Luiz Carlos Ramiro Junior
Doutor pelo IESP-UERJ. Coordenador e tutor na UFF
Jeremiah Morelock – Felipe Ziotti Narita
Felipe Ziotti Narita
Pós-doutorado na USP e doutorado na Unesp. Pesquisador
associado da Fapesp, do Historiar (CNPq) e do Laboratório
de Estudos e Pesquisas sobre
Infância, Juventude e Educação da USP. Editor do grupo
polonês de ciências sociais
Theoretical Practice.
Há duas características que acentuam a importância desse
estudo acerca do populismo. Primeiro, a erige de uma avaliação
global sobre o fenômeno no século XXI, enquanto algo possível
a partir da presentificação do mundo contemporâneo e de uma
espécie de derrubada de fronteiras. A semelhança dos casos
é decorrente do modo acelerado com que as comunicações
e mobilizações sociais fluem mundialmente, gerando
uma sensação de sintonia. O segundo ponto refere-se ao
aprofundamento teórico, que não se encerra num flanco
ideológico e nem em determinismos, mas pretende ver o
populismo de forma multifacetada, de direita e de esquerda.
O pensamento social procura encarar o populismo para além
das mudanças políticas. Ao mesmo tempo, contudo, cabe
refletir: o conceito de populismo pode não ajudar a reconhecer
transformações que fazem parte da história do desenvolvimento
político, a saber, a quebra de ciclos políticos, os giros ideológicos
e a recomposição dos partidos. Nesse sentido, a vitória de
Bolsonaro no Brasil talvez não tenha sido o triunfo eleitoral
do populismo de direita ou de extrema direita, mas, no fim
das contas, o retorno do conservadorismo na dinâmica
política institucional e na representação social.
O PROBLEMA DO POPULISMO
Jeremiah Morelock
Sociólogo do Boston College
(EUA), diretor da Critical Theory
Research Network e pesquisador associado do Comitê de
Comunicação de Mídia da Seção
de Comunicação, Tecnologias
da Informação e Sociologia da
Mídia da American Sociological Association (ASA). Editor
do volume Critical Theory and
Authoritarian Populism pela
University of Westminster
Press, 2018.
O PROBLEMA DO
POPULISMO
Teoria, política e mobilização
ISBN 978-85-462-1574-4
/PacoEditorial
@PacoEditorial
@Paco_Editorial
Jeremiah Morelock – Felipe Ziotti Narita
Fruto de uma conferência
conjunta proferida na Unesp
em 2018, o livro de Jeremiah
Morelock e Felipe Ziotti Narita
enfrenta diretamente a questão do populismo, que voltou a
ganhar destaque nas ciências
sociais e no debate público.
Os autores propõem uma reflexão multidirecional que agrupa
temas a respeito de identidade, polarização, mobilização,
poder e autoritarismo. A obra,
então, discute os problemas de
representação nas democracias liberais contemporâneas
e destaca como as figurações
de “o povo” produzem legitimação na arena política. Por
meio de uma análise não-determinista do populismo,
o livro destaca a dinâmica
variada do fenômeno e suas
relações ambivalentes com a
democracia, tendo em vista
transformações e pressões
culturais disseminadas no
terreno social, ou seja, fora
dos canais da política formal.
Conselho Editorial
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©2019 Jeremiah Morelock; Felipe Ziotti Narita
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pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar,
em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, de fotocópia, gravação, etc., sem a
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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
M841p
Morelock, Jeremiah
O problema do populismo: teoria, política e mobilização/ Jeremiah Morelock, Felipe Ziotti Narita. - 1. ed. - Jundiaí [SP]: Paco, 2019. 80p.; 21cm.
Inclui referências
ISBN 978-85-462-1574-4
1. Populismo. 2. Direita e esquerda (Ciência política). I. Narita, Felipe
Ziotti. II. Título.
Meri Gleice Rodrigues de Souza - Bibliotecária - CRB-7/6439
19-56799
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Foi feito Depósito Legal.
