Texto da Rota 2 - Jornalismo na Sociedade
Texto da Rota 2 - Jornalismo na Sociedade
Texto da Rota 2 - Jornalismo na Sociedade
AULA 2
CONTEXTUALIZANDO
PROBLEMATIZAÇÃO
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TEMA 1 – JORNALISMO COMO CONHECIMENTO
Saiba mais
O excesso de conhecimento pode controlar o imprevisível? Em um vídeo, o
professor Luís Carlos de Menezes, do Instituto de Física da Universidade de
São Paulo (USP), aborda o tema, de modo fantástico (Aprender, 2010).
Portanto, nos prevenir daquilo que oferece risco à nossa existência liga-
se a um processo de conhecimento, que é gerado com base na aquisição de
informações. É aí que o jornalismo exerce um papel fundamental para a vida
em sociedade, já que se trata de uma atividade cujo principal objetivo é
transmitir informações que permitam prever, mensurar, comparar e calcular
certos acontecimentos de modo que as pessoas possam organizar suas vidas.
Não é possível que um ser humano conheça tudo, esteja em todos os
lugares e possa fazer tudo. A menos que alguém invente uma máquina que nos
permita ser onipresentes, oniscientes e onipotentes, só há uma atividade em
todo o mundo capaz de elevar a nossa existência a algo próximo disso, ainda
que de forma ilusória. Estamos falando do jornalismo, uma atividade que lida
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com informações ligadas diretamente ao princípio do conhecimento com o
objetivo de reduzir os riscos que o desconhecido oferece à nossa existência.
Nesse sentido, trata-se de uma atividade essencial para a existência
humana, não só para prever acontecimentos, mas para o desenvolvimento
social, científico e tecnológico. Essa percepção de um jornalismo que contribui
para um processo evolutivo está de acordo com os preceitos do positivismo,
corrente filosófica para a qual o conhecimento é o que permite o progresso da
sociedade.
Saiba mais
Entenda o positivismo em Significado ([2011-2018]).
Essa tese foi muito criticada, uma vez que o jornalismo não evita que as
guerras ocorram e milhares de pessoas morram por causa disso. Não impede
que ocorram assassinatos, diferenças sociais, miséria, entre outros problemas.
Em alguns casos, o tipo de jornalismo que se produz contribui justamente para
esse tipo de acontecimento.
Exemplo disso é o que ocorreu após o 11 de setembro de 2001, quando
as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, foram atingidas. A
imprensa promoveu as manifestações de uma parcela grande da população
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estadunidense defendendo a invasão militar do Iraque e do Afeganistão, o que
ocasionou a morte de milhares de pessoas.
Saiba mais
Assista ao documentário Fahrenheit 11 de setembro (2004), no qual o diretor
Michael Moore mostra como a reprodução do discurso do governo americano
a favor da guerra causou consequências catastróficas.
Saiba mais
Leia o artigo de Meditsch (1997), sobre o jornalismo como conhecimento.
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expostos a situações ruins e para melhorar a nossa qualidade de vida. É aí que
o jornalismo entra.
O “trazer à tona”, trazer para a superfície, é uma analogia para explicar
que existem acontecimentos que estão submersos, escondidos ou que não
estão visíveis. O jornalismo permite que as pessoas tenham acesso a
determinadas informações que não podem ser vistas ou percebidas sem que
haja um trabalho de apuração, investigação, construção e transmissão delas.
Toda reportagem publicada ou veiculada por um meio de comunicação é
movida por um determinado acontecimento. Não existe notícia sem
acontecimento. Leia a reportagem sobre um acontecimento que virou notícia
internacional (OMS, 2015).
Após a leitura, você pode ter concluído que o acontecimento é o fim da
epidemia do ebola. Mas, um olhar mais atento nota que, na verdade, o que gerou
a notícia não foi o fim do vírus, pois não há como o jornalista comprovar isso. O
fato principal é o anúncio da Organização Mundial da Saúde (OMS) de que, em
Serra Leoa, a doença foi erradicada. O comunicado feito numa cerimônia na
capital do país é o acontecimento gerador da notícia.
A compreensão de quais acontecimentos geram notícias é fundamental
para qualquer jornalista. Muitas vezes, isso vem com treino e tempo. É preciso
treinar os olhos, os ouvidos e a mente para saber aquilo que tem potencial para
virar notícia. O primeiro passo é identificar os acontecimentos, sobretudo os que
fogem do comum e têm potencial para despertar o interesse das pessoas.
Saiba mais
Você já deve ter ouvido que “um cachorro morder um homem não é notícia;
mas, quando um homem morde um cachorro, aí sim é notícia”. Por quê?
