Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                

Direito Administrativo I - 1 Frequencia - Resumos - Joana Oliveira

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 29

DIREITO ADMINISTRATIVO I

1ª FREQUÊNCIA

NOÇÕES GERAIS

Administração: tarefa ou atividade que consiste na prossecução de fins públicos, através de diferentes
meios, estando subordinada politicamente (os fins são definidos num plano político-legislativo).
 Sentido subjetivo/orgânico – os órgãos da AP;
 Sentido objetivo/funcional – função de administrar.
o Administrar: ato de gestão de um conjunto de bens para a realização de um conjunto
de fins heterónomos.

Administração Pública Administração Privada

Objeto Necessidades coletivas Necessidades individuais

Meios usados Meios de autoridade que se traduzem Baseados numa relação de


para a no uso de comandos unilaterais – ato paridade/igualdade entre as partes (ex.:
prossecução administrativo (diz o que deve ser feito contrato).
dos interesses e a sua contraparte limita-se a aceitar).

A ADMINISTRAÇÃO PÚBL ICA E O DIREITO ADMINISTRATIVO

A Administração Pública é:
 Conjunto de tarefas atribuídas a um sistema de serviços organizados de acordo com princípios
específicos e que se manifestam por atos com valor e força jurídica próprios;
 Complexo de interesses públicos;
 Instrumento necessário à realização do bem comum (satisfação de necessidades comuns).

Os sentidos da expressão “Administração Pública”


 Sentido organizatório: é uma máquina complexa integrada por vários entes públicos,
organizados, e que incorporam os órgãos, serviços e agentes do Estado (e restantes pessoas
coletivas públicas) que estão responsáveis por prosseguir os interesses públicos secundários em
nome da coletividade (ex.: municípios, freguesias, regiões autónomas, universidades, entidades
públicas empresariais, associações públicas e pessoas coletivas de utilidade pública);
 Sentido material: é uma atividade administrativa típica, isto é, aquilo que é feito por parte da
Administração Pública distingue-se daquilo que é feito pela Administração Privada bem como
daquilo que são as outras funções públicas exercidas (ex.: função legislativa ou jurisdicional, etc.);
 Sentido funcional: conjunto das atividades administrativas prosseguidas pela máquina complexa
(AP) – podendo ser atos de administração materiais ou atividades relacionadas com outros
setores organizacionais dos entes públicos ou até com o domínio do direito privado. Este sentido
remete, portanto, para tudo o que integra a atuação da AP (todo o desenvolvimento e realização
da sua tarefa global);
 Sentido material: é a atividade de administrar (AP vista como tarefa do Estado). Identifica-se a
atividade administrativa típica que se distingue de toda a atividade exercida pela administração

Joana Oliveira, 2020


(nomeadamente quando recorre a meios/instrumentos de direito privado) e todas as atividades
estaduais que se insiram noutras funções diferentes da administrativa.
 Sentido formal: representa formas típicas da atuação da administração (meios pelos quais se
manifesta ao exercer a sua atividade): o ato administrativo, o regulamento e o contrato
administrativo (atos com valor formal e com força jurídica próprias).

O Direito Administrativo é um ramo do direito público que integra as normas jurídicas que vão regular a
organização e o funcionamento da Administração bem como as relações que esta estabelece com outros
sujeitos de direito no âmbito do exercício da função púbica administrativa.
É constituído por um sistema de normas jurídicas de 3 tipos diferentes, conforme regulem:
a) a organização da Administração;
b) o funcionamento da Administração;
c) as relações entre a Administração e outros sujeitos de direito.

Tem, por exemplo, o objetivo de regular a atividade (materialmente administrativa) através das suas
normas (regula o exercício de poderes públicos de autoridade) disciplinadoras da Administração Pública.
 Identifica os interesses públicos de cada entidade pública tem por si;
 Disciplina a organização e a competência dos órgãos integrantes da AP;
 Regula a atividade e as condições/meios de controlo da mesma.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

 Época Medieval (séc. V – séc. XV)


A vida económica e social estava ligada ao feudalismo e ao regime senhorial (ordem política
espontânea), não existindo uma institucionalização da sociedade política porque o próprio
feudalismo fazia com que existissem vários centros de poder.
Não havendo órgãos incumbidos de prosseguir o interesse geral, o panorama existente era o de
um poder central fraco, uma enorme pulverização dos centros de poder (descentralização
política da comunidade) e um povoamento disperso. Por esse motivo, a Igreja desempenhava
um papel de grande protagonismo na comunidade.
Nessa época não era possível identificar a máquina complexa que caracteriza a administração
em sentido organizatório, logo não faz sentido falar em Administração Pública ou em Direito
Administrativo.
Para Rogério Soares existiu, dentro da época medieval, uma sub-época do “Estado de Justiça”:
fase específica em que se detonou que os cidadãos defendiam (mobilizando-se) os direitos
adquiridos junto dos tribunais – é mobilizado o direito privado (único conhecido nesta fase).
Pode considerar-se que existiram “embriões” da Administração Pública – 3 tipos de modelos:
 Administração municipal (administração autónoma das cidades em que já existiam
formas de racionalização de tarefas administrativas);
 Administração da Igreja (estrutura vincada e hierarquizada);
 Administração militar (militares organizados de acordo com as suas regras internas).

 Época Moderna (entre o final da Idade Média e a criação dos Estados Modernos)
Relativamente à anterior, esta época evolui por 2 linhas: a linha racionalizadora (refletir sobre
qual a melhor organização a ter em consideração) e a linha centralizadora
(salvaguardar/promover a concentração crescente de poderes no Rei). Para este efeito, há 3
motivos fundamentais:
1) Religiosos – ligados à reforma protestante, provocam a desvinculação do poder político
face ao Papado;

Joana Oliveira, 2020


2) Militares – o ciclo de guerras impõe a criação e implementação de exércitos regulares e
administrações especiais;
3) Económicos – dá-se a coesão entre os ramos provocada pela abertura ao comércio e
das cidades (aproximando populações).

Estes culminam na criação de um Estado Moderno que apresenta a sua própria administração,
com autonomização do poder político perante a Igreja e a institucionalização e concentração
(territorialmente definida) do poder político.

 Estado de Polícia (séc. XVII – séc. XVIII)


A sua característica principal é o absolutismo da figura do Estado – centralização do poder no
Rei, representante do Estado (substituindo a referida pulverização). Esta forma de Estado vai
suportar-se no Iluminismo, onde o Rei seria o “monarca iluminado” (tudo sabe e pode).
O Rei tem poder de decisão absolutamente arbitrária, unilateral, sobre o bem público prestado
e o que se deveria fazer para prosseguir o interesse público do Estado (promovendo o bem
público)  O interesse verdadeiramente defendido pelo Monarca era a satisfação das
necessidades daqueles que incluíam o engrandecimento do país (e não dos súbditos).
A Administração Pública estadual continuou o seu processo de desenvolvimento com a criação
de órgãos/corpos de funcionários diretamente dependentes do Rei e das tarefas por ele
designadas, visando a promoção do engrandecimento do país.
o Nota: Administração Pública Forte apenas depende da vontade do soberano, logo a sua
atividade não está suportada nas regras jurídicas.
O Fisco era uma espécie de cofre/património do Rei (e da Coroa), onde o Estado aparecia
subordinado ao direito privado, que servia para indemnizar pecuniariamente (com o dinheiro
nele contido) os cidadãos pelas eventuais violações dos seus direitos privados por parte do
Estado.
 Dupla Fisionomia: Fisco + Ausência de Regras (sem base no Direito)

 Época Liberal (destaque para a Revolução Francesa).


As anteriores formas de viver e gerir o país culminaram num sentimento de mal-estar e opressão
que provocaram as revoluções liberais, cujo objetivo era a afirmação de liberdades do cidadão
(individual) e promoção de ideais democráticos que afastem a ideia de centralização de poder
no Rei.
A burguesia aliou-se ao povo com a intenção de promover maior liberdade e menores
constrangimentos por parte do Estado.
Nesta época consagraram-se 2 princípios específicos absolutamente decisivos para o
nascimento do direito administrativo:
1) Princípio da separação de poderes – no sentido organizatório, o Estado tinha de estar
separado de forma a identificar vários centros de poder (sendo o Parlamento o centro
do Estado);
2) Princípio da legalidade da administração – traduz a ideia-cave de que a administração
está subordinada à lei/ao direito com o objetivo de proteger os direitos dos cidadãos
perante as entidades administradoras.

