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Meus Resumos

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I.

Introdução
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O direito das obrigações insere-se, no Direito civil, sendo o maior livro, do código civil, em que os sujeitos
se inserem numa situação de paridade.
No fundo, o direito das obrigações regula o fenómeno da cooperação económica entre os homens na vida
em sociedade.
Obrigação (397º CC)
Em sentido amplo: abrange todo e qualquer vínculo jurídico entre duas pessoas, como sejam os deveres
jurídicos, os ónus e as sujeições
→ Dever jurídico – necessidade do sujeito passivo (devedor) realizar um comportamento a que tem
direito o titular do direito subjetivo, ou seja, o sujeito ativo (credor)
→ Ónus – necessidade de adotar uma conduta em proveito próprio, portanto, de realizar certo
comportamento para beneficiar de uma situação
→ Sujeição – necessidade de suportar as consequências jurídicas correspondentes ao exercício de um
direito potestativo. Não há possibilidade de violação da sujeição
Em sentido estrito: vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa está adstrita em face a outra à adoção
de um certo comportamento, visando a satisfação de um interesse digno de proteção legal
▪ “certo comportamento” – prestação (398º CC), conduta que o devedor deve adotar em proveito do
credor, pode ser uma conduta positiva (ex: ação ou atividade) ou negativa (abstenção ou omissão).
As partes determinam livremente o conteúdo da prestação, ou pode resultar de disposições legais

A relação obrigacional pode ser simples ou complexa. É simples quando compreende uma pessoa o direito
subjetivo atribuído a uma pessoa e o dever jurídico recai sobre outra (ex: compra e venda de um livro - entrega do
livro e o pagamento de um preço: esgota-se o dever de pagar o preço e o direito de exigir a entrega do livro). É
complexa quando o conjunto de direitos e deveres nascem do mesmo facto jurídico
Pode ser autónoma ou não autónoma. É autónoma quando se constituem diretamente, originalmente,
entre dois sujeitos jurídicos sem que entre estes preexista qualquer outra relação jurídica conexa com a obrigação
(não assentam num vínculo preexistente). É não autónoma aquela que surge a partir de uma relação jurídica
anteriormente existente entre os sujeitos (assentam num vínculo preexistente)
Pode ser patrimonial ou não patrimonial. As primeiras têm por objeto uma prestação avaliável em dinheiro,
já as segundas não são avaliáveis em dinheiro.
Distinguem-se de direitos reais, pois enquanto estes são direitos absolutos, inerentes a uma coisa e seguem
a regra da tipicidade, os direitos de crédito são direitos relativos, dirigidos contra pessoas através de uma prestação
e obedecem ao princípio de tipicidade.

II. Princípios fundamentais do Direito das Obrigações

­ Princípio da autonomia privada e o negócio jurídico


Na autonomia privada há possibilidade de alguém estabelecer os efeitos jurídicos que se irão
repercutir na sua esfera. Para tal, depender da utilização de um instrumento, o negócio jurídico.
Negócios jurídicos são atos jurídicos que regulam uma relação jurídica. Estes podem ser unilaterais,
contratos ou bilaterais.

Dentro da autonomia privada, temos a liberdade contratual (405º do CC), que se traduz na possibilidade
conferida pela ordem jurídica a cada uma das partes de se autorregular, através de um acordo mútuo, as
suas relações para com a outra.

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Por sua vez, há liberdade de estipulação do conteúdo dos contratos e liberdade de celebração ou conclusão.
Restrições à liberdade contratual:
· Obrigação de celebração do contrato – dever jurídico de contratar, não sendo permitida
a recusa de contratar da parte a quem incumbe tal dever
(ex: Contrato de seguro obrigatório da responsabilidade civil automóvel, no qual o dever
de contratar coexiste com a liberdade de escolha da contraparte)
· Na liberdade de estipulação – uma parte não é livre de determinar o conteúdo do
contrato, por forma a evitar que tal liberdade seja exercida em prejuízo da parte
economicamente mais fraca
· Proibição de celebrar certos contratos com determinadas pessoas
(ex: 579°; 876°; 953° CC)
· Sujeição de determinados contratos ao assentimento de terceiro (ex: 1682° - A do CC)
ou de uma entidade pública (ex: 1889° ou 1938° CC)

­ Princípio do ressarcimento de danos


Sempre que existe uma razão de justiça, da qual resulte que o dano deva ser suportado por outrem,
que não o lesado, deve ser aquele e não este a suportar esse dano (562°)
A transferência do dano do lesado para outrem opera-se mediante a constituição de uma obrigação de
indemnização. Assim, a responsabilidade civil (483º e ss) é considerada por lei através de três títulos de
imputação de danos:
˖ Imputação por culpa – conduta ilícita e censurável do agente, que justifica ele suportar os prejuízos
resultantes dessa conduta
˖ Imputação pelo risco – aquele que tira proveito de uma situação deve também suportar os prejuízos
dela
˖ Imputação pelo sacrifício – situação em que a lei permite, em homenagem a um valor superior, que
seja sacrificado um bem ou direito pertencente a outrem, atribuindo, porém, uma indemnização
ao lesado como compensação desse sacrifício

­ Princípio da restituição do enriquecimento injustificado


Ação destinada a reagir contra alguém que enriqueça pelo seu ilícito e à custa de outrem
473º, nº1 – tendo que restituir aquilo com que injustamente se locupletou

­ Princípio da boa-fé
Boa-fé subjetiva – elemento intencional individual, exprimindo um estado ou situação de espírito
que envolve o convencimento ou consciência de se ter um comportamento em conformidade com o direito
(1260º) (ignorância de estar a lesar direitos alheios)
Boa-fé objetiva – princípio norteador da conduta das partes, um padrão objetivo de comportamento
e, assim, um critério normativo da sua navegação (regras de conduta que o agente deve adotar, sendo
honesta, correta e leal).
Neste domínio, a boa-fé está presente em todo o ciclo evolutivo da vida da relação:
˖ Na formação ou surgimento do vínculo obrigacional – responsabilidade pré-contratual (227°, 1);
integração do negócio (239°)
˖ Vicissitudes da relação obrigacional – cumprimento da obrigação e no exercício do crédito (762°, 2)
˖ Ilegitimidade de certas posições jurídicas – proibição do abuso do direito (334°); alteração ilegítima
dos contratos (437°, 1)
˖ Extinção do vínculo obrigacional – responsabilidade pós-contratual (457º). A alteração dos
contratos pode levar à resolução do mesmo ou a sua modificação

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Limites à boa-fé: acontece quando a aplicação da norma legal conduz a resultados manifestamente
contrários às suas exigências mais elementares. Sacrifício da boa-fé

­ Princípio da responsabilidade patrimonial


Possibilidade de o credor, em caso de não cumprimento, executar o património do devedor para
obter a satisfação dos seus créditos (817°)
Limites à responsabilidade patrimonial:
▪ Nem todos os bens do devedor estão sujeitos à execução, tal como os bens não suscetíveis de
penhora; e situação da separação de património
▪ A execução pode incidir sobre bens de terceiro – 818° (bens de terceiro satisfazem a dívida)

III. Elementos constitutivos da obrigação

Sujeitos; Objeto; Facto jurídico; Garantias

1. Sujeitos

O vínculo obrigacional estabelece-se entre um sujeito passivo (devedor) e um sujeito ativo (credor). Assim,
o credor é o titular do interesse que o dever de prestar visa satisfazer; e o devedor é sobre o qual recai o dever de
efetuar a prestação
Este, pode ser singular ou plural, em qualquer dos lados. Podendo também tratar-se de pessoas singulares
ou coletivas.
Os sujeitos devem estar perfeitamente individualizados e determinados no momento da constituição da
relação jurídica obrigacional. Porém a lei contempla uma exceção (511º/459º CC), admite-se que o credor não esteja
identificado, no caso de obrigação de sujeito ativo indeterminado.
A existência de dois sujeitos é imprescindível, não significando que os sujeitos da relação não possam alterar.
Logo o regime das obrigações, tanto pode ser originário, como superveniente (sucessão mortis causa ou por
transmissão do direito ou do débito).

2. Objeto

É o meio que satisfaz o interesse do credor, que lhe proporciona a vantagem a que ele tem direito (prestação
devida ao credor).
Note-se que o objeto não é o objeto sobre a qual a prestação incide, mas sim a própria prestação, tudo aquilo
sobre o que incidem os poderes do titular ativo.
Este, pode ser classificado como mediato ou imediato:
˖ Objeto imediato da obrigação é a prestação, podendo ser positiva (dar ou entregar) ou negativa (não fazer)
˖ Objeto mediato da obrigação pode ser uma coisa ou tarefa a ser feita (positiva) ou vedada (negativa)
O objeto deve ser lícito, possível, determinado ou determinável.

Modalidades da prestação (397º)


o Prestação de coisa e prestação de facto
Prestação de coisa – o objeto consiste na entrega de uma coisa (ex: quando alguém compra um bem, o
vendedor obriga-se a entregá-lo – 879, b)).
Esta pode entregar uma de três modalidades: dar, prestar ou restituir.
Distingue-se entre prestação de coisa presente (tem por objeto coisas presentes) e prestação de coisa futura
(211º e 399º - ao tempo da declaração negocial as coisas não estão ao poder do disponente; ex: lavrador
vende vinho da sua próxima colheita)

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Prestação de facto – o objeto consiste em realizar uma conduta de outra ordem (ex: alguém se obrigar a
cuidar de um jardim – 1154º).
Admitem uma classificação entre prestações de facto positivo (facere), que tem por objeto uma ação, ou
negativo (non facere) que tem por objeto uma omissão.
Subdividem-se entre prestação de facto material (adoção de certo conjunto de atos puramente materiais,
ex: reparar ou não reparar uma viatura) ou de facto jurídico (adoção de certo comportamento destinado à
produção de efeitos jurídicos, ex: celebrar ou não um contrato)

o Prestações fungíveis e prestações infungíveis


Prestações fungíveis – a prestação deve ser realizada por outrem que não o devedor, podendo assim este
fazer-se substituir no cumprimento (767º, nº1)
Ex: um advogado encarregado de um processo pode fazer-se substituir por um colega na realização do
julgamento, sem que o cliente possa obstar
Prestações infungíveis – só o devedor pode realizar a prestação, não sendo permitida a sua realização por
terceiro (nº2)
Ex: realizar uma intervenção cirúrgica

o Prestações instantâneas e prestações duradouras


Prestações instantâneas – a execução ocorre num único momento. Subdividem-se em prestações
instantâneas integrais (realizadas de uma só vez, ex: entrega da coisa pelo vendedor) e prestações
instantâneas fracionadas (o seu montante global é dividido em várias frações, ex: venda de prestações –
934º)
Prestações duradouras – prolongam-se no tempo. Distinguem-se em prestações duradouras continuadas
(não sofrem interrupções, ex: o fornecedor de energia elétrica); ou prestações duradouras periódicas
(sucessivamente repetida, renovando-se, ex: rendas, salários)

o Prestação de resultado e prestação de meios


Prestação de resultado – o devedor vincula-se a obter um resultado determinado, respondendo por
incumprimento se esse resultado não fosse obtido
Ex: o transportador está obrigado a entregar a coisa transportada num lugar e tempo determinado
Prestação de meios – o devedor está obrigado a atuar com diligência para que um resultado seja obtido
Ex: o médico está obrigado a desenvolver os seus melhores esforços para que a cura do doente seja obtida

o Prestação determinadas e prestações indeterminadas


Prestações determinadas – encontram-se completamente determinadas
Prestações indeterminadas – a determinação da prestação ainda não se encontra realizada, pelo que essa
determinação terá que ocorrer até ao momento do cumprimento

