Anpuh - Xxiii Simpósio Nacional de História - Londrina, 2005
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Anpuh - Xxiii Simpósio Nacional de História - Londrina, 2005
O tema que aqui apresento, objeto de minha tese de doutorado, começou a fazer
parte do meu universo de interesses por ocasião da pesquisa efetuada para a Dissertação
realizada permitiu detectar alguns pontos importantes que mantiveram minha motivação em
torno dos discursos sobre essa cidade, os quais tomo aqui a liberdade de recuperar.
ou da sociedade –, uma terra fértil, sem desigualdades sociais, que oferecia oportunidades
iguais para todos que tivessem amor ao trabalho e à ordem e quisessem enriquecer da noite
para o dia. Este ideário excluía todos os outros agentes que, porventura, representassem
uma ameaça a esta ordem sonhada. A ideologia estadonovista de pátria como família se
o político e o social. Não podendo mais o Estado impor arbitrariamente a ordem desejada,
novos mecanismos foram criados com o objetivo de, ao mesmo tempo, limitar a participação
popular e extrair sua legitimação desta participação controlada. Este período coincidiu com o
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ANPUH – XXIII SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – Londrina, 2005.
legitimação popular, a civilização que pretende instaurar não pode prescindir dos riscos que
a participação popular implica, sendo, portanto, necessário levar até o limite a sua
de um “outro” – que até então não pensava encontrar, pelo menos com tanta intensidade,
nas páginas criminais, tanto dos autos quanto dos jornais desta cidade, sempre apresentada
Londrina, que no início da década de cinqüenta não passava de uma pequena cidade de
pouco mais de 70.000 habitantes, sendo que desses, apenas 39.000 viviam na zona urbana,
era decorrente também do fato de nunca haver tido contato, nas leituras que fizera, de obras
extrapolassem o âmbito das ações ocorridas nos grandes centros como São Paulo e Rio de
Janeiro . Estudos que, embora densos e com objetivos diversos, muitas vezes perderam-se
em discussões acerca das várias e bruscas viragens que o Partido sofreu à esquerda e à
ações; nas grandes disputas internas pelo poder; nos embates entre “nacionalistas” e
nos equívocos, vitórias e derrotas, críticas e autocríticas, enfim, nos “acertos de contas”.
política”, aquela desenvolvida pelas inúmeras pequenas células espalhadas pelo país.
reais, por homens reais, reflexos/refletores concretos dos grandes embates nacionais, faz
parte de um quadro que deve ser revertido, mesmo porque, não me refiro aqui a ações
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na sede provisória da Célula com o salão literalmente cheio”3, que por si só já diriam muito
sobre o funcionamento do Partido Comunista nas pequenas cidades, mas sim, a ações
trabalho dos poucos militantes do Partido Comunista de Londrina que conseguiram dosar
suas ações entre as perspectivas internacional, nacional e local, significando, por isso,
mesmo tempo que envolviam-se na política partidária local, disputando eleições. Não
estavam ausentes de suas preocupações a organização das bases nas fábricas e fazendas,
Martins, ao tratar dos movimentos sociais rurais brasileiros, chama a atenção, brevemente,
campo – entre outras – como questões nucleares de sua política, refere-se à inauguração
de uma perspectiva que teria promovido o envolvimento do Partido nas lutas dos posseiros
recente, chega a dar às lutas camponesas do período um caráter fundador de uma luta nova
no Brasil. Segundo ele, à partir de 1946, uma nova personagem assoma no cenário político,
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rurais, em particular o Partido Comunista. Tratava-se, segundo o autor, de uma luta nova,
que a dimensão política estava submersa na dimensão religiosa. Para Martins, nos anos 50,
mediação de um partido que tinha um projeto político e que enquadrava e definia as lutas no
Por outro lado, abordar este período iniciado com o fim da ditadura Vargas significa
Marilena Chauí afirma que a memória acerca do período 1945/1964, que constrói o Brasil
como, por exemplo, o de que a Constituição de 1946 define a greve como ilegal, mantém a
legislação trabalhista outorgada pela ditadura Vargas (e que é reprodução da Carta del
Sob uma perspectiva regional, e ainda tendo como questão os silêncios contidos nos
releitura das histórias possíveis, ainda nos deparamos com aqueles que reproduzem a
Associação Pró-Memória7, de uma “História Oficial” da cidade de Londrina, para dar fim às
“divergências” existentes entre as várias versões que vêm sendo construídas nos estudos
ou, poderíamos dizer melhor, inventando-a como memória, eis a representação que
continua vencedora: a cidade é a “casa da família” onde os filhos encontram refúgio, pois
esta “casa”, fruto de construção conjunta permitida pela ausência de barreiras ou regras,
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estaria distante das situações adversas e seria o locus da paz, da justiça, da fartura, da
suas formas, a “política do silêncio”, isto é, ao fato que ao dizer algo necessariamente
apagamos outros sentidos possíveis – mas indesejáveis – em uma situação discursiva dada,
significar diferentes.
