Carta de Marear
Carta de Marear
Carta de Marear
,àqM
4^
h ty*$r
J3xtitnrtPnitrerMt^
Hf a i
C AR T A D E
MAREA DELINE A D A
4j
FREY ANTÓNIO
DOROSARia
Filho da Capucha de Saaeo António
do Brafi! /
Miffionario no dica Efládo,&c.
'.
l BIRIGIDA-AQ SENHOR
D. FRANca DE SOUSA
Fdãtge da CaÇx de Sua Magefláde , Cavalkyr*
&
profe{Jo> Comendador da ordem de Cbrifío^
& Coronel da Cavaliar ia de PernamljHCQ.
LISBOA.
N4 (Mc. d"e FELIPFE DE SO W SA VILLEXA,
AnngdeM. DCCXVIX.
£to íaííif as liemos nccefflxrtas*
Lâ i*w»*ihc ••• --**
g^áhMjWMHM^^
SENHOR.
STA Carta de Marear tem
demarcado o efclareado nome
de KM pelo melhor roteyro
mfuâ Airecçat òe a nobreza
para cem os homem he pren-
da defummorefpeyto\onde melhor fepodiati
fundar as linhas defta Carta os feusjeltces
aufpiciost do que na llluftriffima Itnha dos
ióufauou Seúfòens de *Fortugdl de q
t
M. K
foegarfi, ou ramo bem conhecido ? &
mais
qmndo efta nobreza não fo pela purpura de
q procede > mas feias próprias
acções dedica
Jem comroverfis a benemeritapefioa de V*
M o titulo âeTrincipe*com a veneraç&m
de pio & refpeyto de bmycoxfenào a menor
,
1LEY-
i f
L E Y T O R;
BORRAO dcfta Caiu
f oy parto da roifiaõ que
fiz algum tempo por ti-
tãs de P*r-
Capitanias
nãbucoj a devoção de
muytos , &
exprimental aproveita-
mento das almas me prefegue ainda
hoje pela Cai ta de Marear mas \é< ;
VALLE.
LI
t
LICENÇAS.
PO,defc tornar a imprimir M>m de
Marear % de que trata efta petiça*^ 8*
iroprefíi tornará para te conferir , & da
Licença $ corra & ícm ella*
cão correrá
Lisboai4,de Setembro de 1716.
Monteyrê. Rtbeyro kr.Tantahdí.
Guerreyre.
LlCENQAS.
V Ião eílar cõfòrme pôde correr
Lisboa 20. de May o de tjif.
fBifpo de Tagafle.
U 1 fa
^MMHM
;
CARTA
DE MAREAR.
PARA OS ULTRAMARINOS
do novo mílndò do Brafil.
L^
MARBAfté I
Í3E
foto, os ouvidos, Mçftre, & contra-
roeitre,a língua o Efcrivaõ o tacá
i
4 C A K T A
efphito Deos, que he a Oraçam
a
L
DE MARFAR. 5
naufragou miferavelrnentç, mas tau 5^
ço que carteou , oratido livrou-fe dm ^ ex
naufrágios d f àlma achou o porro on 1$ .
daialvaçao. Xi .d^
r
do^ nam da á cofta nclla morrendo ^cCUm ,
$ c A n ta
inasj para a parte do Lefte eftam
afilhas dos beneficias divinos , corç*
vem tomar eftas Ilhas, para abrigo ,
*mm
DE MAREAR, 7
lejar ,
ou figura corpo-
a poftura ,
U mm
DE MAREAR- 9
ta muy cetebre be o fomno , convé
rauyto faberlhe acauía,& por-lheoporr;
PRI
«i
DE MAREAR. tt
PRIMEYRA LINHA»
DA
CARTA
DE MAREAR.
SEGUNDA FBYRA. _
MEDITAÇÃO.
Do conhecimetq própria.
Onfidcrcmos hoje o q
fomos por natureza , &
acharemos , cj nada fp-
mos, porque do abiftno
donad* nos tirou a Biviaa Omni-
potência ,
para nos fazer crcaturas
emitentes, &: capazes da (ua gloria;
repa-
i* CA R TA
reparemos, que naõ fez Oeos efte
noíFi corpo ,de hum pedaço deffas
esferas releftes , & inCorruptiveis
Ceaf^oude outra matéria forre,
& perdurável, fenaõde hum pouco
dei >do; para que dando a pedra d*
ntiflUconfidieraçam nospè* de barro
dp noffo corpo , fe abataõ as rodas
da prefumpçam , &
louca fantezia.
Es pá , & cm pò te has de tornar,
diífe tfeot,aò primeyro homem v pa-
ra !be curar aquella tam atrevida
vaidade de querer fer como Deos
fendo bum pouco de barro: entre-
mos bem pela nofl* terra dentro ,&
tudo havemos de achar, que he terra
& mà terra , eon muytas miferias
penfoens. & tributos , n»il achaques
no corpo , inmimeraveis infermi-
Jádes na alma i & com fermos
taó
DE MAREAR. 13
taô vis , & mileravcis , ainda fcmos
vãos, &
ioberbos y De que teenfo-
berbecesj pó,& cinza? Pergunte ca-
da hum a.fi mcfmo. Defía confide*
raçaó havemos de o curar monos
tirar
TB^C.jí F ET.QJ.
MEDITARAM.
Dos Teccàdos.
a Divina Mageftadc. O
fegunda
ponto he>coníiderar as infinitas per-
das, & danos, que caufam a$ pecea-
dos , nos que os cometem j o pec-
car, nam he menos perda , que per-
dera Deos, o peccar hedefpojarie o
pecca*
ii tmimmmmÊÊmmammmmÊmm
,
DE MAREAR- i?
pecador de todas as graças , honras ,
privilégios v dons do Eípiriro Safi»
to, he ler inimigo de Deos declara-
do, efçravo do demónio, &
pela pre*
fente juftiç a condenado ao inferno *
ainda he mais, porque he fer o mef-
mo demónio. Hum de \òs heo dia*
bo , difle Chíifto a feus Difcipqios
cótótidendp por Tudas , que eftava
cm peccado mm
tal, o que fupoftò
Q.UA
r "'«*
carta
Quarta Jèjra.
mditacaM.
