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Gafi e Coaf

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Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 2, jul./dez.

2018

Data de recebimento: 10/10//2018


Data de aceitação: 10/12/2018

POLÍTICAS PÚBLICAS DE PREVENÇÃO E COMBATE À


LAVAGEM DE DINHEIRO NO BRASIL: COAF E ARRANJO
INSTITUCIONAL

MARCO AURÉLIO PINTO FLORÊNCIO FILHO1

PATRICIE BARRICELLI ZANON2

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 2 POLÍTICAS PÚBLICAS


DE PREVENÇÃO E COMBATE À LAVAGEM DE
DINHEIRO NO BRASIL E A IMPLEMENTAÇÃO DO
COAF. 3 O COAF E SEU ARRANJO INSTITUCIONAL.
CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.

RESUMO: O presente trabalho visa a analisar o arranjo institucional que envolve o


COAF, a fim de averiguar a adequação ao cumprimento de suas atribuições enquanto um
dos principais atores da política antilavagem brasileira. A partir do método hipotético-
dedutivo e pesquisa elaborada com base em referências bibliográficas e legislativas
apresenta-se um breve panorama sobre a evolução da política pública de combate e
prevenção à lavagem de dinheiro no Brasil, destacando a implementação do COAF. A
seguir, é realizada uma análise do arranjo institucional que o envolve, a qual compreende:
o modelo de unidade de inteligência financeira adotado, sua estrutura e atribuições, bem
como a relação com os demais atores da política antilavagem. Então, constata-se que
embora apresente alguns pontos críticos, o arranjo institucional que envolve o COAF foi
bem estruturado, e, por fim, conclui-se que este é adequado a sua atividade e, se
aperfeiçoado, em especial no que tange à sua estrutura, garantirá maior efetividade à
política antilavagem brasileira.

1
Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Mestre em Direito pela
Universidade Federal de Pernambuco, aprovado com distinção. Bolsista da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CAPES (2006/2008). Pós-Graduado em Direito Penal
Econômica e Europeu pela Universidade de Coimbra. Professor da Faculdade de Direito da Universidade
Presbiteriana Mackenzie. Coordenador e Professor do Programa de Mestrado em Direito da Escola Paulista
de Direito(2014-2016). Professor Visitante da Università degli Studi di Siena. Presidente da Comissão
Especial de Direito Penal Econômico da OAB/SP desde 2014. Líder do Grupo de Pesquisa "Direito Penal
Econômico" - UPM. Pesquisador do Grupo "A Tutela da Supraindividualidade e da Ordem Econômica, em
uma Perspectiva Constitucionalizada da Intervenção Penal" - FMC. Pesquisador do Grupo "Globalização
e Fundamentos Dogmáticos do Direito Penal Econômico" da Faculdade Damas. Pesquisador Associado no
CIHJur. Membro da Comissão de Reclassificação de Periódicos da Área do Direito da CAPES desde 2015.
Tem experiência na área de Direito Penal e Processo Penal, com ênfase em Direito Penal Econômico e
Empresarial. E-mail: marcoaurelio@florenciofilho.com.br.
2
Mestranda em Direito Político e Econômico (Universidade Presbiteriana Mackenzie). Especialista em
Direito das Relações de Consumo (PUC - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e Graduada em
Direito (Universidade Presbiteriana Mackenzie). Participou do Legal Education Exchange Program
(Thomas Jefferson School of Law). Advogada.

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Palavras-chave: Lavagem de dinheiro. COAF. Arranjo institucional. Políticas públicas.

TACKLING AND PREVENTING MONEY LAUNDERING


POLICIES IN BRAZIL: COAF AND LEGAL INSTITUTIONAL
ARRANGEMENT

ABSTRACT: This article aims to analyze the institutional arrangement that involves
COAF, in order to investigate its suitability to achievement of its duties while one of the
main actors of anti-money laundering policy in Brazil. Making use of hypothetical-
deductive method and the research developed based on bibliographical and legal
references it presents a brief overview about the evolution of the Brazilian policy for
tackling and preventing money laundering, and emphasizing the implementation of
COAF. Afterwards, it is analyzed the institutional arrangement that involves COAF,
which addresses the analysis of the adopted financial intelligence unity model, of its
structure and duties, as well as its relationship with the others actors of the anti-money
laundering policy. Hence, it is verified that although it presents some critical issues, the
institutional arrangement which involves COAF was well built, and, finally it is
concluded that the arrangement is suitable for COAF´s activities, and if improved, mainly
in regard to its structure, will assure more effectiveness to Brazilian anti-money
laundering policy.
Key words: Money laundering. COAF. Institucional arrangement. Policy.

INTRODUÇÃO

Não obstante o novo contexto da era globalizada tenha trazido em seu bojo
inúmeros benefícios, tais como o desenvolvimento das comunicações, o intercâmbio de
ideias e conhecimento e a integração econômica dos países por meio do maior fluxo de
bens, serviços e mão de obra, há que se observar que a eliminação de barreiras também
apresenta aspectos negativos, dentre os quais se destacam a expansão dos grupos
criminosos que antes atuavam em âmbito regional e o redesenho da criminalidade para
além das fronteiras, a qual não mais pode ser controlada pelos Estados, que tiveram seu
poder diluído3.

3
Nas palavras de Hobsbawn, “[...] a globalização, a vasta ampliação da mobilidade das pessoas e a
eliminação em grande escala dos controles fronteiriços na Europa e em outras partes do mundo tornam cada
vez mais difícil para os governos controlar o que entra e sai dos seus territórios e o que ocorre neles. É
tecnicamente impossível controlar mais do que uma fração mínima do conteúdo dos contêineres que
transitam pelos portos sem reduzir o ritmo da vida econômica diária quase pela metade. Os traficantes e os
comerciantes ilegais valem-se amplamente dessa facilidade, assim como da incapacidade dos Estados de
controlar ou mesmo monitorar as transações financeiras internacionais.” (HOBSBAWM, E. Globalização,
democracia e terrorismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 144-145.)

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A globalização contribuiu para que os criminosos tirassem proveito de suas


facilidades, em especial daquelas oriundas dos avanços tecnológicos, contribuindo para
expansão e para a organização da criminalidade tanto na seara nacional, como
internacional, de modo que, atualmente, os crimes não mais se restringem àqueles
praticados por sujeitos individuais e marginalizados, mas abrangem também uma esfera
mais sofisticada, conforme ensinam Bijos e Almeida4:

Nesse diapasão, o crime organizado tira proveito das facilidades que o


fenômeno da globalização proporcionou, para fazer o tráfico de armas, drogas
e outros produtos de seus interesses. A economia mais aberta traz, também, a
oportunidade para estes grupos criminosos registrarem companhias de
fachada, as quais praticam negociações quase legais, para ter como fim o
contrabando, a “lavagem” de dinheiro, a pirataria, a fraude financeira e outras
espécies de crimes. A rede criminosa tornou-se mais sofisticada devido ao
avanço tecnológico.

