A Face Revelada - Elaine Elesbao
A Face Revelada - Elaine Elesbao
A Face Revelada - Elaine Elesbao
Sobre a obra:
Sobre nós:
E
A
SCALADD
AEV
A
I
A FACE REVELADA
Supervisão geral:
Gustavo L. Caballero
Revisão de textos:
Tania Hernandes
Capa:
Décio Lopes
Diagramação para o formato E-book:
Elaine Elesbão
Introdução A revelação
Capítulo I A amargura
Capítulo II A família
Capítulo III A separação
Capítulo IV A agonia
Capítulo V O acordo
Capítulo VI O reencontro
Capítulo VII O apelo
Capítulo VIII O arrependimento
Capítulo IX A resignação
Capítulo X O casamento
Capítulo XI A lua de mel
Capítulo XII Os planos
Capítulo XIII A mudança
Capítulo XIV O aniversário
Capítulo XV A festa
Epílogo A dúvida
Introdução
Uma senhora alta, imponente e bem vestida abre a porta. O seu rosto
automaticamente se transfigura quando olha para o Thomas. Ela se segura na
parede, tenta esboçar alguma palavra e não consegue. Durante uns trinta
segundos ela nos olha boquiaberta sem se mover.
Sinto que algo está errado, um pressentimento inesperado começa a me
cutucar. Não sei a razão, mas acredito que a verdade será outra e que muitos
segredos ainda esperam para ser revelados.
– Como vai, Thomas? – Ela inesperadamente pergunta com um leve sotaque.
– Bem. E a senhora, como vai? – Dirige-se a ela como se esse tipo de
diálogo entre eles fosse corriqueiro.
– Bem, também. – Ela responde mais calma. – Vocês gostariam de entrar?
– Sim. – Respondo rapidamente, e só então ela me nota .
– Presumo que o William não veio. – Constata, ressabiada.
– Não. – Thomas diz rispidamente.
A senhora nos dá passagem e faz sinal para que entremos. Entramos, ela
fecha a porta, e nós a seguimos. Somos levados até a sala de estar, que é bonita,
clara, caprichosamente decorada e aconchegante.
Ela se senta e indica o sofá para que nos sentemos exatamente na sua
frente.
– Você é... – Ela me olha de cima a baixo.
– Sou Eva Fiore, a namorada do Thomas. – Respondo timidamente.
– E como a senhora sabe quem eu sou? – Thomas a encara com o olhar gélido.
– Sei quem você é porque eu o vi nascer, acompanhei o seu crescimento e
porque jamais me esqueceria do seu rosto. – A voz dela é firme, segura e o olhar
duro que devolve ao Thomas me faz pensar que esta conversa não será nada
fácil.
– E quem a senhora é? – Thomas assume uma postura desafiadora.
– Se você chegou até aqui é porque sabe quem eu sou. – Responde ainda
muito segura de si.
– Sei que o seu nome é Lucia. – Thomas diz com a voz embargada.
– Então, você não sabe de muita coisa... – Ela fala de um jeito enigmático
que me irrita muito.
– O que eu deveria saber? – Thomas replica.
– Na verdade, você não deveria saber de nada, nada mesmo. Estranha-me
que esteja aqui, que saiba o meu nome e o meu endereço, não posso
compreender como isso aconteceu. – Ela desabafa, e percebo que o Thomas se
aborrece. O olhar dele parece enfurecido e o semblante fica ainda mais sério.
– A vida é cheia de surpresas, mãe. – Thomas diz ironicamente.
– Mãe? Não, Thomas. Eu não sou a sua mãe. Gostaria de ser, mas não sou.
Nem de fato nem de direito. – A voz dela começa a ficar tensa e sua postura de
dona da situação começa a desabar.
– Será que podemos ser mais claros aqui? – Intervenho. – Dona Lucia,
viemos de muito longe em busca de respostas e a senhora de alguma maneira
deve isso ao Thomas. – Os meus nervos estão em frangalhos.
– Vieram em busca de respostas? – Ela questiona quase que para si mesma.
– Queremos a verdade, só isso. Depois a senhora poderá continuar a viver a
sua vida, porque iremos embora e não precisará nos ver nunca mais. Por favor.
– Sou capaz de implorar pela ajuda dela.
– Vocês formam um belo casal. Você é vistosa, alta, tem olhos enigmáticos
com essa cor tão especial e tem classe, muita classe. Dois belos jovens de sangue
europeu que juntos poderão ter lindos filhos. – Ela diz, avaliando-me abertamente.
– Obrigada. A senhora acertou; sou neta de italianos. Com relação ao que
acabou de falar, o Thomas tem descendência europeia?
– Vocês não sabem de absolutamente nada mesmo. – Ela fala e nos
observa.
– Por favor, ajude-nos. – Eu a encaro suplicante, e os olhos dela ficam úmidos.
– Por favor... – Thomas reforça a minha súplica.
– Estou velha, não posso continuar a manter segredos. Durante toda a minha
vida me culpei pelo que fiz e por tudo o que aconteceu... – Ela para de falar e nos
olha e, apesar das perguntas fervilharem na minha cabeça, permaneço calada.
Thomas começa a dizer algo e se interrompe .
– Em primeiro lugar, Thomas, gostaria de esclarecer que não sou a sua
mãe. – Ela levanta a cabeça e olha para cima, parece estar procurando palavras
para continuar o seu relato.
– Não? – Thomas pergunta indignado.
– Eu sou a sua tia. – Ela fala, e ficamos sem entender. – Você é o filho da
minha irmã Lourdes e do meu cunhado William. – Ela explica com a voz
entrecortada, e fico embasbacada, começo a tremer.
– Filho da Lourdes e do William? Como assim? – Thomas pergunta espantado.
– Você é o irmão gêmeo do Nicolas. – Ela responde de supetão.
– Que história maluca é essa? Conheci o Nicolas, conheço a família dele, e
o que a senhora diz não é verdade. – Argumento veementemente.
– É a mais pura verdade. E a culpa de tudo isso é minha. – Ela começa a
chorar baixinho .
– Então a senhora me deve uma explicação, e só sairei daqui com uma que
seja plausível. – Thomas se inclina para frente disposto a esperar.
– Isso não faz sentido. – Digo, sem muita convicção, porque começo a intuir
que agora tudo começará a fazer sentido.
– Irei explicar, prometo. Esse segredo vem me destruindo todos esses anos,
tentei e não pude esquecer a minha culpa. Mudei-me para outro país, casei-me,
fiz parte da comunidade e mesmo assim ainda me sinto um lixo. – Ela se cala
repentinamente e parece estar tentando se acalmar.
Fico na expectativa, espero que ela esclareça os fatos.
– Fui, quando jovem, uma mulher profundamente irresponsável e egoísta.
As festas, os homens, as roupas caras, a bebida e o cigarro me seduziam.
Naquela época eu era uma espécie de ovelha negra, mas os meus pais não me
conheciam de verdade; era o que eles queriam que eu fosse quando estava na
presença deles e por trás vivia outra vida. – Tosse de maneira nervosa e volta a se
acalmar.
– Continue, por favor. – Eu a estimulo.
– Só que um belo dia, há quarenta e cinco anos, eu me apaixonei. Senti que
tudo ao meu redor passava a fazer sentido, fiquei nas nuvens, e no início fui
correspondida. Comecei até a pensar em constituir família, mudei completa e
rapidamente, tornei-me uma mulher mais responsável, abandonei velhos hábitos
nocivos, e o meu corpo passou a ser unicamente do meu namorado. Mas
acontece que o William, o meu amor, apaixonou-se pela minha irmãzinha, a
moça perfeita, a bem comportada e talentosa Lourdes. Eu quis morrer, não sabia
o que fazer. Eles me traíram na minha cara, a minha própria irmã caiu de
amores pelo homem que eu amava, perdeu a cabeça e a compostura. Fingi que
não sabia de nada, tentei afastá-los e não consegui, e o desespero tomou conta de
mim. – Ela se interrompe e nos olha quase em transe, revivendo as suas
lembranças .
– Sei que recordar tudo isso é muito sofrido, mas dona Lucia, por favor,
continue a sua narrativa. – Volto a estimulá-la.
– Então, a Lourdes e o William, que achavam que mantinham um
relacionamento secreto, fugiram para se casar, porque os meus pais jamais
permitiriam que a minha irmã se casasse ainda tão jovem e com o meu namorado.
Enlouqueci e, motivada pela raiva, disse ao meu pai onde encontrá-los. Só que o
remorso tomou conta de mim e tentei impedir o meu pai de fazer alguma loucura,
achei que ele os mataria. Pedi ajuda ao padre, a minha mãe e até a um delegado. Agi
da maneira que pude para salvar a Lourdes e o William e, por fim, consegui. Os dois
se casaram, e o meu pai deserdou a filha caçula. – A pobre senhora começa a chorar
muito .
Eu me aproximo e, mesmo temendo ser repelida, gentilmente coloco os
meus braços ao redor da Lucia. Ela suspira e se acalma. Thomas nos observa
visivelmente desorientado, e a Lucia recomeça, mais uma vez, a sua narrativa.
– O que eu não sabia é que estava grávida, que carregava um filho do William
no meu ventre. Quando descobri, me desesperei. Procurei a Lourdes e contei para
ela. Choramos juntas, a Lourdes queria contar para o William, e supliquei que não o
fizesse. Decidi me livrar da criança e sabia que o George, irmão do William, que
atuava como parteiro, poderia me ajudar. Comprei o silêncio do George e ele me
fez um aborto, mas nada saiu como o esperado. Tive uma forte hemorragia, quase
morri, e foi o George quem cuidou de mim dia e noite. – O olhar de tristeza dela
deixa transparecer o quanto lembrar está sendo penoso.
– Continue. – Agora é o Thomas que a estimula a prosseguir.
– Acabei conseguindo melhorar um pouco, contudo necessitava de cuidados
profissionais. Sendo assim, o George me levou para um hospital em Campinas, e
lá eu soube que deveria ser operada. Perdi o meu útero e nunca mais pude gerar
uma criança. – Ela se interrompe pela enésima vez, coloca o rosto entre as mãos
e estremece.
– Poderia continuar, por gentileza? – Thomas intervém novamente.
– Isso fez o George sentir-se culpado, e mexeu tanto com a cabeça dele que
a forma que achou de me compensar foi sendo o meu amigo de todas as horas,
alguém com quem sempre pude contar, e fiel até a morte aos nossos segredos.
– E a Lourdes nunca contou ao William o que aconteceu? – Pergunto
interessada.
– A Lourdes também guardou o meu segredo. Ela, como o George,
culpava-se pelo que tinha me acontecido, sentia-se em dívida comigo, e isso a fez
tornar-se a minha confidente e grande defensora. Já o William jamais
desconfiou de nada. Ele me evitava, e eu não me importava porque o meu amor
por ele se foi juntamente com o filho que não tivemos. – Mais uma vez a Lucia
chora.
Thomas se levanta, senta ao meu lado no sofá e segura a minha mão.
Ficamos calados esperando o desenrolar da revelação. A Lucia se contém e
consegue continuar a sua sofrida narrativa.
– Eu me tornei uma pessoa pior do que antes, envolvi-me com diversos
homens, até casados. Não me importava com nada, tinha um buraco no meu
peito e eu só queria me arruinar. Quando o meu pai faleceu, perdi o rumo ainda
mais. Era por ele que eu ainda tentava manter a discrição, porque a minha má
reputação não era do seu conhecimento...
– Podemos voltar para o tema central desta conversa? – Um Thomas
visivelmente ansioso a interrompe.
– Claro. – Ela responde. – A vida foi passando, a Lourdes foi tendo os seus
belos filhos um atrás do outro, e eu me ressentia por não poder gerar os meus.
Cada sobrinho que nascia era como uma bofetada na minha cara.
– A senhora sentia inveja da Lourdes? – Thomas a alfineta.
– Pensei muito sobre isso, e até hoje não sei dizer se o que eu sentia era
raiva ou inveja dela. Só sei que a minha irmã tinha tudo, e eu não tinha nada. O
sentimento de ter sido roubada, lesada, enganada, nunca me abandonava, e me
causava dor, muita dor. E essa dor enorme fazia o desespero se apoderar de
mim, completamente.
– Impressionante! – Thomas exclama, e eu aperto com força a mão dele
para que contenha a sua revolta.
– Tentando superar, busquei incansavelmente um novo amor. E, um dia,
conheci e me apaixonei pelo Antonio, o homem que o criou. Ele era um sujeito
instável, mas um amante muito bom, e pensei que poderia ter um futuro com ele.
Só que o Antonio queria muito ser pai, e insistia que para a nossa felicidade ser
completa necessitávamos de um filho. Eu argumentava que precisávamos nos
casar antes. Queria ganhar tempo, e ele afirmava que só se casaria comigo
quando eu engravidasse. Não tive coragem de dizer que não podia gerar uma
criança, temia ser mais uma vez abandonada. Paralelamente a esse meu dilema,
a Lourdes engravidou novamente, mas, dessa vez, não gostou. Ela cuidava de
quatro meninos cheios de energia e já crescidos e da nossa mãe doente, enquanto
o William se matava de trabalhar. Tudo isso fez com que ela não se animasse
com a vinda de um novo bebê. – O olhar dela para o Thomas é quase um pedido
de desculpa. – Eu tentava ajudá-la. O dinheiro da herança do meu pai era todo
administrado por mim, e todo mês eu financiava as despesas e o tratamento da
nossa mãe e ainda colaborava com a criação dos meus sobrinhos, mesmo com a
relutância do William em aceitar. Quando percebi a revolta da Lourdes com essa
nova gravidez, no momento em que ela me disse que desejava não ter
engravidado novamente, senti-me encorajada a fazer a proposta que jamais
deveria ter feito. – A mão dela treme na minha, e ela se cala.
– Qual foi a proposta que a senhora fez? – Pergunto, desconfiando qual será
a resposta.
– Propus a Lourdes que me entregasse o bebê quando ele nascesse. Jurei
que o criaria como meu filho, disse que simularia uma gravidez simultânea e que
ninguém desconfiaria de nada. Argumentei que o George poderia fazer o parto, e
que para justificar a ausência do bebê, ela diria a todos que o filho dela nasceu
morto. Enquanto eu, dias depois, fingiria dar à luz ao meu filho saudável. Deixei
claro que ela tinha uma dívida comigo e que eu iria cobrá-la.
– E como fariam para justificar, inclusive, a ausência do corpo do bebê? –
Pergunto, apenas a título de curiosidade.
– O George cuidaria disso, o combinado era que ele promovesse o enterro
de um caixão lacrado, e com um boneco dentro.
– E a Lourdes aceitou a sua proposta? – Thomas pergunta contrariado,
trazendo a Lucia de volta ao assunto relevante.
– A Lourdes ficou horrorizada, chamou-me de louca, tentou me persuadir a
desistir da ideia, só que o meu desespero era muito grande. Era a minha única
oportunidade e joguei na cara dela todas as minhas frustrações. Acusei-a de me
roubar o namorado, de se casar com o homem que eu amava, e de me tirar a
chance de ser mãe quando não me impediu de abortar o filho do marido dela.
– Só que a senhora abortou porque quis. – Expresso a m inha opinião sem
querer.
– Ou porque tenha sentido a decepção e a dor da m inha irm ã quando
contei que estava grávida, e que o pai da criança era o m arido dela. De
qualquer form a, defendi que o m eu aborto só facilitou a vida da Lourdes e
que ela era culpada pela m inha desgraça. A Lourdes ficou transtornada,
expulsou-m e da casa dela, gritou com igo e durante um a sem ana m e evitou.
Mas insisti, atorm entei-a, e quase nos enlouqueci. Por fim , exaurida e se
sentindo profundam ente culpada, ela concordou. Arrum ei um a barriga falsa
e alardeei a m inha gravidez, o Antonio ficou radiante e para que ele não
percebesse que eu não estava realm ente grávida, passei a ficar m ais distante
dele. Fingi que a gravidez era de risco, sim ulei repouso, e ele acreditou em
m im . Em m eio a tudo isso, a Lourdes entrou em um a espécie de depressão,
evitava fazer o pré-natal, m entia para o William que estava indo às consultas,
e ele tinha tanta coisa para se preocupar que acreditava plenam ente nela. – A
Lucia explica. O sempre crédulo William .
– Quer dizer que a senhora, de maneira totalmente egoísta, conseguiu
persuadir a Lourdes e enganar o Antonio? – Thomas pergunta.
– Infelizmente, sim. – Ela responde e abaixa o olhar.
– Thomas, deixe a dona Lucia terminar de contar o que aconteceu, tente se
acalmar. – Peço olhando-o carinhosamente.
– Irei prosseguir. – Ela afirma e continua. – Eu achava que a gravidez da
Lourdes duraria nove meses como as outras, e então, quando ela estava no oitavo
mês de gestação, eu a levei para a fazenda da nossa família. Queria que ela se
acalmasse para não desistir do plano. Eu disse para o William que a Lourdes
precisava descansar e, como ela estava visivelmente triste e agindo de modo
estranho, ele concordou. Acontece que, horas depois que chegamos à fazenda, a
Lourdes começou a sentir contrações. Entrei em desespero, mandei chamar o
George e ele veio bem rápido. O trabalho de parto foi difícil, demorado e, para a
nossa surpresa, a Lourdes pariu dois bebês em vez de um. Fiquei emocionada,
quase histérica de felicidade, mas a Lourdes me enfrentou, disse que me daria
apenas uma criança, conforme o prometido, a mais saudável, a que teria mais
chances de sobreviver sem o leite materno. – A Lucia olha amorosamente para o
Thomas que desvia o olhar do dela .
– No caso, eu? – Thomas pergunta e, tanto ele quanto eu, sabemos a
resposta que receberá.
– Você era o maior, o mais robusto, e o que chorava com mais energia. A
Lourdes me entregou você, e aos prantos me disse o seu nome, Thomas. Apesar
de ter pensando em outro nome para você, decidi respeitar a vontade da Lourdes.
Chamei-o de Thomas e o segurei em meus braços como um prêmio, um troféu.
Depois de algumas providências para esconder você, o George e eu chamamos o
William para contar do parto e para buscar a Lourdes e o outro bebê. Ele veio, e
ficou tão feliz com o nascimento do filho, a quem a Lourdes deu o nome de
Nicolas, que acreditou totalmente na versão dos fatos contada pelo George.
Nunca contestou nada. O William sempre foi um homem crédulo. – Ela
confirma a minha opinião.
– E o que foi feito de mim? – Thomas pergunta com a voz trêmula.
– Chegarei lá. – Ela diz e recomeça. – Eu o levei comigo para São Paulo.
Fiquei escondida com você durante quase um mês, queria distanciar a sua data
de nascimento da do Nicolas. E, no dia treze de outubro, avisei ao Antonio que o
nosso filho tinha nascido e ele correu ao meu encontro. Durante um mês inteiro
fomos a família perfeita. Só que você era tão crescido para o pouco tempo de
vida, tão branquinho, de feições tão perfeitas, e tão diferente de nós, que a
desconfiança se tornou uma constante em nossas vidas. O Antonio passou a dizer
que eu o havia traído, e eu garantia que não. Eu defendia que você era parecido
com o meu pai, o seu avô, e cheguei até a mostrar algumas fotografias para ele,
mas não consegui convencê-lo.
– Você achou que o Antonio seria tão burro a ponto de nunca desconfiar
que eu não era filho dele? Você pensou que m esm o eu sendo tão diferente de
am bos, ele não suspeitaria de nada? – O m eu indignado doutor pergunta com
sarcasm o.
– Thomas, a Lourdes tinha os olhos verdes como William também tem, e
por essa razão eu sempre soube que você nasceria com os olhos claros, e que
seria muito branquinho, afinal os seus quatro irmãos mais velhos possuem essas
características. Acontece que pensei que convenceria o Antonio a acreditar que o
nosso filho, você, tinha herdado as características do avô, o meu pai, que era um
homem muito alto, branco e de claríssimos olhos verdes...
– Só que nem você é assim. – Thomas a interrompe.
– Verdade. Sou parecida com a minha mãe, a sua avó, que possuía cabelos
e olhos castanhos e a pele morena. A Lourdes também se parecia com ela.
Herdei do meu pai apenas a estatura, sou uma mulher alta, e a Lourdes herdou os
olhos verdes, só que não tão claros quanto os dele. – A Lucia fala, e tenho que
concordar que ela é alta, uns seis centímetros maior do que eu.
– Continue... – Peço.
– De qualquer forma, o Antonio não acreditou que você fosse parecido com
o avô, porque ele achava que o homem das fotografias, que eu mostrava, não era
o meu pai. Talvez se o meu pai fosse vivo, e eu o apresentasse ao Antonio, ele
pudesse acreditar, mas como já tinha falecido...
– Além disso, a sua gravidez e todas as circunstâncias do nascimento do
Thomas eram obscuras, fazendo o Antonio ter elementos de sobra para
questioná-la. – Argumento.
– E o Antonio fez isso. Passou a me atormentar dia e noite, exigia
explicação de tudo. Queria saber a razão pela qual eu não tinha leite, e por que
emagreci tão rápido após dar à luz, depois resolveu que era importante saber o
nome da médica, e o nome da clínica em que fiz o pré-natal e o parto. Eu tentava
despistá-lo, mas de tanto bisbilhotar ele conseguiu chegar até a minha
ginecologista. Disse a ela que nós estávamos com a data do casamento marcada
e que precisava saber das minhas condições. Enrolou-a completamente e a fez
revelar que eu não podia ter filhos. – Ela inspira tão alto que me assusto, e o
Thomas segura mais forte a minha mão.
– E então? – Thomas pergunta.
– O Antonio passou a me chantagear, dizia que roubei o filho de alguém e
que iria me entregar para a polícia. Começou a exigir dinheiro para se calar, e eu
dava cada dia mais. Contudo, não aguentando a situação, me preparei para fugir
com você. Percebendo que eu me livraria dele, o Antonio passou a me vigiar. Foi
mais esperto do que eu e fugiu levando você aos seis meses de vida. Acontece
que você ainda não tinha sido registrado, então ele contou uma história qualquer
para uma antiga namorada e, não sei como, conseguiram registrá-lo como filho.
Para ter você de volta eu teria que ir à polícia ou recorrer à justiça, e qualquer
das duas hipóteses poderia causar um escândalo. Eu não podia arriscar, porque
contar a verdade deixaria a Lourdes exposta, não tive coragem de destruir ainda
mais a vida dela. A Lourdes tinha o William e cinco outros filhos e, se o que
fizemos fosse revelado, sofreria as consequências mais do que eu.
– Santo Deus! – Thomas exclama.
– Fiz de tudo para reavê-lo, ofereci dinheiro, propriedades, contratei uma
pessoa para roubá-lo, mas não logrei êxito, e durante dois anos inteiros lutei para tê-
lo de volta. Sofri como louca, só pensava em você. Então perdi a minha mãe e na
mesma época fui diagnosticada com um câncer. De repente, a minha vida era só
perda e sofrimento. O pior é que o tratamento da doença não era tão avançado no
Brasil quanto no exterior, e as minhas chances de cura eram mínimas. Diante disso
tive que me afastar, eu iria morrer se não tivesse o tratamento adequado.
– E diante disso a senhora me abandonou? – Thomas pergunta indignado.
– Não foi bem assim. Tive que vir me tratar, mas não o deixei
desamparado. O meu procurador e inventariante, muito bem pago, discreto e de
confiança, passou a cuidar das remessas de dinheiro para o Antonio, e articulou a
compra de dois imóveis em seu nome e com o usufruto em favor do Antonio. Fiz
isso para garantir que nunca lhe faltasse um local adequado e digno para morar,
além de serem bens que o Antonio não poderia vender.
– A senhora se preocupou mais com a minha condição financeira do que
com a psicológica. – Thomas reclama furioso.
– Eu me preocupava com tudo que dizia respeito a você, mas diante do
contexto, não pude fazer mais do que isso. Vim me tratar aqui nos Estados
Unidos, e o médico oncologista responsável pelo meu tratamento, doutor Julio
Molina, apaixonou-se por mim. Nessa época eu era outra pessoa, estava
devastada pelo sofrimento e pelo remorso, lutava com todas as minhas forças
contra um câncer, sabia da depressão constante da Lourdes e me sentia culpada.
Tinha conhecimento da vida que o Antonio proporcionava a você e, estando
sozinha e desamparada em meio a tudo isso, resolvi me deixar amar.
– A senhora me deixou sozinho nas mãos de um homem que não era nada
meu e foi viver um romance?
– Não foi isso o que aconteceu, Thomas. As minhas chances de
recuperação não eram grandes. O Julio lutava junto comigo, foi me fazendo ter
esperanças, e milagrosamente o meu corpo começou a reagir. Tenho certeza de
que foi o amor dele que me salvou. Quando o doutor Julio Molina me entregou o
resultado dos exames que indicavam que eu estava curada, junto veio um anel de
brilhante. Ele me pediu em casamento e eu, que também estava apaixonada,
aceitei.
– E eu? Quando a senhora se curou por que não tentou me buscar? –
Thomas volta a questioná-la e a encara visivelmente nervoso e emocionado.
– O Julio nunca soube de nada a seu respeito, ele conhecia o meu histórico
médico e sabia que eu não podia ter filhos. Não tinha como eu, de repente,
aparecer com uma criança. Nunca tive coragem de contar para ele o que fiz.
– E a Lourdes sabia que a senhora não me criava?
– Não, Thomas. A Lourdes achava que você morava aqui comigo. Jamais revelei
para ela que tinha perdido o filho que me deu, temia que ela não pudesse suportar.
– Talvez fosse melhor ter contado e deixado ela decidir se deveriam se
expor ou não. – Thomas manifesta a sua indignação.
– Hoje sei que deveria ter contado, mas naquela época não pensava assim.
Uma criança é um refém muito frágil, e o Antonio me ameaçava demais. – Ela
argumenta. – Se eu não tivesse adoecido de uma maneira tão grave, nunca teria
desistido de você, mas o meu tratamento foi longo, exaustivo e demorou anos até
que eu pudesse ser declarada curada.
– As suas ações me exilaram da minha verdadeira família e da família que
constituiu, fui um nada na sua vida. – Ele desabafa.
– Não é verdade. Você sempre foi tudo para mim. Eu cuidava de você de longe
e, quando o Antonio ficou doente, pedi para o meu procurador descobrir o paradeiro e
entrar em contato com a mãe do Antonio, a dona Diva. Ela foi informada que um
parente materno era o responsável pela parte financeira da sua criação e que
precisava da ajuda dela para que você crescesse longe de problemas e bem
encaminhado. Foi prometido tratamento para a doença do Antonio e uma vida
tranquila para vocês em troca do silêncio dela. A dona Diva fez a promessa, passou a
cuidar de você e do Antonio e a receber o dinheiro que eu mandava. O dinheiro e os
bens, ela os administrava com a ajuda do meu procurador – A Lucia pigarreia.
– Até a minha avó, a pessoa em que eu mais confiava, mentiu para mim? –
Thomas não consegue parar de fazer perguntas.
– Aquela mulher honrada apenas manteve a promessa que fez. Ela cuidou de
você com amor, dedicou-se a criá-lo conforme as minhas orientações e o ajudou a
se tornar um homem descente. Ela o amava muito, Thomas, e serei eternamente
grata a ela por tê-lo, mesmo com toda a simplicidade e humildade dela, conduzido-o
ao bom caminho. – As lágrimas da Lucia rolam sem parar e me apiedo.
– Acabou? – Thomas pergunta espumando de raiva.
– Essa é a sua história, a minha história, a história dos seus pais e a história
do Antonio. Fui a culpada pelo entrelaçamento de todas essas vidas. Eu sou a sua
tia Lucia, um ser humano desprezível que destruiu tudo quanto tocou, que se
envergonha de tudo o que fez e que se arrepende muito.
Thomas se levanta, vai até a janela e olha para o jardim. Amparo a Lucia e
tento acalmá-la.
– Vamos embora, Eva. Já sei tudo o que precisava saber. – Thomas caminha
em direção à porta, levantamos e o seguimos.
– Acompanhei o seu crescimento, Thomas, sei absolutamente tudo sobre
você. Fui à sua formatura e me misturei aos convidados, estava lá quando você
se tornou médico. – Ela fala entre soluços.
– Que pena que eu não soube disso. A senhora deve ter percebido que eu era
o único formando que não tinha família presente. O homem que chamava de pai
e a mulher que chamava de avó, estavam mortos. Além disso, o Antonio não
tinha boas relações com os familiares dele, dispensava a convivência e gostava
de manter distância, e não teve nem um filho sequer para eu chamar de irmão...
Fiquei sozinho no mundo. Nunca me senti tão solitário em toda a minha vida
como no dia da minha formatura. – Thomas diz com os olhos repletos de dor.
– O Antonio não podia ter filhos. – A Lucia faz mais uma revelação. –
Quando você, Thomas, tinha uns dois anos de idade o Antonio descobriu que era
estéril.
– O Antonio, como a senhora, também não podia ter filhos? – Que estranha
coincidência.
– Acho que o Antonio sempre desconfiou que não pudesse ter filhos, afinal
nunca engravidou nenhuma namorada. Creio que era por essa razão que ele
queria tanto que eu engravidasse, para acabar com as suspeitas que tinha. Essa
desconfiança dele só se confirmou mais tarde, após a realização de alguns
exames. Ele mesmo me contou o fato, quando eu ainda estava lutando para tirá-
lo dele, disse-me que você era a única chance dele de ser pai. – Ela explica sem
tirar os olhos do Thomas.
– Uma chance que ele desperdiçou completamente. – Thomas afirma com
frieza, vira as costas e sai.
– Dona Lucia, tenho que ir... Adeus. – Despeço-me estarrecida e
emocionada .
Thomas saiu tão apressado que, quando o alcanço, está sentado no banco do
passageiro. Concluo que ele não tem condições de dirigir e conduzo.
Capítulo I
– Bom dia, vida. – Ouço a voz do Thomas ao longe. Estou confusa, não sei
se estou sonhando ainda ou se estou acordada.
– Thomas?
– Ora essa! Quem mais poderia ser? – Bate de brincadeira com o
travesseiro em mim.
– Um anjo. – Sorrio por toda a verdade contida na minha afirmação.
– De anjo, meu amor, eu não tenho nada. Um anjo não ficaria tão excitado
ao vê-la nua. – Ele me olha faminto, e constato que estou realmente nua.
– Ah, dormi de toalha e ela desenrolou do meu corpo, estava mais
preocupada em cuidar do meu paciente febril do que em me vestir. – Digo
fingindo ser a inocência em pessoa e já ficando excitada.
– O seu paciente está bem melhor e com muita fome. Fome de você
doutora e, corrigindo, de anjo nós não temos nada. – Ele me subjuga e, antes que
eu esboce qualquer reação, me penetra com força e grito.
– Ah, molhadinha! Sempre pronta para me receber. – Diz e rebola dentro de
mim.
– Bom dia também, Thomas. – Gemo, ele sorri me encarando, e posso
perceber o quanto se sente dono de mim.
– Quero você, Eva, no café da manhã, no almoço, no lanche, no jantar, o
tempo todo. – A voz rouca e sensual dele me assanha.
Ele me penetra mais fundo e isso me excita tanto que fico ainda mais molhada.
– Só se você cuidar muito bem de mim. – Contraio os músculos da vagina e
aperto o pênis dele com força fazendo-o urrar.
– Nooossa! Continua o que você está fazendo, não para. Seja uma boa
menina e não me desobedeça.
– Você quer que eu continue fazendo isso? – Dou outro forte aperto e relaxo.
– Então vai ter que me pedir bem direitinho. – Ah, Thomas... Você não sabe o
quanto pode se tornar complicado tentar me governar.
– Quer me fazer implorar, doutora? – Faz um movimento indicando que
pretende sair de dentro de mim. Sei que entramos em uma disputa de poder e me
antecipo, agora sou eu quem o subjuga.
– Quero que me convença a fazer o que deseja. – Contraio a musculatura
da vagina com mais força, ele geme alto e o seu pênis vibra.
– Que mulher má! Por favor, continue fazendo o que está fazendo porque
estou muito excitado. Sou todo seu, faça de mim o que quiser, por favor! – Para
de impor resistência, e o seu corpo relaxa levemente.
– Muito bem, doutor. Estimulando-me e pedindo corretamente, faço o que
quiser. – Igualdade de condições, é assim que eu gosto .
Dedico-me a apertar com força e depois soltar o pênis do meu doutor em
um movimento ritmado e prazeroso. Ele geme e estremece, e sinto pequenos
espasmos percorrerem o seu corpo.
– Que gostoso! Vai, Eva, me aperta! – Thomas grita.
– Por favor, meu pervertido, não se mova. – Peço, e tentamos ficar imóveis
enquanto apenas os músculos vaginais trabalham vigorosamente.
– Você está me deixando maluco. Está acabando comigo. – A voz rouca e
ofegante dele é muito sexy .
– Vou fazer você gozar, doutor. – “Ordenho” o pênis do Thomas, e ele geme
muito alto, não me contenho e gemo também.
– Eu vou gozar, Eva. Agora! – Avisa e, imediatamente, contraio os músculos
com mais energia, literalmente “mordendo” a glande e retardando o orgasmo, e
sinto o corpo dele tremer.
– Agora vamos lá, doutor! – Falo e volto a “ordenhá-lo”.
Thomas se agita. Intensifico o movimento ritmado e vigoroso, a minha
respiração se torna ofegante, e pequenos choques me atingem. Ele urra, e
gozamos intensamente. O corpo do meu doutor desaba sobre o meu. Ele demora
a se recompor e, quando isso parece acontecer, olha para mim com curiosidade.
– Só falta agora me dizer que morou na Tailândia. – Thomas fala em tom de
brincadeira, e exibe um suave sorriso. Compreendo a piada e caio na gargalhada.
– Não, meu amor. Aprendi isso fazendo um curso e depois praticando com
muita disciplina.
Até parece que falei alguma ofensa, o rosto dele enfurece, e não entendo a
sua reação.
– Praticando com muita disciplina? Poupe-me, Eva!
– O treinamento é solitário, não há necessidade de parceiro, meu amor. –
Explico, achando muita graça da indignação dele, e começo a rir.
– É claro que sei que pode ser assim, mas o jeito como você falou. – Diz
desconfiado e irritado .
– Precisava me distrair durante as inúmeras reuniões das quais sou obrigada
a participar quase todos os dias, e os exercícios de Kegel me pareceram bem
adequados. Ninguém percebe o que estou fazendo, são fáceis de serem
executados e trazem muitos benefícios à saúde. – Explico, lembrando-me das
palavras do folheto do curso que fiz.
– Quer dizer que pompoarismo para você é apenas exercício de Kegel? E
que a sua habilidade foi adquirida praticando sozinha em reuniões? Ah, tá! –
Thomas é irônico.
– Você fica tão lindo quando está dominado pelo ciúme! – Alfineto. – Foi
quase isso o que disse. Fiz um curso, li alguns livros sobre o tema, treinei
utilizando acessórios, e pratico sempre que tenho que ficar muito tempo parada. –
Falo e começo a rir .
– Sabe o que é mais engraçado, prodígio? – Lá vem ele com a ironia de
novo. – Foi eu conhecer essa sua habilidade somente agora. – Reclama, e
percebo que está roxo de ciúme e não consigo não rir novamente.
– O mistério faz parte da natureza feminina. – Argumento.
– A surpresa eu adorei, o fato de achar que não fui o único contemplado é
que está me tirando do sério. – O olhar incendiário que me dá, demonstra que
está com muito ciúme.
– Ai ai ai, doutor! Vai me dizer que tudo o que faz comigo na cama só fez
até hoje comigo? – Provoco-o.
– Não estamos falando de mim, estamos falando de você e do meu muito
óbvio ciúme. – Continua me olhando de maneira perigosa.
– Lembre-se, doutor, que a excelência em qualquer assunto exige
treinamento. Somos tão bons fazendo sexo porque sempre gostamos de praticá-
lo, e é tão maravilhoso agora porque adicionamos paixão e amor ao pacote. –
Volto a argumentar.
– Excelente argumentação, doutora, só que não resolveu a questão do meu
ciúme, na verdade só está piorando. – Coça a nuca, e sei que ainda está
irritado .
– Para driblar o ciúme, evito pensar no seu passado de conquistador, quando
traçava todas. Aconselho que evite pensar no meu passado também. Como não
quero aborrecê-lo mais, deixarei de lado as surpresas e as novidades na cama.
– Sei jogar duro.
– Está bem, minha linda. Não precisa apelar, desculpa. Quero que saiba que
simplesmente adorei o que fez comigo. Faça o que quiser e o que souber quando
estivermos transando, não se acanhe. Saberei controlar a minha possessividade e
o meu ciúme. – Ele me dá um beijinho.
– Ok. Desculpas aceitas. Não se preocupe, porque só sinto tesão por você.
Nunca reparou no quanto o acho sexy ? Não sabe o quanto aprecio o seu corpo?
Fico trêmula só de olhar para você. – Faço a minha declaração e rio baixinho.
– Sou mesmo um homem de muita sorte, tenho que reconhecer. Amo e sou
amado por uma mulher muito sem-vergonha. – Ele me encara, e percebo que
ainda está brigando internamente contra o ciúme .
– “Toda panela tem a sua tampa.” – Digo, lançando mão do ditado
popular . – Para um homem safado, uma mulher safada. – Arremato.
– Prepare-se, porque também tenho as minhas cartas na manga.
Surpreenderei você, minha linda. – Ri com os olhos brilhando.
– Positivamente?
– Sempre positivamente quando se trata de você. – Responde de maneira
sedutora.
– Então me surpreenda, estarei esperando ansiosamente. – E dou o assunto
por encerrado .
– Você me deixou completamente louco, o meu nível de excitação foi
altíssimo. – Pelo jeito o assunto ainda não está encerrado.
– Isso é um elogio?
– Sim, minha linda. Admiro a sua energia sexual. – Declara, e fico muito
satisfeita que esse homem lindo e gostoso me admire.