Sumário
Prefácio
7
Capítulo 1
17
Capítulo 2
25
Capítulo 3
33
Capítulo 4
41
Capítulo 5
53
Capítulo 6
59
Referências
69
Prefácio
Nos últimos três anos, passei muitas horas estudando o
controverso tema do populismo em minha tese de doutorado na Universidade Aristóteles de Tessalônica (Grécia). A
ascensão do populismo de esquerda ao poder na Grécia foi
minha oportunidade para comparar o discurso do Syriza
com a experiência populista de governo do kirchnerismo
na Argentina. Então, quando Jeremiah Morelock e Felipe
Ziotti Narita me convidaram para escrever o prefácio para
este pequeno livro sobre o problema do populismo ÀTXHL
honrado e agradecido por ter a oportunidade de apresentar algumas das minhas ideias e debatê-las a partir da
abordagem deles. Uma das principais razões por trás da
PLQKDGHFLVmRÀQDOGHDFHLWDURFRQYLWHFRQVLVWHQRIDWRGH
este pequeno livro revelar as características principais e a
natureza do populismo autoritário, que é, sobretudo, expressa por meio do discurso de partidos radicais de direita e de
líderes pelo mundo. Além disso, é notável que os autores
mantenham uma perspectiva distanciada para a análise do
fenômeno populista, deixando espaço para o desenvolvimento de uma mobilização populista progressista.
É fato conhecido que vivemos em uma época de
crises em diversos níveis, contando com uma variedade
de populismos. A erupção da crise econômica, a falta de
FRQÀDQoDQDVLQVWLWXLo}HVOLEHUDLVHQDWHFQRFUDFLDRIUDFDVVR
do projeto neoliberal e o crescimento das migrações e das
ondas de refugiados deram voz para que partidos anti-establishment emergissem, de maneira dinâmica, por meio de
fortes discursos populistas. A crise promoveu e disseminou
correntes populistas e anti-establishment, transformando-se
7
Jeremiah Morelock | Felipe Ziotti Narita
na cena principal da performance populista.1 Como argumenta Laclau, “a emergência do populismo é historicamente ligada a uma crise do discurso ideológico dominante
que, por sua vez, é parte de uma crise social mais geral”.2
Por um lado, assistimos à ascensão do populismo de
esquerda. Na Grécia, o Syriza conseguiu chegar ao poder,
criando um governo populista estável com o partido radical ANEL. Na Espanha, o Podemos emergiu como um dos
protagonistas da cena política em pouco tempo, enquanto
-HDQ/XF 0pOHQFKRQ QD )UDQoD ÀFRX QD WHUFHLUD SRVLomR
nas últimas eleições presidenciais; no Reino Unido, o líder
do Partido Trabalhista é o populista Jeremy Corbyn; nos Estados Unidos, Bernie Sanders ganhou enorme apoio popular nas eleições para indicação do Partido Democrata (2016)
com uma plataforma populista progressista; no México,
Andrés Manuel López Obrador, um populista de esquerda,
ganhou as eleições de 2018. Sem dúvida, devo destacar os
líderes de esquerda na América Latina que chegaram ao poder no começo dos anos 2000 (especialmente em função do
fracasso das políticas neoliberais dos anos 1990) e formaram
XPDVLJQLÀFDWLYDKHJHPRQLDSRSXOLVWDLQFOXVLRQiULDFRPR
Hugo Chávez, Evo Morales e os Kirchner. Por outro lado,
há partidos radicais e de extrema-direita que expressam discursos xenófobos, nacionalistas e populistas, concentrando
boa parte da classe popular a seu lado. Na França, Marine
Le Pen chegou na segunda posição nas eleições presidenciais de 2017; na Itália, a direita populista tornou-se um
dos campos políticos mais importantes; na Hungria, Viktor
Orbán construiu uma hegemonia populista autoritária; no
0RIÀWW%HQMDPLQThe global rise of populism: performance, political style,
and representation. Stanford: Stanford University Press, 2016.
2. Laclau, Ernesto. Politics and ideology in Marxist theory. Londres: NBL,
1977, p. 175.
