A SEGURANÇA REGIONAL NO CONTEXTO
DO MERCOSUL
Shiguenoli Miyamoto
Professor Livre Docente/Associado
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
Departamento de Ciência Política
Núcleo de Estudos Estratégicos
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Fax – (55 11) 55 65 01 00
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UNICAMP – 2000
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A SEGURANÇA REGIONAL NO CONTEXTO DO MERCOSUL*
Shiguenoli Miyamoto
O objetivo do texto é analisar as relações de segurança no âmbito do
Mercosul. A partir de uma perspectiva geral, sobre a estrutura e o funcionamento
do sistema internacional, abordamos os problemas enfrentados pelos países do
Cone Sul, para implementar de maneira adequada o processo de integração
regional, principalmente no que diz respeito à questão da segurança. As
dificuldades encontradas, que abrangem um espectro variado de temas , vão
desde a preocupação com a idéia de Estado Nacional, com os parceiros
divergindo e defendendo seus interesses individuais, até o surgimento de novos
desafios que afetam a região como um todo, como o tráfico de drogas e o
terrorismo.
Introdução: uma nova ordem, um novo mundo?
O aumento da interdependência, observado nos últimos anos, têm feito com
que parte considerável das análises realizadas pelo meio acadêmico se dirija
para as questões estritamente econômicas. Afinal de contas, neste novo contexto
denominado globalizado, a agenda das grandes potências tem sido preenchida,
em sua maioria, pôr disputas no âmbito do comércio internacional. Acusam-se
mutuamente de adotarem práticas protecionistas, realizarem dumping, e outros
mecanismos contestáveis, ameaçando, como fazem os Estados Unidos, a lançar
mão da Super Cláusula 301, da Lei de Comércio americano.
Os interesses são tão fortes que a própria instituição responsável pela
fixação de regras para o funcionamento do comércio mundial, o Acordo Geral de
Tarifas e Comércio (GATT), não ficou imune a estas disputas e teve que ser
extinta, em meados da década de 1990, após a Rodada do Uruguai, sendo criada
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em seu lugar à Organização Mundial do Comércio (OMC), para atender as novas
demandas, principalmente de países como os Estados Unidos.
Mas não é apenas isto que tem acontecido. Em função de tais disputas,
cada vez mais intensas, e da importância crescente dos assuntos econômicos,
as potências, sem qualquer pudor,
opinião,
têm mudado rápida e freqüentemente de
de um momento para outro, contradizendo o que até há pouco
defendiam.
Como exemplo, podemos mencionar o caso da Casa Branca que, até
recentemente, criticava o governo de Pequim de violar os direitos humanos. O
governo norte-americano
escrava, ora
ora denunciava
o trabalho
infantil,
a mão-de-obra
os descuidos e a falta de uma política adequada pôr parte da
República Popular da China com a preservação do meio ambiente. Esta, ao
depredar os recursos naturais, portanto, sem tomar maiores cuidados, estaria
colocando
em risco
a todos no futuro, indistintamente de fronteiras, dada a
extensão do território daquele Estado asiático. Fazendo tais críticas, Washington
dificultava o ingresso da China em organismos internacionais como a
Organização Mundial do Comércio. Todavia, a entrada cada vez maior de
produtos chineses a baixo custo, extremamente competitivos, em mercados do
mundo inteiro, sem qualquer controle
- já que a China não tinha que prestar
contas de seus atos a nenhuma instância mundial - , fez com que as críticas norteamericanas fossem amenizadas, com Bill Clinton passando a sugerir o ingresso
da China como novo membro da OMC. Ou seja, este país ao fazer parte da
organização teria, portanto, que acatar as regras do jogo que vigoram no contexto
mundial. O que significaria, no limite, a perda de capacidade de competição dos
produtos chineses nos mercados internacionais, favorecendo, destarte , os
interesses das indústrias norte-americanas.
Além desse assunto, é claro que outros têm ocupado a atenção dos líderes
mundiais. Poderíamos listar entre estes últimos, tópicos que vão desde o tráfico de
drogas, - com a lavagem de bilhões de dólares e a corrupção de quase todas as
esferas governamentais dos países envolvidos - o terrorismo, as divergências
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étnicas e religiosas, até aquelas relacionadas com a preservação do meio
ambiente.
Temas como a migração e mão-de-obra estrangeiras igualmente se
converteram
em alvo das autoridades do mundo ocidental, tanto na Europa
quanto nos Estados Unidos, que têm dificultado cada vez mais a entrada livre de
cidadãos de outros países que queiram para lá se transferir em definitivo. Ainda
que acusados de manter posturas xenófobas , ao adotarem tal comportamento, os
países ricos têm procurado, conforme suas óticas, evitar assim a deterioração das
condições de trabalho de seus próprios cidadãos, e o acirramento da competição
da mão-de-obra em locais onde a taxa de desemprego e subemprego é
considerável e motivo de preocupação crescente.
Isto significa dizer que apesar das discussões cada vez maiores e mais
freqüentes, sobre a interdependência e a globalização, seja pela fusão de grandes
empresas, agências bancárias, e em praticamente todos os setores, seja através
do
intercâmbio possibilitado pelos meios de comunicação como a
internet,
ligando instantaneamente milhões de pessoas em todo o mundo, os temas
estratégico-militares, nem pôr isso deixaram de existir.
Fácil de constatar, podemos observar que, apesar de todo esse avanço e
dessas novas prioridades, nenhum país desativou suas Forças Armadas, depois
do final do conflito Leste-Oeste que movimentou a política mundial durante mais
de quatro décadas. Afinal de contas, as Forças Armadas sempre se constituíram
em agentes importantes, em qualquer circunstância, na paz e na guerra. Como
bem informa Daniel Prieto Vial, “as Forças Armadas são sempre necessárias se a
intenção é manter uma paz estável” (1).
A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), por exemplo,
sobreviveu a esse turbilhão de
mudanças. Além de se manter como a
importante instituição militar do planeta,
mais
inclusive alterou, a partir de 1991, sua
própria concepção estratégica, até então condicionada à defesa do território
europeu ocidental, sua tradicional esfera de atuação(2). Ao ampliar seu raio de
ação, tornou possível agir
onde se fizer necessário,
desde que isto seja
considerado crucial para os interesses do continente europeu, no âmbito político,
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econômico ou estratégico-militar. Nem a desativação do Pacto de Varsóvia, em
1991, com o desmantelamento do bloco soviético, foi motivo suficiente para que
o mesmo acontecesse com a OTAN. Daí as intervenções na Bósnia-Herzegovina
e no Kosovo.
Se as instituições castrenses continuam existindo, mesmo depois do
encerramento do conflito denominado guerra fria, é óbvio que desempenham
algum
papel.
Para
as
grandes
potências,
os
conflitos
militares
que,
prioritariamente, eram objeto de atenção, passaram a dividir a agenda com outros
assuntos, tão ou mais importantes, como os já anteriormente referidos, e tidos
como capazes de desestabilizar o sistema internacional.
Apesar do discurso contra as guerras, feito
líderes das grandes nações, a
quase todos os dias pelos
segurança é incontestavelmente elemento
ponderado no quotidiano de suas políticas. Talvez não no mesmo patamar que
ocorria no período da guerra fria, quando se colocava a possibilidade de uma
terceira guerra mundial. Mas sem dúvida alguma, a preocupação com a segurança
permanece. Todas as intervenções desta última década , incluindo o novo papel
da OTAN, ou as discussões sobre a segurança européia, apontam para esse
caminho.
Se os discursos das grandes potências convergem para uma mesma
direção pregando o pacifismo e o entendimento entre os Estados, as decisões e
ações os contradizem, mostrando que as políticas de defesa e de segurança
continuam tão ou mais sólidas do que antes.
Pôr que não há uma coincidência entre as intenções e as ações desses
Estados? Não é muito difícil encontrar as respostas para esse comportamento: os
países assim agem porque, no limite, estão conscientes e seguros de que o
sucesso de um modelo político e econômico, tornando possível que uma nação
pressione ou tome decisões ameaçando boicotar ou impedir que outros exercitem
ou ocupem papel em uma instância ou outra,
internacionais,
é assegurada em larga medida
detém no plano militar.
como nas organizações
pela capacidade efetiva que
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As ameaças feitas pelo governo norte-americano, em meados da década
de 90, de retirar-se da Organização das Nações Unidas, caso o egípcio Bouthros
Galli, então Secretário Geral, fosse reconduzido para um segundo mandato é um
exemplo muito elucidativo das políticas de poder adotadas pôr todos os Estados,
dentro de suas possibilidades, quando seus interesses estão ameaçados.(3)
Nada mais natural, portanto, que comportamentos semelhantes ocorram
também em outras latitudes do mundo, fora do eixo Norte-Norte, ainda que, em
um contexto mais amplo, os demais países estejam diretamente sob a esfera de
influência da hegemonia norte-americana. É o que ocorre, pôr exemplo, na região
austral do continente sul-americano.
Mesmo com o aparente final das costumeiras discordâncias que
movimentaram durante a maior parte do tempo
Brasil e
suas histórias, países como
Argentina têm , ainda, - apesar das boas intenções até aqui
demonstradas
-
que
percorrer
um
longo
percurso
para
se
sentirem
verdadeiramente integradas.