– Na verdade, Thomas, você é que suscita tudo isso em mim, só você!
– Esta afirmação é a mais pura verdade.
– Eu sei... Você me deixa seguro a respeito disso, tudo o que fazemos juntos
é sempre maravilhoso. Sexo para mim nunca foi tão incrível. – O olhar terno que
me dá me encanta e percebo que o ciúme dele arrefece.
– O que podemos fazer hoje? Já que pelo visto você arrumou as nossas
malas. – Mudo de assunto assim que percebo as quatro grandes malas alinhadas
na porta do closet. Só não consigo localizar as duas valises de mão .
– Posso levá-la para fazer a visita que me pediu ontem. – Fala de modo
contido e, automaticamente, sei a que se refere.
– Obrigada, amor. Pode ser logo depois que tomarmos o café da manhã?
– Estou faminta .
– Ei, dorminhoca, está na hora do almoço. – Aponta para o relógio e ri
gostosamente .
– Oba, almoço! – Grito e começo a rir também.
Acredito que é uma grande sorte não sermos parados na alfândega e fico
muito feliz em não ter tido a necessidade de abrir as nossas malas.
Thomas empurra um carrinho de bagagem, e eu outro. Pela porta de vidro
do desembarque internacional observo uma cena surreal. Estão a nossa espera,
os meus pais, o William e todos os filhos dele, e percebo que o Thomas demora
mais do que eu para entender a situação.
Assim que saímos, sou abraçada pelos meus pais, e o Thomas é cercado por
tanta gente que não consigo mais enxergá-lo. O desembarque vira um tumulto,
um burburinho só, e somos observados por inúmeros olhos curiosos.
– Não conseguimos impedi-los de estar aqui. Estavam ansiosos para
conhecer o Thomas. – A minha mãe justifica.
– O William não cabe em si de contentamento. – O meu pai fala animado.
– E o exame de DNA? Essa festa não deveria acontecer só depois do
resultado? – Questiono curiosa.
– O William disse que todas as peças do quebra-cabeça se encaixaram. Ele
não tem a menor dúvida de que o Thomas é filho dele. Fará o DNA para provar a
falsidade do registro de nascimento do Thomas e resolver as questões legais. – A
explicação do meu pai é oportuna.
Thomas se desvencilha dos irmãos e se dirige aos meus pais, cumprimenta-
os e abraça-os, pega a minha mão e me aproxima dele, e o seu rosto deixa
transparecer a felicidade que sente. De repente, sou pega de surpresa pelos
cumprimentos que começo a receber.
– Eva, você está linda, que bom revê-la. – Ouço isso pelo menos quatro vezes.
O motorista do meu pai leva o Thomas e eu, juntamente com as nossas
malas, para o meu apartamento e em outros dois carros seguem os meus pais, o
William e os seus quatro filhos.
No meu apartamento, a conversa alegre de sete homens toma conta do
ambiente, e a minha mãe e eu providenciamos os comes e bebes. Ainda bem
que ela se lembrou de abastecer a geladeira e a despensa.
Apesar de o Thomas fazer questão de que eu fique quase o tempo todo ao
lado dele, mantenho-me um pouco à parte da conversa.
O William deixa claro que pretende provar na justiça que o Thomas é seu
filho legítimo e que depois do devido processo legal procederá ao registro do
nascimento dele com os dados corretos de nascimento e paternidade.
Thomas Henrique Lins Valente, nascido em São Paulo, em 13 de outubro de
1978, não existirá mais; em seu lugar teremos Thomas Henrique Chapman, nascido
em Ribeirão Preto, em 15 de setembro de 1978. Isso sem falar na filiação que será
alterada completamente. Este ano de 2012 está sendo surpreendente!
– Quer dizer que não serei mais o doutor Thomas Valente? – O meu
namorado confuso se manifesta.
– Não. Faço absoluta questão de que você tenha o meu nome e o da sua
mãe na sua certidão de nascimento. Espero que isso não cause transtornos a
você. – O William olha de maneira cautelosa para o Thomas.
– Ainda não tive a oportunidade de pensar a respeito disso, mas acho que
devemos fazer o que é correto. Tenho uma família e desejo que os filhos que
terei possam carregar o nome dela. – Thomas diz muito seguro de si.
A conversa se alonga, os meus pais se despedem, e eu, exausta, deixo o
William e os seus lindos filhos na sala e me recolho ao quarto para descansar.
Nenhum dos irmãos do Thomas comentou nada de relevante sobre o Nicolas, e
acho que foram orientados a não falar sobre nós.
Assim que todos se vão, Thomas se junta a mim. Percebo o quanto está feliz
e me sinto contente por ele.
– Minha linda, nunca esperei ser aceito tão rapidamente e de uma forma tão
carinhosa. Foi uma surpresa e tanto para mim. – Ele diz emocionado.
– A família Chapman é muito amorosa. Você tem a quem puxar. Reparei na
alegria deles em conhecê-lo, além disso, você conquistou todo mundo. Fiquei
muito comovida em vê-los juntos. Parabéns, Thomas. – Sorrio e bato na cama
indicando que quero que deite ao meu lado.
Ele me atende e me abraça.
– Estou feliz também, muito feliz. Nem acredito que tenho quatro irmãos, quer
dizer cinco, o Nicolas também era meu irmão apesar de não estar mais conosco.
– Vamos ver se estou a par das informações dos homens da família. O
Lucas tem quarenta e dois anos e é cardiologista, o Jonas tem quarenta anos e é
veterinário, o Douglas tem trinta e nove anos e também é veterinário, o Silas tem
trinta e sete anos e é dentista, e o Thomas tem trinta e três anos e é pediatra.
Correto? – Gracejo.
– Corretíssimo. Só estou ainda confuso com esse negócio de mudar de
nome, de local e data de nascimento. – Desabafa.
– Veja o lado bom de tudo isso, o seu aniversário agora poderá ser
comemorado junto com o meu, afinal, faço aniversário apenas três dias antes de
você. Podemos fazer uma festa só. – Rio, e ele me acompanha.
– Você e o Nicolas comemoravam o aniversário de vocês juntos? – Ele
pergunta com naturalidade, e os meus nervos se retesam .
– Nunca. Os meus pais sempre fizeram questão de comemorar o meu
aniversário em grande estilo. Você sabe, sou filha única, além disso, a família do
Nicolas é que comemorava o aniversário dele, ele mesmo nunca gostou de
comemorações. – Explico.
– Engraçado o quanto o Nicolas, apesar de ser meu irmão gêmeo, tinha o
temperamento diferente do meu. Sempre sonhei em ter uma grande festa de
aniversário e só comecei a comemorar a data depois de adulto. – Thomas sorri e
me encara .
– Você não tem nem ideia do quanto o temperamento do Nicolas era
diferente do seu. Acho que eu sou a pessoa que melhor o conhecia, então posso
garantir isso com muita propriedade. Amei muito o seu irmão, ele era uma
pessoa maravilhosa, um homem calmo, tranquilo, honesto e responsável .
– Inicio o meu discurso .
– Minha linda, sei que você o amava, que ele foi o seu melhor amigo, mas
ainda não me sinto preparado para saber sobre ele ou sobre a vida dele. Prefiro
aprender a lidar com os meus outros irmãos, conhecer melhor o meu pai, e só
depois ir sabendo sobre o Nicolas, aos poucos.
– Por quê? – Indago, tentando entender os reais motivos dele.
– Porque não quero ser sugestionado, não quero tentar ser como o Nicolas e
não quero que procurem em mim traços da personalidade dele.
– Vou respeitar a sua vontade, por enquanto. – Sorrio.
– Quero continuar sendo a pessoa que sou, e desejo que a minha família
saiba disso e aceite o Thomas e não apenas o irmão gêmeo do Nicolas. – Ele
desabafa, e entendo o porquê da sua resistência.
– Meu lindo doutor, tenha certeza de que o seu pai e os seus irmãos, assim
como eu, amarão você pelos seus próprios méritos. – Falo sinceramente.
– Quase sei disso, minha linda doutora. Agora me diga, já falei que te amo
hoje? – O seu lindo sorriso me acalma, a nossa conversa sobre o Nicolas é
novamente adiada, e não sei se acho isso bom ou ruim .
– Só umas duas vezes. – Digo dengosamente, ele ri e me beija.
A minha vida nunca esteve tão boa. O meu amado doutor e eu estamos a
cada dia mais próximos, íntimos e realizados. Ele não fala nada sobre retornar
para o apartamento dele, e inclusive resolveu que a cozinha também deveria ser
reformada, o que fez aumentar o tempo previsto para a conclusão da obra.
O trabalho no escritório me absorve completamente. Thomas também
voltou a atender os seus pacientes, e a nossa correria é grande.
Eu nem acredito que já se passaram cinquenta dias desde que retornamos
dos Estados Unidos. A felicidade faz o tempo passar mais depressa, tenho certeza
disso, da mesma forma que sei que o inverso é verdadeiro.
Durante esses cinquenta dias muita coisa aconteceu. O exame de DNA foi
realizado e o resultado não poderia ser mesmo outro, o Thomas é filho do
William e em breve terá uma nova certidão de nascimento corroborando isso.
A audiência referente ao processo de agressão que foi aberto contra o
Thomas também foi realizada, e a Sara conseguiu um acordo. Todos ficaram
satisfeitos, e o juiz determinou que o processo de agressão fosse arquivado.
A única coisa que ainda falta para que o meu coração fique completamente
tranquilo é a conversa que preciso ter com o meu namorado maravilhoso e ainda não
tive. Tentei diversas vezes começar o assunto, mas o Thomas, de alguma maneira,
acabou me desestimulando. E para mim, que ainda não estou muito firme no propósito
de promover o confronto necessário, o desinteresse dele em falar a respeito do irmão
gêmeo tornou-se a desculpa perfeita para que eu continuasse adiando.
Preciso fazê-lo me ouvir, e isso para o meu próprio bem, porque tenho
plena consciência de que é vital me livrar logo desse peso, pois só assim
conseguirei me desvencilhar da culpa que guardar esse segredo me faz sentir.
Vou aproveitar esta sexta-feira mais tranquila aqui no escritório para me
preparar psicologicamente e à noite tentarei novamente conversar com o
Thomas. Dessa vez, serei mais incisiva e direta.
Algumas vezes, acho que estou temerosa à toa, porque já demonstrei ao
Thomas, de inúmeras formas, o quanto o meu amor é verdadeiro e sincero.
Tenho certeza de que ele sabe que o amo, e tenho certeza de que ele me ama
também, e muito. Então, mesmo que a conversa seja difícil, acredito que não
abalará as estruturas do nosso relacionamento.
A minha mãe está ainda mais preocupada do que eu. Isso porque ela acha
que o Thomas é muito intransigente em relação ao perdão. O que a faz pensar
assim é o fato de que ele não aceitou falar com a Lucia desde que ela chegou ao
Brasil, e mesmo a Lucia insistindo bastante, ele se recusa veementemente a
manter contato com ela.
Para mim, as situações são diferentes. A minha omissão não causou
nenhum dano ao Thomas. É muito mais fácil para ele perdoar o meu
comportamento do que o da Lucia.
O perdão do William e dos sobrinhos a Lucia conseguiu. E o Thomas não
consegue entender como puderam perdoá-la tão facilmente depois de tudo o que
ela causou na vida deles. Entendo a mágoa do Thomas, ele foi um dos mais
prejudicados, mas também acho que não há mais nada que ele possa fazer além
de perdoá-la. E perdoar não significa que ele precisará conviver com ela.
É preciso superar os danos causados pelo passado para que ele não tenha o
poder de influenciar negativamente as nossas ações no presente. Essa lição acho
que aprendi direitinho.
O dia transcorre muito lentamente, estou nervosa e aflita, mas pressinto que
a conversa precisa ser hoje. Não suporto mais a angústia de estar sempre
procurando o momento certo. Além disso, estou achando que, muito em breve, o
Thomas me fará aquela proposta que disse que faria.
Ele anda muito misterioso, peguei-o medindo um anel meu. Ele tentou
disfarçar, contudo, imagino para que seja. Tenho que me antecipar a ele e fazer
logo a revelação que tanto me aflige, para que a pendência não seja uma sombra
sobre o nosso futuro.
Encerro o expediente. A ansiedade e o nervosismo estão me consumindo, e
vou para casa no piloto automático.
Assim que abro a porta, sinto uma energia ruim, e percebo que algo está
errado. Todas as luzes estão acesas, e isso é algo incomum de acontecer quando
não tem alguém no ambiente.
Caminho pelo living e estremeço. Quando chego à sala de jantar vejo que
as cadeiras da mesa estão desalinhadas, como se alguém as tivesse arrastado. A
carteira do Thomas está em cima do aparador, e me tranquilizo ao saber que ele
também já chegou.
Ando um pouco mais pelo apartamento, que está estranhamente silencioso.
Sinto um aperto no peito e fico incomodada, como se eu estivesse vivenciando
um momento totalmente fora de contexto.
A porta do meu quarto está encostada. Acho estranho, e seguro a maçaneta um
pouco temerosa. Empurro a porta, e vejo que o Thomas está sentado sobre a cama,
com os olhos vermelhos e injetados. Fico muito preocupada, nunca o vi assim antes.
– O que aconteceu, amor? – O meu coração bate completamente
descompassado.
– Cheguei mais cedo em casa hoje, queria fazer uma surpresa para você, só
que o surpreendido fui eu. – A voz dele está embargada, tenho vontade de me
aproximar, mas algo me diz que não devo.
– O que aconteceu, Thomas? Diga-me, por favor. – Imploro.
– Resolvi finalmente guardar as malas que usamos na viagem. Elas estavam
aqui no canto do quarto, e ninguém parecia se incomodar com isso. Então, peguei
a escada e fui colocá-las no maleiro do closet. – Ele fala, e o meu sangue gela. –
Afastei uma caixa para que a mala maior coubesse, não percebi que afastei
demais, e a caixa de papelão caiu, praticamente estourando no chão. Fiquei
preocupado que algo tivesse quebrado, não sabia o conteúdo da caixa. – O olhar
dele é de dor, e começo a suar frio.
– Thomas... – Começo a tentar explicar, mas ele continua falando.
– Quando fui recolher a caixa do chão, o fundo se soltou e de dentro dela
caíram algumas fotografias. Juro que não estava bisbilhotando, não ia olhar, mas
reconheci o Nicolas e você nas fotos. Fiquei curioso, porque você tinha me dito
que não tinha fotografias dele, e porque a primeira foto que vi era de vocês dois
se beijando. Sendo assim, examinei todo o conteúdo da caixa e não acreditei no
que encontrei. – Ele me olha com muita raiva, e estremeço.
– Thomas eu ia lhe contar, tentei lhe contar, mas você nunca deixou. – Tento
argumentar.
– Agora a culpa é minha? Todo mundo mentiu para mim, e o culpado sou
eu? – Ele pergunta irritado. – Você, o meu pai, os seus pais, os meus irmãos,
ninguém comentou que o Nicolas era o seu noivo. Li os cartões que ele lhe deu
de aniversário, de namoro, de noivado e de não sei de mais quantas ocasiões. Vi a
sua aliança com o nome dele gravado e centenas de fotos de vocês dois. – Ele
coça a nuca vigorosamente e a raiva presente em seu rosto me assusta.
– Conheci o Nicolas desde sempre, Thomas. Ele foi o meu melhor amigo, o
meu namorado e depois o meu noivo. Moramos juntos durante cinco anos, até o
dia em que ele faleceu. Eu o amei, e ele me amou, e não me envergonho disso. –
Procuro ser sucinta.
– O problema, Eva, não é que você tenha amado outra pessoa. O problema
é que essa outra pessoa era o meu irmão gêmeo. – O olhar dele fica cada vez
mais raivoso.
– E o que é que tem isso, Thomas? – Pergunto só para que confirme o que
acho que pensa.
– Acontece que nem você nem ninguém mencionou esse pequeno detalhe
para mim. Por que será? – A ironia na voz dele é cortante.
– Porque prometi que conversaria com você e iria fazê-lo. Eu não quis lhe
contar antes de descobrir se vocês realmente tinham algum parentesco, porque
se vocês não o tivessem, essa informação não seria relevante. – Continuo
tentando amenizar a situação.
– Não é relevante o fato de eu ser igual ao homem que foi o seu noivo? – A
ironia continua.
– Thomas, amei profundamente o seu irmão. Vivi com ele, e teríamos
provavelmente nos casado se ele não tivesse falecido, mas tudo isso só aconteceu
porque eu não conhecia você. Se tivesse conhecido você antes, ou
simultaneamente, a situação teria sido bem diferente. Com certeza teria me
apaixonado por você, e teria escolhido ficar com você. – Falo sinceramente.
– Fica fácil para você falar isso porque sou eu quem está vivo. Você não
precisou escolher, só precisou ficar com quem sobrou. – Ele diz me ofendendo.
– Que coisa horrível de se falar! Eu te amo, Thomas. Mais do que amei o
Nicolas, e você sabe do meu amor. Eu não queria esconder o meu relacionamento
com o Nicolas de você, é que no começo não achei que deveria contar. Você
também nunca me contou detalhes das mulheres que teve. Depois, achei que só
deveria lhe contar se fosse comprovado que vocês são parentes, e só a título de
informação, porque faz muito tempo que tudo isso aconteceu. – Falo emocionada .
– Eva, não tente amenizar o fato de ter me feito de prêmio de consolação.
Você amava o Nicolas e transferiu esse amor para mim, porque sou igual a ele.
Você me usou. Agora entendo perfeitamente porque você me olhava com tanta
intimidade quando me conheceu. – Os olhos dele se enchem de lágrimas.
– Não se faça de bobo, Thomas. Você sabia que se parece com alguém que
foi importante para mim, disse isso a você desde a nossa primeira conversa.
Tanto é que até se ofereceu para me deixar “matar a saudade do meu amigo”...
Palavras suas.
– Pensei que me parecia com o seu melhor amigo e não com o seu grande
amor. Isso muda muita coisa!
– Você é o meu grande amor. Nunca sequer troquei o seu nome, como certa
vez você mesmo bem disse. A única coisa que foi útil no fato de vocês serem
gêmeos é que essa semelhança me permitiu conhecê-lo, e conhecendo-o pude
ver o quanto vocês são pessoas diferentes. Não são as semelhanças que me
fazem amá-lo tanto e sim as diferenças. – Também começo a chorar.
– Não acredito nisso. Eu só consigo pensar que você o substituiu por mim e que se
eu tivesse qualquer outro rosto não teria tido chance com você. – Diz irritado.
– Não substituí ninguém. Isso nunca seria possível, porque o temperamento
de vocês é completamente diferente, você é o oposto do que o Nicolas era.
Percebi na primeira conversa que tivemos. Confesso que me aproximei a
primeira vez de você porque fiquei intrigada com tamanha semelhança, mas
tentei me afastar, e você não deixou. Insistiu, e dei uma chance ao Thomas, um
homem interessante e encantador. Permaneci com você, me apaixonei por você
e amo você porque você é o Thomas. A mulher que eu sou hoje não se casaria
com o Nicolas. – Falo com toda sinceridade.
– Você não pode ter certeza disso. Eu não posso ter certeza disso. – Ele me
olha com frieza e sinto muita dor .
– Tenho certeza absoluta disso. – Digo de maneira enfática.
– Então me diga. O Nicolas morreu e você colocou todas as lembranças de
vocês naquela caixa, que nunca jogou fora, e foi viver a sua vida tranquilamente?
Não foi a perda dele que fez você se tornar a mulher viciada em trabalho e
avessa a relacionamentos? – Provoca-me nervoso.
– A perda do Nicolas foi uma tragédia na minha vida. Eu tinha vinte e dois
anos na época, e desde que tinha cinco anos de idade convivia quase diariamente
com ele. Desses dezessete anos de convivência, cinco foram morando juntos. Ele
era tudo para mim. Eu quis morrer quando ele morreu, tentei o suicídio, e os
meus pais quase enlouqueceram. Tivemos que nos mudar de cidade, porque tudo
me lembrava o Nicolas. Tive depressão, fiz terapia, tomei medicamento e
durante dois anos estive quase morta. Estava jogada no fundo de um abismo e
não tinha forças para me levantar. Só que precisei superar, pelos meus pais, por
mim e até pelo Nicolas. É verdade que mergulhei no trabalho, estudei, aprendi
coisas novas, conheci homens interessantes e tentei amar de novo, mas não pude.
Estava escalando lentamente as paredes do meu abismo, tentando chegar à
superfície e, até conhecê-lo, achava quase impossível obter êxito. Foi você quem
despertou o amor em mim, foi você quem me direcionou e impulsionou rumo à
superfície, mas não foi porque você tem o rosto do Nicolas.
– Ah, não? – Ele me interrompe.
– Não. Foi porque você me fez descobrir que o que eu sentia pelo Nicolas
era carinho, era ternura, era um amor fraternal. Só descobri isso porque o que eu
sinto por você é muito mais forte e intenso, e satisfaz completamente a minha
alma, o meu coração e o meu corpo. Eu te amo como uma mulher deve amar
um homem, e não como uma menina ama o amor.
Espero que o Thomas fale alguma coisa, mas ele permanece calado. O seu
olhar frio me faz estremecer, e me sinto impelida a continuar tentando acalmá-
lo.
– E não se esqueça de que você também me ama e de que, segundo você,
só eu fui capaz de fazê-lo descobrir o amor. Sendo assim, sei que pode entender
que o amor é um encontro de almas que se complementam, e que eu jamais
poderia simplesmente resolver amá-lo. – Tento desesperadamente convencê-lo.
– A mim não, o meu argumento é que você continua amando o Nicolas. –
Diz com raiva.
– E o meu argumento é que se eu ainda amasse o Nicolas não conseguiria
estar com você, porque você como eu, ao longo da vida, já deve ter se esforçado
para amar alguém e não conseguiu, porque o amor não é lógico, não é matemático.
Ele acontece quando tem que acontecer e não quando se quer que ele aconteça.
Não premeditei me apaixonar por você, simplesmente aconteceu. – Argumento.
– Nem sei mais como tudo isso funciona, o que sei é que acho que você me
olha e vê o Nicolas. – Ele coça a nuca. – E não vou conseguir viver com ciúme
do meu próprio irmão. – Suspira forte e evita o meu olhar.
– Já lhe disse que olho para você e vejo você, desde que entendi o que sinto
nunca confundi o meu sentimento. Eu te amo com todas as minhas forças.
Acredite em mim, por favor, acredite em mim. – Suplico.
– Você não confia no que está me dizendo, se confiasse teria me revelado,
há muito tempo, qual foi o tipo de relação que teve com o Nicolas. Você temia o
que eu iria pensar, porque é exatamente o que você pensa.
– Isso não é verdade! – Protesto. – Eu o conheci sem querer, Thomas. O
acaso, ou destino, ou uma força superior, sei lá, nos aproximou. Fui a noiva do
irmão que você não sabia que tinha, e você é o irmão que nunca sonhei que ele
tivesse. Começamos a nos relacionar mais por insistência sua, que não sabia de
nada, do que por minha, que imaginava que existisse alguma relação entre vocês.
– Cheguei a pensar, inicialmente, que você estivesse fugindo de mim porque
não se sentia confortável em nutrir, por um homem muito parecido com o seu
amigo de infância, sentimentos que pudessem macular a lembrança que tinha
desse amigo. Acreditava que se envolver comigo seria estranho para você, como
se estivesse cometendo uma espécie de incesto. Ingenuamente, pensava que
você temia confundir a amizade do passado, com os fortes sentimentos do
presente, e não o inverso.
– Não confundi nada. Fugi de você porque percebi, desde que o conheci,
que você mexe muito comigo. Posso até ter considerado a hipótese de que só
estava balançada por causa da semelhança, mas logo descobri que você mexe
comigo porque a nossa química é maravilhosa. Nós nos apaixonamos e, tanto
você quanto eu, não éramos alvos fáceis, mas mesmo assim aconteceu. Acabei
sendo a chave para desvendar o mistério do seu passado, e você acabou sendo a
chave que destrancou o meu coração. Se não foi um milagre o que aconteceu
conosco, não sei como definir. Só sei que não fui eu quem planejou nada disso, e
você não pode me acusar de usá-lo. Acredito que estávamos de certa forma
predestinados a nos encontrar. – Falo e choro.
– Concordo que tudo o que aconteceu foi muito incomum, e que a nossa
história realmente parece um roteiro de filme. Só que nada disso muda o fato de
que não consigo mais confiar no seu amor. Você mentiu para mim, fez todo
mundo mentir para mim e me fez de bobo.
– Thomas, não fui mentirosa, apenas omiti alguns fatos. As pessoas não
mentiram para você, elas só não contaram algo que cabia a mim lhe contar, elas
foram respeitosas. – Continuo tentando argumentar.
– Você não foi mentirosa? E como posso chamar uma mulher que disse não
possuir nenhuma foto do Nicolas, quando na verdade possuía uma caixa repleta
delas?
– Essa caixa nunca foi aberta por mim nos últimos dez anos. Quando a
lacrei, estava guardando mais do que fotos e lembranças, enfiei dentro dela parte
da minha dor. Nunca senti vontade de remexer no conteúdo. Quando disse que
não tinha fotos do Nicolas, fiz isso para evitar abrir a caixa que sempre considerei
uma espécie de Caixa de Pandora.
– Você não respondeu a minha pergunta. Como posso chamar uma pessoa
que mente, Eva?
– Existem mentiras e mentiras...
– Deixe de tentar explicar o inexplicável. – Ele me interrompe
bruscamente.
– Está bem, menti quando disse que não tinha fotos do Nicolas. Perdão. Mas
o que não compreendo é como você não confia no que sinto por você. Não dá
para não saber, para não perceber, é tudo tão intenso, tão forte, tão maravilhoso,
jamais poderia fingir o que sinto.
– Estou falando de amor, Eva, não de sexo. – Thomas fala com desdém, e
acho que está tentando me magoar de verdade.
– Também estou falando de amor, se eu estivesse falando de sexo aí mesmo
é que não precisaria me justificar. Você sabe o efeito que me causa. – As
lágrimas escorrem pelo meu rosto. – Nós temos tantas afinidades, adoramos
tocar violão, gostamos de cozinhar, somos pessoas caseiras, apreciamos a
companhia um do outro e...
– Sabe, Eva... – Ele volta a me interromper bruscamente. – Vi aquelas fotos,
e não posso deixar de pensar que você transferiu o sentimento que tinha pelo
Nicolas para mim. Eu sei que te amo, o quanto te amo, mas não posso suportar a
incerteza de não ser eu o objeto do seu amor. – Thomas respira fundo. – Não
consigo aceitar que o meu rosto seja o mesmo rosto do homem que foi o seu
grande amor e que isso não a afete de alguma forma. Passei horas tentando
relevar, mas a dor só aumenta. Não quero um dia olhá-la e não ter a convicção
de que é a mim que você ama, de que você não me vê como uma imitação
barata do produto original. – Ele chora.
– O que é que você está querendo me dizer, Thomas? – Entro em pânico, as
lágrimas não param de rolar pelas minhas faces .
– Que estou deixando você, Eva. – A voz dele está cheia de indiferença.
– Não faça isso, Thomas. Por favor. Eu te amo, acredite em mim. – Suplico.
Eu me atiro sobre ele na tentativa de abraçá-lo, ele se levanta, e caio em
cima da cama.
– Eva, não dificulte ainda mais as coisas. – Ele me olha com tanta frieza que
fico trêmula.
– Por favor, me perdoe por não ter lhe contado antes. Pense em tudo que
fizemos e em tudo que passamos juntos, nada disso foi falso. Você é muito
importante para mim. Não sei o que será de mim sem você, Thomas. Estou
implorando o seu perdão. Meu amor, acredite em mim. Não vá embora, não vire
as costas para tudo o que vínhamos construindo. Eu te amo... Muito. – Sou capaz
de me humilhar o dia todo se isso o fizer mudar de ideia.
– Não consigo acreditar no seu amor, não mais.
– Thomas, meu amor... Vamos conversar, por favor. Acho que mereço um
pouco mais da sua consideração, dê crédito aos meus sentimentos. Fica comigo!
Fica comigo, por favor, não me deixe! – Entro em desespero.
– Já levei as minhas malas para o carro. As chaves deste apartamento, o controle
remoto da garagem, e o cartão de estacionamento da garagem do seu escritório, estão
sobre a sua escrivaninha. – O tom de voz gelado dele me agride até a alma.
– Então, só posso concluir pelo simples fato de as suas malas terem sido
arrumadas e de estarem, inclusive, no carro, que nada do que eu falasse mudaria
a sua decisão de sair da minha vida. Você me julgou e me condenou sem me dar
chance de defesa. – Seguro o choro.
Thomas permanece calado. E não tenho como não me sentir indignada. Ele
deixou que eu falasse, mas nunca teve a intenção de me escutar de verdade. O
que sei é que ele está jogando tudo para o alto, e que resolveu que seguiria por
esse caminho antes mesmo de conhecer os meus argumentos... E não sou mulher
de aceitar esse tipo de injustiça. O comportamento frio e as ações do Thomas
estão fazendo com que eu me sinta na obrigação de não arrumar essa bagunça.
O estrago foi feito. O tal do amor-próprio surge com força total e me sacode
violentamente, e uma Eva furiosa e magoada desperta e, neste momento, tudo o
que posso fazer é tentar manter a dignidade.
– Pode ir, Thomas, porque agora sou eu quem não confia mais em você. –
Choro copiosamente.
Eu me levanto da cama, entro no banheiro, tranco a porta e começo a vomitar.
Nem sei quanto tempo passo sentada no chão do banheiro. Choro até me
sentir desidratada e vomito todo o conteúdo do meu estômago. Estou arrasada,
por mais que temesse a reação do Thomas, nunca imaginei que seria desse tipo.
O sentimento de perda fez parte da minha vida por tanto tempo que o
reconheço imediatamente, e sei as consequências que ele acarreta para o meu
corpo e para a minha alma. Sinto como se estivesse sendo visitada por um velho
conhecido, daqueles de quem não se consegue gostar ou sentir falta.
Ouço o telefone tocar insistentemente, saio correndo, a esperança me
invade e atendo tentando parecer calma.
– Alô. – Seja o Thomas, por favor, seja o Thomas...
– Oi, minha filha. Tudo bem? – Ouço a voz do meu pai e me decepciono,
não era quem eu desejava que fosse .
– Tudo.
– A sua mãe e eu estamos aqui ansiosos. Você tem alguma novidade para
nos contar? – Ele parece animado.
– Na verdade, tenho. – A minha voz falha.
– Filha, aconteceu alguma coisa? – A animação na voz do meu pai desaparece.
– O Thomas me deixou, pai. Foi embora. – Desabafo.
– O quê? Eu não posso entender, achei que ele faria justamente o contrário,
ele me disse que... – O meu pai se interrompe.
– Pai, ele descobriu tudo sobre o Nicolas. Achou a minha caixa de
lembranças. – Tento esclarecer a situação.
– Você ainda guarda essa caixa? Bem, de qualquer forma já era hora dele saber.
– Ele sabe agora, mas não quis nem escutar o que eu tinha para dizer.
Acreditou veementemente no julgamento errôneo que fez de mim e dos meus
sentimentos e foi embora. – Faço um resumo.
– Filha, estamos indo vê-la agora, fique calma.
– Não precisa, papai. Estou bem. – Não quero que se deparem novamente
com o meu sofrimento, eles não merecem isso.
– Sei disso, mas iremos mesmo assim. – E desliga .
Tomo banho e troco de roupa, não posso deixar que os meus pais me
encontrem devastada. Vou sofrer novamente e muito, eu sei, mas tentarei fazer
isso de pé.
Os meus pais chegam e me fazem contar tudo o que aconteceu, e quando
faço isso não posso deixar de reviver toda a agonia e tristeza que senti durante a
discussão com o Thomas.
– O Thomas ama você, tenho certeza disso. Ele vai repensar a decisão dele.
– O meu pai tenta atenuar a minha dor.
– Pai, não quero que o Thomas volte só porque me ama. Quero que ele
volte porque acredita e confia no meu amor. – Digo emocionada.
– Por favor, filha me explique o porquê disso. – A minha mãe pede.
– Se o Thomas me procurar porque me ama, mas sem acreditar que
verdadeiramente o amo, e que não estava com ele só para me lembrar do Nicolas,
terei que passar a vida toda me justificando. Cada vez que estivermos juntos, terei
medo de que ele pense que estou confundindo-o com o Nicolas, e isso tanto há de
me fazer sofrer quanto há de fazê-lo se magoar. E toda essa desconfiança, toda essa
dor calada acabarão por matar o amor que há em mim e nele. – Explico angustiada.
– A sua argumentação é bem lógica, e se os sentimentos fossem lógicos,
concordaria com você imediatamente. – Ela provoca.
– Quer dizer que você só aceitará o Thomas de volta se ele convencê-la de
que acredita que você o ama? – Agora o meu pai é o curioso. Céus!
– Sim. – Digo.
– E isso no caso de que ele resolva procurá-la, porque pode ser que ele não
faça isso. – A minha mãe e a sua lógica, tão lógica.
– Tem razão. – Concordo.
– E você também não irá procurar o Thomas, não tentará convencê-lo de
que o ama e não ao Nicolas? – O meu pai volta à carga.
– Quero que vocês entendam que quem foi embora foi ele, que quem não
deu nenhuma chance ao nosso amor foi ele. Eu tentei explicar... Mais do que isso,
durante todo o tempo em que estivemos juntos demonstrei de diversas formas
que o amo e esperava que ele tivesse sentido isso.
– Eva, ele está magoado, você está magoada, alguém terá que dar o
primeiro passo. – A praticidade da minha mãe às vezes me irrita.
– Se eu for procurá-lo sem que ele tenha se convencido de que estou falando a
verdade, acontecerá exatamente o que aconteceu aqui hoje, ele não me ouvirá. Eu
não o deixei, repito. Se ele soube ir, terá que saber como voltar. – Começo a chorar.
– E se ele não vier? Se ele achar que é você quem deve procurá-lo?
– Pai, quem duvidou de mim foi ele, quem não acredita ser digno do meu
amor é ele. Se ele não vier é porque não é capaz de acreditar nem em mim e
nem nele, e nada do que eu faça poderá mudar isso, e os nossos caminhos se
bifurcarão. – Digo isso com muita convicção e com muita dor.
– Toda essa sua teoria é m uito boa, m uito racional, só que na prática não
sei se as coisas funcionam com tanta coerência. – A m inha m ãe diz m e
olhando com padecida.
– Se eu pudesse confiar que implorar ou me humilhar faria com que o
Thomas acreditasse na veracidade do meu amor, não tenham dúvidas de que iria
atrás dele e me jogaria aos seus pés agora mesmo. – Alego com tristeza.
– Você está certa minha filha, não é perdendo o seu amor-próprio que
recuperará a confiança do Thomas. Não foi por uma mulher fraca que ele se
apaixonou, foi por uma mulher forte e corajosa. Só espero que você esteja
preparada para suportar a dor, no caso de que ele não seja tão maduro quanto
gostaríamos. – O meu pai me abraça com muito carinho.
– Pai, farei das tripas coração, mas voltarei a viver a minha vida. Cheguei à
superfície do abismo que me aprisionou por anos e, mesmo sabendo que o
Thomas foi fundamental nessa escalada, não posso sucumbir novamente. Se eu
cair agora, nunca mais me levantarei.
– Sei que ele a ama, mas agora deve estar muito desapontado e confuso.
Tenha paciência, porque ele irá procurá-la nem que seja para tentar entender os
seus motivos. – A minha mãe tenta me animar .
– Só que desejo que ele não demore muito a fazer isso, porque não posso
me permitir viver em compasso de espera. Não quero que a esperança de uma
possível volta seja o objetivo da minha existência. Já me alimentei durante muito
tempo de lembranças de tempos felizes, e achei que isso seria suficiente, mas
não é. Viver assim é totalmente insatisfatório, não me comportarei dessa maneira
novamente, não posso mais fazer isso comigo.
O pranto irrompe. Choro com tanto ímpeto, que não acredito que um dia
consiga parar. Os meus pais me consolam, e me sinto grata e protegida.
Apesar de toda a vontade que tenho de reagir, a dor é maior que a minha
força de vontade, e me deixo ficar prostrada em cima da cama.
E como não consigo ficar no meu próprio apartamento e dormir na cama,
que ainda está com o cheiro do Thomas, me refugio no apartamento dos meus
pais. A minha mãe não sai do meu lado, e o meu medo de repetir
comportamentos passados faz com que eu fique ainda mais motivada a encontrar
uma maneira de enfrentar, de cabeça erguida, o meu drama.
O final de semana passa... Quer dizer, me atropela.
A semana seguinte é de total desespero. Tento manter as aparências, mas a
minha silhueta mais esbelta e o meu aspecto cansado, denunciam que estou com
algum problema. Excluindo a Patrícia, de quem não consigo esconder a verdade
sobre o meu desalento, a Sara que é uma observadora perspicaz, e os meus pais,
de quem me tornei hóspede, uma gripe é a desculpa que dou àqueles que se
preocupam com o meu novo aspecto.
Quero me desligar das lembranças e não consigo. O meu pai, sempre que
tem uma oportunidade, deixa escapar notícias a respeito do Thomas. Informou
que ele está hospedado na casa do William em Ribeirão Preto, que aceitou
conversar com a Lucia, que está se unindo cada dia mais aos irmãos... E esse
boletim quase diário me faz achar que o seu Guido e o William estão fazendo
alguma espécie de complô.
Imaginei que seria difícil não pensar no Thomas e quase impossível suportar
não estar com ele, mas me enganei, porque tudo é extremamente pior. A dor é
dilacerante, e não sei como estou conseguindo respirar.
No sábado, após oito dias sem qualquer manifestação do Thomas, começo a
avaliar a possibilidade de que ele nunca acredite no meu amor, e chego à
conclusão de que preciso me afastar de tudo que me lembre dele. Telefono para
o meu agente de viagens e o incumbo de me tirar de São Paulo por pelo menos
duas semanas.
