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Disfagia e Alzheimer

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122

CARACTERÍSTICAS DE MASTIGAÇÃO E DEGLUTIÇÃO


NA DOENÇA DE ALZHEIMER

Characteristics of mastication and swallowing in Alzheimer’s disease


Thaíza Estrela Tavares (1), Cecília Maria Resende Gonçalves de Carvalho (2)

RESUMO

Objetivos: comparar as características de mastigação e deglutição em idosos com e sem Doença de


Alzheimer (DA). Método: estudo comparativo desenvolvido com 86 idosos, na faixa etária entre 60 e
93 anos, de ambos os sexos, distribuídos nos grupos controle (sem DA, n=43) e experimental (com
DA, n=43). A função cognitiva e o estadiamento da DA foram avaliados por meio da aplicação da CDR
(Clinical Dementia Rating). Para a caracterização da mastigação e deglutição foi aplicado o proto-
colo de avaliação miofuncional orofacial. Resultados: as características de mastigação e deglutição
sofreram variações importantes quando comparados os dois grupos. Houve diferença significante
para movimentos mandibulares, reflexo de deglutição, deglutições múltiplas, presença de resíduos
e dificuldade para ingerir comprimidos. Conclusões: as características de mastigação e deglutição,
de maneira geral, sofrem maior comprometimento nos idosos com DA, quando comparados a idosos
saudáveis.

DESCRITORES: Idosos; Doença de Alzheimer; Mastigação; Deglutição

„„ INTRODUÇÃO crescente incidência de doenças crônico-degene-


rativas, dentre elas, a Doença de Alzheimer (DA)².
O envelhecimento da população mundial é Assim, surge a preocupação da comunidade cien-
incontestável. No Brasil, o crescimento da popu- tífica com a qualidade de vida da população idosa,
lação geriátrica constitui um grande desafio para criando novas demandas por intervenção especiali-
a saúde pública. Enquanto a população brasileira zada, como é o caso da Fonoaudiologia.
crescerá 3,22 vezes até o ano 2025, o segmento A Doença de Alzheimer é uma enfermidade
acima de 65 anos aumentará 8,9 vezes, e o acima neurodegenerativa progressiva que causa perda da
de 80 anos, 15,6 vezes. Projeções indicam que memória e altera funções intelectuais superiores,
em 2025, ocupará o 6º lugar entre os países com levando, no curso de sua evolução, a uma situação
mais idosos no mundo¹. A transição demográfica de incapacidade e total dependência. Em virtude de
vem sendo acompanhada por uma transição epide- sua incidência e natureza devastadoras, caracte-
miológica, que tem como principal característica a riza um importante problema de saúde pública em
todo o mundo³. Por ser uma doença grave e ainda
sem cura, gera múltiplas demandas e altos custos
(1)
Fonoaudióloga da Fundação Municipal de Saúde; Profes- financeiros, o que representa um novo desafio
sora da Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tec- para o poder público, instituições, profissionais de
nológicas do Piauí – NOVAFAPI, Teresina, Piauí, Brasil;
Especialização em Motricidade Oral pela Universidade
saúde, aliás, para todos. A DA caracteriza-se por
Federal de Pernambuco-UFPE; Mestrado em Ciências e degeneração que acomete inicialmente a formação
Saúde pela Universidade Federal do Piauí-UFPI. hipocampal, o centro de memória de curto prazo.
(2)
Nutricionista; Professora Associada I da Universidade Posteriormente, atinge áreas corticais associativas,
Federal do Piauí; Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e havendo relativa preservação dos córtices primá-
Extensão Universitária para a Terceira Idade da Universi-
dade Federal do Piauí – UFPI, Teresina, Piauí, Brasil; Dou-
rios. Compromete a memória, afeta a orientação,
torado em Ciência da Nutrição pela Universidade Estadual atenção, linguagem, capacidade para resolver
de Campinas. problemas e habilidades para desempenhar as
Conflito de interesses: inexistente atividades da vida diária4.

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Mastigação e deglutição no Alzheimer 123
A evolução clínica da DA está dividida em três úmidos, pastosos e líquidos, assim como um
estágios: inicial/leve, moderado e tardio/severo. aumento na quantidade de sal e/ou açúcar, decor-
As alterações fonoaudiológicas estão inicial- rentes da diminuição do paladar ¹º,¹¹.
mente associadas a dificuldades na comunicação, Os movimentos mastigatórios ficam mais lentos
evoluindo progressivamente para níveis mais e incoordenados, aumentando o tempo de preparo
elevados de dependência de uma forma geral, e o controle do bolo alimentar, consequentemente,
incluindo as atividades de vida diária, especialmente surge a dificuldade para engolir, facilitando a ocor-
a alimentação, com dificuldade marcante na masti- rência de problemas digestivos e nutricionais
gação e deglutição. O doente torna-se totalmente nestes indivíduos ¹². Idosos saudáveis conseguem
dependente, especialmente para atividades de vida adaptar-se às modificações trazidas pelo envelheci-
diária, alimentação e higiene pessoal5, o que dete- mento, ficando apenas predispostos a fragilização.
riora completamente sua qualidade de vida. Apesar Entretanto, idosos já fragilizados por doenças
da caracterização específica de cada estágio, a crônico-degenerativas, como a DA, podem apre-
evolução clínica da doença, bem como as altera- sentar alteração no processo de deglutição, ficando
ções e dificuldades decorrentes, são únicas para mais propensos a desnutrição, desidratação e
cada indivíduo6. aspiração, sinais clássicos de disfagia ¹º. Pode-se
O idoso portador da DA tem seu estado nutri- enumerar uma série de sinais e sintomas indica-
cional afetado de forma drástica, possivelmente por tivos de anormalidades no idoso: xerostomia (boca
uma provável incapacidade de aceitação, masti- excessivamente seca) ou sialorréia (baba), dificul-
gação, deglutição e assimilação dos alimentos. A dade importante para mastigar e para manter o
perda de apetite, o desinteresse pela alimentação alimento na boca, movimentos repetitivos de língua
e a falta de consciência da importância da nutrição, e mandíbula durante a mastigação, dificuldade para
aumentam os riscos de desidratação e desnu- iniciar a deglutição, mudança na postura de cabeça
trição, influenciando no quadro de saúde geral7. As durante a deglutição, tosse e engasgos freqüentes.
doenças crônico-degenerativas geralmente afetam Também é comum a presença de refluxo nasal,
as necessidades orgânicas de proteínas e de asfixia freqüente e fadiga durante a alimentação,
calorias, podendo estar associadas à inapetência, restos de alimentos não percebidos após a deglu-
causada pela própria doença, por determinados tição, pigarro constante, halitose, febres freqüentes
medicamentos e por dificuldades de alimentação. e voz molhada durante a alimentação9.
Tais dificuldades vão desde falta de auxílio para Atualmente há o reconhecimento de que a adoção
oferecer as refeições, ausência de dentes, consis- de medidas de otimização, prevenção, reabilitação
tência alimentar de difícil deglutição ou não atrativa e manutenção são essenciais para a conquista de
ao paladar, entre outras. Desta forma, avaliações um envelhecimento saudável e melhoria da quali-
odontológicas, fonoaudiológicas e nutricionais dade de vida do indivíduo com DA. Neste contexto,
periódicas são fundamentais para prevenir a desnu- o conhecimento do estado de saúde em relação
trição. A evolução da DA aumenta a perda de peso, aos aspectos alimentares do idoso é importante
atuando como fator determinante de mortalidade para as políticas de saúde, pois auxilia os gestores
para esses casos8. na elaboração de estratégias específicas para essa
Muitas das alterações observadas no idoso população¹³. No Brasil, ainda há escassez de dados
interferem de forma negativa na sua alimentação, e, sobre as características de mastigação e deglu-
conseqüentemente, em sua qualidade de vida. As tição nos indivíduos com a DA. Logo, as informa-
alterações mais frequentemente descritas na litera- ções a respeito dessas questões poderão auxiliar
tura são: desgaste ou perda dos dentes, diminuição no desenho de estratégias de promoção da saúde
da força muscular, lentidão mastigatória, dimi- para a elaboração de programas de intervenção
nuição da produção de saliva, alteração na mucosa mais eficientes, melhorando a qualidade de vida da
e epitélio bucal e lingual, diminuição da percepção pessoa idosa e beneficiando o sistema de saúde. O
gustativa e olfativa, diminuição da capacidade para objetivo desta pesquisa foi comparar as caracterís-
deglutir, entre outras9. Quando há uma doença ticas das funções de mastigação e deglutição em
crônica em progresso, o quadro tende a agravar-se idosos com e sem a Doença de Alzheimer.
ainda mais.
As modificações estruturais e funcionais alteram „„ MÉTODO
o processo de mastigação e deglutição, modifi-
cando, inclusive, os hábitos alimentares. Algumas Foi realizado um estudo comparativo descritivo
ocorrem por orientações médicas, outras ocorrem sobre as características das funções de mastigação
espontaneamente como forma de adaptação. Há e deglutição em idosos com e sem a Doença de
um aumento pela preferência de alimentos moles, Alzheimer.

