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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

THE BIRTH OF THE CAPE VERDEAN ROMANCE

Crisandeson Silva de Miranda1


José João de Carvallho2

RESUMO: Este trabalho analisa o surgimento da literatura de longa ficção


cabo-verdiana, bem como o processo de descolonização, ruptura e
construção de identidade literária nacional por meio do romance Chiquinho
(1947). Essa obra é pioneira em buscar no horizonte literário de Cabo Verde
a verdadeira história, a autêntica cultura e os problemas sociais e reelaborá-
los esteticamente. Para isso, laçaremos mão da filosofia estética de Gyorgy
Lukács e dos conceitos relacionados ao engajamento literário e ao romance
histórico. As reflexões sobre esse romance de Baltasar Lopes possibilitam
perceber como a arte se alimenta da realidade, levando a inúmeros
momentos de catarse e denunciando a mais precária forma de destruição
do ser humano: a fome.
Palavras chave: Romance histórico; Engajamento; Realismo.

ABSTRACT: This work analyzes the emergence of Cape Verdean long fiction
literature, as well as the process of decolonization, rupture, and
construction of national literary identity through the novel Chiquinho
(1947), a pioneering work in searching the literary horizon of Cape Verde the
true history, the authentic culture and the social problems and reelaborate
them aesthetically. For this, we will draw on Gyorgy Lukács' aesthetic
philosophy and concepts related to literary engagement and historical
romance. The reflections on this novel by Baltasar Lopes makes it possible to
perceive how art feeds on reality leading to innumerable moments of
catharsis and denounced the most precarious form of human destruction:
hunger.
Keywords: Historical Romance; Engagement; Realism.

Introdução
O presente artigo proporá um olhar analítico acerca de alguns
vieses do romance Chiquinho, do escritor cabo-verdiano Baltasar Lopes,

1 Mestrando em Crítica Literária pela Universidade de Brasília (UnB); Professor da


Secretaria de Educação do Distrito Federal; correio eletrônico: zander_21@hotmail.
2 Doutor em Linguística pela Universidade de Brasília (UnB); Professor do Instituto
Federal do Goiás; correio eletrônico: josejoaodecarvalho@gmail.com.

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Crisandeson Silva de Miranda; José João de Carvallho

obra publicada em 1947, partindo dos seguintes pontos: a história e o


engajamento literário. Para tanto, apresentará como os elementos: história
e política estão dialogando e também demonstrará como eles são
absorvidos por Lopes para a construção da sua obra prima.
Com efeito, em um primeiro momento, este artigo fará um
sucinto panorama sobre a forma, os conceitos e as características do gênero
romance e do subgênero romance histórico. Para conceituar a literatura
engajada, o ponto de partida será a filosofia estética de Gyorgy Lukács, bem
como apontamentos teóricos de outros autores que serão suscitados para
discutir questões do entrelaçamento da história e do cotidiano em
Chiquinho, descortinando uma narrativa com personagens da ordem social
da época, apontando para conflitos sociais que refletem artisticamente a
história e a identidade de um povo.
Em tempo, será feita também uma exposição sobre as condições
do surgimento do gênero romance em Cabo Verde, onde houve a imposição
da cultura colonial, entretanto apontará características singulares em
relação a outros países africanos que se expressam em língua portuguesa.
Adiante, será realizada uma breve explanação sobre o trajeto literário de
Baltasar Lopes, utilizando-se importantes pesquisadores em literatura de
língua portuguesa.
É importante destacar que serão analisadas, no romance
Chiquinho, questões que versam sobre dois pontos relevantes para a
compreensão da tradição literária cabo-verdiana: o histórico e o
engajamento literário. Sobre o primeiro, serão suscitadas as pesquisas de
teóricos como Gyorgy Lukács e Regina Zilberman, tendo como objetivo a
percepção da presença do gênero romance histórico na obra de Baltasar
Lopes, revelando como o artista absorve da realidade e da história a matéria
prima da sua produção literária.
Já sobre o segundo ponto, utilizaremos a noção de engajamento
literário, presente nos estudos de Benoit Denis e de Edvaldo Bergamo para a
compreensão da função do artista engajado na obra do escritor cabo-
verdiano. Por fim, far-se-á necessário tratar sobre os vieses sócio-político-
culturais, engendrados em um projeto de nação, que torna essa vertente
um elemento de conexão na influência do cotidiano do indivíduo. Essas
colocações carecem de análise cuidadosa, em virtude da busca de
identidade que a narrativa de Baltasar Lopes apresenta.

