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JUS2888 Degustacao

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Coleção

MANUAIS
de PRÁTICA
Coord.: FILIPPE AUGUSTO
DOS SANTOS NASCIMENTO

Paulo Henrique Lima Soares

MANUAL DE
PEÇAS PRÁTICAS
PARA CARREIRAS
JURÍDICAS
Sentença Cível

2023

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DICAS GERAIS PARA REDAÇÃO DE PROVAS DE SENTENÇA EM CONCURSOS PÚBLICOS II

CAPÍTULO II

DICAS GERAIS PARA REDAÇÃO


DE PROVAS DE SENTENÇA EM
CONCURSOS PÚBLICOS

1. CONHECER AS REGRAS DO JOGO


Antes sequer de iniciar a concorrência em certames de magistratura, o
pretendente candidato deverá, necessariamente, ler e estudar o que disposto
na Resolução nº 75/09 do Conselho Nacional de Justiça. Isso porque se cuida
de ato normativo expedido pelo conselho fiscalizatório superior do Poder Ju-
diciário que propiciou melhor uniformização e harmonização nos concursos
públicos para ingresso na carreira de magistratura das cortes nacionais.
Por conseguinte, funcionando como espécie de “manual” da disputa pelo
ingresso no cargo de juiz, é imperioso que aquele que pretenda concorrer reste
ciente dos termos basilares dos certames. Do contrário, seria como um jogador
de futebol, ainda que bastante habilidoso, o qual não sabe que a bola não pode
ser conduzida com a mão. O fracasso é certo!
Regulando a segunda etapa do certame da magistratura, dita a referida
resolução que a sentença cível integra a segunda prova escrita:
Art. 46. A segunda etapa do concurso será composta de 2 (duas) provas
escritas, podendo haver consulta à legislação desacompanhada de anotação
ou comentário, vedada a consulta a obras doutrinárias, súmulas e orienta-
ção jurisprudencial.
(...)
Art. 49. A segunda prova escrita será prática de sentença, envolvendo temas
jurídicos constantes do programa, e consistirá:

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

I – na Justiça Federal e na Justiça estadual, na elaboração, em dias sucessi-


vos, de 2 (duas) sentenças, de natureza civil e criminal;
II – na Justiça do Trabalho, na elaboração de 1 (uma) sentença trabalhista;
III – na Justiça Militar da União e na Justiça Militar estadual, de lavratura
de sentença criminal.

Ademais, “cabe a cada tribunal definir os critérios de aplicação e de afe-


rição da prova discursiva, explicitando-os no edital” (art. 48). Portanto, para
além da leitura geral da Resolução nº 75/09 do CNJ, deve o candidato cuidar
para o exame minucioso das regras editalícias que regem cada concurso pú-
blico especificamente. O ato resolutivo do CNJ proporciona as regras gerais e
o bom conhecimento de como transcorrem as muitas etapas do certame para
a judicatura. Todavia, não se pode ignorar que, de modo mais peculiar, o
edital do concurso traz outras normas que devem ser objeto de maior atenção
pelos disputantes.

Neste momento exordial, de relevo tratar de dois pontos substanciais para


a ambientação de prova e, consequentemente, da aprovação na etapa: o tempo
de realização conferido para a elaboração da resposta e o espaço disponibiliza-
do para sua redação.

2. TEMPO DE PROVA
Inicialmente, não pode o candidato a concurso de juiz, notadamente nas
provas escritas, ignorar previamente o tempo conferido pelo edital para findar
a resposta no texto definitivo. É que, exaurido o prazo regulamentar, deve o
candidato abster-se de inserir qualquer caractere em sua folha de respostas sob
pena de, conforme previsão contida na maioria dos editais de concurso público,
pronta eliminação do certame.

Dessa forma, em não havendo boa gestão da duração de prova, pode o can-
didato mais bem preparado deixar de pontuar adequadamente em virtude de
não haver tempo suficiente para exaurir seus conhecimentos na transmissão da
resposta para a folha. No pior dos cenários, como se anteviu, em desobediência
à ordem de parada, será eliminado da disputa, não havendo sequer chance de
que o conteúdo jurídico já exposto seja avaliado pela banca examinadora.

Ainda, mesmo que haja conclusão da resposta, é possível que o candidato


que, quando percebeu a possibilidade de não haver tempo hábil, deixe de redi-
gir sua resolução do modo mais técnico e completo como poderia, prejudican-
do o reflexo de seu conhecimento em face da nota a ser atribuída.

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DICAS GERAIS PARA REDAÇÃO DE PROVAS DE SENTENÇA EM CONCURSOS PÚBLICOS II

Destarte, a logística de tempo de prova deve ser muito bem pensada e apli-
cada para que não haja dano no concurso, seja por decréscimo de nota, seja por
eliminação, o que tão somente demanda planejamento prévio.
Dispõe o art. 51 da Resolução nº 75/2009 que “o tempo mínimo de duração
de cada prova será de 4 (quatro) horas”. Então, para todo e qualquer certame de
magistratura, o tempo mínimo a ser ofertado pela banca examinadora ao can-
didato para elaboração de seu texto é de quatro horas. Sem prejuízo, se verifica
na praxe que muitos editais de modo específico deferem tempo de prova de
cinco horas. Assim, imprescindível que o candidato verifique no seu edital qual
o tempo de resposta autorizado pelo concurso.
Feito isto, deve o candidato, necessariamente, aplicar o tempo de prova
editalício em seus treinos individuais antecedentes, a fim de que se crie o hábito
com o lapso conferido, seja apressando a finalização da resposta, seja dilatan-
do-a, oportunidade, neste último caso, em que poderá se preocupar em melhor
gestar e destacar com excelência seus argumentos a serem inseridos no texto.
O candidato já deve ter em mente o tempo disponível para cada ato pró-
prio em sua resposta. Como se sabe, no dia da prova, o candidato recebe um
enunciado, algumas folhas de rascunho e as de texto definitivo, sendo o gerente
de seu próprio tempo para entregar estas preenchidas até o fim do exame. As-
sim, o candidato despenderá tempo para a leitura do enunciado e compreensão
do caso, para a busca pelos argumentos jurídicos e dispositivos de lei regentes,
para planejamento de resposta e para transcrição do texto definitivo.
Diante deste cenário, é interessante que o candidato já tenha uma pro-
gramação temporal prévia consigo para perpassar por cada uma das fases de
resposta. Por exemplo, em uma prova de quatro horas, pode o candidato pre-
estabelecer para si, como razoável, vinte minutos para a leitura do enunciado e
compreensão do caso, quarenta minutos para estabelecimento dos fundamen-
tos jurídicos e dispositivos de lei, trinta minutos para organização da resposta
e duas horas para a redação do texto definitivo (insisto que a referida logística
é meramente exemplificativa e pode não se amoldar na individualidade do lei-
tor).
Deste modo, caso durante o estudo dos argumentos jurídicos e da escolha
do embasamento legal, doutrinário e jurisprudencial a ser trabalhado, perceba
o candidato que transcorreu uma hora e quinze minutos de prova, é prudente
que acelere o passo para alçar o início da transcrição de resposta.
Ressalvo, contudo, que, como advertido, os prazos supra estabelecidos
servem apenas como exemplo e que o cumprimento ou não da programação

