Jornalismo: Imprio Romano e Idade Mdia

As Actas romanas: primeiros jornais

Os romanos, depois de conquistarem a Pennsula Itlica, expandiram seu territrio por praticamente todo o entorno do Mar Mediterrneo, incluindo o norte da frica, Egito, Iraque, Turquia e Grcia. Alcanou tambm a maior poro da Europa Ocidental, estendendo-se ao norte at as ilhas Britnicas. A fora imperial venceu todas as resistncias com um exrcito bem preparado e com muitos recursos.

No seu apogeu, o Imprio precisava manter sua hegemonia por um territrio extenso e difcil, com diversidade cultural dos povos locais, diferenas geogrficas acentuadas, incluindo cadeias montanhosas quase intransponveis, vales, rios e mares (Mediterrneo e Canal da Mancha), com variaes extremas de temperatura e relevo. Os meios de transporte, alm da prpria sandlia, no iam alm do cavalo e das embarcaes.

Como manter uma presena dominadora em todas essas regies, promovendo tambm sua integrao com a capital do Imprio?

Claro que a fora militar era importante, mas junto com a fora e a dominao fsica era preciso uma imposio cultural do Estado Romano, forando os povos, alm de outras imposies, a adotarem o latim como lngua oficial, garantindo uma unidade. Essa lngua oficial, amalgamada com as lnguas locais e as variaes populares, deu origem s lnguas neolatinas (portugus, francs, italiano, espanhol, etc.)

As estradas romanas, retas e meticulosamente traadas, exerceram um papel importante para essa integrao, possibilitando alm dos deslocamentos das produes agrcolas e das riquezas, a comunicao entre as diferentes regies com um servio de correio imperial, o cursus publicus, onde funcionrios autorizados levavam as mensagens, contando com um servio estrategicamente localizado de mudas de cavalos, permitindo viagens onde a distncia entre as povoaes era de mais de um dia. Assim, o Imprio Romano contava com um eficiente sistema de comunicao que alcanava longas distncias, algo nunca feito e que no foi facilmente superado aps seu declnio.

Utilizando-se dessa estrutura de distribuio de mensagens, Julio Cesar determinou a circulao das Actas Diurnas (Actae Diurnae), provavelmente surgidas no sc. II a.C., possivelmente em 131 a.C., como um importante instrumento para manter a presena do estado romano no territrio, servindo como um dirio oficial para divulgar os atos governamentais, decises do senado e feitos do imperador. Constituram-se no primeiro exemplo de jornalismo na histria da humanidade, escritas por magistrados, escravos e funcionrios pblicos, os diurnarii ou actuarii, que podem ser considerados os primeiros jornalistas, responsveis pela tarefa de recolher as informaes, redigir os textos e afixar as Actas, mesmo que possivelmente fossem obrigados a registrar o que lhes era ditado pelo Senado. provvel a existncia de oficinas editoras de Actas, como uma empresa jornalstica, que para alcanar um pblico maior e vender seu produto, acrescentavam alm da cpia do texto oficial, informaes de produo prpria, como notcias cotidianas e fofocas sociais.

Registradas mo em bases de madeira, as Actas Diurnas eram expostas na praa central dos povoados para que todos os cidados pudessem ler e comentlas, numa atividade pblica. Porm h indcios de que eram copiadas em placas de cera de abelha para depois serem registradas em papiros para a leitura em recintos particulares. Nesse processo de reescrita e sem um controle rgido, com uma interferncia pessoal a cada cpia, muito possivelmente eram includas novas informaes de toda ordem, indo alm das sentenas de tribunais, dados de nascimentos, mortes, casamentos e divrcios.

As Actas passaram por um processo de segmentao, como no jornalismo atual, surgindo outras Actas direcionadas a pblicos especficos, como a Acta Populi com registros dos acontecimentos do povo e tambm outras de carter oficial como a Acta Civilia (registros civis), Acta Iudiciaria (sentenas judiciais), Acta Militaria (registros de nomes de homens incorporados nas Legies).

Segundo SOUSA (pg. 42) as Actas Diurnas tiveram as seguintes caractersticas comuns aos jornais atuais: 1. Periodicidade mais ou menos regular, presumivelmente quotidiana em algumas fases; 2. Frequncia da publicao;

3. Contedos multifacetados de carter noticioso (a notcia o ncleo da informao);

4. Corpo de escribas (os diurnarii ou actuariii, os primeiros jornalistas) destinado exclusivamente redao das Actas (o Cdigo de Teodsio faz-lhes referncia e procura regular a sua funo, sendo a primeira manifestao de controlo jurdico dos profissionais da informao); 5. 6. Difuso pblica da informao; Difuso distncia e, dentro das circunstncias, massiva;

7. Uso de diferentes suportes para a mesma mensagem (jornal de parede e jornal manuscrito, presumivelmente em papiro); 8. Iniciativa editorial do estado e tambm de particulares (abertura da publicao de Actas iniciativa privada, como se de uma empresa jornalstica se tratasse).

Aps 400 anos de circulao ininterrupta, quando serviram para criar sentimentos de identidade e lealdade entre os habitantes, as Actas acabaram junto com o declnio do Imprio, quando o Imperador Constantino transferiu a sede imperial para Constantinopla em 330 d.C.

