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Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76
O soneto de Camões usa a 1.ª pessoa,
exprimindo o desalento do poeta, resultante da
retrospetiva que faz da sua vida: infeliz e pontuada
de desilusões amorosas (o que o sujeito poético
atribui ao destino mas também a culpas próprias).
O poema de Sophia, dirigido a uma segunda
pessoa, que corresponderá a Luís de Camões,
recupera algumas frases do texto camoniano, mas
molda-as a outra situação: os culpados são agora
os portugueses, ou o governo português, que não
teriam tratado o poeta (e toda a arte, talvez) com o
reconhecimento devido — o poema tem a marca
até de uma crítica ao poder político.
[ca. 100 palavras]
No poema de Sophia […] é dirigido a
O poema
No poema de Sophia […] o sujeito dirige-
se a
Ambos os textos distinguem-se por
Sophia De
Sophia de
Andresen
Sophia
Camões
Ele
Ela
O poeta
O «eu» do texto
O sujeito
O eu lírico
O sujeito poético
fala
«erros»
o quão
Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76
fermosura = formosura, beleza
desterra = exila, afasta
outeiros = pequenos montes
derradeiros = últimos
ofrece = oferece
avorrece = aborrece
mores = maiores
mor = maior
ABORRESCERE, 'afastar-se de'
• avorrecer (via popular)
• aborrecer (via erudita)
MAIOREM
• mor (via popular)
• maior (via erudita)
via «popular»
via erudita ou cultismo & Camões
palavras «divergentes»
A fermosura desta fresca serra,
e a sombra dos verdes castanheiros,
o manso caminhar destes ribeiros,
donde toda a tristeza se desterra;
o rouco som do mar, a estranha terra,
o esconder do sol pelos outeiros,
o recolher dos gados derradeiros,
das nuvens pelo ar a branda guerra;
enfim, tudo o que a rara natureza
com tanta variedade nos ofrece,
me está (se não te vejo) magoando.
Sem ti, tudo me enoja e m' avorrece;
sem ti, perpetuamente estou passando
nas mores alegrias, mor tristeza.
Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76
pílula / *pírula / dissimilação / evita-se
a semelhança que havia entre dois
sons. Neste caso particular, um dos
LL modificou-se em R.
fizeram-lo / fizeram-no /
assimilação / o pronome (lo) passa a
ligar-se por uma consoante nasal
(n), porque assim se aproxima do
som nasal da última sílaba do verbo.
festra (arc.) (<fenestra) / fresta /
metátese/houve a transposição da
consoante r da segunda para a
primeira sílaba (há uma metátese
quando um som muda o seu lugar
dentro da palavra).
crudu / cruu (arc.) / síncope /síncope
é a perda de um som a meio da
palavra. Neste caso, uma consoante
que havia na palavra latina «crudu»,
-d-, desapareceu na palavra
portuguesa arcaica «cruu» (que
aliás, depois, ainda evoluiria para
«cru»).
a + a; a + as / à; às / crase / a
contracção da preposição «a» com o
artigo definido «a» e «as» é a crase
mais frequente.
tio / *tiu / sinérese / tal como a crase, a
sinérese também contrai duas vogais,
só que tornando as duas vogais num
ditongo (neste caso: i-o > iu).
sic / si (arc.) / apócope / apócope é a
perda de um som ou sílaba finais.
No exemplo, a palavra latina «sic»
veio a dar «si» (que, depois, evoluiu
para sim).
Alandroal / *Landroal /aférese /
aférese é a perda dos sons do início
de uma palavra.
você / cê / aférese / esta pronúncia
pode acontecer no português do
Brasil.
portanto / *ptanto / síncope / o
autarca que ouvimos não
pronunciava um som a meio da
palavra.
precisamente / *samente / aférese / o
médico que ouvimos omitia o início do
advérbio.
ignorante / *iguinorante / epêntese/a
epêntese é o desenvolvimento de um
som a meio da palavra. Neste caso, a
vogal inserida, i, desfez um grupo que
não é natural no português, gn, criando
uma sequência mais conforme ao nosso
padrão (este tipo de epênteses é comum
no português do Brasil).
pneu / *peneu / epêntese / de novo um
grupo de consoantes demasiado
erudito (-PN-) a ser desfeito pela
inserção de uma vogal (em Portugal,
produzimos um e; os brasileiros
podem inserir um i [*pineu]).
Skip / *cequipe / epêntese / assim
estava escrito num supermercado.