Os cidadãos tinham cada vez mais consciência dos seus direitos subjetivos públicos (que
poderiam ser invocados perante o Estado), mas era visível um fosso entre as preocupações do
Estado e as preocupações/necessidades da sociedade  Isto explica a configuração do Estado

Joana Oliveira, 2020


como “guarda noturno”, isto é, como se fosse um Estado Mínimo (com um papel mais reduzido
e uma intervenção mais limitada).

 Época pós-liberal (séc. XX, Estado de Direito Social)


O princípio da igualdade estava pensado para assegurar uma igualdade formal, mas acabou por
se verificar uma desigualdade substancial.

Conclui-se que, na medida das suas desigualdades, tratamos o desigual como desigual e o igual
como igual. As desigualdades substanciais, já presentes na época liberal, revelaram-se com a
deterioração da condição de vida das pessoas.
 Ex: Não posso conferir exatamente a mesma taxa de IRS a um cidadão que ganha 100€
e a um que ganha 1000€, porque estou a penalizar da mesma forma cidadãos que estão
numa posição distinta.

Importância das 2 guerras mundiais: as economias de guerra (grandes exigências) juntamente


com a Grande Depressão (1929/32) dão origem à necessidade de se fazer mudanças, tais como
 criação de partidos políticos;
 desenvolvimento do sufrágio universal (voto);
 aparecimento dos sindicatos.

Há uma crescente intervenção do Estado enquanto provedor de serviços públicos de apoio


àqueles que são os mais necessitados  dá-se o nome de Administração de Prestação: crescente
entrosamento entre Estado e Sociedade (começa a falar-se num Estado-Providência, preocupado
com a atuação social).
É visível a criação de entidades administrativas (de empresas públicas) e mostra-se confiança a
particulares para desenvolverem algumas das funções administrativas assumidas pelo Estado.

O Estado de Direito Social vai apresentando um crescente aumento de tarefas públicas, passando
a administração a assegurá-las e a responder às necessidades (presta serviços, fornece bens, etc)
 Pulverização da Administração Pública:
 Os particulares passam a poder intervir diretamente nas tarefas da mesma;
 Verifica-se o fenómeno da privatização da Administração.

O Parlamento vai perder o monopólio da atividade de criação de lei porque o Governo passa a
assumir uma competência legislativa normal.
A Lei deixa de ser vista como um limite para a administração, passando a estar do seu lado, e
começa a permitir prosseguir interesses públicos.
O poder judicial tem um papel crescente: os tribunais passam a fiscalizar a atividade da própria
administração (e não apenas a sua legalidade) – controlo autónomo da atividade administrativa.

O Direito Administrativo passa a ter alguma relevância no âmbito da relação tripolar que se vai
estabelecer entre LEI – ADMINISTRAÇÃO – JUÍZ
 Definir os interesses e fins públicos que deveriam ser prosseguidos pela admin bem
como os órgãos competentes para tal;
 Prosseguir o interesse público;
 Controlar a juridicidade da atuação da administração.

Joana Oliveira, 2020


O Estado Regulador e Garantidor (dos direitos dos consumidores), na evolução da Administração
Pública, faz a ligação com a evolução do direito administrativo:
 Garante serviços públicos e regula a respetiva atividade de quem os fornece;
 É pautado por critérios de eficiência, racionalização e eficácia, prossegue o interesse
público e a proteção dos Direitos dos Cidadãos

EXISTE OU NÃO UM NOV O DIREITO ADMINISTRATIVO?

Os fenómenos da liberalização, da privatização, da desregulação, da maior confiança no mercado, da


procura de maior racionalização, eficiência e eficácia da ação administrativa, o desenvolvimento de
análises de custos-benefícios das medidas administrativas, entre muitos outros, passaram a fazer parte
do discurso do dia a diadas administrações públicas e, por inerência, do direito que as regula.
Tal representa a emergência de um novo direito administrativo: principal forma de atuação da
Administração – o ato administrativo – o qual demonstra flexibilidade e capacidade de adaptação
suficientes para continuar a constituir a principal forma jurídica de atuação da Administração, tanto em
termos práticos como dogmáticos.
Neste contexto fala-se em algumas das principiais alterações e inovações que se têm feito sentir na
Administração Pública e no Direito Administrativo nos últimos 30 anos:
 Privatização
A privatização passa pela retração do papel do Estado e das suas responsabilidades operativas
ou de execuções, confiando cada vez ais nas forças da própria sociedade e da economia. Tal está
ligado à liberalização dos grandes serviços públicos, ao acentuar dos méritos e da importância
do princípio da livre concorrência  A realização de muitas tarefas tradicionalmente considerada
públicas é atribuída a atores privados e colocando-as na dependência das ‘’forças’’ do mercado.

A privatização pode ser:


 Material – transferência de algumas tarefas do setor público para o privado, verificando-
se cada vez menor a intervenção do Estado no desenvolvimento das mesmas;
 Do Património – transferência de bens públicos;
 Da Organização – setor empresarial do Estado e municipal);
 Financeira;
 Funcional;
 Procedimental.

As parcerias público-privadas configuram uma outra forma de privatizar a tarefa da


Administração Pública.
 Regulação
Num modelo menos autoritário e mais próximo dos cidadãos, o Estado terá ao seu lado outras
entidades que regulam o exercício de uma determinada atividade – estas são entidades
administrativas independentes, responsáveis por regular determinadas áreas de mercado.
Tal vem dar resposta, sobretudo no setor económico, às falhas ou ineficiências de mercado para
assegurar o adequado funcionamento do fundamental.

 Desregulação
Há uma maior libertação do Estado relativamente às atividades reguladoras (movimento de
recuo e consequente atribuição de mais e maiores responsabilidades às forças económicas
privadas bem como à própria sociedade).
Beneficiam as estruturas que assentam na satisfação de interesses próprios dos regulados.

Joana Oliveira, 2020


 Economicidade da atuação administrativa
Nos últimos anos do século XX, houve uma maior atenção aos aspetos económicos da atividade
administrativa, que se traduziu na ponderação entre os custos e os benefícios das políticas e das
medidas administrativas bem como na exigência de racionalização, otimização, aceleração e
simplificação da atividade administrativa  Afirma-se o princípio da boa administração – art.º
81, CRP e art.º 5, CPA – traduzido na ideia de que a AP deve pautar-se pelos critérios de eficiência,
economicidade e de celeridade.
o Eficiência: relação entre os custos de uma determinada ação e o fim perseguido,
procurando alcançar-se o máximo benefício com a menor quantidade possível de meios
empregues.
Impõe a analise/ponderação dos custos-benefícios subjacentes à atuação
administrativa.
o Consagração Institucional (art.º 81, CPA): impõe que o Estado utilize (e assegure a
utilização) forças produtivas, zelando pela eficiência do setor público.

 Novos papéis do Estado


Há uma série de conceitos que procuram explicar o novo papel e novas funções que o Estado
passou a desempenhar. Contrastando com o Estado Interventivo do séc. XX (repleto de peso e
robustez), atualmente temos um Estado Regulador que procura ser cada vez mais um Estado
Mínimo principalmente nas áreas da economia e da proteção dos direitos dos
consumidores/produtores.
o Governança: forma de administração em que o “governo” central perde protagonismo,
sendo apenas uma organização entre outros centros que partilham o poder e o exercem
de forma muito mais suave, partilhada e cooperativa;
o Responsabilidade de garantia: o Estado assume a obrigação de disciplinar e enquadrar
legalmente as estruturas de mercado, não se responsabilizando pelo fornecimento de
prestações à sociedade, mas assegurando a sua realização por particulares;
o Estado ativador: regula/orienta/incentiva atividades privadas, designadamente as que
prosseguem interesses gerais ou coletivos e que estabelece relações de cooperação e
de colaboração com os particulares, no sentido de uma satisfação dinâmica, eficaz e
eficiente do interesse público;
o Responsabilidade de reserva: torna-se efetiva nos casos de mau desempenho dos
privados responsáveis pela prestação de serviços sociais e econômicos com ressonância
pública;

 Europeização do Direito Administrativo


O Direito Administrativo não é, nos dias de hoje, exclusivamente um direito nacional porque é
influenciado diretamente pelo Direito Europeu (responsável pela evolução do direito
administrativo de cada um dos Estados-Membros). Contudo, há constrangimentos decorrentes
da implementação de uma imposição europeia porque o DA Europeu se impõe perante o DA
nacional.
Segundo o “Princípio da cooperação leal com a União Europeia” (art.19º, CPA), há uma imposição
de uma cooperação entre Estados-Membros. É incontornável a influência das regras europeias
sobre os direitos administrativos nacionais, nomeadamente por intermédio da obrigação de
transposição das diretivas, as quais constituem o impulso fundamental para o desenvolvimento
de alguns direitos administrativos especiais.
o Ex: A plantação da batata-semente é uma diretiva europeia – o que acontece?
 os Estados-Membros têm um determinado tempo para transpor a diretiva para
território nacional e os produtores responsáveis por essa plantação são, ainda,

Joana Oliveira, 2020


obrigados a cumprir determinadas obrigações adicionais perante várias
entidades públicas (documentos, etc.);
 Se tal não for feito, inicia-se um processo de incumprimento com sanções e
justificações exigidas.
 A única dificuldade da União Europeia é assegurar a implementação da
diretiva.

