Este documento fornece um resumo sobre Fernando Pessoa e seus heterônimos. Apresenta brevemente Pessoa ortónimo e seus temas como fragmentação, angústia existencial e nostalgia. Também descreve sumariamente os principais heterônimos Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos e suas respectivas visões do mundo.
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Pessoa ortónimo e heterónimos
1. Fernando Pessoa
“Quem me dirá quem sou?”
“O que é este intervalo que há entre mim e mim?”
Sessões de estudo “PEP”
Exame Nacional de Português – 12º ano
Docentes: António Fraga
Carla Rosete
Maria José Afonso
Sandra Clarisse Teles
2. Unidade e diversidade em Pessoa
Fernando
Pessoa
“Só me encontro
quando
de mim fujo”
“‘Screvo meu livro à
beira-mágoa”
In Mensagem
Ricardo Reis
“Abdica/ E sê
rei de ti
próprio”
”
Alberto Caeiro
“Sinto todo o meu
corpo deitado na
realidade/
sei a verdade/
e sou feliz”
“O poeta é
um
fingidor”
Álvaro de
Campos
“Ah, não ser eu
toda a gente e toda
a parte!!”
Outros:
Bernardo
Soares,
Alexander
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3. Unidade e diversidade em Pessoa
Fernando
Pessoa
Os
heterónimos
(os outros
“eus”)
Vertente
esotérica
Mensagem
Vertente
tradicional e
modernista:
“Cancioneiro”
4. Objetivos principais do percurso
pessoano
Superar a dor do presente, a fragmentação de si mesmo e do
mundo através:
da evocação da infância, idade de ouro, onde a
felicidade ficou perdida e onde não existia o doloroso
sentir: “Com que ânsia tão raiva/ Quero aquele
outrora!”;
do refúgio no sonho, na música e na noite;
da criação dos heterónimos (“Sê plural como o
Universo!”);
da procura espiritual e esotérica.
5. Pessoa ortónimo: temáticas
“Fragmentação”: “fingimento poético”;
dualidades: sonho/sono; real/irreal…
Angústia existencial
“Dor de pensar” - obsessão pela análise
Visão negativa do mundo e da vida
Solidão interior
Inquietação perante o enigma do mundo
“Nostalgia de um bem perdido”
6. Aspetos formais da poesia do ortónimo
Forma modernista
versilibrismo;
irregularidade da métrica,
rima e composição
estrófica;
pontuação (diversidade);
uso frequente de frases
nominais: “Coração
oposto ao mundo”
Associações inesperadas
(desvios sintáticos): “Os
girassóis do império que
morri” / “Opalesci amar-
me entre mãos raras”;
Forma tradicional
forma simples, curta e
musical;
vide “Cancioneiro” –
quadras e quintilhas...;
linguagem simples,
espontânea, mas sóbria;
Preferência pela métrica
tradicional: redondilha
menor (5) e maior (7);
7. “O fingimento poético”:
“Fingir é conhecer-se”
O “eu” brinca intelectualmente com as emoções,
levando-as ao nível da arte poética.
A expressão dos sentimentos e sensações
intelectualizadas são fruto de uma construção
mental, onde a imaginação impera:
“Eu simplesmente sinto/ Com a imaginação./ Não
uso o coração.”
8. “O fingimento poético”
“Fingir é conhecer-se”
A composição poética resulta de um jogo lúdico entre o
sentimentalismo e a racionalização:
“ E assim nas calhas de roda/ Gira, a entreter a razão, / Esse
comboio de corda/ Que se chama coração.”
A emoção que o poeta exprime artisticamente é um estímulo que
provoca no leitor novos estados de alma.
=> Pessoa é um “estimulador de almas”
poemas “Autopsicografia” e “Isto”
9. A “dor de pensar”
“O que em mim sente ‘stá pensando.”
Deseja ter a inconsciência das coisas ou dos
seres comuns que se limitam a agir, sem pensar
(como a ceifeira ou o gato);
Deseja ter uma consciência inconsciente;
“Ter a tua alegre inconsciência, / E a
consciência disso!”
“Cansa sentir quando se pensa”
10. A “dor de pensar”
“O que em mim sente ‘stá pensando.”
LEVE, BREVE, SUAVE
Leve, breve, suave
Um canto de ave
Sobe no ar com que principia
O dia.
Escuto e passou...
Parece que foi só porque escutei
Que parou.
