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APOSTILA DO CURSO Combate Corrupção

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1

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
Jair Messias Bolsonaro

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA


Anderson Gustavo Torres

SECRETARIA DE GESTÃO E ENSINO EM SEGURANÇA PÚBLICA


Ana Cristina Melo Santiago

DIRETORIA DE ENSINO E PESQUISA


Roberto Glaydson Ferreira Leite

COORDENAÇÃO GERAL DE ENSINO


Juliana Antunes Barros Amorim

COORDENAÇÃO DE ENSINO A DISTÂNCIA


Juliana Antunes Barros Amorim

COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA
Gisele Matos Gervásio

COORDENAÇÃO GERAL DE GERENCIAMENTO DE PROJETOS


PEDAGOGICOS E INOVAÇÃO
Márcia Alencar Machado Da Silva

CONTEUDISTA
Disney Rosseti

REVISÃO DE CONTEÚDO
Cleyber Malta Lopes

2
REVISÃO PEDAGÓGICA
Ardmon dos Santos Barbosa
Gisele Matos Gervásio
Márcio Raphael Nascimento Maia

COORDENAÇÃO DE INOVAÇÃO E TECNOLOGIA APLICADA

PROGRAMAÇÃO E EDIÇÃO
Ozandia Castilho Martins
Renato Antunes dos Santos
Vinicius Alves de Sousa

DESIGNER
Ozandia Castilho Martins
Zulmiro José Machado Filho

DESIGNER INSTRUCIONAL
Ozandia Castilho Martins

3
Sumário

Apresentação do Curso ..........................................................................................................6


Objetivos do Curso .................................................................................................................7
Objetivo Geral ........................................................................................................................7
Objetivos Específicos .............................................................................................................7
Estrutura do Curso .................................................................................................................8
MÓDULO I - INTRODUÇÃO AO COMPLIANCE, ÉTICA E MORAL, O PAPEL DO DIREITO,
O PROBLEMA DA CORRUPÇÃO ..........................................................................................8
Apresentação do módulo ....................................................................................................8
Objetivos do módulo ...........................................................................................................9
Estrutura do módulo:...........................................................................................................9
AULA 1 – BREVE INTRODUÇÃO AO COMPLIANCE ......................................................10
AULA 2 – ÉTICA, MORAL E CORRUPÇÃO .....................................................................15
AULA 3 – O PAPEL DO DIREITO.....................................................................................19
AULA 4 – DIMENSÃO DO PROBLEMA DA CORRUPÇÃO ..............................................22
Leitura Complementar ......................................................................................................25
Finalizando .......................................................................................................................27
MÓDULO II - DA GOVERNANÇA E SUA RELAÇÃO COM COMPLIANCE E CONTROLE
INTERNO .............................................................................................................................28
Apresentação do módulo ..................................................................................................28
Objetivos do Módulo .........................................................................................................28
Estrutura do Módulo .........................................................................................................29
AULA 1 – BREVE INTRODUÇÃO À GOVERNANÇA E COMPLIANCE............................30
AULA 2 – DA GOVERNANÇA ..........................................................................................32
AULA 3 – GOVERNANÇA, COMPLIANCE E CONTROLE INTERNO: UMA VISÃO
SISTÊMICA ......................................................................................................................40
Leitura Complementar ......................................................................................................44
Finalizando .......................................................................................................................45
MÓDULO III - DO COMPLIANCE .........................................................................................47
Apresentação do módulo ..................................................................................................47
Objetivos do Módulo .........................................................................................................47
Estrutura do Módulo .........................................................................................................48
AULA 1 – NOÇÕES GERAIS DO COMPLIANCE .............................................................49
AULA 2 – PROGRAMAS DE COMPLIANCE: UMA VISÃO GERAL..................................56
AULA 3 – PROGRAMAS DE COMPLIANCE NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ................62

4
Leitura Complementar ......................................................................................................67
Finalizando .......................................................................................................................68
Referências Bibliográficas ....................................................................................................70
Notas de Fim ........................................................................................................................76

5
Apresentação do Curso

Caros discentes,

Sejam todos muito bem-vindos ao Curso de Combate à corrupção –


Compliance, onde trataremos de temas atuais e de grande relevância para a
sociedade brasileira.
Ao longo do curso vamos abordar os conceitos e a relação entre corrupção e
compliance, buscando demonstrar a importância das instituições de segurança
pública adequarem-se à realidade deste procedimento, reforçando a necessidade de
uma cultura de ética e conformidade, imperativo a toda e qualquer instituição pública
ou privada, bem como evidenciaremos a relação entre o compliance e o
enfrentamento à corrupção, tanto nas instituições como na atuação dessas
organizações no cumprimento de seu dever constitucional e legal.
Dessa forma, procuraremos fomentar à convicção acerca do avanço que este
sistema representa nas necessárias políticas de enfrentamento à corrupção e na
sedimentação da cultura de ética nas relações público x privado, além das relações
exclusivamente privadas.
Dentro desse escopo, estruturamos nosso curso com uma introdução que
permita uma visão ampla do problema colocado: a corrupção e seu enfrentamento e
o compliance nesse contexto. Trataremos, em seguida, de posicionar o aluno com os
conceitos básicos de ética e moral, analisando criticamente sua relação com o
problema da corrupção enquanto cultura e do papel do Direito em relação a este tema.
Passaremos a uma análise mais acurada do papel do Direito nesse contexto para,
então, tratarmos do problema da corrupção, sua dimensão e consequências para a
sociedade brasileira. Por último, trataremos dos conceitos básicos de compliance e
governança, até pela indissociável ligação entre os temas.
Posicionados os temas e conceitos necessários para tratar do assunto, iremos
discorrer sobre estes dois pontos, pela proximidade e muitas vezes confusão do tema
no setor público. Os conceitos serão aprofundados, sendo conferida uma visão de
evolução histórica dos institutos no campo internacional e nacional, sendo analisados
em pormenores os marcos legais, as consequências e as questões de cunho jurídico-
criminal.

6
Finalmente, serão estudados alguns casos da atualidade e dados os contornos
básicos do que seriam os programas de compliance de órgãos públicos, num exercício
de construção de novos conceitos e desenhos institucionais.

Objetivos do Curso

Objetivo Geral

Este curso tem por objetivo expor aos alunos os conceitos teóricos e as
aplicações práticas de questões sobre compliance e o enfrentamento à corrupção.
Possibilitando uma compreensão mais aprofundada do tema e a necessidade de
implantação de uma cultura de conformidade nas instituições públicas e privadas.

Objetivos Específicos

Ao final do curso, os participantes alcançarão os seguintes objetivos:


• Compreender as questões relativas à ética e à moral e seu reflexo no
problema da corrupção em todas as camadas da sociedade;
• Compreender o papel do Direito no enfrentamento à corrupção e na
criação de uma cultura de ética;
• Ter a percepção do papel do Direito para o enfrentamento à corrupção
e criação de cultura de compliance;
• Entender em sua amplitude o problema da corrupção e suas
consequências para o país e a sociedade;
• Ter a noção conceitual e o contexto do surgimento da governança e
compliance dentro da sociedade de risco;
• Compreender os institutos da governança e do compliance, seus
contornos jurídicos e práticos e sua relação intrínseca com o problema da
corrupção;
• Reconhecer a necessidade de se construir e cultivar uma cultura de ética
e conformidade nas instituições e na atuação de seus integrantes;
• Analisar os marcos legais existentes e sua aplicação na construção de
programas de governança e compliance;

7
• Reconhecer a necessidade de implantar nos órgãos de segurança
pública programas de governança e compliance.

Estrutura do Curso

Para fins didáticos dividimos nosso curso em três módulos, da seguinte forma:

Módulo 1 - Introdução ao Compliance, Ética e Moral, o Papel do Direito e o


combate à corrupção.
Módulo 2 - Da Governança e sua Relação com o Compliance e o Controle
Interno.
Módulo 3 – Do Compliance.

MÓDULO I - INTRODUÇÃO AO COMPLIANCE, ÉTICA E MORAL, O PAPEL DO


DIREITO, O PROBLEMA DA CORRUPÇÃO

Apresentação do módulo

Neste primeiro módulo serão estudados os seguintes temas:

● Breve introdução ao instituto do compliance, sendo apresentado em


linhas gerais ao aluno;
● Ética e Moral e o contexto da corrupção no Brasil, onde serão abordados
conceitos básicos da ética e da moral e sua influência no problema da
corrupção, fundamentando a necessária cultura de ética;
● O papel do Direito nesse contexto;
● A corrupção e seus impactos na sociedade, abordagem que visa conferir
a amplitude do problema e seu real impacto na sociedade.

Propomos ainda, ao final, apresentar uma questão para reflexão, induzindo o


aluno a aplicar os conhecimentos adquiridos ao longo deste módulo.

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Objetivos do módulo

Este módulo tem por objetivos:

● Ter uma noção mínima do que é o compliance;


● Compreender em linhas gerais a necessária cultura de ética como
fundamento da conformidade;
● Reconhecer o papel essencial do direito no enfrentamento do tema e na
criação da cultura de ética;
● Entender a real dimensão do problema da corrupção e seus efeitos,
materiais e imateriais, na sociedade.

Bons estudos!

Estrutura do módulo:

Este módulo compreende as seguintes aulas:

Aula 1 – Breve Introdução ao Compliance.


Aula 2 – Ética, Moral e Corrupção.
Aula 3 – O Papel do Direito.
Aula 4 – A Dimensão do Problema da Corrupção.

A partir de agora para a palavra COMPLIANCE, utilizaremos a abreviação CPL.

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AULA 1 – BREVE INTRODUÇÃO AO COMPLIANCE

Nos últimos anos temos assistido a inúmeras inovações em termos de gestão,


controle, transparência e eficácia, tanto no campo privado como no campo da
Administração Pública. Surgiram novas teorias e termos como “gestão estratégica”,
“governança”, “gestão de riscos” e “compliance” passaram a fazer parte dessa nova
realidade do meio empresarial e, mais recentemente, da Administração Pública.
Essa evolução no trato dos negócios públicos e privados é algo natural e surge
em razão das demandas e movimentos políticos e de mercado principalmente, ligados
ainda, após a globalização, aos riscos dos negócios, em especial das grandes
corporações, detentoras do capital de fundos de investimento e pessoas físicas de
várias partes do mundo.
Nesse sentido, tivemos a revolução industrial como o primeiro grande fator de
mudanças nos meios e modos de produção, até então baseados em produção ou
manufaturas individuais. Houve um processo de migração do campo para as cidades
e a circulação de bens, produtos e serviços se altera exponencialmente, levando ainda
ao surgimento da classe operária, das demandas por direitos sociais e trabalhistas e
da concentração de capital em grandes corporações.1
O aumento da produção em escala, concentrado em grandes corporações
industriais, aliado à diminuição do consumo pelas pessoas e do fim da expansão
desenfreada de crédito nos Estados Unidos da América levaram à crise da Bolsa de
Valores de Nova York em 1929, com consequências desastrosas para o mundo todo,
que se viu em meio a primeira grande crise capitalista. A superprodução e a
especulação financeira foram as principais causas dessa crise, o que levou a se
repensar as questões do mercado, livre comércio, intervenção na economia e o risco
do sistema vigente.

10
Figura 1: Fila para conseguir sopa tendo ao fundo a propaganda do estilo de vida americano
Fonte: Margaret Bourke-White/Wikimedia Commons.

Após a Segunda Guerra Mundial tivemos o incremento de novas tecnologias


que foram gradualmente incorporadas ao processo produtivo, fruto do salto
tecnológico do segundo confronto bélico mundial. A Primeira Revolução Industrial,
identificada pelas máquinas a vapor e pela mecanização dos processos de produção,
e a Segunda Revolução Industrial, marcada pela inserção, no cotidiano das pessoas,
de bens de consumo industrializados como o automóvel, o televisor e o rádio,
começam a ser exponencializados pela junção da tecnologia aos processos
produtivos. A Terceira Revolução Industrial, também chamada de Revolução Digital,
iniciada nos anos 1950, já tem a marca da tecnologia e automação, com o surgimento
dos computadores e ainda de forma incipiente da internet. Chegamos à chamada
Quarta Revolução Industrial ou Revolução 4.0, onde as tecnologias, incluindo a
robótica, a inteligência artificial e a internet, principalmente, passam a ter um papel
crucial na vida das pessoas.2
Aqui interessam para o desenvolvimento de nosso tema duas
questões, que acabam se interligando: o risco e a globalização.
Todo esse processo iniciado ainda na Primeira Revolução Industrial leva a um
aumento considerável do risco das atividades, expondo as pessoas, inicialmente, e a

11
própria coletividade, posteriormente, a riscos antes inimagináveis diante daquele
vigente sistema de produção e circulação de bens, produtos e riquezas baseado no
indivíduo e nas pequenas propriedades.
O advento da mecanização, da produção em escala, os ambientes insalubres
e jornadas de trabalho extenuantes levam a alterar o que poderia ser considerado o
risco da atividade. As consequências de se exercer as atividades mais modernas,
mesmo que dentro das normas vigentes, passa a expor a risco os trabalhadores, a
própria circulação de bens e serviços e a coletividade. Há de se observar que, com a
produção em escala, a falência de uma fábrica poderia levar ao desemprego em
massa de pessoas de uma determinada cidade ou região, a explosão de uma caldeira
de uma fábrica poderia gerar muitas mortes, assim como o descarrilhamento de um
trem a vapor também.
Esse risco passa da mesma forma a ser observado na economia e no mercado
financeiro, uma vez que se alteram substancialmente: o comércio internacional e as
inversões de capital. A crise de 1929 foi a concretização desse risco diante do modelo
de negócios que estava vigendo.
Não é preciso pensar muito para se imaginar que a Revolução Tecnológica,
com o advento e implemento da internet e globalização econômica levaram esse risco,
no campo financeiro, a um patamar até então inimaginável.
Já tratando da segunda questão que nos interessa, a globalização3,
especialmente de cunho financeiro, trouxe o risco de se ter algo muito pior que a crise
da bolsa de 1929. Segundo o professor Antônio Corrêa de Lacerda:
A globalização é um dos processos de aprofundamento internacional da
integração econômica, social, cultural e política,[1][2] que teria sido
impulsionado pela redução de custos dos meios de transporte e comunicação
dos países no final do século XX e início do século XXI[3] sendo considerada
a maior mudança da história da economia nos últimos 40 anos. (Lacerda,
2001)

Como efeito colateral da globalização econômico-financeira temos as crises e


escândalos corporativos, dentre as quais destacamos: o escândalo da ENRON 4 em
2001, escândalo da Parmalat em 20045 e a crise dos subprimes6, levando a se
repensar a questão do livre mercado e da intervenção do Estado, mas principalmente
em como evitar crises dessa natureza, pois os efeitos em nível mundial são
desastrosos.

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O que fica claro é que, com a possibilidade de que os donos do capital e os
investidores estarem em um país, enquanto a empresa ou negócio que eles investem
esteja localizada em outro e, muitas vezes, parte da matéria-prima, insumos e mesmo
mão-de-obra e setores de TI em países diversos, tudo aliado à globalização e
tecnologias que permitam, a um clique, a inversão de valores, investimentos, saques
e etc., o risco se torna algo com potencial imenso de geração de crises em escala
global, com perda de capital em cifras elevadíssimas.
O mesmo raciocínio se faz em relação aos governos e suas políticas, pois um
governo estável, com mecanismos de controle e gestão eficazes, e com níveis baixos
de corrupção, leva a um risco baixo para fins de investimentos, com pouca
probabilidade de ocorrerem escândalos financeiros.
É nesse contexto de alto risco, potencializado pela globalização, e diante de
escândalos financeiros, que surgem as teorias de governança e compliance. Segundo
Walker (2016), ao tratar do tema e reportando-se ainda aos anos de 1970, quando o
governo dos Estados Unidos da América, diante de escândalos de corrupção, adota
medidas no sentido de estabelecer regras de CPL:
“(...) a readequação do mercado e do modelo normativo americano de
combate à corrupção, fazendo nascer o compliance, como ferramenta ou
instrumento de prevenção, detecção e mediação de condutas corruptivas,
sobretudo com o objetivo de resguardar a estabilidade do mercado de capitais
e do sistema corporativo daquele país” (Walker, 2016)

E o que toda essa estória tem a ver com a corrupção? É que em todos esses
escândalos financeiros houve em maior ou menor medida a prática da corrupção,
pública ou privada ou ainda as duas modalidades em conjunto 7. A corrupção está
intrinsecamente ligada a todos esses escândalos e crises, em maior ou menor grau,
ao lado de toda uma gama de crimes. No fim, a corrupção acaba sendo mais um fator
de risco a ser gerido em termos de prevenção e detecção para que o Estado possa
funcionar devidamente e as corporações privadas possam exercer seu negócio e
auferir os lucros pretendidos, evitando-se crises financeiras globais com prejuízos
generalizados.
Diante de todo este quadro e deste contexto histórico, este modelo surge como
o dever de cumprir as normas e regulamentos, passando com o tempo e seu natural
desenvolvimento a significar a criação e fomento de uma cultura de ética e integridade
nas instituições públicas e privadas.

