Dissertação - NORMALIZADA Paula Travancas
Dissertação - NORMALIZADA Paula Travancas
Dissertação - NORMALIZADA Paula Travancas
Rio de Janeiro
2017
Paula Rozenberg Travancas
Rio de Janeiro
2017
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CEH/A
es CDU 316.77
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
dissertação, desde que citada a fonte.
___________________________________ _______________
Assinatura Data
Paula Rozenberg Travancas
Banca Examinadora:
_______________________________________________________
Profa. Dra. Cíntia SanMartin Fernandes (Orientadora)
Faculdade de Comunicação Social – UERJ
_______________________________________________________
Prof. Dr. João Luis de Araújo Maia
Faculdade de Comunicação Social – UERJ
_______________________________________________________
Prof. Dr. Micael Maiolino Herschmann
Escola de Comunicação – UFRJ
Rio de Janeiro
2017
DEDICATÓRIA
A meus pais,
por tudo.
AGRADECIMENTOS
A meus pais, pelo amor e apoio incondicionais, especialmente nos momentos em que
eu mais preciso. Eu não poderia inventar pais melhores mesmo se eu tentasse. À minha mãe,
Riva Rozenberg, por sempre saber ir me guiando de mansinho pro caminho que eu quiser. A
meu pai, Paulo, cuja mente sui generis me municiou do léxico e da curiosidade que
permitiram buscar um caminho em meio às palavras.
A meu irmão, Simon, pelo ânimo indomável e pela tenacidade inabalável que
reverberam nas paredes de casa e ecoam no meu coração (metafórico, é claro). E pela chatice.
A Rodrigo Estevam, meu eterno companheiro e melhor amigo, cujo amor, dedicação e
infinita paciência estão por trás de cada palavra dessa dissertação.
A minha avó Billa, por ser uma mulher inspiradora e por sempre me querer tão bem.
A minha orientadora e amiga, Cíntia Sanmartin Fernandes, por ter me mostrado que
toda pesquisa é feita tanto de encontrar caminhos como de nos perder neles, tanto de dados
que colhemos como das relações que semeamos. Sua presença calorosa radia tão intensamente
que me admira que ela consiga enxergar tão bem o cintilar dos mais delicados vagalumes.
A Leila, cujo carinho supera os laços de sangue, por me entender e me mostrar que há
como viver e prosperar no território que só pessoas como nós habitamos.
A Vitor “Tensai” Nascimento e Arthur “Art” Montoya, por me provarem todo dia que
o virtual é muito real sim, senhor, e que palavras numa tela e memes bobos podem se
transformar em amizade, afeto e presença.
Ao meu primo Dan, que infelizmente nos deixou (para ir morar nos Estados Unidos),
mas cujo humor inigualável que nunca deixará de fazer parte de quem eu sou. E por um dia
ter dito “Ei, Paula, já ouviu falar num negócio chamado ‘animê’?”.
RESUMO
Travancas, Paula Rozenberg. Mais que eventos de animê: da cultura pop japonesa à cultura
pop mundial. 2011. 143f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) – Faculdade de
Comunicação Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.
Palavras-chave: Eventos de Cultura Pop. Eventos de Animê. Otakus. Geeks. Tribos Urbanas.
ABSTRACT
Travancas, Paula Rozenberg. More than Anime Conventions: from Japanese pop cultura to
Global pop culture. 2011. 141 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) – Faculdade
de Comunicação Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.
Keywords: Pop Culture Conventions. Anime Conventions. Otaku. Geek. Urban Tribes.
LISTA DE FIGURAS
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
1
Extraído de trecho do programa Globo Repórter, de 1996, encontrado online, disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=tosgSltAE6M
2 Filmes ou séries de efeitos especiais com atores reais, normalmente sobre super-heróis, monstros e robôs.
Alguns dos tokusatsu de sucesso no Brasil foram National Kid, Jaspion, Changeman e Ultraman.
11
posteriormente, de mangás. Ainda assim, não eram muitas as pessoas que sabiam dessas redes
alternativas de consumo, e menos ainda tinham o hardware e os conhecimentos técnicos para
baixar e fazer rodar animês no computador. Havia ainda menos pessoas que obtinham,
traduziam e disponibilizavam o material online, procedimentos que exigiam ainda mais know
how tecnológico e social.
Devido a todos esses percalços para ter acesso aos animês, os otakus da década de
1990 se organizavam em clubes e promoviam exibições de animê, que também serviam como
lugar para conhecer outros fãs da cultura pop japonesa. Tais exibições deram origem aos
eventos de animê, encontros que passaram a oferecer, além das sessões de desenhos animados
e tokusatsu, outras atrações como “estandes” (na verdade, incialmente, apenas mesas
vendendo produtos) e shows de bandas tocando músicas de tokusatsu e animê
(CAVALCANTE, 2008).
De encontros de algumas centenas de pessoas, esses eventos cresceram e se
multiplicaram, passando a ocorrer com regularidade em todo o país. O Anime Friends, maior
evento do gênero na América Latina, chega a atrair mais de 100 mil pessoas em seus seis dias
de programação (MACHADO, 2009). Mas desde o Mangácon de 1996, considerado o
primeiro evento de animê “propriamente dito” do Brasil e não mais apenas uma sessão de
exibição de animê, houve mudanças não só quantitativas como também qualitativas nos
eventos, as quais se relacionam aos modos de consumir animês e mangás, à sua popularização
e status de mainstream, além de vários outros fatores que daí decorrem.
Não existem dados sobre a quantidade de eventos no país, mas Sérgio Peixoto, criador
e organizador do Animecon, evento que foi por anos o maior do Brasil e de fundamental
importância no estabelecimento da fórmula dos eventos de animê, estima que
Sérgio Peixoto: Nós devemos ter uma média de 200 a 300 eventos que acontecem
em todo o Brasil [...] que se dizem para fãs de anime e mangá ou correlatos. Se a
gente for incluir correlatos, por exemplo, encontros de fãs de Star Wars, encontros
de fãs quadrinhos, encontros de fãs de RPG, que na verdade todos eles acabam
usando quase que a mesma estrutura que havia no Animecon, a gente passa de 500
(dito no podcast SANTOS et al., 2016a).
Ainda segundo Peixoto, apenas os dez maiores eventos do país reúnem cerca de 10 a
30 mil pessoas, com os demais eventos todos atraindo um público entre mil e 5 mil pessoas.
Já o press release do Anime Friends afirmam que, em 2016, o evento paulista teve um
público de 120 mil pessoas (FDCOMUNICAÇÃO, 2016a), enquanto os dados oficiais do
evento cearense SANA são de que
12
Durante três dias, mais de 70 mil pessoas visitaram o festival, que aconteceu no
Centro de Eventos do Ceará, em Fortaleza. A próxima edição do evento acontecerá
em janeiro de 2016.
O evento movimentou R$ 6 milhões na cidade, gerando por volta de 530 empregos
diretos e indiretos. Cerca de um terço dos visitantes vieram de outros estados do
Nordeste (FDCOMUNICAÇÃO, 2016b).
A história da relação dos brasileiros com a cultura pop japonesa e dos eventos de
animê que daí surgiram e se modificaram são mais do que tema de pesquisa para mim, já que
vivi diversos desses acontecimentos, como fã de animês e mangás de longa data. Nas
próximas seções, esclareço o papel da cultura pop japonesa na minha trajetória de vida e de
que modos meus conhecimentos prévios e envolvimento emocional com o universo
pesquisado contribuíram para os rumos da presente investigação.
Era uma quinta-feira nublada no bairro da Liberdade, em São Paulo, e eu estava numa
livraria japonesa rodeada de pessoas que eu tinha conhecido na noite anterior, na rodoviária
do Rio de Janeiro. Todos olhavam admirados os seus velhos conhecidos mangás, só que em
sua encarnação “original” japonesa3. Ao verem os títulos, comentavam com os novos amigos
quais já tinham lido, de quais gostavam, pegavam um ou outro para olhar por dentro.
Resolvi então procurar “o” mangá, aquele que é especial pra mim, que marcou minha
adolescência. Encontrei o número 13 de Neon Genesis Evangelion, edição que encerrava a
história, um belíssimo encadernado com letras prateadas na capa. Abri o livro cuidadosamente
para não danificar a lombada, mas eu não esperava os flyers de propagandas em japonês
soltos no meio, que quase caíram. Os anúncios da época em que o mangá saiu no Japão
situavam-no no tempo e faziam-no parecer tão “autêntico”, como se eu segurasse um
microrrecorte tempo-espacial do Japão materializado. Hesito admitir que meus olhos ficaram
marejados (afinal, isso é conduta de pesquisadora?), mas foi o que escrevi em meu caderno de
campo.
Só de curiosidade, olhei a lista de preços, indicada por bolinhas coloridas coladas na
lombada de cada livro. Afinal, que razão em sã consciência eu teria para comprar um livro
3
Mangás são editados primeiro um capítulo por vez em revistas semanais que publicam várias histórias
diferentes ao mesmo tempo (INGULSRUD, ALLEN, 2009). Como será visto no capítulo 1, só depois de ter
sobrevivido à constante ameaça do cancelamento uma série de mangá é compilada em edição própria.
13
que, apesar dos meus dois anos de curso de japonês, eu não tinha nenhuma possibilidade de
conseguir ler? A cor da bolinha indicava que eu teria, hipoteticamente, que desembolsar
R$40,00 para levar o mangá comigo para o hotel em que a caravana estava hospedada.
Devolvi-o para a estante, convencida de que eu não tinha nenhum motivo “real” para querer
adquirir aquele encadernado. Continuei olhando os mangás e conversando com meus colegas
de caravana.
Logo me vi gravitando novamente para a estante onde estava Evangelion. Tirei o livro
da estante e coloquei-o novamente mais algumas vezes. Consultei meus recém-conhecidos
companheiros de jornada sobre a possível compra que eu não queria admitir nem para mim
mesma que estava considerando, enquanto uma integrante da minha caravana entregava
decidida ao caixa um artbook4 de Cavaleiros do Zodíaco que lhe custou uns bons R$200,00.
A resposta que recebi foi algo como “se Evangelion é importante para você, leva!”, afinal não
é todo dia que encontramos mangás japoneses no Brasil. Além disso, estávamos na Liberdade,
a “meca otaku” do país, numa caravana para ir ao Anime Friends, maior evento de animê do
Brasil, não havia uma combinação melhor de pretextos para gastar com esse tipo de coisa.
Evangelion 13 em japonês está guardado no meu armário, protegido pelo saquinho de
papel da livraria, afinal não posso deixá-lo ao ar livre pegando poeira. Admito que o folheei
poucas vezes desde então, mas as miniaturas (várias vezes mais caras!) que adquiri no eventos
adornam minhas estantes com orgulho. Mas o mangá, primeira coisa que eu comprei na
viagem, quebrou minhas resistências de uma maneira que eu não esperava. Afinal, tenho
assistido poucos animês e lido poucos mangás nos últimos tempos, então me acreditava
emocionalmente distanciada de seus apelos. Além disso, aquela não era minha primeira vez
no bairro da Liberdade e nem naquela livraria (tinha sido eu que guiara a caravana até o
estabelecimento), mas sozinha eu nunca pensara em comprar um mangá que não sabia ler.
Naquele momento, vivenciei toda a força da nostalgia e a sensação inebriante de legitimação
proporcionada pelo sentimento de pertença a uma tribo (MAFFESOLI, 1987).
4
Livro contendo imagens e fotos em alta qualidade
14
Esse foi um dos momentos marcantes de ida a campo, não só no âmbito pessoal, mas
como experiência de contato com meu “objeto” de pesquisa, que naquele momento era eu
mesma. Aprendi muito naquela viagem, partindo do “olhar domesticado” (OLIVEIRA, 1996)
de pesquisadora, que nunca vai a campo inocentemente, sempre já observando as interações a
partir das lentes da teoria. A reflexão posterior sobre minha reação àquele mangá me fez ver
que ela ilustra bem vários dos temas importantes desta pesquisa, que só foram se delineando
mais claramente no decorrer da mesma.
Pude sentir na pele o poder afetivo do consumo, que evocou em mim memórias e
apelou à minha nostalgia, fazendo com que eu experimentasse uma vinculação afetiva a um
objeto. Presenciei também a capacidade da tribo de potencializar emoções, gerando um
contágio afetivo grupal, que me permitiu rapidamente ficar íntima de desconhecidos com
interesses compartilhados. Percebi ainda que, por mais que acreditasse não ter nenhum tipo de
deferência especial com o Japão, ainda assim me descobri movida por alguma medida de
adoração ao original japonês, que estaria um patamar acima do mesmo mangá editado na
minha língua nativa.
É sintomático ainda que essa e outras das minhas experiências mais intimamente
relacionadas à cultura pop japonesa “em si” tenham acontecido fora do evento, reforçando o
fato de que eles estão se afastando dos mangás e animês, que um dia foram o cerne da
experiência que proporcionavam.
Essa ocasião que relatei foi também uma verdadeira “travessia do limiar”, para Joseph
Campbell (2007) no meu percurso afetivo-intelectual de pesquisa. Foi quando saí da mera
observação, como tinha feito sozinha nos eventos do Rio e me tornei uma observadora
15
uma interpenetração com os eventos de cultura pop japonesa, com atividades e frequentadores
de um entremeando-se com os do outro (SASAKI, 2013). Lembro que, em um desses
festivais, ao lado das exibições de origami e ikebana 5 , havia uma televisão passando
episódios de Naruto.
Continuei vendo animês, lendo mangás, jogando videogames e indo a eventos no Rio
de Janeiro, como o Anime Family e Rio Anime Club, mas nunca fui uma ávida frequentadora
(que eu me lembre). Fui esporadicamente a eventos até mais ou menos os meus 20 anos, mas
continuei consumindo cultura pop japonesa mesmo depois de perder interesse nos eventos.
Em 2013 comecei a fazer aula de japonês, que acabei abandonando um pouco depois
de ingressar no mestrado. Mas com o tempo fui ficando “menos otaku”, vendo menos animês
e lendo menos mangás que antes. Meus interesses “de otaku” foram se tornando menos
centrais na minha vida, tornando-se menos “algo especial” como um dia tinham sido.
Por isso o título dessa seção, confissões de uma (ex?-)otaca. É um trocadilho com a
palavra “otaka”, corruptela do termo “otaku” que alguns fãs de animê brasileiros usam para se
referir de brincadeira ou pejorativamente a otakus do gênero feminino. “Otaca” com “c” e não
“k” em referência a Henry Jenkins (2006), um dos “padrinhos” dos estudos de fãs. Jenkins
reconhece a importância de o pesquisador de culturas de fãs declarar sua relação pessoal com
o objeto estudado. A introdução de seu livro Fans, bloggers and gamers (JENKINS, 2006)
intitula-se Confessions of na Aca/Fan, onde ele se diz tanto aca(dêmico) quanto fã. No
decorrer da minha pesquisa, passei a pensar em mim como “otaca”, otaku e acadêmica, por
meu status como mais ou menos insider, gostando de animês, mas menos que antes, e estando
afastada dos eventos há bastante tempo.
Escrevendo agora sobre o meu “passado otaku”, até me surpreendi com o peso que o
gosto pela cultura pop japonesa teve na minha vida. Eu chegara a me convencer de que nunca
tinha sido “tão otaku”, o que é uma reação muito comum a esse rótulo por parte dos fãs de
animação japonesa, como será apontado nesta dissertação. Mas ao rever minha trajetória,
desde minhas aulas de mangá às de japonês, não tenho como negar o meu envolvimento com
“coisas japonesas”. Minha relação com a cultura pop japonesa e mesmo meu posterior
afastamento dela se revelou como um dado que refletia as mudanças que eu descobriria nos
eventos e nos demais frequentadores.
5
Arranjos florais
17
Percurso afetivo-intelectual
“sociabilidade dos otakus nos eventos”. Mas o quê, qual delas? Isso não parecia fechar um
problema de pesquisa.
Eu não sabia como continuar, já que não havia nada específico sobre os eventos que já
não tivesse sido dito em outras pesquisas e que justificasse o estudo que eu estava fazendo
sobre eles. Pelo contrário, eles pareciam uma salada de várias atividades, pessoas e interesses
distintos convivendo em um mesmo lugar ao mesmo tempo. Não parecia haver nada que
unificasse tudo aquilo, nenhum tema subjacente, nenhuma “pequena grande narrativa” teórica
que me permitisse explicar tudo aquilo.
Sentia como se tivesse “perdido” meu objeto de pesquisa, como se aquilo que eu
tivesse ido buscar nos eventos quando os elegi como campo de pesquisa não existisse mais.
Como se eles tivessem se tornado algo diferente de quando eu os frequentava quando
adolescente. Ou como se talvez essa “inconsistência” sempre tivesse sido um aspecto dos
eventos, que na verdade eu só não tivesse percebido no papel de mera frequentadora
descompromissada, e agora eles me revelassem sua “verdadeira” e “confusa” face.
Foi refletindo sobre minha falta de conclusões parciais durante uma conversa com minha
orientadora que me dei conta de que todas aquelas “incoerências” que me deixaram desiludida
com o objeto de pesquisa ERAM conclusões parciais! E que diziam muito sobre hibridação, a
natureza fluida e cambiante das tribos, territorializações temporárias, modos de ser, de estar e
de pertencer.
Eu me impressionara com a ascensão do k-pop e das palestras de youtubers, que
pareciam ter acontecido nos anos em que estive afastada dos eventos. Outras mudanças nos
eventos, que eu presenciara durante a época em que era frequentadora, foram tão graduais que,
sem uma reflexão sistemática, nunca cheguei a me dar conta delas. A partir dessa dissonância
entre memória e atualidade do campo, novas questões tomaram forma. A atual
heterogeneidade de tribos e de atrações, além do aparente distanciamento atual dos eventos
em relação à cultura pop japonesa, levaram-me a pesquisar fotos e programações de eventos
passados, na tentativa de entender se os eventos sempre tinham sido como eram hoje e eu que
não me lembrava. Acabei, assim, pesquisando a distribuição espacial das atrações, o que se
tornou uma análise “histórica” sobre as mudanças nessa distribuição espacial com o correr dos
anos.
Na tentativa de localizar o “animê” dos eventos, percebi que ele nem estava lá, pelo
menos não da forma como eu esperava encontrar. Os eventos foram se tornando, para mim,
cada vez menos um meio para alcançar a relação entre animês e fãs, e cada vez mais um
objeto em si. Tomei-os como arranjos complexos, como entidades temporárias cuja unicidade
19
não se deixa reduzir à unidade (MAFFESOLI, 1987), como conjunto de relações entre
indivíduos, tribos, público, organização, comércio, afetos, realidades, imaginários.