Como uma espécie de ritual de desapego, decido ir ao cabeleireiro. Corto os
cabelos, deixo-os um pouco abaixo dos ombros e com as pontas desfiadas.
Também adquiro uma franja longa, com o comprimento na altura do queixo.
O visual moderno me rejuvenesce e combina melhor com o meu rosto
mais fino, e quando me olho no espelho de corpo inteiro, noto que os quilos que
perdi me fazem parecer mais alta. Tenho dificuldades em acreditar que essa
mulher sou eu.
O meu agente de viagens me convence a passar os próximos quatorze dias
em um resort cinco estrelas em Punta Cana. O bom de tudo isso é que o tal resort
tem de tudo, não precisarei sair de lá para nada. O sistema all inclusive
permitirá que eu passe dia e noite cercada por todo tipo de comida e bebida, e
talvez toda essa diversidade gastronômica me ajude a recuperar um pouco de
peso.
Os meus pais protestam, mas decido ir sozinha. Preciso pensar, tentar forçar
a minha mente a aceitar o fato de que terei que seguir adiante sem o Thomas. A
minha vontade é de me jogar aos pés dele, dizer o quanto o amo, mas acho que
isso seria totalmente improdutivo.
Aproveito a segunda e a terça-feira para organizar tudo o que posso no
escritório. Trabalho como louca e isso me distrai um pouco, só não consigo evitar
o olhar piedoso de uma Patrícia preocupada nem as tentativas, vãs, da Sara de
me levar para a balada.
Na quarta-feira de manhã, depois de doze dias de profundo sofrimento e de
silêncio total por parte do Thomas, embarco rumo ao meu exílio, sofrendo como
uma louca, mas tentando ser forte e racional.
As pouco mais de seis horas de voo me exaurem. O traslado do aeroporto
até o hotel é quase uma tortura, e finalmente chego ao resort, que à primeira
vista me parece belíssimo. Contudo, mesmo diante de tanta beleza, só penso em
tomar posse da minha suíte, que deve ser adorável, e dormir.
A suíte não me decepciona. É ampla, aconchegante e bem decorada. A
cama é grande e convidativa, jogo-me sobre ela e “sou abraçada”. Durmo um
sono leve, turbulento, que não me descansa, e acordo um pouco desorientada.
Vejo que ainda dá tempo de sair para jantar, o que seria ótimo, se estivesse com
fome. Entretanto, tendo dezoito restaurantes à disposição, talvez algum deles
desperte o meu interesse e eu me disponha a comer um pouco.
Decido, apesar do meu estado de ânimo, me arrumar convenientemente
para dar uma volta e verificar as possibilidades. O problema é que toda vez que
penso em jantar, o meu estômago embrulha, então protelo a ida a algum
restaurante para mais tarde, se for o caso.
Folheio a revista do resort em busca de alguma opção para me distrair um
pouco e verifico que o Tropical Bar, um dos treze bares do local, pode ser uma
boa pedida.
Encontro facilmente o tal Tropical Bar, e o local é... Um bar decorado no
estilo tropical. Bem óbvio. Sinto até vontade de rir do esforço mental que faço
para achar o lugar agradável.
Resolvo me sentar e beber um suco enquanto observo as pessoas se
divertirem, a maioria como casal. E, de repente, percebo que ter vindo sozinha
para este resort será uma grande provação. Mas como estou quase chegando à
conclusão de que a vida não quer que eu viva em par, acho que saber me adaptar
a esse tipo de situação talvez seja essencial.
Bebo o meu suco e me perco em divagações, e, não sei o porquê, tenho a
sensação de estar sendo observada.
Uma investigação básica me faz reparar que, do outro lado do balcão,
alguém me olha. Evito encarar, disfarço, a pessoa insiste, e resolvo arriscar um
rápido olhar.
Surpresa, surpresa. Com um lindo sorriso nos lábios e um olhar carinhoso,
Marco Diniz me observa encantado.
Fico imediatamente aborrecida com a Patrícia, tenho certeza de que o
Marco está aqui devido às informações dela.
Esse homem sempre bronzeado, alto, elegante, de cabelos lisos, escuros e
bem cortados, deveria estar agarrado a alguma bela mulher por aí. Não acho
justo que ele perca o tempo dele comigo, tenho certeza de que já expressei a
minha vontade de que ele seja feliz longe de mim.
– Olá, Eva. – O Marco diz quando chega ao meu lado.
– Olá. – Respondo friamente.
– Atrapalho? – Sorri, expondo os seus belos dentes .
– Como é que você veio parar aqui justamente quando estou aqui? – Não
me preocupo nem um pouco em ser educada .
– Calma. Não sabia que deveria ter pedido a sua permissão antes de vir. –
Fala baixo e me encara de maneira desafiadora.
– Quero a minha resposta. – Digo friamente.
– Eva, eu lhe disse uma vez que se o seu romance não desse certo, e se
quando isso acontecesse ainda não estivesse curado do que sinto por você, que
gostaria de ter uma chance.
– E um passarinho verde lhe passou informações fresquinhas ao meu
respeito. – Falo de maneira ácida.
– Forcei a doce e gentil Patrícia, que é um a pessoa que se preocupa
m uito com você, a m e colocar a par das inform ações a seu respeito. Ela
acabou m e contando que você viaj aria de férias por duas sem anas e a
convenci a m e revelar qual seria o seu destino. Com o ainda não m e curei do
que sinto por você e soube que está sozinha novam ente... Aqui estou. – O
olhar provocante dele m e irrita.
– Você é mesmo muito corajoso. Vir atrás de uma mulher com dor de
cotovelo é um enorme ato de bravura. – Provoco-o.
– É que sempre sonhei em ser um príncipe e salvar uma linda princesa de
um dragão. Contudo, como os tempos modernos não me permitem tal proeza,
resolvi salvar uma linda mulher dela mesma. – Ele me observa com cautela.
– E por que você acha que devo ser salva de mim mesma?
– Porque você se autossabota. – Fala e sorri.
– Como é que é? – Pergunto com raiva.
– Você criou um modelo de relacionamento que não é possível de se
concretizar no mundo real.
Essa psicologia barata não vai funcionar comigo.
– Você está enganado. O Thomas conseguiu viver comigo o tipo de
relacionamento que eu considerava ideal e que me fazia totalmente feliz. – A dor
me assola outra vez e nem sei a razão pela qual falo mais do que gostaria.
– E que durou bem pouco. – É ele o provocador agora.
– Dizem que o que é bom, dura pouco. Então, o que é excelente deve durar
menos ainda. – Esta sou eu devolvendo a provocação.
– Ou porque as paixões arrebatadoras, além de serem fulminantes,
costumam ser efêmeras. – Rebate.
– Durou pouco por outro fator que não é da sua conta.
– Talvez seja porque o seu “relacionamento perfeito” entrou em rota de
colisão com a realidade.
– Ah, é? Explique melhor, por favor. – Debocho dele.
– Um relacionamento no mundo real, Eva, dura o tempo em que duas
pessoas conseguem continuar se admirando e se respeitando. Se um desses
ingredientes acaba, é motivo suficiente para o “para sempre” chegar ao fim.
– Você é muito engraçado. Não tem a menor ideia do que aconteceu e se
julga competente para emitir opinião a respeito. – Volto a provocá-lo.
– Você continua admirando e respeitando o Thomas? E ele continua admirando e
respeitando você? – O sorriso amplo do Marco me irrita, mas indiferente ao desconforto
que possa estar me causando, ele puxa um banco e senta ao meu lado.
A pergunta dele mexe comigo, porque começo a questionar se não ter
contado a verdade para o Thomas não foi uma forma de desrespeitá-lo.
– Continuo admirando o Thomas, mas talvez o tenha desrespeitado mesmo
sem ter a intenção de fazê-lo. A sua teoria maluca pode ter algum fundamento.
– De qualquer forma, Eva, acho que você precisa viver um relacionamento
real, com bases sólidas. E sei de alguém que está interessado em partilhar a vida
com você. Uma pessoa que a conhece o suficiente para não deixar que você
sabote, mesmo sem querer, o relacionamento que está disposto que tenham.
– Sinceramente, não sei o que você chama de relacionamento real nem
qual seria esse tipo de pessoa capaz de se antecipar as minhas ações. – Destilo
ironia.
– Chamo de relacionamento real aquele em que duas pessoas, que já se
divertiram e se decepcionaram o suficiente por aí e que se enxergam como
realmente são, se propõem a viver juntas, com respeito e companheirismo, tendo
por compromisso formar uma família e construírem um futuro. Ah, e a pessoa a
que me referi sou eu mesmo! – Ele me encara com o olhar divertido .
– Acho muito estranho você não ter citado amor em nenhum momento, e
para mim o amor é item essencial em um relacionamento, seja ele real ou
idealizado. – Sorrio, com ar de deboche .
– Não o citei porque considero que o amor é a consequência natural em um
relacionamento entre duas pessoas que se admiram e respeitam. – Instiga.
– Discordo, nem sempre é assim. – Continuo sendo ácida.
– Prefiro me focar nas vezes em que é.
– Você é uma das pessoas mais persistentes que conheço, Marco. Acho que
em outra oportunidade, disse-lhe a minha teoria sobre você não gostar de perder
e sobre orgulho ferido.
– Disse, mas não vou considerá-la porque, no caso em questão, não estou
competindo com ninguém, e o orgulho ferido aqui não é o meu. – Ele coloca o
dedo dentro da ferida.
– Muito gentil da sua parte. – Falo friamente.
– Não serei condescendente com você, porque acho que está pagando pela
má escolha que fez. – Diz irritado.
– Só você seria uma boa escolha para mim? – Indago.
– Eva, luto por você desde a primeira vez em que a vi. Tive apenas uma
oportunidade de tê-la e não a desperdicei, e não consegui mantê-la em minha
vida por culpa sua, não minha. Sendo assim, não me peça para entender como
um homem que a tem por inteiro pôde deixá-la. Eu não faria isso, então,
provavelmente, sou uma escolha melhor. – Ele fala muito sério, e rio
nervosamente porque estou ficando muito aborrecida com a conversa.
– Sabe o que é engraçado? É que o Thomas também garantia que não seria
capaz de me deixar, e eu acreditava nele.
– Não questione a promessa, questione quem prometeu.
– Você não sabe o que aconteceu, então não me aconselhe. – Não quero
que ele continue se metendo na minha vida.
– O que aconteceu foi que o Thomas prometeu mais do que estava disposto
a cumprir.
– Não o julgue. Você não está apto para fazer isso. O que me espanta muito
é você ter se dado ao trabalho de vir até aqui para ficar trocando farpas comigo.
– Suspiro .
– Desculpa, não vim brigar. Vim até aqui para cuidar de você. Soube que
estava muito abatida, que tinha emagrecido bastante e que viria sozinha, e pensei
que poderia ser útil. – Esclarece.
– Vim sozinha porque quero estar sozinha. Preciso pensar. – Sou direta.
– E estará sempre que quiser. Cuidarei de você de perto ou de longe, não me
importo. Só desejo que saiba que estarei por aqui se precisar. – Os olhos negros
dele cintilam.
– Obrigada. – Agradeço sinceramente.
– A propósito, fui enganado. Você está mais bonita do que nunca. – Ele me
elogia e sorri.
– Obrigada novamente. – A minha voz denota o meu desânimo.
– Você já jantou?
– Não estou com fome.
– Não é necessário ter fome para comer, é preciso apenas ter apreço pela
saúde. Levarei você para jantar. – Ele segura a minha mão, quase me arrasta, e
desisto de protestar, não tenho forças para resistir .
O Marco escolhe o restaurante especializado em frutos do mar. Ele me
conta que chegou um dia antes de mim ao resort e que fez uma espécie de
reconhecimento do local.
Jantamos em silêncio e, embora a comida esteja deliciosa, sinto quase
repulsa ao me alimentar. O Marco me observa atentamente enquanto empurro a
comida para dentro com muito esforço.
– Eva, quanto menos comer, menos fome terá. É importante se forçar a se
alimentar nos horários corretos, porque quanto mais insistir mais fácil ficará. E,
mesmo que o seu apetite demore a voltar ao normal, você passará a sentir um
pouco de fome. – Explica.
– Agora você é médico? – Pergunto de maneira irônica.
– Se fosse, você seria mais simpática comigo? – Ele me provoca, sabe que o
Thomas é médico .
– Não. Obrigada pela explicação. Pretendo comer mesmo sem vontade.
Instinto de sobrevivência.
– Ótimo. Você gostaria de fazer um tratado de paz?
– Pode ser. – Falo desanimada.
O Marco ri, volta a comer o seu jantar e a beber o seu vinho branco.
Terminamos de jantar e fico muito feliz com a perspectiva de voltar para o
refúgio da minha suíte. O Marco insiste em me acompanhar, deixo, mas ando
apressadamente e evito incentivar uma conversa.
– Boa noite. – Digo quando chegamos à porta da minha suíte.
– Boa noite. Durma bem. – Ele diz e se dirige para a porta ao lado, e não
acredito mesmo que ele é meu vizinho de quarto por pura coincidência.
Entro na minha suíte e me sinto tão vazia quanto ela. Troco de roupa e me
arrumo para dormir, no modo automático, sem deixar de me sentir indignada
com a presença não solicitada do Marco e sem deixar, infelizmente, de me sentir
muito dolorida com a ausência do Thomas.
Ainda bem que eu trouxe o meu sonífero e, depois de checar a caixa de
mensagens do celular e os e-mails e de enviar um e-mail para a minha mãe,
tomo dois e consigo dormir.
Capítulo IV
Acordo com o estômago doendo e acho que é fome. Visto o biquíni, a saída
de praia, calço os chinelos e saio para tomar o café da manhã.
Para o meu alívio, não encontro o Marco no restaurante, mas faço como ele
disse e me forço a comer. Tudo é tão gostoso e a variedade é tanta que o
sacrifício não é assim tão grande.
O dia lindo e ensolarado consegue me animar um pouco. Deito na
espreguiçadeira, fecho os olhos, e deixo o sol aquecer o meu corpo.
– Dormiu bem? – Ouço o Marco perguntar com o leve sotaque nordestino,
bem característico dele, e que é tão bonitinho.
– Dormi. – Respondo com os olhos ainda fechados.
– Tomou café da manhã?
Sinto uns pingos de água molharem a minha pele.
– Tomei.
Abro os olhos, levanto os óculos de sol e vejo que o Marco está todo
molhado, só de sunga, e saltando para se secar. Não posso negar que ele é um
homem atraente, um moreno bonito. Não chega aos pés do Thomas, mas é
interessante.
– Nunca ouviu falar em toalha? – Tento em vão não sorrir observando-o saltitar.
– Ouvi, mas assim é mais divertido, até você sorriu. – Ele sorri também.
– Acho que você está querendo é chamar minha atenção. – Com o corpo
sarado e cara de herói Marvel ele bem que consegue. Uau!
– Consegui? – Parece interessando na resposta.
– Não. – Minto descaradamente e volto a colocar os óculos. Sai de mim,
tentação!
– Tchau. Vejo você mais tarde. – Ele diz e se afasta.
Durante toda a manhã fico entre a piscina e a praia, depois volto para a
suíte. Telefono para os meus pais, que não têm nenhuma notícia interessante para
me dar, tomo banho e me arrumo para o almoço. Não encontro o Marco outra
vez, acho isso ótimo e consigo comer um pouco mais.
O dia passa devagar e, como trouxe o meu violão, aproveito a solidão da
praia ao entardecer e toco um pouco. Sinto tanta saudade do Thomas que acho
que vou enlouquecer, e desisto do violão.
Janto, volto para a suíte e encontro um bilhete debaixo da porta.
“Gostaria de levá-la para dançar. Se estiver interessada, encontre-me no
deck da piscina às vinte e duas horas. Marco.”
O dia amanhece e ainda não consigo estar melhor. Sinto tanto a falta do
Thomas que fico com raiva de mim. Ele não telefonou, não mandou mensagem
nem e-mail e não perguntou por mim para os meus pais. A minha esperança está
cada dia mais fraca, e eu também.
O Marco some o dia todo, melhor assim, prefiro sofrer sozinha, sem plateia.
Faço um passeio de barco, nado um pouco e piloto um jet ski. Almoço,
lancho e janto com mais facilidade. A comida servida nos restaurantes do resort
é ótima, e me sinto melhor quando me alimento. Volto para a suíte e encontro
outro bilhete debaixo da porta.
Por mais que eu tente, não consigo dormir. A falta que sinto do Thomas é tão
grande que me impede até de raciocinar. O meu corpo está saudoso do toque, do
cheiro, do gosto e do corpo dele. É como se ele estivesse próximo de mim
mesmo estando distante.
O pior da minha dor é saber que todo esse sofrimento que estamos nos
impingindo, sim eu sei que o Thomas também sofre, poderia ser dispensado se
ele acreditasse no meu amor ou se eu confiasse que ele me escutaria.
Rolo na cama, o olhar penetrante e sensual do Thomas não sai da minha
cabeça. Quase posso ouvir a voz rouca dele no meu ouvido, e lembrar de nós dois
juntos me atiça.
O desejo governa o meu pensamento, vejo na minha mente o corpo
musculoso do Thomas completamente nu, e o olhar dele no meu. O meu coração
acelera, e fantasio que ele está comigo e que tudo está bem entre nós.
A fantasia m e enleva, escorrego a m ão para dentro do m eu shortinho
de renda, abro as pernas, e com as pontas dos dedos toco o clitóris.
Acaricio suavem ente, estou úm ida e quente, m ovo os dedos em pequenos
círculos, e im agino que o Thom as m e toca. Aum ento a velocidade dos
m ovim entos, o m eu quadril acom panha o ritm o, afasto os grandes lábios e
introduzo um dedo, depois outro. O entrar e sair dos dedos m e excita, volto
a fazer m ovim entos circulares e fico m ais m olhada. O olhar denso e sexy
do Thom as é só o que vej o, e com eço a sentir pequenos choques, um a onda
de energia m e acerta e gozo.
A minha respiração se acalma. A dor da ausência é quase uma dor física, e
choro. Choro por tudo que não faremos mais juntos, choro pela saudade e pela
sensação de vazio, choro pela mágoa que me consome e por tudo que eu poderia
ter feito diferente. Acho que choro até dormir.
Acordo mais cansada do que antes. Perambulo desanimada pela suíte, e só
com muito esforço consigo me arrumar. Preciso achar um lugar afastado e tocar
violão até os meus dedos sangrarem.
Antes de sair, confiro o celular, nenhum telefonema e nenhuma mensagem.
Agora o notebook, checo os e-mails, e só o que foi enviado pela minha mãe me
interessa, abro e o leio.
“Filha,
pensei muito antes de lhe escrever. Ponderei, conversei com o seu pai e
consideramos útil que saiba que ontem à noite, quando chegamos a nossa casa
em Ribeirão, avistamos o Thomas.
Ele estava na porta da casa do William conversando com o pai e com o
Jonas. O motorista estacionou o nosso carro, e fomos imediatamente
cumprimentá-los. Jogamos um pouco de conversa fora, e o William e o Jonas
deram uma desculpa qualquer e, estrategicamente, se retiraram.
O seu pai, o Thomas e eu ficamos a sós. Fiquei surpresa com o tanto que ele
emagreceu. O semblante dele me pareceu cansado e, apesar do sorriso que nos
lançava a todo o momento, notei que estava triste. Afirmo com toda convicção
que ele está sofrendo muito, e sabemos a razão. O próprio William já havia
comentado com o seu pai a enormidade do sofrimento do Thomas. Só que,
mesmo sofrendo tanto, ele não tocou no seu nome, não perguntou por você e não
deu nenhum sinal de que gostaria de saber notícias suas. O seu pai bem que
tentou, deu algumas indiretas, mas o Thomas fingiu não perceber.
Observei mais do que falei e agora acredito que você interpretou muito bem
a situação. O Thomas não consegue aceitar que você o ama, então luta com
todas as forças para esquecê-la.
Sei que vocês são dois cabeças-duras e só conto tudo isso porque acho que
você tem que tomar uma atitude logo. Ou se aproxima e tenta que ele a ouça ou
se afasta de vez e tenta esquecê-lo também.
Sei que é uma decisão difícil, mas como está aproveitando o tempo para
refletir, use-o com sabedoria.
O seu pai e eu amamos você, e o que quer que decida fazer terá o nosso
apoio incondicional.
Você é uma mulher forte, a sua determinação já foi capaz de salvá-la, e sei
que, aconteça o que acontecer, você conseguirá superar.
Dê notícias.
Amor,
Mamãe.”
Leio e releio o e-mail da minha mãe, e, depois do tanto que chorei ontem,
saber que o Thomas está ignorando a minha existência é como um golpe de
misericórdia. Penso em tudo o que poderia fazer para mudar a situação, nada me
parece bom e me lembro das fotos que tiramos com o meu celular. Olhá-las
quase me mata.
Decido organizar as fotografias e preparar uma apresentação.
Coloco Prelude from Cello Suite nº 1 como música de fundo e embaixo de cada
foto nossa, dele ou minha, ponho como legenda uma frase que ouvi dele ou que
falei para ele.
Quando termino, repasso e vejo que a reprodução ficou linda, e me
emociono, e choro outra vez. Encaminho a minha obra de arte para o e-mail
profissional do Thomas, porque esse eu sei que ele confere sempre, e fico na
expectativa de um contato.
Passei a manhã toda envolvida com o meu trabalho com as fotos e reparo
que está na hora do almoço. Estou sem fome, mas mesmo assim decido ir
almoçar. Levo o celular, tenho esperança de conseguir tocar o coração do
Thomas, e se isso acontecer ele irá me telefonar.
Evito encontrar o Marco e escolho um restaurante menos popular para fazer
a minha refeição.
Fico mais tranquila quando, de longe, vejo que o Marco se aventura a iniciar
um passeio de barco. Melhor assim, porque prefiro estar sozinha no caso de o
Thomas telefonar.
A minha ansiedade torna o dia mais longo. Nado um pouco, visito as lojas do
resort, faço uma massagem no SPA e o dia não acaba.
Confiro pela enésima vez o celular e a caixa do e-mail, mas não encontro
nenhuma manifestação do Thomas.
A ideia de tocar violão volta a minha mente. Procuro um lugar tranquilo,
longe das pessoas e toco todas as músicas que o Thomas e eu tocávamos juntos.
Languidamente me deixo levar pelos acordes, pelo barulho do mar, e pelo
som do vento, e ouço palmas quando termino de executar mais uma melodia.
– Bravo! – O Marco diz batendo palmas.
– Obrigada. – Sorrio timidamente.
– Posso ouvi-la tocar durante horas, você é muito talentosa. – Elogia, sorridente.
– Você sabe tocar algum instrumento?
– Só um pouco de piano, fui obrigado a fazer aulas quando criança, mas não
gosto muito. – Explica, e me desanimo .
– Você gosta de ler?
– Gosto. – Ele responde e me olha curioso.
– E lê? – Continuo com as perguntas meio sem nexo.
– Leio pelo menos um livro por mês. Resposta certa?
– Como assim? – Acho que ele entendeu aonde quero chegar.
– Sou aceitável ou deveria ter respondido que gosto de tocar piano e não
gosto de ler, ou que gosto de tocar piano e de ler, ou que gosto de ler tocando
piano, ou, ainda, que não gosto nem de tocar piano nem de ler? – Pergunta de um
jeito divertido que me faz rir.
– Você respondeu sinceramente quando perguntei, foi o suficiente. –
Respondo tentando ser evasiva.
– Sou um homem suficiente ou um homem que dá respostas suficientes?
Não entendi. – Ele ri.
– Um homem que não gosta muito de tocar piano e que gosta de ler.
Informações suficientes para mim. – Rio novamente.
– Você leva a sério o negócio de ser enigmática. – Sorri, me observa com os
olhos brilhando, e desvio o olhar.
– Cansei. Vou descansar um pouco. – Estou tentando evitá-lo, tomara que
ele consiga perceber isso.
– Você não me parece nada bem.
– Deve ser porque não estou nada bem. A ficha começou a cair de verdade.
– Exponho a minha dor.
– Ainda bem que estou aqui. – Ele me ajuda a colocar o violão na capa e o
segura. Ele o leva para mim.
– Eva, esse sofrimento todo vai adiantar de alguma coisa?
– Provavelmente não, mas não consigo evitá-lo. – Sou franca com ele.
– Quanto mais você ficar pensando, mais irá sofrer. Estamos em um local
bonito, agradável, e com tanto divertimento a nossa disposição que acho que não
seria muito difícil enganar a dor se quisesse tentar. Estou driblando a minha
ansiedade com muita atividade ao ar livre, sol e banho de mar.
– A sua ideia até que pode dar certo. Agora me diga, por que está ansioso?
– Sou mesmo muito curiosa.
– Porque estou esperando que você acorde naquele belo dia sobre o qual
falamos e me procure para dizer que me dará uma chance. – Ele fala e desvia o
olhar.
– Fazia uma ideia errada a seu respeito. – Confesso.
– É mesmo? – Volta a me olhar, e noto o seu interesse.
– É. Imaginava que era tão agressivo na vida pessoal quanto é nos negócios.
– Assim que falo, ele cai na gargalhada.
– Muito bem , Eva. Agora percebo porque correu tanto de m im . –
Continua rindo.
– Tenho reparado que você é um homem calmo e paciente.
– Que bom que está mudando a impressão que tem de mim.
– Só que também estou chegando à conclusão de que você é um homem
muito fácil de magoar. – Nossa, como fui má com ele no passado!
– Já foi m ais fácil antes. – Ele diz e faz sinal para que continuem os o
nosso cam inho.
– Na sua vida pessoal você é sempre assim, calmo e paciente?
– Geralmente sim, mas apesar de ser bem difícil de acontecer, às vezes
posso ficar bastante nervoso e, quando isso acontece, costumo ser bem rude.
– Bom saber, tentarei não deixá-lo nervoso. – Sorrio e fico feliz por
estarmos na porta da minha suíte, cansei de conversar.
– Você me deixou nervoso diversas vezes, acredite.
– Sei que algumas vezes feri pessoas que não mereciam, e você foi uma
delas. Você pode me desculpar?
– Só se você me deixar levá-la ao cassino mais tarde. Virei buscá-la. Não
recuse, vamos promover uma overdose de diversão, estamos precisando disso. –
Ele ri, beija a minha testa e sai. Fico observando-o até ele entrar em seu quarto.
O Marco tem sido muito cavalheiro comigo, não fica arrumando pretextos
para entrar no meu quarto, não impõe a sua presença, não fica me
bombardeando com cantadas baratas, é um bom argumentador, está sempre
tentando me animar e tem sido um ótimo ouvinte.
Assim que me encontro sozinha, telefono para os meus pais. Converso
primeiro com o meu pai e depois com a minha mãe. Falamos sobre o e-mail que
ela me enviou, e finjo que estou bem, porque não quero preocupá-la. Enumero
todas as atividades existentes no resort e acho que consigo fazer com que ela
pense que estou me divertindo. Nós nos despedimos amorosamente, e desligo.
Não recebi nenhum telefonema do Thomas e nenhuma resposta para o e-
mail que enviei. Silêncio total. Estou mesmo sendo ignorada, isso me aborrece
muito e decido reagir.
Procuro m e arrum ar com capricho. Coloco o m eu perfum e preferido,
visto um a blusa preta sutilm ente transparente, um a saia envelope na cor
vinho, calço sapatos peep toes pretos Miu Miu e m e esm ero na m aquiagem .
Faço um coque desestruturado nos cabelos, deixo a franj a solta de um lado, e
prendo a ponta atrás da orelha. Coloco brincos de brilhante e uso a m inha
gargantilha de sem pre.
Resolvo chamar o Marco, mas quando abro a porta do quarto dou de cara
com ele.
– Se eu fosse uma assombração não o teria assustado tanto. – Falo quando
vejo a cara de espanto dele.
– Não estou assustado, estou encantado com tamanha beleza. – Beija a
minha mão .
Caminhamos de braços dados até o cassino e, pela primeira vez em muitos
dias, sinto-me alegre.
O cassino é meio sufocante, bem típico e, apesar da fumaça dos cigarros e
do ambiente um tanto noir , divirto-me jogando um pouco. Não perco muito
dinheiro, acho mais estimulante observar o Marco jogar do que participar dos
jogos. Ele sim, perde uma soma razoável porque parece mais interessado em me
entreter do que em ganhar.
Saímos do cassino quando o dia está amanhecendo. Caminhamos
lentamente até os nossos quartos. De repente, o Marco para, e percebo que ele
quer que sentemos em um bangalô de palha que surge lindamente a nossa frente.
Concordo em me sentar ali com ele, mesmo intuindo que deseja conversar sobre
nós, porque a ideia de tomar um pouco de ar fresco me seduz. O ambiente
fechado do cassino me deixou um pouco enjoada.
– Está com sono? – O Marco pergunta.
– Infelizmente, ainda não.
Ele me olha com ternura e, de um jeito abusado, coloca a mão no meu
coque puxando o prendedor e soltando os meus cabelos que caem sobre os
ombros.
– Linda. – Ele diz.
– Obrigada. Você é um homem gentil. – Será que estamos flertando?
– Encosta a cabeça aqui no meu peito, deixe-me mexer nos seus cabelos até
o sono vir.
Fico na dúvida se faço o que ele me pede, mas como estou precisando de
um pouco de afago, atendo. Ele passa a ponta dos dedos com muita delicadeza
pelo meu couro cabeludo e isso me faz relaxar.
O Marco fica tanto tempo acariciando a minha cabeça e os meus cabelos,
que chego a pensar que, a essa altura, ele deve estar com câimbra.
– Agora estou com sono, você é mágico.
– Vem, levo você. – Ele me pega no colo, apesar dos meus protestos, e sai
me carregando. Ainda bem que ninguém cruza o nosso caminho.
– Pronto, está entregue. Quando acordar, me procure, poderemos fazer
alguma coisa juntos, adoro a sua companhia. – Coloca-me de pé diante da porta
do meu quarto e vai embora.
Entro no quarto silencioso e frio, evitando pensar em qualquer coisa que
seja. Visto a camisola e escorrego para debaixo dos lençóis, o sono dessa vez
chega mais rápido, e me sinto agradecida.
O telefone toca sem parar, não o celular, o do quarto. Levanto-me ainda
sonolenta e atendo.
– Alô.
– Oi, Eva. Que saudade! – A Patrícia me saúda.
– Patrícia, queria enforcar você dias atrás quando me deparei com o Marco
por aqui. Sorte sua que a vontade passou. – Falo em tom de brincadeira.
– Desculpa, amiga. É que não consigo dizer não para o Marco, ele é tão
fofo. – E tão persuasivo ...
– Está desculpada. Agora diga o que aconteceu de tão grave para me
telefonar tão cedo em um domingo.
– Eva, acredito que por aí sejam mais de três horas da tarde. – Ela ri.
– Nossa, como dormi! – Ótimo .
– Juro que não queria dizer o que direi, mas preciso fazer isso. Sinto muito,
ia esperar você chegar, mas não consigo parar de pensar nisso. Até chorei, e olha
que não vi nada demais. Resolvi contar porque como o Marco está aí, talvez
mereça um pouco de atenção da sua parte, ele é tão interessado em você. – Ela
fala, e percebo que está toda atrapalhada.
– Por favor, fala logo! – Eu a interrompo, o meu coração está na boca.
– Estou em Ribeirão Preto, vim para o casamento da minha prima. Falei
sobre o casamento com você. Lembra? Foi ontem, um casamento lindo, o vestido
dela era maravilhoso, o noivo é que não é lá muito bonito. – Ela fala e tenho
certeza de que está nervosa.
– Conta logo de uma vez! – Grito e a interrompo novamente.
– Hoj e fui alm oçar com as m inhas prim as que tam bém vieram para o
casam ento, não sei falar o nom e do restaurante, é m eio com plicado, um
lugar ótim o, e, quando estávam os de saída, vi o Thom as de perfil. Ele estava
sentado em um a das m esas, acom panhado de um a m ulher loura. Reparei
que ele está m ais m agro, m as continua tão bonito que é difícil não
reconhecê-lo. Tentei ver se eu conhecia a m ulher, nunca a vi. Eles
conversavam tranquilam ente e riam de vez em quando. Até aí não ia lhe
contar nada, m as quando eu estava saindo do restaurante, resolvi olhar só
m ais pouquinho e vi a m ulher segurar a m ão dele sobre a m esa e acariciá-la.
Ele sorriu e fez um a cara de cão sem dono. Não foi nada com prom etedor,
m as m e incom odou profundam ente. Saí do restaurante chorando, as m inhas
prim as não entenderam nada, tem duas horas que estou olhando para o
telefone, não aguentei, resolvi telefonar e lhe contar.
A minha querida amiga Patrícia, um ser totalmente empático, acaba de me
fazer perder completamente a esperança.
– Era um a m ulher loura m uito bonita? – A figura da Am anda vem a
m inha m ente.
– Uma mulher loura com um rosto bonito e simpático. De qualquer forma
acho você muito mais bonita. – Ela tenta me confortar me elogiando.
– Obrigada, Patrícia. Já imagino quem seja. – A mágoa toma conta de mim.
– Sabe, Eva, adoro você e está me custando muito lhe contar isso. Reafirmo que
não vi nada de tão grave, era só um almoço e duas pessoas próximas conversando. Mas
me ofendi por você, queria que ele estivesse em casa chorando. – Ela se explica.
– Nem eu estou em casa chorando – estou em um hotel chorando – e ele
tem todo direito de superar. – As lágrimas rolam pelo meu rosto.
– Só que não foi você quem saiu batendo o pé se achando a oitava
maravilha do mundo. – Essa é a Patrícia sendo muito parcial .
– Obrigada. Você sabe que também te adoro. Toma conta das minhas coisas
lá no escritório, logo estarei de volta.
Nós nos despedimos e desligo.
Tudo em mim começa a doer, corro para o banheiro e vomito sem parar.
Entro embaixo do chuveiro e deixo a água gelada cair sobre o meu corpo vestido.
Não tenho o menor direito de me aborrecer, se o Thomas me visse com o
Marco também pensaria que estou tentando esquecê-lo. Na verdade, devo
esquecê-lo mesmo. Ele, com toda certeza, não sabe com quem estou tentando
me distrair, e mesmo assim resolveu almoçar com a Amanda ou com outra
loura da antiga coleção dele.
Deve estar muito ocupado seguindo com a vida e por isso não respondeu o
meu e-mail.
Nada de acreditar na Eva, nenhuma chance para a Eva. Ele pode até estar
rindo de mim, ou pior, com pena de mim. A idiota da Eva que achou que poderia
ser a responsável pela regeneração de um conquistador inveterado. A boba que
acreditou que o amor pudesse ser maior que os traumas e medos dele... Que
confiou totalmente no poder do seu “amor curativo e cicatrizante.”
Ai! Que raiva!
O ciúme me cega, estou com tanta raiva que tenho vontade de gritar. Desde
que o Thomas me deixou estou tentando me afastar da beira do abismo, tenho
medo de deixar a tristeza me dominar como aconteceu quando perdi o Nicolas.
Não quero mais cair, mas talvez deva enfrentar uma descida. Acho que
enfrentar a dor é uma tática melhor do que temê-la quando ela é inevitável.
Troco de roupa e deito no sofá. Estou nauseada, magoada e ofendida.
Lá fora chove, e aqui dentro choro. O meu cérebro tenta ordenar os
acontecimentos desde a discussão e o rompimento, e a conclusão a que chego é
que está tudo acabado. Nada mais de Thomas e Eva.
Passo o resto do dia prostrada, só consigo beber água.
O telefone toca milhares de vezes e não atendo. Ouço baterem na porta, o
Marco chama por mim, mas ignoro qualquer tentativa de contato.
Durmo e acordo algumas vezes e perco completamente a noção do tempo.
– Muito obrigado, pode deixar que cuidarei dela. – Ouço a voz do Marco, ele
está falando com alguém.
– Marco? – Vejo uma silhueta se aproximar de mim dentro do quarto escuro.
– Que diabos aconteceu com você? Quase morri de preocupação, tive que
pedir para abrirem a sua porta! – Ele fala exaltado.
– Por favor, me deixe em paz. – Quase suplico.
– Não vou deixá-la assim desse jeito, não me peça isso.
– Por favor, vá embora. Não quero que sinta pena de mim.
– Não estou com pena de você, Eva. Estou preocupado com você e muito.
O que foi que aconteceu? – Pergunta sentando ao meu lado.
– Estou de volta ao abismo, mas resolvi descer em vez de cair.
– O quê? – O Marco pergunta, e constato que não é bom com metáforas.
– Descobri que o Thomas partiu para outra e resolvi deixar de lado os
comportamentos paliativos. – Suspiro e afundo a cabeça na almofada.
– Agora entendi o que significa o abismo. Contudo, ainda ignoro a diferença
entre descer e cair.
– Tentarei explicar. Não tenho como deixar de sofrer porque perder um
amor é dor na certa. O que posso fazer é tentar superar a dor causada por essa
perda, mas para superar tenho antes que encará-la. Encarar a dor é sofrer
entendendo o sofrimento, é escancarar o peito e mostrar a ferida, é descer até o
fundo do abismo, mas prestando atenção no caminho de ida porque isso facilitará
a volta. Cai no abismo quem tenta ignorar a dor. Dor negada é dor dobrada. E
essa queda pode machucar grave e permanentemente.
– Descer é sofrer de maneira consciente e cair é ser devastado pelo
sofrimento? – Ele acaricia a minha cabeça.
– Isso mesmo. Ser devastado pelo sofrimento pode até matar, mas sofrer de
maneira consciente é um processo que tem começo, meio e fim.
– Eva, você está tentando racionalizar o sofrimento? Entendi bem? – O
Marco me observa com ar curioso.