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No Brasil, especialmente diante dos grandes escândalos de corrupção, como
o “Mensalão” e a “Lava Jato”, dentre inúmeros outros casos, o tema ganha força e
surge nos últimos anos como algo imprescindível ao meio corporativo, que capitaneia
esse movimento diante do prejuízo auferido pelas empresas que tiveram seu nome e
imagem envolvidos em esquemas de corrupção.
Paralelamente, o Estado Brasileiro começa também a falar mais fortemente em
governança e compliance nos últimos anos, embora já nos anos de 1990 tenhamos
movimentos neste sentido.
De modo complementar, surgiu doutrina a respeito, multiplicaram-se os
eventos como congressos e seminários, apareceram as certificações de empresas e,
também, de profissionais especialistas no assunto, hoje com implantação
praticamente obrigatória em empresas de grande porte. Sem a qual fica
verdadeiramente inviabilizado o negócio, em especial a captação de recursos de
investidores.
Tudo isso vem com acompanhamento de arcabouço legislativo e
jurisprudencial, tendo como grande marco em nosso país a denominada Lei
Anticorrupção – Lei n.º 12.846/13, que trata da responsabilidade objetiva
administrativa e civil das pessoas jurídicas por atos lesivos à Administração Pública
nacional e estrangeira (Brasil, 2013). A lei fala, ainda, expressamente, na existência
de mecanismos e procedimentos internos de integridade, os quais serão considerados
na aplicação de sanções.
Neste mesmo diapasão, o Tribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral
da União começaram a exigir dos entes públicos uma política de gestão baseada em
práticas de governança. São marcos indiscutíveis desse processo, que se inicia ainda
na década de 1990 (conforme veremos em capítulo próprio), o Referencial Básico de
Governança, do TCU, e a IN 001/16 da CGU e MP, que estabelecem a necessidade
de todo o Executivo Federal implantar práticas de gestão de riscos, controle interno e
governança.
Em suma, este movimento não é um modismo ou algo transitório, mas sim um
conjunto de práticas, políticas, instrumentos de gestão e cultura de ética e
conformidade, que estão sendo estabelecidos no meio privado e no meio público,
ensejando uma transformação positiva para todos os setores da sociedade brasileira.
Por hora, basta que tenhamos em mente que o compliance significa cumprir as
normas, implantar uma cultura do cumprimento de normas e regras como valores

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intrínsecos das instituições públicas e privadas e das relações entre elas, fomentando
a ética nas relações empresariais e com o governo.

AULA 2 – ÉTICA, MORAL E CORRUPÇÃO

É muito comum ouvir que a questão da corrupção em nossa sociedade tem


relação com a degradação dos valores morais e éticos. Uma sociedade fundada em
valores errados, deturpados, na qual as fronteiras do interesse público e do interesse
privado nem sempre são claras, e que se transige com pequenas transgressões e
violações de normas, é uma sociedade que tende a ser corrupta.
Para muitos, temos atualmente uma crise de valores éticos e morais. O filósofo
e sociólogo polonês Zygmunt Bauman faz um alerta sobre essa crise, fruto do que ele
denomina “Modernidade Líquida”. Para ele, isso significa a crescente transformação
de cidadão – aquele que busca sua felicidade através da sociedade, busca seu bem-
estar através do bem-estar da sociedade – em indivíduos – aquele que é cético em
relação ao bem comum, a sociedade justa. E também, o contraponto às estruturas e
relações sólidas vigentes até um passado próximo, em termos sociais, profissionais,
etc., hoje muito mais relativizadas, com a busca de conexões e laços banais,
eventuais, virtuais (Bauman, 2000, pág. 45 e seg.). Isso significa submeter a ética e
os valores sociais aos meus valores e a minha ética.
Podemos ver essa crise de valores, aqui numa abordagem sociológica, com o
rompimento de conceitos nos quais a sociedade se assentava, sendo relativizados por
visões individuais acerca daquele conceito. Como exemplo temos a família, que surge
em novas formas, a intimidade e vida privada, que tomam outra dimensão com as
redes sociais, os preceitos de bons costumes e comportamento, que passam a sofrer
grande contestação, e assim por diante. Vale dizer, esses conceitos se assentavam
na visão calcada em determinados valores tidos como da sociedade, que guiava o
indivíduo, e agora cada indivíduo estabelece e segue sua visão, o que gera uma crise
de valores, até que a sociedade estabeleça novos valores como referência ou retorne
as referências existentes. É o que o Bauman chama de “derreter os sólidos” (op. cit.
pág. 10 e seg.)
Os valores morais e éticos têm uma certa dinâmica, representando as bases
da sociedade e o fundamento para edificação do sistema jurídico. Este, por sua vez,

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acaba sendo uma forma de ordenar a sociedade e servir de controle social, impedindo
que cada um siga suas próprias inclinações ou interesses. Como afirmou Kant:

O direito é a forma universal de coexistência dos arbítrios simples. Enquanto


tal é a condição ou limite da liberdade de cada um, de maneira que todas as
liberdades externas possam coexistir segundo uma lei universal. Finalmente
o direito é o que possibilita a livre coexistência dos homens, a coexistência
em nome da liberdade, porque somente onde a liberdade é limitada, a
liberdade de um não se transforma numa não liberdade que lhe é concedida
pelo direito de todos os outros, e cada um pode usufruir de uma liberdade
igual a dele. (apud Dias, 2018)

Para tratar do tema da corrupção e do CPL, especialmente do papel do Direito


e das normas no enfrentamento e prevenção da corrupção, convém ter a mínima
noção sobre a ética e a moral.

Ética e Moral

No ano VI a.c. o estadista ateniense Solón da Grécia estava disposto a


perdoar todas as dívidas das pessoas com entes públicos e privados. O nobre
propósito era evitar que elas se tornassem escravas caso não honrassem a
dívida, como costumes de época. No entanto, antes de aprovar a lei, contou
a amigos que, se aproveitando da informação privilegiada, pegaram grandes
empréstimos e compraram terras. Após a lei perdoando as dívidas, seus
amigos enriqueceram. (Referencial de Combate à Fraude e Corrupção –
TCU, 2018, pág.10)

Ética vem do latim ethos – morada, habitat, mas para a filosofia é o caráter,
índole, natureza. Para Aristóteles se caracteriza pelo fim e objetivo a ser atingido, já
para Platão significa a busca da Justiça (Valls, 1994, pág. 20 e seg.). Trata de
escolhas que fazemos diante das situações da vida. É medida por princípios e valores
morais, os quais se alteram ao longo da história em crenças religiosas, metafísicas e,
posteriormente, pelo direito.
Ética e moral não se confundem. A moral, tradução de ethos para o latim mos
– costume (plural mores), tem a ver com as convicções de uma pessoa, derivadas dos
costumes, de seu meio social, também representando escolhas. A ética estuda e
critica a moral, refletindo sobre essas regras. Interessa para nosso tema, mais que o
naturalismo ou racionalismo grego, a relação de ética e política, pois aqui podemos
valorar a conduta de um sujeito e os valores da sociedade (Cunha, 2019).
Em resumo a ética é uma reflexão sobre a moral, esta por sua vez estabelecida
em códigos de conduta de acordo com épocas, sociedades, locais, tribos e assim por

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diante. Uma ação considerada moral ou imoral pode ser ética ou não, de acordo com
essa reflexão. Um código de ética traz regras morais que pretendem criar uma cultura
ética. Isso é visto claramente em empresas e entidades, sejam públicas ou privadas.
Immanuel Kant dizia que o ser humano deve agir “por dever” e não “meramente
pelo dever”. Isso significa que uma ação moral é motivada pelo dever, e não aquela
que tem a aparência do dever. Seu exemplo do comerciante que dá o troco correto
por dever, e não pelo medo de perder a clientela ou outras consequências nos dá a
exata noção de ética em sua concepção (apud Dias, 2018).
No célebre diálogo de Platão intitulado Críton8, ele relata que Sócrates foi
condenado a morte, e diante da proposta de seus amigos de promover uma fuga,
subornando inclusive guardas da prisão, ele se recusou ao argumento de que as
regras e leis da cidade (polis) devem ser respeitadas, preferindo sofrer uma injustiça
que praticar algo injusto.
A par do grau de dificuldade da discussão desse tema, haja vista as
peculiaridades históricas, culturais, étnicas, e tantas outras, temos que é possível no
atual estágio de nossa sociedade ocidental, especialmente nas democracias, ter um
norte e concepções de valores básicos para as sociedades. As modernas
constituições fornecem um sólido caminho ao enunciar princípios e valores que
inegavelmente devem compor o ordenamento social, como solidariedade, justiça
social, respeito a dignidade humana, pluralidade, limites ao Estado, direitos e
garantias fundamentais etc.
Quando nós brasileiros vamos a outros países e nos deparamos com
sociedades onde a lei é estritamente cumprida por todos os seus cidadãos no dia a
dia, nas condutas mais simples, temos um certo choque de realidade. Costumamos
nos impressionar com condutas básicas, desde o respeito a um semáforo ou local de
travessia de pedestres, passando pela conduta de agentes públicos no cumprimento
do dever, até mesmo nos espantamos por não haver catracas ou cobradores em
ônibus ou metrôs, pois cada pessoa compra e valida seu bilhete.
O que ocorre é um choque de cultura, e neste termo de fato reside a grande
questão a ser enfrentada por nossa sociedade. Vemos nessas sociedades um forte
substrato de cultura baseada em valores, ou seja, na ética. A percepção é que muito
mais que a política e leis mais duras, o que há de verdade nessas sociedades é uma
cultura sólida baseada na ética a ser seguida por todos os indivíduos. E a sua
valoração de ética trabalha intrinsecamente com valores essenciais e inalienáveis,

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indispensáveis a essas sociedades, ainda que indivíduos que a ela pertençam possam
discordar de alguns desses valores. Nesse sentido não se discute, nessas
sociedades, o valor das normas vigentes que condenam e não aceitam a corrupção.
A reportagem abaixo talvez ilustre bem essa situação:

Figura 2: Texto Vida Pública – Comportamento


Fonte: Conteudista, CITA/EaD/Segen.

Esta, sem sombra de dúvida, é a grande questão a ser enfrentada por nossa
sociedade. Qual a nossa cultura? Ela está baseada em quais valores? Em que moral
nos assentamos? E finalmente, qual a nossa ética enquanto indivíduos, sociedade e
país? É ético nos rebelarmos contra a corrupção, mas transigirmos com pequenos
atos que implicam transgressão de norma?
Nesse contexto, tomam vulto as questões da governança e o CPL. Esses
institutos já existem e são discutidos e aprimorados em outros países há algum tempo,
tendo especialmente nos últimos cinco anos se tornado agenda do dia nas instituições
públicas ou no meio privado no Brasil.
Para muito além de imporem medidas mais rígidas de transparência, controle,
gestão e distribuição de riscos, auditoria, responsabilização de agentes públicos e
privados, a governança e o CPL tem o grande objetivo de instituir e fomentar uma
cultura de ética e conformidade nas relações público x privada e privada x privada,
trazendo os valores da responsabilidade social, da devida compatibilização dos
interesses públicos e privados, da supremacia do interesse público, da lealdade, da

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livre concorrência e, fundamentalmente, do cumprimento das normas como uma nova
forma de se desenvolver essas relações.
Somente com o desenvolvimento de uma cultura ética poderemos refundar
nossa sociedade de uma forma que não esteja vulnerável ao mal da corrupção. A
partir do momento em que os agentes públicos e privados realmente adotarem esses
valores por convicção, as mudanças começarão a ocorrer de forma mais sólidas e
veremos as transformações necessárias e vitais para que o Brasil se livre das amarras
da corrupção e siga seu natural curso de desenvolvimento e justiça social.

AULA 3 – O PAPEL DO DIREITO

Leis são necessárias como instrumentos indispensáveis de se prevenir e


reprimir a corrupção, mas temos de admitir que elas têm um efeito similar aos
remédios aplicados contra quadros febris: não atacam a causa do problema, mas tão
somente seus sintomas e, em termos éticos, podemos no máximo chegar ao agir
“meramente pelo dever”, para usar a expressão de Kant (apud Dias, 2018). Temos
legislação avançada em muitos campos do combate à corrupção, mas o problema
persiste e persistirá enquanto não houver uma mudança de cultura ética de nossa
sociedade.
Atualmente, além da previsão do crime de corrupção no Código
Penal, previstos em seus arts.317 e 333 – respectivamente
corrupção passiva e ativa – temos a Lei de Improbidade
Administrativa – Lei nº.8.429/92, a própria Lei Anticorrupção - Lei
nº.12.846/13, a Lei Antitruste – Lei nº.12.529/11, e tantas outras
leis, artigos de leis e normas infralegais que são amplamente
aplicadas aos casos que envolvem corrupção.
Da mesma forma, as instâncias públicas têm normativos que tratam de temas
afetos diretamente a corrupção, a exemplo do Código de Conduta da Alta
Administração Federal, editado em 2014, que enumera vários normativos que
regulamentam a conduta do servidor público federal. E também, do Código de Ética
do Servidor Público Civil do Poder Executivo – Dec. nº. 1171/94, e regulamentos que

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chegam a tratar da concessão de audiências a particulares, recebimento de brindes e
assim por diante.
Fica evidente que o problema não está na existência de normas, mas sim de
sua eficácia e efetiva aplicação, o que passa por medidas de maior controle por parte
das instituições públicas e pela implantação de programas de governança e
compliance.
A par disso tudo, o Direito tem um papel fundamental quando tratamos da ética
numa sociedade. O velho brocardo latino ubi societas, ibi jus significa que onde está
a sociedade está o Direito, e para haver o Direito haverá uma ética social que lhe
servirá de norte, de fundamento, tendo o Direito o papel de regular e controlar a
sociedade, não permitindo que o valor individual se sobreponha aos valores da
sociedade (Marconi, 2000).
Em cada sociedade há a legitimação de um sistema jurídico, a par de existirem
valores morais de cunho individual ou ainda de etnias, de grupos religiosos, de
indivíduos etc. O que o sistema jurídico faz é conferir a segurança jurídica dentro do
arcabouço jurídico que busca refletir e se legitimar pela ética vigente da maioria da
sociedade.
Neste ponto, fica inevitável o questionamento: quais os valores morais e qual
ética que prevalecem numa sociedade? Como chegar a esse consenso? Não
estaríamos abrindo a porta para valores que podem parecer completamente contrários
a ética? Qual moral e qual ética, a minha ou a sua?
Essas questões são extremamente complexas e não cabem no escopo desta
nossa reflexão enfrentá-las. O filósofo e jurista Norberto Bobbio disse em seu “A Era
dos Direitos:

Figura 3: Conceito de moral


Fonte: CITA/EaD/Segen.

20
O importante aqui é reconhecer duas coisas: primeiro que existem valores que
necessariamente vão ser incorporados por uma sociedade moderna e, segundo que
cabe ao direito tipificá-los, codificá-los e sancionar aqueles que não os cumprirem,
conferindo segurança jurídica a sociedade.
Neste sentido, e no estrito contorno do que nos propomos com este estudo,
existem direitos de natureza humana que parecem incontestáveis no mundo civilizado
atual. Assim, a dignidade da pessoa humana, o direito à vida, a liberdade, a
propriedade e outros, sendo talvez o grande marco moderno neste sentido a
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, que enuncia os direitos
considerados inalienáveis da pessoa humana.
Vale aqui ressaltar que o combate à corrupção pode ser encarado como a
consolidação do valor da honestidade/integridade/probidade, o que parece
incontestável e imprescindível para uma sociedade. E é inegável que em nossa
sociedade, como de resto na imensa maioria dos países ditos civilizados, há clamor
social de que o problema da corrupção seja enfrentado. Em suma, que sejam
adotadas as medidas legislativas pertinentes ao tema, pois é algo validado pela ética
e moral da nossa sociedade.
Ainda quanto ao papel do Direito nesta temática, é importante constatar que se
por um lado a demanda ética e moral impõe o combate à corrupção, a existência de
legislação a respeito e sua efetiva aplicação auxilia na sedimentação do valor da
honestidade e ética nas relações. Ou seja, o Direito acaba por ter um papel
fundamental na criação e propagação de uma cultura de ética na sociedade, o que é
o principal objetivo do compliance, sendo uma via de mão-dupla: a demanda da
sociedade por ética nas relações sociais é fortalecida pela existência de arcabouço
jurídico que impõe obrigações de ordem ética, conferindo fundamento e reforçando a
necessidade de satisfazer essa demanda.
Por fim, no que tange a Administração Pública, existe a chamada ética
administrativa, decorrente do art. 37 da Constituição Federal, que enuncia como
princípios da Administração Pública: a legalidade, a publicidade, a moralidade, a
finalidade e a eficiência (Brasil, 1988). A moralidade aqui implica, segundo Hely Lopes
Meirelles, que:
“o agente administrativo, como ser humano dotado de capacidade de atuar,
deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o Honesto do Desonesto. E
ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético da sua conduta. Assim, não

21
terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo do injusto, o
conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre
o honesto e o desonesto.” (MEIRELLES, 2012, pág. 90)

Quando falamos em ética própria da Administração Pública, temos que ter em


mente que ela está legislada, enunciada pela moralidade administrativa e pela
finalidade do ato público, ambos princípios de cunho constitucional, e
consubstanciada no conceito de probidade administrativa, prevista em legislação
própria. Ou seja, no campo do Direito Administrativo, portanto para os servidores
públicos, o norte ético está devidamente previsto no ordenamento jurídico e deve ser
cumprido.

