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Monografia - Nathalia Oliveira Nunes Dos Santos

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE DIREITO

“A PROTEÇÃO DO TRADE DRESS COMO FORMA DE EXPRESSÃO NA


ECONOMIA DA LIVRE CONCORRÊNCIA”

NATHALIA OLIVEIRA NUNES DOS SANTOS

NITERÓI, RJ
2016
NATHALIA OLIVEIRA NUNES DOS SANTOS

A PROTEÇÃO DO TRADE DRESS COMO FORMA DE EXPRESSÃO NA


ECONOMIA DA LIVRE CONCORRÊNCIA

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


Faculdade de Direito da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora:
Prof.ª Rachel Bruno Pessanha

Niterói, RJ
2016
NATHALIA OLIVEIRA NUNES DOS SANTOS

A PROTEÇÃO DO TRADE DRESS COMO FORMA DE EXPRESSÃO NA


ECONOMIA DA LIVRE CONCORRÊNCIA

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


Faculdade de Direito da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em Direito.

Aprovada em ___ de __________ de _____.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________
Profa. Rachel Bruno Pessanha – Universidade Federal Fluminense
Orientadora

___________________________________________________________________
Prof. Vinícius Chaves – Universidade Federal Fluminense

___________________________________________________________________
Profª. Márcia Dalcastel – Universidade Federal Fluminense

Niterói, RJ
2016
Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)

SANTOS, Nathalia Oliveira Nunes dos, 1990-


S237p A Proteção do trade dress como forma de expressão na
economia da livre concorrência / Nathalia Oliveira Nunes dos
Santos. - 2016.
57 p. : il.

Orientador: Rachel Bruno Pessanha.

Trabalho de Conclusão de Curso – Universidade Federal


Fluminense, Faculdade de Direito.

1. Direito comercial. 2. Propriedade intelectual. 3. Trade dress.


4. Concorrrência desleal. 5. Livre iniciativa. I. PESSANHA, Rachel
Bruno. II. Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Direito.
III. Título.

CDU:34
DEDICATÓRIA

“Dedico este trabalho aos meus pais Naidê


Oliveira dos Santos e Ney Nunes dos Santos
Junior, com todo o meu amor e gratidão, por
tudo que fizeram por mim ao longo da vida.
Sem vocês, eu nada seria.”
AGRADECIMENTOS

A Deus, primeiramente, por toda a força para que eu pudesse chegar até
aqui, impulsionando-me a seguir sempre com fé, mesmo que à minha maneira.

Aos meus pais, por terem me dado todo o apoio necessário em todos os
momentos e por nunca medirem esforços para me proporcionar o melhor. Além
disso, por terem me incentivado até aqui e por sempre acreditarem, muitas vezes
mais do que eu, nos meus sonhos.

À minha irmã Laryssa e à minha prima Thayssa, que também não deixa de
ser irmã, por sempre terem sido minhas companheiras ao logo da vida. Vocês foram
o meu passado, são o meu presente e serão o meu futuro.

Ao meu pequeno irmão Frederico, por ser uma fonte de amor inenarrável e
inexplicável.

À tia Sônia, por ter me acolhido para sua vida, como se sua filha fosse, e por
sempre ter me apoiado. A você também devo essa vitória.

Aos amigos que fiz ao longo destes cinco anos universitários, por terem
compartilhado comigo tantos momentos bons, o que inclui muitos estudos e
festividades. Certamente foram uns dos melhores anos da minha vida.

Agradeço às minhas amigas que me acompanham ao longo da vida, sendo


sempre uma base de apoio, com muitas histórias e alegrias compartilhadas.

Ao Richard, meu namorado, por toda a paciência nos momentos nos quais
não pude estar presente para elaborar este trabalho e por me apoiar em quaisquer
circunstâncias.

À professora Rachel Bruno, por ter aceitado ser minha orientadora, o que,
para mim, é uma grande honra, bem como por ser uma grande fonte de inspiração,
bem como pela paciência com a sua orientanda.

Aos docentes desta Universidade pela dedicação e por todo conhecimento


transmitido ao longo destes anos.
Por fim, à Universidade Federal Fluminense, faculdade que amo e que escolhi
antes mesmo de me escolher, por tão bem ter me acolhido e por ter me dado a
oportunidade de vislumbrar e alcançar os meus objetivos.
EPÍGRAFE

Alguns homens veem as coisas como são, e


perguntam: Por quê?. Eu sonho com as coisas
que nunca existiram e pergunto: Por que não?.
(George Bernard Shaw)
RESUMO

O presente trabalho estuda e busca demonstrar o conceito do trade dress, suas


nuances, sua importância para os seus detentores e suas principais características,
bem como sua aplicação no direito brasileiro. Para tal, primeiro faz-se uma varredura
pelo princípio constitucional da livre concorrência para, posteriormente, demonstrar
que este deve ser relativizado em prol de uma economia justa e equilibrada. Em
adição, o presente trabalho também conceituará a caracterização da concorrência
desleal no âmbito da infração do direito de Propriedade Intelectual, pois, a partir
deste conceito, pode-se chegar ao conceito específico do trade dress e sua base de
proteção. Avalia-se que, embora não haja previsão legal no ordenamento jurídico
brasileiro, a partir de critérios objetivos os atos de confusão gerados pela infração do
uso do trade dress pode levar à concorrência desleal. Por fim, conclui-se que o trade
dress, ou conjunto-imagem, é de grande importância para os que o têm e que, por
isso, embora não esteja citado expressamente na norma brasileira, pode e deve ser
protegido legalmente.

Palavras-chave: Direito comercial, Propriedade Intelectual, trade dress,


concorrência desleal, livre concorrência.
ABSTRACT

The present study demonstrate the concept of trade dress, your nuances, your main
characteristics and requirements as well as their application in Brazilian law. To this
purpose, it is necessary a study by the constitutional principle of free competition to
later demonstrate that this must be relativized in favor of a fair and balanced
economy. In addition, this study also conceptualize the characterization of unfair
competition under the violation of rights of Intellectual Property, therefore, from this
concept, one can reach the specific concept of trade dress and its protective base. It
is estimated that, although there is no legal provision in the Brazilian legal system,
based on objective criteria, acts of confusion generated by the infringement of trade
dress of use can lead to unfair competition. Finally, it is concluded that the trade
dress is of great importance for those who have and, therefore, although it is not
mentioned explicitly in the Brazilian rules, can and should be protected legally.

Key words: Commercial law, Intellectual Property, trade dress, unfair


competition, free competition.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12

CAPÍTULO I – A LIVRE CONCORRÊNCIA COMO NORTEADORA DO SISTEMA


ECONÔMICO BRASILEIRO 14

1.1. O sistema econômico e o seu fundamento na Constituição brasileira 14


1.2. A livre iniciativa como fundamento da livre concorrência 17
1.3. O conceito de Livre Concorrência e seus aspectos teóricos relevantes 19
1.4. Outros aspectos sobre a livre concorrência enquanto princípio da atividade
empresarial 21

CAPÍTULO II – A CONCORRÊNCIA DESLEAL 23

2.1. O conceito da concorrência desleal e a sua importância na Propriedade


Industrial 23
2.2. A concorrência desleal como limitadora da livre concorrência 25
2.3. A configuração de concorrência desleal na legislação brasileira 27

CAPÍTULO III – O TRADE DRESS E O DIREITO BRASILEIRO 31

3.1. O conceito de trade dress 31


3.2. A função econômica, publicitária e de identificação do trade dress perante o
consumidor 33
3.3. A origem do termo trade dress 36
3.4. A proteção do trade dress no direito norte-americano 38
3.5. O trade dress aplicado ao direito brasileiro 40

CONCLUSÃO 51

REFERÊNCIAS 54
INTRODRUÇÃO

Diante do cenário econômico atual tomado pelos avanços tecnológicos e pelo


processo de aprofundamento internacional da integração econômica, social, cultural,
política entre os países, necessária foi a criação de regras e normas que norteassem
estas relações econômicas e os seus agentes. Assim, em um mundo onde o
conhecimento e a informação se mostraram os meios mais importantes para o
desenvolvimento dos países, o Direito Empresarial apareceu como um mecanismo
de proteção a estas relações.

O Direito Empresarial, ou Direito Comercial, ramo do Direito que se pode


conceituar como “o conjunto de normas jurídicas que regulam as transações
econômicas privadas empresariais que visam à produção e à circulação de bens e
serviços por meio de atos exercidos profissional e habitualmente, com o objetivo de
lucro”1, vem evoluindo de forma grandiosa, em conformidade com este crescimento
econômico que necessita de proteção para garantir segurança jurídica aos seus
agentes, bem como para incentiva-los.

Assim, o Direito Empresarial traz regras que disciplinam o mercado


econômico, assentado em princípios próprios, principalmente em função da
empresa, visto que esta é o principal objeto do crescimento econômico, e baseado
em princípios como a livre concorrência e a livre iniciativa. Entretanto, embora estes
princípios estejam ligados de forma muito próxima a este ramo, também se fez
necessário criar limitadores a estes, como o combate aos atos de concorrência
desleal.

A partir disso, este trabalho visa demonstrar como, em meio à uma


sociedade de constante crescimento econômico, pautado na ideia intrínseca já
antiga de livre concorrência, o Direito Empresarial vem combatendo à concorrência
desleal, com foco na proteção ao trade dress, conceito relativamente recente na
doutrina.

No primeiro capítulo será estudado como o princípio da livre concorrência,


bem como, de forma correlata, o princípio da livre iniciativa, norteiam a economia e
se mostram princípios intrínsecos, mas não absolutos, à esta.

1
REQUIÃO, Rubens Edmundo. Curso de Direito Comercial. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. 2 vols.
12
No segundo capítulo será feita uma análise sobre o instituto da concorrência
desleal, a sua importância no Direito Empresarial, e a sua forma limitadora aos
princípios constitucionais estudados no capítulo anterior.

Após, o terceiro capítulo será dedicado ao estudo do trade dress. Será


explicitada como ocorre a sua proteção no Direito brasileiro, sua função na esfera
econômica e publicitária e os prejuízos que podem ser gerados por sua violação.
Ademais, para melhor compreensão do tema, também será feita uma análise do
trade dress no Direito norte-americano, a fim de facilitar a compreensão da origem
do termo, bem como a comparação com o direito brasileiro.

13
CAPÍTULO I – A LIVRE CONCORRÊNCIA COMO NORTEADORA E LIMITADORA
DA ORDEM ECONÔMICA NO BRASIL

1.1. O sistema econômico e o seu fundamento na Constituição brasileira

A Constituição Federal de 19882 tornou-se, após a sua promulgação, um


importante marco da volta do regime democrático no Brasil, com a primazia do
respeito aos direitos individuais, o que confirmou a tendência do Estado de se
comprometer com a não interferência na autonomia dos indivíduos, conforme explica
o constitucionalista Gilmar Mendes3.

Desta forma, a inserção do capítulo “Da Ordem Econômica e Financeira”,


no Título VII, veio como um alicerce na apropriação privada dos meios de produção
e de iniciativa4, de modo a regular do sistema econômico-financeiro do país em
conformidade com os interesses econômicos privatistas, haja vista que o seu
conjunto de normas foi criado para nortear a sociedade principalmente quanto à
ordem pública, privada, econômica e social, conforme elucida Eros Grau5.

Analisando o texto normativo do capítulo supracitado e extraindo suas


ideias, percebe-se que há uma adoção do paradigma de liberdade às iniciativas e à
propriedade privada, o que leva a confirmar que o Brasil se rege na atualidade pelo
sistema econômico capitalista neoliberal, visto que estes conceitos vão de acordo
com a definição de “capitalismo”, conforme explica o jurista André Ramos Tavares6:

“(...) o sistema econômico no qual as relações de produção estão


assentadas na propriedade privada dos bens em geral, especialmente dos
de produção, na liberdade ampla, principalmente de iniciativa e de
concorrência e, consequentemente, na livre contratação de mão-de-obra.”