A fórmula básica dos eventos parece à primeira vista ter se mantido a mesma nos
últimos 20 anos, se levarmos em conta sua estrutura básica de atrações no palco, atividades
para os frequentadores participarem e estandes vendendo produtos variados. Mas um exame
mais minucioso da programação desse tipo de convenção, além da fala de frequentadores
antigos e atuais, revela a complexidade do jogo de mudanças e permanências sobre o qual que
se debruça a presente dissertação, que tem como objetivo entender o que é um evento de
animê hoje, quem o frequenta e por quê. Para tanto, foram investigados os processos que
ocorreram ao longo do tempo para que chegassem à sua configuração atual e quais foram as
causas e consequências das mudanças identificadas.
Outro ponto de interesse foi compreender o que dá a liga aos eventos e qual é seu elã,
uma vez que já não servem ao propósito para o qual nasceram e parecem agregar muitos
gostos e atividades diferentes. E a esse propósito, foi uma preocupação importante contestar a
asserção comum de que os frequentadores dos atuais eventos de animê ainda podem ser
considerados otakus ou mesmo de fãs de cultura pop japonesa.
A hipótese que norteou essa investigação foi a de que eventos atuais oferecem maior
variedade de temas e públicos que os eventos antigos, mas que continuam sendo espaços de
sociabilidade entre fãs, onde eles sentem liberdade para expressar suas paixões. A suposição
mais ampla foi a de que as mudanças nos eventos de animê têm relação com as
transformações nos modos de consumo e engajamento dos brasileiros com a cultura pop
japonesa e com a cultura pop em geral
Estratégias metodológicas
O roteiro das entrevistas foi elaborado a partir das observações de campo e de questões que
emergiram ao longo da pesquisa. Foram realizadas ao todo 12 entrevistas, sendo dez delas
com frequentadores e duas com organizadores de eventos. As entrevistas com os
frequentadores foram feitas por chats online de texto, quatro das quais pelo aplicativo
Whatsapp e seis das quais pelo Messenger do Facebook, uma vez que é muito agitado e
barulhento nos eventos e as pessoas não querem perder o tempo limitado do evento dando
entrevistas longas. As entrevistas foram feitas pela internet dada a maior facilidade para os
entrevistados, alguns dos quais tinham pouco tempo, moravam longe de mim e só podiam
conversar à noite/de madrugada.
O chat de texto foi escolhido porque os entrevistados mostraram mais disponibilidade
e até mais conforto do que por softwares de conversa por voz. Todos tinham bastante
facilidade de se comunicar online, por serem jovens e por serem extremamente conectados, já
que fazem muito uso da internet para assistir animês, ler mangás e conhecer outros fãs.
Os otakus são considerados desde o princípio, seja no Japão ou no Brasil, como um
grupo com forte presença online, o que foi importante até para a formação do próprio fandom
ocidental de cultura pop japonesa. Os otakus japoneses estavam ligados aos produtos de
massa e à comunicação digital, sendo estereotipados como pessoas que se isolavam do mundo
em frente a uma tela de televisão ou computador. Os otakus não japoneses só se
estabeleceram como fandom6 porque sua atividade voluntária e não autorizada de tradução,
distribuição e circulação de animês ajudou a divulgar a cultura pop japonesa em seu país.
Argumenta-se que o próprio sucesso mundial dos animês e mangás só foi possível por causa
das tecnologias de informação e da organização e interconexão entre os fãs (NAPIER, 2007).
Conheci, abordei e conversei informalmente com todos os entrevistados ao vivo antes
de realizar as entrevistas online. Sobre o perfil dos entrevistados, sete deles conheci na
caravana partindo do Rio de Janeiro para o Anime Friends, dois eram pessoas do meu círculo
de amigos e um me foi indicado por conhecidos. Oito eram frequentadores de eventos e dois
eram ex-frequentadores. Quanto à cidade de residência, havia uma pessoa de Petrópolis, uma
de Nova Iguaçu, uma de Campos dos Goytacazes, uma de Belo Horizonte, uma de Juiz de
Fora e cinco do Rio de Janeiro. As idades variavam dos 18 aos 36 anos, sendo cinco dos
entrevistados homens e cinco mulheres.
6
O coletivo de fãs, de determinado “objeto”, seja de um gênero inteiro de produções (como a cultura pop
japonesa) ou de uma obra específica, é conhecido como fandom, junção de “fan” e “dom”, ou seja, território ou
domínio dos fãs.
21
7
Disponível em: http://gigiokdg.wix.com/loucosplay; http://www.animetokuvideos.com
8
Música pop japonesa
9
Música pop sul-coreana
10
Fantasia de personagem de animês, mangás, videogames ou de qualquer tipo de mídia de entretenimento.
22
entretenimento de nicho, que publicam textos e vídeos com as atividades, o ambiente dos
eventos e entrevistas com frequentadores e organizadores do evento.
A pesquisa de campo, apesar de não pretender esgotar todos os eventos do Brasil ou
mesmo da cidade do Rio de Janeiro, inspirou-se também na cartografia, modo de fazer
pesquisa que usa muitas das mesmas estratégias metodológicas da etnografia, entendendo que
é preciso perder o objeto para ganhar o processo (MARTÍN-BARBERO, 2004). A cartografia
“busca desenvolver práticas de acompanhamento de processos e para isso se desvencilha de
métodos rígidos que buscavam representar o objeto retirando-o de seu fluxo e separando-o do
sujeito” (AGUIAR, 2010, p. 6).
Tal abordagem mostrou-se relevante para um estudo sobre as metamorfoses dos
eventos e de suas tribos urbanas (MAFFESOLI, 1987), comunidades emocionais de
pertencimento fluido, agregações efêmeras que têm nos eventos de animê espaços de
enraizamento dinâmico para o compartilhamento de gostos e de emoções. A tribo otaku, as
demais tribos que se reúnem nos eventos e os próprios eventos estão em constante
transformação, em sua composição, em suas práticas e ritualidades, sempre em relação entre
si e com as mídias e imaginários a que se apegam.
A observação participante revelou-se um equilíbrio difícil de atingir, uma vez que
sempre há o estranhamento inicial por parte das pessoas que abordava com relação ao fato de
eu os estar pesquisando. Às vezes, foi preciso mostrar que eu era “uma deles” e que não
exporia nomes ou imagens sem autorização e nem “traçaria um perfil psicológico” deles, o
que de fato me foi perguntado.
Busquei criar rapport, ou seja, “um ambiente de naturalidade, confiança mútua e
interesse” (DUARTE, 2005, p. 72), com as pessoas com quem interagi, já que eles se
preocupavam, ao mesmo tempo em que brincavam, que escreveria sobre a “loucura” deles.
Pareciam acostumados a esse tipo de tratamento na mídia mainstream, que os mostra como
estranhos e infantis, como ficou claro para mim quando mencionaram, em outro contexto,
uma reportagem de 2007 no programa Fantástico 11 , em que os cosplayers entrevistados
sentiram-se usados para causar sensacionalismo em torno do caso de um casal de adolescentes
otakus que frequentavam eventos e que haviam fugido de casa juntos. A matéria ficou
marcada no meio como tendo ridicularizado e desmoralizado os otakus e a prática do cosplay.
11
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=QYZBIiSVv-Q#t=156
23
12
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=AFf61p4OqGM
24
realizar para abrir-se para seu objeto e permitir a atualização de suas virtualidades por meio da
pesquisa (AMADOR; FONSECA, 2009).
Esse tipo de percalço parece relacionar-se à própria natureza adaptável da pesquisa de
campo com inspiração na cartografia, que requer que o pesquisador não se distancie de seu
objeto, pois é no encontro entre pesquisador e processo pesquisado que se dá a produção do
conhecimento (AGUIAR, 2010). Não significa, no entanto, que não haja rigor metodológico,
apenas o reconhecimento de que o pesquisador não pode evitar alterar aquilo que pesquisa,
especialmente em um modo de pesquisar que não separa pesquisa de intervenção (PASSOS;
KASTRUP; ESCÓSSIA, 2009). Daí a importância do ethos cartográfico (TEDESCO, 2013),
que vai além da técnica ou do método, passando pela domesticação teórica do olhar do
pesquisador, que filtrará sua vivência pelo prisma teórico de que está equipado (OLIVEIRA,
1996).
À medida que a pesquisa foi tomando maior “profundidade histórica”, a análise
documental foi se tornando uma estratégia metodológica cada vez mais importante,
entendendo documento em sentido amplo, o que inclui registros online. Foi feita uma
triangulação de diversas fontes para dar conta dos diferentes aspectos dos eventos de animê,
dentre as quais: revistas especializadas da época do boom dos animês e início dos eventos,
entrevistas com organizadores de eventos disponibilizadas online, relatos em blogs pessoais
narrando experiências com eventos atuais e antigos, sessões de comentários de blogs
especializados, podcasts e comentários em redes sociais. Optou-se por preservar o anonimato
dos entrevistados, bem como o de autores de comentários em blogs e redes. Já os
entrevistados que são organizadores de eventos, os autores de blogs e os participantes de
podcasts serão identificados.
Para a pesquisa da história dos eventos de animê, foi utilizada a ferramenta Internet
Archive13, que permite visualizar versões antigas de sites da internet arquivadas em cache,
para visitar os sites dos eventos Mangácon (São Paulo, 1996-2000), Animecon (1999-2011),
Anime Friends (2003-presente), SANA (2001-presente) e Rio Anime Club (Rio de Janeiro,
2007-presente). Dessa forma foi possível consultar a programação e atividades oferecidas,
descrições e press releases de cada um desses eventos através dos anos. O site ainda ativo do
já extinto Animecon (que hoje é uma empresa dedicada a promover eventos de terceiros) foi
visitado e sua galeria de fotos dos encontros realizados desde 1999 até o seu fim foi analisada
13
http://archive.org/web
25
para que fosse possível vislumbrar a ambiência dos eventos de animê para além da mera
enumeração das atividades dos eventos através dos anos.
Desse modo, a dissertação foi estruturada em três capítulos. O primeiro capítulo do
presente trabalho oferece uma contextualização do surgimento da cultura pop japonesa, mais
especificamente mangás e animês, e de como esses produtos passaram a ser mundialmente
consumidos. É descrita também a origem do grupo social dos otakus e o que “otaku” veio a
significar fora do Japão. Por fim, trata do boom da cultura pop japonesa no Brasil, nos anos
1990, e como ele levou à criação dos eventos de animê.
O segundo capítulo abordará desde a chegada e a popularização das animações
japonesas ao Brasil às mudanças sofridas pelos eventos de animê, ilustrando seu surgimento
simples e bastante tímido como pequenas reuniões para exibições de animês até o status de
grades convenções com atrações internacionais e participação de milhares de visitantes.
Trataremos as transformações dos eventos de duas formas distintas, uma focada nas mudanças
em atividades dos eventos de maneira isolada e outra acompanhando as transformações dos
eventos de maneira mais ampla. Por fim, abordaremos o surgimento dos eventos geeks e sua
similaridade com os eventos de animê.
O último capítulo descreve as atividades dos eventos que envolvem a participação e
performance dos frequentadores, que constituem as diferentes tribos urbanas que lá se
encontram. Analisaremos também como seus corpos, roupas e modos de socialidade
compõem a territorialização temporária desses encontros. Por fim, trataremos das
heterogeinedades de opiniões dos frequentadores e de seu papel constitutivo do cimento do
estar junto que torna os eventos um todo coeso, mas sempre cambiante.
26
Shinji: Um mundo onde nada existe além de mim. Mas se sou só eu,
eu não posso interagir com nada. É como se eu estivesse aqui, mas na
verdade não estivesse.
Ritsuko: É normal, pois só você está aqui. Sem outros para interagir,
você não pode reconhecer a sua própria imagem.
Neon Genesis Evangelion
1.1 Mangás
quanto animês foi o kamishibai (teatro de papel), gênero performático em que o contador de
histórias usava cartões de papelão desenhados para contar uma história e garantir seu sustento
vendendo doces às crianças que vinham assistir à performance (STEINBERG, 2012).
Foi nessa época que a indústria do mangá, quase desmantelada e operando sob censura
durante a guerra, precisou se reinventar quase por completo. Ocorreu então o “renascimento”
das histórias em quadrinhos japonesas, gênese dos mangás como os conhecemos atualmente,
na qual a figura mais emblemática foi Osamu Tezuka, desenhista de mangá, animador e
empresário que entrou para a história como “deus do mangá”. Inspirado pelos comics, pelo
cinema, pelas animações ocidentais (especialmente as da Disney), credita-se a ele o posto de
criador dos mangás modernos, trazendo aos quadrinhos maior fluidez nos painéis,
enquadramentos de cenas cinematográficos ou mais próximos dos storyboards das animações
da Disney, além de ter introduzido maior dinâmica aos desenhos, dando a sensação de
movimento por meio de imagens estáticas (INGULSRUD, ALLEN, 2009).
Talvez um de seus maiores legados tenha sido sua maneira de desenhar os
personagens, com ar andrógino, traços simples e arredondados e olhos grandes e cheios de
reflexos, capazes de transparecer emoções, que se tornaram uma característica distintiva da
estética dos mangás e animês. Ele dizia ter se inspirado nos olhos muito maquiados das atrizes
do teatro Takarazuka, sua cidade natal. Independentemente de Tezuka ter ou não criado
sozinho essas técnicas, ele foi o responsável por juntar várias inovações que estavam surgindo
e agregar a elas elementos próprios, como seu estilo de desenho, e histórias interessantes com
personagens marcantes. Seu trabalho deu origem a um produto final que era familiar e
inovador o suficiente para se tornar um sucesso de público, influenciando gerações e gerações
de desenhistas de mangás e animadores (LUYTEN, 2000).
31
No final dos anos 1950, o sistema editorial de mangás sofreu uma importante
repaginação, quando se iniciou o boom das revistas semanais de mangá, instituindo um
formato de edição e publicação que ajudou a moldar o “caráter” dos mangás como mídia,
formato esse que dura até os dias de hoje.
Os mangás que conhecemos no Brasil são encadernados que compilam alguns
capítulos de uma única história, impressos com tinta preta sobre papel branco, numa
periodicidade que costuma ser mensal ou bimestral (CARLOS, 2011). Mas esse tipo de
edição equivale ao tankohon japonês, formato que só ganham as séries que sobrevivem à
aprovação dos leitores por algum tempo. A primeira vez que uma história em mangá é
publicada acontece em grossas revistas semanais ou quinzenais, impressas em papel jornal
tingido de diversas cores. Essas revistas não são de alguma história específica, e sim
publicações com alta segmentação de gênero, idade e interesses do público-alvo. Elas
serializam entre 20 e 30 histórias simultaneamente, que podem ser renovadas ou canceladas a
cada edição, dependendo da aprovação do público, que vota nos seus preferidos por meio de
um questionário que vem junto com a revista. As histórias que são canceladas abrem espaço
para novas séries dentre os muitos autores que estão sempre tentando emplacar uma nova obra,
já que as editoras constantemente recebem manuscritos novos (INGULSRUD, ALLEN, 2009).
Trata-se de um sistema editorial altamente exigente e desgastante para os autores (e
seus eventuais assistentes), que têm apenas uma semana para escrever, esboçar e desenhar um
capítulo, precisando receber a cada etapa a aprovação de seu editor. Esse é uma figura que
32
também tem grande envolvimento no processo criativo, tentando sempre ajudar os autores de
que está encarregado a escrever histórias que façam sucesso e se mantenham na volúvel lista
de renovações. Apenas depois da sobrevivência e sucesso de uma série é que ela é editada no
formato tankohon, compilando capítulos de uma única história em uma encadernação mais
nobre do que as baratas e descartáveis revistas semanais, das quais os japoneses se desfazem
após a leitura, assim como os brasileiros fazem com jornais diários.
Da esquerda para a direita: revista semanal de mangá, compilação, três formatos de edição de mangás no Brasil.
Fonte: CARLOS, 2009, p. 64.
1.2 Animês
As vendas dos mangás têm sofrido queda nos últimos 20 anos, o que não significa
necessariamente um fracasso para a indústria de entretenimento japonesa (INGULSRUD;
ALLEN, 2009). Os mangás fazem parte do media mix japonês, termo que se assemelha ao
conceito de convergência (JENKINS, 2006), em que produtos de uma mesma franquia
funcionam em sinergia, e não em competição com outras mídias e mercadorias que vendem
aqueles mesmos personagens e histórias em outros suportes. Marc Steinberg (2012) considera
que esse sistema de consumo interconectado entre diversos textos midiáticos, imagens e
produtos se estruturou mais organizadamente no país a partir da exibição daquele que é
considerado o primeiro animê propriamente dito, Tetsuwan Atomu (conhecido no Ocidente
como Astro Boy), em 1963, também pelas mãos de Osamu Tezuka.
33
Página do mangá (esquerda) e imagem do animê Tetsuwan Atomu, de Osamu Tezuka, 1952 e 1963,
respectivamente.
Fontes: MATHESON, 2009; POLAND, 2013.
O Japão já produzia animações curtas para o cinema e comerciais de televisão desde 1917,
mas não havia nenhuma animação seriada para a televisão, em parte porque os custos e o
tempo necessários para produzir vários episódios seriam exorbitantes. O método de animação
utilizado no país até então era o de full animation, empregado, por exemplo, pela Disney. No
Japão, há certa confusão acerca do termo animê, já que para o grande público, qualquer
desenho animado, independentemente de sua origem ou modo de produção, pode ser chamado
de animê. Mas para puristas como o diretor Hayao Miyazaki, famoso no Ocidente por seus
trabalhos em full animation, como A Viagem de Chihiro, seriam animês apenas as obras
criadas pelo processo limited animation, sistematizado por Osamu Tezuka (STEINBERG,
2012).