AULA 4 – DIMENSÃO DO PROBLEMA DA CORRUPÇÃO

A esta altura poderemos estar nos questionando se é necessário realmente ter


que reafirmar coisas tão básicas como o valor da ética nas relações sociais e o
compliance como o valor do cumprimento das leis e regulamentos. Não seria “chover
no molhado” dizer que nas relações sociais o indivíduo deve agir com honestidade?
Que o servidor público deve cumprir a lei? Que as relações público-privadas devem
ser efetivadas dentro dos parâmetros legais e éticos? Isto não seria algo muito básico,
intuitivo e desnecessário? A resposta, infelizmente, é não.
Existe sim a necessidade de se legislar regulando as relações sociais no
sentido da integridade, probidade e ética, mas também se deve fomentar a cultura
desta atividade, do cumprimento das regras e normas como valor intrínseco das
instituições públicas e privadas. Basta constatarmos o tamanho do problema da
corrupção no nosso país, a par da existência de leis no campo administrativo, civil e
criminal, com consequências graves para sua violação. E a corrupção continua a
existir.
Precisamos, de antemão, compreender que ao falarmos de corrupção não
estamos falando exclusivamente da Administração Pública e de seus agentes que
transigem com o cumprimento das normas e valores da Administração. Estamos
falando da corrupção como um todo, no setor público, no setor privado e na sociedade
em geral, no nosso dia a dia. Não à toa, nosso anteprojeto de Código Penal tipificava

22
o crime de corrupção privada, a chamada “Corrupção entre Particulares”, em seu
art.1679:
Art. 167. Exigir, solicitar, aceitar ou receber vantagem indevida, como
representante de empresa ou instituição privada, para favorecer a si ou a
terceiros, direta ou indiretamente, ou aceitar promessa de vantagem indevida,
a fim de realizar ou omitir ato inerente às suas atribuições.

Tomemos como exemplo a Operação Lava Jato, cujas polêmicas e discussões


de cunho jurídico e político a respeito não interessam a este nosso curso, mas tão
somente seus números consolidados e cuja discussão na justiça já se encerrou. Em
março de 2021, ao completar seis anos de seu início, ela contabilizava R$ 4 bilhões
devolvidos aos cofres públicos, R$ 12 bilhões em multas e acordos de leniência, R$
6,2 bilhões de prejuízos a Petrobrás e mais de R$ 14 bilhões em prejuízos a Petrobrás
em razão de cartel entre 2004 e 2012 segundo o TCU10.
Ao longo da Operação Lava Jato, aquilo que nós brasileiros
imaginávamos ou tínhamos uma ideia acerca da corrupção foi
definitivamente desnudado com as notícias diárias desse
esquema que tanto custou ao país.
Passamos a ter uma noção, ainda que genérica, dos valores reais da
corrupção, que neste caso foram somas bilionárias. Não se tratava aqui de alguns
poucos milhões, que já nos escandalizavam, mas de bilhões em cifras finais. Tivemos
também a imagem da corrupção, com vídeos de operações policiais com apreensões
de milhões de reais em vários momentos, com confissões de empresários ou agentes
públicos corruptos conferindo o tamanho da empreitada criminosa. Assim, como
tivemos uma melhor noção do tamanho da infiltração destes grupos criminosos no
Estado brasileiro, uma vez que o envolvimento nos crimes chegou aos níveis mais
elevados da Administração Pública, corrompendo agentes políticos, além de grandes
empresários de renome internacional.
O que mais assusta: este não foi o primeiro grande caso de corrupção de nossa
história recente, apesar de ter sido o maior. Se formos resgatar na memória das
últimas décadas nos lembraremos de outros escândalos, como o do Mensalão,
Escândalo da Merenda, Máfia dos Fiscais do Rio de Janeiro, Caso Sudan,
Sanguessugas e tantos outros que lamentavelmente fazem parte de nossa história de
corrupção11.
A cada novo caso de corrupção, assistimos o envolvimento de políticos,
empresários, agentes públicos, gestores e, da mesma forma, vemos as cifras

23
milionárias da corrupção se acumulando, gerando descrédito das instituições, de
autoridades e da própria sociedade com o Estado brasileiro. Haja vista que tivemos
operações policiais sobre supostos esquemas em licitações na área de saúde em
plena pandemia do coronavírus, demonstrando o desprezo pelas vidas humanas em
período tão crítico atravessado em nível mundial12. Infelizmente nesses casos tivemos
as cifras na casa dos bilhões de reais mais uma vez atingida.
Esses números apresentados a cada operação policial contra a corrupção não
conseguem talvez dar a magnitude do dano social, aquele que é intangível, abstrato.
Qual seria o prejuízo a sociedade brasileira de ordem moral? O que isto afeta a
credibilidade do nosso país e nossas empresas? O que poderia ter sido feito com
esses valores se bem administrados em prol da sociedade? E como fica o brasileiro
nisso tudo?
O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes - UNODC, que tem
entre seus objetivos auxiliar os governos dos países no combate à corrupção, dando
a máxima eficácia à Convenção da ONU Contra a Corrupção - UNCAC13, da qual o
Brasil é signatário e vem adotando as medidas para aplicação, elaborou documento
enumerando as consequências da corrupção para a sociedade, como parte da
campanha “Zero corrupção, 100% desenvolvimento”. Vale elencar de forma bem
reduzida as consequências elencadas pelo UNODC14:
1. Freia o desenvolvimento econômico e fere o Estado de Direito;
2. Coloca em risco a democracia e as instituições públicas;
3. Desvia fundos que deveriam ser alocados em serviços essenciais, privando a
sociedade dos mesmos;
4. Gera menos empregos na economia, restringindo o acesso a esses empregos
aos menos favorecidos e minorias, restringindo os investimentos estrangeiros.
Ainda neste documento, o UNODC aponta a corrupção como o maior obstáculo
ao desenvolvimento econômico e social no mundo, estimando em US$ 1 trilhão os
gastos em suborno e US$ 2,6 trilhões desviados pela corrupção, o que corresponde
a mais de 5% do PIB mundial.
É simplesmente impossível mensurar o tamanho do dano causado à nossa
sociedade pelos sucessivos escândalos de corrupção. Mesmo porque, até agora
somente tratamos dos danos materiais, financeiros, da parte que é possível mensurar
ao menos em estimativa. O que sequer conseguimos estimar com a mínima precisão
é o dano de ordem moral, psicológico, o impacto que a sociedade tem e que traz

24
consequências individuais e coletivas. A exemplo da descrença nas instituições e
autoridades públicas, a imagem da nossa sociedade e do nosso país no exterior, o
desânimo das pessoas que pode levar a anarquia ou a um estado de anomia, e tantos
outros efeitos não mensuráveis materialmente. E o pior de tudo: a afirmação tantas
vezes repetida de que a corrupção faz parte de nossa sociedade.
Não podemos aceitar passivamente este quadro. Não é possível achar natural
que o Brasil ostente a desonrosa 94ª colocação no ranking da transparência
internacional, que tem 184 países15. Temos sim que reconhecer o problema, colocá-
lo no devido lugar, em especial porque há uma forte reação da sociedade brasileira
no sentido de se enfrentar o problema da corrupção e muitas são as iniciativas neste
sentido.
As políticas de governança e os programas de compliance constituem um
grande avanço neste sentido, pois estruturam as entidades públicas e privadas dentro
de uma política de gestão estratégica, avaliação de riscos e, fundamentalmente, de
prevenção e detecção de problemas de corrupção, buscando gerar uma cultura de
ética e conformidade nas relações público x privada e privada x privada.

Leitura Complementar

Em agosto de 2017 a jurista alemã Herta Däubler-Gmelin veio ao Brasil para


participar de alguns debates sobre a democracia. Na ocasião ela concedeu entrevista
a Deutsche-Welle Brasil, na qual uma das respostas ao entrevistador é a seguinte:

Eu ouço que existem muitos acontecimentos preocupantes. Sob a


perspectiva alemã, devo dizer que não é comum ver juízes interferirem nas
disputas políticas cotidianas na Alemanha. Esse comportamento é,
absolutamente, um "no go". Isso não pode acontecer de forma alguma. Isso
compromete a neutralidade do juiz, sua independência e até jurisdição. Isso
coloca também a confiança da população na instituição em cheque.
Por outro lado, nunca aconteceria na Alemanha de um presidente sob
suspeita de corrupção, com denúncia apresentada pela própria Procuradoria
Geral da República, não renunciar imediatamente ao cargo.
Tivemos um caso notório na Alemanha [renúncia do presidente Christian
Wulff, em fevereiro de 2012]. Tratava-se de 700 euros. Mas, obviamente,
assim que o procurador-geral apresentou a denúncia, estava claro para a
opinião pública que o presidente tinha que renunciar. E foi o que ele fez.
Aqui é outro mundo. Então, eu posso entender a certa descrença que há
aqui no atual desempenho do Judiciário, de alguns juízes e juízas – mas é
claro que não estamos falando de todos, também há tendências
completamente diferente, como sabemos.
(https://g1.globo.com/politica/noticia/nunca-aconteceria-na-alemanha-de-

25
presidente-alvo-de-denuncia-por-corrupcao-nao-renunciar-diz-ex-ministra-
alema.ghtml) Grifo nosso.

Qual seria o real significado e o que a entrevistada quis dizer


com a expressão utilizada: “aqui é outro mundo”. Faça um
cotejo com os temas estudados no módulo.

26
Finalizando

Neste primeiro módulo estudamos ao longo de quatro aulas os seguintes


temas:
• As revoluções industriais que alteraram consideravelmente os meios e modos
de produção, além da própria circulação de bens, produtos e serviços.
• O risco de uma atividade pode extrapolar a esfera do indivíduo e atingir a
própria coletividade, de forma que o simples exercício de uma atividade passa a poder
gerar um risco para a sociedade.
• Um dos riscos que mais ficaram patentes foi o da atividade econômico-
financeira, tendo na quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929 o primeiro exemplo de
uma crise financeira em escala global.
• Com a globalização e a revolução tecnológica, especialmente no campo
econômico-financeiro, o risco de crises em nível mundial fica potencializado, havendo
vários exemplos nos anos 1990 e 2000 de crises que transbordaram as fronteiras
mundiais.
• Essas crises e escândalos financeiros invariavelmente passam pela corrupção.
• O compliance, assim como a governança, passam a ser uma exigência nesse
contexto, visando gerir o risco através da prevenção e detecção de problemas de
corrupção, buscando fomentar e exigir o cumprimento das normas como algo
essencial para as empresas e instituições.
• A moral e a ética são essenciais no estudo e compreensão do contexto do
compliance, sendo a moral derivada de nossas convicções pessoais, advindas dos
costumes e da sociedade, e a ética a valoração sobre a moral.
• O compliance visa estabelecer, para além da cultura de cumprimento de
normas, o estabelecimento de uma cultura de ética, de valores dentro do ambiente
empresarial e das instituições, especialmente nas relações público x privadas.
• Dentro desse quadro o Direito tem o papel de regular as relações sociais,
pacificando a sociedade.
• Para sua validade, o Direito busca fundamentos éticos da sociedade, dentro de
sua estrutura moral. A par das vicissitudes da sociedade existem valores
inquestionáveis como a dignidade da pessoa humana, a vida, a liberdade e a
honestidade/integridade/probidade nas relações.

27
• Existe ainda uma moral administrativa, onde o servidor público tem de agir de
acordo com a honestidade, derivada dos princípios da administração pública de índole
constitucional.
• Ao regular o tema do compliance e do combate à corrupção o Direito
retroalimenta a necessidade e demanda por este enfrentamento do tema, da
prevenção e detecção da corrupção e da instalação de uma cultura de ética.
• Para enfrentar o problema da corrupção devemos colocar o tema no seu devido
patamar, ter a compreensão da sua dimensão em nossa sociedade, do tamanho de
seu prejuízo material e imaterial, reconhecendo a imperiosa necessidade de enfrentar
o tema.
• O compliance surge como uma ferramenta necessária nesse quadro, sendo
essencial para o enfrentamento ao problema da corrupção.

MÓDULO II - DA GOVERNANÇA E SUA RELAÇÃO COM COMPLIANCE E


CONTROLE INTERNO

Apresentação do módulo

Neste segundo módulo serão estudados os seguintes temas:


● O surgimento dos institutos da governança e do compliance, com seus
históricos e marcos legais fundamentais, além de determinar diferenças e
correlações conceituais, estruturais e práticas entre elas;
● Conceitos, características e noções de governança, conferindo um
panorama atual do tema;
● Esclarecimentos conceituais sobre a relação entre governança,
compliance e Controle Interno.

Propomos ainda ao final apresentar alguns exemplos recentes de programas


de compliance e sua atuação prática.

Objetivos do Módulo

28
● Ter uma noção mínima acerca dos institutos da governança e do
compliance, a correlação existente entre eles e sua aplicação no setor
público e privado;
● Compreender em linhas gerais o instituto da governança, seus
fundamentos, seus marcos legais e o atual estágio de sua aplicação;
● Compreender em linhas gerais as diferenças conceituais e relações
entre os institutos da governança, do compliance e do controle interno;
● Entender a real importância dos programas de governança e compliance
para as instituições públicas e privadas e para a sociedade como um todo.

Bons estudos!

Estrutura do Módulo

Estes temas serão abordados ao longo de 3 (três) aulas, a saber:

Aula 1 – Breve introdução à Governança e Compliance.


Aula 2 – Da Governança.
Aula 3 – Governança, Compliance e Controle Interno: uma Visão Sistêmica.

29
AULA 1 – BREVE INTRODUÇÃO À GOVERNANÇA E COMPLIANCE

Vimos ao tratar das noções gerais do compliance, na primeira aula do módulo


I, que o contexto de surgimento desse instituto remete as alterações nos meios e
modos de produção e circulação de bens e serviços, de acordo com as sucessivas
revoluções industriais. Também estudamos o impacto da chamada revolução digital,
especialmente no mundo globalizado, no mundo dos negócios, resultando no aumento
exponencial do risco pela simples execução de um negócio.
Conforme expusemos no módulo I, as discussões sobre o nível de intervenção
do Estado na atividade econômica aumentam, bem como escândalos de corrupção
pública e privada geram reações de governos e do próprio meio empresarial, e nesse
contexto começam a surgir as regulações de governança e compliance.
Explicamos que o risco é um elemento essencial no surgimento desses
institutos. Aprofundando um pouco este tema, pois crucial para entender os
fundamentos deste programa, a teoria do risco em seus contornos mais atuais tem
por base as ideias do sociólogo alemão Ulrich Beck que em 1986 escreveu a clássica
obra “Sociedade do Risco: Rumo a uma Outra Modernidade”.
Analisando a teoria de Beck, Luciana Carneiro Silva defende a ideia de que a
sociedade do risco está sucedendo a sociedade da revolução industrial, com a
característica de que com o atual estágio de desenvolvimento os riscos sociais,
políticos, econômicos e individuais são potencializados, e o pior, escapam das
instituições encarregadas do controle e proteção da sociedade. Na sua visão Beck diz
que não se trata mais de analisar a distribuição dos benefícios trazidos pela sociedade
da revolução industrial, mas sim enfrentar a distribuição dos malefícios que a
sociedade tecnológica impõe naturalmente na produção de bens, tais como pesquisa
nuclear, genética, catástrofes ecológicas dentre outras (Silva, 2010, pags.05 a 09).
Falando de outra forma, isso significa enfrentar o risco e sua distribuição na sociedade,
em especial para os responsáveis por atividades que o geram.
Exemplificando o que isso significa, imaginemos uma usina nuclear. Trata-se
de fonte de energia largamente utilizada em países do mundo inteiro, em especial as
superpotências, fruto do desenvolvimento tecnológico ocorrido na 2ª Grande Guerra.
A sua simples existência e funcionamento gera grandes benefícios traduzidos na
produção de energia. Porém, gera riscos incomensuráveis, haja vista os desastres de
Chernobyl e Fukushima16. Da mesma forma, temos os desastres ambientais gerados

30
por vazamento de óleo em plataformas de petróleo, como o ocorrido em 2019 no
nordeste do Brasil17 ou, ainda, os recentes desastres de Mariana e Brumadinho,
decorrentes da atividade de extração de minério de ferro18. Trata-se de operação de
transporte de óleo bruto para combustível, num caso, e nos outros dois casos a gestão
de dejetos da extração de minério de ferro, atividades essenciais para a indústria e a
sociedade, mas que geram esse risco que não tem sequer como ser mensurado
antecipadamente em suas consequências, em caso de sua consumação.
Pereira, citando Renato de Mello Jorge Silveira, nos ensina que nunca o
homem enquanto indivíduo teve tão poucos riscos, mas ao mesmo tempo o homem
enquanto coletividade, sociedade, nunca teve tantos riscos e de forma tão constante
(Pereira, 2012, pag. 04). Fica patente que o risco, sempre no objeto desse nosso
estudo, transborda do indivíduo, atingindo toda a sociedade. Dito de outra maneira,
os efeitos danosos da concretização desse risco passam a ser transindividuais,
coletivos, difusos.
Conforme já explicado em linhas gerais na primeira aula do módulo I, esse risco
também se aplica a economia, que no mundo globalizado permite, com um simples
“enter” num computador ou um clique num smartphone, a realização de operações de
grande monta, com remessas e investimento de capitais no mundo virtual. Se por um
lado isso é um propulsor da economia, por outro um escândalo de fraude empresarial
ou de mercado financeiro pode levar a crises mundiais, também com consequências
impossíveis de serem previstas.
A cada evolução da sociedade e momento histórico vivido o direito é chamado
para tentar regular as relações sociais, buscando manter a segurança jurídica e
manter um certo equilíbrio de forças e das relações público x privadas e privadas x
privadas. O momento atual, considerando todas as colocações feitas acerca do
contexto da sociedade do risco, vem demandando do direito em algumas questões,
tais como:
1. Como prevenir ou mitigar esses riscos inerentes ao mundo atual?
2. De quem é a responsabilidade caso esses riscos se concretizem? Como dividir
essa responsabilidade?
3. Como regular essas questões sem tolher a livre iniciativa e a atividade
econômica?
4. Quais os parâmetros para se estabelecer as responsabilidades por eventos
danosos a coletividade?

