Rodrigo Herles Santos
Rodrigo Herles Santos
Rodrigo Herles Santos
São Cristóvão/SE
2015
RODRIGO HERLES DOS SANTOS
São Cristóvão/SE
2015
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
334 f. : il.
CDU: 911.373(813.7)
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
BANCA EXAMINADORA
São Cristóvão/SE
2015
AGRADEÇO...
Roland Barthes
RESUMO
Esta pesquisa aborda a formação do Litoral sergipano. Esse espaço que foi
historicamente constituído e socialmente apropriado. O intuito primeiro é refletir
sobre espaço da comunidade tradicional na perspectiva de sua constituição como
uma formação territorial, verificando os espaços referenciados pelos moradores e a
articulação destes na conformação de identidades sociais e territoriais no Litoral. Em
termos metodológicos, nossa escolha foi por inscrever a pesquisa em uma
abordagem qualitativa, cujo arcabouço de investigação, se adere a natureza
relacional e fenomênica das interações entre natureza, cultura, espaço e território
que exploramos. O desenvolvimento da tese iniciou-se pela apreciação dos
elementos teóricos sobre as categorias utilizadas na análise, especialmente a
discussão sobre território, identidade e representação. Na sequência,
estabelecemos uma análise sobre fatos e processos históricos que ajudam a
compreender a formação territorial de Sergipe de maneira mais ampla e, a do Litoral,
de maneira mais especifica, com foco na constituição das comunidades tradicionais
de pesca. Neste ponto, nos interessamos em fornecer elementos para o
entendimento de como a população tradicional, geralmente excluída de processos
políticos e econômicos hegemônicos, acabou por ocupar ambientes raros e
valorizados do espaço sergipano. O processo de apropriação do espaço e sua
representação foram analisados levando-se em consideração os elementos
espaciais referenciados pelos sujeitos do Litoral. Para tanto, situamos nosso locus
de pesquisa em três comunidades tradicionais de Terra Caída, Pedreiras e
Tigre/Junça entre Litoral Sul, Central e Norte, respectivamente. Adotamos
procedimentos e instrumentos de pesquisa para captar a representação que fora
feita do território em cada comunidade, levando em consideração a distribuição entre
crianças e jovens, adultos e idosos. Nesse sentido, examinamos a constituição das
identidades dos sujeitos, a narrativa da historicidade dele com o seu espaço de
vivência e referência e verificamos a existência de identidade com os espaços e
ambientes litorâneos. A relação entre identidade e território se expressa justamente
na perspectiva de ficar no território, como ato e um sentimento de permanência e de
enraizamento naquilo me pertence na mesma medida que pertenço a esse território.
Por fim, entre a condição de refúgio no vazio do Litoral e a relação de moradia e lar
estabelecido nos territórios, refletimos sobre as identidades e territórios das
comunidades tradicionais do Litoral de Sergipe entre as vivências, as práticas de
trabalho e as “in-visibilidades”.
This research addresses the territorial formation of the Coast Sergipe. This space
was historically constituted and socially appropriate. The first aim is to reflect on the
traditional community space in view of its constitution as a territorial formation,
checking the spaces, referred to by residents and their articulation in the formation of
social and territorial identities in the Coast. In terms of methodology, our choice was
up by qualitative approach, whose research framework, gives grip to the relational
nature and phenomenal interactions between nature, culture, space and territory we
explored. The development of the thesis was initiated by the constitution of the
theoretical elements of the categories used in the analysis, especially the discussion
of territory, identity and representation. Following, we established an analysis of
historical facts and processes that help to understand the territorial formation of
Sergipe more broadly and, the Coastline, so more specific, focusing on the
establishment of traditional fishing communities. At this point, we are interested in
providing elements for understanding how the traditional population, generally
excluded from political and economic processes hegemonic occupied rare and
valued environments of Sergipe territory. The appropriation process of space and its
representation was analyzed taking into account the spatial elements referenced by
the subjects of the Coastline. Therefore, we set our research locus in three traditional
communities of “Terra Caída”, “Pedreiras” e “Tigre/Junça” between the south, center
and north, respectively. We adopt procedures and research instruments to capture
the representation of the territory in each community, taking into account the
distribution among children and youth, adults and seniors. In this sense, we examine
the constitution of the identities of the subjects, the narrative of his historicity with
your experience space and reference, and, We verify the existence of identity with
the spaces and coastal environments. The relationship between identity and territory
is expressed in the prospect of staying in the territory, as an act and a sense of
permanence and rooting what belongs to me to the same extent that I belong to that
territory. Finally, between the refuge condition in empty coastline and home
established in the territories we reflect on the identities and territories of traditional
communities coastline of Sergipe between the experiences, work practices and
invisibilities.
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE FOTOS
LISTA DE MAPAS
LISTA DE DESENHOS
Desenho 5 Representação elaborada por aluno do 4º ano, Terra Caída ................ 210
LISTA DE GRÁFICOS
LISTA DE QUADROS
Tabela 3 Evolução das populações livre e escrava em Sergipe até 1802-1888 ..... 113
Tabela 10 Participação de artes pesca na produção em Terra Caída, 2014 .......... 181
6.3 Perto da água tudo é fartura: elementos da identidade no Litoral ..................... 277
INTRODUÇÃO
PENSAR A REALIDADE:
PROPOR UMA PESQUISA
18
Projeto de Tese
A Construção do Objeto:
b Recorte espacial e Temporal
o
r
d
a
Coleta de Informações
g
e
m
Q
u Formação Pesquisa em Dados
a Histórica Campo Secundários:
l IBGE
i IBAMA
t PEAC
a
t
i
v 1 - Oficinas: a) Minha vida na
a comunidade
b) Nossas Referências
2 – Registros fotográficos
3 – Observação
4 - Entrevistas
Análise e discussão
A ciência evolui sem amarras e limitações. Ela exige uma atitude de liberdade
ao se abrir para conhecer o novo. Neste sentido, o método que usamos em nossas
reflexões, consiste em uma constante avaliação crítica sobre o objeto, tal como ele
26
se mostra e pode ser alcançado com segurança e adequação frente aos postulados,
como nos sugere Cardoso (1971), deve-se suspeitar da complexidade dos métodos.
Por mais que sejam definidos, os passos da investigação não apresentam
ordenação severamente rígida. Lembremos aqui, que métodos e instrumentos tem
uma história e são o fruto de ações intelectuais de cientistas, os quais também são
situados em termos históricos e filosóficos. Fazendo-se ciência, a renovação é um
estado permanente da teoria, do método, da técnica e do objeto.
A rigor a consistência do método resulta do entrelaçamento das técnicas e
procedimentos pelos quais o objeto cientificamente construído possa ser inteligível,
alcançado e submetido a uma verificação constante. Logo, o método adequado é
aquele em que os procedimentos e instrumentos são cuidadosamente associados e
situados frente ao fenômeno estudado e sobre os quais possamos: refletir, criticar e
repensar. Esse processo metodológico é ainda mais sensível nas ciências sociais,
pois lidamos com o “fato social” nas suas múltiplas e cambiantes conexões.
Não há como se pensar esquemas metodológicos absolutamente rígidos e
canonizados, pois a realidade acabaria deformada por consequência, como nos
alerta Bachelard (1996).
Em nossa pesquisa falamos de realidade social e espacial e não de
determinismos, como asseverou Chelotti (2009), ao ressaltar o rigor da atitude
cientifica na pesquisa qualitativa na observação dos fenômenos. Antes de
prosseguirmos é conveniente fixarmos aqui alguns elementos que nos ajudaram a
construir nossa pesquisa:
A CONSTRUÇÃO DA
PESQUISA
33
1 A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA
vivenciados e não fora deles. Eles estão lá, mas a explicação dos fatos exige um
esforço intelectual concatenado ao campo teórico.
A atitude do pesquisador é elemento central em nossa pesquisa. Ele não é
neutro, como uma peça mecânica determinada a executar movimentos calculados.
Apesar de se admitir diversas formas de investigação, na pesquisa qualitativa, o
preparo, a criatividade e a sensibilidade do pesquisador são qualidades
fundamentais, pois é ele o instrumento mais confiável de observação, seleção,
análise e interpretação dos dados coletados. De modo, que o conhecimento é um
constructo da inteligência e não mero resultado de procedimentos e técnicas
controladas. Premissas, indagações, reflexões são tão relevantes quanto o produto
final exposto em um relatório.
Nesse sentido, estabelecemos alguns pressupostos de nossa pesquisa:
ela contribuindo, uma relação de mutualismo científico, pela qual sou muito
agradecido.
Sobre a fase de planejamento e concepção de nossa pesquisa referenciamos
a influência continua de Malinowski (1978), em seu estudo clássico sobre o Kula no
livro Argonautas do Pacífico Ocidental. Apesar de ser um estudo mais do que
secular, ele continua atual, por ser um clássico da literatura antropológica, mas,
sobretudo, porque seus ensinamentos de pesquisa me acompanham desde a
graduação e ainda me são úteis e valiosos e, também, porque, segue influenciando
uma nova geração de pesquisadores, incluindo os da própria Geografia.
O autor sugere que um estudo, como o nosso, que visa incidir sobre o
universo da cultura, em suas múltiplas interfaces, relações espaciais, e suas
interações históricas, econômicas e sociológicas pode se servir do esquema
metodológico formulado por ele para abarcar as dimensões da vida comunitária,
situadas e relacionadas em três aspectos:
2
Essa sistemática foi adotada pela pesquisa: Grandes Projetos e Identidades Locais, a qual aderimos
para execução da tese.
41
pesqueiras; (iv) pelo tempo de existência, desde comunidades seculares e uma mais
recente, que pensamos nos auxiliar no entendimento da identidade territorial e
pertencimento.
mas também Sociologia, Economia, História, que estão sendo adotados como forma
de aprimorar a ciência geográfica na sua tarefa de compreender a produção social e
cultural do espaço.
A essa renovação do trabalho de campo como procedimento e técnica,
aderimos com grande entusiasmo desde o mestrado. Contudo, apesar de nossa
inclinação a essa prática de pesquisa, ela exige treinamento, experiência e
sensibilidade, em especial, porque lidamos com sujeitos reais, homens, mulheres,
crianças, idosos em situações reais de vida, com dramas, conflitos, suspeitas,
medos e interesses muito reais.
“Eles”, os sujeitos estudados, não são simples objetos de pesquisa, em que
me interessa apenas interrogar e retirar algum “dado”. Os nossos “dados” muitas
vezes são depoimentos emocionados e carregados de sentimentos e frustações. Por
mais de uma vez tivemos que interromper as entrevistas porque as pessoas
estavam emocionadas ou concluímo-las em meio aos olhos cheios de lágrimas,
porque aquilo nos tocava. Devemos estar preparados para lidar com emoções e ter
a sensibilidade para captá-las como expressão dos sentidos atribuídos na formação
socioespacial.
Logo, nosso trabalho empírico, visando adentrar no campo das relações entre
os sujeitos e a natureza, é mesmo uma pesquisa interativa, no exato teor do termo,
pois tanto o pesquisador quanto objeto científico, por ele formulado e
cuidadosamente estruturado, estão em interação com o “outro”.
Não se trata apenas de estabelecer relações, selecionar informações,
transcrever uma entrevista, mapear campos, obter dados e manter um diário.
Pensamos a observação como um esforço intelectual, para ver fatos em processo,
mas enxergá-los como eles são e se mostram.
Neste aspecto, o trabalho de campo é um tempo-espaço do estabelecimento
das relações entre “nós” e “eles”. A interação se estabelece em vetor de duplo
sentido. Envolve nossa disposição e sentido de interagir, de nos expor como
pesquisadores e sujeitos, portadores de uma visão de mundo e a visão “deles”, de
um interesse e curiosidade, somos tanto pesquisadores, como também somos
pesquisados pelos sujeitos. A interação pressupõe estabelecer compromissos de
sociabilidade que ultrapassam as fronteiras da pesquisa.
Conhecemos as dificuldades clássicas relatadas por Malinowski (1978) e
Geertz (1989) para penetrar no universo dos “sujeitos”, por exemplo, diferenças de
50
com esse aspecto. Aproximei e me apresentei, como estudante e pedi a ele para
conversar. O senhor, sem pensar, me disse de imediato: não quero falar, eu não sei
falar. Agradeci e me afastei. Depois de alguns contatos estabelecidos na
comunidade, voltei na companhia de um morador que me ajudou muito no decorrer
do trabalho, realizei uma ótima conversa com ele, que me ajudou a entender um
pouco da territorialidade local e as questões envolvendo as restrições sobre a pesca.
Dentre todas as dificuldades, a mais complexa é não se perder em campo. As
incursões, no nosso caso envolveram atividades diárias, com deslocamentos
constantes. A realização das oficinas temáticas, que pressupunham uma
organização preestabelecida com convites, mobilização, disponibilização de espaço
e definição de programação de atividades requer uma dose de objetividade implícita,
mas as atividades de observações e a realização de entrevistas livres merecem
cuidados.
É muito fácil se perder e se desviar dos objetivos. Para evitar isso é
fundamental saber o que se quer ver e onde se deve olhar. Não é o caso de
restringir o seu olhar, mas treiná-lo, para ver aspectos relevantes para compreensão
de seu fenômeno. Não basta olhar, mas, sobretudo, saber para onde e o que olhar.
Nesse sentido os estudos etnográficos de Brandão (1995, 2006) fornecem
esquema interessante para ser seguido neste trabalho. Segundo o autor é preciso
estabelecer e observar as dimensões cotidianas em quatro eixos:
Foi com esse roteiro que vivenciamos os momentos de campo, muito mais
interessados em observar um sentido de cotidiano e cotidianidade que implica em
estabelecer certos vínculos pessoais, que sugere saltar a sala de entrada da casa,
como espaço de uma entrevista formal, com cadeiras delicadamente colocadas para
que “nós” ficássemos a certa distância do mundo “deles”, mas andar lado a lado,
estabelecendo os papos entre um lugar e outro.