Nesse sentido, há que se observar que a prática criminosa, além de sofisticada,


passou a ser exercida por detentores do poder político e econômico, sendo que a lavagem
de dinheiro figura como uma etapa essencial a esse novo esquema, na medida em que
torna aparentemente lícitos os recursos advindos de atividade ilícita, propiciando sua
utilização tranquila e obstando a atividade investigativa.5
Note-se que a lavagem de dinheiro consiste em uma operação financeira ou
transação comercial com o intuito de ocultar ou dissimular a incorporação, transitória ou
permanente, no sistema econômico do país, de bens direitos ou valores que, direta, ou
indiretamente, são resultado de outros crimes, e cujo produto ilícito se pretende dar lícita
aparência.
Assim, verifica-se que a lavagem de dinheiro está intimamente atrelada à
prática dos demais crimes como corrupção, financiamento ao terrorismo, tráfico de
pessoas etc, pois torna aparentemente lícitos seus proveitos e permite seu reinvestimento
e a continuidade da prática de tais delitos. De acordo com relatório da UNODC – United

4
BIJOS, L. M. J.; ALMEIDA, M. J. M. A globalização e a 'lavagem' de dinheiro: medidas internacionais
de combate ao delito e reflexos no Brasil. Revista CEJ, Brasília, v. 19, p. 84-96, 2015. p. 88.
5
MACEDO, C. M. R. Lavagem de dinheiro: análise crítica das leis 9.613, de 03 de março de 1998 e
10.701 de 09 de julho de 2003. Curitiba: Juruá, 2006. p. 29. Segundo Romulo Braga “é importante
assinalar, não obstante, que o critério da utilização do vocábulo lavagem de dinheiro se explica pela
conversão ou transformação do ‘dinheiro sujo’ em ‘dinheiro limpo’, ou de ‘dinheiro frio’ em ‘dinheiro
quente’, que tem como característica determinante a introdução na economia de bens originários de
atividade ilícito, a qual representa um aumento no patrimônio do agente. Neste tipo de transação não se
busca exatamente rentabilidade, a não ser tranquilidade em virtude da origem ilícita de onde provém o
capital.” (BRAGA, Romulo Rhemo Palitot. Lavagem de dinheiro: fenomenologia, bem jurídico protegido
e aspectos penais relevantes. Curitiba: Juruá, 2013, p. 23)

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Nations Office on Drugs and Crime6:

[...] a lavagem de dinheiro é a primeira forma de alguém se engajar em


atividades criminais, pois é o método utilizado pelos contrafeitores para
disfarçar as origens ilegais de sua riqueza e proteger seus rendimentos, como
forma de evitar suspeitas por parte das instituições investigativas e de aplicação
da lei.

Especificamente no que tange ao Brasil, atualmente, a lavagem de dinheiro


encontra-se no cerne dos principais escândalos relacionados à corrupção e representa um
grave desafio a ser superado, se consideradas as sérias consequências que decorrem de
tal crime, pois além de contribuir para perpetuação do elevado índice de corrupção no
país, a lavagem de dinheiro também implica na diminuição de investimentos públicos em
benefício da sociedade e indiretamente acentua a desigualdade social.7
Nesse sentido, considerada a relevância do tema, o Brasil, nas últimas
décadas, vem investindo na implementação de políticas públicas de combate e prevenção
à lavagem de dinheiro, cujo principal marco regulatório consiste na promulgação da Lei
nº 9.613/98, que dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e
valores, aborda a prevenção da utilização do sistema financeiro para tais ilícitos e cria o
COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras.
Desse modo, o presente artigo se propõe a analisar o arranjo institucional do
COAF, órgão de inteligência financeira essencial para a efetividade de tais políticas, a
fim de averiguar sua adequação ao cumprimento de suas atividades, bem como identificar
eventuais oportunidades de aprimoramento.

2 POLÍTICAS PÚBLICAS DE PREVENÇÃO E COMBATE À LAVAGEM DE


DINHEIRO NO BRASIL E A IMPLEMENTAÇÃO DO COAF

Ante os graves efeitos da globalização que contribuíram para a sofisticação


da criminalidade, bem como para a expansão da lavagem de dinheiro em nível
internacional, impôs-se aos Estados o grande desafio buscar novas maneiras de prevenir
e combater tal crime. Nessa senda, a partir dos anos 80 foram editadas inúmeras
convenções internacionais, cujo conteúdo e compromissos propostos em âmbito

6
UNODC. O que é o crime de lavagem de dinheiro. Disponível em: <https://www.unodc.org/lpo-
brazil/pt/crime/o-que-e-o-crime-de-lavagem-de-dinheiro.html>. Acesso em: 08 jun. 2018.
7
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Disponível em:
<http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavagem-de-dinheiro/institucional>. Acesso em: 08 jun. 2018.

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internacional vieram a influenciar a atuação interna dos Estados.


Particularmente em relação ao Brasil, pode-se dizer que as convenções
internacionais tiveram grande importância na construção de um sistema de políticas
públicas de prevenção e combate à lavagem de dinheiro na esfera dos Estados.
Note-se que a expressão “políticas públicas” possui diversos significados e
pode ser compreendida sob diversas perspectivas: política, econômica, orçamentária,
jurídica, etc. Entretanto, considerando o caráter jurídico deste artigo, será adotada a
concepção de políticas públicas desenvolvida por Bucci8:

Política pública é o programa de ação governamental que resulta de um


processo ou conjunto de processos juridicamente regulados – processo
eleitoral, processo de planejamento, processo de governo, processo
orçamentário, processo legislativo, processo administrativo, processo
judicial – visando coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades
privadas para a realização de objetivos socialmente relevantes e
politicamente determinados.

Desse modo, políticas públicas, a partir de uma perspectiva jurídica, podem


ser compreendidas como ações governamentais decorrentes de um processo decisório
regulado cujo objetivo é organizar esforços para a realização de objetivos socialmente
importantes.
Frise-se que, os marcos regulatórios não se confundem com as políticas

8
BUCCI, M. P. O conceito de políticas públicas em direito. In: BUCCI, M; P; D. Políticas públicas:
reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 39. “A política criminal vocacionada à
prevenção e à repressão da lavagem de ativos e à retirada do produto ilícito do delito, bem como do
perdimento do patrimônio adquirido de forma ilegal, passou a impor ao sistema bancário e aos agentes
financeiros a obrigação de colaborar com a persecutio criminis, comunicando às autoridades competentes
toda vez que se deparem com atividade suspeita envolvendo quantias determinadas, além do dever de
comunicar às autoridades ou instituições respectivas movimentos e transações monetárias suspeitas.
É sabido que uma das maiores dificuldades na luta contra o delito de lavagem advém de seu complicado
polimorfismo. À exaustão, a doutrina, acolhendo o modelo explicativo do Grupo de Ação Financeira
(GAFI), destaca os ciclos do branqueamento, distinguindo objetivamente três etapas: i) da colocação
(placement); ii) da dissimulação dos ativos (layering); e iii) da integração dos bens, direitos ou valores à
economia regular (integration). Dessas três fases, o momento mais vulnerável para o agente do delito – e
no qual se pode impor um maior dever de prevenção – é o da primeira, quando o agente tenta introduzir no
sistema financeiro o produto do delito precedente. Nesse diapasão, é compreensível que a medida inicial
de prevenção ao branqueamento de capitais seja a imposição ao sistema bancário e às instituições de crédito
– na função de garantidores do sistema financeiro – um especial dever de diligência (due diligence) quando
da identificação do seu cliente e na comunicação de operações suspeitas.
Desse modo, procede a assertiva de que a normativa em matéria de lavagem de capitais está orientanda a
impedir o ingresso dos fundos maculados na economia formal mediante o adequado conhecimento do
cliente (fase da colocação), a detectar as operações ou transações suspeitas (principalmente na fase da
diversificação) e a identificar os ativos de origem delitiva por meio de uma eficiente investigação
patrimonial (na fase de integração). As legislações penais modernas acolhem dispositivos dessa natureza,
e não poeria ser diferente com a nossa Lei n. 9.613/98, nos arts. 9º, 10 e 11.” (RIOS, Rodrigo Sachez.
Direito penal econômico: advocacia e lavagem de dinheiro: questões de dogmática jurídico penal e de
política criminal. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 46-49)

