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TCC Gabrielle Dos Santos

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FACULDADE MARIA THEREZA

CURSO DE PSICOLOGIA

GABRIELLE DOS SANTOS LIBANIO FERREIRA

LUTO POR COVID-19: A IMPORTANCIA DA PSICOLOGIA EM TEMPOS


PANDÊMICOS

NITERÓI - RJ
2022
GABRIELLE DOS SANTOS LIBANIO FERREIRA

LUTO POR COVID-19: A IMPORTANCIA DA PSICOLOGIA EM TEMPOS


PANDÊMICOS

Trabalho de Conclusão do Curso apresentado à


Coordenação de Psicologia da Faculdade Maria
Thereza como requisito parcial para a obtenção
do grau de Bacharel em Psicologia.

Orientadora: Profa. Dra. Patrícia Constantino

NITERÓI - RJ
2022
GABRIELLE DOS SANTOS LIBANIO FERREIRA

LUTO POR COVID-19: A IMPORTANCIA DA PSICOLOGIA EM TEMPOS


PANDÊMICOS

Trabalho de Conclusão do Curso apresentado à Coordenação de Psicologia da


Faculdade Maria Thereza como parte das exigências do Curso de Graduação em
Psicologia, para a obtenção do grau de Bacharel em Psicologia.
Niterói, 8 de dezembro de 2022

COMISSÃO EXAMINADORA:

Profa. Dra. Patrícia Constantino


Faculdade Maria Thereza
Orientadora

Prof. Dr. Rodolfo Brandão de Azevedo Nogueira


Faculdade Maria Thereza
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, por me manter firme mesmo nos momentos
difíceis.
Agradeço a minha mãe por tudo que ela fez e faz por mim, por todo esforço,
carinho, dedicação e amor sem ela esse momento não seria possível.
Contudo não posso deixar de agradecer à minha avó Delga e ao meu avô Naica
por toda a ajuda, não apenas por esse momento, mas por tudo que fizeram na minha
vida.
Ao meu marido meu companheirismo e admiração
E um agradecimento final aos meus colegas de faculdade por estarem sempre
presentes.
Agradeço a minha orientadora que mesmo nos momentos mais difíceis esteve
comigo.
Meus agradecimentos mais sinceros a todos que me proporcionaram esse
momento.
“Dores todos temos e sempre teremos, mas que as nossas
dores nunca nos tenham”

Lilian Ribeiro
RESUMO
O luto causado pelo novo coronavírus trouxe uma série de reflexões e sequelas sobre
como pensar e vivenciar luto e morte. Esse trabalho tem como objetivo conceituar o
luto e entender como a falta dos rituais de despedidas afetam o processo do luto. E
para alcançar esses objetivos, o estudo se baseou na pesquisa bibliográfica. A partir
das leituras foram desenvolvidos capítulos que falam do luto por COVID-19, de como
rituais e ritos são fundamentais para o enlutado, e por fim como psicólogo a lida em
um contexto de crise. Concluo que a ação do psicólogo dentro de um quadro de
pandemia se torna fundamental não apenas diante de situações imediatas.

Palavras-chave: Luto. Rituais de despedida. COVID-19. Psicólogo.


ABSTRACT

The mourning caused the new coronavirus brought a series of reflections and sequelae
on how to think and experience mourning and death. This work aims to conceptualize
mourning and understand how the lack of farewell rituals affect the mourning process.
And to achieve these objectives, the study was based on bibliographic research. From
the readings were developed chapters that speak of the mourning for COVID-19, of
how rituals and rites are fundamental for the bereaved, and finally as a psychologist
read it in a context of crisis. I conclude that the action of the psychologist within a
pandemic framework becomes fundamental not only in the face of immediate situations

Keywords: Mourning. Rituals farewell. COVID-19. Psychologist.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10
2 LUTO EM CONTEXTO PANDÊMICO .................................................................... 13
2.1 Fatores determinantes para o luto................................................................ 17
3 RITUAIS DE DESPEDIDA...................................................................................... 21
4 O PAPEL DO PSICÓLOGO EM CONTEXTO DE CRISE ...................................... 28
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 35
6 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 36
10

1 INTRODUÇÃO

O Coronavírus foi identificado pela primeira vez em dezembro de 2019 na


China, na cidade de Wuhan como um caso de pneumonia. Em 7 de janeiro de 2020,
as autoridades chinesas confirmaram que existia um novo tipo de coronavírus, logo
em 11 de março de 2020 a Organização Mundial de Saúde caracterizou a COVID-19
como pandemia. O Ministério da Saúde, em 2020 soltou um boletim, afirmando que o
primeiro óbito por COVID-19 ocorreu em 12 de março de 2020 em São Paulo e desde
então os números não paravam de subir tendo o marco de 100 mil pessoas
ultrapassado de 100 mil pessoas mortas na primeira quinzena de agosto. Uma das
maneiras de se evitar a contaminação é através do isolamento, medida direcionada a
aqueles que estão com o diagnóstico confirmado e distanciamento busca evitar a
contaminação e o contato entre pessoas.
“O luto, via de regra, é a reação à perda de uma pessoa querida ou de uma
abstração que esteja no lugar dela, como pátria, liberdade, ideal, etc.” (FREUD, 1917,
p. 172). A pandemia da COVID-19 afetou de todas as maneiras possíveis, tendo em
vista que as pessoas perderam sua liberdade e entes queridos. Segundo Thomas
Fuchs “o luto é um processo complexo e heterogêneo, o qual transcorre e se manifesta
de múltiplas maneiras, e que está sujeito a considerável variação e modificação
cultural” (FUCHS, 2018, p. 45). Morrer é algo natural do ponto de vista biológico e faz
parte do desenvolvimento humano e falar sobre ela é fundamental, contudo, a morte
vem carregada de valores e símbolos estando ligada a um contexto cultural na qual
se manifesta.
Para Kovács (2013) diversos aspectos podem influenciar no desenvolvimento
do luto, como a representação da pessoa perdida, as causas e circunstâncias da
morte, as características de personalidade do enlutado, bem como fatores
psicológicos e sociais.
Luto é um processo que se inicia após o rompimento de elo, não
necessariamente a perda de um ente querido, como popularmente conhecemos.
Sendo caracterizado pelo atravessamento de diversos sentimentos, cada indivíduo
vive o luto de uma maneira, portanto devemos considerar fatores biológicos, sociais e
psicológicos.
Nesse sentido, inúmeros sentimentos podem ser expressos ou reprimidos, tais
como a tristeza, culpa, ansiedade, impotência, raiva e saudade. Esses sentimentos
11

