FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO.e-book
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO.e-book
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO.e-book
DA NUTRIÇÃO
ENSINO A
DISTÂNCIA
Copyright © 2021 by Editora Faculdade Avantis.
Direitos de publicação reservados à Editora Faculdade
Avantis e ao Centro Universitário Avantis – UNIAVAN.
Av. Marginal Leste, 3600, Bloco 1.
88339-125 – Balneário Camboriú – SC.
editora@avantis.edu.br
Inclui Índice
ISBN: 978-65-5901-043-1
ISBNe: 978-65-5901-048-6
OBJETIVOS DA DISCIPLINA
Olá querido(a) aluno(a), seja muito bem-vindo(a) a mais uma disciplina em seus
estudos no curso de Nutrição!
Nesta fase do curso, você já deve imaginar que, como futuro profissional da área
da saúde, precisará conhecer e compreender a fisiopatologia de muitas doenças que
acometem os pacientes. O nutricionista tem como atribuição profissional promover a
saúde, prevenir e auxiliar no tratamento de muitas doenças, garantindo uma melhor
qualidade de vida às pessoas, através da alimentação. Então, isso significa dizer que não
trabalharemos somente com indivíduos saudáveis em nossa linda profissão. Trataremos,
também, de pacientes doentes, com algum acometimento clínico.
Na disciplina de Fisiopatologia da Nutrição, estudaremos inúmeras doenças, que
podem acometer um indivíduo, e suas bases fisiopatológicas, ou seja, a forma como elas
ocorrem no organismo. Este conhecimento é de extrema importância para nós, pois a
conduta dietoterápica de um nutricionista deve ser individualizada e coerente com o
estado de saúde de cada paciente.
Desta forma, é importante sabermos que muitas doenças trazem prejuízos à
qualidade da alimentação e nutrição das pessoas, levando a um desequilíbrio de seu
estado nutricional. Certos pacientes perdem o apetite, perdem peso e até mesmo ficam
desnutridos por conta da fisiopatologia das doenças, ou então por conta do efeito colateral
do tratamento indicado. É neste ponto que o nosso conhecimento técnico se torna um
diferencial para melhorar a qualidade de vida e reestabelecer o estado nutricional dos
nossos pacientes. No entanto, aqui estudaremos somente a fisiopatologia das doenças. A
princípio, você precisa apenas conhecer e compreender as doenças, como e por que elas
ocorrem. Por isso, o manejo dietoterápico de cada uma delas será abordado em outras
disciplinas do curso.
PROFESSORA
APRESENTAÇÃO DA AUTORA
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4962968634068843
SUMÁRIO
12
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
termo Fisiopatologia pode ser definido como a fisiologia da saúde alterada, ou ainda,
estudo das alterações (doenças) do corpo humano.
13
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
1.2 DOENÇAS CARENCIAIS: HIPOVITAMINOSES E ANEMIAS
De acordo com o último Guia Alimentar para a População Brasileira (2014), publicado
pelo Ministério da Saúde, as doenças que hoje acometem os brasileiros deixaram de ser
majoritariamente doenças agudas (como as carências nutricionais e desnutrição, por
exemplo), embora não tenham sido totalmente erradicadas de nosso país, sendo ainda
prevalentes em grupos mais vulneráveis da população: os povos indígenas, quilombolas,
populações ribeirinhas, de regiões periféricas e crianças e mulheres que vivem em áreas
de vulnerabilidade social.
No cenário atual, ocupam espaço as doenças crônicas, como o Diabetes Mellitus, a
Hipertensão Arterial Sistêmica, a Obesidade, entre outras doenças.
Desta forma, faz-se necessário estudar sobre como as carências nutricionais
podem afetar o estado de saúde dos indivíduos que sofrem com a insegurança alimentar
e nutricional, com a falta de acesso regular à alimentação adequada e ao saneamento
básico no Brasil.
1.2.1 Hipovitaminoses
14
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
1.2.2 Deficiência de Vitamina A
15
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
1.2.2.1 Cegueira Noturna e Xeroftalmia por Deficiência de Vitamina A
O papel da vitamina A na visão foi descrito, em 1955, por George Wald. O olho é
o principal órgão acometido pela deficiência de vitamina A, sendo que esta condição
pode causar cegueira noturna e ainda um distúrbio conhecido como xeroftalmia
(ressecamento ocular). A cegueira noturna, ou prejuízo da adaptação ao escuro, é um
sintoma precoce de hipovitaminose A.
A retina é um dos componentes do globo ocular, a qual possui a função de receber
imagens visuais, analisá-las parcialmente e transmitir esta informação modificada ao
cérebro. Ela é dividida em duas camadas: uma camada externa e a retina neural interna.
Esta última contém os seguintes fotorreceptores: os cones, que proporcionam a base da
visão para as cores, e os bastonetes, responsáveis pela discriminação negro-branco. A
visão colorida, produzida pelos fotorreceptores cones, geralmente não é afetada pela
deficiência de vitamina A.
A visão com base nos bastonetes está particularmente adaptada para a noite e
para iluminação sob baixo nível. Nos bastonetes, um pigmento derivado da vitamina A
(retinal) liga-se a uma proteína chamada opsina, formando, juntos, a rodopsina.
A rodopsina é um pigmento visual essencial para a absorção da luz, funcionando
na transdução da luz em sinais nervosos necessários para a visão. Durante a estimulação
luminosa, a molécula de rodopsina (retinal + opsina) se separa, e o retinal é convertido
em vitamina A. A reconstituição da rodopsina se dá durante a escuridão total, em que a
vitamina A será convertida em retinal, a seguir se associando com a opsina, para formar
novamente a rodopsina e viabilizar a visão, a partir de baixo estímulo luminoso ou visão
noturna.
Em caso de deficiência de vitamina A no organismo, não será possível obter o retinal
(substância derivada da vitamina A) e, por consequência, não será possível a produção
da molécula de rodopsina, prejudicando a visão noturna. Contudo, esta situação é
rapidamente revertida pela ingestão adequada, ou injeção de vitamina A diretamente no
organismo.
Já a xeroftalmia se refere à sensação de “secura” nos olhos. A fina película de
lágrima que cobre o olho é essencial para prevenir o ressecamento e dano da camada
externa da córnea. O piscar periódico dos olhos é necessário para manter uma película
contínua de lágrima sobre a superfície ocular, proporcionando uma superfície óptica lisa,
umedecendo, lavando e protegendo a córnea de substâncias irritantes e, principalmente,
16
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
da entrada de microrganismos. Esta lágrima é produzida pela glândula lacrimal que se
situa na órbita, superior e lateral ao globo ocular (Figura 1). As lágrimas são compostas
de 98% de água, 1,5% de cloreto de sódio e pequenas quantidades de potássio, albumina
e glicose.
Figura 1 - Partes do Olho, com destaque para a glândula lacrimal, responsável pela produção de lágrima.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
17
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Ainda, como sinal de xeroftalmia, pode ocorrer o que se chama de mancha de Bitot,
a qual consiste em acúmulo de células queratinizadas e descamadas (que podem ser
facilmente removidas), formando uma área levemente aumentada na conjuntiva. A área
de lesão que regride bem em resposta à suplementação com vitamina A.
Portanto, fique atento(a)! Caso você tenha contato com algum paciente queixando-
se de baixa visibilidade noturna e sensação de “olhos secos”, isso pode ser um sinal de
deficiência de vitamina A.
O tratamento desta hipovitaminose deve ser feito com suplementação de vitamina
A, com doses adequadas para cada indivíduo, considerando questões como gênero e
idade.
SAIBA MAIS
Para saber mais sobre quais variáveis estão relacionadas com a hipovitami-
nose A em crianças, no Brasil, acesse e faça a leitura do artigo: “Deficiência de
vitamina A em crianças brasileiras e variáveis associadas”, disponível em: https://www.scielo.br/
pdf/rpp/v36n2/0103-0582-rpp-2018-36-2-00013.pdf.
LIMA, DAMIANI, FUJIMORI. Deficiência de vitamina a em crianças brasileiras e variáveis asso-
ciadas. Rev Paul Pediatr. v.36, n.2, p. 176-185, 2018.
A vitamina B1, também conhecida como tiamina, faz parte do grupo das vitaminas
hidrossolúveis e também é um micronutriente, adquirido através da dieta. Os alimentos
fonte de tiamina são: levedura, carne suína magra e principalmente os cereais. Ela
concentra-se, principalmente, no germe dos grãos cereais.
Sua deficiência pode estar associada à ingestão inadequada na dieta, absorção
diminuída, transporte defeituoso, aumento das necessidades e perdas acentuadas. Entre
18
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
as condições de risco para carência deste micronutriente estão: alcoolistas, indivíduos
convivendo com HIV/AIDS, doenças gastrointestinais e hepáticas, vômito persistente
(hiperêmese gravídica), indivíduos recebendo nutrição parenteral e fármaco, como a
tolazamida (hipoglicemiante).
Depois de absorvida, a tiamina é rapidamente fosforilada até seu éster difosfato
(difosfato de tiamina – TDP). O TDP é um cofator essencial para enzimas envolvidas no
metabolismo da glicose e dos aminoácidos, a exemplo: a enzima transcetolase, complexo
de piruvato desidrogenase, α-cetoglutarato desidrogenase e desidrogenase de cetoácidos
de cadeia ramificada. As três primeiras enzimas dependentes de TDP estão envolvidas no
metabolismo da glicose e a última no metabolismo dos aminoácidos de cadeia ramificada
(leucina, isoleucina e valina).
A enzima piruvato desidrogenase (da qual a tiamina é cofator essencial) atua
na conversão oxidativa de piruvato em Acetil CoA, o qual entraria no ciclo de Krebs e
produziria energia na forma de ATP. No entanto, sua carência leva ao acúmulo de piruvato
no organismo e à consequente respiração anaeróbica, em que o piruvato é reduzido a
lactato, através da fermentação láctica. Como consequência do processo, o indivíduo
pode entrar em acidose metabólica, por conta do acúmulo de prótons (H+) liberados
durante a glicólise no citosol. Tais prótons, em condições normais, seriam naturalmente
encaminhados à respiração celular, a qual ocorre na crista mitocondrial, porém, neste
caso, a respiração celular está prejudicada pela deficiência da atuação do complexo
enzimático piruvato desidrogenase, dependente de tiamina.
A principal consequência da deficiência de tiamina no organismo é conhecida como
beribéri. O beribéri é fisiopatologicamente dividido em duas apresentações clínicas: seco
e úmido.
19
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A Síndrome de Wernicke-Korsakoff, ou Encefalopatia de Wernicke (EW), é uma
complicação neuropsiquiátrica comum no alcoolismo crônico, causada pela deficiência
de tiamina, que pode ser ocasionada pela ingestão alimentar inadequada, redução
nas reservas hepáticas (esteatose ou fibrose hepática) e redução na absorção, pois o
álcool pode inibir o transporte de tiamina no trato gastrointestinal, além de bloquear a
fosforilação cerebral de tiamina até sua forma de cofator TDP.
O diagnóstico da EW baseia-se no surgimento agudo de paralisias oculares,
nistagmo, ataxia da marcha e confusão mental. Grande parte dos pacientes com EW
exibem sinais de neuropatia periférica (comum ao beribéri). É de extrema importância
que estes pacientes sejam tratados com tiamina, para que sua deficiência seja corrigida,
antes de iniciarem alimentação via oral, receberem infusão de glicose ou nutrição
parenteral.
A psicose de Korsakoff (PK), componente psicótico crônico da EW, ocorre com
a deterioração da função cerebral em pacientes inicialmente diagnosticados com
EW. A PK é uma síndrome amnésica-confabulatória irreversível, caracterizada por
amnésia retrógrada e anterógrada (incapacidade de formar novas memórias), com
comprometimento das funções conceituais e diminuição da espontaneidade e iniciativa.
A desorientação no tempo e criação de histórias imaginárias podem estar presentes. A
administração de tiamina via parenteral produz uma melhoria bastante sensível nestes
quadros.
SUGESTÃO DE LEITURA
Separei um artigo, para leitura complementar, intitulado: “Síndrome de Werni-
cke-Korsakoff - Revisão literária da sua base neuroanatómica”.
Amplie seu conhecimento sobre esta síndrome bastante comum em alcoolistas crônicos.
Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/pdf/am/v27n3/v27n3a04.pdf
20
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
SUGESTÃO DE VÍDEO
Sugiro que você assista ao vídeo a seguir, pois ele explica detalhadamente, em
forma de animação, as principais funções da tiamina.
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=J53iCIJUo0Y.
21
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
doença, formam uma erupção pigmentada nas partes do corpo expostas à luz, similar
às queimaduras solares, sendo que, nos casos mais crônicos, a cor pode ser mais escura.
Lesões em “colar”, descritas por Casal, indicam doença mais avançada. Podem ocorrer
alterações digestivas, como vômitos e diarreia, além do fato de a língua do paciente se
tornar roxa.
A pelagra não é mais uma doença comum na maioria dos países. No entanto, em
países como a Índia e algumas regiões da China e África, ela continua existindo. Em países
desenvolvidos, a pelagra só é encontrada em alcoolistas, muito provavelmente associada
à insuficiência de outros micronutrientes. Os sintomas neurológicos e a dermatite são
sensivelmente melhorados com tratamento de nicotinamida em doses elevadas (40 a
250mg/dia).
A vitamina C, ou ácido ascórbico, é uma vitamina hidrossolúvel que não pode ser
sintetizada por nós. Ela é absorvida no intestino, sendo que, em um consumo entre 30 a
180mg/dia, cerca de 70 a 90% são absorvidos. Porém, a absorção pode cair para 50% ou
mais, quando o consumo é aumentado para 1g/dia, como nos casos de suplementação
desta vitamina.
Não há diferença quanto à biodisponibilidade da vitamina C encontrada nos
alimentos e a dos suplementos comerciais. A maior parte da vitamina C em nossa
alimentação vem de frutas e vegetais, principalmente frutas ácidas e cítricas, como
tomate (molhos), laranja, limão, tangerina e acerola. Outras fontes alimentares de
vitamina C são: couve, brócolis, pimentão amarelo e agrião.
O escorbuto é a doença causada por deficiência de vitamina C. É uma das doenças
mais antigas relatadas na história da nutrição humana. Atualmente, a deficiência
de vitamina C é rara em países industrializados. O termo escorbuto significa boca
inchada e ulcerada, caracterizada por sangramento das gengivas e necrose, articulações
edemaciadas e inflamadas.
A deficiência severa de vitamina C é caracterizada pelo defeito do tecido
conjuntivo, pois esta vitamina é cofator para a síntese de hidroxiprolina e hidroxilisina,
que são aminoácidos necessários à hidroxilação da prolina para a síntese de colágeno
22
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
(componente do tecido conjuntivo). Assim, sua deficiência causa hiperqueratose
folicular, petéquias, alteração da cicatrização e degradação oxidativa de alguns fatores
de coagulação sanguínea, contribuindo para inflamação e sangramento das gengivas,
hemorragia perifoliculares e artralgia.
Esta doença pode ocorrer em indivíduos desnutridos e de baixa renda, pacientes
com caquexia relacionada ao câncer e à má absorção, alcoolistas e naqueles, cuja ingestão
dietética é baixa.
O tratamento pode ser feito com a suplementação da vitamina C, iniciando com
100mg, três vezes ao dia. Pode-se aplicar uma dose inicial intravenosa de 60 a 100mg/dia.
As concentrações plasmáticas estáveis obtidas com uma dose de vitamina C de 100mg/
dia prevenirão a deficiência por cerca de um mês.
23
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
movimento do cálcio através das membranas das células intestinais e renais.
Infelizmente, as fontes dietéticas de vitamina D são poucas, já que a maioria dos
alimentos não contém vitamina D. As únicas fontes alimentares significativas desta
vitamina são: fígado animal, peixes gordos (salmão, bacalhau, halibute), gema de ovo e
óleos de peixe. O leite materno é uma fonte extremamente pobre de vitamina D.
VOCÊ SABIA?