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124 Tavares TE, Carvalho CMRG

Os idosos foram alocados em dois grupos, deve ser classificada em: 0 (nenhuma alteração);
controle e experimental. Para o grupo controle 0,5 (demência questionável); 1 (demência leve); 2
foram selecionados idosos saudáveis, com idade (demência moderada) e 3 (demência grave), exceto
a partir de 60 anos, de ambos os sexos, partici- a categoria cuidados pessoais, que não tem o nível
pantes do “Programa Terceira Idade em Ação” 0,5. A categoria memória é considerada principal,
(PTIA) da Universidade Federal do Piauí (UFPI). A ou seja, com maior significado e as demais catego-
seleção do grupo experimental se deu da seguinte rias são secundárias 16 .
forma: idosos com diagnóstico clínico de Doença A classificação final da CDR é obtida pela análise
de Alzheimer, segundo os critérios do Ministério da dessas classificações por categorias, seguindo um
Saúde, regularmente cadastrados no “Programa conjunto de regras validadas17. Para se chegar à
de Medicamentos de Dispensação em Caráter classificação não há necessidade de notas de corte
Excepcional” do Ministério da Saúde, na cidade de estabelecidas pelo desempenho populacional,
Teresina-PI. pois os indivíduos são comparados ao seu próprio
O cálculo da amostra foi realizado tomando-se desempenho passado. Apresenta sensibilidade de
por base a população de idosos do Piauí (290.410 91,2% e especificidade de 100% e é usualmente
idosos)14 e do número de idosos com DA no estado, utilizada para classificar a gravidade da demência,
cadastrados no “Programa de Medicamentos de relacionando as perdas cognitivas com a habilidade
Dispensação em Caráter Excepcional” (1.123 nas atividades de vida diária18.
idosos com DA em outubro de 2008). Desta forma, A escala de CDR vem sendo mais utilizada nos
chegou-se ao valor de n (n=33). Foi adotado inter- programas e pesquisas no Brasil, por conseguir
valo de confiança de 95% e margem de erro de 2%. integrar aspectos cognitivos e comportamentais e
Ao valor inicial de n foram acrescidos 10 idosos em o quanto estes aspectos interferem nas atividades
cada grupo, perfazendo um total de 43 idosos para de vida diária18, sendo, inclusive, uma exigência do
cada grupo. “Programa de Medicamentos de Dispensação em
O estudo foi executado no período de julho de Caráter Excepcional” do Ministério da Saúde para a
2009 a fevereiro de 2010. Inicialmente, por meio de dispensação de medicamentos aos pacientes com
levantamento de endereço e telefone, realizou-se o Doença de Alzheimer19,20.
contato com a família e/ou responsável do paciente A caracterização das funções de mastigação e
para o esclarecimento da pesquisa e agendamento deglutição foi obtida a partir da aplicação de Proto-
da visita em domicílio para a execução da coleta de colo adaptado da Avaliação Miofuncional Orofa-
dados. cial da UNIFESP – Universidade Federal de São
Participaram do estudo indivíduos com idade Paulo – Escola Paulista de Medicina 21,22. Para a
igual ou superior a 60 anos, independente de raça avaliação da mastigação e deglutição foram utili-
ou sexo. O limite etário foi estabelecido em conso- zados alimentos nas consistências sólida (biscoito
nância com a Organização Mundial da Saúde15 que, tipo “água e sal”) e líquida (água).
nos países em desenvolvimento, classifica como Além das questões fonoaudiológicas especí-
idoso o adulto com 60 anos ou mais. Foram exclu- ficas, o protocolo consta ainda de dados pessoais
ídos do estudo os seguintes pacientes usuários dos pacientes, tais como idade, sexo, escolaridade,
de via alternativa de alimentação (sonda enteral, profissão, data do provável diagnóstico, quando
gastrostomia), além de portadores de outras positivo, e tratamentos realizados. Foi aplicado nos
doenças concomitantes que pudessem interferir idosos, com auxílio dos cuidadores, nos casos em
nos resultados (doenças neurodegenerativas em que os pacientes não possuíssem capacidade para
geral e depressão). responder as perguntas.
A função cognitiva dos idosos foi avaliada Inicialmente, foi realizada inspeção da dentição
com a aplicação da Escala de Avaliação Clínica e/ou próteses dos pacientes. Utilizou-se luvas de
da Demência (Clinical Dementia Rating – CDR), procedimento para a observação da cavidade oral
em ambos os grupos. A CDR é um dos princi- e, com o auxílio de espátula de madeira, verificou-
pais métodos para quantificar os diversos graus se a presença e o número total de dentes, uso de
de demência e seu estadiamento. O questionário prótese dentária e se esta era superior e/ou inferior,
contém 10 itens, sendo seis para o informante, total ou parcial.
referentes ao idoso em relação à memória, orien- Para a caracterização da mastigação, foram
tação, capacidade de julgamento e solução de observados os seguintes aspectos: restrição de
problemas, atividades domésticas e de lazer e consistências alimentares, tipo de corte do alimento,
cuidados pessoais; e quatro questões para o oclusão labial, velocidade, padrão mastigatório e
idoso: memória, orientação, juízo crítico e solução movimentos mandibulares predominantes. A masti-
de problemas. Cada uma dessas seis categorias gação fisiológica deve ocorrer da seguinte forma:

