÉRSTITE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO E
ALIENAÇÃO DE IMÓVEL COMUM. INVIABILIDADE. ALUGUÉIS. DESCABIMENTO.
JULGAMENTO: CPC/2015.
1. Ação proposta em 06/04/2018, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em
28/06/2019 e atribuído ao gabinete em 07/01/2020.
2. O propósito recursal é dizer se a) houve negativa de prestação jurisdiciona; b) o direito real
de habitação assegurado à companheira supérstite constitui empecilho à extinção do
condomínio do qual participa com os herdeiros do de cujus e c) é possível a fixação de aluguel
a ser pago pela convivente e por sua filha, também herdeira do falecido, em prol dos demais
herdeiros, em consequência do uso exclusivo do imóvel.
3. O capítulo da sentença não impugnado em sede de apelação e, assim, não decidido pelo
Tribunal de origem, impede o exame da matéria por esta Corte, em razão da
preclusão consumativa.
4. Se o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese, soluciona
integralmente a controvérsia submetida à sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela
pretendida pela parte, inexiste ofensa ao art. 1.022.
5. O direito real de habitação é ex lege (art. 1.831 do CC/2015 e art. 7º da Lei 9.272), vitalício
e personalíssimo, o que significa que o cônjuge ou companheiro sobrevivente pode permanecer
no imóvel até o momento do falecimento. Sua finalidade é assegurar que o viúvo ou viúva
permaneça no local em que antes residia com sua família, garantindo-lhe uma moradia digna.
6. O advento do Código Civil de 2002 deu ensejo à discussão acerca da subsistência do direito
real de habitação ao companheiro sobrevivente. Essa questão chegou a este Tribunal Superior,
que firmou orientação no sentido da não revogação da Lei 9.278/96 pelo CC/02 e,
consequentemente, pela manutenção do direito real de habitação ao companheiro supérstite.
7. Aos herdeiros não é autorizado exigir a extinção do condomínio e a alienação do bem
imóvel comum enquanto perdurar o direito real de habitação (REsp 107.273/PR; REsp
234.276/RJ). A intromissão do Estado-legislador na livre capacidade das pessoas disporem dos
respectivos patrimônios só se justifica pela igualmente relevante proteção constitucional
outorgada à família (203, I, CF/88), que permite, em exercício de ponderação de valores, a
mitigação de um deles – in casu – dos direitos inerentes à propriedade, para assegurar a máxima
efetividade do interesse prevalente, que na espécie é a proteção ao grupo familiar.
8. O direito real de habitação tem caráter gratuito, razão pela qual os herdeiros não
podem exigir remuneração do companheiro sobrevivente pelo uso do imóvel. Seria um
contrassenso atribuir-lhe a prerrogativa de permanecer no imóvel em que residia antes
do falecimento do seu companheiro, e, ao mesmo tempo, exigir dele uma contrapartida
pelo uso exclusivo.
9. Em virtude do exame do mérito, por meio do qual foi acolhida a tese sustentada pelas
recorrentes, fica prejudicada a análise do dissídio jurisprudencial.
10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido (STJ, REsp 1.846.167-
SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/02/2021 - Info
685)

1.7.2 Sucessões. Partilha. Ausência de citação de litisconsorte necessário. Sentença


juridicamente inexistente. Aplicabilidade do Tema n. 809/STF.

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. PROLAÇÃO DE SENTENÇA


HOMOLOGATÓRIA DE PARTILHA IRRECORRIDA. AUSÊNCIA DE EXPEDIÇÃO DO
FORMAL DE PARTILHA. OBSERVAÇÃO DE VÍCIO GRAVE, CONSISTENTE NA
AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DE LITISCONSORTE NECESSÁRIO. DECLARAÇÃO NO
BOJO DO PRÓPRIO INVENTÁRIO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA JURIDICAMENTE
INEXISENTE. INEXISTÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO E DE COISA JULGADA
MATERIAL. QUERELA NULLITATIS INSANABILIS. PRESCINDIBILIDADE.
RECONHECIMENTO DO VÍCIO NA FASE DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA POR
DISPOSIÇÃO LEGAL. MATÉRIA SUBMETIDA AO CONTRADITÓRIO E QUE
DISPENSAVA A DILAÇÃO PROBATÓRIA. LIMITES SUBJETIVOS DA COISA
JULGADA NO INVENTÁRIO E PARTILHA. INEFICÁCIA EM RELAÇÃO A
TERCEIROS, COMO O LITISCONSORTE NECESSÁRIO NÃO CITADO. DECLARAÇÃO
DE INEXISTÊNCIA JURÍDICA DA SENTENÇA QUE ATRAI A INCIDÊNCIA DA TESE
FIRMADA PELO STJ NO JULGAMENTO DO TEMA 809. AGRAVO JULGADO POR
FUNDAMENTO DISTINTO DOS ALEGADOS PELA PARTE. RECURSO ESPECIAL.
AUSÊNCIA DE INTERESSE. ARGUMENTOS SUSCITADOS PELA PARTE
DESCONSIDERADOS NO ACÓRDÃO E REITERADOS NAS CONTRARRAZÕES DO
RECURSO ESPECIAL. COGNOSCIBILIDADE. MODIFICAÇÃO DA ORDEM LEGAL DE
VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. IMPOSSIBILIDADE.
1- Ação proposta em 21/05/2010. Recursos especiais interpostos em 01/10/2019 e 02/10/2019
e atribuídos à Relatora em 30/01/2020.
2- O propósito do recurso especial de MARIA BARBARA DE OLIVEIRA é definir se a tese
fixada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do tema 809, segundo a qual
“é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista
no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas
de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”, é aplicável na hipótese em que, a despeito
da existência de sentença de partilha irrecorrida que homologou acordo celebrado pelos
colaterais, únicos herdeiros conhecidos ao tempo de sua prolação, houve o superveniente
reconhecimento de herdeira apta a exclui-los da linha sucessória
3- Os propósitos do recurso especial de EMÍLIO XAVIER DE OLIVEIRA, por sua vez,
consistem em definir: (i) se há omissão relevante no acórdão recorrido; e (ii) se poderia o
Tribunal de Justiça de São Paulo, a despeito da existência de sentença de partilha irrecorrida,
nulificar os atos processuais que lhe são subsequentes sem que tenha havido pedido nesse
sentido no agravo de instrumento por ele interposto.
4- O juízo do inventário, após a prolação de sentença homologatória de acordo de
partilha irrecorrida e antes da expedição do respectivo formal, reconhecer a existência de
vício grave consistente na ausência de citação de litisconsorte necessário e, assim, a
inexistência jurídica da sentença por ele proferida, que não transita em julgado e
tampouco forma coisa julgada material.
5- A inexistência jurídica da sentença pode ser declarada em ação autônoma
(querela nullitatis insanabilis) e também no próprio processo em que proferida, na fase de
cumprimento de sentença ou até antes dela, se possível, especialmente na hipótese em que
a matéria foi previamente submetida ao crivo do contraditório e não havia a necessidade
de dilação probatória.
6- Em virtude dos limites subjetivos da coisa julgada, o formal de partilha será título
executivo judicial apenas em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a
título singular ou universal, não alcançando, contudo, terceiros, como o litisconsorte
necessário não citado para o inventário.
7- Declarada a inexistência jurídica da sentença na própria ação de inventário, deve ser
aplicada a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema 809, por
meio da qual foi declarada a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002.
8- A parte que teve fundamento desprezado por ocasião do julgamento de recurso por ela
interposto, mas que foi vencedora por fundamentação distinta e declinada de ofício pelo órgão
julgador, não tem interesse para interpor recurso especial, devendo a questão ser reavivada nas
contrarrazões do recurso porventura interposto pelo vencido. Precedente.
9- Hipótese em que a parte, ao fundamento de que dedicou tempo, esforços e valores na
inventariança e no zelo dos bens deixados por seu irmão, pretende a parte modificar a ordem
legal de vocação hereditária, o que é absolutamente inadmissível, devendo a questão ser
oportunamente apreciada pelo juízo do inventário ou em eventual ação autônoma.
10- Recurso especial de MARIA BARBARA DE OLIVEIRA conhecido e provido; recurso
especial de EMÍLIO XAVIER DE OLIVEIRA não conhecido. (REsp 1.857.852-RS, Rel. Min.
Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/03/2021)

1.7.3 Sucessões. Aplicabilidade do tema 809/STF aos processos em que não tenha havido
trânsito em julgado da sentença de partilha.

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. OMISSÕES.


INOCORRÊNCIA. QUESTÕES DECIDIDAS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. QUESTÃO
CONSTITUCIONAL QUE DEVE SER EXAMINADA EM RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. EFEITO EX
TUNC COMO REGRA. MODULAÇÃO TEMPORAL DE EFEITOS E EFICÁCIA EX
NUNC COMO EXCEÇÃO. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA MODULAÇÃO DE
EFEITOS. NECESSIDADE. TEMA 809/STF. APLICABILIDADE AOS PROCESSOS EM
QUE NÃO TENHA HAVIDO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA DE PARTILHA.
TUTELA DA CONFIANÇA E PREVISIBILIDADE DAS RELAÇÕES PROCESSUAIS
FINALIZADAS SOB A ÉGIDA DO ART. 1.790 DO CC/2002. PRÉ-EXISTÊNCIA DE
DECISÃO EXCLUINDO HERDEIRO DA SUCESSÃO À LUZ DO DISPOSITIVO
POSTERIORMENTE DECLARADO INCONSTITUCIONAL. IRRELEVÂNCIA. AÇÃO
DE INVENTÁRIO SEM SENTENÇA DE PARTILHA E SEM TRÂNSITO EM JULGADO.
EQUIPARAÇÃO COM DECISÃO PROFERIDA NO CURSO DO INVENTÁRIO.
IMPOSSIBILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE DE ARGUIÇÃO
EM IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE IMPLICA NA
POSSIBILIDADE DE SEU EXAME NA FASE DE CONHECIMENTO.
1- Ação proposta em 03/02/2004. Recurso especial interposto em 25/11/2019 e atribuído à
Relatora em 07/10/2020.
2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se o acórdão recorrido possui omissões
relevantes; (ii) se a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento
do tema 809, segundo a qual “é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre
cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas
hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”,
deve ser aplicada ao inventário em que a exclusão da concorrência entre herdeiros
ocorreu em decisão anterior à tese.
3- Inexiste omissão quando o acórdão recorrido enfrenta amplamente a questão controvertida,
ainda que contrariamente aos interesses da parte recorrente, bem como inexiste omissão quando
a questão que se alega deveria ter sido enfrentada possui natureza constitucional e não houve a
interposição de recurso extraordinário pela parte.
4- Considerando que a lei incompatível com o texto constitucional padece do vício de nulidade,
a declaração de sua inconstitucionalidade, de regra, produz efeito ex tunc, ressalvadas as
hipóteses em que, no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, houver a modulação temporal
dos efeitos, que é excepcional.
5- Da excepcionalidade da modulação decorre a necessidade de que o intérprete seja restritivo,
a fim de evitar inadequado acréscimo de conteúdo sobre aquilo que o intérprete autêntico
pretendeu proteger e salvaguardar.
6- Ao declarar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002 (tema 809), o Supremo
Tribunal Federal modulou temporalmente a aplicação da tese para apenas “os processos
judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha”, de modo
a tutelar a confiança e a conferir previsibilidade às relações finalizadas sob as regras antigas (ou
seja, às ações de inventário concluídas nas quais foi aplicado o art. 1.790 do CC/2002).
7- Aplica-se a tese fixada no tema 809/STF às ações de inventário em que ainda não foi
proferida a sentença de partilha, ainda que tenha havido, no curso do processo, a prolação
de decisão que, aplicando o art. 1.790 do CC/2002, excluiu herdeiro da sucessão e que a
ela deverá retornar após a declaração de inconstitucionalidade e a consequente aplicação
do art. 1.829 do CC/2002.
8- Não são equiparáveis, para os fins da aplicação do tema 809/STF, as sentenças de partilha
transitadas em julgado e as decisões que, incidentalmente, versam sobre bens pertencentes ao
espólio, uma vez que a inconstitucionalidade de lei, enquanto questão de ordem pública, é
matéria suscetível de arguição em impugnação ao cumprimento de sentença e que, com muito
mais razão, pode ser examinada na fase de conhecimento.
9- Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 1.904.374/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 13/04/2021 – Info 692).

