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SUMÁRIO

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SUMÁRIO: 

1. Introdução; 2. A regra geral da não aplicabilidade da usucapião entre


condôminos; 3. O cabimento da usucapião por herdeiro condômino; 4. A possibilidade da
usucapião do bem em condomínio pelos cônjuges; 5. Conclusão; 6. Referências Bibliográficas. 

INTRODUÇÃO

No âmbito do nosso ordenamento jurídico, especificamente na seara dos direitos reais,


observa-se que, quando uma regra determina uma interpretação a ser seguida, esta pode ser
contrariada, dessa forma, estaremos diante de uma exceção à regra, que além de significar a
evolução do direito, contribui para a pacificação das relações sociais.

O instituto do condomínio, entendido aqui como a co-propriedade, parte de um de seus


pressupostos do qual cada condômino pode usar e fruir da coisa como um todo, não admitindo
que um outro condômino possa excluir da posse os demais, a respeito do assunto e de acordo
com a temática do estudo em questão, assim manifesta o renomado civilista Caio Mário da
Silva Pereira.

[...] em nosso direito, assim antigo quanto moderno, não tem cabido o
usucapião entre condôminos; uma vez que não é lícito a um excluir da
posse os demais, mostra-se incompatível com esta modalidade aquisitiva
a condição condominial, que por natureza exclui a posse com animus
domini.
(PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de Direito Civil, volume IV,
Editora Forense, Rio de Janeiro, 12ª ed., 1997, p. 114)

 Quanto à usucapião, tem-se que este instituto se apresenta como um meio de se transmitir a
propriedade para um possuidor, deixando de lado o domínio daquele que fora o seu
proprietário, em outras palavras é o modo de se adquirir a propriedade, com base no aspecto
temporal e na observância da lei.

A discussão que se pretende levantar neste artigo são as inovações jurídicas que
possibilitaram a usucapião conjugal no condomínio, e os entendimentos por parte dos Tribunais
Superiores que concedem a possiblidade do herdeiro usucapir as demais partes dos
condôminos, desde que observados os requisitos legais.

A REGRA GERAL DA NÃO APLICABILIDADE DA USUCAPIÃO ENTRE CONDÔMINOS

A comunhão existirá quando determinado direito pertencer a vários indivíduos ao mesmo


tempo. Se a comunhão recair sobre um direito de propriedade, ter-se-á o condomínio ou
compropriedade. O condomínio será, portanto, uma espécie do gênero comunhão.

Segundo Caio Mário da Silva Pereira, “dá-se o condomínio quando a mesma coisa pertencer a
mais de uma pessoa, cabendo a cada uma delas igual direito, idealmente, sobre o todo e cada
uma das partes.”.

O poder de disposição da coisa, com isso, se materializa simultaneamente em várias pessoas


e se encontra reciprocamente limitado no exercício dos direitos concorrentes, compensando-se
as vantagens e sacrifícios dos condôminos.

O artigo 1.314 do CC/02 dispõe que: “cada condômino pode usar da coisa conforme a sua
destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de
terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal ou gravá-la”.   Quando o artigo
faculta o poder de reivindicar a coisa de terceiro, de maneira explícita, não se abrangem os co-
proprietários, pois, enquanto não se partilha o bem, inexiste quinhão concreto. Nenhum dos
sujeitos pode opor propriedade sobre a totalidade da coisa, pois ela se encontra fracionada.
Ademais, o móvel da ação é a restituição da coisa (que esteja em poder de terceiro estranho
aos condôminos), não sendo possível retirar o condômino do que lhe pertença.

A partir disso, deduzimos a regra da não aplicabilidade da usucapião entre condôminos. O


condômino, dono de uma fração ideal da coisa, não pode ser retirado de seu domínio pelo
outro condômino, nem mesmo pelo uso da usucapião. Somente um terceiro estranho ao
condomínio poderá ser retirado da posse do condomínio que não lhe pertença.

No tocante às regras condominiais, o código civil e a doutrina são claros no que concerne ao
fim do condomínio. A perpetuidade do condomínio não é regra, sendo sua extinção sempre
admitida e esperada. O condomínio não é qualificado pela perpetuidade. Pelo contrário, por se
tratar de forma anômala de titularidade, a transitoriedade é de sua essência, pois o
ordenamento jurídico cuida de disciplinar a sua extinção.

A divisão é uma das formas de extinção da coisa comum, cujo desiderato é conferir a cada um
dos ex-condôminos uma área concreta e perfeitamente individualizada.  Ou seja, materializa-se
em uma coisa certa aquilo que anteriormente era fração ideal, abstratamente pertencente a
cada comunheiro.

No entanto, mesmo havendo a regra do não uso do instituto da usucapião entre condôminos,
este pode ocorrer. Ao se constatar que um dos condôminos esteve na posse do bem com
exclusividade durante prazo considerável, prevalecerá a usucapião, e não se cogitará da
faculdade de divisão, pois já terá havido o falecimento do direito de propriedade dos demais
condôminos sobre a coisa comum. Haverá, portanto, a mitigação da regra de não
aplicabilidade da usucapião entre condôminos. Tal mitigação ocorrerá nos condomínios pro
indivisos, pois se um dos condôminos titulares de fração ideal da coisa permanecer na posse
da coisa de forma contínua, total e pacífica, caracterizar-se-á a usucapião.

No condomínio pro diviso (em que já há a noção das partes reais de cada condômino e não
somente uma noção de partes ideais), a usucapião pode atingir limitadamente uma parte
restrita do condomínio, mantendo-se a comunhão sobre o restante e com isso a possibilidade
de divisão.

Via de regra, portanto, não é possível a usucapião entre condôminos. Nesta esteira, segundo o
festejado doutrinador Caio Mário da Silva Pereira, o condômino não pode usucapir frente aos
demais co-proprietários, pois a condição condominial exclui a posse cum animo domini.
Todavia, frente a algumas situações factuais, a usucapião ajuizada por um dos condôminos
pode prosperar. É o caso, por exemplo, de exercício exclusivo da posse por um dos
condôminos do bem a ser usucapido (já tratado anteriormente).

