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Tipos de Agricultura 1

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TIPOS DE

Caetano Marciano de Souza,


Maria José do Amaral e Paiva,
Célia das Eiras L. Dgedge Melo,
António da Piedade Melo,

AGRICULTURA Sérgio Bernardes Sá Teles,


Maria Carolina Gomes Paiva
Tipos de agricultura
Capítulo 11 do livro Agronomia: profissão do presente e do futuro – 2ª ed.

A arte de cultivar vegetais e criar animais surgiu


quando o homem deixou de ser nômade e foi
aprimorada por volta dos anos 3.000 a.C., quando
começou a ser praticada em escala maior, influen-
ciando até o desenho urbano. Por volta do ano
2.000  a.C., os sumerianos já sulcavam o solo com
arados de madeira e abriam canais por onde a água
escoava até as áreas de interesse, iniciando, assim,
a irrigação (Baiardi, 2013).
Durante o período clássico, a agricultura foi desen-
volvida como arte em harmonia com a natureza. Durante
o período medieval, com o pensamento agronômico bem
mais desenvolvido, o foco foi a produção associada à
preservação da biodiversidade e da fertilidade do solo.
O campo das Ciências Agrárias e as formas de culti-
var a terra sofreram intensas alterações com a revolução
científica dos séculos XVII e XVIII. Como a população
urbana aumentou expressivamente, o produtor rural
passou a produzir para ele e para mais nove pessoas.
Independentemente do tipo de agricultura a ser
praticada, a finalidade é a produção de alimentos para
consumo humano ou animal e matéria-prima para a
indústria. Além da forma convencional, podem-se citar
outras, como a agricultura transgênica, a agricultura
familiar, a agricultura hidropônica, o cultivo protegido,
4 | Tipos de agricultura

a agricultura orgânica e a agroecologia, a agricultura biodinâmica, a agricultura


sintrópica e a permacultura.

1 Agricultura convencional
A agricultura convencional é a forma de produção mais utilizada hoje, deno-
minada agricultura moderna. Há várias fases desenvolvidas nesse sistema,
podendo alguns agricultores praticá-las ou não, a depender do nível de tecnifi-
cação da propriedade e dos recursos disponíveis. Essas fases são, entre outras,
remoção da vegetação nativa ou uso de área já aberta anteriormente; aração;
calagem; gradagem; semeadura; adubação mineral simultânea à semeadura e
em cobertura; aplicação de defensivos agrícolas para controle de plantas infes-
tantes, pragas e doenças; capina mecânica ou uso de herbicidas; e colheita
(há culturas em que se faz a dessecação com herbicida antes da colheita).
O sistema convencional de praticar agricultura passou por grande trans-
formação com a chamada Revolução Verde, que começou com os avanços
tecnológicos pós-guerra, mas recebeu esse nome na década de 1970.
O precursor da Revolução Verde foi Norman Borlaug (1914-2009), americano
de Iowa, formado em Agronomia pela Universidade de Minnesota. Em parceria
com a Fundação Rockefeller, Norman iniciou um programa de melhoramento
genético com o trigo no México, em 1944, para resolver o problema da fome,
agravado pela ferrugem que dizimou as lavouras de trigo naquele país.
Borlaug cultivou o trigo ao nível do mar e em altitude de 2.500 metros,
em  diferentes latitudes e climas, o que resultou em plantas que podiam ser
cultivadas em diferentes regiões do mundo. Esse cientista aplicou nas plantas
elevadas doses de fertilizantes e obteve alta produtividade, mas os colmos não
suportaram o peso das espigas e tombaram. Então, foi necessário o segundo
momento do melhoramento, quando Borlaug buscou, no Japão, uma variedade
de trigo anão e realizou cruzamento. O resultado foi o trigo anão do México, com
porte mais baixo, colmos fortes e alta produtividade.
A técnica de melhoramento de Borlaug tornou-se modelo. Foi também
aplicada ao arroz, ao milho e a muitas outras culturas. O modelo de cultivo
iniciado por ele no México foi levado em seguida para vários países, como Índia,
Paquistão, China e Brasil, e continuou sendo propagado. Os próprios países
desenvolvidos também adotaram esse método e diminuíram as importações
de alimentos. O trabalho desse cientista tinha como objetivo erradicar a fome
no planeta, preocupação causada pela explosão populacional, mas utilizando
intensamente as áreas já abertas em vez de abrir outras.
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O modelo da agricultura intensiva é firmado no uso de sementes geneti-