precisam ser vivenciados como forma de elaboração da morte, pois negá-los pode
desencadear um luto mal elaborado e um consequente processo patológico
(KOVÁCS, 2013).
De acordo com Lisboa e Crepaldi (2003), a morte é um enigma que gera medo
e pode gerar sofrimento físico, psíquico e emocional, podendo desencadear uma
sensação de fragilidade para todos e não somente para quem está morrendo.
Segundo Kubler-Ross (2008) e Kubler-Ross e Kesller (2005) nem todas as
pessoas irão vivenciar o luto de maneira semelhante, na ordem que é apresentada.
As fases do luto segundo Kubler-Ross são: a negação a pessoa nega o ocorrido; raiva
é a fase dos questionamentos é nessa fase que surgem perguntas como: (Por que
meu Deus? Por que comigo?); barganha fase da negociação, onde o sujeito tenta
negociar para as coisas serem como era antes; depressão Kubler-Ross e Kessler
(2005) apontam como é importante se ter em mente que a depressão aqui não deve
ser compreendida como um estado patológico, que requeira a intervenção de
medicamentos. É nessa fase que a pessoa toma consciência do que de fato
aconteceu. E por fim a aceitação nela a pessoa aceita a realidade, mas não significa
que está tudo resolvido.
“Nosso luto é tão individual como nossas vidas” (KÜBLER-ROSS; KESSLER,
2005, p.07). Assim, uma mesma pessoa pode ir da fase da negação para a barganha,
como da barganha para a raiva e voltar para a anterior. Cada luto é singular na medida
em que os seres humanos o são, com suas particularidades e diferenças.
O funeral é uma parte importante do comportamento social e propicia a
demonstração e o compartilhamento do sofrimento (SHIMANE, 2018; WALTER e
BAILEY, 2020), mas para muito além disso, os rituais funerários revelam o modo de
funcionamento de uma sociedade e como ela lida com a ideia do morrer (SOUZA e
SOUZA, 2019).
O papel do psicólogo nesse processo é fundamental para auxiliar a pessoa
enlutada a se adaptar a essa nova vivência, possibilitando a elaboração de novas
crenças sobre si e sobre o mundo.
Diante da Resolução no 04/2020 do Conselho Federal de Psicologia (CFP),
onde o texto, pretende orientar os psicólogos acerca da atuação on-line diante do
contexto da pandemia da COVID-19 (CRP-GO, 2020). Documento que regulamenta
o método de consulta remoto “atendimento psicológico on-line” que vem se
12

apresentando uma ótima ferramenta virtual no que se refere ao impedimento de


contato presencial mediante ao período de IS (CRP-PR, 2020).
Esse trabalho tem como objetivo geral conceituar o luto e compreender como
o luto por COVID-19 impacta a vida do sujeito, como metodologia a pesquisa
bibliográfica. O trabalho divide-se em três capítulos. O primeiro capítulo diz sobre o
luto e a possível dificuldade em passar por esse processo. O segundo capítulo aborda
os rituais de despedida e enfatiza a sua importância. Já o terceiro capítulo discute a
atuação do psicólogo em situações de crise
13

2 LUTO EM CONTEXTO PANDÊMICO

A pandemia do coronavírus acomete pessoas de todas as idades e gêneros,


contudo as pessoas idosas e com doenças crônicas se enquadram no grupo de risco
pela condição clínica. Sintomas como febre, falta de ar, tosse, perda do olfato e do
paladar, são um dos vários sintomas, quando são sentidos de maneira grave, há a
necessidade de uma internação, E nesse cenário o paciente deixa de ter contato físico
com seus familiares, em alguns casos o contato pode ser apenas por meio de telefone,
quando essa possibilidade é viável, quando não é muita das vezes o paciente está
dentro de uma unidade de terapia intensiva. Contudo, ainda que não há perdas
concretas (e.g., morte de um familiar), as pessoas podem experienciar sofrimento, por
empatia àqueles mais diretamente afetados e por sensibilização à instabilidade social
gerada pela pandemia (WEIR, 2020a).
Ao longo de nossa vida, passamos por perdas. Essas perdas estão patentes
nas mais variadas situações e podem ser distinguidas entre perdas reais (associada
à perda de uma pessoa, animal ou objeto querido) ou simbólicas (perda de um ideal,
de uma expectativa, de uma potencialidade) (BARBOSA, 2010). Ao viver uma perda,
inicia-se o processo do luto o qual desencadeia reações individuais que incitam a
pessoa a tentar reorganizar a vida que foi modificada e abalada pela situação (ONARI,
2012).
A perda implica, desta forma, a privação de alguém, de algo tangível e que
impulsiona reacções afectivas, cognitivas e comportamentais (BARBOSA, 2010).
Entretanto a dor mais dolorosa, a dor que traz mais sofrimento é a morte de um ente
querido é a certeza de saber que a pessoa amada não voltará.
Barbosa (2010) diz que intrínseco à morte, encontra-se o luto como sendo um
processo reactivo à perda de um ente querido. O processo do luto na maioria das
vezes tende a se manifestar de forma esperada dentro de um contexto social, familiar
e psicológico. Pacheco (2002) acrescenta que a forma como se reage à morte
depende de uma multiplicidade de factores que se conjugam diferentemente entre si
e o que se relacionam principalmente com aspectos espácio-temporais, sócio-
culturais, pessoais e educacionais.
O luto influencia e afeta as estruturas existenciais de quem o vive. É uma
explosão de sentimentos difíceis de se definir, de serem vividos, é pessoal e social e
sensibiliza todos que estão ao redor do enlutado.
14

Para Jonas (2004) morte é um mistério que o ser humano se defronta que o
perturba, visto que contradiz a compreensão, a explicação natural e a universalidade
da vida. Por essa razão muitos negam o fenômeno da morte, dificultando sua
aceitação como parte inseparável da vida. Franco (2008) diz que:

… (o luto) trata-se de um processo por ser uma experiência que não


se coloca estatisticamente um dado momento da vida, que requer que
eventos aconteçam, que percepções se dêem e atuem sobre esses
eventos, que novas situações de apresentem e possam ser
significadas. É um processo particular, não há dois processos
idênticos. (FRANCO, 2008. p. 398)

Estudos apontam que para entender um fenômeno tão complexo e universal a


necessidade de uma visão multidisciplinar, pois o luto é constituído por fatores
biológicos psicológicos e sociais, onde suas perdas reais e simbólicas ocorrem ao
longo do desenvolvimento do ser humano (COELHO FILHO; LIMA, 2017).
O processo do luto é fundamental para a continuidade da vida sem um ente
querido e essa continuidade tem sido dificultosa na sociedade em que estamos
vivendo tendo em vista que o luto é uma manifestação complexa e necessária.
Bowlby diz que criamos vínculo para termos uma sensação de segurança e
proteção e a partir dessa perspectiva quando alguém que se tem um vínculo morre
fica evidente que essa perda representará dor e sofrimento.
Assim, para Bowlby apud Golse (1992, p. 129) o comportamento de apego é
resultado de uma necessidade inata de aquisições, possuindo também uma dupla
função:

Uma função de proteção (segurança trazida pelo adulto capaz de


defender o bebê vulnerável contra toda agressão) e uma função de
socialização: o apego desloca-se, no curso dos ciclos da vida da mãe
aos próximos, depois aos estranhos, e enfim a grupos cada vez
maiores e torna-se um fato tão importante na estruturação da
personalidade da criança (...) (BOWLBY apud GOLSE, 1992 p. 129)

O termo luto, é, pois, usado para indicar uma variedade de processos


psicológicos, provocados pela perda da pessoa amada, qualquer que sejam seus
resultados. (BOWLBY, 2004)
Segundo Bowlby o luto se dá em 4 fases e são elas: entorpecimento, anseio,
desespero e recuperação. Essas fases podem acontecer ao mesmo tempo, mais de
uma vez, porém não existe um tempo máximo para a duração de cada fase.
15

A primeira é a fase do entorpecimento é nela que o enlutado se sente mais


desamparado, perdido, muita das vezes negando se aceitar o que aconteceu e com
dificuldade em expressar os sentimentos. A negação é uma defesa para assimilar um
acontecimento difícil. Em alguns casos, a aceitação pode ser apenas intelectual, a
perda é reconhecida, mas a resposta emocional é negada. (FRADE, 2005)
Passa para a segunda fase quando não é mais possível negar a morte. A fase
do anseio é marcada pelo sofrimento e pela raiva de pessoas próximas. É nessa fase
que a raiva é esperada e é natural ter esse sentimento depois que se tem uma perda
significativa. Bromberg (1994) a morte começa a ser sentida como algo que não se
tem como voltar atrás.
Logo em seguida vem a fase do desamparo, a fase é marcada pela insônia,
depressão, apatia, isolamento social e as atividades rotineiras não são mais
realizadas. O enlutado se conscientizar que o que ocorreu foi real e que o morto não
voltará.