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o leite materno con-
tém 25UI de vitamina D por litro, variando conforme o status materno do micronu-
triente, sendo que a necessidade da criança no primeiro ano de vida é de 2000UI desta vitamina
por dia! Por isso, é muito importante fazer a exposição regular do bebê à luz solar e também, se
necessário, a suplementação adequada (VITOLO, 2015, p.194)
24
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 2 - Densidade Óssea Normal e Densidade Óssea Reduzida no raquitismo e osteomalacia. Fonte:
Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
Figura 3 - Estrutura Óssea Normal e Estrutura Óssea Alterada no raquitismo por deficiência de vitamina D.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
25
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Em adultos, a osteomalacia se caracteriza pelo amolecimento dos ossos,
acompanhado de dor óssea generalizada e deformidades ósseas diversas, especialmente
na coluna, tórax, membros e pelve. Esta condição não deve ser confundida com a
osteoporose em adultos, já que esta é uma doença silenciosa, não apresentando sintomas
como a osteomalacia.
SAIBA MAIS
Para saber mais sobre a vitamina D e a sua função endócrina, acesse e leia o
artigo intitulado: “O sistema endocrinológico vitamina D”, disponível em: https://
www.scielo.br/pdf/abem/v55n8/10.pdf.
CASTRO, Luiz Claudio Gonçalves de. O sistema endocrinológico vitamina D. Arq. Bras. Endo-
crinol. Metab., São Paulo, v. 55, nº 8, p. 566-575, Nov./ 2011.
26
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
deficiência de ferro pode ser uma delas, representando a causa mais comum dos casos de
anemia, conhecida como anemia ferropriva.
Os sintomas de anemia são causados pela diminuição da capacidade de transporte
de oxigênio no organismo, levando à cefaleia, fadiga, fraqueza, cansaço e dispneia. Já a
palidez, sintoma bastante comum, ocorre devido à menor concentração de hemoglobina
nas hemácias e também pela vasoconstrição dos vasos sanguíneos cutâneos superficiais,
priorizando o fornecimento de sangue para estruturas mais vitais.
No Brasil, a carência de ferro no organismo ainda é considerada prevalente entre
crianças menores de cinco anos em algumas regiões do país. Além disso, as mulheres
também fazem parte da população de risco para a anemia ferropriva, pois existe a perda
sanguínea no período menstrual, e também no período gestacional, em que o feto extrai,
de maneira eficiente, o ferro materno para uso em sua própria hematopoese.
Além disso, perdas sanguíneas importantes também podem levar à anemia
ferropriva, como, por exemplo, sangramento do trato gastrointestinal nas doenças
inflamatórias intestinais (Doença de Crohn e Colite Ulcerativa). Pacientes com doença
celíaca, infecção por Helicobacter pylori, gastrectomia ou derivação gástrica também
estão suscetíveis a apresentar anemia ferropriva.
O ferro é um mineral necessário no corpo humano, pois tem a habilidade de receber
e doar elétrons em diversas reações biológicas. Estima-se que o conteúdo corporal de ferro
total seja igual a 3,8 g, em homens, e a 2,3 g, em mulheres. Ele se apresenta na natureza
em duas formas estáveis e reversíveis: na forma ferrosa (Fe²+) ou na forma férrica (Fe³+).
Este micronutriente é reciclado, a partir de hemácias senescentes (velhas), e
obtido através da alimentação, sendo absorvido no intestino delgado, mais precisamente
no duodeno e jejuno proximal.
O ferro pode ser absorvido: em sua forma heme, tipicamente derivado da
hemoglobina ou da mioglobina, proveniente de alimentos de origem animal, como carnes
vermelhas, peixes e aves, sendo esta forma a mais biodisponível a nós; ou na sua forma
não heme, encontrado em diversos alimentos de origem vegetal, como agrião, rúcula,
espinafre, feijão e lentilha, menos biodisponível, devendo ser consumido juntamente
com uma fonte de vitamina C para otimizar sua absorção. O ferro absorvido que não
é imediatamente necessário ao uso é estocado na ferritina, proteína responsável pelo
estoque de ferro, encontrada essencialmente no fígado.
O ferro apresenta papel importante na síntese de células vermelhas do sangue,
as hemácias, que são as células responsáveis pelo transporte de oxigênio em nosso
organismo.
As hemácias maduras são células sem núcleo e bicôncavas, em formato de disco,
cheias de hemoglobina, as quais funcionam como o componente do sangue carreador
27
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
de oxigênio. Ela tem este formato, a fim de que seja uma célula flexível o suficiente para
”escorregar” pelos menores capilares do corpo e fornecer oxigênio até a pontinha dos
nossos dedos (Figura 4).
Figura 5 - Estrutura da Hemoglobina, com quatro cadeias proteicas (tetrâmero), sendo duas α e duas β.
Representação da molécula de grupamento heme com o ferro na posição central.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
28
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Se cada uma das quatro subunidades da hemoglobina conta com uma molécula
heme (na qual o ferro ocupa posição central), significa que cada molécula de hemoglobina
necessita de quatro íons de ferro em sua estrutura.
Quando há a deficiência de ferro, o passo final na síntese do heme é interrompido.
Neste, o ferro ferroso (Fe²+) é inserido na protoporfirina IX pela enzima ferroquelatase
e, quando a síntese de heme é interrompida, há produção inadequada de heme. A
biossíntese de globina é inibida pela deficiência de heme. Assim, menos heme e cadeias
de hemoglobina estão disponíveis em cada precursor de hemácias, causando a anemia
ferropriva. Como consequência disso, as hemácias, na anemia ferropriva, tornam-se
hipocrômicas (com menos quantidade de hemoglobina que o normal) e microcíticas
(menores do que o tamanho normal). Este último sinal pode ser observado, a partir do
exame de Volume Corpuscular Médio (VCM) alterado, com a presença de valores abaixo
do normal.
O Brasil conta com o Programa Nacional de Suplementação de Ferro (PNSF) desde
2005, atendendo crianças, de seis a 24 meses de idade, e gestantes e lactantes, até o
terceiro mês pós-parto, com suplementação profilática de sulfato ferroso via oral. O
sulfato ferroso ainda é o composto de escolha pelo Ministério da Saúde para os programas
de suplementação no Sistema Único de Saúde (SUS).
A suplementação de ferro para crianças com anemia ferropriva deve ser feita por
via oral, com dose terapêutica de 3 a 5 mg/kg/dia de ferro elementar, no mínimo, durante
oito semanas. Para adultos com anemia ferropriva deve-se suplementar 120 mg de ferro
elementar por dia, com duração de três meses.
29
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
porém são imaturas e disfuncionais. Este tipo de anemia normalmente ocorre por
conta da deficiência de vitamina B12 (cobalamina) ou de vitamina B9 (ácido fólico). A
vitamina B12 é encontrada somente em alimentos de origem animal e, por este motivo,
sua deficiência alimentar geralmente é encontrada apenas nos vegetarianos estritos ,
aqueles que, além de não consumirem nenhum tipo de carne, não consomem ovos e nem
produtos lácteos.
A absorção da cobalamina ocorre da seguinte forma: após ser liberada da proteína
animal na presença de ambiente ácido (presença de HCl), ela se liga ao Fator Intrínseco
(FI), formando um complexo FI-B12 que protege a vitamina contra a digestão por enzimas
intestinais. O complexo se desloca até o íleo, onde se liga a receptores específicos de
membrana, nas células epiteliais. Por fim, a vitamina B12 se separa do FI, sendo finalmente
absorvida.
A deficiência da cobalamina afeta não somente as hemácias, mas todas as células
em processo de divisão, como as células epiteliais do intestino, e também outras células
sanguíneas, embora as consequências clínicas para o indivíduo predominem no
sistema sanguíneo. A deficiência da vitamina B12 resulta no bloqueio das atividades das
enzimas dependentes desta vitamina, sendo que ela funciona como cofator para reações
importantes no nosso organismo, por exemplo a síntese de DNA e a maturação nuclear,
que, por sua vez, conduz à maturação e divisão normal das hemácias.
A inibição da enzima metionina sintase (dependente de B12) ocasiona a inibição
da regeneração do tetraidrofolato celular, tornando-o indisponível ao organismo, o que
resulta em sintomas de deficiência de ácido fólico, mesmo quando esta vitamina está
em níveis normais no organismo. Assim, quando há deficiência de B12, B9, ou ambas,
estas não podem participar da síntese de DNA, acarretando rápida divisão das células
eritrocitárias medulares (em comparação às outras células), ao se formarem hemácias
grandes e imaturas.
A enzima metionina sintase também é responsável pela conversão de homocisteína
em metionina. Na deficiência de B12, há um aumento dos níveis de homocisteína no
sangue, fato que pode contribuir com a ocorrência de doenças cardiovasculares, como
Acidente Vascular Cerebral (AVC) e infarto.
O ácido fólico também é necessário para a síntese de DNA e para a maturação
das hemácias. Sua deficiência produz as mesmas alterações megaloblásticas ocorridas
na anemia, por deficiência de vitamina B12. A vitamina B9 é facilmente absorvida pelo
intestino, sendo encontrada em vegetais (folhas verdes), cereais, frutas e carnes.
Na presença de anemia megaloblástica é preciso um processo investigativo, a fim de
identificar sua causa, pois sendo a deficiência de vitamina B12 a causa da anemia, o estado
anêmico persistirá, se o indivíduo receber somente suplementação com vitamina B9.
30
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A anemia perniciosa também é um tipo de anemia megaloblástica, porém de origem
autoimune. Esta anemia resulta em uma perda dos estoques adequados de vitamina B12.
A doença começa no estômago, quando as células parietais gástricas são afetadas por
um fenômeno autoimune, o qual leva a dois defeitos importantes: 1- Acloridria (perda do
ácido clorídrico - HCl); 2- Perda do fator intrínseco (glicoproteína produzida pelas células
parietais do estômago, necessária na absorção da vitamina B12).
Como consequência, a anemia perniciosa interfere tanto na disponibilidade inicial
quanto na absorção da vitamina B12, uma vez que o ácido gástrico é necessário para a
liberação da vitamina B12 dos alimentos, enquanto FI é a glicoproteína que prende a
vitamina B12, sendo necessária para a absorção efetiva da cobalamina na porção do íleo
terminal. Desta maneira, na anemia perniciosa, o indivíduo não absorve corretamente a
vitamina B12, gerando uma deficiência em seus estoques orgânicos.
31
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A ocorrência destes quadros de desnutrição é mais comum em crianças, principalmente
aquelas que vivem em situação de pobreza. São elas: Kwashiorkor, Marasmo e
Kwashiorkor-marasmático.
1.3.2 Marasmo
Figura 6 - Criança Desnutrida, com face de idoso e irritadiça. Presença de sinal físico de desnutrição:
atrofia bitemporal.
Fonte: Shutterstock (2020).
32
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
1.3.3 Kwashiorkor
33
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
SUGESTÃO DE LEITURA
Para entender um pouco mais sobre a síndrome de realimentação, leia o se-
guinte artigo: “Qual é a importância clínica e nutricional da síndrome de realimen-
tação?”, disponível no link: https://www.scielo.br/pdf/abcd/v25n1/13.pdf.
VIANA, BURGOS, SILVA. Qual é a importância clínica e nutricional da síndrome de realimenta-
ção? Arq. Bras. Cir. Dig. v.25, nº 1, p. 56-59, 2012.
FÓRUM
Após fazer a leitura da Unidade 1, quais são os fatores que você considera de
risco para o desenvolvimento das carências nutricionais? Em quais estratégias
poderíamos pensar, para neutralizar as deficiências nutricionais e suas consequências?
Sugiro que você discuta esta temática com seus colegas no FÓRUM. Cada um pode apresen-
tar um ponto de vista interessante, não é mesmo?!
34
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao finalizar o estudo da primeira unidade, deve ter ficado claro a você que,
como nutricionistas, devemos nos preocupar com a oferta de um aporte adequado dos
macronutrientes (carboidratos, proteínas e lipídeos) aos nossos pacientes e, inclusive, a
nós mesmos.
Também os micronutrientes (vitaminas e minerais) possuem papéis de extrema
relevância ao funcionamento regular de nosso organismo. A deficiência de apenas
uma vitamina ou de um mineral específico pode causar patologias extremamente
graves, inclusive levar o indivíduo a óbito, caso não seja tratada adequadamente com
o acompanhamento de um profissional. Logo, os micronutrientes são cofatores muito
importantes para o nosso metabolismo!
Foi possível compreender que as doenças carenciais estão perdendo cada vez
mais espaço de importância epidemiológica no Brasil e no mundo. Todavia, devemos
considerar que, em países como o Brasil, que apresentam grandes taxas de desigualdade
social, ainda existem muitas populações vivendo em situação de vulnerabilidade social,
sem acesso regular a uma alimentação adequada e variada, prejudicando o acesso destes
sujeitos ao aporte de todos os nutrientes necessários. Por isso, é necessário ficarmos
atentos a todo e qualquer sinal de insuficiência dos nutrientes.
35
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
EXERCÍCIO FINAL
02- [ANÁLISE] A anemia ferropriva é uma anemia bastante comum, causada pela
insuficiência de ferro no organismo, sendo que seus sintomas levam à fadiga,
cansaço, sonolência e cefaleia. Sobre a anemia ferropriva, analise as proposições a
seguir:
I- Quando há a deficiência de ferro, a síntese do heme é interrompida e, consequentemente,
a síntese de globina também.
PORQUE
II- O ferro ocupa posição central no núcleo da hemácia, que preenche grande porção no
citoplasma da célula madura.
36
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Está correto afirmar que:
a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II não é uma justificativa correta da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa, porém justifica a I.
e) As asserções I e II são proposições falsas, e a II não é uma justificativa correta da I.
37
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
REFERÊNCIAS
CARDOSO, Marly Augusto. Nutrição Humana. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.
GROSSMAN, Sheila; PORTH, Carol Mattson. Porth - Fisiopatologia. Rio de Janeiro: Grupo
GEN, 2015. 978-85-277-2839-3. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.
br/#/books/978-85-277-2839-3/. Acesso em: 20 de setembro de 2020.
PORTH, Carol Mattosn; MATFIN, Glenn, Fisiopatologia. 8ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2010. 2º v.
SILVA, Sandra Maria Chemin Seabra da; MURA, Joana D’Arc Pereira. Tratado de
Alimentação, Nutrição e Dietoterapia. 3ª ed., São Paulo: Payá, 2016.
38
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
2
UNIDADE
DOENÇAS
INFECCIOSAS
AGUDAS E
CRÔNICAS
INTRODUÇÃO À UNIDADE
2.1 HIV/AIDS
40
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
e subfamília Lentivirinae. Seu RNA codifica nove genes, relacionados principalmente à
sua replicação nas células do hospedeiro infectado. O HIV, para multiplicar-se, necessita
de uma enzima denominada transcriptase reversa, responsável pela transcrição de RNA
viral para uma cópia de DNA, que pode então se integrar ao genoma do hospedeiro
(Figura 8). Este vírus infecta células do sistema imunológico humano, prejudicando ou
destruindo sua importante função de defesa.
Figura 8 - Interação do Vírus HIV com o Linfócito T CD4. O vírus se liga ao receptor da célula, insere seu
material genético de RNA no interior do linfócito e, através da transcriptase reversa, faz a transcrição do
RNA em uma cópia de DNA, que se integra no DNA cromossomal do hospedeiro.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
41
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
SUGESTÃO DE VÍDEO
Este vídeo ilustra, em detalhes, exatamente o processo de interação do vírus
HIV com o linfócito T CD4, mostrando como a infecção se expande.
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=PlSvywlLuNw.
42
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 9 – Linfócito T e Vírus.
Fonte: Shutterstock (2020).
Figura 10 - Linha do Tempo: momento da infecção pelo vírus HIV até o desenvolvimento da AIDS. Fonte:
Elaborada pela autora (2020).
43
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A Acquired Immnunodeficiency Syndrome (AIDS), ou Síndrome da Imunodeficiência
Adquirida (SIDA), é uma doença infectocontagiosa causada pelo vírus HIV. A AIDS é o
estágio clínico mais grave da infecção por vírus HIV, que produz disfunção principalmente
de linfócitos T CD4, também deixando o paciente suscetível ao aparecimento de infecções
oportunistas. Esta condição (AIDS) é definida por evidência sorológica de infecção por
HIV, com a presença de uma variedade de doenças associadas à imunodeficiência clínica,
como por exemplo: pneumonia recorrente, candidíase orofaringeana e vulvovaginal
persistente, com resposta insatisfatória ao tratamento, sarcoma de Kaposi, herpes,
linfadenopatia, dermatite, entre outras.
A maior concentração dos casos de AIDS no Brasil está nos indivíduos com idade
entre 25 e 39 anos para ambos os sexos. Em 2015, o ranking referente às taxas de detecção
da doença mostrou que os estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina apresentaram
as maiores taxas, com valores de 34,7 e 31,9 casos/100 mil habitantes (BRASIL, 2016).
