eBook Vivencias de Pessoas Com Deficiencia Intelectual No Contexto Educacional e Social
eBook Vivencias de Pessoas Com Deficiencia Intelectual No Contexto Educacional e Social
eBook Vivencias de Pessoas Com Deficiencia Intelectual No Contexto Educacional e Social
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Vivências de pessoas com
deficiência intelectual no contexto
educacional e social
2
Rosana Glat
Suzanli Estef
(Organizadoras)
3
Copyright © Autoras e autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida,
transmitida ou arquivada desde que levados em conta os direitos das autoras e dos
autores.
CDD – 371
4
A nossa querida e eterna colega, mestra e amiga
Leila Nunes (in memoriam) pelos seus
ensinamentos, afetos e anos dedicados à
Educação Especial. Você sempre será para nós
uma fonte inspiradora.
5
Sumário
Prefácio 9
Márcia Denise Pletsch
Apresentação 13
Rosana Glat
Suzanli Estef
7
Formação docente para alfabetização e letramento: 97
possibilidades para vida independente da pessoa com
deficiência intelectual
Cristina Angélica de Aquino de Carvalho Mascaro
8
Prefácio
9
Especial, no Rio de Janeiro, quando se criou a Associação Brasileira
de Pesquisadores de Educação Especial (ABPEE).
Nesta obra, os diversos capítulos apresentam perspectivas e
discussões sobre os aspectos psicossociais que envolvem a
educação de pessoas com deficiência, em particular com deficiência
intelectual, aspecto pouco discutido nas pesquisas
contemporâneas.
Entre os diferentes temas abordados, as autoras discutem
dados importantes sobre a inclusão educacional na Educação
Básica e na educação superior, dialogando com temáticas como a
interseccionalidade, a formação de professores, a participação da
pessoa com deficiência, suas experiências sociais e trajetória
educacional. A partir das falas dos sujeitos evidenciam e
problematizam as barreiras atitudinais que essas pessoas
continuam enfrentando no seu cotidiano, em que pesem os avanços
nas políticas de educação inclusiva. A este respeito, um dos temas
apresentados é o da autogestão e autodefensoria, que favorece a
participação, o desenvolvimento e o empoderamento de pessoas
com deficiência intelectual.
Outro tema presente nas discussões se refere à formação de
professores, que continua sendo um tópico central nas pesquisas
em Educação Especial na perspectiva da inclusão na Educação
Básica e, mais recentemente, também na Educação Superior,
sobretudo com a adoção da reserva de vagas para pessoas com
deficiências, viabilizada pelas mudanças na Lei nº 13.409, de 28 de
dezembro de 2016, que alterou a Lei n°. 12.711, de 29 de agosto de
2012, e dispõe sobre a reserva de vagas para pessoas com
deficiência nos cursos técnicos de nível médio e superior das
instituições federais de ensino.
Certamente, esta obra contribuirá para as reflexões que
envolvem a formação de professores e as demandas colocadas pela
inclusão educacional, que exige mudanças não apenas de ordem
pedagógica, mas da própria cultura educacional. Os desafios
postos são imensos. Como, por exemplo, pensar a acessibilidade
curricular, a compreensão da deficiência considerando a sua
10
relação com as barreiras sociais e educacionais, o sistema e níveis
de apoios/suportes demandados por estes estudantes, entre tantas
outras dimensões.
Algumas dessas questões são abordadas nos capítulos deste
livro, indicando caminhos, possibilidades e desafios a serem
enfrentados pela pesquisa e pelas políticas públicas no que diz
respeito à garantia educacional de pessoas com deficiência. No
entanto, o aspecto central desta obra, para mim, é, justamente, o
caminho metodológico adotado pelo grupo de pesquisa para a
produção dos dados aqui apresentados.
As autoras privilegiam a escuta, a experiência e o
protagonismo das pessoas a quem as políticas de educação
inclusiva se direcionam. Esse tipo de metodologia, como as
próprias organizadoras do livro afirmam na apresentação, é
“profícua para a Educação Especial e outras áreas que lidam com
grupos historicamente excluídos”. Essa perspectiva de análise
integra os princípios da ciência cidadã transformadora com a qual
temos trabalhado em nossas pesquisas, que entre outros aspectos,
prioriza metodologias de investigação científica que envolvam a
participação e o engajamento de pessoas com deficiência (Pletsch et
al., 2024).
Nessa direção, os leitores têm em suas mãos um rico trabalho
de investigação coletiva, que certamente iluminará aspectos da
realidade dinâmica e contraditória em que vivemos, bem como
suscitará questões necessárias para que novas pesquisas e
conhecimentos sejam produzidos na Educação Especial, em
particular para pessoas com deficiência intelectual e com autismo.
11
Referências
12
Apresentação
1 www.eduinclusivapesq-uerj.pro.br
13
vertente investigativa com objetivo de privilegiar a escuta dos
indivíduos a quem as referidas políticas públicas visam beneficiar.
Essa proposta metodológica é especialmente profícua para a
Educação Especial e outras áreas que lidam com grupos
historicamente excluídos, pois permite ao pesquisador falar com eles
e não só sobre eles (Glat; Antunes, 2020). Neste sentido, coadunamos
com um dos princípios fundamentais das políticas de inclusão
fomentando a participação, protagonismo e valorização da visão e das
experiências de vida das próprias pessoas com deficiência.
Pois, ao dar voz aos sujeitos, deixando que estes falem abertamente
sobre suas vidas, o pesquisador estabelece com eles uma relação de
horizontalidade e cumplicidade, rompendo com a visão tradicional de
que ele é o detentor do saber e produz, sozinho, o conhecimento sobre
as vivências de determinado grupo social, que passivamente colabora
(“se sujeita”) com o estudo. No nosso entendimento, a grande
contribuição dessa abordagem metodológica é que permite que grupos
historicamente silenciados e marginalizados conquistem um espaço
para escuta de sua fala e, mais do que isso, reafirmem sua condição de
protagonistas de suas próprias histórias (Glat; Antunes, 2020, p. 53).
14
deficiência intelectual3 (Glat, 2020; Glat; Estef, 2021; Redig; Mascaro;
Glat; 2020; Reis; Araújo; Glat, 2019) a qual teve como objetivo
analisar os impactos das políticas de inclusão na autopercepção e
vida cotidiana de pessoas com deficiência intelectual, a partir de
seus relatos pessoais. Os resultados dessa investigação mostraram,
entre outros aspectos, as grandes dificuldades e barreiras –
acadêmicas e sociais – que a maioria dos sujeitos enfrentaram no
ensino comum, levando a sentimentos de fracasso, baixa
autoestima, resultando, inclusive, em alguns casos, a retorno ao
ensino especial ou abandono escolar.
Esses são dados relevantes, pois, com a expansão das políticas
de Educação Inclusiva em nosso país, as matrículas de alunos com
deficiência intelectual no ensino comum apresentaram expressivo
aumento nas últimas décadas. De acordo com o Inep, em 2021, de
um total de 1.575.955 estudantes considerados público-alvo da
Educação Especial por tipo de deficiência, transtorno global do
desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação, 872.917
apresentavam deficiência intelectual, correspondendo a
aproximadamente 55% do conjunto (Bassani; Duarte; Arrebola;
Ronchi Filho; Pereira, 2024).
Com intuito de aprofundar esses dados foi iniciada uma
segunda investigação, ainda em andamento, Vivências de inclusão
escolar de alunos com deficiência intelectual na Educação Básica, (Glat,
2024)4 com foco nos relatos de estudantes com deficiência
intelectual sobre suas percepções e experiências em seu percurso
no ensino comum.
Vale ressaltar que embora já encontremos diversos trabalhos
privilegiando a visão de pessoas com deficiência sobre o processo
de inclusão escolar e social (Antunes, 2012; Castanheira, 2014;
15
Chicon; Sá, 2013; Glat, 2009; Glat; Estef, 2021; Lupetina, 2020;
Oliveira; Campos, 2016; Queiroz, 2022; Reis, Glat, 2022; Spolidoro,
2024; entre outros), estes ainda são relativamente minoritários, em
termos do conjunto da produção científica nacional. Entendemos
que tal conhecimento é imprescindível para o desenvolvimento de
programas que contribuam para que esses indivíduos possam
usufruir de uma melhor qualidade de vida, estabelecendo relações
pessoais mais equânimes e participando com maior autonomia nos
diferentes espaços sociais (Glat, 2024).
Partindo dessas considerações, o presente livro reúne textos de
integrantes do nosso grupo de pesquisa abordando e analisando
diferentes aspectos do processo de inclusão educacional e social de
pessoas com deficiência intelectual. Embora as reflexões e
discussões aqui travadas tenham como base estudos desenvolvidos
por meio de diferentes enfoques metodológicos, todos convergem
na perspectiva de priorizar a visão e vivências, diretamente
relatadas, pelos próprios sujeitos.
Em que pese a contribuição científica dos trabalhos aqui
veiculados para o desenvolvimento do campo da Educação
Especial e Inclusiva, nosso intuito com a presente obra não foi
apenas de natureza acadêmica. Partindo da premissa estabelecida
na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006)
“nada sobre nós sem nós”, acreditamos que o feedback dos
participantes das diferentes pesquisas possa se transformar em um
instrumento fulcral para a reconfiguração de práticas em
consonância com os princípios de acessibilidade e inclusão social.
Indo mais além, ao basearmos o direcionamento da produção
científica e dos produtos dela resultantes no sentido de priorizar “a
versão dos indivíduos pertencentes ao grupo estigmatizado, em
vez dos [...] que rotulam” (Glat, 2009, p. 26), contribuímos para a
transformação e superação das barreiras atitudinais capacitistas5
16
que ainda permeiam a representação social e as interações com
pessoas com deficiência intelectual.
Rosana Glat
Suzanli Estef
Referências
17
CHICON, J. F.; SÁ, M. das G. C. S. de. A autopercepção de alunos
com deficiência intelectual em diferentes espaços-tempos da escola.
Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v. 35, n. 2, p. 373-388, 2013.
COLETTE, M.M. Pesquisa-ação participativa e compromisso
social da Universidade. Curitiba: CRV, 2021.
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deficiência mental. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2ª edição revisada, 2009.
GLAT, R. Falando de si: estudos sobre auto-percepção e histórias de
vida de pessoas com deficiência intelectual. Relatório técnico –
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), 2020.
GLAT, R. Vivências de inclusão escolar de alunos com deficiência
intelectual na Educação Básica. Relatório técnico – bolsa de
produtividade em pesquisa 1 D, Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), 2024.
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pesquisa em Educação Especial: a escuta dos sujeitos. In: NUNES,
Leila Regina d´Oliveira de Paula (Org.) Novas trilhas no modo de fazer
pesquisa em Educação Especial. Marília: ABPEE, p. 53-72, 2020.
GLAT, R.; ESTEF, S. Experiências e Vivências de Escolarização de
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Especial, v. 27, p. 157-170, 2021.
GLAT, R.; PLETSCH M. D. Inclusão escolar de alunos com
necessidades educacionais especiais. EdUERJ, 2012.
GLAT, R.; PLETSCH, M. D.; FONTES, R. de S. Panorama da
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LUPETINA, R. Histórias de vida de indivíduos com surdocegueira
adquirida. São Paulo: Editora Appris, 2020.
MELLO, A. G. Gênero, deficiência, cuidado e capacitismo: uma análise
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18
violências contra mulheres com deficiência. 2014. Dissertação
(Mestrado em Antropologia Social) - Programa de Pós-graduação
em Antropologia Social, Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, 2014.
OLIVEIRA, P. T. C.; CAMPOS, J. A. de P. P. O retrato da escola
segundo o olhar de jovens e adultos com deficiência intelectual
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146-165, 2016.
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PLETSCH, M. D.; GLAT, R. A escolarização de alunos com
deficiência intelectual: uma análise da aplicação do plano de
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18, n. 35, p. 193-209, 2012.
QUEIROZ, A. R. S. Inclusão social através do esporte: vivências de
adultos com deficiência física adquirida. 2022. Tese (Doutorado
em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação,
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2022.
REDIG, A. G.; MASCARO, C. A. A. C.; GLAT, R. A vida pós
escola para a pessoa com deficiência intelectual: uma análise a
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Educação, v. 15, n. 4, p. 1824-1835, 2020.
