Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                
0% acharam este documento útil (0 voto)
13 visualizações52 páginas

EbookDemonstracao I - Sonhos Leni 24jul2019

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1/ 52

A Interpretação

dos Sonhos Segundo


a Escuta Psicanalítica
de Freud e Jung
Descrição e Compreensão de Fenômenos Oníricos
Leni Lourenço de Oliveira

A Interpretação
dos Sonhos Segundo
a Escuta Psicanalítica
de Freud e Jung
Descrição e Compreensão de Fenômenos Oníricos

São Paulo
2a. edição
2019
 Leni Lourenço de Oliveira, 2019

Conteúdo: Psicologia

É proibida a reprodução total ou parcial da obra, de qualquer


forma ou por qualquer meio sem a autorização prévia e por
escrito do autor. A violação dos Direitos Autorais (Lei nº 9610/98)
é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal

Oliveira, Leni Lourenço de.


A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de
Freud e Jung: Descrição e Compreensão dos Fenômenos Oníri-
cos/Leni Lourenço de Oliveira. — São Paulo: Nelpa, 2a. edição,
2019.

ISBN: 978-85-8020-684-5

Índice para catálogo sistemático:


1. Psicologia 2. Psicanálise 3. Sonhos

Capa | Diagramação
Vanessa Simão da Silva

Impressão e Acabamento
Editora Nelpa

NELPA – L. Dower Edições Jurídicas LTDA.


R. Dr. Barros Cruz, 63 – V. Mariana – 04118-130 – São Paulo/SP
Telefax: 11 3854 5493 – E-mail: sac@nelpa.com.br
www.nelpa.com.br
Dedicatória
Dedico este estudo a todos aqueles que estudam os sonhos em
todas as suas formas de manifestação, não os sonhos enquanto projetos
de vida, objeto de estudo dos empreendedores do sucesso do homem
no corpus social e profissional, mas os sonhos enquanto realização de
um desejo manifesto e insatisfeito em nossa consciência de vigília, que
por um motivo ou por outro, foram reprimidos e despejados em nossa
mente inconsciente para ali ter morada e vida independente em nossos
sonhos noturnos, matutinos e vespertinos, durante o sono, visto que
os sonhos acontecem a qualquer hora do dia ou da noite, a qualquer
pessoa, independentemente de o sonhador se lembrar do sonho ou não.
Leni Lourenço de Oliveira
Agradecimentos
Antes de tudo, agradeço a Deus pela paz, pela graça e, sobre-
tudo, por conceder-me, neste meio século de vida que tenho, o discer-
nimento necessário para escrever mais este livro, o quarto de minha
carreira como escritor amador.
Agradeço à minha família que mais uma vez viu a gestação e o
nascimento deste livro que busca levar ao leitor as noções básicas para
a interpretação dos sonhos — assunto que fascina e ao mesmo tempo
proporciona prazer aos sentidos.
Sou grato à minha ex-professora de Psicanálise, Débora Damas-
ceno, pois foi através de seus ensinamentos a respeito dos pressupostos
da obra de Sigmund Freud que tive a atenção despertada para escrever
sobre os sonhos.
Agradeço aos meus alunos que, gentilmente, em muitas opor-
tunidades tiveram a humildade de relatar-me seus sonhos para que eu
pudesse exercitar as técnicas de análise e interpretação dos sonhos que
eles todos tiveram.
Um agradecimento todo especial a todos aqueles que, inúmeras
vezes, tiveram a paciência de escutar as minhas considerações teóricas
a respeito dos sonhos, assunto, às vezes, enfadonho e tedioso àqueles
desprovidos da simpatia.
Agradeço à minha filha Patrícia Anunciada de Oliveira que gas-
tou boas horas de seu tempo no trabalho de primeira revisão deste li-
vro. Alguns apontamentos dela ao longo do texto da obra foram muitos
úteis para a minha segunda revisão.
Agradeço, também, ao Centro Universitário Ítalo Brasileiro –
UniÍtalo pela boa recepção tanto dos alunos quanto dos professores,
bem como de todos que direta ou indiretamente torceram pela publica-
ção desta livro sobre sonhos.
Por fim, agradeço ao Prof. Dr. G. C. Genofre Netto — respon-
sável pelo CEPESQ – Centro de Pesquisa UniÍtalo — pelo apoio e in-
centivo à criação do grupo de pesquisa de “Língua, Literatura, Cultura e
Identidade” do qual faço parte na Instituição.
Epígrafe
“Nós vivemos entre duas realidades: a realidade da vida obje-
tiva (realidade externa, realidade propriamente dita) e a realidade sub-
jetiva, isto é, da nossa vida psíquica (realidade interna: a realidade que
em verdade desejamos). A primeira é sempre agressiva e representa,
por isso, o desprazer. A segunda vem ao encontro daquilo que ideamos,
queremos, ou desejamos. Por isso representa o prazer.”
(Gastão Pereira da Silva)

Vous avez compris que le rêve est une producion pathologique,


le premier terme d’une série qui comprend le symptôme hystérique,
la représentation obsédante, l’idée délirante, mais qu’il se distingue
de ces manifestations morbides par sa fugacité et son apparition dans
les circonstances de la vie normale. Ce qu’ Aristole a dit, nous le répé-
tons: la vie du revê, c’est le travail qu’accomplit notre ame durant le
sommeil. En dormant nous nous détournons du monde extérieur réel et
ainsi se trouve réalisée la condition nécessaire au développment d’une
psychose. L’ étude le plus minutieuse des maladies mentales les plus
graves ne saurait nous faire découvrir de particularités plus propres
à caractériser cet état morbide. Mais dans la psychose, c’est de deux
manières différentes que le sujet se détourne de la réalité, soit que le
refoulé inconscient devienne trop puissant et écrase le conscient atta-
ché à la réalité, soit que devant une réalité trop pénible, insupportable,
le moi menacé se precipite par revolte dans les bras de la pulsion in-
consciente1.
1
FREUD, Sigmund. Nouvelles conférences sur la Psychanalyse. London: Idées/Galkimard,
1936.
Apresentação
Primeiramente, antes de qualquer coisa, este estudo tem como
objetivo comprovar que os sonhos ocorridos durante o sono do sujeito
significam a realização de desejos insatisfeitos e reprimidos no estado
psicológico de vigília. “A interpretação dos sonhos segundo a escuta
psicanalítica de Sigmund Freud e Jung: descrição, análise e compre-
ensão de fenômenos oníricos”, é um livro dirigido, prioritariamente, a
psicólogos, psiquiatras, psicanalistas, psicopedagogos, estudantes de
Comunicação, Letras, Semiótica, Teologia, Psicologia e demais pes-
quisadores e interessados pela linguagem singular dos sonhos — pro-
dução psíquica que aparece durante o sono e que pode, na terapêutica,
ser utilizada à compreensão da personalidade do indivíduo.
O texto e a redação deste trabalho de investigação e pesquisa
têm a estrutura de um tratado científico semelhante às Dissertações
de Mestrado e às Teses de Doutorado, isto é, procura-se comprovar as
assertivas por mim lançadas por meio da citação de vasto material de
apoio como subsídio teórico. A obra, na sua essencialidade, procura,
como enuncia o título, apresentar dois pontos de vista, ou duas escutas
diferentes quanto à descrição, análise, compreensão e interpretação dos
fenômenos oníricos: uma em Freud, outra em Jung, contrapondo-os.
Insisto que o texto tem característica de um tratado, foge do aspecto
de ensaio com um único intuito: incentivar o leitor à investigação, à
pesquisa.
Uma das principais preocupações dos escritos é seu caráter di-
dático; assim, no que se refere à organização do texto, além das pres-
suposições teóricas, apresenta-se, no corpus, aquilo que mais se busca
na árdua tarefa de investigação onírica: uma metodologia eficiente de
aplicabilidade para a interpretação dos sonhos não apenas do ponto
de vista teórico, mas, sobretudo, prático — o maior desejo e vontade
de quem se interessa pelos motivos geradores dos sonhos bem como
o caminho a percorrer na tentativa de entendê-los da melhor forma
possível. Assim, a cada pouco de explicação teórica, valho-me de um
exemplo prático a fim de não tornar a leitura enfadonha e cansativa.
Leia e verá.
Todavia, como era de se esperar, o texto não deixa de apresentar
o jargão psicanalítico que um trabalho desta envergadura requer na sua
contextualização. Procurei tornar os escritos didáticos a fim de que o
leitor possa, paulatinamente, passo a passo, entender os mecanismos
oníricos bem como assenhorar-se das técnicas de interpretação dos so-
nhos tanto do ponto de vista freudiano quanto junguiano. O livro está
dividido em três capítulos. Nas páginas pós-textuais, como recurso di-
dático, apresento um anexo comportando as teorias psicanalíticas de
Freud e Jung para melhor entendimento dos argumentos contidos no
meu livro.
Este livro a respeito de sonhos foi facílimo de escrever, princi-
palmente, o relato dos meus sonhos e o de um aluno/paciente. Na maior
parte das vezes bastou apenas eu ter tido um sonho, após ter sonhado,
ficava deitado com os olhos fechados durante algum tempo tentando
me lembrar de todas as imagens e quadros que vinham à minha mente.
Usava minha mente subconsciente para poder lembrar de tudo antes
que as preocupações do cotidiano invadissem meu Ego, meus pensa-
mentos, e me desviassem a atenção da tarefa de averiguação do sonho.
Em seguida, eu os registrava em um caderno de anotações, dava-lhe
um título, punha-me a narrar meu próprio sonho, para em um segundo
momento, analisá-lo e interpretá-lo como poderá ser observado duran-
te a leitura do livro. Fiz isto inúmeras vezes e continuo fazendo.
A maior parte dos sonhos que são analisados no livro não passa
de uma compilação de sonhos anotados à medida em que iam surgin-
do das lembranças em meu estado psicológico de vigília. Quero, com
a devida vênia, confessar e compartilhar com todos os leitores uma
grande descoberta, um achado incrível: depois que comecei a anotar os
meus sonhos diariamente e a analisá-los, ficou mais fácil me lembrar
deles; há dias, de manhã, ao acordar, que consigo me lembrar de três
ou até quatro sonhos e o que é inacreditável: consigo me lembrar da
sequência em que eles surgiram e aconteceram bem como o vínculo
que um tem com o outro.
Uma das grandes coisas que aprendi com a árdua tarefa de
interpretação diária dos meus próprios sonhos bem como de tercei-
ros foi a de ficar mais atento às informações contidas nos sonhos.
Muitas delas são importantes para nós porque, inúmeras vezes, nos
dão a resposta para um problema que nos atormenta, nos revela as
nossas principais preocupações, nos indicam por meio de símbolos,
aspectos tanto de nosso universo interior quanto exterior. Aliás, uma
das minhas grandes buscas quando iniciei o trabalho de interpretação
dos sonhos era verificar se realmente os sonhos revelavam-nos al-
guma coisa de nós mesmos. Resultado após pesquisa e observação:
revelam sim. E muito. Faça o teste você também: comece a analisar
teus sonhos.
Gostaria que você leitor não lesse este livro em “uma sentada
só”, como geralmente nós fazemos quando lemos um romance ou uma
novela, um conto, uma notícia de jornal ou um artigo de uma revista
qualquer. Como se trata de um trabalho de pesquisa e consulta a uma
grande quantidade de autores, seria bom que lesse um tópico de cada
vez e em seguida refletisse a respeito dele, porque com toda a certeza
vai conseguir reter melhor o conteúdo teórico e, por conseguinte, todo
o conteúdo prático: a série de sonhos que são analisados ora sob a ótica
de Freud ora sob a ótica de Jung. Leia-o como se tivesse construindo
uma casa, veja com o tempo os insights e cada parte do conhecimento
(partes da casa) surgindo no seu devido tempo.
Além de professor universitário de Comunicação, Letras e Se-
miótica, sou, também psicanalista com especialização em escuta psica-
nalítica freudiana e o exercício profissional com pacientes na clínica
tem provado para mim que o relato do sonho do paciente é muito im-
portante para o tratamento de sua neurose. A interpretação dos sonhos é
um meio muito eficaz para saber o que está acontecendo com o pacien-
te bem como para saber como o paciente funciona do ponto de vista de
sua organização como sujeito. Assim, aconselho o leitor que se identi-
ficar com o livro a adentrar-se dentro de si mesmo para se surpreender
com as revelações que os sonhos trazem e tudo aquilo que eles dizem
de nós sem censura.
Ao final do livro apresento as principais referências bibliográfi-
cas utilizadas para a redação do texto, as quais podem servir de subsí-
dio teórico para futuras investigações pertinentes aos sonhos por parte
de quem se interessa pela temática aqui apresentada. A lista (cento e
poucos livros de referências) pode parecer aparentemente grande, mas
não é. Nela, 99% (noventa e nove) do material apresentado está tradu-
zido para a Língua Portuguesa. Tive este cuidado por selecionar textos
no idioma pátrio com o objetivo de tornar o leitor familiarizado com a
leitura de textos em sua própria língua. Entretanto, é bom que se saiba
que existe vasto material sobre sonhos publicado em língua estrangei-
ra e para o leitor poliglota não custa nada consultá-lo. Convém ler.
Como líder de um Ministério Bíblico de uma Igreja Evangélica
e recém-pregador da Palavra de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo,
desejo uma boa leitura. Fique com a paz, a graça e o discernimento de
Deus. A paz para se sentir tranquilo(a), a graça para se sentir protegido
e, sobretudo o discernimento, para poder aprender, apreender e in-
corporar os ensinos por intermédio da práxis — segundo o marxismo,
conjunto de atividades humanas que promovem a transformação da
organização social. Em outras palavras: exercício prático de um conhe-
cimento, aquilo que se pratica habitualmente.
Bons sonhos!
Sumário
INTRODUÇÃO............................................................................................21