2
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
3
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Martires. Curso de
Direito Constitucional. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 155.
4
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.
5
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e critica). 9ª ed.,
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004.
6
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: Método, 2003.
14
José Afonso da Silva7 também descreve de forma pontual o modelo
econômico consagrado na Constituição, afirmando que este se baseia na
propriedade privada, bem como na valorização do trabalho humano:

Em primeiro lugar quer dizer precisamente que a Constituição consagra


uma economia de mercado, de natureza capitalista, pois a iniciativa privada
é um princípio básico da ordem capitalista. Em segundo lugar significa que,
embora capitalista, a ordem econômica dá prioridade aos valores do
trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado.

Em linhas gerais, pode-se dizer que os princípios constitucionais foram


criados de forma a impor um padrão a ser seguido, de modo a condicionar a justiça
e a equidade8. Assim, estes princípios, que são norteadores da conduta do Estado,
buscam, principalmente, a dignidade da pessoa humana e a justiça social 9 e, dentro
de uma ótica de liberdade econômica, adequando-os ao crescimento e ao
desenvolvimento econômico do país, conforme explica José Afonso da Silva10:

(...) a participação do Estado na economia será uma necessidade,


enquanto, no sistema capitalista, se busque condicionar a ordem econômica
ao cumprimento de seu fim de assegurar a existência digna a todos,
conforme os ditames da justiça social e por imperativo de segurança
nacional.

Em relação especificamente aos princípios constitucionais relativos à


ordem econômica, estes são instrumentos necessários – os meios pelos quais são
atingidos com êxito os escopos pretendidos – para alcançar os fins que são a
garantia da livre iniciativa e da valorização do trabalho humano11.

De acordo com José Afonso da Silva12, alguns desses princípios até se


revelam como objetivos, haja vista as suas finalidades tão específicas:

Alguns desses princípios se revelam mais tipicamente como objetivos da


ordem econômica, como, por exemplo, o da redução das desigualdades
regionais e sociais e a busca do pleno emprego. Mas todos podem ser

7
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros, Saraiva,
2013, p. 794.
8
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 36. Título
original: Taking rights seriously. Tradução Nelson Boeira.
9
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
10
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2013,
p. 807.
11
NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro. Comentários à Constituição federal – ordem econômica
e financeira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. p. 21.
12
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 2013, p. 798.
15
considerados princípios na medida em que constituem preceitos
condicionadores da atividade econômica.

Ou seja, embora estes princípios devam ser analisados como


instrumentos da atividade empresarial, eles visam, primeiramente, à realização da
existência digna.

A partir disso, pode-se dizer que, na Carta Magna13, o art. 170 é o que se
destaca, pois aponta a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa como os
seus fundamentos e garantia a todos de uma existência digna como a sua
finalidade.

Além disso, arrola os nove princípios da atividade econômica, os quais


são: soberania nacional, propriedade privada, função social da propriedade, livre
concorrência, defesa do consumidor, defesa do meio ambiente, redução das
desigualdades regionais e sociais, busca do pleno emprego, e tratamento favorecido
para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que
tenham sua sede e administração no país.

Assim, confirma-se que a Constituição de 8814 consagrou o modelo de


produção capitalista, também conhecido como economia de mercado, o que implica
em uma limitação da intervenção do Estado no domínio econômico15.

A função do Estado nesse momento é de atuar como agente normativo e


regulador do mercado, fiscalizando, incentivando e planejando, devendo, assim,
intervir quando o sistema age de forma não razoável, ou seja, além dos limites da
lei, de modo a garantir a manutenção saudável do mercado, como se extrai do art.
174 da Lei Maior16.

Desta forma, as únicas exigências necessárias ao exercício de uma


atividade econômica são o mérito empreendido e o capital, não podendo o Estado
vedar o acesso dos indivíduos aos meios de produção e instrumentos de trabalho, já

13
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
14
Idem.
15
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 4ª. Ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 1998.
16
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
16
que a sua atuação direta na exploração da atividade econômica pelo Estado se
tornou uma hipótese excepcionalíssima, conforme normatiza o art. 173 da
Constituição Federal17.

1.2. A livre iniciativa como fundamento da livre concorrência

Em continuidade, a Carta Magna adotou a livre iniciativa como um dos


fundamentos da ordem econômica, de modo a consagrar o modelo de economia de
mercado, implicando na mínima intervenção estatal supracitada, haja vista que a
livre iniciativa também se constitui como um princípio básico do liberalismo
econômico18.

É importante ressaltar que a livre iniciativa não está restrita à liberdade


econômica, sob pena de visualizar o princípio como tão somente uma afirmação do
capitalismo. Em sua perspectiva substancial, a liberdade é definida por Eros Grau
como “sensibilidade e acessibilidade a alternativas de conduta e de resultado.”19

Segundo o entendimento de José Afonso da Silva20:

A liberdade de iniciativa econômica privada, num contexto de uma


Constituição preocupada com a realização da justiça social (o fim
condiciona os meios), não pode significar mais do que ‘liberdade de
desenvolvimento da empresa no quadro estabelecido pelo poder público, e,
portanto, possibilidade de gozar das facilidades e necessidade de submeter-
se às limitações postas pelo mesmo’. É legítima, enquanto exercida no
interesse da justiça social. Será ilegítima, quando exercida com objetivo de
puro lucro e realização pessoal.

Desta maneira, a livre iniciativa, traduz o ideal de liberdade econômica, e


seu reconhecimento pela ordem jurídica importa assegurar aos indivíduos a livre
escolha da atividade que queiram desenvolver para seu sustento, e limitar a atuação
do Estado no campo das opções econômicas dos agentes.

17
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
18
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 2013.
19
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 4ª. Ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 1998.
20
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 2013, p. 794.
17
Assim, ressalvadas as razões de ordem pública que reservam ao Estado
a iniciativa econômica e o controle do exercício de certas atividades, há de ser
assegurado a todo indivíduo o direito de livremente iniciar a atividade econômica que
lhe aprouver. Naqueles limites, os únicos requisitos necessários ao exercício de uma
atividade econômica são o talento e o capital, não podendo o Estado vedar o acesso
dos indivíduos aos meios de produção e instrumentos de trabalho21.

Ademais, o professor Eros Grau22 também leciona que a liberdade de


iniciativa econômica não se identifica apenas com a liberdade econômica, pois,
segundo ele, tal liberdade abrange todas as formas de produção individuais ou
coletivas, como a “iniciativa cooperativa”, a “iniciativa autogestionária” e a “iniciativa
pública”.

Assim, percebe-se que aquém da liberdade de empresa, a livre iniciativa


remonta à expressão do trabalho, não se limitando ao campo do empresário, mas
também não estando no rol dos direitos fundamentais. Isso porque livre iniciativa é
apenas um dos ramos da liberdade, o qual valoriza o trabalho e a criatividade
humana. Sobre o assunto, Tércio Sampaio Ferraz Júnior fez suas importantes
ponderações23:

Nestes termos, o art. 170, ao proclamar a livre iniciativa e a valorização do


trabalho humano como fundamentos da ordem econômica está nelas
reconhecendo a sua base, aquilo sobre o que ela se constrói, ao mesmo
tempo sua conditio per quam e conditio sine qua non, os fatores sem os
quais a ordem reconhecida deixa de sê-lo, passa a ser outra, diferente,
constitucionalmente inaceitável. Particularmente a afirmação da livre
iniciativa, que mais de perto nos interessa neste passo, ao ser estabelecida
como fundamento, aponta para uma ordem econômica reconhecida então
como contingente. Afirmar a livre iniciativa como base é reconhecer na
liberdade um dos fatores estruturais da ordem, é afirmar a autonomia
empreendedora do homem na conformação da atividade econômica,
aceitando a sua intrínseca contingência e fragilidade; é preferir, assim, uma
ordem aberta ao fracasso a uma ‘estabilidade’ supostamente certa e
eficiente. Afirma-se, pois, que a estrutura da ordem está centrada na
atividade das pessoas e dos grupos e não na atividade do Estado. Isto não
significa, porém, uma ordem do ‘laissez faire’, posto que a livre iniciativa se
conjuga com a valorização do trabalho humano, mas a liberdade, como
fundamento, pertence a ambos. Na iniciativa, em termos de liberdade

21
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 2013, p. 794.
22
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 4ª. Ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 1998, p. 226.
23
Ibidem, p. 228.

18
negativa, da ausência de impedimentos e da expansão da própria
criatividade. Na valorização do trabalho humano, em termos de liberdade
positiva, de participação sem alienações na construção da riqueza
econômica. Não há, pois, propriamente, um sentido absoluto e ilimitado na
livre iniciativa, que por isso não exclui a atividade normativa e reguladora do
Estado. Mas há ilimitação no sentido de principiar a atividade econômica, de
espontaneidade humana na produção de algo novo, de começar algo que
não estava antes. Esta espontaneidade, base da produção da riqueza, é o
fator estrutural que não pode ser negado pelo Estado. Se, ao fazê-lo, o
Estado a bloqueia e impede, não está intervindo, no sentido de normar e
regular, mas está dirigindo e, com isso, substituindo-se a ela na estrutura
fundamental do mercado.

A partir disso, aufere-se que a livre iniciativa é um princípio anterior à livre


concorrência, de modo que a livre concorrência decorre da manifestação da
liberdade de iniciativa de atuação no mercado econômico.

Ou seja, em linhas gerais, o princípio da livre concorrência é


desdobramento do princípio da livre iniciativa, complementando-o com sua
ponderação e, para garanti-la o legislador constituinte, no § 4º do art.174 da Carta
Magna24, dispôs que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à
dominação de mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos
lucros25.

1.3. O conceito de Livre Concorrência e seus aspectos teóricos relevantes

O conceito de concorrência26 quer indicar o ato ou efeito de concorrer, ou


seja, traz em si a ideia de luta, de competição entre pessoas na busca do mesmo
objetivo ou vantagem, conforme se vê:

sf (concorrer+ência) 1 Ato de concorrer. 2 Pretensão de mais de uma


pessoa à mesma coisa; competição. 3 Afluência simultânea de pessoas ou
coisas para um ponto ou lugar. 4 Confluência.

De acordo com Eros Grau27, três pilares são enumerados para a


construção da positivação da livre concorrência: a motivação econômica, a
sociológica e a política.

24
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
25
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 4ª. Ed. São Paulo: Malheiros,
1998, p. 230.
26
CONCORRÊNCIA. In: DICIONÁRIO Michaelis. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br>.
Acesso em: 29 dez. 2015.
27
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 4ª. Ed. São Paulo: Malheiros,
1998, p. 216.
19
Em síntese, a primeira diz respeito à economia que o Estado tem com a
sua não intervenção, já que, neste momento, conforme já explicitado, este atua
meramente como um mero regulador do sistema, o que gera maior eficiência
econômica.

Já a motivação sociológica deriva da possibilidade da escolha do


consumidor, haja vista que, em contrariedade ao monopólio comercial, estes podem,
com a efetivação da livre concorrência, ter um poder de escolha, de acordo com
suas preferências e reais necessidades. Além disso, pauta-se na ideia de que, com
mais concorrentes, as empresas tendem a procurar constantemente melhores e
novos métodos de aperfeiçoamento de suas técnicas, o que garante melhores
produtos no mercado e, consequentemente, maior satisfação ao público consumidor.
Pode-se ressaltar que o trabalhador também se beneficia, pois há a ampliação da
oferta de empregos.

