Revista do Programa de Pós-graduação em Comunicação
Universidade Federal de Juiz de Fora / UFJF
ISSN 1981- 4070
Lumina
Distorções midiáticas do movimento Punk em
tempos de autoritarismo político
Regina Rossetti 1
David Santoro Junior 2
Resumo: Este artigo discute as distorções midiáticas da imagem do
punk durante o período da ditadura militar no Brasil. Trata das
origens do movimento punk no Brasil, apresenta suas ideias e
práticas políticas e analisa matérias publicadas na revista Veja entre
os anos de 1977 a 1986. O resultado mostra uma inadequação entre o
ideário político do punk e sua imagem divulgada pela revista Veja.
Palavras-chave: comunicação; jornalismo; punk.
Abstract: This paper discusses the media distortions of punk image
during the period of military dictatorship in Brazil. Deals with the
origins of punk movement in Brazil, presents his policy ideas and
practices and analyzes articles published in Veja magazine between
the years 1977 to 1986. The result shows a mismatch between the
political punk ideology and its image released by Veja magazine.
Keywords: communication, jounalism; punk.
Introdução
Segundo Bivar (2001), o punk foi influenciado por movimentos urbanos
como o existencialismo do pós-guerra, a geração beat dos anos 50 e os hippies
dos anos 60. Da filosofia existencialista herdou a contestação política e o
pessimismo em relação ao futuro. Os Beats nos anos 50 tinham em comum com
os punks o gosto por roupas escuras e a preferência pela esquerda, ambos
movimentos eram formados por estudantes miilistas e letrados que buscavam
uma forma de viver fora dos padrões estabelecidos. Para Gallo (2010), em
relação ao movimento hippie, embora, ambos fossem movimentos alternativos
de contestação da sociedade burguesa capitalista, o punk não acredita que o
amor supere a força. O punk é visceral seu discurso denunciava a podridão da
Prof. Drª. do PPGCOM da USCS Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Email: rossetti.regina@uol.com.br
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2 Mestre em Comunicação pela USCS Universidade Municipal de São Caetano do Sul.
E-mail: davidsantoro@ig.com.br
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sociedade, o lema "Faça você mesmo" significa que se você não tomar iniciativa,
ninguém fará nada por ti. O movimento punk também possui semelhanças
conceituais com o futurismo e o dadaísmo, que são o rompimento com os
valores do passado para criação do novo e a adoção do caos e o imperfeito como
linguagem.
O rock foi o meio de maior influência para o punk, nos anos 70, as
bandas eram virtuosas, com cantores e músicos técnicos, havia um afastamento
entre os músicos e o público devido ao conhecimento musical. Para O’Hara
(2005), o punk rompia com a barreira que separava plateia dos músicos, que foi
traduzido na camiseta que Jhonny Rotten usava, que dizia: Eu odeio Pink
Floyd. O punk-rock era simples e a forma de cantar era agressiva como um grito
ou urro, igual ao sugerido por Mario de Andrade em “Ode ao Burgues”, as letras
eram politizadas, tratavam do cotidiano, das dúvidas e incertezas dos jovens.
Para Garnet (2002), o primeiro Álbum dos Sex Pistols, de 1977, é o grande
marco da cultura, além de ser referencia para o início do movimento.
O Punk não morreu, é uma resposta aqueles que achavam que o
movimento era apenas uma onda, o uso desta mensagem, foi a maneira de
mostrar que os ideais punks eram verdadeiros.
Para Caiafa (1985), o punk se reinventou no início dos anos 80, surgiram
novas bandas como a americana Dead Kennedys e a Escocesa Exploited, que
impulsionaram o movimento. No Brasil as principais bandas desta fase são:
Cólera, Garotos podres e Ratos de Porão, que são referências para o estilo
mundial. Para Bivar (2001), no final dos anos 90 houve uma nova revigoração
do punk-rock com o trabalho de bandas como Green Day e Offspring, no Brasil
as bandas desta geração influenciadas foram: Chico Science e a Nação Zumbi e
os Raimundos.
Expoentes expressivos como os Sex Pistols e The Clash, foram
incorporados pela indústria musical inglesa, no Brasil, representantes como a
Plebe Rude, Legião Urbana e Camisa de Vênus, foram promovidos e explorados
comercialmente por grandes gravadoras. Garotos Podres, Cólera e Ratos de
Porão apostaram no circuito alternativo e foram mais autênticos, no final da
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década de 90, todos perderam espaço porque o discurso estava saturado devido
a alta exposição nos meios midiáticos.
Origens do punk no Brasil
Mendonça (2002) relata que a crise do petróleo em 1973 afetou o setor
financeiro nacional, o que ficou conhecido como “Milagre econômico”. Com
isso, setores como a classe média e a burguesia ficaram descontentes com o
governo, e, nas eleições para o Senado, elegeram candidatos do MDB, partido de
oposição à ARENA, que representava o governo do general Ernesto Geisel. Este
se viu pressionado e apresentou um plano de redemocratização, que seria lento
e seguro para os militares, o qual conduziria o país à democracia.