camente modificadas, grande quantidade de adubos químicos formulados e
altamente solúveis, pesticidas industriais para controlar pragas, doenças e
plantas infestantes, intensa e tecnificada mecanização, diminuição do manejo,
uniformidade dos cultivos (monocultura), uso de tecnologia para plantio, irriga-
ção e colheita e também o gerenciamento da produção.
Muitos fatores atuando em conjunto levaram a grandes mudanças na
agricultura brasileira a partir da chamada Revolução Verde, que culminou em
expressivos incrementos de produtividade, conduzindo o Brasil ao topo dos
países mais produtivos. Com a criação de órgãos e pesquisas, foram viabilizados
cultivos no Cerrado brasileiro, que hoje representa a maior área produtiva do País.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) foi reor-
ganizado pela Lei Delegada nº 9, de 11 de outubro de 1962, e regulamentado
pelo Decreto nº 52.339, de 8 de agosto de 1963. A partir de então, foram criados
seis institutos de pesquisa e experimentação diretamente vinculados ao órgão,
sendo a maior parte incorporada à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa) a partir de 1973. Essa empresa, juntamente com outras instituições
públicas, universidades, fundações e empresas privadas, executou pesquisas em
diferentes áreas. Um dos primeiros estudos sobre as potencialidades agrícolas
do Cerrado foi desenvolvido em 1972, pelo Instituto de Planejamento Econômico
e Social (Ipea) em parceria com o Instituto de Planejamento (Iplan), por meio de
convênio com a Secretaria da Agricultura de Minas Gerais.
A região do Brasil denominada Cerrado é formada por dois milhões de
quilômetros quadrados, representando 23% do território nacional. Compreen­de
a quase totalidade dos Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás,
Tocantins e do Distrito Federal, e partes dos Estados de Minas Gerais, Bahia,
Maranhão e Piauí, bem como áreas menores de São Paulo, Paraná, Rondônia,
Roraima e Amapá, conforme ilustrado na Fig. 1. Produtores do Estado de São
Paulo e dos três Estados do Sul migraram para a região do Cerrado por causa
da impossibilidade de ampliação das áreas para cultivo e também por causa do
aumento do preço da terra em seus Estados de origem. Foram também motiva-
dos pelos incentivos do governo. Cooperativas de outros Estados criaram filiais
nas regiões do Cerrado e ajudaram a viabilizar essa migração.
A produtividade agrícola do Brasil foi recebendo incremento a cada ano pela
abertura do Cerrado e também por políticas que incentivaram a pesquisa, a assis-
tência técnica e a comercialização. Atualmente, o País vem batendo sucessivos
recordes: a safra 2016/2017 foi a maior da história, com 237,7 milhões de tonela-
6 | Tipos de agricultura

das de grãos, sendo a soja a maior


responsável por esse feito. Hoje, a
previsão para a safra 2021/2022 é
de 288 milhões de toneladas, de
acordo com a Companhia Nacional
de Abastecimento (Conab).
A uniformidade na produção,
representada pelo monocultivo,
tem causado aumento na quan-
tidade de pragas e de pressão

Fig. 1 Área do Cerrado no Brasil de doenças, o que tem levado,


Fonte: Pfly (Wikimedia Commons, em alguns casos, ao uso indis-
https://w.wiki/4MPv). criminado de pesticidas e, por
consequência, ao surgimento de
plantas infestantes e pragas resistentes aos seus princípios ativos. Os Enge-
nheiros-Agrônomos recomendam adotar a rotação de culturas, manter o solo
coberto por palha, fazer o manejo integrado de pragas e doenças e adotar formas
de manejo mais autossustentáveis.