CAPÍTULO I

1SONHOS: UMA REALIZAÇÃO DE DESEJOS.......................................39


1.1 Sonho: realização de desejos e linguagem simbólica...........................44
1.2 Visão popular e bíblica do sonho..........................................................49
1.3 O homem e seus símbolos....................................................................53
1.4 Desejos e sonhos: a relação de causa e efeito do sonhador..................57
1.6 Incompreensão e esquecimento dos sonhos..........................................65
1.7 O sonho e a vigília: dois momentos do sonhador.................................71
1.8 A consciência e a inconsciência psicológica para o entendimento do
sonho...........................................................................................................74
1.9 A irrupção do sonho do ponto de vista fisiológico e orgânico. ............77
1.10 Os sonhos e a compreensão dos processos e conteúdos mentais
inconscientes...............................................................................................80
1.11 O trabalho do sonho: condensação e deslocamento..............................86
Exemplo de condensação nos sonhos.........................................................89
Conteúdo manifesto....................................................................................89
Análise do sonho. .......................................................................................90
2º sonho: fragmentos. .................................................................................93
Conteúdo manifesto. ..................................................................................93
Análise do sonho. .......................................................................................94
1.12 Excitações sensoriais somáticas internas, subjetivas, na irrupção do
sonho. ..........................................................................................................97

CAPÍTULO II
2 SONHO, EMOÇÃO E ESTRUTURA PSÍQUICA................................. 100
2. 1 Fontes psíquicas de estimulação onírica. ............................................ 100
2.2 Emoções e estrutura mental do sujeito................................................. 104
2.3 Prestígios e problemas do sono e dos sonhos...................................... 105
2.4.Sonhos – o caminho régio para o inconsciente segundo Jung.............. 111
2.5.Inconsciente coletivo conforme Carl Jung. .......................................... 114
2.6.Generalidades sobre os sonhos............................................................. 116
2.7.Método de interpretação dos sonhos: associações livres, ab-reações e cura
psicanalítica................................................................................................. 119
2.8.Inconsciente coletivo, símbolos naturais e culturais............................. 121
2.9.A análise dos sonhos............................................................................. 124
Sonho de um aluno/paciente....................................................................... 126
Interpretação............................................................................................... 127
2.10.A natureza dos sonhos......................................................................... 131
2.10.1.Os sonhos tópicos: sonhos sobre mortes de pessoas queridas....... 133
2.11.Os processos primários e secundários: recalque................................. 137
2.12.A inconsciência e a consciência – realidade....................................... 139

CAPÍTULO III
3.SONHOS: SÍMBOLOS DE TRANSFORMAÇÃO................................ 142
3.1.Temas oníricos comuns....................................................................... 143
3.2.Considerações gerais sobre os sonhos e sua interpretação................. 148
3.3.Sonhos de natureza sexual.................................................................. 150
1º sonho....................................................................................................... 151
História do conteúdo manifesto................................................................ 151
Interpretação............................................................................................. 151
2º sonho. ..................................................................................................... 153
Interpretação............................................................................................. 154
3º sonho....................................................................................................... 155
Resistência: conversa com Antonio Carlos............................................... 155
Conteúdo manifesto.................................................................................... 155
Interpretação. ............................................................................................. 155
Conteúdo latente. ....................................................................................... 155
3.4.Os sonhos decorrentes de estímulos sensoriais externos...................... 158
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................... 163
BIBLIOGRAFIA........................................................................................ 169
ANEXO I.................................................................................................... 179
TEORIAS PSICANALÍTICAS DE FREUD E JUNG............................... 179
A teoria da personalidade segundo Sigmund Freud.................................... 179
A dinâmica da personalidade – o instinto................................................... 181
O desenvolvimento da personalidade. ...................................................... 183
Associações livres....................................................................................... 184
Teoria psicanalítica de Carl Jung................................................................ 186
INTRODUÇÃO

Uma função psíquica encarregada de compensar, de su-


avizar, de substituir mesmo, uma realidade que nos é
hostil, por outra, totalmente diferente, onde um novo
mundo se descortina diante da alma e onde todas as nos-
sas ações parecem absurdas, justamente porque as mais
censuráveis, na sociedade em que vivemos, gozam, en-
quanto dormimos, de uma espécie de liberdade condi-
cional, quando se expandem nos sonhos.

(Gastão Pereira da Silva)

Já se antevê nas palavras de Gastão Pereira da Silva, um dos


mais estudiosos pesquisadores dos fenômenos oníricos, que nossos
sonhos1 substituem a realidade que nos é desagradável, quando es-
tamos em estado de adormecimento, por um mundo encantado onde
a censura — típica do estado de vigília — é amortecida de nossos
olhos como que num passe de mágica. Em nossos sonhos tanto diur-
nos quanto noturnos, ações, atos e pensamentos e sentimentos surgem
para nós com uma linguagem hieroglífica e sobrecarregada de signi-
ficação, a qual requer do interpretador conhecimento dos mecanismos
do inconsciente para se fazer a interpretação dos sonhos. As experi-
ências de nosso cotidiano são muito importantes para a nossa vida,
pois é através dessas experiências, segundo Freud, que se deflagram
os sonhos.
1
O trabalho de Freud sobre os sonhos foi o primeiro contacto que ele estabeleceu entre
Psicanálise e Psicologia Geral. Nesse tempo (1900), os sonhos eram universalmente consi-
derados como indignos de serem estudados por um investigador científico sério, porque se
acreditava que eram produzidos por perturbações físicas irregulares do cérebro durante o sono,
de modo que qualquer tentativa para lhes atribuir um significado psicológico adquiria um sabor
de adivinhação. É verídico que a essência da teoria dos sonhos de Freud não obteve sequer
qualquer aceitação excepto às mãos de outros investigadores, mas reconheceu-se, graças ao
seu trabalho, que o estudo dos sonhos não é só uma parte séria da Psicologia como uma das
mais importantes, e ainda que é do maior valor prático no tratamento de desarranjos nervo-
sos em que é necessário penetrar nas camadas profundas da mente. JONES,21 Ernest. O que é
Psicanálise, p. 59.
A coisa mais incrível e natural que faz parte de nossas expe-
riências diárias é o sonho que temos durante o nosso sono — ele-
mento indispensável para recobrarmos nossas forças físicas e mentais
desgastadas em nossas atividades de estado psicológico de alerta: a
vigília. Embora todos saibamos que o sono provoca o relaxamento
das atividades vitais de nosso organismo, qualquer um já teve uma
experiência onírica baseada na seguinte assertiva: em vez de o sono
provocar a diminuição da tensão mental e, por conseguinte, a sensação
de repouso, ele provocou foi um mal-estar tão grande que o sujeito
fora obrigado a acordar para se dar conta e ficar aliviado ao saber que
tudo não havia passado de um mero sonho, todavia as reações psicos-
somáticas permaneceram vívidas na mente do indivíduo. Por que isso
ocorre?
Ocorre porque o nosso cérebro durante o sono não diferencia
uma imagem real de uma imagem imaginária e involuntária, como é
o caso das imagens, ideias e pensamentos que surgem durante a irrup-
ção do sonho. É por esse motivo que todos nós acordamos apavorados
após ter tido um pesadelo, sonho aflitivo com sensação de angústia e
de opressão. Durante o pesadelo, sem a nossa consciência da vigília,
22 toda a carga emotiva gerada pelas imagens, ideias e pensamentos ir-
rompidos nos sonhos foi interpretada pela nossa mente inconsciente
como fatos reais. Isto é incrível. É a manifestação do inconsciente.
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

Precisamos conhecer o inconsciente — essa região obscura


e fonte ilimitada de conhecimentos. Conhecer é pouco: precisamos,
na verdade, entender como é que ele funciona, aí sim seremos mais
bem-sucedidos em nossa árdua tarefa de interpretação dos sonhos. Os
sonhos — sequência de fenômenos psíquicos (imagens, atos, ideias
etc.) que involuntariamente ocorrem durante o sono — sempre re-
presentam, na sua função complexa, segundo Freud, a realização de
um desejo do sujeito, desejo esse que por um motivo ou por outro foi
impedido de ser realizado no seu devido tempo e lugar no estado de
vigília.
Pode supor-se que os desejos impedidos de serem realizados
no estado de vigília encontram nos sonhos a sua realização porque na
mente do sujeito adormecido o desejo ainda existe e o atormenta no
inconsciente — local onde esses desejos estão alojados e esperando
para continuar influenciando as atitudes do indivíduo. Esse incons-

Leni Lourenço de Oliveira


ciente é dinâmico e:

Trata-se do processo pelo qual os elementos mentais


assustadores e inaceitáveis (desejos, pensamentos, per-
cepções) são afastados da percepção consciente, mas
continuam a exercer influência, seja pressionando para
aflorar na consciência ou manifestando-se por desloca-
mento ou disfarce em sintomas psicológicos, sonhos,
lapsos de linguagem ou distúrbios somáticos, doenças 23
físicas (MOLLON, 2005, p. 59).