8
O problema do populismo: teoria, política e mobilização
Reino Unido, a plataforma nacionalista do Brexit venceu um
referendo crucial. Não devo me esquecer de mencionar que
o povo nos Estados Unidos e no Brasil elegeu, respectivamente, Trump e Bolsonaro como presidentes.
Morelock e Narita conseguem explicar o que é o populismo por meio de perspectivas teóricas de pesquisadores
muito conhecidos. Na minha opinião, a teoria de Ernesto
Laclau sobre o populismo parece muito útil para examinar
HVVHLPSRUWDQWHIHQ{PHQRMiTXHRIHUHFHVRÀVWLFDomRWHyrica sem sucumbir ao idealismo, podendo ser aplicada em
muitos casos diferentes.3/DFODXDÀUPDTXH´RSRSXOLVPR
começa no momento em que elementos populares e democráticos são apresentados como opções antagônicas contra
a ideologia do bloco dominante”.4 Na mesma lógica, o centro de pesquisa grego Populismus estabelece dois critérios
mínimos para um discurso populista:
(1 UHIHUrQFLDVUHDOoDGDVD¶RSRYR· RXVLJQLÀFDQWHV
equivalentes, como ‘os desfavorecidos’) e a ‘vontade
popular’ e a necessidade de sua representação verdadeira, (2) uma percepção antagônica do terreno
sócio-político como uma esfera dividida entre ‘o
povo’/os desfavorecidos e ‘as elites’/o establishment.5
Teorias que utilizam adjetivos em sua etimologia, tais
como puro e corrupto, não podem ser aplicadas no exame de
3. Stavrakakis, Yannis. Antinomies of formalism: Laclau’s theory of populism and the lessons from religious populism in Greece. Journal of Political
Ideologies, v. 9, n. 3, p. 253-267, 2004.
4. Laclau, op. cit., p. 173.
5. Conferência Internacional Populismus: Populist Discourse and Democracy/Background Paper, Universidade Aristóteles de Tessalonica, Grécia, 26-28
jun. 2015. Disponível em: <http://bit.ly/2CXMXZz>. Acesso em: 31 jan. 2019.
9
Jeremiah Morelock | Felipe Ziotti Narita
todas as articulações populistas. Como destaca Ostiguy, a noção de pureza pode funcionar bem nos populismos europeus,
mas não consegue ser mobilizada adequadamente para outras regiões. Nos países latino-americanos, o povo não é considerado puro (venezuelanos são zambos, mulatos, mestiços,
etc.), ao passo que a plebe consiste em ladrões mesquinhos.
Além disso, o caráter corrupto das elites nem sempre é um
problema, contanto que o presidente faça o que deve ser feito.6
2V DXWRUHV FRUUHWDPHQWH GHÀQHP populismo autoritário como os espaços onde populismo e autoritarismo se
encontram. Como resultado, o populismo não é sempre
autoritário e não é tomado por uma natureza interna não
democrática. Autoritarismo e populismo podem coexistir
em numerosos casos, mas esses termos não caminham
necessariamente pari passu. Com mais frequência, líderes
de esquerda respeitam procedimentos democráticos e a
vontade popular, buscando a democratização dos sistemas políticos pós-democráticos. Além disso, a orientação
democrática de muitos populismos de esquerda pode também ser vista por meio de diferentes articulações do povo.
(VSHFLÀFDPHQWHRSRYRSDUDDHVTXHUGDQmRpFRQVLGHUDGRFRPRKRPRJrQHRWDPSRXFRXQLÀFDGRPDVFRPRXPD
força heterogênea que articula diferentes demandas sociopolíticas sob as bandeiras de um movimento, apresentando um caráter inclusivo (por populismo inclusionário e
exclusionário, indico o trabalho de Mudde e Kaltwasser).7
A rejeição da homogeneização do povo evidencia que o
6. Ostiguy, Pierre. Populism: a socio-cultural approach. In: Kaltwasser, Cristobal Rovira; Taggart, Paul; Espejo, Paulina Ochoa; Ostiguy, Pierre (eds.).