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públicas em si, de modo que o conjunto de leis de determinado ramo do direito


representam apenas uma das expressões da política pública, a qual apresenta também
outras medidas administrativo-financeiras9.
Diante de tais definições, verifica-se que um sistema de políticas públicas
de prevenção e combate à lavagem de dinheiro implica em uma rede complexa de ações
governamentais resultantes de um intrincado processo decisório regulado, o qual
perpassa diversas dimensões e tem como uma das expressões de seu programa a edição
de diplomas legais antilavagem.
Particularmente em relação ao Brasil, verifica-se que a primeira influência
externa que veio a corroborar para a construção do referido sistema data de 1991,
quando o país se tornou signatário da Convenção de Viena, editada em 1988,
incorporando suas normas ao direito pátrio por meio do Decreto nº 154/91.
A referida convenção, de forma pioneira, ao tratar do tráfico ilícito de
entorpecentes e substâncias psicotrópicas, apresentou uma definição sobre o crime de
lavagem de dinheiro, hoje aceita mundialmente. Saliente-se que todos os países que
ratificassem o tratado se obrigavam a criar um tipo penal visando à responsabilização
pela ocultação de bens ou valores oriundos do tráfico internacional de drogas.
Ainda, no tocante às normas internacionais que vieram a influenciar o
tratamento do crime de lavagem de dinheiro no Brasil destacam-se a Convenção de
Palermo, de 2000, ratificada pelo Brasil em 2004; e a Convenção de Mérida, de 2003,
ratificada pelo Brasil em 2006. Note-se que a primeira apresentou conceitos relevantes
sobre o crime organizado e fez referências à lavagem de dinheiro, em especial no que
tange aos mecanismos de prevenção, além de trazer outros tipos penais que poderiam
ser considerados crimes antecedentes, ampliando o objeto material do crime de
lavagem e foi incorporada ao direito brasileiro pelo Decreto nº 5015/04. A segunda,
incorporada ao direito nacional por meio do Decreto nº 5687/06, embora tenha como
escopo o combate à corrupção, apresentou pontos específicos relacionados à lavagem
de dinheiro, quais sejam: necessidade de cooperação internacional para investigação;
ênfase na regulamentação e fiscalização das instituições financeiras, bem como de
valores e títulos que cruzam as fronteiras.
Outrossim, ainda no que tange às influências externas, faz-se mister

9
DUARTE, C. S. O ciclo das políticas públicas. In: SMANIO, Gianpaolo Poggio; BERTOLIN, Patrícia
Tuma Martins; BRASIL, Patricia Cristina. O Direito e as Políticas Públicas no Brasil. São Paulo: Atlas,
2013. p. 19.

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observar que em 2010 o Brasil passou a integrar o Grupo de Ação Financeira


Internacional contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo –
GAFI/FATF, criado em 1989, no âmbito da OCDE - Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico e hoje consiste no foro de maior relevância nas discussões
internacionais relacionadas ao combate à lavagem de dinheiro e o financiamento do
terrorismo, tendo sua importância reconhecida por diversas outras organizações
internacionais, tais como o Conselho de Segurança das Nações Unidas10. Frise-se que seu
escopo é definir parâmetros internacionais de combate e prevenção a tais crimes, por meio
de recomendações e avaliações periódicas do cumprimento destas.11 Ademais, não se
pode deixar de mencionar a participação do Brasil no GAFI-LAT Grupo de Ação
Financeira da América Latina, grupo análogo ao GAFI, de âmbito regional, o qual
compreende 16 países da América Latina e cujo objetivo é a melhora contínua das
políticas nacionais contra lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo, bem como
o aprimoramento dos diferentes mecanismos de cooperação entre os países membros.12
Assim, compreendida a conjuntura internacional que, desde o início tem
influenciado a elaboração de políticas públicas no Brasil, faz-se necessário destacar as
principais medidas internas nesse sentido.
Saliente-se que em decorrência da Convenção de Viena, foi promulgada
no Brasil a Lei nº 9.613/98, principal marco regulatório antilavagem do país, o qual
posteriormente foi alterado pela Lei nº 12.683/12 a fim de promover adequações e
aperfeiçoamentos.
Note-se que, além de tipificar a lavagem de dinheiro, a lei antilavagem
instituiu também o COAF, constituindo uma unidade de inteligência financeira

10
“Criado em 1989 pelo G-7, o GAFI é um organismo intergovernamental cujo objectivo é o de desenvolver
e promover uma resposta internacional para o combate ao branqueamento de capitais e financiamento de
terrorismo. É um organismo que elabora políticas, reunindo peritos em questões jurídicas, financeiras e de
aplicação da lei para levar a cabo reformas de leis e regulamentos nacionais em matéria ABC e CFT,
uniformizando-as com vista a uma luta eficaz, objectiva e de promoção conjunta de estratégias.
(...)
O GAFI adoptou um conjunto de 40 recomendações, que constituem um sistema abrangente universal em
todos os países do mundo. As 40 recomendações estabelecem princípios de acção; permitem aos países
flexibilizar a aplicação dos princípios de acordo com as respectivas circunstâncias particulares e requisitos
constitucionais. Aesar de não serem vinculativas, elas têm sido amplamente reconhecidas pela comunidade
internacional e pelas organizações relevantes, como os padrões internacionais ABC” (SATULA, Benja.
Branqueamento de capitais. Lisboa: Universidade Católica, 2010, p. 53-54)
11
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Grupo de Ação Financeira Internacional – GAFI. Disponível em:
<http://www.justica.gov.br/sua-protecao/cooperacao-internacional/atuacao-internacional-2/foros-
internacionais/grupo-de-acao-financeira-internacional-gafi>. Acesso em: 09 jun. 2018.
12
GAFILAT. Quem somos. O órgão internacional. Disponível em: <http://gafilat.org.iplan-unix-
03.toservers.com/conte nt/quienes/&lang=pt>. Acesso em: 09 jun. 2018.

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brasileira, a qual atua eminentemente na prevenção e combate à lavagem de dinheiro e


ao financiamento do terrorismo13. Outrossim, é imperioso ressaltar a importância do
COAF, o qual também configura o órgão líder da representação do Brasil perante o
GAFI-LAT.
Todavia, de acordo com Araújo14, inicialmente os informes do COAF não
tinham muita utilidade, pois as técnicas de investigação policial eram ainda rudimentares,
as estratégias processuais da acusação eram inadequadas, e o Judiciário ainda era
resistente as medidas penais mais duras do novo regime instituído pela Lei nº 9.613/98,
de tal sorte que se prescindia de uma cultura institucional e havia uma baixa difusão do
tema, até mesmo dos órgãos persecutórios, o que resultava em quase nenhuma
investigação por crimes de lavagem de dinheiro. Segundo Lenio Streck, “[...] de 1998
até 2010, período em que está vigor a Lei de Lavagem de Dinheiro, não mais de 17
processos tiveram resultado condenatório (paradoxalmente, mantemos presos em terra
brasilis mais de 80.000 pessoas pelo crime de furto...!)”15
Assim, cinco anos após a promulgação da Lei n.º 9.613/98, ocorreu a
instituição de outra relevante iniciativa brasileira em direção à criação de um sistema de
políticas públicas antilavagem: a criação da Estratégia Nacional de Combate à Lavagem
de Dinheiro - ENCLA, um mecanismo de articulação interinstitucional (o qual não
consiste em um órgão público e, portanto, não é ente da Administração Pública) vetor de
políticas públicas inicialmente relacionadas à antilavagem, sendo que no final de 2006,
passou a abranger também o fomento de políticas públicas anticorrupção, quando foi
adicionada mais uma letra “c” (significando corrupção) à sigla que a identifica, passando
a ser denominada ENCCLA.
Frise-se que tal estratégia, atualmente é composta por mais de 70 órgãos, dos
três poderes da República, Ministérios Públicos e da sociedade civil, sendo o COAF um
de seus membros.
Insta salientar que, embora a estratégia ainda precise superar alguns
obstáculos rumo à elaboração de políticas públicas de combate e prevenção à corrupção
e à lavagem de dinheiro mais eficientes, a exemplo da questão orçamentária, como bem