A questão, então, tem-se configurada possível a partir do momento em que o condômino


demonstrar a inexistência de composse com os outros co-proprietários, onde começará a fluir o
prazo prescricional aquisitivo da propriedade. De tal sorte, entende também a doutrina que
aquele, seja herdeiro ou condômino, que pleitear usucapião contra seus consortes, deverá
provar que cessou de fato a composse, estabelecendo posse exclusiva pelo tempo necessário
à usucapião extraordinária, com os demais requisitos que esta requer, de maneira que só a
partir de então será estabelecida a posse exclusiva pelo tempo necessário à usucapião, com
os demais requisitos que esta requer.

Nesse contexto, é claramente possível o reconhecimento da usucapião para um dos


condôminos contra os outros quando o condomínio deixa de existir pela posse exclusiva do
primeiro que impossibilita a composse pelos demais.
No entanto, segundo Pontes de Miranda, não se trata de composse, mas da posse do todo por
um só condômino, que passou a ter a coisa como sua, com a exclusão dos outros. A razão
disso é clara – compreende-se que a comunhão, nesses casos, embora existindo de direito,
deixou de existir de fato, e desde esse momento começa a correr a prescrição. Afirma ainda o
jurista que é necessário que a posição do possuidor pro sue venha de uma série de atos
indicativos desse ânimo, não bastando o simples exercício da posse.

Carlos Roberto Gonçalves posicionando sobre o assunto explica que por não ter ânimo de
dono, não poderia usucapir, salvo em situações excepcionais, em que o referido ânimo restar
demonstrado em razão de circunstâncias especiais, como foi dito anteriormente.

Os poderes que lhe são conferidos são os de simples administração. Não pode praticar atos
que exijam poderes especiais, tais como alienar a coisa, receber citações etc. Poderá,
entretanto, alienar bens que ordinariamente se destinam à venda, como frutos ou produtos de
propriedade agrícola. Combinando-se o dispositivo em apreço com o art. 1.323 do mesmo
diploma, que prestigia as deliberações da maioria, deve-se entender que também neste caso
deve prevalecer a vontade desta, sendo irrelevante a discordância ou oposição da minoria.

Tal fato, portanto, poderá minorar a possibilidade de usucapião por um dos condôminos, já que
haverá perfeita oposição aos atos de um só dos co-proprietários, deixando assim de configurar
uma possível usucapião.

O CABIMENTO DA USUCAPIÃO POR HERDEIROS CONDÔMINOS

Dispõe o artigo 1784 do Código Civil, baseando-se no principio da Saisine, que se abre a
sucessão com a ocorrência do evento morte. Diante disso, a herança será transmitida
imediatamente a todos os herdeiros, sejam eles legítimos ou testamentários. Em regra, tendo
em vista o caráter de universalidade de bens da herança, o patrimônio deixado pelo de
cujus compõe o denominado espólio, massa indivisa de bens. Nesse sentido, a herança é
indivisível até que seja prolatada a sentença judicial que determine a partilha dos bens.

O cabimento da ação de usucapião sobre bens que compõe a herança, inicialmente deve ser
analisado como uma impossibilidade, tendo em vista que não seria licita a exclusão da posse
por um condômino em detrimento dos demais.  Assim, afirma o ilustre doutrinador civilista
Carlos Roberto Gonçalves:

Em princípio, não é lícito a um condômino excluir a posse dos demais.


Dispõe a propósito o art. 1.324 do Código Civil que “o condômino que
administrar sem oposição dos outros presume-se representante comum.
Por essa razão, mostra-se, em regra, incompatível com a prescrição
aquisitiva a convivência condominial, que, por sua natureza, exclui a
posse com animus domini. (GONÇALVES, p. 370).

Entretanto, há posicionamentos jurisprudenciais no sentido de que uma ação de usucapião


proposta por herdeiro condômino em face dos demais seria válida. Nesse sentido, seria
imprescindível a existência de algumas situações especificas para que seja procedente tal
pedido. Conforme salienta Carlos Roberto Gonçalves:

A jurisprudência tem, todavia, admitido tal modalidade aquisitiva do


domínio em casos especiais, ou seja, desde que a posse do condômino
tenha sido exclusiva sobre o bem usucapiendo e com ânimo de dono,
caracterizado por atos exteriores que demonstrem a vontade de impedir a
posse dos demais condôminos, como se proprietário único do imóvel
fosse. (GONÇALVES, p. 370).
A propósito, colacionam-se abaixo importantes jurisprudências do STJ admitindo tal
possibilidade:

CIVIL. USUCAPIÃO DECLARADA EM FAVOR DE CONDÔMINO.


REFLEXOS NA AÇÃO ORDINÁRIA PROPOSTA POR OUTRO
CONDÔMINO CONTRA TERCEIRO EM RAZÃO DA MESMA ÁREA. O
usucapião de parte certa e determinada de condomínio tem o efeito de,
nesta medida, individuar a área desapossada como propriedade
exclusiva; já não subsistindo o condomínio, cessa a incidência do artigo
623 do Código Civil. (...). (STJ, REsp nº 101.009/SP, Rel. Min. Ari
Pargendler, j. em 13.10.98, DJU 16.11.98, p. 40, Lex-STJ 117/157, RT
764/175).

USUCAPIÃO. CONDOMINIO. PODE O CONDOMINO


USUCAPIR, DESDE QUE EXERÇA POSSE PRÓPRIA
SOBRE O IMÓVEL, POSSE EXCLUSIVA. CASO, PORÉM, EM QUE O
CONDÔMINO EXERCIA A POSSE EM NOME DOS
DEMAIS CONDÔMINOS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO (COD. CIVIL,
ARTS. 487 E 640). 2. ESPÉCIE EM QUE NÃO SE APLICA O ART. 1.772,
PARAGRAFO 2. DO COD. CIVIL. 3. RECURSO ESPECIAL NÃO
CONHECIDO. (STJ, REsp nº 10.978/SP, Rel. Min. Nilson Naves, j. em
25.05.93, DJU 09.08.83). (Grifos não autênticos).           