Como são as células mais atacadas pelo vírus HIV, a contagem dos linfócitos T CD4 é
também um critério para caracterizar a presença de AIDS e seu respectivo estadiamento.
Observe o quadro abaixo:
44
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
diagnosticado como HIV positivo deve ter acompanhamento sistemático com equipe de
saúde em um centro de referência para tratamento de AIDS.
Além do médico, o nutricionista tem papel fundamental no cuidado assistencial
destes pacientes, pois todo indivíduo HIV positivo, independente do estágio da doença
em que se encontra, é considerado em risco nutricional, em decorrência da ação do HIV
sobre o sistema imunológico, das infecções oportunistas, da terapia medicamentosa e
dos aspectos psicossociais relacionados a esta doença.
SUGESTÃO DE VÍDEO
Outra sugestão de vídeo sobre a infecção por HIV e o desenvolvimento da AIDS,
as classes de medicamentos que compõem a TARV e que impedem a replicação
viral. Para assistir a ele, acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=ng22Ucr33aw.
O tratamento para HIV e AIDS é feito com terapia antirretroviral (TARV). De acordo
com o Ministério da Saúde (2018), o início imediato da TARV é recomendado para todos
os pacientes HIV positivos, independentemente de seu estágio clínico ou imunológico,
pois a terapia reduz a morbimortalidade e diminui as chances de transmissão do vírus.
No Brasil, cerca de 585 mil pessoas que vivem com o vírus HIV realizam a terapia
antirretroviral em unidades da rede pública de saúde. Desde 1996, são gratuitamente
distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) todos os medicamentos antirretrovirais
e, desde 2013, o SUS garante tratamento a todas as pessoas com HIV, independentemente
da carga viral.
Uma novidade surgiu em 2017, quando o SUS passou a ofertar gratuitamente um
dos melhores antirretrovirais do mundo: o Dolutegravir (inibidor da HIV integrase,
que bloqueia a etapa de transferência de integração do DNA retroviral). Ele é usado
em combinação com os antirretrovirais Tenofovir (inibidor da transcriptase reversa) e
45
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Lamivudina (inibidor da síntese de ácidos nucleicos) no esquema chamado “2 em 1”, no
qual, apesar de serem três compostos, são apresentados em apenas dois comprimidos:
um de Dolutegravir (50mg), e outro formado por Lamivudina (300mg) + Tenofovir
(300mg) (BRASIL, 2018).
O esquema “2 em 1”, uma vez ao dia, tem se mostrado o tratamento mais eficaz e de
primeira escolha na supressão da carga viral do HIV. Esta TARV diminui significativamente
a quantidade de HIV no sangue, suprimindo a carga viral a níveis indetectáveis e reduzindo
a quase zero o risco de transmissão do vírus por via sexual (BRASIL, 2018).
Vale ressaltar que a distribuição universal de antirretrovirais de alta potência
(Highly-Active Antiretroviral Therapy – HAART) oferecida gratuitamente no Brasil, por
meio do SUS, para o tratamento de HIV e AIDS, é reconhecida como uma referência
mundial.
Todo este prejuízo, causado pelo vírus HIV no organismo humano, traz, também,
repercussões no estado nutricional do indivíduo. Alterações nutricionais são muito
comuns em pacientes com HIV e AIDS, e elas costumam acontecer precocemente, não
sendo positivas, em geral. Estas alterações podem estar relacionadas à baixa ingestão
alimentar, má absorção de nutrientes, alterações metabólicas, presença de infecções
oportunistas, fatores psicossociais, interações droga-nutriente e o uso de TARV. Todos
estes fatores podem levar a deficiências nutricionais, que afetam negativamente o estado
nutricional do indivíduo.
A desnutrição é considerada um importante fator prognóstico nos pacientes com
estágios avançados da AIDS, sendo uma das complicações mais frequentes da infecção
pelo HIV. A prevalência de desnutrição é maior nos indivíduos com AIDS do que nos
indivíduos HIV positivos, porém sem Aids.
Muitos pacientes, em estágios avançados da doença, apresentam Índice de Massa
Corporal (IMC) abaixo do normal, sendo este dado relacionado positivamente com altos
níveis de RNA viral no sangue.
A Síndrome Consumptiva pode estar presente nestes pacientes, sendo caracterizada
por perda de peso involuntária (>10% do peso atual em 12 meses), cuja etiologia principal
é a produção exacerbada de citocinas pró-inflamatórias, como fator de necrose tumoral
alfa (TNF-α) e interleucinas, disfunção do sistema endócrino e o aumento do turnover
proteico. Além disso, a redução na ingestão alimentar, alterações estruturais da mucosa
intestinal provocadas pelo vírus HIV, diarreia crônica, febre, hipermetabolismo e
doenças oportunistas associadas aceleram o processo de perda de peso e desnutrição
dos pacientes.
O uso da TARV também traz alterações metabólicas e de composição corporal
importantes, como a dislipidemia, alterações do metabolismo de glicose e a lipodistrofia,
46
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
a qual é definida como uma redistribuição anormal da gordura corporal, podendo ser
classificada em três tipos:
• Lipoatrofia: caracterizada pela diminuição de gordura nas regiões periféricas
(braços, pernas, nádega e face).
• Lipo-hipertrofia: caracterizada pelo acúmulo de gordura abdominal,
gibosidade dorsal, ginecomastia e aumento das mamas em mulheres.
• Forma mista: associação das duas formas descritas acima.
SUGESTÃO DE FILME
Sugiro que você assista aos dois filmes a seguir, os quais são bastante interessantes!
O filme “Clube de compras Dallas”, de 2013, conta a história de uma personagem
heterossexual de Dallas, nos Estados Unidos, que foi diagnosticada como HIV positivo, em 1986,
durante uma das épocas mais obscuras da doença. Esta personagem decide recusar o tratamento
que recebe dos médicos e contrabandear drogas ilegais do México para tratar seus sintomas.
O filme “Cartas para além dos muros”, de 2019, conta a trajetória do HIV e da AIDS, com foco
no Brasil, por meio de entrevistas com médicos, ativistas e pacientes, além de mostrar material
de arquivo sobre a doença.
FÓRUM
Debata com seus colegas, no FÓRUM, sobre o estigma social relacionado aos
indivíduos convivendo com HIV e AIDS, e de que forma isso pode afetar a saúde
deles. Como os profissionais de saúde podem auxiliar neste sentido?
47
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
2.2 TUBERCULOSE
SUGESTÃO DE VÍDEO
Antes de falarmos mais sobre a tuberculose, sugiro que você assista ao vídeo a
seguir, para ter noção do tamanho da microbactéria causadora da doença, em re-
lação a outras células como os linfócitos, eritrócitos, anticorpos e até mesmo um vírus: https://
youtu.be/P0-PchUySSw.
48
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
O Brasil está entre os 30 países de alta carga para TB e TB-HIV, considerados
prioritários pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o controle da doença no
mundo (BRASIL, 2019). No Brasil, em 2019, foram diagnosticados 73.864 casos novos de
TB, o que corresponde a um coeficiente de incidência de 35 casos/100 mil habitantes.
No ano anterior, a taxa de mortalidade relacionada à tuberculose foi de 2,3 óbitos/100
mil habitantes (BRASIL, 2020). A TB é também a principal causa de morte entre pessoas
vivendo com HIV, sendo que a epidemia de HIV/AIDS levou a um aumento significativo
da incidência de TB no Brasil e no mundo.
A transmissão da doença ocorre por via aérea, quando uma pessoa com TB pulmonar
ou laríngea ativa exala, através da tosse, fala ou espirro, gotículas contendo os bacilos da
TB. Estes, por sua vez, podem permanecer em suspensão no ar, bem como sobreviver,
sobre diferentes superfícies, por muitas horas. Por conta disso, ambientes aglomerados e
fechados, sem ventilação, podem aumentar o risco de disseminação da doença.
A TB pode acometer vários sistemas do corpo, mas acomete prioritariamente
os pulmões, sendo as vias aéreas a principal porta de entrada para o patógeno. Uma
vez inalado, o bacilo atingirá as vias aéreas do novo hospedeiro, seguindo pela árvore
brônquica, sem aderir ao epitélio, até se depositar nos alvéolos pulmonares. Ao atingirem
os pulmões, os bacilos acionam nosso sistema imune e são fagocitados pelos macrófagos
alveolares, nossa primeira linha de defesa contra o patógeno. Entretanto, em muitos
casos, o bacilo resiste à eliminação e continua se multiplicando.
Estes macrófagos que fagocitaram os bacilos, ainda que não tenham neutralizado o
patógeno, iniciam uma importante resposta imune, aumentando a quimiotaxia no local
da infecção, ao atraírem outras células de defesa, como os monócitos e células dendríticas,
para auxiliar no combate ao bacilo. Em seguida, após o patógeno ser reconhecido e
internalizado pelas células dendríticas, estas migram até os linfonodos para realizar a
apresentação de antígeno aos linfócitos T e B imaturos, iniciando um novo recrutamento
celular para o foco da infecção.
Como consequência de tal resposta celular imune, há a formação de uma estrutura
granulomatosa branco-acinzentada, ou granuloma, chamado de Foco de Ghon ou
complexo de Ghon (quando já cicatrizado e calcificado), sendo este detectável em
radiografia de tórax. O granuloma é um agregado celular ativo que contém os bacilos da
tuberculose ao centro, sendo rodeado por macrófagos, linfócitos e outras células imunes,
as quais estão em constante renovação (Figura 12).
49
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
6- Cél. Epiteleoide
Figura 12 – Granuloma formado a partir da Resposta Imune contra a Infecção por Bacilos da Tuberculose.
Granulomas são conhecidos como Foco de Ghon.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
50
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A TB deve ser investigada em casos de febre de origem indeterminada, síndrome
consumptiva, pneumonias e tosse persistente. A radiografia de tórax é uma ferramenta
essencial para a detecção precoce da tuberculose, apresentando maior sensibilidade para
o diagnóstico de TB pulmonar do que a triagem dos sintomas. Ela também é utilizada no
acompanhamento da evolução da TB pulmonar.
No entanto, o teste padrão ouro para diagnóstico da doença ativa é a baciloscopia
direta, a partir do escarro do paciente. A baciloscopia do escarro permite detectar de
60% a 80% dos casos de TB pulmonar, em adultos. O exame deve ser realizado em
duas amostras diferentes, sendo uma amostra coletada no primeiro dia, e a outra no dia
seguinte, preferencialmente ao despertar do paciente. Os casos de baciloscopia positiva
(presença de BAAR na amostra investigada) são os maiores responsáveis pela manutenção
da cadeia de transmissão da doença.
EXERCÍCIO
Agora que você já estudou sobre a ação do HIV/AIDS e da tuberculose no orga-
nismo do hospedeiro, responda: Por que a tuberculose é tão nociva aos pacientes
HIV positivos, principalmente com AIDS, a ponto de ser a sua principal causa de morte?
51
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
baseado no metabolismo bacilar. O esquema de tratamento da tuberculose é padronizado,
com duração de seis meses, compreendendo duas fases: a intensiva (ou de ataque) com
duração de dois meses, bem como a de manutenção, com duração de quatro meses.
A fase inicial (intensiva) tem o objetivo de reduzir rapidamente a população bacilar e
a eliminação dos bacilos com resistência natural a algum medicamento. Já a fase de
manutenção busca eliminar os bacilos latentes ou persistentes, e reduzir a possibilidade
de recidiva da doença (COURA, 2013).
No Brasil, o esquema básico para tratamento da TB, em adultos e adolescentes, é
composto por comprimidos em doses fixas combinadas, com a apresentação do tipo 4 em
1 (RHZE) na fase intensiva, sendo eles: (R) rifampicina (150mg), (H) isoniazida (75mg), (Z)
pirazinamida (400mg) e (E) etambutol (275mg). E na fase de manutenção, comprimidos
em doses fixas combinadas do tipo 2 em 1 (RH): rifampicina (150mg) e isoniazida (75mg).
A quantidade de comprimidos a serem tomados varia de acordo com o peso corporal do
paciente a ser tratado (BRASIL, 2019). Nos casos em que a TB apresentar evolução clínica
não satisfatória, o tratamento poderá ser prolongado na sua segunda fase (manutenção),
de quatro para sete meses (BRASIL, 2019).
É indispensável que, ao ser tratado, o paciente compreenda a importância de
manter a terapia medicamentosa de forma adequada, administrando as doses corretas
dos fármacos pelo período indicado. Por se tratar de uma terapia de longa duração,
geralmente entre 6 e 9 meses, e com medicamentos que podem causar reações adversas,
como intolerância gástrica, icterícia, alterações cutâneas e dores articulares, é possível
que alguns pacientes abandonem o tratamento. O abandono do tratamento deve ser
evitado, pois você aprendeu aqui que cepas resistentes podem surgir de um tratamento
farmacológico incompleto!
52
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
contaminados com o bacilo. Por conta disso, o agente patógeno precisa ser capaz de
sobreviver, em número suficiente, às nossas barreiras naturais de defesa como: pH ácido
do estômago, atividades enzimáticas digestivas e peristaltismo do trato gastrointestinal,
para que consiga estabelecer o quadro infeccioso.
A incidência de Febre Tifoide está associada a locais com baixo nível socioeconômico,
principalmente em regiões com precárias condições de saneamento básico, higiene
pessoal e ambiental, ocorrendo de forma endêmica nestas regiões. No Brasil, as regiões
norte e nordeste são as que apresentam maior incidência da doença. A febre tifoide é
incomum em países industrializados, como Estados Unidos, Japão, Canadá e Austrália.
Em geral, os casos de febre tifoide nestes países estão presentes em indivíduos que
viajaram recentemente para regiões endêmicas.
O diagnóstico da febre tifoide é feito com base na avaliação clínica do paciente,
investigando o histórico de onde ele esteve, se viajou, o que consumiu, seus hábitos de
higiene e se mora em regiões com pouco saneamento básico, entre outros. Os principais
sintomas da doença são: febre alta e prolongada, dores de cabeça, mal-estar geral,
anorexia, bradicardia, esplenomegalia, manchas rosadas no tronco (roséolas tíficas),
53
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
distensão e dor abdominal, constipação ou diarreia e tosse seca. Como os sinais e
sintomas da doença são muito gerais, acaba dificultando o diagnóstico clínico.
Assim que o patógeno é acidentalmente ingerido pelo hospedeiro, a partir do
alimento e/ou água contaminados ou via fecal-oral, ele vai até o íleo terminal, penetra
rapidamente na mucosa do epitélio intestinal, chegando até a lâmina própria do órgão,
onde é fagocitado pelos macrófagos. A partir do acionamento de nossa resposta imune,
ocorre um acúmulo de neutrófilos e outras células de defesa na lâmina própria, na
tentativa de conter o agente infeccioso. Há a formação de úlceras, como consequência
dos danos à mucosa intestinal, causando diarreia sanguinolenta. Em casos mais graves,
estas ulcerações podem perfurar o intestino.
Os linfonodos locais ficam aumentados por conterem os agentes patógenos e pelo
acúmulo de fagócitos apresentadores de antígenos. Alguns bacilos permanecem nos
linfonodos locais do intestino, e outros conseguem alcançar a circulação sistêmica pela
drenagem linfática mesentérica e pelo ducto torácico (maior ducto linfático do corpo)
(Figura 14). Depois disso, o patógeno permanece intracelular, em alguns órgãos, como
baço, fígado, medula óssea, incubado de uma até três semanas.
Figura 14 - Sistema Linfático Humano e o Ducto Torácico, maior ducto linfático do corpo.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
54
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A hemocultura é o exame padrão ouro para o diagnóstico da febre tifoide. A
presença da Salmonella no sangue levanta a hipótese da doença, devendo a cepa ser
encaminhada ao Laboratório de Saúde Pública para a realização de análise laboratorial
específica (sorotipagem), uma vez que existe mais de um sorotipo de Salmonella. Outra
opção de diagnóstico é o isolamento da Salmonella typhi, a partir da análise das fezes do
paciente. No entanto, o resultado do exame vai depender da porção das fezes coletadas
e do estágio atual da doença, pois a quantidade de cepa aumenta, conforme aumenta a
duração da doença.
2.4 CÓLERA
A cólera é uma doença infecciosa intestinal aguda que, assim como a febre tifoide,
pode ter relação com a falta de saneamento básico, uma vez que o indicador mais relevante
desta doença é o saneamento. O agente patógeno é a enterotoxina do Vibrio cholerae O1
e O139, bacilo gram-negativo, com flagelo polar, aeróbio ou anaeróbio facultativo (Figura
15).