Padrós e Gasparotto (2009), relatam que em 1979 o presidente João
Batista Figueiredo apresentou ao congresso o projeto de anistia que foi
aprovado por 206 votos a favor contra 201, em 28 de agosto de 1979. Os
movimentos sindicalistas fortaleceram-se devido ao grande arrocho salarial e
condições de trabalho precárias e organizaram paralizações importantes no Rio
Grande do Sul e São Paulo na região do ABC.
A democracia era praticada em grupos como: associações de bairro, pais
e mestres, sindicatos e com o ressurgimento da União dos Estudantes (UNE).
Segundo Tureta e Duarte (2008), o Corinthians teve uma iniciativa que ficou
conhecida como Democracia Corinthiana, que contribuiu para a discussão sobre
redemocratização brasileira.
Para Padrós e Gasparotto (2009), O movimento Diretas foi uma emenda
constitucional proposta pelo Deputado Dante de Oliveira, que propunha
eleições diretas para presidente em 1985 e mobilizou milhares de pessoas, os
comícios foram liderados por Ulisses Guimarães, Franco Montoro e Tancredo
Neves e apoiado por artistas como: Toquinho e Gozaguinha. A emenda não foi
aprovada, mas o clamor popular fez com que Trancredo vencesse Maluf na
última eleição indireta para presidente.
Em 1985, ocorreu a primeira versão do Rock in Rio, festival que trouxe ao
Brasil ícones mundiais como Ozzy Osbourne e Iron Maiden, o evento quebrou o
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paradigma da indústria musical brasileira, que apostava em nomes consagrados
da MPB e no pop romântico.
O final da censura possibilitou que trabalhos artísticos, antes censurados,
passassem a ser exibidos nas televisões e rádios de todo o Brasil, a cultura punk
teve seu ponto mais alto e o rock nacional liderou as execuções das rádios. Em
entrevista para o Blog ABC Rock, Mao dos Garotos Podres informou que havia
um sentimento de liberdade, as autoridades liberavam as manifestações para
mostrar que a repressão havia passado, esta fase prosseguiu até 1989, quando
Fernando Collor foi eleito presidente de forma direta. A alta exposição do
movimento saturou a sociedade com informações, e como uma moda o punk
passou e deu espaço a novas ondas, como a Lambada, o Sertanejo e o Pagode.
Para Bivar (2001), o movimento surgiu numa época de crise, desemprego
e desesperança em relação ao futuro, os punks eram jovens trabalhadores mal
remunerados e buscam melhores condições de vida e reconhecimento social
O punk reflete a vida como ela é, nos apartamentos desconfortáveis
dos bairros pobres, e não o mundo de fantasia e alienação que é o que
a maioria dos artistas criam. É verdade que o punk destruirá, mas não
será uma uma destruição irracional. O que o punk destruir será
depois reerguido com honestidade. (BIVAR, 2001, p.59).
Caiafa (1985), descreve sua experiência com um grupo punk do Rio de
janeiro, que frequentavam o Meier e a Cinelândia, eles usavam jaquetas de
couro preto, adereços militares, alfinetes, braceletes com pregos e a suástica,
eles contrastavam com os jovens que frequentavam o beira mar e com a visão
poética da cidade, o relato registra a segunda fase do movimento, na qual, o
hardcore e o Oi, eram a evolução, o lema: Punk is not dead, marcou esta época e
foi o título do primeiro álbum dos Exploited e da revista editada pelo escritor
Gary Bushell.
Botinada (2006), relata a história do movimento punk no Brasil através
de depoimentos de personagens relevantes em suas localidades como: Fabio da
banda Olho Seco e Redson do Cólera de São Paulo, Wander Wildner dos
Replicantes do Rio Grande do Sul, Canisso dos Raimundos de Brasília e Marcelo
Nova do Camisa de Vênus da Bahia.
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O movimento iniciou-se devido ao descontentamento com o status quo,
no sudeste o movimento atingiu em sua maioria jovens da periferia e do
subúrbio da grande São Paulo, nos demais estados o movimento concentrou-se
nas capitais de Porto Alegre, Salvador e Brasília, na qual, teve a aderência de
jovens da classe média.