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

também dependerá da identificação da extensão do caso exigido, de sorte que,


em sendo hipótese que não demande tanto alongamento, não precisará o can-
didato eventualmente acelerar uma fase para dar curso à outra com tanta brevi-
dade, porém, em se verificando ser caso extenso, deverá encurtar o tempo gasto
nas etapas antecedentes. Tudo decorrerá da sensibilidade do candidato em re-
lação ao que lhe fora posto e ao tempo necessário para a resolução completo.
Cito minha experiência pessoal em dois certames que demandaram pla-
nejamento absolutamente distinto: ao prestar a prova para a magistratura do
Tribunal de Justiça do Ceará, o tempo de prova era de quatro horas para redigir
uma sentença de quatro laudas, o que aproximou o método aplicado ao apre-
sentado como exemplo em parágrafos anteriores; distintamente, na prova para
a magistratura federal do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, haviam doze
laudas e um caso substancialmente mais amplo, quando fora preciso encurtar
a etapa preparatória demasiadamente para possibilitar a ultimação da resposta
definitiva (naquele teste, respondi em dez laudas e meia).
Daí porque vital se obedecer a um ritmo de treino considerável: apenas a
prática e a experiência darão essa sensibilidade e essa adaptabilidade na gestão
do tempo de prova do candidato frente ao enunciado da questão e ao espaço/
tempo disponibilizados pela entidade para confecção do texto definitivo.
Outrossim, perceba-se que o somatório do exemplo acima envidado não
preencheu a integralidade do tempo de prova disponível, mas não sem razão
(eu sou ruim de matemática, porém não tanto). Recomenda-se com firmeza que
a programação reserve aproximadamente meia hora de prova para lidar com
intercorrências. Decerto, não raras vezes os candidatos em concursos públicos,
durante o exame, são expostos a condições com as quais não estão habituados
no cotidiano de treinos, motivo pelo qual pode haver atraso na confecção da
resposta.
Exemplificativamente, ao treinar no local de estudo, o candidato, ao sentir
necessidade fisiológica de ir ao sanitário, apenas levanta-se, vai e volta, sem
maiores percalços. De outro giro, durante a realização da prova, caso queira ir
ao banheiro, primeiro, pode ainda haver uma fila de espera, de modo que não
há como se aliviar de imediato, e, segundo, por vezes as bancas de concurso
exigem sucessivas passagens por detectores de metal ao longo do percurso até o
sanitário, havendo, certamente, maior desperdício de tempo que estaria sendo
empregado na resposta.
Não se deve descurar de vários outros possíveis eventos que influenciam na
dinâmica da prova: frio ou calor excessivos, carteira disponível inapropriada,

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DICAS GERAIS PARA REDAÇÃO DE PROVAS DE SENTENÇA EM CONCURSOS PÚBLICOS II

outros candidatos emitindo sons repetitivos (fungados, batidas de caneta), ner-


vosismo acentuado com sudorese na mão etc. Logo, livrar meia hora na progra-
mação é fundamental para garantir a finalização tranquila da prova.
Na eventualidade de sobrar tempo de prova, não haverá prejuízo, sendo
útil despender o que remanescer na releitura da sua resposta para suplantar
equívocos na transcrição do conteúdo para a folha de texto definitivo, como
acentos, pingos, pontuação, entre outros.

3. ESPAÇO DE PROVA
Além do tempo de prova, precisa-se ter bastante cuidado com o espaço de
prova disponibilizado para resposta. É que, na maior parte dos concursos de
magistratura, há limitação de laudas/linhas para confecção de resposta.
Alguns certames, é certo, mesmo constando limitação editalícia, são bas-
tante generosos, permitindo um cauteloso relaxamento do candidato em rela-
ção à disponibilidade para resposta. Outros, entretanto, nem tanto, merecendo
atenção para utilização precisa e inteligente do que ofertado pelo examinador,
com gestão adequada da quantidade de linhas.
Para estar mais bem preparado, deve-se conhecer a sistemática específica
do concurso que está sendo prestado, no ponto, seja pela previsão editalícia,
quando houver, seja pelo estudo de provas anteriores da mesma banca ou tri-
bunal, aplicando a informação nos treinos preparatórios para habitualização.
Sobre esse aspecto, várias observações são pertinentes quando for a hipó-
tese de exíguo campo de resposta.
A primeira delas consiste em acautelar-se com o tamanho da letra e o espa-
çamento entre palavras. Outrossim, embora visualmente possa se revelar mais
apresentável, não é prudente pular linhas.
Outra dica que pode ser válida é vislumbrar uma extensão demasiada da
abordagem exigida em confrontação com o espaço disponibilizado, oportuni-
dade em que deve ser evitada a capitulação expressa da sentença para economi-
zar linhas preciosas para inserção de conteúdo.

M Abaixo, exemplo de resposta de minha autoria, no concurso para a magistratura


do Ceará, de sentença criminal, tanto do início do meu texto como do fim, revelan-
do uma estratégia não tão interessante, haja vista nítida a compressão e desorgani-
zação do encerramento para comportar a finalização técnica do ato.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

Assim, o que se recomenda é a realização de um planejamento espacial a


fim de que, na maior medida possível, não haja uma desarmonia tão extrema
entre os aspectos visuais da exposição do início e do fim da redação.
Entretanto, mesmo com toda essa lição e adoção de técnicas visando cons-
truir uma resposta completa dentro do quadro fornecido, é possível que não
se saia como o planejado e se perceba que o espaço não será suficiente para
ultimar com tranquilidade o que se almejava escrever. Isto percebido, é hora de
adotar técnicas de sacrifício, consistentes em concentração máxima de escrita e
construções extremamente sucintas para que se logre preencher o máximo dos
itens a serem objeto de pontuação no espelho.

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ELEMENTOS DA SENTENÇA IV

CAPÍTULO IV

ELEMENTOS DA SENTENÇA

Neste capítulo, explicitar-se-á e abordar-se-á, ainda que de maneira breve,


o significado e a importância de cada um dos elementos da sentença, confiando
que já haja base mínima do leitor sobre cada um deles, apenas para que se possa
prosseguir e adentrar na estruturação minudente ideal do referido ato.
O art. 489, caput, do CPC estabelece os elementos essenciais da senten-
ça, quais sejam, relatório, fundamentação e dispositivo, e sobre cada um deles
apresentaremos noções iniciais abaixo, sem prejuízo de ulterior complementa-
ção quando da análise prática de cada um deles envidada em seguida.

1. RELATÓRIO
O inciso I do art. 489 do CPC é bem elucidativo e já esclarece o conteúdo
básico a conter em um relatório, motivo por que de rigor a sua reprodução:
Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com
a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências
havidas no andamento do processo;
(...)

Portanto, por força de lei, sistematizando para melhor memorização, o re-


latório deverá conter, pelo menos:

1. Nome das partes;


2. Identificação do caso;
3. Suma do pedido;
4. Contestação;
5. Registro das principais ocorrências.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

Deve-se ter em mente que duas são as finalidades do relatório: a) demons-


trar para as partes e para a sociedade que o magistrado sentenciante se ateve
aos dados do processo e tem ciência da controvérsia fático-jurídica que lhe fora
apresentada, tendo aptidão e legitimidade para proferir julgamento; b) expor o
caso para outros julgadores para fins de formação de precedentes, permitindo-
-lhes verificar o substrato fático que ensejou a decisão e, assim, confrontar com
as situações que ora se lhe apresentam para verificar a compatibilidade entre
uma e outra.
Destaca-se que a ausência de elaboração do relatório, é majoritariamente
compreendida como hipótese de nulidade, ou seja, a falta do relatório implica
sentença nula.
Ressalva-se respeitável posição doutrinária que entende haver necessidade
de demonstração de prejuízo para tanto, consistente na evidenciação de que,
pela discrepância da fundamentação, de fato, não houve leitura dos autos pelo
magistrado. Diversamente, se for possível perceber que, nada obstante não ela-
borado relatório, o juiz teve plena e ampla ciência da controvérsia decidida,
através da fundamentação específica associada a fatos particulares da causa,
entender-se-ia pela inexistência da nulidade.
Consigne-se que o debate acima não se aplica ao rito sumaríssimo dos Jui-
zados Especiais, regido pelos princípios da oralidade, simplicidade, informa-
lidade, economia processual e celeridade, o que redundou na dispensa legal
expressa de elaboração do relatório da sentença, à luz do que disposto no caput¸
in fine, do art. 38 da Lei nº 9.099/95.
Todavia, refugindo de tais entendimentos, independentemente da con-
vicção pessoal do leitor, para fins de concurso público, nunca deve o relatório
ser esquecido se não expressamente dispensado. A consequência da sua falta
depende, aí sim, da posição do examinador se a ausência implica nulidade ou
não. Se entender pela nulidade, é possível que haja atribuição de nota zero por
parte de um corretor mais rigoroso, ao passo que, do contrário, haveria perda
de pontos referentes a tal aspecto singularmente, sendo avaliado o restante
da prova.

