Cinetica
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Química
CINÉTICA DAS
REAÇÕES QUÍMICAS
Guilherme A. Marson
Érika Reyes
9.1 Introdução
13.2 Velocidade de reações
9.3 Teorias da colisão e do estado de transição
9.4 Fatores que alteram a velocidade da reação
9.4.1 Estado de agregação dos reagentes
9.4.2 Concentração dos reagentes
9.4.2.1 Lei de Guldberg Waage (Lei da ação das massas)
9.4.3 Pressão
9.4.4 Temperatura
9.4.5 Catalisadores
Referências
9.1 Introdução
Nas transformações da matéria podemos identificar dois fatores fundamentais: tempo e
energia. As variações de energia determinam se um processo ocorre ou não em dadas condições
de pressão e temperatura. O tempo determina com que velocidade o processo ocorre. No caso,
interessa-nos especificamente a variação da composição do sistema em função do tempo.
Como o tempo é um fator decisivo em todas as questões humanas, é fundamental entender
e controlar a velocidade com que as transformações químicas ocorrem. Este é o campo de
estudo da cinética química, que se dedica a descrever o comportamento da velocidade das
reações, explicá-lo por meio de modelos microscópicos e controlá-lo.
Algumas variáveis, como temperatura, pressão, concentração dos reagentes, superfície de contato
e presença de catalisadores ou inibidores, alteram a frequência das colisões entre os reagentes de uma
reação química, aumentando ou diminuindo a velocidade com que ela ocorre. Portanto, reações
diferentes, em condições diferentes, ocorrem em velocidades distintas. Um exemplo clássico são as
reações de combustão de combustíveis fósseis como o metano (CH4), cujas velocidades precisam
ser controladas para que possam ser aproveitadas sem explodir os motores a combustão. Por outro
lado, há processos lentos que queremos acelerar, como a degradação de gases poluentes liberados
do escape de veículos automotores. O catalisador no escapamento de um carro realiza seu trabalho
em alguns décimos de segundo.
Desse modo, a cinética química é o estudo da velocidade de uma reação química e dos seus
determinantes, o que, como veremos, nos permite estabelecer modelos sobre o caminho pelo
qual ocorrem as reações químicas, denominadas mecanismos de reação.
Os fatores energéticos que indicam a possibilidade de ocorrência de uma reação são estudados
na termodinâmica a partir de parâmetros como a energia de Gibbs, a entalpia e a entropia.
Na cinética, interessa-nos a velocidade. É a análise conjunta desses dois aspectos da reação que
nos permite explicar por que, num sistema reacional em que vários produtos são possíveis, apenas
um é formado ou são formados mais produtos, mas seguindo certas proporções.
Na Tabela 9.1, podemos observar que nem sempre as reações favoráveis termodinamica-
mente (ΔG0 negativo) são rápidas.
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Tabela 9.1: Valores de ΔG0 e indicação da velocidade para algumas reações químicas.
aA + bB → cC + dD
a velocidade da reação pode ser calculada em função do consumo de qualquer um dos reagentes
ou da formação de qualquer um dos produtos. Como a concentração dos reagentes diminui com
o passar da reação, a velocidade em função deles tem sinal negativo. Como os produtos têm sua
concentração aumentada com o passar da reação, a velocidade em função deles tem sinal positivo.
∆concentração
Vm =
∆tempo
− ∆A
Vmédia de consumo de A =
∆tempo
− ∆B
Vmédia de consumo de B =
∆tempo
− ∆C
Vmédia de consumo de C =
∆tempo
−∆D
Vmédia de consumo de D =
∆tempo
A velocidade de uma reação é mais comumente representada pela variação das concentrações
(em mol/L, entre colchetes) em função do tempo. Mas também podemos representar a velocidade
apenas pela variação da massa, quantidade em mols e volume gasoso com o tempo. Este, por sua
vez, pode ser representado por segundos, minutos, horas etc.
Portanto,
∆m ∆n ∆V ∆C
Vmédia = ou ou ou
∆t ∆t ∆t ∆t
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Na Figura 9.3, encontram-se ilustrados esses conceitos utilizando a seguinte reação genérica:
A + B − B → A ⋅⋅⋅ B ⋅⋅⋅ B → A − B + B
Reagentes Estado de Transição Produtos
A + B2 → AB2 → A-B+ B
a b
Figura 19.3: Diagrama da variação de energia no decorrer de uma reação. a) Reação que libera energia (exotérmica, DE < 0).
b) Reação que absorve energia (endotérmica, DE > 0) / Fonte: modificado de Whitten, Davis e Peck, 1997.