– Estou tentando sim, com todas as minhas forças. Marco, eu sofri demais
quando perdi o Nicolas, me maltratei muito, fiz muita besteira, e a maior delas
foi tentar tirar a minha vida. Se eu tivesse conseguido, os meus pais ficariam
arrasados, a minha tentativa, por si só, os devastou. E o sofrimento enorme que
causei a eles me fez ver que eu não tinha o direito de causar a mesma dor que
estava sentindo. Desde então sempre tento ser racional, principalmente nas
situações que me abalam demais.
– Eva, você é incrível. Quanto mais a conheço, mais a admiro. Você se
mostra como realmente é apenas para poucos. Juro que se eu encontrar o
Thomas vou quebrar a cara dele. – A raiva que domina a voz do Marco quando
ele fala do Thomas me convence de que está falando sério.
– E por que você faria isso? – Não entendo, de verdade .
– Porque aquele imbecil viu e teve o melhor de você, mas mesmo assim
teve coragem de deixá-la.
– E não é isso que você queria? Que a minha história com ele acabasse de
vez? – Acho que as perguntas foram um pouco cruéis.
– Eva, quero você, mas não a qualquer preço.
– Irei melhorar, um dia. – Digo, tentando acreditar nisso.
– Fique tranquila porque cuidarei de você. – Ele diz, e a segurança com que
fala isso faz com que me acalme. Às vezes, tudo o que eu mais quero é me sentir
segura e amada. Mas é difícil descer do salto e admitir que sem amor não sou
absolutamente nada.
O Marco abre as cortinas e as janelas, chama a camareira para trocar os
lençóis e arrumar a cama e me obriga a tomar uma sopa. Massageia os meus
pés, me conta o filme que assistiu, e tento prestar atenção.
Por causa da insistência do Marco concordo em tomar outro banho e
colocar o pijama, mas continuo um caco.
Acho que tudo que acontece na vida da gente tem um propósito e estou
acreditando, cada dia mais, que o Marco estar aqui me ajudando a passar por
essa dor toda deve ter algum sentido maior. Talvez o tipo de pessoa que eu
realmente preciso ao meu lado esteja mais perto de mim do que eu pensava.
O Marco senta no sofá e me convida para assistir um filme de ação, aceito.
Deito a cabeça no seu colo, e ele novamente acaricia os meus cabelos. Estou tão
esgotada que durmo mais uma vez.
Capítulo V
Acordo sobressaltada. Estou na minha cama, olho para o relógio e ainda são
seis horas da manhã. Não aguento mais ficar neste quarto. Quero nadar em mar
aberto, pilotar um barco, saltar de paraquedas, descobrir a cura do câncer, sei lá,
quero ser produtiva e, principalmente, parar de sentir piedade de mim.
Chega! Acho que fiz uma descida superacelerada ao fundo do abismo e
estou pronta para fazer o caminho de volta, a minha escalada recomeçou.
Levanto da cama e vejo o Marco dormindo no sofá, todo vestido e em uma
posição muito incômoda. O meu coração se enche de ternura, ele é um homem
bom e talvez esteja certo. Quem sabe ele não é uma opção mais coerente para a
minha vida?
Verifico o celular e os e-mails. Nada. E quase já sabia disso. Visto o biquíni,
a canga e calço os chinelos.
– Bom dia, dorminhoco. – Passo a mão nos cabelos lisos e escuros do
Marco.
– Bom dia, mulher bipolar. – Ele ri, e rio também.
– Estou melhor hoje, acordei com o firme propósito de me curar. – Mulher
bipolar é mesmo um bom apelido para mim atualmente.
– Obrigado, Senhor! – Diz com jeito brincalhão e me observa. – Você está
pretendendo ir nadar? – Pergunta arqueando a sobrancelha.
– Talvez, quero tomar um ar. – Respondo arqueando a minha também, e ele
ri.
– Vem comigo, vou colocar a sunga e a acompanharei. – Levanta rapidamente.
Entro na suíte dele, sento no sofá e espero comportadamente. Percebo que
ele é um bagunceiro, tem roupa espalhada por todo lado, a camareira ainda não
passou por aqui, a coitada terá muito trabalho.
– Estou pronto. – Aparece sorrindo.
– Você está ótimo. – Sorrio também e me levanto.
– Estou contente que tenha reparado em mim, Eva. Olhe bem e veja um
homem que se ofereceria de bom grado para lhe dar qualquer coisa neste
mundo.
O Marco se aproxima com muita cautela, e o seu olhar é terno. Coloca a
mão embaixo do meu queixo, levanta o meu rosto e me encara. Vai diminuindo a
distância entre os nossos rostos lentamente, e não recuo. Ele encosta os lábios nos
meus com suavidade, não me afasto, e ele, cuidadosamente, empurra a língua
para dentro da minha boca, e deixo. O beijo é doce, macio, longo e carinhoso.
– Obrigada por tudo. – Falo quando o beijo termina .
– O beijo é uma demonstração de gratidão? – O rosto dele fica tenso.
– Não. – Respondo, e ele me beija outra vez .
Enquanto o Marco me beija a minha cabeça dá mil voltas. Ele beija bem,
não posso negar, mas não faz o meu coração acelerar e nem o meu corpo
tremer. É só um beijo bom que me conforta. É como se fosse uma espécie de
carinho na minha autoestima que anda tão melindrada.
O Marco cola o corpo ao meu e sinto a sua ereção, interrompo sutilmente o
beijo e me afasto.
– Vamos tomar café? Estou faminta.
– Vamos. – Ele sorri de uma maneira tão doce que quase me faz chorar...
Tenho receio de vir a magoá-lo novamente .
Passamos o dia fazendo mil e uma atividades, e noto que o Marco está
muito interessado em me distrair e em me fazer sorrir e, por incrível que pareça,
ele consegue as duas coisas.
Sei que poderia evitar o Marco e me concentrar em tentar curar as minhas
feridas sozinha, mas a atenção e o carinho dele me enternecem. Estou tão
fragilizada que não tenho forças para recusar a ajuda e o ombro que ele está me
oferecendo. Além disso, algo me diz que não tenho mais nada a perder, e se o
Marco, mesmo sabendo que amo outro homem, está tão disposto a investir o seu
tempo em mim, posso deixar de ser egoísta e tentar retribuir a atenção.
Talvez a minha grande missão nesta vida seja aprender a dar valor àquilo
que está ao alcance das mãos em vez de sofrer tanto pelo que não posso mais ter.
– Espero que tenha gostado do nosso dia juntos. – O Marco olha
carinhosamente para mim.
– Gostei muito. Obrigada por tudo. – Sorrio.
– Será que você vai me deixar entrar? – O olhar suplicante que me dá, me
constrange.
– Estou cansada, pretendo dormir. – Tento rechaçá-lo.
– Posso fazer você dormir. – Continua parecendo muito gentil.
– Acho que ainda não estou preparada para isso. – Justifico.
– Deixe-me beijá-la novamente, Eva. Por favor... – Ele pede com tanta
vontade implícita na voz que não tenho como recusar e o beijo.
– Agora está na hora do boa noite. Tchauzinho! – Digo quando o beijo termina.
– Você ainda está esperando por aquele telefonema? – Pergunta analisando
o meu rosto.
– Acho que não mais. – A minha voz soa muito triste.
– Está pretendendo cometer algum grande ato de amor para reconquistar o
Thomas? – A tristeza contida nos olhos dele me comove.
– Provavelmente não. – Desvio o olhar.
– Eu não desperto absolutamente nada em você, não é? – Resolve apelar.
– Isso não é verdade . – Desperta, só não sei ainda se são sentimentos
apropriados para o assunto em questão.
– Então por que não posso passar a noite com você?
– Porque não sei se consigo. Ainda estão muito nítidas as lembranças do
Thomas na minha cama. – Falo quase sem querer.
– Acho que só tem uma maneira de apagar essas lembranças. Com outras.
– Você está certo, mas ainda preciso de um tempo. – Tento fazê-lo entender.
– Estou esperando há dois anos. – Ele me observa bastante compenetrado.
– Dois anos é um tempo considerável. – Reflito.
– Nunca entendi o que fiz de errado. Foi tão bom, pensei que você também
tivesse gostado, mas você foi embora quase imediatamente e no dia seguinte,
quando a procurei, deixou bem claro que estava me dispensando. – Fala, e sinto
um pouco de mágoa na declaração dele.
– Naquela época, estava tentando encontrar alguém que me fizesse
esquecer o Nicolas. – Confesso.
– Agora precisa encontrar alguém que a faça esquecer o Thomas. – Ele se
lamenta.
– Essa família me persegue. – Faço graça da minha desgraça, só eu
mesmo.
– O Thomas fez você esquecer o Nicolas, conseguiu o que não pude. – O
Marco diz com tristeza, mas não tenho como contradizê-lo.
– Verdade. – Suspiro.
– Acontece que ele tinha muito mais chance de conseguir do que eu,
porque, mesmo que diga que não, acredito que a semelhança entre eles o deixou
em vantagem. – Argumenta.
– De certa forma sim, acho que abri a guarda por essa razão. Mas a questão
é que ele mexeu comigo por outros motivos. A química entre nós foi o fator
determinante, ele abalou os meus alicerces, atiçou os meus sentidos, despertou os
meus sentimentos, me satisfez completamente, e não sei se conseguirei me sentir
assim de novo com outra pessoa.
Quero que o Marco saiba a verdade antes de seguirmos com isso.
– Se vocês não fizerem as pazes o seu próximo passo será se recolher a um
convento? – Indaga, e rio.
– Não! Deixe de ser irônico. – Continuo rindo.
– Eva, quando uma pessoa deseja esquecer outra, a primeira coisa que ela
deve fazer é evitar comparações. Nenhuma pessoa consegue fazer as coisas
exatamente igual a outra pessoa, mas talvez isso não seja ruim. – Para de falar e
me observa.
– Pode ser. – Falo sem muita convicção.
– O Thomas fode como o Thomas e o Marco fode como o Marco, simples
assim. Quero apenas que compreenda que a Eva poderá transar com o Marco
concentrada apenas no Marco e talvez ela ache gostoso o jeito que o Marco faz;
mas ela também poderá transar com o Marco pensando no Thomas, ou pior,
comparando-o ao Thomas e aí, com certeza, a Eva achará bem
frustrante. – Ele explica quase didaticamente .
– E se mesmo se concentrando no Marco, a Eva não conseguir esquecer o
jeito que o Thomas faz? – Preciso me prevenir .
– A Eva estará bem encrencada se o Thomas resolver não voltar, mas
sempre tem aquela ideia do convento que poderá ser levada em consideração. –
Ele ri.
– O convento está terminantemente fora de cogitação. – Falo e rio também.
– Então você deve começar a expandir os seus horizontes.
– É muita pressão para uma transa, não acha? – Rio divertidamente.
– Foi você quem começou o assunto. Por mim, estaria tirando a sua roupa. –
Ele sorri.
– Preciso contar com a sua paciência...
– Boa noite, princesa. Durma bem. – O Marco desiste.
– Boa noite. – Digo, e ele se afasta rapidamente.
O pior é que eu sei que o Marco tem razão em boa parte do que falou. Usou
bons argumentos e quase me convenci a deixá-lo entrar, porém se fizesse isso,
estaria dando esperanças a ele e não sei se estou pronta para corresponder às
suas expectativas. Além disso, não pretendo magoá-lo novamente, embora talvez
isso seja inevitável.
O sono demora a vir, rolo de um lado para o outro na cama, a dor de ser
ignorada pelo Thomas é lancinante e choro. Choro porque não consigo mais
acreditar que ele me queira de volta. Choro porque mesmo que ele me queira de
volta, mesmo que me convença de que acredita no meu amor, creio que não
serei capaz de aceitá-lo depois que ele me fez me sentir tão pequena, tão
vulnerável, e tão em desvantagem. Caio em prantos porque todas as alternativas
que passam pela minha cabeça não são boas. Orgulho ferido é mesmo uma
droga!
A dor é tanta que o meu estômago embrulha, corro para o banheiro e
vomito. Como me odeio por sofrer tanto por alguém que não foi capaz de
acreditar nos meus sentimentos nem nas minhas justificativas, alguém que me
julgou tão mal e que encontrou tão facilmente a porta de saída da minha vida.
Depois de um banho quente e demorado volto a tentar dormir, o sono vai
chegando aos poucos, e rezo em agradecimento.
Chamo o Thomas e ele parece não me escutar. Pior ainda, acho que está me
ignorando.
Apresso o passo e quase o alcanço, só que ele é ainda mais rápido e
novamente aumenta a distância entre nós.
Sinto as lágrimas molharem o meu rosto e não posso acreditar quando ele
chega ao seu destino e sorri daquele jeito que faz o meu coração disparar, porém o
sorriso não é para mim. Ele recebe a mulher loura em seus braços e a beija. As
minhas pernas tremem. Ele levanta a mulher em seu colo e ela me encara com o
olhar de triunfo.
É a Amanda. O Thomas se afasta carregando-a, e grito. O meu grito é tão
alto que os meus ouvidos doem.
Acordo desorientada e com o coração quase saindo pela boca por causa do
pesadelo. Ouço fortes batidas na porta, o Marco chama o meu nome, pulo da
cama assustada e corro para abrir a porta.
– O que aconteceu, Eva? Você gritou muito alto, e não sei como não
acordou todo mundo.
– Gritei mesmo, então. – Digo quase para mim mesma.
– Gritou sim. – Ele confirma.
– Tive um pesadelo. – E que pesadelo!
– Fique tranquila, estou aqui.
– E como chegou tão rápido?
– Não consegui dormir e fui dar umas voltas para esfriar a cabeça. Estava
retornando do meu passeio noturno e, ao passar pela porta do seu quarto, ouvi o
seu grito.
– Você realmente incorporou o papel de meu salvador. Obrigada, meu
herói. – E não é que ele se parece com o Superman? Só que de olhos escuros e
um pouco mais bronzeado.
O Marco entra no quarto, fecha a porta e me abraça apertado, e me deixo
abraçar. O nosso abraço é bem apertado, sinto o corpo dele tremer, e a sua
ereção me faz lembrar de que estou vestindo apenas uma minúscula camisola de
seda.
– Afaste-se de mim, Eva! Pode me dar um empurrão, um soco, um chute,
qualquer coisa para que eu consiga me desgrudar de você, porque senão não
conseguirei mais me conter.
– Não posso fazer isso, estou me sentindo muito segura em seus braços,
preciso de mais um tempinho por aqui. – Estou brincando com fogo, eu sei .
– Você está tão cheirosa, tão quentinha e tão sumariamente vestida que
estou quase me esquecendo daquela conversa que tivemos antes. Sei que se você
não agir rápido, vou levá-la para aquela cama e não vou parar até que todo o
desejo que me consome esteja sob controle, e isso pode demorar
consideravelmente.
– Neste exato momento não tenho a menor capacidade de impedi-lo. – Digo
a mais pura verdade.
– Eva, você está me dando a sua permissão?
– Sim. Desde que esteja disposto a se arriscar por alguém que, no momento,
não pode lhe prometer nada.
– Por você estou disposto a fazer qualquer coisa, sempre.
Ele me levanta em seu colo e me lembro da cena do pesadelo que tanto me
atordoou. Forço a minha mente a pensar apenas no momento presente e, quando
o Marco me coloca sobre a cama, fico de joelhos e começo a tirar a roupa
diante dos seus olhos negros de desejo.
Tiro a camisola bem devagar, tendo plena consciência de que a necessidade
de esquecer o Thomas é que está realmente me motivando a transar com o
Marco. Já não me importa o que o Marco me fará sentir e, mesmo que eu não
sinta absolutamente nada, sei que não me arrependerei de me entregar a ele
porque acabei de chegar à conclusão de que é melhor viver anestesiada do que
em carne viva.
O Marco me olha incrédulo, acho que ele não acredita que eu tenha
mudado de ideia tão rapidamente, mas é esperto e não me questiona. Ele tira do
bolso um pacotinho, e constato que veio preparado. Fico nua e ele parece muito
excitado.
Começa a tirar a roupa, observo a sua pele bronzeada, os seus braços
musculosos, a sua barriga sequinha, as suas pernas fortes e consigo me animar. A
mulher que fui antes de conhecer o Thomas, a que praticava sexo apenas pelo
sexo, se apresenta.
O instinto é forte e é nele que me agarro. Nunca achei difícil me entregar a
um homem bonito e, na esperança de dar prazer ao meu corpo, fiz isso inúmeras
vezes. O problema é que agindo assim não conseguia aplacar o vazio que corroía
a minha alma, o que me desmotivava seriamente a continuar me encontrando
com o tal homem bonito da vez, e partia para o próximo.
O sexo pelo sexo funcionava como uma tentativa, que, devo reconhecer,
fracassava constantemente, de encontrar alguém que resgatasse o meu amor.
Tento não pensar em mais nada quando o desejo me chama e torço para
não sentir arrependimento, culpa ou remorso. Isso só acontecerá se o sexo for
ruim, porque sexo ruim é péssimo para o moral.
O Marco capricha no quesito preliminares. Que pena que gosto mais de
concomitantes, e lembrar como costumava empregar esse termo quase me faz
chorar.
Sexo com o Marco é pura degustação. Ele é gentil, carinhoso, bem dotado, o
seu toque é delicado e me sinto relaxar. Comparo a sensação a estar faminta e
comer a refeição com colher de chá, e para uma pessoa impetuosa como eu,
pode ser um pouco desestimulante. Mas me deixo ser guiada por ele, que se
empenha bastante em me satisfazer.
Vou alcançando o orgasmo paulatinamente, porém preciso evocar algumas
imagens mentais para conseguir chegar lá, e somente depois que se certifica que
gozei, o Marco goza também.
Cadê os fogos de artifício?
Por que será que não consegui flutuar?
O efeito do orgasmo no meu corpo passa rápido, muito rápido.
O pior é que a minha alma não se engana, a teimosa não se deixou enlevar.
O sexo não foi ruim, foi bom. Só que sexo sem frio na barriga, coração
acelerado, corpo vibrando, alma enlevada e arrebatamento, é apenas sexo. Pura
satisfação de necessidade física, só isso.
O Marco descansa com a cabeça sobre a minha barriga e passo a mão por
seus cabelos.
– Você é bom, Marco. – Sou sincera no elogio, pena que prefiro mais
safadeza e menos gentileza.
– Estava aqui rezando para ter passado no teste. – Ele suspira.
– Jura? Você sabe que faz direitinho, por isso insistiu tanto em me levar para
cama. – Gargalho . – Acredito que se resolvermos fazer isso mais vezes
poderei lhe mostrar como gosto e do que gosto, você também poderá fazer o
mesmo. – Estou aberta às oportunidades . Cansando o corpo, distraio a mente.
– Estou me agarrando à esperança de que você se entregue mais agora
porque me conhece melhor. Você me traumatizou no passado, Eva. – Ele fala, e
percebo uma tentativa de me mostrar que o magoei.
– Sabe, Marco, o problema não era você, o problema sempre fui eu. Estava
procurando por algo que confesso só encontrei com o Thomas, mas estou
disposta a recomeçar a minha busca. – Sou honesta com ele.
– Infelizmente, isso não me conforta. – Ele ri. – Quero que encontre o que
busca comigo, e me esforçarei de verdade para que isso aconteça. Acho que
mereço um voto de confiança depois de dois anos de espera. – Vira a cabeça e
me olha.
– Com certeza você ganhou alguns pontos. – Rio baixinho.
– Só que estar assim com você me faz não conseguir esperar nem mais dois
minutos. – Ele sorri e me acaricia.
– Espero que aquele pacotinho que me mostrou tenha um companheiro em
algum lugar. – Faço questão de que ele tenha outro preservativo.
– Na verdade, ele tem um batalhão de amigos. – Sorri, levanta, pega a calça
no chão e tira outro pacotinho do bolso. E não é que ele veio mesmo preparado?
Acordo com aquela sensação de alma amarrotada e pensando que só posso
ser mesmo muito inconsequente. Estou cansada de saber que a alma sofre
quando o corpo responde antes que a cabeça pense. E, além da quase crise de
consciência, a saudade do Thomas ainda me consome, embora me sinta
confortável com o abraço carinhoso que o Marco me dá.
Observo-o dormir, ele está enrolado em mim e a sua afetuosidade me toca.
Posso dizer, neste preciso momento, que sou a antítese personificada.
– Olá, princesa. – O Marco me olha com carinho.
– Olá. – Sorrio.
De repente, ele começa a rir.
– O que é tão engraçado? – Faço cara de brava.
– Olhei para você e lembrei imediatamente da letra de uma música.
– Ah, é? Qual? – Pergunto curiosa.
– Deixa pra lá! – Ele ri mais uma vez.
– Sou muito curiosa, muito mesmo. – Previno-o.
– Está bem, lá vai: Complicada e perfeitinha, você me apareceu, era tudo o
que eu queria...
– Mulher de Fases , dos Raimundos. – Rio também.
– Perfeitamente!
– Eu o preveni, sou uma mulher problemática. – Continuo rindo.
– E deliciosa, e maravilhosa, e divertida, e inteligente e que é capaz de me
enlouquecer apenas com um sorriso.
– Adoro elogios matinais. – Na verdade os elogios me agradam muito a
qualquer hora do dia .
– Não acredito que ainda não me disse que o que fizemos não se repetirá. –
Ele faz charminho.
– Estou aqui, não direi nada do tipo do que acabou de falar e não vou fugir,
pode acreditar. – Digo passando a mão pelos cabelos dele.
– Você não quer verificar o seu celular, os seus e-mails, ligar para o seu
escritório e ver se alguém deixou algum recado? Que tal telefonar para o
Thomas e ver como ele trata você? – Sugere com o semblante sério.
– Como não fugi, você quer me dispensar. Muito bem! – Brinco, sabendo o
que ele está tentando dizer.
– Na verdade só quero me sentir seguro, você não me disse se o tempo do
Thomas ainda está correndo ou se já acabou. Fizemos um combinado, lembra?
Sou um homem corajoso, mas não sou um camicase.
– Vamos fazer assim, Marco, você vai para o seu quarto, se arruma e depois
me encontra no restaurante para o café da manhã. Conversaremos lá. Pode ser?
– Tudo bem, em uma hora estarei pronto. – Ele me beija gentilmente e
passa a mão pela minha barriga nua.
Quando o Marco sai, sinto a ansiedade e o medo tomarem conta de mim.
Faço tudo o que ele sugeriu, menos telefonar para o Thomas, porque constato que
não houve nenhuma tentativa de contato da parte dele.
Frustrada e magoada, tomo a minha decisão enquanto choro pela enésima vez.
Acho que preciso, agora, tentar fazer com que a indiferença do homem que
amo pare de fomentar a dor que corrói o meu coração e se torne o veneno capaz
de matar o meu amor.
Vou até o banheiro e me exorcizo debaixo do chuveiro. Deixo a água fria
lavar as minhas lágrimas e tiro do pescoço a gargantilha que o Thomas me deu.
Visto o biquíni, a canga, calço os chinelos, faço um rabo de cavalo e pego a
minha bolsa de palha. Respiro fundo e saio em direção ao restaurante.
– Você está linda, princesa. – O Marco diz e me examina meio tímido. –
Andou chorando por acaso?
– O negócio é o seguinte, Marco, o tempo do Thomas acabou. Ele não me
procurou e não irei atrás dele. – Informo assim que me sento em frente a ele.
– Não seria mais prudente, antes de prosseguirmos com a conversa, que
você procure falar com o Thomas para não se arrepender depois de não ter
tentado? – Ele quer parecer firme, porém, reparo insegurança em seu olhar.
– Estou convencida de que falar com ele não mudará muita coisa. O que
ninguém parece compreender é que ele nunca quis me ouvir, não quis antes e
duvido que queira agora. – Sou pura mágoa .
– O sofrimento muda as pessoas, pode ser que agora ele queira. – O Marco
diz parecendo um pouco abalado.
– Se quisesse, teria entrado em contato. O Thomas é o tipo de pessoa que
quando tem interesse toma atitude.
– Qualquer homem interessado é muito ativo. – O Marco sorri meio
nervoso.
– Sei disso. E sei também que o Thomas me julgou e condenou sem me dar
chance de defesa e não consigo suportar uma injustiça dessas. O comportamento
dele me deixou muito ofendida. – Respiro fundo e continuo. – Eu me entreguei
àquele homem de corpo e alma e ele passou a fazer parte da minha vida de uma
maneira tão completa e absorvente que nem sei descrever. Dediquei-me a
ajudá-lo a descobrir o passado e acreditei que teríamos um futuro juntos, só que
ele, simplesmente, fez as malas e deixou tudo isso para trás. Nenhuma palavra
que eu diga conseguirá convencer um homem que trocou a mulher, que jura que
ama, por uma dúvida. – Consigo argumentar com firmeza.
– Diante disso, você quer dizer que terei a minha chance? – O rosto do
Marco se ilumina.
– Isso mesmo. – Falo com convicção.
– Você conhece os meus termos. Quando começar o meu tempo encerra o
do Thomas. Aceitando o acordo, você se compromete a não procurá-lo e a não
aceitá-lo de volta, sob nenhuma circunstância. – O olhar firme dele deixa bem
claro que não está de brincadeira.
– E qual é o tempo que nos daremos? Porque pode ser que um
relacionamento entre nós não dê certo e ficarmos presos em um acordo não será
bom para nenhum de nós. – Tento ser prática.
– O que não estiver se sentindo feliz tem todo o direito de pedir o divórcio. –
Ele sorri calmamente.
– Divórcio? – Rio da brincadeira dele.
– Isso mesmo, Eva. Estou dizendo que quero me casar com você. Faz dois
anos que a namoro platonicamente e, para mim, os próximos passos são o
noivado e o casamento. – Sorri novamente.
– Acho que você enlouqueceu. – Ainda não estou acreditando nele.
– Não enlouqueci. Só não quero perder mais tempo. Podemos namorar
muito depois de casados e, como eu disse antes, se não der certo qualquer um de
nós poderá pedir o divórcio. Quero um compromisso sério e o casamento no civil
será o contrato que selará o nosso acordo. – Pega a minha mão e me olha com
ternura.
– Tudo isso é muito romântico. – Digo com ironia.
– Gostaria muito de fazer de maneira diferente, porém fica difícil ser
romântico tendo que sustentar uma argumentação. – O sorriso carinhoso dele me
desarma.
– Você está ciente de que amo o Thomas? Sabe que estou tentando esquecê-
lo e que isso ainda não aconteceu? Quero muito corresponder às suas
expectativas, Marco, mas pode ser que eu fracasse. – Esta sou eu sendo muito
sincera.
– Completamente ciente. Não sou irresponsável, Eva, apenas acredito que o
tempo e a distância são um santo remédio e que os dois contribuirão para que se
esqueça do Thomas. Estou planejando passar todo o tempo que puder ao seu lado
e promover a maior distância possível entre você e o seu ex, e pode ser que dê
certo.
– Pode ser que dê certo? Não o assusta a possibilidade de estar casado com
uma mulher que não consegue deixar de amar outro homem?
– A vida é uma incógnita, e ninguém pode ter garantia de nada. Se você
voltasse para o Thomas agora, nos seus termos, conseguiria me garantir que
vocês teriam um “para sempre”, um happy end? – Ele se cala e espera que eu
fale.
– Acho que não.
– O ponto que defendo é que se ninguém consegue prever o futuro ou
garantir que ele seja do jeito que se deseja, então, o melhor a fazer é aproveitar
muito bem o presente. Quero você no meu presente, Eva, e quero muito, e talvez
tenhamos a sorte de uma união nossa ser tão boa, que no futuro ela ainda esteja
lá, sólida e com lindos frutos.
– Nos casaríamos em quanto tempo? – Incorporo a praticidade da minha mãe.
– Em um mês a partir da data que me der o seu “sim”, sem dilação do
prazo. Acredito que esse é o tempo necessário para a documentação seguir o
trâmite no cartório, se precisar que alguma coisa seja agilizada poderei usar de
alguma influência. – Explica, e percebo que ele premeditou tudo isso.
– Se eu concordar, será um casamento simples, só as nossas famílias e os
amigos mais íntimos, sem imprensa, mandaremos um comunicado oficial depois
da cerimônia. – Continuo tentando incorporar a tal praticidade materna .
– Só faço questão que esteja vestida de noiva, não quero perder isso por
nada. – Ele continua com a maluquice dele.
– E qual é o prazo para que eu lhe dê a resposta? – Preciso pensar muito
antes de tomar uma decisão desse porte .
– Até o dia da nossa partida daqui, mas se quiser responder antes, agradeço.
– O quê? Você quer que eu tome uma decisão dessas em tão pouco tempo?
– É pegar ou largar, Eva. A ansiedade vai me matar se lhe der um prazo maior.
– Você sabe como defender uma argumentação, deveria ter escolhido ser
advogado em vez de engenheiro. – Gargalho.
– Sou um bom engenheiro também, princesa. Sou bom em qualquer coisa
que me disponha a fazer com vontade. Serei um ótimo marido se me aceitar. – A
voz dele está carregada de emoção.
– Você é um homem persistente, Marco, tenho que reconhecer. – Digo, e
ele segura a minha mão gentilmente e a beija.
Toda a minha vida ouvi dizer que é difícil entender as mulheres, e pode até
ser que eu seja bem complicada, mas o modo como o Thomas se comportou me
faz pensar que complicada é a raça humana.
A discussão me deixou emocionalmente exausta, e a constatação de que não
sei o que fazer da minha vida me transtorna.
Gosto do Marco e amo o Thomas, que dilema! Além disso, assumi um
compromisso com o Marco que sou moralmente obrigada a cumprir. Também
não tenho certeza de que aceitaria o Thomas de volta assim tão facilmente como
ele queria se o compromisso de me casar com o Marco não existisse.
A instabilidade que o Thomas tem demonstrado me deixa insegura. Uma
hora ele me ama desesperadamente e não pode nem pensar em me perder, na
outra não me quer mais e some, e em outra me quer de volta de qualquer jeito.
Isso tudo realmente me confunde.
Acontece que me senti ofendida por ele achar que seria só aparecer e
“assobiar” que eu sairia correndo ao seu encontro. Então, avaliando bem, estar
comprometida com o Marco veio bem a calhar, porque me impediu de agir
como uma tonta.
Na verdade, neste momento, acho que não sei mais nada a respeito de coisa
alguma.
Aviso para o porteiro não deixar mais o Thomas subir sem ser anunciado e
vou para o escritório.
Trabalho como nunca o dia todo. Transformar atividade laboral em
remédio é um território conhecido para mim. As horas ganharam asas, o que
realmente achei ótimo. E mesmo quando já é tarde e estando exausta, continuo
com muita vontade de produzir, porque assim não penso. Só me lembro dos meus
dilemas quando recebo uma visita inesperada.
– Boa noite, princesa. – O Marco entra sem ser anunciado na minha sala.
– Marco! – Nunca fiquei tão feliz em vê-lo, acho que a presença dele me
ajudará a fortalecer as decisões que andei tomando ultimamente.
– Que bom que parece feliz em ver o seu noivo. – Ele me abraça e beija
com suavidade.
– Você veio antes do combinado, na verdade muito antes. – Sorrio. – Estou
muito surpresa.
– Vim conversar com os seus pais sobre o nosso casamento, desejo acabar
com a má impressão que o seu pai está tendo a respeito do assunto. Estou
também bastante motivado a raptá-la para me acompanhar a uma viagem a
Brasília.
– Brasília?
– A AMPLA está realizando alguns empreendimentos por lá, e o meu pai
resolveu me dar o encargo de visitar as obras, verificar o andamento dos projetos
e procurar áreas para futuros empreendimentos. Isso tudo deve levar,
aproximadamente, uma semana. Vamos?
– Você sabe que não posso. Fiquei fora duas semanas, e viajaremos em lua
de mel por mais outros tantos dias. Tenho que fazer a prova do vestido de noiva e
acredito que por mais que a minha mãe tenha se oferecido para cuidar de toda a
organização do casamento, algumas coisas dependerão exclusivamente de mim.
– Estou decepcionado.
– Então está bem, irei com você. Não faz mal que me case com um vestido
desajustado no corpo, que deixemos os preparativos todos com a minha mãe, e
que irrite o meu pai ainda mais me ausentando do escritório sem avisar
previamente. – Sei jogar duro .
– Nem pensar! Quero você usando um vestido de noiva perfeito no dia do
nosso casamento, e irritar mais o seu pai não me anima nadinha. – Ele ri.
– Vou telefonar para a minha mãe e pedir para que ela e o papai nos
encontrem daqui a pouco lá em casa. Chegando lá, preparo alguma coisa para
jantarmos e poderemos conversar e nos entender.
– Ótima ideia, menos a parte de você preparar o jantar. Peça para a
Patrícia telefonar para algum restaurante e encomendar uma boa comida. Soube
que trabalhou muito hoje, nada de trabalho extra para você.
– A Patrícia lhe conta tudo mesmo? Acho que terei que demiti-la. – Digo
brincando.
– Claro que não. Telefonei para cá quando cheguei ao aeroporto e soube que
você ficaria por aqui até mais tarde, fácil presumir que está compensando os dias
que ficou fora. – Ele nem imagina que a agenda cheia foi usada como método de
fuga.
Telefono para a minha mãe e combino o jantar. A Patrícia encomenda
comida italiana no restaurante preferido do meu pai, e o Marco e eu nos
dirigimos rapidamente para o meu apartamento.
O Marco está saudoso, mas a vontade dele de me levar para a cama é logo
subjugada pelo pouco tempo que temos para organizar tudo antes da chegada dos
meus pais.
O interfone toca. A pontualidade dos meus pais é impressionante. Peço para
o Marco atender enquanto troco de roupa.
Logo começo a ouvir vozes alteradas, uma espécie de discussão. Chego à sala
e encontro a porta aberta, e o Marco e o Thomas partindo para as vias de fato.
– O que é que vocês estão fazendo? – Grito interrompendo-os.
– Estou mostrando ao seu ex-namorado que ele não é mais bem-vindo aqui.
– O Marco responde nervoso.
– Marco, você é um oportunista da pior espécie, não vou permitir que
engane a Eva. – Thomas esbraveja e dá um soco no rosto do Marco, que reage e
devolve o soco.
Rapidamente eles se engalfinham, os dois são grandes e não conseguem se
derrubar. Thomas segura o Marco pelo colarinho da camisa, creio eu para fazer
a alavanca, só que o Marco mais uma vez reage e segura o Thomas pelo
colarinho também.
– Vocês estão sendo ridículos, parecem dois meninos disputando uma
figurinha. Thomas, deixe o Marco em paz e vá embora. Marco, solte o Thomas e
entre! – Falo sobressaltada, mas nenhum deles me atende. Começam a tentar se
derrubar, e acho que assistirei a uma luta de MMA.
A porta do elevador abre, a minha mãe sai e se depara com a cena. Ela fica
nitidamente consternada, mas a presença de espírito dela é muito oportuna.
– Meninos, podem parar com isso! – Ela grita. – Agora!
Tanto o Marco quanto o Thomas, apesar de estarem ocupados com as suas
demonstrações de força, param imediatamente, mas não se largam e observam
atônitos a minha mãe.
– Thom as, apesar de sem pre adorar encontrá-lo, acredito que você não
foi convidado para estar aqui hoj e. Estou certa? – A m inha m ãe pergunta
educadam ente.
– Está. – Thomas diz envergonhado.
– Marco, que bom revê-lo. Por favor, entre e ajude a Eva a me receber,
porque o Thomas está de saída. – Ela diz em seguida.
– Onde está o Guido? – Thomas pergunta, soltando e se afastando do Marco
que age exatamente da mesma forma.
– Está em casa se recuperando de um mal-estar. – A minha mãe responde
muito séria.
– Estou entendendo. O Guido deve ser contra toda essa maluquice de
casamento. Eu o conheço, nenhum mal-estar o impediria de visitar a filha e o
noivinho dela. – Thomas é sarcástico.
– Thomas, nós já nos dissemos tudo o que precisava ser dito. – Falo com o
coração partido, e não sei se me aborreço mais por ele ou pelo Marco.
O olhar do Thomas é de dor e agonia e essa dor me atinge. Sofro porque ele
sofre, sofro por não querer fazer o Marco sofrer, e essa situação faz com que eu
sinta vontade de desaparecer do mapa, e, para piorar o que já está péssimo, a
minha cabeça começar a latejar.
– Eva, você não ama o Marco, e por mais que esse casamento seja uma
crueldade comigo, é uma crueldade maior ainda com ele. Sei que nunca
conseguirá amá-lo como me ama. – Thomas infere.
– Não preciso da sua preocupação nem acredito no seu prognóstico. Não
procure mais a minha noiva! – O Marco se irrita, e temo que a briga recomece .
– Ela pode ser a sua noiva agora, m as nunca deixará de ser a m inha
m ulher. Enquanto eu sentir que a Eva m e am a, lutarei por ela. Não se
esqueça disso, Marco. – Thom as dá um passo para frente, e a m inha m ãe se
coloca entre os dois.
– Marco, entre. Thomas, vá embora. – A minha mãe ordena.
Entro no meu apartamento sem olhar para nenhum dos três. Vou para o
quarto e me sento na cama, no escuro. Sinto raiva de mim e do Thomas, da
situação que criamos, e da incapacidade que tivemos de dominar os nossos
temperamentos. Sinto tristeza pelo Marco, pela promessa de amor e felicidade
que ele vê no nosso casamento e que não sei se poderei cumprir.
– Princesa, desculpa. Não deveria ter deixado o Thomas subir. Só queria que
ele soubesse que estamos juntos e que não tem mais o direito de procurá-la. – O
Marco fala com tanta gentileza que me sinto tocada.
– Tudo bem, só que eu já tinha dito para o Thomas que estamos de casamento
marcado, não sei o que ele veio fazer aqui, não dei esperanças a ele. – Explico.
– Percebi o desespero dele. O Thomas sabe que perdeu você e está
enlouquecido. Agora, princesa, necessito do seu carinho. Por favor, coloque gelo
nos meu lábios, estão ardendo muito. – Ele é sempre tão terno que me comove.
