Mulheres Na Vida de Paulo
Mulheres Na Vida de Paulo
Mulheres Na Vida de Paulo
NA VIDA DE PAULO
Coleção Narrativa
MULHERES
NA VIDA DE PAULO
A história de Lídia, Priscila e Febe
Direção editorial: Claudiano Avelino dos Santos
Coordenação de revisão: Tiago José Risi Leme
Capa: Karine Pereira dos Santos
Editoração, impressão e acabamento: PAULUS
CDD B869.3
19-0122 CDU 83-312.2 (81)
Índice para catálogo sistemático:
1. Literatura brasileira: Ficção cristã
1ª edição, 2019
© PAULUS – 2019
Rua Francisco Cruz, 229 • 04117-091 – São Paulo (Brasil)
Tel.: (11) 5087-3700
paulus.com.br • editorial@paulus.com.br
ISBN 978-85-349-4921-7
INTRODUÇÃO
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CAPÍTULO I
UMA COMERCIANTE DE PÚRPURA
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A população de Filipos era bastante heterogênea, pois,
apesar de considerar-se “romana”, por ter sido composta
por colonos italianos (cf. At 16,21), nela havia bom núme-
ro de estrangeiros vindos do Egito, da Anatólia e de outras
localidades. A cidade era primordialmente centro de agri-
cultura, já que os colonos italianos haviam-se dispersado
pelas aldeias ao longo da planície e nos vales que se abriam
para ela. Por isso, o trabalho nas terras ao redor das aldeias
era a base do desenvolvimento econômico da região. Por
outro lado, os imigrantes estrangeiros trabalhavam primei-
ramente no comércio e em várias profissões, entre elas a de
padeiros, verdureiros, barbeiros, sapateiros, leiloeiros, em-
prestadores de dinheiro e hoteleiros.
Naquela época, não havia muitos judeus em Filipos e,
por isso, a cidade não possuía uma sinagoga, que era o local
onde os judeus se reuniam aos sábados para fazer orações e
ler e interpretar trechos da Torá, isto é, dos cinco primeiros
livros do Antigo Testamento.
Chegando o dia de sábado, shabbat, Paulo e sua equipe
de missionários se dirigiram a um lugar de oração situado
fora das muralhas da cidade, onde os judeus e os pagãos1 con-
vertidos à religião judaica se reuniam para celebrar o culto.
Era um dia ensolarado de verão. O sol ardente inunda-
va a terra com brilho e esplendor; porém, o ar era fresco e
seco. Os campos exibiam um verde mais vivo e se abriam
para magníficos horizontes. Para facilitar os ritos de purifi-
cação que os judeus costumavam realizar, o local de oração
ficava às margens do rio Gangite, a 2 km da cidade. Depois
do culto, algumas mulheres permaneceram no local para
continuar em oração e Paulo aproveitou a oportunidade
para pregar para elas a mensagem cristã.
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Os pagãos ou gentios eram aqueles que não pertenciam ao povo de
Israel. Em geral, eles cultuavam vários deuses.
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A figura de Paulo não era nada atraente. Ele era de pe-
quena estatura, tinha as pernas ligeiramente arqueadas, a
barba irregular e no alto da cabeça os cabelos iam-se tor-
nando raros. Seu rosto, porém, impressionava por denotar
força e vigor. Os olhos castanhos, vivos e perscrutadores,
brilhavam como os de alguém que havia perdido e reco-
brado a visão. O nariz aquilino dominava o rosto magro e
ascético. Os lábios finos e o queixo firme moviam-se com
convicção ao falar. Trajava uma túnica de linho de cor cla-
ra, um manto simples azul escuro e sandálias rústicas que
eram encontradas no mercado de Tarso. Sua fisionomia re-
velava sua natureza inquieta e idealista.
Uma das mulheres, chamada Lídia, foi tocada pelas
palavras de Paulo e pediu que fosse batizada. Ela era de
origem pagã, mas havia-se convertido ao judaísmo e ado-
rava o único Deus dos judeus. Porém, por não ter aderido
plenamente às práticas da religião judaica, era considerada
adoradora de Deus ou temente a Deus. Os pagãos que se
convertiam completamente ao judaísmo, até aceitando o
rito da circuncisão,2 eram chamados de prosélitos.
Ao escutar o pedido de Lídia, Paulo imediatamente a
levou para a margem do rio e a batizou, derramando água
três vezes sobre sua cabeça, conforme os missionários cris-
tãos costumavam fazer, de acordo com determinadas cir-
cunstâncias.
Depois de ter sido batizada, Lídia disse a Paulo e a seus
companheiros: “Se vocês consideram-me fiel ao Senhor, ve-
nham ficar em minha casa” (At 16,15).3
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Paulo hesitou em aceitar o convite de Lídia, pois não
costumava receber favores das comunidades fundadas por
ele, para não lhes ser pesado (cf. At 20,34; 1Cor 4,12; 9,13-
15). Mas, ao perceber o quanto Lídia parecia feliz em po-
der lhes prestar esse serviço e, temendo causar-lhe algum
desgosto por recusar sua oferta, resolveu aceitá-la. De fato,
Lídia possuía um temperamento extremamente cordial e
estava sempre disposta a ajudar aqueles que mais precisas-
sem. Sua atenção voltava-se para as necessidades dos ou-
tros e mostrava-se disponível para servir a todos aqueles
que dela se aproximavam.
