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H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9
Muitos executivos acham que já é bastante difícil dominar as práticas
atuais da tecnologia da informação e alegam que o futuro pode esperar.
Será que pode? Para imaginar o impacto da tecnologia da informação (TI) na
organização das empresas, basta pensar que, hoje, boa parte dos funcionários
possui capacidade, autoridade e responsabilidade para tomar decisões.
Por isso, a maneira como acessam a informação e o uso que fazem dela têm
consequências monumentais: podem levar à produtividade ou à bagunça.
Ou seja, é bom que os executivos comecem a dedicar-se rapidamente a
esse assunto.
No Georgia Institute of Technology, de Atlanta, Geórgia, EUA, com
abordagem prática da tecnologia, um grupo de especialistas de campos
tão variados como engenharia, economia, arquitetura, gestão de empresas
e políticas públicas estuda o que está por trás dos desafios atuais da TI.
Cinco membros desse grupo –Gary Tjaden, Alan A. Porter, Judith P. Carlisle,
Daniel S. Papp e Peter G. Sassone– reuniram-se com o jornalista Gary
Abramson, da equipe de jornalistas da revista CIO, para uma mesa-
redonda no campus do Georgia Tech.
Mesa-redonda com os professores do Georgia Institute
of Technology, o Georgia Tech, sobre o impacto –muitas vezes
não percebido– da tecnologia da informação em vários setores
TECNOLOGIA
como devem fazer seu trabalho.
São todos especialistas. A tarefa da
empresa é, portanto, conseguir
que todos trabalhem em conjunto,
porque o conhecimento é um
recurso inesgotável. Quanto mais
pessoas se sentarem a uma mesa
para trocar idéias, como estamos
fazendo aqui, mais conhecimentos
novos surgirão. O segredo é saber
como estimular os trabalhadores do
conhecimento a compartilhar esse
conhecimento, produzindo novas
informações e utilizando-as de
maneira totalmente nova.
PAPP – Acho que devemos falar
em “uma maneira nova e produti-
va”. A forma como temos acesso ao
conhecimento e o utilizamos pode
levar à produtividade, mas também
pode gerar confusão.
CARLISLE – A própria tecnologia
altera a maneira de trabalhar das
empresas. Na University of Arizona
estamos trabalhando muito com os
sistemas de apoio à tomada de
decisões. Nesses sistemas as pessoas
interagem com computadores, em
vez de interagirem entre si. Colo-
cam seus comentários no micro e
permanecem no anonimato.
Esses sistemas são muito eficien-
tes para chegar ao consenso em
grupos muito diversificados, mas
não estimulam as pessoas a apresen-
tar suas melhores idéias. Quando a
discussão acontece pessoalmente,
A TI muda
Como a tecnologia da informação
está afetando o funcionamento das
empresas?
TJADEN – Nós analisamos um
banco de dados com cerca de mil
empresas e descobrimos que
aproximadamente 80% estão
gastando mais com atividades de
informação e criação de ativos
intelectuais do que para buscar
retorno sobre o capital investido.
É natural que esse tipo de empresa
se preocupe mais em obter um
retorno das atividades de informa-
ção do que de ativos fixos ou
qualquer outro tipo de capital.
Parece-me que essa é uma das
preocupações das empresas do
conhecimento hoje em dia.
Como isso altera a organização das
empresas e o trabalho de seus
funcionários?
TJADEN – Imagine o que aconte-
ceria se virtualmente todos os
funcionários de uma empresa
fossem trabalhadores do conheci-
mento –todos com capacidade,
autoridade e responsabilidade para
definir o que fazem e como fazem;
todos com poder para tomar
decisões. Não podemos dizer-lhes
A TI muda
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➙
H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9
StockPhotos
podemos receber o crédito por
nossas idéias, o que não ocorre
quando se mantém o anonimato.
Essa tecnologia, portanto, apesar
de facilitar as reuniões de grupos
grandes, leva a tomar decisões
menos eficazes.
As empresas estão tirando o máxi-
mo proveito da TI?
SASSONE – Do ponto de vista do
uso comercial da tecnologia da
informação, nos últimos três a cinco
anos todos parecem geniais, pois a
economia vem tendo um desempe-
nho excelente e algumas empresas
estão registrando lucros recordes.
A tendência, então, é dizer: “Até
que enfim a TI está compensando”.