Pensamos que a melhor atividade de pesquisa é aquela que estabelecida
nos entre “lugares”, no caminho, cercado de crianças e com “papos” difíceis de
serem transcritos. Aí também estão os fatos imponderáveis que desejamos explicar.
Valiosas lições que tomamos nos cursos de Antropologia e Prática de
Pesquisa, ministrados pelo Prof. Carlos Brandão no curso Pós-graduação em
Geografia na UFU, em especial, a possibilidade de contextualizar sua pesquisa
como um roteiro de um filme ou uma peça de teatro estabelecendo os cenários, os
atores e as cenas. Foi assim que pensamos nossa pesquisa conforme exposto no
quadro 01, a seguir:
análise dos resultados para compreensão dos aspectos observados, bem como para
redação da tese.
No decorrer de todo trabalho, em paralelo com a execução de momentos de
imersão em campo, os produtos fotográficos foram cuidadosamente armazenados e
legendados para facilitar seu uso futuro. Foi produzido material cartográfico de cada
comunidade, a fim de retratar o uso do território.
Nossa abordagem qualitativa, em seu desenvolvimento, procurou integrar as
dimensões de análises, entre: a descrição das atividades cotidianas como práticas
espaciais em nível individual; as relações como mediações entre a sociedade,
ambiente e território; as percepções individuais e coletivas sobre o ambiente, sobre
o espaço que se faz território e; as representações, como sentido de valores e
imaginários criados no contexto social de sua espacialização, conforme sugerido por
(DE PAULA 2009).
Por fim, a última sistematização, compreende a forma e a redação do trabalho
como tese a ser apresentada. A apresentação da pesquisa trata-se da forma que se
dá ao conteúdo e aos resultados. Essa forma final revela que já não somos mais os
mesmos pesquisadores que começamos. A travessia da pesquisa não se reduz ao
entrecruzamento de uma lista de procedimentos técnicos mais ou menos
adequados, ela se conecta a uma realidade.
Os territórios que buscamos apreender são também lugares de vidas e
dramas, e os nossos sujeitos tem rostos e uma trajetória. Temos a consciência que
provavelmente nossa pesquisa pouco mudará as suas vidas, mas eles marcaram
nossa trajetória de pesquisador.
Entre a pesquisa imaginada e a realizada, apreendemos lições de vida,
modos de vida, experiências, cenas, gestos, festas, desafios, conflitos, ritos e cultura
que tornaram mais densas nossas observações. A pesquisa geográfica nos
proporcionou encontros e interações, relações colocadas no palco dos espaços, que
nos propusemos investigar de forma aproximativa, densa, interativa e interpretativa.
55
ITINERÁRIOS SOBRE
TERRITÓRIO E
IDENTIDADE:
APROXIMAÇÕES
56
3
Uso termo co-habitação como sugerido por Martins (2011).
57
4
Nos termos apresentados por Martins (2011).
58
palavras, o território não necessita de uma contiguidade espacial para existir, ele
pode ser articulado em pontos, nós e redes.
Segundo ele, isto ocorre porque a ideia de limite ou de fronteira – se
preferirmos -, não deve ser considerada exclusivamente pelo ponto de vista linear,
mas também em sua possibilidade zonal, no qual não existiria um recorte linear, um
limite, ou um ponto limite em que um território acaba para que outro se inicie.
Logo, o território é segundo Haesbaert (2012) uma espécie de “continuum” de
relações entre a sociedade e espaço. Essa é a visão de território que pretendemos
adotar, ou seja, fixar o entendimento que uma formação territorial não está confinada
a uma única porção espacial situada, mas ela pode se estender em territórios de
diversas formas e configurações possíveis.
É preciso levar em consideração também, que o território é constituído de
uma área que confina certas qualidades intrínsecas que podem ser tomadas em
vários casos como “recursos” a serem usados, isto é, ele pode ser fisicamente
estabelecido como uma base referencial e concreta de elementos materiais para
obtenção de “meios de vida” ou de “mínimos vitais”; quanto pode ser pensado em
termos simbólicos.
Para Haesbaert (2007, p. 38) “o território deve ser visto numa perspectiva que
valoriza as relações e os processos: o território num sentido relacional e processual,
devendo-se mesmo falar mais em processos de territorialização do que território
como entidade estabilizada”. Esse referente simbólico do território, diz respeito à
operação de apropriação e valorização dos elementos simbólicos elaborados pelos
grupos em relação ao seu espaço de vida cotidiana.
A vivência com o território geraria práticas culturais, afetivas e significantes
entre o grupo e o seu lugar de vida. Em outras palavras a cultura quando pensada
em termos do espaço por ela produzida historicamente, revela também a produção
de território com “s”, territórios, pois em contextos socioespaciais distintos, cada
cultura tem seu tempo, que corresponde um modo de agir com o espaço e
pressupõe relações de controle material e simbólico sobre seu espaço de inscrição,
portanto, produção territorial, como assinala Bonnemaison (2002, p. 101-102): “É pela
existência de uma cultura que se cria o território e é por ele que se fortalece e se
exprime a relação simbólica existente entre a cultura e o espaço”.
O território ou os territórios não são obrigatoriamente fechados, não se
constituem um tecido espacial unido que induz um comportamento necessariamente
63
Cremos que a expressão mais apropriada seja que a cultura fez da natureza a
natureza como a conhecemos e nos relacionamos. Ao mesmo passo que a cultura
67
5
Refiro-me ao conceito de ação social racional conforme formulado por Marx Weber, a esse respeito
consultar (COHN, 1997)
69
6
Sobre liberdade e segurança, Bauman (2003), faz uma perturbadora e estimulante reflexão sobre os
aspectos que envolvem os sentimentos de se estar em comunidade. O autor refere-se exatamente ao
sentimento de segurança, como imaginário de bem estar na comunidade e a perda de liberdade
como preço a se pagar por estar em comunidade.
72
marcas que ele mesmo cria, talvez seja um aspecto perturbador que cause enormes
confusões em relação à análise e apreensão da territorialidade como categoria, no
limite como a expressão apontada por Dourado (2014), para se referir a essa
categoria: “quase uma categoria fantasmagórica”, tamanha a dificuldade de se obter
uma caracterização clara do que seria concretamente.
Muitos autores fazem uso do termo territorialidade para expressar processos
de territorialização, por exemplo, para se referir aos sistemas territoriais criados pela
a atuação da igreja católica em termos de suas dioceses e paróquias. A forma que a
instituição e seus personagens agem no espaço é uma territorialidade, mas a
presença física como um elemento é a própria territorialização da igreja.
De fato, a territorialidade entendida por Little (2002) é uma relação social da
sociedade no, com e pelo espaço. Nas palavras de Bonnemaison (2002, p. 99 -
100), a territorialidade se estabelece na relação entre cada grupo, sua cultura e o
repertório de lugares, itinerários que constituem o território.
Neste sentido conceitos habituais de apropriação “biológica do espaço” e de
fronteira rígidas são colocadas em segundo plano, numa perspectiva mais tênue e
sutil. Para o autor é por essa ração que existem povos para quem a noção de
fronteira é praticamente inexistente, sem que isso signifique que eles não tenham
um território.
Identificamos que a territorialidade apresenta tons muito sutis e complexos de
socialização da relação com espaço, da psicologia individual e coletiva e da
interação entre indivíduos mediada pelo e no espaço. Ela remete algo singular e
único, ancorada no sentimento que os sujeitos desenvolvem com seus espaços de
referência. O sentimento de “pertencer àquilo que nos pertence”. Perspectiva
dialética, eu sou daquilo e aquilo também sou eu.
Sentimento de pertencer não significa imobilidade absoluta, condição que
seria contra a perspectiva territorializante do Ser. A (re) criação de territórios em
novas bases é uma característica de vários grupos. Por exemplo, da experiência da
“errância” e da migração, pela qual podemos verificar a possibilidade de novas
apropriações e o estabelecimento de relações de identificação territorial em novos
espaços.
7
Ver Souza (2013) em sua tese de doutorado aborda a existência e as especificidades de uma
cultura ligada ao Rio São Francisco, bem como de suas territorialidades.
75
Cruz (2011) sugere que ambos, identidade e diferença, sejam tomados como
processos, para tanto, nessa concepção de identidade e diferença, como um par em
processo, a diferença deixaria de ser apenas um produto da identidade, passaria ela
mesma a ter, também, um movimento gerador e incessante. Identidade e diferença,
para Haesbaert (2007, p.36) é uma relação que estabelece no cruzamento “intimo”,
pois nas palavras do autor, “não há como “identificar-se” algo sem que sua
“diferenciação” (em relação ao “outro”) seja construída, a ponto de “diferenciar-se” e
“identificar-se” tornarem-se completamente indissociáveis”, esse jogo entre diferença
e identidade mostra o caráter relacional que envolve a identidade em processo.
Segundo Hall (2011, p.87), a “identidade e diferença são indissociavelmente
articuladas e/ou entrelaçadas em identidades diferentes, sendo que uma nunca
anula completamente a outra”.
Para De Paula (2007, 2009), algumas identidades giram em torno da tradição
buscando a reapropriação de uma pureza anterior, unidades e certezas tidas como
perdidas. Outras identidades estão sujeitas a história, a política, a representação e a
diferença, não havendo possibilidade de que sejam unitárias ou puras e elas se
constroem em torno da tradução.
Devemos aqui nos reter no caráter histórico da formação das identidades, isto
é, como já dissemos acima, a identidade é sempre uma possibilidade, uma
construção, situada num tempo e num espaço. As identidades são antes de
qualquer coisa um processo de identificação, que pressupõem “articulação, uma
sutura, uma sobre determinação, e não uma subsunção. Há sempre “demasiado” ou
“muito pouco” - uma sobre determinação ou uma falta, mas nunca um ajuste
completo, uma totalidade” (HALL, 2004, p.106)
Identificar-se é estabelecer relações de identificações com trabalho, com
outros sujeitos em grupos, com territórios. Como processo relacional, identificação
está sujeito ao campo de disputas políticas, econômicas e espaciais, pois isto
79
8
Refere-se a figura de Luiza Erundina ex-prefeita de São Paulo na década de 1990 e que
desempenha outras funções políticas atualmente.
83
de qualquer tipo de material cultural ao seu alcance, constroem uma nova identidade
capaz de redefinir sua posição na sociedade e, ao fazê-lo, de buscar a
transformação de toda a estrutura social.
Obviamente o autor se preocupa com a identidade atribuída no plano do
Estado Nação, ou seja, uma identidade nacional. Mas em nossa concepção, bem
próxima de Penna, pelo menos em parte, o que estamos tratando é de uma
concepção de identidade, em que o processo de identificação se faz utilizando
elementos políticos, econômicos, religiosos, jurídicos, em termos estratégicos (no
plano das táticas de controle e administração do Estado e das instituições
religiosas), para formar e forjar identidades sociais, não raras vezes seculares.
Por outro lado, o autor expõe também a possibilidade de movimentos que
ganham força ao atuar no sentido contrário de uma hegemonia dominante
aproveitando sentidos, sentimentos, discursos e símbolos para propor uma
resistência contra a ordem vigente, redefinindo papeis e instituições. Também nesse
caso, estamos vendo a identidade no seu conteúdo mais político, estratégico e
posicional.
Segundo Ennes e Marcon (2014), as estratégias identitárias são
desenvolvidas pelos sujeitos como meio de encontrar o melhor posicionamento nas
interações sociais. Trata-se de uma dinâmica semelhante à evidenciada por
Goffman (2008) ao estudar a produção do estigma e de como este é absorvido ou
rechaçado pelos grupos e indivíduos.
Para o entendimento da identidade, suas concepções e usos políticos, mais
do que apresentar os autores, suas similitudes e suas divergências, pretendemos
para nosso estudo reter algumas noções:
9
Habitus é entendido como: um princípio gerador que impõe um esquema durável e, não obstante,
suficientemente flexível a ponto de possibilitar improvisações reguladas. Em outras palavras, tende,
ao mesmo tempo, a reproduzir as regularidades inscritas nas condições objetivas e estruturais que
presidem a seu princípio gerador, e a permitir ajustamentos e inovações às exigências postas pelas
situações concretas que põem à prova sua eficácia. A mediação operada pelo habitus entre, de um
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lado, as estruturas e suas condições objetivas, e de outro, as situações conjunturais com as práticas
por elas exigidas, acabam por conferir à práxis social um espaço de liberdade que, embora restrito e
mensurável porque obedece aos limites impostos pelas condições objetivas a partir das quais se
constitui e se expressa, encerra potencialidades objetivas de inovação e transformações sociais. O
habitus vem a ser, portanto, um princípio operador que leva a cabo a interação entre dois sistemas de
relações, as estruturas objetivas e as práticas. O habitus completa o movimento de interiorização de
estruturas exteriores, ao passo que as práticas dos agentes exteriorizam os sistemas de disposições
incorporadas. Ver Bourdieu (1983, p. XLI), introdução de Sergio Miceli.
88
memória para suturar uma adesão as narrativas dos sujeitos, modelando uma
consciência do pertencimento a esse próprio espaço.
As representações, novas ou tradicionais, em seu turno implicam em
negociações, tensões, normas e valores que inseridas nas dinâmicas das relações
sociais mais amplas, resultam em movimentos e contradições internas que
exemplificam o próprio campo de relações por nós estudadas. Nesse sentido, nas
comunidades observamos as distinções e convergências estabelecidas entre os
discursos das identidades historicamente legitimadas e as narrativas das trajetórias
cotidianas; examinamos as expressões do controle sobre território, em termos da
ideia de uma posse, da construção da apropriação culturalmente exercida e do
exercício da organização do território que nos pertence.
Procuramos entender a orientação e a compreensão das condutas com
espaço, vistas nas representações individuais e socialmente estabelecidas do que é
meu, do que é do outro e daquilo que é o nosso espaço. Estendemos nosso olhar ao
sentido das diversas formas de identificação social presentes no Litoral, bem como
os processos que levam a legitimação de algumas identidades e a proteção de
elementos de outras identidades, bem como na ausência de um discurso
regionalmente situado sobre os traços que ligam os sujeitos do Litoral.