Há uma divergência entre São Paulo e Brasília sobre qual foi a primeira
cidade a aderir ao punk. Canisso, dos Raimundos, e Paulo Marchetti, jornalista
que publicou o livro Diário da turma: A história do rock de Brasília, defendem
que começou no Distrito Federal, por causa do registro do primeiro álbum dos
Ramones na cidade, em 1976. Ariel, da banda Restos do Nada; Clemente, dos
Inocentes; e Marcelo Nova, do Camisa de Vênus, defendem que a atitude punk
se iniciou em São Paulo. Em São Paulo, no final dos anos 1970, Kid Vinil tinha
um programa na Rádio Excelsior chamado “Rock Sanduíche”, no qual ele
executava bandas punk e new wave. Seu horário teve muito sucesso entre os
jovens que gravavam fitas K7 com as transmissões, para depois trocá-las com
seus amigos, ou então para tocar nos bailes. Em Salvador, Marcelo Nova era
locutor da Rádio Aratu FM, e, assim como Kid Vinil, divulgava as novidades do
punk que ocorriam pelo mundo afora. Para ele, Salvador era uma cidade
provinciana, na qual a censura e as críticas v inham dos familiares dos
proprietários das emissoras. O artista contou o caso da esposa de um dos
diretores da rádio, que pediu que ele tocasse “My Way”, com Frank Sinatra, em
vez da versão com Sid Vicious.
As revistas Pop e Som Três eram as principais fontes de informação sobre
música e comportamento para os jovens no final dos anos 70, Fabio do Olho
Seco possuía a Punk-Rock Discos, o local tornou-se um ponto de encontro para
punks, e contribuiu para o surgimento de bandas importantes, Fabio produziu a
coletânea Grito Suburbano de 1982, este trabalho foi uma iniciativa
independente com a contribuição financeira dos envolvidos como Inocentes e
Olho Seco. Ataque Sonoro de 1985, é o segundo registro e foi idealizado por
Redson do Cólera, que ficou conhecido por seu ativismo ambiental, social e
pacifico.
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Havia rivalidade entre os punks da capital, conhecidos como os da City,
que eram politizados e idealistas, com os do ABC, que diziam-se verdadeiros
punks, porque eram mais pobres e andavam de trem, para Mao dos Garotos
Podres, a destruição e luta foram mal compreendidos e o desentendimento
gerou conflitos que marginalizaram negativamente o movimento, além de
limitar a expansão filosófica e artística. O’Hara (2005), relata que a
agressividade era a forma de expressar o descontentamento (não no sentido
físico) e, embora o punk fosse pacífico, lutava por suas crenças, se preciso. Ariel,
complementa que a destruição é uma metáfora que significa reconstruir com
justiça e igualdade, Botinada (2006).
A frase do publicitário inglês David Ogilvy: “Comunicação não é o que
você diz, é o que o outro entende” pode ser aplicada ao movimento punk em
relação ao uso da suástica. O uso da suástica proposto por Jamie Reid, designer
gráfico que desenvolveu trabalhos para os Sex Pistols, Dead Kennedys e Green
Day, é controverso e polêmico. Por que mesmo que sua descrição altere o
significado da suástica, pode não ter sido compreendida por todos. Talvez a
ambiguidade dessa mensagem seja resultado da relação entre punks e
skinheads, que no início dos anos 1980 era confusa para quem estava dentro e
fora do meio.
Mesmo entre os punks não havia uma compreensão do uso da
suástica: “Certo dia, estava na Biblioteca Municipal, quando um
amigo de Cristina chega com o Marco, que trazia um estojo
estampado com a suástica nazista, que foi deixado sobre a mesa em
que ela estava. Ela começou a riscar a suástica, já ciente do que aquele
símbolo significava. Depois percebeu que já estava riscada”. (TURRA
NETO, 2004, p. 39).
Segundo Caiafa (1985), Wattie, vocalista do Exploited, usava um moicano
vermelho e uma camiseta com a suástica, embora o primeiro registro da banda
tenha sido em uma coletânea Oi e ela afirmasse não possuir relação política com
os skinheads. O Exploited foi a banda que revigorou o mov imento punk em
1982. Eles possuíam fama de fascistas devido à influência do estilo Oi e porque
eram adorados por punks e skinheads. Em 2012, em entrevista ao programa de
estúdio Som Livre, Wattie disse que era skinhead quando jovem e que sua
ligação com o grupo era só por causa da música. Na Escócia, seu país, o fascismo
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não existia, e punks e skinheads conviviam pacificamente. A má-fama de sua
banda se dava pela ignorância das pessoas, que não sabiam distinguir que, entre
a sua música e a produzida pelos fascistas, a única semelhança era a sonoridade.
Wattie ainda comentou que fez um show com o rapper Ice T, que é negro,
americano e tinha uma banda de hardcore, então se fosse racista, não dividiria o
palco com ele, mas mesmo assim dizem que a sua foto com o músico é uma
montagem.
Segundo Botinada (2006), para unificar os punks da capital com os da
grande São Paulo, as lideranças criaram o evento: Começo do fim do mundo,
que ocorreu no Sesc Pompéia em novembro de 1982, para criar um intercâmbio
sobre a cultura punk, e também para o lançamento do livro O Que é Punk? De
Antonio Bivar, o encontro foi amplamente divulgado pelos meios de
comunicação do estado de São Paulo, do Brasil e até mesmo de veículos
internacionais. O festival terminou em confusão e a polícia interviu, o que
contribuiu para confirmar má fama do movimento, João Gordo relata que o
programa Fantástico fez uma reportagem tendenciosa que ressaltou e distorceu
o real sentido da agressividade dos punks.