2. FUNDAMENTAÇÃO

Rege o inciso II do art. 489, por sua vez, que os fundamentos são elementos
essenciais da sentença, “em que o juiz analisará as questões de fato e de direito”.

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ELEMENTOS DA SENTENÇA IV

Este elemento decorre diretamente do dever constitucional de fundamentação


das decisões judiciais, insculpido no art. 93, IX, da CF/881.
O art. 489, § 1º, do CPC, sem correlato na legislação processual revogada,
estabeleceu diretrizes para o que se tem por decisão não fundamentada. Vale
salientar que os ditames estabelecidos para se reputar válida a decisão são me-
ramente exemplificativos, conforme compreensão majoritária2. Extremamente
relevante sua leitura integral para evitar vício na elaboração da sentença da
prática forense ou do concurso público:
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela inter-
locutória, sentença ou acórdão, que:
I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem
explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo
concreto de sua incidência no caso;
III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de,
em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identifi-
car seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julga-
mento se ajusta àqueles fundamentos;
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente
invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em
julgamento ou a superação do entendimento.

Como aludido no inciso I, deve-se evitar valer-se de fundamentação ju-


rídica, seja ela lei, doutrina ou jurisprudência, sem fazer a adequada subsun-
ção do respaldo jurídico aos fatos concretos apresentados na relação jurídica
processual de parte a parte. E aí está, talvez, uma das grandes dificuldades do
recém-egresso da academia ou do estudante exclusivo de concurso público, ha-
bituado à exposição abstrata de conteúdo jurídico, quando se depara com a
necessidade de elaboração de sentença.
É a razão pela qual o estágio acadêmico supervisionado das faculdades
de Direito e o treino preparatório são indispensáveis antes da elaboração da

1. Art. 93. (...)


IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias
partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimida-
de do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;
2. Enunciado n° 303 do FPPC. (art. 489, §1º) As hipóteses descritas nos incisos do §1º do art. 489 são
exemplificativas. (Grupo Sentença, Coisa Julgada e Ação Rescisória)

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

sentença cível. Neles haverá a capacitação do redator para, além da formula-


ção de fundamentação jurídica genérica conceitual, indispensável, é claro, em
um próximo momento, realizar uma correlação, uma subsunção, como se verá
mais adiante, entre aquela tese e os fatos específicos da causa, para, só então,
ter-se a possibilidade de prolação de uma conclusão.
Outrossim, destaca-se que a fundamentação poderá se subdividir em ca-
pítulos, se houver mais de uma questão a ser solvida. Esses capítulos existem
independentemente de rótulos que se faça constar no ato decisório, de modo
que consistem na abordagem particularizada de cada matéria a ser apreciada.
Isto é, para a identificação de capítulos decisórios, basta que exista uma plurali-
dade de questões jurídicas a serem abordadas e decididas que emanem do caso
apresentado.
Consta-se que a ausência de fundamentação, de modo unânime em dou-
trina e em jurisprudência, diferentemente do que se viu no contexto do relató-
rio, faz implicar nulidade da sentença. Daí porque relevante observar os passos
propostos abaixo, na parte prática deste livro, no que tange a apreciação de
pedidos, preenchendo todos os elementos de uma fundamentação adequada
(identificação do pedido, apresentação da fundamentação jurídica pertinente,
análise das provas apresentadas, apreciação das teses de defesa, subsunção e
conclusão).
Entrementes, não se pode confundir fundamentação carente ou deficiente
com fundamentação sucinta, esta não implicando, necessariamente, em nuli-
dade da sentença.
Por curiosidade, o Código de Processo Civil de 1973 dispunha, expressa-
mente, que a sentença terminativa, ou seja, aquela que não resolve o mérito,
poderia ser prolatada de modo conciso3.
Malgrado a segunda parte do art. 459 não tenha sido objeto de repetição
no correlato art. 490 do CPC/15, o bastante criticado Enunciado nº 10 da EN-
FAM autoriza a elaboração de fundamentação sucinta, destacando ausência de
vício se o juiz enfrentar adequadamente as questões a serem tratadas:
Enunciado ENFAM nº 10: A fundamentação sucinta não se confunde com
a ausência de fundamentação e não acarreta a nulidade da decisão se forem
enfrentadas todas as questões cuja resolução, em tese, influencie a decisão
da causa.

3. Art. 459. O juiz proferirá a sentença, acolhendo ou rejeitando, no todo ou em parte, o pedido formula-
do pelo autor. Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, o juiz decidirá em forma
concisa.

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ELEMENTOS DA SENTENÇA IV

Superando a reprovação doutrinária do enunciado acima indicado, o Su-


perior Tribunal de Justiça entendeu que a concisão da decisão judicial, por si só,
não vicia o ato, quando for possível identificar que a fundamentação se revelara
suficiente para compreensão do convencimento do magistrado à luz dos fatos
que lhe foram apresentados e do ordenamento jurídico subjacente.4
Como já alertado, em provas de sentença, preferir fundamentar ampla-
mente acerca de todos os pontos e questões que se possa inferir do caso pro-
posto5. Para a praxe, mormente em unidades com elevada carga, adotar a com-

4. ADMINISTRATIVO. TERRENO DE MARINHA. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ALEGAÇÃO DE


VÍCIOS NO ACÓRDÃO RELATIVOS À FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA.
(...)
IV – No que trata da apontada violação do art. 489, I e II, e § 1º, e 1.022 do CPC de 2015, verifica-se não
assistir razão ao recorrente, pois o Tribunal a quo decidiu a matéria de forma fundamentada, tendo
analisado todas as questões que entendeu necessárias para a solução da lide, inclusive aquelas aponta-
das no apelo nobre como omitidas, não obstante tenha decidido contrariamente à pretensão da parte.
V – Vejamos os excertos essenciais que tratam das questões (fls. 270- 275). [...] Compulsando os autos,
verifica-se que os documentos anexados são capazes de comprovar o direito alegado, não havendo que
se falar em inexistência de documento essencial. Verifica-se, ainda, que a inicial inclusive foi instruída
de cópia do auto de infração n. 3.786 (fl. 09/10). [...] No caso em tela, verifica-se que a sentença restou
devidamente fundamentada, embora de forma concisa, mostrando-se clara e coerente, com indicação
das razões do convencimento daquela magistrada, que buscou fundamentos nos dispositivos legais
citados e na jurisprudência. [...] In casu, comunga-se com o posicionamento esposado pelo r. juízo
primevo à f. 162, uma vez que em se tratando de invasão de área de domínio público é correta a escolha
do procedimento especial da reintegração de posse. [...] Não há que se falar em ausência de documento
essencial, haja vista que a definição da faixa de domínio, a cargo do apelado, conforme documentação
trazida com a inicial, está estabelecida em 15 metros a partir do eixo da rodovia, seguindo-se, a seguir,
outros 15 metros da área não edificante. Desse modo, a existência da área não edificável, nos 15 metros
de largura após a faixa de domínio da rodovia, representa limitação ao direito de construir e deveria
ter sido obedecida pela apelante, independentemente de indenização, como já se decidiu em caso idên-
tico ao se determinar a demolição e limpeza da área ocupada por um barracão[...]".
(...)
(AgInt no REsp n. 1.650.680/MG, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em
8/5/2018, DJe de 14/5/2018.)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO
DA PRESIDÊNCIA DO STJ. MANUTENÇÃO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTA-
ÇÃO. IMPROCEDÊNCIA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA SUSPENSÃO DE EXPEDIENTE
FORENSE NO ATO DE INTERPOSIÇÃO. PRAZO DE 15 DIAS ÚTEIS. INTEMPESTIVIDADE.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Decisão sucinta não se confunde com ausência de fundamentação, desde que suficiente para que a
parte compreenda as razões do não conhecimento do recurso.
(...)
(AgInt no AREsp n. 2.162.990/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado
em 12/12/2022, DJe de 16/12/2022.)
5. No concurso do TJ/SP – 2019, constou advertência no enunciado nesse sentido no exame de sentença
cível: “Elabore sentença, enfrentando todos os argumentos das partes, expondo os fundamentos que
alicerçarem sua conclusão. Fica dispensado o relatório.”