 Informatização e digitalização
Uma das tendências das últimas décadas passa pela informatização ou digitalização da atividade
administrativa, legitimando a ideia de um e-government ou governo eletrónico e de um ato
administrativo informático. Esta evolução no mundo informático e digital permite evitar a
deslocação a dados locais para consultar processos, etc.
Foi criado o balcão único eletrónico (art.62º, CPA) para que qualquer indivíduo, recorrendo a um
aparelho eletrónico, independentemente do local e da hora, pudesse consultar o estado do
processo, submeter documentos, obter informações, etc.
o Princípio da administração eletrónica (art.14º, CPA): configura a ideia de aproximação
dos serviços às populações, promovendo o uso, por parte dos órgãos e dos serviços da
AP, de procedimentos eletrónicos que assegurem eletronicamente a aproximação dos
interessados;
o Princípio da continuidade dos serviços públicos (art.14º, CPA) – a administração “não
dorme” (24h/7) porque está sempre disponível. Por exemplo, se eu quiser inscrever-me
numa aula remota e os serviços académicos fecharem às 17h, isso não me impede de
fazer a minha inscrição às 20h através das plataformas digitais.

Se não tivéssemos uma administração desburocratizada, eletrónica, informatizada, não era


possível assegurar que, fora do horário normal do expediente de determinado serviço, poderia
relacionar-me com esse mesmo.
 A internacionalização e globalização do DA ou “transnacionalização”
Num mundo global, o Estado tem de partilhar a sua autoridade com outros entes e, nesse
sentido, surge o direito administrativo global que reflete a pluralidade de ordenamentos
jurídicos. É ideal a existência de um ambiente de cooperação internacional, onde a informação,
os estudos, os institutos, as organizações, os procedimentos e os instrumentos jurídicos
assumem cariz internacional.
O Direito Administrativo Global aponta para formas menos impositivas e mais suaves,
partilhadas, abertas e flexíveis de ditar o direito, ocupando lugar de destaque a regulação privada
e o desenvolvimento de atividades com contornos jurídico-administrativos por parte de
associações e organizações privadas.
O ato administrativo transnacional é a decisão administrativa ditada por um Estado, mas cujos
efeitos se produzem ou fazem sentir em ordenamentos jurídicos diferentes daquele onde
ocorreu a sua prática.

Em suma, a evolução da administração veio assegurar a promoção e prossecução do princípio da


continuidade dos serviços públicos.

PRINCÍPIO DA SEPARAÇ ÃO DE PODERES

O princípio da separação de poderes afirmou-se na Revolução Francesa (1789) e foi importantíssimo para
o nascimento e desenvolvimento do Direito Administrativo. Tem ligação ao princípio da competência,
segundo o qual cada órgão só tem efetivamente as competências que lhes forem definidas por lei, logo
não podem invadir competências de outro órgão.

Joana Oliveira, 2020


Os vários poderes do Estado estão necessariamente interligados (interdependência), sendo esta uma
forma de afirmação de democracia.

Os sentidos fundamentais deste princípio:

Sentido Político Sentido Organizatório Sentido Material


Tem a ver com a questão da Divisão dos serviços dentro de Aqui está em causa a separação
titularidade ou da soberania do uma determinada organização – dos poderes em função das
poder: “Onde está/reside o separação organizatória dos principais tarefas do Estado:
poder?” e “Quem é o titular?” poderes. “Quais são e como se
Há 2 sistemas: caracterizam materialmente estas
atividades ou funções?”
Monista Dualista ou Há complexos organizatórios
Após a Revolução Francesa de
Misto dependentes que vão
Aceita-se 1 1789, as tarefas fundamentais do
desempenhar a sua atividade
única forma de Aceitam-se as Estado eram legislar, administrar
(cada um tem os seus poderes).
legitimação do pretensões de e julgar  Configuravam,
poder (1 vários A separação organizatória dos respetivamente, as funções
titular). “candidatos” e poderes tanto pode existir num legislativa,
forma-se uma sistema dualista como num administrativa/executiva e
Não existe
comunidade sistema monista jurisdicional.
separação de
poderes com diversos
Com a afirmação do Estado Social,
centros de
(monarquia, aparece uma 4ª função – a função
poder.
aristocracia, política – porque havia atos
governo Há separação praticados pelos órgãos supremos
popular); de poderes em do Estado que não estavam
sentido abrangidos por nenhuma das
político. outras funções

A SEPARAÇÃO MATERIAL DAS FUNÇÕES DO ESTA DO

É essencial descobrir o local e o papel próprio da função administrativa em comparação com as outras
funções estaduais. Vejamos a contraposição entre elas:

Função Política (1º grau) Função Administrativa (2ª grau)


Carácter concreto e superior, o que faz com que Carácter concreto
os atos políticos estejam afastados do controlo É uma função de 2º grau, ou seja, está subordinada
jurisdicional (pelos tribunais) à lei que funciona como um limite prévio à própria
Tradicionalmente exercida pelos órgãos supremos Administração.
do Estado em aplicação direta da Constituição
(sem interposição de leis ordinárias).
Atualmente, esta função é vista como a
programação e orientação politico-estratégica da
atividade administrativa

Joana Oliveira, 2020


Função Jurisdicional Função Administrativa
Exercida exclusivamente pelos tribunais, estando Exercida pelo Governo (órgão da AP)
subordinada à Lei e ao Direito
Esta função procura criar as condições concretas
Atua através de decisões concretas, momentâneas para a realização do interesse público, não se
e individuais para a resolução de uma “questão de destina, a título principal, à resolução de questões
direito que lhes é levada pelos particulares ou pela de Direito
administração
É uma função mais vinculada à lei do que a função
administrativa

Função Legislativa (1º grau) Função Administrativa (2ª grau)


Tipicamente carácter geral e abstrato Tipicamente carácter individual e concreto;
(podendo haver situações em que se aproxima do (podendo haver situações em que se aproxima do
carácter individual e concreto) carácter geral e abstrato)
Tradicionalmente, o titular do seu exercício era o Tradicionalmente, o titular do seu exercício era o
Parlamento (aprovava e fazia normas jurídicas Governo (enquanto órgão máximo da AP) e
gerais e abstratas). competia-lhe aprovar e tomar decisões individuais
Atualmente, os Decretos-Lei também podem ser e concretas para um caso específico.
aprovados pelo Governo, sempre que tenha Posteriormente, passou a dispor de uma
competência legislativa, que lhe permite aprovar
competência para tal.
diplomas com carácter geral e abstrato, nos
As exceções dizem respeito a 2 tipos de
competência: termos da Constituição
Atualmente, o Parlamento aprova as leis
 Competência absolutamente reservada
individuais e leis-medida com carácter concreto
Neste caso só a AR pode legislar sobre as
bem como os diplomas legislativos que andam
matérias (art.º 164, CRP).
entre a norma geral e abstrata e o carácter
 Competência relativamente reservada
individual e concreto
Neste caso o Governo pode receber
autorização por parte da AR (através de Como sabemos, a Administração Pública
um decreto-lei autorizado) para legislar manifesta-se através de ato administrativo
sobre matérias enunciadas no art.º 165 (individual e concreto), o regulamento (art.º 135
da CRP, durante X período de tempo, de CPA) e o contrato administrativo (bilateral).
certa forma e extensão. Atua sob controlo dos tribunais competentes em
Mesmo sem competência para aprovar o DL ou matéria administrativa (visando inspecionar o
sem autorização da AR, o Governo pode exercício desta função)
apresentar uma proposta de lei que será
tramitada.
Respeitando os comandos constitucionais, o
legislador tem liberdade constitutiva para definir
o desenho do diploma em concreto
Para definir um diploma com várias
especificidades referentes a diferentes áreas, os
grupos parlamentares dão o seu contributo ao
legislador (sendo este a figura que os representa).
Ex: a lei da CRP é apresentada por um grupo
parlamentar, mas o documento em si é fruto de
sugestões de redação, de inclusão de estatutos,
etc., por parte dos restantes grupos.

