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Nota Técnica Oficial Etilenoglicol

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Nota técnica oficial e orientações da Academia Brasileira de Medicina

Veterinária Intensiva – BVECCS, Colégio Brasileiro de Nefrologia e


Urologia Veterinário – CBNUV em parceria com Dr Luis Bolfer

Introdução
O etilenoglicol é uma substância utilizada principalmente na formulação de anticongelantes,
quando ingerida pode causar danos graves e muitas vezes irreversíveis como: insuficiência renal
aguda e acometimento de demais sistemas como sistema nervoso central, cardiovascular e hepático.
A dose letal do etilenoglicol não diluído é de 6,6ml/kg no cão e 1,5ml/kg no gato (1).

O fato de ser rapidamente absorvido pelo sistema gastrointestinal, possuindo picos de


concentração plasmática de 2 a 3 horas após ingestão, faz com que a toxicose seja potencialmente
letal, se fazendo necessário reconhecimento e terapia precoces (2). A toxicidade está relacionada aos
metabolitos produzidos pela ação da enzima ADH. Durante o processo de metabolização o ácido
oxálico promove a formação de cristais insolúveis de oxalato de cálcio em decorrência de sua ação
quelante sob o cálcio. Quando filtrados pelos rins esses cristais se depositam nos túbulos, levando a
injúria renal aguda severa, além de se depositarem também em vasculatura, sistema nervoso e
coração (3).

É importante atentar-se ao histórico sobre a possibilidade da ingestão do composto,


principalmente nos casos que apresentem manifestações clínicas compatíveis.

Manifestações clínicas
A intoxicação pode ser segmentada em 3 diferentes estágios, responsáveis por manifestações
clínicas que podem diferir de acordo com o momento da apresentação, de acordo com o Quadro 1.

Quadro 1: Adaptado de Francey T, Schweighauser A, 2016.

1
Pacientes que tenham histórico de ingestão de petiscos contendo propilenoglicol ou
suspeita da intoxicação, recomendada abordagem precoce e direcionada:

• Solicite ureia, creatinina. Na, K, Cl, hemogasometria, urinálise e, se possível,


ultrassonografia abdominal.
• Siga as condutas terapêuticas conforme abordagem abaixo, incluindo o bloqueio
hepático da metabolização do etilenoglicol.

Tratamento
-- Manejo emergencial inicial dos pacientes deve respeitar o ABC:

A – Laringoscopia, classificação Cormack-Lehane, garantir permeabilidade de vias aéreas


B – Garantir expansão torácica, suplementação com O2, avaliação Vet-Blue
C – Acesso vascular, localização hemodinâmica, reposição volêmica guiada por metas

Não recomendada indução de êmese, uso do carvão ativado e lavagem gástrica. Os pacientes deverão
permanecer em internamento para monitorização e terapia individualizada, de acordo com os próximos
tópicos:

-- Bloqueio hepático da metabolização de etilenoglicol:

- Solução etanol 7%: 8,6ml/kg IV bolus, seguido de infusão contínua 100-200mg/kg/h

- Solução etanol 20%:

• Cães: 5,5mL/kg IV a cada 4 horas, totalizando 5 aplicações, seguido de aplicações


a cada 6 horas, totalizando 4 aplicações
• Gatos: 5,0mL/kg IV a cada 6 horas, totalizando 5 aplicações, seguido de
aplicações a cada 8 horas, totalizando 4 aplicações

- Fomepizol: 20mg/kg IV lento em 15-30 minutos a cada 12 horas, período de 36 horas. ‘


Seguido de 15 mg/kg IV lento, 12-24 horas. Seguido de 5mg/kg IV lento, 36 horas

-- Estadiamento renal e terapia de substituição:

• Pacientes com evolução em estágio de IRA (aumento de creatinina), mesmo que estágio 1
para 2, não responsivo à reposição volêmica: Recomendada terapia de substituição renal,
com base na difusão (diálise).