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Mastigação e deglutição no Alzheimer 125
corte do alimento com os incisivos, lábios ocluídos, tem-se a contração do músculo milohióideo, que
sem ruídos, com lateralização do alimento e padrão permite uma elevação maciça da língua e, então, o
bilateral e alternado e com movimentos rotatórios bolo é direcionado para a orofaringe. Nos indivíduos
de mandíbula21. A literatura relata diversos estudos normais, no momento em que a língua entra em
sobre a avaliação da velocidade de mastigação contato com o palato duro até a elevação do hióide,
baseados no tempo de mastigação de alimentos tem-se o início da fase faríngea e estas ações
de consistências variadas. Há relatos de correlação passam-se em um segundo21,23. A avaliação da
entre a duração da mastigação obtida na avaliação deglutição tem como padrão-ouro a Videofluoros-
com o cronômetro e a duração da mastigação copia da Deglutição. Entretanto, tal procedimento
obtida na avaliação por meio de Eletromiografia ainda é uma realidade distante no país, especial-
(EMG)23,24,25. Com o auxílio de um cronômetro, veri- mente no centro onde a pesquisa foi desenvolvida.
ficou-se o tempo de mastigação em segundos para Desta forma, a avaliação desta função foi realizada
a consistência sólida (biscoito tipo “água e sal”). Foi pela observação clínica. Considerou-se normal
considerado o período compreendido entre o corte a deglutição cujo reflexo foi iniciado cerca de 1
do alimento e o início da primeira deglutição, obser- segundo após a conclusão da mastigação, tendo
vada pela elevação da laringe, característica do como marco a elevação da laringe.
início da fase faríngea da deglutição, como manobra O Comitê de Ética em Pesquisa da Universi-
para proteção das vias aéreas24. Do tempo total, dade Federal do Piauí aprovou o projeto em seus
foi descontado 1 segundo relativo à fase oral. Foi aspectos éticos e metodológicos de acordo com
considerada normal a velocidade de mastigação as Diretrizes estabelecidas na Resolução 196/96 e
com duração semelhante ao tempo médio de masti- complementares do Conselho Nacional de Saúde,
gação dos grupos pesquisados. CAAE (Certificado de Apresentação para Apre-
A deglutição foi caracterizada a partir dos ciação Ética): 0197.0.045.000-08.
seguintes parâmetros: reflexo de deglutição,
Os participantes ou responsáveis assinaram
presença de deglutições múltiplas, auxílio de
um Termo de Consentimento Livre Esclarecido e
líquidos durante a deglutição, presença e frequência
descritivo da pesquisa ao qual foram submetidos
de engasgos e tosse, presença de resíduos alimen-
(Apêndice A), elaborado de acordo com a “Decla-
tares na cavidade oral e dificuldade em deglutir
ração de Helsinque III”, capítulo 50, parágrafos
comprimidos. Também foram questionados quanto
50.20/27.
a: perda de peso, mudança de dieta, tempo médio
gasto nas refeições e postura habitual durante a Os dados foram organizados em planilhas do
alimentação. A perda de peso dos idosos, apesar Programa Microsoft Excel, versão 10.0 XP, para a
de importante indicativo do estado nutricional, foi criação de um banco de dados e realização de uma
apenas questionada, tendo em vista a dificuldade análise descritiva das variáveis observadas nos
prática de pesagem no grupo de idosos portadores grupos estudados. Posteriormente, tais dados foram
de DA. exportados para o programa SPSS (versão 10.0 for
A deglutição, que pode ser iniciada consciente- Windows) para análise estatística dos resultados.
mente, deve ter duração média de 3 a 8 segundos, Foram utilizadas medidas de tendência central e de
destes apenas 1 segundo corresponde à fase oral. dispersão, como média e desvio padrão.
Após a preparação do bolo alimentar, este é levado As associações entre as variáveis foram testadas
para trás, pelo movimento ondulatório da língua, usando os testes t para amostras independentes e
tocando os pilares anteriores, desencadeando o Qui-quadrado. O teste t foi utilizado para verificar
reflexo propriamente dito21. A fase oral tem início se havia diferença estatística entre as variáveis
com a propulsão posterior da língua, cujo perímetro quantitativas. Na análise das variáveis possivel-
se mantém em contato com os rebordos alve­olares. mente inter-relacionadas, foi utilizado o coeficiente
Em seguida, a ponta da língua se eleva até o contato de correlação de Pearson. O teste Qui-quadrado foi
com a papila incisiva, seu corpo desliza contra empregado para verificar se havia associação entre
o palato duro e sua base se deprime. A cavidade as variáveis qualitativas. A diferença foi conside-
oral é fechada anteriormente pela aproximação dos rada significante quando p< 0,05 e o intervalo de
lábios e elevação da man­díbula. Nesse momento, confiança adotado foi de 95%.