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

preensão acerca da possibilidade de fundamentação expedita como maneira de


viabilizar análise quantitativamente maior de demandas pendentes.
Outro ponto de destaque é a celeuma fundamentação exauriente x fun-
damentação suficiente, entendendo, nada obstante entendimento doutrinário
adverso, o Superior Tribunal de Justiça que é prescindível a atividade argumen-
tativa acerca de pontos ou questões jurídicas prejudicadas ante o acolhimen-
to de teses antecedentes logicamente (prejudiciais). Nessa linha, cito a ementa
abaixo:
(...)
II – Conforme entendimento pacífico desta Corte: "O julgador não está
obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando
já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição
trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedi-
mentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julga-
dor apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada
na decisão recorrida." (EDcl no MS n. 21.315/DF, relatora Ministra Diva
Malerbi (Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção, jul-
gado em 8/6/2016, DJe 15/6/2016.)
(EDcl nos EDcl no RMS n. 47.449/PI, relator Ministro Francisco Falcão, Se-
gunda Turma, julgado em 15/12/2022, DJe de 19/12/2022.)

Ademais, insta observar que, conquanto o art. 489, § 1º, IV, do CPC exija
análise de todos os argumentos apresentados, há corrente doutrinária forte que
dispensa a análise de pontos e questões já previamente debatidas no âmbito das
decisões de observância impositiva, listadas no art. 927 do CPC6. Nestes casos,
cabe ao julgador providenciar a subsunção do caso sob exame à tese fixada pela
Corte Superior. É o teor do enunciado nº 594 do Fórum Permanente de Proces-
sualistas Civis – FPPC7.

6. Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:


I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II – os enunciados de súmula vinculante;
III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e
em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Supe-
rior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
7. Enunciado FPPC 524. (art. 489, §1º, IV; art. 985, I) O art. 489, §1º, IV, não obriga o órgão julgador a
enfrentar os fundamentos jurídicos deduzidos no processo e já enfrentados na formação da decisão
paradigma, sendo necessário demonstrar a correlação fática e jurídica entre o caso concreto e aquele
já apreciado. (Grupo: Precedentes, IRDR, Recursos Repetitivos e Assunção de competência)

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ELEMENTOS DA SENTENÇA IV

Aqui, uma vez mais, insisto no disclaimer. Para a praxe forense, é de grande
valia o domínio dessas interpretações mais estritas do dever de fundamentar,
haja vista que as metas impostas pelo Conselho Nacional de Justiça e o assober-
bamento de demandas nos escaninhos físicos e/ou virtuais das unidades obriga
a que o juiz se paute por uma atuação mais racional, focada em eficiência, com
vistas a decidir, com a maior qualidade possível, o maior número de feitos.
Entretanto, para concursos públicos, é essencial, como já se alertou opor-
tunamente em tópico precedente, versar acerca de absolutamente todos os pon-
tos e questões que emanem do enunciado, considerando-se que não se sabe
quais deles constarão no paradigma de avaliação do examinador.
De bom tom ressalvar, outrossim, o entendimento pretoriano manifestado
no AREsp 1.267.283-MG, segundo o qual, para fins do art. 489, § 1°, VI, do
CPC, não se considera como precedente a invocação de julgado "simples" e iso-
lado, afastando, assim, o dever de o magistrado especificamente dispor acerca
da sua não incidência caso decida em sentido adverso. A Corte explicitou que o
referido dispositivo deve ser lido conjuntamente com o art. 927 do CPC, o qual
elenca os chamados precedentes vinculantes ou qualificados, que devem ser
observados pelos juízes e tribunais, estes, sim, exigindo demonstração de dis-
tinguishing (distinção) ou overrulling (superação) para que julgue contra suas
conclusões o magistrado.
Com isso, depreende-se que o julgador não está obrigado a se manifestar
individualmente sobre julgados/precedentes de mero caráter persuasivo, não
infringindo tal postura o dever de fundamentação da decisão judicial.
Em igual sentido, o STJ definiu que o julgador não precisa se debruçar
acerca de julgados indicados na argumentação da parte, ainda que tenham se
formados em nível de qualificação, nos termos do art. 927 do CPC, que tenham
sito prolatados por tribunais de segundo grau distintos do qual está vinculado
o juiz, por disporem, neste caso, tanto quanto, de pura persuasão, não havendo
falar em obrigatoriedade por falta de hierarquia funcional entre o decisor e a
corte que os produziu8.

8. (...)
2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se o dever de seguir enunciado de súmula, juris-
prudência ou precedente invocado pela parte, previsto no art. 489, §1º, VI, do CPC/15, abrange tam-
bém o dever de seguir julgado proferido por Tribunal de 2º grau distinto daquele a que o julgador está
vinculado; (ii) se o valor existente em previdência complementar privada aberta na modalidade VGBL
deve ser partilhado por ocasião da dissolução do vínculo conjugal; (iii) se a apresentação de declaração
de imposto de renda com informação incorreta tipifica litigância de má-fé; (iv) se é possível partilhar
valor existente em conta bancária alegadamente em nome de terceiro.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

Enfim, cabe trazer, à colação, ementa de julgado da Corte Superior em que


reconheceu vício de fundamentação em hipótese em que o tribunal, ao jul-
gar um recurso em sede de uma ação em trâmite sob o procedimento comum,
restringiu-se a apresentar as balizas para a aplicação do entendimento ali ma-
nifestado, atribuindo aos juízes de primeiro grau a responsabilidade pela sub-
sunção aos casos repetitivos respectivos em suas unidades judiciárias. Merece
reprodução:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CPC/
2015. CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA EM EMPRESA
DE TELEFONIA. LIQUIDAÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLE-
TIVA (ACP N. 0632533-62.1997.8.26.0100/SP). PROLAÇÃO DE ACÓR-
DÃO GENÉRICO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DELEGAÇÃO DE
COMPETÊNCIA RECURSAL AO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. DESCA-
BIMENTO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OCORRÊN-
CIA. NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO.
1. Controvérsia acerca da validade de acórdão genérico prolatado pelo Tri-
bunal 'a quo', delegando ao juízo de primeiro grau a atribuição de aplicar o
referido acórdão ao caso concreto, sob a justificativa da existência de mul-
tiplicidade de recursos versando sobre questões atinentes à liquidação da
sentença proferida na ação civil pública n. 0632533-62.1997.8.26.0100/SP.
2. Nos termos do art. 489, § 1º, inciso V, do CPC/2015, não se considera
fundamentada a decisão ou acórdão que "se limitar a invocar precedente
ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes
nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos".
3. Imprescindibilidade, no exercício da jurisdição em caráter difuso, da
resolução das questões atinentes à especificidade do caso sob julgamento.
Doutrina sobre o tema.
4. Inobservância da regra do art. 489, § 1º, inciso V, do CPC/2015 no caso
concreto.
5. Inviabilidade de delegação de competência funcional hierárquica ao juízo
de primeiro grau para aplicar o referido acórdão genérico ao caso dos autos,
em virtude da ausência de previsão legal.

3- A regra do art. 489, §1º, VI, do CPC/15, segundo a qual o juiz, para deixar de aplicar enunciado de
súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, deve demonstrar a existência de distinção
ou de superação, somente se aplica às súmulas ou precedentes vinculantes, mas não às súmulas e aos
precedentes apenas persuasivos, como, por exemplo, os acórdãos proferidos por Tribunais de 2º grau
distintos daquele a que o julgador está vinculado.
(...)
(REsp n. 1.698.774/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 1/9/2020, DJe
de 9/9/2020.)