Fenmenos pr-jornalsticos na Idade Mdia

O Imprio enfraquecido pela incapacidade de conquistar novos territrios, arrebanhar mais escravos e manter o soldo dos militares nas fronteiras, ruiu com as invases brbaras. A Igreja Catlica se fortaleceu em toda a Europa Ocidental, com o aparecimento de regimes apoiados nos seus dogmas.

Com o poder apoiado por um monoplio catlico do conhecimento, durante um perodo de 1000 anos contados aps o declnio do Imprio Romano (sc. IV e V) e o Renascimento (final do sc. XIV), conhecido como Idade Mdia, o conhecimento racional da antiguidade clssica ficou obscurecido. Segundo SOUSA (pg. 44), a Idade Mdia na Europa caracterizou-se por:

1. O sistema feudal, marcado pelo domnio dos detentores do poder e das terras os nobres e clrigos sobre os camponeses servis, que a cultivavam; a sociedade era nitidamente estratificada em trs classes: a nobreza, o clero e o povo;

2. A ruralizao da sociedade europeia, devido ao abandono das cidades e conteno destas em muralhas defensivas asfixiantes; 3. O declnio das trocas comerciais e culturais;

4. O ensino escolstico e teocrtico, frequentemente fundado na f e no na razo e no intelecto, e mesmo assim reservado quase exclusivamente aos religiosos; a retrica, porm, continua a ser estudada; 5. O domnio hegemnico da Igreja Catlica e das suas doutrinas sobre a sociedade e a cultura, com perseguio feroz aos hereges e aos suspeitos de feitiaria; 6. As cruzadas, primeiro movimento posterior ao Imprio Romano a, para o bem e para o mal, abrir novos horizontes Europa; 7. As viagens de Marco Polo e de outros viajantes e as suas crnicas de viagem, que abrem janelas para mundos desconhecidos; 8. As guerras interminveis, por motivos de conquista de territrio, disputa de tronos, etc.

A nova realidade deixou de ser favorvel ao desenvolvimento do jornalismo. As livres trocas de informaes e circulao das novidades limitaram-se transmisso oral atravs dos comerciantes, guerreiros e peregrinos que circulavam entre as regies. Os relatos noticiosos e as sentenas eram transmitidos populao pelos pregoeiros.

Apesar do monoplio da Igreja sobre a escrita, podem ser citados como exemplos de fenmenos pr-jornalsticos as crnicas medievais, as cartas informativas e os relatos de viagens.

Crnicas medievais as antepassadas da reportagem

As crnicas medievais esto no limiar entre o registro histrico, literatura e jornalismo. So documentos que relatam os acontecimentos vividos principalmente pelos nobres, alguns preocupados em elogiar os senhores e outros em descrever os fatos, com um estilo de registro histrico e jornalstico, com caractersticas textuais que so encontradas no jornalismo atual, como citaes diretas e parafraseadas, registros de impresses pessoais e emoes do narrador, como a tradio impressiva e subjetiva aberta pelo Novo Jornalismo nos anos 60 do sc. XX. Tambm pode ser observado o uso do excerto, ou seja, o uso de frases ou textos extrados de uma obra.

Alm da forma, havia uma preocupao com assuntos de interesse, como personalidades da elite envolvidas em casos de crime e morte, alguns com apelo sensacionalista. So encontradas tambm referncias a aspectos comuns da vida cotidiana, como descries de caadas.

Cartas

Elaboradas por monges, cronistas, diplomatas, funcionrios de mercadores e outras personalidades, serviam para noticiar e comentar sobre lugares distantes. Tinham uma estrutura clssica para narrar as novidades, embora seguindo um gnero prprio das cartas (epistolar), uma estrutura que ainda usada em alguns textos jornalsticos.

Relatos de viagens

Como acontece nas crnicas, os relatos de viagens tambm tm caractersticas de reportagem, com descries dos costumes, dos animais, dos lugares e dos povos, saciando o desejo de conhecimento sobre lugares distantes.

Concluses

No difcil imaginar a dificuldade para manter a distribuio das Actas Diurnas, basta ligar a TV num canal de esportes e ver o esforo dos atletas atravessando uma rea montanhosa num evento de vero como o Tour de France de ciclismo. A quantidade de recursos e pessoas envolvidas para a confeco e distribuio de um dirio sem a tecnologia de reproduo e meios de transportes recentes, mostra o quanto o jornalismo, atravs das Actas Diurnas, foi importante para o Imprio Romano. So poucos os indcios sobre a existncia de mecanismos que garantissem a reproduo fiel dos contedos, o que nos permite tambm imaginar que o papel dos jornalistas das Actas possa ter sido maior do que meros escribas com a funo de apenas registrar ditados, pois a reproduo por cpia permite interferncias pessoais. Ainda que sob um cenrio desfavorvel, os documentos produzidos na Idade Mdia mostram que o domnio da Igreja no foi to supremo, pois no calou a

curiosidade e a necessidade da busca do conhecimento que vai alm dos limites dos dogmas. As estruturas formais dos textos, mesmo mantendo muitas caractersticas peculiares da poca, tiveram poucas transformaes, sendo utilizadas ainda hoje, mostrando que a estrutura do pensamento humano permanece a mesma, ou seja, somos iguais, distanciados pelo tempo.

Grupo: Luciano Biagio Toriello redator, Rafaela Mota, Talita Mota, Alberto Andrade, Anderson Correa. Posted 5th September 2011 by TURMA 2011 - FCSAC-UNIVAP