Os discursos otimistas feitos desde 1985, quando se iniciou o processo de
integração entre Buenos Aires e Brasília, e mais tarde aprofundado com a entrada
de Montevidéu e Assunção, construindo o Mercado Comum do Cone Sul
(MERCOSUL), sinalizam com clareza que, passados mais de uma década, os
objetivos iniciais estão longe de terem sido alcançados.
Como é natural nesses processos, divergências inúmeras em todas as
esferas, na melhor maneira de compatibilizar seus interesses – que, em
quantidades apreciáveis, não são coincidentes – têm dificultado o avanço da
integração até no âmbito estritamente econômico. Apenas para ilustrar, vale a
pena relembrar que nada é imutável nas relações entre dois ou mais países. Por
isso, apesar do processo de integração, com alguma frequência, autoridades dos
Estados membros têm defendido a saída de seus países do Mercosul, quando a
relação custo/benefício se apresenta desfavorável. Ou então chegando a adotar
medidas drásticas como fez o Brasil recentemente, em fevereiro do corrente ano,
ao resolver solicitar à OMC a abertura de um panel contra a Argentina para
resolver a disputa em torno do comércio bilateral de produtos têxteis.
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No plano político, as dificuldades continuam iguais, caminhando com mais
rapidez quando se trata de aspectos culturais e educacionais. No que tange à
integração militar, os pronunciamentos têm sido sempre cautelosos. Apesar de
realizarem manobras
conjuntas
dos Exércitos junto às fronteiras argentino-
brasileiras, como a Operação Cruzeiro do Sul em São Borja (Rio Grande do Sul),
em outubro de 1997; entre as duas marinhas na operação ARAEX em fins de
novembro de 1995, ou reuniões entre os Estados Maiores das Forças Armadas, a
cooperação efetiva entre as Forças Armadas de ambos os países ainda tem
deixado muito a desejar. (4)
Qual o motivo que tem dificultado o aprofundamento de uma integração
real, principalmente nas questões estratégico-militares? Há
uma razão muito
simples. A integração não ocorre com a velocidade desejada porque, apesar da
tão propalada crise do Estado Nacional, os governantes têm agido sempre – e
assim continuarão durante muito tempo - em busca das melhores alternativas, em
defesa de seus interesses nacionais, ou seja, de seus Estados como entidades
soberanas.
Não importa aqui discutir qual o grau de autonomia que cada um deles
usufrui em relação ao funcionamento do sistema internacional como um todo. O
que interessa ressaltar é que, juridicamente, todos têm suas políticas individuais
traçadas de acordo com seus próprios critérios, e definidos respeitando-se as
divergências internas, e atendendo às demandas desses grupos de pressão
domésticos. Neste caso, a influência dos parceiros externos é secundária, a não
ser quando eles mesmos puderem
ser afetados, colocando em risco todo o
processo.
Quando a situação interna, pôr exemplo, de um sócio como o Paraguai
puder prejudicar os demais, governos como o de Brasília sentem-se no direito de
ameaçar e intervir em seus assuntos particulares, utilizando como justificativa a
necessidade de obediência às cláusulas democráticas para pertencer ao bloco
regional.
Obviamente
que,
neste
caso,
levar-se levar em consideração,
igualmente, o fato de o país vizinho ser sócio do Brasil em grande
8
empreendimento como Itaipu que, afetado, colocariam em risco a segurança, os
interesses nacionais, atingindo todo o parque industrial brasileiro.
Naturalmente condutas desta natureza só são possíveis e aplicáveis aos
parceiros menores, situação considerada inimaginável para os casos argentino e
brasileiro. A não ser que tais pressões pudessem emanar de um país grande
potência como os Estados Unidos, se a segurança deste último estivesse em
jogo.
O que se pode constatar, portanto, é que o sistema internacional tem
funcionado desde sempre apoiado em relações de poder assimétricas. De
maneira semelhante o relacionamento intra-bloco, como no caso do Cone Sul,
nada mais é do que a reprodução dessa modalidade de comportamento. Sob
este prisma, a “nova ordem” dos tempos mais recentes, mutatis mutandis, pouco
difere daquela dos anos anteriores. É o que veremos a seguir.
Segurança Internacional e segurança regional
Pensada em termos mais gerais, a segurança internacional, nas décadas
passadas, esteve
vinculada permanentemente e diretamente com a idéia de
estabilidade e “bom funcionamento” do sistema mundial, atendendo aos interesses
das grandes potências, sejam quais fossem elas. Como se sabe, através das
conhecidas análises, a estabilidade do sistema pode ser obtida pôr mecanismos
diversos, como a existência
de um governo mundial, de uma política de
segurança coletiva, ou então através de um equilíbrio de poder entre os agentes
mais proeminentes que modelam o mundo conforme suas conveniências e
vontades.
No período pós-Segunda Grande Guerra, a estrutura de poder vigente
contemplou, primordialmente, os países líderes dos dois blocos, Estados Unidos
da América de um lado e União Soviética de outro. Pouco importava se esta
ordem era injusta, se não contemplava os países menores, e se havia ou não
agentes insatisfeitos com esta divisão do planeta.
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Na verdade, o critério de justiça simplesmente não se colocava, desde que
estivesse assegurada, nessa relação de poder bipolar, a estabilidade do sistema.
Torna-se aqui necessário chamar a atenção para o que se deve entender pôr
política mundial num contexto como aquele, em que as duas grandes potências
encontravam-se em um embate de vida e de morte. Como diria anos depois um
dos expoentes do realismo e figura importante no cenário político mundial, Henry
Kissinger, “a estabilidade muitas vezes resultou não de uma procura da paz, mas
de uma legitimidade aceita pôr todos”. Continuando, diz ele,
”esta ‘legitimidade’
não deve ser confundida com justiça. Significa apenas um consenso internacional
sobre a natureza de combinações que funcionem , e sobre fins e métodos
admissíveis para política exterior”. Ou seja, pressupõe “a aceitação da estrutura
da ordem internacional pôr todas as grandes potências, pelo menos até o ponto
em que nenhum Estado esteja tão insatisfeito que, a exemplo da Alemanha após o
Tratado de Versalhes, expresse sua insatisfação pôr meio de uma política externa
revolucionária. Uma ordem legitimada não torna os conflitos impossíveis, mas
limita-lhes a amplitude”.(5)
O equilíbrio do terror nuclear e a repartição do mundo em zonas de
influência, formalizado pelo Tratado de Yalta,
cada um sendo aquinhoado com
seu butim, foi o caminho encontrado para esta estabilidade, e que permeou o
cenário global durante muito tempo, tendo sido a característica básica do sistema
internacional até a desagregação de um dos lados.
Mesmo com esses arranjos,
em várias oportunidades, a segurança
internacional esteve seriamente ameaçada quando um dos contendores resolvia
ampliar suas áreas de influência adentrando espaços alheios, chocando-se contra
os interesses de seu principal oponente. Em situações como essas, a deterioração
das relações soviético-americanas, contribuía para a desestabilização do próprio
sistema internacional, colocando em risco todos os demais países, impotentes
para enfrentar circunstâncias de tal magnitude.
Mas, se de um lado, o globo se encontrava nitidamente bipolarizado, havia
espaços, ainda que reduzidos, para o surgimento de blocos como o do Terceiro
Mundo e de movimentos como o dos países não alinhados (que se formalizaram a
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partir de 196l na Conferência de Belgrado). Excluídos dos benefícios que foram
concedidos para a reconstrução da Europa ,
esses países – além da
característica comum de serem todos pobres e dependentes - tinham interesses
políticos e econômicos diametralmente opostos aos das nações industrializadas,
e possuíam discursos anti-colonialista e anti-imperialista. Achando-se à margem
das decisões mundiais, eram, portanto penalizados individualmente e em termos
coletivos regionalmente.
Neste
desfavorável,
quadro
que
se
lhes
os países periféricos
apresentava
de
maneira
francamente
enfrentavam dois tipos de problemas. O
primeiro, de escopo mais genérico, dizia respeito à sua
inserção internacional,
devendo optar, desde que já não estivesse em uma das zonas de influência, pôr
um dos dois subsistemas liderados pela Casa Branca e pelo Kremlim. Ou então,
permanecer alheio a esta disputa, fincando pé como não-alinhado, não usufruindo,
porém, das possíveis vantagens em ser aliado de um ou de outro.
Pôr isso, em regiões como na América Latina, a afiliação se dava pela
identificação política, econômica, cultural e geográfica com o modelo ocidental
capitaneado pelos Estados Unidos. Aqueles países do continente que, em um
momento de sua história desse período pós-guerra, desejaram ou tentaram
experimentar a outra alternativa sob a influência soviética, tiveram que amargurar
durante anos regimes ditatoriais, anticomunistas, considerando ser esta uma
região de hegemonia norte-americana.
A segurança regional estava, pois,
diretamente relacionada com a
estabilidade de todo o hemisfério, tornando-se imperioso seguir orientações que
atendessem aos interesses de Washington para o continente. Daí os princípios de
segurança hemisférica/continental para toda a região, demonstrada , por exemplo,
em 1965 com a intervenção na República Dominicana. Para tanto, cada país
atingido adotou políticas de segurança nacional com regimes de força,
contribuindo para dar a estabilidade necessária para o continente, reafirmando,
destarte a segurança regional.