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SENTENÇA CÍVEL PONTO A PONTO VI

CAPÍTULO VI

SENTENÇA CÍVEL PONTO A PONTO

Doravante, se minudenciará, no que relevante, os itens acima listados para


sua melhor compreensão individualizada. O objetivo do estabelecimento desses
pontos é propiciar ao redator da sentença cível, ato da maior complexidade no
processo, a possibilidade de redigir de maneira escorreita, coerente e completa.
Isso porque, de nada adianta o julgador conhecer o direito material e o di-
reito processual aplicáveis ao caso, sendo imprescindível que conheça a técnica
de sentença para transpor adequadamente seus conhecimentos em formato de
ato decisório. Não se está diante de artigo jurídico ou mesmo livro acadêmico,
tampouco diante de uma petição advocatícia, mas do principal ato do processo
e da relação jurídica processual.
Note que, dentro dos acima itens elencados, existem os que se pode alcu-
nhar de essenciais, que devem ser trabalhados sob pena de perda sensitiva do
ato; os que se pode chamar de itens de mero deleite perenes, estes que visam
tão somente, em qualquer situação, elevar a impressão positiva do leitor, e os
itens voláteis, que, a depender do contexto emanado do caso concreto, podem
ser essenciais ou de mero deleite.
Uma advertência/desabafo para aqueles leitores da praxe forense: diante do
acúmulo de serviço e escassez de quadro funcional na maioria das unidades,
de um lado, e doutro a sedentia da sociedade por uma justiça mais célere e a
pressão institucional por produtividade com a superação das metas nacionais
do Conselho Nacional de Justiça, notadamente a meta 11, é comum que não

1. Meta 1 – Julgar mais processos que os distribuídos (todos os segmentos)


Julgar quantidade maior de processos de conhecimento do que os distribuídos no ano corrente, exclu-
ídos os suspensos e sobrestados no ano corrente.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

haja disponibilidade do julgador para perpassar por cada um desses pontos,


mormente os de natureza facultativa, restringindo-se aos aspetos estritamente
essenciais para a decisão do caso concreto.
Abaixo, quando da análise pontual de cada item sugerido, nos itens que
consideramos de mero deleite haverá o alerta, competindo ao leitor acolher a
sua colocação ou não na sua sentença cível.
Ao iniciar, deve o redator apor a palavra “SENTENÇA” em caixa alta, cen-
tralizadamente, no documento.
Em prova de concurso público, o candidato procederá tal como explicitado
no parágrafo anterior de maneira manuscrita, salvo se o próprio enunciado já
trouxer em si uma estrutura de relatório, exigindo a fundamentação em con-
tinuidade, quando então o candidato deverá seguir o ato decisório conforme
inaugurado pelo seu examinador2.
Em se tratando de sentença cível da praxe forense, é importante perceber
que alguns sistemas processuais eletrônicos, como o Sistema de Automação Ju-
dicial – SAJ, já automaticamente inserem no documento o tipo de ato, em con-
formidade com o modelo anteriormente selecionado, e alguns dados processu-
ais – cabeçalho – no qual consta número do processo, nome das partes, classe,
assuntos, entre outros. Lado outro, sistemas hão que não fazem tal importação,
ao menos num primeiro momento, como o Processo Judicial Eletrônico – Pje,
abrindo um documento totalmente em branco, porém sendo possível criar fer-
ramentas de autopreenchimento.

2. Na prova de sentença cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o enunciado adotou a
forma de relatório, de maneira que caberia ao candidato iniciar a resposta de texto definitivo imedia-
tamente pela fundamentação:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
XLVII CONCURSO PARA INGRESSO NA MAGISTRATURA DE CARREIRA DO ESTADO DO
RIO DE JANEIRO
SENTENÇA CÍVEL
Leia o relatório abaixo com atenção, presumindo a veracidade de todas as alegações feitas. Limite-se
à fundamentação e à parte dispositiva. Enfrente todas as questões explícita e implicitamente propos-
tas, mencionando na fundamentação todos os artigos eventualmente pertinentes, cuja correta cita-
ção será levada em consideração pela banca. AS QUESTÕES JURÍDICAS SUSCITADAS DEVERÃO
SER SOLUCIONADAS, AINDA QUE O CANDIDATO DECIDA EXTINGUIR O PROCESSO SEM
RESOLUÇÃO DO MÉRITO OU VENHA A ACOLHER EVENTUAIS PRELIMINARES OU PRE-
JUDICIAIS.

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SENTENÇA CÍVEL PONTO A PONTO VI

1. RELATÓRIO
Através do relatório, repetindo o que já se antecipou, o juiz vai indicar
o nome das partes e identificará o caso, narrando a síntese das teses autorais
e de defesa, bem como apontando as principais ocorrências e intercorrências
processuais, tal como comanda o art. 489, I, do CPC, já oportunamente repro-
duzido e analisado. No linguajar coloquial, o julgador conta a “historinha” do
caso e do processo.
No que tange à linguagem a ser adotada nesta parte da sentença, é a des-
critiva, narrativa, ou seja, não se autoriza valoração de qualquer espécie, ainda
que minimamente, neste trecho do ato. Está-se tão somente a descrever o que
se dera no processo até então, desde os pedidos formulados às teses de defesa,
além de narração dos principais eventos ocorridos no processo. Não só, pois,
é impertinente e inoportuno, como tecnicamente equivocado, o redator emitir
juízo de valor nesta sede, devendo-se redigir o texto de maneira criteriosamen-
te expositiva.
Ö Exemplo negativo:

“Às fls. XX, a testemunha YY confirma a tese autoral...”

Ö Exemplo positivo:

“Às fls. XX, consta depoimento da testemunha YY.”

Com efeito, o campo próprio para a atividade valorativa sobre as teses jurí-
dicas aventadas e acerca das provas coligidas aos autos, como se verá com mais
acurácia mais adiante, é a fundamentação.
Outrossim, tanto na praxe como em certames de magistratura, o redator
da sentença cível deve proceder ao relatório com parcimônia, sendo prescin-
dível que se relate especificamente cada ponto, argumento, tese ou ocorrência
processual. Pode (deve), até para evitar a fadiga do leitor/examinador, restrin-
gir-se a narrar aquilo que, com maior ou menor importância, será considerado
para a conclusão jurídica que se adotará.
Portanto, o redator deve se concentrar nos aspectos relevantes para a de-
cisão a ser adotada, numa técnica premonitória de identificação das questões
principais a serem abordadas na fundamentação.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

Desta forma, não precisa o julgador, por exemplo, ao relatar, fazer constar
que houve emenda à inicial para retificar o valor da causa; que houve subs-
tabelecimento com reserva de poderes a outros advogados; que a parte fora
intimada para trazer novo endereço dos réus não localizados para citação etc.,
salvo se tais informações forem relevantes para alguma conclusão a ser adotada
em sentença.
O relatório, assim, deve ser sintético, não se alongando em demasia, nota-
damente sobre aspectos não relativos à decisão que se adotará.
Noutro ponto, impende destacar que o tempo verbal adequado para a
construção adequada do relatório é o passado, haja vista que se fará alusão
ao que já ocorreu.
No que tange ao seu início, propriamente, o julgador pode optar por dar
diretamente partida à narrativa ou pode inserir a expressão “vistos” logo antes,
como se verá adiante. Não se deve escolher, preferivelmente, a expressão “rece-
bidos hoje” para o início do ato, já que, no mais das vezes, etimologicamente,
não representa a realidade. Com efeito, o cenário do Poder Judiciário retrata
excepcionalíssimos casos em que o magistrado consegue despachar/decidir,
quanto mais sentenciar, um feito no exato dia de sua conclusão, sendo mais
usual que o magistrado apenas possa se debruçar sobre o caso apenas após al-
guns dias ou até meses após a devolução dos autos pela secretaria para análise
e impulsionamento.
Em relação ao substantivo identificador das partes, faculta-se a utilização
de autor/réu, promovente/promovido, requerente/requerido, livremente a gosto
do escritor, sem que haja preferência por quaisquer destas ou mesmo erronia
em sua adoção. É a regra.
Nas ações especiais, todavia, quando haja previsão de uma denominação
legal específica a se reconhecer às partes, é impositivo que se opte por ela, como
ocorre no mandado de segurança, nos embargos das mais variadas subespé-
cies, na oposição e no rito sumaríssimo, por exemplo:

Mandado de Segurança: impetrante/impetrado;


Embargos: embargante/embargado;
Oposição: opoente/oposto;
Juizados Especiais: reclamante/reclamado.

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SENTENÇA CÍVEL PONTO A PONTO VI

O relatório pode ser iniciado de dois modos, também de livre escolha do


escritor: com a indicação do tipo de ação, seguida do nome das partes, ou pelo
nome da autora com o tipo de demanda e o nome do réu, tal como se verifica
nos exemplos abaixo:

“Trata-se de ação de obrigação de fazer ajuizada por A em face de


B...”
“A ajuizou ação de obrigação de fazer contra B...”