É seguindo esse itinerário de elementos que os quatro (04) próximos
capítulos dessa tese são apresentados. Nos capítulos 03 e 04 trataremos da
constituição histórica do Litoral de Sergipe, com ênfase nas condições que nos
ajudam entender como se constituíram os territórios das comunidades tradicionais
do Litoral. Nos capítulos 05 e 06 abordaremos a historicidade dos sujeitos do Litoral,
entre as gentes litorâneas, apropriação e representação espacial e o
estabelecimento dos sentidos e dos sentimentos com o território.
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DO LITORAL AO SERTÃO:
UMA LEITURA GEOGRÁFICA
DOS FATOS HISTÓRICOS
SOBRE A FORMAÇÃO
TERRITORIAL DE SERGIPE
96
constrói o espaço na medida em que ele, sujeito social, é construído na relação com
a natureza.
Concordamos com Moraes (2000), pois esse é o caráter pleno do processo
social que se desenrola no espaço, mediado por movimento da sociedade,
reconhecendo desde início que a história, como descreve o autor, é uma
progressiva, continuada e reiterada apropriação e transformação do espaço em
diversas escalas. Reconhecemos também, que tanto os processos sociais em si,
quanto a apropriação do espaço se transformam e variam historicamente.
Logo as condições econômicas, sociais e culturais devem ser vistas como
uma realidade localizada em um tempo-espaço que lhe é próprio. O lugar é então
mediação (ecológica e territorial) e a espacialidade é o elemento que particulariza os
fenômenos no tempo histórico.
Se o espaço é campo e horizonte de um tratamento teórico geral e genérico,
sujeito às indagações e limitações da própria teoria e dos conceitos frente ao real, a
formação territorial pode se colocar como objeto empírico, capaz de mostrar os
ajustes de foco na ótica do movimento histórico: um ajuste de lentes que permite um
zoom mais aproximado.
Segundo Moraes (2000, p. 18), este ajuste entre “espaço e historia” se
inscreve em dois polos: “de um lado, as determinações genéricas, que fornecem os
macro-indicadores que delimitam grandes períodos e lógicas de funcionamento da
sociedade no espaço, de outro, a malha fina do desenrolar das conjunturas”,
permitindo identificar vontades, sentidos, significados, atitudes e interesses
específicos, enfim, singularidades.
Decorre deste pensamento a nossa necessidade de abordar o processo
histórico como elemento de análise para entender os territórios das comunidades do
Litoral atualmente.
Nossa intenção neste capítulo é demonstrar que ao longo do tempo ocorreu
um esforço que resultou na formação de um território de Sergipe. Esse esforço a
nosso ver passou por diversos momentos históricos e por processos geográficos
culminando em uma rede de cidades, vilas, povoados e comunidades. Neste
sentido, ele pode parecer até certo ponto um capítulo construído como leitura
inocente desses fatos históricos, já que por de trás da formação de uma vila ou de
uma comunidade pescadora pode existir e em muitos casos existe, todo um drama
99
10
O indígena sergipano a grosso modo era do ramo tupinambá, pertencentes aos Tupis. Exceções
feitas aos Kiriris, que devido suas práticas e sistemas de crenças, não se encaixariam nessa
classificação como Tupi, (SEDEC, 1973).
100
desta missão pode ser explicado pela mudança de estratégia adotada pelos
religiosos em oferecer: “Evangelho e não às armas; à paz e não à guerra, entregou-
se à conquista da nova capitania”, (FREIRE, 1977, p. 69).
O insucesso definitivo dessa primeira tentativa deveu-se, segundo o
historiador Freire (1977, 1995), às tensões entre o poder na Bahia (Luís Brito) e os
indígenas, percebidos como hostis. A desconfiança do colonizador era estimulada
pela cooperação que os indígenas dispensavam aos franceses, inclusive segundo o
historiador, já se temia naquela época a possibilidade dos nativos se aliarem aos
invasores estrangeiros em um ataque ao poder central em Salvador.
A consolidação da “conquista” só seria concluída em 1590 por Cristóvão de
Barros, já no reinado e por ordem de Felipe II. Seu êxito significou a expulsão dos
franceses, a morte de 1.600 indígenas, dentre eles alguns dos famosos caciques e a
prisão de outros 4.000 índios. Importante situar o movimento e atuação espacial de
empreendida por Barros. Essa conquista territorial se deu exclusivamente no Litoral,
o espaço do interior não fora objeto desta conquista. O sentido de atuação de Barros
se deu de Norte para Sul, iniciando-se nas terras situadas entre o São Francisco e o
rio Japaratuba, em especial na aldeia Japaratuba, local onde hoje situa-se o
município que herdou o nome indígena, palco dos conflitos mais violentos.
Na sequência e na esteira de suas vitórias e conquistas, Cristóvão de Barros
ergueu uma fortificação e fundou um arraial, que mais tarde ficou conhecida como
cidade de São Cristóvão11, primeira capital do estado e uma das quatro cidades
mais antiga do país.
13
A esse respeito consultar Abreu (1930)
103
14
Santos e Andrade (1992), narram epopeia liderada pela figura muito conhecida de Belchior Dias
Moréia, fazendeiro das margens do rio Real que acompanhou Cristovão de Barros na vitória de 1590.
Ele teria percorrido os sertões da Bahia e de Sergipe, durante longos oito anos, e disse ter
descoberto minas de ouro e prata “numa área de sessenta léguas dentro do Rio São Francisco até a
confluência do rio Jacoipe com o Peroaçu, entrando nele sete léguas que tem no Litoral do rio
Pajaype até o rio Itapauma”. Belchior tentou por 02 anos obter sem sucesso financiamento junto às
cortes em Madrid para a exploração das minas e depois novamente tentou em Lisboa, também sem
sucesso. As histórias desse personagem envolvem roteiro digno de Indiana Jones e outros
exploradores, com mapas do tesouro, indicações codificadas. Nada tendo se provado sobre a
existência de tais minas, ao menos suas história serviram de inspiração para o reconhecimento do
território e para plantar a cobiça em outros aventureiros.
15
Moraes (2000) analisa que do ponto de vista da formação territorial, o episódio da ocupação
holandesa implicou antes de tudo, uma imensa destruição do capital fixado na colônia, no período
mais intenso do desenvolvimento da economia açucareira. Acarretando a fuga de população e de
capitais das zonas invadidas para Bahia, no caso de Sergipe também para paragens do Sertão. Os
ataques mútuos às instalações produtivas propiciaram elevado índice de evasão de escravos,
tornando essa época a de maior relevo no que tange á formação de comunidades livres de africanos.
104
Fonte: SANTOS, Rodrigo H. Sistematização a partir dos dados apresentados por Freire (1995, p. 68).
17
Decorrentes do ato de anexação da capitania de Sergipe, Ilheus e Porto Seguro à Capitania da
Bahia, perderam sentido as reinvindicações das Câmaras Municipais das regiões onde pairavam
dúvidas se pertenciam a Sergipe ou a Bahia. Considerando à fronteira setentrional do Vasa-Barris a
colonização caminhou até esses limites ocidentais pela fronteira meridional do mesmo rio, ainda que
não chegasse a um ponto correspondente, que se pudesse unir uma paralela a Geremoabo como
Pombal ou Tucano, todavia ela muito estende-se até além das matas de Simão Dias. Caso tivesse
respeitado o tratado de Uti possidetis a região semi-árida de Sergipe seria mais ampla. Embora
Candido Mendes de Almeida e outros estudiosos da formação brasileira no século passado
atribuíssem à Província de Sergipe uma superfície 54.000 km2, em realidade o atual Estado de
Sergipe com 21,994 km2, ver Santos; Andrade (1992, p.28-29).
111
18
Devemos lembrar que essa crise institucional em Sergipe se deve a aspectos mais amplos da vida
política no Brasil pré e pós independência, já que a Bahia, ou melhor dizendo Salvador se manteve
fiel às ordens de Lisboa, que se opunha ao projeto do Príncipe D. Pedro I. Salvador foi o reduto mais
importante da resistência Portuguesa no Brasil. De toda forma, não era exatamente a viabilidade da
independência de Sergipe que estava em jogo, mas a oposição ao Brasil independente. Lembrando
que a expulsão das tropas portuguesas de Salvador ocorreu no dia 02 de julho de 1823, mesmo
período da crise em Sergipe. Ver Laurentino Gomes (2010). Obviamente, às paixões e os vícios
locais contribuíram para esse período conturbado da vida política de Sergipe, com todo tipo de
intrigas, difamações, armações e violências que se possam imaginar, como muito bem narrado por
Freire (1977).
112
Até 1723 25
Até 1807 114 456 % (+)
Até 1817 Mais de 300 263 % (=)
1824 226 25% (-)
1852 680 300 % (+)
1884 800 117% (+)
1902 692 13,5 % (-)
Fonte: SANTOS, Rodrigo Herles dos. Adaptação baseada em dados apresentados em Mott (1986);
Santos e Andrade (1992).
19
Em meado do século XIX, o efeito da revolução havia-se espraiado como uma onda sísmica pelo
mundo. Todos os governos europeus tinham sido afetados por convulsões políticas, incluindo a
conservadora Inglaterra. As únicas exceções eram os dois grandes impérios na franja oriental, a
Rússia e o Império Otomano, mas esses também cairiam de forma ruidosa nas primeiras décadas do
século seguinte. Os demais haviam sido obrigados pela pressão das ruas a fazer concessões até
então consideradas inadmissíveis. A igreja, sólido pilar da velha ordem, foi perseguida e expropriada
em vários países. Só na França, entre 2.000 e 3.000 padres e freiras foram executados [...], Gomes
(2010, p.46).
113
Fonte: SANTOS, Rodrigo Herles dos. Adaptação baseada em dados apresentados em Mott (1986, p.
140-141).
20
A Lei Áurea (Lei Imperial nº 3.353), sancionada em 13 de maio 1888, pela princesa regente Dona
Isabel. Essa Lei completou o quadro iniciado pelas leis nº 2040 (lei do ventre livre) de 20 de setembro
de 1871; Lei nº 3270 (Lei Sairava Felipe) de 20 de setembro 1885, que regulava a extinção gradual
do elemento servil.
21
É interessante observar que essa riqueza econômica do período, ao contrário do que aconteceu
em outras províncias, não se converteu em patrimônio arquitetônico exuberante nas principais
cidades da época. Exceto São Cristovão, cujo perímetro mais histórico encontra-se tombado como
patrimônio mundial, mas convenhamos bastante modesto em relação à outras cidades importantes,
como Salvador, Recife, Penedo e de Ouro Preto (em outra escala). A pesquisadora Maria Augusta
Mundim Vargas (notas de aula), indica que tal riqueza teria ficado circunscritas aos engenhos, com
casas grandes e igrejas locais bem ornamentadas.
22
Considerando as condições precárias a que esses escravos eram submetidos é de estimar que
para cada grupo de 50.000 muitos outros tenham chegado em não sobrevivido, uma espécie de turn
over macabro, que tanto nos envergonha.
114
Fonte: SANTOS, Rodrigo Herles dos. Adaptação baseada em dados apresentados em Mott (1986).
23
Segundo Mott (1986), inúmeras fontes comprovam fartamente que durante a primeira metade do
século XIX, a população livre de cor representava mais de 50,5% dos habitantes desta Província. Ou
seja, mais da metade da população não era nem senhor, nem escravo. Ele questiona como viviam?
O que faziam? Do que viviam?. A hipótese formulada por ele é que homens de cor livres, constituíam
importante mão de obra nos diversos setores econômicos de Sergipe Del Rey.
115
Fonte: SANTOS, Rodrigo Herles dos. Adaptação baseada em dados apresentados em Mott (1986).
24 Ingênuos foi a designação atribuída aos filhos livres de mães escravas após a promulgação a Lei
do Ventre Livre em 1871.
25
Sobre aspectos entre estrutura demográfica e especialização da economia em nível regional, Mott
(1986), apresenta algumas análises interessantes: A zona da cana apresentava menor índice de
miscigenação e menor número de libertos. Sendo a área economicamente mais ativa e que mais
dependia do trabalho escravo, não havia lugar na estrutura social local para os saídos da escravidão,
segundo ele ou por serem indesejados ou por sentirem-se ameaçados pela estrutura de poder local.
Na zona de pecuária, supreendentemente aparece o menor número de brancos, e a maior
concentração porcentual de negros. Conforme observado tabela 5 é no Sertão que se concentra a
maior porcentagem de libertos, enquanto na zona da cana apenas 1,7% dos indivíduos saíram da
escravidão por alforria, na zona de policultura, os libertos são 4,9% da totalidade da população e em
lagarto, 23,1 % dos pardos e pretos eram libertos. É importante lembrarmos que o autor não analisa a
estrutura demográfica absoluta da capitania, não é possível saber qual a representatividade de cada
zona na composição demográfica da capitania, o que dificulta análises mais gerais.
116
26
Almeida (1984, p.220) analisa as condições de formação de algumas cidades na província: Entre
1832 e 1837, o Ato Adicional permitindo às Assembleia Provinciais a iniciativa da formação dos
quadros administrativos propiciou a elevação à categoria de vila das povoação mais florescentes.
Entretanto, urbanisticamente elas não estavam preparadas para representar sua nova função:
faltavam-lhes os recursos pecuniários para atender às mínimas necessidades da comunidade.
Inexistiam prédios e alojamentos para acolher os próprios serviços públicos: Câmara Municipal,
cadeia, fontes de água potável, açougue. A igreja matriz representava, ontem como hoje, o ponto
referencial do centro urbano.