Na minha opinião, ainda dispomos
de poucos dados para chegar a uma
conclusão. Uma série de fatores
importantes –como os baixos custos
da energia, as características da
geração do baby boom, o fim da
Guerra Fria etc.– foi o que provavel-
mente garantiu uma boa parcela
desse período de prosperidade.
Muitas empresas dependem,
para crescer, de maior acesso
a informações sobre os clientes.
É possível que os clientes um dia
se recusem a cooperar porque não
querem que alguém que sabe onde
eles passam as férias e fazem com-
pras fique ligando para sua casa?
PORTER – Se a empresa que
deseja utilizar informações sobre
os clientes o fizer de maneira
criteriosa, vai sempre dispor de
muito espaço para uma exploração
eficaz. Mas, se isso for feito sem
critério, os clientes se revoltarão
e se negarão a colaborar.
CARLISLE – Já vimos isso acontecer
quando a America Online estava
coletando dados para lançar um CD
tudotudo
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com algumas informações sobre seus
clientes. O fato é que, de um mo-
mento para outro, temos nas mãos
ferramentas para análise de dados
que jamais tivemos antes. O conheci-
mento que as empresas têm sobre os
clientes não está em sintonia com o
conhecimento que as pessoas têm
sobre o mundo a seu redor.
TJADEN – Isso vale para tudo hoje
em dia. Podemos conceber uma
nova ferramenta, uma nova maneira
de fazer alguma coisa. Para nós isso
pode soar perfeitamente normal
e lógico. O maior desafio de um
empresário é criar uma empresa
com base em uma nova idéia e
fazer com que as pessoas realmente
entendam essa idéia.
A adoção da videoconferência e
de outras novas tecnologias altera
fundamentalmente a maneira como
as pessoas trabalham em equipe?
PAPP – Um dos efeitos da video-
conferência é o fato de a interação
humana imediata desaparecer. Mas
ainda há muita gente que gosta de
conversar cara a cara.
CARLISLE – O fato de saber que
existirá um registro permanente da
interação entre as pessoas –e de
saber que daqui a dez anos alguém
vai poder recuperar um arquivo e
ver o que estava realmente aconte-
cendo naquela sala– pode afetar os
relacionamentos.
SASSONE – Existe certa rejeição ao
uso da tecnologia para facilitar
reuniões. Há dez anos pensava-se
que essa seria a tendência do
futuro, porque seria possível regis-
trar o que era dito de maneira
exata. E isso não aconteceu, pelo
menos em muitos casos, porque as
pessoas não querem que suas
palavras sejam gravadas literalmente
–elas querem sempre ter alguma
“margem de manobra”.
CARLISLE – É possível até mesmo
O conhecimento que as empresas têm
sobre os clientes está além do conhecimento
das pessoas sobre o mundo
que haja uma reação social negativa
em relação à tecnologia da informa-
ção. E que precisemos arrastar
pessoas esperneando e gritando
para a Era da Informação ou
simplesmente abandoná-la.
PAPP – Muitas pessoas estão
bastante dispostas a usar as novas
tecnologias. Mas é necessário que
tenham os recursos necessários para
aprender como fazê-lo. É muito
comum ver empresas colocando
novas tecnologias à disposição dos
funcionários, mas é pouco comum
vê-las se preocupando em destinar
recursos para treiná-los de maneira
adequada.
CARLISLE – Eu tenho alguma
aversão à tecnologia. Acho que hoje
vivemos muito em função da
rapidez. Somos muito interrompi-
dos quando estamos trabalhando.
Atendemos o celular, recebemos
um fax, o pager toca. E a quantidade
de trabalho que precisamos fazer
em 8 horas está aumentando
dramaticamente, embora hoje
em dia não trabalhemos apenas
8 horas, mas 10 ou 12.
As pessoas vão se adaptar?
CARLISLE – Eu não tenho certeza
de que as pessoas possam se adap-
tar. E acho que, à medida que se
tornarem mais bem informadas e
começarem a entender realmente
o que é essa tecnologia, elas talvez
decidam que não a querem tão
presente em sua vida. Também é
possível que muitas das previsões
que estamos fazendo hoje sobre a
necessidade da TI, de sua integra-
ção e aceitação, não se tornem
realidade.
PORTER – A tecnologia terá de
evoluir, e nós junto com ela. A
videoconferência, por exemplo,
assim como outras expectativas
iniciais, evoluirá e poderemos
transformar a tecnologia ou utilizá-
la para alguma coisa que ninguém
teria imaginado ser possível.