P* Morte.
W 18 CAR T A
como quem hade morrer, porq Cal
ferà a marte, qual for a vida*
£riRTJ FEY^J.
MEDITA C,AM.
Do fui^p.
,
SESTJ FEY<i(A
MEDITAC,AM.
Dg Inferno.
SJ&.
mm m
D E MAREAR. 23
S J B 8 JD O.
O
nha na
Soldado deyxa a pitria ami-
go,pay, &
máy, &
o que ti-
affcyçao,fo)eitâle a terras ef«
trantias, arrifea a vida em batalhas
perigofas, ate ficar morto, por hum
fraco eftipendio, Çc caduca gloria
do mundo; nos que (como diz Job)
todos militamos neftayida 5 porque
naõ faremos muytémais pelo pre-
mio do Ceo, & péla gloria eterna?
para nos animarmos a merecela ,
mm
,
bE MAREAR 2$
cto mundo , &rematando com Da-
vid, diremos: Huma íò coufa pedi ao
Senhor, & efíabufcarci fempre, que
more eu na caía do Senhor todos os-
dias da minha vida, que faõ os dias
da eternidade doCeo.
2) OMIKGO.]
MEDITARAM.
Vos benefícios © trinos.
Qlíatro confideraçoens té efía
Meditaçamj quaes fam os be-
neficiosj quem os faz o modo com
:
SE-
28 CARTA
SEGUNDA LINHA.
DA CARTA*
DE MAREAR,
SE GVKT> A F EJ^J.
MEDITAC, M,
Do Horta de fetfimani.
Ntrémos agora pelo mar
*ltodaP<*yxaõde Chrif-
to, fegundo o rumo do
Horto de Getfemani , a-
charcmosn c jj eçm ora am ao
ç \^ m
jefus, para nosenfinar,
q fempre, ma*
muyto mais nas tormentas do mar
dcfte
1 1 MH I
DE MARÉ AR. 19
deftemundo, havemos de recolher à
©raçam, por fer o único remédio, &
porto falvo de todos os trabalhos de-
ita vida. Chrifto orando tevç trifte-
?'
i
f CARTA
30
TE^C.J FEY\A.
MEDITARAM.
Da Columna.
mmmKmmÊmÊimmmmaÊmmmÊmmmÊÊÊÊÊ
,
DE MAREAR. gi
guardar as leis do mundo ? Se co-
mo Chriftaõs queremos imitar a
Chrifto , derrubemos o ídolo: Que
diraõ porque nos havemos de en-
:
MEDITAG>VM,
Do Ecce Homo,
e opm*
«-
34 CARTA
Q.PIHTA FEYXA
M E D T A C, A M.
I
Da Cruzas Cojlas.
mm**
DE MAREAR. 35
mano; naõ vai dentro da arca como
Noè, mas com a Arca as cofias , para
falvar Os pecCadores do diluvio de
feus peccadosj vay como Ifaac com a
lenha às cofias, para nella fer facrifi-
(#0
Cij SES"
t 36 CARTA
SESTJ FEX%J.
ME Dl T AC, AM.
De Chrtjlo Crucificado.
WÊmmÊmmmmmmmm—ÊmmÊmm
DE MAREAR; 37
noflbs peccados, 0$ pès, & as mãos
pregados com cravos groílòs & ef*
quinados, as feridas tara abertas ,&
rafgadascom o pezo,& folabanco,
da Cruz, a almofada da cabeça cora
chumaço de penas , a fronha
de ef-
pinhos, os rios de fangue que cor-
rem das fontes do Salvador j quem
tem que lavar, chegue a lavarfe na-
quclla derretida purpura, & liquido
coral , digamos ao Paftcr que eftà
,
nj SJ®>
A.
38 CARJA
S Â $ $ A p 0.
MEDITARAM
W>e Cbrijlo morto nos hraçoi
de/m May,
2>&
:
4° CARTA o
t> M IH G 0.
MEDITARAM.
Ve Chnjlo <%ef«fcit a da:
* ^^
DEMARE AR. 4t
vofla glorioía refurreyçaó refufcita-
rcy a húa nova vida,mascomo os La-
cares naõ podem refutam fe n bc
bradares, dizei, Senhor, à minha al-
ma* que deyxe a mortalha, & fepul*
tura dos vicios, & fe naõ baftaõ as
vozes de húa graça fuffiiitnte, írja o
prado de hú efficaz auxilio , que co-
mo forte cabo me leve á coa, vifto eli
tar tam deftrocado,aííioi como Jevaf-
ces o bom ladraõ , também d^ (troça-
do, mcteyme Senhor naquelle par-
to, onde fe recolhe em paz a arma-
da dos eícolhidosj a frota dos pre-»
deftinados , onde por meyo da Car-
ta de Marear , fe cantam os nauricos
celeumas pos todas $s eternidades.
Amen» *
EXER«
,
4« CARTA
exercício
de noffo Padre.
S. FRANCISCO
Na Segundafejra
Prefentava-fe diante de
Deos, como rco , & cul»
pado diante do Juizfu-
premo, fazendo exame
& sirvjitaçain de fuás culpas , pelas
quaes tinha merecido a pena eter-
na ,explicando , & conhecendo a
milícia, &miíeria cm que tinha ca-
bido, tendo fò efperança na roiferr-
cordia de £>eas > rogava humilde*
mente
mm
DE MAREAR 43
mente lhe perdoafle, appella ndo da
curía da Aia Juftija para a da fon
imíericordia,
é
NaTerçafeyrà.
Na Quarta feyra.
m
t G A R T A
44
mo benefícios, & conhecendo-fe de-
vedor de muytas tnaneyras, ven- &
do que naô podia pagar tudo , nem
parte , pedia a fua Mageftade, que
pois era tico, & liberal pa/a todos, os
que de coraçam o chamavam , oli-
vralTe daquellas dividas, efperando
íò em fua mifericordia.