E a motivação política, pautada na independência das esferas públicas e


privadas. Esta deriva da ideia, de acordo com a lição de Eros Grau28, que já não era
bem vista pelos liberalistas, de ter que submeter o poder econômico ao poder
público, que muitas vezes possuem interesses paradoxais. Desta forma, com a livre
concorrência, garante-se maior autonomia de mercado e maior independência do
poder privado, além de garantir maior impessoalidade das decisões. Em decorrência
da motivação política, maior preservação da forma democracia de governo, com
impessoalidade nas escolhas econômicas.

No campo do direito privado, de acordo com Rubens Limongi França 29, “a


concorrência é a disputa, o ato pelo qual uma pessoa procura estabelecer
competições de preços, com o fim de apurar as melhores condições para efetivação
de compra ou realização de uma obra. ”.

28
Idem.
29
FRANÇA, Rubens Limongi. Enciclopédia saraiva de direito. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 209.
20
Conforme também expõe Ana Maria de Oliveira Nusdeo30, a concorrência
volta-se para as atividades comerciais e industriais, porquanto é através delas que
encontra sua seara de atuação:

Quanto ao seu conteúdo, o princípio da livre concorrência costuma ser


identificado com a liberdade de atuar nos mercados buscando a conquista
da clientela, com a expectativa de sua aplicação levar os preços de bens e
serviços, fixados pelo jogo dos agentes em disputa pela clientela, a níveis
razoavelmente baixos, chegando no caso extremo de concorrência perfeita,
a se igualarem ao custo marginal do produto. Aponta-se, no entanto, que a
essa liberdade jurídica de conquista de clientela pelos concorrentes deve
somar-se a liberdade dos consumidores de usufruírem de alternativas.

Nesse sentido, a livre concorrência, na área econômica, representa a


disputa entre todas as empresas para obter maior e melhor espaço no mercado.

1.4. O aspecto constitucional da Livre Concorrência

Constitucionalmente, segundo João Bosco31, a livre concorrência na


Constituição brasileira representa a afirmação de uma opção pelo regime de
economia de mercado. Segundo ele, a liberdade de concorrência é garantida como
forma de se chegar ao equilíbrio, “não mais aquele atomístico do liberalismo
tradicional, mas um equilíbrio entre os grandes grupos e um direito de estar no
mercado também para as pequenas empresas.”

Desta forma, o princípio de livre concorrência foi criado como uma forma
de refletir o valor do livre exercício de atuação dos particulares na economia e
buscar uma ordem social democrática, que garanta a isonomia de todos de
desenvolverem suas atividades econômicas, inclusive a atuação de forma
concorrente com outros mercados, desde que dentro dos limites da lei, o que será
melhor explicado em capítulo posterior (item 2.2)32.

30
NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Defesa da concorrência e globalização econômica. São Paulo:
Malheiros, 2002, p. 236.
31
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. 5. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Forense, 2007, p. 128.
32
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e critica). 9ª ed.,
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004.
21
Traduz-se a livre concorrência, então, como a possibilidade de atuação
dos agentes econômicos em seus respectivos mercados sem gozar de privilégios
jurídicos, ou seja, em pé de igualdade com os concorrentes, visando à circulação de
bens e serviços, com uma justa competição.

Ou seja, autorizado é o adentramento de qualquer indivíduo no mercado e


a sua atuação será da forma que melhor lhe convir para a captação de sua clientela,
em decorrência da livre iniciativa, que se traduz no ideal da liberdade econômica.

A partir disso, o legislador da Constituição Federal de 198833 previu a


necessidade de criar o conceito da livre concorrência para garantir a proteção do
mercado, preocupando-se com a coletividade e com a garantia de liberdade
concorrencial entre as empresas34.

Neste passo, a constitucionalização da livre concorrência veio a confirmar


a teoria do neoliberalismo em relação as motivações teóricas, o que é visto, na
economia atual, de forma muito positiva, tanto aos agentes econômicos, quanto a
menor responsabilização do Estado35.

Por fim, sabe-se que, como qualquer princípio constitucional, a


relativização costuma acontecer perante certos aspectos concretos previstos pelo
legislador36, o que raramente garante sua forma absoluta. Assim, a livre
concorrência não pode ser estudada de forma isolada, haja vista que outros
princípios a integram e a relativizam.

Desta forma, para sua melhor compreensão e conexão com o tema, será
demonstrado à diante aspectos teóricos e concretos que limitam a livre concorrência
no direito brasileiro.

33
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
34
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 2013, p. 794.
35
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e critica). 9ª ed.,
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004.
36
SARMENTO, Daniel. “Os Princípios Constitucionais e a Ponderação de Bens”. in Teoria dos
Direitos Fundamentais, org.: Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
22
CAPÍTULO II – A CONCORRÊNCIA DESLEAL

2.1. O conceito da concorrência desleal e a sua importância na Propriedade


Industrial

Conforme explicitado em capítulo anterior, a palavra “concorrência” é


definida, de acordo com o dicionário de língua portuguesa37, como o ato de
concorrer entre dois indivíduos ou a pretensão de duas ou mais pessoas à mesma
coisa.

A deslealdade, por sua vez, é conceituada por Denis Borges Barbosa38


como “uma desordem, a violação de ‘uma ordem, no sentido de regularidade e
previsibilidade de comportamentos’”. Continuamente, especificamente no contexto
econômico, o professor analisa ainda que a palavra “desleal” na concorrência não
resulta da conformidade do competidor, ou seja, não se apura somente o dolo deste,
mas a existência da deslealdade, especialmente no caso de um crime de
concorrência desleal (item 2.3).39

Nota-se que, de acordo com o professor Denis Borges40, a concorrência


desleal não diz respeito à boa fé e nem aos atos moralmente aceitos, mas sim à um
ato excessivo no exercício de uma liberdade econômica.

A jurisprudência41, por sua vez, apresenta o conceito de deslealdade


ligado a algo pejorativo, contrários às boas regras e aos bons costumes dentro de
determinado segmento econômico.

37
CONCORRÊNCIA. In: DICIONÁRIO Michaelis. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br>.
Acesso em: 29 dez. 2015.
38
BARBOSA, Denis Borges. A concorrência desleal, e sua vertente parasitária. Disponível em
<http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/novidades/concorrencia_desleal.pdf>. Acesso em: 21
jan. 2016.
39
BARBOSA, Denis Borges. A Propriedade Intelectual no Século XXI. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2009, p. 32.
40
Ibidem, p. 33/34.
41
“O ato contrário aos usos honestos em matéria industrial ou comercial constitui ato de concorrência
desleal, ainda que não se relacione com a propriedade industrial. Mostra-se legítima a condenação
dos falsificadores em indenizar os danos materiais causados à autora, apurando-se em liquidação de
sentença a quantia efetivamente percebida por aquela com a comercialização dos produtos copiados.
É possível pleitear a pessoa jurídica danos à imagem advindos de ato ofensivo a seu patrimônio
imaterial, como bom nome e credibilidade no mercado, inexistindo motivos para a majoração do
quantum indenizatório. Comprovado o ilícito civil, defere-se o pedido de busca e apreensão de
equipamentos na própria ação de conhecimento” (TJMG. Apelação Cível nº 1.0024.02.661935-3/001.
Relator: Desembargador Valdez Machado, DJ: 14/07/2009.) In: Revista do TJMG. Disponível em:
23
Sobre tal tema, elucida ainda Waldo Fazzio Junior42:

O conjunto de condutas do empresário que, fraudulenta ou


desonestamente, busca afastar a freguesia do concorrente. A concorrência
desleal tem característica instrumental, à medida que se caracteriza pelos
meios ilícitos adotados pelo empresário para angariar clientes em
detrimento dos demais concorrentes.

Neste sentindo, também ensina Gama Cerqueira que43:

Sob a denominação genérica de concorrência desleal, costumam os autores


reunir uma grande variedade de atos contrários às boas normas da
concorrência comercial, praticados, geralmente, com o intuito de desviar, de
modo direto ou indireto, em proveito do agente, a clientela de um ou mais
concorrentes, e suscetíveis de lhes causar prejuízo.

Portanto, em síntese, a expressão “concorrência desleal” contém a ideia


de um comportamento anti-competitivo, ou seja, as práticas comerciais e industriais
que contrariam as práticas honestas e permitidas por lei44, conforme descrito na
Convenção da União de Paris.

Como se vê, todos os conceitos de concorrência desleal, em que pesem


apresentarem definição muito objetiva45, permitem chegar a um denominador
comum de que ato de concorrência desleal é o ato inesperado dentro de
determinado segmento econômico por aqueles que exercem atividade naquela área.

Sobre o tema, Denis Borges Barbosa comenta46:

<http://www.tjmg.jus.br/data/files/C2/70/C1/8B/2B5D931033D50C93180808FF/Julho_%20Agosto%20
e%20Setembro%20de%202009.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2016.
42
FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 142.
43
CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da Propriedade Industrial. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, Vol. II, 1982, p. 1622.
44
União de Paris. Convenção da União de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial. Texto
após a revisão de Estocolmo, de 14 de julho de 1967. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/anexo/and1263-94.pdf>. Acesso em: 21 jan.
2016.
45
“Como já observamos, a grande dificuldade nesta matéria está consiste justamente em caracterizar
a concorrência desleal tendo-se em vista a natureza ou a deslealdade intrínseca do ato, porque o
critério de apreciação varia de pessoa a pessoa e aquilo que para uns é reprovável, a outros pode
parecer lícito”. (CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da Propriedade Industrial. 2ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, Vol. II, 1982, p. 1273.)
46
BARBOSA, Denis Borges. A Propriedade Intelectual no Século XXI. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2009, p. 32.
24
Para que se configure deslealdade na concorrência o parâmetro não é legal,
mas fático. É preciso que os atos de concorrência sejam contrários aos
‘usos honestos em matéria industrial ou comercial’ (Convenção de Paris,
art. 10-bis) ou a ‘práticas comerciais honestas’ (TRIPs, art. 39) - sempre
apurados segundo o contexto fático de cada mercado, em cada lugar, em
cada tempo. Os textos internacionais fixam parâmetros básicos para o que
seja, em princípio, desleal, mas em cada caso a ponderação do ilícito será
feita contextualmente.

Nesse sentido, é possível afirmar que a conceituação de deslealdade será


sempre fática, pois dependerá da análise de um determinado segmento econômico,
em determinada época, em determinado espaço geográfico47.

Neste passo, a concorrência desleal mostra-se de grande importância


para a Propriedade Industrial, haja vista que cria definições de limitações para a
prática concorrencial dos mercados, evitando prejuízos de ordem econômica, bem
como a infração da própria prática desleal48, conforme será mais bem explicitado no
item que segue (item 2.2).

2.2. A concorrência desleal como limitadora da livre concorrência

Conforme já fora anteriormente explicitado (item 1.4), a livre concorrência


é um princípio previsto na Constituição de 198849, criado com o intuito de deixar que
os agentes econômicos exerçam livremente as suas atividades, desenvolvendo-as
de forma isonômica.

Essa liberdade de atuação conferida ao particular permite que o país


desenvolva uma economia eficiente e livre das amarras do Estado, mediante a
proliferação de ideias que visem a criação ou o aperfeiçoamento de produtos e
serviços oferecidos ao mercado consumidor50.

47
Ibidem, p. 38.
48
COSTA, Dahyana Siman Carvalho da Costa. Concorrência desleal. Disponível em
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9121>.
Acesso em: 21 jan. 2016.
49
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
50
MANSUR, Pedro. O combate à concorrência desleal é fundamental para o progresso do Brasil.
Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI166898,31047-
O+combate+a+concorrencia+desleal+e+fundamental+para+o+progresso+do>. Acesso em: 06 fev.
2016.
25
Entretanto, a concorrência desleal, como prática que extrapola os limites
à medida que se caracteriza pela utilização de “meios ilícitos adotados pelo
empresário para angariar clientes em detrimento dos demais concorrentes”51, com o
intuito de causar prejuízos aos terceiros concorrentes, bem como aos consumidores,
se impõe como uma medida necessária de relativização e de limitação ao princípio
da livre concorrência, a fim de que o equilíbrio dos mercados seja reestabelecido 52.