Os sonhos que irrompem do nosso sono revelam-nos com uma


linguagem sui generis uma das formas como o inconsciente se apre-
senta para nós com seu modo específico de falar. É uma fala, se é
que se pode afirmar que se trata de uma fala, que se configura em
linguagem hieroglífica e, não-raro, indecifrável: tamanha a quantida-
de de símbolos, imagens desconexas e mais uma infinitude de ma-
terialidades de significados verbais que, para serem compreendidos,
necessitam de um trabalho de desconstrução, isto é, de interpretação2.
Entretanto, os sonhos tratam-se, sim, de uma fala, porque, na sua es-
sencialidade, reproduzem algo que o inconsciente tem para nos dizer,
ainda que em linguagem simbólica. O inconsciente, por intermédio
dos sonhos, diz aquilo que tem para dizer mesmo sem o conhecimento
ou sem a audiência do réu, que somos nós: trabalha por conta própria.
Não é sem espanto, tampouco raro, que nos questionamos se
a fala que se apresenta nos sonhos irrompidos pelo inconsciente per-
tence realmente a nós mesmos (um Outro, um duplo faz parte de nós).
Porque é uma linguagem diferente daquela que usamos para o proces-
so e a práxis de comunicação hodierna, mas nem por este motivo ela
deixa de ser uma linguagem: metafórica, metonímica, com desloca-
mentos, condensações. Os sonhos se apresentam como enigma a ser
decifrado por meio de uma linguagem que lhe é peculiar e que, não

2
São essas precisamente as dificuldades primordiais na interpretação dos sonhos, pois eles se
utilizam de símbolos. Para cada ideia procuram uma imagem visual, que há de encobrir forço-
samente uma ideia oculta... O símbolo é sempre uma comparação particularíssima que, para ser
traduzida, depende de penetrante reflexão, posto que muitos permanecem intraduzíveis. A não
ser nesses casos, os símbolos também variam de acordo com a formação personalíssima de cada
um de nós – inteligência, cultura, sentimentos etc. SILVA, Gastão Pereira da. Compreender
Freud, p. 66.
resta a menor dúvida, nos dá muito trabalho para decifrar, enquanto
“realização de desejos” — pressuposto fundamental da prática ana-
lítica freudiana3 — onde os desejos ocultos assumem configurações
sígnicas, deveras herméticas e complexas, na sua essência.
Os sonhos são a mais viva expressão — fala —, de uma outra
região psíquica, afora da consciência normal, uma segunda consciên-
cia, dir-se-ia. “E é exatamente esta segunda consciência, que, excitada
pela vida exterior, se projeta na tela psíquica, acompanhada por ve-
zes de sentimentos, de ideias, de impressões fornecidas por sentidos
diferentes dos da vida, mas sempre predominando as imagens visu-
ais, que nos acompanham nos sonhos”4. É nos sonhos, nesta segunda
consciência, que essas ideias, desejos e sentimentos, tudo aquilo que
é vergonhoso, desagradável ou penoso, tudo aquilo que foi reprimido
por um processo de defesa psíquica, aflora e se manifesta sem a nos-
sa permissão: vive-se uma outra vida, tudo se expande e toma novos
contornos. Quebra-se todos os códigos e preceitos morais, os tabus
somem.
Os sonhos, reservatório de experiências individuais ou coleti-
24 vas do cotidiano (como salienta Jung em sua escuta analítica), estrada
principal para se chegar ao conhecimento da alma, do inconsciente,
são “símbolo da aventura individual, tão profundamente alojado na
intimidade da consciência que se subtrai a seu próprio criador, o so-
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

nho nos aparece como a expressão mais concreta e mais impudica de


nós mesmos” (CHEVALIER e GHEERBRANT, 2001, p. 844). Isto
não quer dizer outra coisa senão que nós, nos sonhos, passamos a ser
nós mesmos e nos despojamos das falsas aparências: nele, caem todas
as nossas máscaras e todos os disfarces que alimentam nosso estado
psicológico de vigília de sujeito pessoal. Como o inconsciente é atem-
poral e desconhece o passado, presente ou futuro, todos os valores
sociais, da mesma forma, são ignorados.
É engraçada a forma como tudo se desenvolve e se desenrola
em nosso cérebro durante o sono. Muitas vezes, durante o sono, no
desenvolvimento do sonho, acontece exatamente aquilo que gosta-

3
O sonho, qualquer que seja o sentido oculto que encerra, é quase sempre uma realização de
desejos. Entretanto, a análise mostra frequentemente que a realização de desejos nem sempre
é causa de prazer para quem os abriga. Ibidem, p. 68.
4
SILVA, 1968, p. 65.
ríamos que tivesse acontecido quando estávamos acordados, ou, ao

Leni Lourenço de Oliveira


contrário, acontece exatamente aquilo que gostaríamos que não acon-
tecesse, principalmente quando se refere aos nossos piores medos e
aos nossos piores desejos, aqueles desejos que mais repudiamos e gos-
taríamos que permanecessem conosco e fossem levados para o nosso
túmulo após nossa morte física. Categoricamente, é assim que tudo
funciona em se tratando de sonhos, eles, os sonhos, não representam
apenas momento de prazer, surgem neles, também, aquilo que menos
25
queremos nos lembrar: repressão e recalque, este involuntário, aquele
voluntário.
Hoje é sabido, conforme Silva (1968), que os momentos de
prazer e desprazer referentes à nossa vida psíquica surgem porque nós
vivemos imersos em duas realidades: uma objetiva e outra subjetiva.
A realidade objetiva é a representação in loco, no estado de vigília, de
todas as nossas percepções, pensamentos, ideias, sentimentos, frus-
trações, isto é, a realidade propriamente dita da vida objetiva. Já a
realidade subjetiva pode ser interpretada como aquela realidade que
realmente queremos e desejamos para nós.
A realidade objetiva normalmente caracteriza-se por ser agressi-
va, portanto, ela nos causa desprazer; por outro lado, a realidade subje-
tiva, a interna, revela aquilo que ideamos, queremos, assim, ela sempre
causa prazer aos nossos sentidos porque satisfaz os nossos desejos. Neste
contexto, está em jogo o princípio do prazer em oposição ao princípio da
realidade — a eterna dicotomia humana.
Os sonhos funcionam como um elemento compensador de
vontades ou desejos reprimidos pelo indivíduo em seu estado psicoló-
gico de alerta, isto ocorre porque aquele desejo que por um motivo ou
outro não foi satisfeito continua a exercer seu papel em nosso universo
interior. É como se habitassem (ratifico o que já disse) dentro de todos
nós dois seres distintos: um que busca refrear-se de algo que o preju-
dica de alguma forma; outro, diametralmente oposto, que se sente bem
em ser prejudicado; dá-se a impressão, em nossas relações pessoais e
interpessoais, que quase sempre a voz desta segunda pessoa existente
dentro de cada um5 é a vencedora na luta entre o não-querer e o querer
que travamos conosco mesmos o tempo todo.

5
Porque em cada um de nós existe um Outro ente que, na maior parte do tempo, nós o des-
O sonho, exteriorização de um processo psíquico inconsciente,
involuntário, apresenta a realidade interior não como a supomos ou
desejamos, mas como de fato é: a manifestação dessas formas sobre as
quais não temos o verdadeiro controle da situação. Sob esta perspecti-
va, decifrar os significados das imagens dos sonhos é a chave para se
conhecer o estado mental do indivíduo, entender as razões e origens
de doenças e sofrimentos psicológicos. Aqui entram as duas razões
para a interpretação dos sonhos: seu conteúdo manifesto, a história do
sonho (o efeito), e seu conteúdo latente, aquilo que realmente motivou
a realização das imagens oníricas durante o sono (a causa).
Apesar de só no final do século XIX e começo do século XX o
sonho ter sido estudado científica e exaustivamente por Freud, isso não
significou que antes disso não houvesse a preocupação com as mani-
festações oníricas. Assim, é possível afirmar, sem nenhuma contradição
efetiva, que todo ser humano desde o primórdio da civilização certamen-
te já sonhou (e se preocupou com o significado de seus sonhos), e não
são poucos os registros históricos que comprovam esse fato. Santo Agos-
tinho, uma das quatro grandes figuras que estruturaram a Igreja Latina,
por exemplo, ao lado de São Jerônimo, São Gregório e São Ambrósio,
26 era, no seu tempo, atormentado pelas memórias oníricas. Nelas, o bispo
da Igreja Católica chega a afirmar categoricamente:

Mandais-me, sem dúvida, que me abstenha da “concu-


A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

piscência da carne, da concupiscência dos olhos e da


ambição do mundo. Ordenaste-me que me abstivesse
das relações luxuriosas. Quanto ao matrimônio, apesar
de o permitirdes, ensinaste-me que havia outro estado
melhor. E porque mo concedestes, abracei-o antes de
ser nomeado dispensador do vosso Sacramento. Mas
na minha memória, de que longamente falei, vivem
ainda as imagens de obscenidades que o hábito inve-
terado lá fixou. Quando acordado, me vem à mente,
não tem força. Porém, durante o sono, não só me arras-
tam ao deleite, mas até a aparência do consentimento
e da ação. A ilusão da imagem possui tanto poder na
minha alma e na minha carne, que, enquanto durmo,

conhecemos, que nos fala através dos sonhos, comunicando-nos que nos vê de maneira bem
diferente daquela pela qual nos vemos. É por isso que quando nos vemos em situação difícil
e insolúvel, esse estranho pode nos esclarecer com uma luz mais capaz do que qualquer outra
de modificar a atitude que nos colocou no impasse. CALUF, Emir. Sonhos, complexos e per-
sonalidade, p. 66.
falsos fantasmas me persuadem a ações a que, acor-

Leni Lourenço de Oliveira


dado, nem sequer as realidades me podem persuadir
(AGOSTINHO, SANTO, 1980, p. 191).

Como se vê, Santo Agostinho, sem o saber, já pressentia, em-


bora desconhecesse a estrutura do aparelho psíquico, que seria mon-
tado muitos séculos mais adiante no espaço e no tempo, que existia
dentro de si, durante a manifestação do sono, uma voz fantasmagóri-
ca, um voz do mal, demoníaca (dir-se-ia do ponto de vista religioso), 27
que o atormentava e o incitava a praticar algumas ações que o estado
psicológico de vigília o impedia de realizar por causa da censura.
Hoje, com o advento e desenvolvimento da Psicanálise, nós
sabemos, e muito bem, que essa voz interior que se manifesta nos áti-
mos oníricos chama-se inconsciente e é por intermédio dele que toda
a trama onírica se desenrola durante o sono do indivíduo. Percebe-se
neste curto trecho do discurso de Santo Agostinho a presença do Ego,
Id — o elemento inconsciente que o leva a realizar nos sonhos os de-
sejos reprimidos — e do Superego — o censor social com todo bula de
normas e regulamentos para serem obedecidos por todos.
Após buscar uma interpretação para o significado de um sonho
tido durante o sono, nós podemos nos surpreender com a quantidade
de informações oriundas do nosso estado de vigília nele inseridas.
Contudo, a forma de representação e manifestação das imagens oní-
ricas, advindas do estado de vigília, sofre profundas transformações
na sua forma de expressão onírica. Essas imagens com que o sonho
se manifesta se aproximam muito das ilusões delirantes das psicoses
uma vez que tudo que o conteúdo manifesto — a imagem — nos
apresenta com uma linguagem mais ou menos simples, todavia, seu
conteúdo latente — a origem da imagem — se apresenta como uma
linguagem extremamente complexa e simbólica por sua natureza.
Inclusive, os próprios estudos de Freud sobre a interpretação
dos significados dos sonhos durante o sono apontam convergente-
mente para essa direção. Para Freud (apud FADIMAN e FRAGGER,
1986, p. 17), “um sonho, então, é uma psicose, com todos os absurdos,
delírios e ilusões de uma psicose. Uma psicose de curta duração, sem
dúvida, inofensiva, até mesmo dotada de uma certa função útil, intro-
duzida com o consentimento do indivíduo e concluída por um ato de
sua vontade”. Todos os acontecimentos oníricos ocorridos durante o
sono não são gratuitos e estão sob o jugo de uma determinação.
Como não existe uma descontinuidade e nada acontece sem
nenhuma explicação em nossa vida mental, segundo o determinismo
psíquico, cada pensamento, cada memória, cada ação possui um sig-
nificado. Assim, decifrar os significados das imagens dos sonhos é
a chave para se conhecer o estado mental do indivíduo, entender as
razões e origens de doenças e sofrimentos psicológicos. Há uma gama
de situações presentes nos sonhos durante o sono que ora nos tornam
felizes, ora nos atormentam sobremaneira em função de seu conteúdo
ora prazeroso, ora sem prazer na sua contextualização.
Como já se disse, a nossa mente inconsciente não diferencia
uma coisa realmente acontecida em relação a alguma coisa produ-
zida ou imaginada, ou criada, em nosso mundo de ideias, com todos
os detalhes possíveis e imagináveis. Assim, nossos sentidos reagem
à emoção como se ela fosse verdadeira e sofremos muito por isso; e
felicidade e tormento são emoções que vivenciamos constantemen-
te em nosso estado de vigília. Esta mesma felicidade e este mesmo
28 tormento têm a sua presentificação durante o desenvolvimento das
imagens oníricas durante o sono: assim, nos sonhos, vivenciamos as
mesmas emoções do estado de vigília. Para entender o que os sonhos
nos dizem é necessário que compreendamos o que está à superfície e
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

o que está na sua interioridade.