The Oxford handbook of populism. Oxford: Oxford University Press, 2017, p. 91.
7. Mudde, Cas; Kaltwasser, Cristobal Rovira. Exclusionary vs. inclusionary
populism: comparing contemporary Europe and Latin America. Government
and Opposition, v. 48, n. 2, p. 147-174, 2013.
10
O problema do populismo: teoria, política e mobilização
populismo de esquerda não coaduna (sempre) com caminhos autoritários. No entanto, a questão da homogeneização pode ser diferente na retórica xenófoba de partidos
nos quais o povo tem formas concretas com características
étnico-raciais.8 Então, o populismo de esquerda contemporâneo não necessariamente encarna princípios antidemocráticos ou nacionalistas, mas constitui uma reação
popular e igualitarista contra o establishment corrupto e a
ascensão do nacionalismo xenófobo.
Creio que o populismo autoritário discutido neste livro
não faz referência às manifestações populistas de esquerda, mas aos populismos da direita nacionalista e xenófoba.
É verdade que a escalada dos líderes e dos partidos da
direita radical e da extrema-direita lembra a ascensão do
fascismo na Europa de meados do século XX. Não é ilógica
a conexão entre fascismo e populismo. Segundo Laclau,
o fascismo [...] foi [...] uma das maneiras possíveis
de articulação das interpelações democráticas populares em discursos políticos [...] Então, vemos por
que é possível chamar Hitler, Mao e Peron simultaneamente de populistas.9
Hoje, o populismo autoritário diz respeito, sobretudo, aos partidos da direita radical, que partilham características autoritárias, nacionalistas e populistas. Contudo,
há alguns partidos da extrema-direita (por exemplo, o
grego Aurora Dourada) que utilizam um discurso étnico8. Katsambekis, Giorgos. The place of the people in post-democracy: researching antipopulism and post-democracy in crisis-ridden Greece. Postdata, v. 19, n. 2, p. 555-582, 2014.
9. Laclau, op. cit., p. 111 e 174.
11
Jeremiah Morelock | Felipe Ziotti Narita
-nacionalista com marcas populistas. Como resultado,
as fronteiras entre os partidos da direita radical e da
extrema-direita têm se tornado cada vez mais esfumaçadas ao longo dos anos. Não há uma grande distância
entre o discurso nacionalista-xenófobo e uma razão
étnico-racista, especialmente quando ambos promovem
soluções extremas e violentas e discutem independência
nacional e soberania popular. Além disso, todos os casos
acima baseiam seus discursos, sobretudo, no nacionalisPR[HQyIRER(VHUHGHÀQtVVHPRVRFRQFHLWRGHpartidos
populistas radicais? E se categorizássemos aqueles partidos primeiramente como nacionalistas e, depois, como
populistas?10 Precisamos pensar nessas questões.
Se olharmos para o espaço político de direita na Grécia,
QmR FRQVHJXLPRV WUDoDU GLIHUHQoDV VLJQLÀFDWLYDV HQWUH RV
partidos de extrema-direita e a direita radical. Esses partidos
pretendem implementar soluções nacionalistas extremas e
tentam criar dicotomias na sociedade entre o povo (como
uma nação) e as elites/o establishment. O nacionalismo tóxico
que emana disso (por exemplo, do Concentração Popular
Ortodoxa, da Nova Direita, do Solução Grega, da Aurora
Dourada, etc.) se desdobra em um etnocentrismo particular,
rebaixando culturas e ideias do “outro” e atacando (1) minorias (refugiados, imigrantes e LGBTQ) e (2) esquerdistas
que “traem” o país (por exemplo, no caso “macedônio”).
Eles se apresentam como a resistência autêntica contra a
“invasão ilegal” de culturas externas em uma época de propostas nacionalistas extremamente violentas. Isso pode ser
perigoso não apenas para a democracia liberal, mas para
o desenvolvimento de qualquer orientação democrática
10. Stavrakakis, Yannis et al. Extreme right-wing populism in Europe: revisitLQJDUHLÀHGDVVRFLDWLRQCritical Discourse Studies, v. 14, n. 4, p. 420-439, 2017.
