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Relacionando Mente e Corpo

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CURSO DE PSICOSSOMÁTICA 

 
 
 
 
 
  

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Margarida Ferreira​ - CRP 15/0248 
Rosana Melo Brito​ - CRP 15/1798 
Tatiana Nogueira Moraes​ - CRP 15/1680 
Antonisia Ribeiro da Silva​ - CRP 15/2104 
 
 
MÓDULO 2 -​RELACIONANDO: CORPO E MENTE 
 
O problema mente-corpo tem sido tema de discussão desde a antiguidade. As
concepções sobre saúde e doença e sobre a natureza das enfermidades constroem-se
dentro de uma perspectiva dualista, que considera mente e corpo como entidades
distintas, ou numa perspectiva monista, que considera a unicidade e
indissolubilidade de ambos. Ao longo da história, tem-se observado oscilações entre
ambas as concepções que repercutem também no pensamento médico.
Na Grécia Antiga, Aristóteles e Hipócrates consideravam o homem como uma
unidade indivisível. Hipócrates (460 a.C.), numa tentativa de explicar os estados de
saúde e enfermidade, postulou a existência de quatro fluidos (humores) principais no
corpo: bile amarela, bile negra, fleuma e sangue. Desta forma, a saúde era baseada no
equilíbrio destes elementos. Ele via o homem como uma unidade organizada e
entendia a doença como uma desorganização deste estado. Hipócrates entendia que
a doença não representava a vontade divina, mas surgia por antecedentes lógicos. A
saúde, para ele, consistia de um equilíbrio harmônico com o mundo ao redor,
enquanto a doença surgia de desafios a esse equilíbrio. Essa visão racionalista
fundamenta a medicina moderna (VOLICH, 2000).
Cláudio Galeno (129-199) via a causa da doença como endógena, ou seja,
estaria dentro do próprio homem, em sua constituição física ou em hábitos de vida
que levassem ao desequilíbrio. O conceito de Galeno a respeito de saúde e doença
prevaleceu por vários séculos, até o suíço Paracelsus (1493-1541) afirmar que as
doenças eram provocadas por agentes externos ao organismo. Ele propôs a cura
pelos semelhantes, baseada no princípio de que, se os processos que ocorrem no
corpo humano são químicos, os melhores remédios para expulsar a doença seriam
também químicos, e passou então a administrar aos doentes pequenas doses de
minerais e metais (CASTRO et al., 2006).
No século XVII, Descartes postulou uma disjunção entre mente e corpo, por
considerá-los substâncias de naturezas diferentes, denominando como res extensa
(matéria) e res cogitans (alma pensante), e assim favorecendo no âmbito da ciência o
aspecto material (VALENTE e RODRIGUES, 2010).
O principal problema detectado na perspectiva dualista é a dificuldade em
explicar como essas duas substâncias interagem.
Descartes sugeriu que essa comunicação seria por meio da glândula pineal.
Embora esta solução pareça ser arbitrária, diversos autores, inclusive na época
contemporânea, têm pesquisado as funções desta glândula, e alguns deles acreditam
que ela tenha realmente funções especiais. Deste modo, seria possível interpretar a
filosofia cartesiana como um dualismo interativo, em que ocorrem processos causais
em ambas as direções (do corpo para a mente e da mente para o corpo - a chamada
"causação mental").
Apesar da demasiada valorização da substância material em detrimento da
substância mental atribuída pela ciência por influência do dualismo cartesiano, não
se pode afirmar que na perspectiva Descartes as duas substâncias sejam
completamente separadas.
Espinosa trouxe grandes contribuições, apresentando uma perspectiva
diferente de Descartes quando disse que o pensamento e a extensão são produtos da
mesma substância. A referência a uma única substância serve ao propósito de
apresentar a mente como inseparável do corpo, o que deixava de requerer a
integração ou interação desses dois aspectos. A mente e o corpo nasciam em paralelo
da mesma substância sem que houvesse uma relação causal entre ambos (Damásio,
2004).
No século XIX, a visão dualista foi fortalecida com as descobertas de Pasteur e
Virchow (CASTRO et al., 2006), que atribuíram as causas das enfermidades a
agentes externos, como microorganismos, o que destaca a importância dos aspectos
biológicos em detrimento da mente no processo saúde-doença. No início do século
XX, Freud resgata a importância dos aspectos internos do homem com o
desenvolvimento da teoria psicanalítica. Em 1917, Groddeck publica “Determinação
psíquica e tratamento psicanalítico das afecções orgânicas”, sendo este considerado o
marco da medicina psicossomática. Ele estendeu o campo da psicanálise a todas as
doenças e atribuiu a elas uma significação (EPINAY, 1988).
Walter Cannon, em 1929, reforça a concepção holística com uma base
fisiológica ao definir o conceito de homeostase, afirmando que qualquer estímulo,
inclusive o psicossocial, que perturba o organismo, perturba-o em sua totalidade
(CALDER, 1970).
A compreensão da relação mente-corpo, até então, era baseada numa visão
dualista, tanto em relação ao princípio como em relação à função desses dois
aspectos. O funcionamento de ambos era considerado quase que independente um
do outro e a interação ocorreria numa via dupla de forma psicossomática ou
somato-psíquica. A compreensão da interação mente e corpo ganha novas
perspectivas a partir da Psicanálise, quando ambas as dimensões são pensadas de
forma conjunta e dinâmica, possibilitando a criação de um campo de saber
denominado Psicossomática (VALENTE e RODRIGUES, 2010).”
O corpo representa-se e recria-se na mente, produzindo significados que
permitem o diálogo e a intervenção de um interlocutor. A intervenção do interlocutor
que não assegura, na esfera somática, necessariamente, influência curativa. Caso
estivéssemos trabalhando com a concepção dualista mente e corpo, psíquico e
somático, poderíamos inferir relações causais no sentido da mente para o corpo,
como o fizemos no sentido corpo para a mente, quando, compreendendo o corpo
como um sistema, afirmamos que o corpo “causa” a mente ao se esgotar sua
capacidade como sistema, abrindo-se para um sistema hierarquicamente mais
complexo: a própria mente.
A histeria, a hipocondria e os fenômenos psicossomáticos representam
articulações diversas do corpo com a psique, articulações essas que se expressam
caracteristicamente no corpo. A histeria nos remete à neurose, a hipocondria ao
delírio e à psicose e os fenômenos psicossomáticos a uma mal-estabelecida e
intrigantemente pesquisada relação corpo-mente na qual o corpo vê-se atingindo
concretamente em sua intimidade tecidual e humoral, não raras vezes levando a
internações, cirurgias e à própria morte.
Apesar das divergências existentes entre os diversos autores, nota-se um
consenso acerca da existência de uma relação entre aspectos cognitivos, emocionais e
manifestações somáticas, excluindo a possibilidade de uma completa separação
funcional entre mente e corpo. É unânime a convicção de que processos emocionais
são acompanhados por alterações fisiológicas, demonstrando a interligação entre
mente e corpo.
A) Uma via de mão única entre mente e corpo, tal que os processos mentais
teriam efeitos somáticos, mas não vice-versa. Monismo Idealista, para o qual mente e
corpo formam uma unidade determinada pelos processos mentais;
B) Uma via de mão única entre corpo e mente, tal que os processos somáticos
teriam efeitos mentais, mas não vice-versa. Monismo Materialista , para o qual
mente e corpo formam uma unidade determinada pelos processos materiais, sendo
negada a possibilidade da chamada "causação mental", ou seja, a possibilidade de um
processo mental produzir efeitos físicos;