Sem prejuízo, não se descarta a possibilidade de construção em outros es-


tilos redacionais, desde que haja lógica, facilidade de compreensão e preenchi-
mento dos requisitos do elemento da sentença.
Como visto, o relatório é elemento essencial da sentença, na forma do art.
489, I, do CPC, configurando sua ausência nulidade, em seguindo o enten-
dimento dominante. Atente-se, todavia, ao que disposto no art. 38 da Lei nº
9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), o qual dispensa o relatório, apenas exi-
gindo menção aos principais fatos ocorridos em audiência.
Lei nº 9.099/95
Art. 38. A sentença mencionará os elementos de convicção do Juiz, com
breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado o re-
latório.

Todavia, como diz o brocardo “a maiori, ad minus”, isto é, quem pode o


mais, pode o menos, na praxe a elaboração de relatório nas sentenças dos pro-
cedimentos de rito sumaríssimo não implica nulidade, mas apenas desperdício
de tempo e esforço que poderia ser redirecionado a outros casos. Entretanto,
se se tratar de prova de sentença, é importante que o candidato se abstenha de
proceder ao relatório, mesmo que o queira, tendo em vista que a sua elaboração
poderá acarretar impressão do examinador de que aquele desconhece o teor e
a autorização contida no referido dispositivo, acarretando perda de pontuação.
Aliás, convém que expressamente o dispense e mencione o artigo chancelador.
Segue, abaixo, subroteiro de estrutura base de relatório, contendo os pon-
tos e a sua ordem de tratamento que devem ser relatados:
 Tipo de demanda e partes;
 Síntese dos fatos;
 Pedidos autorais;

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

 Documentos principais;
 Tutela de urgência, se o caso;
 Citação e audiência de conciliação, se o caso;
 Contestação: teses de defesa preliminares e meritórias, nessa ordem;
 Documentos principais;
 Mera referência à réplica, salvo fatos novos;
 Saneador, se o caso;
 Principais fatos da instrução, se o caso.
Note, especificamente, que o relatório em provas de sentenças de concurso
público é normalmente dispensado. Deve-se atentar para tal informação, até
para que não haja dispêndio inútil de tempo de prova e/ou espaço de prova,
já que a sua elaboração não ensejará qualquer consequência em sede de nota
atribuída. Ao contrário, pode acarretar gratuito decréscimo de pontuação se o
candidato cometer algum equívoco linguístico.
A dispensa do relatório, insisto, deve vir expressa, podendo constar do
enunciado ou das advertências acerca da prova de sentença. Segue amostra ex-
traída do concurso CEBRASPE – TJPR – 2019:
Considerando os fatos relatados anteriormente, redija sentença cível, dan-
do solução ao caso. Analise toda a matéria de direito processual e material
pertinente ao julgamento, fundamentando suas explanações. Dispense o
relatório e não acrescente fatos novos.

Entretanto, de outra banda, cuidado, atente para identificar se realmente


há dispensa pelo enunciado. É que, por vezes, habitua-se, nos treinos, a solver
os enunciados com dispensa de relatório de modo tal que já se parte do pressu-
posto de que não precisa ser realizado, sem que haja cautelosa verificação sobre
a desobrigação de o fazer. Assim, em eventualmente não liberando a prova da
confecção do relatório, pode o candidato não se aperceber da peculiaridade e
deixar de o elaborar, perdendo preciosos pontos3.

3. No concurso da VUNESP – TJ/AC – 2019, o relatório não fora dispensado: “Deverá o candidato ela-
borar a sentença, de acordo com os artigos 489, 490 e 491 do CPC, vedada sua identificação. Ao final,
deverá assinar como Antônio José, Juiz de Direito da Vara Cível da Capital. Tanto assim que o espelho
de correção assim dispôs: “Atender aos artigos 489, 490 e 491 do CPC – deve indicar as partes e os res-
pectivos pleitos, isto é, síntese da inicial e da contestação. Não houve dispensa de relatório, observan-
do que o artigo 489, inciso I, do CPC o menciona expressamente.” O examinador, na ocasião, atribuiu
um ponto (de dez) à elaboração do relatório, pontuação substancial e que pode fazer a diferença na

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SENTENÇA CÍVEL PONTO A PONTO VI

M Ultimadas as instruções de elaboração de relatório, compete exemplificar:

“Vistos.
I – RELATÓRIO
Cuida-se de ação de obrigação de pagar quantia certa interposta por
José em face de Maria pelo procedimento comum.
Narra o autor que alienara um par de brincos de ouro para Maria,
no valor de R$ 500,00, para pagamento trinta dias após a compra, porém
esta não o realizou na data aprazada.
Requereu a concessão dos auspícios da gratuidade judiciária, bem
assim a condenação à quitação contratual. Suplicou, outrossim, imputa-
ção de custas e honorários de sucumbência a Maria, estes à razão de vinte
por cento do valor da condenação.
Juntou contrato firmado entre as partes e termo de entrega da mer-
cadoria, fls..
Citada para comparecimento à audiência de conciliação, Maria se
ausentou injustificadamente, a teor do termo de fls..
Apresentou contestação de fls.. Na defesa, sustentou, preliminar-
mente, que o autor não era pobre na forma da lei, notadamente por não
ter sido apresentada qualquer documentação econômica ou fiscal neste
sentido, e, em mérito, que não possui condições econômicas atuais para
quitar a obrigação, propondo a entrega de um aparelho celular Xing Ling
como pagamento.
Não juntou documentos.
O autor, replicando às fls., argumentou fazer jus à gratuidade judici-
ária, pois, estando desempregado, promove aquisição de joias por opor-
tunidade, quando seus proprietários falecem e as repassam por valor
bem inferior ao de mercado. Outrossim, destacou que não aceitava o ce-
lular Xing Ling como pagamento, requerendo a condenação em pecúnia,
nos termos da inicial.
Juntou termo de não declaração de Imposto de Renda por perceber
rendimento anual inferior ao teto base às fls..
Vieram os autos conclusos.
É o relatório, passo a fundamentar e decidir.”

nota final, tendo o condão de implicar em eliminação do candidato ou em queda de sua classificação
no certame, notadamente porque, em se tratando de relatório, reputa-se ser um ponto “fácil”.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

Caso se esteja diante de prova de concurso público na qual o enunciado


contenha a previsão de dispensa de relatório, recomenda-se a adoção do se-
guinte formato:

“Vistos.
I – RELATÓRIO
(dispensado pelo enunciado)
É o relatório, passo a fundamentar e decidir.”

2. FUNDAMENTAÇÃO
É o momento de, à luz do caso narrado no relatório, expor os fundamentos
de fato e de direito que acarretarão a conclusão adotada, conforme o já aludido
art. 489, II, do CPC.
Na fundamentação, de rigor o abandono da linguagem meramente descri-
tiva e narrativa do relato para iniciar-se uma linguagem propriamente disserta-
tiva, considerando que já se deve dar curso à atividade argumentativa, visando
ao convencimento do leitor de que se alinha o ato à melhor compreensão sobre
o ordenamento jurídico que subjaz o quadro fático proveniente da demanda. Já
se exerce, então, a exposição dos argumentos que conduzirão o magistrado à
conclusão jurídica dispositiva.
Por esta razão, também, o tempo verbal adotado é o presente, pois não se
está fazendo alusão a fatos pretéritos, mas a argumentos contemporâneos pelos
quais se vale o juiz para julgar a causa.
Para aqueles que prestam concurso público de magistratura, aqui se en-
contra a aprovação do candidato. É na fundamentação que se concentra a
quantidade maior de pontuação da prova de sentença cível e é a base para a
demonstração ao examinador de que o intentante resta habilitado à prolação
de decisões judiciais robustas e sólidas.
Assim, antes de iniciar a parte de fundamentação, respire fundo e se pro-
ponha a fazer o melhor texto argumentativo de sua vida, observando de perto
a melhor técnica de construção da sentença e emitindo de modo mais completo
possível o conteúdo jurídico atinente ao caso proposto.