O 1º festival Punk do Rio de Janeiro aconteceu em abril de 1983 com
o título “Noites Cariocas” e contou com bandas de São Paulo. Durante
esse show que foi realizado no Circo Voador e na PUC o refrão gritado
em uníssono, foi “Pau no cu da Globo”. Ninguém deixou a Globo
filmar. (OLIVEIRA, 2006, p.38).
A repercussão fez com que os punks fossem discriminados, muitos
perderam seus empregos e a polícia ganhou o aval da sociedade para abordar
qualquer um que aparentasse ser punk.
Conforme Gallo (2010), os governos autoritários foram afrontados pelos
punks, que, como forma de subversão, usavam roupas e calçados militares, que
eram restritos aos membros das Forças Armadas. A adoção da vestimenta
militar dava um sentido contrário ao significado original, pois era uma maneira
de se apossar de um símbolo do estado repressor. Para Bivar (2001), atualmente
o punk é um movimento autônomo e global, a filosofia adequou-se as diversas
culturas das principais capitais, nas coletâneas atuais é comum bandas
brasileiras participarem em conjunto com americanas, inglesas e japonesas, isto
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é possível porque o movimento deu voz aos jovens que ansiavam por uma forma
de expressão. O movimento não é exclusivo dos menos favorecidos, jovens
rebeldes de todas as classes sociais se expressam por este meio, isto contribui
para o enriquecimento cultural. Segundo Oliveira (2006), nos anos 80 a banda
Olho Seco foi convidada à participar de uma coletânea inglesa, e foi sugerido
que a gravação fosse em inglês, Fabio, o cantor, recusou e condicionou a
participação em português. Bivar ressalta que a geração atual possui predileção
para a língua inglesa para que o protesto seja universal.
Para Bivar (2001), os meios digitais facilitaram o lema “Faça você
mesmo”, as novas ferramentas possibilitam que o trabalho seja distribuído por
portais como o MySpace, ou então no Site ou Blog da própria banda. Há os
fanzines eletrônicos em formato de e-book, Blog, a ideologia do faça você
mesmo, expandiu-se e qualquer pessoa pode publicar algo independente,
passados 40 anos de seu surgimento, o movimento continua juvenil.
Com todas as polêmicas e contradições, o movimento punk brasileiro
abriu as portas para novos artistas, em 1985 a música brasileira foi invadida por
uma geração talentosa influenciada pelo punk, no setor editorial os fanzines
abriram caminhos para revistas experimentais, a irreverência punk afrontou
símbolos das forças armadas e inspirou a moda, atualmente é comum peças
com motivos camuflados e calçados que lembram coturnos. Marcas como a
Orient Relógios e Vitorinox desenvolvem coleções com estilo militar, além do
Jippe Hummer da GM, que inicialmente era um veículo de guerra e foi
adequado para uso popular, mas isto não significa que a moda e a indústria
desenvolvam produtos assim por influência direta do movimento punk, porque
as culturas periféricas influenciam a dominante e o referência é perdido.
Ideário político do movimento Punk
Para O’Hara (2005), o movimento punk associa-se ao anarquismo,
porque este regime rompe com o governo constituído e prega a igualdade entre
os homens, ou seja, parte do princípio de igualdade, no qual todos exercem a
cidadania e são responsáveis pelo seu espaço na sociedade com direitos e
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deveres. Sem um poder centralizado, o monitoramento social é feito pelos
cidadãos, no qual um supervisiona o outro.
Todo o governo é indesejável e desnecessário. Não existem serviços
fornecidos pelo Estado que a própria comunidade não possa fornecer.
Não precisamos de ninguém para nos dizer o que fazer, tentando
controlar nossas vidas, nos atormentando com impostos, regras,
regulamentos e vivendo à custa de nosso trabalho.(O'HARA, 2005,
p.73)
Em 1907, Errico Malatesta definiu a anarquia da seguinte forma:
anarquia é uma palavra grega, que significa sem governo. O estado anarquista
não possui um governante central que determina o que deve ser feito pelo seu
povo. O poder do governo anarquista é baseado na ética e no respeito que
deveria haver entre as pessoas, cada indivíduo seria um governante. Porém
anarquia foi interpretada erroneamente, e hoje é sinônimo de desordem, talvez,
isto seja resultado da argumentação que a classe dominante exerceu para
manter-se no poder. Para Oliveira (2006), é impossível afirmar que todos os
punks tenham consciência do que a anarquia significava, o fato, é que o símbolo
da anarquia estampava capas de discos, camisetas e botóns, e foi tema de
músicas como a: Anarquia Oi dos Garotos Podres e Anarchy in the UK dos Sex
Pistols.