Tendo fundado sua própria empresa para realizar seu antigo sonho de animar, Tezuka
reuniu e aperfeiçoou diversas técnicas de limited animation, processo de animação utilizado
por estúdios como Hanna-Barbera, que ofereciam produtos finais que, para o “deus do
mangá”, deixavam a desejar. Tezuka e companhia utilizavam várias técnicas que reduziam o
número de desenhos necessários para completar um episódio de 25 minutos de Tetsuwan
Atomu, reutilizando desenhos de um banco de células e criando a sensação de ação a partir
dos ritmos da imagem parada e do súbito movimento, que dá a sensação de menor fluidez e
34
maior impacto do que o movimento da full animation. Muitas vezes eram apenas a voz e os
efeitos sonoros que conferiam a sensação de que algo estava acontecendo enquanto a tela só
exibia uma imagem parada, gerando críticas que afirmavam que o que Tezuka fazia nem
podia ser considerado animação. O próprio dizia que a série televisiva Tetsuwan Atomu era
mangá em movimento, mas que era sempre preciso tomar cuidado para que não virasse
apenas um kamishibai elétrico (STEINBERG, 2012).
Assim, o dinamismo cinematográfico da imagem parada do mangá, as técnicas
narrativas das performances de kamishibai e as restrições orçamentárias que levaram à
utilização do processo limited animation tiveram influência na conformação dos animês como
mídia. A relação do animê com o mangá, que os levaria a ser considerados “artes-irmãs”
(FARIA, 2008), não é a única conexão transmidiática que compõe o media mix japonês.
Tezuka inspirou-se em Walt Disney não só no estilo de seus personagens, mas também no
modelo de negócios baseado em fazer merchandising de outros produtos usando seus
personagens, o que foi importante para conferir rentabilidade a uma animação que era cara
mesmo com todas as restrições orçamentárias aplicadas, e que não pagaria seus custos apenas
com a venda do desenho para a emissora.
Esse modo de custeamento por meio de merchandising, que possibilitou o sucesso do
nascente media mix japonês (apesar de só ter vindo a ser chamado assim bem mais tarde)
ocorreu em consonância com as condições econômicas e culturais favoráveis do Japão da
época, que viveu nos anos 1960 um período de fortalecimento da indústria e grande paz e
prosperidade. Ocorria o chamado “milagre econômico” do Japão, que em poucas décadas
deixava de ser uma nação devastada e humilhada pela guerra e caminhava para se tornar uma
das maiores potências econômicas mundiais (BARRAL, 2000).
Em 1983, então, o colunista Akio Nakamori escreve para a revista Manga Burikko um
curto artigo em que usa pela primeira vez o termo “otaku”, antes meramente uma palavra que
significava “casa”, mas que também possuía valor semântico de pronome de 2ª pessoa, para
designar um grupo social relativamente novo. Tratavam-se de jovens, em sua maioria homens,
que tinham dificuldade de interagir com outras pessoas, preferindo viver cercados de
computadores, animês e miniaturas em vez de assumirem as responsabilidades da vida adulta.
Esses jovens usavam o termo “otaku”, polido demais para situações informais, para se dirigir
uns aos outros, talvez como forma de manter o distanciamento. Essa primeira instância em
que o rótulo é usado já é bastante pejorativa, o que fica claro pelo desdém de Nakamori em
relação a esses jovens, os quais descreve após uma visita ao Comiket, famosa feira de
fanzines de mangás:
Os rapazes eram todos ou pele e osso, como se fossem quase desnutridos, ou então
porquinhos guinchantes com rosto tão rechonchudo que as hastes de seus óculos
prateados corriam risco de desaparecer nas laterais da face; todas as garotas tinham
cabelos curtos e a maioria estava acima do peso, as pernas atarracadas como árvores
apertadas em longas meias brancas14 (NAKAMORI, 1983).
reforçou o estereótipo negativo associado aos otakus. Esses são alguns dos motivos pelos
quais,
De fato, poucos jovens no Japão vangloriam-se de serem eles mesmos otaku. Não é
um qualificativo que se ostente no peito. É muito mais um termo reservado a
terceiros, seja em tom de brincadeira, seja como reprovação, até mesmo insulto
(BARRAL, 2000, p. 28).
Assim como para os otakus japoneses, que buscavam nos produtos de entretenimento
nipônico, segundo Azuma (2001), uma pseudojaponesidade para substituir o vácuo deixado
por alguma japonesidade real que já teria se perdido, também os fãs brasileiros buscavam e
ainda buscam nos mesmos produtos certa essência de japonesidade. Uma característica
importante dos otakus ocidentais é a relação de reverência com o Japão e com quase tudo
aquilo que é japonês.
Os otakus valorizam muito a “autenticidade” do material que consomem, que deve ser
o mais próximo possível do original. Não obstante os processos de hibridação que originaram
e continuam modificando a tribo otaku brasileira e dos próprios animê e mangás como mídias,
os otakus brasileiros buscam aproximar-se de algum modo dessa essência japonesa,
exatamente porque é esse “diferencial” que os destaca das pessoas que não pertencem à tribo.
Essa busca de uma pureza nipônica espelha aquela da própria cultura otaku japonesa
(AZUMA, 2001).
Muitos otakus se interessam inicialmente por algum aspecto da cultura pop japonesa,
que lhes abre o leque de opções em relação a outros aspectos desse pop e, mais tarde, para
outros elementos do cotidiano e da “cultura tradicional” do Japão. Acabam querendo aprender
japonês, fazer lutas marciais japonesas e seu sonho é ir para o Japão.
acho que é bem essa a minha relação. a da idiota que vai pra inglaterra e CAÇA
asiáticos pra se relacionar. (sim, fiz mt esforço pra fazer parte do grupinho deles)
hahahaha. eu diria q é uma relação meio romântica sei lá. tipo, smp tive vontade de
conhecer o japao. e até por conta disso fui estudar japones. mas eu era criança e nao
38
sabia nd sobre o japao. o japao dos animês é mt bonito e acho que na prática nao é
bem assim. por isso acho q é meio romântica. eu sou o tipo de pessoa q qr ir pra lá
só pq gosta do entretenimento deles. mas acho q eu nao sobreviveria lá mt tempo
(entrevistada, ex-frequentadora, 24 anos).
Um dos motivos mais citados pelos otakus para explicar seu fascínio pelos mangás e
animês são os valores japoneses que depreendem de suas leituras. Temas como honra,
amizade, lealdade, esforço e sacrifício do indivíduo em prol de outros podem ser interpretados
não só como uma busca por valores que esses jovens não encontrariam na sociedade ocidental
(LOURENÇO, 2009), mas também como um desejo patentemente tribal de fundir-se em uma
coletividade.
Acho outros desenhos as vezes muito repetitivos em temas mais infantis [...] Gosto
muito de história e personagens que tipo se fazem fortes e superam as dificuldades.
Além dos mundos me atraírem muito (entrevistada, frequentadora, 18 anos).
Hmm, gosto de animes que tem romance, e que passam uma alguma lição legal.
Todos os que eu já vi são assim rs [...] Naruto é o principal pra mim. Gosto muito da
lição de amizade que ele passa. Inuyasha gosto bastante por causa do romance.
Sakura Card Captors também pelo romance rs, e também a amizade que é bem legal.
Clannad é um dos que tem uma história muito linda que me marcou, sobre valorizar
a família (entrevistada, frequentadora, 21 anos).
inexoravelmente, a ideia de Ocidente como centro e Oriente como “outro” a partir do qual o
Ocidente pôde construir, por oposição, sua “identidade”.
Utilizar os rótulos “Ocidente” e “Oriente” é um ato ideológico que colabora para um
sistema de pensamento que cria uma distinção polar entre um “nós” ocidental de um “eles”
oriental. Mas é muito difícil fugir desses artifícios argumentativos, motivo pelo qual os
emprego aqui, consciente dessa questão. Esses conceitos se complicam ainda mais no caso do
consumo do pop japonês no Brasil quando constatamos que o Japão é por vezes considerado
tecnologicamente ocidental e a América-Latina, um Ocidente “incompleto” (HALL, 1992).
A globalização, processo inseparável da constituição do Ocidente como centro,
colocou em cheque as instituições da identidade pessoal e da identidade cultural, caso em que
se encaixa a nacionalidade. Mesmo entendendo que o conceito de nacionalidade se complica
no momento atual da modernidade, essa continua sendo uma categoria importante para os
brasileiros que consomem o pop japonês, de modo que cabe avaliar o quão “japoneses” são
animês e mangás. Seriam eles autênticos representantes culturais do país ou apenas produtos
culturalmente inodoros nascidos das hibridações de um mundo globalizado?
Como dito anteriormente, a cultura pop foi importante na redefinição da identidade
nacional japonesa após a Segunda Guerra (SATO, 2007). Os mangás já nascem no contexto
de globalização da modernidade tardia, mas as influências que ajudaram a dar forma aos
quadrinhos japoneses começaram no século XIX, com os cartunistas europeus que chegaram
ao país após a abertura dos portos. Os processos de hibridação se intensificaram após a
Segunda Guerra, na qual a derrota do Japão vem acompanhada pela ocupação norte-
americana. Seguindo a trajetória de um único criador de mangás e animador, Osamu Tezuka,
podemos mapear as hibridações dos mangás produzidos no Japão antes da guerra com o
kamishibai, o teatro Takarazuka, os desenhos da Disney e o cinema (LUYTEN, 2000).
Com a estruturação da indústria dos animês, que se apoiou no fato de que grande parte
dos japoneses já possuía aparelhos televisores, a técnica de limited animation foi adaptada à
realidade do país. Mesmo precisando desenhar menos quadros no total, ainda no final dos
anos 1960, o trabalho de animação dos animês passou a ser em parte terceirizado,
inicialmente para a Coreia do Sul, e, mais tarde, para outros países, como Taiwan, Filipinas e
Tailândia (STEINBERG, 2012).
Com o boom da cultura pop japonesa no mundo, o estilo dos animês e mangás passou
a ser copiado em animações, quadrinhos e propagandas ao redor do mundo, tornando-se uma
estética mundialmente conhecida. Isso porque a cultura pop, especialmente a de ampla
circulação transnacional, tende a uma desterritorialização cosmopolita. O crítico cultural
40
Koichi Iwabuchi (2002) chegou a dizer que os animês seriam culturalmente inodoros
(mukokuseki), o que significa que seriam étnica, cultural e racialmente não marcados, como se
exatamente por apresentarem um Japão “desniponizado” é que fossem culturalmente
exportáveis. Já outros, como Susan Napier (2007), acreditam que é o equilíbrio entre
alteridade e familiaridade, a partir do ponto de vista estrangeiro ao Japão, que os permitiu ser
ao mesmo tempo compreensíveis e fascinantes para esses públicos. O fato é que os fãs
brasileiros encontram alguma especificidade que os faz gostar de animês e mangás.
não tem em todos, mas tem em alguns que eu gosto: início, meio e fim. você segue o
personagem desde o princípio e vai acompanhando a jornada até o desfecho. nesse
meio tempo o personagem envelhece, casa, tem filhos, perde aliados, ganha outros e
assim vai. é legal porque é bem diferente dos comics ou das animações americanas,
por exemplo, que parecem deixar os personagens estacionados no tempo. nos
comics é ainda pior, tem personagem que tem 20 anos desde a década de 1960
(entrevistado, ex-frequentador, 30 anos).
O conceito de otaku chegou ao Brasil e a outros países nos quais há muitos fãs de
mangás e animês com uma carga bem mais leve do que aquela que tinha no país de origem.
Ser otaku por aqui significa ser ávido consumidor da cultura pop japonesa e ter consciência da
origem desses produtos de entretenimento (CARLOS, 2011). Foi essa identificação que
fundou o pertencimento tribal que levou à criação e à consolidação dos eventos de animê,
ainda que essa denominação só se tenha espalhado ao redor do mundo por volta dos anos
1990. Os animês e mangás, quando de sua popularização no país, ainda demoraram a ficar
conhecidos pelos fãs por suas denominações japonesas, e mais tempo ainda até que esses
nomes se difundissem entre os não-iniciados. Como coloca Sérgio Peixoto, personalidade
importante na promoção da cultura pop japonesa e na história dos eventos de animê no Brasil:
Sérgio Peixoto: Naquela época, nem a gente usava o termo otaku, não tinha o termo
otaku [...] Você era fã de desenho animado japonês, era desse jeito mesmo. (dito no
podcast SANTOS et al., 2016a).
Ocasionalmente, alguma delas virava um grande sucesso, como o tokusatsu (série de efeitos
especiais) Ultraman e o animê Speed Racer (originalmente chamado Mach Go Go Go, que
muitos brasileiros nem sabiam ser nipônico), nos anos 1970 (LOURENÇO, 2009). Mas, em
termos de heróis japoneses que ganharam o coração de toda uma geração de crianças
brasileiras, pode-se dizer que o pioneiro foi National Kid, série que nem fez tanto sucesso no
Japão.
O que nos longínquos anos 60 [...] era apenas diversão e fantasia, hoje, representa
um marco. Mais do que combater os Incas Venusianos e os Seres Abissais, este
herói ficará imortalizado por desbravar uma “fronteira imaginária”, o que
possibilitou — e ainda possibilita — a várias gerações conhecer a magia dos
seriados, desenhos e quadrinhos nipônicos (GUSMAN, 2001).
Figura 7
Tokusatsu e animê que fizeram sucesso no Brasil antes do boom dos animês
Fonte: GOMES, 2013; SIMÕES, 2015.
Sérgio Peixoto: Naquela época já havia as locadoras que você pegava muito
material do Japão. Eles gravavam programas do Japão e botavam pra alugar aqui no
Brasil [...] Eles gravavam o que passava na TV, jogavam numa fita VHS, mandavam
pelo correio pra cá. Chegava aqui eles duplicavam e botavam na prateleira pra
alugar, sem legenda, sem nada. [...] Chegou a ter mais de 40 locadoras só no bairro
da Liberdade (dito no podcast SANTOS et al., 2016a).
Em 1988, Sérgio Peixoto e José Roberto Pereira organizaram uma mostra de animê no
SESC Pompéia para promover seu recém-criado fã-clube ORCADE (Organização Cultural de
Animação e Desenho). Foi um mês inteiro de exibições de animê e exposições de mangás e
miniaturas, que reuniu 20 mil pessoas no total. Os animês e live-actions exibidos, desde
clássicos como A Princesa e o Cavaleiro e National Kid e, até sucessos na época recentes
como Patrulha Estelar, ainda não tinham nenhum tipo de legenda ou tradução.
Sérgio Peixoto: A gente exibiu um monte de anime classudo lá, tudo sem legenda,
só que pra não ficar no vácuo, a gente fazia uma sinopse e distribuía no auditório
onde era feita a exibição. [...] Eu expus a minha coleção pessoal de pôsters [...] Eu
expus também parte da minha coleção pessoal de revistas informativas de anime [...]
Expus alguns mangás, um outro rapaz emprestou a coleção de kits pra montar que
ele tinha de vários desenhos de ficção [...] Num set eram as naves do Yamato, no
outro eram os robôs do Macross [...] E alguns pequenos debates que a gente teve,
mas assim, só pra discutir coisa de fã mesmo [...] Não teve concurso de cosplay, não
teve palestra de dublador, não teve nada disso (dito no podcast SANTOS et al.,
2016a)).
45
Exibições de animê já existiam, portanto, mesmo antes do boom dos animês no Brasil,
que se deu em 1994, deflagrado pela exibição de Cavaleiros do Zodíaco na Rede Manchete.
Devido ao enorme sucesso que o desenho fizera em outros países como México, Portugal e
Estados Unidos, os Cavaleiros já chegaram por aqui acompanhados de uma forte estratégia
mercadológica, apoiada em produtos que já existiam como parte do media mix japonês. Com
efeito, o direito de exibição do animê foi cedido à Rede Manchete sem nenhum custo
monetário, apenas com a condição de a emissora exibir a propaganda dos produtos
relacionados à série (LOURENÇO, 2009).
Segundo a primeira edição da revista Herói (SUPERMANIA..., 1994), os bonecos
baseados no animê chegaram às lojas brasileiras apenas 12 dias após a estreia do desenho,
chegando à marca de mais de 300 mil unidades vendidas em menos de três meses. Além dos
bonecos, diversos outros produtos relacionados ao desenho foram licenciados no Brasil, e a
rápida popularidade alcançada por Cavaleiros chamou a atenção das grandes emissoras de TV
aberta para o enorme potencial financeiro das séries nipônicas.
Ainda demoraria anos até que os mangás nos quais animês de sucesso como
Cavaleiros do Zodíaco, Dragon Ball e Sailor Moon são baseados fossem vendidos por aqui, o
que não impediu o mercado editorial de embarcar no fenômeno. Como a internet ainda era
incipiente, o público ficou sedento por mais informações a respeito dessas e outras animações,
o que levou à criação de revistas que exploravam o assunto, das quais a mais famosa foi a já
mencionada Herói (LOURENÇO, 2009). Essa publicação não tratava apenas da cultura pop
46
japonesa, mas logo surgiram outras com esse foco, como a Animax e a Anime Ex, ambas
editadas por Sérgio Peixoto.
Tais revistas especializadas foram importantes centralizadoras dos fãs de animê dos
anos 1990, familiarizando o público brasileiro com o mundo do entretenimento de massa
nipônico e trazendo informações sobre séries que ainda nem tinham chegado às nossas
telinhas. Além disso, essas revistas buscavam interagir com o público respondendo cartas de
leitores, dando espaço a ilustrações e mangás curtos feitos pelos fãs, realizando enquetes e
promoções. Traziam ainda anúncios de produtos de animês, divulgavam iniciativas dos
leitores (como fã clubes de exibição e troca de fitas VHS de animê) e informavam a respeito
de atrações de interesse, como mostras de ilustrações e, mais tarde, eventos de animê. À
revista Animax é também atribuída a popularização do termo “otaku” para designar fã de
mangás, animês e tokusatsu (LOURENÇO, 2009).
Já após a chegada de Cavaleiros do Zodíaco ao país, aconteceu em 1995 em Belo
Horizonte um encontro para fãs de animê, em que houve exibição de Macross 2 legendado em
português, além de palestras, exposições de miniaturas e pôsteres. A ABRADEMI realizou,
no mesmo ano, sua primeira exposição de mangás fora de São Paulo, que aconteceu em
Curitiba, para um número limitado de pessoas, já que o número de interessados foi grande.
No ano de 1996, quando começam os eventos propriamente ditos no Brasil, mas meses
antes do Mangácon, aconteceu em Porto Alegre o Quadrimania, organizado por Daniel HDR,
artista brasileiro com estilo de desenho fortemente inspirado nos mangás e famoso por
trabalhar para editoras de quadrinhos internacionais. O evento era de quadrinhos em geral,
mas houve “exibições de filmes e desenhos animados japoneses inéditos e uma feira
permanentemente aberta onde se vendeu de tudo: mangás, quadrinhos importados, garage-
kits15, cards de mangá, jogos para computador” (PEIXOTO, 1996). Nesse evento, foi lançado
o primeiro fanzine brasileiro de mangá, chamado Dojinshi, desenhado pelos alunos do
Visuarte, grupo que dava aulas de desenho e foi o responsável por organizar o encontro.