12
O problema do populismo: teoria, política e mobilização
alternativa. O único partido que mantém distância dessa
retórica extrema é o ANEL, em função da participação no
governo do Syriza. Então a mídia mainstream, oponente ferrenha do governo do Syriza, desempenha um papel central
ao incitar o “pânico nacionalista” e o ódio junto ao povo
grego, facilitando a expansão desse tipo de propaganda. O
mesmo ocorre nas mídias sociais e com as fake news. Como
Morelock e Narita sublinham no livro, “os meios de comunicação de massa facilitam a onipresença das mensagens de
propaganda. [...] As estruturas de rede desempenham um
papel central nesses cenários”.
É importante ressaltar também que o populismo
autoritário não é o único problema da sociedade e da
política contemporâneas. Não devemos subestimar, por
exemplo, o discurso antipopulista. A estigmatização de o
povo por antipopulistas degrada a soberania popular, ao
passo que a ascensão da tecnocracia, como uma resposta às
decisões “deseducadas” e “imaturas” das massas, destrói
qualquer direção democrática que a política possa vir a
assumir. E se esse tipo de antipopulismo ameaçar a democracia da mesma maneira que o populismo autoritário?11
Para concluir, gostaria de ressaltar que Morelock e
Narita conseguem com sucesso destacar a natureza interna do populismo autoritário por meio da utilização de
nomes importantes da teoria crítica (Habermas, Adorno,
Horkheimer, etc.). Minha contribuição, aqui, consistiu em
manifestar a importância da análise do discurso para o
exame do populismo, além da diferença essencial entre os
populismos de esquerda e direita – bem como as ameaças
11. Markou, Grigoris. Populism and anti-populism in the semi-periphery: lessons from Greece and Argentina, Draft Paper, PSA. In: ANNUAL INTERNATIONAL CONFERENCE, 68, 2018, Cardiff. Annals. Cardiff, 26-28 mar., 2018.
13
Jeremiah Morelock | Felipe Ziotti Narita
representadas pelo último. Creio que a combinação da
teoria crítica com a análise do discurso pode ser útil para o
entendimento da natureza dos populismos que emergem
pelo mundo, bem como para oferecer soluções para uma
sociedade melhor e mais democrática.
Grigoris Markou
Doutorando na Universidade Aristóteles de Tessalônica
(Grécia)
Bolsista do Secretariado Geral de Pesquisa e Tecnologia e da Fundação Helênica de Pesquisa e Inovação
(Código 391)
Organizador do Círculo de Estudos sobre Populismo
Pesquisador associado do Observatório Populismus
14
A maior parte do presente livro foi escrita entre março e novembro
de 2018, transitando entre Brasil, Estados Unidos, Portugal e
Suíça. Uma versão inicial serviu como base para nossa conferência inaugural, realizada em novembro de 2018, no III Seminário
Internacional de Pesquisa em Políticas Públicas e Desenvolvimento Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da
Unesp, campus de Franca/SP. Pelo convite, pelas observações e
pelo suporte para sua publicação em um pequeno livro, agradecemos a Alexandre Marques Mendes, Vânia Martino, Genaro
Fonseca, Hélio Alexandre Silva, Erick Vivan e Agnaldo Barbosa,
além do apoio fundamental dos pesquisadores do Programa de
Pós-Graduação em Planejamento e Análise de Políticas Públicas
da Unesp. Naturalmente, os únicos responsáveis pelas análises
expressas são seus dois autores.
15
1.