Joana Oliveira, 2020


OS SISTEMAS DE ADMIN ISTRAÇÃO

O estudo de sistemas de administração decorre do facto da AP, em concreto, ter seguido caminhos
diferentes e estar implantada de formas distintas em função dos países onde se foi desenvolvendo
(principalmente Inglaterra e França). Estes sistemas, quando nasceram, tinham determinadas
características que iremos analisar para perceber como fazer a distinção entre eles.

I. SISTEMA DE ADMINISTRAÇÃO EXECUTIVA (DE TIPO CONTINENTAL OU FRANCÊS)


Aparelho administrativo fortemente centralizado, com um modelo hierárquico de relações de
supra-infra ordenação, ou seja, os órgãos são tipicamente estruturados em forma de pirâmide e
com poderes de hierarquia superiores aos que estão inferiormente localizados (estes últimos têm
um dever de obediência para com os que estão acima).

Serve-se de um ramo de direito especial para regular a administração: o direito administrativo


 Conjunto de regras próprias que disciplinam a atuação da administração e regulam o
uso dos seus poderes de autoridade (poderes “exorbitantes” que revelam
supremacia/prioridade em relação aos particulares) para a prossecução do interesse
público.

As funções só poderão ser convenientemente prosseguidas se dispuser de poderes de autoridade


que permitam impor as suas decisões aos particulares  É necessário criar regras próprias que
submetam a Administração a um conjunto de deveres e restrições especiais que não vigoram
entre os particulares.

No âmbito do exercício desses poderes ao abrigo de normas de Direito Administrativo, há uma


necessidade de criar uma jurisdição própria e autónoma – tribunais administrativos (e não os
comuns).

Este privilégio de execução prévia permite uma Administração capaz de executar as suas decisões
por autoridade própria, podendo impor-se coativamente caso essa não seja acatada pelos
particulares, sem precisar de qualquer pronúncia judicial.

O Estado, bem como os restantes entes públicos, são responsáveis pelos atos dos seus
funcionários (“garantia administrativa”).

Note-se que dentro da própria administração há órgãos especiais responsáveis pelo seu controlo.
Por vezes, existem órgãos administrativos especificamente incumbidos de exercer funções de
controle em relação às atuações dos órgãos da Administração ativa.

II. SISTEMA DE ADMINISTRAÇÃO JUDICIÁRIA (BRITÂNICO OU INGLÊS)

Administração Pública com forte descentralização administrativa, distinguindo a administração


central da administração local. Reconhece-se a existência de autarquias locais como entidades
independentes, não sujeitas à hierarquia dos órgãos centrais.
Tem grande importância o procedimento administrativo, marcando a necessidade de os órgãos
administrativos exercerem a sua atuação jurídica no âmbito de um processo de formação das
suas decisões juridicamente regulado.

O Parlamento é o órgão central da vida política, desconhecendo-se a noção de Estado como ente
centralizador.

Joana Oliveira, 2020


A administração e os órgãos e agentes da AP (assim como os particulares) está subordinada ao
direito comum, havendo um único tipo de tribunal (o tribunal comum). Assim, a administração
não pode executar as suas decisões por autoridade própria porque os órgãos administrativos não
dispõem, em regra, de privilégios sobre os cidadãos. Concluindo:
 Não se podem impor coativamente sem uma prévia intervenção do poder judicial;
 A maior intervenção judicial e a maior importância do procedimento “compensam” a
ausência de um direito administrativo.

Os particulares dispõem de um sistema de garantias contra ilegalidades e abusos da


Administração Público.
Evolução e aproximação dos sistemas de administração executiva e judiciária
A evolução dos sistemas acima referidos, ocorrida ao longo do séc. XX, determinou uma aproximação
relativa dos dois em alguns aspetos:

 Na organização administrativa
o A administração britânica tornou-se mais centralizada do que era no final do séc. XIX (as
guerras e as crises reforçaram essas necessidades). Surgiram e desenvolveram-se
ministérios (que exerciam controlo indireto sobre as autarquias), dos quais dependem
os serviços civis: corpos de funcionários profissionais sujeitos a uma hierarquia;
o A administração continental conheceu sucessivas reformas descentralizadoras que
transferiram numerosas e importantes funções do Estado para níveis locais;

 Direito Regulador da Administração (aproximação entre os 2 sistemas)


o Em Inglaterra, a transição para o Estado de Direito Social aumentou consideravelmente
o intervencionismo económico, fazendo avolumar a função de prestação de serviços
culturais, educativos, sanitários e assistenciais da Administração, dando lugar ao
aparecimento de inúmeras leis administrativas;
o No sistema continental passou a ser frequente a utilização do direito privado pela
Administração. Com efeito, a moderna Administração passou a socorrer-se
crescentemente de formas jurídico-privadas de organização e de atuação;

 Execução das decisões administrativas


A aproximação deu-se essencialmente por parte do sistema continental, sendo cada vez mais
comum a defesa de que a administração não pode executar coativamente as suas decisões (a
menos que a lei preveja expressamente essa possibilidade).

 Garantias jurídicas dos particulares face à Administração


o A aproximação deu-se por parte do sistema continental, onde o contencioso
administrativo não é hoje, apenas, um contencioso de anulação dos atos
administrativos, tendo havido um alargamento do controle da juridicidade e dos
poderes dos juízes. Desenvolveu-se o direito procedimental que levou à publicação de
diversos códigos do procedimento administrativo nas últimas décadas do século XX;
o Em Inglaterra, surgiram "administrative tribunals", ou seja, órgãos administrativos
independentes que fazem preceder a decisão administrativa de um "due process of
law", sendo as suas decisões imediatamente obrigatórias para os particulares (não
carecem de homologação judicial prévia).

Joana Oliveira, 2020


ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

A. ESTRUTURA ORGÂNICA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


A administração pública é um aparelho/conjunto estruturado de unidades organizatórias que
desempenham principalmente a função administrativa, cujos elementos básicos são as pessoas
coletivas de direito público (que se manifestam através de órgãos administrativos) e os serviços
públicos (que pertencem a cada ente público e que atuam na dependência dos respetivos
órgãos).

A abordagem será essencialmente sobre os entes públicos, a quem é atribuído o encargo da


satisfação de determinados interesses públicos, e os seus órgãos, que constituem as figuras
capazes de emitir manifestações de vontade imputáveis aos primeiros.

I. PESSOAS COLETIVAS PÚBLICAS


As pessoas coletivas públicas representam a AP nas suas relações com os particulares
(ex.: nas relações jurídico-administrativas, pelo menos um dos sujeitos é, em regra, uma
pessoa coletiva pública). São dotadas de órgãos administrativos que exprimem a
vontade da entidade administrativa.
Os serviços públicos pertencem à entidade pública e atuam sob a competência dos
órgãos administrativos:
 Que existem em cada ente e funcionam na dependência dos respetivos órgãos
(são unidades funcionais meramente internas);
 Levam a cabo atividades materiais ou auxiliares para preparar e executar as
decisões dos órgãos das pessoas coletivas públicas;

As atribuições são fins e, portanto, são de responsabilidade das pessoas coletivas


públicas. Por outro lado, as competências são poderes, os quais configuram matéria dos
órgãos.

Sobre a distinção entre pessoas coletivas públicas e pessoas coletivas privada


Inicialmente:
 Pessoas coletivas públicas consistiam no Estado e demais coletividades públicas
territoriais e atuariam sempre e apenas sob a égide do direto público, detendo
capacidade jurídica pública;
 Pessoas coletivas privadas atuariam sob a égide do direito privado, possuindo
apenas capacidade jurídica privada

A certa altura:
 Pessoas coletivas passaram a poder atuar, também, segundo o direito privado;
 Algumas instituições particulares de interesse público passaram a funcionar,
muitas vezes, em termos de direito público.

Conclusão: as entidades públicas tanto dispõem de capacidade jurídica pública como de


capacidade jurídica privada, o mesmo podendo afirmar-se, de um modo geral, acerca
pessoas coletivas privadas.

O critério de personalidade pública e a noção de pessoa coletiva pública


Segundo o critério de personalidade pública, estas são “pessoas coletivas públicas, o
Estado e demais entidades coletivas territoriais – regiões autónomas e autarquias locais
–, as entidades como tal qualificadas pela lei e as entidades criadas pelo Estado, desde

Joana Oliveira, 2020


que não sejam qualificadas pela lei como privadas e desde que compartilhem dos
predicados da personalidade pública”.

