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SUBMETIDO: 25 SET. 2023 ACEITO: 02 MAR. 2024 doi: 10.21783/rei.v10i2.797 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS DECIDING WHEN TO INTERVENE: CRITERIA FOR IDENTIFYING PRIORITY STRUCTURAL LAWSUITS MATHEUS CASIMIRO 1 EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA 2 RESUMO: Na última década, os processos estruturais têm ganhado destaque no âmbito doutrinário e jurisprudencial. Isso contribuiu para que o número de ações estruturais ajuizadas no país, especialmente no Supremo Tribunal Federal (STF), aumentasse consideravelmente. Para evitar o risco de banalização dos processos estruturais, o presente artigo analisa quais critérios devem ser considerados pelo Judiciário para identificar ações estruturais prioritárias. Como metodologia de pesquisa, além da análise documental e bibliográfica, foram realizadas entrevistas com ministros, assessores, professores e advogados que atuam em relevantes ações estruturais. O trabalho propõe a utilização de cinco critérios: grave violação a direitos fundamentais; especificidade; grupo vulnerável ou minoritário como vítima do litígio; permanente inércia do Poder Público e subsidiariedade judicial. 1 Realiza estágio de pós-doutorado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Mestre e graduado em Direito pela UFC. Especialista em Justiça Constitucional e Tutela Jurisdicional de Direitos Fundamentais pela Universidade de Pisa. Especialista em Filosofia e Teoria do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Assessor Especial da Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), atuando no Núcleo de Processos Estruturais e Complexos (NUPEC). Pesquisador do Laboratório de Pesquisa em Desenhos Institucionais (LAPEDI), coordenando a linha sobre processos estruturais. 2 Doutoranda e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (FDR-UFPE). Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa em Desenhos Institucionais (LAPEDI), do Núcleo de Pesquisa em Interpretação e Decisão Judicial (NUPID) e do Projeto de Extensão Acesso ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos (aSIDH). 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 661 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X PALAVRAS-CHAVE: Processo Estrutural; Jurisdição Constitucional; Direitos Fundamentais; Tutela Jurisdicional Efetiva. ABSTRACT: In the last decade, structural litigation have gained prominence in the doctrinal and jurisprudential spheres. This contributed to the number of structural lawsuits filed in the country, especially in the Federal Supreme Court (STF), have increased considerably. To avoid the risk of trivializing structural litigation, this article analyzes which criteria should be considered by the Judiciary to identify priority structural lawsuits. As a research methodology, in addition to documentary and bibliographic analysis, interviews were carried out with justices, law clerks, a federal attorney, professors and lawyers who work in relevant structural lawsuits. The work proposes the use of five criteria: serious violation of fundamental rights; specificity; vulnerable or minority group as victims of the structural problem; permanent inertia of the Public Power; and judicial subsidiarity. KEYWORDS: Structural Litigation; Constitutional Jurisdiction; Fundamental Rights; Effective Judicial Remdies. INTRODUÇÃO Diariamente, tomamos diversas decisões. Escolhemos qual roupa usar, o que comer em cada refeição, a quais programas assistir. Além dessas decisões casuísticas, fazemos escolhas de outro tipo. Antes de decidirmos o que almoçaremos durante a semana, podemos tomar uma decisão prévia: em todos os dias úteis, comeremos salada. Já nos finais de semana e feriados, nossa refeição será livre. Podemos decidir que, durante a semana, só assistiremos a programas informativos. Veremos séries e filmes apenas no sábado e no domingo. Nem sempre percebemos, mas é comum tomarmos esses dois tipos de decisão. O primeiro tipo, chamado de decisões de primeira ordem, são as escolhas que fazemos diante de um caso específico. Comerei um sanduíche ou uma salada no jantar? Vestirei uma blusa azul ou preta para o meu compromisso de hoje? O segundo tipo, chamado por Cass Sunstein e Margalit-Ulmann (1999) de decisões de segunda ordem, são decisões sobre decisões. São escolhas que fazemos previamente, estabelecendo padrões de conduta sobre como tomar decisões em nossa rotina. 3 Se eu decido previamente que, durante a semana, sempre almoçarei salada, as minhas escolhas são facilitadas. Afinal, não precisarei perder muito tempo decidindo o que almoçar na segunda ou na terça. Já decidi isso previamente. Juízes, no exercício de sua função, também tomam os dois tipos de decisão. As decisões de primeira ordem são a forma como um juiz resolve um litígio específico. “By ‘second-order decisions’ we refer to decisions about the appropriate strategy for reducing the problems associated with making a firstorder decision. Second-order decisions thus include the strategies that people use in order to avoid getting into an ordinary decision-making situation in the first instance” (SUNSTEIN; MARGALIT-ULMANN, 1999, p. 7). 3 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 662 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS Quem está certo, o autor da ação ou o réu? Qual solução o magistrado dará para o caso concreto que está sob sua responsabilidade? Qual fundamentação jurídica irá utilizar? Todos os dias, juízes tomam diversas decisões de primeira ordem, determinando a solução para litígios específicos. Entretanto, antes de solucionar casos específicos, é necessário tomar decisões de segunda ordem. O magistrado precisa estabelecer como e quando julgará os casos que recebe. Qual é a sua abordagem interpretativa? Irá intervir em casos que envolvem políticas públicas? Quanto tempo utilizará para analisar cada processo que recebe? São decisões sobre como tomar decisões. Elas orientam a abordagem interpretativa do juiz e estabelecem padrões decisórios, facilitando a resolução de casos concretos. A doutrina brasileira sobre processos estruturais tem produzido rica pesquisa sobre como os magistrados devem tomar as suas decisões de primeira ordem. Analisando ações judiciais, autores propõem mecanismos dialógicos, alternativas para ampliar a participação social e técnicas de monitoramento de decisões estruturais. No entanto, uma questão anterior precisa ser enfrentada pela doutrina e pela jurisprudência: como identificar uma ação estrutural prioritária, que deve ser conhecida e julgada? Especialmente no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), não há uma sistematização de quais critérios serão utilizados para conhecer e julgar uma ação estrutural. É essencial que o Tribunal estabeleça diretrizes que norteiem a sua atuação e a de magistrados em outras instâncias. Ações estruturais levam ao Judiciário realidades que estão em desconformidade com o Direito, cujo objetivo é transformar um estado de coisas A, no qual direitos são violados, em um estado de coisas B, no qual esses direitos são minimamente assegurados. Se é assim, boa parte da realidade brasileira poderia ser judicializada. Afinal, não é difícil encontrar estados de coisas em nosso país que estão em desconformidade com a Constituição. Ainda assim, seria inviável levar todos esses problemas para o Judiciário. O aumento exagerado de ações estruturais pode levar à banalização e a ineficácia, fazendo-as cair em descrédito e deixando o segmento social que necessita da tutela judicial desamparado. Dessa forma, o presente artigo não busca orientações sobre como um juiz deve decidir um caso estrutural específico. O objetivo é olhar para a fase anterior: quais critérios o magistrado deve utilizar para identificar ações estruturais relevantes que devem ser tratadas no Judiciário? Para responder a essa pergunta, adota-se como metodologia de pesquisa, além da tradicional análise bibliográfica e documental, a realização de entrevistas com Ministros do Supremo Tribunal Federal, assessores, advogado da união, professores e advogados que atuam em ações estruturais. Com a realização de entrevistas, busca-se compreender melhor as ações estruturais e, a partir disso, propor critérios para identificar quais devem ser consideradas prioritárias. Adotamos o modelo de entrevista semiestruturada, mais flexível e dinâmico. Formulamos questionamento pré-definidos para todos os entrevistados, 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 663 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X mas com a possibilidade de novas perguntas serem feitas durante a conversa com o entrevistado. Quanto à divisão interna, o trabalho conta com três tópicos principais. No primeiro, veremos o aumento crescente de ações estruturais no STF, fenômeno que se intensificou a partir de 2020, durante a pandemia de Covid-19. Na segunda parte, são analisados os riscos de uma banalização das ações estruturais e como a judicialização excessiva pode comprometer a obtenção de uma tutela estrutural efetiva. Por fim, o último tópico propõe cinco critérios que podem auxiliar juízes a identificarem ações estruturais prioritárias. 