Location via proxy:   [ UP ]  
[Report a bug]   [Manage cookies]                
r e v b r a s o r t o p . 2 0 1 5;5 0(2):195–199 www.rbo.org.br Artigo Original Luxação acromioclavicular: avaliação pós-operatória dos ligamentos coracoclaviculares por ressonância magnética夽 Rafael Salomon Silva Faria, Fabiano Rebouças Ribeiro, Bruno de Oliveira Amin ∗ , Antonio Carlos Tenor Junior, Miguel Pereira da Costa, Cantídio Salvador Filardi Filho, Cleber Gonçalves Batista e Rômulo Brasil Filho Hospital do Servidor Público Estadual Francisco Morato de Oliveira, São Paulo, SP, Brasil informações sobre o artigo r e s u m o Histórico do artigo: Objetivo: Avaliar radiologicamente a cicatrização dos ligamentos coracoclaviculares após o Recebido em 11 de setembro de 2013 tratamento cirúrgico para luxação acromioclavicular. Aceito em 13 de março de 2014 Métodos: Foram convocados 10 pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico para luxação On-line em 31 de março de 2015 acromioclavicular pela via posterossuperior, com tempo de pós-operatório mínimo de um ano, para avaliação radiológica por ressonância magnética. Essa avaliação foi feita por meio Palavras-chave: de analogia com a escala descrita na literatura para estudo da cicatrização do ligamento Articulação acromioclavicular cruzado anterior do joelho e pela aferição das medidas dos ligamentos coracoclaviculares Ligamentos cicatrizados. Imagem por ressonância magnética Resultados: Houve formação de estrutura cicatricial aparentemente fibrosa em 100% dos casos. Em 50% dos casos, a imagem dessa estrutura era de bom aspecto à ressonância nuclear magnética e 50% deficiente. Conclusão: A avaliação por ressonância nuclear magnética dos pacientes em pós-operatório tardio de cirurgia para tratamento da luxação acromioclavicular aguda, pela via posterossuperior do ombro, mostrou a cicatrização dos ligamentos coracoclaviculares em 100% dos casos, sendo 50% deficiente. © 2014 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados. 夽 Trabalho desenvolvido no Grupo de Ombro e Cotovelo do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil. ∗ Autor para correspondência. E-mail: bruno amin@hotmail.com (B.d.O. Amin). http://dx.doi.org/10.1016/j.rbo.2014.03.010 0102-3616/© 2014 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados. 196 r e v b r a s o r t o p . 2 0 1 5;5 0(2):195–199 Acromioclavicular dislocation: postoperative evaluation of the coracoclavicular ligaments using magnetic resonance a b s t r a c t Keywords: Objective: To radiologically evaluate the healing of the coracoclavicular ligaments after Acromioclavicular joint surgical treatment for acromioclavicular dislocation. Ligaments Methods: Ten patients who had undergone surgical treatment for acromioclavicular disloca- Magnetic resonance imaging tion via a posterosuperior route at least one year earlier were invited to return for radiological assessment using magnetic resonance. This evaluation was done by means of analogy with the scale described in the literature for studying the healing of the anterior cruciate ligament of the knee and for measuring the healed coracoclavicular ligaments. Results: A scar structure of fibrous appearance had formed in 100% of the cases. In 50% of the cases, the images of this structure had a good appearance, while the other 50% were deficient. Conclusion: Late postoperative evaluation using magnetic resonance, on patients who had been treated for acute acromioclavicular dislocation using a posterosuperior route in the shoulder, showed that the coracoclavicular ligaments had healed in 100% of the cases, but that this healing was deficient in 50%. © 2014 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Published by Elsevier Editora Ltda. All rights reserved. Introdução A luxação acromioclavicular (LAC) é uma patologia traumática do ombro, que ocorre predominantemente