CARBONO ORGÂNICO EM CHERNOSSOLO SOB PASTAGEM NATIVA DO RS
GUTERRES, D.B.1; BAYER, C.2,3; CASTILHOS, Z.M.de S.4; NABINGER, C.5
1
Bolsista Iniciação Científica CNPq (diegoguterres@gmail.com);
Professor DS/UFRGS, 3Pesquisador CNPq (cimelio.bayer@ufrgs.br);
4
Pesquisadora FEPAGRO (zelia.voy@terra.com.br)
5
Professor DPFA/UFRGS (nabinger@ufrgs.br)
2
RESUMO: As pastagens nativas do Rio Grande do Sul vêm sendo mal exploradas, com reduzidas ofertas de
forragem (OF = kg de matéria seca por 100 kg de peso vivo por dia), o que pode levar a um processo de
degradação do solo pela redução do estoque de carbono orgânico. Com o objetivo de determinar qual o efeito
do manejo da pastagem sobre a quantidade de C do solo, coletaram-se amostras das camadas de 0-2,5, 5-10,
10-15, 15-20, 20-30 e 30-40 cm de um Chernossolo Argilúvico Órtico Vértico sob pastagem nativa em
Hulha Negra, RS, em novembro de 2005, com quatro repetições de campo. Essa pastagem vem sendo
submetida desde dezembro de 2003 a 4, 8, 12 e 16% de OF. As concentrações de C variaram na média entre
os tratamentos de aproximadamente 80 g kg-1 de C na camada de 0-2,5 cm até aproximadamente 20 g kg-1 de
C na camada de 30,0-40,0 cm. Houve uma correlação quadrática (P<0,0001) entre a variação da OF e o
estoque de C do solo, com 114,4, 127,5, 148,4 e 154,8 mg ha-1 nas OF de 4, 8, 12 e 16% respectivamente,
com a curva indicando os maiores estoques numa OF aproximada de 14 % para a camada de 0-40,0 cm. Tal
fato se deve ao maior aporte de C no solo, pois há maior produção de massa vegetal da pastagem sob OF de
16%. Tendo a OF de 4% como referência, calculou-se uma taxa de seqüestro de C de 13,4 mg ha-1ano-1 na
OF de 16%, a qual é considerada elevada, quando se compara à taxa de 0,48 mg ha-1ano-1 estimada em solos
da região sob culturas anuais. Manejando-se adequadamente a pastagem nativa em termos de produção
animal, também se melhora a qualidade ambiental, pois se eleva expressivamente a quantidade de C do solo.
PALAVRAS-CHAVE: carbono orgânico, pastagem nativa e ofertas de forragem
INTRODUÇÃO: O acúmulo de carbono do solo eleva a qualidade dos agroecossistemas ao melhorar os
seus atributos físicos, químicos e biológicos, sendo uma importante maneira de reduzir as quantidades desse
elemento na atmosfera e o conseqüente efeito estufa. Em sistemas estáveis, o balanço entre a entrada e a
saída de carbono tende à neutralidade, mantendo o estoque constante. Em sistemas com reduzida adição de
resíduos e com revolvimento do solo, tende a ocorrer a redução do estoque de carbono do solo, devido ao
fato de o aporte tornar-se inferior às perdas. O bioma Pampa é um exemplo de ecossistema natural estável,
com o aporte de resíduos garantido por diversas espécies de gramíneas e de leguminosas nativas, além de
outras espécies, e com as perdas reduzidas por não haver revolvimento do solo. Tal ecossistema é explorado
com pecuária no Rio Grande do Sul, ocupando cerca de 10 milhões de hectares. Em situações de mau
manejo da pastagem, com cargas animais excessivas, a produção anual de matéria seca reduz, havendo
menor aporte de resíduos, bem como o incremento de perdas por erosão do solo. Nessas condições, a
qualidade do solo decresce, com reflexos de redução do potencial produtivo da pastagem e de degradação
ambiental. A utilização adequada desse recurso visa à otimização do consumo e o ganho animal em
harmonia com o crescimento vegetal, o que ocorre quando se maneja a pastagem na oferta de forragem ideal.
Nessas condições, deve haver expressivo aporte de carbono no solo, pois a produção de pasto e de resíduo é
elevada e as perdas são amenizadas. Esse trabalho objetivou avaliar as variações na concentração de carbono
e no estoque de carbono do solo de uma pastagem nativa submetida há anos a crescentes níveis de oferta de
forragem.