13
COAF. Competências. Disponível em: <http://www.coaf.fazenda.gov.br/acesso-a-
informacao/Institucional/compete ncias>. Acesso em 14 abr. 2018.
14
ARAÚJO, F. D. Uma análise da Estratégia Nacional Contra a Corrupção e a lavagem de dinheiro
(ENCCLA) por suas diretrizes. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 2, n. 1, p. 53-82,
jan./jun. 2012. p. 64.
15
STRECK, Lenio. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do
Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 35.

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apontam Mohallem e Ragazzo16, não se podem negar os inúmeros e relevantes resultados


da estratégia, bem como o fato de que esta foi reconhecida internacionalmente pelo GAFI
como uma iniciativa única, conforme explica Biasoli17.
Depreende-se, destarte, que o COAF possui uma enorme relevância enquanto
ator na execução da política pública brasileira de combate e prevenção à lavagem de
dinheiro, não apenas como órgão de inteligência financeira, mas também como órgão
líder da representação perante o GAFI-LAT e membro da ENCCLA.
Segundo Bucci18, arranjo institucional pode ser entendido como um conjunto
de disposições, medidas e iniciativas em torno de uma ação governamental, isto é, de uma
política pública, sendo que compreende seu marco geral de ação, incluindo uma norma
instituidora da qual conste o quadro geral de organização da atuação do Poder Público,
com a discriminação da autoridades competentes, as decisões previstas para a
concretização da política, além do balizamento geral das condutas dos agentes privados
envolvidos, tanto os protagonistas da política quanto os seus destinatários ou pessoas e
entes por ela afetados. Ainda segundo a autora, o arranjo comporta uma análise
específica, de forma que seus componentes podem indicar aptidão para maior ou menor
resultado, considerando um número de variáveis.
Assim, a seguir será realizada a análise do arranjo institucional que expressa
a política antilavagem no que se refere à implementação e atuação do COAF, determinado
sua estrutura, seus deveres, responsabilidades e relações com os demais atores.

3 O COAF E SEU ARRANJO INSTITUCIONAL

A instituição do COAF deu a partir da edição da Lei n. 9.613/98, enquanto


unidade de inteligência financeira do Brasil, subordinada ao Ministério da Fazenda, com
o objetivo de recepcionar, analisar e retransmitir aos órgãos públicos competentes para
investigação e persecução penal informações estratégicas que constituam indícios de

16
MOHALLEM, M. F.; RAGAZZO, C. E. J. Diagnóstico Institucional: primeiros passos para um plano
nacional anticorrupção. Rio de Janeiro: FGV Direito Rio – CJUS, 2017, p. 52. Disponível em:
<http://bibliotecadigital.fgv.br/ dspace/handle/10438/18167>. Acesso em 14 abr. 2018.
17
BIASOLI, R. ENCCLA: um exemplo de união. In: Secretaria Nacional de Justiça. ENCCLA - Estratégia
nacional de combate à corrupção e à lavagem de dinheiro: 10 anos de organização do estado brasileiro
contra o crime organizado. Brasília, Ministério da Justiça, 2012 p. 58. Disponível em:
<http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavage m-de-dinheiro/arquivos_anexos/enccla-10-an os.pdf>.
Acesso em: 18 out. 2017.
18
BUCCI, Maria Paula Dallari. Fundamentos para uma Teoria Jurídica das Políticas Públicas. 1. ed. São
Paulo: Saraiva, 2013. v. 1. p. 179
p. 179.

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cometimento do crime de lavagem de dinheiro.19


Há que se observar que a instituição do COAF no Brasil se encontra alinhada
às demandas internacionais, uma vez a Convenção de Palermo propõe a instituição de
Unidades de Inteligência Financeiras - UIF’s, e o GAFI – FATF recomenda que se uma
instituição financeira suspeitar ou tiver motivos razoáveis para suspeitar que os fundos
sejam produtos de atividade criminosa ou estejam relacionados ao financiamento do
terrorismo, ela deveria estar obrigada, por lei, a comunicar prontamente suas suspeitas à
unidade de inteligência financeira.20
Outrossim, deve-se ressaltar que, em consequência da instituição do COAF,
desde 1999 o Brasil passou a integrar o Grupo Egmont, um grupo informal de UIF’s
fundado em 1995 no Palácio de Egmont Arenberg em Bruxelas, Bélgica, visando a
estimular a cooperação nacional por meio de encontros anuais com o intuito de discutir
novas formas de intercâmbio de informações, treinamento e troca de experiências.
Insta salientar que, segundo definição adotada pelo Grupo Egmont21, o termo
unidade de inteligência financeira deve ser compreendido como:

Um centro nacional para recebimento e análise de: a) reportes de transações


suspeitas; b) outras informações relevantes para lavagem de dinheiro, crimes
antecedentes associados, financiamento do terrorismo e para a disseminação
dos resultados dessa análise. A FIU deve ainda ser capaz de obter informações
adicionais de entidades relatoras, e deve possuir acesso a informações
administrativas, financeiras e legais necessárias para desempenhar
adequadamente suas funções (tradução nossa).

Em suma, são consideradas unidades de inteligência financeira as agências


centrais que obtém, processam e compartilham informações financeiras com a autoridade
governamental adequada a fim de contribuir com o combate e a prevenção à lavagem de
dinheiro. Note-se a importância de tal definição, a fim de não confundir as unidades de
inteligência financeiras com outras entidades públicas de investigação de crimes

19
Segundo Marco Antonio de Barros, “criou-se o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras
com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar, identificar e investigar as
ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas na Lei de Lavagem, sem prejuízo da competência dos
demais órgãos e entidades governamentais envolvidos nesse combate.” (BARROS, Marco Antonio de.
Lavagem de capitais: crimes, investigação, procedimento penal e medidas preventivas. Curitiba: Juruá,
2017, p. 187)
20
COAF. Padrões internacionais de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento ao terrorismo e
da proliferação: as recomendações do GAFI. 2012. Disponível em:
<http://www.coaf.fazenda.gov.br/links-externos/As% 20Recomendacoes%20GAFI.pdf>. Acesso em 13
jun. 2018.
21
EGMONT GROUP. Information paper on financal intelligence units and the Egmont Group. Disponível
em: <ht tp://216.55.97.163/wp-content/themes/bcb/bdf/int_regulations/egmont/EGinfo-web_en.pdf>.
Acesso em: 13 jun. 2018.

