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CAPS e Internamento Involuntário

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O funcionamento do CAPS e internamento involuntário

Para uma melhor percepção do que é o caps e sua funcionalidade atual no país
podemos trazer algumas definições referenciadas como:
Hoje os CAPS são o “carro-chefe” da Reforma Psiquiátrica, diferenciando-se do
manicômio pela qualidade de suas respostas e dependência de toda a rede (Miranda,
Oliveira & Santos, 2014).
Tem como objetivo ofertar cuidado para as pessoas com transtornos mentais, de
forma territorial, visando à organização da rede de serviços de saúde mental, a
construção de projetos terapêuticos singulares, o suporte à saúde mental na Atenção
Básica e unidades hospitalares, entre outras atividades. Sempre em busca de um
modelo que priorize a reabilitação e a reintegração psicossocial do portador de
transtorno mental e dependência química, mediante acesso ao trabalho, lazer,
exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares (Ministério da
Saúde, 2004; Luzio & Yasui, 2010).

Os movimentos das reformas psiquiátrica e sanitária ocorreram no Brasil em


paralelo, tiveram seu início na década de 1970 e trouxeram como propostas
fundamentais mudanças no modelo de atenção à saúde, equidade e participação dos
usuários e trabalhadores no processo de gestão. Os Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS) surgiram, no Brasil, na década de 1980, e foram regulamentados em 1992
através da Portaria MS 224/921 com vistas a garantir um cuidado de base territorial e
serem serviços substitutivos aos hospitalares, oferecendo cuidado intensivo ao
portador de sofrimento psíquico2.

A Política Nacional de Atenção Básica teve como estratégia prioritária para


expansão e consolidação a Saúde da Família3, que inclui o cuidado às pessoas com
transtorno mental. Na população adulta, a prevalência de transtornos mentais é alta –
uma revisão sistemática brasileira encontrou valores entre 20% e 56%, com
acometimento principal em mulheres e trabalhadores 4. Considerando não somente a
frequência, mas também a evolução longitudinal destas doenças, conclui-se que são
um dos principais contribuintes para a carga de doença total em nível mundial5.

Em 2011 houve importantes alterações no SUS com o estabelecimento da


estratégia das Redes de Atenção à Saúde, tendo a Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS) como uma das prioritárias. Este status proporcionou o maior investimento
financeiro, na ordem de 200 milhões de reais, tanto para custeio da rede existente
como para melhoria dos serviços já existentes6.

À medida que políticas públicas são implementadas, são necessários estudos de


avaliação de implantação e efetividade dos serviços, assim como o desenvolvimento
de índices e taxas que permitam esta análise. Apesar da relevância, são escassas as
pesquisas que avaliam a efetividade dos serviços substitutivos às instituições
1
manicomiais. Alguns estudos que relacionaram a implantação de CAPS e seus
efeitos nas internações psiquiátricas encontraram resultados divergentes; por vezes
encontrando uma associação positiva entre implementação de CAPS e outros
componentes da RAPS e queda do número de internações; por vezes não obtendo
qualquer associação7-11.

Outro fator que necessita ser considerado na relação internamentos e caps pois
pode influenciar o número de internações psiquiátricas, é a disponibilidade de leitos
de internação. No Brasil, houve redução do número de leitos disponíveis para
internação psiquiátrica de 51.393 em 2002 para 32.284 em 2011. Esta queda é
compatível com os preceitos da Reforma Psiquiátrica 12. Estudo de Fagundes mostra
redução de aproximadamente 2.400 leitos psiquiátricos no município do Rio de
Janeiro nos últimos quinze anos; no mesmo período, as internações foram reduzidas
de 42.762, em 2002, para 20.404, em 201213

A realidade do processo de internamento no CAPS baseado em entrevista


com profissional psicólogo que atua na instituição

Segundo o psicólogo do CAPS, muitas vezes é percebida a necessidade do


internamento como uma ferramenta de última instancia. O profissional afirma que
eles tentam de todas as formas manejar o caso do quadro sem precisar internar.
Muitas vezes acontece que a pessoa chega no atendimento já demandando de um
internamento. Expressando da seguinte forma "Eu quero um internato".

Conforme o psicólogo explicou "Ele está naquele mundo bem agudo, bem
compulsivo. Daí chega aqui e quer um internato. A gente fala, olha, vamos com
calma. Como é que está a situação? A gente vai propondo estratégias para que não
precise internar, por exemplo, fica em acolhimento de olho, fica aqui com a gente
durante o dia, qual o horário que é pior para você, e a gente acompanha aqui, inicia a
medicação, e vamos fazendo o possível"

Com relação a dinâmica de trabalho ao longo dos internamentos o psicólogo


explica que quando ocorrem internamentos, ele é realizado pelo hospital, e os
psicólogos não ficam lá durante toda a estadia. Chega no fim da tarde, ele fecha e vai
embora. Já sobre a questão da estadia do paciente, tem pacientes 24 horas internados,
e quando precisam internar, a gente sempre prioriza um leito num CAPS.

Com relação a utilização dos leitos, o psicólogo informa que "Então, a gente
empresta um leito. A gente não tem leito, mas a gente tem um paciente que demanda.
Então a gente entra em contato com a central, que regula os leitos, fala que gostaria
2
de um leito para um paciente, explica o caso da demanda de um leito de CAPS
Porque o leito de CAPS, a gente precisa que o paciente seja voluntário, seja
voluntário de internamento, que seja de sua vontade ir para uma casa como um
hospital psiquiátrico, porém que ele vai dormir lá, vai participar das oficinas muito
mais tranquilo que um hospital psiquiátrico, né? Só que fica menos tempo também.
Uma, duas semanas, às vezes dez dias, né? Só que tem que ser voluntário. Ou, às
vezes, precisa fazer um internamento involuntário. Então, tem gente desorganizada,
tem críticas sobre a própria vida, se colocando em situações de risco. A família vem,
traz isso, a gente encontra o que realmente está desorganizado e baseado nas
circunstâncias vamos precisar fazer um internamento involuntário."