– Vamos, a minha mãe deve estar preocupada.
– Ela ainda está lá fora conversando com o Thomas.
– Ah, tá. Deixe-me tratar desse ferimento. – Levanto, dou a mão para o
Marco e seguimos para a cozinha.
Quase vinte minutos depois, a minha mãe entra na cozinha como se nada
tivesse acontecido e me oferece ajuda para colocar a mesa. Logo depois, a
entrega do restaurante chega e arrumo a comida nas travessas.
O Marco espera no sofá colocando o saco de gelo na boca. O
constrangimento que sinto é tanto que quase não falo nada, e a minha mãe me
observa como se conseguisse me enxergar por dentro.
Jantamos, conversamos e ninguém toca no episódio da briga, o casamento é o
foco. A minha mãe tem o dom de tornar simples o que é complicado e faz a ausência
do meu pai, que sei que é por birra, não ser sentida pelo Marco como retaliação.
Concordamos com as ideias da minha mãe, na verdade finjo prestar
atenção sem nem saber direito em quê. O meu maior incômodo está na maneira
sutil como ela nos avalia, quase posso ouvir as indagações que está fazendo na
sua cabecinha esperta e temo que perceba o meu desassossego.
Quando a minha mãe se despede fico mais aliviada, e pressinto que, depois
do que aconteceu esta noite, ela tem elementos de sobra para me confrontar.
– Você não me parece nada bem. – O Marco me observa.
– Estou cansada, Thomas, muito cansada.
– Marco. Sou o Marco, o seu noivo. M A R C O. – Fala irritadíssimo, até
soletra para mim .
– Desculpa, Marco, meu noivo. Estou estressada, só isso. – Que
mancada ...
– Quer que a ajude a relaxar? – Ainda parece um pouco irritado.
– Massagem nos pés? – Pergunto na maior cara de pau, tentando desviá-lo
das intenções que sei que tem .
– Só isso será suficiente? – Parece decepcionado.
– Se eu disser que sim, você entenderá?
– Massagem nos pés da minha princesa, vamos lá. – Ele ri e sinto remorso,
queria poder retribuir o seu carinho e boa vontade.
Passamos o dia todo andando pela cidade, o Marco nunca se cansa, tinha
percebido isso quando estávamos no resort. Fazemos mil coisas, ele fica feliz em
esbanjar um pouco de dinheiro, e no fim do dia voltamos para casa, exaustos.
Ele deita bem juntinho de mim na cama, acaricia os meus cabelos e me
olha com paixão. Contudo, não me exige nada.
Sei que antes foi mais fácil me entregar ao Marco porque achava que o
Thomas estava realmente disposto a me esquecer, mas a situação mudou e estou
bem confusa. De qualquer forma, sei que não posso continuar evitando o meu
futuro marido.
– Princesa, você está muito cansada? – Lá vem ele...
– Por quê? – E lá vou eu com a minha tática de responder uma pergunta
com outra.
Marco levanta da cama rapidamente, pega o celular na mesa de cabeceira
e fica todo concentrado procurando algo, estou curiosa. Marco ri e não tenho
como não achá-lo charmoso.
– Levante-se, mulher! Venha aqui! – Ele fala e ri.
– Eu não! – Gargalho.
– Vem aqui, danadinha! Vem sentir a minha veia nordestina bem de
pertinho. Vamos dançar um forró! – Continua rindo e manda um beijinho.
– Forró? Só porque você é um moreno fortalezense?
– É, vem se habituar aos gostos do seu homem!
– Ei, homem! Conheço os seus gostos, e sei que adora dançar. Contudo, você
também deve saber que essa mulher aqui não sabe dançar tão bem quanto você.
– Ensinei você a dançar forró. Lembra?
– Lembro, faz tempo isso. Você passou uma noite me ensinando, mas só
porque queria me levar para a cama. – Volto a gargalhar.
– Quem leva para a cama é sono. Eu queria trepar com você. – Ele fala e
me olha com cara de sem-vergonha.
– E conseguiu!
– Consegui, mas aí você me dispensou logo depois. Justo quando eu tinha
acabado de compreender que queria você muito mais do que uma noite, ou mil e
uma. – Ele sorri.
– Nem comece! – Peço brincando, e torcendo seriamente para o assunto
não ganhar força.
– Essa história faz parte do passado, porque agora estou prestes a conseguir
o que mais desejo. Você será minha, princesa, inteirinha, de corpo e alma e para
sempre. – Só se for o corpo, porque a alma está relutante. Para ser sincera, até o
corpo anda relutando.
Ele coloca um forró para tocar no celular.
– Forró no Escuro , do grande Luiz Gonzaga. – Ele diz e me puxa pra junto
dele, bem junto mesmo, sou literalmente encoxada.
Iniciamos a dança, ele me conduz. Estamos colados, ele roça em mim
enquanto uma mão dele segura a minha, e a outra, bem firme, está estacionada
um pouco acima da minha nádega. Acho o jeito dele de me levar, no ritmo da
música, muito sensual. Quase nem ouço o forró, que é bonitinho, porque só
consigo me sentir cada vez mais quente. O desejo está me chamando e, ele sim,
estou ouvindo. Que bom, estava ficando preocupada com minha falta de
interesse pelo corpo do Marco.
A música termina, mas continuamos encaixados, em pé, ofegando.
– Acho que estou precisando de um beijo. – Inicio o assunto, preciso que o
Marco aprenda a me levar à loucura.
– Posso providenciar um ou dez agora mesmo. – O Marco se inclina e me
beija suavemente. Suavemente, ah não!
Retribuo o beijo e tento me concentrar no homem bonito e carinhoso que
está ao meu lado. E, apesar de estar excitada, é com certa dificuldade que me
deixo levar. Por incrível que pareça, preciso de esforço para não deixar a
excitação se esvair com o seu toque gentil.
O Marco me deita na cama e se deita. Tira cuidadosamente a minha
camisola de seda muito comportada e beija demoradamente o meu pescoço
enquanto acaricia os meus seios. Passo a mão pelos ombros dele e sinto a
musculatura firme, desço a mão pela sua barriga suada até chegar ao cós da
cueca boxer, enfio os dedos e encosto no pênis teso. Estou disposta a apimentar
um pouco este momento. Ele segura a minha mão e gira o corpo para cima de
mim, olha dentro dos meus olhos com admiração e beija a minha boca de
maneira ardente. Acaricio as suas costas, serpenteio a língua em sua boca, sinto a
sua ereção contra a minha virilha e inclino para frente roçando-me nela.
Ele desce a boca até a minha orelha e mordisca delicadamente cada parte
dela, enfia a língua molhada dentro do meu ouvido e me arrepio por causa da
gastura que isto está provocando em mim.
– Que tal se eu tirar a minha calcinha e você a sua cueca? – Sugiro tentando
tornar a brincadeira mais animada.
– Calma, princesa... Estou saboreando você pedacinho por pedacinho. – Diz,
e as suas palavras arrefecem o meu desejo.
– Quero que você me possua com força, com intensidade. Seja menos
gentil. – Tento dar as cartas.
– Eva, quando a vejo nua, quase gozo. Quando meto em você, que é tão
quente e apertada, tenho que me segurar para não gozar no mesmo instante.
Quando você rebola, tenho que me controlar ainda mais para não gozar no
primeiro segundo. O tempo todo me segurando, preciso ir devagar, senão não
duro nadinha. Enquanto não tiver acostumado com esse pedaço de paraíso que é
você, vai ser assim, precisa ter paciência.
– Pode gozar, Marco. Sei que você se recupera rápido. E satisfeito poderá
me satisfazer do jeito que gosto, com mais ímpeto.
– Não sou homem de rapidinha. Quero comer você devagar e com carinho.
– Comer com carinho? – Ah, não, só falta colocar o guardanapo no colo e
usar garfo e faca.
– Com muito carinho e cuidado, pelo menos até que eu esteja menos
impressionado com esse seu jeitinho de safada que tanto me excita e que tem o
poder de me descontrolar. – Ele responde sem se dar conta da minha indignação
com a tal da sutileza.
Retiro as mãos das costas dele e as utilizo para tirar a calcinha. Ele suspende
o corpo para facilitar a minha tarefa sem nunca deixar de beijar a minha orelha,
e acho que ficarei surda com tanta saliva no ouvido. Jogo a calcinha longe e puxo
a cueca dele para baixo, ele me ajuda, e a cueca cai não sei onde. Com a ereção
dele liberada, volto a roçar o meu corpo no dele e o faço gemer.
Seguro o pênis e movimento a mão para cima e para baixo tentando, quem
sabe, despertar o lado leão do gatinho que está na minha cama.
Ele desce a boca até os meus seios, lambe, chupa, mordisca, cheira, tudo
vagarosamente, gentilmente, e continuo esperando a tão sonhada penetração.
Desisto de masturbá-lo e começo a me masturbar. Fricciono o clitóris com
os dedos, faço movimentos circulares e a minha umidade finalmente surge.
– Que coisa mais gostosa de se ver! – O Marco diz observando a tarefa que
executo.
– Onde está o preservativo?
– Precisaremos mesmo dele? – Ele fica aborrecido .
– Precisaremos. Busque-o, por favor. Continuarei me aquecendo para você.
– Ele ri sem sair de cima de mim e pega o pacote na mesinha de cabeceira .
Que homem prevenido!
Ele deita de lado e veste o preservativo no seu membro rijo e tenho que
reconhecer que o Marco é muito bem dotado. Equipamento de primeira, uma
Ferrari que, no momento, está sendo pilotada a 40 km/h. Tento desviar o
pensamento maldoso da mente e continuo me dedicando a me excitar.
– Vou foder você, princesa. De um jeito bem gostosinho. – Marco diz
voltando a subir em cima de mim.
– Mal posso esperar. – Falo com sinceridade e ligeira ironia.
Marco segura a minha mão impedindo que eu continue a me tocar, lambe
os meus dedos e geme, coloca o meu braço ao redor do seu pescoço, e coloco o
outro também. Ele esfrega o pênis na entrada da minha vagina e me animo, vai
penetrando lentamente, e a falta de lubrificação adequada torna o processo
doloroso, e ainda mais lento.
– Você é muito apertada. Adoro isso. – Ele diz no meu ouvido. Suspiro, e ele
geme.
– Então vamos lá, noivo! Sou do tipo de mulher “agite durante o uso”. –
Advirto, e ele ri.
– Quanta impaciência, mulher! – Ri novamente.
– Quanta paciência, homem! – Reclamo, e ele ri mais uma vez não sei de quê.
Enlaço a cintura do Marco com as pernas e inclino o quadril para cima,
obrigando-o a me penetrar mais profundamente. A fricção é boa, remexo
embaixo dele, ele se entusiasma e, finalmente, entra e sai de mim mais
rapidamente.
– Mais forte e mais fundo. – Peço.
– Uma fodida violenta, pode deixar. – Ele atende o meu pedido.
Arremete com força e mais profundamente, estou começando a gostar,
contudo, ele estremece, urra e tenho o enorme pressentimento de que gozou. O
Marco para, procura a minha boca e me beija.
– Não consegui resistir, você é muito gostosa, Eva, estou vendo estrelas. –
Confessa assim que tira os lábios dos meus.
Ele sai de dentro de mim, tira o preservativo e amarra a ponta, coloca-o no
chão, deita ao meu lado e me vira, beija o meu pescoço. Com uma mão belisca
o meu mamilo e com a outra estimula o meu clitóris.
Coloco a mão sobre a dele e o ajudo a me masturbar. Acho que não
conseguirei chegar lá, rebolo nos seus dedos e começo a me sentir ardida por
causa da falta da maravilhosa lubrificação que, neste momento, é coisa do
passado. Gemo dissimuladamente, remexo um pouco mais rápido e dou por
encerrado o assunto.
Fingir orgasmo é o cúmulo da frustração!
A consternação, o cansaço, e o medo de que o Marco fique disposto
novamente me fazem dormir bem rápido, mas antes me lembro do que ele me
disse em Punta Cana: “A Eva pode transar com o Marco pensando no Thomas,
ou pior comparando-o ao Thomas, e aí com certeza ela achará bem frustrante”.
Infelizmente ele tinha razão.
A minha mãe não tarda a chegar. Ela nos mostra fotos de alguns locais que
selecionou para a realização do casamento, e todos parecem bons para mim. O
Marco fica em dúvida, e sem muita cooperação nossa, ela resolve decidir
sozinha e somente após visitá-los.
À tarde levo o Marco ao aeroporto, realmente as despedidas não o
agradam. Ele me dá um monte de beijos, outros tantos abraços, faz mil
recomendações e entra no portão de embarque com cara de poucos amigos. Se
todas as nossas despedidas forem sempre assim, estarei perdida.
Antes de voltar para casa, resolvo visitar os meus pais que ficarão na cidade
por causa dos preparativos do meu casamento.
– Olá, mamãe. – Digo sorridente.
– Que bom que veio, minha filha. O seu pai precisa falar com você. – Ela
pisca para mim e sorri.
Observo um casaco dobrado em cima do aparador e sei imediatamente de
quem é.
– O que o casaco do Thomas está fazendo aqui?
A minha mãe fica visivelmente constrangida e, antes que responda, o meu
pai se junta a nós.
– Como está, minha filha? – Pergunta ainda um pouco formal comigo.
– Bem. Gostaria de saber como o casaco do Thomas veio parar aqui. – Insisto.
– Ele esqueceu na sexta-feira à noite quando veio conversar comigo e
deixei aí para o caso de que venha buscá-lo. – O meu pai explica.
– O que vocês conversaram? – Sinto que estou ficando irritada.
– Sobre o seu casamento. – O meu pai responde.
– Seja mais específico. – Exijo.
– Eva, o seu pai tem o direito de falar com quem quiser sobre o que quiser.
Você está sendo invasiva. – A minha mãe sai em defesa do meu pai.
– Eles falaram sobre mim, tenho o direito de saber. – Mantenho a minha
posição com firmeza.
– Você só precisa saber que concordo com o seu casamento e que a levarei
ao altar. – Papai fala emocionado.
– E por que mudou de ideia? O que o Thomas tem a ver com isso? – Estou
mesmo irritada.
– Mudei de ideia porque não consigo deixar de me preocupar com você e
porque faço qualquer coisa para vê-la feliz. Se o casamento é o que quer, não me
oporei mais.
– Que bom que tenha reconsiderado, papai. Mas não entendo como
conversar com o Thomas o fez mudar de opinião. – Continuo insistindo.
– Conversar com o Thomas me fez entender que manter uma atitude
radical diante de uma adversidade é sempre o comportamento menos indicado. –
Papai diz e me abraça, olho para ele confusa.
– Eva, tudo resolvido, o seu pai e eu daremos a você o casamento que
merece, será inesquecível e especial. – A minha mãe também me abraça.
Converso um pouco mais com os meus pais sobre o casamento, mas estou
me sentindo muito dispersa e decido voltar para o refúgio do meu lar.
Depois que saio da casa dos meus pais, na solidão do meu apartamento,
resolvo arrumar o closet e encontro a minha caixa de lembranças toda
desmantelada encostada em um canto. Separo algumas fotos de momentos
importantes da vida do Nicolas e as coloco em um álbum que darei de presente
ao William. As cartas, as outras fotografias e os cartões, passo pela
fragmentadora de papéis, e jogo tudo no lixo. Agora sei que certas lembranças
devem ficar guardadas apenas no coração.
A noite cai, e fico agradecida porque consigo chegar ao fim de mais um dia.
Amanhã sei que o trabalho dará conta de me entreter.
O interfone toca, e o meu coração acelera. O Thomas deve ter vindo me
procurar. E mesmo sabendo que deve ser ele, resolvo atender.
– Sim.
– Dona Eva, o doutor Thomas está pedindo pra a senhora olhar pela janela
do seu quarto.
– O que ele pretende fazer, Francisco?
– Dona Eva, o doutor Thomas está pedindo pra a senhora olhar pela janela
do seu quarto. – Ele repete.
– Está bem!
Com passos largos e nada gentis me dirijo ao meu quarto. Abro a cortina
com força, empurro a janela sem a menor delicadeza e me deparo com uma
cena inusitada lá embaixo.
Thomas está sentado em um banquinho com o violão devidamente
posicionado diante dele. Atrás estão dois violinistas e um violoncelista, duas
enormes caixas de som e alguns microfones compondo o quadro. Quando o
Thomas me vê na janela, faz um sinal e começam a tocar, e constato que estão
bem ensaiados.
A primeira música da serenata, ou melhor, do concerto, como não poderia
deixar de ser é Prelude from Cello Suite nº 1 , de Bach. Na sequência
tocam Astúrias , de Isaac Albeniz; Csárdás , de Vittorio Monti; Concierto de
Aranjuez , de Joaquín Rodrigo; e Caprice nº 24 in A Minor , de Paganini. Todas
as músicas que conheço tão bem porque o Thomas e eu adorávamos escutá-las e
tocá-las.
Ao final, Thomas se levanta e ouço muitas palmas, estava tão
compenetrada que não percebi que os meus vizinhos acompanharam da janela a
execução do quarteto de cordas. Ele levanta o rosto e me observa, acho que não
pode ver as minhas lágrimas, bate a mão fechada no peito e depois aponta para
mim, manda um beijo e, me surpreendendo ainda mais, troca o violão por uma
guitarra.
– Quero que preste atenção na letra da música que eu vou tocar e cantar
para você, Here Without You , do 3 Doors Down. Espero que saiba o quanto
estou sentindo a sua falta e o quanto me dói estar longe de você. – Thomas fala, e
fico completamente emocionada.
Thomas toca a guitarra e canta muito bem, e a voz dele e a letra da música
me afetam profundamente. Quando termina, é novamente aplaudido. Ele olha
em minha direção e quase tenho uma síncope, se vira, entrega a guitarra, pega o
violão e sai carregando-o. Os outros instrumentistas ficam e guardam os
microfones, caixas de som, a guitarra e os seus instrumentos.
Espero na janela, mas o Thomas não retorna, e vejo ao longe o carro dele
deixando o estacionamento.
Estou emocionada e nervosa, uma ânsia revira o meu estômago e sobe pela
garganta, corro para o banheiro e vomito. O meu corpo está trêmulo, e com
esforço consigo me arrastar até a cama, me deito e fico observando o quarto
rodar.
A noite é longa e sofrida, os pensamentos me atordoam, penso no Thomas e
na serenata que me fez e choro. As tentativas dele de me reconquistar estão me
abalando muito.
Tenho que ser forte. Preciso manter a mente focada porque não posso
romper o compromisso com o Marco, um homem de quem gosto, que tem sido
muito correto comigo e que me ama. Céus!
Detesto estar sempre chorando. Detesto estar sempre vomitando. Detesto
estar tão vulnerável! Acho que ando detestando tudo ultimamente.
Durmo e acordo diversas vezes durante a noite.
O dia amanhece e me arrumo para trabalhar.
Chego ao escritório trajando um tailleur preto, sapatos de saltos médios e
usando enormes óculos escuros.
– Segunda-feira difícil? – A Patrícia pergunta assim que me vê.
– Vida difícil. – Respondo tentando sorrir.
– Coloquei em cima da sua mesa um buquê de rosas colombianas
vermelhas. Acredito que não são do Marco. – Ela me olha atravessado.
– São do Thomas, com certeza. – Penso em voz alta.
– Acho que o Marco não gostará nada disso. – A Patrícia pensa em voz alta
também.
– Deixe o Marco em Brasília cuidando dos assuntos dele. Se você contar
sobre essas rosas ele largará tudo, pegará o primeiro avião e virá para cá. Não
abra a sua boquinha. Entendeu? – Sou dura com ela porque as fofocas com o
Marco estão começando a me irritar de verdade.
– Entendi. – Ela diz chateada.
Entro na minha sala e vou diretamente procurar o cartão que acompanha o
buquê. As rosas são mesmo do Thomas.
“Minha Eva
Estou sentindo uma saudade enorme de você. Eu te amo e vou
continuar insistindo em tê-la de volta enquanto sentir que também me
ama. Se um dia parar de me amar deixe que eu saiba.
Seu, todo seu, Thomas.”
O cartão quase me faz chorar, mas consigo me conter, não quero mais ficar
me debulhando em lágrimas, chega. Pensando em seguir em frente no caminho
que escolhi, consigo me manter firme no propósito de não chorar. Tenho que ser
forte, preciso aprender a administrar o caos que a minha vida se tornou e
fraquejar só irá me fazer sofrer ainda mais.
O empenho do Thomas em me reconquistar é louvável, só que me deixa
preocupada. Será que ele estaria se dedicando tanto se o Marco não estivesse na
minha vida? Quem me garante que o meu pai ou a minha mãe não o fez saber do
meu casamento e isso o motivou a ir me procurar com a desculpa de me
devolver a gargantilha?
Uma coisa que tenho observado muito ao longo do tempo é o quanto o
interesse de uma pessoa pode ser reavivado pelo simples fato de saber que aquilo
que ela quer não está mais disponível.
Sei que o Thomas me ama, mas também sei que ele às vezes briga com
esse sentimento, e suspeito que isso aconteça porque ele se acha menos do que
mereço. Alguma coisa me diz que a autoestima dele, que deveria ser alta por
tudo o que ele é, foi colocada em baixa. Pressinto que o Antonio deve ter
realizado um brilhante trabalho em fazer o Thomas sentir-se insignificante
quando criança, e que isso deixou marcas profundas no intrigante doutor.
O nosso amor poderia ter sido um santo remédio para curar as dores da
alma, dele e minhas, mas agora esse remédio não terá mais oportunidade de
fazer efeito. A vida segue e me arrasta com ela, e me deixo levar, sabendo que
nem sempre aquilo que queremos é do que precisamos.
Quero o Thomas, mas preciso me sentir segura. Preciso de garantias, e ele
não pode oferecê-las, não depois do modo como saiu da minha vida.
Quando me envolvi com ele, me entreguei completamente, acreditei nele,
ignorei os meus medos, abri o meu coração e a minha vida e me expus. Não
deixei de contar sobre o meu passado com o Nicolas por duvidar dos meus
sentimentos pelo Thomas, muito pelo contrário, não contei por medo de perdê-lo.
Eu tinha prometido que não partiria o coração do Thomas e me propus a
amá-lo sem receios e sem reservas, e cumpri a promessa. Quando fiz essa
promessa, o Thomas me prometeu o mesmo, e disse que estava assumindo o
compromisso de manter os meus sentimentos em segurança dentro do coração
dele, e que os cultivaria com respeito e responsabilidade. Só que ao me deixar,
ele quebrou essa promessa, e outras, explícitas e implícitas, e isso não fui capaz
de digerir ou aceitar. Ninguém é obrigado a prometer nada, mas se prometer tem
que, pelo menos, se esforçar para cumprir.
Que coisa! Não deveria estar perdendo tempo lembrando as promessas que
o Thomas não cumpriu quando tenho a promessa que fiz para o Marco,
fresquinha e pronta, para ocupar a minha mente. Foco! Preciso manter o foco e
me ocupar do meu noivo e do meu casamento.
Mergulho de cabeça no trabalho e consigo me desligar um pouco do meu
drama pessoal, mas a cabeça aérea, a boca amarga, o aperto no peito e a
sensação de fracasso me acompanham a manhã toda. Para dar uma elevada no
meu tormento, no meio da tarde, recebo uma cartinha do Thomas e outro lindo
buquê de rosas colombianas acompanhando-o.
– Nossa, Eva, daqui a quatro dias você se casará! – A Patrícia faz questão de
me lembrar.
– Verdade. Você reservou o hotel para o Marco e para a família dele?
– Reservei, ele chegará hoje. Os pais e o restante da família chegarão
somente no dia do casamento, só que pela manhã. – Informa de maneira
profissional.
– Ótimo. Reserve uma mesa em algum excelente restaurante para que o
Marco e eu possamos jantar com os pais dele e os meus no dia seguinte ao do
casamento. Tenho certeza de que no dia do casamento estarei muito ocupada e
não poderei dar atenção aos meus sogros.
– Vocês viajarão em lua de mel dois dias depois da cerimônia, correto?
– Sim. Passaremos a noite de núpcias na suíte que reservou para o Marco e
ficaremos hospedados lá até o dia da nossa viagem.
– Por que o Marco não ficará no seu apartamento? – A curiosidade dela está
mais para bisbilhotice.
– Porque tenho medo de que o Thomas apareça e eles briguem. Entendeu agora?
– Entendi. O Thomas tem aparecido?
– Não, Patrícia. Ele tem feito todas as outras coisas que me perturbam
menos do que vê-lo. Acho até que ele tem sido muito condescendente comigo. –
Revelo de maneira irônica.
– Eva, se você não ama o Marco porque insiste em se casar com ele? E por
que o Marco deseja esse casamento mesmo sabendo que você ainda ama o
Thomas? Não compreendo. – Ela me observa indignada.
– Porque somos absolutamente sem juízo. Você já ouviu falar que quando
se salta de um avião não há como voltar? É isso, saltamos do avião e agora
estamos torcendo para que os nossos paraquedas abram. – Tento sorrir da minha
explicação maluca.
– E você não fica com pena do Thomas? – A Patrícia pergunta e acho que
ela quer mesmo vasculhar o meu íntimo.
– Se sentisse só pena seria fácil. Sinto amor, paixão, desejo, saudade e todo
o restante do pacote, mas, como já disse, saltei daquele avião com o Marco e
ninguém me obrigou a fazer isso. Quanto mais o casamento se aproxima maior é
a sensação que tenho de que terei que usar o paraquedas reserva. – Enfio o rosto
entre as mãos e suspiro.
– Não há nada que possa ser feito para que o casamento não aconteça?
– O único jeito seria o Marco se convencer de que não dará certo e desistir.
Gosto dele, e ele confia em mim, não posso simplesmente mudar de ideia agora.
Se não partir dele a iniciativa, o casamento será um fato. – Explico.
– Então o casamento será um fato. – A Patrícia diz com a voz triste.
– Espero não estar magoando você de alguma forma. – Falo, e ela me olha
ressabiada.
– Por que você me magoaria?
– Porque desconfio que você sente alguma coisa pelo Marco. –Percebo que
ela enrubesce e fica mais séria.
– Se eu fosse você, trataria de me apressar, porque o avião do seu noivo
deve estar quase chegando ao aeroporto. – Muda de assunto.
– É mesmo, estou de saída. – O meu desânimo é perceptível.
Antes de sair recebo um SMS do Thomas declarando o seu amor por mim e
pedindo que eu volte para ele, e isso me deixa ainda mais nervosa.
Quando chego ao aeroporto, recebo outro SMS do Thomas, e leio
rapidamente porque o Marco já está me esperando. Fico feliz em vê-lo, mas
observar a animação dele me irrita um pouco.
Que paradoxo! Ele tão contente com as mudanças que acontecerão em sua
vida e eu tão apavorada com as que acontecerão na minha.
– Olá, princesa. Que saudade! – O Marco m e abraça e m e beij a
apaixonadam ente.
– Fez boa viagem? – Pergunto ainda presa em seu abraço.
– Excelente! – Ele diz abrindo um amplo sorriso.
– Vamos? – Estou um pouco impaciente .
– Quer dizer então que serei abandonado em um hotel? – Ele faz uma
carinha triste.
– Conversamos a respeito, e achei que tivesse entendido. – Faço cara de má.
– Brincadeirinha, princesa. – Diz e sai empurrando em silêncio o carrinho
de bagagens até o meu carro.
No caminho do aeroporto até o hotel o Marco me explica o itinerário da
nossa longa lua de mel, e me esforço para prestar atenção, porém a quantidade
de informação me confunde e em pouco tempo não sei nem do que ele está
falando. A empolgação que sente o impede de reparar o meu pouco interesse e
me sinto ainda mais culpada.
Chegamos ao hotel e o saltitante Marco não cabe em si de contentamento, e
fico dividida entre a vontade de compartilhar dessa alegria e a de enforcá-lo por
tanta alegria.
– O que achou da suíte nupcial? – Pergunto quando terminamos o nosso tour
pelo quarto.
– Bem agradável. Vem aqui porque estou louco para jogá-la em cima
daquela cama enorme. – Ele se aproxima e me beija.
– Depois do casamento passaremos muito tempo na horizontal, além disso, a
minha mãe nos espera para jantar.
– Só que quero fazer isso agora, estou com muita saudade de você, com o
tesão no máximo da escala. Estou de pau duro desde que a vi no aeroporto. Dá aqui
a sua mãozinha, pegue nele, sinta o quanto ele está feliz esperando para entrar em
você. – Ele segura a minha mão e a coloca sobre o enorme volume em sua calça.
Tenho que reconhecer que ele está pronto, mas retiro a mão com delicadeza
e me afasto sutilmente.
– Você é gostosa demais, Eva. Sonho com você todos os dias, até acordado.
Prometo, mesmo não gostando de rapidinhas, que agora serei rápido, só
umazinha para aliviar o desejo e para não nos atrasarmos para o jantar com a
sua mãe. Mas quando voltarmos vou comer você até amanhã de manhã,
prepare-se. – Ele se aproxima novamente e começa a desabotoar a minha
blusa .
– Marco, pare. Acho melhor esperarmos até que a nossa lua de mel
oficialmente comece. – Detenho as mãos dele.
– O que você está dizendo? Entendi bem ou você só estará disposta a transar
comigo quando for inevitável? – Ele diz, ficando irritado.
– Procure compreender que a noiva é a superstar do casamento e tem
milhões de coisas com que se preocupar. Apenas peço que saiba esperar mais
um pouco, porque depois que o grande dia acontecer estarei mais calma e
pronta. – Tento nos convencer.
– Não me venha com conversa fiada! A última vez que transamos faz muito
tempo. Você está me rejeitando. – Ele me olha furioso .
– Marco, tenha paciência, você prometeu que seria compreensivo comigo.
– Lembro a ele do seu discurso.
– Sou um homem paciente, você sabe disso, o problema é que não posso
suportar a sua rejeição depois do tanto que desejei estar com você novamente. E
como acha que fica o meu orgulho? Por acaso a deixei pensar que não tenho
amor-próprio? – A raiva está estampada no rosto dele.
– Depois do casamento, Marco, quando passar o meu nervosismo, juro que
me comportarei como deseja. – Falo com seriedade.
– Se comportará como desejo? – Ele fica muito indignado.
– Desculpa, não foi isso que eu quis dizer. Só quero que entenda que a minha
prioridade agora é o casamento, por favor, espere até que eu seja a sua esposa é
só o que lhe peço. – Explico, sabendo que a emenda ficou pior do que o soneto .
– Não estou acreditando nisso! Só poderei tocá-la depois que você estiver
conformada com o seu destino?
A calma e tranquilidade dele foram para o espaço, consegui realmente
deixá-lo nervoso, então como sei que sou a culpada pela mudança de
comportamento dele, me calo.
– Eva, vá se conformando porque depois da cerimônia, quando trouxer você
para esta suíte, arrancarei o seu vestido de noiva e nada do que diga ou faça
impedirá que o nosso casamento seja consumado. Entendeu? – Ele quase grita.
– Entendi. – Confirmo e o encaro tentando demonstrar confiança.
– Agora vamos, acompanharei você até o saguão, você irá jantar com a sua
mãezinha e irei procurar o bar do hotel. Preciso de uma bebida ou de algumas. –
Segura a minha mão e me arrasta para fora do quarto. Penso em protestar e
desisto.
– Não beba demais, Marco. Procure dormir cedo hoje, e amanhã quando
acordar vá diretamente para o meu apartamento. Nós temos que discutir ainda
alguns pequenos detalhes antes da cerimônia e a minha mãe estará lá. – Digo
quando saímos do elevador.
– Sim, senhora. – Ele me deixa no meio do saguão e sai sem nem olhar para
trás.
– Marco, por favor, não faz assim. – Digo indo atrás dele.
– Tchau, Eva. – Fala, sem se virar e continua andando.
– Marco, volte aqui.
– Tchau, Eva. – Repete a sua fala e continua andando.
Telefono para a minha mãe, desmarco o jantar e conto o que aconteceu e,
inacreditavelmente, ela não se aborrece e me aconselha a não me aborrecer
também.
Durante o caminho que faço para chegar ao meu edifício, tento entender o
porquê de não ter conseguido deixar o Marco me tocar. Os carinhos dele não me
incomodam, gosto dele, sinto-me segura perto dele, mas não estou me sentindo
mais disposta a transar com ele desde que o Thomas decidiu me reconquistar.
Cada vez que o Thomas dá sinal de vida me lembro do quanto era incrível
estar nos braços dele e do poder que ele tem sobre o meu corpo, e qualquer coisa
diferente disso me desanima. O que eu tinha com ele era sexo com amor, e sexo
com amor é infinitamente melhor do que apenas sexo.
O Marco está certo, a palavra para definir o meu comportamento em
relação a ele hoje é rejeição. Terei que trabalhar a minha mente para que o
assunto Thomas seja guardado em algum compartimento do meu cérebro onde
esteja escrito a palavra PERIGO. E tenho que aceitar definitivamente que o
Marco é o homem que dormirá comigo todos os dias, porque, como ele deixou
claro, as minhas obrigações de esposa não poderão ser negligenciadas.
Depois de olhar detidamente o vestido de noiva pendurado no closet, fecho a
capa que o encobre, e ando quilômetros de um lado para o outro dentro do
apartamento. Organizo meticulosamente uma nécessaire para a viagem e ao
terminar resolvo dormir. A discussão com o Marco me entristeceu, e a saudade
do Thomas está acabando comigo. Preciso tentar recuperar a minha antiga
energia e me convencer a fazer o que me comprometi.
O interfone toca, e acho que um Marco bêbado e, provavelmente,
arrependido deve estar querendo falar comigo. Atendo.
– Pronto.
– Dona Eva, o doutor Thomas precisa falar com a senhora. – O porteiro
informa, e fico surpresa.
– Diga a ele que vá embora. – Tento ser forte.
– Ele não parece nada bem, e está dizendo aqui que precisa da sua ajuda.
– O que ele tem? – O meu coração quase sai pela boca.
– Não sei. Ele não parece nada bem, e está dizendo aqui que precisa da sua
ajuda.
Esse porteiro sempre faz isso, nunca explica, só fica repetindo a mesma coisa.
– Deixe-o subir. – Decido angustiada.
Quando o Thom as chegar, m entirei. Direi a ele que não o am o m ais, e
farei isso porque pretendo deixá-lo livre para investir em outra pessoa. A
m inha vida seguirá outro percurso agora, e não posso ser egoísta m antendo-o
preso a m im .
Espero pelo Thomas fora do apartamento, e ele surge do elevador com o
rosto vermelho, o olhar perdido e os passos lentos. A primeira impressão que
tenho é de que está bêbado.
– Estou com muita febre, Eva. Cuide de mim, por favor. – A voz dele está
quase inaudível.
– O que aconteceu? – A preocupação toma conta de mim.
– O de sempre, febre emocional. – E constato, ao tocar na testa dele, que
arde em febre.
– Venha. – Entramos, e o conduzo diretamente para o quarto de hóspedes e
o deito na cama.
Dou a ele um antitérmico e um copo de água. Meia hora depois a febre
começa a ceder, e peço que tome um banho quase frio, e ele me atende.
Thomas sai do banheiro apenas vestido na calça jeans justa, que é a minha
favorita, e com uma toalha pendurada no pescoço. E hiperventilo.
Consigo que ele beba um copo de leite morno e se deite novamente. Ele
dorme, e o admiro. O seu corpo seminu me faz ter pensamentos nada decentes,
tudo nele me atrai e me sinto culpada por desejar demais esse homem enquanto
rejeito o outro que é o meu noivo.
– Obrigado, Eva. Acho que a febre passou. – Ele diz com os olhos fechados.
– Passou sim, e gostaria de deixá-lo descansar mais um pouco, só que não
posso correr o risco de que o Marco o encontre aqui. – Não falo isso para magoá-
lo, contudo, sinto-me na obrigação de informar a razão pela qual não poderá
ficar.
– O Marco não virá aqui por agora. – Abre os belíssimos olhos verdes que
me atordoam.
– Como você pode ter certeza disso?
– Porque antes de vir para cá, passei no hotel em que ele está hospedado e o
vi entrando no quarto. Pelo que observei, acredito que não procurará por você
hoje, até desisti de tentar conversar com ele. – Thomas fala, e acho que não está
me contando tudo.
– E o que você viu exatamente? – Agora estou intrigada.
– Que ele não está em condições de deixar o quarto tão cedo. – Ainda não
explica .
– Bebeu demais? – Arrisco um palpite.
– Isso, minha linda. Poderei ficar mais um pouco. –Thomas sorri, e sinto o
chão sair de debaixo dos meus pés.
– Como você sabe onde ele está hospedado?
– Tenho como conseguir as informações que me interessam. – Sorri e não
revela o seu método.
– O que você queria falar com ele? – O meu interrogatório ainda não terminou.
– Queria que ele me ouvisse e desistisse de você. – Abaixa o olhar.
– O Marco não o atenderá. – Exponho a minha convicção.
– A essa altura o Marco deve estar compreendendo o tamanho do problema
que arrumou. – Fala pensativo.
– Ele também é um homem persistente, quase obstinado. – Sorrio sem graça.
– Sabe o que esse Marco é? Um dissimulado! – A raiva com que ele diz isso
me aflige.
– Podemos mudar de assunto? – Pergunto.
– Deite aqui comigo, Eva, por favor. – O olhar cheio de desejo que me dá,
me atiça e tenho que me afastar.
– Você sabe que não posso. Fique até se sentir melhor, mas peço que saia
antes que eu tenha problemas. – Quase corro em direção ao meu quarto.
Ouço os passos do Thomas atrás de mim, ele me alcança, segura o meu
braço e me aproxima dele. Não consigo e descubro que não quero resistir. O meu
corpo responde ao chamado do dele, nós nos beijamos ardentemente, e fico
completamente molhada.
Thomas me conduz até a cama, tira a minha roupa, e observo hipnotizada a
maneira ágil com que tira e atira a calça dele para longe.