2 Agricultura transgênica
A partir de 1953, quando se descobriu a estrutura tridimensional do DNA,
surgiu a possibilidade de modificar, de forma precisa, a informação genética.
As pesquisas em biotecnologia foram evoluindo, e seus primeiros feitos na
agricultura foram com o tabaco e o tomate geneticamente modificados nos
Estados Unidos. Hoje em dia, a cultura e a prática de cultivo dos transgê-
nicos estão difundidas em praticamente todo o planeta, sendo a inovação
tecnológica mais utilizada na história da agricultura. Os principais alimen-
tos transgênicos produzidos hoje no mundo são arroz, soja, tomate, milho,
batata, linho, mamão, morango, melancia, melão, abóbora, maçã, ervilhas,
feijão, beterraba e cebola. O Brasil é o segundo país com maior área plantada
com organismos geneticamente modificados (OGMs), com destaque para as
culturas de milho, soja, algodão e canola.
A agricultura transgênica é baseada na utilização de OGMs em laboratório,
com o objetivo de incorporar em uma espécie características de outras. É uma
transferência controlada dos genes de interesse. Essa técnica permite que genes
de qualquer ser vivo, como vírus, bactérias e animais, sejam inseridos no DNA
de qualquer outro ser, a exemplo das plantas.
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Atualmente, 77% dos organismos transgênicos cultivados são resisten-


tes a herbicidas; 15% são os chamados cultivos Bt, porque receberam em seu
genoma genes de uma bactéria de solo chamada Bacillus thuringiensis, que produz
substâncias inseticidas; e 8% combinam as duas características, resistência a
herbicidas e propriedades inseticidas. Assim, quando o inseto-praga alvo se
alimenta do organismo geneticamente modificado, mesmo que em pequena
quantidade, ele morre.
O objetivo que inicialmente norteou o lançamento dos transgênicos foi
resolver o problema da fome no mundo, aumentando a produtividade e também
diminuindo o uso de herbicidas e inseticidas. Em contrapartida, tem-se obser-
vado aumento no número de espécies de insetos-praga e muitas plantas
infestantes criando resistência e vencendo a tecnologia.
As principais vantagens listadas do uso dos OGMs na agricultura são resistên-
cia a pragas e doenças – apesar de algumas pragas estarem criando resistências a
essa tecnologia –, maior produtividade, redução de custos e do uso dos pesticidas
em geral e melhor tolerância às condições climáticas. Já a principal desvantagem
está na prática da monocultura em grandes áreas. Toda variedade transgênica,
antes de ser liberada para o plantio comercial e a produção de alimentos, passa
pela análise da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que avalia
sua segurança para o consumo humano e animal e para o meio ambiente. Apenas
as variedades seguras são liberadas.
A presença dos transgênicos na agricultura é alvo de muitos questiona-
mentos. De um lado estão os que defendem e fazem amplo uso da tecnologia
e, do outro, aqueles que alegam não ser totalmente conhecido o efeito dessa
transgenia no organismo humano e na natureza.

3 Agricultura familiar
A agricultura familiar tem-se desenvolvido muito nos últimos tempos.
É  praticada por pequenos produtores com áreas de até quatro módulos
fiscais, em que o regime de trabalho é predominantemente da família.
O  módulo fiscal é uma unidade de medida que o Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (Incra) fixou, em hectare, para os municí-
pios, dependendo de sua localização. Foi calculado de acordo com o tipo de
exploração predominante no município (hortifrutigranja, cultura perma-
nente, cultura temporária, pecuária ou florestal); com a renda obtida
dessa exploração; e com outras explorações expressivas do município,
embora não predominantes por conta da renda ou da área que utilizam
8 | Tipos de agricultura

e do conceito de “propriedade familiar”. O módulo fiscal pode variar seu


valor de 5 a 110 hectares (Fig. 2).
Na agricultura familiar, a renda da propriedade vem sobretudo da atividade
agropecuária, ou seja, depende prioritariamente da produção para sobrevivên-
cia, porém esse conceito vem sendo ampliado. Nos dias atuais, a agricultura
familiar é responsável pela alimentação de grande parte da população do Brasil,
assegurando segurança alimentar e nutricional. A produção é voltada para a
diversificação de alimentos e bens de consumo. Além disso, ela gera renda e cria
condições para que as famílias permaneçam no campo. Nesse sentido, a agri-
cultura familiar é de grande importância para a economia do País.
Essa agricultura, no entanto, carece ser assistida em três pontos funda-
mentais de apoio: obtenção do crédito, assistência técnica de qualidade para
alcançar produção em quantidade e qualidade, e venda direta da produção na
época da safra.