SASSONE – A tecnologia evoluirá
exatamente para resolver o tipo de
problema que estamos levantando
aqui. Por exemplo: desenvolvendo
filtros automáticos para chamadas
telefônicas e para e-mails, propician-
do maior privacidade.
Qual é o impacto da revolução
da informação nas empresas que
atuam em escala mundial?
PAPP – A globalização, que é em
parte um fenômeno resultante
dessa própria tecnologia, nos
permite conversar com as pessoas,
ver seu rosto e enviar informações
em questão de minutos. Mas ainda
existe muita gente por aí –e não
necessariamente no Irã, no Iraque
ou no Camboja; algumas em nosso
país mesmo– que simplesmente não
quer receber idéias, informações ou
conceitos “alienígenas” que possam
influenciar sua maneira habitual de
fazer as coisas. Esse é um dos
problemas reais da Era da Informa-
ção. Ou seja, o potencial para atuar
em escala mundial versus o ressenti-
mento das pessoas que vêem seus
hábitos ameaçados.
TJADEN – A revolução da informa-
ção força a empresa a mudar da
produção em massa para a persona-
lização em massa. A necessidade de
um cliente do Irã é diferente da
necessidade de um do Sudão. Na
revolução da informação, o papel
de uma empresa bem-sucedida é
descobrir como satisfazer essas
diferentes necessidades.
A videoconferência, por ser um registro
permanente da interação entre as
pessoas, pode afetar relacionamentos
105
➙
H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9
SASSONE – Na minha opinião, o
mais provável é que nos próximos
10 ou 20 anos os ricos fiquem cada
vez mais ricos e os pobres cada vez
mais pobres.
PORTER – Eu acredito que a
disparidade se tornará ainda maior
porque as bases para a geração da
riqueza estão sendo alteradas. Todo
o nosso sistema de distribuição da
riqueza baseia-se em um esquema
ultrapassado da era industrial, pelo
qual se recompensava o trabalho e o
capital. E isso está mudando. O que
colocar no lugar? Não sei. E o que
me assusta, nesse ambiente tão
globalizado, é não conseguir sequer
imaginar quem teria a autoridade
necessária para fazer essa mudança.
CARLISLE – A adoção da tecnolo-
gia da informação gera, muitas
vezes, o caos. É possível, entretanto,
que vejamos pessoas ou grupos que
não conseguiram acumular riqueza
por meio dos meios convencionais,
fazendo-o pela TI. Pensemos na
quantidade de jovens das classes
menos favorecidas que conseguem
comprar um computador. E talvez
eles nem precisem de uma boa
StockPhotos
Mas, se quisermos ter um produ-
to baseado em informação sofistica-
da para vender na Arábia Saudita,
devemos nos assegurar de que os
clientes não apenas queiram esse
produto, mas também tenham os
recursos necessários para utilizá-lo.
O que adianta planejar vender um
computador para um país pobre da
África se não há eletricidade, se as
pessoas não sabem digitar?
SASSONE – A empresa é que deve
resolver esse problema. Como, na
realidade, será construída a infra-
estrutura de sustentação da Era da
Informação?
TJADEN – Parte do problema pode
ser simplesmente contornada. Basta
observar o que está sendo feito em
relação aos satélites e telefones de
órbita terrestre baixa. Com essa
tecnologia, não é preciso instalar
cabos no deserto do Saara para ter
o mesmo tipo de serviço telefônico
que temos aqui.
A TI vai alterar o equilíbrio entre
poder político e econômico do
mundo?
PAPP – Para mim, essa é a questão
mais fascinante de toda a Era da
Informação: à medida que a tecno-
logia da informação leva à criação
de riqueza, e a capacidade de
utilizar as novas tecnologias da
informação está limitada a determi-
nados participantes –sejam Estados,
empresas multinacionais, organiza-
ções governamentais e não-governa-
mentais–, a tecnologia da informa-
ção deve criar um padrão cada vez
mais distorcido de distribuição da
riqueza em escala mundial, entre
sociedades e dentro das sociedades.
O desafio, para as empresas e para
os governos, é como resolver o
problema da distribuição da riqueza
no futuro de maneira mais justa.
TJADEN – Eu acredito que esse é
um problema que se resolve por si
e não deve ser motivo de preocupa-
ção. As multinacionais estão extre-
mamente motivadas a distribuir
qualquer coisa que produzam para
um mercado o mais amplo possível.