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SENTENÇA CÍVEL PONTO A PONTO VI

3. ESTABELECIMENTO DO REGIME JURÍDICO PROCESSUAL INCIDENTE


Cuida-se de item de mero deleite, de colocação facultativa.
A ideia do tópico é tão somente esclarecer ao leitor qual a legislação que
embasa(ou) o procedimento adotado, oportunizando a identificação sobre
quais regras jurídicas regeram a tramitação e instruem o próprio ato decisório,
haja vista possível pertinência de providências peculiares em relação a outros
ritos.
O próprio Código de Processo Civil prevê, em seu título III, procedimen-
tos especiais, cujos ritos refogem à ordinarização do procedimento comum pre-
visto no título anterior. Exemplos relevantes para a praxe são a ação de consig-
nação em pagamento, as ações possessórias, o inventário e a partilha, as ações
de família e a ação monitória.
Não se descure, outrossim, acerca da possibilidade de se ter que trabalhar
com o rito do revogado Código de Processo Civil de 1973, por exemplo, com o
procedimento sumário, acaso a ação tenha sido proposta sob sua égide e ainda
não tenha sido sentenciada, a teor do art. 1.046, § 1º, do CPC de 20154.
Outros ritos de bastante incidência prática e exigidos frequentemente em
concursos públicos são o rito sumaríssimo da Lei nº 9.099/95 (Juizados Espe-
ciais), o Mandado de Segurança da Lei nº 12.016/09, a ação civil de improbida-
de administrativa da Lei nº 8.429/92 (devendo se atentar às severas alterações
impostas pela Lei nº 14.230/21), a ação de alimentos da Lei nº 5.478/68 e a ação
de desapropriação do Decreto-Lei nº 3.365/41, dentre outras, cada qual com sua
peculiaridade, devendo o redator da sentença estar atento às nuances de cada
lei especial de regência ritual.

M Segue modelo de apresentação do item. Veja-se que se deve dispor de modo bas-
tante breve:

“Aplica-se o CPC/15 para reger o procedimento na espécie.”

M Entretanto, perceba: em se tratando de legislações mistas (de direito material e de


direito processual – ex.: LIA), há de se conjugar este item com o do estabelecimento

4. § 1º As disposições da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 , relativas ao procedimento sumário e aos


procedimentos especiais que forem revogadas aplicar-se-ão às ações propostas e não sentenciadas até
o início da vigência deste Código.

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MANUAL DA SENTENÇA CÍVEL PAULO HENRIQUE LIMA SOARES

do regime jurídico de direito material incidente, abordado no ponto 9 infra, a fim


de evitar repetições desnecessárias:

“Regem, material e processualmente, o caso, as disposições da Lei nº


8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa).”

4. DECIDIR SOBRE JULGAMENTO CONJUNTO DE AÇÕES


A seguir, passa-se à disposição sobre o julgamento conjunto de demandas,
item essencial neste início de parte fundamentativa. Perceba que, em regra, o
processamento conjunto já fora acolhido explícita ou implicitamente pelo juí-
zo, sob pena de eventual necessidade de conversão em diligência, incabível nes-
ta fase. Excepciona-se apenas as hipóteses em que, mesmo nunca identificada a
necessidade de tramitação conjunta, seja possível o julgamento único, como na
hipótese de conexão ou continência.
Anote-se que devem ser feitos capítulos distintos para cada ação a ser de-
cidida, inclusive, preferencialmente, sendo extremamente recomendável a cria-
ção de tópicos individuais para identificação perfeita pelo leitor de qual ação
está sendo objeto de julgamento em cada uma das exposições.
Ademais, devem, por consequência, serem elaborados tantos dispositivos
quanto a quantidade de ações conjuntamente decididas, com os respectivos
consectários (Ex.: custas e honorários advocatícios de sucumbência).

4.1. Conexão

Uma das hipóteses clássicas de julgamento conjunto de ações é a conexão.


O instituto está regulado no art. 55 do CPC, podendo se subdividir em
conexão propriamente dita (causa de pedir ou pedido comuns) – caput e §§ 1º
e 2º – ou a material (relação de prejudicialidade) – § 3º, valendo colacionar a
redação integral do dispositivo:
Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum
o pedido ou a causa de pedir.
§ 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta,
salvo se um deles já houver sido sentenciado.
§ 2º Aplica-se o disposto no caput:
I – à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao
mesmo ato jurídico;

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II – às execuções fundadas no mesmo título executivo.


§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam ge-
rar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decidi-
dos separadamente, mesmo sem conexão entre eles.

Observe-se, inclusive, que o legislador estabeleceu hipóteses legais expres-


sas de conexão no § 2º do art. 55, sem prejuízo do seu reconhecimento atípico
nos casos em que conceitualmente se verificar a comunidade de pedidos e/ou
causa de pedir entre as demandas comparadas.
Ademais, impende destacar que, conquanto o § 3º do art. 55 do CPC não
tenha paralelo na codificação processual anterior, o Superior Tribunal de Jus-
tiça, mesmo antes da vigência da inédita disposição, reconhecia que a prejudi-
cialidade entre as demandas, com risco de conclusões diversas por diferentes
juízes, mormente contraditórias entre si, acarretava a necessidade de reunião
das demandas sob o juízo prevento5.
Contudo, observe-se que, mesmo diante de conexão formal ou material,
não haverá reunião dos feitos, nas hipóteses seguintes:
 inconveniência na reunião;
 um dos feitos já houver sido julgado;
 se tratar de competência absoluta.

5. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. CONEXÃO. REUNIÃO DE


AÇÕES. RELAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE ENTRE AS CAUSAS. PROCESSO DE CONHECI-
MENTO E DE EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO CONJUNTO. DISSÍDIO JURIS-
PRUDENCIAL NÃO COMPROVADO.
1. Uma causa, mercê de não poder ser idêntica à outra, pode guardar com a mesma um vínculo de
identidade quanto a um de seus elementos caracterizadores. Esse vínculo entre as ações por força da
identidade de um de seus elementos denomina-se, tecnicamente, de conexão. (FUX, Luiz. Curso de
direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001).
2. A moderna teoria materialista da conexão ultrapassa os limites estreitos da teoria tradicional e
procura caracterizar o fenômeno pela identificação de fatos comuns, causais ou finalísticos entre dife-
rentes ações, superando a simples identidade parcial dos elementos constitutivos das ações.
3. É possível a conexão entre um processo de conhecimento e um de execução, quando se observar
entre eles uma mesma origem, ou seja, que as causas se fundamentam em fatos comuns ou nas mesmas
relações jurídicas, sujeitando-as a uma análise conjunta.
4. O efeito jurídico maior da conexão é a modificação de competência, com reunião das causas em um
mesmo juízo. A modificação apenas não acontecerá nos casos de competência absoluta, quando se
providenciará a suspensão do andamento processual de uma das ações, até que a conexa seja, enfim,
resolvida.
(...)
(REsp n. 1.221.941/RJ, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/2/2015,
DJe de 14/4/2015.)