31
É dentro desse contexto fático e como respostas a essas perguntas que surgem
e se consolidam as práticas desta política, constituindo uma forma de se gerir os
negócios de Estado ou privados dentro de padrões de gestão estratégica,
gerenciamento de riscos, cultura de ética, conformidade e integridade, prevenção e
detecção de corrupção e assim por diante.
Trata-se, portanto, de estabelecer uma nova maneira de gestão do
empreendimento público ou privado, bem como de relacionamento público x privado,
de forma a prevenir e mitigar os riscos das atividades, havendo uma prévia distribuição
da responsabilidade dos riscos inerentes a atividades.
Passemos agora ao estudo mais detalhado da governança e do compliance,
institutos que, conforme já falamos, devem ser estudados em conjunto para melhor
compreensão em termos de contexto e conceitos.

AULA 2 – DA GOVERNANÇA

Visto o contexto geral e a noção deste tema cabe agora aprofundar o estudo
desses institutos, a começar pela governança para enfim passarmos ao compliance.
O instituto da governança, conhecido como governança corporativa, do inglês
corporate governance, surge quando o dono do capital investido em um negócio,
numa organização empresarial, passa a não mais ser o detentor e gestor desses
negócios. Isso ocorre nas primeiras décadas do século passado, com o avanço da
Segunda para a Terceira Revolução Industrial, tendo seu início marcado pela década
de 1930, no pós-crise de 1929.
Conforme aponta o Referencial Teórico Básico de Governança do Tribunal de
Contas da União – TCU, as organizações empresariais modernas têm um tamanho
tal e uma proporcional dispersão da relação de propriedade que acaba sendo
imprescindível a existência de regras para a relação entre os proprietários e os
administradores, garantindo que essas cumpram as orientações daqueles (TCU,
2020, pág.26).
Ainda segundo o TCU, embora este assunto seja bastante antigo ele começa
efetivamente a ser estudado, de forma sistemática, a partir dos anos 1930,
identificando estudo do ano de 1932, de autoria de Berle e Means, além da criação
em 1934 da US Security and Exchange Comission, que visava “proteger investidores,

32
garantir a justiça, a ordem e a eficiência dos mercados, e facilitar a formação de
capital” (TCU, 2020, pág.27). Isso tudo decorrente da necessidade de regulação do
Estado, para garantir a realização pelos administradores do quanto proposto pelos
investidores, além de proteger os acionistas minoritários.
Este movimento se intensifica a partir das décadas de 1980 e 1990, com o
agravamento da crise financeira mundial e escândalos financeiros, sendo neste
momento que a governança adquire os contornos atuais em termos corporativos e
governamentais.
Neste ponto cabe conceituar a governança. Apresentamos abaixo alguns
conceitos dos inúmeros existentes acerca deste tema:
Governança compreende a estrutura (administrativa, política, econômica, social,
ambiental, legal e outras) que garante que os resultados pretendidos pelas partes
interessadas sejam definidos e alcançados (IFAC – International Federation of
Accountants).19
Governança seria a tentativa ou esperança de reduzir o risco, reduzir a complexidade
inerente, ou seja, governar e controlar os fenômenos e eventos do mundo real, os
quais seriam naturalmente necessários e contingentes. Assim, a governança seria
uma forma de transformar a complexidade desestruturada em uma complexidade
estruturada (Pereira, citando Jessop, 2011, pág.02).
Sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e
incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de
administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes
interessadas (IBGC – Instituto Brasileiro de Gestão Corporativa).20
Um conjunto de práticas que tem por finalidade otimizar o desempenho de uma
companhia ao proteger todas as partes interessadas, tais como investidores,
empregados e credores, facilitando o acesso ao capital (CVM – Comissão de Valores
Mobiliários – in Serrão et al, 2005, pág.113).
Conjunto de mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para
avaliar, direcionar e monitorar a gestão, com vistas a condução de políticas públicas
e a prestação de serviços de interesse da sociedade (Dec. no.9.2013/17, art.2, inc.I).
Desses conceitos podemos tirar, de forma bem resumida, algumas conclusões
básicas acerca da governança. Primeiro que ela constitui verdadeiro método de
gestão visando mitigar os riscos e aumentar a eficiência do empreendimento.
Segundo que, ao tratar de governança, estamos falando de algo ligado a alta gestão,

33
pois falamos de estabelecimentos de estratégias e gestão de riscos para o
empreendimento, o que demanda poder decisório.
A governança tem como marcos históricos mais importantes em nível mundial,
de acordo com o referencial teórico do TCU (TCU, 2020):
• 1934 – EUA – Criação da US Security and Exchange Comission nos EUA, que
tem como missão proteger investidores, sendo uma agência federal que controla e
regulamenta os mercados, similar a função desempenhada no Brasil pela CVM;
• 1992 – Inglaterra – Cadbury Report, Committee on the Financial Aspects of
Corporate Governance. Grupo de recomendações para a boa governança e mitigação
de riscos;
• 1992 – EUA – Internal Control – Integrated Framework by Committee of
Sponsoring Organizations of the Treadway Commission – COSO. Metodologia
proposta para fins de governança e controle interno amplamente difundida e utilizada;
• 2002 – EUA - Lei Sarbanes-Oxley. Lei decorrente dos escândalos financeiros
nos EUA, em especial o caso ENRON, visando aperfeiçoar os sistemas de
governanças das empresas e impedir a fuga de capitais e investimentos em razão
desses escândalos;
• 2002 – Europa – criação do European Corporate Governance Institute - ECGI,
visando difundir as melhores práticas de governança corporativa e criar fórum de
debate acadêmico;
• 2004 – EUA – Enterprise Risk Management da COSO. Trata do gerenciamento
de riscos nas empresas.
A verdade é que o tema da governança é tratado de forma ampla atualmente,
sendo impositivo nas grandes empresas, consistindo em agenda recorrente do Fundo
Monetário Internacional – FMI - Organização para Cooperação Econômica e o
Desenvolvimento – OCDE - e Banco Mundial.
Como princípios ou elementos fundamentais da governança corporativa temos
o seguinte, segundo o 21IBGC:
• Transparência: que significa fornecer a parte interessada todas as informações
de seu interesse, e não somente aquelas que por lei ou regulamento tenha de ser
fornecidas. É o que permite o controle dos atos de gestão;
• Equidade: é o tratamento equânime de todos os interessados, sejam sócios
majoritários ou minoritários, os stakeholders22;

34
• Prestação de Contas (accountability): quer dizer que aqueles que trabalham
com governança devem prestar contas de todas as suas atividades, assumindo toda
a responsabilidade por estas atividades;
• Responsabilidade Corporativa: significa zelar pela viabilidade econômico-
financeira do empreendimento, reduzindo riscos, eliminando os pontos negativos e
explorando os pontos positivos.
Interessante notar que a governança surge no campo privado, com todos os
seus conceitos, parâmetros, doutrina e princípios. Porém, a Administração Pública
acaba tomando por empréstimo os contornos da governança e os aplica no setor
público.
Surge a indagação: o que fundamenta a existência de governança no setor
público? Segundo Pereira, citando Abbud, Rodrigues e Benedito (Pereira 2011,
pág.05):
As organizações públicas e as corporações têm como ponto em comum a
separação entre a propriedade e a gestão, ou seja, elas enfrentam os
mesmos “conflitos de agência”. Essa fundamental semelhança faz com que
os princípios da governança corporativa possam ser aplicados ao setor
público.

Explicando de forma bem simples, isso significa que na Administração Pública


os gestores estão decidindo sobre interesses da sociedade, aplicando recursos que
não lhes pertencem, mas sim a toda a sociedade. Então, da mesma forma que numa
empresa há os investidores de um lado, donos do capital, e do outro os gestores que
administram esse capital, também na Administração Pública há o dinheiro e interesse
público, de um lado, e os gestores desse dinheiro e interesse público do outro. Isso
demanda uma forma de gestão que ofereça segurança de que o interesse público
prevalecerá e que o dinheiro público será devidamente empregado. Aí que entra a
governança no setor público.
Mas a governança pública não se limita a essa relação entre o dono do capital
(sociedade) e o gestor (Administração Pública). Seria algo muito simplificado para o
tamanho e complexidade da empreitada do Estado, especialmente considerando o
amplo espectro de sua atuação, praticamente impossível de se delimitar na
sociedade. Segundo Alex Teixeira e Ricardo Gomes (2019, págs.07 a 10), a
governança pública:

35
• Trata da aquisição e distribuição de poder na sociedade, segundo Matias-
Pereira, uma vez que estabelece a relação entre o cidadão e os gestores públicos;
• Permite avaliar os resultados e desempenhos segundo Bovaird, avaliar a
qualidade esperada e os seus procedimentos e execução nos atos de gestão;
• Segundo Peters, visa a preocupação com a capacidade do sistema de
efetivamente resolver os problemas públicos, auxiliando na solução desses
problemas;
• Implica em estabelecer critérios avaliativos e indicativos dos órgãos na
execução de políticas públicas, auxiliando-os a executá-las;
• Direcionar os rumos, metas e influenciar os resultados.
Muitas são as abordagens da governança pública, sendo que para os fins deste
nosso estudo basta o conceito trazido pelo TCU (TCU, 2019):
"Governança pública organizacional compreende essencialmente os
mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para
avaliar, direcionar e monitorar a atuação da gestão, com vistas à
condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse
da sociedade."

É importante ter em mente então a função da governança pública, que é na


verdade um método de gestão estratégica, com gerenciamento dos riscos e formas
de controle aprimorado, interna e externamente. Trata-se de um passo além na
questão da eficiência e controle da gestão da coisa pública, aplicando-se a toda a
Administração direta ou indireta.
Também o TCU nos traz os princípios da governança pública, a saber (TCU,
2019):
• Capacidade de resposta: capacidade de responder de forma eficiente e eficaz
as partes interessadas. Busca uma maior sinergia e entendimento entre o Estado e a
sociedade civil, implicando no princípio da participação;
• Integridade: diz respeito a conduta organizacional e do agente público, que
devem estar alinhadas as leis, regulamentos, princípios e ética pública, sempre
visando a prevalência do interesse público;
• Transparência: exige que sejam disponibilizados aos cidadãos todas as
informações de interesse, sejam aquelas públicas por lei ou não, permitindo um

36
controle dos processos e execução das políticas públicas, sendo requisito do controle
do Estado;
• Equidade e Participação: exige a efetiva participação dos cidadãos e da
sociedade nas decisões e execução das políticas públicas, levando em consideração
seus direitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas;
• Accountability (prestação de contas e responsabilidade): trata-se da obrigação
de todo gestor público ou quem tenha gerido verbas públicas, de prestar contas a
sociedade, o que deve ser feito de forma clara, tempestiva e espontânea, assumindo
o agente público ou gestor das verbas públicas toda a responsabilidade pelos seus
atos e omissões;
• Confiabilidade: relacionada com a segurança jurídica que o órgão ou entidade
pública deve passar a sociedade, devendo seguir os seus objetivos e diretrizes
definidos, agindo em conformidade com sua missão institucional. Tem previsão no
Dec.9203/17 – Política de Governança da Administração Pública;
• Melhoria Regulatória: que representa o processo permanente de evolução dos
normativos orientado pelos cidadãos interessados, visando eficiência e clareza. Tem
previsão no Dec.9203/17 – Política de Governança da Administração Pública.

Em termos de sua evolução no Brasil, as grandes discussões acerca da


governança no setor público se intensificam e ganham corpo no início da década de
1990, em razão da grave crise fiscal herdada dos anos 1980, a chamada “década
perdida”23. Assim, podemos apontar como marcos fundamentais da governança
pública, os seguintes normativos ou planos, dentre muitos outros:
1995:
Plano Diretor da Reforma do Estado: foi elaborado no início da década de 1990, com
base nos estudos do professor e então Ministro de Administração Federal Luiz Carlos
Bresser-Pereira. Este plano trouxe grandes inovações na Administração Pública,
dentre elas:
• Criação do Ministério da Administração Federal e Reforma do
Estado, com o objetivo de levar a cabo as mudanças propostas,
a começar pela diminuição do tamanho do Estado, que deveria
passar a se preocupar com serviços essenciais;

37
• Traz o conceito de “eficiência” como um conceito essencial à
prestação dos serviços públicos, sendo que a eficiência passa a
ser um dos princípios fundamentais da Administração Pública a
partir da Emenda Constitucional no.19/98;
• Também apresenta o conceito de gestão, de gerenciamento para
fins de Administração Pública, combinada com eficiência, o que
leva a se exigir uma gestão eficiente ou “Administração Gerencial”
por parte do gestor público, aproximando-se dos conceitos das
corporações privadas;
• O conceito de “transparência” ganha força com a chamada
“Administração Gerencial”, uma vez que confere maior controle
dos atos da Administração Pública.
Dec. nº 1.171/94:
estabelece o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo
Federal.
Lei Complementar nº 101/2000:
chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabeleceu a transparência e
responsabilidade financeira na gestão pública.
Dec. nº 5.378/05:
chamado de GESPÚBLICA, que estabeleceu o programa de gestão por excelência na
Administração Pública.
Lei nº 12.527/11:
Lei de Acesso à Informação, que concretizou o princípio da transparência na
Administração Pública.
Instrução Normativa Conjunta MP/CGU nº 001/16:
trata de controle interno, gestão de riscos e governança no âmbito do Poder Executivo
Federal.
Dec. nº. 9.203/17:
Que estabelece a política de governança da administração pública federal direta,
autárquica e fundacional.
Importante notar que no campo normativo a governança pública vem ganhando
cada vez mais contornos bem definidos de aplicação, o mesmo ocorrendo em relação
a sua execução, tendo o TCU elaborado o referencial para tanto.

38
Segundo o TCU, são necessárias instâncias administrativas, processos de
trabalho, instrumentos (ferramentas, documentos etc.), fluxo de informações e
comportamento de pessoas envolvidas, o que consiste no sistema de governança a
ser aplicado (TCU, 2019). O quadro abaixo ilustra esse sistema proposto pelo TCU:

Figura 4: Sistema de governança em órgãos e entidades da administração pública


Fonte: TCU, Referencial Básico de Governança.

Em linhas gerais esta é a governança pública, cabendo agora entender a


relação entre governança e compliance, objeto de capítulo próprio.