Num segundo plano, - em termos mais localizados - se tomarmos como
exemplo, o relacionamento brasileiro-argentino, veremos que, apesar destes
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países acharem-se estreitamente sintonizados com a concepção de mundo do
american way of life, e devidamente amparados pela Doutrina de Segurança
Nacional, nem pôr isso deixavam de lado as querelas regionais. Principalmente
aquelas que diziam respeito à pressão demográfica , à utilização de recursos
naturais compartilhados,
ou as acusações de
tentativas de satelitização dos
vizinhos menores.
Estas divergências entre argentinos e brasileiros pela “hegemonia regional”
movimentaram durante incontáveis anos a política do Cone Sul, ora com menor
ora com maior intensidade. Nem a existência de modelos políticos semelhantes,
anti-comunistas serviria para reduzir suas diferenças locais.
A chance de um confronto mais grave pela via das armas foi motivo de
especulações constantes, com os departamentos de estratégias de ambas as
Forças Armadas, elaborando e reelaborando
continuamente as hipóteses de
guerra , traçando cenários para enfrentar o outro ator operando sozinho ou em
companhia de um ou mais vizinhos. Daí o grande número de
abordagens
geopolíticas dos dois lados da fronteira.
A possibilidade de uso da força para resolver contenciosos foi, portanto,
uma postura considerada perfeitamente normal no relacionamento da Bacia do
Prata, adotada principalmente pelo estamento militar. Obviamente que nem todas
as instâncias, como as diplomáticas e as econômicas,
pensavam ou
concordavam com esta maneira de solucionar divergências.
A peculiaridade dos anos 60 a 80, com os países do Cone Sul sob mandos
militares, todavia, levava os policy-makers a analisar as relações internacionais e
regionais sob estreitos parâmetros privilegiando o conflito. Pôr outro lado, podese ponderar que este comportamento deve ser visto como perfeitamente natural,
já que o militar pensa apenas na defesa de seu Estado, concebendo estratégias e
preparando-se para
combater não só
o inimigo interno (criado a partir da
Doutrina de Segurança Nacional), mas também o inimigo externo - que nunca
veio – visando preservar a segurança nacional. Neste clima, portanto,
segurança regional sempre esteve
a
ameaçada face à possibilidade de
desestabilização das relações entre os dois maiores atores da América do Sul
12
Com o fim dos governos militares em meados dos anos 80, e com as
rápidas transformações que estavam se processando no sistema internacional, que ainda não definiu claramente seu contorno definitivo – novos mecanismos
foram criados na região, introduzindo-se igualmente
outras formas de
relacionamento, visando privilegiar o aumento do grau de confiança recíproco
entre os parceiros do Cone Sul, abarcando brasileiros, argentinos, uruguaios e
paraguaios.
O fim das preocupações tradicionais?
Contrariando algumas expectativas
que esperavam um refluxo das
influências militares em negócios de Estado, o fechamento do ciclo militar latinoamericano não significou, pura e simplesmente, o retorno dos soldados à caserna.
Em países como o Brasil, o processo de redemocratização
negociado
preservou a autonomia e o papel das Forças Armadas (com estas conseguindo
garantias e condições bastante vantajosas para o seu afastamento do poder), e
difere bastante dos casos argentino e chileno. Enquanto no Brasil a volta dos
civis ao poder foi longamente amadurecido, - eliminando-se
ainda durante o
regime, a legislação repressiva e permitindo o funcionamento normal das
instituições, exceto a eleição direta para a Presidência da República
- na
Argentina os militares foram colocados no banco dos réus, enquanto no Chile a
influência castrense continua até hoje.
Como
conseqüência,
as
Forças
Armadas
brasileiras
continuaram
exercendo forte presença no cenário político nacional. Podia verificar-se isto
principalmente com o ex-ministro do Exército, general Leônidas Pires Gonçalves,
aparecendo em inúmeras solenidades, muitas delas não ligadas à sua Pasta, ao
lado do ex-presidente da República José Sarney, opinando sobre
espectro
variado de assuntos que incluía desde os povos das florestas ao meio ambiente,
da estrutura agrária aos movimentos sociais urbanos.
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No caso brasileiro, o final do governo militar significou o início dos debates
visando a elaboração de uma nova Constituição. Os parlamentares eleitos em
1986, ao compor a Assembléia Nacional Constituinte, tornaram-se, portanto,
responsáveis pela
Carta Magna, substituindo aquela que tinha sido outorgada
pelo regime militar em 1967 (e reformulada em 1969).
Ao lado das disputas
internas, prevalecendo, portanto, o livre jogo das
forças, possibilitadas pela reorganização – desde 1979 - dos sindicatos, dos
partidos políticos e dos demais setores da sociedade, como a Igreja, havia ainda
os lobbies internacionais. Estas últimas pressões se faziam principalmente pôr
intermédio das organizações não-governamentais, centradas em alguns assuntos
como a proteção do meio ambiente, as populações indígenas e a utilização dos
recursos
minerais
e
fundiários,
além
do
antigo
discurso
sobre
a
internacionalização da Amazônia.
Neste contexto, as Forças Armadas não só pressionaram eficazmente para
manter suas
prerrogativas, como também conseguiram fazer com
Constituição de 1988 se tornassem uma
que na
categoria diferenciada dos demais
funcionários públicos, agora como agentes de proteção do Estado. Pelo Artigo 142
da Constituição, as Forças Armadas converteram-se em instituições nacionais
permanentes e regulares, destinando-se à defesa da Pátria e à garantia dos
poderes constitucionais.
Além de preservar espaços e lutar contra o que consideravam um possível
revanchismo,--
verificado, pôr exemplo, na Argentina quando os militares
passaram a ser julgados pôr seus desmandos, situação considerada inadmissível
pelos militares brasileiros, já que a anistia vigorava para ambos os lados desde
1979 – as Forças Armadas brasileiras passaram a se preocupar com a segurança
do país de maneira mais organizada. Não apenas isto aconteceu, mas os anos
posteriores iriam mostrar que mesmo nas reivindicações salariais, os militares
sempre foram melhor aquinhoados em tempos de contenção de despesas. Assim,
considerando as peculiaridades da carreira, que os obriga a
deslocar-se
geograficamente, com certa freqüência, foram estabelecidas políticas salariais
distintas dos demais servidores públicos.
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Ao mesmo tempo que se assinava os protocolos de integração com a
Argentina, o governo brasileiro fazia, através do antigo Conselho de Segurança
Nacional, um projeto para ocupar a Amazônia, deixando que aquele grande
espaço ficasse desprotegido, o que dava até então
margem a especulações
sobre o futuro da região.
O projeto gestado pela Secretaria Geral do Conselho de Segurança
Nacional, ainda que fosse coordenado pelo economista Andrea Calabi, secretário
do Tesouro, e contasse com a participação dos ministérios da Saúde, do Interior e
das Relações Exteriores, além dos militares, era nitidamente de inspiração
castrense. Conhecido como Projeto Calha Norte – cujo
nome integral é
“Desenvolvimento e segurança na região ao norte das calhas dos rios Solimões e
Amazonas” - a
proposta consistia no incremento das relações bilaterais, no
aumento da presença militar na área, recomendando a criação e instalação de
vários pelotões ao longo de 6.500 quilômetros de fronteiras da Amazônia
brasileira, intensificação das campanhas de recuperação dos marcos limítrofes e
definição de uma política indigenista apropriada à região, tendo em vista
principalmente a faixa de fronteiras, a ampliação da infra-estrutura viária, a
ampliação da infra-estrutura viária, a aceleração da produção de energia
hidroelétrica, e a ampliação de recursos sociais básicos.(6)
Os motivos que levaram o governo a redirecionar suas atenções para a
região não só era fazer frente às pressões internacionais, que periodicamente
levantavam a bandeira da internacionalização da Amazônia, propondo inclusive o
surgimento
de um Estado indígena autônomo para os índios yanomamis, mas
também prevenir-se contra a presença dos guerrilheiros do M-19 colombiano que
estariam atuando muito próximos ao território nacional, além do contrabando e das
plantações de epadu .
A conduta do governo brasileiro reorientando-se para a Amazônia tinha sua
razão de ser: desde o final dos anos 70 quando se chegou a bom termo sobre o
contencioso de Itaipu, com a Argentina e com a redemocratização em curso , as
atenções brasileiras na Bacia do Prata passaram a ser gradativamente reduzidas,
voltando-se para o Norte do país, único rincão ainda inexplorado.
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Outros motivos como a ascensão do coronel Bouterse, simpatizante das
causas marxistas, ao governo do Suriname, foram levados em conta. Depois de
assumir o poder e de mostrar disposição em incrementar relações diplomáticas
com o governo de Fidel Castro, Bouterse passou a representar perigo potencial
naquela região do país. Pôr isso, medidas rápidas foram tomadas pôr Brasília
visando
neutralizar
influências consideradas nocivas junto
às fronteiras
brasileiras. As viagens a Paramaribo, do então chanceler Ramiro Saraiva
Guerreiro e do general Danilo Venturini, então secretário geral do Conselho de
Segurança Nacional, chefe do Gabinete Militar da Presidência da República e
Ministro Extraordinário para Assuntos Fundiários serviram para eliminar qualquer
risco à segurança nacional.