2. DIREITO PROCESSUAL CIVIL

2.1 Competência

2.1.1 Ação previdenciária. Competência federal delegada.

COMPETÊNCIA – AÇÃO PREVIDENCIÁRIA – JUSTIÇA FEDERAL E JUSTIÇA


COMUM. A competência da Justiça comum pressupõe inexistência, na comarca do
domicílio do segurado ou beneficiário da previdência, de Vara Federal, sendo neutro o
fator residência considerado certo distrito. (STF - RE 860508, Relator(a): MARCO
AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 08/03/2021, PROCESSO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-055 DIVULG 22-03-2021 PUBLIC 23-03-2021 –
Info 1008)

2.1.2 Insolvência civil

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. INSOLVÊNCIA


CIVIL. EXCEÇÃO DA PARTE FINAL DO ARTIGO 109, I, DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A
questão constitucional em debate, neste recurso extraordinário com repercussão geral
reconhecida (Tema 859), é se a insolvência civil está, ou não, entre as exceções postas na parte
final do artigo 109, I, da Constituição da República, para fins de definição da competência da
Justiça Federal de primeira instância. 2. A falência, no contexto do rol de exceções à
competência da Justiça Federal de primeira instância, significa tanto a insolvência da pessoa
jurídica, quanto a insolvência da pessoa física, considerando que ambas envolvem, em suas
respectivas essências, concurso de credores. 3. Assim sendo, diante do caso dos autos, fixa-se
a seguinte tese: “A insolvência civil está entre as exceções da parte final do artigo 109, I, da
Constituição da República, para fins de definição da competência da Justiça Federal.” 4.
Recurso extraordinário a que se nega provimento. (STF. RE 678162, Relator(a): MARCO
AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 29/03/2021,
PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-091 DIVULG 12-05-
2021 PUBLIC 13-05-2021 – Info 1011)

2.2 Procedimento. Termo inicial de contagem dos prazos processuais, em caso de duplicidade
de intimações eletrônicas.

DIREITO PROCESSUAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO. DUPLICIDADE DE INTIMAÇÕES:
PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO E POR PORTAL ELETRÔNICO
(LEI 11.419/2006, ARTS. 4º E 5º). PREVALÊNCIA DA INTIMAÇÃO PELO PORTAL
ELETRÔNICO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. A Lei 11.419/2006 - Lei do Processo Judicial Eletrônico - prevê dois tipos de intimações
criados para atender à evolução do sistema de informatização dos processos judiciais. A
primeira intimação, tratada no art. 4º, de caráter geral, é realizada por publicação no Diário da
Justiça Eletrônico; e a segunda, referida no art. 5º, de índole especial, é feita pelo Portal
Eletrônico, no qual os advogados previamente se cadastram nos sistemas eletrônicos dos
Tribunais para receber a comunicação dos atos processuais. 2. Embora não haja antinomia entre
as duas formas de intimação previstas na Lei, ambas aptas a ensejar a válida intimação das
partes e de seus advogados, não se pode perder de vista que, caso aconteçam em duplicidade e
em diferentes datas, deve ser garantida aos intimados a previsibilidade e segurança objetivas
acerca de qual delas deve prevalecer, evitando-se confusão e incerteza na contagem dos prazos
processuais peremptórios.
3. Assim, há de prevalecer a intimação prevista no art. 5º da Lei do Processo Eletrônico,
à qual o § 6º do art. 5º atribui status de intimação pessoal, por ser forma especial sobre a
genérica, privilegiando-se a boa-fé processual e a confiança dos operadores jurídicos nos
sistemas informatizados de processo eletrônico, bem como garantindo-se a credibilidade
e eficiência desses sistemas. Caso preponderasse a intimação por forma geral sobre a de feitio
especial, quando aquela fosse primeiramente publicada, é evidente que o advogado cadastrado
perderia o prazo para falar nos autos ou praticar o ato, pois, confiando no sistema, aguardaria
aquela intimação específica posterior.
4. Embargos de divergência conhecidos e providos, afastando-se a intempestividade do recurso
especial. (EAREsp 1.663.952-RJ, Rel. Min. Raul Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado
em 19/05/2021 - Info 697)

2.3 Astreintes. Possibilidade de revisão do valor de ofício.

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. CABIMENTO. MÉRITO ANALISADO. VALOR ACUMULADO DAS
ASTREINTES. REVISÃO A QUALQUER TEMPO. POSSIBILIDADE. CLÁUSULA REBUS
SIC STANTIBUS. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO OU FORMAÇÃO DE COISA JULGADA.
EXORBITÂNCIA CONFIGURADA. REVISÃO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA
CONHECIDOS E PROVIDOS.
1. É dispensável a exata similitude fática entre os acórdãos paragonados, em se tratando de
embargos de divergência que tragam debate acerca de interpretação de regra de direito
processual, bastando o indispensável dissenso a respeito da solução da mesma questão de mérito
de natureza processual controvertida.
2. O valor das astreintes, previstas no art. 461, caput e §§ 1º a 6º, do Código de Processo
Civil de 1973, correspondente aos arts. 497, caput, 499, 500, 536, caput e § 1º, e 537, § 1º,
do Código de Processo Civil de 2015, pode ser revisto a qualquer tempo (CPC/1973, art.
461, § 6º; CPC/2015, art. 537, § 1º), pois é estabelecido sob a cláusula rebus sic stantibus, e
não enseja preclusão ou formação de coisa julgada.
3. Assim, sempre que o valor acumulado da multa devida à parte destinatária tornar-se
irrisório ou exorbitante ou desnecessário, poderá o órgão julgador modificá-lo, até mesmo
de ofício, adequando-o a patamar condizente com a finalidade da medida no caso
concreto, ainda que sobre a quantia estabelecida já tenha havido explícita manifestação,
mesmo que o feito esteja em fase de execução ou cumprimento de sentença.
4. Embargos de divergência conhecidos e providos, para reduzir o valor total das astreintes,
restabelecendo-o conforme fixado pelo d. Juízo singular. (EAREsp 650.536/RJ, Rel. Min. Raul
Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado em 07/04/2021 - Info 691)

2.4 Pedido reconvencional. Requisitos. Atendimento. Nomen iuris. Irrelevância.

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO RECONVENCIONAL.


REQUISITOS. ATENDIMENTO. NOMEM IURIS. IRRELEVÂNCIA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo
Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. A partir das inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015, o oferecimento de
reconvenção passou a ser feito na própria contestação, sem maiores formalidades, visando
garantir a razoável duração do processo e a máxima economia processual.
3. A equivocada denominação do pedido reconvencional como pedido contraposto não impede
o regular processamento da pretensão formulada pelo réu contra o autor, desde que ela esteja
bem delimitada na contestação e que ao autor seja assegurado o pleno exercício do contraditório
e da ampla defesa.
4. A existência de manifestação inequívoca do réu qualitativa ou quantitativamente maior
que a simples improcedência da demanda principal é o quanto basta para se considerar
proposta a reconvenção, independentemente do nomen iuris que se atribua à pretensão,
nos termos do Enunciado nº 45 do Fórum Permanente dos Processualistas Civis.
5. Recurso especial provido (REsp 1.940.016-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/06/2021 - Info 702).
2.5 Ação Civil Pública
2.5.1 Limite territorial dos efeitos das decisões em Ação Civil Pública (art. 16 da lei 7.37/1985)

CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 16


DA LEI 7.347/1985, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 9.494/1997. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA
AOS LIMITES DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DO ÓRGÃO PROLATOR.
REPERCUSSÃO GERAL. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS DESPROVIDOS. 1. A
Constituição Federal de 1988 ampliou a proteção aos interesses difusos e coletivos, não somente
constitucionalizando-os, mas também prevendo importantes instrumentos para garantir sua pela
efetividade. 2. O sistema processual coletivo brasileiro, direcionado à pacificação social no
tocante a litígios meta individuais, atingiu status constitucional em 1988, quando houve
importante fortalecimento na defesa dos interesses difusos e coletivos, decorrente de uma
natural necessidade de efetiva proteção a uma nova gama de direitos resultante do
reconhecimento dos denominados direitos humanos de terceira geração ou dimensão, também
conhecidos como direitos de solidariedade ou fraternidade. 3. Necessidade de absoluto respeito
e observância aos princípios da igualdade, da eficiência, da segurança jurídica e da efetiva tutela
jurisdicional. 4. Inconstitucionalidade do artigo 16 da LACP, com a redação da Lei
9.494/1997, cuja finalidade foi ostensivamente restringir os efeitos condenatórios de
demandas coletivas, limitando o rol dos beneficiários da decisão por meio de um critério
territorial de competência, acarretando grave prejuízo ao necessário tratamento
isonômico de todos perante a Justiça, bem como à total incidência do Princípio da
Eficiência na prestação da atividade jurisdicional. 5. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
DESPROVIDOS, com a fixação da seguinte tese de repercussão geral: "I - É
inconstitucional a redação do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, sendo
repristinada sua redação original. II - Em se tratando de ação civil pública de efeitos
nacionais ou regionais, a competência deve observar o art. 93, II, da Lei 8.078/1990 (Código
de Defesa do Consumidor). III - Ajuizadas múltiplas ações civis públicas de âmbito nacional
ou regional e fixada a competência nos termos do item II, firma-se a prevenção do juízo que
primeiro conheceu de uma delas, para o julgamento de todas as demandas conexas". (RE
1101937, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 08/04/2021,
Tema 1075 – Info 1012)

2.5.2 Ação Civil Pública manejada por associação na condição de substituta processual.
Legitimidade do não associado para a execução da sentença.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL


REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (CPC, ART. 927). AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
CADERNETAS DE POUPANÇA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. AÇÃO PROPOSTA
POR ASSOCIAÇÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (IDEC) EM FACE DE
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SUCEDIDA POR OUTRA. DISTINÇÃO ENTRE AS
RAZÕES DE DECIDIR (DISTINGUISHING) DO CASO EM EXAME E AQUELAS
CONSIDERADAS NAS HIPÓTESES JULGADAS PELO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL (RE 573.232/SC E RE 612.043/PR). TESE CONSOLIDADA NO RECURSO
ESPECIAL. NO CASO CONCRETO, RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.
1. Na hipótese, conforme a fundamentação exposta, não são aplicáveis as conclusões adotadas
pelo colendo Supremo Tribunal Federal, nos julgamentos dos: a) RE 573.232/SC, de que "as
balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida
pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos
associados e a lista destes juntada à inicial"; e b) RE 612.043/PR, de que os "beneficiários do
título executivo, no caso de ação proposta por associação, são aqueles que, residentes na área
compreendida na jurisdição do órgão julgador, detinham, antes do ajuizamento, a condição de
filiados e constaram da lista apresentada com a peça inicial".
2. As teses sufragadas pela eg. Suprema Corte referem-se à legitimidade ativa de associado para
executar sentença prolatada em ação coletiva ordinária proposta por associação autorizada por
legitimação ordinária (ação coletiva representativa), agindo a associação por representação
prevista no art. 5º, XXI, da Constituição Federal, e não à legitimidade ativa de consumidor para
executar sentença prolatada em ação coletiva substitutiva proposta por associação, autorizada
por legitimação constitucional extraordinária (p. ex., CF, art. 5º, LXX) ou por legitimação legal
extraordinária, com arrimo, especialmente, nos arts. 81, 82 e 91 do Código de Defesa do
Consumidor (ação civil pública substitutiva ou ação coletiva de consumo).
3. Conforme a Lei da Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor, os efeitos da
sentença de procedência de ação civil pública substitutiva, proposta por associação com a
finalidade de defesa de interesses e direitos individuais homogêneos de consumidores (ação
coletiva de consumo), beneficiarão os consumidores prejudicados e seus sucessores,
legitimando-os à liquidação e à execução, independentemente de serem filiados à associação
promovente.
4. Para os fins do art. 927 do CPC, é adotada a seguinte Tese: "Em Ação Civil Pública proposta
por associação, na condição de substituta processual de consumidores, possuem legitimidade
para a liquidação e execução da sentença todos os beneficiados pela procedência do pedido,
independentemente de serem filiados à associação promovente."
5. Caso concreto: negado provimento ao recurso especial. (REsp 1.438.263/SP, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria quanto à redação da tese, julgado em
24/03/2021 - Tema 948 – info 694).