Os sonhos, para a sua irrupção, não seguem apensas um motivo
para a sua complexa formação. Exemplificando: como se sabe, nos
sonhos, após uma tentativa de interpretação de seu conteúdo latente
— aquilo que subjaz ao conteúdo manifesto — verifica-se, por exem-
plo, que uma conversa que tivemos6 com alguém, durante o estado de
vigília — quando estávamos acordados — a respeito de um assunto,
ou algumas imagens visuais ou impressões sensoriais quaisquer que
tivemos e às quais demos pouca importância, podem, por condensação
(assunto de que trato mais adiante), reaparecer com uma nova roupa-
gem, diferente da conversa e da imagem originais que tivemos.

6
Nous rêvons de ce que nous avons vu, dit, désiré ou fait; sonhamos com o que vimos, disse-
mos, desejamos ou fizemos. FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos, p. 28.
Assim, a imagem original que reaparece nos sonhos de uma

Leni Lourenço de Oliveira


experiência vivida na vigília transforma-se em algo diferente, con-
tudo, não deixa de atribuir e significar algo de extrema importância
para nós, visto que o sonho não representa uma descontinuidade e
sim uma continuidade de situações que se desenrolaram em nosso
estado psicológico de alerta. Dentro desta perspectiva, segundo Che-
valier e Gheerbrant (2001), o papel do sonho, talvez o mais funda-
mental, é estabelecer no psiquismo de uma pessoa uma espécie de
29
equilíbrio compensador7, uma manifestação inconsciente para suprir
uma privação do estado e vigília.
Se durante o estado de vigília nós vimos a imagem de um idoso
de cãs brancas, ou se conversamos com alguma pessoa a respeito do
assunto “idade”, por exemplo, nos sonhos essas imagens são recupe-
radas, principalmente se elas foram mal resolvidas durante o estado
psicológico de alerta. Estas duas experiências (cãs e idade) nos che-
gam à mente, após acordarmos do sono, sobrecarregadas de outras
informações sobre as quais não temos muita consciência, provavel-
mente devido aos processos de repressão e recalcamento, mecanismos
de defesa distintos chamados também de defesa do Ego.
Eu, por exemplo, sonhei certa vez com um professor de cãs
brancas que me dizia ter sido meu mestre escolar em 1972 e que ele
tinha uma quantidade “X” de anos. Mais especificamente, 72 (setenta
e dois) anos de idade. Era esta exatamente esta a idade do pai de um
amigo meu, conforme o diálogo que tínhamos tido durante uma noite
de meados de um outono já passado. Mais tarde, nessa mesma noite,
assisti a um programa televisivo de entrevista, e nele tanto o entre-
vistador quanto o entrevistado tinham cãs brancas tal qual eu havia
sonhado durante o sono.
No sonho nós — eu e o professor — conversávamos a respeito
de educação e de titulação universitária — um dos assuntos sobre o
qual mais gosto de conversar — e a personagem do sonho com quem
eu dialogava se parecia muito com o finado ator hollywoodiano Mar-

7
Deve-se observar que nos casos normais a compensação se produzia nas perspectivas de
Freud, segundo uma linha horizontal, isto é, no mesmo nível da sexualidade, enquanto, segun-
do Jung, todo equilíbrio psicológico do ser se faz, entre seus planos conscientes e seus planos
inconscientes, na dimensão da verticalidade, tal como num veleiro, o equilíbrio entre a vela e
quilha. CHEVALIER e GHEERBRANT. Dicionário de símbolos, p. 846.
lon Brando (em um dia anterior a este episódio eu havia conversado
com meus alunos universitários a respeito de um filme cujo persona-
gem principal era exatamente esse ator a que me refiro aqui). As úl-
timas imagens visuais que havia visto pela tevê mais a conversa com
meus alunos motivaram a construção desse sonho, ou seja, os sonhos
se encarregaram de fazer a condensação dos conteúdos latentes em
um conteúdo manifesto aparentemente simples. Mas não é simples,
não.
Em outras palavras: em meus sonhos, imagens e audições do
estado de vigília se misturaram com desejos pessoais, com assuntos
sobre os quais queria ter conversado, mas que por um motivo ou por
outro fui impedido de realizar; então, o sonho se encarregou de re-
alizar esse desejo para mim, de modo fragmentado e desconexo. O
sonho revelou-me, com sua linguagem sui generis, um estado mental
de ansiedade do meu estado de vigília. Esse curto episódio ocorrido
comigo corrobora a tese de Freud de que os sonhos representam para
nós sonhadores a realização de um desejo ou vontade inconclusa que
por um motivo ou outro deixou de se realizar. Isto é fato.

30 Essa breve interpretação de meu sonho tem uma relação sig-


nificativa ligada diretamente com experiências diárias do estado de
vigília de 2 (dois) dias respectivamente. Isto quer dizer que uma forma
de manifestação onírica pode estar associada a algo bem recente que
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

aconteceu em nossas vidas e que isso deveria ser resolvido, mas como
não foi, o guardião do sono, o sonho, se encarregou desta tarefa desen-
cadeadora de ansiedade e não-raro de frustração.
Isso prova a autenticidade de um dos pressupostos mais im-
portantes de Freud de que o sonho nada mais é do que a realização de
nossos desejos insatisfeitos, de nossas vontades reprimidas que foram
deslocadas para a camada inconsciente de nosso aparelho psíquico
— depositário de todas as nossas lembranças, pensamentos, ideias e
experiências vividas.
É uma pena que o elemento reprimido ainda faça parte da psique,
apesar de inconsciente, e que continue a ser um problema, dir-se-ia, do
ponto de vista psicanalítico. Isto quer dizer que jamais podemos dele-
tar de nossa estrutura psíquica as experiências vivenciadas no cotidiano.
Nós podemos, assim como na pretensão de guarda de um segredo, dizer
que jamais revelaremos algo que alguém nos pediu para guardar sigilo;

Leni Lourenço de Oliveira


dizemos isso a outrem conscientemente e acreditamos no que pensamos,
todavia desconsideramos o fator inconsciente — o elemento que por ser
atemporal, foge à censura do Ego e do Superego e que não tem medo de
superpor ao que queremos tirar da consciência, aquilo que se nos revela
como interdito. É ele que desmente nossas afirmações, ou melhor, rea-
firma, a verdade.
Como se vê, fazer a interpretação dos sonhos que se têm du- 31
rante o sono não é tarefa fácil por parte do interpretador, visto que,
examinada assim a condição do homem durante o sono, vemos que
são muitos os fatores capazes de influir na produção dos sonhos. Eis
aqui um grande problema a ser desvendado devido à sua extensão,
altura e profundidade.
Desse modo, o maior problema que a pesquisa suscita, nestas
linhas introdutórias, é trazer à tona os verdadeiros motivos que incen-
tivam a produção onírica. Possíveis hipóteses para o entendimento e
interpretação dos sonhos seriam a análise da literatura científica que
trata dos problemas dos sonhos, o método de interpretação, a análise
do sonho como a realização de um desejo, a distorção dos sonhos, o
trabalho dos sonhos bem como a psicologia dos processos oníricos.
“A interpretação dos sonhos”, de Sigmund Freud, é a pedra
basilar para a construção deste estudo que se estrutura na formulação
da tese de que os sonhos representam, quase sempre de modo obscuro,
a realização de um desejo8 reprimido do Ego. Outra: este desejo pode
ser realizado de forma positiva ou negativa, isto é, tanto aquilo que se
deseja veementemente quanto aquilo que se repugna mais veemen-
temente ainda são, por via onírica, re(apresentados) com uma outra
roupagem, com uma linguagem hieroglífica que incita a interpretação
por parte do sujeito sonhador: todos nós, porque todos sonhamos, uns
mais, outros menos, mas todos sonhamos.
A obra de Sigmund Freud intitulada “A interpretação dos so-
nhos”, o que se tem de mais importante sobre sonhos nos dias de

8
Que a realização de um desejo reprimido constitui a essência do sonho, ideia de que Freud já
suspeitara, confirmou-se pela primeira análise completa que realizou, de um de seus próprios
sonhos, numa quarta-feira, 24 de julho de 1895, um momento verdadeiramente histórico; esse
sonho é conhecido pela denominação de “a injeção de Irma”. JONES, ERNEST. Vida e Obra
de Sigmund Freud, p. 350.
hoje, mesmo após mais de cem anos (estamos no ano da graça de
2011) de publicação do compêndio, retrata e relata, na sua essencia-
lidade, toda a problemática relativa ao sonho. Freud faz um passeio
histórico pelo terreno do pensamento mítico e lendário para demons-
trar ao leitor as diversas formas como os sonhos foram interpretados
ao longo do tempo, desde as sociedades arcaicas, da visão religiosa,
até o final do século XIX e meados do século XX – instante em os
sonhos foram, definitivamente, retirados dos contornos dos manuais
torpes de magia negra.
É um livro de um psicanalista, escrito para ser lido, a meu
ver, por outros psicanalistas visto a quantidade enorme do jargão e
vocabulário típicos da Psicanálise. Um leitor ocasional da obra freu-
diana certamente encontrará muita dificuldade para o entendimento
de alguns termos e conceitos psicanalíticos como, por exemplo, o
capítulo em que Freud escreve sobre a fonte onírica dos sonhos: os
estímulos internos e externos. Assim, ler Freud com um bom dicioná-
rio de Psicanálise é uma sugestão sempre bem-vinda, porque além de
elucidar um termo complexo, familiariza o leitor com o assunto que
está sendo abordado.
32
Este livro de Freud — um livro/tese — nos traz muita informa-
ção a respeito dos sonhos e sobre a forma como eles são produzidos
em nosso aparelho psíquico. Por meio de uma estratégia metodológica
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

argumentativa sui generis, Freud nos apresenta os assuntos de uma


forma tão organizada que se torna impossível não compreender a tese
que pretende defender: a de que os sonhos são, na sua essencialida-
de, a realização de um desejo. Didaticamente, configura sua obra por
meio do método indutivo, isto é, relata aquilo que já se conhece sobre
os sonhos, aquilo que é particular (ou que foi em momentos anteriores
à sua descoberta), para depois, em um segundo momento, apresentar
outra concepção, outra verdade geral.
“A Interpretação dos sonhos” é um daqueles livros que desper-
ta em nós as mesmas reações psicossomáticas — se formos cristãos é
claro — que a Sagrada Escritura, porque, assim como a Bíblia, vemos
no livro de Freud, no seu conjunto organizacional, a demonstração de
verdades das quais podemos fazer uso em nossa vida o tempo todo. É
um livro que devemos ter na estante de nossa casa, e dir-se-ia que tudo
o que foi produzido depois de “A interpretação dos sonhos” são relei-
turas da obra primeira de Freud. Sob esta perspectiva, enquadram-se