O Projeto Calha Norte implementado a partir de 1986 foi, então, pensado
dentro deste contexto. Inclusive porque o Tratado de Cooperação Amazônica
firmado em julho de 1978, pôr iniciativa de Brasília, com mais sete países da
região não estava dando os frutos desejados, até pôr falta de recursos
orçamentários.(7)
Outras iniciativas poderiam ser ainda aqui listadas. Pôr exemplo,
o
Programa Nossa Natureza, de 1989 que se caracterizou pôr ser uma diretriz
política de longo prazo, focalizando os seguintes temas: proteção da cobertura
florística, substâncias químicas e processos inadequados de mineração,
estruturação do sistema de proteção ambiental, educação ambiental, pesquisa
científica e a proteção do meio ambiente, das comunidades indígenas e das
populações envolvidas no processo extrativista.(8) Na realidade a perspectiva que
permeava este programa era também claramente militar, já que se tratava de
ocupar efetivamente o território para ver-se livre das acusações de que o governo
brasileiro não sabia proteger adequadamente os recursos aí existentes.
Mesmo a Escola Superior de Guerra, tradicional reduto intelectual das
Forças Armadas projetou cenários para o final do século. No documento intitulado
Estrutura do Poder Nacional Para o Ano 2001, reservava lugar para comentar as
políticas e estratégias para a Amazônia. Entre mais de duas dezenas de ações
estratégicas recomendadas podemos lembrar as seguintes: cristalizar em torno
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da liderança brasileira, os signatários do Pacto amazônico, implementado-o até
suas últimas conseqüências no plano internacional sul-americano e mundial;
perseverar no Programa Especial Calha Norte e em providências que tenham pôr
escopo a vivificação da linha de fronteiras; explorar o potencial hidroelétrico;
demonstrar à comunidade internacional, pôr ação de irradiação e nos seus
satélites
distantes,
a
firme
vontade
nacional
de
expandir
a
soberania
harmonicamente em todas as expressões do Poder Nacional, de modo integral, e
em todos os rincões da amazônica brasileira; fortalecer os eixos ecopolíticos
existentes.(9)
Além dessas iniciativas, não poderíamos esquecer, também, o projeto
denominado Sistema de Proteção da Amazônia/SIPAM com seu braço
operacional Sistema de Vigilância da Amazônia/SIVAM.(10) Entre seus objetivos
poderiam ser mencionados o controle do tráfego aéreo com a proteção aos vôos,
a vigilância ambiental, a coleta de dados via satélite, o mapeamento das florestas
e das queimadas (motivo constante das críticas internacionais, já que as mesmas
estariam contribuindo para o aquecimento do planeta, através do efeito estufa), e
o controle do tráfico de drogas. Para tanto seriam instalados cerca de duas
dezenas de radares fixos, seis radares móveis, demandando um custo inicial de
1,5 bilhões de dólares.
Com o documento sobre a Política de Defesa Nacional divulgado em 1996,
ficavam ainda mais definidos os interesses do Brasil na Amazônia. Na avaliação
do governo, segundo este documento, como se pode ler no item 2.12, “no âmbito
regional ainda persistem zonas de instabilidade que podem contrariar interesses
brasileiros. A ação de bandos armados que atuam em países vizinhos, nos lindes
da Amazônia brasileira, e o crime organizado internacional são alguns dos pontos
a provocar preocupação”. Nas diretrizes da política brasileira, estabelecem-se,
entre outros itens, “proteger a Amazônia brasileira, com o apoio de toda a
sociedade e com a valorização da presença militar: e, também, priorizar ações
para desenvolver e vivificar a faixa de fronteira, em especial nas regiões norte e
centro-oeste” (11)
17
Como se pode ver, as preocupações brasileiras com a segurança diziam
respeito prioritariamente à região amazônica, ficando em segundo plano a Bacia
do Prata, inclusive pelas iniciativas tomadas visando a integração dos países do
Cone Sul. Isto obviamente diminuía as atenções brasileiras na parte sul do
continente.
Se isto ocorria do lado brasileiro,
na ótica argentina dos anos 80 as
inquietações com o “perigo brasileiro” encontravam-se também minimizadas, mas
a Casa Rosada tinha que dar conta de outras tarefas como os dias de guerra nas
águas geladas do Atlântico Sul contra o Reino Unido, as querelas contra o Chile,
pelo Canal de Beagle e pela região dos gelos continentais.
A situação
argentina era bastante diferente da brasileira, porque geograficamente o país se
encontra em apenas
uma parte do continente, ao contrário do Brasil que tem
fronteiras com dez países, ocupa metade do território sul-americano e tem 15 mil
quilômetros de fronteiras terrestres e 7.500 de costas litorâneas.
Comparado com os anos anteriores, evidentemente, a situação das duas
últimas décadas era sensivelmente melhor, com o fim das doutrinas de segurança
nacional e com o retorno ao Estado de direito em toda a região.
O avanço dos acordos brasileiro-argentinos fato surpreendente até para os
mais otimistas, poucos anos antes, culminando com a construção do Mercosul
abarcando agora os outros dois vizinhos , de um lado passou a alimentar e
aumentar o grau de confiança recíproco no relacionamento desses mesmos
países. De outro , a existência da cláusula democrática imposta aos participantes
do Mercosul, reduziu a possibilidade de desestabilizações regionais, praticamente
inviabilizando tentativas de retorno às situações anteriores.
Mas, nem pôr isso, estas desapareceram. Prova disso é que nesse novo
cenário, vários temas tradicionais continuaram recebendo a atenção dos governos
locais. Isto não deve causar estranheza porque apesar dos processos de
integração - não concluídos – os interesses nacionais de cada país sempre foram
colocados em primeiro lugar.
Como se sabe, experiências dessa natureza precisam passar pôr longos
anos
de maturação, de negociações internas envolvendo os diversos agentes
18
interessados no processo, calculando os riscos, as perdas e os lucros, os
mecanismos de compensação para cada setor e as coincidências de interesses
com os demais países, a compatibilização de macro-políticas, etc. Pôr isso mesmo
foi prematuro fixar datas para a plena viabilização do bloco, como se fez no início
das negociações. Deveriam ter servido de exemplo, as dificuldades encontradas
pela própria União Européia, cujos experimentos de unificação datam de mais de
quatro décadas e não se chega a acordos definitivos para a elaboração de
políticas de defesa, segurança e externa comuns. Só depois que estas metas
todas forem alcançadas, é que se poderá, certamente, falar no fim dos Estados
Nacionais da região ou de outros blocos, culminando com um grupo homogêneo,
monolítico que, também, logicamente se transformará ao longo do tempo, como
qualquer outra instituição.
No caso do Cone Sul, as disputas para ver quem ocupa mais espaço no
cenário internacional – mesmo sob a égide do Mercosul –
puderam ser
observadas não só nas prioridades estabelecidas pôr Carlos Saul Menem, mas
também pôr Fernando Henrique Cardoso na disputa pôr uma vaga como membro
permanente do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas.(12)
No plano econômico os desentendimentos se sucedem,
como através das
divergências levadas no seio da Organização Mundial do Comércio tanto pela
fixação de quotas no setor automotivo, quanto em outros setores como os têxteis
ou alimentícios. Ou seja, cada país continuou pensando e agindo primeiramente
em prol dos interesses individuais, e jogando a culpa em seus parceiros quando a
situação interna se torna difícil, como se verificou no caso argentino a partir de
1999 já no final do governo de Carlos Menem.
Mas se essas divergências, tanto em termos econômicos quanto no plano
estratégico-militar continuam
ainda vigorando nesses anos mais recentes, pôr
outro lado é indiscutível que avanços significativos foram conquistados. Pode-se
mencionar, desde a criação, por iniciativa brasileira junto à ONU, da Zona de Paz
e de Cooperação no Atlântico Sul em 1986, a disposição do governo brasileiro em
finalmente concordar com o Tratado de Não-Proliferação Nuclear , em 13 de julho
de 1998, com o final do projeto nuclear desenvolvido pela Marinha em Iperó (no
19
estado de São Paulo), pelo Exército na Serra do Cachimbo (no estado do Pará, na
região norte do país), seja pela Argentina desativando o projeto Condor II , ou
ainda pelos acordos possibilitando inspeções de ambos os lados, submetendo-se
às
exigências feitas pela Agencia Internacional de Energia Atômica,
pelas
reuniões entre os Estados Maiores das Forças Armadas argentino-brasileiros, ou
pelos exercícios conjuntos reunidos os exércitos ora em território brasileiro ora em
terras argentinas.
A
visão conspirativa que durante anos serviu de bússola, orientando a
conduta das chancelarias e do estamento militar de ambos os países passou para
um estágio secundário, mas não foi eliminada. Daí as reticências para que as
Forças Armadas sejam efetivamente integradas. Como disse Guido di Tella é
impensável esta situação: “batalhões conjuntos, pôr enquanto, são pura fantasia”
.(13) Esta
conduta deve ser entendida como um fato dentro do previsto, já que
no cenário não só regional como no internacional, nada é imutável, apesar dos
discursos sobre o aumento da interdependência e da globalização.