– Você é capaz de imaginar a vontade que estou sentindo de estar dentro de
você? – Corre os dedos pelos meus lábios, e o meu corpo todo é só desejo.
– Então vem, quero você.
Seguro a mão do Thomas e a coloco sobre o meu seio, e ele o acaricia.
Ergo o rosto, e a boca gostosa dele encontra a minha. As nossas línguas se
enroscam enquanto os seus dedos ágeis circundam o meu mamilo.
– Quero você desesperadamente. – Sussurra.
Ele coloca a boca molhada em meu mamilo e o suga. A sensação é
deliciosa, e sinto a excitação e a luxúria prepararem o meu corpo para recebê-lo.
– Por favor, Thomas, preciso de você dentro de mim.
Afasto os joelhos e arranho as suas costas. Ele geme, retira a boca do meu seio
e vai para o outro, começa a lambê-lo e a mordiscá-lo, e o meu corpo inflama.
– Não me faça implorar .
Direciono a mão dele até a minha vagina, ele me toca e sente o quanto
estou molhada.
– Quero bebê-la.
Ele se inclina, mas o impeço. Estou latejando .
– Dentro de mim, com força, e bem fundo! – Falo, e vejo o seu olhar selvagem.
Ele se detém e a movimentação do seu corpo me faz pressentir que serei
tomada com paixão e isso quase me descontrola.
Thomas me vira de lado e se posiciona atrás de mim, o contato da pele dele
com a minha é mágico. Ele beija a minha nunca enquanto roça o pênis nas minhas
nádegas, arrepio, e uma espécie de descarga elétrica me percorre por inteiro.
– Deixe um homem de verdade cuidar de você, minha linda. – Sussurra em
meu ouvido, me penetra com força, e gemo.
– Senti muita saudade. – Digo me deliciando com o seu ímpeto.
– Eu te amo, Eva. Você não sabe o quanto estou saudoso do seu corpo, do
seu cheiro e do seu gosto. – Fala entrando e saindo vigorosamente de mim. –
Sinto falta dos seus cuidados, dos seus carinhos, e do seu sorriso. Sinto falta de
cuidar de você e do homem que sou quando estou ao seu lado. E sinto ódio de
quem quer tomá-la de mim.
– Você é o único homem que me tem completamente. – Declaro.
Ele massageia o meu clitóris, e a minha pelve se movimenta no mesmo
ritmo, a sensação é incrível.
– Mais rápido e mais forte. – Peço, e ele urra .
Ele intensifica a massagem e o movimento de entrada e saída. O meu corpo
arqueia, e fico ainda mais molhada, se é que isso é possível.
– Você é deliciosa, minha linda, foi feita para mim, os nossos corpos
encaixam perfeitamente.
Ele arremete profundamente, e grito, estou pulsando. Pequenos espasmos
me acometem e fico ainda mais excitada.
– Você é maravilhoso, meu amor, me faça gozar!
Thomas obedece e me estoca com mais força, cada vez mais rápido e mais
fundo, e sinto como se o meu corpo fosse um violão na mão de um virtuose.
Nem sei mais onde acaba a Eva e onde começa o Thomas. Os nossos
corpos estão fundidos, e não consigo conter os meus gritos e gemidos. Esse
homem tem pegada, me faz arder e me enlouquece. Amo a força com que me
possui e o jeito que me deixa sempre tão absurdamente molhada.
– Quero ouvir o meu nome! – Pede se movendo rápido, a tensão aumenta, e
o desejo me consome.
– Thomas! – Gemo o seu nome. – Thomas! – Grito para que saiba que só
ele me faz sentir tanto prazer.
– Que gostoso. – Diz quase sussurrando.
Ele estremece, e a sua respiração acelera, estou pegando fogo, gozo uma e
outra vez, e é divino. Cada terminação nervosa do meu corpo pulsa de prazer,
flutuo e no meu arrebatamento alcanço outra dimensão. O quarto parece o céu
de Copacabana em noite de festa de réveillon.
– Eva! – Thomas grita o meu nome e se entrega ao êxtase, treme e o sinto
vibrar e se desmanchar dentro de mim em um orgasmo violento.
Ficamos abraçados e encaixados, sei que não temos coragem de nos
separar. Todo o nosso universo particular de sons, cheiros e sensações me
emociona, e as lágrimas molham a minha face.
– Obrigada pelas fotografias, pela canção, pela serenata, pelas mensagens,
pelos telefonemas, pelas inúmeras rosas, pelos presentes e pelo prazer
indescritível que acaba de me proporcionar. – Listo tudo o que ele tem me
ofertado.
– Quero demonstrar o quanto te amo, o quanto estou arrependido por ter
tentado uma queda de braço com os seus sentimentos e o quanto estou disposto a
lutar para ter você de volta. – Ele rola por cima de mim, e ficamos frente a
frente, nos encaramos, e o olhar dele se perde no meu.
– Perdoe-me, Thomas. Agi de maneira irresponsável quando aceitei me
casar com o Marco, nunca deveria ter tomado uma decisão tão importante tendo
como conselheiras a dor e a mágoa. – Digo sinceramente.
– Volte atrás, desista. – Diz, e me analisa.
– Se eu pudesse largaria tudo e iria embora com você, mas agora é tarde.
No momento em que disse sim ao Marco, coloquei-o na minha vida, e permiti
que ele se iludisse e me iludi também porque achei que, não tendo você,
conseguiria refazer a minha vida com ele. – Choro pela culpa e pelo remorso.
– Então volto, e você percebe que nada se compara à felicidade que
sentimos quando estamos juntos. Redescobre que a nossa afinidade e
cumplicidade são únicas e especiais, mas, apesar de tudo isso, você, motivada
por sentimentos misteriosos, prefere se comportar como a Lourdes e me
abandonar porque, aparentemente, sou mais forte que o Marco e tenho mais
chances de sobreviver sem o seu amor. – Ele me castiga com a sua análise, e
percebo dor e tristeza em seu olhar.
– Quando aceitei o Marco achava que você não era mais uma opção,
porém, de certa forma, agi como a Lourdes quando permiti que outros
sentimentos, diferentes do amor, me influenciassem a aceitar a proposta dele. –
Não consigo conter o choro.
– Reconhecer o erro e tentar corrigi-lo é tão nobre quanto nunca errar. A
Lourdes ou a Lucia poderiam ter voltado atrás em qualquer momento da nossa
saga e não o fizeram, e isso causou o sofrimento de muitas pessoas. – Fala com
pesar, e não consigo dizer nada. – Aconselho você a não deixar escapar qualquer
oportunidade de corrigir o seu erro e posso garantir que estou tentando, de todas
as formas, corrigir o meu. – Ele diz e chora também.
Abraço o Thomas e enterro o meu rosto em seu pescoço, ficamos muito
tempo assim e nos acalmamos lentamente. Adoro sentir o cheiro desse homem,
um perfume que me faz lembrar tantas coisas boas e que desperta em mim
inúmeras sensações. Ele percorre as minhas costas com as pontas dos dedos,
arrepio e me aconchego mais. Aninhada ao corpo dele, mais magro e
musculoso, sinto a sua ereção. Ele está novamente disposto, e fico excitada.
Sento sobre ele com as pernas abertas, e nos encaramos demoradamente.
Levanto os quadris, seguro o seu pênis ereto e o introduzo em mim, escorrego,
ele está todo dentro, e eu completamente molhada.
Thomas segura a minha cintura, inclino um pouco para frente e coloco as
mãos em seu peito, ele me ajuda a subir e a descer e, toda vez que desço, vou até
embaixo para permitir o seu toque profundo.
Não desviamos os nossos olhares, e a intensidade do olhar dele me assanha.
A expressão no rosto dele é sensual e acho que está ainda mais bonito. A
ferocidade com que subo e desço sob seu controle, e a energia com que as suas
mãos apertam a minha carne, me fazem perder o contato com a realidade.
– Sou louca por você! – Declaro, e ele sorri maliciosamente, aumenta o
ritmo e geme, arrepio e serpenteio sobre ele.
– Não me castigue, Eva! Não posso aguentar!
A voz rouca dele ecoa em meus ouvidos, ele me desce e vai tão fundo que toca
o meu útero, inclino o quadril levemente para frente, a fricção aumenta, e grito.
– Isso é lindo, minha amada! Vai, Eva! Goza para mim que irei com você!
– Ele diz, e geme alto.
Thomas me aperta mais forte, as minhas pernas tremem e ele urra. Quando
ele estremece, arqueia e grita, gemo alto e gozo, e no meu enlevo vejo
novamente milhões de pontos de luz iluminarem o quarto.
Acordo, sobressaltada. O relógio marca seis horas da manhã. Thomas e eu
estamos enroscados, a minha pele aderida na dele, observo o seu sono pesado, o
seu semblante tranquilo, e me lembro do tempo em que um dos meus maiores
prazeres era acordar ao lado desse homem lindo.
A realidade me acossa e resolvo me levantar. Entro no banheiro, tranco a
porta, visto o roupão e faço todo o meu ritual matinal. Saio e dou de cara com o
Thomas. Ele está nu, os seus cabelos estão desalinhados, e os seus olhos me
examinam com volúpia.
Thomas me empurra novamente para dentro do banheiro, tranca a porta e
abre o chuveiro, tiro o roupão e fico observando-o vasculhar as gavetas do
armário debaixo da pia, entro embaixo da água tépida e relaxo.
– Bom dia. – A minha voz sai mais sensual do que pretendia.
– Será melhor daqui a pouco. – Diz e sorri ao encontrar o que procura.
– O que é isso? – Pergunto curiosa.
– Um presentinho que comprei, antes, para nós. – Responde sorrindo.
Observa-me detidamente enquanto lavo os cabelos, e a maravilhosa ereção
dele me incendeia.
– Defina o presentinho. – Estou muito interessada .
– É um gel dessensibilizante. – O sorriso perfeito dele, como sempre, me faz
perder o rumo.
– Então aquela sua fixação continua. – Sorrio e analiso, detidamente, de
cima a baixo, o corpo nu dele. Ele ri alto, e sei que nota o interesse em meu olhar.
– Ideia fixa total. Sonho com isso, minha linda, e acordo melado. Você me
proporciona prazer até quando não está comigo. – Ele ri novamente. – Então vire
e me permita admirar o meu objeto de desejo. – A voz sensual do Thomas me
deixa ainda mais úmida.
Como adoro provocá-lo, viro de costas, coloco as mãos na parede, arrebito
as nádegas e rebolo fingindo estar me ajeitando.
– Minha nossa! Adoro a sua bunda!
Rapidamente ele se coloca atrás de mim, beija as minhas costas, lambe a
minha coluna do pescoço até a base e isso me enlouquece.
– Seja bonzinho comigo, doutor. – Peço baixinho.
– Você tem merecido sofrer, sua levada. Não sei se conseguirei ser muito
bonzinho. – Estala um tapa na minha nádega e, em resposta, afasto as pernas e
me arrebito ainda mais.
– Veremos o que consigo suportar. – Olho de relance para trás e os nossos
olhares se encontram, o ardor que vejo me incita e o meu desejo é urgente.
Thomas separa as minhas nádegas e me besunta com o gel, faz uma
massagem deliciosa e não consigo ficar parada, remexo e gemo. Ele força a
entrada do seu dedo lentamente e, quando consegue inseri-lo, sinto o prazer se
mesclar a uma ligeira e deliciosa dor e gemo alto.
– O gel começará a fazer efeito dentro de um minuto. – Ele diz de um jeito
malicioso enquanto rebolo em seu dedo.
Outra palmada estala na minha nádega e, dessa vez, inundo. Sinto o meu
líquido escorrer por dentro das minhas coxas, arqueio e recebo uma palmada
ainda mais forte .
– Acho que deve me penetrar de verdade antes que o gel comece a fazer
efeito. Você não quer me castigar? O que está esperando? – Provoco, e ele
gargalha.
– Esta é a minha mulher! – Diz, e substitui o dedo pelo pênis.
Thomas força a entrada da sua glande e me faz sentir mais dor e prazer.
Grito pela expectativa da dor, pela dor em si, e pelo prazer que a dor gostosa e
pungente me proporciona.
Ele força ainda mais, quer me preencher, e isso me estimula ao mesmo
tempo em que também deixa apreensiva.
– Ai! – Protesto.
– Você é uma menina má, merece o castigo. – Diz com a voz rouca e sensual.
Ele se afunda mais um pouco e a dor, em vez de aumentar, ameniza. O gel
começou a funcionar.
– Castigo? Isto para mim é prêmio! – Gargalho baixinho.
Com a dor amenizada, forço as nádegas para trás e, cuidadosamente, vou
me aproximando da virilha do meu sexy doutor, surpreendendo-o e excitando-o
até o ponto de fazê-lo arfar, urrar e estremecer, tudo ao mesmo tempo .
– Masturbe-se para mim, minha linda. – Ele pede, e tiro uma mão da
parede e atendo o seu pedido.
Deslizo a mão pelo meu púbis, acaricio a vulva e massageio o clitóris
gentilmente. Gemo pelo duplo prazer que sinto, e escorrego dois dedos para
dentro de mim enquanto ele segura as minhas ancas e me movimenta para
frente e para trás.
– Adoro isso, doutora. Adoro! – Ele geme alto.
Cada estocada me enlouquece e me faz gemer, e os meus dedos se
movimentam freneticamente. Ele diminui a intensidade do movimento, se
acalma, sai quase totalmente de mim e depois entra vagarosamente, e vou ao
delírio. Urro e me estimulo ainda mais com os dedos, latejo, vibro, tremo e me
perco em meio a tantas sensações.
– Goza! Goza comigo! – Grito.
Thomas começa a estocar com força, ouço os seus gemidos, fico ainda
mais excitada e molhada. O meu orgasmo é explosivo, ele berra o meu nome e
goza. O sêmen quente me inunda, ele estremece um pouco e continua o
movimento para frente e para trás, só que mais lentamente.
– Céus! – Exclamo e coloco a mão de volta na parede e me apoio.
Tento recuperar o fôlego enquanto o meu corpo todo pulsa. Thomas se
detém, sai de dentro de mim e se inclina para frente, a sua cabeça encosta nas
minhas costas e os seus dedos habilidosos principiam a explorar o meu clitóris.
Estremeço, uma nova onda de prazer me invade, remexo e não suporto quase
nada, imploro para que não pare e gozo outra vez enquanto esse homem viril e
maravilhoso me estimula.
– Você é, total e completamente, minha, nunca se esqueça disso. – Diz com
a voz ainda mais rouca e grave.
Ele me puxa para debaixo do chuveiro que, só agora me dou conta, ainda
está ligado e nos abraçamos.
– Nunca me esquecerei, jamais conseguiria. – Afirmo, e as minhas
lágrimas se mesclam aos jatos de água.
Thomas ensaboa cuidadosamente cada milímetro do meu corpo e me lava
com total delicadeza. Retribuo o seu carinho e o ensaboo também. Passar a
esponja pela pele dele me emociona e ver como os seus espetaculares olhos
verdes capturam os meus movimentos me faz quase parar de respirar.
Quando saímos do banheiro, são quase nove horas da manhã, e vê-lo vestir-
se para ir embora me dá um nó na garganta. O meu estômago dói e sei que as
minhas forças serão novamente postas a prova.
– Não quero ir. – O sorriso tímido dele mexe ainda mais comigo e sofro.
– Não quero que vá, mas preciso que vá. – Descontrolo-me e caio em pranto.
– Calma, minha linda, respira, se preciso ir, irei. – Thomas me afaga
gentilmente. – Só necessito continuar sabendo que me ama. – Enxuga as minhas
lágrimas com as costas da mão.
– Isso é fácil, enquanto eu respirar continuarei amando você. – Soluço e
coloco o rosto entre as mãos.
– Que bom ouvir você dizendo isso, agora estou em paz. – Ele me encara, e
acho que está enxergando a minha alma.
– Acontece, Thomas, que não posso permitir que fique preso a mim, e não
poderei suportar a dor de estar com outra pessoa se ainda não tivermos dado um
basta na nossa história. Você também precisa seguir com a sua vida e encontrar
alguém para entregar o seu amor. – Choro copiosamente.
– O meu amor foi entregue a você, você é o meu amor. Na verdade você é
a minha vida e não tem o direito de me pedir para fazer algo que sei que é
completamente impossível. Sem a Eva, o Thomas não é nada.
– Desculpa... Thomas, mas não quero ser uma esposa infiel, não posso fazer
isso.
– Jamais pediria isso a você. – Ele diz de um jeito sério.
– Por favor, Thomas, considere os momentos que acabamos de passar
como a nossa despedida.
– Quero pedir a você que volte a usar a gargantilha que lhe dei, porque
assim saberei que pensa em mim. – Ele levanta o meu queixo e me beija
delicadamente, e até o seu beijo terno me faz sentir um frio na barriga.
– Você ouviu o que eu disse?
– Minha linda, estou apenas pedindo que me deixe saber que me ama,
porque sei que enquanto me amar poderei continuar tendo esperança, e assim
ficará um pouco mais fácil suportar a dor.
Busco a gargantilha e a entrego nas mãos dele, viro de costas e suspendo os
cabelos, ele a coloca no meu pescoço, e seguro o coração de diamante entre os
dedos.
– Algo me diz que esta gargantilha nunca mais sairá daqui. – Passo a mão
pelo pescoço, me viro e o abraço.
– Até logo, mulher da minha vida, minha amada, minha Eva. Eu te amo e
quero que se lembre de que toda estrada tem sempre um retorno e, ainda que ele
esteja a quilômetros de onde achamos que deveria estar, ele aparecerá. –
Thomas diz visivelmente abalado.
– Adeus, doutor. – Digo muito emocionada.
A nossa despedida é triste e deixa um gosto ácido na minha boca. Para não
perder o hábito, quando ele sai, corro para o banheiro e vomito. Sei que essa é
uma reação emocional que só tem acontecido porque tenho vivido sob muita
tensão, porém, continuo detestando toda essa vulnerabilidade. Vomitar nunca é
agradável e tão constantemente é pior ainda.
Capítulo IX
Tomo um café forte e sem açúcar e termino de me vestir. Mal deito no sofá
para tentar relaxar um pouco e pensar no que fazer, e o interfone toca. São quase
onze horas da manhã, provavelmente, deve ser o Marco. Acerto. Deixo-o subir e
tento me acalmar para recebê-lo.
– Bom dia, princesa. – Diz com os olhos fixos em mim.
Está de ressaca ou muito arrependido, porque o olhar dele está
transbordando de amor.
– Bom dia. Tudo bem?
O Marco, pegando-me de surpresa, me abraça forte e apertado, quase me
sufoca, e gentilmente o afasto.
– Desculpa por ontem, princesa. Agi feito um idiota e peço que não fique
brava comigo. – Segura as minhas mãos e me olha, desvio o olhar e o conduzo
até a poltrona.
Ele me puxa e me beija levemente nos lábios, correspondo meio sem jeito
e me afasto novamente.
– Precisamos conversar. – Acho que o meu semblante sério o assusta.
– Eva, desculpa... Saberei esperar até que esteja pronta, prometo que lhe
darei o tempo que precisar. Disse antes que entenderia os seus sentimentos e não
recuarei. – Fala carinhosamente, e noto que parece apreensivo e preocupado.
O Marco chega mais perto da pontinha da poltrona, acho que está tentando
se aproximar, e me sento no outro extremo da sala.
– Aconteceu algo imperdoável, preciso que saiba. Não mentirei para você,
só peço que tente se controlar. – Respiro fundo e me preparo para a confissão.
– Que droga, Eva! Você está me assustando, fala logo que diabo aconteceu.
– Reclama apreensivo. Ele nem imagina o que estou prestes a revelar .
– Ontem, o Thomas veio aqui. – Falo e percebo que o Marco passa de
preocupado a zangado. – Ele estava com febre e o ajudei, cuidei dele como já
tinha feito outras vezes e consegui que melhorasse. – Começo o meu relato pela
parte menos relevante.
– Agora você é médica? Que porra é essa, Eva? – Cerra os punhos e
começa a respirar mais forte.
– Acalm e-se, por favor, preciso que m e ouça. – Peço tentando
perm anecer tranquila.
Marco desliza e encosta-se à poltrona, segura a almofada furiosamente e
me encara.
– Ficarei em silêncio absoluto desde que faça o seu relato por completo e
sem firulas, por favor. – Ele realmente se cala e me observa.
– Acabamos dormindo juntos. Não foi nada premeditado, nunca tive a
intenção de magoar você, mas aconteceu e não me sinto culpada. Amo aquele
homem, Marco, nunca escondi isso, por favor, tente ser razoável. Agora deixo
você escolher como agiremos diante disso. – Talvez essa seja a minha chance de
chegar àquele retorno do qual o Thomas falou.
– Dormir juntos é um eufemismo para trepar? – Pergunta com a voz
carregada de raiva.
– É. – O que mais eu poderia responder?
– Cacete! Você não trepa com o seu noivo, mas trepa com o ex-namorado?
Isso foi proposital, só pode! – Soca a almofada com tanta força que me
preocupo.
– Não fiz de propósito, aconteceu. – Sou sincera.
– O Thomas é que agiu premeditadamente. Ele veio até aqui sabendo que
você não resistiria aos seus encantos, e a seduziu na tentativa de que eu os
flagrasse e acabasse com o casamento. – Dá mais socos na pobre almofada.
– A sua teoria tem um furo, porque o Thom as tinha certeza absoluta de
que você não apareceria. – Falo ainda intrigada com a convicção que o
Thom as dem onstrou.
– Agora o cara também é vidente? – Exalando sarcasmo, ele soca o braço
da poltrona dessa vez.
– Não. Ele disse que o procurou no seu hotel, que foi até o seu quarto e viu
quando entrou e, de acordo com a avaliação dele, você não estaria em condições
de me procurar por um bom tempo. – Explico e me detenho examinando a
mudança de comportamento do Marco, que de muito nervoso se transforma em
totalmente constrangido.
– O que, precisam ente, ele lhe contou? – A pergunta dele m e parece
m uito estranha.
– O que, precisamente, ele deveria ter me contado? – Devolvo a pergunta.
– Absolutamente nada, só bebi um pouco e fiquei de pileque. – Desvia o
olhar, e isso reforça a minha desconfiança.
– Sei que os dois estão tentando esconder algo de m im . – Digo com
segurança.
– Eva, esse Thomas tem que sair do nosso calcanhar, ele me segue, come você
e ainda planta a discórdia entre nós. – Desabafa mais alto do que o necessário.
– Por gentileza, Marco, tente manter o nível da nossa discussão, não é
porque perdeu a calma que precisa também perder a compostura. – O
vocabulário que ele está utilizando me desagrada.
– O que menos importa agora é a maneira como expresso a minha
indignação. Toda a sua educação e polidez não a impediram de fornicar com um
homem que não é o seu noivo. Então quero que saiba que no meu dicionário a
palavra traição vem sempre antecedida e precedida por um palavrão. –
Esbraveja, e fico no aguardo.
O Marco me disse antes que, apesar de ser um homem tranquilo, quando
perde a calma pode ser bem rude, e as nossas últimas conversas estão me
fazendo perceber que ele não mentiu a respeito disso.
– Se ele pensa que o nosso casamento irá por água abaixo por causa de uma
simples despedida de solteira está redondamente enganado.
– Despedida de solteira? – Indago com muita vontade de rir.
– É! Considerarei a trepada de vocês como a sua despedida de solteira. O
casamento será daqui a três dias, depois disso manterei aquele infeliz à distância
nem que tenha que contratar um guarda-costas para você. – Eis um homem
muito indignado.
– Marco, não foi apenas uma simples despedida de solteira. – Tento manter
as esperanças de que aquele retorno está prestes a aparecer .
– Foi sim! Assunto encerrado. Quando nos casarmos, passaremos sessenta
dias viajando e mais outros tantos em Fortaleza e, com certeza, nesse tempo o tal
de Thomas encontrará um divertimento mais a mão. – O Marco levanta e
caminha até a janela. – Confiei antes na sua palavra de que se casaria comigo e
não mudarei de opinião a respeito disso. – Conclui um pouco mais calmo.
– Tudo bem, pode continuar confiando. – O desânimo me atinge como um
caminhão desgovernado .
– Agora me diga como é que o Thomas sabe onde estou hospedado.
– Não faço a menor ideia, Marco.
– Será que o seu pai tem alguma coisa a ver com isso? – Ele me olha intrigado.
– Será? – Respondo com outra pergunta.
– Você está debochando de mim, princesa? – O Marco pergunta com a
irritação estampada no rosto, e só não rio para não correr um risco
desnecessário.
– Claro que não, é que também gostaria de saber, só isso. – Tento livrar a
minha cara.
– Como entro em contato com o Thomas?
– Você acha que sou louca de dizer? Você quer se casar com o rosto
desfigurado? – Digo, e ele ri com desdém.
– O desfigurado poderá ser o Thomas. – Defende-se.
– Você não tem nada o que conversar com ele, vamos nos concentrar no
casamento e pronto. – Falo com seriedade.
– Quero que ele nos deixe em paz, e enquanto promovo esse encontro você
se concentra no casamento. Você já me fez entender que o noivo é só o
coadjuvante. – Agita-se irritado.
– Não sei onde o Thomas está e também não o colocarei em contato com
ele. Se você acha que o meu pai sabe, pergunte para ele porque não o ajudarei
nessa empreitada.
– Eva, nada que você diga agora, me irritará mais do que tudo o que me
disse desde ontem até dois minutos atrás. Então me poupe das suas tentativas de
me aborrecer. – Desaba no sofá, e me apiedo.
– Desculpa, Marco... Estou nervosa com o casamento e com muitas outras
coisas, e a situação fica ainda pior estando em pé de guerra com você. –
Desabafo.
– Pode me tirar da sua lista, estou tentando ser um corno manso exemplar. –
Diz com o sotaque carregado, e quase caio na gargalhada.
– Céus! – Coloco as mãos no rosto para disfarçar a vontade de rir.
– Eva, vem cá, desculpa o meu destempero, deixe-me acariciar os seus
cabelos, sei que você gosta disso.
Vou até ele, que me faz deitar no seu colo no sofá e gentilmente massageia
a minha cabeça.
– Tudo isso vai passar, princesa. A nossa lua de mel será muito especial.
Precisamos apenas estar juntinhos como ficamos em Punta Cana, sem ninguém
para nos atrapalhar. Colocarei o mundo aos seus pés, a nossa vida será de sonho,
você verá.
O Marco fala com tanta ternura e tão sem ressentimento pelo que acabei de
contar que me sinto profundamente culpada em relação a ele. Será que longe de
tudo e de todos ficará mais fácil a nossa convivência ou ainda mais difícil?
– Será? – Deixo escapar.
– Não duvide de mim, Eva. Você e eu nos daremos tão bem que não
desejará outro tipo de vida. – Ele fala, e suspiro.
Ficamos em silêncio, o Marco fazendo um cafuné na minha cabeça, de um
jeito meio nervoso, enquanto penso na grande confusão que a minha vida se
tornou.
Não demora muito e os meus pais chegam. Fico abismada com a simpatia
com que o meu pai trata o Marco. A minha mãe parece radiante com os
preparativos. Ela nos explica cada detalhe da cerimônia e tenta nos envolver no
assunto. Confesso que não esperava que os meus pais estivessem tão animados
assim com o meu casamento, principalmente o meu pai.
– Alguma dúvida? – A minha mãe pergunta ao terminar a sua explanação.
– Não. – Respondo sem muita certeza.
– Não. O papel do noivo até que é bem simples. – O Marco diz e sorri,
constato que gostou do modo como a minha mãe organizou tudo.
– Agora uma surpresa! – A minha mãe fala e olha com cumplicidade para
o meu pai.
– Surpresa para quem? – Pergunto curiosa.
– Na verdade para os dois. – O meu pai responde, e só de olhar para ele
percebo que algo está divertindo-o, e fico intrigada.
– Levarei a Eva para um SPA, ela ficará descansando até o dia do
casamento. – A minha mãe fala como se estivesse dando uma notícia
maravilhosa.
– O quê? – Sobressalto-me. – Que história de SPA é essa?
– Também irei? A surpresa não é para os dois? – O Marco pergunta confuso.
– Só a Eva e eu iremos para o SPA, assim ela poderá ficar afastada de
qualquer problema até o dia do casamento. – Noto que minha mãe enfatiza a
palavra problema. – O Guido se ofereceu para passar esse tempo com você,
Marco, para que possam se conhecer melhor. – A minha mãe nos olha com tanta
inocência que fico desconfiada.
– Não quero ir para lugar nenhum. – Reclamo.
– A Eva e eu passamos tão pouco tempo juntos desde que ficamos noivos,
que preferia passar esse tempo com ela. – O Marco reclama também.
– Marco, gostaria de poder conversar sobre alguns assuntos com você,
nunca tivemos oportunidade. Família é muito importante para mim, e acredito
que precisamos começar a construir uma relação de confiança. – O meu pai e
as suas formalidades.
– Sei que ainda não nos conhecemos bem, contudo, com o tempo tenho
certeza de que o senhor gostará de mim. – O Marco se autopromove.
– Papai, acha que isso é mesmo necessário? – Tento salvar o Marco.
– Acho sim . – O m eu pai fala m uito sério. – Além disso, serão apenas
três dias e a nossa program ação será bastante agradável. Garanto que ele
conseguirá suportar. – O olhar m atreiro do m eu pai m e faz suspeitar que está
tram ando algo.
– Pode ser mesmo uma boa ideia a Eva sair um pouco de cena, porque o
Thomas resolveu perturbá-la. Talvez o senhor possa me ajudar a encontrá-lo,
quero convencê-lo a nos deixar em paz. – O Marco diz pensativo.
– Muito bem, acredito que isso não será problema. – O meu pai concorda, e
o encaro indignada, estou ficando ainda mais intrigada.
– Pode tranquilizar-se, Marco, porque durante esses dias o Thomas não
chegará nem perto da Eva. Prometo a você que ela chegará sã e salva, linda e
radiante à cerimônia de casamento. – A minha mãe diz confiante.
– Vocês estão falando de mim como se eu não estivesse aqui. – Protesto me
sentindo ultrajada.
– Seja razoável, Eva, os seus pais estão tentando ajudar. Relaxe um pouco
com a sua mãe. Aproveitarei para conhecer melhor o meu sogro e para resolver
uma situação que está me afligindo. – O Marco diz mais sério que de costume, e
o meu pai o observa com um leve sorriso irônico nos lábios.
– Papai, por favor, não acredito que o Marco e o Thomas sejam capazes de
se encontrar sem que haja alguma espécie de atrito. Se você promover esse
encontro, a responsabilidade será toda sua. – Advirto o meu pai que não parece
nada preocupado.
– Fique descansada, filha, pelo que entendi o Marco precisa apenas
conversar com o Thomas e deixar claro alguns pontos. – O meu pai fala, e acho
que ele e minha mãe estão realmente agindo de forma muito estranha.
– Venha, mamãe, desmarque as provas de maquiagem e cabelo enquanto arrumo
uma valise. Se tenho que ir, melhor sair logo. – Procuro me impor um pouco.
A minha mãe telefona para o salão de beleza e dispensa os profissionais que,
com certeza, não se aborreceram em não executar um serviço pelo qual já
foram pagos.
O Marco entra no quarto e me observa com pesar, aproxima-se e passa a
mão sobre as minhas roupas que estão sobre a cama.
– Você não está zangada, está? – Ele pergunta enquanto me ajuda a arrumar
a valise.
– Não. Acho que fazer algumas massagens e ser mimada pela minha mãe
me ajudarão a estar mais calma no dia do casamento. – Tento parecer animada,
mas sei que só concordei em ir porque pressinto que os meus pais estão
conspirando, só não sei ainda contra quem.
– Ótimo. Também estou começando a pensar que conversar com o seu pai
será muito interessante e útil. – Ele divaga com ar pensativo, e acho que todo
mundo está me escondendo algo.
Termino de arrumar a valise, troco de roupa, e o Marco e o meu pai levam
a minha mãe e eu até o carro.
Despeço-me do meu pai com um abraço e um beijinho na bochecha.
Quando me aproximo do Marco, ele me puxa e me enlaça pela cintura de um
jeito amoroso e possessivo.
– Até breve, minha princesa. Já estou sentindo a sua falta antes mesmo de
você ir. Prometo que estarei inteirinho e sem nem um arranhão diante do altar. –
O Marco diz todo meloso e me dá um beijinho na boca.
– Que ótimo, Marco. Juízo! Até breve. – Digo, me desvencilho dele e entro
no carro.
Os meus pais se despedem carinhosamente. Depois minha mãe se despede
do Marco e entra no carro também.
O motorista informa que está nos conduzindo até um SPA que fica a quase
duzentos quilômetros de distância de São Paulo, e fico pasmada.
Viagem surpresa, poucos dias antes do casamento, afastando a noiva do
noivo que mal viu durante o noivado, se isso não é um procedimento incomum
não sei o que mais seria.
O pior de tudo é que não sei se estou aborrecida ou aliviada. Aborrecida
porque precisava passar mais tempo com o Marco antes do casamento, ou
aliviada por só precisar estar com ele quando chegar o dia “D”.
Os meus sentimentos estão tão controversos que me assusto constantemente.
Sou completamente apaixonada pelo Thomas e o amo com todas as minhas
forças; mas gosto do Marco, não de um jeito que justifique o meu casamento
com ele, porém, a hipótese de magoá-lo me desagrada muito porque foi ele
quem esteve ao meu lado quando mais precisei.
O Marco foi uma espécie de Band-aid para o meu coração machucado,
pena que só me dei conta recentemente de que ferida profunda precisa de um
curativo mais elaborado.
– Agora conte, mamãe. O que você e o papai estão maquinando? – Acredito
que longe do Marco ela me dirá o que está acontecendo.
– Contar o quê, Eva? – Ela me olha indignada.
– Conheço bem os meus pais e acho que estavam se comportando de um
jeito bem estranho, então supus que agiam movidos por segundas intenções. –
Exponho a minha desconfiança.
– Você deve estar mesmo muito abalada por causa do casamento. O seu pai
e eu apenas queremos afastá-la de São Paulo até o grande dia, só isso. – Ela fala
de maneira estudada.
– E qual a razão disso? – Pergunto, e de antemão sei que a resposta me
aborrecerá.
– O Thomas, ora. Sabemos que ele vem, constantemente, procurando você
e não queremos que nada a afaste daquela cerimônia. – Assim que ela fala acho
que vou explodir.
– Mamãe! Nunca passou nem um segundo pela minha cabeça que você me
achasse capaz de não sustentar a palavra que empenhei. – Fixo o meu olhar no
dela.
– Foi você quem fincou pé e disse que se casaria com o Marco, mesmo o
seu pai sendo contra. Assumiu, irresponsavelmente, um compromisso tão sério e
nos envolveu nele. E agora, com tudo pronto e organizado, queremos que esteja
lá e se case do jeito que sempre sonhamos que seria. – Ela sabe ser realmente
dura quando quer.
– Estou sendo levada para um local seguro e só serei libertada no dia do
casamento, para que não corram o risco de que eu suma por livre e espontânea
vontade ou que seja raptada. Compreendo. Para vocês o mais importante, no
momento, é que me case custe o que custar. Muito bem. – Digo em tom de
deboche .
– Quase isso, minha filha, mas deixe de deboche. Quem inventou de se
casar foi você, não tente jogar a sua frustração sobre mim ou sobre o seu pai.
Queremos apenas garantir que compareça ao casamento no dia e hora
marcados, para que veja o quanto nos esmeramos na organização de tudo. Esse
casamento é uma prova do quanto a amamos e do quanto é importante para nós.
Tentamos preparar uma cerimônia inesquecível e, se tudo der certo, uma festa
muito animada. – Os olhos dela ficam marejados.
– Festa? Não será apenas um jantar para alguns poucos convidados? – Será
que estou tão à parte de tudo assim?
– Jantar animado, festa, tanto faz. – Ela se corrige, e desconfio que ela e
meu pai transformaram o meu casamento em um evento da realeza.
– Estarei lá, mamãe... Dará tudo certo. Você pode ter certeza de que
mesmo profundamente arrependida da decisão que tomei, cumprirei a minha
palavra. – Falo me sentindo mais calma, e ela segura a minha mão com carinho.
O cansaço me faz dormir durante o percurso e só acordo quando chegamos
ao SPA. Conheço o local, estive aqui antes. Adoro a decoração no estilo rústico e
a maneira com que todos os ambientes se integram à natureza. A sensação de paz
é imediata e começo a me sentir satisfeita por ter vindo.
– Por que ficaremos no mesmo quarto?
– Porque não é o mesmo quarto, são duas suítes integradas, você logo verá.
– A minha mãe caminha resoluta na minha frente seguindo o carregador de
bagagens.
– Viu? Como falei são duas suítes integradas. Ficaremos juntas, contudo,
com privacidade. – Ela diz toda cheia de razão.
– Está bem, mamãe, adorei. Tudo aqui é muito agradável. Estou achando
uma ótima ideia ter vindo, obrigada. Quero ser massageada, esfoliada,
embelezada e paparicada o máximo que puder. – Sorrio.
– Agora me entregue o seu celular.
– O quê? – Pergunto indignada.
– Vamos evitar distrações, filha.
– O Marco vai telefonar toda hora, mãe. Tenho certeza.
– Quero que relaxe, trouxe você para cá para isso, sei que está uma pilha de
nervos e quanto menos contato tiver com tudo o que a aflige, melhor será. O seu
pai telefonará para mim se for necessário. – Ela argumenta, e desisto de replicar.
Entrego o celular e começo a rir disso tudo.
– Sabe, minha filha, esses dias que passaremos juntas serão praticamente a
última oportunidade que terá para me ver como uma mulher comum. – Ela ri e
espera a minha pergunta.
– Por quê? – Pergunto satisfazendo o seu desejo.