Amazônia legal

Classes de tamanhos de módulos fiscais


no Brasil (ha)

5 - 20 70 - 80

22 - 35 90 - 95

40 - 50 100 - 110

55 - 65

Fig. 2 Classes e tamanhos


de módulos fiscais no Brasil
Fonte: Landau et al. (2012).
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4 Agricultura hidropônica
Também chamada de ciência, história e arte, é o método de cultivar plan-
tas sem solo ou outro substrato. O fornecimento de nutrientes é feito via
solução nutritiva.
A hidroponia pode ser conduzida tanto como uma simples horta no quintal
de casa em um sistema mais rústico quanto em um ambiente de estufa prote-
gido, com produção em larga escala. Há várias formas de se montar um sistema
hidropônico de maneira simplificada, para o que são necessários uma estrutura
que dê sustentação às plantas, um reservatório ou tanque para a solução nutri-
tiva e um mecanismo em que as raízes possam ter acesso à solução nutritiva.
A palavra hidroponia, originada do grego hidro, que significa água, e ponos, que
significa trabalho, é um sistema bem antigo, mas somente na década de 1930 é
que foi desenvolvido pelo Professor W. F. Gericke, da Universidade da Califórnia.
Por meio de estudos em laboratório, esse professor criou um sistema hidropô-
nico, isto é, um processo em que a planta se desenvolve e produz sem solo.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o exército dos Estados Unidos criou um
sistema de hidroponia em várias ilhas do Pacífico e do Atlântico para alimentar os
soldados, o que foi feito também pelos japoneses em Chofu, em uma área de mais
de 22 hectares, também para alimentar os soldados. Mas os cultivos comerciais
eram poucos. Somente na década de 1960 é que a hidroponia foi alavancada como
cultivo comercial, por meio dos trabalhos do inglês Allen Cooper, cujo sistema
não exigia grande volume de água. Em vez de ser utilizado um reservatório,
chamado de sistema floating, foram usados canais com pequena inclinação por
onde circulava a solução nutritiva para o cultivo das plantas. No Brasil, a hidropo-
nia comercial teve início na década de 1980 em São Paulo, o maior produtor.
Uma das principais vantagens desse sistema é que as raízes não ficavam
totalmente submersas, facilitando sua respiração. O sistema dispunha de um
reservatório que poderia ser menor do que o do método antigo, para manejar a
solução nutritiva e facilitar a sua recirculação. Assim, esse tipo de agricultura se
consolidou em vários países (Fig. 3).
De acordo com Martinez e Clemente (2011), os sistemas hidropônicos podem
ser classificados quanto ao substrato (duas ou três fases) e quanto ao forneci-
mento da solução (não circulante, circulante e solução estática aerada).
A nutrição da planta é feita a partir do uso de uma solução que contém
macronutrientes, como nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio, magnésio e enxofre;
e micronutrientes, como ferro, manganês, boro, cobre, zinco, molibdênio, cloro e
10 | Tipos de agricultura

Fig. 3 Sistema hidropônico


Fonte: Goldlocki (Wikimedia
Commons, CC BY-SA 3.0,
https://w.wiki/4Mrh).

níquel, considerados elementos essenciais ao crescimento e desenvolvimento


das plantas. Podem ser utilizados também o silício, o sódio e o cobalto, elemen-
tos também benéficos.
Em razão de invernos rigorosos, limitações de área e falta de água, nos
países desenvolvidos os sistemas hidropônicos são amplamente utilizados.
No Brasil, esses sistemas têm sido aplicados em locais próximos aos grandes
centros, onde o preço da terra é alto e há grande demanda por produtos hortíco-
las (Martinez; Clemente, 2011).