Vimos anteriormente que a energia de ativação, Ea, é a energia que as moléculas dos rea-
gentes devem ter para que atinjam o estado de transição. Se as moléculas A e B2 possuem essa
energia durante a colisão, é formado o estado de transição AB2, do qual resultam as moléculas
dos produtos. Caso contrário, as moléculas reagentes colidem, mas não chegam a alcançar o
estado de transição, de modo que elas se afastam sem sofrer modificações em sua estrutura.
Se houver a formação do estado de transição, quando os átomos deixam esse estado e se arran-
jam como as moléculas do produto, ocorre liberação de energia até se atingir o nível fundamental
de energia do produto. Se a reação for exotérmica (Figura 9.3a), a quantidade de energia liberada
é maior do que a energia de ativação; mas é menor se a reação for endotérmica (Figura 9.3b).
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A velocidade das reações químicas depende de uma série de fatores. Entre eles, podemos
destacar o estado de agregação dos reagentes e a sua concentração, a pressão e a temperatura
do sistema reacional, além da presença de catalisadores. Conhecendo esses fatores, é possível
controlar a velocidade das reações de forma desejável.
Como regra geral, os gases reagem mais rapidamente do que os líquidos, e estes mais
rapidamente do que os sólidos. Nos gases, as moléculas dos reagentes se deslocam com muita
liberdade e rapidez, os choques entre elas são muito frequentes e, consequentemente, a reação é,
em geral, mais rápida. No estado líquido,
a energia cinética das moléculas é
intermediária em relação aos estados
gasoso e sólido e, portanto, a reação é
mais lenta. Quando um reagente está
no estado sólido, a reação ocorre apenas
na sua superfície; por isso, quanto maior
for o grau de subdivisão do reagente
Figura 9.4: Estados físicos e a variação de velocidade. sólido, maior será sua superfície e a
velocidade de reação.
Dessa forma, podemos notar que a velocidade de uma reação pode ser influenciada pelo estado
de agregação das substâncias reagentes. Isso é ilustrado nos seguintes exemplos: uma barra de ferro,
em contato com o oxigênio e a umidade do ar, enferruja-se mais lentamente do que uma palha de
aço; vapores de gasolina queimam de forma explosiva, diferentemente de uma amostra líquida do
combustível; o leite em pó demora mais para se deteriorar do que o produto líquido; entre outros.
Quanto maior a concentração dos reagentes ou da pressão, no caso dos gases, maior será
o número de choques entre as partículas reagentes; portanto, maior será a velocidade da reação.
Por exemplo, uma folha de papel alumínio oxida-se mais rapidamente quando em contato com
ácido clorídrico concentrado do que com ácido clorídrico diluído.
Em uma reação elementar, ou seja, que ocorre em apenas uma etapa, a velo-
cidade de uma reação é diretamente proporcional ao produto das concentrações
molares dos reagentes, quando estes estão elevados a expoentes, que são os seus
respectivos coeficientes estequiométricos.”
aA + bB → cC + dD
V = k .[A]a .[B]b ,
onde
[A] = concentração de A em mol/L
n
[A] = A
V
[B] = concentração de B em mol/L
n
[B] = B
V
A constante k é chamada de constante de velocidade específica ou, apenas, a constante de
velocidade, para uma reação a uma determinada temperatura. Os valores dos expoentes, a e b, e
da constante de velocidade, k, não têm qualquer relação com os coeficientes da equação química
balanceada e são determinados experimentalmente, exceto no caso de reações elementares, nas
quais os expoentes são os seus respectivos coeficientes estequiométricos. Cada reação tem sua lei de
velocidade e constante de velocidade k característica. A constante de velocidade k é independente
da concentração dos reagentes, mas depende da temperatura e da presença ou não de catalisador.
