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José Vicente Lima Robaina

Viviane de Almeida Lima


Renan de Almeida Barbosa
Rafael Scheffer Pacheco
Daniela Alves da Silva
Editor Chefe Diagramação e Projeto Gráfico
Ivanio Folmer Gabriel Eldereti Machado
Bibliotecária Capa
Tábata Alves da Silva Adolpho H. Rodrigues
Revisora Técnica Revisão
Gabriella Eldereti Machado Organizadores e Autores(as)

Conselho Editorial

Prof. Dr. Adilson Tadeu Basquerote Silva -Universidade para o Desenvolvimento


do Alto Vale do Itajaí
Profa. Dra. Alicia Eugenia Olmos - Universidad Católica de Córdoba
Prof. Dr. Astor João Schönell Júnior - Instituto Federal Farroupilha
Prof. Dr. Alan Ricardo Costa - Universidade Federal de Roraima
Prof. Dr. Camilo Darsie de Souza -Universidade de Santa Cruz do Sul
Prof. Dr. Carlos Adriano Martins - Universidade Cidade de São Paulo
Prof. Dr. Christian Dennys Monteiro de Oliveira - Universidade Federal do Ceará
Profa. Dra. Dayse Marinho Martins - Universidade Federal do Maranhão
Prof. Dr. Deivid Alex dos Santos - Universidade Estadual de Londrina
Prof. Dr. Dioni Paulo Pastorio -Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Prof. Dr. Douglas Manoel Antonio de Abreu Pestana dos Santos - Faculdade Sesi-Sp
de Educação
Profa. Dra. Elane da Silva Barbosa - Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Profa. Dra. Francielle Benini Agne Tybusch - Universidade Franciscana
Prof. Dr. Francisco Odécio Sales - Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Ceará
Prof. Dr. Gilvan Charles Cerqueira de Araújo - Universidade Católica de Brasília
Prof. Dr. Leonardo Bigolin Jantsch -Universidade Federal de Santa Maria
Profa. Dra Liziany Müller Medeiros -Universidade Federal de Santa Maria
Profa. Dra Marcela Mary José - Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
Prof. Dr. Mateus Henrique Köhler - Universidade Federal de Santa Maria
Prof. Dr. Michel Canuto de Sena - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Profa. Dra. Mônica Aparecida Bortolotti - Universidade Estadual do Centro-Oeste
Prof. Dr. Rafael Nogueira Furtado - Universidade Federal do ABC
Prof. Dr. Roberto Araújo Silva - Centro Universitário Lusíada
Prof. Dr. Sidnei Renato Silveira - Universidade Federal de Santa Maria
Prof. Dr. Thiago Ribeiro Rafagnin - Universidade Federal do Oeste da Bahia
Prof. Dr Tomás Raúl Gómez Hernández - Universidade Central “Marta Abreu” de
Las Villas
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Índices para catálogo sistemático:


1. Educação 370
Tábata Alves da Silva - Bibliotecária - CRB-8/9253

10.48209/978-65-5417-129-8

Esta obra é de acesso aberto.


É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte
e a autoria e respeitando a Licença Creative Commons indicada.
Prefácio
Em tempos em de negação da ciência, de disseminação de falsas verda-
des e de um período histórico em que acabamos de vivenciar uma verdadeira
tragédia – a pandemia da Covid 19 –, ser professor/a e fazer pesquisa na área
de Educação em Ciências é um grande desafio. Entre as “heranças” do período
pandêmico, temos um grande déficit de aprendizagem nas escolas, em especial,
naquelas das redes públicas e entre filhos e filhas da classe trabalhadora. Segun-
do dados da Unicef e da Unesco (2022)1, estima-se que quatro em cada cinco
alunos do 6º ano do ensino fundamental na América Latina e no Caribe apre-
sentarão dificuldade de leitura e interpretação simples de textos, nos próximos
anos. O quadro agrava-se ainda mais, quando pensamos esse contexto entre as
populações socialmente mais vulneráveis, como os pretos, pardos, povos tradi-
cionais e do campo.

Neste sentido, a presente obra, desenvolvida coletivamente no âmbito do


Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências da Nature-
za (GPEEC NATUREZA) e do Programa de Pós-graduação em Educação em
Ciências (PPgECI) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),
contando ainda com artigos oriundos de pesquisas realizadas no Programa de
Pós-graduação em Docência para Ciências, Tecnologias, Engenharias e Mate-
mática (PPGSTEM) da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS),
representa a materialização de investigações realizadas durante e após a pande-
mia. Trazem consigo, a marca da resistência: estudantes que conseguiram dar
continuidade às suas pesquisas mesmo com as dificuldades enfrentadas pelas
Universidades Públicas brasileiras nos últimos anos e, além disso, contemplam
temáticas de extrema relevância para a Educação em Ciências.

1 https://www.unicef.org/lac/en/reports/two-years-after-saving-a-generation (2022)
A Educação do Campo, que neste ano de 2023 completa 25 anos de (re)
sistência enquanto movimento organizado e contemplado via políticas públicas,
como o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA),
Programa Nacional de Educação do Campo (PRONACAMPO) e Programa de
Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (PRO-
CAMPO), manifesta seus frutos também nesta obra. A maioria dos autores/as
são docentes ou egressos de Licenciaturas em Educação do Campo, desenvol-
vem pesquisas de mestrado/doutorado relacionadas à Educação do Campo e
vários, atuam como educadores/as na Educação Básica do Campo. Desta ma-
neira, através da seus estudos, cumprem o papel social da universidade pública,
de atender às demandas da população e compartilhar, através do ensino, pesqui-
sa e extensão, conhecimentos científicos produzidos, em uma troca entre o que
se faz academicamente e o que se produz em termos de sabedorias populares e
memórias bioculturais.

Temas importantes como alfabetização/letramento científico, atitudes e


percepções socioambientais, práticas interdisciplinares, agroecologia e dife-
rentes relatos de projetos e intervenções pedagógicas realizadas no ensino de
ciências na Educação Básica, permeiam este livro que é rico daquilo que mais
precisamos em termos de educação na contemporaneidade: o respeito às dife-
renças e à diversidade, à heterogeneidade em todas as formas de vida. Neste
sentido, o educar em rede, o educar na roda, o cooperar, o escrever, o dialogar,
o compartilhar...são verbos muito presentes nesta obra, assim como devem se
fazer presentes na constituição de cada educador/a.

Seja no estágio de docência, no clube de ciências, na roda de conversa, na


pesquisa bibliográfica, nos projetos ou nas cartas, ao constituir-se professor/a e
pesquisador/a em Educação em Ciências, estes autores estão também – talvez
sem nem imaginar o quanto – contando esta página da história da humanida-
de, de vivência e superação de um período que nos foi desafiador em todos
os sentidos. Que nos fez valorizar a vida em sua plenitude e de uma maneira
totalmente diferente, simplesmente pela dureza de sua brevidade. Que nos fez
pensar o quanto os avanços científicos e a educação científica fazem a diferen-
ça na vida das pessoas e o quanto a educação possui o poder transformador de
trazer a esperança, de novo e todo dia!

Que este livro sirva de inspiração a outros trabalhos coletivos e boas lei-
turas para quem acredita em uma docência em ciências diversa, atuante e que
faz a diferença na vida das pessoas.

Marilisa Bialvo Hoffmann


Faculdade de Educação da UFRGS

Porto Alegre, maio de 2023.


Apresentação

Temos a satisfação de apresentar o volume nº 2 do Livro Debates em


Educação em Ciências: Desafios e Possibilidades. A ideia de elaboração deste
livro tem como objetivo, proporcionar aos pós-graduandos do Grupo de Pes-
quisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC NA-
TUREZA) e do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências (PP-
gECI) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) um espaço
de publicização dos resultados de suas pesquisas. Saliento também que nesta
edição, contemplamos 02 artigos relativos a duas dissertações que estão sendo
realizadas no Programa de Pós-graduação em Docência para Ciências, Tecno-
logias, Engenharias e Matemática (PPGSTEM) da Universidade Estadual do
Rio Grande do Sul (UERGS).

O livro está estruturado em 17 capítulos, que trazem alguns temas inves-


tigados por diferentes pesquisadores de escolas do campo, escolas estaduais
bem como de Mestrandos, Doutorandos e Pós-doutorandos dos programas
de Pós-graduação acima citados, versando a partir de temas como: Educação
CTS, Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade, Interdisciplinaridade, Alfabe-
tização Científica, Letramento Científico, Estágio curricular supervisionado
em Ciências da Natureza, Educação Ambiental nas aulas de Química, Atitudes
ambientais de discentes, Percepções socioambientais de educadores, Rodas de
conversas, Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP), Alfabetização e Cultura
científica nos Anos iniciais, Clube de Ciência STEM, Espaços não Formais de
Ensino, Cooperativa Escolar, Cirandar, Cartas Pedagógicas e Agroecologia.

No primeiro capítulo, intitulado de EDUCAÇÃO CTS - UMA REVI-


SÃO BIBLIOGRÁFICA NA REDE DO PROGRAMA DE PÓS- GRA-
DUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, os autores desenvolveram um
estudo com o objetivo de realizar uma reflexão teórica a partir de uma revisão
bibliográfica das dissertações e teses defendidas e publicadas na rede do Pro-
grama de Pós-graduação em Educação em Ciências (PPgECI), do qual parti-
cipam as universidades federais: UFSM, UFRGS e UNIPAMPA. As teses e
dissertações buscadas deveriam contemplar o descritor CTS.

No segundo manuscrito, AS ILHAS INTERDISCIPLINARES DE


RACIONALIDADE COMO POSSIBILIDADE PARA O DESENVOLVI-
MENTO DA ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA E DO LETRAMENTO
CIENTÍFICO, representa um ensaio teórico que tem como tema principal a
metodologia das ilhas interdisciplinares de Racionalidade (IIR) proposta por
Gerard Fourez (1997) como uma possibilidade para o desenvolvimento da Al-
fabetização científica e do Letramento Científico. O mesmo está subdividido
em três sessões, Alfabetização Científica e Letramento científico, a metodolo-
gia das Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR) e a Interdisciplinaridade
como uma possibilidade pedagógica no ensino de ciências.

No terceiro capítulo, intitulado DISCUSSÕES SOBRE INTERDIS-


CIPLINARIDADE E ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA A PARTIR DE
UMA ILHA INTERDISCIPLINAR DE RACIONALIDADE, busca anali-
sar as percepções a respeito da interdisciplinaridade, bem como os atributos en-
volvidos na ACT, a partir de professores e estudantes do Ensino Médio envolvi-
dos no desenvolvimento de uma IRR que discutiu a Agroecologia e a produção
de alimentos em um contexto de escola do campo. Os instrumentos utilizados
foram entrevistas e questionários aplicados com professores, bem como produ-
ções e falas dos participantes durante o desenvolvimento das atividades, sendo
estas posteriormente transcritas. Ainda, entrevistas em grupo focal realizadas
com alguns dos professores envolvidos e com grupos de estudantes. A análise
dos dados compreendeu a Análise Textual Discursiva (ATD), além da compara-
ção quanto aos atributos desenvolvidos em trabalhos de semelhante teor.

No quarto manuscrito, intitulado ESTÁGIO CURRICULAR SUPER-


VISIONADO EM CIÊNCIAS DA NATUREZA: DESAFIOS E POTEN-
CIALIDADES DO PROCESSO FORMATIVO DE LICENCIANDOS EM
EDUCAÇÃO DO CAMPO, investigar alguns aspectos relativos a essa forma-
ção, a partir dos estágios curriculares supervisionados. São apresentadas e dis-
cutidas três vivências de estagiários em escolas, enfatizando a prática docente e
as relações com a formação por área de conhecimento e a interdisciplinaridade,
estas que são questões centrais para as licenciaturas em Educação do Campo.

No quinto capítulo, intitulado EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS AU-


LAS DE QUÍMICA NA MODALIDADE DE ENSINO EJA – SAPUCAIA
DO SUL (RS) contempla uma ação pedagógica desenvolvida na modalidade
de ensino da Educação de Jovens e Adultos (EJA) com a inserção da Educação
Ambiental (EA) no currículo escolar, buscando atender as Diretrizes Curricu-
lares da Educação Básica, elegeu-se trabalhar a Química em uma proposta de
ensino contextualizada e problematizadora. Tendo em vista o público alvo -
composto por mulheres - optou-se por trabalhar conteúdos de Química a partir
da análise dos princípios ativos presentes em produtos de limpeza, culminando
com a elaboração de um produto alternativo e ecológico. O projeto de ação teve
por objetivo promover a integração da temática ambiental com o conhecimento
químico, preparando os estudantes para que sejam capazes de acompanhar, in-
tervir e discutir a Ciência e a Tecnologia no Ambiente na construção de conhe-
cimento e valores diante da problemática do uso excessivo.

No sexto manuscrito, intitulado ANÁLISES ESTATÍSTICAS NA EDU-


CAÇÃO EM CIÊNCIAS: UM ESTUDO SOBRE CONHECIMENTOS E
ATITUDES AMBIENTAIS DE ESTUDANTES BRASILEIROS E ALE-
MÃES, realizou-se um estudo para mensurar e analisar com métodos quantita-
tivos fatores cognitivos relacionados ao comportamento ambiental. O presente
estudo visou (1) avaliar as atitudes ambientais (AA) e conhecimentos ambien-
tais (CA) de estudantes brasileiros e alemães e (2) verificar se a frequência da
participação em movimentos ambientais é um fator relevante para as atitudes
e conhecimentos ambientais. Ao todo, 658 estudantes participaram do estudo,
sendo 327 da Alemanha e 331 do Brasil (idade média de 25,21 ± 7,91 anos).
Aplicou-se a escala dos 2 Principais Valores Ambientais (2-MEV) e questioná-
rios com três dimensões dos conhecimentos ambientais. Realizaram-se análises
das tendências de distribuição e teste de Mann-Whitney.

No sétimo capítulo, intitulado RIO MACACO: PERCEPÇÕES SO-


CIOAMBIENTAIS DE EDUCADORES DO ENSINO FUNDAMENTAL
NO MUNICÍPIO DE PALMEIRA DAS MISSÕES/RS buscam oportunizar
o respeito à sustentabilidade ambiental, social, ética, econômica e política. Este
texto tem como objetivo identificar as percepções ambientais de educadores a
partir de seus conhecimentos e prática relacionada ao Rio Macaco, em esco-
las municipais de Palmeira das Missões/RS. A pesquisa foi realizada em três
escolas, contando com a participação de 40 educadores de diferentes áreas do
conhecimento. Para coleta de dados foi aplicado um questionário semiestru-
turado, em que as respostas abertas foram analisadas por meio da Análise de
Conteúdo.

No oitavo manuscrito, intitulado ENSAIO SOBRE APRENDIZAGEM


BASEADA EM PROJETOS – ABP é um ensaio que apresenta a metodologia
de Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP), também conhecida como Project
Based Learning (PBL), que é considerada uma das práticas de ensino mais pro-
missoras do século XXI. A ABP é uma metodologia ativa que incentiva a inves-
tigação, pesquisa e resolução de problemas, desafiando os alunos a trabalharem
em questões e problemas reais e a apresentarem resultados significativos. A
participação ativa dos alunos torna os conteúdos mais atrativos, contribuindo
para a aprendizagem e melhoria do desempenho individual e coletivo. Trate-se
neste trabalho acerca das principais diferenças conceituais entre Aprendiza-
gem Baseada em Projetos (ABProj) e Aprendizagem Baseada em Problemas
(ABProb).

No nono capítulo, intitulado RODAS DE CONVERSA: CONSTRU-


ÇÃO DE ESPAÇOS DE DIÁLOGOS E APRENDIZAGENS surgiu na bus-
ca do conceito, da dinâmica, do histórico e da aplicabilidade das Rodas de Con-
versa em pesquisas realizadas na plataforma Google Acadêmico, que indicaram
muitos artigos de periódicos, capítulos de livros desde 1995 sobre o tema. As
Rodas de Conversa são consideradas uma metodologia ou espaço de forma-
ção, superam o simples fato de cadeiras dispostas em círculos, são espaços
dialógicos de trocas, contextualizações e reflexões sobre um ou mais assuntos.
Pode-se dizer que as Rodas de Conversa envolvem elementos fundamentais
como a estrutura cognitiva e a experiência, buscando uma atitude interativa dos
participantes. Elas têm grande relevância como instrumento pedagógico favo-
recendo o conhecimento e a troca de experiências, nas empresas, nos serviços
comunitários ou nos centros de saúde.

No décimo manuscrito, intitulado REVISÃO DE LITERATURA:


ALFABETIZAÇÃO E CULTURA CIENTÍFICA NO ENSINO DE
APRENDIZAGENS SIGNIFICATIVAS DE CIÊNCIAS NOS ANOS
INICIAIS, UMA ABORDAGEM STEM, é resultado de uma pesquisa em
andamento junto à Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, tendo como
por finalidade analisar a produção textual sobre os descritores Alfabetização
Científica, Cultura / Enculturação Científica, Aprendizagem Significativa e
STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), com suas abordagens
educacionais, no período de 2019 até 2022. Buscou a temática junto às bases
de dados da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), da
Rede de Revistas Científicas (Redalyc), Scientific Electronic Library Online
(Scielo), da Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (RBPEC)
e no Repositório Google Acadêmico. A metodologia baseou-se na revisão de
literatura que denominamos de “Estudo do Conhecimento”.

No décimo primeiro capítulo, intitulado CLUBE DE CIÊNCIA STEM


COMO SUGESTÃO DE PROJETO INTERDISCIPLINAR EM ESCO-
LA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, CONTRIBUINDO COM O NOVO ENSI-
NO MÉDIO, foi feito a Revisão Sistemática literal (RSL) a partir do estudo
em aportes teóricos que modelaram o cruzamento na forma de matrizes mate-
máticas. Esta buscou interconectar os unitermos, com o objetivo de analisar as
relações entre eles ancorando relevantes argumentações para a viabilidade de
montar no espaço escolar um Clube de Ciências como produto educacional. A
finalidade incidiu em apresentar o desenvolvimento da RSL buscando pelos
quatro unitermos em bases acadêmicas nacionais confiáveis, em um panorama
geral que abordou as diferentes visões dos assuntos relacionados nos últimos
três anos.

No décimo segundo manuscrito, intitulado O ELO ENTRE O ENSINO


DE CIÊNCIAS, O LETRAMENTO CIENTÍFICO E A EDUCAÇÃO EM
ESPAÇOS NÃO FORMAIS DENTRO DE UM CLUBE DE CIÊNCIAS:
UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA surge à necessidade de novas e mais
atrativas metodologias de ensino para alcançar mais êxito no processo de en-
sino-aprendizagem. Este capítulo faz parte de uma proposta de trabalho que
pretende unir o letramento científico e a educação em espaços não formais de
ensino dentro de clubes de ciências, incluindo atividades que visam o fortaleci-
mento da aprendizagem e que rompam os muros das escolas.
No décimo terceiro capítulo, intitulado COOPERB: O COOPERAR
EM UMA ESCOLA DO/NO CAMPO DE NOVA SANTA RITA, RIO
GRANDE DO SUL, tem como objetivo descrever como foi à chegada para
participação no programa Cirandar: rodas de investigação na escola, bem como
relatar as atividades da Cooperativa Escolar da Emef Rui Barbosa, de Nova
Santa Rita durante o ano de 2021. A Cooperb tem como objetivo o protagonis-
mo dos educandos e as contribuições dessa organização para a educação e a
sociedade como um todo, e é importante no que diz respeito ao impacto que ela
traz para o ensino e a própria comunidade escolar. A mesma trabalha a partir
das necessidades observadas no território escolar e baseados nos conhecimen-
tos das ciências da natureza.

No décimo quarto manuscrito, intitulado REFLEXÕES DOCENTES


SOBRE A INTERDISCIPLINARIDADE E A PRÁTICA: RELATO DA
FORMAÇÃO CIRANDAR 2021 busca compreender como docentes parti-
cipantes da formação cirandar /21 trabalham com a interdisciplinaridade de
maneira prática no seu exercício docente, visando trazer contribuições para o
âmbito educacional. O instrumento de coleta de dados foi um questionário de
perguntas abertas aplicado através do Google forms. A metodologia utilizada
adotou narrativas das participantes quanto as suas percepções diante das per-
guntas. Foi possível construir melhores entendimentos sobre as temáticas junto
a autores sobre as categorias: ser professor, interdisciplinaridade e prática in-
terdisciplinar.

No décimo quinto capítulo, intitulado A INTERDISCIPLINARIDA-


DE NAS CARTAS PEDAGÓGICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA
(TRANS) FORMAÇÃO DE EDUCADORES/AS DO CAMPO, é essencial
na comunicação e parcerias entre escolas de educação básica e universidades.
Um excelente exemplo dessa comunhão é o projeto de extensão Cirandar:
rodas de investigação desde a escola, da Universidade Federal do Rio Grande,
desenvolvido em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e
demais instituições públicas. O projeto constrói propostas de reflexão a partir
das narrativas de Cartas Pedagógicas no intuito de transformação social e
ambiental pela prática docente. Nesse contexto, desenvolvemos este capítulo
a partir das escritas das Cartas Pedagógicas na última edição do projeto e a
importância da interdisciplinaridade na formação de professores e professoras,
tornando-se mais aptos a desenvolver sua prática educativa em uma sociedade
em constante transformação, bem como uma visão interdisciplinar no currículo
escolar.

No décimo sexto manuscrito, intitulado CIRANDAR - RODAS DE


INVESTIGAÇÃO DESDE A ESCOLA: O CUIDADO COM A NATURE-
ZA A PARTIR DE CARTAS PEDAGÓGICAS busca contar quem somos e
como chegamos até o programa de extensão “Cirandar: rodas de investigação
desde a escola” por meio das Cartas Pedagógicas, num diálogo e reflexão
em conjunto às pesquisas de Tese que fazem parte do caminho na pós-gra-
duação. As pesquisas tratam sobre o cuidado com a natureza e a abordagem
temática dos agrotóxicos e da Agroecologia nas escolas do campo no estado
do Mato Grosso, bem como, os processos de aprendizagens sobre a Agroe-
cologia nas escolas do campo do Estado do Rio Grande do Sul. Porém, para
esse momento, realizamos uma breve apresentação da temática e as possíveis
articulações/reflexões com a teoria de Paulo Freire e as Cartas Episcopais e
os processos de formação e reflexão que as propõem. São refletidas as con-
junturas pandêmicas e bélicas e as consequências para a sociobiodiversidade
na contemporaneidade e para as futuras gerações.
No décimo sétimo capítulo, intitulado AGROECOLOGIA NA ESCO-
LA DO/NO CAMPO DE NOVA SANTA RITA: UM TRABALHO FEITO
POR MUITAS MÃOS E QUE ULTRAPASSA OS MUROS DA ESCOLA,
tem como objetivo descrever as atividades do Clube de Ciências Saberes do
Campo, de uma escola do/no campo, em Nova Santa Rita/RS. Apresenta-se
todo o percurso didático das suas atividades, durante quatro meses, baseado
no eixo temático “agroecologia”. No decorrer de suas atividades, buscou-se
dialogar sobre a história da escola e da comunidade, bem como observar o
território educativo em que está inserida a escola, como também apresentar a
proposta da agroecologia para a agricultura local e os seus benefícios para o
meio ambiente e seus sujeitos. Percebeu-se pelos relatos das atividades que a
escola trabalha a partir de uma educação contextualizada, que parte do terri-
tório educativo dos educandos e valoriza os saberes locais.

Uma ótima leitura.


José Vicente Lima Robaina.
Sumário

SEÇÃO 1........................................................................................................23

CAPÍTULO 1

EDUCAÇÃO CTS - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA NA REDE


DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM
CIÊNCIAS..................................................................................................24

Camila Simone da Silva


Daniela Alves da Silva
Greice de Souza, Izalina de Vargas Oliva
Roberta Hoffmann Machado
Sandra Mara Mezalira
doi: 10.48209/978-65-5417-129-0

CAPÍTULO 2

AS ILHAS INTERDISCIPLINARES DE RACIONALIDADE


COMO POSSIBILIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DA
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA E DO LETRAMENTO
CIENTÍFICO..............................................................................................51

Ana Paula Santellano de Oliveira


Heidi Fernanda Bertotti
Marcus Eduardo Maciel Ribeiro
doi: 10.48209/978-65-5417-129-1

CAPÍTULO 3

DISCUSSÕES SOBRE INTERDISCIPLINARIDADE E


ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA A PARTIR DE UMA ILHA
INTERDISCIPLINAR DE RACIONALIDADE.................................71

Milene Ferreira Miletto


Lia Heberlê de Almeida
José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-2
CAPÍTULO 4

ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO EM CIÊNCIAS


DA NATUREZA: DESAFIOS E POTENCIALIDADES DO
PROCESSO FORMATIVO DE LICENCIANDOS EM EDUCAÇÃO
DO CAMPO...............................................................................................98

Sinara München
Viviane de Almeida Lima
Renata Portugal Oliveira
doi: 10.48209/978-65-5417-129-3

CAPÍTULO 5

EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS AULAS DE QUÍMICA NA


MODALIDADE DE ENSINO EJA – SAPUCAIA DO SUL(RS)........117

Andréia Lisandra Lussani


Camila Franceschi da Silva
doi: 10.48209/978-65-5417-129-4

CAPÍTULO 6

ANÁLISES ESTATÍSTICAS NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS:


UM ESTUDO SOBRE CONHECIMENTOS E ATITUDES
AMBIENTAIS DE ESTUDANTES BRASILEIROS E ALEMÃES...138

Renan de Almeida Barbosa


José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-5
CAPÍTULO 7

RIO MACACO: PERCEPÇÕES SOCIOAMBIENTAIS DE


EDUCADORES DO ENSINO FUNDAMENTAL NO MUNICÍPIO
DE PALMEIRA DAS MISSÕES/RS......................................................165

Jeferson Rosa Soares


Daniela Costa Vieira Menezes
Laura Schmidt Soares
Roselane Zordan Costella
José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-6

CAPÍTULO 8

ENSAIO SOBRE APRENDIZAGEM BASEADA EM PROJETOS –


ABP..........................................................................................................185

Eduardo Pastorio
Rafael Scheffer
Edimar Fonseca
doi: 10.48209/978-65-5417-129-7

CAPÍTULO 9

RODAS DE CONVERSA: CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS DE


DIÁLOGOS E APRENDIZAGENS...................................................204

Regina Beatriz Leal Morgavi


Vera Maria Treis Trindade
doi: 10.48209/978-65-5417-129-X
CAPÍTULO 10

REVISÃO DE LITERATURA: ALFABETIZAÇÃO E CULTURA


CIENTÍFICA NO ENSINO DE APRENDIZAGENS SIGNIFICATI-
VAS DE CIÊNCIAS NOS ANOS INICIAIS, UMA ABORDAGEM
STEM....................................................................................................232

Felipe de Carvalho César


José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-9

CAPÍTULO 11

CLUBE DE CIÊNCIA STEM COMO SUGESTÃO DE PROJETO


INTERDISCIPLINAR EM ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA,
CONTRIBUINDO COM O NOVO ENSINO MÉDIO......................263

Chamis Nédia Abdul Khalek


José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-Y

CAPÍTULO 12

O ELO ENTRE O ENSINO DE CIÊNCIAS, O LETRAMENTO


CIENTÍFICO E A EDUCAÇÃO EM ESPAÇOS NÃO-FORMAIS
DENTRO DE UM CLUBE DE CIÊNCIAS: UMA REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA.....................................................................................298

Gabriele Milbradt Glasenapp


José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-A
SEÇÃO 2: CIRANDAR..............................................................................325

CAPÍTULO 13

COOPERB: O COOPERAR EM UMA ESCOLA DO/NO CAMPO


DE NOVA SANTA RITA, RIO GRANDE DO SUL...........................326

Sabrina Silveira da Rosa


Andressa Luana Moreira Rodrigues
Mariana Paranhos de Oliveira
José Vicente Lima Robaina
doi: 10.48209/978-65-5417-129-B

CAPÍTULO 14

REFLEXÕES DOCENTES SOBRE A INTERDISCIPLINARIDADE


E A PRÁTICA: RELATO DA FORMAÇÃO CIRANDAR 2021.......350

Ana Paula Santellano de Oliveira


Roniere dos Santos Fenner
doi: 10.48209/978-65-5417-129-C

CAPÍTULO 15

A INTERDISCIPLINARIDADE NAS CARTAS PEDAGÓGICAS


E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA (TRANS)FORMAÇÃO DE
EDUCADORES/AS DO CAMPO..........................................................373

Maria da Conceição do Monte Soares


Aline Guterres Ferreira
doi: 10.48209/978-65-5417-129-D
CAPÍTULO 16

CIRANDAR - RODAS DE INVESTIGAÇÃO DESDE A ESCOLA:


O CUIDADO COM A NATUREZA A PARTIR DE CARTAS
PEDAGÓGICAS....................................................................................390

Aline Guterres Ferreira


Estela Elisalde Toledo
Sandra Mara Mezalira
doi: 10.48209/978-65-5417-129-E

CAPÍTULO 17

AGROECOLOGIA NA ESCOLA DO/NO CAMPO DE NOVA


SANTA RITA: UM TRABALHO FEITO POR MUITAS MÃOS E
QUE ULTRAPASSA OS MUROS DA ESCOLA............................416

Andressa Luana Moreira Rodrigues


Andriara Lima de Oliveira
Arlei Antônio Castro
Cátia Barcellos Zsortika
Eulália Doleski Fraga de Moraes
Janaina da Rosa Pereira
Mariana Paranhos
Sabrina Silveira da Rosa
doi: 10.48209/978-65-5417-129-F

SOBRE OS ORGANIZADORES......................................................445

SOBRE OS/AS AUTORES/AS........................................................447


Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

SEÇÃO 1:

Volume II 23
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 1

EDUCAÇÃO CTS - UMA


REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
NA REDE DO PROGRAMA
DE PÓS- GRADUAÇÃO EM
EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS
Camila Simone da Silva
Daniela Alves da Silva
Greice de Souza
Izalina de Vargas Oliva
Roberta Hoffmann Machado
Sandra Mara Mezalira
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-0

Considerações Iniciais

A Educação em Ciências no Brasil tem passado por diversas necessida-


des de transformações quanto aos aspectos de: currículo, formação de professo-
res, estratégias de ensino aprendizagem e aspectos didáticos metodológicos em
busca de um ensino e aprendizagem eficiente e com mais qualidade. De acordo

Volume II 24
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

com isso, torna-se importante a reflexão e a tomada de decisão responsável, no


campo da educação em ciências e nos mais diversos espaços, sobre a produção
e o uso da ciência e tecnologia, bem como sobre as inúmeras consequências
ambientais, sociais, econômicas e políticas que estes causam ao país e ao mun-
do.

Mesmo que a ciência e a tecnologia tenham avançado e melhorado em


muitos aspectos da nossa vida, o desenvolvimento dela tem provocado algumas
consequências, principalmente, quando se trata da saúde e do meio ambiente. A
produção dos transgênicos, a utilização dos agrotóxicos, a construção de usinas
hidrelétricas, as bombas atômicas, a indústria alimentícia, o consumo ilimitado
de produtos, são alguns exemplos, que de alguma forma afetam a vida.

De acordo com Auler (2018), a degradação socioambiental depende mui-


to da ação humana. Depende também dos diversos setores sociais engajados ou
não, que historicamente têm sido silenciados pela ganância e sagacidade dos
opressores. A sociedade tem muito a aprender, a avançar, especialmente no que
tange à influência exercida pelo capitalismo sobre o sistema produtivo, incluin-
do a ciência e tecnologia; e a agenda de pesquisa, apontando para a geração de
lucros privados e não para o contentamento de necessidades sociais.

O currículo escolar não é diferente desse processo: ele encontra, como


na organização fabril, a sua lógica, a sua inspiração. A revolução industrial
transformou a vida de todas as pessoas, inclusive na forma de conduzir a edu-
cação. A educação bancária denunciada por Paulo Freire, nos mostra a concep-
ção advinda das fábricas, fundamentando o currículo. Alguns poucos (os técni-
cos) concebem o currículo e muitos (os professores) executam. O capital pauta
ou controla Políticas Científico-Tecnológicas, produtos e currículos (AULER,
2018).

Volume II 25
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Assim, se faz necessário ponderar não apenas as implicações e impactos


da ciência e tecnologia (CT), mas também o processo que os antecede, como
as questões política e econômica envolvidas, para podermos, como cidadãos
críticos e facilitadores do conhecimento, participar da construção de políticas
públicas de CT (AULER, 2018).

Quando nos reportamos ao currículo, a educação da Ciência, Tecnologia


e Sociedade (CTS) e o Pensamento Latino Americano em Ciência, Tecnologia
e Sociedade (PLACTS) surgem como possibilidades de transformação da práti-
ca escolar e, por consequência, da vivência social. É por meio do ensino escolar
e não escolar que se pode, no coletivo, minimizar os problemas, alcançando
o bem-estar social. Isto pode se dar por meio da problematização, reflexão e
tomada de consciência com responsabilidade dos fenômenos cotidianos locais.

Diante desse panorama sobre CTS, o objetivo deste estudo foi realizar
uma reflexão teórica a partir de uma revisão bibliográfica das dissertações e
teses defendidas e publicadas na rede do Programa de Pós-graduação em Edu-
cação em Ciências (PPgECi), do qual participam as universidades federais:
UFSM, UFRGS e UNIPAMPA. As teses e dissertações buscadas deveriam con-
templar o descritor CTS. Nessa perspectiva, buscamos identificar os autores,
títulos, anos de publicação, universidades, principais autores CTS referencia-
dos nos trabalhos, as categorias CTS a priori de acordo com Aikenhead (1994)
apud Santos e Mortimer (2000), e os focos temáticos apresentados em cada
trabalho, conforme Megid Neto (1999).

A Educação CTS no Brasil e no mundo

O movimento CTS emergiu nas décadas de 60 e 70 na Europa, nos Esta-


dos Unidos e nos países latino-americanos, inclusive o Brasil. Este movimento
introduziu a crítica ao modelo desenvolvimentista permeado de forte impacto

Volume II 26
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ambiental, difundindo a reflexão sobre o papel da ciência e da tecnologia na


sociedade, com uma perspectiva de formação para a cidadania. Um exemplo
foi à publicação do livro Primavera Silenciosa de Rachel Carson (2010), livro
que denuncia a presença de agrotóxicos que prejudicam o ambiente devido aos
seus efeitos nocivos.

Ao longo do tempo, se construíram mitos, os quais afirmam que a Ciência


e Tecnologia poderiam resolver todos os problemas da humanidade e conduzir
ao bem-estar social, atribuindo, assim, um caráter salvacionista à CT. Esses
mitos também precisam ser discutidos e superados, pois esta ideia ignora as
relações sociais em que a CT é criada e utilizada (AULER, 2011).

Diversas são as siglas utilizadas quando a discussão é sobre CTS, no


entanto, todas têm o intuito - recontextualizado dentro das demandas atuais
de educação científica—de que ela esteja comprometida com a formação para
a cidadania e para uma sociedade justa e igualitária. (SANTOS, 2011). Uma
destas siglas é a CTSA (Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente). Esta é
proposta por autores como Vilches e Gil Perez, estes dão enfoque ao A que se
refere às discussões sobre o ambiente. Já Renato Dagnino, Décio Auler, Oscar
Varsavsky, Herrera e Sabato são autores que discutem a perspectiva CTS, mas
também trazem para a discussão uma outra perspectiva que é do Pensamento
Latino Americano em CTS (PLACTS).

O PLACTS emerge num momento histórico em que está em evidência


a denominada transferência tecnológica. Esse pensamento desenvolve uma
práxis que questiona o modelo de industrialização. Outros representantes do
PLACTS como, Varsavsky, Herrera, Sábato e Mackenzie, alguns deles vincu-
lados a universidades argentinas nas décadas de 60 e 70, do século passado,
destacam que, no processo de transferência tecnológica, não estavam sendo
transferidas ferramentas neutras, mas modelos de sociedade, ou seja, valores e

Volume II 27
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

conhecimentos próprios. Também afirmavam estes autores que a dinâmica do


desenvolvimento científico- tecnológico era alheia, isto é, ignorava as deman-
das do conjunto da sociedade latino- americana, ou seja, as demandas locais.
(AULER; DELIZÓICOV, 2015).

A abordagem PLACTS, teve sua origem, objetivo e desenvolvimento


bem diferentes dos países desenvolvidos, não tinha o objetivo de atuar nos
rumos da CT por meio da participação pública na ciência, e sim mediante uma
ação direta sobre a elaboração da Política Científica e Tecnológica (DAGNI-
NO; THOMAS; DAVYT, 1996; VACCAREZZA, 2004).

No contexto latino americano, o PLACTS, considera a história do país,


a sua localidade, elementos que são comuns neste espaço, tendo a participação
em processos decisórios como elemento essencial. Conforme Auler (2011), o
PLACTS leva em consideração os elementos como: a participação nos rumos
do desenvolvimento científico- tecnológico e não apenas nos impactos pós-pro-
dução e a definição da agenda de pesquisa.

Conforme apontado por vários pesquisadores (CARLETTO, 2009; ME-


GID NETO; ROCHA, 2010; MONTEIRO; TEIXEIRA, 2004; PRAIA; CA-
CHAPUZ; GIL PÉREZ, 2002) no âmbito educacional, as concepções que os
professores possuem acerca da ciência, da tecnologia e de suas inter-relações
com a sociedade, assim como as suas concepções sobre a educação de modo
geral, e sobre o ensino de ciências, em particular, influenciam diretamente nas
práticas pedagógicas, de modo a favorecer ou limitar os processos de ensino e
aprendizagem.

A efetivação de uma educação utilizando o direcionamento CTS, requer


educadores conscientes de seu papel social de formadores dos futuros cidadãos
- educadores facilitadores e mediadores, ao invés de detentores de um conheci-

Volume II 28
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mento estanque - em uma sociedade cada vez mais permeada por CT. Para tan-
to, se faz necessário discutir a formação de professores de ciências, objetivando
criar novas concepções do ser professor.

Décio Auler (2011) chama a atenção para um currículo que potencialize


mecanismos de participação. Participação na sociedade e também na defini-
ção de parâmetros em relação a política científico e tecnológica (PCT), e não
apenas, como é predominante no campo CTS, na avaliação dos impactos da
pós-produção. Assim, se faz necessário pensar nesse outro viés de reflexão CTS
que é a reflexão acerca da ciência e da tecnologia antes mesmo da sua produção.

Na Educação em Ciências, os critérios utilizados pela comunidade para


a tomada de decisão em relação aos temas controversos, muitas vezes tem se
dado de forma tecnocrática. “Tentar compreender e decidir, unicamente via au-
mento de conhecimento técnico/científico, significa um retorno à tecnocracia”
(AULER, 2011, p. 82). Há outras dimensões que precisam ser desenvolvidas,
além da CT.

Um exemplo que Auler (2011) destaca é a questão da transgenia, já que,


além de aspectos científicos e tecnológicos relativos à sustentabilidade dos
ecossistemas, incluindo o ser humano, há outras questões em jogo, como a so-
berania e a autonomia na produção de sementes (monopólio nesta produção).
“Separar ‘fatos científicos’ de ‘juízos de valor’, algo muito caro para o posi-
tivismo/cientificismo, reduzindo as discussões sobre temas contemporâneos a
‘fatos científicos’, silenciando outras dimensões, cristaliza concepções tecno-
cráticas, colocadas a serviço da maximização do lucro” (AULER, 2011, p. 83).

Varsavsky (1976), na época alertava para a não cópia da ciência e tecno-


logia de países desenvolvidos para os países da América Latina. A realidade e
o contexto são outros, não somos países de primeiro mundo.

Volume II 29
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Nessa perspectiva, para Auler (2011), o currículo precisa ser radical-


mente modificado, de forma que possa potencializar a compreensão, a parti-
cipação em debates, a tomada fundamentada de decisões em temas sociais,
marcados pela CT e por sua natureza complexa, decisões “não abarcadas por
um único campo disciplinar e, numa perspectiva de democratização, não res-
trito ao campo técnico-científico” (AULER, 2011, p. 91).

Para reconstruir a CTS no campo educacional, dando originalidade e in-


corporação crítica, é necessário pensar a partir do âmbito do PLACTS, parti-
cipando da elaboração de parâmetros para a definição das Políticas Científicas
e Tecnológicas. E a perspectiva do PLACTS implica “problematizar a trans-
ferência de tecnologia como solução para os problemas da América Latina,
rejeitar a transferência acrítica, a tentativa de universalização da agenda de pes-
quisa. Uma agenda associada a um modelo de desenvolvimento insustentável”
(AULER, 2011, p. 94).

Aspectos metodológicos

O propósito deste trabalho foi realizar uma reflexão teórica e revisão


bibliográfica da Educação CTS por meio de um mapeamento de teses e dis-
sertações buscadas nos sites de cada universidade conveniada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação em Ciências, sendo elas: UFRGS, UFSM e
UNIPAMPA. Um dos critérios para a seleção das pesquisas, é que as mesmas
contivessem a palavra CTS/PLACTS ou Ciência, Tecnologia e Sociedade em
pelo menos um dos seguintes campos: título, palavras-chave, resumo e/ou
trabalho completo. As produções acadêmicas reunidas para a análise foram
no período de 2011 à 2020.

Este trabalho trata de uma abordagem qualitativa, de cunho exploratório


e descritivo. Para Ludke e André (1986), a pesquisa de abordagem qualitativa
retrata desde situações simples e específicas até situações complexas e abstra-
tas de forma completa e profunda.

Volume II 30
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências, foi oficiali-


zado em 2005 pela CAPES e criado a partir do trabalho conjunto entre pro-
fessores de algumas universidades federais do Rio Grande do Sul. Com o ob-
jetivo de investigar os efeitos das práticas sociais presentes nos laboratórios
e nas salas de aula das universidades e escolas, o programa visa estabelecer
interações entre o fazer ciência e o ensinar ciência (PPgECi, 2021).

Uma das análises realizadas, a partir dos trabalhos selecionados, foi ve-
rificar em quais dos focos temáticos (quadro 1) as pesquisas se encaixavam.
A partir daí, elaboramos uma nuvem de palavras (figura 4), em que, apresenta
os focos temáticos mais desenvolvidos nas pesquisas analisadas. Os focos
temáticos foram abordados, inicialmente, por Megid Neto (1999), conforme
quadro 1.

Quadro 1. Focos Temáticos

Focos temáticos Descrição

Estudos dos princípios, parâmetros, diretrizes e funda-


1.Currículos e mentos teóricos- metodológicos para o ensino de Ciên-
Programas cias, contemplando as diversas etapas convencional-
mente atribuídas ao desenho curricular.

Pesquisa que analisa a relação Conteúdo-Método no en-


sino de Ciências, com foco de atenção no conhecimento
2.Conteúdo-Método científico veiculado na escola, na forma como este co-
nhecimento é difundido por meio de métodos e técnicas
de ensino-aprendizagem.

Estudos de avaliação de materiais ou recursos didáticos


no ensino de Ciências, como textos de leitura, livros di-
3.Recursos Didáticos
dáticos, materiais de laboratório, filmes, computador, jo-
gos, brinquedos, mapas conceituais, entre outros.

Volume II 31
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Diagnósticos das condições profissionais do professor


4.Características da área de Ciências. Identificação do perfil sociográfico
do Professor do professor, de sua estrutura intelectual, de seu conheci-
mento “espontâneo”, de suas concepções sobre ciências.

Diagnóstico das condições socioeconômicas e culturais


5.Características
dos alunos e suas implicações no rendimento escolar ou
do Aluno
aprendizagem em Ciências.

Pesquisas que descrevem e analisam o desenvolvimen-


6.Formação de to de conceitos científicos no pensamento de alunos e/
Conceitos ou professores, implicam em processos de mudanças ou
evolução conceitual.

Pesquisa com foco de atenção na organização de insti-


tuições não-escolares ou não-formais de ensino, como
7.Organização da
Organizações Não-Governamentais(ONGs); Secretarias
Instituição/Programa
de Meio-ambiente, de saúde, de Cultura; Museus, Clu-
de Ensino Não-Escolar
bes ou Centros de Ciências; Mostras, Feiras ou Exposi-
ções Científicas.

Aspectos relativos à filosofia ou epistemologia da ciên-


cia, tais como concepções de ciência, de cientista, de
8.Filosofia da Ciência
método(s) científico(s), formulação e desenvolvimento
de teorias científicas, paradigmas e modelos científicos.

Investigação relacionada com a formação inicial de pro-


9.Formação de fessores para o ensino na área de Ciências Naturais, no
Professores âmbito da Licenciatura, da Pedagogia ou do Ensino Mé-
dio - modalidade Normal.

Programas, diretrizes, ações, objetivos e interesses de


um indivíduo ou grupo, governamental ou não-governa-
mental, voltados para o público em geral e relacionados
10.Políticas Públicas
com um único ou um conjunto de problemas da coletivi-
dade, desde que explicitadas suas repercussões ou liga-
ções com a educação científica.

Volume II 32
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Diagnóstico das características de instituições escolares


11.Organização da educação básica ou superior, abrangendo aspectos re-
da Escola lativos à gestão escolar, nos seus aspectos político-ad-
ministrativo,pedagógico, funcional, físico, entre outros.

Estudos de revisão bibliográfica em fontes primárias e


secundárias que resgatam acontecimentos, fatos, deba-
12.História da Ciência tes, conflitos e circunstâncias da produção científica em
determinada época, do passado próximo ou remoto, e as
articulações entre eles.

Pesquisa de caráter histórico sobre a evolução do Ensino


13.História do de Ciências no Brasil ou sobre características isoladas
Ensino de Ciências desse ensino (materiais didáticos, currículos, legislação,
formação de professor, etc.).

Foco particular que não encontra correspondência com


14.Outro os demais, ou cuja incidência de casos no conjunto dos
documentos classificados é bastante pequena.

Fonte - Megid Neto (1999), adaptado pelas autoras (2021).

Santos e Mortimer (2000) — baseado em Aikenhead (1994) — anali-


sando práticas docentes que alegam promover a inserção da CTS no currículo
escolar, elaboram uma classificação, em oito categorias: na primeira delas se
enquadram os trabalhos analisados nos quais a CTS é apresentada com caráter
motivador e eventual, enquanto que na última os materiais são caracterizados
pelos estudos CTS em uma perspectiva sociológica, de forma que o conteú-
do propriamente dito é apresentado de maneira complementar. As categorias
CTS a priori conforme Aikenhead (1994 apud SANTOS; MORTIMER, 2000),
adaptada pelas autoras, são apresentadas conforme segue, no quadro 2 e serão
melhor discutidas nos Resultados desse trabalho.

Volume II 33
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 2. Categorias de ensino CTS

Categorias Descrição

1. Conteúdo de CTS Ensino tradicional de ciências acrescido da menção ao


como elemento de conteúdo de CTS com a função de tornar as aulas mais
motivação. interessantes.

Ensino tradicional de ciências acrescido de pequenos


2. Incorporação eventual
estudos de conteúdo de CTS incorporados como apên-
do conteúdo de CTS ao
dices aos tópicos de ciências. O conteúdo de CTS não
conteúdo programático.
é resultado do uso de temas unificadores.

Ensino tradicional de ciências acrescido de uma série


3. Incorporação
de pequenos estudos de conteúdo de CTS integrados
sistemática do conteúdo
aos tópicos de ciências, com a função de explorar sis-
de CTS ao conteúdo
tematicamente o conteúdo de CTS. Esses conteúdos
programático.
formam temas unificadores.

Os temas de CTS são utilizados para organizar o con-


4. Disciplina
teúdo de ciências e a sua sequência, mas a seleção do
científica (Química,
conteúdo científico ainda é feita a partir de uma disci-
Física e Biologia)
plina. A lista dos tópicos científicos puros é muito se-
por meio de conteúdo
melhante àquela da categoria 3, embora a sequência
de CTS
possa ser bem diferente.

CTS organiza o conteúdo e sua sequência. O conteúdo


de ciências é multidisciplinar, sendo ditado pelo con-
5. Ciências por meio do teúdo de CTS. A lista de tópicos científicos puros as-
conteúdo de CTS semelha-se à listagem de tópicos importantes a partir
de uma variedade de cursos de ensino tradicional de
ciências.

6. Ciências com O conteúdo de CTS é o foco do ensino. O conteúdo


conteúdo de CTS relevante de ciências enriquece a aprendizagem.

Volume II 34
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O conteúdo de CTS é o foco do currículo. O conteúdo


7. Incorporação das
relevante de ciências é mencionado, mas não é ensina-
Ciências ao conteúdo
do sistematicamente. Pode ser dada ênfase aos princí-
de CTS
pios gerais da ciência.

Estudo de uma questão tecnológica ou social importan-


8. Conteúdo de CTS te. O conteúdo de ciências é mencionado somente para
indicar uma vinculação com as ciências.

Fonte – Aikenhead (1994 apud SANTOS; MORTIMER, 2000), adaptado pelas autoras (2021).

As publicações selecionadas foram codificadas com a letra “T” (Traba-


lho) independentemente de serem dissertações ou teses, e seguidas de um nú-
mero, por exemplo, T1, T2 até T18. Para a compilação dos dados e melhor
análise visual dos mesmos, utilizamos quadros, gráficos e nuvem de palavras.
Os trabalhos publicados nessas bases de dados encontram-se disponíveis online
e podem ser acessados na íntegra no lúmen ou site dos programas.

Resultados e discussões

Diante da presente pesquisa, a qual buscou realizar uma reflexão teórica


sobre CTS e a revisão bibliográfica de teses e dissertações que contemplassem
no título, e/ou no resumo, e/ou nas palavras-chave e/ou no texto completo, as
produções acadêmicas encontradas datam de 2011 até 2020. Tais produções
estudadas constituem-se a partir de teses e dissertações de autores/as que fa-
zem parte do PPgECi e que se encontram distribuídos nas unidades da UFRGS,
UFSM e UNIPAMPA e têm contribuído para a pesquisa científica em torno da
temática no país. No total, foram encontradas nas bases de dados, 18 produções
que de alguma forma apresentavam CTS. Em seguida, os trabalhos foram lidos
na sua íntegra para a análise. O quadro 3 apresenta os títulos dos trabalhos ana-
lisados, bem como seus respectivos autores, o ano de publicação e a instituição
de ensino a que estão vinculados.

Volume II 35
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 3. Identificação adotada, título, autores, ano e instituição.

Identificação Título do Artigo Autores Ano Instituição

Abordagem de temas
no ensino de ciências: MEDEIROS,
T1 2019 UNIPAMPA
Reflexões para processos E. F.
formativos de professores

O jovem como
multiplicador das práticas BOTEGA,
T2 2011 UFSM
agrícolas no município M. P.
de Agudo, RS, Brasil

Panorama reflexivo
da contextualização da
química no ensino FAVILA, M.
T3 2014 UFSM
médio: Nas escolas A. C.
estaduais e particulares
de Santa Maria/RS

Intervenções curriculares
na perspectiva da
abordagem temática:
GIACOMI-
T4 avanços alcançados por 2014 UFSM
NI, A.
professores de uma
escola pública
estadual do RS

O diálogo entre a
formação tecnocientífica
e a humanística na
educação tecnológica:
T5 Uma problematização a ILHA, G. C. 2014 UFSM
partir do estudo de caso
do curso superior de
tecnologia em gestão
ambiental da UFSM

Volume II 36
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Poluição como temática


para construção do
T6 conhecimento de reações KLEIN, S. G 2016 UFSM
redox sob uma
perspectiva CTSA
O ensino de ciências
na perspectiva da
alfabetização científica
LOPES, W.
T7 e tecnológica e formação 2014 UFSM
Z.
de professores:
diagnóstico, análise
e proposta
A inserção da perspectiva
ciência- tecnologia-socie-
MÜNCHEN,
T8 dade na formação inicial 2016 UFSM
S.
de professores de
química
Currículo integrado e
formação continuada de
LACERDA,
T9 professores: A 2018 UFSM
C. C.
abordagem CTS como
articuladora do processo
Ensino para jovens e
adultos: A contextualiza-
DA SILVA,
T10 ção como meio de 2018 UFRGS
O. C.
motivação e de
compreensão da química
Alfabetização científica
com enfoque ciência,
tecnologia e sociedade e
o ensino de ciências nos
anos iniciais do ensino
ZACARIAS,
T11 fundamental: 2020 UFRGS
L. W.
Importância, concepções
de professores e
repercussões de ações
formativas nas práticas
docentes

Volume II 37
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Experimentos de física
SILVA, C. H.
T12 no laboratório de ciências 2019 UFRGS
E.
e do de informática
Um olhar sobre os
cursos técnicos em
geoprocessamento e meio
ambiente do colégio COSTA,
T13 2016 UFRGS
politécnico da UFSM, M.R.J.
a partir da perspectiva
ciência, tecnologia e
sociedade
Uma análise crítica, a
partir do enfoque ciên-
cia-tecnologia-sociedade SOUZA, C.
T14 2018 UFRGS
(CTS), do ensino de L. P.
botânica na educação
básica
Entre concepções e práti-
cas de educação integral
ALMEIDA,
T15 e educação ambiental: 2017 UFRGS
L. H. de
Ausências, contradições
e possibilidades
A abordagem CTS no
contexto da formação e
T16 da atuação dos CORTEZ, J. 2018 UFRGS
professores da área de
ciências da natureza
Educação museal e
enfoque CTS: Reflexões
MARTE-
T17 sobre a prática educativa 2018 UFRGS
LLO, C.
no museu entomológico
Fritz Plaumann
Enfoque ciência,
tecnologia e sociedade RODRÍ-
T18 (CTS): contribuições GUEZ, 2018 UFRGS
para a profissionalização A.S.M.
docente
Fonte: As autoras (2021).

Volume II 38
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Na figura 1, podemos verificar a distribuição dos trabalhos analisados nas


universidades nas quais os mesmos foram desenvolvidos. Salientamos que na
UFRGS, dos nove trabalhos analisados, cinco foram dissertações e quatro te-
ses. Na UFSM, seis dissertações e duas teses, e na Unipampa, uma dissertação.

Ainda, na figura 1, podemos perceber que na Unipampa foi encontrado


apenas um trabalho relacionado à CTS (tratando-se de 5,6% do corpus de aná-
lise), enquanto as outras instituições envolvidas apresentaram um número mais
expressivo de publicações sobre a temática, sendo a UFRGS responsável por
50% dos trabalhos analisados e a UFSM por 44,4% dos mesmos. A pequena
porcentagem de trabalhos na Unipampa se deve, possivelmente, à entrada re-
cente da universidade na rede do Programa de Pós-Graduação.

Figura 1. Publicações acadêmicas de acordo com a Universidade de origem.

Fonte: As autoras (2021).

Já a figura 2 apresenta, nos trabalhos analisados, os respectivos autores


mais citados que tratam da temática CTS. Sendo eles: Auler, Santos & Morti-
mer, Santos, Auler e Delizoicov, Cachapuz, Dagnino, Strieder, que são referen-
ciados em 12, 11, 9, 7, 7, 4 e 3 produções, respectivamente.

Volume II 39
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 2. Autores mais referenciados nos trabalhos analisados

Fonte: As autoras (2021).

Esse resultado se deve à trajetória construída pelos referidos pesquisado-


res ao longo dos anos, referente às pesquisas com o enfoque CTS. Décio Au-
ler, autor com maior número de referências nos trabalhos analisados, é físico,
pesquisador e professor da UFSM. Sua tese de doutorado foi desenvolvida e
concluída em 2002, cujo título foi “Interações entre Ciência- Tecnologia-So-
ciedade no contexto da formação de professores de ciências”. Auler é um autor
que defende a ideia de que trabalhar objetivos educacionais do enfoque CTS
utilizando referência bibliográfica estrangeira e transpondo para o contexto
brasileiro é perigoso e inadequado, já que o enfoque CTS tem uma perspectiva
de utilizar temáticas com significado local. Este pesquisador defende, como um
dos objetivos centrais do enfoque CTS, o aumento na cultura de participação
da população em assuntos relacionados à ciência e a tecnologia, e, segundo ele,
isso colabora para a construção de uma perspectiva mais democrática e menos
tecnocrática (dos técnicos e especialistas) nas escolhas feitas pela sociedade
(BOCHECO, 2011).

Volume II 40
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Não por coincidência, o professor Demétrio Delizoicov foi seu orien-


tador nesse período, o que justifica artigos publicados conjuntamente sobre a
temática CTS. Este segundo autor também aparece no gráfico com expressivo
número de referências.

Igualmente, o professor Renato Dagnino, referenciado quatro vezes,


participou da banca examinadora de Décio Auler. O pesquisador, atualmente,
é professor da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e foi um dos
pioneiros a desenvolver pesquisas mais direcionadas à perspectiva de PLAC-
TS. Sua tese de doutorado publicada na Unicamp intitulou-se “A indústria de
armamentos brasileira: uma tentativa de avaliação”.

Em se tratando de Wildson Santos e Eduardo Mortimer, verificou-se


que os trabalhos analisados apresentaram um número expressivo de citações
desses autores. É preciso salientar que os dois pesquisadores escreveram vá-
rios artigos coletivamente, no entanto, o trabalho mais referenciado no país
e, inclusive nos trabalhos analisados, trata de “Uma análise de pressupostos
teóricos da abordagem CTS (Ciência-Tecnologia-Sociedade) no contexto da
educação brasileira”. Wildson Santos (in memorian) foi professor de Quími-
ca e da Pós-graduação em educação na Universidade de Brasília. Sua tese de
doutoramento publicada em 1992, foi direcionada ao “Ensino de Química
para formar o cidadão: principais características e condições para a sua im-
plantação na escola secundária brasileira”. Santos elege o enfoque CTS como
um curso ou uma forma de configuração curricular cuja preocupação central
é a formação para cidadania (BOCHECO, 2011). Já Eduardo Mortimer foi
químico, pesquisador e professor da Universidade Federal de Minas Gerais.
Sua tese de doutorado tratou da “Evolução do atomismo em sala de aula: mu-
dança de perfis conceituais”.

Volume II 41
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

António Cachapuz é professor catedrático da Universidade de Aveiro


(UA), Portugal; e membro do Conselho Nacional de Educação desse mesmo
país. Escreve, em conjunto com diversos autores, sobre linhas de pesquisa da
Educação em Ciências e o enfoque CTS.

Por fim, Roseline Beatriz Strieder, que também foi mencionada em um


número expressivo de citações nas pesquisas analisadas, é licenciada em Físi-
ca pela UFSM, sua tese de doutoramento, de 2012, teve como o título “Abor-
dagens CTS na educação científica no Brasil: sentidos e perspectivas”.

O quadro 4, na sequência, apresenta as categorias CTS elencadas a prio-


ri no corpus de análise dessa pesquisa. Percebeu-se que a categoria “incor-
poração eventual de conteúdo CTS ao conteúdo programático” e a categoria
“Ciências por meio do conteúdo CTS”, enfatizadas em cinco trabalhos cada,
foram as mais presentes nos trabalhos analisados, sendo que as demais cate-
gorias encontradas, apareceram em dois trabalhos cada.

Quando nos referimos à categoria “incorporação eventual de conteúdo


CTS ao conteúdo programático”, estamos aludindo ao “ensino tradicional
de ciências acrescido de pequenos estudos de conteúdo de CTS incorpora-
dos como apêndices aos tópicos de ciências”. (AIKENHEAD, 1994¹ apud
SANTOS; MORTIMER, 2000) Nesta categoria, o conteúdo de CTS não é re-
sultado do uso de temas unificadores. Assim, quando classificamos uma dis-
sertação ou tese analisada nessa categoria, isto se dá porque nela percebemos
que a temática CTS é trabalhada/discutida de forma incipiente, a CTS não
faz parte do currículo escolar, mas é utilizada como um simples acréscimo à
forma tradicional de ensino.

Volume II 42
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 4. O número de trabalhos por categoria.

Identificação
Categoria nº trabalhos
dos trabalhos

Conteúdo de CTS como elemento


2 T2 e T18
de motivação

Incorporação eventual do conteúdo de T3, T4, T5, T7 e


5
CTS ao conteúdo programático; T12

Incorporação sistemática do conteúdo


2 T8 e T9
de CTS ao conteúdo programático.

Disciplina científica (Química, Física e


2 T10 e T16
Biologia) por meio de conteúdo de CTS

T1, T11, T13,


Ciências por meio do conteúdo de CTS 5
T14, T15,

Ciências com conteúdo de CTS 0 -

Incorporação das Ciências ao


2 T6 e T17
conteúdo de CTS

Conteúdo de CTS 0 -

Fonte: As autoras (2021).

Quanto à categoria “Ciências por meio do conteúdo CTS”, conforme


Aikenhead (1994 apud SANTOS; MORTIMER, 2000), “CTS organiza o con-
teúdo e sua sequência. O conteúdo de ciências é multidisciplinar, sendo dita-
do pelo conteúdo de CTS. A lista de tópicos científicos puros assemelha-se à
listagem de tópicos importantes a partir de uma variedade de cursos de ensino
tradicional de ciências”, ou seja, apesar dos trabalhos apresentarem CTS de
forma mais aprofundada, trazendo mais de uma disciplina para a discussão, en-
volvendo a temática na sequência dos conteúdos em tópicos, os trabalhos dessa
categoria ainda se assemelham à visão tradicional de ciências.

Volume II 43
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Aikenhead (1994) afirma que, à medida que se avança da categoria 1


para a categoria 8, a proporção de conteúdo CTS aumenta progressivamente
enquanto o conteúdo tradicional de ciências diminui, conforme indica a seta ao
lado da tabela— quadro 4. Embora nenhuma das categorias possa ser conside-
rada, na visão do autor, um “verdadeiro” curso CTS, as categorias de “incor-
poração sistemática de conteúdo CTS ao conteúdo programático”, “disciplina
científica (Química, Física e Biologia) por meio de conteúdo CTS”, “Ciências
por meio de conteúdo CTS” e “Ciências com conteúdo CTS”, são as que mais
se identificam com os cursos CTS divulgados na literatura.

No corpus de análise, não foi encontrada nenhuma publicação que se


enquadrasse na categoria Conteúdo de CTS, ou seja, nenhum dos trabalhos
analisados apresentou um estudo de uma questão tecnológica ou social im-
portante, no qual o conteúdo de ciências fosse mencionado somente para indi-
car uma vinculação com as ciências. (AIKENHEAD, 1994¹ apud SANTOS;
MORTIMER, 2000) O que comprova o fato de que o ensino tradicional ainda
prevalece, com grande resistência, por parte dos profissionais diretamente
envolvidos com a educação, de ser superado e substituído por práticas que
englobam a realidade social, tecnológica e científica contextualizadas. Daí
se justifica a necessidade de discussão e implementação do enfoque CTS no
currículo dos cursos de formação inicial e continuada de professores.

A figura 4 apresenta o domínio dos trabalhos em seus respectivos focos


temáticos (MEGID-NETO, 1999), através de um gráfico de nuvem de palavras.
É constatada a predominância dos trabalhos relacionados ao tema Formação de
Professores apresentando-se em oito trabalhos (T4; T7; T8; T9; T11; T13; T16;
T18). Em relação ao foco temático relacionado ao Conteúdo-Método apresen-
taram-se em quatro trabalhos (T12; T14; T15; T17), seguido dos focos temáti-
cos Currículos e Programas (T4; T9; T11) e Características do Aluno (T2; T5;
T6) em três trabalhos. Já as temáticas relacionadas a Características do Profes-

Volume II 44
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

sor (T1; T5) e Formação de Conceitos (T3; T10) estiveram presentes em dois
trabalhos cada.

Os focos temáticos relacionados às Políticas Públicas (T11) História da


Ciência (T13) foram desenvolvidos em apenas um trabalho cada. Os focos re-
lacionados à Organização da Instituição/Programa de Ensino Não-Escolar; Fi-
losofia da Ciência; Organização da Escola; História do Ensino de Ciências; e
outros não ocorreram em nenhum trabalho analisado. Alguns trabalhos apre-
sentaram mais de um foco temático como é o caso dos trabalhos T4, T9 e T11
demonstrando que não há delimitação dos focos, corroborando com Megid-Ne-
to (1999) onde o corpus de dados da sua pesquisa foi indicado em dois, três ou
mais focos.

Figura 4. Nuvem de palavras com os trabalhos e seus respectivos focos


temáticos

Fonte: Organizado pelas autoras, 2021.

Ao salientar uma maior expressividade do foco temático em Formação


de Professores, percebe-se a importância e necessidade de tratar dessa temática
junto aos professores das instituições de ensino. As pesquisas que congregam
este foco abordam diversos assuntos relacionados a CTS em diferentes níveis
de formação docente: ensino fundamental nos anos iniciais e anos finais, ensino
de jovens e adultos, ensino técnico e ensino superior.

Volume II 45
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Os estudos T4, T8, T11, T13, T16, T18 buscaram analisar em currículos,
documentos oficiais da Educação no Brasil as abordagens CTS na formação ini-
cial, continuada e na prática pedagógica/didática de professores. As pesquisas
T7 e T9 buscaram analisar as percepções e concepções de professores acerca
da Alfabetização Científica (T7) e de currículo integrado com enfoque em CTS.

Os resultados de alguns estudos apontam preocupações dos professores


com a sua formação e a busca pelo aperfeiçoamento profissional (T4), a in-
serção da perspectiva CTS como um componente de prática de ensino (T8),
a ausência ou uma apresentação generalista da temática CTS nos documentos
oficiais e Projetos Político Pedagógicos (T11), dificuldades em abordar temas
relacionados às interações CTS (T13), percepções da Ciência real, interdisci-
plinar e contextualizada, simplificação na fala dos educadores ao se referirem a
abordagem CTS, entre outros apontamentos (T9).

A partir destes apontamentos é possível perceber que a carência no in-


vestimento em formação profissional é bastante considerável, uma vez que,
muitos professores passaram por um ensino ao longo da vida, dito tradicio-
nal, conteúdos desenvolvidos desconectados da realidade, a fragmentação do
conhecimento em disciplinas, como se os fenômenos da natureza não apre-
sentassem a complexidade do todo. Além disso, há uma grande deficiência na
estruturação dos currículos e da própria estrutura física e administrativa das
instituições, colaborando para esse todo compartimentado. Portanto, há neces-
sidade de investimentos maiores na formação de professores, na reestruturação
de currículos, levando em consideração os aspectos científicos, tecnológicos,
sociais, ambientais e políticos envolvidos, para que se possa também alcançar
bons resultados no ensino aprendizagem. A população também carece de uma
formação crítica, responsável, para que possam no seu dia a dia, na resolução
de problemas, tomar as suas decisões de forma consciente.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Considerações finais

Considerando o exposto, a revisão teórica realizada nos levou a perceber-


mos que as dissertações e teses analisadas do Programa de Pós-Graduação em
Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde, trazem referenciais teóricos
sobre CTS, mencionando ideias de conceituados autores e pesquisadores da
referida temática. Também constatamos que o foco temático mais evidencia-
do dessas publicações se deu em torno da Formação de professores, um foco
que parece crescer e ser muito relevante na área das Ciências da Natureza. No
entanto, a classificação quanto às categorias CTS a priori, mostrou que as dis-
sertações e teses analisadas ainda apresentam perspectivas de trabalho em sala
de aula ou eventos nos quais o ensino tradicional ainda prevalece ao enfoque
CTS. Por essa razão, justificamos a necessidade de discussão e implementação
da temática CTS no currículo dos cursos de formação inicial e continuada de
professores.

Somente novos modelos curriculares e livros didáticos inovadores não


são suficientes enquanto os professores não incorporarem novos propósitos
para a educação CTS. Forgiarini (2007) já ressaltava a importância de se ultra-
passar nos currículos das licenciaturas uma formação unicamente disciplinar,
desvinculada de problemas sociais e negligentes quanto à abordagem temática.

Nota-se, no campo da formação docente, em relação ao enfoque CTS,


a necessidade de um currículo formador de novos professores que privilegie
a abordagem de eventos ou temas e a perspectiva interdisciplinar, pois a for-
mação unicamente disciplinar e conteudista, assim como a simples leitura de
textos ou artigos teóricos, podem não serem suficientes para proporcionar ao
professor em formação uma concepção clara de como abordar um evento ou
tema de modo a explorar as suas potencialidades de alfabetização científica e
tecnológica. No entanto, o enfoque CTS, oferece parâmetros que auxiliam tal
exercício (BOCHECO, 2011).

Volume II 47
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Volume II 49
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Resumo: A Educação CTS é o campo do conhecimento que estuda as suas inter-


-relações em suas múltiplas influências. O trabalho apresenta uma reflexão teórica
e revisão bibliográfica de abordagem qualitativa, com base na perspectiva CTS, em
dissertações e teses buscadas online na rede do Programa de Pós-Graduação em Edu-
cação em Ciências, do qual fazem parte as universidades federais: UFSM, UFRGS e
UNIPAMPA, de 2011 até 2020. Dentre os resultados observamos que Auler, Santos,
Mortimer, Delizoicov, Cachapuz, Dagnino e Strieder foram os autores mais vezes
referenciados quanto à temática CTS. Além disso, baseado nos estudos de Santos
& Mortimer buscamos categorizar os resultados encontrados nas oito categorias es-
tudadas pelos autores que agrupam a produção científica sobre a referida temática.
Porém, evidenciou-se que dos 18 trabalhos avaliados, os mesmos encaixaram-se em
apenas seis das categorias: conteúdo de CTS como elemento de motivação; incorpo-
ração eventual do conteúdo de CTS ao conteúdo programático; incorporação siste-
mática do conteúdo de CTS ao conteúdo programático; disciplina científica (Quími-
ca, Física e Biologia) por meio de conteúdo de CTS; ciências por meio do conteúdo
de CTS; incorporação das Ciências ao conteúdo de CTS. Por fim, a formação de
professores foi o eixo encontrado na maioria dos documentos analisados.

Palavras-chave: Educação CTS; Ensino em Ciências; Revisão Bibliográfica;

Abstract: Education in Science, Technology and Society (STS) is the field of knowl-
edge that studies its interrelationships in their multiple influences. Thus this work
presents a theoretical reflection and a qualitative bibliographic review, based on the
STS perspective, in dissertations and theses searched online in the network of the
Postgraduate Program in Science Education, which includes the federal universities
UFSM, UFRGS, and UNIPAMPA, from 2011 to 2020. Among the results, we ob-
served that Auler, Santos, Mortimer, Delizoicov, Cachapuz, Dagnino, and Strieder
were the authors most frequently referenced regarding the STS theme. Additionally,
based on the studies by Santos & Mortimer, we sought to categorize the results found
in the eight categories studied by the authors that group the scientific production on
the subject. However, it was evidenced that of the 18 works evaluated, they fit into
only six of the categories: STS content as a motivational element; occasional incor-
poration of STS content into the programmatic content; systematic incorporation of
STS content into the programmatic content; scientific discipline (Chemistry, Physics,
and Biology) through STS content; science through STS content; incorporation of
science into STS content. Finally, teacher education was the axis found in most of
the analyzed documents.

Key words: Education STS; Science Teaching; Literature review.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 2

AS ILHAS INTERDISCIPLINARES
DE RACIONALIDADE COMO
POSSIBILIDADE PARA O
DESENVOLVIMENTO DA
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA
E DO LETRAMENTO CIENTÍFICO
Ana Paula Santellano de Oliveira
Heidi Fernanda Bertotti
Marcus Eduardo Maciel Ribeiro
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-1

Introdução

O presente capítulo é um ensaio teórico que tem como tema principal a


metodologia das Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR) propostas por
Gerard Fourez (1997) como possibilidade para o desenvolvimento da alfabeti-
zação científica e do letramento científico.

O manuscrito está dividido em três sessões: a primeira, intitulada “Alfa-


betização científica e letramento científico: a construção do conceito scientific

Volume II 51
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

literacy”, traz a diferenciação dos termos e aborda a parte histórica do concei-


to, além de discutir o termo escolhido por Fourez. Na segunda sessão, chamada
“A metodologia desenvolvida por Fourez: Ilhas Interdisciplinares da Raciona-
lidade”, trazemos uma explicação detalhada da proposta e de suas finalidades.
Já a terceira sessão, designada “A interdisciplinaridade como possibilidade pe-
dagógica no ensino de ciências”, aborda a semântica da palavra relacionando-a
com a aprendizagem de ciências. Por fim, nas contribuições finais, um mapa
conceitual tem a finalidade de conceber relações significativas entre os itens
discutidos.

Cada seção foi elaborada com o apoio de teóricos e trabalhos científicos


que contemplassem a estruturação deste ensaio, visando provocar no leitor re-
flexões sobre possibilidades de desenvolver a alfabetização científica por meio
da metodologia de ensino de Ilhas Interdisciplinares da Racionalidade, de Fou-
rez. Este ensaio não tem intenção de trazer imperativos de nenhuma natureza,
pois aqui se apresenta um de muitos pontos de vista possíveis a respeito do
tema. O propósito é trazer relevância e contribuições pertinentes à Educação
em Ciências.

Alfabetização científica e letramento científico: a


construção do conceito scientific literacy

A expressão scientific literacy remonta aos anos 50 nos Estados Unidos


da América. Possivelmente foi cunhada por Paul Hurd na publicação original
de 1958, intitulada Science Literacy: It ‘s Meaning for American Schools (Al-
fabetização científica: seu significado para as escolas americanas) (CUNHA,
2019). O termo foi originalmente utilizado para explicar a ideia de que as pes-
soas em geral devem ter algum conhecimento de ciência. O interesse pela ciên-
cia naquele período histórico deu-se principalmente pelo lançamento do saté-
lite soviético Sputnik. Então, em resposta a esse episódio da corrida espacial,

Volume II 52
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

os cidadãos americanos passaram a se preocupar com a educação científica que


estava sendo oferecida em suas escolas. A disciplina de ciências foi incorpora-
da ao currículo escolar, tanto na Europa como nos Estados Unidos, a partir do
século XIX, diferentemente do que ocorreu no Brasil: o ensino de Ciências pas-
sou a estar presente nos currículos escolares apenas em 1930 (SANTOS, 2007).

O uso do termo scientific literacy no Brasil vem da década de 90, princi-


palmente por pós-graduandos em educação científica, além de periódicos espe-
cializados. Cunha (2019, p. 7) explica que, até a atualidade, “esse conceito tem
recebido duas diferentes traduções, hora aparecendo como letramento cientí-
fico (LC), hora como alfabetização científica (AC), sendo este último termo
predominante na maioria dos trabalhos”. Nesse contexto, é possível afirmar
que embora o termo já exista há décadas, seu conceito ainda encontra-se em
construção.

Cunha (2019) ainda acrescenta que, no dicionário em língua inglesa, o


significado de literacy é apresentado como a “capacidade de ler e escrever”.
Além disso, o próprio termo letramento chegou aos dicionários de língua por-
tuguesa há pouco tempo e segue sendo mais utilizado por pessoas que estudam
o ensino da língua. Portanto, seria fácil de entender por que, na maioria das
vezes, a palavra é traduzida como alfabetização (CUNHA, 2019).

Para Silva e Sasseron (2021), “scientific literacy” é uma expressão em


disputa vinculada à adesão teórica e à tradução adotada. Ainda segundo as au-
toras, nas produções brasileiras, pode-se encontrar as expressões Encultura-
ção Científica, Letramento Científico, Alfabetização Científica e Alfabetização
Científica e Tecnológica. Entre essas, há predominância dos termos Letramento
Científico e Alfabetização Científica.

Contudo, para além do entendimento sobre as diferenciações de tradu-


ção do termo literacy, também é importante conhecer as diferenciações con-

Volume II 53
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ceituais entre os termos mais utilizados no Brasil: alfabetização e letramento.


Soares (2020) explica que, enquanto alfabetizar significa ensinar a codificação
e a decodificação de símbolos, letrar é desenvolver as habilidades de uso da
leitura e da escrita em um contexto social e cultural. De maneira simplificada,
alfabetizado seria aquele que aprendeu a ler e a escrever. Já o letrado é aquele
que faz uso fluente da leitura e da escrita. Santos (2007) complementa que uma
pessoa alfabetizada pode não ser letrada caso não faça uso social da leitura e
da escrita. Assim, seria alguém que lê mas não entende o que lê – o chamado
analfabeto funcional (SANTOS, 2007, p. 478). Também pode haver pessoas le-
tradas que não são alfabetizadas. Mesmo sem dominar o processo de codifica-
ção e decodificação de símbolos da língua escrita, estas pessoas conseguem ter
“leitura de mundo”, desde que auxiliadas por outrem (uma pessoa leitora, um
áudio, um vídeo…). É possível desenvolver o letramento, independentemente
do processo de alfabetização ter se dado ou não, porque isso pode ocorrer em
diferentes contextos (como família, trabalho, igreja, contato com diferentes ti-
pos de mídias, interações com pares) e em diferentes momentos da vida, não
se limitando ao tempo escolar. Também por esse motivo, a palavra letramento
pode ser utilizada no plural (letramentos) para designar diferentes sistemas de
representação: letramento científico, letramento matemático (ou numeramen-
to), letramento digital, entre outros (SOARES, 2020, p. 32).

Gomes e Santos (2018) traçam um paralelo para demonstrar semelhanças


e diferenças entre alfabetização e alfabetização científica e entre letramento e
letramento científico:
Alfabetização é o processo de ensino da língua escrita, enquanto alfabe-
tização científica relaciona-se com a capacidade de compreender, utilizar
e refletir sobre um tema, utilizando a linguagem científica, promovendo a
participação ativa e adequada nas práticas sociais e profissionais. O ter-
mo letramento possui caráter de inserção e prática social através da língua
escrita, enquanto o LC se relaciona com a função e prática social de um
indivíduo utilizando o conhecimento científico (GOMES; SANTOS, 2018,
p. 2).

Volume II 54
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

No entanto, percebe-se que os autores tratam de alfabetização científica


de maneira intimamente ligada ao uso da linguagem científica em diferentes
contextos (sala de aula, cotidiano, entre outros). Quando abordam o letramento
científico, a expressão aparece para explicar a utilização dos conhecimentos
científicos em diferentes práticas relacionadas a ciência, tecnologia, sociedade
e ambiente. Nesse sentido, observa-se uma diferenciação, mesmo que sutil,
entre as duas nomenclaturas.

Quanto à adesão teórica dos autores que adotam um termo ou outro,


Cunha (2019) explica que aqueles que optam pela expressão “letramento”
valem-se de estudos da área de linguagem e ensino da língua. Por outro lado,
aqueles que adotam a expressão Alfabetização Científica sustentam-se no en-
tendimento do processo de alfabetização tal como foi idealizado por Paulo
Freire (SILVA; SASSERON, 2021, p. 4).

Nesse sentido, é significativo trazer a conhecimento que Freire lançou


o livro “Pedagogia do Oprimido” em 1974, ou seja, antes da discussão sobre
o termo letramento começar no Brasil. Nesta obra, Freire descreve a alfabe-
tização como uma forma de emancipação. Para o autor, não basta saber ler e
escrever, é preciso entender o contexto e fazer uso social da leitura e da escrita
(CUNHA, 2019, p. 172). Ainda se observa uma variação entre os pesquisadores
que optam pela expressão alfabetização científica: alguns optam por chamá-la
de Alfabetização Científica e Tecnológica. Essa diferença terminológica pode
ser explicada pela tradução do termo utilizado por Fourez em uma publicação
de 1994 (Alphabétisation scientifique et technique: Essai sur les finalités de
l’enseignement des sciences). Para Fourez,

[...] as pessoas poderiam ser consideradas científica e tecnologicamente


alfabetizadas/ letradas quando seus conhecimentos e habilidades dão a elas
um certo grau de autonomia (a habilidade de ajustar suas decisões às restri-
ções naturais ou sociais), uma certa habilidade de se comunicar (selecionar

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

um modo de expressão apropriado) e um certo grau de controle e respon-


sabilidade em negociar com problemas específicos (técnico, mas também
emocional, social, ético e cultural). (FOUREZ, 1997, p. 51, tradução livre).

A partir da descrição de Fourez (1997) para alguém alfabetizado/letrado,


é possível perceber o entrelaçamento de objetivos daqueles que defendem uma
expressão ou outra: a educação em Ciências deve servir para o desenvolvimento
da cidadania, do pensamento crítico e da autonomia. Evidenciar tais propósitos
demonstra a intencionalidade de proporcionar aos estudantes novas maneiras
de ver e de pensar sobre a realidade para exercer ações éticas e conscientes em
seus contextos de vida.

Ainda nesse sentido, afirmamos que não temos pretensão de encerrar o


debate sobre as expressões, pois entendemos que a discussão ainda se encon-
tra em andamento. No entanto, mesmo que a essência das preocupações dos
estudiosos seja a qualificação do ensino de Ciências, acreditamos que o en-
tendimento das diferenças entre um processo e outro é importante para a sis-
tematização e o foco da ação docente. Por isso, convém assumir nossa posição
enquanto pesquisadores do tema, afirmando que entendemos que alfabetização
é parte do processo de letramento e que esclarecer as diferenças entre os pro-
cessos direciona o percurso a ser percorrido na intenção de atingir a finalidade
principal da educação em Ciências.

A figura 1 apresenta um mapa conceitual que aborda a diferenciação en-


tre Alfabetização Científica e Letramento Científico de acordo com o enten-
dimento de diferentes pesquisadores e dos autores deste capítulo (CUNHA,
2019; SOARES, 2020; GOMES, SANTOS; 2018).

Volume II 56
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1. Mapa conceitual diferenciando Alfabetização Científica e Letramen-


to Científico.

Fonte: elaborado pelos autores (2022).

Se, por um lado, a discussão sobre diferentes termos utilizados na educa-


ção em Ciências ainda necessita de mais discussões, por outro lado também é
essencial discutir onde queremos chegar com a educação em Ciências e como
qualificá-la. Afinal, qual seria a finalidade da educação em Ciências?

A partir da observação do mapa conceitual, percebe-se que, atualmente, a


educação em Ciências está ligada a um objetivo: obter alfabetização científica
E/OU letramento científico. A escolha de um termo ou outro (e suas variações,

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

como alfabetização científica e tecnológica) está associada diretamente às vin-


culações teóricas de quem escreve. Em nosso entendimento e no de pesquisa-
dores que nos inspiram (CUNHA, 2019; SOARES, 2020; GOMES, SANTOS;
2018), alfabetização e letramento são processos distintos e, portanto, possuem
processos específicos de aprendizagem e ensino.

Seguindo essa linha de pensamento, a alfabetização científica envolveria


atividades de conceituação simples, reconhecimento de nomenclaturas e exer-
cícios de classificação, por exemplo. A alfabetização é um processo importante
e necessário, que faz parte do movimento maior e mais complexo de letramento
científico. Este, por sua vez, envolveria atividades como compreensão, inter-
pretação e desenvolvimento da capacidade de leitura e escrita críticas relacio-
nadas a ciência como um todo.

Independente da nomenclatura utilizada pelos pesquisadores, pode-se


perceber que há certa concordância sobre a educação em Ciências ter como
finalidade formar cidadãos conscientes e atuantes na sociedade. Essa resposta
leva a outra indagação: como qualificar a formação dos sujeitos para formar
cidadãos conscientes e atuantes na sociedade? A depender das vinculações teó-
ricas de cada pesquisador, a resposta poderia ser: intensificar as ações pedagó-
gicas que investem em letramento científico ou em alfabetização científica.  

Como pretende-se sugerir uma possibilidade para qualificar a educação


em Ciências, a partir deste ponto passaremos a adotar a terminologia escolhida
pelo autor Gérard Fourez: Alfabetização Científica e Técnica ou também tec-
nológica. A escolha foi feita mesmo que, em nosso entendimento, o que o autor
discute seja aquilo que conceituamos como letramento científico.

Volume II 58
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A metodologia desenvolvida por Fourez: Ilhas


Interdisciplinares da Racionalidade

A metodologia de ensino voltada para a Alfabetização Científica e Tec-


nológica proposta por Gérard Fourez visa formar estudantes autônomos e que
desenvolvam criticidade em negociar suas ideias perante situações que deman-
dem atuação incisiva na sociedade. Uma das preocupações do autor é a dis-
ciplinaridade, que se faz importante no processo de executar e desenvolver a
metodologia de IIR. Fourez (1994) questiona a eficácia do ensino disciplinar
em proporcionar aos estudantes uma compreensão sobre questões científicas e
tecnológicas que contribuam para a aplicação de situações concretas voltadas
para a vida social, pessoal ou política. Os estudos de Fourez abarcam um gran-
de interesse para a Educação em Ciências, uma vez que trata e articula com
poucos autores, quanto a princípios filosóficos e também de cunho prático, por
se tratar numa proposta metodológica para a prática pedagógica. No livro “A
construção das Ciências” (FOUREZ, 1995), o autor critica a consideração da
ciência como verdade absoluta e incontestável. Fourez defende a pluralidade de
pensamentos e a análise crítica da construção da ciência e, ainda, discute como
tais conhecimentos se inserem na sociedade e como poderiam ser utilizados em
discussões voltadas a questões éticas. Mohr et al. (2019) apontam questões que
Fourez aborda quanto ao empreendimento intelectual:

i) criação de disciplinas científicas que busquem estudar as a particulari-


dades de problemas complexos do cotidiano; ii) os interesses e as influên-
cias que acompanham o cientista e a comunidade científica no decorrer da
sua história; iii) o papel das observações na criação de modelos teóricos
que conformam uma específica visão de mundo, além das mudanças e
persistências destes modelos no decorrer do fazer científico; iv) o papel
da linguagem científica e da comunicação entre pares cientistas e entre
outros cidadãos, e; v) a ciência e a sua inserção na sociedade, bem como
seu poder político e sua possível utilização em discussões éticas (MOHR
et al., 2019, p. 4).

Volume II 59
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Ainda na obra sobre a construção das ciências, Fourez ressalta a interdis-


ciplinaridade presente na formação de um sujeito crítico diante de seu contexto
social. O autor sustenta que, por um lado, as disciplinas específicas possuem
peculiaridades e aprofundam uma pequena parcela da realidade a ser estudada.
Já o diálogo e comunicação entre as disciplinas – características presentes na
percepção sobre interdisciplinaridade de Fourez – formam um modelo mais
complexo e amplo que dá conta da realidade, que é sempre um acontecimento
multifacetado. Essas concepções voltadas à interdisciplinaridade levaram Fou-
rez a construir um instrumento teórico metodológico para o ensino, que intitu-
lou como Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR).

Fourez (1994) traz na metodologia as etapas de construção de uma repre-


sentação interdisciplinar a partir de um contexto do cotidiano. O processo abar-
ca um exemplo de situação-problema vinculada a um projeto técnico. Confor-
me o autor, as Ilhas auxiliam no desenvolvimento da autonomia dos estudantes
e contribuem para a construção do vocabulário científico. Assim, se apropriam
de conceitos da ciência e da tecnologia de maneira natural ao desenvolver mo-
delos para a resolução de um problema.

