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Cabulas Do Exame de Reais

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17 de setembro: Prática
No usufruto o usufrutuário não pode dispor, pois só dispõe aquele que é proprietário, o que vai ao
desencontrou do direito de propriedade porque quem é proprietário frui, usufrui e dispor.
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A compra e venda, artigo 879º CC, tem dois efeitos obrigacionais (alíneas b) e c)) e um efeito real (alínea a)).
Imaginemos o caso em que A vai vender a B por 10€ o objeto X, B ainda não pagou e A ainda não entregou,
ora isto não implica que A seja proprietário do objeto X isto porque perante o artigo 408º CC a transferência do
objeto X dá-se como determinada por mero efeito do contrato. Deste modo, é percetivel que através de um
contrato em que não está estipulado que B só seria proprietário aquando o pagamento do preço, funciona a
regra geral do artigo 408º CC: a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se
por mero efeito do contrato.
Princípio do consentimento: determinar o momento em que os efeitos reais se produzem, então os efeitos reais
produzem-se independentemente da entrega da coisa, produzem-se através da celebração do contrato.
A (proprietário) dá a B o direito de usufruto, ora estamos no âmbito da constituição, artigo 408º nº1 CC, e A
não deixa de ter o direito de propriedade mas dá a B o direito de usufruto, a saber, tal como na transferência
de direitos reais, na constituição de direitos reais os efeitos produzidos da atribuição do direito real também se
dá por mero efeito do contrato.
Caso prático:
A celebrou com B um contrato pelo qual se comprometeu a dar a B preferência do um imóvel de que é
proprietário. Meses depois A vendeu o imóvel a C, não dando conhecimento a B.
B não se conforma com a situação e pretende adquirir a propriedade do imóvel. Quid Juris?
Resposta:
Depende.
Do pacto-preferência, artigo 414º CC, resulta uma obrigação e essa é traduz-se no facto de A ter de dar
preferência a B na venda do imóvel.
B não tem qualquer hipótese de ser proprietário do imóvel, sendo que só poderá pedir uma indemnização pois
A responde em responsabilidade civil, artigo 483º CC.

24 de setembro: Orientação
Teórica
25 Caso prático:
A e B celebraram um contrato-promessa de compra e venda relativo a um imóvel de que o primeiro era
proprietário. Estabeleceram também que a compra e venda seria celebrada daí a 6 meses.
Entretanto B (promitente comprador) registou o contrato-promessa. Porém antes de decorridos os referidos 6
meses A vendeu o apartamento a C.
De que meios dispõe B para reagir contra C?
Resposta:Geralmente quando A vende a C, coloca-se numa situação de incumprimento definitivo: A
mesmo depois de ter vendido a C já não consegue executar a sua promessa com B e, por essa razão, B
só tem um remédio que é recorrer aos mecanismos do artigo 442º nº2 CC, ou seja, dobro do sinal (se
tiver pago sinal) ou pode exigir que A lhe restitua o sinal, acrescido daquela indemnização pelo
aumento do valor.
Eventualmente, para que possa reagir contra C é necessário que o contrato-promessa tenha eficácia real, para
ter eficácia real é necessário que: (artigo 413º CC)
1. Que o contrato-promessa seja celebrado por escritura pública ou por documento autenticado;
Notas: A promessa com eficácia real pode ser celebrado por documento particular quando para o
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próprio contrato prometido a lei não exija escritura pública nem documento autenticado, porque a lógica
do artigo 413º CC é a de exigir para o contrato-promessa da mesma forma que se exigiria para o
contrato prometido. Se o contrato prometido sobre imóveis supõe escritura pública ou documento
autenticado, o. contrato-promessa respetivo exige exatamente escritura pública ou documento
autenticado.
2. É necessário que no documento que formaliza o contrato-promessa as partes (os promitentes)
declarem expressamente que querem atribuir eficácia real ao contrato;
3. Que se faça registo desse contrato-promessa. O registo é definitivo, pois a lei não o colocou na lista
dos registos provisórios
Se os dois primeiros requisitos estiverem cumpridos, o contrato-promessa pode ser registado e esse registo
permite que o contrato-promessa tenha eficácia contra terceiros.
No entanto, há outra maneira de o contrato-promessa poder obter efeitos perante terceiros e dá-se através do
registo provisório de aquisição previsto no artigo 47º CRP e, depois no artigo 92º nº1 g) CRP.
A ideia é a de que nesta situação o contrato-promessa não tem de cumprir os formalismos do artigo 413º CC,
mas a lei permite que mesmo assim seja inscrito no registo, a grande diferença para a hipótese com eficácia
real é a de que o registo efetuado nos termos do artigo 47º CRP é provisório por natureza e, por isso, como
todos os registos provisórios tem uma duração pré-fixada (6 meses).
Assim sendo, no caso concreto, B tinha duas hipóteses: podia levar o contrato-promessa ao registo por duas
vias:

1. Ou promessa com eficácia real e aí seria necessário cumprir os requisitos determinados anteriormente
do artigo 413º CC;
2. Promessa que dá base a um registo provisório por aquisição, nos termos do artigo 47º CRP. Se assim
fosse ia surgir uma colisão entre dois direitos, entre o direito de aquisição decorrente do contrato-
promessa e o direito de propriedade que a compra e venda transmite ao C.
Na hipótese de hoje, há um efetivo conflito, colisão de direitos entre B e C e quando A celebra o contrato-
promessa com B, B adquire um direito real de aquisição que decorre do contrato-promessa supondo que este
contrato-promessa tem eficácia real ou supondo que foi feito o registo provisório de aquisição. E C quando
celebra a compra e venda com A, C adquire o direito de propriedade. Então, aqui o que está em causa é a
colisão de direitos pois derivam da mesma pessoa (A) em relação à mesma coisa. Então como é que isto se
resolve? Ambos os factos que se sucedem são válidos, quer o contrato-promessa entre A e B, quer a compra
e venda entre A e C pois não é porque há um contrato-promessa a favor de B que a compra e venda entre A
e C se torna inválida. Nem se consegue saber se B vai querer executar o contrato promessa ou não, isto
significa que o facto de o contrato-promessa ter eficácia real só significa que B pode tentar recorrer à execução
específica.
No fundo, quando a promessa tem eficácia meramente obrigacional e o promitente vendedor (alienante) entra
em não cumprimento definitivo, ao promitente comprador apenas resta o artigo 442º nº2 CC (dobro do sinal ou
sinal mais indemnização pelo aumento de valor).
Ao contrário, quando a promessa tenha eficácia real o promitente comprador tem duas opções: ou recorre ao
artigo 442º nº2 CC se o promitente vendedor se colocou em posição de não cumprimento ou recorre ao
mecanismo da ação de execução específica. Notas: A eficácia real é conceder ao promitente comprador uma
possibilidade de aquisição que de outra forma não teria, e isso resulta da prioridade

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Quando o registo tenha sido de promessa com eficácia real ou tenha sido de promessa que é inscrita como
provisória por aquisição, nos termos do artigo 47º CRP, B pode recorrer ao artigo 442º nº2 CC ou à execução
específica, artigo 830º CC (este artigo está sempre ao dispor quando a promessa tenha eficácia real ou quando
a promessa tenha sido inscrita no registo a titulo do registo provisório por aquisição).
Se B intentar a ação de execução irá intentá-la contra A porque foi A que prometeu vender e não C. Notas: A
ação de execução específica serve para executar o contrato-promessa.
Para B o A mantém a sua legitimidade para cumprir, por isso para todos os efeitos A para B estava em mora
e não em incumprimento definitivo. Afirmamos isto porque se entende que a compra e venda A-C nestas
circunstâncias é ineficaz perante o promitente comprador (não tem efeitos perante o promitente comprador)
porque este registou primeiro e como registo primeiro determina que prevalece a sua posição ao C.
Deste modo, se B recorrer à execução específica, a compra e venda entre A e C não ocorreu, não tem efeitos.
Notas: Se B recorrer ao artigo 442º nº2 CC, a compra e venda A-C permanece tal e qual como está. Ao recorrer
à execução específica vai implicar que a compra e venda A-C não tenha efeitos.
A execução específica tem dois pedidos contra pessoas distintas:

1. Pedida contra o A;
2. Pedido de restituição da coisa, do imóvel que se faz contra C.
A ideia central é a de que o registo (provisório por aquisição ou através do contrato-promessa com eficácia
real) irá permitir recorrer à execução específica mesmo que o obrigado pela promessa, isto é, o promitente
vendedor tenha alienado a terceiro. Notas: É o registo que, em última análise, dá esta capacidade a B
(promitente comprador).
Ora, o registo serve para a publicidade e estando efetuado o registo torna-o público e portanto quando C
compra a A tinha de saber que havia um contrato-promessa entre A e B porque este contrato estava registado
ou como promessa com eficácia real ou como registo provisório de aquisição, isto significa que o terceiro
comprador (C) não pode alegar que desconhecia porque tinha de saber. Importa relevar que quando a escritura
é feita ou quando o documento autenticado é feito perante a compra e venda entre A e C, quem celebra e
formaliza tem acesso ao registo e tem o dever de informar o adquirente de que há ónus ou encargos que estão
pendentes, ou seja, o notário tinha de informar o C de que havia um contrato-promessa anterior celebrado com
B e que, por essa razão, havia hipótese de o promitente comprador (B) querer a execução do próprio contrato-
promessa.
Diferença prática entre o artigo 47º CRP e do artigo 413º CC: além das diferenças formais, temos de considerar
que na hipótese do contrato-promessa com eficácia real o registo que se faz (registo do artigo 413º CC) é
definitivo porque a lei não o enumera como um caso de registo provisório. Ao contrário, o registo provisório por
aquisição, artigo 47º CRP, no entanto enquanto o prazo de caducidade não tiver terminado o registo provisório
está em vigor.

26 de setembro: Prática
Os Direitos Reais gozam da oponibilidade erga omnes, podendo o sujeito opor determinado facto a terceiros.
Por exemplo, se há um negócio celebrado entre A e B, à partida só é oponível a A e B, mas se deste negócio
resultarem efeitos reais significa que B pode opor o negócio, por exemplo, de compra e venda a terceiros, na

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medida em que consiga alguma forma de publicitar o próprio negócio pois enquanto o negócio não se tornar
público o negócio só é conhecido entre A e B.
A oponibilidade pressupõe o conhecimento e o conhecimento assenta na publicidade do facto, é necessário
arranjar uma maneira de dar a conhecer ao terceiro o negócio celebrado entre A e B. Qual é o mecanismo que
dá a conhecer a toda a gente determinados factos respeitantes a imóveis? Registo predial.
O registo predial tem como única e exclusiva finalidade de dar publicidade à situação jurídica determinado
imóvel, prevendo a segurança do comércio jurídico imobiliário, artigo 1ºCRP.
Notas: A inscrição é o registo dos factos que vão suceder relativamente a determinado imóvel
O efeito regra do registo predial é o efeito consolidativo, artigo 5º nº1 CRP, regra.
Artigo 2º CRP: determina todos os factos que estão sujeitos a registo.
Se determinado facto estiver sujeito a registo em que momento é que esse facto pode ser oponível a terceiros?
Artigo 5º CRP: depois da data do respetivo registo, portanto enquanto determinado facto sujeito a registo não
estiver registado não é oponível a terceiros.
Notas: O efeito consolidativo determina que o facto produz os seus efeitos jurídicos, mas esses efeitos jurídicos
não podem ser oponíveis a quem não é parte do negócio.
Do artigo 7º CRP resultam presunções derivadas do registo, e que presunções são estas? Que o direito existe
e que pertence ao titular inscrito, em primeiro lugar podemos afirmar que o registo está completo (não há
nenhum facto que devia estar registado e não está) e, em segundo lugar, os factos que estão registados são
válidos.
A é proprietário do imóvel X e B está interessado em comprar e A interessado em vender, por isso têm de fazer
um contrato de compra e venda. Quando fizeram a compra e venda, o direito extingue-se em A e aproveita
para B, artigo 408º CC, no entanto o registo continua em nome de A. Notas: O que determina o direto de B é
o próprio contrato, ou seja, o contrato de compra e venda celebrado entre A e B determinam que B passa a ter
o direito de propriedade sobre o imóvel.
Deste modo, é necessário que haja um registo por parte do notário (entidade que celebrou a escritura pública)
para que B seja, no registo, o proprietário. Se não registar, o único problema que pode surgir é o facto de não
conseguir opor o seu direito a terceiros.
Artigo 8º-B CRP: a obrigatoriedade de determinados sujeitos para registo está exposta neste artigo, na hipótese
o sujeito obrigado a registo é o notário, pois é este que celebra a escritura pública.
Notas: O que transmite o direito de A para B não é o registo, mas sim o contrato, o registo não vem acrescentar
nada relativamente à transmissão do direito.
O notário ao não registar imediatamente faz com que haja uma desconformidade entre a substância e o registo.
Substancialmente o direito é do B, mas no registo está determinado que é A aquele que é proprietário do imóvel
X, o que significa que se C (terceiro) for ao notário pedir uma certidão predial vai deparar-se com o facto de o
imóvel X ter como proprietário A, pois B ainda não está como proprietário nesse registo, apesar de já ter o seu
direito devido ao contrato de compra e venda estabelecido entre A e B.
Imaginemos agora que C depois de ter ido verificar o registo do imóvel X vai ter com A e propõe-lhe a compra
do imóvel. A, falido, aceita e vende o imóvel a C e automaticamente C vai registar o imóvel. Ora, A aquando

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pratica o negócio com C está a vender um bem alheio, pois já tinha vendido o mesmo imóvel a B e isto
demonstra-nos que, de facto, o negócio celebrado, em primeiro lugar, entre A e B, é válido.
O negócio celebrado entre A e C não produz efeitos devido ao facto de ser nulo, mas se assim for verificamos
que C só poderá ser indemnizado por A em termos de responsabilidade civil. Sendo o negócio nulo, aquando
o confronto entre B e C tem de prevalecer B pois foi o único que celebrou um negócio válido.
À partida prevalece o B, no entanto pela leitura do artigo 5º nº1 CRP, antes de o negócio feito entre A e B estar
registado, esse não é oponível contra terceiros pois só há uma oponibilidade erga omnes após a data do
respetivo registo.
Não obstante, C apesar de não ter adquirido o negócio porque o mesmo é nulo, adquiriu o direito por virtude
do registo, que neste caso tem um efeito atributivo. Notas: O registo terá um efeito atributivo quando é através
do registo que o sujeito adquire o direito que por via do negócio não adquiriria, a isto se chama aquisição
tabular (aquisição formulada por registo).
Imaginemos agora que A vende a B e B regista e que, posteriormente, B vende a C e C regista, é percetivel
que a verdade substantiva e a verdade registal coincidem. Agora imaginemos que o negócio celebrado entre
A e B é nulo, sendo o negócio nulo significa que o negócio celebrado entre C e B também é nulo, portanto o
imóvel que estava em nome de C regressa para A.
Nesta situação o problema traduz-se num problema de exatidão e nesse sentido, a presunção de que o direito
existe (artigo 7º CRP) não é verdade. A saber, a nulidade do negócio celebrado entre A e B projeta-se no
negócio celebrado entre B e C, então temos de nos questionar sobre de quem é o imóvel? Será do A por força
da nulidade ou do C devido ao registo? A resposta é: depende. Em princípio é de A, pois há uma prevalência
da verdade substantiva ou material. No entanto, em determinadas situações é do C, artigo 291º CC. O artigo
291º CC vai determinar quando é que vai prevalecer a posição de C e quando vai prevalecer a posição de A,
isto em função da verificação dos pressupostos do artigo 291º CC.

1 de outubro: Orientação
Teórica
Caso prático:
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A, proprietário de um apartamento, vendeu-o a B por escritura pública, com data de 1 de setembro de 2020. O
respetivo registo foi pedido e elaborado passados 15 dias.
Entretanto antes desse registo ter sido efetuado C credor de A registou uma penhora sobre diversos bens de
A, incluindo o apartamento vendido a B.
A ação executiva prosseguiu e o apartamento em causa foi vendido a D, prejudicialmente, por 150.000€ e
somente depois de esta venda ter sido efetuado é que B reagiu intentando a competente ação. Poderia a ação
decorrer ou não?
Resolução:
Quando ocorre um facto jurídico qualquer que implique transmissão ou constituição de direitos reais, a regra é
a de que o respetivo registo não seja elemento indispensável para a respetiva aquisição, artigo 408º nº1 CC,
aplicando ao caso.
Quando A vende a B desde que a venda seja válida (desde que não haja defeitos que impeçam a produção
de efeitos), B adquire a propriedade no instante em que faz a escritura pública de compra e venda, mesmo
que não tenha de imediato efetuado o registo. Notas: Quem pede o registo e quem faz o registo é o B, mas
em termos práticos quem tem a obrigação de pedir registo a favor de B é a entidade que formalizou a compra
e venda, no caso concreto seria o notário que lavrou a escritura pública.
Uma vez que, em geral, o registo não é constitutivo da aquisição, ou seja, do registo não depende a aquisição
do direito, podemos afirmar que o registo normalmente tem um efeito meramente consolidativo. O registo não
é requisito de aquisição, os direitos reais quando sejam adquiridos por contrato não dependem de registo para
serem adquiridos, não obstante enquanto o registo não for efetuado a situação daquele que beneficiou de um
facto sujeito a registo, a compra e venda, e não efetuou ainda o registo, está perante uma situação precária.
Então, os efeitos já se deram, mas enquanto não for efetuado o registo, B é proprietário a titulo precário porque
pode acontecer um azar, como aquele que aconteceu na hipótese, que impeça B de continuar proprietário.
Notas: B já é proprietário, ele já adquiriu o seu direito, mas a falta de registo pode impedir a manutenção da
sua titularidade, em virtude de outra pessoa qualquer ter adquirido um direito que se possa considerar
incompativel com aquele que foi adquirido por B.
No que toca a B, o registo é consolidativo porque do registo não depende a aquisição de um direito. No fundo,
o registo é determinado como consolidativo por exclusão de partes.
Notas: O registo é qualificado como consolidativo por exclusão de partes, pois desde que não seja constitutivo
ou desde que não seja enunciativo é consolidativo. Ora, desde que não se verifique um daqueles casos
excecionais em que o registo tem efeito enunciativo ou efeito constitutivo, o registo terá um efeito consolidativo.
Em geral, o registo é meramente consolidativo, apenas consolida, confirma, apenas torna definitivo aquele que
estava numa situação precária. O registo a favor de B, no caso concreto, é efetuado apenas 15 dias depois de
a compra e venda ter sido lavrada porque o notário não conseguiu pedir o registo antes disso. Provavelmente
não é imputável a B a falta de registo, no entanto o notário é que o representa a pedir o registo, por isso se há
um atraso, normalmente, este atraso não é imputável ao adquirente (sujeito ativo, B), sendo imputável ao
próprio notário (mas isto não é assim tão claro, são necessários erros, etc.).

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Como o registo de B não tinha sido feito atempadamente, C inscreveu a penhora sobre o apartamento que A
tinha vendido a B. Importa referir que a temos conhecimento sobre todos os factos da hipótese e, por isso,
sabemos que A tinha vendido primeiro a B, mas C não sabe pois só tem a informação que resulta do registo e
de acordo com o registo se B ainda não inscreveu a sua compra, o titular inscrito é o A. O presumível
proprietário de acordo com o registo é o A, apesar de ser uma falsa informação é a informação que vale e C
não tem maneira de saber se B comprou o apartamento ou outra pessoa qualquer.
O facto de C ter registado a penhora antes de B ter registado a compra, tem alguma utilidade? A resposta é
depende do conceito de terceiro que adotamos para efeitos de registo. No conceito amplo de terceiro, C é
certamente terceiro e, por isso pode fazer fé (assentar a sua confiança) no registo, ou seja, C. pode partir do
princípio de que A é proprietário e se eventualmente os requisitos do artigo 291º CC estiverem preenchidos a
favor de C, C irá prevalecer sobre B. Deste modo, B já não poderá reagir contra C.
Ao contrário, no conceito restrito de terceiro, C não é terceiro porque o direito que ele adquire (direito de
propriedade, penhora) não deriva da vontade de A. Notas: No conceito restrito de terceiro, só são terceiros
aqueles que adquirem direitos a partir do autor comum, na hipótese seria A, com a intervenção da vontade
desse autor comum. O direito que C adquire não é com intervenção da vontade de A porque a penhora é, para
todos os efeitos, um ato com cobertura judicial e um ato unilateral pois é C que nomeia a penhora, A não
intervém.
No conceito restrito, C mesmo que tenha tido o cuidado de registar a penhora o ato é, na mesma, inútil perante
B porque perante B, C não é terceiro. Isto significa que ao B tanto faz que haja C ou não, B vai prevalecer
perante C.
Notas: Quando é feita a penhora, B já podia ter reagido.
Artigo 824º CC.
Na venda executiva, o executado (o devedor) não intervém com a sua vontade pois o tribunal substitui-se ao
executado, na nossa hipótese, o tribunal substitui-se ao A declarando vender em nome de A os bens
penhorados em favor de quem for tido como comprador na venda executiva.
Aplicando ao caso prático, A vende a D os bens que C penhorou, mas vende porque o tribunal se intrometeu
e declarou vender, A não intervém com a sua vontade. É necessário saber isto, porque D no conceito amplo é
terceiro e pode invocar o efeito atributivo se os requisitos do artigo 291º CC estiverem preenchidos.
Ao contrário, no conceito restrito, D não é terceiro porque não adquiriu com a intervenção da vontade do
vendedor, A. A é forçado a vender porque o tribunal o substitui.
Na jurisprudência, tem-se adotado o conceito restrito de terceiro e perfilha-se esta orientação porque existe
um acórdão de uniformização de jurisprudência, Acórdão 3/99, onde se defende o conceito restrito.
No conceito amplo, tanto o C como o D são terceiros porque no conceito amplo não importa como é que se
adquiriu, se foi por contrato, se foi por um ato judicial, o que importa é que se tenha beneficiado de um facto
qualquer sujeito a registo, por isso quer C e D são terceiros. Então, para sabermos se C ou D são protegidos
temos de saber se C ou D estão nas condições do artigo 291º CC, dado que ambos estão a adquirir de um
sujeito que não tem legitimidade para lhes dar.
No conceito restrito só são terceiros aqueles que adquirem com a intervenção da vontade do alienante, B
adquiriu com a intervenção da vontade de A, mas quer C, quer D não adquiriram com a intervenção da vontade
de A. Ambos os atos que favorecem C e D, são atos judiciais, penhora e venda executiva.

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Conceitualmente, quer C, quer D não cabem no conceito restrito de terceiro porque os direitos que eles
adquirem não dependem da intervenção da vontade do A. Então, se não adquirem com a intervenção da
vontade de A não podem ser considerados terceiros, não sendo terceiros não podem invocar o efeito atributivo
(artigo 291º CC), isto significa que mesmo depois de tudo isto B ainda prevalecia.
B podia intentar ação contra D, pedindo ao D a restituição do apartamento e o reconhecimento de que B seria
o proprietário porque no conceito restrito de terceiro, D não teria qualquer proteção, mesmo tendo efetuado o
registo da compra e venda executiva, D não pode invocar o artigo 291º CC no conceito restrito de terceiro e,
por essa razão, não prevalece.
Pelo contrário, quem adotasse o conceito amplo teria que determinar que se D cumprisse os requisitos do
artigo 291º CC, seria D a prevalecer, então B perderia a propriedade para D na medida em que D conseguia
cumprir os requisitos do artigo 291º CC.

2 de outubro: Prática
O que acontece a um contrato se este for declarado nulo ou anulado? Artigo 289º CC, a declaração de nulidade
ou a anulação do negócio tem efeito retroativo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado. Portanto,
a situação que existia é reposta antes da celebração do negócio.
Caso prático:
Em 1 de fevereiro de 2015, A vende a B, por escritura pública o imóvel X e o contrato foi registado no mesmo
dia.
Em 1 de junho de 2019, quatro anos depois, foi proposta uma ação judicial destina a declarar nulo o cotrato
celebrado. A ação foi registada no mesmo dia. (Imaginemos que houve uma simulação).
Dia 10 de setembro de 2020, o tribunal declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado entre A e B.
Quid Juris?
Portanto, tendo o tribunal declarado nulo o contrato, o que é que aconteceu ao imóvel X, que à partida seria
de Bento?
Resposta:
Por força do artigo 289º CC o imóvel regressa ao A e importa referir que B terá direito ao regresso do dinheiro
que pagou ao A.
Caso prático 1:
Em 1 de fevereiro de 2015, A vende a B, por contrato reduzido a escrito, um quadro de Van Gogh, de que era
proprietário
Em 1 de junho de 2019, quatro anos depois, foi proposta uma ação judicial destina a declarar nulo o contrato
celebrado.
Dia 10 de setembro de 2020, o tribunal declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado entre A e B.
Quid Juris?
Resolução:
Notas: É de notar que os casos práticos são iguais o que muda é o objeto.