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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

O Romance, o romance histórico e o engajamento literário


O romance é o gênero literário que surgiu com o objetivo de
retratar uma inédita fase do desenvolvimento da humanidade e da
sociedade. Essa nova forma de expressão, obteve sua preeminência no
período da história em que a sociedade ocidental estava organizada nos
moldes capitalistas. As modificações que sobrevinham nas relações sociais,
no modo de produção e nos fatos históricos foram fundamentais para
estimular nos artistas das letras e das palavras o surgimento dessa
expressão literária.
No começo do século XVII, Miguel de Cervantes escreveu o seu
memorável Dom Quixote de la Mancha (1605), dando início ao gênero
romance e inaugurando uma forma de escrita literária que se diferenciava
de todas as outras. Na sua grande obra, o escritor espanhol parodiava os
romances de cavalaria. A narração dos feitos do herói satirizava os princípios
que conduziam as histórias fantasiosas dos protagonistas de cavalaria,
revelando, dessa maneira, a realidade daquele momento histórico.
O crítico literário Lukács (2009) afirma que Cervantes e Rabelais
foram os criadores do romance moderno e que tanto a aristocracia daquele,
quanto a burguesia deste se opuseram à deterioração do homem na extinta
sociedade feudal e à degradação na iniciante sociedade burguesa. No início
da era moderna, o gênero romanesco se tornou uma tentativa de responder
às expectativas da classe social que representou: a burguesia. Diante do
progresso intenso das conquistas burguesas e capitalistas, o sujeito que não
se rendia à alienação de uma sociedade mercantilizada era exilado, ou
melhor, era posto à margem da organização social.
O romance se consolidou na experiência pessoal e na livre
invenção criadora. Sobre a prosa de longa ficção, Bakhtin salienta que:

O romance se formou precisamente no processo de


destruição da distancia épica, no processo da familiarização
cômica do mundo e do homem, no abaixamento do objeto
da representação artística ao nível de uma realidade atual,
inacabada e fluida. Desde o início o romance foi construído
não na imagem distante do passado absoluto, mas na zona
de contato direto com esta atualidade inacabada (1990, p.
427).

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Desde o princípio, esse gênero literário foi constituído na zona de


contato direto com o presente inacabado, diferenciando-se da epopéia
(expressão literária frequente na sociedade feudal, que privilegiava o
passado e o fantástico) e conquistando a realidade cotidiana. De acordo
com Lukács:

O mundo do romance se limita cada vez mais à realidade


cotidiana da vida burguesa e as grandes contradições
motrizes do desenvolvimento histórico-social são figuradas
apenas na medida em que se manifestam de modo concreto
e ativo nesta realidade cotidiana. Mas estas contradições
continuam a ser figuradas. E o realismo da vida cotidiana,
recém-descoberta ‘poesia da realidade cotidiana’, a vitória
da poesia sobre esta realidade prosaica, tudo isso não passa
de um meio para a figuração concreta e viva dos grandes
conflitos sociais da época. Com clara consciência, os
romancistas tendem a uma figuração do típico, a um
realismo para o qual a cuidadosa figuração dos detalhes não
é mais do que um meio (2009, p. 218).

Segundo Watt (1990), o método narrativo que alavancou o


desenvolvimento do romance foi o realismo formal, possibilitando que o
gênero se tornasse a narração da realidade cotidiana e o relato verossímil da
vivência social e pessoal da sociedade burguesa. O crítico inglês reforçou
que o realismo captou e reconstruiu artisticamente o real. Nesse sentido,
não se trata de uma mera fotografia, mas de um método que procura
absorver a essência das modificações ocorridas e seus reflexos na vida
humana, tendo como finalidade desvelar as mazelas da sociedade burguesa
e denunciar as diversas formas de alienação humana do modo de vida
capitalista.
Sobre o romance histórico, é importante ressaltar que o principal
estudioso desse gênero foi Lukács (2011). O autor húngaro responsabilizou o
escritor escocês Walter Scott (com a obra Waverley Novels de 1814) pelo
surgimento dessa forma. Para o crítico literário, ao chamado romance
histórico anterior à obra de Scott carecia precisamente o ‘específico
histórico’, ou melhor, a singularidade histórica de seu tempo e a
excepcionalidade na ação de cada personagem.
Em seu ensaio O romance histórico: teoria e prática, Zilberman
(2003) relatou que não existiu romance histórico antes de Scott. Segundo a
autora, criador e criatura conectaram-se numa excepcional forma, que se
confirmou como ideia e como realização num método uniforme e único. Ela
reiterou que:

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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

Georg Lukács faz, pois duas exigências ao romance histórico:


a recuperação da ‘singularidade histórica de uma época’, o
que logo a seguir, ele designará como ‘verdade histórica’ (p.
15); a tradução da singularidade histórica por meio da
atuação da personagem, de modo que o comportamento
dos agentes explicite as peculiaridades da época
representada (ZILBERMAN, 2003, p.113).