Requisitos legais da prestação:


▪ 398º - as partes têm a faculdade de determinar o conteúdo da prestação dentro dos limites da lei
▪ Possibilidade física e legal (280º + 400º e 401º) – a impossibilidade da prestação produz a nulidade
do negócio jurídico
▪ Licitude (280º, nº1 e 294º) – o objeto negocial não pode ser contrário a qualquer disposição que
tenha caráter injuntivo, sob pena do negócio jurídico cujo objeto seja indeterminável
▪ Não contrariedade à ordem pública e aos bons costumes (280º, nº2)

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3. Facto jurídico

Pode ter origem num contrato, numa declaração unilateral de vontade, ou até mesmo num ato ilícito.
Para a constituição da obrigação, é necessário que haja uma relação jurídica entre os sujeitos, com obrigações
para ambas as partes.
Os factos jurídicos são realidades pré-jurídicas que criam, modificam ou extinguem as realidades jurídicas que
são os direitos e as obrigações.
Os factos jurídicos respeitantes do Direito das Obrigações são nomeadamente: contratos – Art.405/406 CC;
negócios jurídicos unilaterais – Art.457/463 CC; Gestão de Negócios- Art.464/472 CC; Enriquecimento sem causa –
Art.473/482 CC; Responsabilidade Civil – Art.483 e ss / 798 e ss CC

4. Garantias

A lei procura assegurar a realização coerciva da prestação, sem prejuízo do direito que, em certos casos, cabe
ao credor de resolver o contrato ou de recusar legitimamente o cumprimento da obrigação que recaia sobre ele
próprio, ate que o devedor decida cumprir a obrigação.
Poder de exigir judicialmente o cumprimento da obrigação, quando não cumprida voluntariamente.
O património do devedor é garantia do credor, podendo o credor agir junto dos tribunais contra o património
do devedor, por via de uma ação creditória (817° CC)
No âmbito das obrigações infungíveis existe a sanção pecuniária compulsória (829º-A)
Qualquer um dos modos de execução implicam ação de condenação prévia. Pode existir garantias especiais das
obrigações, que podem ser: pessoais (outra ou outras pessoas respondem com o seu património pelas dívidas de
outra pessoa, ex: fiança 635°) ou reais (o credor tem uma vantagem qualitativa, no sentido de ter o direito de se
fazer pagar com preferência em relação aos demais credores, ex: hipoteca e penhor).

IV. Fontes das Obrigações

Entende-se por fonte de uma obrigação o facto gerador do vínculo obrigacional, aquele facto donde procede
a obrigação, que lhe dá causa, que faz nascer o vínculo obrigacional.
O relevo das fontes das obrigações é maior do que nos direitos reais porque no direito das obrigações vigora
o princípio da atipicidade. Por força da atipicidade há um caráter heterogéneo de que resulta que a obrigação tenha
um conteúdo variável, que depende da sua fonte. Nos direitos reais, como vigora o princípio da tipicidade, só
existem os direitos reais que figuram na lei, com o conteúdo e efeitos nela regulados.
As fontes de obrigações mais importantes são os contratos e a responsabilidade civil (483° e ss).
Assim, a melhor forma de simplificar a enumeração das fontes das obrigações é agrupá-las de acordo com
o princípio jurídico deste ramo do direito a que respeitam:

1) Fonte das obrigações baseadas no princípio da autonomia privada


a) Contratos (405° e ss) – negócio jurídico bilateral, porém pode haver contratos de cariz multilateral.
É o resultado de duas ou mais declarações negociais contrapostas, mas integralmente concordantes entre
si, de onde resulta uma unitária estipulação de efeitos jurídicos.
Pressupõem sempre uma proposta e uma aceitação, resultando o mútuo consenso.

Modalidades dos contratos:


→ Classificação dos contratos quando à forma:
Contratos formais – a declaração negocial só pode ser exteriorizada por uma determinada forma prevista
por lei, por um documento autêntico ou particular (ex: compra e venda – 875º)
Contratos não formais – a declaração negocial pode ser exteriorizada por qualquer meio

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→ Classificação dos contratos quando ao modo de formação:
Contratos reais – são aqueles cuja celebração se exige a tradição ou entrega de coisa de que são objeto
Contratos consensuais – são aqueles em que essa entrega é dispensada

→ Classificação dos contratos quando aos efeitos:


Contratos obrigacionais – criação de direitos de crédito e obrigações, sendo a sua eficácia sobre a esfera
jurídica das partes imediata
Contratos reais – a transmissão de direitos reais sobre uma coisa determinada ocorre por mero efeito de
contrato (408º, nº1). No entanto, a sua eficácia pode não ser imediata por incidir sobre coisas futuras,
indeterminadas (408º, nº2) (211º); assim a transferência de propriedade é diferida para um momento
posterior ao da celebração do contrato
Pode acontecer que por meio de “cláusula de reserva de propriedade”, por acordo entre os
contraentes, a transmissão da propriedade fique diferida para o momento do pagamento integral do preço.
Este acordo permite defender os vendedores das eventuais consequências do incumprimento dos
compradores. Assim, o vendedor deve apenas suportar o risco da perda da garantia, enquanto que o
comprador deve suportar o risco pela sua perda ou deterioração.

→ Classificação dos contratos sinalagmáticos e não sinalagmáticos


Contratos sinalagmáticos e não sinalagmáticos, sendo que os primeiros originam obrigações recíprocas para
ambas as partes, ficando ambas na posição de credor e devedor, enquanto os segundos não originam esta
obrigação simultânea.

→ Classificação dos contratos entre onerosos e gratuitos


Contratos onerosos – quando implica atribuições patrimoniais para ambas as partes (ex: compra e venda,
abdicando o comprador do preço e o vendedor da coisa)
Contratos gratuitos – quando implica atribuições patrimoniais apenas para uma das partes (ex: doação e o
comodato)

→ Classificação dos contratos entre comutativos e aleatórios (restrita a contratos onerosos)


Contrato comutativo – quando ambas as atribuições patrimoniais se apresentem como certas (ex: contrato
de locação; contrato de compra e venda)
Contrato aleatório – quando, pelo menos, uma das atribuições patrimoniais se apresente como incerta,
quer quanto à sua existência, como ao seu conteúdo (ex: contrato de jogo e aposta – 1245º CC; contrato de
seguro – 425º CCom)

→ Classificação dos contratos nominados e inominados. Contratos típicos e atípicos


Contrato nominado é quando a lei o reconhece como categoria jurídica através de um nomen iuris,
enquanto que o contrato inominado a lei não o reconhece como essa categoria contratual
Contrato típico é quando o seu regime se encontra previsto na lei, sendo contrato atípico quando tal não
sucede.
O contrato nominado pode ser típico ou atípico, já o contrato inominado é sempre atípico.

→ Classificação dos contratos mistos e união de contratos


Contratos mistos – são aqueles que reúnem em si regras de dois contratos total ou parcialmente típicos,
assumindo-se como contrato atípico, por não corresponder integramente a nenhum tipo contratual
regulado por lei. Dois contratos dissolvem-se para formar um único.
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União de contratos – verifica-se a celebração conjunta de diversos contratos, unidos entre si, mantendo
cada contrato a sua autonomia e individualização em faze do conjunto. Nestes contratos, não há dissolução
para formar um único, como nos mistos.

Os contratos preliminares

Distinção entre contratos preliminares e contratação mitigada:


Contratos preliminares – contratos cuja execução pressupõe a celebração de outros contratos (ex: contrato-
promessa – 410º e ss – assunção da obrigação de celebração de um futuro contrato) (ex: pacto de preferência –
414º e ss – obrigação de dar preferência a outrem na celebração de um contrato futuro)
Contratação mitigada – a vinculação vai mais longe do que uma obrigação de contratar, procedendo logo à regulação
efetiva dos contratos futuros, isto é, determinam logo o conteúdo dos contratos futuros

Contrato-promessa (410º, nº1) – convenção pela qual ambas as partes, ou apenas uma delas, se obrigam, dentro
de certo prazo ou verificados certos pressupostos, a celebrar um determinado contrato. Assim, tem por objeto uma
prestação de facto positiva. Pelo que, pelo contrato-promessa não se dá a transferência de qualquer direito, o
mesmo só se dá através da realização do contrato futuro prometido.
Vigora o princípio da equiparação, na medida em que se efetua uma extensão do regime do contrato
definitivo ao contrato-promessa, sujeitando-se este às mesmas regras que vigoram para o outro. Ex: se a lei
determina um critério supletivo para o preço de compra e venda (833º), esse critério, é também aplicável para o
preço por que se promete vender.

Exemplo de um contrato-promessa – Suponhamos que A quer comprar um prédio a B e este quer vender-
lho. Não podem, todavia, celebrar já o contrato, porque faltam documentos necessários; ou porque A não dispõe,
por enquanto, do capital para a compra e B não quer vender a crédito; ou porque estão ainda em curso formalidades
burocráticas para regularizar o direito do próprio vendedor; ou porque o prédio ainda não está concluído (...).
Desejando assegurar, desde logo, a realização futura do negócio, os interessados têm um meio natural de fazê-lo,
mediante a celebração dum contrato-promessa de compra e venda.

Modalidades de contratos-promessa:
• Contrato-promessa bilateral - 410º CC. Nos casos do exemplo supra a promessa é bilateral, porque ambos os
contraentes se comprometem a celebrar futuramente o contrato.
• Contrato-promessa unilateral - 411º CC. Há casos em que só um dos contraentes está disposto a vincular-se, e ao
outro interessa compreensivelmente o estabelecimento desse vínculo. Ex: A está disposto a vender a B uma joia ou
um certo n.º de livros por determinado preço; B não sabe se poderá ou lhe convirá comprar, mas interessa-lhe, por
fundadas razões, vincular, desde já, o proprietário da coisa para a hipótese de o contrato lhe convir.

Forma do contrato-promessa
O contrato-promessa segue o regime geral, que se baseia na liberdade de forma (219º). No entanto, segundo o
disposto no nº2 do 410º, quando a lei exige que determinada forma para o contrato prometido é também exigida
a mesma forma para o contrato-promessa.
Assim, um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel, sujeita por lei a escritura pública ou documento
particular autenticado (875º).

Surge a questão se o contrato-promessa bilateral, que seja assinado por apenas um dos promitentes, pode
ser válido como promessa unilateral, subsistindo a obrigação de quem assinou.
Segundo o CC, a ausência de assinatura num contrato-promessa bilateral consubstancia a inobservância de forma
legal. Assim, por força do 410º, 2 e do 220º, o contrato é nulo por vício de forma.