C) Uma via de mão dupla entre mente e corpo, de tal modo que os processos
mentais teriam efeitos somáticos, e os processos somáticos teriam efeitos mentais.
Esta concepção corresponde a um Monismo Neutro ou Interacionista, que admite
tanto a causação mental (dos processos corporais), quanto a causação corporal (dos
processos mentais);
D) Uma unidade mais profunda entre corpo e mente, os quais seriam
diferentes aspectos de um substrato único. Nesta concepção, os processos físicos do
corpo são também mentais, e vice-versa, não se podendo utilizar o conceito de
causação entre os aspectos. Os resultados científicos disponíveis não restringem as
possibilidades de interpretação dos fenômenos psicossomáticos a uma das
alternativas acima. Ressaltamos a importância de se discutir tal diversidade de
interpretações viáveis, ensejando esforços colaborativos no sentido de se melhor
compreender a complexidade do ser humano e do processo saúde/doença. (Cruz e
Pereira Junior)

O todo que é o ser humano foi dividido em partes e sistemas; não se deve
depreciar o método, porém ninguém é obrigado a contentar-se apenas com os seus
resultados. O que traz e mantém nossos vários órgãos e inúmeras funções em
harmonia e união? E o que tem a medicina a dizer a respeito da separação facilmente
feita entre “mente” e “corpo”? O que faz um indivíduo, como implícito na palavra —
um ser não dividido?
A necessidade de um conhecimento maior nesta área é de uma clareza
excruciante. Porém, mais do que uma simples necessidade, há um presságio das
mudanças que virão. A psiquiatria evolui, a neurofisiologia progride, a neurocirurgia
floresce, e uma estrela ainda paira sobre o berço da endocrinologia... Contribuições
de outras áreas devem ser buscadas na psicologia, antropologia cultural, sociologia e
filosofia, bem como na química, física e medicina interna, para resolver a dicotomia
mente-corpo, que Descartes nos deixou.

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