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126 Tavares TE, Carvalho CMRG

Demência Demência Demência


Saudável Demência leve
questionável moderada grave
CDR 0 CDR 1
CDR 0,5 CDR 2 CDR 3

MEMÓRIA Sem perda de Esquecimento leve Perda de memória Perda de memória Perda de memória
memória, ou e consistente; moderada, mais grave; apenas grave; apenas
apenas lembrança parcial acentuada para material muito fragmentos
esquecimento de eventos; fatos recentes; o aprendido é retido; permanecem
discreto e “esquecimento déficit interfere materiais novos
inconsistente benigno” com atividades do são rapidamente
dia a dia perdidos

ORIENTAÇÃO Plenamente Plenamente Dificuldade Geralmente Orientação pessoal


orientado orientado moderada com as desorientado apenas
relações de tempo;
orientado no
espaço no exame,
mas pode ter
desorientação
geográfica em
outros locais

JULGAMENTO Resolve bem Leve Dificuldade Gravemente Incapaz de


E SOLUÇÃO DE problemas do dia a comprometimento moderada na comprometido para resolver problemas
PROBLEMAS dia, juízo crítico é na solução de solução de solução de ou de ter qualquer
bom em relação ao problemas, problemas, problemas, juízo crítico
desempenho semelhanças e semelhanças e semelhanças e
passado diferenças diferenças; diferenças. Juízo
julgamento social social geralmente
geralmente comprometido
mantido

ASSUNTOS NA Função Leve dificuldade Incapaz de Sem possibilidade Sem possibilidade


COMUNIDADE independente na nestas atividades funcionar de desempenho de desempenho
função habitual de independentement fora de casa. fora de casa.
trabalho, compras, e nestas atividades Parece Parece muito
negócios, finanças, embora ainda suficientemente doente para ser
e grupos sociais possa bem para ser levado a atividades
desempenhar levado a atividades fora de casa
algumas; pode fora de casa
parecer normal à
avaliação
superficial

LAR E Vida em casa, Vida em casa, Comprometimento Realiza as tarefas Sem qualquer
PASSATEMPOS passatempos, e passatempos, e leve, mas evidente mais simples. atividade
interesses interesses em casa; Interesses muito significativa em
intelectuais intelectuais abandono das limitados e pouco casa
mantidos levemente tarefas mais mantidos
afetados difíceis;
passatempos e
interesses mais
complicados são
também
abandonados

CUIDADOS Plenamente capaz Plenamente capaz Necessita Requer assistência Requer muito
PESSOAIS assistência no vestir e na auxílio nos
ocasional higiene cuidados pessoais.
Geralmente
incontinente

Fonte: Adaptado de MORRIS, 1993, p. 2413.

Figura 1 – Avaliação Clínica de Demência (Clincal Dementia Ratinga – CDR)

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Mastigação e deglutição no Alzheimer 127

PROTOCOLO DE AVALIAÇÃO MIOFUNCIONAL OROFACIAL

DATA: ­­______________________

I. DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
Nome:___________________________________________________________________________
Data de Nascimento:_______________________________________ Idade:___________________
Endereço:________________________________________________________________________
Telefone: ________________________________ Celular: _________________________________
Escolaridade: _____________________________________________________________________
Profissão: ________________________________________________________________________
Cuidador/responsável: ______________________________________________________________
Data do diagnóstico: _______________________________________________________________

II. TRATAMENTOS/ACOMPANHAMENTOS REALIZADOS


( ) Fono ( ) Neuro ( ) Nutrição ( ) Fisio ( ) Psicologia ( ) Psiquiatria
( ) Outro(s) _____________________ ______________________________

III. ESTRUTURAS DE MASTIGAÇÃO E DEGLUTIÇÃO


1. Dentição
( ) Presente ( ) Ausente
Prótese Dentária: ( ) Sim ( ) Não
( ) Total Superior ( ) Total Inferior ( ) Parcial Superior ( ) Parcial Inferior

2. Lábios
Postura: ( ) Ocluídos ( ) Abertos ( ) Entreabertos ( ) Dificuldade de Vedamento
Tônus: Superior ( ) Normal ( ) Aumentado ( ) Reduzido
Inferior ( ) Normal ( ) Aumentado ( ) Reduzido

3. Língua
Aspecto: ( ) Normal ( ) Alargada ( ) Marcas Laterais
Postura: ( ) Superior ( ) Inferior ( ) Posição Interdental
Tônus: ( ) Normal ( ) Aumentado ( ) Reduzido

4. Bochechas
Aspecto: ( ) Simétricas ( )Assimétricas ( ) Marcas Internas
Postura: ( ) Volumosas ( ) Caídas
Tônus: ( ) Normal ( ) Aumentado ( ) Reduzido

IV. ASPECTOS GERAIS DE ALIMENTAÇÃO


1. Tempo médio para cada refeição
( ) Até 30 minutos ( ) Mais de 30 minutos

2. Mudança recente de dieta


( ) Sim ( ) Não

3. Perda de peso
( ) Sim ( ) Não

4. Postura durante a alimentação


( ) Sentada ( ) Inclinada

5. Auxílio de Líquido
( ) Sim ( ) Não

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128 Tavares TE, Carvalho CMRG

6. Restrição de alguma consistência ( ) Sim ( ) Não


( ) Sólido ( ) Pastoso ( ) Líquido

7. Usa a mastigação
( ) Sim ( ) Não

V. AVALIAÇÃO FUNCIONAL DA MASTIGAÇÃO E DEGLUTIÇÃO


1. Mastigação
Alimento Utilizado: _________________________________________________________________
Características:
1.1.1 Corte
( ) Corte do alimento manualmente
( ) Incisão do alimento com incisivos centrais
( ) Incisão do alimento com caninos e/ou pré-molares
1.1.2.Oclusão labial
( ) Sim ( ) Não
1.1.3Velocidade
( ) Normal ( ) Rápida ( ) Lenta
1.1.4 Movimentos mastigatórios:
( ) Unilateral ( ) Bilateral ( ) Bilateral alternado
1.1.5 Movimentos mandibulares
( ) Movimentos Verticais de Mandíbula
( ) Movimentos Rotatórios de Mandíbula

2. Deglutição
Alimentos Utilizados: _______________________________________________________________
Características
2.1.1 Reflexo de deglutição
( ) Normal ( ) Alterado
( ) Lentificado ( ) Reflexo ausente
2.1.2 Deglutições múltiplas para limpeza total
( ) Sim ( ) Não
2.1.3 Engasgos
( ) Sim ( ) Não
Consistência(s) _________________________
( ) Freqüentes ( ) Esporádicos
2.1.4 Tosse
( ) Sim ( ) Não
Consistência(s) _________________________
( ) Freqüente ( ) Esporádica
2.1.5 Resíduos alimentares na cavidade oral após a deglutição
( ) Sim ( ) Não
2.1.6 Dificuldade para Deglutir Comprimidos
( ) Sim ( ) Não

Figura 2 – Protocolo de avaliação miofuncional orofacial

„„ RESULTADOS Doença de Alzheimer). Na tabela 1 está represen-


tada a distribuição dos idosos, segundo as suas
Foram estudados 86 idosos, de ambos os características dentro de cada grupo.
sexos, avaliados no domicílio, divididos em dois Ao avaliar as condições de mastigação e
grupos, sendo 43 do grupo controle (sem a Doença deglutição nos grupos pesquisados, é importante
de Alzheimer) e 43 do grupo experimental (com a observar alguns fatores que poderiam influenciar a

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Mastigação e deglutição no Alzheimer 129
Tabela 1 – Caracterização dos idosos do estudo, segundo os grupos pesquisados. Teresina, PI,
Brasil, 2009