“A depressão e a desesperança são reações comuns nas perdas


importantes. Inúmeros sintomas de depressão são característicos de
uma situação de luto: introversão, apatia, diminuição da energia,
redução do desejo sexual, regressão, dependência, sentimento de
impotência ou abandono, ambivalência, vergonha, sentimentos de
estar fora do controle, despersonalização, falta de concentração e
problemas somáticos.“ (FRADE, 2005, p. 215)

E por fim, a fase da recuperação, é a partir dessa fase que o enlutado permite
se reorganizar, mesmo sabendo que tem algo faltando. Torna-se possível o
investimento em outros objetos. É, portanto, quando o enlutado se torna capaz de
adquirir novos papéis e iniciar novas relações (BOWLBY, 1985)
Rando (2000) apresenta pontos que precisam ser observados para se ter um
luto saudável:

 Reconhecer a perda: admitir e entender


 Reagir à separação: experimentar a dor, o sofrimento, sentir, identificar,
aceitar e dar alguma forma de expressão
 Recordar e reexperienciar a pessoa perdida e o relacionamento: reviver e
lembrar realisticamente e reviver sentimentos
 Abandonar os velhos apegos em relação ao objeto perdido
16

 Reajustar para se mover readaptativamente em direção ao mundo novo


sem esquecer o velho: desenvolver um novo relacionamento com o falecido,
formar uma nova identidade
 Reinvestir

Oliveira (2006, p. 208) afirma que individualmente, a função do luto é permitir o


reconhecimento da perda como condição real, presente e irrecuperável. O corpo físico
é temporário, temos uma alma que é atemporal, quando morremos perdemos apenas
o corpo físico, o corpo palpável ao toque, existe algo além desse corpo que podemos
tocar.

Para ela, o corpo físico é a morada temporária da alma ou entidade


que se liberta, como uma borboleta do casulo, para habitar uma
dimensão atemporal, na qual não há dor nem sofrimento; onde só há
beleza, prazer e plenitude; onde a pessoa é recebida por um ente
querido que já tenha feito o que ela chamava de transição, e onde
nunca se está só. (AFONSO; MINAYO, 2013)

É importante citar a dificuldade de aceitação no processo do luto para aqueles


que estão doentes e as características dos cinco estágios criados por Elisabeth Kubler
Ross, que necessariamente não seguiu uma devida ordem: negação e o isolamento,
a raiva, a barganha, a depressão e aceitação.
O primeiro estágio é o da negação, receber a notícia que perdeu alguém
querido e não aceitar, negar se acredita; o segundo estágio da raiva ele se apresenta
através da revolta utiliza-se de frases questionadoras a fim de justificar o porquê
daquilo estar acontecendo; o terceiro estágio é o da barganha, como o próprio nome
já diz isso é enlutado tentar negociar ações para que as coisas voltem a ser como
eram antes; o quarto estágio é da depressão é a partir dessa fase que notado senti
uma tristeza profunda já esperada diante do que a pessoa está passando e por fim o
último e quinto estágio é o da aceitação é o momento que o enlutado não nega o que
ocorreu e começa a lidar com suas emoções de forma equilibrada.
O luto saudável é o processo que o enlutado entende
e admite a perda do ente querido, adequando-se sua vivência sem a pessoa.
Normalmente, nesse tipo de luto o indivíduo consente em sentir falta, se lamenta,
chora. O que implica não é o sentir, mas sim, o quanto se sente e controla (BRAZ et
al., 2017).
17

21. Fatores determinantes para o luto

Os fatores determinantes para o luto são:

Dependência: O rompimento de qualquer relação afetiva, ainda mais causada


pela morte causa sofrimento, o sofrimento se torna ainda maior quando a uma
dependência do enlutado para com a pessoa que morreu.
Antecedentes e características pessoais: o enlutado vivencia o luto de acordo
com a sua personalidade, com grau de proximidade da pessoa perdida, de acordo
com a cultura, idade e condições financeiras, gênero são fatores que influenciam
diretamente o processo do luto.
Baixa autoestima: é o fator que mais faz com que as pessoas busquem
psicoterapia e ajuda psiquiátrica. A falta de confiança em conduzir a própria vida.
Influências sociais e culturais: pesquisas (BURGOINE, 1988) (PARKES, 1998,
p. 184) demonstram que sociedades que, culturalmente, mantém vivos e encoragem
os rituais e expressões de pesar e luto tendem a ter menos problemas na vivência de
perdas e do luto.
Tipo e condição em que ocorreu a morte: este é um fator primordial e causador
de traumas e característico na vivência do processo do luto. É nele que vem as
sequelas vivenciado as pelo enlutado, a depender da maneira que a pessoa morreu
(suicídio, assassinado).
Gênero e idade: as mulheres tendem a vivenciar o luto de maneira mais intensa
do que o homem. Quando uma pessoa jovem morre, os familiares e entes queridos
tendem a sofrer mais do que se fosse a de uma pessoa com uma idade mais
avançada.

Segundo Araújo e Alves (2015) determinam algumas formas de luto, que são:
Luto convencional: se manifesta através do choro e da tristeza. É o luto que
primeiramente a pessoa fica anestesiada diante da notícia para depois entender o que
aconteceu.
Luto normal: marcado por atitudes esperadas tendo em vista que acabou de
perder um ente querido, raramente requer ajuda de médicos ou psicólogos.
18

Luto patológico: o enlutado não responde de forma esperada ao ocorrido


nessas situações do sentimento de tristeza e depressão se apresentam de forma mais
intensa. As condições que a morte ocorreu reforça o risco de luto patológico. Nesses
casos a ajuda médica e psicológica se faz necessária.
Identificação excessiva ou psicose do luto: o enlutado se identifica com o ente
querido que se foi a ponto achar que é o falecido. Escuta a voz ou vê a imagem da
pessoa é uma das características dessa forma de luto. A dor supera a razão fazendo
com que a pessoa crie uma nova realidade.
Luto adiado, inibido ou negado: a pessoa que vivencia esse tipo de luto não
consegue expressar nenhum sentimento após o recebimento da notícia, a cultura é
um dos fatores que afetam influenciam esse comportamento (homem não chora). Não
permite que o enlutado viva o luto de maneira real, podendo desviar de forma
inconsciente seus sentimentos para outras esferas da vida.
Luto antecipatório: A tristeza vem diante da morte inevitável, esse luto é o
contrário do luto normal, onde se fica triste com a notícia da morte e a tristeza vai
amenizando com passar do tempo no luto antecipatório a tristeza aumenta quando a
morte se torna mais presente.
Luto dos pais: luto carregado pelo sentimento de culpa e abandono, colocando
para si a responsabilidade pela morte do filho, podendo piorar quando os pais projetam
nos filhos sonhos e desejos que não se concretizaram.
Luto em crianças: a depender da idade da criança, torna-se equivalente ao luto
de um adulto quando a criança consegue entender o significado da morte.
Lamentando-se e querendo o ente de volta, se dá conta que isso não ocorrerá,
fica triste, mas depois passa por um período de distanciamento, então começa a
investir em outros objetos desapegando daquele que morreu. É importante deixar que
a criança expresse o que está sentindo, para não lhe causar traumas no futuro.
Oliveira (2001) aborda sobre a questão do luto em condições calamitosas, que
no trabalho do luto, quando ocorrem mortes trágicas, como por exemplo a queda de
um avião, um naufrágio ou no caso de pessoas que por algum motivo desaparecem,
o processo do luto é um dos mais difíceis de serem elaborados, pois não tem corpo
físico para “comprovar” a morte daquele que desapareceu.
O desaparecimento caracteriza-se como um rompimento sem aviso, sem
explicação, sem conclusão. Assim, diferentemente dos casos de morte nesses casos
não há uma comprovação acerca do que de fato tem acontecido com o índio querido.
19