REIS, J. G.; ARAÚJO, S. M.; GLAT, R. Autopercepção de pessoas
com deficiência intelectual sobre deficiência, estigma e
preconceito. Revista Educação Especial, v. 32, p. 1-16, 2019.
REIS, J. G.; GLAT, R. Inclusão no ensino superior: narrativas de
estudantes com deficiência no contexto amazônico. Revista Espaço
Pedagógico, v. 29, p. 85-109, 2022.
SPOLIDORO, M. M. F. O ensino de ciências pela percepção de pessoas
com deficiência intelectual. 2024. Tese (Doutorado em Educação) -
19
Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do
Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2024.
20
Autogestão e autodefensoria:
promovendo o desenvolvimento e o empoderamento
de pessoas com deficiência intelectual
Rosana Glat
Marcello Miranda Ferreira Spolidoro
Introdução
21
que não são capazes de pensar e agir por iniciativa própria, essas
pessoas são socializadas de forma infantilizada, protegida e, na
maioria dos casos, subestimadas em seu potencial e habilidades
pela família e pelos profissionais que os atendem (Arten, 2018; Glat,
2009; 2018; 2021). Consequentemente, acabam não tendo
oportunidades de vivenciar experiências sociais de desafio que
contribuam com o seu amadurecimento.
Entretanto, o comportamento e o desempenho cognitivo e social
de um indivíduo – tenha ele ou não uma deficiência – não é
determinado apenas por suas características intrínsecas, mas, em
grande parte, pelo contexto em que está inserido, pelas
oportunidades que lhes são oferecidas, e, principalmente, pela forma
como os demais membros do seu círculo social se relacionam com
ele. Consequentemente, independente do grau do seu
comprometimento, pessoas com deficiência intelectual
frequentemente apresentam uma imaturidade ou menor
desenvolvimento em relação à sua idade cronológica, em grande
parte por assumirem o papel estigmatizado que lhes é socialmente
atribuído (Glat, 2006, 2009; Magnabosco; Souza, 2018; Omote, 2004).
Esta realidade impacta as diferentes esferas da vida, inclusive
o campo educacional. De fato, um aspecto apontado em inúmeros
estudos como uma das maiores barreiras para a inclusão de
estudantes com deficiência intelectual no ensino comum é a baixa
expectativa dos professores em relação às suas possibilidades de
aprendizagem (Nunes; Saia; Tavares, 2015; Pletsch; Glat, 2012;
Schambeck, 2020). Esse estereótipo, ainda prevalecente nas escolas
e na sociedade em geral, é oriundo do modelo médico que concebia
a deficiência intelectual como uma doença crônica, resultando em
características fixas que levavam o sujeito a um suposto (baixo)
patamar máximo de desenvolvimento e aprendizagem, que
poderia ser prognosticado a partir de testes psicométricos ou outras
medidas padronizadas de avaliação.
Mas esta conceituação ou representação da pessoa com
deficiência intelectual como incapaz de aprendizagens complexas,
embora persista no imaginário social, hoje é amplamente
22
contestada, tanto científica como politicamente. Embora sem negar
as condições orgânico-etiológicas que geram, em primeira
instância, uma deficiência e suas consequentes limitações,
atualmente entendemos o conceito de deficiência como uma
construção social, sendo ressignificado de acordo com o contexto
político, econômico e cultural.
Nesta perspectiva, a deficiência não é mais vista como um
problema insolúvel, uma doença crônica, ou uma característica
incapacitante fixa que limitará a vida do sujeito para sempre. A
condição de deficiência surge da interação da pessoa com o ambiente
social. Logo, pode-se dizer que uma pessoa só é “socialmente
deficiente” se assim for tratada pelos demais (Cardoso; Naves Neto,
2022; França, 2013; Glat, 2006, 2009, 2018; Omote, 1994). Em outras
palavras, o principal fator de exclusão não é propriamente o déficit
da pessoa, mas sim a inacessibilidade dos ambientes e a ausência dos
apoios necessários para que ela possa usufrir dos mesmos espaços e
oportunidades oferecidas aos demais.
Esta forma de conceber a deficiência, reiterada na Convenção
sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2006), está ancorada
no chamado modelo social. Sem ignorar as características orgânicas
do indivíduo, a condição de deficiência é considerada como o
produto da relação do déficit ou dos atributos físicos da pessoa com
as barreiras do meio ambiente (Diniz, 2003; Piccolo, 2022; Santos,
2016). Entendendo por barreiras as ações, produtos, e, sobretudo,
atitudes que limitam ou tornam impossível a participação de todos
em igualdade de condições (Brasil, 2015).
Segundo esta visão, a inclusão é, portanto, o resultado de um
conjunto de ações que a sociedade deve empreender para reduzir ou
remover as barreiras (físicas, de comunicação, de informação e,
principalmente, atitudinais), tornando as pessoas com deficiência
visíveis como sujeitos de direitos, em todas as esferas da vida social.
Sobre este ponto, cabe uma observação. Geralmente quando
nos referimos às barreiras de comunicação e informação,
costumamos pensar nas pessoas com deficiências sensoriais –
visual e auditiva (surdos). Entretanto, esses aspectos também
23
representam barreiras significativas para pessoas com deficiência
intelectual, sobretudo aquelas com maior comprometimento
cognitivo e/ou que ainda não estão alfabetizadas. Frequentemente
elas necessitam de suporte, seja para leitura ou para interagir em
situações sociais, a fim de entenderem, efetivamente, o que está
sendo dito ou acontecendo.
Para reverter esse quadro e criar condições que lhes
possibilitem efetivamente sua inclusão social e educacional, faz-se
necessário iniciativas que promovam seu desenvolvimento
psicossocial e empoderamento. Entendemos por empoderamento
o processo consciente de aumento da autoestima e construção de
autonomia, no qual o indivíduo assume, gradativamente, maior
poder de decisão e ação sobre sua própria vida.
Historicamente, pessoas com deficiência intelectual têm sido
desprezadas, silenciadas, e excluídas socialmente. Entre outros
aspectos, não são habituadas a expressarem suas ideias, seus
desejos, muito menos a opinar e tomar decisões sobre suas vidas,
mesmo as mais cotidianas. Quando lhes é aberto algum espaço de
participação social, elas são, na maior parte das vezes, tuteladas por
familiares ou profissionais – que atuam como seus porta-vozes ou
intermediários em sua relação com o mundo – reforçando ainda
mais o padrão de dependência. Foi justamente, visando romper
com esse cenário que surgiu o movimento de autogestão e
autodefensoria.
24
construído a partir de um programa de suporte psicossocial e
educacional (Bernardi; Glat; Pilger; Neto, 2015; Glat, 2018, 2021;
Glat; Pimenta; Teixeira; Diniz, 2023).
Ancorada no modelo social, a autodefensoria parte do
princípio, já discutido, que o potencial de desenvolvimento de um
indivíduo com deficiência não representa uma característica ou
condição intrínseca fixa, determinada por seu diagnóstico clínico.
Ao contrário, independentemente da idade ou do grau de
comprometimento, as suas possibilidades se ampliam na medida
em que lhe são proporcionadas suportes e condições adequadas de
aprendizagem, formal e informal, que lhes possibilitarão sair do
estado de impotência existencial e para um estado de maior
empoderamento (Beresford, 2013; Glat, 2018).
Nas palavras de Olshanksy (1972, p. 51), “muito do que se é
depende da qualidade e frequência de oportunidades”. Logo,
através dos programas de autogestão e autodefensoria, pessoas
com deficiência intelectual são instrumentalizadas para melhor
lidar com as situações cotidianas, ampliando suas possibilidades
existenciais, nas diferentes etapas e esferas da vida.
Autogestão e autodefensoria representam duas vertentes
integradas e interdependentes do processo de empoderamento de
pessoas com deficiência, e ambos os aspectos precisam ser
trabalhados, continuamente, para que possam romper com as
barreiras internas e externas que restringem seu amadurecimento
e atuação no mundo. Autogestão está relacionada à dimensão da
ação privada, da vida cotidiana; autodefensoria, por sua vez, se
refere à esfera da ação pública, do papel político-social que o
indivíduo venha a assumir (Dantas, 2014, 2018; Glat, 2018, 2021;
Glat et al., 2023)
Mais do que um protocolo de ações e procedimentos,
autogestão é uma perspectiva, uma diretriz para a orientação nas
atividades de vida diária (cuidados pessoais, alimentação,
locomoção), na escolarização e/ou inserção no mundo do trabalho,
nos relacionamentos, no lazer, etc. Seja em programas
estruturados, seja no convívio familiar cotidiano, o importante é
25
propiciar-lhes condições e instrumentalizá-las para que alcancem o
maior grau de independência possível para gerenciar, na medida
de suas possiblidades, sua própria vida, tornando factível sua
inclusão social.
Justamente por se tratar de uma aprendizagem ao longo da
vida – da infância à idade adulta –visando romper com o processo
de socialização estereotipada, o envolvimento da família é
imprescindível. Orientação familiar sistemática é um componente
obrigatório de um programa, formal ou informal, de autogestão.
Pelo fato de pessoas com deficiência terem um histórico de
silenciamento e exclusão social, um componente fundamental para
seu empoderamento é a autodefensoria. Independente do formato,
os programas de autodefensoria visam incentivar os participantes
a falarem e a agirem por si mesmos, decidindo o que é melhor para
eles e assumindo a iniciativa de alcançar seus objetivos. Como em
outros grupos de autoajuda, através de encontros, atividades
temáticas e troca de experiências com seus pares, eles adquirem a
habilidade de expressar seus pensamentos de forma assertiva,
fazendo escolhas, tomando consciência dos seus pontos fortes e
fracos, aprendendo quando e como pedir ajuda, e que tipo de ajuda
necessitam em cada situação (Glat, 2021; Neves, 2005).
Mas, para além da dimensão individual, de crescimento
pessoal, a autodefensoria, como lembra Dantas (2014), apresenta
uma dimensão coletiva, política. Pois nesse processo, ao se
tornarem mais empoderadas, pessoas com deficiências começam a
conhecer os seus direitos e formam um movimento, uma rede de
apoio mútuo, que luta em prol do respeito e das reinvindicações do
seu grupo (Glat et al., 2023). No contexto das atividades e fóruns de
autodefensores, alguns participantes se destacam por sua
capacidade de liderança e assumem a representatividade de seu
coletivo em diversos espaços, no âmbito de suas instituições e da
sociedade civil.
A autodefensoria, como movimento organizado de pessoas
com deficiência intelectual e múltipla, surgiu na Escandinávia no
final da década de 1960 e nos primeiros anos da década 1970, no
26
bojo do movimento de desinstitucionalização e integração social1.
Apesar das dificuldades e descrédito, em pouco tempo, espalhou-
se pela Grã-Bretanha, Canadá, Estados Unidos e gradativamente
para várias partes do mundo, possibilitando, o “início de uma
grande alteração na forma de ver e entender as pessoas com
deficiência intelectual” (Bernardi et al., 2015, p. 17).
No Brasil, o primeiro passo para a organização desse
movimento foi dado em 1986 durante o 9º Congresso Mundial da
Liga Internacional das Associações para Deficiência Mental
(ILSMH) – hoje denominada Inclusão Internacional –, realizado no
Rio de Janeiro, sob os auspícios da Federação Nacional das APAEs2.
Um dos eventos mais importantes desse congresso foi o chamado
“Congresso Paralelo”, do qual participaram mais de 150 pessoas
com deficiência intelectual, representando 15 países e falando mais
de seis idiomas diferentes. Este evento representou uma mudança
radical de paradigma, na medida em que, pela primeira vez em
nosso país, pessoas com deficiência intelectual tiveram espaço
público para falar por e sobre si mesmas, expressar as questões que
as afligiam e que estratégias utilizavam para lidar com suas
dificuldades (Glat, 2009, 2018).
Desde então, essa proposta foi aos poucos se difundindo no
âmbito das APAEs. Seguindo esse modelo, foram realizados série de
encontros de discussão locais e estaduais que culminaram em 2001,
1 Em grande parte dos países da Europa e América do Norte até meados da década
de 1970 pessoas com deficiência intelectual eram internadas em instituições totais,
semelhantes a hospitais psiquiátricos.