Pôr isso mesmo, políticas de poder vigorosas continuaram sendo
implementadas nos anos 90, sem o menor constrangimento, pelas potências como
a China, a França, a Grã Bretanha ou pelos Estados Unidos, seja individual, seja
coletivamente quando interesses ditos nacionais ou a segurança internacional se
sentiram – segundo é claro suas avaliações muito particulares -- ameaçadas. A
França detonou em 1995 e 1996 na Polinésia, portanto longe do continente
europeu,
seis artefatos nucleares, antes de encerrar os testes. Para garantir
capacidade de dissuasão pelos próximos cinqüenta anos,
diria o presidente
Jacques Chirac antes de aderir ao Tratado de Rarotonga, que desnucleariza o
Pacífico Sul. A China procedeu de forma semelhante, pouco se importando com
as pressões e críticas internacionais, provindas não só dos outros governos, como
de inúmeras organizações não-governamentais principalmente aquelas de caráter
pacifistas e ambientalistas. Pequim não só agira assim, mas também ameaçou
utilizar a força contra Taiwan visando incorporar a ilha aos seus domínios.
Se isto é visível pouco se podendo fazer, quando se trata de grandes
nações, ou mesmo com outros Estados detentores de tecnologia nuclear, como a
20
Índia e o Paquistão, que também exercitaram seus experimentos nucleares, no
plano regional, idêntico comportamento é adotado
pelos atores de maior
capacidade.
Destarte, pode-se entender os motivos que têm levando a desconfianças
mútuas entre argentinos, chilenos, peruanos e brasileiros, quando um desses
países
anuncia
qualquer
tipo
de
aquisição
ou
modernização
equipamentos militares. A primeira providência adotada
de
seus
nesses casos, é
rotineiramente denunciar o vizinho, acusando-o de incrementar a corrida
armamentista no continente, o que estaria contribuindo para um possível
desequilíbrio de forças na região, portanto colocando em perigo a segurança
regional.
Estudo da própria Comissão Econômica para a América Latina – CEPAL,
inclusive mostrou que a tendência nos gastos em armamentos na região é
considerável. Ao invés de decrescerem, com a volta dos regimes democráticos, as
despesas simplesmente aumentaram, muitas vezes em desacordo com os
próprios investimentos na área social. De acordo com esse estudo os gastos
militares da América Latina e do Caribe atingiram a cifra de “25 bilhões de dólares,
em meados dos anos 90, tendo a participação média no gasto dos governos
centrais na região alcançado 9,7%. Os governos centrais da região gastam em
torno de um dólar em defesa para cada 1,1 dólar de gasto direto na educação e
0,9 dólar em saúde”. Em termos percentuais do produto interno bruto, no período
compreendido entre 1990-1995, a Argentina gastou 1,5%, o Brasil 1,2%, o Chile
3,3%, o Uruguai 1.8% enquanto o Paraguai destinou 2.2% de seu PIB para as
despesas militares (14)
Para Oscar Camilión, então ministro da Defesa argentino, os “governos do
continente devem adotar medidas para incrementar a confiança e a segurança
através do conhecimento recíproco dos planos militares no continente”. Mas ao
participar na Primeira Reunião de Cúpula Hemisférica de Ministros da Defesa,
realizada na cidade de Williamsburg, no estado norte-americano da Virgínia, em
julho de 1995, chamava a atenção para a integração dos blocos prevista para
2005. Dizia ele que “isto não era apenas um detalhe, mas sim um marco que
21
também reclama conseqüências no campo da defesa, já que todo processo de
integração regional tem implicações na defesa”.(15) Pode-se perceber pôr seus
pronunciamentos que, apesar de se tratarem de assuntos econômicos, a atenção
para as questões de defesa e de segurança não pode ser negligenciada devendo,
portanto, tomar-se as devidas precauções.
No mesmo ano, os militares argentinos sentiam-se um tanto incomodados
com notícias vindas do Chile, quando se divulgou que o governo da Casa da
Moneda pretendia fabricar o míssil Rayo, com alcance de 40 quilômetros, em
conjunto com o governo britânico.
Pôr outro lado, autoridades argentinas
divulgavam que tais notícias não
eram tão alarmantes já que possuíam o sistema Palmaria, ou seja, um canhão de
155 mm acoplado sobre chassis de tanque argentino mediano, com alcance de 37
quilômetros, o que lhes conferia, assim, paridade militar nesse terreno.(16)
Esta informação, na realidade, trazia certo grau de ansiedade, porque em
março daquele ano, haviam chegado à base de Antofogasta, no Chile, 25 novos
Mirage comprados da Bélgica, tendo sido anunciado que o governo chileno tinha,
ainda, planos para adquirir F 16 ou F 18 dos Estados Unidos, Grippen suecos ou
os Mirage 2000 franceses, para substituir os antigos A-37. E isto faria parte de um
plano de reequipamento que daria prioridade a aquisição de unidades de assalto
helitransportadas, e na aviação militar.(17)
A possibilidade de aquisição desses aviões inquietava fortemente o governo
argentino porque o “Chile já dispunha de cerca de cinqüenta aviões de combate
de primeira linha, enquanto a Força Aérea Argentina ainda não se tinha
recuperado pelos danos sofridos na guerra das Malvinas”. (18)Um dos temores
de Buenos Aires é que esta atitude de Santiago era fruto da não resolução do
problema relacionado com a região dos gelos, cujo tratado ainda não fora
ratificado pôr ambos os países. Em maio de 1996 o Exército chileno também
mantinha disposição em renovar seus tanques, adquirindo 150 unidades
alemãs.(19)
Preocupado Carlos Menem manifestou suas ansiedades para o
presidente Eduardo Frei, quando se encontraram na reunião de cúpula do Grupo
do Rio realizada em agosto de 1996.(20)
22
Enquanto isto se sucedia, os governos chileno e argentino decidiam criar
um Comitê Permanente de Segurança que teria como propósito fixar uma agenda
de trabalho, visando aprofundar matérias nessa área.(21) Ao mesmo tempo
Buenos Aires
não se descuidava, também, em solidificar relações com os
Estados Unidos, recebendo deste prioridade no tratamento regional, em virtude,
possivelmente das políticas adotadas pela Casa Rosada em participar das
operações internacionais comandadas pela ONU, tendo enviado mais de 1.600
soldados para países em conflito como o Chipre, o Haiti, o Kwait, entre outros.
Esta política preferencial demonstrada pelo governo norte-americano
privilegiando Buenos Aires teria, como se veria depois, reflexos imediatos. O Chile
que tinha intenção de adquirir os F16 dos Estados Unidos para equipar sua Força
Aérea anunciou, agora, sua disposição de comprar outro tipo de equipamento,
desta vez dos europeus. Como resposta, o governo de Bill Clinton viu-se forçado a
suspender o embargo de armas para a América Latina, tendo tanto ele, quanto o
Secretário de Defesa William Perry falando sobre a disposição de os Estados
Unidos estudarem a possibilidade de , em alguns casos, ceder armamentos
altamente sofisticados, mas sem incentivar a corrida armamentista na América do
Sul.(22)
Mesmo uma proposta de construir um organismo de segurança com o
Brasil, abrangendo os demais países do Mercosul foi levantada pôr Oscar
Camilión. A viabilização de tal acordo entretanto enfrentaria obstáculos desde
aqueles relacionados com a restrição orçamentária, já que cálculos iniciais
estimavam a necessidade de gastos da ordem de pelo menos 100 milhões de
dólares neste projeto, até as reticências do chanceler brasileiro Luiz Felipe
Lampréia que, em visita a Buenos Aires, em 20 de fevereiro de 1996, declarava
ser esta iniciativa ainda muito precoce.(23)
O tema da defesa era igualmente abordado pelo senador Eduardo Pedro
Vaca que propunha para seu pais que “o sistema de Defesa Nacional em
concordância com a política de integração regional teria de observar uma
concepção estratégica defensiva baseada na dissuasão convencional e no
equilíbrio cooperativo”. Para o senador o tema da defesa não deve ser esquecido,
23
porque há “uma irrenunciável obrigação do Estado Nacional de defender o povo
argentino”.(24)
Embora alguns setores das Forças Armadas ainda continuassem a
raciocinar sob os parâmetros antigos, considerando a possibilidade de choques
entre argentino e brasileiros, e defendendo que as hipótese de conflito tradicionais
deveriam ser levados em conta, o presidente Menem e o tenente general Martin
Balza em novembro de 1996 diziam claramente aos novos chefes de unidades do
Exército que isto não era mais motivo de preocupação, podendo-se descartar
qualquer tendência nesta direção.(25)
Como é compreensível, os países mais limitados como o Uruguai e o
Paraguai,
como parceiros menores do bloco , face à impossibilidade de
desenvolver políticas de poder efetivas frente aos seus dois grandes vizinhos, tem
se mantido à margem de disputas, pôr influencias no cenário regional.
A percepção que cada país tem de sua presença seja em cenário mais
restrito, seja no cenário mais amplo, como se sabe está diretamente condicionada
pelas capacidades de projeção de seu poder. Como os indicadores territoriais,
demográficos,
militares
e
econômicos
são
nitidamente
desfavoráveis,
comparativamente, as demandas de Uruguai e Paraguai estiveram mais voltadas
para o encaminhamento e resolução de seus próprios problemas no âmbito
doméstico, pôr exemplo, no caso paraguaio com recaídas dos princípios
democráticos. Ou do Uruguai, mais interessado em manter seu padrão sócioeconõmico procurando,
pragmaticamente, usufruir dos benefícios que as
condições favoráveis da integração do Mercosul lhe podem trazer.