Portanto, de acordo com José Afonso da Silva 53, o princípio constitucional


da livre concorrência deve ser entendido como instrumento para se alcançar a
dignidade da pessoa humana, visto que tal princípio garante um direito subjetivo de
todos poderem competir igualmente no mercado, enquanto que a legislação
antitruste, repressora dos casos de infração à ordem econômica e, também,
concorrência desleal, mostra-se como indispensável ao sistema capitalista vigente,
ao passo que viabiliza as possibilidades de concretização do princípio constitucional
citado enquanto fundamento da atividade empresarial54.

Desta maneira, é sabido que a concorrência é essencial para o


desenvolvimento saudável da atividade econômica, existindo desde os primórdios,
quando os empresários se dividiam em simples comerciantes ou feirantes. Todavia,
a concorrência precisa ter limites bem definidos para que não reste configurada a
infração à ordem econômica, além da própria concorrência indevida55.

Assim, é fundamental identificar quando a concorrência lícita se


transforma em ilícita, quais são os requisitos que levam à sua configuração e a
exposição das proteções jurídicas atribuídas ao concorrente lesado.

Portanto, por ser tão importante no auxílio do equilíbrio da ordem


econômica, será exposta no item a seguir como ocorre a configuração da
concorrência desleal de acordo com as leis brasileiras.

51
FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 142.
52
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36ª. ed. São Paulo: Malheiros,
Saraiva, 2013, p. 765.
53
Idem.
54
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e critica). 9ª ed.,
rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004.
55 55
COSTA, Dahyana Siman Carvalho da Costa. Concorrência desleal. Disponível em
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9121>.
Acesso em: 26 jan. 2016.
26
2.3. A configuração de concorrência desleal na legislação brasileira

No tocante às leis que regem este instituto, cada país regula os seus
direitos da propriedade industrial, artística e literária, visando atender as suas
próprias necessidades56. Entretanto, no cenário de globalização, o qual permite uma
rápida e constante troca de informações e de produtos entre as fronteiras, foi
percebida a necessidade de homogeneizar as normas, a fim de uma maior proteção
internacional57.

A partir disso, a fim de harmonizar internacionalmente os diferentes


sistemas jurídicos nacionais relativos à Propriedade Industrial, alguns países se
uniram na Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Intelectual
(CUP), cuja redação atual vigente no Brasil é a da revisão de Estocolmo, ocorrida
em 1967 e promulgada pelo Decreto executivo nº 635 de 21 de agosto de 199258.

A CUP veio não para uniformizar as leis nacionais, mas ao revés, ela
prevê ampla liberdade legislativa para cada país, mas para principalmente exigir
paridade de tratamento entre os países signatários, a fim de caracterizar igualmente
as práticas desleais como atos de concorrência desleal59.

Além da vigência da CUP, no Brasil, os meios legais de coerção a


concorrência desleal estão normatizados tanto na esfera penal quanto na esfera
cível60.

No âmbito civil, busca-se a responsabilidade civil, bastando que esteja


caracterizado o ato como ilícito, bem como o abuso de direito, de acordo com a
definição descrita no art. 209 da Lei 9.27961, que descreve o direito ao prejudicado

56
SOARES, José Carlos Tinoco. “Concorrência desleal” vs. “trade dress” e/ou conjunto imagem. São
Paulo: Ed. do autor, 2004, p. 10.
57
BARBOSA, Denis Borges. A Convenção da União de Paris para a Proteção da Propriedade
Industrial. Disponível em:
http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/apostilas/inpi_doutorado/cup1.pdf. Acesso em: Acesso
em: 21 jan. 2016.
58
Idem.
59
Idem.
60
SOARES, José Carlos Tinoco. “Concorrência desleal” vs. “trade dress” e/ou conjunto imagem. São
Paulo: Ed. do autor, 2004, p. 11.
61
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de
prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência
desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar
27
de fruir de perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de
violação de direitos de propriedade industrial, bem como em atos de concorrência
desleal.

Já na esfera penal, o objetivo é a cessação da violação dos atos desleais,


sob pena de detenção ou pagamento de multa, a fim de proteger o indivíduo dos
crimes de concorrência desleal62.

O art. 195 da Lei 9.27963 enumera, de forma taxativa, todas as condutas


tipificadas como crime de concorrência desleal, como, exempli gratia, o emprego de
meio fraudulento para desviar clientela, a utilização de sinal ou propaganda alheio
para fins de confundir os consumidores e o uso indevido do nome comercial de

confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os


produtos e serviços postos no comércio.
62
COSTA, Dahyana Siman Carvalho da Costa. Concorrência desleal. Disponível em
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9121>.
Acesso em: 21 jan. 2016.
63
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem:
I - publica, por qualquer meio, falsa afirmação, em detrimento de concorrente, com o fim de obter
vantagem;
II - presta ou divulga, acerca de concorrente, falsa informação, com o fim de obter vantagem;
III - emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;
IV - usa expressão ou sinal de propaganda alheios, ou os imita, de modo a criar confusão entre os
produtos ou estabelecimentos;
V - usa, indevidamente, nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios ou vende,
expõe ou oferece à venda ou tem em estoque produto com essas referências;
VI - substitui, pelo seu próprio nome ou razão social, em produto de outrem, o nome ou razão social
deste, sem o seu consentimento;
VII - atribui-se, como meio de propaganda, recompensa ou distinção que não obteve;
VIII - vende ou expõe ou oferece à venda, em recipiente ou invólucro de outrem, produto adulterado
ou falsificado, ou dele se utiliza para negociar com produto da mesma espécie, embora não
adulterado ou falsificado, se o fato não constitui crime mais grave;
IX - dá ou promete dinheiro ou outra utilidade a empregado de concorrente, para que o empregado,
faltando ao dever do emprego, lhe proporcione vantagem;
X - recebe dinheiro ou outra utilidade, ou aceita promessa de paga ou recompensa, para, faltando ao
dever de empregado, proporcionar vantagem a concorrente do empregador;
XI - divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados
confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que
sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve
acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato;
XII - divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se
refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude; ou
XIII - vende, expõe ou oferece à venda produto, declarando ser objeto de patente depositada, ou
concedida, ou de desenho industrial registrado, que não o seja, ou menciona-o, em anúncio ou papel
comercial, como depositado ou patenteado, ou registrado, sem o ser;
XIV - divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de resultados de testes ou outros dados não
divulgados, cuja elaboração envolva esforço considerável e que tenham sido apresentados a
entidades governamentais como condição para aprovar a comercialização de produtos.
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.
28
outro. Neste artigo seguem elencadas todas as hipóteses, de forma taxativa, que se
configuram como concorrência desleal.

Em síntese, pode-se dizer que a caracterização da conduta criminal da


concorrência desleal decorre somente dos atos ilícitos praticados em conformidade
com o tipo penal previsto na Lei de Propriedade Industrial64, diferente do que ocorre
quando se busca apenas a responsabilidade civil 65.

Na esfera civil, além da já citada possibilidade do prejudicado poder


buscar a reparação por danos, de acordo com o art. 207 da Lei de Propriedade
Industrial66, o art. 209 do mesmo ordenamento prevê a possibilidade de outros atos
não previstos serem enquadrados como concorrência desleal, podendo ser
quaisquer atos “tendente a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar
confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço,
ou entre os produtos e serviços postos no comércio.”67.

Analisando as classificações e os artigos dispostos, aufere-se que os atos


de concorrência desleal podem ser aqueles que ensejam confusão entre produtos,
serviços ou estabelecimentos dos concorrentes, bem como aqueles que causem
prejuízos ao concorrente, seja por desvio de clientela, denegrição do concorrente,
segredos da empresa, desrespeito a cláusula contratual de não-reestabelecimento
ou concorrência parasitária68.

No que se refere às ações cabíveis para repressão dos atos de


concorrência desleal, verificando o exposto nos dispositivos da Lei 9.279/9669,
entende-se que, configurada a violação de qualquer direito de propriedade industrial,
bem como quando existente a concorrência desleal, o indivíduo lesado poderá fazer
uso dos arts. 207 e 209 da referida lei, para ajuizar a ação cabível a fim de cessar o
ato desleal, além de obter o ressarcimento aos danos sofridos pelo concorrente.

64
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
65
COSTA, Dahyana Siman Carvalho da Costa. Concorrência desleal. Disponível em
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9121>.
Acesso em: 21 jan. 2016.
66
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
67
Idem.
68
COSTA, Dahyana Siman Carvalho da Costa. Concorrência desleal. Disponível em
<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9121>.
Acesso em: 21 jan. 2016.
69
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
29
Desta maneira, passadas as premissas necessárias, passar-se-á a
análise do conceito de trade dress, matéria cerne deste trabalho, bem como sua
proteção pela legislação brasileira e internacional.

30
CAPÍTULO III – O TRADE DRESS E O DIREITO BRASILEIRO

3.1. O conceito de trade dress

A expressão americana trade dress – traduzida para o português como


“conjunto imagem” – pode ser definida como um conjunto de características que
determinam a identidade visual de certo produto, serviço ou estabelecimento70.

A expressão, embora não seja definida conceitualmente pela legislação


brasileira, tem ganhado bastante repercussão e vem sendo bastante utilizada em
decisões judiciais, sendo conceituada, literalmente, como a vestimenta e/ou o
conjunto-imagem de algo comercial71.

José Carlos Tinoco Soares72 conceitua o trade dress como:

(...) a imagem total do negócio; num sentido bem geral, é o look and feel, é,
o ver e o sentir do negócio; é o meio pelo qual o produto é apresentado no
mercado; é o identificador de origem; o termo ‘trade dress’ significa a
imagem total ou aparência geral de um produto ou serviço, incluindo, mas
não limitado a, desenho da embalagem, rótulos, recipientes, mostruários, à
característica do produto ou à combinação de elementos ou figuras que são
ou se tornam associadas exclusivamente com uma existência particular que
permitem funcionar como sendo um indicador de origem do produto; o
‘trade dress’ compreende um única seleção de elementos que
imediatamente estabelecem que o produto se distancia dos outros, por isso
se torna inconfundível. ‘Trade dress’ e/ou ‘Conjunto-Imagem’, para nós é a
exteriorização do objeto, do produto ou sua embalagem, é a maneira
peculiar pela qual se apresenta e se torna conhecido. É pura e
simplesmente a ‘vestimenta’, e/ou o ‘uniforme’, isto é, um traço peculiar,
uma roupagem ou a maneira particular de alguma coisa se apresentar ao
mercado consumidor ou diante dos usuários com habitualidade. Na
generalidade da expressão ‘alguma coisa’ pode-se incluir mas, logicamente,
não limitar às marcas figurativas ou mistas; tridimensionais; a todos os
objetos que foram ou não suscetíveis de patentes, mas que se apresentam
mediante uma forma de exteriorização característica; a toda e qualquer
forma de produto ou de sua embalagem, desde que constituída de
características particulares; a toda e qualquer decoração interna ou externa
de estabelecimentos; a toda e qualquer publicidade desde que elaborada e
apresentada com particularidades a torne conhecida como procedente de
uma determinada origem. Por todos esses e muitos outros elementos e

70
DANIEL, Denis Allan. Litígios contendo conjunto-imagem (“trade-dress”) no Brasil. Disponível em:
<http://www.daniel.adv.br/port/articlespublications/denisdaniel/trade_dress.pdf>. Acesso em: 07 fev.
2016.
71
Idem.
72
SOARES, José Carlos Tinoco. “Concorrência desleal” vs. “trade dress” e/ou conjunto imagem. São
Paulo: Ed. do autor, 2004, p. 213.
31
componentes, o ‘trade dress’ nada mais é do que aquilo que já
denominamos, desde há muito, ou seja, o CONJUNTO-IMAGEM.