2.6 Mandado de Segurança

2.6.1 (In)constitucionalidade de dispositivos da Lei do Mandado de Segurança

Constitucionalidade do art. 1º, § 2º da Lei nº 12.016/2019. Não cabe mandado de segurança


contra atos de gestão comercial praticados por administradores de empresas públicas,
sociedades de economia mista e concessionárias de serviço público.
Constitucionalidade do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2019. O juiz tem a faculdade de exigir
caução, fiança ou depósito para o deferimento de medida liminar em mandado de
segurança, quando verificada a real necessidade da garantia em juízo, de acordo com as
circunstâncias do caso concreto.
Inconstitucionalidade do art. 7º, § 2º da Lei nº 12.016/2009. É inconstitucional ato
normativo que vede ou condicione a concessão de medida liminar na via mandamental.
Constitucionalidade do art. 23 da Lei nº 12.016/2009, que fixa o prazo decadencial de 120
dias para a impetração de mandado de segurança.
Constitucionalidade do art. 25 da Lei nº 12.016/2009, que prevê que não cabe, no processo
de mandado de segurança, a condenação em honorários advocatícios.
STF. Plenário. ADI 4296/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de
Moraes julgado em 9/6/2021 (Info 1021).

2.6.2 Inviabilidade de impugnação de decisões interlocutórias por mandado de segurança

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM


INDENIZATÓRIA. REQUERIMENTO CONSENSUAL DE DESIGNAÇÃO DA
AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO PREVISTA NO ART. 334 DO CPC. IMPUGNAÇÃO
IMEDIATA. POSSIBILIDADE. INUTILIDADE DO EXAME DA QUESTÃO APENAS EM
APELAÇÃO. VIA ADEQUADA APÓS TEMA REPETITIVO 988. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. EXCEPCIONAL UTILIZAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA
COMO MEIO DE IMPUGNAR DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS APÓS TEMA
REPETITIVO 988. IMPOSSIBILIDADE ABSOLUTA.
1- O propósito recursal é definir se, após a publicação do acórdão em que se fixou a tese
referente ao tema repetitivo 988, segundo a qual “o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade
mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a
urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”, ainda
é admissível, ainda que excepcionalmente, a impetração de mandado de segurança para
impugnar decisões interlocutórias.
2- A decisão interlocutória que indefere a designação da audiência de conciliação pretendida
pelas partes é suscetível de impugnação imediata, na medida em que será inócuo e inútil
reconhecer, apenas no julgamento da apelação, que as partes fariam jus à audiência de
conciliação ou à sessão de mediação previstas, na forma do art. 334 do CPC, para acontecer no
início do processo.
3- A decisão judicial que, a requerimento do réu, indefere o pedido de designação da audiência
de conciliação prevista no art. 334, caput, do CPC, ao fundamento de dificuldade de pauta,
proferida após a publicação do acórdão que fixou a tese da taxatividade mitigada, somente é
impugnável por agravo de instrumento e não por mandado de segurança.
4- Conquanto seja excepcionalmente admissível a impugnação de decisões judiciais lato sensu
por mandado de segurança, não é admissível, nem mesmo excepcionalmente, a impugnação
de decisões interlocutórias por mandado de segurança após a tese firmada no tema
repetitivo 988, que estabeleceu uma exceção ao posicionamento há muito adotado nesta
Corte, especificamente no que tange à impugnabilidade das interlocutórias, de modo a
vedar, em absoluto, a impugnação dessa espécie de decisão pelas partes mediante
mandado de segurança, porque há via impugnativa recursal apropriada, o agravo de
instrumento.
5- Recurso ordinário constitucional conhecido e desprovido. RMS 63.202-MG, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado
em 01/12/2020, DJe 18/12/2020 (Info 684).

2.7 Recursos

2.7.1 Técnica de julgamento ampliado em embargos de declaração contra acórdão que julgou
apelação
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TÉCNICA DE JULGAMENTO
AMPLIADO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VOTO DIVERGENTE. APTIDÃO.
MODIFICAÇÃO DO RESULTADO UNÂNIME. RECURSO DE APELAÇÃO. ART. 942
DO CPC/2015. CABIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. Deve ser aplicada a técnica de
julgamento ampliado nos embargos de declaração toda vez que o voto divergente possua
aptidão para alterar o resultado unânime do acórdão de apelação. 2. Recurso especial
provido para determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que seja dada continuidade ao
julgamento não unânime dos embargos de declaração, aplicando-se a técnica prevista do art.
942 do CPC/2015 (REsp 1.910.317-PE, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por
unanimidade, julgado em 02/03/2021 - Info 687).

• Obs: No caso de agravo de instrumento provido por maioria para rejeitar impugnação
ao cumprimento de sentença, o TJSC já decidiu que é inaplicável o julgamento com
quórum ampliado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PETIÇÃO ASSIM


RECEBIDA A DESPEITO DE NÃO INTITULAR O RECURSO. INCIDÊNCIA DOS
PRINCÍPIOS DA FUNGIBILIDADE E DA INTERPRETAÇÃO AO CONJUNTO DA
POSTULAÇÃO (ART. 322, § 2º, DO CPC).
RECLAMO DOS AGRAVADOS. ALEGADA OMISSÃO ACERCA DA INOBSERVÂNCIA
AO ART. 942, § 3º, DO CPC, À HIPÓTESE. IMPERTINÊNCIA. CASO DE ÊXITO DE
AGRAVO DE INSTRUMENTO PARA REJEITAR IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO
DE SENTENÇA. DECISÃO POR MAIORIA DE VOTOS. INAPLICABILIDADE DO
JULGAMENTO COM QUÓRUM AMPLIADO. REDISCUSSÃO SOBRE O MÉRITO.
INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. DECLARATÓRIOS REJEITADOS.
1. "As hipóteses de ampliação do quórum para o julgamento do órgão colegiado são restritas,
incidindo apenas em caso de pronunciamento não unânime em apelação, em ação rescisória
ou em agravo de instrumento, sendo que, quanto a este último, tão somente quando houver
reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito (§ 3º, II, do art. 942 do CPC/2015).
Especificamente no que se refere ao agravo de instrumento, a interpretação restritiva do
dispositivo impõe concluir que a regra se dirige apenas às ações de conhecimento, não se
aplicando ao processo de execução e, por extensão, ao cumprimento de sentença, como no
caso." (STJ, AgInt no AREsp n. 1.233.242, rel. Min. Lázaro Guimarães, j. em 18.09.2018).
2. "A estreita via dos embargos declaratórios não se compraz com o equivocado intuito de se
querer, com fins infringentes, rediscutir matérias em cujos pontos o aresto não foi favorável à
parte embargante, tanto mais porque ausente omissão, contradição ou obscuridade no
julgado." (ED em AC n. 2014.092959-0, rel. Des. Eládio Torret Rocha, j. em 14.04.2016).
HONORÁRIOS RECURSAIS. DESCABIMENTO NA HIPÓTESE. RECLAMO DERIVADO
DE AGRAVO DE INSTRUMENTO.
EMBARGOS DECLARATÓRIOS CONHECIDOS E REJEITADOS.
(TJSC, Agravo de Instrumento n. 4017689-82.2019.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa
Catarina, rel. Gerson Cherem II, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 18-03-2021).
2.7.2 Interposição de REsp ou RE contra acórdão que julgou IRDR. Efeito suspensivo
automático.

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE


DEMANDAS REPETITIVAS. RECURSOS EXTRAORDINÁRIO E ESPECIAL. EFEITO
SUSPENSIVO AUTOMÁTICO. NECESSIDADE DE AGUARDAR O JULGAMENTO DOS
TRIBUNAIS SUPERIORES. ARTS. 982, § 5º, E 987, §§ 1º E 2º, DO CPC. RECURSO
PROVIDO. 1. Cinge-se a controvérsia a definir se a suspensão dos feitos cessa tão logo julgado
o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas pelo TJ/TRF, com a aplicação imediata da
tese, ou se é necessário aguardar o julgamento dos recursos excepcionais eventualmente
interpostos.
2. No caso dos recursos repetitivos, os arts. 1.039 e 1.040 do CPC condicionam o
prosseguimento dos processos pendentes apenas à publicação do acórdão paradigma. Além
disso, os acórdãos proferidos sob a sistemática dos recursos repetitivos não são impugnáveis
por recursos dotados de efeito suspensivo automático.
3. Por sua vez, a sistemática legal do IRDR é diversa, pois o Código de Ritos estabelece, no art.
982, § 5º, que a suspensão dos processos pendentes, no âmbito do IRDR, apenas cessa caso não
seja interposto recurso especial ou recurso extraordinário contra a decisão proferida no
incidente.
4. Além disso, há previsão expressa, nos §§1º e 2º do art. 987 do CPC, de que os recursos
extraordinário e especial contra acórdão que julga o incidente em questão têm efeito suspensivo
automático (ope legis), bem como de que a tese jurídica adotada pelo STJ ou pelo STF será
aplicada, no território nacional, a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre
idêntica questão de direito.
5. Apesar de tanto o IRDR quanto os recursos repetitivos comporem o microssistema de
julgamento de casos repetitivos (art. 928 do CPC), a distinção de tratamento legal entre os dois
institutos justifica-se pela recorribilidade diferenciada de ambos. De fato, enquanto, de um lado,
o IRDR ainda pode ser combatido por REsp e RE, os quais, quando julgados, uniformizam a
questão em todo o território nacional, os recursos repetitivos firmados nas instâncias superiores
apenas podem ser objeto de embargos de declaração, quando cabíveis e de recurso
extraordinário, contudo, este. sem efeito suspensivo automático.
6. Admitir o prosseguimento dos processos pendentes antes do julgamento dos recursos
extraordinários interpostos contra o acórdão do IRDR poderia ensejar uma multiplicidade de
atos processuais desnecessários, sobretudo recursos. Isso porque, caso se admita a continuação
dos processos até então suspensos, os sujeitos inconformados com o posicionamento firmado
no julgamento do IRDR terão que interpor recursos a fim de evitar a formação de coisa julgada
antes do posicionamento definitivo dos tribunais superiores.
7. Ademais, com a manutenção da suspensão dos processos pendentes até o julgamento dos
recursos pelos tribunais superiores, assegura-se a homogeneização das decisões judiciais sobre
casos semelhantes, garantindo-se a segurança jurídica e a isonomia de tratamento dos
jurisdicionados. Impede-se, assim, a existência - e eventual trânsito em julgado - de julgamentos
conflitantes, com evidente quebra de isonomia, em caso de provimento do REsp ou RE
interposto contra o julgamento do IRDR.
8. Em suma, interposto REsp ou RE contra o acórdão que julgou o IRDR, a suspensão
dos processos só cessará com o julgamento dos referidos recursos, não sendo necessário,
entretanto, aguardar o trânsito em julgado. O raciocínio, no ponto, é idêntico ao aplicado
pela jurisprudência do STF e do STJ ao RE com repercussão geral e aos recursos
repetitivos, pois o julgamento do REsp ou RE contra acórdão de IRDR é impugnável
apenas por embargos de declaração, os quais, como visto, não impedem a imediata
aplicação da tese firmada.
9. Recurso especial provido para determinar a devolução dos autos ao Tribunal de origem a fim
de que se aguarde o julgamento dos recursos extraordinários interpostos (não o trânsito em
julgado, mas apenas o julgamento do REsp e/ou RE) contra o acórdão proferido no IRDR n.
0329745-15.2015.8.24.0023. (REsp 1.869.867/SC, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma,
por unanimidade, julgado em 20/04/2021 - Info 693)