27
Outra importante medida em nível territorial foi a transferência da capital da província de São
Cristóvão para recém criada cidade de Aracaju em 1855, visando criar um centro administrativo que
se integra-se com a região do Cotinguiba, zona mais prospera. Aracaju deveria exercer o papel
comercial e marítimo propiciando condições de inserir Sergipe nas relações internacionais de
comércio, Almeida (1984). Fazia sentido já que São Cristóvão na desempenhava a função urbana
que se esperava dela e tão pouco era necessária exercer as funções de cidade fortaleza como
outrora. Em 1837 a então capital apresentava apenas 4.012 fogos, menor que Laranjeiras.
117
28
A cultura algodoeira era vista como importante elemento para desenvolvimento econômico das
áreas mais castigadas por intempéries climáticas, como produto tinha bom valor de mercado naquele
momento e como cultura se adaptava bem ao Agreste e ao Sertão, sem necessariamente concorrer
com a cana-de-açúcar na zona úmida. “A opinião geral é de que o algodão nasce nas terras próximas
ao Litoral e que as frequentes mudanças atmosféricas lhe são prejudiciais. As estações do inverno e
do estio são mais regularmente marcadas a certas distâncias do mar, e nessas regiões as variações
sucessivas dependem menos da superabundância de chuva do que sua escassez”, Santos e
Andrade (1992, p.33).
119
unidades industriais de açúcar dentre todos os estados do País, mesmo que isso
não representasse melhorias consistentes na organização da atividade como um
todo.
A grande diferença entre os engenhos tradicionais se deu apenas pela
substituição dos maquinários usados na produção, pois tanto as usinas quanto a
lavoura pertenciam ao mesmo dono.
Esse início de século XX também foi marcado por sucessivas crises agrícolas,
que deflagraram um processo intenso de migração campo-cidade, cujo destino
principal foi a capital do estado, conforme apontado anteriormente. A população de
Sergipe ainda se mostrava predominantemente rural.
Contudo a busca por melhores condições de vida e a fuga do campo,
determinou uma marcha crescente aos centros urbanos, especialmente à Aracaju,
que após um tímido início desde a sua criação, passou por um processo de
modernização, recebendo também os grandes proprietários rurais.
Estes senhores importantes da sociedade da época transferiam suas
residências e parte de suas riquezas para a capital, além de acesso a educação
para os seus filhos, eles buscavam também um modo de vida urbano, que
significava cultura, lazer e modernidade.
Lembrando que do ponto de vista do emprego, Aracaju29 se consolidava como
uma cidade industrial com presença da indústria têxtil30 (Confiança e Sergipe
Industrial), e foi em torno das mesmas que surgiram os primeiros núcleos operários.
Assim como em todo o Brasil, o processo de crescimento urbano em Sergipe
manteve-se mais ou menos lento até 1950, intensificando-se fortemente na década
de 1970, superando pela primeira vez o número de habitantes da zona rural, sendo
a Aracaju a cidade mais dinâmica desse quadro:
29
A população das cidades e da capital acompanhou o crescimento populacional entre 1872 e 1890.
Vinte e cinco anos de sua fundação, Aracaju se colocaria entre as quatro capitais brasileiras que
conseguiram maior crescimento populacional. Ver Almeida (1984)
30
A medida que a cidade era procurada ela também mudava:[...] Aracaju começou a ser dotada água
encanada, luz elétrica, esgotos, ruas calçadas e construções luxuosas [...] As primeiras casas de
cinema, o bonde puxado por animais, a circulação de automóveis em suas ruas, o aparecimento dos
primeiro bairros [...] A continuação desse processo de modernização da capital permitiu, que nas
décadas de 1920 e 1930, o bonde puxado por burro fosse substituído pelo bonde elétrico e Aracaju
passasse a dispor de serviço telefônico, jardins, praças e outros benefícios. Santos e Oliva (1998,
p.82).
125
Como Aracaju foi a cidade que mais atraiu habitantes que migraram
de outras, inclusive de fora do Estado, sua população chegou aos
402.000 habitantes no ano de 1991, mais de um terço da população
de Sergipe que naquele ano era de 1.002.877 habitantes, para
488.999 habitante da zona rural. (SANTOS E OLIVA, 1998, p. 84).
Vemos que os fatores apontados pelos autores, em sua grande maioria dizem
respeito às questões conjunturais da vida tradicional no campo brasileiro, que pouco
tem se alterado ao longo do tempo. Algumas delas, como as mudanças de
legislação trabalhista, pensadas como solução para melhoria das relações de
trabalho, em favor da proteção e extensão de direitos ao próprio homem do campo,
mas que se revelou problemática e os resultados decorrentes de sua aplicação
126
31
Considerar a importância desempenhada pela Superintendência para o Desenvolvimento do
Nordeste – SUDENE criada em 1959, cujo papel de agente financiador, com progressiva
transferência de capitais produtivos das regiões mais industrializadas para as periféricas, o que
Guimarães Neto (1989) chamou de fase de “Integração Produtiva”.
127
32
Sobre esse período consultar valiosa análise realizada por Feitosa (2013).
128
33
Essas sucessões de ciclos não significa a ideia de ruptura, devemos lembrar que o
desenvolvimento de uma atividade econômica não necessariamente se faz por anulação de outra, ao
contrário em vários casos as atividades econômicas de que falamos se desenvolveram
concomitantemente a manutenção de outras atividades.
130
34
Alguns autores consultados, como Santos e Andrade (1992) e Moraes (2000) usam o termo alemão
hinterland ou hinterlândia, para designar esse sistema territorial de contato ou fluxo de produtos e
pessoas, ver Milton Santos (2008b) em seu Manual de geografia urbana. Contudo, não creio que o
uso do termo seja absolutamente preciso, porque as cidades só predominaram como executoras de
funções urbanas apenas recentemente e como preenchimento mais denso na “zona canavieira”, no
restante do espaço sergipano, tanto a densidade populacional quanto a ocorrência de cidades foi
bastante rarefeito.
136
sistema econômico que permitia mesmo vender excedentes agrícolas tanto para
portugueses quanto para os holandeses (na fase de ocupação), (MORAES, op. Cit).
Tratava-se, sobretudo, do exercício de organização e controle de um amplo
território comandado por uma rede de núcleos populacionais, polarizados pela
aglomeração urbana de Macaco, que funcionava nos dizeres do autor como uma
verdadeira da capital palmaria. Após a expulsão holandesa a destruição desse
“inimigo” interno tornou-se uma prioridade geopolítica, aliás, destino semelhante
tiveram as tribos indígenas, também consideradas “rebeldes”, mais uma estratégia
territorial muito clara.
Não nos convém seguir narrando os desdobramentos das formações
quilombolas no período colonial e pós-colonial. Os quilombos se difundiram em
praticamente todos os pontos nos quais ocorreu a escravidão: Minas Gerais, São
Paulo, Bahia, Pernambuco, Maranhão e Sergipe também. Por hora, para nossa
argumentação convém ressaltar o aspecto de uma extra-territorialidade em relação
ao sistema colonial, depois imperial e finalmente estatal que se instalou.
Sob nosso ponto de vista, essas não foram às únicas expressões de
extraterritorialidades, as comunidades tradicionais que habitavam outras porções do
espaço, fracamente articuladas ao sistema territorial predominante, como
vazanteiros, comunidades de fundo de pastos, geralistas, veredeiros entre outras,
exemplificam também do ponto de vista territorial, experiências de territorialidades
localizadas em espaços intersticiais do exercício hegemônico de um sistema
territorial oficial, conforme interpretações contidas nos trabalhos, por exemplo, de
Brandão (2012); Little (2002); Almeida (2005); Costa (2005); Souza (2013); Diegues
e Arruda (2001).
Em resumo os autores citados apontam alguns elementos que ajudam
explicar elementos das territorialidades em comunidades, que sejam: (i) forte relação
de simbiose ou troca com a natureza – ambiente que lhe envolve e com os ciclos
naturais com os quais se constrói o modo de vida; (ii) o desenvolvimento de
conhecimento aprofundado da natureza e de seus ciclos, como resultado. Isso
reflete na elaboração de percepção, regras e normas de conduta no uso e no
manejo deles.
Esses conhecimentos são acessíveis e transmitidos predominantemente com
base na oralidade como costume e de geração para geração; (iii) forte
reconhecimento do território onde o grupo social se reproduz econômica e
138
socialmente; (iv) moradia e ocupação de um território por várias gerações; (v) pela
importância dos símbolos, mitos e rituais associados à caça, à pesca e atividades
extrativistas e; (vi) pelo fraco poder político em relação ao poder proveniente de
centros urbanos, em especial, o poder econômico, considerado por muitos como o
“poder” de fato.
Em nossa abordagem consideramos que o Litoral sergipano, que abrange
desde a faixa de praia até as áreas alagadas – maré e mangues – foi apropriado por
comunidades que desenvolveram sistemas socioespaciais peculiares, ajustando
práticas culturais e de trabalho ao ambiente de entorno.
Em geral, essas comunidades se instalaram numa faixa de território marginal,
locais de difícil acesso e inacessíveis ao sistema econômico hegemônico,
representado pela cultura da cana-de-açúcar, vetor principal da territorialização
colonial e pós-colonial.
A interdição de que falamos foi expressa pela proibição de desenvolvimento
de atividades econômicas numa faixa conhecida como terra de marinha, combinada
com pouca capacidade de gestão, uso e controle da própria marinha. Tal situação
resultou em verdadeiros territórios do “vazio” ou se quisermos mais precisão: áreas
de interstícios.
Devemos lembrar que a ocupação desta faixa de Litoral antecede a existência
de um território nacional ou mesmo à constituição de Sergipe, com suas cidades.
Essas modalidades de território, como forma geográfica, são diferentes daquelas
adotadas pela estratégia do poder colonial, constituídas inicialmente por como os
aldeamentos indígenas e sucedidas no tempo por povoações de ex-escravos em
busca de abrigos.
Vários povoados de Sergipe, de Norte a Sul do Litoral, atualmente pleiteiam
ou já obtiveram reconhecimento de suas posses territoriais como unidades
quilombolas. Segundo levantamento obtido em consulta à Fundação Cultural
Palmares, nos munícipios litorâneos confrontantes com o mar, concentram 12 dos
27 territórios quilombolas certificados no estado de Sergipe, conforme quadro 03:
139
Pedreiras
Tinharé
Aracaju Mosqueiro
Matapuã
Atalaia Nova
Canal
Jatobá
Barra dos Coqueiros Olhos D´água
Praia da Costa
Praia do Jatobá
Touro
Aguilhadas
Pirambu Alagamar
Aningas
Catinguinhas
Aracaré
Boca da Barra
Estiva do Raposo
Estiva Funda
Fazenda Nova
Pacatuba Guaratuba
Oitizeiro
Ponta dos Mangues
Tigre/Junça
Brejão dos Negros
Brejo Grande Carapitanga
Resina
Saramém
Org.: SANTOS, Rodrigo Herles dos.
Fonte: Pesquisa de campo/2014.
LITORAL, LITORAIS:
EM BUSCA DE UM RECORTE
144
Viver à beira mar, morar no Litoral, ter uma residência na praia, passar férias
no Litoral, caminhar na orla, morar numa cidade costeira. São situações que
denotam alguma experiência com o lugar Litoral. São muitas designação
“costumeiras” para se referir aos espaços específicos do que se convencionou
chamar de Litoral no singular.
Quando refletimos o que cada experiência citada acima quer fazer
representar, percebemos uma polissemia de formas de valoração do espaço, que
resultam numa valorização do lugar comum do Litoral. Por Litoral pode se entender
comumente os espaços próximos ao mar e a praia, como um conjunto paisagístico
incluindo faixa de areia e ambientes alagados.
A forma com que a sociedade percebe e usa o Litoral se alterou muito nas
últimas décadas. Dos espaços considerados impróprios, sujos e sem valor social à
contexto histórico em que a praia, a beira a mar, a orla, o Litoral no plural são
lugares de prazer e de deleite, que por suas qualidades “naturais”, motiva usos de
recreação e contemplação e o valor atribuído a esses espaços é cada vez mais alto.
Ocorre que o Litoral envolve muitos outros ambientes. Estar numa praça, em
um bairro periférico ou em uma fazenda que produz cana-de-açúcar, também pode
significar estar em um lugar no Litoral.
Então como pensar o Litoral como uma categoria analítica capaz de fornecer
coerência interna no campo da Geografia para entender processos de relação
sociedade e natureza situada num tempo-espaço histórico?
A resposta para essa questão é complexa. Muitos esforços, inclusive
internacionais, foram realizados para se tentar estabelecer uma delimitação mais
precisa para Litoral. Vamos adentrar nessa questão para demonstrar que ela permite
muitas respostas se considerarmos a pluralidades de situações possíveis de se
desenrolar nesse espaço.
Em primeiro lugar, cabe contextualizar o uso amplo de dois termos: Litoral e
zona costeira, que são adotados hoje em dia quase como sinônimos. O primeiro
decorre de um uso amplo e popular. Como adjetivo para se referir a lugares, é
adotado para apontar espaços muito próximos ao mar, como a praia ou a beira-mar
145
e, não muito raro é adotado como expressão oposta àquilo que é do interior. Neste
termo, ser do Litoral se contrapõe ao ser do interior.
Como conceito, tem uso farto no meio jurídico internacional. Por exemplo,
Litoral designa uma faixa de terras junto à costa marítima que englobaria cerca de
50 km para o interior, segundo nuances especifica de cada legislação nacional.
Por zona costeira, compreende-se um recorte para designar o conjunto de
todos os espaços e ambientes existentes na interação entre “meios terrestres,
marinhos e atmosféricos”35.
O conceito de zona deriva em grande parte do uso feito pela biologia
marinha, com intuito acadêmico de designar o conjunto de ecossistemas localizados
em um espaço cuja dinâmica está ligada ao comportamento do mar e das variações
das marés. Nele encontram-se praias, costões rochosos, mangues, estuários e
dunas como paisagens que a caracterizam.