76
Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 2, jul./dez. 2018

financeiros, às vezes, também reconhecidas pelo acrônimo FIU – Financial Investigating


Unit.22
Nesse sentido, considerando que o COAF consiste em uma UIF, faz-se mister
ressaltar que tais unidades podem ser constituídas de acordo com um dos quatro modelos
estipulados pelo Grupo Egmont, quais sejam: a) Modelo Judicial; b) Modelo policial
judiciário c) Modelo Administrativo d) Modelo Híbrido.23
O modelo judicial ou promotorial, de acordo com tal classificação, é
estabelecido dentro da instância judiciária, particularmente, sob a jurisdição do Ministério
Público, sendo que tal modelo é comum em países de tradição continental em que a
promotoria integra o sistema judiciário e possui autoridade sobre os órgãos investigativos,
atuando como fiscal e norteadora das investigações criminais. Ainda, esse modelo
funciona bem em países onde há uma rígida Lei de Sigilo bancário, sendo necessária a
atuação judicial-promotorial no sentido de garantir a cooperação das instituições
financeiras24. Nesse modelo, o Ministério Público será responsável por receber as
informações sobre atividades financeiras suspeitas reveladas pelas agências investigativas
do setor financeiro de um país, possibilitando a aplicação de poderes judiciais como
indisponibilidade de fundos, congelamento de contas bancárias, realização de
interrogatórios e emissão de ordens de prisão, por exemplo.25
Por sua vez, o modelo policial judiciário consiste em unidades criadas como
parte do aparato policial, as quais detém poder investigatório. Operacionalmente, este
modelo estará mais próximo às demais agências policiais e investigativas, a exemplo das
unidades de crimes financeiros e poderá se beneficiar de sua experiência e fontes de
informação. Em contrapartida, as informações recebidas poderão ser acessadas e
utilizadas nas investigações26. Outrossim, esse modelo implementa novas medidas
antilavagem à margem do sistema de leis já existentes, o que pode ensejar uma
multiplicidade normativa, bem como a concorrência de competência entre as autoridades
judiciárias.27
O modelo administrativo consiste em uma autoridade administrativa

22
BUSINESS CRIME BUREAU. Information paper on The Egmont Group and Financial Intelligence
Units. Disponível em: <http://216.55.97.163/wp-content/themes/bcb/bdf/int_regulatio ns/egmont/EGinfo-
web_en.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2018.
23
EGMONT GROUP, op. cit.
24
WORLD BANK. International Monetary Fund. Financial Intelligence Units: an Overview. Washington,
2004, p.15. Disponível em: <https://www.imf.org/external/pubs/ft/FIU/fiu.pdf>. Acesso em 09 jun. 2018.
25
EGMONT GROUP, op. cit.
26
WORLD BANK, op. cit., p. 13-14.
27
EGMONT GROUP, op. cit.

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Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 2, jul./dez. 2018

centralizada e independente, que recebe e processa as informações do setor financeiro e


as transmite para as autoridades legais ou judiciárias competentes para persecução penal,
uma vez que não possui tais poderes. Em geral essas entidades autônomas estão
subordinadas a um Ministério, agência reguladora ou constituem-se sob a forma de
autarquias. Nesse caso, a unidade de inteligência funciona como um amortecedor na
relação entre o Estado e o setor financeiro privado, uma vez que procura amenizar o
impacto negativo inerente a um ambiente marcado por suspeitas de cometimento de
crimes por parte das instituições financeiras sobre seus próprios clientes.28
Por fim, o modelo híbrido, consiste em unidades que combinam elementos de
pelo menos dois modelos supracitados.
Diante dos modelos apresentados e, considerando que o COAF se insere no
âmbito do Ministério da Fazenda, o qual atua como receptor das informações relacionadas
a atividades financeiras suspeitas (ou também denominadas, pelo próprio COAF, de
atípicas), sendo responsável por transmiti-las às autoridades competentes, verifica-se que
o Brasil adotou o Modelo Administrativo de UIF.
Ressalta-se que todos os modelos supramencionados apresentam vantagens e
desvantagens na sua aplicação. Em relação ao modelo administrativo destacam-se como
vantagens: a atuação da UIF como canal de comunicação entre o setor financeiro e outros
setores sujeitos ao dever de notificação, e autoridades competentes para investigação e
persecução judicial, suavizando tal relação e propiciando a obtenção de informações;
fornecimento das informações com maior confiança por parte das instituições financeiras,
uma vez que sabem que a divulgação se restringe às suspeitas de lavagem de capitais e
que tais informações serão processadas, analisadas e confrontadas com outras
informações obtidas por outras fontes; atuação da UFI como ente “neutro”, técnico e
especializado; facilitação da comunicação com outras UFIS em razão da sua neutralidade
e autonomia. De outra banda, o modelo administrativo apresenta as seguintes
desvantagens: prescinde de agilidade na aplicação de medidas de repressão e prevenção
de cunho judicial; as informações colhidas e processadas em relatórios de inteligência
não configuram prova em juízo, mas representam apenas indícios de delito; em geral, as
unidades subordinam-se a um controle político, exceto quando assumem a forma de
organismos públicos independentes, a exemplo das autarquias.29
Observa-se, portanto, que, embora o modelo administrativo do COAF confira

28
WORLD BANK, op. cit., p. 10-11.
29
Ibidem, 2004, p. 11.

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ao Brasil muitas vantagens em relação à eficiência de sua atividade, este também


apresenta alguns pontos negativos que devem ser mitigados, e que tem gerado debates
quanto ao seu tratamento.
No que tange à utilização das informações recebidas e processadas pelo
COAF, cumpre esclarecer, que, de acordo com Bechara30, o Relatório de Inteligência
Financeira - RIF, o qual consolida as referidas informações, não constitui meio de prova,
ainda que assim tenha sido mencionado em acórdãos de casos relacionados à lavagem de
dinheiro referentes à recente Ação Penal nº 470 do STF. Segundo o autor, a expressão
“prova” teria sido utilizada em tais decisões de forma genérica. Na realidade, em um dos
casos, o RIF tinha o condão de confirmar a omissão da instituição financeira em
comunicar determinadas operações, as quais esta estava obrigada por lei a informar e
constituiria um mero ato de documentação, uma vez que o documento em si, na qualidade
de meio de prova estaria representado pelo ato de comunicação do banco ao COAF em
que as operações foram omitidas. Na outra hipótese, o relatório do COAF é utilizado
como fonte de referência para a constatação de um dos réus era representante legal de
duas pessoas jurídicas, de modo que o RIF constitui, então, um ato de documentação
somente, não se tratando de documento, nem mesmo de qualquer outro meio de prova,
pois, o meio de prova nesse caso é o contrato social das pessoas jurídicas em que a ré
figurava como representante legal. Na mesma linha, a exemplo do acórdão do STJ
referente ao HC 191.378/DF – STJ, o RIF é considerado um meio de obtenção ou pesquisa
de fontes de prova, sem valor persuasivo, sendo o meio de prova o dado constante no
relatório.
Observa-se que, embora as informações recebidas e processadas pelo COAF
não constituam meio de prova, uma vez que configuram atividade de inteligência, a qual
não possui valor probatório, o RIF, ainda assim é de suma relevância para o processo
penal, pois pode ser considerado um meio de obtenção de provas, bem como um ato de
documentação do ponto de vista formal.
Em relação à sujeição do COAF a um controle político, Romantini31 explica:

O mais grave dessa questão é que o COAF, como um órgão administrativo que

30
BECHARA, F. R. Desafios na investigação de organizações criminosas: meios de obtenção de prova;
relatório de inteligência financeira. Revista jurídica ESMP-SP, São Paulo, v.10, p. 159-186, 2016. p. 181-
182.
31
ROMANTINI, G. L. O desenvolvimento institucional do combate à lavagem de dinheiro no Brasil desde
a lei 9.613/98, 2003. 226 f. (Dissertação de Mestrado em Ciências Econômicas) – UNICAMP, Campinas,
2003. p. 138.