Para que ocorra a construção das IIR, o autor propõe oito etapas que con-
tribuem para a delimitação do trabalho e para alcançar o objetivo final:

1. Etapa 1 - Elaboração do clichê da situação problema. Conhecida como


tempestade de ideias, esta parte deve abranger desde questões mais gerais até
questões específicas;

2. Etapa 2 - Panorama espontâneo. Segundo a ideia original de Fourez


(1994) essa etapa é composta por seis ações. Para o autor, “Trata-se de ampliar
o contexto do clichê. Utiliza-se uma grade de leitura que permite realizar ques-
tões desprezadas durante a primeira etapa” (FOUREZ, 1004, p.114). A espon-

Volume II 60
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

taneidade dessa etapa não requer busca por especialistas e traz relevância aos
próprios conhecimentos dos estudantes;

3. Etapa 3 - Consulta aos especialistas e especialidades. Nessa etapa se-


rão selecionados, diante das listas feitas na etapa anterior, alguns especialis-
tas que poderão ser consultados, de modo a possibilitar a abertura de algumas
caixas-pretas. É importante estar evidente a escolha da situação problema e da
construção do projeto por meio da equipe;

4. Etapa 4 - Indo à prática. Essa etapa visa conferir ação ao projeto, ou


seja, sair do campo teórico e examiná-lo de maneira prática. Consiste em buscar
conhecer e entrevistar um especialista na temática do projeto a ser desenvolvi-
do, visitar uma indústria/comércio local, desmontar e conhecer um equipamen-
to, entre outros procedimentos adotados de maneira prática. Visa desenvolver
a criatividade em equipe;

5. Etapa 5 - Abertura de caixas-pretas e busca de princípios disciplina-


res. É quando se aprofunda algum conceito que emergiu durante a abertura
das caixas-pretas, diante do olhar disciplinar. Esse aprofundamento não requer
necessariamente a presença de uma especialista, que é facultativa nessa etapa;

6. Etapa 6 - Esquema global da situação estudada. Nesse momento, é


realizada uma síntese da metodologia IIR construída pelas equipes envolvidas,
que articulam um esquema quanto a suas decisões e ações. Pode ser elaborada
uma síntese, um resumo ou uma figura que represente a ideia do trabalho;

7. Etapa 7 - Abertura de caixas-pretas sem a ajuda de especialistas. A au-


tonomia se faz presente ao buscar o que se tem disponível sobre determinado
conhecimento/assunto, por meio de pesquisas na internet. Formula-se explica-
ções para situações que ocorrem a partir de vivências e experiências do cotidia-
no, permitindo que as equipes criem e articulem ideias de maneira autônoma;

Volume II 61
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

8. Etapa 8 - Síntese da IIR produzida. Ao finalizar, procura-se apresentar


de maneira oral ou escrita a IIR construída durante o processo. Como afirma
Fourez, é necessário responder algumas perguntas nesta etapa:

Até que ponto o que foi estudado nos ajuda a negociar com o mundo tec-
nológico focado durante o trabalho? O que nos proporciona autonomia no
mundo científico-tecnológico e na sociedade em geral? De que maneira
o conhecimento obtido nos ajuda a discutir com maior precisão quando
decisões precisam ser tomadas? Como isso nos dá uma representação do
nosso mundo e da nossa história que nos permite comunicar e posicionar-se
melhor? (FOUREZ, 1997, p. 121).

Segundo Milaré (2014), as etapas que constituem as IIR não precisam ser
cumpridas na ordem posta acima, pois vão sendo construídas juntamente com
os estudantes. Além disso, também podem ser ampliadas, suprimidas ou até
mesmo revisitadas (PIETROCOLA; ALVES FILHO; PINHEIRO, 2003).

Estudos como o de Tramontin et al. (2019) trazem relatos de experiên-


cia da prática docente realizada por meio de IIR como proposta metodológica
para a prática em Ciências. O trabalho foi realizado com alunos do 6º ano do
ensino do fundamental de uma escola de rede pública estadual do município de
Carambeí/PR, visando a construção de conhecimentos e a formação de cidadão
críticos e ativos na transformação do contexto local.

O contexto utilizado nesta experiência baseou-se no descarte inadequado


de resíduo doméstico no meio rural. A partir disso, foi possível elaborar um
estudo interdisciplinar sobre a realidade socioambiental. O trabalho propor-
cionou o envolvimento da comunidade e da escola na construção do projeto,
potencializando assim a construção da autonomia dos estudantes para a for-
mação científica e tecnológica. Também se demonstra a importância de tra-
balhar com possibilidades de desenvolvimento de atividades/metodologias de
caráter interdisciplinar de maneira prática por meio da IIR (TRAMONTIN et
al., 2019). Portanto, o exemplo reforça que é um desafio para as escolas e para

Volume II 62
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

profissionais da educação o desenvolvimento de trabalhos como este, diante de


diferentes contextos sociais.

A próxima seção busca apresentar interdisciplinaridade como uma pos-


sibilidade estratégica de potencializar o ensino e a aprendizagem, por meio da
metodologia IIR, no qual exige um empenho não só do docente, mas também
dos alunos envolvidos com a ação pedagógica.

A interdisciplinaridade como possibilidade


pedagógica no ensino de ciências

A interdisciplinaridade é um tema que promove muitas discussões entre


estudiosos da área de Educação. A epistemologia da palavra carrega uma polis-
semia de entendimentos que instiga diferentes campos da ciência, a qual justifi-
ca-se pela expectativa de maior integração entre os conteúdos disciplinares. No
Ensino de Ciências, assim como nas demais áreas do conhecimento, são per-
ceptíveis dificuldades no desenvolvimento de propostas didático-pedagógicas
com a intenção de superar a fragmentação do conhecimento. Isto é resultado da
intensificação e do desenvolvimento do saber científico e tecnológico. Novas
propostas metodológicas surgem nos últimos anos para abordar o ensino de
Ciências e superar tais dificuldades. Dentre elas, podemos citar a metodologia
de Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade, criada por Gerard Fourez (1994).
Segundo o autor, a IIR preza por atingir uma representatividade teórica apro-
priada em uma situação precisa e em função de um projeto determinado. Isso
implica em construir conhecimento por meio do uso da abordagem IIR, ou seja,
desenvolver uma teorização acerca da problemática da interdisciplinaridade no
ensino.

No entanto, várias são as concepções atribuídas ao conceito de inter-


disciplinaridade, pois seu sentido geral pode ser concebido não somente pela

Volume II 63
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

compreensão epistemológica da palavra. Ele também pode se expressar pela


necessidade de articulação/interação entre as diferentes áreas do conhecimento,
conforme afirmam variados autores, como Pombo (2008), Thiesen (2008) e Fa-
zenda (2008). A palavra interdisciplinaridade tem sua raiz na palavra discipli-
na. Nesse sentido, Pombo (2008) aponta que há uma família de conceitos que
se apresentam como mais ou menos equivalentes: pluridisciplinaridade, multi-
disciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Tais palavras da
mesma família devem ser pensadas num continuum que vai da coordenação à
combinação e desta à fusão (POMBO, 2008), conforme a figura 2.

Figura 2. Concepções de Olga Pombo.

Fonte: Extraído de Pombo (2008).

A figura ilustra a concepção de Pombo (2008) quanto à diferenciação en-


tre as terminologias pluri, multi, inter e trans. Mas no caso do prefixo inter, que
constitui a interdisciplinaridade, se fazem valer os preceitos da convergência,
da complementaridade e do cruzamento, o que parece ser possível de ocorrer na
prática. Assim, a interdisciplinaridade é um processo contínuo e em evolução,
não algo isolado e perene (POMBO, 2008). Além do mais, trabalhar com pro-
postas metodológicas no Ensino de Ciências vem sendo desenvolvido ao longo
de décadas, e uma delas é a que apresentamos neste estudo as Ilhas Interdisci-

Volume II 64
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

plinares de Racionalidade (IIR), de Gerard Fourez (1994). Conforme o autor, a


IIR busca alcançar uma representação teórica que seja apropriada a uma situa-
ção precisa, em função de um determinado projeto definido. Com isso, para o
desenvolvimento de um conhecimento por meio da metodologia da IIR poderá
construir uma teorização, a grosso modo, que se articule na problemática da
interdisciplinaridade voltada ao ensino.

A iniciativa de buscar trabalhos pautados na relação entre diferentes dis-


ciplinas ou áreas do conhecimento é conhecida por educadores e pesquisadores
das práticas de ensino como interdisciplinaridade. Apesar de não haver defini-
ção do termo, se percebe o crescimento dessa temática no contexto educacional
nos últimos trinta anos. Um dos autores que abarca essa temática é Frigotto
(1993), que entende que o questionamento interdisciplinar presente na educa-
ção é definido no interior das Ciências Sociais. Para o autor, “[...] os processos
educativos [são] constituídos nas e pelas relações sociais, sendo eles mesmos
constituintes das relações” (FRIGOTTO, 1993, p. 63).

Isso é evidenciado também por Morin (1994) no estudo intitulado “Sobre


La interdisciplinariedad”, no qual caracteriza a interdisciplinaridade como a
relação entre diferentes disciplinas com a possibilidade de uma troca – não só
voltada ao conhecimento, mas também de experiências e de cooperação. Nas
movimentações em prol de articulações entre temas, disciplinas e conteúdos
que utilizem interdisciplinaridade de maneira prática, é relevante considerar
metodologias que contemplem essa possibilidade de articulação de conteúdos
no ensino.

A interdisciplinaridade, para Thiesen (2008), é um movimento importante


de articulação entre o ensinar e o aprender. Compreendida como formulação
teórica e assumida enquanto atitude, tem a potencialidade de auxiliar os
educadores e as escolas na ressignificação do trabalho pedagógico em termos de

Volume II 65
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

currículo, de métodos, de conteúdos, de avaliação e nas formas de organização


dos ambientes para a aprendizagem. Essa articulação também está evidente nas
etapas das IIR de Fourez (1994) para a resolução de um problema por meio da
cooperação de todos os envolvidos, o que reforça a importância da articulação
entre ensinar e aprender na construção de um conhecimento.

Ademais, interdisciplinaridade produz um conflito no âmbito educacio-


nal e abrange um novo olhar sobre como pensar e fazer no cerne da Educação.
Ela seria a superação da abordagem disciplinar, tradicionalmente segmentada.
A tentativa de trabalhar de maneira interdisciplinar nas escolas ainda é desafia-
dora, porém, a possibilidade de desenvolvê-la traz benefícios e potencialida-
des, de modo que se possa assumir uma nova postura dentro do processo edu-
cacional. Desse modo, a interdisciplinaridade emerge como uma tentativa de
articular a prática reflexiva no cenário estudantil. Para Fazenda (2008, p. 11),

A interdisciplinaridade é considerada uma nova atitude diante da questão


do conhecimento, de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato
de aprender e dos paralelamente expressos, ou seja, uma nova maneira de
olhar as questões de ordem epistemológica, metodológica e axiológica vi-
venciada pelos professores no seu cotidiano nas escolas, pois a interdisci-
plinaridade é essencialmente um processo que precisa ser vivido e exercido
na sala de aula.

Buscamos fazer uma contribuição teórica quanto a interdisciplinaridade


como possibilidade de articular conhecimento e, assim, evidenciou-se que Fou-
rez (1994), por meio da metodologia IIR, aborda a interdisciplinaridade. Como
apontam Tramontin et al. (2019) no estudo com IIR voltadas ao ensino funda-
mental, é necessário que os estudantes se envolvam juntamente com a escola
em trabalhos que busquem estratégias de resolução de problemas locais, o que
incentiva a autonomia do aluno e a construção de cidadãos críticos e reflexivos.
Além disso, ao trabalhar com IIR conduz o processo interdisciplinar de modo
que haja confiança no projeto que está sendo trabalhado. Desse modo, de acor-

Volume II 66
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

do com o que propõe Thiesen (2008), “um processo educativo desenvolvido na


perspectiva interdisciplinar possibilita o aprofundamento da compreensão da
relação entre teoria e prática, contribui para uma formação mais crítica, criativa
e responsável”.

Sendo assim, é fundamental promover a integração dos diferentes sabe-


res para a construção de conhecimento. A possibilidade de utilizar a interdisci-
plinaridade para se compreender e construir conhecimentos sobre um problema
estudado é relevante para potencializar o ensino e aprendizagem na educação.

Contribuições finais

Convém destacar que não existe apenas uma forma de articular a interdis-
ciplinaridade e a alfabetização científica e técnica. Quanto a diferentes estraté-
gias além das Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR), podemos citar o
ensino de Ciências com enfoque Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), o En-
sino Através de Temas (EAT), a Aprendizagem Centrada em Eventos (ACE), a
Metodologia de Projetos (MP), a Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP)
e os Três Momentos Pedagógicos (TMP).

O fato é que se desejamos transpor a barreira de um ensino baseado em


memorização, fechado em disciplinas que não se comunicam, alheio ao coti-
diano dos alunos e que não atende aos objetivos dos estudantes e da sociedade,
há de se investir em trabalhar de outras maneiras, aprender a aprender e apren-
der a ensinar com sentido.

Em nosso entendimento, a Educação em Ciências pode se beneficiar por


meio de investimentos em Alfabetização Científica e Tecnológica. Para tanto, a
estratégia curricular da interdisciplinaridade se mostra como uma possibilidade
potente para formar cidadãos conscientes e atuantes na sociedade. A metodo-

Volume II 67
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

logia das Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade, composta por oito etapas


não obrigatórias, mas ilustrativas, demonstra como a interdisciplinaridade pode
ser de fato implantada. Dessa forma, proporciona articulação e interação entre
disciplinas e professores, além de acréscimos cognitivos relevantes aos conhe-
cimentos e habilidades a serem desenvolvidos por estudantes.

A figura 3 apresenta um mapa conceitual que contempla o que foi abor-


dado neste ensaio teórico de maneira a contribuir para a Educação em Ciências.

Figura 3. Alfabetização Científica e Técnica, interdisciplinaridade e a metodo-


logia de Fourez (IIR).

Fonte: elaborado pelos autores (2022).

A interdisciplinaridade pode ser vista como um caminho para articular


o conhecimento, sendo as Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR) um
meio de contribuir para que o Ensino de Ciências atinja uma das suas finali-
dades: a alfabetização científica e tecnológica. Diante do exposto, este estudo

Volume II 68
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

traz sugestões e contribuições ao Ensino de Ciências, uma vez que não existem
receitas prontas em educação. Por isso, pensar medidas integrativas de constru-
ção de conhecimento se faz necessário para qualificar o trabalho que vem sendo
feito na área até o momento.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Volume II 70
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 3

DISCUSSÕES SOBRE
INTERDISCIPLINARIDADE E
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA
A PARTIR DE UMA ILHA
INTERDISCIPLINAR DE
RACIONALIDADE
Milene Ferreira Miletto
Lia Heberlê de Almeida
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-2

Introdução

A interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas vem sendo discutida na


academia e na escola, bem como está prevista nos documentos oficiais nortea-
dores dos currículos brasileiros há algumas décadas. Contudo não é difícil per-
ceber o quanto os discursos oficiais e de especialistas em Educação estão longe
da sala de aula e da realidade prática dos saberes docentes (MOZENA; OS-
TERMAN, 2014). Isso posto, percebe-se que a distância entre as abordagens

Volume II 71
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

teóricas e o que efetivamente se consegue construir na sala de aula é imensa,


sinalizando que ainda há um longo caminho a percorrer.

Nessa perspectiva, reflete-se que contemplar verdadeiramente a interdis-


ciplinaridade no fazer pedagógico tem se configurado como um desafio (dentre
tantos outros) nas salas de aulas de escolas e também de instituições de ensino
superior.

Diversas propostas metodológicas e estratégias de ensino vêm sendo uti-


lizadas e pesquisadas nesse sentido, como, por exemplo, as chamadas metodo-
logias ativas, ensino por projetos, resolução de problemas, trabalho a partir de
temas geradores, situação de estudo, dentre tantas outras experiências relatadas
no ensino de Ciências.

Nesse contexto, as Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR), basea-


das nos estudos de Fourez e colaboradores, demonstram-se eficazes no quadro
dos processos pedagógicos que exigem uma análise sistêmica de problemáticas
complexas ou uma construção de uma representação com vistas à realização de
um projeto (FOUREZ; MAINGAIN; DOUFOUR, 2002).

Nesse sentido, o trabalho a partir das IIR visa promover uma Alfabetiza-
ção Científica e Tecnológica (ACT) nos estudantes envolvidos, pois, conforme
concebe Fourez (2002, p. 258),

uma pessoa alfabetizada científico-tecnicamente é alguém que é capaz de


utilizar conhecimentos provenientes de disciplinas variadas para resolver
certas questões e saber quando e como consultar especialistas, sem cair
numa dependência total relativamente aos peritos.

De acordo com essa perspectiva, a ACT constitui-se como uma forma de


tornar um indivíduo autônomo e um cidadão participativo em uma sociedade
altamente tecnificada, no sentido de que não é suficiente possuir certos conhe-
cimentos científicos, pois é preciso também que estes sejam compreendidos em

Volume II 72
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ligação com outras noções, provenientes das diversas disciplinas necessárias à


abordagem dos contextos concretos (FOUREZ, 2002).

Baseados nessas concepções, Bettanin e Pinho Alves (2003) compreen-


dem que a ACT deve fornecer ao indivíduo conhecimentos para que ele possa
explorar o seu próprio mundo e integrar-se em sociedades cada vez mais sofis-
ticadas.

Conforme Paiva (2016), nesse contexto, um indivíduo pode ser conside-


rado alfabetizado científica e tecnologicamente à medida que

[...] seus saberes lhe proporcionaram uma certa autonomia (possibilidade


de negociar suas decisões frente às pressões naturais ou sociais), uma certa
capacidade de comunicação (encontrar maneiras de se expressar), e um
certo domínio e responsabilidade, frente a situações concretas (como o
contágio, o processo de congelamento, um computador, um fax, um motor
diesel, etc.) (FOUREZ, 2005, p. 62, grifo das autoras).

Assim, compreende-se que, nessa elaboração, é necessário especialmente


que o indivíduo tenha capacidade de negociar (BETANIN; PINHO ALVES,
2003), o que demanda certos atributos elencados pelo autor como integrantes
de uma ACT: autonomia para tomar decisões plausíveis frente a uma situa-
ção-problema, sem a necessidade obrigatória de especialistas ou de receitas
prontas; domínio e responsabilidade frente a situações reais e comunicação
com os demais, o que significa ser capaz de dialogar com os outros a respeito
do assunto (FOUREZ, 2005).

Conforme Pastório, Nicoletti e Robaina (2022), as discussões que en-


volvem temas científicos são cada vez mais relevantes no contexto contem-
porâneo, estando presentes no dia a dia e repercutindo na escola, demandando
entendimentos que envolvem Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) de forma
que,

Volume II 73
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

As novas tecnologias surgem acompanhadas de avanços e impactos so-


ciais, econômicos e ambientais, suscitando novos desafios para a socie-
dade. A segurança alimentar, as questões hídricas, as mudanças climáti-
cas, entre outras temáticas de interesse da sociedade, devem ser abordadas
de maneira a fomentar e incentivar a participação pública nesses debates.
(PASTÓRIO; NICOLETTI; ROBAINA, 2022, p. 160).

Assim, constata-se que a segurança alimentar, temática que permeou os


estudos que serão analisados a seguir, pode constituir-se como uma fomentado-
ra de discussões importantes, na qual as relações CTS puderam estar em deba-
te, buscando a construção da formação científico-cultural dos alunos, a promo-
ção e a participação deles em discussões sobre temas científicos (PASTÓRIO;
NICOLETTI; ROBAINA, 2022).

Embasados nesses pressupostos, apresentamos no presente estudo dados


obtidos a partir da construção de uma IIR por estudantes e professores que
participaram no contexto de escola do campo relatada em Miletto e Robai-
na (2022). Esta envolveu os alunos em pesquisas a respeito da Agroecologia
na produção de alimentos, buscando compreender, nessa temática, as relações
existentes na realidade local, visto que a escola em questão se localiza em zona
de grande expressão do agronegócio.

Discorreremos a seguir a respeito da organização metodológica que


orientou a elaboração do estudo apresentado, relatando a intervenção peda-
gógica desenvolvida através da estratégia das IIR, bem como as reflexões dos
estudantes e professores envolvidos sobre as construções interdisciplinares e
sobre a alfabetização científica.

Caminho metodológico

A escola na qual foi realizado o estudo pertence à rede estadual de ensi-


no gaúcha e está localizada na divisa entre os municípios de Caçapava do Sul
e Cachoeira do Sul, atendendo cerca de uma centena de estudantes do Ensino

Volume II 74
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Médio (EM) de diversas localidades dos dois munícipios, que vão até a esco-
la utilizando transporte escolar. Situa-se em uma área rural na qual prevalece
a agricultura (especialmente de monocultura de soja), fator preponderante na
escolha desta para a realização da pesquisa, com vistas a discutir a temática da
segurança alimentar e Agroecologia.

Pesquisou-se um grupo de quatro professores da área de Ciências da Na-


tureza (CN), sendo dois de Física, um de Química e um de Biologia, além da
professora de História e Geografia (que participou da IIR como especialista) e
um grupo de doze alunos do terceiro ano do EM que estava presente em sala de
aula no dia em que foram aplicados os instrumentos de pesquisa e entregues os
termos a partir dos quais assentiram participar.

Os professores serão denominados, neste estudo, com os nomes fictícios


de Alice, Beatriz, Celina, Davi e Estela. A professora Alice é a docente de Bio-
logia da escola, tem experiência de dez anos no magistério e sua formação é
em Ciências Biológicas com especialização em Gestão Ambiental. A profes-
sora Beatriz atua com o componente curricular de Química, possui formação
em Ciências Biológicas e está cursando especialização em Gestão Ambiental,
relatou ter oito anos de experiência e também atuar nas séries iniciais do Ensi-
no Fundamental. A professora Celina tem a mesma formação de suas colegas e
especialização em Ecologia, atua no componente de Física na turma pesquisada
e tem vinte e um anos de experiência docente em escolas do campo e urbanas.

O professor Davi também é docente de Física, atualmente exerce a função


de diretor da escola, é licenciado em Ciências Exatas, com especialização em
Supervisão Escolar e mestrado em Ensino de Ciências, relatou ter nove anos de
experiência docente. Também participou do estudo a professora de História e
Geografia da turma, a Estela, formada em Ciências Sociais e cursa especializa-
ção em Educação Especial, é especialista em Filosofia e Sociologia, Supervisão
e Orientação Escolar e tem experiência de onze anos de atuação na profissão.

Volume II 75
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Os quatro professores da área de CN responderam a um questionário ini-


cial, a partir do qual se pôde analisar as suas concepções a respeito da interdis-
ciplinaridade. Eles também participaram de uma entrevista semiestruturada em
que, dentre outros temas de interesse da tese em construção da qual este estudo
é um recorte, constavam questões a respeito de práticas interdisciplinares já de-
senvolvidas por eles, a fim de compreender as suas experiências e dificuldades.

Os estudantes envolvidos cursavam o terceiro ano do EM na referida


escola, com a média de idade entre 17 e 18 anos. Eles participaram das etapas
da IIR, elaboraram suas pesquisas, criaram e apresentaram seminários em gru-
pos a partir das temáticas que foram surgindo durante o desenvolvimento da
metodologia. Alguns deles serão citados no decorrer do texto, com os nomes
fictícios de Ana, Bruno e Carolina. No decorrer da implementação da IIR, eles
solicitaram auxílio de alguns especialistas, os quais agregaram seus conheci-
mentos para a compreensão das discussões propostas. Na análise, menciona-se
a professora Estela, com sua devida autorização.

Na sequência foi desenvolvida a intervenção propriamente dita, que com-


preendeu as etapas previstas na metodologia das IIR, conforme apresentado
em Miletto e Robaina (2022). Após a conclusão da intervenção, realizaram-se
entrevistas em grupo focal com dois professores que puderam participar (Bea-
triz e Estela) e três grupos de estudantes. Este foi um momento no qual se pôde
refletir sobre as atividades desenvolvidas a fim de compreender se e como, de
acordo com as concepções dos participantes, a interdisciplinaridade havia se
constituído no decorrer da proposta.

Também foram considerados instrumentos de pesquisa o material produ-


zido e apresentado em sala de aula, bem como as falas audiogravadas e trans-
critas dos estudantes no decorrer da IIR. Os dados foram analisados quanto às
duas questões em estudo: as construções interdisciplinares a partir da IIR e as
elaborações quanto à ACT.

Volume II 76
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

No que tange à análise a respeito das construções interdisciplinares, os


dados colhidos foram tratados a partir da Análise Textual Discursiva (ATD),
cuja intenção é compreender os conhecimentos assimilados sobre os temas in-
vestigados, através de um estudo criterioso e rigoroso dos textos produzidos, de
modo a organizar categorias de significado, culminando na produção de meta-
textos (MORAES; GALIAZZI, 2011).

A partir da análise e desconstrução das falas transcritas, no processo de


atribuição de significados, emergiram as categorias iniciais, sucedidas pelas in-
termediárias que finalmente deram origem às três categorias finais: obstáculos
ou facilitadores na construção da interdisciplinaridade no trabalho pedagógico,
avanços na construção da interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas e ex-
periência interdisciplinar a partir da IIR desenvolvida.

A questão da alfabetização científica foi analisada conforme os indicati-


vos correspondentes aos atributos de Fourez para uma ACT (BETTANIN; PI-
NHO ALVES, 2003): autonomia, domínio e comunicação, no sentido de com-
preender essas construções no decorrer da IIR em estudo, buscando estabelecer
uma comparação com outros trabalhos já desenvolvidos (PAIVA, 2016; ROSA;
DEMARCO; DARROZ, 2020).

Destacamos que o presente estudo consiste em um recorte de uma pes-


quisa de doutorado em construção, registrada e aprovada junto ao Comitê de
Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul sob o número
5.205.072 e, na Plataforma Brasil, sob o número 53810121.0.0000.5347.

O desenvolvimento da IRR:

Conforme Fourez, Maingain e Doufour (2002) a prática escolar da in-


terdisciplinaridade visa a aquisição pelos alunos de uma competência inter-
disciplinar. Conforme os autores, esta pode ser definida como a capacidade de

Volume II 77
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

campos tradicionalmente isolados, com vistas a elaborar uma representação


de uma situação, integrando a contribuição de diversas disciplinas.

O trabalho com as IIR se desenvolve a partir de etapas adaptáveis a dife-


rentes contextos, as quais, no estudo analisado, foram: clichê, panorama espon-
tâneo, consulta aos especialistas, trabalho de campo, abertura de caixas pretas
(CP) com ou sem auxílio de especialistas, esquema global e síntese. A IIR em
estudo compreendeu as etapas listadas no quadro 1:

Quadro 1. etapas de desenvolvimento da IRR

Etapa da IIR Atividade desenvolvida Horas aula

- Debate a partir vídeo do Youtube:


Clichê (1/2) aula
“O que é Agroecologia”

-Construção da lista de caixas pretas,


disciplinas e especialistas envolvidos;
Panorama espontâneo (1/2) aula
- Organização da turma em grupos de
acordo com as CP apontadas.
Fora da
Trabalho de campo - Pesquisa dos alunos.
aula- tempo
Abertura aprofundada
- Apresentação de seminários com
de CP com auxílio de 1 aula
participação de especialista.
especialista
- Avaliação do andamento da atividade
Esquema Global 1 aula
até aqui

Abertura de CP sem
- Apresentação dos demais seminários 2 aulas
auxílio de especialista

- Criação de cartaz com as principais


Síntese da IIR ideias e aprendizagens desenvolvidas 1 aula
durante a IIR.

Fonte: os autores, 2022.

Volume II 78
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

As atividades estão descritas detalhadamente e analisadas em Miletto e


Robaina (2022), com a finalidade de construir um entendimento a respeito das
questões iniciais discutidas: O que é alimento no Brasil hoje? Nós temos co-
nhecimento e consciência exata sobre o que consumimos? Somos produtores
de alimentos aqui na comunidade? Nós comemos o que plantamos?

A partir dessas, desenrolou-se uma discussão a respeito de quais seriam


as questões envolvidas para elucidar essas problemáticas, quais os especialis-
tas ou professores poderiam ser contatados a fim de se obter os conhecimentos
necessários e quais as relações e disciplinas que poderiam estar envolvidas,
constituindo, assim, a etapa de panorama espontâneo, conforme a anotação
construída no quadro branco a seguir (Figura 1).

Figura 1. Panorama espontâneo

Fonte: os autores, 2021.

Volume II 79
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

As CP correspondem a temas ou assuntos que, se pesquisados, podem


contribuir com a elucidação da problemática em estudo. Conforme Fourez,
Maingain e Doufour (2002), as CP designam conceitos ou sistemas que se utili-
za sem dominar necessariamente a sua representação estandartizada ou a teoria
que o explica. Nicoletti e Seppel baseadas no próprio Fourez, propõem uma
ilustração das IIR (Figura 2), na qual representam as CP em um mar de igno-
rância a respeito de determinado assunto.

Figura 2. Representação das IRR

Fonte: Nicoletti e Seppel (2015).

No caso em estudo as CP deram origem aos seminários elaborados pelos


estudantes: biodiversidade, “agro”, defensivos/agrotóxicos, produção de ali-
mentos, segurança alimentar e agricultura tradicional.

A seguir desenvolveu-se a etapa de trabalho de campo, na qual os estu-


dantes desenvolveram efetivamente as pesquisas sobre os respectivos temas,
construindo os seminários que seriam apresentados na sala de aula.

A etapa seguinte foi a de abertura de CP com e sem auxílio de especia-


listas, na qual os estudantes apresentaram as pesquisas empreendidas sobre:
biodiversidade, agrotóxicos/defensivos agrícolas e segurança alimentar. No en-

Volume II 80
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

contro posterior assistiu-se a um documentário (O veneno está na mesa, 2014),


sugerido pela professora pesquisadora durante as discussões sobre a questão
dos agrotóxicos, e se fez a retomada das construções feitas até o momento,
constituindo a etapa de esquema global.

Logo foram realizadas novas aberturas de CP, dessa vez sem auxílio de
especialista, de forma a apresentar os demais seminários construídos pelos gru-
pos a respeito de agronegócio e agricultura tradicional.

Concluindo a IIR, os estudantes elaboraram um cartaz como produto fi-


nal (Figura 3), retomando as construções adquiridas ao longo das etapas, de
modo a sintetizar suas ideias no sentido de elaborar uma representação sobre
os temas em estudo.

Figura 3. Síntese da IRR

Fonte: os autores, 2021.

Volume II 81
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Refletindo sobre a Interdisciplinaridade

Conforme Paiva (2016), a interdisciplinaridade insere-se na construção


de uma IIR devido à necessidade de cruzar saberes de diversas disciplinas e
até mesmo os saberes cotidianos, para a construção da representação. Assim, a
utilidade de uma IIR depende de sua eficiência em fornecer uma representação
que contribua para a solução de um problema específico que a originou (PAI-
VA, 2016).

Dessa forma, a utilização das IIR busca construir uma modelização na


simplificação do real (PAIVA, 2016), constituindo-se como uma prática inte-
gradora que implica na interação entre duas ou mais áreas de conhecimento
em função de um contexto particular e de um projeto determinado com vistas
a construir um modelo original em resposta ao problema (FOUREZ; MAIN-
GAIN; DUFOUR, 2002).

Antes de examinar a intervenção propriamente dita, discorreremos bre-


vemente sobre as experiências anteriores dos professores quanto à interdisci-
plinaridade relatadas na entrevista. Após, apresentaremos a análise a partir das
categorias emergentes: obstáculos ou facilitadores na construção da interdis-
ciplinaridade no trabalho pedagógico, avanços na construção da interdiscipli-
naridade nas práticas pedagógicas e experiência interdisciplinar a partir da IIR
desenvolvida. Ainda, levamos em consideração também algumas questões do
questionário que foi aplicado com o grupo que, dentre outros temas de interesse
da tese, envolviam a questão da interdisciplinaridade.

Em seus relatos durante a entrevista, os professores Alice, Beatriz e Davi


mencionaram possuir diversas vivências relativas à interdisciplinaridade. A
professora Celina, por sua vez, alegou ter poucas experiências a relatar, pois

Volume II 82
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

não considera que esse seja o seu perfil, o que atribuiu sobretudo ao componen-
te curricular de Física que atualmente leciona na escola em estudo.

O professor Davi relatou que devido à sua formação (Ciências Exatas)


sempre trabalhou com os componentes de Química e Física de forma a inter-
ligá-los, procurando abordar temáticas que promovessem a interdisciplinari-
dade. Além disso, referiu-se à experiência de trabalhar com projetos durante o
Ensino Médio Politécnico.

A professora Beatriz mencionou que tem mais facilidade em promover


atividades interdisciplinares ao trabalhar com as séries iniciais. Todavia, atual-
mente ela está propondo projetos como, por exemplo, sobre obsolescência
planejada nos componentes curriculares do novo Ensino Médio que está le-
cionando (Empreendedorismo e Tecnologia). De acordo com ela, “seria ideal
trabalhar a interdisciplinaridade o tempo todo, mas faltam oportunidades”
(PROFESSORA BEATRIZ).

No mesmo sentido, a professora Alice considera que teve alguma expe-


riência com trabalhos interdisciplinares, porém destacou que gostaria de ter
mais. Ainda, tal qual seus colegas, ela percebe várias dificuldades para a efe-
tivação de práticas que realmente contemplem a dimensão interdisciplinar na
escola.

Assim, os professores elencaram algumas circunstâncias e questões que,


segundo suas percepções, constituir-se-iam como obstáculos ou facilitadores
na construção da interdisciplinaridade no trabalho pedagógico. Um destes
seria o tempo, pois consideraram que apesar de atuarem na mesma área do co-
nhecimento na referida escola, pouco se veem, uma vez que nem sempre têm
horários coincidentes e, mesmo quando estão na escola, cada um está em sua
respectiva sala de aula, visto que a carga horária não contempla tempo para

Volume II 83
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

planejamento conjunto. Ademais, atendem diferentes demandas e trabalham


em diversas escolas, o que dificulta o trabalho interdisciplinar.

Isso posto, podemos compreender outro obstáculo: a organização es-


colar. Segundo analisou a professora Beatriz, “se tu tem o tema, a oportuni-
dade, tu até consegue (...) Precisaria organizar de uma forma diferente para
gente poder trabalhar. O posicionamento da professora Alice foi no mesmo
sentido: quando pode a gente tenta, mas fica difícil, os professores trabalham
em mais de uma escola, então a gente acaba, muitas vezes, não fazendo isso”
(PROFESSORA ALICE). A realidade é que cada professor cumpre com a sua
tarefa individual na escola, pouco havendo oportunidade de planejamento em
conjunto.

Conforme o professor Davi, a exigência do trabalho interdisciplinar é o


planejamento, sendo a falta deste o maior motivo de engessamento no ensino,
visto que o trabalho interdisciplinar “exige muito mais tempo de planejamento
do que de execução em sala de aula com o aluno, então, ele não é um trabalho
fácil, pois exige mais do que nós temos disponível para planejarmos” (PRO-
FESSOR DAVI).

As entrevistas foram realizadas durante o período de pandemia, quando


ainda se iniciava o retorno dos estudantes ao ensino presencial. Diante deste
cenário, as dificuldades do ensino também foram salientadas pelos educadores
como um obstáculo, ainda mais por se tratar de escola do campo, em que nem
todos os estudantes tinham acesso à internet para acessar as aulas na platafor-
ma.

A esse respeito, a professora Alice salientou o quanto foi complexo tra-


balhar durante o referido período, atendendo no aplicativo on-line, elaboran-
do material físico para os estudantes que permaneciam em casa e, ao mesmo

Volume II 84
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tempo, atendendo parte da turma que havia retornado à escola, pois isso tudo
demandou muito tempo extra dos professores, de forma que se tornou muito
mais difícil “ter tempo para planejar e programar alguma atividade interdisci-
plinar” (PROFESSORA ALICE).

Augusto e Caldeira (2007), ao analisar as dificuldades para a implemen-


tação de práticas pedagógicas interdisciplinares apontadas por professores na
área de CN na rede estadual paulista, apontaram-nas como: concepções de or-
dem epistemológica, concepções relacionadas à própria prática pedagógica e
dificuldades relativas à organização do trabalho coletivo na organização esco-
lar.

No caso em estudo, pôde-se apreender da fala das professoras todas essas


questões, o que sinaliza tratarem-se de dificuldades comuns à rede pública e
que permanecem inalteradas no período entre os estudos de Augusto e Caldeira
(2007) até a atualidade. Talvez estejam até acentuadas pelas consequências da
pandemia nas escolas, conforme apontado neste estudo.

Contudo, mesmo vislumbrando tantas dificuldades, os professores foram


unânimes em se posicionar quanto à pertinência de promover avanços na cons-
trução da interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas, de modo que, ao
desenvolver esse tipo de trabalho, “faria diferença para o professor e para a
aprendizagem do estudante” (PROFESSORA CELINA). Nesse sentido o pro-
fessor Davi refletiu que:

Com certeza seria o ideal, porque o conhecimento não é compartimentali-


zado, ele não é em caixas, ele é uma coisa só. No momento em que tu con-
segue fazer essa ligação entre todos os conhecimentos de todas as áreas,
se torna muito mais fácil o aprendizado para o aluno e com mais sentido
também. (PROFESSOR DAVI).

Os professores relataram que consideraram importante a realização da


atividade proposta pela pesquisadora e que esta seria mais um exemplo de

Volume II 85
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

atividade interdisciplinar. Além disso, destacaram a possibilidade de voltar a


abordarem a mesma temática em outros momentos, com outras turmas na esco-
la, pois, segundo percebem: “esse é o caminho, não há como fugir” (PROFES-
SORA BEATRIZ).

Conforme sinalizado por Augusto e Caldeira (2007) realmente existem


muitas dificuldades para o desenvolvimento de projetos interdisciplinares nas
atuais condições da escola pública. No entanto, os autores compreendem que
essas não são barreiras intransponíveis, visto que várias dessas adversidades
podem ser solucionadas pelos próprios professores, no sentido de que, se pre-
tendemos implantar novos métodos de ensino, objetivando alunos mais moti-
vados e com melhor aprendizagem, a interdisciplinaridade apresenta-se como
uma opção.

Após o desenvolvimento da intervenção, durante a entrevista em grupo


focal, os estudantes discutiram sobre as atividades que haviam vivenciado nas
aulas, refletindo sobre a experiência interdisciplinar a partir da IIR desen-
volvida. Eles examinaram que nunca tinham parado para pensar exatamente na
questão da segurança alimentar, em como é importante saber como os alimen-
tos são produzidos. De acordo com a aluna Carolina, “essa questão também de
Agroecologia, a maioria de nós não tinha noção do que era e nem que existia”.

Nesse momento do diálogo, os alunos evidenciaram ter percebido que


haviam conhecimentos de Química, Física e Biologia nos elementos de suas
pesquisas e discussões: “na questão das plantas, tinha a ver com Biologia”
(ALUNA ANA), “Química e Física também entram na questão dos agrotóxi-
cos” (ALUNO BRUNO). Além disso, a aluna Carolina ponderou: “gente, tinha
História e Geografia o tempo todo em tudo”.

Questionados sobre o que seria melhor, uma aula do referido componente


ou uma atividade tal qual a que havíamos desenvolvido, a aluna Ana expressou:

Volume II 86
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Acho que envolver um pouco de cada um, trazer uma aula mais didática
e também trazer uma aula que gere uma conversa, um questionamento, a
maioria das aulas que a gente teve geraram questionamento, dentro do
questionamento, tu acaba aprendendo sobre o assunto melhor do que em
um texto passado no quadro, e precisa pensar mais de uma disciplina ao
mesmo tempo, foi legal ter mais de uma professora junto. (ALUNA ANA).

A aluna se referia à participação da professora Estela no decorrer das


atividades, a qual foi procurada pelos estudantes durante as realizações das
pesquisas por grupos e teve a oportunidade de estar presente em dois momen-
tos: na abertura de CP sobre segurança alimentar e agrotóxicos e no dia em que
debateram o documentário assistido. Assim, a professora Estela se integrou à
IIR como especialista em História e Geografia, juntando-se à professora pes-
quisadora e aos estudantes durante alguns debates.

Analisando as atividades desenvolvidas, a professora Celina considerou


importante o trabalho desenvolvido pelos estudantes, no sentido de que “eles
têm que produzir e produzindo eu acho que eles aprendem mais, entendeu?”
(PROFESSORA CELINA).

A professora considerou importante o diálogo entre os conhecimentos


sistematizados pelos diferentes componentes, pois, “a partir do momento que
dois ou mais educadores se juntam numa proposta de trabalho, ele consegue
se desenvolver, aí tu consegue ver qual a aptidão, às vezes, consegue se de-
senvolver mais em uma área ou em outra, mas sempre com aquele conteúdo
propriamente dito” (PROFESSORA CELINA).

As reflexões dos professores vieram ao encontro dos resultados obtidos


com o mesmo grupo, durante a aplicação dos questionários, no qual foram unâ-
nimes quanto às seguintes colocações:

1. muitos temas trabalhados nas aulas poderiam ter uma abordagem inter-
disciplinar, o que tornaria a aprendizagem mais enriquecedora e significativa;

Volume II 87
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

2. a escola precisa acompanhar e compreender as exigências interdisci-


plinares que hoje participam da construção de novos conhecimentos, refletindo
sobre suas próprias práticas;

3. trabalhar de forma interdisciplinar envolve romper hábitos e acomoda-


ções, buscar algo novo e desconhecido, o que se constitui em um grande desafio
para os professores e a escola;

4. para organizar o trabalho pedagógico de forma interdisciplinar é preci-


so repensar as metodologias de ensino.

Assim, consideramos que a intervenção realizada se constituiu como uma


importante experiência para os estudantes, professores e também para a pro-
fessora pesquisadora, no sentido de evidenciar as possibilidades de um ensino
interdisciplinar a partir de uma temática de interesse de todos os participantes,
que envolveu questões inerentes ao dia a dia dos estudantes. Atividades assim
são uma alternativa a aulas no modelo tradicional, as quais muitas vezes não
fazem sentido para o aluno ou são abordadas para atender a currículos que não
favorecem que os conhecimentos aprendidos em sala de aula sejam utiliza-
dos fora dela, pois estão fortemente marcados por idealizações, simplificações
e restrições, que os tornam impotentes para lidarem com a complexidade do
mundo (PIETROCOLA; PINHO-ALVES; PINHEIRO, 2003).

Por meio da intervenção ora descrita, os estudantes puderam se apropriar


de conhecimentos sistematizados nos diferentes componentes curriculares
ou resgatar conhecimentos dos quais já dispunham, buscando saberes da
comunidade e das famílias e envolvendo a participação dos professores em
uma experiência com uma estratégia de ensino (as IIR) que não conheciam e
que pode ser desenvolvida em outros momentos e contextos, com as adaptações
que se fizerem necessárias.

Volume II 88
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Considerações sobre a Alfabetização Científica

Para analisarmos as construções viabilizadas através do desenvolvimen-


to da IIR, discutiremos brevemente os atributos para a ACT, concebidos por
Fourez (1997), buscando compreender em que momento da intervenção cada
atributo pode ser demandado e desenvolvido pelos estudantes em comparação
aos dados apresentados por Paiva (2016) e Rosa, Demarco e Darroz (2020) em
estudos semelhantes.

Tais atributos correspondem aos objetivos pedagógicos de uma ACT. São


estes: a autonomia, o domínio e a comunicação, que apresentam um caráter
social, voltados a promover, sobretudo, atitudes que levem os indivíduos a inte-
ragir com a sociedade em assuntos que envolvem ciência e tecnologia (PAIVA,
2016), mediados pela negociação, conforme representado no esquema abaixo
(Figura 4):

Figura 4. Objetivos pedagógicos da ACT

                                              
Fonte: os autores, baseados em Paiva (2016).

Volume II 89
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Compreendendo essa relação, examinamos que o primeiro deles diz res-


peito à autonomia. Esta relaciona-se com a necessidade de o indivíduo assumir
uma posição fundamentada frente às situações concretas, sem ficar dependen-
do totalmente dos conhecimentos de especialistas ou receitas prontas (PAIVA,
2016), o que, consoante enfatiza Bettanin (2013), configura-se como algo de
cunho pessoal. Assim, o referido atributo visa desenvolver o sujeito como um
todo, de forma a torná-lo apto a elaborar críticas e empreender pensamentos e
compreensões que o definam (ROSA; DEMARCO; DARROZ, 2020).

Rosa, Demarco e Darroz (2020) sinalizam que a busca por informações


pode estar relacionada à estrutura organizacional da atividade, ou seja, quando
foi solicitado aos estudantes a consulta aos especialistas, ao buscarem respostas
para a situação-problema e mesmo na etapa de síntese da IIR. Assim, na IIR
em estudo, podemos compreender que os estudantes demandaram esse atributo
no momento de buscar as informações, definir quem seriam os especialistas e
fazer contato com eles.

Seguindo a linha de análise adotada por Rosa, Demarco e Darroz (2020),


no caso em estudo, podemos analisar que no que tange a não se deixar influenciar
pelos outros, diretamente relacionado à autonomia, os estudantes depararam-se
com situações que contrariavam suas concepções iniciais, especialmente quan-
do se discutiu a questão dos agrotóxicos ou, como a maioria dos estudantes op-
tou por utilizar: defensivos agrícolas, escolha notadamente influenciada a partir
dos dados selecionados para a apresentação do seminário sobre essa temática,
indicados pela especialista consultada (funcionária da cooperativa vizinha à
escola) no decorrer da etapa de trabalho de campo.

Especialmente neste momento da IIR o debate entre a turma tornou-se


acentuado, no sentido de os estudantes divergirem (São bons ou ruins? São
necessários? O que de fato são essas substâncias?), o que ficou muito evidente

Volume II 90
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

na escolha retórica de quem se posicionou a favor (defensivos) e contra (agro-


tóxicos).

Foi notório o posicionamento de grande parte dos estudantes no sentido


de conceber tais produtos como necessários, com discursos bastante influencia-
dos pela especialista e pelos dados coletados. Contudo, alguns estudantes, mes-
mo com toda essa influência, compreenderam o risco que são os agrotóxicos
para o ser humano e o meio ambiente, conforme sinaliza a aluna Ana:

A questão ali dos agrotóxicos que apesar de saírem do campo (os alimen-
tos, no caso), passarem por toda aquela função de agrotóxico, de a gente
ter noção que ainda chega com uma certa porcentagem na mesa, que a
gente ingere agrotóxico, apesar de ser uma pequena quantidade, aquilo ali
foi bem chocante de descobrir, porque eu só ouvia falar bem dos defensi-
vos. (ALUNA ANA).

Na entrevista em grupo focal, os estudantes discutiram entre si se haviam


ou não mudado de opinião sobre algum tópico abordado durante as atividades,
então a maioria se referiu novamente à questão dos agrotóxicos. Nesse diálogo
a aluna Ana salientou que: “eu realmente não tinha muita opinião, não tinha
mesmo, os conhecimentos que a gente pesquisou foram para adquirir mais pi-
lares para formar a opinião da pessoa”. Podemos analisar que essa fala remete
diretamente ao atributo da autonomia, ora discutido.

No que diz respeito ao domínio, esse objetivo implica no “saber-fazer” e


no “poder-fazer”, considerando as possibilidades individuais e sociais, o domí-
nio dos conhecimentos necessários e a responsabilidade (PAIVA, 2016). Por-
tanto esse atributo envolve certas características como: contribuir com a equi-
pe, conhecer para decidir, poder de argumentação, capacidade pela busca do
conhecimento, desenvolvimento do pensamento crítico, coerência ao relacio-
nar a situação-problema com determinados conhecimentos (ROSA; DEMAR-
CO; DARROZ, 2020).

Volume II 91
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O desenvolvimento desse atributo pôde ser observado durante o desen-


volvimento da IIR quando os estudantes se organizaram nos grupos, ao cons-
truírem suas pesquisas e especialmente ao apresentar os seminários, nos quais
notou que alguns grupos empreenderam pesquisas bem mais aprofundadas e
com clareza conceitual mais adequada.

Rosa, Demarco e Darroz (2020) destacaram o modo como foi encami-


nhado a IIR de forma que as discussões que emergiam possibilitaram questio-
namentos sobre conceitos de Física (foco da IIR analisada) e as relações com
as outras disciplinas, de maneira que os estudantes se sentiram livres e interes-
sados em questionar aspectos abordados anteriormente (ROSA; DEMARCO;
DARROZ, 2020).

Nesse sentido, analisa-se que, em Miletto e Robaina (2022), os estudan-


tes, em certa medida, também demonstraram coerência em relacionar a situa-
ção-problema com conhecimentos que já possuíam (relações ecológicas para
compreender a importância da biodiversidade, indicadores de saúde pública
quanto à percepção da questão da segurança/insegurança alimentar, conheci-
mentos de História e Geografia na compreensão da evolução agricultura), den-
tre tantos outros que foram demandados durante as discussões que constituíram
a IIR.

Em Rosa, Demarco e Darroz (2020), percebeu-se a dificuldade dos alu-


nos em relacionar os conhecimentos científicos com a situação-problema (não
funcionamento de aparelhos de ar-condicionado que haviam sido instalados na
escola). Entretanto, não foi observado esse obstáculo na IIR em estudo, visto
que esta abordava um assunto de interesse da vida de todos, sobretudo por en-
volver a agricultura, que se constitui como principal atividade econômica das
famílias dos estudantes.

Volume II 92
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Além disso, a familiaridade com o assunto também pode ter contribuído


com a correta utilização dos conceitos científicos empregados pelos estudantes
durante suas interações, ressalvando-se a temática dos agrotóxicos, a qual foi a
mais polêmica e surgiu várias vezes no decorrer da IIR.

A comunicação é definida por Fourez (1997) como um componente cul-


tural, social, ético e teórico. Diz respeito à lógica de que para o indivíduo se
posicionar frente a uma situação concreta, ele deve ter a capacidade de expres-
sar suas ideias, utilizando adequadamente o domínio das palavras, conceitos e
estruturas de representação e organizando argumentações pertinentes (PAIVA,
2016).

Conforme Rosa, Demarco e Darroz (2020), analisar esse atributo envolve


aspectos como: ser capaz de expressar sua opinião, saber discutir em equipe e
também com os especialistas, conseguir elaborar modelos teóricos e apresentar
argumentação coesa, dentre outros.

Durante o desenvolvimento das atividades, os estudantes demandaram


esse atributo em diversas oportunidades: ao dialogar entre si, com a professora
pesquisadora e com os especialistas, ao apresentar suas pesquisas nos seminá-
rios e ao se articularem em conjunto na finalização do projeto.

Quanto à elaboração um modelo teórico, ressaltamos que os estudantes


demonstraram um pouco de dificuldade nesse sentido. Na etapa de síntese na
IIR, a proposta inicial da professora pesquisadora foi a da criação de um vídeo,
porém esta foi rejeitada de pronto pelos envolvidos, visto não terem acesso à
internet nesse dia na escola (uma das dificuldades encontradas na atividade,
pois era instável, por se tratar de zona rural). Então, a seguir discutiram sobre a
construção de um texto coletivo, mas também rejeitaram a ideia e após chega-
ram ao consenso da criação de um cartaz.

Volume II 93
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Conforme sinalizam Rosa, Demarco e Darroz (2020), a capacidade de


expressar opiniões e de saber dialogar sobre elas é algo que nem sempre fica
claro em uma aula nos moldes tradicionais, entretanto, através da IIR desen-
volvida pelos autores, foi proporcionado aos estudantes inferências e manifes-
tações sobre diversas temáticas.

Nesse mesmo sentido, percebe-se que em Miletto e Robaina (2022) po-


de-se estabelecer essa mesma relação, ainda que com algumas dificuldades
elencadas pelos autores, pois a aplicação da IIR se deu durante o processo de
retorno dos estudantes ao ensino presencial, após o longo período de aulas re-
motas, em que, por se tratar de escola do campo, muitos estudantes não tiveram
acesso nem mesmo às atividades síncronas propostas pelos professores.

Considerações Finais

O desenvolvimento de uma IIR mobiliza diversos conhecimentos e de-


manda certos atributos dos estudantes, de modo a construir uma representação
complexa acerca de uma situação-problema, como a produção de alimentos, de
modo a empreender diversas conexões a partir das pesquisas realizadas, susci-
tando um olhar interdisciplinar sobre a questão em estudo.

Assim, durante o desenvolvimento da IIR sobre Agroecologia, os estu-


dantes tiveram a oportunidade de buscar informações, debater sobre elas a par-
tir de diferentes fontes e especialistas, construindo, dessa forma, um entendi-
mento. Isto corrobora as concepções dos professores acerca da importância da
interdisciplinaridade nas práticas pedagógicas, de modo que a utilização das
IIR pode constituir-se como um caminho nesse sentido.

O trabalho com as IIR contribui para o desenvolvimento da alfabetização


científica dos envolvidos, já que demanda habilidades que vão ao encontro dos

Volume II 94
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

atributos elencados por Fourez (1997), quais sejam, autonomia, domínio e co-
municação, de modo a construir as habilidades necessárias para que o estudante
se aproxime de uma alfabetização científica. Assim, eles entendem o contexto
e aprendem a se posicionar criticamente frente às situações reais para além da
escola, de forma a mobilizar conhecimentos científicos nas mais diversas de-
mandas do dia a dia.

Por fim, ressaltamos a importância dessas construções quanto à interdis-


ciplinaridade e quanto à contribuição no desenvolvimento da ACT, no contex-
to de escola do campo, pois a temática a respeito da produção de alimentos e
Agroecologia foi potencializadora de diversas discussões pertinentes quanto
à realidade vivida neste espaço, de modo a instrumentalizar os estudantes de
argumentos e questionamentos para o enfrentamento de problemáticas impor-
tantes em busca de um novo modelo de desenvolvimento para o campo, para
suas famílias e que passa, sim, por outro modelo de escola, representado pela
educação do campo.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Resumo: As Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade vêm sendo empregadas como


estratégia de ensino particularmente na área de Ciências da Natureza, envolvendo a
construção de estudos interdisciplinares a partir da busca pela solução de determina-
da situação-problema, de forma a contribuir com a Alfabetização Científica e Tecno-
lógica (ACT) dos estudantes envolvidos. Este estudo busca analisar as percepções a
respeito da interdisciplinaridade, bem como os atributos envolvidos na ACT, a partir
de professores e estudantes do Ensino Médio envolvidos no desenvolvimento de uma
IRR que discutiu a Agroecologia e a produção de alimentos em um contexto de esco-
la do campo. Os instrumentos utilizados foram entrevistas e questionários aplicados
com professores, bem como produções e falas dos participantes durante o desenvol-
vimento das atividades, sendo estas posteriormente transcritas. Ainda, entrevistas
em grupo focal realizadas com alguns dos professores envolvidos e com grupos de
estudantes. A análise dos dados compreendeu a Análise Textual Discursiva (ATD),
além da comparação quanto aos atributos desenvolvidos em trabalhos de semelhan-
te teor. Os resultados sinalizam a importância das oportunidades vivenciadas pelos
estudantes quanto às construções no sentido do desenvolvimento dos atributos para
uma alfabetização científica e para fomentar a interdisciplinaridade no ensino básico.

Palavras chave: Metodologias ativas; Agroecologia; Ensino de Ciências.

Abstract: This paper aims to analyze the perceptions about interdisciplinarity, as


well as the attributes involved in Scientific and Technological Literacy (ACT), from
teachers and high school students involved in the development of an IRR that dis-
cussed Agroecology and food production in a rural school context. The Interdisci-
plinary Islands of Rationality have been used as a teaching strategy, particularly in
the area of Natural Sciences, involving the construction of interdisciplinary studies
based on the search for the solution of a given problem situation, in order to contribute
to ACT of the students involved. The instruments used sor this study are interviews
and questionnaires applied with teachers, as well as productions and speeches of the
participants during the development of the activities, which were later transcribed.
Also, focus group interviews were carried out with some of the teachers involved and
with groups of students. Data analysis included Discursive Textual Analysis (DTA),
in addition to comparing the attributes developed in works of similar content. The
results indicate the importance of opportunities experienced by students in terms of
constructions towards the development of attributes for scientific literacy and to in-
stigate interdisciplinarity in education.
Keywords: Active methodologies; Agroecology; Science teaching.

Volume II 97
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 4

ESTÁGIO CURRICULAR
SUPERVISIONADO EM
CIÊNCIAS DA NATUREZA:
DESAFIOS E POTENCIALIDADES
DO PROCESSO FORMATIVO
DE LICENCIANDOS EM
EDUCAÇÃO DO CAMPO
Sinara München
Viviane de Almeida Lima
Renata Portugal Oliveira
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-3

Introdução

Os cursos de Licenciatura em Educação do Campo iniciam no Brasil em


2006 e constituem-se como campo de formação de professores e espaço para
produção de conhecimento acerca da docência, voltados à educação do campo
e às escolas do/no campo (MOLINA, 2015). Essas licenciaturas foram organi-

Volume II 98
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

zadas visando a formação de professores para os anos finais do Ensino Funda-


mental e o Ensino Médio das escolas do campo, e uma de suas especificidades
é o regime de alternância pedagógica, que se caracteriza em tempos na univer-
sidade e períodos formativos na comunidade de origem dos estudantes.

É essencial que a formação de educadores do campo privilegie a


compreensão da educação como prática política e social, para atuarem nos
espaços educativos (escolares e não escolares) que valorizem a vida, a cultura
do sujeito no e do campo. A formação de professores do campo, assim
compreendida, possibilita fortalecer a construção de um ensino significativo,
partindo da realidade da comunidade, valorizando sua diversidade social e
cultural.

A Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) oferece cursos de Li-


cenciatura em Educação do Campo nos campi de Laranjeiras do Sul/PR e Ere-
chim/RS. O curso Interdisciplinar em Educação do Campo: Ciências da Natu-
reza - Licenciatura (CCIECCNER) é ofertado no campus Erechim desde o ano
de 2013, e, tem como objetivo “desenvolver o processo de formação inicial do
educador do campo com ênfase em Ciências da Natureza, de modo que esteja
capacitado para engajar-se aos desafios que se enlaçam à educação e à vida do
e no campo” (BRASIL, 2019, p. 45).

A formação por área de conhecimento se coloca como meio de superação


para formações e práticas educativas fragmentadas, lineares e descontextuali-
zadas. A tentativa de avançar para uma formação menos reducionista torna-se
significativa quando é pensada a área de Ciências da Natureza, que apresenta
de forma recorrente características como a fragmentação e a linearidade, res-
saltadas em muitas práticas escolares pela falta de articulação da ciência com
os contextos de vida dos estudantes.

Volume II 99
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A implementação dos cursos de Licenciatura em Educação do Campo e


a organização curricular por área do conhecimento ser são recentes, por isso as
pesquisas relacionadas a essas temáticas são um campo em construção. Portanto,
há necessidade de se fomentar investigações acerca da formação de educadores
do campo, especialmente no que tange à área de Ciências da Natureza, e, assim,
oportunizar que as pesquisas e o compartilhamento de experiências possam
orientar caminhos para a docência, considerando a especificidade das escolas do
campo. Considerando esses aspectos iremos relatar, discutir e analisar algumas
experiências vivenciadas no âmbito do Estágio Curricular Supervisionado,
enquanto espaço de constituição do professor de Ciências da Natureza, no âm-
bito da Licenciatura em Educação do Campo da UFFS Campus Erechim-RS.

A interdisciplinaridade na formação de
professores de Ciências da Natureza

A formação de professores por área de conhecimento traz a possibilida-


de de mudanças nas escolas do campo, entre elas atender a demandas como a
falta de professores, a fragmentação curricular, a falta de vínculo do currículo
com a realidade dos povos do campo e a organização das escolas a partir de
modelos urbanos (BRICK; BORGES, 2017). Para Molina e Sá (2013, p. 469),
a principal intenção da formação por área de conhecimento deve ser “contribuir
com a construção de processos capazes de desencadear mudanças na lógica de
utilização e de produção de conhecimento no campo”.

Pensar a profissionalização de um professor nesse contexto traz inquieta-


ções, relacionadas às formações iniciais dos formadores, as realidades comple-
xas e específicas dos povos do campo e as possibilidades de construir conheci-
mento a partir desses contextos (BRITTO; PAITER, 2017). Para concretizar a
formação por área de conhecimento, considerando um educador que não ape-

Volume II 100
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

nas atue no campo, mas que mobilize conhecimentos a partir da especificidade


e demandas do campo, é que emergem discussões e reflexões sobre a interdis-
ciplinaridade.

As licenciaturas em Educação do Campo, que habilitam por área de co-


nhecimento, podem promover “experiências interdisciplinares que permitam
que o futuro professor ou professora possa integrar os conhecimentos e os pro-
cedimentos das diversas disciplinas (ou disciplina) com uma visão psicopeda-
gógica” (IMBERNÓN, 2004, p.62). Nesse sentido, Morin (2000) salienta que
as práticas interdisciplinares surgem como uma solução possível para a supera-
ção da descontextualização e fragmentação do conhecimento e, principalmen-
te, como busca de soluções para problemas complexos.

Ao considerar os contextos da educação superior, Pinto e Pinto (2014)


mostram que as discussões sobre a interdisciplinaridade na formação de profes-
sores aparecem desde 2000, principalmente nos cursos de Educação do Cam-
po e Pedagogia, que se organizam por eixos ou temas interdisciplinares. Para
Fazenda (2012, p.22-23), o “ensino universitário deveria exigir uma atitude
interdisciplinar que se caracterizaria pelo respeito ao ensino organizado por
disciplinas e por uma revisão das relações existentes entre as disciplinas e entre
os problemas da sociedade”.

As disciplinas e a interdisciplinaridade são essenciais na seleção de co-


nhecimentos e é necessário destacar esse aspecto, pois a área do conhecimento
não nega as disciplinas (BRITTO; PAITER, 2017). Para Brick e Borges (2017)
é essencial ressaltar que a área de conhecimento é um conceito polissêmico,
que se desenvolve em diversas práticas e modalidades multi/inter/transdiscipli-
nares implementadas nos cursos.

A formação de professores por área de conhecimento inclui alguns as-


pectos desafiadores como a formação inicial dos docentes do ensino superior, a

Volume II 101
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

alternância pedagógica enquanto modalidade de educação e a organização das


práticas do curso a partir da construção coletiva. Assim, é um espaço instigante
em relação à pesquisa e a prática docente, devido à estruturação curricular e pe-
dagógica diferenciada. Esses aspectos ressaltam a importância da pesquisa das
propostas e práticas de organização das Licenciaturas em Educação do Campo
por área do conhecimento.

O estágio curricular supervisionado na


licenciatura em Educação do Campo

Os componentes curriculares de estágio do Curso Interdisciplinar em


Educação do Campo: Ciências da Natureza - Licenciatura se caracterizam pe-
las “possibilidades de experimentação da docência na área na qual o futuro
professor está buscando sua formação” (BRASIL, 2019, p. 63). Os estágios
compreendem um total de 465 horas e iniciam na 4ª fase, organizados em cinco
componentes curriculares.

O primeiro componente é o estágio em Gestão Escolar que analisa a orga-


nização e funcionamento da instituição escolar, seu currículo, seus sujeitos, os
processos de gestão e coordenação pedagógica. Os componentes Prática Peda-
gógica no Ensino Fundamental (Estágio I) e Prática Pedagógica no Ensino Mé-
dio (Estágio III) consistem na observação e investigação do contexto da Escola
do Campo, nos respectivos níveis de ensino e na experimentação da docência a
partir da regência de turma em algumas aulas.

Segundo Carvalho (2012) os estágios de observação possibilitam aos fu-


turos professores,
...detectar e superar uma visão simplista dos problemas de ensino e apren-
dizagem, proporcionando dados significativos do cotidiano escolar que
possibilitem uma reflexão crítica do trabalho a ser desenvolvido como pro-
fessor e dos processos de ensino e aprendizagem em relação ao seu conteú-
do específico. (p. 11).

Volume II 102
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Esses estágios possibilitam um mapeamento por parte dos estagiários no


que tange a leitura do contexto escolar, envolvendo a realidade sociocultural, a
instituição, à docência, o currículo, os sujeitos e a contextualização, envolven-
do o mapeamento e a problematização das questões que emergem do espaço
campo de estágio. Além disso, os discentes desenvolvem uma oficina temática
interdisciplinar, de seis horas, com o acompanhamento dos docentes da área de
Ensino de Ciências (Biologia, Física e Química).

A regência de sala de aula acontece no Estágio Supervisionado no Ensino


Fundamental (Estágio II) e no Estágio Supervisionado no Ensino Médio (Está-
gio IV). Esses estágios possibilitam aos licenciandos entrar em contato com a
realidade da escola e da profissão docente e compartilhar experiências com pro-
fessores atuantes na Educação Básica. Tendo como principal finalidade “fazer
com que nossos alunos aproveitem os estágios para testar, como professores, as
inovações que discutiram teoricamente na universidade e/ou observaram com
os bons professores da escola básica” (CARVALHO, 2012, p. 66).

Os estagiários comumente optam por realizar os estágios nos seus muni-


cípios de origem, que se localizam em grande maioria na mesorregião noroeste
do Rio Grande do Sul, com distâncias de até 150 km do campus da universi-
dade. Os estágios são desenvolvidos preferencialmente em escolas do campo.

Práticas pedagógicas nos estágios curriculares


supervisionados

Para investigar os estágios no âmbito da formação de professores por área


de conhecimento, partimos de uma abordagem qualitativa, que, para Bogdan e
Biklen (1994), valoriza o ambiente onde acontecem os fenômenos e fatos, como
sua fonte direta de dados. Nesse sentido, a pesquisa documental é o caminho
para investigar os estágios do curso Interdisciplinar em Educação do Campo:

Volume II 103
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Ciências da Natureza - Licenciatura a partir da leitura e análise dos relatórios


de estágio. Foram escolhidos três relatórios que contemplam diferentes etapas
do curso, de modo a contribuir para um olhar acerca dos desafios relacionados
ao processo formativo. Como modo de explorar alguns elementos vivenciados
a partir da proposta de estágio serão descritas, e, posteriormente analisadas, três
práticas pedagógicas desenvolvidas por estudantes do curso.

Caso 1: A oficina pedagógica como prática


interdisciplinar no Ensino Fundamental

O relato a seguir é resultado de uma experiência realizada no Compo-


nente Curricular Prática Pedagógica no Ensino Fundamental por meio de uma
oficina pedagógica interdisciplinar. O objetivo deste estágio é o de investigar
o contexto da escola e desenvolver uma oficina. De acordo com Vieira e Vol-
quind (1996) a oficina pedagógica consiste em ensinar e aprender realizando
algo de forma coletiva, portanto a oficina desafia os estagiários a construir uma
proposta em que os alunos sejam ativos e participantes durante todo o processo.

A escola onde o trabalho foi desenvolvido localiza-se no município de


Planalto/RS e atende alunos oriundos do campo e comunidades do entorno. A
estagiária trabalhou o tema Lixo no 6º ano do Ensino Fundamental e relacionou
com os conteúdos de saúde pública, doenças causadas pelo acúmulo do lixo,
tempo que os diferentes tipos de materiais levam para se decompor e por último
propôs aos alunos que fizessem um mini jardim com garrafas PET além de
jogos com materiais recicláveis. No intuito de compreender o que os alunos
aprenderam como atividade final da oficina ela solicitou aos alunos que, em
grupos, construíssem uma história em quadrinhos sobre o tema.

A abordagem da estagiária sobre o lixo se deu de maneira expositiva,


através de slides, porém, utilizando-se do diálogo e interação frequentes com

Volume II 104
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

a turma, e também utilizou recursos como vídeo e música durante a oficina. A


estagiária iniciou abordando a identificação dos diferentes tipos de lixo e quais
podem ser reaproveitados, problematizando junto aos alunos para onde o lixo
vai depois de sair das residências e das indústrias. A seguir ela discutiu sobre
quanto tempo cada material leva para se decompor no ambiente e quais danos
podem ocorrer quando o lixo não é descartado adequadamente como o entupi-
mento de bueiros que causam enchentes.

O tema doenças causadas pelo acúmulo do lixo trouxe à tona vários


relatos e comentários dos alunos sobre casos de pessoas conhecidas por eles
que adoeceram em locais por falta de saneamento básico, sendo esta parte da
oficina de grande participação dos alunos. Na parte prática da oficina, os alu-
nos se dividiram em grupos para construir os materiais recicláveis. Um grupo
foi para o pátio da escola e confeccionou um mini jardim com garrafas PET e
outro construiu jogos com materiais recicláveis.

Na última etapa da oficina os alunos elaboraram histórias em quadri-


nhos sobre o acúmulo de lixo. Nas histórias dos alunos apareceram preocu-
pações relativas às enchentes, doenças e separação correta do lixo em casa e
na escola.

Na oficina desenvolvida foi possível perceber a facilidade que a aluna


teve de trabalhar um tema de forma interdisciplinar sem distinguir as dife-
rentes disciplinas da área das ciências. No entanto os conceitos de química e
biologia salientaram-se nos conteúdos sobre separação correta do lixo, tempo
de decomposição de cada material e doenças causadas pelo acúmulo do lixo
respectivamente. Neste caso foi possível perceber que a temática lixo foi tra-
tada como um tema transversal, na medida em que originou e articulou todas
as etapas da oficina realizada.

Volume II 105
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Caso 2: Regência em uma turma multisseriada do


Ensino Fundamental

O presente relato foi experienciado no estágio supervisionado do Ensi-


no Fundamental nos Anos Finais, em uma turma multisseriada a saber, 8º e 9º
anos do Ensino Fundamental, em que a estagiária trabalhou a importância da
horta escolar orgânica, como temática interdisciplinar, relacionando com os
conceitos do aparelho digestório em que levava em consideração a digestão dos
alimentos e alimentação saudável.

Neste estágio se trabalhou a importância de uma alimentação saudável


partindo da discussão sobre os alimentos produzidos na própria horta orgâni-
ca da escola. Visto que, a mesma possui uma horta orgânica, estufa, canteiro
de ervas medicinais (relógio biológico), minhocário e composteiras e de onde
provêm os itens cultivados para a preparação da merenda: verduras, legumes,
entre outros.

Os planos de aula tentaram envolver uma metodologia em que houvesse,


tanto a participação do professor quanto do aluno em sala de aula. Partindo de
questões problematizadoras a estagiária iniciava as aulas com discussões sobre
colesterol, alimentação saudável, alimentos industrializados, entre outros as-
suntos, permitindo trazer para cada aula uma atividade prática em que os alunos
puderam participar ativamente, na qual envolvia toda a turma, independente do
ano que os alunos estavam. No assunto sobre lipídios trouxe discussões sobre a
obesidade ressaltando novamente a importância de uma alimentação saudável,
discutindo questões sobre o colesterol LDL e HDL, além de questões ligadas
ao meio ambiente como a reciclagem da gordura pela própria escola em que
são produzidos o sabão a partir dos óleos e gorduras residuais provenientes da
cozinha da escola.

Volume II 106
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A atividade de culminância da estagiária foi a realização conjuntamente


com os alunos da confecção de um sanduíche (cada grupo de alunos mon-
tavam os seus sanduíches) onde foram instigados pela professora a relatar
quais os nutrientes continham nos alimentos que estavam consumindo. Logo
após, as crianças em grupo desenharam o aparelho digestório, seus órgãos,
explicando o caminho que o alimento percorre no tubo digestório, com cada
nutriente ingerido e digestão dos mesmos com suas enzimas correspondentes
e absorção dos mesmos.

Pelo relato da estagiária percebemos a satisfação do processo de ensino


e aprendizagem, “pois me surpreendeu que alunos que se mantiveram quieti-
nhos durante as aulas, participaram com afinco na atividade e corretamente
produziram seus modelos anatômicos do aparelho digestório e corretamente
descreveram o que aconteceu com órgãos e nutrientes em todo o tubo digesti-
vo” (Estagiária).

Caso 3: Articulação das Ciências da Natureza no


Ensino Médio

O quarto e último Estágio Curricular Supervisionado tem como objetivo


a regência em turma de Ensino Médio na área de Ciências da Natureza, por-
tanto, nas disciplinas de Biologia, Física e Química, articulando-as em uma
perspectiva interdisciplinar. A experiência a ser relatada ocorreu no segundo
semestre de 2017, e foi desenvolvida por uma estagiária, com acompanhamen-
to dos professores supervisores das escolas e de dois professores formadores,
totalizando 20 horas em sala de aula.

O estágio ocorreu em uma escola de Educação Básica com Ensino Médio


integrado ao ensino técnico, no município de Erechim/RS, em uma turma de
primeiro ano do Ensino Médio. Inicialmente a dificuldade foi relacionar a temá-

Volume II 107
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tica proposta considerando o contexto escolar e os conteúdos indicados pelos


professores, especificamente os envoltórios celulares (Biologia), Movimento
Retilíneo Uniformemente Variado (Física) e o Histórico dos Modelos Atômicos
(Química). Ao considerar que muitos estudantes residiam no campo e o cultivo
de soja era recorrente entre as famílias, com questões como a ferrugem e a la-
garta da soja, a proposta foi organizada, dando enfoque à experimentação.

O Histórico dos Modelos Atômicos foi estudado a partir dos bioferti-


lizantes nas culturas de soja, com o exemplo da calda bordalesa, assim foi
possível inserir questionamentos sobre o modelo de agricultura convencio-
nal, que indicaram que os estudantes conheciam pouco alternativas ao uso
de agrotóxicos convencionais. A estagiária partiu da constituição química da
calda bordalesa para abordar conceitos de molécula, elemento e átomo, e com
isso trabalhar os modelos atômicos em uma perspectiva histórica.

Na Biologia, a visualização e diferenciação de células vegetais em fo-


lhas de soja, uma em desenvolvimento regular e outra afetada pela ferrugem
Asiática, foi feita com um microscópio construído pela estagiária, acoplado a
câmera de celular. A partir do estudo da célula, os estudantes produziram, no
coletivo, um modelo do Mosaico Fluido com materiais de papelaria. Em Física
a abordagem dos conceitos se deu através de aulas expositivas, exercícios e ex-
perimentação da aceleração em plano inclinado e de aceleração em queda livre
de corpos de massas iguais em ambiente com atrito diferenciado.

A estagiária trabalhou as três disciplinas de forma separada, em seus ho-


rários específicos, tentando articular os conteúdos a partir de uma questão co-
mum, que nesse caso foi o cultivo da soja. Foi possível problematizar algumas
questões como o uso de biofertilizantes e a relação com o modelo convencional
de produção.

Volume II 108
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Desafios da docência a partir dos estágios em


Ciências da Natureza

A partir das experiências de estágio relatadas identificamos limitações


comuns aos três casos: 1) articulação entre Biologia, Física e Química; 2) Co-
nhecimento dos conceitos científicos; e 3) Abordagem de questões sociais e
culturais.

A dificuldade de articulação se deve a diversos fatores, entre eles, a pro-


ximidade/distanciamento dos conteúdos entre as três disciplinas, o domínio dos
conceitos científicos, a organização e dinâmica do contexto escolar, as carac-
terísticas da turma e a abordagem metodológica. Essa limitação existe, pois,
de acordo com Zanon (2012), criar relações com a realidade dos estudantes é
um grande desafio, que abarca a problematização de algo vivido no cotidiano e
pode ser interpretado a partir das Ciências da Natureza, no sentido de ampliar o
entendimento do dia a dia. Para Zanon (2012, p. 256) “a organização de ensino
por áreas de estudo representa um avanço do pensamento educacional”, o que
infere diretamente nos desafios identificados a partir das vivências de estágio
analisadas.

Em relação a segunda limitação, o conhecimento dos conceitos científi-


cos, a Física em específico foi a que se destacou nos três casos como a de maior
dificuldade conceitual das estagiárias, o que pode estar relacionado com o nível
de abstração dos conceitos e com a tradição da abordagem da física na escola,
predominantemente teórica e matematizada.

Pietrocola (2002) argumenta que quando a cultura científica é comparada


com o senso comum, percebe-se que a linguagem utilizada é que faz a diferen-
ciação entre elas, e reforça que muitas vezes a ciência “vale-se da Matemática
como forma de expressar seu pensamento” (p.89). Assim, atribui-se o fracasso

Volume II 109
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

escolar no ensino de Física a dificuldade na linguagem matemática, muitas ve-


zes reafirmada pelos professores.

O terceiro elemento, que envolve questões sociais e culturais relaciona-


da aos temas trabalhados nas Ciências da Natureza, poderia ser ampliada nos
casos descritos, especialmente pela formação das estagiárias priorizar o estudo
e as vivências do campo. No terceiro caso, por exemplo, não houve discussão
aprofundada acerca da questão da monocultura da soja, que ocorre tanto no
contexto regional quanto nacional, e as diversas problemáticas relacionadas
à ampliação dessa cultura, como a diminuição do cultivo de alimentos, o uso
excessivo de agrotóxicos, o desmatamento, entre outros.

A discussão da monocultura da soja seria um ponto importante de proble-


matização e formação crítica dos estudantes do Ensino Médio, especialmente
por serem oriundos ou ainda viverem no campo, e a comercialização da soja
ser uma das fontes de renda das famílias. Para Santos e Auler (2015) a relação
entre o desenvolvimento científico e tecnológico e a sustentabilidade socioam-
biental pode ser problematizada e discutida nos espaços educacionais, pois o
comportamento consumista da sociedade não está direcionado à sustentabilida-
de. Os autores destacam que esse é um desafio a propostas na abordagem Ciên-
cia-Tecnologia-Sociedade (CTS) pelo fato de que a participação da sociedade
relativa a ciência e tecnologia não pode ocorrer apenas no consumo, mas nas
decisões que indicam quais valores definem a produção científico-tecnológica.

No caso 01, a estagiária não problematizou questões para além da reci-


clagem, como aspectos em torno do consumo, já que este é o ponto gerador
do acúmulo de lixo. Poderia ter abordado o consumismo a partir de aspectos
sociais e culturais o que auxiliaria em uma discussão mais aprofundada sobre
a temática abordada. Para Santos (2016) a discussão das questões ambientais
não pode ficar restrita aos seus impactos. A autora afirma que a geração de re-

Volume II 110
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

síduos está diretamente ligada ao modelo de desenvolvimento, e para que isso


se problematize na escola, por exemplo, é essencial que a formação de profes-
sores discuta questões relativas ao desenvolvimento da ciência e tecnologia e
sustentabilidade.

Entre as potencialidades que as experiências apresentam, podemos elen-


car aspectos que fizeram parte dos três casos: 1) abordagem temática; 2) expe-
rimentação; e 3) recursos didáticos.

A abordagem por temas pode se ancorar em muitos referenciais, dentre


eles Temas Sociais vinculados à perspectiva Ciência-Tecnologia-Sociedade,
Temas Geradores embasados na pedagogia freireana, Temas Transversais rela-
cionados a propostas de organização curricular como os Parâmetros Curricula-
res Nacionais, entre outros. Ao optar por partir de um tema ou problema há um
rompimento da organização curricular usual no contexto escolar, que muitas
vezes se organiza a partir de listas de conteúdos e conceitos.

Segundo Auler, Dalmolin e Fenalti (2009) os temas permitem uma arti-


culação dos conhecimentos científicos a partir de questões mais amplas que a
abordagem a partir dos conteúdos. Na organização por temas o conteúdo irá
auxiliar na compreensão do tema/problema, o qual perpassa todas as aulas, e se
estabelece como um fio condutor do processo de ensino e aprendizagem (AU-
LER; DALMOLIN; FENALTI, 2009).

No segundo caso percebemos um esforço por parte da estagiária em tra-


balhar a partir de tema da realidade dos alunos em que a horta orgânica foi tra-
balhada ao longo do estágio, de modo que iniciava as aulas a partir de questões
problematizadoras do contexto dos alunos, instigando-os a participarem ativa-
mente na construção do conhecimento. Percebemos que durante a regência a
estagiária conseguiu articular os conceitos de Biologia e Química, tendo uma
grande dificuldade de articular os conceitos de Física.

Volume II 111
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

No terceiro caso relatado observamos que ao considerar o contexto esco-


lar, a origem e ocupação dos estudantes e suas famílias foi possível articular al-
guns conceitos a partir dessa realidade. Nas disciplinas de Biologia e Química
houve uma maior articulação entre os conceitos e a problemática, enquanto que
na Física houve dificuldade de interação. Apesar de alcançar essa aproximação
e estudar os conceitos a partir de questões relacionadas às vivências dos estu-
dantes, ainda há limitação a ser superada que se coloca na integração entre as
disciplinas da área. A organização curricular e a dinâmica escolar são aspectos
relevantes nessas experiências, além disso, os estagiários iniciam a regência de
turma com o ano letivo em andamento, o que infere, na maior parte das vezes,
que deem seguimento aos assuntos que vêm sendo abordados pelos professores.

O segundo aspecto relevante nos estágios analisados foi a experimenta-


ção. Há uma discussão expressiva sobre a importância de atividades experi-
mentais em Ciências da Natureza para o processo de ensino e aprendizagem,
porém percebemos nas escolas a pouca frequência da experimentação no en-
sino de ciências, mesmo que muito se justifique que esta facilite e contribua
para a compreensão da ciência e possibilita a diversidade de metodologia no
processo de ensinar (ROSITO, 2003). Entretanto, as “atividades experimen-
tais’’ não devem vir desvinculadas das aulas teóricas, das discussões em grupo
e de outras formas de aprender. O que foi exposto em aula e o que foi obtido no
laboratório precisa se constituir como algo que se complementa”, argumenta
Rosito (2003).

No caso 03 a estagiária optou por usar a experimentação para a com-


preensão dos conceitos de biologia e física. A construção de um microscópio
alternativo, é um elemento relevante na constituição do professor de Ciências,
pois além de optar pela experimentação como recurso no processo de ensino e
aprendizagem há uma busca por alternativas frente a condições materiais das
escolas, que em geral não possuem equipamentos como microscópios.

Volume II 112
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Nos três casos a utilização de recursos didáticos veio a complementar


as potencialidades identificadas nas experiências de estágio. Conforme Souza
(2007, p. 113), “O uso de materiais didáticos no ensino escolar, deve ser sempre
acompanhado de uma reflexão pedagógica quanto a sua verdadeira utilidade no
processo de ensino e de aprendizagem, para que alcance o objetivo proposto”.

Todas estagiárias optaram por diversos recursos didáticos entre eles a


experimentação, projeção multimídia com slides, vídeos, músicas, construção
de materiais lúdicos e jogos didáticos, elaboração de histórias em quadrinho,
modelos didáticos e cartazes com síntese dos conceitos. Esse aspecto evidencia
a preocupação com a diversidade metodológica no processo de ensino e apren-
dizagem.

Considerações finais

Com o relato e a análise das práticas desenvolvidas pelas estagiárias


foi possível identificar lacunas, assim como elementos potencialmente ricos
oriundos do processo formativo na Licenciatura em Educação do Campo com
habilitação em Ciências da Natureza. É importante que os elementos como a
abordagem por temas, o uso de recursos didáticos variados e a experimentação
continuem sendo abordados e ampliados na formação inicial dos educadores
do campo, e que sejam qualificados ao longo do curso pelos estudantes e for-
madores.

Em relação às lacunas identificadas é preciso um aprofundamento maior


para o entendimento das causas e/ou espaços da formação que estão atrelados
às dificuldades identificadas na prática docente das estagiárias. As dificuldades
conceituais, especialmente em Física, e a tímida inserção de questões sociais e
culturais nas propostas devem ser olhadas e pensadas pelo coletivo de formado-
res, visto que a Educação do Campo é uma reivindicação dos povos do campo
e sua organização deve partir das vivências dos camponeses.

Volume II 113
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A garantia do trabalho coletivo dos formadores, no intuito de qualificar


o estágio enquanto espaço de iniciação à profissão docente, é uma das ações
essenciais para superar algumas fragilidades identificadas. Esse aspecto pode
ser considerado o de maior relevância ao pensar a formação de professores por
área de conhecimento, pois vincula a interdisciplinaridade e os desafios que ela
apresenta.

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Resumo: A interdisciplinaridade e a formação por área de conhecimento perpassam


a formação de professores de Ciências da Natureza na Licenciatura em Educação
do Campo, portanto, necessitam de aprofundamento e análise de suas propostas e
práticas. Este artigo tem como objetivo investigar alguns aspectos relativos a essa
formação, a partir dos estágios curriculares supervisionados. São apresentadas e
discutidas três vivências de estagiários em escolas, enfatizando a prática docente e
as relações com a formação por área de conhecimento e a interdisciplinaridade, estas
que são questões centrais para as licenciaturas em Educação do Campo. A análise
indica alguns desafios e limitações como a dificuldade de articulação das disciplinas
na área de Ciências da Natureza, dificuldades conceituais e pouca relação com ques-
tões sociais e culturais nas propostas desenvolvidas. As potencialidades identificadas
foram o esforço no trabalho a partir de temáticas, a experimentação e a diversidade
de recursos didáticos.

Palavras-chave: Estágio curricular; Educação do Campo; Interdisciplinaridade.

Abstract :Interdisciplinarity and training by area of knowledge permeate the train-


ing of Natural Science teachers in the Degree in Rural Education, therefore, they
require a deeper analysis and analysis of their proposals and practices. This arti-
cle aims to investigate some aspects related to this training, based on supervised
curricular internships. Three experiences of trainees in schools are presented and
discussed, emphasizing the teaching practice and the relationships with training by
area of knowledge and interdisciplinarity, which are central issues for degrees in
Rural Education. The analysis indicates some challenges and limitations such as the
difficulty of articulating the disciplines in the area of Natural Sciences, conceptual
difficulties and little relationship with social and cultural issues in the proposals de-
veloped. The identified potentialities were the effort in the work from the themes, the
experimentation and the diversity of didactic resources.

Keywords: Curricular internship; Field Education; Interdisciplinarity.

Volume II 116
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 5

EDUCAÇÃO AMBIENTAL
NAS AULAS DE QUÍMICA
NA MODALIDADE DE ENSINO
EJA – SAPUCAIA DO SUL(RS)
Andréia Lisandra Lussani
Camila Franceschi da Silva
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-4

Introdução

Em âmbito mundial muito se tem falado sobre Educação Ambiental (EA)


e, inúmeras também são as pesquisas que apontam para os problemas que o
Planeta vem sofrendo, entre eles destacam-se os aterros sanitários, a ocupação
de áreas inadequadas para moradia, a impermeabilização dos solos, o desma-
tamento, a poluição dos recursos hídricos, do ar, entre tantos outros. Por esse
motivo, a inserção da temática ambiental nos currículos escolares pode contri-
buir para a formação do educando, preparando-o para o exercício da cidadania.

Diante desse contexto e, buscando atender as necessidades de uma das


modalidades de ensino da Educação Básica – a Educação de Jovens e Adultos

Volume II 117
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

– EJA, onde muitos estudantes estão fora da idade escolar, tornou-se necessário
à adequação dos conteúdos e seleção de temas relevantes para trabalhar a Quí-
mica de forma articulada às necessidades dos estudantes matriculados na etapa
final da Educação Básica na modalidade de ensino EJA na instituição de ensino
Saint Germain, localizada no município de Sapucaia do Sul – RS.

Para compor a ação pedagógica elegeu-se trabalhar a Química de forma


integrada com a EA apostando na pedagogia problematizadora de Paulo Freire,
instrumentos de investigação e em atividades experimentais como recurso me-
todológico, procurando estabelecer a relação entre o conhecimento científico e
o cotidiano dos estudantes, sem desconsiderar o meio social e cultural, valori-
zando suas vivências e experiências.

Partindo desse pressuposto, a escolha por esse projeto de ação pode ser
justificada pela necessidade de inserir a EA no contexto escolar, dada a impor-
tância da contextualização no ensino por meio da abordagem de temas sociais
do cotidiano do aluno não dissociados da teoria, e tampouco utilizados como
meros elementos motivacionais ou ilustrativos (BRASIL, 2006).

Além dessa necessidade de inserção nos currículos escolares, como as


Diretrizes educacionais nos sugere, outro fator norteador para a ação desenvol-
vida refere-se à necessidade de trabalhar a Química de forma mais proximal,
valorizando questões do contexto dos alunos, respeitando níveis crescentes de
complexidade e abstração onde o aluno possa participar atuando como sujeito
do processo educativo.

Segundo Santos e Mortimer (2002, p. 5) o objetivo da inserção do CTS


nos currículos escolares é desenvolver a alfabetização tecnológica para que o
aluno possa construir conhecimentos, habilidades e valores necessários para to-
mar decisões responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade
e atuar na solução de tais questões.

Volume II 118
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

De forma interdisciplinar, ao longo do projeto, os conteúdos foram sendo


inseridos priorizando a contextualização voltada para os referenciais e discus-
sões do movimento Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS).