2.7.3 Agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em ação de improbidade


administrativa

PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DECISÃO


INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE PEDIDO DE DEPOIMENTO PESSOAL. AGRAVO
DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. PREVALÊNCIA DE PREVISÃO CONTIDA NA LEI
DA AÇÃO POPULAR SOBRE O ARTIGO 1.015 DO CPC/2015. MICROSSISTEMA DE
TUTELA COLETIVA. HISTÓRICO DA DEMANDA
1. Na origem, trata-se de Ação por Improbidade na qual se narra que a então Prefeita de Angra
dos Reis/RJ teria deixado de repassar à entidade de previdência dos servidores municipais as
contribuições previdenciárias descontadas de seus vencimentos, o que teria resultado na
apropriação indébita, entre Janeiro e Dezembro de 2016, da quantia de R$ 15.514.884,41
(quinze milhões e quinhentos e quatorze mil e oitocentos e oitenta e quatro reais e quarenta e
um centavos), atualizado até fevereiro de 2017. Em valores atualizados: R$ 23.590.184,71
(vinte e três milhões, quinhentos e noventa mil, cento e oitenta e quatro reais e setenta e um
centavos).
2. O Juízo de primeiro grau indeferiu o pedido de depoimento pessoal da ré, o que resultou na
interposição de Agravo de Instrumento.
3. O acordão ora recorrido não conheceu do Recurso, sob o fundamento de que seria
"inaplicável na hipótese o disposto no artigo 19, parágrafo 1º da Lei nº 4.717/65, já que se
refere às Ações Populares" e "a Decisão hostilizada não se enquadra no rol taxativo do artigo
1.015 do Código de Processo Civil" (fls. 48-49, e-STJ).
PREVALÊNCIA DO MICROSSISTEMA DE TUTELA COLETIVA SOBRE NORMAS
INCOMPATÍVEIS PREVISTAS NA LEI GERAL
4. Esse entendimento contraria a orientação, consagrada no STJ, de que "O Código de Processo
Civil deve ser aplicado somente de forma subsidiária à Lei de Improbidade Administrativa.
Microssistema de tutela coletiva" (REsp 1.217.554/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda
Turma, DJe 22.8.2013).
5. Na mesma direção: "Os arts. 21 da Lei da Ação Civil Pública e 90 do CDC, como normas
de envio, possibilitaram o surgimento do denominado Microssistema ou Minissistema de
proteção dos interesses ou direitos coletivos amplo senso, no qual se comunicam outras
normas, como o Estatuto do Idoso e o da Criança e do Adolescente, a Lei da Ação Popular, a
Lei de Improbidade Administrativa e outras que visam tutelar direitos dessa natureza, de forma
que os instrumentos e institutos podem ser utilizados com o escopo de 'propiciar sua adequada
e efetiva tutela'" (art. 83 do CDC)" (REsp 695.396/RS, Primeira Turma, Rel. Ministro Arnaldo
Esteves Lima, DJe 27.4.2011).
6. Deve-se aplicar à Ação por Improbidade o mesmo entendimento já adotado em relação
à Ação Popular, como sucedeu, entre outros, no seguinte precedente: "A norma específica
inserida no microssistema de tutela coletiva, prevendo a impugnação de decisões
interlocutórias mediante agravo de instrumento (art. 19 da Lei n. 4.717/65), não é afastada
pelo rol taxativo do art. 1.015 do CPC/2015, notadamente porque o inciso XIII daquele
preceito contempla o cabimento daquele recurso em 'outros casos expressamente referidos
em lei'" (AgInt no REsp 1.733.540/DF, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira
Turma, DJe 4.12.2019). Na mesma direção: REsp 1.452.660/ES, Rel. Ministro Og Fernandes,
Segunda Turma, DJe 27.4.2018.
CONCLUSÃO
7. A ideia do microssistema de tutela coletiva foi concebida com o fim de assegurar a
efetividade da jurisdição no trato dos direitos coletivos, razão pela qual a previsão do artigo 19,
§ 1º, da Lei da Ação Popular ("Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento") se
sobrepõe, inclusive nos processos de improbidade, à previsão restritiva do artigo 1.015 do
CPC/2015.
8. Recurso Especial provido, com determinação de o Tribunal de origem conheça do Agravo
de Instrumento interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e o decida como
entender de direito. (REsp 1.925.492-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por
unanimidade, julgado em 04/05/2021 - Info 695).

2.7.4 Cumprimento de sentença. Intimação do executado para pagamento, sob pena de multa e
fixação de honorários. Despacho de mero expediente. Descabimento de agravo de instrumento

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO


NCPC. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO PARA
PAGAMENTO, SOB PENA DE MULTA E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. DESPACHO DE
MERO EXPEDIENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO. RECURSO
ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. Aplicabilidade do novo Código de Processo Civil, devendo ser exigidos os requisitos de
admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado Administrativo nº 3,
aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com
fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016)
serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
2. As decisões proferidas em liquidação ou cumprimento de sentença, execução e inventário,
são impugnáveis por agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do NCPC).
3. Com o advento do Novo Código de Processo Civil, o início da fase de cumprimento de
sentença para pagamento de quantia certa passou a depender de provocação do credor.
Assim, a intimação do devedor para pagamento é consectário legal do requerimento, e,
portanto, irrecorrível, por se tratar de mero despacho de expediente, pois o juiz
simplesmente cumpre o procedimento determinado pelo Código de Processo Civil (art.
523 do NCPC), impulsionando o processo.
4. Recurso especial a que se nega provimento (REsp 1.837.211-MG, Rel. Min. Moura Ribeiro,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 09/03/2021, DJe 11/03/2021 - Info 688).
3. DIREITO DO CONSUMIDOR

3.1 Tarifa de “cheque especial”

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental conhecida como Ação Direta de


Inconstitucionalidade. 2. Resolução 4.765, de 27 de novembro de 2019, do Conselho Monetário
Nacional (CMN). Cobrança de tarifa de cheque especial. 3. Resolução editada pelo CMN tem
caráter de norma primária. 4. Princípio da subsidiariedade e fungibilidade entre as ações diretas.
5. Atuação do CMN no campo da intervenção estatal na economia (arts. 174 e 192 da CF).
Tarifa bancária com características de taxa. Possível violação ao princípio da legalidade
tributária. Cobrança que coloca o consumidor em situação de vulnerabilidade econômico-
jurídica. Desproporcionalidade da medida adotada pelo CMN para correção de falha de
mercado. 6. Medida Cautelar deferida e referendada pelo Plenário do STF. 7. Ação direta de
inconstitucionalidade julgada procedente. (ADI 6407, Relator(a): GILMAR MENDES,
Tribunal Pleno, julgado em 03/05/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-091 DIVULG 12-
05-2021 PUBLIC 13-05-2021 – Info 1015)

3.2 Recusa ao cumprimento da oferta

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE


FAZER. COMÉRCIO ELETRÔNICO. COMPRA E VENDA DE MERCADORIA PELA
INTERNET. RECURSA AO CUMPRIMENTO DA OFERTA. ART. 35 DO CDC.
ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. AUSÊNCIA DE PRODUTO EM ESTOQUE.
CUMPRIMENTO FORÇADO DA OBRIGAÇÃO. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO. 1.
Cuida-se de ação de obrigação de fazer, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada em razão
do descumprimento da entrega de mercadoria adquirida pela internet, fundada na alegação de
ausência de estoque do produto. 2. Recurso especial interposto em: 05/08/2019; conclusos ao
gabinete em: 02/03/2020; aplicação do CPC/15. 3. O propósito recursal consiste em determinar
se, diante da vinculação do fornecedor à oferta, a alegação de ausência de produto em estoque
é suficiente para inviabilizar o pedido do consumidor pelo cumprimento forçado da obrigação,
previsto no art. 35, I, do CDC. 4. No direito contratual clássico, firmado entre pessoas que se
presumem em igualdades de condições, a proposta é uma firme manifestação de vontade, que
pode ser dirigida a uma pessoa específica ou ao público em geral, que somente vincula o
proponente na presença da firmeza da intenção de concreta de contratar e da precisão do
conteúdo do futuro contrato, configurando, caso contrário, mero convite à contratação. 5. Como
os processos de publicidade e de oferta ao público possuem importância decisiva no escoamento
da produção em um mercado de consumo em massa, conforme dispõe o art. 30 do CDC, a
informação no contida na própria oferta é essencial à validade do conteúdo da formação da
manifestação de vontade do consumidor e configura proposta, integrando efetiva e atualmente
o contrato posteriormente celebrado com o fornecedor. 6. Como se infere do art. 35 do CDC,
a recusa à oferta oferece ao consumidor a prerrogativa de optar, alternativamente e a sua
livre escolha, pelo cumprimento forçado da obrigação, aceitar outro produto, ou rescindir
o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada,
monetariamente atualizada, somada a perdas e danos. 7. O CDC consagrou expressamente,
em seus arts. 48 e 84, o princípio da preservação dos negócios jurídicos, segundo o qual se pode
determinar qualquer providência a fim de que seja assegurado o resultado prático equivalente
ao adimplemento da obrigação de fazer, razão pela qual a solução de extinção do contrato e sua
conversão em perdas e danos é a ultima ratio, o último caminho a ser percorrido. 8. As opções
do art. 35 do CDC são intercambiáveis e produzem, para o consumidor, efeitos práticos
equivalentes ao adimplemento, pois guardam relação com a satisfação da intenção
validamente manifestada ao aderir à oferta do fornecedor, por meio da previsão de resultados
práticos equivalentes ao adimplemento da obrigação de fazer ofertada ao público. 9. A
impossibilidade do cumprimento da obrigação de entregar coisa, no contrato de compra
e venda, que é consensual, deve ser restringida exclusivamente à inexistência absoluta do
produto, na hipótese em que não há estoque e não haverá mais, pois aquela espécie, marca
e modelo não é mais fabricada. 10. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido impôs à
recorrente a adequação de seu pedido às hipóteses dos incisos II e III do art. 35 do CDC, por
considerar que a falta do produto no estoque do fornecedor impediria o cumprimento específico
da obrigação. 11. Recurso especial provido. (REsp 1.872.048-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 23/02/2021 - info 686)

• A jurisprudência do TJSC reconhece o direito à indenização por danos morais nos


casos em que há oferta de produto sem estoque:

RESPONSABILIDADE CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR


DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DO RÉU. COMPRA DE
VIDEO GAME E JOGOS RELACIONADOS AFIM DE PRESENTEAR O FILHO NO
NATAL. ENTREGA APENAS DE PARTE DO PEDIDO. FRUSTRAÇÃO NA
CELEBRAÇÃO NATALINA. ALEGAÇÃO DA PARTE RÉ DE QUE O PRODUTO FICOU
INDISPONÍVEL APÓS O PEDIDO DO AUTOR. AVENTADA BOA-FÉ JÁ QUE O
ESTORNO DO VALOR FOI REALIZADO 20 (VINTE) DIAS APÓS O PRAZO FINAL DE
ENTREGA. AUSÊNCIA DE QUALQUER PROVA NESSE SENTIDO. PRODUTO
OFERTADO SEM QUE HOUVESSE ESTOQUE. DESCASO DA EMPRESA RÉ.
GARANTIA DE ENTREGA NO PRAZO DIANTE DE DIVERSOS CONTATOS DO
CONSUMIDOR. ATRASO. POSTERIOR CONSTATAÇÃO DE QUE NÃO SERIA
POSSÍVEL A ENTREGA DO PRODUTO. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O MERO
DISSABOR. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO
ARBITRADO EM R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS). PLEITO DE MINORAÇÃO.
INSUBSISTÊNCIA. VALOR RAZOÁVEL DIANTE DAS PECULIARIDADES DO CASO.
FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO
DESPROVIDO. 1. O simples fato de ofertar mercadoria que não faz parte do estoque e
por isso, incapaz de concretizar a venda prometida, evidencia uma prática abusiva e
inaceitável no mercado, configurando, inevitavelmente, atitude legítima de má-fé, porque
além de estimular o consumidor a ponto de provocar neste uma expectativa, causa-lhe
frustração que ultrapassa em muito a esfera do mero aborrecimento, ensejando direito a
ressarcimento do dano moral sofrido. 2. Para a fixação do quantum indenizatório, devem
ser observados alguns critérios, tais como a situação econômico-financeira e social das partes
litigantes, a intensidade do sofrimento impingido ao ofendido, o dolo ou grau da culpa do
responsável, tudo para não ensejar um enriquecimento sem causa ou insatisfação de um, nem a
impunidade ou ruína do outro. (TJSC, Apelação Cível n. 0301486-62.2015.8.24.0038, de
Joinville, rel. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 23-07-2019).
3.3 Dano moral coletivo e publicidade enganosa

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO.