2. O AUMENTO DE AÇÕES ESTRUTURAIS NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Em 2015, com o ajuizamento da paradigmática ADPF nº 347, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), tendo em vista a situação caótica e degradante do sistema prisional brasileiro, requereu que o STF reconhecesse um Estado de Coisas Inconstitucional do sistema prisional. O Estado de Coisas Inconstitucional (ECI) é um remédio estrutural, desenvolvido pela Corte Constitucional da Colômbia, em resposta a graves litígios estruturais de âmbito nacional, quando uma determinada realidade ocasiona grave e sistemática violação a direitos fundamentais. Inclusive, o sistema prisional colombiano, por razões similares ao do brasileiro, também foi declarado inconstitucional em 1998. Analisando os pedidos cautelares da ação, o relator, ministro Marco Aurélio, determinou que os juízes e os tribunais, entre outras medidas, estabelecessem, quando possível, penas alternativas à prisão; que a União liberasse o saldo acumulado do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), devendo ser utilizado em prol da finalidade para o qual foi criado, sendo proibida a realização de novos contingenciamentos; e reconheceu a existência de um ECI no sistema prisional do país (STF, 2015c, p. 30). A ação também apresenta uma ampla lista de pedidos finais, requerendo que o STF: declare o ECI do sistema penitenciário; determine ao Governo Federal que elabore, no prazo máximo de três meses, um plano nacional para superar, dentro de um prazo de três anos, o ECI; deliberar sobre o plano nacional, para homologá-lo ou para fixar medidas alternativas ou complementares; determinar aos governos dos Estados e do Distrito Federal que formulem e apresentem, no prazo de três meses, planos para a superação do ECI na respectiva unidade federativa, no prazo máximo de dois anos; deliberar sobre cada plano estadual e distrital; para homologá-lo ou estabelecer medidas alternativas (STF, 2015c, p. 15-18). Após seis anos, o ministro Marco Aurélio, em maio de 2021, logo antes de sua aposentadoria, apresentou o seu voto e acolheu vários dos pedidos de mérito, como o dever de o Governo Federal elaborar um plano nacional, no prazo de três meses, e a obrigação de os Estados e o Distrito Federal formularem planos específicos à realidade local, em harmonia com o apresentado pela União, visando à superação 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 664 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS do ECI em dois anos. Após o voto, o ministro Luís Roberto Barroso pediu vista dos autos e, desde então, o julgamento da ação segue pendente. Vale ressaltar que as medidas adotadas no julgamento da medida cautelar, como o descontingenciamento do FUNPEN, não têm ainda caráter estrutural. Não há a adoção de um conjunto de medidas com o objetivo específico de transformar a realidade constatada como inconstitucional. Por isso, entende-se que a referida ação, ainda que tenha caráter estrutural, pelos pedidos apresentados, até o momento não se tornou um processo estrutural, assim como outras ações no Tribunal4. Mesmo que o mérito da ADPF 347 não tenha sido julgado, a referência ao Estado de Coisas Inconstitucional possibilitou que diversas outras ADPFs fossem ajuizadas com base na técnica colombiana. Em 07.05.2020, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou a ADPF nº 682, requerendo a suspensão das autorizações para a criação de novos cursos jurídicos que ainda não iniciaram o seu funcionamento e a proibição da abertura de novas vagas em instituições privadas. Para a entidade, há um ECI referente à situação do ensino jurídico, em decorrência da violação sistemática ao art. 209 do texto constitucional, que garante a qualidade do ensino superior (STF, 2020a, p. 70). O relator, ministro Ricardo Lewandowski, em maio do mesmo ano, negou seguimento à ADPF, alegando que a OAB não utilizou o instrumento processual adequado para defender suas pretensões (STF, 2020a, p. 6). O ECI também foi utilizado pelos autores da ADPF 760, cujo objeto é a execução efetiva da política pública de Estado em vigor para o combate ao desmatamento na Amazônia Legal – o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (“PPCDAm”) – de modo suficiente para viabilizar o cumprimento das metas climáticas assumidas internacionalmente pelo Brasil. A ação faz parte da chamada “pauta verde”, conjunto de ações que tratam de relevantes questões ambientais. No julgamento da ADPF 760, conjuntamente com a ADO 54, a relatora, ministra Cármen Lúcia, reconheceu a existência de um ECI quanto ao desmatamento ilegal da Floresta Amazônica e de omissão do Estado brasileiro em relação à função protetiva do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Determinou também que a União, os órgãos e as entidades federais competentes, dentro de suas respectivas atribuições, formulem e apresentem, em 60 dias, um plano de execução efetiva e satisfatória do PPCDAm, especificando as medidas adotadas para a retomada de efetivas providências de fiscalização, o controle das atividades para a proteção ambiental da Floresta Amazônica, do 4 Existe, nesse sentido, uma diferença entre litígio, ação e processo estrutural. Litígio estrutural é o problema estrutural que se busca resolver e, geralmente, envolve a violação massiva e reiterada de direitos fundamentais. Ação estrutural é uma ação cuja petição inicial estabelece um pedido de cunho estrutural. O fato de a ação estrutural ser ajuizada não significa, entretanto, que ela será acolhida pelo magistrado enquanto estrutural. O processo estrutural, portanto, só ocorre quando o magistrado reconhece o caráter estrutural da ação sub judice e implementa medidas estruturais. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 665 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X resguardo dos direitos dos indígenas e para o combate de crimes praticados no ecossistema (STF, 2020b, p. 155-156). Após o voto da relatora, o ministro André Mendonça pediu vistas do processo, suspendendo o julgamento. Na ADPF nº 786, a Rede Sustentabilidade alegou que o Sistema Tributário Brasileiro se encontra em um ECI, visto que é regressivo, privilegia os mais ricos e promove a desigualdade social. O ECI decorreria de ações e omissões do Executivo e do Legislativo, como a não tributação de grandes fortunas e a alta carga de tributos sobre o consumo. Requereu que o STF determinasse ao Executivo e ao Legislativo a elaboração, em seis meses, de proposta de reforma tributária capaz de superar o ECI. Em 09.02.2021, o relator da ação, ministro Alexandre de Moraes, negou seguimento à ação, alegando que não cabe ao Tribunal reconstruir o Sistema Tributário Nacional e substituir o Congresso Nacional em sua função típica (STF, 2021a, p. 7). Para o ministro, além de existirem outros meios processuais aptos a defender os preceitos fundamentais envolvidos no caso, o partido deve impugnar especificamente as leis, os atos e as omissões normativas, caso a caso. Já na ADPF nº 822, dezoito entidades coletivas questionavam as políticas de saúde do governo federal no enfrentamento da pandemia de Covid-19, afirmando que existiria um ECI na condução da crise, com ameaça ao direito à saúde e à vida. A ação ficou conhecida como “ADPF do Lockdown”, visto que um dos pedidos liminares consistia na determinação, pelo STF, de medidas de lockdown por 21 dias. O relator da ação, ministro Marco Aurélio, acolheu o pedido para declarar o ECI na condução de políticas públicas destinadas à realização dos direitos à vida e à saúde (STF, 2021b). Dessa forma, determinou aos entes federados, sob