Em adição, Denis Borges Barbosa conceitua de forma sucinta que o trade


dress é um:

(…) conjunto de cores, a forma estética, os elementos que compõem a


aparência externa, como o formato ou apresentação de um produto,
estabelecimento ou serviço, suscetível de criar a imagem-de-marca de um
produto em seu aspecto sensível.

Em síntese, percebe-se que o trade dress nada mais é do que a


vestimenta de um produto, serviço ou estabelecimento, ou seja, a forma como tal
seguimento é apresentado ao público.

Não se trata de uma marca, e, sim, da “roupagem externa”, do “conjunto-


imagem” ou da “apresentação visual” de produtos, estabelecimentos e serviços,
criados por profissionais do marketing para diferenciá-los da concorrência,
chamando a atenção do consumidor, criando a sua relação de identidade com o
mesmo.

É importante ressaltar que essa forma de apresentação consiste no


resultado do conjunto de uma série de elementos comuns, que conforme se reúnem
em um único objeto, ganharão uma apresentação que se difere, de caráter único.

Segue abaixo, para fins exemplificativos, a fotografia de um conjunto-


imagem de um estabelecimento, caracterizando a identidade visual do
estabelecimento e permitindo sua identificação perante os consumidores:

73
Figura 1- Identidade visual do estabelecimento Outback

73
Disponível em: <https://kekanto.com.br/biz/outback-steakhouse-45/fotos/487530>. Acesso em: 15
mar. 2016.
32
Desta maneira, elementos de uso comum, como cores, formatos de
embalagens ou estabelecimentos, imagens, formas de atendimento ao cliente, entre
outros, quando combinados e dispostos de maneira que se difere das demais,
ganharão uma apresentação capaz de permitir que o consumidor a reconheça e
identifique que os produtos ou serviços assinalados por aquela mesma
apresentação visual são da mesma origem74.

Desta forma, as formas de apresentação que caracterizam o trade dress


podem ser as mais variadas possíveis: desde embalagens, layouts dos
estabelecimentos comerciais (físicos ou eletrônicos) até as mais diversas formas de
divulgação de um produto ou serviço, desde que suscetível de criar a imagem-de-
marca de um produto em seu aspecto sensível75.

Ademais, de acordo com Marino Postiglione76, o conceito de trade dress


evoluiu, assim como seu enquadramento, não se limitando apenas à marca em si,
mas englobando uma forma ampla de vestimenta, um traço peculiar ou a maneira
particular de uma marca se apresentar ao mercado.

A título de exemplificação, são formas possíveis de apresentação de trade


dress: latas e garrafas de bebidas, embalagens de produtos de limpeza, caixas e
recipientes de alimentos, e, ainda, layouts de restaurantes, interiores de lojas,
fachadas de postos de gasolina, entre outros77.

3.2. A função econômica, publicitária e de identificação do trade dress


perante o consumidor

74
BARBOSA, Denis Borges. Do trade dress e suas relações com a significação secundária.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/trade_dress.pdf>.
Acesso em: 14 fev. 2016.
75
BARBOSA, Denis Borges. Do trade dress e suas relações com a significação secundária.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/trade_dress.pdf>.
Acesso em: 03 mar. 2016.
76
POSTIGLIONE, Marino Luiz. Direito empresarial: O estabelecimento e seus aspectos contratuais.
Barueri. São Paula. Manole: 2006, p. 97.
77
PIVA, Fernanda Neves. A imitação do Trade Dress: Concorrência Desleal. Disponível em:
<http://revistadireitoempresarial.com.br/artigos/95-Artigo%20trade%20dress.pdf>. Acesso em: 14 fev.
2016.
33
Em continuidade ao subcapítulo anterior, é possível auferir a relação
singular criada entre o trade dress (conjunto-imagem) de um produto ou serviço e o
público consumidor, gerando uma relação de identificação e confiança78.

Sobre este tema, Luiz Edgard Montaury Pimenta e Marianna Furtado de


Mendonça79 afirmam que:

O conjunto-imagem normalmente reúne características tão singulares que


consegue identificar o público-consumidor, de forma imediata, a qual o
produto ou estabelecimento o mesmo se refere. Tais características
mantêm tamanha relação entre produtos/serviços e clientela que é capaz de
exercer forte influência no público, fazendo com que os consumidores
associem, até de forma inconsciente, a qualidade dos produtos e serviços a
tais características.

Por ter essa característica de permitir ao consumidor identificar a origem


de um produto ou serviço, exercendo função próxima à das marcas, é possível
afirmar que o trade dress apresenta natureza jurídica de signo distintivo, como
podemos ver, a título de exemplificação, no julgado80 que segue:

DIREITO MARCÁRIO. TRADE DRESS. CONCORRÊNCIA DESLEAL.


DANOS MATERIAIS E MORAIS. A autora pretende a reparação de danos
em razão do uso indevido da marca e trade dress do produto CARLTON de
sua titularidade no ramo de cigarros. Alega-se que o produto EIGHT
comercializado pela ré viola seus direitos marcários, dada a semelhança
entre estes. O trade dress constitui a identificação visual única e
distintiva de um produto, serviço ou estabelecimento perante o
mercado de consumo. Tal identificação visual, por permitir que o
consumidor reconheça o produto, possui natureza jurídica de signo
distintivo a merecer proteção jurídica. (i) No direito brasileiro, a proteção
jurídica ao trade dress se extrai do sistema de amparo

78
SANTOS, Murilo Rodolfo Rodrigues dos. “Trade-Dress”, o Conjunto-imagem sob o enfoque do
Direito do Consumidor: Garantir a proteção da roupagem do produto é proteger o consumidor?.
Clubjus, Brasília-DF: 25 nov. 2008. Disponível em:
<http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.22102>. Acesso em: 16 fev. 2016.
79
MONTAURY, Luiz Edgard e DE MENDONÇA, Marianna Furtado. Trade Dress e a Tutela dos
Websites, Revista da ABPI nº 100, de mai/jun de 2009, pg. 20.
Disponível em: <http://www.montaury.com.br/wp-content/uploads/2014/10/Revista-da-ABPI-n.---
100.pdf>. Acesso em: 14 fev. 2016.
80
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ). Apelação nº 0080560-
38.2011.8.19.0001, Relator: Des. Roberto de Abreu e Silva, julgado em 01.04.2014. Disponível em:
<http://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/116656073/apelacao-apl-805603820118190001-rj-0080560-
3820118190001>. Acesso em: 14 fev. 2016.
34
à propriedade industrial, em especial, ante os preceitos contidos nos art. 5º,
XXIX e art. 170, da CRFB/88, art. 2º, V, 195, III e IV e 209 da Lei 9279 /96.
(ii) As mencionadas normas tratam dos princípios gerais da ordem
econômica, proteção à propriedade das marcas e dos signos distintivos,
bem assim coíbem o uso indevido e desautorizado da marca, amparando o
seu titular e prevenindo o mercado da concorrência desleal. Aquele que se
utiliza indevidamente do trade dress de produto de titularidade de outrem,
fica sujeito às sanções cíveis previstas no art. 209 e parágrafo único
da Lei 9279 /96 cominadas àqueles que violam os direitos
de propriedade industrial e atos de concorrência desleal típicos ou
assemelhados. (grifado)

O conjunto-imagem de um produto, serviço ou estabelecimento, então,


mostra-se essencial para a sua função de identificação do consumidor com o objeto
consumido, pois é por meio daquele que este reconhece o que lhe é oferecido,
realizando a associação direta à qualidade do produto e do serviço81.

Desta maneira, como forma de sobreviver em um mercado cada vez mais


exigente, a inovação e o caráter singelo de um produto ou serviço passa a ser fator
que se impõe, e, assim, o trade dress se constitui como um grande aliado na busca
da tão desejada distintividade82.

Além de conquistar o público consumidor, o signo identificador de um


produto ou serviço possui grande valor na sua representação perante o mercado,
reforçando os conceitos e valores da empresa titular desse signo, posicionando-a
perante um cenário econômico, além de resultar em vantagem econômica ao titular
do trade dress perante seus concorrentes, mostrando-se clara a necessidade de se
proteger o conjunto-imagem de forma objetiva, buscando cada vez mais medidas
eficazes, bem como estratégias de mercado, a fim de que não haja prejuízos
econômicos gerados por terceiros, através de uma concorrência desleal83.

81
PAULA, Priscila Oliveira de e JÚNIOR, Lair de Castro. Trade Dress: Concorrência desleal e atos de
confusão. Disponível em: <http://www.viannajr.edu.br/files/uploads/20160201_145309.pdf>. Acesso
em: 14 fev. 2016.
82
MANARA, Cecília. A proteção jurídica do “trade dress” ou “conjunto-imagem”. Propriedade
Intelectual em perspectiva. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2008, p. 1.
83
AREDES, Natália. As formas de proteção do conjunto-imagem, ou trade dress, à luz do direito
brasileiro. Disponível em: <http://nataliasaredes.jusbrasil.com.br/artigos/132787408/as-formas-de-
protecao-do-conjunto-imagem-ou-trade-dress-a-luz-do-direito-brasileiro>. Acesso em: 14 fev. 2016.
35
Diante deste quadro, e sob a ótica de uma realidade interconectada, na
qual o acesso à informação ocorre de maneira dinâmica e ágil, o público consumidor
se torna cada vez mais exigente, fazendo com que as empresas se adaptem às
mudanças e busquem se fortalecer frente ao mercado, a fim de garantir uma
presença notável em seu ramo mercadológico84.

Desta maneira, percebe-se, haja vista a importância do trade dress na


relação de confiança entre o empresário e o público consumerista, a importância
econômica de proteção de seu conjunto-imagem e a necessidade de exercer a
publicidade deste, a fim de garantir seu lugar em um respectivo ramo de mercado.

Pelo exposto acima, faz-se necessária a presença da lei, para que sejam
impostas as necessárias medidas contra eventuais tentativas maliciosas e imitações
flagrantes, a fim de cessar fraudes e a concorrência desleal85, conforme será visto
melhor em item posterior (item 3.5).

3.3. A origem do termo trade dress

O instituto do trade dress teve origem nos Estados Unidos da América,


especificamente no ano de 1922, em uma ação judicial que ficou conhecida como “o
caso Two Pesos Inc X Taco Cabana Inc”86.

Em síntese, a rede de fast food Taco Cabana ingressou com a ação


judicial alegando que a concorrente Two Pesos estava utilizando indevidamente da
cópia de todas as suas características visuais. A Suprema Corte americana, por sua
vez, reconheceu o direito da autora impondo que a ré cumprisse a obrigação de
indenizar, bem como alterasse o layout de seu estabelecimento – nascia, então, o
trade dress87.