partido. Procurei reconstruir como os militantes dessa cidade representaram papéis que os
Para tanto, foi necessário recuperar suas trajetórias desde que emergiram do
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criação dos partidos políticos nacionais, entre eles, do Partido Comunista do Brasil, que
quando o Partido Comunista sofreu uma guinada à esquerda e colocou a luta no campo
como uma das questões centrais de sua política, marcado pelo fim da “Guerra de Porecatu”,
de um processo-crime cujo eixo principal foi a participação dos acusados – como “líderes
Londrina. Esta construção só foi possível através das 860 páginas de um auto-criminal, peça
principal sobre a prisão do grupo, a partir da qual montei um roteiro cuja urdidura se dá pela
história política dos primórdios do município, quando se revela o monopólio político da Ctnp
situacionista da época, o PSD. Nos últimos anos do Estado Novo, com a nacionalização da
Ctnp e a transferência dos seus escritórios para Maringá (cidade próxima a Londrina),
Partido Comunista já que o mesmo se engaja, junto com os partidos burgueses, na luta
conciliatória pós Segunda Guerra que unia, no plano da política externa, os aliados,
inclusive a URSS. É assim, que deste “momento fundador”, marcado por uma aceitação dos
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clandestinidade.
de um objetivo comum, e é em primeiro lugar sobre aqueles que reúne que ele é
capaz de nos esclarecer”8, aproximei-me dos homens que se reuniram para fundar e
o envolvimento do grupo na grande “tarefa” que fora reservada pelo PCB para os
“revolucionários do interior”.
que concebeu a ação dos comunistas em Londrina a partir de duas esferas políticas
“revolucionário”, por sua vez, consistiu desde o engajamento às teses nacionais de caráter
Com esta pesquisa procurei, em primeiro lugar, trazer à cena uma importante história
do partido nos “cafundós” do país, tentando preencher um lugar de memória política até
então apagado. Tal apagamento se dava, por um lado, por efeito de uma formação
discursiva marcada pelos sentidos de progresso e de felicidade e regida por uma formação
ideológica jurídico capitalista. De outro, por conta das próprias falas dos comunistas da
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para o “proletariado de fábrica” como era de se esperar caso a análise estivesse voltada
para um grande centro; mesmo com quadros urbanos, apresentava forte militância no
campo; construía estratégias próprias de luta junto aos camponeses (reuniões, mutirões,
embargos, expulsões); envolvia seus militantes full time nas tarefas de propaganda e
agitação; um partido que não separava a vida pública da vida privada, o lazer da militância,
os comunistas como pessoas de “carne e osso”, com suas trajetórias não apenas políticas,
mas sobretudo com suas histórias de vida, tentei tratar de um momento importante da
“pequena política” do interior, sem perder de vista a inserção do meu objeto nas questões
NOTAS:
1
ADUM, Sonia M. S. Lopes. Imagens do Progresso: civilização e barbárie em Londrina 1930-1960. 1991.
Dissertação (Mestrado em História) -Departamento de História do ILPH/UNESP. Assis/São Paulo.
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Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), subsidiária da Paraná Plantations Syndicate, empresa de
capital inglês, que adquiriu, entre os anos de 1925-7 uma área de 515.000 de terras onde se localizaria a cidade
de Londrina.
3
Manuscrito: “Realizações da Célula Siqueira Campos do Partido Comunista do Brasil – Londrina (dentro do
o
plano de emulação da “Campanha Pró Imprensa Popular”) – 1 período do plano. 1951”.
4
MARTINS, José de Souza. Os camponeses e a política no Brasil. 2.ed. Petrópolis: Vozes, 1983. P.81 e A
Chegada do Estranho. São Paulo : Hucitec, 1993. (Ciências Sociais 32). P. 85.
5
CHAUÍ, M. Conformismo e Resistência. São Paulo : Moderna, 1982. P. 47.
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Entre outros: ARIAS NETO, Miguel. O Eldorado: representações da política em Londrina 1930 – 1975.
Londrina : UEL, 1998. TOMAZI, Nelson D. Certeza de lucro e direito de propriedade: o mito da CTNP. 1989.
Dissertação (Mestrado) -UNESP, Assis.
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A Associação Pró-Memória é uma instituição criada por “descendentes de pioneiros”, docentes universitários,
escritores, etc., aglutinados no objetivo de produzir uma história de Londrina como “uma verdadeira obra de
arte”. Suas edições serão sempre bilíngües (português-inglês), de maneira a permitir que empresários e
cidadãos possam utilizá-las como um verdadeiro “cartão de visitas” no mundo inteiro.
8
BERSTEIN, Serge. Os Partidos. In: REMOND, René (org.). Por uma história política. Rio de Janeiro : Ed.
UFRJ, 1996. p.72.