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Horto (1910)/Feliz

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Dizes-me que a ventura te foi dada
E contente tu’alma jamais chora:
Vives sorrindo à luz de uma alvorada
E a noite para ti é cor da aurora...

Não creio nessa dita, me perdoa.
Ninguém na terra pode ser feliz.
Até o sino que na torre soa
Tem sua dor, nem sempre ele bem-diz.

Longe... distante... Pelo azul chalrando,
A modular uns hinos tão suaves,
Pássaros meigos lá se vão cantando...
Mas tu crês na ventura d’essas aves?

Repara bem naquela que ficou
Pousada lá no cimo da aroeira:
Ela chora, coitada, pois deixou
Muito longe perdida a companheira.

Aves da terra, em tímidos adejos,
Também alegres como as rolas mansas,
Rostos corados, recendendo beijos,
Correm cantando grupos de crianças.

E enquanto passa, em revoada louca,
Este dourado batalhão de arcanjos,
Eu quero ouvir-te da risonha boca
Se é eterna a ventura desses anjos.

A moça também sofre... Um áureo cofre
Guarda-lhe os prantos e o martírio duro,
E, de todas, aquela que mais sofre
É a que tem o coração mais puro.

Jardim - 1893