Neste sentido, a Corte norte-americana afirmou o que segue:

84
MANARA, Cecília. A proteção jurídica do “trade dress” ou “conjunto-imagem”. Propriedade
Intelectual em perspectiva. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2008, p. 1-2.
85
SOARES, José Carlos Tinoco. Direito de Marcas. São Paulo: Ed. Atlas, 1968, p. 137.
86
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. No. 91-971. “Two Pesos, Inc., Petitioner v. Taco Cabana, Inc.”
Disponível em: <https://www.law.cornell.edu/supct/html/91-971.ZO.html>. Acesso em: 22 fev. 2016.
87
VARELLA, Yuri. “Concorrência Desleal, Dificuldades legislativas para a proteção do trade dress ou
conjunto-imagem de empresas multinacionais”. Disponível em:
<http://www.varellaadvogados.com.br/artigos/detalhe/concorrencia-desleal-dificuldades-legislativas-
para-a-protecao-do-trade-dress-ou-conjunto-imagem-de-empresas-multinacionais>. Acesso em: 22
fev. 2016.
36
“[T]rade dress” is the total image of the business. Taco Cabana’s trade dress
may include the shape and general appearance of the exterior of the
restaurant, the identifying sign, the interior kitchen floor plan, the decor, the
menu, the equipment used to serve food, the servers’ uniforms, and other
features reflecting on the total image of the restaurant. 1 App. 83-84. The
Court of Appeals accepted this definition and quoted from Blue Bell Bio-
Medical v. Cin-Bad, Inc., 864 F.2d 1253, 1256 (CA5 1989): “The ‘trade dress’
of a product is essentially its total image and overall appearance.” See 932
F.2d 1113, 1118 (CA5 1991). It “involves the total image of a product, and
may include features such as size, shape, color or color combinations,
texture, graphics, or even particular sales techniques.” John H. Harland Co.
v. Clarke Checks, Inc., 711 F.2d 966, 980 (CA11 1983). Restatement (Third) of
Unfair Competition 16, Comment a (Tent. Draft No. 2, Mar. 23, 1990)88

Segue abaixo uma ilustração comparativa entre as fachadas dos dois


estabelecimentos em questão:

Figura 2 - Comparação entre os conjuntos-imagens das fachadas da Two Pesos (à esquerda) e da


89
Taco Cabana (à direita)

Conforme se vê, embora os elementos isolados dos estabelecimentos


sejam diferentes (nome do estabelecimento, cores, marca), o conjunto dos
elementos da fachada, o conjunto-imagem, é bastante similar.

Historicamente, o termo trade dress se referia à forma como um produto


era “dressed up to go to the Market”90, ou seja, como o produto era “vestido para

88
Tradução livre: “Trade dress” é a imagem total de um negócio. O trade dress do Taco Cabana pode
englobar o formato e a aparência total do exterior do restaurante, o signo distintivo, a arquitetura do
interior da cozinha, a decoração, o menu, o equipamento utilizado para servir comida, o uniforme dos
empregados, e outras características que refletem a imagem total do restaurante. O trade dress de
um produto é essencialmente a sua imagem total e sua aparência conjuntural. Ela envolve a imagem
total de um produto, e pode incluir características como tamanho, formato, cores, combinação de
cores, textura, gráficos e, até mesmo, técnicas de vendas.
89
Figura 1 - Disponível em:
<http://m.blog.daum.net/_blog/_m/articleView.do?blogid=0OteO&articleno=3841>. Acesso em: 20
mar. 2016.
37
entrar no mercado” e, inicialmente, fora criado com o objetivo principal de impedir um
fabricante de vestir o seu produto como o de outro fabricante, evitando que os
consumidores comprassem bens por engano em mercados errados91.

Desta maneira, o instituto abrangia, primordialmente, embalagens e


rótulos de produtos, sendo posteriormente ampliado para compreender a
configuração dos produtos com formas únicas e serviços, bem como a impressão
visual dos estabelecimentos92.

Desta maneira, o trade dress foi criado para atender dois objetivos
principais: proteger os consumidores de confusão, por que lhes permite distinguir
entre diferentes produtos e associá-los com os produtores respectivos, e também
gerar uma segurança jurídica para os produtores, para que pudessem investir mais
em criação93.

3.4. A proteção do trade dress no direito norte-americano

À partir disso, foi promulgada a “The Lanham Act”94, em 1946, com o


intuito de fornecer, em âmbito federal, ampla proteção contra a concorrência desleal,
oferecendo proteção contra “deceptive marking, packaging, and advertising of
goods", ou seja, “marketing enganoso, embalagem e publicidade de mercadorias",
que, segundo a lei, “poderiam induzir em erro o consumidor no que diz respeito à
verdadeira origem de um produto”95.

Posteriormente, no ano de 1988, tal lei foi modificada, a fim de ampliar o


seu rol de proteção, fornecendo uma proteção mais ampla e codificado o que havia
se tornado uma regra bem reconhecida da jurisprudência: que tanto as marcas
registradas quanto as não registadas podiam ter o seu trade dress protegido96.

90
STEPHEN F. MOHR ET AL., U.S. TRADE DRESS LAW: EXPLORING THE BOUNDARIES 1 (Int'l
Trademark Ass'n eds., 1997).
91
Idem.
92
Idem.
93
Antonia L. Sequeira, Wal-Mart Stores, Inc. v. Samara Bros., 16 Berkeley Tech. L.J. 251 (2001).
Disponível em: <http://scholarship.law.berkeley.edu/btlj/vol16/iss1/15>. Acesso em: 28 fev. 2016.
94
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. 15 U.S.C. § 1125(a) (1994 & Supp. IV 1998).
95
Antonia L. Sequeira, Wal-Mart Stores, Inc. v. Samara Bros., 16 Berkeley Tech. L.J. 251 (2001).
Disponível em: <http://scholarship.law.berkeley.edu/btlj/vol16/iss1/15>. Acesso em: 28 fev. 2016.
96
Idem.
38
Desta maneira, em âmbito norte-americano, tradicionalmente a lei que
protege o trade dress abrange quaisquer embalagens e rótulos usados em qualquer
produto e/ou serviço. Em adição, nos anos 80, os tribunais criaram o entendimento
de que tal lei abrange “qualquer forma ou design do produto em si”97.

A título de exemplificação, um caso emblemático que ocorreu nos


Estados Unidos da América, que por muito se tornou o símbolo da possibilidade de
proteção do trade dress, foi o caso conhecido como “Wal-Mart vs. Sâmara
Brother”98, julgado pela Suprema Corte americana no ano 2000.

Em síntese, o litígio versava sobre a fabricante de roupas infantis Samara


Brothers, que alegava a violação do trade dress de suas peças por parte da rede
varejista Wal-Mart, que, à época, encomendou uma linha de roupas baseada nas
peças de sua coleção99.

Nesta demanda, a corte norte-americana fixou o entendimento de que é


possível a proteção do trade dress de produtos e não só de rótulos e/ou
embalagens, desde que suficientemente distinta a possiblidade de confusão pelo
público consumidor100.

Como último exemplo, importante citar o caso “Qualitex Co. vs Jacobson


Products Co.”101, no qual a Suprema Corte aprovou o conceito de “funcionalidade
estética” ao permitir que cores sozinhas podem funcionar como marcas, conferindo
distintividade à elas. Assim, as cores isoladamente não poderiam ser registradas
como marcas ou protegidas como trade dress, exceto nos casos em que ficasse

97
Idem.
98
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. No. 99-150. “Wal-Mart Stores, Inc. Petitioner v. Samara
Brothers, Inc.”. Disponível em: <https://www.law.cornell.edu/supct/html/99-150.ZO.html>. Acesso em:
01 mar. 2016.
99
BHERING, Philippe. “A aplicação do trade dress na indústria da moda.” Disponível em:
<http://bheringadvogados.com.br/pt_br/artigos/180-a-aplicacao-do-trade-dress-na-industria-da-
moda>. Acesso em: 01 mar. 2016.
100
Idem.
101
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. No. 93-1577. “Qualitex Company, Petitioner v. Jacobson
Products Company, Inc.”. Disponível em: <https://www.law.cornell.edu/supct/html/93-1577.ZO.html>.
Acesso em: 01 mar. 2016.
39
comprovado que as mesmas adquiriram um “significado secundário”, tornando-se,
aos olhos do consumidor, um forte indicativo da origem daqueles produtos.102

Conforme percebido, nos Estados Unidos da América o trade dress surgiu


a partir de decisões proferidas pelas cortes norte-americanas, as quais constituem a
base conceitual aplicada até hoje, ou seja, primeiro surgiram as decisões
jurisprudenciais e posteriormente foram definidas pela legislação, tendo atualmente
amparo específico com o Lanham Act103 da Lei Federal de Marcas.

Atualmente, os detentores do trade dress podem registra-lo perante o US.


Patent and Trademark Office (USPTO), assim como outros tipos de marcas,
recebendo, portanto, proteção dos tribunais federais104.

Feita a análise sobre a origem do trade dress e como sua proteção ocorre
no direito norte-americano, demonstrar-se-á como tal questão é abordada no direito
brasileiro (item 3.5).

3.5. O trade dress aplicado ao direito brasileiro

Embora já seja bastante conhecido pelos doutrinadores da área, na


legislação brasileira ainda inexiste uma proteção específica ao trade dress – ou
conjunto-imagem105.

Tal proteção não ocorre em específico haja vista que na legislação


brasileira não há possibilidade de registro para imagem geral de um produto. Nesta
seara, o professor Denis Borges Barbosa leciona quais são os elementos protegidos
por nossa legislação atual:

Têm proteção contra a concorrência ilícita os elementos não funcionais das


embalagens, estejam protegidos por registro de desenho industrial ou de
marca tridimensional (quando a concorrência é ilícita por ser interdita), ou
sejam simplesmente objeto da criatividade concorrencial, antes ou
prescindindo de qualquer registro (quando a concorrência é ilícita por ser
desleal).

102
TEIXEIRA, Cassiano Ricardo Golos. “Concorrência desleal: Trade Dress”. Disponível em:
<https://ibpibrasil.org/ojs/index.php/Revel/article/download/17/17>. Acesso em: 01 mar. 2016.
103
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. 15 U.S.C. § 1125(a) (1994 & Supp. IV 1998).
104
STIM, Richard. Patent, Copyright and Trademark – An Intellectual Property Desk Reference. 13ª.
Ed California: Nolo, 2014, p. 464.
105
DANIEL, Denis Allan. Litígios contendo conjunto-imagem (“trade-dress”) no Brasil. Disponível em:
<http://www.daniel.adv.br/port/articlespublications/denisdaniel/trade_dress.pdf>. Acesso em: 01 mar.
2016.
40
Desta maneira, a proteção ao trade dress é uma área tanto quanto
nebulosa na nossa legislação, principalmente pelo fato do conceito não estar
referenciado diretamente na Lei de Propriedade Intelectual106.

Entretanto, a ausência de um dispositivo específico não significa que que


o instituto não possa ser protegido legalmente de outras formas107.

Primeiramente, faz-se necessário reiterar que o trade dress é o conjunto-


imagem de um produto e/ou serviço (ou conjunto-imagem) composto por diversos
elementos visuais, os quais podem ser marcas, desenhos industriais, entre outros.

Neste passo, a violação ao trade dress pode ser reprimida pelas normas
que tutelam tais elementos isolados que compõem o conjunto imagem do produto,
se estes elementos estiverem sido registrados pelo órgão responsável,
caracterizando uma “proteção indireta”.108

Acerta desse ponto, Denis Borges Barbosa109 leciona que:

(...) a proteção do trade dress se dá, indiretamente, através dos seus


elementos protegidos por marca registrada, inclusive tridimensional, se for o
caso (art. 122 e seg. do Código da Propriedade Industrial de 1996); pelo
nome de empresa, protegido pelo Código Civil; pelo desenho industrial, se
registro houver (art. 94 e seg. da mesma lei); e pela lei Autoral (Lei
9.610/98), no que couber. Mas, no sistema brasileiro, o trade dress é
protegido diretamente (embora não por um direito exclusivo) pelas regras de
concorrência desleal, especificamente consagradas no pertinente no art.
195, III do Código da Propriedade Industrial vigente. Assim, como ocorre em
todos objetos de proteção da concorrência desleal, o trade dress é
protegido na espaço geográfico onde a concorrência ocorre de fato, material
e positivamente.