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O quadro de Van Gogh irá regressar à esfera jurídica de A porque é essa a regra do artigo 289º CC, pois se é
declarado nulo não produz quaisquer efeitos: A recupera o quadro e B recupera o dinheiro que deu a A pelo
valioso quadro.
Notas: Só existem dois sujeitos, o negócio que vinculou os sujeitos é nulo e por isso, os efeitos desse negócio
são destruídos e retoma-se a situação que existia antes da celebração do negócio.
Caso prático 2:
Em 1/02/2015, A vendeu a B, por contrato reduzido a escrito, um quadro de Van Gogh, de que era proprietário.
Dia 1/03/2015, B vendeu a C, por contrato reduzido a escrito, o referido quadro.
No dia 01/06/2019 foi proposta uma ação judicial destinada a declarar nulo o contrato celebrado e no dia
10/09/2020, o tribunal declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado entre A e B.
Quid Juris?
Resposta:
Importa entender que quando o tribunal declara nulo o contrato de compra e venda celebrado entre A e B, o
quadro está na posse de C, sujeito que praticou um ato de compra e venda com B sobre o mesmo quadro.
A invalidade do negócio A-B vai afetar os direitos de C, isto significa que se o negócio entre A e B for nulo,
significa que B nunca adquiriu o direito de propriedade sobre o quadro e, por essa razão, B nunca teve
legitimidade para vender a C. Então, a venda que B faz a C é nula porque é uma venda de bem alheio.
Portanto, se a venda A-B é nula, nula é também a venda B-C.
Mas os efeitos de declaração de nulidade do negócio A-B prejudicam os efeitos do negócio celebrado entre B
e C? Prejudicam o C? Prejudicam.
Então, se o negócio entre A e B é nulo, o negócio celebrado entre B e C também é, assim sendo e seguindo o
artigo 289º CC, o quadro Van Gogh iria voltar para o proprietário original, A.
O negócio B-C não tem nenhum vício próprio, mas tem um vício que vem por detrás, ou seja, a invalidade do
negócio entre A e B torna o negócio B-C, também, inválido. O negócio B-C não teria nenhum problema se o
negócio A-B não tivesse nenhum vício.
O vício do negócio A-B, destrói o negócio A-B e B-C devido às regras do artigo 289º CC.
Caso prático 3:
Em 01/02/2015, A vendeu a B, por escritura pública o imóvel X de que era proprietário e o contrato foi registado
no mesmo dia.
Em 01/03/2015, B vendeu a C, por escritura pública o imóvel X e o contrato foi registado no mesmo dia.
No dia 01/06/2019 foi proposta uma ação judicial destinada a declarar nulo o contrato celebrado. A ação foi
registada no mesmo dia
No dia10/09/2020, o tribunal declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado entre A e B. Quid Juris?
Resposta:

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O imóvel é de A, tal como está previsto no caso prático 2, a não ser que a lei diga que não é e , neste caso, a
lei vai dizer que não é e porquê? Porque temos de associar à regra do artigo 289º CC a situação do artigo 291º
CC que é aplicável, exclusivamente, se a coisa for imóvel ou se for uma coisa móvel sujeita a registo.
Ou seja, se a coisa for imóvel, um automóvel ou um barco o regime não é dado pelo artigo 289º CC, mas sim
pelo artigo 291º CC. Notas: Todas as coisas que não sejam móveis sujeitas a registo ou imóveis, o regime é o
do artigo 289º CC.
Artigo 291º CC: não basta que estejam em causa imóveis e móveis sujeitos a registo porque isso também
ocorre no artigo 289º CC, não resolvemos a hipótese pelo artigo 289º CC porque o artigo 291º CC ainda
necessita da existência de um sub-adquirente, ou seja, a existência de um sujeito que vai adquirir a seguir.
Então, quando existe um sub-adquirente dos mesmos bens temos de aplicar o artigo 291º CC.
Porque é que surge o artigo 291º CC? Surge para tentar compatibilizar a fé pública registal com o direito
substantivo e a invalidade dos negócios. A razão de ser do artigo 291º CC é exclusivamente o registo, se o
registo não estiver envolvido a solução nunca passa pelo artigo 291º CC, mas sim pelo artigo 289º CC.
Na medida em que se trate de um facto respeitante a imóveis, significa que a solução pode não ser o artigo
289º CC, se o Carlos, sub-adquirente, preencher os requisitos do artigo 291º CC. portanto nesse sentido, das
duas uma, ou o C está na posição do artigo 291º CC ou não está. Se C não estiver na posição do artigo 291º
CC, aplica-se o artigo 289º CC e este fica sem o imóvel X, por outro lado, se estiver perante a posição do artigo
291º CC fica com o imóvel através do efeito atributivo, sendo este efeito aquele que lhe vai dar o direito que C
não tinha pois este contrato é nulo (venda de bem alheio).
Quais são os requisitos que o artigoº 291 CC exige para que o efeito atributivo funcione?

1. Têm de dizer respeito a bens imóveis ou a bens móveis sujeitos a registo;


2. Tem de ter havido um sub-adquirente, o terceiro que adquire a partir do primeiro adquirente;
3. É preciso saber se este terceiro adquiriu através de negócio oneroso; Notas: No caso de C ter adquirido
por negócio gratuito, uma doação, o artigo 291º CC já não podia ser utilizado.
4. É necessário que C estivesse de boa fé, e este conceito está determinado no artigo 291º nº3 CC: é
necessário que o terceiro desconheça, sem culpa, o negócio anterior; Notas: De boa fé no sentido de
desconhecer no momento da aquisição o vício.
5. É preciso que o negócio celebrado com C não tenha nenhum vício próprio, este requisito não está
expressamente consagrado na norma;
6. É necessário que o registo da aquisição, ou seja, o registo da aquisição por parte de C seja anterior
ao registo da ação de nulidade porque se C tivesse acesso à ação judicial registada a declarar nulo o
negócio, por isso já não poderia ser protegido.
É necessário que no momento em que ele regista a aquisição, ainda não esteja registada a ação
judicial;
Para já, e verificando estes pressupostos, se o tribunal declarar nulo o contrato de compra e venda celebrado
entre A e B, C vai beneficiar do efeito atributivo do registo ficando com o imóvel e o A não fica com o imóvel,
sendo ressarcido nos termos da responsabilidade civil no valor correspondente.

7. Este requisito está patente no artigo 291º nº2 CC: se a ação de nulidade ou de anulação for proposta
e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio, os direitos do terceiro não são
reconhecidos. Notas: O Professor Sérgio afirma que faz sentido contar este prazo, de três anos, a
partir do segundo negócio porque o artigo 291º CC só será aplicável se surgir o terceiro. Como o

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artigo 291º CC está feito no pressuposto de que existe um sub-adquirente, está feito no pressuposto
da existência de um terceiro só faz sentido contar o prazo a partir do momento em que este terceiro
surge.
Considerando, o caso prático e verificando que de 2015 para 2019 vão 4 anos, então a ação entrou mais do
que três anos depois da data da celebração do segundo negócio (compra e venda entre B e C). Concluímos,
que o imóvel é de C porque, apesar de C ter adquirido a partir de um negócio inválido, C vai adquirir por força
do registo.
É o registo que atribui ao C o direito que ele não tinha por força do negócio, então o registo tem um efeito
atributivo e surge a denominada aquisição tabular, ou seja, aquisição derivada do registo.
Notas: Relativamente ao artigo 291º nº2 CC: se a ação de nulidade ou de anulação for proposta e registada
dentro dos três anos determinados, os direitos de terceiros não são reconhecidos.
Não sendo reconhecidos, a declaração de nulidade prejudica os direitos adquiridos por terceiro, por isso no
caso prático o imóvel seria de A, e utilizaríamos o artigo 289º CC.
A solução que estamos a dar, apenas está a funcionar para o sentido da fé-pública, ou seja, para as situações
lineares. Então, como é que isto se resolve no sentido negativo, ou seja, nas situações triangulares? Qual é a
diferença do sentido positivo e do sentido negativo da fé-pública?
A fé pública tem o duplo sentido (sentido positivo e sentido negativo) que resulta do artigo 7º CRP. No sentido
positivo (situação linear) os factos inscritos presumem-se que ocorreram e são válidos, tendo produzido os
seus efeitos.
O sentido negativo (na situação triangular) assenta na ideia de completude, ou seja, parte-se do princípio de
que todos os factos que deviam ter sido registados foram-no efetivamente, no fundo presume-se que o registo
está completo (não falta qualquer facto). Isto pode não acontecer no âmbito das situações triangulares.
8 de outubro: Orientação
Teórica
Caso prático:
A e B celebraram um pacto-preferência por força do qual o primeiro se obrigava a dar primazia ao segundo,
caso eventualmente decidisse vender um apartamento de que era proprietário.
Estabeleceram também que o pacto-preferência deveria ser dotado de eficácia real nos termos do artigo 421º
CC. Entretanto, passados 2 anos, A vendeu o referido apartamento a C sem proceder perante B à comunicação
a que se encontrava vinculado pelo disposto no artigo 416º CC.
No ano seguinte, C vendeu o mesmo imóvel a D.
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Só depois destes negócios terem sucedido é que B intentou ação de preferência. Poderá B intentar esta ação
de preferência? Em caso afirmativo, contra quem?
Resposta:
O direito que o B tem de proferir prevalecerá sobre as compras efetuadas tanto por C, como por D.
O pacto-preferência para ter eficácia real, nos termos do artigo 421º CC, supõe que foi lavrada (que está
contido) em escritura pública ou documento autenticado que o obrigado à preferência e o preferente acordaram
em atribuir eficácia real ao pacto-preferência e que, ainda, seja efetuado o registo a favor do B.
Na hipótese, B tem primazia na aquisição, mas uma primazia que devido ao facto de estar registado, valerá
entre as partes (A-B) e externamente, ou seja, perante C e D.
O obrigado à preferência, A, quando projeta vender, nos termos do artigo 416º CC, tem de efetuar uma
comunicação ao preferente, B, dando-lhe conhecimento do que está a pensar fazer e em que termos está a
pensar fazer. No caso prático verificamos que A nem sequer cumpriu essa obrigação, pois A vendeu a C o
mesmo apartamento e nem deu conhecimento a B de que estava a projetar fazer (a compra e venda).
No fundo, falta-nos saber em que situação é que o B fica perante esta alienação. E qual é? Ora, se o pacto-
preferência está dotado de eficácia real e se o respetivo registo foi realizado terá alguma utilidade prática.
A utilidade prática consiste no facto de ao ter eficácia (ao ter registo) a seu favor B poder exercer o seu direito
de preferência não apenas perante quem se obrigou a dar-lhe primazia, A, como, também, perante terceiros.
Como é que o B faz isto? Sempre que o pacto-preferência tenha eficácia real manda-se aplicar o disposto no
artigo 1410º CC.
Agora, contra quem é que B pode intentar uma ação de preferência e com que efeitos? Então, quando se pode
recorrer à ação de preferência o preferente que intenta a ação de preferência tem de aceitar, necessariamente,
os termos do contrato contra o qual pode intentar a ação de preferência. No caso prático, se o C pagou
100.000€ a A o B querendo preferir e recorrendo à ação de preferência tem que entregar ao C exatamente
aquilo que C tinha entregue a A nos termos em que o C tinha entregue a A.
Portanto, se B intentar a ação de preferência significa que vai ter de aceitar as condições contratadas entre A
e C porque o efeito da procedência da ação de preferência vai implicar uma sub-rogação pessoal ou uma
modificação subjetiva no contrato. O contrato A-C está feito e não é inválido só pelo facto de A não ter cumprido
a obrigação que dava preferência a B e isso, como qualquer obrigação não cumprida, pode implicar
responsabilidade por danos causados (responsabilidade obrigacional) e porque a proteção do interesse do B
até lhe interessa que o contrato A-C seja válido pois se não fosse válido o preferente não tem contra quem
preferir.
Quando o B intenta uma ação de preferência, tendo êxito, a decisão proferida nessa ação promove, decreta
uma substituição no contrato de compra e venda, ou seja, o contrato celebrado entre A-C mantém-se, o
vendedor permanece, as cláusulas contratadas permanecem todas, os efeitos mantêm-se, todavia, por efeito
da própria ação, o C é substituído pelo preferente. Daqui, entendemos que o preferente tem de entregar ao
terceiro, C, o que tinha entregue ao A porque a ideia é aproveitar o contrato tal e qual como estava feito, para
assim valer para outra pessoa.
Notas: Quando se intenta uma ação de preferência o efeito da procedência da ação é a substituição de pessoas
no contrato, de tal maneira que a decisão proferida na ação de preferência é apenas averbada no registo.

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No caso da hipótese, C já tinha alienado a outra pessoa, D e só depois é que aparece o B a preferir. B pode
ainda preferir não obstante o atual titular já não ser C, mas D?
Tratando-se de preferência legal, só está obrigado a dar preferência quem contratualmente que obrigou a dar
preferência, por isso só A é que estava obrigado a dar preferência a B. Assim sendo, na venda que A faz a C,
A estava obrigado nos termos do artigo 416º CC a fazer comunicação ao B, mas quando C vende a D, C não
contratou nada com B (C não estava obrigado a contratualmente a dar conhecimento ao B que estava a vender
a D em condições X e Y).
Então, se B quer preferir tem de necessariamente de preferir na compra e venda A-C, nunca na compra e
venda C-D.
A compra e venda entre C e D não se deve manter porque se o pacto-preferência tem eficácia real, estamos a
supor que foi registado, isto significa que quando C comprou a A sabia que havia um pacto-preferência entre
A e B, pois o pacto-preferência estava inscrito no registo. Além disto, quando D comprou a C sabia que havia
um pacto-preferência em vigor, pois o mesmo estava registado.
D não pode invocar que na sua compra e venda não houve violação da obrigação de dar preferência porque
na venda anterior (A-C) esse incumprimento deu-se. D não pode afirmar que não sabia que havia um pacto-
preferência em vigor, pois tinha de saber porque o mesmo estava inscrito no registo.
Se o B só tem preferência na compra e venda A-C, B só pode intentar ação contra C para se substituir ao C e
tem que depositar à ordem do C o preço que o preço declarou ter pago ao A, artigo 410º CC, isto para dar
alguma proteção a C.
No entanto, não adianta a B substituir-se ao C pois C já vendeu a D, por isso o atual proprietário é o D.
Vamos supor que a compra e venda A-C foi feita dia 1 de janeiro de 2018 e que a compra e venda C-D foi feita
dia 1 de janeiro de 2020 e, só depois desta data é que B intenta a ação de preferência só se conseguindo obter
a respetiva decisão em 2024. Supondo que esta decisão de 2024 é dada a favor de B, ou seja, reconhece que
ele tinha preferência e que ela não foi observada, nessa altura a decisão judicial decreta a substituição, B entra
no lugar de C, todavia isto nada adiante em termos práticos, pois C já não era o proprietário do imóvel.
Ainda assim, se dissermos que B entra no lugar de C significa que tudo se passa como se o C nunca tivesse
existido, então ficciona-se que o contrato celebrado entre A-C em 2018 foi celebrado entre A-B (ficciona-se que
nunca houve C). Então, para todos os efeitos considera-se que B comprou não na data em que obteve a
decisão judicial, mas considera-se que B comprou no dia 1 de janeiro de 2018. No fundo, tudo se passa como
se a compra e venda tivesse sido feita de origem entre A e B e não entre A e C.
Ora, a decisão proferida desde 2024 produz um efeito retroativo de colocar o preferente, B, na situação em
que estaria como se o contrato de compra e venda tivesse sido, desde logo, celebrado com B decorre que B é
o proprietário desde 2018. Isto determina que a compra e venda efetuada entre C e D feita em janeiro de 2020
é, para todos os efeitos, venda de bem alheio, o que significa que é nula nos termos do artigo 892º CC.
Na altura em que foi feita não era nula, pois C tinha legitimidade para vender porque a ação de preferência só
foi intentada depois da venda C-D.
Por fim, a ação tem de ser intentada contra C e este irá perder a sua posição contratual na venda e tem de
receber de B tudo aquilo que C tinha anteriormente entregue a A.

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D é afetado por repercussão, ou seja, o D também é afetado na medida em que a sua compra e venda passa
a ser nula por isso tem interesse em participar na ação.
Quanto ao A, os efeitos da compra e venda A-C não são afetados (permanecem), por isso A participar ou não
na ação é irrelevante pois para A é um “problema dos outros”. Não obstante, A por não ter cumprido a obrigação
de comunicação é que causou este caso prático, logo é o responsável pelas custas sociais, logo haverá razão
para que a ação seja, também, intentada contra A.
O A tem de intervir porque essas custas têm de correr por sua coisa pois A deu causa à situação ao não
cumprir a obrigação que incidia sobre o mesmo, nos termos do artigo 416º CC.
Notas: O artigo 291º CC protege terceiros contra invalidades provenientes de atos jurídicos anteriores ao seu.

9 de outubro: Prática
A primeira parte da aula foi sobre os casos práticos do dia 2 de outubro.
Importa saber que a transmissão do direito, nos termos do artigo 408º CC, não necessita da entrega da coisa,
sendo obrigação por parte do vendedor e mesmo que não entregue o direito é transmitido. Isto significa que
quando há uma compra e venda, mesmo quando não há a entrega da coisa o direito é transmitido no momento
em que o contrato é celebrado.
Quando se fala na titularidade temos de distinguir:

a) Titularidade efetiva;
b) Titularidade aparente: por exemplo, no caso de uma compra e venda sem a entrega do objeto, pode
aparentar que o direito pertence àquele que vende se o mesmo não tiver entregue a coisa.
Imaginemos uma situação triangular em que A vende a B um quadro e que não entrega o mesmo de imediato.
Mais tarde, A vende o mesmo quadro a C e entrega-o a C. Neste cenário podem surgir duas situações: o B
demonstra ao C que é o verdadeiro dono do quadro porque o mesmo comprou o primeiro lugar e C devolve
(devolvendo C pode tentar obter uma indemnização por parte de A por todos os danos que lhe causou e o
direito á restituição do preço que lhe pagou), no entanto pode dar-se o caso de C não querer devolver o quadro
ao B.
Ora, considerando que C não quer devolver o quadro a B pela via extrajudicial, a alternativa é que B reclame
o seu direito judicialmente através das ações petitórias. Notas: Ações de defesa da propriedade, sendo que
uma delas é a ação de reivindicação. Neste sentido, B terá de em tribunal a propor contra C uma ação de
reivindicação.
Qual é a vantagem de C? A lei estabelece a favor do mesmo uma presunção ilidível: quem tem a posse tem o
direito correspondente à posse, ou seja, pelo facto de C ter a posse do quadro tem a favor dele uma presunção
jurídica que determina que presumivelmente ele é o titular do direito, o que significa que vai caber a B o ónus
de provar que C não é o dono do quadro. B vai ter de provar que a compra que ele fez com A é anterior à
compra e venda A-C e fazendo a prova desses factos pedirá ao tribunal, no âmbito da ação de reivindicação,
que condene o C a devolver-lhe o quadro.
Deste modo, do ponto de vista de Direitos Reais o “assunto” ficou resolvido.
Do ponto de vista da responsabilidade civil, o C tem direito a pedir ao A a devolução do preço que pagou e,
ainda, a responsabilidade civil pelos danos que lhe causou. Além disso, B também pode demandar o A em

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responsabilidade civil sobretudo se tiver pedido uma ação judicial contra C que, obviamente, acarreta custos
e incómodos.
No fundo, se a situação triangular disser respeito a uma coisa móvel não sujeita a registo o terceiro, no caso
prático o C, nunca faz prevalecer a sua posição porque não há qualquer tipo de registo.
Notas: Coisas móveis sujeitas a registo: barcos, carros, aviões.
Caso prático:
A vende a B um imóvel por escritura pública registada, mas por acordo A ficou com as chaves e entregou-as
passados 7 dias.
Sendo que importa referir que o notário (responsável pelo registo) não registou a compra e venda
imediatamente.
Com a chaves na mão A dirigiu-se a outro notário e propõe a venda do imóvel a C e C aceitou. De imediato, A
entregou as chaves a C.
O notário que fez a escritura optou por registar imediatamente, ou seja, registou a aquisição.
Resolução:
Notas: A transmissão do direito não pressupõe registo, a não ser no caso em que o registo tenha um efeito
constitutivo, por exemplo a hipoteca.
O negócio A-C é nulo porque se A vendeu a B não pode vender a mesma coisa a B.
Artigo 5º CRP: este artigo vem determinar que os factos sujeitos a registo (a venda A-B é um facto sujeito a
registo) só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respetivo registo, considerando o caso prático
o negócio celebrado entre A e B estava sujeito a registo e só produzirá efeitos contra terceiros, ou seja, só é
oponível a terceiros depois de estar registado.
Quem são os terceiros? Artigo 5º nº4 CRP: são aqueles que tenham adquiridos direitos incompativeis, perante
o caso prático verificamos que estes direitos incompativeis estão presentes pois B e C reclamam o direito de
propriedade sobre o mesmo imóvel. Além disto é necessário verificar se a situação de incompatibilidade foi
causada pelo mesmo sujeito, e no caso prático foi, pois A vendeu o mesmo imóvel a B e a C.
Deste modo, podemos concluir que C é terceiro em relação a B.
Agora, parece que por força do registo C tem alguma hipótese de fazer prevalecer o seu direito isto porque B
apesar de ter comprado o imóvel em primeiro lugar, não consegue fazer valer o seu contrato contra terceiros
(o contrato não produz efeitos perante terceiros). Isto significa que o registo muda totalmente o cenário.
O proprietário do imóvel será C e não B.
B poderá ser indemnizado por A pelos danos que foram causados por este último.
B não consegue fazer valer a sua posição pois a falta de registo determina que o contrato celebrado com A da
compra e venda do imóvel não é oponível a terceiros, ou seja, é ineficaz perante terceiros.
Notas: O facto de C não saber que A já tinha vendido a B faz com que C beneficie da fé pública registal que
está presente no artigo 7º CRP.

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Isto significa que se C ficasse com o imóvel, C adquire, não por efeito do contrato que celebrou com A devido
ao facto de o contrato ser nulo, mas pelo facto de ter registado o contrato. Com. Isto, estamos a ver o efeito
atributivo do registo a funcionar, ou seja, é o registo de um facto inválido (compra e venda nula) que não
obstante atribui o direito ao C.
Do ponto de vista do artigo 5º CRP parece que o caso prático termina aqui, mas isso pode não ser verdade.
Vamos admitir que A combinou com C que ia vender o imóvel a B sem lhe dar as chaves e, posteriormente, A
venderia a C, sendo que C teria que imediatamente registar. Esta situação demonstra que a má fé é de A e de
C e, por essa razão, não faz sentido proteger C.
Vamos admitir agora que ao invés de C ter comprado o imóvel recebeu-o por doação, ou seja, adquiriu o imóvel
por titulo gratuito. Nesta situação não faria qualquer sentido proteger C pois B pagou um preço pelo imóvel.
Basta ser terceiro para beneficiar do efeito atributivo ou é necessário mais algum requisito? A resposta está no
artigo 291º CC especificamente para a situação linear, mas não podem deixar de ser aplicados às situações
triangulares porque o vício que está subjacente às situações lineares é o mesmo que está por detrás das
situações triangulares. Os requisitos necessários são: ser terceiro, estar de boa fé, tem de ter adquirido a titulo
oneroso, tem de ter registado a aquisição antes do registo da ação de nulidade, o negócio do próprio terceiro
não pode ter vícios próprios e não podem ter decorrido três anos quando qualquer ação seja intentada.
Portanto B tem três anos para propor a ação e registá-la para declarar nulo o negócio celebrado entre A e C,
considerando que se o fizer fará prevalecer a sua posição e não a de C.
O C apenas beneficiará do efeito atributivo se, para além de ser terceiro, estiver na situação do artigo 291º CC.
15 de outubro: Orientação
Teórica Caso prático:
A, B e C são comproprietários de um edifício com 3 andares. Convencionaram que cada qual ficaria com o uso
exclusivo de um desses andares.
Passados alguns anos, A vendeu a D o andar sobre o qual tinha uso exclusivo.
Os outros dois proprietários, terão preferência na aquisição?
Solução:
De acordo com o 1409º CC para os comproprietários terem direito de preferência temos de verificar os
seguintes requisitos:

1. Que se trata de venda ou dação em cumprimento (a compra e venda não tem de ser contratual, uma
venda judicial é considerada compra e venda);
2. Feita a estranhos, feita a terceiros, a quem não seja comproprietário;
3. A venda ou dação em cumprimento é da quota.
No caso concreto, A está a vender um apartamento, por isso não está a vender uma quota. O A é proprietário
exclusivo de 1/3 do edifício, mas não é proprietário exclusivo do apartamento pois pertence a A, B e C.

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B e C não têm preferência porque a preferência é dada para a venda ou dação em cumprimento da quota e
porque, nesta altura, a venda já está feita, por isso nesta altura (com a venda já feita) preferir significa substituir
D por B ou C. Agora, como é que o B ou o C vão substituir-se ao D se o D nada adquiriu? Resposta mais à
frente.
A compra e venda do apartamento como é do apartamento é compra e venda de parte especificada, A não
vendeu o seu 1/3, A vendeu o apartamento. Ora, se o edifício está em compropriedade, o apartamento é só
uma parte do edifício, por isso se o edifício está em compropriedade o A vendeu uma parte especificada da
coisa comum (vendeu um bocado do edifício).
No caso concreto, nem os três juntos poderiam vender o apartamento pois tinham de pôr o edifício em
propriedade horizontal e depois é que podiam, os três juntos, o apartamento em causa, porque antes disto o
apartamento seriam parte especificada da coisa. Notas: O facto de os três intervirem não significa que possam
vender.
O A não tem legitimidade para vender o apartamento, por isso estamos perante a venda de parte especificada
e o artigo 1408º nº2 CC a venda desta parte especificada é equiparada a venda de bem alheio (artigo 892º
CC), considerando que a venda de bem alheio é nula. Assim sendo e sabendo nós que a venda de A é
equiparada à venda de bem alheio, a venda de A é nula
Se a venda é nula, como é que B e C iriam substituir D? Para substituir temos de pressupor que os efeitos do
negócio ou ato jurídico se produziram, não faz sentido que B ou C ingressem no lugar de D, se D nada adquiriu
devido ao facto de o negócio ser nulo
Nem sequer teria sentido fazer a substituição porque não há substituição possível.
O B ou o C podem, em tese, exercer preferência, mas como? Notas: A razão de ser do direito de preferência
dos comproprietários é para ir conseguindo eliminando os outros comproprietários. Pode conjeturar-se
aproveitar a compra e venda de parte especificada (o que aconteceu na hipótese prática) e converter isso na
compra e venda de quota ideal, que é aquilo que o A pode fazer, através das regras gerais do artigo 293º CC.
No fundo, vamos verificar se através do artigo 293º CC é possível transformar a compra e venda de parte
especificada em venda de quota ideal, para que na sequência o B ou o C possam preferir (isto tudo na mesma
ação). B e C devem aproveitar o negócio nulo para ver se o conseguem validar com a venda de quota ideal.
De acordo com o 293º CC têm de ser cumpridos 3 requisitos:

1. Temos de ver se o negócio nulo, na hipótese venda de parte especificada, contém os requisitos
substanciais e formais para valer como venda de quota ideal.
Em termos formais, tratando-se de imóvel a venda de quota ideal sobre imóvel tem de ser feita por
escritura pública ou documento autenticado. Notas: O artigo 875º CC funciona neste caso também.
Em princípio esta compra e venda tal e qual foi feita não pode ter sido feita por escritura pública porque
para fazer a escritura pública de compra e venda quem faz a escritura tem de consultar o registo e, do
registo, em princípio, vai ser percetivel que os comproprietários são A, B e C, por essa razão o notário
tinha o dever de recusar fazer a escritura, dado que quem lhe aparece para vender é somente A, ao
invés dos 3 comproprietários.
E na hipótese havia outro problema, pois segundo o registo aquele apartamento não existiria pois só
haveria um edifício.