Este é também o posicionamento do egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. POSSE DECORRENTE DE


SUCESSÃO. CONDIÇÕES. REQUISITOS PRESENTES. Comprovando
o condômino que tinha a posse exclusiva de parte do imóvel, com os
requisitos aptos a configurar a prescrição aquisitiva, pelo prazo
suficiente, com ânimo de dono e sem a oposição de quem quer que
seja, em área localizada e identificada, faz jus à declaração do
usucapião em seu favor. (TJMG. 18ª Câmara Cível. Apelação nº
1.0604.06.000333-1/001. Rel. Des. Unias Silva, DJ: 22/02/08). (Grifos não
autênticos).

Desta forma, é possível afirmar que é plenamente possível um dos herdeiros usucapir bem
objeto de herança, excluindo-se os demais sucessores, desde que esse herdeiro tenha (a)
exercido, de forma exclusiva, a posse do bem com animus domini e (b) cumprido os demais
requisitos legais.

A POSSIBILIDADE DA USUCAPIÃO DO BEM EM CONDOMÍNIO PELOS CÔNJUGES

Com o advento da Lei 12.424/2011, que teve por objetivo a modificação da Lei 11.977/2009,
que disciplina o programa "Minha Casa, Minha Vida", surgiu uma figura inovadora de
usucapião, inserida no Código Civil através do art. 1.240-A, com a seguinte redação:

Art. 1240-A: Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e


sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de
até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade
divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar,
utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio
integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. 

§ 1o  O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo


possuidor mais de uma vez.
A modalidade de usucapião é chamada por alguns doutrinadores de “usucapião familiar”,
enquanto outros preferem denominá-la de “usucapião especial urbana por abandono do lar”.
Certo é que, independente do título, a inovação veio a pacificar a possibilidade de usucapião
do bem em condomínio entre os cônjuges, tema a muito debatido.

A intenção inicial do legislador na inserção dessa modalidade de aquisição de propriedade, em


função do programa em que estava inserida, foi a proteção do lar familiar, com especial
atenção às famílias carentes que se viam, com o abandono do cônjuge/companheiro,
impossibilitadas de regularizar sua moradia. A modalidade, embora polêmica, possui inegável
amplitude social, atendendo, como ensina o jurista Vitor Frederico Kümpel (2014, p.01), aos
preceitos constitucionais da função social da propriedade (inc. XXIII, art. 5º, da CF/88), o
exercício de moradia (art. 6º, da CF/88), e a proteção conferida ao núcleo social familiar (art.
226, da CF/88)

A maioria dos pressupostos exigidos para a configuração da usucapião familiar se assemelha


aos exigidos na modalidade já existente de usucapião especial de imóvel urbano, prevista no
art. 183, da CF/88.

Da análise do mencionado artigo de lei, se depreende que para configurar a usucapião familiar
é necessário: a) que o imóvel seja em zona urbana; b) que a metragem do terreno não
ultrapasse 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados); c) que o cônjuge ou companheiro
tenha abandonado o lar; d) posse ininterrupta e inconteste do bem pelo período de 02 (dois)
anos; e) propriedade única e para fins de moradia; e) que o imóvel seja de propriedade do
casal; e, por fim, g) que o beneficiário ainda não tenha se valido desta modalidade de aquisição
de propriedade.

Os requisitos que englobam os limites da área em 250m², a impossibilidade de reconhecimento


do instituto ao beneficiário por mais de uma vez, a exigência de que o imóvel seja utilizado para
fins de moradia sendo o único do requerente e a posse ininterrupta e inconteste sobre o bem
imóvel são condições já conhecidas e necessárias na análise de outras modalidades de
usucapião existentes em nosso ordenamento jurídico. A novidade, entretanto, fica a cargo do
prazo estabelecido para a efetivação da aquisição da propriedade através da usucapião
familiar, que são de exíguos 02 (dois) anos (art. 1240-A, CC), em contraste aos 05 (cinco) anos
exigidos nas modalidades de usucapião especial rural (art. 1.239, CC)  e urbana (art. 1.240,
CC), aos 10 (dez) anos da usucapião ordinária (art.1.242, CC) e aos 15 (quinze) anos da
extraordinária (art. 1.238, CC).

Tendo em vista o fato de que a usucapião familiar integra o programa governamental "Minha
Casa, Minha Vida", que tem por escopo a tutela ao direito de moradia, somente os imóveis
situados em zona urbana podem ser usucapidos nesta modalidade aquisitiva. Não obstante, a
omissão do legislador na inclusão das propriedades rurais na usucapião familiar é fonte de
duras críticas pelos doutrinadores, que vislumbram no artigo de lei uma ofensa constitucional
ao direito à igualdade. Compactuando com este entendimento, Maria Vilardo leciona que “a
discriminação legal não se sustenta diante da Constituição e da necessidade de se conceder a
mesma proteção a qualquer casal, seja na cidade, seja no campo”(VILARDO, 2012).

Outro requisito polêmico do instituto é o abandono do lar pelo condômino. Alguns estudiosos
do direito de família repudiaram essa modalidade de usucapião ao reconhecer a existência de
retrocesso jurídico na análise da culpa no momento do divórcio. Nas palavras de Maria
Berenice Dias (2011, Correio Brasiliense), participante de peso da corrente crítica deste novo
instituto, da qual também participa Elpídio Donizetti,

[...] ressuscitar a discussão de culpas desrespeita o direito à intimidade,


afronta o princípio da liberdade, isso só para lembrar alguns dos
princípios constitucionais que a viola ao conceder a propriedade exclusiva
ao possuidor, tendo por pressuposto a responsabilidade do cotitular do
domínio pelo fim da união.

Outra vertente, porém, entende que o abandono exigido na usucapião familiar não se coaduna
com a culpa pela separação judicial ou divórcio, sendo as duas primeiras inexistentes no
sistema jurídico atual. O abandono não é relativo aos motivos que levaram à separação, mas
unicamente sobre questões possessórias, sobre o abandono voluntário dos atos possessórios
inerentes ao proprietário, quais sejam os de uso, gozo, disposição e reivindicação.