a coordenação da União, medidas como a realização de campanhas educativas sobre as formas de prevenção da doença e a distribuição de máscaras em áreas de concentração populacional e de baixo percentual de adesão às medidas preventivas. Após o voto do relator, o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo, suspendendo o julgamento. Pedido similar foi apresentado na ADPF nº 866, ajuizada pela Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCON). Segundo a instituição, há décadas o país vivencia uma grave instabilidade do custeio do Sistema Único de Saúde (SUS), gerando um ECI na política de saúde pública brasileira, que foi agravado com a pandemia de Covid-19. Dentre os pedidos apresentados, a Associação Nacional do Ministério Pública de Contas (AMPCON) requereu a concessão de liminar para que todos os recursos disponíveis no Fundo Social do Pré-Sal fossem aplicados em ações e serviços públicos de saúde e no financiamento de atividades de ciência e tecnologia que se fizesse necessário ao enfrentamento da pandemia da Covid-19. O relator da ação, ministro Alexandre de Moraes, determinou o seu arquivamento em 16.07.2021, sob o argumento de que a AMPCON, por ser uma legitimada especial do controle de constitucionalidade, deveria demonstrar a pertinência temática entre os interesses de classe que defende e o objeto da ADPF (STF, 2021c, p. 5-6). No caso, o relator entendeu que não foi 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 666 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS demonstrada a conexão entre a política pública de saúde brasileira e a defesa dos interesses dos membros do Ministério Público de Contas. Na ADPF nº 973, setes partidos políticos, em colaboração com a Coalização Negra por Direitos, requerem que o Tribunal reconheça um ECI relacionado à população negra do país, caracterizado pela alta letalidade de pessoas negras em virtude da violência estatal e pelo desmonte de políticas públicas voltadas a essa parcela da população. As ações e omissões do Estado geram uma violação sistemática dos direitos fundamentais à vida, à saúde e à segurança, originando “[...] um estado de coisas inconstitucional fundado no racismo estrutural e racismo institucional que sustenta uma política de morte financiada e aplicada pelo Poder Público à população negra brasileira [...]” (STF, 2022a, p. 59). Para superar a realidade inconstitucional, as legendas pedem que o STF determine o desenvolvimento e a implementação de um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional. Até a data de conclusão desta pesquisa, a mais recente tentativa de utilizar o ECI ocorreu na ADPF nº 976. A Ação foi proposta pelos partidos políticos REDE Sustentabilidade e PSOL, bem como pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), em face de um ECI concernente às condições desumanas de vida da população em situação de rua no Brasil, decorrente de omissões estruturais de todos os Poderes e níveis federativos. Entre os pedidos apresentados na ação, estão a criação de uma Comissão de Enfrentamento à Emergência da População em Situação de Rua e a apresentação, em até 15 dias, de planos municipais, estaduais, distrital e federal para zerar a carência de abrigos institucionais permanentes para a população em situação de rua (STF, 2022b, p. 34-35). O relator da ação, ministro Alexandre de Moraes, convocou uma audiência pública para o dia 21.09.2022 e, após a sua realização, concedeu prazo de quinze dias para que os expositores da audiência encaminhassem dados, documentos e propostas que reputassem pertinentes à solução do litígio estrutural (STF, 2022b, p. 3). Em 25.07.2023, o ministro determinou, em decisão liminar referendada unanimemente pelo Tribunal, que o governo federal elabore um plano de ação e monitoramento para a efetiva implementação da política nacional para a população em situação de rua, no prazo de 120 dias. Também determinou que estados e municípios adotem medidas que garantam a segurança pessoal dentro dos abrigos institucionais existentes. Apesar do número de ADPFs que recorrem ao ECI, nem todas as ações estruturais no STF seguem o mesmo caminho. No mesmo período, tivemos outras ADPFs que levaram ao Tribunal graves litígios estruturais, sem que os pedidos tivessem por base a experiência da Colômbia. O primeiro exemplo é a ADPF nº 635 (STF, 2020), também chamada de ADPF das favelas, que questiona a política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro, especialmente a crescente letalidade da atuação policial em comunidades periféricas. A ação possibilitou uma audiência pública histórica, nos dias 16 e 19 de abril de 2021, com participações de 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 667 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X representantes de movimentos sociais, organizações e entidades relacionadas aos direitos humanos e às vítimas de violência do Estado. Durante a pandemia de Covid-19, tendo em vista a insuficiência das ações ordinárias para tratar de políticas de saúde complexas (STEFFENS; JOBIM, 2022, p. 729-731), duas relevantes ações estruturais foram ajuizadas no STF. Em maio de 2020, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) ajuizou a ADPF nº 709, tratando de dois problemas principais: (i) aborda a necessidade de adoção de medidas de proteção e promoção da saúde dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (PIIRC); e (ii) propõe medidas mais amplas voltadas aos Povos Indígenas em geral. No julgamento da medida cautelar, confirmada pelo Pleno do Tribunal em 05.08.2020, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, fixou algumas importantes medidas para a proteção dos grupos indígenas: criação de barreiras sanitárias que impeçam o ingresso de terceiros nos territórios dos PIIRC; criação de sala de situação para gestão de ações de combate à pandemia quanto aos povos em isolamento; necessidade de elaboração e monitoramento de um Plano de Enfrentamento da Covid-19 para os povos indígenas, com a participação do Conselho Nacional de Direitos Humanos, da Fundação Nacional do Índio (Funai), da Fundação Osvaldo Cruz, do Grupo de Trabalho de Saúde Indígena da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e dos representantes das comunidades indígenas (STF, 2020c, p. 33-35). A segunda ação é a ADPF nº 742, também de 2020, ajuizada contra ações e omissões do governo federal em relação ao enfrentamento da pandemia nas comunidades quilombolas (STF, 2020d). Em 23.02.2021, o STF julgou a ação, determinando que a União elabore, no prazo de 30 dias, um plano nacional de enfrentamento da pandemia da Covid-19, com providências e protocolos destinados à população quilombola. Além disso, o Plenário determinou que o governo federal deveria constituir, em até 72 horas, grupo de trabalho interdisciplinar e paritário, com a finalidade de debater, aprovar e monitorar a execução do plano de imunização, com integrantes, pelo menos, do Ministério da Saúde, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, da Fundação Cultural Palmares, da Defensoria Pública da União, do Ministério Público Federal, do Conselho Nacional de Direitos Humanos, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva e de representantes das comunidades quilombolas. Como os requerentes alegaram em suas iniciais, os povos indígenas e quilombolas, além de uma vulnerabilidade imunológica e sociocultural, também são vulneráveis politicamente, visto que são grupos minoritários e insuficientemente representados nas esferas políticas. “Em razão disso, as comunidades indígenas enfrentariam enorme dificuldade em ter os seus interesses contemplados nas instâncias majoritárias e teriam baixíssimo acesso a todo tipo de serviços públicos essenciais, tais como a educação, o saneamento básico e a saúde” (STF, 2020c, p. 6). 