Na Quinta feyra.
MOS
D EMA RE AR. 45
redor liberalismoo foccorreííe a«
,
KrSejla fejtra.
m
,
4^ CARTA
No Sabbado.
APrefentava a fua alma como
efpofa diante do feu Efpofo,
coníiderando que a alma era ef«
íu<*
No Domingo.
EXER§
48 CARTA
EXERCÍCIO
do Seráfico Doutor
S. BOAVENTURA.
Para os aproveytados.
Segunda feyr a.
U £M hc o que pidece?
Aqui fe hade fojeitaro
D*Bo-
nav. entendimento aedo fir-
cr*. mifllraarncnte , fer o Fi-
in 10-
cehdio
lho de Deos , verdadeyro principio
amo- de todas as coufas , Salvador dos
eis*
homens , & recotnp enfado r de todos
os merecimentos.
Ter*
WÊtm
BERTA RE AR 49
Terçtfeym
Quinta feyr**
Quadecaufapatitur?
sé
u* M '
[- d e marear. 51
Sejlafeyra.
Sabbido.
Dominga.
Quid ex hoc confequitur?
m 54
Firtus
CARTA
Ltudabiíis : defcobrio fe
que mais quiz o Senhor perder a vi*
da, porque fenaõ perdeffem as noflas'
almas,
íBeatus culpalilis
defcobrio-fe á
t
Ifieceyta efj>iritml9
SE a oração he tratb
to d'aima com Deos
, & contra-
, as almas
q tem o contrato dos dizítrfias reaes
para darem a Dcos,âp q he áe Deos
& a Cefar o que he de Cefar: as al«
%& € * rt a
migos, que tantas vezes
entram »te
q deyxáo a praça por Aia, as vir. U
tudes,
praçai
que dentro eftavãò
& ainda mal
,
poft a s m
, porque a texpe-
uencia té provado tantaa vezes
efía
verdade, retrocendo tantas
almas no
caminho da perfeyçaó
j as quaes
querendo levar o Cco como mun-
do, ficam prezas na maõ do
mun-
do,
„
*** f«gWido lugar , devem tomar
ousfuores nas potencias, para que fi-
quem livres do aceidente do ar que
,
íempre impede os movimentos para
oCeo, obrigando a que todas fe em-
preguem nas coufas terrenas diífi-
$
fuítando a virtude, &'fempre clama-
do que íò o mundo he o feu Ccfar.
Eftcs fuores haõde tomar na
fe
f#ufa da Oraçaõ Mental , no fogo
í
do
mm»
D E MâRÈAR. 57
do amor de Deos, deputando para
iffò doas horas cada dia, nas qnaes o
entendimento vay defpedindo nam
:
humilhado.
Oslambedoris vê feytos do Cal*
vario, porque â vifla do que Deos
illipadeceo por dos , tudo aos fica
doce, &fe ha alguma dureza no pey*
\q logo ft vay gaitando , ôcaodo a
irontadefia, gofloíà de padecer ,&
3e muyto gofiofa lambe as dore* , &
Paz eúiançnm dás penas, tudo quan-
62
que nunca
CARTA
fe faz a cama à nofla von
tadej mas para a vefdadeyra faude
eftasfaõas melhores? porque a ai
ma, que menos fizer a fua vontade
dormirá no leyto do Efpofo con;
ttiaisdcfcanço.
Para os acidentes de melancolia
j
que <aô muyto ordinários nes q en-
ttêó a con valecer de novo , Te devem
tomar huns pò* da terra com os o-
Ihosno Ceo, &
conhecida a diffe-
rença, logo foge a trifteza da*alma
;
porque julga por nada quanto pade»
ce, â vilta da Gloria que efpera*
Os xaropes faõ feytos da raiz
contraria ao vicio, que mais rcyna
em quanto efte naô cahe por terra
fcinprefedevc temera recahi te; as
Wtetás faõ fcy tas pela
maó do jfjum,
&: todos quantos entraõ nefta cura,
lo.
i
.._ r ,-~
DE MAREAR. 63
logo fe poera de dieta ,porque a-
inor entre regalos , morte de apo-
plexia. >
de marear; ; ê$
lugmentos, dadhe, gofto erri todo^
Fazei lhe a vontade 5 ade vmharlhc os
pe&famehtos,euydarmuyto #elle ,
& liam lhe dar occafiamdequeyxa*
ifto hè amor,
fer &
quem defeja te-
lo a Deos Noffo Senhor i que fò he
digno de fer amado, &
fòclle he ver-
dadeyro amante, guarde cilas coo*
diçoens.
Qiieyralhe bem, gofando-fe, &a
legrando-fe exceífivamente ,de fer
elle quem he ^ defeje > & procure *
£. tra-
j
66 CARTA
trazendo-o femprc perfehte , natn
lhe de oçcafiaô de queyxas: guar-
dando os feus preceytos , ifto hç &
terlhe amor , & para o exercitar ,
quem de veras dezeja fervir a Beos *
tome os divinos atributos pela or-
,
dem dos dias.
No Domingo coydar na fermo*
fura de Deos. *
E ij .ieftfó*
ri 68 CART A
tentarem, & forem do coração.