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Contudo, as dúvidas surgem em saber se o contrato-promessa é nulo total ou parcialmente. A doutrina e a
jurisprudência não estão de acordo.
A 1ª solução foi a aplicação direta do 411º, que previa e regulava a figura da promessa unilateral. Mas, a partir da
publicação do acórdão do Supremo, de 26 de Abril de 1977, foi a premissa da nulidade (total ou parcial) do contrato
que vigorou, defendendo-se que ambas as assinaturas eram elementos necessários.
A tese da conversão defende que cabe à parte interessada na invalidade total do negócio alegar e provar que este
não teria sido concluído sem a parte viciada, quando o correto seria antes que este ónus recaísse sobre a parte
interessada no aproveitamento do negócio
A tese da redução defende que se no contrato-promessa a lei só exige a assinatura para a declaração negocial do
contraente que se vincula à promessa, a nulidade por falta de forma no contrato-promessa bilateral será parcial se
apenas um dos contraentes não assinar o contrato. Este regime é o que melhor tutela os interesses da parte que
pretende o aproveitamento do negócio. É ao interessado na nulidade total do negócio que caberá alegar e provar
que o contrato não teria sido concluído sem a parte viciada (292º).

Nos termos do 412º, os direitos e obrigações emergentes do contrato-promessa, que não sejam
exclusivamente pessoais, transmitem-se por morte aos sucessores das partes (nº1), sendo a transmissão entre vivos
sujeitas às regras gerais (nº2).

A lei admite a execução especifica da obrigação de contratar (830º), obtendo o credor a satisfação do seu
direito por via judicial. Assim, o tribunal emite uma sentença que produza os mesmos efeitos jurídicos da declaração
negocial que não foi realizada, operando-se assim a constituição do contrato definitivo.

Articulação com o regime do sinal


O sinal consiste numa cláusula acessória dos contratos onerosos, mediante a qual uma das partes entrega à outra,
por ocasião da celebração do contrato, uma coisa fungível.
Assim, o sinal funciona como fixação das consequências do incumprimento, uma vez que a parte que
constituiu o sinal deixou de cumprir a sua obrigação, a outra parte tem o direito de fazer a sua coisa entregue. Se o
não cumprimento partir de quem recebeu o sinal, tem este que o devolver em dobro (442º, nº2, primeira parte).
Caso se verifique o cumprimento do contrato, a coisa entregue será imputada na prestação devida (valendo
como princípio de pagamento), ou restituída, caso não seja possível (nº1).
Uma vez constituído o sinal, a propriedade é adquirida pelos accipiens, podendo esta vir a ser restituída ao
dans por não ser possível imputar o sinal à prestação. Sendo a imputação possível, em caso de cumprimento do
contrato, a coisa objeto do sinal fica definitivamente no património do accipiens. Verificando-se o incumprimento
do contrato, há lugar à aplicação de efeitos penais, que passam ou pela perda do sinal ou pela sua restituição em
dobro (810º, nº1 CP).
Resulta do 440º que a realização de uma datio rei, por uma das partes, não implica presunção de
constituição de sinal, antecipando apenas o cumprimento da obrigação. Se as partes quiserem que a prestação
entregue tenha carácter de sinal, deverão atribuir-lhe essa natureza. Ex: se A comprar um automóvel,
comprometendo-se a pagar o preço posteriormente e entregar logo uma quantia ao vendedor B, considera-se que
A apenas adiantou uma parte do preço. Aplicando-se o regime do sinal se for estipulado que a quantia entregue
tem essa natureza.
Resulta do 441º que a entrega de quantias em dinheiro, datio pecuniae, pelo promitente-comprador ao
promitente-vendedor constitui presunção da estipulação do sinal por essa via, mesmo que as quantias entregues o
sejam a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço. No entanto, como a lei não considera inilidível
a presunção de estipulação do sinal, admite-se prova em sentido contrário (350º, nº2).
Relativamente ao 442º, nº1, este refere-se ao regime do sinal em geral, indicando o seu funcionamento em
caso de cumprimento. Já no nº2, primeira parte, refere-se ao mesmo regime, mas indicando o seu funcionamento
em caso de incumprimento, na medida em que, se o não cumprimento for de quem constituiu o sinal, este será

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perdido a favor da contraparte; por outro lado, se for a contraparte a incumprir o contrato, esta terá que restituir o
sinal em dobro.
Já na segunda parte do nº2 do mesmo artigo, fala-se especificamente do regime do sinal no contrato-
promessa. Assim, a lei prevê que se houver tradição da coisa a que se refere o contrato-prometido, o promitente
adquirente pode optar, em lugar da restituição do sinal em dobro, por receber o valor atual da coisa, ao tempo do
incumprimento, com dedução do preço convencionado, acrescido do sinal (em singelo) e da parte do preço que
tenha sido paga.
O nº3 do mesmo artigo, primeira parte, (exclusivo aos contratos-promessa), refere que o contraente não
faltoso pode, em alternativa, requerer a execução específica do contrato, nos termos do 830º, haja ou não haja
tradição da coisa a que se refere o contrato-prometido. No mesmo artigo, segunda parte, prevê-se que se o
contraente não faltoso optar pelo aumento da coisa ou do direito, pode a outra parte opor-se, cumprindo a
promessa, salvo o 808º. Logo, a oferta do cumprimento da promessa por parte do promitente faltoso, paralisa o
direito de aumento do valor da coisa ou do direito pela outra parte.
Em suma, a perda do sinal ou a sua restituição em dobro pressupõem o incumprimento definitivo (442º,
nº2). Já a opção pelo aumento do valor da coisa, na medida em que admita ainda um posterior cumprimento, pode
ocorrer em caso de simples mora (442º, nº3), pressuposto para a execução específica.
442º, nº4 – exclui outras indemnizações resultantes do não cumprimento do contrato-promessa. Assim, se
o contraente faltoso não cumprir a obrigação de restituição do sinal em dobro, poderá naturalmente ser-lhe exigida
indemnização pela mora, ou incumprimento definitivo

Defende-se que a função do sinal se qualifica na natureza confirmatória-penal, já que a indemnização


convencionada não funciona como preço de arrependimento (penitencial), mas antes como sanção para um ato
ilícito, o incumprimento definitivo da obrigação. Funcionando assim como pré-determinação das consequências
desse incumprimento.

A eficácia real do contrato-promessa


No caso de a promessa respeitar a bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, os contratos têm eficácia real, no caso
de as partes declararem expressamente a atribuição de eficácia real e procedam ao seu registo (413º, nº1).
Tal significa que o direito à celebração do contrato definitivo prevalecerá sobre todos os direitos reais que
não tenham registo anterior ao registo do contrato promessa com eficácia real. Assim, o direito à celebração do
contrato definitivo pode ser sempre exercido, mesmo que as partes decidam constituir sinal ou estabelecer
penalizações para o incumprimento.

Pacto de preferência (414º e ss) – convenção pela qual alguém assume a obrigação de escolher outrem como
contraente, nas mesmas condições negociadas com terceiro, no caso de decidir contratar, logo, é contrato
preliminar de outro contrato.
O pacto de preferência é um contrato unilateral, uma vez que apenas uma das partes assume uma obrigação,
ficando a outra parte (o titular da preferência) livre de exercer ou não o seu direito.

Forma do pacto de preferência


Sujeito ao mesmo regime do contrato-promessa, o pacto de preferência não depende de forma especial, exigindo-
se que o mesmo conste de documento particular se para a celebração do contrato preferível for exigido documento
autêntico ou particular (410º, nº1).
No caso, sendo unilateral, apenas terá de ser assinado pelo obrigado à preferência

O direito e a obrigação de preferência são, em princípio, intransmissíveis, entre vivos e por morte, salvo estipulação
em contrário (art.º 420 CC).

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O direito convencional de preferência não prevalece contra os direitos legais de preferência; e só procede
relativamente à alienação efetuada em execução, insolvência, se gozar de eficácia real (art.º 422 CC).

Em princípio o pacto de preferência apenas possui eficácia relativa (inter partes), mas pode ser-lhe atribuída eficácia
real quando se reporte a bens imóveis, ou a móveis sujeitos a registo, desde que verificados os requisitos exigidos
para o caso paralelo do contrato-promessa (art.º 413 CC).

Exercício do direito de preferência:


˖ Comunicação de um projeto de contrato e das cláusulas respetivas. A notificação judicial é dispensada, podendo
agir-se extrajudicialmente, inclusive verbalmente (art.º 219 CC).
˖ Uma vez recebida a comunicação, o beneficiário dispõe de 8 dias para a declaração de preferência, exceto se
do próprio pacto resulta outro prazo, ou se, ao notificá-lo, o obrigado lhe conceda um prazo mais longo do que
o convencionado ou definido por lei a título supletivo.
˖ Não se efetuando a declaração de preferência dentro do prazo devido, o correspondente direito caduca.
˖ A declaração de preferência assume o significado de uma aceitação. Neste caso, o obrigado à preferência e o
preferente ficam vinculados à celebração do negócio

Violação da preferência:
As consequências da violação da preferência são diversas, consoante a sua eficácia:
˖ Se não há eficácia real, só existe a possibilidade de o preferente obter do promitente faltoso uma indemnização
dos danos que resultarem do incumprimento do pacto de preferência (art.º 798 CC)
˖ Se o direito do preferente possui eficácia real, é-lhe lícito, através do exercício da ação de preferência, fazê-lo
prevalecer sobre o negócio realizado com terceiro. Aplica-se, operadas as necessárias adaptações, o disposto
no art.º 1410 CC para a preferência legal (art.º 421 n.º 2 CC).

Contato a favor de terceiro (443º e ss) – contrato em que uma das partes se compromete perante outra a efetuar
uma atribuição patrimonial em benefício de outrem, estranho ao negócio.

Contrato para pessoa a nomear (452º, nº1) – verifica-se quando um dos intervenientes no contrato se reserva a
faculdade de designar outrem para adquirir os direitos ou assumir as obrigações resultantes desse contrato

b) Negócios unilaterais (457° e ss) – aquele em que há uma manifestação de vontade, ou havendo várias
declarações de vontade, todas elas têm o mesmo conteúdo (declarações concorrentes ou paralelas).
Caracteriza-se pela existência de um único lado ou parte, quer dizer, de um único centro de interesses que apenas
por si, sem necessidade de concordância de uma contraparte, produzir o efeito jurídico visado.
Classificam-se como:
˖ Reptício: a declaração de vontade tem de ser dirigida e comunicada a uma certa pessoa (ex. procuração)
˖ Não reptício: a declaração de vontade vale independentemente de ser dirigida e comunicada a uma certa
pessoa (ex. testamento)

Encontra-se consagrada no 457º a tipicidade dos negócios unilaterais enquanto fonte das obrigações, logo,
salvo disposição em contrário, a emissão de uma simples declaração negocial não é vinculante para o seu autor em
termos de consideração de obrigações, exigindo-se a celebração de um contrato

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Modalidades dos negócios unilaterais

Promessa de cumprimento e reconhecimento de dívida (458 CC) – A lei consente, através de ato unilateral, que se
efetue a promessa de uma prestação ou reconhecimento de uma dívida, sem que o devedor indique o fim jurídico
que o leva a obrigar-se, presumindo-se a existência e a validade da relação fundamental.
Uma vez que este negócio não reveste características de negócio abstrato, não pode ser considerado com
fonte de obrigação. Podendo esta presunção ser ilidida (350º, nº2) pela demonstração de que a relação fundamental
não existe, estando assim perante um negócio abstrato constitutivos de obrigações
A lei exige, em termos de forma, que constem de documento escrito, se outras formalidades não forem
exigidas para a prova da relação fundamental (458 n.º 2)

Promessa pública (459º e ss) – declaração negocial dirigida ao público, através da qual se promete uma prestação a
quem se encontre em determinada situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo.
Logo, é uma declaração emitida ao público através de anúncio público. Este, abrange qualquer meio de comunicação
social ou de difusão pública de mensagens. O público a que se dirige a promessa pode limitar-se a uma certa
categoria de pessoas.
Uma vez emitida, a declaração tem como efeito a constituição imediata de uma obrigação, ficando o
promitente desde logo vinculado à promessa, mesmo ignorando quem é o beneficiário, que só virá a ser
determinado posteriormente.
A promessa pode extinguir-se por(460º):
˖ Caducidade – opera quando as promessas públicas têm fixado um prazo de vaidade ou este é imposto pela
natureza ou fim da promessa. Se o direito não for exercido neste prazo, extingue-se por caducidade
˖ Revogação – no entanto não se pode verificar se o facto já tiver sido praticado

Concursos públicos (463º CC) – oferta de a prestação ocorrer como prémio de um concurso, o que justifica que
tenha de ser fixado um prazo para a apresentação dos concorrentes, sem o que o negócio não será válido (nº1)
A decisão sobre a administração dos candidatos e sobre a atribuição do prémio caberá às pessoas designadas no
anúncio como júri do concurso ou do promitente (nº2). Logo, não basta que o candidato ao prémio efetue a sua
prestação, pois ainda se torna necessário que a ele seja atribuído pelo júri designado no anúncio ou, na sua falta,
pelo promitente.