Para O’Hara (2005), a ideologia punk adota o anarquismo, porém isto
não significa que não existam punks de esquerda, comunistas, direita e
capitalistas. O movimento compartilha com os anarquistas os valores de
igualdade e liberdade, os punks europeus são mais engajados politicamente que
os americanos, o que reflete no trabalho das bandas e fanzines que militam
politicamente em seus trabalhos, a primeira geração atualmente é chamada de
punk 77, a segunda iniciou-se nos anos 80 é mais engajada política e
socialmente, bandas como Dead Kennedys transformaram simples roqueiros
em indivíduos ativos nas questões sociais. O ativismo político e artístico de Jello
Biafra, levantou discussões positivas sobre os ideais do movimento punk, em
1979 ele foi candidato a prefeito de São Francisco e entre 10 candidatos, ficou
em quarto lugar, uma de suas propostas era que cada policial fosse eleito pela
população, porque ela teria direito de escolher quem as controlariam. O motivo
que o levou a ser candidato, seria provar que a eleição em São Francisco não era
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real, e sim uma batalha entre diferentes setores da direita, os votos que recebeu
representam uma parcela da população que tinha consciência sobre a realidade
política e estava descontente. (OGG, 2014).
O’Hara (2005), complementa que para o anarquismo, o capitalismo e o
comunismo escravizam o homem, no qual uns tiram proveito do trabalho de
outros para enriquecer, além de privá-los de sua liberdade, jovens punks
anarquistas desprezam os regimes políticos a que são submetidos devido a sua
conscientização e por militarem pelos valores de liberdade e igualdade. Em
alguns casos os punks associam-se com a esquerda por causa de algum interesse
político ou para a defesa de uma causa especifica como o sexismo, uma causa
ambiental ou uma reivindicação da classe operária.
O capitalismo é o primeiro alvo dos punks porque o movimento surgiu
em regimes democráticos ou ditaduras como a que ocorreu no Brasil após o
golpe militar de 1964. No capitalismo há o interesse de sempre aumentar o lucro
individual, abusos ambientais são capitalizados como parte de um processo
produtivo, ou então algo necessário para um bem maior, o sistema capitalista
não se preocupa com o futuro do planeta, o capitalismo é canibalismo porque
explora o semelhante, em épocas de guerras, a exploração é levada ao extremo e
as mortes são somadas como perdas necessárias e também reforçam a exposição
comercial dos conflitos, com campanhas patriotas que reforçam o preconceito e
a xenofobia. O avanço tecnológico, o comercio de armas e equipamentos bélicos
geram lucros, e após o conflito quem lucra são as construtoras. (O’HARA,
2005).
Parece perverso lucrar com a guerra, mas é isto que acontece. Será
que é ir longe demais pensar que alguém esteja ansioso para que a
guerra impulsione a economia e os lucros pessoais, diminua o
desemprego e aumento o fervor patriótico, tudo sob o disfarce de um
objetivo militar declarado?(O'HARA, 2005, p.78 e 79)
Para o anarquista as melhorias da esquerda apenas remediam um
problema, a esquerda deseja agir em regime corrompido e viciado, a anarquia
acredita que é preciso destruir para construir o novo sem os vícios do passado. A
democracia é uma utopia que favorece o capitalismo, anarquia é a única forma
política que não controla o indivíduo pela força, ao recusar ser controlado ele
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passa a ter o domínio de sua vida e inicia o começo de sua ordem pessoal e não
caos como é interpretado. O dilema é justamente o indivíduo escolher ter o
poder sobre sua vida, porque eles não poderiam forçar ou educar quem não
aceite esta, por isto há uma espera para que a evolução ocorra naturalmente,
pois se houver a imposição rompe-se o princípio de liberdade e o regime se
iguala aos demais e a igualdade anarquista é baseada na suposição de que a
natureza humana é boa.
A Banda europeia Crass, fazia campanha contra o desarmamento nuclear
nos anos 80, no Brasil o Cólera possuía a mesma convicção e pregava o
pacifismo, que foi abordado no álbum Pela Paz em Todo Mundo de 1986. O U2,
banda pós punk irlandesa, possuía um discurso pacifista que sugeria o diálogo
para o desarmamento nuclear, em 1995 com Luciano Pavarotti, o U2 gravou a
canção Miss Sarajevo, sob o pseudônimo “The Passenger” para levantar fundos
para os refugiados da guerra na Bósnia. Em 1990 o Simple Minds, banda
escocesa gravou Mandela Day, para que o mundo olhasse para a África do Sul e
seus conflitos raciais, e que, Nelson Mandela fosse libertado.