em jovens, na qual a alteração anatômica e biomecânica gerada pela ruptura dos ligamentos coracoclaviculares (LCC) é fator crucial para decisão de fazer tratamento cirúrgico ou não cirúrgico.1–3 A consagrada classificação radiográfica descrita por Rockwood1 usa como parâmetro o ombro contralateral: quando não há alteração da distância do intervalo coracoclavicular (LAC grau I); se há variação do intervalo coracoclavicular, porém menor do que 25% (LAC grau II); se a variação do intervalo coracoclavicular estiver aumentada entre 25% e 100% (LAC grau III); se há desvio posterior da clavícula (LAC grau IV); quando ocorre variação do espaço coracoclavicular aumentada entre 100% a 300% (LAC grau V); e quando o espaço coracoclavicular está diminuído ou invertido (LAC grau VI). Os LCC são os principais estabilizadores da articulação acromioclavicular e principais sustentadores do membro superior.1–3 Apesar disso, pouco se sabe sobre a sua cicatrização após o tratamento cirúrgico para LAC. Materiais e métodos Foram avaliadas as imagens de RM de 10 pacientes, homens e mulheres, com diagnósticos iniciais de LAC grau III a V, com idades entre 20 e 50 anos, escolhidos aleatoriamentes (sorteio), dentro da nossa casuística de pacientes. Todos haviam sido operados pela mesma equipe e com a mesma técnica cirúrgica: amarrilha da clavícula ao processo coracoide por duas âncoras metálicas (5 mm de diâmetro com fios inabsorvíveis), pela via posterossuperior do ombro4 (fig. 1A-B) O seguimento mínimo pós-operatório foi de um ano. Como critérios de exclusão usaram-se: pacientes tratados de maneira incruenta; pacientes tratados cirurgicamente nos quais outras técnicas foram usadas (como a transferência do LCC para a clavícula distal) e idade inferior a 20 ou superior a 50 anos. Os pacientes sorteados foram convocados para exame de RM em aparelho de 1,5 tesla, dentro de padrões descritos na literatura para avaliação dos LCC (fig. 2). Foram feitos cortes em planos paralelos a uma linha traçada entre o ápice do processo coracoide e o ápice do tubérculo menor do úmero, com 3,5 mm de espessura, ponderados em T1 e T2, com o paciente em posição neutra. Os parâmetros da imagem foram: campo de visão 145 × 145 mm a 150 × 150 mm; tamanho da matriz de 353 × 512 ou 256 × 512; e 3,5 mm de espessura seccional.5 Os exames eram avaliados em conjunto por um médico ortopedista especialista em cirurgia do ombro e cotovelo e um médico estagiário do Grupo de Ombro e Cotovelo do HSPE. Para avaliar a presença e a qualidade da cicatrização dos LCC, usou-se uma escala já descrita na literatura:6 escala para avaliação da cicatrização do enxerto de tendões flexores do joelho, usada nas reconstruções das lesões do ligamento cruzado anterior. Essa escala gradua a imagem do ligamento, obtida na RM, em quatro estágios segundo seu tamanho e sinal de homogeneidade (tabela 1). Os ligamentos classificados como graus I e II estariam relacionados a boa estabilidade, considerando-se então como cicatrizados, e aqueles graduados como graus III e IV, com cicatrização deficiente ou não cicatrizados. A avaliação da geometria do tecido cicatricial encontrado (neoligamento) foi feita com o software Impax 6.3 Client. Fizeram-se as seguintes medições: comprimento, aferido no sentido das fibras do neoligamento, do ponto médio da origem clavicular ao ponto médio da inserção no processo coracoide; largura, no plano coronal de sua porção proximal (origem clavicular) e distal (inserção no processo coracoide); angulação, r e v b r a s o r t o p . 