2 A Federação Nacional das Apaes, ou Apae Brasil, é a maior rede de defesa e
27
durante o 20º Congresso da Federação Nacional das APAEs em
Fortaleza, Ceará, no 1º Fórum Nacional de Autodefensores. Nas
décadas que se seguiram, vêm acontecendo regularmente fóruns
locais, estaduais e nacionais (Bernardi et al., 2015; Glat et al., 2023).
Outras organizações e associações de pessoas com deficiência
desenvolvem programas semelhantes, de forma mais ou menos
estruturada.
Buscando contribuir com o processo de inclusão, o movimento
de autodefensoria, se norteia por alguns princípios ou diretrizes
básicas, a saber: eliminação de rótulos e afirmação da identidade
pessoal, desenvolvimento de autonomia e participação social, e luta
em defesa de seus direitos (Bernardi et al., 2015; Glat, 2004, 2018, 2021;
Glat et al., 2023), os quais serão brevemente discutidos a seguir.
Eliminação de rótulos e afirmação da identidade pessoal - Quando
nos referimos às pessoas com deficiência – a pessoa deve ser
considerada em primeiro lugar, não a deficiência. Justamente por
isso, quando foi criado na América do Norte, em meados da década
de 1970, o movimento de autodefensores foi intitulado de “People
First” (Pessoas Primeiro). Devido à representação social da
deficiência como incapacidade, é muito comum que todas suas
ações ou características pessoais sejam interpretadas ou explicadas
em função dos atributos estereotipados do estigma (Glat, 2006,
2009; Goffman, 2008; Omote, 1994). Em outras palavras, todas as
potencialidades, aptidões e características pessoais do indivíduo
são subestimadas: “não aprende porque tem uma deficiência
intelectual”, “não adianta explicar porque ela não vai entender
mesmo”. Ou seja, ela deixa de ser uma pessoa, “a Lucia”, e passa a
ser apenas um exemplo do rótulo: “aquela garota deficiente”.
O movimento de autodefensoria, portanto, reivindica que as
pessoas com deficiência intelectual sejam tratadas com dignidade e
consideração, sem que a sua condição seja um “cartão de visita”
que de imediato as identifique e segregue, ou um fator limitador, a
priori das oportunidades, que lhe serão oferecidas. Assim, um dos
seus objetivos principais é apoiar as pessoas com deficiência
intelectual afirmarem a sua identidade pessoal, a serem
28
reconhecidas e respeitadas como indivíduos únicos, como os
demais, apesar de suas limitações ou dificuldades.
Autonomia e Participação - contrapondo-se ao estereótipo de
incapacidade e rompendo com o padrão de superproteção familiar,
o desenvolvimento da autonomia nas atividades rotineiras, e
sobretudo na tomada de decisões, é, talvez, o aspecto mais
importante do movimento de autodefensoria. Em um artigo clássico,
denominado “A dignidade do risco”, Perske (1972) alerta que
29
com as barreiras do meio ambiente. Além de outros possíveis
comprometimentos, pessoas com deficiência intelectual
apresentam, por um lado, dificuldades de compreensão e
comunicação, e por outro, uma defasagem em experiências sociais,
por conta da superproteção que marca sua convivência social. Para
ultrapassar essas barreiras, elas demandam o que denominamos de
acessibilidade cognitiva e comunicacional. Ou seja, necessitarão de
apoio3, mais ou menos intenso para frequentar e usufruir dos
diferentes espaços e situações de interação social. Este auxílio pode
ser gradualmente reduzido na medida em que a pessoa alcance
maior autonomia no seu cotidiano.
Esse suporte é dado por familiares, amigos ou profissionais,
que incentivam a sua independência e agem como facilitadores,
preparando-os antecipadamente para o exercício de suas funções e
atuações, ou mesmo para atividades de vida diária. Junto com o
autodefensor, identificam suas dificuldades e constroem as
melhores estratégias para superação das barreiras. O apoiador
também atua como um mediador, auxiliando o sujeito em situações
sociais inclusivas, sobretudo quando tem que exercer sua
representatividade em reuniões, fóruns ou outros espaços
similares, para entender o que está sendo dito e expor suas ideias.
É fundamental, porém, que o apoiador não tenha atitudes de
proteção que impeçam o protagonismo do autodefensor. Ao
contrário, o seu papel é lhe ajudar a evitar problemas e desenvolver
estratégias sociais bem sucedidas, sem que isso signifique uma
atitude de tutela ou de responsabilização pelas ações da pessoa a
30
quem está dando suporte (Glat et al., 2023), visto que errar ou
perder faz parte do processo de amadurecimento pessoal.
Em consonância com o movimento de defesa dos direitos das
pessoas com deficiência, cujo lema é Nada sobre nós, sem nós (ONU,
2006), apresentamos a seguir alguns depoimentos de
autodefensores, sobre sua experiência.
31
[...] Tenho como papel defender os direitos das pessoas com
deficiências, inclusive, meus amigos aqui, né? Também eu participo
das reuniões, eventos, festas, viagens. Isso demonstra inclusão,
respeito... Aqui, na unidade III, a gente aprende a ter
responsabilidade, aprende a trabalhar, a conviver, a respeitar [...]
(Oliveira, 2019).
Considerações finais
32
qualquer aspecto da sua rotina: o que vestir, o que comer ou o como
passar suas horas de lazer, por exemplo.
Acreditamos que um dos maiores benefícios do movimento de
autogestão e autodefensoria seja a consciência que o sujeito adquire
sobre sua identidade pessoal, para além de sua condição de
deficiência: seus interesses, preferências, aptidões e dificuldades.
“Considerando a interação entre a dimensão da autogestão e da
autodefensoria no processo de empoderamento, esse é o primeiro
passo para ressignificar sua identidade como sujeitos singulares e
romper com a passividade imposta pela condição de deficiência”
(Glat, 2021, p. 21).
Com uma perspectiva de direitos humanos e a consciência de
que o potencial criativo de um indivíduo se amplia na medida em
que lhe são dadas condições e contextos favoráveis ao
desenvolvimento pessoal, é preciso romper com a tendência
histórica de desvalorização e superproteção das pessoas com
deficiência intelectual. A atuação junto a este segmento precisa ter
como objetivo primordial a criação de estratégias psicossociais e
pedagógicas que incentivem sua autonomia e desenvolvimento em
todas as etapas e esferas da vida, elementos sem os quais qualquer
política de inclusão não será, de fato, implementada.
Para tal, sobretudo, familiares e profissionais que convivem
com pessoas com deficiência precisam abrir mão da posição “de
poder” que exercem sobre elas (Glat, 2009), abrindo espaço para
que elas tomem a palavra, expressem suas necessidades,
expectativas e desejos, e descubram, através de sua própria ação
(incluindo, também erros e decepções), como melhor se colocar no
mundo, desfrutar dos recursos e experiências disponíveis na
sociedade e lutar para que sejam respeitadas em suas
individualidades e em seus direitos sociais.
Em que pese a importância das habilidades desenvolvidas nas
atividades de autodefensoria e autogestão para inclusão e
empoderamento das pessoas com deficiência intelectual, esta
temática ainda se apresenta pouco investigada e discutida em
nosso país no âmbito dos estudos em Educação Especial, em
33
contraponto com a literatura internacional, conforme aponta
Lindolpho (2020). Entretanto, a análise bibliográfica realizada por
este autor, entre outros trabalhos aqui citados, que corroboram a
experiência acumulada do movimento de autodefensoria, apontam
os resultados significativos de programas psicossociais orientados
por perspectiva emancipatória para na transformação da
identidade pessoal e participação social deste público.
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39
40
Encontro de vozes silenciadas frente as
práticas sociais in/excludentes
Introdução
41
ainda, por marcadores normativistas, nos quais são estabelecidos
padrões únicos de existências. No caso de pessoas com alguma
condição de deficiência, Carvalho (2014, p. 17) discute que
42
o sentido ampliou-se, sendo hoje “... mais aplicado à própria
desgraça do que à sua evidência corporal” (Goffman, 2008, p. 5).
Essa discussão corrobora com Omote (2004, p. 296) ao destacar
que a condição social de desgraça e descrédito exercida pelo
estigma resulta no controle social, fabricado de modo a estabelecer
hierarquias e papeis aceitáveis necessários. Em outras palavras,
esses papéis “não estão pré-determinados geneticamente, mas
construídos nas relações sociais”. Quando pensamos na
experiência de vida das pessoas com deficiência intelectual, fica
claro a função excludente exercida pelo estigma, uma vez que até
os dias atuais persiste a perspectiva orgânica, de um cérebro lesado,
sem expectativa de mudanças e, portanto, desacreditado
socialmente.
Sob a perspectiva do modelo social, o foco está na interação
entre “pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e
ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas
pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as
demais pessoas” (Brasil, 2009, p. 1). Logo, a compreensão da
deficiência intelectual é postulada a partir de uma relação em que
as condições socioculturais implicam diretamente no
desenvolvimento e subjetividade do indivíduo.
Omote (2021, p. 45) sobre a construção social da deficiência
destaca ainda que
43
Intelectual e Desenvolvimento (AAIDD), que a caracterizada por
limitações significativas no funcionamento intelectual e no
comportamento adaptativo, expresso nas habilidades conceituais,
sociais e práticas, originando-se antes dos 22 anos de idade
(AAIDD, 2021).
É importante ressaltar que a condição de deficiência
intelectual não é estática e permanente, e não pode ser reduzida ao
viés médico, que a percebe como uma doença que necessita de
reabilitação (Glat; Fernandes, 2005). Ademais, como lembram
Santos e Braun (2007, p. 7) “[...] a deficiência intelectual não pode
ser representada como um atributo da pessoa, mas sim como um
estado de funcionamento que depende de condições e apoios”.
Tendo em vista que o conceito de deficiência é evolutivo e que
os processos de discriminação e exclusão social relacionados às
pessoas com deficiência e seus efeitos na construção de suas
subjetividades têm disso discussões recorrentes nos estudos
científicos (Diniz, 2012; Carvalho, 2014; Reis, et al.; 2019, entre
outros), foi introduzido no debate nos últimos anos o termo
capacitismo.
Baseadas nos estudos de Campbell (2009), Gesser, Block e
Mello (2020) argumentam que a perspectiva capacitista situa a
deficiência como uma condição inerentemente negativa, devendo
ser “melhorada”, curada ou mesmo eliminada. Esta forma de
pensar se coaduna com os discursos médicos, estabelecendo
segundo as autoras, relação direta com práticas eugênicas ao
produzir um padrão de corpo “sadio”, “hábil” e “capaz”.
44
A construção de um padrão compulsório de normalidade,
segundo as segundo as referidas autoras, resulta na produção de
violências e vulnerabilidades nas experiências de pessoas com
deficiência, seja na vida social, particular e/ou educacional, na
medida que contribui na constituição de “uma condição de
precariedade da vida e relações ancoradas em concepções
caritativas/assistencialistas e/ou patologizantes dos corpos”
(Gesser, 2019, p. 19).
Tais discussões assumem dimensões importantes no campo
das políticas públicas, incorporadas em documentos legais, como,
por exemplo, no Decreto n⁰ 11.793/2023, que institui o Plano
Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência - Novo Viver sem Limite.
Em seu Art. 2⁰, o inciso I ressalta “o enfrentamento do capacitismo,
do preconceito e da violência contra pessoas com deficiência”
(Brasil, 2023, p. 04), e segue no parágrafo único determinando que:
45
recorrentes processos de rotulação e estigmatização com base no
mito do estudante “ideal”, excluindo-os em vez se acolhê-los na
diversidade que constitui o contexto escolar.
Dessa maneira, ao considerar que as trajetórias de vida de
pessoas com deficiência foram marcadas por segregação,
preconceito, discriminação e exclusão (Reis, 2019), faz-se necessário
evidenciar as vozes dos estudantes com deficiência intelectual a
partir de suas experiências psicossociais narradas, sentidas e
experienciadas no campo educacional.
46
[...] a realização da entrevista e a transcrição imediata são um
procedimento que ajuda o entrevistador a corrigir e a perceber o
crescimento de sua escuta, pois exige muita disciplina, como, por
exemplo, de ajuste de condução da entrevista, inferindo uma questão
em que o entrevistado não havia relatado. Durante a entrevista, o
registro de palavras-chave contribuiu para andamento desta, pois no
momento em que o estudante parava e pedia uma pergunta,
retornava a entrevista solicitando esclarecimento ou
aprofundamento a partir de seu relato.