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Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 2, jul./dez. 2018

não dispõe de prerrogativas semelhantes às do Ministério Público para evitar


pressões externas, fica sujeito aos mais diversos interesses, inclusive aos de
ordem política. É fundamental que um órgão com o poder que o COAF possui,
em função do caráter das informações que recebe de todo o Brasil e do exterior,
esteja submetido a algum tipo de controle externo, a fim de não se tomar um
instrumento de chantagens, favores políticos e impunidade. O ideal é que o
Ministério Público, pela natureza de suas atribuições e de suas
responsabilidades, participe desse mecanismo de controle.

Desse modo, observa-se que no Brasil, o problema de sujeição ao controle


político decorrente do modelo administrativo é agravado pela ausência de algum tipo de
controle externo.
Além de adotar o modelo administrativo, de acordo com o Decreto n.
2799/98, o qual aprova o Estatuto do COAF, este é um órgão de deliberação coletiva com
atuação em todo território nacional, que integra do Ministério da Fazenda, e é autorizado
a manter núcleos descentralizados.
As atribuições do COAF constam do artigo 14 da Lei nº 9.613/98 e resumem-
se em disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as
ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei, sem prejuízo da
competência de outros órgãos e entidades.
Note-se que o COAF tem atribuição, também, para coordenar e propor
mecanismos de cooperação e de troca de informações que viabilizem ações rápidas e
eficientes no combate à ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores, podendo
requerer aos órgãos da Administração Pública as informações cadastrais bancárias e
financeiras de pessoas envolvidas em atividades suspeitas.
Ainda, de acordo com o artigo 15 da Lei n.º 9.613/98, o COAF comunicará
às autoridades competentes para a instauração dos procedimentos cabíveis, quando
concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de fundados indícios de sua prática,
ou de qualquer outro ilícito.
Como bem expõe Oliveira32, a legislação concede ao COAF poder funcional
de analisar, receber e identificar ocorrências suspeitas de lavagem de dinheiro; poder
funcional de aplicar multas administrativas e poder funcional regulamentar o tema
lavagem de dinheiro para as entidades abrangidas pela lei, mesmo que não estejam
sujeitas a nenhum regulador ou fiscalizador específico, como os bancos, que estão sujeitos
às normas que emanam do Banco Central.

32
OLIVEIRA, B. Q. As limitações impostas pelo princípio da legalidade ao poder regulamentar do
conselho de controle de atividades financeiras. Justiça do Direito, Passo Fundo, v. 30, p. 421-443, 2016. p.
434.

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Assim, diante das atribuições e poderes concedidos ao COAF, constata-se que


a sua atividade não é investigativa, tampouco, confunde-se com uma agência reguladora.
Segundo Bechara33, o COAF é um órgão de assessoramento aos órgãos reguladores e
outros órgãos de justiça criminal, sendo que sua atividade tem a qualidade de inteligência.
Em relação a sua estrutura, tem-se que o COAF é composto por servidores
públicos designados pelo Ministro de Estado da Fazenda, dentre os integrantes do quadro
de pessoal efetivo do Banco Central do Brasil, da Comissão de Valores Mobiliários, da
Superintendência de Seguros Privados, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da
Secretaria da Receita Federal do Brasil, da Agência Brasileira de Inteligência, do
Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Justiça, do Departamento de Polícia
Federal – PF, do Ministério da Previdência Social e da Controladoria-Geral da União,
atendendo à indicação dos respectivos Ministros de Estado.
Note-se que sua estrutura organizacional compreende: um presidente,
nomeado pelo Presidente da República, mediante indicação do Ministro da Fazenda; a
Secretaria Executiva, dirigida por um secretário-executivo designado pelo Ministro da
Fazenda; o Plenário, composto por oito conselheiros designados pelo Ministro da
Fazenda, mediante indicação dos Ministros do Estado, sendo que tal função não exige
dedicação exclusiva; e a diretoria de análise e fiscalização. Enquanto a Secretaria possui
a função de proporcionar suporte técnico e administrativo às atividades do COAF, o
plenário é responsável por zelar pelo cumprimento das leis, de seu estatuto e regimento
interno, bem como decidir e aplicar as sanções administrativas previstas para as pessoas
que não possuam órgão fiscalizador próprio, além de coordenar e propor mecanismos de
colaboração e troca de informações que viabilizem ações rápidas e eficientes. Por sua vez,
à diretoria de análise e fiscalização compete planejar, dirigir, coordenar e orientar as
atividades relacionadas ao macroprocesso de inteligência financeira.34
Depreende-se de tal estrutura que o COAF não possui quadro de pessoal
próprio, sendo que seus servidores são requisitados de outros órgãos da Administração
Pública, o que pode comprometer a qualidade de suas atividades, se não houver
investimento em treinamento e especialização adequada, uma vez que como bem explica
Romantini35, as estruturas financeiras e comerciais utilizadas nos esquemas de lavagem

33
BECHARA, op. cit., p. 174.
34
COAF. Estrutura. 2018. Disponível em: <http://coaf.fazenda.gov.br/acesso-a-
informacao/Institucional/organograma >. Acesso em: 14 jun. 2018.
35
ROMANTINI, op. cit., p. 108.

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de dinheiro são demasiadamente complexas e, portanto, exigem uma grande qualificação


dos servidores em relação a conhecimentos teóricos e práticos, não apenas sobre
investigação, mas também sobre sofisticadas operações financeiras e comerciais.
Ademais, há que se observar que o referido problema tende a ser agravado
pelo baixo número de servidores do qual o COAF dispõe. Frise-se que o Conselho já foi
objeto de recomendações no sentido de ampliação do quadro de servidores na ocasião do
Acórdão do TCU nº 1213/2005, bem como da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito
– CPMI Correios (2006), cujo relatório final considerou que os níveis de atividade do
COAF demandariam um quadro técnico composto de aproximadamente 150 servidores e
propôs a transformação do Conselho em uma Agência Nacional de Inteligência
Financeira, ainda que vinculada ao Ministério da Fazenda. Tal alteração teria como
escopo conferir maior autonomia ao órgão, além de dotá-lo de estrutura permanente de
servidores técnicos e administrativos qualificados que, independente da mudança dos
componentes da direção, tenham condições de manter o funcionamento adequado e
ininterrupto de suas atividades, bem como memória de sua atuação e processos.36
Nessa senda, o Relatório do GAFI-FATF de avaliação mútua, de 2010, do
Brasil, reconhece que o COAF não possui competência de supervisão adequada, nem
pessoal suficiente.37
Ainda, cabe ressaltar que após 10 anos, o problema persiste, pois, segundo
seu Relatório de Gestão do exercício de 2016, o COAF dispõe de apenas 48
servidores/empregados públicos, 03 empregados públicos em capacitação, 05
terceirizados em funções administrativas e 22 estagiários. Frise-se que tal questão foi
agravada com o advento da lei nº 12.683/2012, que ampliou o rol de setores econômicos
que devem participar do esforço de prevenção e combate à lavagem de dinheiro e ao
financiamento do terrorismo, o que aumentou o número de setores sob supervisão do
COAF e, com isso, trouxe inúmeros desafios ao Conselho, sobretudo na área de
fiscalização, que deve abranger um universo significativo de pessoas físicas e jurídicas
que integram os setores econômicos supervisionados pelo COAF. Ainda, o mesmo
documento afirma que os riscos inerentes à gestão de pessoas estão relacionados,
principalmente, à falta de pessoal, gerando uma dependência da cessão de servidores de

36
CONGRESSO NACIONAL. Relatório final da CPMI dos correios VIII, Brasília, 2006, p.1747-1751.
Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/84897>. Acesso em 14 jun. 2018.
37
COAF. Relatório de avaliação mútua do Brasil, 2010, p. 9. Disponível em:
<http://www.coaf.fazenda.gov.br/menu /avaliacao-mutua-do-brasil>. Acesso em: 14 jun. 2018.