De acordo com Lukács (2011), o momento que possibilitou o


surgimento dessa foi o ano de 1814, marcado pela derrota de Napoleão
Bonaparte pelas tropas aliadas de ingleses e austríacos, encerrando assim, o
ciclo revolucionário iniciado pelo movimento de 1789. Esse evento
proporcionou aos europeus um sentido histórico fundamental para o
aparecimento e a materialização do romance histórico. A ascensão e a
queda de Napoleão Bonaparte foi um fenômeno vivenciado pelo povo que
resultou numa experiência de massas, fortalecendo nas pessoas a ideia da
existência de uma história que intervém diretamente em suas vidas
individuais e coletivas.
O romance social possibilitou a Scott criar o romance histórico,
permitindo aos leitores uma experiência reabilitadora, verdadeira e épica
que apreendeu a vida social em sua profundidade. O romance histórico é
um fenômeno que sobrevive até os dias contemporâneos, despontando a
história viva; a relação entre o coletivo e o privado; a história que se
materializa no cotidiano; a existência de forças antagônicas alienadas. Por
fim, essa forma de expressão literária possibilitou o conhecimento de que a
história é mutável e apontou para a importância de resgatar o passado para
compreender o presente e modificar o futuro.
Para compreender a presença do engajamento literário e a sua
constância no gênero romance, é importante perceber a preocupação do
romancista em usar sua arte como forma de refletir a realidade, provocando
nos leitores a essência da sua humanidade. Nesse sentido, surgiu no século
XIX o romance político, que atingiu seu apogeu no século XX, estimulado
pelos acontecimentos que giravam em torno da Revolução Russa. Durante
esse período, a obra artística se transformou num veículo de consciência
social e a literatura se tornou engajada, ora declinada à questão social, ora
voltada para a defesa dos valores universais (justiça, liberdade, dignidade
humana etc.). O escritor engajado usa a sua obra a serviço de uma causa
política e a favor da sociedade e do homem.

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Para Denis (2009), o romancista político não espera que a obra


literária se finalize nela mesma e que depare nessa autossuficiência a sua
justificação última. Muito pelo contrário, ele a analisa cruzada por um
projeto de natureza ética, que permite uma análise do homem e da vida,
concebendo a partir disso a arte literária com o objetivo de anunciar e se
definir pelos fins que busca no mundo. O romancista engajado é aquele que
se apropria da literatura para ofertar as suas razões e que compreende que
esses motivos não podem ser descobertos numa essência da literatura
definida a priori, mas, no papel que a literatura apreende e preenche na
sociedade e no mundo. Para ele, expressar-se por meio da literatura é um
ato público desempenhado com toda responsabilidade. Nesse sentido,
Bergamo aponta que a arte deve proporcionar reflexão e provocar no leitor
uma participação mais ativa aos desafios de seu tempo histórico. Ele
acrescenta que é:

Inegável que toda obra de arte possua um posicionamento


diante da vida; resta saber, contudo, se essa postura pode
ser traduzida em termos de alienação e conformismo ou
indagação crítica em face aos desafios desfechados
constantemente pela vida concreta ao homem concreto,
uma vez que o verdadeiro engajamento deve ser formulado
‘no sentido de compatibilidade da eternidade da obra
literária com a fidelidade às exigências irrecusáveis da época
histórica que reflete’ (BERGAMO, 2008, p. 51).

Por fim, a função do artista engajado se concretiza em realizar


uma arte revolucionária, unindo estética e ideologia. A posição solicitada
consiste em assumir o caráter ideológico da obra, afirmando a importância
para que ela atue como meio de conscientização e de amadurecimento
político. Tudo isso por meio da estética, ou melhor, dos efeitos artísticos.
Nesse sentido, os romancistas não podem jamais se anular diante da
realidade histórica de seu tempo.