No que diz respeito às pessoas coletivas públicas, estas podem ser:


i. Classificadas por espécies:
 o Estado;
 os institutos públicos;
 as entidades públicas empresariais;
 as associações públicas;
 as autarquias locais;
 as regiões autónomas;
 as entidades administrativas independentes.

ii. Organizadas consoante 2 grandes grupos:


 Estado: principal ente público, cujo órgão superior é o Governo;
 Entes públicos menores: dependentes, em regra, do principal órgão
do Estado (Governo) e exclusivamente administrativos (não
desempenham nenhuma das outras funções estaduais). As suas
atribuições administrativas têm escopo mais restrito que as do Estado
(a nível da matéria abrangida ou do âmbito territorial/pessoal).

iii. Distinguidas entre:


 Entidades territoriais (Estado, regiões autónomas, autarquias locais) –
têm um substrato populacional e base territorial, com carácter
originário e necessário, generalidade de atribuições, tipificação
constitucional e o poder para criar entre públicos a exercer controlo
sobre eles;
 Entidades funcionais (institutos públicos, que não personificam
coletividades, e as corporações públicas, que personificam
coletividades funcionalmente definidas) – não incluem o território na
sua definição por terem atribuições/finalidades especiais e por
deterem um carácter atípico.
iv. Distinguidas entre:
 Entes públicos dependentes – criados por outros entes públicos
autónomos por razões de agilidade e conveniência administrativa, não
tendo capacidade para prosseguir outros fins que não os do ente que
o criou (“ente-mãe”);
 Entes públicos independentes – gozam de autonomia em relação a
outros, tendo capacidade de definir a sua própria orientação, mesmo
divergindo da orientação do Estado. Há uma substancial
independência dos seus órgãos face ao Estado, não estando sujeitos à
sua orientação.

Regime Jurídico
O regime jurídico a que se encontram subordinadas, em regra, as pessoas coletivas de
direito público é um regime diferenciado e não uniforme.
É possível avançar algumas ideias gerais: a sua criação e extinção é de iniciativa pública;
têm capacidade de direito privado e património privado, podendo prosseguir atividades
de gestão privada; têm capacidade de direito público detendo poderes e deveres

Joana Oliveira, 2020


públicos; detêm capacidade administrativa e financeira; estão sujeitas a controlo por
parte do TC e à jurisdição do Tribunais Administrativos.

II. ÓRGÃOS, TITULARES E TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


Os órgãos podem ser concebidos como centros institucionalizados de poderes
funcionais (art.º 20, nº 1 CPA). São figuras organizatórias dotadas de poderes que lhes
permitem preparar, expressar ou controlar as manifestações de vontade da pessoa
coletiva pública.
Tipos de órgãos:
 singulares (1 só titular) e colegiais (3 ou mais titulares com regras especiais
previstas nos art.º 21 a 35, CPA);
 centrais (competência sobre todo o território nacional) e locais (limitado a uma
circunscrição administrativa);
 primários (competência própria para decidir as matérias que lhes são
confiadas), secundários (competência delegada) e vicários (competência de
substituição de outros órgãos);
 representativos (são livremente designados por eleição) e não representativos
(não são livremente designados por eleição);
 ativos (tomar decisões ou executá-las), consultivos (emitir pareceres e
esclarecer os órgãos ativos antes de estes tomarem decisões) e de controle
(fiscalizar a regularidade do funcionamento de outros órgãos);
 permanentes (existência duradoura) e temporários (não têm existência
duradoura).
Para que um indivíduo ou indivíduos se transformem em titulares do órgão é necessário
um ato formal que os ligue a ele: a investidura. Os trabalhadores da AP são indivíduos
com uma relação especial de serviço com os entes administrativos e que desenvolvem
a atividade dos serviços. Não têm poderes decisórios, limitando-se a preparar e a
executar decisões dos órgãos.

III. AS ATRIBUIÇÕES, AS COMPETÊNCIAS E A LEGITIMAÇÃO


A seguinte distinção (atribuições vs. competência) ajuda a compreender os fins que se
prosseguem e os meios jurídicos usados nesse sentido:
 Atribuições: são os fins ou interesses que a lei incumbe as pessoas coletivas
públicas de prosseguir ou realizar. Geralmente, as atribuições referem-se às
pessoas coletivas públicas em si;
 Competência: é o conjunto de poderes funcionais que a lei confere para a
prossecução das atribuições das pessoas coletivas públicas. Na maioria dos
casos, a competência reporta-se aos órgãos;

Estas limitam-se mutuamente porque nenhum órgão administrativo pode prosseguir as


atribuições da pessoa coletiva a que pertence por meio de competências que não sejam
suas, mas também não pode exercer a sua competência fora das atribuições da pessoa
coletiva em que se integra.

No caso do Estado, são as atribuições que separam juridicamente os Ministérios (órgãos)


uns dos outros. Os vários Ministros têm competências idênticas para prosseguirem
atribuições diferentes – estas encontram-se repartidas pelos vários ministérios, onde
cada Ministro possui atribuições específicas (finanças, saúde, educação), embora
usando para isso poderes jurídicos idênticos aos seus colegas de Governo (autorizar,
nomear, contratar, punir, etc).

Joana Oliveira, 2020


Enquanto os atos praticados fora das atribuições são nulos, os atos praticados fora da
competência do órgão que o pratica são, em regra, anuláveis.

A legitimação é a qualificação específica do órgão para exercer a sua competência numa


situação concreta. Existem assim fatores de legitimação:
 A investidura do titular do órgão – o órgão existe enquanto conjunto
institucionalizado de poderes funcionais. Se há órgão, há a competência;
 Os casos de impedimento – casos em que a lei impede que os titulares de um
órgão pratiquem atos ou participem em atos e respetivos procedimentos que
toquem os seus interesses particulares (art.º 69 CPA);
 As situações de falta de quórum nos órgãos colegiais (art.º 29 CPA) – o quórum
é a fração mínima do número legal de membros do órgão colegial cuja presença
é necessária na reunião para que possam ser votadas as deliberações. A falta
de quórum corresponde à falta de legitimação do órgão para decidir na
situação concreta;
 O decurso de um determinado lapso de tempo – Por vezes a administração não
pode praticar atos antes de decorrido um determinado período de tempo,
como por exemplo, não pode declarar a caducidade de uma licença de
construção enquanto não tiver decorrido o prazo que o interessado tem para
executar a obra;
 A autorização para agir – Por vezes, um determinado órgão só pode exercer
aquela sua competência depois de ter obtido uma autorização que visa fazer
um controle preventivo sobre a legalidade ou o mérito do ato que vai ser
praticado. Sem esta autorização, o órgão em causa está privado de legitimação;

Sobre a competência, temos:


 O princípio da legalidade da competência (art.º 36 CPA)
 A competência não se presume: só há competência quando a lei
inequivocamente a confere a um dado órgão, sem prejuízo de se
admitirem, a par de competências explícitas, competências implícitas;
 A competência é imodificável: nem a Administração nem os
particulares podem alterar o conteúdo ou a repartição da
competência estabelecida por lei;
 A competência é irrenunciável: os órgãos administrativos não podem
renunciar aos seus poderes ou transmiti-los para outros órgãos da
Administração ou para entidades privadas;
 É comum ainda distinguir-se as competências próprias (conferidas
diretamente pela lei ao órgão em causa) das competências delegadas
(que resultam de delegação de poderes).

 Critérios de repartição das competências


 Em razão da matéria: a distribuição de competências entre os vários
órgãos da pessoa coletiva tem em vista fazer corresponder um
especial interesse ou grupo de interesses a um órgão particularmente
adequado a realizá-lo pela sua estrutura ou qualidade.
 Em razão do território: a distribuição é feita atribuindo a cada órgão
uma determinada circunscrição ou área territorial sobre a qual atuar.
É o caso da repartição de poderes por órgãos locais diferentes.