Quem escreveu mal inseria um som
vocálico entre [s] e [k].
sexo / *cequisso (no pg. do Brasil) /
epêntese / aqui o par de consoantes
desfeito foi o que existia escondido na
letra <x>, os sons ks.
sport (ingl.) / esporte / prótese / o
desenvolvimento de um som no início
da palavra é uma prótese. Os
brasileiros costumam fazer esta
adaptação aos seus empréstimos
começados por s- seguido de
consoante (snob > esnobe), enquanto
em Portugal é mais comum a
manutenção da sequência estrangeira
(snob).
mora / amora / prótese / a palavra
portuguesa que descendeu da palavra
latina mora tem um som inicial que não
havia no seu étimo.
alguidar / *alguidare / paragoge / a
paragoge é o desenvolvimento de som
no final da palavra. É comum, por
exemplo, na pronúncia alentejana.
estar / *tar / aférese / no português
europeu, a não ser em situações
formais, raramente dizemos a primeira
sílaba das formas do verbo «estar» (na
escrita temos de ter cuidado!).
ski (ingl.) / esqui / prótese / na
adaptação do anglicismo ao português
acrescentou-se um som no início da
palavra.
adição
(inserção de sons)
no princípio: prótese
no meio: epêntese
no final: paragoge
supressão
(perda de sons)
no princípio: aférese
no meio: síncope
no final: apócope
alteração
(mudança de sons)
aproximação a um som vizinho:
assimilação
diferenciação relativamente a um som
vizinho: dissimilação
contração de duas vogais numa só:
crase
contração de duas vogais num ditongo:
sinérese
transposição
passagem de um som para outro ponto
da palavra: metátese
Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76
«Endechas a Bárbara escrava»
(cantadas por Sérgio Godinho)
Aquela cativa,
que me tem cativo
porque nela vivo
já não quer que viva.
Eu nunca vi rosa
em suaves molhos,
que para meus olhos
fosse mais formosa.
Nem no campo flores,
nem no céu estrelas,
me parecem belas
como os meus amores.
Rosto singular,
olhos sossegados,
pretos e cansados,
mas não de matar.
Uma graça viva,
que neles lhe mora,
para ser senhora
de quem é cativa.
Pretos os cabelos,
onde o povo vão
perde opinião
que os louros são belos.
Pretidão de Amor,
tão doce a figura,
que a neve lhe jura
que trocara a cor.
Leda mansidão
que o siso acompanha;
bem parece estranha,
mas bárbora não.
Presença serena
que a tormenta amansa;
nela enfim descansa
toda a minha pena.
Esta é a cativa
que me tem cativo,
e, pois nela vivo,
é força que viva.
Nem no campo flores,
nem no céu estrelas,
me parecem belas
como os meus amores.
Rosto singular,
olhos sossegados,
pretos e cansados,
mas não de matar.
Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76
TPC — Para a próxima aula prepara a
leitura expressiva, ou tendencialmente
expressiva, destes sonetos de Camões.
Os números entre parênteses retos
reportam-se aos números dos alunos.
Cada número aparece duas vezes, o que
significa que cada um terá de preparar a
leitura de dois poemas (um já estudado
em aula; outro, ainda por estrear). No
caso dos sonetos novos, além do ensaio
em voz alta, bastante repetido, aconselha-
se uma prévia compreensão do texto,
ainda que, naturalmente, superficial.