2 0 1 5;5 0(2):195–199 197 Figura 1 – Desenho esquemático que demonstra posicionamento das âncoras e das perfurações feitas na clavícula em visão (A) posterior e (B) anterior. Tabela 1 – Graduação para avaliação de cicatrização ligamentar por RM Grau I: Banda reta bem definida e de tamanho normal com sinal de intensidade baixa homogênea. Grau II: Banda reta bem definida com sinal de baixa intensidade com pontos de sinal de alta intensidade. Grau III: Banda fina de sinal de baixa intensidade contendo massa de sinal de alta intensidade. Grau IV: Uma banda de sinal escuro não discernível. Fonte: Ihara et al.6 aferida entre a linha usada para medida do comprimento e uma linha reta no bordo inferior da clavícula distal (fig. 3A-C). Resultados Foi observado que todos os pacientes apresentavam ao exame de RM a imagem de um tecido cicatricial aparentemente fibroso, que conectava a clavícula distal ao processo coracoide. Em cinco exames, classificados como grau II, considerou-se que havia boa cicatrização ligamentar. Os outros cinco exames mostravam cicatrização deficiente. Três foram classificados como grau III e dois como grau IV. Quanto à geometria dos LCC cicatrizados, não se observou distinção entre os dois ligamentos (conoide e trapezoide). Foi apenas observada estrutura cicatricial única e com variação das medidas entre os pacientes (tabela 2). No entanto, o novo ligamento apresentou, na maioria dos casos, manutenção do aspecto trapezoidal dos LCC, com sua porção clavicular mais larga do que sua porção distal no processo coracoide. Os exames dos pacientes classificados como grau IV (dois casos) não permitiram mensurações efetivas, por causa de suas irregularidades anatômicas. os LCC. O tempo considerado para que ocorra a cicatrização dos pacientes tratados cirurgicamente por LAC foi determinado tendo por base o tempo de pós-operatório mínimo necessário para que o ligamento cruzado anterior do joelho, reconstruído com enxerto de tendões flexores, obtenha histologia semelhante à original, o qual varia de 30 a 52 semanas, segundo a literatura consultada.7 Em estudo feito por Clayer et al.,8 com exames sequenciais de RNM em seis pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico para LAC, nos quais foi usada uma alça absorvível para a fixação coracoclavicular, observou-se que com seis meses de pós-operatório já era evidenciada uma estrutura de aparência fibrosa que conectava o processo coracoide à clavícula. A RM é um exame de acurácia eficiente para avaliação detalhada das estruturas ligamentares das articulações do corpo humano, como o ombro e o joelho.9 Nemec et al.10 compararam a RM à radiografia para classificação das LAC ocorridas em 44 pacientes, segundo o sistema de Rockwood. Os exames Discussão Para avaliação da cicatrização dos LCC foram usados, neste estudo, parâmetros anatômicos já estabelecidos na literatura para lesões ligamentares do joelho, uma vez que não foram encontrados na literatura parâmetros pré-estabelecidos para Figura 2 – Imagem de RM nos padrões descritos para visibilização dos LCC de paciente submetido ao tratamento cirúrgico para LAC. 198 r e v b r a s o r t o p . 2 0 1 5;5 0(2):195–199 A B 22,9 mm 24,0 mm 11,0 mm C 32,3 148 Figura 3 – Parâmetros usados para mensuração do neoligamento entre o processo coracoide e a clavícula, em paciente no pós-operatório tardio de tratamento cirúrgico para LAC. A, comprimento; B, largura na origem clavicular e na inserção no processo coracoide; C, angulação em relação à clavícula distal. foram concordantes para a classificação da lesão em apenas 52,2% dos casos, o que demonstra a RM como um exame mais específico. Em nosso estudo, observou-se a presença de uma estrutura de característica cicatricial, aparentemente fibrosa, com formato trapezoidal e ligação coracoclavicular, pela imagem da RM, em 100% dos casos operados. No entanto, com sinais de cicatrização deficiente em 50% dos casos. Esses achados foram compatíveis com o estudo de Clayer et al.,8 no qual também se observou a formação de estrutura anatômica de aspecto fibroso na topografia dos LCC, o que sugere a cicatrização desses ligamentos. Tabela 2 – Resultados da avaliação por RM dos pacientes em pós-operatório tardio de tratamento cirúrgico para LAC Pacientes 1 2 3. 