Leni Lourenço de Oliveira


os estudos de “Psicologia Analítica” do ex-discípulo de Freud, Carl
Gustav Jung, do qual temos muito que falar neste estudo, porém, no
seu devido tempo e, sobretudo, lugar.
Os estudos de Freud sobre os sonhos envolveram uma pesquisa
histórica, filosófica e literária. A literatura e as artes plásticas podem
se beneficiar muito com as contribuições teóricas de Freud sobre os
sonhos. Dentro dessa perspectiva, os sonhos revelam o desenrolar e a 33
eficácia de um processo analítico. Ou como o próprio Freud argumen-
ta em “A literatura científica que trata dos problemas dos sonhos”: (...)
“Apresentarei provas de que existe uma técnica psicológica que torna
possível interpretar os sonhos, e que, quando esse procedimento é em-
pregado, todo sonho se revela como uma estrutura psíquica que tem
um sentido e pode ser inserida num ponto designável nas atividades
mentais da vigília” (FREUD, 1999, p. 22).
Por fim, segundo o consenso geral, “A interpretação dos so-
nhos” é a obra-prima de Freud e aquela que será provavelmente mais
duradouramente lembrada. Como bem assevera Jones (1979, p. 349),
biógrafo do Pai da Psicanálise, em “Vida e obra de Sigmund Freud”,
“o livro é caracteristicamente exaustivo. O tópico essencial, a inves-
tigação da vida psíquica, foi levado a efeito com tal minúcia de deta-
lhes que as conclusões têm sofrido apenas um mínimo de alterações
ou aditamentos no meio século decorrido desde a sua publicação. De
muitas poucas obras científicas pode-se dizer o mesmo”.
Além de Freud, fundamenta-se também este trabalho na obra
de Jung intitulada “O homem e seus símbolos”. Tal qual o próprio
título diz, a obra de Jung fala do homem e seus símbolos, seja qual for
a sua forma de manifestação no tempo e no espaço, no passado ou no
presente. Já nas primeiras linhas a obra Jung nos lembra que o homem
utiliza a palavra escrita ou falada para expressar o que deseja transmi-
tir e que a linguagem humana é sobrecarregada de símbolos. Procura,
desde o início, esclarecer que os símbolos diferenciam-se de sinais e
imagens, abreviaturas, marcas comerciais, divisas etc., que, para ele,
não constituem símbolos. “O que chamamos símbolo é um termo, um
nome ou mesmo uma imagem que nos pode ser familiar na vida diária,
embora possua conotações especiais além de seu significado evidente
e convencional” (JUNG, 1964, p. 20).
Sob esta perspectiva, uma palavra ou uma imagem são simbóli-
cas quando implicam alguma coisa além do seu significado manifesto
e imediato: têm um aspecto inconsciente mais amplo, que nunca é
precisamente definido ou de todo explicado. Faz-se uso racional do
símbolo (da linguagem simbólica) para a criação de representações de
coisas convencionalmente aceitas e que fazem parte do universo pes-
soal, social e universal da pessoa humana. “Mas este uso consciente
que fazemos dos símbolos é apenas um aspecto de um fato de grande
importância: o homem também produz símbolos, inconsciente e es-
pontaneamente, na forma de sonhos” (JUNG, 1964, p. 21).
Quando se fala a respeito de símbolos, é preciso ter sempre
em mente que sua compreensão não é fácil, mas é preciso entendê-los
se quisermos conhecer mais a respeito dos métodos de trabalho da
mente humana. “A Psicanálise freudiana, embora também fundamen-
tada na noção do inconsciente, considera os símbolos e o imaginário
a partir dos significados contidos na história individual e coletiva. Os
indivíduos produzem seus sonhos coletivos (mitos) e sonhos pesso-
ais utilizando imagens que são registros transfigurados e sublimados
de experiências individuais” (LAPLANTINE, TRINDADE, 2003, p.
34 20). Geralmente, o aspecto inconsciente de um acontecimento nos é
revelado através dos sonhos, onde se manifesta como um pensamento
racional, mas com uma imagem simbólica.
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

A compreensão dos símbolos, tanto os símbolos naturais quan-


to os símbolos culturais, dos quais falaremos no seu devido tempo, é
de fundamental importância para a análise, interpretação e compre-
ensão dos sonhos e, como bem assevera John Freeman na introdução
da obra de Jung “O homem e seus símbolos”:

E através de toda esta obra, você vai encontrar o sonho


tratado como um meio de comunicação direto, pessoal e
significativo com aquele que sonha — um meio de co-
municação que usa símbolos comuns a toda humanida-
de, mas que os emprega sempre de modo inteiramente
individual, exigindo para sua interpretação uma ‘chave’,
também inteiramente pessoal (JUNG, 1964, p. 13).

Conclusivamente, os sonhos têm uma linguagem própria: o


símbolo. O homem utiliza a palavra escrita ou falada para expressar ou
exprimir o que deseja transmitir ao seu semelhante, e esta linguagem é
cheia de símbolos. Além de seu significado evidente e convencional,

Leni Lourenço de Oliveira


implica alguma coisa vaga, desconhecida ou oculta. Nesta investiga-
ção retirar-se-ão vários recortes da obra “O homem e seus símbolos”
a fim de corroborar a tese que se aplica tanto para Freud quanto para
Jung de que o sonho significa, na sua interioridade, a realização de
desejos, ou compensação como costuma dizer Jung.
Existem aqui no Brasil dezenas, senão centenas, de livros es-
critos pelos mais diversos autores nacionais e internacionais, que ver- 35
sam a respeito da interpretação dos sonhos que temos durante o tempo
em que dormimos. A maior parte deles, senão a grande maioria, faz
apenas uma descrição teórica do fenômeno do sonho e, por mais in-
crível que possa parecer, traz poucas novidades aos pesquisadores dos
sonhos, aqueles que buscam livros que não se prendem apenas aos
seus aspectos e pressupostos teorizantes.
Como estudiosos dos sonhos, ao lermos um livro a respeito de
sonhos o que procuramos é encontrar neles informações que fogem ao
senso-comum, isto é, que nos apresente algo além das pressuposições
teóricas, aquilo que nós mais buscamos na árdua tarefa de investiga-
ção: uma metodologia eficiente de aplicabilidade para a interpretação
dos sonhos não apenas do ponto de vista teórico, mas, sobretudo, prá-
tico — o maior desejo e vontade de quem se interessa pelos motivos
geradores dos sonhos bem como o caminho a percorrer na tentativa de
entendê-los da melhor forma possível.
Quando resolvi escrever este livro, mais uma obra que fala a
respeito da interpretação dos sonhos, tive o cuidado inicial de reunir
toda a literatura pertinente ao problema dos sonhos e, durante o tempo
em que me dediquei à reunião de material para leitura e pesquisa, qual
foi a minha grande surpresa? Qual a minha grande descoberta estimu-
lada pelas leituras da literatura dos sonhos? Resposta simples, clara e
objetiva: a de que existem no Brasil poucos livros escritos retratando
a problemática dos sonhos, isto é, temos poucos autores que escrevem
sobre eles (pelo menos nos livros que vemos publicados e a nossa dis-
posição nas livrarias, sebos e estantes de universidades).
Vocês podem observar que a maioria dos autores que consta nas
referências bibliográficas deste tratado sobre sonhos é de origem estran-
geira, especialmente de origem norte-americana, francesa, espanhola. A
constatação deste fato serviu como uma mola propulsora para a escritu-
ração deste livro que retrata a interpretação dos sonhos segundo a ótica
de Sigmund Freud e Carl Gustav Jung — os dois maiores nomes no que
se refere à análise, interpretação e compreensão dos sonhos por meio de
métodos paradoxais, como poderá ser observado na leitura da obra.
Durante o percurso para a confecção do texto tive a preocupa-
ção, diferentemente da maioria dos livros que retratam os sonhos, de
dar ao texto uma tonalidade mais científica do que puramente descri-
tiva — caminho pelo qual enveredam a maioria dos autores no trata-
mento dos sonhos. Talvez seja esse o principal diferencial deste livro
em relação a tantos outros que lemos sobre sonhos: a apresentação de
aspectos puramente teorizantes e descritivos dão lugar a uma argu-
mentação calcada em diversos pressupostos que ratificam os pontos
de vista apresentados com a intenção de comprová-los mediante mi-
nha argumentação e à de outros autores. O livro segue um caminho
didático, visto que teoria e práticas sempre caminham de braços de
dados com o intuito de não tornar o texto fastidioso e cansativo —
como é o caso dos livros exaustivamente teóricos.

36 Todavia, o texto não deixa de apresentar o jargão psicanalítico


que um trabalho desta envergadura requer na sua contextualização.
Procurei tornar os escritos didáticos a fim de que o leitor possa, pau-
latinamente, passo a passo, se tornar senhor do que lê, se familiarizar
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

com os relatos oníricos, com o desdobramento da análise, interpreta-


ção e compreensão tanto dos elementos de ordem teórica quanto das
conclusões advindas da interpretação dos sonhos transcritos e anali-
sados.
A pesquisa que aqui é apresentada deve responder a algumas
perguntas ao longo da argumentação: Os sonhos representam, real-
mente, do ponto de vista psicanalítico, a realização de um desejo
insatisfeito durante o estado vigília do sujeito ou outros fatores contri-
buem para isso? Existem outras formas de realização de desejos que
não se enquadram nas da concepção de Freud? De que forma devemos
interpretar o sonho a fim de não cairmos no risco de uma falsa inter-
pretação, a qual pode dar margem ao engano e, sobretudo, uma falsa
resposta a nós mesmos ou aos nossos pacientes? Quais os tipos de
sonhos mais comuns em nossa vida diária: são aqueles ligados a expe-
riências diurnas recentes ou o material pode estar ligado a momentos
mais distantes de nossa consciência? Quais critérios Jung utiliza para

Leni Lourenço de Oliveira


a interpretação dos sonhos?
Por fim, o que me levou à investigação dos sonhos foi a curio-
sidade e ao mesmo tempo um questionamento que sempre me intrigou
e me chamou a atenção: qual o melhor mecanismo para se conhecer
os subterrâneos da alma humana? Resposta simples, clara o e objeti-
va: estudo dos sonhos conforme prega Freud. As palavras de Freud,
tido pela crítica psicanalítica como um homem tão importante por sua 37
contribuição científica quanto Charles Darwin e Nicolau Copérnico,
penetraram fundo no meu espírito: “a interpretação dos sonhos é a es-
trada principal para se chegar ao conhecimento da alma e em nenhum
outro fenômeno da vida psíquica normal, os processos inconscien-
tes da mente são revelados de forma tão clara e acessível ao estudo”
(BRENNER, 1973, p. 161).
O segundo ponto que chamou a atenção nos sonhos e o que é
muito interessante é que, psicanaliticamente falando, ao sonhar temos
reações psicossomáticas — sensações físicas e psicológicas — como
experiências reais e verdadeiras em nosso complexo aparelho psíqui-
co. Ilusões e realidades se transformam, se deformam, ganham ares de
psicose. Dentro desta perspectiva, “o sonho subtrai, portanto, à von-
tade e à responsabilidade do homem, em virtude de sua dramaturgia
noturna ser espontânea e incontrolada. É por isso que o homem vive o
drama sonhado, como se ele existisse realmente fora de sua imagina-
ção” (CHEVALIER e GHEERBRANT, 2001, p. 844).
Espera-se que os resultados desta investigação sejam úteis à
comunidade cientifica e que este estudo sirva de paradigma para ou-
tras investigações nesta área da Psicologia, e mais especificamente
da Psicanálise, que trata da análise, compreensão e interpretação dos
sonhos. Por fim, fundamento-me e discorro por toda a minha argu-
mentação textual na hipótese de que o inconsciente tem importância
na formação onírica e que os sonhos são a expressão da atividade
inconsciente. A tentativa de analisar e interpretar os sonhos é, para
começar, um empreendimento, teoricamente justificável do ponto de
vista científico, como bem afirma C. G. Jung em “Ab-reação, análise
dos sonhos, transferência”.
CAPÍTULO I

Os sonhos são atos psíquicos tão importantes quanto


quaisquer outros; sua força propulsora é, na totalidade
dos casos, um desejo que busca realizar-se; o fato de não
serem reconhecíveis como desejos, bem como suas múl-
tiplas peculiaridades e absurdos, deve-se à influência da
censura psíquica a que foram submetidos durante o pro-
cesso de sua formação.
(Freud)

1. SONHOS: UMA REALIZAÇÃO DE DESEJOS.


Muito já foi dito por estudiosos e pesquisadores dos processos
oníricos que os sonhos são o “caminho régio” para o inconsciente e
isto acontece porque, nos sonhos, a censura diminui o bastante para
38
fazer reaparecer aquelas imagens que por um motivo ou outro fo-
ram reprimidas: repressão, percepções subliminares — percepções
demasiado fracas para atingir a consciência9. A censura diminui nos
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

sonhos, dentre outros fatores, pelo fato de se estar liberto das normas
sociais repressoras do estado de vigília — o Superego e, em segundo
lugar, porque os sonhos são regidos por leis próprias: compensa, ami-
úde, desejos positivos e negativos protelados no estado psicológico
de alerta.