39
AULA 3 – GOVERNANÇA, COMPLIANCE E CONTROLE INTERNO: UMA VISÃO
SISTÊMICA

Após explicar o contexto da governança, seu surgimento e conceitos básicos,


cabe agora, antes de adentrarmos no estudo mais aprofundado do CPL, estabelecer
algumas relações conceituais e diferenças entre os institutos da governança
corporativa ou governamental edo controle interno.
É importante neste momento explicarmos que atualmente no
Brasil existe uma certa confusão entre o que configura
governança, CPL, controle interno, auditoria, integridade e
conformidade. Os conceitos desses termos nem sempre são
utilizados da forma adequada e, em outras vezes, observamos
verdadeira sobreposição. Muitos programas que constituem
governança são chamados de CPL, e vice-versa. Outras vezes
vimos a confusão entre controle interno e governança ou CPL.
Uma coisa é perceptível na configuração desses programas no nosso país: em
regra, no meio privado, se fala em CPL (embora exista governança), e no meio público
se fala em governança (embora algumas práticas sejam típicas de programas de
compliance). A Lei anticorrupção fala em programa de integridade. Mas o fato é que
o termo “CPL” é o que está com ampla difusão neste momento, seja no setor privado
ou no setor público.
De antemão é preciso esclarecer que no Brasil este assunto é algo
relativamente recente, impulsionado na última década, com implantação numa
velocidade muito grande, o que naturalmente gera confusão conceitual dentro de uma
doutrina que ainda está sendo sedimentada. O mesmo pode ser dito quanto às
consequências jurídicas, que levam mais tempo para serem definidas em termos de
jurisprudência.
E vejam que não pretendemos aqui defender de forma ortodoxa algumas
questões conceituais, até porque o importante é a existência de programas neste
sentido, seja a que título for, governança, compliance, integridade, conformidade etc.
Trazendo esta discussão para o âmbito público, esfera que interessa mais
diretamente ao nosso estudo, podemos estabelecer as diferenças conceituais e
pontos de intersecção da governança, gestão de riscos e integridade/CPL (GRC), e
do controle interno e auditoria nos termos abaixo:

40
Governança:
conforme já estudamos, trata de uma nova forma de administrar, de gerir a máquina
pública, com responsabilidade, transparência, desempenho, estabelecimento de
metas e controle dessas metas, avaliação de risco, participação de atores da
sociedade civil e assim por diante. É, portanto, uma nova forma de gestão pública,
surgida no final do século XX, em substituição aos modelos burocrático e gerencial
(Barreto, 2019, págs.34 e 35);
Governança e Conformidade ou Compliance:
esse novo modelo de governança “reestabelece como um de seus pilares a dimensão
da conformidade (ética e legal do Estado), como valor público fundamental” (Idem,
2019, pág.36). Aqui temos o compliance surgindo dentro desta nova concepção de
governança, a exemplo do que significa o modelo no setor privado, que nada mais é
do que o valor da norma, da ética, da integridade como valor da empresa;
Gestão de Riscos:
faz parte da governança, consistindo no “conjunto de atividades coordenadas para
identificar, analisar, avaliar, tratar e monitorar riscos” (ibidem, pág.98). Permite ao
gestor planejar e executar as políticas públicas dentro de um acompanhamento do
risco, desde a escolha ou mesmo rejeição na execução de determinada política
pública, passando pelo acompanhamento constante durante sua execução e eficácia.
Da mesma forma, permite um maior controle da própria administração e da sociedade
sobre as políticas públicas e sua gestão, assegurando mais transparência e
integridade;
Controle Interno:
também está inserido no âmbito da governança, sendo que as ações de controle
interno “ajudam a garantir o cumprimento das diretrizes determinadas pela alta
administração para mitigar os riscos, a realização dos objetivos e assegurar a razoável
segurança no alcance de objetivos” (ibidem, pág.107). Assim, as ferramentas,
instrumentos e mecanismos de controle interno serão aplicadas para fins da gestão
de riscos;
Auditoria:
as auditorias internas e externas vão atuar na avaliação da eficácia do funcionamento
da gestão de riscos, amadurecendo este sistema com recomendações e sugestões.

41
Importante também transcrever alguns conceitos constantes no Dec. nº
9.203/17, que dispõe sobre a política de governança na Administração Pública Federal
direta, autárquica e fundacional, que positivou alguns desses conceitos, conferindo
norte na compreensão do sistema de governança e a questão do compliance:
• Art.2º., inc. I - governança pública - conjunto de mecanismos de liderança,
estratégia e controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar a gestão,
com vistas à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da
sociedade;
• Art.2º. inc. IV- gestão de riscos - processo de natureza permanente,
estabelecido, direcionado e monitorado pela alta administração, que contempla as
atividades de identificar, avaliar e gerenciar potenciais eventos que possam afetar a
organização, destinado a fornecer segurança razoável quanto à realização de seus
objetivos;
• Art.3º. - são princípios da governança pública: inc.II - integridade;
• Art.4º. inc. VI- implementar controles internos fundamentados na gestão de
risco, que privilegiará ações estratégicas de prevenção antes de processos
sancionadores;
• Art.5º. - são mecanismos para o exercício da governança pública: inc. I, “a” -
integridade; inc.III - controle, que compreende processos estruturados para mitigar os
possíveis riscos com vistas ao alcance dos objetivos institucionais e para garantir a
execução ordenada, ética, econômica, eficiente e eficaz das atividades da
organização, com preservação da legalidade e da economicidade no dispêndio de
recursos públicos.

Do todo o exposto, temos de forma bem clara, a par da já mencionada confusão


conceitual existente, que a governança é um sistema de gestão complexo, que surge
na iniciativa privada para compatibilizar interesses de investidores e administradores,
e que no setor público vai além, constituindo verdadeiro sistema de gestão da máquina
pública quanto ao planejamento e execução de políticas públicas.
Visa a governança pública estabelecer uma forma de gestão baseada na
eficiência, que consiga entregar os melhores resultados possíveis dentro do que se
espera do poder público. Para tanto, são estabelecidos planejamentos e ações

42
estratégicas, com escolha feita por métodos que permitam o controle e participação
da sociedade, permeado sempre pela transparência e tecnicidade nas escolhas.
A execução das políticas públicas passa a ser algo acompanhado internamente
por mecanismos de controle interno, dentro de uma política de gestão de riscos, tudo
avaliado por auditorias internas e externas. As atribuições, competências e
responsabilidades são bem definidas e distribuídas, sendo de antemão conhecidas.
Nesse contexto, a cultura de integridade de cumprimento das normas, da ética
e prevenção à corrupção fazem parte da governança, compreendida em seu sentido
macro. Isto é o compliance, que conforme veremos tem forte impacto positivo nas
instituições, estando fortemente em evidência por ser algo essencial na prevenção,
detecção e correção do grave problema da corrupção.
A imagem abaixo demonstra o que estamos querendo dizer:

GOVERNANÇA

AUDITORIAS
GESTÃO DE RISCOS
CONTROLE
COMPLIANCE INTERNO

Figura 5: Governança
Fonte: Conteudista.

Para finalizar este módulo veremos dois exemplos de programas de


governança e compliance no âmbito do Poder Executivo Federal e uma empresa
pública a ele vinculada.

43
Leitura Complementar

Exemplos de Programas de Governança e Compliance

No Poder Executivo Federal temos atualmente uma forte implantação e


execução de programas de governança e compliance/integridade. Propomos ao aluno
estudar os dois exemplos abaixo:
• O Ministério da Infraestrutura criou em sua estrutura organizacional a
Subsecretaria de Conformidade e Integridade, “com o objetivo de promover
ações de prevenção à fraudes e apurações preliminares relacionadas a
situações de corrupção, conflito de interesse, nepotismo, enriquecimento ilícito
e outras irregularidades, promovendo, assim, um ambiente de integridade
institucional e conformidade”. Este programa tem sete pilares, sendo um deles
o Programa RADAR Anticorrupção. Seguem dois links para entender essa
iniciativa que já e uma realidade muito bem-sucedida em termos de integridade:
▪ https://www.facebook.com/watch/?v=1354747874680380
▪ https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/acesso-a-
informacao/transparencia-e-prestacao-de-contas/radar-
anticorrupcao
• A Petrobrás, que tem natureza jurídica de empresa pública, criou em 2014 a
Diretoria de Governança e Integridade com o objetivo de “fortalecer a ética, a
integridade e a transparência em nossos negócios, com foco na aderência às
leis, normas, padrões e regulamentos internos e externos”. Dentro do escopo
deste programa está o PPPC – Programa Petrobrás de Prevenção a
Corrupção. Convidamos os alunos a acessar os links abaixo e conhecer essas
iniciativas:
▪ https://petrobras.com.br/pt/quem-somos/perfil/compliance-etica-
e-transparencia/?gclid=CjwKCAjw-
sqKBhBjEiwAVaQ9a942OGsEZlN0FqsH3fBe-
oUc29BS4kTjQ_LQiqGsFZ3j4WLQzXdUDhoCodwQAvD_BwE
▪ https://petrobras.com.br/data/files/62/20/16/0B/8BC8A710E563B
A97B8E99EA8/Programa-Petrobras-Prevencao-Corrupcao-
PORT.pdf

44
Finalizando

Neste segundo módulo estudamos ao longo de três aulas os seguintes temas:


• Aprofundamos o estudo da teoria do risco, criada pelo sociólogo alemão
Ulrich Beck, sendo um grande pilar de fundamentação da governança e do
complianc.
• Por esta teoria, o risco das atividades pós-revolução Industrial passa a ser
um risco coletivo, difuso, que atinge a toda a sociedade. O risco individual
diminui enquanto o risco coletivo aumenta exponencialmente.
• Passa a ser necessário gerir este risco, considerando inclusive que ele
começa a não mais ser passível de controle pelas agências do Estado que
tem essa missão.
• A globalização leva ao risco das crises financeiras, ambiente em que
surgem as ideias de governança e compliance, no sentido de gerir e
distribuir este risco, além de preveni-lo.
• Surge a governança quando o dono do capital não mais exerce as funções
de gestão do empreendimento, como forma de controle da utilização dos
recursos financeiros, controle da própria gestão em cumprir as diretrizes dos
donos do empreendimento.
• Tem início a governança no meio privado ainda nos anos de 1930 nos EUA,
sendo definida como um conjunto de mecanismos de liderança, estratégia
e controle, ou seja, uma ferramenta de gestão e controle do negócio.
• Como princípios a governança tem a transparência, equidade, prestação de
contas e responsabilidade.
• No setor público a governança surge com fundamento semelhante ao do
setor privado, ou seja, os gestores estão executando políticas públicas de
interesse da sociedade, financiadas com recursos públicos.
• Mais ainda, a governança pública passa a ser um método de gestão calcado
em planejamento estratégico, gestão de riscos, integridade (compliance),
controle interno e auditorias.
• Capacidade de resposta, integridade, transparência, equidade/participação,
accountability, confiabilidade e melhoria regulatória.

45
• O sistema de governança proposto pelo TCU implica instâncias
administrativas, processos de trabalho, instrumentos (ferramentas,
documentos etc.), fluxo de informações e comportamento de pessoas
envolvidas.
• O compliance está dentro do escopo da governança. É um de seus pilares.
• É comum na Administração Pública se falar em governança, enquanto no
meio privado é mais usual se falar em Compliance.

46
MÓDULO III - DO COMPLIANCE

Apresentação do módulo

Neste terceiro módulo serão estudados os seguintes temas:


● Conceitos, características e noções de compliance, conferindo um
panorama atual do tema em termos de doutrina e prática.
● Programas de compliance no campo privado: estruturação básica e
fundamentos, onde serão compreendidos as bases e os elementos
necessários para estabelecer programas de compliance em instituições
privadas.
● Programas de compliance em órgãos públicos, onde serão vistas as
bases para esses programas em órgãos da Administração Pública.

Propomos ainda, ao final, apresentar alguns exemplos recentes de programas


de compliance e sua atuação prática.

Objetivos do Módulo

● Ter uma noção pormenorizada do que é o instituto do compliance, seu


conceito, seus elementos, características, marcos legais e reflexos no
direito administrativo e penal e ainda a necessidade de sua implantação.
● Compreender em linhas gerais o instituto do compliance, seus
fundamentos, seus marcos legais e o atual estágio de sua aplicação.
● Compreender em linhas gerais o que consiste um programa de
compliance dentro da estrutura da Administração Pública, seus elementos
básicos e funcionamento.
● Entender a real importância dos programas de compliance e seus
desafios e panorama para o futuro.

Bons estudos!

47
Estrutura do Módulo

Este módulo compreende as seguintes aulas:

Aula 1 – Noções Gerais do Compliance.


Aula 2 – Programas de Compliance: Uma Visão Geral.
Aula 3 – Programas de Compliance na Administração Pública.

48
AULA 1 – NOÇÕES GERAIS DO COMPLIANCE

Estudamos até aqui questões referentes aos conceitos de ética e moral, como
pano de fundo do grave problema da corrupção. Sobre a corrupção fizemos também
um apanhado visando dimensionar o problema e seu impacto para o Estado e a
sociedade.
Nesse contexto de corrupção e problemas éticos e morais procuramos
estabelecer o surgimento dos institutos da governança e do compliance, como uma
forma de enfrentar este problema e gerir as instituições, públicas ou privadas, dentro
de regras de planejamento estratégico, transparência e controle, gestão de riscos,
distribuição de competências e responsabilidade, controle interno e cultura de
integridade, nesse último aspecto, o CPL.
Cabe agora estudarmos de forma mais detalhada o instituto do compliance,
estabelecendo uma visão que permita não somente compreender seus fundamentos
legais, práticos e estruturais, mas também a importância de programas dessa
natureza dentro de uma visão de enfrentamento à corrupção e fomento de uma cultura
de ética nas relações.
Em obra considerada clássica sobre o tema, Enrique Bacigalupo começa o
estudo das questões do compliance com a frase lapidar “el cumplimiento del derecho
como valor de la ética y la cultura empresarial”, afirmando que “sobre el punto de
partida el consenso parece total”, complementando que “una cultura empresarial
basada en valores es un factor del exito empresarial” (Bacigalupo, 2011, pág.17).
Prosseguindo em sua introdução ao tema, o célebre autor hispano-argentino
traz à baila a lição de Hartmann:
En la etica es claro: (...) cada uno depende de sí mismo y toma solo, por sí y
ante sí, la decisión; cargando solo, en caso de error, con la responsabilidad y
la culpabilidad (...) No hay una conducción que provenga de una mano
extraña. (idem, pág. 18)

Completando sua reflexão introdutória, Bacigalupo faz menção ao então


Presidente da Alemanha, que disse, em relação ao contexto da crise financeira no
final da década de 2000, que “necessitamos de una regulación eficaz de los mercados
financeiros y un retorno a la los valores éticos por parte de los agentes principales”
(idem, pág.18).

49
Finalizando este raciocínio, Bacigalupo afirma que uma regulação mundial dos
mercados consiste em um aumento do número de normas, com sanções
administrativas ou penais, resultando num aumento do risco da atividade empresarial.
Com isso, “la prevención de estos riesgos de responsabilidad jurídica deberá ser
considerada como un componente necessário del principio de eficiencia y de la
responsabilidad social de la empresa” (idem, págs.18-19).
Essas ideias lançadas por Bacigalupo indicam o real sentido do compliance,
que é a adoção do valor da ética e da cultura de cumprimento de normas como algo
necessário de ser incorporado, de uma vez por todas, nas empresas. Isto decorre dos
problemas de falta de regulação balizadora dos agentes financeiros e de mercado,
além da corrupção, que gera escândalos e subsequentes crises financeiras, o que traz
consequências negativas para todos.
Aqui ressaltamos o risco da atividade empresarial, especialmente o risco
econômico dentro do mundo globalizado, e a prevenção desses riscos passa a ser um
componente essencial das empresas, tido pelo autor como algo necessário a
eficiência e responsabilidade social da empresa.
A definição básica e mais difundida de compliance é tomada da origem do
termo, do idioma inglês. To comply significa cumprir, estar em conformidade e, de
forma bem simplificada, em resumo significam fundamentalmente o cumprimento da
lei. Mas, para muito além disso, este programa visa “estabelecer mecanismos e
procedimentos que tornem o cumprimento da legislação parte da cultura corporativa”
(Caravalho et al, 2017, pág.31).
Para o professor Giovani Saavedra, a dificuldade conceitual do compliance
reside na característica relacional deste conceito, vale dizer, quem está em
conformidade está em conformidade com alguma coisa. Contudo, falar que está em
conformidade com a lei não é algo novo, pois todos temos de estar em conformidade
com a lei (Saavedra, 2016, pág.245).
Prosseguindo, o professor Saavedra ensina que “estado de conformidade” do
Compliance tem um sentido próprio e novo, tratando-se de:
“um estado dinâmico de conformidade (...) implica o compromisso com a
criação de um sistema complexo de políticas, de controles internos e de
procedimentos, que demonstrem que a empresa ou organização está
buscando “garantir” que se mantenha em um estado de Compliance.
Portanto, Compliance é a área de conhecimento, que busca definir qual é
este conjunto complexo de medidas (Idem, 2016, pág.246).

50
Essa consideração é crucial, pois permite uma análise mais de conteúdo do
que de forma destes programas. Evitando-se a existência de programas de
compliance pro forma ou somente de fachada, para fins de cumprimento das
obrigações, sem as quais fica praticamente impossível para uma grande empresa ou
organização se impor no mercado privado.
A professora e ex-Ministra da Administração de Portugal Anabela Miranda
Rodrigues trata do conceito de CPL, assim como de corporate governance, dentro do
tema da autorregulação regulada, em que o Estado, diante dos escândalos financeiros
e de corrupção dentro do quadro de total desregulação da atividade econômica, passa
a uma estratégia de controle da atividade empresarial para garantir a aplicação da
regulamentação dessa atividade, o chamado “capitalismo regulatório” (Rodrigues,
2018, pag.47).
Segundo esta estudiosa o tema a autorregulação regulada surge com a
dificuldade prática na fiscalização das empresas, o que leva, dentro de uma visão de
Estado Regulador, citando Ian Ayres, ao Estado dirigir a embarcação enquanto a
sociedade rema, em contraponto ao Estado Liberal, onde a sociedade dirigia e
remava, e ao Estado Interventor, onde há o predomínio do Estado em remar (idem,
2018, pág.48). Os deveres de prevenção, detecção e repressão de condutas ilícitas
passam às empresas, sendo que (idem, págs.57-59):
Os programas de compliance visam a promoção de uma cultura empresarial
ética e reponsabilidade administrativa, civil e, em última linha mas sobretudo,
penal. (...) Os códigos de ética ou de conduta condensam as medidas que
definem os limites do risco permitido na atuação de administradores e
empregados da empresa.