2) Fonte das obrigações baseadas no princípio do ressarcimento de danos


a) responsabilidade por factos ilícitos (e culposos) / responsabilidade delitual – onde alguém através de uma
conduta ilícita e culposa causa danos em bens juridicamente protegidos de outrem (483°, nº1)
Pressupostos:
­ facto voluntário
˖ É um ato dominável pela vontade humana, um comportamento.
˖ O facto voluntário pode revestir duas formas: ação (facto positivo – 483º), ou omissão (facto negativo
– 486.º: apenas quando haja dever jurídico de praticar o ato; ex.: 491º, 492º e493º CC).
­ Ilicitude
˖ Violação de direito de outrem (direitos subjetivos)
˖ Direitos absolutos (ex. direitos reais, direitos de personalidade)
˖ Violação de disposição legal destinada a proteger interesses alheios (normas de proteção)
˖ Requisitos:
a) Violação de uma norma legal;
b) Tutela dos interesses particulares deve figurar entre os fins da norma violada;
c) Que a lesão se efetive no próprio bem jurídico ou interesse privado que a lei tutela.

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˖ Os 484º e 485º CC regulam tipos deliquais específicos:
• Ofensa do crédito ou do bom nome;
• Prestação de conselhos, recomendações e informações;
• Exclusão da ilicitude – causas justificativas do facto danoso: ação direta, legítima defesa, estado
de necessidade…
­ Culpa (dolo e negligência)
˖ Pressupõe-se, em regra, que o agente tenha atuado com culpa (483º, n.º 1).
˖ O juízo de culpa representa um desvalor atribuído pela ordem jurídica ao facto voluntário do agente.
˖ A culpa tem como pressuposto a imputabilidade do agente.
˖ Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei (art.º
483, n.º 2 CC), isto é, de responsabilidade civil pelo risco (499º e ss. CC).
˖ Em tais casos, a lei contenta-se com a existência, entre o facto e o agente, de um puro nexo material.
˖ Modalidades da culpa:
• Dolo: corresponde à intenção do agente de praticar o facto
• Mera culpa (ou negligência): o agente não tem a intenção de praticar o facto, mas o seu
comportamento não deixa de ser censurável em virtude de ter omitido a diligência a que estava
legalmente obrigado.
- Só nas situações de mera culpa se admite, em certos termos, a redução equitativa da indemnização
(494.º).
- Quando a lei não estabeleça outro critério, a culpa será valorada, em face das circunstâncias de
cada caso, pela diligência de um bom pai de família ou homem médio (487.º, n.º 2).
˖ Prova e presunções de culpa - incumbe ao lesado a prova de culpa do autor da lesão, exceto se houver
presunção legal de culpabilidade (art.º 487, n.º 1 CC).
˖ Presunções ilidíveis (art.º 350, n.º 2): a prova compete ao lesante (inversão do ónus da prova)
• Danos causados por incapazes (arts. º 491 e 489º);
• Danos derivados de edifícios ou outras obras (art.º 492);
• Danos causados por coisas, animais ou atividades (art.º 493);
­ Dano - verificação de um dano ou prejuízo a ressarcir
˖ Não existe correlação entre a amplitude dos danos e a gravidade da culpa.
˖ Classificações de danos:
o Dano em sentido real – perda in natura que uma pessoa sofre no património ou na esfera moral,
ou seja, respetivamente, por via de destruição, subtração, deterioração ou privação do uso de
uma coisa, ou de implicação de um sofrimento físico-psíquico.
◦ A indemnização consiste na reparação da coisa lesada (restauração natural) ou na entrega
de outra equivalente (indemnização específica) - art.º 562 CC
o Dano em sentido patrimonial – avaliação concreta dos efeitos da lesão no âmbito do património
do lesado, consistindo assim a indemnização na compensação da diminuição verificada nesse
património, em virtude da lesão.
◦ Indemnização através de compensação da diminuição verificada no património, em
virtude da lesão (indemnização em dinheiro) – art.º 566 CC
o Danos patrimoniais: correspondem à frustração de utilidades suscetíveis de avaliação
pecuniária (ex. perda de bens, redução do valor da força de trabalho, danos referidos no art.º
495 CC).
o Danos não patrimoniais (ou morais): correspondem à frustração de utilidades não suscetíveis
de avaliação pecuniária (ex. sofrimento físico, desgosto resultante da perda de um ente
querido). Ressarcibilidade dos danos morais: art.º 496 CC
o No âmbito dos danos patrimoniais é habitual distinguir-se entre:

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◦ Danos emergentes: situação em que alguém em consequência da lesão vê frustrada uma
utilidade que já tinha adquirido. Há diminuição do património já existente na esfera jurídica
do lesado à data da lesão.
◦ Lucros cessantes: situação em que é frustrada uma utilidade que o lesado iria adquirir, se
não fosse a lesão. Corresponde a uma forma de não aumento do património já existente.
◦ Ambos estão abrangidos pelo dever de indemnizar (art.º 564/1 CC).
o Danos presentes: já se encontram verificados no momento da fixação da indemnização.
o Danos futuros: não se encontram verificados no momento da fixação da indemnização (564º
n.º 2 e 565º CC)
­ nexo de causalidade entre o facto e o dano
˖ Apenas os danos causados pelo facto ilícito são incluídos na responsabilidade do agente (483º n.º 1 CC).
˖ Tal decorre também da regra geral do art.º 563 CC, que dispõe: “A obrigação de indemnização só existe
em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”
˖ Titularidade do direito à indemnização.
- Tem direito à indemnização o titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado com
a violação da disposição
• Mas, há exceções a esta regra, cfr. 495º e 496º CC - Pluralidade de responsáveis pelos danos
causados (490.º)
• Responsabilidade solidária (497º e 512º) - Prescrição do direito de indemnização 498º
Responsabilidade obrigacional; responsabilidade pré-contratual; responsabilidade após extinção do contrato;
responsabilidade de contrato com eficácia de proteção para terceiros

b) responsabilidade pelo risco – (483º, nº2 e 499º e ss)


˖ Diferentes conceções do risco
o Conceção do risco proveito – A pessoa deve responder pelos danos resultantes das atividades
que tira proveito
o Conceção do risco de autoridade – A pessoa deve responder pelos danos resultantes das
atividades que tem sob o seu controle
˖ São consideradas como situações de responsabilidade pelo risco a atuação de pessoas em proveito
alheio (500º e 501º); e a utilização de coisas perigosas, como animais – 502º, veículos – 503º; e
instalações de energia elétrica e gás – 509º)
˖ A responsabilidade manifesta primordialmente funções de reparação do dano e limitadamente funções
acessórias de prevenção
˖ Modalidades:
o Responsabilidade do comitente – 500º
▪ Pressupostos:
1) Existência de uma relação de comissão (o comissário encontra-se numa relação de
subordinação ou dependência quanto ao comitente);
2) Prática do facto danoso pelo comissário no exercício da função que lhe foi confiada
(ainda que este tenha agido intencionalmente ou contra as instruções do comitente).
3) O comissário ter obrigação de indemnizar (o que pressupõe a sua culpa nos termos
da responsabilidade civil por factos ilícitos, cf. 483º e ss. CC).
▪ É uma responsabilidade objetiva, logo não depende de culpa sua na escolha do
comissário, na sua vigilância ou nas instalações que lhe deu. Esta apenas funciona em
relação ao lesado, já que posteriormente o comitente terá o direito de exigir ao
comissário a restituição de tudo quanto pagou ao lesado, salvo se ele próprio tiver
culpa (nº3 – pluralidade de responsáveis)

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▪ Se existe apenas culpa do comissário, o comitente que indemnize o terceiro tem direito
de exigir daquele, tudo o que pagou (art.º 500 n.º 3 CC). Caso se verifique culpa do
comissário e do comitente, ambos respondem solidariamente para com o lesado, mas
no plano das relações internas (entre eles), o encargo repartir-se-á em função das
respetivas culpas (500º n.º 3 e 497º n.º 2 CC).
▪ Tem por função específica a garantia do pagamento da indemnização do lesado
o Responsabilidade do Estado e demais pessoas coletivas – 501º
▪ Quando haja danos causados a terceiros pelos seus órgãos, agentes ou representantes
no exercício de atividade de gestão privada
▪ Responsabilidade estabelecida nos mesmos termos do 500º, quando o comitente seja
o Estado ou outra pessoa coletiva, mas apenas quanto aos atos de gestão privada
o Danos causados por animais – 502º
▪ Anteriormente o 43º, 1, estabelece uma relação de culpa presumida em relação ao
vigilante de animais
▪ Requisitos:
a) Utilização dos animais no próprio interesse (pode ser o proprietário, o usufrutuário,
o locatário, o comodatário, o simples possuidor);
b) Os danos resultem do perigo especial que envolve a utilização do animal (incluídos
os casos de força maior – ex: o cavalo que derruba alguém em fuga de um incendio; e
factos de terceiro – ex: hipótese de o animal ter sido açulado por terceiro).
o Acidentes causados por veículos
▪ Danos causados por veículos de circulação terrestre – 503º
• Responsabilidade objetiva do utilizador de veículos: limitada aos riscos
próprios do veículo
• Pressupostos:
◦ Direção efetiva do veículo de circulação terrestre (quem dá ordens sobre a
condução; quem exerce o controle sobre o veículo);
◦ Utilização do veículo no próprio interesse, ainda que por intermédio de
comissário;
◦ Nexo de causalidade entre os danos e os riscos próprios do veículo, ainda que
este não se encontre em circulação (ex: colocação do veiculo em andamento
por avaria no sistema de travões)
◦ Exige-se a imputabilidade do agente (art.º 503 n.º 2 CC): os inimputáveis só
respondem nos termos do art.º 489 CC.
• 508º, nº3 – a responsabilidade abrange todos os veículos de circulação
terrestre, como automóveis, motocicletas, bicicletas, combóis, carruagens de
metropolitano, etc
• Condução de veículo por conta de outrem – art.º 503 n.º 3 CC:
◦ Presunção de culpa, em consequência da qual o condutor (comissário) é
responsabilizado se não a conseguir ilidir.
◦ Havendo culpa do comissário, respondem solidariamente perante o lesado, o
condutor e a pessoa que tinha a direção efetiva do veículo (503º nº 1, 500º n.ºs
1 e 2 CC), aplicando-se o disposto no 500º nº 3
◦ A responsabilidade objetiva do condutor só existe se ele conduzir o veículo
fora das suas funções de comissário – interesse próprio (503.º, n.º 3 e 1).
• Beneficiários da responsabilidade - art.º 504 CC
o Abrange tanto os que se encontram dentro do veículo como dora dele
• Exclusão da responsabilidade – art.º 505 CC