O assunto escolhido para o desenvolvimento da ação pedagógica consis-


tiu no estudo da composição química de produtos industrializados, tais como
detergente, desinfetante e aromatizador de ambiente. Esse estudo foi desenvol-
vido a partir da análise dos rótulos dos produtos, seguido de uma investigação
para avaliar o efeito nocivo ao homem e ao ambiente. Assim, a metodologia
empregada para a execução do projeto ambiental vai ao encontro do método
científico, uma vez que fez o emprego da análise investigativa com a observa-
ção de dados pré-estabelecidos, culminando com a experimentação.

A escolha pela abordagem química ligada a EA a partir de produtos de


uso doméstico, especificamente de limpeza, se justifica devido ao público alvo.
A turma era composta por um número expressivo de mulheres, na faixa dos 40
e 50 anos, já inseridas no mercado de trabalho e donas de casa ativas. Assim,
procurou-se diminuir o distanciamento dos conteúdos com a realidade dos alu-
nos através da aproximação das atividades diárias, levando o aluno a refletir
sobre o consumo e a mudança de hábitos frente à natureza.

Para atender a demanda de mercado um produto de limpeza deve conci-


liar eficiência e redução de custo, porém muitos dos princípios ativos empre-
gados na fabricação dos saneantes domissanitários têm provocado fortes im-
pactos ambientais e sérios danos à saúde humana. A acerca dessa problemática
procurou-se trabalhar a EA associada aos conteúdos de Química necessários à
formação discente.

O projeto de ação foi organizado considerando os seguintes procedimen-


tos metodológicos: análise investigativa do conhecimento prévio dos estudan-

Volume II 119
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tes acerca das questões ambientais ligadas aos produtos industrializados, mais
especificamente estudo da composição presente nos rótulos de produtos de lim-
peza; levantamento da composição química para compreender as implicações à
saúde humana, bem como ao ambiente culminando com o desenvolvimento de
um produto com princípio ativo menos agressivo.  

Desta forma, espera-se que o aluno perceba a relação entre a química e


a EA sendo pela ampla disponibilidade de produtos e materiais, contribuindo
para uma maior relação dos conteúdos e sua aplicabilidade.

A educação ambiental e o contexto social

Desde épocas mais remotas, acontecimentos ligados ao meio ambiente


têm nos indicado, os problemas decorrentes de catástrofes ambientais. Diaria-
mente os veículos de informação e comunicação noticiam um aumento na gra-
vidade dos problemas ambientais associados às ações humanas. Como exem-
plo, temos o aquecimento global, a poluição do ar, a destruição das florestas,
a contaminação dos rios, o desgaste do solo, o crescimento demográfico, o de-
senvolvimento tecnológico e científico. Tal conduta, possivelmente, resulta da
exploração de recursos naturais orientados pela visão da natureza como fonte
inesgotável de riquezas.

Muitas das questões ambientais fogem do controle, pois estão atreladas


a envolvimentos políticos, culturais, sociais, financeiros, econômicos e interes-
ses particulares. Partindo dessas premissas percebe-se a dificuldade de constru-
ção e consolidação de ações de preservação frente à sociedade moderna. Em
contrapartida, muitas são as ações emprenhadas para reverter essa situação.
Esforços por meio de ações de ambientalistas, de Conferências, Congressos,
entre tantos outros.

Volume II 120
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

No Brasil, a EA, embora admitida como obrigação nacional em 1988


através da Constituição Federal, tornou-se lei somente em 27 de abril de 1999.
Por isso, fazer valer esse direito constitucional sem dúvida apresenta-se como
um desafio a qualquer cidadão, mas no âmbito escolar, pode ser um aliado ao
resgate da sensibilização humana no que se refere a eminente destruição da
natureza. Por isso, a escola não pode ser omissa e precisa contribuir para ser
realizada uma reflexão sobre como o Planeta vem sendo tratado.

De acordo com Loureiro (2005), estudar as Ciências Naturais permite a


construção de valores e a atuação comprometida com o ambiente, por conse-
guinte a EA torna-se essencial na formação da consciência crítica que insere
o homem na natureza. Todavia, apenas a sensibilização quanto aos problemas
não basta, um novo significado deve ser dado a esta questão, por procedimentos
educacionais especializados.

Como forma de inserção dessa temática nas instituições de ensino, o Mi-


nistério da Educação, por meio de documento orientador que define e orienta
o sistema educacional brasileiro, propõe que a EA seja trabalhada de forma
transversal e interdisciplinar. Assim, desde 1999, foi publicada a Lei 9.795/99,
que institui a Política Nacional de Educação Ambiental e, em seu artigo 2º, ela
reforça:

A educação ambiental é um componente permanente da educação nacional,


devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modali-
dades do processo educativo, em caráter formal e não formal. (BRASIL,
1999 p.01).

Sendo assim, a EJA é uma modalidade de ensino na qual a EA deve fazer


parte do currículo. Face ao exposto, o projeto de ação desenvolvido procurou
articular a Química e a EA fazendo o emprego da CTS e a pedagogia progres-
sista de Paulo Freire.

Volume II 121
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Prática pedagógico-progressista de Paulo Freire e


CTS

Freire (1996) na perspectiva problematizadora de educação, defende o


educando como ponto de partida. Para ele suas necessidades e realidades de-
vem ser consideradas para que a partir de uma leitura da realidade possa ser
vislumbrada a aprendizagem, sendo o diálogo e a problematização os prin-
cípios norteadores da prática educativa. Ao encontro dessa mesma perspec-
tiva de educação, Gadotti aponta que: “A educação problematizadora faz uso
do diálogo e da comunicação nivelada e fundamenta-se justamente na relação
dialógico-dialética entre educador e educando, onde ambos aprendem juntos”
(GADOTTI, 1996, p.86).

Assim, problematizar não é criar problemas, mas, através do diálogo,


levantar situações no intuito de fazer pensar e refletir, acerca das questões
ligadas ao “contexto social” que se quer intervir por meio da conscientiza-
ção-ação.

Freire (1996) nos coloca que problematizar é ir além da utilização de


um problema do cotidiano do educando para, através dele, introduzir concei-
tos e conteúdos. A problematização deve ser um processo no qual o educando
se confronta com situações de sua vida diária e, a partir disso, se sinta mo-
tivado pela busca do conhecimento, por meio do diálogo e da troca, onde os
sujeitos consigam pensar juntos e recriar a realidade de forma ativa, sendo os
agentes de sua própria transformação.

Deste modo, na perspectiva freireana, encontramos uma aliada ao pro-


cesso de construção do conhecimento, uma vez que ele defende uma educa-
ção libertadora, livre de uma educação bancária, uma educação construtivista
e contextualizada, onde aprender é um processo de compreensão e reflexão
crítica (1996).

Volume II 122
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Seguindo esta linha de argumentação, Loureiro, (2006, p.88) também


acredita em uma educação transformadora. Para ele a EA apresenta-se como
uma proposta que vem de encontro com uma nova perspectiva de sociedade
caracterizada como crítica, dialógica, democrática, participativa, multidimen-
sional e ética.

Buscando uma relação entre Freire e os autores que o venho adotando


como referencial, desenvolveu-se um projeto de ação a partir da inserção da EA
nas aulas de química na modalidade de ensino EJA. Por considerar maior apro-
ximação com a realidade dos estudantes-maioria mulheres-e, assuntos como
organização e limpeza estavam em pauta, optou-se por contextualizar a temá-
tica ambiental por meio da problematização dos estudos dos impactos ambien-
tais ocasionados pela própria composição dos produtos saneantes associados ao
uso excessivo.

Desta forma, a prática desenvolvida e a metodologia empregada vão ao


encontro da pedagogia libertária e emancipatória de Paulo Freire, onde primei-
ramente priorizou-se a problematização inicial, por meio da qual são apresen-
tadas questões de estudo da realidade o, qual resume as ações propostas por
Freire (2005), em que é feito o “Levantamento Preliminar” (FREIRE, 2005,
p.120), a “Análise das Situações Significativas e a contextualização”, sendo
que é nessa última que se dá a delimitação dos “Temas Geradores” – que nessa
proposta de ensino pode ser compreendida como a inserção de temas que en-
volvem Ciência, Tecnologia e Sociedade - CTS.

Assim, o que se pretende com um ensino fundado em uma pedagogia


humanista e nos princípios da dialogicidade libertadora, é que os estudantes
atinjam um nível de Consciência Crítica, onde a construção do conhecimento
seja fruto da ação com o conhecimento, onde ocorra a interação pelo comparti-
lhamento de saberes, ideias e situações (FREIRE, 2007, p. 69-70).

Volume II 123
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Contrário a tudo isso, a educação bancária tão criticada por Freire nos
faz colocações, ressaltando que a “educação padece da doença da narração.
O professor fala da realidade como se esta fosse sem movimento, estática,
separada em compartimentos e previsível.” Assim, para Freire a concepção
bancária é antidialógica por natureza, onde ao aluno a única ação permitida é
a de captar e guardar todo o conhecimento, o que consequentemente bloqueia
toda a criatividade e a transformação. Desta forma, o professor do século
XIX, comprometido com a educação e a formação de sujeitos críticos, aptos
a intervir na sociedade-deve ser o agente da transformação educativa.

Corroborando coma crítica à educação bancária de Paulo Freire, na obra


intitulada Encontros e Caminhos: Formação de Educadoras(es) Ambientais
e Coletivos Educadores, Ferraro (2013) afirma que não adianta trabalhar a
conscientização ambiental a “nível de informação”, ou seja, apenas transmi-
tir conhecimento ecologicamente correto. Há, sim, necessidade de vivenciar
a EA, sendo ela um caminho para uma sociedade democrática, onde a escola
pode ser o fio condutor e aliado no resgate de valores e comportamentos em
relação ao ambiente.

Deste modo, a EA deve integrar os currículos da Educação Básica e a


interdisciplinaridade pode representar uma forma de sua inserção. Pedrini
(2000, p.10), acredita que a EA é uma das possibilidades de reconstrução do
saber humano, uma vez que está inserida no saber social, interdisciplinar na
linguagem e transdisciplinar na sua ação, visto que permite a construção do
conhecimento através do desenvolvimento de novos valores, hábitos, postu-
ras, condutas e atos na relação homem e meio ambiente.

Volume II 124
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Educação ambiental e o ensino de química

Frequentemente a mídia relaciona a Química como causadora de grandes


impactos ambientais, sendo associada a vários aspectos negativos e prejudi-
ciais como poluição, venenos, inseticida, conservantes, aditivos, agrotóxicos.
Quando, na verdade, através do correto direcionamento, ela pode ser tornar
uma aliada frente aos problemas ambientais, contribuindo para a formação de
cidadãos capazes de intervir ativamente no ambiente social em que vivem, com
uma visão crítica da realidade, aptos ao exercício da cidadania. Conforme San-
tos e Schnetzler (2003, p. 105),

Os temas químicos sociais desempenham papel fundamental no ensino de


química para formar o cidadão, pois propiciam a contextualização do con-
teúdo químico com o cotidiano do aluno, além de permitirem o desenvolvi-
mento das habilidades básicas relativas à cidadania, como a participação e
a capacidade de tomada de decisão, pois trazem para a sala de aula discus-
sões de aspectos sociais relevantes, que exigem dos alunos posicionamen-
tos crítico quanto a sua solução.

Uma prática educacional fundamentada nessas perspectivas não pode dei-


xar de lado a interdisciplinaridade. O planejamento didático que contemple a
EA e a interdisciplinaridade muito podem contribuir, uma vez que trabalhando
de forma integrada o resultado é a construção de um saber menos fragmentado.

De acordo com Fazenda (2005) o trabalho interdisciplinar não se ensina,


nem se aprende, mas vivencia-se, constrói-se, pois o que caracteriza um tra-
balho interdisciplinar é a busca, a pesquisa e a ousadia em romper os limites
das fronteiras estabelecidas entre as várias áreas de conhecimento, por meio
do diálogo dialético respeitado a especificidade do estatuto epistemológico de
cada área do saber.

Buscar construir uma forma de relação dialógica e dialética entre as vá-


rias áreas que compõe o currículo escolar exige assumirmos o currículo como

Volume II 125
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

um artefato social, uma produção histórica observando o tempo e espaço no


qual o mesmo está inserido.

Nesse contexto, em se tratando da inserção no âmbito escolar, é funda-


mental que o educador descubra e priorize os temas geradores mais emergentes
para a comunidade na qual está inserida, enfatizando algumas questões e en-
volvendo a comunidade em programas que induzam a transformação socioam-
biental.

A química presente em produtos industrializados

Diariamente uma quantidade enorme de produtos de limpeza invade as


redes de esgoto, que devido à falta de saneamento básico acaba também de-
sembocando em lagos ou rios. Tal situação resulta do descontrole e má admi-
nistração dos recursos e até mesmo a pouca disponibilidade de produtos menos
agressivos ao ambiente. Partindo dessa premissa, o presente projeto de ação
pedagógico procurou, por meio da Química, trabalhar questões ambientais
através da análise dos impactos ocasionados pela composição presente em pro-
dutos industrializados.

Para Borsato, (1999) o desempenho de um detergente se verifica por


aspectos como: capacidade detergente, formação e estabilidade da espuma,
viscosidade e suavidade à pele. No Brasil, a tecnologia de formulação mais
empregada combina tensoativos aniônicos agindo como detergentes; tensoa-
tivosnão-iônicos atuando como estabilizadores de espuma e espessantes; re-
forçadores e diversos aditivos conforme o fim a que se destina. Tanto sabões,
quanto detergentes sintéticos praticamente não sofrem modificações químicas
nos processos de lavagem com água.

Em contrapartida, os sabões feitos de matérias graxas, quimicamente, são


totalmente biodegradáveis e quase não interferem com a fauna e flora aquática,

Volume II 126
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

uma vez que há pouca formação de espumas. Já produtos formulados a partir


de princípios ativos do tipo aniônico como os sais de sódio de alquilbenzeno
sulfonados lineares (LAS) causam o inconveniente de formação acentuada de
espumas nos cursos de águas receptoras (BORSATO; 1999).

Além dos surfatantes, os detergentes podem apresentar na sua composi-


ção fosfatos complexos que, na presença de água dura, podem garantir um bom
desempenho do agente tensoativo, mas acabam por originar diversos proble-
mas ecológicos, sendo à eutroficação um deles. Tal situação acontece porque
sabões e detergentes, por exemplo, ao entrarem em contato com os mananciais
de água comportam-se como redutores de tensão superficial e, quando subme-
tidos à agitação, produzem espuma. Nessas condições a espuma provoca dese-
quilíbrios nos sistemas aquáticos, culminando com a perda da biodiversidade.

As aves aquáticas também são prejudicadas com a poluição das águas.


Elas possuem um revestimento de óleo em suas penas e boiam na água graças
à camada de ar que fica presa debaixo delas. Quando esse revestimento é remo-
vido o deslocamento fica prejudicado.  

Mesmo assim, Fairbanks, (1989) afirma que a carga de poluição decor-


rente da presença de sabões e detergentes sintéticos é muito pequena se com-
parada com outros poluentes usualmente presentes no esgoto. Apesar disso, ela
pode contribuir de maneira bastante desfavorável para a poluição das águas
receptoras, devido sua interferência no potencial hidrogênio iônico (pH) da
água e aumento a concentração de metais pesados devido à eutrofização, o que
consequentemente dificulta os procedimentos normais de tratamento de esgo-
tos residuais.

Por esse motivo o investimento em pesquisas para encontrar tensoativos


biodegradáveis e atóxicos deve ser uma postura adotada pelas indústrias e, um

Volume II 127
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

assunto a ser discutido nas salas de aula. Assim, visando de trabalhar a EA


elegeram-se as aulas de Química para contextualizar a elaboração de produtos
com princípio ativo natural.

Percurso metodológico

O projeto de ação foi desenvolvido no decorrer do ano letivo de 2014,


mais especificamente a partir do mês de Agosto até Outubro com uma turma de
Química da modalidade de ensino EJA – Educação de Jovens e Adultos na ins-
tituição de ensino denominada Colégio Saint Germian – Cooperativa de Educa-
dores do Estado do Rio Grande do Sul Ltda – COOPEARGS-BR, localizada na
Rua Lindolfo Collor, 66 Centro de Sapucaia do Sul – RS. A turma participante
do projeto era composta por 20 estudantes, desses 15 eram mulheres e 5 ho-
mens. Quanto às idades, ficava em torno dos 45 anos. Em relação às profissões,
destacam-se: o trabalho informal, empregadas domésticas, cabeleireiras, aten-
dente de loja, atendente de padaria, mecânico e montador de tratores.

É importante destacar que os estudantes foram voluntariamente convi-


dados a participar da pesquisa, os termos constituídos para ação do projeto
foram esclarecidos pelas professoras e aprovados com consentimento de to-
dos os envolvidos, bem como os mesmos poderiam desistir de participar a
qualquer momento. A pesquisa desenvolvida não teve apreciação do Comitê
de Ética em Pesquisa – CEP.

Com base no contexto dessa modalidade de ensino e objetivando atingir


os objetivos propostos, como ferramenta norteadora da aplicação do projeto
de ação realizou-se as atividades, priorizando a perspectiva freireana, con-
templando, assim, a contextualização e a problematização por meio interdis-
ciplinar, contando com a participação ativa dos estudantes.

Volume II 128
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Primeiramente foi realizado um levantamento de dados com os estudan-


tes, através de um questionário com perguntas para responderem, tendo como
objetivo a coleta de informações a respeito da visão que os alunos têm sobre a
importância de analisar os rótulos dos produtos de limpeza, bem como, inves-
tigar se eles reconhecem a ocorrência de impactos ambientais e à saúde huma-
na como fruto da própria composição química. Procurou-se analisar, também,
quais os cuidados adotados na manipulação e a seleção que fazem na hora da
compra.

Esse levantamento de dados serviu para selecionar, ordenar e sequenciar


os temas, bem como os recursos metodológicos a serem empregados em função
do perfil dos estudantes e de suas realidades. A partir desse levantamento de da-
dos e considerando a falta de conhecimento apresentada acerca dos questiona-
mentos realizados, optou-se por contextualizar o tema para debater, pesquisar,
refletir e motivar aos estudos trazendo significado a aula.

Com essa mesma compreensão, Wartha e Alário (2005), acreditam que


contextualizar é buscar o significado do conhecimento a partir de contextos do
mundo ou da sociedade em geral, é levar o aluno a compreender a relevância e
aplicar o conhecimento para entender os fatos e fenômenos que o cercam.

Dando continuidade à metodologia empregada, na sequência, os alunos


realizaram o fichamento da composição química presente nos rótulos de pro-
dutos amplamente comercializados, tais como: detergente, amaciante de roupa,
aromatizador de ambiente e desinfetante. Em seguida, realizaram-se leituras de
textos para estudar a função de cada princípio ativo presente na formulação dos
produtos, bem como avaliar seus efeitos ao meio ambiente e à saúde humana.

Nessa etapa da ação desenvolvida, por meio de estudos de textos e deba-


tes, procurou-se fazer aproximação entre o objeto de aprendizagem - A EA - e

Volume II 129
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

à proposta freireana que nessa perspectiva as situações existenciais apresen-


tam-se como codificadas, portanto, parte de um todo que precisa ser analisado
criticamente (descodificado), por meio deu ma metodologia conscientizadora,
que insere ou começa a inserir os homens numa forma crítica de pensarem o
seu mundo (FREIRE, 2005, p. 112). Assim, ao estabelecer a relação entre a EA
e a proposta freireana de educação problematizadora, criam-se possibilidades
para a contextualização no Ensino de Química.

O término do projeto de ação culminou com o desenvolvimento de um


produto alternativo com princípio ativo menos agressivo ao meio ambiente;
entrega de relatório e socialização dos resultados. Por uma questão de espaço
físico e a inexistência de laboratório, o procedimento experimental foi desen-
volvido pelos estudantes fora do espaço escolar e na semana seguinte sociali-
zado com os demais colegas de sala de aula.

Os alunos organizados em grupos optaram pelo desenvolvimento orien-


tado de produtos com composição alternativa. Entre os produtos elaborados,
destacam-se: o aromatizador de ambiente, detergente e desinfetante.

Para desenvolver um aromatizador de ambiente, por exemplo, os estu-


dantes utilizaram álcool de cereais, cravo e canela. Os estudantes que elabora-
ram um detergente de louça usaram água, sabão de coco, bicarbonato de sódio e
suco de limão. Já os estudantes que produziram um desinfetante utilizaram dois
litros de água, 250 mL de álcool 95%, 100 gramas de sabão de coco e cerca de
20 folhas verdes de eucalipto, laranjeira ou limão.

Nesse contexto, o uso de produtos derivados de ingredientes naturais


pode ser tão eficaz quanto os produtos industrializados, apresentando ainda
aspectos positivos relacionados à economia financeira e a preservação do meio
ambiente.

Volume II 130
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Análise e discussão dos dados

A partir dos dados coletados através do questionário, foi possível cons-


tatar que poucos são os estudantes que possuem o hábito de ler e interpretar o
rótulo dos produtos e, mesmo aqueles que o analisam, demonstram ter pouca
compreensão dos termos técnicos. Mesmo assim, quando questionados sobre a
quantidade de substâncias químicas empregadas na fabricação de produtos de
limpeza, a maioria dos entrevistados respondeu acreditar que há um exagero.

Diante disso, percebe-se que os rótulos deixam de cumprir os elementos


essenciais de comunicação entre produtos e consumidores. Cabe ressaltar que
não é falta de informação. Supervisionado pela ANVISA – Agência Nacional
de Vigilância Sanitária – os rótulos trazem informações acerca da composição
química; das formas de manuseio; das reações adversas, enfim sobre os riscos a
que estão sujeitos. Essa conduta só reafirma a necessidade do trabalho em sala
de aula, instruindo para que o aluno consiga perceber o grau de toxicidade e se
dê conta dos impactos ambientais ocasionados pelo uso sem controle.

Cabe avaliar que talvez um dos fatores que podem contribuir para a falta
de interesse de leitura dos rótulos, possivelmente seria o emprego de nomencla-
turas e termos técnicos não acessíveis à população.

Quando questionados sobre os efeitos a saúde associados à manipulação


de produtos domissanitários, os sintomas mais citados foram às alergias pelo
contato, irritação nos olhos e na pele e a intoxicação. Nenhum dos estudantes
citou implicações associada aos rins, ao fígado ou ao sistema respiratório. Ca-
racterizando assim, falta de conhecimento sobre o assunto.

No que diz respeito aos impactos dos produtos de limpeza ocasionados


pela própria composição química e ao descarte em exagero ao meio ambiente,

Volume II 131
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

percebeu-se déficit de conhecimento, sendo a acidificação das águas e a conta-


minação dos lençóis freáticos os itens mais apontados. No entanto, a contami-
nação do solo, a perda da biodiversidade (fauna e flora)e, consequentemente,o
desequilíbrio do ecossistema não foram nem citados.

Finalmente, quando questionados acerca da existência de produtos ecolo-


gicamente corretos, dos 20 estudantes, 10 citaram ter conhecimento, mas apon-
tam a não disponibilidade dos mesmos.

Realmente a disponibilidade de produtos alternativos para essa área ain-


da é explorada de forma superficial, basta para isso observarmos a oferta de
produtos do gênero disponíveis nos supermercados. Outro fator é a relação
consumista, onde a praticidade, a falta de tempo e a facilidade em adquirir pro-
dutos industrializados, tornam-se uma medida viável para o homem moderno,
mas o afasta cada vez mais de medidas ecológicas e sustentáveis para o Planeta.

Tendo em vista que o projeto de ação teve por objetivo promover a in-
tegração da temática ambiental com o conhecimento químico, preparando os
estudantes para que sejam capazes de acompanhar, intervir e discutir o papel
da Ciência e da Tecnologia na sociedade, depois de realizado o projeto de ação,
consideramos que a prática trouxe resultados positivos ao que se propôs a tra-
balhar. No decorrer dos estudos realizados os alunos demonstraram participa-
tivos, envolvidos e sensibilizados em relação às implicações ambientais decor-
rentes dos princípios ativos presentes nos produtos industrializados.

Questões relacionadas aos efeitos à saúde humana ocasionada pela mani-


pulação incorreta e as implicações ao meio ambiente proporcionou momentos
fecundos de debates em grupos. Após a manipulação dos produtos com princí-
pio ativo menos agressivo, as estudantes relataram que fizeram uso e gostaram
da qualidade obtida, evidenciando assim, a possibilidade de substituir produtos
industrializados por ecológicos. No entanto, apontam como um dos empecilhos

Volume II 132
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

a essa questão é a falta de tempo para elaborar o produto alternativo e a prati-


cidade na hora da compra do produto industrializado. Em contrapartida, reco-
nhecem que a continuidade de vida na Terra prescinde do emprego de atitudes
sustentáveis como princípio fundamental de gestão ambiental e admitem que
muitos dos problemas ambientais fossem provocados em decorrência do modo
de vida contemporâneo.

É importante mencionar que os produtos ecológicos desenvolvidos pelos


estudantes se mostraram eficientes. No caso do detergente, este apresentou
poder de detergência e uma boa formação de espuma, já o desinfetante, além de
permitir a limpeza pela formação de espuma-devido ao sabão de coco empregado
na composição–deixou um suave aroma de eucalipto. O aromatizador de
ambiente, pela adição de cravo, canela e álcool, evita o uso dos CFCs – Cloro
Flúor Carbonetos presentes nos aerossóis. Resultando assim, em economia
doméstica e diminuição dos impactos ambientais.

Ao término do projeto de ação, percebemos a importância deste nos cur-


rículos escolares, pois, apesar da mídia evidenciar a preservação do ambiente,
muitas vezes falta por em prática. Nesse cenário, a escola passa a ser uma mola
propulsora e a inserção no currículo evidencia um primeiro passo. Nessa pers-
pectiva a escola tem o papel de sensibilizar os alunos, para serem os multipli-
cadores das informações em suas casas, ou seja, com seus familiares poderão
agir e mobilizar a sociedade em defesa do meio ambiente.

O projeto desenvolvido e a participação dos estudantes foram além do


esperado, atingindo por meio das ações envolvidas um patamar de interdisci-
plinaridade, onde se tornou possível permear por outras disciplinas, entre elas
o português por meio da elaboração do relatório escrito; artes na elaboração do
slogan e layout dos rótulos para os produtos desenvolvidos; biologia e a ques-
tão da reutilização de embalagens, impactos ambientais e suas consequências e
por fim a relação homem natureza.

Volume II 133
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Considerações finais

A manipulação de produtos alternativos fomentou questionamentos e


discussões no ambiente da sala de aula, permitindo que os estudantes per-
cebessem a crise socioambiental que estamos enfrentando. Por esse motivo
consideramos o projeto desenvolvido com resultados satisfatórios e relevan-
tes ao nível de esclarecimento, análise e formas de rever conceitos já estabe-
lecidos, onde questões como desperdício de água, possibilidade de emprego
de produtos alternativos em detrimento dos industrializados e a dependência
do homem em relação à natureza puderam ser debatidos.

Assim, por meio da ação pedagógica procurou-se inserir no currículo da


EJA para que através da contextualização do ensino e da problematização fosse
permitido aos estudantes novos olhares, possibilitando ampliar o conhecimento
e o senso crítico.

Contudo, percebeu-se, a fragilidade do processo educativo no que diz


respeito ao emprego da EA nos currículos da Educação Básica, onde ela ainda
é tida como distante e difícil de ser implantada, restringindo-se apenas ao nível
de projeto quando, na verdade, esse assunto deve permear por todas as disci-
plinas.

Durante a execução do projeto, novas ideias de projetos ambientais fo-


ram surgindo na escola, caracterizando, assim, como o emprego de ações edu-
cativas são viáveis e com pequenas ações podemos influenciar e mobilizar para
o desenvolvimento de outros projetos educativos.

Trabalhar a temática ambiental integrada a Química contribuiu para o


desenvolvimento do senso crítico e análise da relação com a natureza, podendo
se posicionar e contribuir para a mudança de comportamento e atitudes. Por
esse motivo, a escola, por ser um canal de comunicação e formação, não pode

Volume II 134
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ser omissa, pelo contrário, deve favorecer e contribuir para a inserção nos cur-
rículos escolares. Assim, gradualmente foram sendo introduzidos no currículo
da modalidade EJA novas perspectivas e olhares que encontraram apoio na
interdisciplinaridade, nos conteúdos de química e na relação homem natureza.

Almejou-se nesse projeto de ação evidenciar a importância da EA, em es-


pecial na Educação de Jovens e Adultos. Os resultados demonstraram o quanto
é pertinente fazer com que o aluno perceba a relação entre aquilo que se ensina
e o seu cotidiano.

É fundamental reconhecer que há necessidade de realização de campa-


nhas para esclarecimento sobre a relação toxicológica e o efeito sobre o meio
ambiente, assim como também o desenvolvimento e a oferta de produtos mais
ecológicos devem ser repensados por parte da ANVISA e o Ministério da Saú-
de.

Por isso é importante elaborar estratégias para intervir nos processos que
afetam e culminam com a falta de informação, fazendo com que os órgãos
competentes se mobilizem para realizar os ajustes necessários, situação essa
que somente cidadãos críticos terão condições de reivindicar.

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Resumo: O artigo contempla uma ação pedagógica desenvolvida na modalidade de


ensino da Educação de Jovens e Adultos (EJA) com a inserção da Educação Ambiental
(EA) no currículo escolar. Buscando atender as Diretrizes Curriculares da Educação
Básica, elegeu-se trabalhar a Química em uma proposta de ensino contextualizada e
problematizadora. Tendo em vista o público alvo - composto por mulheres - optou-se
por trabalhar conteúdos de Química a partir da análise dos princípios ativos presentes
em produtos de limpeza, culminando com a elaboração de um produto alternativo e
ecológico. O projeto de ação teve por objetivo promover a integração da temática
ambiental com o conhecimento químico, preparando os estudantes para que sejam
capazes de acompanhar, intervir e discutir a Ciência e a Tecnologia no Ambiente na
construção de conhecimento e valores diante da problemática do uso excessivo. A
metodologia se baseou na pedagogia problematizadora de Paulo Freire por meio do
emprego da análise investigativa de dados pré-estabelecidos, culminando com a ex-
perimentação. Os resultados obtidos na aplicação da proposta serviram como aliado
no processo de ensino e aprendizagem e no resgate de valores ambientais.

Palavras-chave:Educação ambiental;Educação de jovens e adultos; Ação docente.

Abstract: The article contemplates a pedagogical action developed in the education


field ofYouth and Adult Education (EJA) with the insertion of Environmental Educa-
tion (EE) in the school curriculum. Seeking to meet the Basic Education Curriculum
Guidelines, Chemistry was chosen to work in a contextualized and problematizing
teaching proposal. Considering the target audience - formed by women - it has been
decided to work with Chemistry contents from the analysis of the active principles
present in cleaning products, culminating in developing an eco-friendly alternative
product. The project aimed to integrate environmental issues with chemical knowl-
edge to prepare students to follow, intervene and discuss Science and Technology in
the Environment in the construction of knowledge and values in the face of the prob-
lem of excessive use. The methodology was based on Paulo Freire’s problematizing
pedagogy through investigative analysis of pre-established data, culminating in ex-
perimentation. The results obtained by the proposal served as an ally in the teaching
and learning process and the rescue of environmental values.

Keywords: Environmental education; Youth and adult education; Teaching action.

Volume II 137
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 6

ANÁLISES ESTATÍSTICAS
NA EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS: UM
ESTUDO SOBRE CONHECIMENTOS
E ATITUDES AMBIENTAIS
DE ESTUDANTES BRASILEIROS
E ALEMÃES
Renan de Almeida Barbosa
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-5

Introdução

O debate sobre as mudanças climáticas, suas consequências e ações para


sua mitigação têm sido destaque ano após ano, fazendo com que diferentes se-
tores da sociedade civil atuem e se manifestem sobre o impacto ambiental dos
seres humanos no planeta. Esse debate se intensificou pois estamos assistindo
diferentes tragédias ambientais, como por exemplo, grandes inundações, quei-
madas incontroláveis, desmatamento da Floresta Amazônica, derretimento de

Volume II 138
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

geleiras, para mencionar de forma geral uma variedade de desastres e crimes


ambientais que afetam a biodiversidade e a vida humana. Distribuídos ao redor
do mundo, embora com maior impacto para as regiões dos países subdesenvol-
vidos, a crise socioambiental definitivamente ganhou destaque para além dos
cientistas climáticos e das práticas de Educação Ambiental (EA).

É nesse contexto que, em 2018, uma jovem estudante sueca do Ensino


Médio chamada Greta Thunberg usou dos seus direitos civis para faltar aula em
uma sexta-feira e se dirigir para frente do parlamento da Suécia, com o objetivo
de pressionar os agentes políticos a agirem para a mitigação das mudanças
climáticas. Inicialmente solitário, esse protesto da jovem sueca contagiou
milhares de jovens ao redor do mundo, criando um movimento social organizado
que tem realizado protestos demandando ações para o combate às mudanças
climáticas, chamados Fridays for Future [(FFF), em tradução literal, Sextas-
-feiras para o futuro; embora, no Brasil, se tenha adotado o nome Greves pelo
Clima]. Com essa diversificação de atores, organizações e formas de protestos,
esse movimento já atingiu o total de 18.919 protestos ambientais, em mais de
150 países diferentes ao redor do globo (FRIDAYS FOR FUTURE, 2021).

Portanto, a intensificação de protestos ambientais como os do FFF se tor-


nou objeto de pesquisa de diferentes campos e vertentes acadêmicas. Do ponto
de vista da pesquisa sobre participação em protestos, psicólogos investigaram
o perfil, motivações e crenças de manifestantes em várias cidades europeias em
2019 (WAHLSTRÖM et al., 2019). Quanto à ação coletiva, pesquisadores de
diversas áreas sugerem diferentes fatores sociopsicológicos que influenciam
um indivíduo a participar de uma manifestação, tais como identificação social,
percepção de injustiça ambiental e certos aspectos afetivos e cognitivos, como
atitudes, valores e conhecimentos (VAN ZOMEREN et al., 2008).  

Volume II 139
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O que a literatura diz a respeito dos


conhecimentos e atitudes ambientais?

As atitudes ambientais são caracterizadas como sentimentos favoráveis


ou desfavoráveis em relação à natureza ou algum problema que dela deriva e são
oficialmente definidas como “percepções ou convicções em relação ao ambien-
te físico, incluindo fatores que afetam sua qualidade” (AMERICAN PSYCHO-
LOGICAL ASSOCIATION, 2001, p.89). Portanto, são atitudes construídas ou
desenvolvidas a partir da interação com o contexto em que se vive em sua tota-
lidade, contemplando as relações entre os indivíduos e destes com o ambiente
em que se estão inseridos. Além do nível de consciência ambiental, que muitas
vezes está relacionado com a apreciação da natureza, as atitudes ambientais
também se relacionam com processos naturais ou antrópicos nos quais o meio
ambiente é o objeto atitudinal (COELHO. GOUVEIA; MILFONT, 2006).

Para mensurar atitudes e valores ambientais, Bogner e Wiseman (1999)


criaram um questionário para o Modelo dos Dois Principais Valores Ambien-
tais (2-MEV [Two Major Environmental Values Model)], que compreende vinte
afirmativas baseadas em fatores de primeira ordem (atitudes) que podem prever
fatores de ordem superior (valores), categorizados como valores de Preserva-
ção (PRE) e Utilização (UTL), como pode ser observado na figura 1. Os valo-
res de PRE descrevem “uma dimensão biocêntrica que reflete a conservação
e a proteção do meio ambiente”; por outro lado, valores de UTL “dimensão
antropocêntrica que reflete a utilização dos recursos naturais” (WISEMAN;
BOGNER, 2003, p. 787). Por exemplo, fatores de primeira ordem como a preo-
cupação com os recursos naturais e a valorização da natureza compreendem
valores preservacionistas (PRE), enquanto que a alteração do meio ambiente e
o domínio do homem sobre correspondem à valores utilitaristas (UTL) ao da
utilização (BOGNER; WISEMAN, 1999).

Volume II 140
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1. Representação dos dois domínios da escala do Modelo dos Principais


Valores Ambientais (2-MEV). No topo, os fatores de ordem superior (valores),
seguido pelo valores de primeira ordem (atitudes) e na base, exemplos de afir-
mativas de cada domínio.

Fonte: elaborado pelos autores (2023).

Com sólido referencial teórico, a escala 2-MEV foi testada e aplica-


da nas últimas décadas em diferentes países, tais como Alemanha, Costa do
Marfim, Estados Unidos, Grécia, Irlanda e México, entre outros (BOGNER,
2018; MAURER; BOGNER, 2020). A aplicação do questionário demonstrou
alta confiabilidade e correlação entre seus componentes em diferentes cultu-
ras, revelando atitudes e valores ambientais de estudantes de diferentes níveis
educacionais.

Compreendendo indicadores do comportamento ambiental, as atitudes


são importantes para as políticas que buscam uma mudança social (KOLL-
MUSS; AGYEMAN, 2002). Além disso, a pesquisa sobre atitudes ambientais

Volume II 141
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

com o uso da escala 2-MEV corrobora para investigar como experiências


diretas e indiretas na natureza podem influenciar o comportamento ambiental
de um indivíduo (KOLLMUSS; AGYEMAN, 2002).

A EA também requer uma maior participação da Educação Científica


(EC) para potencializar o conhecimento, atitudes e comportamentos nos pro-
cessos de ensino e aprendizagem, à medida que revela aspectos científicos,
econômicos, políticos e culturais das questões ambientais. Especificamente
sobre o conhecimento ambiental, considera-se a sua definição a partir de três
dimensões: conhecimento relacionado ao sistema (SYS), conhecimento re-
lacionado à ação (ACT) e conhecimento sobre a eficácia (EFF). A dimensão
SYS compreende a preocupação com os processos naturais dos ecossistemas
e seus efeitos sobre a relação homem-natureza. A segunda dimensão são as
possibilidades de comportamento disponíveis que são adequadas a problemas
ambientais específicos. E a dimensão EFF diz respeito ao impacto específico
e efetivo de uma determinada atitude ou alternativa em comparação essa ati-
tude (ROCZEN et al. 2014). O quadro 1 a seguir apresenta alguns exemplos
de questões para cada uma das dimensões do conhecimento ambiental, de
acordo com a escala aplicada.

Volume II 142
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 1. Um exemplo de questão de múltipla escolha com apenas uma res-


posta correta sobre cada dimensão do conhecimento ambiental presente no
questionário aplicado.

Dimensões do
Sigla Exemplo de questão de múltipla escolha
conhecimento ambiental

Qual fenômeno natural não é relacionado ao


aquecimento global?
Conhecimento
Terremotos
SYS relacionado ao sistema
Derretimento glacial
(cinco perguntas)
Aumento do nível dos oceanos
Mudanças das correntes oceânicas

Qual é a principal causa do aumento dos


níveis da poluição por nitrato nas águas
Conhecimento subterrâneas?
ACT relacionado à ação O excesso de carros como meio de transporte
(quatro perguntas) Poluição do ar industrial
Água não-tratada despejada nos rios
Agricultura

Qual atividade abaixo você acha que consome


mais água no dia a dia?
Conhecimento sobre a efi- Tomar banho
EFF
cácia (cinco perguntas) Descarga do vaso sanitário
Lavar a louça
Lavar as roupas

Fonte: adaptado e elaborado pelo autor a partir de Roczen et al. (2014) e Geiger et al. (2019).

Considera-se o pressuposto que indivíduos devem estar cientes dos mo-


tivos, modos e consequências de suas atitudes para que o comportamento am-
biental seja cognitivamente significativo e concretamente viável (KAISER;
ROCZEN; BOGNER, 2008). A dimensão SYS do conhecimento ambiental

Volume II 143
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

pode ser entendida como simplesmente o conteúdo conceitual, e pode não levar
à mudança de atitude. Portanto, as dimensões ACT e EFF também influenciam
atitudes e comportamentos, que têm suas bases na dimensão SYS (MAURER;
BOGNER, 2020).

Um estudo sobre a aplicação da escala 2-MEV no


Brasil

Como mostrado acima, a escala 2-MEV foi aplicada em estudos sobre


atitudes ambientais em diferentes países, mas ainda não se conhece sobre sua
aplicabilidade e resultados da utilização deste instrumento no contexto brasilei-
ro. Esta escala tem uma estrutura dimensional fixa, a possibilidade de aplicação
em estudos comparativos e a adequação na Psicologia Ambiental (BOGNER;
WISEMAN, 2006). Consequentemente, há uma contribuição para a compreen-
são das atitudes e valores ambientais dos estudantes brasileiros.

Considerando a participação nos protestos do FFF, investigar os fatores


cognitivos de participantes e não-participantes de protestos ambientais pode
ajudar a compreender a motivação desses jovens, embora os estudos com esse
objetivo de pesquisa ainda sejam escassos (BRÜGGER et al., 2020). Nesse
sentido, a força e o potencial dos determinantes cognitivos e demográficos con-
siste em fornecer alguma compreensão sobre a qual atitudes, valores e conhe-
cimentos ambientais podem ser preditores da participação ou não de protestos
ambientais.

O presente estudo objetivou (1) avaliar as atitudes e conhecimentos am-


bientais de estudantes brasileiros e alemães e (2) verificar se a frequência da
participação em movimentos ambientais é um fator relevante para as atitudes
e conhecimentos ambientais. As variáveis independentes incluídas foram país
de origem e quantidade de participação em protestos ambientais. Dessa forma,

Volume II 144
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

elencou-se as hipóteses a seguir:

• hipótese 1: As atitudes ambientais de estudantes apresentam diferenças


em relação ao país de origem (1a) e participação em protestos ambientais
(1b);
• Adicionalmente, estudantes da Alemanha possuem escores mais elevados
em atitudes e valores preservacionistas do que estudantes do Brasil (1c);
ainda, que participantes de protestos ambientais possuem escores mais
elevados em atitudes e valores preservacionistas do que não participantes
(1d); e
• hipótese 2: Os conhecimentos ambientais dos estudantes apresentam di-
ferenças em relação ao país de origem (2a) e participação em protestos
ambientais (2b).

Os métodos quantitativos na pesquisa em


Educação em Ciências: uma breve reflexão
sobre a conflito dos paradigmas dos métodos
científico quantitativo vs. qualitativo

Se olharmos para o que nos mostra a História da Ciência, dentro de uma


perspectiva do Ocidente, os paradigmas dos métodos científicos foram sendo
consolidados a partir de um rigor científico resultante de pesquisas quantitati-
vas na área das Ciências da Natureza. Com o surgimento e desenvolvimento
das Ciências Sociais, a aplicação do método científico a partir dos pressupostos
da outra área geraram discussões, uma vez que na primeira área entende-se que
o(a) pesquisador(a) é sujeito e objeto de sua pesquisa, contrapondo-se com o
dualismo epistemológico da perspectiva positivista (SANTOS FILHO; GAM-
BOA 2013).

Isto posto, entendo que a distinção entre tais paradigmas do método cien-
tífico, aplicados à pesquisa em Educação, direciona a compreensão de uma in-
compatibilidade das duas abordagens, porém, essa constatação recaiu também
por muito tempo sobre o nível técnico (SANTOS FILHO; GAMBOA 2013).
Dessa forma, percebe-se um debate superficial que, alimentado por “ismos” e
supostos “vieses”, impede o aprofundamento do debate sobre a relação sujei-

Volume II 145
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

to-objeto, quantidade-qualidade, explicação-compreensão (SANTOS FILHO;


GAMBOA, 2013).  

Na tentativa de superar esse conflito, observa-se um esforço recente de


estudiosos em apontar que esse antagonismo é contraproducente, na medida em
que a escolha pelo uso de métodos quantitativos e qualitativos na investigação
sobre determinado problema poderia proporcionar insights e poder preditivo
mais sólido (SANTOS FILHO; GAMBOA, 2013). Admitindo a intersubjetivi-
dade do pesquisador na relação sujeito-objeto e a interpretação dos fenômenos
quando analisados em profundidade ao mesmo tempo em que se assume o po-
tencial da operacionalização de variáveis através de análises estatísticas, afasta-
-se o antagonismo mútuo entre qualitativo e quantitativo para investigarmos o
fenômeno do ensino e aprendizagem com mais repertório técnico, teórico-me-
todológico e de inferências epistemológicas.

Sem alongar a discussão concernente ao campo da Epistemologia e His-


tória da Ciência, reafirma-se a posição de complementariedade da abordagem
quantitativa e qualitativa, particularmente aplicadas ao objeto desta pesquisa.
Aproveitando-se do conhecimento produzido historicamente sobre esse debate,
destaca-se que essas contribuições corroboram com minha pesquisa de mestra-
do, no qual investiguei e argumento o visível mutualismo antagônico nas pes-
quisas da área do Ensino (BARBOSA, 2019). Acredito ser necessário avançar
nesse debate a medida em que escolhemos analisar o ensino e aprendizagem de
Ciências e suas relações com as atitudes ambientais para uma conscientização
ecológica/ambiental, uma vez que a mensuração de construtos psicológicos e
o aprofundamento através da linguagem e seus significados são essenciais em
uma sociedade cada vez mais imersa em uma crise socioambiental.

Como mencionado acima, os conhecimentos teóricos disponíveis e a


trajetória do pesquisador apresentadas em seção anterior, confirmam o enten-

Volume II 146
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

dimento da presente pesquisa como uma articulação entre os níveis teórico,


metodológico, técnico e epistemológico para a reconstrução lógica da pesqui-
sa proporcionada dentro de condições materiais, sociais e históricas que a ca-
racterizam como um produto social histórico (SANTOS FILHO; GAMBOA,
2013). Reconhecendo a possibilidade de construir uma síntese entre esses dois
polos – quantitativo e qualitativo – tidos como opostos, nos permite “produzir
respostas novas para problemas e perguntas relacionados com o mundo da ne-
cessidade que envolve a educação e a sociedade nas condições históricas de seu
desenvolvimento” (SANTOS FILHO; GAMBOA, 2013, p. 109).

Percurso metodológico do estudo

O presente estudo é do tipo exploratório, de natureza quantitativa. Uti-


lizamos a ferramenta online SoSciSurvey para coletar dados com estudantes
brasileiros e alemães, tanto participantes como não-participantes de protestos
ambientais.

Sujeitos do estudo

Ao todo, 658 estudantes participaram de nosso estudo, 327 da Alemanha


(204 do gênero feminino, 110 do gênero masculino, 3 de gênero diverso e 4 pre-
feriram não responder) e 331 do Brasil (207 do gênero feminino, 121 do gênero
masculino e 3 do gênero diverso). A média de idade de todos os participantes
foi de 25,21 ± 7,91 (faixa etária de 16-65 anos). Na Alemanha, a média de idade
foi de 23,02 ± 5,14 (variação de 16-61 anos) e no Brasil, a média de idade foi
de 27,38 ± 9. 43 (variação de 16-65 anos). No total, 34 participantes eram do
ensino médio e/ou técnico (20 da Alemanha e 14 do Brasil), 333 eram estudan-
tes de graduação (145 da Alemanha e 188 do Brasil) e 291 eram estudantes de
Especialização/Mestrado/Doutorado (162 da Alemanha e 129 do Brasil).

Volume II 147
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O estudo foi realizado durante o primeiro trimestre do ano de 2021 de


maneira totalmente remota. Os questionários estavam hospedados na plata-
forma SosciSurvey, que permitiu a geração de um link de compartilhamento
enviado por e-mail à diferentes departamentos de duas instituições de ensino
no Brasil e Alemanha, bem como por mensagens diretas em redes sociais dos
movimentos sociais. Cada participante levou de 10 à 13 minutos para respon-
der todas as questões. As instituições de ensino foram escolhidas devido ao
vínculo do primeiro autor com ambas; os estudantes do nível do ensino médio
foram escolhidos por conveniência, de acordo com à adesão a partir do vín-
culo com os movimentos sociais contactados.

Os participantes tiveram que ler o convite de participação na pesquisa


antes de começar a responder o questionário, contendo os objetivos, riscos e
benefícios do estudo. Além disso, os participantes podiam se retirar do preen-
chimento do questionário a qualquer momento. Para as análises estatísticas que
foram realizadas, apenas os questionários completamente respondidos foram
considerados.

O estudo em seu nível técnico: os questionários


aplicados

Foi utilizada uma bateria de questionários. Coletamos dados sociodemo-


gráficos, a saber: idade, sexo, país, característica do local de residência (urba-
no/rural), nível de escolaridade, nome do curso que frequentam (se for gradua-
do ou pós-graduado), e níveis de escolaridade dos pais. O país foi codificado
como Alemanha e Brasil. Para o presente estudo, foram consideradas apenas
a variável sociodemográfica do país de origem. A participação em protestos
ambientais, como por exemplo o FFF, foi solicitada em uma variável categóri-
ca [nunca (1), uma vez (2), duas-quatro vezes (3) ou cinco ou mais vezes (4)],

Volume II 148
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mas posteriormente agrupada dicotomicamente em “nunca participei” e “sim,


já participei”, devido ao tamanho da amostra.

Para mensurar atitudes ambientais, utilizamos a escala 2-MEV com 20


(vinte) afirmativas (dez sobre Utilização e dez sobre Preservação), derivada de
Bogner (2007). As afirmativas foram apresentadas em uma escala do tipo Likert
de 5 (cinco) pontos, na qual a opção 1 (um) significava “discordo totalmente” e
a opção 5 (cinco) significava “concordo totalmente”, sendo que o ponto inter-
mediário significava “indiferente”. As perguntas sobre conhecimento ambien-
tal foram extraídas de Roczen et al. (2014) e Geiger et al. (2019): cinco sobre
conhecimento relacionado ao sistema; quatro sobre conhecimento relacionado
à ação; e cinco sobre conhecimento sobre eficácia. Com o objetivo de medir
o número médio de perguntas respondidas corretamente nas três dimensões, a
alternativa correta foi recodificada para o valor 1, e as alternativas incorretas
foram recodificadas para o valor 0.

Os dois questionários foram traduzidos da sua versão original em ale-


mão para o português por um tradutor oficial, sendo que essa primeira versão
traduzida foi, então, avaliada por duas pesquisadoras da área do Ensino para
verificar a correspondência da tradução “literal” ao contexto brasileiro. Por fim,
a versão traduzida e contextualizada foi novamente traduzida para o alemão,
avaliada novamente por um pesquisador da área para apontar a congruência
entre as versões.

Análises realizadas

Primeiramente, os dados brutos foram submetidos ao teste de Shapiro-


-Wilk para verificar sua adequação à normalidade. Depois, verificou-se a ho-
mogeneidade de variâncias pelo teste de Bartlett. Ambos os testes foram basea-
dos em um nível de significância de 5%, mas ponderações sobre a distribuição

Volume II 149
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

de probabilidade dos dados brutos também foram realizadas considerando uma


inspeção visual através de histograma de frequências e de gráfico de quantis
normais. As medidas de frequência e de distribuição foram calculadas para to-
das as variáveis de interesse. Após realização da análise descritiva das variáveis
incluídas na base de dados descrita anteriormente, foi possível verificar que
nenhuma delas possui distribuição normal, sendo todas as distribuições assi-
métricas; ainda, não se verificou homogeneidade de variâncias. Sendo assim,
constatou-se condições de não normalidade na distribuição das observações
das variáveis categóricas com mensurações de natureza ordinal, que guiou o
teste das hipóteses e inferências estatísticas relacionadas.

Optou-se pela realização de testes não-paramétricos, especificamente o


teste de Mann-Whitney para amostras independentes. Variáveis dependentes:
média dos scores em UTL e PRE. Variáveis independentes: país de origem,
gênero, idade e participação em protestos ambientais.

As recodificações foram realizadas na base de dados consolidada, bem


como a análise de confiabilidade da escala, foram realizadas no software IBM
SPSS 25. Calculou-se α de Cronbach para a escala 2-MEV nas duas línguas
aplicadas, observando-se resultados satisfatórios (LANDIS; KOCH, 1977). Em
alemão: UTL (α de Cronbach = .75) e PRE (α de Cronbach = .81). Em portu-
guês: UTL (α de Cronbach = .81) e PRE (α de Cronbach = .85).

Apenas participantes que responderam todas as questões foram incluí-


dos(as), com a base de dados consolidada, as análises numéricas e estatísticas
passaram a ser realizadas no software Rstudio 2021.091.2.0. Para evitar a uti-
lização do espaço com apêndices neste livro, os códigos utilizados podem ser
encontrados no site Harvard Dataverse ou mediante contato com o primeiro
autor.

Volume II 150
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O que se evidenciou sobre conhecimentos e


atitudes ambientais de ativistas ambientais que
vivem na Alemanha e no Brasil?

Inicialmente, realizou-se a análise das medidas de posição para todas as


variáveis escolhidas, conforme resultados demonstrados na tabela 1 a seguir.

Tabela 1. Valores das medidas de posição das variáveis escolhidas e do desvio-


-padrão para as variáveis dependentes.

1º 3º Desvio-
Variável Mínimo Mediana Média Máximo
quartil quartil -padrão

País de
1,00    1,000   1,000   1,48    2,00 2,00 -
origem

Participação
em protestos 0,00   0,00 0,00 0,24   0,00 1,00 -
ambientais

Preservação
1,5 3,5 3,9 3,84 4,30 5,00 0,6070
(PRE)

Utilização
1,00 1,20   1,50   1,59    1,80    4,40 0,4839
(UTL)

Conhecimento
relacionado ao 0,20 0,80 1,00   0,93   1,00 1,00 0,1161
sistema (SYS)

Conhecimento
sobre a 0,00 0,20   0,40   0,45   0,60   1,00 0,2322
eficácia (EFF)

Conhecimento
relacionado 0,00 0,50 0,75   0,73   1,00   1,00 0,2187
à ação (ACT)

Fonte: elaborado pelo autor (2022).

Volume II 151
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Para verificar a frequências das variáveis independentes selecionadas, foi


organizado um histograma de frequências para o país de origem (a) e participa-
ção em protestos (b), conforme a figura 1 a seguir.

Figura 1. Frequências absolutas observadas para as variáveis país de origem e


participação em protestos ambientais como os do FFF.

Fonte: elaborado a partir de output do Rstudio, 2022.

Volume II 152
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Para analisar com mais precisão as medidas de tendência central e disper-


são, elaborou-se gráficos de densidade para as variáveis dependentes, conforme
a figura 2 a seguir.

Figura 2. Gráficos de distribuições de médias das variáveis dependentes: esco-


res em UTL (a); escores em PRE (b), escores em conhecimento ambiental rela-
cionado à ação (ACT) (c); escores em conhecimento ambiental relacionado ao
sistema (SYS) (d); e escores em conhecimento ambiental sobre eficácia (EFF).

Fonte: elaborado a partir de output do Rstudio, 2022.

Volume II 153
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Para os escores em atitudes preservacionistas (PRE) e utilitaristas


(UTL), verificou-se assimetria à esquerda para PRE (figura 2, gráfico b) e
assimetria à direita para UTL (figura 2, gráfico a), corroborando a violação
da distribuição normal para testes paramétricos. De acordo com os histogra-
mas assimétricos com desvios à esquerda com valores extremos (figura 2,
gráficos c, d) e à direita (figura 2, gráfico e) das variáveis de conhecimentos
ambientais (SYS, ACT e EFF), decidiu-se por não prosseguir com os testes
não-paramétricos.

Deste modo, observa-se de acordo com as distribuições dos quartis,


que as médias dos escores em UTL são baixas e as médias dos escores em
PRE são altas para toda a amostra. Ainda, considerando que as variáveis para
conhecimentos ambientais foram dicotomizadas, a figura 2e aponta que para
o domínio do conhecimento EFF, as frequências de estudantes que tiveram
média de respostas corretas são menores do que para os domínios ACT e
SYS. Tal resultado sugere maior dificuldade em compreender a totalidade dos
conhecimentos ambientais sobre a eficácia de atitudes pró-ambientais, pois
refere-se à um fator cognitivo mais complexo e associativo entre determinado
conhecimento e seu impacto no cotidiano através de atitudes e comportamen-
tos presentes no cotidiano. Ainda, a aprendizagem de conhecimentos ambien-
tais tem sido historicamente enfatizada apenas em sua dimensão conceitual
(SYS), com pouca ênfase nas consequências e utilidades de conhecimentos
mais práticos.  

Prosseguindo para corroborar a escolha de testes não-paramétricos, rea-


lizou-se o teste de Shapiro-Wilk para verificar a normalidade das distribui-
ções das variáveis dependentes, adotando o intervalo de confiança de 95%, ou
seja, de significância estatística de p-valor < 0,05, conforme Tabela 2 a seguir.

Volume II 154
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Tabela 2. Resultado do teste de normalidade de Shapiro-Wilk calculado para


as variáveis dependentes.

Variável Estatística (W) df Sig. (p) Conclusão

Utilização (UTL) 0,89568 658 < 2,2e-16 Rejeita-se H0

Preservação (PRE) 0,97672 658 < 1,42e-08 Rejeita-se H0

Conhecimento relacionado
0,60592 658 < 2,2e-16 Rejeita-se H0
ao sistema (SYS)

Conhecimento sobre
0,92926 658 < 2,2e-16 Rejeita-se H0
a eficácia (EFF)

Conhecimento relacionado
0,85129 658 < 2,2e-16 Rejeita-se H0
à ação (ACT)

Fonte: elaborado pelo autor (2022).

Estatística (W) é o valor calculado do teste; df compreende a quantidade de observações; e Sig. é


o valor de significância estatística estabelecido (p<0.05).

Dessa forma, rejeita-se as hipóteses 2, 2a e 2b sobre as diferenças dos


níveis de conhecimentos ambientais dos estudantes de acordo com seu país de
origem e a participação em protestos ambientais, pois não permitiram a realiza-
ção dos testes estatísticos escolhidos para investigar a variância das médias das
variáveis dos conhecimentos ambientais.

Realizaram-se testes para verificar a diferença das medianas nos scores


em UTL e PRE a partir dos fatores país de origem e participação em protestos
ambientais, adotando o intervalo de confiança de 95%, ou seja, de significância
estatística de p-valor < 0,05.

O teste de Mann-Whitney demonstrou que a diferença das médias dos


escores em valores utilitaristas e preservacionistas são estatisticamente signi-
ficativas entre estudantes do Brasil e Alemanha (UTL: W = 172987, p-valor

Volume II 155
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

= 3,527e-07; PRE: W = 942, p-valor < 2,2e-16). O teste de Mann-Whitney


demonstrou que diferença das médias dos escores em valores utilitaristas e
preservacionistas são estatisticamente significativas entre participantes e não
participantes de protestos ambientais (UTL: W = 3239, p-valor < 2,2e-16; PRE:
W = 0, p-valor < 2,2e-16). Para melhor visualização dos testes não-paramétri-
cos de variância das distribuições, elaborou-se os gráficos do tipo boxplot das
médias dos escores em PRE e UTL de acordo com os fatores de participação
em protestos ambientais e país de origem, conforme os gráficos a, b, c e d na
figura 3 abaixo.

Figura 3. Gráficos boxplot das médias dos escores em UTL e PRE de acordo
com país de origem e participação em protestos ambientais.

Fonte: elaborado a partir de output do Rstudio, 2022.

O asterisco (*) acima das colunas indica a diferença das medianas a p-valor < 0,05.

Volume II 156
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Dado os boxplots apresentados, mostrando a distribuição dos escores


pontuações por país e a participação em protestos ambientais, pode-se ver que
estudantes do Brasil e participantes de protestos e movimentos ambientais pa-
recem ter escores mais elevados em valores preservacionistas do que estudan-
tes da Alemanha e não-participantes, respectivamente.

Sendo assim, realizou-se novo Teste de Mann-Whitney unicaudal para


verificar se as medianas de um grupo são maiores do que a de outro. O teste de
Mann-Whitney unicaudal demonstrou que as medianas dos escores em valores
preservacionistas dos estudantes do Brasil são estatisticamente maiores do que
as medianas dos estudantes da Alemanha (W = 942, p-valor < 2,2e-16). O teste
de Mann-Whitney unicaudal demonstrou que as médias dos escores em valores
preservacionistas de participantes de protestos ambientais são estatisticamente
maiores do que as medianas de não-participantes (W = 0, p-valor < 2,2e-16).

Sendo assim, o teste não-paramétrico de Mann-Whitney bicaudal sugeriu


a diferença das medianas dos escores em atitudes preservacionistas e utilitaristas
entre estudantes do Brasil e da Alemanha e entre participantes e não-participan-
tes de protestos ambientais. Deste modo, as hipóteses 1, 1a e 1b foram aceitas,
ou seja, o país de origem e a participação em protestos foi determinantes para
as diferenças nos escores de atitudes ambientais dos estudantes participantes.

Por fim, o teste não-paramétrico de Mann-Whitney unicaudal evidenciou


que estudantes do Brasil e participantes de protestos ambientais, possuem esco-
res mais elevados de atitudes preservacionistas do que estudantes da Alemanha
e não-participantes de protestos ambientais, respectivamente. Deste modo, as
hipóteses 1c e 1d foram aceitas.

A participação em protestos ambientais, como por exemplo o FFF, de-


monstrou ser um fator relevante para prever atitudes e valores ambientais, con-

Volume II 157
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

forme as médias e medianas de escores em PRE e UTL. Os estudantes que se


engajaram nessas manifestações demonstraram notas mais baixas na UTL e
notas mais altas na PRE em comparação com os estudantes que não participa-
ram mais ativamente. Isto indica que os participantes de protestos ambientais
estão mais preocupados em preservar o meio ambiente e têm uma visão me-
nos exploradora dos recursos da natureza. Estudos anteriores mostraram que a
participação em protestos do FFF também foi motivada pela identificação do
grupo e pela percepção do risco das consequências ambientais das mudanças
climáticas (BRÜGGER et al. 2020).

A partir do país de origem como fator determinante, demonstrou-se tam-


bém diferenças significativas nas médias dos escores em PRE e UTL entre
estudantes brasileiros e alemães. Revelou-se que os brasileiros estão mais pre-
ocupados com o meio ambiente e menos favoráveis à exploração da natureza
quando comparados aos estudantes alemães. Portanto, os resultados sugerem
que o nível de desenvolvimento de um país ou sua riqueza não indica necessa-
riamente atitudes mais pró-ambientais quando comparado a um país em desen-
volvimento. Ainda, deve-se considerar constrangimentos situacionais, efeitos
ambientais locais ou outros fatores individuais (KOLLMUSS; AGYEMANN,
2002; LIST et al., 2020).

Percebe-se, portanto, a importância dos programas educacionais para o


desenvolvimento sustentável em ambos os países. As altas pontuações PRE
indicam motivação, melhor desempenho no aprendizado e também se correla-
cionam com altos níveis de conhecimento sobre biodiversidade e conservação
de espécies (RANDLER et al., 2020).

Algumas limitações do presente estudo correspondem à 1) amostragem


e forma de resposta ao questionário e aos 2) tratamentos estatísticos emprega-
dos. Primeiro, por se tratarem de sujeitos envolvidos em instituições de ensino

Volume II 158
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

e movimentos sociais, deve-se moderar as inferências de generalização dos


resultados; ainda, nem todos os possíveis sujeitos foram alcançados, pois o
acesso à internet e tempo para responder questionários online podem restringir
o número de respondentes. Segundo, outros tratamentos estatísticos de inferên-
cia mais elaborados, como por exemplo, os Modelos Lineares Generalizáveis,
permitem sofisticar as análises e diminuir as limitações relativas ao primeiro
aspecto.

Por fim, se consideramos a questão metodológica da pesquisa em Ensino


e Educação em Ciências, o nosso estudo buscou contribuir com a validade e
reprodutibilidade de um instrumento de nível técnico para investigar as atitudes
ambientais. Torna-se relevante para estudos futuros com delineamento empíri-
co e que também objetivam o impacto de diferentes abordagens didáticas em
atitudes e conhecimentos ambientais. A descrição dos dados e suas análises a
partir de representação, transformação e análise dos registros, permitiu inves-
tigarmos as condições do contorno em que os referidos constructos teóricos
ocorrem, na perspectiva dos processos de ensino e aprendizagem, e por ser um
fenômeno social, amplia o olhar do(a) pesquisador(a) sobre as variáveis psico-
lógicas da consciência ambiental (MOREIRA; ROSA, 2013).

Reflexões finais

Adentrando o caminho do uso de métodos quantitativos na pesquisa em


Educação em Ciências, nosso estudo investigou as atitudes e conhecimentos
ambientais de estudantes brasileiros e alemães, que participaram ou não de pro-
testos ambientais, como por exemplo o FFF. Para tanto, realizou-se um estudo
com métodos quantitativos e análises estatísticas para investigar os referidos
objetos de interesse das áreas da EA e da EC. Adiciona-se, portanto, ao crescen-
te número de validações do modelo 2-MEV em diferentes idiomas e culturas.

Volume II 159
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A participação em protestos ambientais foi um fator determinante na ex-


plicação de escores elevados em valores preservacionistas e baixos escores em
valores utilitaristas. Isto é de grande importância considerando a intensidade
e relevância desses protestos desde seu início, em 2018. A mudança climática
é uma questão do nosso tempo, e é importante elucidar como estes protestos
impactam as políticas ambientais em todo o mundo. Assim, podemos entender
melhor como a sociedade civil participa para exercer seus direitos e reivindicar
ou propor agendas políticas, e avaliar estas conquistas de ação coletiva na miti-
gação das mudanças climáticas. Vale notar que os últimos anos foram marcados
por protestos on-line do FFF devido à crise da COVID-19, levantando questões
sobre se a participação aumentou e quão eficaz ela foi.

O presente estudo comparativo entre o Brasil e a Alemanha forneceu, en-


tre outros fatores, as diferenças de atitudes e níveis de conhecimentos ambien-
tais entre os estudantes desses países. O comportamento ambiental é relevante
e tem sido amplamente estudado nas últimas décadas, e esse estudo comparado
revelou, entre outros fatores, que os brasileiros poderiam se beneficiar de apren-
der mais sobre temas de sustentabilidade, dado seus escores elevados em PRE.
Finalmente, acreditamos no potencial que o Brasil possui para a elaboração e
implementação de políticas e subsídios para aumentar a proteção ambiental,
como é mais evidente na Alemanha.

Agradecimentos

O presente estudo foi financiado pela pesquisa foi financiada pela Coor-
denação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-Brasil (CAPES)-
CÓDIGO FINANCEIRO 001 e pelo Deutscher Akademischer Austauschdienst
(DAAD), bolsa individual número 57507870.

Volume II 160
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Resumo: As mudanças climáticas (MC) e suas consequências exigem ações para


sua mitigação, estimulando a sociedade debater sobre processos educativos, conhe-
cimentos e atitudes ambientais. Realizou-se um estudo para mensurar e analisar com
métodos quantitativos fatores cognitivos relacionados ao comportamento ambiental.
O presente estudo visou (1) avaliar as atitudes ambientais (AA) e conhecimentos
ambientais (CA) de estudantes brasileiros e alemães e (2) verificar se a frequência
da participação em movimentos ambientais é um fator relevante para as atitudes e
conhecimentos ambientais. Ao todo, 658 estudantes participaram do estudo, sendo
327 da Alemanha e 331 do Brasil (idade média de 25,21 ± 7,91 anos). Aplicou-se
a escala dos 2 Principais Valores Ambientais (2-MEV) e questionários com três di-
mensões dos conhecimentos ambientais. Realizaram-se análises das tendências de
distribuição e teste de Mann-Whitney. A participação nos protestos do Fridays for
Future (FFF) demonstrou relação com as atitudes ambientais, com os participan-
tes possuindo escores mais elevados em AA preservacionistas. Ainda, esses mesmos
participantes também demonstraram escores menos elevados em AA utilitaristas. O
estudo contribui para a discussão de questões metodológicas na EC e sobre o efeito
das AA e CA no comportamento ambiental.

Palavras-chave: Atitudes ambientais; Greves pelo clima; 2-MEV; Sustentabilidade;


Mudanças climáticas.

Abstract: Climate change (CC) and its consequences require actions for its miti-
gation, motivating society to debate about educational processes, knowledge, and
environmental attitudes. We conducted a study with quantitative methods to measure
and analyze cognitive factors related to environmental behavior, related issues to the
field of Science Education (SE). The present study aimed to (1) assess the environ-

Volume II 163
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mental attitudes (EA) and environmental knowledge (EK) of Brazilian and German
students and (2) verify whether the frequency of participation FF is a relevant factor
EA and EK. A total of 658 students participated in our study, 327 from Germany and
331 from Brazil (mean age 25.21 ± 7.91 years). The 2-Major Environmental Val-
ues scale and questionnaires with three dimensions of EK were applied. Descriptive
and inferential statistical analyses were performed, namely distribution trends and
Mann-Whitney test. Participation in the FFF protests showed a relationship with
environmental attitudes, with participants having higher scores in the preservation
values. Moreover, these same participants also demonstrated lower scores on utili-
tarian values. The study provides a discussion of methodological issues in SE and on
the effect of EA and EK on environmental behavior.

Keywords: Environmental attitudes; Fridays for future; 2-MEV; Sustainability; Cli-


mate change.

Volume II 164
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 7

RIO MACACO: PERCEPÇÕES


SOCIOAMBIENTAIS DE
EDUCADORES DO ENSINO
FUNDAMENTAL NO MUNICÍPIO
DE PALMEIRA DAS MISSÕES/RS
Jeferson Rosa Soares
Daniela Costa Vieira Menezes
Laura Schmidt Soares
Roselane Zordan Costella
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-6

Introdução

Diante da preocupação quanto à proteção dos bens naturais, sobretudo


em ambientes urbanos, cresce também um olhar da sociedade civil, da mídia e
do poder público quanto à manutenção e restauração desses bens naturais, sob
risco de progressiva diminuição da qualidade na vida das populações. Diversos
territórios municipais têm como objetivo, inclusive do poder público, diminuir
a degradação dos bens naturais. Entre medidas possíveis, encontra-se a pre-

Volume II 165
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

servação de áreas com alta diversidade de espécies nativas. Essas áreas verdes
que se encontram em territórios urbanos são extremamente importantes para as
cidades, pois aproximam os humanos de ambientes naturais, remetendo assim
a uma melhoria na qualidade de vida para os habitantes.

Neste contexto, encontra-se a microbacia do Rio do Macaco, situada no


sul do Brasil, incluída na bacia hidrográfica do Rio da Várzea, uma parcela da
região hidrográfica do Rio Uruguai. O Rio Macaco é a fonte mais importante de
abastecimento de água para a população do noroeste gaúcho, além de ser fun-
damental para o desenvolvimento da fauna e da flora do município de Palmeira
das Missões, Rio Grande do Sul. A parte territorial da microbacia é de cerca
3.700 hectares, com práticas associadas na área de agropecuária, preenchendo
aproximadamente dois terços dessa área, com 127 nascentes que nutrem o Rio
Macaco e, ainda, as matas ciliares entorno destas (SOARES, 2018).

Além de fornecer água potável para a região, o Rio Macaco ameniza


choques ambientais como contaminação e assoreamento do solo e da água por
meio de fertilizantes agrícolas. Em função da relevância do Rio Macaco para
o município de Palmeira das Missões foi estabelecido o Plano Diretor Partici-
pativo que instituiu a Microbacia do Rio Macaco como setor de preservação:

Zona Especial da Microbacia do Arroio Macaco, na sua localização acima


do ponto de captação de água da CORSAN, para fins de preservação am-
biental e melhoria quantitativa e qualitativa do referido manancial hídri-
co, cuja água é utilizada para o abastecimento da comunidade palmeirense
(PALMEIRA DAS MISSÕES, 2013, p. 15).  

O Plano Diretor anuncia instruções em relação à Política Ambiental Lo-


cal, de maneira constante e conjunta para promover a Educação Ambiental
(EA), para a construção e implementação de políticas públicas sustentáveis,
recuperação e defesa do meio ambiente, diminuição da poluição e depredação
do meio ambiente, preservação e saneamento dos recursos hídricos.

Volume II 166
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

No entanto, a forma que cada indivíduo em seu coletivo, tem de reco-


nhecer o ambiente ao seu redor é própria, de tal modo, que seja comum que
cada um tenha uma concepção de modo de viver diferente, assim como o seu
modo de preservar o meio ambiente. Entende-se a percepção ambiental como
a consciência do se humano em relação ao território que ele se encontra com
o objetivo de preservar. Assim, é de grande necessidade uma formação que
qualifique o saber socioambiental, ampliando as percepções socioambientais
individuais para a construção de percepções socioambientais coletivas, diante
de um mesmo território.

Cientes da importância do Rio Macaco em seu entorno, como um ambien-


te natural a ser preservado, considera-se que os espaços educativos e escolares
são os lugares de excelência para vivências em EA, pois estes têm o potencial
de valorizar o interesse dos estudantes nos fatos/espaços/problemáticas relacio-
nados ao meio ambiente. Perante o exposto, o presente texto tem a finalidade
de averiguar as concepções socioambientais de educadores em relação ao Rio
Macaco, com o intuito de desenvolver atividades voltadas para a EA.

Notas sobre a Educação Ambiental

O termo “Educação Ambiental” - EA surgiu oficialmente no ano de 1965,


durante a Conferência em Educação na Universidade de Keele, na Inglaterra,
ao longo do tempo, as preocupações presentes na crescente sociedade indus-
trial, com base em uma visão restrita à biofísica, passam a incluir o campo
social, com forte influência de movimentos pós-guerra, ocorridos na Europa.

Com o impacto do livro “Primavera Silenciosa” de Rachel Carson, em


1962, e as discussões do Clube de Roma, em 1968, iniciando as discussões in-
ternacionais importantes para as produções acadêmicas, documentos e políticas
públicas e para as vivências de Educação Ambiental no Brasil e no mundo.

Volume II 167
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1. Linha do Tempo dos Movimentos Internacionais.

Fonte: Autores (2022).

A figura 1 apresenta o fluxo dos eventos liderados pela Organização das


Nações Unidas - ONU, sobretudo a partir de sua agência para a Educação,
Ciência e Cultura (UNESCO), que tratam mais diretamente das questões de
educação ambiental. Após as primeiras reuniões do Clube de Roma, ocorreu
um progressivo crescimento do uso do termo “Educação Ambiental”, até sua
consolidação e estruturação na Agenda 21. Posteriormente, com o crescimento
do “Desenvolvimento Sustentável”, há uma mudança conceitual.

Brugger (2004), enfatiza que ao se introduzir o adjetivo ambiental à edu-


cação, se reconhece que a educação tradicional não é ambiental. Na mesma
linha de pensamento, Carvalho (2002) afirma que a educação ambiental no
Brasil está diretamente ligada aos movimentos ambientalistas e sociais que ex-
plodiram durante a Ditadura Militar (1964-1985), com uma construção que se
aproxima da macrotendência crítica da educação ambiental.

No ano de 1972 foi publicado o relatório intitulado “Os limites do cresci-


mento econômico”, e por meio de encontros e conferências com a temática de
sustentabilidade foi determinado o objetivo de buscar as causas para a questão

Volume II 168
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ambiental e apontar soluções. Nesse cenário, a ONU propõe, também em 1972,


a Conferência sobre o Meio Ambiente Humano em Estocolmo, reconhecendo
a EA como uma forma de discutir criticamente os problemas relacionados à
temática ambiental.

Nessa acepção, no ano de 1975, ocorreu a Conferência de Belgrado, or-


ganizada pela UNESCO, promovendo um encontro Internacional, o qual esta-
beleceu objetivos, conteúdos e métodos (contínuo, integrado e interdisciplinar),
para se instituir a EA no ensino formal.

A Conferência de Tbilisi, realizada no ano de 1977, definiu os rumos


da Educação Ambiental, determinando: objetivos, estratégias, características
e princípios, firmando em todos os cantos do planeta a Educação Ambiental
como elemento essencial na educação e sua incorporação nos currículos esco-
lares; enfoque na resolução dos problemas de caráter interdisciplinar, contínuo,
tendo por finalidade a compreensão do meio ambiente na sua totalidade, levan-
do em conta a interdependência dos fatores sociais, políticos, econômicos e na-
turais nas zonas urbanas e rurais; - desenvolvimento do senso crítico, aquisição
de conhecimentos, valores e a sensibilização da necessidade de se proteger e
melhorar o meio ambiente (KIST, 2010, p. 28).

No que diz respeito à Conferência das Nações Unidas celebrada em Esto-


colmo, a concepção sobre o meio ambiente está caracterizada como o conjunto
de componentes físicos, químicos, biológicos e sociais capazes de causar efei-
tos diretos ou indiretos, em um prazo curto ou longo, sobre os seres vivos e as
atividades humanas. Assim, na década de 1980 se intensificam os compromis-
sos com a EA, introduzindo cada vez mais a ideia de que o Desenvolvimento
Sustentável - DS, presente no Relatório Brundtland, de 1987, como necessário
para que não haja um comprometimento da vida das gerações futuras na terra.

Volume II 169
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Mesmo que a ideia de Desenvolvimento Sustentável e de Educação Am-


biental, tenha ocupado os mesmos espaços sem grandes contradições. Entretan-
to, a ênfase na EA coloca as relações entre o humano e o mundo como princípio
do cuidado ambiental, abrindo espaço para as fragilidades sociais presentes
nesta relação. Já o DS pauta as relações entre humanidade e ambiente a partir
dos meios de produção e consumo, com a ideia de que se pode manter a estru-
tura macroeconômica das sociedades com ajustes para a manutenção do status
quo.

Entende-se aqui que defender o meio ambiente se respalda em princípios


que discorrem sobre a defesa dos direitos humanos, a recusa ao arbítrio e ao
autoritarismo, a ampliação e a consolidação da cidadania e o aprofundamento
da democracia. De todo o exposto, o meio ambiente se constitui em um patri-
mônio da humanidade existindo uma inter-relação ligada à existência humana
e, assim, por direito pertence a todos os seres humanos. Desta forma, a im-
portância da preservação do meio ambiente cabe a todas as pessoas físicas ou
jurídicas, sendo a conscientização a principal forma de combate aos problemas
ambientais.

Nesse contexto, a sociedade como um todo deve se preocupar em dis-


cutir a temática da EA para além do DS, com o alerta de que a mobilização
social precisa se articular melhor no sentido de ampliar as discussões sobre as
soluções para o problema da degradação ambiental. Uma forma de mobilizar a
sociedade é procurar desenvolver no seio da escola uma prática de ensino que
inclua a EA, interferindo positivamente na vida dos estudantes, oportunizando
a formação cidadã consciente e crítica, para que possam intervir e atuar sobre
o meio ambiente.

A esse respeito, Carvalho (2002) assevera que a abertura política na déca-


da de 1980 proporcionou o surgimento de novos movimentos sociais, que pos-
suíram características de contestação e libertária da contracultura, articulando

Volume II 170
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

assim, algumas lutas ecológicas entre algumas instituições como movimentos


populares, Igreja da Libertação, Comunidades Eclesiais de Base por exemplo.

Discutindo sobre os atores sociais que marcaram o diálogo com a EA,


fica absolutamente claro que sua existência está ligada diretamente a uma gama
de temas significativos, do desenvolvimento à democracia, da cidadania à cul-
tura e do meio ambiente à emancipação entre outros.

Nesse ângulo, uma concepção emancipatória de EA engloba o compro-


misso de transformar a sociedade, criticando a realidade de cunho histórico à
medida que preconiza a conscientização dos estudantes a respeito das relações
de poder, proporcionando a autonomia e o exercício da cidadania. Portanto, a
EA deve enfatizar os aspectos sociais, históricos e culturais do processo edu-
cacional, valorizar o pensar dos indivíduos e articular o conhecimento com as
questões sociais.

Diversos fatores constituem o meio ambiente, como a sociedade e a edu-


cação. Um meio ambiente equilibrado é uma conquista que exige a participação
e a vigilância das pessoas que vivem em países ricos e pobres, sem restrição.
Ainda, a preocupação com a preservação do meio ambiente vai além da manu-
tenção da qualidade dos bens naturais, do combate à pobreza e ao desenvolvi-
mento da cidadania em exercício dos direitos e deveres do cidadão, permitindo
o acesso à inclusão social, por meio de programas e serviços.

Sendo assim, a EA pode ser um dos principais caminhos para se abordar


formas de manutenção saudável dos ecossistemas, visto que analisa e discute as
questões relacionadas aos problemas ambientais (RIBEIRO, 2012), ao mesmo
tempo em que relaciona a responsabilidade do ser humano enquanto pessoa
jurídica como partícipe da proteção ao meio ambiente e à melhoria das condi-
ções de vida no planeta, como também à responsabilidade jurídica por causa de
algum dano causado a esse, na construção de novas formas de viver em socie-
dade, incluindo a questão ambiental.

Volume II 171
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Como se fez o caminhar

A pesquisa foi realizada em três escolas públicas da rede municipal de


educação, no município de Palmeira das Missões/RS, em continuidade a in-
vestigação que vem sendo desenvolvida desde 2019. Para esta pesquisa foram
selecionados 40 educadores de diferentes áreas do conhecimento do Ensino
Fundamental do 6º ao 9º ano.

Como instrumento de coleta de dados foi utilizado um questionário se-


miestruturado com o objetivo de verificar o perfil de cada educador, o conhe-
cimento dos mesmos sobre as questões ambientais relativas ao Rio Macaco,
assim como a utilização sistematizada destes conhecimentos em suas práticas
docentes diárias.

Esta pesquisa possui um caráter quali-quantitativa, que no entendimento


de Schneider et al (2017, p. 570) são complementares, enriquecendo a análise e
as discussões finais. Nesta perspectiva, a pesquisa qualitativa pode ser apoiada
pela pesquisa quantitativa e vice-versa, possibilitando uma análise estrutural
do fenômeno com métodos quantitativos e uma análise processual mediante
métodos qualitativos.

A metodologia de interpretação dos dados coletados se deu por meio


da análise de conteúdo conforme Bardin (2011), utilizada para a categoriza-
ção das respostas e melhor entendimento das concepções dos participantes
da pesquisa. Essas análises permitiram estabelecer ligações entre a situação
em que o participante da pesquisa se encontra e as manifestações acerca da
temática proposta, possibilitando um olhar para além da visão sistêmica. Fo-
ram também utilizados dados matemáticos para obtenção dos percentuais e
comparação entre respostas.

Volume II 172
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O que se demonstra de Resultados

A primeira parte do questionário possibilita a construção de um perfil de


formação e atuação docente entre os participantes. A maior parte dos educado-
res é formada na área de linguagens (39,5%) e pedagogia (36,8%), além disto,
a maior parte dos educadores atua na escola Antônio Carlos Borges (65,0%).
Quanto à pós-graduação, apenas dois educadores não tinham nenhuma (5,0%)
e nove educadores não responderam (22,5%), todos os demais têm ao menos
uma especialização. Destaca-se que um educador é pós-graduado em Educação
Ambiental.

Ressalta-se, também, que os educadores têm formação específica em


áreas diversas, o que poderia qualificar uma proposta interdisciplinar a partir
do estudo coletivo da Microbacia do Rio do Macaco. A média de idade dos
educadores foi de 40 anos, variando entre 24 e 63 anos. Além disso, o tempo de
profissão apresentou uma média de 14 anos de trabalho, variando entre 2 e 31
anos de atuação.

Sobre o nível de conhecimento dos educadores a respeito do abasteci-


mento de água da região, 97,4% dos participantes sabiam que o abastecimento
de água do município se origina do Rio Macaco. Sobre a opinião a respeito
da qualidade do abastecimento, mais de 60% respondeu a opção boa e 20,5%
respondeu ótima (Tabela 3). Quando questionados sobre as propostas para a
melhoria do abastecimento da região, em pergunta aberta, a categoria mais
presente foi centrada em preservação ambiental (31,4%) seguida de propostas
centradas em reflorestamentos e outras propostas, ambas com 20% das respostas.

Volume II 173
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Tabela 1. Conhecimento sobre o abastecimento da região.

Contagem %

Conhece a origem do Não 1 2,6%


abastecimento? Sim 37 97,4%

Não respondeu 2 -

Qual é? Rio Macaco 37 100,0%

Não respondeu 3 -

não sei 1 2,6%

Como avalia a qualidade Regular 5 12,8%


do abastecimento? Boa 25 64,1%

Ótima 8 20,5%

Não respondeu 1 -

Reflorestamento 7 20,0%

Conscientização 6 17,1%
Tem proposta de
melhoria na qualidade Preservação ambiental 11 31,4%
do Rio Macaco
Ações contra a poluição 4 11,4%

Outros 7 20,0%

Não respondeu 5 -

Fonte: Autores (2022).

Mais da metade dos educadores respondeu que conhece o Rio Maca-


co (65%) e a maioria entre eles (56%) conheceu o mesmo por meio de visi-
tas. Apesar de conhecerem, a grande maioria nunca realizou atividades in situ
(75%), e aqueles que realizaram foram atividades de reflorestamento/cuidado
com a fauna (40%) ou visitas/solenidades (40%). Sobre a relação de utilização
do Rio, a maioria respondeu de forma negativa (68,4), e entre os que respon-

Volume II 174
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

deram positivamente, a maioria (70%) se referiu ao uso da água para abasteci-


mento da região.

Entrando nos objetivos deste estudo, apresenta-se a relação dos educa-


dores com o Rio Macaco. Mais da metade considera que o mesmo tem impor-
tância socioambiental para a região (66,7%), principalmente focado na questão
do papel em relação ao abastecimento de água (70%). Os maiores problemas
que afetam o rio Macaco, de acordo com os educadores, foram a poluição em
conjunto com o desmatamento ou ocupação das margens (45,7%) e a ocupação
em conjunto com o desmatamento (31,4%) (Tabela 2).

Tabela 2. Relação socioambiental do Rio Macaco com a região.

Variáveis Freq. %
O Rio Macaco tem importância socioambiental para a região
Não 13 33,3%
Sim 26 66,7%
Não respondeu 1 -
Qual a importância
Apenas abastecimento de água 28 70%
Biodiversidade e fonte de recursos naturais diversos 10 25%
Não respondeu 2 -

Na sua opinião quais os maiores problemas que afetam o Rio


Macaco

Ocupação e desmatamento 11 31,4%


Poluição, desmatamento e/ou ocupação das margens 16 45,7%
Desmatamento e matriz produtiva ou barramentos 3 8,6%
Outros 5 14,3%
Não respondeu 5 -

Fonte: Os autores (2022).

Volume II 175
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Nessa acepção, criam-se novos questionamentos acerca da ação do ho-


mem em relação ao meio em que vive, no sentido da conservação da natureza,
visando à valorização da vida. A esse respeito, Berna (2011, p.17) analisa que:
“a destruição da natureza não resulta da forma como nossa espécie se relaciona
com o planeta, mas da maneira como se relaciona consigo mesmo”. De acordo
com essa afirmação, compreendemos que, ao desmatar, queimar, poluir, utilizar
ou desperdiçar bens naturais ou energéticos, estamos destruindo o planeta e ao
mesmo tempo minando a possibilidade da nossa existência futura. Quando bus-
camos a promoção de novas posturas benéficas em relação ao meio ambiente,
estamos pensando numa forma de garantir a nossa existência no planeta terra.

Nesse sentido, a EA se institui como instrumento para exercitar a cida-


dania e transformar a sociedade. Para tanto, precisamos levar em conta três
fatores que embasam a concepção da educação como instrumento de ligação
entre a questão ambiental e a formação de pessoas críticas e emancipadas. En-
tre elas podemos citar: discutir de forma democrática os meios para enfrentar a
crise ambiental; criar e efetivar políticas públicas que conscientizem acerca da
responsabilidade coletiva em torno da questão ambiental e compreender que se
vive em uma crise socioambiental (JACOBI, 2003).

Todavia, reconhecemos que cada pessoa ou grupo social pode ter a sua
própria representação ou trajetória. O que é inadmissível é que as pessoas se
livrem do poder da criticidade e reproduzam discursos e práticas orientadas
para uma desmobilização da EA como gestão ambiental ou somente como uma
prática educativa qualquer. Atualmente, até orientações para modificar sua es-
trutura nominal vêm sendo feitas, como “educação para o desenvolvimento
sustentável”.