MATERIAL E MÉTODOS: Coletaram-se amostras de um Chernossolo Argilúvico Órtico Vértico da
região da Campanha do Rio Grande do Sul, num experimento instalado em novembro de 2003, na estação
experimental da FEPAGRO, em Hulha Negra, RS. Os tratamentos da pastagem são 4, 8, 12 e 16% de oferta
de forragem. Realizaram-se as coletas de solo no dias 16 e 17 de novembro de 2005, das camadas de 0-2,5,
5-10, 10-15, 15-20, 20-30 e 30-40 cm a partir da superfície do solo, com quatro repetições de campo, para
determinação da concentração e dos estoques de carbono do solo. Nas mesmas trincheiras onde se coletaram
as amostras para as determinações de carbono, coletaram-se, as amostras de solo das camadas de 0-10, 10-20
e 20-40, para determinar a densidade do solo. Os valores de densidade do solo, para as respectivas camadas
foram, respectivamente, 1,30, 1,33 e 1,30 g cm-3 para a OF de 4%; 1,26, 1,26 e 1,30 para a OF de 8%; 1,15,
1,21 e 1,28 para a OF de 12% e 1,18 para todas as camadas da OF de 16%. As amostras de solo para
concentração de carbono foram moídas em almofariz de ágata e se determinou a concentração de C orgânico
total por combustão seca em equipamento SHIMADZU® TOC-V CSH. Calculou-se o estoque de carbono
segundo o método da massa equivalente de solo (ELLERT & BETTANY, 1995). Calculou-se a taxa de
seqüestro de carbono dividindo a diferença entre o estoque de C de cada OF e a OF de 4% (usada como
referência por ser supostamente a condição geral de manejo das pastagens nativas da região) pelo tempo de
implantação do experimento. Os resultados de concentração e de estoque de carbono de 0-20 cm e de 0-40
cm foram submetidos ao teste de Tukey, com nível de significância de 5%. Os resultados de estoque de
carbono foram correlacionados com as OF por análise de regressão polinomial.
RESULTADOS E DISCUSSÃO: A produção de massa vegetal, o resíduo de massa vegetal e o
desempenho animal tendem a crescer com o aumento da OF até um determinado nível (MARASCHIN,
1997). Assim, ocorre maior deposição de resíduos na superfície do solo, quando a OF é maior. Além disso,
as plantas são mais desenvolvidas onde a oferta de forragem é maior, tanto a parte aérea, quanto o sistema
radicular. O sistema radicular mais desenvolvido explora maior volume de solo, e contribui
consideravelmente com a agregação do solo, pela emissão de exsudatos que irão agir como agentes
cimentantes entre as partículas minerais de solo. Na figura 1, estão os resultados de concentração de C, com
valores bastante elevados. Houve concentrações marcantemente superiores nas camadas superficiais em
relação às mais profundas, em todos os tratamentos, devido ao efeito da deposição superficial de resíduos,
tanto da pastagem na forma de material morto, quanto animal na forma de fezes e do efeito da não
incorporação desses resíduos por ação antrópica via mobilização para preparo do solo.
Ajustou-se uma correlação polinomial entre a variação de OF e os estoques de C na camada 0-40 cm
(figura 2), com o estoque variando de 114,4 na OF de 4%, a 154,8 na OF de 16%, e estoque máximo de C no
solo foi correspondente a uma OF estimada de 14 %. Pastagens naturais submetidas por muitos anos ao
mesmo nível de OF estabelecem um determinado padrão de matéria seca residual e de produção de matéria
seca (MS) ao longo do ano, sendo essas variáveis superiores nas OF maiores. Em um experimento de longa
duração (18 anos) em pastagem nativa sobre um Argissolo Vermelho distrófico típico, na Estação
Experimental Agronômica (EEA) da UFRGS, em Eldorado do Sul, repetiram-se anualmente as maiores taxas
de acúmulo de MS em torno da OF de 12% e as maiores massas residuais de 16%. A cobertura do solo
também é maior nas OF maiores, pois se mantém uma massa de forragem maior, o que reduz as perdas de
solo e de material morto da superfície do solo por erosão. No mesmo experimento da EEA-UFRGS,
BERTOL et al. (1998) encontraram maior macroporosidade, diâmetro médio ponderado de agregados e taxa
de infiltração de água no solo em torno da OF de 12%. Desses resultados, subentende-se que o escoamento
superficial é menor nessa OF, o que acarreta menores perdas de material orgânico depositado na superfície
do solo por erosão.
C (g kg-1)
0
20
40
60
80
C (Mg ha )
-1
Profundidade (cm)
y= -1,30x + 36,99x - 69,55
R2= 0,78 ; P<0,0001
200
10,0
15,0
20,0
30,0
2
250
100
0,0
2,5
5,0
4%
8%
12%
16%
40,0
Figura 1: Ofertas de forragem, concentrações de C e
camadas de solo.