Ambos conceitos se referem ao menos como arcabouço teórico, a um quadro
natural, que ao possuir uma compartimentação mais ou menos delimitada, serviria
então como uma base de divisão com limites fisionomicamente bem definidos. Tal
conceituação seria precisamente adotada, se o Litoral compreendesse apenas a
porção do sudeste brasileiro. Visto que, no trecho em que a serra do Mar se constitui
uma barreira física, os ambientes litorâneos são claramente delimitados. Contudo, a
diversidade espacial no Brasil é grande, não existindo apenas uma face de Litoral,
mas vários Litorais.
Em Sergipe, por exemplo, onde a influência marinha estende se por vários
quilômetros continente adentro, essa conceituação restaria confusa. Nesse sentido,
a própria noção de zona costeira não se apresenta como um recorte natural
favorável. Já que ambientes costeiros estariam envoltos e interagindo
biologicamente com ambientes não costeiros, sem influência da dinâmica oceânica e
sem limites claramente estabelecíveis.
A situação se complica quando entra em cena o recorte do município como
unidade de exercício político e de planejamento. Pois a conformação territorial dos
municípios brasileiros é desconforme no que diz respeito ao arranjo espacial.
Existem estados em que os municípios apresentam baixa extensão territorial e
35
Sobre esse tema consultar Moares (1999).
146
outros, como Norte do país em que um município confrontante com oceano pode
alcançar mais 300 km de extensão, como ocorre em municípios do Amapá.
Segundo Morares (1999) já em 1991 o IBGE observando o recorte da “linha
de costa”, portanto, sem considerar os ambientes que são influenciados pela
dinâmica de maré continente adentro, identificou 258 munícipios litorâneos, destes
07 em Sergipe.
Todavia o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro – PNGC II36, lista a
existência de 317 munícipios costeiros, sendo 18 em Sergipe37. O PNGC adota
como conceito que a zona costeira é aquela que abriga um mosaico de
ecossistemas de alta relevância ambiental, cuja diversidade é marcada pela
transição de ambientes terrestres e marinhos, com interações que lhe conferem um
caráter de fragilidade. Para o PNGC II (1997) zona costeira é o espaço geográfico
de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos ambientais,
abrangendo as seguintes faixas:
36
O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro – PNGC, derivou da atuação da Comissão
Interministerial para os Recursos do Mar – CIRM. O Plano se desdobrou em duas etapa, o PNGC I e
o II de 1997, que se constituiu uma revisão da primeira fase.
37
Segundo PNGC II (1997), 18 munícipios de Sergipe são classificados como litorâneos: Brejo
Grande, Pacatuba, Indiaroba, Pirambu, Santa Luzia do Itanhy, Barra dos Coqueiros, Laranjeiras,
Santo Amaro das Brotas, Riachuelo, Aracaju, Maruim, Nossa Senhora do Socorro, Rosário do Catete,
São Cristóvão, Itaporanga D ´Ajuda, Estância, Ilha das Flores e Neópolis.
147
38
Como veremos no item 4.2 deste capítulo.
150
39 Usamos o termo “mínimos vitais” de acordo com a proposição de Antônio Candido (2003), para
expressar os objetivos sociais de produção em cultura rústica ou caipira (como o autor usa). Para ele
os tipos culturais, caipiras, camponeses, pescadores, ou seja as culturas tradicionais estabelecem em
seu modo de vida um sistema de produção que visa obter um equilíbrio entre essas condições
mínimas e as condições sociais ecológicas locais.
40 Ambos os países dispunham de melhores condições navais do que Portugal naquele momento.
Ver Moraes (2000).
154
sujeita a vigilância e controle. Devemos nos perguntar também o que impediu gente
poderosa, capaz de dirigir-se à coroa no Rio de Janeiro de reivindicar posse sobre
as terras do Litoral.
Observamos de início, que boa parte desse espaço do Litoral esteve
“interditado” à “política” de territorialização, para usar um termo moderno, praticado
desde o inicio da consolidação do espaço Brasil. Constituindo área intersticial, onde
predominava um “vazio”, mas não um “vazio demográfico”. Esse nos parece ser o
elemento espacial mais coerente para explicar o sucesso de formações territoriais,
baseado no relativo controle de territórios coletivos.
Antes de prosseguirmos explicando como se constituiu uma área intersticial
no Litoral de Sergipe, julgamos ser relevante revisitar as bases teóricas para
pensarmos uma área como “vazios de poder”.
A formulação do conceito de “vazio de poder” foi apresentada originalmente
por Parsons (1964), cuja aplicação se deu no campo do poder político na face
moderna do Estado-Nação em que analisava predominantemente as implicações
das trocas recíprocas entre governos e governados.
O autor avaliou as trocas e a manutenção da confiança nos governantes
pelos governados, como condição da governabilidade num sistema político, de
forma que a limitação destas trocas bem como a incredibilidade dos governados nos
governantes caracterizaria um “vazio de poder”.
Giddens (2001) admite parcialmente a formulação de Parsons (op. Cit),
reconhecendo a possibilidade de reciprocidade na dialética do controle
administrativo no Estado-Nação moderno. Ele discorda de Parsons apenas no que
se refere à generalização da reciprocidade das relações de confiança entre um
poder central, por assim dizer, e a sociedade de uma forma geral. Para esse autor, a
relação de poder se estabelece sem necessariamente envolver a “confiança” como
esquema geral, tão somente seria necessário uma “aceitação” tácita de obrigações
ou uma submissão pragmática a este poder estabelecido na forma de governo.
Daí que o uso da violência poderia ser legalmente acionado como uma forma
de controle nos casos em que se constituem vazios de poder, mais uma vez torna-
se compreensível o enorme esforço militar para subjugar Palmares e Canudos em
tempos mais recentes.
As condições para formação de vazios de poder decorrem geralmente,
segundo Giddens (op. cit), de lutas em relação a direitos, incluindo: civis, políticos e
157
econômicos. Em última análise o próprio território, como meio de vida, pode ser
entendido como um direito, principalmente num período em que a exploração física
era a regra.
Reconhecemos que tais formulações são muito genéricas e filosóficas e
foram estabelecidas no campo das relações sociais envolvidas nos direitos e
cidadania. Contudo, vale ressaltar que tais teorias foram desenvolvidas observando
à constituição de um Estado-nacional aplicado ao contexto Europeu, cujas nações,
já apresentavam contornos mais ou menos claros antes mesmo do Estado-Nação
moderno.
Destacamos esse ponto, porque no caso do território nacional Brasileiro, o
Estado antecede à sociedade brasileira como conhecemos os símbolos de
brasilidade só foram forjados muito tempo depois do controle territorial.
A busca pela conformação territorial ocorre mesmo sem uma nação para
enraizar seus costumes, crenças e relações territoriais tradicionais. Isso é
fundamental para compreender que a formação territorial nacional Brasileira é fruto
de geopolítica de expansão e alargamento do território, cujo padrão foi determinante
no exercício do controle territorial baseada em pontos, constituindo um território
rede.
No Brasil colonial não se lutava por reconhecimento de direitos – essa é uma
luta muito recente – se buscava a sobrevivência, ou seja, alcançar as mínimas
condições de sobreviver em um sistema socioeconômico fortemente hierarquizado e
excludente.
A organização de um dado território pelo poder legitimador (figura do Estado)
envolve a criação de meios e de uma infraestrutura administrativa para atender as
demandas sociais e estabelecer controle sobre a sociedade e o território.
A figura moderna do Estado adotou recursos políticos e materiais para
efetivar o “seu poder”, é o caso das sesmarias como exemplo da territorialidade
oficial no período colonial. O poder está “relacionado aos recursos que os agentes
empregam ao longo de suas atividades para concluir o que se quer fazer”,
(GIDDENS, 2001, p. 33).
É a partir da capacidade de intervir nas dinâmicas sociais e pela “dominação
sobre as facilidades materiais, incluindo os bens materiais e as forças naturais que
passam a ser subordinadas a sua produção” que o Estado conclui o que se quer
fazer com a organização do território. Mas é pelo domínio dos meios e das
158
sendo o instituto da posse a forma através da qual os sujeitos do Litoral, obtêm seus
territórios ainda hoje.
Muitas delas procuram justamente no reconhecimento da diferença cultural
um estatuto legal capaz de lhes garantirem segurança e posse do território, como é
o caso dos territórios quilombolas como unidade territorial.
Se fizermos uma análise mais abrangente de comunidades tradicionais e as
questões da posse em relação à propriedade privada do território está presente em
quase a totalidade dos conflitos territoriais, em especial quando envolvem terras
“públicas” ou “devolutas”, Brandão (2012) – cujas designações podem se estender
às veredas, as beiras de rio, ao fundo de pasto ou as ilhas do rio do São Francisco
ou; a uma comunidade pescadora e marisqueira do Litoral sergipano, frente a atual
expansão do turismo41 que as têm como “terras de ninguém”, (MORAES, 2000).
No nosso caso em particular, essa condição de “vazio de poder”, se
estabeleceu por um processo de interdição espacial, que teve na instituição dos
terrenos de marinha, compreendidos inicialmente como a faixa de praia e as áreas
alagadas, nas quais não se poderiam conceder sesmarias.
A faixa de terras que se denominou como de “marinha” visava dar condições
à marinha de guerra para exercer suas funções de defesa do espaço marítimo,
construindo fortes e instalações militares. Essa restrição parece ter funcionado de
fato para expansão do sistema territorial oficial da colônia.
Podemos entender melhor essa questão se considerarmos alguns aspectos.
Em primeiro lugar o objetivo inicial da geopolítica portuguesa para o Litoral, inclusive
o de Sergipe foi estabelecer um nível de controle territorial, que afastasse outros
concorrentes. Não havia no país uma “sociedade” unificada em termos de tradições
e nem a presença de instituições reconhecidas, tudo era eminentemente novo e,
como vamos demonstrar esse quadro institucional primordial para o funcionamento
da territorialização oficial, praticamente não alcançou essa área litorânea mais
imediata, exceto pontualmente.
Se é verdade que inicialmente o medo de invasões predominou como motivo
da instalação de cidades fortificadas mais ou menos distante do Litoral, o medo por
si mesmo não explica a manutenção desse quadro ao longo do tempo. Algum outro
41
Turismo no contexto da especulação imobiliária, das políticas da Embratur e da forte indução do
turismo de sol e praia
162
fator espacial atuou para afastar a incorporação do Litoral mais imediato na dinâmica
econômica.
Em nossa análise entendemos que interdição espacial pode explicar esse
quadro, tendo na figura das terras de marinha a instituição pela qual o espaço se
tornou inacessível ao estabelecimento de organização econômica similar ao que
ocorreu em outras sub-regiões do Estado, especialmente na zona da cana de
açúcar, mas também no Agreste e no Sertão.
Notemos que o distúrbio ora relatado, não é tanto um conflito ambiental nos
termos em que entendemos hoje, mas um distúrbio de ocupação extra-oficial de um
espaço/território. Segundo o autor, podemos notar o “velho e novo”, ou seja, a antiga
ideia de as marinhas serem áreas reservadas, dentre outros, para fins portuários, e
a nova ideia estatal de aforar as terras sob a outorga das câmaras municipais e
anuência da Coroa. Observa-se então, problemas entre o patrimônio público e a
apropriação de terras pelos comerciantes que se estabelecem nas praias, no caso
D. Manoel na Corte Imperial do Brasil.
No ano de 1832 a possibilidade de utilização destes terrenos é reafirmada, a
previsão de uso agora se baseia no recolhimento de um Foro42, uma espécie de
aluguel a ser recolhido aos cofres públicos em retribuição à concessão para uso:
Para Diniz; et al. (2007) os terrenos de marinha poderiam então ser aforados,
e os “enfiteutas”43 pagariam foro de 2,5% do valor da avaliação feita pelo estado,
essa avaliação seria custeada pela parte interessada na avaliação.
42
O aforamento é espécie de contrato através do qual se transfere direito real sobre bem imóvel
alheio. Nele, ocorre o desdobramento do domínio entre o efetivo proprietário, apelidado de senhorio,
e aquele que recebe o direito real sobre o imóvel, apelidado de foreiro ou enfiteuta. O senhorio é
titular do domínio direto, enquanto o foreiro do domínio útil, o que outorga a ele amplos poderes sobre
a coisa, podendo aproveitá-la como se ela o pertencesse. O foreiro conserva esses direitos
perpetuamente, podendo transferi-los aos seus herdeiros ou a terceiros, de modo gratuito ou
oneroso. Em contrapartida, o foreiro deve pagar anualmente à União o foro correspondente a 0,6%
(seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno (...), bem como, em caso de
transferência onerosa do aforamento - que deve contar com o assentimento da União, que inclusive
exerce direito de preferência (...) -, deve pagar o laudêmio correspondente a 5% (cinco por cento)
sobre o valor do domínio pleno e benfeitorias (...). A inadimplência do foreiro por 3 (três) anos
consecutivos ou 4 (quatro) anos intercalados importa na caducidade do aforamento, Diniz; et al.
(2007)
43
Uma espécie de arrendatário de longo prazo, que obtém um direito real, o domínio útil de um
imóvel (terras não cultivadas, terrenos destinados à edificação), mediante pagamento de uma pensão
anual, chamada foro; aforamento.
166
44
O conceito de preamar, designa a medida máxima da influência da linha d´água do mar exerce na
condição de maré alta, de tal sorte que, para se identificar um terreno de marinha de forma apenas
aproximada, basta se contar 33 metros em um dia de maré cheia. A exata definição adveio com a
demarcação da LPM – Linha Preamar Média – no ano de 1831. Estas medidas são bastante
questionadas por supostamente estarem desatualizada, dada elevação do nível do mar ao longo dos
dois últimos séculos.