O comprometimento com o meio ambiente está recomendado por todas


as conferências internacionais, estando previsto na Constituição da República

Volume II 176
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Federativa do Brasil de 1988. Em seu artigo 225º, determina-se que cabe ao


poder público conscientizar a sociedade para a preservação do meio ambiente,
o que poderá acarretar profundas e contundentes mudanças no setor industrial,
promovendo uma mudança de comportamento que pode levar também ao apa-
recimento de consequências sociais positivas.

Apenas 14 dos 40 educadores, menos de 40%, afirmaram sentir-se pre-


parados para trabalhar com a EA e, quando questionados sobre como se autoa-
valiavam a respeito do conhecimento sobre EA, quase metade dos educadores
responderam itens não específicos à mensuração de seu conhecimento. Apenas
um educador se autoavaliou com muito conhecimento sobre o tema.

Quando questionados sobre a maneira como esse conteúdo é descrito ou


trabalhado, 40% dos educadores não sabiam ou não recordavam como o con-
teúdo era proposto. Entre os educadores que tinham conhecimento, a maioria
(20%) se referia a ensino de hidrografia e EA. Além disso, 68,4% dos educa-
dores afirmaram que este trabalho foi principalmente focado no cuidado com o
meio ambiente onde os alunos vivem.

A grande maioria dos educadores relatou que sua escola não tem ativida-
des de EA com relação ao Rio Macaco (84,2%). Nas escolas onde existem ati-
vidades realizadas no Rio, as visitas e intervenções são focadas em atividades
(como plantio de árvores), ambas com 40% das respostas.

A EA está recomendada por todas as conferências internacionais, estando


prevista na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Em seu
artigo 225, assevera que cabe ao Poder Público promover a EA em todos os
níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio am-
biente. Devemos buscar por uma EA que se adapte à realidade brasileira, na
perspectiva da diversidade cultural e biológica, devendo ser capaz de criticar os
modelos importados da sociedade industrial (SATO, 2004).

Volume II 177
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Refletindo acerca da EA nas escolas brasileiras, e seguindo o que defende


a Política Nacional da Educação Ambiental - PNEA, essa temática deveria es-
tar integrando-se às áreas de forma transversal visando permear toda a prática
educativa e ao mesmo tempo, criar uma visão global da questão ambiental à
medida que inclui os aspectos físicos e histórico-sociais, como também as arti-
culações entre a escala local e do planeta de um modo geral.

Ao abordar a EA de forma transversal e interdisciplinar, busca-se disse-


minar nas escolas a transformação dos conceitos, transformando e edificando
os valores sobre o meio ambiente e incluindo procedimentos conectados à re-
alidade cotidiana da sociedade, assim como pensarmos em ações políticas de
forma coletiva como alternativas para minimizar a degradação ambiental des-
sas realidades.

Nesta linha, deve-se ter clareza do papel da escola enquanto promotora


das oportunidades para que os alunos atuem na realidade e possam modificá-la
por meio de práticas coerentes e democráticas, independentes de suas condi-
ções física e/ou intelectual. A escola deve ser de todos e abarcar todas as pesso-
as por meio da produção do conhecimento. Ressalta-se que a EA se fundamenta
no princípio da interdisciplinaridade.

As ideias em defesa de uma educação interdisciplinar surgiram na Euro-


pa, especialmente na França e Itália, em meados da década de 1960, época em
que eram fortes as reivindicações por um novo modelo de escola e de univer-
sidade em que ensino e pesquisa pudessem ser concebidos de uma forma mais
integrada. Rejeitam-se os currículos que privilegiavam a especialização e o
conhecimento fragmentado e desconectado do cotidiano.

Assim, iniciou-se um movimento em favor da interdisciplinaridade em


que vários teóricos contribuíram com suas ideias, com um projeto que previa a

Volume II 178
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

diminuição da distância entre as ciências humanas. Ali, já se começava a ques-


tionar as barreiras entre as disciplinas, suas fronteiras e limitações e as subdivi-
sões das áreas de conhecimento do currículo no saber tradicional.                                              

A interdisciplinaridade pressupõe mais do que a interação entre duas ou


mais disciplinas, pretende superar a fragmentação do conhecimento e para tan-
to necessita de uma visão de conjunto para que se estabeleça coerência na ar-
ticulação dos conhecimentos. Para que se obtenha essa noção de conjunto é
necessário que os educadores de diferentes áreas de conhecimento se engajem
com o objetivo de facilitar o diálogo entre os conteúdos estudados sistematica-
mente e o cotidiano dos discentes. Nesse contexto, os educadores envolvidos
em um projeto interdisciplinar devem se envolver em um diálogo permanente
entre as disciplinas, compartilhando ideias acerca dos diferentes conteúdos e
atitudes a serem tomadas.

Os docentes engajados em projetos interdisciplinares precisam ter em


mente que o conhecimento produzido a partir de tais práticas é sempre reali-
zado com diferentes partes, com muitas forças por meio de um projeto edu-
cacional atuante com intencionalidade articulada com as questões históricas
relativas a existência humana.

Portanto, para que exista um trabalho docente interdisciplinar deve-se


pensar num projeto educacional que articule as disciplinas envolvidas na grade
curricular. A escola, para continuar sendo legitimamente o lugar do ensino-
-aprendizagem, terá que se adaptar e acompanhar as exigências que as práticas
interdisciplinares pressupõem. Dentre elas destaca-se uma metodologia em que
o aluno interaja com os conhecimentos a partir da sua contextualização e pro-
blematização, dialogando com sua própria realidade.

Embora haja um interesse institucional em favorecer a interdisciplina-


ridade, ainda são limitadas as iniciativas nesse sentido. Nas Universidades e

Volume II 179
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

nas Escolas de Educação Básica, os modelos disciplinares e a estrutura dos


currículos são desconectados, imperando a lógica funcional e racionalista para
formação dos quadros técnicos e pedagógicos. Também é notável a resistência
dos educadores, que teimam em se entrincheirar defendendo, cada um, a rele-
vância de suas disciplinas.

Portanto, é necessário integrar o que sempre foi aprendido separadamen-


te, religar o que foi desconectado, problematizar o que sempre foi dogmatizado
e questionar o que sempre foi tido como um saber pronto. Conectar os saberes
e, como ressalta Gadotti, Barcelos (1993), ensinar e aprender com sentido, ga-
rantir a construção de um conhecimento globalizado, rompendo com as fron-
teiras das disciplinas.

As discussões iniciais apontam que deve haver uma rigorosa análise da


realidade dos alunos aos quais se destina a integração dos conteúdos, no sentido
de atenderem às suas necessidades de formação escolar. Também é de extrema
importância uma reorganização do currículo e da oferta das disciplinas, assim
como a revisão dos processos de ensino e aprendizagem, incluindo as metodo-
logias de ensino e avaliação, a carga horária, e questões como as condições que
a instituição dispõe para a o acolhimento dos alunos.

Assim, entende-se que o educador, precisa estar atento a planejar suas ati-
vidades de forma criativa num movimento de ação-reflexão-ação para que uma
postura interdisciplinar seja atingida de forma gradual em sala de aula como
também em conjunto com os educadores parceiros.

Os educadores que se propõem a trabalhar com interdisciplinaridade pre-


cisam, antes de tudo ter consciência de que, além de uma sólida formação na
sua área de conhecimentos eles necessitam se apropriar dos saberes de outras
áreas, para poder oferecer um ensino de qualidade (THIESEN, 2008). Ao mes-

Volume II 180
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mo tempo, isso não significa que o conhecimento especializado, sistemático,


analítico deixe de ter importância, cabendo ao educador o papel de guia na
sua reconstrução a fim de favorecer a aprendizagem dos seus alunos. Por fim,
é oportuno observar que os educadores sozinhos, sem o devido suporte peda-
gógico e institucional, não conseguirão mudar as concepções de ensino, secu-
larmente instituídas, mas cabe a eles dar os primeiros passos. Outra forma de
trabalhar a EA é por meio da elaboração de Projetos problematizadores.

O escopo do projeto é criado em forma de desafio ao educador, procuran-


do desenvolver a visão crítica e sistêmica de processos, a criatividade, a busca
de novas alternativas, o empreendedorismo e a capacidade de interpretar o mer-
cado e identificar oportunidades, a gestão, o planejamento, além das condições
para o autoconhecimento e avaliação. Essas relações diretas com os processos
de ensino e aprendizagem dizem respeito à leitura de mundo, conscientização
crítica e a ação no sentido de transformar a partir da contextualização da reali-
dade (FREIRE, 2007).

Sendo assim, se utiliza a imagem ressignificada por meio de uma palavra


geradora, criando um vínculo entre a imagem, o vocábulo e as experiências vi-
vidas pelos alunos. Por meio dessa relação, se criam novas palavras que dão ao
estudante uma consciência crítica. Os projetos permitem o acompanhamento
do desenvolvimento das competências e podem estar representados através de
pesquisas, estudos de caso, desenvolvimento de projetos de intervenção, simu-
lação na implementação de projetos, estudos técnicos.

Algumas Conclusões

A inclusão da EA na escola pode ajudar na análise e discussão sobre os


problemas ambientais, relacionando a responsabilidade do ser humano, indivi-
dual e coletivamente, no contato com os ambientes diante de diferentes afaze-

Volume II 181
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

res diários. Portanto, ao se abordar o Rio Macaco como forma de problematizar


a formação continuada de educadores e suas práticas escolares, contribui-se
para a formação de uma consciência ambiental.

Em complemento ao presente trabalho, se destaca a formação continuada


onde os educadores foram convidados a fazerem um curso em que o Rio Ma-
caco é o tema central em diferentes aspectos socioambientais na relação com
as realidades destes educadores. O Rio Macaco pode ser discutido pelos parti-
cipantes de forma interdisciplinar, envolvendo predominantemente as áreas e
disciplinas que os mesmos lecionam nas escolas com conteúdos relacionados
á EA, demonstrando que há uma preocupação com os problemas socioambien-
tais que o Rio apresenta para a qualidade de vida de todos.

A presente pesquisa demonstra que o Rio cumpre diferentes funções,


inclusive social muito importante, alterando a vida dos munícipes de forma
representativa. No entanto, os educadores destacam que o Rio Macaco vem
sofrendo modificações constantes pela ação do homem e problemas oriundos
dessa relação se apresentam tais como: agricultura tomando conta de suas mar-
gens, infertilidade do solo, falta de preservação de suas matas ciliares entre ou-
tros. Por isso é importante que os problemas de toda comunidade escolar sejam
trabalhados pelos educadores em suas práticas de sala de aula por meio da EA
e cursos de formação continuada dos profissionais da Educação como um todo
possam ser ofertados em parcerias entre diferentes Instituições.  

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Resumo: O meio ambiente precisa ser cuidado, considerando a importância dos ele-
mentos naturais para a sobrevivência humana e manutenção da vida. Nesse contexto,
a educação ambiental busca oportunizar o respeito à sustentabilidade ambiental, so-
cial, ética, econômica e política. Este texto tem como objetivo identificar as percep-
ções ambientais de educadores a partir de seus conhecimentos e prática relacionada
ao Rio Macaco, em escolas municipais de Palmeira das Missões/RS. A pesquisa foi
realizada em três escolas, contando com a participação de 40 educadores de dife-
rentes áreas do conhecimento. Para coleta de dados foi aplicado um questionário
semiestruturado, em que as respostas abertas foram analisadas por meio da Análise
de Conteúdo. Como principal resultado, foram observados que o Rio Macaco não
é abordado nas práticas pedagógicas dos docentes participantes, os quais possuem
percepções conservacionistas sobre a questão ambiental.

Palavras-chave: Concepções Ambientais; Educação Ambiental; Práticas Docentes.

Volume II 184
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 8

ENSAIO SOBRE
APRENDIZAGEM BASEADA
EM PROJETOS – ABP
Eduardo Pastorio
Rafael Scheffer
Edimar Fonseca
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-7

Introdução

Este trabalho é um ensaio que tem como objetivo apresentar a metodo-


logia “Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP)”, também denominada de
“Project Based Learning (PBL)”, considerado no cenário educacional contem-
porâneo como Metodologia Ativa e como práticas de ensino mais promissores
do Século XXI.

Este método de ensino contribui no processo de ensino e aprendizagem


dos alunos, através do estímulo à investigação, pesquisa e resolução de proble-
mas, onde os sujeitos são desafiados a trabalharem como questões e problemas
reais, planejar e criar soluções, e apresentar resultados significativos para o
enfrentamento do proposto.

Volume II 185
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A participação ativa dos estudantes na resolução dos projetos, torna os


conteúdos mais atrativos, contribuindo na estimulação para a aprendizagem
e consequente melhoria nos desempenhos individuais e coletivos. Destaca-
mos ainda as diferenças conceituais entre Aprendizagem Baseada em Projetos
(ABProj) e Aprendizagem Baseada em Problemas (ABProb).

A complexidade que envolve pensar o conceito de educação, exige es-


forços de diferentes agentes em encontrar estratégias adequadas para atender o
objetivo do setor educacional, de desenvolver o processo de ensino e de apren-
dizagem entre as instituições de ensino e seus estudantes (crianças, jovens e
adultos), da Educação Básica ao Ensino Superior.

Nesse sentido surgem as Metodologias Ativas, que consistem em uma


série de métodos de ensino criados e executados de maneira a incentivar que os
estudantes aprendam de forma autônoma, investigativa, democrática e partici-
pativa. Nessas metodologias, os estudantes encontram-se no centro do processo
de aprendizagem, com participação ativa e responsável na construção do co-
nhecimento e na resolução dos problemas/projetos.

De maneira geral, o ensino tradicional tem como base o aluno recebendo


conhecimento de forma passiva, com a centralidade no professor como respon-
sável pelo processo de ensino e detentor do conhecimento. Nas metodologias
ativas, o processo é invertido, com o professor atuando como mentor, facili-
tador e mediador, porém com a centralidade no aluno como sujeito da apren-
dizagem. Essas metodologias proporcionam uma participação mais ativa dos
alunos, com métodos dinâmicos e linguagem próxima à realidade deles.

A Figura 1 retrata a Pirâmide de Aprendizagem proposta por William


Glasser (1986), que entre outros aspectos, descreve que o contato com o pro-
cesso de ensino proposto pelos professores, pode facilitar como os alunos re-
cordam porções variadas do conteúdo abordado em aula, ou seja, quando se
utiliza métodos de aprendizagem mais passivos, a aprendizagem é menor, do
que quando faz uso de métodos mais ativos.

Volume II 186
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1. Pirâmide de Aprendizagem de William Glasser.

Fonte: Glasser (1986).

Para o contexto da educação, a Pirâmide de Aprendizagem demonstra


a necessidade de criar estratégias pedagógicas de promoção de aprendizagem
significativa, a partir de métodos mais ativos. Nessa concepção que surgem as
Metodologias Ativas, sendo uma série de propostas metodológicas que centra-
liza no aluno o processo de aprendizagem, como podemos citar: Gamificação,
Aprendizagem Baseada em Problemas, Sala de Aula Invertida (Flipped Clas-
sroom), Ensino Híbrido, Aprendizagem entre Pares (Peer-Instruction), Apren-
dizagem Baseada em Times (Team-Based Learning – TBL) e, a base deste en-
saio, Aprendizagem Baseada em Projetos (Project Based Learning).

A Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP), também denominada de


Project Based Learning (PBL), é constituída como Metodologia Ativa no cená-
rio educacional e vem contribuindo no enfrentamento aos desafios do processo
de ensino e aprendizagem nas instituições de ensino, proporcionando maior
participação dos alunos durante o processo de aprendizagem.

Volume II 187
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O Buck Institute for Education (2008) define ABP ou PBL como “um
método de ensino no qual os alunos aprendem se engajando ativamente em
projetos do mundo real e pessoalmente significativos” e reforça que “os alunos
adquirem conhecimento e habilidades trabalhando por um longo período de
tempo para investigar e responder a uma questão, problema ou desafio autênti-
co, envolvente e complexo”.

Para Bender (2014, p.15), “A ABP pode ser definida pela utilização de
projetos autênticos e realistas, baseados em uma questão, tarefa ou problema
altamente motivador e envolvente”, com a finalidade de “ensinar conteúdos
acadêmicos aos alunos no contexto do trabalho cooperativo para a resolução de
problemas”. Ainda na perspectiva de Bender, a ABP deve envolver a participa-
ção ativa dos alunos na escolha e planejamento do projeto, na pesquisa e coleta
de informações, na criação de soluções e na apresentação dos resultados. Para
isso, é necessário estabelecer metas claras e objetivas, permitindo que os alunos
tenham um papel ativo na construção do conhecimento, além de adaptar o pro-
jeto para as necessidades individuais dos estudantes. Através da ABP, os alu-
nos desenvolvem habilidades sociais, cognitivas e emocionais, além de terem
a oportunidade de aplicar conceitos teóricos em situações práticas, tornando a
aprendizagem mais significativa e relevante para suas vidas.

Aprofundamento teórico

A metodologia de Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP) abordada


por John Dewey (1859-1952), filósofo e pedagogo norte-americano, sendo re-
ferência no campo da educação moderna. Dentro de sua concepção, defendeu
a capacidade de pensar dos alunos mediante o aprender a fazer e foi ganhando
espaço em universidades de ciências aplicadas, devido à necessidade de os es-
tudantes desenvolverem inúmeras habilidades para a vida profissional.

Volume II 188
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Nesta perspectiva a Aprendizagem Baseada em Projetos (ABP) tem ga-


nhado destaque na área da educação por seu potencial de engajar e motivar os
alunos no processo de aprendizagem, onde segundo Dewey (1938), a aprendi-
zagem é um processo ativo que se desenvolve a partir de situações problemáti-
cas e desafiadoras que exigem a reflexão e a busca por soluções. Nesse sentido,
a ABP propõe a realização de projetos que envolvam investigação, pesquisa e
resolução de problemas reais, estimulando a participação ativa dos alunos na
construção do conhecimento, através da ABP, os alunos são desafiados a traba-
lhar em equipe, a desenvolver habilidades de comunicação e a aplicar conceitos
teóricos em situações práticas, o que contribui para o desenvolvimento de com-
petências essenciais para a vida.

Esta “ideia de trabalhar com projetos como recurso pedagógico na cons-


trução de conhecimentos remonta ao final do século XIX, a partir de ideias
enunciadas por John Dewey, em 1897” (BARBOSA; MOURA, 2013, p.61).
Em suas produções, Dewey (1958 e 1959) buscou valorizar, questionar e con-
textualizar como os alunos seriam capazes de adquirir conhecimentos e identi-
ficou que seria através de situações problema em forma de projetos, relaciona-
dos com os conteúdos curriculares.

Destaca-se que “A natureza do problema a resolver determina o objetivo


do pensamento e este objetivo orienta o processo do ato de pensar” (DEWEY,
1979, p.63). Dewey ainda reforça que a ABP parte da ideia de aluno ativo no
processo de construção do conhecimento, e que busca a resolução de proble-
mas complexos e reais, através de planejamento e ações dinâmicas e profundas
(DEWEY, 1958; 1959).

Talvez possamos refletir que a ABP tem a finalidade de promover o prin-


cípio da autonomia, onde os alunos sejam capazes de pensar, definir priorida-
des, interesses e objetivos, sendo no contexto da educação, capaz de pesquisar

Volume II 189
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

o tema abordado pelo projeto a ser desenvolvido e que perceba, entre outros
aspectos, que vale a pena aprender (MOURSUND, 1999).

Considerando este método, Barbosa e Moura (2013, p.51) define “quanto


à tipologia, os projetos podem ser do tipo intervenção, desenvolvimento, pes-
quisa, ensino e aprendizagem”. Os cinco tipos citados trata-se da classificação
geral entre os vários tipos de projetos que ocorrem na área educacional, que são
classificados pela finalidade principal ou atividade predominante do projeto.
Porém os projetos educacionais citados não são trabalhados de forma isolada,
excludentes, podendo haver situações que podem ocorrer de forma integrada/
articulada.

Além disso, Barbosa e Moura (2013, p. 63) estabelecem que os projetos


podem ser classificados em três categorias, da seguinte forma:

1 - PROJETO CONSTRUTIVO: “tem em vista construir algo novo, in-


troduzindo alguma inovação, propor uma solução nova para um problema ou
situação. Possui a dimensão da inventividade, seja na função, na forma ou no
processo”.

2 - PROJETO INVESTIGATIVO: “destina-se ao desenvolvimento de


pesquisa sobre uma questão ou situação, mediante o emprego do método cien-
tífico”.

3 - PROJETO DIDÁTICO (ou EXPLICATIVO): “procura responder


questões do tipo: “Como funciona? Para que serve? Como foi construído?”
Busca explicar, ilustrar, revelar os princípios científicos de funcionamento de
objetos, mecanismos, sistemas etc”.

O importante no uso deste método, encontra-se na escolha do problema


a ser resolvido e na participação do professor, que deve orientar o processo de
planejamento, acompanhando o trabalho de investigação. Todos os espaços de

Volume II 190
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

interações entre alunos e professor devem ser significativos, conduzindo para o


aprofundamento do tema selecionado e resolução dos problemas encontrados.

Considerando algumas experiências para o desenvolvimento de projetos


como método de ensino e aprendizagem, podemos citar as diretrizes considera-
das como fundamentais nesse processo, proposto por Barbosa e Moura (2011):

- definir o tema a ser pesquisado, a partir da relação entre alunos e profes-


sores.
- definir o período de realização do projeto, com cronograma organizado
para sua realização.
- realizar os projetos com o número específico de participantes, de acordo
com o tema selecionado.
- possuir objetivos claros e finalidade real nos projetos.
- utilizar múltiplos recursos no decorrer do projeto.
- socializar os resultados em diferentes níveis e lugares/espaços.

Considerando Buck Institute for Education (2021, p.14), “os alunos tra-
balham em um projeto por um longo período de tempo [...] que os envolve na
solução de um problema do mundo real ou na resposta a uma pergunta comple-
xa”. Por fim, “como resultado, os alunos desenvolvem um conhecimento pro-
fundo do conteúdo, bem como pensamento crítico, colaboração, criatividade
e habilidades de comunicação”, liberando “uma energia contagiante e criativa
entre alunos e professores”.

Para contribuir sobre a importância dos projetos para o desenvolvimento


da aprendizagem, apresentaremos a Estrutura para Aprendizagem Baseada em
Projetos de Alta Qualidade, disponível no site da High Quality Project Based
Learning (HQPBL) e no documento intitulado de “Un Marco para el Aprendi-
zaje de Alta Calidad Basado en Proyetos”, que estabelece a seguinte estrutura:

1 - DESAFÍO Y LOGRO INTELECTUAL (DESAFIO INTELECTUAL E


REALIZAÇÃO): “Los estudiantes aprenden en profundidad, piensan críti-
camente y persiguen la excelencia”.
2 - AUTENTICIDAD (AUTENTICIDADE): “Los estudiantes trabajan en
proyectos que son significativos y relevantes para su cultura, sus vidas y
su futuro”.

Volume II 191
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

3 - PRODUCTO PÚBLICO (PRODUTO PÚBLICO): “El trabajo de los


alumnos se muestra públicamente, se discute y se critica”.
4 - COLABORACIÓN (COLABORAÇÃO): “Los estudiantes colaboran
con otros estudiantes en persona o en línea y/o reciben orientación mento-
res y expertos adultos”.
5 - GESTIÓN DE PROYECTO (GERENCIAMENTO DE PROJETOS):
“Los estudiantes definen un proceso de gestión del proyecto que les permi-
te trabajar en el mismo de forma efectiva del principio al final”.
6 - REFLEXIÓN (REFLEXÃO): Los estudiantes reflexionan sobre su tra-
bajo y su aprendizaje a lo largo del proyecto”.

A HQPBL é baseada na experiência e pesquisas de diversos professores


pelo mundo. O PBL de alta qualidade, como também é conhecida, descreve
o PBL em termos da experiência do aluno e tem como objetivo fornecer aos
educadores uma base compartilhada para projetar e implementar projetos de
qualidade.

Termos presentes da ABP

Alguns termos são frequentemente utilizados na ABP, conforme Ben-


der (2014) estes, que também podemos chamar de elementos de uma ABP,
são instrumentos de exequibilidade das propostas, e auxiliam na construção de
projetos que utilizem ABP. Estes termos, além de oferecer um caminho para
aplicação da ABP, constituem também uma forma orientadora que facilita a
construção e fornece subsídio à implementação desta metodologia.

Entre os termos presentes na ABP temos a âncora, este elemento procura


estabelecer uma relação prática entre o mundo concreto e a aprendizagem. Não
se trata de uma contextualização, mas sim, de um elemento substancial que
fornece materialidade ao processo de ensino-aprendizagem, de forma ampla,
delimitando e oferecendo um caminho para o desenvolvimento da ABP.

A âncora pode consistir em um ou mais materiais com uma diversidade


de recursos como por exemplo: vídeos, textos de jornais, revistas, materiais vir-

Volume II 192
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tuais ou um discurso. Ela pode conter uma questão inquietante ou uma reflexão
que estabeleça esta natural orientação para o desenvolvimento do projeto e que
proporcione o espírito investigativo entre os alunos.

Outro elemento presente na ABP são os artefatos, estes itens são resul-
tado do progresso dos trabalhos desenvolvidos ao longo do projeto e podem
representar uma ou diversas respostas ao problema proposto. Em geral estes
artefatos se encaixam como uma mostra real e concreta, presente na realidade
dos alunos.

Além do mais, os artefatos são o acompanhamento do progresso do pro-


cesso de aprendizagem e estão ligados diretamente ao progresso das investiga-
ções e as elaborações das respostas. Estes são permeados de materialidade, não
sendo exclusivamente um produto textual, mas compreende um universo de
possibilidades podendo ser até mesmo oriundas do universo digital.

Temos ainda o elemento chamado de desempenho, este se constitui em


oferecer as respostas que os envolvidos esperariam receber do mundo real. Ha-
verá um confronto de ideias, entre o que se construiu e o que realmente aconte-
ce na realidade, este embate de propostas pode levar a novas discussões e posi-
cionamentos quanto à realidade contribuindo para construção de um indivíduo
crítico e consciente.

Temos ainda, o processo de brainstorming que se configura como ele-


mento importante para o desenvolvimento de um projeto, onde segundo Boro-
chovicius e Tortella (2014, p. 274) “compreende o processo de chuva de ideias
onde se pode usar conhecimentos prévios e senso comum próprios”. Onde se
tenta formular o maior número possível de explicações para uma questão pro-
posta.

Outro elemento que pode ser destacado é a questão motriz, ela deve
estar clara pois, é o que podemos denominar como o centro do projeto, ela for-

Volume II 193
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

nece a linha diretiva da pesquisa. E consequentemente deve ser inquietadora


e motivadora, que desperte a curiosidade ou o anseio pelo trabalho. A questão
motriz é a tarefa em si, ou seja, a questão que precisa ser respondida.

Além desses elementos, temos ainda a aprendizagem expedicionária,


que funciona como uma espécie de oportunidade de conhecer a realidade de
forma sensitiva, onde se pode experienciar o projeto, para Bender (2005) nem
sempre os projetos de ABP contemplam a aprendizagem expedicionária, no
entanto, este tipo de projeto é enriquecedor para o processo de aprendizagem
dos alunos.

É importante ainda, destacar o papel da voz e escolha do aluno, pois,


como parte de sua aprendizagem, estes devem possuir o direito de decisão o
que contribui também para o desenvolvimento de sua autonomia. O tipo de
metodologia desenvolvida pela ABP procura construir um ambiente onde o alu-
no “aprenda a aprender”, Demo (1996), por meio da pesquisa e da autonomia,
portanto, este indivíduo precisa ter voz no seu processo de aprendizagem, e
além do mais, é preciso valorizar a pesquisa desenvolvida a partir de suas ex-
periências e vivências.  

Há também uma relação com a web 2.0, sendo que este termo nos per-
mite compreender o espaço mais amplo, onde o desenvolvimento da ABP pode
ser alavancado pelos inúmeros recursos tecnológicos disponíveis, onde por
meio da colaboração é possível superar os limites impostos pelo tempo e es-
paço, aumentando o rendimento do trabalho. Além disso, os alunos possuem a
possibilidade de criar propostas e testá-las das mais diversas formas, abrindo
oportunidade para desenvolvimento de novas pesquisas em espectros ainda não
estudados ou direcionados pela questão norteadora, esta abertura de horizonte é
oportunizada por intermédio do uso dos recursos digitais.

Volume II 194
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Outro aspecto desenvolvido por intermédio da colaboração com recursos


digitais é a capacidade de tomada de decisão coletiva. Para esse tipo de ativi-
dade, o pensamento coletivo precisa ser construído e deve ser assumido com
intuito de deliberar sobre o problema a ser respondido. Torna-se necessário o
papel do professor como mediador na organização deste processo, proporcio-
nando a relação direta entre alunos, tecnologia e aprendizagem.

O ensino baseado em ABP possui em sua gênese uma profunda e espessa


tessitura com a pesquisa, pois esta torna-se um veículo do processo de aprendi-
zagem ao longo do projeto. Além do que, durante a ABP surgem questões que
precisam ser respondidas bem como, elementos que precisam ser estudados,
além do mais é preciso prototipar e discutir os resultados obtidos.

Todos os elementos destacados por Bender (2014) dão conta de organizar


e facilitar a identificação destas práticas durante a execução de uma ABP, além
de oferecer uma flexibilidade para práticas enriquecedoras como às experimen-
tadas pelos alunos que usufruem de uma aprendizagem expedicionária.

Tecnologias e a ABP

O uso das tecnologias digitais pode colaborar com o ensino baseado na


metodologia de ABP. Quando se tratou do termo web 2.0, algumas questões
envolvendo o uso de tecnologias foram abordadas, no entanto, existem ainda
outras perspectivas que não foram apontadas neste trabalho e que precisam ser
abordadas.

As tecnologias digitais estão no centro da atual revolução tecnológica, e


em um mundo onde as mudanças ocorrem em um ritmo cada vez mais frenéti-
co, principalmente devido ao uso dessas tecnologias, o ensino baseado em ABP
pode contar com estes recursos para amplificar sua aplicação, contribuindo para
um aumento da produtividade, de forma que os projetos possam acompanhar as

Volume II 195
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mudanças do mundo, evitando que a aprendizagem proporcionada pelos proje-


tos esteja desconectada da realidade contemporânea.

Além disso, o uso dos recursos tecnológicos associadas ao ensino basea-


do em ABP pode colaborar para diminuir a discrepância entre a forma como
a escolarização é proposta e o uso da tecnologia e dos procedimentos educa-
cionais, pois o uso do aparato tecnológico por parte da ABP implica em um
rompimento com a didática reprodutivista que projeta sobre o uso da tecnolo-
gia o mesmo uso tradicional dos antigos métodos instrucionistas, evitando o
que Demo (1996, p.54) sugere ao descrever que: “o trágico disso tudo é que as
tecnologias em educação são mais facilmente encurraladas em procedimentos
instrucionistas e que, consequentemente, enredam-se em trambiques encurta-
dos, atalhos duvidosos”.

Além disso, o ensino de ABP, pode usar a tecnologia para estender o


processo de pesquisa e de construção, evidenciando o que Moran (2015, p. 99)
enfatiza: “a escola pode estender-se fisicamente até os limites da cidade e vir-
tualmente até os limites do universo”. A capacidade de vencer a distância com-
põem uma característica irrevogável do uso dessa tecnologia, isto ficou mais
evidente, e fisicamente concreto quando no ano de 2020 surgiu a necessidade
de suspensão das aulas presenciais em escolas e universidades devido a pande-
mia causada pelo novo coronavírus, sem uma perspectiva de retorno às aulas,
o ensino mediado por tecnologia tornou-se a única ferramenta para manter o
vínculo entre estudantes e as instituições.

No entanto, isto não se restringe somente às instituições de ensino, um


grande número de empresas que se viram obrigadas a adotar o trabalho remoto,
observaram que os setores de P&D, conseguiram de forma remota desenvolver
seus projetos e ampliar seus processos produtivos, associando o uso da tecno-
logia ao desenvolvimento de projetos para viabilizar a continuidade das ações
empresariais.

Volume II 196
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

É preciso também destacar que o uso tecnologia, no caso da ABP, contribui


para o desenvolvimento de diversas habilidades como a inserção do aluno no
mundo investigativo, a necessidade de trabalhar de forma colaborativa, onde:  
[...] los alumnos logran comunicarse aun fuera del horario de clase sin te-
ner que concurrir a clases de consulta, pueden compartir puntos de vista
con compañeros de clase, y llevar a cabo trabajos en grupo. (SCAGNOLI,
2000, p. 2)

Este processo de colaboração fortalece a perspectiva de sociedade e


constrói a capacidade de superação de dificuldades advindas da aprendiza-
gem colaborativa, e da necessidade do desenvolvimento da autonomia e da
disciplina, além de estimular os debates e consequentemente reforçar a for-
mação de sujeitos críticos e ativos como cidadãos.

Aspectos na elaboração da ABP

Este segmento do texto foi redigido seguindo as discussões de Bender


(2014, p.25), que apresentam alguns componentes fundamentais para a ABP.
Pensar o trabalho pedagógico em sala de aula utilizando de projetos tornou-se
sinônimo de educação contemporânea e de aprendizagem significativa. Porém,
das práticas pedagógicas com o uso de projetos, os teóricos e proponentes da
abordagem de ensino indicam que nem todos podem ser considerados como
exemplos de ABP.

De qualquer forma, o uso de projetos deve ser incentivado no contexto


educacional, proporcionando o espírito investigativo entre alunos. O importan-
te é que, segundo Larmer e Mergendoller (2010), nessa abordagem os alunos
devem perceber que o projeto é significativo de forma individual para cada um
deles e, assim, buscar o máximo do seu envolvimento.

Em síntese, Bender (2014) apresenta uma série de aspectos, em discussão


com outros autores, que corroboram no planejar e incentivar as práticas de ABP

Volume II 197
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

no contexto pedagógico, como podemos observar:

- questão de pesquisa autêntica;


- questão orientadora e motivadora aos alunos;
- tarefa desafiadora e complexa;
- tarefa do mundo real;
- definição de papéis claros entre os alunos;
- atenção para incluir todos componentes e/ou atividades necessárias ao
projeto;
- apresentar o tema em diferentes abordagens aos alunos;
- trabalho colaborativo entre os alunos;
- trabalho de planejamento e de organização entre os alunos;
- projetos extensos e em longos prazos;
- diversas soluções possíveis e complexas.

Um grande desafio pensar ABP nas escolas. Porém, a inserção dos princí-
pios de investigação e planejamento, favorece e incentiva a adoção de práticas
organizacionais e metodológicas nas escolas. Isso contribuirá no processo de
ensino e aprendizagem dos alunos que, de forma inovadora, favorecerá a cons-
trução de novos conhecimentos.

Aprendizagem Baseada em Projetos (ABProj) e a


Aprendizagem Baseada em Projetos (ABProb)

Nesses últimos anos, outros termos foram sendo utilizados para definir
essa abordagem de ensino, incluindo: aprendizagem baseada em problemas,
aprendizagem investigativa, aprendizagem autêntica, e ainda aprendizagem
por descoberta.

Porém, ainda existem dúvidas sobre as diferenças entre Aprendiza-


gem Baseada em Projetos (ABProj) e a Aprendizagem Baseada em Projetos
(ABProb). Para que não ocorram dúvidas entre os tipos de metodologias ativas,
abaixo trouxemos uma tabela que diferencia os métodos, estruturada por Bar-
bosa e Moura (2013).

Destaca-se que, em temos gerais, ABPProj apresenta as seguintes dife-


renciações e relevâncias, em relação a ABPprob:

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

- na definição do problema, explora-se o interesse dos alunos e a necessida-


de/importância da sua resolução.
- o contexto teórico é relevante para o aprofundamento do tema, da mesma
forma da situação contextual.
- a seleção do problema ocorre de forma democrática entre alunos e a me-
diação do professor.
- o tempo maior dedicado ao desenvolvimento do projeto, de forma a ex-
plorar de forma mais aprofundada a temática.
- o desenvolvimento do projeto e de suas etapas possibilitam maior flexibi-
lidade, de acordo com as novas curiosidade que possam surgir no decorrer
do processo, podendo ser fundamental para os resultados finais.
- encontra-se disposto para apresentar e desenvolver algo novo, resolvendo
o problema inicial com um produto final.

Figura 2. Tabela de diferenciação entre ABProj e ABProb.

Fonte: Barbosa e Moura (2013).

Volume II 199
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Considerações finais

A discussão sobre ABP ou PBL neste ensaio, buscou estabelecer a im-


portância do método e demonstrar que é preciso repensar, continuamente,
estratégias de ensino e aprendizagem desenvolvidas nas escolas, sempre com
a centralidade no aluno. Ao mesmo tempo que reforça o uso das metodologias
ativas na educação, para a promoção de uma aprendizagem significativa, des-
de que sempre favoreça atividades de ouvir, ver, perguntar, discutir, fazer e
ensinar nos alunos (SILBERMAN, 1996 apud BARBOSA; MOURA, 2011).

A potência que envolve trabalhar com Aprendizagem Baseada em Pro-


jetos, conduz ao seu uso em sala de aula, de forma mais ampla e difundida
pelos professores, pois conforme Bender (2014, p.15), a ABP “é uma das
mais eficazes formas disponíveis de envolver os alunos com o conteúdo de
aprendizagem e, por essa razão, é recomendada por muitos líderes educacio-
nais como uma das melhores práticas educacionais na atualidade”. O autor
ainda reforça que “ABP é um formato de ensino empolgante e inovador, no
qual os alunos selecionam muitos aspectos de sua tarefa e são motivados por
problemas do mundo real que podem, e em muitos casos irão, contribuir para
a sua comunidade”.

Por fim, destacamos a importância de os professores conhecerem os


fundamentos principais do método, compreendendo a relação existente entre
a ferramenta utilizada com as práticas pedagógicas. A partir de um método
cooperativo e colaborativo, insere os alunos em uma realidade social e permi-
te o desenvolvimento dos conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais
por meio de situações-problema.
        

Volume II 200
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Referências
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Volume II 202
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Resumo: O trabalho é um ensaio que apresenta a metodologia de Aprendizagem Ba-


seada em Projetos (ABP), também conhecida como Project Based Learning (PBL),
que é considerada uma das práticas de ensino mais promissoras do século XXI. A
ABP é uma metodologia ativa que incentiva a investigação, pesquisa e resolução de
problemas, desafiando os alunos a trabalharem em questões e problemas reais e a
apresentarem resultados significativos. A participação ativa dos alunos torna os con-
teúdos mais atrativos, contribuindo para a aprendizagem e melhoria do desempenho
individual e coletivo. Trate-se neste trabalho acerca das principais diferenças concei-
tuais entre Aprendizagem Baseada em Projetos (ABProj) e Aprendizagem Baseada
em Problemas (ABProb).

Palavras-chaves: Aprendizagem Baseada em Projetos; Project Based Learning; Me-


todologias ativas; Método de ensino.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 9

RODAS DE CONVERSA:
CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS DE
DIÁLOGOS E APRENDIZAGENS
Regina Beatriz Leal Morgavi
Vera Maria Treis Trindade
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-X

Introdução

Este capítulo surgiu na busca do conceito, da dinâmica, do histórico e da


aplicabilidade das Rodas de Conversa em pesquisas realizadas na plataforma
Google Acadêmico, que indicaram muitos artigos de periódicos, capítulos de
livros desde 1995 sobre o tema. Nesta revisão são comentados diversos traba-
lhos que fazem menção à aplicabilidade desta dinâmica, considerada por mui-
tos autores, como instrumento metodológico, que promove a troca e produz
conteúdos e significados diferenciados, possibilitando o debate e a pesquisa na
área de educação, além das potencialidades a serem utilizadas em outras áreas
e contextos.

De início, gostaríamos de citar Catherine Kerbrat-Orecchioni, especialis-


ta em análise do discurso e análise das conversações, que já em 1943, mencio-

Volume II 204
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

nava a importância de conversar, dizia que, conversar é interagir, “[...] implica


um número relativamente restrito de participantes, cujos papéis não são prede-
terminados, que gozam, em princípio, dos mesmos direitos e deveres [...] e não
têm outro objetivo explícito, que não seja o prazer de conversar” (KERBRA-
T-ORECCHIONI, 2006, p.13). Existem muitas bibliografias relacionadas a
este contexto como instrumento pedagógico, tendo início na Educação Infantil,
passando pelo Ensino Fundamental e Médio e alcançando o Ensino Superior
(Graduação e Pós-Graduação), (MELO; CRUZ, 2014; MOURA; LIMA, 2014;
BEDIN; DEL PINO, 2018).

São encontrados textos que referenciam o envolvimento das Rodas de


Conversa na construção dialógica com aplicabilidade no treinamento empre-
sarial e na promoção de atividades integrativas nos serviços comunitários ou
postos de saúde (GADOTTI, 2012; MACHADO et al., 2015). A Roda de Con-
versa é um método onde a grupalidade propicia o afeto, o convívio e o díálogo.
Este método consegue facilitar o dia-a-dia dos trabalhadores, pois possibilita
um espaço para troca de opiniões e de experiências valorizando os saberes dos
envolvidos.

Ressaltamos que o saber falar e se expressar contribuem para o cresci-


mento pessoal e profissional, assim como, expressões faciais e corporais dizem
muito sobre as pessoas. Durante as Rodas de Conversa, os posicionamentos
podem ser praticados e aperfeiçoados de maneira natural, sem que os sujeitos
percebam, promovendo e facilitando o convívio familiar, social, educacional
e profissional (MACHADO et al., 2015). Acreditamos que o diálogo, assim
como, o silêncio durante as rodas de conversa podem ser considerados exercí-
cios que envolvem o saber ouvir e falar. Durante as colocações dos participan-
tes, estas podem ser complementares, concordantes ou discordantes, desde que
sejam feitas com respeito e dentro do tempo permitido.

Volume II 205
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Neste trabalho, será contextualizada a possibilidade da Roda de Conser-


va ser inserida nos Itinerários Formativos (BRASIL, 2018). Além disto, serão
apresentadas algumas características que diferenciam as Rodas de Conversa
dos Grupos Focais (GADOTTI, 2012).

Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018), Itinerários


Formativos correspondem a um conjunto integrado, sistemático e contínuo de
desenvolvimento de pessoas e profissionais. Os Itinerários Formativos preten-
dem combinar as necessidades dos estudantes com o conteúdo transmitido pelo
docente e reforçar a aprendizagem, levando o aluno a protagonizar o estudo,
criando autonomia para que a transmissão do conteúdo acadêmico se efetive.
Para tanto, o objetivo dos Itinerários Formativos é fazer com que o/a estudante
passe por uma sequência contínua de treinamentos sobre determinado conteúdo
e, assim, melhore o seu nível de entendimento sobre o assunto.

Nestes itinerários a metodologia aqui contextualizada é apropriada, bus-


cando a definição de Moura e Lima (2014) [...] “a Roda de Conversa é um
espaço de formação de trocas de experiências e desabafos, que mudam cami-
nhos produzindo conteúdos e significados”. Em outras palavras, podemos dizer
que são momentos de inclusão e integração, que possibilitam aos participantes
expressar-se livremente, sem a preocupação de que suas percepções e senti-
mentos serão desrespeitados e que os componentes destes encontros estarão
trocando opiniões ou dividindo sentimentos e experiências. As dinâmicas das
Rodas de Conversa não são únicas, podendo ser organizadas utilizando mate-
riais diversos a fim de envolver e direcionar os participantes ao que se preten-
de. Entretanto, para que tudo se realize a contento é necessário planejamento,
considerando não só os materiais, mas o número de participantes, definição de
data, horário e local (MACHADO et al., 2015).  

Volume II 206
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Levando em conta o descrito acima, esta revisão apresenta o conceito, a


dinâmica, o histórico, as características das Rodas de Conversa e a sua aplica-
bilidade em diferentes áreas (Figura 1).

Figura 1. Revisão das Rodas de Conversa

Fonte: Autores (2023)

Conceito de Rodas de Conversa

As Rodas de Conversa são espaços para vivências de oportunidades de


formação, de troca de experiências, de confraternização e que possibilitam mu-
danças de caminho e de formação de opiniões, ou seja, se caracterizam como
situações em que acontecem interferências e compreensões mútuas a respeito
de uma determinada temática, contribuindo para a construção de conteúdos e
de significados para aprendizagens e pesquisas na área de educação (MOURA;
LIMA, 2014). Pode se dizer que as Rodas de Conversa apresentam uma pro-
posta de construção e reconstrução por meio do ato educativo e reflexivo, que
acontece, tanto por meio da fala e como da escuta, evidenciado pela discussão
e pela participação dos envolvidos. A entrada em contato com outros contextos
de vida, realidades diferentes e pontos de vista distintos a respeito dos temas
debatidos propicia novas interações, dando oportunidade de ressignificar as te-
máticas apresentadas e colocadas em debate. Nessa lógica, é um debate cole-
tivo, amplo, participativo sobre determinado assunto, em que os participantes

Volume II 207
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

são estimulados a se expressarem, escutarem e refletirem sobre as suas falas e


a dos outros participantes da roda. Desta forma, permitindo que a compreensão
da temática aconteça não de forma prescritiva, como na educação tradicional,
mas na forma de prática, em que o conhecimento é produzido pelo coletivo
(MELO; CRUZ, 2014). Segundo o Marco de Referência da Educação Popular
para as Políticas Públicas (BRASIL, 2014, p.1), as Rodas de Conversa cor-
respondem a uma Metodologia Educacional Dialógica com concepção teórica
e prática que “articula os diferentes saberes e práticas, com as dimensões da
cultura e dos direitos humanos”. É considerável enfatizar que os participantes
durante estas conversas trazem suas vivências, conceitos e opiniões, já estrutu-
radas ou não, com passividade de mudança, podendo ser relacionadas à área de
conhecimento dentre outras. Nesta perspectiva, os argumentos e os conceitos
são construídos e reconstruídos pelos exercícios da escuta e do diálogo com
seus pares. Ressaltando-se que o diálogo elaborado simboliza o pensamento e
a fala de “[...] indivíduos com histórias de vida diferentes e maneiras próprias
de pensar e de sentir, de modo que os diálogos, nascidos desse encontro, não
obedecem a uma mesma lógica”. (WARSCHAUER, 2004, p. 46). Quanto às
Rodas de Conversa, não podemos deixar de ratificar a aplicabilidade desta me-
todologia para o exercício da contextualização de múltiplos conteúdos e ade-
quação a diversas disciplinas inseridas desde o Ensino Infantil até o Superior.
Além do ensino, as Rodas de Conversa têm usabilidade em outras áreas, desde
que sejam bem organizadas para o seu adequado desenvolvimento. Estes mo-
mentos propiciam maior entendimento dos conteúdos, além de promoverem
a autoestima e autoconfiança, permitindo aos alunos participantes o exercício
de cidadania, democracia respeito à diversidade e à inclusão dentro e fora do
contexto escolar (WARSCHAUER, 2004; MOURA; LIMA, 2014) (Figura 2).

Volume II 208
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 2. Rodas de Conversa e suas potencialidades

Fonte: Autores (2023)

Dinâmica das Rodas de Conversa

Roda de Conversa é uma estratégia de participação democrática que


permite a troca de diferentes saberes, uma vez que a relação entre os sujeitos
envolvidos acontece de forma horizontal. Os integrantes são convidados a se
sentarem em círculo e, após, por meio de uma dinâmica de apresentação ou
descontração, são incentivados a se integrarem (MACHADO et al., 2015). A
dinâmica da roda de conversa não tem uma proposta fechada, mas é necessário
ser planejada, observando a quantidade de participantes para que todos possam
fazer suas colocações e se sentirem confortáveis e acolhidos.

Definir data e horário, organizar o local com materiais sobre o tema. Es-
tes poderão ser revistas, cartazes, frases e imagens que servirão para estimular
as falas dos participantes sobre o assunto em pauta e, assim, todos os objetivos
possam ser alcançados.

As manifestações só ocorrerão após o(a) ou mediador(a) apresentar o(s)


tópico(s) da proposta e solicitar que todos se apresentem para o grupo (em
ordem solicitada pelo mediador). Após as apresentações, o grupo já deverá es-
tar mais descontraído, então, o tema entrará em discussão e os participantes
compartilharão suas ideias e opiniões. O mediador deve conduzir as coloca-

Volume II 209
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ções se atendo à participação de todos os presentes de forma igualitária, aten-


to sempre para que as discussões e interações não se exaltem, incentivando o
debate e a discussão. Um relator registra as falas, expressões, gestos, conexões
estabelecidas, dificuldades, pontos em conflitos que possam de serem notados,
assim como, facilidades e entrosamento dos participantes. Ou seja, todas as ob-
servações que possam ser relevantes para que se alcance o objetivo proposto.
No tempo previsto, deve ser encerrada a Roda de conversa, agradecendo aos
participantes e enfatizando o quanto foi proveitoso aquele encontro (WARS-
CHAUER, 2002).

Lembramos que as rodas podem ser encaminhadas de modo a se adequar


aos assuntos previstos. Sobre o tema a ser proposto poderão ser utilizados
vários materiais como auxílio e estímulo, ou para organização das ações
com: textos, revistas, cartazes, fotos ou figuras, frases, imagens, objetos
como panos e fitas, canetas coloridas, caixas, músicas ou sons diferenciados e
outros recursos podem ser utilizados para estimular as falas dos participantes
sobre o assunto. Estes dependem de quem as organiza e qual o propósito a ser
trabalhado (Figura 3).

Figura 3. Rodas de conversa e sua dinâmica

Fonte: autores (2023)

Volume II 210
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Histórico de Rodas de Conversa

Supõe-se que Sócrates, entre 469-399 a.C., quando debatia seus pensa-
mentos e conclusões, tenha utilizado esta estratégia. Ele promovia, habitual-
mente, uma troca de ideias com seus interlocutores, estimulando a reflexão
e caracterização de algumas qualidades e virtudes como dever, amizade, co-
ragem, justiça, moderação, etc. (KERBRAT-ORECCHIONI, 2006). Aqui no
Brasil, acredita-se que as Rodas de Conversa foram inspiradas em Paulo Freire
que utilizava os chamados Círculos de Cultura para alfabetização de adultos.
Ele, devido aos contatos que teve durante a sua adolescência com os trabalha-
dores rurais e seus filhos, vivenciou a realidade e as dificuldades do trabalhador
adulto analfabeto. Este educador iniciou a sua jornada, rumo a uma prática
consciente e libertadora, a partir, das experiências que foi adquirindo com os
pais e educadores, em 1950, no Nordeste do Brasil. O próprio Freire entendia
que o Círculo era o Coordenador de Debates em lugar de professor, que tinha
tradições fortemente doadoras (SCOCUGLIA, 1999).

Buscando informações sobre os Círculos de Cultura percebemos que se


tratava de uma forma de ensinar diferenciada na época, em que os alunos, por
terem ultrapassado a idade de frequentar os bancos escolares por diversos mo-
tivos, sentiam-se mais à vontade e eram alfabetizados de maneira mais rápida.
Scocuglia (1999), enfatiza que Freire como coordenador do Plano Nacional de
Alfabetização (PNA), no final de 1963, previa a alfabetização de mais de 5 mi-
lhões de brasileiros através da formação de 20 mil Círculos de Cultura. Em vez
de aula discursiva surgia o diálogo. Após práticas e publicações de Freire sobre
os círculos, aos poucos, esta metodologia foi sendo modificada para se adequar
a outros tipos de situações e buscas de concepções.

Ao que tratamos aqui, podemos citar Celèstin Freinet (1896-1966), fran-


cês que vivia em um momento de regime capitalista, acreditava no rompimen-
to da escola tradicional e buscava maneiras mais atrativas e instigantes para

Volume II 211
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

trabalhar com o ensino, estas foram documentadas para posterior elaboração.


Conforme Oliveira (1995, p.41), “Freinet dialogou com seu tempo, confrontou-
-se com a problemática social e educacional de sua época (...) Sua obra foi um
avanço considerável e, até certo ponto revolucionária, uma vez que ensejou o
surgimento do novo que estava prestes a nascer do velho”.

A publicação datada do ano de 1993, denominada “A Roda e o Registro”,


escrito pela professora Cecília Waschauer em parceria com seus alunos, corres-
ponde ao primeiro registro feito em sala de aula, associado ao diário de campo,
onde a docente afirma:
“Mas para que as conversas na Roda não sejam meros “bate-papo”, e real-
mente alimentem a construção dos conhecimentos, é necessário o registro,
pois o registro é um grande instrumento para a sistematização e organização
do conhecimento. É também a possibilidade de que a Roda não se feche em
si mesma, mas se abra para o mundo. Através de textos, os conhecimentos
ali gestados podem, por exemplo, atingir outros grupos... de fato a abertura
é uma característica importante do “espírito” da Roda”. (WARSCHAUER,
2002, p. 56)

Esta mesma autora criou propostas pedagógicas diferenciadas, pois


acreditava que a contribuição da educação deveria ir além do ler e escrever,
e pautar-se no conhecimento e no desenvolvimento das potencialidades e da
personalidade, considerando a voz dos alunos e suas necessidades. Associa-
mo-nos a esta proposta pedagógica, pois acreditamos que os alunos durante
as Rodas de Conversa, podem desenvolver potencialidades quando as suas
opiniões e experiências são compartilhadas e colocadas em debate. Além dis-
to, é um ato participativo que se completa com expressões faciais, corporais
e de silêncio. A presença de um mediador é obrigatória com os participantes
dispostos informalmente, de maneira similar a uma mesa redonda. Em conso-
nância a esta teoria, a Roda de Conversa corresponde a uma metodologia que
permite que os significados atribuídos às dificuldades humanas e aos proble-
mas sociais sejam compreendidos e/ou analisados por um determinado grupo
(WARSCHAUER, 2002).

Volume II 212
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Aplicabilidade das Rodas de Conversa

Rodas de Conversa e o Treinamento Empresarial

As Rodas de Conversas podem se adequar a outras finalidades desde que


sejam anteriormente bem planejadas. Como exemplo, para promoção ou for-
mação de funcionários. Os participantes das Rodas de Conversa podem res-
significar suas experiências e, a estas acrescentar novas, pois contribuem para
formação e treinamento (MACHADO et al., 2015). Também, são utilizadas em
terapias de grupo nos serviços comunitários e postos de saúde onde é feito o
acolhimento e orientações de boas práticas sociais, neste contexto são chama-
das de dinâmicas terapêuticas as quais oportunizam a troca de experiências, de-
sabafos, confraternizações e possibilitam mudanças nos constituintes do grupo
(GADOTTI, 2012).

Nestes encontros, durante as Rodas de Conversa terapêuticas os partici-


pantes podem ser resgatados, principalmente, em sua dignidade, pois são ouvi-
dos e podem se expressar, livremente, dividindo suas experiências e suas dores.
Sem dúvida, estes momentos proporcionam o aprendizado no momento em que
as trocas, sentimentos e emoções possam levar a compreensão e a saída para os
possíveis conflitos. Ao pensar a forma de adotar e de conduzir esse instrumen-
to, nestas situações, temos que considerar que o diálogo construído representa o
pensar e o falar de “[...] indivíduos com histórias de vida diferentes e maneiras
próprias de pensar e de sentir, de modo que os diálogos, nascidos desse encon-
tro, não obedecem a uma mesma lógica” (WARSCHAUER, 2004, p. 46).

Quando nos referimos ao acolhimento social e ao treinamento empresa-


rial, estamos nos referindo à busca de uma melhor qualidade de vida, além de
uma importante função social. Os participantes se expõem à incompreensão,
intraduzibilidade, do que não é capaz de dizer, da sua impotência, se expõem

Volume II 213
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

também, ao que virá em resposta às suas falas ou aos posicionamentos de ou-


tros participantes sem se precaver de antemão (GADOTTI, 2012). Conversa
não é apenas uma tomada de posição, é exercício de aceitação, escuta, respeito
e compreensão, portanto o reconhecimento de várias visões e percepções sobre
o mesmo fenômeno, objeto e situação (MACHADO et al., 2015).  

Rodas de conversa como Instrumento pedagógico

A escola é uma instituição com caráter social que propõe a formula-


ção de objetivos e de metas, empregando conhecimentos produzidos e que
possibilita a reelaboração de suas ações, promovendo a aprendizagem e o
desenvolvimento de funções psicológicas superiores. Este espaço favorece
a existência de momentos e atividades, no qual se estabelece a interação de
sujeitos com o ambiente social (OLIVEIRA, 2000).

A conversa é um espaço de formação, de troca de experiências, de con-


fraternização, de desabafo, muda caminhos, forja opiniões, razão por que a
Roda de Conversa surge como uma forma de reviver o prazer da troca e de
produzir dados ricos em conteúdo e significado para a pesquisa na área de
educação (MOURA; LIMA, 2014).

Acreditamos na importância deste fazer, pois é criada nestes momentos


a oportunidade para refazer ou complementar opiniões, saberes, exercício da
fala e interação dos participantes, aceitando e discordando com respeito. Será
por meio do diálogo que os participantes poderão ampliar e revisitar as ideias
e as opiniões preconcebidas em relação aos temas abordados nas Rodas de
Conversa.

De acordo com os autores Zanini e Leite (2011), durante as rodas de


conversas, tanto os educandos quanto educadores trocam experiências, vivên-
cias, opiniões e modos de ser dos envolvidos, respeitando e valorizando cada

Volume II 214
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

troca de olhares, gestos, falas, curiosidades, medos, inseguranças, até mesmo


risadas. Assim, estes momentos de interação os possibilitam se reconhecer
e reconhecer o outro. As rodas de conversa permitem a ressignificação de
conceitos, conhecimentos e conteúdo e lugar onde as experiências são com-
partilhadas fazendo os participantes refletirem as questões abordadas dentro
e fora do ambiente escolar. Elas podem ser usadas instrumento pedagógico
em todas as fases de aprendizagem, desde o Ensino Infantil e Fundamental,
passando pelo Ensino Médio, chegando ao Ensino Superior (Figura 4).

Figura 4. Rodas de Conversa e as fases de aprendizagem

Fonte: autores 2023.

Rodas de Conversa na Educação Infantil

A Roda de Conversa está presente há muito tempo e, ainda é utilizada nas


Escolas Infantis. Este termo é utilizado para denominar as instituições envolvi-
das com os anos iniciais da Educação Infantil, no atual currículo. Nesta fase da
educação é imprescindível um olhar e uma escuta zelosa do educador e dos res-
ponsáveis. Pais e professores devem ficar atentos nas demonstrações de senti-
mentos, falas e aprendizagens que aos poucos as crianças vão apresentando. As
Rodas de Conversa propiciadas nas Escolas Infantis têm, entre outras funções,
avaliar e promover a evolução infantil tanto em relação às competências socioe-
mocionais quanto às cognitivas, neste período. Segundo Sandra Araújo (https://
www.hiboo.com.br/blog/ categories/socioemocional/single-post/2017-08-18),

Volume II 215
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Acesso em: 14 /12 2022.

“A necessidade de saber identificar, reconhecer, entender e comunicar as


emoções é bastante destacada no trabalho com as competências socioemo-
cionais e tais habilidades são muito importantes para o processo de desen-
volvimento saudável e integral das crianças. Essas emoções interferem na
vida delas, mas, quando devidamente reconhecidas e nomeadas, além de
percebidas entre elas mesmas e entre os adultos, as auxiliam a se relacionar
consigo mesmas e com os demais de maneira menos conflituosa”.

Pensamos que a Educação Infantil tem início em casa, sem dúvida o papel
das famílias é fundamental. São elas que constituem os alicerces para a orienta-
ção inicial tanto no desenvolvimento cognitivo quanto no social. Entretanto, as
interações com colegas e com professoras na primeira escola são fundamentais,
pois é neste espaço que os pequenos alunos aprendem a se expressar, comparti-
lhar, respeitar aos outros. Além disto, são estimulados a organizar seus objetos,
seus pensamentos e suas ações.

É importante ressaltar que a fala e a preparação para conversas, para o


entendimento de suas vocalizações e atitudes se torna inevitável neste período,
assim como, a promoção de situações em que, naturalmente, as crianças possam
se expressar.

As rodas de conversas promovem a democratização da fala, nas quais


cada indivíduo, independente da faixa etária, deve ouvir a opinião do outro,
refletir sobre a mesma e, em seguida, dar a sua opinião contrária ou não, ao que
está sendo exposto. Nesse contexto, as crianças devem participar do processo,
e possuem total direito de emitir suas opiniões, pronunciar a sua forma de ver o
mundo (ZANINI; LEITE, 2011).

Acrescentamos, que nesta fase é que as crianças aprendem a interagir


com os pares, a relatar acontecimentos que fazem parte de suas rotinas enfim,
as crianças desenvolvem o ato de conversar em grupo.

Volume II 216
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A importância do desenvolvimento da linguagem verbal é comentada no


volume III do Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil, do Minis-
tério da Educação (BRASIL, 1998), associando o desenvolvimento da lingua-
gem oral, o falar e o escutar enumerando os seguintes aspectos:

- uso da linguagem oral para conversar, brincar, comunicar e expressar de-


sejos, necessidades, opiniões, ideias, preferências e sentimentos e relatar
suas vivências nas diversas situações de interação presentes no cotidiano.
- elaboração de perguntas e respostas de acordo com os diversos contextos
de que participa;
- participação em situações que envolvem a necessidade de explicar e argu-
mentar suas ideias e pontos de vista;
- relato de experiências vividas e narração de fatos em sequência temporal
e causal;
- reconto de histórias conhecidas com aproximação às características da
história original no que se refere à descrição de personagens, cenários e
objetos, com ou sem a ajuda do professor;
- conhecimento e reprodução oral de jogos verbais, como travalínguas, par-
lendas, adivinhas, quadrinhas, poemas e canções.

Conforme o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil, a


Roda de Conversa é o momento privilegiado de diálogo e intercâmbio de ideias.
Por meio desse exercício cotidiano as crianças podem ampliar suas capacida-
des comunicativas, como a fluência para falar, perguntar, expor suas ideias,
dúvidas e descobertas, ampliar seu vocabulário e aprender a valorizar o grupo
como instância de troca e aprendizagem. A participação na roda permite que as
crianças aprendam a olhar e a ouvir os amigos, trocando experiências. Pode-se,
na roda, contar fatos às crianças, descrever ações e promover uma aproxima-
ção com aspectos mais formais da linguagem por meio de situações como ler
e contar histórias, cantar ou entoar canções, declamar poesias, dizer parlendas,
textos de brincadeiras infantis etc. BRASIL (1998).

Volume II 217
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Rodas de Conversas no Ensino Fundamental

Na Base Nacional Comum Curricular a segunda etapa do ensino básico,


o Ensino Fundamental está direcionado aos alunos entre 6 a 14 anos (com al-
gumas exceções, é esperado que os alunos sejam alfabetizados entre o primeiro
e segundos anos, desenvolvam a escrita, leitura e interpretação desta. Além
disso, com o convívio já propiciado na Educação Infantil, a compreensão sobre
vivência e socialização, os quais são valores básicos, já são esperados para la-
pidação e desenvolvimento.

Para Furman (2009) é nessa fase de escolaridade que devem ser


construídas ferramentas de pensamento que permitam aos estudantes
compreender e questionar como as coisas funcionam e, a desenvolver
habilidades e competências para usar e conhecer a ciência, sempre refletindo
seus aspectos individuais, sociais, econômicos e tecnológicos. Deve ser
estimulada a curiosidade quanto ao mundo científico buscando que eles
desenvolvam sua criatividade, formulem perguntas e saibam buscar e
questionar respostas prontas em um caminho contínuo de apropriação rumo
aos anos finais.

O Ensino Fundamental corresponde a um período de várias de transfor-


mações afetivas, sociais e emocionais, onde o acolhimento deve estar presente.
Estas habilidades podem ser desenvolvidas e trabalhadas durante as Rodas de
Conversa, pois ajudam a diminuir as desigualdades sociais e de aprendizado,
já que nelas existem trocas e compartilhamento de emoções. Conteúdos e com-
petências socioemocionais, ajudam o aluno a reconhecer suas dificuldades e
facilidades. Aliado a isso, o exercício do autocontrole tem grande importância,
pois está associado à memória e ao desenvolvimento cognitivo, processos rele-
vantes no aprendizado (FURMAN, 2009).

Volume II 218
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Nas Rodas de Conversas o aluno desenvolve a empatia, o aceite às dife-


renças e às semelhanças, mantendo relações saudáveis e aprendendo a resolver
possíveis conflitos não só na escola, mas ao longo de sua vida.

Rodas de Conversas no Ensino Médio

Com a finalização do Ensino Fundamental, final do ensino básico, o aluno


passa para a terceira transição escolar, esta é talvez a mais marcante, acredita-
mos que seja, uma vez que no Ensino Médio os alunos terão que se adaptar a di-
ferença de carga horária, quantidade de disciplinas e professores, além de com-
promissos e responsabilidades, que passarão a serem cobrados. É sem dúvida
um ciclo importante. O Ensino Médio gera muitas expectativas, acrescentadas
as já mencionadas, pois os jovens estarão, também, na transição inicial entre
o adolescer para o jovem adulto, que com certeza não é fácil! Neste momento,
as mudanças corporais, as relações amorosas e a descoberta da sexualidade
influenciam na construção da personalidade dos jovens. As relações sociais e o
mundo estão a toda hora se modificando e colocando-os à prova.

Autoafirmação, autonomia, responsabilidade por suas escolhas, metas a


serem buscadas, sentimentos e sensações se misturam, ou seja, muito a ser ad-
ministrado de um momento para outro. Com esta intensificação de sentimentos
e escolhas, para muitos a escola é um lugar de experimentação, de vivencia e
de socialização e, nem todos priorizam os estudos. Nesta fase além de ter que
conviver e se adaptar a tudo que foi mencionado, são seguidamente cobrados
sobre o rumo profissional, se vão fazer a prova do ENEM (Exame Nacional do
Ensino Médio), se sua opção é de um curso profissionalizante! Isto os leva a um
estresse constante por cobranças e questionamentos que antes não tinham, as-
sociado a sonhos e metas confusas. Conviver com a escola, família e amigos se
torna uma questão de sobrevivência, bem difícil, em razão de muitas mudanças

Volume II 219
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

abruptas. Aceitar mudanças e tolerar frustrações, também, a eles são cobradas.


Tudo que foi mencionado acima são possíveis motivos de interferência nas ha-
bilidades cognitivas e de raciocínio lógico.

Para tanto, nós professores devemos buscar alternativas metodológicas


que façam com que estes jovens sejam inseridos, naturalmente, no processo
de ensino-aprendizagem. Sem dúvida é um dos principais desafios enfrentados
pelos professores em sala de aula. Dentro deste contexto e alinhado a uma pro-
posta pedagógica que favoreça aos alunos a exercerem a troca de experiências
e opiniões, está inserida as Rodas de Conversa. Estas buscam, entre outras fi-
nalidades, o estimulo e a aquisição da oralidade, a pavimentação das relações
pessoais e sociais, ou seja, correspondem a uma poderosa ferramenta na busca
de habilidades socioemocionais e de capacidade de comunicação.

Citando algumas habilidades que consideramos importantes presentes na


Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018) e que comungam com esta
metodologia:

- inferir a presença de valores sociais, culturais e humanos e de diferentes


visões de mundo, em textos literários, reconhecendo nesses textos formas de
estabelecer múltiplos olhares sobre as identidades, sociedades e culturas e con-
siderando a autoria e o contexto social e histórico de sua produção e habilidade;

- a habilidade trata de demonstrar empatia pelos outros, percebendo que as


pessoas têm diferentes sentimentos, necessidades e maneiras de pensar e agir.

A Roda de Conversa é uma metodologia dinâmica que tem o propósito


de fazer trocas e aproximar os alunos, questionamentos entram em pauta, afir-
mação de personalidades que vão sendo elaboradas e o respeito posto como
prioridade. A identidade é visualizada por expressões corporais fisionômicas

Volume II 220
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

e pelas colocações ou silêncios característicos de cada participante. Pode


ser considerada como uma dinâmica providencial em uma idade em que
os condicionamentos, cobranças e imposições sociais podem definir ou até
direcionar parte de suas personalidades. Conforme Scocuglia (1999), para
Paulo Freire, dialogar é compreender também as necessidades do eu, do outro
e do mundo, pois se é para o bem social, todos os sujeitos devem participar
ativamente com o poder de sua palavra e sua escuta da transformação do
mundo. Sem dialogar as pessoas tornam-se alienadas, sem esperanças e sofre
as consequências da violência dos opressores sobre si, pois acabam tornando-
se meros depósitos de conteúdos condicionados ou domesticados para serem
simples receptores de regras.

Nas Rodas de Conversa, procura-se estabelecer diálogos respeitáveis


e construtivos, com colocações que agreguem e tornem os participantes pro-
tagonistas durante e depois destes encontros. Esta metodologia, sendo bem
planejada, permite que os conteúdos trabalhados sejam assimilados e contex-
tualizados de maneira descontraída e, até mesmo um tanto divertida, depen-
dendo do tema discutido.

Rodas de Conversa e Itinerários Formativos

No ano de 2022, foi implementado o novo Ensino Médio em todo país,


tendo como importante mudança a aplicação dos Itinerários Formativos. Estes
correspondem a um conjunto de Componentes Curriculares e de Unidades Cur-
riculares Eletivas que os/as estudantes escolhem para cursar durante o Ensino
Médio. Os Itinerários Formativos tem por objetivo uma aprendizagem mais
flexível e diversificada para atender melhor às expectativas e necessidades dos
jovens, ou seja, podem escolher e direcionar seus estudos à área de trabalho que
mais se adéqua ao seu perfil e vontade (BRASIL, 2018).

Volume II 221
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Segundo a Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio


(BRASIL, 2018), os Itinerários Formativos agregam vários benefícios como:

- aumento da visão do participante em relação às competências requeridas;

- nivelamento de conhecimento e incentivo ao seu compartilhamento;

- estímulo à autonomia e autodesenvolvimento integral do indivíduo;

- promoção da cultura de aprendizagem contínua;

- potencialização do processo de aprendizado;

- desburocratização de capacitação e meios alternativos de aprimoramento;

- maior percepção das possibilidades de carreira na área de interesse;

- engajamento individual é estimulado;

- investimento no capital humano e os resultados do negócio aumentam.

O desenvolvimento dos Itinerários Formativos, no decorrer dos três anos


do Ensino Médio, pode ocorrer por meio de diferentes atividades propostas
pelos professores e protagonizadas pelos discentes, como projetos, oficinas,
visitas e outras ferramentas de aprendizagem, como por exemplo, a Roda de
Conversa (BRASIL, 2018). Durante estas práticas, o/a estudante terá a oportu-
nidade de aprofundar seus conhecimentos na área de conhecimento escolhido,
permitindo o seu ingresso no mercado de trabalho, mais apto.

De acordo com a Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio


(BRASIL, 2018), são cinco as possibilidades de Itinerários Formativos: Lin-
guagens e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências da Na-
tureza e suas Tecnologias; Ciências Humanas e Sociais Aplicadas; Formação
Técnica e Profissional. Estas possibilidades devem ser adequadas à realidade
local e dentro desta perspectiva possibilitar a construção e o desenvolvimento
das escolhas dos discentes, de forma consciente e autônoma (BRASIL, 2018).

Volume II 222
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Os Itinerários Formativos estão direcionados ao/à estudante, respeitando


as diferenças socioculturais, utilizando conteúdos inseridos no seu dia-a-dia, ou
seja, adaptados à socialização, à área profissional escolhida pelo/pela estudante
e relativos ao seu interesse e, com liberdade de montar o seu currículo. Este
estará inserido no chamado “Projetos de Vida”. Conforme a Base Nacional Co-
mum Curricular para o Ensino Médio (BRASIL, 2018), diferentes metodolo-
gias ativas podem ser utilizadas na aplicação dos Itinerários Formativos, entre
elas, as Rodas de Conversa. Esta metodologia é adequada e pertinente, pois es-
timula o/a estudante a desenvolver competências técnicas e comportamentais,
por meio da flexibilidade de suas manifestações (Figura 5).

Figura 5. Rodas de Conversa e o novo Ensino Médio

Fonte: autores (2023)

Rodas de Conversas no Ensino Superior

As Rodas de Conversa podem ser utilizadas durante a graduação, assim


como nos programas de pós-graduação, principalmente, na formação de novos
professores. Estas favorecem o entrosamento entre colegas e professores, fa-
cilitando diálogos e entendimento dos conteúdos contextualizados. Os alunos
inseridos acabam levando as didáticas desenvolvidas durante o curso para a sua
prática. Assim, se estabelece um processo entre as potencialidades dos sujeitos
e as interações fundamentais dos mesmos, corroborando com as exigências da
profissão. A aprendizagem durante o tempo de docência é realizada dentro das

Volume II 223
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

possibilidades internas e relacionada às necessidades externas (BEDIN; DEL


PINO, 2018). Professores dos cursos superiores, assim como os de pós-gra-
duação, buscam propiciar novas práticas aos alunos. As Rodas de Conversa ao
serem inseridas neste cotidiano preenchem este espaço dialógico importante,
onde docentes e alunos se envolvem, questionam, exercem a escuta, a colabo-
ração, a troca de experiência e conhecimentos de forma integrada. Bedin e Del
Pino (2018, p. 56) compreendem que “por meio das rodas de conversa existe
uma horizontalização das relações de poder; os professores que as compõem
se implicam, dialeticamente, como atores histórico-sociais e crítico-reflexivos
diante da realidade do contexto social”. Os mesmos autores (BEDIN; DEL
PINO, 2018, p. 55) comentam, que esses momentos “proporcionam conversas
formativas-dialógicas que possibilitam a produção e ressignificação de saberes
sobre as experiências dos professores”. Durante a formação acadêmica é de
extrema importância que os futuros docentes se sintam capazes de refletir sobre
práticas e metodologias a serem aplicadas, tendo presente uso da pesquisa e da
produção de conhecimento inerentes para o desenvolvimento de sua profissão.
Além disso, é fundamental que percebam que ensinar não se restringe em repro-
duzir e decorar conteúdo ou teorias, distribuir exercícios e provas avaliativas. É
claro, que estas atividades têm a sua importância, mas não são, apenas, elas que
estimulam a apropriação do conhecimento e que farão os alunos protagonistas
de suas aprendizagens.

As Rodas de Conversa, também, são utilizadas nos programas de Pós-


-Graduação, onde a comunidade acadêmica a utiliza para promover o debate
reflexivo e crítico de temas variados atuais e pertinentes à área da Educação.
Como exemplo, temos Bedin e Pino (2018, p. 224) narrando a pesquisa voltada
ao debate sobre o “ser professor na contemporaneidade”, efetuada em rodas de
conversa com professores de Química em formação universitária inicial. Os

Volume II 224
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

encontros foram antecedidos de levantamentos por questionário, e as transcri-


ções posteriores tratadas mediante análise textual discursiva. Além da finali-
dade investigativa, afirmavam que as Rodas de Conversa seriam uma “estraté-
gia política libertadora e que favorecem a emancipação” (BEDIN; DEL PINO,
2018, p. 228). Por outro lado, Moura e Lima (2014) procuram destacar o uso
de Rodas de Conversa para a produção de narrativas mnemônicas entre pares,
configurando um espaço de trocas em que o pesquisador integra a conversa e a
produção de dados. Dessa forma, estes autores as relacionam com a criação de
um ambiente propício à escuta, ao diálogo e à singularidade das partilhas.

Rodas de Conversa e Grupo Focal

Muitas pessoas confundem estas metodologias, por este motivo achamos


necessário trazer alguns aspectos e particularidades que as caracterizam.

O Grupo Focal utiliza as opiniões, sentimentos e colocações feitas para


produzir dados que teriam dificuldade na busca fora destes encontros, tem ca-
ráter de técnico e coleta de dados para investigações qualitativas. O Grupo
Focal tem como uma das suas características, a tendências dos participantes
formarem opiniões e terem suas atitudes vinculadas a opiniões de outros par-
ticipantes. Somente, então, formam as suas próprias, entretanto, estas acabam
tendo características comuns e, obviamente, associadas ao tópico que está sen-
do abrangido. Além disso, os participantes devem ser homogêneos (GADOT-
TI, 2012).

Diferente das Rodas de Conversa, que não é considerada uma técnica


de coleta de dados, e sim uma metodologia que pode ser aplicada em diversos
contextos, onde os participantes diferem entre si, e não precisam esperar outras
opiniões ou experiências para terem as suas, além do que não é obrigatório ter
experiências vivenciadas no assunto em pauta (MOURA; LIMA, 2014).

Volume II 225
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Sem dúvida, no Grupo Focal, o próprio nome já chama a atenção, pois fo-
cal se remete ao assunto exato a ser debatido, enquanto nas Rodas de Conversa,
além da formação em círculo, as colocações circulam naturalmente e dentro do
tempo necessário dos participantes.

Podemos acrescentar, também, que o Grupo Focal deve ser realizado


com um pequeno grupo de pessoas, visando a discussão e a busca de soluções
de problemas de forma aprofundada. Por outro lado, a roda de conversa tem
por objetivo principal a construção de um ambiente de diálogos, demonstra-
ções de respeito e integração, envolvendo atos de reflexão de falas e de escu-
tas (Quadro 1).

Quadro 1. Comparação das características das Rodas de Conversa e do Grupo


focal

Rodas de conversa Grupo focal

Participantes com características


Participantes diferem entre si
homogêneas

Não coleta dados Coleta dados

Construção de ambiente de diálogo


Contexto e tópico único
e integração

Fonte: os autores 2023.

Considerações Finais

Após nossas leituras, na busca da contextualização proposta, entendemos


a metodologia conceituada como Rodas de Conversa como espaços de trocas
e discussões em que diversos temas podem ser utilizados e uma infinidade de
metas ou propósitos podem ser alcançados. São momentos de integração que
acontecem de uma maneira informal, onde as escutas e as falas provocam o

Volume II 226
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

envolvimento dos participantes. Isto pode ocorrer pôr colocações ou por contri-
buições sobre os saberes e as experiências individuais desenvolvendo o fortale-
cimento das aprendizagens, do autoconhecimento e da autoestima (MACHA-
DO et al., 2015).

Durante as Rodas de Conversa o saber falar e o se expressar contribuem


para o crescimento pessoal e profissional. As expressões faciais e corporais
fazem parte desta evolução, pois dizem muito sobre as pessoas. Além disso,
o posicionamento individual pode ser praticado e aperfeiçoado sem que seja
percebido de imediato por outros participantes, ocorrendo de maneira natural,
promovendo tanto o convívio familiar, como o social e, principalmente, o pro-
fissional (GADOTTI, 2012).

Quanto ao convívio familiar, nos referimos às rotinas, possivelmente,


conturbadas no trabalho dos pais/responsáveis ou na escola dos filhos, onde
o tempo dispensado ao relacionamento entre seus membros vai se tornando
cada vez mais escasso. Em alguns casos, pais e filhos, após sua jornada ten-
dem a ficar ilhados no seu respectivo celular, presos a redes sociais, as quais,
hoje substituem, infelizmente, os adequados e pertinentes diálogos ao redor da
mesa, durante o café da manhã, almoço ou jantar (Figura 6).

Lembramos que vivemos em constante aprendizagem, estas tanto no


contexto profissional quanto no pessoal. O treinamento dos funcionários
numa empresa comercial, industrial, entidade associativa ou instituição pú-
blica é composto por atividades que envolvem planejamento, metas imedia-
tas e de longo prazo, organização de cronogramas, entre outras práticas. O
protagonismo na gestão e na organização são investimentos necessários. Os
profissionais que participam de treinamentos se sentem mais motivados no
trabalho, pois adquirem novos conhecimentos e têm maior facilidade para
enfrentar problemas e desafios em seu trabalho. Observa-se, assim, mais a
aplicabilidade das Rodas de Conversas (Figura 6).

Volume II 227
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 6. Rodas de Conversa e sociabilidade

Fonte: autores 2023

As Rodas de Conversa correspondem a um instrumento metodológico


possível de ser utilizado em todas as fases de aprendizagem, desde o Ensino
Infantil até o Ensino Superior (Figura 4). Esta metodologia não tem como fina-
lidade especifica, apenas, a aprendizagem de conteúdos. As Rodas de Conver-
sa permitem encontros de diálogos, criando possibilidades dos alunos partici-
pantes para a produção e ressignificação de saberes. Elas se caracterizam por
momentos em que são desenvolvidas a oralidade, a expressão e a interação. O
contexto escolar, independentemente do nível de aprendizagem, nos convida
a refletir sobre opções de metodologias de ensino, que remetam os alunos de
parte principal do processo, transformando-os de participantes em protagonis-
tas críticos, capazes de se expressar sem constrangimento e com desenvoltura,
além de exercitar o respeito, aceitando a diversidade e, principalmente, saben-
do lidar com ela (MOURA; LIMA, 2014).

O conhecimento possibilita a transformação dos sujeitos, na esperança


contribuir para um mundo melhor. Os relacionamentos são inerentes aos seres
humanos, suas atitudes e posturas caracterizam a maturidade, humildade e evi-
denciam o bom senso. Com isto conflitos podem ser evitados, posicionamentos
preconceituosos e prepotência podem ser mitigados e o crescimento emocional
estimulado (SCOCUGLIA, 1999).

Volume II 228
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Finalizando, as Rodas de Conversa podem estar presentes nos processos


de ensino formal e profissional, nos convívios familiar e social, potencializando
o exercício do protagonismo dos participantes, a ampliação do conhecimento, o
incremento da inclusão e do respeito mútuo (Figura 7).

Figura 7. Rodas de Conversa e seus resultados.

Fonte: autores 2023.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Volume II 230
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Resumo: Esta revisão surgiu na busca do conceito, da dinâmica, do histórico e da


aplicabilidade das Rodas de Conversa em pesquisas realizadas na plataforma Google
Acadêmico, que indicaram muitos artigos de periódicos, capítulos de livros desde
1995 sobre o tema. As Rodas de Conversa são consideradas uma metodologia ou
espaço de formação, superam o simples fato de cadeiras dispostas em círculos, são
espaços dialógicos de trocas, contextualizações e reflexões sobre um ou mais as-
suntos. Pode-se dizer que as Rodas de Conversa envolvem elementos fundamentais
como a estrutura cognitiva e a experiência, buscando uma atitude interativa dos par-
ticipantes. Elas têm grande relevância como instrumento pedagógico favorecendo o
conhecimento e a troca de experiências, nas empresas, nos serviços comunitários ou
nos centros de saúde. As Rodas de Conversa podem ser usadas como metodologia de
ensino nos Itinerários Formativos desde a Educação Infantil, Fundamental, Médio,
na Graduação e Pós-Graduação. Também, são contextualizadas algumas diferenças
em relação às Rodas de Conversa e Grupos Focais. Portanto, as Rodas de Conversa
podem estar presentes nos processos de ensino formal e profissional, nos convívios
familiar e social, potencializando o exercício do protagonismo dos participantes, a
ampliação do conhecimento, o incremento da inclusão e do respeito mútuo.

Palavras-chave: Rodas de conversas; Instrumento de aprendizagem; Metodologia de


ensino

Abstract :This review arose from the search for the concept, dynamics, history and
applicability of Conversation Circles in research carried out on the Google Schol-
ar platform, which indicated many journal articles, book chapters since 1995 about
the subject. Conversation Circles are considered a methodology or formation space,
exceed the simple fact of chairs arranged in circles, they are dialogic spaces for ex-
changes, contextualization and reflections on one or more subjects. It can be said
that the Conversation Circles involve fundamental elements such as cognitive struc-
ture and experience, seeking an interactive attitude of the participants. They have
great relevance as a pedagogical instrument favoring knowledge and the exchange
of experiences, in companies, community services or health centers. Conversation
Circles can be used as a teaching methodology in Formative Itineraries since early
childhood, elementary, high school, undergraduation and graduation levels. In ad-
dition, some differences from Conversation Circles and Focal Groups are contextu-
alized. Therefore, Conversation Circles may be present in formal and professional
teaching processes, family and social living, and also in enhancing the exercise of
participants’ protagonism, knowledge expansion, and in the increase of inclusion and
mutual respect.

Keywords: Conversation circles; learning instrument; Teaching methodology

Volume II 231
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 10

REVISÃO DE LITERATURA:
ALFABETIZAÇÃO E
CULTURA CIENTÍFICA NO
ENSINO DE APRENDIZAGENS
SIGNIFICATIVAS DE
CIÊNCIAS NOS ANOS INICIAIS,
UMA ABORDAGEM STEM
Felipe de Carvalho César
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-9

Introdução, problematização e justificativa

Este artigo tem por finalidade fazer uma revisão sistemática de literatu-
ra no período de 2019 a 2022, utilizando como descritores as palavras STEM
(Science, Technology, Engineering, and Mathematics) sendo esse, um acrôni-
mo proveniente da língua inglesa e um movimento ligado a educação e seus
mecanismos de aprendizagem nas áreas envolvidas no acrônimo, Aprendiza-

Volume II 232
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

gem Significativa que tem como referência a relação entre o saber existente
e a reconstrução do novo saber adquirido, Alfabetização Científica e Encul-
turação Científica, se referindo a como o estudante vê e participa da ciência
e do conhecer científico, esse último tendo como variação o termo “Cultura
Científica”. Tais descritores são bases para a dissertação de mestrado junto ao
Programa de Pós Graduação em Formação Docente Para Ciências, Tecnolo-
gia, Engenharia e Matemática (PPGSTEM) da Universidade Estadual Do Rio
Grande Do Sul (UERGS), unidade Guaíba.

Os descritores utilizados têm como autores de base nomes como Ausubel


e Moreira para a Aprendizagem Significativa, Delizoicov, Chassot e Sasseron
para a Alfabetização Científica, Bação, Pugliese, Bybee e Lins para o STEM
e, novamente, Sasseron, Carvalho, Ferreira e Santana para a Cultura/Encultu-
ração Científica. Todos foram acompanhados e acrescidos por outros autores
encontrados durante a referida revisão; também ainda por nomes contemporâ-
neos que reforçam as pesquisas nas áreas citadas. Ratificamos que todos foram
relevantes para a pesquisa e para a dissertação, especialmente no tocante às
hipóteses, projeção de trabalho de pesquisa e validação do produto educacional
proposto.

Nesta escrita, serão abordados os conceitos base de cada descritor, com


algumas referências clássicas, bem como serão listados os artigos e os trabalhos
de pesquisa realizados nos últimos 3 anos, utilizando como base os descritores
mencionados. Ressalta-se que, devido à pouca produção ou quase inexistência
de publicações nacionais sobre alguns descritores, buscou-se publicações reali-
zadas em bancos de dados de fora do Brasil, com mesma relevância acadêmica,
mantendo o rigor necessário para uma revisão de literatura.

A pesquisa baseia-se no seguinte questionamento: Os estudantes desen-


volvem a Alfabetização Científica e a Enculturação Científica como Aprendi-
zagens Significativas através de abordagens atrativas no ambiente educacional?

Volume II 233
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Nesse sentido, o profissional de educação deve ser a base para que esse
questionamento seja respondido, pois somente ele é capaz de “aproveitar aquilo
que é natural nos alunos: o desejo de conhecer, agir, dialogar, interagir e experi-
mentar. Um ambiente em que se proporciona aos estudantes essa oportunidade
favorece a aquisição da Alfabetização Científica” (LEITE, 2019, p.25), onde
“ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que está escrita
a natureza.” (CHASSOT, 2003, p.91). Logo, o profissional atuante nos anos
iniciais do Ensino Fundamental I (4º e 5º ano) é o responsável por estimular
os estudantes e norteá-los rumo ao conhecimento. É nessa fase que ocorre o
“desenvolvimento de conceitos, da aplicação dos princípios e da lógica, da
capacidade da criança realizar ações em seus pensamentos relacionadas às
ideias e memórias” (PIAGET, 1983, p.31), reforçando, então, a necessidade de
esse profissional ter ferramentas que alcancem os estudantes nas mais diversas
esferas do conhecimento.