47
Já sofri preconceito na escola. Tiveram alunos que não queriam fazer
trabalho comigo no colégio. Achavam eles que eu não tinha capacidade
de executar os trabalhos e não queriam que eu participasse. [...] Aí as
meninas não queriam de jeito nenhum que eu fizesse trabalho com
elas. Aí foi demais para mim quando eu soube que as meninas não
queriam que eu fizesse trabalho [...] para eles lá eu era uma menina
incapaz de executar as coisas. Aí eu me sentia muito mal de ver que
como eles estavam me colocando. [...] Aí eu ia para casa triste, mas não
tinha a capacidade assim de falar, não tinha maturidade como eu tenho
hoje de me expressar, de dizer para elas que eu tinha capacidade de fazer
(Edna, 22 anos, Ensino Médio completo; Glat, 2024, p. 22-23, grifo das
autoras).
48
educacionais frente àqueles que não acompanham o mesmo ritmo
de aprendizado esperado, tornando-os os desviantes, os
“estudantes problema”. A continuidade do relato de Edna ilustra
bem essa relação:
[...] Tinha algo acontecendo, né [...] minha mãe não quis me levar
mais para o colégio, porque ela viu que tinha algo acontecendo. [...]
eles viram que eu era um problema no colégio (Edna, 22 anos,
Ensino Médio completo; Glat, 2024, p. 23, grifo das autoras).
49
principalmente em situações explícitas de bullying, e até mesmo de
violência explícita, do qual ele foi alvo.
50
gerar, inclusive, atitudes de automutilação na tentativa de
amenizar o sofrimento.
[...] Teve uma parte da minha vida que eu chegava a levar gilete para
a escola para quando eu estava estressado e como o pessoal mexia
muito comigo eu ia para o banheiro, eu falava para o professor que
ia para o banheiro, mas era para me mutilar. [...] (João, 20 anos,
Ensino Médio completo; Glat, 2024, p. 24, grifos das autoras).
51
3. Narrativas sobre acolhimento x barreiras atitudinais nos
espaços educacionais
52
Destaca-se que apesar do avanço, ainda permeia a visão da
diferença pautada no desvio, na anormalidade, entre outras
categorizações que acabam sendo imputadas ao outro.
As experiências vão sendo constituídas a partir do tempo e
lugar da existência de cada pessoa. Assim, os estudantes com
deficiência intelectual relataram situações de in/exclusão nas
relações de amizade, conforme narrativas a seguir
Assim, eu não era muito amiga deles, não, pra falar a verdade...
Porque eu não tinha assunto. Eu só falava quando tinha trabalho em
grupo, porque era obrigado. Vou te dizer que do meu 6º ano ao 9º foi
melhor. A convivência... tipo assim, dos alunos. Eu tinha mais
amigos do que no Ensino Médio. [...]Tem alguns que eu falo até hoje.
Mas, tipo assim, do Ensino Médio não tinha (Gisele, 21 anos, Ensino
Médio completo; Glat, 2024, p. 25).
[...] pensei que não ia fazer amizade, mas fiz. Fiz muito amizade
nessa e nas outras. [...] Na [nome da escola] que eu te falei e na [nome
de outra escola], e na outra escola eu não fiz muita amizade. Nessa
escola eu fiz muita amizade, porque na outra escola, na primeira, eu
não fiz muita amizade, porque quase ninguém gostava de mim, mas
nessa aí até gente que gosta de mim, fala comigo, mas quem não
gosta de fazer amizade comigo eu não ligo não. [...] Porque depois
quando sai, a gente não tem mais contato e tal. A pessoa vai seguir a
vida dele e tal. E eu pensava muito nisso que tipo, mano, eu tô me
formando e, tipo, será que vai continuar a amizade e tal. [...],. Mas
algumas pessoas eu tenho contato até hoje, tipo, em relação ao que
esteve comigo na minha trajetória até aqui (João, 25 anos, Ensino
Médio completo; Glat, 2024, p. 27).
53
Há barreiras atitudinais que emergem nas vozes dos
estudantes com deficiência, mas também ocorrem relatos de maior
acolhimento, mediação durante as atividades escolares e relação de
amizades, sentimentos que emergem nas narrativas a seguir
Eu amo muito meus amigos lá. É, todo mundo que tem lá, mas,
assim, eu queria, eu queria, é, é, a participarem [...] tem um monte de
amigos lá que ajudou (Jurema, 22 anos, Ensino Fundamental I
incompleto; Glat, 2024, p. 25).
Mas às vezes eram meus amigos que às vezes me dava explicação “tá
com dúvida disso?” Aí eu vou lá “é, isso...” (João, 20 anos, Ensino
Médio completo; Glat, 2024, p. 26).
54
alegria e afeto. Porém ainda persistem, práticas e atitudes
permeadas pelo preconceito, permeados pelo viés do capacitismo.
Considerações Finais
55
incapacidade. O relato de João, por exemplo, ilustra como o
sofrimento psíquico gerado na sua trajetória educacional, quase o
levou a um desfecho trágico, de desistência da própria vida.
Há nas vozes tanto uma denúncia, quanto pedido de socorro,
frente um cenário demarcado pela contradição da in/exclusão e
violação dos direitos humanos. Cabe atentar para a totalidade das
dimensões (política, social, cultural e econômica) que estão
imbricadas na existência humana, assim, problematizar essas
relações e seu o impacto na trajetória escolar dos alunos com
deficiência intelectual.
Portanto, nos espaços educacionais, onde as convivências
sociais deveriam ser constituídas por empatia, acolhimento,
respeito pelas diferenças humanas, as vozes dos estudantes com
deficiência intelectual, embora reflitam essas atitudes positivas,
apontam inúmeras situações desrespeito e exclusão. Daí
necessidade de ecoar suas próprias narrativas em estudos e
pesquisas, que contribuam para sua efetiva inclusão social e melhor
qualidade de vida, de modo geral.
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60
Vivência de inclusão escolar de alunos com deficiência
intelectual na educação básica: foco nas práticas pedagógicas
Rosana Glat
Suzanli Estef
Katiuscia C. Vargas Antunes
61
usufruir de uma melhor qualidade de vida, estabelecendo relações
pessoais mais equânimes e participando com maior autonomia nos
diferentes espaços sociais.
No conjunto do chamado público-alvo da Educação Especial1,
destacam-se as pessoas com deficiência intelectual, as quais
manifestam grande fragilidade social e acadêmica, na medida em que
sua condição afeta diretamente o processo ensino aprendizagem e as
relações sociais, de modo geral. Em estudos anteriores que analisaram
os impactos das políticas públicas de inclusão na autopercepção deste
grupo, parte significativa dos sujeitos relatou que suas vivências na
escola comum não foram bem-sucedidas (Antunes, 2012; Castanheira,
2014; Glat; Estef, 2021a).
Partindo dessas considerações, no presente capítulo,
apresentamos um recorte de uma pesquisa, ainda em andamento,
que teve como objetivo investigar as vivências de estudantes com
deficiência intelectual na Educação Básica2, analisando suas
experiências de escolarização, a partir de seus relatos pessoais. Por
meio da metodologia de História de Vida foram coletados
depoimentos sobre suas experiências no ensino comum, levando
em consideração aspectos como: trajetória de escolarização;
dificuldades de aprendizagem e socialização; práticas pedagógicas,
acessibilidade ao currículo e atendimento educacional
especializado, entre outros.
Percurso metodológico
62
abertas, seguindo a metodologia de História de Vida (Glat, 2009;
Glat, Antunes, 2020). Este método considera como única fonte de
dados o relato de vida narrado pelo sujeito durante a entrevista.
Justamente, por partir das narrativas dos sujeitos, a
metodologia de História de Vida é especialmente profícua para a
Educação Especial e outras áreas que lidam com grupos
historicamente excluídos, pois permite ao investigador falar com
eles e não só sobre eles (Glat; Antunes, 2020). Nesta direção, a
valorização da visão dos próprios estudantes com deficiência
intelectual sobre suas experiências educacionais, representa uma
mudança de perspectiva investigativa, se alinhando com o
pressuposto básico do movimento de autodefensoria, “nada sobre
nós sem nós”, conforme discutido no capítulo anterior.
Conforme os procedimentos básicos do Método de História de
Vida, no início de cada entrevista, pedia-se ao participante para
falar sobre sua vida na escola, desenvolvendo, a partir daí, o
diálogo. De acordo com as suas narrativas, o entrevistador
formulava, na hora, algumas perguntas para aprofundar ou
esclarecer determinado ponto; porém, a direção da conversa e os
tópicos abordados eram sempre de iniciativa espontânea do sujeito.
63
1. Práticas pedagógicas de ensino
64
Corroborando, alguns entrevistados relataram não terem
experienciado práticas pedagógicas diferenciadas que atendessem
às suas necessidades educacionais específicas, conforme ilustrado
nos depoimentos a seguir.
A escola não permite e não adapta nada pra mim e só me ameaça que
vai me deixar reprovada, que vai me reter (Nelma, 18 anos, cursando
Ensino Médio).
65
[...] A outra que estudei não gostava de mim, não falava comigo. Tem
professor que eu acho que hoje em dia nem gosta mais de mim
porque não me passava; que a professora não me passava de jeito
nenhum porque eu não sabia nada. Aí era muito difícil essa
professora. [...] Só tinha essa, essa não me passava de jeito nenhum,
de jeito nenhum! Eu tirava nela, eu tirava só I4 e…só I. Ninguém me
ajuda, mas eu só tirava I, ela me dava I em tudo (Milena, 16 anos,
cursando o Ensino Fundamental II).
Não são todos professores que abraçam a causa. Têm professores que
não querem abraçar, que realmente, assim, desdenham, assim, não
querem ter o trabalho de ensinar. [...] que chegam, que tiram as
dúvidas, que têm a paciência de tá ali; porque pra você ensinar um
aluno especial, você tem que sentar, você tem que ter tempo e a hora
pra você poder sentar com eles e explicar e pra poder chegar até o
ponto que ele consiga entender. [...] Ele (professor de Biologia) teve
esse tempo, ele tinha esse tempo pra poder me explicar, pra fazer
com que eu chegasse até a pergunta, até a resposta (Edna, 22 anos,
Ensino Médio completo).
66
direito de todos à aprendizagem, pressuposto básico da política de
Educação Inclusiva. Proporcionar acessibilidade curricular para
estudantes que apresentam condições que afetam diretamente o
processo de aprendizagem, como os com deficiência intelectual, é,
certamente uma tarefa complexa, que demanda, como
mencionado, entre outros aspectos, formação e orientação para os
professores, planejamento (e tempo para planejamento), avaliação
continuada do processo.
67
De fato, a maioria dos sujeitos relatou que, em suas escolas,
não havia acessibilidade nos processos avaliativos.
68
Só que às vezes quando eu não sabia mesmo ou tinha esquecido, eu
deixava em branco. [...] Aí teve uma época que eu tava fazendo prova
e eu sempre fui o último a terminar a prova (João, 20 anos, Ensino
Médio completo).
69
específicas. Logo, um dos objetivos principais da pesquisa era
analisar a percepção e experiência dos participantes sobre o AEE.
Na rede pública de ensino,6 o tipo de suporte mais difundido
é a sala de recursos multifuncionais onde alunos com deficiência
recebem atendimento especializado individualizado ou em
pequenos grupos no contraturno, tendo sido citado por vários
entrevistados:
70
Outro tipo de suporte citado foi a mediação de aprendizagem
ou mediação pedagógica, que consiste na oferta de atendimento
individual de um mediador (que pode ser um profissional ou um
estagiário) que acompanha e auxilia o estudante na sua sala de aula
durante o turno escolar. Vale destacar que, “este profissional não
substitui o papel do professor da turma, trabalha
colaborativamente com ele, auxiliando o processo de ensino
aprendizagem.” (Rio de Janeiro, 2022, p. 4). O ideal é que o
mediador seja integrante da equipe pedagógica da escola (ou no
caso de estagiários, supervisionado por um profissional da escola),
e a legislação atual, inclusive preconiza que as escolas, públicas e
privadas, e não as famílias são as responsáveis pela contratação
desse profissional.