Com relação ao internamento involuntário o psicólogo explica que: "Às vezes a


gente vai por aqui, passa pelo médico, a gente tenta já iniciar a medicação, abaixar
um pouquinho, compartilha isso com a família, porque a família precisa assinar,
então a gente precisa assinar por esse internamento. Muitas vezes eu disse também
assim, porque tem consequências isso também, né, da família bancar esse
internamento, depois, diante do usuário, isso acaba tendo Algumas situações
familiares para que seja definido o internamento, a explicação quanto ao prazo de
estadia etc. E daí saem voluntários por aqui. Quando já não saem aí por uma hora
para que o internamento se concretize, por questões familiares ou relacionadas a
disponibilidade do leite, a gente tem a unidade de estabilização do perinatal. A
unidade de estabilização psiquiátrica, ela surgiu durante a pandemia. Então lá como
uma alternativa o paciente, como é um lugar fechado, bem fechado, fica ao mínimo
de tempo possível. Dois, três, no máximo cinco dias. Não dá para ficar mais disso. E
daí aguarda, porque nem sempre sai o leite no mesmo dia, sabe? Então a gente pede
um leito, num hospital não tem. Não tem como essa pessoa ir para casa, não tem
como ir para outro, chegar e evadir. Então daí vai para essa unidade de estabilização,
para estabilizar mesmo essa crise que está muito avançada naquele dado momento
assim, enquanto aguarda esse leito em hospital psiquiátrico. Muitas vezes acontece
de estabilizar, mas não precisa ir para leito integral. Daí volta para a gente de novo e
a gente dá um dia."

Conclusão quanto ao processo de internamento involuntário no CAPS


segundo as informações obtidas em entrevista com o psicólogo do CAPS

Com base nas afirmações do psicólogo é perceptível que um grande problema dos
internamentos do CAPS não se dá apenas pelo alto volume de pacientes em estado de
gravidade avançada de suas doenças mentais ou de dependência química, mas sim da
infraestrutura e disponibilidade de absorção dessas pessoas pelo próprio CAPS. Além
disso, é notório que os pacientes suscetíveis ao internamento involuntário estão em
estado de risco a si mesmo ou a qualquer público seja familiar ou outros e também
3
para determinar seu internamento demandam de uma clausula onde os familiares,
médicos e envolvidos do CAPS definam o processo, diferente do internamento
voluntário onde o paciente tem livre arbítrio para concluir sua estadia.

Referências
1
Brasil. Portaria n° 224, de 29 de janeiro de 1992 da Secretaria Nacional de
Assistência à Saúde do Ministério da Saúde (MS). Diário Oficial da União 1992; 30
jan.
2
Souza AR, Guljor APF, Silva JLL. Refletindo sobre os centros de atenção
psicossocial. Av Enferm 2014; 32(2):292-298.
3
Brasil. Ministério da Saúde (MS). Política Nacional de Atenção Básica Brasília:
MS; 2012.
4
Santos EG, Siqueira MM. Prevalência dos transtornos mentais na população
adulta brasileira: uma revisão sistemática de 1997 a 2009. J Bras Psiquiatr 2010;
59(3):238-246.
5
Hyman S, Chisholm D, Kessler R, Patel V, Whiteford H. Mental Disorders. In:
Jamison DT, Breman JG, Measham AR, Alleyne G, Claeson M, Evans DB, Jha P,
Mills A, Musgrove P. Disease Control Priorities in Developing Countries Nova
York: Oxford University Press; 2006. p.606.
6
Brasil. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção
Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades
decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de
Saúde (SUS). Diário Oficial da União 2013; maio 2013.
7
Tomasi E, Facchini LA, Piccini RX, Thumé E, Silva RA, Gonçalves H, Silva SM.
Efetividade dos centros de atenção psicossocial no cuidado a portadores de
sofrimento psíquico em cidade de porte médio do Sul do Brasil: uma análise
estratificada. Cad Saude Publica 2010; 26(4):807-815.
8

4
Henna ES, Abreu LC, Ferreira Neto ML, Reis AOA. Rede de atenção à saúde
mental de base comunitária: a experiência de Santo André. Rev Bras Crescimento
Desenvolv Hum 2008; 18(1):16-26.
9
Gastal FL, Leite SO, Fernandes FN, Borba AT, Kitamura CM, Binz MAR,
Amaral MT. Reforma psiquiátrica no Rio Grande do Sul: uma análise histórica,
econômica e do impacto da legislação de 1992. Rev Psiquiatr RS 2007; 29(1):119-
129.
10
Morais MLS, Feffermann M, Fernandes M, Figueiredo R, Paula SHB, Venancio
SI. Um estudo avaliativo das ações de saúde mental no estado de São Paulo. Saúde
Debate 2009; 33(81):112-128.
11
Silva JPL. A desinstitucionalização e o processo de reformulação da assistência
psiquiátrica no Rio de Janeiro no período 1995-2000: Monitoração de resultados de
uma política pública utilizando dados de inquérito epidemiológico associados a
registros administrativos [dissertação]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2003.
12
Brasil. Ministério da Saúde (MS). Saúde Mental em Dados ‐ 10, ano VII, nº 10.
Informativo eletrônico Brasília: MS; 2012.
13
Fagundes Júnior HM, Desviat M, Silva PRF. Reforma Psiquiátrica no Rio de
Janeiro: situação atual e perspectivas futuras. Cien Saude Colet 2016; 21(5):1449-
1460.

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