169
I. em primeiro lugar, o trecho acima não deixa dúvida, havia um bloqueio de uso
em relação aos terrenos de marinha em Sergipe e esse instituto era
reconhecido legalmente e socialmente;
II. nesse tempo parece existir alguma dificuldade em se apontar com precisão
onde seria ou não esses terrenos. Depreendemos que deveria haver muitas
dúvidas in locu para analisar os critérios técnicos que definiam os limites a
serem observados. Tanto que o suposto perseguidor aproveitou-se dessa
dificuldade de delimitação para causar constrangimentos territoriais ao
suplicante;
III. por outro lado, como se trata de uma questão de delimitação de terrenos que
envolvia o interesse do império, nota-se a ausência de uma burocracia
171
% % %
AGRO INDUS SERV
MUNICÍPIOS POP. IDHM PIB (R$)*
Litoral Norte
Pacatuba 13.137 0,55 136.569,00 14,6 33,5 48,9
Pirambu 8.369 0,60 69.274,00 6,7 31,1 60,0
Brejo Grande 7.742 0,54 53.007,00 11,2 2,1 63,0
Litoral Central
Aracaju 571.149 0,77 9.222.818,00 0,1 16,5 70,0
Itaporanga D'Ajuda 30.419 0,56 598.646,00 3,1 50,5 35,6
Barra dos Coqueiros 24.976 0,65 320.447,00 1,1 40,0 51,1
Litoral Sul
São Cristóvão 78.864 0,66 557.339,00 3,1 21,3 68,6
Estância 64.409 0,65 1.132.534,00 2,1 38,0 43,0
Indiaroba 15.831 0,58 93.04,00 13,1 8,3 75,0
Santa Luzia do Itanhy 13.733 0,54 105.047,00 20,0 7,0 66,0
Adicionado Bruto – VAB da agricultura, ou seja, dentre toda riqueza gerada pela
agricultura parte expressiva tem como origem a comercialização do pescado.
45
Não incluímos São Cristóvão e Santa Luzia do Itanhy nesse gráfico pela indisponibilidade de dados
sobre esses municípios.
175
Pacatuba 24 05
Brejo Grande2 07 07
Japaratuba 08 02
Barra dos Coqueiros 03 02
Aracaju 07 05
São Cristóvão 34 12
Itaporanga D´Ájuda 22 05
Estância 03 03
Indiaroba 03 03
Santa Luzia do Itanhy 03 01
Total 1083 40
46
As comunidades e povoados que constituem o Apêndice D, apesar de ainda incompleto,
representam um banco de dados fruto de levantamentos secundários, incluindo consulta às
bases de 1820-1920 e de trabalhos de campo.
176
O Litoral Sergipe começou a ser ocupado na sua porção Sul, coincidindo com
o território do atual povoado Saco do Rio Real. No ano de 1575, com a chegada dos
jesuítas Gaspar Lourenço e João Salônio criaram uma feitoria às margens do rio
Piauí, que mais tarde deu lugar a atual cidade de Santa Luzia do Itanhy. A ocupação
das terras sergipanas, conforme demonstramos páginas atrás e no capitulo 03,
iniciou-se pelo Litoral aproveitando os cursos dos rios e avançando em direção ao
interior.
Mesmo antes da presença sistemática de ocupação portuguesa, pequenos
portos, surgiram na costa e nos estuários sergipanos para darem suporte às
atividades comerciais, especialmente às trocas envolvendo a extração de pau Brasil.
Essa parece ter sido a característica que circunda o pequeno lugarejo de Terra
Caída, que nos primórdios pode ter abrigado barcos franceses frequentadores da
costa sergipana.
O pequeno povoado secular encontra-se distante cerca de 100 km de ao Sul
de Aracaju, bem na divisa dos municípios de Santa Luzia do Itanhy, Estância e
Indiaroba, numa situação entre águas. Politica- administrativamente ao município de
Indiaroba.
O nome “oficial” do povoado é Praia São José, só que quase ninguém,
inclusive os moradores, adotam essa designação. Até as placas de sinalização
possuem o nome “popular” pelo qual é conhecido, conforme demonstra foto 01 a
seguir:
178
Total 92
A pesca em alto mar é mais produtiva, responde por cerca de 43% do total do
pescado e mais rentável em termos de retorno financeiro, apesar de representar
apenas 12% da frota local e absorver uma quantidade limitada de pessoas. As
principais artes de pesca utilizadas no povoado são:
181
Total 100,0
Contudo, nos últimos anos, foi estabelecido acesso terrestre regular sobre rio
Piauí com a construção da Ponte Gilberto Amado (foto 05). Com isso a
exclusividade exercida pelo povo como ponto de passagem e parada obrigatória foi
interrompida, gerando enormes preocupações. Pois agora com a ponte as pessoas
não precisariam obrigatoriamente passar ou parar no povoado, tudo isso provocou
temores de possíveis prejuízos à frágil estrutura de serviços lá instalada.
47
Não foi possível inferir a produção total no povoado.
188
Segundo Torres (2014), embora predomine casas com fachada frontal e com
poucos metros – 5 a 7 metros, a grande maioria possui quintais, com criação de
aves e fruteiras. São poucas as casas com recuo, mas em todas, arbustos e
pequenas plantas ornamentais enfeitam as fachadas.
Os sítios e as casas de “veraneio” são identificadas por seu porte, geralmente
são maiores; pelo o acabamento mais requintado se comparadas as casas simples
dos pescadores; e por estarem quase sempre com portas e janelas fechadas, em
face de sua utilização sazonal. Ao lado da casa grande sempre existe um anexo
para o caseiro, geralmente um pescador com sua família que fica encarregada de
zelar pela casa do morador temporário.
Outro aspecto relevante sobre o povoado é a simplicidade do arranjo
“urbanístico” em conformidade com sua beleza cênica. Constata-se a presença de
jardins floridos, muitas cores, texturas, cheiros; cenas de um cotidiano carregado de
significados e singularidades como: pescadores tecendo suas redes em suas
varandas; crianças aqui e acolá brincando na rua, subindo em árvores, barcos
ancorados nos portos, ou saindo para a pescaria.
A paisagem do rio vista de cima do barranco, de onde se avistam as ilhas
Grande e Pequena, os apicuns e a exuberância dos manguezais, completam a
193
tranquilidade que reina no ambiente e tão valorizada pela gente do lugar: “gosto da
tranquilidade de morar aqui, posso sair e deixar a porta de casa aberta”:
48
Conhecida cientificamente como: Juncus effusus, planta aquática da família Juncaceae
195
49
Nomenclatura cientifica: Typha domingensis.
198
TRABALHAR, BRINCAR E
LEMBRAR: O COMPLEXO
TERRITORIAL DAS
COMUNIDADES
TRADICIONAIS
DO LITORAL
SERGIPANO
202
Entorno da paisagem
Sol/céu
Casa (minha)
Árvores
Rio
Coqueiro
Animais
Cotidiano
Campo de futebol
Brincadeiras
Rio/maré; mar
Escola
Outras referências
Pessoas (família)
Escola
Carro e motos
Barco
Igreja
Animais
Peixe, rio, mar
Posto de saúde
Centro social
Ponte
Estrada
Legenda:
Predominante no desenho Compõem o desenho
50
Uso esse título de empréstimo e em referência ao excelente e basilar livro de Roberto Damatta
(1997) A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil.
206
“minha árvore”, aquela que tem significado e um sentido para aquela criança. Existe
um sentido na função brincadeira, mas existe ainda um significado do prazer e da
emoção. Contudo, não é só árvore que importa, é a representação do espaço da
árvore e o conjunto de usos que a criança faz dela como um espaço.
A criança não só conhece, mas reconhece o espaço que passa a fazer parte
do seu espaço de referência cotidiana. Dele gosta e dele se lembra. Função espacial
e sentimento se fundem no reconhecimento do território, tal como apontado por Leal
(2012) com base em Tuan (2013, p. 43):
Por isso, o cenário é retratado com detalhes e carinho, “ (...) lá é bom para tomar
banho, pular do porto, mergulhar na maré”.
Esse “lá é bom” coloca-se em oposição à obrigação de ficar em casa, de
participar do cotidiano da casa ou da escola. É a maneira de ser criança na
comunidade sem shoppings ou playgrounds. Muito embora esses espaços seduzam
e povoem a imaginação das crianças, essas referências que chamamos do
imaginário como piscinas, shoppings, parques também chegam aos jovens das
comunidades do Litoral pelas antenas de TVs, geralmente parabólicas, as mesmas
que afastam e rareiam os mitos culturais como lobisomem.
Segundo Tuan (2013) o horizonte geográfico da criança expande à medida
que ela cresce, mas não necessariamente em direção a uma apropriação escalar
mais ampla. O interesse imediato é pela sua comunidade local, representada pelos
parentes e colegas. A criança pode saltar inclusive localidades próximas e
conhecidas e se fixar em referências mais amplas, incluindo elementos que não ele
conhece apenas no imaginário, como foram o caso das diversas representações de
pés de maçãs, que não compõe a flora das comunidades estudadas ou, até mesmo
elaborados campos de futebol, conforme desenho 06, que são o oposto dos
campinhos esburacados dessas comunidades.
suficiente já participa da unidade familiar, mesmo que por diversão. É a família que a
introduz nos ambientes em que se pratica as atividades tradicionais, mostrando-a
como se faz, transmitindo lhes saberes, ensinando-as os conhecimentos populares e
tradicionais e principalmente, estimulando-as a explorar novas faixas de território,
aumentando, desta maneira, o repertório espacial de referência do sujeito, conforme
retratado no desenho 07 acima.
Porém, para a criança, o sentido contido nessas primeiras experiências de
pesca não é de trabalho, mas sim, de participar de um tempo-espaço de deleite, de
aprendizado, de novidades. A pesca, em especial, exerce um fascínio sobre os
jovens pescadores. Poucos vão obrigados, por força da coerção da família, ao
contrário, em muitos casos, os pais não querem que os filhos sigam esses caminhos
da pesca, “ (...) porque isso não dá futuro”.
Visto pela criança, como sujeito, este barquinho leva e traz nos ciclos da água
um modo de vida tradicional. A tradição não se constitui desta forma, uma opção, a
qual se adere ou não. Na tradição se nasce e se vive, ela é um meridiano que
atravessa a vida. Mesmo em algum momento dela (vida) se possa afastar por
situações sociais, como no processo de migrações ou como em mudanças nas
relações de trabalhos.
É dessa forma, pela tradição que a criança é inserida no território de vivência
na comunidade, conhecendo e se reconhecendo nesse espaço, em especial, por
meio de sua apropriação, na diversão e nas brincadeiras, mas também na prática
das atividades. Nesse sentido, não há limites para a imaginação infantil que
transforma um lugar às vezes proibido em uma representação de um lugar
imaginado (LEAL, 2012).
Pesca
Igreja/festa padroeiros
Extrativismo vegetal
Pratos típicos
Roça
Artesanato
Centro Comunitário
Vegetação
Escola
Posto de saúde
Festas populares
Folguedos
Porto* *
* Em branco não foi citado
51
Objetivações entendidas a partir das ideias de Moscovici (1978) sobre a formação das
representações sociais, envolvendo a formulação e assimilação de um novo conteúdo e sua
objetivação e cristalização em determinado contexto cultural.
225
junco, se planta, quem faz, o espaço que cada um pode ocupar em cada período de
tempo), ou ainda; como simbólico-expressivo (valor cultural, suporte simbólico-
ideativo das práticas sociais e culturais), no qual o território corresponde ao
elemento gerador de crenças, mitos, ritos, costumes, o que corresponde a um
território como fundamento das relações que organizam o mundo simbólico.
Afinal, o mundo social com suas representações, contém espaços vividos por
diferentes grupos, neles são expressos suas vivências, mas, também seus conflitos
e tensões. O processo que responde a formação de objetos culturais ancora-se nos
fatores culturais já mencionados, alimentando-se e retroalimentando-se na
apropriação espacial cotidiana e tradicionalmente estabelecida suturando formas e
modos de ver no espaço.
Essas formas de apropriação são separadas apenas como recurso analítico,
pois, no que concerne a vivência cotidiana elas estão absolutamente indissociáveis,
estão imbricadas uma na outra, sendo desta maneira, o território a base material e
também fonte de símbolos, ritos e mitos.
O conhecimento que confere significado ao território, às paisagens parece
obedecer a um regime cíclico que se inicia na infância, na qual os sujeitos exploram
o ambiente desde a casa, a escola e o entorno mais imediato com uso para fins de
lazer e brincadeiras.
Nas comunidades litorâneas, como pontuamos, o alcance do uso do espaço
vai se alargando na mesma medida em que as experiências sociais também são
ampliadas quando os jovens pescadores assumem e desempenham papéis e
funções sociais mais amplas. Na perspectiva do jovem e do adulto, o sentido do
trabalho determina a incorporação dos espaços que convertem paisagens antes
ligadas ao deleite e a diversão em espaços onde se desempenham papéis e funções
de trabalho e de reprodução da vida, em última medida em lugares onde se realiza
cotidianamente o trabalho.
O conhecimento profundo da paisagem e do ambiente é fundamental para a
estratégia de obtenção de meios de vida. Os sujeitos sociais se estabelecem e se
especializam de acordo com o componente da paisagem que é apropriado. O
mangue oferece o caranguejo, os sujeitos sociais que se identificam socialmente
com a atividade são conhecidos como caranguejeiros. A faixa de areia entre o
mangue e o rio é rica no massunim, essa faixa é ocupada cotidianamente por
marisqueiras que revolvem a areia em busca do pequeno marisco e o levam para
226
Terra Caída
Tigre/Junça
Pedreiras
Legenda: Muito Importante Importante
(1) Mangaba, coco e palha (artesanato); (2) Pedreiro, eletricista, encanador, marceneiro, etc; (3) doméstico, vigilante,
funcionário público; (4) bar, pousada e restaurante, atravessador, piloto de barco.
52
BRANDÃO, C. R. A comunidade tradicional. In: COSTA, João Batista; OLIVEIRA, Claúdia Luz de.
Cerrado, gerais, Sertão: comunidades tradicionais nos sertões roseanos (Orgs.). São Paulo:
Intermeios, 2012.
231
Não se pesca apenas como atividade técnica de lançar uma rede e recolhê-la.
A pesca envolve um universo social e territorial extenso e complexo, que começa
muito antes do barco deixar o porto do Dedé nas Pedreiras. Ela começa muitas
vezes na fabricação de apetrechos, na preparação do barco, na limpeza e no
tratamento do pescado e, por fim, na comercialização.