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o Acidente imputável ao próprio lesado ou terceiro – a sua conduta deve
ser a única causa do dano
o Acidente resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento
do veículo – exige-se que este acontecimento seja exterior ao
funcionamento do veículo (ex: o veículo ser projetado por um ciclone)
• Colisão de veículos – 506º
o Na ausência de culpa dos condutores:
◦ se os danos são produzidos por ambos os condutores, a
responsabilidade reparte-se na proporção em que o risco de cada um
dos veículos houver contribuído para os danos.
◦ se danos são produzidos apenas por um dos condutores, só este será
obrigado a indemnizar. Em caso de dúvida, considera-se igual a medida
de contribuição de cada um dos veículos para os danos e igual
contribuição da culpa de cada um (art.º 506 n.º 2 CC)
◦ se os danos forem causados somente por um veículo, sem culpa de
nenhum dos condutores, só a pessoa por eles responsável é obrigada
a indemnizar
• Pluralidade de responsáveis pelo dano – 507º
o É aquele que tem maior interesse na utilização do veículo que suporta
a maior parte da indemnização
• Limites da responsabilidade – 508º
o DL n.º 291/2007, de 21 de agosto
o Energia elétrica ou gás – 509º e 510º CC
▪ Esta responsabilidade está excluída:
* se a instalação, ao tempo do acidente, cumpria as regras técnicas em vigor e estava
em perfeito estado de conservação.
* os danos devem-se a causa de força maior; a causa exterior independente do
funcionamento e utilização da coisa.
*danos causados por utensílios de uso de energia (ex. eletrodomésticos)
▪ Limites da responsabilidade – art.º 510 CC

c) responsabilidade pelo sacrifício – a lei atribui, como contrapartida da autorização conferida a alguém para
sacrificar bens juridicamente protegidos de outrem uma indemnização pelo prejuízo sofrido (81º, nº2 e
339º e ss)
˖ A lei prevê o direito à indemnização a quem viu os seus direitos sacrificados em resultado de uma atuação
ilícita destinada a fazer prevalecer um direito ou um interesse de valor superior
˖ A responsabilidade manifesta exclusivamente funções de reparação do dano
˖ 339º – Estado de necessidade – é justificada a conduta do agente que sacrifica bens patrimoniais alheios
para evitar um perigo atual de um dano manifestamente superior
Ex: alguém, para salvar uma pessoa, cujas roupas se encontram a arder, apagar o fodo com um casaco de
peles que tem à mão, o agente só é necessariamente responsável se tiver sido ele a provocar o sinistro
˖ Casos de responsabilidade pelo sacrifício: 1322º, n.º 1; 1347º n.º 3; 1348º n.º 2; 1349º n.º 3; 1367º

3) Fonte das obrigações baseadas no princípio da proibição de enriquecimento injustificado (473° e ss)
­ É uma obrigação na qual o devedor é o enriquecido, e o credor aquele que suporta o enriquecimento
­ Para que haja uma pretensão de enriquecimento, mostra-se indispensável a verificação cumulativa de 3
requisitos:
o Existência de um enriquecimento (Aumento de um ativo patrimonial/diminuição de um passivo)

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o Obtenção desse enriquecimento à custa de outrem
o Ausência de uma causa justificativa para o enriquecimento
­ Subsidiariedade – 474º CC
o Não há lugar à restituição por enriquecimento:
- Quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído. Ex. ação de
invalidade (art.º 289, n.º 1); de resolução do contrato (art.º 801, n.º 2);
- Se a lei recusa esse direito. Ex. prescrição (300.º e ss); usucapião (1287.º e ss); estando em causa
objetos achados e não reclamados dentro de certo prazo (1323.º);
- Se a lei atribuir “outros efeitos ao enriquecimento”: impõe ao beneficiado uma obrigação com
objeto diverso da fundada no enriquecimento sem causa. Ex. benfeitorias úteis que possam ser
levantadas (1273.º, n.º 1)
­ Exclui-se do âmbito deste instituto as vantagens obtidas à custa de outrem, que não sejam suscetíveis de
avaliação pecuniária, como sucede com os benefícios de cariz espiritual ou moral
­ O enriquecido tem a obrigação de restituir ao empobrecido tudo quanto haja obtido à sua custa. Deve
proceder-se a uma restituição em espécie, mas, não sendo esta possível, entregar-se-á o valor
correspondente (art.º 479º, n.º 1 CC)
­ A obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento à data em que se verifique algum
dos factos mencionados nas alíneas do art.º 480 CC (enriquecimento atual) – 479º, n.º 2
­ Verificando-se qualquer um desses factos a obrigação a cargo do enriquecido é agravada (480º)
­ Obrigação de restituir no caso de alienação gratuita – art.º 481 CC
­ Prescrição (482º) – O direito à restituição por enriquecimento prescreve no prazo de três anos, a contar da
data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável. Mas, sem
prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do enriquecimento - prazo
ordinário: 20 anos (art.º 309 CC)
o Se o empobrecido deixar passar um destes prazos sem exigir a restituição (323º, 1) o enriquecido
poderá opor-lhe eficazmente a prescrição do seu direito (304º, 1)
­ Defende-se a doutrina da divisão do instituto. Modalidades do enriquecimento sem causa:
a) enriquecimento por prestação
˖ Respeita a situações em que alguém efetua uma prestação a outrem, mas se verifica uma ausência de causa
jurídica para possa ocorrer por parte deste a receção dessa prestação
˖ Hipóteses de enriquecimento por prestação:
o A repetição do individuo – 476º
▪ Prestação com intenção de cumprir uma obrigação
▪ Obrigação objetivamente inexistente – nº1: a restituição está excluída tratando-se de
obrigação natural (402º e ss. CC)
▪ A obrigação prescrita assume-se como natural (art.º 304 n.º 2 CC). Prestação feita a pessoa
que não o credor (art.º 476, n.º 2 CC)
▪ Prestação feita por erro desculpável antes do vencimento da obrigação
▪ Cumprimento de obrigação alheia na convicção errónea de que se trata de dívida própria
(477º CC)
▪ Cumprimento de obrigação alheia na convicção errónea de estar vinculado para com o
devedor a esse cumprimento (art.º 478 CC)
o A restituição da prestação por posterior desaparecimento da causa – 473º, nº2
▪ Alguém ter recebido uma prestação em virtude de uma causa que deixou de existir
▪ Exemplos: *Recuperação de uma coisa cujo desaparecimento levou à indemnização do seu
titular (a seguradora entrega a indemnização relativa a um objeto roubado que depois é
restituído ao dono);

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*Na sequência da dissolução de união de facto (extinção da causa jurídica da contribuição
monetária)
o A restituição por prestação por não verificação do efeito pretendido – 473º, nº2
▪ Alguém realizar uma prestação em vista de um efeito que não se verificou
▪ Pressupõe três requisitos:
a) Realização de uma prestação visando um determinado resultado;
b) Esse resultado corresponda ao conteúdo de um negócio jurídico;
c) Que esse resultado não se produza.
▪ Duas exclusões decorrem do art.º 475 do CC:
•O autor, quando realizou a prestação, sabia que o efeito previsto era impossível;
•O autor impediu de má-fé a verificação do resultado
b) enriquecimento por intervenção
˖ Alguém obter um enriquecimento através de uma ingerência não autorizada no património alheio, como
sucederá nos casos de uso, consumo, fruição ou disposição de bens alheios
˖ Tem com fim a recuperação da vantagem patrimonial obtida pelo interventor
c) enriquecimento pela realização de despesas de que outrem beneficia
˖ Pode-se distinguir entre enriquecimento por:
o Incremento de valor de coisas alheias
▪ Situações em que alguém efetua despesas em determinada coisa, que se encontra na posse
do benfeitorizante ou, mesmo que não se encontrando na sua posse, ele acredita que a
coisa não lhe pertence
▪ Situação de alguém, embora conhecendo o caráter alheio da coisa, desconhece que se
encontra a realizar as despesas com materiais seus e não com materiais alheios
▪ Exemplos: despesas de produção de frutos – 1270º, nº2 e 1447º; restituição das
benfeitorias necessárias e uteis ao possuidor – 1273º
o Enriquecimento por pagamento de dividas alheias
▪ Hipótese em que o empobrecimento libera o enriquecimento de determinada dívida que
este tem para com terceiro sem visar realizar-lhe uma prestação, nem estar abrangido por
qualquer uma das hipóteses em que a lei lhe permite obter uma compensação por esse
pagamento
d) enriquecimento por desconsideração de património
˖ Casos em que, com prejuízo para o empobrecido, se verifica uma aquisição de terceiro a partir de um
património que se interpõe entre ele e o empobrecido
˖ Ex: 289º, nº2 – em caso de alienação gratuita de coisa que o alienante tenha adquirido por negócio inválido,
deve o alienante enriquecido restituir

4) Situações específicas de fontes de obrigações não baseadas em princípios gerais


a) gestão de negócios (464° e ss)
˖ A lei pondera, simultaneamente, a proteção dos interesses do dono do negócio, através da imposição
de deveres ao gestor, bem como a eventual responsabilidade pelos danos que causar, bem como a
atribuição de uma compensação ao gestor pelas despesas suportadas e prejuízos sofridos
˖ Aquele que interfere no negócio chama-se gestor; o titular do negócio chama-se dono do negócio
˖ Pressupostos:
o Assunção de negócio alheio
▪ Negócio num sentido amplo: assunto ou interesse. Inclui verdadeiros negócios jurídicos
ou simples atos jurídicos (ex. venda de uma coisa, arrendamento de um prédio,
pagamento ou cobrança de uma dívida), como puros atos materiais (ex. reparação de
um edifício, extinção de um incêndio, colheita de frutos)