Portanto, o objeto de amor não está presente, mas não se sabe se algum dia voltará
(OLIVEIRA, 2001)
De acordo com Oliveira (200, p. 20) as reações de luto são propensas a serem
mais intensas e podem levar a um quadro denominado de luta ambíguo:

“A perda é desconcertante e as pessoas se vêem desorientadas e


paralisadas. Não sabem como se portar nessa situação. Não podem
solucionar o problema porque não sabem se este (o desaparecimento)
é definitivo ou temporário […] a incerteza impede que as pessoas se
adaptem a ambiguidade de sua perda, reorganizando os papéis e as
normas de suas relações com os outros querido […] se agarram à
esperança de que as coisas voltem a ser como era antes e são
privados dos rituais que geralmente dão suporte a uma perda clara,
tais como funerais depois de uma morte na família. ” (OLIVEIRA, 2001,
p. 20).

Desta forma, o autor afirma que o desaparecimento é um luto, tendo em vista


que o luto não se caracteriza apenas pela morte. O enlutado passa a viver em função
do desaparecido, muitas das vezes sentindo-se culpado pelo desaparecimento
trazendo sentimentos ambíguos.

“Ao contrário da morte, uma perda ambígua pode nunca permitir


que a pessoa que sofre alcance desapego necessário para encerrar
adequadamente seu luto (…) é sentida como uma perda, mas não é
de fato. As pessoas intercalam esperança e desespero, depois
retomam esperança e assim sucessivamente. ” (OLIVEIRA 2001, p.
23).

Segundo Parkes (1998), o traço mais característico do luto são os episódios


agudos de dor. O enlutado sente tanta saudade do ente querido que chora e chama
pela pessoa.
De acordo com Franco (2002), existem 5 dimensões das reações comuns ao
luto:

1. Dimensão Intelectual: composta por reações de confusão,


desorganização, desorientação, falta de concentração,
intelectualização e negação;
2. Dimensão Emocional: choque, entorpecimento, raiva, culpa,
alívio, depressão, irritabilidade, solidão, saudade, descrença,
tristeza, negação, ansiedade, confusão e medo;
3. Dimensão Física: alteração do apetite, visão borrada,
alterações do sono, inquietação, dispneia, palpitações
20

cardíacas, exaustão, boca seca, perda do interesse sexual,


alterações no peso, dor de cabeça, mudanças no
funcionamento intestinal, choro e;
4. Dimensão Espiritual: sonhos, perda de fé, aumento da fé, raiva
de Deus, dor espiritual, questionamento de valores, sentir-se
traído por Deus, desapontamento com membros da igreja.
5. Dimensão social: perda da identidade, isolamento,
afastamento, falta de interação, perda da habilidade para se
relacionar socialmente".

Com essas mudanças, a maneira de vivenciar o luto se modificou, “aumentando


o risco para problemas de saúde mental nos sobreviventes após a crise“ (CREPALDI
et al., 2020, p.6). Esta impossibilidade do luto pode intensificar o sofrimento e ao longo
do tempo, a pessoa pode apresentar comportamentos desadaptado os, como
pensamentos recorrentes sobre a pessoa que faleceu, afastamento de relações
interpessoais e falta de sentido na vida (CREPALDI et al., 2020, p. 6). Logo, os rituais
de despedida têm o papel de fundamental na elaboração do luto.
21

3 RITUAIS DE DESPEDIDA

Cada cultura tem sua maneira de expressar a dor pela perda de um ente
querido. Segundo Gomes (2010, p. 147), “ um ritual é composto de um conjunto de
comportamentos mais ou menos previstos, com trajetórias padronizadas em começo,
meio e fim”. Esse ritual começa quando alguém morre, com tudo antes de ir para o
velório o corpo passa por um processo de higienização para ser exposto ao público.
Após a morte, o corpo é levado, vestido e colocado no caixão de acordo com os
costumes e tradições da família, muita das vezes acatando algum pedido do morto e
quando o falecido está no caixão é colocado uma coroa de flores. A partir desse
momento começa a chegar às primeiras figuras que farão parte desse processo, logo
em seguida chegam amigos e conhecidos.
Ritualismo dar a morte favorece o sentido do luto, pois concretiza a morte,
facilita a expressão de angústia e dor. Talvez sua maior função seja de solidificar os
laços de solidariedade do grupo na época que os indivíduos são forçados a se adaptar
às mudanças fundamentais na sua existência ou inexistência (PEIRANO, 2003).
Em 11 de março de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou
que estávamos vivendo uma pandemia causada pelo novo coronavírus. Nos casos
mais graves podendo evoluir para um quadro de síndrome respiratória aguda e
rapidamente vir a óbito. Com a alta taxa de transmissão do coronavírus o mundo
precisou tomar atitudes que impactaram nossas vidas, até porque estávamos vivendo
uma pandemia. Com vírus se propagando rapidamente e por consequência a morte,
havia a necessidade de estarmos em isolamento social, os rituais de despedidas
foram interrompidos ou resumidos para que não houvesse contato entre as pessoas.
Logo, a COVID-19 modificou a maneira que expressamos vivemos a morte. Nesse
contexto, torna-se mais complexa a realização de rituais de despedida entre doentes
na iminência da morte e seus familiares, bem como de rituais funerários, o que dificulta
a experiência do luto (EISMA, BOELEN e LENFERINK, 2020; FIOCRUZ, 2020a).
Diante de uma internação, e logo em seguida a morte, a falta de contato com o
ente querido dificulta o processo de assimilação da perda. Essas interações face a
face são consideradas importantes nos chamados “rituais de despedida”, isto é,
processos de despedida realizados entre pessoas na iminência da morte e seus
familiares (LISBÔA e CREPALDI, 2003). Tanto a comunicação verbal quanto a não
verbal se mostram essenciais nos rituais de despedida; a comunicação não verbal,
22

especificamente, parece importante em situações em que as palavras são


insuficientes para externalizar o que se deseja ou, ainda mais podem ser ditas
(LISBÔA e CREPALDI, 2003).
Frente ao cenário pandêmico da COVID-19, os rituais de fúnebres foram
modificados. O Ministério da Saúde traz recomendações de como devem ser
realizados os funerais. Durante o velório o caixão deve permanecer fechado, com no
máximo 10 pessoas, mantendo o distanciamento de 2 metros a fim de evitar maior
propagação do vírus. Diante desse panorama, houve a necessidade de ressignificar
o modo de compreender a morte e por consequência o luto, logo o modo de realizar
os rituais de despedida foram modificados. Tudo isso provoca sentimentos de
negligência e desumanização, bem como de injustiça e abandono, aumentando os
riscos de adoecimento mental após a crise (Fundação Oswaldo Cruz, 2020; FRANCO,
2012; MIYAZAKI e TEODORO, 2020). Segundo (SCANLON e MCMAHON, 2011;
TAYLOR, 2019) rituais funerários, considerados organizadores do processo de
despedida e importante para a elaboração do luto, necessitam de reconfiguração
durante as pandemias.
O ritual de despedida é valorizado em diferentes sociedades e culturas. Ritual
é a prática, ações e gestos, enquanto os ritos compõem um ritual podendo ser de
passagem ou cura. Os rituais estão presentes em todo mundo do Oriente ao Ocidente,
são extremamente valorizados, porque ajudam o indivíduo a investir seus
sentimentos, suas emoções e partilhar crenças, sendo um marco na vida do enlutado.
Esses rituais favorecem a maturação psicológica do enlutado, e essa ausência
dificulta a solidificação do enlutado de entender que o ente querido não voltará.
A impossibilidade da realização desse ritual completo pode desencadear uma
má elaboração no processo do luto, contribuindo para um outro complicado, que é
caracterizado pelo prolongamento do movimento dual. Contudo existem fatores que
contribuem para um outro complicado, como por exemplo: contexto da morte, vínculo
com o morto, suporte social, cultura familiar, religião, espiritualidade e cultura.
Na pandemia de COVID-19 existem diversos fatores que dificultaram o
processo de elaboração do luto, por isso nesse contexto coisa lamento dentro de
unidade hospitalar o entendimento sobre a morte e morrer em em uma situação de
sofrimento emocional físico psíquico, e a falta dos rituais são fatores determinantes
nesse processo.
23