Bandas como Crass e Cólera quebraram o paradigma de que lutar pela
paz fosse coisa de Hippie, a anarquia não é contraditória ao pacifismo, para o
punk, ser pacifico não significa ser passivo, o punk luta se for preciso, mas não
força ninguém à acreditar em algo, promove o diálogo e acredita que a evolução
ocorrerá pela educação.
Para O’Hara(2005), a resistência à polícia é justificada porque os punks
creem que a força policial é desperdício de dinheiro, os policiais abusam de seu
poder, aterrorizam e ceifam a liberdade daqueles a quem deveriam proteger,
embora nem todos sejam assim, isto não impede os confrontos. No
documentário Botinada (2006), um episódio sofre o confronto de punks com a
polícia no Sesc Pompeia é descrito pelos participantes como uma farra e uma
afronta ao poder.
Só haverá paz quando o homem respeitar o fluxo natural que coloca
todos os seres e elementos naturais em igualdade. No manejo com a natureza
que inclui os diversos cultivos vegetais e a criação de várias espécies animais
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para consumo humano, a ideologia punk defende o cultivo responsável, que
preserva áreas vitais e sem a utilização de produtos químicos. O modelo
sustentável adotado é rejeitado porque o homem não se coloca como parte da
natureza, ele a controla e a preservação é uma fonte de lucro, modelos como o
FSC Forest Stewardship Council, que certifica a origem da madeira empregada
em sua cadeia produtiva, é uma forma de reserva de mercado que habilita as
empresas à um mercado que supostamente exige uma ação responsável nos
patamares: social, financeiro e ambiental.
O protocolo de Kyoto determina uma cota máxima de emissão de gases
de emissão do efeito estufa para os países desenvolvidos, que criam legislação
de controle sobre a emissão do CO 2 , empresas que não conseguem atingir as
metas estabelecidas, são obrigadas a comprar créditos de carbono de outras que
obtiveram a meta. Ações como o FSC e o protocolo de Kyoto, existem devido a
uma questão financeira, que não seriam respeitadas caso não acarretassem
prejuízos.
A sociedade acredita que é engajada, e que faz a sua parte e cobra ações
sustentáveis de empresas, por outro lado não possuem consciência de que o
alimento de origem animal foi a causa do desmatamento. Quando há violência
contra a propriedade privada, os alvos são escolhidos de acordo com o assunto
que os punks se manifestam, o fanzine Profane Existence apoia e estimula este
tipo de ação em seu editorial.
Numa edição recente da Profane Existence, foi escrito um longo e
bem pesquisado editorial sobre os problemas causados pela
construção de campos de golfe nos EUA. Pesticidas e armadilhas para
matar animais, desperdício de água e planejamento de terras
desnecessários e destrutivos foram os motivos para incentivar uma
ação direta. (O'HARA, 2005, p.129)
Cada campo de golfe custa 18 mil dólares, como o governo não toma
partido sobre a questão, punks sabotaram campos utilizando cloro, que deixou o
gramado prejudicado.
Segundo Bivar(2001), em relação ao vegetarianismo, bandas como Crass
dão exemplo aos seu seguidores, eles não vestem couro nem nos calçados,
porque o seu uso significa a matança de animais. Bandas inglesas alertam para a
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forma como os animais são criados e abatidos em suas letras e encartes de seus
álbuns. O Álbum Meat is Muder, da banda pós-punk The Smiths, chama
atenção para isto e classificava o abate de animais como assassinato. Fanzines
punk alertam para o assunto e sugerem receitas vegetarianas, que tem
convencido muitos punks a adotarem a dieta.
A ideia de como tratamos os animais influencia o modo como
tratamos uns aos outros foi sugerida anteriormente. Essa violência
que nos cerca o tempo todo e tem tantas formas esta bem aqui, na
nossa comida. Você tem certas coisas em sua personalidade que
anseiam por satisfazer seus impulsos agressivos de devorar o sangue e
a carne de outras criaturas. Alimentar-se de carne e encorajar essa
agressividade pode ser um elo entre opressão humana e
animal.(O'HARA, 2005, p.137)
O movimento punk é nobre por ser contestador, libertário e procurar
romper com os paradigmas existentes. Porém, a associação com o anarquismo
visto de uma maneira distorcida, faz com que o movimento seja visto como
desordeiro e a influência da mídia transformam os punks em malucos e
drogados, que pregam a violência gratuita.
Distorções da imagem do punk pela mídia
Segundo Bivar (2001), os punks despertaram a curiosidade da sociedade
e por isto a imprensa passou a procurá-los para entende-los, vários jornalistas
foram entrevista-los e alguns ficaram surpresos, embora alguns punks não
tivessem terminado os estudos, eles tinham opiniões formadas sobre a realidade
social e política brasileira.
O’Hara (2005), afirma que o movimento foi fortemente distorcido pela
mídia, que retratavam os punk como drogados e viciados que pregavam a
violência e a desordem. A mídia os rotulou como uma moda autodestrutiva e
violenta, os programas e seriados americanos associavam o assunto com a
vergonha e a loucura.