O sistema educacional contemporâneo necessita que os alunos obtenham


as competências mínimas para serem capazes de absorver e reorganizar os co-
nhecimentos, partindo, ou não, daqueles preexistentes em sua estrutura cog-
nitiva, estimulando o processo cultural-científico, entendido até então como
“um processo de Enculturação Científica. Isso significa que temos que levar
os alunos a entenderem e a participarem da cultura científica, fazendo com que
pratiquem seus valores, suas regras e principalmente as diversas linguagens
das ciências” (SASSERON e CARVALHO, 2011, p.50). Através dessa prática,
o estudante deve aplicar esse conhecimento no seu cotidiano, percebendo-se
como parte desse meio social de sistema vivo cabendo à escola ser o “espaço
de apresentação e discussão de culturas em que devemos, como professores,
nos posicionar em relação à cultura que devemos perpetuar, sem descuidar da
percepção de que os estudantes também possuem culturas que devem ser reco-
nhecidas” (FEREIRA 2018, p.34).

Volume II 234
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

No contexto citado, as Aprendizagens Significativas, tidas por Ausubel et


al. (1978, p. 159), são um:
[...] modelo construtivista e cognitivista, onde as informações ficam arma-
zenadas na estrutura cognitiva do indivíduo e vão sendo substituídas a cada
nova informação que o sujeito consegue obter, fazendo a correlação dos
saberes já adquiridos e existentes em sua estrutura, com os novos apren-
dizados vinculados aos pré existentes através dos chamados subsunçores.

São entendidas como um novo caminho para a conexão entre o conheci-


mento já adquirido ou preexistente no estudante, servindo, então, de base para
que o novo conhecimento seja inserido e agregado à formação de epistemes
significativas ao longo da vida escolar e social dos indivíduos.

Desenvolver esses conceitos citados e tornar o ensino e a aprendiza-


gem realmente significativos, em tempos de evoluções tecnológicas, é um
desafio, tendo em vista que a escola não é mais o único lugar em que os
estudantes têm a possibilidade de aprender algo, escola essa que é constan-
temente bombardeada por novas informações e não consegue acompanhar a
evolução social e tecnológica em que vivem. Sendo assim, além dos métodos
tradicionais, os profissionais nela atuantes devem se fazer valer de aborda-
gens metodológicas que sejam mais atrativas e que, de certa forma, prendam
a atenção dos estudantes modernos, chamados também de nativos digitais,
sedentos de conhecimento. Nesse sentido, a educação STEM vem ganhando
espaço no contexto escolar, pois trata-se de “um movimento educacional que
busca trabalhar o conhecimento de forma integrada, observando aspectos re-
lacionados à ciência, tecnologia, engenharia e matemática” (SANTOS et al,
2022, p.51), sendo assim uma metodologia interdisciplinar que “desenvolve
o conhecimento a partir da integração entre áreas do conhecimento, contem-
plando o desenvolvimento de habilidades práticas, com a engenharia e a tec-
nologia, em aplicação dos conhecimentos teóricos, também abordados, das

Volume II 235
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ciências e matemática”. (MACHADO e JUNIOR, 2019, p.24). Buscando a


reconstrução das epistemes existentes nos indivíduos, ocorrendo, então, por
uma catarse intelectual e afetiva. Resta a tarefa mais difícil: “colocar a cultura
científica em estado de mobilização permanente, substituir o saber fechado
e estático por um conhecimento aberto e dinâmico, dialetizar todas as variá-
veis experimentais e oferecer, enfim, a razão/razões para evoluir” (BACHE-
LARD, 1996, p.23).

Percurso e critérios de busca

Esta pesquisa é caracterizada como Revisão de Literatura e categorizada


como Estudo do Conhecimento, tornando-se a “junção de ideias de diferentes
autores sobre determinado tema. Revisão essa conquistada através de leituras
e de pesquisas realizadas pelo pesquisado, sendo a documentação feita pelo
pesquisador sobre o trabalho” (BRIZOLA; FANTIN, 2016, p. 27). Esse Estudo
tem finalidade exploratória, auxiliando “na explicitação do problema, na clare-
za e na construção de hipóteses [...]; além de também ter o objetivo de averi-
guar sobre um questionamento inicial que visa propiciar inúmeras informações
para que a investigação se efetive” (ROBAINA et al, 2021, p.48). Ainda, essa
pesquisa apresenta caráter descritivo, já que tem como por objetivo “descrever
as características de determinada população ou fenômeno, buscar novas dimen-
sões até então não observáveis, estabelecer relações com outros tipos de pes-
quisa, além de ser o primeiro passo de um trabalho científico” (ROBAINA et
al, 2021, p.49), buscando, assim, o aprofundamento teórico e possíveis ajustes
pertinentes ao estudo feito.

A busca pela literatura foi conduzida de forma qualitativa, incluindo ar-


tigos científicos, artigos de conferência, revisões sistemáticas e de literatura,
dissertações de mestrado e teses de doutorado publicadas no período de 2019
a 2022, nacionais e, inclusive, internacionais, uma vez que há pouca produção

Volume II 236
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

nacional do descritor STEM, sendo realizada em outubro de 2022 e tendo como


propósito, o aprofundamento acerca de publicações contemporâneas correla-
cionadas ao assunto temático, a referida literatura revisada servirá de ferra-
mental teórico na pesquisa realizada junto ao Programa de Pós Graduação em
Formação Docente para Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática (PP-
GSTEM) da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS). Para isso,
foram analisadas e organizadas as publicações de 5 bases de dados descritas no
Quadro 1, com os respectivos números de publicações encontradas, através dos
cruzamentos dos descritores em cada uma.

O objetivo primário foi buscar por temas relacionados à formação da


Cultura/Enculturação Científica para séries iniciais com foco no 4º e 5º ano, re-
lação com uso de STEM em sala de aula, dificuldades de aprendizagem, Apren-
dizagem Significativa e trabalhos que abordassem a Alfabetização Científica.

Quadro 1. Bases de dados utilizadas.

Quantidade
Base Endereço
Encontrada
Rede de Revistas
https://www.redalyc.org/ 21
Científica (Redalyc)
Scientific Eletronic
Library Online https://scielo.org/ 13
(Scielo)
Biblioteca Digital
Brasileira de Teses e http://bdtd.ibict.br/vufind/ 20
Dissertações (BDTD)
Revista Brasileira
de Pesquisa em
https://periodicos.ufmg.br/index.php/rbpec 06
Educação em
Ciências (RBPEC)

Google Acadêmico https://scholar.google.com.br/?hl=pt 24

Fonte: Autor (2022).

Volume II 237
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Essas bases foram selecionadas devido à importância para a produção


acadêmica nacional e internacional, sendo, também, necessária para as buscas
do descritor STEM, principalmente por se tratar de uma área em constante
crescimento no Brasil e em crescente escala de produções acadêmicas como
referência.

Os descritores usados foram: “Alfabetização Científica”, “Aprendiza-


gem Significativa”, “Cultura/Enculturação Científica” e “STEM”. As buscas
ocorreram de forma diferente em cada base de dados, visto que o cruzamento
dos descritores não demonstrou o resultado esperado quando agrupados em
conjunto, surgindo resultados escassos quando utilizados em trio. Obteve-se,
então, resultados significativos quando aplicados em duplas e individualmen-
te. As buscas foram alternadas, utilizando os operadores booleanos AND, OR,
Aspas duplas e parênteses, descritos por Santin (2021, p.16) como um “Re-
curso Importante para a pesquisa em bases de dados [...] pois tem a finalidade
de compor adequadamente a estratégia de busca, amplia as possibilidades e a
especificidade para o filtro de resultados relevantes para a pesquisa”, refinando
a busca por área de concentração ligada às temáticas de Ciências, Matemática,
Engenharia e Tecnologia (STEM).

Foi utilizado um gerenciador de referências descrito como uma das


“ferramentas acadêmicas que permitem a organização de bibliotecas pessoais
de referências e arquivos, a organização e o fichamento de leituras, e a inclu-
são/formatação automática de citações e referências em diversos estilos de
normalização” (SANTIN, 2021, p.23), cuja finalidade é qualificar, agilizar e
contribuir para a formatação e a organização do estudante/pesquisador. No
caso em questão, foi utilizado o software Zotero, descrito por Santin (2021,
p.23) como um:

Volume II 238
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

software gratuito de gerenciamento de referências e citações. Permite


armazenar, organizar, compartilhar e gerar referências recuperadas em
diversas bases de dados. Possui as versões web e desktop e pode ser
integrado aos editores de texto para geração automática de citações e
referências.

Primeiramente, os documentos foram selecionados de acordo com o tí-


tulo temático e a relação com o descritor. Em momento posterior, o montante
encontrado foi selecionado através da leitura de seu resumo e da relevância
para a pesquisa em andamento. Ainda assim, havia um número significativo
de obras. Optou-se, então, pela aplicação de um terceiro filtro de inclusão para
cada descritor, citados no Quadro 2.

Quadro 2. Critérios de análise e seleção dos documentos após a seleção primá-


ria e secundária.

Descritor Critério

Alfabetização Produção documental/acadêmica utilizando a


Científica Alfabetização Científica como foco.
Produções documental/acadêmica que tenham o
Cultura/Enculturação
termo Cultura Científica ou Enculturação Científica
Científica
vinculado à educação.

Aprendizagem Produções documental/acadêmica que abordem a


Significativa Aprendizagem Significativa no ensino fundamental.

Produções que usem abordagens STEM como


STEM
ferramenta educacional.

Fonte: Autor (2022).

Foram encontrados, inicialmente, 84 resultados pertinentes aos critérios


primários (título temático), dos quais, após aplicação do segundo critério (leitu-
ra dos resumos), selecionou-se 72 publicações, que foram submetidas ao tercei-
ro critério (citado acima no quadro 2). Tal critério refinou o material encontrado

Volume II 239
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ao número de 53 itens para leitura na íntegra e análise qualitativa do material,


observando o seu conteúdo e a correlação com a proposta de pesquisa em an-
damento, selecionando-se, então, as produções que tratavam da alfabetização
científica e sobre como estimular/mensurar sua evolução, se estimulavam a
disseminação/aquisição da cultura científica nos ambientes educacionais e fora
deles, se as abordagens utilizavam conceitos significativos de ensino e apren-
dizagens e, por fim, se as aplicações também usavam conceitos ancorados no
STEM. Restaram, então, os itens selecionados, que descritos na análise e na
discussão de resultados, serão aproveitados como ferramental teórico na dis-
sertação.

Análise e discussão de resultados  

Ao cruzar os descritores para a busca de referenciais teóricos nas bases


de dados já citadas, observou-se que não houve resultados quando se usou os
descritores conectados, através dos operadores booleanos, bem como, também,
não houve resultados significativos na utilização de três descritores, o que acar-
retou o surgimento de materiais para possíveis análises, a partir do cruzamen-
to de dois descritores. Logo, em uma primeira análise de critérios de corte
de acordo com o título temático, nas 5 bases, foi encontrado um montante de
84 trabalhos entre teses, dissertações e artigos nacionais e internacionais, haja
vista que o descritor STEM ainda não tem amplitude de produções nacionais,
sendo, então, escassos os seus resultados. O mesmo fato se repetiu com o des-
critor Enculturação Científica que foi alternado durante as buscas pelo termo
“cultura científica”, porque apresentou maior potencial de busca. Percebe-se
que, em muitos trabalhos, o termo Enculturação surge como uma variação do
termo Alfabetização. Já em outros, é tratado como parte da cultura individual
do ser aprendiz e do seu convívio em sociedade, aplicando os conhecimentos
oriundos do meio científico.

Volume II 240
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Usou-se como refinamento as publicações feitas nas bases de dados que


estivessem dentro do tempo e do espaço delimitado entre janeiro de 2019 e de
outubro de 2022, filtrando a busca por área de ensino voltada à educação em
ciências, matemática, engenharia e tecnologia, estreitando, assim, as buscas
em relação aos referenciais do programa de pós-graduação ao qual o autor é
vinculado.

Ao final das buscas, foram encontradas 84 publicações, dentre as quais,


após a leitura do resumo e utilização do critério de corte, restaram 53 para a
leitura na íntegra. Utilizando critérios de análise e afinidade com a proposta de
pesquisa; os resultados foram divididos de acordo com o descritor nas seguin-
tes proporções descritas no Quadro 3.

Quadro 3. Resultados totais encontrados e selecionados após a primeira


análise.

Cultura/
Alfabetização Aprendizagem Quantidades
STEM Enculturação
Científica Significativa Totais
Científica

Encontrados: 25 Encontrados: 34 Encontrados: 10 Encontrados: 15 Total: 84


Selecionados: 13 Selecionados: 23 Selecionados: 05 Selecionados: 12 Total: 53

Fonte: Autor (2022).

Após esse sequenciamento, os arquivos foram lidos em sua totalidade e


selecionados conforme critérios de proximidade com os descritores e com a
temática proposta para este trabalho. Obteve-se os seguintes resultados e es-
colha dos documentos que mais se enquadram e adequam com a pesquisa em
andamento.

Volume II 241
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Aprendizagem significativa

Segundo Ausubel, “a Aprendizagem Significativa é o processo através


do qual um novo conhecimento se relaciona de maneira não-arbitrária e subs-
tantiva (não-literal) com a estrutura cognitiva do aprendiz” (AUSUBEL, 2003,
p.21). Moreira corrobora no sentido de que a Aprendizagem Significativa “é
uma teoria cognitivista construtivista que se ocupa da cognição, com signifi-
cado, em situação formal de ensino” (MOREIRA, 2013, p.43), onde uma nova
informação se ancora em um conhecimento já existente na estrutura cognitiva
do indivíduo, os chamados e definidos pelos mesmos autores como subsunço-
res. Nesse sentido, a presente revisão de literatura buscou por autores que fize-
ram uso desses conceitos para trabalhar em pesquisas relacionadas ao ensino e
aprendizagem no Ensino Fundamental, período em que deve haver o processo
de alfabetização e letramento dos indivíduos nele inseridos.

Os autores descritos no Quadro 4 trabalham o conceito de Aprendizagem


significativa de forma interconectada e coerente ao cotidiano escolar interdis-
ciplinar, sendo essa abordagem, realizada através de atividades lúdicas e de
contextos onde os estudantes colocam a mão na massa e aprendem, através
de diferentes metodologias, como: conexão entre teoria e prática, efetivada
através de feiras de ciências, aplicação de sequências didáticas e utilização dos
clássicos e de eficazes mapas mentais e conceituais que são fundamentais para
o aprendizado de conceitos físicos de movimentos dos objetos. Os trabalhos fa-
zem uso de análises quantitativas e qualitativas para sua formulação, trazendo,
também, marcos teóricos do desenvolvimento do ser humano como conexão
para a aprendizagem se tornar significativa no cotidiano escolar.

A observação dos pesquisadores selecionados quanto à utilização des-


ses mecanismos de trabalho junto ao modelo educacional foi muito relevante

Volume II 242
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

para o Ensino em Ciências, uma vez que as clássicas feiras de ciências são, e
sempre serão, mecanismos de disseminação da ciência e do fazer científico
dentro e fora da sala de aula regular. O uso de sequências didáticas otimiza e
potencializa o processo de apropriação do saber, bem como norteia o ensino
do profissional, minimizando as lacunas no processo de aprendizagem, sendo
possível, também, analisar as habilidades e as atitudes desenvolvidas através
das competências propostas pela BNCC.

Das análises feitas nos 5 arquivos finais do descritor Aprendizagem Sig-


nificativa, escolheu-se 3 deles para serem utilizados como aporte teórico da dis-
sertação, pois seguem a mesma linha proposta para a pesquisa e estão alinhados
à dissertação. Esses estão apontados abaixo no Quadro 4.

Quadro 4. Trabalhos relacionados sobre Aprendizagem Significativa para se-


rem usados como aporte teórico da dissertação.

Título do Trabalho Autor Tipo/Ano

A Feira De Ciências Como Instrumento


Taise Helena Dissertação
Para Promoção Da Aprendizagem
De Sousa Silva 2019
Significativa No Ensino De Ciência
Sequência Didática: Uso De Mapas
Mentais E Mapas Conceituais No Auxílio
Alexandre Dissertação
À Aprendizagem Significativa Do Conceito
Baratta Santana 2019
De Velocidade Média, Com Foco
Na Alfabetização Científica
Arthur Philipe
Cândido
Análise das Habilidades e Atitudes na
Magalhães;
Aprendizagem Significativa Crítica Artigo
Jesus Angel
de Fenômenos Físicos no Contexto das 2020
Meneses Villagrá;
Séries Iniciais
Ileana María
Greca.

Fonte: Autor (2022).

Volume II 243
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Todos os trabalhos são resultados de dissertações e de artigos científicos,


cujos autores se fazem valer da Aprendizagem Significativa, buscando, além
desse conceito, trabalhar, também, a Alfabetização Científica, através de abor-
dagens eficazes em sala de aula, dinamizando o ensino e a aprendizagem da
disciplina de ciências e sendo coerente com a pesquisa realizada, bem próxima
da abordagem estabelecida como meta.

Enculturação/cultura científica

O processo cultural científico deve ser entendido “como um processo de


Enculturação Científica, isto é, temos que levar os alunos a entenderem e a par-
ticiparem da cultura científica fazendo com que pratiquem seus valores, suas
regras e principalmente as diversas linguagens das ciências” (SASSERON;
CARVALHO, 2011, p.60). A expressão Enculturação Científica é utilizada por
autores como Carvalho e Tinoco (2006), Mortimer e Machado (1996), no sen-
tido de que o Ensino de Ciências deve proporcionar condições para que os es-
tudantes, além das próprias culturas em que estão inseridos, passem, também,
a incorporar as noções, as ideias e os conceitos científicos, desenvolvendo, as-
sim, habilidades para a participação de debates dessa cultura, propondo que:

os autores brasileiros que usam a expressão Enculturação Científica partem


do pressuposto de que o ensino de Ciências pode e deve promover condi-
ções para que os alunos, além das culturas religiosa, social e histórica que
carregam consigo, possam também fazer parte de uma cultura em que as
noções, ideias e conceitos científicos são parte de seu corpus. Deste modo,
seriam capazes de participar das discussões desta cultura, obtendo informa-
ções e fazendo-se comunicar (SASSERON, 2008, p.11).

Esse termo vem sendo difundido como variação de Alfabetização Cien-


tífica. Alguns autores citam e aproximam a Alfabetização Científica da Encul-
turação Científica, referindo-se, então, ao “conjunto de características humanas
que se criam, preservam e se aprimoram através da comunicação, cooperação e

Volume II 244
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

convívio em sociedade, embora ainda em crescimento no meio de pesquisa em


ciências, ainda está entrelaçado nas raízes da alfabetização científica agregando
e fazendo-se presente no processo de construção dos saberes científicos” (SAS-
SERON; CARVALHO, 2011, p.60). Difere, conforme as autoras, do processo
de Alfabetização Científica, tendo como objetivo final o processo de Alfabeti-
zação e letramento, resultando a enculturação como ato final desses processos.
Porém, não está desvinculado, sendo mais voltado para o processo de utilização
dos conhecimentos científicos em meio à sociedade, a fim de que a cientificida-
de dos processos defendidos pelas ciências seja menos inferiorizada em tempos
de fake news.

Para esse descritor, foram encontrados 15 itens, selecionados através dos


critérios de inclusão e exclusão no período estabelecido. Realizou-se a leitura,
na íntegra, de todos os arquivos, selecionando-os para os estudos da dissertação
um montante de 09 publicações que continham o aprofundamento necessário e
condizente. Abaixo, estão eles apresentados no Quadro 5:

Quadro 5. Trabalhos relacionados sobre Cultura/Enculturação Científica para


serem usados como aporte teórico da dissertação.

Título Do Trabalho Autor Tipo/Ano

A Natureza Da Ciência Pelas Lentes Do


Cristiano Moura;
Currículo: Normatividade Curricular, Artigo
Tânia Camel;
Contextualização E Os Sentidos De 2020
Andreia Guerra.
Ensinar Sobre Ciências
A Pesquisa Em Ensino De Ciências E A Giselle Faur De
Educação Científica Em Tempos De Pandemia: Castro Catarino; Artigo
Reflexões Sobre Natureza Da Ciência José Cláudio De 2021
E Interdisciplinaridade Oliveira Reis.
As Ciências Da Terra E Do Universo E Suas
Possibilidades Interdisciplinares: Um Carolina Silveira Dissertação
Estudo Com Alunos Do 5º Ano Do Leite 2019
Ensino Fundamental

Volume II 245
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Dayvisson Luís
As Representações Do Ensino De Ciências
Vittorazzi;
De Um Grupo De Professores Do Ensino Artigo
Alcina Maria
Fundamental: Implicações Na Formação 2020
Testa Braz Da
Científica Para A Cidadania
Silva

Guilherme Da
Da Reformulação Discursiva A Uma Práxis
Silva Lima; Artigo
Da Cultura Científica: Reflexões Sobre
Marcelo 2019
A Divulgação Científica
Giordan.

Ensino De Ciências Da Natureza E Conceitos Valter Carabetta Artigo


Científicos Junior 2022

Ana Glória B.
Bezerra De
Sousa Lima;
Projeto Vida: Educação Científica Fernanda
Artigo
Para Estudantes Do Ensino Fundamental Heloisa Cruz
2019
Anos Iniciais Marques;
Rozicleide
Bezerra De
Carvalho.

Bruno Francisco
Melo Pereira;
Uso Da Linguagem Cinematográfica
Eliane Ferreira Artigo
Para Promover A Argumentação E
De Sá; 2019
Enculturação Científica
Marina Assis
Fonseca.

Entre Fake News E Boatos, Lorotas, Fofocas


Luiz Alberto De Monografia
E Potocas: A Divulgação Científica
Souza Filho 2020
Em Tempos De Desinformação

Fonte: Autor (2022).

Volume II 246
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Foram encontradas 09 publicações que se valem do contexto cultural e


da disseminação da cultura científica, através de atividades e olhares de espe-
cialistas no ensino de ciências, debatendo acerca das necessidades e eficácias
dessa área. O objetivo é o processo de enculturação e de disseminação/utili-
zação da cultura científica no cotidiano escolar e social, percebidos através
dos trabalhos dispostos no Quadro 5, os quais tratam sobre as normativas
curriculares que estão em transformação desde a implementação da BNCC
(Base Nacional Comum Curricular) no ano de 2017 e vigorando até o atual
momento. Tais trabalhos ampliam a necessidade do ensino por investigação
cada vez mais cedo no ambiente educacional, evidenciando o fazer científico
como ferramenta de prática e informação/formação social, combatendo as
fakes news acerca da ciência, trazendo, também, para o Ensino em Ciências
os debates socioambientais contemporâneos, a formação continuada como
uma necessidade para a revisão de materiais e métodos de trabalho docente,
bem como para o projeto de vida dos estudantes.

Todas as 09 publicações corroboram a proposta de análise documental,


versando sobre a divulgação científica a favor da Cultura/Enculturação Cientí-
fica no ambiente educacional, trabalhando desde abordagens interdisciplinares
até os percalços da desinformação para com os dados científicos em períodos
pandêmicos e de desinformação.

STEM

O termo STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics) é


um acrônimo proveniente da língua inglesa e “faz referência a um movimento
educacional que busca trabalhar o conhecimento de forma integrada, obser-
vando aspectos relacionados à ciência, tecnologia, engenharia e matemática”
(SANTOS et al, 2022, p.51). Essa metodologia é utilizada como uma tentativa
de promover o pensamento crítico, a análise e o desenvolvimento do trabalho

Volume II 247
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

em equipe, incentivando os alunos a integrarem processos e conceitos do mun-


do real, desenvolvendo as competências para sua educação, trabalho e vida
cotidiana. É vista como uma abordagem educacional que busca:
[...] alcançar os jovens em várias frentes simultâneas, de modo muito mais
abrangente e sem a segmentação observada nas salas de aula. Seu principal
objetivo é trabalhar conceitos de várias áreas do conhecimento simultanea-
mente, de forma com que o aluno consiga entender o conteúdo proposto e
consiga aplicá-lo em outros ramos científicos (LINS et al, 2019, p.01).

As publicações encontradas nesse descritor foram muito importantes


para reforçar o que já se conhece sobre esse acrônimo, pois se trata de um
tema emergente e que já possui ramificações em sua dinâmica, sendo encon-
tradas também publicações com a adição da disciplina de Artes, potenciali-
zando e ampliando as opções de ensino e aprendizagem. Os trabalhos reali-
zados pelos autores selecionados evidenciam que essa forma de trabalho, no
meio docente, pode ser adaptada a qualquer tema ou objeto do conhecimen-
to, sendo, então, interdisciplinar e objetivando o ensino e as aprendizagens
significativas dos estudantes. Evidências são destacadas nas publicações que
tratam da conexão entre a área de química e os componentes de Arduino, pro-
fissionais que se utilizaram dessa abordagem para diversificar seu contexto
de trabalho, uso conectado com a disciplina de inglês, uso de salas maker ou
ambientes chamados markerspace para o ensino, iniciação científica e inves-
tigação no ambiente escolar, trazendo, então, uma nova roupagem no fazer
educacional contemporâneo, acompanhando, assim, a evolução tecnológica
e, possivelmente, educacional.

Todas essas abordagens e mecanismos usados ainda não estão disponí-


veis e acessíveis a todos os participantes do sistema educacional. Porém, há o
movimento de investimento de alguns segmentos municipais e estaduais acerca
desse ferramental, a fim de proporcionar uma visão diferenciada para o fazer
científico e tecnológico, beneficiando, dessa forma, o ensino das habilidades

Volume II 248
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

científicas e o Ensino de Ciências, esse, que teve muitas reformulações frente


à BNCC. Os resultados obtidos pelos pesquisadores selecionados mostram que
o uso de abordagens STEM no cotidiano educacional tem potencial de desen-
volvimento de diversas áreas do conhecimento, tornando o aprendizado dos
conhecimentos, habilidades e atitudes uma ação mútua, ampliando e possibili-
tando a aprendizagem por parte do aprendiz, demonstrado através das análises
e dos resultados dos trabalhos selecionados.

Na revisão realizada nos documentos desse descritor, foram encontradas


25 publicações pertinentes ao tema norteador desta pesquisa, sendo que, após
a aplicação dos critérios de seleção e corte, foram selecionados 13 para a leitu-
ra na íntegra, restando, então, 08 itens para integrarem parte do referencial da
pesquisa em andamento, conforme sequenciados no Quadro 6.

Quadro 6. Trabalhos relacionados sobre Metodologia e Abordagens STEM e


possíveis variações para serem usados como aporte teórico da dissertação.

Título do Trabalho Autor Tipo/Ano


Abordagem STEM Com Interfaces Arduino
Relatório Do
No Ensino Experimental Da Química: Marcos
Projeto De
Implementação E Avaliação De Uma António Da Silva
Investigação De
Proposta Pedagógica No 10.º Ano De Lopes
Mestrado 2022
Escolaridade.
Relatório Do
A Abordagem STEM Em Contexto De Marisa Isabel
Projeto De
Educação De Infância: Práticas E Desafios Ferreira
Investigação De
De Uma Jovem Educadora Bação
Mestrado 2019
Mauricio Antonio
Dos Santos;
Judah Américo
Aplicação Da Abordagem STEM
Dos Santos Brito; Artigo
Integrada Ao Inglês Voltada Aos Alunos
Luiza Maria 2022
Da Educação Básica
Valdevino Brito;
Junio Moreira
Alencar.

Volume II 249
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Implementação De Um Makerspace Na
Thatiane Verni Dissertação
Perspectiva STEM Em Séries Iniciais Do
Lopes De Araujo 2019
Ensino Fundamental

Interdisciplinaridade Na Investigação Dos Eduardo Da Silva


Princípios Do STEM /STEAM Education: Machado; Artigo
Definições, Perspectivas, Possibilidades E Gildo Girotto 2019
Contribuições Para O Ensino De Química Júnior.

Francisco
Antonio Vieira
Lins;
O Uso Da Metodologia STEM
Elwis Gonçalves
(Science, Technology, Engineering And Artigo
De Oliveira;
Mathematics) No Ensino De Química: 2019
Lucas Ferreira
Uma Proposta A Ser Aplicada.
Batista;
Ariana Leticia
Furtado Abrantes.

STEM Education – Um Panorama E Sua Gustavo Oliveira Artigo


Relação Com A Educação Brasileira Pugliese 2020

Possibilidades De Ensino Interdisciplinar A


Partir Do STEAM Education: Um Desafio Dulcilene Barreto Dissertação
Lançado Aos Licenciandos De Ciências Da Ruiz Dias 2021
Natureza

Fonte: Autor (2022).

Todas as 08 publicações escolhidas e listadas acima estão de acordo com


os critérios de elegibilidade adotados para a revisão de literatura, sendo es-
sas as que mais se aproximaram da proposta de trabalho com a metodologia e
abordagem STEM no cotidiano escolar, tendo, também, a inclusão da letra “A”
em alguns documentos selecionados, significando e agregando a disciplina de

Volume II 250
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Artes em alguns trabalhos, pois, conforme algumas leituras que utilizam desse
acréscimo, tendem a aprimorar os conceitos relacionados à visão espacial das
outras áreas já existentes no contexto STEM. Nesse sentido, “a arte e o design
teriam uma função de engajar os estudantes em ciência e tecnologia, tornando
o ambiente de aprendizagem mais produtivo e substancial” (PUGLIESE, 2020,
p.211).

Alfabetização científica

Durante o caminho da revisão realizada desse descritor, foram encontra-


das 34 publicações pertinentes, sendo que, após os critérios de análise, 23 foram
selecionadas para a leitura na íntegra, restando, então, 17 itens para integrarem
parte do referencial da pesquisa em andamento, conforme listados no Quadro 7.

Quadro 7. Trabalhos relacionados sobre Alfabetização científica e possíveis


variações para serem usadas como aporte teórico da dissertação.

Título do Trabalho Autor Tipo/Ano

Virginia Roters
A alfabetização científica nos anos iniciais: Artigo
Da Silva;
Os indicadores evidenciados por meio de 2020
Leonir Lorenzetti.
uma Sequência didática
Cristiane Assis
De Siqueira; Artigo
A importância da alfabetização científica
Raphael Guazzelli 2019
Valerio.
Werner Zacarias
Abordagem dos temas alfabetização
Lopes; Artigo
científica (ac) e ciência, tecnologia,
Rosane Nunes 2019
sociedade (cts)
Garcia.
Amanda Cristina
Alfabetização científica e criança: análise de Teagno Lopes Artigo
potencialidades de uma brinquedoteca Marques; 2019
Martha Marandino.

Volume II 251
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Alfabetização científica e domínios do Maíra Batistoni


conhecimento científico: proposições para E Silva; Artigo
uma perspectiva formativa comprometida Lúcia Helena 2021
com a transformação social Sasseron.
Cristina Aparecida
Alfabetização científica nos anos iniciais:
De Oliveira; Artigo
urgência em investir na formação de
Patricia Da Silva 2022
professores
Sessa.
Werner Zacarias
Contribuições e desafios no processo
Lopes; Artigo
formativo de professores dos 4° e 5° anos
Rosane Nunes 2021
na temática da alfabetização científica (ac)
Garcia.
Docência compartilhada e ensino interdisci- Débora Perônio
plinar nas Ciências da Natureza na Educação Da Silva; Artigo
Básica: uma revisão bibliográfica no período Rosane Nunes 2022
de 2017 a 2021 Garcia.

ENSINO DE CIÊNCIAS POR


INVESTIGAÇÃO: contribuições da leitura Tamiris De Almeida Dissertação
para a Alfabetização Científica nos Silva 2020
anos iniciais
Fernanda Monteiro
Rigue;
O Ensino de Ciências e a Formação
Micheli Bordoli Artigo
de Professores: A criança e a alfabetização
Amestoy; 2019
científica
Guilherme Carlos
Corrêa.
O ensino de ciências na promoção da
Márcia Maria
alfabetização científica no contexto da Dissertação
Da Rosa Sanches Da
educação infantil: aproximações a partir 2021
Silva Rizzi
da bncc
Carla Daeski De
Professores de educação infantil e
Andrade; Artigo
suas percepções em relação à alfabetização
Leila Inês Follmann 2021
científica
Freire.

Sobre ensinar ciências, investigação e nosso Lúcia Helena Artigo


papel na sociedade Sasseron 2019

Volume II 252
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Werner Zacarias
Promoção da alfabetização científica(ac):
Lopes; Artigo
construção, formação e desenvolvimento na
Rosane Nunes 2021
prática docente
Garcia.

Tatiana Schneider
Vieira De Moraes;
Débora Vanessa
Perfil dos estudos sobre Alfabetização
Camargo; Artigo
Científica no Ensino Fundamental: uma
Sônia Maria Petitto 2021
pesquisa bibliográfica
Ramos;
José Salustiano Da
Silva.

Ileana Cardoso Da
ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA NOS Silva Calasso; Artigo
ANOS INICIAIS: Reflexões teóricas José Augusto 2019
Mendes Sobrinho.

Práticas e contextos da produção científica


no Ensino de Ciências na perspectiva da Juliana Carvalho Tese
Alfabetização Científica nos anos iniciais Pereira 2020
do Ensino Fundamental

Fonte: Autor (2022).

“A Alfabetização Científica é o processo pelo qual a linguagem das


ciências naturais adquire significados, de modo a possibilitar aos alunos a
compreensão de seu universo, propiciando o acesso a novas formas de conhe-
cimento e cultura, capacitando-os a exercer a cidadania na sociedade em que
vivem” (LORENZETTI, 2000, p.13). Tem sua origem a partir da tradução de
Scientific Literacy para a língua portuguesa, trazendo para a Alfabetização
Científica e tratada contemporaneamente por alguns autores, como Sasseron,
Carvalho, Lorenzetti, Andrade, dentre outros, como a similaridade para com
o Letramento Científico e a Enculturação Científica.

Volume II 253
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Sasseron e Carvalho são citadas por diversas vezes nos documentos que
fazem parte do corpus de análise, trazendo a apresentação de três eixos bases
para que a Alfabetização Científica possa se concretizar, “a saber: 1) a com-
preensão básica de termos e conceitos científicos; 2) a compreensão da nature-
za da ciência e dos fatores que influenciam sua prática; 3) o entendimento das
relações entre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente” (SASSERON, 2015.
p. 56). Para ela, esses eixos surgem “da análise de referenciais da área de En-
sino de Ciências que apresentavam ideias e habilidades a serem desenvolvidas
com o intuito de que a Alfabetização Científica ocorra” (SASSERON, 2015,
p.56), refletindo, assim, sobre “a concepção de Alfabetização Científica como
um processo de aprendizagem potente para o Ensino de Ciências e que se cons-
titui em uma ferramenta para a formação científica desde os anos iniciais vi-
sando uma formação mais crítica, social e política das crianças e adolescentes”
(CAMARGO; RAMOS; MORAES, 2021, p.03).

As publicações apresentadas trabalham a alfabetização científica de for-


ma interdisciplinar. Objetivou-se a seleção por publicações que estivessem ade-
quadas ao Ensino Fundamental I, respectivamente, no 4º e 5º ano, pois é nesse
período que a Alfabetização se intensifica e se consolida na estrutura da grande
maioria dos indivíduos. Os trabalhos versam sobre o contexto teórico do des-
critor, contextualização ao longo do tempo, importância, métodos de aborda-
gens que potencializam efeito/impacto no ambiente educacional; uma vez que
proporcionam melhorias no contexto profissional e social dos envolvidos nas
pesquisas selecionadas, estimulando o ensino por investigação alicerçado na
BNCC, incitando a prática/aperfeiçoamento docente.

Todos os trabalhos selecionados desse descritor estão de acordo com o


fazer científico, evidenciado nos resultados e discussões dos objetos de análi-
se; beneficiando, dessa forma, o Ensino em Ciências e traçando um parâmetro
de análise e reflexão do fazer educacional na disciplina específica, ensino este

Volume II 254
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

que, depende muito da ação do profissional e de seu olhar científico e norteador


da aprendizagem, através de mecanismos próprios. Os resultados encontrados
apontam para essa necessidade, de se conhecer, saber fazer e saber ser ciência
no ambiente educacional, proporcionando, assim, a alfabetização científica no
fazer ciência dentro e fora de sala de aula.

Todas as 17 publicações utilizam-se do descritor principal e têm varia-


ções de abordagens metodológicas de acordo com a finalidade e a proposta de
cada pesquisa/documento. Utilizam-se dos mesmos autores como referencial
teórico, considerando também, os autores utilizados na proposta de dissertação
desta pesquisa, estando todos os itens dentro dos critérios de corte e inclusão
para o corpus do documento final. Salienta-se que todas as publicações seguem
a proposta de Chassot (2003, p.91), que diz: “o ser alfabetizado cientificamente
deverá saber ler a linguagem em que está escrita a natureza, sendo um analfa-
beto científico aquele incapaz de uma leitura do universo”.

Considerações finais

Ao finalizar a presente revisão, deparo-me com uma carga de aprofun-


damento teórico de grande valia, porém inacabada, pois a aquisição do co-
nhecimento é contínua e progressiva, assim como o processo de alfabetização
científica, a partir do Ensino de Ciências presente nessa busca, pois “aprender
ciências de forma contextualizada e com significado, leva a uma melhoria so-
cial; uma vez que o aprendizado possibilita essa (re)significação da realidade,
minimizando uma percepção ingênua da sociedade e permitindo a construção
de uma visão crítica” (SILVA; GARCIA, 2022. p.02).

Há, então, a necessidade contemporânea e contínua do ser e fazer edu-


cação como um todo, formando significados a partir dos processos de fazer a
cultura científica de forma significativa, já que “o processo de ensino-aprendi-

Volume II 255
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

zagem está progressivamente diferenciando sua estrutura cognitiva e fazendo


a reconciliação integradora de modo a identificar semelhanças e diferenças,
reorganizando seu conhecimento, ou seja, o aprendiz constrói seu conhecimen-
to e, também, produz seu conhecimento” (MOREIRA; MASINI, 2006, p.46).
Nesse sentido, tal como propõe Ausubel, através da sua teoria da Aprendiza-
gem significativa, o ser aprendente, usando-se de seus subsunçores, reconstrói
os significados do que já conhece, aprimorando e ampliando seu conhecimento,
conduzindo-o à aprendizagem cognitiva.

A cada dia, torna-se mais necessária uma abordagem que possa ser utili-
zada como ferramenta eficaz em sala de aula e fora dela, trazendo a significa-
ção do aprendizado, com o intuito de alfabetizar cientificamente os estudantes
participantes da pesquisa e enculturar cientificamente a sociedade escolar. Por
esse fator, a busca pelo descritor STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e
Matemática) apresentou-se como uma possível ferramenta metodológica a ser
usada, pois aborda áreas distintas de conhecimento de uma proposta didática
e está em constante crescente nacional; fato esse percebido durante as leituras
dos arquivos selecionados. O potencial de ensino e aprendizagem desse tipo
de abordagem é amplo e merece um olhar mais detalhado, pois estimula várias
áreas cognitivas durante a sua aplicação.

A busca de produções que façam a conexão entre os descritores e o En-


sino Fundamental I é relevante, pois é nessa modalidade de ensino que os es-
tudantes aprendem e precisam de significados naquilo que aprendem. Durante
a busca de produções, não foram encontradas publicações, quando utilizados
em conjunto, sendo que, apenas no cruzamento de dois em dois, mostrou-se
eficiente e com resultados potencialmente utilizáveis, demonstrando, assim, a
necessidade e a importância da pesquisa que está em andamento. Foram en-

Volume II 256
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

contradas publicações que evidenciam a preocupação contemporânea com a


Alfabetização Científica, pois, ao longo do contexto histórico e das traduções,
constata-se a preocupação com o significado desse termo para a continuidade
da cultura científica nos ambientes escolares, através de diversos autores que,
a priori, dão continuidade aos trabalhos já produzidos e, de certa forma, uma
nova visibilidade e formatos ao descritor.

A aprendizagem significativa tem se tornado um desafio contemporâneo,


já que, por vezes, o advento da evolução tecnológica não é aproveitado como
ferramenta em sala de aula. As propostas de aula dos profissionais também não
são atrativas aos olhos dos estudantes, dificultando e desafiando os profissio-
nais para que consigam, de forma eficaz, proporcionar uma aprendizagem mais
significativa aos estudantes. Nesse viés, as abordagens STEM podem ser uma
ferramenta eficiente para o ambiente de ensino e aprendizagem, fator esse ob-
servado nas publicações analisadas. Por fim, a Enculturação Científica é tratada
nos documentos analisados como uma vertente similar à Alfabetização Cientí-
fica, em que percebo, enquanto pesquisador, que tem potencial para ser um pro-
cesso oriundo da Alfabetização e do Letramento Científico dos grupos sociais,
pois se aproxima bastante do processo de aquisição da cultura científica.

Percebe-se que a Enculturação Científica é o resultado final dos proces-


sos de Alfabetização Científica e do Letramento Científico, onde um estudante
é capaz de se fazer valer do conhecimento científico adquirido para o conví-
vio em sociedade, fazendo-se comunicar e interpretar os fatores ambientais e
científicos, semelhante a quando se utiliza da cultura linguística, matemática,
geográfica, etc, aproximando-se mais da denominada Cultura Científica. A En-
culturação é trazida pelos autores com uma certa similaridade à Alfabetização e
ao Letramento Científico, percebida aqui, então, como um processo desprendi-

Volume II 257
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

do da Alfabetização Científica e do Letramento Científico, onde um grupo pode


ser Enculturado e, através dessa Enculturação, ser Alfabetizado e Letrado Cien-
tificamente nas atividades propostas nos ambientes educacionais e fora deles,
pois, se há a cultura científica do fazer ciências nos ambientes educacionais, o
ser ingressante estará no processo de enculturação.

Por fim, percebe-se que há a tentativa dos atores do sistema educacional


em tornarem a Alfabetização Científica uma Aprendizagem significativa, bem
como os profissionais, embora ainda tímidos, tentem integrar em suas aulas al-
guma abordagem metodológica que possa surtir um efeito melhor no processo
de ensino e aprendizagem, buscando, também, trazer o fazer científico para a
cultura do dia a dia educacional e fora dele também. A presente revisão vem a
estruturar o referencial teórico da dissertação e dar uma amplitude maior para
o Ensino em Ciências, reforçando as necessidades de melhorias nas formas
metodológicas, procedimentais e estruturais das aulas contemporâneas dos pro-
fissionais de educação.

Agradecimentos

Em especial, à minha esposa Patrícia Zuse, pela disponibilidade e suporte


em todos os momentos em que eu não posso me fazer presente; ao GPEEC-Na-
tureza, pelo acolhimento e estímulo enquanto coletivo; e ao meu Orientador de
mestrado, Prof. Dr. José Vicente Lima Robaina, pelo acolhimento, aconselha-
mento e puxões de orelha; também, à Universidade Estadual do Rio Grande
do Sul (UERGS), pelo acolhimento junto ao Programa de Pós Graduação em
Formação Profissional Para Docência em Ciências, Tecnologia, Engenharia e
Matemática (PPGSTEM).

Volume II 258
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Referências
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Volume II 259
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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2008.

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ção Científica: Uma Revisão Bibliográfica. Revista Investigações em Ensino
de Ciências – V16, p. 59-77, 2011.

Volume II 260
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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da e ensino interdisciplinar nas Ciências da Natureza na Educação Básica: uma
revisão bibliográfica no período de 2017 a 2021. Research, Society and Deve-
lopment, v. 11, n. 8, p. 2022.

Resumo: Esta Revisão de Literatura é resultado de uma pesquisa em andamento


junto à Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, tendo como por finalidade
analisar as produções textuais sobre os descritores Alfabetização Científica, Cultura/
Enculturação Científica, Aprendizagem Significativa e STEM (Ciência, Tecnologia,
Engenharia e Matemática), com suas abordagens educacionais, no período de 2019
até 2022. Buscou a temática junto às bases de dados da Biblioteca Digital Brasileira
de Teses e Dissertações (BDTD), da Rede de Revistas Científicas (Redalyc), Scien-
tific Electronic Library Online (SciELO), da Revista Brasileira de Pesquisa em Edu-
cação em Ciências (RBPEC) e no Repositório Google Acadêmico. A metodologia
baseou-se na revisão de literatura que denominamos de “Estudo do Conhecimento”.
Foram encontradas 84 produções com relação aos descritores supracitados, analisa-
das sequencialmente, através da leitura de seus respectivos resumos; restando, as-
sim, 53 produções para a leitura na íntegra. Utilizou-se quatro questionamentos que
nortearam a seleção do restante do material, os quais se encontram no corpo desta
escrita e estão apresentados em tópicos temáticos. Essas produções foram organiza-
das em uma plataforma de referências e citações, chamada “Zotero”. Os resultados
obtidos, nesta revisão de literatura, mostram dados promissores e relevantes para o
atual cenário educacional, bem como para a contribuição do ferramental teórico e
metodológico desta pesquisa.

Palavras chave: Alfabetização científica; Aprendizagem significativa; Enculturação


científica; STEM.

Abstract: This Literature Review is the result of an ongoing research at the State
University of Rio Grande do Sul, with the purpose of analyzing the textual produc-
tions on the descriptors Scientific Literacy, Scientific Culture/Enculturation, Mean-
ingful Learning and STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics),
with their educational approaches, from 2019 to 2022. It sought the theme from the
databases of the Brazilian Digital Library of Theses and Dissertations (BDTD), the
Scientific Journals Network (Redalyc), Scientific Electronic Library Online (SciE-
LO), the Brazilian Journal of Research in Science Education (RBPEC) and the Goo-

Volume II 261
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

gle Scholar Repository. The methodology was based on the literature review that
we call “Knowledge Study”. A total of 84 productions related to the aforementioned
descriptors were found, analyzed sequentially, through the reading of their respective
abstracts; thus leaving 53 productions for reading in full. Four questions were used
that guided the selection of the rest of the material, which are found in the body of
this writing and are presented in thematic topics. These productions were organized
in a reference and citation platform called “Zotero”. The results obtained, in this
literature review, show promising and relevant data for the current educational sce-
nario, as well as for the contribution of the theoretical and methodological tools of
this research.

Keywords: Scientific literacy; Meaningful learnin; Scientific enculturation; STEM.

Volume II 262
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 11

CLUBE DE CIÊNCIA STEM


COMO SUGESTÃO DE PROJETO
INTERDISCIPLINAR EM ESCOLA
DE EDUCAÇÃO BÁSICA,
CONTRIBUINDO COM O NOVO
ENSINO MÉDIO
Chamis Nédia Abdul Khalek
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-Y

Introdução

Este texto está de acordo com o que foi abordado na dissertação que
compõe o projeto de Mestrado Profissional em Docência para Ciências, Tecno-
logias, Engenharia e Matemática, (PPGMSTEM), oferecido pela Universidade
Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), do qual faz parte a Revisão sistemá-
tica literal (RSL). Esta gerou os estudos que procuramos apresentar como uma
proposta à viabilidade de se montar um Clube de Ciências STEM na escola e

Volume II 263
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

para que a partir desse trabalho conseguíssemos atender aos objetivos da pes-
quisa que compõe a Revisão sistemática literal (RSL).

Buscou-se, com isso, dar significado para a análise feita na Revisão siste-
mática literal (RSL) qualitativamente, baseado em bases confiáveis, referenciar
o trabalho como forma de contribuir com a formação de ideias que auxiliam
aos estudantes atuar em uma sociedade que está sempre em constante evolução.

O Clube de Ciências STEM busca apresentar uma ferramenta potencia-


lizada de ensino, com atividades que têm o intuito de chamar a atenção dos
alunos dos ensinos médio e fundamental, propondo articulações a fim de se
explorar as informações científicas que estimulam o processo de ensino-apren-
dizagem através de projetos STEM de forma interdisciplinar de ensino. O clube
tem o propósito de fazer o aluno pensar sobre a situação em estudo, no sentido
de construir um pensamento científico crítico sobre o objeto de estudo. Além
disso, os conteúdos propostos para o projeto Produto Educacional CCS vêm
agregar conceitos científicos tecnológicos, apropriando o aluno ao contato, tan-
to com a alfabetização científica quanto ao letramento científico, dependendo
do nível e turma de classe de estudo que os alunos clubistas frequentam. Em um
lugar de aprendizagem, num ambiente propício para a construção do conheci-
mento, a apropriação da alfabetização e letramento científico, colaborando com
o ensino por investigação (ZITKOSKI et al, 2021, p. 55) em uma abordagem
de aprendizagem significativa (AUSUBEL, 1982). Como forma interessante de
projetos para o ensino de Ciências interdisciplinar e STEM na educação básica
do novo ensino médio.

O estudo busca implementar no contexto escolar um Clube de Ciências


STEM, tendo este trabalho a intenção de corroborar para sua viabilidade do
funcionamento. Dessa forma, quer-se estimular, segundo Sasseron e Carvalho
(2011), que colocam sobre a compreensão das relações entre ciência, tecnolo-

Volume II 264
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

gia, sociedade e meio ambiente. Em concordância entendemos que o ambiente


seja envolvente que contribui com o ensino por investigação em uma aborda-
gem STEM interdisciplinar de aprendizagem significativa, como forma inte-
ressante de projeto proposto na educação básica, para que no CCS se tenha um
olhar significativo sobre a alfabetização cientifica e letramento científico, que é
imprescindível para que aconteça da forma, como descreve Freire (1980):

Mais que o simples domínio psicológico e mecânico de técnicas de escre-


ver e de ler, sendo o domínio destes conhecimentos em termos conscientes,
implicando em um auto formação em que possa resultar uma postura inter-
ferente do homem sobre seu contexto (FREIRE, 1980, p.111).

Carvalho e Sasseron (2011), quando se referem à alfabetização cientifica,


colocam que o conhecimento científico é formado por meros conteúdos cien-
tíficos, visto que a Alfabetização Científica (AC) é um processo contínuo que
envolve o pensar crítico e a tomada de decisões sobre as questões da avaliação
em situações que permitem ou culminem com a tomada de decisões e o posi-
cionamento (SASSERON, 2015, p.56). Porém, concordam com Freire (1980)
no sentido de que:

Um ensino que não almeja tão somente a formação de futuros cientistas,


mas que também forneça subsídios para que os alunos sejam capazes de
compreender e discutir os significados dos assuntos científicos e os apli-
quem em seu entendimento do mundo (CARVALHO; SASSERON, 2011,
p. 43-72).  

Nessa caminhada e a fim de auxiliar na contínua base do saber, que en-


volve a educação básica e o novo ensino médio, e em meio a objetivos propos-
tos para os educandos, temos como fim atingir com êxito, contribuindo com a
construção da aprendizagem significativa e do conhecimento, segundo David
Ausubel (1982), bem como complementar o ensinamento adquirido pelos mes-
trandos do Programa de mestrado para docentes (PGMSTEM) oferecido pela
UERGS.

Volume II 265
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A reforma proposta para o Novo Ensino Médio, a qual é tratada de acordo


com a Lei federal 13.415/2017, alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional e estabeleceu uma mudança na estrutura do Ensino Médio, com o au-
mento da carga horária e um currículo mais flexível. Tem como proposta ajudar
o aluno a ser protagonista tendo um repertório de ensinamentos em que ele pre-
cisa para fazer as escolhas certas, com a flexibilidade intelectual para aprender
coisas novas que deverão estar caracterizadas na própria interdisciplinaridade
do currículo proposto para o Novo Ensino Médio.

Será a partir do ano de 2023, de acordo com os Estados e Municípios que


a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, em seu artigo
26, inciso I estabeleceu que o currículo do ensino fundamental abrange “[...] o
estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico
e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil [...]” (BRA-
SIL, 2014, p. 19).

Diante das justificativas sobre a reforma, entendemos que ela foi propos-
ta para sanar a necessidade de se ver os jovens dentro da escola e de buscar os
que não estavam frequentando. Com isso conseguir oferecer um novo ensino,
com aulas mais atrativas, proporcionando como solução em uma concepção
utilitarista do conhecimento. Evidenciando isso nos itinerários formativos que
vem sendo propostos pelas escolas estaduais de Porto Alegre.

Tendo em vista as dificuldades que permeiam o trabalho do professor,


optou-se por desenvolver um estudo de forma a contribuir para com as áreas
de conhecimento, agregando atividades STEM, com enfoque interdisciplinar
em alguns conceitos e conteúdo que auxiliassem no Clube de Ciências STEM
(CCS) junto aos professores, com atividades que devem se adequar às possí-
veis nova forma de ensinar, em virtude das reformas curriculares. Estas que
estão alinhadas à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), de acordo com

Volume II 266
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

as normativas prescritas nas organizações propostas para o Novo Ensino Mé-


dio, de acordo com a (Lei federal 13.415/2017), com as disciplinas de física,
química e biologia as que migram para a área de conhecimento, como na área
das Ciências da Natureza e suas Tecnologias. Nesse interim, o Estado do RS e
as relações com cuidados para as novas regras já estão sendo tomados para que
as escolas estaduais se ajustem às mudanças do novo percurso que envolve o
ensino médio gaúcho nos calendários escolares ao longo dos próximos anos. E
é por conta disso que o CCS vem a incidir, onde Mancuso (1996 apud SEDIC,
1994, p.12) coloca que um Clube de Ciências é o lugar de encontro de variá-
veis, concordando com Behrendt (p. 82, 2017), que diz que Clubes de Ciên-
cias: “são organizações ou programas destinados a proporcionar às estudantes
oportunidades de explorar e participar diretamente em atividades relacionadas
à ciência”.

Nesse prisma, este estudo contribui com o aproveitamento de fontes lite-


rárias, ancoradas de forma a cumprirem as normas estabelecidas na base BNCC
e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que são uma coleção de do-
cumentos que compõem a grade curricular de uma instituição educativa e que
abordam questões relacionadas ao tema, pois estão de acordo com as políti-
cas públicas de incentivo ao conhecimento científico, seguindo as determina-
ções da legislação vigente (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
9.394/96, em seu artigo 26, inciso I), a qual diz que:
O Governo Federal e o Congresso Nacional, em parceria com as integra-
ções estaduais e municipais, estabeleceram o Plano Nacional de Educação
(PNE), de acordo com a lei 13.005/14, foram definidas múltiplas estraté-
gias e vinte metas em um plano de vigência de dez anos (2014-2024), na
busca pela universalização da Educação Básica para crianças e jovens de
4 a 17 anos e a alfabetização de todas as crianças até os 8 anos de idade
(BRASIL 2014b).

Ainda conforme a lei, pois convém destacar que traz a necessidade da


promoção científica, cultural, humanística e tecnológica com o desenvolvimen-

Volume II 267
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

to de tecnologias educacionais e de inovação nas práticas pedagógicas e apren-


dizagem dos alunos.

Baseados nessas legislações, objetivamos dar significados para o estudo


feito na RSL, tendo como apoio aportes teóricos significativos para a viabilida-
de de se montar o Clube de Ciências STEM, buscando argumentos plausíveis
descritos nas próximas seções.

Desenvolvimento da pesquisa

O desenvolvimento e o planejamento da RSL descreveram as principais


características que o texto aborda sobre o unitermo buscado, primeiramente
sozinho e após interconectado, demonstrando as suas aplicabilidades. O plano
também constituiu em delinear através da busca na internet os artigos e disser-
tações em banco de dados digitais acadêmicos de fontes seguras, uma vez que
estes apoiaram para a confiança da análise de dados desta pesquisa. Nesse viés
é que percebemos a necessidade de agregar os estudos interdisciplinares em
uma abordagem STEM.
...uma abordagem do trabalho pedagógico que favorece o desenvolvimen-
to da aprendizagem criativa e ativa, oportunizando aos estudantes tomar
decisões e avaliar resultados, por meio de projetos interdisciplinares que
buscam resolver problemas do mundo real (CARVALHO; APPELT, 2021,
p.70).1

O trabalho se estendeu a partir da escolha dos quatro unitermos, de forma


que todos os unitermos se cruzaram embasando teoricamente os autores que
se interconectaram com a objetividade de cogitarem a respeito dos saberes que
influenciam nas propostas do Clube de Ciências Stem (CCS).

Para tanto, primeiramente foram investigados cada um dos unitermos se-


paradamente e deles foram extraídos dados que, por sua vez, foram categori-

1https://www.academia.edu/76254433/Abordagem_STEAM_na_educa%C3%A7%-
C3%A3o_b%C3%A1sica_brasileira_uma_revis%C3%A3o_de_literatura

Volume II 268
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

zados no Plano de Análise Literal (PAL), respeitando em título, autor, data e o


link da publicação e, após a pesquisa, com seu devido cruzamento de unitermos
e, por fim, um trecho do que propunha o resumo de cada um dos trabalhos.

A proposta do estudo foi ajustada em um percurso metodológico de acor-


do com o julgamento do autor. Procuramos apresentar como a pesquisa bi-
bliográfica foi realizada; obtendo esclarecimentos e categorizações a partir do
uso da Análise Textual Discursiva (ATD), bem como a forma de apreciação de
resultados esperados para a pesquisa bibliográfica.

O levantamento bibliográfico inicial foi realizado no período de agosto


a novembro de 2022 e a coleta de dados se deu, primeiramente, a partir de
buscas em artigos e trabalhos disponíveis em periódicos publicados em bases
literárias confiáveis para o estudo do conhecimento, no período relativo entre
2019 e 2022, utilizando os seguintes acrônimos: Clube de Ciências (CCS) – In-
terdisciplinaridade (ID) – Alfabetização e letramento científico (ALC) – Ensi-
no por investigação (EI), para que com os cruzamentos dos unitermos fossem
interconectados, podendo assim serem debatidos e terem confiabilidade teórica
em cada uma das análises feitas pelo pesquisador. Tal busca implicou em um
estudo de alinhamento de ideias sobre o que se escreve a respeito deles na
contemporaneidade, apesar de serem palavras opostas e sem ligação, mas que
tem a possibilidade de serem aproveitadas de forma a interagir contemplando a
aquisição do conhecimento.

A pesquisa bibliográfica normalmente traz uma grande quantidade de


dados e informações para serem analisados. Nesse sentido, a ATD se apresenta
como método que possibilita a interpretação do material bibliográfico e textual,
bem como a posterior comunicação das compreensões do pesquisador a res-
peito do objeto investigado, contendo assuntos significativos para os unitermos
pesquisados com os seus devidos temas, os quais se cruzam proporcionando
um processo de relações entre os unitermos, desta vez, mais refinados.

Volume II 269
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Desígnio a atingir

Corroborar com a Revisão Sistemática Literária (RSL) qualitativamen-


te, através das investigações feitas, contribuindo também para que o estudante
consiga agir em uma sociedade, esta que está sempre em constante evolução;
promovendo assim, estímulos à alfabetização e o letramento científico, em um
ambiente que contribui com o ensino por investigação em uma abordagem
STEM, de forma interdisciplinar de aprendizagem significativa. Buscaremos
no CCS um contorno interessante de se trabalhar com projeto de ensino apren-
dizagem.

Para tanto, é por conta disso que o estudo relacionado com a RSL cor-
robora com a aprendizagem baseada em projetos. O artigo de Gil (1987), em
aspectos teóricos, informa alguns propósitos que são usados e auxiliam os estu-
dantes e profissionais, ao elaborar-se projetos de pesquisa. Estes que envolvem
o processo de criação científica, tendo como preocupação a natureza prática,
com atividades propostas para o CCS. Maneira usada para que futuramente
seja recomendado como forma de trabalho, com a intenção de produzir projetos
que ajudarão na montagem de um espaço Maker, com ênfase na disciplina de
ciências STEM. Propondo experiências que estarão de acordo com o currículo
onde os resultados apoiarão a abordagem STEAM, gerando proveitos para o
desenvolvimento da criatividade significativa dos discentes, além de favorecer
as experimentações científicas de forma interdisciplinar.

Desenvolvimento do Estudo

Este capítulo apresenta o arranjo metodológico usado para se conseguir a


base referencial teórica da pesquisa bibliográfica literária e os passos que foram
tomados para sua organização, com o auxílio da ferramenta Zotero, que é um

Volume II 270
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

organizador de referências aproveitado para que se consiga organizar o traba-


lho e, com isso, propor parâmetros PAL na RSL.

O estudo foi realizado a partir de leituras feitas em artigos, teses disserta-


ções e outros textos disponíveis em publicações dos anos de Parâmetro ano da
submissão do artigo (PA12) 2019 até 2022 (Quadro 2), as quais tiveram como
objetivo selecionar os trabalhos em bases confiáveis encontradas no Google
Acadêmico Parâmetro base da submissão do artigo (PA23).

Procurou-se, nas fontes de pesquisas, realizar um levantamento literário


bibliográfico em 51 trabalhos. Usando os critérios de eliminação, restaram 28
trabalhos em nosso estudo com análise de 15 quinze coligações buscadas em
15 diferentes portais, entre eles; bancos de teses e dissertações, repositórios e
bibliotecas digitais, portal de periódicos (tabela 2), tais como: LUME UFRGS,
EDUCAPES, BDTD, TEDE, CAPES, CNPQ; livros, revistas Interdisciplina-
res, como SCIELO BRASIL, IENCI, SULEAR, RIUFPA, REDALYC, RIS,
RENCIMA.

Também adotamos parâmetros PA3 para realizar a relação de busca, con-


seguindo, assim, uma coligação entre os cruzamentos propostos pelos uniter-
mos PAUT4(Quadro1) e (Quadro2). Utilizamos os operadores Parâmetro ope-
radores de busca na Internet (PA35)6 (Quadro2) para encontrarmos cada termo
sozinho e, no final, percebermos que elas aparecerem oito vezes (imagem1) no
cruzamento como matrizes (Quadro1) em cada um dos trabalhos selecionados.
Todos os trabalhos foram publicados de acordo com a base e o ano de sua sub-
missão. No PAL, apresentados nos quadros 1 e 2, está demonstrado o número

2 PA – Parâmetro/ *PA1: Parâmetro 1: Ano 2019 a 2020


3 PA2- Parâmetro/ *PA2: Parâmetro Bases Google Acadêmico
4 PAUT- Parâmetro/ *Parâmetro Unitermo “ CCS- ID- ALC- EI
5 PA3 – Parâmetro/ * Parâmetro Operadores de busca na Internet
6 Booleanos (AND, OR, NOT) e aspas - O operador é usado em buscas, pois ele facilita a
identificação de assuntos específicos dentro de áreas do conhecimento muito amplas.

Volume II 271
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

total de tabalhos selecionados, a partir dos recursos de buscas pelo Parâmetro


unitermo CCS-ID-ALC-EI (PAUT), o quail foi criteriosamente analisado de
forma qualitativa para que os documentos que compõem o corpus do nosso
trabalho respondessem à questão da RSL relativas ao CCS.

Figura 1. Mapeamento Matriz

Fonte: Autores (2022)

Legenda Unitermos: ALC: Alfabetização e Letramento Científico; CCS: Clube de Ciências STEM;
EI: Ensino por Investigação; ID: Interdisciplinaridade; STEM, science, technology, engineering
and mathematics” Ciencias Tecnologia Engenharia Matemática; UT:Unitermos                                                                                                                      

Tabela 1. Número total de cruzamentos.

CCS ID ALC EI Total

8 8 8 8 32

Fonte: Autor (2022)

Volume II 272
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Tabela 2. Número total de artigos.

Unitermos Número Total de artigos Total

CCS ID ALC EI

CCS ID

CCS ALC

CCS EI

CCS ID ALC
4x - sozinho PAUT
ID ALC 6x - dois PAUT
ID EI 4x - três PAUT
1x - quatro PAUT
CCS ID EI

CCS ALC EI

ALC EI

ID ALC EI

CCS ID ALC EI

8 8 8 8 15 cruzamentos

Primeiramente, os unitermos foram pesquisados sozinhos e examinados


quatro vezes no mapeamento, depois foram cruzados os estudos entre e dois
unitermos e na matriz matemática eles aparecem seis vezes. E, na sequência,
coligamos os estudos entre três unitermos e suas ideias aparecem quatro vezes
no estudo. Por fim, foram investigados os quatro unitermos juntos se interco-
nectando na matriz matematicamente e relacionando conceitos, uma vez na
matriz. Dando um total de 15 cruzamentos de unitermos, em 32 artigos busca-
dos, exemplificados nos quadros 1 e 2.

Volume II 273
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Diante da quantidade de textos buscados para análise, foram pensados


critérios para que houvesse a eliminação de algumas das leituras iniciais feitas
nos artigos, de acordo com os parâmetros PA2, buscados através dos parâme-
tros PA3, onde se estabeleceram critérios os quais foram organizados para que
houvesse a eliminação de leituras que não atendiam aos critérios escolhidos
para a inserção dos artigos de acordo com os descritos e tabelados após.

Sendo assim, para a inserção, usamos como parâmetro de escolha PA1,


estudos de trabalhos que foram submetidos nos anos recorrentes de 2019 até
2022. Este período foi sugerido pelo orientador do mestrado, professor dr. Jose
Robaina, para que houvesse essa investigação e que tivesse como finalidade
selecionar alguns dos trabalhos em bases confiáveis encontradas no Google
Acadêmico, para que o referencial fizesse sentido à pesquisa feita.

E essas referências deveriam estar escritas ou publicadas no Plano de


analise (PA2), em base acadêmica confiável, buscadas na internet, através dos
operadores, como exemplo demonstrado no quadro 3. Esse texto deveria conter
unitermos (UT), primeiro sozinho e após interconectado como outro UT, pro-
pondo sentido às vistas do pesquisador para o estudo e, assim, conseguindo dar
significado às perguntas que foram propostas na Revisão Sistemática Literal
(RSL), dando ao trabalho ideias e veracidade por estarem ancorados na litera-
tura de referência apresentada na RSL.

Volume II 274
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Tabela 3. Comparativos base operadores unitermos quantidade.

Anos
Base Operadores Unitermos Quantidade

CCS ID ALC 2019


Booleanos
IENCI CCS 3 2020
(AND, OR, NOT)
ALC EI 2021
CC 2021
LUME “ Aspas “ 2
CCS 2022
ID 2019
Booleanos CC ALC 2020
BDTD 6
(AND, OR, NOT) CC ID ALC EI 2021
CCS ALC EI 2021
Booleanos
ENPEC ID ALC 2 2019
(AND, OR, NOT)
REDALYC “ Aspas “ ID ALC EI 1 2019
EDUCAPES “ Aspas “ ID 1 2020
CNPQ RIUFPA “ Aspas “ EI 1 2019
Booleanos CC ALC ID EI
SULEAR 3 2022
(AND, OR, NOT) CCS
RIS “ Aspas “ CC 1 2021
EENCI -UFMT Booleano (AND) CC ID 1 2019
Booleanos ID ALC EI 2020
RENCIMA 1
(AND, OR, NOT) CCS 2022
CC ALC ID EI
Booleanos
TEDE PUCRS ALC ID EI 4 2021
(AND, OR, NOT)
EI
Ifrs.Edu.Br
Booleano (AND) ID ALC 1 2022
TEAR
SIELO “ Aspas “ ID ALC 1 2015
CCS ID ALC 2020
GOOGLE Booleanos (AND,
EI 4 2021
ACADÊMICO OR, NOT)
CCS ALC ID EI 2022
32
Fonte: Autor 2022.

Volume II 275
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Aplicação Técnica

Após refinar as análises dos artigos ao aplicar a metodologia ATD


(MORAES; GALIAZZI, 2006) que referenciam sobre as aplicações das
técnicas, estas que já foram objetivadas no início do processo de busca pelos
unitermos e pelos cruzamentos deles para que, com isso, se conseguisse definir
a construção do inventário, após aplicados os parâmetros de eliminação. Estes
que demandaram um rigor metodológico ao seguir os critérios de inserção e
eliminação para que se impetrasse no problema da questão as unidades de análises
e as percepções para as construções das unidades de significados e categorias de
análise metodológica. Estas que o pesquisador utilizou para conseguir atingir o
resultado desejado em suas avaliações e diagnósticos provenientes dos estudos
primários descontruídos e conduzidos para objetivar a questão da RSL.

Para tanto foi feito um modelo de plano de análise literária PAL (quadro
4), onde as avaliações qualitativas dos dados coletados foram analisadas a partir
das unidades de análise a priori. Esta análise considerou as informações descri-
tas na RSL revisão sistemática literária a qual nos permitiu identificar através
da organização bibliográfica feita por Zotero a análise dos textos investigados e
disponíveis no PAL, que consiste em analisar as informações, exemplo de mo-
delo no quadro 4, de forma que cada Unitarização e categorização fosse feita
de formato rigoroso, pois os mesmos geraram o metatexto representativo dos
fenômenos investigados em cada um dos PAL, Plano de Leitura inventariada,
descrito abaixo: exemplar acadêmico (EX), área da pesquisa (AP), (TI) título,
(AU) autor, unitermos da pesquisa (UT) e ano (PA1), resumo (RE) e a conec-
tividade do unitermo e STEM. É importante ressaltar que os dados completos
que contemplam os resultados de toda a investigação contidos nos quadros
deste trabalho estão disponíveis na dissertação que este artigo compõe.

Volume II 276
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 1. Plano de Análise Literária (PAL) (modelo).

1 EX Exemplar
Artigo científico dissertação LUME UFRGS
Acadêmico
AP Área
Google Acadêmico
Da Pesquisa

Clube de Ciências Saberes do Campo: contribuições para


aprendizagem da educação em ciências da natureza na
TI Título
EMEF Rui Barbosa, em Nova Santa Rita, Rio Grande do
Produções – Autor
Sul- Rosa, Sabrina Silveira Da.

UT Unitermos -
Clube de Ciências – 2021
Ano da Pesquisa

Investigado neste trabalho através de uma pesquisa


de estudo de campo, com abordagem qualitativa e
exploratória. Contribuições desse estudo poderá ser tema
para outro artigo, pois fica claro na análise dos dados e na
conclusão desta pesquisa a relevância do Clube de Ciências
dentro de uma Escola do/no Campo que busca trabalhar
com a participação da comunidade escolar contemplando a
especificidade daquele povo e do seu território.
RE Resumo As atividades propostas pelo C.C.S.C. foram elaboradas
com base no simples dia a dia da comunidade escolar,
sem a dependência dos livros didáticos com base nas
curiosidades das crianças e se percebe, na análise dos livros
construídos, que o aprendizado aconteceu, eles assimilaram
várias informações sobre os conteúdos trabalhados.
https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/231939

Demarcações De
Busca trabalhar com a participação da comunidade /
Clube Ciência
didáticos com base nas curiosidades.
STEM

STEM abordagem qualitativa – Interdisciplinar

Fonte: Autor 2022

Volume II 277
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Com os dados gerados no PAL, empregamos o método ATD para que


dessa forma o pesquisador conseguisse apreciar cada uma das 32 leituras
PAL, exemplo no quadro 4. Estas foram já seletas após os critérios de ex-
clusão feitos na análise do resumo, onde buscou-se, através das unidades de
significados, desconstruir a leitura à luz do pesquisador.

Após as apreciações feitas, foi-se dando definição possível de se repli-


car os objetivos do nosso estudo, ancorando as vivências descritas no traba-
lho dos outros ao nosso clube de Ciências STEM e com isso, objetivando e
justificando os contextos, para que se conseguissem argumentos plausíveis
para a viabilidade de acesso, tanto virtual quanto físico, para um clube de
Ciências STEM na escola. E foram com os dados gerados demonstrados no
exemplo do quadro 5 que empregamos como método a ATD e se obteve atra-
vés da apreciação a interpretação qualitativamente dos resultados esperados,
diante da temática de abordagem, configurando as análises das transcrições
de cada um dos 15 trabalhos cruzados. Estes foram usados na unitarização
de significados dos conceitos escolhidos, segue exemplo: (Quadro 6) para
que se conseguissem categorias inicial, secundário e final, com a intenção
de objetivar, estabelecendo no metatexto a relação da interconexão ancoran-
do significado para as perguntas descritas (Qual o maior fator que influencia
para que se consiga a viabilidade de montar um Clube de Ciências STEM na
Escola?), RSL, com os unitermos pesquisados como resposta de viabilidade
de se ter um CCS.

Dessa forma, sistematizaram-se os dados dos artigos em 82 unidades


de significados. Assim, procurou-se unitarizar em categorias que originas-
sem sentido às perguntas de abordagens da Revisão Sistemática de Literatura
RSL e que foram criteriosamente observadas e analisadas nos documentos

Volume II 278
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

do PAL para que se conseguisse interconectar as ideias que anunciavam os


quatro unitermos, primeiramente pesquisados, para que conseguisse nos do-
cumentos literários as recorrências agrupadas em categorias emergentes e,
assim, obter resultados satisfatórios a partir das análises interdisciplinares.
Assim, interligou-se o método como finalidade para lidar com os desafios da
contemporaneidade, conseguindo abordá-los no contexto escolar de forma
dinâmica e atrativa, trazendo significado ao conceito aprendido, contribuindo
com a modelagem em termos de processo de formação total do homem como
agente modificador da realidade. Segundo, para superar a lógica fragmentada
do conhecimento, Freire (1987, p. 37) trata da realidade entre o pensar do
educador e educando quando diz: “Por isto, o pensar daquele não pode ser
um pensar para estes nem a estes imposto”. Cabe, então, expor o método de
aprendizagem proposto no Clube de Ciências STEM pelo ponto de vista de
uma educação libertadora, em que os educandos devem ser entendidos, assim
como suas realidades.

Volume II 279
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 2. Características ATD e Unidades de Significados.

CC Link Autor Base Ano Resumo Unidade de significado

Investigado neste trabalho


https://www.lume.ufrgs.br/hand-
A1 através de uma pesquisa de
le/10183/231939
Clube De Ciências Saberes Do Campo: estudo de campo, com
https://scholar.google.com.br/ 1...Abordagem qualitativa.
Contribuições Para Aprendizagem Da LUME abordagem qualitativa e
scholar?q=related:e_PvdvTeZL- 2...Clube de Ciências.
Educação Em Ciências Da Natureza repositório exploratória. Contribuições
4J:scholar.google.com/&scio- 2021 3...Participação da comunidade
Na EMEF Rui Barbosa, digital da desse estudo poderá
q=https://www.lume.ufrgs.br/ 4...construídos, que o aprendizado.
Em Nova Santa Rita, UFRGS ser tema dos dados e
handle/10183/231939+&hl=pt- 5... base nas curiosidade
Rio Grande Do Sul. na conclusão
-BR&as_sdt=0,5
desta pesquisa a relevância
Autor: Rosa, Sabrina Silveira Da.
do Clube de Ciências ...

Fonte: Autor 2022.


         

Volume 2 280
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

As próximas etapas são muito importantes para a análise do corpus,


pois é nestas que, segundo Moraes e Galiazzi (2016, p. 71), ocorre a “unita-
rização, descrita como parte do interesse de construir significados a partir de
um conjunto de textos, entendendo que sempre há mais sentidos do que uma
leitura possibilita elaborar”, uma vez que é na construção das unidades de
significado que se imagina um movimento de interpretação dos textos, atra-
vés de uma leitura adentrada no sentido de buscar as unidades de significado
para o escrito, após, partindo então para a categorização que, segundo Moraes
e Galiazzi (2016, p. 97): “Categorizar corresponde a simplificações, reduções
e sínteses de informações da pesquisa, concretizadas por comparação e dife-
renciação de elementos unitários, resultando em formação de conjuntos de
elementos que possuem algo em comum”, em que Rosa (2021. p. 84) define
que “Categorizar e classificar, é organizar em conjuntos semelhantes”. São
definidos como conjunto de ações para manter a qualidade que irá determinar
o desenho do estudo, da interpretação de dados. Organizou-se, então, o cor-
pus da seguinte maneira inseridos e distribuídos parte nos quadros abaixo e o
restante na RSL do trabalho.

Volume II 281
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 3. Unidades de significados e categorizações (onde- como- por quê?)

Categorias

Unidade de Significados Categoria Inicial Categorias emergentes

...Participação da comu-
A1
nidade
1...Abordagem qualitativa.
...Clube de Ciências
2...Clube de Ciências.
...construídos, que o
3...Participação da comunidade
aprendizado.
4...construídos o aprendizado.
5... base nas curiosidades. ...Ambiente interativo
...base nas curiosidades
Onde? No Clube de ciências um

A2 ambiente interativo que propõe


6...Experimental investigativa ...interações participar do ensino por investiga-
7... interações ...investigar os princípios ção.
8... investigar os princípios de autono- de autonomia moral
mia moral ...ensino Investigativo.
Clube de Ciências como lugar em
9... Ensino Investigativo.
que acontece a alfabetização e o le-
A3
10...método científico tramento científico.
...estimulem o protago-
11...formar novos cientistas.
nismo estudantil social
12...alfabetização científica, Porque? Incide através da diver-
...críticas e reflexivas
13...estimulem o protagonismo estu-
...formar novos cientistas sidade científica com a busca do
dantil.
Dimensão coletiva enfoque nos estudos interdiscipli-
14... atuações sociais
15... críticas e reflexivas nares e STEM.
A4
Currículo de ciências
16...currículo de ciências contexto Porquê? É no Clube de Ciências
Pensamento crítico.
17...pensamento crítico. que se estabelece dimensão social
Contexto escolar
18...métodos científicos.
e coletiva.
19...Área disciplinar Para quem? Coletividade comu-
20...interdisciplinaridade e suas im- ...interdisciplinaridade
nidade escolar no contexto educa-
plicações.
cional
A5
21...Sequência didática
... Letramento
22... Letramento
23 ...de recursos tecnológicos visuais

A6 ...aprendizagem interdis-
24...aprendizagem interdisciplinar ciplinar

Fonte: Autor 2022

Volume II 282
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Sendo assim, foram utilizadas duas questões norteadoras da pesquisa,


nomeadas de acordo com legenda: * P1RL- pergunta 1 da revisão de literatura
(Qual o maior fator que influencia para que se consiga a viabilidade de montar
um Clube de Ciências STEM na Escola?), *P2RL- pergunta 2 da revisão de
literatura (Levantamento de dados dos impactos positivos e negativos para se
propor um espaço virtual e físico, com objetivo de estimular a alfabetização e
o letramento científico, em um ambiente que contribui com o ensino por inves-
tigação como forma interessante de projeto interdisciplinar de aprendizagem
significativa).

Volume II 283
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 4: Unitarização Categorias emergentes e o Metatexto (Onde Como


porque).

*P1RL Qual o maior fator que influencia para que se consiga a viabilidade de
montar um Clube de Ciências STEM na Escola?
Categorias
Unitarização Metatexto
emergentes
A3
11...formar novos cientistas.
13...estimulem o estudantil.
15...críticas e reflexivas
Onde e Como?
A4 Espaço escolar
16...currículo de ciências físico e virtual
17...pensamento crítico.
No Clube de
A6 ciências um
Coletividade
24...aprendizagem participar do ensino ambiente interativo e
por investigação. que propõe
singularidade
participar do ensino
com a
por investigação.
Prática edu-
A7 Em encontros
cativa em um
25...prática docente. semanais, no contra
ambiente em
P1RL 26...perspectiva de espaço virtual turno; com tempo
que acontece
27...melhoria da prática docente controle organizado de
a
da carga horária acordo com o plano
alfabetização
de trabalho proposto
e o letramen-
A9 e no modo virtual.
to científico.
30...Desenvolvimento profissional do- Na Elabora-
cente singularidade Clube de Ciências
ção e constru-
31...Perspectiva do ensino por investiga- como lugar em
ções dos
ção em ambiente on line que acontece a
saberes no
32...Abordagem qualitativa ambiente in- alfabetização e o ensino por
terativo letramento científico
investigação.
33...protagonismo, singularidade e ensino por
investigação,
A11 através do
36...Materiais educacionais na internet compartilhamento
37...Qualidade tecnologia de informações
38...elementos construções dos saberes e trocas de
investigativos experiências.

A17
52...Pesquisa como qualitativa.
53...Ensino investigativo virtual

Volume II 284
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

*P2RL. Levantamento de dados dos impactos positivos e negativos para se pro-


por um espaço virtual e físico, com objetivo de estimular a alfabetização e o
letramento científico, em um ambiente que contribui com o ensino por inves-
tigação como forma interessante de projeto interdisciplinar de aprendizagem
significativa.
Categorias
Unidade de significados Metatexto
Emergentes
A1
1...Abordagem qualitativa dimensão co- Porquê? Para
letiva. quem?
3...Participação on line
5... base nas curiosidades.
Clube de Ciências Diversidade
A2 como diversidade científica com
6...Experimental investigativa atividade científica com a aspectos in-
virtual busca do enfoque terdisciplina-
7... interações e alfabetização falta de
nos estudos res e STEM.
tempo
interdisciplinares
8... investigar os princípios de autono-
mia moral diversidade científica e STEM. Otimização
9... Ensino Investigativo. do tempo e
P2RL
É no Clube de Ciên- flexibilidade
A5
21...Sequência didática falta de carga ho- cias que se estabele- para desen-
raria para aplicação de reuniões ações e ce dimensão social e volver proje-
projetos interdisciplinar coletiva. tos virtual.
22... Letramento
23 ...de recursos tecnológicos visuais Coletividade Relação com
A8 comunidade escolar “saber” signi-
28...Desenvolvimento no contexto educa- ficativo para
29...Ciências Naturais STEM
cional comunidade se
A10
autonomia moral Conhecer as
35...Mudanças na prática pedagógica.
STEM Letramento e ciências de
A20 alfabetização na forma interes-
60...Atividade experimental investigati- prática pedagógica sante.
va. Ciências Naturais
61...Atitudes coletividade interdisciplinar
A28 procedimentais.
81...Senso crítico e para a potencializa-
ção da AC escolar.
82...Ciências escolares situações viven-
ciadas, aprendendo com a sociedade.
Fonte: Autor 2022.

Volume II 285
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Metatexto P1RL

Nesta etapa procurou-se examinar nos artigos onde um Clube de ciên-


cias, que é um ambiente interativo de aprendizagem que participa de atividades
e ações através de ensino por investigação, pudesse responder à pergunta da
PRSL: “Qual o maior fator que influencia para que se consiga a viabilidade de
montar um Clube de Ciências STEM na Escola” e, com isso, conseguisse per-
ceber na leitura, onde o artigo poderia descrever algum episódio sobre a traba-
lhar na escola um clube que envolvesse os aspectos interdisciplinares e STEM.
Foi de acordo com Mancuso (1996) que percebemos que ele coloca as questões
sobre a finalidade para de um Clube de Ciências e, assim, para ele Mancuso,
Lima e Bandeira (1996, p.41, grifo dos autores), existem diferentes definições
e “como existem muitos tipos de CLUBES, inúmeras são as concepções que
podem fornecer elementos para uma resposta significativa questão [...]”.

Assim, em concordância com o autor, para que, através das obras, tam-
bém pudéssemos fazer a separação dos diversos conteúdos propostos nos arti-
gos, em unidades de significados, a chamada unitarização da ATD, comentada
pela autora a respeito da Análise Textual Discursiva, com a intenção de inter-
pretar os dados contidos nos Planos de Analise Literal, como se fosse a des-
montagem textual, à luz do pesquisador, para que a proposta pedagógica fosse
aproveitada e agregada como fator importantíssimo, observado e categorizado
como emergente nesta pesquisa.

Dessa forma, poderíamos conseguir relacionar o referencial teórico ao


processo de construção do Clube de Ciências STEM (CC/S), de forma cole-
tiva e assim foi com a análise textual discursiva como ferramenta analítica
(MORAES, 2003; MORAES; GALIAZZI, 2005) que os autores colaboram
dialogando entre os trabalhos inventariados. Concordando com esses autores

Volume II 286
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

para que assim conseguíssemos categorizar algumas das questões e problemas


decorrentes de interesses práticos, existentes nos ambientes escolares como re-
sultados que influenciam na viabilidade de se ter um CCS com vistas a planejar
ações adequadas para tal.

Comparou-se, em algumas análises, diferenças entre as unidades de sig-


nificado escolhidas como contribuições para a produção do conhecimento e
montagem do documento, sendo esse o corpus da nossa pesquisa, onde as ba-
ses de dados multidisciplinares foram, em grande maioria, relevantes e volta-
das para o ensino STEM. Conforme Andreatta (2020) mostra em seus estudos
para docência em STEM, a sala de aula é um espaço do professor pesquisador
apresentando um movimento que enfatiza determinadas áreas do conhecimento
como Ciências e Tecnologia - apresentado um currículo contextualizado com o
mundo real e menos disciplinar. Assim, concordamos com o professor Luciano
Andreatta, pois entendemos que agrega informações de forma interessante e
que auxilia no desenvolvimento do projeto CCS como ferramenta inovadora
(ANDREATTA, 2020, p. 29). Esse que congrega estímulos de novas pesquisas,
como oportunidade para que os alunos de comunidades escolares consigam
ampliar suas habilidades e conhecimentos em um ambiente acessível, moti-
vado pela curiosidade da investigação, um dos motivos analisados que torna a
Ciência interessante.

Ainda conforme o autor Luciano Andreatta, buscamos para as análises


dos resultados da P1RL auxílio para a questão da coletividade e singularidade
para que a prática educativa aconteça em um ambiente em que ocorra a alfabe-
tização e o letramento científico, além das construções dos saberes no ensino
por investigação.

Volume II 287
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Metatexto P2RL

Analisou-se a influência dos fatores positivos para que conseguíssemos


ampliar a compreensão a serem tratados em ambientes como CC/S e, com isso,
percebeu-se nos artigos uma contribuição das experiências dos diferentes auto-
res que nos corroboraram com diversos aprendizados os quais nos influenciam
em alfabetização e o letramento científico aplicados nas elaborações e cons-
truções dos conhecimentos propostos pelo meio das trocas de experiências e
compartilhamentos, onde o aluno é o sujeito de aprendizagem.

Neste questionamento se buscou nas pesquisas associar as leituras bus-


cando questões para que se conseguisse perceber, através dos dados, possíveis
impactos positivos e negativos que pudessem associar como normas que aju-
dassem a responder à pergunta P2RL. Com isso, procurou-se examinar nos ar-
tigos e nas dissertações acepções para dar sentido às unidades de significados e,
com isso, elas pudessem agregar retornos como respostas descritas nos artigos
para as: “... principais dificuldades encontradas na utilização destes ambientes”
e se estabelecessem dimensão social e coletiva, como categoria emergente, es-
tas que estão inseridas durante a análise deste processo “da qual se dá a partir de
análises indutivas, sendo a forma de chegar a um conjunto de categorias, indo
das informações e dados para classe de elementos que têm algo em comum.
É um movimento que vai dos elementos unitários e específicos para aspectos
abstratos e gerais e às categorias” (MORAES; GALIAZZI, 2016, p. 109), po-
dendo-se construir o metatexto de análise a partir deste ponto.

À luz do pesquisador, analisamos como resultado da questão ressaltada


na unidade de significado da PRL2 que tem em uma das categorias a questão
sobre a diversidade científica, termo este que parece nos remeter para uma visão
que nos leva a pensar em diferentes pontos de vista e fortalecem a resolução

Volume II 288
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

de problemas e equilibra preconceitos e distorções propostos em aspectos de


abordagens interdisciplinares e Stem.

Outra questão que nos fez pensar foi o ponto que trata sobre o tempo para
se trabalhar em um CCS e assim, de acordo com as análises que foram feitas na
RSL e a partir da escolha para essa unidade de significado, que teve como meta
buscar formas para entender os pontos negativos. Logo, a questão da otimiza-
ção do tempo veio como sugestão após a análise. Na questão de que algumas
das leituras dos artigos nos levarem a perceber as relações negativas com a car-
ga-horária de trabalho excessiva do professor, com isso a falta de tempo dentro
do espaço escolar e assim a falta de tempo para participar de projetos dentro do
contexto educacional.

Analisamos como impacto positivo, a questão de um CCS na forma vir-


tual, pois surge como otimização do tempo e flexibilidade para desenvolver
projetos, beneficiando, de acordo com Ausubel (1982), ao trazer conceitos para
uma aprendizagem significativa, uma vez que este autor nos apropria de im-
portantes relações com conhecimento significativo. Assim, entendemos que,
a fim de se apreciar as ciências de forma interessante, o espaço virtual vem ao
encontro de uma forma positiva que poderá ajudar na flexibilidade do tempo
por conta da aderência e participação dos clubistas.