Controle Experimental Total


Variáveis
N % N % N %
60-69 22 51,1 03 6,9 25 29
Idade (anos) 70-79 14 32,5 17 39,5 31 36
80 e mais 07 16,2 23 53,4 30 34,9
Feminino 33 76,7 28 65,1 61 70,9
Sexo
Masculino 10 23,2 15 34,9 25 29
Analfabeto 03 07 15 35 18 20,9
Fundamental 17 39,5 18 41,8 35 40,7
Escolaridade
Médio 16 37,2 07 16,2 23 26,7
Superior 07 16,2 03 07 10 11,6
0 39 90,7 00 00 39 45,3
1 00 00 14 32,5 14 16,2
CDR 2 00 00 10 23,2 10 11,6
3 00 00 11 25,5 11 12,8
Outros 04 9,3 08 18,6 12 14
Total 43 50 43 50 86 100

alimentação de uma forma geral, interferindo direta No que diz respeito aos aspectos gerais de
ou indiretamente na execução de tais funções, alimentação, foram observados: tempo médio de
como aspectos gerais de alimentação, dentição e/ refeição, mudança de dieta, perda de peso, postura,
ou uso de prótese dentária e tônus muscular dos auxílio de líquido, restrição de consistência e uso da
idosos. mastigação, conforme a Tabela 2.

Tabela 2 – Aspectos gerais de alimentação nos grupos controle e experimental. Teresina, PI, Brasil,
2009

Controle Experimental Total


Variáveis
N % N % N %
Tempo médio de até 30 min. 42 97,6 28 65,1 70 81,4
refeição mais de 30 min. 01 2,4 15 34,8 16 18,6
Mudança de dieta sim 03 6,9 12 27,9 15 17,4
não 40 93,1 31 72,1 71 82,6
Perda de peso sim 04 9,3 23 53,4 27 31,4
não 39 90,7 20 46,6 59 68,6
Postura sentada 43 100 38 88,4 81 94,2
inclinada 00 00 05 11,6 05 5,8
Auxílio de líquido sim 29 67,5 32 74,4 61 71
não 14 32,5 11 25,6 25 29
Restrição de sim 00 00 13 30,2 13 15,2
consistência não 43 100 30 69,8 73 84,8
Uso da mastigação sim 43 100 36 83,7 79 91,9
não 00 00 07 16,3 07 8,1
Total 43 50 43 50 86 100

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130 Tavares TE, Carvalho CMRG

A análise da dentição dos idosos, quanto ao 10,5 ± 11,6 dentes para o grupo controle e 5,9 ±
número de dentes, evidenciou uma média de 8,2 ± 8,7 dentes para o grupo experimental. A Tabela 3
10,4 dentes. Ao se observar a quantidade de dentes mostra a caracterização dos grupos segundo a
por grupo, encontra-se os seguintes valores médios: presença de dentes e/ou prótese dentária.

Tabela 3 – Caracterização dos grupos segundo a presença de dentes e/ou prótese dentária. Teresina,
PI, Brasil, 2009

Controle Experimental Total


Dentição
N % N % N %
Dentes ausente 16 37,2 23 53,4 39 45,3
presente 27 62,8 20 46,6 47 54,7
Prótese superior total/parcial 34 79,1 24 55,9 58 67,5
não usa 09 20,1 19 44,2 28 32,5
Prótese inferior total/parcial 29 67,5 17 38,7 46 53,5
não usa 14 32,5 26 60,4 40 46,5
Total 43 50 43 50 86 100

A Tabela 4 mostra a distribuição percentual mastigatórias: corte do alimento, oclusão labial,


das características de lábios, língua e bochechas, velocidade de mastigação, movimentos mastigató-
quando avaliado o tônus muscular. rios e movimentos mandibulares.
As características de mastigação nos grupos A caracterização da deglutição nos dois grupos
estudados estão apresentadas na Tabela 5. Do foi realizada de acordo com os seguintes crité-
grupo total estudado (n=86), 8,1% (n=7) dos idosos rios: reflexo de deglutição, deglutições múltiplas,
não realizavam mastigação, utilizando apenas engasgos, tosse, resíduos alimentares na cavidade
alimentos nas consistências pastosa e líquida. oral após deglutir e dificuldade para deglutir compri-
Desta forma, para a mastigação, foram conside- midos. Os valores encontrados estão dispostos na
rados apenas 36 idosos no grupo experimental. Tabela 6.
Foram avaliadas as seguintes características

Tabela 4 – Características de lábios, língua e bochechas quanto ao tônus muscular por grupo
pesquisado. Teresina, PI, Brasil, 2009

Controle Experimental Total


Variáveis
N % N % N %
normal 29 67,4 15 34,9 44 51,1
Lábios
alterado 14 32,5 28 65,1 42 48,8
normal 31 72,1 16 37,2 47 54,6
Língua
alterado 12 27,9 27 62,8 39 45,3
normal 24 55,8 09 20,9 33 38,4
Bochechas
alterado 19 44,2 34 79,0 53 61,6
Total 43 50 43 50 86 100

Rev. CEFAC. 2012 Jan-Fev; 14(1):122-137


Mastigação e deglutição no Alzheimer 131
Tabela 5 – Características de mastigação nos grupos controle e experimental. Teresina, PI, BRASIL,
2009

Controle Experimental Total


Variáveis Características
N % N % N %
normal 88,3 38 55,5 20 73,4 58
Corte
alterado 11,6 05 44,4 16 26,6 21
Oclusão sim 83,7 36 72,2 26 78,5 62
labial não 16,3 07 27,7 10 21,5 17
normal 69,7 30 22,2 08 48,1 38
Velocidade
alterada 30,3 13 77,8 28 51,9 41
Movimento normal 37,2 16 22,2 08 30,3 24
mastigatório alterado 62,8 27 77,8 28 69,7 55
Movimento normal 53,5 23 22,2 08 39,2 31
mandibular alterado 46,5 20 77,8 28 60,8 48
Total 54,4 43 45,6 36 100 79

Tabela 6 – Características de deglutição nos grupos pesquisados. Teresina, PI, Brasil, 2009

Controle Experimental Total


Variáveis Características
N % N % N %
normal 88,4 38 53,5 23 70,9 61
Deglutição
alterada 11,6 05 46,5 20 29,1 25
Deglutições sim 20,9 09 44,2 19 32,5 28
múltiplas não 79,1 34 55,8 24 67,5 58
sim 41,8 18 65,1 28 53,5 46
Engasgos
não 58,1 25 34,9 15 46,5 40
sim 30,2 13 60,5 26 45,3 39
Tosse
não 69,8 30 39,5 17 54,7 47
sim 20,9 09 55,8 24 38,3 33
Resíduos
não 79,1 34 44,2 19 61,7 53
Dificuldade sim 25,5 11 53,5 23 39,5 34
comprimidos não 74,5 32 46,5 20 60,5 52
Total 50 43 50 43 100 86