Todos os povos ritualizam seus mortos e apresentam maneira similar de reação


diante da perda por morte de um ente querido (IMBER-BLACK, 1998; SchILINDWEIN,
2001). Hoje tu vais fúnebres é uma das formas de compreender como o indivíduo ou
a sociedade se relaciona com a morte.
Segundo Rivière (1997, p. 30):

(...) os ritos devem ser sempre considerados como conjunto de


condutas individuais ou coletivas, relativamente codificadas, com um
suporte corporal (verbal, gestual, ou de postura), com caráter mais ou
menos repetitivo e forte carga simbólica para seus atores e,
habitualmente, para suas testemunhas, baseadas em uma adesão
mental, eventualmente não conscientizada, a valores relativos a
escolhas sociais julgadas importantes e cuja eficácia esperada não
depende de uma lógica puramente empírica que se esgotaria na
instrumentalidade técnica do elo causa-efeito. (RIVÉRE, 1997, p. 30)

Então, nesse contexto ritual traz sentido sobre o que é ritualístico, vai além do
ato adquirindo características simbólicas. Em Bayard (1996), hoje tu fúnebre é, a
princípio, o gesto técnico de lavar, enterrar e cremar o cadáver, mas é o seu
prolongamento para o ato simbólico que o torna abrangente em todo o seu sentido.
Os rituais vêm repleto de símbolos esses símbolos têm vários significados que
permite expor o que não conseguimos expressar em palavras. Visto a partir de seu
interior simbólico, o ritual pode ser entendido como um sistema de Inter comunicação
simbólica entre o nível do pensamento cultural em seus complexos significados, ação
social e o acontecimento imediato (KROM, 2000). Desta forma, a capacidade que o
ritual tem de funcionar como sistema de intercomunicação entre estrutura e significado
lhe confere forte poder transformador, pois, à medida que permite um significado ao
longo das gerações, possibilita a formação de novas concepções de mundo (KROM,
2000).
A respeito do significado dos termos, Rivière (1997) nos diz que na tradição
francesa os termos de rito ritual possuem zonas semânticas vizinhas que apresentam
fronteiras indeterminadas e interpenetrações recíprocas, a ponte que virem mesmo a
se tornar muitas vezes palavras sinônimas. Com o passar do tempo o significado
destes termos foram confundidos, que segundo o autor Rivière não há distinção das
palavras rito e ritual no inglês quanto no francês.
De acordo com Ferreira (2003, p. 483), a definição para Rito é a seguinte: “ As
regras e cerimônias próprias da pátria de uma religião”; enquanto isso Ritual é definido
24

como: “Relativo a ritos(s)”. Gennep (1978) assinala a existência de Ritos de


Passagem, que se decompõem em: Ritos de Separação (preliminares), Ritos de
Margem (liminares) e Ritos de Agregação (pós-liminares), sendo que dependendo das
características referentes a cada cerimônia, todas podem aparecer ou uma pode ser
mais evidente.
Hoje, rituais fúnebres no processo do luto marcam um estado dele de
reconhecimento da perda. O Ritual promove alguém lotado sem reorganizar para
depois reintegrar-se a vida social. Com a COVID-19 alguns cemitérios foram
selecionados para receber esses corpos e realizar o enterro.

A pandemia cria situações inusitadas, entre elas a de mortes sem


funerais. Como é possível ficarmos alheios a um rito de passagem tão
ancestral, exclusivamente humano? Na natureza, nenhum outro ser
chora os seus mortos e os reverência no sepultamento (O Globo, Rio
de Janeiro (Brasil), 27/04/2020 - Artigo: Antígona e Antares)

Esses rituais marcam o momento de despedida do ente querido, sendo


essencial para as pessoas que estão ligadas a esse morto se despedir e expressar
todo seu sentimento. Por conta da pandemia, os velórios e enterros, que são os rituais
clássicos, agora são proibidos ou limitados.

Agora, o vírus nos rouba tudo isso que traduz nossos laços de
parentesco e amizade: visitar o enfermo, consolá-lo e animá-lo,
preparar o corpo para o funeral, promover o velório, cumprir os rituais
de enterro ou cremação, ver o caixão descer ao túmulo, orar em
conjunto pelo falecido, e manifestar condolências e abraçar os mais
afetados pela perda (O Globo, Rio de Janeiro (Brasil), 27/04/2020 -
Artigo: Antígona e Antares)

Quando esses marcos não ocorrem, a abertura para complicações na


elaboração do luto e a perda pela COVID-19 retrata a experiência de forma solitária.

Maurício (nome fictício) perdeu a mãe para a COVID-19 no final de


março. Ela teve acesso ao tratamento com cloroquina e respirador,
mas não melhorou. Tinha 56 anos e nenhuma doença prévia. "Meu pai
foi sozinho reconhecer o corpo no hospital, sozinho até o cemitério e
sozinho ao crematório. Não tiveram velório ou qualquer ritual fúnebre,
mas Maurício espera poder realizar algo quando a pandemia passar,
como uma missa de celebração da vida dela" (Folha de São Paulo,
São Paulo (São Paulo), 14/04/2020 - Coronavírus priva famílias de
importantes rituais do luto)
25

Podemos destacar que a ausência desse jeito as fúnebres dificultam o


processo de elaboração do luto por várias etapas fundamentais nesse processo.
Destaca-se o velório como uma prática de ritualização em que existe espaço para
despedida e elaboração da morte daquele ambiente, momento esse em que ver o
corpo reafirma o sentimento de perda. Enquanto, o enterro concretiza a morte, o ato
de fechar o caixão é o momento carregado de emoção e certeza da morte. Essas
mudanças tornam ainda mais doloroso o processo do luto, visto que os familiares
podem considerar que o falecido não recebeu um final digno, ou mesmo, por não
terem tido a oportunidade de serem confortados e de oferecer conforto às pessoas
próximas, o que favorece a elaboração da perda e a possibilidade de seguir em frente
(CREPALDI et al., 2020).
Bromberg (2000, p. 112) pontua que o uso de rituais como recurso terapêutico
envolve três aspectos:

 Um ritual para admitir a perda e entrar no luto;


 Um ritual que simbolize o que os familiares incorporaram do morto;
 Um ritual para simbolizar os momentos de mudança na vida.