Tornar a ciência interessante ao buscar por diversidade científica, permite


produzir melhores respostas para a sociedade como um todo. Em um aspec-
to interdisciplinar e STEM o saber significativo, de acordo com Paulo Freire
(1987), leva-nos à superação de um processo de ensino-aprendizagem tradicio-
nal ao indicar que a aprendizagem significativa adere a um sentido profunda-
mente humanizador.

Concordamos com Freire, uma vez que traz à tona o desejo de conhecer,
descobrir e realizar o aprender, capaz de relacionar conhecimentos de várias

Volume II 289
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

áreas do saber de forma que a elaboração e construção do metatexto leve em


conta chamar a atenção para os saberes significativos, estes que vem a ser um
saber referido ao conhecimento adquirido por meio de estudo, ou melhor di-
zendo: quando o aluno está em contato com muitos saberes, de diferentes dis-
ciplinas.

Sasseron e Carvalho (2011) discutem sobre os sujeitos de saber alfabe-


tizados cientificamente dando ênfase para o ensino por investigação. Entende-
mos que ao estimular o conhecimento, os autores falam sobre a compreensão
das relações entre ciência, tecnologia, sociedade e meio ambiente. Percebemos
e concordamos, pois entendemos que o ambiente tem que ser envolvente para
que se consiga contribuir com o ensino por investigação estimulando o princí-
pio interdisciplinar. Freire (1993, p.41) ajuda a superar a fragmentação disci-
plinar “pedagogia bancária”, contextualizando um ambiente não recomendado
para a viabilidade do CC/S.

Todos as demais discussões e embasamentos que compõem de forma


completa estão disponíveis nos documentos que agregam a seção do referen-
cial teórico e que faz parte da dissertação completa deste trabalho de Mestrado.

Considerações a atingir

No contexto educacional, o CCS no formato virtual surge como forma


de otimização do tempo e flexibilização para se desenvolver projetos de for-
ma interdisciplinar, numa abordagem STEM atingindo o objetivo de analisar
as relações e assim ancorando relevantes argumentações para a viabilidade de
montar no espaço escolar um CCS.

A Metodologia ATD foi utilizada como forma de se obter a confiabili-


dade do embasamento teórico, para que esse corroborasse com a configuração

Volume II 290
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

metodológica qualitativa, através de análise observada à luz do pesquisador,


ancorando as possibilidades de emergirem compreensões no processo analíti-
co, o qual foi pensado no surgimento das associações das leituras e nas relações
entre as análises categorizadas e emergentes, elaboradas para as apreciações
dos dados no processo da construção do metatexto.

Tais construções foram objetivadas nas buscas dos unitermos e pelos cru-
zamentos desses, para que, assim, fossem definidas para que houvesse a cons-
trução do inventário a partir das fontes e de acordo com os critérios de inserção
e eliminação. Estes diagnósticos foram provenientes dos estudos primários, os
quais foram conduzidos para responder à questão da RSL e se obtivesse argu-
mentos plausíveis para implementar um CCS na comunidade escolar.

A implantação de Clubes de Ciências busca desenvolver atividades que


despertem novos olhares para o ensino de ciências, como também a conscienti-
zação da importância de atividades criativas, segundo Mitchel Resnick (2020)
nas escolas onde Resnick defende que o resto da escola (e o resto da vida) deve
ser mais como o jardim de infância onde a participação dos professores, alunos
e membros da comunidade escolar e as suas singularidades com a prática edu-
cativa tornam um ambiente prazeroso de aprendizagem.

Os resultados sugerem benefícios, como ferramenta importante na co-


munidade escolar, num ambiente propício para construção do conhecimento,
apropriação da alfabetização, letramento científico e ensino por investigação,
numa abordagem significativa de Ausubel (1982), que contribui de maneira
significativa na construção da sociedade do conhecimento. Para tanto, como
forma interessante de projetos do ensino de Ciências STEM, interdisciplinar na
educação básica, na forma de Clube de Ciências, uma vez que propõe ajudar o
aluno aprimorar os conhecimentos vindos da sala de aula de forma significati-
va. Isso porque será no CCS que o aluno irá aprimorar os conhecimentos teóri-

Volume II 291
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

cos que foram estudados em aula, onde se tornam significativos quando vistos
de forma prática no CCS.

Elencamos no estudo algumas ações e perspectivas que julgamos impor-


tantes para um clube de Ciências STEM, uma vez que propõe uma oportunida-
de para os alunos e comunidade escolar ampliarem suas habilidades e conheci-
mentos em um ambiente acessível, motivado pela curiosidade da investigação.

Com isso, Clube de Ciências STEM, tem como propostas oferecer


atividades compostas de roteiros de práticas investigativas em uma perspectiva
STEM multidisciplinar, as quais sugerem ações em temas que contemplam os
procedimentos, estratégias significativas e nas áreas de Ciências da Natureza,
Biologia, Química, Física, Matemática, Inglês, Português, entre outras. Com
o interesse de inscrever a escola e os membros clubistas em campeonatos,
concursos, desafios, olimpíadas e gincanas nacionais e internacionais. Estas que
apresentam abordagens voltadas para alunos de escola pública, como sugestões
didáticas, que ajudam a atender os rápidos avanços tecnológicos, uma vez
que a presença da Ciência está no cotidiano do aluno e ele muitas vezes tem
dificuldades para entender os processos e fenômenos científicos.

Para que consigam uma melhor formação e desenvolvimento humano


dos alunos clubistas, através da promoção de práticas pedagógicas desenvol-
vidas através do projeto que será sugerido no Clube de Ciências STEM, em
âmbito escolar como uma dimensão privilegiada no trabalho cooperativo de
um coletivo.

Assim, para avançar em etapas posteriores com a pesquisa, a metodolo-


gia estará descrita no seu passo a passo, na seção, da dissertação completo e
que compõe esse artigo.

Volume II 292
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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da Faculdade de Educação da USP. E-mail: sasseron@usp.br Disponível em:
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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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www.ufrgs.br/bibedu/novidades-livros-impressos-ago22/ Acesso em: 26 de
out. 2022.

Resumo: Este artigo da Revisão sistemática literal (RSL) foi feito a partir do estudo
em aportes teóricos que modelaram o cruzamento na forma de matrizes matemáticas.
Esta buscou interconectar os unitermos, com o objetivo de analisar as relações entre
eles ancorando relevantes argumentações para a viabilidade de montar no espaço
escolar um Clube de Ciências como produto educacional. A finalidade incidiu em
apresentar o desenvolvimento da RSL buscando pelos quatro unitermos em bases
acadêmicas nacionais confiáveis, em um panorama geral que abordou as diferentes
visões dos assuntos relacionados nos últimos três anos. Dessa forma foi criado o
modelo sistemático Plano de análise da literatura (PAL), para que se obtivesse defini-
ções sobre as decorrências e se conseguisse, através da metodologia Análise textual
discursiva (ATD), formular unidades de significados e categorizações para que a pes-
quisa qualitativa, após aplicados os critérios de eliminação, inventarie quinze formas
diferentes coligadas, estabelecendo relações, captando o novo emergente, trazendo
sentido ao trabalho. Resultados sugerem benefícios como ferramenta importante na
comunidade escolar, num ambiente propício para construção do conhecimento, apro-
priação da alfabetização, letramento científico e ensino por investigação, numa abor-
dagem de aprendizagem significativa Ausubel (1982) como forma interessante de
projetos do ensino de Ciências STEM, interdisciplinar na educação básica e no novo
ensino médio.

Palavras-chave: Clube de ciências STEM; Alfabetização e letramento científico;


Interdisciplinaridade; Ensino por investigação.

Abstract: This RSL article was made from the study of theoretical contributions that
modeled the intersection in the form of mathematical matrices. This one that sought
to interconnect the keywords, with the objective of analyzing the relationships be-
tween them, anchoring relevant arguments for the feasibility of setting up a CCS in
the school space as an educational product. The purpose focused on presenting the
development of RSL, searching for the four keywords, in reliable national academic

Volume II 296
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

bases, in a general panorama that addressed the different views of related subjects, in
the last 3 years. In this way, the Systematic Model, PAL, was created in order to ob-
tain definitions about the consequences and manage, through the ATD methodology,
to formulate units of meanings and categorizations so that the qualitative research,
after applying the elimination criteria, inventory fifteen different connected forms,
establishing relationships, capturing the new emergent, bringing meaning to the
work. Results suggest benefits, as an important tool in the school community, in an
environment conducive to the construction of knowledge, appropriation of literacy,
scientific literacy and teaching by investigation, in a meaningful approach Ausubel
(1982) as an interesting form of STEM Science teaching projects, interdisciplinary
in basic education and new secondary education.

Keywords: STEM Science Club; Literacy and Scientific Literacy; Interdisciplinari-


ty; Teaching by Research.

Volume II 297
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 12

O ELO ENTRE O ENSINO DE


CIÊNCIAS, O LETRAMENTO
CIENTÍFICO E A EDUCAÇÃO
EM ESPAÇOS NÃO-FORMAIS
DENTRO DE UM CLUBE DE
CIÊNCIAS: UMA REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA
Gabriele Milbradt Glasenapp
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-A

Introdução

Ser professor é um desafio constante, pois tornar a aula atrativa e próxima


da realidade do educando é algo visto longe dos livros didáticos. Nos deparamos,
ainda, com uma educação fragilizada e centrada no “conteudismo” e não na
formação de seres humanos preocupados com suas ações em sociedade.

Volume II 298
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A prática pedagógica, muitas vezes, atrela-se a conceitos e exemplos dis-


tantes do cotidiano escolar vivido pelos alunos, usando exemplos que não são
palpáveis e que se tornam imagens meramente ilustrativas no aprendizado dos
estudantes.

Acredita-se que, para um aprendizado realmente efetivo, é necessário tra-


zer exemplos e vivências que façam parte do cotidiano (não somente escolar,
mas também social) de cada estudante. Dessa maneira, eles poderão visualizar
de forma realista e mais próxima da sua realidade assuntos que são tratados em
sala de aula, que podem deixar de ser tabus e matérias vistas como “inimigas”.

É de extrema importância que o professor, dentro dessa perspectiva de


tornar o ensino mais atrativo e atrelado com a realidade vivida pelos estudantes,
lembre-se do que Krasilchik (2004) fala sobre a influência do ambiente no pro-
cesso de aprendizagem, onde salas de aula com as classes voltadas para frente
com os alunos em fileiras fixas denota um processo de aprendizagem apenas
de transmissão de informações, sendo o aluno mero receptor e não o agente do
processo.

Apesar de sabermos que a escola é o local onde grande parte do conheci-


mento será construído é de extrema necessidade que se faça um elo entre a sala
de aula e os espaços não-formais de ensino. Para Krasilchik (2004), aulas mi-
nistradas apenas em sala de aula não terão todos os seus objetivos alcançados
pois, para que tenhamos uma aprendizagem efetiva e cada vez mais prazerosa,
é necessário que se faça o contato com a realidade, visto que as experiências
formativas devem aproximar-se cada vez mais a futuras situações em que os
educandos estão inseridos.

Em vários locais da cidade temos espaços que podem ser atrelados ao


ensino e contribuir no processo educacional de todos os níveis. No caminho de

Volume II 299
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

casa para a escola, por exemplo, podem ser visualizados diferentes conceitos
que são vistos em aula, como: ecologia, reino das plantas, reinos dos animais,
etc. Ou seja, a ciência pode ser construída em espaços que saem do cotidiano
da sala de aula e atinge lugares que antes eram vistos apenas como destinos de
lazer ou até mesmo de trabalho, distantes da realidade de cada um.

Sendo assim, é de suma importância a ligação de novos espaços de apren-


dizagem com a formação do estudante, pois isso aproxima eles das coisas na-
turais e, para que isso seja efetivo, o alinhamento do conteúdo em sala de aula
com os espaços não-formais pode trazer uma grande contribuição para um pro-
cesso significativo de aprendizagem por onde os educandos poderão, além de
adquirir conhecimento, construir valores e atitudes responsáveis e conscientes
com o local em que eles habitam.

Para que isso aconteça basta que, dentro da sala de aula, seja despertado
um olhar atento dos alunos para o seu entorno, que fuja da realidade virtual e
conecte-se a uma realidade palpável cheia de novas descobertas. Contudo, é
notório que, para dar vencimento aos conceitos exigidos, professores se veem
em uma “saia justa”, pois não podem fugir do tradicional, já que as exigências
são de vencimento de conteúdo. Existem diversos espaços extraclasse que po-
dem servir de auxílio no processo de aprendizagem dos estudantes, possibili-
tando romper os muros escolares e ir em busca de um processo participativo.

Para que o rompimento dessas barreiras seja possível ainda dentro da


educação básica, os clubes de ciências tornam-se peças importantes, já que
podem ser considerados espaços de educação não-formal e que estão tornando-
-se, cada vez mais, aliados ao processo de aprendizagem dentro do ensino de
ciências. Como características, um clube de ciências é o local onde os estudan-
tes têm o encontro com o conteúdo de forma lúdica e recreativa (OLIVEIRA,

Volume II 300
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

2009) e que, segundo Menezes (2012), estimulam um interesse em conteúdos


mais voltados para a ciência e que tornam o processo de letramento científico
algo construtivo de forma coletiva.

Indo ao encontro de todas essas afirmações, este estudo embasa a cria-


ção de um clube de ciências que atrela o letramento científico e o ensino de
ciências em espaços não-formais de ensino em uma pequena cidade do interior
do Rio Grande do Sul. Para que esse trabalho se torne efetivo, foi necessária
a realização de um levantamento bibliográfico que une o ensino de ciências, a
educação em espaços não-formais, o letramento científico e o clube de ciências,
buscando a união dos horizontes de ensino que possam tornar a realização do
projeto possível.

Tendo em vista essas percepções, o presente capítulo apresenta dados


levantados em alguns bancos de pesquisa e estabelece vínculos entre os uni-
-termos já mencionados, com objetivo de averiguar as pesquisas já feitas nessas
áreas que possam fortalecer o estudo e, também, pesquisas que unam todos
esses termos que possam servir de exemplo para a realização das atividades
previstas.

Apresentação dos unitermos

Ensino de ciências

Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o ensino de ciên-


cias dentro da educação básica é fundamentado na formação de cidadãos ca-
pazes de debater e tomar decisões sobre quaisquer que sejam os assuntos re-
lacionados ao meio científico, desde a leitura de um rótulo de alimentos até o
entendimento de como a água potável chega em suas casas. Dessa maneira, o
ensino de ciências dentro da educação básica apresenta um comprometimento

Volume II 301
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

na formação social e educacional do aluno, ou seja, em sua formação integral.

Ainda, segundo a BNCC, ensinar ciências não vai ao encontro apenas da


finalidade informativa, mas deve ter participação no desenvolvimento social
do aluno, o qual passará a entender a sua atuação dentro do meio em que está
inserido, tendo plena consciência da importância de seu exercício de cidadania.

Assim sendo, nos alinhamos a Somavilla e Zara (2016), entendendo o


ensino de ciências como um movimento constante que associa os processos que
existem em todo o universo, entre o ontem, o hoje e o que pode vir a acontecer
amanhã, que interferem diretamente no cotidiano dos estudantes, conduzindo
dessa maneira a possíveis investigações e interrogações.

Também é muito importante ressaltar o que Nascibem e Vieiro (2015)


defendem sobre o ensino de ciências não ser algo imutável, já que a ciência
faz parte da construção humana. Dessa forma, ela é algo praticável, dinâmico
e instável. Ao saber disso, faz-se necessário o rompimento de paradigmas que
entendem a ciência como um conjunto de conhecimentos fechado, pois só após
esse rompimento os estudantes entenderão que ela vai além das fronteiras co-
nhecidas pelos muros da sala de aula.

Considerando o que foi exposto, vemos que uma das grandes dificul-
dades encontradas nas metodologias de ensino de ciências é a forma como os
conteúdos são passados aos estudantes. Muitas vezes, são abordados de manei-
ra muito formal e com pouca didática, tornando os temas em ciências menos
atrativos que os demais e distanciando os estudantes do meio científico (PA-
TERLINI, 2016).

Dessa maneira, estudos e pesquisas voltadas para o ensino de ciências


mostram a fragilidade do ensino o qual precisa passar por mudanças, deixando
de lado o ensino focado apenas na formação científica com o objetivo de for-

Volume II 302
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mar cientistas, mas passar a ser um ensino amplo para todos cuja meta deve
ser uma ciência vivida e estudada por/para todos (DELIZOICOV; ANGOTTI;
PERNAMBUCO, 2011).

E ainda, indo ao encontro a esses pressupostos segundo Delizoicov, An-


gotti e Pernambuco (2011), encontram-se inúmeros desafios ao ensinar uma
ciência que seja para todos, ensino esse que seja interessante e que contribua
para a formação não só educacional, mas também cultural e social dos educan-
dos, englobando aspectos cotidianos comuns e mais complexos no dia a dia
escolar.

Assim, destaca-se a importância da busca por metodologias que saiam do


cotidiano da sala de aula, do quadro, do caderno e do livro didático. É preciso
buscar didáticas capazes de romper os muros escolares, que rumam para as
fronteiras do conhecimento mais amplo e ligado às vivências de cada um que
participa do processo de ensino-aprendizagem.

Letramento científico

Ao procurar por definições de Letramento Científico depara-se com uma


infinidade de possibilidades de descrever o que seria letrar cientificamente. Bor-
ges (2012) diz que Letramento Científico é o nome dado àquela área que está
preocupada com a formação do cidadão que entende o seu papel na sociedade e
que interpreta de maneira correta o uso da ciência e da tecnologia dentro dela.

Já Cunha (2018) liga o conceito de alfabetização científica ao ponto de


vista de alfabetizar, ou seja, distinguir aqueles que sabem e aqueles que não
sabem ler e interpretar cientificamente. Já o termo letramento científico é rela-
cionado a um processo contínuo e que pode desenvolver diversas habilidades
em diferentes níveis de complexidade.

Volume II 303
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

De acordo com essas discussões sobre uma definição, são estabelecidos


alguns objetivos que norteiam o Letramento Científico, que envolvem:

[...] democratizar o acesso ao conhecimento científico e tecnológico; for-


mar cidadãos para compreender, atuar e transformar sua realidade; valori-
zar a Ciência enquanto fator de inclusão social; reconhecer que a Ciência
pode trazer benefícios ou malefícios – a depender do uso de que faz dela
(BRANCO et al., 2018, p. 703).

Branco et al. (2018) dizem que, de acordo com esses objetivos estabe-
lecidos, não importa a definição a ser adotada, mas o que se manifesta no Le-
tramento Científico é a formação cidadã que se torna uma ligação com a luta
por uma sociedade igualitária e pela ascensão e divulgação das pesquisas, ino-
vações e do desenvolvimento científico. Cunha (2018) enfatiza também que o
letramento científico não envolve somente as questões vinculadas à ciência e
a tecnologia, mas traz consigo o viés de uma ciência que faz relação com a so-
ciedade e que procura a divulgação dela, tornando-a algo de todos e para todos.

A Base Nacional Comum Curricular, estabelecida em 2016 e publicada


em 2017, refere-se ao desenvolvimento do Letramento Científico dentro da
área de Ciências da Natureza, na Educação Infantil e no Ensino Fundamental,
como algo que:
[...] envolva a capacidade de compreender e interpretar o mundo (natural,
social e tecnológico), mas também de transformá-lo com base nos aportes
teóricos e processuais da ciência. Em outras palavras, apreender ciência
não é a finalidade última do letramento, mas, sim, o desenvolvimento da
capacidade de atuação no e sobre o mundo, importante ao exercício pleno
da cidadania (BRASIL, 2018, p. 273).

Em síntese, Cunha (2018) nos mostra um viés de letramento científico


interdisciplinar, apontando que um estudante letrado cientificamente é capaz de
ler o universo em sua totalidade e não apenas na constância vista e aprendida
nas aulas de ciências, sejam elas de Química, Física ou Biologia, mas que tam-
bém é capaz de debater, ler e entender temas científicos dentro das disciplinas
de Português, História e Geografia, por exemplo.  

Volume II 304
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Sendo assim, o letramento científico dentro do ensino de ciências se torna


imprescindível, pois essa busca por uma ciência múltipla e de alcance de todos,
que seja palpável e do entendimento de todas as pessoas, deve estar presente
no dia-a-dia escolar dos alunos desde o ensino básico. Dessa maneira, indo em
consonância com o que Cunha (2018) diz, um estudante que é letrado cienti-
ficamente não será apenas aquele que quer seguir a carreira científica, mas é
também aquele que quer seguir carreiras diferentes, mas que usa e defende os
meios científicos pois sabe interpretá-los e entendê-los.

Clube de Ciências

Ao questionar-se sobre o que é um clube de ciências encontra-se a defi-


nição de Rocha et al. (2015), a qual diz que um clube de ciências é um espaço
educacional formado por alunos de variados níveis de ensino que estão orga-
nizados em um grande grupo de partilha e busca por conhecimentos ligados à
ciência. Esses estudantes são acompanhados por professores que servirão de
orientadores e parceiros no decorrer das atividades investigativas, culturais,
sociais e de cooperação que acontecerão dentro do clube.

O clube de ciências surge ainda como um apoio para que desperte em


cada estudante a curiosidade para o saber científico, tornando-se um estímulo
para as relações sustentáveis com o meio e auxiliando a formação de perguntas
e indagações e a procura de possíveis soluções para problemas que envolvam
o cotidiano. Dessa maneira, os clubes atuam no desenvolvimento cognitivo,
científico e na autonomia perante as relações sociais (ROCHA; MELO; TO-
MIO, 2016).

Nos clubes de ciências, estudantes de todos os níveis escolares, com o


auxílio e orientação de um professor, passam a praticar diferentes metodologias
e projetos investigativos dentro da própria escola. Tais atividades e projetos
auxiliam na construção de conhecimento e no desenvolvimento de novas for-

Volume II 305
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mas de pensar e agir cientificamente, proporcionando relações mais próximas e


responsáveis com o meio no qual os educandos vivem (TOMIO; HERMANN,
2019).

Dessa forma, o clube de ciências é um local de constante crescimento de


funções cognitivas dos estudantes como a imaginação e a criatividade, além de
possibilitar uma vivência em grupo e individual com o meio ao qual eles estão
inseridos física e socialmente. Ainda, dentro das atividades propostas, os clu-
bistas passam a ter contato com diferentes metodologias de ensino e aprendi-
zagem, tendo um contato maior com a problematização e a busca por soluções
de problemas sociais, culturais e científicos, tornando assim o clube um forte
incentivo para o desenvolvimento do letramento científico, da autonomia e das
relações interpessoais (MENEZES; SCHROEDER; SILVA, 2012).

Sabendo disso, vai-se ao encontro com o que Rosa, Rodrigues e Robaina


(2021) abordam sobre clubes de ciências, o qual deve ser ou tornar-se um local
de constante produção de conhecimento, onde por meio dessas atividades po-
derão aprender conceitos científicos caracterizados pelas trocas interpessoais
entre os colegas. Assim, ressalta-se que os clubes de ciências são espaços que
passam a facilitar o desenvolvimento do senso crítico dos estudantes, sendo
também aliado a isso um espaço formativo.

Assim, o clube de ciências enquadra-se nas características de ser um local


que permite uma aprendizagem desafiadora e que reconhece a diversidade local
e ainda incentiva a curiosidade científica dos estudantes, proporcionando mo-
mentos de identificação de problemas e auxiliando na resolução deles, segundo
Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2011).

Esse processo investigativo e que torna o aluno protagonista de sua apren-


dizagem é frisado na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a qual diz que
essa metodologia precisa ser vista como componente central no processo de

Volume II 306
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

formação dos estudantes. Esses processos investigativos podem ser vistos ao


longo da educação básica dentro dos clubes de ciências, que proporcionaram
aos estudantes momentos de aprendizagem investigativa e participativa dentro
do meio científico, cultural e social.

Assim, o clube de ciências se torna uma proposta de ensino investigativo


com o objetivo de desenvolver o conhecimento científico dos estudantes nos
níveis de educação básica, onde dentro dos clubes o objetivo principal não será
a formação de cientistas, mas sim a formação de pessoas conscientes do seu
papel na sociedade, sendo dessa maneira futuros cidadãos que têm plena cons-
ciência do local ao qual estão inseridos e que todas as suas ações possuem uma
reação sobre ele.

Educação em espaços não-formais

A educação em espaços não formais de ensino tem ocupado um papel


importante em muitos ramos da pesquisa em educação. O termo, segundo Ja-
cobucci (2008), é utilizado por diversos profissionais para apresentar locais que
sejam diferentes da escola, desde que esses locais sejam passíveis da realização
de atividades com fins educativos.

Ainda não é possível encontrar uma definição consolidada. Por ser um


ramo extenso de estudo, e apto a receber diversas e diferentes definições, Ma-
randino et al. (2004) trazem em seu texto uma vasta discussão sobre o uso ou
não do termo na atualidade, e a mesma relata que o uso do termo não-formal
tem trazido riquíssimas reflexões acerca das práticas docentes dentro do am-
biente escolar e fora do ambiente escolar as quais trazem grandes e importan-
tes relações com diversas instâncias de ensino. Sendo assim, o uso do termo
promove e contribui para uma compreensão mais sólida e maior divulgação de
práticas de ensino-aprendizagem dentro da área educacional

Volume II 307
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Dessa maneira, para compreender melhor o termo, é preciso entender o


que é um espaço formal de educação. O espaço formal é aquele inserido den-
tro da escola como consta em lei. É composto por salas de aula, laboratórios,
quadras de esporte, biblioteca, pátio, cantina, refeitório e tudo que está cercado
pelos muros que limitam as escolas (JACOBUCCI, 2008).

Seguindo Jacobucci (2008), é possível compreender lugares que fazem


parte dos espaços não-formais de ensino. Ela destaca duas diferenças entre os
espaços formais e não-formais de ensino e os classifica em: institucionais (que
possuem regulamentação e uma equipe preparada para o atendimento dos edu-
candos durante a visita); e naturais ou urbanos (que não apresentam uma es-
trutura institucional nem profissionais em uma equipe, mas são passíveis de
visitação e atividades práticas guiadas pelos próprios professores).

Dentro desses espaços é possível desenvolver atividades que articulem


um elo entre a escola e o seu entorno, podendo ser utilizado como fonte de
aprendizado fora das paredes da sala de aula, tirando os alunos de um processo
vicioso de ensino, aquele onde apenas o professor é o detentor do conheci-
mento. As atividades em espaços não-formais podem e devem unir o conteúdo
visto em sala de aula com locais não convencionais de ensino, ou seja, fora da
escola, podendo desenvolver um senso crítico e de preocupação com o entorno
da comunidade escolar e do bairro.

O processo de ensino voltado para uma educação não-formal é capaz


de auxiliar na formação dos alunos na sua consciência de cidadãos atuantes e
participantes na sociedade. Esse método de aprendizagem é voltado para um
processo interativo, onde os alunos são pilares essenciais na formação de seu
conhecimento, fazendo parte dele e indo em busca deles, tendo o professor
como mediador e orientador.

Volume II 308
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Dessa forma, é possível perceber que as atividades desenvolvidas em es-


paços não-formais são aquelas que prezam pela coletividade, pela participação
e pela reflexão das próprias ações através de atividades que ocorrem fora da
escola, ocasionando uma visão geral e mais enriquecedora para os estudantes
da sua própria realidade.

Procedimentos metodológicos

Para realização da pesquisa do presente estudo, foram consultadas três


bases de dados digitais, sendo a primeira, a Biblioteca Digital Brasileira de Te-
ses e Dissertações (BDTD), uma plataforma digital de referência em pesquisas
acadêmicas. Em seu acervo, encontram-se trabalhos de grande importância nas
áreas investigadas pelo estudo aqui apresentado. Pesquisamos em um primei-
ro momento trabalhos desenvolvidos e publicados em três anos (2019, 2020
e 2021). Contudo, os resultados obtidos não foram satisfatórios e a busca foi
estendida para mais três anos (2016, 2017 e 2018).

O segundo banco de dados visitado foi a Red de Revista Científicas de


Acceso Abierto no Comercial Propiedad de la Academia (Redalyc). Trata-se de
uma base de dados bibliográficos digitais de revistas de acesso aberto dirigida
pela Universidade Autónoma do Estado do México com o auxílio de diversas
instituições de ensino superior e diferentes sistemas de informação. A pesquisa
também filtrou por publicações dos anos de 2019, 2020 e 2021 e, da mesma
forma, estendeu-se o período da busca por mais três anos: 2016, 2017 e 2018.

O terceiro e último banco digital de pesquisas utilizado foi o acervo do


Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC), escolhido
por ser um evento nacional que abrange trabalhos realizados nas mais diferen-
tes regiões do país e contribui para a excelência no ensino e na pesquisa em
ciências. Os anais escolhidos foram do ano de 2019, com o foco em pesquisas
mais recentes na área do ensino de ciências.

Volume II 309
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Como já apresentado anteriormente, a pesquisa baseou-se na escolha de


alguns unitermos que são o foco principal e mediador da pesquisa, que foram:
“ensino de ciências”, “letramento científico”, “educação em espaços não for-
mais” e “clubes de ciências”. Empregamos como base metodológica as orien-
tações presentes no livro Fundamentos Teóricos e Metodológicos da Pesquisa
em Educação em Ciências (ROBAINA et al., 2021).

Além da pesquisa individual de cada um dos unitermos, foi feito o cruza-


mento 4x4, misturando os unitermos na busca por trabalhos que os relacionem
coletivamente. Os passos seguidos foram três: número de trabalhos encontra-
dos, leitura do resumo e posterior leitura do artigo.

Nesse cruzamento, após ser estabelecido os quatro unitermos de trabalho


e ter sido feita a pesquisa individual, fez-se o mesmo para averiguar as possí-
veis relações que esses termos podem ter e possíveis trabalhos que façam essa
ligação. Sendo assim, cruzou-se primeiramente de dois em dois unitermos (ex.:
Clubes de Ciências; Letramento Científico), em um segundo passo cruzou-se
de três em três (ex.: Clubes de Ciências; Letramento Científico; Educação em
espaços não-formais) e, por último, cruzou-se os quatro unitermos de estudo
(ex.: Clubes de Ciências; Ensino de Ciências; Letramento Científico; Educação
em espaços não-formais). Em cada cruzamento foi feita uma seleção dos traba-
lhos que poderiam ser utilizados em nossa pesquisa.

A seleção dos trabalhos pertinentes foi feita da seguinte maneira: na aba


de pesquisa colocamos os unitermos individualmente e posteriormente cruza-
dos conforme Robaina et al. (2021). Como filtro utilizamos os anos menciona-
dos acima e pesquisas que fossem brasileiras. Na sequência, procuramos pelos
unitermos no título dos artigos ou trabalhos encontrados, um a um. A seguir,
analisamos o título de cada artigo ou trabalho selecionado e, aqueles com mais
relação com os nossos objetivos de pesquisa, passaram por mais uma seleção.

Volume II 310
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Por conseguinte, avaliamos o resumo dos artigos ou trabalhos seleciona-


dos, buscando compreender melhor cada estudo para que pudéssemos analisar
se tinham o mesmo foco de nossa pesquisa. Por fim, lemos por completo cada
artigo ou trabalho de interesse desta investigação, os quais serão utilizados
como fonte para a escrita e desenvolvimento do projeto de pesquisa de mestra-
do.

Como critérios para inclusão de artigos e trabalhos em nossa análise, bus-


camos por pesquisas que tivessem um mesmo viés ou semelhante, ou seja, com
objetivos parecidos e que pudessem, dessa maneira, agregar de forma efetiva o
andamento de nosso trabalho.

Foram excluídos trabalhos que tinham um foco totalmente diferente do


nosso, assim sendo, aqueles que não tinham pelo menos um objetivo parecido
com o de nossa pesquisa foram retirados, para que dessa maneira, o filtro pu-
desse selecionar apenas trabalhos de interesse semelhante ao da pesquisa.

Análise dos dados

A seguir serão apresentados os resultados dos cruzamentos e dos filtros


mencionados para cada uma das plataformas empregadas no estudo e pesquisa.
As próximas tabelas (Tabela 1 e 2) demostram os resultados obtidos nas buscas
realizadas na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações:

Tabela 1: Resultados obtidos na busca individual dos unitermos com os filtros


mencionados.

Unitermos 1º filtro 2º filtro 3º filtro


Ensino de ciências 25 5 3
Letramento científico 3 2 1
Educação em espaços não-formais 4 0 0
Clube de ciências 0 0 0
Fonte: a autora (2022).

Volume II 311
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Tabela 2: Resultados obtidos nos cruzamentos dos unitermos com os filtros


mencionados.

1º 2º 3º
Unitermos
filtro filtro filtro

Ensino de ciências e Letramento científico 1 1 0

Ensino de ciências e Educação em espaços não-formais 2 2 1

Ensino de ciências e Clubes de ciências 3 1 0

Letramento científico e Educação em espaços não-formais 0 0 0

Letramento científico e Clubes de ciências 0 0 0

Educação em espaços nãos formais e Clubes de ciências 0 0 0

Ensino de ciências, Clubes de Ciências e Educação


0 0 0
em espaços não-formais

Ensino de ciências, Clube de Ciências e Letramento


0 0 0
científico

Ensino de Ciências, Letramento científico, Educação


0 0 0
em espaços não-formais e Clubes de ciências

Fonte: a autora (2022).

Abaixo as tabelas mostram os resultados obtidos na Red de Revista


Científicas de Acceso Abierto no Comercial Propiedad de la Academia (Ta-
bela 3 e 4):

Volume II 312
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Tabela 3: Resultados obtidos na busca individual dos unitermos com os filtros


mencionados.

Unitermos 1º filtro 2º filtro 3º filtro

Ensino de ciências 42 8 3
Letramento científico 2 1 0
Educação em espaços não-formais 2 1 0
Clube de ciências 2 0 0
Fonte: a autora (2022).

Tabela 4 - Resultados obtidos nos cruzamentos dos unitermos com os filtros


mencionados.

Unitermos 1º filtro 2º filtro 3º filtro

Ensino de ciências e Letramento científico 1 1 0

Ensino de ciências e Educação em espaços


0 0 0
não-formais

Ensino de ciências e Clubes de ciências 0 0 0


Letramento científico e Educação em espaços
0 0 0
não-formais
Letramento científico e Clubes de ciências 0 0 0

Educação em espaços nãos formais e Clubes


0 0 0
de ciências
Ensino de ciências, Clubes de Ciências e
0 0 0
Educação em espaços não-formais

Ensino de ciências, Clube de Ciências e


0 0 0
Letramento científico

Ensino de Ciências, Letramento científico,


Educação em espaços não-formais e Clubes 0 0 0
de ciências

Fonte: a autora (2022).

Volume II 313
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Abaixo seguem os resultados obtidos nos Anais do Encontro Nacional de


Pesquisa em Educação em Ciências (Tabela 5 e 6):

Tabela 5: Resultados obtidos na busca individual dos unitermos com os filtros


mencionados.

Unitermos 1º filtro 2º filtro 3º filtro


Ensino de ciências 124 22 11
Letramento científico 2 0 0
Educação em espaços não-formais 9 5 3
Clube de ciências 4 2 0

Fonte: a autora (2022).

Tabela 6: Resultados obtidos nos cruzamentos dos unitermos com os filtros


mencionados.

Unitermos 1º filtro 2º filtro 3º filtro

Ensino de ciências e Letramento científico 0 0 0


Ensino de ciências e Educação em espaços
1 1 0
não-formais  
Ensino de ciências e Clubes de ciências 0 0 0
Letramento científico e Educação em espaços
0 0 0
não-formais
Letramento científico e Clubes de ciências 0 0 0
Educação em espaços nãos formais e Clubes
0 0 0
de ciências
Ensino de ciências, Clubes de Ciências
0 0 0
e Educação em espaços não-formais
Ensino de ciências, Clube de Ciências
0 0 0
e Letramento científico
Ensino de Ciências, Letramento científico,
Educação em espaços não-formais e 0 0 0
Clubes de ciências
Fonte: a autora (2022).

Volume II 314
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Conforme esperado, foi encontrado um número maior de trabalhos em


unitermos com assuntos mais amplos, que contam com uma gama maior de
estudos, como mostrado nas tabelas. No caso da nossa pesquisa, o unitermo
com mais trabalhos encontrados foi o de Ensino de ciências, confirmando nos-
sa hipótese de que assuntos mais amplos apresentariam um maior número de
pesquisas e trabalhos acerca do tema.

Contudo, apesar de se tratar de um termo com grande variedade de traba-


lhos e estudos, o ensino de ciências ainda precisa ser foco de diferentes assun-
tos que o veiculem com outros meios de desenvolvimento de trabalhos e que
estimulem diferentes tipos de aprendizagem. Delizoicov, Angotti e Pernambu-
co (2011) trazem, em suas discussões, que o ensino de ciências precisa passar
por grandes mudanças que, por muitas vezes, podem ser drásticas, principal-
mente no papel desempenhado pelo professor nos diferentes níveis de ensino.
Os autores ainda ressaltam que o ensino de ciências necessita deixar de lado o
foco apenas na formação de cientistas, mas que precisa ser voltado para uma
ciência para todos, sejam eles futuros cientistas ou não, pois assim formaremos
cidadãos conscientes de suas ações perante o meio ao qual eles fazem parte.

Dessa maneira, através dos resultados obtidos, observamos um crescente


número de trabalhos que alinham o ensino de ciências com novas metodologias
de ensino que procuram atrelar o uso da tecnologia ao uso de espaços fora da
escola (o que aqui trazemos como espaços não-formais) e, em sua grande maio-
ria, trabalhos que trazem vivências e experiências de acadêmicos e professores
perante aos desafios de ensinar ciências.

É importante ter em mente que no Brasil não temos uma verdadeira


valorização do ensino de ciências, o qual segundo Delizoicov, Angotti e
Pernambuco (2011) não é visto como um modelo de tradição de ensino, já
que por muito tempo se excluía o conhecimento de ciências dentro da escola.

Volume II 315
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Trazemos isso para refletir que, apesar de não ser um conhecimento valorizado,
o ensino de ciências se mostra eficaz e resistente perante os desafios encontrados
em nosso país.

Os trabalhos relacionados ao tema que foram selecionados foram aqueles


que traziam diferentes metodologias de ensino e aprendizagem dentro do ensi-
no de ciências, os quais servirão de incentivo e que auxiliarão no processo de
formação do posterior projeto a ser realizado. Esses trabalhos unem o ensino
de ciências com diversas áreas e metodologias, em sua grande maioria, ligadas
as tecnologias digitais, que cresceram bastante nos últimos anos dentro do am-
biente escolar.

Por mais que os Clubes de Ciências façam parte de um assunto que está
cada vez mais em evidência, ainda há um déficit de trabalhos relacionados ao
tema, talvez pelos últimos anos terem sido atravessados pela pandemia da Co-
vid-19 e suas restrições, já que as atividades relacionadas aos clubes necessi-
tam ser presenciais e de trocas entre os alunos. Contudo, no decorrer dos anos
seguintes, o número não aumentou, mostrando que apesar de ser um assunto
muito importante e de uma extrema valia para o ensino, ainda há poucos traba-
lhos dedicados a esse tema em específico.

No Brasil, segundo dados encontrados no site da Rede Internacional de


Clubes de Ciências, há o cadastro de cem Clubes de Ciências em diferentes es-
tados, sendo o Rio Grande do Sul o que mais possui clubes cadastrados, sendo
dezesseis ao total. O que nos deixa intrigados é que, apesar do grande número
de clubes cadastrados, a parcela de trabalhos relacionados ao tema ainda é bai-
xa, mas reforçamos que, dos anos selecionados de pesquisa, alguns deles esta-
vam em meio a pandemia, onde o número de trabalhos e pesquisas que fossem
relacionadas a atividades presenciais baixou drasticamente.

Volume II 316
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Acredita-se que esse número irá crescer nos próximos anos já que as
medidas e restrições impostas pela pandemia vem diminuindo, permitindo en-
contros presenciais e, além disso, a Base Nacional Comum Curricular estimula
a articulação de conhecimentos científicos dentro do ensino de ciências em
diferentes ambientes que possam assegurar aos alunos um trabalho de aprendi-
zagem voltado para processos, práticas e procedimentos de investigação cientí-
fica, encontrados dentro das atividades propostas pelos clubes de ciências.

Diante das adversidades e desafios encontrados no ensino de ciências,


podemos prever que o número de trabalhos que envolvam os clubes de ciências
aumente com o passar dos anos pois atividades que auxiliam pedagogicamente
os alunos a terem acesso a conhecimentos distantes, os quais sozinhos os mes-
mos não encontrariam, auxiliam na potencialização do processo de aprendiza-
gem e potencializam o ensino de ciências.

O termo letramento científico, como apresentado ao longo do texto, ainda


é um conceito cuja definição está em discussão, dificultando o seu uso na pes-
quisa. Porém, é um assunto de extrema importância e contribuição na formação
de indivíduos preocupados com o meio científico e interessados no ramo ainda
na fase da educação básica. O letramento fortalece ainda mais a divulgação
científica e o conhecimento científico fora do meio acadêmico, tornando um
assunto específico (conhecimento apenas de cientistas e professores da área)
em algo de conhecimento geral.

Como cita Cunha (2018), dentro do ensino de ciências, o uso da palavra


“letramento” ainda é escasso pois dentro da bibliografia ainda prevalecem tra-
balhos que utilizam o termo “alfabetização científica”, termos que se confun-
dem e que ainda não são bem distintos dentro do ramo da pesquisa, porém é
crescente o número de autores que começam a adotar o uso do termo letramen-
to científico em seus trabalhos e pesquisas.

Volume II 317
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Porém, como no caso dos clubes de ciências, acreditamos que trabalhos


que tragam esse viés de pesquisa tenham uma crescente nos próximos anos,
pois com a inserção da nova Base Nacional Comum Curricular que traz em
suas diretrizes que, ao ter contato com a ciência, os alunos devem aguçar o seu
olhar para as coisas que os cercam e que dessa maneira possam tomar decisões
conscientes e alicerçadas nesse conhecimento que é estimulado no ensino ali-
cerçado ao letramento científico. E ainda, como ressaltam Delizoicov, Angotti
e Pernambuco (2011, p. 21), “é fundamental que essa dimensão do processo de
produção do conhecimento científico também se faça presente na educação de
nossos alunos”; vemos um grande potencial de fonte de pesquisa e desenvolvi-
mento de trabalhos.

É válido ainda salientar que, quando cruzamos o letramento científico


com o ensino de ciências na busca, o número reduz ainda mais, reforçando a
importância da inserção do letramento científico dentro das escolas como parte
das estratégias pedagógicas de todos os professores, não só daqueles da área de
ciências.

Os trabalhos que foram selecionados que envolvem o cunho do letramen-


to científico foram aqueles relacionados com o uso do letramento dentro do en-
sino de ciências, mostrando as suas potencialidades e que pudessem servir para
aprimorar o tema. A grande maioria dos achados que envolvem o tema pro-
curam caracterizá-lo ou distingui-lo do termo “alfabetização científica”, pois
como relatado anteriormente em muitos trabalhos ainda temos uma mistura dos
dois temas.

A educação em espaços não-formais ainda é um paradigma a ser rompido


dentro do processo de ensino-aprendizagem. Isso fica evidenciado no número
de artigos e trabalhos encontrados relacionados ao tema. Romper as barreiras
e os muros da escola ainda é um processo a ser traçado pelos professores de

Volume II 318
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

todas as áreas de ensino – e ainda mais dos professores de ciências e suas ra-
mificações – já que os assuntos tratados são práticos e precisam fazer parte do
cotidiano dos alunos.

Uma das funções principais do ensino de ciências é permitir que o alu-


no, em qualquer nível de escolarização, possa apropriar-se de toda a estrutura
presente no conhecimento científico, do seu potencial explicativo e também de
sua capacidade transformadora, garantindo-o uma vasta visão do processo e do
produto final, construído ou não por eles mesmos (DELIZOICOV; ANGOTTI;
PERNAMBUCO, 2011). Segundo esses mesmos autores, esses modos de or-
ganização curricular no ensino básico podem e devem ocorrer dentro e fora da
escola. Essas dinâmicas fora do ambiente escolar serão incorporadas de forma
cultural na vivência dos alunos e serão levadas para além da fase da escolariza-
ção de cada um ressaltando, dessa maneira, a importância desses trabalhos que
envolvem esses espaços, servindo de divulgação e de incentivo para que outros
educadores possam seguir passos semelhantes em sua didática na sala de aula.

Sendo assim, destacamos que a aprendizagem dos alunos deve ser feita
através da interação do mesmo com o seu meio circundante, cultural e social,
dessa forma a aprendizagem deve ser vista com um novo olhar voltado para um
sistema que é resultado da interação do espaço escolar com o espaço fora do
muro das escolas (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011).

Dos artigos selecionados para leitura relacionados ao tema, grande parte


relata novas metodologias que utilizam os espaços não-formais de educação
como ferramenta de aprendizagem. Além disso, encontramos alguns que rela-
tam diferentes ambientes que podem ser usufruídos como espaços educativos
com grande potencial que fogem dos muros escolares. Todos esses servirão de
inspiração e de incentivo para a realização do posterior projeto.

Volume II 319
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Ao cruzar os três unitermos o número de trabalhos diminuiu ainda mais.


A maioria dos cruzamentos não retornou resultados, evidenciando ainda mais
a importância de pesquisas que envolvam esses temas, sendo estas capazes de
fortalecer o ensino de ciências e a aprendizagem dos educandos através de prá-
ticas pedagógicas diferenciadas.

É importante ressaltar que a maioria dos trabalhos selecionados


para leitura relatavam experiências nas áreas pesquisadas ou traziam uma
fundamentação teórica importante para a pesquisa. Porém. como já mencionado.
não localizamos nas bases de dados que selecionamos artigos ou trabalhos
que fizessem uma relação com os nossos focos de pesquisa, dessa maneira,
mostrando e evidenciando a importância de trabalhos que alinhem o ensino de
ciências dentro de um clube de ciências que procurem o letramento científico
em espaços de educação não-formal.

Considerações finais

Ao analisar os trabalhos e artigos encontrados nas três plataformas di-


gitais, foi possível perceber que, por mais que tratem de assuntos corriquei-
ros, ainda existe um déficit de publicações na área. Isso é ainda mais pertinen-
te quando correlacionamos os assuntos que, na teoria, podem ser trabalhados
muito bem em conjunto, mas na prática ainda não se vê acontecer.

É importante considerar que dois anos abrangidos pela busca contaram


com restrições importantes em função da pandemia da Covid-19, período em
que as pesquisas estacionaram ainda mais na área da educação, em que os
trabalhos são em sua maioria presenciais e, por isso, sofreram impacto das
adversidades vividas. Acredita-se que esses números passem a crescer nos pró-
ximos anos com o retorno aos trabalhos presenciais, que possibilitam as trocas
necessárias para a realização dessas investigações.

Volume II 320
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Dessa forma, o uso de clubes de ciências para promover a cultura do


letramento científico, unido aos espaços não-formais de ensino de ciências na
educação básica, promove aos estudantes uma aproximação com temas cien-
tíficos e que fazem parte do seu cotidiano. Essas atividades podem, além de
possibilitar a construção de um novo olhar para as coisas simples do dia-a-dia
de cada educando (que se tornará um cidadão socialmente e cientificamen-
te preocupado com o meio em que está inserido), proporcionar momentos de
vivências completamente distantes da sua realidade, apresentando locais que
eles mesmos nem conheciam dentro do seu próprio território, aflorando dessa
maneira o sentimento de pertencimento, conhecimento e amor pela sua terra,
aumentando assim a sua preocupação com as questões ambientais e sociocul-
turais.

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Volume II 323
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Resumo: O ensino de ciências está cada vez mais desafiador, considerando a reali-
dade em que os estudantes estão inseridos. Com isso, surge a necessidade de novas e
mais atrativas metodologias de ensino para alcançar mais êxito no processo de ensi-
no-aprendizagem. Este capítulo faz parte de uma proposta de trabalho que pretende
unir o letramento científico e a educação em espaços não-formais de ensino dentro de
clubes de ciências, incluindo atividades que visam o fortalecimento da aprendizagem
e que rompam os muros das escolas. Foi realizado um levantamento bibliográfico em
três bancos de dados digitais (Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações,
Red de Revista Científicas de Acceso Abierto no Comercial Propiedad de la Aca-
demia e no Encontro Nacional de Pesquisas em Educação em Ciências), utilizando
esses quatro unitermos: educação em ciências, letramento científico, clubes de ciên-
cias e educação em espaços não-formais de ensino, a fim de analisar a existência de
estudos que envolvam esses quatro termos. O número de trabalhos que fizessem essa
relação foi muito abaixo do esperado, chegando ao marco zero, evidenciando dessa
maneira a grande importância de trabalhos que deem destaque a esses temas que tem
um grande potencial para serem auxílio no processo de ensino aprendizagem.

Palavras-chave: Ensino de ciências; Letramento científico; Clubes de ciências; Edu-


cação em espaços não-formais.

Abstract: Nowadays the science teaching is getting challenger due to the reality in
which students are in. Building on that, the need of new and more attractive method-
ologies of teaching emerges to achieve success in the teaching-learning process. This
chapter aims to show a proposal of work in which science literacy and non-formal
educational spaces of teaching in science clubs are united, promoting activities that
support the strengthening of students learning in a way to break down the schools’
walls. It was carried out a bibliographical survey in three digital databases (Bibliote-
ca Digital Brasileira de Teses e Dissertações, Red de Revista Científicas de Acceso
Abierto no Comercial Propriedad de la Academia e no Encontro Nacional de Pesqui-
sas em Educação em Ciências), using these four uniterms: Science teaching. Scien-
tific literacy. Science clubs. Non-formal educational spaces, in order to analyze the
existence of studies involving these four terms. The number of works that made this
relationship qas much lower than expected, reaching the zero mark, thus evidencing
the great importance of works tha highlight these themes that have great potential to
be an aid in the teaching-learning process.

Keywords: Science teaching; Scientific literacy; Science clubs; Non-formal educa-


tional spaces.

Volume II 324
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

SEÇÃO 2:

CIRANDAR

Volume II 325
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 13

COOPERB: O COOPERAR
EM UMA ESCOLA DO/NO
CAMPO DE NOVA SANTA RITA,
RIO GRANDE DO SUL
Sabrina Silveira da Rosa
Andressa Luana Moreira Rodrigues
Mariana Paranhos de Oliveira
José Vicente Lima Robaina
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-B

Educação do/no Campo de Nova Santa Rita e o


despertar de novos saberes

A caminhada para o programa de extensão em rede “Cirandar: rodas de


investigação na escola” da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) não
iniciou no programa em si e sim, através de uma longa caminhada, a partir de
um projeto municipal de capacitação para as educadoras/educadores das Esco-
las do/no Campo, onde se firmou uma parceria com a Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS) no curso Licenciatura em Educação do Campo-
-Ciências da Natureza. A diretora da escola Camila Grellt (gestão 2016 a 2020)

Volume II 326
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

decidiu por conhecer um pouco mais sobre esse assunto que tanto desafiava
as educadoras das escolas do campo de Nova Santa Rita, Rio Grande do Sul.
Curso esse ofertado pela nova gestão (2013 a 2020) municipal que acreditava
na reforma da Educação do/no Campo de nossa cidade.

Novos conhecimentos chegaram para nos desacomodar, foram dois anos


de formações continuadas, palestras, oficinas e planejamentos coletivos para
todas as escolas do campo de Nova Santa Rita, onde se iniciou uma base so-
bre Educação do/no Campo e se descobriu que: A Educação do/no Campo é a
modalidade de ensino que deve ocorrer em espaços denominados rurais nos
municípios. Diz respeito a todo espaço educativo que se dá em áreas fora da
zona urbana como: florestas, regiões onde há o predomínio da agricultura e da
agropecuária, populações ribeirinhas, caiçaras, extrativistas, assentamentos in-
dígenas e comunidades quilombolas.

A Educação do/no Campo tem três grandes desafios: 1) assegurar o aces-


so dos camponeses ao conhecimento, 2) direito a diferença, 3) trabalhar um
novo projeto no campo da elaboração e da disseminação do conhecimento que
rompa a hegemonia e o capital no campo. Segundo Arroyo (2005, p. 14) “todo
o movimento social sabe que toca em consciência, valores, representações, pre-
conceitos, culturas. Esta consciência do papel educativo e formador tem sido
destacada nas experiências de formação de educadores”.

O reconhecimento de que as pessoas que vivem no campo têm direito a


uma educação diferente daquela oferecida para quem vive nas cidades é recen-
te. Ele extrapola a noção de espaço geográfico e compreende as necessidades
culturais, os direitos sociais e a formação integral desses indivíduos, tornan-
do-se uma proposta inovadora no universo educacional. Para Caldart (2004, p.
17) “o povo tem direito de ser educado no lugar onde vive; o povo tem direito
a uma educação pensada desde o seu lugar e com participação, vinculada à sua
cultura e às suas necessidades humanas e sociais”.

Volume II 327
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Também descobrimos que é inviável falar de Educação do/no Campo


sem falar em Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), pois sa-
bemos que a mesma teve seu início a partir das lutas pela terra, depois passou
a contemplar a luta pela educação e por uma transformação social por comple-
to, de valorização do meio. Segundo Molina (2009, p. 11) “A Educação do/no
Campo originou-se no processo de luta dos movimentos sociais camponeses e,
por isso, traz de forma clara sua intencionalidade: construção de uma sociedade
sem desigualdades, com justiça social”. A Educação do/no Campo fundamen-
ta-se na preocupação da formação humana, com a emancipação e a consciência
crítica, coletiva e atuante, objetivando a libertação de toda sociedade. Todas as
discussões que permeiam a educação do campo, segundo Freire (2013) devem
ser alicerçadas por pessoas do meio em que o campo está inserido, que repre-
sente o contexto, caso contrário será para o campo.

Ensino de Ciências e sua história

Durante nossos estudos descobrimos que a partir da década de 1940, se


iniciou no Brasil o interesse pela Ensino de Ciências para que esse ensino fosse
organizado e que viesse a formar profissionais que ajudassem no desenvol-
vimento de estudos científicos. Como forma de fomentar esse incentivo para
formação na área de ciências, foram criados e organizados alguns sistemas de
ensino como o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), a pro-
mulgação da constituição brasileira e o surgimento do Instituto Brasileiro de
Ciências e Cultura (IBECC) que passou a ser um marco no ensino de ciências
no Brasil.

Nesse mesmo período se percebe um movimento norte americano em


apoio ao Brasil para incentivar o ensino de ciências, pois após o lançamento do
Sputinick, pelos soviéticos, inicia-se uma corrida pelo desenvolvimento dos es-

Volume II 328
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tudos científicos em países que eram influenciados por eles para que tornassem
a referência mundial. Os muitos projetos desenvolvidos pelos norte-america-
nos, da época, influenciaram o ensino de ciências brasileiro, com a intenção de
formar pessoas que pudessem ajudar nos estudos para descobertas no espaço.

O Brasil passou a investir na área de física, química, matemática e biolo-


gia com o intuito de incentivar pesquisas nessas áreas, principalmente em nível
universitário. Esses investimentos qualificaram o ensino de ciências no Brasil,
pois houve uma parceria entre as universidades e as escolas de ensino médio.
Os currículos foram adaptados e materiais didáticos foram criados por profis-
sionais capacitados, porém, ainda baseados no sistema americano. No Brasil,
segundo Krasilchik (2000, p. 86):

A necessidade de preparação dos alunos mais aptos era defendida em nome


da demanda de investigadores para impulsionar o progresso da ciência e
tecnologia nacionais das quais dependia o país em processo de industria-
lização. A sociedade brasileira, que se ressentia da falta de matéria-prima
e produtos industrializados durante a 2ª Guerra Mundial e no período pós-
-guerra, buscava superar a dependência e se tornar autossuficiente, para o
que uma ciência autóctone era fundamental.

Essas modificações foram pensadas para que o ensino de ciências sofres-


se mudanças significativas e tivesse relevância na formação de novos cientis-
tas, principalmente no ensino superior, pois acreditava-se que esses novos pro-
fissionais que estavam sendo formados fossem incentivar os demais níveis de
ensino. Porém, não se tinha na época, profissionais suficientes para se trabalhar
nesta área. Dos anos 1950 aos 1980 algumas ações foram pensadas para que se
continuasse investindo em um ensino de ciências de qualidade, como:

• Nos anos de 1950: o IBECC confeccionou kits para ensino Química, Físi-
ca e Biologia para professores e estudantes da educação básica.
• Em 1961: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº
4024/61) tornou obrigatório a inclusão da disciplina de Ciências Naturais
no currículo para todas as séries ginasiais, que antes atendia somente as
duas últimas séries. Com a lei foram aumentadas a carga horárias de Físi-

Volume II 329
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ca, Química e Biologia e com essa mudança os alunos passaram a ter uma
educação baseada na reflexão e na crítica a partir dos seus conhecimentos.
• Em 1964: após o golpe militar as disciplinas científicas sofreram alte-
rações e um convênio foi assinado entre o governo brasileiro e a United
States Agency for International Development (USAID).
• Em 1965: foram criados seis centros de ciências: Centro de Ciências do
Nordeste, no Recife, Centro de Ciências do Rio Grande do Sul, em Porto
Alegre, o Centro de Ciências de Minas Gerais, em Belo Horizonte, o Cen-
tro de Ciências da Guanabara, no Rio de Janeiro, o Centro de Ciências de
São Paulo, em São Paulo e o Centro de Ciências da Bahia, em Salvador.  
• Em 1966: verba da Fundação Ford – que concedeu 86 mil dólares para
profissionais que atuariam nos CECIs.
• Em 1967: Fundação Brasileira para o Desenvolvimento do Ensino de Ci-
ências (FUNBEC) – tinha como objetivo renovar o ensino de ciências para
o ensino superior.
• Em 1968: curso regional realizado pela Unesco em São Paulo: curso dire-
cionado para as professoras do magistério com a intenção de desenvolver o
ensino de ciências nos anos iniciais.
• Em 1971: a Lei nº 5.692 tornou obrigatório a inclusão da disciplina de
Ciências Naturais nas oito séries do primeiro grau, atingindo todos os ní-
veis de ensino. Instituiu o Projeto Nacional para Melhoria do Ensino de
Ciências.
• Anos 1980: redemocratização da sociedade brasileira – Criação da Coor-
denação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
• Em 1998: os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN).

Com a Lei n. 5.692/71 foi criado o Programa de Expansão e Melhoria


do Ensino (PREMEN) que ficaria responsável pela produção de materiais di-
dáticos voltado ao ensino de ciências. Esse órgão juntamente com o IBECC e
o FUNBEC perceberam que todos os investimentos na área estavam em desa-
cordo com os livros didáticos utilizados na época e passaram a elaborar novos
materiais que pudessem contemplar os objetivos de melhoria do ensino de ciên-
cias no Brasil.

O ensino de ciências, a partir dos anos 1990, não ficou estático, esteve em
constante movimento e adequações, foi se desfazendo dos objetivos de somen-
te formar cientistas para construção dos avanços tecnológicos e passou para

Volume II 330
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

um ensino que abordasse a compreensão da realidade que cerca os alunos e se


possível levar os conhecimentos adquiridos a uma mudança de comportamento
frente a essa realidade, em caso de necessidade.

Na atualidade autores afirmam que é imprescindível a inserção da reali-


dade dos educandos no ensino de ciências, sendo um ensino contextualizado
social, político, histórico e econômico, com o objetivo de evidenciar um ensino
de ciências para a formação da cidadania. Nessa perspectiva, os autores defen-
dem a ideia que:
[...] aprender e ensinar, longe de serem meros processos de repetição e acu-
mulação de conhecimentos, implicam transformar a mente de quem apren-
de, que deve reconstruir em nível pessoal os produtos e processos culturais
[...][...] a ciência é um processo e não apenas um produto acumulado em
forma de teorias ou modelos, e é necessário levar para os alunos esse ca-
ráter dinâmico e perecedouro dos saberes científicos. (POZO; CRESPO,
2009, p. 21).

É necessário incorporar ao ensino de ciências elementos culturais e sociais


da vida dos estudantes nos mais variados conteúdos, trabalhando temáticas
abrangentes que envolvam questões como a do meio ambiente.

Clube de Ciências e suas costuras em uma Escola


do/no Campo

Entendendo a Educação do/no Campo e buscando aprimorar o que se tem


de maior riqueza neste ambiente que seria necessário aliar esse entendimento
ao Ensino de Ciências para aprendizagem dos seus educandos, onde segundo
Blaszko, Ujiie e Carletto (2014, p. 152) descrevem que: “O ensino de ciências
aborda conteúdos articulados com a realidade, com o meio ambiente, com o
desenvolvimento do ser humano, com as transformações tecnológicas, dentre
outros temas”.

A reflexão e a ação sobre o meio natural, físico e social possibilitam que


a criança desde a primeira infância possam observar, manusear, explorar, in-

Volume II 331
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

vestigar e construir conhecimentos científicos, aproveitando os conhecimentos


dos educandos que são baseados nos saberes do campo, com conhecimentos
que cada um traz da sua realidade, e acaba se adequando ao que diz respeito as
práticas e atividades do estudantes, bem como seus saberes que são passados de
geração em geração devem ser contemplados pela escola, sendo esses saberes
populares ou saberes primevos (CHASSOT, 2006). Se aliarmos esses conheci-
mentos prévios e acrescentarmos aos saberes que a escola oferece, formaremos
educandos pesquisadores, críticos, conscientes da sua realidade e ainda incen-
tivaremos a curiosidade científica.

O ensino nas Escolas do Campo deve ter a intenção de exercitar o con-


vívio com as atividades do meio em que nossos educandos vivem, conhecer
esse meio e valorizá-lo, sair do sistema de memorização de conteúdos e livros
didáticos que não os representem e passar para uma aprendizagem realmente
significativa, com objetivos adequados que se fundem perfeitamente com os sa-
beres das ciências da natureza, os quais ao serem trabalhados através de Clubes
de Ciências, facilitariam a compreensão das a aprendizagens do conhecimento
científico contextualizado, utilizando temáticas que fizessem sentido para os
educandos. Para Fasolo e Moraes (1988) apud Mansuso et al. (1996, p. 42)
“[...] os clubes constituem-se [...] de uma estratégia de melhoria do Ensino de
Ciências, em redutos de ação e combate contra um sistema de ensino ineficiente
e domesticador”.

Com o envolvimento neste novo conhecimento chegou um convite muito


especial à escola onde lecionamos. Querem formar um Clube de Ciências? E
então a escola, juntamente com seu coletivo educador decidiu por implantar
um Clube de Ciências. Ficou como coordenadora do Clube de Ciências a pro-
fessora Andressa Luana Moreira Rodrigues, que iniciou suas atividades a partir
do contexto local, conhecendo a comunidade, aprendendo sobre o território ao
qual nossos educandos pertenciam. Na sequência foi criado o nome, o logo e a
mascote do agora intitulado: Clube de Ciências Saberes do Campo.

Volume II 332
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A partir da implantação do Clube de Ciências em nossa escola as portas


do conhecimento se abriram para as educadoras, foram variadas experiências
de aprendizagem com os educandos e com a comunidade, tempos de pesquisa
e planejamentos, onde despertamos para as leituras na área de Clubes de Ciên-
cias e Ensino de Ciências.

Os Clubes de Ciências devem usar uma fala que melhore a nossa com-
preensão sobre o mundo (CHASSOT, 2006). As atividades desenvolvidas de-
vem promover práticas lúdicas e atrativas sobre temas diversos, os quais terão
sempre ligação com o mundo real, presente no dia a dia e no cotidiano dos edu-
candos, as quais estão ligadas as demais atividades da escola que fazem parte
do todo, o ensino e aprendizagem.

Clubes de Ciências classificam-se como espaços não formais de ensi-


no, caracterizando-se principalmente por possuírem cronogramas flexíveis que
atendem às necessidades e desejos de cada grupo de alunos. Para Lima (1998,
p. 26), um Clube de Ciências é:  
Um espaço pedagógico com possibilidade de estudos científicos numa
perspectiva de construção/produção de conhecimentos, apresentando forte
integração com a comunidade e encontrando-se seus participantes envolvi-
dos em clima de cooperação e solidariedade.

Um clube de ciências depende da motivação dos alunos pelas atividades


propostas e também no interesse que esses alunos têm de produzir ciência. As
atividades não devem cair na rotina e nem se tornarem práticas desinteressantes
e comuns.

[...] o objetivo principal de um Clube de Ciências atualmente é: [...] abor-


dar conteúdos não de maneira tradicional, mas próximos do cotidiano dos
estudantes e das demais áreas do conhecimento, buscando uma formação
científica, porém voltada para a interpretação do cotidiano e em prol da
comunidade. (PARANÁ, 2008, p. 4).

Reconhecendo que o Clube de Ciências deve estar de acordo com a


realidade dos educandos e que a partir dos seus conhecimentos prévios podemos

Volume II 333
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ensinar ciências que faça sentido para essas educandas/educandos, que então
foi realizada, como uma das primeiras atividades o (re) conhecimento da
comunidade, onde educandos e educadores fizeram uma visita, em caminhada
pela comunidade, com provocações para um novo olhar, um olhar atento e
curioso à aquilo que normalmente quando estão indo ou vindo para a escola não
é visto por pressa ou costume. A partir desta saída de observação foram criadas
pelas educandas/educandos e educadoras temas que seriam importantes saber e
conhecer envolvendo ciências.

O Caminhar para o Cirandar

Nesse espaço amplo de conhecimento, experiências e leituras que foi o


Clube de Ciências, podemos contar sempre com a presença da universidade
através do professor José Vicente Robaina, que muito nos orienta e incentiva
a pesquisa no ambiente real dos educandos. Desde 2016, ano de criação do
Clube de Ciências Saberes do Campo (C.C.S.C.) tivemos muitas trocas de ex-
periências com as educadoras da Escola Municipal de Ensino Fundamental Rui
Barbosa (EMEF Rui Barbosa), a comunidade escolar, os educandos e o projeto
de extensão de Clube de Ciências, da UFRGS.

O envolvimento com os projetos escolares, apresentações de relatos de


experiências em congressos de ciências e de educação do campo, aliados ao
apoio da universidade e o incentivo por parte do professor José Vicente Robaina
de participar da seleção de mestrado para 2019, do Programa de Pós-graduação
em Ensino de Ciências (PPGeCI/UFRGS), onde estamos inseridas desde 2019.
Através do PPGeCI, nos aproximamos do Grupo de Estudos em Educação do/
no Campo e Ciências da Natureza (GPEEC/Natureza), do qual participamos,
que tivemos a oportunidade de assistir uma palestra com a professora Maria do
Carmo Galliazi, sobre Analise Textual Discursiva (ATD) e também foi apresen-
tado um pouco sobre o Cirandar: rodas de investigação na escola e todo o grupo
foi convidado a participar deste belo e encantador projeto.

Volume II 334
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Neste ano de 2021 foi sugerido que se estudasse uma temática durante
a escrita do Cirandar: rodas de investigação na escola e sendo este ano o cen-
tenário de Paulo Freire e levando em consideração toda sua significância para
diferentes áreas do conhecimento que também sugerimos como tema para ser
estudado no Cirandar: rodas de investigação na escola, 2021 “Paulo Freire”.

Paulo Freire e uma breve escrita da sua grande


história

A partir dos estudos sobre Educação do/no Campo se tornou parte do pla-
nejamento escolar textos sobre nosso patrono da Educação, Paulo Freire, foi a
partir das capacitações que nos aproximamos ainda mais deste amoroso autor,
onde conheci um pouco sobre sua história de vida e seu método de ensino e sua
contribuição para a educação nacional e mundial.

Paulo Freire nasceu em 19 de setembro de 1921, em Recife. Graduou-se


em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, mas não seguiu a profis-
são de advogado. Tendo optado pela carreira da educação, foi professor de por-
tuguês entre 1941 e 1947. A partir daí, ocupou alguns cargos sempre vinculados
à área educacional: Diretor do Departamento de Educação e Cultura do SESI/
PE (1946-1954), onde desenvolveu suas primeiras experiências com educação
de trabalhadores, o que o conduziria mais tarde para o desenvolvimento de seu
método, iniciado em 1961. Lecionou história e filosofia da educação na Univer-
sidade Federal de Pernambuco (1957-1963). No governo Goulart (1963), pre-
sidiu a Comissão Nacional de Cultura Popular e coordenou o Plano Nacional
de Educação de Adultos. Em 1964, acusado de subversão, foi condenado a 15
anos de exílio pelo governo militar.

Pernambucano, era filho de um oficial da polícia militar, Joaquim Temís-


tocles Freire, e de uma dona de casa, muito temente a Deus, Edeltrudes Neves
Freire. Ao longo de suas obras, Paulo Freire registrou que, com seus pais, apren-

Volume II 335
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

dera o diálogo, tema recorrente em toda a sua trajetória militante na educação.


Aos 23 anos de idade (1944), o casamento com a professora Elza Maia Costa
iria influenciá-lo significativamente como pensador e educador brasileiro, pois
do comprometimento e da militância da esposa colecionara os testemunhos da
realidade e a necessidade de uma escola transformadora.

Mesmo tendo se licenciado em Direito, percebeu imediatamente sua não


compatibilidade com a área. Deveria haver para ele um trabalho que o encan-
tasse e justificasse sua ação na história, mobilizada por um sentido maior de
justiça e liberdade que a advocacia não lhe despertara. Assim, a educação es-
colar, que fora sempre um desafio aos seus olhos, aos poucos foi se tornando
o principal objeto de seu cuidado. Estimulado pela esposa, foi trabalhar no
Departamento de Educação do SESI (1946-1954), o que lhe possibilitou a con-
solidação de sua escolha e seu propósito de vida profissional.

Entre os anos de 1961-1962, as condições de vida e educação das popu-


lações campesinas passaram a ser tema de sua indignação e busca de encami-
nhamentos para a construção de uma sociedade mais igualitária e alicerçada
na justiça. Propunha que seria necessária uma leitura de mundo do sujeito cog-
noscente, de sua situação como protagonista, e isso só seria possível por meio
de uma educação problematizadora. A partir desses pressupostos, criou o seu
método de ensino, tendo significativa expressão no Movimento de Cultura Po-
pular do Recife. O método em si não era o objetivo de sua razão de luta, mas
uma forma de despertar, para a leitura da palavra, o grande contingente de anal-
fabetos entre a população adulta. Vale dizer que, por essa época, a educação de
adultos começou a ter uma relevância como nunca tinha tido anteriormente,
ao ponto de, em 45 dias, os trabalhadores serem alfabetizados, refletindo a sua
própria situação de classe.

Ao invés de denominar simplesmente de sala de aula, as classes de al-


fabetização eram chamadas, por ele, de Círculos de Cultura/Leitura, princi-

Volume II 336
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

palmente porque sua finalidade não era somente instrumental, mas sobretudo,
uma forma de provocação da consciência das massas, isto é, nesses Círculos, os
processos históricos de exclusão social - denunciados entre a leitura de mundo
e a leitura da palavra - passavam a ser objeto de estudo, temário do conteúdo
de seu método.

Essa proposta ganhou expressão, quando, em 1963, foi convidado pelo


governo João Goulart para realizar a formação de coordenadores de Círculos
de Leitura, entre junho de 1963 e março de 1964. Entretanto, com a eclosão da
ditadura militar, em 1964, Paulo Freire foi preso por 70 dias e, imediatamente
depois, exilado, por ser considerado um “subversivo internacional”. A acusa-
ção era a de que seu método, comparado às perspectivas de Stálin, Hitler, Perón
e Mussolini, provocava movimentos antipatriotas.

Estando no Chile, recebeu o reconhecimento de educador por excelência,


cujas ideias e método, por conta de seu histórico, eram vistos com resistência
pelos militantes governamentais, uma vez que o seu ideário se dirigia às massas
oprimidas, despertando-lhes a percepção da necessidade de sua emancipação.
Mas, ainda assim, obteve respaldo para o desenvolvimento de suas ideias e
suas contribuições para a educação. Seu trabalho avançou também em outros
países, via o Instituto de Ação Cultural (IDAC), que ajudou a fundar na Suíça
no período de 1972-1974. Como exilado, esteve na Universidade de Harvard
(EUA), na Tanzânia, em Guiné-Bissau, dentre outros e retornou ao Brasil, em
1979, por ocasião da anistia.

Recebeu inúmeras premiações, no Brasil e no exterior, depois do exílio,


em reconhecimento pela sua contribuição na área educacional. Foi secretário
municipal da educação na cidade de São Paulo (1989-1991) e desenvolveu do-
cência e pesquisas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP)
e na Universidade Estadual de Campinas/SP (Unicamp). Faleceu em 1997, dei-
xando significativa produção literária, da qual se destacam: Pedagogia do opri-

Volume II 337
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mido (traduzido em 18 línguas), Conscientização, Educação como prática da


liberdade, Pedagogia da esperança, Pedagogia da autonomia, Ação cultural
para a liberdade, A importância do ato de ler, Educação e mudança, dentre
outras.

A preocupação de Paulo Freire com a formação do homem para a cida-


dania no âmbito da escola era recorrente quanto ao domínio de todo o instru-
mental possível para o despertamento do sujeito cognoscente. Assim, a ação
pedagógica do educador se origina numa leitura de mundo, da realidade de sua
turma, do conhecimento e das trocas entre os sujeitos cognoscentes. O pro-
fessor, como ator social que também aprende ao ensinar, deve ter sempre em
vista que o trabalho com a realidade envolve uma responsabilidade pontual: o
planejamento de ações que favoreçam o desenvolvimento de seus alunos num
movimento de ressignificação de conhecimentos.

Cooperativismo – um complemento à colcha de


retalhos

Foi com base em todo esse contexto de Educação do/no Campo, Educa-
ção em Ciências, Clube de Ciências e em conjunto à teoria de Paulo Freire que
constituímos nossa Cooperativa Escolar, baseada em conhecimentos teóricos
e em seu Território Educativo, a mesma complementa uma colcha de retalhos,
feita por muitas mãos e com diferentes conhecimentos que conversam entre si
e constituem a fortalecida educação da escola descrita nesse artigo.

Bialoskorski Neto (2006) comenta que o cooperativismo e as formas de


cooperação são algo de muito antigo na história da humanidade. Há registros
sobre a cooperação e a associação solidária desde a Pré-História da civilização,
em tribos indígenas ou em antigas civilizações como os Babilônicos. As pes-
soas quando se juntam, produzem muito mais que a soma do que produziriam
individualmente.

Volume II 338
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O cooperativismo é uma forma de somar capacidade dentro de um mundo


de concorrência. É uma forma de preservar a força econômica e de vida dos in-
divíduos de um mesmo padrão e tipo, com objetivos comuns e com as mesmas
dificuldades. A cooperativa quase sempre surge em momentos de dificuldades
e da consciência de fragilidade do homem dentro do mundo em que atua.

Aconteceu em 1844 por 28 operários – 27 homens e 1 mulher, em sua


maioria tecelões, no bairro de Rochdale-Manchester, na Inglaterra, fundamen-
tados no sentimento de cooperação e mutualidade pregados por Robert Owen
e Fourier, dentre outros; finalmente conseguiu colocar um funcionamento um
empreendimento, que a história registra como marco inicial do cooperativismo.
Analisando a época, conclui-se os mentores desta ideia eram homens à frente
de seu tempo, buscavam meios de melhorar suas condições sociais e econômi-
cas. Os pioneiros de Rochdale inauguram um armazém, organizado e regido
por normas estatutárias que, segundo (PINHO, 1982 apud SANTOS, 2001)
objetivavam:

a) formação de capital para emancipação dos trabalhadores mediante


economias realizadas com a compra em comum de gêneros alimentícios;

b) b) construção de casas para fornecer habitação a preço de custo;

c c) criação de estabelecimentos industriais e agrícolas com duplo ob-


jetivo: produzir direta e economicamente tudo o que fosse indispensável aos
operários desempregados ou que percebiam baixos salários;

d) d) educação a luta contra o alcoolismo;

e) e) comercialização (compra e venda) somente a dinheiro, para que os


cooperados só assumissem compromissos dentro de suas possibilidades orça-
mentárias, e evitando o crédito, que considerava um “mal social”;

f) f) cooperação integral. Esse fato é considerado o início do movimento


cooperativista mundial, ou seja, o marco fundamental do cooperativismo mo-
derno.

Volume II 339
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Como nos mostra a história, foi em um ambiente de dificuldade que as


ideias cooperativistas se firmaram e os avanços das práticas industriais e dimi-
nuição da atividade artesanal, inicia-se a exploração da mão-de-obra, o coope-
rativismo surge como forma de amenizar os traumas econômicos e sociais que
estas transformações submeteram o homem da época. Hoje o que se discute são
alternativas viáveis para a realidade atual; os motivos que os precursores do
cooperativismo à época e, o momento atual, quais as semelhanças e soluções
estão nosso alcance alicerçado nos ideais cooperativista.

Nas Cooperativas Escolares, a educação ganha protagonismo nesta dis-


cussão, as contribuições dessa organização para a educação e a sociedade como
um todo é importante no que diz respeito ao impacto que ele traz para o ensino
e a própria comunidade escolar. Certamente a escola é encarregada de promo-
ver o conhecimento às gerações presentes, pensando já o futuro.

É sob essa visão que se acredita no espírito da cooperação aliado à


realidade dos estudantes envolvidos com esse movimento que Monserrát (1949,
p. 80) já afirmava:
E é entre estas instituições que vamos encontrar a Cooperativa Escolar
como instrumento eficientíssimo para a criança exercitar o self-governe-
ment no trato de questões relacionadas com a vida futura, bem como para
preparar uma geração melhor que a precedente, numa escala ascendente de
ensinamentos econômicos e de aprendizagem prática dos deveres e neces-
sidade de solidariedade social.

O trabalho em equipe é um aprendizado para a vida, não importa o tema


ou o objeto de aprendizado.

A escrita para o Cirandar

Como assunto, para ser desenvolvido na escrita para o Cirandar: rodas


de investigação na escola deste ano (2021), levamos o projeto da Cooperativa
dos Alunos da Escola Rui Barbosa (Cooperb), um projeto que surgiu partir do
conhecimento cientifico das formigas (dentro do Clube de Ciências). Uma ati-

Volume II 340
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

vidade que orienta os educandos para ações diárias de cooperação, autonomia,


dinamismo, autoestima, educação financeira, organização, liderança e perten-
cimento. A cooperativa escolar veio ao encontro de todo o conhecimento que
tivemos ao estudar os princípios norteadores da Educação do Campo, Paulo
Freire e o sentido do ensino de ciências nas escolas de ensino fundamental,
onde todos esses assuntos se interligam com a realidade da escola.

A Cooperb (Cooperativa dos Alunos da Escola Rui


Barbosa) e o seu cooperar

A Cooperb foi fundada em junho de 2018 e teve sua idealização a partir


do inventário, que as educadoras realizaram, durante uma visitação ao território
escolar. Percebendo a existência de uma cooperativa na localidade da escola,
mais precisamente dentro do assentamento onde está a nossa escola, se notou
a bonita ligação que teria uma cooperativa dos educandos, ligando os conhe-
cimentos das educandas/educandos com a realidade das mesmas, exercitando,
através do movimento cooperativo, dentro da escola, uma formação democrá-
tica (FREIRE, 2004).

Durante o ano de 2021 a Cooperb realizou e participou de diferentes


ações com seus associados, as quais irei separar por tópicos para ficar melhor
compreendido.

Fevereiro: todas as cooperativas escolares possuem uma parceria com


um banco de crédito que também é uma cooperativa e o mesmo apoia pedago-
gicamente, através de capacitações, as educandas/educandos e as educadoras
das cooperativas escolares. E este ano iniciou-se com uma linda recepção e
acolhida aos professores orientadores das Cooperativas, onde através de um
encontro online tivemos diversas dinâmicas com música, brincadeiras e muito
estudo e reflexões sobre o andamento das Cooperativas para 2021. Além das
atividades de reflexão, foi muito marcante o carinho com que os educadores
foram recebidos neste bonito momento.

Volume II 341
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Maio: como não foi possível voltarmos presencialmente neste início de


ano letivo, a cooperativa teve que realizar encontros online para dialogar sobre
uma possível organização da Assembleia Geral Ordinária (momento de presta-
ções de contas de uma cooperativa e eleição do novo conselho administrativo)
e então os educandos, juntamente comigo (professora orientadora). Logo, em
maio, foi combinado o encontro, onde a partir de afinidades e conversas entre
os associados se pensou os nomes que seriam colocados à disposição para os
cargos da nova diretoria. Foi um momento de desenvolvimento de liderança e
autonomia dos educandos, eles conseguiram argumentar e propor suas ideias
para os seus cargos e os demais associados foram aprovando e colaborando
com as possibilidades. Ver esse movimento de cooperação e diálogo dos edu-
candos me remeteu ao livro dicionário de Paulo Freire, onde Adams (2010, p.
662) diz que “a consciência crítica, as relações solidárias e democráticas que
são condições para a participação na construção de uma sociedade solidária”.

Junho: neste mês tivemos o retorno das aulas presenciais e com isso po-
demos nos aproximar dos associados que não tinham a possibilidade de esta-
rem de forma online, pois, os mesmos não tem acesso à internet. Em diálogo
com os cooperados presenciais e remoto, como o inverno foi bem rigoroso,
os educandos tiveram a ideia de realizar uma ação social de apoio às famílias
carentes, através de doações de roupas quente, com o projeto “Varal Coopera-
tivo”. Todos os cooperados em conjunto com as educadoras da escola fizeram
uma campanha de doação de roupas e arrecadaram muitas peças e assim se fez
o I Varal Cooperativo da Cooperb. Com o sucesso e também ainda necessária
ação, em julho, foi realizado o II Varal Cooperativo e agora com doações de
alimentos também. As famílias que realmente necessitavam de doações de ali-
mentos receberam uma cesta básica, tudo organizado pelos educandos, associa-
dos da Cooperativa.

Volume II 342
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1: Dia do Cooperativismo: o varal cooperativo

Fonte: arquivo das autoras (2021).

Agosto: baseados nos princípios que regem a proposta da cooperativa


escolar, e também da EMEF Rui Barbosa, que são alimentação saudável e pre-
servação ambiental, que os associados da Cooperb dialogaram e pensaram em
uma ação que pudesse contribuir com a diminuição da poluição ambiental. Um
dos objetos de aprendizagem da Cooperb são as sacolas retornáveis, então os
associados pensaram em conversar com o poder legislativo e executivo do mu-
nicípio para que se criasse um projeto de lei para inserção das sacolas retorná-
veis nos mercados do município de Nova Santa Rita. Em setembro deste ano
uma das vereadoras entrou com o pedido de providência para se organizasse
essa ação. Foi a realização de um sonho dos pequenos associados da Cooperb,
uma ação que mexeu com os educandos e com a comunidade e que demons-

Volume II 343
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tra uma grande mobilização pela humanização das educandas/educandos, uma


energia e esperança de que novas atitudes e a conscientização podem realmente
mudar o nosso entorno e que segundo Zitkoski (2010, p. 647) “O que deve mo-
ver nossa luta pela humanização do mundo é a esperança no potencial dos seres
humanos em modificar o mundo e a si mesmos”.

Figura 2: Apresentando o projeto para o prefeito municipal

Fonte: arquivo das autoras (2021).

Quem sabe com um trabalho de consciência crítica através de uma ree-


ducação a Cooperb não consiga eliminar as sacolas plásticas dos mercados
de Nova Santa Rita, depois do Rio Grande do Sul e porquê não no Brasil.
Idealizar é o princípio do realizar!

Setembro: este ano a Cooperb pode participar da Expointer, evento do


qual já haviam participado desde 2018, porém em 2020, devido a pandemia

Volume II 344
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

não teve, e este ano retornou, porém somente a professora orientadora poderia
ir para expor os materiais construídos pela cooperativa. Nos anos anteriores
essa era uma das atividades mais esperadas do ano, não somente pelo retorno
financeiro, mas principalmente pelo fato de estarem participando de um even-
to internacional, onde eles podem apresentar e mostrar todo o conhecimento
e atividades que fazem na cooperativa.

Outubro: neste mês os educandos associados da Cooperb que moram na


Coopan estudaram a possibilidade de colocar, no escritório desta cooperativa
os objetos de aprendizagem da Cooperb, que são as sacolas retornáveis e o
sal temperado. Dialogaram com os cooperados da Cooperb, onde os mes-
mos aceitaram a proposta e depois levaram aos responsáveis pela Coopan a
intenção desta parceria. A Coopan aceitou a proposta e hoje os cooperados
já podem levar os objetos de aprendizagem para serem comercializados no
escritório desta cooperativa.

Novembro: realização da Assembleia Geral Ordinária (AGO) local de


aprendizado, demonstração de resultados e eleição da diretoria. Após uma
semana de ensaios os associados candidatos à Diretoria da Cooperb fizeram
sua assembleia, onde eles mesmos realizaram o protocolo, escreveram a ata
e conduziram toda a reunião, foram atentos aos detalhes e quando necessário
tiveram autonomia e liderança para improvisar. Foi um momento de muita
expectativa, mas eles surpreenderam e emocionaram os convidados e autori-
dades presentes no evento.

Volume II 345
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 3: Nova diretoria da Cooperb e as autoridades e pessoas da comunidade


presentes na AGO

Fonte: arquivo das autoras (2021).

Observar todo esse contexto nos faz refletir que a Cooperb desenvol-
ve nos educandos não somente o esperançar de novos conteúdos didáticos e
o aprender mecanizado dos saberes, mas sim o esperançar de uma sociedade
mais igualitária e justa para os cidadãos e as cidadãs da nossa cidade, onde os
mesmos sairão da EMEF Rui Barbosa com um novo olhar sobre a sua função
na sociedade.

Considerações finais (alinhavando o contexto)

Os educandos/educandas que vivem no campo têm o direito de uma edu-


cação diferente das que vivem na cidade, elaborar atividades que são da reali-
dade deles, de uma escola do campo, extrapolar a noção de espaço geográfico e
compreender as necessidades culturais, os direitos sociais e a formação integral
desses indivíduos são uma forma de fazer a educação contextualizada.

O projeto da Cooperb é um movimento que traz essa educação contex-


tualizada, o qual nos orgulha e nos enche de esperança, esperança por estarmos

Volume II 346
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

contribuindo para a formação de cidadãos e cidadãs autônomos do seu fazer e


críticos da sua realidade. São educandas/educandos de sete à onze anos que par-
ticipam deste projeto e já conseguem se auto organizarem e dialogar com pro-
priedade quanto aos seus objetivos e necessidades, sempre pensando no bem-
-estar dos associados e também saúde dos que irão consumir o sal temperado
e ainda ao construírem as sacolas retornáveis eles desenvolvem a consciência
crítica ambiental, gerando uma prática pedagógica realmente transformadora.

A Cooperb é uma cooperativa que extrapola os muros da escola, perce-


be-se pelo projeto que a EMEF Rui Barbosa tem um ambiente em que os edu-
candos desenvolvem atividades extracurriculares, com ênfase no estudo das
ciências da natureza e estudos científicos, essas atividades vão além de uma
mera lista de conteúdos e da tradicional sala de aula, esses conteúdos serão
levados para vida de cada criança e suas famílias, assim como também para as
vidas das educadoras.

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Volume II 348
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Resumo: o presente trabalho tem como objetivo descrever como foi a chegada para
participação no programa Cirandar: rodas de investigação na escola, bem como rela-
tar as atividades da Cooperativa Escolar da Emef Rui Barbosa, de Nova Santa Rita
durante o ano de 2021. A Cooperb tem como objetivo o protagonismo dos educandos
e as contribuições dessa organização para a educação e a sociedade como um todo,
e é importante no que diz respeito ao impacto que ela traz para o ensino e a própria
comunidade escolar. A mesma trabalha a partir das necessidades observados no terri-
tório escolar e baseados nos conhecimentos das ciências da natureza. São educandas/
educandos de sete à onze anos que participam deste projeto e já conseguem se auto
organizarem e dialogar com propriedade quanto aos seus objetivos e necessidades,
sempre pensando no bem-estar dos associados e também saúde dos que irão consu-
mir o sal temperado e ainda ao construírem as sacolas retornáveis eles desenvolvem
a consciência crítica ambiental, gerando uma prática pedagógica realmente transfor-
madora.