9
Os motivos para a irrupção dos sonhos não seguem um itinerário lógico, nem poderia ser, pois
estamos lidando com uma outra linguagem, diferente da linguagem que utilizamos no estado de
vigília quando temos consciência do que falamos, vimos, dissemos ou vivenciamos. Exemplo:
quando estamos conversando seriamente com alguém a respeito de determinado assunto, nossa
atenção e concentração voltam-se totalmente para o conteúdo do diálogo, embora todas as nossas
percepções sensoriais continuem trabalhando paralelamente. Pode acontecer de não prestarmos
atenção a alguma coisa ligada à visão, tato, olfato, paladar olfato etc. durante uma conversa e, por
mais incrível que possa parecer, essas informações que não foram pensadas por causa da impor-
tância primária podem irromper sob a forma de sonhos, por causa do fator emocional provocado
pelo recalque involuntário e das percepções subliminares.
Temos em nosso estado psicológico de vigília a predisposição

Leni Lourenço de Oliveira


para ter dois tipos específicos de desejos: os desejos positivos e os
desejos negativos. Estes, à flor da consciência, formas indesejáveis e
inaceitáveis por nós, aqueles, formas desejáveis e aceitáveis por nós.
Este provoca dor e desprazer, aquele, prazer: os dois universos sobre
os quais se situam nosso estado de espírito e nossos maiores anelos.
Com relação à realização dos desejos, mesmo nas formas mais negati-
vas, Silva (1968, pp. 41-42) faz a seguinte consideração:
39
Uma apreensão é uma forma negativa de desejar. O
indivíduo tem medo que isto ou aquilo aconteça e fica
preocupado. O inconsciente, então, através de uma
reação de defesa, perfeitamente explicável, enfrenta
a coisa temida no sonho para dar o caso como encer-
rado e livrar a pessoa da preocupação. Estes sonhos
são bastantes frequentes. E só depois de inúmeras e
pacientes análises cheguei a compreender aquilo a que
chamo a realização de um desejo negativo.

Todos, de um modo lato sensu, se mostram favoráveis ao de-


sejo de que alguma coisa não aconteça, então os nossos maiores de-
sejos alucinam nossos sonhos fazendo-nos encará-lo a fim de que, ao
final das contas, fiquemos livres, quites com os pensamentos negati-
vos. Dentro desta perspectiva estão as autopunições, que, embora in-
conscientes, revelam traços hostis da personalidade do indivíduo que
aplica a si mesmo castigos e punições como formas de amenizar-lhe
a carga de culpabilidade movida por seus próprios complexos. Às ve-
zes, o conteúdo manifesto desses sonhos, sua parte compreensível, é
mascarada pela parte escondida dos sonhos: o conteúdo latente.
Todo esforço do sonho está em transformar o conteúdo latente
em conteúdo manifesto no intrincado processo de elaboração onírica.
A condensação é uma dessas formas que o processo de elaboração
onírica encontra para a formação das imagens que surgem durante
o sonho, e o deslocamento, as substituições, da mesma forma par-
ticipam desse complexo processo sobre o qual o sonho se forma,
se desenvolve e se manifesta em nosso estado de adormecimento.
Falar-se-á, no seu devido tempo, sobre estes dois mecanismos que
participam ativamente na formação dos sonhos: a condensação e o
deslocamento.
Há também, nos sonhos, as antíteses. O trabalho de elaboração
é esforçar-se para que as ideias tomem, em última análise, uma forma
visual nos sonhos. Numa interpretação dos sonhos havemos de levar
em conta todas essas considerações. Além disso, há também o traço
remoto e de infantilismo caracterizado pelo fato de o sonho fazer vol-
tar um duplo passado: o ontogenético e o filogenético, quer dizer:

Isto é, há sonhos que regridem uma fase tão remota da


infância que nos aparecem inteiramente estranhos, en-
quanto outros se tornam muita vez inacessíveis, de vez
que se referem à própria evolução da espécie. Nesses
sonhos, não raro, temos a impressão de ver lugares por
onde nunca andamos e de entrar em intimidade com pes-
soas de que nunca tivemos notícia (SILVA, 1968, p.
48).

A interpretação dos sonhos demanda, antes de mais nada, prá-


tica, afinal a oniromancia é uma ciência e uma ciência para ser reco-
nhecida necessita de estudos avançados. Sem essa condição não che-
garemos a lugar algum. A análise dos sonhos não é nenhuma invenção
da Psicanálise, que deu apenas um novo sentido e significação a eles,
40 tirando-lhes o caráter supersticioso de que estavam revestidos quando
a ciência apenas engatinhava.
A Psicanálise encara os sonhos como um fenômeno psíquico
perfeitamente determinado. Podemos iniciar a análise e a interpreta-
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

ção dos sonhos procurando descobrir o que aflora à lembrança quando


recordamos os sonhos que tivemos em mãos, idem aos sonhos alheios.
Feito isso, temos a informação de que o sonho foi provocado por fatos
recentes ou remotos com o objetivo de formar um sentido, contar uma
história; enfim, realizar um desejo.
Quando os sonhos não provocam lembranças, tem-se um re-
curso para conseguir este fim: a sinonímia. A hipótese de que o estí-
mulo é aproveitado pelo sonho, estímulo externo, acha-se justificada,
segundo Freud, por diversas experiências dos chamados “sonhos ex-
perimentais”. Assim:

É bom, entretanto, ter sempre em mente o seguinte


preceito: ‘para que uma impressão sensorial possa ser
reconhecida no sonho e exatamente interpretada, bem
como para ser incluída nas lembranças do autor de um
determinado sonho, é preciso que seja suficientemen-

Leni Lourenço de Oliveira


te forte, CLARA e duradoura, e que sobre ela também
possa o dormente refletir bastante. Sem estas condi-
ções, torna-se quase impossível chagar-se a uma per-
feita conclusão (SILVA, 1968, p. 64).

Àqueles momentos de confusão e dissociação de ideias que


ocorrem entre o estado de vigília e o estado de sono, dá-se o nome
de alucinações hipnagógicas10, fenômenos de sonolência. São estas
imagens visuais que caracterizam a excitação subjetiva, provocadora 41
de fenômeno onírico: o estímulo interno, subjetivo, se mescla com a
excitação sensorial externa.
Há uma variedade de sonhos que podemos ter em nosso estado
de adormecimento: sonhos prazerosos, sonhos de angústia, sonhos
sexuais, sonhos fantásticos entre muitos outros. Uma pergunta que
todos fazem com relação aos sonhos é a seguinte: por que, na maior
parte das vezes, não conseguimos nos lembrar de nossos sonhos,
e por que nos esquecemos dele? Duas hipóteses podem explicar o
fato: em primeiro lugar, o sujeito pode não ter nenhum interesse de
lembrá-los, neste caso, o esquecimento é automático. Em segundo
lugar, os sonhos são tanto mais esquecidos quanto mais do fundo do
inconsciente eles surgem.
Sonhos não recordados estão tão profundamente recalcados
que mal o indivíduo desperta, são desde logo atraídos de novo para as
profundezas das camadas do espírito. Sabe-se que as pessoas que não
sonham apresentam recalques afetivos e que há sonhos acordados
que também cumprem a sua missão, e o que os diferencia dos sonhos
noturnos é que é que neles o sonhador sabe que está realizando e/ou
antecipando os desejos (são os conhecidos devaneios). Pode-se su-
por que, “guardadas todas as proporções, o sonho acordado pode ser
comparado ao sonho noturno, tanto pelos símbolos que se coloca em

10
Sob esta designação, compreende-se um fenômeno psíquico constituído pela revivescência
de percepções, de sensações, de imagens-recordações que se realiza enquanto temos os olhos
fechados, a atenção frouxa, e lassos os liames que nos prendem ao mundo exterior. Estas ima-
gens, cuja aparição precede de pouco a anulação das impressões reais que os nossos órgãos
dos sentidos fornecem, podem ser de diferentes espécies, mas, de todas, as que mais merecem
atenção são as que dizem respeito ao sentido da vista e ouvido. LHERMITE, Jean. Os sonhos,
p. 10.
ação, como pelas funções psíquicas que é capaz de cumprir” (CHE-
VALIER e GHEERBRANT, 2001: p. 845).
Assim como os sonhos noturnos, segundo a teoria psicanalí-
tica de Freud, representam, na sua contextualização, a realização de
um desejo do sujeito decorrente do estado psicológico de vigília, da
mesma forma, os sonhos diurnos ou sonhos acordados também ope-
ram a realização de um desejo do indivíduo. A diferença básica entre
o sonhar noturno e o sonhar acordado centra-se no fato de que neste
último tem-se plena consciência de que se está divagando e, de certa
forma, em um determinado momento o sujeito consegue perceber com
riqueza de detalhe o estado de elaboração de fantasia. Por que isso
ocorre?
Com frequência temos a vontade ou o desejo de fazer ou reali-
zar alguma coisa, todavia uma circunstância eventual (medo, frustra-
ção, adiamentos, repressões, preocupações com as coisas hodiernas
etc.) nos impede de praticar esta ação que gostaríamos de ter prati-
cado a nosso bel-prazer. Por conseguinte, a resolução do impasse se
dá através de uma outra válvula de escape: a representação mental
42 consciente daquilo que foi a causa de nossa insatisfação e adiamento
do desejo. Sob este aspecto, sonhos acordados e sonhos noturnos têm
características peculiares.
Durante o sonho noturno nos deparamos com um conjunto
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

de fatores que promovem a condensação dos conteúdos latentes e os


transformam em conteúdo manifesto. Nos sonhos acordados isso não
acontece, o que ocorre é que o sujeito, nos átimos de divagação do
sonho acordado, escolhe um assunto mal resolvido e sobre ele cria
as mais imaginárias resoluções de seus conflitos hodiernos. Sob esta
perspectiva já se antevê que os conceitos psicanalíticos, conteúdo ma-
nifesto e conteúdo latente, assumem uma nova configuração em se
tratando de sonhos acordados em estado de vigília.
Por conseguinte, o trabalho de interpretação de um sonho
acordado é muito mais fácil por parte tanto do analista quanto do
analisando. O interpretador, por sua vez, não precisa fazer malaba-
rismos teóricos tampouco lançar mãos de hipóteses conceituais para
desvendar o sonho do sujeito. Já o sujeito pode, sem muito esforço
mental, descobrir perfeitamente a causa daquilo que o atormenta e o

Leni Lourenço de Oliveira


incita ao processo de elaboração de fantasia.
Como já se sabe, o conteúdo latente dos sonhos se faz por cau-
sa do processo de condensação, isto é, vários fatos e/ou acontecimen-
tos, tal qual uma orquestra, se fundem, para, por exemplo, revelar algo
a partir de uma representação em que a parte assume o todo. Assim
como uma orquestra representa a voz de um somatório de vozes dos
vários instrumentos musicais tocados simultaneamente, da mesma 43
maneira ocorre com o conteúdo latente do sonho. Isto quer dizer, em
outras palavras, metonimicamente falando, que a parte representa o
todo.
Sob este enfoque já se pode perceber que a condensação é me-
tonímica no sentido de que ela representa uma relação de contiguidade
entre os vários objetos descritos no processo de elaboração onírica.
No caso dos sonhos, esses objetos são as várias informações, imagens
oníricas que contextualizam uma série de coisas e/ou situações que só
podem ser entendidas e interpretadas se tomarmos o todo.
Existe um tipo de manifestação consciente do indivíduo em
estado psicológico de vigília que se assemelha aos sonhos que ocor-
rem no sujeito durante o sono: o delírio. Este distúrbio mental ca-
racterizado por ideias que contradizem a evidência e que são inacei-
táveis à crítica, diferente do sonho, é uma manifestação voluntária
do indivíduo. Este estado de exaltação do espírito, diferentemente
do sonho que se subtrai à vontade e à responsabilidade do homem
em virtude de sua dramaturgia noturna (ou vespertina ou matutina)
ser espontânea e incontrolada, caracteriza-se por atividades mentais
espontâneas, porém, voluntárias — fruto de busca de algum tipo de
compensação.