Modelo do punk desajustado, foi utilizado na novela da Rede Globo Ti-TiTi de 1985, em que a personagem de Betty Gofman, após sofrer uma desilusão
amorosa tornou-se punk, e consequentemente influenciou o personagem do
ator Rodolfo Bottino, que virou punk para conquista-la, no final da história, eles
voltaram ao normal e tornaram-se executivos de sucesso.
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Na explosão punk a revista Pop(Editora Abril) publica uma foto de
dois pivetes armados, com uma legenda dizendo que os dois são
garotos são membros do primeiro grupo punk de São Paulo. Nome do
grupo Segundo a Pop: “Os filhos da Crise”. Este grupo nunca existiu.
É pura ficção da revista para dar a impressão de que aqui também o
artigo genuíno esta começando a aparecer. (BIVAR, 2001, p.65.)
Contrapondo a forma habitual que a mídia retratava o punk, o filme Sid
and Nancy de Alex Cox, de 1988, retratou e humanizou o baixista dos Sex
Pistols, Sid Vicious, que morreu de overdose aos 22 anos, enquanto respondia a
um processo por assassinato de sua namorada Nancy. Gary Oldman, atuou sem
fazer uso de clichês ou caracterizá-lo como costumeiramente era feito com
personagens punks.
Para O’Hara (2005), a mídia americana vinculou punks e skinheads pela
semelhança na maneira de vestir-se e pela preferência musical. Na Inglaterra, o
mesmo não ocorreu porque os carecas possuíam uma cultura solidificada. No
Brasil houve a mesma confusão, provavelmente os skinheads brasileiros foram
influenciados pelos grupos de extrema direita e neonazistas que defendem a
supremacia branca, pois estes grupos são racistas e violentos, o que explicaria os
ataques aos nordestinos e homossexuais que ocorreram em São Paulo.
O punk pelo enfoque da revista Veja
A revista Veja, editada pela Editora Abril é um veículo de comunicação
impresso tradicional do Brasil, nos seus 45 anos de mercado a publicação
tornou-se referência para consulta de informações sobre política, cotidiano e
cultura. Pela influência deste título para a sociedade este artigo faz uma análise
de três matérias que interpretaram o movimento no período de 1977 a 1986.
A primeira menção, data de 28 de setembro de 1977, a matéria intitulada
de: "A Moda Podre",
relatava um movimento desconhecido que causava
estranheza, a música é classificada como lixo e foi comparada com a música
disco que era o padrão de qualidade. Os jovens são classificados como
suburbanos que cultuavam o mal gosto e a violência. Os Sex Pistols são postos
como a referencia para antiestética do rock, é ressaltada a postura marginal dos
seus integrantes que tiveram problemas com a polícia. O Clash e o Dammed são
citados como bandas arruaceiras, caracterizadas por confusões em suas
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apresentações e os méritos da gravação do primeiro LP dos Sex Pistols, pela
gravadora Virgin é apontado como desespero da indústria inglesa, que
atravessava uma crise criativa.
O movimento punk é retratado como fruto da grave crise econômica que
a Inglaterra atravessa no final dos anos 70. Há um alerta aos pais para as
transformações que seu filhos poderiam passar, os exemplos são as trocas de
símbolos inofensivos como corações com flecha, por suásticas e dragões. Foi
feito um perfil dos punks cariocas, que seriam os rebeldes sem causa da zona sul
da Rio do Janeiro por influência da moda e os suburbanos da zona norte por
identificação com o ambiente violento e hostil ao qual eles cresceram.
Figura 1: Matéria Rev ista V eja - 28 de setembro de 1 97 7
Em uma reportagem da veja com data de 4 de agosto de 1982, intitulada
"Tropa de Choque". Surge em São Paulo o punk brasileiro. Descreve com ironia
o comportamento dos punks paulistas, em uma referência a Londres de 1977. Os
jovens foram abordados no Largo do Paissandu, eles são descritos como
rebeldes que desejam afrontar a sociedade com roupas surradas e visual
agressivo. Ao contrário dos punks ingleses, que eram tidos como arruaceiros, os
paulistas eram pacifistas, conservadores, não toleravam a homossexualidade,
bebiam bastante e não usavam drogas, porque isto era coisa de hippie.
A matéria os classificam como filhos da crise econômica brasileira sem
esperanças futuras, as músicas que gostam eram barulhentas e mal tocadas,
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eram mal remunerados em seus trabalhos e tinham orgulho de morar no
subúrbio. Há uma pequena menção ao lançamento da coletânea Grito
Suburbano, primeira gravação com bandas punks de São Paulo e do fanzine
Punk SP, editado pelo jornalista Antonio Bivar.