15
Bonecos que vêm em partes para ser montados e pintados pela própria pessoa, processo demorado e que exige
o conhecimento de diversas técnicas.
47
Foi nesse contexto de interesse pela cultura pop japonesa, com diversos fã-clubes de
animê surgindo e organizando exibições e exposições, que a ABRADEMI comemorou o 12º
aniversário da instituição, em 1996, que já prenunciava várias das atrações que viriam a fazer
parte da fórmula para esse tipo de convenção: exibição de animê, exposição de esculturas dos
Cavaleiros do Zodíaco, música de animê tocando. Além disso, a comemoração já contava
com um elemento que viria a se tornar quase que onipresente nos eventos, a fila para entrar:
“O público estava tão interessado que o evento que estava programado para começar às 15
horas teve que começar antes, já que todos estavam aguardando na porta da Associação
Shizuoka, em São Paulo” (ABRADEMI, 2012a, online).
48
atividades dos clubes, e não a partir de um grupo que se reunia exclusivamente para organizar
eventos.
Thiago Almeida: Os eventos no início não eram nada mais do que, assim, exibição
de anime, entendeu? Eram salas, ou algum lugar um pouco mais amplo, tipo uma
quadra, onde você tinha... Nem um projetor não, era uma TV de tubo 29, e a galera
sentava e ficava vendo anime o dia todo. E aí foram aparecendo alguns
estandezinhos vendendo uma camiseta, vendendo um chaveirinho e tal, e aí a coisa
começou a ter cara de evento mesmo (dito no podcast ALMEIDA et al., 2014).
Devido ao grande sucesso dos dois primeiros eventos (com a participação efetiva de
cerca de 70 pessoas), o evento terá dois dias e serão convidadas personalidades
envolvidas com animes (dubladores da TV, editores de revistas especializadas,
maqueteiros, etc.). Por isso, a opção foi realizar este 3o Animencontro na
Cinemateca da Fundação Cultural de Curitiba, para abranger um número bem maior
de participantes para este evento. A novidade é um concurso de ilustrações, e um
concurso de fantasias de personagens de animes (Cosplay ou Costume Play), além
da exposição de grupos de fanzines (Fan Magazines) e a presença de lojas, com
venda de material relacionado a anime e mangá. (RADTKE; FERREIRA, 1999)
51
No amplo hall de entrada da Faculdade Casper Líbero foram armados estandes dos
patrocinadores, todos envolvidos com mangá (quadrinhos) e anime (desenhos
animados). Estavam lá: Devir Livraria (importadora de gibis e editora de material
para RPG), Animangá (loja e publicadora de Ranma 1/2), Trama (editora de RPGs),
Conrad (editora brasileira oficial da revista Herói e do gibi Pokémon), Fonomag
(tradicional livraria com títulos japoneses), Kingdom Comics e Animax, revista
brasileira de mangá e anime. [...] Ao mesmo tempo, no quinto andar da faculdade
havia projeções de vídeos de animes. Muitos vídeos são legendados e distribuídos
por entidades de fãs, os chamados fansubbers ("fan subtitlers"), de forma a remediar
a crônica ausência de distribuidores oficiais desses desenhos no Brasil. Também
houve uma oficina (curso relâmpago) ministrado por desenhistas tarimbados [...] e
um curso de roteiro [...] Em salas vizinhas às dos cursos de quadrinhos, estavam
expostos desenhos amadores e impressionantes modelos de personagens de anime
esculpidos artesanalmente, com técnica excepcional (AV, 1999).
52
Nós temos que remontar 1999, Animecon, um dos primeiros eventos de anime do
Brasil, em São Paulo. E esse evento, ele que moldou, vamos dizer assim, o que é o
evento de anime hoje que a gente conhece (SILVEIRA, 2016, online).
Desde o primeiro Animecon, em 1999, estes encontros de fanáticos por cultura pop
(sobretudo anime e manga) começaram a se popularizar e a se espalhar por todo o
Brasil. Sim, antes do Animecon houve outros eventos (ORCADE, MangaCon, BH
Anime 99 etc.), mas pode-se dizer que da mesma forma que já havia mangas no
Brasil antes de Conrad, foi o Animecon que teve a honra de ser o modelo para todos
os outros eventos que vieram depois (FACAIA, 2016, online).
53
2.3 A fórmula
Ainda que a maioria seguisse a fórmula do Animecon, não havia muita uniformidade
entre os eventos, de modo que cada um nasceu com suas peculiaridades e com diferentes
focos, quer fossem as exibições, os concursos de cosplay ou as apresentações de dubladores.
Os eventos sempre variaram muito em termos de estrutura, de modo que os menores ou mais
novos tinham menos variedade de atrações e menos espaço disponível.
A fórmula dos eventos consiste em quatro tipos de organização do espaço, que variam
de acordo com sua função. Há espaços para assistir atrações, constituídos por auditórios,
palcos e salas; espaços de consumo, que são estandes de vendas de produtos e barracas de
alimentação; espaços para demais atrações e atividades; e ainda espaços livres para
socialização e circulação.
O palco ou auditório é onde acontecem as atrações a serem assistidas, em frente a uma
área livre ou com cadeiras para o público. Costuma haver ao menos um palco principal, onde
acontecem as atrações com hora marcada na programação do evento, como concursos de
cosplay, palestras de dubladores e shows de música, sendo essa a área de maior prestígio e
destaque, ocupando os principais horários dos encontros e servindo como hub para outras
atividades e estandes, que por estarem mais perto do palco acabam sendo beneficiados pelo
maior fluxo de pessoas circulando no local. Pode haver outros palcos auxiliares com
programação paralela à principal, que podem ser dedicados a alguma atividade ou tema em
especial. Incluem-se nessa categoria também as salas de exibição de vídeos.
54
Exemplo de disposição das atrações de um evento de animê, com palco principal, palco
musical, área de estandes, praça de alimentação, área de jogos e salas temáticas (19º
Animextreme, 2013, Porto Alegre, RS).
Fonte: CRONA, 2013.
As mudanças nos eventos não têm como ser descritas a partir de um corte transversal
de uma fase ou ano. Cada atividade ou atração teve seus próprios rumos e desenvolvimentos,
que estão relacionados ao todo do evento, mas na maioria dos casos não podem ser ligados
especificamente a alguma mudança em outra atividade, e sim a mudanças no consumo da
cultura pop. Por isso, é preciso traçar as transformações que cada atividade ou atração sofreu,
de acordo com suas próprias condições de satisfazer certas necessidades no público, antes de
abordar as mudanças nos eventos em âmbito geral, que será tratado mais adiante. Essa seção
trata das mudanças nos eventos até 2010, a partir de quando os eventos começaram a se
reconfigurar mais profundamente e se encaminhar para o diferente perfil de público e
atividade que temos hoje.
Apesar de não ser uma atividade em si, o primeiro aspecto que chamava atenção
mesmo antes de entrar em quase qualquer evento era a fila na porta, que começava a se
formar mesmo antes do horário para o qual estava marcada a abertura dos portões. Ficar na
fila sempre foi mais que apenas uma espera tediosa, tornando-se também uma atividade
coletiva que deixa as pessoas no clima do evento, além de servir para reencontrar amigos e
socializar com pessoas novas.
Uma área que não pode faltar em eventos de animê são os estandes, vendendo
produtos variados relacionados a animês, mangás, tokusatsu, videogames japoneses, entre
outras coisas. Inicialmente, esses “estandes” nada mais eram do que mesas dispostas lado a
lado, por vezes forradas com algum tecido, sobre as quais ficavam dispostas as mercadorias à
venda, que podiam ser bonecos, pôsteres, colares, camisetas, bottons, dentre diversos outros
produtos.
Com o passar dos anos, os estandes passaram a ser mais profissionalmente montados,
com divisórias e decoração própria, especialmente no caso das editoras, enquanto lojas
menores continuavam mais simples. O número de estandes cresceu enormemente desde 2000,
assim como a variedade de mercadorias vendidas. Apesar de os itens oferecidos no início
59
serem em bem menor quantidade, não havia a massificação que mais tarde passou a existir,
seja nos produtos importados ou naqueles que são produzidos pelos vendedores, como as
famosas touquinhas. Parece ter havido também uma certa homogeneização das lojas do nicho
de animê, de modo que vemos vários estandes em eventos que vendem as mesmas
mercadorias, ficando até difícil distingui-los.
[Meu primeiro evento] foi um pequenininho, num teatro, onde colocaram umas 2
banquinhas com DVDs piratas e umas outras coisinhas de anime. Mas que eram
boas, inclusive o meu medalhão do Shun é do modelo original, totalmente igual
(depois nunca mais achei igual, depois só tinha com o fundo preto e não totalmente
prata e de tamanho menor) (entrevistada, frequentadora, 29 anos).
Os estandes estão cada vez mais iguais e com coisas cada vez mais parecidas. Cadê
aquela coisa de procurar ate encontrar uma figure rara de um personagem?
Basicamente os estandes só tem coisa de CDZ, Dragon Ball, One Piece e Naruto.
Ainda acha uma coisa ou outra de Fairy Tail e Attack on Titans e outras coisas que
são as modinhas do momento e acabou. Sempre as mesmas camisetas silk, as
mesmas orelhas neko, as mesmas toquinhas e as mesmas figures (MAIA, 2015,
online).
Alguns dos estandes de maior destaque nos eventos são os de lojas ou editoras de
mangá. Nos eventos de animê dos anos 1990, quase não havia mangás em português. Podiam
até ser encontrados em japonês ou traduzidos para outros idiomas, mas os preços e a barreira
da língua os tornavam quase que inacessíveis. A primeira história em quadrinhos japonesa
lançada no Brasil foi Lobo Solitário, em 1988, e até o fim dos anos 1990, os títulos lançados
aqui podiam ser contados em uma mão, muitas vezes sem nenhuma regularidade entre as
edições e às vezes mudando o formato e número de páginas das revistas.
No ano 2000, esse setor editorial se estruturou e se padronizou, começando com o
lançamento de Dragon Ball, pela então desconhecida editora Conrad, primeiro mangá a ser
publicado no sentido de leitura original, já que antes os mangás eram espelhados para imitar a
leitura dos quadrinhos ocidentais (URBANO, 2013). Assim, a presença de estandes de lojas
ou editoras vendendo mangás em português tornou-se quase obrigatória nos eventos, o que
facilitava a aquisição de edições que já não estavam mais nas bancas ou até de coleções
completas, às vezes com descontos.
60
Comprar mangás nos eventos se tornou uma prática bastante comum, mas parece ter
diminuído um pouco nos últimos anos, talvez devido ao fato de que os mangás ficaram cada
vez mais fáceis de encontrar à medida que gostar da cultura pop japonesa foi se tornando algo
mais mainstream. No final dos anos 2000 já era possível comprá-los com muita facilidade não
só nas bancas como em lojas especializadas e até em livrarias comuns, seja nas lojas físicas ou
pela internet, onde também se podia adquiri-los nos sites das próprias editoras. Assim, ficou
fácil completar a coleção sem precisar esperar o próximo evento e sem precisar carregar peso
na volta para casa.
Há ainda as scanlations, mangás escaneados e traduzidos por fãs, disponibilizadas na
internet. A variedade de títulos oferecida é expressivamente maior do que a soma de todos os
mangás já licenciados no Brasil, pois há diversos grupos de scanlators, que acabam
61
traduzindo até as obras mais desconhecidas. Muitos fãs preferem ler a versão pirata, mesmo
no caso de mangás lançados por aqui, uma vez que os capítulos recém-publicados no Japão
são disponibilizados pelos scanlators em um tempo bem menor do que o que levam para
chegar às nossas bancas. Somando-se a isso o alto preço dos mangás, com revistas custando
normalmente entre R$10,00 e R$40,00 (COMIX, 2016), muitos fãs precisam economizar para
poder colecionar apenas uns poucos títulos favoritos.
A sala principal de exibição de animês costumava ser bastante disputada, podendo haver fila
na porta e distribuição de senhas para os assentos limitados.
[N]essa época Internet ainda não era algo difundido, então os fãs conseguiam
informações pelos fanzines, revistas e batendo papo nos eventos. E não havia essa
facilidade de conseguir as coisas baixando da Internet, então os eventos eram
praticamente apenas exibições que, em geral, iam de umas 9:00h da manhã até umas
17:00h (com uma pequena pausa para o almoço na qual ninguém almoçava de
verdade e sim comia um hambúrguer ou coisa que o valha). Fora a enxurrada de
desenhos, havia o sorteio de brindes, com coisas bem legais rolando como camisetas
e mesmo fitas VHS (é, eu sei, pré-histórico...). (DOTAKU, 2006a, online).
Os clubes responsáveis pelas salas podiam também oferecer outras atividades, como
sorteios, gincanas, bate-papos e pequenos workshops. Dessas salas vieram as chamadas salas
temáticas, que inicialmente tratavam de nichos dentro da cultura pop japonesa, mas depois
passaram a ser de qualquer assunto que se acreditava que fosse agradar o público, como Star
Wars, Senhor dos Anéis, Harry Potter e até Chaves. As salas de exibição foram, então, se
mesclando às salas temáticas, que não tinham foco na exibição, e foram se tornando mais
periféricas no evento.
Podia haver ainda exibições de shows ou clipes de j-music16 e AMVs (Anime Music
Videos), que são montagens de músicas (orientais ou não) com cenas de animês. Esse tipo de
peça era feita por fãs, por vezes havendo concursos de AMV nos eventos.
16
Músicas japonesas, referindo-se especialmente aos gêneros j-rock e j-pop, cujas bandas muitas vezes são
responsáveis pela performance de músicas de abertura e encerramento de animês, que fazem muito sucesso
entre o público otaku.
63
A Internet já existia mas era muito mais prático dar 10 reais numa temporada
completa em DVDs do que ficar semanas baixando episódio por episódio (DR.
ESPIRAL, 2016, online).
64
Era bastante comum a diversos eventos de animê haver também áreas com outras
atividades como jogos (videogames, trading card games, RPGs), combate medieval, animekê
e pista de dança com música de animê.
67
quantidade de eventos que ocorrem atualmente. Em julho daquele ano, Sérgio Peixoto
publicou sua previsão no editorial da revista Anime Ex.
[V]ários grupos do país estão se mexendo para fazer suas atividades regionais.
Podem anotar aí: no ano que vem, haverá pelo menos 10 convenções em todo o país!
São os otakus indo à luta e brigando por seu espaço e respeito. E ainda tem os
grupos que fazem exibições periódicas, atraindo centenas de Otakus. (PEIXOTO,
2000, p.3).
No início dessa década, os eventos ainda tinham como objetivo servir de ponto de
encontro para os fãs da cultura pop japonesa. Ofereciam atividades culturais e sociais
relacionadas a esse interesse, além de divulgar e informar sobre suas diversas manifestações,
já que mesmo os fãs precisavam ser aclimatados às minúcias dos animês e mangás. Os
eventos começaram pequenos e simples, muitas vezes apenas uma exibição de animê com um
pequeno sorteio ou palestra ao final. Costumavam ser menos subdivididos, de modo que a
sala de exibição era o único espaço do evento, servindo também como palco onde aconteciam
outras atrações. Vale ressaltar que as próprias exibições periódicas realizadas por fãs eram
consideradas eventos, mesmo que não houvesse nenhuma outra atividade. Aos poucos e a
cada edição, os eventos maiores foram se organizando e dispondo de uma infraestrutura de
mais alto nível.
Comecei a ir em eventos no ano 2000 aqui mesmo no Rio. [...] Os eventos nessa
época eram bem reduzidos com pequenas bancas de produtos de animes e alguns
cosplays. Eu gostava muito, mesmo sendo reduzido, pois lá fazíamos amizades com
a galera que curtia animes também. Fiquei encantado com tanto cosplay eram uma
coisa nova pra mim, pois só tinha visto em revistas de animes que eram a sensação
na época (entrevistado, frequentador, 36 anos).
foi só por volta de 2005 que comecei a frequentar eventos de anime. Naquela época
eles eram menos elaborados e muito menos diversificados do que hoje em dia
(entrevistado, ex-frequentador, 30 anos).
Em 2003, aconteceu o primeiro Anime Friends, realizado pela empresa Yamato, que
não só trouxe atrações japonesas para um evento pela primeira vez, como exibiu um
investimento e uma estrutura que nunca antes se pensou possível para esse tipo de evento.
Essa convenção sinalizou também a profissionalização dos eventos de animê e um novo rumo
de transformar esse tipo de confraternização em megaeventos comercialmente rentáveis, o
que levou também a uma maior homogeneização das atrações em todo o país, já que os
eventos maiores serviam como termômetro para todos os outros em termos de o que
funcionava e o que não agradava o público.
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Thiago Almeida: É impossível a gente falar sobre evolução de evento e não falar de
Yamato. Vocês acham que os eventos da Yamato [...] foram meio que um norte pra
todos os outros eventos? [...]
Bruno Antonucci: Creio que sim, porque depois do Animecon, que era o que
mandava mesmo, a Friends chegou trazendo uma grande novidade, que eram os
artistas de fora. Lá em 2003, quando teve o primeiro Anime Friends, ele foi
totalmente diferente, não por causa dos artistas nem nada, mas porque o concurso de
cosplay tinha regras. Eles colocaram na internet as regras, todo mundo leu. Sei lá,
seis meses depois, num evento aqui do Rio [...] tinha regras que não existiam antes e
quando você lia as regras, assim, eram as mesmas que eram da Yamato (dito no
podcast ALMEIDA et al., 2014).
Não é que os eventos mais “comerciais” não fossem também muitas vezes organizados
por fãs, mas em meados da década de 2000, ficou claro que os eventos não eram apenas
reuniões de pessoas com uma paixão em comum, e sim um negócio.
Nessa época, houve também a proliferação da frase “de fãs para fãs” como mote de
eventos organizados mais amadoramente, o que tinha como subtexto a premissa de que os
responsáveis por aquele evento eram pares dos frequentadores, e portanto teriam como foco
maior a diversão. A frase, no entanto, foi tão usada que se desgastou, além de ficar associada
à menor qualidade que derivaria do menor investimento monetário. Com um maior número de
eventos acontecendo por ano, ao menos nos grandes centros, passou a valer mais a pena
economizar para gastar nos eventos considerados melhores, geralmente os de maior porte, que
tinham atrações de maior renome, maior qualidade nas atividades competitivas devido ao
maior número de pessoas competindo, além de mais lojas, o que permitia comprar mais
material relativo a animês e mangás.