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Com efeito, excepcionalmente, é possível que o magistrado entenda que,


num específico caso concreto que lhe tenha sido submetido, não se revelem
presentes os fundamentos ensejadores da reunião para decisão conjunta: eco-
nomia processual e segurança jurídica. A doutrina majoritária propõe que cabe
ao julgador, em cada caso, ponderar os benefícios e os eventuais malefícios da
reunião para, fundamentadamente, decidir sobre.
Ainda, se uma das ações conexas já houver sido sentenciada, não é caso
de reunião processual. Isso porque, como se disse no parágrafo anterior, os
objetivos precípuos do legislador em propor a união são propiciar economia
processual, com a possibilidade de adoção de atos conjuntos, e a segurança jurí-
dica, evitando decisões conflitantes. Ocorre que, com o julgamento de uma das
ações, tais propósitos desaparecem, de maneira que a própria lei ressalva a não
reunião neste caso, nos termos da parte final do § 1º do art. 55 do CPC. Nesse
sentido, a lição de DANIEL NEVES6:
Apesar de toda a polêmica que envolve a questão da obrigatoriedade ou não
da reunião de processos conexos criada na vigência do CPC/1973, e que deve
ser mantida na vigência do atual Código de Processo Civil, acredito que
uma reunião que não possa alcançar nenhum dos dois objetivos traçados
para o instituto está totalmente fora de questão. A aplicação automática,
sem nenhuma ponderação a respeito da ratio da norma não se justifica. E
parece concordar com tal posição a jurisprudência, sumulando o Superior
Tribunal de Justiça o entendimento de que não existe reunião de processos
conexos quando um deles já estiver no tribunal, circunstância esta em que
obviamente a reunião dos processos não geraria qualquer economia proces-
sual ou harmonia dos julgados, visto que em um deles a prova já foi produ-
zida e a decisão já foi prolatada.
Há diversos julgados do Superior Tribunal de Justiça que afirmam expres-
samente existir um verdadeiro juízo de conveniência baseado em juízo de
discricionariedade na reunião de ações conexas, deixando suficientemente
claro não ser obrigatória tal reunião no caso concreto. Essa facultatividade
de reunião de ações conexas está inclusive sumulada quando a conexão se
der entre execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor. Tudo leva a
crer que a reunião nos termos do § 3° do art. 55 do CPC seguirá a mesma
lógica, ou seja, não será obrigatória mesmo que haja risco de decisões con-
flitantes e contraditórias.

Enfim, note que a reunião dos processos conexos se restringe aos casos de
competência relativa, fixada no principal interesse privado das partes processu-
ais, não abrangendo, pois, casos em que a competência do juiz advém de norma

6. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume Único. Salvador:
Juspodivm, 2016.

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de natureza absoluta, selecionada no maior interesse público. É a interpretação


que decorre da leitura do art. 54 do CPC7, sendo o entendimento adotado pelo
Superior Tribunal de Justiça8.
Nestes casos, a solução para evitar a prolação de decisões conflitantes é o
juiz da demanda prejudicada ter a sensibilidade de, em percebendo tal situação,
proceder à suspensão processual, nos termos do art. 313, V, do CPC, aguardan-
do-se a definição da demanda prejudicial.9

4.2. Continência

A continência é outra hipótese de julgamento conjunto de ações, quando


se verifica identidade de partes, de causas de pedidos, mas um dos pedidos é
mais amplo, abrangendo em si o da outra ação. Esta regida no art. 56 do CPC:
Art. 56. Dá-se a continência entre 2 (duas) ou mais ações quando houver
identidade quanto às partes e à causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser
mais amplo, abrange o das demais.

Entretanto, destaque-se que só haverá reunião se a ação contida for pro-


posta primeiro. Se a ação continente houver sido proposta anteriormente, deve-
rá ser extinta sem resolução de mérito a demanda contida, porquanto há de se
considerar que, neste último caso, haverá tecnicamente uma litispendência, já

7. Art. 54. A competência relativa poderá modificar-se pela conexão ou pela continência, observado o
disposto nesta Seção.
8. (...)
2. Eventual existência de conexão entre demandas não é causa de modificação de competência absolu-
ta, o que impossibilita a reunião dos processos sob esse fundamento. A conexão por prejudicialidade
prevista no art. 55, § 3º, do CPC/2015 submete-se à previsão do art. 54 do mesmo diploma processual,
que limita as hipóteses de modificação de competência de natureza relativa.
3. Inviabilizada a reunião de processos, a multiplicidade de penhoras sobre o mesmo bem demanda
a definição da competência de um único juízo para recebimento dos créditos e posterior distribuição
entre os diversos credores, evitando-se decisões conflitantes e garantindo segurança jurídica.
(...)
(CC n. 171.782/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Segunda Seção, julgado em 25/11/2020, DJe de
10/12/2020.)
9. Art. 313. Suspende-se o processo:
(...)
V – quando a sentença de mérito:
a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação
jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente;
b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova,
requisitada a outro juízo;

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que o seu pedido estaria completamente abrangido pelo formulado na preten-


são pretérita. É a regra do art. 57 do CPC10.
Até poderá haver julgamento conjunto neste último caso, mas só se perce-
bido tão somente quando da prolação da sentença, quando para um dos pedi-
dos, o contido, se imporá prévia extinção de resolução de mérito, seguindo-se
à análise do remanescente.

4.3. Oposição

Através da oposição, um terceiro pretende o bem ou o direito sobre o qual


controvertem autor e réu em uma relação processual. Era prevista como inter-
venção de terceiro na codificação revogada. Porém, no CPC de 2015, é tratada
como procedimento especial, ajuizado por dependência à causa originária, sen-
do julgados ambos pela mesma sentença, conforme art. 682 e ss.
Art. 682. Quem pretender, no todo ou em parte, a coisa ou o direito sobre
que controvertem autor e réu poderá, até ser proferida a sentença, oferecer
oposição contra ambos.
Art. 685. Admitido o processamento, a oposição será apensada aos autos
e tramitará simultaneamente à ação originária, sendo ambas julgadas pela
mesma sentença.

Cuida-se de procedimento prejudicial, conforme art. 686 do CPC, razão


pela qual deverá o juiz julgar, no ato de sentença em que tem de analisar a de-
manda originária e a oposição, primeiramente esta.
Art. 686. Cabendo ao juiz decidir simultaneamente a ação originária e a
oposição, desta conhecerá em primeiro lugar.

É que, caso procedente a oposição, será considerada prejudicada a deman-


da originária, porquanto há perda de seu objeto, que fora conferido ao opoente.
De outra sorte, rejeitada a pretensão do opoente, sucumbente este, portanto,
passa-se ao julgamento da demanda originária a fim de se decidir a qual dos
opostos deve ser conferido o bem ou direito debatido.

10. Art. 57. Quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta anteriormente, no pro-
cesso relativo à ação contida será proferida sentença sem resolução de mérito, caso contrário, as ações
serão necessariamente reunidas.

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4.4. Reconvenção

Reconvenção é espécie de ação sui generis manejada pelo réu em face do


autor, quando houver conexão entre o seu pedido e o do autor ou entre aquele
e algum fundamento da defesa. Está prevista no art. 343 do CPC, infra cola-
cionado:
Art. 343. Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifes-
tar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento
da defesa.

Julgar-se-á depois da ação principal, porém não há dependência em relação


a esta, diferentemente do que se dá com a oposição ou mesmo com o recurso
adesivo no processo civil11. Ou seja, mesmo que haja extinção sem julgamento
do mérito da demanda originária, se a reconvenção preencher os pressupostos
processuais e requisitos de admissibilidade, deve ser apreciada pelo magistrado.
Assim é que a demanda proposta através de reconvenção tem que preen-
cher os mesmos requisitos e pressupostos de uma ação interposta originaria-
mente, inclusive no que toca à taxa judiciária, se houver previsão neste sentido
na legislação local de regência. Se a petição estiver viciada, mas for possível a
correção, tanto quanto possui o reconvinte direito subjetivo de emenda.
Vale ressaltar que, desde o advento do CPC de 2015, houve uma simplifica-
ção no procedimento da reconvenção. Com efeito, na égide da legislação ante-
rior, exigia-se que a reconvenção fosse proposta em petição própria, distinta da
peça de contestação/defesa. Era o que decorria da redação do art. 299 do CPC
de 197312.
Diferentemente da redação dada pelo legislador anterior, a novel ressalta
que, “na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção...”, de maneira que se
admite o manejo simbiótico de defesa e reconvenção. Nem mesmo se exige a
rotulação da demanda reconvencional na peça de defesa, ou seja, que o pro-
movido crie tópico específico na contestação para abordar o pleito, embora tal,
por razões práticas, seja de todo recomendável. Todavia, um alerta: como quem

11. Art. 997 (...)


§ 2º O recurso adesivo fica subordinado ao recurso independente, sendo-lhe aplicáveis as mesmas
regras deste quanto aos requisitos de admissibilidade e julgamento no tribunal, salvo disposição legal
diversa, observado, ainda, o seguinte:
(...)
12. Art. 299. A contestação e a reconvenção serão oferecidas simultaneamente, em peças autônomas; a
exceção será processada em apenso aos autos principais.

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