Quando entrar na oraçaõ
, depois
cios a&os coftumados de adoraçam
u%oap£ii contriçam ,& petiçam
;
]
pondofe em prefença deDcos,com
sdodtFèdiga: Creyo Senhor que
fois o que fois , & gozome
de feres
fermofiffimo (ou fapientiífímo, con-
forme o attributo do dia, em que
ora$) cníinaiinc meu Deos , & meftre
a vos conhecer, &
amar, que de mim
nada fou^ nada poffo, nada valho,
nada mereço, nada quero mais que a
vos, f&çzk cm mim voíía vontade*
Confiderando o prefente façamuy-
tos actas de Fè: Creyo
q meu Deos,
cila prefente , & que he fermofiffi-
ípo,& miíericordicííííímo, eterno. E
fallando com clle lhe diga; Mil para-
béns vos dou Senhor de feres taro
\ . . baila
l
-*^g
,
DE MAREAR. 69
Bello, (ou Sábio , conforme odii)
daynos a mim também An/os, & to-
das as crestaras, de ter eu tal Deos
Sr tal Senhor, a quem efpcro ver, &
fo C A R T A
Dcfía maneyra imitando os Sera-
fins, quefam os mai* amantes efpiri-
DE MAREAR. 71
fie o aftrolabio mais
certo para a
reisno"quefois, &
no que haveis de
•
fen
Eftc tofco, & feyo globo
foy do
mundo pequeno Imperial Corte j
duma Princcza do Cco Palácio en-
cantado da alma racional laberin-
}.
to admirável , &
do livre alvedrio
efcorial mais fumptuofo, dentro def.
ta medonha esfera eftava a Sé Ca-
thedral do Juizo, eftas ruinas foram
paços da vontade, num quarto def-
taabobada fc accomodava a biblio-
teca da memoria ^por eftas peças
falfas, tones de vento ,paiTeava, &
corria a vaga munda fantefia , neftas
7» GA R T A
eícuras coca vida desfe armavam as
Ceadas da íenfualidadc as
, logeas
da ambiçam,as efialagcns dos
fonhos,
«s cubículos dos defenhos as
, offici4
pas das ideas, as celias dos
cuydado*
os teatros em que por
fonhos faziaõ
os Demónios comedias
dos pecea*-
àm,
|
Nefte monre âo corpo humano
affiftiam os quartéis dos finco
fenti-
dos,porcíies becos fe alojava a in-
fantaria dos torpes, &
vãos penfa-
roentosv nas portas de palácio efta-
í
va dç guarda a companhia dos Jaíci-
ívos, a£bs dcftes buracos noutro
,
Com
Hl
DE^ MAREAR, n
Com toda a fabrica que cila bola
do mundo pequeno teve, & com to*
daa iafticnt, q fevè, avifao Efpiri-
to Santo pelo Eccleíiafticò , a to-
dos os mortaes, dizendo: \femor ef*
pjjudícij mei. Lembr ate cabeça viva,'
pos
,
DE MAREAR. 7*
tornados a«
pos bemaventurados ,
Ircts
gora triftcs. E na outra parte:
ver ao criftal, os olhos
bellos , &
eram.
os naó veteis como dantes
Com razam o tempo da vida he co-
repofteyro, que arma os
paços
mo o
de tapeçarias, & bordados , acabada
afeftatornaadefarroaros ricos pa»
nos,&preciofas colgaduras, dey-
xando as paredes nuas, &
frias. Aca-
defartnaó-
bafe a fefta da mocidade ,
fe as lindas armaçoens
dos tenros an-
nos,& o melhor frontifpicio da na-
tureza humana por violências da
,
7<* CArt A
do o foberano,pompofo*
rico,deley^
tavcJ do mundo: ácaveyra
do Prin-
«pe, a caveyra do pobre feraÕ
díflfc
rentes para os applaufos
da fama ,
mas iguaes nos eftragos da
morte :
morre o pobre morre o
í
Príncipe ;
porque a morte naò perdoa
, nem
aos palácios dourados,
nem aos paf-
tons albergues: &
que ma } s ttm OJ
oilo s ,Sf a caveyra
do Príncipe, que
» do pobre? menos tem, ou mç no ,
duraõ os oflbs do Príncipe,
porque
como faõ oíTos mais mimofos
, que
fe creáraô nos regaços
da fortuna
mais depreda os corrompe
a morte,
& gafa a terra: & na parte da cavey-
ra,q hea relíquia mais
perdurável,
taó caveyra he a do Príncipe,
como a
do pobre, a do illuftre, como a
do
humilde , a do rico , como a do po-
bre,
DE MAREAR. 77
bre, ado fabio , como a do idiota, a
do fenhor, como a do cfcravo.
Aquclla foberba cftatúa que *•
tormentou a idèa , & eternizou a
memoria de Nabucodonofbr , diz o
fagrado Texto , que tinha a cabeça
de ouro, 0$ pcy tos de prata, o vet*
tre de bronze , as canas de ferro, os
pès àç barro, baftou huma pedra ati-
rada fem maõ, para derrubar aqueU
Ia arrogante fabrica em que altiva
Mageftade unio artificioía os mais
preciofos metaes» que formou a na
tureza. Nam reparo em que a pedra
logotopafleno barro , havendo na
cftatua em que fazer mais íubido
emprego; reparo fó em que efte ou-
ro, efta prata, efte bronze , cfte fer*
ro, de que fe compunha a eftatua ,
Na
DE MAREAR. 79
Nabucos , Ccfares , Auguftos ,
p0mpeios,Claudios, Tiberios , A-
lexandres, Sdpioens, Ànnibaes, De-
métrio* , Credos , Darios H Maríos y
Sillas, ltmbray vos de mim Memor :
cença
8o GA R T A
cença para fallar : Memor ejlo judi*
cumet tâmòem eu tenho licença pa*
ralhe dizei: Cayeyra,onde eftão os
ícii$ cahcilos? lembrate y que quando
os penteavas > fezhs de cada prizao
dburadahúliço para os olhos, hiam
engãrjo para os fentidos. Que he fey-
to dos negros das íobrancelhas , co-
Rio arcos, fettas,& arpoens , que por
ferem negras por natureza 5 ou por
ai tificio, tanto esforçava© a neve, &
o burnido da tefía? E fitas lapas , que
tiverap a dous foes por hofpedes t
cri-
DE MAREAR. 8i
crilego pirata roubou a dei iàde, que
*iiefta caveyra íe adornava? Ah cruel
arpia Lah morte ! àh bichos- famin-
tos, & rai voíos 1 deík maueyra dei*-
m*m mm w&m
g2 C AR T A
a icmetriados acidentes, a fifono-
jnia das íeyçoens para çxcti plo> par»
cícarmento dos prefumidoj* Soes da
terra, fckna sntes de íer cavcyra,
vio num cíptli o a fragilidade da
forma, a mudaria do teirpo r;a mu-
dança do feu jçfío} diz Plutar» &
çho, que ria > &
chorava : tiaíc aos
€xcefíbs,que por feu refpe^tofe cô*
n eteram , deípovoaríe Grécia , abra-
zarfeTTroya, pelejarem Deofc* cn ~
trefi poiamor delia: iras tarrbem
chorava de ver com os feus olhos, o
que ;â era efcandalo da vifta, a que
fora idolo de tantos olhos, & de ver
€íb fi executada a cruel fentença
do tempo; dizem que com payxam
fc enforcara , &
quanto melhor lhe
fora verfe nefte efpelho, que talvtz
com elle melhorara a vida, enforcara
a vaida*
:
D EM A RE AR. 83
a vaidade, que a fez perder a vida.
