Uma Revisão Sistemática Do Tratamento Da Esquizofrenia Monoterapia Vs Associação de Antipsicóticos
Uma Revisão Sistemática Do Tratamento Da Esquizofrenia Monoterapia Vs Associação de Antipsicóticos
Uma Revisão Sistemática Do Tratamento Da Esquizofrenia Monoterapia Vs Associação de Antipsicóticos
https://www.revistardp.org.br https://doi.org/10.25118/2763-9037.2023.v13.414
RESUMO:
Introdução: O tratamento farmacológico da esquizofrenia com a
associação de antipsicóticos é uma prática bastante comum, ainda que não
haja evidências científicas consolidadas que a fundamentem, tampouco
haja orientação nesse sentido, nas diretrizes de tratamento clínico.
Objetivo: Avaliar os benefícios e os riscos do uso da associação de
antipsicóticos em comparação ao uso de antipsicótico em monoterapia para
o tratamento de esquizofrenia. Metodologia: Foi realizada uma revisão na
literatura em busca de estudos científicos que comparassem o uso de
antipsicóticos em monoterapia com a associação de antipsicóticos para o
tratamento da esquizofrenia. Resultados: Na maioria dos estudos não
houve diferenças no controle de sintomas entre os grupos. No entanto,
observou-se menor frequência de reagudizações de sintomas e redução
das hospitalizações nos pacientes em tratamento com antipsicótico em
monoterapia. Além disso, houve menos efeitos adversos em pacientes com
essa opção terapêutica. A adesão foi menor com a troca do tratamento
com associação de antipsicóticos para antipsicótico em monoterapia.
Porém a mudança foi bem tolerada, sendo que, em quase todos os
pacientes, foram observados resultados favoráveis. Conclusões: O
tratamento da esquizofrenia e do transtorno esquizoafetivo com
antipsicótico em monoterapia apresenta um controle de sintomas
semelhante ao tratamento com associação de antipsicóticos. Entretanto,
em monoterapia é menor a ocorrência de efeitos colaterais, reagudizações
Antipsicóticos no tratamento da esquizofrenia
ABSTRACT:
Introduction: The pharmacological treatment of schizophrenia with the
association of antipsychotics is a very common practice, although there is
no consolidated scientific evidence to support this practice, not even some
guidance regard to the clinical treatment guidelines. Objective: To
evaluate the effectiveness and risks of using the combination of
antipsychotics comparing to using antipsychotics in monotherapy in the
treatment of schizophrenia. Method: A literature review was carried out in
search for scientific studies which compared the use of antipsychotics in
monotherapy with the use of antipsychotics in association for the treatment
of schizophrenia. Results: Most studies showed no differences in symptom
control between the groups. However, there was a lower frequency of
relapse of symptoms and a decrease in hospitalizations in patients treated
with antipsychotic monotherapy. In addition, there were fewer adverse
effects in patients with this therapeutic option. Adherence was lower when
switching from antipsychotic combination treatment to antipsychotic
monotherapy. However, the change was well tolerated and in almost all
patients favorable results were observed. Conclusions: The treatment of
schizophrenia and schizoaffective disorder with antipsychotic monotherapy
presents a symptom control like the treatment with combination of
antipsychotics. However, in monotherapy the occurrence of side effects,
relapses and hospitalization is lower. Therefore, this review emphasizes
that in clinical practice the pharmacological treatment of schizophrenia, as
well as schizoaffective disorder, should prioritize the use of antipsychotics
in monotherapy.
RESUMEN:
Introducción: El tratamiento farmacológico de la esquizofrenia con la
asociación de antipsicóticos es una práctica muy común, aunque no existe
evidencia científica consolidada que avale esta práctica, ni existen
orientaciones al respecto en guías clínicas de tratamiento. Objetivo:
Como citar: Bertoni RA, Leal FM. Uma revisão sistemática do tratamento
da esquizofrenia: monoterapia vs associação de antipsicóticos. Debates
em Psiquiatria, Rio de Janeiro. 2023;13:1-20.
https://doi.org/10.25118/2763-9037.2023.v13.414
Introdução
A esquizofrenia é um transtorno mental que acomete cerca de 0,3 a 0,7%
da população, cuja manifestação mais emblemática é a vivência de
sintomas psicóticos. Também é caracterizada por disfunções cognitivas,
comportamentais e emocionais. A apresentação clínica é bastante
heterogênea, existindo assim uma importante variação entre os quadros
clínicos dos doentes. Trata-se de uma doença crônica, associada a
importante disfunção social e profissional. Além disso, a esquizofrenia
aumenta o risco de suicídio, de forma que 20% dos acometidos atentam
contra a própria vida pelo menos uma vez. Seu diagnóstico é feito a partir
do reconhecimento de um conjunto de sinais e sintomas e da exclusão de
outras causas que justifiquem tais manifestações. [1-5, 16]
Objetivo
A presente revisão sistemática possui o objetivo de comparar o uso da
associação de antipsicóticos com o uso de antipsicóticos em monoterapia
para o tratamento de esquizofrenia, avaliando riscos e benefícios de
ambos.