„„ DISCUSSÃO (p<0,05) para mudança de dieta, postura e uso da


mastigação.
Estudos afirmam que as mudanças nos hábitos Não foi possível observar presença ou ausência
alimentares surgem gradativamente, como forma de associação para tempo médio de refeição, perda
de adaptação às situações de perdas com que de peso e restrição de consistências alimentares
os idosos se deparam, tais como a diminuição da entre os grupos, quando aplicado o teste de qui-
saúde orgânica e a integridade do sistema estoma- quadrado. A distribuição de quadrado só pode ser
tognático26, 27. adequadamente usada para um tamanho mínimo
O presente estudo comparou as caracterís- de 5 indivíduos por casilas (células). Quando a
ticas das funções de mastigação e deglutição entre mesma não é atingida, não é possível identificar
idosos com e sem a Doença de Alzheimer. A obser- presença ou ausência da associação, necessi-
vação dos aspectos gerais de alimentação entre os tando, portanto, estudos posteriores com tamanho
grupos evidenciou diferença estatística significante superior de indivíduos.

Rev. CEFAC. 2012 Jan-Fev; 14(1):122-137


132 Tavares TE, Carvalho CMRG

Não foi encontrada associação (p>0,05) entre propenso à fadiga muscular por conta do envelhe-
o hábito de ingerir líquidos entre os dois grupos. cimento e hipotonia das fibras dos músculos da
Cerca de 71% dos idosos pesquisados tem o hábito mastigação30. Tal função também pode ser afetada
de ingerir líquido durante a alimentação, de tal pela ausência de dentes, problemas periodontais,
modo que não há qualquer diferenciação estatística atrofia dos músculos mastigatórios, uso de prótese
entre controle e experimento. Em estudo realizado dentária e diminuição da produção de saliva nos
sobre a relação entre perdas dentárias e queixas idosos31.
de mastigação, deglutição e fala em indivíduos A quantidade reduzida de dentes foi observada
adultos, a ingestão de líquido foi mencionada como nos dois grupos, sendo encontrada diferença esta-
um hábito adquirido, sem relação com outras alte- tística significante (p<0,05) para a quantidade de
rações presentes28. dentes entre os grupos, com média de 10,5 ± 11,6
Não foi possível mostrar a relação direta entre dentes para o grupo controle e 5,9 ± 8,7 dentes
CDR e tempo médio de refeição. Contudo, fica para o grupo experimental. Entretanto, não houve
evidente que na CDR 0, a grande maioria dos idosos diferença quanto ao uso de prótese total/parcial,
situa-se no menor tempo (97,4%), e, à medida que superior e/ou inferior.
aumenta o valor de CDR, e, portanto, o grau de DA, O edentulismo observado na pesquisa é carac-
diminui o número de idosos com tempo médio de terística frequente na maioria dos idosos brasileiros,
refeição de até 30 minutos (CDR 1 e 2 com 68% e agravando-se ainda mais na presença de doenças
CDR 3 com 54,5%). associadas25. A perda parcial e/ou total dos dentes é
A perda de peso também foi questionada entre inclusive, aceita pela sociedade em geral, como algo
os grupos pesquisados, sendo encontrada em normal ou natural do envelhecimento. Entretanto, a
mais da metade dos idosos do grupo experimental perda de um dente apenas pode gerar um dese-
(53,4%) e em menos de 10% do grupo controle. O quilíbrio nas relações oclusais entre os restantes,
hipocampo e a amígdala, afetados na DA, podem ocasionando efeitos negativos na realização das
causar perda de peso e alterações no comporta- funções estomatognáticas, principalmente as obser-
mento alimentar. A redução do peso também pode vadas no presente estudo25. De acordo com estudo
estar associada a: autonegligência, esquecimento realizado em 2004, indivíduos com perda dentária
de se alimentar, alterações no olfato e no paladar, tinham 2,7 vezes mais propensão à dificuldade de
perda de habilidades, aumento do gasto energético, mastigação que as pessoas sem perdas, encon-
além de descuido no trato com os doentes26. trando associação significante entre menor número
Com o envelhecimento a prevalência de doenças de pares dentários na cavidade oral e maior proba-
crônicas aumenta, podendo colaborar para o surgi- bilidade em apresentar dificuldade mastigatória32.
mento de anorexia, aumento das necessidades Há várias referências na literatura sobre a perda
nutricionais e consequente carência de vitaminas e múltipla dos dentes e consequente substituição
micronutrientes27. A DA tem como achados clínicos dos alimentos duros por aqueles de menor consis-
freqüentes a perda de peso e caquexia, especial- tência, ou seja, aqueles mais fáceis de engolir sem
mente nos primeiros estágios, mesmo com dieta mastigar, o que pode comprometer, a longo prazo,
adequada7. o estado nutricional do indivíduo devido ao baixo
Diversos estudos, em vários países, têm demons- valor nutricional desses alimentos. Além disso, a
trado a alta prevalência de distúrbios nutricionais na perda dentária contribui para o padrão unilateral de
população idosa. Estudo comparativo realizado em mastigação, uma vez que os indivíduos tendem a
Taiwan, com pacientes portadores de DA e indiví- mastigar do lado de maior número de dentes 33-34.
duos sadios, avaliou fatores que poderiam interferir Em estudo realizado com indivíduos de 42 a 67
na mudança ponderal dos idosos. Mais da metade anos, usuários de prótese dentária total e/ou parcial
dos pacientes portadores de DA desenvolveram foram encontradas várias alterações mastigatórias,
perda ponderal, além de serem significantemente como no corte do alimento e indefinição de tipo
mais magros que os sadios. Apresentaram estado mastigatório35.
nutricional inadequado, apesar de a ingestão ener- Vários trabalhos têm sido relacionados à quali-
gética não ter sido significantemente diferente dade de vida e de saúde geral entre os idosos com
entre os dois grupos. Ao final do estudo, associou- a possibilidade de consumo de bons nutrientes que,
se a perda ponderal em idosos com Doença de em geral, exigem a presença de dentes naturais
Alzheimer à diminuição do apetite29. sadios ou de próteses dentárias bem adaptadas.
Foi encontrada ausência de mastigação em Estas, quando não possuem boas condições de
16,3% dos idosos do grupo experimental com funcionamento e trituração dos alimentos, causam
diferença estatística significante entre os grupos modificações nos hábitos alimentares, podendo
(p<0,05). À medida que se envelhece, fica-se mais levar ao enfraquecimento do organismo, aumento