150
100
50
0
4
8
12
14,23
16
Oferta de Forragem (%)
Figura 2: Ofertas de forragem e estoques de C na
camada de 0-40 cm.
Um aspecto muito importante é que a OF de 14% se aproxima da amplitude ótima de utilização da
pastagem nativa entre 11,5 e 13,5% de OF, na qual se obtêm os maiores ganho de peso por unidade animal e
ganho de peso animal por unidade de área (MARASCHIN et al., 1997). Isso corrobora com a idéia de
manejar adequadamente a pastagem, pois, além de se obter maior produtividade em desempenho animal, está
havendo um elevado acúmulo de C no solo, o que contribui para a manutenção do potencial produtivo do
sistema e para a redução desse elemento na atmosfera.
As taxas de seqüestro de carbono são apresentadas na tabela 1. Observa-se o enorme potencial de
resposta desse solo sob pastagem natural em acumular carbono. Em apenas três anos de implantação do
experimento, houve uma taxa de 8,4 Mg de C ha-1 ano-1 na camada de 0-20 cm e 13,4 Mg de C ha-1 ano-1 na
camada de 0-40 cm. BAYER et al. (2006) apresentam uma média entre taxas de seqüestro de C para a região
de 0,48 Mg ha-1 ano-1 na camada de 0-20 sob culturas anuais. Fica evidenciada a capacidade desse
Chernossolo sob pastagem natural de seqüestrar carbono, através do manejo adequado da pastagem a partir
do ajuste da carga animal conforme a quantidade de pasto para se manter a OF adequada. O potencial de
acúmulo de C deve-se à elevada proteção química da matéria orgânica, pois esse solo possui mineralogia da
fração argila composta predominantemente por argilominerais 2:1. A proteção física da matéria orgânica do
solo também deve ser um fator importante para esse acúmulo de C no solo, com as melhorias em agregação
do solo pela ação do sistema radicular mais desenvolvido, ativo e denso das gramíneas nativas da pastagem.
Tabela 1: Ofertas de forragem, camadas de solo, estoques de C e taxas de seqüestro de C.
Camada (cm)
90
Oferta de Forragem
4%
8%
12%
16%
-1
--------------------------- C (Mg ha ) -------------------------------
0-2,5
2,5-5,0
5,0-10,0
10,0-15,0
15,0-20,0
20,0-30,0
30,0-40,0
23,3
12,1
17,1
13,5
11,4
20,3
16,7
23,5
13,9
16,9
14,8
13,1
22,5
22,8
27,9
15,7
19,8
17,2
15,4
28,8
23,7
28,9
18,2
22,8
17,2
15,4
26,2
26,0
0-20,0
0-40,0
77,4 b*
114,4 b
82,2 a
127,5 a
96,0 a
148,4 a
102,5 a
154,8 a
--------- Taxa de Seqüestro de C (Mg ha-1 ano-1) --------------0-20,0
1,6
6,2
8,4
0-40,0
4,4
11,3
13,4
* Letras diferentes na linha representam diferença de 5% no teste de Tukey.
CONCLUSÕES: O ajuste do estoque de C no solo ,através de uma relação quadrática, com a variação da
oferta de forragem de 4 a 16% , demonstra que os maiores estoques de C são obtidos com oferta de forragem
aproximada de 14%. As taxas de seqüestro de C revelam-se bastante superiores a taxas estimadas para solos
sob culturas anuais, demonstrando o potencial da pastagem nativa do bioma Pampa do Rio Grande do Sul no
seqüestro de C, quando manejadas adequadamente.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BAYER, C.; MARTIN-NETO, L.; MIELNICZUK, J.; PAVINATO, A.; DIECKOW, J. Carbon sequestration
in two Brazilian Cerrado soils under no-till. Soil & Tillage Research 86. p. 237–245, 2006.
BERTOL, I.; GOMES K.E.; DENARDIN, R.B.N.; MACHADO L.A.Z. e MARASCHIN G.E. Propriedades
físicas do solo relacionadas a diferentes níveis de oferta de forragem numa pastagem natural. Pesquisa
Agropecuária Brasileira, v.33, n.5, p. 779-786, 1998.
ELLERT, B. H.; BETTANY, J. R. Calculation of organic matter and nutrients stored in soils under
contrsting management regimes. Canadian Journal of Soil Science, Otawa, v. 75, n. 4, p. 529-538, 1995.
MARASCHIN, G.E. Produção de Carne a Pasto. In: PEIXOTO, A.M.M.; MOURA, J.C.; FARIA, V.P. de.
(ed.) Simpósio sobre manejo da pastagem: Produção de Bovinos a Pasto, 13. Fealq. Piracicaba, SP, 1996.
p. 243-274. 1997.