82
Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 2, jul./dez. 2018

carreiras de outros órgãos, ou, ainda, a nomeação de servidores comissionados sem


vínculo com a Administração Pública. Ao ter sua demanda de ingresso de 30 servidores
para o ano de 2016 denegada perante à Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda em
razão da impossibilidade de realização de concursos públicos no ano de 2016, o COAF
formalizou novo pedido para o ano de 2017. Além do mais, o COAF tem buscado, junto
à Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, concentrar sua demanda de pessoal nos
servidores das carreiras do próprio Ministério da Fazenda e de carreiras que possam ter
exercício descentralizado, a fim de tentar mitigar os riscos relacionados à falta de
servidores.38
Ademais, Rodrigues39 aponta outro aspecto que se deve considerar em relação
à estrutura e composição do COAF. Para o autor, o modelo institucional do COAF se
torna problemático quando se observa que com o objetivo de compartilhar informações
estratégicas, este órgão colegiado é dirigido por representantes de diversas carreiras da
burocracia estatal, cujas relações, por vezes resultam em atritos aparentemente
corporativistas.
A corroborar, o já mencionado Relatório da CPMI dos Correios expande a
dificuldade de interação para o âmbito externo, ao afirmar que a falta de incentivos legais
e políticos para que os órgãos de fiscalização atuem em conjunto funciona como um fator
complicador estrutural, em especial no que tange à relação entre COAF e órgãos de
supervisão bancária.40
Nessa mesma linha, na pesquisa de 2002, intitulada “Uma análise crítica da
lei dos crimes de lavagem de dinheiro”, realizada pelo Conselho da Justiça Federal, com
o objetivo de conhecer como as instâncias da Polícia Federal, Ministério Público Federal
– MPF e juízes federais percebiam o controle jurídico formal existente da lavagem de
dinheiro, constatou-se, dentre as dificuldades elencadas pelos procuradores da república:
a dificuldade de obtenção de cópias dos procedimentos administrativos que contenham
indícios de crimes antecedentes; a atuação do COAF foi considerada não sistemática e
coordenada no repasse das informações para investigação; falta de treinamento de todos
os órgãos envolvidos com o tratamento das informações, principalmente do COAF, MP

38
COAF. Relatório de gestão – exercício 2016, Brasília, 2017, p. 31 Disponível em:
<http://www.coaf.fazenda.gov.br /links-externos/5-relatorio-de-gestao-de-2016.pdf/view>. Acesso em: 14
jun. 2018.
39
RODRIGUES, P. P. COAF: Unidade de Inteligência Financeira no Brasil, 2008. 59 f. (Dissertação para
conclusão do curso de Direito) – USP, São Paulo, 2008. p. 12-13.
40
CONGRESSO NACIONAL, 2006, p. 1662.

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e Polícia Federal. Há que se observar que tais críticas ao COAF denotam o problema de
coordenação e interação dos próprios membros do COAF, bem como destes com órgãos
externos, como o MP e a PF. Como sugestões aventadas pelos procuradores da república,
na mesma pesquisa destacam-se: acesso do MP às informações colhidas pelo COAF;
maior estrutura do COAF; inserção do MPF como membro do COAF; criação de um setor
de inteligência no âmbito do MPF, interligado ao COAF. Outrossim em um dos
comentários dos juízes federais, tem-se que uma das prováveis razões para a aplicação da
Lei nº 9.613/98 ser classificada como tímida e incipiente no momento de realização da
pesquisa, seria a falta de disposição política do COAF no sentido de desenvolver um
trabalho integrado com as instituições vistas com desconfiança pelo Executivo (MPF,
judiciário).41
Nesse ponto vale destacar que, apesar de ter havido avanços nessa seara, o
problema ainda persiste e o COAF tem ciência das implicações negativas que as situações
conflituosas entre seus membros, bem como destes com outros atores institucionais, como
outros órgãos supervisores, MP e judiciário podem vir a ter sobre a eficiência no
tratamento da lavagem de dinheiro.
Nesse sentido, em seu Relatório de Gestão de 2016, destaca como um dos
dois Projetos Estratégicos Corporativos – PEC do Ministério da Fazenda que estão sob
sua responsabilidade a otimização dos processos de trabalho do COAF, sobretudo suas
interfaces com os processos de outras unidades do Ministério da Fazenda e outros atores
com competências ou interesse em prevenção e combate da lavagem de dinheiro,
mediante a adoção de solução tecnológica avançada e a proposição de plano de
fortalecimento de suas estruturas organizacionais.
Em suma, as principais críticas ao arranjo institucional que implementou o
COAF estariam relacionadas à estrutura insuficiente do órgão, o que reflete diretamente
na qualificação e especialização dos servidores e a precariedade na integração e
coordenação das relações entre os membros do COAF, bem como destes para com atores
externos inseridos no sistema de combate e prevenção de lavagem de dinheiro.
Ressalte-se que tais críticas correspondem a limitações em suas atividades
que estão intimamente ligadas às desvantagens do sistema administrativo, em especial no

41
JUSTIÇA FEDERAL. Conselho da Justiça Federal. Uma análise crítica da lei dos crimes de lavagem de
dinheiro. Brasília: Conselho de Justiça Federal, 2002. Série Pesquisas do CEJ, v. 9. Disponível em:
<http://www.cjf.jus.br /cjf/corregedoria-da-justica-federal/centro-de-estudos-judiciarios-1/publicacoes-
1/pesquisas-do-cej/uma-analise-critica-da-lei-dos-crimes-de-lavagem-de-dinheiro>. Acesso em: 18 abr.
2018.

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Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 2, jul./dez. 2018

que tange à falta agilidade na aplicação de medidas de repressão e prevenção de cunho


judicial e à submissão ao controle político.
Outrossim, diante do panorama traçado em relação ao arranjo institucional
que implementa o COAF e suas atribuições, é possível confirmar que este possui um
papel central no sistema de políticas públicas de combate e prevenção à lavagem de
dinheiro. Porém, para garantir que suas atividades venham a contribuir ao máximo para
a eficácia plena das políticas públicas antilavagem, devem ser superados alguns desafios,
a fim de mitigar as desvantagens inerentes ao modelo adotado e as falhas na sua execução.
Nessa esteira, Bucci42 considera a coordenação como elemento essencial para
efetividade das políticas públicas, assegurando ser primordial a criação de um arranjo
institucional sistêmico, ou seja, a organização concreta e operacional dos agentes
envolvidos na política pública a partir de um encadeamento de normas e efeitos, a fim de
trazer ordem à multiplicidade de normas e estruturas e possibilitar o enfrentamento dos
problemas de fragmentação e desarticulação governamental que se revelam em âmbito
intragovernamental (desarticulação de várias competências) e extragovernamental
(desarticulação com agentes externos ao governo), bem como a questão da
descontinuidade administrativa que exige uma articulação temporal, a fim de evitar a
ameaça da execução dos programas quando há troca de mandado político.
Assim, concentrar esforços para promover a coordenação e integração dos
membros e atores ligados ao COAF parece ser o primeiro passo rumo à eficiência de suas
atividades no interior do sistema de políticas públicas antilavem, uma vez que tal
reformulação do arranjo permitirá suprir determinadas lacunas e evitar sobreposições e
rivalidades, as quais do ponto de vista de Coutinho43 são contraproducentes e representam
óbices à institucionalização das políticas públicas.
Frise-se que ao promover alteração no arranjo com intuito de maior
integração e coordenação, automaticamente torna-se possível reconsiderar a estrutura
organizacional do COAF, isto é, a necessidade de contratação de novos servidores, a
divisão de tarefas, inclusão de novos membros, bem como o investimento em capacitação
e especialização para realização de suas atividades.
Dessa forma, verifica-se que, não obstante o advento da Lei nº 9.613/98 e a

42
BUCCI, M. P. Fundamentos para uma teoria jurídica das políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2013.
p. 191.
43
COUTINHO, D. R. O direito nas políticas sociais brasileiras: um estudo sobre o programa Bolsa Família.
In: SCHAPIRO, Mario Gomes; TRUBEK, David. Direito e Desenvolvimento um diálogo entre os Brics.
São Paulo: Saraiva, 2012. p. 73-122.