As Elenas, Libias, Europas, pe-
xemfe neftc aftrolabio, &
veraõ co-
roo nos alterados mares da prefump-
çaó he fàlfa 4 &
vãa a fua fermcfura
aprcndão também os Nabuco$ r &
faíbaõ que tem o Geo pedras > para
fazer cm meuda arca a nui$ fober-
ba eftatua do mundo: aprendam of
Abfaloens r que cabellos de ouro
fervem hoje de omatc 5 à manbáa&
de deíengano 5 aprendaõ as Racheis,
que brevemente feraõ Saras, & de
Saras pafíaràõ logo a caveyras; & dc-
íengariem fe as Saras, que jà naõ faó
Racheis naõ queyraó contradizer
5
ra úniverfal 3
que fe compõem de
muytas figuras , he figura que vay
i.Cor.^ Vratait evimfiçm
a fl ânc ò njoftra
f :
em vida vereis
ra kijus mutidi : as fi-
da vida? Aqui fe vé
me a melhor flor
À?oc, que víoS. Joaóno feu. ^Jpocalyp-
d
o feno verde queyma o Omnt
*' 7
* :
íe ,
DE MAREAR. 87
gloria, & fermofura do mundo; 0m~
ms caro fanum , & omnis gloria ejus
quafifios agri , fe queyma , &
abraza
pondo nefte eíiado, combuftum ejl;
fe
putationis adventt.
9o C A RTA
tal lindeza cm taó pçquena planta ;
afontamíe cm cortes to las as flores,
& veado na roía formi digna, de
a
9* CARTA
tora, que naç acharão mais que ã ca-
veyra ; Mm m^enerunt nifi calvariam j
mais
,
94 CARTA
roais humilhada , & caftigada , pode
cftar afermof ura do mundo , do- que
nas caveyras, ainda das que foraó lan*
tas como Noemi, Rebecca, Michol
Ofl
de marear; §7
vêo , & íem rebuço > & fiot mândâ
ver nella como eiit hum eípeího w»
Vò : Mefnor eflo jtidkij toei ; vcji*
CDO*nos todeà nefle efpelho* porque
todos nos havemos de tornar nelíe i
r*8W
DE MAREAR. 99
âo compoflo humano , vendo , 8c
vendo fe cntaõvil , & afquerofo re-
trato, nam pôde deyxar de fç htmú*
lhar , & compun gir , ccnfiderando
o trifte , & miferaveí fim que hade
ter. O pavão quando olha para as
fuás plumas, & vè os penachos taô
luzidos, &efmahados de vivas co*
res, inchafegrandemente efiende a
peícoço , &
encrefpa-fe formando
hurna loberba roda , mas tanto que
olha para os pès , & os vc disformes,
enrugados, &
polidos, logo desfjz a
cola abate a roda ,
í fica trifte 1 & o
que íuccede ao p4Vaõ com os pé? ,
nos hade fucceder a ròs com a ca-
beça : elle com a fealdade dos pca
abate a roda^ foberba: nó? com a íe*
aldade da cabeça t nos havemos de*
Jnimilhar dâ cabeça acé os pé : o pa-j
G i; vaãj
,
ico C A R TA
váocom os pês, q hc o feu fim, íe
humilhai ohomcíBcoma caveyra,
que he o nm do fim em qne fe torna
com o fim da morte , que vè na ca*
veyra, abata as rodas da preíumpçaõ,
deyxe de fer foberbo, & fcrá logo
fanto : veja-fc nefte efpclho que
,
com fcr tam efcuro , Jie mais claro
queocríftal para os defenganos da
vidfíi. Os efpelhos de vidro foram
inventados, como difre o Eftoico
,
para conhecimento do homem , &
elles fam os que fazem o homem
roais defeonhecido , porque como
íe vem neiles por vaidade > como
íeenfeytam para enganarem,
tielles
D E MAREAR. ior
es vo0o$ chriftaes , as voífas venezas
fam os q vos matam vendo vos ncl-
les. Eftesfeyos, & medonhos retra-
tos moftramvos a verdade dizem-
,
&
mo que me buíco, que me retiro.
Tfifte forte ! cruel praça! na flor da
idade me tiras a vida? Com as lagri-
DE MAREAR. 105
Croceum precopore o;
l
, florem '\
ln\>eniunt folijs médium cingentthm
aibis.