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▪ Não é necessário que o ato ou facto tenha em vista proporcionar vantagens com valor
pecuniário, podendo ser de diversa ordem.
▪ O negócio tem de ser suscetível de ser realizado por pessoa diferente do seu dono ou
titular – Existência de uma atividade do gestor
▪ Estamos perante um negócio alheio sempre que se verifique da parte do gestor a
intenção de atribuir a outrem o resultado da sua atividade
o Atuação no interesse e por conta do dono do negócio
▪ O gestor deverá agir intencionalmente em proveito alheio e não em proveito próprio.
▪ Não é indispensável que o gestor conheça o dono do negócio, que pode ser, inclusive,
uma pessoa futura (ex. nascituro, pessoa coletiva em constituição)
▪ O fundamento do instituto subsiste se o gestor se encontra em erro sobre a pessoa do
dono do negócio: os direitos e obrigações emergentes da gestão cabem ao que
efetivamente tenha essa qualidade.
o Falta de autorização
▪ Não deve existir entre o gestor e o dono do negócio uma relação jurídica convencional
ou legal que autorize ou imponha a intromissão (ex. contrato de prestação de serviço,
procuração, mandato, responsabilidades parentais, tutela).
Ou seja, exige-se que o gestor não tenha o direito ou a obrigação de assumir a direção
do negócio alheio
˖ Deveres do gestor para com o dono do negócio – 465º
˖ Responsabilidade do gestor – 466º
o O gestor é responsável tanto pelos danos que causar com culpa sua no exercício da gestão como
a injustificada interrupção desta, considerando-se culposa a sua atuação sempre que ele agir
em desconformidade com o interesse ou a vontade, real ou presumível do dono do negócio
o Havendo dois ou mais gestores que tenham agido conjuntamente, a sua responsabilidade será
solidária (art.º 467, 512º, n.º 1 e 513º, todos do CC)
˖ Deveres do dono do negócio para com o gestor – 468º
o Variam consoante se trate de uma gestão regular ou irregular
▪ Regular – a gestão foi exercida em conformidade com os interesses do dono do negócio.
Assim, o gestor tem o direito a ser reembolsado de todas as despesas suportadas e
indemnizado dos prejuízos que haja sofrido
▪ Irregular – não foi respeitado o previsto no 465º, a), logo, o dono do negócio responde
apenas de acordo com as regras do enriquecimento sem causa por despesas – 468º,
nº2
o Fica reconhecido o direito de o gestor ser reembolsado das despesas que ele fundadamente
tenha considerado indispensáveis, com os respetivos juros legais a contar do momento em que
foram realizadas, bem como indemnização do prejuízo que haja sofrido (art.º 468, n.º 1).
o Como regra, afirma-se a gratuitidade da gestão. Mas, o dono do negócio é obrigado a remunerar
o gestor, sempre que a gestão corresponda a uma atividade profissional deste (art.º 470, n.º 1)
˖ A aprovação da gestão – 469º
o A aprovação significa que é em geral conforme com o interesse e vontade do dominus
o Uma vez emitida aprovação, o dono do negócio deixa de poder isoladamente considerar que
em determinado ato o gestor atuou em desconformidade com os seus deveres, não lhe
podendo por esse motivo exigir-lhe responsabilidade
o Se o gestor agiu em conformidade com o interesse e vontade do dono do negócio: terá os
mesmos direitos que lhe competiram no caso da gestão ter sido aprovada (art.º 468 n.º 1) –
gestão regular
˖ Relações entre o dono do negócio e terceiros – 471º

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o Se a gestão tiver consistido na prática de atos jurídicos, designadamente em contratos, coloca-
se o problema da posição do dono do negócio, em face dos terceiros, que celebraram esses
negócios com o gestor.
o Distingue-se assim a atuação do gestor em nome do negócio (representativa) e atuação do
gestor em nome próprio (não representativa):
▪ Representativa – é necessária a atribuição de poderes representativos e a invocação do
nome do dono no negócio, nos termos do 258º
• Vigora a disciplina da representação sem poderes
• Estando na gestão de negócios excluída a possibilidade de procuração, pois a
sua aplicação pressupõe uma inexistência de qualquer tipo de autorização
(464º). Logo, a atribuição dos poderes representativos deve ser a posteriori,
com eficácia retroativa, por negócio distinto da procuração, a ratificação (268º)
• Assim, o ato resulta originariamente ineficaz para o dono do negócio.
• Para que produza efeitos, torna-se necessária a sua ratificação.
• Considera-se negada a ratificação, se não ocorrer no prazo porventura fixado
pela outra parte (268º n.º 3).
• A ratificação encontra-se sujeita à forma requerida para a procuração (art.º
268, n.º 2 CC), que, em princípio, é a mesma do negócio representativo (art.º
262 n.º 2 CC). Faculdade de revogação ou rejeição pela outra parte enquanto o
negócio não for ratificado (art.º 268. n.º 4 CC)
▪ Não representativa, 471º – está totalmente excluída a possibilidade de representação,
nem à posteriori
▪ O 471º manda aplicar o regime do mandato sem representação – 1180º e ss:
* Os direitos e obrigações decorrentes do negócio produzem-se imediatamente com
referência ao gestor, mesmo que as partes conheçam a sua qualidade de gestor (art.º
1180 CC).
* Mas, o gestor deverá transferir para o dono do negócio através de um negócio
alienatório específico os direitos que tenha adquirido no exercício da gestão (art.º
1181/1 CC).
˖ Gestão de negócio alheio julgado próprio (472º CC)
o Situação em que o gestor efetua uma ingerência na esfera jurídica doutrem, verificando-se
consequentemente uma situação de alienidade objetiva do negócio. No entanto,
desconhecendo o gestor desta alienidade, não atua por conta doutrem, mas antes por conta
própria, faltando assim o requisito da intenção de gestão
o Falta um dos requisitos da gestão de negócios: atuação em nome e no interesse do dono do
negócio.
o As regras da gestão só vigoram se houver aprovação do dono do negócio:
* Nesse caso, o dono do negócio renuncia ao direito de indemnização pelos danos devidos
a culpa do gestor e vale como reconhecimento dos direitos que a este são conferidos no n.º
1 do art.º 468CC
* Não havendo aprovação, são aplicáveis as regras do enriquecimento sem causa (473º e
ss), sem prejuízo de outras que ao caso couberem
o Na hipótese de ignorância culposa e de resultarem da gestão prejuízos para o dono do negócio,
este tem direito a indemnização de acordo com as regras gerais da responsabilidade civil (art.º
472º, n.º 2 CC)

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b) relações contratuais de facto
˖ Ocorrem várias situações em que as partes manifestam comportamentos que, em termos de
normalidade social, são associados ao pagamento de uma retribuição, sem que emitam expressamente
qualquer declaração negocial relativa à celebração do contrato
Ex: quem entra num parque de estacionamento ou num transporte público fica vinculado ao pagamento
do preço respetivo, sem ter que emitir qualquer declaração negocial
˖ Este conceito destina-se a três tipos de situações: o contacto social; a participação em relações
comunitárias; e os deveres de prestação de bens e serviços essenciais

c) outras situações de facto


˖ onde existe uma obrigação gerada por simples situações de facto
˖ Exemplos:
A situação de poder informar – 573º – sempre que o titular de um direito tenha fundada dúvida
sobre a existência e conteúdo desse direito e outrem esteja em condições de dar as informações
necessárias. Trata-se de uma obrigação subsidiária em relação às outras fontes de deveres de
informação, funciona assim em ordem a permitir o esclarecimento do titular do direito, a título gratuito,
por parte de quem dispõe das informações necessárias sobre a sua existência e conteúdo.
A situação do possuidor de coisas (574º) ou documentos controvertidos (575º) – o qual tem a
obrigação de proporcionar o exame das coisas ou dos documentos, ou inclusivamente de permitir a sua
reprodução. Esta obrigação exerce-se através do 1476º CPC e desempenha funções probatórias, sendo
necessário a invocação de um direito, por parte de quem tem necessidade da coisa ou do documento
para averiguar da existência e conteúdo desse direito

V. Modalidades das obrigações

1. Modalidades quanto ao vínculo


a) Obrigações civis – 817º e 476º nº 1 do CC;
b) Obrigações naturais – 402º e ss. CC

O credor de uma obrigação civil dispõe de uma garantia mais forte do que o credor de uma obrigação
natural, já que pode exigir judicialmente o cumprimento (ação declarativa de condenação e ação executiva) – art.º
817 CC – Obrigação jurídica perfeita
Como consequência da exigibilidade judicial da prestação, o autor da prestação realizada com a intenção de
cumprir uma obrigação objetivamente inexistente tem a faculdade de reaver aquilo que prestou (473º e 476º)

O credor de uma obrigação natural só pode pretender o cumprimento, pois esta obrigação não é
judicialmente exigível (402º) – obrigação jurídica imperfeita.
Contudo, o que foi prestado espontaneamente (ou seja, livre de toda a coação) não pode ser repetido (476º
nº 1 e 403º)
As obrigações naturais estão sujeitas ao regime das obrigações civis em tudo o que não se relacione com a
realização coativa da prestação, salvas as disposições especiais da lei (art.º 404.º)
Exs.: dívida prescrita depois de invocada a prescrição (art.º 302º e ss. CC); dever dos pais em compensar os
filhos menores, com eles conviventes, participação nos bens obtidos pelo seu trabalho e utilizando capitais ou
recursos paternos, ou compensa-los de outra forma (art.º 1895 CC)

O confronto entre o art.º 304 nº 2 e o art.º 403 nº 1 CC reconduz a espécie da obrigação prescrita ao género
da obrigação natural. Contudo, é necessário a invocação da prescrição para que a obrigação civil se converte em
obrigação natural (art.º 303 CC)

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Acórdão do 4371/07.0TJCBR.C1 Tribunal da Relação de Coimbra
“Vem dada por provada a seguinte matéria fáctica:
1. Autora e réu foram casados entre si no regime de separação de bens, tendo-se divorciado por mútuo
consentimento em Julho de 2006, na Conservatória de Registo Civil de Coimbra.
2. Autora e réu assinaram um acordo para divórcio (datado de 6 de Maio de 2006) onde figuram como primeiro
outorgante o réu e como segunda outorgante a autora.
3. Tal acordo contém entre outras as seguintes cláusulas:
- cláusula décima primeira:” fica o primeiro outorgante obrigado e aceita pagar à segunda, para a mesma fazer face
a encargos da vida doméstica, as seguintes prestações;
a) 2000,00 €, mensalmente e até ao dia 8 do respetivo mês, até à concretização da escritura pública de compra e
venda da casa de morada de família, ...”
- cláusula décima segunda: “não estão incluídas nas verbas acima referidas, as despesas da Universidade Vasco da
Gama da filha da segunda outorgante, C...., que serão pagas, até à conclusão do curso, pelo primeiro outorgante,
como tem vindo a acontecer até aqui, e se compromete a continuar a fazer através de transferência da sua conta
bancária”.
4. Em Agosto de 2007, o réu não pagou a prestação mensal da filha da autora C.... na Universidade Vasco da Gama.”