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 668 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS É comum o pensamento de que, em situações de crise, não seria útil conversar com o grupo afetado, para não atrasar a resolução do problema. Mesmo assim, o ministro Luís Roberto Barroso, no julgamento da medida cautelar, afirmou: Tampouco procede a alegação de que a pandemia demanda ações emergenciais e velocidade de resposta que autorizariam o afastamento extraordinário da participação indígena. O que se postula nesta ação é a complementação de tais ações com medidas que são imprescindíveis para torná-las eficazes e que não foram providenciadas pelo Poder Público, a despeito da sua atuação emergencial. Aí está a relevância e a necessidade da participação. Por isso se requer a elaboração de um plano concreto, com cronograma de implementação e identificação das autoridades responsáveis (STF, 2020c, p. 22-23). Na data de conclusão desta pesquisa, a última ação estrutural ajuizada no STF, sem o recurso ao ECI, foi a ADPF nº 991, apresentada pela APIB. A entidade requer que sejam adotadas providências voltadas a evitar e reparar graves lesões a preceitos fundamentais da Constituição, relacionadas às falhas e às omissões no que concerne à proteção e à garantia dos direitos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato. Elencando algumas das principais ações e omissões estatais que violam direitos fundamentais, a APIB aponta: Dentre as afrontas a tais preceitos, destacam-se principalmente: i) a abertura das Terras Indígenas de isolados e povos de recente contato à entrada de terceiros, como missionários, garimpeiros, madeireiros e outros ocupantes ilegais que buscam explorar ilicitamente o território, ou desrespeitar a autodeterminação dos povos; ii) o sucateamento e aparelhamento de entidades estatais especializadas em prover proteção para os povos isolados, como as Frentes e Bases de Proteção EtnoAmbiental, a Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (CGIIRC), dentre outras; iii) os ataques institucionalizados governamentais às terras dos povos isolados (STF, 2022c, p. 2). Ao julgar os pedidos cautelares pleiteados, o relator da ação, ministro Edson Fachin, deferiu algumas medidas importantes que estão de acordo com os princípios defendidos na pesquisa. Como exemplo, vale mencionar: a União deve apresentar, no prazo de 60 (sessenta) dias, contados inclusive durante o recesso forense, um plano de ação para a regularização e a proteção das terras indígenas com presença de PIIRC; a União deve disponibilizar dados que já deveriam ser públicos; a União deve demonstrar, junto à apresentação do plano, a existência dos recursos necessários à execução das tarefas, primordialmente daquelas consideradas prioritárias e mais urgentes; designar ao Conselho Nacional de Justiça 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 669 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X (CNJ), no âmbito do Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão, a instalação de um Grupo de Trabalho com prazo indeterminado, para acompanhamento contínuo de ações judiciais relacionadas ao tema (STF, 2022c, p. 57-58). Em dezembro de 2022, teve início o referendo das medidas cautelares. Após os votos dos ministros Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia, que referendaram a decisão do relator, o processo foi destacado pelo ministro Nunes Marques, ou seja, foi solicitada a interrupção do julgamento e a sua retirada do Plenário Virtual, para que seja deliberado presencialmente. Para encerrar a lista de ações relevantes, vale mencionar a decisão proferida pelo Tribunal em 04.07.2023, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 684.612. O caso tratava das falhas estruturais existentes no Hospital Municipal Salgado Filho, no município do Rio de Janeiro. O Tribunal firmou a tese de que: 1. A intervenção judicial em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos poderes; 2. A decisão judicial, como regra, em lugar de determinar medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem alcançadas e determinar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para alcançar o resultado (STF, 2023). 3. O RISCO DE BANALIZAÇÃO DAS AÇÕES ESTRUTURAIS A má utilização de ações estruturais, ou mesmo o seu uso frequente, sem que haja, efetivamente, um estado de coisas violador de direitos fundamentais, pode levar à sua banalização. Isso pode ocorrer de duas formas: a) pela judicialização excessiva de ações estruturais; b) pela judicialização de ações que não são estruturais como se estruturais fossem. Essa banalização provocaria, pelo menos, duas consequências negativas: a) a perpetuação de estados de coisas violadores de direitos fundamentais; b) o desgaste político-institucional do Poder Judiciário. É o que se verá a seguir. Ações estruturais, quando utilizadas corretamente e de modo estratégico, podem desbloquear os canais políticos e catalisar mudanças sociais. Essa mudança é capaz de melhorar a qualidade de políticas públicas ou mesmo de criar políticas que estejam aptas a lidar com o problema que se pretende superar. Além disso, auxiliam vítimas diretas desses problemas e indivíduos que, se não fosse por meio da ação estrutural, jamais acessariam a via judicial para pleitear a efetivação de seus direitos, de modo que certamente permaneceriam em um quadro calamitoso de pobreza e marginalização social. Com isso, não se defende, aqui, a utilização de ações estruturais como caminho principal para viabilizar reformas estruturais. É sempre mais interessante que as transformações pretendidas ocorram pelos canais políticos, seja de forma espontânea ou por pressão do povo. Entretanto, nem sempre se pode contar com a mobilização desses atores para a superação de cenários envolvendo graves 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 670 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS transgressões a direitos, razão pela qual o Poder Judiciário pode funcionar enquanto via alternativa e como meio de obtenção de resultados profícuos, mesmo que demorados. A não existência de ações estruturais, portanto, por certo, feriria a possibilidade de que as demandas de grupos vulneráveis cujas pretensões são sub-representadas ou não representadas nos canais políticos fossem atendidas, agravando ainda mais o cenário de desigualdade social existente no Estado brasileiro. No que concerne ao desgaste do Poder Judiciário, é certo que juízes não têm formação para intervir em questões que demandam conhecimentos técnicos de economia, administração e política, por exemplo. Essa, destaca-se, é uma das principais críticas feitas ao controle jurisdicional de políticas públicas. Cada vez que os magistrados interferem em questões de políticas públicas, sobretudo quando essa intervenção se dá por meio de uma ação estrutural e não de uma ação individual, ocorre um desgaste político-institucional em maior ou menor escala e retomam-se às tradicionais críticas, envolvendo a separação de poderes e a falta de capacidade institucional. Esse desgaste é ainda maior quando ações estruturais chegam ao Supremo Tribunal Federal. Apesar de ter sido construído para desempenhar, também, uma função política, já que a Constituição lhe atribui funções que, na maioria das democracias contemporâneas, estão distribuídas entre, pelo menos, três outras instituições (VIEIRA, 2008, p. 447), o STF ainda é visto e criticado como se fosse, tão somente, uma Corte Constitucional. Esse enfoque é pouco abordado e merece ser destacado, em que pesem as críticas dos juristas que discordam veementemente do papel político do Tribunal. O STF, no contexto de uma Constituição ambiciosa do ponto de vista normativo, acumula, hoje, as funções de tribunal constitucional, órgão de cúpula do Poder Judiciário e foro especializado. Além disso, teve seu papel político reforçado pelas emendas de nº. 3/93, e nº. 45/05 e pelas leis nº. 9.868/99 e nº. 9.882/99 (VIEIRA, 2008, p. 444), tornando-se, conforme aponta Oscar Vilhena Vieira (2008, p. 444), uma instituição singular em termos comparativos, seja a partir de uma perspectiva que analisa a sua própria história, seja de uma perspectiva que analisa a história de cortes existentes em outras democracias. Logo, por mais que discordem os críticos, o STF exerce, sim, uma função política, que lhe foi atribuída não por uma decisão própria dos ministros, mas pela própria Constituição e legislação vigentes no Estado brasileiro. Apesar disso, quando ações estruturais chegam ao Supremo Tribunal Federal, o Tribunal exerce, necessariamente, um papel interventivo no que concerne às funções de outras instituições, uma vez que precisa despertá-las de suas omissões ou inércia proposital, que ocorrem, comumente, com demandas não populares, que dizem respeito a pedidos de grupos vulneráveis e marginalizados. A atuação do STF na resolução de ações estruturais, portanto, exige que o Tribunal tenha que remar contra a maré, sendo, usualmente, contramajoritária. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 671 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X Em que pese a função contramajoritária ser própria do Tribunal e essencial à democracia, não raro ela provoca reações adversas por parte das instâncias políticas e mesmo do próprio povo brasileiro, fazendo que o STF, a depender da circunstância, tenha sua autoridade comprometida quando suas decisões não são cumpridas. Afinal, como destacava Alexander Hamilton, no Artigo Federalista nº 78, o Poder Judiciário não tem a chave do cofre ou a espada, de modo que, muitas vezes, depende da boa vontade do Executivo e do Legislativo para que suas decisões sejam cumpridas. Não é impossível ou raro, portanto, que o STF tenha certa dificuldade para implementar decisões de cunho estrutural, sobretudo quando as forças do Executivo e/ou do Legislativo estejam agindo de forma contrária à sua atuação. Isso gera, desse modo, um desgaste para o Tribunal, que prolata suas decisões, mas nem sempre tem apoio daqueles que são responsáveis por executá-las, acarretando que sejam, possivelmente, descumpridas. Nessas hipóteses, as decisões do STF acerca de casos estruturais podem ficar desacreditadas e perder o valor que poderiam ter, caso fossem ajuizadas de forma estratégica e precisa. Ações estruturais são um alerta de emergência: destacam um litígio grave e complexo, que está sendo ignorado pelo Poder Público. Se tudo for destacado, mediante uma hiperjudicialização, nada vai ser destacado. Os problemas mais graves serão equiparados a litígios mais simples e as ações estruturais perderão o seu poder de mobilização jurídica e política em relação a situações especialmente graves. Perdem, com isso, o Tribunal e as vítimas de violações massivas e reiteradas a direitos fundamentais, que se antes tinham uma chance no STF, ficam à mercê da boa-vontade política, que pode nunca acontecer. Com isso, também, dificulta-se ainda mais as promessas constitucionais estabelecidas no artigo 3º, I, III e IV, quais sejam: a de construir uma sociedade livre, justa e solidária; de erradicar a pobreza, marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e, por fim, de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de discriminação. Os entrevistados para a pesquisa mostraram preocupação com o ajuizamento excessivo de ações estruturais no STF. Para o Assessor 01 (2022), para não superlotar o Judiciário e o STF com ações estruturais que não poderão ser adequadamente tratadas pela via judicial, é necessário identificar os litígios mais graves que possibilitam uma intervenção judicial apta a produzir efeitos benéficos para o grupo afetado. Essa também é uma preocupação do Assessor 02 (2023), que alerta: “O excesso de judicialização favorece a banalização da ação estrutural, isso me preocupa. O capital político de uma Corte é construído gradualmente, por décadas. Quando tudo vem para o STF, isso pode comprometer a sua atuação e a imagem do Tribunal”. Os ministros também se preocupam com o excesso de ações estruturais. Para o Ministro 01, a intervenção judicial deve ser excepcional: “Deve-se verificar se o bem 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 672 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS jurídico é constitucionalmente tutelado e se a política pública adotada pelo governo é gravemente insuficiente, deficiente ou inexistente” (2022). Da mesma forma, o Ministro 02 (2022) teme uma banalização das ações estruturais com a superabundante judicialização de litígios estruturais, comprometendo a capacidade do Tribunal de fornecer uma tutela jurisdicional efetiva. No mesmo sentido, o Advogado da União (2023) que atuou na ADPF nº 709, mesmo reconhecendo o potencial das ações estruturais no STF, vê com preocupação o aumento das ações estruturais no Tribunal, o que pode gerar a banalização dessas ações e comprometer uma intervenção judicial efetiva. Para que o processo estrutural funcione, é preciso adotar uma visão global do Judiciário, ou seja, olhar para além dos casos individuais e pensar no impacto que muitas ações podem gerar no funcionamento do sistema de justiça e na sua capacidade de respondendo adequadamente aos problemas apresentados. É necessário pensar em uma decisão de segundo grau sobre quais critério utilizar para identificar ações estruturais prioritárias, tema do próximo tópico. 4. CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AS AÇÕES ESTRUTURAIS MAIS RELEVANTES O título do tópico fala em ações estruturais mais relevantes. É importante tratar a questão assim, pois o fato de uma ação estrutural não ser conhecida pelo Judiciário não significa que o problema apresentado é irrelevante. Na verdade, é possível que no futuro uma outra ação sobre o mesmo tema seja ajuizada e haja boas razões para conhecê-la e julgá-la. Porém, tendo em vista o risco de superlotar o Judiciário com ações estruturais que não poderão ser adequadamente tratadas pela via judicial, é necessário identificar os litígios mais graves que possibilitam uma intervenção judicial apta a produzir efeitos benéficos para o grupo afetado. Antes de prosseguir, há uma questão terminológica que precisa ser esclarecida. No tópico anterior, vimos que existem dois grupos principais de ações estruturais no STF: as que fazem referência à experiência colombiana e aquelas que identificam um litígio estrutural sem recorrer ao ECI. Os critérios aqui defendidos são aplicáveis a qualquer ação estrutural, ajuizada no STF e em outras instâncias, independentemente de uma referência na petição inicial ao Estado de Coisas Inconstitucional e à jurisprudência colombiana5. Dito isso, propomos que, no Brasil, sejam aceitas ações estruturais que tratem de graves, sistemáticas e específicas violações aos direitos fundamentais de um grupo vulnerável ou minoritário, devendo o Judiciário atuar subsidiariamente, diante da contínua inércia do Poder Público. Assim, cinco critérios devem ser utilizados e comprovados para que haja a priorização de uma ação estrutural: 5 Sobre a diferença entre ECI e processos estruturais, ver: FRANÇA, Eduarda Peixoto da Cunha. O futuro do Estado de Coisas Inconstitucional no Brasil: remédio judicial efetivo ou mera retórica? Revista de Processo. Vol. 342, ano 48, p. 365-392. São Paulo: Ed. RT, agosto 2023. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 673 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA Critérios para identificar as ações estruturais mais relevantes ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X 1. Graves e sistemáticas violações a direitos fundamentais. 2. Especificidade. 3. Grupo vulnerável ou minoritário. 4. Permanente inércia do Poder Público. 5. Subsidiariedade judicial. O primeiro é a necessidade de comprovar uma grave violação aos direitos fundamentais. Os entrevistados foram unânimes em reconhecer que as ações estruturais são necessárias em casos de graves e reiteradas violações aos direitos fundamentais. Existem realidades fáticas que violam direitos não fundamentais e, para sua alteração, exigem medidas estruturais. Não devem, todavia, ser prioridade para o Judiciário. Como ressaltou o Advogado da União (2023), não é qualquer falha do Poder Público que deve ser judicializada em ações estruturais. Por isso, os casos mais graves, com profundas e reiteradas violações aos direitos fundamentais, essenciais à dignidade humana e ao desenvolvimento básico do indivíduo, devem ser priorizados. O segundo critério é a especificidade. Devem-se priorizar violações aos direitos fundamentais bem delimitadas, em que seja possível identificar um grupo específico – ainda que a totalidade de seus membros não seja identificável –, a localidade em que ocorre e um recorte da realidade que seja factível de apreciação judicial. Ações genéricas dificultam uma intervenção judicial efetiva e um monitoramento adequado, além de facilitar a resistência do Executivo (SHARP, 1999, p. 163-164). O pedido da ação estrutural deve ser bem delimitado, pois pedidos muito amplos dificultam a atuação do Judiciário e um enfrentamento adequado do problema (ASSESSOR 02, 2023). O critério da especificidade contribui para evitar ações que questionam, genericamente, toda a política nacional de habitação, de saúde, de moradia ou de educação. Exemplo de ação estrutural genérica é a ADPF 866, na qual a AMPCON requereu o reconhecimento de um ECI de toda a política de saúde pública do país 