Todos esses exemplos, até agora mencionados, tiveram como finalidade
apenas
mostrar que, apesar das grandes transformações nos cenários
internacional e regional, as orientações tradicionais persistiram no relacionamento
dos países sul-americanos, bem como no resto do mundo.
Não se tratou aqui de apostar no conflito, mas simplesmente de ponderar
que um período relativamente curto de cinco ou dez anos , ainda que sob novas
conjunturas, é insuficiente para que todas as concepções de mundo até então
vigentes sejam completamente substituídas.
24
Ademais, os conflitos continuaram existindo em todo o planeta, as
desigualdades não foram reduzidas e os Estados Nacionais tornaram-se mais
protecionistas do que antes, municiando-se para defender-se contra os efeitos
negativos da globalização – conspirando contra a idéia rotineiramente divulgada
de sua perda de função, daí sua desnecessidade. Não devemos nos esquecer,
ainda, que os militares de alta patente, responsáveis pela defesa e segurança de
todos os países, tiveram sua formação e preparação durante o clima da guerra
fria, sofrendo todas as suas influências e tendo toda uma vida profissional de três
ou quatro décadas sob conceitos antigos, difíceis de serem mudados de um
instante para outro. Ou seja, já eram coronéis ou generais quando findou o conflito
Leste-Oeste, mas foram socializados com os mesmos valores que permearam
todo aquele período.
O problema da segurança das fronteiras e as políticas de reequipamento e
modernização das Forças Armadas caminharam, assim, pari passu, às novas
modalidades de atuação de grupos solidamente organizados que passaram a
colocar de sobreaviso todos os países da região.
Como veremos a seguir, apesar de esses novos agentes nada terem a ver
com aquelas divergências que durante décadas
permearam as relações sul-
americanas, o que deveria, em princípio, facilitar a adoção de políticas comuns
contra o mesmo inimigo, não foi exatamente isto que aconteceu, pelos motivos
que agora passaremos a discutir.
A segurança no contexto atual
Ao lado dos tradicionais temas – fronteiras, armamentos, guerras, disputas
econômicas – que sempre ocuparam a agenda dos policy makers de todo o
mundo, as duas últimas décadas trouxeram a cena outras preocupações, como o
tráfico de droga e o terrorismo. Tão ou mais difíceis de serem combatidos do que
as até então existentes, esses novos desafios trouxeram problemas de complexa
25
solução, e que se tornam
mais complicados à medida que as discussões
avançam ou as decisões políticas são tomadas.
As modalidades de atuação de grupos envolvidos com o tráfico de drogas e
com o terrorismo no cenário doméstico, regional e internacional, na maior parte
das vezes às ocultas, de maneira não convencional, converteram-se em alvos de
atenção cada vez maiores,
impotentes
perante
essas
com
os governantes mostrando-se quase que
situações,
não
sabendo
como
combatê-los
eficazmente. Embora sempre ocorressem, esses assuntos passaram a assumir
intensidade cada vez
maior com o passar do tempo, convertendo-se nas
questões centrais dos anos mais recentes em todo o mundo.
Antes de abordarmos o caso específico do Mercosul, vale a pena tecer
algumas breves considerações sobre esses temas. Certamente existem inúmeras
discussões sobre o que se deve entender pôr tráfico de drogas ou terrorismo.
Ambos, como se sabe, são também manipuláveis em sua parte conceitual.
A idéia vigente de narcotráfico, pôr exemplo, é de origem norte-americana,
quando em 1981 a administração do então presidente Ronald Reagan cunhou o
próprio termo, passando a colocar em uma mesma categoria, coisas distintas.(26)
Como bem chama a atenção diversos autores que têm trabalhado com o
assunto, a Casa Branca “através de uma hábil campanha dos meios de
comunicação não somente
converteu o narcótico em sinônimo de cocaína
(apesar de não sê-lo), mas também fez com que ele fosse assimilado na
linguagem quotidiana, como o inimigo principal”. As implicações deste conceito
são óbvias: “passam a ser incluídas na categoria narcotráfico desde camponeses
que cultivam as plantas como seus antepassados, há séculos, até governos ou
guerrilheiros latino-americanos, segundo o caso, sem diferenciá-los” (27), “ com o
qual se generaliza o temor e se criam expectativas não realistas, motivando
soluções impossíveis” (28).
Distorce-se assim a realidade, de tal maneira que “todos são culpados do
problema de consumo de cocaína nos Estados Unidos e, de passagem, dos
problemas econômicos ou de violência na América Latina” (29)
26
Desta forma o “narcotráfico (leia-se cocaína) passa a ser considerado como
um perigo econômico e uma ameaça à estabilidade política e à coesão social”
(30). O narcotráfico assume, sob este prisma, uma dimensão imensurável,
passando a ser responsável pôr todos os problemas que afetam a América Latina,
já que “o poder econômico dos narcotraficantes, sua penetração no sistema
político e no aparato jurídico-constitucional constituem uma ameaça para a
estabilidade geral da economia e da sociedade” (31). Afetaria, desta forma, a
segurança
regional,
estando
o
continente
totalmente
à
deriva,
sem
o
funcionamento adequado de qualquer instituição.
O significado de terrorismo também sofreu modificações. Não há dúvidas
sobre o que se deve entender pelo tema
atualmente. O terrorismo é, pois,
percebido como forma não legítima de atuação utilizada pôr grupos que não
aceitam as regras do jogo nas disputas de poder. Estas últimas se dariam via
instituições de representação, pôr exemplo,
através dos próprios partidos
políticos, ou grupos de pressão, sendo que os terroristas
ao agirem
clandestinamente atingem alvos e populações civis , motivo pelo qual têm sido
discriminados em quase todas as partes do mundo.
Tal forma de encarar o problema implica em aceitar que esta definição de
terrorismo - como dizia o ministro do Interior argentino, Carlos Corach, ao abrir a
2ª Conferência Interamericana de Luta Contra o Terrorismo, realizada em Mar del
Plata em novembro de 1998, -“não inclui as questões de política interna (que
dizem respeito exclusivamente à autodeterminação dos Estados), mas apenas os
crimes cometidos pôr organizações internacionais” (32).
As consequências deste tipo de conceito são visíveis. Em primeiro lugar,
isentam os governantes dos países que, em regimes de exceção, utilizam-se dos
aparatos repressivos para se manterem no poder, praticando o terrorismo de
Estado. Em segundo lugar, desconhecem as reivindicações de povos oprimidos
que procuram constituir-se como novos Estados, ou terem reconhecidas suas
demandas, e que face às disparidades de forças só conseguem agir de outras
maneiras evitando o confronto direito com as forças organizadas do Estado que
combatem.
27
Pôr outro lado, o conceito também desconsidera as realidades existentes
no sistema internacional, já que poderosos Estados, quando têm seus interesses
contrariados
bombardeiam cidades e países em prol de uma concepção de
mundo, atingindo alvos e populações civis, como nos casos da Bosnia
Herzegovina, do Iraque e do Kosovo, apenas para lembrar alguns exemplos, sem
que nenhuma providência seja tomada contra eles.
O que se vai entender pôr terrorismo, igualmente depende de como se
consideram legítimos ou não -
de acordo com os interesses das grandes
potências, - os motivos que levam determinados agentes a atuar desta forma na
busca de suas reivindicações. Assim, a imagem construída sobre os terroristas é
de que eles precisam ser exterminados, porque ao agirem às escuras não
combatem segundo as regras do jogo.
Conforme
as conveniências e os momentos,
os conceitos mudam
radicalmente de sentido. Pôr exemplo, enquanto o líder palestino Yasser Arafat
falava na constituição de um território para seu povo, utilizando o recurso da
guerra, sempre foi considerado terrorista pelo Estado israelense. Mas nos anos
40, mais precisamente em julho de 1946, quando os depois líderes de Israel, entre
os quais Menachen Begin que chefiava o grupo Irgun, ou Organização Militar
Nacional, explodiram o Hotel
Rei David em Jerusalém, local controlado pelo
governo britânico, matando 91 civis, este gesto foi considerado como forma de
atuação legítima para pressionar o mundo e chamar a atenção para a
necessidade de um território para o povo judeu.(33) Reivindicações, aliás, mais do
que justas, e que deveriam ser igualmente aplicadas não só aos demais
habitantes da região, mas a todos os povos que fazem igual tipo de demanda no
mundo inteiro.
Como se pode constatar, são utilizados critérios diferenciados para se
analisar e aplicar fórmulas para resolver problemas semelhantes, de acordo com
os interesses do momento e com as capacidades do agentes envolvidos, sejam
eles Estados ou grupos.
Da mesma forma que esses assuntos têm assumido importância crescente,
ao lado dos demais temas tradicionais, na pauta de todos os países, nada mais
28
natural, portanto, que nesta parte do continente comportamento semelhante fosse
adotado. Assim, com o arrefecer das rivalidades estratégico-militares entre
brasileiros e argentinos, o
tráfico de drogas, principalmente, passou a se
converter no alvo maior de atenção regional, no que diz respeito à segurança não
só de cada país individualmente, mas do Mercosul como um todo.