O romance cabo-verdiano e o lugar do artista


A narrativa literária africana de língua portuguesa tem buscado
sua identidade utilizando, sobretudo, a temática pós-colonial, carregada das
marcas das guerras de independência, das lutas posteriores e da
necessidade de reconstruir uma arte literária capaz de expressar a voz de
um povo, as necessidades de uma nação, proporcionando aos seus leitores e
aos seus produtores uma marca de pertencimento. Gomes (2006) alerta

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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

que, apesar da força de uma dominação cultural que se estabeleceu por


cinco séculos, o sujeito cabo-verdiano desde cedo marcou sua atitude de
resistência, avocando sua identidade.
A pesquisadora acrescenta que o crioulo (cabo-verdiano) é
utilizado como um instrumento de resistência, “pelas vozes que entoavam
as cantigas de trabalho, os repiques do batuque, a euforia do funaná
dançado, dos poemas engajados, dos contos ‘di bóka do tardi” (GOMES,
2006, p.161). Todas essas manifestações marcaram uma resistência
organizada que estimularam as lutas de independência nacional.
Diante dessa oposição ao aculturamento português, o povo cabo-
verdiano se diferenciou dos demais colonizados africanos e até mesmo
americanos. Segundo Mariano:

Parece-me ter havido em Cabo Verde um certo desvio


naquilo que o português realizou nas áfricas. Melhor
dizendo: um certo desvio na posição do homem português
perante a direcção dos fenômenos que foram surgindo nas
vicissitudes de contacto com os povos afro-negros. No Brasil,
por exemplo, nota-se que ao branco coube sempre uma
função de líder, de mestre na evolução da sociedade
brasileira. Em Angola, Moçambique, Guiné ou S. Tomé e
Príncipe coube ao português o poder de comandar o fluir e
refluir dos acontecimentos locais. Em Cabo Verde o mulato
adquiriu desde cedo grande liberdade de movimento... ter-
se ia transferido para o mulato a condição de mestre, de
líder na estruturação da sociedade caboverdeana... Teria
sido o funco, e não o sobrado, o laboratório exacto onde se
processou a síntese de culturas e apropriação pelo negro e
pelo mulato de elementos e expressões civilizacionais
portugueses. A cultura fez-se de baixo pra cima (2008, p.
51).

Nesse contexto, a figura do mulato protagoniza de forma


significativa o sentido de pertencimento ao seu próprio lugar. As expressões
de cultura mestiça se tornaram essenciais para assegurar a identidade cabo-
verdiana.
Lopes (2010) revelou que para a efetiva comprovação das
primeiras prosas de ficção em Cabo Verde serão necessárias investigações
capazes de resgatarem das bibliotecas e dos arquivos um relevante número
de escritores e textos. Ele evidenciou alguns trabalhos de pesquisadores
mais recentes que sinalizavam para uma importante fase de formação e que
ficaram espalhadas por jornais, revistas e publicações de circulação restrita.

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Para muitos investigadores, o romance que inaugurou a longa


narração em Cabo Verde foi escrito por José Evaristo d’ Almeida, um
colonizador branco, que viveu uma relevante parte da sua vida nas colônias
africanas. O escravo (1856) tinha como protagonista Maria, uma mulata de
classe média. É possível perceber, desde já, uma intenção do autor em
evidenciar na construção de sua heroína, certo nativismo local. Entretanto, a
crítica ressaltou que a heroína foi criada com características inerentes às
qualidades de uma branca europeia que se apaixonou por um escravo
negro, evidenciando as características românticas da época.
Em 1936, Baltasar Lopes e alguns companheiros criaram a revista
Claridade com o lema “fincar os pés na terra cabo-verdiana”. Nesse
momento, os escritores tidos como criadores da literatura cabo-verdiana
autônoma introduziram temas inéditos que guardavam consonância com a
realidade, a história, a sociedade e o indivíduo local. Assuntos como a
estiagem, a vida urbana e a emigração, serviram de alicerce para criar a
identidade de uma literatura descolonizada. Nesse sentido, Ferreira assinala
que:

O projecto da geração da Claridade descola-se pela


transgressão, pelo deslocamento da visão europeia para
uma visão cabo-verdiana. Daí o rompimento com os
modelos temáticos europeus e uma radical consciência
regional. O ideário de certeza enriquece a tomada de
posição de Claridade pela introdução de uma visão dialéctica
dada pelo marxismo. Este grupo do Suplemento Cultural,
mercê da participação de alguns dos seus membros, enceta
a substituição do conceito regional pelo conceito nacional. É
assim que uma nova perspectiva em relação à situação
colonial surge já próxima da década de sessenta, e nesta se
vai prolongar e aprofundar (1977, p. 47).

Ferreira (pesquisador de Literatura africana de expressão


portuguesa), também pontuou a importância do romance Chiquinho (1947)
como a obra pioneira que abriu a série de longa ficção cabo-verdiana.
Sobre Baltasar Lopes da Silva, vale salientar que o escritor nasceu
na ilha de São Nicolau em Cabo Verde, no ano de 1907. Realizou seus
estudos universitários na cidade de Coimbra em Lisboa, formando-se em
Direito e Filologia Românica. Retornou para Cabo Verde, onde exerceu o
cargo de professor, reitor e advogado. Faleceu em 1989 de uma
enfermidade cerebrovascular em Lisboa.