55
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 15 - Vibrio Cholerae: agente infeccioso causador da Cólera.
Fonte: Shutterstock (2020).
56
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
acidose e colapso circulatório, devido a grandes perdas de água e eletrólitos corporais em
poucas horas. Os quadros leves e as infecções assintomáticas são mais frequentes do que
as formas graves (BRASIL, 2010). Diarreia e vômito são as manifestações clínicas mais
comuns nestes casos.
Na forma leve (em mais de 90% dos casos), o quadro costuma iniciar de maneira
insidiosa, com diarreia discreta, sem distinção das diarreias comuns, podendo também
ocasionar vômitos (BRASIL, 2010).
Nos casos graves, mais típicos, porém menos frequentes (menos de 10% do total), o
início é súbito, com diarreia aquosa, abundante, que não cessa, com inúmeros episódios
diários. A diarreia e os vômitos dos casos graves de cólera levam à acentuada perda de
líquido (podendo ser de um a dois litros por hora!). Tal quadro conduz à rápida e intensa
desidratação, que precisa ser urgentemente revertida. Por conta da desidratação, cãibras
podem decorrer do distúrbio hidroeletrolítico em nível muscular, podendo atingir
a musculatura abdominal, a musculatura dos membros superiores e dos membros
inferiores (panturrilhas, principalmente) (BRASIL, 2010).
A desidratação não corrigida nos casos graves da doença levará a uma deterioração
progressiva da circulação, da função renal e do balanço metabólico, produzindo dano
irreversível a todos os sistemas do organismo.
O diagnóstico laboratorial da cólera deve ser feito a partir do cultivo em meios
apropriados de fezes e/ou vômitos, objetivando o isolamento e a identificação bioquímica
do Vibrio cholerae O1 toxigênico, bem como a sua subsequente caracterização sorológica
(BRASIL, 2010).
57
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
administração deve ser por via oral, quando cessarem os vômitos, em geral, após um
período de 3 a 4 horas do início da reidratação (BRASIL, 2010). Os antibióticos de escolha
para o tratamento da cólera dependem da idade do paciente. O sulfametoxazol, aliado
a trimetoprim são indicados para tratar pacientes menores de oito anos. A tetraciclina
(primeira opção), ou doxiciclina, ou furazolidona, ou eritromicina são indicadas para
pacientes maiores de oito anos. Para nutrizes, é indicado o uso de ampicilina.
Nos casos de choque , a administração deve iniciar, quando o paciente sair deste estado
e recuperar a capacidade de ingerir o medicamento com segurança. A antibioticoterapia é
especialmente benéfica nos casos de desidratação grave (BRASIL, 2010).
2.5 LEPTOSPIROSE
A leptospirose é uma doença infecciosa febril de início abrupto, sendo uma zoonose
(doença transmita ao homem pelos animais) de grande importância epidemiológica. É
causada por bactérias do gênero leptospira patogênicas (Figura 16), que penetram no
hospedeiro pelo contato de alguma lesão (na pele ou mucosa) com a urina de animais
infectados (cães, gado, porco, cavalos, roedores), ou água e lama contaminadas pela bactéria.
58
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
A maior incidência desta doença está relacionada com locais de baixa renda,
em indivíduos que vivem à beira de córregos, em locais com aglomerações urbanas,
com infraestrutura sanitária precária e com infestações de roedores, principalmente
ratos de esgoto. Nas estações chuvosas, as inundações e enchentes podem aumentar a
disseminação da doença, pois predispõem o contato do homem com águas contaminadas
por leptospira patogênica.
Após sua liberação no ambiente, as leptospiras podem sobreviver por semanas a
meses no solo e na água. O período de incubação da doença varia de 1 a 30 dias , sendo
mais frequente entre 5 e 14 dias. A doença apresenta manifestações clínicas variáveis,
podendo ser assintomática ou pouco sintomática, até apresentar quadros clínicos mais
graves associados a manifestações fulminantes (BRASIL, 2014).
A Síndrome de Weil, comumente descrita na literatura como a tríade de icterícia,
insuficiência renal e hemorragias, é a manifestação clássica de leptospirose grave, podendo
levar o paciente ao óbito. É uma síndrome rara que ocorre em 5% a 10% dos casos de
leptospirose, costumando ser fatal. No entanto, a síndrome de hemorragia pulmonar vem
sendo reconhecida como uma forma grave emergente da doença (BRASIL, 2014).
As apresentações clínicas da doença são: a fase precoce (leptospirêmica) e a fase
tardia (fase imune). Na fase precoce, ocorre instalação abrupta de febre, acompanhada
de cefaleia, mialgia, anorexia, náusea e vômito. Esta fase corresponde à maioria das
apresentações clínicas da doença (90%) e apresenta sintomas pouco diferenciais. Tende
a ser autolimitada e regredir, em três a sete dias, sem deixar sequelas.
Já na fase tardia da leptospirose, há a evolução para manifestações clínicas graves,
que tipicamente iniciam após a primeira semana de doença, mas que podem ocorrer
mais cedo, especialmente em pacientes com apresentações fulminantes (BRASIL, 2014).
A síndrome de Weil, citada anteriormente, é a apresentação clínica clássica da doença em
estado grave, caracterizada pela tríade de icterícia (utilizada para auxiliar no diagnóstico
da leptospirose, sendo preditor de pior diagnóstico), insuficiência renal e hemorragias,
mais comumente pulmonar. A síndrome de hemorragia pulmonar é caracterizada por
lesão pulmonar aguda e sangramento pulmonar maciço, e ela vem sendo cada vez mais
reconhecida no Brasil como uma manifestação distinta e importante da leptospirose na
fase tardia (BRASIL, 2014).
Enquanto a letalidade geral para os casos de leptospirose notificados no Brasil é de
10%, a letalidade para os pacientes que desenvolvem hemorragia pulmonar é maior que
50% (BRASIL, 2014).
O diagnóstico da doença é feito, a partir de métodos sorológicos nos laboratórios
centrais de Saúde Pública (Lacen). Os mais utilizados são: o método ELISA-IgM (teste
imunoenzimático que permite a detecção de anticorpos específicos) e a microaglutinação
59
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
(MAT), sendo este último o teste padrão ouro, recomendado pela OMS para o diagnóstico
de infecção por Leptospira (BRASIL, 2014).
Quadro 2 - Fármacos utilizados no tratamento da Leptospirose, de acordo com a fase da doença e está-
gio de vida do paciente
Fase da doença Estágio de vida Fármaco
- Amoxicilina: 500 mg, VO, 8/8h, por 5 a 7 dias
Precoce Adulto
- Doxiciclina 100 mg, VO, 12/12h, por 5 a 7 dias
- Amoxicilina: 50 mg/kg/dia, VO, divididos, 8/8h, por 5 a 7
Precoce Criança
dias
- Penicilina G Cristalina: 1.5 milhões UI, IV, de 6/6 horas
- Ampicilina: 1 g, IV, 6/6h
Tardia Adulto
- Ceftriaxona: 1 a 2 g, IV, 24/24h ou Cefotaxima: 1 g, IV, 6/6h.
- Alternativa: Azitromicina 500 mg, IV, 24/24h
- Penicilina cristalina: 50 a 100.000 U/kg/dia, IV, em quatro
ou seis doses
- Ampicilina: 50-100 mg/kg/dia, IV, dividido em quatro doses
Tardia Criança
- Ceftriaxona: 80-100 mg/kg/dia, em uma ou duas doses, ou
Cefotaxima: 50-100 mg/kg/dia, em duas a quatro doses.
- Alternativa: Azitromicina 10 mg/kg/dia, IV
* Duração do tratamento com antibióticos intravenosos: pelo menos 7 dias. VO: via oral; UI: unidade
internacional; IV: intravenoso.
Fonte: Adaptado pela autora, a partir de BRASIL (2014).
60
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Chegamos ao final de mais uma unidade de estudos, na qual foi possível perceber,
no mínimo, dois fatos muito relevantes: o quanto nosso sistema imune tem significância
para nós, cumprindo seu papel de nos defender de agentes patógenos, e o quanto o
acesso ao saneamento básico, algo tão trivial em nosso cotidiano, é importante para a
manutenção da saúde da população.
E os microrganismos? Estes seres microscópicos, impossíveis de serem vistos a
olho nu, mas que podem nos ser letais, caso vençam as barreiras naturais de proteção e
nosso sistema imune.
Na Unidade 2, compreendemos que algumas infecções apresentam sinais e
sintomas muito generalistas, como: febre, diarreia, náusea, vômito ou anorexia. Assim,
muitas vezes, fica difícil distinguir uma doença de outra, sendo sempre determinante a
busca pelo diagnóstico diferencial por parte dos médicos.
Estudamos que alguns tratamentos farmacológicos são bastante longos, como no
caso da tuberculose, por exemplo, o qual pode durar de 6 a 9 meses. Ou, ainda, o tratamento
do vírus HIV com TARV que, de acordo com o Ministério da Saúde, está recomendado a
todos os indivíduos vivendo com HIV, independentemente do estágio da doença. Vimos,
também, que o nosso Sistema Público de Saúde (SUS) custeia o tratamento do HIV/AIDS
a toda a população brasileira, e com o melhor antirretroviral disponível atualmente!
61
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
EXERCÍCIO FINAL
62
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
a) Tuberculose e Leptospirose.
b) HIV e Febre Tifoide.
c) Febre Tifoide e Cólera.
d) Cólera e Tuberculose.
e) Leptospirose e Tuberculose.
63
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
REFERÊNCIAS
CUPPARI, Lilian. Nutrição Clínica no Adulto. 3ª ed. Barueri, SP: Manole, 2014.
64
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
PORTH, Carol Mattson; MATFIN, Glenn, Fisiopatologia. 8ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2010. 2º v.
SILVA, Sandra Maria Chemin Seabra da; MURA, Joana D’Arc Pereira. Tratado de
Alimentação, Nutrição e Dietoterapia. 3ª ed., São Paulo: Payá, 2016.
65
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
66
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3
UNIDADE
DOENÇAS
DO APARELHO
DIGESTIVO E
RESPIRATÓRIO
INTRODUÇÃO À UNIDADE
O esôfago é um tubo muscular que liga a orofaringe ao estômago. Ele está situado
posteriormente à laringe e à traqueia e se estende através do mediastino, atravessando
o diafragma no nível da 11ª vértebra torácica. Seu comprimento médio varia entre 20 e
35 centímetros. O esôfago é dividido, de forma artificial , em esôfago proximal, médio e
distal. Sua função é basicamente conduzir, através do peristaltismo (contração muscular
rítmica), os alimentos e líquidos ingeridos pela boca, da faringe até o estômago.
68
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.1.1 Acalasia
69
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Como consequência desta condição, os pacientes podem regurgitar o alimento que
está preso no esôfago para a boca, correndo risco de aspiração da dieta, principalmente
durante a noite, quando estão deitados. Em alguns casos de acalasia, os pacientes não
conseguem consumir, por via oral, a quantidade energética e de nutrientes necessária
para a manutenção do seu estado nutricional adequado, pois eles ficam com a sensação
desconfortável de alimento “entalado”. Desta forma, faz-se necessário viabilizar uma
gastrostomia (acesso direto ao estômago), para nutrição entérica nos pacientes com
funcionamento gástrico adequado.
70
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
O sintoma mais comum da DRGE é a queimação dolorosa epigástrica e/ou
retroesternal, que com frequência irradia-se para a garganta, ombro ou costas. Em
virtude da sua localização, a dor pode ser confundida com angina e infarto do miocárdio.
O refluxo também pode provocar sintomas respiratórios como sibilos, tosse crônica e
rouquidão.
O diagnóstico da DRGE depende da história de sintomatologia clínica do paciente
e do uso seletivo de métodos diagnósticos, como investigações radiológicas utilizando
meio de contraste (como o bário), esofagoscopia e monitoração ambulatorial do pH
esofágico.
O esfíncter de entrada no estômago é conhecido como EEI ou cárdia. Ele é
responsável por permitir a passagem dos alimentos até o estômago (como vimos
anteriormente), e também por não permitir que o conteúdo ácido gástrico reflua,
retornando para o esôfago, depois que já entrou no estômago. O relaxamento (abertura)
do EEI é o reflexo do tronco encefálico, que é mediado pelo nervo vago, em resposta
a vários estímulos aferentes (estímulos sensoriais ou viscerais enviados ao Sistema
Nervoso Central).
O relaxamento transitório do EEI com refluxo é comum após as refeições, visto que
a distensão gástrica e refeições ricas em gordura elevam a frequência deste relaxamento.
Aumento da pressão gástrica e/ou intra-abdominal, provocada por situações como
esvaziamento gástrico tardio, uso de roupas apertadas na região abdominal, obesidade
e gestação, também contribuem para o refluxo. Além disso, alguns hormônios, como
a colecistocinina e a secretina, secretados na fase intestinal da digestão, promovem o
relaxamento do EEI, facilitando o refluxo.
Os líquidos ácidos gástricos refluídos (pH <4,0) são particularmente nocivos,
podendo causar lesão na mucosa do esôfago, a qual não costuma (de maneira fisiológica)
ter contato com conteúdo tão ácido quanto a mucosa do estômago. A lesão da mucosa
esofágica está relacionada com a natureza destrutiva do refluxo e o tempo durante o
qual permanece em contato com o esôfago. Normalmente, o refluxo é neutralizado pela
peristalse esofágica e pelo bicarbonato da saliva que engolimos, tendo esta a capacidade
de tamponamento do conteúdo ácido refluído.
71
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.1.3 Esofagite
PARA REFLETIR
Você já se deu conta de que o refluxo gastroesofágico persistente pode levar
à esofagite que, por sua vez, devido à inflamação crônica da mucosa esofágica,
pode levar à alteração, como o Esôfago de Barrett? E ainda, o Esôfago de Barrett é uma condição
patológica, a qual predispõe o paciente a desenvolver adenocarcinoma de esôfago?
72
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.1.4 Disfagia
73
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
respiratórias e chega aos pulmões. Em caso de pneumonia broncoaspirativa, o paciente
precisará ser internado para tratá-la e, em alguns casos, esta condição poderá levar o
paciente a óbito.
Figura 19 - Disfagia: alimento sendo conduzido para as vias aéreas, por distúrbio no processo de deglutição.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
SAIBA MAIS
Sugiro que você assista ao vídeo a seguir, o qual mostra um exame de fluoros-
copia da deglutição, evidenciando a disfagia: https://www.youtube.com/watch?-
v=CjLvG7rz684.
74
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.1.5 Divertículos Esofágicos
75
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 20 – Tipos de Hérnia Hiatal.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
3.2.2 Gastrite
76
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
(secreção e barreira mucosa, ação das prostaglandinas) e os fatores que agridem a mucosa
(ácido clorídrico, medicamentos ulcerogênicos, álcool, toxinas).
• Gastrite Aguda:
Caracteriza-se por um processo de inflamação aguda da mucosa gástrica,
normalmente de natureza transitória, de curta duração, desaparecendo, na maioria
das vezes, sem deixar sequelas.
Esta condição está comumente associada a irritantes locais , tais como o uso de
alguns fármacos (ex.: aspirina) ou outros anti-inflamatórios não esteroides (AINES),
álcool ou toxinas bacterianas. A uremia, tratamento com agentes quimioterápicos
para o câncer e a irradiação gástrica constituem outras causas de gastrite aguda.
• Gastrite Crônica:
Nesta situação, há presença de alterações inflamatórias persistentes, que levam
à atrofia crônica e progressiva do epitélio glandular do estômago. A infecção por
Helicobacter pylori constitui a causa mais comum de gastrite crônica.
O H. pylori é uma bactéria flagelada, gram-negativa, frequentemente encontrada na
mucosa gástrica, e que se adapta em meio extremamente ácido, como o estômago,
colonizando células epiteliais secretoras de muco neste órgão. Ela secreta urease,
que possibilita a produção suficiente de amônia, para tamponar a acidez do seu meio
ambiente. Também produz enzimas e toxinas que têm a capacidade de interferir na
proteção local da mucosa gástrica contra o ácido, provocando inflamação intensa
e desencadeando resposta imune. Por conta disso, há um aumento na produção de
citocinas pró-inflamatórias, recrutando neutrófilos ao local da lesão.