Metodologia
Pesquisa
As bases de dados do PubMed, Lilacs e SciELO foram usadas para busca
de artigos científicos que comparassem o uso de associação de
antipsicóticos com antipsicótico em monoterapia para o tratamento de
esquizofrenia.
Resultados
Os dois estudos de Suzuki et al., assim como o de Kamei et al., tiveram
como intervenção a troca do tratamento da esquizofrenia de combinação
de antipsicóticos para antipsicótico em monoterapia em todos os pacientes,
avaliando as mudanças clínicas implicadas. As limitações do ensaio clínico
de Suzuki et al. foram a não aplicação de escalas clínicas para avaliação
dos efeitos colaterais, desenho de estudo naturalista (os resultados podem
ter sido influenciados pelas diferentes circunstâncias dos tratamentos) e
presença de viés de perda de seguimento (três pacientes). Já em ambas
as séries de casos, destacam-se a falta de grupo controle, amostra
pequena, não sendo representativa da população geral, e maior tendência
de relato apenas de casos bem-sucedidos (viés de amostragem) [18-20].
O estudo de Kamei et al. foi uma série de casos publicada em 2020, com
uma amostra de cinco pacientes com idade média de 30,2 anos, sendo três
do sexo masculino. Os participantes estavam em tratamento de
esquizofrenia com combinação de antipsicóticos em uma dose ≥ 600 mg
de dose equivalente de clorpromazina, sendo o número médio de
antipsicóticos em uso de 2,4 (2-3). Além da redução dos antipsicóticos até
atingir a monoterapia, foi feita também a diminuição dos medicamentos
Discussão
Nesta revisão foram analisados seis estudos que compararam antipsicótico
em monoterapia com antipsicóticos em associação para o tratamento da
esquizofrenia e transtorno esquizoafetivo, visando elucidar os riscos e
benefícios destas diferentes práticas, uma vez que a combinação de
antipsicóticos é frequente e sem fundamentação consolidada [8, 16, 21].
Desta forma, fica evidente que a monoterapia é uma opção com amplas
vantagens e que deve ser priorizada, inclusive em casos tratados
previamente com altas doses de antipsicóticos em associação. Contudo,
deve-se ter maior cautela na modificação do tratamento em casos estáveis,
como assinalado no artigo de Constantine et al., no qual deve haver
monitorização rigorosa dos sintomas e efeitos colaterais [18-23].
Conclusão
Tratamento da esquizofrenia com antipsicótico em monoterapia é
recomendado pela maioria dos protocolos clínicos, apresentando um
controle de sintomas igual ao tratamento com associação de antipsicóticos.
Reagudizações são mais frequentes e precoces nos pacientes em uso de
antipsicóticos associados e neste grupo é observada maior taxa de efeitos
colaterais. Além disso, a monoterapia parece reduzir a frequência das
hospitalizações. São necessários mais estudos que avaliem eficácia,
segurança, adesão ao tratamento e eficiência do uso de antipsicóticos em
associação. Assim, concluímos que o tratamento da esquizofrenia mais
recomendado é com antipsicótico em monoterapia.
Referências
17. Gallego JA, Nielsen J, De Hert M, Kane JM, Correll CU. Safety
and tolerability of antipsychotic polypharmacy. Expert Opin Drug
Saf. 2012;11(4):527-42.
https://doi.org/10.1517/14740338.2012.683523 - PMID:22563628
PMCID:PMC3384511
22. Essock SM, Schooler NR, Stroup TS, McEvoy JP, Rojas I, Jackson
C, Covell NH; Schizophrenia Trials Network. Effectiveness of
switching from antipsychotic polypharmacy to monotherapy. Am J
Psychiatry. 2011;168(7):702-8.