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Então, o notário tinha de recusar fazer escritura porque segundo o registo o A não era proprietário
exclusivo e depois porque, segundo o registo não há apartamento.
Em princípio faltaria forma, assim sendo considerando que faltaria forma a conversão do negócio nulo
para venda de quota ideal não seria possível;
2. Para que se faça conversão é necessário que a chamada vontade conjetural das partes esteja de
acordo com o negócio resultante da conversão, o raciocínio é: o que A e D fizeram foi a compra e
venda do apartamento, agora temos de perceber que se eles soubessem isto, ou seja, soubessem que
a venda do apartamento não valia se teriam ou não pretendido, querido a venda de 1/3 do edifício,
obviamente que A só queria retirar-se da compropriedade por isso A quereria a venda de 1/3 do
edifício, agora para o terceiro adquirente, D, uma coisa é ser proprietário de um apartamento que D
julga estar a adquirir exclusivamente e outra coisa é ser proprietário em conjunto com B e C de um
edifício.
Se são B ou C os interessados que pedem a nulidade para depois pedirem a conversão e,
posteriormente, exercerem a preferência para o D tanto faz porque D nunca iria adquirir. Ora, se não
se faz a conversão para preferência o negócio é nulo, D tens de restituir apartamento, A tem de restituir
o preço, de outra forma, se se faz a conversão para preferência é para B ou C, ou ambos, entrarem no
lugar do D. Portanto, de qualquer maneira, D nunca adquire ou porque é nulo ou porque que se
converte para preferência, então em termos práticos, de exercício da propriedade nunca há aquisição
para D. Assim sendo, por esta via tem-se entendido que nestas situações o terceiro adquirente não
pode opor-se à conversão.
B e C teriam preferência no pressuposto de que se fazia conversam da venda de partes especificadas para
venda de quota ideal.

16 de outubro: Prática
Efeito atributivo, este efeito tem um pressuposto necessário: o registo de um facto inválido, ou seja, o facto que
está a ser inscrito é um facto inválido.
A situação está prevista no artigo 291º CC a prepósito da situação linear.
A vende a B um imóvel e B regista a aquisição, B vende C e C regista a aquisição. Por força do artigo 408º CC
a transferência ou constituição de direitos reais dá-se por mero efeito do contrato e, quando é feito o pedido
de inscrição ao conservador este deverá conferir, no âmbito do princípio da legalidade, se existem ou não
vícios no próprio registo. Além disto, o conservador também deverá apreciar avaliar a validade substantiva do
facto que se pretende registar.
Os únicos meios de que o conservador dispõe para apreciar a validade substantiva dos factos são os
documentos que lhe são apresentados, imaginemos que a venda A-B é simulada a favor de B o negócio é
obviamente nulo, pois trata-se de uma simulação, no entanto está feito por escritura pública, por isso o
conservador não tem nenhuma forma de se aperceber da nulidade e regista a favor de B
Como sabemos, o conservador só pode recusar fazer registo quando haja nulidades manifestas.
Importa referir que o registo executado a favor de B não é nulo. Porquê? Porque não está enquadrado na
posição do artigo 3º CR, mas o negócio registado é nulo pois estamos perante uma simulação. Notas: Não
podemos confundir o negócio e o registo do negócio, sendo que são realidades distintas, diferentes.

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A partir do registo a favor de B, há presunções que decorrem do artigo 7º CRP no âmbito da fé pública: a
presunção de que o direito existe (o direito de propriedade de B) e que pertence ao titular inscrito (B).
Posteriormente, B decide vender ao C, fazendo escritura pública e C regista. O negócio B-C, em si mesmo,
não tem qualquer vício, porém o negócio A-B tem vícios que se vão repercutir no negócio B-C.
Agora imaginemos que existe um D que era credor de A, sendo credor quer nomear à penhora o imóvel que já
está em C, desconfiado D intenta uma ação destinada à declaração de nulidade do negócio A-B. Obviamente
que cabe a D alegar, demonstrar as provas dos factos em que fundamenta a invalidade do negócio A-B.
D vai propor uma ação judicial destinada à declaração de nulidade do negócio A-B e regista a mesma, pois
esta ação está sujeita a registo perante o artigo 3º b) CRP.
Nesta altura temos 4 registos:

1. Registo a favor de A;
2. Registo a favor de B;
3. Registo a favor de C;
4. Registo a favor de D sobre a ação de declaração de nulidade.
Admitindo que D faz a prova da simulação e que o tribunal profere uma sentença a declarar o negócio nulo.
Quid Juris? O que acontece ao imóvel? Quando é declarada a nulidade ou quando um negócio é anulado a
declaração não produz efeitos ex nunc, mas sim ex tunc, ou seja, não produz efeitos apenas para o futuro,
sendo que produz efeitos, também, para o passado.
Na medida em que a declaração de nulidade nos termos do artigo 289º CC tem efeito retroativo significa que
embora o negócio A-B tenha sido celebrado em 2010 e a sentença de nulidade só tenha sido proferida em
2020, tudo se passa como se o negócio celebrado em 2010 não tivesse sido celebrado.
A validade do negócio não afeta somente as partes, pois B vendeu o mesmo imóvel a C. A declaração de
nulidade do negócio A-B além de afetar as partes A-B, também vai afetar o C porque na medida em que a
declaração de nulidade faz com que o negócio celebrado entre A e B nunca tenha sido celebrado, e isto
determina que B nunca tenha tido o direito para vender a C.
A declaração de nulidade do negócio A-B vai, consequentemente, afetar a validade do negócio B-C. O negócio
B-C torna-se nulo, não por razão própria.
Neste sentido, o imóvel regressará à esfera jurídica de A, contudo isto vai prejudicar C. Notas: C pode
responsabilizar A e B em termos civis, mas a restituição do dinheiro ou uma indemnização não é equivalente
ao próprio bem.
Faz sentido prejudicar C? Ora, consoante o artigo 7º CRP presume-se que os factos registados são válidos e
eficazes, por isso C não tinha qualquer forma de saber o vício do negócio A-B.
Do ponto de vista material ou substantivo, faz sentido que o bem (imóvel) regresse ao A porque essa é a
consequência da nulidade, todavia, do ponto de vista registal, da fé pública não faz sentido que regresse ao A
faz é sentido que fique no C.
Importa destacar que se não estivessem em causa imóveis ou móveis sujeitos a registo não haveria qualquer
dúvida que o imóvel fosse voltar para A, porque a aplicação é o do artigo 289º CC. Notas: A solução é esta
quando em causa estejam móveis não sujeitos a registo porque não há qualquer registo.

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Quando há registo, temos de articular as regras substantivas com as regras registais.


O legislador arranja uma solução intermédia. Em determinadas circunstâncias vai prevalecer A e, noutros
casos, irá prevalecer C. Notas: Não há uma resposta única, pois é necessário verificarmos os requisitos
Nas situações em que prevalece o C, significa que C fica com o bem, não obstante importa perceber que C
não adquire através do negócio, mas sim através do registo: este registo. Tem um efeito atributivo.
Nas situações em que vai prevalecer o C, a prevalência do C não resulta do negócio que ele celebrou com B
pois esse negócio é nulo, resulta do facto de ter registado e, por isso dá-se a aquisição tabular. O que é a
aquisição tabular? Aquisição derivada do registo.
C adquire porque registou.
Notas: Na base de um registo com efeito atributivo, temos sempre um registo de um negócio inválido.
É o artigo 291º CC que nos vai dar a resposta, pois verificadas as situações deste artigo é o C que vai
prevalecer. Portanto, a regra geral é A ficar com o bem imóvel, mas se as condições do artigo 291º CC se
verificaram, C fica com o imóvel.
Notas: O artigo 291º CC funciona como exceção à regra e a regra é o do artigo 289º CC, ou seja, o direito real
em causa deve ser restituído, no fundo a situação anterior é reposta.
O efeito atributivo só funciona se todos os 5 requisitos (4 expressos e 1 implícito) do artigo 291º CC estiverem
todos verificados, ou seja, C prevalecerá se os 5 requisitos do artigo 291º CC estiverem verificados, a saber:

1. A declaração de nulidade ou anulação do negócio jurídico tem de considerar o negócio anterior, no


caso o negócio A-B e como objeto os negócios têm de ter bens imóveis ou bens móveis sujeitos a
registo (carros, barcos). Notas: Se a coisa não for imóvel ou móvel sujeito a registo o artigo 291º CC
nunca se aplica, e a solução está no artigo 289º CC;
2. O C tem de ter adquirido de B a titulo oneroso;
3. C tem de estar de boa fé, ou seja, desconhecer sem culpa o vício do negócio A-B no momento da
aquisição. Notas: A boa fé do terceiro é aferida no momento em que o mesmo compra, e não
posteriormente;
4. O negócio B-C não pode ter vícios próprios, e este requisito não está expressamente consagrado, ou
seja, tem de existir uma ausência de vícios próprios decorrentes do segundo negócio, B-C;
5. O registo da aquisição por parte de C tem de ser anterior ao registo da ação de nulidade ou de
anulação, pois se no momento em que regista a ação de declaração de nulidade ou anulação já está
registada, o terceiro tem, pelo menos a possibilidade de saber que há um vício no negócio A-B, por
isso já não pode invocar qualquer desconhecimento;
6. Artigo 291º nº2 CC: os direitos do terceiro não são, todavia, reconhecidos, se a ação for proposta e
registada dentro dos três anos posteriores à conclusão do negócio (o negócio a que nos estamos a
referir é o segundo e último negócio): se a ação tiver sido intentada nos três anos posteriores à
conclusão do segundo negócio, o bem imóvel pertence a A, ou seja, o problema será resolvido pelo
artigo 289º CC, no caso de ter intentado a ação depois dos três anos o imóvel é do C.
O C adquire por força efeito atributivo do registo, visto que o negócio B-C é nulo.
Notas: O artigo 291º CC aplica-se apenas quando determinada invalidade ou modificação vai produzir efeitos
em terceiras pessoas para além daquelas que integravam o negócio.

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Agora, em relação à matéria dos terceiros. Temos dois conceitos de terceiro:

1. Conceito amplo: perante o caso prático acima, C é terceiro porque, embora a situação de conflito não
tenha resultado da vontade de A, o conflito existe e como o conceito amplo dispensa a vontade do
causador, significa que C é terceiro.
São terceiros todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, veriam esse
direito ser arredado por qualquer facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente;
2. Conceito restrito: artigo 5º nº4 CRP, são terceiros todos os adquirentes de um mesmo transmitente
comum, de direitos incompativeis, sobre a mesma coisa.
O artigo 5º nº4 CRP não determinam um conceito de terceiro óbvio, pois o autor não é um transmitente, por
isso é que se discute o conceito de terceiro. Notas: A maior parte da doutrina defende o conceito restrito de
terceiro.

22 de outubro: Orientação
teórica 23 de outubro: Prática

29 de outubro: Orientação
Teórica Caso prático:
A e B são proprietários de terrenos contiguos. A construiu no seu terreno uma casa cujas janelas laterais se
encontram a 90cm da linha divisória entre os prédios.
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Ao fim de 14 anos, B levantou um muro encostado à linha divisória com altura suficiente para tapar as janelas
de A.
Terá A o direito de exigir a demolição desse muro?
Solução:
De acordo com o artigo 1360º CC aquele que faça uma edificação qualquer que tenha aberturas, ou seja,
janelas, portas, varandas, que permitam alguma espécie de indiscrição, que permitam alguma espécie de
intromissão ou invasão no prédio vizinho deve deixar 1 metro e meio entre qualquer dessas aberturas e a linha
divisória.
A questão das métricas é mais ou menos discutivel, porque é que não são 2 metros ou 90cm? O Professor
Gonzalez apenas pode acrescentar que é tradição ser 1 metro e meio.
O que importa é o A quando deixa as janelas abertas da maneira como deixou está a atuar contra a disposição
do artigo 1360º CC.
Notas: A restrição que é imposta pelo artigo 1360º CC (do 1 metro e meio) está estabelecido no interesse
privado, é para defesa do interesse dos vizinhos.
A defesa do interesse privado, do vizinho tem como consequência que o vizinho (protegido por essa restrição
de 1 metro e meio) pode abdicar dela, ou seja, o vizinho pode renunciar (em termos muito genéricos) à
vantagem que lhe é conferida pelo 1 metro e meio. O vizinho querendo pode abdicar da vantagem do 1 metro
e meio. Notas: Abdicar significa sempre consentir.
O vizinho pode consentir que o outro tenha a janela a menos de metro e meio, normalmente esse
consentimento há de ser um consentimento do artigo 340º CC, ou seja, há de ser o consentimento do lesado
que têm em vista apenas excluir a ilicitude da conduta alheia. Construir e deixar a abertura a menos de 1 metro
e meio é contrário à lei, por isso é ilícito, mas se o vizinho consentir a ilicitude fica excluída porque se verifica
uma causa de justificação de ilicitude (consentimento do afetado, do lesado). Sendo certo que o consentimento
tanto pode ser dado expressa, como tacitamente.
No caso concreto, até se poderia entender que o pelo facto de durante 14 anos B não ter criado qualquer
oposição, até se podia entender que havia um consentimento tácito. Não obstante, o consentimento, do artigo
340º CC, independentemente de ser expresso ou tácito, é um consentimento chamado tolerante, ou seja, esse
consentimento apenas confere ao beneficiário do consentimento uma tolerância.
Aquele que beneficia do consentimento, no fundo, está a beneficiar de um favor que o outro lhe está a conceder,
do ponto de vista prático tolerar é conceder um favor qualquer.
O A se tiver fundado apenas com o consentimento do B sem mais, A é apenas um detentor nos termos do
artigo 1253º b) CC e, portanto, não tem direitos que lhe sejam reconhecidos. Beneficiar da tolerância é isto
mesmo, beneficiar da tolerância é apenas ter uma condescendência de outra pessoa para a atuação, sem que
daí se possa retirar mais do que isso.
Aquele que beneficia apenas da tolerância quanto muito poderá, se a tolerância perdurar durante muito tempo,
como verificamos no caso prático, constituir abuso erguer um muro ao alto.
Eventualmente poderá levantar-se a hipótese de estarem decorridos os prazos decorrentes para usucapião e
A adquirir algum direito por via da usucapião, direito esse denominado de servidão, artigo 1362º CC.
A pode obter uma servidão.

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O que importa é, eventualmente, A pode obter uma servidão que lhe permita ter, no caso, as janelas abertas
a menos de 1 metro e meio. O prédio de A passa a ser o prédio dominante e o prédio de B passa a ser o prédio
serviente.
A servidão será legal ou voluntária? Será uma servidão voluntária, sendo voluntária só se pode constituir nos
termos do artigo 1547º nº1 CC, ou seja, contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família. Notas:
Para a servidão ser legal é necessário que exista o poder de constituir unilateralmente a própria servidão, do
artigo 1362º CC não parece resultar isto. Ora, não há nenhum indício de que A possa impor servidão
unilateralmente mesmo contra ou independentemente da vontade de B.
Notas: As servidões legais são as servidões que podem ser constituídas unilateralmente nos termos do artigo
1547º nº2 CC.
No caso prático, não há nada que indicie que seja assim.
Relativamente à servidão voluntária:
• No caso concreto, destinação do pai de família fica excluído porque a destinação do pai de família
pressupõe que, de início os dois prédios pertencessem ao mesmo dono;
• O testamento também não está presente no caso prático;
• O contrato, qualquer que ele seja, compra e venda, doação, permuta, entre outros, implica constituir
direitos sobre imóveis, por isso o contrato teria de ser necessariamente celebrado por escritura pública
ou por documento autenticado (são as fórmulas normais para se constituir direitos sobre imóveis.
Então, resta-nos, perante o caso prático a usucapião.
• Os prazos de usucapião sobre imóveis, ou seja, os prazos para adquirir direitos sobre imóveis são 10
anos, 15 anos ou 20 anos, artigos 1294º e 1296º CC. No entanto, os prazos mais curtos, os de 10 anos
ou de 15 anos, supõem uma de duas coisas: (1) ou a boa fé ou (2) que haja um titulo que
legitime a atuação, considerando a hipótese prática um titulo que legitime a atuação não existe. A
começou a atuar por sua própria iniciativa, não tem nada que legitime a sua atuação, não há nenhum
negócio que legitime a sua atuação.
Em princípio, A está de má fé. Notas: A boa fé consiste em ignorar que se lesa um direito alheio. Ora,
A não pode ignorar que quando abre a janela e está a 90cm que está a lesar o direito de B.
Então, dificilmente os prazos mais curtos, 10 e 15 anos, estariam preenchidos, mas a hipótese não é
excluída.
No caso de a servidão se tivesse constituído por usucapião, se existisse, de facto servidão, seria aparente ou
não aparente? Só as servidões aparentes é que se podem constituir por usucapião, artigos 1548º CC e 1293º
b) CC. Portanto, se a servidão se constituísse por usucapião, estamos no pressuposto de que seria aparente.
Notas: Só poderia ser uma servidão aparente porque as servidões aparentes são aquelas que se revelam por
sinais visíveis e permanentes.
A distância inferior a 1 metro e meio é um sinal visível ou extensivo, até, e permanente da provável existência
de uma servidão.
A saber, o efeito do registo é o efeito enunciativo porque a servidão já tem publicidade que decorre dos
próprios sinais visíveis e permanentes, no caso concreto artigo 5º nº2 b) CRP.
Em concreto, se A tivesse a servidão que lhe permitia ter as janelas a menos de 1 metro e meio, o B podia
construir o muro onde construiu ou não? Até a própria servidão de vistas não é exata, por isso as servidões

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de vistas são sempre conhecidas por ou servidão non aedificandi (servidões para não construir, para não
edificar) ou por servidão altius non tollendi (não construir acima de determinada altura).
A servidão de vistas é sempre para ver algo, o que vai implicar ou não construir acima de determinada altura
(para não tirar a vista) ou para não construir de todo para não retirar a vista.
Com esta servidão não se pode sustentar que o B não pode construir o muro, B pode construir o muro, a
existência da servidão não poderia ter uma implicação destas.
B pode elevar e instalar o muro como entende? Sim, a questão é se o B pode colocar o muro onde o colocou,
isto no suposto de que há servidão, ou se o muro deve ser colocado mais atrás.
Se houver servidão, a favor das janelas, o proprietário do prédio serviente, ou seja, o B pode construir o que
entender, mas o que edificar ou construir tem que guardar 1 metro e meio de distância em relação à janela que
tiver servidão, em relação à abertura que tiver servidão.
Então, se as janelas estavam a 90cm da linha divisória, significa que o muro tinha de recuar 60cm para que
ficasse a 1 metro e meio da janela. Esta servidão do artigo 1362º CC, a distância que o proprietário serviente
tem de observar é a distância em relação à própria abertura.
Em termos práticos, se B quiser fazer uma edificação com aberturas tem de deixar 1 metro e meio para a linha
divisória pois o artigo 1360º CC também funciona contra B, se ao contrário, B quiser fazer o quer que seja que
não tenha aberturas, então tem de deixar 1 metro e meio em relação às aberturas que tiverem servidão, ou
seja, não tem de deixar 1 metro e meio para a linha divisória.
A servidão do artigo 1362º CC tem como finalidade a obtenção de luz e de ar.
Claro que se o A tem várias janelas direcionadas para a linha divisória e a menos de 1 metro e meio, em rigor
tem de ter uma servidão para cada uma das janelas, pois cada janela tem de ter o seu benefício e para cada
janelas tal e qual ela lá estar, ou seja, se a janela for ampliada está em violação da servidão, A não poderia ter
uma janela maior sem ter servidão que justificasse essa janela.
Se o A quisesse abrir uma nova janela, porta, varanda, entre outras aberturas, teria de ter servidão para essa
abertura porque as servidões que existem são para as aberturas iniciais e não para novas aberturas.
A ideia é a de que a servidão dá sempre uma utilidade específica nos termos em que foi constituída.

30 de outubro: Prática
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atuação do B (importa referir que a atuação de B é ilícita) que impediu o exercício do direito de ação por conta
do titular da servidão, está inerte no sentido exato do termo.
A não agiu porque não lhe apeteceu, não quis, não tem dinheiro, etc., mas certamente podemos afirmar que
não agiu porque houve algum tipo de coação, pelo contrário, não houve coação nenhuma, por isso não agiu
porque não quis, não tinha dinheiro, etc.
Do que é que adianta qualificar a posse como violenta nestas circunstâncias se não é isso que impede o
decurso dos prazos possessórios? O Professor Gonzalez não vê razão para alargar o conceito de coação física
e dar-lhe um sentido unicamente de força física porque isso nada adiante, ou seja, não é por isso que os prazos
possessórios deixam de decorrer, dado que não há nenhum impedimento colocado à pessoa que podia reagir
por causa da utilização de força física.
No entanto, na jurisprudência o entendimento dominante é o inverso.
Outro exemplo, imaginemos que B além de ter colocado o muro a tapar a passagem de A, B (proprietário do
prédio serviente) está lá com uma caçadeira sentado, o que tinha como significado que se A saltasse o muro,
B dispararia.
Nesta situação, estaríamos perante uma coação moral e enquanto isto se mantivesse, os prazos possessórios
não podem estar a contar porque se o A não reage não se pode afirmar que não reage por inércia. A não reage
porque está pressionado a não reagir, e enquanto for assim e demonstrada a prova, os prazos não podem
estar a contar.

5 de novembro: Orientação
Teórica Caso prático:
A proprietário de um apartamento prometeu vendê-lo a B e este prometeu comprá-lo pelo preço de 1 milhão
de euros.
A entregou de imediato uma cópia das chaves a B, mas manteve outra chave consigo.
B instalou-se no apartamento e fez diversas obras especialmente na cozinha e na sala.
A situação permaneceu assim durante 16 anos.
B pretende, agora, invocar usucapião. Está em condições para isso?

Resolução:
Os prazos podem variar entre 15 e 20 anos, artigo 1296º CC.
Vamos apresentar um esquema de resolução pois as hipóteses sobre posse são como as hipóteses de penal
ou como as hipóteses de responsabilidade civil, o esquema é sempre o mesmo.
O esquema é, por pontos:

1. Temos de ver se há posse ou se há detenção. A saber, se houver detenção o resto do problema não
se coloca visto que a detenção juridicamente é irrelevante, ou seja, não tem efeitos. Portanto, quando
há detenção o resto de toda a matéria possessória é irrelevante.
Se entendermos que há posse, temos de verificar o seguinte;
2. Temos de identificar o modo de aquisição da posse, artigo 1263º CC;

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3. Identificado o modo de aquisição da posse, temos de verificar as espécies de posse, se é titulada, se


é não titulada, se é de boa fé ou de má fé.
Temos sempre de fazer isto, porque disto dependem os efeitos da posse.
A usucapião é um efeito da posse, portanto se neste caso entendêssemos que B tinha posse de má fé, o prazo
é um determinado prazo, se tivesse de boa fé, o prazo seria outro, por aí fora.
Na hipótese concreto, para sabermos se B tem posse ou detenção, não há maneira de entender se é posse
ou detenção sem atender às conceções de posse. A lei não toma opção, o que significa que a lei não nos
ajuda de uma forma óbvia para este efeito, por isso temos de ir verificar as conceções.
Temos duas conceções: (1) conceção objetiva da posse e (2) conceção subjetiva da posse.
1. Conceção objetiva: pela conceção objetiva há posse sempre que exista corpus, a menos que em alguma
situação particular a lei tenha dito que aquele corpus não se qualifica como posse, mas sim como detenção.
Na nossa hipótese há um pormenor que nos deixa muitas dúvidas: o facto de A entregaras chaves a B, mas
fica com uma cópia, por esta razão “dá para desconfiar” se verdadeiramente se desapossou ou não. O
Professor Gonzalez afirma que em princípio não, ou seja, que A não se desapossou, quem não dá as cópias
todas das chaves que tem é porque não confia.
Portanto, o Professor Gonzalez afirma que poderíamos configurar a entrega que o A faz ao B como um simples
ato de tolerância, artigo 1253º b) CC, porque A só entrega uma cópia das chaves e não entrega todas as
chaves.
Assim sendo, há uma situação em que a lei desvaloriza o corpus e o qualifica como detenção.
Então, mesmo pela conceção objetiva não teríamos posse, apenas teríamos detenção.
Notas: Na conceção objetiva isto funciona com o sistema “regra-exceção”: havendo corpus, por regra há posse,
então para haver detenção é preciso que alguma norma desvalorize o corpus qualificando-o como detenção.
Temos de verificar se, na situação em concreto, se ocorre uma exceção, se essa exceção ocorrer estaremos
perante detenção, se a exceção não estiver preenchida estamos perante a regra e a regra é a posse.
No caso concreto e na opinião do Professor Gonzalez, se o A não entrega todas as cópias das chaves, é
porque, em rigor, está apenas a tolerar que o B ocupe o apartamento, sem que esteja já a desapossar-se desse
mesmo apartamento.
Apesar de na conceção objetiva não valer muito fica a questão de sabermos o que é que vale (se é que vale
alguma coisa) o facto de o B ter feito obras e/ou reparações, todavia na conceção objetiva, em princípio isso
não tem relevância pois se já está verificada a exceção, B é unicamente detentor.
Notas: Se é detentor e a detenção não tem efeitos, nem vale a pena colocar em questão se ao fim dos 16 anos
B poderia invocar ou não usucapião, pois se é detentor não pode.
A detenção não é posse e se não é posse não tem efeitos. A saber, a usucapião é efeito da posse,
consequentemente se B é detentor não pode invocar usucapião, independentemente do tempo em que lá
estiver instalado.
Isto, a menos que tivesse ocorrido o que se denomina a inversão do titulo da posse, artigo 1265º CC, a favor
de B. No entanto, se isso tivesse acontecido só na data da inversão é que B iria adquirir posse, por isso os
prazos de usucapião só iriam começar a decorrer da data da inversão do titulo para a frente.
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A inversão é um modo pouco comum de aquisição da posse, mas pode suceder-se.