Nesse mesmo período, o mercado de licenciamento e publicação de mangás no Brasil
parecia se aquecer cada vez mais. Mesmo com a facilidade de se encontrar um imenso
número de quadrinhos japoneses na internet, muitas vezes traduzidos para o português (com
um número ainda maior de títulos disponíveis na rede em inglês), as editoras brasileiras
comemoravam o sucesso de vendas nas bancas e livrarias nacionais. O brasileiro parecia
consumir e colecionar mais mangás com o passar dos anos.
Já a disponibilidade de animês no Brasil por meios legais seguiu o caminho inverso ao
dos mangás. No início dos anos 2000, ainda havia uma quantidade considerável de animações
japonesas compondo a grade de programação de diversas emissoras de TV. Mas por conta de
diversos fatores, dentre os quais a censura sofrida por essas animações no mercado ocidental e
o gradual desinteresse do público brasileiro pelos animês disponíveis na televisão, os
populares blocos de animês foram migrando para horários de menor destaque ou mesmo
desaparecendo da programação. Assim, a melhor opção para os fãs era assistir à exibição
desses desenhos animados nos eventos de animê, que os permitiam acompanhar os principais
70
animês que já eram febre ao redor do mundo muito antes do licenciamento oficial desses
produtos para o mercado nacional.
Mesmo a chegada da internet de banda larga não extinguiu, a princípio, as exibições
dos eventos, já que eram poucas as pessoas que podiam pagar esse serviço, somado ao fato de
que ainda era bastante demorado e complicado encontrar e baixar animês na internet. Dessa
forma, a boa estrutura das salas de exibição dos eventos de animê e suas sedutoras
programações repletas de novos sucessos reinavam como a melhor forma de assistir animês
legendados em português no Brasil.
O auge das exibições dos eventos de anime foram quando não tinha mais nada
passando na TV aberta [...] A Rede Manchete desapareceu, então a gente pode supor
aí de 2002 [...] até 2005 [...]. De 2006 pra frente voltaram a ser relicenciados,
principalmente os clássicos, pra TV aberta e TV fechada [...] Eu acho que até 2005
foram o auge das exibições. (LUCENA, 2016).
Nesse mesmo período, essas convenções foram se tornando cada vez mais
multitemáticas. Diversos outros produtos e atividades não relacionadas ao Japão ganhavam
espaço, com áreas temáticas e estandes sobre Star Wars, Harry Potter e jogos de RPG, por
exemplo, se tornando recorrentes na maioria dos grandes eventos.
O primeiro AnimABC aconteceu nos dias 16 e 17 de abril de 2005 [...].E além de ser
o primeiro grande evento deste gênero no ABC, nosso evento foi também o primeiro
a reunir num único lugar tantos fãs de tão variados gostos. Era um projeto ousado,
pois ainda existe uma idéia pré-concebida que fãs de uma série de desenho animado
não gostam de fãs de filmes, por exemplo.
Nós provamos que essa idéia é furada, pois tivemos representados cerca de 30
grupos diferentes de fãs, e todos se divertiram, trocaram informações e idéias e
saíram satisfeitíssimos do evento. Mais do que apenas um encontro de
entretenimento, o AnimABC foi também um evento de confraternização e troca de
idéias entre grupos diferentes, que no final descobriram que não são tão diferentes
assim. O AnimABC se torna assim o primeiro evento multitemático do Brasil
(ANIMABC, 2005, online).
17
Disponível em http://web.archive.org/web/20010925145454/http://www.animecon.com.br
18
Disponível em: http://web.archive.org/web/20061102021520/http://www.animecon.com.br/
programacao_salasdeclubes.php
19
Disponível em: http://web.archive.org/web/20080615035042/http://www.animecon.com.br
20
Disponível em: http://www.animecon.com.br/acon2010/images/mapa_animecon2010-01.jpg
72
Mapa do Animecon 2010, onde apenas as áreas em verde correspondem a salas dedicadas a animês.
Fonte: ANIMECON, 2011.
[O]s eventos de anime já deram o que tinham que dar. As atrações são sempre as
mesmas, as editoras são sempre as mesmas, os cosplayers são sempre os mesmos e,
não raramente, os concursos premiam praticamente os mesmos [...]. Sem esquecer
que a paparicação dos dubladores já era, pois todo mundo conhece os caras, eles já
imitaram pra carambas “seus” personagens famosos… E nada mais tem novidade.
Junte‑ se a isso o AMADURECIMENTO do público, pois por incrível que pareça
até otaku envelhece, e a tragédia está armada. Quando o Noriyuki da Abrademi
passava anime no Bunka aqui da Liberdade, nos anos 90, era OUTRA história
porque quase ninguém conhecia mangá e anime. Hoje, mais de 20 anos depois, não
apenas o público mudou, envelheceu, cresceu como a TEMÁTICA dos eventos não
foi renovada. ******Porque não há mais o que mostrar!****** O assunto se
esgotou, mixou, secou! (PEREIRA, 2011, online).
Foi nesse período que algumas atividades secundárias e muitas vezes não relacionadas
à cultura pop japonesa começaram a ganhar cada vez mais espaço, preenchendo o vazio
deixado pela baixa das exibições de animações japonesas e pela diminuição do interesse pelas
demais atrações relacionadas a animês. Os organizadores vinham expandindo as atrações de
modo a contemplar vários nichos da cultura pop, na interseção dos interesses dos otakus.
Investir em fenômenos da internet parecia ser uma aposta bastante segura, uma vez
que fãs de animês e mangás já eram usuários assíduos da web, a qual estava se popularizando
mais ainda e se tornando parte indispensável do cotidiano de grande parte dos brasileiros. Um
dos acertos dos produtores desses eventos, por volta de 2010, foi em abraçar o k-pop cover.
K-pop é um estilo musical sul-coreano, que virou febre na Ásia no final dos anos 1990
graças ao sucesso dos k-dramas (novelas coreanas) e se tornou um verdadeiro fenômeno
global a partir dos anos 2010, com a difusão online dos clipes musicais de suas boy e girl
bands no YouTube. Essa manifestação da cultura pop foi cuidadosamente planejada para cair
no gosto dos públicos internacionais, aliando o apelo estético de jovens bonitas(os) usando
roupas coloridas e da moda à batida marcante da música, acompanhada de coreografias
altamente sincronizadas. Nos eventos de animê, o concurso de covers dos k-poppers (como
74
são chamados os fãs do estilo) já virou presença certa, normalmente no cobiçado palco
principal. Concorrendo sozinhos ou em grupos, dançam coreografias inspiradas nos clipes
sul-coreanos, que mesclam fofura e sensualidade (KARAM; MEDEIROS, 2015).
Nem todas as tentativas de trazer atrações da internet, porém, foram um sucesso, como
bem ilustra o caso do Vitinho “Sou Foda”, anunciado como convidado de destaque do Rio
Anime Club em 2012. O anúncio foi feito na página do encontro no Facebook, e não demorou
até que uma chuva de reclamações e comentários reprovando a escolha do destaque caísse na
publicação. Fãs e potenciais visitantes reclamavam da tentativa “absurda” dos organizadores
em levar um funkeiro para um evento de animê, ainda por cima como convidado de destaque.
Os próprios organizadores logo anunciaram o cancelamento da presença do convidado,
explicando a intenção de contar com fenômenos da web em suas próximas edições.
só aumentaram de tamanho como têm atraído uma considerável fatia do público dos eventos,
levando muitos frequentadores a considerar os games como “substitutos” dos animês no
evento, pelo menos no que diz respeito à popularidade e assiduidade do público.
[N]ota-se que a "era dos animes" no Brasil está acabando. Agora é a era dos games.
Até meados de 2009 foram feitos eventos de games de empresas famosas que não
deram certo e depois, com a chegada do BGS [Brasil Game Show] a São Paulo, eles
começaram a crescer e agora estão mais fortes do que nunca, principalmente por
causa do mercado. (comentário no Facebook).
André Fava: A fórmula do evento sempre foi a mesma. Tá, vai ter uma sala de
exibição. Depois que o anime ficou bem fácil de achar, tinha uma sala de exibição só
pra atingir as pessoas, pra mostrar coisas novas que elas não tinham visto ainda, que
elas poderiam chegar na casa delas e baixar. Tinha a sala de videogames, né, que
hoje em dia, o videogame tomou o lugar do anime. O anime deu uma caída muito
grande e o jogo cresceu muito (dito no podcast ALMEIDA et al., 2014).
Outros jogos que têm ganhado bastante destaque são os jogos de tabuleiro, que antes
ocupavam pequenas porções do espaço dedicado aos videogames ou aos RPGs e hoje já
recebem espaços próprios.
Algo que ficou cada vez mais visível com o passar dos anos foi o fato de que os
eventos estavam se fragmentando. Eram muitos os diferentes interesses agregados aos eventos,
o que tornava difícil manter a “unidade” entre cada um desses interesses. Grandes eventos,
como o Anime Friends, por exemplo, já pareciam mostrar que o caminho era justamente
agradar não somente ao público fã de animês, mas também aos fãs de cultura pop em geral.
Dada a sua relevância no cenário dos eventos no Brasil, ao juntar em um só canto
“minieventos” voltados para colecionadores, jogadores de RPG, fãs de Star Wars dentro do
Friends, a Yamato ajudava a moldar o futuro dos eventos de animês no Brasil.
Assim, com a crescente importância de atividades antes consideradas secundárias e
sem atividades relacionadas a animês como espinha dorsal em torno do qual os outros
interesses gravitavam, foi-se tornando mais evidente a multiplicidade de interesses que já
estavam há anos presentes nos eventos. Esses interesses foram se delineando em alguns
núcleos que diziam respeito a tribos urbanas das quais muitas vezes que os fãs de animês e
mangás faziam parte.
Pra se manter acontecendo, eventos de “anime” com nomes bem japoneses estavam
lotados de público diversificado, atirando pra todas as direções. O “público só de
animes” era só mais um fandom, e nem era o maior. Com a mistura dos conteúdos
em eventos, ficou claro que as turmas se misturavam. Quem jogava Street Fighter
também colecionava o mangá do Rurouni Kenshin e lia Homem-Aranha, mas queria
fazer um cosplay de Predador. Tinha até cosplay de meme. Adicionam-se o público
amante do k-pop, que já é tradicional a ponto de ter competições próprias (DR.
ESPIRAL, 2016, online).
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Cartaz dos destaques do Anime Friends 2011 (acima), com foco em atrações japonesas ou
relacionadas a animê e cartaz dos destaques do Anime Friends 2013 (abaixo), segmentado em
diversos “minieventos”, como a Jedicon (Star Wars), a Brasil Comic Con (HQs) e a Colecon
(miniaturas e colecionáveis)
Fonte: SAMPAIO, 2011; MORELLI, 2013.
77
Outra atração que ganhou novas cores com a diversificação do público dos eventos são
as palestras/entrevistas. Agora, no entanto, nem todos os frequentadores dos eventos têm
interesse em saber como são feitos os quadrinhos e os dubladores são mais lembrados por
seus trabalhos antigos ou por emprestar a voz a desenhos ou filmes não japoneses. Esses
profissionais ainda são chamados para os eventos, mas foram perdendo espaço uma vez que
os organizadores de eventos já vinham buscando incorporar atrações ligadas à internet, como
visto no caso do Vitinho “Sou Foda”. Assim, a ascensão meteórica dos youtubers como
grandes ídolos da juventude tornou-os uma escolha factível para preencher esse espaço e
renovar os eventos.
Fato é, que vivemos na era dos Youtubers, eles lotam eventos, então é óbvio que
compensa mais pagar R$ 1500,00 (média acho) pra vir um deles do que pagar
passagem ida e volta do Japão, mais hotel, translado, tradutor, alimentação, cachê
entre outros gastos que não são poucos (comentário no Facebook).
Inicialmente, os youtubers eram mais uma das atrações e eram chamados apenas os
que produziam conteúdo relacionado aos animês e videogames. A partir de 2015, dada a boa
recepção por parte do público e sua crescente relevância como personalidades midiáticas, os
youtubers foram promovidos a destaques principais dos eventos, independentemente da
temática da qual falam. Numa análise do material promocional do Ressaca Friends de 2014 e
2015, nota-se que no primeiro os youtubers ainda eram uma atração bastante secundária, com
Muca Muriçoca sendo o único youtuber a figurar no flyer, e mesmo assim de maneira bem
tímida e sem a alcunha “youtuber”, que só se popularizou nos últimos anos. Já no flyer
seguinte, referente à edição de 2015 do evento, os youtubers ganharam seção própria e um
destaque muito maior, além de terem aumentado em número.
78
O fato de os youtubers terem virado atração principal na maioria dos eventos de animê
veio na esteira da quase extinção das salas de exibições de animês nesses encontros. Assim
como nos eventos de animê, na TV brasileira, tanto de sinal aberto quanto fechado, os animês
estavam quase extintos. No caso da televisão brasileira, as animações oriundas do Japão
foram perdendo espaço, em princípio, por conta da excessiva censura. Os desenhos japoneses
passavam por cortes para se adequar não somente ao público-alvo (as crianças brasileiras),
mas também ao horário, já que várias dessas animações eram exibidas durante a manhã.
Desse modo, grandes sucessos chegavam às telinhas completamente picotados, com cenas
mais violentas muitas vezes sendo completamente removidas, o que geralmente fazia com que
várias tramas se tornassem bastante confusas.
79
Outro ponto importante a ser citado com relação ao desaparecimento dos animês da
TV brasileira é o fato de que, em 2014, entrou em vigor uma medida que proibia a veiculação
de propagandas voltadas para o público infantil. Como muitas vezes os blocos com
programação infantil eram utilizados pelas emissoras de TV para exibir comerciais de
produtos e brinquedos para crianças, com a chegada dessa medida já não havia mais incentivo
para a permanência dos blocos infantis e vários canais começaram a deixar de licenciar,
dublar e exibir animações japonesas. Como explica Eduardo Miranda (2015), responsável por
trazer Cavaleiros do Zodíaco para o Brasil:
Pra TV aberta, hoje em dia, isso é meio impossível, porque primeiro você tem leis
que limitam a publicidade direcionada a crianças. E isso já causa um desinteresse
completo das emissoras de ter algum tipo de programação infantil. [...] Outro
problema grave que nós temos é a classificação indicativa. Por quê? [...] Porque o
japonês não faz, assim, nenhum tipo de restrição quanto ao uso da emoção, da
violência, da violência pelo bem, do mal pelo bem. Ele fica permeando o bem e o
mal de uma forma muito inteligente. Lembrem-se, a cultura deles é muito mais
antiga que a nossa. Vamos ter um choque cultural sempre. Então a classificação
indicativa muitas vezes não entende esse choque cultural e coloca a classificação lá
em cima. E o que acontece? Você acaba tendo produtores que alteram a obra e isso
pro fã é mortal. De repente ele prefere esperar vir no computador, que hoje em dia é
simples, e no entanto ver a obra na íntegra, do que de repente você ver uma coisa
programada oficialmente e totalmente cortada ou alterada (MIRANDA, 2015,
online).
Assim, sem precisar dos eventos para se manter “em dia” com a programação de
animês e novos episódios de suas séries favoritas recém-lançados no Japão, a internet se
consagrava de vez como a principal fonte para suprir os fãs das animações japonesas. Em
tempos de economia da dádiva, que traz consigo um senso de gratuidade sem remorso
(MOULIER-BOUTANG, 2012), é possível ver na internet a programação completa dos
animês que ainda vão passar no Japão e saber que algum grupo de fansub disponibilizará os
episódios em poucos dias após a estreia japonesa. Essa facilidade faz com que os
frequentadores dos eventos prefiram passar o tempo em atividades que não podem realizar no
dia a dia.
Além dos fansubs há alternativas legais para ver animês na internet, com serviços de
streaming como Netflix (que oferece vários animês no catálogo) e Crunchyroll (serviço
dedicado unicamente a animês e mangás). No entanto, mesmo que as salas de exibição nos
eventos tenham diminuído consideravelmente, há ocorrências de retorno desse tipo de sala.
Agora atendem a funções diferentes, seja como sala patrocinada do Crunchyroll ou para
satisfazer a nostalgia do otakus que viveram outra época dos eventos.
80
Com o advento de séries como Netflix, Crunchyroll, onde os animes estão sendo
disponibilizados em streaming, oficialmente até, não há mais tanto a necessidade de
exibições. [...] As salas de exibição hoje são patrocinadas pelo próprio Crunchyroll,
que faz como que uma degustação pras pessoas comprarem o produto deles
(LUCENA, 2016).
Hoje em dia, o povo que vai assistir, não vai assistir anime, ele vai assistir os
clássicos tokusatsus, que é pelo menos o que eu vejo nos eventos. É uma salinha que
tá passando tokusatsu, aqueles bem classicão mesmo.
Mas sabe por que isso? Porque a pessoa tinha esse hábito. [...] Hoje em dia a gente
vai pra recordar o que era aquela época. [...] Então a gente vai relembrando estágios
da nossa evolução otaku (comentário em blog).
Além da diminuição dos animês, mesmo os mangás, cujo mercado vem crescendo e se
diversificando nas bancas brasileiras, vêm perdendo espaço nos estandes de quadrinhos dos
eventos para as HQs ocidentais. Os demais estandes agora vendem produtos relacionados não
apenas à cultura pop japonesa, como também à cultura pop de forma mais geral.
Disponibilizam, assim, artigos relacionados a animês, mangás, seriados de televisão, histórias
em quadrinhos ocidentais e videogames, além de vários tipos de roupas e acessórios que
agradam a várias tribos.
O consumo sempre atraiu muitos fãs aos eventos de animê, mas o aumento da
quantidade e diversidade dos produtos disponíveis elevou a atividade a um novo patamar. Se
antigamente as pessoas iam aos encontros para adquirir e ter acesso a novos episódios de
animações ou edições de mangás, hoje elas têm acesso a esses produtos do conforto de seu lar.
Nos eventos, então, agora elas encontram mercadorias que apelam aos seus mais diversos
gostos e paixões. De broches a camisetas, de canecas a cosplays, de bonecos a almofadas, os
visitantes são bombardeados de imagens referentes aos mais diversos elementos da cultura
pop japonesa, brasileira e mundial.