Lídia não era rica, mas vivia com relativo conforto. Ela
era uma comerciante de tecidos tingidos com tinta de cor
púrpura (roxo), e havia emigrado com seu esposo da cidade
de Tiatira na Ásia Menor, algum tempo depois de seu casa-
mento. Naquela época, a púrpura era um corante de grande
renome e o mais caro de todos os corantes. Simbolizava ri-
queza e distinção, e era utilizada nas vestes reais romanas.
Tendo ficado viúva ainda relativamente jovem, logo depois
da morte do marido, assumiu os negócios dele. Sendo mui-
to ativa e determinada, aos poucos ela conseguiu prospe-
rar. Na ocasião em que se tornou cristã, tinha três filhos
adolescentes, duas servas que a auxiliavam nos trabalhos
domésticos e dois servos que a ajudavam quando realizava
transações comerciais.
A casa onde Lídia morava era uma espécie de vila ro-
mana espaçosa, situada nos arrabaldes da cidade. As salas
de espera e de refeição possuíam tetos altos e pisos de mo-
saico, e abriam-se diretamente para um pátio interno que
servia como vão de entrada para a luz. Os quartos de dormir
e os recintos dos empregados abriam-se para corredores.
Ao chegarem à casa de Lídia, Paulo e seus companhei-
ros anunciaram o evangelho a seus filhos e a seus servos e
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todos eles foram batizados. Assim, toda a “casa” de Lídia
tornou-se cristã, pois, naquele tempo, a “casa” era mui-
to mais ampla do que a família nuclear, incluindo não só
parentes próximos, mas também escravos libertos, isto é,
escravos libertados pelos seus donos; trabalhadores contra-
tados e, algumas vezes, atendentes e parceiros no comércio
e na profissão.
Em seguida, quando todos haviam-se sentado à mesa
para tomar a ceia, a principal refeição do dia, Lídia pergun-
tou a Paulo quando ele tinha-se tornado cristão. Paulo, en-
tão, respondeu-lhe:
– Eu sou judeu de nascimento, natural da cidade de
Tarso, na Cilícia. Estudei a Lei numa das melhores escolas
rabínicas de Jerusalém e tornei-me um zeloso fariseu.
Percebendo que talvez Lídia não soubesse o que signi-
ficava a palavra fariseu, Silas interveio:
– Os fariseus constituem um grupo do judaísmo que
se destaca pelo cumprimento rigoroso da Lei de Moisés,
principalmente pelas regras de pureza prescritas no livro
do Levítico, isto é, um dos cinco primeiros livros da Bíblia.
Eles observam os mandamentos nos seus mínimos deta-
lhes, pois acreditam que são justificados diante de Deus por
meio do cumprimento da Lei.
– Sendo assim – continuou Paulo –, ao tomar conhe-
cimento da pregação dos seguidores de Jesus, comecei a
persegui-los, pois acreditava que eles pregavam contra nos-
sas instituições mais sagradas: o Templo e a Lei. E quando
Estêvão, o primeiro mártir cristão, foi apedrejado, eu estava
presente e concordei com a morte dele (cf. At 8,1-3). Um
dia, porém, enquanto viajava para a cidade de Damasco,
levando cartas de recomendação do sumo sacerdote para
prender os cristãos e trazê-los de volta para Jerusalém, fui
ofuscado por uma luz que me envolveu inteiramente (cf.
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At 9,1-19). Ouvi uma voz que me dizia: “Saulo, Saulo, por
que me persegues?”. Eu, então, perguntei: “Quem és tu,
Senhor?”. E ouvi a seguinte resposta: “Eu sou Jesus, a quem
tu persegues”. Imediatamente caí por terra e não consegui
mais enxergar. Ao chegar a Damasco, fui enviado a um dis-
cípulo que se chamava Ananias. Este impôs as mãos sobre
mim fazendo com que eu recuperasse a visão. Em seguida,
fui batizado por Ananias e, pela graça de Deus, sou o que
sou. Compreendi, então, que somos salvos pela fé em Jesus
Cristo e não pela observância da Lei de Moisés, de modo
que os cristãos vindos do paganismo não precisam subme-
ter-se ao rito da circuncisão. Todos nós, judeus e pagãos,
somos salvos pela graça de Deus em Jesus Cristo.
– Na verdade – disse Timóteo –, ao me tornar cristão, eu
não precisava ser circuncidado, mas sendo eu filho de mãe
judia e de pai pagão, era conveniente que eu recebesse a cir-
cuncisão para ser bem acolhido pelos judeus, a quem primei-
ro nos dirigíamos ao anunciar o evangelho (cf. At 16,1-5).
– Eu, porém – acrescentou Lucas –, que sou gentio (pa-
gão) de nascimento, nunca fui circuncidado. Assim também
não o serão todos os cristãos convertidos do paganismo.
– Nós todos, judeus e gentios (pagãos), formamos o novo
povo de Deus, pois somos salvos pela fé em Jesus Cristo, e
não pelo cumprimento da Lei de Moisés, concluiu Paulo.
Na manhã seguinte, Lídia acompanhou Paulo e seus
companheiros até o lugar de oração, pois ela sabia que, na-
quele dia, um grupo de prosélitos, isto é, pagãos que haviam
se convertido plenamente à religião judaica, estaria reunido
naquele local para estudar a Lei. A instrução dos proséli-
tos era ministrada por um escriba4 judeu chamado Sízigo.
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Os escribas ou doutores da Lei eram estudiosos e intérpretes das
Escrituras. Ocupavam um lugar de destaque na vida judaica, exercendo
as funções de teólogos e juristas.
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