2. Conceção subjetiva: nesta conceção, para haver posse é necessário que estejam verificados dois
elementos: corpus + animus possidendi.
Notas: Para que alguém possa ter animus possidendi supõem-se que essa pessoa tem consciência do que
está a fazer, a pessoa que está em estado de coma com um relógio no pulso não se pode afirmar que essa
pessoa tem posse ou detenção porque, apesar de a coisa estar com a própria pessoa, a pessoa não tem
consciência de que está a deter algo.
Animus possidendi: intenção, prepósito de atuar como se fosse titular do direito.
Na conceção subjetiva é necessário provar-se as duas coisas, o corpus e o animus possidendi.
O B tem o corpus porque o apartamento está no seu poder e demonstra-se que B tem esse poder pelo facto
de estar a fazer obras no apartamento e o animus possidendi é que tem as suas dificuldades na conceção
subjetiva visto que é necessário avaliar se ele está presente ou não.
De acordo com a jurisprudência portuguesa, é quase unânime a adoção da conceção subjetiva e na conceção
subjetiva com o animus avaliado em concreto. Para sabermos se o B na conceção subjetiva com o animus
avaliado em concreto tem posse ou não é preciso verificar se os atos concretamente por ele praticados
manifestam a intenção de atuar como titular do direito de propriedade, no caso concreto, ou não.
Temos sempre em questão a cópia das chaves mas, por outro lado, o B instalou-se, B ocupa e está a usar o
apartamento para o fim próprio a que o apartamento se destina.
Além disto, B fez as tais obras, se estas obras pudessem ser vistas como benfeitorias tornaria mais evidente
a intenção do prepósito do B.
A conceção é subjetiva, ou seja, afirmar que os atos praticados são suficientes para permitir presumir o animus
é sempre uma questão de perspetiva, dependendo de quem aprecia. Não obstante, o Professor Gonzalez
considera que com os atos que foram praticados, neste caso, o mais certo seria poder afirma a existência de
animus possidendi.
A questão da ocupação por parte de B e, ainda, das obras realizadas por B são evidentes ao ponto de, desta
forma, B se considerar de facto o proprietário, mesmo não o sendo. Então, no caso concreto, há atos concretos
e suficiente que permitem presumir pela existência de animus e, depois, acresce, que a situação se encontra
há 16 anos da mesma forma. Notas: O facto de a situação ser a mesma há 16 anos é demonstrativo de que B
se está a comportar como se fosse proprietário.
Esta situação está constituída apenas, está fundada apenas num contrato-promessa por isso estamos perante
uma situação precária, mas ao fim de tantos anos pode entender-se que, pelo menos por isso, B está a
pretender atuar como se fosse proprietário do imóvel, mesmo não sendo.
Neste caso em concreto, pela conceção subjetiva e pelo animus avaliado em concreto teríamos a possibilidade
de afirmar posse a favor de B.
Se entendêssemos que a situação de B é qualificável como posse, ou seja, se adotássemos a conceção
subjetiva poderíamos colocar em questão se o B poderia invocar ou não usucapião por se encontrar instalado
há 16 anos. A resposta seria não porque nos termos do artigo 1296º CC os prazos de usucapião podem ser
de 15 ou de 20 anos, se entendermos que B tem posse a sua posse é não titulada, não está fundada, não está
legitimada num ato jurídico translativo (o contrato-promessa não é um ato translativo). Mesmo que o

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contrato-promessa seja válido, o contrato-promessa nunca é ato translativo, por esta razão a posse de B
deveria ter-se como posse não titulada.
Considerando a posse como não titulada, é presumivelmente de má fé, artigo 1260º nº2 CC. Com rigor, não
sabemos se é uma posse de boa fé ou de má fé, todavia, podemos afirmar que sendo não titulada presume-
se de imediato que a posse é de má fé. Notas: A presunção é ilidível, ou seja, admite prova em contrário. À
partida, enquanto essa prova não se fizer, a única certeza de que temos é que a posse sendo não titulada, é
presumida a posse de má fé.
Conclusão, mesmo que B tenha posse, a sua posse sendo não titulada e presume-se, por isso, de má fé,
exigiria que os prazos de usucapião fossem os máximos, ou seja, 20 anos, artigo 1296º CC.
Assim sendo, B não poderia invocar usucapião.
Sobre os prazos de usucapião:
Importa referir que os prazos de usucapião não têm de ser obrigatoriamente cumpridos pelo possuidor que
invoca a usucapião, ou seja, não tem de ser o possuidor que atualmente invoca a usucapião a cumprir na
íntegra os 15 ou 20 anos exigidos. Na prática, a lei admite que se juntem os tempos possessórios cumpridos
pelo possuidor atual (aquele que invoca usucapião) com os tempos possessórios de possuidores anteriores.
Por exemplo, o possuidor atual pode juntar os seus 10 anos de posse aos 5 anos de posse do possuidor
anterior, artigo 1256º CC. Para esta acessão, esta soma de tempos possessórios ocorrer é necessário que
haja nexo de derivação de uma posse para outra, ou seja, é necessário que o possuidor atual tenha adquirido
a sua posse a partir do possuidor anterior!
Notas: O raciocínio que se utiliza para avaliar o animus em abstrato é o mesmo que se utiliza para saber se a
posse é titulada ou não.

6 de novembro: Prática
Distinção entre a posse e a detenção
O artigo 1253º CC: a detenção é uma posse precária.
Falamos de posse causal e posse formal, e esta distinção é muito importante.
O que é que distingue a posse formal da posse causal? A posse, mediante o artigo 1251º CC, é um poder de
facto sobre uma determinada coisa, o que significa que o possuidor está a exercer sobre a coisa um
determinado poder de facto.
O poder de facto é exercido sobre uma coisa, quando um sujeito utiliza uma coisa está a exercer um poder de
facto sobre a coisa, logo o sujeito tem posse sobre essa coisa. O sujeito é possuidor da coisa porque está a
exercer sobre a coisa um poder de facto.
Porque é que o possuidor está a exercer aquele poder de facto? Por que razão é que o sujeito está a exercer
o poder de facto? O sujeito, ao contrário das outras pessoas, tem o direito sobre a coisa que lhe permite exercer
o poder de facto, o direito que tem sobre a coisa é o direito propriedade.
O direito de propriedade permite usar, fruir e dispor e o possuidor está a usar a coisa, o exercício do poder de
facto que o sujeito está a exercer sobre determinada coisa tem uma justificação juridicamente atendível: o facto
de o sujeito ter o direito que lhe permite a sua atuação, logo a esta posse denominamos posse causal.

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Quando é que a posse é causal? Quando o poder de facto está sustentado num direito real correspondente.

*
Terreno Terreno
do A * do B
*

*** No terreno do A há um caminho que está a favor de B. este caminho resultou de um contrato feito entre A
e B por escritura pública, nos termos do qual o A consentiu que B usasse o caminho. Então, que direito real
resultou do contrato celebrado entre A e B? Direito de servidão.
Por força desta servidão estamos a ver que B passa no caminho, ou seja, o B está a exercer um poder de facto
sobre o terreno que não é dele, que. é do A. B está a exercer esse poder de facto porque foi constituída a seu
favor uma servidão.
Então, se B está a exercer um poder de facto significa que tem posse, tem posse daquele caminho. E esta
posse é causal ou é formal? Se estiver assente num direito real é uma posse causal, se não estiver é formal.
Neste caso, é posse causal porque assenta da existência de um direito real, a servidão.
Então, quando alguém exerce um poder de facto sobre uma coisa e o exercício desse poder de facto está
sustentado no direito correspondente teremos posse causal, caso contrário não temos por causal. Por exemplo,
se B para além de passar no caminho, começar a cultivar o terreno de A, B estaria a exercer dois poderes de
facto sobre o terreno de A, um era passar no caminho e o outro era cultivar no terreno de A, em relação ao
cominho B tem uma posse causal, em relação ao cultivo a posse de B é formal porque o direito constituído a
favor de B não lhe permite cultivar.
No fundo, quando se fala em posse a posse pressupõe o exercício de um determinado poder de facto sobre
uma coisa, esse poder de facto, em relação à posse, existe sempre pois se não existir poder de facto não há
posse. O poder de facto é exercido da mesma maneira quer na posse causal, quer na posse formal.
Posse formal: se o B está a exercer um poder de facto, mas não tem como fundamento um direito real, significa
que a posse não tem uma causa. Quando o poder de facto não estiver acompanhado do direito que o suporta.
Estamos perante uma situação de detenção quando? Estamos perante uma situação de detenção quando não
existe posse formal porque, no fundo, a questão da detenção coloca-se ao nível da diferença entre posse
formal e posse precária. Notas: Não se discute a posse causal não se discute, se o sujeito tem o direito
correspondente à posse não há qualquer dúvida de que tem posse.
O problema coloca-se quando o sujeito não tem direito, mas exerce um determinado poder de facto sobre a
coisa, com isto temos uma posse formal ou uma posse precária (detenção).
Somos confrontados com várias posições e teses, ou seja, temos a chamadas:

1. Conceção objetiva da posse;


2. Conceção subjetiva da posse:
a) Conceção subjetiva em sentido concreto;
b) Conceção subjetiva em sentido abstrato.

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A posse assenta em dois pressupostos: o corpus e o animus. O corpus, de uma forma muito simples, é o poder
de facto sobre uma coisa. Notas: A posse, por via de regra, pressupõe o corpus, à partida não há posse sem
corpus.

1. Na conceção objetiva predomina o corpus, ou seja, nesta conceção se há corpus há posse formal.
Se alguém exerce poder de facto sobre uma coisa, em princípio será possuidor, exceto quando a lei determine
que ele não é.
À partida, na conceção objetiva, quem tem corpus, tem posse, a não ser que a lei determine o contrário.

2. Na conceção subjetiva já não é tão simples, nesta conceção temos de dar relevância está no animus.
O que é que é o animus? É o elemento intencional da posse, ou seja, o elemento intelectual da posse. Notas:
O corpus é o elemento material da posse.
A questão agora coloca-se perante a intenção do sujeito quando está a exercer aquele poder de facto.
Por exemplo, quem está a conduzir o comboio da CP é o maquinista, quem está a exercer o poder de facto
sobre o comboio é obviamente o maquinista, mas o maquinista é possuidor ou detentor? Se for possuidor
levante problemas, pois um dos efeitos da posse formal é a possibilidade da aquisição do direito por usucapião.
O maquinista corre o risco depois de 15 anos de adquirir o direito de propriedade do comboio enquanto
possuidor.
Um dos efeitos da posse formal é a possibilidade de aquisição do direito correspondente à posse.
Então, o maquinista embora esteja a exercer o poder de facto sobre a coisa, sobre o comboio, não tem o
animus e se não tem animus não tem posse.
Na conceção subjetiva interessa avaliar o elemento intencional do possuidor, o maquinista está a exercer
aquele direito em que termos? Como se fosse o verdeiro titular do direito real ou sabendo que não é, nem
querendo ser? Se o sujeito que não tem o direito (tem apenas o corpus) exerce o poder de facto com a intenção
de agir como beneficiário do direito, então o sujeito também tem o animus possidendi, o que determina que o
sujeito terá posse.
Se o sujeito está a exercer o poder de facto sem a intenção de existir como beneficiário do direito, embora o
sujeito tenha o corpus (poder de facto sobre a coisa) não tem o animus possidendi, por esta razão é detentor
e não possuidor.
A análise do animus pode ser feita em concreto e em abstrato.

a) Conceção subjetiva em sentido concreto


Em concreto temos de verificar a atuação daquele possuidor em determinado momento.

b) Conceção subjetivo em sentido abstrato


Em abstrato, temos de deslocar a atenção para o facto que determina a posse.
Vamos verificar exemplos.
A é proprietário de um imóvel, tudo o que analisarmos adiante temos de atender que A é proprietário do imóvel
X.

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A vai vender o imóvel X a B, entre A e B vai ser celebrado um contrato de compra e venda que tem por objeto
o imóvel X.
A faz um contrato de compra e venda do imóvel X a B por escritura pública e o B vai morar para o imóvel que
comprou ao A, isto significa que B está a exercer um poder de facto sobre o imóvel.
Agora temos três hipóteses:

1. Ou é possuidor causal;
2. Ou é possuidor formal;
3. Ou é detentor.
O B, do ponto de vista da posse, é possuidor causal, nesta hipótese, porque o poder que está a manifestar
tem na sua base o direito que ele adquiriu do A a partir do contrato que celebrou com A. Neste exemplo, B é
possuidor causal.
Agora, vamos admitir que este contrato de compra e venda não foi feito, afinal, por escritura pública e foi feito
por documento particular não autenticado. A única coisa que mudou foi a forma do contrato.
A posse do B, neste caso, é formal porque como o negócio é nulo não transmitiu um direito, mas transmitiu a
posse, então B é possuidor formal, ou seja, B comporta-se da mesma maneira que se comportava à pouco.
No exemplo anterior, como contrato de compra e venda do imóvel observou a forma legal correta, significa que
o A transmitiu ao B o direito que lhe permite a atuação.
Não obstante, com a falta de forma legal, o contrato é nulo, por isso o direito não se transmitiu, transmitiu-se
apenas a posse porque B encontra-se a viver no imóvel. Nesta altura, a posse não é acompanhada do direito
correspondente, logo estamos perante posse formal.
Notas: Do ponto de vista do corpus nada foi modificado. A diferença está no facto que determinou a posse.
Vamos agora admitir que A vai vender ao B, mas ainda não vendeu. Celebraram o contrato-promessa de
compra e venda e combinaram que iriam fazer o contrato definitivo no dia 1 de dezembro de 2020. B já pagou
o preço todo ao A e o A já entregou as chaves ao B para fazer as obras de remodelação.
O contrato definitivo só seria celebrado dia 1 de dezembro de 2020, mas B já está a exercer o poder de facto
sobre o imóvel. Será que B é possuidor? Formal ou causal? Ou é detentor? Depende.
Na conceção objetiva, o B, à partida é possuidor.
Na conceção subjetiva, temos de atender ao animus. Em relação ao animus das duas uma: (1) ou o animus
avaliado em concreto ou (2) animus avaliado em abstrato.
Embora haja divergências na doutrina, a jurisprudência direciona-se para a análise do animus em concreto.
Então, para além do corpus, vamos ter de verificar se os atos que o B praticou são compativeis com atos que
representam já o exercício do direito. B ainda não tem o direito, mas os atos que ele pratica são ou não
compativeis com o direito que se está a reclamar? Neste exemplo, tudo indicia que são.
B tem as chaves para fazer obras de remodelação, ora normalmente quem faz obras de remodelação é o
proprietário. B está, no fundo, a praticar atos materiais compativeis com o exercício de um direito que ele não
tem, como não tem direito, o B não tem posse causal, tem posse formal.
Todavia, tem posse e não detenção.

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Concluindo, B será possuidor na conceção objetiva e na conceção subjetiva será necessariamente possuidor,
isto quando a conceção subjetiva seja avaliada em concreto.
No caso de a conceção subjetiva ser avaliada em abstrato, B não será possuidor porque o facto que
fundamenta o exercício do poder de facto não é idóneo para transmitir o direito, porque é apenas um contrato-
promessa e através de um contrato-promessa não se transmite qualquer direito real.
O que é que distingue detenção da posse formal? Não existe uma mera distinção, temos de verificar em
primeiro lugar qual a conceção que vamos adotar e depois testar a conceção na situação que estaremos a
analisar.
Recapitulando, na conceção objetiva o elemento fulcral é o corpus sendo que havendo corpus, à partida, há
posse. Na conceção subjetiva não basta o corpus, tem de existir o animus.
Como é que analisamos o animus? Em concreto ou em abstrato. Em concreto temos de verificar se na atuação
de determinado sujeito há um comportamento compativel com o chamado animus possidendi, no fundo o
sujeito está a atuar como se tivesse o direito.
Em abstrato, não interesse a atuação em concreto, interessa sim, saber, qual é o facto que determina o poder
de facto.
Imaginemos agora que A e B celebram um contrato de compra e venda de um imóvel por documento particular
não autenticado, neste caso e como o contrato é nulo não são transmitidos direitos. B é possuidor na conceção
subjetiva em abstrato? Na conceção subjetiva avaliada em abstrato é possuidor porque o contrato de compra
e venda tem um efeito translativo, mas não transmite o direito porque há um vício de forma.
A detenção não confere nenhum direito particular e a posse confere, direito a frutos, direito a benfeitorias e a
usucapião. Através da usucapião o possuidor formal pode invocá-la e adquirir o direito que não tinha, ou seja,
o possuidor formal pode adquirir por usucapião o direito correspondente à sua posse e isto não está ao alcance
do detentor.
A única posse que o detentor tem é se ele próprio passar a possuidor através da figura da inversão do titulo.
O que é a inversão do titulo? Forma de o detentor passar a possuidor formal, através de oposição, artigo 1265º
CC. A partir do momento em que o detentor inverter o titulo da posse passa a ser possuidor formal e a partir
daí começam a decorrer os prazos para a usucapião.
Artigo 1268º CC: quem tem a posse beneficia de uma presunção de que tem direito, isto é importante porque
quem tem de provar que aquele que aparenta ter posse não é o proprietário é aquele que quer demonstrar que
o sujeito que detém a coisa não é proprietário.
Isto é importante quando em questão temos coisas móveis não sujeitas a registo, por isso a lei estabelece um
princípio muito simples: quem tem a posse presume-se que tem o direito. Cabe àquele que pretenda invocar o
direito demonstrar o contrário, por isso é que numa ação de reivindicação o sujeito que reivindica vai ter, antes
de mais nada, de provar que é detentor do direito porque o sujeito contra quem reivindica tem a seu favor a
presunção da existência do direito, então a prova tem de ser feita pelo reivindicante.

12 de novembro: Orientação
Teórica Caso prático:
A proprietário de um apartamento prometeu vendê-lo a B por 400.000€. No momento em que o sinal foi
entregue A entregou a B as chaves do apartamento.
Embora tivessem combinado a celebração da escritura de compra e venda para dali a 6 meses, a verdade é
que ao fim de 8 anos a situação permanecia idêntica.
Por isso B vendeu o referido apartamento a C e em simultâneo este deu-o em hipoteca a favor do Banco X.
Aprecie a situação possessória dos intervenientes.
Solução da hipótese:
Em relação ao A, não temos elemento suficientes, por isso partimos do princípio de que A é proprietário e, por
isso, é possuidor causal.
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O B como promitente comprador que obteve a entrega da coisa, a saber se o apartamento não tivesse sido
entregue ao B o problema de ele ter posse ou detenção não se colocaria. Por esta razão, estamos no
pressuposto de que a entrega foi efetuada, caso contrário não valeria apena entrar na discussão.
Tendo o promitente comprador obtido a entrega da coisa a questão seguinte é: saber se tem posse ou detenção
porque os efeitos que a lei associa à posse, não associa à detenção.
Para evitar dúvidas, para o Professor Gonzalez, o melhor é abrir as duas sub-hipóteses.
De acordo com a conceção subjetiva da posse, aquela que é usualmente utilizada pelos tribunais, para haver
posse tem de existir o animus possidendi. O animus possidendi presume-se a partir dosa tos concretamente
praticados.
É verdade que na jurisprudência tendencialmente, diz-se que no caso de contrato-promessa presume-se que
o promitente comprador em princípio apenas tem detenção e só excecionalmente é que terá posse, no entanto
este raciocínio é meramente formal porque o que importa é saber os atos praticados, neste caso, pelo B a titulo
de promitente comprador são suficientes para presumir o animus possidendi ou não.
Se A se limitou a entregar as chaves e o B a recebê-las e o B eventualmente terá feito alguma mudança ou
colocação de móveis no apartamento, isto é claramente um ato de mera tolerância, ou seja, podemos concluir
que nesta situação, só assim, o A apenas está a tolerar que B se instale e portanto do lado do B não pode
existir mais do que posse precária (detenção e posse precária é a mesma coisa), nos termos do artigo 1253º
b) CC. Caso contrário, no caso de B ter praticado atos em quantidade e com a intensidade suficiente para se
poder presumir o animus possidendi teria posse.
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Se o B se instalou e está a habitar o apartamento, se tivesse contratado os serviços de luz, gás, telefone e
televisão, se está a pagar as prestações de condomínio e se até fez alguma benfeitoria, se o preço já está todo
ou quase todo pago ao abrigo do contrato-promessa presumindo que isso aconteceu visto que, perante o caso,
já passaram 8 anos, nestas situações e com este conjunto de circunstâncias poderíamos partir do princípio de
que para as partes a escritura de compra e venda funciona como uma formalidade e nada mais do que isso.
Todos os efeitos práticos da compra e venda foram produzidos ao abrigo do contrato-promessa e, por isso e
consoante as circunstâncias acima descritas, fazer a escritura, no fundo, em termos práticos é fazer um papel.
Sabemos que juridicamente a venda não está efetuada enquanto a escritura ou o documento autenticado
dessa compra e venda não estiver outorgada, mas, na prática se tudo isto tivesse acontecido poder-se-ia dizer
que o B estava na posse, posse esta formal, pois se a compra e venda não estiver celebrada o proprietário
juridicamente continua a ser o A. Notas: Na prática não seria A, mas a prática é irrelevante para este efeito.
Temos de ir pelas duas sub-hipóteses.
Se B apenas é detentor, o resto dos problemas não se colocam, se o B não passa de um detentor, não importa
estar a identificar modos de aquisição da posse, nem características da posse, pois é só detentor.
Ao contrário, se entendêssemos que B tinha posse, se entendêssemos que pelos atos praticados B tinha
animus possidendi e portanto tinha posse, teríamos posteriormente de identificar o modo de aquisição da
posse. Como é que o B teria adquirido posse nesta situação? Qual seria o modo de aquisição da posse? Se B
tivesse posse, como é que a teria adquirido? Em princípio, no caso concreto, será entrega.
Por exclusão de partes, a inversão do titulo da posse supõe que aquele que adquiriu posse antes era detentor
e o B antes de ser possuidor não era detentor. Notas: Neste caso estamos a supor que B é possuidor, por isso
antes não seria detentor.
A traditio brevi manu é a mesma coisa, supõe que aquele que adquire posse antes era detentor.
O constituto possessório é um modo de aquisição de posse muito particular que supõe uma situação que no
caso não se verifica, supõe que quem transmitiu posse permanece como detentor, artigo 1264º nº1 CC.
Conclusão, só restaria ou prática reiterada ou entrega. Ora a prática reiterada é um modo de aquisição
originário e no caso concreto, o A ao entregar ao B está a colaborar, a cooperar na aquisição no domínio de
facto pelo B. Portanto, em princípio a aquisição originária não seria concebível no caso concreto.
Isto significa que o B só poderia ter adquirido posse, no caso concreto, pela alínea b) do artigo 1263º CC.
Se foi assim, é necessário analisar a espécie de posse. Temos de classificar a posse que B adquiriu.
A posse é titulada ou não titulada? Artigo 1259º CC, a posse para ser titulada tem que estar justificada num
ato translativo ou num ato constitutivo do direito real ao qual essa posse se refere. Se estamos a supor que o
B tem posse de proprietário, o natura, neste caso, é presumirmos que o animus possidendi do B se refere à
propriedade, portanto para a posse ser titulada teria de se provar a existência de um ato translativo da
propriedade, mesmo que esse ato fosse inválido, seria necessário demonstrar que esse ato existia.
O caso prático demonstra-nos um contrato-promessa de compra e venda, um contrato-promessa de compra e
venda válido ou inválido nunca é um ato translativo. O contrato-promessa nunca se pode visualizar como ato
jurídico translativo ou constitutivo, no caso seria translativo.
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Conclusão, a posse do B teria de ser não titulada, pois não existe qualquer ato translativo ou constitutivo que
sustente essa mesma posse.
Se a posse é não titulada, presumivelmente é de má fé, artigo 1260º nº2 CC.
Com os elementos que temos não dá para ir mais longe porque saber se a posse é pública ou oculta ou saber
se a posse é pacífica ou violenta, é necessário termos mais elementos.
Geralmente, nas hipóteses possessórias estas duas primeiras classificações (titulada ou não titulada e boa fé
ou má fé) atingem-se com facilidade porque está sempre esclarecido na hipótese, as outras classificações vão
depender dos dados presentes no caso prático e neste caso prático não temos dados suficientes para afirmar
isto ou aquilo.
Agora, vamos passar para a situação do C.
A situação do C depende da situação do B, dependa da situação em que o próprio B estiver, por isso temos
de atender às duas sub-hipóteses.
O B vende a C, mas não sabemos em que posição possessória é que este se encontra.
Temos de pressupor que B vende a C e, ainda, que entrega ao C, pois se não faz a entrega não vale a pena
levantar qualquer questão possessória em relação ao C porque se não obteve o domínio de facto sobre a coisa
para se poder discutir se é posse ou detenção.
Se B vende ao C e entrega ao C, considerando B como detentor, ou seja, na sub-hipótese de B ser detentor,
pode C ter adquirido posse ou não? Se sim, como? Qual o modo de aquisição de posse que funcionaria? De
todos os modos de aquisição da posse só há um que pode funcionar para o C.
A situação do C é, num ponto, diferente da situação do B. C comprou, C não tem uma promessa de compra e
venda, C tem compra, C tem o contrato translativo a seu favor. A saber, quem adquire através de um contrato
translativo tem que se presumir que atua com animus possidendi, aquele que compra o quer que seja, no caso
aquele que compra o apartamento, em função do ato que pratica temos de presumir que atua como se fosse
proprietário, por isso o animus consegue-se identificar logo.
Portanto, passamos à frente a questão de analisarmos se C tem posse ou detenção porque quase
garantidamente que tem posse. Então, falta saber se tem modo e qual o modo de aquisição que está a
funcionar a favor de C.
Por exclusão de partes, quer a inversão do titulo da posse, quer a tradito brevi manu supõem que aquele que
adquire posse antes de adquirir posse fosse detentor, e no caso C antes de adquirir posse nada era. Logo,
inversão do titulo da posse e traditio brevi manu não se coloca em questão.
O constituto possessório passa-se da mesma forma, ou seja, o constituto possessório supõe que aquele que
transmite a posse permaneça como detentor, o que transmitiria, no caso, seria o B, mas B não continua como
detentor, por isso o problema não se põe.
Assim sendo, restam-nos prática reiterada de atos materiais, artigo 1263º a) CC, e entrega da coisa. Se B
vendeu ao C terá efetuado a entrega, por isso a mais natural seria a entrega da coisa.
Essa entrega, na primeira sub-hipótese, se é efetuada pelo B como detentor, não chega para que o C adquira
posse por essa via (pela entrega) porque como afirma o artigo 1263º b) CC: a entrega só é modo de aquisição
da posse quando seja efetuada pelo anterior possuidor. Se partimos do princípio e se estamos no pressuposto
de que B é detentor, mesmo que B entregue está a entregar não como possuidor, mas como