A última reflexão acerca dos pressupostos exigidos no art. 1.240-A do CC/02 é com relação a
exigência de que o bem imóvel seja propriedade de ambos os cônjuges/companheiros. Esse
provavelmente é o ponto mais importante para o tema explanado neste estudo. Isto porque,
conforme mencionado nas considerações introdutórias, somente se configura o condomínio
quando duas ou mais pessoas detêm sobre o mesmo bem os poderes inerentes à propriedade.
Neste sentido, ensina o professor José Fernando Simão (2011, p.01):

O imóvel deve ser de propriedade do casal que surge com o casamento


ou com a união estável, seja ela hétero ou homossexual. O imóvel pode
pertencer ao casal em condomínio ou comunhão. Se o casal for casado
pelo regime da separação total de bens e ambos adquiriram o bem, não
há comunhão, mas sim condomínio e o bem poderá ser usucapido.
Também, se o marido ou a mulher, companheiro ou companheira, cujo
regime seja o da comunhão parcial de bens compra um imóvel após o
casamento ou início da união, este bem será comum [...] e poderá ser
usucapido por um deles. Ainda, se casados pelo regime da comunhão
universal de bens, os bens anteriores e posteriores ao casamento,
adquiridos a qualquer título, são considerados comuns e portanto, podem
ser usucapidos nesta nova modalidade. Em suma: havendo comunhão ou
simples condomínio entre cônjuges e companheiros a usucapião familiar
pode ocorrer. (SIMÃO, 2011, p.01)

Quando se diz que a propriedade deve ser comum, está-se falando exatamente em
propriedade certa e conhecida, já previamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis
(CRI) em nome de ambos os cônjuges/companheiros. Logo, exclui-se da possibilidade de
usucapião familiar os bens que sejam propriedade privada do cônjuge/companheiro que
abandona o lar, bem como o imóvel sobre o qual estes apenas detêm a posse conjuntamente.
É necessário o condomínio do bem imóvel urbano, de forma que o proprietário possuidor
apenas venha a usucapir a fração ideal que a ele não pertencia. Não seguindo rigorosamente
este requisito, a aquisição da propriedade poderá ser reconhecida por outra modalidade de
usucapião, mas não pela constante do art. 1.240-A, do CC/02.

CONCLUSÃO

Em conclusão, pode-se haurir do presente estudo que a usucapião, como direito descrito nas
regras da nossa Codificação Civil atravessa remodelação dos conceitos absolutos face aos
novos princípios condicionantes do Estado Democrático de Direito. Podendo se observar o
surgimento de interpretações diferentes, ou mesmo contrárias à regra vigente, as quais se
constituem nas exceções tratadas supra – caminho incontestável para evolução do
Ordenamento Jurídico e sua influência nas relações sociais.

Partindo da luz do entendimento do artigo 1.314 do CC/02 é verificada a princípio a


impossibilidade da usucapião entre condôminos. Verificados, entretanto, pressupostos
externos, extravagantes, à situação base, resta demonstrada a aplicabilidade do instituto na
situação ora em estudo.
E nesse sentido avançam a jurisprudência e a doutrina, onde a despeito da existência de
institutos até então sólidos, abrem espaço para a evolução do direito por seu viés
principiológico.

Observadas, entretanto, as particularidades processuais no que tange ao procedimento da


usucapião, bem como os requisitos a serem cumpridos para possibilitar a pretensão do autor
ao requerer em juízo a aplicação da ferramenta processual em estudo quando em caso de
existência de condomínio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Ex-Casal. Disponível em: <http://www.rkladvo

Condômino que exerce posse sem oposição do


coproprietário pode pedir usucapião
24 de junho de 2022, 14h27 Imprimir Enviar

Para a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, o condômino que exerce a posse do


imóvel por si mesmo, sem nenhuma oposição dos demais coproprietários, tem
legitimidade para pedir usucapião em nome próprio.

O entendimento foi firmado pelo colegiado ao


confirmar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que considerou o ex-
cônjuge parte legítima para ajuizar a ação de usucapião em nome próprio, após a
dissolução da sociedade conjugal, desde que exerça a posse exclusiva com animus
domini e sejam atendidos os outros requisitos legais.

Segundo o processo, uma mulher pediu o reconhecimento de sua propriedade sobre a


fração ideal de 15,47% de vários imóveis. As partes, casadas desde 1970, se
divorciaram em 1983, mas não partilharam os bens. Por estar na posse exclusiva dos
imóveis há mais de 23 anos (desde o divórcio até o ajuizamento da ação, em 2007),
sem oposição do ex-marido, a mulher ajuizou ação objetivando a usucapião
extraordinária.

No recurso especial apresentado ao STJ, o homem alegou que a coproprietária – no


caso, sua ex-esposa –, enquanto administrava a fração ideal dos imóveis comuns
(alugando-os a terceiros), não exerceu posse ad usucapionem, por mais longa que tenha
sido essa posse; por isso, não seria cabível o reconhecimento da usucapião em seu
favor.

Ânimo de dono
De acordo com o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, a jurisprudência do STJ
considera que, dissolvida a sociedade conjugal, o imóvel comum do casal passa a ser
regido pelas regras do condomínio, ainda que não realizada a partilha de bens, cessando
o estado de mancomunhão anterior. 

"Nesse contexto, possui legitimidade para usucapir em nome próprio o condômino que
exerça a posse por si mesmo, sem nenhuma oposição dos demais coproprietários, tendo
sido preenchidos os demais requisitos legais", afirmou o ministro, citando vários
precedentes do tribunal (REsp 668.131; REsp 1.631.859; AgInt no REsp 1.787.720).

Segundo Bellizze, a posse de um condômino sobre o imóvel, exercida com ânimo de


dono, ainda que na qualidade de possuidor indireto, sem nenhuma oposição dos
coproprietários, nem reivindicação dos frutos que lhes são inerentes, confere à posse o
caráter ad usucapionem, que legitima a procedência da usucapião, quando atendidas as
outras exigências da lei.

Abandono de bens
No caso julgado, observou o relator, após o fim do matrimônio, o ex-marido abandonou
completamente a fração ideal dos imóveis pertencente ao casal, sendo que a ex-esposa
não lhe repassou nenhum valor proveniente de aluguel (nem ele o exigiu) e tampouco
prestou contas por todo o período antecedente ao ajuizamento da ação.