Rev. CEFAC. 2012 Jan-Fev; 14(1):122-137


Mastigação e deglutição no Alzheimer 133
dos problemas digestivos por uma ineficiência na siva do uso do corte adequado (com incisivos) à
formação do bolo alimentar. A opção por dietas medida que aumenta o valor da CDR.
mais pastosas/macias, para superar problemas Apenas 50,7% dos idosos apresentaram velo-
orais, em médio prazo, pode agravar o estado nutri- cidade de mastigação dentro dos parâmetros de
cional de idosos 32,33. normalidade. No grupo estudado, foi possível iden-
A redução do tônus muscular pode relacionar- tificar que este padrão, quando visto por grau de
se à diminuição da massa muscular e a mudança CDR, apresentou diminuição percentual importante
morfológica que diminui as unidades motoras ativas à medida que a DA evolui. Em estudo realizado
com o avanço da idade23. para avaliar a alimentação e deglutição de idosos
O tônus muscular pode ser caracterizado como com DA leve (CDR 1) e moderada (CDR 2), foi
normal, aumentado ou reduzido21. Foi verificada observada manipulação lenta do bolo alimentar, ou
alteração de tônus muscular nos dois grupos em seja, velocidade alterada de mastigação, em 50%
todas as estruturas pesquisadas (lábios, língua e dos indivíduos avaliados e necessidade de auxílio
bochechas), com predomínio de tônus reduzido, para cortar o alimento e leva-lo à boca em alguns
porém, não foi possível identificar presença ou idosos39.
ausência de associação neste caso. Entretanto, Em relação aos movimentos mastigatórios, não
ficou evidente, nos idosos pesquisados, a diferença houve diferença estatística significante (p>0,05)
percentual do tônus muscular entre os grupos, com entre os grupos experimental e controle. Os movi-
redução do tônus muscular maior no grupo expe- mentos mastigatórios foram considerados normais
rimental e, neste grupo, fica clara tal diminuição para padrão bilateral alternado e alterados para os
conforme o grau de CDR do idoso avança. padrões unilateral e bilateral simultâneo. O predo-
mínio de alterações nos dois grupos (62,8% no
Estudos apontam a maior propensão à fadiga
controle e 77,8% no experimental) pode ser expli-
muscular por conta do envelhecimento e hipotonia
cado pelas características dentárias e musculares
das fibras dos músculos da mastigação. A compo-
encontradas.
sição muscular sofre modificações, com decrés-
cimo do número de unidades motoras, caracteri- Na avaliação dos movimentos mandibulares, foi
zando-as com menos fibras de rápida contração considerado normal o movimento rotatório e alte-
restantes, resultando em diminuição do tônus das rado o movimento vertical de mandíbula. Foi encon-
trada diferença estatística significante para movi-
estruturas 27,32.
mentos mandibulares (p<0,05) entre os grupos.
Quando avaliadas as características de masti-
Apesar de não haver consenso na literatura
gação e deglutição em idosos, é importante lembrar
sobre o padrão predominante de mastigação em
que sofrem modificações estruturais e funcionais.
idosos, sabe-se que há predominância dos padrões
Em idosos saudáveis, tais alterações são vistas
alterados de mastigação (unilateral e bilateral simul-
como adaptações do organismo às condições
tâneo). Em relação aos movimentos mandibulares,
presentes, sem prejuízos significantes na execução
as pesquisas apontam para o predomínio do padrão
das funções. Fala-se em mastigação e deglutição
alterado em idosos. Tais características são conse-
adaptadas, havendo, inclusive, o termo presbifagia
quência do próprio envelhecimento e da redução
para identificar a deglutição do idoso. Porém, na
do tônus muscular das estruturas envolvidas, difi-
presença de doenças associadas, o quadro tende
cultando a coordenação da lateralização do bolo
a se agravar e o organismo pode perder sua capa-
alimentar e dos próprios movimentos mandibulares
cidade de adaptação, levando a complicações no necessários aos padrões adequados (mastigação
processo alimentar¹º. bilateral alternada com movimentos rotatórios de
Não foi possível identificar presença ou ausência mandíbula) 27,39.
de associação para corte, oclusão labial e veloci- Os processos fisiológicos associados ao enve-
dade de mastigação. Entretanto, ao se observar lhecimento alteram vários parâmetros da deglu-
os percentuais encontrados para estas variáveis, tição, porém, não há evidências que as mudanças
especialmente para corte e velocidade mastiga- relacionadas à idade tenham efeito adverso em
tória, identifica-se diferenças consideráveis, com idosos saudáveis. Nos estágios mais avançados
predomínio de características alteradas no grupo das doenças neurológicas, a disfagia é um sintoma
experimental (corte com caninos/pré-molares ou comumente observado. Nas demências, especial-
corte manual ao invés corte com incisivos, padrão mente no Alzheimer, são observadas alterações na
considerado normal; velocidade rápida ou lentifi- deglutição decorrentes do déficit cognitivo significa-
cada, com predomínio desta última). tivo, que altera os hábitos de alimentação, tornando
No grupo pesquisado, considerando-se o valor os pacientes dependentes, antes mesmo do apare-
da CDR, foi possível verificar diminuição progres- cimento dos sintomas de disfagia39.

Rev. CEFAC. 2012 Jan-Fev; 14(1):122-137


134 Tavares TE, Carvalho CMRG

A caracterização da deglutição nos dois grupos Vários estudos investigaram a dinâmica da