– Porque quando uma mulher constitui a própria família, quando deixa de
ser apenas filha e se torna mãe, a mãe dela passa a ser vista sob outra
perspectiva. Foi assim comigo, a minha mãe se tornou muito mais importante
para mim depois que tive você, comecei a considerá-la uma santa! – Gargalha, e
não consigo deixar de rir também.
– Já ouvi essa teoria, só que para mim você sempre foi muito mais que
apenas uma mulher. Eu a admiro, mamãe, e não terei problemas em admirá-la
ainda mais quando, um dia, me tornar mãe também. – Falo, ela me abraça, e
seguimos assim por alguns segundos.
Esses dois dias e meio no SPA até que foram agradáveis. A minha mãe e eu
nos entregamos nas mãos dos profissionais de beleza e de relaxamento e isso,
aliado à tranquilidade do local, me fez conseguir dormir bem, relaxar, comer
adequadamente e estar com a pele viçosa. Mas mesmo assim não consegui parar
de pensar que, dentro em breve, serei a senhora Eva Maria Fiore Diniz.
Quem poderia imaginar que a destruidora de corações teria o coração
destruído e, justamente, por ela mesma? Acho que só eu desconfiei disso.
Não tive nenhuma notícia do Thomas desde que cheguei ao SPA. Afastada
de tudo e sem celular, seria mesmo difícil. Também não falei com o Marco, e
mesmo sabendo que ele recebeu diariamente notícias minhas pelo meu pai,
quase posso ter certeza de que toda essa intromissão por parte dos meus pais está
irritando-o muito. Não me irritei também porque esse afastamento, de certa
forma, me ajudou a encontrar forças para me resignar ainda mais a cumprir o
compromisso assumido.
– Filha, quero que tente dormir um pouco hoje à tarde, dará tempo. O
casamento será à noite, e chegaremos ao seu apartamento na hora do almoço. A
sua empregada está lá e cuidará da sua alimentação e do que mais precisar. Às
dezessete horas o cabeleireiro e o maquiador chegarão para arrumá-la, ainda bem
que já cuidamos da nossa manicure hoje cedo. – A minha mãe diz quando
deixamos o SPA, e examino as minhas unhas pintadas de um branco muito suave.
– Você não estará lá? – Pergunto preocupada.
– Não, irei para casa. Serei arrumada lá. Contratei um cabeleireiro e um
maquiador para mim também, além disso, estou com saudade do seu pai e
preciso vê-lo antes da cerimônia. – Ela me olha carinhosamente.
– Quem me ajudará a vestir o vestido de noiva? Acho que não pensamos
nisso. – Suspiro.
– A Patrícia. Pedi que ela a ajude a se vestir e creio que já deve ter chegado
ao seu apartamento, ela se arrumará com você. – Explica e, automaticamente,
gosto do arranjo.
– Que bom! – Digo sinceramente.
A viagem até São Paulo me parece mais curta do que foi a de ida para o
SPA. Estou tentando manter-me calma, mas quanto mais me aproximo de casa,
mais ansiosa fico.
Entro no meu apartamento e vejo que não posso mesmo reclamar de nada.
A arrumação do local está impecável, a Patrícia me aguarda e o meu almoço
está pronto, tudo organizado da maneira prevista pela minha mãe.
– Espero que esteja preparada para o seu grande dia. – A Patrícia diz no
momento em que saio do banho.
– Também espero. – Digo cautelosa.
– A sua mãe recomendou que você dormisse um pouco antes que os
profissionais que nos atenderão cheguem. – Ela diz usando o seu tom profissional.
– Farei isso. – Concordo rapidamente.
A Patrícia sai do quarto, e deito na cama vestida no meu robe de seda e me
preparo para tentar cochilar um pouco. Ouço o alerta do meu celular, que a
minha mãe me devolveu quando deixamos o SPA, e verifico que tenho um SMS
do Thomas, que ansiosamente abro.
“Eva. Desejo que o amor seja sempre o seu maior objetivo e que nunca
deixe de aproveitar toda e qualquer oportunidade de vivenciá-lo. Quero, do fundo
do meu coração, que o seu casamento seja especial e que encontre a felicidade
que tanto merece. Tenho certeza de que será a noiva mais linda que já existiu. E
espero que o seu marido saiba fazê-la muito feliz. Boa sorte.”
Poderíam os ter saído para alm oçar, só que não estávam os dispostos. O
dia anterior foi de m uita tensão, e estar j untos no nosso am biente fam iliar foi
a m aneira perfeita que encontram os para relaxar. Descongelam os um assado
que estava no freezer, fiz um a salada, e com em os alegrem ente o nosso
banquete im provisado.
– Marido, só consigo imaginar que realmente recebemos alguma espécie de
ajuda divina. Demos muita sorte de tudo ter dado certo porque acho que o plano
de vocês tinha algumas pontas soltas. – Digo, saboreando o meu suco de uva.
– Pontas soltas? Não venha criticar um plano que deu tão certo. Tão certo
que você está aqui comigo, completamente minha e da maneira que sempre
sonhei. – Thomas ri.
– Por exemplo... – Começo a especular. – Se o Marco não tivesse
concordado em cumprir os compromissos de trabalho que o pai dele demandou,
teria passado mais tempo comigo aqui em São Paulo e, com ele por perto, o
plano de vocês poderia ter sido atrapalhado. – As palavras saem da minha boca
e, vendo o rosto do Thomas ficar vermelho, acho que falei demais.
– Se ele ficasse mais tempo por perto o que teria acontecido, Eva? –
Thomas pergunta com o olhar furioso, e sei que o ciúme o pegou de jeito.
– Talvez ele tivesse se intrometido na organização do casamento ou, quem
sabe, tivesse ido verificar os documentos no cartório. Algo poderia tê-lo deixado
desconfiado. – Tento explicar.
– Ah, sim, verdade. Mas acontece que a empresa do Marco, assim como a
sua, é familiar, e o pai dele exerce grande influência sobre os filhos. Acredito
que o Guido pediu a ajuda do senhor Donato porque sabia que ele não
concordaria com um casamento que poderia arruinar a vida do filho.
– O senhor Donato deve ter se lembrado de quando você invadiu a sala de
reunião e me arrastou para fora da sede da AMPLA em Fortaleza. Deve ter
pensado que eu sou maluca e você um troglodita e resolveu colaborar com o
meu pai para livrar o filho de nós. – Gargalho.
– Acho que isso deve ter contribuído bastante. – Thomas concorda e ri
também. – Mais pontas soltas? – Pergunta quando consegue parar de rir.
– Não quero mais falar sobre isso agora, doutor meu marido.
– E você quer falar sobre o que então, doutora minha esposa? – Olha-me
carinhosamente e me oferece um caloroso sorriso.
– Na verdade, acho que está na hora da sobremesa. – Sou toda insinuação e
promessas .
– Mais sobremesa? – O meu marido pergunta e sorri de um jeito muito sensual.
– O que fizemos antes do almoço foi um aperitivo. A sobremesa é depois do
almoço. Regra gastronômica, tenho certeza. – Uso bons argumentos.
– Uau! A nossa lua de mel começou bastante animada. – Levanta e me
pega no colo.
A viagem até Campos do Jordão foi tão rápida, que nem chegamos a nos
cansar. Cantamos o caminho todo, a nossa alegria está tão grande, que
transforma todos os nossos momentos juntos em um grande prazer.
A cidade parece muito charmosa à primeira vista. Sei que ainda teremos
que explorá-la, contudo, o que vejo me agrada. Estou me sentindo na Europa.
– Que chalé lindo! Parece uma casa de boneca. – Digo assim que saímos do
carro.
– Que bom que gostou, passaremos ótimos momentos aqui. – Thomas
afirma e me pega no colo.
– Ah, pensei que se esqueceria do protocolo. – Rio satisfeita no colo do meu
marido apaixonado.
O chalé está localizado no bairro Alto do Capivari e é uma graça. Amarelo,
cercado por árvores e por uma grama verdinha que se espalha como um tapete.
O interior dele é muito aconchegante, está decorado em estilo rústico, com
robustos móveis de madeira maciça compondo os ambientes.
Possui uma sala de estar com lareira em modelo belga, sala de jantar,
cozinha, uma suíte master com um amplo banheiro com banheira e outra suíte
menor, e posso dizer que me apaixonei pelo local em questão de segundos.
– É tudo tão bonito aqui, meu amor. Adorei! – Bato palminhas de contentamento.
– Você não sabe o quanto estou feliz com a sua satisfação, minha linda. Que
bom que gostou. O que você quer que façamos depois que desarrumarmos as
nossas malas?
– Que tal um banho de banheira e depois um passeio pela cidade? – Estou
exultante .
– Aprovado. O banho de banheira seria juntos ou separados? – Pergunta,
sorrindo maliciosamente.
– Claro que juntos! Marido, lua de mel é sempre tudo juntinho. Estou
eufórica com o tanto de coisas que estou imaginando fazer com você dentro
deste chalé, ainda bem que as paredes não falam. – Gargalho baixinho e me jogo
em seus braços.
O chalé possui sistem a de aquecim ento, ótim o, porque faz bastante frio
na cidade nesta época do ano. Sei que tenho o Thom as para m e esquentar e
isso m e anim a, m as costum o ficar preguiçosa no inverno, talvez porque não
goste de vestir tanta roupa para sair ou porque a cidade onde nasci é quente
com o o inferno, e desde criança sem pre fui acostum ada ao calor, tanto que
passei a preferi-lo.
Confesso que o inverno tem o seu charme. O frio faz todo mundo se vestir
de maneira mais elegante, e ver o Thomas usando um sobretudo me deixou
boquiaberta. Como um homem lindo consegue ficar ainda mais lindo?
– Acho que o meu sobretudo a agradou. – A risada gostosa do Thomas
sempre me extasia.
– Agradou mesmo. Só que estou mais interessada no recheio dele. – Gracejo.
– E você também não está maravilhosa?
Estou vestindo calça preta de veludo justíssima, blusa de gola alta de lã
mostarda, que realça a cor dos meus olhos, trench coat preto acinturado da
Burberry e calçando as minhas superconfortáveis botas pretas de cano curto.
– Foi você quem arrumou a minha mala, então tudo o que eu vestir será
responsabilidade sua. – Provoco-o.
– Eu sou mesmo muito bom em vestir a minha esposa porque você está
linda, contudo, confesso que despi-la é o meu ponto forte. – Fala e me encara.
– Mais tarde deixarei que me dispa, ou melhor, que me descasque, temos
muita roupa para tirar aqui. – A minha piadinha faz o meu marido rir. Que olhar
incrível esse homem sabe me dar.
À noite a cidade fica ainda mais charmosa, toda iluminada, e vejo que
muita gente aprecia o local porque inúmeros turistas circulam pelas ruas e lotam
os restaurantes.
Passeamos pela Vila Capivari, andamos de mãos dadas visitando algumas
lojinhas que ficam abertas durante a noite. Depois escolhemos um pequeno
restaurante para comermos fondue, e optamos por um rodízio de fondues, porque
escolher um sabor só seria muito difícil.
– Estou impressionada que tenha conseguido parar de beber. Comer fondue
acompanhado de água mineral com gás é coisa de Eva, pensei que o Thomas
fosse pedir uma taça de vinho, mas não pediu. Gostaria apenas que soubesse que
não quero vê-lo bêbado, contudo, não me importo que beba socialmente. Uma
taça de vinho ou um copo de cerveja de vez em quando não faz mal. –
Argumento.
– Água mineral com gás para acompanhar qualquer prato, agora é coisa do
Thomas. Sou um homem passado a limpo. A bebida nunca me agregou nada,
muito pelo contrário, e cheguei à conclusão que não devo beber nunca mais.
– O último porre que tomou foi quando mesmo? – Desconfio que
desconheço o seu último porre .
– Você é muito perspicaz, esposa. O último porre que tomei foi
exatamente na noite em que a deixei. Sequei quase duas garrafas de uísque...
Quase morri porque estava sofrendo e porque a ressaca que tive foi a pior da
minha vida. Não posso mais nem sentir o cheiro do tal de uísque que sinto ânsia
de vômito. – Coloca a língua para fora e faz cara de nojo.
– E fez alguma coisa da qual se arrependa quando estava bêbado? – O
meu coração fica apertadinho .
– Eu me refugiei no meu apartamento que estava no fim da reforma. Fui
para lá levando as garrafas de uísque e bebi sentado no chão, porque a mobília
estava no depósito. Tenho pavor de lembrar aquela noite, na verdade quase não
me lembro de nada do depois que comecei a beber. Estava sóbrio há tanto tempo
que a bebida me pegou em cheio, acredito que já estava bêbado no terceiro
copo. Além disso, no outro dia acordei no exato lugar em que estava quando
comecei a beber. Se não saí do lugar não posso ter feito nada de errado. – Ele
parece constrangido com a confissão.
– Bebida alcoólica nunca mais mesmo?
– Nunca mais, minha amada esposa, juro. A bebida só me envergonha.
Acordei no outro dia com tanta febre e com tanta ressaca, que tive que pedir
para o meu irmão, Silas, ir me buscar e me levar para Ribeirão Preto para o
William cuidar de mim lá. Nem bem entrei para a família e a bebida me obrigou
a incomodá-los, mas precisava de ajuda e sabia que poderia contar com eles.
– O Silas parece ser uma pessoa muito prestativa, acredito que não deve ter
se aborrecido com o seu pedido. – Tento amenizar o drama de consciência dele.
– Tem razão, com a ressaca e com a febre ele nem ficou incomodado,
porém ficou uma fera quando soube que eu tinha deixado você. Foi brigando
comigo, que não estava em condição nenhuma de opor resistência, de São Paulo
até Ribeirão Preto. Depois contou para os meus outros irmãos que vieram em
romaria me aconselhar a mudar de ideia. A família toda idolatra você. – Sorri de
um jeito bonitinho e beija a minha mão.
– Eles me conhecem desde criança, angariar a simpatia deles ao longo dos
anos não foi tão difícil. – Rio baixinho. – Podemos dar mais uma voltinha antes de
retornarmos para o chalé?
– Claro. Tudo o que você quiser, minha linda.
Caminhamos de mãos dadas observando as pessoas e sendo observados por
elas. Chegamos à Praça São Benedito que está repleta de gente porque, na
concha acústica existente no local, a apresentação de um pianista chama a
atenção de todos, inclusive a nossa.
Ficamos abraçados ouvindo o belo concerto e a satisfação do meu marido é
visível. Ele, assim como eu, adora música instrumental.
Ouvindo a bela execução do pianista e sentindo o perfume delicioso do meu
marido, me distraio observando as pessoas ao nosso redor, e vejo quando um
grupo de jovens rapazes passa ao nosso lado e um deles deixa cair a carteira. Um
reflexo imediato me faz sair do abraço do Thomas, pegar a carteira no chão e
acelerar o passo para alcançar o rapaz. Quando o alcanço, bato a mão em seu
ombro, ele se vira e estendo a carteira. O rapaz nem olha para a minha mão,
concentra o olhar em mim e me encara.
– Você só pode ser uma visão. – O rapaz diz e sorri.
– A sua carteira caiu. – Balanço a carteira que está na minha mão bem
diante dos olhos dele.
– Deixe-me ver se você é real. – O rapaz coloca a mão no meu braço.
Thomas aparece e levanta o rapaz pela gola do casaco, ele fica suspenso no
ar, e algumas pessoas ao nosso lado se afastam. Os amigos do rapaz retornam e
nos cercam, e fico preocupada com o desenrolar dos acontecimentos.
– Acalme-se, Thomas, coloque o rapaz no chão.
– Pegue a carteira que a minha esposa está lhe entregando e deixe de
gracinhas. – Thomas vocifera.
O rapaz pega a carteira da minha mão sem me dirigir o olhar novamente.
– Desculpa, não queria ser rude com a sua esposa, não quis ofendê-la e nem
ao senhor.
Os amigos do assustado rapaz olham espantados e começam a se alvoroçar.
Ele pede para que tenham calma, e o Thomas o abaixa e solta a gola do casaco
dele.
– Da próxima vez seja menos galante com a mulher alheia. – Um Thomas
muito irritado encara o rapaz que está quase em pânico.
Seguro o braço do Thomas e o puxo, e saímos de perto do grupo de rapazes
e dos observadores que estavam começando a se aglomerar ao nosso redor.
– Francamente, Thomas! Acha mesmo que agiu corretamente? Não
reparou que ele é apenas um garoto? – Estou muito indignada .
– Vamos, não quero conversar sobre isso agora. – Emburra e segura firme a
minha mão até chegarmos ao carro.
O silêncio é total, não falamos absolutamente nada durante o percurso até o
chalé, onde também continuamos em silêncio.
Com os planos alterados pelo exacerbado mau humor do Thomas, resolvo
trocar de roupa e me deitar no sofá para ler a revista que encontrei na mesinha
de centro.
Thomas entra na sala e, ao pé do sofá, me olha.
– Desculpa. – Fala tão baixinho que quase não o ouço.
– Gostaria que me explicasse a sua reação. – Estou aborrecida ainda.
– Morro de ciúme de você, só isso. – Explica desviando o olhar.
– Meu amor, até ciúme tem que ser lógico. Você poderia ter arranjado uma
enorme confusão por causa de um acontecimento sem importância. Era só um
garoto, você deveria simplesmente ter se aproximado, tirado a carteira da minha
mão e entregado para ele. Isso teria resolvido a questão. – Suspiro.
– Era só um garoto, mas estava cantando a minha mulher e não consegui
me controlar quando ele colocou a mão em você. – Coça a nuca e anda pela
sala.
– Conheço inúmeras pessoas, relaciono-me com vários clientes do meu
escritório e não posso evitar encontrá-los. Não quero ficar constrangida cada vez
que algum deles me abraçar ou me cumprimentar. – Tenho que traçar alguns
limites.
– Sei diferenciar uma situação onde há desrespeito de outras. – Defende-se.
– Espero que saiba mesmo. Imagina se eu começar a agredir todas as
mulheres que resolvam tocá-lo? Quantas mulheres você conhece? Quantas mães
vão ao seu consultório todos os dias? Um comportamento assim deixaria você
sem clientes em pouquíssimo tempo. – Argumento.
– As mulheres são mais respeitosas, elas jamais me cantariam ou
passariam a mão em mim no meio da rua. – Apresenta a sua teoria de sempre.
– Acredito que a sua argumentação é muito simplista, mas não vamos
discutir a sua teoria sobre homens versus mulheres agora. Quero apenas que
saiba que tenho certeza de que quando estiver ao meu lado as pessoas que
conheço se dirigirão a você também, mas se estiver distante talvez não saibam
que se considera o meu dono. Resumindo, alguns homens irão me tocar e isso
não significará desrespeito nem com você nem comigo, e você terá que
aprender a suportar isso. – Termino a minha arguição.
– Tudo bem, você tem razão. Tentarei me controlar mais. – Sai da sala,
cabisbaixo.
Espero alguns minutos e vou atrás do Thomas. Ele está sentado na cama
com a cabeça entre as mãos, e fico consternada ao vê-lo tão desolado.
– Marido, deixe-me abraçá-lo um pouquinho. – Falo e mesmo no escuro
posso ver a surpresa em seu rosto.
Sento ao lado dele na cama e ele me abraça apertado, me solto do seu
abraço, chego para trás e o puxo para o meu colo, ele deita a cabeça na minha
coxa e inspira profundamente.
– Odeio discutir com você. – Vira o rosto e me observa.
– Também acho péssimo. Acabamos de passar muito tempo longe um do
outro e creio que devemos aproveitar a nossa lua de mel para aplacar a saudade.
– Passo as pontas dos dedos pelo contorno do seu rosto.
– Você está certa. Tudo o que aconteceu, desde o nosso rompimento até esta
sonhada lua de mel, me deixou muito ansioso e nervoso, o meu corpo ainda
transpira adrenalina. Obrigado por não transformar esse desentendimento que
tivemos em algo mais desagradável do que já foi. Sei que se preocupa comigo e
sou grato por me ajudar a ser um homem melhor. – Respira fundo .
– Nós não estamos brincando de cabo de guerra e, mesmo que
estivéssemos, somos do mesmo time. Você é o meu marido, o meu amor e
temos que aprender a resolver os nossos problemas causando os menores danos
possíveis. Sempre estarei ao seu lado . – Despenteio o cabelo dele, e ele sorri.
– Posso acender a lareira. Que tal? – Resolve mudar de assunto.
– Ótimo, e enquanto faz isso irei à despensa verificar se temos os
ingredientes necessários para eu preparar um chocolate quente. Tenho quase
certeza de que quando alugou este chalé, mandou abastecer a despensa e deve
ter se lembrado dos ingredientes para o chocolate quente! – Digo animada, e
Thomas sorri sem confirmar a minha afirmação.
Saímos do quarto de mãos dadas e menos aborrecidos, cada um disposto a
realizar a tarefa a que se propôs.
O chocolate quente que sei fazer é maravilhoso, receita da minha finada
avó Morgana. Encontro quase todos os ingredientes que preciso nos armários da
cozinha e consigo me aproximar da receita original. O resultado é muito bom.
A lareira está acesa e o fogo crepita, e estamos abraçados no sofá, debaixo
de uma manta, tomando o nosso chocolate quente.
– Está delicioso. – Thomas elogia.
– Obrigada.
Quando terminamos, coloco as canecas na mesinha ao lado do sofá e
acomodo as costas no peito do Thomas. Aconchego-me em seus braços, sinto o
seu perfume, o seu corpo quente, a sua respiração tranquila e relaxo me sentindo
totalmente feliz aninhada ao meu homem protetor.
De repente, sou transportada para o tapete em frente à lareira. Thomas se
coloca sobre mim apoiado em seus cotovelos, a sua boca procura a minha e me
beija com desespero, passo os braços pelo seu pescoço e o atraio ainda mais para
mim. As nossas línguas se enroscam, o meu corpo responde ao beijo ardente, e
gemo pelo prazer que me dá estar perdida nele.
Puxo a camiseta do Thomas por sobre os seus ombros, ele interrompe o
nosso beijo para me ajudar, e em fração de segundos se desfaz também da sua
calça de pijama. Tiro a camisola e fico apenas de calcinha. Ele volta a deitar
sobre mim e novamente me beija, passa a mão pela minha barriga, circunda as
minhas costas com seu braço e em um movimento quase perfeito nos rola e me
faz ficar sobre ele.
Ele enfia os dedos nas laterais da minha calcinha, fico completamente
molhada, e com um puxão rasga a minúscula peça de ambos os lados. Retira-a
de mim deslizando-a para cima e, quando a renda é arrastada pela minha vulva,
provoca uma gostosa fricção que me faz gemer outra vez.
Ergo-me e me sento sobre ele. Elevo o quadril e desço lentamente, me
afundando na ereção do meu marido delicioso. Ele geme e aperta a minha
cintura, levanta as costas do chão e senta, comigo sentada sobre ele. Subo e desço
roçando os seios em seu peito. Thomas ofega e me puxa pela nuca, a sua boca
encontra a minha e nos beijamos. Ele sobe a mão até o meu seio e circunda o
mamilo com o polegar, adoro a sensação e passo a remexer vigorosamente em
cima da sua virilha. Sinto o meu líquido encharcá-lo, as nossas bocas se apartam
e ele resfolega.
– Você me enlouquece, rebola que eu adoro. – A voz sensual dele me excita
ainda mais.
Ele também se remexe, a sua mão livre percorre a minha nádega e arrepio
com o seu toque. O seu pênis pulsa dentro de mim, e me sinto massageada. Uma
onda de energia percorre as minhas pernas chegando até as entranhas, e não me
contenho, movimento-me mais rápido, e subo e desço com força e agonia sobre
ele. A minha vagina lateja apertando-o dentro de mim, o orgasmo se aproxima e
jogo a cabeça para trás sentindo o meu corpo tremer.
– Olhe para mim. – Thomas exige.
Encaro-o com o olhar cheio de desejo e malícia, ele geme e retira a mão
da minha nádega, e o seu polegar passa a massagear o meu clitóris. Volto a
rebolar e desta vez mais rápido, a minha respiração fica muito acelerada, passo a
cavalgá-lo vigorosamente, e o prazer descomunal que sinto me faz gritar.
Thomas chama o meu nome, aumenta a fricção no meu clitóris, e gemo sem
parar. Grito o seu nome diversas vezes e ele arfa, o seu corpo estremece e sou
acometida por inúmeros espasmos.
– Vou gozar. – Anuncio.
– Goza, minha linda. – Thomas diz ofegando.
O orgasmo chega violentamente e o prazer me leva a nocaute. Quase
detenho os meus movimentos para aproveitar o enlevo, mas o Thomas me
segura pelos quadris, e me ergue e me afunda em seu pênis diversas vezes. Ele
urra, o meu corpo reage, e a minha vagina, pulsando loucamente, deságua.
Diversos pequenos choques pinicam o meu clitóris, sinto que mais um orgasmo
se aproxima, cada estocada me enlouquece.
– Vou gozar outra vez! – Grito.
– Iremos juntos! – Ele grita também.
Os gemidos do Thomas se tornam mais altos, ele me arremete cada vez
mais forte e mais rápido. O orgasmo explode, e urro, ele urra também e se
enterra dentro de mim, estremeço sobre ele, nos abraçamos e descansamos
assim.
Lentamente me ergo e retiro-o de dentro de mim, e volto a me sentar sobre
ele. O seu pênis encostado na minha barriga, os meus braços envoltos em seu
pescoço, a minha cabeça no seu ombro e os seus braços circundando a minha
cintura. Começo a cochilar ouvindo a respiração pesada do meu marido. Ele se
ajeita e se levanta levando-me junto, ficamos em pé, ele se agacha um pouco e
passa um braço por baixo dos meus joelhos, me ergue em seu colo e me leva
para o banheiro da suíte.
Thomas me coloca de pé ao lado da bancada da pia, escova os dentes e fico
observando-o, exausta e perfeitamente satisfeita. Ele nota a minha preguiça e
resolve me ajudar. Escova os meus dentes com bastante cuidado, bem direitinho
e quando termina me dá um beijinho suave. Ele me empurra gentilmente até o
chuveiro e tomamos um banho morno e rápido; na verdade ele me dá um banho,
depois me seca. Estou totalmente sonolenta.
Vamos para a cama e deitamos abraçados, nus. As minhas pernas
entrelaçadas nas dele, a minha cabeça no seu braço e durmo pesadamente.
Apesar de tudo o que temos que arrumar antes da nossa partida para
Ribeirão Preto, decidimos sair para jantar. Em casa a despensa está quase vazia e
a geladeira está desligada.
Escolhemos um restaurante japonês que conhecemos bem porque fica no
mesmo bairro em que moramos, o Jardim Paulista. O meu edifício está
localizado na Rua Guarará e o restaurante na Rua Padre João Manoel.
Fazemos o nosso pedido e me distraio verificando os meus e-mails pelo
celular enquanto o Thomas vai ao banheiro.
– Eva?
Olho para a elegante mulher que me sorri .
– Priscila! Quanto tempo. – Levanto e abraço a mulher que durante algum
tempo foi uma grande amiga.
– Nem acredito que a encontrei depois de mais de dois anos sem vê-la.
Você está fenomenal. – Ela me elogia.
– Obrigada. Você também está fantástica. – Exagero um pouco, para
retribuir o elogio.
– Você se casou? Tem filhos? Fale de você, estou muito por fora das notícias
a seu respeito, não tenho tido tempo para ler as colunas sociais. – Pergunta e ri
amigavelmente.
– Sim, me casei e ainda não tenho filhos, acabei de voltar da minha lua de mel .
– A satisfação vibra na minha voz, e a felicidade deve estar estampada no meu rosto.
– Boa noite, com licença. – Thomas retorna e sorri simpaticamente para a
minha amiga.
O rosto da Priscila se transforma, o seu espanto se torna nítido, ela abre a
boca e tenta esboçar alguma palavra e não consegue. O meu marido fica
intrigado e me olha. A reação exagerada dela ao encará-lo me faz descortinar as
lembranças e descobrir o que está acontecendo.
– Priscila, acalme-se! Este é o Thomas, o meu marido. – Falo
pausadamente.
– Thomas? – Ela consegue esboçar o nome dele e olha para mim confusa,
como se estivesse exigindo uma explicação.
– Alguém poderia me dizer o que está acontecendo? Estou ficando um
pouco constrangido. – Thomas diz ainda de pé, ao lado de uma Priscila que se
esqueceu de dar licença para que ele passe.
– Amor, a Priscila é médica, ela e o namorado, agora marido,
frequentaram o curso de Medicina na mesma época em que o seu irmão.
Éramos muito amigos e eles sentiram muito a perda do Nicolas, creio que ela
está confundindo você com ele. – Resumo a situação rapidamente .
– Ah, sim. Muito prazer, Priscila! Eu sou o Thomas, marido da Eva e irmão
gêmeo do Nicolas. – Calmamente se apresenta e o olhar dele, agora divertido,
revela que está achando a cena engraçada.
– Minha nossa! Mil desculpas, é que eu nunca soube que o Nicolas tinha um
irmão gêmeo, nunca mesmo. Além disso, é surpreendente o fato de que tenha se
casado com a noiva... Bem, tudo isso é muito surpreendente. – A Priscila fica
cada vez mais atrapalhada.
– Tudo bem, Priscila... A minha história e do Thomas é realmente bastante
incomum. Outra hora, poderemos nos encontrar, e lhe contarei sobre a minha
enorme sorte. – Procuro convencê-la a deixar para depois o restante das
explicações que sei que gostaria de receber.
– Claro! Telefonarei para o seu escritório e poderemos marcar um almoço
ou algo assim, saiba que estou muito curiosa. Desculpe o meu comportamento,
Thomas é um prazer conhecê-lo. – Eles apertam as mãos.
– O prazer é todo meu. – Ele diz.
– Tchau, Eva. Tchau, Nicolas, quer dizer... Thomas! A minha irmã deve
estar achando que morri no banheiro, deixe-me voltar para a minha mesa. – A
Priscila sai de um jeito muito estabanado.
Encaro o Thomas, e caímos na gargalhada. Ele se senta e segura a minha
mão, continuamos a rir só que cada vez mais baixo. O garçom chega e coloca os
nossos pratos sobre a mesa e, finalmente, conseguimos nos recompor.
– É a primeira vez que algo assim me acontece. – Thomas revela.
– Deve ser porque é a primeira vez que alguém que conheceu o Nicolas
encontrou você comigo. Acho que juntos fazemos qualquer um recordar do casal
Nicolas e Eva, e então o mistério ganha tons macabros. – Rio novamente.
– É muito engraçado, tão engraçado que quase tenho vontade de chorar
quando me lembro de que você foi o grande e único amor da vida do meu irmão
gêmeo .
O homem, que até agora a pouco estava sorridente, se torna ácido.
– A vida é mesmo uma caixinha de surpresa. Quem diria que no meu
pacotinho viria uma figurinha repetida? – Alfineto o meu marido.
– Figurinha repetida? – Passa de ácido a indignado.
– Ora, Thom as, não é assim que se vê toda vez que se depara com o
assunto Nicolas? – Responder um a pergunta com outra pergunta é um a boa
tática m inha .
Thomas se cala, e fico em silêncio também. Comemos e bebemos sem
emitir nenhuma palavra, e o olhar perdido dele me atormenta, porém
permaneço firme no meu propósito de ter a conversa que nunca tivemos sobre o
Nicolas. Esse assunto precisa deixar de ser uma espécie de tabu para ele, e me
sinto tranquila para falar a respeito porque isso não me incomoda mais há algum
tempo.
Voltamos para casa ainda sem conversarmos direito. O Thomas está
visivelmente indignado comigo, e continuo convicta de que chegou a hora de
falar sobre o Nicolas.
– Figurinha repetida! – Resmunga vestindo a calça do pijama.
– Está pronto para a conversa sobre o seu irmão ou continuará fugindo? –
Confronto o meu marido.
Eu me aproximo da porta do banheiro e o observo escovar os dentes. Ele
desvia o olhar, e me afasto.
Vou para o escritório, ligo o computador e descarrego as fotos da nossa lua
de mel. Demoro um longo tempo examinando-as e não consigo eleger a melhor
porque todas ficaram ótimas. A alegria transborda dos nossos olhos em cada uma
delas, e fico comovida com todo o amor que foi capturado nas imagens.
– Não sou uma figurinha repetida.
Ergo o olhar do monitor e me deparo com um Thomas muito indignado
bem na minha frente. Começo a rir, ele retesa o corpo e o seus olhos me
fulminam, rio mais ainda e estico os meus braços convidando-o para um abraço.
Relutantemente ele se aproxima com a cara fechada, tão sexy que me hipnotiza,
e dou um abraço nele no melhor estilo urso.
– Doutor, olhe como as nossas fotografias estão bonitas. – Liberto-o do
esmagamento que quase promovo.
Ele observa o monitor, e as fotografias passando uma após a outra fazem com
que ele sorria, e o seu amplo sorriso, como de costume, aquece o meu coração.
– Falei aquilo da figurinha repetida só para provocá-lo, queria gerar polêmica
para que você se sentisse tentado a falar sobre o Nicolas. – Confesso e sorrio.
– Você não sabe o quanto estou tentado a falar sobre um dos quase
m aridos da m inha esposa que, por acaso, era m eu irm ão gêm eo. – Ele ainda
continua azedo.
– Geralmente você solta uma frase de efeito a respeito do meu
envolvimento com o Nicolas e depois se fecha. Isso tem me aborrecido e quero
falar a respeito. – Exponho o meu desconforto.
– Desculpa, ainda tenho muito ciúme da história de vocês e certo recalque
por não ter tido a oportunidade de crescer ao lado do meu irmão. – Expõe as
razões dele.
– Amei profundamente o seu irmão, só que isso faz parte do passado e não
saberia dizer o que teria acontecido se você tivesse crescido conosco. A única
coisa que posso afirmar hoje, com certeza, é que o nosso relacionamento
amoroso é muito mais compensador para mim do que o que eu tive com o
Nicolas.
– É mesmo? Por quê? – Thomas pergunta e parece irônico .
– Falo com toda sinceridade. O Nicolas e eu éramos muito diferentes. Ele
era tímido demais, introspectivo demais e respeitoso demais. Como meu amigo
ele era excepcional, mas como o meu amor, hoje sei, que deixava a desejar.
– Então vocês eram os tais dos opostos que se atraem?
O Thomas aprendeu o negócio de fazer perguntas e acho que não pretende
mais parar.
– Acho que éramos mais do tipo os opostos que se compensam. O afeto
entre nós nasceu da capacidade dele de ser tudo o que eu precisava e da minha
capacidade de ser tudo o que ele precisava . – Não sei por que tenho certa mania
de fazer jogo com as palavras que mais confunde do que esclarece o interlocutor.
– Apesar da explicação meio confusa, entendi o que quer dizer. Um se
moldou à necessidade do outro e dessa forma conviveram em simbiose. É isso? –
Sorri satisfeito.
– A sua inteligência me excita. Exatamente isso, sintetizou perfeitamente .
– Elogio o meu marido que é muito bom com as palavras.
– Você um dia me disse que amou tanto o meu irmão que quis morrer
quando ele faleceu, então não consigo compreender porque acha que o nosso
relacionamento é melhor do que o que tiveram. – Expõe a dúvida que considero
bem-vinda.
– Nunca tive com o que comparar o meu relacionamento com o Nicolas
antes de me relacionar com você. Tudo o que tive depois dele e antes de você
não pode ser considerado. A minha análise só pôde se tornar efetiva quando me
apaixonei e passei a conviver com você e, embora vocês sejam fisicamente
muito parecidos, excluí esse quesito da minha amostra.
– De figurinha repetida a ratinho de laboratório. Muito animador. – Ele sorri.
– Aquele rapaz, que estava ainda se tornando um homem, era bom,
carinhoso, responsável, fiel e dedicado, e eu achava sinceramente que o amava.
Pensava que ele era a pessoa ideal para mim porque nunca imaginei que
encontraria alguém que fosse tudo o que ele era e muito mais. Você é
espontâneo, comunicativo, protetor, atraente, sensual, desinibido, gostoso e sabe
me satisfazer completamente. Thomas, você é o Nicolas com superpoderes. –
Rio assim que termino a frase.
– Então eu ganhei mais pontos porque sou melhor de cama, é isso? –
Pergunta me encarando maliciosamente.
– O que eu quero dizer é que você é o homem ideal para viver comigo um
relacionamento amoroso, perfeito para ser o meu marido. O Nicolas era a
pessoa ideal, perfeita e especial para viver comigo um relacionamento fraternal,
ele foi o melhor amigo do mundo. – Esclareço.
O Thomas ri e o seu olhar carinhoso me abraça. Percebo que está gostando
das minhas revelações e resolvo seguir por um terreno mais arenoso.
– Acredito que o Nicolas, desde cedo, se tornou tão apegado a mim porque
necessitava de uma figura feminina em sua vida, e eu preenchi essa lacuna. –
Solto a bomba.
– Como assim? – Pergunta interessado.
– A casa dele cheirava a testosterona, afinal lá residiam os seus quatro
irmãos mais velhos, o seu pai e ele. Só tinha a mãe de vocês de mulher, mas ela
nunca foi muito próxima a ele. Na verdade, costumava evitá-lo... Os dois mal se
falavam e isso desde sempre. – Chego a sentir vontade de chorar quando me
lembro disso.
– Por que ela o tratava dessa maneira? – Indaga visivelmente curioso.
– Agora fica fácil presumir que ela sentia remorso e culpa toda vez que o
olhava, e deve ter sido por essa razão que se afastou dele. – Faço a minha análise
psicológica.
– Quer dizer que não fui só eu quem foi privado do amor materno? Pior
ainda, o Nicolas não teve amor de mãe mesmo tendo mãe. Coitado! – Thomas se
solidariza.
– Mas, apesar de ter sido privado do amor materno, você teve a chance de
conviver, por causa do perfil namorador do seu pai de criação, com várias
mulheres e ainda teve uma avó muito presente. Então, acredito que não faltou
referência feminina na sua vida como faltou na do Nicolas. Quero que
compreenda que era comigo que ele supria a carência de afeto feminino. –
Argumento.