• Pacientes com débito urinário <1mL/kg/h, por 6 horas, não responsivo à reposição volêmica,
sobrecarga de volume: Recomendamos terapia de substituição renal, com base na
ultrafiltração (hemofiltração).

2
-- Acidemia, acidose metabólica com ânion gap aumentado:

• Recomendada reposição de bicarbonato de sódio somente após avaliação criteriosa e


individualizada do paciente se pH< 7,1; HCO3 <10 meq/L.

• Atenção aos possíveis efeitos adversos: indução de hipernatremia, acidose paradoxal de


sistema nervoso central, acidose respiratória, hipocalemia

-- Fluidoterapia:

• Recomendada fluidoterapia direcionada e individualizada, com base em metas, evitando


sobrecarga de volume.

• Para a estratégia de ressuscitação volêmica recomendamos solução cristaloide balanceada


10mL/kg em 30 a 60 minutos, a depender da competência cardiovascular direita do paciente.

• É imprescindível o monitoramento do débito urinário, balanço hídrico e peso do paciente para


correções momento a momento das taxas de infusão. Pacientes com nefropatia podem ter
maior risco de sobrecarga de volume.

• Monitorar os limites de segurança através de parâmetros ultrassonográficos (índice de


colapsabilidade da veia cava inferior, artefatos pulmonares - linhas B), pressão venosa
central, pressão intra-abdominal.

-- Cuidado adjunto:

- Nutrição:

• Recomendamos nutrição entérica assim que estabilidade hemodinâmica e débito


gástrico <0,5mL/kg/h. Respeitar REB 30 x p + 70 kcal/dia, em caso de anorexia prévia
iniciar com 25%, totalizando 100% em 3 a 4 dias, com o objetivo de evitar a síndrome
de realimentação.

- Terapia de suporte gastroentérico:

• Antieméticos, protetores gástricos, sucralfato

-- Monitoramento contínuo:

Peso
Débito urinário
Balanço hídrico
Pressão arterial
Temperatura

Ureia, creatinina e urinálise


Lactato e glicemia
Hematócrito, proteína total e frações
Hemogasometria / Ânion gap: AG = (Na + K) – (Cl + HCO3)

3
Referências

1- Thrall MA, Connally HE, Disque SM, Grauer GF:Avanços na terapia para envenenamento por
anticongelante. Califórnia. Vet. 1998; 52: 18–22
2- Grauer G. F., Thrall M. A., Henre B. A., Hjelle J. J.: Comparison of the effects of ethanol and 4-
methylpyrazole on the pharmacokinetics and toxicity of ethylene glycol in the dog. Toxicol. Lett.
1987, 35: 307–314.
3- Gaynor A. R., Dhupa N.: Acute ethylene glycol intoxication. Part II. Diagnosis, treatment,
prognosis, and prevention. Compend. Contin. Educ. Pract. Vet. 1999b, 21: 1124–1133
4- Francey T, Schweighauser A. Ethylene glycol poisoning in three dogs: Importance of early
diagnosis and role of hemodialysis as a treatment option. Band 158;2. 2016, 109–114
5- Khan S. A., Schell M. M., Trammel H. L., Hansen S. R., Knight M. W.: Ethylene glycol exposures
managed by the ASPCA National Animal Poison Control Center from July 1995 to December
1997. Vet. Hum. Toxicol. 1999, 41: 403–406.
6- Doty R. L., Dziewit J. A., Marshall D. A.: Antifreeze ingestion by dogs and rats: influence of
stimulus concentration. Can. Vet. J. 2006, 47: 363–365
7- Rietjens S. J., de Lange D. W., Meuenbelt J.: Ethylene glycol or methanol intoxication: which
antidote should be used, fomepizole or ethanol? Neth. J. Med. 2014, 72: 73–79

Academia Brasileira de Medicina Veterinária Intensiva – BVECCS

Colégio Brasileiro de Nefrologia e Urologia Veterinário – CBNUV

Dr Luis Bolfer

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