Joana Oliveira, 2020


B. OS SETORES DA ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA PORTUGUESA
I. ADMINISTRAÇÕES ESTADUAIS

Dependem do Governo, sendo possível distinguir a administração direta e indireta do


Estado. Em modo esquemático:

Central

Direta

Periférica

Administração
Estadual Institutos
Públicos
Pública
Entidades
Indireta Públicas
Empresariais
Privada

 Administração direta do Estado (art.º 182, CRP)


Enquadra-se toda a atividade administrativa levada a cabo diretamente pelos
próprios serviços administrativos do Estado, sob direção do Governo, órgão
superior da administração pública estadual (artigo 182.º CRP)
Os órgãos centrais têm competência em todo o território nacional (ministérios,
direções gerais, inspeções gerais, etc.) e os serviços são organizados em forma
de pirâmide (relação hierárquica).
Os órgãos locais ou periféricos são órgãos da pessoa coletiva Estado que, na
dependência direta ou hierárquica do Governo, exercem uma competência
limitada a uma certa circunscrição administrativa (diretores regionais,
comissões de coordenação e desenvolvimento regional, serviços de finanças,
etc.).
 Administração indireta do Estado
Conjunto das entidades públicas, com personalidade jurídica própria e
autonomia administrativa e financeira que desenvolvem uma atividade
administrativa destinada à realização de fins do Estado.
Os entes públicos na Administração indireta do Estado podem ser
caracterizados pelo fato de não prosseguirem interesses próprios, mas sim
interesses da entidade mãe (o Estado) e não definirem, na sua atuação, a sua
própria orientação. É a prossecução de atribuições de uma entidade
administrativa por intermédio de outra entidade administrativa.
 Administração Estadual indireta pública
Institutos Públicos: pessoas coletivas públicas, de tipo institucional ou
fundacional, criadas para assegurar o desempenho de determinadas
funções administrativas de caráter não empresarial, pertencentes ao
Estado ou a outra pessoa coletiva pública. Há 3 categorias:
 Serviços personalizados: são serviços públicos de caráter
administrativo a que a lei atribui personalidade jurídica e
autonomia administrativa e financeira (ex.: Instituto do
Registro e Notariado);
 Fundações públicas: são patrimônios afetados à prossecução
de fins públicos especiais (ex.: Fundação para a Ciência e
Tecnologia).

Joana Oliveira, 2020


 Estabelecimentos públicos: são institutos públicos de caráter
cultural ou social, organizados como serviços abertos ao
público e destinados a efetuar prestações individuais à
generalidade dos cidadãos que delas careçam (ex.: Hospitais
públicos).

Entidades públicas empresariais (EPEs): pessoas coletivas de direito


público, com natureza empresarial, criadas pelo Estado. Embora sejam
pessoas coletivas de direito público, estão sujeitas ao direito privado,
uma vez que o seu fim é o lucro e necessitam de maior liberdade de
ação (facilitados pela utilização do direito privado).

 Administração Estadual indireta privada


Este setor integra a generalidade das empresas públicas – sociedades
instituídas para finalidades públicas sob a forma de sociedades
comerciais, as quais podem, excecionalmente, ser detentoras de
poderes públicos de autoridade.
Integram-se, ainda, as fundações públicas de direito privado de
criação estadual e as associações públicas de direito privado.

II. ADMINISTRAÇÕES AUTÓNOMAS


São características das entidades que pertencem à administração autónoma:
1) a prossecução de interesses próprios;
2) a representatividade dos órgãos (prossecução dos interesses pelos próprios
interessados);
3) a auto-administração (autonomia em face do Estado).

Segundo Vital Moreira, consiste na administração de interesses públicos próprios de


certas coletividades ou agrupamentos infraestaduais por meio de corporações de direito
público ou de outras formas de organização representativa, dotadas de poderes
administrativos que exercem sob responsabilidade própria, sem sujeição a um poder de
direção ou de superintendência do Estado nem a formas de tutela de mérito.

Desta definição decorrem os seus principais elementos constitutivos do conceito, que


são vários e cumulativos:
 Uma coletividade territorial ou outra dotada de especificidade dentro da
coletividade nacional global;
 A prossecução de interesses específicos dessa coletividade infraestadual;
 A administração autônoma quer dizer administração pelos próprios
administrados. A isto podemos designar de autogoverno mediante órgãos
próprios emanados dessa coletividade;
 Os respetivos órgãos gozam de autonomia de ação face ao Estado, estabelecem
a sua própria orientação na sua esfera de ação, livres de instruções estaduais e
à margem de controle de mérito, em suma, sob responsabilidade própria.

Tipos de Autonomia
 Jurídica: possibilidade de cada entidade administrativa se estabelecer como um
centro de imputação de relações jurídicas;

Joana Oliveira, 2020


 Administrativa: possibilidade de praticar atos administrativos, só suscetíveis de
impugnação direta via contenciosa;
 Financeira: garantia de receitas próprias e capacidade de as afetar segundo um
orçamento próprio a despesas decididas e aprovadas autonomamente.
Decompõe-se em autonomia patrimonial, autonomia orçamental, autonomia
de tesouraria e autonomia creditícia (art.º 238, nº 4 CRP);
 Normativa: possibilidade de emissão de regulamentos autônomos com eficácia
externa (art.º 241 CRP);
 Disciplinar interna: possibilidade de aplicação definitiva de sanções
disciplinares ao seu pessoal;
 Sancionatória: capacidade de aplicação de sanções administrativas;
 De orientação: capacidade de definir a sua própria orientação, sem submissão
a instruções de outrem;
 Organizatória: definição dos seus órgãos e organização dos seus serviços.
 Estatutária: capacidade de definição do seu estatuto;
 Auto-governo: governo mediante órgãos próprios, representativos, escolhidos
mediante eleição e não nomeados por entidades exteriores.
Modalidades da administração autónoma (distinção pelo fator territorial)
 Administração autónoma territorial: o território faz parte da definição do
substrato das respetivas instâncias (autarquias locais e regiões autónomas);
 Administração não territorial/corporativa: o território não tem relevo
específico na definição do substrato das pessoas coletivas que o integram.

Em modo esquemático

Freguesias

Territorial Municípios

Administração Regiões
autónoma Autónomas

Não Territorial Associações


ou Corporativa Públicas

 Administração autónoma territorial


o Administração autárquica (freguesias e municípios)

Joana Oliveira, 2020


As autarquias locais são pessoas coletivas públicas, de base territorial,
que asseguram a prossecução de interesses próprios do respetivo
agregado populacional através de órgãos próprios, por este eleito –
são pessoas coletivas públicas de população e de território (art.º 235,
nº 1, CRP).
Uma vez que as autarquias locais são pessoas coletivas de fins
múltiplos, podem, a par da sua administração direta, deter uma sua
administração indireta, formada por entes públicos ou por entes
privados. Assim, as autarquias locais podem criar entes públicos
indiretos de caráter institucional, empresas locais e fundações
públicas municipais; bem como criar em sociedades, associações ou
fundações de direito privado.

 Elementos essenciais da noção de autarquia local


 O território (uma porção do território nacional);
 O agregado populacional (os residentes);
 Os interesses comuns diferentes dos interesses
gerais;
 Os órgãos representativos da população.
 Cada uma das autarquias locais tem órgãos respetivos:
 Na freguesia temos a junta de freguesia e a
assembleia de freguesia;
 No município temos a câmara municipal, a
assembleia municipal e o presidente da câmara
municipal.

o Regiões Autónomas
Têm autonomia tanto do ponto de vista administrativo como no que
respeita ao exercício da função legislativa e da função política.
Contudo, não é por terem mais poderes que deixam de ser pessoas
coletivas de direito público e, enquanto tais, são naturalmente
administrações autónomas territoriais. Aqui, o território é
determinado tanto com base em critérios político-administrativos
como com base em elementos naturais, uma vez que se trata de ilhas.

A nível da Administração regional é possível distinguir a sua


Administração direta (serviços hierarquicamente dependentes do
Governo regional) e a sua Administração indireta (quer institutos
públicos regionais quer entidades públicas empresariais).

 Administração autónoma corporativa


o Associações Públicas
São pessoas coletivas públicas, de natureza associativa, criadas por ato
do poder público, que desempenham tarefas administrativas próprias,
relacionadas com os interesses dos seus membros e que em princípio
se governam a si mesmas mediante órgãos próprios que emanam da
coletividade dos seus membros, sem dependência de ordens ou
orientações governamentais, embora normalmente sujeitas a tutela
administrativa estadual.

Joana Oliveira, 2020


Tem como elementos constitutivos:
 Coletividade de membros;
 Criação ou reconhecimento por ato público;
 Estrutura associativa;
 Autogoverno;
 Desempenho de tarefas públicas confiadas aos próprios
interessados;
 Autodeterminação.

Podem ser de várias espécies: associações públicas profissionais,


associações públicas econômicas, associações públicas culturais,
associações públicas de assistência e segurança social, associações
públicas desportivas, associações públicas religiosas, etc.

Um dos exemplos mais típicos de associações públicas são as de


caráter profissional, que são associações públicas formadas por
membros de certas profissões de interesse público com o fim de
regular e disciplinar o exercício da respetiva atividade profissional.