Figura 2: Matéria Rev ista V eja – 4 de agosto de 1 982
Em uma matéria com data de 16 de julho de 1986, com o título: “As
ovelhas negras. Punks, Darks e Skinheads, uma tribo que dentro de casa nem
sempre briga com os pais”. O punk é tratado sutilmente como um desvio de
conduta, o termo ovelha negra é utilizado para representar os jovens que
escolheram uma forma comportamental alternativa. O conflito de gerações é
retratado na matéria que descreve as mudanças de um rapaz que ao tornar-se
punk adotou o apelido de “morto”, o que escandalizou sua mãe, que recusava
chama-lo assim, a agressividade era apenas aparente, pois sua mãe conta que
ele a beija todas as vezes que saia de casa. Isto é explicado pelo psiquiatra Edson
Engels, que o jovem precisa afrontar seus pais para ser aceito no meio em que
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convive e assim, conquistar o seu espaço, ele aconselha, que não há motivos
para preocupação, porque é apenas uma fase passageira. A dúvida que acercava
os pais em relação aos novos costumes de seus filhos, é representada pela frase:
“Ela ainda é minha filhinha”, que foi dita pela mãe de uma jovem punk. Ela
ainda acrescenta, que em casa sua filha não mudara os hábitos e continuava
como sempre foi, sua nova postura era apenas para a sociedade.
Nem todos os pais toleravam as mudanças de seus filhos, há o caso do
skinhead Marco Lenha, que morava em Brasília e saiu de casa porque não
conseguiu conviver com o conflito que seus hábitos causavam em casa, com isto
ele foi morar com uma tia. Os Skinheads são apontados como um vertente do
punk, eles são descritos como jovens que utilizam acessórios militares como o
coturno, gostam de música punk com temas politizados e que afrontam o
sistema capitalista. Há também uma menção aos Darks, que hoje são
conhecidos como Góticos, que são jovens tristonhos que gostam de músicas que
refletem o seu estado depressivo.
Embora a matéria procure categorizar as tribos, ela as colocam sobre um
mesmo patamar, na qual os jovens podem transitar de uma para outra. Uma
confusão perigosa também é feita em relação aos punks e Skinheads, no qual
estes são apontados como uma vertente do punk, quando na realidade, são
ideologias diferentes.
Na mesma página em que esta matéria é finalizada, há um box com uma
noticia com o título "A heroína no caminho de Boy George", nesta matéria ele é
colocado como uma influência para jovens punks, darks e skinheads. O seu
problema com a droga é retratado como um alerta aos pais, é como se a revista
dissesse que o ídolo maior de seus filhos é um drogado e que eles podem seguir
o seu exemplo, segundo a matéria, para a policia inglesa, um dark ou skinhead é
a pista certa para um flagrante de heroína.
Boy George apareceu no cenário musical londrino com grupo Culture
Club em 1982, eles lançaram seu primeiro trabalho com a gravadora Virgin, a
mesma dos Sex Pistols. A música deles não era punk e sim um pop rock, a banda
chamou atenção devido ao visual andrógino de Boy George, com eles a
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gravadora de Richard Branson, mais um vez mostrou o seu arrojo, pois além do
visual andrógino o Culture Club era uma banda assumidamente gay, o que para
época era uma afronta aos costumes.
Figura 3: Matéria Rev ista V eja – 1 6 de julho de 1 986
Considerações finais
O punk é contestador como os movimento passados que o influenciaram,
talvez por causa da agressividade natural deste estilo, que é a sua pr incipal
diferença entre os demais, ele tenha causado um impacto negativo na sociedade
que não compreendia os seus ideais e sua mensagem.
Mesmo se opondo ao movimento hippie, o punk foi uma continuidade
das manifestações culturais que o antecederam, o movimento utilizou o
sarcasmo e a violência simbólica, como um diferencial, pois anteriormente, a
agressividade não era componente evidente da rebeldia juvenil, talvez, este fato
seja o que despertou o interesse do punk para a sociedade em geral.
O contexto histórico do final dos anos 70 era opressor, as classes menos
favorecidas poderiam somente observar o que acontecia na sociedade, havia
uma imposição que pregava que somente quem detinha conhecimento sobre
uma determinada área poderia produzir conteúdos e formas de expressão
artística, o punk foi um basta a todos estes valores, a proposta: “Faça você
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mesmo”, rompeu com o paradigma de que a arte necessitava de conhecimento
prévio, e que deveria respeitar os conceitos da boa forma, e também abriu o
caminho para a subversão, na qual elementos sociais como roupas militares,
imagens governamentais, ou de grandes corporações, foram apropriadas e
tiveram o seu sentido original alterado.
O movimento abriu as portas da expressão à uma classe discriminada,
que a utilizou para expor o seu descontentamento. O meios de comunicação são
um reflexo da nossa sociedade, e seus representantes, assim como a sociedade,
não estava preparado para compreender o questionador discurso punk, o
resultado foi a distorção que ressaltou o lado negativo do movimento porque via
nele uma ameaça.
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