A pesca como atividade sociológica é uma ação social, envolve todas as
dimensões da vida comunitária, desde o jovem pescador que imita o pai, até a
economia das trocas simbólicas e os laços de reciprocidade estabelecidos com os
“companheiros de pesca”. Na pesca não se pega somente peixes, se cria relações.
Essa centralidade que ainda persiste em torno da prática pesqueira contribui
para a manutenção das características tradicionais, mesmo com o avanço de outras
práticas de trabalho, especialmente as que envolvem a formalização do trabalho e a
perda de autonomia. Contribui ainda para a permanência e o sentido tradicional do
modo de vida, pois permanecem as lógicas próprias do mundo tradicional e os
sentidos de práticas sociais.
A obtenção de produtos para realizar a reprodução social e econômica nas
comunidades inclui também a prática de outras atividades como agricultura de
pequena escala (macaxeira, arroz, etc.) e o extrativismo do coco, de forma
complementar por outros membros do povoado ou como segunda atividade
praticada pelos próprios pescadores, conforme apontado no quadro 09.
O sujeito que pesca, também cata o aratu e ele vive segundo o que a
natureza oferece. “Se não sair peixe pegamos aratu, o importante é não voltar sem
nada”, reafirma um pescador que entrevistamos. Essa polivalência em se transitar
entre várias técnicas de pesca estende-se também para uma múltipla funcionalidade
de trabalhos, ou seja, o pescador também coleta ou planta uma pequena roça. Ser
um sujeito que exerce várias atividades garante autonomia e liberdade.
232
Org.: Sistematização a partir de dados da pesquisa de campo pelo Projeto: Grandes Projetos e
Identidades Locais, 2013.
(...) todo mundo aqui sabe pescar peixe e marisco, quando não tem o
peixe a gente tira um marisco. É homem e é mulher que tira o
marisco. As marisqueiras ficam só na maré não tira peixe, é difícil,
tem que pular nos galhos e raízes para pegar a ostra, o caranguejo e
o aratu. (Entrevista concedida pelos senhores Vanderlei, presidente
da associação, José Cristóvão, pescador e Senhora Zélia,
pescadora, no povoado Pedreiras).
lembrar também reforça os vínculos com o território. Segundo Brandão (1998, p.12)
nós pensamos os nossos pensamentos, mas a memória revela quem somos nós, as
nossas identidades. “Lembrar refere-se ao de onde se veio. Antes com os outros, os
meus, minha gente; depois sozinho, minha alma, sua vida, minhas vidas: a de agora
e as passadas, o meu eu”.
Há um lirismo que muitas vezes aproxima o imaginário infantil à lembrança do
velho. As doces lembranças de uma realidade, muitas vezes, dura e áspera, são
traduções para expressar a alegria contida nas situações vivenciadas com
dificuldade e a durezas do viver em outro tempo, em que faltava toda sorte de
recursos, mas que não é suficiente para apagar um mundo da pesca do passado.
Vejamos o depoimento de uma pescadora já aposentada que nasceu e cresceu nas
Pedreiras:
Um homem não sabe o que ele é se não for capaz de sair das
determinações atuais. Uma lembrança é diamante bruto que precisa
ser lapidado pelo Espirito. Sem o trabalho da reflexão e da
localização, seria uma imagem fugidia (BOSI, 1994, p. 81).
54
Ver notícia: Moradores da Pedreira bloqueiam estrada em São Cristóvão, disponível em
http://www.infonet.com.br/cidade/ler.asp?id=146997, acesso em 01/11/2014. Pode verificar também
matéria: Comunidade volta a protestar por afasto, disponível em
http://www.jornaldodiase.com.br/noticias_ler.php?id=13611, acesso em 02/11/2014.
244
ponte na opinião dos moradores de Terra Caída poderia incidir sobre um nicho de
atuação muito caro à parte da comunidade.
Ao estabelecer outra forma de transpor o rio, a ponte romperia a
especialização econômica propiciada pela operação de balsa que realizava a
intermediação de transportes, ajudando a vencer o estuário até então obstáculo aos
carros, sendo que a comunidade de Terra Caída se beneficiava como um dos
pontos estratégicos para o atracadouro.
Além da operação direta das balsas, o fluxo ordinário e regular de carros e
viajantes que passavam pela localidade, ajudou a uma relativa segmentação de
atividades de apoio, com a presença de restaurantes e outros prestadores de
serviços.
Uma parcela da comunidade, principalmente os interessados diretamente na
manutenção das condições de comércio, defendia que a ponte poderia significar a
depleção econômica de Terra Caída. Esse cenário durou todo período de
construção da ponte (2010-2013) e marcou as falas da população: “Terra Caída vai
ficar invisível depois dessa ponte”, “(...) ninguém vai parar aqui”.
Curiosamente, ocorreu o inverso do esperado, a ponte apareceu apenas
secundariamente e em apenas uma representação. Esses exemplos sugerem que a
comunidade não representa elementos com os quais não mantêm relações
cotidianas, sejam simbólicas, funcionais ou econômicas. Ocorreu um distanciamento
entre a narrativa, da ponte em Terra Caída e da estrada em Pedreiras, realizadas
por lideranças e agentes econômicos específicos e, a apropriação e representação
social das referências espaciais nas respectivas comunidades.
Por outro lado, a inserção da REBIO Santa Izabel ao promover restrição
territorial resultou em uma dupla consequência. Em primeiro lugar a restrição
imposta significa a ruptura da relação sujeito-território-prática social, apartando, em
parte, pela interrupção da pesca de mar, o sujeito social, nesse caso o pescador, da
reprodução cotidiana de sua atividade social de trabalho.
De tal sorte, que ao longo do tempo o sujeito social se coloca (des)conectado
do seu modo-de-vida, compreendido como repertório sociocultural. Esse
(des)centramento entre o sujeito e o cotidiano tem implicações importantes na
própria reprodução do sujeito pescador e da manutenção material e simbólica da
atividade.
246
Por tal razão é que apesar de encontrarmos várias narrativas de sujeitos que
se vêm e se entendem como pescador, a prática cotidiana da pesca em Tigre/Junça
se mostra em declínio, tanto em número de praticantes, quanto em termos de
produção do pescado e do tempo dedicado a prática.
Mesmo considerando que os territórios das comunidades do Litoral são
formas seculares, e ainda que os sujeitos representem sentimentos de
pertencimento aos seus territórios e que em suas narrativas e discursos apontem a
existência de uma consciência desse sentimento de pertencimento, as relações de
poder que criam e engendram elementos nos território seguem sendo muitas vezes “
in-visíveis” e sutis. Essa assertiva é verdadeira quando analisamos a imposição de
interdições operadas em nível territorial com o a introdução REBIO, que limitou a
representação e a prática pesqueira na comunidade de Tigre/Junça.
A restrição opera em um nível muito sutil, praticamente imperceptível, pois os
sujeitos pesquisados não incluíram a Unidade de Conservação como elemento
espacial importante na sua vida e, também não problematizaram os efeitos de sua
restrição no cotidiano da, até então, principal atividade socioeconômica da
comunidade.
Exemplos menos emblemáticos dessa sutileza na conformação territorial são
a ponte Gilberto Amado na comunidade Terra Caída e a exploração de petróleo e
gás nas três comunidades estudadas. Essas incursões nos territórios comunitários,
seja pela legitimidade do poder estatal na imposição de UCs, sejam nas ações
privadas para apropriação econômica do espaço denotam ainda fragilidade e “in-
visibilidade” das comunidades tradicionais frente às tramas e aos processos
territoriais em suas múltiplas escalas de relações.
Mesmo que o jovem morador de Tigre/Junça não perceba a restrição
territorial em sua rotina de infância, como mostrado nos desenhos, ela certamente
implica, com o passar do tempo, em uma interrupção da transmissão do saber
tradicional do pescador nessas comunidades. Tal fato pode vir a ocorrer em
Pedreiras e em Terra Caída, mas o ambiente da pesca e a representação de seus
elementos, como barcos, pelas crianças e adultos, ainda foram retratados de forma
viva.
CONSTRUINDO SENTIDOS
COM O TERRITÓRIO
254
55
Adoto os termos natureza no sujeito e sociedade no sujeito nos termos formulados por Peter
Berger no seu livro “Perspectivas Sociológicas: uma visão humanística”, capítulos I e II (2010), no
qual o autor demonstra do ponto de vista sociológico as múltiplas influências da sociedade e da
natureza no sujeito social.
259
que isso, ela mesma nos diz muita coisa sobre a natureza dos sujeitos sociais do
Litoral.
Podemos afirmar que se existisse uma matriz sociológica original do sujeito
litorâneo, hegemonicamente ela se expressaria na figura do sujeito pescador. O
pescador é aquele sujeito social que pratica a pesca, utilizando-se de técnicas,
instrumentos, métodos variados e se vale do conhecimento ecológico tradicional do
local e das espécies a serem capturadas. Esse tipo geral de pescador, que
representa a maioria dos sujeitos do Litoral, apresenta algumas subdivisões
importantes, em especial sobre duas dimensões: (i) da abrangência espacial dos
ambientes explorados; (ii) em torno das organização social como uma categoria de
trabalho.
No que diz respeito à abrangência, podemos encontrar pescadores que
exploram estuário e lagoas. Eles praticam suas atividades, adotando principalmente
canoas de remo e canoas de propulsão a motor, com apetrechos como rede de
arrasto, tarrafas, linhas e anzóis.
Encontramos também os pescadores de mar, especialmente em Terra Caída
e Pedreiras, que adotam embarcações de maior porte e autonomia e praticam
pesca, em ambientes de mar aberto. Estes se diferenciam dos pescadores de rio
adentro, além do aspecto territorial, pela forma que organizam suas atividades, pois
apresenta uma racionalidade do tipo empresarial, com objetivo de maximizar as
capturas, dado alto custo envolvido na operação da pesca em alto mar.
No que concerne a organização social da pesca, entre os pescadores é
estabelecida uma diferenciação que envolve a representação da legitimidade da
prática perante órgãos públicos, qual seja: o pescador artesanal profissional, aquele
que possui o Registro Geral de Pesca, que está registrado na Colônia de
Pescadores e, que faz jus ao seguro defeso e; o pescador amador, aquele que
pesca eventualmente ou de forma esportiva.
Desta maneira, o sujeito pescador apresenta na sua constituição um duplo
processo apontado por Silva (1988): (i) no que diz respeito à cultura da pesca como
modo de vida, processo de trabalho, símbolos e signos culturais; (ii) o processo de
institucionalização e organização do sujeito social promovida pelo Estado a partir do
início do século XX com a criação das colônias de pesca.
Podemos entender o sujeito pescador atual como o imbricamento entre o
sujeito cultural, que carrega uma história de adaptação e um modo de vida, incluindo
260
56
Informações colhidas na Federação dos Pescadores de Sergipe dão conta que a primeira colônia
de pescadores foi a atual colônia Z5 Pirambu pelos idos de 1911.
262
Litoral em relação ao seu território tradicional o pescador que planta uma “rocinha”
ou que pratica atividades extrativistas no período em que maré está ruim.
Nesse sentido podemos destacar a existência de um grupo social,
especialmente em áreas que apresentam manguezais, os caranguejeiros, homens
que desenvolvem a cata do caranguejo Uçá (ucidis cordatos).
Segundo Vargas (1987), a atividade consiste em uma rotina diária regulada
pelo ciclo da maré: “(...) a hora da entrada e da saída ou levantar e deitar”, do
período do estudo da autora até hoje, apesar de esforços para melhorar as
condições técnicas das atividades, pouca coisa se alterou, a atividade ainda é
realizada sobre duras condições.
Os ambientes propícios para a cata do caranguejo caracterizam por ser
“lodosos”, no qual o sujeito permanece por 10 horas ininterruptas, exigindo do
praticante não só conhecimento, mas também energia. A captura do caranguejo
segundo a autora consistia, durante o verão (período de outubro a março), na
introdução dos braços nas tocas até encontrar o animal através do tato e da
disposição do sol. No período de chuva entre abril e setembro, as tocas estão mais
profundas, os caranguejeiros são obrigados a um esforço adicional de tapar os
buracos forçando o caranguejo a procurar a saída.
Como a pesquisa não foi direcionada para esse grupo, os caranguejeiros,
foram para nós quase “invisíveis”. Foi o pescador que nos disse sobre usa
existência. “Também catam caranguejo”, ou seja, tem que o faça. Apesar do
consumo do caranguejo manter-se como um costume internalizado pelo sergipano e
de ter atingido um valor comercial crescente nas últimas décadas, o caranguejeiro
segue sendo um sujeito não reconhecido em sua comunidade, principalmente, se
comparado ao pescador e à marisqueira. Daí a sua “invisibilidade” em nossa
pesquisa.
Uma categoria sujeito que obteve grande visibilidade social nos últimos anos
são as marisqueiras ou, catadoras de mariscos. Trata-se da extração de crustáceos
e moluscos das áreas de mangues. Segundo Oliveira (1993) é uma atividade na
qual a dinâmica ambiental influência no processo de reprodução social, incluindo o
estabelecimento de uma rotina diária dos grupos domésticos, por extensão
influenciando na organização da vida comunitária.
O processo de trabalho inicia-se no mangue com a “captura” e se estende às
residências, com o beneficiamento dos mariscos. Os dias da semana ocupados com
263
O aratu é o marisco que aparece com maior frequência, por sua abundância
nos bosques de mangues. Praticamente todos os entrevistados que se dizem
praticantes de mariscagem, afirmam capturar essa espécie, seguida do sururu, siri e
massunim, conforme dados apesentados na tabela 11 a seguir. Apesar de não ser
uma produção elevada frente à produtividade na pesca no estuário e no mar, a
mariscagem tem uma importância grande, porque ela é complementar à pesca, é
utilizada fortemente na dieta das famílias e absorve principalmente a mão de obra
feminina.