Diante disso, o ministro entendeu ser descabida a alegação de que a mulher apenas
administrava os bens. "O que houve — e isso é cristalino — foi o exercício da posse
pela ex-esposa do recorrente com efetivo ânimo de dona, a amparar a procedência do
pedido de usucapião, segundo já foi acertadamente reconhecido na origem", afirmou o
relator. Com informações da assessoria de imprensa do Superior Tribunal de Justiça.

Clique aqui para ler o acórdão


REsp 1.840.561
Usucapião de imóvel por inteiro que
em condomínio pertença a mais de
uma pessoa
Não se desconhece que na hipótese excepcional devem restar plenamente demonstrados os
requisitos exigidos para a Usucapião.
Por
 Gabriel Dau
 -
27/07/2021
754

MUITA GENTE AINDA NÃO SABE mas pode estar correndo grande risco de perder sua
parte no imóvel se efetivamente o outro condômino exercer sobre ele a POSSE
EXCLUSIVA, reunindo e demonstrando cabalmente os requisitos para a Usucapião…

O mestre BENEDITO SILVÉRIO (Tratado de Usucapião. 2012) elucida a questão


pontuando que a possibilidade da Usucapião sobre bens em condomínio é exceção mas
é REAL:

“Em suma, lembrando ainda que o bem objeto de condomínio”pro indiviso”é,


EM PRINCÍPIO, insuscetível de ser adquirido por usucapião, tal ocorre de
modo geral, pois, como pormenorizadamente exposto em tópico passado,
APENAS EM CASOS EXCEPCIONAIS permite-se a incidência de Usucapião por
parte do condômino que FAÇA CESSAR DE FATO o condomínio, seja no tocante
à sua parte ideal, seja DO TODO, com EXCLUSÃO dos demais comunheiros”.

Não se desconhece que na hipótese excepcional devem restar plenamente


demonstrados os requisitos exigidos para a Usucapião: TEMPO, COISA HÁBIL e POSSE
qualificada, com ânimo de dono – além da evidenciada ausência de providências ou
qualquer contestação por parte dos demais condôminos.

Como sempre apontamos, reunidos os requisitos legais A USUCAPIÃO NASCE,


independentemente de SENTENÇA ou RECONHECIMENTO EXTRAJUDICIAL
(art. 216-A da LRP), sendo estes procedimentos destinados a tornar CERTA a
aquisição imobiliária pelo implacável instituto da USUCAPIÃO.
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POR FIM, a jurisprudência da Corte Superior já debateu a questão e com o acerto
esperado, em brilhante acórdão da ilustre Ministra NANCY ANDRIGHI assentou a PLENA
POSSIBILIDADE do reconhecimento da Usucapião de condôminio em face dos demais:

“STJ. REsp:  1631859/SP. J. em: 22/05/2018. (…) AÇÃO DE USUCAPIÃO


EXTRAORDINÁRIA. (…) HERDEIRA. IMÓVEL OBJETO DE
HERANÇA.  POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO POR CONDÔMINO SE HOUVER
POSSE EXCLUSIVA.  (…) 2. O propósito recursal é definir acerca da
possibilidade de usucapião de imóvel objeto de herança, ocupado
exclusivamente por um dos herdeiros. (…) 4. Aberta a sucessão, a herança
transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários
(art.  1.784  do  CC/02). 5. A partir dessa transmissão, cria-se um
CONDOMÍNIO PRO INDIVISO sobre o acervo hereditário, regendo-se o direito
dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, pelas NORMAS
RELATIVAS AO CONDOMÍNIO, como mesmo disposto no art.  1.791,  parágrafo
único, do CC/02. 6.  O CONDÔMINO TEM LEGITIMIDADE para usucapir em
nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que
comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido
exercida POSSE EXCLUSIVA com efetivo ANIMUS DOMINI pelo PRAZO
DETERMINADO em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários.  7.
Sob essa ótica, tem-se, assim, que é possível à recorrente pleitear a
declaração da prescrição aquisitiva em desfavor de seu irmão – o outro
herdeiro/condômino -, desde que, obviamente, observados os requisitos para
a configuração da usucapião extraordinária, previstos no art.  1.238  do  CC/02,
quais sejam, lapso temporal de 15 (quinze) anos cumulado com a posse
exclusiva, ininterrupta e sem oposição do bem (…)”.

Fonte: Julio Martins
TJ confirma usucapião especial de imóvel em que casal mora há 35 anos
O relator ressaltou que o fato de os possuidores serem proprietários de metade do imóvel não os impede de
reivindicar a usucapião especial de imóvel urbano da outra metade.

Nesta terça-feira, 27, a 3ª turma do STJ reconheceu usucapião especial de imóvel urbano por parte de casal que
vive no apartamento há mais de 35 anos. A decisão reforma acórdão do TJ/RJ que negou o pedido, pois entendeu
que os réus realizaram atos para proteger a sua propriedade, não havendo o preenchimento dos requisitos para a
declaração da usucapião. O voto condutor foi do ministro Villas Bôas Cueva.

Trata-se de ação interposta por casal contra decisão que inadmitiu recurso especial. O apelo, com fundamento no
artigo 105, III, "a", da CF/88, é contra acórdão do TJ/RJ ementado da seguinte maneira:

"Usucapião - tendo os réus demonstrado a prática de atos em busca da salvaguarda de sua propriedade, além de
incomprovados os requisitos para a aquisição do bem, nos moldes dos artigos 1.238, 1.240 e 1.242, todos do
código civil, não há que se cogitar de interversão da posse, decorrente de contrato de locação, no qual figuram
autores e réus, respectivamente, como locatários e locadores sentença de improcedência do pedido que se
mantém desprovimento do recurso."

O casal alega que reside no apartamento na qualidade de donos do imóvel desde 1984, após a falência da
administradora imobiliária responsável pelos aluguéis. Sustentam, ainda, que há mais de 35 anos arremataram
metade do apartamento e, desde então, exercem com exclusividade a posse para fins de moradia.