Conforme Stephen Ladas110, tendo em vista que o trade dress é um


conjunto de diversos elementos, há também outras formas de proteção:

106
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
107
DANIEL, Denis Allan. Litígios contendo conjunto-imagem (“trade-dress”) no Brasil. Disponível em:
<http://www.daniel.adv.br/port/articlespublications/denisdaniel/trade_dress.pdf>. Acesso em: 07 fev.
2016.
108
GUSMÃO, José Roberto e d’HANENS Laetita Pablo. Breves comentários sobre a proteção ao
trade dress no Brasil. In: Revista dos Tribunais - RT 919, maio de 2012, p. 591.
109
BARBOSA, Denis Borges Barbosa. Parecer sobre apelação nº 0191736-89.2009.8.26.0100.
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 3ª Câmara Cível. No prelo.
41
1) Pelo direito autoral, quando a criação for artística e original;
2) Através do desenho industrial, caso a criação possuas as características
para ser protegida por este instituto;
3) Através da proteção marcaria, se dentre as marcas passíveis de registro
em determinado país abranger marcas mistas e tridimensionais; e
4) Através da concorrência desleal, quando a imitação gerar engano ou
confusão ao público.

Entretanto, de acordo com Denis Borges Barbosa, sabendo que este


instituto do conjunto-imagem em sua completude não é registrável, somente a ação
fundada em concorrência desleal é possível, não sendo possível utilizar-se das
tutelas específicas111.

Neste passo, se tal elemento não estiver registrado como marca ou como
outro elemento distintivo registrável, e o mesmo for imitado por outrem, por
“analogia”, a ação judicial mais adequada (e utilizada) é a ação fundamentada na
concorrência desleal112, conceito estudado em capítulo anterior (item 2.1).

Sob à luz da lição de Dennis Borges Barbosa, a concorrência desleal será


a exceção, podendo ser arguida somente em casos onde o direito de propriedade
industrial não chega. Segundo ele, a regra é que quando há uma regra específica,
no caso, a violação à um direito tutelado pela Lei de Propriedade Industrial, o titular
deverá basear-se nos artigos pertinentes para reparar seu dano e condenar o
contrafato113.

A bem da verdade, cabe ressaltar que, mesmo que haja violação


específica aos elementos isolados do conjunto-imagem, a violação deste, ainda sim,
será configurada como concorrência desleal114.

110
LADAS, Stephen. “Patents, Trademarks and Related Rights”. Cambridge: Harvard University
Press, 1975 p. 1709.
111
BARBOSA, Denis Borges. Do trade dress e suas relações com a significação secundária.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/trade_dress.pdf>.
Acesso em: 08 mar. 2016.
112
DANIEL, Denis Allan. Litígios contendo conjunto-imagem (“trade-dress”) no Brasil. Disponível em:
<http://www.daniel.adv.br/port/articlespublications/denisdaniel/trade_dress.pdf>. Acesso em: 07 fev.
2016.
113
BARBOSA, Denis Borges. Do trade dress e suas relações com a significação secundária.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/trade_dress.pdf>.
Acesso em: 08 mar. 2016.
114
Idem.
42
Desta maneira, tendo em vista que não há lei específica que tutele o trade
dress, a repressão à concorrência desleal figura como fundamento na maioria das
ações judiciais envolvendo o tema.

Neste ínterim, as ações que versam sobre a proteção de um conjunto-


imagem são baseadas sob a luz do art. 195 da Lei de Propriedade Industrial115, o
qual tipifica a concorrência desleal como crime. Ademais, além da tipificação penal,
as ações também são pautadas no art. 209 da mesma lei, a qual prevê o
ressarcimento de danos morais e materiais ao prejudicado por atos de emprego de
meios fraudulentos para desviar clientela de outros através da aproximação da
“apresentação visual” de produtos, estabelecimentos ou serviços116.

Não obstante a não menção expressa do trade dress na lei, a


jurisprudência brasileira já reconhece a possibilidade do reconhecimento do
conjunto-imagem, entendendo que este é passível sim de proteção jurídica.

Para tal, demonstra-se essencial que o sinal distintivo tutelado mostre-se,


de fato, original e diferenciado em relação aos demais. Ou seja, o trade dress não
pode apresentar uma configuração ordinária e trivial com a qual o consumidor já
esteja acostumado, sob pena de não exercer sua função precípua de sinal
distintivo117.

Portanto, a distintividade é um elemento essencial para qualquer disputa


de gênero, pois sem ela o trade dress não possui capacidade para diferenciar o
produto ou serviço do empresário em relação aos outros produtos existentes.

Em adição, para que tal proteção seja conferida deve demonstrar-se que,
em função da similaridade entre as impressões visuais, existe possibilidade de

115
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
116
PIVA, Fernanda Neves. A imitação do Trade Dress: Concorrência Desleal. Disponível em:
<http://revistadireitoempresarial.com.br/artigos/95-Artigo%20trade%20dress.pdf>. Acesso em: 14 fev.
2016.
117
ANDRADE, Gustavo Piva de. O trade dress e a proteção da identidade visual de produtos ou
serviços. Disponível em:
<http://www.dannemann.com.br/dsbim/uploads/imgFCKUpload/file/GPA%20_O_trade_dress_pi.pdf>.
Acesso em: 14 mar. 2016.
43
confusão entre os produtos ou serviços. Ou seja, além da distintividade, outros dois
atos devem ser vislumbrados pelo Juízo, os quais são118:

1. A geração de confusão entre os produtos, serviços ou


estabelecimentos comerciais;

2. Associação indevida pelo consumidor, levando ao desvio de


clientela.

Desta maneira, faz-se necessária uma análise sobre os atos confusórios,


bem como ocorre a sua identificação.

Conforme fora dito em subcapítulo anterior (item 3.2), todos os sinais


distintivos de uma empresa possuem uma relação com mercado consumidor, de
forma que é através desses sinais que o consumidor identifica determinado produto
ou serviço e, consequentemente, reconhece suas características e suas qualidades.
A partir disso, verifica-se o caráter informativo e publicitário do conjunto-imagem
dotado de distintividade.

Em continuidade, os atos confusórios são aqueles que geram confusão


entre os sinais que distinguem os produtos, serviços ou estabelecimentos, gerando
uma falsa identificação. Utiliza-se, por exemplo, o sinal distintivo de outrem, de
maneira indevida, a fim de se aproveitar da reputação alheia, induzindo os
consumidores ao erro119.

Não obstante, para levar à caracterização de uma violação de um trade


dress de uma empresa, o ato não somente deve gerar confusão entre os símbolos,
mas também deve ter o intuito de ludibriar o consumidor, enganando-o em relação
ao sinal distintivo de uma marca, serviço ou estabelecimento, gerando uma falsa
identificação120.

118
MINADA, Luciana Yumi Hiane. O instituto do trade dress no Brasil – a eficácia da repressão à
concorrência desleal enquanto mecanismo de proteção. Disponível em:
<https://www.kasznarleonardos.com.br/files/artluciana-trade%20dress.pdf>. Acesso em: 08 mar.
2016.
119
BARBOSA, Denis Borges. Do trade dress e suas relações com a significação secundária.
Disponível em: <http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/200/propriedade/trade_dress.pdf>.
Acesso em: 13 mar. 2016.
120
MINADA, Luciana Yumi Hiane. O instituto do trade dress no Brasil – a eficácia da repressão à
concorrência desleal enquanto mecanismo de proteção. Disponível em:
<https://www.kasznarleonardos.com.br/files/artluciana-trade%20dress.pdf>. Acesso em: 13 mar.
2016.
44
Em qualquer ação do gênero, portanto, é fundamental que o magistrado
leve em consideração o grau de discernimento do consumidor médio que
normalmente adquire o produto121. Leva-se em conta e o grau de discernimento do
consumidor e as circunstâncias em que os produtos são habitualmente adquiridos.

Sobre este tema, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça122, a lei


não visa resguardar o consumidor atento, mas, sim, o consumidor desatento ou
incapaz de reparar nos detalhes da embalagem por qualquer motivo:

Para a Lei, basta que os produtos sejam parecidos a ponto de gerar


confusão. Naturalmente, uma pessoa atenta percebe a diferença
entre duas marcas, ainda que sejam quase idênticas. Entretanto, é
necessário que se tenha em mente que não se trata de um ‘jogo de
sete erros’. A Lei se destina, não ao consumidor atento, mas
justamente ao consumidor que, por qualquer motivo, não se encontra
em condições de diferenciar os produtos similares. Não se pode
descurar o fato de que, muitas vezes, o consumidor não pode ler a
embalagem de um produto ou, ao menos, tem dificuldade de fazê-lo,
seja por seu grau de instrução, por problemas de saúde ocular ou
mesmo por pressa. Nesses casos, tudo o que o consumidor
distinguirá será a forma da embalagem, as características gerais do
produto, as cores apresentadas e assim por diante. Ora, ao observar
as fotografias dos produtos com a marca ‘Brilhante’ e dos produtos
com a marca ‘BioBrilho’ que constam do processo, é nítida a
possibilidade de confusão. Num olhar rápido, as embalagens são
muito parecidas.

Percebe-se que, então, a possibilidade de confusão ou associação


indevida do trade dress deve ser analisada com base no consumidor médio, que na
maioria das vezes não se apega às minúcias e aos detalhes, seja por uma limitação
social ou por meros hábitos cotidianos.

Conforme já fora explicitado, todos os sinais distintivos de uma empresa


guardam, em maior ou menor medida, uma relação com seus consumidores, de
modo que é através desses sinais que o consumidor identifica determinado produto

121
ANDRADE, Gustavo Piva de. O trade dress e a proteção da identidade visual de produtos ou
serviços. Disponível em:
<http://www.dannemann.com.br/dsbim/uploads/imgFCKUpload/file/GPA%20_O_trade_dress_pi.pdf>.
Acesso em: 14 mar. 2016.
122
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 3ª Turma de Direito Privado, Recurso Especial nº 685.903.
ReI. Min. Nancy Andrigh, 29/1012007.
45
ou serviço e, em adição, identifica suas características e sua qualidade, se
verificando o caráter informativo que os sinais distintivos possuem123.

A partir disso, reconhecendo a importância dos sinais distintivos de uma


empresa, resta indubitável a importância da repressão aos atos de utilização
indevida de conjunto-imagem que geram a prática da concorrência desleal124.

Cumpridos os requisitos supracitados para que o trade dress possa ser


protegido através do instituto da repressão à concorrência desleal, o detentor do
trade dress violado pode/deve ingressar com uma ação no Judiciário a fim de
requerer a cessação da conduta desleal do infrator e, quando cabível, a condenação
deste ao pagamento de indenização e reparação de danos125.

Para melhor exemplificação, seguem abaixo alguns casos envolvendo


trade dress que ocorreram nos tribunais brasileiros recentemente.

Um dos casos mais emblemáticos no Brasil na área do Direito


Empresarial, bem como um dos pioneiros no tocante ao tema estudado, é conhecido
como “Victoria’s Secret x Monange Fashion Show”126.

Em síntese, o Monange Dream Fashion Tour, evento de moda itinerante,


levava ao país desfiles com modelos de lingerie e shows – uma apresentação no
mesmo molde do famoso desfile anual da marca Victoria's Secret –, no qual as
modelos que desfilavam trajavam asas de anjos e plumas.

Assim, segundo a Victoria's Secret, no evento "Monange Dream Fashion


Tour" foram praticados atos de concorrência desleal decorrentes da utilização
indevida e desautorizada de seu símbolo distintivo "asas de anjo" – seu famoso
conjunto-imagem conhecido mundialmente –, fazendo alusão ao evento da autora,
"Victoria's Secret Fashion Show".

123
MINADA, Luciana Yumi Hiane. O instituto do trade dress no Brasil – a eficácia da repressão à
concorrência desleal enquanto mecanismo de proteção. Disponível em:
<https://www.kasznarleonardos.com.br/files/artluciana-trade%20dress.pdf>. Acesso em: 13 mar.
2016.
124
Idem.
125
Idem.
126
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Ação ordinária nº 0121544-64.2011.8.19.0001. 5ª
Vara Empresarial.
46
Assim, a parte autora alegou a concorrência parasitária, pois, segundo
ela, os consumidores seriam induzidos a erro ao pensar que o evento da ré teria
alguma ligação com o evento da autora.