https://doi.org/10.1176/appi.ajp.2011.10060908 - PMID:21536693
PMCID:PMC3739691
Suzuki et al. [18] Constantine et al. [21] Essock et al. [22] Foster et al. [23] Kamei et al. [20] Suzuki et al. [19]
A clinical case series of
The risks and benefits of Effectiveness in
switching from
Revising polypharmacy switching patients with Effectiveness of Combination Switching from
antipsychotic
to a single schizophrenia or Switching from antipsychotic therapies: Antipsychotic
polypharmacy to
TÍTULO antipsychotic regimen schizoaffective disorder Antipsychotic an analysis from a Polypharmacy to
monotherapy with a
for patients with from two to one Polypharmacy to longitudinal pragmatic Monotherapy in Patients
second-generation agent
chronic schizophrenia antipsychotic medication: A Monotherapy Trial with Schizophrenia: A
on patients with chronic
randomized controlled trial Case Series
schizophrenia
ANO 2004 2015 2011 2017 2020 2004
Ensaio clínico
TIPO DE ESTUDO Ensaio clínico Ensaio clínico randomizado Ensaio clínico Série de casos Série de casos
randomizado
LOCAL Japão (Tóquio) EUA (Flórida) EUA (Connecticut) EUA (Flórida) Japão (Nagoia) Japão (Tóquio)
25 pacientes com
5 pacientes com esquizofrenia em
47 pacientes com
127 pacientes com esquizofrenia em tratamento com
esquizofrenia em 107 pacientes com
esquizofrenia ou tratamento com combinação de
tratamento com esquizofrenia ou transtorno 305 pacientes com
transtorno combinação de antipsicóticos com dose
AMOSTRA associação de esuquizoafetivo estáveis em esquizofrenia ou
esquizoafetivo em antipsicóticos com dose equivalente de
antipscióticos por > 6 tratamento com 2 transtorno esquizoafetivo
tratamento com 2 equivalente de clorpromazina > 1000
meses com a mesma antipsicóticos
antipsicóticos clorpromazina ≥ 600 mg/dia, por > 6 semanas,
combinação
mg/dia sem controle sintomático
adequado
24 semanas (após 12 semanas (após
TEMPO DE
transição completa 1 ano 6 meses 30 meses Não relatado transição completa para
SEGUIMENTO
para monoterapia) monoterapia)
Divisão dos pacientes
pelo uso de: combinação
de antipsicóticos (n=50), Troca do tratamento da
Randomização dos Troca do tratamento da
Randomização dos antipsicótico injetável de esquizofrenia de
Troca do tratamento participantes entre esquizofrenia de
participantes entre longa-ação (n=20) ou combinação de
da esquizofrenia de continuar com a combinação de
continuar com a antipsicótico oral em antipsicóticos para
combinação de combinação de antipsicóticos para
INTERVENÇÃO combinação de 2 monoterapia (n=206), antipsicótico em
antipsicóticos para antipsicóticos (n=62) antipsicótico em
antipsicóticos (n=52) ou renadomizados monoterapia
antipsicótico em ou mudar para monoterapia
mudar para 1 antipsicótico posteriorente para *Outros psicotrópicos
monoterapia antipsicótico em *Outros psicotrópicos
em monoterapia (n=52) receber antipsicótico oral foram também
monoterapia (n=65) foram também reduzidos
de segunda geração ou reduzidos
antipsicótico injetável de
longa-ação
Suzuki et al. [18] Constantine et al. [21] Essock et al. [22] Foster et al. [23] Kamei et al. [20] Suzuki et al. [19]
BPRS, DIEPSS, SAI-J e
GAF e CGI – SOI e GI DAI-10
PANSS, CGI, AIMS, SAS e PANSS, AIMS, SAS,
*Também foram *Também foram
EAB ASEX e Subjective Side
ESCALAS DE avaliados avaliados
*Também foram avaliados Effect Rating Scale BPRS GAF e CGI – SOI e GI
AVALIAÇÃO CLÍNICA subjetivamente os subjetivamente os
IMC, PA, HbA1c e perfil *Também foi avaliado
sintomas e efeitos sintomas, efeitos
lipídico IMC
colaterais colaterais e a satisfação
do paciente
- Piora dos sintomas com a - Ausência de diferença - Maior controle da
- Doença se manteve
monoterapia; entre os grupos na doença após troca para
estável após a troca;
- Redução dos efeitos psicopatologia, efeitos monoterapia no grupo de - Melhor controle da
- Redução de efeitos
- Doença se manteve colaterais extrapiramidais adversos sexuais, combinação de doença após a troca;
RESULTADOS colaterais;
estável após a troca. com a associação; extrapiramidais ou antipsicóticos; - Redução de efeitos
Ausência de redução da
- Ausência de diferença discinesias; - Menos reagudizações e colaterais.
aderência ao
entre os grupos no IMC, PA, - Perda de peso com a hospitalizaçãos no grupo
tratamento.
HbA1c e perfil lipídico. monoterapia. da monoterapia.
Ausência de diferença Menor número no grupo Menor duração da
HOSPITALIZAÇÕES Não avaliado Não avaliado Não avaliado
quanto ao número AO internação
Maior frequência e Inalterada com a
DESCONTINUIDADE Maior frequência na
Não avaliado menor tempo na Não avaliado mudança para Não avaliado
DO TRATAMENTO monoterapia
monoterapia monoterapia
Legenda: GAF - Escala de Avaliação Global do Funcionamento; CGI - Escala de Impressão Clínica Global;
SOI - Severity of Illnes; GI - Global Impression; PANSS - Escala das Síndromes Positiva e Negativa;
AIMS - Escala de Movimentos Involuntários Anormais; SAS - Escala de Efeitos Extrapiramidais de Simpson e Angus;
EAB - Escala de Acatisia de Barnes; ASEX - Escala de Experiência Sexual do Arizona; BPRS - Escala Breve de Avaliação
Psiquiátrica; DIEPSS - Escala de Sintomas Extrapiramidais Induzidos por Drogas; SAI-J - Schedule for Assessment of
Insight; DAI-10 - Drug Attitude Inventory-10 Questionnaire; IMC - Índice de Massa Corporal; PA - Pressão Arterial