[1, 5, 9, 13, 17, 21, 25, 29] «O dia em que eu nasci, moura e pereça» (p. 148)
[2, 6, 10, 14, 18, 22, 26, 30] «Erros meus, má fortuna, amor ardente» (p. 155)
[1, 6, 11, 16, 21, 26, 32] «Grão tempo há já que soube da Ventura (p. 158)
[2, 7, 12, 17, 22, 27, 31] «Busque Amor novas artes, novo engenho» (p. 159)
[3, 7, 11, 15, 19, 23, 27, 31] «Amor é um fogo que arde sem se ver» (p. 160)
[3, 8, 13, 18, 23, 28] «Tanto de meu estado me acho incerto» (p. 161)
[4, 9, 14, 19, 24, 29] «Leda serenidade deleitosa» (p. 164)
[5, 10, 15, 20, 25, 30] «Um mover d’olhos, brando e piadoso» (p. 164)
[4, 8, 12, 16, 20, 24, 28, 32] «A fermosura desta fresca serra» (p. 170)
Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76

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Apresentação para décimo ano de 2014 5, aula 75-76

  • 2. O soneto de Camões usa a 1.ª pessoa, exprimindo o desalento do poeta, resultante da retrospetiva que faz da sua vida: infeliz e pontuada de desilusões amorosas (o que o sujeito poético atribui ao destino mas também a culpas próprias). O poema de Sophia, dirigido a uma segunda pessoa, que corresponderá a Luís de Camões, recupera algumas frases do texto camoniano, mas molda-as a outra situação: os culpados são agora os portugueses, ou o governo português, que não teriam tratado o poeta (e toda a arte, talvez) com o reconhecimento devido — o poema tem a marca até de uma crítica ao poder político. [ca. 100 palavras]
  • 3. No poema de Sophia […] é dirigido a O poema No poema de Sophia […] o sujeito dirige- se a
  • 4. Ambos os textos distinguem-se por
  • 7. Sophia Camões Ele Ela O poeta O «eu» do texto O sujeito O eu lírico O sujeito poético
  • 12. fermosura = formosura, beleza desterra = exila, afasta outeiros = pequenos montes derradeiros = últimos ofrece = oferece avorrece = aborrece mores = maiores mor = maior
  • 13. ABORRESCERE, 'afastar-se de' • avorrecer (via popular) • aborrecer (via erudita)
  • 14. MAIOREM • mor (via popular) • maior (via erudita)
  • 15. via «popular» via erudita ou cultismo & Camões palavras «divergentes»
  • 16. A fermosura desta fresca serra, e a sombra dos verdes castanheiros, o manso caminhar destes ribeiros, donde toda a tristeza se desterra;
  • 17. o rouco som do mar, a estranha terra, o esconder do sol pelos outeiros, o recolher dos gados derradeiros, das nuvens pelo ar a branda guerra;
  • 18. enfim, tudo o que a rara natureza com tanta variedade nos ofrece, me está (se não te vejo) magoando.
  • 19. Sem ti, tudo me enoja e m' avorrece; sem ti, perpetuamente estou passando nas mores alegrias, mor tristeza.
  • 21. pílula / *pírula / dissimilação / evita-se a semelhança que havia entre dois sons. Neste caso particular, um dos LL modificou-se em R.
  • 22. fizeram-lo / fizeram-no / assimilação / o pronome (lo) passa a ligar-se por uma consoante nasal (n), porque assim se aproxima do som nasal da última sílaba do verbo.
  • 23. festra (arc.) (<fenestra) / fresta / metátese/houve a transposição da consoante r da segunda para a primeira sílaba (há uma metátese quando um som muda o seu lugar dentro da palavra).
  • 24. crudu / cruu (arc.) / síncope /síncope é a perda de um som a meio da palavra. Neste caso, uma consoante que havia na palavra latina «crudu», -d-, desapareceu na palavra portuguesa arcaica «cruu» (que aliás, depois, ainda evoluiria para «cru»).
  • 25. a + a; a + as / à; às / crase / a contracção da preposição «a» com o artigo definido «a» e «as» é a crase mais frequente.
  • 26. tio / *tiu / sinérese / tal como a crase, a sinérese também contrai duas vogais, só que tornando as duas vogais num ditongo (neste caso: i-o > iu).
  • 27. sic / si (arc.) / apócope / apócope é a perda de um som ou sílaba finais. No exemplo, a palavra latina «sic» veio a dar «si» (que, depois, evoluiu para sim).
  • 28. Alandroal / *Landroal /aférese / aférese é a perda dos sons do início de uma palavra.
  • 29. você / cê / aférese / esta pronúncia pode acontecer no português do Brasil.
  • 30. portanto / *ptanto / síncope / o autarca que ouvimos não pronunciava um som a meio da palavra.
  • 31. precisamente / *samente / aférese / o médico que ouvimos omitia o início do advérbio.
  • 32. ignorante / *iguinorante / epêntese/a epêntese é o desenvolvimento de um som a meio da palavra. Neste caso, a vogal inserida, i, desfez um grupo que não é natural no português, gn, criando uma sequência mais conforme ao nosso padrão (este tipo de epênteses é comum no português do Brasil).
  • 33. pneu / *peneu / epêntese / de novo um grupo de consoantes demasiado erudito (-PN-) a ser desfeito pela inserção de uma vogal (em Portugal, produzimos um e; os brasileiros podem inserir um i [*pineu]).