E elas serão forçadas a fazer isso por
meio da personalização em massa e
não da produção em massa. Hoje em
dia esse movimento é mais poderoso
do que os governos nacionais.
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H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9
N
Uma limitação das empresas será a
disponibilidade de trabalhadores do
conhecimento, mais qualificados
escola, porque podem aprender por
meio de programas de computador.
De repente vemos que um país
como a Índia, que não teve nenhu-
ma grande oportunidade de cons-
truir a riqueza, tem essa possibilida-
de agora.
De que forma o acesso global à
informação modificará a maneira
como empresas e governos atuam?
PAPP – Estamos testemunhando
como o fluxo de informações que
atravessa fronteiras via Anistia
Internacional e outras organizações
de direitos humanos vem influen-
ciando a maneira como alguns
governos tratam seus cidadãos.
Organizações não-governamentais,
como o Greenpeace e o Environ-
ment Watch, estão desempenhando
papel importante de pressão sobre
os governos para acabar com os
programas de testes nucleares,
por exemplo.
CARLISLE – Coisas que não tería-
mos como saber –como foi o caso
das práticas trabalhistas da Nike nos
países emergentes– hoje são de
conhecimento público.
Quais os limites das empresas para
explorar a tecnologia?
TJADEN – Uma limitação das
empresas será a disponibilidade
de trabalhadores do conhecimento.
E outra será sua capacidade de
organizar o trabalho do conheci-
mento de maneira produtiva. Ainda
não sabemos muito bem como fazer
isso. Somente um terço dos adultos
tem educação superior nos Estados
Unidos. Não que eu ache que
alguém precise de um diploma de
faculdade para ser um trabalhador
do conhecimento –e Bill Gates é um
bom exemplo. Entretanto, é preciso
mais e não menos conhecimento e
formação para ser um bom traba-
lhador do conhecimento.
Quais são os riscos para as empre-
sas com extrema dependência da
informação impulsionada pela TI?
CARLISLE – Depois que adotarem
uma tecnologia, as organizações
talvez não consigam sobreviver a
uma falha tecnológica. Digamos
que sua empresa forneça um serviço
baseado na análise de informações,
e você tem um contrato para
cumprir. E sabe como uma falha da
tecnologia pode afetar seu serviço.
Portanto, você pode se proteger
incluindo uma cláusula no contrato
que o isente de responsabilidade no
caso de falha. Mas, se você não
souber quais as chances de ocorrer
a falha –coisa que as pessoas em
geral não sabem– , não terá como se
proteger.
Existe também o risco de um
fracasso econômico de grandes
proporções caso a infra-estrutura
de TI seja danificada?
PAPP – O potencial de um fra-
casso catastrófico, intencional ou
não, foi bem realçado no relatório
preparado em 1997 pela Comissão
de Proteção da Infra-Estrutura
instalada pelo presidente Bill
Clinton. Esse relatório é assustador
quando fala do impacto que
uma falha nos aplicativos que
hoje controlam a maioria das
coisas teria na vida dos cidadãos
norte-americanos.
Aparentemente, ainda estamos
muito longe de dominar por com-
pleto nossas tecnologias...
PAPP – A melhor maneira de
demonstrar isso é lembrar a falha
do satélite que aconteceu em maio
de 1998. Vocês lembram como
muitos de nossos amigos –e nós
mesmos– deram graças a Deus por
se livrarem, pelo menos por um
tempo, daquele maldito bipe
tocando sem parar no bolso?
Por outro lado, muitos de nós
também disseram que o motivo
pelo qual não podíamos desligar
o bipe, mesmo quando o satélite
voltasse a funcionar, era porque o
pessoal do escritório precisava
garantir um contato permanente
conosco. É assim que pensamos, e
é assim que os outros pensam:
eles esperam que respondamos
imediatamente porque temos a
tecnologia para isso.
TJADEN – Um dos princípios
básicos da “organização que apren-
de” é o domínio pessoal. Significa
que uma pessoa já se desenvolveu
a ponto de poder se dar ao luxo de
desligar o bipe, se isso for o certo
a fazer para garantir sua eficácia
básica. Se quiserem realmente
aproveitar os frutos da revolução da
informação, as empresas precisarão
aprender a treinar seus funcionários
sobre como se comportar.
© CIO
Saiba mais sobre os
participantes
GARY TJADEN é diretor do Center for
Enterprise Systems e professor do
College of Management do Georgia
Tech.