1.1. Sonho: realização de desejos e linguagem simbólica.


Antes do surgimento da Psicanálise reinava a obscuridade e
sua irrupção provocou mudanças sob vários aspectos: religiosos, cien-
tíficos, sociológicos, antropológicos e fisiológicos, o que promoveu
a pesquisa pelo assunto. Assim, a superstição deu lugar à razão, o in-
compreensível tornou-se claro e passou a fazer sentido. Os sonhos têm
uma função psicológica muito importante, porque na teoria de Freud
eles tendem a realizar os desejos insatisfeitos, suavizando e substi-
tuindo as dificuldades da vida, trocando a realidade pela fantasia.
Esse faz-de-conta nos alegra, a nós adultos, bem como às
crianças, quando queremos transformar uma situação adversa e não
podemos por causa da censura e também por fazer de nossos desejos
um impulso instintivo agressivo avesso à moral e aos bons costumes.
Sob esta perspectiva, “a educação tradicional ensinava — e ainda en-
sina, em certos ambientes — que os impulsos agressivos devem ser
reprimidos, sob pena de sofrer as mais severas coações disciplinares,
tanto no lar quanto na sociedade” (WALMIR, 1988, p. 78).
O sonho tem a função de possibilitar o impossível, realizar de-
sejos positivos e negativos, isto é, sonhamos com aquilo que mais
nos atormenta. Nem sempre podemos expressar nossos sentimentos
como queremos devido a preconceitos morais e religiosos que nos
controlam desde o nascimento até o “aqui e agora”. Quando deseja-
mos alguma coisa, um ato agressivo e/ou imoral, por exemplo, nesses
momentos a censura íntima intervém e o desejo vai para o inconscien-
te, de onde tenta libertar-se a todo custo para atingir o consciente. E
o sonho é um desses recursos de que mente inconsciente vale-se para
44
manifestar um desejo na sua totalidade ou não. Por quê? Porque tanto
em estado de vigília como nas fantasias dos sonhos há restrições aos
nossos impulsos.
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

Tudo, como mecanismo de realização do desejo, se passa na


fantasia onírica para evitar que o ato ocorra na vida real, e o símbolo
é uma forma de encobrir a verdadeira ideia, a mascarada, o que Freud
chama de disfarce. E decifrado o símbolo, desmascara-se o impulso
agressivo ou de natureza sexual, neste caso tudo o que se faz neces-
sário é desvendar o sentido oculto que encobre as verdadeiras ideias.
“Há assim uma engrenagem camuflada, cifrada, e a interpretação oní-
rica consiste em decifrar o quebra-cabeça, encaixando devidamente as
peças que são os símbolos” (WALMIR, 1988, p. 75).
Desta maneira, os sonhos devem ser analisados e traduzidos
devidamente para conseguirmos saber o seu significado verdadeiro.
E para isso existe a Psicanálise, para tentar provar que o trabalho do
sonho, na sua essencialidade, tem o objetivo de dissimular um desejo
reprimido. Sob esta ótica, poder-se-ia dizer que o sonho é uma expres-
são dissimulada de tudo aquilo que passa sob a superfície da mente:
E o sonho provém de processos psíquicos inconscientes.

Leni Lourenço de Oliveira


Por isso a interpretação dos sonhos também pôde ser de-
signada por Freud de ‘a via régia para o inconsciente’.
Esses processos inconscientes, entretanto, também são
acompanhados pelo estado consciente; nesse sentido o
sonho é igualmente interessante para a investigação so-
bre o que é consciência, podendo gerar novas questões
no contexto das investigações sobre criatividade (KAST,
2010, p. 34).
45
Esses processos inconscientes se manifestam por meio de uma
linguagem simbólica. A Psicanálise utiliza uma técnica para traduzir
o sonho que, normalmente, se processa de forma obscura e confusa,
porque na linguagem onírica aparecem os símbolos como formas de
defesa psíquica, através da censura. Essa simbologia não é fixa e inva-
riável, pode ter várias significações, dessa forma, os símbolos existem
por causa das restrições morais. A linguagem simbólica constitui uma
linguagem universal da raça humana, portanto é fundamental a sua
compreensão para um melhor conhecimento de nós mesmos e para
adquirir consciência plena da personalidade.
O sonho é uma linguagem simbólica, conhecê-lo na sua espe-
cificidade é a melhor forma de entrarmos em contato com o nosso Id,
para melhor conhecermos a nós mesmos, sim, e ter plena consciência
desse conhecimento, não obstante a linguagem dos sonhos ser uma
linguagem hermética (sejamos francos em reconhecer esta verdade).
Como se sabe, símbolos são imagens pictóricas ou palavras que subs-
tituem uma ideia, um sentimento, ou um pensamento. A linguagem
simbólica dos sonhos, durante o sono, é expressa, do ponto de vista
freudiano, por meio de condensações, associações, nossas ideias, nos-
sos sentimentos e nossos principais pensamentos. Isto é fato.
Todavia, há quem diga, como é o caso de Jung, que nem sem-
pre as ideias, os pensamentos e os sentimentos irrompidos durante o
sono nos pertencem: pertencem, por meio de sua teoria do inconscien-
te coletivo11, a outros; mas, quais outros? À primeira vista, esta visão
11
Mas a sua mais notável contribuição ao conhecimento psicológico é o conceito de incons-
ciente — não (à maneira de Freud) como uma espécie de “quarto de despejos” dos desejos
reprimidos, mas como um mundo consciente e “mediador” do Ego. E infinitamente mais am-
plo e mais rico. A linguagem e as “pessoas” do inconsciente são os símbolos, e os meios de
comunicação com este mundo são os sonhos. JUNG, Carl Gustav. O homem e seus símbolos,
p. 12.
do ex-discípulo de Freud soa como um certo tom de espiritismo, se é
este o termo correto a empregar aqui neste início de apresentação. Sua
teoria do inconsciente coletivo — avessa à teoria do inconsciente indi-
vidual de Freud — toma outros rumos e procura demonstrar que certas
ideias, pensamentos e sentimentos oníricos são de origem ancestral.
Segundo esta teoria, nossas ideias, nossos pensamentos e nos-
sos sentimentos em algum momento no tempo e no espaço humano se
ligaram a nós ancestral e culturalmente por intermédio dos ritos, reli-
gião, mitos, superstição, folclore e demais tipos de processo culturais
(os contos de fadas, por exemplo) herdados por toda a raça humana
desce os primórdios da civilização. Sob este enfoque, não seria um ab-
surdo, do ponto de vista junguiano, interpretarmos, por exemplo, um
sonho recente sobre o qual não encontramos nenhuma explicação, sob
a ótica da análise do inconsciente pessoal, a experiências de nossos
antepassados que, genética e culturalmente, chegaram até nós.
Essas experiências provindas do inconsciente coletivo, que
Jung intitula como “herança arquetípica” chegam até a nossa men-
te individual, todavia, como afirma Jung, estas experiências não nos
46 pertencem, não foram vividas por nós, são frutos de experiências co-
letivas extemporâneas a nós. Nesse ponto já se pode deduzir que a lin-
guagem simbólica é uma linguagem em que as experiências íntimas,
os sentimentos e pensamentos são expressos como se fossem experi-
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

ências sensoriais, fatos do mundo exterior. Para Froom (1969, p. 16):

É uma linguagem cuja lógica difere da linguagem con-


vencional que falamos de dia, uma linguagem em que
as categorias dominantes não são o espaço e o tempo,
mas sim a intensidade e a associação. É o único idioma
universal jamais criado pela raça humana, o mesmo para
todas as criaturas e para todo o curso da história. É uma
língua com gramática e sintaxe próprias, por assim di-
zer, e cujo conhecimento é imprescindível para se poder
entender o significado dos mitos, dos contos de fadas e
dos sonhos.

Como se vê, a linguagem simbólica é uma linguagem onde o


mundo interior é um símbolo do mundo exterior, um símbolo de nossas
almas e de nossas mentes. Embora existam três espécies de símbolos
— o convencional, o acidental e o universal — só estes dois últimos
exprimem experiências interiores. O oposto exato do símbolo conven-

Leni Lourenço de Oliveira


cional e do símbolo acidental, apesar de ambos terem uma coisa em
comum: não há relação intrínseca entre o símbolo e o simbolizado.
Podemos ter anelos, sentimentos e desejos motivadores de nos-
sas ações dos quais, todavia, não tomamos conhecimento. Aqui há a
presença de um poderoso “censor” que nos protege contra a possi-
bilidade de o percebermos: o medo de perder a aprovação dada por
nossos pais e amigos nos faz reprimir esses anelos, cuja conscienti- 47
zação nos faria sentir culpados ou receosos de ser punidos. Durante
o sono, adquirem vida certos impulsos cuja existência não queremos
ou não ousamos reconhecer quando acordados. Todavia, essa ideias
e sentimentos reprimidos adquirem vida e manifestam-se durante o
sono, porque nosso controle consciente se enfraquece e esses desejos
fazem-se ouvir nos sonhos. Para Froom (1969, p. 45):

Nosso sistema consciente pensa ter-se descartado de


sentimentos e desejos assim indesejáveis e horroriza-se
ante a ideia deles poderem estar dentro de nós; quando,
de fato, voltam e revelam sua presença, aparecem, por
isso, tão deformados e disfarçados que nosso pensa-
mento consciente não se identifica com o que deveras
são.

Para Freud, o sintoma neurótico se manifesta a partir do áti-


mo em que os desejos e/ou anelos reprimidos por intermédio do fato
censura exprimem-se de forma mascarada. Para ele, nós só tomamos
conhecimento do sofrimento provocado pelo sintoma e não da rea-
lização dos desejos irracionais. “O sonho dá manifestação a anseios
inconscientes de que nós não nos permitimos tomar conhecimento e
assim mantemos fora da conscientização quando estamos no pleno co-
mando de nossos pensamentos. Essas ideias e sentimentos reprimidos
adquirem vida e manifestam-se durante o sono, e damos-lhe o nome
de sonhos” (FROOM, 1969, p. 47). Então, o que é um sonho? Kast
(2010, p. 34) responde a nossa pergunta:

O sonho se torna um sonho apenas quando acordamos. O


sonho é uma vivência impressionante que ocorre duran-
te o sono, da qual nós podemos lembrar razoavelmente
no estado desperto, que revela algo sobre nossa situação
de vida central em termos emocionais naquele momento
e que estimula múltiplas ligações cognitivas e emocio-
nais. Ele é uma vivência que provoca mudanças. Trata-
se da expressão de nosso si-mesmo durante o sono, da
nossa própria criação, existe pouca influência externa.
Segundo Jung: ‘O sonho é uma parcela da atividade psí-
quica involuntária que possui, precisamente, suficiente
consciência para ser reproduzida no estado de vigília’.