João Leão: Vai ter muita gente que vai prum evento desse pra realmente comprar
algumas coisas que não vai ter a paciência [...] de comprar na internet e esperar três
meses vir lá do outro lado do mundo [...] que vai pro evento pra já comprar ali e
levar pra casa (dito no podcast SANTOS et al., 2016b).
Januncio Neto: A cultura pop japonesa, ela só teve relevância (...) para uma certa
exclusividade temática quando ela era escassa. A partir do momento em que a
internet populariza tudo, inclusive a cultura pop japonesa, o leque se abre. (dito no
podcast SANTOS, 2016a)
Harucon 2010, descrito como “Encontro Cascavelense de Anime e RPG” (esquerda) e o mesmo evento
em 2015, descrito como “Convenção de Anime e Cultura Geek” (direita)
Fonte: KUWAN, 2010; HARUCON, 2015.
A maioria dos eventos continua mantendo pelo menos alguma referência à cultura pop
e à cultura tradicional japonesa, com atrações como apresentações musicais e de artes
marciais, além de material de divulgação cuja estética costuma conter elementos associados
ao Japão. Mesmo quando há esse esforço para manter raízes japonesas, os eventos têm como
grandes atrações aquilo que hoje atrai público, o que pode criar uma dissonância entre um
design japonês que serve para promover atrações sem relação nenhuma com aquele país. Uma
das edições de 2016 do Rio Anime Club, por exemplo, contou com material promocional cuja
diagramação remete a elementos gráficos e arquitetônicos do Japão tradicional, mas cujas
principais atrações são youtubers. O espaço do evento também foi subdividido entre áreas
com tipos de atrações diferentes, cada uma das quais ganhou o nome de uma província
japonesa. No entanto, as atividades eram praticamente as mesmas de qualquer outro evento
atual e a marcação das “províncias” consistia apenas em faixas não muito visíveis que não
explicitavam o conteúdo da área.
Por outro lado, alguns encontros menores tentam manter-se fincados nas raízes dos
eventos de animê, apostando na nostalgia ao oferecer eventos old school com foco em
atrações relacionadas às animações japonesas e sem a presença dos youtubers, detestados por
muitos dos fãs antigos. Um exemplo foi o Otakontro, evento de Santos que colocou grande
ênfase em sua divulgação no fato de que não haveria youtubers se apresentando no palco.
85
e SANA, grande parte dos fãs precisa escolher um por ano para frequentar e muitos outros
precisam se contentar com eventos menores e mais baratos.
O problema [dos eventos de animê] não são os “youtubers” ou o preço alto dos
ingressos [...], acontece que tem eventos maiores como a CCXP que fazem as
pessoas quererem poupar o dinheiro para irem neles. Eu sei que a CCXP e algumas
outras maiores não falam sobre anime e sim sobre assunto nerd, o anime ou mangá
nestes eventos tem apenas um espaço pequeno porém se parar pra pensar os eventos
de anime mesmo já não são diferentes, encontrar alguém falando de animes é difícil
(comentário em blog).
Semelhanças de atrações e de layout entre os flyers do Rio Anime Club e da Expo Geek Brasil
Fonte: A autora, 2017.
Tais convenções seguem a mesma fórmula das de animê: palco principal com
concursos e shows, vários dos mesmos estandes e mesmas atrações dos eventos de animê,
como jogos, combate medieval, cosplays. Assim, os eventos geeks oferecem uma experiência
bastante parecida com aquela vivida pelos frequentadores nos eventos de animê, incluindo até
a heterogeneidade das tribos presentes.
88
Para além das atrações, o que faz (ou desfaz) um evento é o público. Os organizadores
gostam de anunciar quantos milhares de frequentadores pagaram para entrar em seu evento,
trazendo mais patrocínio e incentivando ainda mais fãs a frequentar. No entanto, o presente
que os eventos trazem jaz no que lá se sente, na presença das pessoas, cujos afetos e efeitos se
traduzem em corpos e roupas que se expressam no espaço por meio de gostos e gestos,
alterando-se e alterando umas às outras.
Com a diversificação da programação das convenções, a própria tribo urbana dos
otakus se expande, se fragmenta e se recompõe. É por isso que, entre otakus, gamers,
cosplayers, nerds, geeks e muitos outros grupos, essas convenções podem ser caracterizadas
como “eventos intertribais” (MACHADO, 2009, p. 117). O sentimento de pertença a uma ou
mais tribos é fluido, dinâmico e ambivalente, não havendo fronteiras claras nem exclusividade
entre os diversos grupos (MAFFESOLI, 1987). Assim, os espaços dos eventos de animê são
marcadamente heterotópicos, já que estes “têm o poder de justapor em um só lugar real vários
espaços, vários posicionamentos que são em si próprios incompatíveis” (FOUCAULT, 1984,
p. 411).
A constituição de nichos mais específicos de interesses dentro do grupo dos otakus e
suas afinidades tangenciais com outras tribos urbanas faz com que os eventos sejam
territorializações temporárias em que convivem outros microcosmos, revelando a
complexidade do viver social. Essas agregações sociais proporcionam experiências diferentes
89
de relação com a cultura pop, mas não deixam de ter diversas interseções e pontos de contato,
já que uma mesma pessoa pode transitar por vários deles.
As diferentes atrações e atividades que convivem no mesmo evento estão em constante
negociação de espaço físico e simbólico, evidenciando seu processo constante de hibridação,
resultantes da natureza fluida do tribalismo pós-moderno e da própria natureza da festa.
21
Tradução nossa, do original: “Performances mark identities, bend time, reshape and adorn the body, and tell
stories. Performances – of art, rituals, or ordinary life – are “restored behaviors,” “twice-behaved behaviors,”
performed actions that people train for and rehearse”
91
3.1.1 Cosplay
cujo gênero é diferente do seu. A roupa toda é adaptada, de modo que é como se aquele
personagem realmente fosse de outro gênero.
Eu acho muito legal e pretendo fazer no futuro. Acho que mostra um esforço tão
grande de mostrar seu amor a um personagem. Quando eu vejo um cosplay bem
feito isso me deixa muito impressionada com a capacidade dessa galera (entrevistada,
frequentadora, 18 anos).
3.1.2 Animekê
Eu sempre fui muito tímido, mas já faz um tempo que não tenho mais vergonha de
nada. Uma vez eu cantei Re:Member do Flow, Abertura da Quinta temporada do
Naruto. Tinha bastante gente olhando, e eu estava bem nervoso, cantei de olhos
fechados. Quando terminei me aplaudiram bastante, fiquei mega orgulhoso
(entrevistado, frequentador, 21 anos).
95
Figura 42 – Animekê
Algumas pessoas escolhem músicas de animês que possuem versão em português, mas
é muito comum os participantes escolherem músicas em japonês, que não têm dificuldade em
cantar, ainda que não dominem a língua. Esse fato impressiona muitos não otakus, mas é
tratado com naturalidade nos eventos. Isso porque, ainda que não tenham feito curso de
japonês, os fãs de animê estão acostumados com a sonoridade da língua.
Nego acha que eu to zuando, ou algo assim, mas quando eu começo a cantar, vozes
se calam [...] as músicas em japonês que eu sei cantar, eu posso até escrever elas pra
você, porque eu sei direitinho a pronuncia de cada palavra. demora pra aprender,
mas a música fica bem legal (entrevistado, frequentador, 21 anos).
Como a oferta de animês dublados no Brasil é relativamente pequena nos dias de hoje,
os otakus recorrem à internet, onde facilmente encontram desenhos legendados (LOURENÇO,
2009). Essa legendagem costuma ser feita por fãs, que traduzem diretamente do japonês ou de
outras legendas já existentes, atividade conhecida como fansub. É de tanto ouvir a língua
japonesa em animês, filmes, novelas e músicas que os otakus acabam aprendendo a pronúncia,
a cadência e até a impostação de voz japonesa.
Tanto cantar quanto aprender outro idioma, ainda que apenas a maneira de vocalizá-lo,
desconhecendo-se seus significados, são técnicas corporais que fazem uso do aparelho
96
fonador humano. São aprendidas, como quaisquer outras, por imitação e treino, atos que
requerem a assimilação de movimentos (MAUSS, 1974), nesse caso, movimentos que
produzem voz e melodia.
Outra atração comum nos eventos são as bandas de rock, normalmente fazendo covers
de músicas de animês e videogames. Essa atração, no entanto, não entra no escopo das
atividades em que qualquer frequentador pode participar e competir. Os shows mencionados,
por outro lado, são atrações previamente planejadas. Os nomes das bandas, que normalmente
têm algum grau de fama na mídia mainstream ou no Youtube, são anunciados como parte
formal da programação.
Pode parecer estranho que a música pop sul-coreana tenha conquistado um enorme
espaço nos eventos de cultura pop japonesa nos últimos anos. Essa expansão, no entanto, fica
clara uma vez que examinamos o fenômeno da Hallyu. Esse termo, que literalmente significa
“fluxo coreano”, mas é mais conhecido como “Onda Coreana”, marca a rápida ascensão da
Coreia do Sul como país exportador de produtos culturais para o mundo todo. Inicialmente
propelida pela disseminação das novelas coreanas (conhecidas como k-dramas) no sudeste
asiático, a Hallyu ganhou força mundial no começo dos anos 2000 por meio do k-pop
(KARAM; MEDEIROS, 2015).
Abreviação de “Korean pop”, o k-pop vai além do estilo musical de batida marcante e
influência de gêneros americanos como música eletrônica, R&B e hip hop. O fenômeno
engloba também a estética de seus coloridos videoclipes, em que os integrantes das bandas
vestem roupas da moda e executam coreografias altamente sincronizadas. Essas boy e girl
bands (raramente mistas) são resultado de verdadeiras fábricas de talento, recrutando crianças
e adolescentes para a chance de um dia virarem idols. Esses jovens trainees são treinados
exaustivamente durante anos para virarem estrelas que agradem aos mercados globais
(KARAM; MEDEIROS, 2015).
A internet foi fundamental para espalhar pelo mundo o gosto pelo k-pop. Os sites de
redes sociais permitem a comunicação dos ídolos coreanos, que aprendem outras línguas em
seu treinamento, com suas bases de fãs internacionais, fortalecendo sua imagem e dando a
sensação de serem pessoas acessíveis, “gente como a gente”. Já o Youtube permitiu que os
97
clipes e shows das bandas fossem facilmente compartilhados pelos fãs, que começaram a
gravar seus próprios covers das coreografias de k-pop e disponibilizá-los na plataforma de
vídeo (JUNG, 2011). A internet é essencial também para a comunicação e formação de redes
entre os fãs, que podem compartilhar seus gostos com pessoas de seu país e do mundo,
aprender uns com os outros e organizar encontros offline.
Daí nasceram os k-covers, prática em que os fãs de k-pop aprendem e executam,
normalmente em grupo, as coreografias de seus clipes preferidos. Como os eventos de animê
abrangem cada vez mais interesses e a própria hallyu ganhou muita força por meio do
mercado japonês, não demorou até que os covers de k-pop virassem parte da programação.
Nos concursos dos eventos, não raro etapas de concursos maiores (assim como os das
demais atividades aqui relatadas), há categorias em que só são permitidos covers da dança
original e outros que contam também com a categoria livre, em que os participantes podem
fazer mashups22 de músicas e criar suas próprias coreografias. Por vezes, há divisão entre as
apresentações solo, dupla e grupo. Nos concursos menores, é comum só haver uma
modalidade, que acaba recebendo poucos participantes solo, já que a sincronização de
movimentos entre os dançarinos é de grande importância para tornar a performance
impactante. As equipes buscam a coordenação nos gestos e também no visual caprichado,
apostando em roupas iguais ou combinando, quase sempre com peças bastante coloridas.
22
Faixa que combina trechos de duas ou mais músicas.
98
Há desde as coreografias mais simples, que podem ser praticadas por iniciantes, até as
mais complexas, que requerem alto grau de treino e habilidade. Alguns grupos escolhem
apresentações mais “fofas”, elemento que o k-pop tem em comum com o j-pop (música pop
japonesa), outros exibem mais sensualidade nas roupas e nos movimentos, fazendo jus à
influência norte-americana da música sul-coreana. Alguns k-poppers (fãs de k-pop, quer
dancem ou não) buscam se aproximar da aparência asiática, o que às vezes se revela difícil,
devido às diferenças de constituição física entre os corpos brasileiros e os de seus ídolos
coreanos.
As técnicas corporais necessárias à execução das coreografias do k-pop são aprendidas
por meio de produtos para consumo massivo acessados pela internet. Os k-poppers imitam e
reproduzem as coreografias que assistem, mas também as ressignificam e com elas negociam,
já que essas técnicas sobrepõem-se a corpos que já contam com um repertório gestual e
99
simbólico prévio assimilado durante anos em meio à cultura e aos modos de ser dos
brasileiros.
Ainda no âmbito das coreografias, outra forma de diversão popular nos eventos são os
videogames de dança. Esse gênero de game surgiu no Japão como evolução dos jogos de
ritmo, em que o jogador usava o direcional do controle para acompanhar os comandos em
forma de setas, acertando a batida da música. Lançado em 1998, Dance Dance Revolution deu
ao jogador o comando das setas por meio de botões sob seus pés, fazendo com que precisasse
pisar nos lugares certos conforme as ordens que apareciam na tela.
Nos primeiros anos do século XXI, Dance Dance Revolution (DDR) virou moda nos
eventos de animê, estes mesmos recém-estabelecidos no Brasil. Os jogos de dança evoluíram
e mudaram, o que refletiu em sua presença nos eventos. À moda do DDR, seguiu a do Pump It
Up, muito parecido com o anterior, mas acrescentando setas na diagonal, não só cima, baixo,
frente e trás. Depois houve o momento do jogo Para Para Paradise, que usava sensores no
chão para detectar os braços do jogador, trazendo o foco da dança aos membros superiores.
Rapaz dança Pump It Up no Animecon 2010 (esquerda) e grupo aprende coreografia de Para Para
Paradise no Animecon 2008
Fonte: ANIMECON, 2011.
controle. É para o Wii que foi lançado Just Dance, jogo de 2009 da multinacional francesa
Ubisoft. Com gráficos coloridíssimos, jogabilidade mais intuitiva e uma seleção de hits
famosos, o game alcançou enorme popularidade, até entre pessoas que não tinham o costume
de jogar videogames. Outra grande diferença desse novo tipo de jogo de dança é que, ao
contrário do DDR e similares, em que a música era interrompida após muitos erros do jogador,
causando frustração, a geração do Just Dance permite que o jogador continue a jogar até o fim
da música, facilitando o processo de aprendizado das coreografias.
O Kinect, sistema de sensor de movimento dos consoles da linha Xbox, da Microsoft,
elevou a jogabilidade dos games de dança. Ao usar esse sistema para jogar Just Dance 2016,
versão mais atual da série, o jogador usa seu corpo inteiro para interagir com o console
(SILVA, 2013). Não é mais preciso segurar controles, já que ele possui uma câmera que capta
os movimentos do jogador. Mais do que nunca, não basta mover os pés ou as mãos para
“enganar” o jogo, é preciso participar de corpo todo.
Nos eventos de animê, o Just Dance, e às vezes seu concorrente Dance Central, é
jogado em um espaço delimitado no “chão” do próprio evento. É só em convenções maiores
ou em fases de torneios maiores que há um palco específico para esses jogos. Os games de
dança costumam ser jogados nos eventos com o número máximo de participantes possíveis,
dois no Dance Central e quatro no Just Dance.
É interessante notar que, em volta dos jogadores, forma-se uma roda de pessoas que
também conhecem a coreografia e a executam como se estivessem participando, fenômeno
também percebido na plateia que assiste às apresentações de k-covers.
101
Existem vários tipos de swordplay, atividade que simula combates medievais, dos
quais o boffering é o mais difundido no Brasil. A prática que aqui é conhecida como combate
medieval consiste na luta entre oponentes empunhando réplicas de armas brancas feitas de
materiais leves e revestidas de espuma para não causar contusões.
102
É a atividade cuja inspiração parece destoar das demais aqui descritas. Remete não só
a um outro lugar, a Europa, como a outra época, a Idade Média. O imaginário acionado é o
dos cavaleiros, com seus clãs, hierarquias e códigos de honra. Esses sistemas são emulados
pelos grupos de combate medieval em seus próprios encontros, mas não se fazem tão
relevantes para o público dos eventos de animê, em geral menos “fiel” à atividade.
A diferença de público é que nós aqui somos contratados pra trazer essa atividade e
mostrar pro pessoal. Ganha dos dois lados, né, porque a gente além de ganhar pra tá
aqui, a gente conhece muitas pessoas interessantes e leva elas também pra esse
mundo, mostra pra elas como é uma atividade tanto de socialização quanto uma
atividade física e até educacional. Então a gente aqui leva pra um público que chega
aqui, qualquer pessoa pode chegar, participar. E lá nos nossos treinos também é
aberto, qualquer pessoa pode chegar, participar, perguntar. Tem muitas vezes que os
pais levam os filhos, os filhos levam os pais, às vezes vai a família toda [...]
Geralmente isso aqui é uma porta de entrada pros jogos maiores (responsável pelo
combate medieval, entrevistado em evento).
No combate, cada participante da luta (seja um contra um, um contra vários ou vários
contra vários) escolhe suas armas, dentre espadas curtas, longas, lanças, machados e até
escudos, normalmente reproduções aproximadas de armas medievais. Os lutadores devem
atingir o(s) oponente(s), evitando golpes na cabeça, pescoço e “partes íntimas”, o que inclui
os seios no caso das moças, que são minoria no jogo. As regras podem variar, mas o mais
comum é os golpes no torso serem “fatais” e golpes nos membros fazem com que o lutador
“perca” a parte atingida, não podendo usar aquele braço ou perna até o fim da partida. Há
juízes, mas espera-se que o próprio atingido reconheça que foi golpeado, revelando a
importância dos ideais da honra e da honestidade (NAPPO, 2015).
A presença do combate medieval também pode parecer deslocada nos eventos de
animê mas, assim como os k-covers, é de fácil compreensão ao observarmos as origens da
prática. O fascínio com a Era Medieval é comum ao universo do que é comumente
compreendido como “nerd 23”, grupo que tem grande interseção com os interesses dos otakus,
como pode ser visto pela quantidade de videogames, jogos de tabuleiro e trading card games
jogados nos eventos de animê.