ALAN A. PORTER é professor de
engenharia industrial e sistemas e
de políticas públicas e diretor do
Technology Policy and Assessment
Center.
JUDITH P. CARLISLE é professora da
Texas A&M University, College Sta-
tion, Texas, e foi professora assistente
do grupo de gestão da tecnologia
da informação do College of Mana-
gement até junho de 1998.
DANIEL S. PAPP é presidente interino
da Southern Polytechnic State
University, de Marietta, Geórgia,
e professor da Sam Nunn School
of International Affairs.
PETER G. SASSONE era professor de
economia e tecnologias de gestão
do Georgia Tech.

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A ti muda

  • 1. 102 H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9 Muitos executivos acham que já é bastante difícil dominar as práticas atuais da tecnologia da informação e alegam que o futuro pode esperar. Será que pode? Para imaginar o impacto da tecnologia da informação (TI) na organização das empresas, basta pensar que, hoje, boa parte dos funcionários possui capacidade, autoridade e responsabilidade para tomar decisões. Por isso, a maneira como acessam a informação e o uso que fazem dela têm consequências monumentais: podem levar à produtividade ou à bagunça. Ou seja, é bom que os executivos comecem a dedicar-se rapidamente a esse assunto. No Georgia Institute of Technology, de Atlanta, Geórgia, EUA, com abordagem prática da tecnologia, um grupo de especialistas de campos tão variados como engenharia, economia, arquitetura, gestão de empresas e políticas públicas estuda o que está por trás dos desafios atuais da TI. Cinco membros desse grupo –Gary Tjaden, Alan A. Porter, Judith P. Carlisle, Daniel S. Papp e Peter G. Sassone– reuniram-se com o jornalista Gary Abramson, da equipe de jornalistas da revista CIO, para uma mesa- redonda no campus do Georgia Tech. Mesa-redonda com os professores do Georgia Institute of Technology, o Georgia Tech, sobre o impacto –muitas vezes não percebido– da tecnologia da informação em vários setores TECNOLOGIA como devem fazer seu trabalho. São todos especialistas. A tarefa da empresa é, portanto, conseguir que todos trabalhem em conjunto, porque o conhecimento é um recurso inesgotável. Quanto mais pessoas se sentarem a uma mesa para trocar idéias, como estamos fazendo aqui, mais conhecimentos novos surgirão. O segredo é saber como estimular os trabalhadores do conhecimento a compartilhar esse conhecimento, produzindo novas informações e utilizando-as de maneira totalmente nova. PAPP – Acho que devemos falar em “uma maneira nova e produti- va”. A forma como temos acesso ao conhecimento e o utilizamos pode levar à produtividade, mas também pode gerar confusão. CARLISLE – A própria tecnologia altera a maneira de trabalhar das empresas. Na University of Arizona estamos trabalhando muito com os sistemas de apoio à tomada de decisões. Nesses sistemas as pessoas interagem com computadores, em vez de interagirem entre si. Colo- cam seus comentários no micro e permanecem no anonimato. Esses sistemas são muito eficien- tes para chegar ao consenso em grupos muito diversificados, mas não estimulam as pessoas a apresen- tar suas melhores idéias. Quando a discussão acontece pessoalmente, A TI muda Como a tecnologia da informação está afetando o funcionamento das empresas? TJADEN – Nós analisamos um banco de dados com cerca de mil empresas e descobrimos que aproximadamente 80% estão gastando mais com atividades de informação e criação de ativos intelectuais do que para buscar retorno sobre o capital investido. É natural que esse tipo de empresa se preocupe mais em obter um retorno das atividades de informa- ção do que de ativos fixos ou qualquer outro tipo de capital. Parece-me que essa é uma das preocupações das empresas do conhecimento hoje em dia. Como isso altera a organização das empresas e o trabalho de seus funcionários? TJADEN – Imagine o que aconte- ceria se virtualmente todos os funcionários de uma empresa fossem trabalhadores do conheci- mento –todos com capacidade, autoridade e responsabilidade para definir o que fazem e como fazem; todos com poder para tomar decisões. Não podemos dizer-lhes A TI muda