5 Cultivo protegido
O plantio de plantas em ambiente protegido consiste em cultivá-las em
locais onde é viável controlar alguns fatores envolvidos no processo produ-
tivo, adaptando o ambiente às plantas e ampliando o período de produção
mesmo em áreas consideradas inadequadas à agricultura. Podem ser utili-
zadas estruturas complexas, como as casas de vegetação climatizadas, ou
estruturas mais simples, como as coberturas apenas para sombreamento.
Entre as principais vantagens do cultivo em ambiente protegido com
fertirrigação por gotejamento, podem-se destacar o controle do ambiente, que
permite a produção de diversas culturas em diferentes regiões e épocas do ano;
a menor severidade da grande maioria das doenças da parte aérea; a proteção
contra chuva, granizo e geada; o controle do vento e da radiação solar; a melhor
condição de trabalho para os funcionários; a diminuição do ciclo da planta; o
prolongamento do período de colheita; o aumento da produtividade da cultura;
a melhor qualidade do produto; a oferta de produto durante todo o ano e com
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melhores preços; a redução do consumo de água, já que o sistema fechado dimi-


nui a evapotranspiração; e a possibilidade de produzir e comercializar produtos
diferenciados, como miniprodutos/baby.
A grande limitação para as culturas tanto no campo quanto no ambiente
protegido é a luminosidade, uma vez que influencia diretamente no crescimento
e desenvolvimento da planta. No entanto, a luminosidade em ambiente prote-
gido pode ser controlada de acordo com o tipo de material que irá cobrir a casa
de vegetação.
O cultivo protegido ainda viabiliza a realização da agricultura orgânica,
uma vez que esta é contrária à utilização de agroquímicos, o que seria inviável
se o cultivo fosse feito em épocas inapropriadas.
Esse sistema também apresenta suas desvantagens, como alto investimento
inicial; dificuldade de realizar a rotação de áreas para amenizar problemas com
doenças de solo, por conta da estrutura; ausência de organização e planeja-
mento por parte dos produtores e do governo para fomentar uma política ampla,
nacional, de apoio ao cultivo protegido; falta de informação/assistência técnica
para o produtor implantar e desenvolver o sistema; poluição do meio ambiente
pelo plástico (possui durabilidade média de três anos e, após o uso, precisa ser
devidamente descartado); e falta de recomendação técnica oficial sobre o uso de
defensivos e fertilizantes específicos para o sistema.

6 Agricultura orgânica e agroecologia


O sistema de produção orgânico baseia-se na preservação do ecossistema.
Tem como primícias o cultivo com manejo e conservação de solo e água,
compostagem, adubação orgânica, adubação verde, fixação biológica de
nitrogênio, rotação de culturas, uso de pós de rochas, manutenção do solo
coberto, aporte constante de matéria orgânica no solo, condições ideais
para aumento da microbiota do solo e promoção e preservação da biodiver-
sidade. Outras práticas inerentes a esse sistema são o controle biológico e
integrado de insetos, pragas e doenças e a aplicação de condições trabalhis-
tas, econômicas e sociais justas. Além disso, não permite o uso de adubos
químicos formulados altamente solúveis, pesticidas ou outros compostos
sintéticos como reguladores de crescimento e aditivos alimentares aos
animais. Também não permite o uso de OGMs e de radiação ionizante.
A agricultura orgânica teve seu ponto inicial com o inglês Sir Albert Howard,
que, entre 1925 e 1930, dirigiu em Indore, na Índia, uma instituição que realizou
vários estudos com compostagens e adubação orgânica, enfatizando a impor-
12 | Tipos de agricultura