Pode-se verificar, também, a presença de linfócitos T e B na gastrite crônica por H.
pylori. Alguns indivíduos infectados são assintomáticos. O tratamento proposto,
neste caso, é farmacológico, associando inibidor da bomba de prótons (IBP) +
claritromicina + amoxicilina ou metronidazol, durante 7 a 14 dias. No entanto, a
erradicação da bactéria tem sido difícil.
Além disso, na forma crônica, existe a gastrite autoimune e a gastrite atrófica
multifocal, porém estas com uma prevalência mais baixa.
77
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
SAIBA MAIS
Sugiro que você faça a leitura do seguinte artigo de revisão, o qual trata sobre
o uso de probióticos na erradicação da H pylori: Efeito dos probióticos na erradica-
ção do Helicobacter pylori: uma revisão baseada na evidência. Disponível em: http://www.scielo.
mec.pt/pdf/rpmgf/v35n5/v35n5a06.pdf.
PINTO, Cristiana Sousa; ALVES, Patrícia; FRASCO, Joana. Efeito dos probióticos na erradicação
do Helicobacter pylori: uma revisão baseada na evidência. Revista Portuguesa de Medicina
Geral e Familiar, v. 35, nº 5, p. 392-400, 2019.
Pacientes com gastrite crônica e atrofia grave das células parietais do estômago
(produtoras de ácido gástrico e fator intrínseco (FI)), podem apresentar risco de
deficiência de vitamina B12, pois a acidez gástrica libera a vitamina B12 dos alimentos, e
o FI é indispensável para a absorção da vitamina B12 na porção intestinal do íleo. Além
disso, o tratamento da doença com a utilização de inibidor da bomba de prótons também
pode prejudicar a absorção da vitamina B12. É importante destacar que a gastrite crônica
está associada ao risco aumentado de desenvolvimento de câncer gástrico.
78
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 21 - Úlcera Péptica: acometimento das camadas mais internas do órgão.
Fonte: Shutterstock (2020).
79
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
de granulação ou da erosão de uma úlcera em uma artéria ou veia. A perfuração ocorre,
quando uma úlcera provoca a erosão de todas as camadas da parede do estômago ou
do duodeno. Nos casos de perfuração, o conteúdo gastrointestinal penetra no peritônio,
causando peritonite.
O diagnóstico da úlcera péptica deve ser feito com base em anamnese clínica, que
investigará o uso de aspirina ou outro AINE, exames laboratoriais, exame de imagem
radiológica e exame endoscópico. Os achados laboratoriais de anemia hipocrômica e
sangue oculto nas fezes indicam sangramento.
O tratamento da úlcera péptica tem como objetivo erradicar a causa da patologia
e promover uma cura permanente. A terapia medicamentosa visa erradicar a H. pylori,
aliviar os sintomas e curar as úlceras. Aspirina e AINES devem ser evitados, sempre que
possível. Os fármacos utilizados para reduzir o ácido gástrico são os antiácidos: carbonato
de cálcio, o hidróxido de alumínio e o hidróxido de magnésio, além do inibidor da bomba
de prótons.
3.2.4 Gastroparesia
80
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
endoscopia digestiva alta (EDA) e cintilografia do esvaziamento gástrico.
As complicações da gastroparesia incluem: mau controle da glicemia,
desenvolvimento de bezoares por conteúdo gástrico retido, supercrescimento bacteriano,
inapetência por sensação de empachamento. Nos casos em que as náuseas e vômitos são
muito frequentes, pode ocorrer perda de peso.
O tratamento desta condição pode ser feito por meio de ajuste dietético, fracionando
melhor as refeições durante o dia, a fim de evitar o consumo de refeições volumosas,
além de limitar o consumo de alimentos muito gordurosos e fibrosos, de difícil digestão,
pois estes normalmente retardam o esvaziamento gástrico. Além disso, pode ser utilizada
farmacoterapia, como: metoclopramida (estimula as contrações musculares do estômago
e reduz náuseas e vômitos); eritromicina (antibiótico prescrito em doses baixas, melhora
o esvaziamento gástrico, também aumentando as contrações musculares gástricas). A
eritromicina é reconhecida pelo receptor do hormônio motilina, afetando a motilidade
gastrointestinal. Em alguns casos, pacientes apresentam melhora da gastroparesia com
análogos da eritromicina.
3.3 PANCREATITE
81
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 22 - Pâncreas, Ducto Pancreático, Ilhotas de Langerhans (produtoras e secretoras de hormônios
insulina e glucagon) e células Acinares (produtoras e secretoras de enzimas digestivas).
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
82
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
envolve a autodigestão do órgão por enzimas pancreáticas inapropriadamente ativadas.
Tais enzimas podem danificar tecidos e ativar a cascata inflamatória, ao produzirem
citocinas pró-inflamatórias, causando inflamação e edema intersticial do pâncreas.
Acredita-se que o processo começa com a ativação da tripsina, pois, uma vez que a
tripsina é ativada, ela pode ativar uma variedade de enzimas digestivas, causando lesão
pancreática e respostas inflamatórias intensas.
Embora diversos fatores estejam associados ao desenvolvimento da pancreatite
aguda, a maioria dos casos resulta da presença de cálculos biliares no ducto colédoco
que, em conjunto com o ducto pancreático, forma um ducto comum (Figura 23), ou
ainda do abuso de álcool .
No caso da obstrução do trato biliar devido a cálculos biliares, acredita-se que
a obstrução do ducto pancreático ou o refluxo biliar ativem as enzimas no sistema de
ductos pancreáticos. Já os mecanismos precisos, através dos quais o álcool exerce sua
ação, são desconhecidos. Sabe-se que o álcool é um potente estimulador das secreções
pancreáticas, o qual também provoca obstrução parcial do esfíncter do ducto pancreático.
Figura 23 - Ductos Biliares: Ducto Colédoco e Ducto Pancreático se unem e desembocam no duodeno.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
83
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
As manifestações da pancreatite aguda podem variar de leve (com disfunção
orgânica mínima), autolimitada (de 2 a 3 dias, com nenhuma sequela significativa) até
manifestações mais graves, e potencialmente fatais, associadas de falência dos sistemas
de órgãos (pulmonar, circulatório e/ou renal). As manifestações leves da pancreatite
aguda são mais comuns, sendo que os casos graves ocorrem apenas em cerca de 20% das
manifestações.
A dor abdominal é o principal sintoma da pancreatite aguda, sendo localizada na
região epigástrica ou periumbilical, podendo irradiar-se para as costas, tórax ou área do
flanco. Náusea, vômitos e anorexia também podem estar presentes como sintomas da
doença.
A amilase e a lipase séricas constituem os marcadores laboratoriais mais utilizados
para estabelecer o diagnóstico de pancreatite aguda. A lipase sérica pode permanecer
elevada por mais tempo que a amilase. Em geral, efetua-se uma ultrassonografia do
abdômen, à procura de cálculos biliares. A Tomografia Computadorizada (TC) e a TC
Contrastada Dinâmica do Pâncreas são usadas para detectar a existência de necrose
e acúmulo de líquido. Os marcadores sorológicos em fase de investigação também
incluem o peptídeo de ativação do tripsinogênio, a proteína C reativa, a procalcitonina, a
fosfolipase A2, e as citocinas interleuciona-6 e interleucina-8.
O tratamento da pancreatite aguda depende da gravidade dos sintomas. Exigem
hospitalização aqueles indivíduos que apresentam dor persistente e intensa, vômitos,
desidratação ou sinais de pancreatite aguda grave. O tratamento é direcionado ao alívio
da dor, “repouso do pâncreas”, através da suspensão do consumo de alimentos e líquidos
por via oral e restauração do volume plasmático perdido. Para isso, administram-se
líquidos e eletrólitos por via intravenosa. São fornecidas soluções coloidais intravenosas
para repor o líquido sequestrado no abdômen e no espaço retroperitoneal.
84
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
da função pancreática, a qual caracteriza a pancreatite crônica.
A causa mais comum de Pancreatite Crônica é o consumo abusivo prolongado
de álcool. As causas menos comuns incluem: obstrução do ducto pancreático de longa
duração, cálculos, neoplasias, pancreatite crônica autoimune, idiopática e associada à
fibrose cística.
A Pancreatite Crônica se manifesta em episódios semelhantes aos da pancreatite
aguda, porém, em menor gravidade, sendo que os episódios são persistentes e recorrentes
de dor epigástrica e no quadrante superior esquerdo. Com frequência, as crises são
causadas pelo abuso de álcool ou por alimentação excessiva. É comum a ocorrência de
anorexia, náusea, vômitos, constipação e flatulência.
Por fim, a evolução da doença pode resultar na deficiência das funções endócrina
e exócrina do pâncreas. Neste estágio, os sinais de diabetes mellitus e da síndrome de má
absorção, como a perda de peso e a esteatorreia se tornam presentes.
O tratamento consiste em manejo dos sinais e sintomas, através de atitudes
como: excluir o consumo de álcool, uma vez que ele frequentemente precipita as crises;
tratar a má absorção alimentar e a esteatorreia com o uso de enzimas pancreáticas;
observar a deficiência de vitaminas lipossolúveis, por conta da má absorção; tratar da
doença coexistente do trato biliar e tratar o diabetes mellitus com insulina. A intervenção
cirúrgica é necessária, em alguns casos, para remover qualquer possível obstrução dos
ductos pancreáticos que possa estar presente. Nos casos avançados, pode ser necessária
uma pancreatectomia parcial ou total.
85
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.4.1 Doenças Inflamatórias Intestinais (DIIs)
86
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
reconhecidamente associados ao desenvolvimento de DII e, provavelmente, contribuem
para o aparecimento da doença. Estes genes incluem as associações de Antígenos
Leucocitários Humanos (HLA).
O diagnóstico da DC pode ser difícil, devido à heterogeneidade das manifestações
e à sua sobreposição com os sintomas da Retocolite Ulcerativa (RCU). O paciente deve
ser avaliado através de dados clínicos: anamnese, exame físico e exames laboratoriais;
análise endoscópica, radiológica e histológica, além de investigações por imagem
seccional, como a TC e a ressonância magnética (RM). Nos exames de TC e RM, os
principais achados característicos da doença são o acometimento do intestino delgado
e presença de fístulas. A colonoscopia com duas biópsias de cinco locais distintos do
intestino, incluindo o íleo, é o método preferencial para o diagnóstico.
A DC acomete, com mais frequência, a região do íleo distal, cólon e região
perianal. Como dito anteriormente, as áreas de ulceração e inflamação ocorrem de modo
descontínuo, intercalando partes saudáveis e ulceradas, e acometem toda a espessura
da parede intestinal. A combinação da ulceração profunda da mucosa e espessamento
da submucosa confere ao intestino do portador de DC um aspecto característico de
pavimentação com pedras ou “pedras de calçamento” (Figura 24).
Figura 24 - Lesões Intestinais na Doença de Crohn, em forma de “pedras de calçamento”. Fonte: Adapta-
da pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
87
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Os sintomas principais da DC são: diarreia intermitente, dor em cólica, perda de
peso e sangramento intestinal. Como a DC afeta a camada submucosa em maior grau do
que a camada mucosa, ocorre menos diarreia sanguinolenta do que na RCU.
As complicações frequentes da DC compreendem a formação de fístulas
(principalmente perianais), abscessos, perfuração e obstrução do intestino delgado por
estenose (Figura 25). O sangramento franco das ulcerações da mucosa pode ocorrer e
ser massivo. Outra complicação importante é a possível incidência aumentada de câncer
intestinal. Algumas manifestações extra intestinais podem ocorrer nos portadores de DC,
como: inflamação das articulações (artrite), inflamações na pele, inflamações no olho,
das membranas mucosas (membrana bucal) e dos canais biliares (colangite esclerosante).
Figura 25 - Alterações Intestinais, como consequência das lesões por Doença de Crohn.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
A investigação para saber se a doença está ativa ou em remissão pode ser feita
por meio do Índice de Harvey-Bradshaw (IHB), disponível no Quadro 3. Este índice é
simples e investiga a presença ou ausência de sinais e sintomas, através de um esquema de
pontuação, mantendo uma boa correlação com o índice de atividade da DC, sendo padrão
ouro para a caracterização dos estágios da doença. Caso o paciente pontue 4 pontos ou
menos, e não esteja em uso de corticoides, ele é considerado em remissão sintomática
da doença. Pacientes com manifestações graves da doença normalmente pontuam 8 ou
mais pontos no IHB.
88
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Quadro 3 - Índice de Harvey-Bradshaw.
Variável Descrição Score
0= muito bem
1= levemente comprometido
1 Bem-estar geral 2= ruim
3= muito ruim
4= péssimo
0= nenhuma
1= leve
2 Dor abdominal
2= moderada
3= intensa
3 Número de evacuações líquidas por dia 1 ponto por cada evacuação
0= ausente
1= duvidosa
4 Massa abdominal
2= definida
3= definida e dolorosa
1 ponto por item:
Artralgia
Uveíte
Eritema nodoso
5 Complicações Úlceras aftosas
Pioderma gangrenoso
Fissura anal
Nova fístula
Abscesso
Soma dos scores das variáveis de
Total
1 a 5.
Fonte: Brasil (2017).
89
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.4.1.2 Retocolite Ulcerativa
90
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
emagrecimento, anemia, fraqueza e fatigabilidade.
As inflamações da RCU limitam-se ao reto e ao cólon (Figura 26). Em geral, a
doença começa no reto e sofre disseminação proximal, acometendo principalmente a
camada mucosa, embora possa se estender para a submucosa. A extensão da inflamação
varia, podendo acometer apenas o reto (proctite ulcerativa), o reto e o cólon sigmoide
(proctossigmoidite) ou todo o cólon (pancolite).
91
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
deve ser feita em indivíduos com doença grave devido ao risco de perfuração intestinal.
O achado colonoscópico mais típico da doença é o comprometimento da mucosa desde
a margem anal, estendendo-se proximalmente, de uma forma contínua e simétrica, com
demarcação clara entre a mucosa inflamada e normal.
O câncer de cólon é uma das complicações mais temidas da RCU, por isso é
recomendada a realização regular de colonoscopias de vigilância, com biópsias múltiplas,
para indivíduos com colite extensa.
O tratamento depende da extensão da doença e da gravidade dos sintomas, e inclui
medidas para controle das manifestações agudas da doença e prevenção de recidiva. O
tratamento cirúrgico, por meio da remoção do reto e/ou de todo o cólon, com criação de
ileostomia ou anastomose (junção) ileoanal, pode ser necessário para indivíduos que não
respondem à medicação e a métodos conservadores de tratamento.
As medicações utilizadas no tratamento da RCU são semelhantes àquelas utilizadas
no tratamento da DC, compreendendo os aminossalicilatos (sulfassalazina e mesalazinas)
orais e por via retal, corticoides (prednisona), imunossupressores e terapia biológica anti-
TNF (adalimumabe, infliximabe, golimumabe).
Na prática clínica, nem sempre o diagnóstico das DIIs é fácil. Muitas vezes, o
paciente está em sofrimento com seus sintomas, porém ainda sem diagnóstico fechado.
Os achados endoscópicos não são conclusivos em todos os casos, sendo necessária uma
investigação mais aprofundada, para estabelecer o diagnóstico correto.
Neste processo de investigação, muitos pacientes têm perda ponderal importante,
então o nutricionista terá um desafio grande, ao acompanhar e elaborar o plano alimentar
deles, com o objetivo de recuperar seu estado nutricional, oferecendo-lhes uma boa
qualidade de vida.
EXERCÍCIO
Agora que já estudou as doenças inflamatórias intestinais, você saberia dife-
renciar a Doença De Crohn da Retocolite Ulcerativa? Sim? Então, cite três caracte-
rísticas patológicas que diferenciam uma doença da outra.
92
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
3.4.2 Síndrome do Intestino Irritável
93
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Em relação à terapia farmacológica, antiespasmódicos e anticolinérgicos podem
ser recomendados, porém, com sucesso variável entre os pacientes.
94
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 27 - Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica: Bronquite Crônica e Enfisema Pulmonar. Fonte: Adaptada
pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
A Bronquite Crônica é definida por uma história de tosse produtiva por 3 meses do
ano, em 2 anos consecutivos. Tipicamente, a tosse está presente por muitos anos, com
aumento gradual em exacerbações agudas, que produzem um catarro essencialmente
purulento, além da dispneia e obstrução das vias aéreas de forma intermitente ou
contínua. O tabagismo é a causa principal, embora outros irritantes inalados (por
exemplo, poeira ocupacional) podem causar o mesmo processo de inflamação crônica.