  • 2. 103 ➙ H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9 StockPhotos podemos receber o crédito por nossas idéias, o que não ocorre quando se mantém o anonimato. Essa tecnologia, portanto, apesar de facilitar as reuniões de grupos grandes, leva a tomar decisões menos eficazes. As empresas estão tirando o máxi- mo proveito da TI? SASSONE – Do ponto de vista do uso comercial da tecnologia da informação, nos últimos três a cinco anos todos parecem geniais, pois a economia vem tendo um desempe- nho excelente e algumas empresas estão registrando lucros recordes. A tendência, então, é dizer: “Até que enfim a TI está compensando”. Na minha opinião, ainda dispomos de poucos dados para chegar a uma conclusão. Uma série de fatores importantes –como os baixos custos da energia, as características da geração do baby boom, o fim da Guerra Fria etc.– foi o que provavel- mente garantiu uma boa parcela desse período de prosperidade. Muitas empresas dependem, para crescer, de maior acesso a informações sobre os clientes. É possível que os clientes um dia se recusem a cooperar porque não querem que alguém que sabe onde eles passam as férias e fazem com- pras fique ligando para sua casa? PORTER – Se a empresa que deseja utilizar informações sobre os clientes o fizer de maneira criteriosa, vai sempre dispor de muito espaço para uma exploração eficaz. Mas, se isso for feito sem critério, os clientes se revoltarão e se negarão a colaborar. CARLISLE – Já vimos isso acontecer quando a America Online estava coletando dados para lançar um CD tudotudo
  • 3. 104 H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9 com algumas informações sobre seus clientes. O fato é que, de um mo- mento para outro, temos nas mãos ferramentas para análise de dados que jamais tivemos antes. O conheci- mento que as empresas têm sobre os clientes não está em sintonia com o conhecimento que as pessoas têm sobre o mundo a seu redor. TJADEN – Isso vale para tudo hoje em dia. Podemos conceber uma nova ferramenta, uma nova maneira de fazer alguma coisa. Para nós isso pode soar perfeitamente normal e lógico. O maior desafio de um empresário é criar uma empresa com base em uma nova idéia e fazer com que as pessoas realmente entendam essa idéia. A adoção da videoconferência e de outras novas tecnologias altera fundamentalmente a maneira como as pessoas trabalham em equipe? PAPP – Um dos efeitos da video- conferência é o fato de a interação humana imediata desaparecer. Mas ainda há muita gente que gosta de conversar cara a cara. CARLISLE – O fato de saber que existirá um registro permanente da interação entre as pessoas –e de saber que daqui a dez anos alguém vai poder recuperar um arquivo e ver o que estava realmente aconte- cendo naquela sala– pode afetar os relacionamentos. SASSONE – Existe certa rejeição ao uso da tecnologia para facilitar reuniões. Há dez anos pensava-se que essa seria a tendência do futuro, porque seria possível regis- trar o que era dito de maneira exata. E isso não aconteceu, pelo menos em muitos casos, porque as pessoas não querem que suas palavras sejam gravadas literalmente –elas querem sempre ter alguma “margem de manobra”. CARLISLE – É possível até mesmo O conhecimento que as empresas têm sobre os clientes está além do conhecimento das pessoas sobre o mundo que haja uma reação social negativa em relação à tecnologia da informa- ção. E que precisemos arrastar pessoas esperneando e gritando para a Era da Informação ou simplesmente abandoná-la. PAPP – Muitas pessoas estão bastante dispostas a usar as novas tecnologias. Mas é necessário que tenham os recursos necessários para aprender como fazê-lo. É muito comum ver empresas colocando novas tecnologias à disposição dos funcionários, mas é pouco comum vê-las se preocupando em destinar recursos para treiná-los de maneira adequada. CARLISLE – Eu tenho alguma aversão à tecnologia. Acho que hoje vivemos muito em função da rapidez. Somos muito interrompi- dos quando estamos trabalhando. Atendemos o celular, recebemos um fax, o pager toca. E a quantidade de trabalho que precisamos fazer em 8 horas está aumentando dramaticamente, embora hoje em dia não trabalhemos apenas 8 horas, mas 10 ou 12. As pessoas vão se adaptar? CARLISLE – Eu não tenho certeza de que as pessoas possam se adap- tar. E acho que, à medida que se tornarem mais bem informadas e começarem a entender realmente o que é essa tecnologia, elas talvez decidam que não a querem tão presente em sua vida. Também é possível que muitas das previsões que estamos fazendo hoje sobre a necessidade da TI, de sua integra- ção e aceitação, não se tornem realidade. PORTER – A tecnologia terá de evoluir, e nós junto com ela. A videoconferência, por exemplo, assim como outras expectativas iniciais, evoluirá e poderemos