Para melhor referência e comparação, seguem as imagens dos


conjuntos-imagens – “asas de anjo” – das partes em litígio:

127
Figura 3 – “Asas de anjo” – Trade dress da marca Victoria’s Secret
128
Figura 4 – “Asas de anjo” – Trade dress da marca Monange

Ao revés, a parte ré argumentou, à época, que não poderia a autora


requerer indenização por utilização alheia de algo que sequer é passível de
proteção, já que o formato dos eventos e as asas de anjo, penas e plumas utilizadas
não seriam protegíveis por não serem registráveis.

Na resolução do conflito, a juíza proferiu sua sentença emitindo que as


asas de anjo, embora não registráveis, fazem parte da identidade visual da autora e
deveriam sim ser protegidas, a fim de evitar a concorrência desleal e parasitária 129.

127
Figura 2 - Disponível em: <http://www.triplex.com.pt/products/angels-da-victorias-secret-/>. Acesso
em: 20 mar. 2016.
128
Figura 3 - Disponível em: <http://virgula.uol.com.br/modaebeleza/monange-tera-que-pagar-
indenizacao-victoria-secrets-por-uso-de-asas-em-desfile-da-marca-brasileira/>. Acesso em: 20 mar.
2016.
129
"As 'asas de anjo', inquestionavelmente, fazem parte da identidade visual da VICTORIA'S
SECRET e vêm sendo utilizadas pela autora há muitos anos, nos seus desfiles e propagandas (...) O
sinal distintivo em questão - "asas de anjo" -, portanto, merece a proteção legal, como forma de
impedir a concorrência desleal, só assim evitando-se a possibilidade de confusão passível de
acarretar desvio de clientela e locupletamento com o esforço alheio. "A conduta das rés está
subsumida na definição de concorrência parasitária, eis que tudo nos autos indica que elas buscaram
inspiração nas realizações da autora, tentando tirar proveito de seus investimentos no plano artístico
47
Cabe ressaltar que tal decisão foi mantida pelos desembargadores da 14ª Câmara
Cível do Tribunal do Estado do Rio de Janeiro, que entenderam também que o sinal
distintivo merecia proteção legal e fixando um quantum indenizatório no valor de R$
100.000,00 (cem mil reais)130.

Tal decisão foi inédita no âmbito, sendo o primeiro e o mais importante


precedente de proteção legal do trade dress nos Tribunais brasileiros131, abrindo
possibilidade para outras ações pautadas no mesmo direito.

Outras decisões emblemáticas foram proferidas posteriormente por


diversos Tribunais, como o caso “Carlton X Eight”, no qual, em síntese, a autora
requereu a reparação de danos em razão do uso indevido da marca e trade dress do
produto Carlton, de sua titularidade no ramo de cigarros.

Alegou-se que o produto Eight, comercializado pela ré, violava seus


direitos de conjunto-imagem, dada a semelhança entre estes. A partir disso,
pautando-se no direito de proteção do conjunto-imagem e não apenas aos
elementos individuais, a autora teve o reconhecimento de seu direito protegido em
sentença judicial proferida132.

Para melhor ilustrar, seguem abaixo os modelos das embalagens do


cigarro Carlton e, ao lado, do cigarro Eight:

ou comercial"." Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Ação ordinária nº 0121544-


64.2011.8.19.0001. 5ª Vara Empresarial.
130
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Embargos Infringentes nº 0121544-
64.2011.8.19.0001. 14ª Câmara Cível. Julgado em 09/10/2013.
131
BEZERRA, Elton. TJ-RJ condena Hypermarcas a indenizar Victoria's Secret. Disponível em:
<http://www.conjur.com.br/2013-ago-19/hypermarcas-indenizar-victorias-secret-concorrencia-
parasitaria>. Acesso em: 15 mar. 2016.
132
“O trade dress constitui a identificação visual única e distintiva de um produto, serviço ou
estabelecimento perante o mercado de consumo. Tal identificação visual, por permitir que o
consumidor reconheça o produto, possui natureza jurídica de signo distintivo a merecer proteção
jurídica. (...) Assim sendo, ante o conjunto probatório dos autos não há dúvidas que a ré cometeu
atos de concorrência desleal ao colocar no mercado de consumo de cigarros o produto EIGHT com a
mesma identificação visual do produto CARLTON. (...)”. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro. Apelação nº 0080560-38.2011.8.19.0001. Relator: Des. Roberto de Abreu e Silva. Julgado
em: 01.04.2014.
48
133
Figura 5 - Conjunto-imagem do produto Carlton (à esquerda)
134
Figura 6 - Conjunto-imagem da marca Eight (à direita)

Além das ações supracitadas, outras diversas foram propostas Brasil


afora, o que demonstra que as ações deste cunho têm se tornado cada vez mais
frequentes, verificando-se que a maioria gira em torno de infrações de conjunto-
imagem de produtos farmacêuticos, bebidas e cosméticos135.

Pelo exposto, podemos afirmar que a proteção do trade dress tem como
principal forma de proteção a vedação à concorrência desleal, sendo esta proteção
contemplada, ainda, somente no âmbito jurisprudencial.

As decisões acima citadas possibilitam concluir que o trade dress têm


sido gradativamente reconhecido pelos Tribunais como um sinal distintivo que pode
ser protegido pela Constituição Federal136 e pela Lei da Propriedade Industrial137,
desde que cumpridos os requisitos para sua proteção através da repressão à
concorrência desleal.

Assim, embora ainda obscura no plano doutrinário e normativo, a


proteção do conjunto-imagem é uma nova e importante ferramenta em face da
concorrência desleal, sendo cada vez mais contemplada pela jurisprudência.

133
Figura 4 - Disponível em: http://www.smoke-free.ca/filtertips03/images/carlton-red.jpg. Acesso em:
20 mar. 2016.
134
Figura 5 - Disponível em: http://1306.py.all.biz/pt/cigarros-com-filtro-g1557. Acesso em: 20 mar.
2016.
135
DANIEL, Denis Allan. Litígios contendo conjunto-imagem (“trade-dress”) no Brasil. Disponível em:
<http://www.daniel.adv.br/port/articlespublications/denisdaniel/trade_dress.pdf>. Acesso em: 07 fev.
2016.
136
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
137
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
49
Importante não somente no âmbito stricto sensu, ou seja, para
meramente proteger o direito do empresário e do consumidor, mas também no lato
sensu, para ornar em uma sociedade de livre concorrência como uma importante
ferramenta de instigar a criação sem que haja o medo da deslealdade, se mostrando
como uma relativização essencial ao princípio constitucional da livre concorrência.

50
CONCLUSÃO

Nossa sociedade é pautada sob a Constituição Federal de 1988 138, lei


fundamental e suprema, que serve de parâmetro de validade a todas as demais
espécies normativas, ditando princípios os quais devem ser seguidos, por regra, e,
excepcionalmente, relativizados.

Um destes princípios é o princípio da Livre Concorrência, um princípio


previsto no capítulo da Ordem Econômica, pelo qual qualquer agente econômico é
livre para praticar formas de troca mercadológica. O princípio da livre concorrência
vem esculpido no art. 170, inciso IV, da Constituição Federal de 1988139 que com o
perfil neoliberal baseou-se na livre iniciativa como pilar essencial da ordem
econômica e financeira, sem o qual a atividade empresarial não alcançaria seus
objetivos maiores, como a obtenção de lucros e a captação de clientela.

Tal princípio, embora proveniente da Carta Magna, pode e deve ser


relativizado quando o agente econômico age de maneira desleal, ultrapassando os
limites de razoabilidade, e atua com práticas ilícitas para prejudicar seus
concorrentes e angariar a clientela em detrimento dos demais – deslealdade esta
conceitualmente conhecida como “concorrência desleal”.

A linha de raciocínio é de que a concorrência é um dos pilares das


políticas públicas em todo o mundo. E, assim, se a competitividade não transborda
para a deslealdade, é estimulante e beneficia o consumidor. Entretanto, caso os
limites sejam ultrapassados, a prática desleal deve ser coibida.

Desta maneira, a concorrência desleal é caracterizada como um desvio


de conduta moral, com violação dos princípios da honestidade comercial, da
lealdade, dos bons costumes e da boa-fé, tipificada na Lei de Propriedade
Industrial140 como uma forma de estabelecer um norte sobre as condutas desleais
no mercado econômico.

138
BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal, 1988.
139
Idem.
140
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
51
A concorrência desleal pode ser caracterizada tanto no âmbito civil quanto
no âmbito penal, desde que sejam preenchidos os requisitos normatizados nos
artigos 195 e 209 da LPI141.

Continuamente, o trade dress, cerne deste trabalho, consiste no conjunto-


imagem de um produto, serviço ou estabelecimento, sendo a sua “vestimenta”,
devendo ser considerada sua originalidade e suas características específicas e
individuais. Consiste, pois, em cores, rótulos, texturas, gráficos, ornamentos, na
estilização de letras e na configuração externa do produto ou serviço, desde que
estes, juntos, se caracterizem em um conjunto que se diferencie dos demais.

Um conjunto-imagem de produtos que guarda semelhanças pode ser


diferenciado pelo cliente na hora da compra e, por isso, pode agregar enorme
vantagem competitiva ao atribuir valor à empresa, por ter a possibilidade de gerar
distintividade e originalidade ao produto e/ou serviço oferecido, proporcionando à
empresa uma vantagem competitiva em relação aos seus concorrentes e sendo
considerado um importante bem imaterial142.

Sua origem remonta à jurisprudência norte-americana e, atualmente,


pode ser registrado, assim como uma marca, e, mesmo quando o titular não efetua
tal registro, o Lanham Act garante sua proteção.

No ordenamento jurídico brasileiro, entretanto, não há proteção legal do


trade dress, embora já existam decisões judiciais reconhecendo a sua proteção,
embasando-se no direito à repressão a concorrência desleal, previsto na LPI143.

Assim, embora o conceito não esteja expresso, reconhecida é sua


importância diante da necessidade de proteger o consumidor e o comerciante, ainda
que a sociedade seja regida pela livre concorrência.

Sua dificuldade de reconhecimento se encontra principalmente na


subjetividade da análise das ações, haja vista que não há referência expressa e
direta a ela na Lei nº 9.279/90.

141
Idem.
142
SANTOS, J. L. et al. Ativos intangíveis: fonte de vantagem competitiva. ConTexto, Porto Alegre, v.
6, n. 8, 2º semestre de 2006.
143
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
52
Entretanto, após estudos doutrinários, critérios objetivos de cumprimento
dos requisitos que configuram a violação ao trade dress foram criados para facilitar o
reconhecimento dos atos desleais, além dos critérios subjetivos que devem ser
considerados pela autoridade julgadora, principalmente em relação à possibilidade
de confusão pelo consumidor médio.

Assim, recentemente os tribunais brasileiros passaram a reconhecer a


importância do trade dress e a necessidade de sua proteção, desde que os
requisitos para tal sejam verificados.

Assim, ao observar as demandas que chegam ao Judiciário, verifica-se a


existência de diversos casos em que os titulares do trade dress obtiveram decisões
favoráveis, demonstrando que a ausência de previsão expressa desse instituto não
prejudica efetivamente o acesso à efetiva prestação jurisdicional.

Conclui-se, pois, que o instituto do trade dress enquanto sinal distintivo


das empresas é de grande relevância e expressão, ao passo que desempenha um
importante papel na dinâmica mercadológica, restando cristalina a necessidade de
sua proteção, ainda que, por ora, não seja expressamente regulado e tutelado por
nosso ordenamento jurídico.

Em adição, conclui-se também que o reconhecimento da importância do


conjunto-imagem é basilar para que se mantenha um equilíbrio nos mercados
econômicos, prevalecendo que a economia, acima de tudo, deve ser justa e
favorecer principalmente o consumidor.

53
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