Esta visão da professora Anabela tem o condão de nos conferir, inicialmente,


a noção da autorregulação regulada, de fundamental importância para compreender
o conceito de CPL, uma vez que permite o entendimento de que este modelo visa
imputar às empresas o estabelecimento de regras, com base nas regras gerais do
Estado, e cobrar delas o seu cumprimento. E por outro lado também nos confere o
conceito de criminal CPL, que nada mais é que o cumprimento de regras para se evitar
a violação de deveres no campo criminal.
De forma resumida e simplificada, estes programas visam
estabelecer e disseminar em todos os níveis da empresa seus

51
valores e código de ética e/ou de conduta, bem como fomentar
a cultura institucional pautada nesses valores e no cumprimento
das leis, normas e regulamentos. Visa também estabelecer
mecanismos de prevenção, detecção e repressão de atos que
violem as leis, normas, regulamentos, valores e código de
ética/conduta da empresa, especialmente aqueles que
constituem corrupção.
É através deste programa que se faz a minimização e o gerenciamento dos
riscos inerentes a atividade, a exemplo de uma atividade do mercado financeiro, que
minimiza e gerencia os riscos via CPL, cumprindo a legislação pertinente e seus
códigos e valores internos. Também se distribui o risco pela atividade, pois é atribuído
o grau de responsabilidade, no mesmo exemplo de atividade típica de atuação no
mercado financeiro, de cada um dos integrantes da empresa, em seus respectivos
níveis de ação e atribuições, permitindo ao Estado a persecução no caso de
concretização desse risco e evitando-se a diluição da culpa ou imputação em culpa
nesses casos.
Passemos agora ao estudo dos principais marcos legais e institucionais do CPL
e do criminal CPL. Vale destacar que se trata basicamente de um único instituto,
sendo o criminal com base em normas penais, inclusive quanto a suas consequências.
Podemos apontar como marcos legais do compliance:
• 1934 – EUA – Criação da Security and Exchange Comission -SEC, agência
federal independente que realiza a fiscalização e o controle do mercado financeiro.
Sua criação vem na esteira da grande depressão de 1929, com o intuito de evitar as
situações que levaram a quebra da bolsa naquele ano. Ainda nos anos 1960 a SEC
começa a fomentar as empresas a contratarem profissionais para trabalhar na
questão da conformidade com os regulamentos. Portanto um marco fundamental para
o compliance24.
• 1977- EUA - Edição do FCPA – Foreign Corrupt Practices Act. Lei visando
combater o suborno de funcionários públicos no exterior, estabelecendo parâmetros
para se evitar a prática de corrupção. Trata-se da grande referência mundial em
termos de compliance, pelas regras impostas, exigências de registros, sanções de
natureza civil, administrativa e penal, constituindo em importante referencial para fins
de compliance25;

52
• 1988 - Acordo da Basiléia, tendo versões subsequentes nos anos 2004 e 2010.
Este acordo foi firmado no âmbito do Comitê da Basiléia para Supervisão Bancária
(Basel Committee on Banking Supervision), que é um fórum mundial para fins de
supervisão da atividade bancária. Visa fomentar boas práticas de regulação e
supervisão dos sistemas bancários, buscando a estabilidade e segurança desses
sistemas em nível mundial. O Brasil é representado pelo Banco Central do Brasil -
BACEN26;
• 2010 – Reino Unido - Bribery Act – trata-se de mais um ato que serve como
referência em nível mundial para fins de prevenção do suborno e combate à
corrupção. Tem em seus dispositivos previsão de crimes e sanções penais, além de
proibições e orientações para prevenir a ocorrência de suborno. Alcança qualquer ato
que “ofenda o Reino Unido ou ali ocorram”27.

No Brasil, podemos apontar os seguintes marcos legais e institucionais sobre


a temática do compliance:
1. Resolução nº 2554/98 do Banco Central do Brasil – BACEN (Brasil,
1998). Esta resolução buscou alinhar as instituições financeiras
brasileiras às recomendações do Comitê da Basiléia e da Security and
Exchange Commission - SEC, inclusive com implementação de
mecanismos de controles internos28.
2. Lei nº. 9.613/98 – Lei de Lavagem de Dinheiro (Brasil, 1998). O primeiro
marco legal em termos de compliance no Brasil foi nossa lei de lavagem
de capitais, ou seja, o CPL no Brasil foi inaugurado por uma lei de cunho
penal, apesar de que as obrigações impostas a vários segmentos da
atividade econômico-financeira tenham natureza administrativa nesta
lei. Esta lei teve e tem papel fundamental no sistema de CPL e criminal
CPL ligado aos setores financeiros e afins, tendo criado o Conselho de
Controle de Atividades Financeiras – COAF, que é a unidade de
inteligência financeira do Brasil, em alinhamento a acordos
internacionais de combate à lavagem de dinheiro e corrupção. Depois
da edição desta lei as instituições financeiras começaram a estruturar
áreas de CPL29.

53
3. Manual da Controladoria-Geral da União de 2009 (Brasil, 2009) –
Responsabilidade Social das Empresas no combate à corrupção. Foi
estabelecido um rol de boas práticas de uma empresa íntegra30.
4. Lei nº 12.846/13 – Lei Anticorrupção (Brasil, 2013). Esta lei é
considerada o grande marco no Brasil na questão do compliance e do
combate à corrupção, vez que insere no nosso ordenamento jurídico, de
forma ampla, o combate à corrupção com regramento próprio. Esta lei
tem como características fundamentais os seguintes pontos31:
• Regula pormenorizadamente a responsabilidade por ato
praticado contra a Administração Pública Nacional ou
Estrangeira, em especial ao atentar contra o patrimônio
público, princípios da Administração e acordos internacionais;
• Explicita a responsabilização nas fraudes, fraudes em
licitações e corrupção;
• Prevê a responsabilidade objetiva quanto à reparação dos
danos causados por atos dessa natureza;
• Trata de responsabilidade no campo civil e administrativo,
embora a natureza das sanções administrativas leve a um
estreitamento com o direito penal;
• Permite a desconsideração da personalidade jurídica para fins
de apuração e responsabilização;
• Prevê a suspensão do ato ou processo objeto de investigação;
• Trata do acordo de leniência entre a pessoa jurídica e a
Administração Pública, prevendo total cooperação nas
apurações para desmantelar esquemas de corrupção e
reparação dos danos, concedendo em troca uma sanção
menor;
• Traz a questão da responsabilização da pessoa jurídica,
independentemente da responsabilização da pessoa física;
• Prevê, expressamente, considerar para dosimetria da pena a
existência de programas de compliance e sua efetividade.
5. Decreto nº 8.420/15 – regulamenta a Lei Anticorrupção (Brasil, 2015),
trazendo em seu art.42 e seus 16 incisos os parâmetros para avaliação

54
de um programa de compliance, dentre eles o comprometimento da alta
direção com o programa, existência de código de ética, treinamentos,
canais de denúncia etc32;
6. Lei nº 13.313/16 – Lei de Responsabilidade das Estatais (Brasil, 2016),
que trouxe mecanismos para aperfeiçoamento da governança e
compliance no âmbito das estatais, a exemplo da gestão de riscos e
controles internos, além de alterações em regimes de contratos33.
7. Dec. nº 9.203/17 – Trata da Política de Governança da Administração
Pública Federal Direta, Autárquica e Fundacional (Brasil, 2017), além da
IN Conjunta CGU/MPOG nº 001/16, que trata de controles internos,
gestão de riscos e governança (Brasil, 2016), já vistos no capítulo
referente a governança.
8. Dec. no.10.756/21 – institui o SIPEF – Sistema de Integridade
Pública do Poder Executivo Federal, tendo como órgão central a
Secretaria de Transparência e Prevenção da Corrupção da CGU e
como unidades setoriais todas as unidades responsáveis pela
gestão da integridade nos órgãos
9. Lei no. 14.133/21 – Lei de Licitações e Contratos – passou a tratar
da existência de programas de integridade como obrigatórios para
contratos acima de determinados valores, além de considerá-los
para fins de desempate, dosimetria de sanções e reabilitação de
licitantes
É importante notar que embora se fale de CPL há quase um século, a verdade
é que a preocupação com a regulação e controle da atividade empresarial tem início
fortemente após a crise da bolsa de 1929. Porém, com os contornos mais atuais e
dentro da ótica de programas de integridade, de cultura de cumprimento de normas e
exigência de valores éticos, o tema toma força em nível mundial a partir dos anos de
1970/80, sendo que após as crises financeiras da década de 2000 de fato esse
movimento se fortalece, chegando em nosso país a partir da década de 1990 e
ganhando forte impulso na última década, em especial com os fatos revelados no
âmbito da Operação Lava Jato.
Conforme visto, a legislação foi sendo promulgada e aperfeiçoada ao longo
desses últimos anos, sendo necessário agora efetivar os programas de compliance.
Uma coisa é a implantação desses programas, sua formalização e existência na

55
estrutura de uma empresa, outra é efetivar esta cultura, no que se deseja com esse
movimento.
Como adverte Patrícia Punder, algumas empresas implantam o programa
acreditando na frase de Maquiavel: “algo deve mudar para que tudo continue como
está” (Punder, 2021). E este não é o escopo do CPL.
Passemos agora ao estudo do que constitui, na prática, um programa de CPL.

AULA 2 – PROGRAMAS DE COMPLIANCE: UMA VISÃO GERAL

Visto os fundamentos conceituais do CPL, sua evolução e marcos normativos,


cabe agora estudarmos o que exatamente consiste, na prática, este programa.
Partiremos do estudo dos programas de CPL existentes na iniciativa privada.
Primeiro, porque o desenvolvimento desta ideia vem da iniciativa privada, sendo as
empresas e corporações de natureza privada as primeiras a adotá-los. Segundo
porque, conforme vimos, no meio público brasileiro se fala muito mais em governança,
embora o CPL esteja, como estudamos, dentro da governança, sendo um de seus
pilares. Assim, compreendendo o modelo na iniciativa privada podemos transpor o
instituto, com as devidas adaptações, para o setor público
Cabe ressaltar que não há uma fórmula ou modelo absoluto de CPL. Cada
empresa ou negócio tem sua estrutura própria, suas características e particularidades,
cultura institucional própria etc. Logo, o sistema será estruturado dentro de cada
realidade, embora haja obviamente pontos essenciais a todo e qualquer tipo de
negócio, inclusive público, assim como uma base de programa de compliance que
serve a todos os tipos de negócio. Também devem ser observados os regramentos
contidos na legislação vigente, que orienta de forma clara muitas questões acerca do
assunto.
Passemos então ao estudo da estrutura básica de um programa de CPL, que
atenda ao mínimo para fins de efetividade.
Inicialmente, vale destacar que a CGU editou no ano de 2015 o manual
“Programa de Integridade – Diretrizes para Empresas Privadas” (Brasil, 2015). Neste
manual são elencados os cinco pilares de um programa de integridade: 1 –
comprometimento e apoio da alta administração; 2 – instância responsável (quem ou
qual órgão da estrutura da empresa será responsável pelo programa); 3 – análise de

56
perfil e riscos; 4 – regras e instrumentos; 5 – monitoramento contínuo. Esses pilares
orientam os programas de integridade, com suas variações práticas de acordo com a
empresa.
Os programas de CPL, de forma geral, implicam, segundo Luciano Malaro, no
estabelecimento de políticas, processos e procedimentos, além de se realizar uma
atividade de análise, avaliação e controle de riscos. Segundo este autor (Malaro, in
Lamboy, 2017, págs.550-552):
A política pode ser considerada como um conjunto detalhado das regras da
empresa. Está ligada diretamente a cultura da empresa, mostrando qual a
sua personalidade (...). Já o processo pode ser entendido como a
continuidade das atividades, transformando as entradas (que vão desde
informações e instruções, até materiais) em saídas (que podem ser
considerados os produtos, serviços ou decisões que a empresa irá tomar) (..).
Com relação aos procedimentos, podemos dizer que são formas de executar
uma atividade ou processo. O procedimento tem o intuito de instruir como se
deve fazer a atividade (...). Podemos dizer então que o processo determinará
o que se deve fazer e o procedimento em como a atividade deve ser feita, já
a política conectará os dois, estabelecendo as características da organização
em relação a tal assunto.

A base de todo o programa de CPL será a política da empresa. Esta política


deve ser clara e amplamente difundida internamente, pelos mais variados canais. Sua
adoção deve ser fomentada e praticada pela alta gestão da empresa, assim como por
todos os seus empregados e colaboradores.
Também é crucial a avaliação de riscos, que é algo permanente e fundamental
na governança. Mas, para fins de se estruturar um programa de CPL, deve atuar no
mapeamento dos riscos em razão da atividade exercida. Assim, a título de exemplo,
no caso de empresa do ramo financeiro, os riscos são ligados essencialmente a
lavagem de dinheiro, o que demandará políticas fortes de CPL na prevenção a
lavagem de dinheiro.
Como documento básico de toda a estrutura do programa, que irá inspirar e
delimitar todas as políticas, processos e procedimentos, está o código de conduta,
muitas vezes chamado de código de ética ou de conduta e ética. É o ponto de partida
para se implantar o sistema e será sempre a sua referência.
Marcelo Lapolla ensina que (Lapolla, in Lamboy, 2017, pág.559):

57
As empresas viram na criação de seus códigos próprios a oportunidade de
consolidar as principais regras de observância obrigatória em um único
documento, além de transmitir sua personalidade por meios da divulgação de
seus princípios, valores e missão (...) a utilização do código como ferramenta
central se difundiu e consolidou.

Apesar de o código de conduta e/ou de ética enunciar os valores e princípios


da empresa, existem evidentemente valores e princípios que podem ser considerados
universais, necessários a toda e qualquer corporação, a exemplo da honestidade,
respeito e cumprimento das normas e assim por diante.
Lapolla ainda apresenta os elementos considerados indispensáveis para o
código de conduta (idem, 2017, págs. 560-563):
• Definir a finalidade do documento através de sua nomenclatura -compliance,
ética, valores, conduta etc;
• Evidenciar o envolvimento da alta administração;
• Definir seu escopo e alcance (se atinge colaboradores e terceiros, a exemplo
de fornecedores);
• Ter uma linguagem compreensível ao público que se pretende alvo;
• Conteúdo claro quanto ao endereçamento do código, p. ex., confidencialidade
de dados e propriedade, comportamento em licitações etc, permitindo ao público-alvo
entender o que se espera do comportamento deles;
• Apresentar toda a estrutura de compliance e seu funcionamento;
• Clareza e objetividade na comprovação de que o público-alvo tem
conhecimento do código, além de sua vigência para fins de atualização;
• Uma parte dedicada a regras de relacionamento com terceiros, fornecedores,
órgãos e servidores públicos etc.

A importância do código de conduta e/ou ética no meio empresarial tem sido


tamanha que permite até mesmo aplicação de penalidades e, inclusive, demissão pelo
seu descumprimento por parte dos empregados da empresa, por caracterizar falta
grave nos termos da CLT (TST AIRR 591922015050222, TRT 17 - RO 0001146-
06.2016.5.17.0006 - ES, TRT 1 - RO 00728000820085010482 – RJ).
Fato é que para se aplicar o código de conduta e/ou ética ele deve ter
legitimidade, tendo sido feito com o máximo de participação dos integrantes da

58
instituição e daqueles que com ela interagem, sejam clientes ou fornecedores. E ainda
deve ser amplamente divulgado, conferindo-se ciência de seu teor, para ser
finalmente aplicado, sob pena de virar letra morta.
A partir da edição do código de conduta e/ou ética, duas providências passam
a ser essenciais na estruturação do programa de CPL.
Inicialmente, deve ser criada e difundida amplamente uma cultura de CPL.
Como asseveram Francisco Mendes e Vinícius Carvalho (Carvalho, 2017, pág.138):
Por mais abrangente que seja o código de conduta de uma organização, ele
nunca será capaz de antecipar todas as situações de risco a que seus
funcionários e colaboradores estarão expostos. A realidade empresarial é
sempre mais rica, interessante e complexa que as previsões existentes nos
textos legais. (...) O pior destino de um programa de compliance é se tornar
um checklist que os colaboradores veem como um obstáculo burocrático à
realização de negócios.