Um dos passatempos mais classicamente “nerds”, os RPGs (role-playing games),
jogos abertos e narrativos de interpretação de papéis em que os resultados das contendas são
decididos nos dados, são grandemente influenciados pelo gênero literário da fantasia medieval.
Surgiram dele os LARPs, live action role-playing games, em que os jogadores se caracterizam
23
Não há definição unânime para o termo, mas seriam características nerds a introversão, a timidez, a
intelectualidade, a facilidade com as novas tecnologias, o colecionismo e, especialmente, a paixão por
atividades que dizem respeito aos mundos da ficção e da fantasia.
103
como seus personagens e determinam o vencedor das lutas cruzando espadas (revestidas de
espuma). A partir daí, o boffering, ou combate medieval, parte que diz respeito a esse tipo de
luta, saiu apenas do domínio dos LARPs para se tornar uma prática à parte.
O swordplay, ele é um dos elementos do LARP. O LARP é o live action roleplay, ele
é um jogo de caracterização e atividade num cenário já predeterminado, por exemplo,
medieval fantástico, que é o nosso cenário, tem o medieval realista, tem o cyberpunk,
steampunk [...]. No caso, o swordplay é só mais uma das atividades. Por exemplo,
tem o LARP político, tem o LARP que é meio estilo Game of Thrones, o LARP
econômico, onde você pode simplesmente ser um ferreiro, um artesão, um padeiro,
um taberneiro. Você não precisa se envolver em combate direto, necessariamente, o
combate direto é só um dos elementos, às vezes pra resolver alguma contenda ou
você simplesmente é um guerreiro contratado pra acabar com outro reino. [...] Essa
aqui é uma atividade mais nerd, mais diferenciada (responsável pelo combate
medieval, entrevistado em evento).
A inspiração mais óbvia do combate é a Idade Média, mas não qualquer Idade Média,
e sim um recorte específicos dessa era: a nobreza cavalheiresca da época das Cruzadas, com
seus ideais românticos e de honra, numa sociedade hierárquica com base na
consanguinidade/hereditariedade, dividida em estamentos. O combate medieval, então,
provém em grande parte à noção de cavaleiro como retratado nos filmes e livros de ficção, já
que não há como ter acesso direto à realidade dos cavaleiros medievais. Somam-se a isso os
imaginários fantásticos de um mundo regido pela magia e povoado por dragões, prontos para
serem heroicamente aniquilados no evento de animê mais perto da sua casa.
104
Desse modo, a roupa “fala”, comunicando uma grande quantidade de informação antes que se
estabeleça qualquer conversa, pois se apresenta como elemento da fachada pessoal do
indivíduo (GOFFMAN, 1983).
Para muitos frequentadores de eventos, os cosplays ou as peças de roupas e adereços
que vestem nos eventos representam mais a realidade de quem eles são do que as roupas que
vestem na vida cotidiana, de modo que é “como se, ao disfarçar-se de personagens de
desenhos animados, os jovens chegassem a encontrar sua verdadeira personalidade. Como se
a roupa insípida de todos os dias fosse de fato o verdadeiro disfarce” (BARRAL, 2000, p.
140).
Um grande número de frequentadores veste camisetas pretas de bandas, de animê ou
games mas, mesmo quando não estão vestidos de algum personagem ou segundo algum estilo
específico, usam muitos adereços e acessórios que marcam seu pertencimento à tribo. Usam
colares metálicos com pingentes (para moças e também rapazes), sobretudos, luvas, presilhas
de cabelo, chaveiros e bótons na bolsa ou mochila, os quais podem ou não fazer menção a
personagens ou séries específicas. Há também as touquinhas, orelhinhas e rabos de bichinho,
que são usados por garotos e garotas.
é engraçado porque nunca parei para pensar por que usava os gorrinhos. acho que no
final das contas era um lance de identidade. eu via o pessoal usando e queria usar
também. era como se eu quisesse mostrar que fazia parte daquele grupo
(entrevistado, ex-frequentador, 30 anos).
Todos esses elementos tornam difícil identificar até onde vai a simples composição de
acessórios e onde começa o cosplay. Esses modos de vestir as paixões traz à tona a
importância do corpo na sociabilidade, o qual serve como um outdoor afetivo que convida o
contato de outros membros da tribo. É comum nos eventos uma pessoa iniciar uma conversa
com outra apenas por tê-la visto usando uma camiseta ou bóton de um animê ou série do qual
também gosta.
3.3 Plaquinhas
O aparato comunicativo que mais chama a atenção dos não iniciados são as chamadas
“plaquinhas”, pequenas lousas brancas portáteis feitas de fórmica, que possuem um cabo de
106
madeira por onde são seguradas. Em sua superfície, normalmente de ambos os lados, é
possível escrever com a caneta de ponta porosa que a acompanha, de modo que se podem
limpar as marcações com um apagador ou mesmo com a mão. Assim, é possível alterar partes
da mensagem, apagá-la e reescrever quanto e quando a pessoa quiser.
É difícil determinar com precisão a data, o lugar ou a circunstância da criação das
plaquinhas, mas há relatos de que existiriam desde 2001, ao menos em alguma versão
primitiva (PLAQUINHAS, 2010). Tudo teria tido início nos eventos de São Paulo com os
comentários às apresentações que ocorriam no palco principal, que surgiam em forma de
reações gritadas por parte de membros da plateia. Devido à dificuldade de se fazer
compreender em meio a dezenas de gritos diferentes, alguns participantes do evento
começaram a escrever mensagens em folhas de caderno, que escreviam na hora e levantavam,
de modo que pudesse ser vista do palco e também pelos demais membros da plateia. Ambas
as práticas, gritar comentários e escrever em folhas de caderno, são comuns até hoje, mas
alguns frequentadores dos eventos resolveram sofisticar a forma de transmitir suas opiniões.
Começaram então a levar placas prontas de casa, feitas de cartolina ou papel colados a
algum tipo de haste. Como não era possível apagar a mensagem, as placas eram sucintas e
genéricas, como uma mão com polegar para cima, outra com o polegar para baixo ou então
alguma palavra ou frase curta. Usavam-se também placas com desenho de gota, código visual
empregado nos animês e mangás para denotar embaraço ou desconforto. A placa de gota caiu
em desuso, mas esse símbolo ainda é comumente encontrado nas plaquinhas de lousa. Essa e
outras convenções gráficas dos mangás “são, em grande parte, transparentes, expressam
emoções que são facilmente decodificadas pelos leitores” (FREITAS; NUNES, 2012, p. 12).
Os otakus da época anterior às placas de lousa estavam, portanto, utilizando códigos dos
próprios mangás para comunicar suas emoções de maneira condensada e eficiente, já que se
supõe que a maioria dos presentes compartilhava desse mesmo conjunto de significados.
Mais tarde, os frequentadores dos eventos chegaram a uma solução capaz de poder
transmitir pensamentos mais complexos e imediatos, de forma mais visível do que traços de
caneta esferográfica no papel e que ainda evitava o gasto de várias folhas de caderno. Surgiam
assim as plaquinhas do tipo lousa branca, feitas por eles próprios e que, a princípio, só podiam
ser escritas em um dos lados.
Seguindo a tendência lançada pelos próprios frequentadores dos eventos, algumas das
empresas que tinham estandes nos eventos começaram a fazer lousas dupla face para
distribuir como brinde na aquisição de algum outro produto. Essas placas retangulares tinham
e logomarca da empresa e, muitas vezes, uma moldura desenhada no formato de balão de fala,
107
em clara alusão ao modo de apresentação de texto nos mangás. Até hoje podem ser
encontradas nos eventos algumas plaquinhas cuja lousa é cortada nesse formato de balão
(figura 47), ainda que a de forma retangular e sem nenhuma logomarca seja mais comum.
Os usos das plaquinhas são tão diversos quanto as pessoas que as carregam. Devido ao
clima festivo dos eventos, as inscrições costumam ser bem-humoradas e zombeteiras, por
vezes entrando no terreno do que alguns dos próprios frequentadores consideram apelativo ou
de mau gosto.
As mensagens possíveis são praticamente infinitas, mas muitas delas acabam se
encaixando em fórmulas consagradas. É possível, portanto, ensaiar uma classificação das
mensagens mais comuns, compreendendo que as categorias a seguir são flexíveis, muitas
vezes se misturando, e que toda tipificação é essencialmente uma simplificação.
Há placas que não convidam diretamente a algum tipo de interação específica, como
as que só contêm algum tipo de declaração ou desenho, que parecem externar apenas a
vontade do autor de se expressar. Outras têm como objetivo a autopromoção, divulgando uma
rádio online, conta em rede social ou canal do Youtube, normalmente pertencentes ao portador,
que o mesmo deseja que os demais acompanhem na Internet. Tais tipos de mensagem podem
suscitar a conversa de passantes com o portador, mas essas abordagens não são necessárias
para servir à função expositiva da mensagem.
A maioria dos outros modelos de mensagem, no entanto, só cumpre o papel desejado
pelo autor da placa quando gera a participação de outras pessoas. É frequente, por exemplo,
108
encontrar plaquinhas que promovem enquetes informais. Pode haver uma pergunta no topo
(figura 48), trazendo abaixo as alternativas de resposta. Pode também apenas conter alguns
nomes de animês, personagens ou bandas, por exemplo, caso em que os passantes podem
votar em seu preferido (figura 48). O portador da plaquinha de enquete está implicitamente
aberto a abordagens, de modo que qualquer pessoa pode ir até ele, que oferecerá a caneta para
que o passante acrescente um traço à área da lousa que contém a opção em que deseja votar.
O voto também pode ser registrado oralmente, caso em que o dono da placa fará a marcação
que foi pedida.
pede “free hugs” ou sua tradução, “abraço grátis”. A prática de oferecer abraços a estranhos
sem pedir nada em troca se espalhou pelo mundo a partir do vídeo viral em que o australiano
de pseudônimo Juan Mann anda com uma placa em que se lê “FREE HUGS”. “Mann apenas
esperava que um transeunte qualquer, ao ler a mensagem no cartaz, se sensibilizasse e
também se propusesse à troca de abraços, sem necessidade de perguntar o motivo da
proposta” (MARTINS; GUSHIKEN, 2012, p. 183). O movimento mais tarde virou uma
campanha, incluindo flash mobs em várias cidades do mundo. Mas os abraços grátis já
transcenderam qualquer relação com a campanha e tornaram-se tradição nos eventos de animê,
a tal ponto que atualmente é quase impossível passar o dia inteiro em uma dessas convenções
e não se deparar com pelo menos uma plaquinha oferecendo abraços.
Alguns frequentadores de eventos se aproveitam dessas fórmulas para pregar peças
naqueles que aceitam a oferta de sua plaquinha. Uma pegadinha comum é uma menina andar
com uma placa de “beijo grátis”. Quando abordada por algum rapaz, ela vira a placa, cuja
outra face revela que ela só beija outras meninas ou que os beijos grátis na verdade dizem
respeito ao amigo que está andando ao lado dela.
Os criadores dos kaomoji recorrem à linguagem visual dos mangás, que retratam
estados emocionais internos, na elaboração de rostos a partir de botões do teclado. A
forte influência do mangá no desenvolvimento dos kaomoji fica mais aparente em
111
exemplos mais elaborados que combinam texto e grafemas para produzir, com efeito,
células de expressão online no estilo mangá24 (KATSUNO; YANO, 2002, p. 14).
Figura 51 – Kaomojis
Para além das brincadeiras e da pura autoexpressão, a maioria das placas carregam
recados cujo propósito é servir de quebra-gelo para o contato face a face. O meio escrito
aumenta exponencialmente o número de destinatários da proposta do dono da placa, o que
resulta em mais pessoas aceitando seu convite, tudo sem que ele tenha precisado abordar
ninguém ou vocalizar uma única sílaba. Devido às inúmeras possibilidades que criam, as
plaquinhas são instrumentos que auxiliam no gozo da corporeidade facilitada pela ambiência
dos eventos. Talvez se usadas em outros contextos ou isoladamente, as placas de fórmica
causassem estranhamento e rejeição, mas nessas ocasiões, esses simples aparatos de escrita
24
Tradução nossa, do inglês: “Creators of kaomoji draw upon the manga visual language depicting internal
emotional states in fashioning faces from keyboard strokes. The strong influence of manga upon the
development of kaomoji can best be seen in more elaborate examples that combine text and graphemes to
produce, in effect, on-line manga-like cells of expression.”
112
Os eventos de animê são “um mundo à parte” enquanto duram, como territorializações
temporárias heterotópicas, festividades que têm o poder de por em primeiro plano aquilo “que
113
já está lá”. Mas sua importância e o que eles representam para as pessoas que têm com eles
uma conexão afetiva vai além daquilo que é visível durante os encontros. Pensar a estética
como ética e o lugar como ligação podem ser o suficiente para enxergar o elã que une cada
tribo e as tribos entre si, todavia as rivalidades e insatisfações muitas vezes são silenciosas ou
murmuradas apenas para os mais chegados, raramente se traduzindo em conflito aberto no
decorrer das festividades.
Por isso que você tem que misturar essas culturas e a partir daí que surgiu o evento
de cultura pop [...] que é quando tudo tem sua vez, tudo tem seu momento, tudo tem
sua parte. Todos esses nichos, é o momento que todo mundo se dá bem ali, que se
interage. Às vezes nem se dá tão bem assim, né (comentário em blog).
trazendo outras tendências para os eventos. Como observa Igor Lucena, um dos diretores do
SANA, que começou em 2001 em Fortaleza como evento de animê e atualmente é um dos
maiores eventos multitemáticos de cultura pop do Brasil:
O público se renova e as atrações se renovam tanto para o público mais velho quanto
mais novo. Meus amigos solteiros que vinham ao evento, hoje estão casados e levam
seus filhos, sua família, e com isso surge um novo público que nunca vai ver que o
SANA era um evento só de anime. Hoje o evento para eles vai ser uma coisa, o próximo
que vier já vai ser outra muito maior, mais diversificada — mas também não dá pra você
negar que tenham os carros chefes, como games, animes ou quadrinhos (LUCENA, 2015,
online).
À medida que os eventos foram se abrindo para novas atrações, que agradavam a
diferentes tribos urbanas, a ambiência criada passou a ser convidativa para um leque mais
amplo de possibilidades de autoexpressão. No começo não havia nenhuma regra formal que
impedisse certos tipos de cosplay ou vestimentas mas, nos primeiros eventos, apenas se viam
cosplays de animês, mangás, tokusatsu e videogames japoneses, já que era esse o tipo de
participação que eventos estritamente de cultura pop japonesa implicitamente estimulava.
André Fava: Lembro até hoje em 2004, foi lá o cara de cosplay numa armadura de
Unreal, fenomenal, o cara fez tudo em papelão, o negócio parecia todo de ferro,
brilhava, explodia. “Ah, você não vai participar porque isso não é japonês, não é
desenho japonês”. Em nenhum lugar da regra falava isso (dito no podcast
ALMEIDA et al., 2014).
Vê-se hoje o público usando roupas, acessórios e cosplay que fazem referência às mais
variadas franquias da cultura pop. Assim, uma pessoa que fosse a eventos há dez anos e
gostasse tanto de animê quanto de seriados norte-americanos talvez optasse por um cosplay
relativo a uma série japonesa. Mas, atualmente, vestir-se de personagens ocidentais nos
eventos é uma alternativa perfeitamente aceitável. Pode-se dizer que o frequentador dos
eventos de animê, então, é “um indivíduo estético ou, mais exatamente, transestético por não
depender mais do estesismo à moda antiga, compartimentado e hierarquizado.”
(LIPOVETSKY; SERROY, p. 30).
A integração de pessoas com gostos distintos agradou uma parte dos frequentadores,
os quais acreditam que otakus, nerds, geeks, gamers e outros tipos de fãs são parecidos e o
115
convívio com mais tribos diversas enriquece o encontro e abre novas possibilidades de
confraternização.
O nerd joga video games e assiste animes, o otaku joga video games e curte hq, ai eu
te pergunto qual a diferença? [...] Se o público quase que totalmente curte um pouco
de cada coisa, é muito melhor ter um pouco de cada coisa, a diversidade é que torna
as coisas interessantes [...] não existe ninguém completamente fan só de animes e
outros completamente fans só de jogos! Eu mesmo [...] sempre gostei das duas
coisas e ir a eventos e mesclam ambos sempre foi algo muito conveniente para mim
assim posso ver e comprar artigos otakus, gamers e tirar fotos com meus youtubes
favoritos (comentário em vídeo no Youtube).
Eu acho bom misturar um pouco as culturas. É até melhor a galera otaku, gamer e
geeks em geral juntar todo mundo em um lugar interagindo, não me importo se
gamers e otakus estão no mesmo lugar, é melhor estarmos junto fazendo amizades,
brincando e etc.. do que estar se separando e criando treta por causa disso
(comentário em vídeo no Youtube).
É muito bom conviver com pessoas de outras “tribos” obviamente dês de que sejam
coisas legais. Quadrinhos e mangás tem tudo a ver com o outro. Do mesmo modo
que tem a ver com series e filmes e mesmo musica (comentário no Facebook).
Mas para alguns frequentadores antigos, existe um limite de quais as atrações que
poderiam ou não fazer parte de um evento de animê, já que é comum as tribos urbanas
estabelecerem algum tipo de policiamento de fronteiras para que possa manter coeso seu
senso de identificação. Assim, mesmo os que acharam a integração positiva costumam
acreditar que há certas tribos que “combinam” com esse tipo de eventos e há outras que
fugiriam da proposta.
Eu não acho que seja ruim a união entre anime e games em um só evento, até porque
existem muitas pessoas que curtem games e animes ao mesmo tempo. [...] Enfim, o
grande problema não é a fusão entre otaku + gamer e sim otaku + youtubers fans que
tem um gosto totalmente diferenciado e, geralmente, incompatível com a cultura
otaku (comentário em vídeo no Youtube).
Januncio Neto: O que que esse público quer? (...) eu vi comentários do tipo (...) “ah,
pra mim evento acabou no momento em que permitiu que entrasse cosplay de super-
herói americano”, “ah, pra mim evento de anime acabou quando permitiram que
entrasse videogame”, “ah, pra mim evento acabou quando permitiu que entrasse o k-
pop” (dito no podcast SANTOS et al., 2016b).