J
f|P4 '<3 *RT*
*efpe IJiado^ Narciío vendo- fie /jo
,
rece*
DE MAREAR 105
reeer vaidade. A fortuna do mundo
chamafe vidrenta, porque 0$ anti-
gos lhe confagraraô hum templo de
vidro; quem fe vè nefie efpelho, ef*
tufe de fe ver nos de vidro porque :
o futuro, chorar
ternos de prevenir
padado, emendar o prefente.
vedes ? ouvis? acabais jà de vos de
feoganar o que he o mundo grande
& pequeno? O que he a vida em fo
lha, em flor, em fruto? o que íe tir
Au^
naõ havia de morrer: Me quem quaj
Cornou morituwm dtUicerdm mortuus erai
I4#
Vendo morto o amigo defenga
r\OUÍ
DE MAREAR. 107
fioufe que a ametade da fua alma,
Vtmiàium anima: me *e,fe podia a partir,
& deyxar a outra ametade: a melhor
prenda que os antigos podem dey-
xar aos feus arnantes r ou amados, fie
cfta relíquia, cfte efpelho da morte:
Memor efto jnãtaj mei ,
pela virtu-
io8 G AR TA
potencias de Júpiter , a$ arrogâncias
de Marte, os roubos efe Platam
, as
negociaçoens de Mercúrio, os juízos
de Parit , os raptos de Ganitnedes
as intemperanças de Bacho , os de-
leytes de Vénus , as traveffuras de
Cupido, asprefumpçoens dç Palias,
as riquezas de Juno , as nobrezas de
Cibelle, as cabeças deMeduza , as
maçansde Atalanu , as fenfualida-
des de Flora,os encantos deMedea,
pois efpelho tain grandeno que re-
prefenta, no qne
alcança , no que
deícobre; efpelho tam claro, taó vi»
vo para deftruir vaidades , & humi-
lhar íoberbas, nam no ha como efte
fce mais eiigenhofo , & poderofo
efte efpelhoque todos os efpelhos
de Archknede», qiie com os rayos
do Sol queymàrara húa ar nnsda. Hu*
/na
DE MAREAR. 109
ma caveyracotn hu íò rayo do Sol
de Juftiça , com hucna íê infpiraçam
&
do Cco , bafta para defiruir , abra-
zar quantas armadas põem no mar
defle mundo o inferno, quantos ex-
ércitos pòcje por em campo a vaida*
de do mundo.
Em Pariz havia hum Pregador
da Ordem de noíío Padre Sam Do-
mingos, que coftumava pelas Qua-
refmas fabir a pregar pelas Cidades
circunvizinhas. Certa Matrona de
mais vaidade, que virtude, pediolhe
que quando vieflè na feguinte Qua-
reíma , lhe trouxefle hú eípelbo de
Parjz, Promcteolfae o ftdigiofo
que de boa vontade o traria , como
fez na Quarefmã que logo íe fe-
guio , & antes de lhe moftrar o cfpe-
liOjdííIeque mandafle ajuntar a fa-
mília
,
no CARTA
milia } Sc a vizinhança, para verem
todos o efpclho de Paris , que tinha
tnuyto què ver: junto ao auditório,
tirao Pregador de huma caveyra
& diz; Vós íenhora me pcdífíes, hum
eípelho de Pariz , eif-aqui o melhor
tfpelho que ha em Pariz , & em to»
doo mundo, naõ para toucar prima*
veras , concertar cabellos f pintar
coraçoens, mas para reformar cofio*
toes, desfazer vaidades, defenganar
loucuras: éfta caveyra foy o que voa
agora íois, vos brevemente fercis o
que ela agora he. Palmarão os ou^
vintes a ítnhora da caía que pedia
oeípelfio, foy a que mais fe apro»
veytou do lanço da caveyra , porque
mudando de cores* mudou de coí»
tumes, dcfprezando , o munlo , &
fuás vaidades, bufe® u a melhor, &
teerna
DE MAREAR. in
terna fermofura.
Aqui tendes Chrillãos o melhor
fpelho que ha no mtstndo 7nam dos
jue com falfo refplandor enganam
iosque nelle fe vem para ferem vit
os; mas he efpelho eíftc , que com
rfeuro , & defeorado gofío vos
iefengana, clara, & efficazmente diz
jue affiai como o vedes haveis
íe fer: Sk enim erit , U tuum. Quafi
ttcat,à\zLyra, fejimes operart btmum
hm Vivis y quia pojl mortem nnn pote*
is. Que vos reíolvais logo a obrar
?isçxi%ím< HH
na CÁ R T A
a Àonibal na batalha da* Canas: Cnm
potui noiui cumVoíui nonpotwQuan- :
—
ii ^ C A R T A
ciai de ju ftiça, que por condenar , fir
t$É MAREAR, i0 :
H ;
i;- "veyf*'
w^^m^M
tí6 C A R T A
veyra , In eum qui dtcitnr CafoarU
locus, apar do defenganoo remédio,
, & cõ
a rniíericordia fobre a miíeria
-hum <tefcante de arpa & cravo, Cruz
& caveyra, a letra que ao fom dos
doiís inílromentos canti o Salva-
dor do mundo ,he efta iTopjde meus
qHidfecttibt^autinquo contriUuVt te?
rejponcle vuhi.Pergunta o Senhor
da Cruz ao feu povo,q he o que lhe
fez, em que o moleftou para o offen-
der, & tornar a crucificar, & diz que
lhe refponda%e[pmie núht. Eu
;
Veneris in règnum
tuum : nam temos
Senkoroutra reporta que dar ás voí-
íasjuftas, & clementillimàs queyxas,
que fazeis de mais que pedirvos
fròs,
que vos lembreis de nós,ufandocom
nofco de miíericordia , antes que ic-
emos caveiras , & por final da dor
que temos de vos havermos oíFtndi-
d° > & do propofico firme de nunca
Hiii vos
li« C A R t A
vos oflfetiáeriDos, Sc de/prezando, &•
aborrecendo os engano* do num-
do, damos por volta da letra , que
nos c.anjujies ? miíerieordia , miferi-
cvsáhé
M-
DE M AKEaR. i »9
LAMENTAQAQ.
fie bum ChriJlaÕ ?
arrependido no fuaVt
P R O L O G p.