Conforme vimos, o CPL é um conceito dinâmico e que implica


fundamentalmente implantar esta cultura de conformidade entre todos os integrantes
de uma corporação.
Em segundo lugar, é necessário efetivar um programa de treinamento a todos
que estarão submetidos ao código de conduta e/ou ética, para que eles tenham
ciência do seu conteúdo e da necessidade de cumpri-lo, e mais, para que seja criada
e difundida uma cultura de CPL. Isto quer dizer que esses treinamentos devem ser
constantes, abrangendo todas as áreas da empresa, de forma inclusive especializada
por setor. Por exemplo, um setor de empresa que lide com licitações de órgãos
públicos deve ser treinado no relacionamento com agentes públicos.
A edição de cartilhas, treinamentos on-line, eventos como
palestras e workshops, datas específicas como compliance day,
concursos de iniciativas em conformidade são, dentre outros
exemplos, atitudes e medidas necessárias para atingir estes
objetivos do compliance.
Neste sentido temos ainda a necessidade de documentação de todos os
procedimentos e práticas, dos desvios detectados e dos cases de sucesso, o que
permitirá a avaliação do programa na empresa e sua constante revisão e
aperfeiçoamento, permitindo ainda uma avaliação externa quanto a efetividade do
programa em andamento.

59
O próximo passo no programa é a criação de canais de comunicação, muitas
vezes chamados de canais de denúncia (whistleblowing), mas que na verdade
servirão não somente para denúncias, mas para que o empregado, um colaborador
ou mesmo uma terceira pessoa possa tirar uma dúvida, fazer uma sugestão de
aprimoramento e também comunicarem uma conduta que configura o
descumprimento de regra por parte de outro empregado.
Christian de Lamboy faz a devida advertência no que toca ao canal de
comunicação, especialmente quanto à denúncias (Lamboy, 2017, pág.615):

Sistemas de denúncias podem ser extremamente benéficos para as


instituições. Podem incentivar a cultura ética, aumentar a confiança dos
acionistas e, em última instância, reduzir a exposição de uma organização ao
risco. Mas também há um lado mais sombrio para a prática. Aqueles que
denunciam em uma instituição são vulneráveis a retaliação.

Saltam aos olhos os benefícios, porém o sucesso dos canais de comunicação


passa pela efetiva resposta às situações apresentadas, o que demanda um setor de
CPL estruturado e que consiga responder adequadamente. E o mais importante de
tudo: em caso de denúncia, garantir o anonimato e a não-retaliação por parte da
empresa, sob pena de trazer consequências àquele que denunciou uma má conduta
e desacreditar no sistema da empresa. Finalmente, é preciso que a estrutura do canal
de comunicação consiga “filtrar” as denúncias recebidas e dar o devido
encaminhamento interno, com as checagens necessárias.
Em fevereiro de 2018 o presidente da Ford nos Estados Unidos
da América foi demitido por violação do código de conduta da
empresa. O fato chegou ao conhecimento da área de CPL
através do canal de denúncias, sendo levada a cabo
investigação interna que culminou com a demissão do
executivo34. Isto mostra a importância desse mecanismo para o
programa.
Dando sequência nos elementos essenciais da estruturação de um programa
de CPL, temos a necessidade de que sejam tomadas as providências cabíveis diante
de um possível caso de desvio de conduta detectado. Isso impele que sejam

60
realizadas investigações internas para confirmação dos fatos e levantamentos de
todas as circunstâncias que os envolvam.
O tema da investigação interna é um pouco mais tormentoso, demandando das
áreas de CPL e da própria empresa certa cautela, vez que uma empresa não se trata
de instituição que tem, por vocação ou atribuição legal, a investigação. Com a lei
anticorrupção e seu decreto regulatório, fica patente não somente a possibilidade de
se investigar internamente fatos tidos como desvios de conduta, como isso passa a
ser uma exigência de compliance, com reflexos e consequências nos processos de
apuração oficiais, conforme estudamos na legislação pertinente.
Acrescentamos aqui a Cartilha da CGU, com diretrizes para empresas privadas
em seus programas de integridade, que exigem a realização de investigação interna
(Brasil, 2015, pág.22):
A detecção de indícios de ocorrência de atos lesivos à Administração Pública,
nacional ou estrangeira, deve levar a empresa a iniciar uma investigação
interna, que servirá como base para que sejam tomadas as providências
cabíveis (grifo nosso)

Muitas perguntas são levantadas no tema da investigação interna, desde quem


a fará, quais seus limites, se convém ser feita por auditoria externa etc. Isto varia de
empresa para empresa. Muitas vezes a área de CPL detém estrutura para tanto, em
outras não tem ou não é conveniente que faça a investigação. Também devem ser
levadas em consideração questões de ordem trabalhista, de LGPD – Lei Geral de
Proteção de Dados, e obviamente de direitos e garantias individuais.
Fato é que as investigações internas são algo relativamente recente no Brasil,
merecendo talvez uma maior regulamentação por meio de lei, mas trata-se de algo
requisitado pela legislação de CPL, além de ser um consentâneo lógico do sistema de
conformidade exigido de uma empresa.
À guisa de exemplo, no ano de 2015 o Ministério Público Federal recebeu da
empresa Rolls Royce investigação realizada internamente pela própria empresa,
sendo detectado o suborno de funcionários da Petrobrás no contrato de fornecimento
de turbinas para geração de energia em plataformas de petróleo. Foi firmado acordo
de leniência com a empresa, que pagou cerca de 80 milhões de reais à Petrobrás, em
reparação de danos35. As investigações internas são uma realidade nos programas,
com forte impacto no enfrentamento à corrupção.

61
Dentro ainda dos programas, de uma forma geral, chamamos a atenção para
as práticas abaixo, essenciais na execução desses programas:
• Due diligence, que significa “diligência prévia”, com previsão expressa no Dec.
nº 8420/15, em seus incisos XII e XIV (Brasil, 2015). Implica na checagem completa
para contratação e, a depender do caso, supervisão de terceiros que contratem com
a empresa. De forma clara significa que a empresa deve tomar o devido cuidado para
que suas normas de compliance sejam também seguidas pelos seus terceirizados,
contratados, fornecedores e no geral àqueles que mantém relação com ela. O mesmo
se diz em fusões, aquisições e reestruturações societárias. Em regra, esse processo
é feito por auditoria.
• Compliance nas contratações de chefias: é importante a checagem dos
profissionais que serão contratados para trabalhar na empresa, bem como daqueles
que irão assumir chefias, em especial nos níveis da alta administração da empresa.
Isto visa evitar a contratação de profissional com histórico negativo ou envolvimento
em desvios de conduta.
• Autonomia e poder decisório da área de compliance: uma das medidas de
eficiência da área de compliance de uma empresa é a autonomia concedida a esta
área, bem como seu nível de poder decisório, em especial o de veto a determinados
atos julgados incompatíveis com o código de conduta e/ou ética da empresa. Se não
houver estes requisitos o programa estará fadado ao fracasso ou a ser de “fachada”.
Em linhas gerais, esses são os contornos dos programas de compliance
adotados nas empresas privadas, no entanto, empresas públicas e sociedades de
economia mista têm programas que se assemelham a esses elementos estruturantes
desses programas. Claro que o aprofundamento do estudo do tema permitirá
encontrar nuances, características e ainda outros elementos que possam compor os
programas, até porque se trata de temática relativamente nova e extremamente
dinâmica. Mas, para efeito do escopo pretendido por este nosso curso, esta noção
conferida é suficiente para prover o aluno do que é um programa de compliance.
Passemos agora ao estudo destes programas nos órgãos da Administração
Pública.

AULA 3 – PROGRAMAS DE COMPLIANCE NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

62
Abordados os conceitos e características gerais do instituto do compliance,
bem como estudados os elementos e características essenciais deste programa no
setor privado, cabe agora tecer as considerações a respeito do compliance na
Administração Pública.
A primeira questão que devemos enfrentar é: existe CPL nos órgãos da
Administração Pública? A resposta é sim. Até porque, ao menos em nível federal
temos o Dec.nº 9.203/17, que estabelece a política de governança da Administração
Pública Federal direta, autárquica e fundacional, elencando no seu art.3º inc.III a
integridade como princípio da governança pública (Brasil, 2017). Logo, dentro da
governança pública na Administração Direta Federal é imperativo haver programa de
integridade ou CPL.
Também a Lei nº 13.303/16 – Estatuto das Estatais – passou a exigir
governança e integridade em seu art.9º e parágrafos (Brasil, 2016), assim como a Lei
nº 13.848/19 – Nova Lei das Agências Reguladoras – exige em seu art.3º, § 3º, um
programa de integridade para todas as agências reguladoras federais (Brasil 2018).
No mesmo sentido, a CGU editou em 2017 o “Manual Para Implementação de
Programas de Integridade – Orientações para o Setor Público” (CGU, 2017), onde são
dadas as linhas gerais em termos conceituais do que vem a ser CPL na primeira parte,
e na segunda e terceira parte são dadas orientações de como elaborar um programa
de CPL, além de medidas e ações para um programa dessa natureza.
A CGU aponta quatro eixos principais e essenciais para um programa de
compliance (CGU, 2017, págs. 10-14):
1. Comprometimento da Alta Administração: sem o que fica difícil tornar qualquer
programa de compliance eficaz e aplicável. Esse apoio deve ser dado interna e
externamente, além da atitude sempre em forma exemplar no aspecto ético exigível
neste nível de função pública;
2. Instância Responsável: será o servidor, setor ou departamento responsável por
elaborar e executar o programa. A Instrução Normativa Conjunta MP/CGU nº 001/16
exige de todos os órgãos e entidades federais um Comitê de Governança, Riscos e
Controles, responsável em nível estratégico pelo programa, sendo relevante que o
órgão subordinado tenha sua instância para tanto36;
3. Análise de Riscos: é um trabalho constante de detecção, análise e avaliação
de riscos para o órgão ou entidade da Administração Pública, revelando áreas ou
processos sensíveis, permitindo atuar de maneira mais direta na prevenção e

63
gerenciamento dos riscos. O risco de integridade (corrupção de servidor público) está
inserido neste contexto.
4. Monitoramento Contínuo: que permite avaliar e atualizar ou corrigir o programa
e suas metas e objetivos.

Para a CGU, nesta metodologia proposta, o documento fundamental é o Plano


de Integridade (CGU,2017, págs.15 e segs.), onde estarão presentes todos os riscos
levantados, sua avaliação e propostas de gerenciamento, o seu monitoramento,
responsáveis e metas para estes e tudo mais de relevante e necessário para o
programa de integridade/compliance.
Na elaboração do plano de integridade propõe a CGU as seguintes fases:
1. Aprovação da Alta Direção: que é decisão acerca da proposta apresentada de
elaborar o Plano de Integridade, conferindo a chancela e apoio para tanto.
2. Ambiente para Implantação: para tanto se designa grupo de trabalho com
pessoal especializado que realizará levantamentos necessários e um planejamento,
com escopo e cronograma de implantação.
3. Identificação e Avaliação de Riscos: onde serão definidos os riscos, as áreas
mais vulneráveis e as prioridades no plano. Aqui entram os riscos relacionados ao
setor privado, como contratações, fiscalizações, concessões de alvarás etc., e riscos
a integridade, como nepotismo, abuso de poder, corrupção, conflitos de interesses
etc. Além de identificação dos riscos são identificados sua manifestação e seus
fatores, sendo gerada uma tabela com os níveis de risco.
4. Identificação, Avaliação e Adequação de Medidas: aqui são buscadas
respostas aos riscos detectados, quais as medidas podem ser tomadas, com sugestão
para utilização de Formulário de Registro de Riscos.
5. Construção do Plano de Integridade: finalmente chega-se a fase de elaboração
da primeira versão do Plano de Integridade, sendo apresentado no manual os tópicos
sugeridos neste plano.

Em sua parte final, o Manual da CGU traz as “Medidas e Ações de Integridade:


Categorias e Boas Práticas” (CGU, 2017, págs.45 e segs). Aqui estão previstas:
exigência de manuais ou códigos de ética, probidade e conduta; criação ou
reorganização de comissão de ética, ações de comunicação e treinamento sobre o
programa, com efetivo esclarecimento de dúvidas de condutas de servidores, visando

64
prevenir desvios e melhorar o profissionalismo; estabelecimento de canais de
denúncia com proteção dos denunciantes e fluxo de encaminhamento e apuração;
adoção efetiva de medidas de controle e disciplinares se for o caso, retroalimentando
o sistema com seu aperfeiçoamento na prevenção de desvios de conduta.
É possível observar que o modelo proposto é muito similar aos modelos básicos
adotados na iniciativa privada, com as adequações necessárias próprias ao ambiente,
peculiaridades e complexidade da Administração Pública.
Muito do que se propõem com esses modelos, ou ao menos parte deles, já
existe de uma forma ou de outra.
Passando mais efetivamente para o exame dos órgãos e instituições que
compõem a segurança pública, difícil imaginar que alguma não tenha um canal de
denúncias, uma ouvidoria interna, corregedorias que emitem orientações e comissões
de ética, ainda que integrante da estrutura da Administração Pública do Ente Federado
como um todo, estando submissas aos órgãos de controle interno etc. Isso sem falar
nos programas de governança na União, nos Estados e em boa parte dos Municípios,
que devem tratar, em maior ou menor grau, da questão da integridade.
O grande desafio neste tema, em especial nos órgãos e
instituições de segurança pública talvez esteja concentrado em
duas frentes: uma delas é coordenar, estruturar e formalizar as
ações de CPL, e outra torná-las eficazes com o efetivo
engajamento do público interno.
Dentro desse contexto, é preciso que haja a decisão política da Alta
Administração do órgão ou instituição do sistema de segurança pública, em abraçar a
ideia do programa, nomeando comissão que possa mapear a situação e os pontos
elencados no manual da CGU. Caso não haja profissionais com competências
específicas para tanto nos quadros, deve-se tentar valer de auxílio de servidores da
área de controle interno do Estado ou mesmo de convênios ou contratações com
entidades que tenham profissionais qualificados para tanto (Universidades Públicas
ou Privadas, Institutos, por exemplo.)
Algo que é fundamental para legitimar uma decisão e sobretudo a implantação
do produto dessa decisão é a mais ampla participação interna e externa. Durante o
processo de mapeamento de riscos e demais pontos que precedem o estabelecimento
do programa de integridade/CPL é necessário abrir e fomentar a participação dos
servidores e daqueles que são usuários dos serviços (advogados, público em geral,

65
fornecedores, empresas terceirizadas etc.). Isto permite ao servidor especialmente a
sensação de participação, a compreensão do processo e sua utilidade.
O segundo passo seria criar na estrutura da instituição ou órgão da segurança
pública um setor, área, departamento, diretoria ou o que seja que possa ser o
responsável por iniciar e levar adiante este trabalho, dispondo do mínimo possível de
estrutura para fazer frente ao desafio.
Importante notar que uma área de CPL deve se relacionar
intimamente com outras áreas como corregedoria, controle
interno (execução orçamentária e financeira), ouvidoria,
comissão de ética, recursos humanos, comunicação social etc.
Todas essas áreas serão essenciais em algum momento do
trabalho e ciclo do programa numa organização. Assim, é
necessário que elas participem e interajam com a área de CPL.
Aproveitar os mecanismos e procedimentos já existentes pode e deve ser feito,
com as devidas remodelagens e integração ao sistema de compliance. Assim, um
canal de denúncias já existente tem de ser avaliado quanto a seus procedimentos,
encaminhamentos, efetiva utilização pelo público interno e externo, interação com a
área de CPL e respostas aos fatos levados a seu conhecimento.
Um dos grandes gargalos do CPL, em especial no setor público, é conseguir o
engajamento dos servidores e colaboradores no programa, com a participação ativa
em seus momentos e fases. Aqui o treinamento e comunicação são essenciais para
difundir a ideia do programa para o público interno e externo, e mais especificamente:
• Para os gestores, compreender que o CPL é uma ferramenta que antes de tudo
vai auxiliá-lo, dentro do amplo espectro da governança, a exercer o poder de decisão
com maior segurança em termos de sua responsabilidade administrativa, além de
poder cobrar de seus subordinados algo que ele sabe que está sendo disseminado
na cultura interna da organização. O CPL deve ser visto pelos gestores como uma
ferramenta que auxilia a gestão.
• Para os servidores e colaboradores em geral permite esclarecer condutas que
muitas vezes não são as mais adequadas nas situações do dia a dia, conferindo
também maior segurança na execução de suas atividades. O CPL deve ser visto como
uma ferramenta que vai auxiliar no desempenho das tarefas diárias.
• Para os fornecedores e público externo confere a segurança de um padrão de
fornecimento de serviços e trato no atendimento, processos e procedimentos internos

66
dentro de um padrão de integridade, que deve ser exigido, além de se comportar nos
moldes desse padrão da organização.

Com esses requisitos básicos o programa irá aos poucos surtindo seus efeitos
na organização pública, elevando seu padrão de desempenho e nível de credibilidade
frente a sociedade.