Cara, vou te dizer que eu frequento evento de anime desde 2006, e desde que eu
frequento, tem ALGUMA COISA DO DEMÔNIO que sempre “estragava os
eventos”. Primeiro eram os emos, depois era o kpop, e agora são os youtubers. E
assim, as gerações dos eventos se renovava. Eu, por outro lado, tava sempre lá. E se
quer saber, eu ainda gosto deles, ainda vejo meus amigos de 10 anos atrás, ainda
tomo Mupy e me divirto muito (comentário no Facebook).
Outras são categóricos em afirmar que um evento que inclui youtubers, fãs de Harry
Potter e de k-pop foi totalmente descaracterizado em relação à sua japonesidade, já que a
ocidentalização crescente significaria a perda da essência daquilo que os eventos de animê
deveriam ser.
Desculpa [...], mas em um evento que se diz "de anime" acho absurdo virem com
salas kpop, Harry Potter, Crepúsculo, Medieval, entre outros. Sintome extremamente
ofendido pelo descompromisso para com a própria declaração. Não tenho nada
contra quem aprecia isso (quer dizer, desde não seja lunático nem ignorante), mas
cada um em seu espaço. Toda vez que vejo isso, eu me sinto como ao entrar em uma
loja de informática e encontrar uma geladeira (comentário em blog).
Os eventos atuais a cada dia que passam, deixam de ser eventos de cultura pop
japonesa e ficam socando atrações que não tem nada a ver com a cultura japonesa.
Eles perderam totalmente a sua essência e estão se "ocidentalizando" completamente
com o objetivo de agradar públicos completamente diferentes, as atrações dedicadas
a fãs de anime, mangá, tokusatsu, Jmusic e afins aos poucos estão desaparecendo
(SHIMAKAZE, 2016).
A perda de território físico e simbólico da cultura pop japonesa nos eventos fez com
que a antiga “tribo dominante” dos otakus se tornasse apenas uma dentre muitas, não mais
determinando sozinha a ambiência dos encontros. Se, por um lado, gostar de desenhos
japoneses se tornou um hobby mais aceito e mais fácil de usufruir, essa incorporação do pop
japonês ao gosto mainstream fez com que a exclusividade temática japonesa perdesse a razão
de ser. Desse modo, os eventos de animê, que sempre foram um lugar onde os otakus
puderam “ser eles mesmos”, passaram a ser frequentados por pessoas que não
necessariamente compartilhavam de seus modos de ser e de se expressar. O encontro com a
alteridade, com pessoas que vivenciam de modos diferentes suas paixões por objetos outros
da cultura pop, pode levar a estranhamentos e a perda do sentimento de pertença
incondicional propiciado pela identificação com uma tribo.
Evento de anime deveria ser (...) um lugar onde por mais estranho que eu pareça ou
me comporte sou igual a todo mundo, isso dá uma segurança sabe ? Quando começo
a sentir que algumas das minhas ações não são bem vindas, como ficar gritando
117
genki dama, não vou me sentir totalmente livre das amarras sociais cotidianas. Mas,
no entando, se a maioria dos frequentadores não for do meu estilo então eu me retiro
de fininho com meu banquinho (comentário em blog).
Eu ouvi de um amigo que trabalha nesse ramo, né, que é dono de um grande evento.
“(...) os eventos de anime no Brasil estão mortos”, e eu fiquei com isso na cabeça, eu
falei “Poxa, mas os eventos de anime estão mortos?”, Sim, os eventos de anime
estão mortos porque hoje o pessoal, a grande maioria das vezes só vai num evento
pra poder ver os benditos dos youtubers (SILVEIRA, 2016, online).
Desse modo, não haveria mais por que chamar os eventos atuais de eventos de animê,
o que já era uma preocupação em 2011, como visto nos comentários de um post do blog Mais
de Oito Mil.
Os eventos estão apelando pra tudo: Chaves, Harry Potter, Star Wars, Medieval
etc… Então pra que a alcunha Anime? Um evento de tal permissividade não merece
ter anime no nome! [...] Eventos assim tirem o nome Anime e assumam outro
(comentário em blog).
A palavra ANIME no nome desse eventos ta perdendo o sentido. Nao que eu ache
que estao cometendo uma heresia ao misturar anime com outras coisas.
Eh soh uma questao de mudar o maldito nome. [...] poderia tirar esse `Anim` do
nome… Nao sei o q iria no lugar, infelizmente (comentário em blog).
O que temos hoje são eventos sobre a cultura pop jovem, não só a oriental, mas que
ao menos estão interligados (a maioria), como kpop, games, etc (comentário em
blog).
Youtubers não deixam de ser cultura nerd, mas nessa questão de que os eventos de
anime estão se ocidentalizando eu concordo totalmente. Nem deveria ser mais
“evento de anime”, e sim evento de cultura nerd... [...] Cultura nerd pra mim é tudo
118
com a mudança brusca de foco nesses eventos de "anime" onde a parte de anime
acaba se tornando minuscula fora das quinquilhiarias piratas não haveria tanta gente
descontente. Anime Friends por exemplo ta na hora de trocar o nome para
Youtubers/Memes Friends (comentário em blog).
Mesmo pessoas que estão insatisfeitas com o estado atual dos eventos admitem que
eles já não têm como se sustentar sendo só “de animê”. Colocar youtubers como atração
principal é extremamente rentável para os organizadores, justamente porque as estrelas da
internet são muito requisitadas pelos atuais frequentadores. Mesmo que os youtubers não
fossem chamados, já não há mais como realizar eventos “puramente” de animê, até porque já
não o são praticamente desde que deixaram de ser meras exibições de animê.
Januncio Neto: Vão se criando vários nichos, e os eventos a partir de agora (...)
convergem pra tentar agregar pra todos esses nichos. Porque hoje em dia, eu
confesso, ficaria muito difícil você fazer um evento de cultura pop exclusivamente
japonesa como muitos querem, ou muitos têm saudade, e ainda assim ter uma
demanda de público comercialmente viável (dito no podcast SANTOS, 2016b).
Eu gosto muito das palestras, ainda mais quando quem vai dar a palestra, eu sou fã.
Tipo hoje, o [youtuber] T3ddy vai tá lá em cima e eu sou fã dele. Então eu tô
esperando a hora pra eu ir lá (entrevistada em evento).
Eu vou nos eventos só porque que é lá que todos meus amigos vão se encontrar com
certeza! Sei que dá pra se encontrar em outros lugares e tal, mas um evento e anime
é um evento de anime; Tem coisas como os convidados especiais, karaokê,
cosplayers e a possibilidade de fazer mais amigos (comentário em blog).
Na minha opinião o mais legal é curtir o que você gosta com as pessoas que você
gosta, junto com varias outras pessoas com gosto parecido com o seu, o principal
sentimento que esses eventos passam é de pertencer a um grupo, de ser você mesmo
sem ser jugado (comentário em blog).
Assim, o que se busca nos eventos é uma sucessão de momentos de intensidade, que
pode ser atingida pela dissolução na tribo, a qual se congrega sob o “pretexto” nada
negligenciável de estar na proximidade física de seu objeto de adoração, seja qual for a
manifestação física que esse objeto possa tomar. Se em casa é possível ver, seja animês ou
filmes de super-herói, no evento é possível vive-los. Experienciar o êxtase de “ser” nos
mundos da fantasia com os quais se sonha, experimentar de tudo um pouco daquilo que a
cultura pop engendra como imaginários.
[O visitante do evento] não quer só ver, ele quer participar, ele quer ter uma
experiência, ele quer ter uma noção. Então, o que muda bastante é a interação. O
público demanda atrações que interajam com ele. Então a gente tem trono oficial do
Game of Thrones, nós vamos fazer agora a arena do Pokémon Go no formato do
ginásio real. [...] A pessoa tem que tá imersa nesse cenário. [...] A transposição de
mídia hoje do anime que vai pro mangá, que vai pro game, que vai pro cinema, isso
é importantíssimo, ele tem que tá cercado de todas essas atividades dos personagens
dele favoritos (LUCENA, 2016).
japonesa. Essa abordagem era adequada para falar dos eventos até o final da década passada,
mas o que vemos hoje é uma constelação de diferentes tribos urbanas que têm em comum o
fato de serem fãs de um ou mais aspectos da cultura pop.
Um fã é alguém que tem um envolvimento emocional e intelectual com algum gênero
ou texto midiático, sendo assim um leitor “excessivo”, que diferiria do leitor “normal” no
grau de importância que certo texto adquire em sua vida (FISKE, 1992). A origem da palavra
remonta ao latim “fanaticus”, que significava originalmente servo ou devoto de um templo,
mais tarde vindo a incorporar a conotação de alguém em estado de frenesi causado por um
rito orgiástico (JENKINS, 1992). A excessividade e a associação tanto à devoção da
religiosidade quanto à libido generalizada da orgia são comumente malvistas, de modo que
não raro se procura afastar os fãs desses significados. No entanto, “o que é esta orgia senão o
aspecto fundador de uma paixão comum, de emoções tornadas comuns, de sentimentos que
saem para a praça pública” (MAFFESOLI, 2004, p. 80)?
Os eventos de cultura pop são ocasiões para que os fãs exercitem suas paixões
partilhadas e comunguem da imanência que é elevada à transcendência por meio da
intensidade de um momento vivido na ambiência de diversos imaginários pop, num
verdadeiro politeísmo de valores. Assim, ainda que não consideremos qualquer público como
fã, os frequentadores de eventos de animê satisfazem os dois eixos mais proeminentes do
engajamento de fã: o investimento emocional pessoal e envolvimento com a comunidade de
fãs (BUSSE, 2006).
O coletivo de fãs é conhecido como fandom, junção de “fan” e “dom”, ou seja,
território ou domínio dos fãs, para os quais a cultura pop é como um portfólio de investimento
emocional, matéria-prima a partir da qual constroem mapas de significatividade
(GROSSBERG, 1992). Mapas esses que são a um tempo individuais e coletivos,
constantemente sendo redesenhados para comportar os novos territórios relacionais dos fãs, os
quais não tanto dominam como se deixam dominar pelos espaços afetivos que habitam. O
enraizamento dinâmico de um indivíduo apenas tem como se fincar provisoriamente no
húmus efêmero do espírito do tempo.
Desse modo, parece adequado observar os frequentadores de eventos pelo viés do
entrecruzamento dos diversos fandoms dos quais fazem parte, contemplando assim os
variados aspectos da cultura pop que se deixam perceber nos eventos e na caracterização de
seus frequentadores para além da cultura pop japonesa. Para encarar espaços quentes e
abarrotados, filas que dão a volta no quarteirão e percursos que por vezes são verdadeiras
peregrinações interestaduais, é preciso um nível de engajamento que coloca essas pessoas no
121
terreno do fã. Não importa se de animê, tokusatsu, k-pop ou algum youtuber, todos lá são fãs
de um ou, mais frequentemente, muitos objetos. Os eventos de animê atuais e seus
frequentadores precisam ser compreendidos sob o prisma das práticas interculturais de fãs,
mas sem fixá-los em diferentes grupos ou objetos de adoração, uma vez que é preciso
“considerar como as pessoas podem ser fãs de múltiplos textos ao mesmo tempo, bem como o
modo como as pessoas se movem através de e entre diferentes fandoms ao longo do tempo25”
(HILLS, 2014, p. 9).
25
Tradução nossa, do inglês: “consider how people can be fans of multiple texts at the same time, as well as how
people might move through and between different fandoms over time”
122
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os mangás e animês, que são para o Ocidente as mídias de cultura pop mais
emblemáticas do Japão, têm como pano de fundo valores tradicionais da cultura japonesa,
como honra, amizade, sacrifício e valorização do grupo acima do indivíduo. Ao mesmo tempo
em sua própria conformação como mídias incorporaram influências estrangeiras,
especialmente dos Estados Unidos, já que surgem no contexto da globalização e da cultura de
massa do século XX. Dessa forma, já nascem hibridizados.
O consumo dos mangás e animês no Ocidente como formador de uma identidade
específica chega aqui filtrado pelo conceito de otaku, que no Japão se referia a um estereótipo
de jovens que preferiam se isolar em casa a assumir seu papel na sociedade como adultos,
rodeando-se de tecnologias e de produtos da cultura midiática, especialmente quadrinhos e
animações. Se no Japão otaku era uma designação extremamente pejorativa normalmente
aplicada a terceiros, o termo passou a ser empregado no Ocidente para designar fãs da cultura
pop japonesa, na maior parte das vezes sendo empregado por essas próprias pessoas para
demarcar seu apreço por animês e mangás.
O conceito de otaku chegou ao Brasil na década de 1990, quando ocorreu o boom da
cultura pop japonesa a partir da exibição do animê Cavaleiros do Zodíaco na Rede Manchete.
Com o grande interesse pela cultura pop japonesa e devido à dificuldade de acesso à esse
material fora da TV aberta, os fãs de desenhos e seriados japoneses começaram a organizar
exibições de animês e encontros que dariam origem aos chamados eventos de animê.
Quando surgiram, os eventos de animê tinham como objetivo ser ocasiões em que as
pessoas podiam assistir animês, comprar fitas cassete com episódios e estar na companhia de
outros que compartilhavam dos mesmos interesses. Supriam assim as duas grandes
123
dificuldades dos otakus do fim da década de 1990, conseguir novos animês e conhecer outros
fãs da cultura pop japonesa.
Os primeiros eventos não eram muito mais que exibições de vídeos, às vezes até sem
legendas, e uma ou outra barraquinha vendendo fitas VHS e bonequinhos. Com o sucesso dos
eventos e o aumento exponencial do número de frequentadores, esses encontros foram
incorporando mais atrações e melhorando sua infraestrutura.
Estabeleceu-se, então, uma fórmula para esse tipo de eventos, que consistia em
exibições de animê, pelo menos um palco com atrações como concurso de cosplay e shows
musicais, área de estandes oferecendo produtos relacionados à cultura pop japonesa, além de
espaços dedicados a outras atividades, como videogames, RPG, combate medieval.
Na primeira década do século XXI foi ficando cada vez mais fácil para os otakus
terem acesso aos animês por meio da internet, livrando-os de ter que acompanhar apenas as
séries exibidas na televisão e mesmo da necessidade de ver animês nos eventos. Assim, as
exibições de animês, antes a atividade principal dos encontros e maior motivação para
frequentá-los foi sendo relegada a espaços cada vez menores e menos importantes. Enquanto
os animês foram saindo da TV, tanto aberta quanto fechada, o mercado oficial de mangás vem
crescendo desde o ano 2000, com cada vez mais títulos disponíveis nas bancas brasileiras.
Mas, se no começo, valia a pena economizar dinheiro para comprar mangás com promoções
vantajosas nos eventos, os descontos foram diminuindo e fazendo ser mais interessante
comprá-los nas bancas e livrarias ou mesmo por meio dos sites das mesmas lojas que os
vendem nos eventos. Com a diminuição do espaço físico e simbólico ocupado pelos animês e
mangás nos eventos, esse tipo de convenção viu a necessidade de se reinventar
constantemente para manter-se atraente, oferecendo atrações que agradavam a diversos nichos
do mundo otaku. Assim, os eventos foram se tornando multitemáticos e incluindo atividades
cada vez mais distantes do “núcleo” da cultura pop japonesa.
Se no começo os eventos se autodefiniam como “eventos de cultura pop japonesa”,
com o tempo passaram a “eventos de cultura pop”. Com a ascensão dos youtubers a atrações
principais, por volta de 2014, cada vez mais eventos se assumiram como direcionados ao
público geek, denominação similar a nerd, porém menos pejorativa, que vinha ganhando força
desde meados da década de 2000 para designar fãs da cultura pop em geral. Alguns eventos
vêm acrescentando a palavra geek ao próprio nome, ainda mantendo “anime” numa tentativa
de se manter reconhecível para os frequentadores antigos e ao mesmo tempo atrair o público
geek. Têm também surgido eventos geeks que são em praticamente todos os aspectos
124
indistinguíveis dos eventos ainda ditos de “animê”, algumas vezes organizados pelas mesmas
produtoras que realizam os eventos de “animê”.
Enquanto as exibições de animês estão praticamente extintas dos eventos e os
dubladores muitas vezes são convidados como atrações secundárias, o palco principal agora é
o local onde acontecem as entrevistas com youtubers, concursos de cosplay, shows de bandas
covers e competições de grupos de k-pop.
Nos estandes e nas áreas temáticas, encontramos referências aos mais variados filmes,
livros e séries, que muitas vezes ultrapassam o número de produtos relacionados à cultura pop
japonesa. Os brinquedos e colecionáveis, antes quase limitados a miniaturas de personagens
de animês, mangás e games japoneses, hoje variam muito mais contando com produtos
licenciados referentes a diversos ícones da cultura pop mundial, com bonecos baseados em
séries como Breaking Bad dividindo espaço com a cobiçada edição especial dos bonecos dos
Cavaleiros do Zodíaco.
As mudanças nos eventos também se refletem no público, que antes era composto em
grande maioria por fãs de animês e mangás, com suas camisetas estampadas com seus
personagens favoritos, mochilas para carregar suas compras e touquinhas que simulavam
personagens da cultura pop nipônica. Hoje, esse perfil de frequentador ainda existe, mas
vemos também tribos mais heterogêneas, com pessoas de todas as idades circulando com
roupas e acessórios que refletem seus gostos mais variados. Como o pertencimento tribal é
cambiante e não exclusivo, uma mesma pessoa pode se sentir parte de alguns desses grupos,
mas não necessariamente de outros. Sejam nerds, otakus, gamers ou fãs de seriados, no evento
de animê todos têm vez.
Tanto para tendências mais duradouras, dentre as quais fazem parte as mudanças nas
palestras e a ascensão dos k-pop covers, como para as modas mais passageiras, os eventos de
animê funcionam como termômetro da cultura pop japonesa e da cultura pop mundial no
Brasil (CAVALCANTE, 2008). Seja a última temporada do animê Tokyo Ghoul, o mais
recente filme da Marvel ou o novo episódio de Star Wars que ainda nem saiu nos cinemas, o
que quer que esteja em alta no momento estará estampado em bótons, em camisetas, será
inspiração para muitos cosplays, palestras e áreas temáticas. Nas convenções atuais, Capitão
América e Batman, por exemplo, são tão populares quanto Goku, de Dragon Ball, e Kirito, de
Sword Art Online, e o mesmo pode ser dito de personagens e séries de videogames. O evento
de animê segue o ethos do fã, que sabe ser fiel a amores de longa data, mas tem também fortes
inclinações poliamorosas, vivendo intensas paixões cuja fagulha é uma ou outra novidade da
cultura pop, mas cujo combustível é a experiência social de partilhar angústias e prazeres.
125
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