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Os coeficientes a e b das concentrações são, geralmente, números inteiros ou iguais a zero, mas,
ocasionalmente, são fracionários ou até mesmo negativos. Eles nos dão uma ideia do quanto a
concentração de um determinado reagente influencia a velocidade (taxa) da reação. Dessa forma,
a potência zero significa que a taxa não depende da concentração do reagente correspondente; já
a potência de dois significa que a taxa é diretamente proporcional ao quadrado da concentração,
isto é, a velocidade da reação quadruplica quando a concentração é dobrada. O valor de a é
considerado como a ordem da reação em relação a A, e b é a ordem da reação com respeito a B.
A ordem global da reação é a + b.
Exemplo
Seja a reação:
2 H 2 + 2 NO → N 2 + 2 H 2O
V = k .[H 2 ]1.[NO]2 .
Portanto, esta reação é de 3ª ordem.
9.4.3 Pressão
nA
A (g) ⇒ PA = RT → PA =[A]RT
V
9.4.4 Temperatura
A temperatura está ligada à agitação (energia cinética) das moléculas. Quanto mais energia
há em um dado sistema, maior é o grau de agitação de suas moléculas. Se estas se movimentam
mais, elas se chocam com maior frequência e energia; logo, a fração de moléculas com energia
cinética maior ou igual à energia de ativação aumenta, de modo que a velocidade da reação
aumenta também. Por esse motivo, por exemplo, utilizamos panela de pressão para cozinhar
alguns alimentos com maior rapidez; por outro lado, armazenamos a comida na geladeira para
retardar a sua deterioração.
A dependência da temperatura por parte das velocidades das reações nos dá uma informação
valiosa sobre a origem das constantes de velocidade. Embora a velocidade de uma reação química
aumente com a elevação da temperatura, a extensão desse aumento varia muito de reação para
reação. Em termos da lei de velocidade, a causa dessa dependência está no fato de que a constante
de velocidade k varia quando se altera a temperatura. A relação quantitativa entre ambas foi
descoberta por Svante Arrhenius, em 1889.
Arrhenius realizou um estudo do efeito quantitativo da temperatura na velocidade de reação
e descobriu uma equação que relacionava a constante de velocidade à temperatura da reação.
Tal relação ficou conhecida como Equação de Arrhenius:
k = Ae - Ea /RT
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ln k = intersecção + inclinação × T −1
Ea
ln k = ln A −
RT
onde:
k = constante de velocidade.
A = fator pré-exponencial. É uma medida da frequência com que as moléculas colidem.
R = constante universal dos gases: 8,3145 J.K-1.mol-1
T = temperatura absoluta ou termodinâmica em kelvin (K)
Ea = energia de ativação ( J/mol).
Um gráfico de Arrhenius de ln k versus 1/T é usado para determinar os parâmetros de
Arrhenius de uma reação (A e Ea); uma energia de ativação grande significa uma grande sensi-
bilidade da constante de velocidade a mudanças de temperatura.
9.4.5 Catalisadores
Catalisadores são substâncias que podem ser adicionadas aos sistemas reacionais para propiciar
caminhos alternativos às reações. Esses caminhos requerem uma energia de ativação mais baixa,
aumentando, portanto, a velocidade das reações. Um catalisador, logo, não diminui a energia
de ativação de uma reação. O catalisador acelera a reação por fazê-la ocorrer via um complexo
ativado de menor energia.
Os catalisadores possuem algumas propriedades importantes, sendo elas:
1. Um catalisador não afeta a entalpia nem a constante de equilíbrio da reação.
2. Um catalisador acelera a reação, mas não aumenta seu rendimento, isto é, ele produz a
mesma quantidade de produto, mas num período de tempo menor.
3. Um catalisador acelera tanto a reação direta quanto a reversa, pois diminui a energia de
ativação de ambas.
4. Um catalisador participa da reação, e pode ou não ser consumido durante o processo.
Figura 9.7: Efeito do uso dos catalisadores na velocidade das reações químicas. / Fonte:
modificado de Whitten; Davis; Peck, 1997.
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As reações que ocorrem na presença de catalisadores são denominadas catálises, e podem ser de
dois tipos: homogênea e heterogênea. Na catálise homogênea, os reagentes e o catalisador formam
um sistema monofásico, enquanto, na catálise heterogênea, os reagentes e o catalisador formam um
sistema com duas ou mais fases, ou seja, catalisador e reagentes constituem um sistema polifásico.