foi realizada de acordo com os seguintes aspectos: deglutição com diversas consistências alimen-
reflexo de deglutição, deglutições múltiplas, tares em portadores de DA. Foram encontradas as
engasgos, tosse, presença de resíduos na cavi- seguintes alterações: reflexo de deglutição lentifi-
dade oral após deglutir e dificuldade para deglutir cado, aumento do tempo total da deglutição para
comprimidos. Foram encontradas diferenças esta- líquidos, penetração/aspiração para líquidos, ajuda
tísticas significantes (p<0,05) quando comparados de líquido para ingerir sólidos e engasgos/tosses
entre os grupos com e sem DA as seguintes vari- com líquidos e sólidos39,40.
áveis: reflexo de deglutição, deglutições múltiplas, No Canadá, após revisão de prontuários de
presença de resíduos e dificuldade para ingerir 47 idosos com demência foram verificadas alte-
comprimidos. rações significantes na deglutição de metade dos
O reflexo de deglutição apresentou-se alterado pacientes: mastigação ausente, esquecimento da
em 11,6% (n=5) dos idosos do grupo controle. deglutição, dificuldade com líquidos e presença de
Entretanto, no grupo experimental, o percentual tosse/engasgos41.
de deglutição alterada chegou a 46,5% (n=20). No presente estudo, encontrou-se valores
Aliada ao reflexo de deglutição, foi encontrado o bem distintos quando se compara o percentual de
artifício de deglutições múltiplas em 20,9% (n=9) do presença de resíduos na cavidade oral pós-deglu-
grupo controle e 44,2% (n=19) do experimental. A tição entre os grupos, variando de 20,5% na CDR
presença de engasgos esporádicos ou frequentes 0 a 72,7% na CDR 3. Fato semelhante ocorre com
durante a alimentação foi observada em 41,8% a dificuldade de deglutir comprimidos, variando de
(n=18) do controle; já no grupo experimental, a 25,6% na CDR 0 a 90,9% na CDR 3. Apesar de
frequência de engasgos foi de 65,1% (n=28). não ser possível identificar presença ou ausência
A ocorrência de tosse esporádica ou frequente de diferença dentro do grupo experimental, devido
apareceu na seguinte proporção: 30,2% (n=13) ao tamanho da amostra, os percentuais apresen-
e 60,5% (n=26) para os grupos controle e experi- tados apontam para um declínio progressivo das
mental, respectivamente. características de deglutição paralelo à evolução da
Sobre a ocorrência de resíduos na cavidade oral patologia.
após a deglutição, foi encontrada em 20,9% (n=9) Em estudo da alimentação e deglutição de
dos idosos do grupo controle ao passo que, no grupo idosos com doença de Alzheimer leve e moderada,
experimental, a proporção chegou a 55,8% (n=24). queixas como engasgos/tosses com alimentos
A dificuldade na ingestão de cápsulas/comprimidos sólidos e líquidos e dificuldades para engolir
foi referida por 25,5% (n=11) dos idosos do grupo comprimidos, foram relatadas principalmente pelos
controle e por 53,5% (n=23) do grupo experimental. cuidadores dos idosos com demência moderada.
Não foi possível verificar diferença estatística Os autores sugeriram que as fases oral e faríngea
para engasgos e tosse entre os grupos pesqui- da deglutição estão alteradas desde o início da
sados. Entretanto, ao se observar a distribuição por Doença de Alzheimer42.
grau de CDR, o percentual de engasgos e tosse Apesar de não ser possível identificar presença
freqüentes (5,1% a 72,7% e 5,1% a 63,7%, respec- ou ausência de diferença dentro do grupo experi-
tivamente) eleva-se à medida que a doença evolui. mental, devido ao tamanho da amostra, os percen-
A tosse é um reflexo protetivo cuja presença tuais apresentados apontam para um declínio
indica a ocorrência de penetração e/ou aspiração progressivo das características de deglutição para-
laríngea. Entre as várias causas da aspiração, lelo à evolução da DA.
destacam-se as doenças neurológicas, princi- Em pesquisa que avaliou 25 indivíduos com
palmente em idosos. O envelhecimento e suas doença de Alzheimer de grau moderado e grave
consequências, cirurgias de cabeça e pescoço, por meio da videofluoroscopia, as análises estatís-
depressão, demência, uso de fármacos, particular- ticas evidenciaram que as alterações da deglutição
mente em idosos, também favorecem a aspiração estavam associadas com o grau da demência. Foi
silenciosa42. detectada tendência a aspiração proporcional ao
Diversos trabalhos relatam que as alterações grau de demência 43.
da deglutição estão associadas com ao grau da Ao investigar as funções relacionadas a alimen-
demência1,10,39,43. tação e deglutição de idosos entre 70 e 91 anos com
Na avaliação da deglutição realizada em estudo demência, a maioria dos indivíduos pesquisados
com idosos, os indivíduos conseguiam compensar apresentou dificuldades relacionadas ao momento
algumas alterações encontradas nas fases oral e da alimentação, como: inabilidade no preparo do
faríngea da deglutição, como deglutição lentificada, alimento, manuseio de utensílios, na higiene oral,
deglutindo repetidas vezes até a limpeza total39. além de dependência em relação ao cuidador39.

Rev. CEFAC. 2012 Jan-Fev; 14(1):122-137


Mastigação e deglutição no Alzheimer 135
A demência gera uma série de mudanças nos idosos com Doença de Alzheimer, quando compa-
hábitos dos idosos em geral, inclusive os alimen- rados a idosos saudáveis. Foram encontradas dife-
tares: perversão do apetite, mudança da preferência renças importantes entre os grupos, demonstrando
dos alimentos, redução ou aumento da ingestão oral, degeneração concomitante ao avanço da doença.
uso inadequado de utensílios e incapacidade para Ainda são escassos os estudos sobre as dificul-
expressar de forma adequada os sinais de sede, dades alimentares na Doença de Alzheimer, bem
fome e saciedade. Com a progressão da doença, o
como suas conseqüências para a saúde nutricional
nível de dependência aumenta, chegando ao ponto
e geral do idoso. Desta forma, é imprescindível a
de, em geral, necessitarem do auxílio de outros
realização de mais estudos relacionados a este
para realizar tarefas antes facilmente executadas,
tema. É preciso aprofundar os conhecimentos
sendo comum o auxílio de sugestões verbais e
acerca da realização das funções de mastigação
assistência parcial durante atividades de vida diária,
como a alimentação. e deglutição na Doença de Alzheimer, inclusive
em cada estágio da doença, buscando relações
entre estas e o estado nutricional dos indivíduos,
„„ CONCLUSÃO com vistas à promoção da saúde e otimização
dos programas de intervenção, garantindo, assim,
As características de mastigação e deglutição, de melhor qualidade de vida para a pessoa idosa, seja
maneira geral, sofrem maior comprometimento nos ela saudável ou portadora da Doença de Alzheimer.

ABSTRACT

Purpose: to compare the characteristics of chewing and swallowing in elderly with and without AD.
Method: a comparative study carried out with 86 elderly people, aged between 60 and 93 years, of both
genders, distributed in control (without AD, n = 43) and experimental (AD, n = 43) groups. Cognitive
function and staging of AD were evaluated by applying the CDR (Clinical Dementia Rating). For
characterizing chewing and swallowing we applied the miofunctional assessment protocol. Results:
the characteristics of chewing and swallowing have varied considerably when comparing both groups.
There was a significant difference as for mandible movements, swallowing reflex, swallowing multiple
residues and difficulty to swallow tablets. Conclusions: the characteristics of chewing and swallowing,
in general, suffer more in AD patients when compared to healthy elderly.

KEYWORDS: Aged; Alzheimer Disease; Mastication; Deglutition

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http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011005000123
RECEBIDO EM: 11/08/2010
ACEITO EM: 27/04/2011

Endereço para correspondência:


Thaíza Estrela Tavares
R. Valdemar Martins, 3333, ap. 101 –
Morada do Sol – Teresina – PI
CEP: 64055-280
E-mail: testrela@zipmail.com.br
tetavares@novafapi.com.br

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