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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

O romancista é considerado por boa parte da crítica: um cabo-


verdiano enraizado à sua terra. Poeta, ficcionista ensaísta, estudioso da
língua cotidiana de Cabo Verde (o crioulo). É respeitado pela sua
contribuição à literatura de longa ficção nacional. O autor publicou contos
em diversos periódicos e antologias; escreveu diversos poemas que foram
assinados sob o pseudônimo de Osvaldo Alcântara. Além de alguns ensaios,
foi um dos autores da Antologia da ficção cabo-verdiana contemporânea.
O estudioso de literatura africana em língua portuguesa Abdala
Junior (2003) ressaltou a importância do trabalho desse romancista para a
legitimação do crioulo como expressão da oralidade cabo-verdiana. Segundo
o crítico literário, essa busca de identidade em Baltasar Lopes teve como
objetivo o combate ao aculturamento português, e, sobretudo trouxe à tona
as origens culturais que caracterizavam a intelectualidade cabo-verdiana.
Ferreira (1977) afirmou que Baltasar Lopes foi o pioneiro em
buscar a construção de identidade linguística crioula no território africano
de colônia portuguesa. Segundo o pesquisador, a ruptura iniciada por esse
romancista é um ponto recorrente na narrativa cabo-verdiana. Acrescenta
que nenhum outro logrou tão longe na obstinação de construir na literatura
de Cabo Verde a expressão cultural do seu povo descolonizado. Chiquinho
(1947) foi a sua maior contribuição literária e é, sem dúvida, um dos
romances cabo-verdiano mais estudado no universo acadêmico.
Chiquinho (1947) foi o romance que inaugurou a longa narrativa
em Cabo Verde. A narrativa apresenta detalhes do país africano na primeira
metade do século passado. Baseado em uma realidade escondida, o texto
literário denuncia o desamparo do cidadão cabo-verdiano; a dificuldade de
sobrevivência em meio à seca; à prostituição e à enxada. O romance aponta
para o exílio como uma das poucas possibilidades de vencer a fome. O texto
é organizado em três partes: Infância, S. Vicente e As Águas.
Na primeira parte, o protagonista Chiquinho (narrador em
primeira pessoa) relata sua infância, apresenta sua família, seu povo e seu
local. Revela que sair do país de origem, foi a única solução encontrada pelo
pai para não deixar a família passar por privações:

Foi quando da seca de novecentos e quinze. Os sequeiros


não deram nada e no regadio a água quase secou. Ao tempo
éramos só dois filhos, eu e Lela, porque Nina, que era depois
de mim morreu com três anos. Lela era menino de mão
quando papai embarcou...

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[...]
— Maria, eu preciso dar uma ordem na vida. Este tempo não
está capaz...
— Ordem de que maneira criatura?
— Estou pensando em embarcar para a América.
Mamãe quis dissuadi-lo.
— Não menina. Precisamos criar esses meninos. Hortas não
está dando nada (LOPES, 1986, p. 8).

Nessa parte do romance, é narrado ao leitor o ambiente


trepidante da Ilha de São Nicolau. Vários personagens que fizeram parte da
vida do herói e suas pobres existências são exibidos aos leitores. Nesse
momento, também são apresentados: a seca, o trabalho no cabo da enxada,
a agricultura de sobrevivência, as histórias contadas por Nhá Rosa Calita,
recordando figuras como a do cruel Nho Maninho Bento (traficante de
escravos) etc.
Chiquinho (1947) apresenta os dramas vividos pelos cabo-
verdianos operários que tinham conseguido emigrar para os Estados Unidos.
O trecho a seguir foi retirado de uma carta que um parente manda para
uma mãe informando sobre a morte do seu filho:

Tudinha triste novidade que eu tenho para você, é teu filho


Manuel que faleceu no dia 3 de novembro, derivado de uma
maquina que pegou ele e matou na fábrica. Nós tudo ficou
muito triste, coitado de Manuel era um bom moço e nós
tudo tinha com ele uma vivencia, Tudinha, teu filho teve um
fanarol bonito e todos os amigos de Betfete acompanhou ele
até o cemitério (LOPES, 1986, p. 60).