Embora os eventos patológicos predominantes sejam inflamação das vias aéreas
maiores, acompanhadas por espessamento da submucosa e hipersecreção de muco, a
inflamação nos brônquios menores e nos bronquíolos é o principal local de aumento
da obstrução do fluxo de ar. Do ponto de vista histológico, estas alterações incluem
um aumento importante na quantidade de células caliciformes e a produção excessiva
de muco, com a formação de tampões no lúmen das vias respiratórias, infiltração
inflamatória e fibrose da parede bronquiolar.
Tanto a hipertrofia da submucosa, nas vias respiratórias maiores, quanto o aumento
na quantidade de células caliciformes, nas vias respiratórias menores, são uma reação
de proteção dos pulmões contra a fumaça do tabaco e outros poluentes, como a poeira
ocupacional. Infecções virais e bacterianas são comuns em indivíduos com bronquite
95
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
crônica, piorando o quadro de inflamação crônica.
Já o Enfisema é uma doença do parênquima pulmonar circundante, a qual se
caracteriza pela perda da elasticidade pulmonar e aumento de tamanho anormal dos
espaços aéreos dos bronquíolos terminais, com a destruição das paredes alveolares e
leitos capilares, conforme mostra a Figura 28.
Ao contrário da bronquite, o quadro patológico do enfisema pulmonar é de baixa
alteração inflamatória, porém, com destruição progressiva e irreversível das unidades
respiratórias terminais (alvéolos) e de capilares alveolares, resultando em capacidade de
difusão (hematose) diminuída e hipoxemia progressiva.
Figura 28 - Enfisema Pulmonar no Tabagismo: destruição dos septos alveolares e formação de uma
grande cavidade de ar prejudicial à respiração.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
96
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
interdisciplinar. A cessação do tabagismo é a única medida que torna lenta a progressão
da doença. Embora antibióticos sejam usados para tratar exacerbações agudas da DPOC,
devido a infecções bacterianas, não há evidências de que o uso profilático de antibióticos
previna exacerbações agudas.
O tratamento farmacológico da DPOC inclui o uso de corticoides e
broncodilatadores, incluindo agentes adrenérgicos e anticolinérgicos inalados. Ainda, os
agonistas β2-adrenérgicos inalados de longa duração podem ser mais eficazes do que as
formas de curta duração da droga, sendo considerados redutores da adesão de bactérias
às células epiteliais das vias respiratórias, ao reduzirem o risco de exacerbações por
infecção.
Em pacientes com DPOC, a perda de peso é muito comum, mas ela está associada
a um pior prognóstico e menor sobrevida. A má nutrição, combinada com a DPOC, é
denominada de “síndrome da caquexia pulmonar”. Esta condição está relacionada com o
declínio acelerado do estado funcional do paciente, sendo um preditor independente de
mortalidade.
Já o Índice de Massa Corporal (IMC) está correlacionado inversamente com a
taxa de sobrevida dos pacientes: quanto maior a perda de peso corporal (menor IMC),
maior a chance de mortalidade. Pacientes com DPOC fazem maior esforço respiratório,
aumentando o gasto energético de repouso. Além disso, o quadro inflamatório
característico da doença, com produção exacerbada de muco e dispneia, leva o paciente
à anorexia, entrando, muitas vezes, em déficit calórico, o que leva à perda de peso e
desnutrição.
A tosse crônica e produtiva característica da doença, principalmente em período
de exacerbação, pode prejudicar a alimentação por via oral, ao favorecer o risco de
broncoaspiração da dieta, levando à pneumonia aspirativa. Em alguns casos, é necessário
suspender a alimentação via oral, realizando alimentação por via nasoenteral ou ostomia.
FÓRUM
Sugiro que você e seus colegas debatam, no FÓRUM, o seguinte questiona-
mento: Para além do tabagismo, quais são as profissões mais relacionadas ao
risco de desenvolvimento de DPOC? Descreva, também, de que forma a DPOC afeta o estado
nutricional dos pacientes.
97
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Chegamos ao final de mais uma unidade, embora ainda tenhamos outros conteúdos
para estudar! Você aprendeu sobre alguns distúrbios que afetam o trato gastrointestinal
e o Sistema Respiratório. Foi possível perceber que todas as patologias estudadas
interferem no estado nutricional do paciente e, normalmente, de maneira negativa,
como, por exemplo, favorecer processos inflamatórios, aumentar o gasto energético de
repouso, reduzir o apetite, levar a prejuízos na digestão e absorção dos alimentos e, como
consequência, à perda de peso e à desnutrição.
Esclareceu-se que a doença de Crohn pode acometer o trato gastrointestinal, desde
a boca até o ânus, e que doenças como a gastrite e as úlceras pépticas exigem tratamento
medicamentoso, o qual pode prejudicar a absorção de vitamina B12, pois ela precisa da
acidez gástrica para ser liberada dos alimentos, além da associação com o fator intrínseco,
para ser absorvida no íleo.
Na Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), também há prejuízos na
alimentação e nutrição do paciente, associada com o aumento do gasto energético de
repouso e redução do consumo via oral, por conta da fisiopatologia da doença, que
envolve inflamação, tosse crônica e produtiva e dispneia.
Espera-se que, por meio desta análise, você reconheça o quanto é importante ao
nutricionista ter o conhecimento sobre a fisiopatologia das doenças e de seus respectivos
tratamentos, visto que a patologia interfere diretamente na conduta nutricional a ser
indicada.
É necessário manter-se estimulado a estudar mais ainda a respeito destas e de outras
doenças que acometem os Sistemas Digestório e Respiratório, uma vez que o profissional
da área da saúde precisa ampliar seus conhecimentos, estando continuamente atualizado.
98
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
EXERCÍCIO FINAL
99
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
c) A pancreatite aguda tem como patogenia a autodigestão, ocasionada pela ativação
inadequada da lipase lipoproteica, enzima responsável por ativar as demais enzimas
digestivas, causando processo inflamatório do pâncreas.
d) A pancreatite aguda compromete a função exócrina do pâncreas, responsável pela
secreção de hormônios contrarregulatórios, como a insulina e o glucagon, levando a
quadros de hipo e hiperglicemia no indivíduo acometido.
e) As células acinares do pâncreas, responsáveis pela produção e secreção de
enzimas digestivas, são destruídas de forma irreversível na Pancreatite Aguda Leve,
comprometendo, de forma permanente, a função endócrina do pâncreas.
100
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
REFERÊNCIAS
CUPPARI, Lilian. Nutrição Clínica no Adulto. 3ª ed. Barueri, SP: Manole, 2014.
LAURINO-NETO, Rafael Melillo et. al. Avaliação diagnóstica da acalasia do esôfago: dos
sintomas à classificação de Chicago. ABCD. Arquivos Brasileiros de Cirurgia Digestiva
(São Paulo), v. 31, nº 2, 2018.
PORTH, Carol Mattson; MATFIN, Glenn, Fisiopatologia. 8ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2010. 2º v.
SILVA, Clarice Siqueira et. al. Abordagem nutricional em pacientes com doença
pulmonar obstrutiva crônica. Pulmão RJ, v. 19, nº 1-2, p. 40-44, 2010.
101
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
102
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4
UNIDADE
DOENÇAS RENAIS,
HEPÁTICAS E DOENÇAS
CRÔNICAS NÃO
TRANSMISSÍVEIS
INTRODUÇÃO À UNIDADE
Chegamos à última unidade de estudos de nosso caderno! Mas isto não significa
que você encerrará por aqui seus estudos sobre a fisiopatologia, combinado?! Sugiro que
você acesse a biblioteca virtual na plataforma e aprofunde seu conhecimento sobre esta
disciplina tão importante para a sua formação acadêmica.
Na quarta unidade, entenderemos algumas doenças renais bastante frequentes,
como a famosa “pedra nos rins”, a insuficiência renal aguda e também a doença renal
crônica, a qual traz consequências muito sérias à saúde e à vida do paciente. Veremos,
também, algumas doenças crônicas não transmissíveis bastante prevalentes, como
a hipertensão arterial e o Diabetes Mellitus. Doenças estas que cada vez mais vêm se
manifestando entre a população mundial e aumentando os gastos com a saúde pública.
Estudaremos, ainda, sobre as alterações metabólicas causadas pelo câncer,
alterações que ocorrem na glândula tireoide, como o hipo e hipertireoidismo. Além
disso, compreender-se-ão algumas reações adversas causadas pelos alimentos como a
intolerância à lactose e a doença celíaca. É importante que você compreenda a diferença
fisiopatológica entre as duas manifestações, pois a doença celíaca mobiliza uma reação
imunológica, já a intolerância à lactose não.
Por fim, conheceremos algumas doenças hepáticas, como a Esteatose Hepática
(a popular gordura no fígado), a Cirrose e doenças das vias biliares, como a Colelitíase,
Colecistite, Coledocolitíase e a Colangite.
Ao final desta unidade, é esperado que você seja capaz de: conhecer a fisiopatologia
das doenças agudas e crônicas abordadas na unidade; compreender o diagnóstico e o
tratamento das doenças apresentadas; relacionar a fisiopatologia das doenças com o
estado nutricional do paciente; e associar a presença destas doenças com a alimentação,
nutrição e alterações do estado nutricional dos indivíduos.
104
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.1 DOENÇAS RENAIS
Os rins são órgãos pares, encapsulados, que possuem formato de feijão. Localizam-
se na parte posterior do abdômen superior, um de cada lado da coluna vertebral, no nível
da décima segunda vértebra torácica. Em um adulto, cada rim mede aproximadamente
de 10 a 12 cm de comprimento, 5 a 6 cm de largura e 2,5 cm de espessura, pesando cerca
de 113 g a 170 g cada.
Este órgão possui diversas funções, como a filtração do sangue, para retirar dele
substâncias que não são necessárias, ou que estão em excesso, excretando-as na urina,
ou então as reabsorvendo ao sangue. Os rins também fazem a regulação do equilíbrio
acidobásico, do volume dos líquidos corporais e regulam a pressão arterial, através do
sistema renina-angiotensina. Produzem, ainda, a eritropoetina, hormônio que estimula
a produção dos eritrócitos (hemácias).
O rim (Figura 29) é uma estrutura multilobular, que apresenta até 18 lobos. Cada
lobo é composto de néfrons, a unidade anatômica funcional do rim (Figura 30). O néfron
é constituído por um tufo de capilares, chamado glomérulo, local em que o sangue é
filtrado; e um túbulo renal, o qual reabsorve seletivamente o material do filtrado de
volta ao sangue, secretando substâncias do sangue para o filtrado, enquanto a urina
está sendo formada. Um glomérulo consiste em uma arteríola aferente e uma eferente
e um tufo de capilares interventores, revestidos por células epiteliais que formam uma
camada contínua com as da cápsula de Bowman e o túbulo renal. Cada rim humano tem
aproximadamente 1 milhão de néfrons.
A diminuição da função renal, ou insuficiência renal, é uma condição patológica
que leva a um acúmulo de ureia sérica e a uma incapacidade de manter o equilíbrio
acidobásico, de eletrólitos e água no sangue. O paciente com insuficiência renal apresenta
um quadro chamado de uremia, causado pelo acúmulo de ureia, creatinina e outras
toxinas no sangue, que, não sendo tratado adequadamente, pode levar o paciente ao
óbito. A insuficiência renal pode ocorrer como distúrbio agudo ou crônico, dependendo
da sua etiologia.
105
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 29 - Estrutura Anatômica do Rim.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
106
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.1.1 Litíase Renal
A Litíase Renal ou Cálculo Renal (conhecido popularmente como “pedra nos rins”)
são agregados policristalinos, compostos por substâncias normalmente excretadas pelos
rins, através da urina. Acredita-se que a etiologia dos cálculos renais seja complexa e
multifatorial, incluindo o aumento dos níveis sanguíneos e urinários dos componentes
dos cálculos e interações entre estes componentes, alterações anatômicas nas estruturas
do trato urinário, influências metabólicas e endócrinas, fatores dietéticos e de absorção
intestinal e infecção do trato urinário.
A formação dos cálculos renais necessita de uma urina supersaturada, de um núcleo
para facilitar a agregação dos cristais e de um ambiente que possibilite o crescimento do
cálculo. Ou seja, esta formação é influenciada pela concentração dos componentes do
cálculo na urina, pela capacidade dos componentes de se reunir em complexos e formar
“pedras”, e pela presença de substâncias que inibem a formação destes cálculos.
O risco da formação de cálculo aumenta, quando a urina está supersaturada com
componentes do cálculo, tais como: sais de cálcio, ácido úrico, fosfato de magnésio-
amônio, cistina. A supersaturação depende do pH da urina, da concentração de solutos,
da força iônica e da complexação (formação de complexos). Quanto maior a concentração
de dois íons, maior a probabilidade de sofrerem precipitação.
Na urina supersaturada, a formação de cálculos começa com pequenos agregados de
cristais, como o oxalato de cálcio. A maioria dos pequenos agregados tende a se dispersar.
Os agregados maiores de íons formam núcleos e permanecem estáveis, podendo crescer
até formar o cálculo.
Algumas pessoas apresentam supersaturação da urina, porém não formam cálculos.
Acredita-se que isto possa resultar da presença de inibidores naturais dos cálculos,
incluindo o magnésio, o citrato e a mucoproteína de Tamm-Horsfall. No entanto, a
manipulação destes inibidores naturais não faz parte da prática clínica, exceto do citrato.
O citrato é um subproduto normal do ciclo do ácido cítrico nas células renais, o
qual reduz a supersaturação da urina, por meio de sua ligação ao cálcio e inibição da
nucleação e crescimento de cristais de cálcio. O jejum prolongado é um exemplo de
situação metabólica que consome o citrato, reduzindo sua concentração na urina. Pode-
se utilizar a suplementação de citrato na forma de citrato de potássio, para o tratamento
de algumas formas de cálculos renais hipocitratúricos.
A desidratação favorece a formação de cálculos. A alta ingestão de líquidos, para
107
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
manter um volume urinário diário de 2 litros ou mais, parece ser protetora. Supõe-
se que, neste caso, há maior diluição de substâncias que predispõem a formação dos
cálculos e menor tempo de trânsito do cálcio pelo néfron, minimizando a probabilidade
de precipitação deste mineral.
Uma dieta rica em proteínas pode predispor a formação de cálculos em indivíduos
suscetíveis. Uma sobrecarga proteica na dieta causa acidose metabólica transitória,
favorecendo a reabsorção óssea para liberação de cálcio no sangue, a fim de equilibrar
o pH sanguíneo. Além disso, leva ao aumento na Taxa De Filtração Glomerular (TFG)
para excretar os subprodutos do metabolismo das proteínas, como a ureia, por exemplo.
O excesso de proteína na dieta pode favorecer a formação de cristais de ácido úrico, em
indivíduos com história de doença renal.
Dieta rica em sódio também pode predispor o indivíduo ao aumento da excreção
urinária de cálcio e à formação de cálculos de oxalato de cálcio. No entanto, a relação dos
componentes dietéticos e a Nefrolitíase serão discutidos mais detalhadamente em outra
disciplina do curso.
Os cálculos renais podem ter formações diferentes, sendo eles: os Cálculos de
Cálcio (oxalato de cálcio e fosfato de cálcio), os Cálculos de Fosfato de Magnésio-amônio,
os Cálculos de Ácido Úrico e os Cálculos de Cistina.
A maioria dos cálculos renais é formada de cálcio (oxalato ou fosfato de cálcio,
ou uma combinação dos dois materiais), sendo 70% a 80% dos casos de Nefrolitíase
(lembre-se de interpretar os termos pelo prefixo e sufixo: nefro= néfron, parte funcional
dos rins, e litíase = cálculo, “pedra” ou seja: pedra nos rins). Em geral, os cálculos de
cálcio estão associados a concentrações elevadas de cálcio no sangue e na urina, assim
como as concentrações elevadas de oxalato no sangue e na urina predispõem à formação
de cálculos de oxalato de cálcio.
A manifestação clínica da Nefrolitíase se dá, principalmente, por dor em cólica
renal aguda. A formação de cálculo renal por si só, dentro da pelve renal, é indolor, até que
um fragmento do cálculo se desloque ao ureter, causando obstrução do fluxo urinário. A
intensidade da dor está relacionada com o grau de distensão que o cálculo promove no
ureter, sendo extremamente forte na obstrução aguda. Podem ocorrer também náuseas
e vômitos por conta da dor excessiva.