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detentor, o que tem como consequência o facto de o modo de aquisição da posse do artigo 1263º b) CC não
pode estar a funcionar para C visto que temos como pressuposto de que B é detentor.
Quando B entrega coloca o apartamento à disposição de C e, por isso, permite que por via da prática reiterada
de atos materiais o C eventualmente adquira posse.
Ao contrário, se entendermos que B a titulo de promitente comprador fosse possuidor, ou seja, B tivesse posse
o C adquire posse pela entrega nos termos da alínea b) do artigo 1263º CC.
A ideia é a de que se a entrega é efetuada pelo detentor o que recebe não pode estar a adquirir posse por
essa entrega porque ela não está a ser efetuada pelo anterior possuidor, nesta hipótese o que recebe só pode
estar a adquirir posse pela alínea a) do artigo 1263º CC, o tal apossamento. Ao contrário, se a entrega é
efetuada por quem é possuidor, quem recebe adquire pela entrega, funciona o artigo1263º b) CC.
No caso concreto, teríamos de abrir as sub-hipóteses porque estamos a assentar que não temos certezas de
se B é detentor ou possuidor.
Características da posse de C. A posse de C é titulada ou não titulada?
Para haver titulo da posse, para a posse ser titulada supomos três coisas: pressupomos que existe um titulo,
ou seja, um ato jurídico translativo ou constitutivo e no caso existe, isto quer dizer que mesmo que tenha sido
celebrado um ato translativo ou constitutivo de um direito real mas a lei sancione esse ato com inexistência
jurídica, por exemplo coação física, para todos os efeitos não existiu.
Uma aquisição de posse fundada numa compra e venda celebrada por coação física é posse não titulada, pois
juridicamente a compra e venda não existiu.
Depois, supõe-se que existindo um ato jurídico translativo ou constitutivo do direito ao qual a posse se refere,
ele seja substancialmente inválido, ou seja, tenha um vício qualquer de ordem substancial, portanto que não
seja um vício formal.
O terceiro requisito é o de que esse ato translativo ou constitutivo de um direito real tenha observado a forma
que a lei exige para ele próprio.
Este ato translativo ou constitutivo não é da posse, a posse adquire-se nos termos do artigo 1263º CC.
O que é preciso saber é se a justificar a posse existe ou não um ato translativo ou constitutivo do direito ao
qual essa posse se refere. Neste caso e no caso do C, se esta posse se refere à propriedade do apartamento
teríamos de supor a existência de um ato translativo ou constitutivo da propriedade, mas também temos de
supor que este ato translativo ou constitutivo é inválido, se é válido então o próprio direito de propriedade está
a ser transmitido, ou seja, se o ato translativo ou constitutivo é válido a posse do C seria posse causal e se a
posse fosse causal, esta não se classificaria. Notas: A posse causal não pode ser classificada, não faz sentido
que a posse causal possa ser não titulada, não faz sentido, não pode ser classificada de boa ou má fé, não faz
sentido. A posse causal é aquela que está fundada no direito que existe, se o direito existe aquele que é
proprietário não está de boa, nem de má fé, está unicamente a exercer o seu direito.
No caso concreto, de B para C há uma compra e venda, o que determina que há um ato translativo ou
constitutivo de um direito real. Esta compra e venda é substancialmente inválida, o B está a vender ao C o que
não é dele, pois juridicamente não tendo havido a compra e venda de A para B, o A continua a ser o proprietário,
o que determina que quando B vende ao C, para todos os efeitos, B está a vender um bem alheio. A saber,
isto não é impedimento para que a posse seja titulada, porque o vício é substancial, a falta de

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legitimidade de B é um defeito de substância, portanto a venda é nula, mas isto não impede que seja tida como
titulo para este efeito e não impede a posse do C seja titulada.
Não obstante, há outro defeito que está implícito que é o de se B é apenas promitente comprador para todos
os efeitos, não tem o registo de aquisição de propriedade a seu favor, ou seja, B não apresentou nada a registo
que pudesse justificar a transmissão de propriedade. Para todos os efeitos, do ponto de vista jurídico, ele não
passe de promitente comprador, mesmo que seja possuidor é promitente comprador. Isto significa que B não
pode ter registo de transmissão de propriedade a seu favor.
B não podendo ter registo da propriedade a seu favor, quem lavra a escritura pública ou quem lavra o
documento autenticado de compra e venda não pode fazer a escritura de compra e venda, não deve pois não
está comprovada a legitimidade do vendedor em função da certidão do registo predial, por isso a formalização
da escritura pública de compra e venda de B-C não pode ser obtida porque falta um pressuposto para que ela
possa ser efetuada.
Esta compra e venda B-C não pode, na prática, ter sido feita por escritura pública ou por documento
autenticado. No limite, podemos supor que no limite o notário que fez a escritura pública que não sabe que B
não poderia vender a C pois não está inscrito no registo como proprietário. Na prática, esta hipótese nem
sequer se coloca.
A venda B-C tem garantidamente um vício substancial, a falta de legitimidade de B e quase garantidamente
um vício formal, falta de forma.
Em resumo, a posse de C seria, então, posse não titulada. Como a posse é não titulada presumivelmente
afirmamos que a posse é de má fé, artigo 1260º nº2 CC.
Por fim, perguntar pela situação possessória do credor hipotecário, ou seja, do Banco X não tem sentido porque
a constituição de hipoteca nunca implica a transferência possessória. A coisa hipotecada nunca é transferida
para o credor hipotecário, por isso o credor hipotecário nunca tem posse e nunca tem detenção, pois a coisa
“nunca lhe chega à mão”.
O efeito do registo da hipoteca é constitutivo, ou seja, não havendo registo não há hipoteca. Ora, como B não
tinha registo de aquisição, C não podia ter registo de aquisição, não tendo C registo de aquisição a hipoteca
não se pode registar. Por isso, em rigor, a hipoteca nem sequer existe, juridicamente a hipoteca nem existe.
Mesmo que tenha sido celebrado o contrato constitutivo da hipoteca, a hipoteca não existirá porque não há
registo possível que possa ser feito e mesmo que fosse feito o registo seria nulo porque seria feito em violação
do trato sucessivo, artigo 16º CRP.

13 de novembro: Prática
Um aluno colocou uma dúvida sobre o caso prático que o Professor Gonzalez fez na aula anterior.
É preciso verificar quando é que estamos perante uma situação de posse, e houver posse temos de
demonstrar como é que a mesma foi adquirida e ainda caracterizar a própria posse.
Para estes efeitos, estamos obviamente a falar de posse formal, pois a posse causal é aquela posse que não
suscita dúvidas.
Posse causal: aquela que está suportada pela existência do direito real correspondente.

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A distinção entre posse causal e formal é fácil: será possuidor causal o possuidor que exercer o poder de facto
suportado no direito real que lhe dá esse poder, não será possuidor causal aquele que exercer o poder de
facto sem ter o direito.
A saber, se determinada pessoa está a exercer poder de facto sobre uma coisa e se não tiver o direito real
correspondente o possuidor não é causal, mas mesmo assim não sabemos se é possuidor formal ou detentor,
depende do caso e da situação.
A detenção não confere nenhuma vantagem e a posse formal oferece bastantes vantagens.
Exemplo 1:
A celebrou um contrato-promessa de compra e venda do imóvel Y com B, e isto significa que ficaram de
celebrar o contrato definitivo de compra e venda. Nesta sequência, B pagou uma quantia a titulo de sinal e A
entregou as chaves ao B.
B foi viver para o apartamento Y.
Isto significa que B está a exercer um poder de facto sobre a coisa. Será que B é possuidor causal devido ao
contrato-promessa de compra e venda celebrado com A? Não, porque há transferência de direito real, o
contrato-promessa não tem efeito translativo do direito.
Então, B é possuidor formal ou detentor? A resposta a esta pergunta vai depender da conceção que adotarmos.
Temos de distinguir a conceção objetiva da conceção subjetiva.
Notas: A posse é o poder de facto sobre uma coisa, a este poder de facto chamamos de corpus. Este poder
de facto sobre a coisa não tem de ser exercido diretamente pelo possuidor.
Sobre a nota acima, imaginemos que A é proprietário e celebrou com B um contrato de arrendamento, portanto
quem vive na casa é o B, B está a exercer um poder de facto. B é possuidor? Não, porque o contrato de
arrendamento não gera qualquer direito real, B é detentor. Neste caso, possuidor é o A, não está é a exercer
o poder de facto diretamente! A está a exercer o seu poder de facto através do detentor, artigos 1252º nº1 e
1253º c) CC.
Na conceção objetiva, quem tem corpus é possuidor, a não ser que a lei diga o contrário, a saber a lei diz o
contrário nas situações do artigo 1253º CC. Nesta conceção objetiva, basta que haja corpus para existir posse
formal, a não ser que a lei exclua determinadas situações de corpus, qualificando-as como detenção.
Na conceção subjetiva, para além do corpus (elemento material da posse) exige-se mais, exige-se a análise
do elemento psicológico da posse, ou seja, o animus possidendi.
Na conceção subjetiva avaliada em concreto, temos de avaliar o animus do possuidor em concreto, ou seja, o
sujeito tem de estar em concreto a exercer o poder de facto sobre uma coisa como se fosse efetivamente o
titular do direito.
No exemplo 1, conseguimos configurar o B como possuidor quer na conceção objetiva, quer na conceção
subjetiva avaliada em concreto, porque o B não está apenas a residir lá em casa, o ele até já pagou parte do
preço e até imaginemos que fez obras no imóvel. Ora, um sujeito que faça obras num apartamento não é um
detentor, não está a atuar como detentor, um sujeito que faz obras e modifica a coisa está a ter um poder
compativel com o direito de propriedade.

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Na conceção subjetiva avaliada em abstrato B não é possuidor porque na conceção subjetiva avaliada em
abstrato o que releva não é a atuação do B, mas sim o facto que o leva a atuar. Nesta conceção o que conta
é o facto que permite ao B ir para o apartamento.
Exemplo 2:
A vende a B por documento particular o imóvel Y. Nesta sequência, B pagou uma quantia a titulo de sinal e A
entregou as chaves ao B.
B foi viver para o apartamento Y.
Na conceção subjetiva avaliada em abstrato, B já seria possuidor porque o poder de facto que B exerce sobre
a coisa tem na sua base que tem efeito translativo. No exemplo 2, o contrato não transmitiria o direito porque
tem um vício de forma, mas a compra e venda legitimaria B a atuar daquela forma, porque produz efeitos reais.
No contrato-promessa de compra e venda, exemplo 1, não se produzem efeitos reais. Portanto, na génese da
atuação do B não está um contrato que produza efeitos translativos.
É a eficácia translativa do contrato que releva na conceção subjetiva da posse avaliada em abstrato.
A saber, na jurisprudência a posse é entendida no âmbito da conceção subjetiva avaliada em concreto, na
doutrina mais recente a posse tem como fundamento a conceção objetiva.
No exemplo 1, B será possuidor ou detentor dependendo da conceção que adotarmos.

19 de novembro: Orientação
Teórica
Caso Prático:
A, B e C são comproprietários de uma casa de habitação adquirida por sucessão a seus pais em 1981.

Somente A é que a utiliza, pois os restantes têm habitação própria. Por isso, não se opuseram quando A
realizou diversas obras de beneficiação procedendo inclusivamente à redivisão interna da casa.

1. Poderia A tornar-se ,agora, por causa da utilização que vai efetuando, proprietário exclusivo da dita casa?
2. Em qualquer caso poderia A obrigar B e C a participar nas despesas relativas as obras que realizou?
Matéria:
Esta hipótese aparece sempre por esta razão: sempre que há sobreposição de direitos reais sobre a mesma
coisa, sejam da mesma espécie (sobreposição paralela) ou sejam de espécies diferentes (sobreposição
hierárquica) do ponto de vista possessório a ideia principal permanece, ou seja, tem de se definir quem tem
posse e quem tem detenção. Do ponto de vista possessório não há mais opções.
A lógica geral é a de que, nestas situações, um ou todos serão ao mesmo tempo detentores ou possuidores.
Se a sobreposição for de direitos diferentes, por exemplo o proprietário e um usufrutuário: o proprietário não
tem a possibilidade de exercer a posse porque a coisa foi entregue ao usufrutuário, portanto há uma coisa e
duas pessoas que, potencialmente, podem ser possuidoras.
A maneira que se encontrou para explicar isto é: o titular do direito menor, que é aquele que tem a posse em
termos factuais, tem posse em relação ao seu direito, usufruto, e é detentor da coisa em relação à propriedade,
isto é a mesma coisa que dizer que o proprietário exerce a sua posse através do usufrutuário. Por isso, em
rigor, o proprietário e o usufrutuário são ambos possuidores, o proprietário nos termos da propriedade e o
usufrutuário nos termos do usufruto, mas como só há uma coisa o usufrutuário tem a detenção da coisa em
relação ao proprietário, por outras palavras o usufrutuário é possuidor e detentor, possuidor na medida em
relação ao seu direito e detentor em relação ao direito do proprietário.
Esta é a única maneira de conjugarmos as situações, pois caso contrário se fossemos afirmar que o proprietário
perdeu a posse quando entregou a coisa ao usufrutuário corria-se o risco de o usufrutuário, depois, invoca-se
a usucapião.
Matéria em relação ao caso prático:
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No caso da sobreposição paralela, ou seja, no caso do próprio caso prático acima (compropriedade) todos os
comproprietários exercem a posse, todos têm direito à posse porque todos exercem a posse em simultâneo.
Em termos possessórios, temos de afirmar que cada comproprietário, cada contitular em geral é em simultâneo
possuidor nos termos do seu direito e detentor em relação ao direito dos demais. Por exemplo, se temos 3
comproprietários, qualquer um deles é possuidor porque todos têm o direito de exercer a posse, dado que
todos têm o direito de propriedade só que nenhum deles tem a posse exclusiva, ou seja, os 3 comproprietários
têm de ter maneira de atuar possessoriamente.
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Cada qual exerce posse em relação ao seu direito e na medida da sua quota, supondo que cada qual tem 1/3,
cada qual exerce posse em relação à sua propriedade da medida de 1/3 e cada qual é detentor dos 2/3 alheios.
Notas: Este raciocínio só feito do ponto de vista intelectual. A saber, ninguém que tenha compropriedade de
uma casa vai dividir a casa em “partes”, obviamente que todos são possuidores da casa no seu todo.
Solução do caso prático:

1. Poderia A tornar-se ,agora, por causa da utilização que vai efetuando, proprietário exclusivo da dita casa?
Quando se pergunta se o A pelo facto de ter a posse exclusiva da totalidade da casa, nesta altura já se pode
ter também como proprietário exclusivo, a resposta não, isto considerando os elementos da hipótese.
A resposta é não porque o facto de o A estar na prática a usar mais do que o seu 1/3, se está a utilizar a
totalidade da casa, significa apenas que ele está a atuar como possuidor em relação ao seu 1/3 e como detentor
em relação ao 1/3 de B e ao 1/3 de C.
Quem começa como detentor presume-se que é sempre detentor, quem começa como possuidor presume- se
que é sempre possuidor, portanto se A começa como detentor e possuidor ao mesmo tempo presume-se que
é sempre possuidor para o seu 1/3 e detentor consoante os 2/3 alheios.
Portanto, em princípio, não havia maneira de o A invocar usucapião. Para invocar usucapião da propriedade,
do apartamento, seria necessário que tivesse posse em relação à totalidade da casa e A não tem.
Podemos por uma sub-hipótese? Sim, podemos por a sub-hipótese de o A ter feito a inversão do titulo.
Das duas modalidades de inversão do titulo que são concebíveis, artigo 1265º CC, só uma delas é que podia
funcionar. A saber, a inversão do titulo da posse pode dar-se por:

1. Oposição;
2. Ato de terceiro.
Como não temos nenhum terceiro envolvido, então nem sequer colocamos essa sub-hipótese.
O simples facto de A estar a utilizar a casa por inteiro e ter realizado muitas obras de beneficiação, incluindo
uma obra que implica a redivisão interna só isso não é suficiente para que tenha o poder de inversão.
A inversão para suceder tem de dar-se perentoriamente mediante uma contradição do detentor perante o
possuidor, ou seja, dependerá de caso, não obstante a inversão por oposição supõe que o detentor atue
perante o possuidor de uma maneira que contradiga a posse do possuidor, por exemplo B e C algum dia
quiseram entrar na casa e A não permitiu porque lhes declara perentoriamente que a casa é dele, importa
referir que não é titulo de aquisição, mas implica uma contradição, implica que o A esteja a manifestar perante
B e C que não lhes reconhece a posse e, por isso, à conta disso afirmar uma posse exclusiva a seu favor.
Notas: Tudo depende das situações em concreto. No caso prático em concreto, só o que aconteceu não chega
para determinar a inversão do titulo.
Admitindo que a inversão do titulo seria admitida, é necessário saber quando é que houve a inversão porque
só após a data da inversão é que começam a contar os prazos da usucapião. Então, a questão seguinte
consiste em saber se os prazos de usucapião já estariam decorridos a favor de A, a saber que não temos
nenhum elementos que nos dê conhecimento disto.

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Nesta situação, não houve titulo, nem sequer inválido de aquisição do direito correspondente, ou seja, aquele
modo legítimo de adquirir que se refere o artigo 1259ºCC (ato translativo ou constitutivo de direito real), no
caso em contrato, não existiu, não há qualquer negócio entre A e B, C, houve apenas uma mudança unilateral
de comportamento.
Não há titulo nos termos do artigo 1259º CC, logo a posse é não titulada. Se a posse é não titulada.
presumivelmente é de má fé, logo os prazos de usucapião aqui seriam os máximos, de acordo com o artigo
1296º CC, 20 anos.
Notas: Artigo 1296º CC: “Não havendo registo do titulo (...)”, ou seja, nem sequer havendo titulo, pois se não
há titulo não pode haver registo do titulo.
No caso da compropriedade, em geral o caso da contitularidade, é a própria lei que enuncia esta ideia, o artigo
1406º nº2 sendo que afirma que o comproprietário só pode adquirir quota superior àquela que lhe pertence no
pressuposto de ter havido inversão.
2. Em qualquer caso poderia A obrigar B e C a participar nas despesas relativas as obras que realizou?
Verificar artigo 1411º CC.
A ideia central é a de que ser contitular implica participar nas vantagens, como nas desvantagens. Então,
havendo despesas a realizar ou já realizadas em relação à coisa comum, em princípio essas despesas são da
responsabilidade de todos na medida das respetivas quotas.
Acontece que o artigo 1411º CC apenas atinge com a sua obrigação as despesas de conservação e de fruição,
as denominadas despesas de gestão corrente. Ora, no caso prático estamos perante despesas de
conservação.
Só as benfeitorias necessárias é que têm em vista a conservação ou manutenção, artigo 216º CC, a saber
quer as benfeitorias úteis ou voluptuárias não são de conservação.
A despesa que foi feita no que toca à redivisão interna da casa não é uma benfeitoria necessária, por esta
razão esta despesa pode não ser paga por todos os comproprietários porque excede a conservação.
Então, B e C teriam de responder, mas só na medida em que fossem despesas de conservação, ou seja, só
na medida em que se tratasse de benfeitorias necessárias.
Estas obrigações são as chamadas obrigações reais porque se encontram forçosamente conexionadas com a
titularidade do direito real, ou seja, o obrigado, o devedor está necessariamente identificado, determinado pela
titularidade do direito real. É devedor quem for titular do direito real no qual essa obrigação estiver incluída.
No caso concreto, quem é que deve? Quem for comproprietário, quem for proprietário no instante em que a
obrigação se vença. Daqui resulta, artigo 1411º nº3 CC, uma característica muito própria destas obrigações: o
respetivo titular pode liberar-se do cumprimento da obrigação renunciando ao direito no qual a sua obrigação
está incluída, a isto denominamos renúncia liberatória. Ou seja e consoante o caso prático, se o B ou o C não
quiserem cumprir alguma destas obrigações, supondo que alguma delas tinha em vista a conservação da
habitação poderiam liberar-se do cumprimento renunciando ao direito, a saber como a obrigação está
intrinsecamente ligada renunciando-se ao direito a obrigação também desaparece, obviamente que isto implica
que B e C deixem de ser titulares do direito.
A renúncia serve, neste caso, para se liberarem do cumprimento da obrigação.

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20 de novembro: Prática
Sobre os benefícios da posse ligado a frutos e benfeitorias
Os efeitos da posse ligado a frutos estão presentes nos artigos 1270º e 1271º CC.
Notas: Quando falamos na posse de boa fé e má fé o conceito vai ser recolhido da caracterização da posse.
O artigo 1260º CC determina a posse de boa fé: a posse diz-se de boa fé quando o possuidor ignorava, não
sabia que usava o direito de outrem. Isto significa que se a posse tiver sido adquirida de boa fé, para efeitos
de caracterização, aquela posse será sempre de boa fé, mesmo que mais tarde deixe de ser.
A má fé é irrelevante superveniente em matéria da caracterização da posse, se a posse foi adquirida de boa
fé será sempre considerada de boa fé, mesmo que posteriormente o possuidor venha a saber que está a lesar
o direito de outrem.
Todavia, o mesmo já não acontece em relação aos frutos e às benfeitorias. O legislador vem dizer que o direito
a frutos só existe enquanto se mantiver a boa fé, o que determina que na questão dos frutos há um tratamento
distinto.
Na classificação da posse a má fé superveniente é irrelevante, no entanto, em matéria de frutos e benfeitorias
o má fé superveniente é relevante.
Imaginemos que A adquire a posse de boa fé e passados 2 meses percebe, afinal, que estava a lesar o direito
de outrem, em termos de classificação da posse a posse é de boa fé, pois A quando adquiriu a posse estava
de boa fé porque não sabia, ou seja, ignorava que estava a lesar o direito de outrem. Contudo, em matéria de
frutos e benfeitorias a má fé superveniente é relevante, ou seja, o direito que A tinha a frutos enquanto tinha
posse de boa fé, deixa de o ter a partir do momento em que tem conhecimento de que estava de má fé.
A má fé superveniente vai relevar em matéria de frutos e benfeitorias, considerando o artigo 1270º nº1 CC:
“(...) até ao dia em que souber que está a lesar com a sua posse o direito de outrem (...)”.
Isto significa que o possuidor de má fé não tem direito a frutos, por isso deve restituir os frutos que a coisa
produziu até ao termo da posse, artigo 1271º CC, e ainda responde pelo valor que podia ter sido obtido. E não
responde por mais nada? Depende. Imaginemos que A ocupava um terreno de B, em que inicialmente estava
de boa fé e, depois, veio a perceber que, de facto, estava a ocupar o terreno de B (A estava a lesar o direito
de B). A conseguiu frutos no valor de 10, por isso A tem de restituir a B os 10. Mas se ele tivesse sido mais
diligente e conseguisse mais frutos, será que só conseguiria obter aqueles 10 ou conseguia mais? Ou seja, o
proprietário diligente podia ou não ter obtido um fruto mais valioso? Imaginemos que B demonstra que se A
tivesse atuado de forma mais diligente conseguiria obter 15, ora neste caso o A tem de restituir aquilo que
produziu inicialmente e a diferença entre aquilo que produziu e aquilo que podia ter produzido se tivesse atuado
de forma mais diligente.
Vamos admitir que estamos perante um caso de posse formal e que temos outra situação, a saber A adquire
a posse consciente de que estava a lesar o direito de B, isto determina que todos os frutos da coisa devem ser
restituídos ao B e tudo aquilo que A podia ter produzido também, só que para isso é preciso que o B peça.
B vai intentar ação de reivindicação no tribunal contra A. Mas o que é que acontece se o B quando intentar a
ação em tribunal já tiverem passado mais de 20 anos? Se o B é proprietário, o A não tem qualquer maneira de
demonstrar o contrário porque o B vai demonstrar através da escritura de que aquilo é dele. Ainda assim, 98
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já passaram 20 anos, ou seja, A até pode afirmar que B era o proprietário e que estava de má fé, só que A
podia também afirmar que B teve tempo para reagir e não reagiu, e entretanto passaram 20 anos.
20 anos é o prazo máximo da usucapião, a saber mesmo com uma posse de má fé temos a possibilidade de
invocar a usucapião ao fim de 20 anos.
A na ação de reivindicação vai fazer um pedido reconvencional. O que é um pedido reconvencional? Quando
alguém intenta uma ação (autor) está a intentar contra o réu, a reconvenção é o contra-ataque do réu, ou seja,
o réu não se limita a impugnar, contradizer os factos, o réu vai formular um outro pedido contra o autor. O réu,
A, vai formular o pedidos reconvencional invocando a sua posse.
O A vai afirmar que tem posse pública, pacífica e efetiva há mais de 20 anos, então vai dirigir como pedido que
o tribunal reconheça o direito de propriedade adquirido por usucapião.
A saber, se o tribunal reconhecer o direito que o A invoca significa que o tribunal vai produzir uma sentença
que em simultâneo produz dois efeitos:
1. Atribuir ao A em concreto o direito de propriedade;
2. A extinção do direito de propriedade de B.
Então, que efeitos é que isto produz em relação aos frutos? Depende. Se a sentença que reconhece a
usucapião apenas produzir efeitos para o futuro, então não há dúvidas de que B perdeu o direito de
propriedade, mas tem direito aos frutos anteriores à sentença pois a sentença só produz efeitos futuros.
No entanto, se a sentença produz um efeito retroativo à data do início da posse, então em bom rigor nunca
houve frutos de má fé porque se a sentença tiver efeito retroativo retroage ao início da posse e, por essa razão,
podemos afirmar que, em rigor, os frutos pertenceram sempre a A.
A solução legal é que a sentença produz efeitos retroativos, artigo 1288º CC.
Resumindo, os frutos de má fé têm de ser restituídos e inclusivamente o possuidor de má fé responde por
aqueles frutos que podiam ter sidos produzidos pelo proprietário diligente e não foram.
Vamos admitir que o proprietário (B) não reage e só reage depois de já ser possível a invocação da usucapião.
Ora, quando invocada a usucapião os efeitos retroagem ao início da posse, os frutos serão sempre de A porque
o A é reconhecidamente o proprietário desde o início da posse.
O dever de restituir deixa de fazer sentido porque a usucapião prevalece.
Caso prático:
A e B são proprietários de dois prédios contiguos.
Apesar de nenhum deles se encontrar encravado A, no início de 2015, autorizou B a passar no seu terreno,
para mais facilmente chegar à via pública.
B, desde então tem vindo a passar normalmente no referido caminho, tendo inclusivamente efetuado uma
pequena obra de pavimentação, constatou que hoje A lhe vedou a passagem. Quid Juris?
Solução:
Existe o exercício de um poder de facto, B está a passar no terreno do outro autorizado pelo A.
A autorizou, consentiu que B passasse no seu terreno e o facto de ter autorizado ou consentido é a base do
caso prático.

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A saber, se a autorização de A tivesse sido celebrada por escritura pública ou documento particular autenticado
teria sido constituída uma servidão de passagem, por isso a passagem do B no terreno do A iria ser
determinada como posse causal porque a atuação de B estava fundada na existência de um direito real,
servidão de passagem, que foi validamente constituído.
Consequentemente, B considerando o comportamento de A (A vedou-lhe a passagem) podia reagir através de
uma ação de restituição (para defender a sua posse) e uma ação de reivindicação (para defender o seu direito).
O comportamento do A está a violar ao mesmo tempo a posse do B e o direito do B, considerando que o direito
de B existia através ou da escritura pública ou através do documento autenticado. Notas: Se B tem o direito de
passar, o A tem o dever de lhe deixar passar.
Quem ganharia a ação? B porque detinha posse e direito.
Se porventura esta autorização não tivesse sido dada por escritura pública ou por documento autenticado,
sabemos então que posse causal não poderia ser. Seria o quê posse formal ou detenção? Sendo posse formal,
B podia defender-se através de uma ação de restituição pois B só tinha a posse e não o direito que corresponde
à posse.
Quem ganharia a ação de restituição? Seria o A, porque a passagem do B no terreno do A, nestes termos, não
configurava nenhum direito.
Ainda se podia dar outro caso, esta autorização pode apenas ser uma simples tolerância do titular do direito,
artigo 1253º b) CC, sendo mera tolerância, o B seria detentor.
A questão do registo é irrelevante, neste caso prático.
O registo só é relevante a partir do momento em que há terceiros.
A saber, a constituição de uma servidão predial é sujeita a registo, por esta razão é que a matéria do registo
só é relevante quando há terceiros pois entre as partes a escritura pública e/ou o documento particular
autenticado produzem efeitos.