ALIENAÇÃO DE TERRENOS A CONSUMIDORES DE BAIXA RENDA EM
LOTEAMENTO IRREGULAR. PUBLICIDADE ENGANOSA. ORDENAMENTO
URBANÍSTICO E DEFESA DO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE
EQUILIBRADO. CONCEPÇÃO OBJETIVA DO DANO EXTRAPATRIMONIAL
TRANSINDIVIDUAL.
1. O dano moral coletivo caracteriza-se pela prática de conduta antijurídica que, de forma
absolutamente injusta e intolerável, viola valores éticos essenciais da sociedade, implicando um
dever de reparação, que tem por finalidade prevenir novas condutas antissociais (função
dissuasória), punir o comportamento ilícito (função sancionatório-pedagógica) e reverter, em
favor da comunidade, o eventual proveito patrimonial obtido pelo ofensor (função
compensatória indireta).
2. Tal categoria de dano moral — que não se confunde com a indenização por dano
extrapatrimonial decorrente de tutela de direitos individuais homogêneos — é aferível
in re ipsa, pois dimana da lesão em si a "interesses essencialmente coletivos" (interesses difusos
ou coletivos stricto sensu) que "atinja um alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes
do individualismo, afetando, por sua gravidade e repercussão, o círculo primordial de valores
sociais" (REsp 1.473.846/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma,
julgado em 21.02.2017, DJe 24.02.2017), revelando-se despicienda a demonstração de
prejuízos concretos ou de efetivo abalo à integridade psicofísica da coletividade.
3. No presente caso, a pretensão reparatória de dano moral coletivo, deduzida pelo Ministério
Público estadual na ação civil pública, tem por causas de pedir a alienação de terrenos em
loteamento irregular (ante a violação de normas de uso e ocupação do solo) e a veiculação de
publicidade enganosa a consumidores de baixa renda, que teriam sido submetidos a condições
precárias de moradia.
4. As instâncias ordinárias reconheceram a ilicitude da conduta dos réus, que, utilizando-se de
ardil e omitindo informações relevantes para os consumidores/adquirentes, anunciaram a venda
de terrenos em loteamento irregular — com precárias condições urbanísticas — como se o
empreendimento tivesse sido aprovado pela municipalidade e devidamente registrado no
cartório imobiliário competente; nada obstante o pedido de indenização por dano moral coletivo
foi julgado improcedente.
5. No afã de resguardar os direitos básicos de informação adequada e de livre escolha dos
consumidores — protegendo-os, de forma efetiva, contra métodos desleais e práticas
comerciais abusivas —, o CDC procedeu à criminalização das condutas relacionadas à fraude
em oferta e à publicidade abusiva ou enganosa (artigos 66 e 67), tipos penais de mera conduta
voltados à proteção do valor ético-jurídico encartado no princípio constitucional da dignidade
humana, conformador do próprio conceito de Estado Democrático de Direito, que não se
coaduna com a permanência de profundas desigualdades, tal como a existente entre o
fornecedor e a parte vulnerável no mercado de consumo.
6. Nesse contexto, afigura-se evidente o caráter reprovável da conduta perpetrada pelos
réus em detrimento do direito transindividual da coletividade de não ser ludibriada,
exposta à oferta fraudulenta ou à publicidade enganosa ou abusiva, motivo pelo qual a
condenação ao pagamento de indenização por dano extrapatrimonial coletivo é medida
de rigor, a fim de evitar a banalização do ato reprovável e inibir a ocorrência de novas e
similares lesões.
7. Outrossim, verifica-se que o comportamento dos demandados também pode ter violado o
objeto jurídico protegido pelos tipos penais descritos na Lei 6.766/1979 (que dispõe sobre o
parcelamento do solo para fins urbanos), qual seja: o respeito ao ordenamento urbanístico e,
por conseguinte, a defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado, valor ético social —
intergeracional e fundamental — consagrado pela Constituição de 1988 (artigo 225), que é
vulnerado, de forma grave, pela prática do loteamento irregular (ou clandestino).
8. A quantificação do dano moral coletivo reclama o exame das peculiaridades de cada caso
concreto, observando-se a relevância do interesse transindividual lesado, a gravidade e a
repercussão da lesão, a situação econômica do ofensor, o proveito obtido com a conduta ilícita,
o grau da culpa ou do dolo (se presente), a verificação da reincidência e o grau de
reprovabilidade social (MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano moral coletivo. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2007, p. 163-165). O quantum não deve destoar, contudo, dos postulados da
equidade e da razoabilidade nem olvidar os fins almejados pelo sistema jurídico com a tutela
dos interesses injustamente violados.
9. Suprimidas as circunstâncias específicas da lesão a direitos individuais de conteúdo
extrapatrimonial, revela-se possível o emprego do método bifásico para a quantificação do dano
moral coletivo a fim de garantir o arbitramento equitativo da quantia indenizatória, valorados o
interesse jurídico lesado e as circunstâncias do caso.
10. Recurso especial provido para, reconhecendo o cabimento do dano moral coletivo, arbitrar
a indenização em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), com a incidência de juros de mora desde o
evento danoso. (REsp 1.539.056/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por
unanimidade, julgado em 06/04/2021 - info 691).

3.4 Inversão do ônus da prova. Regra de instrução

RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO


ESTADUAL - NEGATIVA DE PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA PELA
SEGURADORA FUNDADA EM SUPOSTA APURAÇÃO DE FRAUDE -
PROCEDIMENTO ILÍCITO DOLOSAMENTE ENGENDRADO PARA POSSIBILITAR A
RECUSA DO PAGAMENTO DO CAPITAL SEGURADO, VISANDO A CONSUMAÇÃO
DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO, COM O ENVOLVIMENTO DE DOCUMENTOS
FALSOS OBTIDOS NO ESTRANGEIRO - TRIBUNAL DE ORIGEM QUE MANTEVE A
CONDENAÇÃO COM BASE NA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA APLICADA
ENQUANTO REGRA DE JULGAMENTO NO ÂMBITO RESTRITO DA SEGUNDA
INSTÂNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ. 1. Existência de omissões relevantes cujo saneamento,
pelo Tribunal a quo, se afigura imprescindível ao correto deslinde da controvérsia. 2.
Julgamento empreendido pela Corte local mediante a aplicação da inversão do ônus da prova,
como regra de julgamento, já em sede de apelação. 2.1 A jurisprudência desta Corte é no
sentido de que a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de
instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina
deve ocorrer antes da etapa instrutória, ou quando proferida em momento posterior,
garantir a parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas.
Precedentes. 2.2 Inviabilidade da inversão do ônus probatório em sede de apelação,
notadamente quando fundado em premissa equivocada atinente a suposta hipossuficiência da
parte autora, visto que o órgão do Ministério Público não é de ser considerado opositor
enfraquecido ou impossibilitado de promover, ainda que minimamente, o ônus de comprovar
os fatos constitutivos de seu direito. 3. Recurso especial conhecido em parte e, na extensão,
provido, para cassar os acórdãos dos embargos de declaração e apelação relativamente ao
recurso manejado pela seguradora e determinar o retorno dos autos à instância precedente para,
uma vez afastada a inversão probatória, proceda a Corte local a análise da apelação interposta
pela ré como entender por direito. Ficam prejudicadas as demais teses arguidas no
reclamo. (REsp 1.286.273-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade,
julgado em 08/06/2021).

3.5 Incorporação imobiliária. Atraso na entrega do imóvel.

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃO


IMOBILIÁRIA. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ENTREGA. ATRASO. ALTERAÇÃO.
CRONOGRAMA. RESOLUÇÃO JUDICIAL. CONTRATO. OPÇÃO. ADQUIRENTE.
STATUS QUO ANTE. RETORNO. RESTITUIÇÃO. VALORIZAÇÃO. PERDAS E DANOS.
NÃO INTEGRAÇÃO. VIOLAÇÃO. LEI FEDERAL. AFASTAMENTO. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo
Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Não se conhece do recurso especial interposto pela alínea "c" do permissivo constitucional
quando ausente a similitude fática entre os casos confrontados.
3. De acordo com o artigo 43, inciso II, da Lei nº 4.591/1964, o incorporador deve
responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes
dos prejuízos que a estes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar
injustificadamente a conclusão das obras.
4. Eventual valorização do imóvel não se enquadra no conceito de perdas e danos. Não
representa uma diminuição do patrimônio do adquirente, nem significa a perda de um
ganho que se devesse legitimamente esperar.
5. O suposto incremento do valor venal do imóvel não decorre, de forma direta e imediata, da
inexecução do contrato, mas de fatores extrínsecos, de ordem eminentemente econômica.
6. A frustração da expectativa de lucro ventilada na hipótese não decorre de ato
compulsório imposto pelo vendedor, mas da opção pela resolução antecipada do contrato
livremente exercida pelo adquirente.
7. Recurso especial conhecido e não provido (REsp 1.750.585-RJ, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 01/06/2021 - info 699).

3.6 Plano de saúde

3.6.1 Reembolso de despesas médico-hospitalares

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE


SAÚDE. REEMBOLSO DE DESPESAS MÉDICO-HOSPITALARES REALIZADAS FORA
DA REDE CREDENCIADA. RESTRIÇÃO A SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. ART. 12, VI,
DA LEI N. 9.656/1998. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA DESPROVIDOS. 1. Cinge-se a
controvérsia em saber se a operadora de plano de saúde é obrigada a reembolsar as despesas
médico-hospitalares relativas a procedimento cirúrgico realizado em hospital não integrante da
rede credenciada. 2. O acórdão embargado, proferido pela Quarta Turma do STJ, fez uma
interpretação restritiva do art. 12, VI, da Lei n. 9.656/1998, enquanto a Terceira Turma do STJ
tem entendido que a exegese do referido dispositivo deve ser expandida. 3. O reembolso das
despesas médico-hospitalaes efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de
saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais
como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no
local e urgência ou emergência do procedimento. 4. Embargos de divergência desprovidos.
(EAREsp 1.459.849-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por maioria,
julgado em 14/10/2020, DJe 17/12/2020 - info 684).