  • 34. Skip / *cequipe / epêntese / assim estava escrito num supermercado. Quem escreveu mal inseria um som vocálico entre [s] e [k].
  • 35. sexo / *cequisso (no pg. do Brasil) / epêntese / aqui o par de consoantes desfeito foi o que existia escondido na letra <x>, os sons ks.
  • 36. sport (ingl.) / esporte / prótese / o desenvolvimento de um som no início da palavra é uma prótese. Os brasileiros costumam fazer esta adaptação aos seus empréstimos começados por s- seguido de consoante (snob > esnobe), enquanto em Portugal é mais comum a manutenção da sequência estrangeira (snob).
  • 37. mora / amora / prótese / a palavra portuguesa que descendeu da palavra latina mora tem um som inicial que não havia no seu étimo.
  • 38. alguidar / *alguidare / paragoge / a paragoge é o desenvolvimento de som no final da palavra. É comum, por exemplo, na pronúncia alentejana.
  • 39. estar / *tar / aférese / no português europeu, a não ser em situações formais, raramente dizemos a primeira sílaba das formas do verbo «estar» (na escrita temos de ter cuidado!).
  • 40. ski (ingl.) / esqui / prótese / na adaptação do anglicismo ao português acrescentou-se um som no início da palavra.
  • 41. adição (inserção de sons) no princípio: prótese no meio: epêntese no final: paragoge
  • 42. supressão (perda de sons) no princípio: aférese no meio: síncope no final: apócope
  • 43. alteração (mudança de sons) aproximação a um som vizinho: assimilação diferenciação relativamente a um som vizinho: dissimilação contração de duas vogais numa só: crase contração de duas vogais num ditongo: sinérese
  • 44. transposição passagem de um som para outro ponto da palavra: metátese
  • 46. «Endechas a Bárbara escrava» (cantadas por Sérgio Godinho)
  • 47. Aquela cativa, que me tem cativo porque nela vivo já não quer que viva. Eu nunca vi rosa em suaves molhos, que para meus olhos fosse mais formosa.
  • 48. Nem no campo flores, nem no céu estrelas, me parecem belas como os meus amores. Rosto singular, olhos sossegados, pretos e cansados, mas não de matar.
  • 49. Uma graça viva, que neles lhe mora, para ser senhora de quem é cativa. Pretos os cabelos, onde o povo vão perde opinião que os louros são belos.
  • 50. Pretidão de Amor, tão doce a figura, que a neve lhe jura que trocara a cor. Leda mansidão que o siso acompanha; bem parece estranha, mas bárbora não.
  • 51. Presença serena que a tormenta amansa; nela enfim descansa toda a minha pena. Esta é a cativa que me tem cativo, e, pois nela vivo, é força que viva.
  • 52. Nem no campo flores, nem no céu estrelas, me parecem belas como os meus amores. Rosto singular, olhos sossegados, pretos e cansados, mas não de matar.
  • 54. TPC — Para a próxima aula prepara a leitura expressiva, ou tendencialmente expressiva, destes sonetos de Camões. Os números entre parênteses retos reportam-se aos números dos alunos. Cada número aparece duas vezes, o que significa que cada um terá de preparar a leitura de dois poemas (um já estudado em aula; outro, ainda por estrear). No caso dos sonetos novos, além do ensaio em voz alta, bastante repetido, aconselha- se uma prévia compreensão do texto, ainda que, naturalmente, superficial.
  • 55. [1, 5, 9, 13, 17, 21, 25, 29] «O dia em que eu nasci, moura e pereça» (p. 148) [2, 6, 10, 14, 18, 22, 26, 30] «Erros meus, má fortuna, amor ardente» (p. 155) [1, 6, 11, 16, 21, 26, 32] «Grão tempo há já que soube da Ventura (p. 158) [2, 7, 12, 17, 22, 27, 31] «Busque Amor novas artes, novo engenho» (p. 159) [3, 7, 11, 15, 19, 23, 27, 31] «Amor é um fogo que arde sem se ver» (p. 160) [3, 8, 13, 18, 23, 28] «Tanto de meu estado me acho incerto» (p. 161) [4, 9, 14, 19, 24, 29] «Leda serenidade deleitosa» (p. 164) [5, 10, 15, 20, 25, 30] «Um mover d’olhos, brando e piadoso» (p. 164) [4, 8, 12, 16, 20, 24, 28, 32] «A fermosura desta fresca serra» (p. 170)