Apesar da vida de proletariado que era o que sobrava para o


emigrante nos Estados Unidos, a família do protagonista não sofria na pele a
agressão da seca e o descaso político, “não obstante a água escassa para as
regras. Papai não faltou da América, ajudava-nos a manter a pequena
realeza que exercíamos no Caleijão no meio da pobreza” (LOPES, 1986,
p.73).
A primeira parte do romance se encerra com a ida de Chiquinho
para a casa dos parentes em S. Vicente com o objetivo de prosseguir aos
estudos. Na parte seguinte, titulada como S. Vicente; o personagem André,
primo do protagonista, vai ser uma figura central para despertar no herói da
narrativa o pertencimento e a necessidade da participação ativa do povo na
mudança da história. Isso fica evidenciado no primeiro diálogo entre
Chiquinho e André:

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Vens de S Nicolau. Ilha respeitável, sem dúvida, pela sua


resistência moral. Mas aquilo ainda deve ser primitivo.
Depois compreenderás aquilo, como isto, como Cabo Verde
em peso... Nós, os novos, devemos ser a consciência da
nossa terra e desta geração. Temos agora um grupo.
Rapazes do Liceu, de quem aglutinei as vontades, Tenho a
certeza de que farás parte do grupo. Vens precedido de boa
fama, como aluno inteligente. A vontade, que é do que
precisamos. Forja-se na luta (LOPES, 1986, p. 72).

Na segunda parte, o narrador apresenta a tentativa dos


estudantes em suscitar na população cabo-verdiana a luta por condições
melhores, são exemplos: a tentativa de organizar um grêmio, a publicação
de dois números de revistas, o recrutamento dos trabalhadores, os
discursos emancipadores: “— Temos aqui matéria que baste. O Homem é
uma consequência das suas possibilidades econômicas. Estão de acordo?”
(LOPES, 1986, p.83). Esses foram alguns dos instrumentos utilizados para o
processo de desalienação que os jovens discentes queriam provocar na
população. Embora o esforço da juventude tenha sido relevante, a
dificuldade de sobrevivência vivenciada pelo povo daquela ilha o
desanimava de qualquer possibilidade de melhora.
A infância perdida é denunciada nessa parte da história,
mostrando crianças em busca do seu próprio alimento: “Finita chega. Dez
anos. Os seus olhos hoje não são de fome. Não houve paquete no porto,
mas Finita deve ter pegado em dinheiro de esmola” (LOPES, 1986, p.95). Na
segunda parte da narrativa, é revelado, também, o drama das jovens cabo-
verdianas, que vislumbravam nos caberes de Dacar (Ilha colonizada pelos
franceses), uma forma de se livrar da crise.
A parte S. Vicente finaliza com o fracasso dos estudantes em
mobilizar a população; o retorno do protagonista para seu local de origem,
após finalizar os estudos secundários e o reconhecimento da crítica situação
local: “Nós todos estávamos no centro de uma encruzilhada sem saída
visível. Agricultura, funcionalismo, comércio, tudo caminhos que não luzia
uma esperança” (LOPES, 1986, p.122).
A terceira e última parte do romance intitulada como As águas
inicia com Chiquinho apresentando seu sentimento de despertencimento à
terra da sua infância. Os estudos, a experiência com o Grêmio e seu grande
amor por Nuninha – personagem por quem se apaixonara em São Vicente –
tornou-o diferente dos demais moradores de S. Nicolau. As cobranças
sociais e da família, esperando que alguém com tanto investimento em

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estudo pudesse ter um futuro porvir do que o futuro do povo sem instrução
também o atormentava. Isso fica evidente no seguinte trecho:

Titio Joca veio logo da Praia Branca ver-me. Com seu jeito
estranho de dizer as coisas, começou por me dar pêsames. E
os seus pêsames caíram-me como a própria verdade, no
coro alvoroçado dos homens de enxada, das mulheres da
lenha de tortolho e dos encanecidos no trabalho das hortas
e nas manobras dos veleiros, para quem o saber é a maior
riqueza deste mundo e que iam salvar alegremente o
menino esperto que tinha tanta prenda na cabeça (LOPES,
1986, p. 124).