3.6.2 Sucessão de titulariedade e responsabilidade pelas dívidas do titular falecido.

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C


RESTITUIÇÃO DE VALORES. RECONVENÇÃO. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE.
MORTE DO TITULAR. COBRANÇA DE VALORES RELATIVOS À COPARTICIPAÇÃO
NAS DESPESAS DE INTERNAÇÃO. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE CONDICIONA
A MANUTENÇÃO DA DEPENDENTE COMO BENEFICIÁRIA À QUITAÇÃO DA
DÍVIDA CONTRAÍDA PELO FALECIDO. ABUSIVIDADE. JULGAMENTO: CPC/2015.
1. Ação declaratória de inexistência de débito c/c restituição de valores, ajuizada em
04/04/2019, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 18/06/2020 e
atribuído ao gabinete em 26/10/2020.
2. O propósito recursal é decidir sobre a responsabilidade do cônjuge supérstite (dependente)
pelas dívidas contraídas pelo falecido (titular) junto à operadora de plano de saúde.
3. Falecendo o titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, nasce
para os dependentes já inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos
dos arts. 30 ou 31 da Lei 9.656/1998, a depender da hipótese, desde que assumam o seu
pagamento integral.
4. A conduta da recorrida, de impor à dependente a obrigação de assumir eventual dívida
do falecido titular, sob pena de ser excluída do plano de saúde, configura, em verdade, o
exercício abusivo do direito de exigir o respectivo pagamento, na medida em que, valendo-
se da situação de fragilidade da beneficiária e sob a ameaça de causar-lhe um prejuízo,
constrange quem não tem o dever de pagar a fazê-lo, evitando, com isso, todos os trâmites
de uma futura cobrança dirigida ao legítimo responsável (espólio).
5. Hipótese em que, a pretexto de exercer regularmente um direito amparado no contrato, a
recorrida desvirtua o fim econômico e social dos arts. 30 e 31 da lei 9.656/1998, pois se vale da
garantia neles assegurada como moeda de troca para coagir o dependente à quitação da dívida
deixada pelo titular que morreu.
6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp 1.899.674-SP, Rel. Min.
Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/03/2021 - Info 689).

3.6.3 Plano de saúde coletivo empresarial. Resilição unilateral pela operadora

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO


JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. PLANO DE SAÚDE COLETIVO
EMPRESARIAL. OPERADORA. RESILIÇÃO UNILATERAL. LEGALIDADE.
INCONFORMISMO. USUÁRIO. PLANO INDIVIDUAL. MIGRAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE. MODALIDADE. NÃO COMERCIALIZAÇÃO. PORTABILIDADE
DE CARÊNCIAS. ADMISSIBILIDADE. BENEFICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO.
FINALIZAÇÃO. OBSERVÂNCIA. NECESSIDADE. NORMAS. INTERPRETAÇÃO
SISTEMÁTICA E TELEOLÓGICA.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo
Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. As questões controvertidas nestes autos são: a) se ocorreu negativa de prestação jurisdicional
pela Corte de origem no julgamento dos embargos de declaração; b) se, em plano de saúde
coletivo extinto, a operadora deve continuar a custear os tratamentos ainda não concluídos de
beneficiários e c) se a operadora que rescindiu unilateralmente plano de saúde coletivo
empresarial possui a obrigação de fornecer aos usuários, em substituição, planos na modalidade
individual, mesmo na hipótese de não os comercializar.
3. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva
adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que
entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte.
4. Quando houver o cancelamento do plano privado coletivo de assistência à saúde, deve
ser permitido aos empregados ou ex-empregados migrarem para planos individuais ou
familiares, sem o cumprimento de carência, desde que a operadora comercialize tais
modalidades de plano (arts. 1º e 3º da Res.-CONSU nº 19/1999).
5. A operadora não pode ser obrigada a oferecer plano individual a usuário de plano
coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal modalidade contratual (arts. 1º e
3º da Res.-CONSU nº 19/1999). Inaplicabilidade, por analogia, da regra do art. 30 da Lei nº
9.656/1998.
6. A exploração da assistência à saúde pela iniciativa privada também possui raiz constitucional
(arts. 197 e 199, caput e § 1º, da CF), merecendo proteção não só o consumidor (Súmula nº
469/STJ), mas também a livre iniciativa e o livre exercício da atividade econômica (arts. 1º, IV,
170, IV e parágrafo único, e 174 da CF).
7. A concatenação de normas não significa hierarquização ou supremacia da legislação
consumerista sobre a Lei de Planos de Saúde, até porque, em casos de incompatibilidade de
dispositivos legais de igual nível, devem ser observados os critérios de superação de antinomias
referentes à especialidade e à cronologia. Observância do art. 35-G da Lei nº 9.656/1998.
8. A portabilidade de carências nos planos de saúde poderá ser exercida, entre outras hipóteses,
em decorrência da extinção do vínculo de beneficiário - como nas rescisões de contrato coletivo
(empresarial ou por adesão) -, devendo haver comunicação desse direito, que poderá ser
exercido sem cobrança de tarifas e sem o preenchimento de formulário de Declaração de Saúde
(DS), afastando-se objeções quanto a Doenças ou Lesões Preexistentes (DLP). Incidência
dos arts. 8º, IV e § 1º, 11 e 21 da RN nº 438/2018 da ANS.
9. A portabilidade de carências, por ser um instrumento regulatório, destina-se a incentivar tanto
a concorrência no setor de saúde suplementar quanto a maior mobilidade do beneficiário no
mercado, fomentando suas possibilidades de escolha, já que o isenta da necessidade de
cumprimento de novo período de carência.
10. Nas situações de denúncia unilateral do contrato de plano de saúde coletivo empresarial, é
recomendável ao empregador promover a pactuação de nova avença com outra operadora,
evitando-se prejuízos aos seus empregados, que não precisarão se socorrer da portabilidade ou
da migração a planos individuais, de custos mais elevados.
11. A operadora de plano de saúde, apesar de poder promover a resilição unilateral do plano de
saúde coletivo, não poderá deixar ao desamparo os usuários que se encontram sob tratamento
médico. Interpretação sistemática e teleológica dos arts. 8º, § 3º, "b", e 35-C da Lei nº
9.656/1998 e 18 da RN nº 428/2017 da ANS, conjugada com os princípios da boa-fé, da função
social do contrato, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana. Precedentes.
12. É possível a resilição unilateral e imotivada do plano de saúde coletivo, com base em
cláusula prevista contratualmente, desde que cumprido o prazo de 12 (doze) meses de vigência
da avença e feita a notificação prévia do contratante com antecedência mínima de 60 (sessenta)
dias, bem como respeitada a continuidade do vínculo contratual para os beneficiários que
estiverem internados ou em tratamento médico, até a respectiva alta, salvo a ocorrência de
portabilidade de carências ou se contratado novo plano coletivo pelo empregador, situações que
afastarão o desamparo desses usuários.
13. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1.846.502/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi,
Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021)

3.6.4 Custeio de medicamento de uso domiciliar

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. MEDICAMENTO DE USO


DOMICILIAR. CUSTEIO. OPERADORA. NÃO OBRIGATORIEDADE.
ANTINEOPLÁSICO ORAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. LIMITAÇÃO LÍCITA.
CONTRATO ACESSÓRIO DE MEDICAÇÃO DE USO DOMICILIAR. POSSIBILIDADE.
ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. SUS. POLÍTICA PÚBLICA. REMÉDIOS DE ALTO
CUSTO. RELAÇÃO NACIONAL DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS (RENAME). 1.
Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil
de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a definir se
medicamento de uso domiciliar (no caso, Viekira Pak, utilizado no tratamento de Hepatite-C),
e não enquadrado como antineoplásico oral, é de cobertura obrigatória pelo plano de saúde. 3.
É lícita a exclusão, na Saúde Suplementar, do fornecimento de medicamentos para
tratamento domiciliar, isto é, aqueles prescritos pelo médico assistente para
administração em ambiente externo ao de unidade de saúde, salvo os antineoplásicos orais
(e correlacionados), a medicação assistida (home care) e os incluídos no Rol da ANS para
esse fim. Interpretação dos arts. 10, VI, da Lei nº 9.656/1998 e 19, § 1º, VI, da RN nº
338/2013 da ANS (atual art. 17, parágrafo único, VI, da RN nº 465/2021). 4. Os
medicamentos receitados por médicos para uso doméstico e adquiridos comumente em
farmácias não estão, em regra, cobertos pelos planos de saúde. 5. As normas do CDC aplicam-
se apenas subsidiariamente nos planos de saúde, conforme previsão do art. 35-G da Lei nº
9.656/1998. Ademais, em casos de incompatibilidade de normas, pelos critérios da
especialidade e da cronologia, há evidente prevalência da lei especial nova. 6. A previsão legal
do art. 10, VI, da Lei nº 9.656/1998 não impede a oferta de medicação de uso domiciliar pelas
operadoras de planos de assistência à saúde (i) por liberalidade; (ii) por meio de previsão no
contrato principal do próprio plano de saúde ou (iii) mediante contratação acessória de caráter
facultativo, conforme regulamentação da RN nº 310/2012 da ANS. 7. No âmbito do Sistema
Único de Saúde (SUS), a assistência farmacêutica está fortemente em atividade, existindo a
Política Nacional de Medicamentos (PNM), garantindo o acesso de fármacos à população,
inclusive os de alto custo, por meio de instrumentos como a Relação Nacional de Medicamentos
Essenciais (RENAME). 8. Recurso especial provido. (REsp 1.692.938/SP, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 27/04/2021 - Info 694)

• O TJSC já decidiu que:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR


DANOS MORAIS. AUTORA COM DIAGNÓSTICO DE ARTRITE REUMATOIDE COM
INDICAÇÃO DE USO DO MEDICAMENTO OLUMIANT. NEGATIVA DE
COBERTURA, PELA OPERADORA, AO ARGUMENTO DE QUE SE TRATA DE
MEDICAMENTO PARA USO DOMICILIAR. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DA RÉ. TESE DE LICITUDE DA NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO.
INSUBSISTÊNCIA. EXISTÊNCIA DE COBERTURA PARA O TRATAMENTO DA
PATOLOGIA APRESENTADA PELA AUTORA. TRATAMENTO MAIS ADEQUADO AO
CASO DO PACIENTE QUE DEVE SER DEFINIDO PELO MÉDICO RESPONSÁVEL.
NEGATIVA INJUSTIFICADA SOBRETUDO PELO FATO DE A OPERADORA TER
FORNECIDO O ÚLTIMO MEDICAMENTO UTILIZADO PELA AUTORA.
APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. INTERPRETAÇÃO MAIS
FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. PROCEDIMENTOS ESTABELECIDOS PELA ANS
EM PATAMAR MÍNIMO A SER CUMPRIDO. PREVALÊNCIA AO BEM MAIOR A SER
TUTELADO. GARANTIA DA INTEGRIDADE FÍSICA DA PACIENTE. HONORÁRIOS
RECURSAIS. FIXAÇÃO CABÍVEL. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n.
5012648-05.2019.8.24.0005, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Saul Steil, Terceira
Câmara de Direito Civil, j. 25-05-2021).

No mesmo sentido: TJSC, Agravo de Instrumento n. 5003080-77.2019.8.24.0000, do Tribunal


de Justiça de Santa Catarina, rel. Stanley da Silva Braga, Sexta Câmara de Direito Civil, j.
11-05-2021.