O diagnóstico baseia-se na sintomatologia e em exames diagnósticos, como: exame
de urina, radiografia simples, pielografia intravenosa e ultrassonografia do abdômen. Os
cálculos, em sua maioria, são facilmente visíveis em uma radiografia simples do abdômen.
O tratamento da Nefrolitíase consiste em impedir sua recidiva. A prevenção de
novas crises exige investigação da etiologia do cálculo, utilizando exames de urina,
exames de sangue e análise do cálculo expelido. Durante o momento agudo de crise
108
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
por cálculo renal, habitualmente, é feita analgesia intravenosa para aliviar as dores e,
nos casos de ITU, realiza-se, também, a antibioticoterapia. A maioria dos cálculos com
menos de 5 mm de diâmetro é eliminada espontaneamente. Toda urina deve ser coletada
durante uma crise, a fim de recuperar o cálculo para análise química e determinação da
sua formação, essenciais para prevenir recidivas.
109
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
contraste radiológico, como aqueles usados para o cateterismo, estimulam uma intensa
vasoconstrição intrarrenal e podem induzir hipoperfusão glomerular e insuficiência pré-
renal. Esta condição é conhecida como Nefropatia Induzida por Contraste.
O tratamento da IRA depende do seu fator etiológico, mas basicamente consiste
em neutralizar o agente causador da insuficiência renal.
SAIBA MAIS
Sugiro que você visite o site da Sociedade Brasileira de Nefrologia e conheça
mais detalhes sobre a Insuficiência Renal Aguda.
Acesse o link: https://www.sbn.org.br/orientacoes-e-tratamentos/doencas-comuns/insufi-
ciencia-renal/.
110
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
dos sinais e sintomas de uremia, havendo a necessidade de iniciar uma terapia renal
substitutiva, seja ela diálise ou transplante renal.
A National Kidney Foundation (NKF) utiliza a TFG para classificar a DRC em cinco
estágios, começando com lesão renal, com TFG normal ou elevada, progredindo para DRC
e potencialmente para Insuficiência Renal Crônica (estágio final da doença). Observe o
quadro abaixo, para compreender o estadiamento da Doença Renal Crônica.
Quadro 5 - Estadiamento da Doença Renal Crônica, conforme proposto pela National Kidney Foundation
(2020)
ESTÁGIOS DE ALBUMINÚRIA (MG/G)
A1 A2 A3
Normal a levemen- Moderadamente Gravemente
te aumentada aumentada aumentada
< 30 30 a 300 > 300
Normal ou
1 ≥ 90 1. Baixo risco 2. Monitorar 3. Encaminhar
elevada
Estágios de TFG (mL/min/1,73m²)
Redução leve a
3a 59 a 45 2. Monitorar 3. Monitorar 4. Encaminhar
moderada
Redução mode-
3b 44 a 30 3. Monitorar 4. Monitorar 4. Encaminhar
rada a grave
* 1: Baixo risco (monitorar 1x/ano se DRC); 2: risco moderadamente aumentado (monitorar 1x/ano); 3:
alto risco (monitorar 2x/ano); 4: risco muito alto (monitorar 3x/ano); 5: risco muito alto (monitorar 4x/
ano ou mais).
Fonte: Adaptado pela autora (2020), a partir de Calixto-Lima; Gonzalez (2017).
O valor normal da TFG varia de acordo com idade, sexo e tamanho corporal. Em
adultos jovens e sadios, o valor normal é de aproximadamente 120 a 130 mL/min/1,73m²,
sendo que a TFG diminui naturalmente com o avançar da idade, mesmo que o indivíduo
não apresente doença renal.
Independentemente da sua causa, a DRC representa uma perda irreversível de
111
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
néfrons dos rins, com deterioração progressiva da filtração glomerular, da capacidade
de reabsorção tubular e das funções endócrinas dos rins. Todas as formas de DRC se
caracterizam por uma redução da TFG, refletindo uma diminuição correspondente no
número de néfrons funcionais.
Tipicamente, a DRC é silenciosa, os sinais e sintomas ocorrem de modo gradual e
só se tornam evidentes, quando a doença já está muito avançada, o que acontece, devido
à surpreendente capacidade compensatória dos rins. À medida que as estruturas renais
são destruídas, os néfrons remanescentes sofrem hipertrofia estrutural e funcional,
aumentando sua função na tentativa de compensar os néfrons que foram perdidos.
Somente quando os poucos néfrons remanescentes são destruídos, as manifestações da
insuficiência renal se tornam evidentes.
Como os néfrons remanescentes acabam suportando um fardo funcional muito
maior para compensar as perdas, há um aumento da pressão de filtração glomerular e
hiperfiltração. Por motivos não bem compreendidos, tal hiperfiltração compensatória
predispõe os néfrons à fibrose e retração cicatricial, conhecida como esclerose
glomerular. Como resultado deste processo, há maior destruição e perda funcional de
néfrons, aumentando a progressão da DRC.
Os rins têm uma grande reserva funcional, sendo que até 50% dos néfrons podem
ser perdidos, sem qualquer evidência de deficiência funcional a curto prazo. Justamente
por isso, indivíduos com dois rins sadios podem doar um deles para transplante e
continuar vivendo de forma saudável.
O tratamento da DRC é realizado por meio do manejo dietoterápico conservador
(o qual discutiremos com mais detalhes em outra disciplina), a fim de evitar ou retardar
a velocidade de destruição dos néfrons. Quando o paciente se encontra em estágio de
falência renal (TFG < 15 mL/min/1,73m²), o tratamento é feito através de terapia renal
substitutiva: diálise ou transplante renal. A escolha entre um ou outro tratamento é
determinada por idade, comorbidades, disponibilidade de doador e preferências pessoais.
A diálise mantém a vida dos pacientes que não são candidatos ao transplante renal,
e daqueles que estão aguardando um transplante. Existem duas amplas categorias de
diálise: a Hemodiálise e a Diálise Peritoneal.
112
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.1.3.1 Hemodiálise
113
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 31 - Processo de Hemodiálise, para purificação do sangue.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
Figura 32 - Fístula para hemodiálise. União de uma artéria a uma veia, através de procedimento cirúrgico.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
114
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
SUGESTÃO DE VÍDEO
Para melhorar sua compreensão sobre o processo de hemodiálise, sugiro que
você assista ao seguinte vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=di8QvYtOJyk.
115
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 33 - Diálise Peritoneal.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
SUGESTÃO DE VÍDEO
Para melhorar sua compreensão sobre o processo de diálise peritoneal, sugiro que
você assista ao seguinte vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=7xU7m1NhlhU.
FÓRUM
Debata com seus colegas no fórum sobre os prós e contras da hemodiálise e
da diálise peritoneal.
116
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.2 HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA (HAS)
117
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
morbimortalidade, por meio de modificações do estilo de vida do paciente.
A manutenção de peso saudável, com redução de peso, quando necessário, é a
maneira não farmacológica mais efetiva para controlar a HAS, sendo que pequenas
reduções de peso diminuem significativamente a pressão arterial, bem como os riscos de
eventos cardiovasculares.
De acordo com a Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial (2017), ocorre uma
diminuição de 20% a 30% da pressão arterial para cada perda ponderal de 5%. A
recomendação é de manter o IMC < 25 kg/m² até os 65 anos, e IMC < 27 kg/m² após os
65 anos. Ainda, manter circunferência abdominal < 80 cm em mulheres e < 94 cm em
homens.
O tratamento farmacológico da HAS é feito com bloqueadores beta-adrenérgicos,
inibidores do sistema renina-angiotensina, inibidores de canal de cálcio e diuréticos. Estas
medicações reduzem a pressão arterial, geralmente para níveis normais. A utilização da
medicação é importante para retardar ou prevenir as complicações da pressão elevada,
aumentando a expectativa de vida do paciente.
No entanto, a medicação não é curativa, pois a hipertensão primária é como o
diabetes, por exemplo, que pode ser controlada, mas não curada, por ser uma doença
crônica. Já no caso da HAS secundária, que está relacionada com outra doença de base,
é necessário melhorar o estilo de vida do paciente, promovendo mudanças em seus
hábitos alimentares, nível de atividade física, encorajando-se a cessação do tabagismo e
a redução do consumo de bebidas alcoólicas.
4.3 NEOPLASIAS
Antes de começarmos a falar sobre as neoplasias, sugiro que você faça uma releitura
da unidade 4 do seu caderno da disciplina de Patologia, a qual aborda um capítulo inteiro
sobre neoplasias. Como você já teve contato com o estudo das neoplasias na disciplina
de Patologia, abordaremos aqui assuntos mais relacionados ao câncer, alterações
metabólicas e o estado nutricional do paciente.
O termo Neoplasia comumente é utilizado para se referir a tumores, embora eles não
sejam sinônimos. As neoplasias, em geral, são classificadas como benignas ou malignas.
118
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
As neoplasias benignas contêm células bem diferenciadas, aglomeradas em uma
massa bem solitária. Geralmente, não levam à morte, a menos que sua localização ou o
seu tamanho interfiram nas funções vitais.
Já as neoplasias malignas, sinônimo de câncer, possuem células bem menos
diferenciadas, e apresentam a capacidade de se desprender do seu local de origem,
chegando ao sistema circulatório ou linfático e formando tumores malignos em outros
locais do corpo. O reconhecimento de franca malignidade de um tumor por exame físico
ou estudo de imagem requer a presença no corpo de cerca de 1 bilhão de células malignas.
As neoplasias malignas frequentemente provocam sofrimento e morte, caso não sejam
tratadas ou controladas.
O processo de neoplasia é um resultado de alterações progressivas da função celular.
Estas alterações fenotípicas conferem os potenciais proliferativo, invasivo e metastático
que constituem a marca do câncer.
119
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
aumento do hormônio liberador de Corticotropina (CRH), um neurotransmissor do
Sistema Nervoso Central que suprime a ingestão alimentar. A IL-1 também bloqueia o
neuropeptídeo Y (NPY) com função orexígena, reduzindo a ingestão alimentar. Tanto
IL-1 quanto TNF-alfa foram associadas com a perda de massa muscular. A IL-6 aumenta a
expressão de vários oncogêneses e a de proteína de fase aguda, como a proteína C reativa
(PCR), relacionada à ativação do estado inflamatório.
Provavelmente, estas citocinas têm efeito sinérgico, ocasionando anorexia,
aumento da taxa metabólica basal e perda de massa muscular no paciente oncológico.
Ainda, a célula tumoral utiliza a glicose como nutriente essencial, aumentando a produção
endógena e o turnover de glicose. Ela tem preferência em utilização do metabolismo
anaeróbico, mesmo na presença de oxigênio, com formação de lactato, que gasta mais
energia para produzir uma quantidade muito menor de ATP, quando comparado com o
metabolismo aeróbico (ciclo de Krebs). Este processo é conhecido como efeito Warburg.
A fim de suprir a necessidade de energia e crescimento tumoral, há estímulos para
o aumento da disponibilidade de glicose, por meio da neoglicogênese. Ocorre, assim, a
ativação de mecanismos, como: o ciclo de Cori, produção de lactato muscular, proteólise,
degradação da proteína muscular, resistência periférica à insulina e hiperglicemia, tudo
com objetivo de fornecer mais glicose para o tumor.
A proteólise e a degradação de proteína muscular causam depleção da massa
muscular corporal, com consequente perda de peso e sarcopenia (processo progressivo
de perda de massa muscular). A presença de citocinas pró-inflamatórias e a ativação do
estado inflamatório levam à diminuição da síntese de proteínas musculares e circulantes
(como a albumina, pré-albumina e transferrina) e aumentam a síntese de proteínas de
fase aguda, como a PCR, que tem seu nível sérico aumentado em pacientes com câncer
avançado e metastático.
120
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Quando o processo de desnutrição está associado à anorexia, produção de citocinas,
aumento do gasto energético, ativação do estado inflamatório, hipoalbuminemia e perda
grave de peso, é chamada de caquexia do câncer, ou Síndrome Anorexia-caquexia.
A caquexia pode ser classificada como uma síndrome multifatorial, caracterizada
pela perda de massa muscular, com ou sem perda de tecido adiposo, que não pode ser
revertida com suporte nutricional convencional, acarretando progressiva disfunção
orgânica. Sua fisiopatologia é caracterizada pelo balanço energético e nitrogenado
negativo, anorexia e alterações metabólicas (hipermetabolismo). Para qualquer tipo de
tumor, a sobrevida do paciente é menor naqueles que perdem peso, antes de iniciar o
tratamento.
Os pacientes oncológicos são pacientes de risco nutricional, ou seja, eles correm
risco de se tornarem desnutridos e, consequentemente, apresentarem pior resposta ao
tratamento, refletindo em pior prognóstico. O nutricionista tem papel muito importante
no acompanhamento do paciente oncológico. As formas de avaliação nutricional e a
dietoterapia recomendada nesta patologia serão assuntos abordados nas próximas
disciplinas do curso.
4.3.3 Tratamento
121
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.4. DIABETES MELLITUS
122
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Quadro 6 - Critérios Laboratoriais para Diagnóstico de DM adotados pela SBD
Glicose 2 horas após
Glicose em jejum (mg/
sobrecarga com 75 g HbA1c* (%)
dL)
de glicose (mg/dL)
Normoglicemia < 100 < 140 < 5,7
Pré-diabetes ou risco
≥ 100 e < 126 ≥ 140 e < 200 ≥ 5,7 e < 6,5
aumentado para DM
Diabetes estabelecido ≥ 126 ≥ 200 ≥ 6,5
* HbA1c = Hemoglobina Glicada. Exame bioquímico que reflete a média glicêmica do paciente, referente
aos últimos 3 a 4 meses.
Fonte: Adaptado pela autora (2021), a partir de SBD (2019-2020).
SAIBA MAIS
Sugiro que, para aprofundar seus conhecimentos sobre o Diabetes Mellitus,
uma doença bastante prevalente na população brasileira e mundial, você aces-
se o documento sobre as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2019-2020), no link a
seguir: https://www.diabetes.org.br/profissionais/images/DIRETRIZES-COMPLETA-2019-2020.pdf.
123
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
do DM do tipo 1 com antígeno leucocitário humano (Human Leukocyte Antigen, HLA)
DR3 e DR4 (SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES, 2019-2020).
A prevalência deste tipo de diabetes (DM do tipo 1 em geral) corresponde somente
a 5% - 10% de todos os casos de DM. É mais frequentemente diagnosticado em crianças,
adolescentes e, em alguns casos, em adultos jovens, afetando igualmente homens e
mulheres (SBD, 2019-2020).
Como o DM do tipo 1 se caracteriza pela produção insuficiente de insulina, o
tratamento medicamentoso depende da reposição deste hormônio. Ou seja, os pacientes
são insulinodependentes. Cada paciente recebe seu esquema de insulina com base no
estabelecimento de alvos glicêmicos pré e pós-prandiais. Em todas as faixas etárias, a
reposição da insulina deve tentar atingir o perfil mais próximo possível do fisiológico
(SBD, 2019-2020).
124
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Em relação ao tratamento do DM2, deve-se orientar a mudança no estilo de vida do
paciente. Sabe-se que a importância da terapia nutricional tem sido enfatizada desde a
sua descoberta. No entanto, além do manejo dietético recomendado para o controle do
DM2, há também a necessidade de controle e manutenção do peso corporal adequado.
É dado na literatura que grande parte dos portadores de DM2 apresenta excesso de peso
(sobrepeso ou obesidade), e sabe-se, também, que a manutenção do peso adequado pode
melhorar a sensibilidade à insulina e o controle da glicemia (SBD, 2019-2020).
Além do manejo dietético para o controle e tratamento do DM2, a atividade física
regular e a terapia medicamentosa com antidiabéticos compõem os outros pilares
necessários no manejo desta doença. No tratamento do DM2, é preciso tentar alcançar
níveis glicêmicos tão próximos da normalidade quanto viável, minimizando, sempre que
possível, o risco de hipoglicemia (SBD, 2019-2020).
125
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
mg/dL, devem receber diagnóstico de DMG (SBD, 2019-2020).
Toda mulher com glicemia de jejum < 92 mg/dL inicial deve ser submetida a teste
de sobrecarga oral com 75 g de glicose anidra entre 24 e 28 semanas de gestação, sendo
o diagnóstico de diabetes gestacional estabelecido, quando no mínimo um dos valores
a seguir encontrar-se alterado: Glicemia em jejum ≥ 92 mg/dL; Glicemia 1 hora após
sobrecarga ≥ 180 mg/dL; Glicemia 2 horas após sobrecarga ≥ 153 mg/dL (SBD, 2019-2020).