Nunca, nunca, em nada,
Raie a madrugada,
Ou ‘splenda o dia, ou doire no declive,
Tive
Prazer a durar
Mais do que o nada, a perda, antes de eu o ir
Gozar.
11. A “nostalgia de um bem perdido”
Procura superar a angústia existencial através
da evocação da infância e da saudade desse
tempo;
A infância é a imagem-símbolo da felicidade –
pela inconsciência vivida e pelo domínio da
fantasia;
O passado pesa: “como a realidade de nada”,
e o futuro: “como a possibilidade de tudo”. O
tempo é para ele um fator de desagregação, na
medida em que tudo é breve e efémero.
12. Instruções verbais
Resposta curta
“Indique”, “aponte”, “refira”, “mencione”: dizer, designar algo que
aparece no texto;
Transcreva: retirar do texto e colocar, entre aspas, uma expressão
antecedida de uma frase introdutória;
Enumere: retirar do texto uma série de termos;
Resposta longa
Explicite: definir por outras palavras uma expressão, desmontando
bem as ideias mais complexas da mesma;
Explique, clarifique, justifique: apresentar as razões, os motivos que
deram origem a algo com palavras próprias e/ou retiradas do texto;
Comente, demonstre, comprove: responder de forma desenvolvida
com expressões pessoais e outras do texto, seguindo a lógica de
um raciocínio;
Delimite, divida: fragmentar o texto em partes – designar a parte em
questão (a primeira, a segunda, etc..) e o local textual onde se
encontra.
13. Pessoa ortónimo - Análise textual
O que me dói não é
O que há no coração
Mas essas coisas lindas
Que nunca existirão...
São as formas sem forma
Que passam sem que a dor
As possa conhecer
Ou as sonhar o amor.
São como se a tristeza
Fosse árvore e, uma a uma,
Caíssem suas folhas
Entre o vestígio e a bruma.
in Fernando Pessoa, Cancioneiro
1. Transcreva um paradoxo e explicite o seu valor expressivo.
14. Proposta de correção
Um dos paradoxos verifica-se no verso
:“São as formas sem forma”. Essa figura de estilo
remete para a complexidade do mundo sensível e
inteligível: o aparentemente real deixa de o ser.
O paradoxo exprime o inalcançável, o inefável,
que define o sonho do que se poderia ter.
15. Pessoa ortónimo: análise textual
As nuvens são sombrias
Mas, nos lados do sul,
Um bocado do céu
É tristemente azul.
Assim, no pensamento,
sem haver solução,
Há um bocado que lembra
Que existe o coração
E esse bocado é que é
A verdade que está
A ser beleza eterna
Para além do que há.
1. Identifique a imagem-
símbolo deste poema e
explicite o seu valor para a
compreensão da mensagem
pretendida.
16. “Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.”
(Fernando Pessoa)
Os heterónimos
17. Alberto Caeiro – o mestre
Metaforicamente, é “um guardador de rebanhos”: “o único
poeta da natureza”;
Sensacionista: deambula pela natureza e interpreta o
mundo a partir dos sentidos; interessa-lhe a realidade
imediata e o real objetivo que as sensações lhe oferecem,
com o predomínio do “olhar”;
Antimetafísico: nega a utilidade do pensamento; tem um
discurso argumentativo que condena a subjetividade e as
abstrações; é a sua principal contradição;
Panteísta: tudo se renova e se dispersa em tudo; cada
coisa é divina.
18. Alberto Caeiro: análise textual
XXI
Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento ...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...
Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva ...
O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja ...
1. Mostre que os
três últimos
versos
contribuem para
a compreensão
do sentido
global do poema.
19. Proposta de correção
Os últimos versos apontam para a
inevitabilidade da passagem do tempo na vida
das pessoas, tal como acontece na natureza:
quem vive com a natureza e aceita os seus
fenómenos com naturalidade, deve fazê-lo
também em relação à sua vida.
De facto, o poema transmite a aceitação
da passagem da vida, tal como se aceita a
passagem dos dias, vivendo com
tranquilidade a aproximação da morte – ideia
igualmente subjacente ao três versos em
questão.
20. Ricardo Reis
epicurismo: carpe diem e disciplina estóica: “Olha
Lídia...”;
indiferença cética; ataraxia: “Ouvi contar que outrora,
quando a Pérsia” (“Os jogadores de xadrez”);
neopaganismo;
sobriedade clássica da forma e do pensamento;
drama da fugacidade da vida e da fatalidade da morte.