3.7 Cartão de crédito. Débito em conta-corrente do valor mínimo da fatura

RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - AVENTADA ABUSIVIDADE DE


CLÁUSULA INSERTA EM CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO NA QUAL
PREVISTO, EM CASO DE INADIMPLEMENTO DO TITULAR, O DÉBITO DIRETO EM
CONTA CORRENTE DO VALOR MÍNIMO DA FATURA - INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS
QUE REPUTARAM ILÍCITA A PRÁTICA E CONDENARAM A DEMANDADA À
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DAS QUANTIAS. INSURGÊNCIA DA RÉ. Hipótese: Cinge-
se a controvérsia principal em saber se, em contrato de cartão de crédito, é abusiva a cláusula
contratual que permite o desconto do valor, referente ao pagamento mínimo da fatura em caso
de inadimplemento, diretamente na conta corrente do titular do cartão. 1. Não configura
cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o Tribunal de origem entender
adequadamente instruído o feito, declarando a prescindibilidade de produção probatória, por se
tratar de matéria eminentemente de direito ou de fato já provado de forma documental. 1.1 No
caso, a verificação da necessidade da produção de outras provas, faculdade adstrita ao
magistrado, demanda revolvimento de matéria fática, providência vedada pela Súmula 7/STJ.
2. Na linha da jurisprudência do STJ, o Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar
ação civil pública com o propósito de velar direitos difusos, coletivos e, também, individuais
homogêneos dos consumidores, ainda que disponíveis. 3. Não é abusiva a cláusula inserta em
contrato de cartão de crédito que autoriza a operadora/financeira a debitar na conta
corrente do respectivo titular o pagamento do valor mínimo da fatura em caso de
inadimplemento, ainda que contestadas as despesas lançadas. 4. Inviável a devolução (em
dobro) das quantias até então descontadas pela financeira, haja vista que o montante debitado
diretamente na conta corrente do titular do cartão a título de pagamento mínimo de fatura está
expressamente autorizado por cláusulas contratuais adequadamente redigidas que não
redundam em constrangimento apto a denotar defeito na prestação do serviço, tampouco
demonstram desprezo à vulnerabilidade do consumidor no mercado. 5. Recurso especial
parcialmente provido para julgar improcedentes os pedidos da inicial. (REsp 1.626.997-RJ,
Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 01/06/2021).

4. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

4.1 Competência. Ações envolvendo matrícula de crianças e adolescentes em creches ou escolas

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO


DE CONTROVÉRSIA DE NATUREZA REPETITIVA. CONFLITO NEGATIVO DE
COMPETÊNCIA. JUÍZO DA VARA DA INFÂNCIA, DA ADOLESCÊNCIA E DO IDOSO
DA COMARCA DE CAMPO GRANDE/MS E JUÍZO DE DIREITO DA 3ª VARA DE
FAZENDA PÚBLICA E REGISTROS PÚBLICOS DA COMARCA DE CAMPO
GRANDE/MS. DIREITO À EDUCAÇÃO. CRECHE. VAGA PARA MENOR EM CENTRO
DE EDUCAÇÃO INFANTIL - CEINF PRÓXIMO À SUA RESIDÊNCIA. COMPETÊNCIA
ABSOLUTA DA JUSTIÇA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE. ARTS. 148, IV, E 209 DA
LEI 8.069/90. PRECEDENTES DO STJ. TESE FIRMADA SOB O RITO DOS RECURSOS
ESPECIAIS REPETITIVOS. ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
I. O Recurso Especial foi interposto contra acórdão publicado em 23/05/2019, na vigência do
CPC/2015, orientando-se o caso pelo Enunciado Administrativo 3/STJ ("Aos recursos
interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de
18/03/2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC").
II. A controvérsia ora em apreciação, submetida ao rito dos recursos especiais representativos
de controvérsia, nos termos do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, cinge-se a estabelecer a
competência para processar e julgar causas envolvendo matrícula de menores em creches ou
escolas, se da Vara da Fazenda Pública ou da Vara da Infância e da Juventude, conforme o
seguinte tema: "Controvérsia acerca da competência da Vara da Fazenda Pública ou da Vara
da Infância e da Juventude para processar e julgar causas envolvendo matrícula de menores
em creches ou escolas"
III. Na origem, trata-se de Conflito Negativo de Competência, suscitado pelo Juízo da Vara da
Infância, da Adolescência e do Idoso da Comarca de Campo Grande/MS em face do Juízo de
Direito da 3ª Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos da Comarca de Campo Grande/MS,
a fim de definir a competência para processar e julgar Mandado de Segurança impetrado por
menores com idade inferior a 5 (cinco) anos, ora recorrentes, representados por sua genitora,
contra ato da Secretária de Educação do Município de Campo Grande/MS, que lhes negara vaga
e matrícula em Centro de Educação Infantil - CEINF próximo à sua residência. O Mandado de
Segurança foi distribuído ao Juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública e Registros Públicos da
Comarca de Campo Grande/MS, que, invocando os arts. 98 e 148 da Lei 8.069/90, declinou da
competência para a Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da referida Comarca, Juízo que,
por sua vez, suscitou Conflito Negativo de Competência perante o Tribunal de origem, que, no
acórdão recorrido, deu pela competência do Juízo suscitado, ou seja, o Juízo da 3ª Vara da
Fazenda Pública e de Registros Públicos da Comarca de Campo Grande/MS.
IV. No caso dos autos, o acórdão recorrido, interpretando os arts. 98 e 148 da Lei 8.069/90,
concluiu que "o Juízo da Infância e Juventude possui competência para julgar apenas os casos
em que se discutam direitos que estejam previstos expressa e exclusivamente no Estatuto da
Criança e do Adolescente. Ou seja, somente as situações envolvendo situação irregular e de
risco grave de violação de direitos típicos da infância ou da juventude, tais como guarda,
alimentos, adoção, consoante dispostos nos artigos 98 e 148, do ECA", o que não ocorreria,
in casu, por se tratar de demanda na qual menores de idade inferior a 5 (cinco) anos,
representados pela genitora, postulam vaga em Centro de Ensino Infantil - CEINF público,
próximo à sua residência.
V. Os trinta anos da instituição do Estatuto da Criança e do Adolescente, completados em
13/07/2020, celebram a mudança de paradigma da doutrina da situação irregular, advinda dos
Códigos de Menores, para a teoria da proteção integral, garantidora da prioridade absoluta às
crianças e aos adolescentes, no âmbito do Estado, da família e da sociedade, abraçada pela
Constituição Federal de 1988 e pela Lei 8.069/90.
VI. Com lastro na Constituição Federal de 1988, a Lei 8.069/90 assegura expressamente, à
criança e ao adolescente, o direito à educação como direito público subjetivo, mediante "acesso
à escola pública e gratuita, próxima de sua residência, garantindo-se vagas no mesmo
estabelecimento a irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo de ensino da educação
básica" (art. 53, V), bem como "atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a
cinco anos de idade" (art. 54, IV). O art. 148 da Lei 8.069/90 estabelece que "a Justiça da
Infância e da Juventude é competente para: (…) IV - conhecer de ações civis fundadas em
interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o
disposto no art. 209".
VII. A Lei 8.069/90 estabelece, no seu Capítulo VII, disposições relativas "às ações de
responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes
ao não oferecimento ou oferta irregular" (...) "do ensino obrigatório" e "de atendimento em
creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade" (art. 208, I e III), estatuindo que
"as ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva
ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar e julgar a
causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais
superiores" (art. 209).
VIII. A jurisprudência do STJ, interpretando os arts. 148, IV, e 209 da Lei 8.069/90, firmou
entendimento, ao apreciar casos relativos ao direito à saúde e à educação de crianças e
adolescentes, pela competência absoluta do Juízo da Infância e da Juventude para processar e
julgar demandas que visem proteger direitos individuais, difusos ou coletivos afetos à criança
e ao adolescente, independentemente de o menor encontrar-se ou não em situação de risco ou
abandono, porquanto "os arts. 148 e 209 do ECA não excepcionam a competência da Justiça
da Infância e do Adolescente, ressalvadas aquelas estabelecidas constitucionalmente, quais
sejam, da Justiça Federal e de competência originária" (STJ, REsp 1.199.587/SE, Rel.
Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 12/11/2010). Em igual
sentido: "Esta Corte já consolidou o entendimento de que a competência da vara da infância e
juventude para apreciar pedidos referentes ao menor de idade é absoluta, consoante art. 148,
inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente" (STJ, AgRg no REsp 1.464.637/ES, Rel.
Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 28/03/2016). Adotando o mesmo
entendimento: STJ, REsp 1.486.219/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, DJe de 04/12/2014; REsp 1.217.380/SE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA,
SEGUNDA TURMA, DJe de 25/05/2011; REsp 1.201.623/SE, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 13/04/2011; REsp 1.231.489/SE,
Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de
19/06/2013; EDcl no AREsp 24.798/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA
TURMA, DJe de 16/02/2012.
IX. Examinando caso idêntico ao ora em apreciação, a Segunda Turma do STJ firmou o
seguinte entendimento: "O Estatuto da Criança e do Adolescente é lex specialis, prevalece
sobre a regra geral de competência das Varas de Fazenda Pública, quando o feito envolver
Ação Civil Pública em favor da criança ou do adolescente, na qual se pleiteia acesso às ações
ou aos serviços públicos, independentemente de o infante estar em situação de abandono ou
risco, em razão do relevante interesse social e pela importância do bem jurídico tutelado. Na
forma da jurisprudência do STJ, 'a competência da vara da infância e juventude para apreciar
pedidos referentes ao menor de idade é absoluta, consoante art. 148, inciso IV, do Estatuto da
Criança e do Adolescente' (STJ, AgRg no REsp 1.464.637/ES, Rel.Min. Sérgio Kukina,
Primeira Turma, DJe de 28.3.2016). Assim, ao afastar a competência da Vara da Infância, da
Adolescência e do Idoso para o julgamento de mandamus destinado a assegurar vaga em
creche para menor, o Tribunal local dissentiu do entendimento desta Corte Superior, devendo
o acórdão vergastado ser reformado" (STJ, REsp 1.833.909/MS, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2019). No mesmo sentido, apreciando
hipóteses idênticas à ora em julgamento: STJ, REsp 1.760.648/MS, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, DJe de 08/02/2019; REsp 1.762.782/MS, Rel. Ministra
ASSUSETE MAGALHÃES, DJe de 11/12/2018.
X. Tese jurídica firmada: "A Justiça da Infância e da Juventude tem competência absoluta
para processar e julgar causas envolvendo matrícula de menores em creches ou escolas, nos
termos dos arts. 148, IV, e 209 da Lei 8.069/90." XI. Recurso Especial conhecido e provido,
para reconhecer a competência do Juízo da Vara da Infância, da Adolescência e do Idoso da
Comarca de Campo Grande/MS. XII. Recurso Especial julgado sob a sistemática dos recursos
especiais representativos de controvérsia (art. 1.036 e seguintes do CPC/2005 e art. 256-N e
seguintes do RISTJ). REsp 1.846.781/MS, Rel. Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, por
unanimidade, julgado em 10/02/2021 (Tema 1058)

4.2 Multa do art. 249 do ECA e advento da maioridade civil do adolescente

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE. ART. 249. MULTA. AUSÊNCIA DE RECURSO QUANTO AO EVENTO
QUE CULMINOU COM A PENALIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA
MAIORIDADE CIVIL DA VÍTIMA. IRRELEVÂNCIA PARA APLICAÇÃO DA MULTA.
1. A maioridade não retroage para afastar os efeitos da aplicação do Estatuto da Criança e do
Adolescente aos fatos anteriormente ocorridos. 2. A multa instituída pelo art. 249 do ECA
(Lei 8.069/90) não possui caráter meramente preventivo, mas também punitivo e
pedagógico, de modo que não pode ser afastada sob fundamentação exclusiva do advento
da maioridade civil da vítima dos fatos que determinaram a imposição da penalidade. 3.
Recurso especial provido. (REsp 1.653.405-RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma,
por unanimidade, julgado em 02/03/2021 - Info 687)

4.3 Sentença concessiva de adoção e ação rescisória

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. INFÂNCIA E JUVENTUDE.