A destruição da camada de ozônio é um exemplo de catálise homogênea. O gás ozônio (O3)
é um poderoso agente oxidante que, em concentrações significativas, destrói muitos materiais,
podendo ser danoso e tóxico ao ser humano na baixa atmosfera. Na atmosfera superior, porém,
esse gás desempenha um papel muito importante na absorção da radiação nociva do sol.
O ozônio é destruído por fréons, geralmente o CF2Cl2. A grandes altitudes, onde existe a
maior concentração de ozônio, o fréon origina átomos livres de cloro (sob a ação do ultravioleta):
CF2Cl 2 Luz
→ CF2Cl ⋅ +Cl ⋅
O átomo de cloro livre não é estável (possui sete elétrons na última camada, quando o ideal
seria possuir oito), e seu elétron livre pode ser usado para fazer uma ligação, proporcionando,
dessa forma, a transformação do ozônio em oxigênio:
O3 + Cl⋅ → O 2 + ClO ⋅
ClO ⋅ + O3 → 2O 2 + Cl ⋅
2O 2 → 3O 2 Reação Global
Pela repetição dessas duas etapas, um Cl⋅ consegue destruir várias moléculas de O3.
Um catalisador heterogêneo, ou catalisador de contato, encontra-se em uma fase diferente
da fase dos reagentes. Tais catalisadores são geralmente sólidos que proporcionam superfícies
nas quais as moléculas de reagentes podem ser adsorvidas, reduzindo a energia de ativação da
reação. Em uma etapa final há dessorção, as moléculas formadas do produto deixam a superfície
do catalisador, liberando espaços que podem ser reutilizados.
Como exemplo deste tipo de catálise temos a decomposição da solução de peróxido de
hidrogênio (água oxigenada), que é acelerada pela presença de uma porção de batata na solução.
A decomposição da água oxigenada em água e oxigênio, quando catalisada, ocorre de forma
muito mais rápida, a ponto de ser possível observar as bolhas da liberação de oxigênio em
grandes quantidades.
Metais de transição, como Pt, Pd e Ni, e seus compostos são catalisadores heterogêneos
muito eficazes, sendo utilizados como sólidos finamente divididos (maior área de contato) para
oferecer superfícies sobre as quais as reações heterogêneas podem ocorrer.
As enzimas são bons exemplos deste tipo de substâncias em sistemas biológicos. Acredita-se
que as moléculas de enzima apresentem sítios ativos em suas superfícies. O sítio ativo é frequen-
temente uma depressão na superfície da molécula
de enzima, à qual a molécula de substrato, ou
parte dela, se ajusta (Figura 9.8). Esses catalisa-
dores biológicos aceleram reações, que seriam
extremamente lentas na sua ausência, viabilizan-
do processos vitais do nosso corpo.
A enzima anidrase carbônica, por exemplo,
facilita a combinação de CO2 e água (substratos),
permitindo o transporte do gás carbônico pelo
Figura 9.8: Representação esquemática da catálise enzimática.
sangue. Cada enzima é extremamente específica, O substrato se liga reversivelmente à enzima em região da
molécula de enzima denominada sítio ativo (1), e gerando um
catalisando somente algumas reações intimamen- complexo enzima substrato (2). Neste processo, ocorre alter-
ação estrutural do sítio ativo e no substrato. A reação procede
te relacionadas ou, em muitos casos, apenas uma e forma-se um complexo ativado no sítio ativo da enzima (3).
O complexo ativado origina os produtos que se desligam da
reação particular por certos substratos. enzima (4). / Fonte: modificado de Wikipedia.
Referências
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de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 2002.
Brown,T. L.; Lemay, H. E.; Bursten, B. E.; Burdge, J. R. Química: a ciência central. 9. ed. São
Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.
Kotz, J. C.; Treichel, P. M.; Weaver, G. C. Química geral e reações químicas. 6. ed.
São Paulo: Cengage Learning, 2010.
Mahan, B. M.; Myers, J. R. Química: um curso universitário. São Paulo: Edgard Blücher, 1995.
Química
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Whitten, K.W.; Davis, R. E.; Peck, M. L. General Chemistry. 5. ed. New York: Heartcourt
College Pub., 1997.
Shriver, D.F. & Atkins, P.W. Química inorgânica, 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2008.
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Acesso em: 03 set. 2013.
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03 set. 2013.