As associações públicas estão sujeitas a um especial estatuto


constitucional:
 A legislação que lhes respeita é reserva relativa da AR (art.º
165, nº 1, s), CRP);
 Só podem ser constituídas para a satisfação de necessidades
específicas (art.º 267, nº 4 CRP);
 Não podem exercer funções próprias das associações
sindicais (art.º 267, nº 4 CRP);
 A sua organização interna deve basear-se no respeito dos
direitos dos seus membros e na formação democrática dos
seus órgãos (art.º 267, nº 4 CRP).

Poderes das associações públicas:


 Privilégio da unicidade: só pode haver uma associação
pública para cada interesse a prosseguir por essa forma no
país ou na circunscrição;
 Princípio da obrigatoriedade de inscrição;
 Quotização obrigatória;
 Controle do acesso à profissão;
 Autonomia regulamentar, administrativa, financeira e
disciplinar.

Quanto aos seus deveres e sujeições, têm de colaborar com o Estado


em tudo o que lhes seja solicitado no âmbito das suas funções e com
salvaguarda da sua independência; têm de respeitar na sua atuação
os princípios gerais do direito administrativo; as decisões unilaterais
que elas tomam são consideradas atos administrativos
contenciosamente impugnáveis perante os tribunais administrativos;
e a responsabilidade a que estão sujeitas é de direito administrativo.

Joana Oliveira, 2020


o As corporações territoriais: integram-se nesta categoria da
Administração autônoma as corporações de base legal e as entidades
de base associativa: comunidades intermunicipais;
o Consórcios públicos: pessoas coletivas públicas constituídas por
diversos entes públicos, para determinadas finalidades públicas
comuns, como, por exemplo, cooperativas de interesse público e
centros tecnológicos.

III. ADMINISTRAÇÃO INDEPENDENTE


A Administração independente é constituída por organismos criados pelo Estado, para
realizarem tarefas administrativas que lhe competem, mas que o mesmo Estado isenta
de subordinação e controle.
Apresenta as seguintes características:
 Os seus membros são, em regra, nomeados pela AR;
 Os membros designados pelo Governo não o representam nem recebem
instruções dele;
 Não devem obediência a nenhum outro órgão;
 Os titulares são inamovíveis (não podem ser livremente afastados de seus
cargos) e irresponsáveis pelas posições ou opiniões que adotem no exercício
das suas funções;
 Não podem ser dissolvidos nem demitidos;
 As suas tomadas de posição são públicas;
 Os pareceres, recomendações e diretivas emitidos por eles são, em princípio,
vinculativos.

Pertencem à Administração independente: o Provedor de Justiça, a Comissão Nacional


de Proteção de Dados, a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos
(C.A.D.A.), etc.

IV. NOTAS IMPORTANTES


(1) A ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA NO ÂMBITO DAS TRANSFORMAÇÕES DA
ATUAL AP
 Descentralização administrativa;
 Proliferação de formas de administração indireta do Estado;
 O movimento de desintervenção econômica do Estado e de
privatização de tarefas administrativas;
 A liberalização de antigos serviços públicos;
 O crescente recurso das entidades administrativas a forma
organizatórias de direito privado;
 Racionalização da administração;
 Expansão da autorregulação privada de interesses públicos;
 Criação de autoridades reguladoras;
 Europeização da atividade administrativa;
 A globalização do direito administrativo.

(2) OS PROBLEMAS DOS LIMITES DO APARELHO ADMINISTRATIVO


Não deve considerar-se como fazendo parte da AP, as pessoas coletivas
privadas de criação estadual que visem de forma imediata exclusivamente
fins privados e não disponham, em regra, de poderes de autoridade, as

Joana Oliveira, 2020


pessoas coletivas de mera utilidade pública, nem as pessoas coletivas
privadas com funções de autorregulação privada.

Mas podem nela ser integradas as referidas entidades administrativas


privadas quando realizem finalidade públicas e dispõem de poderes de
autoridade, bem como as sociedades concessionárias, cooperativas de
interesse público e “pessoas coletivas de utilidade pública administrativa” e
outras entidades privadas dotadas de poderes públicos delegados pela
Administração.

C. TIPOS DE RELAÇÕES FUNCIONAIS INTERORGÂNICAS E INTERSUBJETIVAS


Relações intrapessoais: as relações que se estabelecementre os vários órgãos administrativos
de uma determinada pessoa coletiva.
Relações interpessoais: as relações entre órgãos pertencentes a pessoas coletivas distintas.

I. RELAÇÕES DO TIPO GERAL


 Hierarquia (relação interorgânica): modelo de organização administrativa
vertical, constituído por dois ou mais órgãos com atribuições comuns, ligados
por um vínculo jurídico que confere ao superior o poder de direção e ao
subalterno o dever de obediência.
Relação hierárquica: poder de direção a que corresponde um dever de
obediência.
O poder de direção confere ao superior hierárquico o poder de emanar
comandos vinculativos sobre todas as áreas de competência do subalterno,
mesmo que este goze de discricionariedade, funcionando, assim, o poder de
direção como limite da competência discricionária do subalterno.
O dever de obediência existe sempre que se trate de ordens emanadas de
legítimo superior hierárquico, em matéria de serviço e com a forma legal (art.º
271, nº 2 CRP).
Para além do poder de direção, o superior hierárquico detém, ainda, o poder
de anulação e de supervisão, que é a faculdade de revogar, de suspender ou de
modificar, total ou parcialmente, os atos administrativos praticados pelos
subalternos.

Outros poderes:
 Poder de inspeção: poder de fiscalizar o comportamento dos
subalternos e o funcionamento dos serviços;
 Poder disciplinar: faculdade de o superior punir o subalterno,
mediante a aplicação de sanções previstas na lei;
 Poder de decidir recursos: poder de o superior reapreciar os casos
primeiramente decididos pelos subalternos, podendo confirmar ou
revogar e, eventualmente, substituir os atos impugnados;
 Poder de decidir conflitos de competências: faculdade de o superior
declarar a qual deles pertence a competência conferida por lei (art.º
51, nº 2 CPA).

As relações de hierarquia encontram-se tipicamente no âmbito da


administração estadual direta. Isto significa que a estrutura da Administração
direta do Estado é fortemente hierarquizada.

Joana Oliveira, 2020


Uma ordem ilegal deve ser cumprida, mas deve ser emitido um pedido por
escrito, com o objetivo do afastamento de responsabilidades do subalterno. Já
uma ordem ilegal que corresponda a um crime não deve ser cumprida.

 Superintendência (relação intersubjetiva): poder conferido ao Estado ou a


outra pessoa coletiva de fins múltiplos, como as autarquias, de definir os
objetivos e guiar a atuação das pessoas coletivas públicas de fins singulares
colocadas por lei na sua dependência.
Fixação de orientações estratégicas: a superintendência é caracterizada pelo
poder de orientação (orientar e controlar) das entidades a ela sujeitas.

 Tutela (relação intersubjetiva): conjunto de poderes de intervenção de uma


pessoa coletiva pública na gestão de outra pessoa coletiva pública, a fim de
assegurar a legalidade e/ou o mérito da sua atuação (art.º 199, d)).
Quanto ao fim:
 Tutela de legalidade: quando visa controlar a legalidade das decisões
da entidade tutelada.
 Tutela de mérito: quando visa controlar a conveniência
(administrativa, técnica ou financeira) e oportunidade das decisões da
entidade tutelada.

De notar que a tutela que o Governo exerce sobre as autarquias locais, quando
estejam em causa interesses locais, é apenas uma tutela da legalidade (art.º
242, nº 1 CRP).

Relativamente ao conteúdo:
 Tutela inspetiva: poder de fiscalizar a organização, o funcionamento
dos órgãos ou serviços;
 Tutela integrativa: poder de aprovar ou autorizar os atos da entidade
tutelada;
 Tutela sancionatória: poder de aplicar sanções por irregularidades que
tenham sido detetadas pela entidade tutelada;
 Tutela revogatória: poder de revogar ou anular os atos
administrativos praticados pela entidade tutelada;
 Tutela substitutiva: poder de suprir as omissões das entidades
tuteladas, praticando, em vez delas e por conta delas, os atos que
forem legalmente devidos.

Relativamente às autarquias locais – especialmente quando estejam em causa


atribuições exclusivas destes entes – não é constitucionalmente admissível a
tutela revogatória nem a tutela substitutiva

Joana Oliveira, 2020


O afirmado sobre a superintendência e a tutela permite uma mais clara distinção entre
Administração estadual indireta e Administração autónoma. Estes são os traços mais
importantes da distinção:

II. RELAÇÕES DO TIPO ESPECIAL


 Delegação de Poderes (art.º 44 e seguintes, CPA)
Requisito: não é possível delegar a globalidade dos poderes, é necessário
identificar o ou os poderes que serão delegados [art.º 45, a)].
o Natureza jurídica e noção de delegação
Tese da autorização: O ato de delegação visa facultar ao delegado o
exercício de uma competência que, embora condicionada à obtenção
de uma permissão do delegante, já é – antes da delegação – uma
competência do delegado. Assim, o delegado já possuía a
competência, necessitando apenas de uma autorização para cumpri-
la.