Sustentam que preenchem os requisitos para a aquisição por usucapião. Afirmam que "o ajuizamento de uma
medida cautelar, baseada no artigo 846 do CPC/73, que objetivava unicamente vistoriar o imóvel, não pode ser
considerada verdadeira oposição à posse dos recorrentes". 

Na análise do recurso, o relator considerou que ao negar a interversão da posse sob o fundamento de que o
contrato de locação firmado em 1983 afastaria peremptoriamente o animus domini dos recorrentes, o acórdão
recorrido contrariou o entendimento do STJ.

Nesse sentido, para o ministro, a controvérsia se resumiu em definir se houve falha na prestação jurisdicional no
2º grau; se a aquisição de metade do imóvel usucapiano caracteriza a propriedade de outro imóvel, impedindo o
reconhecimento à usucapião constitucional; se o ajuizamento de ação contrária de vistoria pode ser considerado
como oposição à posse, impedindo o reconhecimento da usucapião extraordinária; por fim, se o caráter original
da posse pode ser transmudado na hipótese dos autos.

O relator ressaltou que o fato de os possuidores serem proprietários de metade do imóvel usucapiano não recai
na vedação de não possuir outro imóvel urbano contínuo no artigo 1.240 do código civil.

"É firme a jurisprudência dessa Corte no sentido de ser admissível a usucapião de bem em condomínio, desde que
o condômino exerça a posse do bem com exclusividade."

Ainda de acordo com o voto, a posse exercida pelo locatário pode se transmudar em posse com animus domini na
hipótese em que ocorrer substancial alteração na situação fática. 

"Na hipótese, os possuidores permaneceram no imóvel por mais de 30 anos sem contratos de locação regular e
sem efetuar o pagamento de aluguel, realizam bem feitoria, tornaram-se proprietários da metade do
apartamento e adimpliram todas as taxas de tributos, taxas extraordinárias de condomínio, comportando-se
como proprietários exclusivos do bem. É possível o reconhecimento da prescrição aquisitiva ainda que o prazo
exigido por lei se complete apenas no curso da ação de usucapião."

Assim sendo, a turma destacou que a contestação não tem a capacidade de exprimir a resistência em demandar a
posse exercida pelo autor, mas apenas a sua discordância com aquisição do imóvel pela usucapião.
Dessa forma, a turma, por unanimidade, votou por reconhecer a usucapião especial de imóvel urbano do casal.

Veja o acórdão.

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Usucapião entre herdeiros e condôminos


CONDÔMINODIREITOS REAISHERDEIROSUSUCAPIÃO POR HERDEIROSCONDOMÍNIO

Usucapião entre herdeiros e condôminos


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Publicado por Pedro Henrique Almeida Alves


há 9 anos
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Tema bastante controverso no campo dos direitos reais é,
indubitavelmente, o usucapião (ou a usucapião, como preferem alguns)
sobre herança e entre condôminos. O instituto do usucapião, por si, já é
palco de inúmeras discussões jurídicas, talvez pela sua peculiaridade de
transmitir propriedade a um “mero” possuidor e destituir do domínio o seu
real proprietário, como se jamais estivesse sobre o senhorio desse. Por isso
é compreendida como meio de aquisição originária da propriedade imóvel.

Inicialmente regulado pelo Direito Romano (Lei das XII Tábuas) o


usucapião pode ser compreendido como um instituto singular e
complicadíssimo, em que sedimentos de todas as épocas concluíram para a
sua evolução[i]. O usucapião necessita de três requisitos para a sua
existência no plano jurídico. Posse, tempo e previsão legal. A posse deve ser
dotada de animus dominis, um requisito subjetivo do possuidor a
exteriorizar a sua intenção de ser dono da coisa, além dos requisitos
objetivos: ser ela pacífica, pública e contínua. Alcançando o lapso temporal
exigido pela lei, variável conforme as diversas modalidades de usucapião
(extraordinário, ordinário, especial e familiar), o possuidor adquire direitos
sobre a propriedade, prescindível a declaração judicial por uma sentença,
que uma vez registrada o transmitirá propriedade originária do bem.
Superadas as breves introduções ao instituto, surge, nesse esteio, a
interessante discussão sobre a possibilidade jurídica da ocorrência do
usucapião por condômino ou por um herdeiro.

Muito embora ensine o ilustre CAIO MARIO[ii] que "em nosso direito,


assim antigo quanto moderno, não tem cabido o usucapião entre
condôminos; uma vez que não é lícito a um excluir da posse os demais,
mostra-se incompatível com esta modalidade aquisitiva a condição
condominial, que por natureza exclui a posse com animus domini", em não
raros casos podemos encontrar na doutrina e jurisprudência[iii] opiniões
favoráveis a essa possibilidade, mas quando há condomínio pro diviso[iv] e
o condômino exclusivo exercer a posse de maneira ininterrupta e pacífica,
com intenção de ser dono (animus domini) durante o prazo legal.
A questão, aparentemente, tem-se configurada possível a partir do
momento em que o condômino demonstrar a inexistência de
composse[v] com os outros coproprietários, onde começará a fluir o prazo
prescricional aquisitivo da propriedade. De tal sorte, entende também a
doutrina[vi] que aquele, seja herdeiro ou condômino, pleitear usucapião
contra seus consortes, deverá provar que cessou de fato a composse[vii],
estabelecendo posse exclusiva pelo tempo necessário à usucapião
extraordinária, com os demais requisitos que esta requer, de maneira que
só a partir de então será estabelecida a posse exclusiva pelo tempo
necessário ao usucapião, com os demais requisitos que esta requer.

Com efeito, cabe salientar que no tangente aos condomínios edilícios


(apartamento, lojas ou escritórios) a situação é diferente. As áreas comuns
(hall de entrada e de acesso as unidade, rampas de acesso, etc.) que
porventura estejam sendo utilizadas por um dos condôminos, em regra, não
são passíveis de usucapia. O uso dessas áreas comuns por um ou alguns dos
condôminos é considerado como ato de mera tolerância pelos demais
condôminos. Atos de tolerância, em tese, não induzem posse, mas mera
detenção, que é uma posse desprovida de qualificação jurídica. A tolerância
é uma aceitação tácita do uso, não significa inércia por parte dos
condôminos e legítimos possuidores.