DE DIREITO
A) Se a cláusula 12ª do acordo celebrado consubstancia uma obrigação natural
A questão a dirimir nos presentes autos traduz-se em se saber se, face à matéria dada como provada e que
não vem posta em causa pelo que se deve considerar como definitivamente assente (art. 712º do C.P.C.), dever-se-
á considerar que a obrigação contida na cláusula 12ª do Acordo para Divórcio constante do documento de fls. 4 a 6
configura uma mera obrigação natural, ou se estamos na presença de uma obrigação de alimentos contratualmente
estabelecida.
A sentença recorrida sustenta que estamos na presença de uma obrigação civil de alimentos tendo como
fonte um negócio jurídico.
Para o apelante (Réu) os factos provados integram uma obrigação natural, donde resulta não ser
judicialmente exigível.
Invocando entre outras, as seguintes razões:
“(…) ainda que se entenda que o “acordo para divórcio” era válido não poderia proceder o pedido formulado
pela autora, a obrigação de prestação de alimentos a favor de pessoas que não tenham o direito de exigi-los, como
é o caso presente, constitui uma obrigação natural, não sendo o seu cumprimento judicialmente exigível, como
dispõe o Artigo 402º do Código Civil; a entender-se estarmos perante uma obrigação civil de prestação de alimentos
– a esta obrigação sempre seriam aplicáveis, por força do disposto no Artigo 2014º do Código Civil, as disposições
previstas nos artigos 2003º a 2013º daquele Código, designadamente, o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo
2013º (a obrigação de prestar alimentos cessa quando quem os presta não possa continuar a prestá-los)”

Vejamos, então.
Dispõe o artigo 402º do Código Civil que "a obrigação diz-se natural, quando se funda número dever de
ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponda a um dever de justiça."
(…) compreendendo no seu âmbito todos os deveres de ordem moral e social, cujo cumprimento não seja
judicialmente exigível, mas corresponda a um dever de justiça.
A obrigação natural compreende, então, tudo o que não é nem uma mera obrigação civil munidade ação, nem uma
pura liberalidade.
Geralmente são dados como exemplo de deveres de ordem moral e social, cujo cumprimento corresponde
a uma ordem de justiça, o caso típico do cumprimento da obrigação prescrita ou do dever legal que haja caducado

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ou da percentagem remitida pelos credores ao devedor concordado, e não um simples pensamento de piedade, de
caridade, de cavalheirismo ou a um sentimento de escrúpulo de carácter individual

São seus pressupostos - ou requisitos positivos - o basear-se a obrigação num dever moral ou social e ao
seu cumprimento corresponder um dever de justiça.
"Para que haja obrigação natural é necessário que exista como fundamento da prestação, um dever moral
ou social específico entre pessoas determinadas cujo cumprimento seja imposto por uma reta composição de
interesses (ditames da justiça)", de que constitui um caso típico referido na lei aprestação de alimentos (495º, nº 3
do Código Civil) efetuada a favor de certas pessoas que não tenham direito de exigi-los mas que por laços de sangue,
relações de convívio ou de serviços prestados ao devedor imponham como um dever de justiça o encargo da
sustentação, habitação e vestuário da pessoa a quem são facultados.
É requisito negativo da obrigação natural, e constitui ponto líquido, a sua não coercibilidade. Há plena
liberdade de incumprir por o direito do credor não ser acionável.
Ora, o dever de ordem moral ou social em que se funda a obrigação não é definido por lei, nem o podia ser.
Cabe aos tribunais determinar, em relação a cada caso, se existe ou não um dever que justifique a qualificação da
obrigação como natural

Com efeito, dos factos provados resulta que: - Quando a autora e réu casaram em 13/04/89, já a primeira
tinha a filha C.... nascida em 25 de Agosto de 1985 (doc. fls. 49/50 e 21 dos factos provados);
- Durante todo o tempo de duração do casamento entre a autora e o réu, sempre este tratara a filha da
autora como sua própria filha e sempre esta o tratara como pai, acarinhando-a, apoiando-a nas mais diversas
atividades, acompanhando o seu percurso escolar, acompanhando-a nos seus tempos de lazer, em passeios,
brincadeiras e jogos, bem como nas suas doenças, ajudando a suportar os encargos com a sua saúde e formação
(13 dos factos provados)
Assim tendo acontecido, sem dúvida que enquanto durou o casamento as prestações prestadas pelo réu
custeando as despesas da filha da autora no seu curso de veterinária correspondem a verdadeira obrigação natural.
A relação conjugal com a autora, a ambiência e harmonia familiar vivida, a especial relação de afeto que se
estabeleceu entre o réu e a filha da autora, que ele reconhece e invoca, tratando o réu aquela como se fosse sua
filha e esta aquele como se fosse seu pai, até porque do casamento da autora e réu não advieram filhos, e a natural
dependência económica da C.... da mãe, justificam perfeitamente o dever moral, social e o dever de justiça de que
o réu suportasse essas despesas como se ela sua filha fosse.
Porém, esse quadro familiar, essa harmonia de afetos e de sustentos, desmoronou-se com a degradação da
vida conjugal, a saída do réu da casa de morada de família, e a dissolução do casamento.

É bem diferente o caso sub júdice após o divórcio das partes.


A partir da ruptura conjugal e da dissolução do casamento o réu deixou de estar vinculado a qualquer dever
de ordem moral ou social de pagar ou se responsabilizar pelo pagamento dos estudos da filha da autora, cujo
cumprimento constituísse um dever de justiça.
O que o recorrente pretendeu foi obter a aceitação por parte da autora do divórcio por mútuo
consentimento e, para tanto, propôs-se assumir pessoalmente a responsabilidade pelo pagamento dessas despesas.
Não se trata, portanto, de um mero dever de ordem moral ou social correspondente a um dever de justiça.
Depois, do conteúdo da cláusula 12ª do Acordo para Divórcio resultam para recorrentes prestações não só
futuras como periódicas às quais é fixado um termo ad quem, a conclusão do curso da C.....
A necessidade de preservar a incoercibilidade da obrigação natural a que já aludimos tem como
consequência, quanto às prestações periódicas, que a realização da prestação relativa a certo período não vincula
o devedor ao cumprimento das prestações correspondentes aos períodos subsequentes.

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“O espírito da lei, ao reconhecer os deveres de ordem moral ou social que estão na base das obrigações
naturais, é o de manter a espontaneidade do cumprimento.... Até ao momento da prestação, a pureza do vínculo
exige que o devedor conserve a plena liberdade de cumprir ou deixar de cumprir...

Daí que se se tratasse de uma obrigação natural, teria de emanar daquela cláusula que a prestação do réu
se manteria enquanto ele o considerasse conveniente, ou seja, ter-lhe-ia sido dada uma redação que lhe conferiria
a plena liberdade de deixar de efetuar essa prestação quando o entendesse. Mas não, ao contrário, a cláusula
vincula-o ao pagamento das despesas da filha da autora na Universidade Vasco da Gama, enquanto ela aí se
mantiver a estudar e até à conclusão do curso.
Temos, pois, não se tratar de uma obrigação natural, mas de uma obrigação civil, voluntariamente assumida,
dentro da liberdade estatuída no art.º 405º do Código Civil, visto que após a dissolução do casamento nenhum
dever de justiça lhe impunha o pagamento de tais despesas.
Foi, neste contexto, que o aludido acordo foi celebrado, e da análise do mesmo, constata-se que se rege por
estipulações, fixadas pelas partes, de harmonia com o princípio da liberdade negocial consagrado no art.º 405º do
Código Civil.
(…)
Em suma, a obrigação assumida pelo apelante é uma obrigação civil, parecendo-nos que essa conclusão
resulta, com certa clareza, da cláusula referida.”

- Efeitos do cumprimento de obrigações naturais


O art.º 615 CC consagra uma exceção à regra da equiparação entre os efeitos do cumprimento das
obrigações civis e os efeitos do cumprimento das obrigações naturais (art.º 404 CC).
Se o cumprimento da obrigação natural conduzir à impossibilidade, para o credor civil, de obter a satisfação
integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade (art.º 610 al. b) CC), este pode impugnar o
cumprimento (art.º 615 n.º 2 CC).
A Lei dá preferência ao interesse do credor de obrigação civil sobre o interesse do credor de obrigação
natural.

2. Modalidades quanto ao sujeito

- Obrigações de sujeito ativo indeterminado ou determinado; - Obrigações plurais ou singulares

Os sujeitos da obrigação devem estar determinados no momento da constituição da obrigação.


O art.º 511 CC admite que um dos sujeitos (o credor) seja determinado após a constituição da obrigação.
Mas, o credor tem de ser determinável, sob pena de ser nulo o negócio jurídico do qual a obrigação resultaria.
A indeterminação do credor pode resultar de uma destas situações:
* A determinação depende de um facto futuro e incerto (por ex. arts.º 459 e ss. CC);
* Não há ligação direta entre o sujeito ativo e a relação obrigacional (títulos ao portador, como os bilhetes de
lotaria, cheques ao portador…)

- Obrigações plurais e singulares


- Se a obrigação abrange apenas dois sujeitos (o credor e o devedor) fala-se em obrigação singular.
- Se a obrigação abrange mais do que dois sujeitos, tendo assim uma pluralidade de credores e/ou de devedores,
fala-se em obrigação plural.
- A contribuição dos diversos devedores para a realização da prestação a que estão vinculados e os termos em
que cada um dos credores pode exigir a prestação depende da modalidade da obrigação plural:
* Obrigações conjuntas ou parciárias
* Obrigações solidárias

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Obrigações conjuntas ou parciárias:
cada um dos devedores está vinculado a prestar ao credor ou credores a sua parte na prestação e cada um
dos credores só pode exigir do devedor ou devedores a parte que lhe cabe.
A prestação é assim realizada por partes, prestando cada um dos devedores a parte que se vinculou e não
recebendo cada um dos credores mais do que lhe compete.
O regime da conjunção é o regime regra (art.º 513 CC a contrario).

Obrigações solidárias (arts.º 512 e ss. CC) – Características (art.º 512 CC):
- Identidade da prestação em relação a todos os sujeitos da obrigação (mesmo que as quotas deles possam
ser diferentes no âmbito das relações internas)
- Extensão integral do dever de prestar ou do direito à prestação em relação respetivamente ato dos os
devedores ou credores.
- Efeito extintivo comum da obrigação caso se verifique a realização do cumprimento por um ou apenas a
um deles.
O regime da solidariedade só se aplica quando resulte da lei ou da vontade das partes (art.º 513 CC).
• Exemplos de casos em que a lei civil manda aplicar o regime da solidariedade passiva:
arts.º. 467 CC (responsabilidade de gestores); 497º e 507º CC (responsabilidade pelo risco).
Por sua vez, no Direito comercial vigora a regra da solidariedade passiva, por força do disposto no art.º 100
do Código Comercial.
“Nas obrigações comerciais os co-obrigados são solidários, salva estipulação contrária.”

Regime da solidariedade passiva Efeitos nas relações externas (entre o credor e os diversos devedores):
- Quanto ao credor:
• O credor pode exigir toda a prestação de qualquer dos devedores; sendo o direito do credor satisfeito, a
obrigação extingue-se em relação a todos os devedores (arts.º 512, n.º 1, 1.ª parte).
• O devedor demandado pela totalidade da dívida não pode invocar o benefício da divisão (art.º 518 CC).
• Direitos do credor – art.º 519 CC
• A solidariedade não impede que os devedores solidários demandem conjuntamente o credor ou sejam
por ele conjuntamente demandados (art.º 517, n.º 1 CC).
• Se o credor renunciar à solidariedade apenas a favor de algum dos devedores conserva o direito à
prestação por inteiro sobre os restantes (art.º 527 CC)
Quanto aos devedores:
• Responsabilidade dos herdeiros do devedor solidário (art.º 515/1 CC)
• Extinção da obrigação em relação a todos os devedores no caso de satisfação do direito do credor por
cumprimento, dação em cumprimento, … (art.º 523 CC).
Dação em cumprimento (arts.º 837 e ss. CC); compensação (arts.º 847 e ss CC; 848º/1 CC)
• Extinção parcial da obrigação: remissão concedida a devedor solidário (art.º 864/1 CC); confusão (art.º
869/1 CC).
• Impossibilidade da prestação por facto imputável a um dos devedores (art.º 520 CC).
• Meios de defesa (art.º 514, nº 1 CC).