Como sempre aconteceu em todos os temas, apesar de os quatro países
membros do mercado regional serem igualmente afetados, as respostas para
resolver os problemas não têm sido coincidentes. As visões têm sido distintas, de
acordo não só com as disputas internas de cada país, mas também conforme a
filiação que cada um deles apresenta em sua relação com o parceiro gigante das
Américas, os Estados Unidos.
sempre fez,
Como interessado maior, Washington , como
tenta impor seus pontos de vista para
a região, procurando
estabelecer políticas para todos, e querendo militarizar a luta contra os traficantes
de drogas e os terroristas.
Em alguns países da América Latina que se encontram mais afinados com
a visão norte-americana de resolução de problemas, o tráfico de drogas se
converteu em tema de segurança nacional. É o caso, pôr exemplo, do México e
das nações caribenhas, da Bolívia , do Peru , da Venezuela e do Brasil, enquanto
nos demais países, as abordagens são diferentes (34).
As instâncias responsáveis pelo combate ao problema também diferem.
Enquanto na Argentina não se chegou a um consenso sobre a utilização das
Forças Armadas para fazer frente ao narcotráfico, no Brasil as discussões se
sucedem, embora, os altos escalões militares tenham se posicionado contrário à
participação neste tipo de atividade, alegando não ser o seu papel, nem estarem
devidamente preparadas para tal.
Juntamente com o México e o Chile, o Brasil tem se manifestado contra a
criação de um organismo continental de defesa contra o tráfico de drogas, como
desejam os Estados Unidos. Ao inaugurar a Reunião de Cúpula de Ministros da
Defesa do Continente, realizada em Bariloche, em outubro de 1996, o ministro da
Defesa argentino Jorge Dominguez
manifestava-se claramente a favor de
29
cooperação
com
os
Estados
Unidos,
“mas
preservando
o
respeito
à
soberania”.(35)
Esta ressalva não era feita gratuitamente. Continuamente o governo norteamericano tem pressionado para que sejam criadas instâncias que uniformizem o
combate tanto ao tráfico de drogas quanto ao terrorismo. Em meados dos anos
90, pôr exemplo, dentre outros países, o Brasil rejeitou a idéia de terrorismo
internacional, da mesma forma que se manifesta contrária a organizações para
resolver esses problemas no continente.
Ou seja,
aceitar a concepção norte-
americana, significa abrir a possibilidade para que os Estados Unidos, em nome
da segurança, interfiram em qualquer país da região, rompendo formalmente com
a soberania dos mesmos.
As dificuldades enfrentadas pelos países da região para dar conta dos
problemas adequadamente, são visíveis tanto pelas divergências verificadas ao
nível interno de cada país, quanto nas prioridades que cada um deles dedica aos
temas. Para o Brasil a questão do narcotráfico é de suma importância, enquanto o
terrorismo é apenas tratado lateralmente. Já para os argentinos os dois assuntos
são importantes.
No caso brasileiro, o terrorismo não se fez presente no cenário político
nacional, ao contrário do que se sucedeu em Buenos Aires quando atentados
atingiram a Embaixada de Israel em 1992 e
a Associação Mutual Israelita
Argentina (AMIA), em 18 de julho de 1994, causando neste último caso em torno
de uma centena de mortos.
Mesmo não tendo sido atingido, isto não quer dizer que as autoridades
brasileiras não se tenham mostrado sensíveis ao tratar o tema do terrorismo
inclusive em função das pressões argentinas. Depois do atentado atingindo a
AMIA, e não tendo encontrado os responsáveis, o governo argentino passou a
criticar abertamente o Brasil alegando que este mostrava pouca vontade para
colaborar com as investigações, visando solucionar aquele crime. Os motivos das
críticas eram centrados no fato de que o Brasil não estaria vigiando
suficientemente a região da tríplice fronteira, onde estariam concentrados grupos
terroristas como o Hezbolah.
30
Segundo o secretário de Inteligência da Argentina, Hugo Anzorreguy, a
existência do Mercosul se transformava em um elemento complicador para
resolver problemas da magnitude do terrorismo. Ao participar de seminário sobre
“A Ameaça do Terrorismo Fundamentalista”, promovido pela AMIA , descontente
com a não resolução do atentado de julho daquele ano, Anzorreguy dizia que a
não identificação de pessoas que transitam nas fronteiras entre Argentina, Brasil,
Uruguai e Paraguai facilitaria a ação de grupos extremos (36).
As dificuldades eram agravadas porque para qualquer tipo de operação
conjunta envolvendo os países da tríplice fronteira eram necessárias várias
articulações entre pelo menos duas instâncias, como as Chancelarias e os
respectivos Ministérios da Justiça (37)
Contudo o governo argentino, pôr intermédio do vice-chanceler Fernando
Petrella rejeitava a participação do serviço secreto israelense nas fronteiras do
Cone Sul, como desejaria o presidente da Comissão de Defesa do Parlamento de
Israel, Ori Or (38).
As pressões norte-americanas e argentinas, pelo que se pode constatar
depois, dariam resultado. Tanto é assim que em março de 1996 anunciava-se que
a Argentina juntamente com o Brasil e o Paraguai assinariam um acordo
antiterrorista para patrulhar as fronteiras comuns.
Carlos Corach, ministro do
interior argentino diria naquela ocasião que “nossos países decidiram eliminar os
santuários físicos do terrorismo e do narcotráfico”, referindo-se à intenção de
eliminar os grupos terroristas identificados com o fundamentalismo islâmico (39).
Na prática esse acordo possibilitaria o livre trânsito de agentes federais nos
países signatários , agilizando as operações, e resolvendo uma das maiores
dificuldades encontradas até aquele momento (40).
Para o ministro Corach não havia problemas com as fronteiras argentinas,
mas o mesmo não poderia ser dito no que tange ao caso paraguaio-brasileiro,
onde existiria uma “ausência de controle”, com o “conseqüente crescimento de
grupos guerrilheiros islâmicos em Ciudad del Leste e Foz do Iguaçu” (41).
Pôr isso, se falava agora na criação de uma comissão para investigar a
atuação de terroristas na tríplice fronteira, mas desta vez, ampliando as instâncias
31
envolvidas, como a Polícia Federal, Forças Armadas e Ministério das Relações
Exteriores (42). Em março de 1998 os quatro países do Mercosul estabeleciam,
desta vez, um plano geral de segurança para a fronteira tríplice. Conforme este
novo plano, seria criado um “sistema único de controle na lavagem de dinheiro,
Os exemplos até aqui tomados servem para mostrar que a solução dos
problemas relativos tanto ao tráfico de drogas quanto ao terrorismo não seriam
solucionados apenas pelo fato de assinarem acordos e criarem comissões quase
todos os anos.
Os interesses envolvidos, bem como a incapacidade ou “má
vontade” que os países do Mercosul, individual ou coletivamente, demonstraram
nos últimos anos, apenas reforçam a idéia de que faltaram políticas mais firmes ,
melhor articuladas e sobretudo vontade política para realmente reduzir a atuação
dos grupos que têm agido no Cone Sul.
Considerações Finais
Ao longo do tempo as preocupações dos países que compõem o Mercosul
mudaram de enfoque. Se no primeiro momento, antes dos anos 80, a ênfase
básica era remetida à questão do anticomunismo e dos contenciosos brasileiroargentinos,
com as rápidas transformações do cenário mundial, outros itens
passaram a merecer atenção dos dirigentes e preencher a pauta dos governos da
região.
Apesar de novos itens serem acrescentados, como o tráfico de drogas e o
terrorismo, os outros que diziam respeito não ao anticomunismo, mas às
desavenças junto às fronteiras e às políticas de rearmamento ou modernização
das Forças Armadas continuaram existindo.
As ameaças de desestabilização da região, afetando a segurança regional,
foram de um lado neutralizadas pelos processos de integração entre esses países.
Mas, pôr outro lado, o tráfico de drogas praticamente alcançando todas as esferas
32
da sociedade e penetrando em todas as instâncias de poder desses países
trouxe perigos maiores corrompendo instituições e autoridades, tornando-se quase
impossível ser resolvido satisfatoriamente.
As divergências verificadas nos últimos anos , tanto em termos internos,
quanto na dificuldade para compatibilizar interesses externos, e envolvendo dois
ou mais países simultaneamente, além da extensão das redes principalmente do
tráfico de drogas, tem se convertido nos motivos maiores para o fracasso até
agora verificado.
O exemplo brasileiro é muito ilustrativo a este respeito, como pode ser
verificado recentemente, em abril deste ano. A não coincidência de interesses e as
divergências entre as instâncias responsáveis pelo combate ao tráfico de drogas ,
não se definindo exatamente quem deve ter a prioridade sobre o assunto,
terminaram pôr resultar na queda do próprio Ministro da Justiça, José Carlos Dias,
à qual está subordinada a Polícia Federal (linha de frente contra o tráfico de
drogas) e de Walter Maierovitch, responsável pela Secretária Nacional Antidrogas,
envolvendo o general Alberto Cardoso, chefe do gabinete de Segurança
Institucional da Presidência da República.
A morosidade com que as decisões e as ações têm sido implementadas
tanto interna quanto externamente contribuíram, ainda, para piorar a situação,
devendo-se levar, também, na devida conta que não necessariamente o que era
prioritário para um país era para outro. Como a própria imprensa costuma apontar,
o governo brasileiro, pôr exemplo, não faz a mesma avaliação que os Estados
Unidos para os problemas da região. Assim, Brasília considera que Washington dá
“demasiada importância ao combate ao terrorismo no continente, sendo que este
tipo de delito não é prioritário na área de segurança interna do país, ao contrário
do narcotráfico e dos crimes contra o meio ambiente” (43).