Para Herouet (2013) ao ressaltar que, apesar de a cerimônia ser, a priori, em


homenagem ao morto, a vida continua é para os vivos, sendo o ritual, portanto,
especialmente vital e benéfico para aqueles que assistem, criando um momento de
comunhão, de estar juntos, de cumplicidade, de compaixão e renovação,
estabelecendo conexão com o sagrado e marcando o início do luto necessário.
A forma de se comunicar é fundamental no ritual de despedida, através dos
gestos o enlutado consegue expressar o que está sentindo mesmo que as palavras
não sejam suficientes.
Para Imber-Black (1998), os rituais de luto apresentam funções: marcar a perda
de um dos membros da família; afirmar a vida como foi vivida pelo que morreu; facilitar
a expressão do luto conforme os valores da cultura; falar sobre a morte e sobre a vida
que continua expressando significados; apontar uma direção que faça sentido diante
da perda e da continuação da vida dos que ficaram.
O falecimento gera uma série de desdobramentos que precisam ser
executados, prolongando o tempo de “convívio” com o morto. Hoje rituais fúnebres
são essenciais para que essa perda seja elaborada e para que o sofrimento não se
26

prolongue. Esses rituais são carregados de simbolismo onde o corpo pode ser lavado,
tocado e olhado pela última vez, no momento do velório é fundamental para se
concretizar que a pessoa realmente morreu e que não está enterrando a pessoa
errada.
Já podemos observar um marco para os enlutados pela COVID-19, esse
momento de olhar, tocar e velar seu ente querido não é mais permitido. Não sendo
mais possível velar o corpo tendo que ir diretamente para o enterro de caixão lacrado
e muita das vezes em cemitérios específicos para esse tipo de morte, sendo
necessária uma quantidade mínima de pessoas para manter o distanciamento social.
Logo, os familiares de vítimas fatais da COVID-19 tinham os seus rituais incompletos
aumentando o seu sofrimento. Os familiares sentem a necessidade dos rituais de
despedida, essa não realização traz sentimento de impotência e a realidade que é
vivido dentro de outras circunstâncias traria sensação de concretização: “ele não volta
mais”. Esses rituais consistem em momentos de comunicação familiar, com definição
de questões não resolvidas, assim como rememoração e de compartilhamento de
bons momentos vividos, de pedido de perdão e de agradecimento (CREPALDI et al.,
2020).
Antes de falar de mortes pela COVID-19, há uma dolorosa separação entre a
pessoa internada e seus familiares que no pico da transmissão do vírus era impossível
visitar ou familiar, recebendo notícias de melhores ou piores por telefone.
Ana Claudia Quintana (2016) em ‘’A morte é um dia que vale a pena viver, a
vida depois da morte: o tempo do luto’’

“Essencialmente, o luto é um processo de profunda transformação. Há


pessoas que podem transformar a nossa temporada na caverna em
um período menos doloroso, mas não podem fazer o trabalho por nós.
A tarefa mais sensível do luto é restabelecer a conexão com a pessoa
que morreu por meio da experiência compartilhada com ela. A revolta,
o medo, a culpa e outros sentimentos que contaminam o tempo de
tristeza acabam prorrogando nossa estadia na caverna e podem nos
conduzir a espaços muito sombrios dentro de nós. ” (QUINTANA,
2016, p. 163)

Para Bayard, citado por Souza e Souza (2019, p. 3)


27

Os ritos fúnebres têm início com a agonia e coincidem com a fase


inicial luto. O segmento se dá com o velório, as exéquias, as
condolências luto público (para pessoas de destaque), social (como
no caso do uso de específica de roupa) e psicológico (o sentimento da
perda), prolongando com o culto dos mortos ou a visita ao cemitério,
como ocorre no dia finados. (Souza & Souza, 2019, p. 3)

Então, os rituais simbólicos incorporados pelas pessoas tendem a facilitar a


forma como lidam com a morte e o morrer, ajudando a consolidar essa morte e
reintegrar-se na vida social. Contudo, os rituais fúnebres, por exemplo, são
fundamentais para o processo de elaboração do luto, possibilitando um conforto
psicológico diante da perda. Rituais alternativos relacionados à espiritualidade
também podem ser incentivados, o que inclui celebrações religiosas virtuais, tais como
cultos, missas e velorios (Fiocruz, 2020a; Hernández & Berman, 2020). A
espiritualidade tende a ser um recurso importante para muitas famílias, podendo
contribuir no enfrentamento aos diversos desafios da vida, na adaptação e na
resiliência às perdas (Walsh, 2016).
No Brasil devido a diversidade, há diversos tipos de religião e cada religião lida
com os rituais de despedida à sua maneira, porém todas tiveram que se adaptar ao
contexto da pandemia. No continente africano, por exemplo, as maneiras de viver os
rituais são diferentes da do Brasil.
Segundo Sihawukele Ngubane, professor da Universidade de Kwazuku-Natal,
na África do Sul.

Em diversos países da África, o combate à COVID-19 alterou


tradições funerárias que mesclam rituais de religiões locais com
elementos critãos introduzidos pela colonização europeia do
século 19 [...] O funeral na África é algo comunitário, não
individual. Quando alguém morre, a comunidade toda sente o
luto e divide a tristeza da família. (Sihawukele Ngubane -
professor da Universidade de Kwazuku-Natal, na África do Sul)
28

4 O PAPEL DO PSICÓLOGO EM CONTEXTO DE CRISE

A demanda para a Psicologia atuar em situações de desastres e emergências


está relacionada com o que Lomeña (2010) diz com a descoberta de que pessoas
podem manifestar, individualmente ou coletivamente alterações psicológicas, em
decorrência do trauma, físico e/ou emocional, produzido por um evento externo.
Mesmo sem ter modelos ou teorias a serem seguidas, o campo da psicologia dos
desastres é capaz de estudar a partir da visão que a prática trás. Por isso, Lourente
(2003, p. 32) define Psicologia das emergências como o "campo psicológico que
abarca o conjunto da emergência".
Desta forma, a intervenção sem circunstâncias trágicas, procura auxiliar a
vítima a se reconstruir psiquicamente e socialmente, a fim de diminuir os possíveis
danos. Por isso tem a concepção de que as pessoas que sofreram ou sofrem por
eventos internos ou externos entram em crise. De acordo com Slaikeu (1996, p. 16),
é "um estado temporal de transtorno e desorganização, caracterizado principalmente
por uma incapacidade do indivíduo para manejar situações particulares utilizando
métodos comumente conhecidos para a solução de problemas, e pelo potencial para
obter um resultado radicalmente positivo ou negativo".
Assim a intervenção psicológica se dá em qualquer situação de catástrofe.
Estamos vivendo em uma sociedade contemporânea, onde cada vez mais pessoas
experienciam momentos inesperados, podendo ser causado pelo crescimento
populacional, aquecimento global, efeito estufa e violência. Contudo, mostra Llinàs
(2010), é necessário avaliar e cuidar para não “patologizar” toda e qualquer situação
que tenha o potencial para um trauma, impondo desta forma a presença do psicólogo
como imprescritível a qualquer vítima e/ou equipe de socorro, policial e voluntários.
Para Blanchot (1987), o desastre é um fenômeno que - do ponto de vista
individual e coletivo - nos atravessa, nos arrebata, nos excede: não nos permite
alcançá-lo totalmente, dá-se como um algo para além do que é possível pensar e
representar naquele momento, exigindo um tempo é uma distância para ser, talvez
compreendido e elaborado.
Quarantelli (2000) afirma que o desastre não é apenas um ‘acidente mais grave’
do que usualmente acontecia em uma dada região: ele é caracterizado por quatro
elementos importantes, tanto do ponto de vista individual como social: no local atingido
pelo desastre, a população deve se preocupar com a perda da autônomo, sendo
29