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 674 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS (STF, 2021c, p. 5-6). Realmente, existem bons argumentos para dizer que várias políticas de saúde não realizam os mandamentos constitucionais. Entretanto, ajuizar uma ação para solicitar uma intervenção judicial que trata de todo o Sistema Único de Saúde é ignorar a complexidade da matéria, os diferentes serviços existentes no SUS e os limites da capacidade institucional do Judiciário para tratar de questão tão ampla. Da mesma forma, não passaria pelo critério da especificidade a ADPF 973. Ainda que o racismo institucional seja um problema estrutural, que vitima um grupo vulnerável, a amplitude dos pedidos da ação inviabilizam uma intervenção adequada pelo STF. Como mencionado na petição inicial, busca-se a construção de planos de ação pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios para enfrentar o racismo em instituições públicas e privadas diversas. Por fazer um recorte muito amplo da realidade, a ação acaba comprometendo a possibilidade de uma tutela estrutural efetiva. Então, o que seria uma ação específica? Para continuar na área de saúde pública, o problema das cirurgias ortopédicas no Estado do Ceará ajuda a compreender. Um usuário do Sistema Único de Saúde (SUS), portador de Espondilite Anquilosante Aguda, necessitava de uma prótese de quadril. Ao procurar o serviço público de saúde, foi informado dos problemas existentes para a obtenção do procedimento, como a insuficiência de médicos para realizá-lo, a pequena quantidade de hospitais credenciados e uma grande fila de espera (SANTANA, 2021, p. 137). Tendo em vista que a situação afetava uma coletividade que dependia do referido procedimento para ter qualidade de vida, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou a Ação Civil Pública, alegando que: havia reduzido número de hospitais credenciados junto ao SUS; faltavam profissionais especializados nos hospitais já credenciados, em virtude da não realização de concurso público; os recursos destinados aos hospitais habilitados eram insuficientes; faltavam equipamentos e estrutura física adequada nos hospitais já credenciados, situação que contribuiu para a existência de enormes filas de espera (FARIA, 2019, p. 77). O caso foi julgado em 24.11.2010, determinando-se que a União, o Estado do Ceará e o Município de Fortaleza adotassem as medidas necessárias à solução do problema da fila de espera das cirurgias ortopédicas de alta complexidade. O estado de coisas levado ao Judiciário era mais específico: uma grande fila de pacientes esperando as próteses de que necessitavam, enquanto faltavam investimento e infraestrutura para dar conta da demanda (FARIA, 2019, p. 81). Seria possível cogitar uma ação estrutural para tratar de todas as políticas públicas de saúde em nível estadual, mas quais as reais chances de obter um tratamento adequado desta demanda por parte do Judiciário? É factível esperar que o Executivo, voluntariamente, revise todas as suas ações em saúde pública mediante uma única ação judicial? Acreditamos que não. Assim, é aconselhável que as ações estruturais mais específicas, com recortes bem delimitados da realidade, sejam priorizadas. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 675 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X O terceiro critério é um dos mais relevantes: as ações estruturais prioritárias devem tratar de grupos minoritários e vulneráveis (WEAVER, 2002, p. 1631-1.632). Apesar de existirem autores que diferenciam as duas expressões (SÉGUIN, 2005, p. 11-14), optamos por adotar uma definição convergente entre os termos e que não depende da quantidade de pessoas que compõem o grupo (SODRÉ, 2005, p. 11-14). Estão nessa categoria os segmentos sociais que por circunstâncias externas – pobreza, falta de escolaridade e de poder socioeconômico – e por características intrínsecas – deficiências físicas e mentais, doenças graves, idade e orientação sexual – têm direitos ameaçados e encontram grandes dificuldades para influenciar os fóruns democráticos tradicionais (ROGERS; BALLANTYNE, 2008, p. 32). Cláudio Márcio do Carmo adota definição semelhante, explicando que: Nessa perspectiva, minoria pode ser definida a partir de uma particularização de um grupo, já que a maioria se define por um agrupamento generalizado, ou seja, por um processo de generalização baseado na indeterminação de traços, os quais indicam um padrão de suposta normalidade, considerada majoritária em relação ao outro que destoar dele. A vulnerabilidade advém, pois, de pressões desse suposto padrão de normalidade, que pressiona tudo e todos que possam ser considerados diferentes. A violência, por sua vez, tanto pode ser física quanto simbólica, originária dessa pressão, que, muitas vezes, na forma de preconceito e rejeição, marginaliza e discrimina o diferente (CARMO, 2016, p. 204-205. É comum que os grupos vulneráveis se encontrem em uma pobreza multidimensional (SEN, 2000, p. 114), comprometendo o exercício dos seus direitos fundamentais e privando-os de oportunidades para assegurar as condições necessárias para uma vida digna. Por terem características estigmatizadas pelos padrões dominantes, além de não terem poder político e econômico, tornam-se as principais vítimas da impermeabilidade das instituições democráticas (NUNES, 2016, p. 19). Em um contexto de constitucionalismo transformador, o Judiciário, sobretudo sua Corte Constitucional, desempenha um papel importante na proteção dos mais vulneráveis, especialmente quando os outros Poderes falham em garantir o mínimo existencial (ROA ROA, 2020, p. 4-6). Uma outra característica dos grupos vulneráveis parece ser o fato de que estes dificilmente conseguem modificar sua situação precária de vida, permanecendo no ciclo de pobreza e/ou vulnerabilidade 6. Isso ocorre por diversas razões. Uma delas, entretanto, é que esses grupos estão tão focados em garantir sua subsistência e condições mais dignas (ou menos degradantes) de vida que, muitas vezes, não 6 Essa ideia é trazida por: FRANÇA, Eduarda Peixoto da Cunha. O futuro do Estado de Coisas Inconstitucional no Brasil: remédio judicial efetivo ou mera retórica? Revista de Processo. Vol. 342, ano 48, p. 365-392. São Paulo: Ed. RT, agosto 2023, p. 11. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 676 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS conseguem direcionar atenção a esforços que permitiriam uma efetiva transformação de sua condição social 7 . Essa falta de perspectiva, portanto, retroalimenta o ciclo da desigualdade social e mantém uma hierarquia na qual os privilegiados permanecem numa condição de prestígio e os vulneráveis não conseguem se mobilizar para fugir da pobreza e marginalização social. A jurisprudência nacional já identifica alguns dos principais grupos vulneráveis. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende como hipervulneráveis (STJ, 2015a, p. 8) os indígenas (STJ, 2009); as crianças e os adolescentes (STJ, 2015b); os idosos (STJ, 2015a); as pessoas com deficiência (STJ, 2008) e as mulheres em situação de violência doméstica (STJ, 2018). Na jurisprudência do STF, incluindo as atuais ações estruturais, também são considerados como vulneráveis os quilombolas, os negros, as pessoas em situação de rua, os moradores de comunidades carentes e periféricas e os presos. A lista não é exaustiva, servindo apenas como um parâmetro para que o juiz identifique se o grupo afetado pelo litígio estrutural é minoritário ou vulnerável. O critério da vulnerabilidade é útil para evitar que litígios de caráter estrutural, que atingem predominantemente um segmento social com recursos econômicos e políticos para lutar por mudanças em outras instâncias, sejam judicializados. A ADPF 682 (STF, 2020a), que pedia o reconhecimento do ECI do ensino jurídico superior no Brasil, é um exemplo de ação que não passaria por esse critério. Mesmo que exista um estado de coisas em desconformidade com os preceitos constitucionais, a OAB não representa uma categoria profissional vulnerável e desprovida de acesso às instâncias políticas, pelo contrário. Em casos assim, em vez de arquivar a ação com base no princípio da subsidiariedade da ADPF, como fez o ministro Lewandowski, é possível negar seguimento com base na inexistência de um grupo vulnerável ou minoritário diretamente afetado pelo litígio. O quarto critério é a prolongada inércia do Poder Público. As ações e omissões estatais que contribuem para a existência do litígio estrutural não podem ser falhas pontuais e momentâneas; é necessário que haja uma permanente e injustificada inércia em solucionar adequadamente a questão (PUGA, 2021, p. 119-121). Normalmente, são problemas que se prolongam há anos ou décadas. A falta de um serviço público momentâneo ou falhas pontuais em uma política pública podem ser questionadas, mas não em uma ação estrutural. Por se tratar das mais graves violações aos direitos fundamentais, é preciso verificar a constância do problema. Dificuldades momentâneas ou a desorganização temporária da fila para a cirurgia de próteses ortopédicas não ensejariam uma ação estrutural. Por outro lado, uma permanente desorganização do sistema de saúde para lidar com a demanda por essas cirurgias, com uma fila que não diminui ao longo dos anos, a falta de investimento na infraestrutura necessária para realizar os procedimentos e a 7 Essa ideia é trazida por: FRANÇA, Eduarda Peixoto da Cunha. O futuro do Estado de Coisas Inconstitucional no Brasil: remédio judicial efetivo ou mera retórica? Revista de Processo. Vol. 342, ano 48, p. 365-392. São Paulo: Ed. RT, agosto 2023, p. 11. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 677 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X inexistência de novos convênios com hospitais poderiam justificar uma ação estrutural em conformidade ao quinto critério. Em alguns casos, o problema enfrentado pode até ser novo, porém a inércia e a indiferença com o grupo afetado são permanentes. As ADPFs 709 e 742 são um bom exemplo disso. Ambas foram ajuizadas em 2020, no mesmo ano em que a pandemia de Covid-19 se agravou no Brasil. Apesar de ser um novo problema de saúde, as comunidades indígenas e quilombolas, que são protegidas pelas ADPFs, sofrem constantemente com a exclusão social e política. Para esses segmentos sociais, as omissões públicas são reiteradas há muito tempo. Além disso, tendo em vista a emergência de saúde pública, não faria sentido esperar alguns meses ou anos para que o problema fosse tratado como permanente. Até lá, as comunidades poderiam ter sido exterminadas. Por último, o quinto critério, de grande relevância e diretamente ligado ao anterior, é a subsidiariedade da intervenção judicial. Idealmente, litígios estruturais não devem ser resolvidos no Judiciário. São problemas que estão no âmbito de competência do Executivo e do Legislativo e, por conseguinte, deveriam ser por eles identificados e solucionados. A sua judicialização é um sinal de que os outros Poderes falharam em suas atribuições e precisam do auxílio do Judiciário para reajustar a sua atuação e cumprir com suas obrigações constitucionais (FLETCHER, 2004, p. 1629-1631). Dito isso, alguns pontos precisam ficar claros, principalmente para acalmar os críticos. Primeiro, o Judiciário não deve ser visto como a primeira opção para solucionar o litígio estrutural, como frisou Sarmento (2022), mas como a última opção, quando outros caminhos foram tentados e inexistem alternativas à proteção efetiva do grupo afetado (MBAZIRA, 2009, p. 213-214). Razão que relaciona o quinto critério intimamente ao quarto. As omissões são prolongadas porque, geralmente, os grupos sociais afetados já se mobilizaram e pressionaram os órgãos públicos responsáveis pela solução do problema. Contudo, não conseguiram respostas ou, caso tenham obtido algum sucesso, as medidas adotadas foram insuficientes. Quando as outras portas se fecham, o papel do Judiciário como um fórum de protestos se torna mais necessário (CASIMIRO; MARMELSTEIN, 2022). A intervenção judicial se torna essencial, quando o grupo vulnerável já recorreu aos outros Poderes, mas não obteve respostas, ou quando sequer há interesse político em proteger o grupo. É o caso, por exemplo, dos presos. Como bem identificou o então relator da ADPF 347, ministro Marco Aurélio: A inércia configura-se não apenas quando ausente a legislação, mas também se inexistente qualquer tentativa de modificação da situação, uma vez identificada a insuficiência da proteção conferida pela execução das normas vigentes. Esse é o cenário legislativo dos direitos dos presos – as leis, versando-os, simplesmente “não pegaram”, não se concretizaram em proteção efetiva daqueles que deveriam ser beneficiados, e nada se 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 678 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS tenta para alterar isso. É possível citar, por exemplo, o fato de, mesmo instalada a mencionada Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara dos Deputados, constatadas as inconstitucionalidades decorrentes de sistema carcerário e notificadas diversas autoridades a respeito, não foram envidados esforços e propostas para modificá-lo. A ausência de medidas legislativas, administrativas e orçamentárias eficazes representa falha estrutural a gerar tanto a violação sistemática dos direitos, quanto a perpetuação e o agravamento da situação. A inércia, como dito, não é de uma única autoridade pública – do Legislativo ou do Executivo de uma particular unidade federativa –, e sim do funcionamento deficiente do Estado como um todo. Os poderes, órgãos e entidades federais e estaduais, em conjunto, vêm se mantendo incapazes e manifestando verdadeira falta de vontade em buscar superar ou reduzir o quadro objetivo de inconstitucionalidade. Faltam sensibilidade legislativa e motivação política do Executivo (STF, 2015c, p. 9). Em segundo lugar, a intervenção judicial não deve ser sinônimo de usurpação de competências. Pelo contrário, o Judiciário deve atuar para proteger o grupo afetado, apontar as falhas da Administração Pública e contribuir para que os órgãos responsáveis reajustem a sua atuação. Se é verdade que o Judiciário desempenha um relevante papel no constitucionalismo transformador, é igualmente verdadeiro que ele não é o protagonista na realização do projeto constitucional, tampouco detém o monopólio para determinar o conteúdo dos fins constitucionais ou estabelecer os melhores meios para alcançá-los. Verdadeiras transformações sociais podem ser estimuladas pela via judicial, mas só ocorrem com a atuação protagonista do Executivo, do Legislativo e da sociedade civil (ROA ROA, 2020, p. 7-8). Como alertam Diego Werneck e Evandro Süssekind (2022, p. 2586-2589), o constitucionalismo transformador não deve implicar uma “engenharia social judicial”, com juízes monopolizando a escolha de meios e fins sob o argumento de realizar uma técnica interpretação constitucional. Aqui, o pensamento pragmático mostra-se necessário. Ainda que alguns autores brasileiros tenham uma leitura reducionista sobre o tema, associando-o ao solipsismo ou ao autoritarismo judicial (STRECK, 2014, p. 35), os autores pragmáticos recomendam o contrário. Ao receber uma ação estrutural e analisá-la pelas lentes do pragmatismo, é preciso prudência sobre a necessidade de decidir o caso e o grau de intervenção judicial na questão. O juiz não deve buscar boas consequências apenas no caso específico (BUTLER, p. 2002, p. 279-280), Deve analisar os impactos sistêmicos de sua decisão, buscando tutelar os direitos em questão com o menor nível de perturbação no sistema jurídico. Dessa forma, um juiz pragmático não aceitará todas as ações estruturais para julgamento. Ele sabe que não dispõe de capacidade técnica para o grande volume de ações e, principalmente, está ciente de que a sua função não é substituir os representantes 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 679 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X democraticamente eleitos (ARGUELHES; LEAL, 2009, p. 201-208), mas contribuir para que saiam da inércia e deem atenção para os grupos esquecidos. Em resumo, a finalidade do processo estrutural não é tornar o juiz um administrador público, mas fazer o administrador público cumprir adequadamente o papel que já deveria estar desempenhando. Por isso, David Landau (2014, p. 1546) entende que medidas rígidas, como as estruturais, são justificadas desde que tenham como finalidade o aprimoramento das instâncias democráticas, não a sua substituição. Caso contrário, a sua utilização pode ter efeitos negativos na relação entre os cidadãos e as instituições políticas. De forma semelhante, Oscar Vilhena defendeu em sua entrevista que: O Judiciário não é o responsável primário para reformas estruturais, são as outras instâncias do Poder Público. A responsabilidade primária é dos poderes políticos. O Judiciário entra quando existe violação massiva de direitos e há omissão do Poder Público diante disso. Não se trata de usurpação de competências diante de um cenário desse tipo. [...] Para quem postula medidas estruturais, é bom ter cuidado que o Judiciário não substitua os outros poderes. A função judicial é levar a mudança das instituições públicas e a reformular a sua atuação judicial. Modificar a inércia e monitorar a superação desse estado de inconstitucionalidade (SERAFIM, ago., 2022). 