Sob este enfoque, pode supor-se que o sonho tem a função de


reduzir até um limite toda a carga de tensão e de ansiedade sobre a
qual estamos imersos em nosso universo mental. A realização do de-
sejo insatisfeito deixa-nos com um sentimento de satisfação em vez
de uma frustração. Assim, é permitido dizer que o sonho tem a função
de diminuir, de aliviar a ansiedade do sujeito. Sua principal função é
a preservação do sono: no sonho dá-se a fantasia alucinatória com a
fantasia de se tornar real, por exemplo, alguns de nossos desejos ime-
diatos: a sede, a fome, a excreção, o sexo, por exemplo.

1.2. Visão popular e bíblica do sonho.


Sonho, dentre as suas inúmeras definições e conceituações, é
um ato psíquico, assim como o ato falho, o chiste, o esquecimento
48
também são atos psíquicos que possuem sua própria figurabilidade. O
sonho é a representação ou realização de um desejo manifesto do su-
jeito; a forma como o sonho se apresenta é, aparente e sensorialmente,
confuso e desconexo, psicótico e não-raro sem sentido: eles podem
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

ter esta figurabilidade após acordarmos, repentinamente, devido a um


fator que nos causa sentimento de culpa e sobre o qual eu terei opor-
tunidade de falar nesta investigação: a censura.
A crendice popular, com toda a sua sobrecarga de supersti-
ções, interpreta os sonhos de uma forma bastante simplificadora e
destituída de qualquer valor científico, o que constitui um sinal de
menos na equação da teoria de causa e efeito — objeto de experimen-
tação e formação de juízos de valor da Ciência. Existem muitas obras
populares não científicas que mais aproximam o leitor da cegueira do
que da luz quando se fala de sonhos. E isso reforça a ignorância po-
pular a respeito deste assunto que requer uma cuidadosa investigação
científica a fim de oferecer uma resposta mais racional em detrimento
de uma resposta emocional — como assim o querem os manuais de
investigação simplistas dos sonhos tão propalados na mente das pes-

Leni Lourenço de Oliveira


soas comuns que não pensam ou não querem pensar cientificamente.
O jogo de bicho é, por exemplo, um caso típico da manifestação
de atitudes e comportamentos errôneos em relação à verdadeira signi-
ficação dos nossos sonhos. A crendice popular sobre o significado dos
sonhos a partir do sonho com animais é bastante antiga. “Não é esse o
caminho positivamente seguido pela Psicanálise para explicar os sonhos
e os seus mistérios. Ela não vê a influência de poderes demoníacos ou 49
a sobrevivência da alma como queriam os antigos, nem admite, como
os espíritas, que os sonhos sejam também viagens que o nosso espírito
realiza a ignotas paragens, enquanto dormimos” (SILVA, 1968, p. 52).
No livro de São Cipriano — o bruxo ocultista que viveu nos
primeiros séculos da Era Cristã — já são apresentados na tessitura no
compêndio de bruxaria um rol de animais e seus respectivos signifi-
cados para aqueles que com eles sonham durante o sono. Neste livro
o significado dos sonhos liga-se ao caráter da adivinhação — um dos
motivos da criação do compêndio — tema tão propalado na literatura
antiga. Já nos tempos do Velho Testamento da Sagrada Escritura, a
adivinhação, método de investigação não científica, era um tema co-
mum entre os estudiosos. Faraó, no livro de Gênesis, uma literatura
antiga, capítulo 41.1-37, por exemplo, já consultava seus adivinhos
para revelar-lhe os significados de seus sonhos intrigantes.
Em um dos seus sonhos Faraó procurara-os para desvendar-
-lhe os significados, mas foi tudo em vão, os magos não conseguiram
decifrar seu sonho. Naquele episódio, todos os deuses do Egito foram
desmoralizados, visto que seus magos e adivinhadores não consegui-
ram compreender os sonhos de Faraó, tampouco puderam impedir a
fome — o motivo dos sonhos de faraó — ou sugerir uma solução
para o grande problema que o País estava prestes a enfrentar nos anos
vindouros: os sete anos de prosperidade e os sete anos de fome. José
— um dos doze filhos de Jacó — desvendou-lhe o significado dos
sonhos, dizendo ao Faraó que o País enfrentaria sete anos de fartura e
sete de fome. É um sonho do tipo coletivo12.

12
O sonho coletivo foi altamente apreciado na Antiguidade onde lhe era reconhecida natureza
de oráculo e os seus avisos levados a sério. Hoje aparecem-nos como fantasiosos estes sonhos
e as suas interpretações; no entanto, há paralelismo que podemos assinalar, com os princípios
de interpretação que hoje utilizamos. O sonho de Faraó e a sua interpretação por José, registra-
Nós não podemos dizer que esta vasta literatura antiga tenha
muito significado lógico, visto que ela fora escrita sem obedecer a
nenhum critério científico. Aliás, a ciência à época estava apenas en-
gatinhando, não obedecia aos padrões de investigação sólidos e com
fundamentação teórica pertinentes — dois pressupostos básicos para
quaisquer buscas de respostas a problemas que surgem a céu aberto.
Assim, pairava para aquelas mentalidades arcaicas a preponderância
da superstição para a análise do sonho em detrimento da razão como
assim apontam as investigações científicas amparadas na lógica e no
estudo das relações de causa e efeito.
Além disso, como se acreditava que os sonhos continham men-
sagens divinas, restava, assim, pouco espaço para o desenvolvimento
de investigações mais profundas em torno do problema dos sonhos e
suas reais significações. Acreditava-se no aspecto divinatório simples-
mente por se acreditar, visto que não havia razões para deixar de se
acreditar. Os sonhos de faraó, sob essa perspectiva, tinham um caráter
profético e divino: foi José quem desvendou o conteúdo latente do
sonho manifesto do faraó do Egito13, como se sabe pela extensa litera-
tura bíblica de que se tem notícias até hoje.
50
Na Sagrada Escritura não há nenhum relato sobre práticas cien-
tíficas praticadas pelo filho de Jacó, José — o sonhador — o que re-
força nossa tese de que os sonhos eram interpretados à luz de uma
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

mensagem profética — uma espécie de premonição cuja função era a


de oferecer respostas a eventos e mistérios futuros. Para Leadbeater
(1990-95, pp. 50-51), “este sonho deve também ser atribuído exclusi-
vamente à ação do Ego, que prevê por si mesmo ou se inspira em al-
gum acontecimento futuro para o qual deseja preparar sua consciência
de vigília. É possível um certo grau de certeza e veracidade nesta an-
tevisão, conforme a capacidade do Ego para captar os fatos e, tendo-os
captado, imprimi-los no cérebro de vigília”.
Já para Freud (1999, pp. 112-113), em “A interpretação dos so-
nhos”, o fato de o mundo leigo, desde os tempos mais remotos, se inte-

dos no Gênesis 41, são deste tipo coletivo. FORDHAM, Frieda. Introdução à Psicologia de
Jung, pp. 87-88.
13
Em um outro livro escrito por mim intitulado “A semiótica psicanalítica através da prosa
romanesca”, publicado por esta mesma editora, apresento uma interpretação dessa passagem
bíblica aqui expressa sob forma cômico/literária e, sobretudo, psicanalítica. Convém ler.
ressar pela interpretação dos sonhos o levou a se servir de dois métodos

Leni Lourenço de Oliveira


diferentes para a investigação dos sonhos:

O primeiro desses métodos considera o conteúdo do so-


nho como um todo e procura substituí-lo por outro con-
teúdo que seja inteligível e, em certos aspectos, análogo
ao original. Essa é a interpretação “simbólica” dos so-
nhos, e cai inevitavelmente por terra quando se defron-
ta com sonhos que não são apenas ininteligíveis, mas
também confusos. Um exemplo desse método pode ser 51
observado na explicação do sonho do Faraó, proposta
por José na Bíblia. As sete vacas gordas seguidas pelas
vacas magras que devoraram as gordas — tudo era o
substituto simbólico para uma profecia de sete anos de
fome nas terras do Egito, que consumiriam tudo que fos-
se produzido nos sete anos de abundância... A ideia de
os sonhos se relacionarem principalmente com o futuro
e poderem predizê-lo — um vestígio da antiga importân-
cia profética dos sonhos fornece uma razão para transpor
o sentido do sonho, quando se chega a tal sentido por
meio da interpretação simbólica, para o tempo futuro.
É obviamente impossível dar instruções sobre o método
de se chegar a uma interpretação simbólica. O êxito deve
ser uma questão de se esbarrar numa ideia inteligente,
uma questão de intuição direta, e por esse motivo foi
possível à interpretação dos sonhos por meio do simbo-
lismo ser exaltada numa atividade artística que depende
da posse de dons peculiares.

Aristóteles (apud FREUD, p.113, in BÜCHSENSCHULTZ,


1868, p. 65) comentou a este respeito [referindo-se à interpretação
simbólica], que “o melhor intérprete dos sonhos seria o homem mais
capaz de apreender as semelhanças, pois as imagens oníricas, como as
imagens na água, são deformadas pelo movimento, e o intérprete de
maior êxito é o homem que consegue identificar a verdade a partir da
imagem deformada”. Dentro desta perspectiva, pode-se dizer que os
sonhos da Sagrada Escritura, concretamente, se antecipavam aos fa-
tos, adivinhavam, ofereciam mensagens que deviam ser interpretadas
para resolver situações concretas, ou para compreender as mensagens
de Deus e seu poder acima dos homens.
A interpretação de Aristóteles dá-nos, pensadores modernos, a
entender que a interpretação dos sonhos feita pelos povos antigos não
passava de “adivinhações baratas”, na qual o interpretador não se apoia-
va em nenhuma fonte de pesquisa, nenhum método, para dar sustenta-
ção àquilo que ele estava interpretando. Eram interpretações simbólicas
forjadas pela ausência do Ego, durante o sono. Dentro desta perspectiva
pode-se dizer que:

Outro ponto digno de atenção com referência à condi-


ção do Ego quando ausente do corpo durante o sono é
que parece ele pensar por meio de símbolos. Queremos
dizer: o que em nosso plano seria uma ideia cuja ex-
pressão exigiria grande número de palavras, ao Ego é
perfeitamente transmissível através de simples imagem
simbólica. Ora, quando um pensamento como esse vem
a ser impresso no cérebro e relembrado na consciência
de vigília, sem dúvida que precisa de tradução. Muitas
vezes é a mente que executa essa função; mas em outras
o símbolo não vem acompanhado de sua chave — per-
manecendo, por assim dizer, sem tradução; e então sur-
ge a confusão (LEADBEATER, 1990-95, p. 47).

Terei ocasião de ampliar e completar essas poucas indicações


preliminares sobre a significação geral dos sonhos, mas é importante
frisar, desde já, um fato que nos parece essencial: os sonhos podem
52 ser considerados, do ponto de vista de Freud, como a realização de
desejos e que esses desejos estão subordinados a vários outros fatores
na irrupção dos conteúdos oníricos: condensações, deslocamentos en-
tre outros. Urge conhecer seus símbolos e todos os mecanismos que
A Interpretação dos Sonhos Segundo a Escuta Psicanalítica de Freud e Jung

o regem para a manifestação de seus conteúdos manifestos e latentes.

Aqui termina a demonstração do livro

Para adquirir o e-book completo ou o livro impresso,


por gentileza clique no link abaixo ou visite o site da editora
Nelpa.
Link para compra: http://www.nelpa.com.br/livro/
busca?q=interpreta%E7%E3o

Site da editora Nelpa: http://www.nelpa.com.br

Você também pode gostar