– Você foi a mulher da vida dele em todos os sentidos. É isso o que está
dizendo?
– Sim, só que mais em alguns do que em outros, da mesma forma que o
Nicolas foi o homem da minha vida também, porque a proximidade que tenho
com o meu pai só se deu nos últimos dez anos.
– Explique-se melhor.
– Antes, o meu pai, o único homem em uma casa onde viviam três
mulheres, passava a semana toda aqui em São Paulo, só ia para Ribeirão nos
finais de semana, e durante esses dois dias a minha mãe o monopolizava. Ele não
tinha como me dar muita atenção, e isso de certa forma também ajudou a
desenvolver em mim a necessidade de uma referência masculina.
– O Nicolas carente de mãe, você carente de pai. O tal dos opostos que se
compensam.
– Exatamente e, ainda, analisando tudo o que passamos juntos, posso até
arriscar dizer que muitas vezes agi realmente como uma espécie de figura
materna para o Nicolas.
– Ouvindo o que está me dizendo, só consigo imaginar o relacionamento de
vocês como algo repleto de compensações afetivas, o que dificulta
demasiadamente que eu compreenda o envolvimento sexual que tiveram. –
Argumenta, e acho que o meu doutor sabe mesmo ser contundente.
– Aos quinze anos, comecei a fazer sucesso com os garotos. Eles passaram
a me assediar, então acho que o Nicolas me pediu em namoro antes que outro o
fizesse e isso me afastasse dele. Aceitei pelo mesmo motivo, já que as garotas
caíam em cima dele como mosca no mel. – Fica tão fácil perceber isso
atualmente .
– E, como começaram a namorar, uma coisa levou a outra. – Thomas conclui.
– Não exatamente... O nosso namoro sempre foi muito comportado. O
Nicolas era muito controlado, e sempre me respeitou até demais. Foi só quando
ficamos noivos e fomos morar juntos que uma coisa levou a outra. – Sorrio.
– Quer dizer que o meu maninho era devagar? – Dá uma risada alta, parece
que está achando muita graça.
– Ah, Thomas! Não foi isso que eu quis dizer, e não me faça entrar em
detalhes. O importante é que saiba que nos relacionávamos de uma maneira
muito suave, e que sempre tive que ser bem direta com ele quando o assunto era
sexo. – Abaixo o meu olhar, ligeiramente embaraçada.
A lembrança da quantidade de vezes que tive que provocar e estimular o
Nicolas para que ele se interessasse em me dar mais do que carinho, me
constrange.
O Nicolas e eu nunca tínham os tido nenhum a experiência anterior, não
sabíam os m uita coisa sobre sexo, e não m e sentia à vontade para conversar a
respeito com a m inha m ãe. Nem as m inhas am igas de faculdade eram de
grande aj uda, porque evitavam falar a respeito do assunto sexo com igo. Elas
supunham que eu soubesse tudo sobre o tem a, j á que m orava com m eu
noivo. Naquela época, sem ter parâm etro e sem coragem para ir atrás de
inform ações, considerava o interesse sexual do Nicolas com o satisfatório. Na
cam a ele era sem pre tão terno, tão doce, tão gentil... Agora sei que era tão
sem sal, tão sem pim enta...
– Fiquei muito curioso. Como era a convivência de vocês no período em que
moraram juntos? – Thomas me esquadrinha.
– Era tranquila e agradável. Vivíamos em função do estudo e tínhamos
pouco tempo livre. Na maior parte das vezes, o Nicolas estudava muito, varava
madrugadas debruçado sobre os livros, ele era muito dedicado. A Medicina era
uma rival ciumenta com a qual nunca me atrevi a competir.
– Vocês viveram juntos quando estavam na flor da idade, em uma época
em que os hormônios exalam de todos os poros, e o meu irmão devorava os
livros, apenas os livros? – Pergunta com um sorriso irônico nos lábios.
– O seu irmão estava concentrado em ser um excelente médico, e teve o
meu apoio apesar de, algumas vezes, ter me ressentido com a ausência dele em
nossa cama. – Confesso.
– O engraçado é que eu também estudei Medicina, também me concentrei
em ser um excelente médico, só que nunca dispensei uma cama quentinha. – Ri
descaradamente.
– Rá, rá, rá. Muito pertinente a sua observação. – Eva, a ciumenta, se
apresenta com todo seu esplendor.
– Quero dizer com isso, minha linda, que estudar Medicina nunca impediu
nenhum homem de se comportar como um homem, nem mesmo o mais
aplicado dos estudantes.
– Cada pessoa é de um jeito e, além disso, conforme vim traçando o perfil
do meu relacionamento com o Nicolas até agora, fica fácil perceber que éramos
mais amigos e companheiros do que amantes. – Exponho a conclusão a qual
cheguei desde que comecei a me relacionar com o Thomas, um homem que me
deseja e me satisfaz plenamente.
– Vocês eram tão próximos, tão unidos e tão jovens, que talvez tenham
confundido uma forte amizade com amor. – Conjectura.
– O que quero que realmente entenda com essa conversa toda é que, apesar
de inicialmente ter me aproximado de você por ser fisicamente tão parecido
com o Nicolas, nunca considerei estar com você para me lembrar dele. Você e
eu nos relacionamos de uma maneira mais sistêmica, mais passional e, desde
que estamos juntos, não tenho como pensar em mais ninguém. – Abro o meu
coração para o meu marido que adora declarações.
– Você quer esclarecer de uma vez por todas que, mesmo que nunca
saibamos realmente quais foram as razões que fizeram o Nicolas e você serem
tão ligados um ao outro, você me ama de uma maneira que jamais o amou, é
isso?
– Já lhe disse isso antes e não estou confirm ando só porque foi você
quem sobrou. – Não consigo deixar de relem brar a frase dele que um a vez
tanto m e m agoou.
– Você realmente é muito boa em jogar uma conversa na cara... A sua
memória é prodigiosa. – Thomas ri, demonstrando que também não se esqueceu
do que um dia me disse, e me abraça.
– Será que agora conseguiu compreender tudo o que há tempos tento
explicar? – Torço para que eu tenha conseguido me fazer entender.
– Perfeitamente. Adorei a nossa conversa. O meu coração está mais
tranquilo e não sinto mais ciúme do frouxo do meu irmão. – Gargalha.
– Thomas! – Ralho com ele.
– Brincadeirinha, doutora, brincadeirinha. – Sorri, levanta o meu queixo e
me beija.
– Quero aproveitar para deixar bem claro que, apesar de amá-lo de uma
maneira que jamais amei o Nicolas, ele sempre terá um lugar no meu coração,
porque ninguém esquece o melhor amigo. Ninguém é capaz de superar
totalmente a perda daquela pessoa que o entende mesmo que nenhuma palavra
seja dita, que consegue confortá-lo apenas segurando a sua mão e que quando
olha para você enxerga o seu íntimo. – Falo emocionada.
– Fique tranquila, compreendi que você ama a nós dois. A mim como
homem e a ele como amigo. Sei que muitas vezes um amigo pode ser mais
importante na vida de alguém do que um amor. Então, permita-me apenas tentar
ser, além do homem da sua vida, um amigo também. Não quero competir com o
Nicolas, não é isso. No quesito amizade acho que não me sairia tão bem, mas
preciso que saiba que poderá contar comigo sempre e para sempre, em qualquer
situação.
– Obrigada, Thomas, por significar tanto para mim. Conte comigo também
sempre e para sempre.
– Obrigado, minha Eva, por ser absolutamente tudo para mim. – Diz e volta
a me beijar.
Capítulo XIII
– Você está fantástica, Eva. Quero tirar a roupa que acabou de vestir agora
mesmo. – O olhar de admiração do Thomas me deixa convencida de que escolhi
a roupa adequada.
– Marido, nem pense nisso, os convidados devem estar chegando. Além
disso, o que tem de mais em uma calça preta e uma blusa de seda branca?
Roupinha básica. – Provoco.
– Quando a calça preta é justíssima e a blusa de seda tem esse decote
profundo e envolvem um corpo escultural como o seu, não consigo achar nada
de básico na composição. – Ele se aproxima exalando sensualidade.
Que bom que ainda não passei batom , porque o m eu sensual doutor m e
beij a com tanto ím peto que a m inha boca arde, bem com o outras partes
m inhas. Quando ele enfia as m ãos debaixo da m inha blusa e acaricia as
m inhas costas, sei que não posso resistir e inflam o, a m inha calcinha fica
m olhada e os m eus m am ilos se eriçam , estrem eço e deixo transparecer que
estou pronta para ele.
– Você tem razão, os seus pais estão lá embaixo e a campainha não para de
tocar. Acho que teremos que terminar esse nosso assunto mais tarde. – A cara de
safado dele me deixa em dúvida sobre as suas reais intenções.
– Foi você quem começou, agora diz que terei que esperar? Nunca ouviu
falar em presente de aniversário? – Reclamo quase irritada.
– A espera tornará o que faremos mais tarde ainda mais delicioso. Quanto
ao seu presente de aniversário, quero entregá-lo ao final do jantar que nos
aguarda. – Ele termina a frase, e sei que preparou algum tipo de surpresa para
mim também.
– Por favor, doutor... Como terei que fazer um enorme esforço e esperar
para receber o meu presente, poderia pelo menos antecipar o sexo de
aniversário. – Tento negociar.
– Nada disso. Esqueceu que acordei você hoje cantando parabéns e que
transamos logo em seguida? – Ele me estreita ainda mais em seus braços, e
suspiro inconformada com o meu desejo reprimido.
– É o meu aniversário, tenho direito a mais sexo. – Resmungo.
– Você é insaciável, sei disso. Mas os convidados estão aqui para vê-la, e
não podemos prolongar a sua ausência. E acho que merece mais do que uma
rapidinha. O sexo de início de aniversário você já teve, mais tarde faremos o
sexo de encerramento de aniversário. – Ele beija a ponta do meu nariz.
– Se é assim, adiante pelo menos o presente. – Insisto, não resisto ao hábito
de negociar.
– O presente, que receberá depois do jantar, é meu e dos seus pais e eles
participarão da entrega, como não os estou vendo neste quarto... – Olha para
mim de um jeito divertido e sorri.
– Está bem. – Saio do abraço dele e tento me recompor.
– Olha só. Não é propriamente um presente para você, é mais para mim.
Também iria lhe mostrar mais tarde, só que não posso deixá-la receber os
convidados tão irritadinha assim. Então vou mostrar-lhe uma coisinha agora. –
Fala com tanta sensualidade que sinto vontade de sorvê-lo.
Ele abre o botão da calça e o zíper, e acho que devo ter começado a babar,
porque ele se interrompe.
– Eva, vou abaixar a calça, mas prometa que não vai pular em cima de
mim. A minha força de vontade não é tão grande e tenho medo de não conseguir
resistir. – Avisa cheio de malícia.
– Tudo bem, doutor. Não sei o que está pretendendo fazer, mas faça logo.
Quando ele finalmente abaixa a calça jeans e o cós da cueca boxer, vejo o
meu nome tatuado do lado direito da sua virilha. A tatuagem não é muito grande,
mas é perfeitamente visível, as letras foram muito bem desenhadas e, minha
nossa, como acho isso sexy !
– Uau! – Dou um gritinho. – Quando foi que fez essa tatuagem para
homenagear a única mulher no mundo que poderá tocá-la? – Os meus olhos
ficam marejados .
– Hoje de manhã, ainda está um pouco inchada e dolorida, mas nada sério.
O que achou?
– Sexy demais! Obrigada, meu amor. Amei a homenagem. Agora, por
favor, suba a calça porque se antes eu já queria pegar você, agora então...
– Você está entranhada na minha pele. A tatuagem é uma forma de
demonstrar isso. – Declara, e me jogo em seus braços beijando-o
apaixonadamente.
– Amo você, Thomas. Obrigada por ser tão descaradamente apaixonado
por mim e por demonstrar de tantas formas o seu amor.
– É fácil ser descaradamente apaixonado por você, e demonstrar o amor
que sinto é um prazer que adoro cultivar. Você é maravilhosa, deliciosa e tão
cheia de qualidades que preciso me beliscar o tempo todo para ter certeza de que
não estou sonhando. – Ele me emociona com as belas palavras, e volto a beijá-lo.
Relutantemente nos afastamos, e o Thomas sobe a calça. Ele me ajuda a
ajeitar a minha roupa e sei que terei que me conformar com a espera. Estou
acesa, e só o fato de ele alisar a minha blusa para colocá-la dentro da calça me
deixa quase sem fôlego. Ele acha muito divertido me provocar assim, e
considero a situação muito excitante.
Descemos a escada e vemos os nossos convidados reunidos nos esperando.
Estão presentes apenas os nossos familiares, que quando me veem, levantam as
taças e brindam a minha saúde.
A alegria que percebo nos olhos dos meus pais, do William e da Lucia me
faz abrir um amplo sorriso. Os meus animados cunhados me cercam quando
termino de descer os degraus, e me erguem nos braços como a estrela de um
musical e, apesar de ficar um pouco constrangida, acho graça. A gargalhada que
o Thomas dá diante da cena inusitada, contagia-nos, e todos os presentes
começam a rir também.
O jantar é verdadeiramente animado. Os nossos sobrinhos correm pela casa
desafiando a lei da gravidade, os meus cunhados e as suas esposas conversam
sem parar, e planejo promover novos encontros para desfrutarmos da agradável
companhia dessas pessoas divertidas, ainda mais.
Às dez e meia, nós nos despedimos do William, que é o último convidado a
sair, e a animação pelo que sei que o Thomas e eu faremos a seguir, domina o
meu ser.
– Oba! Enfim sós. – Comemoro.
– Hum hum. Os seus pais nos aguardam lá fora, você receberá o seu
presente agora. – Thomas me lança o seu sorriso perfeito, e amoleço.
Sou levada para o jardim da frente da nossa casa e os meus pais me
abraçam. Não entendo a situação e fico ainda mais curiosa. Todos estão muito
misteriosos, o meu pai e o Thomas trocam olhares enquanto a minha mãe sorri
satisfeita. A curiosidade que estão me fazendo sentir quase me mata.
– Muito bem, entreguem logo o presente porque a curiosidade não satisfeita
pode me deixar muito mal humorada. – Ameaço.
– Então olhe para a rua e espere um pouco. – O meu pai dá as instruções.
– Isso é ridículo. Oh céus, o que é isso?
Estaciona na frente da minha casa, um carro prata com um enorme laço
vermelho em cima que só posso concluir que é o meu presente.
O carro é muito bonito, o aspecto dele me agrada bastante, parece ser um
veículo espaçoso e robusto, e menos chamativo do que a minha BMW X6 vermelha.
– É uma Toy ota Hilux SW4 SRV, com tração 4x4, transmissão automática,
sete assentos e a diesel. – Thomas esclarece.
– É um carro maior, de menor valor e mais discreto do que o seu.
Acreditamos também que é mais apropriado para uma mulher casada, que
brevemente deverá ampliar a família. – O meu pai intervém.
O motorista do meu pai sai do carro deixando os faróis acesos. Também
abre todas as portas do carro e se posiciona ao lado dele com um sorriso de
satisfação iluminando o seu rosto.
– Pelo sorriso do Moacir, acredito que esse carro deve ser muito bom de
dirigir. – Rio animada.
– Você gostou? – O meu marido espera ansioso pela resposta.
– Adorei tudo o que recebi até agora! – Dou um a piscadinha para ele. –
Falando, especificam ente, desse presente, inform o que entendi o recado.
Estou ganhando um carro para a fam ília, e pelo núm ero de assentos, com eço
a m e preocupar com a quantidade de filhos que o m eu m arido estim a que
terem os. – Sorrio.
– Espero que pelo menos dois. – A minha mãe responde rapidamente.
– Dois apenas? – O meu pai reclama.
– Quero que saiba que estou adorando ter uma família grande e, sendo um
apaixonado por crianças, acho que me contentarei com cinco ou seis delas.
– Thomas! – Ralho com ele. – Acredito que devemos conversar sobre isso
em outra ocasião. Sou uma profissional dedicada e não pretendo abandonar as
minhas atividades para ser mãe em tempo integral. – Protesto acaloradamente,
deixando todos sem fala.
– Querida, não quer dar uma volta no seu carro novo? – A minha mãe
pergunta me salvando da situação constrangedora.
– Claro! Quem vai comigo?
– Eu! – Thomas beija o topo da minha cabeça parecendo mais animado.
– Nós já demos algumas voltas no seu presente hoje, então iremos para
casa porque estamos cansados. – O meu pai diz olhando para a minha mãe.
– Parabéns m ais um a vez, filha, am am os m uito você. – A m inha m ãe
m e abraça.
– Obrigada aos três pelo maravilhoso jantar e pelo presente especial, mas
faço questão que saibam que o melhor presente que poderia receber é
comemorar mais um ano de vida ao lado de vocês, pessoas que eu amo. – Sorrio
afetuosamente e recebo um abraço triplo, estilo sanduíche.
O meu carro novo é realmente bonito por fora e por dentro, moderno, e
uma delícia de dirigir. Apesar de adorar o meu charmoso carro vermelho,
realmente acho que este tem mais a ver com o meu momento atual.
Os olhos do Thomas me devoram enquanto estou ao volante, e fico excitada
só de sentir a tensão sexual que impregna o ar. Estaciono o carro na garagem,
entre o Honda CRV do meu marido e a minha brilhante BMW, e o meu marido
aciona o botão para que o portão eletrônico baixe.
Thomas afasta o banco dele para trás, muito para trás e faz o mesmo com o
meu, pegando-me de surpresa.
– O que está fazendo, doutor?
– Quero você agora, aqui, no seu carro novo. – Respira fundo, vira de lado
no banco, e sei que está tão excitado quanto eu.
– Sexo no carro, doutor? Você é muito pervertido. – Deito de lado no banco,
imitando-o, e o encaro.
– Já fez isso antes, doutora? – Pergunta quase naturalmente, e a sua cara de
sem-vergonha não me engana, porque sei que deseja saber um pouco mais sobre
o meu passado.
– Nunca precisei. E você, doutor? – Sorrio maliciosamente.
– Nunca também. Sou um homem grande, sempre achei que seria
desconfortável. – Retribui o meu sorriso malicioso.
– E o que o faz mudar de ideia agora? – Inclino um pouco para frente dando
a ele uma visão privilegiada do meu decote.
– A linda mulher que eu amo e que me excita a ponto de me fazer querer
possui-la em todo e qualquer lugar.
Passa o dedo indicador da base do meu pescoço até o vale entre os meus
seios, o que me arrepia e eriça os meus mamilos.
– Sendo assim, doutor, este carro se tornará um presente ainda melhor,
inesquecível.
– É o seu aniversário, diga-me o quer que eu faça, porque o seu desejo é
uma ordem.
– Primeiro, quero que me beije aqui. – Aponto para a minha boca. – Depois,
bem aqui. – Aponto para o meio das minhas pernas. – Mais depois ainda, quero que
me penetre de qualquer maneira que seja possível dentro deste lindo carro e, para
terminar, quero que me leve lá para o chuveiro e faça o que quiser comigo. Será
que fui clara? – Percebo que o volume dentro das calças dele fica ainda maior.
– Você sabe o que eu vou querer fazer com você embaixo do chuveiro, não
sabe? – Respira fundo e geme.
– Aquela fixação ainda persiste? – Passo a mão pela nádega provocando o
meu marido obsceno.
– Cada vez mais, as suas calças justas são uma inspiração. – Geme outra
vez, e fico muito molhada .
– Dê-me a sua mão. – Exijo, e ele tira o dedo de dentro do meu sutiã e me
entrega a mão.
Coloco a mão do Thomas entre as minhas pernas e a aperto.
– Está sentindo como estou pulsando? Como estou querendo você? – Olho
bem dentro dos olhos dele e vejo quando se tornam densos e perigosos.
– Ah, Eva. Ah! – Geme e ataca a minha boca com um beijo imoral sem
tirar a mão do local em que a pousei. O seu dedo indicador me massageia sobre
o tecido da calça justa que visto, e o fogo incendeia o meu ventre.
– Amor, coloque a mão dentro da calça, estou morrendo para sentir o seu
toque, quero pele com pele, depois quero a sua boca lá. – Suplico sem tirar os
meus lábios dos dele.
Thomas desabotoa a minha calça e abre o zíper, enfia a mão com
dificuldade dentro da calça muito justa e não consegue acomodá-la direito.
– Minha linda, preciso que fique nua. Estamos dentro da nossa garagem,
ninguém entrará aqui.
Concordo me ocupando em tirar a calça e a calcinha de uma só vez sob o
olhar faminto do meu marido. Com menos pressa, porque gosto que ele me
observe tão maravilhado quando me dispo, tiro a blusa e depois o sutiã e ele fica
hipnotizado contemplando os meus seios.
– O mesmo serve para você, doutor. – Provoco.
Ele abre a porta do carro, sai e tira a roupa do lado de fora, atira-as no banco de
trás juntamente com os sapatos, entra e volta a ficar de lado no banco me observando
com luxúria. Admiramos os nossos corpos nus com visível deleite, como se fôssemos
dois voyeurs, e a tatuagem com o meu nome me comove e me excita.
Thomas me encara e acaricia o seu membro grosso e duro, sei que ele quer
me provocar e atiçar ainda mais o fogo que me consome. A sua ereção me faz
perder o fôlego e a cabeça. Quero esse homem mais do que qualquer coisa, o
desejo que sinto chega a doer fisicamente e sei que sou capaz de me render a ele
de todas as formas a fim de dar e receber prazer.
– Thomas, você é todo lindo, todo gostoso e estou louca de tesão. Pare de
torturar a aniversariante!
– Eu te amo, Eva. Você é a materialização do meu sonho. Saber que me
quer tão intensamente é o melhor afrodisíaco do mundo. – Debruça sobre mim e
concentra a boca entre as minhas pernas, seguindo o roteiro que defini.
– Vou dirigir. – Informo ao meu marido que ficou ainda mais bonito do que
eu previa com a roupa que dei de presente para ele.
A calça de alfaiataria Giorgio Armani, reta e preta; a camiseta lisa, da
mesma cor, com leve decote em V da Diesel; o blazer ajustado de algodão com
linho, sem forro interno, na cor verde militar; as botas e o cinto de couro, ambos
pretos, da Ellus; o deixaram com o visual moderno e despojado.
– Fico feliz que goste de dirigir o seu carro novo. – Dá uma risada alta e
entra no carro .
– Qual é a graça? – Rio, contagiada pela risada gostosa dele.
– É que me lembrei da primeira vez em que a vi dirigindo um carro, foi
quando a convidei para tomar um café.
– Sim, eu sei. Você me esperou na saída da garagem, quanto o vi acenei,
você entrou no seu carro e o segui. Você está rindo disso?
– É que você, dirigindo um carro com a placa personalizada, EVA 1209, não
precisava nem ter acenado. Na hora em que vi a placa soube que era você e
imaginei que uma mulher que dirige uma BMW vermelha, cuja placa tem o seu
nome, deveria ser muito exibida e que eu estava me metendo em encrenca. –
Volta a rir.
– Ei, você nunca me disse que me acha exibida. – Reclamo.
– Você não é exibida, tem tudo para ser, mas não é, e isso me encantou.
Você é uma pessoa simples e, geralmente discreta. O que me faz não entender
até hoje a tal placa personalizada. – O olhar divertido do Thomas me inquire.
– Devo confessar que estava em uma fase meio celebridade quando
comprei o carro. – Volto a rir e acelero, dando o assunto por encerrado.
O meu marido adora música, e sempre que estamos no carro ele gosta de
ouvir música instrumental para relaxarmos ou, quando estamos animados como
hoje, coloca para tocar algo dançante e animado, que canta sem parar e me faz
rir o tempo inteiro. Ele fica tão distraído executando a sua performance que nem
percebe o caminho que faço, que é exatamente o oposto do caminho do
restaurante que ele acha que iremos.
– Aqui é um restaurante? – Thomas está visivelmente confuso.
– Não. – Evito entrar em detalhes.
– Casa de festa? – Continua confuso.
Pego a mão do Thomas e o conduzo até o salão principal, chegamos na hora
marcada, e ele é recebido com palmas pelos presentes.
– O que está acontecendo?
– Você nunca ouviu falar em festa surpresa? Surpresa! – Abraço um
homem completamente atônito.
– Você preparou uma festa surpresa para mim? – Ele está pasmado.
– Sim! Confesso que tive a ajuda dos meus pais, do seu, da Lucia e do Silas.
Vamos circular? Os seus convidados estão loucos para cumprimentar você. –
Dou um leve beijo em seus lábios e depois o empurro para o meio do salão.
A festa está um sucesso, Thomas fica tão contente que não para de sorrir. De
mãos dadas comigo passeia pelo salão sendo cumprimentado por todos, e quando os
meus pés começam a latejar, nos sentamos à mesa com os nossos familiares.
A banda do Silas inicia a sua apresentação e a esposa dele, os irmãos e as
esposas deles demonstram ser fãs ardorosos. Assoviam e aplaudem
efusivamente, e eu não consigo não rir da cena.
O Silas toca guitarra e canta bem, a banda é boa, a minha mãe pode ficar
tranquila. Em pouco tempo o Thomas e eu também aderimos ao fã clube e
aplaudimos com energia.
Depois de algumas músicas o Silas para de cantar e pede silêncio. É
atendido, todos concentram a atenção nele, e o meu cunhado pop star começa
o seu discurso.
– Boa noite! – Cumprimenta, e é cumprimentado por todos. – Estamos
aqui para comemorar o aniversário do meu irmão caçula, o aniversariante
bonitão ali, Thomas, ou Tom, como é mais conhecido. Quero pedir que ele suba
ao palco e venha até aqui para dar um alô para todos vocês.
O Thomas protesta, me olha contrariado, mas o Lucas e o Jonas o arrastam
até o palco. Ele sobe, abraça o Silas, recebe um microfone nas mãos e parece
bastante sem graça, apesar de estar um arraso sob as luzes do palco. Ele sorri e
todo o seu carisma surge.
– Obrigado ao Silas e a sua banda por estarem tornando esta festa m ais
anim ada, obrigado tam bém a todos vocês que vieram prestigiar o m eu
aniversário, obrigado aos m eus fam iliares que contribuíram para a
realização desta festa e obrigado, principalm ente, a m inha linda e
m aravilhosa esposa, Eva. – Quando ele cita o m eu nom e, im ediatam ente,
percebo inúm eros olhares sobre m im .
– Ei, parem de admirar a minha mulher, sou ciumento! – Todos riem. –
Obrigado, minha amada, por tornar tudo na minha vida especial, eu te amo!– Ele
é aplaudido, e eu me derreto.
Thomas faz menção de devolver o microfone ao Silas, e ele recusa.
– Ah, não, Tom. Você vai cantar comigo. Eu sei que canta bem, você já fez
uma serenata para a Eva. Todos nós queremos ouvi-lo também. – O Silas o
incentiva .
– Desculpa, pessoal... Mas atualmente só canto para a minha esposa e no
ouvido. – Ele brinca, cruza os braços e todos riem.
– Então pelo menos toque a guitarra enquanto eu canto. – O Silas insiste.
– Toca! Toca! Toca! – Os convidados fazem coro, inclusive eu.
Thomas pega a guitarra, se ajeita, faz cena e demonstra que está preparado.
– Informe qual a música que iremos tocar e manda ver!
– Muito bem, grande Tom, será Start Me Up , do The Rolling Stones! E
vocês podem cantar também.
No exato momento em que o Silas fala o nome da música alguém aperta o
meu braço e me cumprimenta.
– Boa noite, Eva. Você está um espetáculo!
Um Marco bronzeado, com o cabelo um pouco mais comprido, porém com
um corte moderno, vestido com uma camisa de linho branca com as mangas
dobradas e calças de alfaiataria cinza, me devora com os olhos enquanto o
examino dos pés a cabeça.
– Você também me parece ótimo. – Sorrio e o abraço. – Que bom que veio
prestigiar a festa de aniversário do Thomas. – E me viro para ver o desempenho
do meu marido que, de cima do palco, me observa atentamente e, acho eu, um
tanto contrariado.
– Os meus pais foram convidados pelos seus e, como eles não puderam vir,
vim no lugar deles. – Informa como se fosse uma coisa banal aparecer na festa
do Thomas .
– Seja bem-vindo. – Não tiro os olhos do palco. – Deve ter muitos
conhecidos seus por aí. A Sara e o pessoal do escritório estão se esbaldando na
pista de dança, e acho que adorarão a sua companhia.
– A Patrícia veio?
– Não. A Patrícia está de férias. Tentei convidá-la só que não consegui
entrar em contato com ela. Vocês por acaso têm se falado? – Torço intimamente
para que a resposta seja sim.
– Não. Ainda estou tentando esquecer a minha noiva. Ela se casou com
outro, porém como é linda, divertida e especial não consigo parar de sentir a sua
falta. Daria qualquer coisa para não ter aberto mão dela. – Eu me viro e encaro
os olhos tristes dele.
– Não faça isso, Marco. Não se maltrate assim. Você é um homem bom e
merece viver um grande amor. Tenho certeza de que encontrará uma mulher
maravilhosa e se apaixonará por ela e, melhor ainda, será correspondido. Quem
sabe essa mulher não é a Patrícia? Doce, suave, meiga e que acha você um deus.
– Você pode dizer o que quiser, porque nada mudará o que sinto e o que
acho. Eva, sei que poderíamos ser muito felizes juntos.
– Marco, gosto muito de você e é por essa razão que lhe peço que procure
um psicólogo. Você tem que superar, tem que tratar essa espécie de obsessão.
Estou casada, feliz e amo o meu marido, nada mudará o que sinto também,
conforme-se e siga adiante.
De repente me vejo cercada pelos meus cunhados, eles sorriem e
cumprimentam cordialmente o Marco que não se afasta de mim. A música
termina, o Thomas agradece e desabala do palco até nós com os olhos ardendo
em fúria. Chega e me beija levemente nos lábios, coloca a mão na minha cintura
e encara o Marco.
– Parabéns, Thomas. Pelo aniversário e pelo desempenho com a guitarra. –
O Marco o cumprimenta.
– Obrigado. – Apertam as mãos, e percebo o Thomas relaxar um pouco.
Os garçons chegam e nos servem. Pego um coquetel sem álcool e o
Thomas um copo de água mineral, o Marco pega um copo de uísque, o Jonas
uma taça de vinho, e o Lucas e o Douglas não aceitam nada. Seguro no braço do
Thomas e aponto para a mesa dos meus pais, que estão cercados de amigos, faço
sinal para que nos juntemos a eles, o meu marido concorda e, assim que fazemos
menção de sair, o Marco se aproxima novamente.
– Eva, tentei falar com você no dia doze e não consegui. Este ano não
tivemos a sua tradicional festa de aniversário, então gostaria de aproveitar e
entregar o seu presente agora. – Ele olha para o Thomas, e quase posso ver
faíscas.
– Obrigada, Marco, mas realmente não precisa. Agradeço a atenção, só que
a festa hoje é do Thomas, e os presentes são para ele.
– Você acha mesmo necessário me confrontar dessa maneira, Marco? –
Thomas intervém.
Jonas tira o copo da mão do Thomas e coloca juntamente com a sua taça de
vinho sobre a mesa mais próxima, e percebo que a situação está prestes a esquentar.
– Prezado Thomas, conheço a Eva há algum tempo e sempre a presenteio
no aniversário dela, não vejo nada ofensivo nisso. – Debocha, e fico realmente
preocupada com o desfecho da conversa.
Marco também coloca o copo sobre a mesa, enfia a mão dentro do bolso da
calça e a estende em minha direção, revelando uma caixinha de veludo preto
com um pequeno laço vermelho em cima e, sem saber o que fazer, recebo o
presente e agradeço.
– Por favor, abra o seu presente, e veja se gostou. – O Marco parece querer
provocar o Thomas.
– Vamos lá, minha linda, abra o presente que o atencioso Marco lhe deu. –
Thomas aceita a provocação, e fico gelada.
Coloco a taça do coquetel sobre a mesa também e abro a caixa, vejo o
conteúdo, um cordão de ouro com um pingente em forma de violão.
– Toda vez que ouço uma música me lembro de você, sentada na praia com
os cabelos ao vento, olhando o infinito e tocando violão, essa cena...
Antes que o Marco termine a frase, Thomas acerta um murro direto no
queixo dele. O Jonas e o Lucas seguram o Thomas, e o Douglas levanta o Marco
que, com o impacto do soco inesperado, se desequilibrou e caiu no chão.
Marco levanta furioso, e o Douglas tenta segurá-lo. Ele é forte e,
percebendo que conseguirá se desvencilhar, me coloco entre ele e o Thomas.
– Marco, o Douglas e o Jonas o acompanharão até a saída. – Tento encerrar
a confusão.
Jonas solta o Thomas e se coloca ao lado do Marco, pronto para
acompanhá-lo. Olho ao redor e constato que quase ninguém se deu conta da
situação constrangedora, porque a música alta e a grande circulação de pessoas
ajudaram a encobrir a cena.
– Tem razão, Eva, estou de saída. Só quero dizer que, quando o Thomas
decepcioná-la novamente, estarei esperando por você para que possamos dar
continuidade àquele nosso projeto. – Marco me encara, e fico preocupada.
Thomas se solta das mãos do Lucas e parte para cima do Marco, mas como
estou no caminho entre os dois, ele se detém para não me machucar. Abraço-me
a ele e consigo que desista da sua investida.
Ouço a risada do Marco e sinto os músculos do meu marido se retesarem
em volta de mim.
– Vá embora, Marco! E deixe a minha mulher em paz, é um aviso. –
Thomas quase grita .
O Jonas e o Douglas saem quase abraçados ao Marco, levando-o embora. O
Lucas se abaixa e pega a caixa de veludo que deixei cair no chão, examina o
conteúdo e ri com vontade.
– Não podemos dizer que o Marco não se esforça para ser inconveniente. –
Lucas diz ainda rindo.
– Por que está dizendo isso? – Thomas arqueia a sobrancelha e encara o irmão.
Lucas entrega o cordão ao Thomas, fazendo questão de que ele repare na
inscrição gravada atrás do violão.
– “Só você toca o meu coração”. É isso mesmo o que está escrito? Ele
mandou gravar uma frase dessas em uma joia para dar de presente para a
mulher de outro? O Marco não tem o menor amor à vida mesmo. – Thomas
protesta visivelmente irritado.
– Pensei que ele deixaria a Eva em paz depois do casamento de vocês, mas
me enganei. Pode deixar que farei com que ele receba esse presentinho de volta.
– Lucas tira a joia das mãos do Thomas e a guarda.
Engulo em seco, o cheiro da testosterona impregna o ar, e a expressão de
raiva no rosto do meu marido é quase assustadora, volto a abraçá-lo e ele me
aperta com força.
– Agora é oficial, quero você longe do Marco.
– Pode deixar. Farei o que for possível para manter distância.
Ficamos abraçados até que percebo que ele está mais calmo. A banda para
de tocar, e o DJ começa. A música é lenta, porque o jantar está sendo servido, e
a pista de dança fica quase vazia. Conduzo o meu marido até lá, e dançamos
agarradinhos. Os meus cunhados e as suas esposas nos acompanham, os meus
pais também, até a Lucia e o William fazem par e se unem a nós. O momento é
especial, Thomas e eu conseguimos relaxar da tensão que passamos momentos
antes, e sorrimos observando todos os que amamos dançando a nossa volta.
– Obrigado, minha linda. A festa está incrível e, com exceção de um
penetra inconveniente, estou adorando tudo.
– Eu te amo. Fico feliz que esteja gostando.
– Gostando? Estou adorando, já disse. Tudo está perfeito. Você está sempre
realizando os meus desejos, mesmo os mais secretos. – Ele sorri.
– Realizar desej os é a outra coisa que sei fazer m uito bem quando
estam os j untos.
– Tenho um desejo mega secreto que precisa ser realizado ainda hoje. –
Fala, simulando uma voz misteriosa.
– E o que será? – Pergunto me fazendo de curiosa, quer dizer, fiquei mesmo
curiosa.
– Comer uma fatia do meu bolo de aniversário em cima da barriga da
mulher mais linda que conheço. O nome dela é Eva. Acho que se ela permitir,
poderei retribuir o favor, lambendo o local em que o bolo estava, bem como os
arredores.
– Ouvi dizer que a Eva adora realizar desejos, principalmente os de um
homem bonito e gostoso chamado Thomas. – Falo, e ele ri.
– Não posso me esquecer de pedir para o garçom embrulhar algumas fatias
de bolo para levarmos para casa.
– Pode deixar comigo, amor. As fatias irão conosco, pode apostar, desejo de
aniversário tem que ser atendido, é regra.
Thomas me aperta ainda mais em seus braços, e dançamos até a música
voltar a ficar mais animada, e quando isso acontece decidimos ir jantar.
Jantamos calmamente, sentados na mesa dos meus pais, cercados de
amigos, mas algo me perturba. As palavras que o Marco disse sobre o Thomas
me decepcionar novamente me fazem lembrar o telefonema anônimo que
recebi. Será que o telefonema foi a mando do Marco para que eu ficasse
desconfiada do Thomas e a minha felicidade começasse a ruir? Não, acho que
não. O Marco não me parece ser esse tipo de pessoa. Mas é estranho a palavra
decepção ser relacionada ao Thomas pela segunda vez em poucos dias.
Pensei em contar o telefonema para o Thomas, contudo desisti. Se a
intenção de quem ligou foi a de criar atrito entre o meu marido e eu e
desestabilizar o meu casamento, não colaborarei. E se existir algo que o Thomas
fez que possa vir a me decepcionar, esse algo irá surgir mais dia ou menos dia, e
quando surgir e se for realmente grave, aí sim me preocuparei com isso. A
felicidade é a minha prioridade ultimamente e quero manter o foco nela. O resto
estou ignorando ou quase.
Epílogo
Fim