26 de novembro: Orientação
Teórica Caso prático:
A, B e C são comproprietários de um terreno para construção.

Somente A é que pretende construir. Com consentimento dos outros dois edificou uma vivenda que ocupa a
totalidade do solo.
Passados alguns anos os comproprietários desentenderam-se e um deles exige a divisão do prédio.
Poderá A manter a sua construção?
Solução:
Temos de levantar a possibilidade de usucapião do solo, só que quando há compropriedade cada
comproprietário tem posse do seu direito na medida do seu direito e detenção em relação aos direitos dos
outros! A única maneira do A chegar à usucapião seria inverter o titulo da posse perante os outros dois, quando
invertesse começariam a contar os prazos de usucapião e, eventualmente, chegaria à usucapião.
O simples facto de o A estar a construir ocupando o solo por inteiro, só isto não é oposição. Isto, é reforçado
pelo artigo 1406º nº2 CC: “O uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva
ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do titulo.”, portanto só porque o A construiu
ocupando tudo, não significa que A tenha invertido o titulo da posse, aliás o mais certo é que não tenha invertido
porque se os outros consentiram e se o A sentiu necessidade de pedir consentimento aos outros é porque está
a reconhecer que os outros são comproprietários (A não se está a opor à posse dos outros comproprietários,
até está a reconhecê-las).
O facto de A ter construído não demonstra oposição, ainda por cima considerando que A teve a necessidade
de pedir autorização aos outros comproprietários.

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Não tendo, portanto, havido inversão, não pode haver usucapião. A saber, por muito tempo que isto dure será
sempre uma detenção! Os prazos de usucapião são escusados pois não há posse para usucapião.
Outra hipótese é a acessão, sendo a acessão a mais óbvia, nos termos dos artigos 1340º e 1341º CC.
Para todos os efeitos A quando constrói está a implantar materiais que lhe pertencem num solo que é dele,
mas que também não é dele. O solo é de A porque ele é comproprietário, mas o solo também é do outros,
aliás maioritariamente é dos outros, por isso é suficiente para que o solo seja alheio, ou seja, o facto de ser
parcialmente alheio já chega para ser qualificado como alheio. Notas: Os comproprietários podem resolver
esta questão dando ao A o todo e o A fica obrigado a compensar os outros dois em dinheiro ou, outra vez por
acordo, o A beneficiar de direito de superfície, B e C podem constituir a favor do A o direito de superfície.
A acessão é um método de solução de um problema claramente à bruta porque se não se entendem, então o
resultado é: um deles tem de ficar com o todo, compensando os outros em dinheiro, mas um deles fica com
tudo. Ora, para sabermos como é que isso se faz a principal questão é saber se o A está de boa ou de má fé:
para sabermos se aplicamos o artigo 1340º CC ou o artigo 1341º CC.
A boa fé está determinada no artigo 1340º nº4 CC e tem dois critérios:

1. Está de boa fé aquele que ao incorporar ignora que está a incorporar em solo alheio, consoante o caso
o A estaria de boa fé se desconhecesse desculpavelmente que ao construir estaria a construir em solo
que não lhe pertencia por inteiro, importa referir que se o critério fosse este o A estaria de má fé.
A teria de saber necessariamente que o solo não lhe pertence exclusivamente;
2. E, também está de boa fé, quem sabendo que o terreno é alheio beneficia de autorização do respetivo
dono ou respetivos donos para o efeito, ou seja, para fazer a incorporação.
Aqui a questão determina-se pelo facto de termos de saber o que é uma autorização? O que é uma
autorização para este efeito? Os tribunais, nesta matéria, levam isto à letra: se consentiu e se autorizou
então está de boa fé.
A saber, geralmente as autorizações para este efeito são atos de tolerância. A autorização geralmente
é, por exemplo “faz lá aquilo que queres fazer” e assim sendo podemos considerá-la como um favor,
portanto este género de autorizações significam apenas tolerância! Sendo apenas tolerância, o A não
pode invocar acessão.
Quem arriscou construir em solo alheio foi o A, o A tem de assumir os riscos daquilo que está a fazer,
não são B e C que têm de assumir os riscos por terem autorizado e pelo facto de A ter interpretado
mal essa mesma autorização.
Então, para sabermos se há boa fé é necessário o importante é saber se houve ou não falta de
oposição dos outros. Notas: O importante não é saber se existiu uma autorização expressa. O A
construi, ora a construção demora tempo e a construção está claramente à vista de toda a gente,
incluindo o B e o C, portanto se B e C não reagem perante a construção de A estão implicitamente a
consentir e isso dá boa fé.
Notas: Nos termos do artigo 1340º nº4 CC quando se menciona autorização tem de ser no sentido de
permissão implícita, o Professor Gonzalez rigorosamente até acha que é no sentido de falta de oposição
Havendo boa fé do A, a questão seguinte é sempre saber o que é que vale mais. Em geral, valerá mais a
construção, mas não podemos assumir logo isto.

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Na resolução da hipótese devemos colocar as coisas nestes termos: se a construção valia mais que o solo o
A adquire tudo (solo e construção) e compensa os outros dois por aquilo que perderam, ao contrário se o solo
valer mais, o B e o C adquirem a construção e compensam o A pelo valor da construção.

3 de dezembro: Orientação
Teórica Caso prático:
A é proprietário de um terreno agrícola não descrito na respetiva conservatória do registo predial.
Prometeu vendê-lo a B por 150.000€, por documento escrito com data de 1 de fevereiro de 1997. Entretanto,
dia 1 de fevereiro de 1998, por escritura pública, B vendeu o mesmo terreno a C.
C construiu aí uma pequena instalação fabril.
A e B acabaram por se desentender e a escritura de compra e venda entre ambos nunca chegou a ser
outorgada. A pretende, por isso, obter a restituição do terreno. Como é que se pode resolver esta situação?
Solução:
Na essência temos duas soluções a favor de C ou a usucapião ou a acessão.
De antemão, para o C é preferível a usucapião porque pela usucapião não paga, enquanto pela acessão,
mesmo que a acessão o favoreça, supõe que compensa o A pela perda que A sofreu, mas esta conveniência
pode não se ajustar, estando dependente de requisitos que possam não ser preenchidos.
A usucapião pressupõe posse durante um certo período de tempo, portanto a primeira questão é saber se B
(promitente comprador) tem ou não tem posse: se o B tiver posse, o C pode juntar ao seu tempo de posse o
tempo de posse do B, por outro lado, se B não tem posse essa junção não se pode dar.
Para se fazer a junção dos tempos de posse, aquilo a que a lei designa acessão da posse, artigo 1256º CC, é
necessário que o possuidor atual, ou seja, aquele que vai invocar usucapião, possa juntar ao seu tempo de
posse o tempo de posse de quem o antecedeu, isto quer dizer que tem de haver entre o possuidor atual e
quem o antecedeu (pode ser mais do que um sujeito) um nexo de derivação. Por outras palavras, só se pode
fazer junção dos tempos de posse se as posses tiverem sido adquiridas derivadamente, portanto onde haja
uma aquisição originária há uma quebra e, a partir daí, não há continuação.
É por isto que temos de saber como é que o C adquiriu a posse, pois do modo como ele tenha adquirido
depende a possibilidade de juntar ao seu tempo de posse o tempo de posse de B. Com isto, temos de saber
se B tem posse.
De acordo com a doutrina, mas particularmente de acordo com a jurisprudência tem-se entendido que o
promitente comprador não tem posse! O B não teria posse, mas isto é um regra, uma diretriz que só pode ser
verificada no caso concreto! Na hipótese prática, estamos perante uma situação em que nos faz duvidar

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do facto de B não ter posse pois B já pagou o preço todo e pagar o preço na totalidade ao abrigo do contrato
de promessa é um indício de que o A já entregou e de que B já recebeu e está recebido, ou seja, geralmente
o pagamento da totalidade do preço é um indício de que a escritura de compra e venda para A e para B é uma
mera formalidade, sendo um papel, pois na prática já está tudo feito. Se assim fosse, isto é, se nesta situação
pudéssemos dizer que B adquiriu posse, então quando B vende a C, ainda que invalidamente (é uma venda
de bem alheio dado que A e B acabam por não fazer escritura de compra e venda), mas se B é possuidor com
base na compra e venda quando está a entregar a C está a fazer com que C adquira posse nos termos do
artigo 1263º b) CC, ou seja, tradição da coisa.
A compra e venda B-C não faz com que o C seja proprietário, mas é base para podermos afirmar que quando.
o B entrega está a entregar com o intuito de ceder, assim sendo e repetindo, podemos determinar que C
adquire posse pela entrega da coisa e terá posse adquirida derivadamente, ou seja, pode juntar o seu tempo
de posse ao tempo de posse do B.
Notas: Quando estamos a falar de posse temos de considerar sempre: a titularidade do direito e a posse,
geralmente estas “duas linhas” são paralelas, isto significa que normalmente aquele que tem a posse tem o.
direito. No entanto, podem existir casos em que há posse e não há o direito correspondente quando se diz que
a venda A-B não vale porque não há escritura pública e quando se determina que a venda B-C é venda de
bem alheio isso só significa que nem B, nem C são proprietários.
Se o C tiver posse a posse será formal.
O facto de a compra e venda B-C ser nula, apenas significa que o C não vai adquirir propriedade, mas pode
adquirir posse, ora C não adquire posse pela compra e venda pois a compra e venda é a base da entrega, se
B vendeu a C entregou a C. Não obstante, se B é possuidor e está a fazer entrega com fundamento numa
compra e venda, ou seja, se B está a entregar ao C porque lhe está a vender, isso em princípio faz com que C
adquira posse. Notas: C não adquire a posse pela compra e venda, o C adquire posse pela entrega que o B
lhe faz. A entrega como é efetuada pelo anterior possuidor pode-se entender que o C tem posse.
Se podermos afirmar que o B tem posse quando o B entrega ao C está a fazer essa entrega com base numa
compra e venda, mesmo que a compra e venda seja inválida, como está a entregar o C está a adquirir posse
pela entrega, artigo 1263º b) CC: entrega efetuada pelo anterior possuidor faz com que o adquirente tenha
posse formal, pois C não é proprietário.
No caso de B não ter posse, se entendermos que o B como promitente comprador não tem posse, então B
será apenas detentor.
Mesmo assim, B entregou ao C, não obstante a alínea c) do artigo 1263º CC supõe que para adquirir posse a
entrega tem de ser efetuada pelo anterior possuidor, então ao considerarmos B como detentor, mesmo que B
entregue o terreno ao C o C não vai adquirir posse pela entrega pois quem estava a fazer a entrega não era o
anterior possuidor.
Importa referir que, de qualquer maneira, o C obtém a entrega do terreno de qualquer maneira, mas se essa
entrega for feita pelo B enquanto possuidor o C adquire posse pela entrega, se a entrega é feito pelo B como
detentor o C não adquire posse pela entrega, mas vai adquirir posse pela prática reiterada de ato materiais, ou
seja, pelo artigo 1263º a) CC.
Considerando a atuação de C, este adquire sempre posse, pode é estar a adquiri-la pela alínea b) do artigo
1263º CC se B for considerado possuidor e irá adquiri-la pela alínea a) do mesmo artigo se B for considerado
detentor.

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Notas: Quando C constrói uma fábrica no terreno, estamos perante corpus.


O C adquire sempre posse, a saber:
• Se adquirir pela alínea b) pode juntar ao seu tempo de posse, o tempo de posse do B;
• Se adquirir posse pela alínea a) não pode juntar o tempo de posse do B, o único tempo de posse que
C pode invocar é o seu tempo de posse.
Não pode invocar o tempo de posse do B porque a aquisição da posse pela alínea a) corta a sucessão
de posses pois é uma aquisição originária.
Também não sabemos quando é que o C começou a posse, podemos afirmar que perante esta atuação C tem
posse, mas não sabemos quando é que a posse começou e a lei dá uma ajuda com uma presunção: quando
a posse seja titulada, como é o caso, para todos os efeitos há uma compra e venda que é um ato translativo,
sendo um modo legítimo de adquirir para efeitos do artigo 1259º CC e essa compra e venda é formalmente
válida pois foi feita por escritura pública. Quando a posse seja titulada presume-se que a posse começou na
data do titulo, portanto se o titulo (compra e venda B-C) é de fevereiro de 1998, presume-se que a posse do C
começou nessa data. Notas: Não esquecer que isto é uma presunção, o que significa que admite prova em
contrário. Não havendo qualquer indicação, presume-se que a posse de C começou na data em que fez a
compra e venda com B.
Isto significa que mesmo que C não conseguisse ou não pudesse juntar o seu tempo de posse ao tempo de
posse de B já tinha mais que tempo o suficiente para invocar usucapião.
Se a posse é titulada, artigo 1260º nº2 CC, presume-se a boa fé do possuidor.
Tudo isto determina que o prazo de usucapião para o C seria de 15 anos, artigo 1296º CC. O Professor
Gonzalez ainda determina que seria sempre aplicável o artigo 1296º CC e nunca o artigo 1295º CC porque,
embora a posse seja titulada, não havia descrição daquele prédio no registo predial e não havendo descrição
não se podem fazer inscrições, portanto a compra e venda que o C faz a seu favor não podia ser inscrita no
registo predial dado que não há descrição. Notas: No registo predial não haver descrição significa que não há
prédio, ou seja, que o prédio no registo não existe, então não existindo prédio não se podem fazer registos
relativos a um prédio que não existe.
O artigo 1295º CC supõe registo do titulo, por essa razão, no caso concreto, os prazos teriam de ser os do
artigo 1296º CC.
Importa referir que não convinha que C juntasse ao seu tempo de posse o tempo de posse de B porque para
juntar os tempos de posse basta que haja nexo de derivação. Não obstante, a posse do B a ser posse é posse
não titulada porque mesmo que disséssemos que aquilo não era bem uma promessa, mas uma compra e
venda, formalmente seria compra e venda inválida pois só havia um documento particular.
Quando se juntam tempos de posse e as posses têm características diferentes, a junção pode fazer-se na
mesma, mas faz-se consoante aquela posse que valer menos. Ora, se a posse do B é não titulada
presumivelmente é de má fé, juntando o tempo de posse do C com o tempo de posse do B teríamos 16 anos
de posse de má fé (considerando o ano de 2013), artigo 1256º nº2 CC.
Claro que se C vai invocar a acessão da posse e a usucapião em 2018 cumprindo já os 20 anos, já pode juntar
as posse sem quaisquer problemas. Notas: A acessão é uma espécie de direito de benefício, ora se o
possuidor não tem vantagem com a acessão não junta, ou seja, se o possuidor não tem vantagem com a
junção dos tempos de posse não os junta.

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A outra via seria a acessão.


Para todos os efeitos, o C implantou materiais seus num terreno que não lhe pertence, pertence ao A e, por
isso, temos uma hipótese ou com o artigo 1340º CC ou com o artigo 1341º CC, sendo que está tudo dependente
da boa ou má fé do incorporador, ou seja, do C.
Perante a acessão, para aferirmos se o incorporador está de boa fé ou de má fé vai-se ao artigo 1340º nº4 CC
e, antes de mais nada, tem de se verificar se o incorporador ignorava desculpavelmente que o terreno era
alheio.
Considerando o caso prático e as informações, a resposta mais indicada seria determinar que não sabemos
se, de facto, C está de boa fé ou de má fé. Não obstante, temos de resolver a hipótese, por isso perante esta
situação na normalidade só sabemos que C comprou ao B por escritura pública e um negócio celebrado neste
termos, geralmente, faz-nos pressupor que quem comprou adquiriu de quem poderia vender.
Deste modo, não sendo impossível que o C esteja de má fé, na normalidade estará de boa fé pois quem
compra através de um documento que implica a intervenção de um oficial público (notário) é legítimo supor
que está a adquirir validamente, não quer dizer que esteja mesmo, mas em princípio sim.
Na normalidade, C como qualquer outra pessoa (que é isto que quer dizer o desculpavelmente) estaria a
adquirir convencido de que o terreno pertencia ao vendedor, portanto, em princípio de boa fé. O que significa
que, agora, teríamos de saber aquilo que valia mais, se o terreno ou se a construção.
Quando estamos a aplicar o artigo 1340º CC, ou seja, no pressuposto do incorporador temos de saber o que
é que vale mais, sendo que a parte que for de maior valor confere ao respetivo dono o direito de aquisição.
Quem é que é o beneficiário da acessão? É aquele dos dois, entre A e C, que for dono da parte de maior valor,
a saber pela normalidade o que vale mais, geralmente, é a construção. Notas: Se a construção for edifício o
que vale mais, geralmente, é o edifício por isso o beneficiário da acessão, em geral, será aquele que construiu
o edifício. No caso prático seria o C, o C deverá pagar ao A o valor do terreno.
Qual é o valor do terreno? É o valor à data em que o C declara que quer adquirir. O valor que o terreno tem
para efeitos de acessão, bem como o próprio valor da construção, são valores à data em que o C invoca
acessão, por exemplo se está a invocar em 2020 é nesta altura que se avalia. Notas: A aquisição sucede-se
no instante em que o beneficiário diz que quer adquirir.
Nota importante: A relevância de se dizer que a aquisição por acessão é potestativa está patente neste aspeto.
Desde há uns 10 anos os tribunais aceitam a posição maioritária na doutrina: a acessão tem um carácter
potestativo, a menos que a lei diga claramente não, por exemplo artigo 1339º CC em que a aquisição é
automática. A acessão ser potestativa implica que os valores a ter em consideração são os valores à data em
que o problema se põe!
Releva referir que se o C estiver em condições de invocar ou acessão ou usucapião pode fazê-lo, mas isso
resolve o seu problema com A, ou seja, perante A através da acessão ou usucapião soluciona o problema.
Todavia, sempre que se constrói há um problema que temos de considerar sempre: é que é preciso saber se
aquela instalação fabril podia ir para aquele sítio. Hoje em dia todos os Municípios têm um PDM (Plano de
Direção Municipal) e este PDM estabelece zonas de utilização, ou seja, os PDM determinam para cada área
de um respetivo território o que é que se pode fazer, em termos de utilização, naquele espaço territorial.

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Mesmo que o C esteja em condições de invocar acessão ou usucapião isso não resolve o seu problema com
a. Câmara Municipal, simplesmente resolve os seus problemas com A. O C por acessão ou usucapião irá
acabar por adquirir a propriedade do terreno, mas isto não quer dizer que a fábrica possa lá ficar porque se
segundo o PDM aquela zona não for zona para instalar uma fábrica, a Câmara Municipal pode sempre exigir
a demolição.
O Professor Gonzalez diz que, no fundo, a acessão é uma compra e venda forçada, não é contratual, mas é,
no fundo, uma compra e venda pois “eu fico com o que é teu e pago-te aquilo que tinhas”.
Do ponto de vista prático, é mais conveniente utilizar a usucapião pois não tem de haver um pagamento, mas
a usucapião supõe, pelos menos e nesta hipótese, 15 anos.

4 de dezembro:
Prática Hipótese
prática:
Há alguns anos, A, com o consentimento de B, construiu um lagar de azeite num prédio rústico pertencente a
este último.
Tendo B morrido, o seu herdeiro único, C, exigiu a A que lhe pagasse o valor do prédio em que o lagar foi
construído. Sabendo que A não quer adquirir o prédio, diga se ele o pode recusar, bem como, se, em tal caso,
tem direito a exigir de C alguma compensação.
Solução da hipótese:
A acessão é uma figura jurídica que não é só, mas é sobretudo uma figura que se destina a resolver um
problema que ocorre quando duas coisas que pertencem a donos diferentes se juntam não sendo a sua
separação fisicamente possível ou então, sendo até possível fisicamente não é economicamente viável, por.
isso tem de se perceber quem é que vai ficar com a coisa que resultou da junção, a chamada coisa adjunta.
É verdade que olhando para esta hipótese há uma maneira que o C tem de ficar com o terreno livre do lagar
de azeite: demolir o lagar de azeite, a saber se o lagar de azeite for demolido significa que o C fica com o
terreno completamente livre.
Claro está que isto só resolve o problema de C, porque se a construção for demolida o A perde o dinheiro que
investiu na construção, então será que o C tem esse direito? C tem direito porque o lagar não é dele, mas não
deixa de ser verdade que o A ao construir no terreno que não era dele, construiu com o consentimento de B.
O próprio B consentiu na construção é injusto demolir a construção fazendo com que A perca o dinheiro lá
investiu, isto no pressuposto de que o A construiu de boa fé, de boa fé no sentido de ter construído na sequência
do consentimento do B.
Das duas uma:

1. Se o A construiu de boa fé não faz sentido que C possa demolir a sua construção, ou seja, A iria perder
o edifício e ia perder o dinheiro investido na construção;
2. Se A construiu de má fé, “não faz mal que A perca tudo”, ou seja, faz sentido que seja penalizado por
isso.
As situações de acessão são várias e a que diz respeito ao caso prático são aquelas determinadas pelos
artigos 1340º e 1341º CC, ou seja, o caso prático expõe uma situação de acessão que decorre do facto de
alguém ter utilizado materiais próprios na construção de um edifício colocado num terreno que não lhe

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pertencia. Notas: O artigo 1339º CC é para situações em que o dono do terreno constrói com materiais que
não lhe pertencem.
Se a construção for feita de má fé a pergunta que se coloca é: que culpa é que tem o dono do terreno de um
sujeito de má fé ter construído lá um edifício? Nenhuma, e não tendo culpa nenhuma tem de aceitar o edifício
construído mesmo que não queira? Não. Neste sentido percebe-se que aquando a construção seja feita de má
fé o dono do terreno não “tem que levar com aquela construção se não quiser”.
Notas: Construção, sementeira ou plantação é a mesma coisa.
Nestes casos, tendo a construção sido feita de má fé o dono do terreno tem o direito (potestativo) de exigir, de
impor que a construção seja demolida e que o terreno, deste modo, regresse ao seu estado primitivo.
Quem é que paga a demolição? Paga o sujeito que, de má fé, a executou.
Resumindo: se alguém de má fé, utilizando materiais seus, construir um edifício num terreno que não lhe
pertence é evidente que o dono do terreno não é obrigado a ficar com aquilo, com o edifício, por isso por
simples vontade do dono do terreno, ele pode impor que o edifício seja demolido e que esta demolição seja
paga por aquele que fez a construção.
Então e se o dono não quiser que a construção seja demolida e pretenda ficar com a mesma? Isto pode
acontecer e nem tem de indemnizar o construtor nos termos gerais da responsabilidade civil, com isto e
considerando que está a atuar de forma lícita o dono do terreno só terá de pagar ao incorporador o valor que
for fixado segundo as regras do enriquecimento sem causa.
Portanto, se a construção for feita de má fé toda a tutela recai sobre a posição do dono do terreno.
O dono do terreno vai decidir, de uma forma potestativa, se quer ou não que a construção seja demolida ou se
quer ou não ficar com ela.
Agora vamos atender à hipótese de a construção ter sido feito de boa fé.
Se a construção for feita de boa fé não faz sentido demolir o edifício, sendo verdade que o edifício pode ser
demolido na mesma, mas é necessário haver um acordo entre os dois.
E se um quiser demolir e outro não? Ora, isto é um problema porque a lei na situação do artigo 1340º CC a
propósito da construção feita de boa fé não pressupõe, em nenhuma circunstância, a demolição. Então, se não
existir qualquer acordo entre as partes, é sabido que a construção não vai ser demolida!
Então, se a construção não vai ser demolida, quem é que fica com o quê? Quem é que fica com o todo? É o
dono do edifício que fica com o terreno ou é o dono do terreno que fica com o edifício? A lei, adota o critério
económico, ou seja, ficará com o todo aquele que tinha a coisa de maior valor. Ora, se o terreno valia mais
que a construção é o dono do terreno que fica com a construção, se a construção valer mais que o terreno é
o dono da construção que fica com o terreno e se forem de valor igual abre-se uma licitação entre eles, artigo
1340º nº1, 3 e 2 CC, respetivamente.
Neste caso, o que é imprescindível é saber se houve ou não boa fé de quem incorporou, pois modifica tudo.
O artigo 1340º nº4 CC, análise do sentido de boa fé:
• O autor da incorporação estaria de boa fé se desconhecesse sem culpa que o terreno era alheio, ou
seja, o autor estava convencido que o terreno era dele, estando convencido de uma forma
relativamente legítima. Por exemplo, A vende o terreno a B por documento particular e B constrói um
edifício nesse terreno, estamos perante um caso tipico de acessão porque se o A vende a B o
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terreno por documento particular significa que a compra e venda é nula, o que significa que o terreno
nunca foi transmitido ao B, por isso quando B constrói está a construir num terreno que ainda era de
A precisamente por força da nulidade do negócio. Neste caso poderíamos alegar que B estava
convencido que não era preciso celebrar o negócio por escritura pública ou por documento particular
autenticado;
• “(...) ou se for autorizada a incorporação pelo dono do terreno.”. O que é a autorização? Notas: Não
pode ser uma autorização expressa. A autorização tem de ser uma autorização chamada não
oposição, ou seja, é o sujeito que porventura começa a construir sem nenhuma autorização expressa
do dono do terreno começa o dono do terreno até se apercebe da construção, pode impedi-la, mas
nada faz.
Esta autorização não é mais do que uma não oposição!
O sujeito sabe que alguém está a construir no seu terreno e pode reagir contra essa construção quer
defendendo a posse (ação de restituição) , quer defendendo o direito (ação de reivindicação), mas
nada faz. É esta inércia, esta não oposição que qualifica a tal autorização.
Notas: Pode haver uma autorização expressa, mas não pode ser invocada a acessão quanto muito
haverá posse.

10 de dezembro: Orientação
Teórica Caso prático:
A proprietário do automóvel Y vendeu-o a B reservando para si a respetiva propriedade até que este efetuasse
o pagamento integral do preço.
O automóvel foi imediatamente entregue após a celebração do contrato.

1. Antes de efetuado o pagamento integral do preço A vendeu o mesmo automóvel a C. Este após comprar
exigiu, de imediato a B, a entrega do automóvel. Teria direito a essa entrega?