[...] professor de apoio. Tinha uma que era da escola, tinha outra que
não era (Gustavo, 26 anos, Ensino Superior incompleto).
[...] tem outra professora que me ajuda [...] até umas coisas que eu não
sei fazer e eu peço ajuda dela, só as profe… têm alguns professores,
têm algumas professoras que eu perguntava, que eu perguntava como
faz ...e ai faço sozinha depois mostro pra minha outra professora
(Milene, 12 anos, cursando o Ensino Fundamental I).
71
Considerações finais
72
capacitismo7 (Gesser; Block; Mello, 2020; Lunardelli; Kawakami,
2023), ainda forte no ambiente escolar programado para a
homogeneidade e a meritocracia.
Pode-se dizer que, de modo geral, a deficiência intelectual
continua sendo concebida como um problema, um impedimento
para aprendizagem acadêmica. E este quadro se potencializa, nos
níveis mais avançados de ensino. Entretanto, esses estudantes
estão chegando à universidade trazendo novos desafios para o
sistema educacional, como será discutido em capítulos
subsequentes desta obra.
A proposta de Educação Inclusiva coloca em xeque a escola
meritocrática, competitiva e excludente e exige uma nova cultura
escolar, pautada na diversidade e no desenvolvimento de práticas
pedagógicas que contemplem a flexibilização e acessibilidade
curricular. No caso dos estudantes com deficiências, como os
participantes desta pesquisa, é necessário também dispor de um
sistema de suporte especializado que acompanhe e oriente não só
eles, mas, sobretudo, os professores regentes para que possam
transformar sua atuação e atender às suas necessidades
educacionais específicas.
O estudante com deficiência intelectual, de modo geral,
precisa de um acompanhamento sistemático, frequentemente com
suporte individual e especializado, para que não haja defasagens
em sua aprendizagem que o deixem aquém ou alheio ao seu grupo
de referência, ou seja, a classe em que está matriculado. Quando o
processo não é programado adequadamente, resulta,
invariavelmente, em sua exclusão educacional e social, levando
frequentemente ao fracasso, e até mesmo, abandono escolar.
Na maioria dos casos, estudantes com deficiência intelectual
incluídos no ensino comum não experimentam a vivência escolar
na sua integralidade. E, mais importante, não são ouvidos durante
73
a sua trajetória estudantil, por não serem considerados aptos a esse
tipo de participação.
Nessa direção, para fazer frente às atuais expectativas
colocadas pela inclusão escolar de estudantes com deficiência
intelectual, “mais do que desenvolver novos métodos e propostas
de atendimento, precisamos desconstruir a visão estereotipada de
incapacidade, de dependência e de limitação que sempre marcou −
aberta ou veladamente − o tratamento que conferimos a esses
alunos [...]” (Glat, 2018, p. 10). Somente atuando sob uma ótica
inclusiva e emancipatória será possível atender à diversidade
presente nas instituições de ensino, seja a escola básica, seja o
ensino superior. Sem as transformações necessárias, haverá a
perpetuação de situações inadequadas no ambiente escolar.
Neste sentido, consideramos que a valorização do discurso do
sujeito como dado primordial para construção do conhecimento
sobre o fenômeno estudado, é a característica principal que valida
a utilização da metodologia de História de Vida, para pesquisas
voltadas a grupos marginalizados e excluídos, como estudantes
com deficiências. Entendemos que a escuta a esses estudantes é
primordial para compreender suas demandas e elaborar propostas
educacionais mais inclusivas, contribuindo, assim, para
desenvolvimento de estratégias pedagógicas que melhor garantam
sua participação e aprendizagem deste público no contexto do
ensino comum.
Referências
74
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78
Avaliação da aprendizagem escolar de alunos com deficiência
intelectual: concepções e percepções dos sujeitos
Suzanli Estef
Rosana Glat
79
deficiência intelectual não é mais classificada em níveis – leve,
moderado, profundo e severo – visto que o diagnóstico deve
considerar os aspectos sociais, familiares, entre outros. A atual
concepção de deficiência intelectual proposta pela AAIDD (online),
portanto, contempla o sujeito em seu desenvolvimento global. Por
esta definição, o comportamento adaptativo abrange (AAIDD,
online; Almeida, 2012): Habilidades sociais: habilidades
interpessoais, responsabilidade social, autoestima, resolução de
problemas sociais, compreensão de regras, leis e não se fazer de
vítima; Habilidades conceituais: linguagem e alfabetização,
dinheiro, tempo, conceitos matemáticos e autodefensoria;
Habilidades práticas: atividades da vida diária (cuidados pessoais),
habilidades ocupacionais, de saúde, transporte, rotina, segurança,
uso do dinheiro, telefone.
80
requer uma reflexão responsável, realista e consciente. Em outras
palavras, precisamos rever nossas práticas curriculares,
metodológicas, e a dinâmica escolar cotidiana; ou seja, repensar a
função da escola e o papel do professor frente esta diversidade do
alunado que agora frequenta as salas de aula.
Esta demanda, entretanto, esbarra em um modelo de
organização escolar seriada, classificatória, em que os alunos são a
priori agrupados por idade, com conteúdos curriculares pré-
selecionados, e que ao final de cada ano letivo promove (ou não) a
sua inserção para os anos seguintes. Neste cenário, a avaliação do
desempenho escolar de estudantes com diferenças significativas no
ritmo e estilo de aprendizagem se torna um dos maiores desafios
para os educadores.
Nesse sentido, considerando a temática, no decorrer do texto,
discutiremos diferentes conceitos sobre avaliação do desempenho
escolar, com base na literatura, em documentos legais, bem como a
visão de educadores e de estudantes com deficiência intelectual que
passaram por processos avaliativos no contexto da Educação Básica.
Seguindo a proposta desta obra, destaque será dado às
percepções dos estudantes com deficiência intelectual que,
indubitavelmente, representam um dos maiores desafios aos
sistemas educacionais contemporâneos, sobretudo no campo da
avaliação de seu desempenho escolar. Para tal, utilizaremos dados
de estudos que analisaram a percepção desses sujeitos a partir de
seus próprios depoimentos (Caldwell, 2011; Carneiro, 2007; Glat;
Estef; 2021; Glat, 2024; entre outros)
81
Quadro 1 - Conceitos teóricos sobre avaliação escolar
BASE DE CONCEITOS DE
CITAÇÃO
PESQUISA AVALIAÇÃO
Avaliação
formativa, que
[...] A avaliação formativa está,
participa da
portanto, centrada essencial,
regulação da
PERRENOUD direta e imediatamente sobre a
aprendizagem com
(1999) gestão das aprendizagens dos
vista a intervir nos
alunos (pelo professor e pelos
processos de
interessados).
aprendizagem em
curso.
A avaliação escolar é um meio
e não um fim em si mesma; está
delimitada por uma
determinada teoria e por uma
determinada prática
Avaliação como pedagógica. Ela não ocorre
CALDEIRA reprodutora do num vazio conceitual, mas está
(2000) modelo de dimensionada por um modelo
sociedade. teórico de sociedade, de
homem, de educação e,
consequentemente, de ensino e
de aprendizagem, expresso na
teoria e na prática pedagógica.
(p. 122)
[...] prática de investigação, se
configura como prática
fronteiriça que permite o
trânsito entre lugares já
percorridos e novos lugares,
ESTEBAN Avaliação
alguns que já se podem
(2000) investigativa
vislumbrar e outros ainda não
explorados, não pensados e
alguns que sequer foram
nomeados ou demarcados.
(p.15)
82
Avaliar é o ato de diagnosticar
uma experiência, tendo em
Avaliação
vista reorientá-la para produzir
LUCKESI diagnóstica e
o melhor resultado possível;
(2005) reorientadora de
por isso, não é classificatória
práticas.
nem seletiva, ao contrário, é
diagnóstica e inclusiva. (p. 83)
[...] ato de avaliar depende da
percepção que cada um tem de
si, de sua prática pedagógica e
de sua própria relação com a
escola. Exige reflexão sobre o
papel da escola na sociedade
Avaliação como atual, sobre a natureza e o
ação docente âmbito do conhecimento
cercada de juízos de escolar, reflexão sobre seu
DALBEN valores, próprio papel diante do
(2004) subjetividade e conteúdo que é veiculado e
reflexão acerca de como mediador na relação do
suas ações aluno com esse conhecimento.
pedagógicas. Exige o conhecimento do aluno
e da sociedade, conhecimento
do hoje, do ontem e ainda uma
capacidade de prever um
futuro próximo, já que
formamos um jovem para o
amanhã. (p. 183)
Fonte: Elaborado pelas autoras
83
Quadro 2 - Conceitos de avaliação escolar: documentos educacionais
legais
BASE DE CONCEITOS DE
CITAÇÃO
PESQUISA AVALIAÇÃO
Avaliação como
Lei de
instrumento de
Diretrizes e Verificação do rendimento
verificação do
Base - escolar [...]. Art. 24, inciso V
aprendizado do
LDB/1996
aluno.
[...]conjunto de atuações que
Avaliação como
tem a função de alimentar,
processo
sustentar e orientar a
Parâmetros contínuo,
intervenção pedagógica.
Curriculares sistematizado,
Acontece contínua e
Nacional - qualitativo e
sistematicamente por meio da
PCNs/1997 direcionador das
interpretação qualitativa do
práticas
conhecimento construído pelo
pedagógicas.
aluno. (p. 55)
84
no “chão da escola”, através das formas e instrumentos utilizados
para as avaliações, bem como as práticas pedagógicas adotadas.
A Figura 1 mostra quatro vertentes avaliativas, sintetizando as
concepções de professores da Educação Básica sobre avaliação do
desempenho escolar (Estef, 2016; 2021).
85
Avaliação qualitativa processual
86
global. Logo, não pode ser só uma medida quantitativa de aspectos
isolados.
87
cenário educacional (Capellini; Mendes, 2002; Jesus, 2004; Estef,
2016; 2021; entre outros).
As Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação
Básica, elaboradas no ano de 2001, define avaliação do desempenho
escolar como um
88
somente da adaptação de recursos pedagógicos ou a flexibilização
do tempo e espaço de realização das provas.
A concepção da organização didática, do planejamento dos
conteúdos curriculares e a elaboração dos instrumentos deve
considerar as necessidades do aluno e tornar acessível o processo
de ensino e de avalição. Como, por exemplo, se um estudante cego
faz uso de braille seu processo de ensino e, consequentemente, o de
avaliação deve ser na escrita em braille. Considerando que um
estudante com deficiência intelectual que tem como centro de
interesse cavalos e precisa trabalhar sequência de produção de
textos, construir uma história sobre cavalos com o uso de imagem
é uma boa alternativa pedagógica de acessibilidade e se deve usar
como estratégia para facilitar a inclusão escolar desse aluno.
As concepções sobre avaliação da aprendizagem na Educação
Básica, apresentadas até aqui, servem como fundamentação para
uma reflexão sobre a inclusão de estudantes com deficiência
intelectual no contexto escolar e vão ao encontro às percepções dos
próprios sujeitos, conforme será discutido a seguir.
89
E um dos caminhos mais profícuos para fundamentar essa
mudança de paradigma de ensino e avaliação meritocrático e
excludente para uma proposta diferenciada e acessível, é
justamente levar em consideração a experiência e demandas dos
próprios estudantes. Os trechos a seguir mostram exemplos, sob a
própria ótica de estudantes com deficiência intelectual, dos efeitos
da prática pedagógica do professor na sua aprendizagem e sua
percepção sobre o processo de escolarização e, consequentemente,
sobre o processo de avaliação.
90
supridas com recursos de acessibilidade (Glat, 2016). Mesmo em
vigência das políticas de inclusão, grande parte dos alunos com
deficiência são “incluídos” em classes comuns da Educação Básica,
sem que haja nenhuma transformação nas práticas pedagógicas
para atender às suas necessidades educacionais específicas. E, mais
ainda nas atitudes dos professores em relação à sua
responsabilidade em ensinar a esses alunos.