S Aves, diz Santo A-
Vide»
goftinho, proferem vo mus
too CARTA
por eíkemisfaio, o Sabeá da praya
hç o meftre. da Capella pelo muy-
to ,
que arremeda o Melro , & Rou-
xinol de Portugal, para huma Ia*
RKiitaçao tem linda voz, alta, agu-
da , Tuaye, enternecida paflaro fo*
;
litario, &c penitente no canto, no
habito , na habitação : & o canto
,
como digo, fuavemente trifte , fenti-
damente quebrado , ou foílenido a ,
DE MAREAR izt
Be rigores do tempo/ pafla a vida
cantando , ou chorando , por ilTo &
o Real Profeta David vendo na5
Aves do Ceo tantos exemplos de
vida auftera, &
era paífaro íolitario
penitente, dizia que
, Ave do monte
^
pifo
te< ?°
Pcllicano da foledade, des paííaros^s
mais recolletos tirava o penitente^
ReJ/ retiros do mundo, abftrações in ' 110
paííer
os prantos dos Pfalmos f entendi PíaK
que com as mefmas vozes que asl?\1#
A J r-i - i
Simi-
.
Aves do Ceo cantão , louvando a »*{*•
Deos , choram lamentando o pecca* rU m
dor ; o quê ao vulgo parece canto a ^ elIi ~
David parecia choro, & naõ lhe pa- ioiitu-
reciamal, porque de todas asmufi piTi!"
cas das Aves , nenhuma agrada mais lor 7 *
*mm
i22 CARTA
Vox-
gemer , & fufpirar } fc a nofla alma,
turtu- diz o mefmo David, he coroo pafla*
ns au-
dita ro eirado do laço, íe arrependida , Sc
eit in-
terr4
agradecida quizer cantar , ou pa-
nottra melhor dizer, chorar , íufpirar,
ra
ionec
vox & lamentar , que he para Deos o
tua ia
aun-
melhor cantar, façaffe Sabeà da pra-
bus ya:no fuave ,& enternecido canto
méis
•voz defU retirada Ave lamente, chore ,
enira
clame, lamente as nviferias defta vi-
tua
dulcis da j chore a feus peccados , clame á
Cát.i
Anim. Divina mifericordia, que gofia
muy-
noftra
íkuc
to deffa mufica-, &
fe o Seráfico Sam
paffer Boaventura Doutor, faz da alma
«repta
eil de devota filomela j hum Sabeà da pra-
laqueo
venã-
ya, que he o Houxinol do fiiafil,
tíUlH,
porque nam fará a figura de huma
Piai.
alma penitente por nos nam tirar
,
orara
OE MAREAR. 12?
màra o metafórico Sabeá da praya
o fundamento da fua lamentaçaro
para honra ,& gloria da Ave chea
da graça , da Senhora do Rofario,
advogada dos peccadores , confola-
çam dosaffligidos , alento dos peni-
tentes.
Apoc. 8. 13,
ay do entendimento perdido } ay d^
vontade cega , ay da memoria de-
sencaminhada , ay dos habitadores
da
a
»H C a R T A
da cerra em que o apetite reina ,&
razam obedece , ay dos habitadores
da terra , que íe naó lembraõ que
faõ terra , ay dos que vivem na ter-
eis ra > em 9 ue ha peccados como terra;
quia ay fobreosaysdo Ceo , pelos caiii-
vimus gos que a ameaçam pelas condena-
,
*^
DE MAREAR.- is?
los hombros deftas áreas , me eflà Pecca
mfinando , que os meus pecca- viíu ~
x per nu
* e .
lixla-
13 qual o naq fragantc entra no por
cryvria.
las no-
aesle grimas 1
x étutn
raéuns
«tia-
cri mis
méis
.ítratíí
JF O GADOS. ,
xiieum
rigaba JJHGJ 7> A.
ÇfcV
4éf
ALG a n AIS.
<P01VC A.
CE%IN H A Et
<^I0 EE%MOS&.
FHa.
TA.
DE MARÉ AR fQ7
T aTVAMVNTTJ.
CJ M A^JGKBE.
^
refa.
. S.ANTÓNIO G%AKVE.lt*
S. ANTÓNIO ME%IM.
g$
%I0 DE S. M1GVEL. ti»
McoCcoa
*
meSça
*
cOm os ays di*H ua -
ruiu •*
baf<
ia8 C AR T A
Kafhrám tantos Rios para defafogc
tò*-^ tantos aysj nao iey ie o meu pran-
bHonf
co ^9. mar ^ UC cu ^ ra as ar eas j nam
mete icy íe m lagrimas véceràõ as culpas;
& tig. nao ne iem dor eíie ay ; nam he fetn
5*
piai!
callía eí^ a <*or,
-
P or H naó v ej° j nam
i&ú acho, naõ leyo com quem me poíTa
compara/j bufeo o primeiro pec*
fe
cador do mundo, acho nelle cem«an-
nos de penitencia por hum fò pec-
cado, & em mim nad fe achará hum
dia, nem huma hora de verdafdeyra
penitencia por milhares dç milhares
de peccadosj fe me lembro de Da-
vid peccador , corrome de naõ fer
como David arrependido, fe trago
á memoria as fraquezas de Pedro,
confudome com as amarguras do
feu pranto, fe olho para a peccado-
ra do Evangelho, & viro fobre mim,
vejo
DE MAREAR. *29
VCJo os feus efcandalos em mim , &
nam vejo nclla arrependimentos
meus: fe differ que fuy como o pró-
digo na relaxaçam -da vida , direy
bem , mas pródigo reduíldo , pródi-
go emendado , com que verdade o
Iiey de dizer ; A
mais ceita verdade
^
he,fereu humpeccador faõ fing lai "/£
que no dia do Juizo fe verá que 01 g« $
no numero, ou nas circunftancias dot n«.
peccados , ninguém me cntga ? mm-
igualar, &como de mim tenho elle
conceito , cuydo que quantos mares
nes
^
& rios ha no mundo naó baftâopa- ^ra-
,
SP*
,
130 CARTA
Doutor Santo Agoftinho, no li-
vro das fuás ConfilToens diz que na
fua mocidade fervera em peccados
fegundo.o Ímpeto de feus vicio?} elle
fervia como niarè , mas eu como
ferícordia i
facilidade do remedia ,
n«°
^ m
c ^ e i am íublimadas íobrç todas
«jus a$ voflas obras infinitas , eternas, tn«
OBMAREAR ff
*)~\
Tuum ^
de mii)
C' Q
^ l3e €U > P or q ue aíT5m como
propi fortes mais offendido que de
na <* todos os mais peccadores , pela in«
fulgência j &' remiflam dos meus
mmel
muita peccados mais conhecido,
fereis
cni m .