Palavras-chave: Cirandar, cooperativismo, educação do/no campo.

Abstract: the present work aims to describe how it was the arrival to participate in
the Cirandar: research circles at school program, as well as report the activities of
the Cooperativa Escolar da Emef Rui Barbosa, from Nova Santa Rita during the year
2021. Cooperb’s objective is to play a leading role in students and the contributions
of this organization to education and society as a whole, and it is important with
regard to the impact it brings to teaching and the school community itself. It works
from the needs observed in the school territory and based on the knowledge of natu-
ral sciences. There students/students from seven to eleven years old who participate
in this project and are already able to organize themselves and communicate properly
about their goals and needs, always thinking about the well-being of the associates
and also the health of those who will consume the seasoned salt and even when buil-
ding. the reusable bags they develop critical environmental awareness, generating a
truly transformative pedagogical practice.

Keywords: Cirandar, cooperativism, education of/in the field.

Volume II 349
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 14

REFLEXÕES DOCENTES SOBRE


A INTERDISCIPLINARIDADE
E A PRÁTICA: RELATO DA
FORMAÇÃO CIRANDAR 2021
Ana Paula Santellano de Oliveira
Roniere dos Santos Fenner
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-C

Introdução

Este capítulo, que contempla o segundo volume do e-book do grupo de


pesquisa GPEEC da Natureza, traz um estudo realizado por meio de um projeto
de formação chamado “Cirandar: rodas de investigação desde a escola”, que foi
realizado de forma remota no ano de 2021 com docentes de Porto Alegre/RS.

A formação Cirandar permite que os participantes escrevam e estudem so-


bre diversos assuntos. Neste estudo, busquei junto aos meus colegas, docentes
participantes da formação Cirandar/21, dialogar sobre vivências e experiências
voltadas à temática da interdisciplinaridade na escola. A interdisciplinaridade
pode ser entendida por meio de formações e cursos como o Cirandar, através
de diálogos e experiências dos participantes, que permitem compreender como

Volume II 350
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

cada um aborda a interdisciplinaridade de maneira prática em seu exercício


docente.

O projeto Cirandar iniciou no ano de 2010, fruto de outro projeto inti-


tulado Encontros de Investigação na Escola, promovido pela Rede de Investi-
gadores da Educação Superior (RIES) no Rio Grande do Sul. Os encontros do
Cirandar buscam trazer estudos e discussões voltados à realidade da vivência
dos professores da Educação Básica, bem como seus relatos de sala de aula.
O projeto objetiva promover uma formação acadêmico-profissional na qual o
participante, enquanto docente, assume a autoria de sua vivência/prática de-
senvolvida em sala de aula, em diferentes níveis e modalidades de ensino, por
meio da escrita, leitura e diálogo. Devido ao avanço desse projeto, hoje há pes-
quisadores que atuam no mestrado e doutorado que também contribuem com
seus estudos, vivências e experiências acadêmicas e profissionais.

Ressalta-se que a intenção da formação Cirandar é desenvolver escritas


voltadas para a prática em sala de aula por meio das vivências e experiências do
exercício docente. A figura 1 traz o logotipo utilizado pela formação Cirandar,
que representa os participantes da área educacional que exercem seu trabalho
docente de mãos dadas, integrando conhecimentos, experiências e vivências do
cotidiano escolar.

Figura 1. Logotipo da Formação Cirandar.

Fonte: Identidade visual Cirandar.

Volume II 351
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A elaboração da primeira formação teve como objetivo discutir a reestru-


turação curricular proposta pela Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul
(SEDUC/RS). Participaram professores e coordenadores do Seminário Integra-
do que, em 2012, tratava-se de um componente curricular presente nas escolas
de educação básica, mais especificamente no ensino médio.

Já a segunda edição ocorreu no período de abril a novembro de 2013.


Logo após, a terceira edição da formação Cirandar ocorreu de julho a novem-
bro de 2014. Na quarta edição, ocorrida entre os meses de maio e novembro de
2015, houve a ampliação dos diálogos sobre as experiências de sala de aula com
a participação dos professores da rede Municipal de Educação do Rio Grande
do Sul. A rede se integrou por meio de parcerias já estabelecidas, trazendo
novos aliados no processo de reafirmar a identidade dos grupos que se consti-
tuíam como comunidades aprendentes. A quinta edição (de maio a novembro
de 2016) contou com a participação de licenciados vinculados ao Programa
Institucional de Bolsas a Iniciação à Docência (PIBID). Na sexta edição, houve
mudanças na duração do projeto, que teve início em maio de 2017 e finalização
em março de 2018. Isto possibilitou um tempo maior de leitura entre pares, diá-
logos, estudos e reescritas voltadas às temáticas que contemplaram os relatos
produzidos. De abril de 2019 a 2020 a formação cirandar ocorreu de maneira
remota devido à pandemia da COVID-19 e os encontros foram realizados por
meio da plataforma Google meet.

Durante 2021, ainda vivenciamos a pandemia da COVID-19, sendo a


área educacional uma das grandes afetadas. Neste ano, participei da formação
na roda de cirandeiras(os) de Porto Alegre/RS com encontros mensais via Goo-
gle meet. A localização da sede do grupo de formação cirandar/21 a qual fiz
parte como apresenta o mapa abaixo (Figura 2):

Volume II 352
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 2. Localização da sede de minha formação cirandar/21.

Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/brasil/porto-alegre.htm.

A proposta da formação Cirandar em 2021 era que os docentes partici-


pantes desenvolvessem uma carta e nela descrevessem uma temática que ti-
vesse relevância e contemplasse a realidade prática no âmbito educacional de
cada um. Por estar imersa numa pesquisa de doutoramento, resolvi aprofundar
minha temática de estudo sobre a interdisciplinaridade nos encontros mensais,
buscando fazer uma carta que contemplasse experiências e vivências de mi-
nhas colegas do grupo de formação

O grupo de formação cirandar/2021 contou com 12 participantes, sendo


que todas se declararam do gênero feminino e também possuem formação aca-
dêmica voltada à Educação. Os encontros ocorreram mensalmente aos sábados,
tendo duas a três horas de duração, sempre com diálogos participativos sobre
as experiências e discussões das ideias para a construção de suas cartas. Os en-
contros foram conduzidos por meio de um diálogo integrativo, que possibilitou
investigar as práticas interdisciplinares. A proposta da escrita de minha carta
foi buscar nas vivências e experiências das participantes da formação Cirandar
sua compreensão sobre a interdisciplinaridade e como desenvolvem em seu
exercício docente práticas interdisciplinares. Com isso, o objetivo deste estudo

Volume II 353
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

é compreender como as docentes participantes da formação Cirandar/21 traba-


lham com a interdisciplinaridade de maneira prática no seu exercício docente.

A carta: movimento inicial da formação e minha


experiência como pesquisadora e docente

A proposta dos organizadores da edição de 2021 do Cirandar aos parti-


cipantes foi a escrita de uma carta. Ela deveria contemplar o movimento pro-
fissional do autor e suas vivências profissionais e acadêmicas. No meu caso,
sou pesquisadora e não estou exercendo a docência em sala de aula, então tive
a ideia de convidar os colegas participantes a relatarem suas vivências e expe-
riências sobre a interdisciplinaridade, que foram coletadas por meio de pergun-
tas feitas via Google forms. Todos os participantes (exceto eu, que construí a
carta) participaram da ideia compartilhando realidades, percepções e contribui-
ções. A carta, que também era nosso instrumento de produção, não exigia ne-
nhum parâmetro técnico ou acadêmico, apenas o número de páginas: até quatro
contando com as referências. A escrita serve para proporcionar ao autor um
momento de liberdade em contar e argumentar suas experiências e vivências de
maneira livre e dinâmica.

Assim, ao escrever minha carta e começar a dialogar com os colegas


participantes no curso de formação, foi perceptível por meio dos diálogos o
compromisso com a qualidade do ensinar e também do aprender. Senti uma
sensação de bem-estar misturada com alegria ao contar com as contribuições
dos docentes/participantes que estão no caminho da luta por melhorias no ensi-
no, da resistência e da empatia pelos nossos profissionais da educação, escolas
e alunos. A intenção de construir minha carta para a formação do Cirandar/21
se remete à dinâmica do grupo não só na busca de um conhecimento disciplinar
e linear, mas pela construção de ideias e vivências que contemplassem a inte-
gração do grupo. Isto permite um olhar interdisciplinar sobre o mundo, concep-

Volume II 354
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ções, vivências e experiências voltadas à interdisciplinaridade presente na vida


e no exercício profissional desses participantes.

Dar voz aos professores por meio de minha escrita com vistas à interdis-
ciplinaridade presente em suas práticas permitiu resgatar memórias e manter
viva e dinâmica a percepção de cada um/a. Cada ser humano é único e traz uma
história cheia de vivências, experiências e sabedoria. Quando isso é socializa-
do, torna-se integral. O ato de educar e trabalhar com a educação é exatamente
este: ter histórias, vivências e experiências a serem socializadas para todos ou-
virem, e diante disso, reconstruir-se como ser humano todos os dias. Conhecer
as contribuições desses participantes por meio da carta que redijo possibilita
também conhecer um pouco mais sobre os profissionais da educação que dedi-
cam seu tempo, sua vida e sua sabedoria para exercer a docência, contribuindo
na formação dos alunos.

Antes de explorar as contribuições dos participantes por meio de suas vo-


zes e narrativas, é de extrema importância compreender a epistemologia sobre
a interdisciplinaridade voltada a uma dinâmica prática, trazendo contribuições
teóricas que contemplem e corroborem as vozes dos participantes quanto a prá-
ticas interdisciplinares no âmbito escolar.

Os encontros mensais virtuais ocorriam em várias sedes, sendo a de Porto


Alegre ocorreu de forma remota por meio da plataforma Google meet. Ocor-
riam muitos diálogos voltados à temática escolhida por cada participante. Além
disso, estabelecemos leituras de livros – como o “Dicionário Paulo Freire” e
o “Cartas Pedagógicas”. Estes foram essenciais para a construção de nossas
cartas, pois elucidam o que são cartas pedagógicas. Os encontros reforçaram
o olhar interdisciplinar sobre nossas vivências, o exercício docente em sala de
aula e a importância da escuta e do diálogo como aspectos essenciais para res-
gatar memórias importantes do que se executa diariamente no ambiente esco-
lar. Assim como dizia Freire (1996, p. 12): “Quem ensina aprende ao ensinar e
quem aprende ensina ao aprender”.

Volume II 355
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Da disciplina à interdisciplinaridade: uma


possibilidade de articulação por meio das práticas

A compreensão sobre disciplina e como ela se caracteriza envolve um


modo de organizar e alinhavar uma área do conhecimento, concentrar e orga-
nizar estudos científicos e experimentos dentro de determinada perspectiva.
Definir a palavra e como é constituída epistemologicamente a disciplina é algo
intangível. Porém, uma disciplina se define pelo seu objeto de estudo específico
e por meio de seus marcos conceituais, no que constitui o desenvolvimento e
estratégias de seus métodos e processos próprios (SANTOMÉ, 1998; LOPES,
2000). O marco histórico sobre o conceito de disciplina foi estabelecido, segun-
do o pensamento positivista, em meados do século XIX, diante de um contexto
histórico, social e científico que sugeria a especialização (SANTOMÉ, 1998;
LOPES, 2000; MACEDO, 2000). Com isso, ocorreram avanços no campo de
ensino e, para Macedo (2000, p. 18), “a divisão disciplinar do conhecimento
escolar é responsável pela pouca relevância que parece ter aquilo que é ensina-
do em nossas escolas”. Na tentativa de buscar novas maneiras de se trabalhar a
partir da disciplina, a interdisciplinaridade emerge, em meados do século XX,
como uma crítica da contemporaneidade à disciplinaridade. Assim, é uma das
alternativas para atender processos da sociedade atual, na busca por trazer sig-
nificados aos saberes escolares. A interdisciplinaridade depende das disciplinas
(FAZENDA, 2011) pois, para se trabalhar de maneira interdisciplinar, é ne-
cessária uma articulação entre as disciplinas que possibilite práticas de cunho
interdisciplinar – ou tentativas que se aproximem da interdisciplinaridade. Essa
articulação traz implicações à educação em ciências, que está em um processo
contínuo de aprimoramento.

A interdisciplinaridade, tanto no campo epistemológico quanto no pe-


dagógico, está sustentada em autores que fazem críticas ao modelo positivista
das ciências e buscam resgatar a totalidade e a inteireza do conhecimento como

Volume II 356
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

um todo. Compreende-se a importância da interdisciplinaridade como forma


de facilitar o ensinar e o aprender, por meio da atitude do sujeito (em especí-
fico, do professor). A ressignificação do trabalho pedagógico possibilita que
esse professor construa sua estratégia de ensino tendo como base o trabalho
pedagógico voltado ao currículo, métodos, conteúdos, avaliações e ao próprio
ambiente escolar.

Alguns dos fenômenos presentes na interdisciplinaridade são as estra-


tégias/metodologias práticas que movimentam a ação dos professores em seu
exercício docente. Elas representam uma possibilidade de desenvolver práticas
interdisciplinares que tenham como apoio o diálogo entre disciplinas com a
finalidade de significar, qualificar e potencializar a aprendizagem dos alunos.
O ponto de partida e de chegada de uma prática interdisciplinar está na ação
(FAZENDA, 2009). Assim, alunos e professores, sujeitos de sua própria ação,
engajam-se num processo de investigação, (re)descoberta e construção coleti-
va de conhecimento, que supera sua divisão em disciplinas. Ao compartilhar
ideias, ações e reflexões, cada participante é, ao mesmo tempo, “ator” e “autor”
do processo (LEITE; CARDOSO, 2006). Sendo assim, é importante a recons-
trução de paradigmas do ensinar e aprender tendo em vista a construção do
conhecimento e sua percepção pelo aluno.

Reflexões por meio de vozes e narrativas das


participantes da formação Cirandar/21

Para a escrita de qualquer vivência, conhecer a voz e a narrativa do par-


ticipante é fundamental para a construção de realidades, sejam elas do campo
educacional ou de quaisquer outros que contemplem o saber daquele indivíduo,
que traz consigo memórias de sua trajetória acadêmica, profissional e social.
Para coletar informações, foi elaborado um formulário na ferramenta Google
forms contendo quatro perguntas voltadas à docência e interdisciplinaridade,

Volume II 357
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

partindo dessa socialização e do interesse das colegas em contribuir com suas


ideias e experiências, convidei o grupo a responder algumas perguntas, por
meio de um formulário com os seguintes questionamentos:

a. O que é ser professor/a para você?

b. Qual a sua concepção sobre o que é Interdisciplinaridade?

c. Em sua vivência como professor/a, já realizou práticas interdisciplina-


res? Se sim, quais metodologias/estratégias de ensino você utilizou?

d. Na sua concepção, o que seria uma prática interdisciplinar?

Todas as 12 participantes do cirandar responderam. Buscou-se, por meio


da análise das respostas, compreender como elas se enxergam como professo-
ras; suas concepções quanto à interdisciplinaridade; e como elas realizam suas
tentativas de práticas interdisciplinares no exercício docente. A intenção foi dar
ouvidos às suas experiências relacionadas à interdisciplinaridade.

Uma análise reflexiva sobre a voz e a narrativa das


participantes: percepções docentes

Esta seção apresenta as categorias que emergiram da análise das respos-


tas das participantes para as quatro perguntas que nortearam esta escrita. O
primeiro quadro aborda como as participantes compreendem o que é ser profes-
sor. Com isso, essa categoria refere-se a percepções de memórias acadêmicas,
de vida e de experiências docentes. Já o segundo quadro situa o leitor sobre a
percepção das participantes acerca da interdisciplinaridade. A última categoria
aborda o exercício docente e de que modo ele contempla práticas de cunho
interdisciplinar. Por meio da voz/narrativa das participantes, o que emergiu de
novo para contribuir com a interdisciplinaridade e o ensino constituiu três te-
mas: Ser professor, Interdisciplinaridade e Prática interdisciplinar. Essas cate-

Volume II 358
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

gorias trazem um significado relevante quanto à trajetória e à prática docente


desenvolvida em sala de aula.

A fim de organizar as contribuições das vozes/narrativas dos participan-


tes, foram utilizadas letras e números em ordem crescente para identificar as
afirmações. A letra P representa Professor (quadro 1); I corresponde a Interdis-
ciplinaridade (quadro 2); e PI significa Prática Interdisciplinar (quadro 3).

Quadro 1 – Respostas das Participantes: “Ser professor é”.

Saber articular saberes e fazeres da vida e científicos sendo capaz de


P1
promover experiências nas quais todos os envolvidos construam coletiva-
mente saberes.

É ser alguém que conhece o suficiente para contribuir com estudantes.


P2 Alguém que aprende quando ensina e compartilha o conhecimento já
adquirido.
Professor reconhece suas dúvidas e busca as informações que geram
P3
curiosidade em seus estudantes.

P4 É uma missão de amor e responsabilidade.

É ensinar e aprender, construir e desconstruir, profissão escolhida com


P5
muito amor, que tem muitos desafios.

É ser motivador, problematizador, ensinar a pensar e sempre buscar a


P6 solução, ser estimulador e um formador que possibilite aos seus alunos o
seu crescimento profissional.

P7 É ter vocação e acima de tudo gostar de passar conhecimento.

É agir com consciência e responsabilidade na formação de sujeitos que


P8 possam contribuir na construção de uma sociedade mais equânime e que
pense nas demandas coletivas.

Ser professor também comunga com a ideia de fazer com que os sujeitos,
P9 independente da modalidade de ensino, possam usar o conhecimento cien-
tífico para ler e entender o mundo à sua volta.

Fonte: Construída pelos autores, grifos nossos (2022).

Volume II 359
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A partir das afirmações do quadro 1, ser professor é uma profissão que


traz em si memórias, vivências, experiências que se remetem a períodos desde
a infância. Quando ouvimos professores narrarem que, desde pequenos, sonha-
vam com a profissão, isto nos leva a acreditar em memórias e vivências que um
profissional da educação carrega desde sua tenra infância. A partir das respostas
das participantes, percebe-se que (ser) professor é um exercício que contem-
pla memórias profundas em trabalhar com a docência. As participantes trazem
reflexões voltadas às experiências e à vocação: para a construção da carreira
educacional, é necessário ter vocação, habilidades e competências para traba-
lhar com uma profissão que toca a vida dos alunos. Destaca-se a fala de P1, que
diz que ser professor é “[...] a construção dos saberes por meio do coletivo”,
reforçando a importância do coletivo em articular saberes para contribuir com a
aprendizagem dos alunos. Sobre isso, Tardif (2007, p. 52) afirma que é a partir
destas relações com os pares, com o coletivo, por meio “do confronto entre os
saberes produzidos pela experiência coletiva dos professores, que os saberes
experienciais adquirem certa objetividade [...]”. Dessa forma, as certezas que
são produzidas no dia a dia, subjetivamente, devem ser objetivadas, sistema-
tizadas e organizadas para “se transformarem em um discurso da experiência
capaz de informar ou formar outros docentes e fornecer uma resposta aos seus
problemas [...]” (TARDIF, 2007, p. 52). Assim, se busca contribuir para um
ensino em que ocorram trocas entre os professores e também com os alunos.

Ainda sobre ser professor, para P2 é “alguém que aprende quando ensina
e compartilha saberes já adquiridos”, o que seria a busca por conhecimento
e sua construção junto dos alunos, num constante aprendizado. Como afirma
Freire (1996, p. 17), “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina
ao aprender”. Em sala de aula, professor e aluno compartilham experiências
que vão além da simples transmissão de conhecimento. A importância de estar
sempre aprendendo quando se ensina é um marco dentro da sala de aula quando

Volume II 360
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

o professor compartilha conhecimento com os alunos. A curiosidade também


está nos docentes pois o aprender é eterno, uma vez que estes reconhecem
que nem tudo sabem. Como dito por P3, “Professor reconhece suas dúvidas
e busca as informações que geram curiosidade em seus estudantes”. Portanto,
essa busca pela informação remete humildade no professor em alcançar novos
conhecimentos quando necessário. Na busca desses conhecimentos, a humil-
dade pedagógica se faz necessária, pois é por meio dela que os professores irão
fortalecer os alicerces das suas aulas (CABRAL; HAUER, 2019).

Outra reflexão pertinente quanto ao entendimento de ser professor apa-


rece na resposta de P6: “[...] é ser motivador, problematizador, ensinar a pen-
sar e sempre buscar a solução, ser estimulador e um formador que possibilite
aos seus alunos o seu crescimento profissional”. A questão motivacional pa-
rece ser pessoal, pois nem todos os participantes entendem a motivação como
um fator de contribuição para a aprendizagem dos alunos. Em uma sala de
aula, é fundamental que o aluno tenha motivos para adquirir o conhecimento,
ou seja, a motivação é um dos elementos que contribui para o aluno agir.

A motivação é, portanto, o processo que mobiliza o organismo para a ação,


a partir de uma relação estabelecida entre o ambiente, a necessidade e o
objeto de satisfação. Isso significa que, na base da motivação, está sempre
um organismo que apresenta uma necessidade, um desejo, uma intenção,
um interesse, uma vontade ou uma predisposição para agir. A motivação
está também incluída o ambiente que estimula o organismo e que oferece
o objeto de satisfação. E, por fim, na motivação está incluído o objeto que
aparece como a possibilidade de satisfação da necessidade. (BOCK, 1999,
p. 121).

No entanto, as estratégias e os recursos utilizados pelos professores deve-


riam fazer com que os alunos quisessem aprender, fornecendo estímulos para
que se sintam motivados a isso. Outro fator importante para ser professor é
trazido por P7, que diz: “É ter vocação e acima de tudo gostar de passar conhe-
cimento”. Conforme Nóvoa, existem dois fatores na gênese profissional dos

Volume II 361
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

professores: a relação do professor com o saber (ou seja, os saberes e as téc-


nicas de ensino, produzidos por técnicos e especialistas, sem a participação
do professor); e a influência de crenças e atitudes na elaboração de normas e
valores da docência. O autor aponta que “mesmo quando a missão de educar
é substituída pela prática de um ofício e a vocação cede lugar à profissão, as
motivações originais não desaparecem” (NÓVOA, 1999, p. 16). Portanto, é
relevante para a conexão entre professores/alunos.

Figura 3. Esquema de categorias que emergiram da voz/narrativa das partici-


pantes.

Fonte: Elaborada pelos autores (2022).

O esquema da figura 3 traz de maneira resumida palavras ou frases da


voz/narrativa dos participantes sobre o que entendem da função de ser profes-
sor, tendo várias possibilidades de auxiliar na melhoria e na qualidade educa-
cional dos alunos.

Volume II 362
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 2 – Resposta dos Participantes: “Interdisciplinaridade é”.

É uma postura epistemológica e metodológica que nasce do diálogo com


I1
as áreas do conhecimento, e desse diálogo nasce um outro saber, diferente.

I2 É uma possibilidade de desenvolver estratégias diversas de ensinar.

É a interação que existe entre duas ou mais disciplinas que pressupõe


I3
diálogo comum entre pelo menos, dois professores de disciplinas diferentes.

É trabalhar em conjunto com outras disciplinas, buscando parcerias com


I4
outros professores de modo a desenvolver um trabalho mais integral.

I5 É abordar o mesmo tema de uma forma com abordagem diferente.

É conseguir trabalhar das mais variadas formas um tema. É partir de um


I6 tema norteador e trabalhar com diferentes colegas de área o mesmo assun-
to, demonstrando a conexão entre as ciências.

É a forma de atuar em que os professores aproximam a sala de aula da


realidade em que desligam o modo “caixinhas do saber” e ligam o modo
I7
que demonstra com maior ou menor sucesso que o todo é bem mais com-
plexo que a soma das partes.

É articular diferentes conteúdos da vida de forma integrada com todas as


I8
áreas do conhecimento.

É um grande desafio para os docentes, pois precisam sair da zona de conforto,


I9 deixar a sua caixinha e buscar integrar os seus conteúdos de sua área com as
demais por meio de temas geradores.

É trabalhar em conjunto, em parceria com as demais áreas do conheci-


I10
mento.

É uma ótima proposta, pois nos dá a oportunidade de ver um conteúdo em


I11
diversas disciplinas.

É a promoção de um diálogo entre diversas áreas do conhecimento humano,


I12 de forma que a partir da criação de hipóteses os sujeitos possam construir
novas ideias.

Fonte: Construída pelos autores, grifos dos autores (2022)

Volume II 363
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O termo interdisciplinaridade remete a construção de uma movimenta-


ção, articulação e interação no fazer disciplinar. Diante da polissemia da pala-
vra, é necessário cuidado ao definir e compreender a temática, tanto no cam-
po epistemológico como no metodológico/prático. Algumas contribuições das
participantes deste estudo apontam que a interdisciplinaridade é compreendida
no campo epistêmico ou metodológico, como indica a voz/narrativa de I1: “É
uma postura epistemológica e metodológica que nasce do diálogo com as áreas
do conhecimento, e desse diálogo nasce um outro saber, diferente”. Fazenda
(2009, p. 11) entende que o diálogo “[...] é constituído entre o eu e o outro um
terreno comum; nele, o meu pensamento e o do outro formam um único todo.
Não há no diálogo dois seres isolados, mas um ser a dois”. A linguagem nos
remete não apenas a um instrumento, mas revela aspectos íntimos e laços psí-
quicos que nos unem ao mundo e aos nossos semelhantes – no caso das escolas,
unem professor/professor, professor/aluno e aluno/aluno.

Para I3, a interdisciplinaridade “É a interação que existe entre duas ou


mais disciplinas que pressupõe diálogo comum entre pelo menos, dois profes-
sores de disciplinas diferentes”. Essa compreensão sobre a temática enquanto
uma conversa de duas ou mais disciplinas dialoga com Japiassu (1976, p. 74):
“A interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre os es-
pecialistas e pelo grau de interação real das disciplinas no interior de um mes-
mo projeto de pesquisa”. Ainda nesse viés, Fazenda (1993, p. 12) ressalta que a
ideia de interdisciplinaridade não surgiu para anular a ideia de disciplinas, pois
“O conceito de interdisciplinaridade como ensaiamos em todos nossos escritos
desde 1979 e agora aprofundamos encontra-se diretamente ligado ao conceito
de disciplina, onde a interpenetração ocorre sem a destruição básica às ciên-
cias conferidos”. A temática também promove outra forma de trabalhar – na
percepção de I4, isto “é trabalhar em conjunto com outras disciplinas, buscan-
do parcerias com outros professores de modo a desenvolver um trabalho mais
integral”, o que também fica evidente nos estudos de Fazenda (2009) quando a
autora afirma que:

Volume II 364
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Um ensino interdisciplinar requer um trabalho em conjunto entre alunos


e professores assim como de gestores e demais sujeitos integrantes da co-
munidade escolar, ou seja, a integração não deve ocorrer apenas entre as
disciplinas escolares, mas também entre pessoas, conceitos, informações e
metodologias (FAZENDA, 2009, p. 18).

No entanto, a interdisciplinaridade busca a valorização de todas as ciên-


cias, sem haver supremacia de determinada área em relação às outras. Na mes-
ma direção, I10 aponta a importância de “trabalhar em conjunto, em parceria
com as demais áreas do conhecimento”.

Figura 4. Esquema de categorias que emergiram nas respostas dos participan-


tes.

Fonte: Elaborada pelos autores (2022).

A figura 4 traz termos-chave que possibilitam expressar por meio das vo-
zes/narrativas das participantes suas percepções sobre a interdisciplinaridade,
contribuindo para o melhor entendimento sobre esse fenômeno trabalhado no
âmbito educacional.

Volume II 365
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Quadro 3 - Resposta dos Participantes: “Prática Interdisciplinar é...”.

PI1 É uma estratégia de ensino.

É escolher um tema gerador a partir da realidade, do contexto das pessoas


PI2
e a partir das diferentes disciplinas explorar as diferentes facetas do assunto.

Contextualizar o assunto em todas as disciplinas, formando um todo do


PI3
tema.

É dar um enfoque a um determinado conteúdo e todos somam um contributo


PI4
no final do processo de aprendizagem.

É envolver um tema em diferentes lentes, é fazer de variadas formas e di-


PI5
nâmicas um mesmo tema.

É trabalhar um tema comum, norteador, nas diferentes áreas do


conhecimento, como por exemplo: o índice pluviométrico. Podendo
PI6
também trabalhar a história, ciências, matemática, português, geografia
por meio de um projeto.

É interligar um ou mais professores com o objetivo de auxiliar alunos em


PI7
seu processo de busca por conhecimento.

É uma prática que agrega os conhecimentos de diferentes áreas na cons-


PI8
trução de novos saberes.

É uma atividade que proporcione aos docentes e discentes vivenciarem um


determinado tema gerador a partir de um trabalho integrado e articulado
PI9 com as diferentes áreas do conhecimento, onde os discentes são os princi-
pais atores e os docentes os propositores e responsáveis pela realização de
diferentes formas de ensinar através de diferentes estratégias de ensino.

É a construção de uma arquitetura pedagógica, com a consequente reali-


zação de uma prática pedagógica, criada por professores (sozinhos ou de
PI10
forma coletiva) a partir do diálogo do conhecimento entre as diversas áreas
do espaço científico. É unir duas ou mais matérias e unir num único plano.

Fonte: Construída pelos autores, grifos dos autores (2022).

Volume II 366
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A prática interdisciplinar é uma possibilidade de se trabalhar de maneira


dinâmica com disciplinas, temáticas, alunos e em parcerias entre professores.
No entendimento de PI1, práticas na tentativa de ser interdisciplinar são “uma
estratégia de ensino”. Para Paviani (2005, p. 19), a interdisciplinaridade de ma-
neira prática “não é um fim que deva ser alcançado a qualquer preço, mas uma
estratégia, um meio, uma razão instrumental, uma mediação entre a unidade e
a multiplicidade entre as partes e o todo”.

Trabalhar com a interdisciplinaridade, requer uma mudança de atitude


voltada ao ensino e ao conhecimento que está sendo construído de maneira glo-
balizada emergido possibilidades de compartilhar ideias e projetos num exer-
cício contínuo de pensar e construir tal conhecimento. A voz/narrativa de PI3
entende que a prática interdisciplinar possibilita “contextualizar o assunto em
todas as disciplinas, formando um todo do tema”. Para ocorrer essa contextua-
lização quanto à abordagem de temas, entende-se como necessário que
No espaço escolar e acadêmico, organizados em disciplinas, a prática in-
terdisciplinar refere-se à ação que parte de uma disciplina, mas utiliza de
conceitos ou instrumentos de outras para tratar das questões previstas em
seus objetivos. O professor que atua numa perspectiva interdisciplinar é
aquele que domina o conteúdo de sua área e recorre a outras disciplinas
para explorar plenamente os temas de que está tratando (CORDIOLLI,
2002, p. 19).

Isso reforça o quanto o entendimento da interdisciplinaridade, diferen-


te do que aparenta, não dilui as disciplinas, mas mantém sua individualidade
na integração para a construção de conhecimentos. Ainda, PI8 entende como
“uma prática que agrega os conhecimentos de diferentes áreas na construção
de novos saberes”. Além do desenvolvimento de novos saberes, a prática inter-
disciplinar favorece novas possibilidades de aproximação da realidade social,
fazendo com que o aluno seja protagonista de sua própria história, numa rela-
ção interdependente com o contexto social. Com isso, os alunos junto do pro-
fessor constroem esse processo diante de suas curiosidades, questionamentos

Volume II 367
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

que emergem em sala de aula.

O processo interdisciplinar desempenha papel decisivo para dar corpo ao


sonho de fundar uma obra de educação à luz da sabedoria, da coragem e da
humildade. [...] A lógica que a interdisciplinaridade imprime é a da inven-
ção, da descoberta, da pesquisa, da produção científica, porém gestada num
ato de vontade, num desejo planejado e construído em liberdade (FAZEN-
DA, 2009, p. 18-19).

Evidencia-se que a interdisciplinaridade ainda é um desafio para o pro-


fessor, que apresenta dificuldades quanto à maneira de transmitir e transitar por
outros conhecimentos. Por conta disso, é necessário, algumas vezes, utilizar
saberes não pertencentes ao âmbito educacional que se leciona.

Figura 5. Esquema de categorias que emergiram da voz/narrativa dos partici-


pantes.

Fonte: Elaborada pelos autores (2022)

O esquema da Figura 5 apresenta palavras e frases curtas que contem-


plam as ideia dos participantes quanto à tentativa de fazer práticas de maneira
interdisciplinar. Por meio de vivências/experiências, as participantes podem
desenvolver trabalhos envolvendo parcerias, trabalhos em grupos entre outras
possibilidades pedagógicas.

Volume II 368
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Contribuições Finais

Esta escrita possibilitou discutir a importância de formações como o Ci-


randar para conhecer vivências e experiências do trabalho dos professores em
seu exercício docente na sala de aula. Sabe-se que ensinar é uma tarefa que
exige comprometimento, formação e determinação, por isso, é importante res-
saltar que cada profissional da educação tem sua maneira de abordar o conheci-
mento junto aos alunos diante de cada contexto escolar. Além disso, na educa-
ção básica se depara com situações distintas em diferentes escolas, sejam elas
públicas ou privadas.

A intenção deste estudo foi compreender empiricamente, por meio das


contribuições de docentes, percepções quanto a ser professor, interdisciplinari-
dade e prática interdisciplinar. Com isso, evidencia-se a responsabilidade de ser
professor na vida dos alunos, tendo como principal ponto ser motivador e ter
a consciência de exercer uma profissão que exige ser um eterno aprendiz. No
campo da interdisciplinaridade, foi relevante compreender como as participan-
tes percebem a temática em seu cotidiano escolar, assim como as tentativas de
práticas nesse sentido. Entende-se que ainda não é muito desenvolvido o con-
ceito de interdisciplinaridade para as participantes, por isso, formações práticas
(como oficinas interdisciplinares) trariam melhor compreensão e mais manei-
ras de executar atividades e práticas de cunho interdisciplinar, favorecendo seu
domínio por parte dos professores.

Sendo assim, por meio da nuvem de palavras (Figura 6), se apresenta


vozes/narrativas das participantes que contemplam o entendimento sobre ser
professor, interdisciplinaridade e suas tentativas de práticas interdisciplinares.

Volume II 369
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 6. Nuvem de palavras que emergiu da contribuição dos participantes.

Fonte: Elaborado pelos autores (2022).

Por fim, agradecemos as doze participantes docentes que contribuíram


de maneira significativa para este trabalho, enriquecendo este estudo com o
objetivo apresentar o que os docentes compreendem sobre a interdisciplinari-
dade e as práticas interdisciplinares – lembrando que, antes de tudo, é preciso
exercer o Ser Professor. Que todos os profissionais da educação sejam sempre
motivados e incentivados de alguma maneira, jamais desistindo de seus sonhos
pessoais, profissionais e de vida. Também não esqueçamos que cada aluno tem
sua história e realidade, e que está ali se espelhando em você, professor/a.

Volume II 370
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Resumo: O presente estudo busca compreender como docentes participantes da for-


mação cirandar /21 trabalham com a interdisciplinaridade de maneira prática no seu
exercício docente, visando trazer contribuições para o âmbito educacional. O instru-
mento de coleta de dados foi um questionário de perguntas abertas aplicado através do
Google forms. A metodologia utilizada adotou narrativas das participantes quanto as
suas percepções diante das perguntas. Foi possível construir melhores entendimentos
sobre as temáticas junto a autores sobre as categorias: ser professor, interdisciplina-
ridade e prática interdisciplinar. Evidenciou-se, por meio deste estudo empírico, que
ainda é necessário desenvolver a interdisciplinaridade de maneira prática: percebe-se
que, apesar de existir a prática, nem sempre há entendimento do que se faz.

Palavras-chave: Cirandar; Formação de professores; Interdisciplinaridade; Prática


Interdisciplinar.

Abstract: The present study seeks to understand how teachers participating in the
cirandar /21 training work with interdisciplinarity in a practical way in their teaching
practice, aiming to bring contributions to the educational scope. The data collec-
tion instrument was an open-ended questionnaire applied through Google forms. The
methodology used adopted the participants’ narratives regarding their perceptions of
the questions. It was possible to build better understandings about the themes with
authors on the categories: being a teacher, interdisciplinarity and interdisciplinary
practice. It was evidenced, through this empirical study, that it is still necessary to
develop interdisciplinarity in a practical way: it is perceived that, although there is
practice, there is not always an understanding of what is done.

Keywords: Cirandar; Teacher education; Interdisciplinarity; Interdisciplinary Practice.

Volume II 372
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 15

A INTERDISCIPLINARIDADE
NAS CARTAS PEDAGÓGICAS
E SUAS CONTRIBUIÇÕES
NA (TRANS)FORMAÇÃO DE
EDUCADORES/AS DO CAMPO
Maria da Conceição do Monte Soares
Aline Guterres Ferreira
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-D

“Dizem que sou pesquisador, dizem


que sou educador, dizem que sou
filósofo, que sou isso ou aquilo. No
fundo eu sou um pouco essas coisas
todas” (FREIRE, 1995, p. 20).

Neste capítulo realizamos uma reflexão sobre Cartas Pedagógicas segun-


do a leitura de Vieira (2010) sobre as concepções de Paulo Freire ao referir-se
como um instrumento coerente ao exercício do diálogo por meio escrito, pois
ao escrever Cartas é exigido pensar sobre o que se diz e (a)guardar a resposta.
Visto que as Cartas Pedagógicas constituem o processo reflexivo do projeto
de extensão de formação acadêmico-profissional Cirandar, destacamos sua im-

Volume II 373
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

portância na constituição de professores e professoras, tornando-os aptos a de-


senvolver práticas educativas em uma sociedade em constante transformação.
Ainda, trataremos da visão interdisciplinar nos projetos que constroem as pro-
postas curriculares a partir das realidades escolares no contexto da Licenciatura
em Educação do Campo - Ciências da Natureza da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul.

Cirandar: rodas de investigação desde a escola

O projeto de extensão de formação acadêmico-profissional batizado de


Cirandar (figura 1), carrega na sua essência a construção do conhecimento a
partir da reflexão da prática docente no “chão” da escola, ou melhor, no “mundo
da escola”, visto sua próxima relação com os e as professores e professoras que
atuam diuturnamente nas escolas de educação básica. As autoras Rafaela Gün-
zel e Aline Dorneles (2021) contam que a proposta do projeto de extensão de
formação acadêmico-profissional Cirandar originou-se de amplas discussões
sobre a formação docente, a partir de diferentes perspectivas, onde diversos
sentidos e abordagens necessitariam ser considerados, para um trabalho mais
próximo, coletivo, compartilhado, cooperado e integrado entre a universidade
e as escolas de educação básica. Ainda segundo as autoras.
Partimos do pressuposto que a formação acadêmico-profissional dos
professores precisa ser realizada com a escola e suas necessidades e nin-
guém as conhece melhor do que os professores que ali atuam, ainda que
seja necessário tomar consciência. Nessa perspectiva, seria preciso con-
siderar o contexto escolar com suas características próprias, o currículo
desenvolvido, as dificuldades laborais, as expectativas, anseios e,
principalmente, a disposição interna do professor para a mudança e abertu-
ra ao novo. (GÜNZEL, DORNELES, 2021, p. 122 - 123).

Um dos pressuposto da formação do projeto Cirandar, origina-se no de-


senvolvimento conjunto entre os professores/as da rede de educação básica e
universitários, visto que o saber pedagógico desta cooperação é construído co-

Volume II 374
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

letivamente, em um processo de ensinar e aprender compartilhado e dialógico


de acordo com a teoria freireana. Demais pressupostos que as autoras desta-
cam, que subsidiam o projeto de extensão de formação acadêmico-profissional
Cirandar são os Círculos de Cultura de Paulo Freire, onde os/as Cirandeiros e
Cirandeiras têm sua voz ouvida e respeitada por seus pares. Ainda, as Rodas
em Redes, “como um modo de realizar processos formativos na escola e
em outros espaços, garantindo a liberdade de expressão, o exercício da
escuta e o compartilhar de saberes.”, que se expressa como uma grande dança
de ciranda, uma dança em comunidade, que aprende e investiga sua própria
prática, refletindo sobre ela no seu lócus de trabalho, como cantam Günzel e
Dornelles (2021).

O Cirandar desenvolve-se a partir da troca e partilha de Cartas Pedagó-


gicas entre a coordenação do projeto e os/as participantes, Cirandeiras e Ciran-
deiros. Tendo como orientação perguntas que conduzem a narrativa, tais como,
“Como cheguei até aqui?”, “Quais temáticas investigativas carrego na minha
trajetória?” e “Como essas temáticas/investigação se expressam na minha his-
tória?”. O projeto nasceu na Universidade Federal do Rio Grande (FURG), é
desenvolvido em Redes por inúmeros pólos e em parceria com a Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), entre outras instituições de ensino su-
perior e educação básica. Neste capítulo, descrevemos as vivências a partir do
Pólo Porto Alegre & Região Metropolitana e sua expressão na Licenciatura em
Educação do Campo da UFRGS.

Volume II 375
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1 - Identidade do projeto Cirandar: rodas de investigação desde a es-


cola.

Fonte: https://cirandar.furg.br/.

São inúmeras as contribuições que esse processo reflexivo promove na


prática docente, por isso, destacamos as transformações pedagógicas, a partir
da nossa vivência. Ao responder as questões orientadoras do projeto, os Ci-
randeiros/as empreendem uma reflexão da sua prática docente sob o espaço
escolar no intuito de construir propostas de intervenções sociais para/com os
estudantes, rumo à mudanças socioambientais. Destaca-se de Ferreira e Robai-
na (2021) que o projeto Cirandar é um espaço de reflexão e proposição de um
novo mundo, a partir da prática docente na educação básica, valorizando
o potencial dos conhecimentos e saberes dos professores, de forma amorosa e
afetiva.

A construção de narrativas nas Cartas desenvolvem o processo reflexivo


e conduzem a transformações sociais, desta maneira, as identificamos como
Cartas Pedagógicas no intuito de denunciar as problemáticas, e anunciar as
alternativas e soluções na profissão docente e estruturas escolares. Ao discor-
rermos sobre a realidade da educação brasileira, a partir das práticas pedagógi-
cas, são propostas transformações possíveis e viáveis no avanço escolar. Neste
sentido, descrevemos a construção das Cartas Pedagógicas do projeto Cirandar
e sua importância na Educação do Campo junto a interdisciplinaridade, a partir
da (trans)formação docente.

Volume II 376
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Os caminhos na Licenciatura em Educação do


Campo

Eu, Maria da Conceição, inicio essa narrativa a partir do meu ingresso


na Licenciatura em Educação do Campo - Ciência da Natureza na UFRGS, em
junho de 2016. Durante minha formação vivenciei inúmeras experiências den-
tro e fora das salas de aulas, entre elas, participei do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), de 2018 a 2021. Com o projeto obtive
um grande aporte teórico sobre conceitos pedagógicos. Tais contribuições des-
pertaram meu interesse sobre as questões que envolvem o currículo escolar nas
escolas públicas as quais tive acesso, e sua importância na busca de projetos
educativos interdisciplinares.

A Licenciatura em Educação do Campo possui o objetivo de formar do-


centes para as escolas de educação básica do/no Campo, bem como, para de-
mais instituições educativas não escolares e ainda atuar junto à extensão rural.
Enfatiza a construção da educação escolar e do trabalho pedagógico para os
anos finais do ensino fundamental e médio, preparando educadores/as compro-
metidos com o desenvolvimento educacional, social, econômico e cultural das/
junto às populações do Campo. O termo Educação do Campo foi construído
com a participação de movimentos sociais populares do Campo, Universida-
des, ONGs, organizações sindicais e religiosas. É direito dos povos do Campo
a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola recebendo uma
educação de qualidade.

No curso os e as estudantes desenvolvem períodos de estudos na univer-


sidade e em outros espaços escolares ou não, integrando ensino, pesquisa e ex-
tensão. O curso é ofertado na modalidade presencial em regime de alternância
com dois tempos educativos: Tempo Universidade e Tempo Comunidade. Nes-
tes diferentes tempos, vivenciamos as experiências que acontecem na institui-

Volume II 377
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ção e no cotidiano das comunidades rurais, realizando trabalhos e experiências


compartilhadas nesses espaços com diferentes propostas.

Importante mencionar que o curso proporciona aos/às estudantes a opor-


tunidade de uma construção do saber interdisciplinar a partir de atividades que
dialogam entre os conhecimentos acadêmicos e tradicionais. Os conhecimentos
acadêmicos neste curso são organizados por área de conhecimento, especifica-
mente, em Ciências da Natureza que articula conteúdos de Química, Física e
Biologia. E ainda, desenvolvem a interdisciplinaridade como fundamento bási-
co que se constitui a partir de referências metodológicas da Educação Popular
e da Educação do Campo. Por se tratar de uma política pública, a Educação do
Campo proporciona uma educação de qualidade e que atinge a totalidade dos
povos do Campo, das Águas e das Florestas.

Sobre Cartas Pedagógicas… Cartas são marcas?

Paulo Freire (2000) já dizia que uma Carta Pedagógica pode conter senti-
mentos contraditórios, inundados por duas ações éticas: a raiva e a indignação.
Narrar o sentimento durante esse período atípico de Pandemia, distanciamento
social e educação online, requer uma reflexão para além das habituais. Propos-
tas educacionais que reconheçam o contexto e busquem alternativas que pos-
sam contribuir com a realidade estudada, sugerindo mudanças reais e viáveis,
tornam-se necessárias e urgentes.

Escrever Cartas Pedagógicas para Paulo Freire (2000) é uma prática po-
lítica, possui função política (não partidária). Entender a ação social enquanto
educadoras nos conduz à caminhada e essa Carta (transformada em capítulo)
é um convite a um diálogo entre dúvidas e incertezas. É uma possibilidade de
refazer, de reencontrar o percurso e os valores que orientam a trajetória. Nesse
sentido, refletir sobre a formação de professores e professoras é (re)pensar a
transformação social através da educação.

Volume II 378
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Ao longo dos estudos e pesquisas pudemos observar vários momentos


em que as Cartas Pedagógicas são instrumentos educativos, biográficos e/ou
narrativos, de diversos contextos e circunstâncias, e ainda são registros realiza-
dos em diferentes tempos. As Cartas Pedagógicas para Freire, segundo Vieira
(2010), materializam o processo dialógico, enquanto um exercício rigoroso do
pensamento refletido e compartilhado, por isso
referir-se às cartas pedagógicas implica referir-se ao diálogo, um diálogo
que assume o caráter do rigor, na medida em que registra de modo orde-
nado a reflexão e o pensamento; um diálogo que exercita a amorosidade,
pois só escrevemos cartas para quem, de alguma forma, nos afeta, nos toca
emotivamente, cria vínculos de compromisso. (VIEIRA, 2010, p. 75).

A possibilidade de quem recebe a Carta Pedagógica é o diálogo que se


estabelece entre quem escreve e quem lê, podendo despertar inúmeros senti-
mentos e se constituir em fonte de inspiração. Assim, podemos dizer que Cartas
Pedagógicas deixam marcas. Temporal, histórica, plural e complexa, as Cartas
Pedagógica não devem ser uma escrita dogmática, fechada, envolta em folhas
amareladas por ideias ultrapassadas. Segundo a autora Leda Portal (2013), às
Cartas Pedagógicas enquanto processos pedagógicos compõem as práticas do-
centes, assim como, constituem a vida cotidiana, dependendo das intenciona-
lidades que nelas debruçamos. No ato de escrever são construídas mensagens
de encantamento e acontecimentos de acordo com os sentimentos do momento.

Cartas Pedagógicas podem demonstrar afeto, zelo, ternura, desejos, so-


nhos, aflição e devaneios. Escrever ou receber uma Carta é um momento de
troca de sentimentos, experiências, vivências e saberes. Nas Cartas Pedagógi-
cas podemos argumentar, questionar, expor nossas ideias e pensamentos. Ao
enviar uma Carta estaremos dialogando com aquele que a recebe, nos dando
o privilégio de mostrarmos como seres humanos com nossas aventuras, ativi-
dades, sucessos, insucessos, e novos projetos. A autora Fernanda Paulo (2022,
p. 5) interpreta as Cartas Pedagógicas como “formas de construir e possibilitar

Volume II 379
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

aproximações de afetividade, compromisso, amorosidade, respeito e registro


de uma história”.

De certa forma, a Carta Pedagógica é uma fotografia que muitas vezes


desnuda nossa alma e nossas marcas tornando possível o registro de nossas
memórias, comunicando o que desejamos de forma contextualizada. As práti-
cas voltadas para a aprendizagem dos sujeitos através de Cartas Pedagógicas
oportuniza a discussão sobre a importância da reflexão, quer seja em grupo ou
em caráter pessoal.

Cartas Pedagógicas na formação docente

Pensar a educação como maneira de transformar a sociedade é caminhar


em busca de uma (trans)formação humana, de uma tomada de consciência so-
cial e política. Paulo Freire (2000) através de suas Cartas propõe reflexões crí-
ticas, apresentando experiências e relatos sobre as lutas sociais populares que
permeiam sua atuação como educador popular. Nas Cartas podemos argumen-
tar, questionar, expor nossas ideias e pensamentos.

Quando tratamos do trabalho com Cartas na formação de professores po-


demos vislumbrar enormes possibilidades. Paulo Freire (1997) afirma que atra-
vés da ‘leitura de mundo’ é que se evidenciam essas possibilidades. Estava se
referindo às grandes questões do mundo e da humanidade.

É importante que em toda a prática e teoria o/a professor/a possa


fundamentar os princípios freireanos, enfatizando a importância da educação
para a diversidade, respeitando as várias e diferentes culturas existentes. Nesse
contexto, a tarefa é educar cidadãos capazes de questionar e fundamentar
valores críticos e éticos na educação que lhe é oferecida. Como educadores/
as, é indispensável assumir compromisso com a educação frente a todas essas
questões, sociais e éticas, refletindo sobre o ato de educar, considerando as

Volume II 380
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

exigências em torno da atual conjuntura social e política, ou seja, uma educação


para a vida, uma educação na perspectiva emancipatória, enfrentando a
fragmentação do conhecimento.

A autora Leda Portal (2013) destaca que nos processos pedagógicos, en-
tendemos as Cartas como fontes de pesquisa quando encontradas em acervo,
entretanto, podem ser consideradas instrumentos de pesquisa e reflexão na prá-
tica docente. O ato de escrever para além e junto ao processo reflexivo pode ser
considerado pedagógico, quando possui a intenção de ensinar, de aprender, de
informar algo novo que possa de alguma forma contribuir com o destinatário
assim como com o remetente. No que se refere a utilização das Cartas Peda-
gógicas enquanto metodologia de pesquisa, sua construção, desenvolvimento,
análise e interpretação devem estar de acordo com as abordagens de pesquisa
com tendências interdisciplinares, visto, a construção reflexiva que esse méto-
do compõe.

Trabalhar de forma interdisciplinar e contextualizada na formação de


professores faz sentido na medida em que temas como educação ambiental na
Educação do Campo são exemplos de como se faz necessário que se formem
profissionais da educação assim como instituições de ensino que possibilitem
flexibilidade e competências para continuar aprendendo e se atualizando frente
às demandas no contexto da formação continuada. As Cartas Pedagógicas nes-
te contexto, “contribuem para recuperação do processo vivido de sujeitos
invisibilizados, a iniciar com a verbalização dos silêncios, mediante a (trans)
formação permanente via produção autoral, fundamentada em epistemologias
críticas e decoloniais.”, como discorre a autora Fernanda Paulo (2022, p. 10).

Segundo Freire (1997), as propostas dialógicas na prática pedagógica são


oriundas de ações coletivas além de um ato cognitivo e político, sendo ne-
cessário um diálogo e uma reflexão sobre a transformação dos sujeitos e do
mundo devendo emergir deles mesmos. Professores e estudantes construindo o

Volume II 381
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

conhecimento coletivamente, compreendendo o mundo e toda sua dimensão é


exercitar a liberdade em busca de transformação.

O respeito à liberdade dos estudantes e a formação do professor são ações


complexas, sobretudo quando nos referimos ao papel docente e sua função so-
cial ao destacar a necessidade de uma transformação que deve partir do co-
nhecimento coletivo quanto à crítica social e a humanização dos sujeitos. O
diálogo constante entre o estudante e o professor é fundamental para o processo
de crescimento desses atores em um ambiente de igualdade. Visto como a au-
tora Fernanda Paulo (2022) afirma que as Cartas Pedagógicas são instrumento
de luta, pois anunciam e denunciam, conduzindo a permanentes reflexões. “A
escrita de Cartas Pedagógicas exige ação, reflexão e ação, e um movimento de
sistematizar experiências a partir da recuperação de memórias e histórias vivi-
das e refletidas.” (PAULO, 2022, p. 11).

Professores com formação continuada são necessários numa sociedade


onde circulam seres, saberes e conflitos diuturnamente. Onde ações coletivas
possibilitam a comunicação entre esses atores que discutem seus dilemas e bus-
cam ações para solucioná-los.

Interdisciplinaridade e formação de professores

As definições de interdisciplinaridade passam a ser debatidas nos anos


70 com as contribuições de Piaget, que a partir da teoria da vida como sistema
no campo da Biologia, propõe uma discussão interessante na área educacional.
Tendo como princípio, uma questão fundamental, ou seja, uma abordagem ho-
lística da realidade, Piaget afirma que, a partir dessa concepção, é possível su-
perar os problemas decorrentes de uma expressiva especialização dos docentes
e contribuir para vincular o conhecimento à prática.

Para Ferreira (1999, p. 22) “Interdisciplinaridade é uma atitude, isto é,


uma externalização de uma visão de mundo que, no caso, é holística. Tudo

Volume II 382
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

o que existe, todo “ente”, se “vela”, se “des-vela” e se “revela” ante nossos


olhos”. Fazenda (1991), por sua vez, comenta que a interdisciplinaridade é uma
atitude e que se manifesta numa relação de reciprocidade, pressupondo uma
atividade assumida frente ao conhecimento, e significa substituir a concepção
fragmentada por uma concepção unitária do ser humano. Trabalhar de forma
interdisciplinar é superar a fragmentação dos conteúdos, contextualizando o
ensino.

Esses autores conduzem-nos a pensar que ao praticar uma proposta cur-


ricular interdisciplinar esta deve estar voltada ao ensino dentro da realidade da
vida do estudante, relacionando o conhecimento científico a uma prática que
compreenda a realidade buscando transformá-la. Requer esforços coletivos,
professores desenvolvendo trabalhos junto com a coletividade e assumindo a
responsabilidade na produção de conhecimento.

A interdisciplinaridade para esses autores, é uma forma natural e inerente


às Ciências, fazendo-nos compreender a realidade, reconhecendo ser neces-
sária a formação do sujeito tanto quanto suas ações. Para que essa condição
se estabeleça, a interdisciplinaridade deve proporcionar possibilidades de su-
peração das experiências, dissociando-as da realidade social. O exercício da
interdisciplinaridade é impulsionado por uma decisão pessoal. Romper com os
mecanismos estabelecidos, propor novas atividades e recomeçar em um novo
caminho no processo educativo. É um caminho amplo, requer tomada de deci-
sões, induzindo professores e estudantes a trabalharem juntos, rompendo com
os vários obstáculos encontrados no caminho.

Esse entendimento nos orientou a refletir que o papel dos educadores/as é


fundamental na construção do caminho do estudante. Ele é responsável por ob-
servar suas necessidades e o que a interdisciplinaridade na educação lhes pro-
porcionará daí por diante, podendo envolvê-los numa construção coletiva do
conhecimento, da capacidade de pensar e propor respostas às suas indagações
que porventura estabeleçam mudanças e transformações nas relações sociais.

Volume II 383
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Os diálogos interdisciplinares na formação de


educadores do Campo

Meu maior desafio como discente da Licenciatura em Educação do Cam-


po – Ciências da Natureza foi apreender o conceito de interdisciplinaridade e
caminhar entre os conceitos apreendidos. Por ser uma prática que requer inte-
ração entre saberes diversos, entendo que necessitamos como educadores/as,
ter uma visão aberta e disposta ao diálogo com outros saberes, sendo neces-
sário um debate de ideias e atitudes interdisciplinares no processo de ensino
aprendizagem. No meu entendimento a interdisciplinaridade pressupõe muitos
caminhos a serem tomados nessa problematização.

Entendemos necessário que durante a formação do/a educador/a, este seja


qualificado técnica e cientificamente, tornando-se efetivamente competente, re-
lacionando-se e conhecendo os conteúdos desenvolvidos com os/as estudantes,
e as diferentes formas de trabalhá-los. É importante que os/as educadores/as
conheçam os/as estudantes, suas histórias, seus interesses e principalmente ter
clareza política de suas escolhas. Para Freire (1997), o ponto de partida da prá-
tica educativa tem de ser não apenas a compreensão do mundo que possuem os/
as educadores/as e seu sistema de conhecimento, mas a compreensão de mundo
que tenha ou que está tendo no decorrer de sua prática educativa.

Na formação de professores/as interdisciplinares, é necessário considerar


que uma discussão intensa possa trazer mudanças de atitudes. Compreender o
mundo e consequentemente mudar sua prática pedagógica, apresentando aos
estudantes novas possibilidades que exigem comprometimento e um sentimen-
to de coletividade superando o individualismo disciplinar.

Na minha experiência como discente da Educação do Campo, posso afir-


mar que o curso tornou-me mais confiante em relação à docência, pois tive a
oportunidade de rever muito das minhas atitudes como professora. Dessa ma-

Volume II 384
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

neira, consegui compreender e dar nova dimensão aos conceitos, o alcance e


os limites da interdisciplinaridade. Escutar os anseios dos/as estudantes e ficar
contente ao partilhar de suas alegrias, foi uma das transformações que alcancei.
Essa nova concepção de educação desvelou-me novas possibilidades de discus-
sões interdisciplinares. Entendi que a prática da interdisciplinaridade quebra
as barreiras disciplinares, numa constante descoberta científica da realidade. É
neste contexto que a utilização das Cartas Pedagógicas na formação de profes-
sores/as nos despertam para a necessidade de mantermos a esperança, a palavra
e o compromisso com a construção de um mundo mais humano, segundo Fer-
nanda Paulo (2022).

As leituras do projeto Cirandar, estudos e pesquisas do curso e as conse-


quentes reflexões proporcionaram-me o entendimento que a interdisciplinari-
dade requer um saber intelectual além das competências. Resultado de uma es-
merada boa vontade, amparada pela teoria, prática e por uma atitude reflexiva.
Ao pensar a formação de professores/as no contexto da ação interdisciplinar é
importante considerar tratar-se de uma dimensão de totalidade. Composta de
múltiplos saberes que para compreender necessitamos de preparação e condi-
ções especiais para seu exercício. Interagindo entre si, saberes das vivências,
das práticas e os saberes teóricos adquiridos no contexto em que a aprendiza-
gem se constrói de forma compartilhada e possui vida própria.

O resgate das minhas memórias afetivas

Em anos epidêmicos, com grandes reflexos na educação, mudando as


formas de acesso aos conhecimentos, às vivências e às aprendizagens, pergun-
to-me, o que aprendi? Como reconheço-me egressa de um curso tão importante
para minha formação, nesse momento de minha existência? No que acredito
que irá vigorar daqui por diante? Uma boa carta, segundo Paulo Freire (2000),
pode conter amor e raiva, novamente.

Volume II 385
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Escrever uma Carta, seja qual teor ela tiver, é estar por inteiro envolvido
em sua escrita. Por ser uma possibilidade de comunicação, traz memórias reto-
madas, conteúdos, gera papéis, desenhos, mil cores, sabores, possibilidades de
encontrar em suas linhas quem me precedeu, meus valores presentes e um ca-
minho acolhedor para minhas indagações e dúvidas sobre a humanidade. Uma
Carta Pedagógica carrega as formas nas quais nos inserimos no mundo, segun-
do Paulo Freire na leitura de Vieira (2010), está possui natureza pedagógica
traduzida enquanto um ato político. E ainda, “tomam uma dimensão fortemente
marcada pelo compromisso com um diálogo que construa, de forma sistemá-
tica, mas agradavelmente humana, a reflexão rigorosa acerca das questões da
educação.” (VIEIRA, 2010, p. 76).

Para Freire, escrever é uma prática política, é um convite ao diálogo, as-


sim, passo a entender melhor minha ação social enquanto educadora. Trata-se
de momentos de reflexão, e de um comprometimento com a continuidade, traz
sentimentos e um novo olhar para onde seguir e novas tomadas de decisões.
Aponta novas possibilidades de mudanças.

Para encerrar… sem concluir

Ao findar essa Carta & Capítulo, esclareço que o meu olhar pode não de-
monstrar a significância das minhas inquietações vivenciadas durante o curso
de Licenciatura em Educação do Campo – Ciências da Natureza da UFRGS,
porém, digo do meu esforço para relatar minhas contribuições e apontar en-
quanto educadora, a importância da apropriação de novas Ciências, dentre elas
a interdisciplinaridade e as novas tecnologias. O mundo tecnológico está exi-
gindo de nós educadores grandes mudanças na forma de construção do conhe-
cimento. Aprender a lidar com o pensamento interdisciplinar é uma forma de
estar inserida nesse novo mundo. Nesse contexto, a interdisciplinaridade vem
como proposta para uma organização curricular de formação de professores/as

Volume II 386
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

conscientes do seu trabalho na desconstrução de um currículo disciplinarizado


e a construção de um enfoque interativo criando condições necessárias para
o surgimento de uma escola onde a interdisciplinaridade é algo mais do que
ensinar e aprender. E as Cartas Pedagógicas apresentam-se como caminho e
alternativa real e viável para seguir nesta perspectiva.

Trata-se de um movimento, não apenas de um conceito, de uma prática,


de um processo que se constrói em busca de superação da disciplinaridade. É
algo que se vivencia por meio de práticas, posturas investigativas e de pesqui-
sas que se entrelaçam nas diversas formas do conhecimento. Ao adotar uma
atitude interdisciplinar os/as professores/as tornam possível romper com tudo
que é formal na educação e transformar a ação pedagógica em uma ação que
pode ser levada para a vida toda, levando os/as estudantes a relacionar-se e li-
dar com diferentes situações, quer seja no campo educacional, familiar, social
ou religioso.

Pensar na formação de professores e professoras mais capacitados para


desenvolver conteúdos em diferentes espaços, numa sociedade em transforma-
ção contínua, é o que me faz refletir sobre qual educação desejo para nossos/as
estudantes.

Referências
CALDART, R. S.; PEREIRA, I. B.; ALENTEJANO, P.; FRIGOTTO, G. Dicio-
nário da Educação do Campo. São Paulo: Expressão Popular, 2012.

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Cortez, 1991.

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da, Ivani, C. A. (Org.) Práticas Interdisciplinares na escola. São Paulo: Cortez,
1999.

Volume II 387
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

FERREIRA, A. G., ROBAINA, J. V. L. O currículo das escolas do campo é


analisado nas Cartas Cirandeiras. In: Revista Extensão em Foco, Palotina, n.
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FREIRE, P. A Educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1995.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996

FREIRE, P. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do


Oprimido. Rio de Janeiro. Paz e Terra 1997.

FREIRE, P. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos.


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GÜNZEL, R. E., DORNELES, A. M. A Formação de Professores em Rede no


Cirandar. In: Revista Extensão em Foco. n° 25, edição especial. Curitiba/PR.
2021.

PAULO, F. S. Cartas pedagógicas como instrumento metodológico de pesqui-


sas participativas. Revista Internacional de Educação Superior, Campinas,
SP, 2022. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rie-
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PORTAL, L. L. F. Cartas: um Instrumento Desvelador da Amorosidade do Ser


Professor. In: EDUCERE – XI Congresso Nacional de Educação, 2013, Curi-
tiba, Paraná. Anais do XI Congresso... Paraná: PUCPR, 2013. Disponível em:
http://educere.bruc.com.br/arquivo. Acesso em: 21 fev. 2023.

VIEIRA, A. Cartas Pedagógicas. In: STRECK, D. R.; REDIN, E. ZITKOSKI,


J. J. (Orgs.). Dicionário Paulo Freire. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Au-
têntica Editora, 2010.

Resumo: Projetos de (trans)formação acadêmico-profissional são essenciais na co-


municação e parcerias entre escolas de educação básica e universidades. Um excelen-
te exemplo dessa comunhão é o projeto de extensão Cirandar: rodas de investigação
desde a escola, da Universidade Federal do Rio Grande, desenvolvido em parceria
com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e demais instituições públicas. O
projeto constrói propostas de reflexão a partir das narrativas de Cartas Pedagógicas
no intuito de transformação social e ambiental pela prática docente. Nesse contexto,

Volume II 388
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

desenvolvemos este capítulo a partir das escritas das Cartas Pedagógicas na última
edição do projeto e a importância da interdisciplinaridade na formação de profes-
sores e professoras, tornando-se mais aptos a desenvolver sua prática educativa em
uma sociedade em constante transformação, bem como uma visão interdisciplinar
no currículo escolar. Neste ínterim, ainda discorremos sobre as marcas que as Cartas
deixam em nossas histórias e os processos interdisciplinares na trajetória da Licen-
ciatura em Educação do Campo.

Palavras-chave: Cartas Pedagógicas, Interdisciplinaridade, Educação do/no Campo.

Abstract: Academic-professional (trans)training projects are essential in communi-


cation and partnerships between basic education schools and universities. An excel-
lent example of this communion is the extension project Cirandar: research circles
from the school, at the Federal University of Rio Grande, developed in partnership
with the Federal University of Rio Grande do Sul and other public institutions. The
project builds proposals for reflection based on the narratives of Pedagogical Letters
with the aim of social and environmental transformation through teaching practice.
In this context, we developed this chapter based on the writings of the Pedagogical
Letters in the last edition of the project and the importance of interdisciplinarity in
the training of teachers, making them more able to develop their educational practice
in a society in constant transformation, as well as a interdisciplinary vision in the
school curriculum. In the meantime, we still discuss the marks that the Letters leave
in our stories and the interdisciplinary processes in the trajectory of the Degree in
Rural Education.

Keywords: Pedagogical Letters, Interdisciplinarity, Education from/in the Field.

Volume II 389
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 16

CIRANDAR - RODAS DE
INVESTIGAÇÃO DESDE A
ESCOLA: O CUIDADO COM
A NATUREZA A PARTIR DE
CARTAS PEDAGÓGICAS
Aline Guterres Ferreira
Estela Elisalde Toledo
Sandra Mara Mezalira
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-E

“Que nunca nos canse a mão e nunca nos falte tinta


para escrever a nova história do novo mundo possí-
vel”. (DICKMANN, 2020, p. 50).

Estimad@s leitor@s!

Essa escrita busca em um primeiro momento contar, quem somos e como


chegamos até aqui. Posteriormente, busca-se refletir, dialogar e analisar as Car-
tas Pedagógicas enquanto ferramenta de reflexão em conjunto às pesquisas de
Tese que fazem parte do nosso caminho na pós-graduação. As nossas pesquisas
tratam, de maneira geral, sobre o cuidado com a natureza, em um momento
tão soturno, diante de conflitos bélicos, das pandemias, do agronegócio, das

Volume II 390
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

fake news, da hegemonia política e econômica capitalista, que dilacera a vida


em muitos aspectos em nossa sociedade. A questão central de diálogo gira em
torno desta temática, porém no decorrer da escrita, deixaremos mais claro a
problemática a ser dialogada.

Antes de nos debruçarmos sobre essas questões, nessa conversa, inicial-


mente, é necessário destacar: Como chegamos até aqui e com que temática?
Como chegamos nas Cartas Pedagógicas? Chegamos por meio de um Projeto
de extensão e que se desenvolve por meio de um evento científico amoroso,
dialógico e interativo, que ocorre anualmente com um grupo de professores/
as e estudantes de diversas partes do país, ao qual denominamos de “Ciran-
dar: rodas de Investigação desde a Escola”. O projeto é direcionado para a
compreensão dos/as participantes do papel político que os/as docentes assu-
mem na autoria de suas práticas em sala de aula, em diferentes níveis e mo-
dalidades de ensino. É utilizada a metodologia de carta pedagógica ....ocorre
em três etapas: a primeira, é a apresentação do/a participante com a pergunta
de como chegou até esse evento e com que temática, a segunda é a consti-
tuição da pergunta de investigação e a terceira carta é o desenvolvimento da
problemática. Ao final, as três cartas pedagógicas se unem e formam uma só,
finalizando então, a escrita, que será melhor explicada no item a seguir.

Cirandar: rodas de investigação desde a escola

O projeto Cirandar desenvolve-se em Rede conglomerado por Pólos, dis-


tribuídos em todas as regiões do Estado do Rio Grande do Sul e até mesmo, em
outras unidades federativas. Envolve redes de Instituições superiores parceiras,
como: Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Universidade Federal
de Pelotas (UFPel), Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul- (IFSUL) -
campus Rio Grande, Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Uni-

Volume II 391
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

versidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Federal do Rio Grande do


Sul (UFRGS).

Cada região é composta de participantes, os quais carinhosamente nos


referimos como Cirandeiros e Cirandeiras. Cada região, conta anualmente com
a participação, de aproximadamente, 15 pessoas, que compõem os grupos, os
quais caracterizam-se enquanto professores/as da rede básica de educação e
universitária, estudantes de graduação e pós-graduação, e Coordenadores/as
regionais, os quais mobilizam e organizam essas instâncias locais.

Nossa região abrange a capital estadual Porto Alegre & Região Metropo-
litana, coordenado pelas Mestras Aline Guterres Ferreira e Sandra Mara Me-
zalira, doutorandas do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências,
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que buscam desenvolver em
suas Teses, temáticas semelhantes relacionadas, portanto, à Agroecologia e à
Educação do Campo.

Junto a elas, tem como coordenador o professor Doutor José Vicente


Lima Robaina, docente da graduação em Licenciatura em Educação do Cam-
po - Ciências da Natureza e da Pós-graduação em Educação em Ciências na
UFRGS. Também compõem este colegiado a estudante Estela Elisalde Toledo,
graduanda em Pedagogia na UFRGS e bolsista selecionada para auxiliar no
projeto do Cirandar no Polo da Capital e Metropolitana. É importante salientar
a participação de estudantes e professores/as do Grupo de Pesquisa e Estudos
em Educação do Campo & Ciências da Natureza (GPEEC Natureza), também
coordenado pelo professor Robaina.

Devido a Pandemia mundial do novo coronavírus, as atividades do pro-


jeto Cirandar nos últimos anos, transcorreram de maneira online, representado
nas imagens da figura 1, as quais ilustram reuniões e encontros de coordenado-
res/as de todas as regiões do país, ocorrido em 2020/21, via plataforma digital.
Ressaltamos que as gravações/registros das figuras/imagens dos encontros on-
line foram autorizadas pelos participantes nas datas de cada encontro, tanto nas
reuniões de coordenadores quanto nas reuniões no Polo.

Volume II 392
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1 - Reunião de coordenadores/as e Encontro Final do Cirandar

Fonte: acervo pessoal das autoras, 2020.

Na mesma toada, as imagens da figura 2, representam os encontros do


coletivo de Cirandeiros e Cirandeiras do Polo de Porto Alegre & Região Me-
tropolitana, junto aos/às Coordenadores/as.

Volume II 393
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 2 - Encontros do Polo Porto Alegre & Região Metropolitana

Fonte: acervo pessoal das autoras, 2021.

Nestes últimos anos, com intuito de fortalecer os laços que foram distan-
ciados pela segurança sanitária, construímos coletivamente uma imagem que
representasse o grupo com elementos significativos às nossas jornadas. O qual
foi idealizado em conjunto e construído voluntariamente por uma artista, agri-
cultora familiar e estudante de uma escola do campo do interior do Rio Grande
do Sul. Como podemos apreciar a imagem da figura 3.

Volume II 394
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 3 - Identidade Cirandar do Polo de Porto Alegre & Região Metropoli-


tana

Fonte: acervo pessoal das autoras, 2020.

É livre o processo de avaliação do projeto Cirandar de acordo com os


Polos de desenvolvimento. No intuito de No intuito de registar os sentimentos
e registrar os sentimentos e significados desses últimos anos de Encontros
online, foram organizadas avaliações construtivas no decorrer de todo o pro-
cesso de escritas, reflexões e reescritas, para isso, sistematizamos e desenha-
mos esses significados em “nuvens” de palavras, como ilustrado na figura 4
a seguir.

Volume II 395
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 4 - Avaliação por Nuvem de Palavras significativas do Polo de Porto


Alegre & Região Metropolitana

Fonte: acervo pessoal das autoras, 2020.

É importante destacar que, em 2018, a UFRGS passou a participar do


Cirandar por um convite realizado pelas Coordenadoras e idealizadoras do
projeto da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), às professoras Doutoras
Maria do Carmo Galiazzi e Aline Machado Dorneles. Em 2022, registramos o
projeto Cirandar na UFRGS, junto ao CNPq, passando a ser co-autor junto a
FURG. No conseguinte, são descritas as especificidades formais do projeto de
acordo com o registrado nas Pró-Reitorias de Extensão da UFRGS e FURG.

O Cirandar caracteriza-se como um programa de extensão, o qual teve


início em 2012 na FURG, e visa a formação de professores/as e licenciandos/as
a partir da construção de conhecimentos de modo coletivo, cooperado e dialó-
gico, fundamentado nos ensinamentos de Paulo Freire. Iniciou com a produção
de relatos de experiências docentes pelos/as participantes, porém ao longo de
sua trajetória a produção escrita foi orientada e sistematizada às Cartas Pedagó-

Volume II 396
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

gicas. As quais estão mais alinhadas à teoria freiriana, tendo sido utilizadas por
Freire em diversas de suas obras.

O objetivo geral, de acordo com o projeto de extensão da FURG (2021) é,


“promover a formação acadêmico-profissional integrando a Escola e a Univer-
sidade, buscando a compreensão do participante de seu papel político enquan-
to docente que assume a autoria de sua prática em sala de aula nos níveis de
ensino por meio do diálogo” (2021, p. 1). Em consonância a isso, o projeto de
extensão da FURG (2021, p. 2), apresenta os seguintes objetivos específicos:
a. Promover Rodas de Conversas que fundamentam as teorias da docência
por meio do diálogo sobre experiências educativas na rede de educação
básica e na Licenciatura de modo a problematizar e aprofundar teorias que
sustentam as ações dos professores em seu contexto educacional;
b. Desenvolver Rodas de Estudo com a leitura e discussão de textos de
fundamentação teórica sobre a formação docente, bem como de aspectos
estruturantes de sala de aula nos diferentes níveis e modalidades de ensino;
de políticas públicas; do papel da educação pública;
c. Promover Rodas de Escrita de cartas pedagógicas com a indagação so-
bre as atividades educativas narradas de modo a evidenciar reflexões que
possam auxiliar uma futura reescrita fundamentada nas teorias estudadas;
d. Realizar Rodas de Leitura da carta pedagógica do colega com elabora-
ção e envio de contribuições e indagações no modo de uma carta resposta,
promovendo a parceria na produção escrita;
e. Reescrita e reenvio da carta pedagógica na versão final com o aprofunda-
mento das teorias e indagações emergidas no processo formativo;
f. Desenvolver processos de leitura das cartas pedagógicas em rodas virtu-
ais de formação de modo a intensificar o compromisso com o pertencimen-
to à formação.

Este projeto tem sua origem nos Encontros sobre Investigação na Es-
cola (EIE), os quais acontecem no Estado do Rio Grande do Sul desde 2000.
De acordo com os Anais da última edição do evento, o EIE é promovido pela
Rede de Investigação na Escola (RIE), com periodicidade anual. O Encontro
nasce a partir das ideias de eventos semelhantes nos anos 1980, desenvolvidos
pelo grupo Investigación em La Escuela, com vinculação ao departamento de

Volume II 397
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Didáctica de las Ciencias Sociales y Experimentales da Universidade de Se-


vilha. O EIE tem como proposta de formação, a escrita, a leitura e a discussão
de relatos de experiências de professores/as da Escola, da Universidade e em
formação inicial (licenciandos/as). Desta maneira, consiste em um evento que
prioriza a participação e a interação dos/as participantes e direciona-se para o
público de docentes em diferentes estágios de formação, inicial e continuada
do Rio Grande do Sul.

Também são elucidados na Apresentação dos Anais, que o Encontro EIE


inspira-se nas atividades organizadas pela Rede de Investigação e Renovação
Escolar (IRES), que conglomera universidades ibero-americanas e grupos inde-
pendentes de professores/as inovadores/as de Países como a Argentina, Brasil,
Colômbia, Espanha e o México. Atualmente o coletivo desses Países também
organizam-se em Redes, como a Red Iberoamericana de Colectivos Escolares
y Redes de Maestros/as que Hacen Investigación y Innovación desde la Escue-
la, que reúnem-se a cada três anos para discutir e socializar experiências. O
Brasil compõe esse coletivo a partir da Rede de Investigação na Escola (RIE).

A dinâmica do EIE, ainda descrito na Apresentação dos Anais, consiste


em rodas de discussão em que cada participante inscreve, previamente, um re-
lato investigativo sobre alguma atividade inovadora realizada em sala de aula,
preferencialmente, sobre sua prática. Há uma troca de leitura entre pares e, em
seguida, os relatos são organizados e separados em rodas de formação, con-
forme as temáticas, e enviados aos demais participantes da roda para leitura
prévia, questionamentos e sugestões. A roda elabora uma síntese das suas temá-
ticas e as apresenta em um dos momentos do encontro. Os relatos, após leitura,
discussão e avaliação, são reescritos para a publicação final. Ou seja, o EIE tem
como proposta a formação num movimento reflexivo por meio da escrita, da
leitura, da discussão e da reescrita de relatos de experiências.

Na mesma toada, o Cirandar conta com edições anuais do projeto, no


decorrer do qual são produzidas três Cartas Pedagógicas em resposta às Cartas

Volume II 398
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

escritas pela coordenadora Maria do Carmo Galiazzi, nas quais instiga os/as
participantes a se envolverem num processo dialógico de partilha e constru-
ção de conhecimentos a partir da troca firmada entre as partes por intermédio
das Cartas Pedagógicas. A Carta da professora Maria do Carmo abre o diá-
logo e convida os/as membros a se apresentarem relatando sua jornada até o
Cirandar, em sua resposta a professora incentiva que compartilhem uma te-
mática que desejem pesquisar nesta edição. Após a apresentação na primeira
Carta em resposta à questão orientadora da professora, é iniciada a reflexão
direcionada à construção científica da escrita.

Na segunda Carta os/as integrantes dividem os conhecimentos construí-


dos sobre a temática que os/as mobilizam na prática docente e/ou no caminho
da pesquisa acadêmica. Desta maneira, é encaminhada à construção da terceira
Carta Pedagógica, em que desenvolvidas essas temáticas mobilizadoras, com
intuito de aprofundar os conhecimentos e exercitar a investigação docente da
sua realidade.

Esta última produção, conglomera as escritas anteriores, em conjunto a


uma reflexão e embasamento teórico metodológico, a qual será encaminha-
da para uma leitura entre pares dentre todos/as os/as participantes do projeto.
Desta maneira, são realizadas considerações a fim de enriquecer e contribuir
para sua reescrita final com um embasamento teórico mais robusto e rigoroso
visando a publicação desta produção.

Após a escrita final a partir da contribuição entre os pares, ocorre o en-


contro final online ou presencial com a apresentação das Cartas a todos/as os/as
participantes. Posteriormente, acontece a publicização das Cartas Pedagógicas
produzidas no site do Cirandar, bem como, a publicação das experiências em
forma de Anais de eventos e/ou livros.

Esse projeto já conta com a produção de cinco e-books, disponibilizados


no site do projeto, mencionado anteriormente, nos quais são apresentados as

Volume II 399
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

produções finais decorrentes das edições anteriores. No ano de 2022 haverá


uma nova edição contando os 10 anos do projeto.

Agora que nos inteiramos das características do programa de extensão


Cirandar: rodas de investigação desde a escola, e que desenvolve suas escritas
por meio da metodologia das Cartas Pedagógicas, perguntamos:

Mas afinal, o que são as Cartas Pedagógicas?

As Cartas sempre existiram, antes mesmo de existirem o computador,


a internet, o e-mail. A escrita para os/as amigos/as, familiares e até mesmo
para negócios, acontecia por meio de Cartas escritas à punho e enviadas pelos
Correios (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), as “cartas de verdade,
escritas com máquina de escrever, se não tivesse pelo menos uma página seria
um desrespeito a pessoa, mesmo que se tratasse somente de um comunicado
ou para pedir uma simples informação”, como dizia Carlos Rodrigues Brandão
(2020, p. 12). Durante toda a vigência dos governos militares, “as nossas car-
tas eram também perigosos documentos cuja indevida leitura por um alguém
do Serviço Nacional de Informação poderia redundar em busca do autor e do
destinatário. Poderia resultar em prisão, ou mesmo em algo pior” (BRANDÃO,
2020, p. 13).

Na carta de Brandão (2020, p. 14), ele dizia:


Dias e noites em fundos de quintais, ao redor de fogueiras acesas, selecio-
nando e queimando quilos e quilos de cartas e de mensagens entre a ‘Equi-
pe Central do Movimento de Educação de Base de Goiás’ e lavradores,
monitores camponeses e participantes das ações de ‘educação de base’ ou
de ‘encontros de comunidade’. E, também, jogando no fogo pacotes com
as nossas ‘aulas de alfabetização’.

Escapavam do fogo apenas aquelas cartas “não politicamente comprome-


tedoras”. Muitos acontecimentos, conhecimentos, ficaram somente na memó-
ria, e foram se perdendo ao longo do tempo, por não terem sido escritas e do-

Volume II 400
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

cumentadas. Algo semelhante, também ocorreu com Paulo Freire na sua cidade
de Angicos em Rio Grande do Norte, quando alfabetizava jovens e adultos, até
o golpe civil-militar-empresarial de 1964, sendo exilado para o Chile.

Caminhando um pouco mais nessa escrita, parte significativa das escri-


tas de Paulo Freire foram no formato de Cartas, como: “Cartas a Guiné-Bis-
sau: Cartas a Guiné-Bissau: registros de uma experiência em processo” (1978),
“Cartas à Cristina: reflexões sobre minha vida e minha práxis” (2019a), “Pro-
fessora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar”(1993), entre outras. A própria
Bíblia Sagrada traz 21 dos seus escritos em forma de cartas, sendo 13 escritas
pelo Apóstolo Paulo e oito escritas por diversos autores/as. Um outro formato
de Cartas que encontramos, são as Cartas encíclicas, uma comunicação por
meio de Cartas escritas pelos Papas endereçadas aos Bispos, Arcebispos e aos
fiéis de toda a igreja. A Encíclica “Laudato si” que trata sobre o cuidado da
casa comum, e a “Fratelli tutti”, que busca promover uma aspiração mundial à
fraternidade e à amizade social. Ele escreve essa última Carta em um momento
mundial de Pandemia em que profere: “Ninguém se salva sozinho”, “Somos
todos irmãos”. Essas duas cartas foram escritas pelo Papa Francisco ao povo
nos anos de 2015 e 2020, respectivamente.

Mais recentemente, as Cartas têm sido escritas com um teor mais pedagó-
gico e científico, por isso denominadas de Cartas Pedagógicas, utilizadas como
um instrumento metodológico de escrita por pesquisadores/as, professores/as e
estudantes. Inclusive já existem escritas de Cartas em forma de livros já publi-
cizados (CAMINI, 2012; SOLIGO, 2015; PAULO; DICKMANN, 2020), além
de artigos, teses e dissertações.

A diferença de uma Carta convencional para uma Carta Pedagógica,


é que esta “deseja produzir conhecimento e tem uma postura política” (DI-
CKMANN, 2020, p. 41). Além disso, as Cartas chamam para o diálogo, para a
resposta, para a aproximação, estabelecendo uma relação pessoal. Elas podem

Volume II 401
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

ser escritas de diversas formas, mais elaboradas ou mais livres, podem ser in-
dividuais ou coletivas, porém, a potência dessa metodologia de escrita provém
da criatividade de cada um (DICKMANN, 2020).

Existe um outro documento/carta denominada de Cidades Educadoras,


que tem como compromisso despertar o interesse na participação dos cidadãos
em um viés crítico e co-responsável, porém para que isso aconteça o governo
deverá ofertar a informação necessária e impulsionar, “na transversalidade, as
orientações e as atividades de formação em valores éticos e cívicos” (ASSO-
CIAÇÃO..., 2020, p. 6). Assim, o Papa em sua carta afirma que “precisamos de
uma comunidade que nos apoie, que nos auxilie e dentro da qual nos ajudemos
mutuamente a olhar em frente” ASSOCIAÇÃO...,2020, p. 3).

As Cidades Educadoras, baseiam-se nas intenções educacionais das po-


líticas públicas gerais e são entendidas em um sentido amplo, não apenas a
Secretaria Municipal de Educação. Portanto, as cidades brasileiras podem se
tornar efetivamente cidades educacionais somente quando os governos locais
como um todo garantam que suas ações sejam educacionais, abrangentes e di-
versificadas. Além de equivocado conceitualmente, confiar o papel da cidade
de promover a educação às escolas individualmente, exclusiva ou prioritaria-
mente, traz desafios injustos e intransponíveis (COSTA, 2021).

No livro organizado por Paulo e Dickmann (2020), “Cartas Pedagógi-


cas: tópicos epistêmico-metodológicos na Educação Popular”, o artigo de Di-
ckmann (2020), vai apresentar dez características que identificam uma Carta
Pedagógica, sendo elas: 1) Ponto de partida: toda carta tem início a partir da
história de vida, da realidade, das experiências e saberes; 2) Objetivo da escrita:
possui abertura para o diálogo, instiga uma conversa sobre um tema, há cone-
xão com o Outro, possibilidade de registro de ideias; 3) Por que é pedagógica?:
deseja produzir conhecimento e tem um caráter político; 4) O efeito da carta
pedagógica: ela gera um movimento de aproximação e diálogo, chama à res-

Volume II 402
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

posta e continuidade da escrita, estabelece uma relação pessoal; 5) O conteúdo


das cartas: elas podem ser por meio de uma notícia, informação, mensagem e
reflexão; 6) Escrever exige compromisso: é preciso ter uma postura pedagógi-
ca crítica, uma opção metodológica criativa e inovadora; 7) As cartas geram
potências: destacam aspectos lógicos/racionais por meio das informações que
a escrita aborda, e também, tocam o coração das pessoas caracterizadas pela
afetividade, emoção, sensibilidade e humanização; 8) Para quem escrevemos?:
a carta precisa ter um destinatário - que público lerá a carta? para uma possibili-
dade de gerar diálogo e reflexão; 9) A resposta da carta pedagógica: toda carta
anseia por uma resposta que é a outra carta. A resposta pode vir em forma de
perguntas, outras dúvidas, ela é aberta; 10) O método de escrita da carta peda-
gógica: elas podem ser mais elaboradas ou mais livres, podem ser individuais
ou coletivas, o que importa é a criatividade.

Para além dessas características que indicam caminhos de escrita de uma


Carta Pedagógica, Paulo (2021, p. 2), inspirada em Paulo Freire, nos ensina
que: “Escrever Cartas Pedagógicas é um processo de libertação em relação às
formas históricas de produção do conhecimento. É uma possibilidade de Liber-
tação frente à opressão imposta pela universidade e escola colonial, bancária e
instrumental”.

E nesse sentido, escrever sobre aspectos relacionados à questão ambien-


tal, exposta na sequência, é um processo de libertação e problematização, fren-
te à opressão que diversos pesquisadores/as e instituições vêm enfrentando nos
últimos tempos.