Os dois relatos a seguir são bastante significativos, pois
mostram como ainda é bastante arraigado o preconceito dos
professores, que se manifesta na baixa expectativa das
possibilidades de aprendizado desses alunos. Essas posturas, que
representam as chamadas barreiras atitudinais, são percebidas de
forma dolorosa pelos estudantes, contribuindo para sua
insegurança e baixa autoestima, fatores que afetam e dificultam
ainda mais sua aprendizagem, se refletindo diretamente no seu
desempenho escolar medido pelo processo avaliativo.
[...] tipo assim, era uma mesa separada pra quem não sabia e pra
quem sabia; Por exemplo, tem um papel, tem um texto, uma história;
se você não sabe, como, como é que você vai fazer o negócio se você
não sabe ler e escrever? Aí ela falava pra gente que não queria
ensinar porque a gente era burro e não ia conseguir aprender (J. 23
anos, Glat, 2020).
91
resta dúvida que a grande parte desses estudantes, mesmo com
adequações curriculares, demandará algum nível de acessibilidade
aos métodos e procedimentos avaliativos. Diferenciação do ensino
implica, necessariamente, em uma avaliação acessível, seja de
conteúdo, forma e/ou tempo-espaço de realização das provas e
testes, entre outras possibilidades (Rosa; Sardou; Estef; 2024).
Segundo Maffezoli e Góes (2024), para alguns alunos com
deficiência intelectual, a experiência de avaliação do aprendizado
escolar pode ocorrer de maneira tão empobrecida, fora do contexto
curricular e sem recursos de acessibilidade, que muitos não se
recordam dela. Isso se dá devido à descrença nas habilidades e
capacidades do indivíduo, fazendo com que as propostas e
perspectivas de ensino e avaliação sejam desenvolvidas de forma a
abordar minimamente o conteúdo proposto, para aquele nível de
ensino. Neste caso, a abordagem pedagógica e a relação entre o
professor e o aluno pautam-se numa visão reducionista e
preconceituosa, não colaborando para a ampliação do repertório de
conhecimentos destes alunos e não permitindo o seu pleno
desenvolvimento.
Ficou aparente pelos relatos das pessoas com deficiência
intelectual, que apesar da consolidação das políticas de inclusão,
esses estudantes não estão tendo experiências escolares adequadas
que, de fato, garantam sua participação, aprendizagem e
favoreçam sua inclusão educacional e social. A análise das falas
sobre o processo de avaliação nos faz questionar, inegavelmente, a
concepção do processo ensino e aprendizado, currículo, a
estruturação e aplicação dos projetos político pedagógicos das
escolas, além da formação dos professores e as políticas
educacionais, como um todo.
O feedback desses alunos deve servir de base para a
reconfiguração de procedimentos e estratégias avaliativas
construídas em consonância com a perspectiva de inclusão escolar.
A intenção é convocar outro olhar para essa prática, que não diz
respeito somente ao aluno, mas às crenças e suposições do outro a
quem esse sujeito está submetido.
92
Um convite a reflexão
Referências
93
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96
Formação docente para alfabetização e letramento:
possibilidades para vida independente da pessoa com
deficiência intelectual
Introdução
97
piloto do estudo e os caminhos por ele trilhados, a partir de sua
participação na pesquisa.
98
diferentes objetivos, possibilita que a pessoa se torne autônoma, em
diferentes situações. Entretanto, a aprendizagem da leitura e de
habilidades para compreender textos, requer uma intervenção
adequadas para serem consolidadas.
Sendo assim, optamos nessa pesquisa, ao elaborarmos a
proposta da formação docente para alfabetização e letramento,
coadunar as duas ações: alfabetizar e letrar. Senna (2019, p. 179),
aponta que “embora possamos falar de duas áreas, letramento e
alfabetização são faces de um único campo acadêmico”, sendo a
compreensão dessa globalidade algo complexo, do qual ainda não
se percebe um compromisso efetivo voltado para a aproximação
efetiva à realidade dos sujeitos escolares.
Nessa direção, complementamos nossa proposta para
alfabetizar e letrar pessoas com deficiência intelectual coadunando
com Soares (2020) que nos adverte sobre ser imprescindível que os
estudantes aprendam o sistema alfabético de escrita, conhecendo
seus usos sociais: ler, interpretar e produzir textos. Em outras
palavras, não se deve apenas alfabetizar e sim, alfabetizar e letrar,
o que a autora supracitada denomina “alfaletramento”. Ou seja,
devem dominar o código escrito simultaneamente com a
aprendizagem do seu uso social.
O cerne de nossa proposta vai de encontro à busca por
alfaletrar pessoas com deficiência intelectual. Segundo a
Associação Americana de Deficiência Intelectual e
Desenvolvimento (AAIDD, 2021) a pessoa com deficiência
intelectual é definida como aquela que apresenta limitações
significativas tanto no funcionamento intelectual quanto no
comportamento adaptativo, manifestadas nas habilidades
adaptativas conceituais, sociais e práticas. Também é destacado
que a deficiência se origina durante o período de desenvolvimento
que é definido como aquele antes de o indivíduo atingir a idade de
22 anos. A AAIDD (2021) ressalta ainda que o funcionamento da
pessoa nesta condição vai ser diretamente influenciado pela
qualidade de suportes que receberem ao longo da vida.
99
Dessa forma, o planejamento de ações voltadas ao pleno
desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual, necessita
considerar a existência de limitações intrínsecas como aquelas
relacionadas ao funcionamento intelectual, mas também que há
formas de interferir no nível de comprometimento manifestado nas
habilidades adaptativas (aprendizagem conceitual, uso de
dinheiro, uso de regras de convívio social, dentre outras).
O estudo desenvolvido teve como objetivo contribuir para a
eliminação de barreiras relacionadas às habilidades conceituais;
especificadamente aquelas voltadas para a leitura, escrita, cálculos
simples e o uso das tecnologias. A intenção foi associar o ensino
destas habilidades ao Plano Educacional Individualizado – PEI, por
meio de uma formação docente teórico e prática. O PEI é um plano
de ensino elaborado com estratégias pedagógicas personalizadas
com objetivo de tornar um conteúdo curricular acessível a um
estudante (Mascaro; Redig, 2021). Na próxima seção
apresentaremos a organização da proposta formativa.
100
situação social com a visão de modificá-la dentro do seu contexto.
Segundo Desroche (2006), na pesquisa-ação os atores não são
objetos de observação, explicações ou de interpretações, eles são
sujeitos participantes do processo.
A pesquisa-ação não delimita hierarquia entre os sujeitos,
porém, é imprescindível que cada um tenha seu papel bem
delimitado. No presente estudo os sujeitos participam da seguinte
forma:
A) Equipe de pesquisadores/ professores articuladores:
professores integrantes da equipe, que, com orientação da
coordenação da pesquisa, durante a etapa teórica, ministram as
aulas e na etapa prática, acompanham as equipes de professores
cursistas na elaboração e aplicação do PEI. Neste tipo de pesquisa-
ação são considerados sujeitos devido ao fato de analisarem os
passos dados no estudo e reavaliarem sempre que necessário, os
procedimentos da investigação visando alcançar os objetivos.
B) Professores cursistas: são os participantes da proposta
formativa. Realizam individualmente a etapa teórica, e na etapa
prática são organizados em equipes de três a quatro componentes
para planejamento e aplicação do PEI. São selecionados pela equipe
da pesquisa, após divulgação de processo seletivo nas redes sociais.
Seguindo os pressupostos da pesquisa, após concluírem a
formação, alguns passavam a integrar a equipe de pesquisadores,
atuando na articulação das novas turmas.
C) Estudantes com deficiência intelectual: participam do
estudo em suas residências, realizando as atividades do PEI. São
considerados protagonistas, pois cada PEI é elaborado com base no
que eles expressam sobre suas necessidades e potencialidades em
relação a alfabetização e letramento. Foram selecionados
inicialmente por meio de uma parceria com o Caep Favo de Mel da
Rede FAETEC3, posteriormente passaram a ser indicados pelos
próprios professores cursistas.
101
D) Agentes de apoio domiciliar: responsáveis (pais e/ou
irmãos) que dão suporte inicial ao estudante com deficiência
intelectual para realizar a mediação tecnológica. Estes participantes
não haviam sido pensados inicialmente, mas surgiram quando foi
percebida a necessidade dos estudantes de lidarem com os recursos
tecnológicos em suas moradias.
O ambiente do estudo é virtual e a proposta formativa conta
com carga horária de 180 horas. O registro de todas as atividades
acontece por meio de elaboração de notas de campos dos
pesquisadores. O planejamento das atividades do PEI é realizado a
partir do modelo elaborado em um protocolo específico. E a
avaliação do trabalho desenvolvido segue a espiral cíclica da
pesquisa-ação: planejamento, aplicação, avaliação e
replanejamento.
Em prosseguimento, apresentamos inicialmente, o desenho
estruturado para a formação docente, dando ênfase a relatos dos
professores cursistas. Em seguida são apresentados os resultados
relacionados a aplicação do PEI com um estudante com deficiência
intelectual e seus desdobramentos.
102
de jovens e adultos com deficiência intelectual, utilizado na
formação docente.
Como mencionado, a formação foi estruturada em atividades
assíncronas em um site, criado pela equipe de pesquisadores, no
qual os cursistas realizavam individualmente as atividades, e
participavam de encontros síncronos semanais para discutir a
proposta do PEI na plataforma Zoom5. Na etapa de aplicação do PEI
com os estudantes, foram formadas equipes com
aproximadamente quatro integrantes cada uma, estruturando um
caminho, buscando atender as necessidades dos estudantes, os
quais recebiam atendimento remotos semanais com duração
aproximada de uma hora. Os conteúdos selecionados pela
coordenação da pesquisa, distribuídos com as atividades síncronas
e assíncronas, totalizam180 horas de formação.
Sendo assim, na etapa teórica os professores cursistas assistem
aulas síncronas semanais e realizam as tarefas assíncronas
propostas, e na etapa prática, se organizam em equipes de dois ou
três cursistas para planejar e aplicar o PEI, tendo o suporte de um
professor articulador (integrante da equipe de pesquisa). O Quadro
01 sintetiza as diferentes fases do estudo.
103
Seguindo o protocolo do curso, após um contato inicial com um
familiar do estudante (por e-mail e/ou What’sApp), é explicado o
objetivo do estudo e solicitada a autorização para convidar o
estudante com deficiência intelectual sob sua responsabilidade. A
partir do aceite do responsável, a equipe combina um contato por
meio da plataforma Zoom para realizar o convite ao estudante. Neste
primeiro encontro é realizada a sondagem inicial, na forma de uma
conversa informal e/ou realização de atividades on-line (com
objetivo de coletar informações) visando obter conhecimento sobre
sua vida, expectativas e necessidades no contexto atual. Para
elaborar o PEI, essa etapa inicial é denominada “Etapa Introdutória”,
com aproximadamente 4/5 encontros virtuais da equipe com o
estudante. Após esse momento, as equipes definem os objetivos e
conteúdos a serem trabalhados em um formulário próprio.
A Figura 01 apresenta, de modo esquemático, a estrutura da
formação:
Planejamento
Etapa teórica Alfaletramento
do PEI
Fonte: a autora
104
Especial é a participação no AEE no contraturno escolar.
Entretanto, de acordo com o Censo Escolar de 2023, apesar do
aumento de matrículas de estudantes com deficiência no ensino
comum, a adesão a este tipo de atendimento tem se mostrado
estável nos últimos cinco anos, pois de 2019 a 2023, a porcentagem
de estudantes com acesso ao serviço passou de 40% para 42%
(Brasil, 2023). Um dado relevante para que possamos criar
estratégias que tornem este tipo de atendimento mais efetivo no
que concerne ao suporte para estes estudantes.
Até final de 2024, terão participado da proposta 240
professores cursistas e 45 estudantes com deficiência intelectual.
Vale destacar que os professores cursistas abrangem diferentes
estados do território brasileiro, por ser uma formação totalmente
remota. A adesão dos estudantes com deficiência intelectual
também tem índices de frequência excelentes, pelo fato de não
precisarem se deslocar no contraturno escolar para realizar as
atividades.
Sobre a relevância do curso, destacamos algumas falas dos
docentes cursistas:
105
Os relatos como das cursistas X, L e H validam a importância
da interação entre a formação teórica e prática, pois o desenho para
aplicação do PEI não se limitou a um protocolo e/ ou modelo a
seguir. O planejamento e aplicação na referida proposta exige a
pesquisa e o diálogo com os pares, assim como com os estudantes
para os quais o trabalho é dirigido.