obrigada a seguir normas excepcionais; um desastre redefine as linhas tornando o


público em privado; instituições e grupos sociais são envolvidos mais rapidamente do
que em situações consideradas normais.
A Organização Mundial de Saúde utiliza essas definições como referências:
Crise: É um evento ou uma série de eventos que representam uma ameaça
crítica à saúde, segurança, proteção ou bem-estar de uma comunidade, geralmente
em uma área ampla. Conflitos armados, epidemias, fome, desastres naturais,
emergências ambientais e outros grandes eventos prejudiciais podem envolver ou
levar a uma crise humanitária.
Desastre: a) uma séria interrupção do funcionamento de uma comunidade ou
sociedade causando perdas humanas, materiais, econômicas ou ambientais
generalizadas que excedem a capacidade da comunidade ou sociedade afetada de
lidar com seus próprios recursos. Um desastre é uma função do processo de risco.
Resulta da combinação de perigos, condições de vulnerabilidade e capacidade ou
medidas insuficientes para reduzir as potenciais consequências; b) qualquer
ocorrência que cause danos, perturbação ecológica, perda de vidas humanas ou
deterioração da saúde e dos serviços de saúde em escala suficiente para garantir uma
resposta extraordinária de fora da comunidade ou área afetada.
Emergência: uma ocorrência repentina exigindo ação imediata que pode ser
devido a epidemias, catástrofes naturais, tecnológicas, conflitos ou outras causas
humanas.
Perigo: qualquer fenômeno que tenha o potencial de causar perturbações ou
danos às pessoas e seu meio ambiente.
Risco: a probabilidade de consequências prejudiciais ou perdas (mortes,
lesões, perda de bens, meios de subsistência, atividade econômica interrompida ou
danos ao meio ambiente) resultantes de interações entre riscos e vulnerabilidades
naturais ou induzidos pelo homem.
Vulnerabilidade:
a) as condições determinadas por fatores ou processos físicos, sociais,
econômicos e ambientais, que aumentam a suscetibilidade de uma comunidade ao
impacto de perigos;
b) o grau em que uma população ou um indivíduo é incapaz de antecipar, lidar,
resistir e se recuperar do impacto de um desastre.
30

A pandemia da COVID 19 trouxe um cenário inimaginável promovendo


situações surpreendentes além do cotidiano de todos nós. Resistir, se adaptar e
buscar soluções são meios de gerar as práticas em um contexto de crise. Em 2004 o
Ministério da Saúde, identifica o acolhimento como uma prática de estratégias em
busca de um atendimento mais humanizado. Considera-se que com o medo de
contágio pela doença, junto com o distanciamento e o isolamento físico como formas
de controle da pandemia, seja vivenciada uma carga elevada de experiências e
emoções perturbadoras, suscitando a necessidade de cuidados psicológicos
constantes desde o período inicial do problema (Ministério da Saúde, 2020).
Com a pandemia do coronavírus, as pessoas passaram a ter comportamentos
que mudaram o dia a dia. Como o isolamento social, ou uso de máscaras, ações para
evitar a contaminação. No novo normal muitas pessoas não souberam lidar com a
nova realidade, consequentemente afetando a saúde mental. Por isso a necessidade
da atuação do psicólogo para minar as sequelas da pandemia disponibilizando
instrumentos que ajudem o paciente a lidar com suas inseguranças e medos.
Com as mudanças vivenciadas desde 2020 em todo mundo, a insegurança
toma conta da população gerando um grande impacto na saúde mental do indivíduo,
exigindo uma adaptação dos profissionais de saúde no acolhimento e manejo
terapêutico neste contexto de crise.

O sistema de saúde passou a conviver com um crescimento


exponencial de pessoas dando entrada nos hospitais, mortes se
multiplicando, turnos de trabalho com manutenção da vigília
prolongada, precarização das condições de trabalho, além da
necessidade de estrutura física e de equipamentos para amortecer as
consequências do COVID-19. (BIZARRO, et al., 2020, p. 1)

Danzmann et al., (2020) diz que a atuação do(a) psicólogo(a) no exercício da


prevenção dos impactos na saúde mental é justificado pela necessidade de discutir a
atuação deste profissional e sua importância nas fases pré, inter e pós-pandemia.
Desta forma dando ênfase a dificuldade que os psicólogos encontraram com o
distanciamento social.

A(o) psicóloga(o) no exercício da prevenção dos impactos na saúde


mental, permite ampliar e intensificar a organização dos serviços e dos
cuidados em saúde mental e atenção psicossocial no contexto da
COVID-19, assim como nas situações que possam envolver outras
31

emergências em saúde pública e desastres futuros. (DANZMANN et


al., 2020, p.17).

Os lugares de atuação do psicólogo podem ser, dentro de um hospital, na


clínica, em empresas, nas escolas. Para prevenir os impactos na saúde mental e
aliviar os danos causados pela COVID-19. A maneira que o profissional lida com seu
paciente que não consegue conduzir situações de angústia, estresse e sofrimento
psíquico o ajudará a externalizar o que sente. Para Noel et al., (2020):

Os atendimentos psicossociais durante a pandemia requerem atenção


a respeito do manejo, distinção sobre reações esperadas nesse tipo
de evento e indicadores de risco: sintomas persistentes, complicações
associadas (por exemplo, conduta suicida); comprometimento
significativo do funcionamento social e cotidiano, depressão maior/
unipolar, psicose, transtorno de estresse pós-traumático ou mesmo
manifestação de sofrimento agudo intenso que ocasione a ruptura com
as estratégias que promovam a vida, são quadros que exigem uma
atenção especializada imediata. Reações de raiva, confusão e
estresse agudo são comuns durante períodos de quarentena e
isolamento. (NOEL, et al., 2020, p. 55)

Diante disso, vale ressaltar e compreender que a pandemia do coronavírus


trouxe sofrimento, como um gatilho. O papel do psicólogo, se faz necessário dentro
dessas condições para auxiliar e evitar possíveis sequelas dentro desse quadro.
Segundo Noal et al (2020), a atuação da(o) psicóloga(o) na prevenção do que pode
ocorre a respeito das consequências geradas no impacto da saúde mental das
pessoas, como também com relação ao seu entorno socioeconômico e de aspectos
sanitários, salvaguardando as pessoas com alguma doença mental e que se torna
vulnerável à COVID-19 e por fim, buscar recursos de proteção aos profissionais de
saúde e cuidadores, buscando também recursos para aqueles que são cuidados por
eles.
A atuação do psicólogo não está apenas dentro de um hospital ou consultório.
Por exemplo, dentro de uma escola com a realidade de ensino remoto, esse
profissional busca agir nas questões de ensino-aprendizagem, facilitando o
desenvolvimento dentro da realidade daquele momento. Para Rodrigues (2020), a(o)
profissional facilita a análise dos cenários, o acolhimento e identificação das
demandas da população e incentiva a conservação dos vínculos familiares. A(o)
psicólogo(a):
32

[…] Permite estratégias de enfrentamento e fortalecimento da saúde


mental do indivíduo foram propostas por meio de intervenções sociais
e psicológicas. Como, por exemplo, o trabalho da Fiocruz que
incentivou a capacitação de profissionais da área de saúde realizando
gratuitamente um curso online sobre saúde mental e atenção
psicossocial na COVID-19. Além disso, o fortalecimento da assistência
social, apoio familiar, estratégias de acompanhamento e atendimento
emergencial às demandas em saúde mental, por meio de psicoterapia
online. (RODRIGUES, 2020, p. 21)

A atividade do psicólogo passa por modificações, em condições que a saúde


mental não dá conta da realidade estabelecida. Limitando sua condição emocional
promovendo um sofrimento ainda maior. A atribuição dada ao psicólogo na pandemia
da COVID-19 é de facilitar e possibilitar ao paciente acolhimento e liberdade através
da escuta ativa.
Não apenas da população geral que os psicólogos precisam se mobilizar. Os
profissionais de saúde precisam estar na linha de frente tendo que lidar com todo
estresse causado pela pandemia. Sobre a COVID-19 em particular, os desafios
enfrentados pelos profissionais de saúde podem ser um gatilho para o
desencadeamento ou intensificação de sintomas de ansiedade, depressão e estresse
(BAO et al., 2020), especialmente quando se trata daqueles que trabalham na
chamada “linha de frente”, ou seja, em contato direto com as pessoas que foram
infectadas pelo vírus (LI et al., 2020a).
Recomenda-se que as intervenções psicológicas presenciais sejam evitadas, a
fim de minimizar a contaminação. Os atendimentos passaram a ser realizados por
meio da internet. A Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), em parceria com o Ministério
da Saúde lançou uma cartilha “Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia
COVID-19” apresentando estratégias para o cuidado das famílias enlutadas.