transformar a tecnologia ou utilizá- la para alguma coisa que ninguém teria imaginado ser possível. SASSONE – A tecnologia evoluirá exatamente para resolver o tipo de problema que estamos levantando aqui. Por exemplo: desenvolvendo filtros automáticos para chamadas telefônicas e para e-mails, propician- do maior privacidade. Qual é o impacto da revolução da informação nas empresas que atuam em escala mundial? PAPP – A globalização, que é em parte um fenômeno resultante dessa própria tecnologia, nos permite conversar com as pessoas, ver seu rosto e enviar informações em questão de minutos. Mas ainda existe muita gente por aí –e não necessariamente no Irã, no Iraque ou no Camboja; algumas em nosso país mesmo– que simplesmente não quer receber idéias, informações ou conceitos “alienígenas” que possam influenciar sua maneira habitual de fazer as coisas. Esse é um dos problemas reais da Era da Informa- ção. Ou seja, o potencial para atuar em escala mundial versus o ressenti- mento das pessoas que vêem seus hábitos ameaçados. TJADEN – A revolução da informa- ção força a empresa a mudar da produção em massa para a persona- lização em massa. A necessidade de um cliente do Irã é diferente da necessidade de um do Sudão. Na revolução da informação, o papel de uma empresa bem-sucedida é descobrir como satisfazer essas diferentes necessidades. A videoconferência, por ser um registro permanente da interação entre as pessoas, pode afetar relacionamentos
  • 4. 105 ➙ H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9 SASSONE – Na minha opinião, o mais provável é que nos próximos 10 ou 20 anos os ricos fiquem cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. PORTER – Eu acredito que a disparidade se tornará ainda maior porque as bases para a geração da riqueza estão sendo alteradas. Todo o nosso sistema de distribuição da riqueza baseia-se em um esquema ultrapassado da era industrial, pelo qual se recompensava o trabalho e o capital. E isso está mudando. O que colocar no lugar? Não sei. E o que me assusta, nesse ambiente tão globalizado, é não conseguir sequer imaginar quem teria a autoridade necessária para fazer essa mudança. CARLISLE – A adoção da tecnolo- gia da informação gera, muitas vezes, o caos. É possível, entretanto, que vejamos pessoas ou grupos que não conseguiram acumular riqueza por meio dos meios convencionais, fazendo-o pela TI. Pensemos na quantidade de jovens das classes menos favorecidas que conseguem comprar um computador. E talvez eles nem precisem de uma boa StockPhotos Mas, se quisermos ter um produ- to baseado em informação sofistica- da para vender na Arábia Saudita, devemos nos assegurar de que os clientes não apenas queiram esse produto, mas também tenham os recursos necessários para utilizá-lo. O que adianta planejar vender um computador para um país pobre da África se não há eletricidade, se as pessoas não sabem digitar? SASSONE – A empresa é que deve resolver esse problema. Como, na realidade, será construída a infra- estrutura de sustentação da Era da Informação? TJADEN – Parte do problema pode ser simplesmente contornada. Basta observar o que está sendo feito em relação aos satélites e telefones de órbita terrestre baixa. Com essa tecnologia, não é preciso instalar cabos no deserto do Saara para ter o mesmo tipo de serviço telefônico que temos aqui. A TI vai alterar o equilíbrio entre poder político e econômico do mundo? PAPP – Para mim, essa é a questão mais fascinante de toda a Era da Informação: à medida que a tecno- logia da informação leva à criação de riqueza, e a capacidade de utilizar as novas tecnologias da informação está limitada a determi- nados participantes –sejam Estados, empresas multinacionais, organiza- ções governamentais e não-governa- mentais–, a tecnologia da informa- ção deve criar um padrão cada vez mais distorcido de distribuição da riqueza em escala mundial, entre sociedades e dentro das sociedades. O desafio, para as empresas e para os governos, é como resolver o problema da distribuição da riqueza no futuro de maneira mais justa. TJADEN – Eu acredito que esse é um problema que se resolve por si e não deve ser motivo de preocupa- ção. As multinacionais estão extre- mamente motivadas a distribuir qualquer coisa que produzam para um mercado o mais amplo possível. E elas serão forçadas a fazer isso por meio da personalização em massa e não da produção em massa. Hoje em dia esse movimento é mais poderoso do que os governos nacionais.