Sendo o PEI uma estratégia de customização de atividades de
forma a constituir uma proposta pedagógica acessível, não cabe o
oferecimento de modelos prontos. Da mesma forma, não pode ser
elaborado sem informações pormenorizadas sobre o estudante.
106
pois para tal é necessário ofertar diferentes possibilidades de acesso
a uma educação de qualidade.
No contexto do estudo aqui discutido, o cerne da inovação
envolve duas temáticas contemporâneas, a saber: formação docente
para o ensino de leitura, escrita e letramento de estudantes com
deficiência intelectual e o atendimento educacional especializado
remoto, com destaque para o uso dos recursos tecnológicos para mediação
ao longo do curso.
Entendendo a relevância do domínio de habilidades como a
leitura, escrita e letramento como fundamentais para inserção
social e consequente vida independente, a formação realizada se
apresenta como uma oportunidade de acesso ao mundo letrado
para pessoas com deficiência intelectual.
107
Foi um grande desafio realizar a aplicação de forma remota. Tudo
era ainda muito novo dentro do contexto epidêmico. As cursistas
precisavam se apropriar das tecnologias digitais para realizar os
atendimentos e dar orientações e suportes para o estudante e sua
agente de apoio que tinham ainda menos conhecimento do uso das
tecnologias. No início as aplicações foram norteadas “pelas
tentativas e erros”, e aos poucos os participantes foram se
familiarizando com as ferramentas tecnológicas e as oportunidades
que elas vislumbravam.
108
PEI para o Alfaletramento com objetivo de sua manutenção no
mundo do trabalho.
Dentre as habilidades adaptativas, Marcelo apresentava uma
necessidade de apoio em algumas habilidades conceituais e
práticas, assim como o próprio alfaletramento. Os conteúdos do
Quadro 02 foram selecionados pela equipe de professoras no PEI
01 (o primeiro PEI) para serem priorizados. Entre outros aspectos,
o estudante precisava aprender a reconhecer os números em
diferentes contextos laborais, visto que foi identificado que ele não
tinha noção sequer do salário que recebia.
109
necessidade educacional específica requer, pois, a personalização
das atividades possibilita eliminar o que for uma barreira para
consolidação da aprendizagem.
Sendo assim, o rapaz que no final do ano de 2020 não sabia
lidar com o seu salário, ao longo da aplicação de quatro PEIs para
alfaletramento, adquiriu autonomia para fazer suas próprias
compras, utilizar cartão bancário, dentre outras habilidades
práticas. Na Figura 02, podemos visualizar uma atividade on-line
cujo objetivo era identificar o valor das cédulas para a compra de
um sorvete. Vale ressaltar que embora a aplicação do PEI fosse
totalmente remota, as atividades eram planejadas de forma
contextualizada com situações reais. A avaliação do estudante ao
final de cada uma das aplicações permitia uma gradação de
complexidade em relação ao conteúdo que era ensinado.
110
Figura 03 – Utilização do Google Earth
111
Até o momento de elaboração deste texto, está sendo
dinamizada a sexta turma da referida formação. Assim como
Marcelo, outras 31 pessoas com deficiência intelectual tiveram a
oportunidade de participar das atividades do PEI para a
alfabetização e letramento e 240 professores integraram esta
formação de caráter inovador.
No que concerne à temática aqui apresentada, a alfabetização
e letramento pelo viés do PEI constitui um trabalho pedagógico que
possibilita que a pessoa com deficiência intelectual desenvolva
uma vida independente. O relato de Marcelo, ao ser questionado
sobre a possibilidade de voltar a frequentar a escola especial, ilustra
bem essa proposição:
112
pelo estudante. Buscamos nessa formação docente a criação de
estratégias para o alfaletramento de estudantes com deficiência
intelectual a partir de experiências ricas e diversificadas, e
principalmente contextualizadas ao momento de vida de cada um.
Cabe pontuar que Marcelo é um dos 35 estudantes
participantes do estudo, a pesquisa ainda se encontra em
andamento. Nossa intenção é que o conhecimento compartilhado
seja amplamente divulgado, revisitado e aponte caminhos para que
estudantes com deficiência intelectual não tenham sua história de
vida limitada pela falta de acesso à alfabetização e letramento.
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114
Inclusão na universidade de pessoas com deficiência intelectual
e/ou transtorno do espectro autista a partir de um
projeto de extensão
115
barreiras, de modo que os participantes encontrem meios para
realizar a prova sem ter seu acesso ao conteúdo comprometido. Mas,
para além do cumprimento das leis que exigem a presença de
recursos técnicos, há esforços da educação escolar em favorecer o
rompimento de barreiras para acesso ao ensino superior brasileiro.
Entre as estratégias empregadas para a superação dessas
dificuldades estão os recursos de acessibilidade. No ENEM, seriam:
os códigos aplicáveis, adaptações arquitetônicas e estruturais,
recursos humanos especializados fluentes em línguas minoritárias,
entre outros.
116
a permanência e conclusão da graduação apresentam-se como
desafio para esses alunos, visto que há necessidade de se repensar
as práticas pedagógicas, os currículos, bem como sua futura
inserção no mercado de trabalho.
De acordo com os dados estatísticos do IBGE (2023), a taxa de
alunos com deficiência no ensino superior na idade entre 18 e 24
anos é de 14,3% enquanto os que não apresentam deficiência é de
25,5% nessa mesma faixa etária.
117
Em relação às matrículas no ensino superior, Junior, Silva e
Hillesheim (2024, p. 89) apontam que “Essa amostra gradativa de
ingresso de estudantes com deficiência nesse nível educacional
contrasta, aparentemente, com práticas discriminatórias e uma
cultura seletiva e elitista”. Compactuamos com essa posição, pois
ao olharmos para a Sinopse Estatística da Educação Superior de
2022, elaborada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep, 2023), verificamos que os
dados expressam um número significativo de matrículas em cursos
de graduação por pessoas com deficiência. Porém, ao compararmos
com as taxas dos estudantes sem deficiência, percebemos o quanto
o acesso ao ensino superior ainda é discriminatório e seletivo.
118
e Estado do Rio de Janeiro1. Englobando instituições públicas e
privadas das esferas federal, estadual e municipal. A partir desses
dados percebemos que ainda há grande necessidade de investir em
políticas públicas, ações afirmativas e acessibilidade para que os
sujeitos público-alvo da Educação Especial2 possam ingressar na
universidade.
1 Adotamos esses critérios, pois as discussões que apresentamos nesse texto são
referentes às pesquisas realizadas no estado do Rio de Janeiro na Universidade do
Estado do Rio de Janeiro – UERJ, com financiamentos Jovem Cientista do Nosso
Estado – Faperj, Programa de Apoio à Jovem Cientista Mulher com Vínculo em
Icts do Estado do Rio de Janeiro – Faperj e Prociência – UERJ/Faperj (Redig, 2023a,
2023b, 2023c).
2 De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da
119
presencial e a distância, englobando pessoas brasileiras (não
contabilizando brasileiros naturalizados e estrangeiros e pessoas
com deficiência intelectual e TEA. A partir desses dados,
observamos que o número de sujeitos com deficiência intelectual e
TEA no ensino superior ainda é baixo.
Analisando os dados referentes aos alunos com deficiência
intelectual, chama atenção é que há mais mulheres cursando
graduação do que homens, já com relação aos que apresentam TEA,
o cenário é inverso, apenas no Rio de Janeiro é que tem menos
homens em comparação às mulheres. Todavia, esses dados são
referentes às matrículas, não temos registros referentes aos índices
de conclusão de curso para analisarmos se esses estudantes
conseguiram permanecer e finalizar seus cursos.
Vale ressaltar que os dados apresentados se referem aos
estudantes com deficiência que conseguiram ingressar em um
curso superior. Entretanto, não se pode minimizar o fato de que
ainda há grande número de pessoas que não têm oportunidade de
frequentar a universidade, e para elas é preciso pensarmos
estratégias para que também possam vivenciar experiências no
espaço universitário, favorecendo seu amadurecimento e o
desenvolvimento de habilidades para vida independente.
120
repertório de experiências e aprendizagens para o
desenvolvimento de habilidades importantes para estar em
sociedade. Feitas essas considerações, o presente capítulo tem
como objetivo discutir dois cursos de extensão voltados para jovens
e adultos com deficiência intelectual e/ou TEA com a intenção de
vivenciar a universidade.
121
frequentar a universidade e vivenciar esse espaço é formativo para
qualquer pessoa. Portanto, é fundamental que sujeitos com deficiência
ou alguma necessidade específica na aprendizagem, tenham
oportunidades de experimentar atividades universitárias, mesmo
aqueles que sua escolarização, ainda não permita a aprovação para o
ingresso no Ensino Superior (Redig; Mascaro, 2023, p. 136).
122
facilitou que os alunos se colocassem em “seu lugar de fala” para
compreender os processos de inclusão e exclusão vivenciados por
eles e, também, produzidos por eles.
Sendo assim, foram realizados dois cursos de extensão,
conforme exposto na Figura 2:
123
protagonistas das suas ações e participassem do planejamento do
que foi trabalhado.
Avaliação coletiva
Decisão coletiva
Realização das
atividades Aluno assume o
seu lugar de fala
124
Os alunos com deficiência intelectual e/ou TEA puderam
vivenciar a universidade em seus diferentes espaços, tais como o
restaurante universitário, eventos, biblioteca, cantina, aulas,
palestras. Isso possibilitou o empoderamento do sujeito e da
construção do sentimento de pertencimento ao lugar, o que se
configura como um dos aspectos que traduzem a real inclusão. O
sucesso desta proposta mostrou que é preciso ter altas expectativas
em relação ao desenvolvimento e aprendizagem desses estudantes
para que seja possível apresentar e oferecer as ferramentas
necessárias para o rompimento de barreiras que denotam a
exclusão desses educandos.
125
que auxiliem nesse percurso de transição educacional para a vida
independente.
Por meio dos dados coletados nos cursos, percebemos que os
sentimentos de pertencimento e de empoderamento ficaram
marcados nas falas dos participantes com deficiência intelectual
e/ou TEA:
“Hoje não poderei lanchar com você, porque hoje é o meu dia de ir para a
universidade”. (Relato de um participante com TEA sobre a sua
conversa com a professora na escola)
“Já começa que, como vamos falar de inclusão sem ter pessoas com
deficiência no meio? E nessa disciplina temos: nós, futuros professores, e os
alunos de extensão trabalhando e pensando juntos! É uma aula que parece
126
mais uma roda de conversa em que temos total liberdade para nos
expressarmos”. (Relato de uma estudante do curso de Pedagogia)
Considerações finais
127
transdisciplinaridade, orientadas ao fortalecimento do diálogo e da
troca de epistemes e concepções de mundo.
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Rio de Janeiro. Educação, Sociedade & Culturas, n. 58, p. 97-115, 2021.
130
Interseccionalidade como ferramenta de análise para
entender as condições de permanência dos estudantes com
deficiência no ensino superior
131
Uma rede de crenças, processos e práticas que produz um
determinado tipo de corpo (o padrão corporal) que é projetado como
perfeito, típico da espécie e, portanto, essencial e totalmente
humano. A deficiência é então moldada como um estado diminuído
de ser humano (Campbell, 2001, p. 44).
132
predominantemente, para adequação do corpo às normatividades;
iii. acentuação da hierarquização das PcD, uma vez que para alguns
corpos a inteligibilidade não é alcançável; e iv. a emergência de
uma condição precária. As autoras apontam como marcadores
capacitistas da deficiência a vulnerabilidade, a fraqueza, a
anormalidade física e mental e a dependência.
Reduzidas à condição de deficientes, essas pessoas constroem
sua subjetividade atravessados pelos sistemas de opressão às quais
são submetidos. Subjetividade essa que, segundo Michel Foucault,
está relacionada com um modo de vida, ou seja, está ligada à
maneira como o sujeito se relaciona com o mundo, com as coisas,
com os outros, com o tempo. A subjetividade não se constitui em
algo fixo, imutável, ao contrário, se constrói e se transforma a partir
das experiências vividas pelos sujeitos (Foucault, 1986). Nessa
direção, narrativas capacitistas sobre as PcD moldam as
circunstâncias como são configuradas as relações com esses
indivíduos.