São alguns fatores de risco para o desenvolvimento de DMG: Idade materna
avançada; sobrepeso, obesidade ou ganho excessivo de peso na gravidez atual; deposição
central excessiva de gordura corporal; história familiar de diabetes em parentes de
primeiro grau; crescimento fetal excessivo, polidrâmnio, hipertensão ou pré-eclâmpsia
na gravidez atual; antecedentes obstétricos de abortamentos de repetição, malformações,
morte fetal ou neonatal, macrossomia ou DMG; síndrome de ovários policísticos; baixa
estatura (inferior a 1,5 m) (SBD, 2019-2020).
O tratamento do DMG deve seguir planejamento dietoterápico, com
acompanhamento do nutricionista, a fim de evitar o ganho de peso excessivo durante
a gestação, e de manter os níveis glicêmicos o mais próximo possível do normal. É
orientada a não utilização de antidiabéticos orais durante a gestação, pois não se têm
estudos que comprovem sua segurança, uma vez que estes medicamentos atravessam a
placenta (SBD, 2019-2020).
As reações adversas aos alimentos podem ser classificadas em: tóxicas, intolerância
e hipersensibilidade (alergia).
As reações tóxicas ocorrem, quando uma quantidade suficiente de toxina capaz de
provocar manifestações clínicas é ingerida por qualquer indivíduo (todos são suscetíveis).
Por exemplo, a ingestão de alimentos com toxina produzida pelo Staphylococcus aureus
ou bacilo cereus.
A intolerância depende da suscetibilidade individual, sendo uma reação adversa
não tóxica. Por exemplo, a intolerância à lactose, que tem como fator individual de
suscetibilidade a deficiência da enzima lactase.
126
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Já as reações de hipersensibilidade (alergias) são determinadas por proteínas que
desencadeiam uma reação imunológica, a qual pode determinar várias síndromes clínicas.
Segundo o mecanismo imunológico, são classificadas em: reações tardias mediadas por
células T, reações imediatas mediadas por imunoglobulina E (IgE), e reações mistas, nas
quais ambos os mecanismos participam.
A alergia alimentar é mais prevalente nos primeiros anos de vida, e cerca de 6%
das crianças menores de 3 anos de idade experimentam algum tipo de reação alérgica
aos alimentos.
127
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
intestinal, podem tornar o epitélio mais permeável, permitindo o acesso dos peptídeos
de gliadina à lâmina própria.
Os peptídeos de gliadina não digeridos cruzam o epitélio intestinal, por um
mecanismo ainda desconhecido, e alcançam a lâmina própria. Os peptídeos nativos e os
peptídeos diaminados pela ação da TTG (glutamina em glutamato) ligam-se às moléculas
HLA – DQ2 ou DQ8 expressas na membrana externa das células com antígeno, e são
reconhecidas pelos linfócitos T CD4. A ativação destas células T resulta na liberação de
interferon-ɤ que, por sua vez, atrai macrófagos e leva à destruição do epitélio intestinal. A
gliadina atua diretamente no epitélio intestinal, para estimular a liberação de interleucina
15 (IL-15), que pode sinergizar a resposta imune na lâmina própria. A gliadina também
é capaz de ativar o sistema imune inato, reprogramando os linfócitos T citotóxicos do
epitélio intestinal em células do tipo killer.
SUGESTÃO DE VÍDEO
Assista aos seguintes vídeos para compreender melhor a resposta imunoló-
gica, desencadeada pelo glúten, no intestino delgado de indivíduos com doença
celíaca: Parte 1 - https://www.youtube.com/watch?v=TvrAkazCZcM;
Parte 2 - https://www.youtube.com/watch?v=4Wo8GUgldZM;
Parte 3 - https://www.youtube.com/watch?v=0h-TGiuQiwI.
128
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 34 - Atrofia das vilosidades no intestino delgado de indivíduo com doença celíaca e inflamação
crônica.
Fonte: Adaptada pela autora, a partir de Shutterstock (2020).
129
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
de hipersensibilidade alimentar, resultando em manifestações alérgicas (BRASIL, 2015).
Vale ressaltar que a exclusão do glúten da dieta somente é recomendada para
indivíduos que apresentam diagnóstico de doença celíaca, pois os cereais integrais
são fontes de fibras e outros nutrientes importantes à nossa saúde. Indivíduos que não
possuem suscetibilidade genética para o desenvolvimento da doença celíaca não têm
necessidade de excluir o glúten da dieta!
130
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
indivíduo passa a apresentar deficiência na produção de lactase. A diminuição de lactase
pode ter início a partir dos 2 aos 3 anos, em geral, a partir dos 4 a 5 anos, ou até mesmo
após esta idade. A maior parte dos hipolactásicos do tipo adulto é assintomática, mesmo
quando consome lactose como parte da dieta habitual.
Já a deficiência secundária à lactase ocorre em consequência à lesão intestinal por
diferentes mecanismos, como, por exemplo, agentes infecciosos que agridem a mucosa
do intestino delgado, promovendo a diminuição da quantidade de lactase no ápice das
vilosidades ou, então, no período de ativação da doença de Crohn.
4.6.1 Hipertireoidismo
131
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
e bócio difuso. Na doença de Graves, a tireoide está simetricamente aumentada e mais
vascularizada.
Trata-se de um distúrbio autoimune, o qual se caracteriza pelo estímulo anormal
da glândula tireoide, através de anticorpos estimuladores da tireoide (anticorpos contra
o receptor de TSH), que atuam nos receptores normais do Hormônio Tireoestimulante
(TSH), levando as células foliculares da tireoide a produzirem quantidades excessivas de
T3 e T4. A manifestação desta doença está associada ao antígeno leucocitário humano
(HLA) DR3 e B8, e é evidente em tendência familiar.
Outras causas do hipertireoidismo são: bócio multinodular tóxico, adenoma
folicular, adenoma da hipófise, doença hipotalâmica, carcinoma folicular de tireoide
metastático, tireoidite linfocítica, tireoidite granulomatosa, tireoidite de Hashimoto.
Seja qual for a etiologia do hipertireoidismo, os níveis séricos dos hormônios
tireoidianos estão elevados, tanto a tiroxina livre quanto o índice de tiroxina livre. Muitas
das manifestações do hipertireoidismo estão associadas ao estado hipermetabólico, bem
como o aumento da atividade do Sistema Nervoso Simpático. No estado hipermetabólico,
há queixas frequentes de nervosismo, irritabilidade e de fatigabilidade. A perda de
peso é um sinal comum, apesar do grande apetite. Outras manifestações consistem
em: taquicardia, palpitações, dispneia, sudorese excessiva, câimbras musculares e
intolerância ao calor.
O tratamento do hipertireoidismo é direcionado para a redução dos níveis de
hormônio da tireoide. Essa redução pode ser efetuada através da erradicação da glândula
tireoide com iodo radioativo, remoção cirúrgica de toda a glândula ou de parte dela, ou
uso de fármacos que diminuem a função da tireoide. A erradicação da glândula tireoide,
com iodo radioativo, é mais utilizada do que a cirurgia.
Os agentes bloqueadores beta adrenérgicos (propranolol, metoprolol, atenolol
e nadolol são os preferidos), sendo administrados para bloquear os efeitos do estado
hipertireoideo sobre o Sistema Nervoso Simpático. Eles são administrados juntamente
com agentes antitireoideos, como propiltiouracil e metimazol. O propiltiouracil impede
a conversão do iodo em sua forma hormonal pela tireoide e bloqueiam a conversão da T4
em T3 nos tecidos.
132
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.6.2 Hipotireoidismo
133
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Trata-se o hipotireoidismo em adultos através de terapia de reposição com
preparações sintéticas de T3 ou T4, sendo a maioria dos indivíduos tratados com T4. Os
níveis séricos de TSH são utilizados para estimar a adequação da terapia de reposição de
T4, pois, uma vez normalizado o nível de TSH, a dose de T4 é considerada satisfatória.
4.6.3 Bócio
134
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
4.7 DOENÇAS HEPÁTICAS
135
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
Figura 35 - Esteatose Hepática: acúmulo de gordura nos hepatócitos, levando ao aumento de tamanho
do fígado.
Fonte: Shutterstock (2020).
A Esteatose Hepática Não Alcoólica (EHNA) envolve tanto o acúmulo de lipídeos nos
hepatócitos quanto a formação de radicais livres, de modo bastante semelhante ao que
ocorre no metabolismo do álcool. As anormalidades metabólicas que levam ao acúmulo
de lipídeos não estão bem elucidadas, porém acredita-se que incluem alterações nas vias
de captação, síntese, degradação ou secreção de lipídeos hepáticos, em consequência da
resistência à insulina.
O consumo excessivo de calorias na dieta, principalmente de carboidrato e
gorduras, está relacionado ao surgimento da Esteatose Hepática. A obesidade aumenta
a síntese e reduz a oxidação de ácidos graxos livres. O DM2, ou a resistência à insulina,
também aumentam a lipólise do tecido adiposo e a produção de ácidos graxos livres.
Quando a capacidade do fígado de exportar triglicerídeos é ultrapassada, os ácidos
graxos em excesso contribuem para o desenvolvimento da Esteatose Hepática. Tanto as
cetonas quanto os ácidos graxos livres são indutores das enzimas CYP 450, o que resulta
na formação de radicais livres, incluindo peróxido de hidrogênio e superóxido. Ocorre
peroxidação anormal dos lipídeos, seguida de lesão direta dos hepatócitos, liberação de
subprodutos tóxicos, inflamação e fibrose.
A EHNA é habitualmente assintomática. A elevação leve a moderada dos níveis
séricos de AST e ALT (antigas TGO/TGP) constitui o achado laboratorial mais comum,
e frequentemente o único, anormal. O diagnóstico da EHNA exige biópsia hepática e
136
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
exclusão do álcool como causa do distúrbio.
No caso de consumo de álcool, seu metabolismo leva ao ataque químico de certas
membranas do fígado, porém não se sabe se a lesão é causada pelo acetaldeído ou por
outros metabólitos.
Sabe-se, no entanto, que o acetaldeído (subproduto do metabolismo hepático
do álcool) impede o sistema de transporte mitocondrial de elétrons, que é responsável
pelo metabolismo oxidativo e pela geração de ATP (através da respiração celular). Em
consequência disso, os íons hidrogênio gerados nas mitocôndrias são deslocados para a
síntese de lipídeos e a cetogênese. Verifica-se, então, a presença de acúmulos anormais
destas substâncias no sangue e nos hepatócitos, o que caracteriza a Esteatose Hepática.
A ligação do acetaldeído a outras moléculas compromete a desintoxicação dos
radicais livres e a síntese de proteínas. O acetaldeído também promove síntese de colágeno
e fibrogênese. As lesões observadas no dano hepatocelular tendem a prevalecer mais na
área centrolobular que circunda a veia central, onde se encontram as vias do metabolismo
do álcool. As alterações gordurosas que ocorrem com a ingestão excessiva de álcool
normalmente são silenciosas, sendo reversíveis após a interrupção do consumo de álcool.
A quantidade necessária de álcool para provocar doença hepática crônica varia
amplamente, dependendo do tamanho corporal, idade e sexo. Porém, a faixa mais baixa parece
ser de 80g/dia (240ml de uísque, duas garrafas de vinho ou 6 garrafas de cerveja de 360ml).
O tratamento tem por objetivo retardar a evolução da doença. Tanto a perda
de peso quanto a prática de exercício físico melhoram a resistência à insulina e são
recomendados, juntamente com o tratamento dos distúrbios metabólicos associados. No
caso da Esteatose Hepática Alcoólica, deve-se evitar o consumo de álcool.
4.7.2 Cirrose
137
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
desenvolver-se no curso de outros distúrbios, como a hepatite viral, reações tóxicas a
fármacos e substâncias químicas, obstrução biliar e EHNA. As principais causas da
cirrose são: infecção pelos vírus de hepatite B e C, pela ingestão excessiva de etanol, de
fármacos e doença autoimune.
A patogênese da cirrose está relacionada com a síntese aumentada de colágeno e de
outros tecidos conectivos, implicando o desenvolvimento da fibrose nos hepatócitos. A
doença caracteriza-se por fibrose difusa e conversão da arquitetura normal do fígado em
nódulos que contêm hepatócitos em proliferação, circundados por fibrose.
O tecido fibroso, que substitui o tecido hepático normalmente funcional, forma
faixas constritivas, as quais interrompem o fluxo nos canais vasculares e sistemas
dos ductos biliares do fígado. O comprometimento dos canais vasculares predispõe
à hipertensão portal (aumento da resistência ao fluxo no sistema venoso porta) e suas
complicações, obstrução dos canais biliares e exposição aos efeitos destrutivos da estase
da bile e perda de células hepáticas, levando à insuficiência hepática.
Um aspecto crucial na cirrose é que as lesões hepáticas não são agudas e
autolimitadas, mas sim crônicas e progressivas. As apresentações clínicas desta doença
são consequência tanto da disfunção hepática progressiva quanto da hipertensão portal.
No caso da hipertensão portal, há abertura de canais colaterais que conectam a circulação
porta com a circulação sistêmica, cujas principais complicações são: formação de ascite,
esplenomegalia (aumento do tamanho do baço), formação de derivações portossistêmicas
com sangramento de varizes gastroesofágicas.
Os sintomas da insuficiência hepática são: náusea, diarreia, vômitos, ascite,
icterícia (aspecto amarelado por acúmulo de bilirrubina no sangue), edema periférico,
perda de peso, desnutrição e encefalopatia hepática.
Como a cirrose é um processo de lesão irreversível do fígado, a alternativa de
tratamento definitivo é o transplante hepático.
138
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
estende até a vesícula biliar e ducto colédoco, formado pela união do ducto hepático
comum e do ducto cístico. O ducto colédoco desce até o duodeno, onde entra em contato
com o ducto pancreático principal (ver Figura 23).
A vesícula biliar é um saco muscular distensível, em forma de pera, cuja função
é armazenar e concentrar a bile. A bile é produzida pelos hepatócitos, e contém sais
biliares, colesterol, bilirrubina, lecitina, ácidos graxos, água e eletrólitos.
A entrada dos alimentos no intestino delgado provoca a liberação do hormônio
colecistocinina (CCK), o qual promove a contração da vesícula biliar para liberar a bile no
duodeno. A função da bile é auxiliar na digestão e absorção dos lipídeos.
4.7.3.1 Colelitíase
4.7.3.2 Colecistite
139
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
de cálculos biliares. Os demais casos estão relacionados com sepse, traumatismo grave
ou infecção da vesícula biliar. A Colecistite Crônica resulta de episódios repetidos de
Colecistite Aguda ou da irritação crônica da vesícula por cálculos.
Os indivíduos com Colecistite aguda podem apresentar dor de início agudo,
frequentemente associada à febre baixa, anorexia, náusea e vômitos.
140
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
141
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
EXERCÍCIO FINAL
a) O paciente com doença renal crônica encontra-se em falência renal, quando sua taxa
de filtração glomerular está entre 49 e 69 mL/min/1,73m².
b) A diálise peritoneal e a hemodiálise constituem métodos de terapia renal substitutiva,
funcionando como “rins artificiais”. Ambas podem funcionar de forma contínua no
paciente, permitindo que este trabalhe, estude e viaje com autonomia.
142
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
c) O princípio de funcionamento da diálise é a filtração do sangue, através de uma
membrana semipermeável, por meio de difusão ativa.
d) Os rins possuem capacidade surpreendente de compensação funcional dos néfrons
perdidos, e isto se deve à elevada capacidade de hiperplasia dos néfrons.
e) São os principais fatores de risco para doença renal crônica: Diabetes Mellitus e
Hipertensão Arterial mal controlados.
143
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
REFERÊNCIAS
BORGHETTI, G., et. al. Diabetic Cardiomyopathy: Current and Future Therapies.
Beyond Glycemic Control. Front Physiol, v. 9, p. 1.514, 2018. ISSN 1664-042X. Disponível
em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30425649. Acesso: 05 de dezembro de 2020.
CUPPARI, Lilian. Nutrição Clínica no adulto. 3ª ed. Barueri, SP: Manole, 2014.
PORTH, Carol Mattson; MATFIN, Glenn, Fisiopatologia. 8ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2010. 2v.
144
FISIOPATOLOGIA DA NUTRIÇÃO
uniavan.edu.br
146
XXXX