OMISSÃO AUSÊNCIA. IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO. INTERPRETAÇÃO
SISTEMÁTICA E TEOLÓGICA. FINALIDADE PROTETIVA. PRINCÍPIOS DA
PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE. SENTENÇA CONCESSIVA DA ADOÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA.
POSSIBILIDADE. PROVA NOVA. CARACTERIZAÇÃO. PROVA FALSA.
CARACTERIZAÇÃO.
1- Ação ajuizada em 27/11/2014. Recurso especial interposto em 13/5/2020 e concluso ao
gabinete em 20/10/2020.
2- O propósito recursal consiste em definir: a) se houve omissão da Corte de origem ao apreciar
a tese relativa à caracterização de falsidade ideológica, notadamente a própria declaração do
adotado no sentido de que não desejava a adoção; e b) se é possível, ante a regra da
irrevogabilidade da adoção, a rescisão de sentença concessiva dessa espécie de colocação em
família substitua ao fundamento de que o adotado, à época da adoção, não a desejava
verdadeiramente e de que, após atingir a maioridade, manifestou-se pela procedência do
pedido.
3- No que diz respeito à apontada omissão, verifica-se que os recorrentes não indicam quais os
dispositivos legais teriam sido violados pelo acórdão hostilizado, tornando patente a falta de
fundamentação do apelo especial, circunstância que atrai a incidência, por analogia, do
Enunciado de Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal. Ademais, não houve negativa de
prestação jurisdicional, porquanto a Corte de origem analisou a questão deduzida pelos
recorrentes.
4- A interpretação sistemática e teleológica do disposto no § 1º do art. 39 do ECA conduz à
conclusão de que a irrevogabilidade da adoção não é regra absoluta, podendo ser afastada
sempre que, no caso concreto, verificar-se que a manutenção da medida não apresenta reais
vantagens para o adotado, tampouco é apta a satisfazer os princípios da proteção integral e do
melhor interesse da criança e do adolescente. 5- A sentença concessiva de adoção, ainda
quando proferida em procedimento de jurisdição voluntária, pode ser encoberta pelo
manto protetor da coisa julgada material e, como consectário lógico, figurar como objeto
de ação rescisória. Precedentes. 6- Está caracterizada a “prova nova” apta justificar a sentença
concessiva de adoção, porquanto se extrai do Relatório Psicológico que não houve, de fato,
consentimento do adotando com relação à adoção, conforme exige o § 2º do art. 45 do ECA.
Não se trata de vedada alegação de fato novo, mas sim de prova pericial nova que se refere à
existência ou inexistência de ato jurídico anterior à sentença, qual seja, o consentimento do
adolescente. 7- Subsume-se a hipótese ao previsto no inciso VI do art. 966 do CPC, porquanto
admitiu o magistrado singular, ao deferir a adoção, que houve o consentimento do adotando,
conforme exigido pelo § 2º do art. 45 do ECA, o que, posteriormente, revelou-se falso. 8-
Passando ao largo de qualquer objetivo de estimular a revogabilidade das adoções, situações
como a vivenciada pelos adotantes e pelo adotado demonstram que nem sempre as presunções
estabelecidas dogmaticamente, suportam o crivo da realidade, razão pela qual, em caráter
excepcional, é dado ao julgador demover entraves legais à plena aplicação do direito e à tutela
da dignidade da pessoa humana. 9- A hipótese dos autos representa situação sui generis na
qual inexiste qualquer utilidade prática ou reais vantagens ao adotado na manutenção da
adoção, medida que sequer atende ao seu melhor interesse. Ao revés, a manutenção dos
laços de filiação com os recorrentes representaria, para o adotado, verdadeiro obstáculo ao
pleno desenvolvimento de sua personalidade, notadamente porque impediria o evolver e o
aprofundamento das relações estabelecidas com os atuais guardiões, representando
interpretação do § 1º do art. 39 do ECA descolada de sua finalidade protetiva. 10- Levando-se
em consideração (a) os princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e
do adolescente, (b) a inexistência de contestação ao pleito dos adotantes e (c) que a regra
da irrevogabilidade da adoção não possui caráter absoluto, mas sim protetivo, devem,
excepcionalmente, ser julgados procedentes os pedidos formulados na presente ação
rescisória com a consequente rescisão da sentença concessiva da adoção e retificação do
registro civil do adotado. 11- Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.
(REsp 1.892.782/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em
06/04/2021 0 info 691)

4.4 Guarda compartilhada. Genitores domiciliados em cidades distintas.

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA.


OBRIGATORIEDADE. PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR
INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. GUARDA ALTERNADA.
DISTINÇÃO. GUARDA COMPARTILHADA. RESIDÊNCIA DOS GENITORES EM
CIDADES DIVERSAS. POSSIBILIDADE. 1- Recurso especial interposto em 22/7/2019 e
concluso ao gabinete em 14/3/2021. 2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a fixação
da guarda compartilhada é obrigatória no sistema jurídico brasileiro; b) o fato de os genitores
possuírem domicílio em cidades distintas representa óbice à fixação da guarda compartilhada;
e c) a guarda compartilhada deve ser fixada mesmo quando inexistente acordo entre os
genitores. 3- O termo “será” contido no § 2º do art. 1.584 não deixa margem a debates
periféricos, fixando a presunção relativa de que se houver interesse na guarda compartilhada
por um dos ascendentes, será esse o sistema eleito, salvo se um dos genitores declarar ao
magistrado que não deseja a guarda do menor. 4- Apenas duas condições podem impedir a
aplicação obrigatória da guarda compartilhada, a saber: a) a inexistência de interesse de
um dos cônjuges; e b) a incapacidade de um dos genitores de exercer o poder familiar. 5-
Os únicos mecanismos admitidos em lei para se afastar a imposição da guarda compartilhada
são a suspensão ou a perda do poder familiar, situações que evidenciam a absoluta inaptidão
para o exercício da guarda e que exigem, pela relevância da posição jurídica atingida, prévia
decretação judicial. 6- A guarda compartilhada não se confunde com a guarda alternada e não
demanda custódia física conjunta, tampouco tempo de convívio igualitário dos filhos com os
pais, sendo certo, ademais, que, dada sua flexibilidade, esta modalidade de guarda comporta as
fórmulas mais diversas para sua implementação concreta, notadamente para o regime de
convivência ou de visitas, a serem fixadas pelo juiz ou por acordo entre as partes em atenção às
circunstâncias fáticas de cada família individualmente considerada. 7- É admissível a fixação
da guarda compartilhada na hipótese em que os genitores residem em cidades, estados,
ou, até mesmo, países diferentes, máxime tendo em vista que, com o avanço tecnológico, é
plenamente possível que, à distância, os pais compartilhem a responsabilidade sobre a
prole, participando ativamente das decisões acerca da vida dos filhos. 8- Recurso especial
provido. (REsp 1.878.041-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade,
julgado em 25/05/2021, DJe 31/05/2021 - Info 698).

4.5 Adoção. Relativização da regra que estabelece diferença mínima de idade entre adotante e
adotando

RECURSOS ESPECIAIS - AÇÃO DE ADOÇÃO UNILATERAL SOCIOAFETIVA DE


ENTEADO PROMOVIDA POR PADRASTO - INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL,
POR IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO, DADO O NÃO CUMPRIMENTO DO
REQUISITO DA DIFERENÇA MÍNIMA DE 16 ANOS DE IDADE ENTRE ADOTANTE E
ADOTANDO - DELIBERAÇÃO MANTIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM EM FACE
DO CARÁTER COGENTE DA NORMA PREVISTA NO ART. 42, § 3º DO ECA -
IRRESIGNAÇÃO DO DEMANDANTE E DO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
DISTRITAL QUE ATUA NO FEITO COMO CUSTOS LEGIS.
Hipótese: Cinge-se a controvérsia em definir se a regra que estabelece a diferença mínima de
16 (dezesseis) anos de idade entre adotante e adotando (art. 42, § 3º do ECA) é norma cogente
ou, na medida das peculiaridades do caso concreto, pode ser relativizada no interesse do
adotando, à vista da situação fática efetivamente vivenciada de forma pública, estável,
duradoura e contínua.
1. O dispositivo legal atinente à diferença mínima etária estabelecida no art. 42, § 3º do
ECA, embora exigível e de interesse público, não ostenta natureza absoluta a inviabilizar
sua flexibilização de acordo com as peculiaridades do caso concreto, pois consoante
disposto no artigo 6º do ECA, na interpretação da lei deve-se levar em conta os fins sociais a
que se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a
condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
2. O aplicador do Direito deve adotar o postulado do melhor interesse da criança e do
adolescente como critério primordial para a interpretação das leis e para a solução dos
conflitos. Ademais, não se pode olvidar que o direito à filiação é personalíssimo e
fundamental, relacionado, pois, ao princípio da dignidade da pessoa humana. 2.1 No caso
em exame, o adotante é casado, por vários anos, com a mãe do adotando, razão por que esse se
encontra na convivência com aquele desde tenra idade; o adotando possui dois irmãos que são
filhos de sua genitora com o adotante, motivo pelo qual pode a realidade dos fatos revelar
efetiva relação de guarda e afeto já consolidada no tempo, merecendo destaque a peculiaridade
de tratar-se, na hipótese, de adoção unilateral, circunstância que certamente deve importar para
a análise de uma possível relativização da referência de diferença etária
3. A justa pretensão de fazer constar nos assentos civis do adotando, como pai, aquele que
efetivamente o cria e educa juntamente com sua mãe, não pode ser frustrada por apego
ao método de interpretação literal, em detrimento dos princípios em que se funda a regra
em questão ou dos propósitos do sistema do qual faz parte. 4. Recursos especiais providos.
(REsp 1.338.616-DF, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em
15/06/2021 - info 701).

4.6 Apuração de ato infracional e pedido de acesso aos autos pela vítima
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ESTATUTO DA CRIANÇA
E DO ADOLESCENTE. PROCESSO DE APURAÇÃO DE ATO INFRACIONAL.
SEGREDO DE JUSTIÇA. PLEITO DE ACESSO AOS AUTOS. VÍTIMA DO ATO
INFRACIONAL. INSTRUÇÃO DE AÇÃO DE DESERDAÇÃO. INTERESSE JURÍDICO.
FINALIDADE JUSTIFICADA. ART. 144 DO ECA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1. O art. 143 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, como regra geral, a vedação
à divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito à apuração de atos
infracionais. Esta disposição, em primeiro juízo, obsta o acesso de terceiros aos referidos autos.
2. Todavia, a vedação contida no art. 143 do Estatuto da Criança e do Adolescente não é
absoluta, sendo mitigada, conforme se extrai do art. 144 deste mesmo diploma normativo, nas
hipóteses em que há interesse jurídico e justificada finalidade no pleito de acesso aos autos.
Nesse caso, presentes interesse e finalidade justificadas, deverá a autoridade judiciária deferir
a extração de cópias ou certidões dos atos do processo infracional.
3. No caso, a Recorrente comprovou seu interesse jurídico, pois é mãe da adolescente apontada
como infratora e foi vítima do ato infracional imputado à filha. Ademais, a Recorrente
apresentou finalidade justificada ao pleitear o seu acesso aos autos do processo de apuração do
ato infracional, consignando a utilidade dos documentos nele produzidos para servirem como
provas em ação de deserdação.
4. Uma vez que o Estatuto da Criança e do Adolescente exige a justificação da finalidade para
a qual se defere o pleito de acesso aos autos e de extração de cópias do processo de apuração
de ato infracional, é certo que a concessão do pedido está vinculada a esta finalidade (no caso,
instrução de ação de deserdação), não podendo a Recorrente utilizar os documentos obtidos
para finalidade diversa, sob pena de responsabilização cível e penal.
5. Recurso ordinário provido para conceder a segurança, determinando ao Juízo da Vara da
Infância e da Adolescência de Campo Grande/MS que permita o acesso da Recorrente aos autos
do Processo de Apuração de Ato Infracional n. 0020018-05.2018.8.12.0001 e a extração das
cópias dos documentos destinados exclusivamente a instruir ação de deserdação contra a autora
do ato infracional. (RMS 65.046-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade,
julgado em 01/06/2021 - info 699)

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