tância da matéria orgânica para o solo. Em 1984, o Departamento de Agricultura


dos Estados Unidos (USDA) reconheceu a importância da agricultura orgânica
para a agricultura americana.
Após a Revolução Verde, surgiram opiniões contrárias a esse método, por
causa da grande quantidade de adubos químicos utilizada e do uso de agroquí-
micos, além de ser um método intensivo e que poderia conduzir ao esgotamento
dos ecossistemas. Dessas opiniões surgiram movimentos que levariam ao forta-
lecimento de uma linha denominada agricultura alternativa.
No Brasil, a partir de 1990, a agricultura orgânica veio crescendo em maior
proporção. Em 17 de maio de 1999, o Ministério da Agricultura lançou a Instru-
ção Normativa nº 7, que normatizava os produtos de origem animal e vegetal no
sistema orgânico. Em 23 de dezembro de 2003, entrou em vigor a Lei nº 10.831,
que regulamentava a produção orgânica, abrangendo armazenamento, rotula-
gem, transporte, certificação, comercialização e fiscalização dos produtos.
Em 27 de dezembro de 2007, pelo Decreto nº 6.323, foi regulamentado todo o
sistema de produção orgânica, começando na propriedade até o ponto de venda,
quando foi criado o Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica,
formado pelo Ministério da Agricultura, órgãos de fiscalização e organismos de
avaliação da conformidade orgânica. Várias instruções normativas entraram
em vigor para regulamentar todos os segmentos e processos do sistema. Com o
Decreto nº 7.794, de 20 de agosto de 2012, foi instituída a Política Nacional de
Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo), para articular ações de incentivo à
produção de alimentos orgânicos e agroecológicos.
A agroecologia tem emergido como um campo complexo de pesquisa,
prática e construção social, carecendo de um conceito que a defina de modo
mais rígido e consensual. Diferencia-se da agricultura ecológica, na qual se
inserem muitas vertentes e sistemas de produção sustentáveis, na medida em
que resgata a dimensão cultural da agricultura e, portanto, sua pluralidade de
manifestações, de acordo com cada região e atores sociais envolvidos. Assim
como a diversidade ecológica é a base para o equilíbrio dos sistemas agroecoló-
gicos, a diversidade cultural fundamenta a agroecologia.
No Marco Referencial em Agroecologia, lançado pela Embrapa em 2006, o
termo “agroecologia” foi cunhado para “demarcar um novo foco de necessidade
humana, qual seja o de orientar a agricultura à sustentabilidade” (Embrapa,
2006, p. 2). Ainda de acordo com esse documento, num sentido mais amplo,
a agroecologia se concretiza quando cumpre os ditames da sustentabilidade
econômica, ecológica, social, cultural, política e ética.
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No movimento agroecológico há um esforço para a compreensão tríplice da


agroecologia como ciência, prática e movimento. Como um referencial teórico,
ela se concretiza na dimensão local, onde são executados seus princípios e
práticas. Essas inúmeras experiências servem de inspiração para o redesenho
e manejo de agroecossistemas em distintos contextos. Para Gliessmann (2000),
a noção do agroecossistema é central e a ênfase do conceito de agroecologia
deve estar em sintonia com os ecossistemas locais, causando menos interfe-
rências possíveis.
Em 17 de outubro de 2013, foi instituído o Plano Nacional de Agroecologia e
Produção Orgânica (Planapo) para facilitar a gestão da Pnapo. Esse plano forta-
leceu a produção e aumentou a oferta de alimentos orgânicos, disseminou o
conhecimento de base agroecológica e ampliou o número de produtores fami-
liares que se voltaram para esse tipo de produção. Já foram criadas duas versões
do plano: a primeira, para o período de 2013 a 2015, com o objetivo de aumentar
a produção e a oferta de produtos orgânicos; e a segunda, para 2016 a 2019, com
a principal meta de cadastrar mais produtores, através de projetos sociais, no
sistema orgânico e agroecológico de produção.
Em 2016, a área de produção orgânica no Brasil era superior a 750 mil hecta-
res, e o número de unidades produtoras era de 15.700. No início de 2020, foram
contabilizadas 22.000 propriedades regularizadas e, hoje, já são 25.000 unidades
produtoras, das quais somente os Estados do Paraná e Rio Grande do Sul possuem
um terço (Mapa, 2020; Cruz, 2021).