Mas, sem qualquer dúvida, o receio que os países têm de que esses temas,
da mesma forma que outros foram nas décadas passadas, possam converter-se
em pretexto para uma atuação mais agressiva dos Estados Unidos na região,
para salvaguardar a segurança regional e continental, tem feito, com que bem ou
mal, individual e coletivamente, os países
membros do Mercosul tenham se
33
dedicado a discutir e colocar na agenda do dia essas preocupações. Talvez não
com a dedicação e urgência que as mesmas demandam, e muito menos a Justiça
e os demais poderes têm agido com a rapidez possível e necessária para inibir e
dar conta desses novos desafios. Que certamente são mais perigosos e sutis,
afetando a sociedade como um todo de cada um desses países, convertendo-se,
portanto, em ameaça permanente
para sua segurança nacional e para a
segurança regional.
*Este texto contou com o apoio do CNPq através de Bolsa de Produtividade
em Pesquisa concedida ao autor para desenvolvimento do projeto “As
políticas sul-americanas de segurança regional”.
Notas bibliográficas
1. Cf. Daniel PRIETO VAZ – Defensa Chilena 2000. Una política de defensa para
Chile Santiago: Flacso, 1980, p. 45-51.
2. Uma boa análise sobre a OTAN pode ser encontrada em Patrícia Helena
VICENTINI – A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e a
incorporação das operações de paz no pós-guerra fria – a intervenção na
Bósnia-Herzegovina (1992-1998), Dissertação de Mestrado em Relações
Internacionais apresentada à Universidade de Brasília em setembro de 1998,
mimeografado. Sobre as mudanças na concepção estratégica da OTAN,
consultar o documento “The Alliance’s New Strategic Concept”, no site da
própria instituição.
3. Ver, pôr exemplo, o discurso do presidente da Comissão de Relações
Exteriores do Senado norte-americano, Jesse HELMS, “Os Estados Unidos e a
ONU”, Foreign Affairs., nº 1, p. 23-25, edição brasileira publicada pelo jornal
Gazeta Mercantil, de 11 de outubro de 1996.
34
4. As reuniões entre os dois Estados Maiores das Forças Armadas iniciaram-se
em 1987, quando promoveram em Buenos Aires, o 1º Simpósio de Estudos
Estratégicos Argentino-Brasileiro, e em São Paulo no ano seguinte.
5. As citações foram retiradas de Henry KISSINGER – O mundo restaurado, Rio
de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1973, p. 1 e 2.
6. O Projeto Calha Norte faz parte da Exposição de Motivos nº 18/85 e foi
encaminhada pelo general Rubens Bayma Denys, Secretário Geral do
Conselho de Segurança Nacional, ao presidente da República José Sarney,
em 19 de junho de 1985. Ver também o anexo E.M. n.º 770, sem data.
7. Sobre este projeto ver algumas considerações em meu texto intitulado
“Diplomacia e militarismo: o Projeto Calha Norte e a ocupação do espaço
amazônico”, Revista Brasileira de Ciência Política, Universidade de Brasília,
vol. 1, n.º 1, março de 1989, p. 145-163.
8. Cf. Presidência da República/Secretaria de Assessoramento da Defesa
Nacional – Programa Nossa Natureza, Relatório da Comissão Executiva
instituída pelo Decreto n.º 96.944/88, Brasília, fevereiro de 1989,
mimeografado.
9. Cf. Escola Superior de Guerra – Estrutura do poder nacional para o ano 2001,
Rio de Janeiro, 1990, especialmente a “Estrutura do Anexo B”, item IV ,
“Políticas e estratégias para a Amazônia”, p. 149-191.
10. Além dos inúmeros documentos oficiais sobre o assunto, é interessante
consultar, também, Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da
Câmara dos Deputados – “Projeto Sivam – Audiências Públicas 1995 – vol. I”,
Brasília: Centro de Documentação e Informação/Coordenação de Publicações
da Câmara dos Deputados, 1996.
11. O documento Política de Defesa Nacional, levado a conhecimento público em
1996, é o primeiro na história do país que tenta estabelecer as diretrizes de
atuação na área. Foi, também, este documento que precedeu a criação do
Ministério da Defesa em 1999, subordinando os 4 ministérios militares até
então existentes em uma única instância. Para consultar o referido texto,
35
consultar Parcerias Estratégicas, Brasília, Centro de Estudos
Estratégicos/SAE, vol. 1, n.º 2, dezembro de 1996, p. 7-15
12. Depois de muitas discussões, os governos dos dois países resolveram não
levantar mais o problema, mesmo porque os Estados Unidos passaram a se
mostrar pouco interessados na reformulação da instituição. Ver, pôr exemplo,
Marta SALOMON e Fernando GODINHO – “FHC e Menem selam trégua na
disputa de vaga na ONU”, Folha de S. Paulo. 24 de agosto de 1997., p. 1-4.
13. Cf. Rodrigo Bertolotto – “Integração militar começa, mas é lenta”, Folha de S.
Paulo, 11 de maio de 1997, p. 1-3.
14. Todas as cifras mencionadas foram retiradas do texto de Eugénio LAHERA e
Marcelo ORTÚZAR – “Gasto militar y desarrollo en América Latina”, Revista de
la Cepal, Santiago/Chile, n.º 65, agosto de 1998, p. 15-29.
15. Cf. “Planes militares a la recíproca”, El Diario Quarto Poder, 26 de julho de
1995,
16. Cf. Luis Garasino – “Los militares se preocupan por el desequilíbrio regional”,
Clarin, 08 de outubro de 1995.
17. Idem.
18. Cf. Daniel SANTORO – “Chile anunció que comprará 15 aviones
supersónicos”. Clarin, 09 de outubro de 1996.
19. Cf. “El Ejército chileno anunció una compra de 150 tanques alemanes”. El
Cronista Comercial, 10 de maio de 1996.
20. Cf. Daniel SANTORO, op. Cit. Cf.
21. “Cooperación entre Argentina y Chile”, SER 2000, n.º 9, junho de 1996.
22. Cf. “Dura advertencia de la Armada”, Clarin, 03 de outubro de 1996.
23. Cf. Alfredo CANEDO – “La cuestion militar com Brasil”, Ambito Financiero, 1º
de fevereiro de 1995.
24. Cf. Eduardo Pedro Vaca – “Lineamentos de política de Defesa”(Comunicación
Exped. S -1023/96), Câmara dos Deputados.
25. Cf. “Menem: no existen hipotesis de conflicto”, La Nación, 22 de novembro de
1996.
36
26. CF. Rosa del OLMO – “Drogas: distorsiones y realidades”, Nueva Sociedad,
Caracas/Venezuela, n.º 102, julho/agosto de 1989, p. 90.
27. Idem
28. Cf. Grant WARDLAW, “Linkages between the illegal drug traffic na terrorism”,
Conference on International Drugs: Threat and Response, Washington, DC,
1987, apud OLMO, p. 90
29. Cf. Rensselaer W. LEE – “The Latin American Drugs Connections”, Foreign
Policy, n.º 81, 1985/1986, apud OLMO, p. 90.
30. Idem.
31. Cf. John AULD , N. DORN & N. SOUTH – “Heroin now: bringing it all back
homes”, Youth & Policy, n.º 4, 1984, apud OLMO, p. 90.
32. Cf. Maurício Santana Dias – “Américas tentam conter terrorismo”, Folha de s.
Paulo, 23 de novembro de 1998, p. 1-10.
33. Cf. O Estado de S. Paulo, 02 de julho de 1996, p. A-10 e 21 de julho de 1996,
p. A-24.
34. Cf. Paz V. MILET (ed.) – Narcotráfico y seguridad en América Latina y el
Caribe – Informe Especial, Série “Paz y Seguridad en las Américas”,
Flacso/Chile e W. Wilson Center, n.º 15, dezembro de 1997. Ver
“Introducción”, escrita pôr Francisco Rojas ARAVENA e Paz V. MILET, p. 5-8.
35. Cf. “Dura advertência de la Armada”, Clarin, 03 de outubro de 1996.
36. Cf. Sônia MOSSRI – “Mercosul favorece o terrorismo diz Argentina”, Folha de
S. Paulo, 19 de dezembro de 1994, p. 2-8.
37. Cf. Daniel BRAMATTI - “Brasil define acordo antiterror”, Folha de S. Paulo, 30
de abril de 1996, p. 1-12.
38. Cf. Sônia MOSSRI, op. Cit.
39. Cf. Denise Chrispin MARIN – “Países assinam acordo antiterrorismo”, Folha de
S. Paulo, 19 de março de 1996, p. 3-3.
40. Cf. Daniel BRAMATTI, op. Cit.
41. Cf. Leo GERCHMANN – “Argentina busca terroristas no Mercosul”, Folha de S.
Paulo, 25 de novembro de 1997, p. 1-12.
37
42. Cf. Mariane COMPARATO – “Mercosul terá ação conjunta antiterror” , Folha de
S. Paulo, 27 de novembro de 1997, p. 1-18.
43. Cf. Augusto GAZIR – “Comitê da OEA unificará políticas antiterror”, Folha de S.
Paulo, 23 de novembro de 1998, p. 1-10.