A temática ambiental por meio das Cartas


Pedagógicas

Na edição 2021 do encontro Cirandar: rodas de investigação desde a es-


cola, a temática ambiental se fez presente nas nossas leituras, escritas e dis-
cussões, pois percebemos as aproximações com os temas de pesquisas de dou-

Volume II 403
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

torado. Se referem a abordagem temática dos agrotóxicos e da Agroecologia


nas escolas do campo no estado do Mato Grosso, bem como, os processos
de aprendizagens sobre Agroecologia nas escolas do campo do Estado do Rio
Grande do Sul. Como embasamento teórico metodológico, utilizamos Paulo
Freire e o Pensamento Latino Americano em Ciência, Tecnologia e Sociedade
(PLACTS). Porém, para esse momento, pretendemos realizar uma breve apre-
sentação da temática e as possíveis articulações/reflexões com a teoria de Paulo
Freire e as Cartas.

Em um primeiro momento, é necessário dizer que a sociedade esteve e


está passando por momentos de incertezas, inseguranças, mudanças drásticas
em vários aspectos, cujo ator principal pela desestrutura é o próprio ser huma-
no. Desde o final de 2019 e início de 2020 o mundo foi acometido pela Pande-
mia do vírus Sars-Cov-2 (COVID-19) disseminando-se País por País. Um dos
vieses para explicar o surgimento do vírus está no desequilíbrio das cadeias
vivas da natureza causadas pelas queimadas, desmatamentos, poluição do ar
liberados pelas indústrias e automóveis, produção e aplicação de agrotóxicos
no solo e por consequência presentes na nossa alimentação, na água e no ar,
entre outros fatores.

Preocupado com todas essas adversidades que a humanidade vem en-


frentando, na data de quatro de outubro de 2020, o Papa Francisco escreve a
sua terceira carta Encíclica intitulada ‘Fratelli tutti’ (todos irmãos), e um pouco
antes, no ano de 2015, teria escrito a Carta ‘Laudato si’ (louvado sejas). Este
menciona que é necessário cuidarmos da casa comum, se referindo a natureza,
o espaço, o planeta onde vivemos e complementa dizendo que tudo está interli-
gado. Logo, podemos dizer da complexidade que é a vida, uma vez que, quando
prejudicamos uma parte do planeta, todas as partes serão afetadas.

Vivemos em um contexto da cultura da dominação, conforme menciona


Paulo Freire (2019b). Os grandes empresários, as multinacionais, os políticos,

Volume II 404
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

o capital, comandam e manipulam grande parte da população, consequente-


mente, a Natureza, e na maioria das vezes a classe mais pobre vive à mercê
dessa minoria, vivem alienados. Apropriam-se de tudo, da ciência, das tecno-
logias, dos sistemas políticos, da educação, do dinheiro, utilizam tudo como
instrumento para manter a ordem opressora.

Paulo Freire, se preocupou muito com a questão política hegemônica e


ao modelo de racionalidade estabelecida pelo cinismo e frieza da humanidade,
a desumanização. Seu pensamento se constitui a partir de uma posição política
em favor dos oprimidos da sociedade. O mesmo, durante sua vida, tem passado
por diversos desafios, mas que com esperança, persistência e humildade, jamais
se deixou abater e enfrentou as adversidades com perspicácia e ousadia.

Nesse mesmo caminho, duas palavras importantes, encaminhadas por


Paulo Freire, podem caber nessa discussão, que são a biofilia e a necrofilia.
Na opinião do autor, os opressores tendem a controlar tudo, fazendo as pes-
soas objeto do sadismo, que é caracterizado por um impulso para a morte. O
sadismo aparece, como uma das características de consciência opressora, em
sua visão necrófila do mundo. É por isso que seu amor é um amor às avessas
- um amor pela morte em vez de um amor pela vida. Em certa medida, para
governar, esforçam-se para deter o desejo de explorar, inquietar e criar forças,
que caracterizam a vida, o opressor mata a vida (FREIRE, 2018; 2019b). “Para
os opressores, o que vale é ter mais e cada vez mais, à custa, inclusive, do ter
menos ou do nada ter dos oprimidos. Ser para eles, é ter e ter como classe que
tem” (FREIRE, 2019b, p. 63).

Mesmo com a dominação persistente, cuidar da casa comum sugere que


cada um de nós tenhamos o compromisso com a qualidade de vida de todos/
as os/as habitantes, como afirma a Carta das Cidades Educadoras: “A cidade
deverá garantir a qualidade de vida de todos os seus habitantes. Significa isto,
um equilíbrio com o ambiente natural, o direito a um ambiente sadio, além do

Volume II 405
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

direito ao alojamento, ao trabalho, aos lazeres e aos transportes públicos, entre


outros” (ASSOCIAÇÃO..., 2020, p. 6).

Conforme a Encíclica “Fratelli tutti” do Papa Francisco, cuidar do mundo


que nos rodeia, significa cuidar de nós mesmos. Ele realiza uma crítica dizendo
que o cuidado com a casa comum não interessa ao poder econômico, pois o
que eles desejam é o ganho rápido. E acrescenta que na cultura que estamos vi-
vendo e desenvolvendo é “vazia, fixada no imediato e sem um projeto comum,
é previsível que, perante o esgotamento de alguns recursos, se vá criando um
cenário favorável para novas guerras, disfarçadas sob nobres reivindicações”
(2020, p. 5). A insustentabilidade associada à progressiva degradação socio-
ambiental provocada pelo mesmo, insustentável porque é movido por insumos
cada vez mais escassos, insumos finitos e cuja durabilidade não deverá passar
de algumas décadas, conforme analisa Taibo (2019).

Perante a isso, podemos destacar que o confronto bélico que vem ocor-
rendo entre os Países da Rússia e a Ucrânia, acelerou essa compreensão, assim
como diversos conflitos armados que ocorreram, trazem consequências diver-
sas, além da morte de civis e soldados: impactos ao meio ambiente, como a
contaminação do solo, escassez de recursos hídricos, poluição sonora e do ar, e
morte e extinção dos seres vivos animais e vegetais.

É importante destacar que os efeitos ao meio ambiente, posterior a uma


guerra, podem vir à tona a médio e longo prazo. Os combustíveis fósseis são
a base para a fabricação de muitos produtos, no entanto, estes estão acabando.
Enquanto humanidade, o que iremos fazer depois que tudo acabar, quais as
alternativas para a vida humana e sustentável na terra?

Quando tratamos da escassez de insumos, a Agroecologia tenta ganhar


visibilidade e importância na sociedade, principalmente, neste momento de
conflito bélico envolvendo a Rússia e a Ucrânia, entrando em pauta a falta ou

Volume II 406
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

diminuição de insumos exigidos pelo modelo agrícola do agronegócio. A partir


dessa reflexão, é possível questionarmos como está a participação da sociedade,
da escola, da universidade, na questão ambiental, mais especificamente na re-
flexão e atitude para a abertura de outros caminhos, tomada de decisões, quanto
a temática dos agrotóxicos, tomando como uma possibilidade, a Agroecologia.

As monoculturas em larga escala representam atualmente cerca de 80%


dos 1,5 milhão de hectares de terras agrícolas do mundo. Como mais de 2.500
plantas diferentes podem, em princípio, ser consumidas, a maioria das pessoas
atualmente limita sua dieta a três culturas principais: trigo, arroz e milho. Elas
fornecem mais de 50% do consumo global de calorias. As culturas industriais
são particularmente vulneráveis ​​à infestação de ervas daninhas, invasões de
insetos, epidemias e, mais recentemente, mudanças climáticas devido à sua
baixa diversidade ecológica e baixa homogeneidade genética. Para o controle
de pragas, em geral são utilizados cerca de 2,3 milhões de quilos de agrotóxicos
a cada ano, dos quais menos de 1% realmente atingem os organismos-alvo –
considerados diferentes tipos de “pragas” (ALTIERI; NICHOLLS, 2021).

E o que temos observado em pesquisas realizadas sobre a produção e uso


de agrotóxicos (BOMBARDI, 2017; CARNEIRO et al., 2015), é que o Brasil
está entre os primeiros países, pela extensa área de plantio, que mais utiliza
agrotóxicos na agricultura, sendo o Estado do Mato Grosso, em primeiro lugar.
É possível registrar que esse número vem aumentando progressivamente. Entre
2010 e 2015, foram registrados 815 agrotóxicos. Entre 2016 e 2020 (até 26 de
novembro de 2020), esse número mais que dobrou, sendo liberados 2.009 tipos
de agrotóxicos (FRIEDRICH et al., 2021).

A maioria dos insumos químicos acaba se acumulando no solo, ar e água,


com impactos crescentes na saúde pública estimados em mais 10 bilhões de
dólares por ano (somente nos EUA). Esses processos afetam aproximadamente
26 milhões de pessoas em todo o mundo a cada ano. Mas também vale a pena

Volume II 407
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

notar que esses cálculos não levam em consideração os custos associados aos
efeitos tóxicos agudos e crônicos dos resíduos de pesticidas que permanecem
nos alimentos. Doenças renais, cardiovasculares e respiratórias, incluindo asma,
alergias, enfisema e Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), bem como
doenças autoimunes, têm aumentado constantemente nos últimos 50 anos. Essa
tendência anda de mãos dadas com um aumento dramático no uso de pesticidas
químicos, plásticos e muitos outros produtos (ALTIERI; NICHOLLS, 2021).

Por outro lado, muitos agrotóxicos levam a uma redução nas paisagens
agrícolas de polinizadores, predadores naturais de pragas, e espécies como bor-
boletas e besouros, aves e biota do solo que contribuem para a produção de
serviços ecológicos essenciais para manter a viabilidade e sustentabilidade. de
colheitas. Hoje, essa perda de biodiversidade custa centenas de bilhões de dó-
lares anualmente na produção de alimentos e na gestão de sistemas de promo-
ção da saúde humana. Ou seja, ao fortalecer a espiral de pesticidas, amplifica
os efeitos prejudiciais nas respectivas comunidades de habitat. Cerca de 586
espécies de insetos e ácaros são resistentes a mais de 325 pesticidas, sugerin-
do que a agricultura moderna carece cada vez mais de ferramentas para lidar
com pragas e doenças endêmicas, como a dengue, a malária, etc. (ALTIERI;
NICHOLLS, 2021).

Outra questão importante, é que o agronegócio e, em especial os agrotó-


xicos, além de causar a degradação ambiental, tem eliminado a classe campo-
nesa e os seus saberes tradicionais, e de um controle ideológico sociocultural
e econômico que está colocando em risco o futuro desses povos. Além disso,
os agrotóxicos afetam também a saúde, provocando doenças como o câncer,
malformação congênita, desregulação hormonal, depressão etc. (CARNEIRO
et al., 2015).

Os autores Pignati et al. (2017, p. 2) apresentam alguns fatores que con-


tribuíram e ainda contribuem para o aumento do consumo dos agrotóxicos,

Volume II 408
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

sendo um deles a imposição da política chamada “Revolução Verde”, “cultivos


transgênicos, o aumento de “pragas” nas lavouras, de créditos agrícolas subsi-
diados e isenção de tributos fiscais [...] fragilidades da vigilância estatal sobre
o seu uso e a ausência de políticas que reduzam o uso de agrotóxicos e incenti-
vem a produção agroecológica.”

O processo da política Revolução Verde também conhecida como a “Re-


volução industrial da agricultura” acelerou a “modernização” no Campo por
meio da utilização de agroquímicos, maquinários, sementes transgênicas, e es-
timulando o processo de monocultura. Para manejar esses pacotes tecnológi-
cos, segundo essa lógica, não serve para qualquer camponês simples, é preciso
ser um empresário e que tenha condições financeiras. Em decorrência às no-
vas exigências e inovações tecnológicas, os produtores familiares começaram
a se exilar para os centros urbanos, por serem incapazes financeiramente de se
manterem nas atividades e alcançar boa produção. Isso reforça o que dissemos
anteriormente sobre a dominação.

Com a estruturação desse pacote tecnológico na agricultura, a população


mais vulnerável e que mais sofre com isso, são os produtores familiares, as
comunidades tradicionais, pois até então a terra é o que os alimentava de for-
ma saudável e de certa maneira trazia segurança de vida a essas pessoas. Os
responsáveis pela monocultura, são os grandes opressores, dominadores, os
que possuem dinheiro/capital, e faz com que os mais pobres tenham que tomar
outros rumos, indo a maioria para as cidades onde a pobreza se intensifica.

É preciso registrar que toda a população é afetada pelos agrotóxicos,


Campo e cidade, pois se alimentam de produtos que passam pelos agrotóxicos,
no ar existem nuvens de veneno a todo momento. Essas são questões que
passam a ser questionadas quanto a sua segurança, a alimentação saudável,
água potável, etc. No entanto, precisamos nos unir e pensarmos em outras
possibilidades, como a questão da prática da Agroecologia.

Volume II 409
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Existe uma grande pressão política no Brasil quanto ao banimento de


substâncias que são proibidas, por exemplo, na União Europeia. O agronegó-
cio, a indústria química e suas commodities são quem comandam o país, sem
termos o direito de opinar, participar das decisões (BOMBARDI, 2017).

Todas essas questões relacionadas ao agronegócio são certamente um de-


safio sem precedentes históricos se levarmos em conta os cenários projetados
de declínio de áreas agricultáveis; de rarefação e instabilidade no suprimen-
to de petróleo, água e nitrogênio; e no contexto de mudanças climáticas ex-
tremas, as tensões sociais que acompanham fielmente a dinâmica volátil dos
mercados competitivos. O progresso consistente nessa direção, a nosso ver,
dependerá da consolidação de um novo paradigma de desenvolvimento rural
baseado na conservação da sociobiodiversidade, resiliência, segurança alimen-
tar e a consequente distribuição justa da riqueza, o que parece bastante óbvio.
Como resultado, a Agroecologia – e sua estreita ligação com a promoção da
saúde humana e ambiental – emerge como uma alternativa possível, mas ainda
incerta, à reterritorialização das práticas de produção e consumo de alimentos
a partir dos eixos: Abolição progressiva do uso de pesticidas; Enriquecimento
da matriz ecológica; Revitalização de agricultores familiares; Otimização da
agricultura urbana; Sistemas alternativos de produção agropecuária (ALTIERI;
NICHOLLS, 2021).

Nesse sentido, essas discussões nos fazem refletir sobre a necessidade de


uma formação cidadã para a participação na tomada de decisões de fenômenos
como este em discussão, e que instituições como a escola e a universidade tem
um papel proeminente de propiciar aos cidadãos essa formação para que se
tornem pessoas sensibilizadas e com consciência crítica e responsável perante
os fatos que nos são apresentados. A política governamental atual, sem dúvida,
é desfavorável a esse cidadão com atitude, crítico e reflexivo. Muitas vezes,
não existe participação, não porque a população não queira, mas porque são, de

Volume II 410
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

várias formas, obrigadas a silenciar perante uma indústria química que mono-
poliza, que doméstica, que oprime, que ameaça. Até mesmo o currículo escolar
é silenciado, uma vez que, o mesmo não busca discutir de forma específica essa
temática. De acordo com Streck, Redin e Zitikoski (2008), existe no campo da
pedagogia planejada pelos opressores, a reprodução de uma cultura de domina-
ção e de opressão e que se faz presente nos processos políticos e culturais.

Um pressuposto importante é que as instituições políticas, secretarias de


educação e instituições de ensino revisem constantemente seus currículos, se
adaptem ao contexto de cada comunidade, práticas inovadoras, incluindo mí-
dias digitais e novas tecnologias, para garantir que os conhecimentos funda-
mentais e pessoais (formação humana) e sociais sejam valores incontestáveis​​
da comunidade em que estão integrados. Portanto, o trabalho dessas instituições
contribuirá para o sucesso de cidades que precisam de educadores. No entanto,
como promotores da cidade educadora, não podemos simplesmente transferir a
responsabilidade para a escola (COSTA, 2021).

O método de Paulo Freire é fundamentalmente um método de cultura


popular: ele a sensibiliza e politiza. Não vai absorver a política no pedagógico,
mas também não vai antagonizar a educação e a política. Elas se distinguem,
mas na unidade de um mesmo movimento, o homem se historiciza nele e busca
se reencontrar, ou seja, busca a liberdade. Não é ingênuo pensar que a educa-
ção por si só determinará o curso da história, mas tem coragem de dizer que
a verdadeira educação conscientiza as contradições do mundo humano, sejam
elas estruturais, superestruturais ou transversais, que promovem o desenvolvi-
mento humano. As contradições conscientes não o deixam descansar, tornam
a adaptação insuportável. O método de ensino da consciência alcançou a fron-
teira final da humanidade. E como o ser humano sempre se excede, o método
também o acompanha.

Volume II 411
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Com intuito de findar o diálogo, mas não concluir as ideias, refletimos


sobre a atuação das escolas do campo nesses diferentes Estados ao passo que
desenvolvem suas ações na perspectiva do desenvolvimento rural ecológi-
co e solidário. Analisando a educação como estratégia do desenvolvimento,
anunciamos a reformulação curricular de forma cooperada entre a escola e a
comunidade rural em que está inserida, no sentido de articular os diferentes
conhecimentos rumo ao desenvolvimento sustentável, com segurança/sobera-
nia alimentar combinada a preservação/conservação ambiental, para essa e as
futuras gerações.

“É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo esperan-


çar, porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E
esperança do verbo esperar não é esperança, é espera”. (Mário
Sérgio Cortella, inspirado em Paulo Freire).

Porto Alegre, inverno de julho de 2022.

Referências
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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Curitiba: UFPR, 2019.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE - FURG. Cirandar: rodas de


investigação na escola. Projeto de Extensão. Rio Grande: FURG, 2021.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS. Ciran-


dar: rodas de investigação na escola. Projeto de Extensão. Porto Alegre: UFR-
GS, 2021.

Volume II 414
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Resumo: Essa escrita busca contar quem somos e como chegamos até o programa
de extensão “Cirandar: rodas de investigação desde a escola” por meio das Cartas
Pedagógicas, num diálogo e reflexão em conjunto às pesquisas de Tese que fazem
parte do caminho na pós-graduação. As pesquisas tratam sobre o cuidado com a
natureza e a abordagem temática dos agrotóxicos e da Agroecologia nas escolas do
campo no estado do Mato Grosso, bem como, os processos de aprendizagens sobre
a Agroecologia nas escolas do campo do Estado do Rio Grande do Sul. Porém, para
esse momento, realizamos uma breve apresentação da temática e as possíveis articu-
lações/reflexões com a teoria de Paulo Freire e as Cartas Episcopais e os processos
de formação e reflexão que as propõem. São refletidas as conjunturas pandêmicas e
bélicas e as consequências para a sociobiodiversidade na contemporaneidade e para
as futuras gerações. No que tange a sustentabilidade da produção dos alimentos e a
conservação/preservação ambiental para garantir a segurança e soberania alimentar
da nação são refletidos os caminhos agroecológicos em detrimento ao agronegó-
cio, o qual historicamente assola o Campo brasileiro, destruindo a biodiversidade do
Campo e invisibilizando as populações originárias do Campo, junto a sua cultura e
conhecimentos.

Palavras-chave: Metodologias de escrita; Educação em ciências; Educação do/no


campo.

Abstract: This article seeks to tell who we are and how we got to the extension
program “Cirandar: rodas de investigação desde a escola” through the Pedagogical
Letters, in a dialogue and reflection together with the Thesis researches that are part
of the path in the graduate course. The research deals with the care for nature and the
thematic approach to pesticides and Agroecology in rural schools in the state of Mato
Grosso, as well as the learning processes about Agroecology in rural schools in the
state of Rio Grande do Sul. However, for this moment, we will make a brief presenta-
tion of the theme and the possible articulations/reflections with Paulo Freire’s theory
and the Episcopal Letters and the formation and reflection processes that they pro-
pose. The pandemic and war conjunctures and the consequences for sociobiodiversi-
ty in contemporary times and for future generations are reflected upon. Regarding the
sustainability of food production and environmental conservation/preservation to en-
sure the nation’s food security and sovereignty, the agroecological paths are reflected
in detriment to agribusiness, which historically ravages the Brazilian countryside,
destroying the biodiversity of the countryside and making the original populations of
the countryside, along with their culture and knowledge, invisible.

Keywords: Writing Methodologies; Science Education; Field Education.

Volume II 415
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

CAPÍTULO 17

AGROECOLOGIA NA
ESCOLA DO/NO CAMPO
DE NOVA SANTA RITA: UM
TRABALHO FEITO POR MUITAS
MÃOS E QUE ULTRAPASSA
OS MUROS DA ESCOLA
Andressa Luana Moreira Rodrigues
Andriara Lima de Oliveira
Arlei Antônio Castro
Cátia Barcellos Zsortika
Eulália Doleski Fraga de Moraes
Janaina da Rosa Pereira
Mariana Paranhos
Sabrina Silveira da Rosa
Doi: 10.48209/978-65-5417-129-F

Introdução

Este trabalho é uma escrita do coletivo educador de uma escola do/no


Campo localizada no município de Nova Santa Rita, no Rio Grande do Sul, que
tem como eixo articulador de suas atividades pedagógicas um Clube de Ciên-

Volume II 416
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

cias que aborda temáticas a partir do seu Território Educativo. Para organização
deste estudo, traremos primeiramente uma discussão teórica sobre as ativida-
des realizadas no segundo semestre de 2022 e na sequência apresentamos uma
descrição de como e com quem foram realizadas as aulas.

Os referenciais teóricos Educação do/no Campo, Clubes de Ciências,


Território Educativo e Educação Ambiental foram abordados nesta escrita pois
seus autores acabam relacionando suas teorias, ou seja, elas “conversam” entre
si, um complementa o outro.

Durante a análise do desenvolvimento das atividades concluiu-se que as


aulas abordadas neste Clube de Ciências partem da realidade dos educandos
e educandas, de algo que eles/elas já viram, viveram ou conhecem, levando à
uma aprendizagem mais significativa e que faça sentido para a vida das crian-
ças.

Educação do Campo

O Decreto Federal, n° 7.352 (2010, on-line), que dispõe sobre a política


de educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrá-
ria (PRONERA), define “Escola do Campo como aquela escola localizada em
área rural, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou
em área urbana, desde que atenda predominantemente a populações do cam-
po”, ou seja, diz respeito a todo espaço educativo que se dá em locais como, por
exemplo, florestas, regiões onde há o predomínio da agricultura e da agrope-
cuária, populações ribeirinhas, caiçaras, extrativistas, assentamentos indígenas
e comunidades quilombolas.

Conforme consta no site da Secretaria de Educação do Estado do Rio


Grande do Sul, a Educação do Campo não conta apenas com a educação básica,
mas também com diversos níveis e modalidades de ensino, é legislada por lei

Volume II 417
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

própria e faz parte de um projeto de desenvolvimento sustentável, vinculado a


outras instituições do meio rural.

A educação do campo tem três grandes desafios: 1) assegurar o acesso


dos camponeses ao conhecimento, 2) direito à diferença, 3) trabalhar um novo
projeto no campo da elaboração e da disseminação do conhecimento que rompa
a hegemonia o capital no campo. Para Caldart et al. (2012, p. 545) conceitua a
escola do meio rural ou do campo, como:
Enraizada em um processo histórico da luta da classe trabalhadora pela su-
peração do sistema do capital onde o acesso ao conhecimento e a garantia
do direito à escolarização para os sujeitos do campo fazem parte dessa luta.
Tal especificidade, dessa inserção, se manifesta nas condições concretas
em que ocorre a luta de classes no campo brasileiro, tendo em vista o modo
de expansão do agronegócio e suas determinações sobre a luta pela terra e
a identidade de classe dos sujeitos coletivos do campo.

O reconhecimento de que as pessoas que vivem no campo têm direito a


uma educação diferente daquela oferecida para quem vive nas cidades é recen-
te. Esse reconhecimento extrapola a noção de espaço geográfico e compreende
as necessidades culturais, os direitos sociais e a formação integral desses in-
divíduos, tornando-se uma proposta inovadora no universo educacional. Para
Caldart (2004, p. 17), “o povo tem direito de ser educado no lugar onde vive; o
povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com participação,
vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais”.

É importante que os setores do estado e a própria sociedade percebam


que a educação do campo não é um resíduo ou oferta das sobras urbanas. Deve-
se compreender e ter consciência de que a educação do campo é importante
para que se preservem as identidades dos homens e das mulheres do campo e
que essa escola possa contribuir em um novo projeto educativo contextualizado
e com princípios de respeito mútuos.

Também não podemos deixar de lembrar, a necessidade de ver a escola


do homem e da mulher do campo como um fenômeno importante diante do pro-

Volume II 418
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

cesso de globalização e trazer como prioridade uma escola onde especialmente


as crianças e os jovens possam sentir orgulho dessa origem e desse destino, não
porque são enganados sobre os problemas que existem no campo, mas porque
dispostos e preparados para enfrentá-los (CALDART, 2004, p. 157).

Também sabemos que é inviável falar de educação do campo sem falar


do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST, pois sabemos que
aquela teve seu início a partir das lutas pela terra e depois passou a contemplar
a luta pela educação e por uma transformação social por completo, de valoriza-
ção do meio. Segundo Molina (2009, p. 11), “a educação do campo originou-se
no processo de luta dos movimentos sociais camponeses e, por isso, traz de
forma clara sua intencionalidade: construção de uma sociedade sem desigual-
dades, com justiça social”.

A educação do campo fundamenta-se na preocupação da formação huma-


na, com a emancipação e a consciência crítica, coletiva e atuante, objetivando a
libertação de toda sociedade. Todas as discussões que permeiam a educação do
campo, segundo (FREIRE, 2013) devem ser alicerçadas por pessoas do meio
em que o campo está inserido, que represente o contexto, caso contrário será
para o campo.

Clube de Ciências

Entendendo a educação do campo e buscando aprimorar o que se tem de


maior riqueza neste ambiente, foi que a Escola Municipal de Ensino Fundamental
Rui Barbosa, no município de Nova Santa Rita, dedicou-se à educação em
ciências como seu carro chefe para aprendizagem dos seus educandos. Segundo
Blaszko, Ujiie e Carletto (2014, p. 152), “o ensino de ciências aborda conteúdos
articulados com a realidade, com o meio ambiente, com o desenvolvimento do
ser humano, com as transformações tecnológicas, dentre outros temas”. A re-
flexão e a ação sobre o meio natural, físico e social possibilitam que a criança

Volume II 419
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

desde a primeira infância possa observar, manusear, explorar, investigar e cons-


truir conhecimentos científicos.

No caso da escola do/no Campo que será estudada neste trabalho, aprovei-
ta-se os conhecimentos dos educandos que são baseados nos saberes do campo,
nos conhecimentos que cada um traz da sua realidade, e acaba se adequando ao
que diz Chassot (2016, p. 04) “as vivências dos estudantes devem ser contem-
pladas nas práticas escolares, valorizando os conhecimentos passados ao longo
das gerações, sendo esses saberes populares ou saberes primevos”. Se aliarmos
esses conhecimentos prévios e acrescentarmos aos saberes que a escola ofere-
ce, formaremos educandos pesquisadores, críticos, conscientes da sua realida-
de e ainda incentivamos a curiosidade científica.

Para Fasolo e Moraes (1988, p. 56) apud Mancuso et al. (1996, p. 42)
“[...] os clubes constituem-se (...) de uma estratégia de melhoria do Ensino de
Ciências, em redutos de ação e combate contra um sistema de ensino ineficiente
e domesticador”. Clubes de Ciências classificam-se como espaços não formais
de ensino, caracterizando-se principalmente por possuírem cronogramas flexí-
veis que atendem às necessidades e desejos de cada grupo de alunos.

Para Lima (1998, p. 26), um Clube de Ciências é:  


Um espaço pedagógico com possibilidade de estudos científicos numa
perspectiva de construção/produção de conhecimentos, apresentando forte
integração com a comunidade e encontrando-se seus participantes envolvi-
dos em clima de cooperação e solidariedade.

O Clube de Ciências Saberes do Campo (CCSC) utiliza uma “linguagem


para facilitar nossa leitura de mundo” (CHASSOT, 2006, p. 37). As atividades
desenvolvidas promovem práticas lúdicas e atrativas sobre temas diversos, os
quais sempre têm ligação com o mundo real, presente no dia a dia e no cotidia-
no dos educandos, as quais estão ligadas às demais atividades da escola fazen-
do parte do todo do ensino.

Volume II 420
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Os assuntos pertinentes ao CCSC partem da sua realidade, do conheci-


mento primevo dos educandos. Segundo Moreira e Sousa (1980), a função do
conhecimento prévio é a de servir de ponte, ou ponto de partida entre o que o
aprendiz já sabe e o que ele deve saber, aliando os conhecimentos do educando
com os conhecimentos que possa adquirir por métodos científicos.

As atividades do CCSC estudam ações naturais ao redor da escola, no


seu entorno onde os pátios das famílias e da escola passam a ser um laborató-
rio prático para nossas inquietações e curiosidades, o entorno é a extensão da
sala de aula. As atividades não devem cair na rotina e nem se tornarem práticas
desinteressantes e comuns. Esses alunos precisam ser formados para contribuir
na escola, na sociedade e no meio em que vivem, melhorando assim as suas
habilidades e, também, a sua qualidade de vida. Para Fasolo e Moraes (1988, p.
67) apud Mancuso et al. (1996, p. 42):
[...] os clubes constituem-se [...] de uma estratégia de melhoria do Ensino
de Ciências, em redutos de ação e combate contra um sistema de ensino
ineficiente e domesticador [...] em oportunidades para as lideranças ativas
no Ensino de Ciências influírem sobre a Educação Científica, sua atuação
em torno da investigação científica, de modo a possibilitar uma visão de
ciência, não apenas como produto acabado, mas como um processo perma-
nente de construção da realidade em que o homem ocupa uma posição de
destaque.

Reconhecendo que o Clube de Ciências deve estar de acordo com a rea-


lidade dos educandos e que a partir dos seus conhecimentos prévios podemos
ensinar ciências que faça sentido para essas crianças, que então foi realizada,
para o relato narrativo deste artigo, uma atividade que partiu do (re)conheci-
mento da comunidade, onde educandos e educadores fizeram uma visita, em
caminhada pela comunidade, com provocações para um novo olhar, um olhar
atento e curioso àquilo que normalmente não é visto por pressa ou costume.

A partir desta saída de observação, foram criadas pelas crianças e educa-


dores temas que seriam importantes saber e conhecer envolvendo ciências. De

Volume II 421
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

acordo com Paraná (2008, p. 4):

[...] o objetivo principal de um Clube de Ciências atualmente é: [...] abor-


dar conteúdos não de maneira tradicional, mas próximos do cotidiano dos
estudantes e das demais áreas do conhecimento, buscando uma formação
científica, porém voltada para a interpretação do cotidiano e em prol da
comunidade.

O Clube de Ciências Saberes do Campo trabalha com o Ensino de Ciên-


cias de forma interdisciplinar, contemplando o território educativo dos educan-
dos, valorizando os diferentes saberes das famílias.

Território Educativo

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Rui Barbosa (EMEF Rui


Barbosa) traz de forma explícita suas características de escola do/no campo na
constituição da sua identidade, principalmente por estar localizada dentro de
uma área de Assentamento da Reforma Agrária onde não poderia desprezar o
contexto histórico e social dos sujeitos que compõem o seu território. Mas o
que é território? Um breve conceito sobre a palavra território, segundo teóricos
como Raffestin (1993, p. 144), defende que o território é construído a partir de
um espaço geográfico. Para Fernandes (2005), a palavra território é ampla, uma
vez que se trata de um espaço de vida e multidimensional.

Esse caminho de perceber o território como um espaço de vida, faz com


que a escola faça um reconhecimento, ou melhor, um mapeamento. O território
presente da EMEF Rui Barbosa é um espaço de vida e produção dos campone-
ses e dos cortadores de mato, que, ali, constroem as características do seu pró-
prio território, a partir das suas relações sociais, sua existência, cultura e produ-
ção de alimento saudável, como o arroz orgânico, produzido pela Coopan e os
demais núcleos, consumido pelas populações urbanas. Para Fernandes (2005,
p. 744) “A unidade espacial se transforma em território camponês quando com-
preendemos que a relação social que constrói esse espaço é o trabalho familiar,

Volume II 422
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

associativo, comunitário, cooperativo, para o qual a reprodução da família e da


comunidade é fundamental”.

Após olhar e refletir sobre o seu território, é preciso pensar a organização


pedagógica, que tem como base, para o seu processo educativo, a forma de
produção de vida do território, articulado com os saberes empíricos desse cam-
po. Durante essa busca por entender e conhecer sobre a Educação do Campo,
a EMEF Rui Barbosa, por meio de uma proposta pedagógica de escola do/no
campo, estabeleceu um diálogo com os saberes das famílias e sua comunidade,
a partir do ensino em ciências com atividades diretamente ligadas com os sabe-
res locais e seu território.

Nessa direção, conforme Jesus (2004, p. 121) “o contexto que se desen-


volve nos territórios vividos com suas temporalidades próprias é capaz de criar
novos conhecimentos e reorganizar os saberes em função de um outro modelo
de desenvolvimento do/no campo”. A educação do/no campo ocorre em vá-
rios espaços formativos, como as comunidades e os movimentos sociais, assim
como nas relações entre os sujeitos. Cabe à escola perceber esses diferentes
espaços formativos e valorizar a sua identidade. Considerando as questões de
identidade, é possível notar o sentimento de pertencimento dos educandos e de
suas famílias pelo seu território e sua história.

É o sentimento de pertença à terra, a uma comunidade, a uma cultura que


cria o mundo, para que os sujeitos possam existir. É este sentimento que
dá forma às nossas percepções para que possamos existir, como também
nos oferece os locais onde podemos desenvolver nossas competências.
(JESUS, 2005, p. 119).

O processo educativo vai se transformando, conforme a escola percebe


a importância de incorporar o território ao currículo escolar, pois o currículo
precisa dialogar com o seu território para que faça sentido para os educandos.
A escola, ou seja, o coletivo educador, precisa conhecer o território e a sua

Volume II 423
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

história e suas experiências sociais, pois, segundo Arroyo (2011, p. 121), “re-
cuperar essa história como parte dos currículos e como função da docência será
uma forma de garantir o direito a seus conhecimentos pelos educandos e pelos
mestres”. Assim, a escola exercerá a sua verdadeira função de constituição do
indivíduo, de modo que “[...] todo conhecimento tem origem na experiência
social” (ARROYO, 2011, p. 121).

Nesta perspectiva, a escola tem realizado caminhadas com todo coletivo


de educandos e educadores na comunidade. Neste momento passamos a ob-
servar o nosso território com olhar atento, curioso e investigativo. Após essas
caminhadas os alunos trazem os mais diversos questionamentos e, também,
respondem curiosidades e peculiaridades sobre determinados fatos para seus
professores. Isso ocorre porque eles conhecem aquele espaço. A partir dessas
caminhadas, é possível trabalhar o Ensino de Ciências de forma interdiscipli-
nar, onde os alunos passam a ser protagonistas na construção do seu conheci-
mento, todos aprendem, alunos, professores e até mesmo a comunidade.

Após olhar e refletir sobre o seu território, é preciso pensar a organização


pedagógica, que tem como base, para o seu processo educativo, a forma de
produção de vida do território, articulado com os saberes empíricos desse cam-
po. Durante essa busca por entender e conhecer sobre a Educação do Campo,
a EMEF Rui Barbosa, por meio de uma proposta pedagógica de escola do/no
campo, estabeleceu um diálogo com os saberes das famílias e sua comunidade,
a partir do ensino em ciências com atividades diretamente ligada com os sabe-
res locais e seu território.

Volume II 424
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Figura 1: Entrega de sementes de girassol para comunidade

Fonte: arquivo da escola

Educação Ambiental

O artigo 225 da Constituição Federal (1988, on-line) ao estabelecer o


“meio ambiente ecologicamente equilibrado” como direito dos brasileiros,
“bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida”, também, atribui
ao “Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações”.

Porém, sabe-se que os impactos ambientais no Brasil decorrentes das


ações do homem existem desde o período colonial e persistem até hoje. O mo-
delo de sobrevivência adotado pela sociedade moderna caminha em direção
oposta à sustentabilidade, por meio do aumento da população e da crescente
urbanização que têm agravado a saúde do planeta com a redução das áreas ver-
des, a poluição do ar, a subutilização do solo e os impactos causados no ciclo
hidrológico e na qualidade das águas.

Isso vem sendo percebido, porque se vivencia um período de grandes


catástrofes naturais e escassez de alguns recursos não renováveis. Ações no

Volume II 425
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

mundo inteiro são desenvolvidas com a finalidade de conscientizar, sensibili-


zar, preservar e realizar a utilização do meio ambiente de forma sustentável, de
forma a garantir os recursos para as gerações futuras.

Neste contexto, e da necessidade de uma mudança de paradigma que en-


volve valores sociais, filosóficos, econômicos, éticos, ideológicos e científicos,
adotados pela nossa sociedade, surge a Educação Ambiental (EA). A EA possui
conceitos e temáticas diversas, que se analisados no seu axioma tem a pretensão
de definir e estimular a reflexão sobre a importante integração entre o homem
e o meio ambiente de modo a contemplar todos os caminhos que conduzam a
uma conscientização do homem da necessidade de autopreservação.

Conforme o artigo 1º da Lei 9.795/99 - lei do meio ambiente:

Art. 1º Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais
o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, ha-
bilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio
ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de
vida e sua sustentabilidade.

Dias (1998) definiu a EA como um processo de formação e informação,


orientado para o desenvolvimento da consciência crítica sobre as questões am-
bientais, e de atividades que levem à participação das comunidades na preser-
vação do equilíbrio ambiental.

Já, segundo Lisboa e Kindel (2012), educar ambientalmente significa,


além da apropriação de conceitos e processos que digam respeito ao ambiente,
a aquisição de visões de mundo que possibilitem o respeito a todas as formas
de vida e o entendimento de que a vida só se dá pelas complexas teias tecidas
pelos elementos naturais e socioculturais que se entrelaçam. Logo, é a busca
da construção de uma cidadania efetiva e responsável com o meio ambiente e,
também, o incentivo do pensamento e das atitudes conscientes para um mundo
mais sustentável e possível de se viver com saúde.

A educação ambiental como formação e exercício de cidadania refere-se


a uma nova forma de encarar a relação do homem com a natureza, baseada em

Volume II 426
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

uma nova ética, que pressupõe outros valores morais e uma forma diferente de
ver o mundo e os homens. Para Jacobi (2003), a educação ambiental deve ser
vista como um processo de permanente aprendizagem que valoriza as diversas
formas de conhecimento e forma cidadãos com consciência local e planetária.
Dessa forma, deve-se priorizar o desenvolvimento de ações voltadas para o
cuidado com o meio ambiente presentes no nosso cotidiano, para assim, repen-
sarmos as mesmas, não como algo mecânico, mas, significativo, compreenden-
do este processo como prática social, na qual, formamo-nos como sujeitos que
atuam criticamente na sociedade.

O Brasil é um dos países com maior contingente de leis que regulam a


proteção ao meio ambiente, leis estas que definem a obrigatoriedade da implan-
tação de programas de educação ambiental em todos os segmentos de ensino.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental reco-


nhecem e destacam o papel transformador e emancipatório da Educação Am-
biental – fato que se torna cada vez mais visível diante dos atuais contextos
nacional e mundial, nos quais a preocupação com as mudanças climáticas, a
degradação da natureza, a redução da biodiversidade, os riscos socioambientais
locais e globais e as necessidades planetárias evidenciam-se na prática social,
pois os problemas socioambientais constituem uma soma conexa e articulada
de processos hipercomplexos e mutáveis (BRASIL, 2012).

Da mesma forma que cria a obrigatoriedade de uma educação básica, a


constituição brasileira determina expressamente que é obrigação do Estado a
promoção da educação ambiental como forma de atuação com vistas à preser-
vação do meio ambiente. A Constituição determina, também, no artigo 225 da
Constituição Brasileira (1988, on-line) que: “Art. 225: § 1º Para assegurar a
efetividade deste direito, incumbe ao Poder Público: VI – promover a educação
ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a pre-
servação do meio ambiente”.

Volume II 427
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

O artigo 6º da lei 9.795/99 institui a Política Nacional de Educação Am-


biental e no artigo 7º determina que “a educação ambiental deverá ser desen-
volvida pela União, Estados, Distrito Federal, Municípios e Entidades Não-Go-
vernamentais com atuação em educação ambiental.

Logo, a educação ambiental é considerada pela lei um componente es-


sencial e permanente da educação nacional.

Metodologia

A escrita deste artigo foi construída de forma coletiva pelos educadores


da escola. As práticas educativas foram escritas de forma narrativa.

A EMEF Rui Barbosa, de Nova Santa Rita, elabora suas atividades do


Clube de Ciências Saberes do Campo a partir de um eixo temático elaborado
em conjunto com o coletivo educador da escola para cada trimestre letivo. Este
ano, decidiu-se pelo tema Agroecologia através do estudo da história da nossa
escola, onde realizou-se as atividades descritas a seguir.

Descrição das atividades

1ª atividade – Contação de História da Escola Rui Barbosa: diálogo


com uma antiga aluna da escola e uma professora – neste dia vieram até nossa
escola uma ex-aluna muito especial, que hoje tem 75 anos. Ela morava na pro-
priedade onde antes estava fixada a Escola Rui Barbosa, na época pertencia à
cidade de Canoas e nos contou sobre como foi vivenciar a escola naquela épo-
ca.

Contou-nos dos hábitos e costumes daquele momento, onde a professora


que trabalhava na escola tinha que vir de Canoas e ficar dormindo na casa da
avó desta ex-aluna durante toda a semana e final de semana pegava o ônibus e
voltava para sua família.

Volume II 428
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Contou-nos, também, que a estrutura a escola era uma antiga casa e aca-
bou virando uma escola, nesta época não se oferecia merenda por parte dos
governos e cada aluno levava sua merenda, que quase sempre girava em torno
de um bom pão caseiro com banha de porco e açúcar e que seus materiais esco-
lares eram levados em um saco de açúcar cristal e não em mochilas escolares.
Ainda acrescentou que em boa parte da alimentação da época era baseada na
plantação de subsistência.

As brincadeiras da época eram de correr, pega-pega, esconde-esconde,


pular corda e atividades ao ar livre e está ex-aluna relatou que adorava estar na
escola e brincar com seus colegas.

Ela também nos trouxe um pouco da história do bairro onde está a EMEF
Rui Barbosa, contou que a escola atendia filhos dos moradores da região, que
viviam da produção própria, tanto agrícola como da criação de gado ou traba-
lhavam na fazenda de Mário Machado, homem conhecido na época, devido
oferta de emprego que sua fazenda oportunizava.

Em 1967, a “fazenda do Mário Machado”, como era conhecida na região,


foi vendida para os padres Lassalistas que passaram a produzir arroz e a criar
gado. No ano de 1968, o Governo Federal destinou uma verba para a constru-
ção de um novo prédio para a escola, que foi construída dentro da Fazenda dos
Padres, sendo denominada Escola Unitária Rui Barbosa, onde seguia atenden-
do os moradores da região. Neste mesmo período, a escola foi fechada, devido
à falta de alunos. Em 1972, aproximadamente, a escola foi reativada e as pro-
fessoras passaram a pernoitar no próprio prédio da escola.

Em 1976, o padre Alfredo Schneider doou para a Prefeitura Municipal de


Canoas, conforme a Lei n. 1693/1976, uma área de terra onde estava construída
a escola. Esses desencontros de ano de construção da escola e ano de doação de
terrenos parece estranho, porém, na época essa situação era bastante comum,

Volume II 429
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

pois o governo destinava a verba para construção dos prédios que eram levanta-
dos no local de melhor logística ou onde houvesse a oferta do espaço por algum
proprietário e somente depois regularizavam a doação dos terrenos.

Em 1980, a “fazenda dos padres” foi vendida para a família Garcia, pas-
sando a se chamar Fazenda Capela. Os atuais proprietários passaram a investir
alto na produção de álcool na região, mas o projeto não teve sucesso financeiro
e os atuais donos não conseguiram pagar suas dívidas bancárias, e, em, 1992
perderam sua propriedade.

Em 18 de setembro de 1993, cem famílias de agricultores (as) oriundos


de diferentes municípios do estado do Rio Grande do Sul, iniciaram a ocupa-
ção da Fazenda Capela, uma área de 2.040 hectares, após uma jornada de cinco
anos de luta para conquistar as suas terras.

Segundo relatos verbais de dois moradores da comunidade, que vivem na


região desde os primeiros anos de funcionamento da escola, a mesma perma-
neceu sempre aberta até dezembro de 1992, com exceção dos anos entre 1968
e 1972, tempo em que o novo prédio estava sendo construído.

Em 20 de março de 1992, o segundo distrito de Canoas, Santa Rita, eman-


cipa-se, tornando-se o município de Nova Santa Rita. Em dezembro de 1992,
a escola fechou temporariamente, por não ter alunos suficientes. Em janeiro e
fevereiro de 1993, os primeiros ocupantes da Fazenda Capela iniciaram a luta
pela reabertura da escola para atender os filhos dos ocupantes e comunidade e
obtiveram sucesso.

Muito comum na época, as diretoras da escola da EMEF Rui Barbosa


eram também professoras, merendeiras e serventes, mudando um pouco essa
característica a partir de 1993, com o aumento do número de crianças após a
chegada do assentamento, onde, neste mesmo ano, eram uma diretora e uma
professora.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

E, para nos falar um pouco sobre a época em que a Escola tinha apenas
uma profissional para realizar todas as atividades, contamos com uma profes-
sora aposentada para nos agraciar com esse diálogo. Esta professora nos con-
tou que quando trabalhava na escola, ela morava na cidade de Sapucaia do Sul
e utilizava um trem até na cidade de Canoas, onde utilizava um ônibus para
chegar até uns 10 km da escola e depois ela usava um meio de transporte bem
comum naquela ocasião, um cavalo encilhado em uma charrete. E durante seu
percurso, ela pegava alguns alunos para que os mesmos não precisassem ca-
minhar mais de 7 km para chegarem na escola e esses alunos ajudavam essa
professora com um saco de milho por mês para garantirem a saúde do animal
e não perderem as aulas durante o ano. Essa professora fez esta “maratona” de
1986 até 1992, quando nossa cidade se emancipou do município de Canoas.

Foi uma linda manhã de muitas histórias e redescobertas da história da


nossa escola e da nossa comunidade.

2ª atividade – A história do assentamento capela: nesse dia, contamos


com a presença de mais um morador da região, o seu Airton, da Coopan, que
nos contou sobre a chegada dos moradores do assentamento Capela, sua orga-
nização para iniciarem seus projetos e atividades. Contou-nos que foram anos
de muitas dificuldades e muita luta e que tiveram que estudar e aprender sobre
muitos processos para chegarem aonde estão hoje. Relatou-nos sobre como
foram organizadas as construções das casas para as famílias assentadas e que
iniciaram suas plantações com ajuda do coletivo de assentados do MST da mes-
ma cidade, e ao jogarem suas primeiras sementes no solo deste assentamento
eles utilizaram o agrotóxico, mas que perceberam que as pessoas começaram
a adoecer e eles refletiram sobre este caso e iniciaram a plantar sem veneno.
Hoje, depois de 30 anos, a Coopan está organizada e é a maior produtora de
arroz orgânico do Brasil. Ele também contou que a cooperativa realiza o ciclo
completo do arroz, desde o plantio até a venda do produto.

Volume II 431
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Fez questão de salientar a importância de se pensar a partir do cooperati-


vismo e que o plantio orgânico é fundamental para a saúde do povo brasileiro.

3ª atividade – Re (conhecendo nossa comunidade): para se ter a verda-


deira noção da realidade da atual escola em que trabalhamos e estudamos foi
necessário realizar uma caminhada pelo entorno das propriedades e localidades
que nos cercam, e assim fizemos. Saímos um dia para caminhar em direção
oeste da nossa comunidade e conhecemos a Coopan (Cooperativa de Produtos
Agropecuários), na qual temos alguns educandos que moram e, também, co-
nhecemos outras localidades que fazem parte deste contexto.

Figura 2: Caminhada pela comunidade

Fonte: arquivo da escola.

No retorno desta caminhada, fizemos um diálogo sobre as diferentes ob-


servações realizadas pelas educadoras e pelas crianças e quais eram suas dúvi-
das e/ou curiosidades do que viram durante a caminhada.

Após esta conversa, cada turma teve como proposta orientadora discutir
com os educandos quais foram as maiores curiosidades e pesquisar sobre as
mesmas e apresentar durante a sua acolhida.

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Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A turma dos 1º, 2º e 3º anos pesquisaram sobre a “caixa dos elementos


da natureza”, uma caixa na qual colocaram alguns elementos (pinhão, pinha,
pedras) que pesquisaram para socializar com seus colegas. Eles viram que o
pinhão não dá no pinheiro, o pinheiro nos dá a pinha e que o pinhão vem da
araucária. Também contaram que o pinhão não pode ser colhido antes de maio,
pois é a época em que os pássaros fazem o plantio natural das araucárias e que,
também, esta árvore é protegida por lei e que não se pode cortá-la. E ainda con-
taram que o pinheiro é um deserto verde, pois não nasce nada embaixo deles e,
também, demonstram quais eram as principais diferenças de estética entre as
duas árvores.

Figura 3: Caixa da natureza

Fonte: arquivo da escola.

As turmas do quarto e quinto anos optaram por pesquisar sobre os ani-


mais que fazem parte do nosso território e trouxeram algumas curiosidades
sobre eles. Trouxeram curiosidades, nomes científicos, fisiologia, costumes e
locais de moradia dos seguintes animais: capivara, garça, maçarico, quero-que-
ro e o pica-pau.

Volume II 433
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

A turma do pré-escolar optou por demonstrar aos colegas todas as pai-


sagens, animais e curiosidades, como os porcos, os ninhos de pássaros, que
observaram durante todo o trajeto.

4ª atividade – Agroecologia: nessa atividade do Clube de Ciência, tive-


mos a participação da Professora aposentada e agricultora Maria Gorete Argo-
lo, assentada no Assentamento Itapuí, produtora orgânica das feiras em Porto
Alegre, tendo seu lote certificado como produtor orgânico, e, também, do Téc-
nico Antônio Marcos Vignolo, da Secretaria da Agricultura, que possui espe-
cialização em Agroecologia e mestrado em Agroecossistemas, para falar sobre
a Agroecologia e sua importância para o nosso meio ambiente.

Importante ressaltar que foi pensado trazer Gorete e Marcos para esta ati-
vidade do Clube de Ciência por serem duas pessoas que estão ligadas ao tema
desenvolvido. Marcos é um técnico que desenvolve acompanhamento com as
famílias que trabalham de forma orgânica no Município de Nova Santa Rita e
já, há algum tempo, trabalha nesta área da produção orgânica. Gorete é produ-
tora, há muito tempo, da produção orgânica e realiza as feiras em Porto Alegre.
Os colaboradores desta atividade nos trouxeram diferentes conhecimentos e
reflexões como as que serão descritas a seguir.

A agroecologia é um tema que está sendo trabalhado a partir da prática


educacional sintonizada com o meio social dos alunos e da própria escola do
campo, portanto, a busca pela participação destes profissionais foi algo que se
procurou, sempre respeitando o tempo de cada um, de acordo com suas habili-
dades, para consolidar processos na busca de melhoria das relações das pessoas
com o meio ambiente. Isto só pode ser alcançado se as pessoas se conscientiza-
rem do seu envolvimento e de suas responsabilidades.

A agroecologia é um estudo da agricultura numa perspectiva ecológica,


ou seja, uma prática agrícola que utiliza recursos naturais conscientes respei-

Volume II 434
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

tando os recursos naturais desde o plantio até a colheita. É uma alternativa para
a agricultura atual, substituindo a conhecida monocultura que causa a diminui-
ção da biodiversidade e esgota os nutrientes bem como a qualidade do solo.

A agroecologia propõe algo sustentável que preserve o solo trabalhando


a biodiversidade, uma agricultura mais saudável e com equilíbrio do meio am-
biente, tendo como sujeito principal o camponês.  

Na agricultura camponesa, o trabalho é familiar e não se define só pela


forma de trabalho, mas também pela preservação da natureza, como por exem-
plo, a utilização de biofertilizantes, da adubação verde, do composto orgânico,
do supermagro. Assim, resgatar as práticas alternativas de se fazer agricultura a
partir da agroecologia é uma forma de buscar maior autonomia para os campo-
neses, e valorizar o conhecimento camponês. Por isso, a agroecologia tem sido
vista como uma ferramenta importante para a agricultura camponesa. Segundo
Guterres (2006, p. 24),
Um dos maiores roubos que a agricultura das multinacionais fez com os
camponeses foi roubar-lhes séculos de conhecimentos que foram transmi-
tidos de pai para filho, durante várias gerações, em especial através da fala
(tradição oral) e da experiência (aprendizado da prática e do ensino). Boa
parte deste conhecimento não foi registrado, não foi escrito. Muito conhe-
cimento, muita sabedoria camponesa popular se perdeu para sempre. É pre-
ciso reconquistar esse patrimônio perdido e buscar novos conhecimentos
possíveis graças a sempre novos avanços do conhecimento humano, com
base nos princípios agroecológicos de produção.

A agricultura camponesa tem como uma de suas características principais


a diversidade da cultura. Sua existência se afirma e reafirma na resistência e na
luta permanente, tendo como aliada a agroecologia.

Esta temática trabalhada no Clube de Ciências está ligada ao nosso Eixo


temático que é resgatando a história da escola e suas origens. O próximo passo
é ir até a propriedade do Agricultor para conhecer como se dá a plantação dos
produtos Agroecológicos, atividade que será realizada no mês de julho, como
fechamento deste projeto.

Volume II 435
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

5ª atividade - Consumo e comercialização de produtos agroecológi-


cos: a agroecologia surge como uma nova proposta de produção agrícola e
anda, totalmente, na contramão da agricultura convencional. Trata-se de um
modelo de agricultura baseada na aplicação de conceitos ecológicos e sustentá-
veis na produção de alimentos.

A diferença não se restringe apenas ao produto final entregue ao consu-


midor, pois todo processo de produção desde a escolha da área do plantio, a
seleção das sementes e os métodos de manejo utilizados no cultivo, visam sem-
pre uma prática sustentável, procurando não causar desequilíbrio ao ambiente.

Após as crianças aprenderem os conceitos básicos da agroecologia, che-


gou a hora de aprender sobre o consumo e a comercialização de alimentos
agroecológicos. O assunto foi abordado no nosso Clube de Ciências, projeto
desenvolvido em nossa escola desde 2016 que acontece, semanalmente, todas
às quintas-feiras para educandos da pré-escola ao 5º ano.

Sobre o consumo dos alimentos orgânicos, destacamos a importância e os


benefícios de uma alimentação saudável, sem a presença de agrotóxicos, defen-
sivos agrícolas ou pesticidas. Os riscos do uso destes produtos podem causar
vários problemas de saúde tanto para os produtores, quanto para os consumido-
res. Os problemas podem aparecer em curto, médio e longo prazo, dependendo
da substância utilizada e do tempo de exposição aos produtos.

Ainda sobre o consumo e o acesso a estes produtos, enfatizamos que os


consumidores devem dar preferência ao realizarem suas compras, a lugares
onde tenham contato direto com o produtor. Nestes locais, as frutas, hortaliças
e legumes oferecidos são mais frescos e possuem melhor qualidade nutricional.
Além disso, o consumidor pode ter acesso a informações sobre as técnicas de
cultivo utilizadas, avaliar a preocupação dos produtores em entregar alimentos
de qualidade e saber de onde vem o alimento que está adquirindo.

Volume II 436
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Em relação a comercialização dos produtos agroecológicos, apresenta-


mos aos nossos alunos duas modalidades: a venda direta e a venda indireta.

Na venda direta ou venda em circuitos curtos, além dos consumidores


terem acesso a produtos mais frescos, os agricultores conseguem repassar seus
produtos com preços mais atrativos ao consumidor final e com esta prática ain-
da valorizam suas atividades.

A venda indireta ocorre quando uma empresa usa os serviços de interme-


diários para que os produtos cheguem até o consumidor. Um bom exemplo são
os supermercados, que compram produtos de várias marcas e de vários pro-
dutores para repassar aos seus clientes. Neste caso não temos a oportunidade
de obter informações sobre o que iremos consumir e, devido a participação de
canais de distribuição envolvidos no transporte e na entrega dos produtos até
seu destino, o consumidor acaba pagando mais por estes alimentos.

Mostramos para nossas crianças também, que tanto na comercialização


direta, como na indireta, os alimentos são analisados e certificados. Instituições
federais, estaduais e municipais, credenciadas pelo Ministério da Agricultu-
ra, disponibilizam a certificação após a inspeção. Os produtos inspecionados e
aprovados ganham um selo que garante sua procedência e qualidade.

No caso dos alimentos agroecológicos vendidos em supermercados ou


em feiras ecológicas, o mesmo acontece. Os produtos passam por inspeções
regulares e são avaliados quanto ao seu cultivo sob o ponto de vista ambiental,
tributário e sanitário.

Para tratar deste assunto com crianças de faixa etária de 4 a 11 anos, reali-
zamos uma aula expositiva dialogada como recurso, que além de contar com as
opiniões das crianças no debate, também valorizou o conhecimento prévio dos
educandos que vivenciam esta realidade. Como nossa escola está localizada em
uma área de assentamento do Movimento Sem Terra, o MST, muitos deles são

Volume II 437
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

filhos de trabalhadores rurais que têm a agricultura familiar como ofício e base
de seu sustento.

A ludicidade fez parte da aula através de pequenos vídeos que retratam


a venda direta de produtos agroecológicos e orgânicos, e o funcionamento dos
ciclos curtos de venda, onde os agricultores cooperam uns com os outros, para
que os produtos agrícolas possam chegar, com certa rapidez sem perder a qua-
lidade, em algumas regiões onde não são produzidos e assim diversificar a va-
riedade de frutas, legumes e hortaliças para o consumidor.

Também foi utilizado como recurso, o livro “Tudo vem da Terra... Até os
tomates explosivos”, da escritora Gisella Cassol. O livro conta a história de um
menino que prepara receitas saudáveis e deliciosas com sua tia, que vive em
um apartamento, e mantém uma pequena horta orgânica. A partir da ludicidade
ao fazer as receitas, do exemplo da tia e da experiência do plantio, o menino
descobre que tudo vem da terra e passa a valorizar o cultivo destes produtos.

Como culminância de nosso trabalho, incentivamos todos os alunos a


plantar sementes em casquinha de ovos, previamente guardadas com este obje-
tivo. As crianças maiores auxiliaram as menores no processo de plantio.

Nas cascas de ovos, foram plantadas as hortaliças, os legumes e os frutos


citados no livro, tomates cereja, cenoura, rúcula e alface. Os ovos foram acon-
dicionados em caixas que ficam na área coberta da escola, onde os educandos
conseguem acompanhar todo o processo de germinação das sementes.

Posteriormente, as mudas serão transferidas para nossa horta escolar e as


casquinhas dos ovos servirão como excelente adubo, rico em cálcio, magnésio
e potássio, nutrientes muito importantes para o desenvolvimento das plantas.

6ª atividade - A produção agroecológica: seguindo o projeto sobre


Agroecologia, coube a mim desenvolver sobre como se produz de maneira
agroecológica.

Volume II 438
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Inicialmente foi posto um vídeo retratando um projeto chamado de Pro-


dução Agroecológica Sustentável Integrado (PAIS), o qual se baseia na pro-
dução agroecológica integrada com a natureza, respeitando sobretudo o Meio
Ambiente. Após, foi feito um trabalho sobre os elementos presentes que carac-
terizam a produção agroecológica, tais como O SOLO, sendo que o mesmo ne-
cessita de uma análise do mesmo, bem como verificação geográfica do relevo
do mesmo.

Também foi visto sobre a irrigação aspecto essencial na produção, nesse


elemento foi colocado que a água também deve ser feita uma análise da mesma,
que a irrigação é feita de duas formas, aspersão e gotejamento. Quanto a adu-
bação foi explanada que a planta necessita para se desenvolver essencialmente
um conjunto de nutrientes presentes na combinação NPK (Nitrogênio, Fósforo
e Potássio), e que encontramos o mesmo nos estercos de frango, suíno e bovi-
no, além de outras compostagens, bem como no húmus. Ademais foi falado do
quebra-vento, do sol e do consórcio de cultivares.

Foi pedido para que as turmas representassem através de desenho a Horta


da escola, levando em conta os elementos vistos na palestra. Para encerrar a
atividade, fizemos uma visita na Horta da Escola, onde verificamos se na mes-
ma está presente os elementos vistos no decorrer deste trabalho sobre Produção
Agroecológica. A participação dos educandos e educandas foi muito positiva
haja visto que grande parte dos mesmos vivenciam a Produção Agroecológica
em suas famílias.

7ª atividade - Recursos naturais: nesse dia, os estudantes puderam re-


fletir e debater sobre como seria a nossa vida se recursos tão imprescindíveis
como a água, por exemplo, deixassem de existir ou se tornassem de difícil
acesso para a maioria da população. Após esta reflexão, puderam concluir que
devemos transformar as nossas atitudes desde já, para garantirmos um futuro

Volume II 439
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

no qual possamos viver com mais harmonia na relação homem-natureza/recur-


sos naturais.

Este tema também foi discutido durante a semana na qual foi trabalhada
a cultura indígena, pois estes povos sempre viveram em perfeita harmonia
com a natureza e nos deixaram um legado muito importante, não somente
na cultura, mas também no que diz respeito ao manejo correto dos recursos
naturais.

A preocupação com o meio ambiente é um tema abordado durante todo


o ano, porém, foi na Semana do Meio Ambiente que compartilhamos nosso
trabalho com o restante da escola através da aula do Clube de Ciências. Todos
os estudantes da escola foram estimulados a considerar os problemas rela-
cionados à falta dos recursos naturais mais comumente associados ao nosso
dia a dia. Os alunos escolheram fotos e gravuras de diferentes situações e em
seguida, puderam relacionar com algum dos principais recursos naturais uti-
lizados pelo ser humano: ÁGUA, AR, SOLO E VEGETAÇÃO.

Esta atividade mais prática e concreta foi extremamente significativa,


pois em várias situações retratadas pelos desenhos, as crianças puderam con-
cluir que todos aqueles recursos naturais mostrados nas fotos e gravuras, são
igualmente necessários e que a natureza está toda conectada, onde nós, seres
humanos, não devemos interferir em seu equilíbrio.

Após a montagem coletiva de um mural, os alunos sortearam alguns


enigmas relacionados ao assunto e levaram para a turma a fim de debater e
solucionar. Nosso objetivo é ajudar na formação de futuros cidadãos cons-
cientes, responsáveis e principalmente, comprometidos com a redução da de-
sigualdade social e dos impactos ambientais.

Volume II 440
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Conclusão

As crianças que vivem no campo têm o direito a uma educação diferente


das que vivem na cidade. Portanto, se faz necessário elaborar atividades que
são da realidade dos educandos de uma escola do campo, extrapolar a noção de
espaço geográfico e compreender as necessidades culturais, os direitos sociais
e a formação integral desses indivíduos, constituem uma forma de fazer a edu-
cação contextualizada.

Conhecer a história da escola e da localidade dos educandos estabelece


um vínculo e uma necessidade de cuidar e preservar essa caminhada. Saber de
onde viemos, valoriza as raízes desta comunidade do campo que consegue per-
sistir com seus sonhos e objetivos.

A escola EMEF Rui Barbosa ao incorporar o seu território ao currículo


escolar, oportuniza uma educação de forma integral ao qual valoriza e dá senti-
do à vida dos educandos e comunidade. A prática pedagógica da escola também
muda, o ensino fragmentado passa a ser substituído pela interdisciplinaridade
entre os conteúdos, retirando as fronteiras entre as áreas do conhecimento.

Estas atividades que ultrapassaram os muros da escola e que valorizaram


a cultura e conhecimento local e a sabedoria popular da história desta comuni-
dade não somente traz para dentro da escola o valor desta região como também
estimulou os educandos desta escola e se sentirem pertencente a esta realidade,
criando vínculos e afeto pela realidade que os cercam.

Permitir uma educação que valorize os saberes locais, que traz a comuni-
dade para dentro da escola e que consiga alinhar e vincular esses conhecimen-
tos aos conhecimentos científicos revela uma educação para a formação inte-
gral dos indivíduos, uma educação que servirá a vida dos sujeitos envolvidos
neste contexto.

Volume II 441
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Volume II 442
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

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Resumo: Esta escrita tem como objetivo descrever as atividades do Clube de Ciên-
cias Saberes do Campo, de uma escola do/no campo, em Nova Santa Rita/RS. Apre-
senta-se todo o percurso didático das suas atividades, durante quatro meses, baseado
no eixo temático “agroecologia”. No decorrer de suas atividades, buscou-se dialogar
sobre a história da escola e da comunidade, bem como observar o território educativo
em que está inserida a escola, como também apresentar a proposta da agroecologia
para a agricultura local e os seus benefícios para o meio ambiente e seus sujeitos.
Percebeu-se pelos relatos das atividades que a escola trabalha a partir de uma edu-
cação contextualizada, que parte do território educativo dos educandos e valoriza os
saberes locais. Essa forma de trabalho conduz os alunos a realizarem um trabalho de
Ensino de Ciências de forma interdisciplinar, relacionando os conhecimentos empíri-
cos da comunidade com os conhecimentos científicos utilizados na escola, construin-
do saberes para vida dessas crianças.

Palavras-chave: educação do campo; práticas do clube de ciências; território edu-


cativo.

Abstract: This paper aims to describe the activities of the Science Club “Saberes do
Campo” from a rural school in Nova Santa Rita/RS. It presents the whole didactic
course of its activities, during four months, based on the thematic axis “agroecol-
ogy”. During its activities, we tried to talk about the history of the school and the
community, as well as observe the educational territory in which the school belong,
and present the proposal of agroecology for local agriculture and its benefits for the
environment and its subjects. The reports of the activities showed that the school
works on the basis of a contextualized education, which starts from the educational
territory of the students and values local knowledge. This way of working leads stu-
dents to perform an interdisciplinary science teaching work, relating the empirical
knowledge of the community with the scientific knowledge used in school, building
knowledge for the life of these children.

Keywords: rural education; science club experiences; educational territory.

Volume II 444
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

SOBRE OS ORGANIZADORES

José Vicente Lima Robaina


Pós-Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS); Doutor em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos
(UNISINOS); Mestre em Educação – UFRGS; Graduado em Licenciatura
Curta em Ciências e Licenciatura Plena em Química pela Pontifícia Univer-
sidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS); Professor do Departamento
de Ensino e Currículo da Faculdade de Educação, do curso de Educação do
Campo: licenciatura em Ciências da Natureza e professor do Programa de
Pós-Graduação em Educação em Ciências - UFRGS/Campus Porto Alegre.
Coordenador do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e
Ciências da Natureza (GPEEC NATUREZA), certificado na CAPES e na
UFRGS.

Viviane de Almeida Lima


Licenciada em Química, Mestre em Educação (UPF), Doutora em Edu-
cação em Ciências (UFRGS). Professora da Universidade Federal da
Fronteira Sul (UFFS) Campus Erechim/RS do Curso Interdisciplinar em
Educação do Campo – Ciências da Natureza- Licenciatura. É vice-líder do
INTERAÇÃO - Rede de estudos e pesquisas sobre interdisciplinaridade na
educação - FURG/UFFS.

Renan de Almeida Barbosa


Doutorando e Mestre no Programa de Pós-Graduação em Educação em
Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com
período de intercâmbio (“sanduíche”) na Eberhard Karls Universität Tü-
bingen, associado do departamento Didaktik der Biologie e sob supervisão
do prof. dr. Christoph Randler. Licenciado em Ciências Biológicas pela
Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). Membro do Gru-
po de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências da Natureza
(GPEEC-Natureza). Área de pesquisa: Ensino de Ciências e Biologia com
ênfase na Educação Ambiental.

Volume II 445
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Rafael Scheffer Pacheco


Possui graduação em Química pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul (2012), Mestrado em Educação em Ciências e Matemática pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2017), doutorando
em Educação em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Possui experiência na área da Indústria Química e em educação
com ênfase em meio ambiente e uso de novas tecnologias na escola, atuando
principalmente nos seguintes temas: TIC, Ambientes virtuais, aprendizagem
colaborativa, meio ambiente e controvérsias sociocientíficas.
E-mail: prof.rafaelscheffer@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3207-2925
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5899089801053652

Daniela Alves da Silva


Professora temporária do Estado no Rio Grande do Sul. Doutoranda em
Educação em Ciências - UFRGS. Mestra em Educação em Ciências - UFR-
GS. Graduada em Licenciatura em Educação do Campo/Ciências da Na-
tureza - UFRGS. Pós-Graduada em Educação Infantil - FADE. Membro
do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências da
Natureza - UFRGS. Extensionista no Programa de Extensão Clubes de Ci-
ências do Campo - UFRGS. Associada a ABRAPEC (Associação Brasileira
de Pesquisa em Educação em Ciências).
E-mail:danielasilva.ufgrs@gmail.com

Volume II 446
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

SOBRE OS/AS AUTORES/AS

Aline Guterres Ferreira


Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências: Química
da Vida e Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Mes-
tra em Extensão Rural e Especialista em Educação Ambiental pela Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM); Licenciada em Educação do Campo - Ciências da
Natureza - UFRGS e Educação Profissional (UFSM); Zootecnista (UFSM); Área
de Pesquisa: Educação do Campo, Agroecologia, Centros Educativos Familiares de
Formação por Alternância (CEFFA).

Ana Paula Santellano de Oliveira


Doutoranda e Mestra no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências:
Química da Vida e Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFR-
GS); Especialista em Educação Ambiental - SENAC em Porto Alegre/RS. Licencia-
da em Ciências Biológicas pela Universidade da Região da Campanha (URCAMP)
na cidade de São Gabriel/RS; Tutora no Curso de especialização Ciência é 10; Área
de pesquisa: Educação básica, Práticas docente, Ensino de Ciências, Interdisciplina-
ridade, Formação de Professores.

Andressa Luana Moreira Rodrigues


Mestra no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências pela Universida-
de Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em Supervisão Escolar na
Uniasselvi. Graduação em Pedagogia pela La Salle. Professora da Prefeitura Nova
Santa Rita, desde 2012, de séries iniciais. Área de pesquisa: Educação do Campo,
Clube die Ciências com enfoque no Currículo de Ciências e Territorialidade.

Andriara Lima de Oliveira


Pós-Graduação Lato Sensu: Gestão Escolar (Administração, Supervisão, Orientação
e Inspeção) - Centro de Ensino Superior Dom Alberto LTDA. Pós- Graduação
Lato Sensu em nível de Especialização em Orientação Educacional- Faculdade De
Educação São Luís. Graduação em Geografia pela Universidade Estadual Paulista
Júlio de Castilho de Mesquita Filho (UNESP). Ensino médio/ Magistério-Escola
Josué de Castro.

Volume II 447
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Andréia Lisandra Lussani


Graduada em Licenciatura Plena em Química pelo Centro Universitário La Sal-
le - Canoas (2007), Graduada em Licenciatura Plena em Ciências Biológicas pelo
Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIASSELVI (2019), Especialização em
Física para a Educação Básica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
- UFRGS (2011), Especialização em Educação Ambiental pela Universidade Fede-
ral do Rio Grande - FURG (2015), Supervisão Escolar pela Centro Universitário
Leonardo da Vinci - UNIASSELVI (2016). Mestrado Profissional em Docência
para Ciências, Tecnologias, Engenharia e Matemática (PPGSTEM), ofertado pela
UERGS - Unidade em Guaíba, estado do Rio Grande do Sul, 2022. Docente do
Governo do Estado do Rio Grande do Sul na Educação Básica (Fundamental e Mé-
dio) nas disciplinas de Ciências, Biologia e Química na Escola Estadual de Ensino
Médio Jardim Planalto (2005-2017). Atualmente docente das Prefeituras Municipais
de Ensino de Esteio e Cachoeirinha com atuação no Centro Municipal de Educação
Básica Oswaldo Aranha (Esteio R/S) e na Escola Ivo Antônio Rech (Cachoeirinha
R/S). Tem experiência na área de Ciências - Ensino Fundamental; Química, Física
e Biologia – Ensino Médio.

Arlei Antonio Castro


Graduação em Ciências Biológicas no Centro Universitário Leonardo da Vinci. Ma-
gistério - Escola Josué de Castro. Especialização em Segurança Pública (UFRGS).
Pós-Graduando Educação do Campo - Faculeste.

Cátia Barcelos
Pós-Graduação em Supervisão e Orientação Escolar. Possui Graduação em Ciên-
cias Biológicas pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). Professora da Pre-
feitura Nova Santa Rita/RS, desde 2001, de séries iniciais e da Prefeitura de Canoas/
RS, desde 2008.

Camila Franceschi da Silva


Graduada em Licenciatura em Ciências - Habilitação: Biologia pela Universidade
Luterana do Brasil - ULBRA (2009), Bacharel em Ciências Biológicas pela Univer-
sidade Luterana do Brasil - ULBRA (2012), Especialização em Educação Ambien-
tal pela Universidade Federal do Rio Grande - FURG(2015), Especialização em
Ciência é Dez pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS (2022),
Supervisão Educacional pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci - UNIAS-
SELVI (2018), Orientação Educacional pelo Centro Universitário Leonardo da Vin-
ci- UNIASSELVI (2018), Especialização em Gestão Escolar pela Universidade Po-
sitivo - POSITIVO (2019). Atualmente docente na Prefeitura Municipal de Esteio/
RS (24 horas) na Escola Municipal de Educação Básica Santo Inácio e Prefeitura de
Gravataí / RS (20 horas) na Escola Municipal de Ensino Fundamental Rosa Maria
com experiência na área da Educação como professora de Ciências nos anos finais
do ensino fundamental. Participa do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação
do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC) da UFRGS desde 2021. Mestranda da
UFRGS 01/2023.

Volume II 448
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Camila Simone da Silva

Daniela Alves da Silva


Professora temporária do Estado no Rio Grande do Sul. Doutoranda em Educação
em Ciências - UFRGS. Mestra em Educação em Ciências - UFRGS. Graduada em
Licenciatura em Educação do Campo/Ciências da Natureza - UFRGS. Pós-Gradu-
ada em Educação Infantil - FADE. Membro do Grupo de Pesquisa e Estudos em
Educação do Campo e Ciências da Natureza - UFRGS. Extensionista no Programa
de Extensão Clubes de Ciências do Campo - UFRGS. Associada a ABRAPEC (As-
sociação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências).
E-mail:danielasilva.ufgrs@gmail.com

Daniela Vieira Costa Menezes


Professora da Rede Municipal de Ensino de Novo Hamburgo/RS; Doutoranda em
Educação em Ciências (PPGECi/UFRGS); Mestra em Ambiente e Sustentabilidade
(PPGAS/UERGS); Especialista em Formação Continuada (IFSul Pelotas), em Tec-
nologias da Informação aplicadas à Educação (UFSM), e em Educação Ambiental
(FURG); Licenciada em Pedagogia (UFRGS).
E-mail: daniela.vieira.costa@gmail.com

Edimar Fonseca da Fonseca


Pós-Doutorando em Ensino de Ciências e Matemática pela Universidade Estadual
de Ponta Grossa (UEPG) Doutor em Educação em Ciências pela Universidade Fe-
deral do Rio Grande do Sul (UFRGS). Graduado em Licenciatura Plena em Mate-
mática (2011) e Licenciatura em Ciências Exatas (2013), Especialista em Educacao
de Jovens e Adultos (2014) e Mestre em Ensino de Ciências (2016). Docente da
rede pública municipal de Caçapava do Sul.
E-mail: fonseca.edimar@gmail.com
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5729116307379138

Eduardo Pastorio
Doutorando em Educação em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS). Graduado em Licenciatura Plena em Geografia (2012), Especialis-
ta em Gestão Educacional (2019) e Mestre em Geografia (2015) pela Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM). Docente da rede pública estadual do Rio Grande
do Sul e da rede pública municipal de São Gabriel/RS. Integrante do Grupo de Pes-
quisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências da Natureza da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (GPEEC Natureza/UFRGS). E-mail: eduardopas-
torio@hotmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2342-7851 Lattes: https://
lattes.cnpq.br/5748360963106965

Volume II 449
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Estela Elisalde Toledo


Graduanda em Licenciatura em Pedagogia (UFRGS). Tecnóloga em Gestão da
Qualidade (Fadergs). E-mail: estela2112@gmail.com.

Eulália Doleski Fraga de Moraes


Pós Graduação em Psicopedagogia na Faculdade de Educação São Luís. Graduação
em Ciências Biológicas pelo Centro Universitário La Salle (UNILASALLE). Ensino
Médio/Magistério - Colégio Maria Auxiliadora.

Felipe de Carvalho César


Mestrando do curso de Pós-Graduação em Formação Docente Para Ciências, Tec-
nologias, Engenharias e Matemática da Universidade Estadual do Rio Grande do
Sul (PPGSTEM - UERGS). Possui licenciatura em Ciências Biológicas pelo Centro
Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI), 2ª licenciatura em Matemática
pela Universidade Pitágoras Unopar Anhanguera (UNOPAR), Especialista em Ensi-
no de Ciências – Anos Finais do Ensino Fundamental “Ciência é Dez” pela Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Especialista em Ciências da Natu-
reza, Suas Tecnologias e o Mundo de Trabalho pela Universidade Federal do Piauí
(UFPI); também especializado em Supervisão Educacional; Docência no Ensino
Superior; Educação a Distância: Gestão e Tutoria, todos pelo Centro Universitário
Leonardo da Vinci (UNIASSELVI). Atualmente é professor da rede Municipal de
Educação de Eldorado do Sul (SMEC), exercendo o cargo de Professor de Ciências
Naturais – Séries Finais desde 2017.
E-mail: felipe-cesar@uergs.edu.br
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5939-4812

Greice de Souza

Heidi Fernanda Bertotti


Doutoranda e Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências:
Química da vida e da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2021).
Especialista em Tecnologias Educacionais para a Prática Docente no Ensino da
Saúde na Escola pela FIOCRUZ (2019). Professora de Ciências nos anos finais do
Ensino Fundamental na Rede Municipal de Porto Alegre. Área de pesquisa: Ensino
Fundamental, Ensino de Ciências e Alfabetização e Letramento Científico.

Izalina de Vargas Oliva

Volume II 450
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Janaina da Rosa Pereira


Pós-graduação em Psicopedagogia Institucional e Interdisciplinaridade na Univer-
sidade Luterana do Brasil-Graduação em Pedagógica/Orientação Educacional e
disciplinas pedagógica do Ensino Médio- Universidade Luterana do Brasil. Ensino
médio/Magistério- Centro Educacional La Salle.

Jeferson Rosa Soares


Pós-doutorado em andamento em Educação em Ciências: Química da vida e da
saúde (UFRGS), Doutor em Educação em Ciências: Química da vida e da saúde
(UFRGS). Integrante do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e
Ciências da Natureza. Mestre em Educação Ambiental pela Universidade Federal
do Rio Grande e Especialista em Educação em Ciências – Universidade Federal do
Pampa. Graduado no Curso Superior de Tecnologia em Gestão Ambiental pela
Universidade Norte do Paraná. E-mail: josoares77@gmail.com

José Vicente Lima Robaina


Pós-Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFR-
GS); Doutor em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISI-
NOS); Mestre em Educação – UFRGS; Graduado em Licenciatura Curta em Ciên-
cias e Licenciatura Plena em Química pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul (PUCRS); Professor do Departamento de Ensino e Currículo da
Faculdade de Educação, do curso de Educação do Campo: licenciatura em Ciências
da Natureza e professor do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências
- UFRGS/Campus Porto Alegre. Coordenador do Grupo de Pesquisa e Estudos em
Educação do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC NATUREZA), certificado na
CAPES e na UFRGS.

Laura Schmidt Soares


Psicóloga da Educação do Município de Guarujá do Sul/SC. Discente de Espe-
cialização em Psicologia Educacional em andamento pela Faculdade Porto União.
E-mail: laura0308laura@gmail.com

Lia Heberlê de Almeida


Mestra e doutoranda Educação em Ciências pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS). Docente da rede pública municipal de São Gabriel/RS.
Graduada em Licenciatura Plena em Pedagogia (2010) pela Universidade da Re-
gião da Campanha (URCAMP). Especialista em Tecnologias da Informação e da
Comunicação Aplicadas à Educação (2012) e em Mídias na Educação (2015) pela
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Integra o Grupo de Pesquisa e Estu-
dos em Educação do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC Natureza – UFRGS).
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9551-6883. E-mail: lia_ha@hotmail.com.

Volume II 451
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Marcus Eduardo M. Ribeiro


Professor de Química e Doutor em Educação em Ciências e Matemática. Professor
do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul) e professor permanente do PPGECE
(FURG), PPGQ (UFPel) e PPGECi (UFRGS). Presidente da Sociedade Brasileira
de Ensino de Química (SBEnQ).

Maria da Conceição do Monte Soares


Professora licenciada em Educação do Campo - Ciências da Natureza pela Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Integrante do Grupo de Pesquisa
e Estudos em Educação do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC Natureza) na
UFRGS.

Mariana Paranhos
É bacharela em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS) (2017), especialista em Educação Ambiental pela Faculdade São Luís
(2020), mestre pelo Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências (UFRGS)
(2021), doutoranda no Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências (UFR-
GS), membro do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências
da Natureza e do Grupo de Pesquisa RICA - Redes, Informação, Conhecimento e
Aprendizagem da mesma instituição. Atualmente é servidora pública da UFRGS.

Milene Ferreira Miletto


Possui graduação em Ciências Biológicas Licenciatura Plena - URCAMP (2002) e
especialização em Educação com ênfase em Gestão na UFSM (2005) . Mestra em
Ensino de Ciências pela UNIPAMPA (2017) e doutora em Educação em Ciências
pelo Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências UFRGS (2022). Atu-
ação na educação básica das redes estadual e municipal em Caçapava do Sul-RS. .
Atualmente aluna de pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação
em Ciências na UFRGS e pesquisadora do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educa-
ção do Campo e Ciências da Natureza da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), RS. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7784-3936.
E-mail: seduc.mfmiletto@gmail.com

Rafael Scheffer Pacheco


Possui graduação em Química pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (2012), Mestrado em Educação em Ciências e Matemática pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2017), doutorando em Educação em
Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Possui expe-

Volume II 452
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

riência na área da Indústria Química e em educação com ênfase em meio ambiente


e uso de novas tecnologias na escola, atuando principalmente nos seguintes temas:
TIC, Ambientes virtuais, aprendizagem colaborativa, meio ambiente e controvérsias
sociocientíficas.
E-mail: prof.rafaelscheffer@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3207-2925
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5899089801053652

Regina Beatriz Leal Morgavi


Doutoranda em Educação em Ciências, Programa de Pós-Graduação (PPgCi)
na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Mestra em Educação
na mesma Universidade no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciên-
cias; Química da Vida e Saúde (PPGEC); Participante do Grupo de Pesquisa em
Educação do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC Natureza), Certificado pela
UFRGS e CAPES.

Renan de Almeida Barbosa


Doutorando e Mestre no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com período de inter-
câmbio (“sanduíche”) na Eberhard Karls Universität Tübingen, associado do de-
partamento Didaktik der Biologie e sob supervisão do prof. dr. Christoph Randler.
Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Mato Grosso do
Sul (UFMS). Membro do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e
Ciências da Natureza (GPEEC-Natureza). Área de pesquisa: Ensino de Ciências e
Biologia com ênfase na Educação Ambiental.

Renata Portugal Oliveira


Universidade Federal da Fronteira Sul/Campus Erechim. Doutoranda em Educa-
ção em Ciências (UFRGS). Mestre em Ensino de Ciências e Matemática (UFPEL).
Docente da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) Campus Erechim/RS.
Brasil.

Roniere dos Santos Fenner


Doutorado no Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências: Química da
Vida e da Saúde pela UFRGS – RS. Professor de química do Ensino Médio, pré-ves-
tibular e curso técnico em auxiliar de farmácia. Agente Educacional do Estado do
Rio Grande do Sul desde 1994-2015. Coordenador o Setor de Recursos Humanos
da 32ª Coordenadoria Regional da Educação em São Luiz Gonzaga. Atualmente
Professor Adjunto A pela UFRGS, Campus Litoral Norte, no curso de Licenciatura
em Educação do Campo: Ciências da Natureza. Professor nível mestrado e douto-
rado do PPG Educação em Ciências na UFRGS.

Volume II 453
Debates em Educação em Ciências: desafios e possibilidade

Roselane Zordan Costella


Licenciada em Geografia, Mestra e Doutora na linha de pesquisa em ensino de Ge-
ografia (UFRGS). Professora no Programa de Pós-Graduação em Geografia (POS-
GEA/UFRGS). À frente da Coordenadoria das Licenciaturas da UFRGS/COORLI-
CEN, Gestão 2015-2017. Porto Alegre/RS. E-mail: professoracostella@gmail.com

Roberta Hoffmann Machado

Sabrina Silveira da Rosa


Doutoranda no Programa de Pós-graduação de Educação em Ciências pela Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestra pelo mesmo PPG na UFR-
GS. Pós-Graduação em Atividade Física Adaptada e Saúde – Universidade Gama
Filho. Possui Graduação em Educação Física pela Universidade do Vale do Rio dos
Sinos (UNISINOS). Professora da Prefeitura Nova Santa Rita/RS, desde 2003, de
séries iniciais e finais.

Sandra Mara Mezalira


Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências (PPGECi)
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e integrante do Grupo
de Pesquisa e Estudos em Educação do Campo e Ciências da Natureza (GPEEC-
-Natureza) na mesma instituição. Mestra em Educação nas Ciências - área de Biolo-
gia e Licenciada em Ciências - Habilitação em Biologia e Ciências pela Universidade
Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ). Atua como pro-
fessora de Ciências da rede estadual de ensino em Sinop/MT.
E-mail: sandmezal@gmail.com.

Sinara München
Licenciada em Química, mestre e doutora em Educação em Ciências pela Univer-
sidade Federal de Santa Maria (UFSM). É professora da Universidade Federal da
Fronteira Sul (UFFS) Campus Erechim/RS, e no Programa de Pós-Graduação em
Ensino de Ciências (PPGEC) Campus Cerro Largo/RS. É líder do grupo de pesqui-
sa Investigações em Ciência, Educação e Tecnologia (GICET) da UFFS.

Volume II 454
Vera Maria Treis Trindade
Professora Titular do Departamento de Bioquímica, Instituto de Ciências Básicas
da Saúde (ICBS), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Bolsista
Capes de Pós-Doutorado no Departamento de Ciências Biológicas, Faculdad de
Ciências Químicas, Universidad Nacional de Córdoba, Argentina; Doutora em Bio-
química pela Universidade Federal do Paraná, Mestre em Ciências Biológicas-Bio-
química-UFRGS; Graduada em Farmácia -UFRGS; Orientadora do Programa de
Pós-Graduação em Ciências Biológicas-Bioquímica e do Programa de Pós-Gradu-
ação em Educação em Ciências do ICBS-UFRGS; Coordenadora do Grupo de
Pesquisa de Criação de Objetos Educacionais em Bioquímica (GCOEB); Editora
da Revista de Ensino de Bioquímica (http://www.bioquimica.org.br).

Viviane de Almeida Lima


Licenciada em Química, Mestre em Educação (UPF), Doutora em Educação em
Ciências (UFRGS). Professora da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)
Campus Erechim/RS do Curso Interdisciplinar em Educação do Campo – Ciências
da Natureza- Licenciatura. É vice-líder do INTERAÇÃO - Rede de estudos e pes-
quisas sobre INTERdisciplinaridade na educAÇÃO - FURG/UFFS.
www.arcoeditores.com
contato@arcoeditores.com
(55)99723-4952

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