2. B não concluiu o pagamento do preço. A intentou ação executiva contra B na qual penhorou o automóvel
em causa. Esta penhora poderia valer ou não?
Resolução:

1. Antes de efetuado o pagamento integral do preço A vendeu o mesmo automóvel a C. Este após comprar
exigiu, de imediato a B, a entrega do automóvel. Teria direito a essa entrega?
Este caso prático necessita de uma explicação prévia que tem em vista a questão de saber qual é que é a
natureza da cláusula de reserva de propriedade.
Tradicionalmente, a posição dominante e em especial na jurisprudência, tem-se entendido que a cláusula de
reserva de propriedade prevista no artigo 409º CC é uma condição suspensiva, mas com particularidades, a
saber esta cláusula não suspende todos os efeitos do negócio porque, pelo menos, a obrigação de pagar o
preço permanece. O próprio facto que condiciona os efeitos da compra e venda é o pagamento do preço, pelo
menos esse efeito não fica suspenso.

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Em termos esquemáticos: considerando os efeitos do artigo 879º CC (efeitos essenciais da compra e venda),
a saber consoante as alíneas:

a) Este efeito fica suspenso, pois este é o efeito real, efeito de transmissão ou constituição de um
direito;
b) (O Professor Gonzalez não mencionou nada);
c) O efeito desta alínea não fica suspenso porque é da produção desse efeito que os restos dos
efeitos da compra e venda.
Será uma condição suspensiva, mas não é normal pois não suspende todos os efeitos como é normal na
condição suspensiva.
O efeito da alínea a) do artigo 879º CC fica certamente suspenso, a questão que se põe a seguir é saber se a
alínea b) (entrega da coisa) também fica suspenso ou não. A doutrina mais antiga é no sentido de entender
que a entrega da coisa por parte do vendedor ao comprador é um ato de mera tolerância pois o vendedor
entrega porque quer, porque tem conveniência prática nisso, mas não está obrigado a entregar até ao
pagamento do preço. Notas: Havendo cláusula de reserva de propriedade só entrega se quiser, por isso não
tem a obrigação de entregar até ao pagamento do preço.
Defende-se isto porque, embora a garantia que resulta para o vendedor, permaneça quer se faça a entrega da
coisa, quer não se faça, em termos práticos o que se chama a consistência da garantia pode perder-se se a
entrega for efetuada. Por outras palavras, a hipótese de reserva de propriedade funciona sobretudo nesta
situação que é tipica, a compra e venda de automóveis (é a situação mais vulgar). Ora, tratando-se de
automóveis ou em geral de coisas móveis a consistência prática da garantia que o vendedor tem perde-se por
duas razões, pelo menos, a saber:
• Em primeiro, a utilização do automóvel já desvaloriza o automóvel, por isso em termos práticos a
garantia de que o vendedor é beneficiário diminui;
• Por outro lado, as coisas móveis desaparecem com facilidade, portanto se o vendedor faz a entrega
ao comprador corre o risco de nunca mais a ver.
Por estas razões é que se sustentava que a entrega que o vendedor efetua a favor do comprador baseava-se
num simples ato de tolerância e, portanto, o vendedor entrega porque quer e o vendedor deixa que a coisa
permaneça em poder do comprador porque quer. Notas: Um ato de tolerância pode cessar os seus efeitos a
qualquer instante.
Hoje em dia, entende-se que a exposição anterior é demasiado radical porque é verdade que o vendedor não
está obrigado a entregar, mas depois de entregar já não pode reaver quando entende e como entende, depois
de entregar só pode reaver se tiver fundamento para resolver o contrato de compra e venda e a regra é a de
que nos termos do artigo 886º CC o vendedor não pode resolver o contrato de compra e venda com fundamento
em não pagamento do preço. Notas: A regra deste artigo 886º CC é muito importante.
Em geral não pode resolver o contrato, mas mesmo quando o vendedor pode resolver quando o fundamento
é o não pagamento do preço é preciso que se verifiquem as circunstâncias do artigo 934º (compra e venda a
prestações, compra e venda a um preço fracionado). Ora, se a lei é tão rígida no que toca à concessão do
direito de resolução com fundamento do não pagamento do preço não poderia permitir que o devedor pudesse
quando entendesse pedir a restituição da coisa, por esta razão e se for assim o vendedor não pode resolver o
contrato com fundamento em não pagamento do preço, a não ser nos casos excecionais previstos e mesmo
nestes casos tem de declarar que quer o contrato resolvido para que, na sequência, possa pedir a restituição
da coisa.
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O comprador que obteve a entrega da coisa tem direito à sua utilização, ou seja, não está apenas a beneficiar
de tolerância do vendedor e tem direito à sua utilização, com esta ressalva: o comprador não tem direito à
entrega, mas se entrega for efetuada tem direito a manter a coisa em seu poder, tem direito à sua utilização.
Vendo-se isto desta forma, significa que comprador que obteve a entrega da coisa tem direito à sua utilização
(para todos os efeitos tem o direito de gozo, direito de usar e fruir), no entanto esse direito só pode ser visto
como direito pessoal porque não cabe em nenhum modelo de Direito Real previsto na lei, sendo direito pessoal
resulta que só vale entre as pessoas que o convencionaram.
Perante o A, o B tem o direito de manter o automóvel em seu poder até que eventualmente o A consiga resolver
o contrato com fundamento em não pagamento do preço.
Entretanto, A vendeu o automóvel a C, em si mesmo o A pode vender a C porque se A continua a ser
proprietário até que B pague isso significa que se tem os poderes normais de proprietário, por isso pode vender,
doar, permutar, o que seja.
Temos de acrescentar que o A pode transmitir para o C aquilo que A tem, mas A tem um direito de propriedade
sob condição, ou seja, A é proprietário sob condição de o B pagar um preço, por isso A não é proprietário a
titulo definitivo, é um proprietário precário.
O C adquire a propriedade que A tinha, ou seja, adquire uma propriedade precária.
Outro ponto importante é o de que se o A não pode exigir restituição da coisa ao B porque o B tem um direito
pessoal de gozo quando o A vende a C só pode dar ao C aquilo que tem, ora se o A não tem o direito de exigir
a restituição do automóvel enquanto o B não entrar em incumprimento definitivo, então o C não pode adquirir
mais do que isso (o C não pode ter o direito de exigir ao B a restituição do automóvel enquanto não houver
fundamento para resolver o contrato de compra e venda).
O C não pode pedir a restituição entendendo-se o raciocínio anterior.
2. B não concluiu o pagamento do preço. A intentou ação executiva contra B na qual penhorou o automóvel
em causa. Esta penhora poderia valer ou não?
A regra é a de que só os bens do devedor é que respondem pelo cumprimento das suas obrigações, o que
significa que só os bens de B é que responderiam.
A lei admite, artigo 818º CC, que em alguns casos os bens de terceiro também respondam, especialmente
aqueles casos em que o terceiro tenha garantido o cumprimento da obrigação, por exemplo através de uma
fiança ou constituição de uma hipoteca, ou aquela hipótese em que antes de penhorar os bens o credor tenha
procedido à impugnação pauliana dos atos pelo seu devedor.
No caso da hipótese, formalmente o automóvel continua a pertencer ao A, se o A vendeu sob reserva até ao
pagamento do preço e se entendermos que isto dá origem a uma condição suspensiva (se a cláusula dá origem
a uma condição suspensiva), então enquanto B não paga A continua a ser proprietário. A não pode penhorar
o automóvel para satisfação de obrigação de pagar o preço porque o automóvel não é do devedor (B), nem de
terceiro.
Na prática a solução que se arranjou foi a de se permitir ao vendedor reservante, A, declarar perante o registo
automóvel que renuncia à reserva de propriedade, renunciando à reserva isto significa que o automóvel deixa
de pertencer a A e passa a pertencer ao comprador, B, então a penhora já pode prosseguir.

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Supostamente só se renunciam direitos e não a cláusulas porque os contratos, artigo 406º CC, são
imodificáveis, os contratos só podem ser modificados se as partes acordarem ou se a lei permitir que a
modificação se faça por declaração unilateral.
Mesmo que se entenda que o A renuncia não exatamente à cláusula ou à reserva, mas renuncia à propriedade
sobre o automóvel de modo a que o automóvel possa pertencer ao B e aí possa ser penhorado, surge outra
dificuldade é a de que: a renúncia à propriedade sobre coisas móveis coloca essas coisas na situação de
coisas sem dono e como sabemos as coisas sem dono podem ser objeto de ocupação, artigo 1318º CC. Com
isto, o automóvel passaria a pertencer a B só que passaria a pertencer a B por causa da ocupação, ora
adquirindo por ocupação e não por compra e venda B não tem de pagar preço, a aquisição por ocupação
sucede sem qualquer contrapartida. Notas: Quando há uma aquisição por ocupação, estamos perante uma
aquisição originária.
Na prática, o que se tem feito é: admitir que se renuncia a reserva de propriedade e isso irá permitir a penhora,
mas o Professor Gonzalez determina que não é uma solução aceitável.
Há uma alternativa e esta consiste em dizer que quando se estipula a cláusula de reserva isso dá origem a
uma situação de propriedade dividida entre o vendedor e o comprador, o vendedor fica proprietário
exclusivamente para efeitos de garantia (a reserva de propriedade fica a funcionar como se fosse, por exemplo
uma hipoteca), ao contrário, o comprador é proprietário para efeitos de utilização. Ora, se assim fosse não
haveria qualquer dificuldade em conseguir a penhora nestas circunstâncias.

11 de dezembro: Prática
Dúvida: Qual é a diferença entre a ação industrial mobiliária e imobiliária?
Na ação industrial mobiliária as coisas que se juntam (no caso de serem duas) são coisas móveis.
Na ação industrial imobiliária é uma coisa móvel que se junta a uma coisa imóvel.
Caso prático:
Em 1 de janeiro de 200 António acordo com Bento, por escrito particular, o direito de utilizar uma faixa de
terreno do prédio X, devidamente identificada, como forma de melhor aceder ao prédio Y.
Em 1 de janeiro de 2013 Bento vendeu a Carlos, por escritura pública, a propriedade do prédio Y, continuando
este a utilizar a referida faixa de terreno.
Em 1 de janeiro de 2016 António, que havia emigrado para a Austrália no final de 2011 e desconhecia a venda
efetuada, regressou a Portugal e, logo depois dela ter tomado conhecimento, pretende:

a) Intentar uma ação de preferência, destinada a obter para si a propriedade do prédio Y, com fundamento na
violação do seu direito de preferência legal;
b) Vedar o acesso à faixa de terreno do seu prédio, impedindo Carlos de a continuar a utilizar.
Pronuncie-se sobre as seguintes questões:
1. A viabilidade da ação de preferência que António pretende intentar.
2. A pretensão de António de vedar o acesso à faixa de terreno do seu prédio.
3. A possibilidade de Carlos reagir a esta atuação de António.

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4. A possibilidade de António cessar os efeitos do acordo celebrado com Bento.


Solução:

1. A viabilidade da ação de preferência que António pretende intentar.


Temos de perceber que existem consequências quando qualificamos uma servidão de passagem como legal
ou como voluntária, desde logo perante o direito de preferência porque é verdade que o artigo 1555º CC
estabelece que o proprietário de prédio onerado com a servidão legal de passagem, independentemente do
titulo executivo, tem direito de preferência no caso de venda, dação em cumprimento ou aforamento do prédio
dominante.
Verificar artigos 416º a 418º CC a prepósito do pacto-preferência.
Artigo 1410º a prepósito da ação de preferência, que está prevista para a compropriedade, mas que é aplicável
às outras situações em que exista um direito legal de preferência.
Notas: O facto de a servidão ser legal não significa que não possa constituir-se voluntariamente, por acordo.
isto só acontece se a servidão for legal e para que a servidão seja legal esta pode ser constituída por contrato,
testamento, usucapião ou destinação do pai de família, não obstante se a servidão for legal e não houver uma
constituição voluntária, a servidão pode ser constituída por sentença judicial ou decisão administrativa, artigo
1547º CC.
Portanto, existem 4 possibilidades de constituir servidões voluntárias, a saber contrato, testamento, usucapião
ou destinação do pai de família, e 6 possibilidades de constituir servidões legais, então contrato, testamento,
usucapião, destinação do pai de família, sentença judicial ou decisão administrativa, artigo 1547º CC.
A servidão é legal no sentido em que se não puder ser estabelecida por acordo pode ser constituída por decisão
judicial: é o próprio tribunal que vai impor a constituição da servidão. Para que o tribunal se substitua à vontade
das partes tem de haver um fundamento sério para que tal suceda.
Ora, não nos podemos esquecer que o direito de propriedade tem tutela constitucional, por isso à partida o
proprietário pode ou não ter interesse em que alguém construa no seu terreno, se tiver interesse estabelece a
servidão por acordo, mas se não tiver interesse não faz sentido que alguém possa, contra a vontade do
proprietário, constituir uma servidão num terreno que é do proprietário. Então, para que o tribunal possa forçar
a constituição de uma servidão tem de haver um fundamento válido para que tal suceda.
Notas: A servidão é um encargo e sendo um encargo desvaloriza qualquer prédio.
Para que o tribunal force contra a vontade do proprietário à constituição da servidão por sentença tem de haver
um fundamento válido e o fundamento válido será a existência de um prédio que não tem comunicação para a
via pública ou então que não tenha comunicação suficiente para a via pública, ou seja, é a existência de um
prédio que se encontre encravado, artigo 1550º CC. Quando é que existe um prédio encravado? Existe nos
termos em que a lei define: prédio que não tem comunicação com a via pública, nem condições que permite
estabelecê-la sem excessivo incomodo ou dispêndio, artigo 1550º nº1 CC.
Notas: O primeiro requisito para que possa existir uma servidão legal é que exista um prédio encravado.
Olhando para o caso prático verificamos que nenhum dos prédios está nessa circunstância, pois está exposto
que ambos têm acesso à via pública, o que significa que o prédio não está encravado.

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Ainda assim, para que haja a possibilidade de impor a constituição de servidão não basta que o prédio esteja
encravado! É preciso que o prédio que permite o acesso à via pública sejam prédios rústicos, ou seja, terrenos
agrícolas, zonas de pasto, ou seja, é preciso que haja um prédio rústico que permita passagem pois se não
houver prédio rústico já não se pode impor a servidão de passagem.
Havendo um prédio encravado, mas não havendo um prédio rústico que permita a passagem temos de recorrer
ao artigo 1551º CC os proprietários em que não existam prédios rústicos podem subtrair-se ao encargo de
ceder a passagem adquirindo o prédio encravado pelo justo valor, neste caso comprando o prédio encravado
deixa de haver necessidade de servidão pois a servidão pressupõe donos distintos.
Só há lugar à imposição de servidão de passagem de natureza legal se:

1. Houver um prédio encravado;


2. O prédio que permite a passagem seja um prédio rústico.
Estando reunidos os pressupostos para a constituição da servidão de passagem, a partir do momento em que
se impõe a constituição de servidão de passagem nesse prédio rústico vamos verificar como é que isto funciona
pois é o tribunal que vai decidir.
Então, onde é que vai passar o caminho? É onde o tribunal entender que vai provocar menor prejuízo para o
dono do prédio serviente, artigo 1553º CC.
Há ou não há direito a indemnização? Claro que há, artigo 1554º CC, pela constituição da servidão de
passagem é devida uma indemnização correspondente ao prejuízo sofrido. Ora, se tem de haver uma servidão
de passagem no prédio rústico e considerando que a servidão é um encargo que vai desvalorizar o prédio
rústico é evidente que ao proprietário do prédio rústico é devida uma indemnização.
Há ou não lugar ao direito de preferência caso o prédio dominante seja vendido? Há, artigo 1555º CC, mas,
mais uma vez, este artigo diz respeito à servidão legal. Então, e na servidão voluntária não há preferência?
Há, se as partes o estabelecerem nesse sentido, as parte ao abrigo do princípio da liberdade contratual não
estão proibidas de estabelecer, entre elas, regras de preferência, mas obviamente que precisam de o
estabelecer no contrato. Por outras palavras, no contrato pelo qual se constituiu a servidão é necessário que
se estabeleçam as regras de preferência e se houver um direito de preferência nesse caso e se o direito de
preferência tiver sido registado, então haverá oponibilidade relativamente à sua violação, nos termos gerais
das regras do artigo 416º a 418º CC. Notas: Para que a o direito de preferência tenha eficácia real é necessário
que seja registado.
Não há nenhum direito de preferência legal, por isso a pretensão do António não tem razão de ser porque ele
acordou a constituição da servidão, os prédios não estão encravados e, por estas razões se a servidão tiver
sido constituída validamente será sempre uma servidão voluntária e não uma servidão legal, ora o direito de
preferência do artigo 1555º CC diz respeito às servidões legais e não às servidões voluntárias.
Mas será que está constituída uma servidão de passagem? Será que foi mesmo constituída uma servidão de
passagem? A forma que as partes utilizaram para a constituição da servidão foi o documento particular, ora o
documento particular não é uma forma legalmente exigida para a constituição de Direitos Reais sobre coisas
imóveis.
Quando estamos a falar de constituição ou de transmissão de Direitos Reais sobre coisas imóveis a lei
estabelece ou a escritura pública ou o documento particular autenticado! No fundo, segue o regime ou da
compra e venda, aquando um negócio oneroso, ou da doação, negócio gratuito.

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As partes acordaram por documento particular e acordaram o direito de o Bento utilizar uma faixa de terreno
do prédio X que está identificada, então o que é que é o Bento em relação àquele caminho por onde passa
desde 2000? É possuidor, mas é possuidor formal, porquê? Porque Bento está a utilizar o caminho nos
mesmos termos em que utilizaria se a servidão tivesse sido devidamente formalizada, se a constituição da
servidão tivesse sido formalizada devidamente.
A servidão não foi devidamente formalizada, por essa razão o comportamento de alguém que atue da forma
correspondente ao exercício do direito, essa atuação qualifica-se como posse e se essa atuação corresponder
ao exercício de um direito que se tem essa posse chama-se causal, mas no caso de a atuação não
corresponder ao exercício de um direito e corresponder à aparência de direito essa posse denomina-se formal.
Bento é possuidor formal e não pode ser considerado detentor pois o caso prático determina que António lhe
deu o direito de utilizar, o que significa que não estamos perante um ato de mera tolerância pois António
atribuiu-lhe o direito de utilizar.
Portanto, se a forma legalmente exigida havia a constituição de uma servidão.
Assim sendo, não estamos perante uma servidão, estamos sim perante uma posse formal de servidão. É uma
posse não titulada porque assenta num negócio que tem uma invalidade formal e sendo não titulada presume-
se de má fé, esta presunção é ilidível e, neste caso, era fácil ilidir a presunção pelo contrato pois o contrato
poderia ser prova suficiente para demonstrar a inexistência de má fé.
Temos uma posse pública, pois o caminho está identificado e é uma posse pacífica, sendo que a posse foi
constituída a partir do ato do António.
O Bento é possuidor causal do terreno Y e é possuidor formal da servidão constituída no prédio X

2. A pretensão de António de vedar o acesso à faixa de terreno do seu prédio.


Pode, António pode vedar o acesso à faixa de terreno do seu prédio impedindo que Carlos continue a utilizar
aquele caminho pois o terreno X é de António.
António não poderia vedar o terreno se existisse, de facto, a servidão porque a servidão é um Direito Real e
se é um Direito Real tem de ser respeitado como tal, não obstante como apenas existe posse formal da
servidão António podia vedar o terreno e impedir a passagem do Carlos.
Não há servidão, mas há posse formal da servidão e ao vedar o terreno António está a esbulhar Carlos. O que
é o esbulho? É a perda da posse contra a vontade do possuidor, Carlos.
A lei dá formas de defesa do possuidor causal ou formal? Uma das ações a que o possuidor pode recorrer é a
ação de restituição (ação possessória). Notas: As ações possessórias são ações que defendem a posse, seja
a posse formal ou posse causal. Do ponto de vista das ações possessórias, do ponto de vista da legitimidade
para intentar uma ação possessória é irrelevante ser posse formal ou posse causal, é legítimo o possuidor
formal e o possuidor causal.
O possuidor causal pode defender a sua posse com uma ação possessória e pode defender o seu direito com
uma ação petitória, obviamente que se apenas for possuidor formal pode apenas a sua posse e não pode
defender qualquer direito porque não o tem.

3. A possibilidade de Carlos reagir a esta atuação de António.

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António, na qualidade de proprietário, pode construir o muro, mas também é evidente que ao construir o muro
impede a passagem de Carlos (possuidor formal) e, por isso, Carlos tem a seu dispor meios de defesa da
posse: ação de restituição. Carlos poderia reagir contra o esbulho com uma ação de restituição.
No final, o tribunal daria sempre razão ao António porque este é o proprietário do terreno e não há nenhuma
servidão predial.
A não ser que o Carlos para além da ação de restituição possa vir invocar outra coisa: invocar que por
usucapião adquiriu a servidão predial porque a usucapião tem como ponto de partida a posse formal, efetiva,
pública e que se mantenha por um determinado período de tempo, ou seja, existindo uma posse formal que
seja efetiva, pública e que se mantenha por um determinado período de tempo pode o possuidor por usucapião
adquirir o direito correspondente à sua atuação. Qual é o direito que corresponde à atuação de Carlos? É a
servidão. Tudo indica que o Carlos tenha posse e posse efetiva, pública, mas e o determinado período de
tempo, verifica-se? Não, pois o Carlos adquiriu em 2013 e estamos em 2016, deste modo não tem prazo para
a usucapião.
Ainda assim, pode haver acessão da posse porque Carlos adquire a posse formal da servidão a partir da
transmissão do anterior possuidor, ou seja, Bento (possuidor formal) vende o terreno a Carlos, e ao vender o
terreno a Carlos transmite o direito de propriedade sobre o terreno, mas também lhe transmite a posse pois a
posse transfere-se para Carlos. Com este raciocínio se chegarmos à conclusão que o Carlos adquire por
transmissão a partir de Bento, Carlos adquire a posse pela via derivada, adquirindo pela via derivada significa
que ele pode beneficiar do regime da acessão da posse no sentido de permitir juntar ao seu tempo de posse
o tempo de posse do Bento e o Bento tem posse desde 2000 (os 13 anos de Bento + 3 anos de Carlos = 16
anos).
Artigo 1256º nº1 CC: “Aquele que houver sucedido na posse de outrem por titulo diverso da sucessão por
morte pode juntar à sua a posse do antecessor.”.
16 anos é suficiente? Sim, porque é de boa fé, a posse do Bento era não titulada, mas facilmente Bento
conseguia ilidir a presunção de que a posse não titulada é de má fé, a posse do Carlos é indiscutivelmente de
boa fé.
Artigo 1296º CC: considerando a posse de boa fé e os 15 anos necessários para invocar a usucapião, Carlos
poderia por usucapião invocar a aquisição do direito correspondente à sua atuação.

4. A possibilidade de António cessar os efeitos do acordo celebrado com Bento.


Os efeitos do acordo celebrado com Bento já estão cessados por natureza porque o Bento já não tem nada a
ver com o assunto, mas pode o António impedir a passagem do Carlos? Tem fundamento porque esta servidão
foi constituída por usucapião, por outro lado vimos que o terreno não está encravado, o que significa que a
servidão não necessária para o prédio Y e como sabemos as servidões extinguem-se nos termos do nº1 do
artigo 1569º CC e em nenhum deles está prevista a desnecessidade, mas no nº2 as servidões constituídas por
usucapião, como é o caso, serão judicialmente declaradas extintas a requerimento do proprietário do prédio
serviente (A) desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante.
O C por usucapião podia conseguir a constituição da servidão que não tinha, sendo que ele apenas tinha posse
formal que adquiriu a partir do B, mas também é verdade que como o prédio dele não estava encravado a
servidão não era necessária e, tendo sido constituída como usucapião e, depois de estar constituída, o dono
do prédio serviente (A) judicialmente (ação judicial) requerer a sua extinção precisamente com fundamento na
desnecessidade.

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A desnecessidade é óbvia porque na hipótese prática está determinado que ambos os prédios, X e Y, têm
acesso à via pública.