Após passar por um tempo ocioso e sem perspectiva, Chiquinho


conseguiu trabalho como professor em uma comunidade bem distante da
sua. Os conselhos do tio foram sempre de estimulá-lo a sair daquele lugar:
“– Larga tudo isso! Vai para a Guiné, para Angola, para o Brasil, para o
Diabo! Mas não fique aqui” (LOPES, 1986, p. 136). A experiência do
protagonista com o magistério coincidiu com uma das piores secas que seu
país já vivera. A fome, causada pela da escassez de água, levou as pessoas a
mudarem de região em busca de melhores condições: “Constantemente
passava pela minha porta gente que fugia dos povoados de Norte-a-Baixo,
em direção à vila. Era um cortejo lamentável de homens, mulheres e
crianças” (LOPES, 1986, p.155).
A seca e, consequentemente, a fome e as doenças levaram a uma
verdadeira comoção nacional. Inúmeras pessoas morreram por falta do
mínimo possível para a existência humana. O diálogo, a seguir, um dos mais
comoventes do romance, será citado com o objetivo de ilustrar o momento
histórico que o romance traz à tona:

O garoto parou ao pé da porta, com os olhos no chão. Esteve


um pedaço sem dizer ao que ia. O objeto ainda na cabeça.
Por fim mamãe perguntou-lhe o que queria.
— Mamãe mandou-me trazer esta conveniência, se você
quer comprar. Diz que é para socorrer uma necessidade...
[...]
— Como? Por que vocês vendem a caldeira?
— Dormimos sem cear, Totonhinho está doente, está só
pedindo comida, mamãe não tem...
Perguntei-lhe quantos irmãos eram.
— Vivemos seis com mamãe, Totonhinho é o codê, está só a
pedir comida, não dormiu chorando fome, fome dói...
— Mas vocês vendem a caldeira por quê? Podiam vender
outra coisa...
— Não temos mais nada, Mamãe já vendeu o vestido novo
que tinha, tresantontem fomos a vila vender a cama para
lenha.

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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

— Mas foram buscar a ração da Irmandade...


— Disseram que não tinha mais. Não chegou para todo
mundo. Eu bem que pedi, porque Totonhinho está doente,
mas no fim tive que vim sem nada ...
— Tua mãe não foi para lenha?
— Mamãe não pode, está pele e osso... (LOPES, 1986, p.
161).

Diante desse cenário, a única esperança que Chiquinho encontrou


foi deixar sua terra tão amada e seguir para os Estados Unidos onde seu pai
vivia. Todos os seus amigos convergiam em favor dessa mudança.
Nesse romance, Baltasar Lopes assume uma postura política
admirável. De acordo com Lukács (2009), o importante romancista deve
criar uma situação que seja típica e contemporânea com o seu tempo, e isso
é percebido durante toda a narrativa. O crítico literário destaca que para
protagonizar a ação proposta no romance, o escritor deve optar por um
herói que possa atuar revestido dos traços típicos que identificam a sua
classe, como é possível perceber em Chiquinho.
A pesquisadora Zilberman (2003) afirma que no gênero histórico
é imprescindível que os indivíduos retratados possuam certa sensibilidade
para a história e que esta se converta numa experiência possível, vivenciada
pelo intelectual, pelo povo, pela aristocracia, pelas camadas medianas e
baixas da população. Ela acrescenta que:

São, pois os pilares do romance histórico: a época


representada que coincide com um período de crise e
mudança; acima da época, a presença de seres humanos
que vivenciam, nas suas existências, mesmo quando
deslocados dos grandes centros de poder, as consequências
das alterações por que passa o período. Assim não é preciso
traduzir os grandes eventos, pois mesmo ‘sucessos
aparentemente insignificantes’ podem ser expressivos,
básicos e contar com a presença de indivíduos que plasmem
o modo de ser, pensar e atuar nesses momentos
determinantes, refletindo as tendências da época
(ZILBERMAN, 2003, p. 121).

Em Chiquinho, o contexto apresentado revela a crise, os


indivíduos, as relações sociais, o modo de atuação e a participação do povo
diante de determinado momento. A narrativa ficcional expressa
historicamente a vida do povo cabo-verdiano, situando os indivíduos e
apresentando a movimentação deles diante de determinados
acontecimentos, demonstrando como esses atores refletem, percebem,
atuam e interagem diante da realidade histórica.

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Crisandeson Silva de Miranda; José João de Carvallho

Bergamo (2008) afirma que o principal objetivo da literatura


engajada é denunciar as mazelas de uma realidade histórica e perversa. No
romance em análise, a consciência política de Baltasar Lopes manifestada
em Chiquinho (1947) converte-se em um fator importante para reflexão
acerca dos problemas sociais mais urgentes (a escassez de água e a fome)
em Cabo Verde, refletindo assim, por meio da arte, determinado momento
histórico.
Diante desse contexto, é importante ressaltar a relevância dessa
obra para literatura cabo-verdiana. Em Chiquinho (1947) é possível
compreender uma narrativa descolonizada que busca oferecer aos leitores
cabo-verdianos uma ideia de pertencimento. Nesse romance, o sujeito cabo-
verdiano, ou melhor, o mulato, é representado ativamente, reivindicando
seu lugar na literatura do seu país. Comungando com as pesquisas de
Ferreira (1977), pode-se perceber que Baltasar Lopes cria uma narrativa de
longa ficção em consonância com a realidade, a história, a sociedade e o
indivíduo cabo-verdiano. Sendo assim, esse texto pode ser enquadrado
como romance histórico, engajado e de ênfase social, centralizado na ação
de um herói, estudante, professor e emigrante, que representa o povo cabo-
verdiano de determinado período histórico.