680 Portanto, para evitar uma banalização das ações estruturais, é preciso que o STF e o Judiciário como um todo levem a sério o seu papel subsidiário e não aceitem a ação quando houver outro recurso efetivo para tratar do problema. Por último, cabe ressaltar que nem toda ação estrutural aceita pelo STF terá âmbito nacional. Na ADPF 635, por exemplo, temos o problema da segurança pública e a letalidade policial do Rio de Janeiro sendo questionados no Tribunal. O critério da subsidiariedade também deve ser aplicado aqui, ajudando a identificar ações estruturais que têm como objeto litígios locais, mas que precisam ser julgadas no STF. Quando existem razões que demonstram a insuficiência da Justiça Estadual ou da Justiça Federal para resolver o problema, deve-se recorrer ao Tribunal subsidiariamente. Isso pode ocorrer em duas situações: existência de prévias ações judiciais que tratavam do tema e foram ignoradas pelas outras instâncias ou não obtiveram uma tutela estrutural; e por existir fundado receio de alinhamento político e ideológico dos magistrados com a política questionada. Daniel Sarmento, advogado da ADPF 635, apontou a desconfiança do Judiciário do Rio de Janeiro para lidar com o litígio estrutural levado ao STF: Identificar quando ajuizar uma ação estrutural no Supremo depende de uma análise contextual, é você olhar para as alternativas e ver os seus prós e contras. Por exemplo, a ADPF das favelas poderia, hipoteticamente, ser 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS uma Ação Civil Pública no Rio de Janeiro. Já existia até uma ACP nesse sentido, mas o foco era a Favela da Maré. Só que a ação não andava, o Judiciário do Rio de Janeiro tendia a decidir em favor do governo e a ação não andava (SERAFIM, jun., 2022). No entanto, é importante ressaltar que o autor da ação não deve alegar, genericamente, a insuficiência das outras instâncias judiciais. Como regra geral, o STF não é a instância que deve julgar ações estruturais (FACHIN, 2018, p. 229). Processos desse tipo devem chegar ao Judiciário, quando necessário, mediante Ação Civil Pública. Por isso, para levar um problema local ao STF, é preciso demonstrar as tentativas prévias de resolução, o resultado insatisfatório da tutela judicial obtida e os indícios de que os magistrados competentes não estão dispostos a questionar a atuação do Poder Público. Caberá ao STF, com base nas circunstâncias do caso e nos argumentos apresentados, determinar se há uma exceção à regra da nacionalidade. Em futuras ações estruturais que tratem de problemas locais, recomenda-se que o Tribunal deixe claro que a ADPF 635 foi uma exceção e casos semelhantes só serão aceitos se comprovada a presença de razões excepcionais. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve como propósito apresentar ao leitor critérios para o reconhecimento de ações estruturais, tanto no Supremo Tribunal Federal quanto em outras instâncias do Poder Judiciário. Nesse sentido, foram reconhecidos os seguintes critérios: a) graves e sistemáticas violações a direitos fundamentais; b) especificidade; c) a existência de um grupo vulnerável ou minoritário; d) permanente inércia do Poder Público; e) subsidiariedade judicial. No que diz respeito ao primeiro critério, entende-se que não é qualquer tipo de cenário que deve ser considerado digno de uma ação estrutural, mas somente aqueles que realmente envolverem violações a direitos fundamentais que comprometem a dignidade humana e o desenvolvimento básico do indivíduo. Com isso, restringe-se consideravelmente os quadros que podem ser alvo de uma ação estrutural, evitando que toda e qualquer transgressão a direitos seja judicializada como se estrutural fosse. O segundo critério, o da especificidade, faz referência ao fato de que as violações mencionadas no parágrafo anterior devem ser bem delimitadas, sendo possível identificar o grupo vitimado, ainda que a totalidade dos membros não seja identificável. Esse critério foi estabelecido tendo em vista que ações genéricas dificultam consideravelmente uma intervenção profícua do Poder Judiciário, assim como o monitoramento da decisão estrutural implementada. O terceiro critério é o da identificação, na ação, de grupos minoritários e vulneráveis enquanto vítimas diretas do litígio em questão. Esse critério é muito relevante, pois delimita de forma significativa que ações serão prioritárias. Afinal, 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 681 MATHEUS CASIMIRO GOMES SERAFIM EDUARDA PEIXOTO DA CUNHA FRANÇA ORCID 0000-0002-3963-3783 ORCID 0000-0001-7163-923X apesar de muitas situações no Brasil envolverem a violação de direitos fundamentais, nem todas essas violações afetam os grupos aqui mencionados. A classificação dos grupos aqui utilizada, portanto, diz respeito a segmentos sociais que por fatores externos, como miséria, falta de escolaridade e de condições financeiras, por exemplo, ou por características intrínsecas como deficiências físicas e mentais, doenças graves, idade, entre outros, os quais têm seus direitos ameaçados e encontram óbices nos canais políticos para que suas demandas sejam atendidas, o que ocasiona que sua situação de vida permaneça a mesma, sem que haja qualquer tipo de melhora. Esses grupos, de tal maneira, em um contexto de constitucionalismo transformador, devem ser privilegiados no âmbito do Poder Judiciário, sobretudo no Supremo Tribunal Federal, a fim de que seus pleitos tenham a chance de visibilidade e lograr êxito. O quarto critério é a reiterada inércia do Poder Público, reforçando a ideia de que mudanças estruturais não devem ocorrer de modo prioritário pela via judicial. O Judiciário só deve ser provocado quando as alternativas políticas já foram acionadas e permanecem omissas. Apenas diante da não atuação das instâncias políticas e da permanência do quadro de graves violações a direitos, o Poder Judiciário deve, quando provocado, intervir. Estabelece-se, com isso, um vínculo com o quinto critério, que diz respeito à subsidiariedade da atuação judicial. Isso porque o quarto critério estabelece um privilégio das instâncias políticas na resolução de questões estruturais, mitigando possíveis críticas à interferência jurisdicional em questões de políticas públicas. Se não houvesse a possibilidade de judicializar essas demandas, a alternativa à inércia política seria a manutenção do estado de coisas violador de direitos e a perpetuação das transgressões a direitos de grupos vulneráveis, o que acarretaria um cenário completamente calamitoso. Entende-se que a adoção desses critérios, sobretudo no Supremo Tribunal Federal, tem o condão de mitigar as críticas que são direcionadas à atuação judicial no controle de políticas públicas e, principalmente, evitar que as ações estruturais sejam trivializadas. Apesar de não ser difícil vislumbrar que, no Brasil, vários são os cenários que escancaram a desconformidade das promessas constitucionais com a realidade, nem todos devem ser tratados pela via judicial com a roupagem estrutural, sob pena de banalizar esse tipo de ação. Recomenda-se, assim, que os critérios aqui estabelecidos sejam avaliados antes do reconhecimento ou não de uma determinada ação como estrutural. REFERÊNCIAS ADVOGADO DA UNIÃO. Depoimento [set. 2023]. Entrevistador: XXX. Realizada virtualmente, 2023. Entrevista concedida para a elaboração de tese de doutorado e utilizada neste artigo. 10 JOURNAL OF INSTITUTIONAL STUDIES 2 (2024) Revista Estudos Institucionais, v. 10, n. 2, p. 661 - 688, maio/ago. 2024 682 DECIDINDO QUANDO INTERVIR: CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR AÇÕES ESTRUTURAIS PRIORITÁRIAS ARGUELHES, Diego Werneck; SÜSSEKIND, Evandro Proença. Constitucionalismo transformador: entre casas de máquinas e “engenharia social judicial”. 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