  • 5. 106 H S M M a n a g e m e n t 1 7 n o v e m b r o - d e z e m b r o 1 9 9 9 N Uma limitação das empresas será a disponibilidade de trabalhadores do conhecimento, mais qualificados escola, porque podem aprender por meio de programas de computador. De repente vemos que um país como a Índia, que não teve nenhu- ma grande oportunidade de cons- truir a riqueza, tem essa possibilida- de agora. De que forma o acesso global à informação modificará a maneira como empresas e governos atuam? PAPP – Estamos testemunhando como o fluxo de informações que atravessa fronteiras via Anistia Internacional e outras organizações de direitos humanos vem influen- ciando a maneira como alguns governos tratam seus cidadãos. Organizações não-governamentais, como o Greenpeace e o Environ- ment Watch, estão desempenhando papel importante de pressão sobre os governos para acabar com os programas de testes nucleares, por exemplo. CARLISLE – Coisas que não tería- mos como saber –como foi o caso das práticas trabalhistas da Nike nos países emergentes– hoje são de conhecimento público. Quais os limites das empresas para explorar a tecnologia? TJADEN – Uma limitação das empresas será a disponibilidade de trabalhadores do conhecimento. E outra será sua capacidade de organizar o trabalho do conheci- mento de maneira produtiva. Ainda não sabemos muito bem como fazer isso. Somente um terço dos adultos tem educação superior nos Estados Unidos. Não que eu ache que alguém precise de um diploma de faculdade para ser um trabalhador do conhecimento –e Bill Gates é um bom exemplo. Entretanto, é preciso mais e não menos conhecimento e formação para ser um bom traba- lhador do conhecimento. Quais são os riscos para as empre- sas com extrema dependência da informação impulsionada pela TI? CARLISLE – Depois que adotarem uma tecnologia, as organizações talvez não consigam sobreviver a uma falha tecnológica. Digamos que sua empresa forneça um serviço baseado na análise de informações, e você tem um contrato para cumprir. E sabe como uma falha da tecnologia pode afetar seu serviço. Portanto, você pode se proteger incluindo uma cláusula no contrato que o isente de responsabilidade no caso de falha. Mas, se você não souber quais as chances de ocorrer a falha –coisa que as pessoas em geral não sabem– , não terá como se proteger. Existe também o risco de um fracasso econômico de grandes proporções caso a infra-estrutura de TI seja danificada? PAPP – O potencial de um fra- casso catastrófico, intencional ou não, foi bem realçado no relatório preparado em 1997 pela Comissão de Proteção da Infra-Estrutura instalada pelo presidente Bill Clinton. Esse relatório é assustador quando fala do impacto que uma falha nos aplicativos que hoje controlam a maioria das coisas teria na vida dos cidadãos norte-americanos. Aparentemente, ainda estamos muito longe de dominar por com- pleto nossas tecnologias... PAPP – A melhor maneira de demonstrar isso é lembrar a falha do satélite que aconteceu em maio de 1998. Vocês lembram como muitos de nossos amigos –e nós mesmos– deram graças a Deus por se livrarem, pelo menos por um tempo, daquele maldito bipe tocando sem parar no bolso? Por outro lado, muitos de nós também disseram que o motivo pelo qual não podíamos desligar o bipe, mesmo quando o satélite voltasse a funcionar, era porque o pessoal do escritório precisava garantir um contato permanente conosco. É assim que pensamos, e é assim que os outros pensam: eles esperam que respondamos imediatamente porque temos a tecnologia para isso. TJADEN – Um dos princípios básicos da “organização que apren- de” é o domínio pessoal. Significa que uma pessoa já se desenvolveu a ponto de poder se dar ao luxo de desligar o bipe, se isso for o certo a fazer para garantir sua eficácia básica. Se quiserem realmente aproveitar os frutos da revolução da informação, as empresas precisarão aprender a treinar seus funcionários sobre como se comportar. © CIO Saiba mais sobre os participantes GARY TJADEN é diretor do Center for Enterprise Systems e professor do College of Management do Georgia Tech. ALAN A. PORTER é professor de engenharia industrial e sistemas e de políticas públicas e diretor do Technology Policy and Assessment Center. JUDITH P. CARLISLE é professora da Texas A&M University, College Sta- tion, Texas, e foi professora assistente do grupo de gestão da tecnologia da informação do College of Mana- gement até junho de 1998. DANIEL S. PAPP é presidente interino da Southern Polytechnic State University, de Marietta, Geórgia, e professor da Sam Nunn School of International Affairs. PETER G. SASSONE era professor de economia e tecnologias de gestão do Georgia Tech.