4 5 6 7 8 9 10 Média Classificação da cicatrização Grau II Grau IV Grau II Grau III Grau II Grau III Grau II Grau IV Grau II Grau III n.m., não mensurável. Comprimento longitudinal do neoligamento coracoclavicular 23,7 mm n.m. 23,0 mm 10,5 mm 29,1 mm 13,3 mm 15,4 mm n.m. 17,0 mm 23,2 mm 19,3 mm Largura do neoligamento (clavicular) 23,9 mm n.m. 31,9 mm 27,6 mm 34,2 mm 29,5 mm 18,6 mm n.m. 32,4 mm 20,1mm 27,3 mm Largura do neoligamento (coracoide) Angulação do neoligamento 14,3 mm n.m. 22,4 mm 12,8 mm 25,4 mm 17,0 mm 17,3 mm n.m. 20,2 mm 12,3 mm 17,7 mm 44◦ n.m. 61◦ 69◦ 48◦ 20◦ 29◦ n.m. 75◦ 74◦ 52◦ r e v b r a s o r t o p . 2 0 1 5;5 0(2):195–199 Em estudo anatômico sobre os LCC, Harris et al.11 fizeram aferições em 24 ombros de cadáveres e encontraram as seguintes médias: comprimento do ligamento conoide de 19,4 mm; comprimento do ligamento trapezoide de 19,3 mm; largura clavicular da origem do ligamento conoide e largura de sua inserção no processo coracoide, respectivamente, de 20,6 e 10,6 mm; largura clavicular da origem do ligamento trapezoide e largura da sua inserção no processo coracoide, respectivamente, de 21,7 e 14,0 mm. Em nosso estudo por RM, obteve-se média semelhante, do comprimento do neoligamento formado no pós-operatório. As médias das larguras não foram passíveis de comparações, por causa das diferenças de conformação entre os LCC e o neoligamento. Não foram feitas correlações clínicas e biomecânicas com os achados deste estudo, por causa do espaço amostral reduzido. 2. 3. 4. 5. 6. Conclusão A avaliação por RM dos pacientes em pós-operatório tardio de cirurgia para tratamento da LAC aguda pela via posterossuperior do ombro mostrou a cicatrização dos LCC em 100% dos casos, sendo 50% deficiente. 7. Conflitos de interesse 9. 8. Os autores declaram não haver conflitos de interesse. 10. refer ê ncias 11. 1. Collins DN. Disorders of acromioclavicular joint. In: Rockwood CA Jr, Matsen FA 3rd, Wirth MA, Lippitt SB, editors. 199 The shoulder. 4th ed. Philadelphia: Saunders Elsevier; 2009. p. 453–526. Costic RS, Vangura A, Fenwick JA, Rodosky MW, Debski RE. Viscoelastic behavior and structural properties of the coracoclavicular ligaments. Scand J Med Sci Sports. 2003;13(5):305–10. Dawson PA, Adamson GJ, Pink MM, Kornswiet M, Lin S, Shankwiler JA, Lee TQ. Relative contribution of acromioclavicular joint capsule and coracoclavicular ligaments to acromioclavicular stability. J Shoulder Elbow Surg. 2009;18(2):237–44. Dal Molin DC, Ribeiro FR, Brasil Filho R, Filardi Junior CS, Tenor Junior AC, Stipp WN, et al. Via de acesso cirúrgico posterossuperior para o tratamento das luxações acromioclaviculares: resultados de 84 casos operados. Rev Bras Ortop. 2012;47(5):563–7. Alyas F, Curtis M, Speed C, Saifuddin A, Connell D. MR Imaging appearances of acromioclavicular joint dislocation. Radiographics. 2008;28(2):463–79. Ihara H, Miwa M, Deya K, Torisu K. MRI of anterior cruciate ligament healing. J Comput Assist Tomogr. 1996;20(2): 317–21. Fu FH, Bennett CH, Lattermann C, Ma CB. Current trends in anterior cruciate ligament reconstruction Part I: biology and biomechanics o reconstruction. Am J Sports Med. 1999;27(6):821–30. Clayer M, Slavotinek J, Krishnan J. The results of coraco-clavicular slings for acromio-clavicular dislocation. Aust N Z J Surg. 1997;67(6):343–6. Cohen M, Marcondes FB. Lesões ligamentares. In: Cohen M, Mattar Júnior R, Garcia Filho RJ, editors. Tratado de ortopedia. Roca: São Paulo; 2007. p. 401–11. Nemec U, Oberleitner G, Nemec SF, Gruber M, Weber M, Czerny C, Krestan CR. MRI versus radiography of acromioclavicular joint dislocation. AJR Am J Roentgenol. 2011;197(4):968–73. Harris RI, Vu DH, Sonnabend DH, Goldberg JA, Walsh WR. Anatomic variance of the coracoclavicular ligaments. J Shoulder Elbow Surg. 2001;10(6):585–8.