Leitura Complementar

Governança e Compliance no Âmbito do Ministério da Justiça e Segurança


Pública

No âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública a Portaria nº 86, de 23


março de 2020, estabeleceu o Sistema de Governança, que abrange todos os órgãos
no âmbito do MJSP e da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, tratando em seu art.4º,
inc.V, de programa de integridade.
Este normativo criou o Comitê de Governança Estratégica – CGE, a Comissão
Técnica do CGE, além de comissões temáticas que auxiliam o CGE. Cada órgão que
compõe o MJSP tem assento na CGE.
Convidamos a todos os alunos a visitar os links abaixo visando conhecer um
pouco o sistema de governança do MJSP:
• https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-86-de-23-de-marco-de-2020-
249439874
• https://www.justica.gov.br/Acesso/governanca/gestao-de-
riscos#:~:text=O%20Modelo%20de%20Gerenciamento%20de,dos%20objetiv
os%20estrat%C3%A9gicos%20da%20organiza%C3%A7%C3%A3o

67
Finalizando

Neste terceiro módulo estudamos ao longo de três aulas os seguintes temas:


• O compliance compreende o cumprimento do direito como valor da ética
e da cultura empresarial, exigindo-se uma cultura empresarial baseada em
valores.
• Como a prevenção exige a edição de normas, o risco do
descumprimento dessas normas aumenta o risco da atividade empresarial,
sendo a prevenção desse risco essencial à atividade empresarial, segundo
Bacigalupo.
• Por definição, compliance significa “cumprir as normas”, entretanto o
conceito vai além ao exigir uma cultura de cumprimento das normas, uma
cultura de integridade.
• Giovani Saavedra fala em “estado dinâmico de conformidade”, que seria
o conjunto de políticas e práticas que implicam um “estado de compliance”. O
compliance ditará quais são essas políticas e práticas.
• Pela autorregulação regulada as empresas estabelecem suas normas
internas, configurando o risco permitido, sempre dentro das balizas das
normas gerais emitidas pelo Estado.
• Através dos programas de compliance se faz a minimização e o
gerenciamento dos riscos naturais da atividade.
• No Brasil o compliance tem como primeiro marco legal a Lei de Lavagem
de Dinheiro e, após isso, o grande fundamento dos programas de compliance
é a Lei Anticorrupção.
• Um programa de compliance em empresa privada se assenta em cinco
pilares, segundo a CGU: comprometimento e apoio da alta administração,
instância responsável, análise de perfil e riscos, regras e instrumentos, e
monitoramento contínuo.
• O Código de Ética e/ou Conduta é o documento básico de um programa
de compliance, enunciando os valores e os princípios de uma instituição.
• Também são essenciais os programas de treinamento em compliance,
os canais de comunicação e denúncia, as investigações internas dos fatos
que em tese constituem violação das políticas de integridade/ética da

68
instituição, além do due diligence, compliance em contratações e autonomia
dos setores de Compliance.
• Na Administração Pública os programas de compliance podem ter as
mesmas bases dos programas das instituições privadas, com as necessárias
adaptações ao setor público.
• A CGU confere as balizas para os programas de integridade em órgãos
públicos.
• Para a CGU o documento base é o Plano de Integridade, onde estarão
presentes todos os riscos levantados, sua avaliação e propostas de
gerenciamento, o seu monitoramento, responsáveis e metas para estes e tudo
mais de relevante e necessário para o programa de integridade/Compliance.
• A CGU também apresenta as medidas e ações de integridade, similares
ao que compõe o compliance no meio privado, como manuais ou códigos de
ética, probidade e conduta, criação ou reorganização de comissão de ética,
ações de comunicação e treinamento, canais de denúncia com proteção dos
denunciantes e fluxo de encaminhamento e apuração com adoção efetiva de
medidas de controle e disciplinares, se for o caso.
• É fator fundamental de sucesso de qualquer programa de compliance
em órgão público o engajamento de todos os seus servidores, em todos os
níveis hierárquicos.

69
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https://www.gov.br/cgu/pt-br/centrais-de-

conteudo/publicacoes/integridade/arquivos/manual_profip.pdf, acesso em 10 de

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Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-

2022/2019/lei/l13848.htm, acesso em 20 de agosto de 2021.

BRASIL, Lei no. 14.133, de 01 de abril de 2021 – Lei de Licitações e Contratos.

Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-

2022/2021/lei/L14133.htm, acesso em 05 de setembro de 2021.

74
BRASIL, Decreto no.10756, de 27 de julho de 2017 – Institui o Sistema de Integridade

Pública do Poder Executivo Federal. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/decreto/D10756.htm,

acesso em 01 de setembro de 2021.

75
Notas de Fim

1 Sobre o tema vide a monografia: “Mudanças no Papel do Indivíduo Pós-Revolução Industrial e o


Mercado de Trabalho na Sociedade da Informação”, in
http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_
produtos/bibli_informativo/bibli_inf_2006/RPensam-Jur_v.14_n.1.13.pdf
2 Vide sobre o tema “A Revolução Industria”, de Francisco M.P. Teixeira, ed. Atica, 2021 e também “A

Quarta Revolução Industrial”, de Klaus Shwab, Edipro, 2020.


3 Segundo a Wikipedia, “A globalização é um dos processos de aprofundamento internacional da

integração econômica, social, cultural e política,[1][2] que teria sido impulsionado pela redução de
custos dos meios de transporte e comunicação dos países no final do século XX e início do século
XXI[3] sendo considerada a maior mudança da história da economia nos últimos 40 anos”.
4 A publicação feita no site migalhas explica em detalhes a fraude na ENRON e seu impacto em nível
mundial. Segundo o site, “a "Enron" - então considerada uma potência empresarial - divulgou, em 2 de
dezembro de 2001, seu pedido de concordata e, dez dias após, o Congresso Americano começou a
analisar a falência do grupo, o qual possuía uma dívida aproximada de 22 bilhões de dólares. Em
diversos artigos, foi considerada a falência mais importante da história empresarial americana.
A "Enron" era a sétima maior empresa dos Estados Unidos e uma das maiores empresas de energia
do mundo. No Brasil, a "Enron" mantinha participações na CEG/CEGRio, no Gasoduto Brasil / Bolívia,
na Usina Termoelétrica de Cuiabá, na Eletrobolt, na Gaspart e na Elektro, esta última, empresa paulista
de energia elétrica que atende aproximadamente 1,6 milhões de consumidores.(...)
Não podemos afirmar quais foram as reais causas desse trágico desfecho da "Enron", mas
certamente a economia de mercado teve acentuada influência na prática de fraudes e manobras
contábeis que culminaram na concordata da empresa e no prejuízo de milhares de investidores,
credores e empregados. Ademais, todas as atitudes praticadas pelos administradores da "Enron"
comprovam a fragilidade dos mecanismos contábeis e de auditoria capazes de coibir abusos e evitar
fraudes lesivas ao mercado. Outra séria conclusão a que chegamos é que há que existir uma prática
transparente entre administradores de corporações, seus investidores e empregados capazes de
refletir a real situação financeira de uma empresa. https://www.migalhas.com.br/depeso/6852/caso-
enron--breve-analise-da-empresa-em-crise
5
A Revista “Le Monde Diplomatique Brasil” publicou naquele ano de 2004 que “Viva a ética nos
negócios!”, “Viva a empresa moral!” Ouvidos durante o Fórum Econômico Mundial, de Davos, estes
gritos revelam uma promessa: a de que o capitalismo partirá para uma retomada em bases
desinfetadas. Será difícil. Isto porque, precisamente no momento em que esse desejo era
manifestado, a imensidão do caso Parmalat explodia à luz do dia. Classificado como o maior
escândalo financeiro na Europa desde 1945, deixa prever ondas de choque semelhantes àquelas,
desastrosas, que provocaram a falência fraudulenta da distribuidora de energia Enron, em dezembro
de 20011 .A Parmalat significava o exemplo de um sucesso impulsionado pela dinâmica da
globalização liberal. Começando como uma pequena empresa familiar de distribuição de leite
pasteurizado localizada nos arredores de Parma, na década de 60, ela se desenvolveu graças à
habilidade de seu fundador, Calisto Tanzi, e aos generosos subsídios da União Européia. A partir
de 1974, a Parmalat internacionalizou-se, instalando-se no Brasil e, depois, na Venezuela e no
Equador. Multiplicou suas filiais e criou empresas intermediárias em todos os territórios que
oferecessem facilidades fiscais (Ilha de Man, Holanda, Luxemburgo, Áustria e Malta) e, em seguida,
nos paraísos fiscais (Ilhas Cayman, Ilhas Virgens britânicas, Antilhas holandesas…). Em 1990,
colocou ações na Bolsa de Valores, afirmando-se como o sétimo grupo privado da Itália e ocupando
o primeiro lugar mundial no mercado de leite de longa conservação. Este colosso empregava em
torno de 37 mil funcionários em mais de 30 países e seu faturamento chegou, em 2002, a 7,6 bilhões
de euros (cerca de 27 bilhões de reais), valor superior ao do Produto Nacional Bruto (PNB) de países
como o Paraguai, a Bolívia, Angola ou o Senegal…Jogada por tudo ou nada. O endividamento
da Parmalat chega a 11 bilhões de euros! E que foi deliberadamente dissimulado, há vários
anos. Por ser permanente, a fraude não era detectável https://diplomatique.org.br/o-escandalo-
da-parmalat/

6
Segundo noticiou o Blog Warren, do Estadão, A crise do subprime foi o resultado do estouro de uma
bolha de investimentos massivos em hipotecas nos EUA que cresceram ao longo dos anos 2000. As
hipotecas são uma forma de financiamento imobiliário comum nos EUA, em que o imóvel é dado como

76
garantia ao banco caso o tomador não consiga pagar as dívidas. Já o nome “subprime” refere-se a
empréstimos concedidos a pessoas com alto risco de crédito, isto é, com pouca estabilidade financeira
e credibilidade para pagar contas. Por natureza, empréstimos subprime são investimentos
extremamente arriscados e com altíssima chance de default — termo financeiro para o universalmente
conhecido “calote”.Em linhas gerais, a bolha surgiu porque o crescente interesse por rendimentos de
hipotecas deu origem a uma imensa estrutura financeira para negociar esses ativos no mercado.A alta
demanda incentivou as instituições de crédito a ampliar sua “produção” e oferecer hipotecas com
grande risco de calote — as famigeradas hipotecas subprime.Quando muitos tomadores de hipotecas
deixaram de pagar as contas, o mercado imobiliário foi inundado por imóveis desvalorizados e a
estrutura entrou em colapso, levando à crise. Quando ocorreu a crise do subprime? O ápice da crise
ocorreu em 15 de setembro de 2008 com a falência do Lehman Brothers, um dos maiores e mais
antigos bancos de investimentos do mundo.Os indícios da bolha já vinham crescendo desde 2007,
quando dezenas de instituições ofertantes de hipotecas começaram a falir ou ser compradas por
bancos maiores.Em 2008, a crise se alastrou para outras instituições financeiras ao redor do mundo
que tinham participação no mercado imobiliário norte-americano. No mesmo mês da falência do
Lehman Brothers, o tradicional banco Merrill Lynch foi comprado pelo Bank of America, enquanto o
Goldman Sachs e o Morgan Stanley pediram crédito emergencial ao Federal Reserve (Fed, o banco
central dos EUA). https://warren.com.br/blog/crise-do-subprime/

7 Embora no Brasil não haja ainda a tipificação da corrupção privada, em vários outros países existe
esse crime.
8 Sócrates, na cadeia, aguarda a execução da sentença condenatória. Enquanto isso, Críton e outros

amigos de Sócrates tentaram lhe persuadir para que ele fugisse. Entretanto, Sócrates se manteve firme
no seu proceder, afirmando que obedeceria às leis e à cidade, mesmo discordando da justiça da
decisão. Críton faz uso de três argumentos para persuadir Sócrates a fugir da cadeia, a saber: primeiro,
Sócrates é um amigo sem igual para ele; segundo, a reputação de Críton será maculada, pois o povo
comentará que este tinha condições de providenciar a fuga de Sócrates, mas preferiu poupar seu
dinheiro em vez de salvar seu amigo; por fim, tendo esposa e filhos para criar e, mesmo assim,
escolhendo cumprir a pena de morte quando poderia fugir, Sócrates opta por abandonar sua família.
Contra o argumento de que a reputação dos seus amigos será maculada, Sócrates diz que não é a
toda opinião que se deve prestar atenção, mas somente à opinião qualificada. Para demonstrar isso,
cita o exemplo de um atleta e de seu técnico, em que questiona se, para cuidar do corpo, o atleta deve
obedecer ao técnico ou à opinião da multidão. A partir disso, faz uma analogia às leis e à cidade, pois
elas representam a opinião qualificada sobre a justiça (mesmo que, aparentemente, injustas) e, se é o
corpo do atleta que pagará pela desobediência às ordens do técnico, será a alma de Sócrates que
sofrerá os prejuízos do descumprimento das leis humanas no Hades. Além disso, desrespeitar às leis
será enfraquecer as instituições da cidade. Sócrates diz que não devemos cometer injustiças
voluntariamente nem retribuir a injustiça com a injustiça. Pois não há diferença entre cometer o mal e
uma injustiça. Sócrates cria uma ficção, um diálogo seu com as leis e a cidade. São elas que lhe
apresentam as decorrências do seu posicionamento (de Sócrates): uma convenção (as leis da cidade)
deve ser cumprida, mesmo que injusta; descumprir a lei, mesmo que injusta, é cometer injustiça (e não
devemos retribuir a injustiça com outra injustiça). Ao invés da desobediência, quem não estiver
satisfeito com as convenções da sua cidade deverá modificá-las através do Direito. Por fim, além da
oportunidade de modificar as leis pelo Direito, quem não conseguir fazer isso e ainda estiver em
desacordo com elas poderá ir embora da cidade. https://www.conjur.com.br/2019-jan-26/diario-classe-
dialogo-criton-platao-arduo-combate-ativismo-judicial
9 Em https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=3515262&ts=1630417794456&disposition=inline
10 Vide https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/tcu-aponta-que-cartel-causou-prejuizos-de-r-18-
bilhoes-a-petrobras.htm. O TCU chegou criar uma Secretaria Extraordinária de Operações Especiais
em Infraestrutura, vide https://portal.tcu.gov.br/combate-a-corrupcao/tcu-e-a-lava-jato.htm
11 Vide sobre o tema https://luanmesan.jusbrasil.com.br/noticias/465611767/os-10-maiores-casos-de-

corrupcao-da-historia-do-brasil
12 Vide https://www.gazetadopovo.com.br/republica/corrupcao-durante-a-pandemia-estados-
municipios/
13 A Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção foi aprovada em 31 de outubro de 2003 e

assinada pelo Brasil em 09dezembro de 2003. Foi introduzida no sistema jurídico pátrio através do Dec.
no.5.687/03. Vide http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5687.htm

77
14 Vide https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil//Topics_corruption/Campanha-
2013/CORRUPCAO_E_DESENVOLVIMENTO.pdf
15 Para maiores informações sobre este ranking vide https://transparenciainternacional.org.br/ipc/
16 Vide https://super.abril.com.br/especiais/radiacao-a-solta/
17 Vide https://veja.abril.com.br/brasil/mpf-vazamento-de-oleo-e-maior-desastre-ambiental-da-

historia-do-litoral/
18 Vide http://periodicos.pucminas.br/index.php/geografia/article/view/25541
19 Vide https://www.ifac.org/
20 Vide https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa
21 Vide https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa
22 O termo stakeholder é largamente utilizado no linguajar corporativo, significando “parte interessada”

ou “qualquer pessoa ou organização impactada pela ação de determinada empresa”. Este termo foi
cunhado nos anos 1980 pelo filósofo norte-americano Robert Edward Freeman. Para mais informações
vide https://www.ibccoaching.com.br/portal/o-que-significa-stakeholder-e-o-seu-papel-dentro-
de-uma-empresa/
23 Vide https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2759:catid=28
24 Para aprofundar no tema vide https://www.sec.gov.ph/
25 Para mais informações vide https://www.justice.gov/criminal-fraud/foreign-corrupt-practices-

act
26 Vide https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/recomendacoesbasileia
27 Vide https://www.legislation.gov.uk/ukpga/2010/23/contents
28 https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/res/1998/pdf/res_2554_v3_P.pdf
29 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm
30 https://www.gov.br/cgu/pt-br/assuntos/noticias/2009/06/cgu-ethos-e-unodc-lancam-manual-

contra-corrupcao-para-empresas
31 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm
32 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/decreto/d8420.htm
33 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm
34 https://www.migalhas.com.br/depeso/274963/ceo-da-ford-e-demitido-apos-investigacao-do-

compliance-da-empresa
35 https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/procurador-diz-que-atitude-de-rolls-

royce-deve-servir-de-exemplo/
36 A título de exemplo, o Ministério da Justiça e Segurança Pública tem seu Comitê de Governança

Estratégica – CGE, criado pela Portaria no.86/20. Todos os órgãos subordinados ao MJSP participam
do comitê, sendo relevante que tenha instâncias próprias para governança e compliance.

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