Em uma série de artigos publicados em 2017, Nancy FraVHU DÀUPRXTXHRSUHVHQWHPRPHQWRSROtWLFRHVSHcialmente com a ascensão transnacional da extrema-direita,
LQGLFDRÀPGRQHROLEHUDOLVPRSURJUHVVLVWD'XUDQWHDV~OWLmas duas décadas, a expansão das estruturas de mercado e
DÀQDQFHLUL]DomRHVWLYHUDPLQWHJUDGDVDXPIRUWHVXEVWUDWR
cultural relacionado ao que poderíamos chamar de “agenda
progressista” baseada no pluralismo institucional, multiculturalismo, direitos de minorias, etc. Essa consideração,
sem dúvida, deve ser tomada com muita cautela, já que a
exclusão social, as formas de violência física e simbólica, a
precarização estrutural do trabalho e as diversas expressões
de discriminação não foram abruptamente varridas do ambiente construído pelas democracias liberais – as pesquisas
desenvolvidas em diversos países por Loïc Wacquant, Pierre
Bourdieu, Michael Burawoy, Jessé Souza, Ruy Braga, Chris
Tilly, Enzo Mingione e diversos outros nomes demonstram
exatamente isso. Contudo, nosso argumento é que, subjacente às visões triunfalistas das democracias liberais e às
realizações da jouissance individual e dos direitos sociais,
havia um consenso hegemônico referente a movimentos
progressistas no sentido do reconhecimento da necessidade
de políticas sociais de inclusão junto ao cosmopolitismo
liberal e seu horizonte globalista. Essa atmosfera vem desaparecendo com a emergência de um insólito momento
SROtWLFR LGHQWLÀFDGR FRPR D DVFHQVmR GH PRYLPHQWRV GH
extrema-direita e do populismo de direita.
Muitas pessoas ainda argumentam que populismo é
XPWHUPRTXHFDUHFHGHXPDGHÀQLomRFODUDRXTXHVHWUDWD
de um vocábulo utilizado contra todos aqueles dos quais
17
Jeremiah Morelock | Felipe Ziotti Narita
discordamos ou não gostamos – ou seja, como se o populismo operasse como uma espécie de retórica política e fosse
reduzido a um artefato para acusar e culpar um oponente
político de ser mentiroso ou apresentar soluções falsas e
rasteiras apenas para satisfação das massas. O populismo,
nesse sentido, seria mais um rótulo do que um conceito,
em função da falta de um quadro analítico mais rigoroso
(Fassin, 2017). Conforme esse uso cotidiano do termo (cuja
pervasividade é notável no jargão jornalístico e nas disFXVV}HV PDLV SURVDLFDV GR GLD D GLD R SRSXOLVPR ÀJXUD
sempre como uma forma de manipulação ou promessa de
realidades inconsistentes, variando conforme esquemas
retóricos. Sem dúvida, mesmo esse uso retórico tem sua
validade na pesquisa social na medida em que a política é
WDPEpPRFDPSRGRFRQÁLWRHFRPRRVWHyULFRVGD(VFROD
de Cambridge demonstraram (sobretudo na esteira dos
trabalhos de John Pocock), a linguagem política e seus usos
são saturados com uma pluralidade de práticas sociais que
transformam sublinguagens políticas (ou seja, a diversidade de maneiras de fala e artefatos retóricos) em jogos de
linguagem e funcionam como um importante elemento no
entendimento da historicidade das disputas sociais. No entanto, devemos esclarecer desde o início deste ensaio que
o que chamamos de populismo nada tem a ver com esse
nível mais retórico de caracterização.
Às vezes, o termo é utilizado para grupos de direita e
às vezes para grupos de esquerda. Às vezes, sugere um
WLSRGHLQVXOWRVLJQLÀFDQGRDOJXPDIRUPDGHUHDomRHHP
algumas ocasiões é utilizado em registro positivo, caracterizando movimentos sociais com potencial de democratização. O populismo, em um nível mais retórico, certamente
é utilizado de todas essas maneiras – assim como outros
18
Título
Autores
Coordenação Editorial
Assistência Editorial
O problema do populismo: teoria, política
e mobilização
Jeremiah Morelock
Felipe Ziotti Narita
Simone Silva
Taís Rodrigues
Paloma Almeida
Andressa Marques
Capa
Imagem de Capa
Projeto Gráfico
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Formato
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1ª Edição
Matheus de Alexandro
Davide Ragusa (via Unsplash)
Larissa Codogno
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14x21cm
80
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Maio de 2019