7 Agricultura biodinâmica
A agricultura biodinâmica é um modelo que visa à  retomada  da força
original da agricultura, por meio da  construção de um ambiente autos-
sustentável e com o mínimo de intervenção exterior. Dessa forma, uma
propriedade rural deve ser capaz de prover tudo de que necessita, criando
um ambiente vivo, equilibrado e protegido.
A base dessa corrente de pensamento antroposófico são as conferências do
filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925) na Fazenda Koberwitz, próxima a
Breslau, na Polônia. Um dos temas principais de suas palestras foi a importância
de se ter um solo de boa qualidade para a saúde das plantas. Ele propôs aditivos
para reestimular as forças naturais do solo, os chamados preparados biodinâmi-
cos, utilizados até hoje pelos praticantes desse segmento de agricultura. Além
desses preparados, as atividades na propriedade são regidas somente por calen-
dário próprio, chamado de calendário biodinâmico.
14 | Tipos de agricultura

8 Agricultura sintrópica
É um tipo de agricultura agroecológica desenvolvida como sistema produ-
tivo pelo pesquisador e agricultor suíço Ernst Götsch, a partir de suas
observações de sistemas tradicionais de cultivo praticados por indígenas
da Costa Rica e, sobretudo, de sua experiência de mais de 40 anos na Mata
Atlântica da Bahia.
O termo sintropia é definido como o contrário de entropia, conceito da
termodinâmica que consiste no nível de desorganização de um sistema, sendo
essa uma tendência universal (unidades complexas e com energia organizada
transformam-se em unidades simples, com energia dispersa). Na agricultura
sintrópica ocorre o processo inverso, de modo que um sistema menos estrutu-
rado e complexo (baixa biodiversidade, baixo estoque de C e nutrientes, poucas
interações ecológicas) é redesenhado e manejado no sentido de aumentar a
qualidade e complexidade da vida, acumular recursos e energia (solo, biomassa,
interações ecológicas), em um processo que mimetiza a regeneração natural de
solos e florestas por meio da produção de alimentos. Essa agricultura trabalha
com sistemas agroflorestais (SAFs) fundamentados na dinâmica natural das
florestas para promover um processo combinado de produção de alimentos e
forragem e recuperação florestal.
Alguns princípios da agricultura sintrópica são a cobertura sistemá-
tica dos solos com matéria orgânica, a biodiversidade, a sucessão vegetativa,
a estratificação (aérea e radicular) do sistema e a poda racional das plantas,
gerando sincronização sistêmica e pulsos de crescimento.
A cobertura dos solos com troncos, galhos e folhas é o princípio essencial
ao promover sua recuperação e conservação e o aumento da fertilidade, da ativi-
dade biológica e da infiltração da água da chuva, bem como a diminuição da
erosão laminar e da evaporação da água do solo. Essa prática, por sua vez, aponta
outros dois pontos centrais desses SAFs: a presença de plantas (principalmente
árvores) para o fornecimento da matéria orgânica e sua poda sistemática e racio-
nal para a cobertura do solo.
Como se trata de um sistema produtivo, o desempenho dessas funções
ambientais em um SAF deve estar associado à produção diversificada e suces-
siva de alimentos e/ou forragem. Nesse sentido, para se estabelecer um SAF
ecologicamente funcional e economicamente produtivo, é necessário utilizar
espécies adaptadas e adequadas aos objetivos de cada sistema, mediante a
adoção de planejamento, desenho e manejo criteriosos. Tudo isso para evitar
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a competição entre espécies, promover níveis ideais de luminosidade a cada