17 de dezembro: Orientação
teórica Caso prático:
A proprietário de um terreno agrícola concedeu usufruto a B sobre esse prédio. Depois disso B concedeu
servidão de passagem a favor de C por contrato de doação. Nesse contrato, ficou estabelecida uma cláusula
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segundo a qual B assumia a obrigação de efetuar reparações no local da passagem sempre que tal fosse
necessário.
Entretanto B apercebeu-se que as despesas indispensáveis por causa das obras eram de montante tão
elevado que preferia deixar de ser usufrutuário e, por isso renunciou ao seu direito
Esta renúncia iria livrá-lo do cumprimento da obrigação de fazer as referidas reparações?
Resposta ao caso prático:
Em primeiro lugar é preciso saber se o usufrutuário pode constituir servidão predial. É mais ou menos intuitivo
que sim porque o usufrutuário tem o uso e fruição e, em geral, conceder uma servidão numa outra pessoa é
estar a conceder o uso parcial da coisa usufruída, no caso concreto o C adquire o direito de passar sobre o
prédio objeto de usufruto, portanto está a usar o prédio do A (proprietário) e do B (usufrutuário) de forma
limitada pois só passa.
O artigo 1460º CC estabelece explicitamente que o usufrutuário pode constituir servidões ativas ou passivas,
a saber todas as servidões são em simultâneo ativas e passivas pois são ativas para o prédio dominante e
passivas para o prédio serviente, portanto constituem um encargo para o serviente e para o prédio dominante
são um benefício (nesse sentido são ativas). De acordo com o artigo referido se a servidão for passiva para o
usufrutuário, como é o caso, ela extingue-se com a extinção do usufruto.
Ao contrário (que não é o caso da hipótese), se a servidão for ativa para o prédio usufruído, ela permanece
depois da extinção do usufruto porque para todos os efeitos é uma vantagem para o prédio. Portanto, quem
beneficiou foi o usufrutuário enquanto o usufruto existiu e o proprietário passa a beneficiar quando o usufruto
se extinguir e o proprietário de raiz passar a ter a propriedade plena.
O usufrutuário quando deu a servidão ao C obrigou-se a fazer as reparações que fossem necessárias na
passagem, sendo que para todos os efeitos o B assumiu uma obrigação perante o C. A questão que se põe
agora é saber se essa obrigação que B assumiu é uma obrigação normal ou se cabe na categoria das
chamadas obrigações reais.
As obrigações reais são aquelas obrigações que são obrigações pois implicam uma relação obrigacional, um
devedor e um credor, mas com a especialidade de que estas obrigações estando integradas no conteúdo de
um direito real acompanham esse direito, tendo também a oponibilidade erga omnes, noutras configurações.
Notas: São obrigações reais porque tal como os direitos reais têm oponibilidade erga omnes. Foram
constituídas entre A e B, mas se o B transmitir o seu direito essa obrigação que inicialmente vinculava A e B
passa a vincular A e C.
Na hipótese a questão seria saber se essa obrigação que o B assume perante o C é uma obrigação real ou
não.
As obrigações reais precisamente porque têm a tal oponibilidade erga omnes (perante terceiros) estão sujeitas
ao mesmo princípio, o chamado números cláusulos, artigo 1306º CC, a que se sujeitam os próprios direitos
reais. De acordo com o artigo 1306º CC só podem existir direitos reais nos casos previstos na lei, portanto
estendendo esta ideia às obrigações reais ficamos na mesma: só pode haver obrigações reais nos casos
previstos na lei, por isso as partes não podem atribuir carácter real a qualquer obrigação, só nos casos
previstos.
No que toca às obrigações reais o estar previsto na lei pode ter 2 significados:

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1. Há obrigações reais que estão previstas na lei porque a lei diretamente impõe essas obrigações, casos
do artigos 1411º, 1424º e 1472º CC, nestes três casos a lei impõe a certa pessoa (comproprietário,
condómino ou usufrutuário) o cumprimento de certas obrigações;
2. Mas pode significar também a lei permitir que as partes, por contrato, estabeleçam uma obrigação real.
Não há muitos casos, mas eles existem e um dele está presente na hipótese do caso prático: artigo
1567º nº4 CC, por acordo o proprietário do prédio serviente pode estabelecer, admitir ou consentir que
a obrigação de fazer obras na servidão se constitua através do acordo entre o dono do prédio serviente
e o dono do prédio dominante.
Em princípio, na normalidade quem tem que fazer reparações na passagem é o dono do prédio dominante
visto que quem tem o benefício acarreta com o prejuízo, ou seja, é o dono do prédio dominante é que terá que
efetuar as obras necessárias para o exercício da servidão. Notas: Não é uma obrigação, é um ónus! Não
obstante, a lei admite que seja o contrário: admite que o titular do prédio serviente assuma a obrigação das
obras necessárias, o Professor Gonzalez afirma que não é vulgar, mas admite-se que seja assim.
B ao conceder a servidão ao C aceita que não só fique onerado com a servidão como incida sobre ele (B). a
obrigação de fazer as reparações necessárias à passagem do C.
Este acordo entre B e C em princípio caberia na hipótese do artigo 1567º nº4 CC, então daqui decorre que a
obrigação de fazer essas obrigações teria carácter real, vinculava o B agora, mas se B eventualmente
transmitisse o seu usufruto passaria a vincular a pessoa que adquire-se esse usufruto.
O B entende que a despesa da reparação é demasiadamente elevada para os benefícios que tira para o facto
de ser usufrutuário, por isso quer renunciar ao usufruto para ver se se livra da obrigação.
Tudo depende da renúncia que estiver a fazer.
Se B simplesmente renuncia essa renúncia denomina-se abdicativa, esta renúncia abdicativa tem por
consequência a extinção do direito à qual se renunciou, no caso do usufruto artigo 1476º nº1 e) CC.
Renunciando abdicativamente a consequência é extinção do seu direito, o C que é o credor da obrigação de
fazer obras não beneficia nada com isso, pelo contrário, havendo renuncia abdicativa quem beneficia é o A,
extingue-se o usufruto desaparece a oneração que o A sofria (A deixa ter de suportar o B como usufrutuário).
Ora, se alguém beneficia com esta renúncia é o A e só isto já permite dizer que a obrigação não se pode
extinguir porque o C não tem nenhum benefício com esta renúncia.
Se o C não tem qualquer benefício significa que a obrigação se mantém, mas mantem-se com quem? Com o
B ou com o A? Quem é que tem de fazer as obras, o B ou o A? Em termos abstratos, o B mesmo que queira
fazer as obras já não pode, isto é: se o B renuncia abdicativamente extingue o usufruto, por outras palavras o
B deixa de ser usufrutuário.
Para fazer as obras é necessário ir ao local, ou seja, é necessário entrar no terreno por onde se faz a passagem
portanto o B se já não é usufrutuário já não tem legitimidade para entrar no terreno, em rigor o A pode impedir
o B de entrar, o que leva o Professor Gonzalez a dizer que a obrigação que antes era do B passou para o A,
houve uma transmissão chamada legal da obrigação que o B tinha de fazer as obras para o A porque é o único
que tem viabilidade prática no cumprimento, ou seja, só o A pode cumprir.
Dado que a obrigação se mantém e dado que a obrigação é real, o A tem de cumprir a obrigação.
Será preferível dizer que B permanece obrigado e que o A fica obrigado a permitir que o B aceda ao local para
fazer as obras. Notas: Esta é a ideia que o Professor Gonzalez acha mais coerente.

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Ao contrário, se o B fizer o que no caso cabe fazer: a renúncia liberatória, artigo 1476º nº1 e) CC, o beneficiário
da renúncia é o C (da renúncia liberatória). Notas: A renúncia liberatória serve para isto mesmo, ou seja,
renuncia-se para dar ao credor, C, a vantagem decorrente dessa renúncia. Portanto, nesta hipótese renunciar
liberatoriamente significa dizer que o direito de usufruto do B é oferecido ao C como contrapartida do não
cumprimento da obrigação. O B libera-se do cumprimento oferecendo ao C o direito de usufruto que B tem.
É possível, mas no caso tinhamos de levantar a sub-hipótese. É possível se o usufruto for transmissível, esta
renúncia implica transmissão de B para C. Notas: Em geral, o usufruto é transmissível, ou seja, na lei o usufruto
em geral é transmissível, mas para sabermos se é transmissível ou não temos de ver se no ato de constituição
de usufruto o proprietário não terá proibido a transmissão, artigo 1444ºCC.
A lei encara o usufruto, em princípio, como direito transmissível, mas o nº1 do artigo 1444º CC estabelece isto
salvo quando a lei ou o ato de constituição digam o contrário. Notas: A lei não chama transmissão, chama de
traspasse, mas em rigor é transmissão.
Teríamos então de fazer assim: se o usufruto fosse transmissível o B podia renunciar ao usufruto
liberatoriamente a favor de C, se não fosse transmissível não podia.
Se pudesse renunciar liberatoriamente, neste caso concreto credor e devedor são titulares de direitos sobre
coisas diferentes, os direitos de B e os de C não incidem sobre a mesma coisa e neste caso a renúncia
liberatória extingue automaticamente a obrigação, mas não produz automaticamente a transmissão do devedor
para o credor (do B para o C). A transmissão fica dependente de o credor (C) aceitar, a saber para que o direito
de usufruto se transmita do B para o C é preciso que C aceite e para que B se liberte da obrigação por causa
da renúncia não é preciso aceitação, o efeito liberatório da renúncia produz-se quer o C aceite, que não aceite.
A transmissão do direito só se verifica se eventualmente C, credor, aceitar a transmissão, caso contrário a
transmissão não se sucede.

7 de janeiro: Orientação
Teórica Caso prático:
A, B e C são comproprietários de um terreno agrícola com 10 mil metros quadrados.

A sem oposição de B ou de C construiu uma vivenda de dois andares com área de 300 metros quadrados
durante 2 anos.
Passados outros 2 anos, A entende que o terreno lhe pertence exclusivamente na totalidade em virtude de a
vivenda ter um valor superior ao terreno.
Quid Juris?
Resposta:
Em primeiro lugar temos de saber se estamos perante uma situação de benfeitoria ou de acessão.
Considerando a benfeitoria ou a acessão o problema é sempre o mesmo: estamos perante uma situação em
que alguém que incorpora coisas suas numa coisa alheia, por isso o problema que se coloca é a quem é que
pertence o conjunto.
Tradicionalmente, e entre nós, sempre que exista uma relação jurídica prévia que autorize o autor da
incorporação a realizá-la entende-se que se deve aplicar o regime das benfeitorias, por isso o regime da
acessão fica para ser aplicado quando não seja assim, ou seja, perante este raciocínio só se aplica o regime
da acessão quando o autor da incorporação não tivesse uma relação jurídica prévia que lhe permitisse essa
incorporação.
A ideia é se há compropriedade, como é o caso da hipótese, é verdade que o terreno é do A, mas também é
verdade que é do B e do C, portanto, em parte o terreno é alheio e isto já é suficiente para poder aplicar a
acessão. O simples facto de o terreno ser parcialmente alheio já é suficiente para que estejamos perante um
problema de acessão, pois para todos os efeitos A construiu algo num terreno que não é só dele.
O critério referido é muito utilizado e implica uma consequência pois a ser assim e espcialmente tratando-se
de acessão imobiliária é quase impossível aplicar a acessão, pois quase tudo será uma benfeitoria. Porquê?
Porque realizar uma qualquer construção em solo alheio não pode ser um ato ocasional, não pode acontecer
num minuto ou dois, é algo que supõe alguma relação mais ou menos duradoura com o solo para que a
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incorporação seja possível daí que a construção tenha levado 2 anos.


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Portanto, se não houver mais nada no mínimo há posse. Aquele que constrói em terreno alheio, pelo menos
tem a posse desse terreno, ora se a posse é suficiente para irmos aplicar o regime das benfeitorias, pelo menos
na acessão imobiliária é quase impossível aplicá-la. Notas: A acessão mobiliária ainda pode ser aplicada
porque esta pode resultar de situações puramente ocasionais e a imobiliária supõe uma relação mais ou menos
duradoura e estável com a coisa em que se faz a incorporação.
O Professor Gonzalez acredita que a distinção entre benfeitoria e acessão se faz pela própria definição do que
é uma benfeitoria. Benfeitoria é um melhoramento e para estarmos perante um melhoramento temos de supor
sempre que a incorporação se traduz numa coisa acessória, numa coisa marginal.
A benfeitoria é reparar o telhado ou reparar as porta, algo que seja acessório, secundário em relação à coisa
principal. O Professor Gonzalez afirma que choca afirmar que A fez uma benfeitoria no próprio terreno e no
terreno dos outros dois (B e C), uma vivenda com 300 metros quadrados é uma simples benfeitoria? Não faz
sentido.
Em todo o caso o Professor Gonzalez determina que não tem quaisquer dúvidas de que se aplicarmos o critério
tradicional, isto dava benfeitoria, por isso, em princípio seria benfeitoria útil pois aumenta o valor. Considerando
a benfeitoria como útil, no máximo, daria ao A o direito de ser indemnizado pelo enriquecimento sem causa,
artigo 1273º nº2 CC, mas também iria perder a propriedade da vivenda pois a vivenda ficaria a pertencer ao A
e ao B e C.
Não obstante, se entendêssemos que era acessão, o Professor Gonzalez afirma que acha que é a única coisa
que faz sentido numa hipótese destas, o problema que se punha a seguir era saber se o caso é de acessão
de boa ou má fé (artigos 1340º ou 1341º CC).
De acordo com o artigo 1340º nº4 CC, onde estão os critérios para identificação de boa ou má fé, temos dois
critérios:

1. Temos de saber se aquele que fez a incorporação (A) ignorava desculpavelmente que o terreno era
alheio ou não. No caso prático, o terreno era parcialmente alheio.
Ora se os três são comproprietários, mesmo que o A ignorasse que era alheio não podia ignorar, ou
seja, mesmo que ele efetivamente ignore não ignora de forma desculpável pois não é aceitável que o
A desconheça que está em compropriedade. Assim sendo, o primeiro critério não está verificado.
Então, se formos por este primeiro critério o A está de má fé pois não pode ignorar que o terreno não
é só dele.
Mesmo que o A tivesse pedido a B e C para construir e estes tivessem dito que sim, o problema não fica
resolvido, pois para todos os efeitos há uma construção feita por uma pessoa num terreno que não é só dela.
O consentimento de B e C não salvaria a situação, só salvaria se em primeiro lugar tivessem feito a divisão do
terreno e atribuído ao A aquela parte em que ele construiu.
O consentimento apenas significa que ao não está a atuar ilicitamente pois quando B e C consentem A está a
fazer aquilo que B e C permitem, portanto não há ilicitude no comportamento do A. Todavia, não faz com que
a casa seja só do A, a autorização/consentimento não chega pois o terreno continua a ser de todos.

2. Mesmo que o incorporador, construtor (A) saiba que o terreno é alheio ou não deva ignorar que o
terreno é alheio a verdade é que pode dar-se o caso de o dono do terreno, no caso concreto B e C
terem autorizado a construção. Está de boa fé aquele que incorporou mediante autorização de quem
for o dono do terreno.
Obviamente que é necessário sabermos o que, de facto e concretamente, significa autorizar.

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Não é qualquer autorização que põe o incorporador numa posição de boa fé porque, em geral, quem
constrói em terreno alheio mesmo que seja com a autorização do dono do terreno é quem está a correr
riscos, não sendo o dono do terreno. Por outras palavras, em geral quem está a um terreno que não é
seu é que está a arriscar.
Então, normalmente uma autorização explícita, expressa, não pode valer mais do que um mero ato de
tolerância. Aquele que autoriza explicitamente apenas está a dizer o que está a permitir, pois o significa
normal dessa autorização é um mero ato de tolerância, está a aceitar que o outro construa e jamais a
conceder-lhe direitos sobre essa construção.
Se houver autorização explícita seguem-se os termos da autorização, ou seja, tem que se ver o que
é. que foi autorizado e em que medida foi autorizado. O artigo 1340º nº4 CC quando refere autorização
refere-a como sinónimo de falta de oposição.
No âmbito do contrato-promessa de compra e venda imaginemos que A prometeu vender ao B um terreno
para construção e o B prometeu comprar, A entregou esse terreno só com o contrato-promessa ao B. O B
começou a construir, em rigor está a construir num terreno que não é dele, pois com o contrato-promessa o B
promitente comprador não é proprietário do terreno pois ainda não houve escritura de compra e venda, portanto
tem que se entender que ele está a fazer apenas aquilo que um proprietário normal deveria fazer.
Objetivamente está a construir em terreno alheio, mas se o promitente vendedor (A) lhe entregou o terreno e
se tem maneira de entender que a construção já começou e não se opôs, aqui sim pode-se afirmar que A
autorizou.
Na hipótese é a mesma coisa. O A começou a construção, o B e o C não se opuseram a isso, por esta razão
pode-se dizer que permitiram autorizar a construção, nessa medida podemos afirmar que A está de boa fé pois
teve autorização de B e de C para aquilo que está a fazer.
Ao dizermos que A está de boa fé só temos de aplicar o critério do valor, artigo 1340º nº1 e 3 CC, aqui a
questão é saber o que vale mais. Vale mais a vivenda ou o terreno? Se a construção valer mais, artigo 1340º
nº1 CC e o A fica com o direito de adquirir o terreno compensando o B e o C pela perda. No caso de o terreno
valer mais o B e o C ficam com o direito de adquirir a vivenda pagando ao A o correspondente ao valor da
vivenda, claro que o A também será comproprietário da vivenda pois se é comproprietário do solo será
comproprietário da vivenda, tem é de suportar B e C como comproprietários da vivenda.
B e C para serem comproprietários da vivenda têm de pagar para adquirir, têm de pagar o valor correspondente
ao seu benefício.
No caso de a construção valer mais do que o terreno, o A ficava com o direito de adquirir o terreno e
compensava B e C pelos valores perdidos, assim A ficava o proprietário exclusivo do todo.
Há uma outra questão importante que na prática é o maior problema: supondo que a construção vale mais do
que o terreno, portanto estamos a aplicar o artigo 1340º nº1 CC, o A fica com o direito de adquirir a totalidade
do terreno, ou seja, adquirir os 10 mil metros quadrados ou só com o direito de adquirir a parcela de terreno
que está ocupada com a construção? A acessão é total ou pode ser parcial?
Há uma divisão de opiniões.
Há quem entenda que a acessão tem de ser total, ou seja, querendo adquirir tem de se adquirir a totalidade
do terreno pagando o valor correspondente à totalidade.

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Há quem entenda que a acessão é meramente parcial, diz respeito apenas àquela parcela de terreno que foi
ocupado com a construção, neste caso. O Professor Gonzalez acha que esta hipótese é aquela que mais. Faz
sentido pois afirma que não há qualquer necessidade de conceder-lhe o direito de expropriar tudo.
A acessão pode ser parcial, desde que isso não envolva violação das regras sobre loteamentos urbanos.
Notas: Quando se loteia, quando se parcela um terreno não se pode parcelar de forma em que alguém fique
encravado, justamente para evitar constituição de servidões de passagem.
Se no caso concreto, A invocasse acessão parcial e depois fica encravado, então a acessão não pode ser feita.
Além disto, o A pode invocar outra hipótese que é a usucapião. O A precisa de bastante mais tempo, mas
antes de mais nada, por exemplo, no caso da compropriedade, no artigo 1402ºCC, está estabelecido que a
utilização exclusiva da coisa por um dos comproprietários ou a utilização em medida superior à sua quota não
faz adquirir posse exclusiva.
No caso da hipótese, mesmo que o Ase comportasse como proprietário único e exclusivo do solo, a verdade
é que há compropriedade com B e C, portanto para invocar usucapião do todo, em princípio não consegue, a
menos que, artigo 1406º nº2 CC, tivesse havido uma inversão do titulo.
Para se conceber a possibilidade de o A invocar usucapião do solo todo (10 mil metros quadros) teríamos de
supor que ele fizesse inversão do titulo contra B e C e só após a inversão do titulo é que começaríamos a
contar o prazo de usucapião, que no caso concreto, dado que falta titulo (a posse seria não titulada), só podia
ser algum dos prazos máximos do artigo 1296º CC, 15 ou 20 anos.
Teria eventualmente o mesmo efeito que a acessão, só que primeiro supondo inversão e depois supondo este
decurso deste prazo muito longo.
A usucapião numa hipótese destas tem o mesmo problema que a acessão: usucapião dos 10 mil metros
quadrados ou só do que está ocupado com a construção da vivenda? Usucapião total ou parcial? A resposta
é a mesma da acessão.
A usucapião poderá ser parcial desde que isso não implique violação das regras do loteamento, se implicar a
usucapião teria de ser uma usucapião total e para ser uma usucapião total teríamos de pressupor que a
inversão do titulo foi feita para tudo, ou seja, se o A se tivesse oposto ao B e ao C declarando que era único
possuidor teria de dizer que era possuidor da totalidade do terreno (10 mil metros quadrados).

8 de janeiro:
Prática Hipótese
tipo teste:
Em junho de 2014, António vendeu a Bento, por escritura pública e pelo preço de 1.000€ um terreno destinado
a construção. Em outubro de 2014, Bento, igualmente por escritura pública doou a Carlos, seu filho, o terreno.
Ambas as transmissões foram registadas devidamente.
Em agosto de 2015, Carlos concluiu a construção de uma vivenda de luxo no terreno em causa, composta por
três pisos e em cujo jardim construiu duas piscinas e um campo de ténis, na qual passou a residir com a sua
família.

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Em setembro de 2017, transitou em julgado a sentença judicial proferida numa ação que havia sido proposta
e registada por António em setembro de 2015, que declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado
entre António e Bento.
António não gosta de nenhuma das construções efetuadas por Carlos e pretende recuperar a plena
propriedade do terreno.
Quid Juris?
Solução:
O problema que aqui se coloca prende-se com os efeitos da sentença que transitou em julgado em setembro
de 2017 que declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado entre António e Bento. Isto é relevante
porque quando é declarada a nulidade de determinado contrato a declaração de nulidade produz efeitos tanto
para o futuro, como efeitos retroativos (efeitos para trás), artigo 289º CC.
A declaração de nulidade tem efeito retroativo, ou seja, a situação que existia antes da celebração do contrato
tem de ser reposta! Na nossa hipótese, antes da celebração do contrato o imóvel era do António, logo o
proprietário era de António. Foi o contrato celebrado com Bento que transmitiu a Bento a propriedade que era
do António, o problema é que o contrato foi declarado nulo e tendo sido declarado nulo, significa que a venda
A-B não produziu efeitos, então o imóvel nunca deixou de ser do António devido ao efeito retroativo da
declaração de nulidade.
Agora, o problema coloca-se em relação ao segundo negócio pois se o negócio foi declarado nulo e a situação
anterior foi reposta significa que Bento não adquiriu a propriedade e não tendo adquirido a propriedade a partir
do António, não podia ter transmitido ao Carlos.
Temos de verificar se há alguma forma alternativa de evitar a destruição dos efeitos do negócio C-B.
Para já e na medida em que o negócio foi declarado nulo, o que é que seria o Carlos em relação ao terreno?
Não obstante a nulidade do contrato, Carlos atuou como se efetivamente fosse o dono, proprietário do terreno.
Neste sentido, Carlos é possuidor formal porque quando Carlos constrói tudo isto está a construir no
pressuposto de que é proprietário, está a atuar como atuaria qualquer outro proprietário. Notas: Carlos nção é
proprietário por força da nulidade do contrato A-B.
Será uma posse adquirida pela transmissão, pois B doa a Carlos, será uma posse titulada porque não há
nenhum vício de forma, presumivelmente de boa fé e efetivamente de boa fé porque Carlos está convencido
de que o terreno é seu, posse pública e é uma posse pacífica.
Qual é o problema? É que esta posse vai contar muito pouco, pois António é o dono do terreno, o que significa
que no confronto entre o titular do direito de propriedade e o possuidor formal acabará por prevalecer sempre
a posição do titular do direito. Notas: Sempre exceto num caso, quando o possuidor formal já tenha prazo que
lhe permita invocar usucapião e na hipótese não há prazo para usucapião.
Deste modo, temos de verificar se há alguma forma de a nulidade do negócio A-B não prejudicar o negócio B-
C e, de facto, a regra do artigo 289º CC, tem uma exceção que diz respeito aos imóveis e coisas móveis
sujeitas a registo.
Artigo 291º CC: não obstante a declaração de nulidade, esta pode não afetar os negócio celebrados
posteriormente por terceiro de boa fé, sendo que para isso é necessário que se verifiquem todos os requisitos
presentes no artigo 291º CC.
Perante a hipótese, falta pelo menos um dos requisitos exigidos.
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Os requisitos são:
• Terceiro de boa fé, que está patente no artigo 291º nº3 CC;
• Que o registo de aquisição seja anterior ao registo da ação de nulidade ou anulação, consoante a
hipótese, quando António registou a ação em setembro de 2015, Carlos já tinha registado a aquisição
do terreno em setembro de 2014;
• O terceiro deve adquirir o direito a titulo oneroso e o Carlos adquire a titulo gratuito, através de uma
doação de Bento.
Então, por força da nulidade deste negócio e pelo facto de Carlos ter adquirido a titulo gratuito, Carlos vai ser
mesmo prejudicado com a nulidade do negócio A-B, sendo que o imóvel tem de regressar ao A.
A com a posse e apenas a posse também não lá chegamos, pois a posse de Carlos não lhe permite a
aquisição do terreno por usucapião.
António, legítimo proprietário do terreno não gosta das construções e quer recuperar a plena propriedade do
terreno, ou seja, quer que tudo seja mandado abaixo.
Então, se o negócio celebrado entre A-B é nulo e, consequentemente, o negócio B-C é nulo, significa que B
nunca foi proprietário e como nunca foi proprietário nunca pode ter transmitido a propriedade ao C. Deste
modo, quando o C constrói está a construir numa coisa que não é sua, ou seja, o terreno é do A.
A construção foi incorporada por C no terreno do A, além disso a separação física já não é possível.
Obviamente que se tudo for mandado abaixo é possível a separação física, claro está que na perspetiva do A
a destruição total faz sentido, mas quais as consequências que isso produz em C? Neste caso é importante, é
perceber se aquela construção foi feita de boa ou de má fé, pois se C tiver feito a construção de má fé ele não
poderia ser protegido. Notas: Há casos em que o incorporador estar de boa ou de má fé é irrelevante pois a
consequência é a mesma, falamos da situação do artigo 1339º CC. Neste artigo se um sujeito no seu terreno
constrói ou planta com materiais ou sementes que não são suas estando de boa fé ou estando de má fé adquire
sempre a propriedade dos materiais.
Num terreno próprio quando um sujeito incorpora coisas que não são suas, e se já não for possível separá-las
a solução passa pelo sujeito ficar com aquilo que não é seu, por exemplo A tem um terreno e pega nos tijolos
do terreno de B e constrói uma casa, já não é possível retirar de lá os tijolos e nem faz sentido demolir a casa
pois a demolição da casa não traz nenhuma vantagem para o proprietário dos tijolos. A terá de pagar a B pelos
tijolos utilizados e, ainda, uma indemnização pelos prejuízos provocados.
Temos de atender à boa e à má fé do incorporador, a saber:
•Se quem faz a obra está de má fé não merece proteção, sobretudo se o dono do. terreno em que a
obra for feita não quiser aquela construção, por isso por decisão do dono do terreno a obra pode
mesmo ser demolida porque é interesse do dono do terreno ficar com aquilo que é seu, da maneira
que ele quer.
Se o C constrói de má fé, por opção de A surgem 2 hipóteses:
1. Vai tudo abaixo, pois A tem o direito de exigir (como está expresso no artigo 1341º CC) que a
construção seja demolida, a saber que este direito é potestativo;
2. Não vai tudo abaixo e quer ficar com a construção, neste caso C será pago não nos termos gerais,
mas de acordo com as regras do enriquecimento sem causa;
• Havendo boa fé do sujeito incorporador, é necessário atendermos ao critério económico, ou seja, se
alguém de boa fé construir obra em terreno alheio e o valor dessa construção, sementeira ou

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plantação for maior do que o valor que antes tinha, o autor da incorporação pode adquirir (aquisição
potestativa, pois fica com o direito de adquirir) o terreno pagando o valor que o terreno tinha antes de
ter incorporado a obra, sementeira ou plantação. No caso de o valor acrescentado ser menor, quem
tem o direito de adquirir é o dono do terreno com a obrigação de indemnizar o autor da incorporação,
artigo 1340º nº1 e 3 CC.
No caso de o valor ser idêntico aplicamos o artigo 1340º nº2, que determina o critério da licitação.
Notas: Em relação à boa fé, temos de atender à autorização. A autorização não é uma autorização expressa,
é uma autorização tácita, no sentido da não oposição! Havendo uma autorização expressa em que o dono do
terreno autoriza expressamente alguém a construir naquilo que é seu, se seguir a forma pedida temos direito
de superfície, se não segue a forma devida estaremos perante posse formal no direito de superfície.
No fundo, a autorização (tácita) é um ato de não oposição, isto segundo as palavras do Professor Sérgio Brás.

- Sobre benfeitorias
Existem dois critérios para qualificar benfeitorias:

1. Critério tradicional: critério que diz que a benfeitoria é feita com alguém que tem determinada relação
contratual com a coisa, por exemplo contrato de arrendamento;
2. Benfeitoria quando é possível distinguir a benfeitoria da coisa principal.
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