Por outro lado, ao que tange o usucapião requerido por herdeiro, o tema
possui outras especificidades. Primeiro ponto é que a herança, pela adoção
do princípio de SAISINE ao nosso ordenamento, se transmite aos herdeiros
no momento do óbito, todavia, essa herança é considerada indivisa até a sua
partilha, por força do artigo 1.791 do Código Civil, sendo inviável que
apenas um herdeiro, isoladamente, requeira a usucapião de imóvel
possuído anteriormente pelo autor da herança, pois, com o falecimento, a
posse do imóvel é transmitida a todos os herdeiros.
Havendo herdeiros a serem contemplados numa mesma herança, não é
dado utilizar-se da usucapião, pois a herança é uma universalidade de
coisas, achando-se em comum os bens do acervo hereditário, até a
ultimação da partilha, onde teremos o condomínio de direito. Por outro
lado, esparsos julgados[viii] vêm admitindo o usucapião de bem em
herança, de igual modo ao entendimento do usucapião entre condôminos,
isto é, desde que haja intenção de ser dono exclusiva, de apenas um
herdeiro (animus domini unici).
Outro ponto, não menos interessante, é no caso da inexistência de herdeiros
até o quarto grau, ab intestato, isto é, sem deixar testamento. Caso de uma
herança jacente ocupada por terceiro. Herança jacente é aquela entendida
cujos sucessores ainda não são conhecidos, ou então renunciam a sua
vocação hereditária. Compreende-se como um período transitório, um
prazo de proteção aos herdeiros relapsos ou desconhecidos, até a sua
substituição pela vacância.
Nessa linha, em não havendo herdeiros até o quarto grau, o início da
prescrição aquisitiva do imóvel para verificação do usucapião, começa a
correr pela abertura da sucessão (art. 1.791), ou seja, com o óbito do autor
da herança[ix]. Outro entendimento consolidado é de que o terceiro na
posse do imóvel, desde que comprovados os requisitos para o usucapião é
parte interessada para figurar em embargos de terceiros para obstar a
arrecadação do bem pelo Estado de herança vacante[x].

Cabe salientar que a propriedade, assim como o direito patrimonial em


geral, passa por um momento paradigmático, onde está se moldando à luz
dos valores esculpidos na Constituição Federal, dentre os quais o da função
social da propriedade. Esta mudança identificada pela doutrina de direito
civil-constitucional tende a modificar todos os preconceitos civilistas
clássicos sobre os temas patrimoniais, eis que uma propriedade não
utilizada, sequer em composse, não está cumprindo sua função social e não
pode ser considerada aos princípios fundamentais regentes como
imprescritível. Como bem ensina CELSO DE MELLO[xi]:

'Inércia, omissão e desinteresse do proprietário são sancionados pela


perda do domínio, em favor, precisamente, daquele que, possuindo o bem
pro suo, vem a dar-lhe a destinação e a utilização reclamadas pelo
interesse social. A ratio do usucapião, inegavelmente, é a promoção do
bem comum. A função social inerente à propriedade justifica a perda do
domínio, em favor do possuidor, por via do usucapião.

Essa modificação estrutural da interpretação do Direito não é recente,


apesar do maior enfoque nos debates atuais. Já era, desde o início do século
passado, prevista pelos juristas, como nas sábias palavras do visionário Rui
Barbosa[xii]: “Já não se vê mais na sociedade um mero agente agregado,
uma justaposição de unidades individuais, acasteladas cada qual no seu
direito intratável, mas uma unidade orgânica, em que a esfera do
indivíduo tem por limites inevitáveis, de todos os lados, a coletividade. O
direito vai cedendo à moral, o indivíduo à associação, o egoísmo à
sociedade humana.”
Não obstante, outro ponto necessário ao enfoque é o fato de, na maioria das
vezes, as posses entre condôminos ou herdeiros ocorrer por força da
confiança entre proprietário e possuidor, extraindo sempre a ideia da
precariedade da sua posse, o que tornaria inviável a aquisição do usucapião.
Entretanto, a relativização de preceitos até então absolutos, através da
ponderação entre os direitos individuais conflitantes, atinge, como não
podia deixar de ser, certos efeitos da posse que eram considerados
imutáveis. Como se observa no saneamento da posse precária.

Entende-se como precária, em síntese, a posse injusta adquirida com base


no abuso de confiança entre o proprietário e o detentor/possuidor. Sempre
foi tida como um vício insanável na pretensão de aquisição por usucapião,
ao contrário da posse clandestina e contestada, sanáveis, uma vez cessadas
os seus obstáculos. Era inconcebível, de tal sorte, que um possuidor direto
viesse ser declarado por sentença em ação de usucapião como proprietário
de bem emprestado pelo comodante (possuidor indireto), independente do
prazo de permanência no imóvel por aquele, pois detentor de posse ad
interdicta, insanável.
Todavia, nota-se hoje uma ponderação a esse conceito. Defendem alguns a
possibilidade de transformação do caráter da posse, inicialmente precária,
existindo a desídia do proprietário somado a um aproveitamento
econômico exclusivo do precarista, que passaria a ter exercício pleno, dos
poderes inerentes à propriedade, cumprindo sua função social e
legitimando o usucapião.

Tal modificação começa a ser presenciada paulatinamente em nossa


jurisprudência, de onde se extraem as ideias centrais do julgado proferido
pelo Superior Tribunal de Justiça[xiii], de lavra do eminente Ministro César
Asfor Rocha:

“Usucapião extraordinário. Comprovação dos requisitos. Mutação da


natureza jurídica da posse originária. Possibilidade. O usucapião
extraordinário – art. 550, CC – reclama, tão-somente: a) posse mansa e
pacífica, ininterrupta, exercida com animus domini; b) o decurso do prazo
de vinte anos; c) presunção juris et de jure de boa-fé e justo título, ‘que não
só dispensa a exibição desse documento como também proíbe que se
demonstre sua inexistência.’ E, segundo o ensinamento da melhor
doutrina, ‘nada impede que o caráter originário da posse se modifique’,
motivo pelo qual o fato de ter havido no início da posse da autora um
vínculo locatício, não é embaraço ao reconhecimento de que, a partir de
um determinado momento, essa mesma mudou de natureza e assumiu a
feição de posse em nome próprio, sem subordinação ao antigo dono e, por
isso mesmo, com força ad usucapionem. Precedentes. Ação de usucapião
procedente. Recurso especial conhecido, com base na letra ‘c’ do
permissivo constitucional, e provido.”