Por outro lado, pensar a deficiência desde uma perspectiva
emancipatória provoca uma ruptura com a lógica capacitista e
possibilita o surgimento de narrativas outras, que passam a ver e
compreender a deficiência sob o aspecto social, deslocando o olhar
do sujeito e sua deficiência de forma isolada, para a maneira como
as pessoas com deficiência se relacionam com o meio social da qual
fazem parte. Desta forma, o que ficam evidenciadas são as barreiras
que obstaculizam a participação social desses indivíduos.
O paradigma emancipatório ou investigação emancipatória
que vem norteando estudos mais recentes sobre a deficiência
(Gesser et. al, 2020) significa situar a deficiência como uma questão
política, de Direitos Humanos e de luta. Segundo Barnes (2003, p.
6), a investigação emancipatória se define como “a formação das
pessoas com deficiência através da transformação das condições
materiais e sociais de produção do conhecimento”.
É no contexto da investigação emancipatória que a
interseccionalidade surge como uma importante ferramenta
teórico-metodológica de luta política, tal como conceitua Akotirene
133
(2019). A interseccionalidade é um conceito advindo das Ciências
Sociais e, inicialmente, introduzido por autoras feministas negras
como uma forma de diferenciar e se contrapor ao chamado
“feminismo branco”.
Trata especificamente da forma pela qual o racismo, o
patriarcalismo, a opressão de classe e outros sistemas
discriminatórios criam desigualdades básicas que estruturam as
posições relativas de mulheres, raças, etnias, classes, entre outras.
Além disso, a interseccionalidade trata da forma como “ações e
políticas específicas geram opressões que fluem ao longo de tais
eixos, constituindo aspectos dinâmicos ou ativos do
desempoderamento” (Crenshaw, 2002, p. 177).
Para Collins e Bilge (2016), a interseccionalidade revela
relações de poder, atravessando os domínios capital, cultural,
disciplinar e interpessoal. Elucida as desigualdades sociais,
relações de poder interseccionais, contextos sociais,
relacionalidade, justiça social e complexidade.
Pelas lentes analíticas da interseccionalidade, a deficiência é
compreendida na intersecção com outras categorias como gênero,
raça, classe que, por sua vez, produzem e potencializam processos
de exclusão ou discriminação. Podemos dizer que a visão
interseccional da deficiência já estava anunciada desde a
Convenção Internacional sobre Direitos das PcD (ONU, 2006) e,
também, mais recentemente, na Lei Brasileira de Inclusão – LBI
(Brasil, 2015), que já apontam para singularidades da intersecção
entre a deficiência com a pobreza, a idade e o gênero.
Antunes e Martins (2022), ao trabalharem a relação entre
deficiência e classe, trazem dados que ilustram a importância de se
ter uma análise interseccional acerca do processo de inclusão
educacional. Dados do Censo de 2022 mostram que o percentual de
pessoas com deficiência no Brasil é de 8,9%, correspondendo a um
total de 16.240.000 brasileiros com deficiência. Entre os
respondentes, o censo constatou baixa escolaridade; baixa renda;
maioria de pessoas pretas, pardas e indígenas; e maioria de
mulheres, estas com menor nível educacional e inserção no
134
mercado de trabalho. Em relação a esse tópico, 29,2% da população
com algum tipo de deficiência está inserida no mercado de
trabalho, uma diferença significativa para a população sem
deficiência (54,7%). A desigualdade persiste quando observamos
que das pessoas com deficiência que estão inseridas no mercado de
trabalho, apenas 54,7% possuem ensino superior, enquanto esse
percentual é de 84,2% para as sem deficiência (IBGE, 2022).
Sobre o Ensino Superior, o panorama de acesso da pessoa com
deficiência é de crescimento, mas o fato é que essa população ainda
se encontra muito distante de uma participação expressiva, como
podemos verificar no quadro a seguir:
135
estudantes (Rio de Janeiro, 2003; Brasil, 2016). Os dados,
apresentados no Quadro 1, demonstram que a política de reservas
de vagas gerou um aumento nas matrículas no Ensino Superior,
indicando um avanço no processo de inclusão. Não obstante,
importa destacar que a mudança na legislação não vem
acompanhada de uma discussão ampla sobre o sistema acadêmico
das universidades, que certamente precisam ser revistos para que
esses estudantes sejam efetivamente incluídos. Conforme nos
apontam Antunes e Amorim (2020), existe uma cultura
universitária marcada por padrões de excelência que pressupõem
que apenas os “mais capazes”, alcançam êxito nos estudos.
Segundo Guimarães (2021) esse cenário se dá por ainda
vivenciarmos uma universidade que não se abriu plenamente para
a diversidade. O autor questiona o porquê de pouquíssimos
estudantes com deficiência adentrarem às universidades. Como
causa destaca o capacitismo estrutural que “potencializa as
barreiras na trajetória das pessoas com deficiência, até naqueles
processos destinados à acessibilidade e à inclusão desses sujeitos
na educação superior” (Guimarães, 2021, p. 126).
A exemplo do que ocorreu na Educação Básica, a chegada de
estudantes com deficiência nas universidades tem desafiado a
cultura institucional desses espaços, bem como as práticas
educativas e de gestão que historicamente foram construídas no
contexto do Ensino Superior. Gestores, docentes e demais
profissionais que trabalham nesse nível de ensino são desafiados,
cotidianamente, a lidar com a diversidade do alunado que
frequenta as universidades. Diferenças culturais, socioeconômicas,
étnicas, raciais, de gêneros, de credos, entre outras, têm feito com
que a cultura institucional das universidades seja questionada e
repensada (Amorim; Antunes; Santiago, 2019), mais ainda quando
observamos que deste ingresso, menos da metade dos estudantes
com deficiência consegue concluir o seu curso (Cabral; Melo, 2017).
O ingresso dos estudantes com deficiência no Ensino Superior
vai além do direito ao acesso. Implica o pertencimento, que
transcende a presença física e passa pela adequação do currículo,
136
pela formação de professores para o atendimento às necessidades
dos estudantes, pelo desenvolvimento de práticas pedagógicas
inclusivas, entre outros aspectos.
Destacamos que o ingresso desses estudantes, mesmo em um
quantitativo bem inferior ao total de matrículas no Ensino Superior,
traz ao sistema o repensar e reformular de uma trajetória muitas
vezes formatada e tradicional, que é insuficiente perante toda
diversidade encontrada. A pesquisa desenvolvida por Nascimento
(2024) ilustra essa preocupação nas falas dos coordenadores do
curso de Pedagogia de uma universidade pública do Rio de Janeiro,
os quais abordam a diversidade e interseccionalidade como fatores
que devem ser considerados:
Como é que a gente faz uma inclusão real, assim, no sentido das
pessoas...Um cara de classe média, branco, não tem a mesma
possibilidade, não é a mesma possibilidade uma pessoa negra,
periférica, que tenha alguma deficiência, desenvolver sua vida
acadêmica, participar de um grupo de pesquisa, de extensão, então,
137
a desigualdade está mais distribuída de uma forma às vezes sutil, às
vezes não, e a institucionalidade, às vezes, camufla muito essa
desigualdade (C3, 2023).
Estou com muita dificuldade pra estudar porque faço tudo pelo
celular e minha visão está piorando [...] (E2-Baixa Visão, 2023).
138
mostrar também que eu sou pobre, você tem que provar que você
mora na favela, a casa que você tinha, arrumar testemunha, fazer
declaração a mão... pro laudo de deficiência não porque eu sempre
tinha o laudo de pessoa com deficiência. Eu não sabia que tinha que
comprovar isso tudo. Isso pra mim era tudo muito novo, quem ia me
ajudar? Minha mãe não sabe, meu padrasto também não e era muita
coisa [...] (E3-Surda, 2024).
139
deficiência, os impactos e o suporte que o Núcleo de Apoio à
Inclusão (NAI) tem sobre a sua permanência nos cursos de
graduação (Antunes; Braga, 2023).
Ter alguém pra mediar traz um certo conforto de que não terei que
lutar minhas batalhas sozinha e que caso necessário terei alguém
para traduzir a comunicação com meus professores (E6- Transtorno
do Espectro do Autismo, 2023).
140
Como esclarecem Di Blasi et al., (2024), a realidade legal
brasileira, apesar de seus evoluídos marcos e políticas públicas
voltadas à PcD, ainda não transitou satisfatoriamente do contexto
assistencialista a uma realidade emancipatória. Reconhecemos que
mudar a cultura universitária não é tarefa simples, mas
considerando que o processo de inclusão é dialógico e se constrói
cotidianamente, ter os estudantes com deficiência no Ensino
Superior é uma oportunidade ímpar para que a universidade se
repense no sentido de lidar com as diferenças e promover práticas
inclusivas, dentro e fora da sala de aula.
Aprender com esses estudantes através do feedback de quem
vivencia os processos inclusivos, é fundamental para alcançar um
espaço que de fato seja para todos, valorizando o lema da pessoa
com deficiência “Nada sobre nós, sem nós”. Considerar as
necessidades específicas de cada estudante com deficiência
contextualizadas à sua realidade de vida, também se faz primordial
nesse processo em que o estudante, em grande parte dos casos, tem
sua entrada garantida por lei, mas ainda não tem sua permanência
respeitada no Ensino Superior.
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145
146
As autoras e os autores
147
Joab Grana Reis
Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Educação
(ProPEd/UERJ). Mestre em Educação pelo Programa de Pós-
graduação em Educação (PPGE/UFAM). Especialização em
Psicopedagogia e Interdisciplinaridade (ULBRA/AM). Professora
Adjunta da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
Coordenadora Geral do Comitê Gestor das Políticas de Inclusão
das Pessoas com Necessidades Específicas na UEA. Coordenadora
do Núcleo de Inclusão da Escola Normal Superior (ENS/UEA).
Pesquisadora e Vice-líder do Grupo de Pesquisa Educação
Inclusiva e o Aprender na Diversidade (UEA). Pesquisadora do
Laboratório de Políticas, Pesquisa e Práticas Educacionais em Altas
Habilidades/Superdotação (LAPEAHS/UFPR).
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4326050959750580
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8560-1830.
148
Paula Naranjo da Costa
Mestre pelo Pós-graduação em Educação em Ciências na Amazônia
(PPGEC/UEA). Graduada em Pedagogia pela Universidade do
Estado do Amazonas (UEA). Professora efetiva de Educação Especial
da Secretaria de Estado de Educação do Amazonas (SEDUC), atuando
como pedagoga no Centro de Apoio Educacional Específico - CAESP,
na Escola Estadual de Atendimento Específico Mayara Redman
Abdel Aziz. Experiência nas áreas de Deficiência Intelectual e
Transtorno do Espectro Autista.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4165988356941168
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-4303-6188
Rosana Glat
Doutora em Psicologia Social pela Fundação Getúlio Vargas do Rio de
Janeiro (FGV-RJ). Professora Titular da Faculdade de Educação da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), atuando no Programa
de Pós-graduação em Educação (ProPEd/UERJ) e no Curso de Pedagogia
na modalidade EAD. Assessora da Diretoria Científica da Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado Rio de Janeiro (FAPERJ). Diretora de
Pesquisa, Extensão e Pós-graduação da Faculdade APAE-Brasil Dr.
Eduardo Barbosa, da Federação Nacional das APAEs. Pesquisadora
Cientista do Nosso Estado pela FAPERJ e bolsista de Produtividade em
Pesquisa IC do CNPq. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Inclusão e
aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais:
práticas pedagógicas, cultura escolar e aspectos psicossociais.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3913283461109185
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-0186-1342
Suzanli Estef
Doutora em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (ProPEd/UERJ). Professora
Adjunta do Departamento de Educação Inclusiva e Continuada da
Faculdade de Educação da UERJ, atuando no Programa de Pós-graduação
em Educação e no Curso de Pedagogia, nas modalidades presencial e
EAD. Coordenadora de disciplina do Curso de Especialização Educação
Especial e Inovação Tecnológica, (UFRRJ / CEDERJ). Coordenadora do
149
Laboratório Universal de Planejamento em Acessibilidade na Avaliação –
LUPAA/UERJ.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5103676278019238
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-3354-6598
150
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