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consequente implementação do COAF tenham representado um grande avanço no


combate e prevenção à lavagem de dinheiro, o maior desafio do sistema de políticas
públicas antilavagem como um todo, bem como do COAF, enquanto seu ator, consiste
em promover a articulação entre seus membros e atores externos, aproveitando para rever
sua estrutura organizacional, conforme explica Bechara44:

Os avanços legislativos somados a iniciativas de aperfeiçoamento das


estruturas de controle e fiscalização, como o COAF, impulsionam a capacidade
do Estado Brasileiro no enfrentamento das organizações criminosas, com
particular destaque na prevenção e na repressão à lavagem de dinheiro. Todo
esse esforço deve ser acompanhado pela necessária articulação e cooperação
entre as estruturas do Estado, sua especialização e amadurecimento quanto à
importância de incorporação de técnicas e modelos não convencionais, aptos
ao enfrentamento proposto.

CONCLUSÃO

Apesar de a globalização ter proporcionado diversos benefícios para a vida


em sociedade tanto em âmbito interno dos Estados, como em nível internacional, não há
como se negar seus efeitos negativos, dentre os quais se destacam a expansão e a
sofisticação da criminalidade em diversas áreas, mas em especial no que se refere aos
crimes contra o sistema econômico. Como visto, a preocupação com a lavagem de
dinheiro, espécie deste gênero, ganha relevo, uma vez que ocorre sempre atrelada a outros
crimes como corrupção e financiamento ao terrorismo, e, ao buscar tornar lícitos os bens
ilícitos proveitos destes, a lavagem de dinheiro encontra-se no centro do ciclo criminoso,
proporcionando a ocultação e perpetuação da atividade.
Nesse sentido, o Brasil, tem-se preocupado em elaborar políticas públicas
antilavagem, visando criar um verdadeiro sistema de políticas públicas capaz de combater
e prevenir tal crime. Como principal marco regulatório deste sistema tem-se a Lei nº
9.613/98, a qual, em consonância com os compromissos internacionais assumidos pelo
Brasil, tipificou a lavagem de dinheiro e instituiu o COAF como unidade de inteligência
financeira brasileira, visando proporcionar que as autoridades competentes para
investigação e persecução penal tivessem acesso às informações relacionadas a atividades
e transações financeiras suspeitas de envolvimento com lavagem de dinheiro.
Assim, verifica-se que, no âmbito do sistema de políticas públicas de

44
BECHARA, op. cit., p. 181-182.

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prevenção e combate à lavagem de dinheiro, o COAF assume papel de suma relevância,


sendo que o arranjo institucional que o organiza acaba por influenciar na efetividade de
tais políticas.
De acordo com a análise do arranjo institucional realizada, constatou-se que
o Brasil adotou um modelo administrativo de unidade de inteligência financeira, o qual,
assim como os demais, possui vantagens e desvantagens, de tal sorte que SE deve
trabalhar nas desvantagens a fim de mitigá-las.
Como desvantagens, o modelo administrativo apresenta: falta de agilidade
na aplicação de medidas de repressão e prevenção de cunho judicial; as informações
colhidas e processadas em relatórios de inteligência não configuram prova em juízo, mas
representam apenas indícios de delito; em geral, as unidades subordinam-se a um controle
político, exceto quando assumem a forma de organismos públicos independentes, a
exemplo das autarquias.
Em relação ao fato de o RIF não constituir prova, já se demonstrou que este
não parece ser um óbice ao sistema, considerando que ele tem sua relevância e se mostra
apto a fazer importantes contribuições para o processo investigativo enquanto um meio
de obtenção de prova.
Ademais, as outras duas desvantagens encontram-se relacionadas com as
demais críticas aventadas em relação à estrutura organizacional do COAF, qual seja, a
quantidade insuficiente de servidores públicos, a qual leva a uma especialização precária,
e a necessidade de maior integração e coordenação entre os membros do COAF, bem
como destes para com os órgãos externos envolvidos na persecução penal da lavagem de
dinheiro. Frise-se que a quantidade de pessoal inadequada e não especializada, bem como
o estabelecimento de relações descoordenadas entre os atores contribuem para trazer
menos agilidade na aplicação de medidas de repressão e prevenção de caráter judicial, e
comprometem uma atuação mais assertiva dos membros e atores do sistema quanto aos
seus objetivos, tornando-os mais suscetíveis às influências e pressões políticas externas.
Insta salientar que tais desvantagens e críticas ao arranjo institucional que
organiza o COAF acima apontadas tem impacto direto na eficiência plena das políticas
públicas antilavagem, pois podem levar ao advento de fragmentação, lacunas e
sobreposições em relação às atividades, competências, o que representaria desperdício de
esforços e recursos e prejudicaria a institucionalização.
Dessa forma, a princípio parece haver um aparente paradoxo em relação ao
sistema de políticas públicas antilavagem no Brasil, pois, se por um lado tem-se o

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reconhecimento internacional do GAFI em relação aos avanços e qualidade das medidas


para combate e prevenção da lavagem de dinheiro, por outro, ao analisar o arranjo
institucional que estrutura o COAF percebem-se algumas fragilidades que interferem em
tal sistema.
Entretanto, na realidade não há que se falar em um paradoxo, pois a
construção de um sólido sistema de políticas públicas é algo que perpassa por uma
evolução, ou seja, a tipificação da lavagem de dinheiro, bem como a instituição e atuação
do COAF representam sim avanços significativos em relação às políticas públicas
antilavagem, ainda que existam críticas quanto ao arranjo institucional que envolve o
COAF.
Outrossim, insta salientar que as críticas feitas ao arranjo não implicam a
alteração ou substituição do modelo adotado, mas apenas indicam a necessidade de
aperfeiçoamento em relação a algumas características.
Ainda, não se pode ignorar fato de que o próprio COAF tem reconhecido suas
fragilidades, tanto que em seus últimos relatórios de gestão já constam objetivos e
diretrizes voltados a superação dos problemas de integração, coordenação e insuficiência
de pessoal e especialização.
Por fim, conclui-se que o arranjo institucional que engloba o COAF foi
estruturado com base em um bom modelo, adequado à realidade brasileira e, embora
apresente desvantagens e pontos críticos, estes já foram reconhecidos pelo próprio órgão
que vem trabalhando na superação de tais desafios. Nesse sentido, definitivamente pode-
se dizer que a implementação do COAF sob o formato do atual arranjo institucional
significou um importante passo para a consolidação do sistema de políticas públicas
antilavagem no Brasil, digno de reconhecimento internacional. Todavia, a fim de
assegurar a efetividade de tal sistema o COAF deve continuar trabalhando no
aperfeiçoamento do referido arranjo, visando à superação das lacunas e sobreposições
que este propiciou.

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