57
(Cocos nucifera)
266
58
Os munícipios que integram o movimento das catadoras de mangaba são (i) Estância; (ii)
Itaporanga D´ájuda; (iii) Barra dos Coqueiros; (iv) Indiaroba; (v) Japaratuba; (vi) Japoatã; (vii)
Pirambu. Todos situados no Litoral sergipano.
268
59
Nos termos formulados por Ennes; Marcon (2014).
272
60
Sobre segurança em termos jurídicos, tento fazer uma aproximação com ideia de segurança
expressa por Bauman (2003). O autor indica que a busca por segurança é um sentido importante
para identificação a uma comunidade ou as diversas formas de relações comunitárias em sentido
mais próximo ao analisado por ele. A insegurança proporcionada pelas fragilidades de direitos
“legais” sobre seu território aumenta a busca pela conformidade e identificação com sua comunidade
“Não seremos humanos sem segurança ou sem liberdade” (p. 11). Pertencer a comunidade resulta
em segurança e a liberdade está no território.
273
Primeiro ponto a observar é que a referência que justifica o início dele nessa
“vida” de associação e organização comunitária se dá por inspiração e influência de
sua mãe, responsável local pela introdução de cursos de capacitação oferecidos
pelo SEBRAE visando o desenvolvimento de artesanato no Tigre/Junça.
(...) Tivemos uma parte negativa e uma parte boa, positiva. A parte
negativa que nós tivemos que devolver metade do recurso porque no
inicio a gente não estava acostuma da a lidar com prestação de
contas. Mas a parte positiva foi essa que, com relação a prestação
de contas eu aprendi muita coisa, porque é um troço que dá dor de
cabeça. Chato, chato, chato. Para vocês terem uma ideia nós
recebemos um recurso em 2009,2010. Passamos um ano porque eu
coloquei em parcelas nós passamos um ano pra realizar a prestação
de contas da primeira parcela. Então isso atrasou um pouco o
processo, os objetivos do projeto. Aí eram pra ser 10 parcelas e nós
só conseguimos receber 4 parcelas porque aí nós fizemos as quatro
prestações de contas. (Entrevista concedida por Domingos Ferreira,
liderança comunitária, 29 anos, Tigre/Junça).
A água leva-nos.
A água embala-nos.
Agua adormece-nos.
A água devolve-nos a nossa mãe.
A água convida-nos à viagem imaginária
(BACHELARD, 1997, p. 136-137).
278
No cenário do Litoral existem as água dos rios, o ciclo das águas da maré,
água turva e agitada do estuário, a água calma da lagoa, a água que se transforma
em lama quando a maré fica baixa e quando não há ali é o apicum, ali é o barranco,
ali é a duna. Suas diversas formas e paisagens indicam não só uma relação
funcional de uso, mas a própria essência da vida no Litoral.
As referências múltiplas à água retratam bem a importância central que ela
desempenha para a existência das comunidades. Na água se brinca e da água se
tira sustento e elementos sociais e simbólicos. Basta um pouco de tempo a beira do
canal para ver a algazarra das crianças pulando dentro da água, o rio que reflete no
riso e no olhar, na festa dentro da água.
A identidade dos sujeitos litorâneos está intensamente relacionada como a
própria representação que esses sujeitos fazem de sua vida perto da água. Ela é um
elemento territorializante, é uma matéria para composição do Ser litorâneo e é
também um território - múltiplos territórios.
Citamos a história de vida da pescadora retratada na foto 23. Viúva,
aposentada, mas que diariamente embarca em sua canoa e adentra no estuário do
rio Vaza-Barris para pescar. Não é a necessidade material que a move, mas a
própria essência da natureza da identidade pescadora realizando na atividade
cotidiana: “ (...) enquanto Deus me der forças eu vou pescar. Eu gosto de ir pro rio,
me sinto feliz lá dentro, pegando meus peixinhos para comer e meus Aratus”.
279
Fui trabalhar na roça pra ajudar meu pai! Carregar coco! Carregar
manga, carregava manga até dez horas da noite onze, ali era pau
viu, tinha uns 12 anos! Ai foi quando apareceu pescar de tarrafa! Foi
quando apareceu essa tal dessa rede de televisão! Naquele tempo
não existia IBAMA era a SUDEPE! Ai a SUDEPE atraia aqueles
pescador mais velhos. Ai vendeu duzentos metros de rede pra cada
um pescador, aquele que pudia né? Comprava!” Mas era pelo
governo? “não!”Pela Sudepe mesmo? “Pela Sudepe, vinha com cem
metros de altura! Ai comprou, finado Berto comprou duzentos, finado
Miguezinho comprou duzentos, finado primo de Diva comprou
duzentos e Luiz comprou duzentos! Então seu pai já tinha né, ele
ficava no rio né? Ai o tio passou e ficou com a rede impacada. Ai, tio
Luiz, você sabe que tio Luiz tinha né. Se você puder comprar as
cordas e as curtias e, eu fico com a rede, naquele tempo eu
trabalhava não bebia, só fazia fumar escondido quando ia trabalhar.
Um dia de hoje como esse, quando eu chegava eu dava o dinheiro a
minha mãe, oi aqui minha mãe! Ai ela pegava pra inteirar a feira né?
Ai me dava aquele “dinheirozinho” e eu tome dentro do sapato, no
bico do sapato, lá não cabia, ai eu botava debaixo do coxão e uma
vez perdi! Ai lá vai! Quando a minha mãe diz vá toma um dinheiro
280
Aqui sempre tem água, se aqui falta água, Meu Deus, porque aqui é
difícil faltar água. Mesmo que seque, mas sempre tem lagoa que não
seca. E aqui é muito fácil pra água. E como é que a senhora
imagina que é a vida no Sertão por exemplo ? É difícil né? Porque
a maior dificuldade do lugar é não ter água, eu acho. Trabalho tudo é
ruim, mas sem água é pior. Porque a pessoa não pode plantar, não
pode fazer nada. Aqui eu faço tudo, tudo que eu quero. (Entrevista
concedida por Luzineide dos Santos, 51 anos, pescadora e artesã
em Tigre/Junça).
Ela enfatiza a possibilidade de morar perto da água como algo inerente e bom
do Litoral. Em oposição ao Sertão, no Litoral a percepção é de que não existe seca e
assim, não haveria escassez do elemento fundamental para vida. Ela ainda associa
a água à possibilidade de trabalho, bastante semelhante ao enfatizado por
Bachelard (1997, p. 15, grifos nossos).
Nós temos água aqui com abundância e graças a Deus nunca faltou
água, mesmo com esse verão que teve aqui seco, não é minha
comadre?! Mas não faltou. Aqui mesmo, eu moro aqui e o cano
passa aqui, oi! Mas, aqui mesmo nunca faltou água. Graças a Deus!
E muita gente por ai, está sem água. E nos aqui, oi! Temos água
284
mandioca, tem a tapioca, faz a puba pra fazer o cuscuz e chega ali ói pega o siri,
pega o aratu, pega ostra, o que for(...)”. A natureza presente no Litoral sergipano é
percebida como portadora de uma generosidade natural. O sujeito então recebe
aquilo que tem na natureza quase como uma dádiva. No imaginário da população no
Litoral a vida se torna mais fácil.
não. Só quem não quer mesmo! A vida aqui é muito boa. Você vê
todo mundo aqui tem suas casinhas, não tem mais casa de taipa,
naquele tempo era tudo de taipa, coberta de palha. Agora é de telha,
de alvenaria(...) tudo arrumadinho(...) as Pedreiras é uma maravilha!
(Entrevistas concedidas pelas marisqueiras e pescadoras
aposentadas Maria do Socorro de 68 anos e Inês de 70 anos,
moradoras de Pedreiras).
61
Segundo Costa (2005) as classificações sociais, nas quais se incluem o sentido de pertencer, tem como
objeto fazer compreender, tornar inteligíveis as relações entre os seres.
288
Olhe(..).eu tenho grande amor por aqui. Tenho bom sentimento tenho
amor por aqui. Porque nasci e me criei. Meus antepassados tudo
daqui, apesar de hoje dia ta(...) tem muita violência, tem muita coisa
né mulher mas mesmo assim (...) eu quero, eu gosto daqui, eu quero
bem. As vezes eu penso assim: a gente devia ir embora né zequinha
daqui e ele diz „pra onde?‟ Morar em São Cristóvão? Deixar aqui o
nosso sitio, aa gente tem a jacá, tem a manga, tem a banana, tem
tudo tudo( ...)tem a goiaba. Uma goiaba tão gostosa. (Depoimento
Dona Socorro, Pedreiras).
espaço. No limite significa uma espécie de união como uma ação de fixar-se no
território e de estar a ele ligado, grudado, fixado, aderido.
Esse sentimento contém mesmo uma dupla dimensão que está imbricada
uma na outra. Ela se refere ao apego à comunidade tanto quanto ao território.
Vejamos bem esses trechos:
Vou fazer uma última pergunta pra senhora, todo mundo gosta
muito do lugar, todas as pessoas com quem conversei no povo,
dizem que gostam daqui, mas entre o povo e o local o que a
senhora acha que é mais importante? O lugar. O lugar aqui é rico,
esse lugar aqui é rico, agora porque a gente não sabe é distribuir o
que tem, porque a gente não entende de nada, mas aqui é rico, esse
lugar é rico, é muito rico aqui. Saia aqui nas dunas aqui atrás, pra
você vê, quanta coisa linda você vê. Aquelas dunas, aqueles morro,
tudo. Lagoas, tudo, mas é que aqui é uma paz que é tudo
sossegado, mas agora que é pobre o lugar. Mas o lugar é rico e o
povo, como é que faz? O povo é pobre, mas o terreno tem
prosperidade de ser tudo de bom, agora nos que não prospera nada
porque nos não tem o poder. Nos não tem o conhecimento de
prosperar nada. Como é que esse lugar vai melhorar cada vez mais.
Mas o lugar aqui é muito bom, quem vem de fora dá valor e sabe,
nos que tá aqui nos não dá valor [...]. (Entrevista com a pescadora
Maria Célia, moradora de Tigre/Junça).
62
Para Hall as identidades podem oscilar entre as tradições e as traduções. Segundo ele as
identidades culturais não podem ser mais pensadas como fixas, mas devem ser vistas como
suspensas, sempre em transição, entre diferentes posições, que se ancoram em diferentes tradições
culturais e suas traduções.
292
Tem algo que você queria ver ser concretizado, algum sonho
para a comunidade? “Essa região aqui sempre foi uma região
muito esquecida pelo poder publico, não tem saneamento básico,
energia chegou a depois. Há pouco tempo, acho que tem uns 10
anos ou 13 anos, foi em 2000 que chegou. Para uma comunidade
que tem mais de 50 anos, chegou agora. Saneamento básico não
existe, os jovens não tem oportunidade de nada aqui. Você tem o
potencial no artesanato, da agricultura aqui. O turismo rural, o
turismo ecológico de aventura é um potencial enorme aqui, você
pode ver os mangue nessa região toda e você não vê nenhuma ação
do poder publico estadual ou municipal nesse sentido. O que
acontece aqui, geralmente os jovens fazem aquela questão do êxodo
rural e o jovem que sai daqui ele só vai pra um lugar, pra favela.
(...) Ele não vai pra zona sul, ele só vai pra favela. Favela, o que você
vê de favela hoje é o quê? Então eles saem com o pensamento de
tentar melhorar de vida, mas na verdade ele acaba se frustrando
porque ele não teve aqui uma qualificação. Lá ele não vai ter essa
oportunidade por mais que trabalhe de tarde, são poucos o que vai
qualificar. Então ele sai daqui e vai pra uma favela, lá tem droga que
aqui também já chegou. (Entrevista concedida por Domingos
Ferreira, 29 anos, líder comunitário, morador de Tigre/Junça).
CONSIDERAÇÕES
DO REFÚGIO AO LAR:
DO ESPAÇO AOS TERRITÓRIOS
297
63
Pontuamos que o município de Santana do São Francisco (1989) foi último a ser emancipado em
Sergipe.
301
REFERÊNCIAS
308
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APÊNDICES
321
Pesquisador:_______________________________________________
Data:_____/_____/_______
Comunidade:_________________________
Município:______________________________________
Entrevistado_______________________________________________________________
Idade:______________________ Profissão/ocupação: ________________________
BLOCO I
O QUE TEM?
Nomenclatura: enumerar o nome dos prédios lugares: ex1: Escola Maria Furtado
(não sabe quem é)? Ex2: Igreja N. Sra. Imaculada Conceição – Padroeira do lugar?
13 – Outras festas: (nas escolas, data cívica) Quais? Quando? O que tem? O que
faz?
BLOCO II
Representação do Patrimônio
BLOCO III
Pesquisador:
Data:
Comunidade:
Município:
1 – Quem produz: características, participantes, gênero, raça etc de cada uma das
expressões citadas de acordo com a ordem de importância atribuída.
- Definição/descrição
- Características: forma da produção e transferência do saber (dificuldade,
habilidade), forma do aprendizado, comercialização e matéria prima no caso de
artesanato.
- Participantes ou produtores: número, quantitativo aproximado, composição
(familiar, homem, mulher, criança, raça, cor)
- Data período de apresentação: data período de produção e comercialização
2 – Onde ocorre: data de ocorrência, período, onde (sede, povoado) de cada uma
das expressões citadas de acordo com a ordem de importância atribuída
- Distinguir sede de povoados
- data período de apresentação; data período de produção e comercialização
1. Nome completo:
2. Idade:
3. Sexo: ( ) masculino ( ) feminino
4. Nível de Escolaridade: primário completo e incompleto( ) fundamental ( )
médio ( ) superior ( ) pós-graduado
5. Estado civil: ( ) solteiro ( xx) casado ( ) viúvo ( ) outro
__________________
6. Local de nascimento:
7. Tempo de residência na localidade:
8. Quantos membros da família?
9. Quantos membros da família residem em sua casa?
Conhecimento e reconhecimento
___________________________________________________________