^
louvado , quanto mais me per-
pfaim. doares , mais fantificado
íerà o voflb
vâ^vinome , mais glorificada, applau- &
b*un-
*da a vo ^ a roifericordia no Ceo , &
.tibus na terra.
tcr
ra. Dos meusays , dos meus peza-
rcs ' das m 'nhas ^ontriçoens , quero
í/'ir.
paliar às de todos os habitadores da
terra , íobre que eftaõ cahindo os
ays da Efcriptura $ a lamentação naõ
he
,
DE MAREAR. 135
ht fò para os pcccados particulares
também entende , por amor ,
fe &
rharidade , aos dos povos peccado-
res: &jà por peccados cahigados.
Jeremias lamentando a Jerulalem, v
dava ays, com bem de lagrimas ; Ay bije-
^
dc tijeruíalem, fem eu íer Profeta^;
do futuro , mais que teftemunha , & **•**•
çomplice do tempo paliado , & pre
fente pofíb lamentar, &
dizer por
nl «*"
taõ , ou chorão os Sabeàsda p«aya »
m mm
w.
136 CA R T A
paíTàgeyros,q nam tem lembrança
dos íucccflos paliados, nem provi*
Vencia dos futuros mas eu que co-
j
DE MAREAR. 137
|
ác vinte &
quatro annos de capti-
veiro de Olanda , nam
desfazendo
fof-
no valor dos Pernambucanos ,
fe inilagrofamente
reftaurada j &
porque no efpaço de quarenta , &
dous annos da rtftamaçaô , fenam
ferroo-
reftaurou ate agora aquclla
fura aquella gloria ,
opulência, co-
,
£'
tido tantas mudanças , tantas deftrui- ,
i 98 C A R T A
nam menos de cinco mudanças , cin-
co caftigos, 00 pragas tem padeci-
do Pernambuco , a guerra de Olan-
da, a guerra dos Palmares, primey-
ras bexigas fegundas bexigas ,
, &
mal contagiofo , a fome de farinha
,
ifto pòr tempos interpolados entre
mm
"1 m 141 CARTA
maò efquerda na fortaleza de Tá*
m.
'
1
íi âs , &
Certões deCerinhaei&co-
r
meçao as canas atè as Alagoas , no rio
de S. Francifco cftaõ os pés : a efte
egnimatico corpo, myftica cfta* &
túa tem atirado muytas pedrada; o
Ceo ; com
Pernambuco neftes
Sc
calamitofos tempos ter defcahido
meyro dos feus brios, ainda naoi ca-
hio de todo porque Deos he de
,
- ^
DE MAREAR. 143
cripturt, & reparando nos cafligos
antecedentes defta faral terra $
nan? Ceci-
te Beraque tenha o fim na realidade, dic ce-
cidit
que teve em fonhos a efhtúi ce Baby-
Nabpco ? quem nam. temerá que ca- lcn,
mag-
ya toda em pezo ella Babilónia pc na.
A poc.
quena, como cahio a gran Je. ? Quero 18. z.
nam temerá que venha outro foge IgíturDomí
mayor que o do mal pafla do , que a- nus
pluic
braze, & confuma a todas tilas Ca- fuper
pitanias , como abrazou , & íoverteo mam
Sodo-
y
as Cidades de Pentapolt * Sabendo &Go-
mor»
o Profeta Ezechkl , queDeos que bum
ria deftruir, & aniquilar o povo de phur,
fui-
m mmws*
,
,44 CARTA
ainda taS mào como dantes, fe ain-
da perfevera náquellas culpas , por-
heu
que fuy jà caftigado quem fe bade
}
heu
elle ? quem hade
,
heu, atrever a orar por
Do-
mine pedir a Deos ,
que fe riam confumaó
Deus
as relíquias de Pernambuco? Sòhum
ergo • *
y"
povo de pernambuco , fò por huma pn
srzaõ, ío por fauma palávra> porq be tutíi~
woíío povo 5
Per doa y ao voíío povo ms
li per
___ ;
146 CARTA
perdoay
J
Seohor.diz o Prophetajoel,
manu * ,
OE MAREAR. 149
comBarac, Juditcom os de Betulia^uw
u "*
as voffas milericordias, q catemos, &^ v c
as
m
DE MAREAR. içi
as offenfas , & naõ
tenho língua p^ra
remédios; tive coração para aggravar
a fuma bõdade,& naõ tenho coração
para fentir,taõ enormes aggravos.Oh
Deos da minha alma, do meu coração
Sc dos meus olhos, eu bem qoizera q
na pólvora de minhas culpas, appliea-
do o fogo da minha dor .cftahífe tfíe
penhafeo , arrebenf affe efta mina; bé
tomara ter hum pezar, fauma pena ta*
manha como a voffa mifericordi ^mas
onde irei bufear fontes para os olho?,
amarguras para o coração, lavatório
para a alma fenaõ no immenfo mar da
Voffa miferkordia ; q he Águia que
Uie traz a voffos pè* 5 &* 4 rae £*z re-
parar que tendes tãcas fontes abertas
tantas entradas,& portas francas para
todo o peccador, quãtas faõ as chagas
»do tncu Senhor Jefu Cfarifto , pois o
«oral
iça CARTA
ral deretido de caõ prefiojb Sangoc
ha de ptemetir q fe eódene hú Cbrif-
tâô,q ptopoé com voffa graça emen-
dar a vida,confcfíar culpas., perdoar
aggravos íreftitoirjviver,& morrer na
vcíla Fè? Remato Senhor o men
pe-
zar,có três nos cegos do crer,efperar,