21. Ricardo Reis - citações
“Acima da verdade estão os deuses”
“Colhe/ O dia, porque és ele”
“(…)
Inutilmente parecemos grandes.
Salvo nós nada pelo mundo fora
Nos saúda a grandeza
Nem sem querer nos serve.
Se aqui, à beira-mar, o meu indício
Na areia o mar com ondas três o apaga,
Que fará na alta praia
Em que o mar é o Tempo?”
22. Ricardo Reis -Análise textual
Cumpre a lei, seja vil ou vil tu sejas.
Pouco pode o homem contra a externa vida.
Deixa haver a injustiça.
Não odeies nem creias.
Não tens mais reino do que a própria mente.
Essa, em que és dono, grato o Fado e os Deuses,
Governa, até à fronteira,
Onde mora a vontade.
(…)
Se nem de mim posso ser dono, como
Quero ser dono ou lei do que acontece
Onde me a mente e corpo
Não são mais do que coisas?
(…)
Ricardo Reis, Poesia, Lisboa, Assírio & Alvim, 2000
1. Interprete o seguinte
verso:
“Não tens mais reino do
que a própria mente”.
2. Aponte um dos sentidos
produzidos pelas formas
verbais: “Cumpre”,
“Odeies” e “creias”,
relacionando-o com a
mensagem global do
poema.
23. Proposta de correção
1. No verso indicado, o sujeito poético restringe o
campo de poder do homem ao seu próprio pensar.
Assim, ainda que esteja nas mãos do fado e dos
deuses, consegue, pela razão, estabelecer algum
autodomínio sobre a sua existência.
2. Um dos sentidos produzidos pelas formas verbais
apontadas é o de propor normas de conduta pelo uso do
imperativo, como é típico do discurso moralizante de Reis.
Assim, recomenda uma submissão à ordem
estabelecida e, de acordo com as sentenças estóicas, uma
passividade, uma renúncia a qualquer reacção mais
violenta, pois nada nos pertence verdadeiramente, tudo
fora já traçado pelo destino.
24. Álvaro de Campos
2ª fase: futurismo e sensacionismo: exaltação da força,
da violência, do excesso; apologia da civilização
industrial; intensidade e velocidade (a euforia
desmedida)
“Sentir tudo de todas as maneiras,/Viver tudo de
todos os lados,” (“Passagem das horas” )
3ª fase: intimismo: a depressão, o cansaço e a
melancolia perante a incapacidade das realizações; as
saudades da infância
“Ver as coisas até ao fundo.../E se as coisas não
tiverem fundo?”
“O que há em mim é sobretudo cansaço”
25. Álvaro de Campos
“Tabacaria” - Excerto
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
(...)
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
(...)
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
(...)
26. Álvaro de Campos - Análise textual
Paragem. Zona
Tragam-me esquecimento em travessas!
Quero comer o abandono da vida!
Quero perder o hábito de gritar para dentro.
Arre, já basta! Não sei o quê. mas já basta...
Então viver amanhã, hein?... E o que se faz de hoje?
Viver amanhã por ter adiado hoje?
Comprei por acaso um bilhete para esse espectáculo?
Que gargalhadas daria quem pudesse rir!
E agora aparece o eléctrico — o de que eu estou à espera —
Antes fosse outro... Ter de subir já!
Ninguém me obriga, mas deixai-o passar, porquê?
Só deixando passar todos, e a mim mesmo, e à vida...
Que náusea no estômago real que é a alma consciente!
Que sono bom o ser outra pessoa qualquer...
Já compreendo porque é que as crianças querem ser guarda-freios...
Não, não compreendo nada...
Tarde de azul e ouro, alegria das gentes, olhos claros da vida...
1. Caracterize o estado de
espírito do sujeito poético,
fundamentando-se no texto.
2. Identifique as sensações
aludidas no poema,
comprovando-as com
citações.
27. Proposta de Correção
1. O “eu” denuncia um estado de espírito negativo, como
se pode observar pelos sentimentos expressos .
O sujeito poético está revoltado: “Arre, já basta!”;
entediado:
“Quero comer o abandono da vida!”; indignado :“Então
viver amanhã, hein?... E o que se faz de hoje?” e
desiludido: Não, não compreendo nada...”.
2.
No poema, são diversas as sensações referidas
indiretamente pelo sujeito poético.
Deteta-se o paladar :“quero comer o abandono da
vida”, a audição:“ quero perder o hábito de gritar para dentro”
e a visão:“ Tarde de azul e ouro”.