Caso julgado (art.º 522.º)


• O caso julgado formado entre algum dos devedores solidários e o credor não pode ser invocado perante
os demais devedores quando lhes seja desfavorável (caso julgado condenatório).
• Mas, os restantes devedores podem opô-lo ao credor quando o caso julgado os ampare (caso julgado
absolutório), “desde que não se baseie em fundamento que respeite pessoalmente àquele devedor”.
Exceção à regra de que a sentença só vale inter partes.

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Efeitos nas relações internas (entre os diversos devedores):
• O devedor que satisfizer prestação acima da parte que lhe competir adquire um direito de regresso contra
os outros devedores, pela parte que lhes compete – art.º 524 CC.
• Presumem-se iguais as partes dos devedores solidários (art.º 516 CC), pelo que a obrigação de regresso
será cumprida em partes iguais.
• Meios de defesa oponíveis pelos condevedores – art.º 525 CC
• No caso especial de prescrição – art.º 521 CC
• Remissão com reserva do credor do seu direito por inteiro (art.º 864/2 CC).
• Insolvência dos devedores ou impossibilidade de cumprimento - art.º 526 CC.

Regime da solidariedade ativa Efeitos nas relações externas (entre os diversos credores e o devedor): -
Quanto aos credores:
• Qualquer dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, do devedor a prestação por inteiro e a prestação
efetuada pelo devedor a qualquer deles libera-o em face de todos os outros credores (art.º 512, n.º 1 in fine CC).
• Herdeiros do credor solidário – art.º 515, n.º 2 CC
• Escolha do credor – art.º 528 CC
• Os credores solidários podem, porém, optar por demandar conjuntamente o devedor, podendo este
igualmente demandar conjuntamente os seus credores (art.º 517, n.º 2 CC).
Quanto ao devedor:
• Satisfação do direito de um dos credores – art.º 532 CC
• Impossibilidade da prestação – art.º 529 CC
• Meios de defesa do devedor demandado – art.º 514, n.º 2 CC
• Prescrição – art.º 530 CC
• Caso julgado – art.º 531 CC

Efeitos nas relações internas:


• O credor cujo direito foi satisfeito além da parte que lhe competia na relação tem a obrigação de satisfazer
aos outros a parte que lhes cabe no crédito comum (art.º 533 CC).
• Presumem-se iguais as partes dos credores na obrigação solidária (art.º 516 CC).

3. Modalidades quanto ao objeto


- Obrigações divisíveis e indivisíveis;
- Obrigações específicas e obrigações genéricas;
- Obrigações cumulativas, alternativas e com faculdade alternativa;
- Obrigações pecuniárias;
- Obrigações de juros

- Obrigações divisíveis e indivisíveis


A indivisibilidade de uma obrigação pode resultar:
• da Lei – indivisibilidade legal (ex. art.º 1376 CC)
• de convenção das partes – indivisibilidade convencional
• da natureza da obrigação – indivisibilidade natural

- A obrigação é naturalmente indivisível, quando a sua prestação não pode ser fracionada ou repartida sem alteração
da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo para uso a que se destina. (tendo por referência o conceito de
coisa divisível – art.º 209 CC).
- Obrigações divisíveis – art.º 534 CC:
• Presunção de igualdade quanto às partes que os vários credores ou devedores possuem na obrigação

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• Responsabilidade dos herdeiros do devedor

- No caso de prestação indivisível e pluralidade de devedores (arts.º 535 – 537º CC):


* Só interpelando todos os devedores o credor pode exigir o cumprimento da obrigação, mesmo que a
prestação tenha por objeto coisa que esteja em poder de um deles, ou o facto que só um ou alguns deles estejam
em condições de realizar.
* Não há entre os devedores nenhum vínculo de solidariedade, salvo se este resultar da lei ou da estipulação
das partes (art.º 513 CC).
* Se o primitivo devedor faleceu, o credor tem de interpelar todos os herdeiros daquele.
* Extinção relativamente a um dos devedores – art.º 536.º (remissão, dação em cumprimento, prescrição,
confusão…)
* No caso de impossibilidade da prestação por facto imputável a um ou alguns devedores, os outros
devedores ficam exonerados (art.º 537 CC), mas o culpado (ou culpados) responde pelo valor integral da coisa e
pelos danos que hajam de ser indemnizados (art.º 798 CC).

No caso de prestação indivisível e pluralidade de credores – art.º 538 CC:


* Qualquer credor pode exigir a prestação por inteiro; o devedor enquanto não for citado, só se pode
exonerar em relação a todos os credores em conjunto.
* O caso julgado favorável a um dos credores aproveita aos outros, se o devedor não tiver, contra estes,
meios especiais de defesa.
* Pelo contrário, o caso julgado desfavorável a um dos credores não pode ser oposto aos outros (mantém-
se neste caso o princípio da eficácia relativa – inter partes – do caso julgado).
- Obrigações específicas e obrigações genéricas:
• Obrigação específica: objeto está individualmente e concretamente fixado.
estão sujeitas ao regime geral das obrigações.
• Obrigação genérica: objeto está determinado pela quantidade e pelo género.
suscitam algumas questões especiais, por virtude da indeterminação do seu objeto.

- N.B. Esta classificação é circunscrita às obrigações de prestação de coisas.


Obrigações genéricas – regime (arts.º 539 a 542º CC)
* O facto de a obrigação ser genérica implica naturalmente que tenha de ocorrer um processo de
individualização dos espécimes dentro do género
A obrigação genérica transforma-se em especifica com a concentração.
* Regra: a escolha compete ao devedor (art.º 539 CC).

- Enquanto a prestação for possível em coisas do género estipulado, não fica o devedor liberado pelo facto
de terem perecido aquelas que escolheu para cumprir (art.º 540 CC).
* Portanto, qualquer perecimento da coisa que ocorra antes do cumprimento da obrigação corre por conta
do devedor.
* A concentração das obrigações genéricas por escolha do devedor ocorre no momento do cumprimento
da obrigação (teoria da entrega).

- A Lei admite, porém, no art.º 541 CC casos em que, embora a escolha caiba ao devedor, a concentração
da obrigação ocorre antes do cumprimento:
a) acordo das partes
b) o facto de o género se extinguir a ponto de restar apenas uma (ou, mais precisamente, a quantidade
devida) das coisas nele compreendidas;
c) o facto de o credor incorrer em mora;

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d) a promessa de envio referida no art.º 797 CC
- Nestes casos, o obrigado fica a dever somente a coisa determinada e não qualquer outra incluída no
respetivo género.

As partes têm a faculdade de confiar a escolha a qualquer delas ou a terceiro (art.º 400, n.º 1 CC).
- A determinação da prestação deve ser sempre realizada segundo juízos de equidade (deve ser adequada
à satisfação do credor) – art.º 400/1 CC.
- Se a escolha couber ao credor ou a terceiro, ela só é eficaz se for declarada respetivamente, ao devedor,
ou a ambas as partes, e é irrevogável (art.º 542, n.º 1 CC) – a escolha concentra a obrigação.
- Se a escolha cabe ao credor, mas este não a realizou dentro do prazo estipulado ou daquele que o devedor
razoavelmente fixou para o efeito, a escolha passa a competir ao devedor (art.º 542, n.º 2 CC).

Obrigações cumulativas, alternativas e com faculdade alternativa


* Obrigações cumulativas: o devedor vincula-se a mais de uma prestação.
* Obrigações alternativas: o devedor vincula-se a várias prestações, mas libera-se da obrigação realizando
apenas uma das prestações – aquela que por escolha, vier a ser designada – art.º 543 e ss. CC.
* Obrigações com faculdade alternativa: são aquelas que têm por objeto uma só prestação, mas em que o
devedor tem a faculdade de se exonerar mediante a realização de uma outra, sem necessidade de concordância do
credor

Nas obrigações alternativas


• Na falta de determinação em contrário, a escolha pertence ao devedor (art.º 543, n.º 2 CC). Mas, a escolha
também pode competir ao credor ou a terceiro (art.º 549 CC).
• O direito de escolha do devedor pode (em ação executiva) ser devolvido ao credor – art.º 548CC.
• À escolha que o credor ou terceiro deva efetuar é aplicável o disposto no art.º 542 (artº. 549CC).
• Não é permitido, mesmo tratando-se de prestações divisíveis, que aquele a quem incumbe a escolha
decida realizá-la entre parte de uma prestação e parte da outra ou outras (art.º 544 CC).

- Regime aplicável em sede de impossibilidade da prestação, verificada antes de a escolha ter sido realizada:
• Impossibilidade não imputável a nenhuma das partes – art.º 545 CC
• Impossibilidade imputável ao devedor – art.º 546 CC
• Impossibilidade imputável ao credor – art.º 547 CC

Obrigação pecuniária (arts.º 550 e ss. CC)


* Prestação debitória correspondente a uma quantia em dinheiro, que se toma pelo seu valor monetário.
• Dois requisitos cumulativos:
1) a obrigação ter dinheiro por objeto, e 2) visar proporcionar ao credor o valor dele. As obrigações
pecuniárias subdividem-se em:
• Obrigações de quantidade; Obrigações em moeda específica; Obrigações em moeda estrangeira

As obrigações pecuniárias com mais relevância são as obrigações de quantidade (arts.º 550 e 551º CC).
Consistem naquelas obrigações que têm por objeto uma quantidade de moeda com curso legal no país.
São dois os princípios reguladores do regime destas obrigações:
• Princípio do curso legal: a obrigação tem sempre por objeto uma quantia de unidades monetárias,
devendo o cumprimento ser realizado com espécies (moedas ou notas) que, nesse momento tenham curso legal.
• Princípio do nominalismo monetário: o cumprimento faz-se pelo valor nominal que a moeda tenha nesse
momento (um euro é sempre igual a um euro).

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O princípio do nominalismo monetário admite exceções.
- As partes podem convencionar, ao abrigo da autonomia privada, formas de atualização da prestação
(“salvo estipulação em contrário”, cfr. art.º 550 CC, in fine).
- Em certas situações é a própria lei que prevê a atualização das obrigações pecuniárias, o que acontece em
geral nas obrigações de prestações periódicas.
- Nos casos em que a atualização das obrigações pecuniárias decorre da lei, o critério preferencialmente
adotado é o do índice dos preços (art.º 551 CC).

Obrigações de juros
• Juros: frutos civis que consistem nos rendimentos de uma obrigação de capital.
• Variam em função do montante do capital; do tempo durante o qual o credor fica privado do capital; e da
taxa da remuneração.

Determinados por lei – arts.º 468, n.º 1; 480º; 806º; 1199º, b) CC.
Determinados pela vontade das partes – em especial: art.º 1145 CC

Legais: 4%: art.º 559, n.º 1 CC – Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril


Máximos = juros legais + 3%/5%: art.º 559-A e 1146º CC

O art.º 560 CC consagra a regra da proibição do anatocismo, ou seja, da cobrança de juros sobre juros,
porque indiretamente poderia ser violada a proibição da cobrança de juros considerados excessivos.
Mas este preceito também admite exceções a essa proibição.
- Autonomia do crédito de juros (art.º 561 CC): a partir do momento em que se constitui, o crédito de juros
adquire autonomia em relação ao crédito de capital, podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o
outro.

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