Porque, quando um cachorro morde um homem, a não ser que ele seja
alguém famoso ou que a mordida tenha causado a sua morte, o caso não foge
do comum. Pessoas são mordidas por cachorros todos os dias. Mas, quando
um homem morde um cachorro, aí temos algo que sai do comum, porque
ninguém espera que isso aconteça.
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A resposta envolve uma série de fatores considerados legítimos pela
maior parte das pessoas. Por exemplo, a OMS é um órgão de relevância em
todo o mundo por apontar critérios que devem ser adotados pelos países a fim
de garantir a qualidade da saúde das pessoas. Além disso, o anúncio refere-se
a uma doença com alto poder de morte, cujo vírus pode ser contraído por
qualquer ser humano, independentemente de cor, raça, credo ou classe social.
Ou seja, qualquer pessoa está sujeita a contrair o vírus.
Mas, se acontecimento para o jornalismo é tudo aquilo que foge do
comum, o que há de diferente no que foi noticiado (OMS, 2015)?
A novidade nesse caso é que se trata de um país com histórico de um alto
grau de mortes por ebola e em que, depois de várias medidas adotadas, houve
uma mudança na curva dos gráficos, apontando a redução de pessoas
contaminadas e mortas pela doença. Se não fossem realizadas essas medidas,
o vírus continuaria matando pessoas (OMS, 2015).
Existem dois tipos de acontecimentos que viram notícias: o fato-notícia e
o fato-ruptura.
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uma de suas principais atividades a escolha ou seleção de acontecimentos que
serão noticiados. Essa escolha é motivada por uma série de fatores que podem
ser entendidos como critérios de noticiabilidade, que veremos no tema seguinte.
Você já leu ou ouviu a frase “good news is bad news” (“notícias boas são
notícias ruins”)? Esse é o título do livro do jornalista e filósofo norte-americano
Jeremy Iggers. Ele critica um tipo de jornalismo em que notícias ruins (tragédias,
mortes, roubos...) ganham maior espaço nos meios de comunicação, uma vez
que chamam mais a atenção e vendem mais.
A crítica de Iggers relaciona-se à lógica de funcionamento dos meios de
comunicação, em que a concorrência pela audiência determina qual tipo de
acontecimento ganha cobertura. O princípio básico é que a audiência é
determinante para a venda de publicidade e, portanto, para o sucesso do
negócio. Então, as notícias “ruins” seriam as “boas”, financeiramente falando.
Proposta de estudo
Analise a edição de um telejornal. Classifique as notícias entre aquelas que
relatam acontecimentos bons e aquelas que relatam acontecimentos ruins,
depois analise se a teoria de Iggers se encaixa em sua pesquisa.
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Em linhas gerais, essa teoria diz que, no trabalho jornalístico, existe um
processo de seleção de fatos que serão transformados em notícia, que serão
publicados. O jornalista seria um “porteiro”, que define o que passa ou não pelo
“portão”. Com base na teoria do gatekeeper, desenvolveram-se vários estudos
que buscam identificar o que é considerado notícia, pelos jornalistas. Eles
apontam que existem certos critérios para isso.
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diversos), voltado a assuntos de interesse do cidadão das classes médias. Ao
mesmo tempo, nasce o sensacionalismo, no jornalismo.
As notícias se tornam mais acessíveis, mais objetivas, menos complexas
para permitir que qualquer pessoa as pudesse ler e assim compreender os
acontecimentos relatados. Esse tipo de jornal se tornou um grande negócio,
reconfigurando todo o mercado da comunicação e, sobretudo, o que se
compreende por jornalismo.
O resultado disso é que o jornalismo passou a abranger uma gama maior
de acontecimentos que podem virar notícia, partindo do princípio de que os
critérios de seleção passaram a ser determinados pelo interesse do público. Ao
longo dos anos, esses critérios foram sendo desenvolvidos, treinados,
experimentados até que se chegasse a determinados temas que repetem as
condições de potencial de audiência.
Segundo Traquina (2013), essa percepção sobre os fatos constitui o que
ele chama de óculos particulares dos jornalistas. Em outros termos, os jornalistas
têm uma maneira própria de perceber os acontecimentos e que é diferente da
do restante das pessoas.
Imagine um acidente entre dois ônibus. O cidadão que o presenciou
procura ver se há feridos, talvez se pergunte sobre a causa. O jornalista se
pergunta o que aconteceu, como aconteceu, por que aconteceu, quem estava
envolvido, qual a versão dos motoristas e a dos passageiros, se há testemunhas,
qual o número de mortos e feridos, qual a versão da polícia, o que os socorristas
acharam, o que o órgão de trânsito tem a dizer, quais os índices de acidente
envolvendo ônibus, quantos acidentes já ocorreram naquela esquina, se existem
imagens de câmeras de segurança etc.