 Promover apoio emocional ao enlutado através de estratégias remotas de


despedida estimulando familiares a se expressarem com uso da tecnologia.
 Se o funeral não for realizado ou tempo for curto reservar um tempo para criar
o memorial para o ente falecido.
 Criar um livro online de assinaturas para que os familiares e amigos mais
próximos possam escrever algo para o falecido e depois de ler, essa leitura
contínua amenizar a tristeza naquele momento.
33

 Produzir rituais fúnebres alternativos para ajudar nesse processo de despedida.


 Reforçar as redes de apoio, como religião, família e espiritualidade, manter
contato com essa rede mesmo que de forma virtual.
 Manter o enlutado sob supervisão através das redes de apoio e caso perceba
dificuldade em lidar com o que aconteceu procurar ajuda profissional.

O isolamento social, o histórico de transtorno psiquiátrico além do desgaste


emocional são fatores que juntos culminam em emoções negativas e duradouras.
Esses fatores causam sofrimento psíquico e pela necessidade de ficar em casa o
medo de ser infectado e de infectar pessoas. Alguns desses fatores foram associados
a um maior número de sintomas de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT),
transtorno de ansiedade e fatores negativos após o final do isolamento (DESCLAUX
et al., 2017; HAWRYLUCK et al., 2004; JEONG et al., 2016; REYNOLDS et al., 2008).
Não podemos deixar de falar o quanto a pandemia afetou a população
financeiramente se tornando um outro fator de risco para aumento de possíveis
transtornos. Os prejuízos financeiros, por sua vez, parecem constituir o maior fator de
risco no desenvolvimento de transtornos mentais para as famílias de níveis sócio-
econômico abaixo (HAWRYLUCK et al., 2004). Isso pode decorrer do maior impacto
que a perda de renda representa para essas famílias (BROOKS et al., 2020)
Em 2021, o Conselho Federal de Psicologia emitiu um documento para
referenciar a atuação do psicólogo. (UNDRR, 2004) diz que “desastre é uma séria
interrupção no funcionamento de uma comunidade ou sociedade causando grande
quantidade de mortos, bem como perdas impactos materiais, econômicos e
ambientais que excedem a capacidade da comunidade ou sociedade arretada de
fazer frente à situação mediante o uso de seus próprios recursos”. Já no Brasil o
Ministério da Integração Nacional utiliza a normativa n. 02, de 20 de dezembro de
2016, conceitua desastre como resultado de eventos adversos, naturais, tecnológicas
ou de origem tropical, sobre o cenário vulnerável exposto ameaça, causando danos
humanos materiais ou ambientais e consequentes prejuízos econômicos e sociais
(BRASIL, 2016).
Enfrentar situações de emergências e desastres está relacionado com a forma
como a comunidade e a sociedade, de maneira mais ampla, percebe riscos preparar
para ser e participar das estratégias de enfrentamento (COÊLHO, 2011). Estudos
mostram o quanto é fundamental um espaço para que se possa expressar livremente
34

toda dor e saudade do ente querido. Desta forma estimular o apoio psicológico
essencial para o cuidado da saúde mental desses enlutados, promovendo estratégias
de atuação que a pandemia exige.
35

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através deste trabalho, exponho a dificuldade que os enlutados tiverem e tem


em passar por esse processo devido uma morte por COVID-19. O momento da
pandemia que passamos nos trará sequelas imediatas e a longo prazo, esse período
foi marcado por isolamento e distanciamento social, afastamentos de pessoas e a
incerteza da própria vida e daqueles que amamos.
Essa monografia teve o objetivo de compreender a ausência dos rituais de
despedida a partir de uma revisão bibliográfica. Vivenciar o luto na pandemia, sem os
rituais de despedida é um fator decisivo para se viver um luto complicado. As
ausências desses rituais mostram o quanto eles são fundamentais para que o
enlutado consiga concretizar o ocorrido. Por mais que a morte seja a única certeza da
vida, a morte por COVID-19, é diferente, é solitária, triste, repentina, indesejada, vem
carregada de desesperança quando se tem o diagnóstico. Há um sofrimento psíquico
quando uma pessoa querida é hospitalizada, mas quando há uma internação por
COVID-19 o sofrimento é ainda maior.
Baseado nos estudos e em todas as pesquisas realizadas para o
desenvolvimento deste trabalho, pôde-se entender que a morte é um processo natural
da vida, no entanto, a sociedade que estamos inseridas enxerga esse processo com
algo ruim, causando dor e sofrimento. No processo do luto, há diversos fatores que
contribuem para o processo de elaboração de um luto saudável ou complicado. O
vínculo, cultura, gênero, idade, religião, suporte social, contexto da morte são fatores
determinantes, logo o luto não é algo linear. Havendo um movimento chamado
processo dual, onde o enlutado oscila entre restauração e perda.
Através deste podemos entender a atuação do psicólogo em contexto de crise
e o suporte técnico e teórico que o Conselho Federal de Psicologia deu para os
profissionais atuantes. Diante deste cenário pandêmico a atuação do psicólogo em
determinadas situações se faz necessária para o auxílio da elaboração da morte do
ente querido, tendo em vista que a morte por COVID-19 não acontece os rituais de
despedida, tão fundamentais nesse processo. Logo, os psicólogos tiveram que se
adaptar à nova realidade.
Podemos concluir que daqui a alguns anos teremos mais literatura e relatos de
casos que serão embasados no tempo para dar um prognóstico das sequelas da
pandemia em todos nós.
36

6 REFERÊNCIAS

A PRÁTICA PSICOLÓGICA NA PANDEMIA: de norte a sul histórias de profissionais


que precisaram encontrar alternativas em meio à crise. Dialógos. Losiley Alves
Pinheiro. Ano 17, N° 12, Junho. ISSN 19812418. 2021.

AFONSO, Selene Beviláqua Chaves; MINAYO, Maria Cecília de Souza. Uma


releitura da obra de Elisabeth Kubler-Ross. Ciência & Saúde Coletiva, [S.L.], v. 18,
n. 9, p. 2729-2732, set. FapUNIFESP (SciELO). 2013.

BASSO, Lissia Ana; WAINER, Ricardo. Luto e perdas repentinas: contribuições da


Terapia Cognitivo-Comportamental. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas. Rio
de Janeiro , v. 7, n. 1, p. 35-43, jun. 2011 . Disponível
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56872011000100007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 25 set. 2022.

ENUMO, S. R. F e LINHARES, M. B. M. Contribuições da Psicologia no contexto da


Pandemia da COVID-19 sessão temática. Estudos de Psicologia (Campinas), 37,
e200110. 2020.

FRANCO, Maria Helena Pereira. Crises e desastres: a resposta psicológica diante


do luto. O Mundo da Saúde, São Paulo - 2012. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/artigos/mundo_saude/crises_desastres_resposta_psi
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GIAMATTEY, Maria Eduarda Padilha; FRUTUOSO, Joelma Tavares;


BELLAGUARDA, Lígia dos Reis; LUNA, Ivânia Jann. Rituais fúnebres na pandemia
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