Considerações finais
Com o presente artigo, procura-se revisar o conceito, o
surgimento e alguns pontos da trajetória histórica da forma romance.
Gênero que se consolida na experiência pessoal, na livre iniciativa criadora e
que se distancia das demais formas literárias ao conquistar a realidade
cotidiana, denunciando as mazelas oriundas da sociedade burguesa e a
inúmeras possibilidades de alienação humana na sociedade capitalista.
Fez-se necessário, também, abordar algumas das contribuições de
Lukács para compreensão do surgimento e da consolidação do romance
histórico como gênero literário que apreende a vida social em sua
profundidade. Pode-se concluir que o gênero histórico que surgiu com o
escritor Walter Scott (com a obra Waverley Novels em 1818) permanece
presente no cenário literário até os dias contemporâneos, utilizando-se da
história em constante movimento para rediscutir o passado, compreender o
presente e transformar o futuro.

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O NASCIMENTO DO ROMANCE CABO-VERDIANO

Foi proposta uma breve explanação sobre o artista engajado,


mostrando como os romancistas políticos captam a realidade histórica de
seu tempo, proporcionando verdadeiras reflexões e incentivando um
comportamento ativo em relação aos desafios do tempo histórico
apresentado nas suas obras. Evidenciou-se que o objetivo do escritor
engajado é realizar uma arte revolucionária que entrelace estética e
ideologia.
Foram apresentados: as condições de surgimento do gênero
romance em Cabo Verde, a resistência de aculturamento do cabo-verdiano,
a necessidade do rompimento colonial para a construção de uma literatura
descolonizada e o momento do surgimento da obra que inaugura a série de
longa ficção cabo-verdiana. Foi importante evidenciar a importância de
Baltasar Lopes pela sua contribuição e pioneirismo em buscar a identidade
do cabo-verdiano em combate ao aculturamento português. Sendo esse
romancista um dos primeiros a romper com o passado colonial para
construir na literatura do seu povo, uma expressão tipicamente africana e
cabo-verdiana.
Diante desse contexto, é apresentada a obra mais importante de
Baltasar Lopes: Chiquinho (1947). Uma narrativa que propõe uma releitura
capaz de preencher as lacunas deixadas pela história oficial, apresentando
as condições climáticas das ilhas e as dificuldades de sobrevivência que
levam o protagonista à consciência social, possibilitando o
autoconhecimento e uma análise desalienada de uma realidade
historicamente cruel.
Nesse romance, é possível perceber como o texto literário se
alimenta do contexto histórico para a construção de uma literatura nacional,
denunciando a fome e a miséria que assolou os menos favorecidos,
subjugados, os quais são desumanamente reificados. Em Chiquinho está
presente as preocupações sociais e humanas de um escritor engajado que
buscou na literatura uma tentativa de responder, artisticamente, aos
dilemas vividos pelo seu povo.
No romance em análise, é possível compreender, conforme
destaca Bergamo (2008), que a realidade social não se encontra
diretamente refletida no objeto de arte, mas aparece modificada pelo
processo de mediação e transfiguração que permeia toda manifestação
artística. Sendo assim, é plausível perceber que o romance Chiquinho

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Crisandeson Silva de Miranda; José João de Carvallho

apresenta a realidade histórica e social cabo-verdiana por meio da ótica do


romancista Baltasar Lopes.
Por fim, espera-se que a análise desse romance engajado e
histórico traga um novo olhar sobre a dignidade humana e o que de fato é
realmente necessário para construção de um mundo menos desigual.
Somente mergulhando no passado, é possível compreender o presente e
mudar a história. Vale ressaltar, finalmente, que a leitura de Chiquinho
permite uma reflexão necessária e fundamental sobre valores humanos. E
compreende-se que o romance cabo-verdiano surge de modo histórico e
engajado por meio de Baltasar Lopes, que constrói a sua obra com o
objetivo de denunciar as estruturas político-sociais cabo-verdianas,
provocando possíveis reflexões sobre as causas de um modelo social injusto.

Referências

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Recebido: 07/04/2018
Aceito: 14/07/2018

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