elemento e garantir que a produção seja sucessiva e satisfatória.
Dessa maneira, a agricultura sintrópica tem o potencial de criar agroecos-
sistemas produtivos, duráveis e mais resilientes em um cenário de crescente
instabilidade climática. Os sistemas sintrópicos são regidos por processos
naturais que, ao longo do tempo, poderão restabelecer o equilíbrio agroecossis-
têmico. Assim, não se trata de estabelecer sistemas altamente dependentes de
insumos e energia externos (adubação orgânica ou inorgânica, agroquímicos),
mas de criar um sistema que se autorregule e regenere a si mesmo. Daí dizer
que a agricultura sintrópica é uma agricultura de processos naturais, e não de
insumos, embora estes últimos possam (e devam) ser utilizados no início dos
processos de recuperação como forma de potencializar a sucessão agroflorestal.
Há algumas experiências exitosas social, econômica e ambientalmente
em diversas regiões do Brasil, as quais vêm despertando interesse de institui-
ções de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) e pesquisa. Trabalhos em
pequena e larga escala, com distintos propósitos produtivos e em diferentes
contextos ambientais, apontam um caminho de crescimento das experiências
em sintropia.
A agricultura sintrópica emerge como notável estratégia de desenvolvi-
mento rural. As experiências mostram que a metodologia é capaz de conciliar
o desafio da produção de alimentos (em um cenário de escassez de recursos e
instabilidade climática) com a recuperação de áreas degradadas. Além disso,
a sintropia é capaz de viabilizar economicamente processos de recuperação
ecológica de paisagens, por meio de sistemas agroflorestais sucessionais alta-
mente funcionais e potencialmente produtivos.

9 Permacultura
Permacultura, ou cultura permanente, é uma expressão criada pelos ingle-
ses Bill Mollison e David Holmgren, na década de 1970, que abrange diversos
segmentos do conhecimento de várias áreas científicas, com o propósito de
criar ambientes humanos sustentáveis, produtivos e que respeitem o ecos-
sistema local, estando, assim, em harmonia com a natureza.
Há três éticas que norteiam sua forma de trabalho e são baseadas na obser-
vação do ecossistema onde a propriedade está inserida. A primeira ética é cuidar
da terra, a segunda é cuidar das pessoas e a terceira é cuidar do futuro. A perma-
cultura tem por objetivo buscar uma forma sustentável de interação com o meio
para a produção e para a sobrevivência humana.
16 | Tipos de agricultura

É regida por 12 princípios de planejamento desenvolvidos em conformidade


com as éticas, ao longo de duas décadas, e publicados em 2002 por David Holmgren
no livro Permacultura: princípios e caminhos além da sustentabilidade, traduzido para o
português em 2013. São eles: (1) adequação criativa a mudanças; (2) observação e
interação; (3) captura e armazenamento de energia; (4) obtenção de rendimento;
(5) aceite e adaptação ao feedback; (6) uso de serviços e recursos renováveis; (7) não
produção de lixo; (8) desenho dos padrões aos detalhes; (9) integração em vez de
segregação; (10) uso de soluções pequenas e lentas; (11) uso e valorização da diver-
sidade; e (12) uso e valorização das margens (Holmgren, 2013) (Fig. 4).

Manejo
da terra e
da natureza Espaço
construído

Posse da terra e Ferramentas


governo comunitário e tecnologias

Economia Educação
e finanças e cultura

Saúde e
bem-estar
espiritual

Fig. 4 Princípios da
permacultura
Fonte: UFSC (s.d.).

Finalizando, a Agronomia permite que o Engenheiro-Agrônomo se envolva


com os mais variados tipos de agricultura. Acredita-se que haja espaço para
todos esses tipos no mercado atual e futuro, especialmente no Brasil, um país
com grande vocação agrícola e com enorme potencial para ser um produtor e
exportador de alimentos para o mundo.
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Referências bibliográficas
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do Desenvolvimento Regional, v. 10, n. 2, p. 157-62, jul./dez. 2013.
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GLIESSMANN, S. R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável.
4. ed. Porto Alegre: UFRGS, 2009.
HOLMGREN, D. Permacultura: princípios e caminhos além da sustentabilidade. Porto
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LANDAU, E. C. et al. Variação geográfica do tamanho dos módulos fiscais no Brasil.
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MARTINEZ, H. E. P.; CLEMENTE, J. M. O uso do cultivo hidropônico de plantas em pesquisa.
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cultura da UFSC. O que é permacultura? Santa Catarina: UFSC, [s.d.]. Disponível em:
<https://permacultura.ufsc.br/o-que-e-permacultura/>. Acesso em: 16 abr. 2018, 9 h.

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