Tese da concessão translativa (ou alienação da competência): A


delegação de poderes é um ato de transmissão/transferência
(pressupõe que o órgão deixa de ter essas competências) da
competência do delegante para o delegado.

Joana Oliveira, 2020


Tanto a tese da autorização, quanto a tese da concessão translativa
não traduzem a verdadeira natureza do ato de delegação de poderes.
Na primeira, a competência é exclusivamente do delegante, não
existindo ainda no delegado antes do ato da delegação. Já no caso da
segunda, os poderes delegados deixariam de pertencer ao delegante,
sendo que a titularidade dos poderes passaria a ser, exclusivamente,
do delegado.

Nos termos do art.º 36 CPA, a competência não pode ser transferida


por um ato da administração.

Tese da concessão constitutiva: esta tese é a que traduza verdadeira


natureza jurídica da delegação de poderes. Ela vê a delegação de
poderes como o ato pelo qual um órgão de uma pessoa coletiva
pública permite que outro órgão, em princípio da mesma pessoa
coletiva, exerça uma competência que continua a ser do primeiro
órgão. Com a delegação cria-se, no delegado, uma qualificação para o
exercício, em nome próprio, de uma competência alheia. Está em
causa, por isso, uma verdadeira concessão constitutiva “em que o que
se transfere para o delegado é o encargo do exercício da competência
do delegante”.

 Distinção de figuras afins


o Coadjuvação – relação que se estabelece entre dois órgãos a que a lei
atribui competências iguais, que podem ser exercidas
independentemente por qualquer deles;
o Delegação tácita – verifica-se quando a própria lei considera
delegadas num determinado órgão competências que atribui a outro,
mantendo neste o poder de revogar os atos praticados pelo
“delegado” nessa matéria, bem como, em qualquer circunstância, o
poder de fazer cessar a “delegação”, chamando a si o exercício da
competência;
o Delegação de firma (ou de assinatura) – não constitui uma delegação.
Neste caso, um determinado órgão permite que um outro agente da
Administração assine em substituição do seu titular
 Regime jurídico da delegação
o Necessidade de habilitação ou autorização legal (art. 44º, nº 1 CPA);
o Necessidade de um ato de delegação de poderes (art. 44º, nº 1 CPA);
o Possibilidade de uma competência delegada ser subdelegada (crf. Art.
46º, nº 1 CPA);
o Do ponto de vista do conteúdo, o delegante deve especificar os
poderes que são delegados (art. 47º, nº 1 CPA);
o Os atos de delegação e de subdelegação estão sujeitos a publicação
(art. 47º, nº 2 CPA);
o A lei exige que o delegado ou subdelegado faça menção da sua
qualidade, no uso da delegação ou subdelegação (art. 48º CPA);
o O ato de delegação cria entre o delegante e o delegado uma relação
jurídica nova:

Joana Oliveira, 2020


1) A delegação cria para o delegado o poder-dever de exercer a
competência delegada. Por sua vez, o delegante pode emitir
diretivas ou instruções vinculativas sobre o modo como o
delegado deve exercer os poderes delegados (art. 49º, nº 1
CPA);
2) O delegante tem ainda o poder de revogar, de anular ou de
substituir os atos do delegado (art. 49º, nº 2 e 169º, nº 4) e o
poder de anular ou revogar a delegação (art. 50º, al. a);
3) Por fim o delegante tem o poder de avocar a competência
delegada. A avocação é o poder que o delegante tem de
chamar a si o caso concreto ou o procedimento (art.49º, nº
2). A avocação não tem de ser publicada, porém é necessário
que os interessados no procedimento tomem conhecimento
dela, geralmente, por meio de notificação.
De acordo com Rogério Soares, para que o delegante exerça
a competência que delegou não necessita de avocar;

o A delegação e a subdelegação extinguem-se por anulação, revogação


e por caducidade, quer porque os efeitos da delegação se esgotaram,
quer porque os titulares dos órgãos (sub)delegante ou (sub)delegado
mudaram (crf. art. 50º CPA); - ver slides!
o Para efeitos de reação contenciosa, os atos praticados pelo delegado
ou subdelegado têm o mesmo caráter do correspondente ato, quando
praticado pelo delegante. Por seu lado, nos termos do art. 199º, nº 2
do CPA, cabe recurso para o delegante, dos atos praticados pelo
delegado, recurso esse que é facultativo.

Concordamos, pois, com aqueles que defendem que se pode obviar à aparente
excecionalidade do recurso para o delegante por uma das formas:
o entender-se que se trata de um erro manifesto, sanável através de
uma interpretação corretiva;
o entender-se que, por restringir de forma desproporcional as garantias
dos interessados, a solução legal é inconstitucional.

III. RELAÇÕES DE INTERDEPENDÊNCIA


Nem sequer os órgãos que integram uma pessoa coletiva se encontram relacionados
por vínculos hierárquicos:

Por vezes, o exercício do poder de um dos órgãos está dependente de outro

O que sucede, por exemplo, com os atos da câmara municipal sujeitos a controle
preventivo da assembleia ou com os atos do presidente da câmara sujeitos a recurso
para a câmara municipal

Outras vezes existe uma independência mútua entre órgãos, como a que se verifica nas
relações entre órgãos de uma pessoa coletiva desconcentrada horizontalmente (ex.:
entre a câmara, a assembleia e o presidente da câmara municipal), entre pessoas
desconcentradas verticalmente (ex.: as relações entre órgãos de gestão das Faculdades
e o Reitor) ou no seio de um órgão complexo (ex.: as relações no âmbito do Governo,
entre o Primeiro Ministro e os ministros, ou as destes entre si).

Joana Oliveira, 2020


IV. COORDENAÇÃO, COOPERAÇÃO E CONCERTAÇÃO

Coordenação:
 Tipo de relação que visa o estabelecimento de uma sintonia e articulação entre
as tarefas próprias de unidades administrativas diferentes, continuando cada
uma dela a realizar as suas, mas fazendo-o de olhos postos no trabalho das
unidades concorrentes, de modo a evitar atritos e potenciar resultados;
 Ela estabelece-se entre 2 pontos: um órgão coordenador e entidades a
coordenar, na qual o primeiro ocupa uma posição institucional de supremacia
ou de superioridade relativamente aos segundos;
 A coordenação pressupõe a descentralização e a autonomia das entidades
coordenadas, bem como uma diversidade de atribuições que o coordenador
deve respeitar;
 De facto, a coordenação não implica uma subtração das competências próprias
das entidades coordenadas;
 Além disso, a coordenação pressupõe uma relação de verticalidade, acrescida
da complexidade de a decisão de coordenação ter de respeitar o âmbito de
autonomia das entidades coordenadas e o conteúdo próprio das competências
destas, de modo a que cada uma delas opere como limite ao exercício das
restantes

As relações de cooperação, que se apresentam como mais intensas, consistindo na


ajuda ou colaboração de uma das unidades correlacionadas na realização de tarefas
atribuídas à outra ou, então, na realização em comum de uma obra conjunta das
unidades correlacionadas:
 Da cooperação fazem parte um conjunto de técnicas de auxílio e assistência
recíprocos, mas voluntárias, entre entidades administrativas, sem que
nenhuma tenha a faculdade jurídica de impor a sua decisão às demais;
 O CPA de 2015 veio consagrar no seu seio algumas técnicas de cooperação
entre entidades, como o auxílio administrativo (art.66º CPA) e as conferências
procedimentais (art.77º e seguintes CPA).

Concertação: encontra-se estritamente relacionada com um novo modelo ou, no


mínimo, um novo estilo de administração pública – “a administração concentrada” -,
típica das sociedades abertas e que se apresenta como oposição ao clássico modelo
administrativo, autoritário, centralizado e burocrático
 A administração concertada marca tipicamente a participação dos cidadãos nos
assuntos administrativos tendendo, no limite, para uma administração
contratual, consensual e não autoritária. Está em causa uma forma de
relacionamento da Administração com os particulares;
 Também é possível referir-se à concentração quando esteja em causa o
relacionamento entre as distintas entidades públicas, já que a prossecução das
diferentes atribuições pode também ser objeto de contratualização.

Joana Oliveira, 2020


MAPAS MENTAIS

Joana Oliveira, 2020


Joana Oliveira, 2020

Você também pode gostar