Todas essas questões são fundamentais para o jornalista construir bem a
narrativa, de modo que possa selecionar o que deve ou não fazer parte da
notícia. Por essência, essa escolha tem a ver com o público para quem a notícia
será produzida.
Assim, os critérios de noticiabilidade sempre levam em consideração
cinco aspectos básicos:
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outros acontecimentos parecidos;
Saiba mais
Para aprofundar o tema, leia:
TEMA 4 – OS VALORES-NOTÍCIA
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Valores-notícia de construção: são os critérios utilizados no momento
de construir a notícia com base no acontecimento e que contribuem para
dar valor ao produto final.
Morte
Atividade prática
Leia a matéria de Pains (2015) e liste seus valores-notícia de seleção e de
construção.
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Os estudos sobre valores-notícia fazem parte da chamada teoria do
newsmaking (o fazer a notícia), que compreende as rotinas de produção
jornalísticas na elaboração das notícias.
Saiba mais
Leia o texto Teoria newsmaking ([2016?]) para saber mais sobre o assunto.
Relata o assunto formalmente: texto usa uma linguagem formal, para dar
seriedade ao que está sendo informado.
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Nilson Lage (2006): “O repórter, além de traduzir, deve confrontar as
diferentes perspectivas e selecionar fatos e versões que orientem o leitor
diante da realidade”.
Ronaldo Henn: “Sendo signo, a notícia integra uma cadeia semiótica que
inicia no acontecimento e prossegue seu percurso mesmo depois de ser
efetivamente veiculada”.
Com base nessas citações, percebe-se que a notícia pode ser entendida
como uma representação da realidade, cuja proposta é constituir um produto
jornalístico a ser vendido. É fundamental que preserve certas qualidades que
garantam o seu valor. Por exemplo, deve demonstrar que está fundamentada na
verdade sobre os acontecimentos. Como isso é possível? Por meio de
declarações de testemunhas, de pessoas envolvidas no fato ou de especialistas
em determinado assunto.
O jornalista pode recorrer ainda a documentos e citar trechos, dizendo de
onde retirou a citação. Pode usar dados de organizações ou instituições
reconhecidas socialmente, como índices de preços ou dados sobre a população.
Assim, a notícia precisa ser credível, digna de se acreditar que a informação
escrita, filmada, falada ou fotografada realmente aconteceu.
Além dos recursos apresentados, para afirmar a veracidade de uma
notícia, podem ser considerados aspectos como o prestígio do veículo em que
ela é publicada, a plataforma utilizada (TV, rádio, impresso ou internet), o
jornalista que produziu a notícia etc.
A proximidade com a realidade é o fator mais importante na produção de
uma notícia. Porém, o modo como ela é contada também é considerável, já que
a narrativa precisa estar encadeada de maneira que permita às pessoas
entenderem o que houve e tirarem suas próprias conclusões.
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Atividade
Leia a notícia Ele foi o único passageiro a bordo de um 737 – e voou na classe
turística (2015) e procure os aspectos que garantam a sua veracidade.
Feedback do professor
Entre os elementos que garantem veracidade para a notícia estão a fotografia,
a descrição detalhada do voo, o uso das aspas na declaração de uma
testemunha, os dados numéricos, o comunicado da empresa e os créditos da
BBC (Ele foi, 2015).
Texto: é tudo aquilo que pode ser entendido como conteúdo próprio do
jornalista, ou seja, sua narrativa. Na tevê ou no rádio, pode ser o que se
chama de off.
Leitura obrigatória
LAGE, N. Estrutura da notícia. 6. ed. São Paulo: Ática, 2006. cap. 4. p.
17-27.
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TROCANDO IDEIAS
NA PRÁTICA
FINALIZANDO
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REFERÊNCIAS
OMS declara fim da epidemia de ebola em Serra Leoa. G1, São Paulo, 7 nov.
2015. Disponível em: <http://g1.globo.com/ciencia-e-
saude/noticia/2015/11/oms-declara-fim-da-epidemia-de-ebola-em-serra-
leoa.html>. Acesso em: 19 dez. 2018.
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TEORIA newsmaking. Teorias da Comunicação, [2016?]. Disponível em:
<https://teoriasdacomunicacao2.wordpress.com/teoria-newsmaking/>. Acesso
em: 19 dez. 2018.
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