Por fim, conclui-se que a nova ordem jurídica vigente pautada na defesa dos
interesses esculpidos na Constituição Federal torna necessária uma
remodelação dos conceitos absolutos face aos novos princípios estruturais
do Estado Democrático de Direito. Há que se observar se alguns cânones do
direito privado colidem com princípios ora atuantes, em especial o do
direito à moradia e da função social da propriedade. E nesse sentido
deverão avançar os julgamentos e as reformas legislativas ao que se referem
o usucapião como forma de aquisição de propriedade, socialização e
dignidade da pessoa humana.

[i] RIBEIRO, Benedito Silvério, Tratado de Usucapião, 2. Ed, Saraiva, São


Paulo, 1998.
[ii] PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de Direito Civil, volume IV,
Editora Forense, Rio de Janeiro, 12ª ed., 1997, p. 114
[iii] REsp nº 10.978/RJ , Terceira Turma, Relator o Ministro Nilson Naves,
DJ de 9/8/93), REsp nº 214.680/SP, Quarta Turma, Relator o Ministro Ruy
Rosado de Aguiar, DJ de 16/11/99; REsp nº 101.009/SP, Segunda Turma,
Relator o Ministro Ari Pargendler, DJ de 16/11/98; AgRg no Ag 731971/MS ,
Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti - 20/10/2008.
[iv] É o condomínio que só existe de direito, ou seja, no cartório o imóvel
está registrado em nome de dois ou mais condôminos, mas a situação fática
não reflete a realidade do registro, pois um dos condôminos exerce posse
exclusiva sobre a totalidade do imóvel.

[v] “Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma
exercer sobre ela atos possessórios, contando que não excluam os dos
outros compossuidores.” (Art. 1199 do Código Civil).
[vi] RIBEIRO, Benedito Silvério, Tratado de Usucapião, 2. Ed, Saraiva, São
Paulo, 1998, pag. 284; Pontes de Miranda. Tratado de Direito Privado, p.
124/128; SERPA LOPES, Miguel Maria. Curso de Direito Civil, vol. VI, 3ª
ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, p 286/287
[vii] "AÇÃO ORDINÁRIA. CONDOMÍNIO. USUCAPIÃO. POSSIBILIDADE.
USO EXCLUSIVO DO BEM COMUM POR UM DOS CONDÔMINOS.
COMPROVAÇÃO. A doutrina tem admitido a possibilidade de que o
condômino adquira a propriedade do imóvel comum através de usucapião,
desde que exerça a posse, com exclusividade, sobre parte determinada do
bem, ou sobre a totalidade deste. O usucapião constitui-se num modo de
adquirir o domínio da coisa ou de certos direitos reais pela posse
continuada durante certo lapso de tempo, com o concurso dos requisitos
que a lei estabelece para esse fim. Estando preenchidos os requisitos da
posse mansa e pacífica, exclusiva pelos réus, por mais de 10 (dez) anos, com
ânimo de dono e justo título, nos termos exigidos no art. 551 do CC, devem
ser julgados improcedentes os pedidos formulados pelos autores."(TJMG.
17ª Câmara Cível. Apelação nº 1.0686.00.002584-7/001. Rel. Des. Eduardo
Marine da Cunha, DJ: 29/06/06).
[viii] “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. POSSE DECORRENTE
DE SUCESSÃO. CONDIÇÕES. REQUISITOS PRESENTES. Comprovando o
condômino que tinha a posse exclusiva de parte do imóvel, com os
requisitos aptos a configurar a prescrição aquisitiva, pelo prazo suficiente,
com ânimo de dono e sem a oposição de quem quer que seja, em área
localizada e identificada, faz jus à declaração do usucapião em seu
favor."(TJMG. 18ª Câmara Cível. Apelação nº 1.0604.06.000333-1/001.
Rel. Des. Unias Silva, DJ: 22/02/08). USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO.
CONDOMÍNIO. HERDEIROS E CONDÔMINOS. NECESSIDADE DE
POSSE EXCLUSIVA" ANIMUS DOMINI UNICI ". REQUISITO
INEXISTENTE NA ESPÉCIE. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. É possível o
usucapião entre herdeiros e condôminos, comprovados, porém,
determinados requisitos, sendo imprescindível a posse exclusiva," animus
domini unici ", traduzido de modo inequívoco, com exclusão dos
demais."(RT524/210).

[ix] R Extraordinário 92.352-7, RT vol.510/111.

[x] REsp 73.458-SP, 4ª Turma, Ruy Rosado do Aguiar.


[xi] MELLO, José Celso,Constituição Federall Anotada, p. 500.
[xii] Na sua conferência proferida em 20 de março de 1919, no Teatro Lírico
do Rio de Janeiro.

[xiii] STJ, RSTJ 143/370, grifamos. Tal voto foi seguido, por votação
unânime, pelos Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Jr.,
Sálvio de Figueiredo Teixeira e Raphael Barros Monteiro. No mesmo
sentido: TJRJ: "Usucapião – Posse – Mudança do título – Admissibilidade.
Locatário que jamais pagou aluguel, ocupando a coisa como se fosse dono –
Inexistência de oposição por parte do proprietário – Animus domini
configurado – Voto vencido." (RT 690/140). Neste sentido: "Usucapião –
Interversão – Mudança do título da posse – Possibilidade – CC, art. 492."
(TJRJ, RJ 188/71); Ver também TJRJ, RT 528/189.

Pedro Henrique Almeida Alves


Advogado
Advogado. Pós-graduado em Direito Processual Civil e Imobiliário. Especializado em Direito Privado. Membro
do escritório do Cunha de Almeida Advogados Associados no Rio de Janeiro. Membro da Academia Brasileira
de Direito Civil (ABDireitoCivil). contato: pedro@cunhadealmeida.com.br

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